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Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social

Universidade Federal do Rio de Janeiro


Curso: Teoria Antropológica I
Professoras: Olívia Gomes da Cunha e Bruna Franchetto
Aluno: Dennis Novaes Saldanha Côrtes
Questão 1.
A compreensão do processo que consolidou a Antropologia enquanto disciplina
– e as especificidades de sua problemática – está ligada à reflexão de como o “homem”
tornou-se paulatinamente um objeto de conhecimento científico. O trabalho de Hélène
Clastres sobre os desdobramentos da idéia de “selvagem” na produção literária e
filosófica do século XVIII elucida uma ligação oriunda não necessariamente de uma
unidade no pensamento, mas do compartilhamento de certos “universais comuns” a esta
produção. No período elencado pela autora os conceitos de natureza e razão orientavam
uma problemática que não se voltava “aos selvagens”, mas “ao selvagem”: aquele não
conhecia o Estado, a religião e outros elementos do Ocidente civilizado. A este “outro”
idílico cabia o papel de artífice retórico que permitia a crítica ou o elogio ao contexto
vivido pelos próprios autores. Imaginário que perpassava várias dessas obras, a
preocupação com um direito natural surgiria de certa forma como conseqüência de um
pensamento pautado na busca por leis naturais passíveis de serem desveladas pela razão.
É a partir do século XIX que surge, segundo Foucault, a consciência
epistemológica do homem enquanto tal. Apenas no momento em que a linguagem se
desloca da representação e se dobra sobre si mesma – abrindo caminhos ao homem que
é ao mesmo tempo objeto de conhecimento e sujeito que conhece – é possível a
construção do que o autor chama de uma “analítica da finitude”. Bem diferente do
pensamento afinado ao direito natural no século XVIII, a análise de Henry Maine sobre
o sistema jurídico na Roma Antiga, por exemplo, considera as relações humanas em sua
historicidade. Não se trata de encontrar valores universais absolutos subjacentes à
ordem da natureza, aqui o homem debruça-se sobre si: Maine tem como objeto o
universo de valores afinado à jurisprudência romana, pensando suas ligações com as
relações familiares, a mitologia ou a transmissão de propriedade. Considerando as
diferenças desse sistema em comparação ao direito costumeiro britânico, esmiúça um
“outro” em suas idiossincrasias. As preocupações de Lewis Morgan também
evidenciam essa transformação fundadora do pensamento moderno nos termos de
Foucault. Interessado em filologia, acabou por voltar seus esforços à análise dos
sistemas de consangüinidade e afinidade. Não por acaso os sistemas de parentesco
surgem em sua obra como ponto-chave para o desdobramento das diversas relações
sociais considerando as terminologias de afinidade em sua ligação com o parentesco, a
posse do território, classificação de seres, funções e posições rituais nos diferentes
contextos. Autores como Morgan e Maine, além de outros como Tylor e Frazer, foram
os responsáveis por elucidarem várias das problemáticas básicas que marcariam as
preocupações da Antropologia enquanto disciplina. Apesar de não abordarem
diretamente as dicotomias indivíduo/sociedade, ou homem/grupo – que só mais tarde se
tornaria uma questão de peso neste debate – representam um momento crucial na
preocupação que trouxe o “homem” ao foco da análise científica e qual seria a
perspectiva antropológica em relação a este objeto.
É Franz Boas quem reivindica à Antropologia a alcunha de uma “ciência
moderna”. Parte considerável de sua produção foi dedicada a esmiuçar os fundamentos
do método antropológico pensando seus limites e suas potencialidades, principalmente
no que tange à sua concepção de um “método histórico” que deveria servir de base a
esta ciência em construção. É também a partir deste autor que a dualidade
homem/grupo, indivíduo/sociedade, mostra-se uma questão mais premente. A inserção
desta problemática nos debates antropológicos está, em muitos pontos, relacionada à
consolidação da Psicologia enquanto ciência. Ao abordar o tema das mudanças culturais
em “Os métodos da etnologia”, Boas argumenta que
“as atividades dos indivíduos são determinadas em grande medida por seu ambiente social; por
sua vez, suas próprias atividades influenciam a sociedade em que ele vive, podendo nela gerar
modificações de forma.” (Boas: 2005, p. 47)
Logo em seguida, o autor trata a possibilidade de que o indivíduo, mesmo
influenciado por seu contexto, tem a capacidade de “reagir”, o que repercutiria em
diferenças de opinião e de comportamento dentro de um ambiente social que podem
gerar transformações relevantes. Apesar de não obliterar o indivíduo sob o manto de seu
ambiente social, Boas deixa clara a necessidade de distinguir o método de análise dos
fenômenos sociais dos métodos de análise dos fenômenos individuais. Em “Os
Objetivos da Pesquisa Antropológica”, o autor problematiza a utilização de métodos
psicofísicos por ignorarem que as experiências dos indivíduos a eles submetidos são, em
grande medida, influenciadas pelo contexto em que se inserem. O método antropológico
almejado por Boas tenta, assim, compreender as características inerentemente sociais
construídas nas relações entre os indivíduos, sem ignorar o papel destes na atualização e
na transformação de seus contextos: “precisamos basear a investigação da vida mental
do homem sobre um estudo da história das formas culturais e das inter-relações entre
vida mental individual e cultura.” (Boas: 2005, p. 97)
Grande parte da abordagem boasiana acerca da relação entre indivíduo e
sociedade pode ser percebida na obra de seus alunos. A relevância dada a essa clivagem
parece se acentuar nesta geração de autores. Ruth Benedict a aborda diretamente
referindo-se a dois posicionamentos opostos: por um lado, psicólogos sociais
argumentavam que a sociedade não seria nada além dos indivíduos que a compunham e
suas mentes; por outro, alguns estudiosos – Durkheim entre eles – afirmavam a
inexistência do indivíduo, reiterando a hegemonia da sociedade. A proposta oferecida
pela autora sugere que não haveria de fato um antagonismo entre estas duas esferas e
considera que a sociedade é inseparável dos indivíduos que a compõem, ao mesmo
tempo em que estes dependem da cultura a qual pertencem para o desenvolvimento de
suas potencialidades. Dentro desta perspectiva, os indivíduos aparecem de certa forma
como detentores de características básicas que impossibilitariam a erradicação das
diferenças por um processo de socialização, criando aqueles que se adéquam melhor aos
comportamentos exigidos em sua sociedade e outros que nela seriam vistos como
inferiores, ou incapazes. A partir do momento que se compreende a relatividade do que
é bem ou mal quisto numa sociedade, é possível que os indivíduos desajustados
diminuam sua frustração e que a sociedade envolvente busque uma maior tolerância em
relação a eles (Benedict: 2013). Margaret Mead, por sua vez, trata como relevantes as
contribuições da psicologia na apreensão do comportamento humano, propondo que
arranjos interdisciplinares poderiam render frutos ao matizarem melhor a relação entre o
ambiente social e o comportamento individual, considerando esse cruzamento essencial
para a compreensão, por exemplo, do caráter nacional (Mead:1962, p.413).
Ao desenvolver sua reflexão sobre o que chama “Cultura Autêntica”, Edward
Sapir também resvala nas dicotomias supracitadas. Para tal, o autor reúne dois usos do
termo “cultura”: aquele que carrega o sentido de refinamento individual; e o referente a
atitudes gerais e manifestações específicas que asseguram a um povo específico seu
lugar no mundo. A partir dessas duas premissas, a cultura autêntica surge como aquela
inerentemente harmoniosa e equilibrada, construindo-se a partir dos interesses dos
indivíduos, aos quais deve ser permitido o pleno desenvolvimento de seus impulsos
criativos e emocionais. Dessa forma, não haveria uma oposição de fato entre uma
cultura do grupo e uma cultura individual, devendo-se ao afinamento das duas a
conjunção favorável a uma cultura autêntica. A crítica do autor dirige-se à padronização
que induz a fórmulas impessoais, anulando o indivíduo por uma totalidade opressora. A
reconciliação necessária na busca pela cultura autêntica implicaria primeiramente em
encontrar um modo de atender às satisfações espirituais apesar dos limites estritos de
uma atividade econômica à qual se está involuntariamente confinado; em segundo lugar
é preciso reconciliar as ambições e necessidades individuais com a vida espiritual geral
da comunidade. A arte seria uma peça fundamental nesse processo, uma vez que por
meio dela é possível refletir ao mesmo tempo a cultura coletiva e a individual.

Bibliografia

BENEDICT, Ruth. Padrões de Cultura. Trad: ROSENBUSCH, Ricardo A. Petrópolis:


Ed. Vozes, 2013
BOAS, Franz. “Os métodos da etnologia, 1920”. Trad: CASTRO, Celso. In: Franz
Boas – Antropologia Cultural. Org: CASTRO, Celso. Rio de Janeiro: Ed. Jorge Zahar,
2005.
___________. “Os objetivos da pesquisa antropológica, 1932”. Trad: CASTRO, Celso.
In: Franz Boas – Antropologia Cultural. Org: CASTRO, Celso. Rio de Janeiro: Ed.
Jorge Zahar, 2005.
CLASTRES, Héléne. “Sauvages et Civilisés au XVIII Siècle”. In: Histoire des
Ideologies, vol 3. Savoir et Pouvoir Du XVIII au XX Siècle. Paris: Ed. Hachette,
1978.
FOUCAULT, Michel. As palavras e as coisas: uma arqueologia das Ciências
Humanas. São Paulo: Ed. Martins Fontes, 2010
MAINE, Henry. Ancient Law. London: Ed. Dent, 1957.
MEAD, Margareth. “National Character”. In: Antropology Today – Selections.
Chicago: The University of Chicago Press, 1962
MORGAN, Lewis H. Systems of consanguinity and affinity of the human family.
Washington: Smithsonian Institute, 1871.
SAPIR, Edward. “Cultura: Autêntica e Espúria”. Trad: GONÇALVES, José Reginaldo
e Markus Hediger. Sociologia e Antropologia v. 02.04: 2012.

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