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2006
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“Mulher, grande é a tua fé”
João Wesley Dornellas
Dedicatória:
A minha mãe
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Meu anjo protetor
As tendências ao esoterismo
que têm surgido ultimamente,
talvez porque as religiões tenham falhado
em sua missão de ensinar a verdade da Bíblia,
trouxeram à moda a figura dos anjos.
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O incrível, porém, aconteceu.
De uns tempos para cá,
por ter acompanhado pessoalmente,
minuto após minuto, hora após hora,
durante muitos dias e muitas noites,
a ação de um anjo em minha vida,
fui praticamente obrigado a acreditar
que os anjos existem.
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Primeira Introdução
Os feministas da família
Papai feminista
Quando meu pai namorava minha mãe, ele estudava Teologia
em Juiz de Fora, preparando-se para ser pastor, e ela vivia em Paraíba
do Sul. Namoravam muito por cartas. Tenho guardadas todas as car-
tas que trocaram, mais de duzentas. As cartas do meu pai eram bem
mais longas e, muitas vezes, ele gastava papel e tinta para falar de
suas idéias, de comentar alguns sermões que havia pregado ou ouvi-
do e até fazer alguma reflexão religiosa. Meu pai era tão espiritual,
tão entregue à carreira para a qual foi chamado, que até nas cartas
de amor ele mostrava isto.
A que transcrevo abaixo, escrita em 31 de maio de 1932, é
um exemplo. A valorização da mulher é uma tônica dessa carta.
Muito antes do movimento feminista, papai o viveu intensamente.
Papai, como pastor e como pessoa, nunca discriminou as mulheres.
Como de resto, nunca teve preconceito algum de sexo, cor, idade ou
condição social.
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Mulheres do Antigo Testamento
Sara, a mulher de Abraão
Os comentaristas bíblicos não dão muita importância à pessoa
de Sara, a não ser para dizer que era a mulher de Abraão. Nas poucas
vezes em que aparece, especialmente em alguns capítulos do livro de
Gênesis, muito pouca coisa se sabe dela. Era a mulher de Abraão e,
parece, sua meia irmã, isto é, seu pai também era o pai de Abraão.
Também se sabe, pela Bíblia, especialmente no capítulo 12 de Gênesis,
que era muito bonita. Razão pela qual, ao entrar no Egito, Abraão
recomenda a Sarai, para proteção dele, que ela não informasse a con-
dição de esposa mas de irmã. Isto gerou, por parte do Faraó, a vonta-
de de tê-la como mulher, levando-a para sua casa. Em virtude disto,
Abraão foi muito bem tratado no Egito. Quando foi descoberto, em
virtude de pragas que caíram sobre ele, que ela era esposa de Abraão,
o Faraó lhe devolve Sarai e manda que todos saiam do Egito.
Episódio parecido ocorre mais tarde em Gerar. Ao sabê-la irmã
de Abraão, Abimeleque, o rei de Gerar, mandou buscá-la. Outra vez
revelada a verdade, Abrão foi instado a deixar o lugar. Por duas
vezes, portanto, quase que Sarai, apesar de esposa de Abraão, acaba
caindo em mãos estranhas.
Deus havia feito uma promessa a Abraão, de que em sua
descendência seriam benditas todas nações da terra. Só que Sara,
por ser estéril, não dava sequer um filho a Abraão. Decidiu ela então,
como se precisasse, resolver, ela mesma, a promessa ainda não cum-
prida por Deus. No versículo 2 de Gênesis 16, ela diz ao marido que o
Senhor a tem “impedido” de dar à luz filhos. Assim, oferece sua serva
egípcia Hagar para que, através dela, fosse permitido a Deus cumprir
sua promessa. Assim, nasceu Ismael. Isto não constituiu nenhuma
solução mas, ao contrário, um grande problema. De início, por ter
dado um filho a Abraão, Hagar, como seria muito natural na luta pelo
poder, começou a fazer pouco de sua senhora. Ela tinha o grande
trunfo de ter dado um filho varão a Abraão.
Esse não era, contudo, o plano de Deus. Assim, Deus prome-
te a Abraão que sua esposa Sarai, cujo nome Ele mudou para Sara,
ficaria grávida e lhe daria um filho, que se chamaria Isaque. Ele, e
não Ismael, seria o filho da promessa. Mostrando Abraão preocupa-
ção com seu filho Ismael, Deus o tranqüiliza dizendo que ele também
seria abençoado e pai de uma grande nação, reforçando, ao mesmo
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tempo, que a Sua aliança seria estabelecida com Isaque, filho de
Sara. A promessa é realizada e, mais tarde, quando o filho da escra-
va caçoava de seu pequeno irmão Isaque, Sara intervém e pede ao
marido que Hagar e seu filho fossem expulsos dali, dizendo “porque
o filho dessa escrava não será herdeiro com Isaque, meu filho”. Hagar
e Ismael saíram errantes pelo deserto de Berseba. Os dois irmãos só
se viram novamente no sepultamento do pai.
Tudo o que foi dito acima justifica, sem dúvida, a pouca im-
portância que a Bíblia e os seus comentaristas dão à figura de Sara,
que era certamente uma mulher rancorosa e com muitos defeitos.
Voltemos, no entanto, a promessa de que Deus lhe permitira ficar
grávida aos 90 anos de idade.
É justamente nesse episódio que se manifesta o caráter e a
personalidade de Sara. A princípio, ela duvidou e riu da situação para o
próprio Deus e este chegou a perguntar a Abraão o porquê do riso. É
preciso, agora, fazer um intervalo para dizer que os fatos até agora
narrados foram transmitidos oralmente de pais para filhos e destes para
os netos durante mais de 500 anos, quando a Bíblia começou a ser
escrita. É realmente um milagre a narrativa tão coerente da Bíblia, cujos
fatos foram retransmitidos de maneira tão precária. Havia, é claro, a
recomendação de Deus feita em Deuteronômio, capítulo 6, versículos 6
a 9: “Estas palavras que hoje te ordeno, estarão no teu coração; tu as
inculcarás a teus filhos, falarás delas assentado em tua casa, e andando
pelo caminho, e ao deitar-te e ao levantar-te. Também a atarás como
sinal na tua mão e te serão como frontal entre teus olhos. E as escreve-
rás nos umbrais de tua casa, e nas tuas portas”. E parece que elas foram
muito bem seguidas.
Relembrando Sara que ela e Abraão eram velhos, avançados
em idade e que já lhe havia cessado o “costume das mulheres”, ex-
pressão poética para definir a menstruação, ela riu-se, pois, no seu
íntimo, dizia para consigo mesma: “depois de velha, e velho também o
meu senhor, terei ainda prazer?”. O que estava no seu íntimo, os
sentimentos profundos de sua alma sofrida, acabaram sendo reparti-
dos com alguém, que o texto bíblico não identifica , que foram transmi-
tidos, no decorrer de mais de quatro séculos, por pais a filhos e por
filhos a netos, até que fossem eternizados no texto definitivo da Bíblia.
É essa pérola do pensamento íntimo de Sara que a faz ser uma
grande mulher, digna das maiores homenagens, especialmente no Dia
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Internacional da Mulher. Porque ela foi uma grande mulher. Para Adão e
Eva, a ordem de Deus era apenas “crescer e se multiplicar, ser uma só
carne”. Para Sara, é muito mais do que isto. O “crescer e multiplicar”
passa a ter um novo significado que acaba caracterizando a espécie
humana, o amor – espiritual e também físico – entre um homem e uma
mulher. Pela primeira vez na Bíblia, fala-se do prazer que caracteriza as
relações homem-mulher. Ele foi criado por Deus mas, até hoje, parece
que se tem vergonha dele. É Sara quem lhe dá a relevância máxima na
Bíblia. Os homens, parece que em todo o decorrer da história humana,
foram quase sempre machistas e egoístas, nunca dando muita bola para
a satisfação da mulher.
Um filho não se gera somente com a união no útero de um
espermatozóide e um óvulo, que se transformam em ovo. Não! Mil
vezes não! Isto é coisa só para animais ou pessoas que se compor-
tam como se fossem. É muito mais do que isto. Um filho tem que ser
gerado por amor, com desejo e prazer. Com romantismo. Somente
assim, por serem desejados, podem ser amados e bem criados. A
Bíblia não revela a resposta à indagação de Sara mas o sucesso de
tudo nos faz crer, sem sombra de dúvidas, que ela é positiva. Numa
época mercantilizada como a de hoje, de mulheres que se transfor-
mam em objetos ou são assim transformadas pelos homens, a lição
de Sara é de uma verdadeira humanista, um ser humano integral,
que a absolve, pelas lições que o seu pensamento mais íntimo revela,
de tudo o que possa ter feito de errado em sua vida. Mais do que
humanista, no entanto, podemos dizer que a visão íntima de Sara é
humanizante. O de que o mundo necessita é de seres humanos que
sejam realmente humanizantes, que ajudem a melhorar esse nosso
pobre planeta.
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“Sete anos de pastor Jacó servia
Labão, pai de Raquel, serrana bela;
Mas não servia ao pai, servia a ela,
E a ela só por prêmio pretendia.
Os dias, na esperança de um só dia,
Passava, contentando-se com vê-la;
Porém o pai, usando de cautela,
Em lugar de Raquel lhe dava Lia.
Vendo o triste pastor que com enganos
Lhe fora assim negada a sua pastora,
Como se a não tivera merecida,
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Bate-seba, a mãe de Salomão, identificada apenas como mulher de
Urias, que foi atraída ao palácio por Davi que a viu tomando banho, e
de Rute, cuja história de fidelidade à sua sogra e ao Deus dela é um
exemplo para todos nós.
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Mulheres do Novo Testamento
Maria, a doce mãe de Jesus
Quando a querida Zel, minha nora, aproximou-se nossa família no
começo do seu namoro com Luiz Otávio, uma das coisas que ela me
disse, em nossa primeira conversa sobre religião, é que ela fora cria-
da no catolicismo, tendo estudado em colégio de freiras, e que não
gostava muito dos protestantes porque eles não gostavam da Virgem
Maria. O que lhe respondi, antes de muitas explicações, foi simples-
mente: “pois eu gosto muito”.
E ela tinha um pouco de razão. Pela ênfase que os católicos
dão a Nossa Senhora, por alguns dogmas da Igreja de Roma, pelo
“pede à mãe que o filho atende”, plástico aplicado em muitos carros,
etc., etc., os protestantes acabam colocando a figura da mãe de Je-
sus num plano inferior. Alguns anos atrás, a Voz Missionária publicou
um artigo sobre grandes mulheres da Bíblia, no qual ficou faltando a
mulher mais importante de todas, justamente a mãe de Jesus. Mui-
tas pessoas ficam escandalizadas comigo quando digo que posso per-
feitamente saudar Maria com os católicos dizendo “Ave Maria, cheia
de graça, o Senhor é convosco, bendita sois vós entre as mulheres e
bendito o fruto do vosso ventre, Jesus”. O que não faço é orar “San-
ta Maria, mãe de Deus, perdoai os nossos pecados, agora e na hora
de nossa morte”.
Também já escandalizei muita gente ao dizer, em pleno ser-
mão, apesar das ressalvas de que nós não oramos à Virgem Maria,
porque nosso intercessor é Cristo, que, na minha opinião, uma das
poesias mais lindas da língua portuguesa é de Manoel Bandeira: “Eu
vi minha mãe rezando/ aos pés da Virgem Maria./ Era uma santa
escutando/ o que outra santa dizia”.
A doce Virgem Maria é a mulher mais importante da Bíblia
pois o anjo lhe disse que ela havia achado graça diante de Deus e que
Deus a convocava para uma grande missão, ser a mãe de Jesus, o
libertador da humanidade. Ela era, como acontecia naqueles tempo,
uma jovenzinha, recém saída da adolescência. A resposta de Maria,
simples mas significando uma entrega total à missão que lhe seria
confiada, foi: “Aqui está a serva do Senhor; que se cumpra em mim
conforme a tua palavra”.
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No chamado Cântico de Maria, uma poesia linda e cheia de
significados, ela diz coisas de profunda transcendência: “A minha alma
engrandece ao Senhor, e o meu espírito se alegra em Deus, meu
Salvador, porque contemplou na humildade da sua serva. Pois agora
todas as gerações me considerarão bem-aventurada, porque o Pode-
roso me fez grandes coisas, Santo é o seu nome. A sua misericórdia
vai de geração em geração sobre os que o temem. Agiu com seu
braço valorosamente; dispersou os que no coração alimentavam pen-
samentos soberbos. Derrubou dos seus tronos os poderosos e exal-
tou os humildes. Encheu de bens os famintos e despediu vazios os
ricos. Amparou a Israel, seu servo, a fim de lembrar-se da sua mise-
ricórdia, a favor de Abraão e de sua descendência, para sempre,
conforme prometera aos nossos pais”.
Depois dos sacrifícios da viagem de Nazaré a Belém para o re-
censeamento, da necessidade de ter o seu filho numa simples estrebaria,
porque não havia lugar para eles na estalagem, e ter que colocá-lo numa
manjedoura, ela viu surpresa a visita dos pastores e mais surpresa ainda
ficou com o relato das coisas que aconteceram nas campinas de Belém,
como o anúncio do anjo e do coral composto da milícia celestial que
cantava “Glória a Deus nas maiores alturas, e paz na terra entre os
homens a quem ele quer bem”. Ouvindo isto tudo, Maria “guardava
todas estas palavras, meditando-as em seu coração”.
Como guardou certamente os problemas do exílio no Egito,
as dificuldades da criação do menino, a responsabilidade que tinha
de educá-lo no verdadeiro caminho e os 30 anos de luta até que seu
filho Jesus começasse a sua missão. Esteve sempre presente na vida
de Jesus. Estava com ele nos momentos alegres do casamento em
Caná, onde fez o seu primeiro milagre. E estava também nos momen-
tos de perseguição e dor. Como presente estava, angustiada, nos
momentos cruciais de sua prisão, de seu julgamento, de sua conde-
nação. Aos pés da cruz onde Jesus estava dando a vida por nós,
assistiu todo o seu suplício e ajudou a recolher o seu corpo sem vida.
Por tudo isto, e até pela preocupação que Jesus teve com ela
já pregado na cruz, nomeando João para que se tornasse seu filho,
isto é, cuidasse dela em sua ausência, e, ao mesmo tempo, transfor-
mando-a em mãe do seu discípulo amado, provavelmente o mais
jovem de todos, Maria é a mulher mais importante da história humana.
A Bíblia não revela muitos dos cuidados que ela tinha com Jesus a
longo de sua vida. Conhecendo o seu caráter, porém, bem podemos
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imaginar. E nem os grandes pintores e escultores da história humana,
nem os que lidam com as palavras, puderam descrever bem o que
aquela mulher sofreu no desempenho de uma missão que recebera do
Altíssimo quando ainda tão jovem. Por isto tudo, ela é chamada de
“mater dolorosa”. Nada, no entanto, a despiu da condição que ela
expressou no seu cântico de ser bem-aventurada. A maior das mulhe-
res, a maior das mães, aquela que dignificou o papel da mulher na vida
humana, elo entre o divino e o humano, a que possibilitou que os Pais
da Igreja pudessem afirmar, para todo o sempre, que “Jesus é verda-
deiramente Deus e verdadeiramente homem”, é realmente o padrão
de mulher cristã e o Senhor sempre esteve com ela.
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O relacionamento de Jesus com as mulheres era muito bom.
Ele as aceitava, gostava delas e reconhecia que elas eram capazes de
entender as coisas revolucionárias que pregava e ensinava. Conver-
sas longas entre Jesus e as mulheres não são muito comuns. É certo
que, por estar freqüentemente no lar de Betânia, com Lázaro, Marta
e Maria, ele conversava muito com as duas irmãs. No caso da morte
de Lázaro, ele teve com Marta discussões teológicas muito sérias,
como se verá em capítulo mais à frente.
As duas conversas mais longas de Jesus com mulheres fo-
ram, por paradoxal que seja, com as estrangeiras, a mulher cananéia
e a mulher samaritana com quem se encontrou junto ao poço de
Jacó, as duas heroínas sem nome. A mais tempestuosa conversa, em
que Jesus se mostrou ríspido, até mesmo grosseiro, preconceituoso e
um pouco mal educado, foi justamente com a mulher cananéia. Ele
a tratou de uma forma cruel, parecida com a maneira com que trata-
va, nos limites de sua terra, os escribas e fariseus. Uma teóloga
americana, ao comentar esse texto, diz que “parece que Jesus deixou
sua condição de Messias no lado palestino da fronteira e, também,
sua compaixão e sensibilidade”.
Apesar de saber de todas as questões dessa centenária incom-
patibilidade ente os judeus e os cananeus, aquela mulher, cujo único
desejo na vida era a cura de sua filha, e cuja única certeza era de que
só Jesus poderia curá-la, assumiu todos os riscos desse encontro. Ela
estava disposta a não sair dali sem beneficiar-se do poder de Jesus. Ela
percebeu, também, que chamar a atenção de Jesus, exigiria uma atitu-
de toda especial para sobrepujar a barreira que os discípulos dele fazi-
am para protegê-lo. Ela clamou, isto é, falou alto, gritou, “Senhor, filho
de Davi, tem compaixão de mim!”. O texto de Mateus diz que Jesus
ficou indiferente aos seus apelos, “não lhe respondeu palavra”. Inco-
modados com a insistência da mulher, os próprios discípulos rogaram a
Jesus para que a despedisse, isto é, que atendesse os seus apelos,
curasse a menina para que ela fosse embora.
Nesse momento, começou o diálogo de Jesus com ela mas foi
uma conversa muito hostil, apesar de que ela clamava respeitosamen-
te, usando para Jesus os títulos corretos, como Senhor e Filho de Davi.
Disse-lhe Jesus, como a desculpar-se por não poder curar sua filha:
“Não fui enviado senão às ovelhas perdidas da casa de Israel”. Face à
face com uma grande necessidade humana, a resposta de Jesus não
foi realmente uma resposta. Jesus não tinha argumentos para convencê-
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la. Porque, ao levar esse fora, ela veio e o adorou dizendo e pediu a sua
compaixão: “Senhor, socorre-me!”.
Jesus, para espanto dela, não só não a socorre, mas usa ago-
ra um argumento injurioso e ofensivo: Não é bom tomar o pão dos
filhos e lançá-los aos cachorrinhos”. Os judeus chamavam os estran-
geiros, os gentios, de cachorros. Num certo sentido, essa ofensa es-
tava sendo repetida por Jesus àquela mulher. Ela tinha três coisas
que eram normalmente desprezíveis para os judeus: era uma estran-
geira, ou seja, pagã, sendo vista como impura; por isto, os judeus
guardavam uma distância segura dos gentios. Era mulher, e as mu-
lheres não mereciam nenhuma consideração por parte dos judeus.
Os judeus eram proibidos de falar com elas a não ser na presença dos
seus maridos. Se o pai da menina é que fosse pedir o milagre a Jesus,
talvez fosse diferente. Havia uma terceira coisa a desgastar a ima-
gem da mulher, ela era a mãe de uma menina endemoninhada, uma
louca. Os judeus gostavam de atribuir as desgraças da saúde a peca-
dos cometidos por pais ou outros antecessores. Quem sabe aquela
mulher cananéia não teria alguma culpa no cartório?
Era o momento decisivo da conversa. Mesmo ofendida, per-
cebendo muito bem aonde Jesus queria chegar, ela foi muito inteli-
gente em sua fala, na qual começa concordando com Jesus: “Sim,
Senhor!”. Mas, em seguida, para usar uma linguagem do jogo de
xadrez, ela dá o cheque-mate em Jesus, a jogada definitiva: “porém
os cachorrinhos comem das migalhas que caem da mesa dos seus
donos”. É exatamente isto. Ela tinha a convicção que mesmo ínfimas
parcelas da graça seriam suficientes para que sua filha fosse curada.
Então, é Mateus quem narra, Jesus lhe disse: “Ó mulher, grande
é a tua fé. Faça-se contigo como queres”. E desde aquele momento,
sua filha ficou sã.
A partir dali, ninguém mais teve barrado o seu acesso a Deus,
às bênçãos de Deus, em virtude de seus antepassados, da religião
que herdou ou de sua cultura. Com sua atitude, a mulher cananéia
verdadeiramente estendeu a mesa do Senhor e, desde então, há pão
em abundância para todos, gentios, judeus, gregos, escravos, livres,
homens, mulheres e crianças. E na grande comissão, texto de Mateus
28:18-20, a ordem de Jesus é: “Toda a autoridade me foi dada no
céu e na terra. Ide, portanto, fazei discípulos em todas as nações,
batizando-as em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo; ensinan-
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do-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado. E eis que
estou convosco todos os dias até à consumação do século”.
A mulher samaritana
Estamos falando do surpreendente encontro de Jesus com a
mulher samaritana à beira do poço de Jacó, em Samaria. Jesus e
seus discípulos estavam caminhando da Judéia, ao Sul, para a Galiléia,
ao Norte. Passaram por Samaria, território historicamente hostil aos
judeus, apenas para ganharem tempo. Se a tivessem evitado, gasta-
riam seis dias e não três. Preferiam, portanto, o caminho mais curto.
Numa bifurcação da estrada, perto de Sicar, está o que se conhece
pelo nome de poço de Jacó. O local, que não lhes pertencia, tinha,
contudo, muita importância histórica para os judeus. Ali havia terras
que foram compradas por Jacó (Gn 33:18-19). Em seu leito de mor-
te, Jacó deixou aquelas terras para José (Gn 48:22). Depois de sua
morte, o corpo de José foi levado para ser enterrado ali (Js 24:32). O
poço tinha cerca de 30 metros de profundidade.
O calor era forte e era meio dia, a hora sexta dos judeus.
Enquanto os discípulos foram ao centro da cidade para comprar ali-
mentos, Jesus pára à beira do poço para descansar. Uma mulher
samaritana aproximou-se do poço. Por que teria ela vindo àquele
poço? Provavelmente haveria um outro poço perto de sua casa. Tal-
vez sua má reputação fazia com que fosse discriminada por outras
mulheres. O fato é que ela chega a um poço distante e na pior hora,
a mais quente do dia, para apanhar água. Trazia certamente algo
com que apanhar a água no fundo, possivelmente um saco feito de
couro ao qual se amarrava uma corda. A água assim extraída era
transportada num cântaro para casa.
Jesus, com sede (e é possível que os discípulos tivessem leva-
do consigo o saco de couro que certamente possuíam), pede à mu-
lher que lhe desse de beber. A resposta da mulher foi muito clara:
“Como, sendo tu judeu, pedes de beber a mim que sou mulher
samaritana?”. Porque os judeus e os samaritanos não se davam bem.
E nos costumes dos dois povos, nenhum homem dirigia a palavra a
uma mulher. A resposta de Jesus aprofundou a conversa: “Se conhe-
ceras o dom de Deus e quem é que te pede “dá-me de beber”, tu lhe
pedirias e ele te daria água viva”.
Coisa curiosa é que essa conversação de Jesus com a samaritana
segue exatamente o mesmo esquema da conversa que ele tivera,
algum tempo atrás, com Nicodemos. Jesus faz uma afirmação, que
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não é entendida e sim tomada num sentido incorreto. Jesus repete a
afirmação de maneira mais clara mas não consegue ser interpretado
corretamente. Jesus então obriga a pessoa com quem está falando a
descobrir e enfrentar a verdade por si mesma. Tal como Nicodemos,
a mulher tomou as palavras de Jesus num sentido literal, sem conse-
guir compreendê-las no plano espiritual.
Água viva, para as pessoas comuns, significava simplesmente
água corrente, de um rio ou de uma fonte, não a água de um poço ou
de um pântano. É claro, a água viva era sempre melhor. E a mulher
lhe pergunta, como lhe daria essa água se não tinha com que tirá-la
do poço que era bem fundo. “Onde, pois, tens a água viva?” Ela
agora lhe fala do patriarca Jacó e pergunta se o viajante era maior do
que ele.
A resposta de Jesus não foi exatamente sobre o que ela per-
guntou. Ele lhe disse: “Quem beber desta água, tornará a ter sede;
aquele, porém, que beber da água que eu lhe der, nunca mais terá
sede, para sempre; pelo contrário, a água que eu lhe der será nele
uma fonte a jorrar pela vida eterna”.
E ela, ainda sem entender exatamente o que Jesus lhe queria
dizer, pede que ele lhe dê dessa água, para nunca mais ter que vir
buscá-la do poço.
Os samaritanos só aceitavam os cinco primeiros livros da Bí-
blia, os chamados livros da Lei. Por isto, ela desconhecia todo o sig-
nificado espiritual da expressão água viva. A promessa era que o
povo escolhido tiraria com alegria as águas das fontes da salvação (Is
12:3); o salmista falava de sua alma sedenta de Deus, do Deus vivo
(Sl 42:1). A promessa de Deus era: “E eu derramarei águas sobre o
sedento” (Is 44:3). O chamado dizia que todo aquele que estivesse
sedento devia ir às águas e bebê-las gratuitamente (Is 55:1). Jeremias
se queixava de que o povo havia abandonado a Deus, fonte de água
viva, e cavara cisternas rotas, que não contêm as águas (Jr 2:13);
Ezequiel teve a visão das águas purificadoras, o rio da vida (Ez 47: 1-
12); Zacarias, por sua vez, dizia que o novo mundo abriria uma fonte
para remover o pecado e a impureza (Zc 13:1) e que as águas vivas
brotariam de Jerusalém (Zc 14:8). “Não terão fome nem sede”, pro-
clamava Isaías (Is 49:10); “Contigo está o manancial da vida”, excla-
mava o salmista (Sl 36:9); e Isaías profetizava: “a areia embraseada
se transformará em lagos, e a terra sedenta em mananciais de água
(Is 35:7). Os rabinos antigos identificavam essa água viva com a
sabedoria de Deus. Outras vezes, a identificavam com o Espírito San-
to de Deus.
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Essa idéia de que a sede da alma que só se poderia satisfazer
com a água viva que era o dom de Deus não fazia parte da cultura e
da experiência daquela mulher.
Jesus, incompreendido, muda o tom da conversa: “vai, cha-
ma o teu marido e vem cá”. Isto foi um choque para a mulher porque,
de repente, Jesus a estava chamando à realidade do seu dia-a-dia.
Ela foi obrigada a confessar que não tinha marido. E Jesus, ainda
incisivo, lhe diz que isto era verdade mas que ela tinha tido cinco
maridos. Só aí a mulher percebeu que não estava falando com qual-
quer um e lhe disse: “Senhor, vejo que és profeta”. Pega no seu
pecado, ela muda de assunto e pergunta a Jesus se Deus deve ser
adorado no Monte Gerizim, onde Abraão esteve perto de sacrificar
Isaque, e era um local sagrado para os samaritanos, ou no monte
Sião, em Jerusalém, lugar sagrado pelos judeus.
A conversa vai chegando ao ponto que Jesus planejara. Dizen-
do-lhe que os verdadeiros adoradores adoram em espírito e em verdade
– e isto nada tem a haver com o local da adoração – porque são estes
que o Pai procura para seus adoradores, a mulher, começando a com-
preender as coisas, lhe diz: “eu sei que há de vir o Messias, chamado
Cristo; quando ele vier, nos anunciará todas as coisas”.
Finalmente, Jesus faz-lhe a declaração: “eu o sou, eu que falo
contigo”. A mulher descobriu, atônita, que a declaração de Jesus não
era um mero sonho mas a verdade mesma. E dali para a frente, tudo
iria ser diferente. Nesse ponto, os discípulos chegam de volta e se
surpreendem, mesmo sem fazer nenhum comentário, de vê-lo con-
versando com uma mulher.
Ela, deixando o seu cântaro, foi à cidade e anunciou aos ho-
mens com quem se encontrou: “Vinde comigo, e vede um homem
que me disse tudo quanto tenho feito. Será este, porventura, o Cris-
to?”. Os homens foram ter com Jesus e creram nele, em virtude do
testemunho daquela mulher. Pediram e Jesus permaneceu com eles
dois dias. Muitos creram nele por causa de sua palavra e diziam à
mulher: “já agora não é pelo que disseste que nós cremos; mas por-
que nós mesmos temos ouvido e sabemos que este é verdadeira-
mente o Salvador do Mundo”.
A mulher samaritana, cujo nome será sempre desconhecido,
se transformou, ao conhecer Jesus, numa verdadeira evangelista.
Não só entregou a sua vida a Cristo, mudou de vida, mas imediata-
mente levou outros a conhecê-lo. O primeiro instinto da mulher
samaritana foi repartir a sua experiência.. Barclay nos diz que a vida
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cristã se baseia em dois pilares gêmeos, o descobrimento e a comu-
nicação. “Nenhum descobrimento é completo até que nossos cora-
ções se encham do desejo de reparti-lo, mas não podemos comuni-
car Cristo aos outros até que o tenhamos descoberto para nós mes-
mos. Os dois grandes passos da vida cristã são, em primeiro lugar,
encontrar a Cristo e, em segundo, falar dele”.
Como a samaritana, um homem pode esconder o seu pecado
mas quando encontra a Jesus Cristo e o reconhece como seu Salvador,
seu primeiro instinto è dizer aos outros: “Vede o que eu era e olhai para
o que sou agora: é isto o que Cristo tem feito por mim”.
Assim era Jesus, um homem sem preconceitos, nem contra
as mulheres e nem para com os estrangeiros, quaisquer que fossem
os seus erros, que ele estava sempre disposto a perdoar e conceder
a chance de um novo nascimento.
Essa história nos mostra que a mulher samaritana, uma das
grandes mulheres da Bíblia, é um exemplo de cristã. Precisamos to-
dos, homens e mulheres, ser evangelistas como ela foi.
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Ela o explicou narrando que tinha vindo da casa de seu irmão
Paulo, onde ele e seus amigos desbaratavam a noite no jogo. E ela
fala de sua decisão: “Resolvi, irmão, que já não podemos continuar
mais sem orientação espiritual”. Philip, já acostumado com o tempe-
ramento impetuoso de Bárbara, apenas esboçou um sorriso.
– Está certo, irmã Heck, mas por que se dirige a mim?
Os olhos de Bárbara chamejaram ainda mais:
– E por que não? Por que razão você se converteu na Irlanda?
Com que finalidade você era guia de classe entre os fiéis de nossa
sociedade? Que motivos o impulsionaram a tornar-se pregador local
metodista antes de virmos para a América?
Não deixando que Philip sequer se desculpasse, ela insistiu:
– Você deve pregar para nós, do contrário todos iremos para o
inferno e Deus requererá o nosso sangue das mãos de você.
Philip Embury, constrangido com aquelas palavras tão duras,
lhe perguntou, meio aborrecido: “Como poderei pregar? Não tenho
casa nem congregação”. A resposta de Bárbara foi incisiva: “Pregue
em sua própria casa, a princípio para os seus somente”. No outono
de 1766, reuniu-se a primeira congregação metodista em Nova York,
na casa alugada por Philip, no nº 10 das Rua Augustus, nas proximi-
dades da rua do Quartel, onde havia um destacamento inglês. Ape-
nas sete pessoas participaram do primeiro culto, Philip, sua mulher,
Paulo, Bárbara, John Lawrence, Betty e um escravo negro.
O trabalho cresceu, alguns soldados foram convertidos e mui-
ta gente, pela operosidade de Philip Embury e de Bárbara Heck, se
agregou ao grupo. Dois anos depois, em 1768, a igreja mudou-se
para a Rua João. Até hoje, a Igreja Metodista da John Street é um
marco histórico da cidade de Nova York. Os maiores nomes do
metodismo americano, como o Bispo Francis Asbury, pregaram no
seu púlpito.
Anos mais tarde, Bárbara Heck e sua família se mudaram
para o Canadá, onde ela também iniciou o movimento metodista,
contando com a ajuda da família Embury que também se mudara
para lá. Bárbara Heck é considerada também a mãe do metodismo
canadense. A Igreja Metodista do Canadá deixou de existir em 1925
quando passou a fazer parte de uma nova igreja, a Igreja Unida de
Cristo. que foi criada, e existe até hoje, para juntar fiéis de várias
denominações. Bárbara Heck morreu no Canadá em 1804.
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Martha Walker – a heroína brasileira
A história do metodismo brasileiro começa com a histórica via-
gem do Rev. Fountain Pitts ao Brasil em 1835 para fazer um estudo da
situação. Logo depois, em 1836, chegou o Rev. Justin Spaulding, que
estabeleceu a Missão Metodista, abrindo escola e criando a primeira
escola dominical do Brasil. Depois chegaram outros obreiros e o traba-
lho prosseguia. Em 1841/42, em virtude dos problemas políticos e fi-
nanceiros surgidos na Igreja Metodista dos Estados Unidos, o trabalho
missionário foi interrompido. Em 1841, Cynthia Kidder, esposa do mis-
sionário Daniel P. Kidder, morreu de febre amarela, sendo sepultada no
cemitério dos Ingleses na Gamboa. Logo a seguir, antecipando o fim
da missão, Kidder e seu filho voltaram aos Estados Unidos.
A interrupção do trabalho metodista é, sem dúvida, um erro de
muitos livros que contam a nossa história. Na realidade, interrompeu-
se a missão, não o trabalho, que certamente continuou vivo na casa de
Martha (Mary) Walker, mantendo acesa no Brasil a chama do metodismo.
A verdade bíblica é que uma Igreja, para ser Igreja, não precisa de
templos nem de organização: precisa de gente disposta a ser igreja. O
apóstolo Paulo, em quatro ocasiões, faz referência à igreja que está na
casa de alguém. Em Rm 16:5 e I Co 16:19, ele se refere à igreja que
está na casa de Priscila e Áquila. No versículo 2 da carta a Filemon, ele
menciona a igreja que está em sua casa e, da mesma forma, em Cl
4:15, ele menciona a igreja que Ninfa hospeda em sua casa.
Não foi diferente o que ocorreu na casa dos Walker. Não se
sabe o que ocorreu com o chefe da casa mas a história registra que,
mais de 25 anos depois, a igreja que estava na casa de Mary Walker
se encontra com o novo pastor tão esperado por ela, que se tornou
oficialmente, em 11 de agosto de 1873, membro nº 1 da Igreja
Metodista do Brasil, arrolando-se, por assunção de votos, ela que já
pertencera à Igreja Metodista de sua pátria, a Inglaterra, na Igreja
Metodista do Catete, a primeira igreja do metodismo brasileiro.
Dando rédeas à minha imaginação, eu vejo, com os olhos da
alma, aquela mulher, que mantinha a igreja em seu lar, firme na
esperança da chegada de um novo pastor. Posso bem imaginar: a
cada vez que era anunciada a chegada de um navio procedente dos
Estados unidos, Mary Walker arrumava-se toda e se dirigia à Praça do
Paço Imperial, hoje Praça XV, onde se encontrava o porto do Rio de
Janeiro, para dar as boas-vindas ao novo pastor. Com que ansiedade
ela devia abordar os passageiros que desembarcavam, perguntando
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se entre eles havia um pastor metodista. Posso imaginar também sua
tristeza ao constatar, durante tantos anos e tantas idas e vindas, que
seu sonho estava tardando em realizar-se. Passado, porém, cada de-
sapontamento, a esperança se restabelecia e ela voltava ao cais do
porto à espera de um novo pastor.
Além do mais, ela tinha outra preocupação, entregar ao novo
pastor uma Bíblia de Almeida, em português, que ela recebera do
Rev. Kidder para entregar ao pastor que viesse substituí-lo. Para
cumprir essa tarefa, ela tinha que ser diligente, persistente e confian-
te E ela o foi. Quando Junius Newman chegou ao Brasil em 1867,
mais de um quarto de século depois, Mary, aquela que combateu o
bom combate, pôde desincumbir-se de sua missão e entregou a Bí-
blia ao seu novo pastor. Essa Bíblia, que depois foi entregue por
Newman ao Rev. Hugh C. Tucker, se encontra hoje no Museu da
nossa Faculdade de Teologia em São Paulo.
Mary Walker, que poderia ser considerada mãe do metodismo
brasileiro, é o elo perdido entre as duas fases de nossa história. Deus
seja louvado porque Mary Walker iniciou um caminho sobremodo exce-
lente, que tem sido fielmente seguido por milhares de mulheres metodistas
que estão no seu dia-a-dia, na igreja, no lar e em todas as trincheiras da
vida moderna, mantendo acesa, bem alta e forte, a chama do metodismo.
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Mulheres de Vila Isabel
A história da Igreja Metodista de Vila Isabel, desde o seu
início, é o relato de homens e mulheres que consagraram suas vidas
ao trabalho de Cristo. O Bispo Sante Uberto Barbieri bem poderia
estar pensando neles ao escrever o texto que se segue: “Na verdade,
não podemos entender o movimento metodista sem levar em consi-
deração a obra efetiva de tantos que trabalharam em posições secun-
dárias e sem ordenação eclesiástica de nenhuma espécie, mas que
receberam, sem dar margem à dúvida, a ordenação invisível do Espí-
rito Santo. Porque levar a cabo a obra de Cristo não depende de
ordenação humana e sim de uma paixão por Cristo e seu Evangelho”.
Há mulheres muito importantes naquela história. Seria fasti-
dioso citá-las todas, mesmo porque de muitas delas não ficaram
registros adequados. Elas amaram a igreja e dedicaram sua vida a ela
mas o tempo, e a falta de uma visão histórica e de registros, as
deixou no anonimato, da mesma forma como, na própria Bíblia, não
se encontra a história de muita gente que estava ao lado de Jesus em
suas peregrinações nos ásperos caminhos da Galiléia. Algumas, no
entanto, a história registrou e vamos mencioná-las aqui como home-
nagem neste Dia Internacional da Mulher.
A igreja começou na casa de Ana Pereira de Souza Duarte, no
número 96 do chamado Boulevard. Foi na sala da frente daquele
sobradinho que, em 15 de junho de 1902, foi fundada a nossa igreja.
Maria Gomes de Oliveira, a avó da saudosa Dona Ondina Franco, é uma
daquelas valorosas mulheres. Foi dedicada e fiel e a primeira presidente
de nossa Sociedade de Mulheres, fundada em 1902. De suas fundado-
ras, só três nomes ficaram conhecidos, o dela e os de Rosa Soares,
mulher de Antônio Soares, e Maria Gonçalves, respectivamente, mães
de Elyas Soares e Almeirinda Soares. Eram portanto as avós de Alice,
minha mulher, e bisavós de meus filhos. Outras mulheres enriqueceram
depois essa galeria de verdadeiras heroínas da fé. Diná Dias Alves, mãe
de Pedro Américo e sogra de Alice Dias Alves, Filismina Bento, a evangelista
que convidou o casal Duarte, José e Isaura, pais da saudosa Alzira Duarte,
para virem à igreja, isto no ano de 1917. Vieram, viram e gostaram e
aqui ficaram até que Deus os chamasse ao lar.
Há uma história muito bonita que envolveu, no início dos anos
20 do século passado as mulheres de nossa igreja. O sonho do novo
templo as envolveu em trabalhosas campanhas para angariar fundos
para a construção. Elas faziam doces e salgadinhos que vinham vender,
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todos os dias, fizesse sol ou chuva, no local estratégico que era a calçada
de nosso terreno. Algumas aventuravam-se a vendê-los na esquina de
28 de Setembro com Souza Franco, que, na época, era chamada de
“Ponto do Cem Réis”, isto é um ponto de seção, onde as pessoas, para
economizar um tostão, assim se chamada a moeda de cem réis, desciam
dos bondes, mesmo quando iam para as proximidades da Praça Sete,
hoje chamada Barão de Drummond, e completavam o percurso a pé.
A compra do nosso terreno, adquirido da Cia. de Carris, Luz e
Força, a Light”, foi um verdadeira epopéia. Foi muita visão daquele
grupo de membros, pobres e humildes, mas que queriam o melhor
para a igreja. Pois bem, quando se planejavam os “finalmentes”, isto
é, a construção do templo, a “Light” se arrependeu da venda e quis
comprar o terreno de volta. Ofereceu então “um negócio da China”,
assim se chamavam os bons negócios na época. Ela receberia o seu
terreno de volta, perdoaria o restante da dívida e, em troca, daria à
igreja, numa rua lateral, na certa distante da 28 de Setembro, um
templo pronto. Preocupados com a dívida, os anciãos da igreja esta-
va quase topando o negócio. Que só não foi feito porque as mulheres
não deixaram e seu argumento foi decisivo. “O nosso sonho era ter
um templo na rua principal do bairro. Não se pode abrir mão de um
sonho”. E o negócio não foi feito, graças à obstinação e visão das
mulheres de Vila Isabel. A história mostrou que elas estavam com a
razão. O nosso templo foi inaugurado e consagrado em agosto de
1922. Naquele tempo, para ser consagrado um novo templo, era pre-
ciso que não restasse nenhuma dívida da construção.
Naqueles tempos difíceis, muita gente morava longe da Igre-
ja e os deslocamentos não eram fáceis como hoje. E havia ainda a
falta de recursos porque as pessoas eram muito pobres. Devemos
citar aqui, em homenagem às mulheres daquela geração, o sacrifício
que as que residiam em Vila Isabel faziam para receber com almoço
as pessoas que moravam longe e que assim, passavam a tarde na
igreja ou em visitação para poderem participar do culto da noite e, só
depois dele, voltavam às suas casas. A saudosa Alzira Duarte relatava
esses almoços amorosos na casa de seus pais José e Isaura.
Gastaríamos páginas e mais páginas só para mencionar a le-
gião de heroínas que nossa igreja teve. Vamos mencionar algumas,
pedindo perdão pela omissão de outras já que as informações são
poucas. Na nossa escola paroquial, destacamos sua primeira profes-
sora, Amélia Anders, bem como Eunice Corrêa Dias, que foi sua diretora
muitos anos, e as professoras Ondina Franco, Cladyr Oliveira de Cas-
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tro, Nair Pinto, Maria Carolina de Araújo, Antônia e Adair Ventura.
Uma das professoras, a única sobrevivente, foi Alice Dias Alves.
Outras mulheres se destacaram muito em nossa igreja, como
Laurinda Soares, nossa primeira organista, Araci Nery Gonçalves, Laura
Lobo Carneiro Monteiro, Wanda Torres, Nice Daltro Santos, Letícia
Pantaleão, a criadora do Dia do Pastor Aposentado, Georgina Silveira,
Santa Clara de Moraes, Albertina Pimenta, Celina, Ismênia Campante,
Norma Nunes e muitas outras que merecem o nosso respeito e a
nossa gratidão.
Um capítulo especial reservamos para outra mulher de Vila
Isabel, Ana da Conceição Gonzaga, aquela que foi fiel no muito e
deixou uma obra imorredoura.
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“Mulher, grande é a tua fé”
ÍNDICE PÁGINA
Dedicatória
1
A minha mãe 1
Meu anjo protetor 2
Papai feminista 4
Filho também feminista 7
Os direitos da mulher 8