Sie sind auf Seite 1von 3

Atabaque e Capoeira

Augusto Mario Ferreira

O atabaque integrou-se ao instrumental da Capoeira em épocas recentes, dentro do


movimento de ​renovação​ que se desenvolve ainda hoje nos núcleos de prática da luta. Na
verdade, o atabaque nunca foi instrumento de Capoeira e os que o introduziram nas rodas
basearam-se sobretudo numa gravura de Rugendas, do século passado, em que aparece
um negro tocando atabaque e outro executando uma espécie de ginga. Provável que fosse
apenas uma interpretação artística livre do pintor europeu e não o registro histórico fiel de
uma manifestação popular do povo escravo.

Até há meio século atrás nenhum Mestre de renome na Bahia, permitia o uso do atabaque
no instrumental da roda. Nem Vicente Ferreira Pastinha, o Mestre Angoleiro Pastinha, na
sua escola da Ladeira do Pelourinho, em Salvador, praticava essa mistura de Candomblé
com Capoeira.

Para Manoel dos Reis Machado, o Mestre Bimba parecia uma heresia. Ele, que se
propunha a cultivar a Capoeira original nas suas escolas, o Centro de Cultura Física
Regional, da antiga Rua das Laranjeiras ou da Amaralina, jamais praticou esse sincretismo.
Para ele, Candomblé era Candomblé e Capoeira era Capoeira, coisas distintas, embora da
mesma origem da população negra. Não misturava canais, embora mantivesse um terreiro
de Candomblé no Alto da Amaralina, no mesmo local onde ensinava a Capoeira.

No meu tempo, o Mestre Bimba jamais permitiu sequer o uso de dois berimbaus nas rodas
que promovia porque, conforme me explicou, o som dos toques deviam ser puros, audíveis
e preponderantes. Além desse único berimbau, aceitava um ou dois pandeiros, tocados
com moderação para não ​abafar​ o som límpido do berimbau.

Com isto, o Mestre Bimba transmitia aos seus alunos a função técnica dos instrumentos
musicais na roda de Capoeira. Ele mesmo, nas nossas muitas conversas a sós, na
Amaralina, criticava o que chamava de ​banda de música​ das rodas de Angoleiros, que
utilizavam quatro ou mais berimbaus, em geral atravessando os toques, e quantos
pandeiros houvesse à disposição.

Nas visitas que realizei (1955) à escola do Mestre Pastinha, vi tocar agogô na roda, em
jogo de Angoleiros, que não se ligavam muito nessa questão do purismo da luta. Nunca vi
porém o uso do atabaque. Não vi também atabaque nas rodas de Angoleiros, promovidas
com freqüência na Cidade Baixa em especial na rampa do Mercado Modelo.

Não era por preconceito que esses mestres antigos evitavam o atabaque nas rodas de
Capoeira. Para Mestre Bimba era por um motivo de ordem técnica, ou seja, o toque do
berimbau, para ele, servia para orientar o ritmo e o tipo de jogo. Os praticantes precisavam
ouvi-lo com clareza para não sair do ritmo. Um toque de iúna, por exemplo, indicava que só
​formados​ podiam jogar na roda dali para a frente, pois só eles tinham experiência suficiente
para jogar ao som desse toque destoante dos demais. A iúna inclusive, pelo seu estilo,
dispensava até os pandeiros. O berimbau trabalhava solo, permitindo ao tocador
demonstrar sua performance e seu virtuosismo musical, num toque tão despojado e tão
límpido como é a iúna.

O atabaque é instrumento fundamental no Candomblé e nas atividades de terreiros, onde


tem funções de muita influência nos cânticos aos orixás. O etnólogo Waldeloir Rego, no seu
excelente trabalho Capoeira Angola Ensaio Sócio-Etnográfico[1], o melhor que já se
produziu no Brasil até hoje, com profundidade de conhecimento, reforça a tese de Mestre
Bimba, negando que o atabaque seja instrumento para a prática da Capoeira.

​O principal instrumento musical da Capoeira ​ ele afirma ​ é o berimbau, o qual, numa roda
de jogo de Capoeira, pode funcionar sozinho sem os demais instrumentos​.

Embora ele registre informações de ​capoeiristas antigos​, incluindo o atabaque como


instrumento de uso esporádico no acompanhamento musical do jogo de Capoeira, ele
especifica logo a seguir:

​No presente (década de 60), só vi, até agora, acompanhamento com berimbau, caxixi,
pandeiro e agogô​ e cita, como exemplo, as academias de Vicente Ferreira Pastinha, Mestre
Pastinha e Washington Bruno da Silva, Mestre Canjiquinha.

Waldeloir faz menção ainda a um instrumento de origem remota, citado até na Bíblia, o
adufe utilizando durante algum tempo como instrumento musical da Capoeira. ​O adufe é um
pequeno pandeiro de formato quadrado e de proveniência mourisca​ ele explica, depois de
extensa pesquisa de sua origem, concluindo: ​O adufe foi também aculturado e aproveitado
pelos negros no Brasil​. Pelo que se deduz, este instrumento de percussão desprovido das
soalhas (as placas metálicas presas ao seu aro) servia na roda para fazer a marcação,
enquanto o pandeiro executava os repiques e outras variações pertinentes, sem contudo
abafar o som básico do berimbau.

Talvez por desconhecimento ou por se ter perdido essa memória dos tempos da Capoeira
original, é hoje muito raro vê-se uma roda na qual o atabaque esteja ausente. É um
contra-senso? Sem dúvida. É uma aculturação? Claro. É um erro técnico? Evidente. Mas,
enfim, como diria por certo o Mestre Acordeon, no seu tom conciliador, ​cada um joga sua
Capoeira do modo que lhe convém​.

_________________________

Augusto Mario Ferreira, jornalista,

é formado pelo mestre Bimba (1955)


[1] Editora Itapuã, Salvodor, BA., 1968

Das könnte Ihnen auch gefallen