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DIREITO CONSTITUCIONAL
Sumários de Direito Constitucional segundo as prelecções aos alunos do 1º ano
jurídico da Universidade Lusíada de Lisboa no 2.º semestre do ano lectivo 2016/2017
Texto para uso exclusivo dos alunos. Não dispensa a leitura das
Versão provisória. Não deve ser citado sem autorização expressa do autor.
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Parte I
Constitucionalismo e Constituição
1. Constitucionalismo
Bibliografia: J. J. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição,
Coimbra, Livraria Almedina, 2003, Parte I e Parte II; JORGE BACELAR GOUVEIA, Manual de Direito
Constitucional, Coimbra, Livraria Almedina, 2013, Vol. I, Cap. I a IV, MANUEL AFONSO VAZ,
Direito Constitucional – O sistema constitucional português, Porto, Universidade Católica Editoria, 2015,
Introdução, e PAULO OTERO¸ Direito Constitucional Português, Livraria Almedina, Coimbra, 2010,
vol. I, Cap. I, secção 3.ª
a partir de meados do séc. XVIII, questiona nos planos político, filosófico, jurídico,
nova ordem política e social respeitadora da (i) pessoa humana como ser livre e racional
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francesa com os movimentos propulsionados, respectivamente, pela Glorious
das suas instituições políticas numa linha de evolução na continuidade: a Magna Charta
Rights (1628), Habeas Corpus Act (1679), Bill of Rigths (1689), estão inseridos numa
assim como as declarações proferidas pelos povos das demais colónias, às quais aquela
(4 de Julho de 1776).
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O constitucionalismo alemão configura uma experiência de constitucionalismo
incorporavam (i) as (putativas) actas das Cortes de Lamego que estabeleciam a forma
sobre a regência e tutoria na menoridade dos reis (1674), (iii) sobre o casamento dos
reconhecer direitos dos súbditos e o seu efeito útil consistia em impedir o Rei de alterar
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O texto constitucional consagrava direitos e deveres fundamentais típicos do
igualdade perante a lei, a justiça criminal, pela proibição da prisão sem culpa formada e
e judicial (juízes). As Cortes eram compostas por uma única câmara, eleita por sufrágio
directo e universal (!) e em escrutínio secreto. O Rei, titular da Coroa, era designado por
explicações.
de 1823), revolução absolutista impulsionada por D.ª Carlota Joaquina e por D. Miguel
VI, apesar de haver jurado a Constituição, assumiu a condução do sistema político como
rei absoluto. A Constituição de 1822 conheceu ainda uma segunda vigência entre 1936
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1.3.1.3. A Carta Constitucional de 1826
dos Pares e a Câmara dos deputados. A primeira era composta por pares hereditários e
por pares vitalícios, de nomeação régia e sem número fixo, enquanto a segunda era
A Carta Constitucional conheceu três vigências: a (i) primeira entre 1826, com o
antiga, a (ii) segunda iniciada em 1834, com a Paz de Évora Monte que colocou termo
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1.3.1.4. A Constituição de 1838
poderes do Estado. As Cortes eram compostas por duas Câmaras: dos Senadores e dos
Fontes Pereira de Melo, com intuito de retirar essa arma eleitoral à oposição.
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Quanto à organização do poder político, a legislatura foi reduzida de quatro para
três anos. Ainda neste âmbito, foi suprimida a hereditariedade do pariato como modo de
designação dos titulares da câmara alta e o número de pares foi limitado a cem pares de
nomeação régia mais cinquenta eleitos pelos pares do reino entre si. O poder moderador
Deputados que passou a estar restringido aos casos em que o bem do Estado assim o
exigisse, ficando ainda o Rei impedido de exercer esta prerrogativa nos primeiros três
petição e de reunião.
Regenerador, presidido por Hintze Ribeiro (1895), e confirmado pelas Cortes após
reeleição destas.
Acto Adicional de 1896 suprimiu os pares electivos, a Câmara dos pares passou a ser
composta apenas por pares por direito próprio que a título transitário continuariam a
conjunta das Câmaras, convocada a pedido de qualquer delas, suprimindo assim o poder
de arbitragem do Rei.
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O Rei foi compensado com a devolução do poder de dissolução livre da Câmara
dos Deputados.
Supremo Tribunal de Justiça) para julgar os delitos cometidos pelos Ministros da Coroa.
Constituição (19.Junho.1911).
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de resistência. Ainda ano contexto das relações entre o cidadão e o Estado, foram
(cfr. infra).
Senado, ambas eleitas por sufrágio directo. O Senado era uma câmara alta territorial
as leis, sendo a promulgação um acto vinculado, isto é, que o Chefe de Estado deveria
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praticar obrigatoriamente ou, noutra fórmula, sem possibilidade de veto (como sanção
1917, foi aprovada por decreto ditatorial do Governo, confirmado pelo Congresso (ao
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A Constituição de 1911 cessou a vigência com o golpe militar de 28 de Maio de
poderemos dizer que o período em que vigorou esteve marcado pela instabilidade do
militar entre 1926 e 1933. Segundo alguns autores como MARCELLO CAETANO, a
1930, sob a forma de decreto com força de lei sujeito a futura ratificação pela
Assembleia Constituinte.
corporativo.
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O texto integral do projecto foi publicado em todos os jornais diários com
tiragem quer em Portugal continental, quer nas ilhas adjacentes, quer nas províncias
favorável (!), indícios que nos permitem quilificar esta consulta como plebiscitária.
assumiam a natureza jurídica de direitos fundamentais dos cidadãos (Título II) mas
ensino e cultura nacional, das relações do Estado com a Igreja Católica e demais cultos,
direitos fundamentais. Com efeito, além de acolher o legado das Constituições liberais
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à reparação efectiva de todas as lesões causadas por entidade pública (eventualmente
princípio do Estado laico foi substituído pelo princípio da separação cooperante (v.g.
dos direitos fundamentais porque a prática política do Estado Novo era algo diversa,
não por violação da constituição mas com cobertura constitucional, porque o artigo 8.º,
ordem económica e social corporativa que significa o abandono da matriz liberal das
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salário compatíveis com a justa remuneração dos outros factores de produção (artigo
O Chefe do Estado era o Presidente da República, eleito pela Nação, isto é, por
sufrágio directo dos cidadãos eleitores, para um mandato de sete anos (artigo 72.º) e
das suas funções (artigo 78.º). A Constituição de 1933 estabelecia a inelegibilidade dos
Reis de Portugal e seus familiares até ao sexto grau para o cargo de Chefe do Estado
(artigo 74.º).
A Assembleia Nacional era composta por noventa (90) deputados, eleitos por
sufrágio directo dos cidadãos eleitores, para uma legislatura de quatro anos (artigo 85.º).
A duração da sessão legislativa era de três meses (improrrogáveis) em cada ano civil,
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A Assembleia Nacional era o órgão competente, entre outros poderes do Estado,
para aprovar as leis, assim como para as interpretar, suspender e revogar (artigo 91.º/1).
respectivo mandato estavam regulados por lei (artigo 102.º). A acção da Câmara
Corporativa estava circunscrita à tarefa de “relatar e dar parecer por escrito sobre todas
membros do Governo eram também nomeados e demitidos pelo Chefe de Estado mas
(artigo 107.º).
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Aos tribunais cabia exercer a função jurisdicional (artigo 115.º).
sistema político era o Presidente do Conselho de Ministros, uma vez que, no plano
de Presidente do Conselho.
podia rever a Constituição no prazo de dez anos (artigo 133.º). A Constituição poderia
específica residia no encurtamento do prazo de revisão para cinco anos, sendo neste
caso exigido o voto favorável de 2/3 dos Deputados para abertura do procedimento de
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Governo determinar que a Assembleia Nacional a eleger assumisse poderes de revisão
Assembleia Nacional foi aumentado para cento e vinte (120) mas, em compensação, as
da situação “de urgência e necessidade pública”. O Governo passou deste modo a ser
do Estado que deixou de ser eleito por sufrágio universal e directo para passar a ser
eleito por um colégio restrito, composto pelos Deputados à Assembleia Nacional e pelos
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Procuradores à Câmara Corporativa, em reunião conjunta. Ainda no contexto desta
reforço dos direitos das pessoas em sede de garantias do processo criminal e do recurso
revisões constitucionais
sucedido com a generalidade das revoluções militares do séc. XX, com intuito de
política portuguesa até à aprovação de uma nova Constituição. Neste contexto, importa
procedimento constituinte.
ainda que durante o período que mediava até à aprovação da mesma o poder seria
exercido pelos seguintes órgãos. O Presidente da República seria escolhido pela Junta
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de Salvação Nacional de entre os seus membros. A Junta de Salvação Nacional seria
por sete (7) membros. O Conselho de Estado seria composto pelos sete membros da
Junta de Salvação Nacional, mais sete representantes das Forças Armadas, mais sete
e aprovar os decretos-lei propostos por este. O Governo seria nomeado pelo Presidente
Conselho de Chefes dos Estados-Maiores das Forças Armadas que seria competente
de Primeiro-Ministro.
do Movimento das Forças Armadas. Uma facção radical do Movimento das Forças
uma eleição para o Presidente da República por sufrágio directo universal e secreto,
cujo decreto-lei não foi aprovado pelo Conselho de Estado. O Gerenal Spínola, sentindo
Junta de Salvação Nacional, agora reduzida a três vogais, designou o General Francisco
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da Costa Gomes, chefe do Estado Maior das Forças Armadas, para Presidente da
República interino.
momento eram titulares de órgãos do poder político ou das forças armadas, quer
sucessivas (cidadãos que haviam exercido cargos públicos durante o Estado Novo).
golpe militar de 11 de Março de 1975, que representou a vitória de uma facção mais
nível dos órgãos de soberania. Assim, foi criado o Conselho da Revolução que
Maior e era composto por vinte e quatro (24) membros, passando a democracia
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organização do poder político que contemplasse (α) a continuidade do Conselho a
Nove, em cujos termos um grupo de nove oficiais das Forças Armadas, discordantes da
europeu oriental”. O grupo dos nove saiu vencedor do golpe militar de 25 de Novembro
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e os partidos políticos encontrar a conjuntura favorável para desencadear negociações
Revolução e circunscrição das suas funções (neste contexto foi prevista a criação de
Abril de 1981 (entretanto retirado por a ASDI haver subscrito o projecto da FRS), enquanto a
votação final global, realizada em 12 de Agosto de 1982, foi o seu termo final. Além
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apresentados (e não retirados). Assim, por um lado, os projectos da AD e da FRS
nas eleições presidenciais e, embora houvesse sido apoiado pelo PS, não lograra o apoio
pessoal do Dr. Mário Soares… Por outro lado, os projectos de revisão constitucional do
A parte da Constituição mais alterada nesta revisão constitucional foi a Parte III,
exercício das suas funções). Por seu turno, as (ii) competências políticas e legislativas em
matéria militar foram distribuídas pelo próprio PR (presidir ao Conselho Superior de Defesa
Nacional e nomear e exonerar as altas chefias militares, embora neste último caso, sob proposta do
matéria militar) e pelo Governo (dirigir a Administração militar). Por último, (iii) as
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dissolver a AR, passou poder exercer livremente essa competência (o parecer do CE não
política do PR.
do CDS) e 8 de Julho de 1989 (votação final global da Lei Constitucional n.º 1/89).
Contudo, o impulso decisivo para a revisão constitucional foi dado com o acordo de
A parte da Constituição mais alterada nesta revisão constitucional foi a Parte II,
colectivista das estruturas de produção por força dos compromissos a que o Estado
Europeia. Assim, na sequência do acordado entre PPD/PSD e PS, foi (i) abolido o
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aprovação de uma lei-quadro das privatizações vinculada a princípios consagrados em
mencionar a força jurídica dos planos na medida em que estes passaram a estar
articulados com o programa do Governo, foi criado o (v) Conselho Económico e Social
e por último (vi) o título referente à reforma agrária foi substituído por outro de maior
intervalo entre 230, mínimo, e 250, máximo, a criação de um novo tipo de leis, as (iv)
composição de conflitos.
permitir a ratificação do Acto Único Europeu pelo Estado português e por esse motivo
exercício em comum de poderes soberanos (artigo 7.º/6). Por outro lado, em matéria de
posteriormente, a adesão de Portugal à moeda única (artigo 105.º) e, por último, foram
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alterados os prazos para a revisão constitucional ordinária (artigo 284.º/1) com intuito
importa mencionar: (i) a consagração de novos direitos fundamentais, v. g., direito geral
de regras para o exercício dos mesmos, (iii) alargamento do direito de voto na eleição
integração europeia, (vi) supressão parcial do regime jurídico dos planos económicos,
permitir a ratificação do (i) Estatuto do Tribunal Penal Internacional (cfr. artigo 7.º/7);
como língua oficial (artigo 11.º, n.º 3), o (iii) alargamento dos direitos políticos dos
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(sem que no entanto que haja sido reconhecido o direito à greve às forças militares nem
sequer militarizadas).
Direito português e o Direito da União Europeia (artigo 8.º/3 e 4), a (ii) (re)regulação da
exercício de cargos públicos (artigo 118.º/2) e o (iv) alargamento dos poderes das
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2. Constituição
medida em que toda a gente, em todos os locais, fala acerca da Constituição mas, no
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pessoa humana e (ii) organização do poder político (segundo um modelo que
“sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos, nem estabelecida a
dos franceses e, por outro lado, o Estado Liberal (de legalidade) foi estruturado com
alicerce no binómio Estado / Sociedade (civil), cujos termos são considerados por
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2.3. Constituição e Estado de Direito Democrático
movimento constitucional, o Estado, pelo que será legítimo o quesito: que coisa é o
comunidades humanas, caracterizado pela (i) cidadania, pela (ii) territorialidade e pela
europeus) estava imune ao Direito, antes de ser transmutado, por acção das revoluções
liberais, num Estado Constitucional, isto é, num Estado com as qualidades (GOMES
constitucional, foi concebido e gerado em várias latitudes: Rule of Law, Etat légal e
Unidos da América) são (i) o due process, (ii) a superioridade das leis e dos costumes
A pedra de toque do Etat légal, por seu turno, consiste na estruturação de uma
Constituição e Lei de modo a que as fontes de Direito situadas num escalão superior
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A premissa do Rechetsstaat, por último, reporta-se à (i) limitação do Estado
domínio legitimada pelo povo, no sentido de conjunto dos cidadãos, que configura o
exercer o poder político, enquanto o liberalismo responde à questão de saber como pode
actuar, e dentro de que limites, a pessoa que exerce o poder (ORTEGA Y GASSET).
assim enunciados constitucionais mais concentrados (ou menos densos) que as normas.
procedimentos decisórios e direitos e deveres das pessoas, e normas (β) adjectivas, que
politico. Sendo que no âmbito das primeiras importa ainda distinguir entre normas (1) organizatórias ou
de organização (que definem a formação, a composição e a competência dos órgãos do poder político),
(2) normas procedimentais ou formais (que definem a tramitação dos procedimentos decisórios e a forma
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que as decisões finais carecem revestir) e (3) normas materiais (que definem o conteúdo das relações
jurídico-políticas).
à sua (ii) relação com o tempo, em (α) normas preceptivas, aquelas que acolhem
e cultural. Sendo que no âmbito do primeiro termo importa ainda distinguir, em razão da sua eficácia,
as (1) normas exequíveis por si mesmas das (2) normas não exequíveis por si mesmas.
isso dotados de um âmbito mais alargado. O que pensar sobre este assunto?
Portuguesa acolhe a tese da normatividade plena nos termos dos artigos 204.º e 277.º/1.
hermenêutica jurídica,
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β) princípio da interpretação de harmonia com a Declaração Universal
sentido documental; as hipóteses de coincidência entre estes dois últimos sentidos de Constituição são
as seguintes: (i) CF = CD, (ii) CF = várias CD simultâneas (v.g. Constituição francesa de 1875) ou
ii) Quanto à concordância das normas constitucionais com a realidade dos factos
programáticas.
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iv) Quanto ao quantum de ideologias que acolhe, podemos distinguir entre
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Parte II
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3.2.1.2. O princípio da liberdade
A liberdade de um homem “consiste [na possibilidade de] fazer tudo o que ele
considere conveniente para garantir a sua própria preservação, bem como a dos outros,
dentro dos limites autorizados pela lei natural” (JOHN LOCKE, Dois tratados de direito civil, p.
317; cfr. ainda artigo 4.º DDHC) ou, noutra formulação, consiste “[n]a autonomia da razão
pessoal existente em cada ser humano e a sua inviolabilidade na regência da sua própria
riscos produzidos pela vida em comunidade” (A. BARBOSA DE MELO, Democracia e Utopia,
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3.2.2.2. O princípio democrático
da soberania, isto é, o povo (cfr. artigos 1.º, 2.º e 3.º, 1.ª parte; democracia pressupõe
soberania popular), e aquele que o exerce (cfr. idem, 2.ª parte). Neste contexto, a
soberania pode ser exercida pelo próprio povo (democracia directa), pelos seus
Direito v. Democracia).
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3.2.3.2. O princípio do reconhecimento das autonomias locais e regionais
democrática da administração pública (artigo 6.º/1) mas sem prejuízo da necessária eficácia e da unidade
de acção da Administração pública (artigo 267.º/2), portanto enquadrado por uma ideia de equilíbrio
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4. A organização do poder político
Bibliografia: J. J. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição,
Coimbra, Parte III, Título IV; JORGE BACELAR GOUVEIA, Manual de Direito Constitucional,
Coimbra, Livraria Almedina, 2013, Vol. II, Cap. XII, § 44.º, e MANUEL AFONSO VAZ, Direito
Constitucional – O sistema constitucional português, Cap. I, e PAULO OTERO¸ Direito Constitucional
Português, vol. II, Cap. II.
4.1. Aspectos gerais sobre o regime constitucional dos órgãos do poder político
subjectivo do Estado é o titular do poder político (cfr. artigos 3.º/1 e 108.º CRP) que no
entanto (apenas) o exerce nos termos previstos na Constituição (cfr. artigos 10.º/1 e
soberania (cfr. artigo 110.º/2). Solução que implica uma reserva do legislador
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judicial, estão vinculados a respeitar escrupulosamente. (artigo 111.º/1). Neste contexto,
A separação de poderes, além das dimensões orgânica e funcional que lhe são
pessoal de poderes de modo a impedir que o mesmo homem integre dois poderes do
Civil (cfr. artigo 12.º/1 CRP) que, ainda segundo CHARLES DE MONSTESQUIEU,
diversos órgãos do Estado (isto é, o Rei deveria ocupar o poder executivo, enquanto a Nobreza e o
Povo ocupariam as duas câmaras do poder legislativo e os tribunais seriam um pouvoir neutre (!) de
modo a assegurar que o homem que faz a lei não a aplica ao caso concreto ), as incompatibilidades e
impedimentos dos titulares dos cargos políticos e dos altos cargos públicos (cfr. artigo
Cargos Políticos e Altos Cargos Públicos, aprovado pela Lei n.º 64/93, de 26 de Agosto, com
sucessivas alterações, a última das quais pela Lei Orgânica n.º 1/2011, de 30 de Novembro ) constituem
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instituições democráticas e é, por inerência, Comandante Supremo das Foças Armadas
(artigo 121.º/1, 1.ª parte), reconhecendo a Constituição capacidade eleitoral activa aos
ainda, desde a revisão constitucional de 1997, os emigrantes mas, neste caso, nos termos
3.ª parte, e ainda n.º 2). A solução legal em vigor vai no sentido da cidadania portuguesa
artigos 1.º/1 e 1.º-B da Lei eleitoral para o Presidente da República, aprovada pelo
Decreto-Lei n.º 319-A/76, de 3 de Maio, com sucessivas alterações, a última das quais pela Lei n.º 72-
A/2015, de 23 de Julho).
da universalidade dos direitos fundamentais (cfr. artigo 12.º/1 CRP), justificada pela
exigida aos candidatos maturidade mais elevada que aquela que é exigida em geral aos
lado, que o Presidente da República é reelegível por uma única vez (consecutiva) (cfr.
artigo 123.º/1) e, por outro lado, que as candidaturas são apresentadas pelos próprios
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15000 cidadãos eleitores (artigo 124.º/1), regra que encerra uma cláusula militar
Constitucional até 30 dias antes da data marcada para o acto eleitoral (idem, 2).
maioritário de maioria absoluta (artigo 126.º/1), com recurso a uma eventual segunda
volta entre os dois candidatos mais votados (idem, 3) no caso de nenhum dos candidatos
obter esta maioria na primeira volta (idem, 2). As regras que consagram o sistema
distingue entre (i) competência quanto a outros órgãos (artigo 133.º), (ii) competência
para a prática de actos próprios (artigo 134.º) (iii) competência nas relações
internacionais (artigo 135.º), embora se nos afigure mais consistente cientificamente a classificação
doutrinária entre poderes próprios, poderes partilhados e poderes de controlo (GOMES CANOTILHO e
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O Presidente da República é por inerência Presidente do Conselho de Estado
(cfr. artigo 133.º/a) CRP) que a Constituição define como “o órgão de político de
(que são membros designados por inerência simultânea, cfr. artigo 142.º/a) a e)), (ii) os
inerência sucessiva, cfr. idem f)), (iii) cinco cidadãos nomeados pelo Presidente (cfr.
idem g)) e ainda (iv) cinco cidadãos eleitos pela Assembleia da República (cfr. idem h)).
Superior de Defesa Nacional (cfr. artigo 133.º/o) CRP) que é o órgão de consulta do
disciplina das Forças Armadas (cfr. artigo 274.º/2 CRP) e cuja definição a Constituição
remete para a Lei da Defesa Nacional com a ressalva de integrar membros eleitos pela
funcionamento
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A Assembleia da República é composta por 230 deputados. Ao arrepio da
constitucional de 1997. Actualmente (desde a redacção introduzida nos termos da Lei n.º 18/90,
pela Lei n.º 14/79, de 16 Maio, com sucessivas alterações, a última das quais pela Lei Orgânica n.º
10/2015, de 14 de Agosto) estabelece que este órgão de soberania é composto por 230
deputados.
Lei eleitoral para a Assembleia da República (cfr. artigo 149.º/1/1.ª parte CRP) que por
sua vez actualmente estabelece que o território eleitoral está dividido, para efeito de
administrativos, são designados pelo mesmo nome e têm como sede as suas capitais
círculo eleitoral na Região Autónoma dos Açores, designados por estes nomes e com
eleitores residentes fora do território nacional são agrupados em dois círculos eleitorais,
um abrangendo todo o território dos Estados europeus e outro o dos Estados do resto do
mundo, ambos com sede em Lisboa (idem, 4). A decisão legislativa de fazer coincidir os
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círculos eleitorais com uma divisão administrativa pré-existente acolhe um bom
dos limites dos círculos eleitorais com vista a favorecer um partido ou lista
149.º/2 CRP e Mapa Oficial n.º 2-A/2015 da Comissão Nacional de Eleições, pub. in
DR I, de 10.Agosto.2015).
(ii) vários círculos eleitorais plurinominais ou ainda (iii) um modelo que contemple a
acordo as regras do método da média mais alta de Hondt (cfr. artigo 149.º/1/in fine) e
com proibição de cláusulas barreira (cfr. artigo 10.º/1, que consagra o princípio do voto
maiores de 18 anos (cfr. artigo 49.º/1) e capacidade eleitoral passiva, por regra, a todos
os cidadãos portugueses eleitores (artigo 150.º). Neste contexto, a ordem jurídica portuguesa
militares e dos elementos das forças militarizadas e ainda dos membros da Comissão Nacional de
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Eleições (cfr. artigos 150.º CRP e 5.º LEAR) e, em termos especiais, dos diretores e chefes de repartições
de finanças, assim como dos ministros de qualquer religião ou culto com poderes de jurisdição, pelo
círculo onde exerçam a sua actividade (artigos 150.º CRP e 6.º/1 LEAR), e ainda dos cidadãos
portugueses que tenham outra nacionalidade pelo círculo eleitoral que abranger o território do Estado
pode ainda incluir cidadãos independentes nas suas listas (cfr. artigo 151.º/1 CRP).
para a sua eleição, isto é, de outros círculos eleitorais, não é legítimo que estes últimos
República após eleições e cessa com a primeira reunião após as eleições subsequentes
(cfr. artigo 153.º/1 CRP). Assim, os deputados não tomam posse (no sentido técnico-
funções dos titulares de cargos públicos designados por nomeação que é conferida pelo
órgão nomeante.
mandato até à cessação destas funções (cfr. artigo 154.º/1 CRP) e estão ainda sujeitos às
importa mencionar o dever de exercer o mandato em regime de exclusividade (cfr. supra 4.2. e ainda
artigos 1.º/1 e 4.º/1 do Regime Jurídico de Incompatibilidades e Impedimentos dos Titulares de Cargos
Políticos e Altos Cargos Públicos e 20.º e 21.º do Estatuto dos Deputados, aprovado pela Lei nº 7/93, de
1 de Março, com sucessivas alterações, a última das quais pela Lei n.º 16/2009, de 1 de Abril).
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Os deputados dispõem a título individual de poderes de acção e de intevenção
disciplinarmente pelos votos e opiniões que emitirem no exercício das suas funções (cfr.
artigo 157.º/1 CRP), de (ii) não serem ouvidos como declarantes nem como arguidos
sem autorização da Assembleia da República (idem, 2), de (iii) não serem detidos ou
pela Assembleia da República para seguimento dos termos do processo (idem, 4).
individualmente?
uma ampla competência legislativa que abrange todas as matérias que as maiorias
parlamentares entenderem como credoras de regulação por acto legislativo (cfr. artigo
161.º/c) CRP), salvo as reservadas pela Constituição ao Governo (cfr. infra) e beneficia
por esse motivo devem ser aprovadas mediante um debate público (princípio do Estado
de Direito) e plural (princípio democrático) (cfr. artigos 164.º (reserva absoluta) e 165.º
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políticas strictu sensu (cfr. artigo 161.º), de competência de fiscalização (artigo 162.º,
(i) publicidade das reuniões (regra que vincula apenas os órgãos colegiais com a natureza de
complexo, isto é, que comporta vários órgãos (no sentido restrito de centros de decisão)
CRP e 16.º e ss. RegAR), a (ii) Mesa da Assembleia da República (artigos 175.º/b) CRP
e 22.º e ss. RegAR), a (iii) Comissão Permanente (artigo 179.º CRP e 39.º e ss. RegAR),
as (iv) Comissões Parlamentares que podem configurar um dos seguintes (três) tipos,
(α) comissões especializadas permanentes (artigos 178.º/1 CRP e 29.º e ss. e 34.º e ss. RegAR),
(β) comissões eventuais de inquérito (artigos 178.º/1, 4 e 5 CRP e 29.º e ss., 37.º e ss, 234.º e 237.º
RegAR) e (δ) outras comissões eventuais (v.g., protocolo) (artigos 178.º/1 CRP e 29.º e ss. e
34.º e ss. RegAR), os (v) Grupos Parlamentares (artigos 180.ºCRP e 6.º e ss. RegAR) e a
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órbita do Parlamento porque incumbidos de funções do Estado que na tradição liberal
europeia estavam a cargo deste órgão de soberania mas que foram entretanto confiadas
do Estado independente, eleito pela Assembleia da República por maioria de 2/3 dos
deputados (cfr. artigo 23.º/1 CRP; cfr. ainda artigos 1.º a 19.º do Estatuto do Provedor
de Justiça, aprovado pela Lei n.º 9/91, de 9 de Abril, com sucessivas alterações, a última das quais pela
Lei n.º 17/2013, de 18 de Fevereiro), ao qual os cidadãos poderão apresentar queixa pela
acção (ou omissão das autoridades públicas) mas cujos poderes se circunscrevem à
fundamentais e dos interesses legítimos dos cidadãos e das pessoas colectivas mas, no
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política económica e para o reforço da credibilidade financeira do Estado (cfr. artigo 4.º
dos Estatutos do Conselho das Finanças Públicas, aprovados pela Lei n.º 54/2011, de 19 de
Outubro, com as alterações introduzidas pelo artigo 187.º da Lei n.º 82-B/2014, de 31 de Dezembro) mas
comporta as seguintes fases: (i) nomeação pelo Presidente da República (artigo 187.º
188.º) e (iii) apreciação do mesmo (artigo 192.º) no termo do qual o Governo necessita
interior os seguintes órgãos internos: (i) o Conselho de Ministros (cfr. artigos 184.º/1
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Subsecretários de Estado (cuja competência não está constitucionalmente garantida e portanto
(artigo 184.º/2 e 202.º/2) e (v) a Reunião de Secretários de Estado (artigo 1.º/2 do Regime de
Organização e Funcionamento do XXI Governo Constitucional, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 251-
A/2015, de 17 de Dezembro).
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5. A actividade legislativa do Estado e das regiões autónomas
Bibliografia: J. J. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição,
Coimbra, Parte III, Título 5, Cap. 1 a 7 e 10; JORGE BACELAR GOUVEIA, Manual de Direito
Constitucional, Coimbra, Livraria Almedina, 2013, Vol. II, Cap. XII, § 45.º a 47.º, e MANUEL AFONSO
VAZ, Direito Constitucional – O sistema constitucional português, Cap. II.
do Estado soberano.
Estado e (β) Direito da União Europeia) e, por outro lado, de (ii) fenómenos de
legislativos regionais).
originária da soberania do povo (artigo 3.º, n.º 1, CRP), como (ii) fundamento de
validade das leis e das demais fontes normativas de produção interna, quer por entidades
públicas (idem, n.º 2 e 3), quer por entidades privadas que interagem no espaço estadual
(artigo 56.º, n.º 4, da CRP), (iii) como critério (artigo 8.º, n.º 2) e (iv) como limite (idem,
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5.2. Os princípios constitucionais sobre a produção normativa
legislativa (genérica: artigo 110.º, n.º 2; Assembleia da República: artigos 161.º, c),
164.º e 165.º; Governo: artigo 198.º, n.ºs 1 e 2, e Assembleias Legislativas das Regiões
Autónomas: artigos 112.º, n.º 4, 227.º, n.º 1, a), e 228.º, n.º 1, CRP),
constitucional dos actos legislativos (artigo 112.º, n.º 1 e n.º 5, 1.ª parte, CRP),
determina a superioridade dos actos legislativos sobre os demais actos normativos (v. g.
β) o princípio da paridade entre lei e decreto-lei (artigo 112.º n.º 2, 1.ª parte,
CRP), com excepção dos actos legislativos sujeitos a uma relação de superioridade /
subordinação relativamente a outros actos legislativos (idem, 2.ª parte) e das leis com
órgãos de soberania (i. é, lei e decreto-lei) no território das Regiões Autónomas (artigos
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5.3. As leis; algumas categorias de leis tipificadas na CRP: leis que beneficiam de
Uma lei goza de valor reforçado em relação a outra(s) lei(s), ou a outro(s) acto(s)
legislativo(s), sempre que revestir aptidão para derrogar este(s) último(s) sem que por
i) leis orgânicas,
A CRP estabelece uma reserva de lei orgânica, isto é, carecem ser reguladas
sobre a forma de lei orgânica, as seguintes matérias: as (i) eleições dos titulares dos
dos presidentes os órgãos executivos das autarquias locais, bem como as demais
eleições a realizar por sufrágio directo e universal, o (ii) regime jurídico dos referendos,
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e do segredo de Estado, o (ix) regime das finanças das regiões autónomas e a (x) criação
públicos, (iii) a lei que regula o exercício do direito de voto dos cidadãos portugueses
residentes no estrangeiro nas eleições presidenciais, (iv) as leis eleitorais que estabelece
eleitorais para a Assembleia da República e que regulam as eleições dos órgãos das
autarquias locais, (v) as leis que restringem o exercício de direitos por militares e
agentes militarizados dos quadros permanentes, bem como por agente das forças de
autónomas (artigo 112.º/4, 227.º/1 e 228.º/1), a lei das finanças regionais (artigo 229.º/3)
e a lei-quadro das privatizações (artigo 293.º/1), configuram leis que nos termos da
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iv) leis que devem ser respeitadas por outras leis.
A CRP consagra v. g. os seguintes casos de leis que devem ser respeitadas por
outras leis e pelos demais actos legislativos: a lei do orçamento deve respeitar as
legislativos não podem implicar aumento das despesas ou diminuição das receitas
5.4. Os decretos-lei
termos do artigo 169.º CRP, em termos de natureza jurídico-política, não consiste numa
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fase complementar do procedimento legislativo do Governo mas numa competência de
legislativa do Governo.
(idem) e pode ter por finalidade (objecto mediato) a alteração ou cessação da vigência
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6. A actividade política do Estado
Bibliografia: J. J. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição,
Coimbra, Parte III, Título V, Cap. 8 e 9; JORGE BACELAR GOUVEIA, Manual de Direito
Constitucional, Coimbra, Livraria Almedina, 2013, Vol. II, Cap. XII, § 45.º
6.4. As resoluções
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7. A defesa da Constituição: a fiscalização da
constitucionalidade e da legalidade
Bibliografia: J. J. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição,
Coimbra, Parte III, Título 6; JORGE BACELAR GOUVEIA, Manual de Direito Constitucional,
Coimbra, Livraria Almedina, 2013, Vol. II, Cap. XIII, e MANUEL AFONSO VAZ, Direito
Constitucional – O sistema constitucional português, Cap. III.
balances
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8. A defesa da Constituição: a revisão constitucional
Bibliografia: J. J. GOMES CANOTILHO, Direito Constitucional e Teoria da Constituição,
Coimbra, Parte III, Título 7, Cap. 1; JORGE BACELAR GOUVEIA, Manual de Direito Constitucional,
Vol. II, Cap. VI, §26, e MANUEL AFONSO VAZ, Teoria da Constituição – O que é a Constituição,
hoje?, Cap. III.
seguintes características: é um (i) poder inicial porque não existe outro que lhe sirva de
fundamento, é um (ii) poder autónomo porque só a este cabe decidir se, como e quando
existência das teorias (i) teocráticas (direito divino), (ii) monarquias (direito próprio do
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8.2. O Poder constituinte e o poder de revisão constitucional
doutrina divide-se entre as teses (i) da irrelevância (MARCELLO CAETANO), (ii) dos
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