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Manifesto

o PAPEL ATIVO DA GEOGRAFIA


UM MANIFESTO

Milton Santos=

The active role of Geography: A Manifesto

The active role of Geography in conccption which encompasses both the


Academia, in Planning and as a tool for aclive role of space as actor and its role
building up citizenship are discussed in as lhe object of action. It is only through
this Manifesto. Considering space as the adoption 01' such a perspective that
the central scientific category of the dis- geographers will effectively address the
cipline, the author proposes that one significam questions which face society
should view it as 'used territory ', a today.

1 Se tal conceituação não é


abrangente de todas as formas de
o papel atribuído à geografia e relação da sociedade com seu meio,
a possibilidade de uma intervenção as intervenções serão apenas parciais
válida dos geógrafos no processo de ou funcionais, e sua eficácia será Ii-
transformação da sociedade são mitada no tempo.
interdependentes e decorrem da ma- É verdade que, na linguagem
neira como conceituarmos a discipli- comum e no entendimento de outros
na e seu objeto . especialistas, assim como de políticos

. Colaboradores: Adriana Bernardes, Adriano Zerbini, Cilene Gomes, Edison Bicudo, Eliza
Almeida, Fabio Betioli Contei, Flávia Grimm, Gustavo Nobre, Lídia Antongiovanni, Maíra
Bueno Pinheiro, Marcos Xavier, María Laura Silveira, Marina Montenegro, Marisa Ferreira
da Rocha, Mónica Arroyo, Paula Borin, Soraia Ramos, Vanir de Lima Belo

Estudos Territoriais Brasileiros - Laboplan


Departamento de Geografia
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
Uni versidade de São Paulo

XII Encontro Nacional de Geógrafos - Florianópolis - Julho de 2000


104 Revista Território, Rio de Janeiro, ano V, n" 9, pp. 103-109,jul./dcz., 2000

e administradores, a geografia é fre- frouxas, as práticas políticas aImeja-


qüentemente considerada como a dis- das serão, no mínimo, enviesadas.
ciplina que se preocupa com localiza- A compreensão do espaço ge-
ções. Aliás, um bom número de ográfico como sinônimo de espaço
geógrafos trabalha com essa visão. banal obriga-nos a levar em conta
A geografia considerada como todos os elementos e a perceber a
disciplina das localizações, posição inter-relação entre os fenômenos.
aceita durante largo tempo, mostra-se Uma perspectiva do território usado
todavia limitante do rol de relações conduz à idéia de espaço banal, O
que se dão entre o homem e o meio e, espaço de todos, todo o espaço. Tra-
por essa razão, revela-se insuficiente. ta-se do espaço de todos os homens,
Mas esse não é o único enfoque não importa suas diferenças; o espa-
simplificador e deformador. ço de todas as instituições, não im-
porta a sua força; o espaço de todas
2 as empresas, não importa o seu po-
der. Esse é o espaço de todas as
Foi por isso que propusemos dimensões do acontecer, de todas as
considerar o espaço geográfico não determinações da totalidade social. É
como sinônimo de território, mas como uma visão que incorpora o movimen-
território usado; e este é tanto o to do todo, permitindo enfrentar cor-
resultado do processo histórico quan- retamente a tarefa de análise. Com
to a base material e social das novas as noções de território usado e de
ações humanas. Tal ponto de vista espaço banal, saltam aos olhos os
permite uma consideração abrangente temas que o real nos impõe como
da totalidade das causas e dos efeitos objeto de pesquisa e de intervenção.
do processo socioterritorial. Mas tal constatação não é suficiente.
Essa discussão deve estar É indispensável afinar os conceitos
centrada sobre o objeto da disciplina que tornem operacional o nosso
- o espaço geográfico, o território enfoque. A riqueza da geografia como
usado - se nosso intuito for construir, província do saber reside, justamente,
a um só tempo, uma teoria social e no fato de que podemos pensar, a um
propostas de intervenção que sejam só tempo, os objetos (a materialidade)
totalizadoras. Entre os geógrafos, in- e as ações (a sociedade) e os mútuos
cluindo aqueles convidados para tra- condicionamentos entretecidos com o
balhar com toda sorte de questões movimento da história. As demais ci-
voltadas ao planejamento, o problema ências humanas não dominam esse
do espaço geográfico como ente rico veio epistemológico.
dinamizador da sociedade é raramen- O território usado constitui-se
te levado em consideração. Ora, se como um todo complexo onde se tece
as bases do edifício epistemológico são uma trama de relações complementa-
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res e conflitantes. Daí o vigor do vimento da disciplina e de seu papel


conceito, convidando a pensar proces- como ramo do conhecimento, particu-
sualmente as relações estabelecidas larrnente quando parecem tomar o
entre o lugar, a formação socioespacial lugar da geografia ou justificar auto-
e o mundo. nomamente sua existência.

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Cada vez que, em lugar de Por vezes é a própria forma-


considerar o movimento comum da ção do geógrafo que se torna um
sociedade como um todo e do territó- convite à fragmentação do conheci-
rio como um todo, partimos de um mento e do trabalho.
dos seus aspectos, acabamos encon- Quando se toma apenas uma
trando Iineamentos que apenas são parte do corpus da disciplina e assim
aplicáveis a uma determinada área de mesmo o trabalho se torna exito o, há
atuação - uma instância da vida so- nas pessoas um reforço à crença
cial -, sem todavia autorizar uma in- numa disciplina parcializada. É comum
tervenção realmente eficaz para o con- a opinião de que propor intervenções
junto da sociedade. Em outras pala- é possível àqueles enfoques fundados
vras, tais soluções são ocasionais, mas em visões parciais, ainda que essas
não duradouras, remédios parciais, mas intervenções amiúde sejam funcionais
não globais. à política das grandes empresas. Será
Qualquer proposta de análise e esse o êxito que buscamos?
interpretação que pretenda inspirar ou No ensino da geografia é me-
guiar uma intervenção endereçada ao nos freqüente do que seria desejável
conjunto da sociedade não pode pres- a consideração da totalidade do co-
cindir, então, de uma visão desse todo. nhecimento geográfico. A geografia
Incapazes de gerar mudanças que en- é quase sempre apresentada ao estu-
globem a totalidade do território e da dante, desde o primeiro momento, de
sociedade, as intervenções parciais forma segmentada, dificultando a
atendem a interesses particulares ou apreensão de uma abordagem essen-
apresentam resu ltados efêmeros e cialmente geográfica e comprometen-
inoperantes. do a formação do profissional e o
Uma posição parcial da geogra- futuro da própria disciplina. Como
fia frente ao seu objeto encontra abri- resultado, muitas vezes o geógrafo
go nas fragmentações e dicotomias especializa-se em um ramo
presentes em seu próprio seio, o que operacional voltado ao restrito mer-
a toma teoricamente frágil. Conheci- cado de trabalho.
mentos operatórios e parcelares po- Acreditamos poder escapar à
dem tornar-se entraves ao desenvol- "parc ial iz.ação" da disciplina (e,
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destarte, das intervenções a partir Soma-se a isto a consagração da frag-


dela), com a busca firme e continua- mentação no ensino em todos os pla-
da de uma ontologia do espaço geo- nos (nas aulas, nos livros, nas grades
gráfico. Esta busca pode ser entendi- curriculares). A situação é agravada,
da como a construção de um conjunto ainda, quando no ensino superior -
de proposições epistemológicas que, público e privado - adota-se uma es-
formando um sistema lógico coerente, pecialização cujo fim é atender a uma
e sendo fundada nos avanços certa política e ao mercado.
metodológicos já conseguidos pela
disciplina no século XX, aprimoraria o 6
que se pode chamar de "núcleo duro"
da geografia, desembocando, neces- Tanto o mercado como a polí-
sariamente, numa visão geográfica tica às vezes inspiram soluções desse
totalizadora. tipo. Não será o caso de certas pro-
Conseguiríamos, desse modo, postas fundadas por exemplo nas
um rechaço à "indolência epistemoló- geografias do turismo, do meio ambi-
gica" (situação que, aliás, não é só ente, da cultura, dos SIG's, ou de
brasileira) na produção do conheci- sugestões ditas de planejamento regi-
mento geográfico. onal mas que, na verdade, beneficiam
uma ou poucas atividades em um dado
5 momento?
Não é demais assimilar estas
o espaço é freqüentemente proposições a uma fragmentação da
considerado como espaço político, disciplina geográfica em outras tantas
espaço econômico, espaço antropoló- geografias, que desejam, na prática,
gico, espaço turístico. E esse é um impor-se como autônomas, quando seu
grande problema para a disciplina. papel auxiliar apenas as qualifica como
Fragmentada, a geografia não ramos operacionais de uma geografia
oferece uma explicação do mundo e mais complexa e unitária. Esta pare-
portanto passa a precisar, cada vez ce mais possível de alcançar através
mais, de adjetivos que expliquem a de uma perspectiva do território
sua finalidade. Ela perde substância e usado, uma vez que estamos levando
corre sérios riscos de não ser mais em conta todos os atores.
necessária nos currículos escolares. Buscando atender às exigênci-
Tal fragmentação é decorrente, de um as na formação de profissionais para
lado, da crescente impossibi Iidade, o mercado de trabalho, cursos de
socialmente gestada, de percebermos graduação têm privilegiado a especi-
que todos os elementos agem conjun- alização do saber em detrimento do
tamente (e separações podem ser conhecimento abrangente, afastando
feitas apenas para fins analíticos). o profissional do cidadão. Por outro
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lado, políticas restritivas de financia- dade do mundo real. Todavia, no caso


mento provocam um distanciamento particular da geografia, essa idéia de
entre as várias áreas do saber, pri- unidade da Terra é contraposta por
vilegiando-se àquelas que possibili- aqueles que se apóiam em realidades
tam investigações aplicadas, consi- parciais para fundamentar argumen-
deradas de maior relevância econô- tações também parciais ou redutoras.
mica ou política. Assim, a geografia foi se firmando ao
Nesse contexto, muitos longo de sua história à base desse
geógrafos procuraram adaptar-se às confronto entre duas vocações bem
novas exigências por meio de saídas distintas. No plano do conhecimento
particularistas no ensino e na pesqui- ou das propostas de ação, a verdade
sa, enfatizando aspectos da realidade teria sido tomada por diversas formas
social como se fossem a totalidade do de engano.
fenômeno geográfico. Em nome de E hoje? Quando a própria glo-
uma modernização utilitária e produ ti- balização é vista como um resultado
vista, certos cursos de geografia cor- da vontade de integrar mercados se-
rem o risco de jogar fora princípios gundo um discurso único, ela não
que deveriam balizar e singularizar permite o reencontro de enfoques
esta área do saber. mais abrangentes.

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Na evolução do pensamento o problema central é como


geográfico, a vontade de totalização e utilizar os conhecimentos sistematiza-
a formulação dos respectivos enfoques dos por uma disciplina no delineamen-
têm sido presentes, ainda que contra- to de soluções práticas e caminhos
riadas sempre por uma tendência à frente aos problemas concretos da
segmentação. sociedade. Dependendo das filiações
Vejamos um exemplo. Na épo- teórico-ideológicas dos autores, isso
ca de Vidal de la Blache, a possibili- parece ter sido possível a especialis-
dade de totalização, às vezes concre- tas da ciência política, da economia
tizada com a ajuda da política de um etc, cuja tarefa ultrapassa, sem maio-
Estado necessitado de um conhecimen- res dificuldades, o limite da simples
to geográfico, não sofria as investidas interpretação dos fenômenos para
do mercado tal como as conhecemos sugerir mudanças, isto é, para se erigir
hoje. Desse modo, opunha-se um di- como uma política.
que à fragmentação do saber geográ- Quando o esquema interpreta-
fico e das suas propostas de ação. tivo da sociedade, próprio à nossa
Enfoques totalizadores tendem província do saber dá conta da reali-
a buscar uma correspondência à uni- dade concreta em sua totalidade, ele
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pode ser o fundamento da construção compreender indissociavelmente obje-


de um discurso novo para a ação tos e ações.
política dos ator~s sociais responsá- O território usado, visto como
veis por sua prática, tais como parti- uma totalidade, é um campo privilegi-
dos políticos, movimentos sociais, ins- ado para a análise, na medida em que,
tituições etc. Um discurso socialmen- de um lado, nos revela a estrutura
te eficaz pode ser o conteúdo, a base global da sociedade e, de outro lado,
de intervenções "sistêmicas" na so- a própria complexidade do seu uso.
ciedade, em diferentes níveis do exer- Para os atores hegemônicos o
cício da política, entre os quais, o mais território usado é um recurso, ga-
abrangente seria a contribuição para rantia da realização de seus interes-
a elaboração de um projeto nacional, ses particulares. Desse modo, o
comprometido com a transformação rebatimento de suas ações conduz a
da sociedade em benefício da maioria uma constante adaptação de seu uso,
da população do país. com adição de uma materialidade
A idéia de intervenção supõe funcional ao exercício das atividades
um interesse político, entendido como exógenas ao lugar, aprofundando a
interpretação histórica mais ampla, que di visão social e territorial do trabalho,
implica um ideal de futuro como es- mediante a seletividade dos investi-
paço de resolução de problemas su- mentos econômicos que gera um uso
postamente arraigados nas sociedades. corporati vo do território. Por outro
lado, as situações resultantes nos
9 possibilitam, a cada momento, enten-
der que se faz mister considerar o
Não se trata de impor uma comportamento de todos os homens,
definição única. O conteúdo de uma instituições, capitais e firmas. Os dis-
geografia compreensiva pode certa- tintos atores não possuem o mesmo
mente responder a uma entre várias poder de comando levando a uma
linhas teóricas, segundo a escolha do multiplicidade de ações, fruto do con-
autor. Mas, a partir daí, é indispensá- vívio dos atores hegemônicos com os
vel dispor de um conjunto coerente hegemonizados. Dessa combinação
de proposições, onde todos os elemen- temos o arranjo singular dos lugares.
tos em jogo sejam considerados em Os atores hegemonizados têm
sua integração e em seu dinamismo. o território como um abrigo, buscando
A geografia deve estar atenta constantemente se adaptar ao meio
para analisar a realidade social total a geográfico local, ao mesmo tempo que
partir de sua dinâmica territorial, sen- recriam estratégias que garantam sua
do esta proposta um ponto de partida sobrevivência nos lugares. É neste
para a disciplina, possível a partir de jogo dialético que podemos recuperar
um sistema de conceitos que permita a totalidade.
o Papel Ativo da Geografia. Um Manifesto 109

10 território como ator e a sociedade


como objeto da ação. É essa, ao nos-
Somente assim responderemos so ver, a maneira de encontrar um
à questão crucial de saber como e enfoque totalizador, que autorize uma
porque se dão as relações entre a intervenção interessando à maior par-
sociedade como ator e o território te da população.
como agido e, ao contrário, entre o

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