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volume 12 — nº 3— 2004 ISSN - 0104-3579

Artigos
• Perfil dos pacientes acometidos por AVE tratados na clínica escola de
fisioterapia da UMESP

• Uma análise do comprometimento da fala em portadores


de doença de Parkinson

• Avaliação da capacidade funcional de idosos em tratamento fisioterapêutico

• Trombólise endovenosa com Alteplase em AVC Isquêmico -


Experiência em 27 casos - Joinville – SC

• Tratamento inicial da doença de Parkinson

• Utilização do SF-36 em ensaios clínicos envolvendo pacientes fibromiálgicos:


determinação de critérios mínimos de melhora clínica

• Intervenções fisioterapêuticas para pacientes com fibromialgia

• Midazolan nasal no tratamento de crises convulsivas


revista
Neurociências
Neurociências 115

Editorial
Variação terapêutica e ensino médico
O que é possível ensinar aos nossos alunos e residentes? O que poderia ser duradouro o suficiente para justificar o mestre? Do que
necessita o aluno para querer ao seu lado alguém experiente? A prática da neurologia, principalmente no que concerne às doenças
cérebro-vasculares, vem ganhando um corpo de evidências cada vez mais consistente, conduzindo obrigatoriamente a uma reflexão do
que ensinar. A linguagem da epidemiologia clínica necessita ser difundida, e independentemente de interesses, custos e preconceitos,
nossos futuros médicos não escaparão às exigências de uma prática científica do diagnóstico e tratamento.
Aquele mestre que fazia de uma maneira muito própria, peculiar e sua parece não ter mais lugar no mundo médico. O mestre que agia
e determinava os destinos de pacientes porque tinha convicções fundamentadas na sua vida e racionalidade particular passou a fazer
parte dos experimentos da clínica. O avanço tecnológico e a difusão da clínica como ciência permitiu uma constante avaliação das
posturas e decisões médicas. Argumentos baseados em autoridade foram progressivamente sendo desconsiderados e muito pouco
tolerados, principalmente nos países desenvolvidos. Na medicina americana, pelo menos nos centros de excelência no atendimento (que
nem sempre coincidem com os de pesquisa ou renomados pesquisadores), ocorre uma prática menos deificada da medicina. Os argu-
mentos clínicos e o que ensejam à pesquisa são a moeda de troca no mercado do pensamento e atenção ao paciente. Já não se requer
mentes excepcionais para praticar e fazer evoluir o conhecimento médico: um modo de pensar e fazer, prático e eficiente, vem dando
conta da demanda clínica e científica. O trabalho a ser realizado é enorme! As ciências básicas e associadas apontam indicadores
relevantes, mas o paradigma da reatividade idiossincrásica do corpo exige o experimento clínico. E o experimento clínico pode reacender
chamas de outrora, ou condenar ao esquecimento vultosos investimentos em uma terapêutica.
O aluno de medicina é aluno para toda a vida, e seus verdadeiros mestres deveriam ensiná-lo a aprender eternamente. O aluno levará
do mestre a postura diante da medicina e paciente, o cuidado propedêutico e o bom senso terapêutico. O mestre se justifica pela
dimensão do possível, pelo espectro do comparável e pela força de modelação tão necessárias ao psiquismo humano.
Quando o aluno se depara com a variação terapêutica não se lembrará de argumentos autoritários, mas da mão que o guiou para a
melhor opção científica de tratamento.
Felizmente estamos assistindo a uma grande transformação na maneira de pensar clinicamente no Brasil, e apesar de algo atrasados
em relação aos países desenvolvidos, muito tem sido implementado na assistência terapêutica ao paciente, motivo porque gostaria de
parabenizar todos aqueles que estão se dedicando ao enorme trabalho de prover treinamento profissional, pesquisa e atendimento aos
pacientes com “acidente vascular cerebral” em nosso país. Os excelentes trabalhos sobre trombólise no AVC publicados aqui na Revista
Neurociências tem sido de grande utilidade para reflexões e ações de saúde neste importante campo epidemiológico e clínico que muito
onera nosso país e faz sofrer nossos cidadãos.
Gilmar Fernandes do Prado
Editor

Índice
ARTIGOS ORIGINAIS

Perfil dos pacientes acometidos por AVE tratados na clínica escola de fisioterapia da UMESP
Rodrigues, José Erickson; Sá,Márcia da Silva; Alouche, Sandra Regina. .......................................................................................... 117

Uma análise do comprometimento da fala em portadores de doença de Parkinson


Alcidézio Luís Sales de Barros, Erideise Gurgel da Costa Silveira, Roberta Cristiny Medeiros de Souza,
Lorena Canto de Freitas .......................................................................................................................................................................123

Avaliação da capacidade funcional de idosos em tratamento fisioterapêutico


Laiz Helena de Castro Toledo Guimarães, Débora C. A. Galdino, Fábio Luiz Mendonça Martins, Simone R. Abreu, Mary Lima,
Débora Fernandes de Melo Vitorino. ....................................................................................................................................................130

Trombólise endovenosa com Alteplase em AVC Isquêmico - Experiência em 27 casos - Joinville – SC


LONGO,A.L.; MORO,C.H.C.; CABRAL,N.L. ........................................................................................................................................134

Tratamento inicial da doença de Parkinson.


Antônio L. Teixeira Jr, Francisco Cardoso. ...........................................................................................................................................141

Utilização do SF-36 em ensaios clínicos envolvendo pacientes fibromiálgicos: determinação de critérios mínimos de
melhora clínica
Débora Fernandes de Melo Vitorino; Fábio Luiz Mendonça Martins; Alessandra de Castro Souza; Débora Galdino;
Gilmar Fernandes do Prado. ................................................................................................................................................................147

ARTIGOS DE REVISÃO
Intervenções fisioterapêuticas para pacientes com fibromialgia: Atualização
Débora Fernandes de Melo Vitorino, Gilmar Fernandes do Prado ......................................................................................................152

Midazolan nasal no tratamento de crises convulsivas


Sueli Rizzutti, Lucila Bizari Fernandes do Prado, Gilmar Fernandes do Prado. ....................................................................................157

REVISTA NEUROCIÊNCIAS V12 N3 - JUL/SET, 2004


Neurociências 116
REVISTA NEUROCIÊNCIAS
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única e exclusiva de seus proponentes. Tiragem: 3.000 exemplares

REVISTA NEUROCIÊNCIAS V12 N3 - JUL/SET, 2004


Neurociências 117

Artigo Original

Perfil dos pacientes acometidos por AVE


tratados na clínica escola de fisioterapia
da UMESP
Profile of the stroke patients treated in the clinical school of physical
therapy of the UMESP
Rodrigues, José Erickson1; Sá,Márcia da Silva 1; Alouche, Sandra Regina2.

RESUMO

O objetivo deste estudo foi traçar o perfil clínico e funcional dos pacientes com diagnóstico de Acidente
Vascular Encefálico (AVE) atendidos na Clínica Escola de Fisioterapia da UMESP. Foi feito um estudo retrospectivo
em pacientes acometidos por AVE, realizado através de uma coleta de dados em prontuários de 109 pacientes
no período de fevereiro de 2001 a junho de 2003. A coleta de dados foi realizada por meio de um protocolo
previamente desenvolvido, abrangendo questões sócio-demográficas, clínicas, físicas e funcionais.
O AVE é uma doença comum em todo mundo, por ser a principal causa de incapacidade neurológica em
adultos, podendo acometer a função dos membros, controle motor, equilíbrio, força e mobilidade. Apesar de
ocorrer uma maior recuperação motora e funcional nos primeiros três meses após o AVE, há evidência de que
o exercício terapêutico é efetivo mesmo em casos crônicos.
O estudo demonstrou que a população atendida na Clínica Escola de Fisioterapia da UMESP é em sua
maioria composta de pacientes crônicos. Este fato acarreta uma permanência maior em terapia e dificulta ganhos
funcionais. Contudo pôde-se constatar melhora do quadro motor durante o tratamento, o que reforça a idéia de
que mesmo pacientes em fase crônica de AVE podem ter uma boa evolução em termos funcionais.

Unitermos: Hemiplegia, Acidente Vascular Cerebral, Fisioterapia, Resultados.

SUMMARY

The purpose of this study was to plot a clinical and functional profile of stroke patients fulfilled at Clinical
School of Physical Therapy of the UMESP. This retrospective study was done by a collection of data in fiches of
109 patients, from February 2001 to July 2003. The collection of data was done with a questionnaire beforehand
developed with social-demographic, clinical, physic and functional questions.
The stroke is an ordinary sickness all over the world and it is the main cause of neurological incapacity in
adults, it can causes problems in the function of the limbs, motor control, balance, strength and mobility. In spite
of to occur a great recovery an functional in the first three months after the stoke there is evidence that the
therapeutic exercise is effective even in chronic cases.
This study showed that the population treated at Clinical School of Physical Therapy of the UMESP is the great
part formed by chronic patients. This fact cause a greater permanence in therapy and worse functional gains.
However, it could see improvement during the treatment. This fact reinforces the idea that even patients in chronic
stroke can have functional improvement.

Keywords: Hemiplegia, Stroke, Physical Therapy, Outcome.

Trabalho realizado: UMESP/UNIBAN

1 - Pós-Graduando do Curso de Fisioterapia em Neurologia da UMESP.


2 - Professora Doutora em Neurociências e Comportamento, Coordenadora da Pós-Graduação de Fisioterapia em Neurologia da
UMESP, Docente do Mestrado em Reabilitação Neuromotora da UNIBAN.

Endereço para correspondência: Márcia da Silva e Sá


Rua Otávio Mangabeira 48 Jardim Ana Maria - cep 09260-570 - Santo André - SP e-mail: marcia_s_sa@yahoo.com.br
Trabalho recebido em 06/07/2004. Aprovado em 01/09/2004.

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Neurociências 118

INTRODUÇÃO são conhecidos por meio de estudos norte-


O Acidente Vascular Encefálico (AVE) é uma americanos e europeus. Pouco tem sido
doença comum e de grande impacto na saúde publicado nos países em desenvolvimento .
2

pública em todo o mundo1,2,3 por ser a principal O objetivo desse estudo é traçar o perfil
causa de incapacidades neurológicas em clínico e funcional dos pacientes com
adultos 4,5, acometendo a função das diagnóstico de AVE atendidos na clínica escola
extremidades de membros, controle motor, de fisioterapia da UMESP, bem como a
equilíbrio, força e mobilidade 6, e devido aos evolução apresentada nestes aspectos
altos custos despendidos com o seu durante o período de atendimento
tratamento agudo e a longo prazo 1. fisioterapêutico nesta clínica.
A incidência do AVE vem crescendo devido
ao aumento da expectativa de vida e pelas
mudanças no estilo de vida 2,4 . Estima-se que MATERIAL E MÉTODO
na América do Sul isto seja mais evidente nas
Este é um estudo retrospectivo que envolve
próximas décadas pelos mesmos motivos.2 coleta de dados em prontuários de 109
Saposnik, em estudo epidemiológico realizado
pacientes acometidos por AVE, atendidos na
na América do Sul, constatou em sua
Clínica Escola da UMESP no período de
comunidade-base uma prevalência de AVE
fevereiro de 2001 a junho de 2003. Todos os
que variava de 1.74 a 6.51 por 1000 habitantes
pacientes envolvidos já haviam sido
e taxas anuais da incidência de 0.35 a 1.83 desligados do serviço. A coleta de dados foi
por 1000 habitantes 2.
feita com base em um protocolo previamente
Apesar de ocorrer uma maior recuperação desenvolvido, o qual abrangia questões sócio-
motora e funcional nos primeiros três meses demográficas, clínicas, físicas e funcionais.
após o AVE1,6,7 há evidências de que o exercício Dentre as questões sócio-demográficas foram
terapêutico é efetivo mesmo em casos coletados os dados referentes a gênero, idade
crônicos6. Petrilli evidenciou em pacientes sub- e motivo do desligamento do serviço. Nas
agudos que 87,1% dos pacientes tinham questões clínicas, verificou-se o tipo de AVE,
recuperado a habilidade de marcha após 64 fatores de risco, tempo e freqüência de
dias de reabilitação 1. Dean constatou em tratamento, período icto-triagem, cognição
pacientes com AVE crônico (1,3 anos em (mini-exame do estado mental)8 e alterações
média) que o grupo experimental obteve um de fala. Quanto aos aspectos físicos, verificou-
desempenho significativamente melhor, que o se o trofismo, tônus e sensibilidade do
grupo controle nos testes de caminhada de 6- hemicorpo acometido, paralisia facial,
minutos, a velocidade na marcha, o step e no hemicorpo acometido, predomínio e
teste de “levantar e andar”. Neste estudo os deformidades. Os aspectos funcionais
exercícios foram realizados por 4 semanas, englobaram a locomoção e transferências no
supervisionado por fisioterapeutas, e essa início da terapia, funções adquiridas e
melhora foi mantida por dois meses após realização de AVD´s no início e fim da terapia
cessado o treinamento5. por meio do índice de Barthel9.
Muitos estudos têm sido realizados sobre A análise estatística dos dados foi realizada
o AVE com base no tratamento, avaliação, de forma descritiva simples, onde as variáveis
prevenção, conseqüências a curto, médio e qualitativas foram apresentadas por meio de
longo prazo, fatores predisponentes e que tem freqüências relativas (percentuais) e de
influência sobre estas conseqüências e no freqüências absolutas (N) e as variáveis
tratamento global do paciente1-7. Porém, a quantitativas/numéricas por meio de médias,
maioria dos dados clínicos atuais, sobre o AVE, desvios-padrão, mínimo e máximo.

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Os dados quantitativos obtidos no início e relatados. Quanto aos fatores de risco 45


no final do tratamento foram analisados (63,38%) tinham hipertensão arterial sistêmica
utilizando o Test-T de Student. (HAS), 38 (54%) pacientes eram tabagistas, 22
Os cálculos e gráficos foram executados (30,99%) tinham diabetes, 12 (17%) eram
com o auxílio do software Statistica ® 5.0 for etilistas, 9 (12,68%) doenças cardíacas, 6
Windows ® e foi adotado um nível de (8,45%) Hipercolesterolemia , 3 (4,22%) à
Doença Ateromatosa, 1 (1,41%) à Aneurisma,
significância de 5%.
1 (1,41%) à Hipotiroidismo, 9 (12,68%) negam
e 8 (11,27%) não relatados. A média de tempo
RESULTADOS de tratamento foi de 4 meses, e 56 (79%)
pacientes faziam tratamento 2 vezes por
Dos 109 prontuários analisados, 38 deles semana e 15 (21%) pacientes 3 vezes por
não foram incluídos na pesquisa por abandono semana. O período icto-triagem médio foi de
da terapia logo após a avaliação inicial, ou 21,25 meses, porém não haviam relatos sobre
antes de completar um mês de tratamento. Os este período nos prontuários de 6 pacientes.
71 pacientes incluídos na pesquisa foram Quanto a Cognição (mini exame do estado
descritos em quatro aspectos que envolvem: mental) o escore possível no exame é de 30
Questões sócio-demográficas; Questões pontos. Considera-se que de 28 a 30 pontos
clínicas; Aspectos físicos e Aspectos não há alteração da cognição, e abaixo de 24
funcionais. pontos há comprometimento cognitivo (8). Na
Em relação aos aspectos sócio- população estudada, 25 (35,5%) pacientes
demográficos, a população estudada tiveram o índice <24 pontos, 8 (11%) pacientes
englobou 43 (60,56%) homens e 28 (39,44%) 25-27 pontos, e 13 (18%) pacientes >28
mulheres (Tabela1); cuja faixa etária foi de 64 pontos. Os 25 (35,5%) pacientes restantes não
±13,1 anos. O motivo de desligamento foram submetidos a essa avaliação. Quanto
apresentado ao final do atendimento envolveu: às alterações de fala, 5 (7%) pacientes tinham
28 (40%) indivíduos abandonaram o afasia de expressão, 1 (1%) afasia mista, 3 (4%)
tratamento, 9 (14%) atingiram os objetivos apresentavam afasia não discriminada, 9
estipulados, 5 (7%) pacientes que foram (13%) disartria, 15 (21%) sem alteração e 38
considerados de manutenção, 4 (6%) (54%) não relatados.
mudaram de cidade, 4 (6%) foram à Óbito, 3 Nos aspectos físicos verificou-se que 39
(4%) apresentavam Hipertensão Arterial (56%) pacientes apresentavam hipotrofismo
Sistêmica (HAS) sem controle, 2 (3%) hemicorpo acometido, 20 (28%) pacientes
apresentavam alteração de comportamento, apresentavam-se o normotróficos, e 1 (1%)
2 (3%) por problemas familiares, 2 (3%) por hipertrófico e 11 (15%) não relatados. O tônus
internação hospitalar, 2 (3%) por problemas do hemicorpo acometido apresentava-se
com transporte,1 (1%) foi admitido em um reduzido em 22 (31%) pacientes, 9 (13%) eram
emprego, 1 (1%) por dificuldade financeira, 1 normotônicos, 35 (49%) hipertônicos e 5 (7%)
(1%) por fratura de úmero, e 1 (1%) para não relatados. A sensibilidade do hemicorpo
realização de exames, 6 (8%) casos não foram estava ausente em 4 (6%) pacientes, em 20
relatados. (28%) encontrava-se alterado, em 39 (53%)
Em relação às questões clínicas foram sem alteração e em 9 (13%) não relatados. 8
avaliados os tipos de AVE, os fatores de risco (11%) pacientes apresentaram paralisia facial,
e aspectos relacionados ao tratamento. 43 (61%) não e 20 (28%) não relatados. 38
Quanto ao tipo de AVE, 49 (70%) AVE (54%)pacientes apresentaram o hemicorpo
Isquêmico, 10 (14%) tiveram diagnóstico de direito acometido (Tabela1), 30 (42%) o
AVE Hemorrágico (Tabela.1), 1 (1%) AVE hemicorpo esquerdo (Tabela1), 1 (1%) paciente
Isquêmico para Hemorrágico e 11 (15%) não apresentava dupla hemiparesia e 2 (3%) não

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relatados; quanto ao predomínio 26 (37%)


braquial, 10 (14%) crural e 35 (49%) não
relatados. As deformidades foram detectadas
em 12 (17%) pacientes, 40 (56%) não
apresentavam e 19 (27%) pacientes não
relatados.
Quanto aos aspectos funcionais foram
incluídos: a locomoção, sendo que no início Tabela 1 – Características da população estudada (n=71)
da terapia 20 (28%) apresentavam
deambulação independente, 12 (17%)
deambulavam com auxílio de bengala ou
muleta, 14 (20%) com ajuda de acompanhante, Em relação aos ganhos funcionais, 1 (1%)
22 (31%) eram cadeirantes dependentes e 3 paciente relatou melhora da dor que sentia em
(4%) cadeirantes independentes. Quanto às membro inferior direito, 1 (1%) melhorou a
transferências posturais no início da terapia 43 mobilidade de ombro, 1 (1%) paciente atingiu
(31%) pacientes rolavam, 39 (29%) passavam os objetivos do tratamento, 2 (2%) melhoraram
de decúbito dorsal para sentado, 28 (21%) a força, 2 (2%) conseguiram o movimento de
passavam de sentado para em pé, 15 (11%) hemiface, 3 (3%) adquiriram habilidades
não realizavam transferências e 11 (8%) não manuais, 3 (3%) conseguiram independência
relatados. As funções adquiridas durante o nas AVDs, 1 (1%) passou a vestir-se
tratamento, e a realização de atividades de vida independentemente, 16 (18%) obtiveram
diária (AVD´s) foram avaliados através do melhora no Índice de Barthel, 2 (2%)
Índice de Barthel, no início e fim de terapia. conseguiram rolar, 3 (3%) conseguiram passar
Foi constatado que no início do tratamento 56 de decúbito dorsal para sentado, 2 (2%)
(78,87%) pacientes foram submetidos á
pacientes conseguiram passar de sentado
avaliação pelo Índice de Barthel, destes,
para em pé, 1 (1%) passou a fazer transferência
apenas 17 (23,94%) pacientes foram
submetidos a uma segunda avaliação do da cadeira de rodas para o tablado, 3 (3%)
Índice de Barthel no final do tratamento. adquiriram o controle de tronco, 2 (2%)
Contudo estes indivíduos que foram conseguiram realizar a transferência de peso,
submetidos a uma avaliação inicial e outra final, 1 (1%) adquiriu equilíbrio estático, 2 (2%)
foi observada uma melhora significativa adquiriram o equilíbrio na marcha, 4 (5%)
(p<0,001) da avaliação inicial (12,4±4,8) para conseguiram a melhora da marcha, 3 (3%)
a avaliação final (16,9±2,9) como demonstra andar com auxílio, 8 (9%) atingiram a marcha
a (Figura 1). independente, 1 (1%) passou a subir escadas.
Em 26 (30%) não foi detectado algum ganho
funcional.

DISCUSSÃO
A população com AVE tem sido
caracterizada na literatura como sendo mais
freqüente no gênero masculino6, 10-14 e na faixa
etária de 60 a 74 anos em média 1- 4, 6, 7, 11-15. A
população utilizada neste estudo apresenta
características semelhantes à apresentada na
literatura, sendo maior a proporção de homens
Figura 1 – Comparação dos escores do Índice de que de mulheres e com uma média de idade
Barthel obtidos no início e no final do tratamento dos
pacientes (n:17). de 64 anos.

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Em relação ao tipo de AVE encontrado nesta disso podemos afirmar que esses dados podem
população a predominância foi de AVE isquêmico ser errôneos.
atingindo 70% dos indivíduos concordando com O hemicorpo mais freqüentemente acometido
a literatura que aponta uma maior freqüência de em nossa população foi o direito, contudo isso não
AVE isquêmico em relação ao hemorrágico1, 2, 6, 11, parece ser relevante como fator prognóstico, pois
16
. Dentre os fatores de risco encontramos uma a literatura mostra variações nesta frequência1, 4, 6,
grande incidência, em ordem decrescente, de 7, 15
. Com relação ao tônus e o trofismo vimos que
HAS, tabagismo, diabetes, etilismo, doenças a maioria seguiu um padrão de AVE crônico
cardíacas, hipercolesterolemia, doença apresentado na literatura, que relata uma evolução
ateromatosa, aneurisma e hipotireoidismo. Estes com hipertonia e hipotrofia do hemicorpo
fatores de risco têm sido apontados na literatura acometido18,19. A maioria dos pacientes não
como facilitadores da ocorrência de AVE1, 3, 4, 6, 7, 11, 13, 16 . apresentava nenhuma alteração de sensibilidade
A média de tempo de tratamento na população do hemicorpo acometido, porém 30% deles
estudada, de 4 meses, encontrada foi baixa em apresentavam, mas os relatos em prontuários
relação a outro estudo realizado em São Paulo, deixavam muitas dúvidas sobre quais os tipos de
que encontrou um período médio de 10,8 meses alteração e se realmente estava relacionada à
de tratamento10. Outros realizados fora do Brasil sensibilidade ou a presença de heminegligência.
relatam que o período de tratamento estava em Os relatos sobre o predomínio do acometimento
torno de 2 a 3 meses1, 7, 15. Analisando o período segmentar corporal mostraram que a maioria foi
icto-triagem foi verificado que a nossa população braquial, entretanto esta era uma questão subjetiva
é composta de pacientes bastante crônicos na ficha de avaliação do paciente, e por isso a
comparados com aqueles encontrados em alguns maioria dos prontuários não apresentava este
estudos1, 7, 15, porém, esse longo período entre a dado. Grande parte dos pacientes (76% dentre os
lesão e admissão em um serviço de reabilitação relatados) não apresentava deformidades de
parece ser comum em nossa realidade como membros e isto é um dado positivo diante da
mostra o estudo realizado por Bruno em São cronicidade da nossa população e do grande
Paulo10. Isto pode ser explicado pela dificuldade espaço de tempo entre a lesão e o início da terapia.
em encontrar vagas nos serviços de fisioterapia
que atendem a população carente devido as Através do Índice de Barthel 9 foram avaliados
grandes filas de espera. os ganhos funcionais nas AVDs e foi observada
uma melhora significativa entre a avaliação inicial
Dentre os indivíduos avaliados através do Mini- e a final. No entanto apenas 23,94% dos
Exame do Estado Mental 8 (64,5%), a grande prontuários dos pacientes continham essa
maioria teve índice abaixo de 24 pontos, mas isto informação. Outros ganhos funcionais foram
pode ter sido agravado pelos baixos níveis de detectados através da observação das evoluções
educação em nossos pacientes. No estudo em prontuários, tais como: aquisição/melhora da
realizado por Özdemir, comparando o estado marcha, aquisição de transferências posturais,
cognitivo com os ganhos funcionais em pacientes independência nas AVDs e habilidades manuais.
pós AVE, foi visto que as desordens cognitivas Entretanto esses ganhos não puderam ser
representavam um fator de grande influência nos quantificados estatisticamente por não ter sido
resultados funcionais na reabilitação15. Em nosso utilizado um índice de avaliação, sendo realizada
estudo não foi possível fazer a relação entre essas apenas a porcentagem na população.
questões.
Analisando os motivos do desligamento, foi
Quanto às alterações da fala foi visto que um encontrada uma grande incidência de abandono
quarto dos pacientes estudados apresentavam sem justificativa, isso pode ser justificado por se
algum distúrbio, não sendo raro neste tipo de tratar de uma clínica escola que tem uma
paciente1, 4, 7, 17. A disartria foi o mais freqüente e rotatividade grande de alunos e o paciente só fica
dentre as afasias, a de expressão foi a mais um mês com cada um, tornando difícil o vínculo
relatada, porém percebemos que essas questões com a terapia. Outros indivíduos foram desligados
não estavam claras nos prontuários, pois havia por serem considerados pacientes de
relatos de afasia sem especificação do tipo e manutenção, ou seja, pacientes que não
pacientes com paralisia facial sem relatos de apresentavam melhora funcional. Por se tratar de
disartria, o que é bastante incomum devido ao uma clínica escola onde há necessidade de
acometimento de músculos fonatórios, diante rotatividade devido à grande fila de espera, este

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Neurociências 122

desligamento torna-se justificável. A HAS sem didáticas, mas que dificultam uma coleta objetiva
controle foi um problema bastante freqüente no de dados para pesquisas similares à presente.
nosso serviço, já que a maioria dos pacientes CONCLUSÃO
apresenta HAS e muitos dependem do serviço
público para fazerem um acompanhamento eficaz Este estudo demonstra que a população
e conseguirem o medicamento. Os outros motivos atendida na Clínica Escola de Fisioterapia da
para o desligamento do serviço foram mudança UMESP é em sua maioria composta de pacientes
de cidade, óbito, alterações de comportamento, crônicos. Este fato acarreta uma permanência
problemas familiares, internação hospitalar, maior em terapia e dificulta os ganhos funcionais.
problemas com transporte, dificuldades Questões sociais influenciam o prognóstico e o
financeiras, fratura de úmero, realização de resultado da terapia e levam ao abandono
exames, e um último que arrumou um emprego, o freqüente do tratamento, fato não discutido na
que merece destaque, visto representar a literatura internacional. Contudo pôde-se constatar
reinserção do indivíduo no mercado de trabalho. melhoras durante o tratamento, o que reforça a
Um dado importante a ser considerado é a alta idéia de que mesmo os pacientes em fase crônica
incidência de ausência de informação constatada de AVE podem vir a ter melhorias na função.5, 20, 21
neste levantamento de prontuário. Neste caso Protocolos de avaliação com questões
podemos salientar dois pontos. Este estudo foi objetivas que avaliem e quantifiquem melhor as
desenvolvido com base no preenchimento de características clínicas e os ganhos funcionais dos
prontuários de uma clínica-escola. A pouca pacientes são necessários a fim de que a
experiência dos terapeutas que realizam as continuidade do tratamento seja garantida e para
avaliações pode ser um fator determinante para a que pesquisas específicas para determinados
escassez de dados. Outro ponto, é a utilização procedimentos terapêuticos possam ser
de questões dissertativas e subjetivas integrantes elaborados e a otimização do atendimento ao
do protocolo de avaliação, adotadas por questões paciente conquistada.

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Artigo Original

Uma análise do comprometimento da fala em


portadores de doença de Parkinson
Analisys of speech problems in Parkinson´s disease patients
Alcidézio Luís Sales de Barros1, Erideise Gurgel da Costa Silveira 2, Roberta Cristiny Medeiros
de Souza3, Lorena Canto de Freitas4,

RESUMO
1. Contexto. Os distúrbios clínicos primários encontrados na D.P são: tremor, rigidez, bradicinesia
e instabilidade postural. A rigidez é caracterizada por aumento no tônus muscular em todo corpo, e a
bradicinesia por pobreza na movimentação, o que leva a uma hipomimia facial. Estes são os dois
principais sinais que ocasionam alterações nos órgãos responsáveis pela articulação da fala, causando
alterações na emissão dos fonemas /s/ e /l/ e incoordenação nos movimentos da cavidade oral. 2.
Objetivos. A presente pesquisa objetiva analisar a fala, enquanto processo articulatório em sujeitos
com Doença de Parkinson (D.P). 3. Material e Método. Foram realizadas entrevistas, avaliações e
terapia fonoaudiológica em seis pacientes que se encontravam em estágio inicial da doença. 4.
Resultados/Conclusões. Com os dados obtidos, foi possível analisar e concluir que o tratamento
precoce em sujeitos em estágio inicial possibilita a atenuação das alterações da articulação da fala,
que compromete a inteligibilidade da mesma, proporcionando uma melhor qualidade de vida.
UNITERMOS
Doença de Parkinson, Articulação da fala, Tratamento precoce, Qualidade de vida.

SUMMARY
1. Background. The primary clinical disturbances found in P.D. are: tremor, rigidity, bradykinesia and
postural instability. The rigidity is characterized by increase in the muscular tonus in entire body, and
bradykinesia for motion deficiency. These are two main signs that cause alterations in the emission of
the phonemes /s / and /l / and incoordination in the movements of the oral cavity. 2. Objectives. This
research purpose to analyze the speech, concern to articulation process in people with Parkinson’s
Disease (P.D.). 3. Material and Methods. Interviews, evaluations and phonological therapy were
accomplished in six people that were in initial stage of the disease. 4. Results and Conclusions. According
to obtained data, it was possible to analyze and to conclude that the precocious treatment in people in
initial stage makes possible to reduce alterations of the articulation of the speech, providing speech’s
intelligibility, resulting a better life quality.

KEYWORDS
Parkinson’s disease, Articulation of speech, Early intervention, Quality of life.

Trabalho desenvolvido no Departamento de Psicologia e Fonoaudiologia da UNICAP - Fonte de auxílio: PIBIC / UNICAP - Área de trabalho: Fonoaudiologia

1 - Médico Neurologista. Mestre em Fonoaudiologia pela PUC de São Paulo. Profº Adjunto da Graduação em Fonoaudiologia da Universidade Católica de
Pernambuco (UNICAP).
2-Médica Doutora em Otorrinolaringologia pela USP. Profª. Adjunta da Graduação em Fonoaudiologia e do Mestrado em Ciências da Linguagem da
Universidade Católica de Pernambuco (UNICAP).
3 - Estudante de Fonoaudiologia da UNICAP e Coord. De Ações Políticas de Saúde da DENEFONO (Diretoria Executiva Nacional de Estudantes de
Fonoaudiologia).
4 - Estudante de Fonoaudiologia da UNICAP.

E n d e r e ç o p a r a c o r r e s p o n d ê n c i a : Roberta Cristiny Medeiros de Souza - Rua Estrada do Arraial, 2405 / 1401 - Tamarineira, Recife-PE Cep: 52051380 -
E-mail: betamedeiros@yahoo.com.br - E-mail: alcidezo@hotlink.com.br

Trabalho recebido em 06/07/2004. Aprovado em 01/09/2004.

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INTRODUÇÃO As características mais citadas na literatura


fonoaudiológica a respeito da fala, enquanto
Esta pesquisa tem por objetivo analisar a
articulação da fala, enquanto processo processo articulatório (movimentos dos órgãos
como: língua, lábios, dentes, bochechas,
articulatório, em pacientes portadores de Doença
mandíbula, palato duro, palato mole e úvula), diz
de Parkinson. Para este fim, faz-se necessário
proceder a uma revisão histórica sobre a patologia respeito à limitação no âmbito dos movimentos
da musculatura dos mecanismos da articulação
em questão. A Doença de Parkinson (D.P), foi
descrita originalmente por James Parkinson, em da fala, diminuição ou aumento da velocidade da
mesma, redução da inteligibilidade de
1817, em seu trabalho clássico “An say on the
conversação, da habilidade de elevar e realizar
shaking palsy”.¹ Em homenagem à descrição
inicial, esta recebeu a denominação de Doença movimentos coordenados com a língua durante a
fala . O tremor ao atingir a face altera a mobilidade
5
de Parkinson. Geralmente o diagnóstico é
realizado a partir dos 60 anos, em ambos os sexos e a motricidade dos lábios, mento e língua . Há
10,11

autores que relatam que há repetição, omissão,


e de diferentes classes sociais². A etiologia da D.P
substituição ou distorção das sílabas, fricativas,
permanece obscura, é considerada uma doença
degenerativa do Sistema Nervoso. Autores relatam sendo substituídas por explosivas, distorções de
vogais e de consoantes manifestadas pela
que existe uma lesão na substância negra do
mesencéfalo o que leva a uma diminuição da substituição de classes diferentes de fonemas .
9

dopamina, a qual exerce função inibidora É relatado que os portadores de Doença de


importante no controle central dos movimentos . Parkinson apresentam prejuízos na articulação,
3,4

Dentre os distúrbios clínicos encontrados nos como: consoantes imprecisas, divergência de


portadores de Doença de Parkinson, encontram- qualidade vocal e que, através da análise
se: tremor, rigidez, bradicinesia e instabilidade eletromiografica, estes sujeitos apresentam
postural5. A rigidez é caracterizada por aumento movimentos articulatórios reduzidos e
no tônus muscular desencadeado durante o coordenação imprópria dos músculo agonistas e
movimento passivo6. E a bradicinesia se exterioriza antagonistas¹². O portador de Doença de
por uma pobreza na movimentação, acarretando Parkinson apresenta uma língua rígida e
uma expressão facial em “máscara”. A disartria preguiçosa, apresentando grandes dificuldades
pode ser definida como uma alteração da de deslocamento ativo, e que, quando realiza, o
expressão oral causado por um acometimento no faz com lentidão. O que reflete numa fala lenta,
controle muscular dos mecanismos da fala7. fraca, parcimoniosa e sobretudo monótona14.
Na presente pesquisa, observo as alterações Várias pesquisas vêm sendo realizadas em
da fala, do ponto de vista articulatório, englobando portadores de Doença de Parkinson com objetivo
os aspectos oromiofuncionais responsáveis pela de conhecer melhor as dificuldades articulatórias,
adequada articulação dos sons da mesma. entretanto, não se leva em consideração o estágio
Desordem de fala é freqüente na doença de de comprometimento que o portador se encontra,
Parkinson e tem um impacto significativo na e que estas dificuldades são devido às
qualidade de vida destes sujeitos8. perturbações articulatórias.
“Anormalidades na articulação foram atribuídas Vale salientar que, na literatura, estas
ao decréscimo nos limites da variação, na características não possuem demarcações quanto
velocidade, na força do movimento, o que é às alterações existentes em cada estágio de
atribuído à rigidez e á bradicinesia associadas comprometimento, por esta razão, foram
com o distúrbio”9. observados e analisados qualitativamente os
A característica predominante na hipocinesia comprometimentos da fala, no estágio inicial da
refere-se a marca limitação do âmbito de patologia. Devido ao acometimento na articulação
movimentos da musculatura dos mecanismos da da fala nos portadores de D.P, busca-se analisar
fala5. Isso se explica à danificação das células da as queixas mais freqüentes relacionadas à fala,
substância negra que produzem a dopamina identificar quais os distúrbios fonéticos mais
acarretando insuficiência dos movimentos, que freqüentes, avaliar os distúrbios da articulação de
por sua vez ficam incoordenados e lentos5. fonemas, apresentar uma proposta de avaliação

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e tratamento das disartrofonias, baseadas em relação entre elas, e, por último, chega-se a uma
propostas anteriores e esclarecer a importância classificação, produto da generalização da relação
do diagnóstico precoce dos distúrbios da fala, a observada.
fim de que o médico encaminhe estes pacientes
Em relação aos métodos de procedimentos,
ao fonoaudiólogo, com objetivo de tratá–los e, com
estes englobam etapas mais concretas da
isso, obter um melhor prognóstico das funções investigação, com finalidade mais restrita em termo
perturbadas que serão traduzidas de forma
de explicação geral dos fenômenos e menos
positiva na sociabilidade e na qualidade de vida. abstratos. Para a análise da presente pesquisa,
os fatos foram observados, através de um
METODOLOGIA procedimento experimental e monográfico, de
forma longitudinal por seis meses, na qual
Este estudo foi aprovado pela Comissão de consistiu em investigar, avaliar e analisar seis
Ética do Real Hospital Português localizado na pacientes em estágio inicial de Doença de
cidade do Recife, na reunião ordinária do dia 02 Parkinson, com objetivo de obter generalizações
de outubro de 2002, quando todos os membros sobra sua natureza, partindo do princípio de que
presentes foram unânimes em dizer que este qualquer caso que se estude em profundidade
trabalho não oferece nenhuma ofensa a quaisquer pode ser considerado representativo de muitos
dos artigos do Código de Ética, particularmente, outros ou até de todos os casos semelhantes.
os de nº 122 a 130, Capítulo XII, que trata
especificamente da pesquisa em Medicina,
PROCEDIMENTOS
devendo apenas obter o termo de consentimento
dos pacientes que participam da pesquisa. Participaram desta pesquisa seis pacientes
portadores de Doença de Parkinson, que se
encontravam em estágio inicial da patologia, de
PACIENTES ambos os sexos.
Participaram desta pesquisa seis pacientes Inicialmente, na presente pesquisa, foram
portadores de Doença de Parkinson, que se entrevistados 30 sujeitos com Doença de
encontravam em estágio inicial da patologia, de Parkinson, de ambos os sexos, na clínica do
ambos os sexos, sendo 4 homens e 2 mulheres, orientador da pesquisa, neurologista Alcidezio Luiz
com idades entre 51 e 60, na Clínica do orientador Sales de Barros. Foi usado como critério de
da pesquisa em Recife, no estado de Pernambuco. inclusão, pacientes que não relatassem queixas
subjetivas relacionadas à fala, uma vez que
queríamos investigar as alterações existentes no
MATERIAIS início da patologia. Esta foi verificada após
Foram utilizados na presente pesquisa: carta de aplicação de um roteiro de entrevista semi-
informação; termo de compromisso; roteiro de estruturada.
entrevista inicial semi-estruturado; roteiro de A articulação da fala foi avaliada e analisada
avaliação semi-estruturado; roteiro de terapia através de diálogos espontâneos, observações da
miofuncional oral; espátula; luva cirúrgica latex; fonte
musculatura, palpações e exercícios isométricos
luminosa; gravador; fita cassete; filmadora; fita VHS;
(avalia a tonicidade da musculatura), isocinéticos
álbum articulatório; livros; revistas e jornais. (avalia a forca da musculatura) e isotônicos(avalia
mobilidade muscular) sistemáticos, no intuito de
verificar o estado da musculatura dos órgãos
MÉTODOS envolvidos na produção da fala. Para este
A presente pesquisa foi realizada e embasada procedimento, foram utilizados materiais
sob os princípios do método indutivo, pois parte descartáveis como luva cirúrgica e espátula. A
do particular para a generalização como produto avaliação tinha duração de 1 hora ocorrendo 3
dos dados coletados. A indução realiza – se em vezes por semana, gravada em fita k-7 e filmados
três etapas: Primeiro observa-se o fenômeno e os em fita VHS, após assinatura da carta de
analisa, com a finalidade de descobrir as causas informação e termo de consentimento. Com o
de sua manifestação, depois, descobre-se à objetivo de observar as alterações fonéticas

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Neurociências 126

existentes, foram realizadas conversas músculos fazendo com que fiquem mais rígidos e
espontâneas, leituras de livros, revistas e jornais de difícil controle, com lentidão dos movimentos,
e álbum articulatório, com todos os fonemas da sobressaindo a atuação dos movimentos
língua portuguesa brasileira, além de nomeação involuntários4, por isso a queixa da rigidez, fala
de palavras. Com este procedimento, foi possível partida, articulação travada e velocidade lenta.
realizar, de forma efetiva, a transcrição fonética dos
De acordo com estas alterações, podemos
dados obtidos, no intuito de realizar a análise
observar que, no início da instalação da doença,
fonética da fala e identificar as alterações fonéticas
os músculos extra e intra - orais responsáveis pela
existentes no início da patologia.
articulação dos fonemas se encontram
As terapias miofuncionais orais eram realizadas acometidos nos âmbitos da postura, tonicidade e
3 vezes por semana com duração, aproxi- mobilidade.
madamente de 2:00 horas, na residência dos
participantes da pesquisa, na qual eram utilizados Para manifestar este achado, foi possível
os mesmos exercícios isométricos, isotônicos e verificar que todos os músculos da face
isocinéticos, aplicados para verificar a tonicidade responsável pela articulação da fala, em estado
da musculatura facial e intra – oral. Também foram estático, se encontrava rígidos com exceção do
aplicados estímulos térmicos e massagens músculo mentual, responsável pela elevação do
manuais relaxantes em pontos motores da face lábio inferior e auxilio na protrusão e eversão dos
no intuito de observar e analisar se os mesmos¹ 5 em três dos seis casos não se
comprometimentos existentes poderiam ser apresentava tão rígido quanto os demais, assim
atenuados, de acordo com o resultado das como o masseter, responsável pela elevação da
terapias miofuncionais orais. mandíbula, em quatro dos dois casos em estado
estático.
Estes dados mais detalhados quanto às
RESULTADOS E DISCUSSÕES alterações de cada músculo que compõe a mímica
De acordo com as observações empíricas facial responsável pela articulação da fala, não
realizadas, foi possível submeter os sujeitos foram encontrados na literatura revisada, sabe-se
participantes da pesquisa à avaliação e terapia que apenas que há uma rigidez global
fonoterápica, foi possível verificar as queixas mais desencadeado durante o movimento passivo,
freqüentes se referem à velocidade, que é mais através da amplitude dos movimentos6. Esta
lenta, mais pausada; rigidez muscular da língua e rigidez observada nos sujeitos da pesquisa é uma
bochechas, articulação travada e fala trêmula. conseqüência de uma resistência do estiramento
Estas queixas foram relatadas empiricamente por que se apresenta em todas as direções dos
todos os entrevistados. movimentos do corpo e dos articuladores,
A lentidão ao falar reflete a própria dificuldade realizados pelos músculos agonistas e
em movimentar os órgãos periféricos da fala, antagonistas 8 .
devido à presença da rigidez e de bradicinesia Os músculos extra - orais, em estado dinâmico
associado com o distúrbio9, com hipocinesia dos ou em movimento, apresentaram – se, em todos
órgãos periféricos da fala traduzida pela marcada os casos, rígidos, principalmente o músculo
limitação do âmbito de movimentos da orbicular da boca, sendo mais evidente a região
musculatura dos movimentos da fala 10. Esta rigidez superior. Os outros músculos da face como:
associada a bradicinesia acarreta um padrão temporal, palpebral, prócero, nasal e triangular
postural muscular alterado, mais retraído onde há apresentavam um estado considerado normal
deterioração do ajustamento dos músculos para a idade cronológica e para a instalação da
antagonistas10. Este fato é uma conseqüência do patologia.
dano das células da substancia negra que
produzem o neurotransmissor denominado de Como as bochechas são estruturas móveis e
dopamina4, 5, 7,1 ³, 14, 15. contribuem para a expressão facial, abertura e
oclusão de boca alterando a ressonância da voz.
Como existe uma pobre atuação no corpo Alterações nesta influencia diretamente nos lábios,
estriado, responsável pelos movimentos pois os músculos da bochecha são intrinse-
involuntários, há uma alteração na tonicidade dos camente relacionadas com os lábios.

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Neurociências 127

Como mencionado anteriormente, as as alterações fonéticas encontradas no estágio


bochechas apresentavam – se rígidas, porém com inicial da patologia estudada.
expressões ainda visíveis ao demonstrar emoções A redução na amplitude dos movimentos pode
no momento das interações dialógicas,
ser atribuída a falha no mecanismo de contração
assimétricas, onde a tonicidade era maior no lado
e relaxamento recíproco entre os músculos anta-
direito em 4 dos 6 casos. gonistas e agonistas7, extensão15,16.
Neste aspecto, ao considerar que a mastigação Com relação aos lábios, estes se encontravam
lateral direita exerce grande influência na
rígidos e ocluídos encurtados superiormente. Tam-
tonicidade da musculatura, foi necessário observar
bém foram observados redução na amplitude dos
o tipo mastigatório, que em todos os casos era movimentos5, 16. O superior é o mais rígido, porém
considerado normal, apesar de haver ausência de
o inferior é o mais hipocinético, mais móvel, rápi-
alguns elementos dentários que não influenciaram do e depende dos movimentos mandibulares, os
na movimentação adequada do bolo alimentar, por
quais se encontram acometidos17.
isso, foi descartada a hipótese de que esta simetria
teria ligação com a função da mastigação. Como mencionado anteriormente, os múscu-
los faciais que revestem as bochechas e inserem-
Entretanto, como a própria rigidez muscular, se nos lábios são formados por músculos trans-
que afeta os músculos dos sujeitos, influência na
versos, angulares e verticais, cada grupo de ,mús-
postura corporal e nos órgãos fono-articulatórios, culos desempenham uma função diferente e ao
o que significa um déficit na colocação, pressão e observar, avaliar e analisar a movimentação dos
integração dos movimentos da articulação da fala.
lábios, constatamos que estes se encontravam su-
No que diz respeito à cavidade intra-oral, os tilmente comprometidos, no sentido de se apre-
órgãos responsáveis pela articulação dos fonemas sentarem mais rígidos dificultando na movimen-
encontraram-se com a tonicidade, postura e tação, acarretando pouca força na emissão dos
mobilidade alteradas, devido á rigidez dos fonemas bilabiais havendo a presença de
mesmos, tanto em estado estático como dinâmico, bradicinesia.
refletindo as próprias condições musculares
Os músculos sutilmente comprometidos são:
globais, porém de forma mais sutil, menos mentual em três dos seis casos, que origina-se
incapacitante e evidente.
na base do lábio inferior. Este levanta o lábio infe-
A língua, em todos os sujeitos da pesquisa, rior e auxilia na protrusão e eversão; o depressor
encontrava-se bastante comprometida, no sentido do ângulo da boca em todos os casos se origina
de apresentar-se mais rígida em todos os casos, na linha oblíqua da mandíbula e insere-se no mús-
mais retraída, com hipocinesia e incoordenação culo orbicular da boca, no ângulo da boca e lábio
nos movimentos apresentando resistência ao inferior 15. O músculo orbicular da boca dirige o lá-
movimento passivo em toda extensão 1,5. O bio superior para baixo contra o inferior; o
músculo longitudinal inferior (encurta a língua ou zigomático maior que realiza o movimento de ele-
empurra o ápice para baixo), transversos (acarreta var o ângulo da boca, como ocorre ao sorrir;
o esteritamento e alongamento da mesma), depressor do lábio inferior que leva o lábio inferior
estiloglosso (sua contração direciona a língua para para baixo e para a lateral, importantes nos exer-
cima e para trás e é considerado antagonista do cícios de vibração e lateralização de lábios; o
músculo genioglosso) e genioglosso (é o mais músculo levantador do ângulo da boca, no qual
forte dos músculos e possui a faculdade de retrair, sua contração leva o ângulo da boca para cima e
abaixa e elevar a língua para a porção anterior) se auxilia no fechamento da boca direcionado o lá-
encontravam mais comprometidos, pois os bio superior para cima e, por fim, o músculo risório
movimentos mais alterados eram o de encurtar a que retrai o canto da boca.
língua, elevar o ápice ou ponta da mesma ao
Todos os exercícios solicitados e trabalhados
palato, além de estreitar e alongar a língua, o que na terapia fonoaudiológica exigem um bom funci-
ocasionava sutis substituições de fonemas /l/ e /
onamento e um adequado equilíbrio muscular,
s/, as quais posteriormente, serão abordadas.
com força e intensidade suficiente para a realiza-
Esta análise não foi confrontada com a literatura ção dos mesmos. Como esta musculatura se en-
fonoaudiológica, mas faz-se necessário referir, pois contra hipofuncionante, devido á rigidez e a

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Neurociências 128

bradicinesia, os exercícios que exigem mais mo- inspeção e realização dos exercícios de sopro e
vimentação não são realizados com facilidade. A sonorização do /a/ e /ã/, da emissão de sons
lateralização, apesar de não exigir tanta mobilida- vocálicos, os quais ocorrem elevação do palato
de, exige que exista um tônus equilibrado, onde mole e úvula, ao contrário da emissão de sons
nos casos observados, verificou-se uma rigidez nasais, em que ocorre o abaixamento dos
intensa na musculatura peri-oral com presença de mesmos.
sincinesias (realização de um movimento
Após analisar as queixas mais freqüentes
involuntário associado ao voluntário), devido ao
relacionados à fala, dos pacientes com Doença
esforço exagerado para a realização do exercício de Parkinson, em estágio inicial da patologia e
solicitado.
avaliar e analisar os órgãos fono-articulatórios, há
É de suma importância evidenciar que em to- a necessidade de relatar as alterações ou
dos os momentos, os portadores de (D.P), apre- distúrbios da articulação de fonemas.
sentaram tensão exacerbada da região cervical e
De acordo com alguns autores os fonemas
cintura escapular, principalmente ao realizar os
mais prejudicados no momento da articulação dos
exercícios isotônicos (verifica a mobilidade), pacientes portadores de Doença de Parkinson, são
isométricos (verifica a tonicidade) e isocinéticos
a substituição dos fricativos (/f/, /v/, /s/, /z/, /š/, /ž/),
(verifica a força). Com a inclusão da terapia pelos plosivos (/p/, /t/, /k/, /b/, /d/, /g/, /m/, /n/, /ñ/) e
fonoaudiológia de forma sistemática, foi evidente
entretanto, não se sabe em que estágio de doença
após 1 mês que a musculatura já apresentava uma
os pacientes se encontram para existir estes
tonicidade menos rígida, com melhora da mobili- acometimentos9. Na presente pesquisa realizada
dade e da força da musculatura.
com pacientes no estágio inicial da Doença de
As terapias fonoaudiológicas possibilitaram, Parkinson, foi observado que os fonemas ///, /?/,
além de um estado menos comprometido da /s/ e /š/ apresentaram distorções assistemáticas.
musculatura, uma melhora na auto-estima com A distorção ocorre quando a produção do som é
ausência de excitação e estresse emocional pela alterado, de modo que a sua resultante seja
presença do quadro sintomatológico. apenas aproximado do som desejado.
Um outro órgão participante da articulação da Os fonemas que mais soaram de forma alterada
fala a qual se encontrava alterado, é o palato duro, foram as palavras que continham o fonema /?/
mais conhecido como “céu da boca”. Este se (linguodental ou líquida lateral), onde era distorcido
encontrou profundo, atrésico e ogival em todos pelo /?/ (linguopalatal ou líquida lateral) em 5 dos
os casos. Profundo pela dificuldade em elevar a 6 pacientes analisados. Estas emissões ocorreram
língua, apesar do fato de que em repouso a de forma assistemática nos inícios de sílabas início
mesma se encontra em papila, ou seja, seu ápice, de palavra (ISIP) e finais de sílabas final de palavra
corpo e dorso paralelo ao palato. Atrésico e ogival (FSDP), numa interação dialógica, no entanto,
pela pressão exercida pela musculatura da quando era solicitado que emitissem palavras
bochecha devido à rigidez encontrada. isoladas que continham estes fonemas, os
Não se pode afirmar que este achado é uma mesmos eram produzidos corretamente em sua
grande maioria, onde das 86 palavras isoladas
característica das alterações miofuncionais orais
emitidas 5 eram distorcidas; diferentemente da
em fase inicial da doença de Parkinson, mas estas
características são evidentes e refletem a rigidez consistência das palavras contextualizadas. Da
mesma forma ocorreram com os fonemas /s/ e /
muscular. Pois as partes ósseas e duras da
cavidade oral crescem e se desenvolvem por š/, em apenas 3 dos 6 pacientes avaliados.
tração e contração. É relatado na literatura fonoaudiológica que os
últimos fonemas a serem adquiridos são os
Já o palato mole e a úvula apresentavam-se líquidos laterais e vibrantes. Pensamos que,
adequados quanto à mobilidade, pois os quando há uma alteração no Sistema Nervoso
exercícios foram realizados com sucesso, central, os primeiros fonemas a serem acometidos
afirmação esta verificada através de observação, são os últimos adquiridos, ou seja o /?/, /l/ e /r/.

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Neurociências 129

Pudemos constatar que ocorre uma CONCLUSÃO


posteriorização dos fonemas /l/ e /?/, pensamos De acordo com os dados obtidos na literatura,
que este fato se deve ao posicionamento do ápice observações analisadas, e instituição precoce da
da língua ao ter que tocar a região alveolar, é terapia fonoaudiológica nos portadores de Doença
retraído e toca na região alveolar mais próxima ao de Parkinson, foi verificado que, de fato, o
palato duro. Pensamos que este fato ocorra devido encaminhamento precoce à terapia
à rigidez muscular da língua, que ao atuar nos fonoaudiológica e fundamental, uma vez fornecerá
músculos antagonistas, faz com que esta se mais qualidade de vida com condições mais
posteriorize tocando no tipo de articulação satisfatórias de comunicação. Estes pacientes
sutilmente5. possuem uma rigidez muscular global,
acarretando alterações da articulação dos
Durante as avaliações, a qual puderam ser fonemas e inteligibilidade de fala. Estas não
observadas as alterações mencionas a cima, não podem ser evitadas, mas atenuadas com o
foi observado pausas durante as leituras ou nas encaminhamento precoce ao Fonoaudiólogo pelo
falas espontâneas dos sujeitos, com duração de Neurologista, uma vez que a alteração é uma
fala mais curta, causando inteligibilidade da conseqüência de uma patologia que se encontra
mesma17. no Sistema Nervoso Central.

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Neurociências 130

Artigo Original

Avaliação da capacidade funcional de idosos


em tratamento fisioterapêutico
Functional capacity assessment in elderly on physiotherapy
Laiz Helena de Castro Toledo Guimarães1, Débora C. A. Galdino2, Fábio Luiz Mendonça Martins2,
Simone R. Abreu2, Mary Lima2, Débora Fernandes de Melo Vitorino3.

RESUMO
Com o avançar da idade as perdas funcionais tornam-se evidentes e o idoso deixa de realizar
atividades básicas da vida diária, diminuindo assim sua capacidade funcional. A capacidade funcional
é dimensionada em termos de habilidade e independência para realizar determinadas atividades,
sendo esta um dos grandes componentes da saúde do idoso. Objetivo: identificar a capacidade
funcional dos idosos em tratamento fisioterápico. Métodos: Foram avaliados 40 idosos que
encontravam-se em tratamento fisioterápico na clínica escola do UNILAVRAS, nos setores de neurologia
e ortopedia. Foi utilizado o Índice de Katz para avaliar a Capacidade Funcional. Resultados: Os
resultados obtidos demonstram que houve diferença estatisticamente significativa entre os pacientes
ortopédicos e neurológicos, sendo que os primeiros apresentaram um maior nível de independência
(p=0,003) e nenhum deles apresentou-se totalmente dependente (p=0,007) na realização de suas
atividades diárias. Conclusão: os idosos em tratamento fisioterápico por patologias neurológicas
apresentam menor capacidade funcional e, conseqüentemente, uma maior dependência daqueles
que apresentam patologias ortopédicas.
Unitermos: Idosos; Capacidade funcional; Fisioterapia.

SUMMARY
Moving forward with the age the functional losses become evident and the elderly stops
accomplishing basic activities of daily life, reducing the functional capacity. The functional capacity is
measured in ability terms and independence to accomplish certain activities, being this one of the
great components of the elderly’s health. Objective: to identify the elderly’s functional capacity in
physiotherapic treatment. Methods: There were analysed 40 elderly that were in physioterapic treatment
in the clinic school of UNILAVRAS, in the neurology sections and orthopedics. The Index of Katz was
used to evaluate the Functional Capacity. Results: The obtained results demonstrate that there was an
significant statistic differentiation among the orthopedical and neurological patients, and the first ones
presented a larger independence level (p=0,003) and none of them came totally dependent (p=0,007)
in the accomplishment of the daily activities. Conclusion: the elderly in physioterapic treatment for
neurological pathologies present smaller functional capacity and, consequently, a larger dependence
of those than they present orthopedical pathologies.

Keywords: Elderly; Functional capacity; Physiotherapy.


Trabalho realizado no Centro Universitário de Lavras - UNILAVRAS - Lavras - MG

1 - Fisioterapeuta, Professora do Curso de Fisioterapia – UNILAVRAS.


2 - Aluno do Curso de Fisioterapia – UNILAVRAS.
3 - Fisioterapeuta, Professora do Curso de Fisioterapia – UNILAVRAS.

Endereço para correspondência: Centro Universitário de Lavras – UNILAVRAS


R. Hebert Vilela 1700/301 – Bairro Presidente Kennedy – Lavras – MG - CEP 37.200-000
laizunilavras@hotmail.com

Trabalho recebido em 22/03/2004. Aprovado em 07/08/2004.

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Neurociências 131

INTRODUÇÃO problemas médicos, sendo estes fortemente


associados com s perda da capacidade funcional.
O envelhecimento é um processo dinâmico e
Entretanto, observa-se que a capacidade funcional
progressivo no qual há alterações morfológicas,
funcionais e bioquímicas que vão alterando é influenciada também por fatores demográficos,
sócio-econômicos, culturais e psicossociais6,8 .
progressivamente o organismo, tornando-o mais
susceptível a agressões1. A manutenção e a preservação da capacidade
para desempenhar as atividades básicas de vida
Percebe-se que nas alterações relacionadas
com a idade estão a presença de fatores de risco diária são pontos básicos para prolongar o maior
e a ocorrência de doenças crônico-degenerativas, tempo possível a independência, com1 isso o idoso
mantém a sua capacidade funcional .
que determinam para o idoso um certo grau de
dependência, relacionado diretamente com a A Reabilitação Gerontológica visa a
perda de autonomia e dificuldade de realizar as preservação da função, adiamento da instalação
atividades básicas de vida diária, interferindo na de incapacidades, através de medidas preventivas
sua qualidade de vida2. tendo ainda como objetivo diminuir o
comprometimento imposto por incapacidades,
A capacidade funcional surge, como um novo
paradigma de saúde, particularmente um valor promovendo um modo de vida mais saudável e
adaptando o indivíduo de forma a propiciar uma
ideal para que o idoso possa viver independente,
melhor qualidade de vida9.
sendo esta a capacidade do indivíduo realizar suas
atividades físicas e mentais necessárias para O objetivo deste estudo foi avaliar qual o nível
manutenção de suas atividades básicas e da capacidade funcional dos idosos em
instrumentais, ou seja: tomar banho, vestir-se, tratamento fisioterapêutico.
realizar higiene pessoal, transferir-se, alimentar-se,
manter a continência, preparar refeições, controle
financeiro, tomar remédios, arrumar a casa, fazer MÉTODOS
compras, usar transporte coletivo, usar telefone e Foram selecionados 40 idosos (acima de 60
caminhar uma certa distância3,4 . anos) de ambos os sexos que se encontravam
A capacidade funcional, especialmente a em tratamento fisioterapêutico na clínica escola
dimensão motora, é um dos importantes do UNILAVRAS, nas áreas de neurologia (21
marcadores de um envelhecimento bem sucedido idosos) e de ortopedia (19 idosos). Todos os
e da qualidade de vida dos idosos. A perda dessa sujeitos incluídos foram informados quanto aos
capacidade, está associada a predição de objetivos e procedimentos do estudo e assinaram
fragilidade, dependência, institucionalização, risco o termo de consentimento de forma livre e
aumentado de quedas, morte e problemas de esclarecida.
mobilidade, trazendo complicações ao longo do Utilizou-se o Índice de Katz para avaliar a
tempo, e gerando cuidados de longa permanência capacidade funcional em relação à realização das
e alto custo5. atividades básicas de vida diária, composta por 6
Tem-se constatado que é muito mais fácil atividades: banhar-se, vestir-se, usar o banheiro,
evitar mortes do que evitar o desenvolvimento de transferir-se, ter continência e alimentar-se.
incapacidades associadas ao envelhecimento. A Cada item do Índice de Katz seguiu um escore
cada ano, cerca de 10% da população adulta, a de 0 a 3, representando o nível de dependência e
partir dos 75 anos perde a independência em uma independência do indivíduo da seguinte forma: 0)
ou mais atividades básicas da vida diária, tais independência completa, 1) necessidade de ajuda
como: banhar-se, vestir-se, alimentar-se e higiene não humana, 2) assistência humana, 3) completa
pessoal6,7 . dependência.
A grande maioria dos idosos é portadora de Os dados foram analisados através do Teste t
doenças crônicas, deficiências ou apresentam de student, utilizando nível de significância de 5%.

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Neurociências 132

RESULTADOS A Figura 1 apresenta a correlação entre os


pacientes de ortopedia e neurologia quanto à
independência completa em suas atividades
A Tabela 1 apresenta os valores obtidos no diárias.
Índice de Katz pelos 19 pacientes avaliados na
área de ortopedia em suas atividades diárias.

Figura 1 – Correlação entre os pacientes de ortopedia e neurologia


quanto à independência completa em suas atividades diárias.

Tabela 1 - Indice de Katz de pacientes ortopédicos

A Tabela 2 apresenta os valores obtidos no A Figura 2 apresenta a correlação entre os


Índice de Katz pelos 21 pacientes avaliados na pacientes de ortopedia e neurologia quanto à
área de neurologia em suas atividades diárias. dependência completa em suas atividades diárias.

Tabela 2 - Indice de Katz de pacientes neurológicos


Figura 2 – Correlação entre os pacientes de ortopedia e
neurologia quanto à dependência completa em suas
atividades diárias.

Na comparação estatística entre os grupos


utilizando o Teste t de student, observa-se que há
diferença significativa entre os dois grupos quando
analiza-se os itens independência completa
(p=0,003) e dependência completa (p=0,007). DISCUSSÃO
Nos itens ajuda não humana e assistência A promoção do envelhecimento saudável e a
humana, não houve diferenças estatisticamente manutenção da máxima capacidade funcional do
significativas entre os grupos (respectivamente indivíduo que envelhece, significa uma maior
p=0,839 e p=0,070) valorização da autonomia e da autodeterminação

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Neurociências 133

e a preservação da independência física do idoso. alterações neurológicas que, na grande maioria,


De acordo com FEDRIGO (1999), para obter um são extremamente incapacitantes, podendo levar
envelhecimento saudável é melhor acrescentar a alteração na mobilidade, na coordenação, na
vida aos anos a serem vividos do que anos a uma consciência corporal, na localização do corpo no
vida precariamente vivida. espaço, entre outras.

LIMA-COSTA; BARRETO e GIATTI (2002) LUCENA et al. (2002), afirmaram que o banho
esclareceram que a capacidade funcional é um e o vestuário apresentam um maior nível de
dos grandes componentes da saúde do idoso e dependência. Resultados semelhantes foram
vem emergindo como um componente-chave para observados neste trabalho, onde o banho, o
a avaliação da saúde dessa população. Ela vestuário e a transferência foram as atividades que
geralmente é dimensionada em termos de apresentaram o maior índice de dependência
habilidade e independência para realizar parcial ou total, em ambos os grupos.
determinadas atividades.

A maioria dos idosos do estudo apresentou-se CONCLUSÃO


independente na realização das suas atividades
diárias. Entretanto, somente idosos do setor da Os idosos em tratamento fisioterápico por
neurologia apresentaram nível de dependência patologias neurológicas apresentam menor
completa. Isto se explica pelo fato do maior déficit capacidade funcional e, conseqüentemente, uma
para a realização de atividades nos pacientes maior dependência daqueles que apresentam
neurológicos, devido às seqüelas deixadas pelas patologias ortopédicas.

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Neurociências 134

Artigo Original

Trombólise endovenosa com Alteplase em


AVC Isquêmico - Experiência em 27 casos -
Joinville – SC
LONGO,A.L.; MORO,C.H.C.; CABRAL,N.L.

RESUMO:Objetivos: Demonstrar a experiência com o uso de Alteplase endovenosa na prática clínica diária,
verificando a eficácia e segurança de tal procedimento.Material e Métodos: Foram estudados
retrospectivamente todos os casos de utilização de Alteplase EV no tratamento do AVC isquêmico no período
de agosto de 1997 à Julho de 2004. Resultados: Em 27 pacientes foi utilizado o Alteplase. O tempo entre o
início dos sintomas e a administração da droga foi: em 17 pacientes entre 90-180 minutos, em 2 pacientes
em menos de 90 minutos. O escore do NIH médio da admissão foi de 18, sendo que 11 pacientes apresentaram
uma redução de 5 ou mais pontos no escore do NIH nas primeiras 24 horas. Verificou-se 12 óbitos; 9 casos
apresentaram Rankin modificado 0/1. Um paciente apresentou hemorragia intracraniana não sintomática.
Conclusão: Observamos maior gravidade dos nossos pacientes explicando as altas taxas de mortalidade.
De forma paradoxal não observamos nenhum caso de sangramento sintomático do SNC. Estes dados ratificam
a segurança da Alteplase na fase aguda do AVC isquêmico.

Descritores: Trombólise Endovenoso, AVC isquêmico, Alteplase, rt-PA

SUMMARY:Objetives: To demonstrate an experience with the use of intravenous Alteplase in the daily clinical
practice, verifying the efficiency and safety of the mentioned procedure. Methodology: All the cases where
intravenous Alteplase was used inthe treatment of Ischaemic Stroke were studied retrospectively from August
1997 to July 2004. Results: Alteplase was used in 27 patients. The time between the onset of the symptoms
and the drug administration was: in 17 patients between 90-180 minutes, in 6 patients between 180-360
minutes and in 2 patients less than 90 minutes. The mean NIHSS Score at admission was 18, having 11
patients presented a reduction af 5 or more points in the NIHSS score within the first 24 hours. One patient
had non-symptomatic intracranial haemoerhage Conlusion: The high mortality rates observed can be explained
by the severity of the patients in this series (mean NIH -18). When conpared ti the NINDS (mean NIH – 15) and
ECASS II (mean NIH -11) series parodoxally we have observed no cases of symptomatic intracranial bleeding,
despite the great number of protocol violations. This data ratifies the safety of IV Alteplase use in the treatment
of Ischaemic Stroke.

Keywords:Cerebrovascular Accident, Tissue Plasminogen Activator, Thrombolytic

Trabalho realizado na CLÍNICA NEUROLÓGICA DE JOINVILLE - U-AVC -HMSJ - JOINVILLE - SC - Hospital Dona Helena
1. Neurologista, Professor Neurologia as UNIVILLE
2. Coordenadora Unidade Acidente Vascular Cerebral do Hospital Municipal São José (SC)
3. Professor Medicina UNIVILLE - Mestre Clinica Médica Univresidade Federal Parana (PR)

Endereço para correspondência: Rua Plácido Olimpio de Oliveira, 1244 - Centro - Joinville - SC - e-mail - neurologia@clinica.com.br

Trabalho recebido em 08/09/2004. Aprovado em 09/09/2004.

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Neurociências 135

INTRODUÇÃO aonde são atendidos os pacientes com AVC, 4


dos quais com serviço de tomografia e sobreaviso
neurológico/neurocirúrgico 24hs, além de
laboratório e banco de sangue. O Hospital
O uso do trombolítico - Alteplase (recombinant
Municipal São José (público) possui Unidade de
tissue-plasminogen activator , rt-PA) por via EV em
AVC e o Hospital Dona Helena (privado) “Stroke
até 3 horas do início dos sintomas foi aprovado
Team”.
para uso pelo FDA (Food and Drug Adminstration)
em Julho de 1996, em decorrência do resultado A incidência de AVC em Joinville é de 156.000 /
positivo do estudo NINDS [1] (National Institute of 100.000h / ano (1996) 6. Cerca de 25% dos pacientes
Neurological Disorders and Stroke), que tinha como são admitidos dentro das primeiras 3 horas do
desfecho primário o grau de independência após início dos sintomas. Rotineiramente, em todos os
3 meses de administração (Escala de Rankin casos suspeitos de AVC o neurologista é acionado
modificada). Estes achados foram corroborados pelo plantonista do serviço de emergência, e o
mais recentemente por diversas metanálises, nas paciente encaminhado para a realização de
quais são analisados dados dos pacientes tomografia, sendo esta analisada pelo
incluidos em 4 estudos (NINDS, ECASS I, ECASS neurologista, sendo o tempo médio para a
II e ATLANTIS)2,3,4 sobre a utilização de Alteplase chegada desde aos hospitais de 15 à 20 minutos.
na fase aguda do Acidente Vascular Cerebral Desde Junho de 2004 a Alteplase está disponível
(AVC) Isquêmico. É consenso atual que o uso de no Hospital Municipal São José.
Alteplase é útil no tratamento do AVC isquêmico
agudo, sendo que a sua eficácia está diretamente Todos os neurolgistas envolvidos no
relacionada com o intervalo de tempo entre o início atendimento foram instruidos desde 1997 sobre o
dos sintomas e a administração da droga, isto é, uso de Alteplase de acordo com os critérios do
quanto menor for este intervalo maior a chance protocolo do NINDS (Quadro 1), e possuem
de um bom prognóstico. experiência na interpretação de Tomografia
Computadorizada de Crânio.
Apesar deste nível de evidência de bom
resultado, ainda os índices de utilização do
procedimento são muito baixos (1 à 2 % nos EUA)5.
OBJETIVO
As razões para esse baixo índice estão
provavelmente relacionadas à chegada tardia da
maioria dos pacientes, aliadas a não
Nosso objetivo é demonstrar a experiência do
disponibilidade de atendimento capacitado nos
uso de Alteplase na prática clínica diária,
serviços de emergência e o não engajamento dos
verificando a eficácia e segurança de tal
neurologistas no atendimento da fase aguda do
procedimento.
AVC; sendo que tais assertivas nunca foram
sistematicamente estudadas em nosso meio.

MATERIAL E MÉTODOS

Características do Atendimento em Joinville

Joinville está localizada na região norte de Santa Foram estudados retrospectivamente todos os
Catarina, com uma população estimada pelo IBGE casos em que foi utilizada Alteplase EV no
(2004) de 480.000 habitantes. Possui 5 hospitais, tratamento do AVC Isquêmico agudo no período

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Neurociências 136

de Agosto de 1997 à Julho de 2004. Múltiplas relação a classificação etiológica (Toast) (quadro
fontes de informação foram utilizadas, dentre elas 5): 13 cardioembólicos, 5 aterotrombóticos de
registros hospitalares, informações dos grandes vasos, 2 aterotrombóticos de pequenos
neurologistas envolvidos, e protocolos da Unidade vasos, 6 indeterminados, sendo 5 com
de AVC. Foram analisados os seguintes dados: investigação incompleta e 1 com investigação
Idade e sexo dos pacientes, tempo entre o início negativa, e 1 caso de outra etiologia (Tabela 4).
dos sintomas, admissão e administração de Com respeito a evolução verificou-se: 10 óbitos
Alteplase, achados tomográficos da admissão e durante a primeira semana pôr efeito direto do
controle após a administração de Alteplase, infarto cerebral e 2 por complicações clínicas
classificação clínica e etiológica dos tipos de AVC tardias, um dos quais apresentou recuperação
isquêmico, escala de NIHSS (National Institute of parcial do déficit neurológico falecendo por
Health Stroke Scale) (Quadro 2) da admissão e complicações cardíacas pré-existentes. Entre os
após 24hs, verificação da taxa de letalidade e sobreviventes 9 apresentaram Escala de Rankin
morbidade através da Escala de Rankin modificado entre 0 e 1; 5 Escala de Rankin
modificada (Quadro 3) aos 3 e 6 meses, modificado 2 e 3 e um paciente Escala de Rankin
complicações hemorrágicas maiores e menores modificado de 4 – 5 (Tabela 5). Em todos os
e violações do protocolo do NINDS. pacientes a tomografia de crânio da admissão não
demonstrou sinais diretos ou indiretos de infarto
cerebral. Apenas 1 paciente apresentou
hemorragia intracraniana não sintomática e 2
RESULTADOS pacientes sangramentos menores.

Em 27 pacientes foi utilizado o Alteplase. A


idade média dos pacientes foi de 61,8 anos (33 - Dentre as violações do protocolo do NINDS
85), sendo 15 indivíduos do sexo masculino. O observou-se: em 5 pacientes o intervalo de tempo
tempo entre o início dos sintomas e a entre início dos sintomas e a administração da
administração da droga foi: em 2 pacientes entre droga foi maior que 3 horas e em 2 casos o horário
0 - 90 minutos, em 17 pacientes entre 90 - 180 do início dos sintomas não pode ser determinado
minutos, em 6 pacientes entre 180 - 360 minutos, com exatidão; um paciente havia sido submetido
e em 2 paciente não foi possível determinar o início à cirurgia de grande porte há 15 dias do íctus e
dos sintomas (Tabela 1). O escore do NIHSS médio um paciente havia sido vitimado por infarto agudo
da admissão foi de 18, sendo que 11 pacientes do miocárdio há 15 dias do íctus.
apresentaram uma redução de 5 ou mais pontos
no escore do NIH nas primeiras 24hs (Tabela 2).

Com relação a classificação clínico-topográfica DISCUSSÃO


(Bamford) (Quadro 4), 13 apresentavam síndrome
total da circulação anterior, 7 síndrome parcial da Nesta série observamos um alto índice de
circulação anterior, 5 síndrome da circulação mortalidade quando comparados aos
posterior e 2 síndrome lacunar (Tabela 3). Com encontrados no estudo do NINDS.

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Neurociências 137

a mudança de atitude dos profissionais de saúde


envolvidos no atendimento dos pacientes com
AVC isquêmico submetidos a trombólise, quando
da verificação de recuperação significativa do
déficit neurológico após o uso da droga.

De maneira geral estes resultados reforçam a


Escala de Rankin Modificado
noção já existente da segurança do uso da
Alteplase na prática clínica diária quando utilizada
Tal fato pode ser justificado pela maior dentro das diretrizes preconizadas e por pessoal
gravidade dos pacientes nesta série (NIHSS médio capacitado no atendimento de pacientes com AVC
de 18) comparado aos pacientes do estudo NINDS isquêmico.
(NIHSS médio de 15) e do ECASS II (NIHSS médio
de 11), indicando uma tendência de tratamento
de casos mais graves, talvez por estes serem
identificados de forma mais rápida pelos familiares
e receberem atendimento preferencial nos serviços
de emergência, associado à decisão do
neurologista de utilizar o trombolítico nos casos
mais graves, onde o risco de complicações seria
amenizado em virtude da condição do paciente
(especialmente nas síndromes completas da
circulação anterior esquerda).

O número de casos é pequeno não nos


permitindo analisar os subgrupos que apresentem
uma melhor tendência a respostas positivas
(intervalo de tempo entre o início dos sintomas e
início da administração da droga; tipo clínico;
categoria etiológia e dados demográficos).

O aspecto mais relevante desta série se refere


aos achados de baixo índice de complicações
hemorrágicas, observando-se apenas um caso de
hemorragia intracraniana (3,7%), sendo esta
assintomática, especialmente se levarmos em
consideração a gravidade dos pacientes e o
número de violações do protocolo.
Quadro 1 - (Protocolo de NINDS para uso da Alteplase
Condutas para a terapia trombolítica em AVC Isquêmico
Outro aspecto relevante, porém de caráter (Recomendação grau A)
Droga: fator ativador do plasmogêneo tecidual (rt-PA)- Alteplase
subjetivo, é a impressão dos autores com relação

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Neurociências 138

Quadro 3 - Escala de Rankin de Incapacidade Modificada

Quadro 4 - Classificação Clínica de Bamford

Quadro 5 - Classificação do Toast

Tabela 1 - Intervalo de tempo entre início dos sintomas e


Quadro 2 - Escala de NIHSS
administração do rt-PA / Número de Casos

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Tabela 2- NIHSS

Tabela 3 - Classificação Clínico Topográfica (Bamford)


Número de Casos

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Tabela 4 - Classificação de Toast -


Número de Casos

Tabela 5 - Escala de Rankin Modificado –


Número de Casos

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Artigo Original

Tratamento inicial da doença de Parkinson.


Initial therapy of Parkinson’s disease.

Antônio L. Teixeira Jr1, Francisco Cardoso2.

RESUMO:
Na abordagem inicial da doença de Parkinson, é importante determinar se o paciente realmente
necessita de tratamento sintomático. Quando os sintomas são ainda muito leves e não incapacitantes,
selegilina, anticolinérgicos e amantadina podem ser utilizados. Quando os sintomas tornam-se
problemáticos ou incapacitantes, deve-se optar entre tratar precocemente com levodopa ou empregar
agonista dopaminérgico. Para pacientes jovens com maior risco de desenvolverem complicações
com a terapia com levodopa, como flutuações motoras e discinesias, os agonistas dopaminérgicos
são a melhor escolha. Por outro lado, em pacientes idosos (acima de 70 anos), a terapia com levodopa
deve ser recomendada como tratamento inicial no sentido de evitar a maior incidência de efeitos
colaterais cognitivos, como confusão mental e alucinações, freqüentemente associados aos agonistas
dopaminérgicos. Ainda, as complicações motoras da levodopa são menos freqüentes em pacientes
idosos.

Unitermos: Doença de Parkinson, Tratamento inicial, Levodopa, Agonistas dopaminérgicos.

SUMMARY:
When approaching the initial treatment of PD, it is important to determine whether a patient really
needs symptomatic therapy. When symptoms are still very mild and not disabling, selegiline,
anticholinergics and amantadine can be considered. When symptoms become troublesome or disabling,
one needs to choose between to treat early with levodopa or to use a dopamine agonist therapy. For
younger patients who are at greater risk of developing complications from levodopa therapy, such as
motor fluctuations and dyskinesias, dopamine agonists are a better choice. On the other hand, in older
patients (over 70 years) levodopa therapy should be recommend as initial treatment to avoid the higher
incidence of neuropsychiatric side effects, such as confusion and hallucinations, often associated with
use of dopamine agonists. Moreover, the motor complications of levodopa are less likely to occur in
older patients.

Keywords: Parkinson’s disease, Inital treatment, Levodopa, Dopamine agonists.

Trabalho relizado: Clínica de Distúrbios do Movimento, Hospital das Clínicas e Faculdade de Medicina, Universidade Federal de Minas Gerais,
Belo Horizonte, Brasil.

1 - Médico Neurologista, Professor Adjunto do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG).
2 - Chefe do Serviço de Neurologia do Hospital das Clínicas da UFMG e Professor Adjunto do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina
da UFMG.

Correspondência: Francisco Cardoso - Clínica de Distúrbios do Movimento, Faculdade de Medicina, UFMG


Av. Pasteur 89/1107, 30150-290 - Belo Horizonte MG, Brasil - E-mail:cardosofe@terra.com.br

Trabalho recebido em 06/04/2004. Aprovado em 09/09/2004.

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Neurociências 142

INTRODUÇÃO: emissão de fóton único) e a progressão da DP


avaliada através de escalas como a UPDRS (do
A doença de Parkinson (DP) é uma doença
inglês: “Unified Parkinson’s Disease Rating
neurológica progressiva caracterizada por
bradicinesia, tremor de repouso, rigidez e Scale”), que quantificam sinais e sintomas. Ainda,
a deterioração clínica observada na DP parece
instabilidade postural1 . A prevalência da DP é
correlacionar-se a dois outros fatores: surgimento
estimada em 100 a 200 casos por 100.000
indivíduos, acometendo preferencialmente o sexo de lesões em sistemas não-dopaminérgicos e
alterações moleculares nos neurônios de projeção
masculino a partir da sexta década de vida.
do estriado3.
Apesar de não existirem marcadores biológicos
para a DP, o diagnóstico baseado em critérios
essencialmente clínicos apresenta boa Estratégias terapêuticas na doença de
confiabilidade. O diagnóstico definitivo só é Parkinson:
possível com o estudo anátomo-patológico que A terapêutica na DP pode ser dividida em
mostra degeneração preferencial dos neurônios
sintomática, neuroprotetora e restauradora. A
dopaminérgicos da parte compacta da substância
terapia restauradora é a que pretende substituir
negra mesencefálica associada a inclusões os neurônios dopaminérgicos perdidos na DP. Até
citoplasmáticas eosinofílicas de agregados
o momento, os estudos com o transplante de
protéicos, denominados corpos de Lewy.
células mesencefálicas fetais não demonstraram
É importante ressaltar as conseqüências melhora clínica dos pacientes com DP
biológicas da deficiência de dopamina para a transplantados 4,5. O emprego de fatores
compreensão das estratégias terapêuticas na DP2. neurotróficos, como o GDNF, também não foi
A primeira delas é hiperatividade das fibras capaz de alterar clinicamente os pacientes com
glutamatérgicas que se projetam do córtex DP6.
cerebral para o estriado. Isso acontece porque há
receptores dopaminérgicos inibitórios nas porções
A terapia neuroprotetora visa retardar a
terminais das fibras córtico-estriatais, ocorrendo
degeneração neuronal, impedindo a progressão
desinibição destas com a deficiência de da DP. Apesar de inúmeros estudos terem avaliado
dopamina. Uma segunda conseqüência é o
o potencial neuroprotetor de diferentes
aumento da expressão de receptores do tipo D3
medicamentos, os resultados não permitem a
nos neurônios de projeção do estriado. Outro indicação de qualquer terapêutica com finalidade
resultado da escassez de dopamina é o
neuroprotetora. A investigação mais significativa
surgimento de hiperatividade do globo pálido
de terapia neuroprotetora foi o estudo multicêntrico
medial e, sobretudo, do núcleo subtalâmico. Este DATATOP, que avaliou a capacidade de a
efeito decorre da redução da atividade da via direta
selegilina, inibidor da monoamino oxidase-B
(facilitadora do movimento) e aumento dos
(MAO-B), e o tocoferol (vitamina E) isoladamente
disparos da via indireta (inibidora do movimento) ou em combinação retardarem a progressão da
de conexão entre o estriado e o pólo efetuador
DP. 7 Os resultados demonstraram que os
dos núcleos da base, constituído pelo globo pálido
pacientes tratados com selegilina apresentaram
interno e pela parte reticular da substância negra2. retardo significativo na necessidade de levodopa,
Apesar de a disfunção dopaminérgica ser o que poderia sugerir um possível efeito
fundamental, não se pode subestimar a neuroprotetor. Entretanto, a reanálise dos dados
participação de outros mecanismos na evidenciou que o efeito sintomático da selegilina
fisiopatologia da DP3. Não existe, por exemplo, sobre a DP, apesar de pequena intensidade,
correlação inequívoca entre a queda da explicaria o atraso na necessidade de levodopa.7
transmissão dopaminérgica medida através de Especula-se atualmente sobre o possível efeito
neuroimagem funcional (PET, tomografia por neuroprotetor dos agonistas dopaminérgicos (ver
emissão de pósitrons e SPECT, tomografia por discussão no item: Os agonistas dopaminérgicos).

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Neurociências 143

A terapia sintomática objetiva melhorar os sinais


juntamente com a levodopa, uma vez que
e sintomas da DP. A introdução da levodopa no aminoácidos e a droga competem por sítios de
final dos anos 60 revolucionou o tratamento ligação no transportador, diminuindo a absorção
sintomático da DP, que até então, baseava-se desta. A levodopa apresenta meia-vida curta entre
exclusivamente no emprego de anticolinérgicos. 1 e 2 h, sendo metabolizada a dopamina pela
Entretanto, ainda hoje, no tratamento sintomático dopa-descarboxilase, e a 3-o-metil-dopa pela
da fase inicial da DP podem ser empregados catecol-o-metil-transferase (COMT). A
medicamentos não-dopaminérgicos, como os administração conjunta de um inibidor da dopa-
anticolinér-gicos e a amantadina8. descarboxilase, carbidopa ou benserazida, com
Os anticolinérgicos, como o biperideno e o a levodopa previnem sua transformação periférica
em dopamina, atenuando efeitos colaterais e
trihexifenidil, têm efeito sobre o tremor
aumentando a disponibilidade da droga para ação
parkinsoniano e leve ação sobre a rigidez e a
bradicinesia. Estas drogas têm, porém, dois central. No sistema nervoso central, a levodopa
seria captada pelos neurônios dopaminérgicos
inconvenientes: a eficácia terapêutica é baixa e
remanescentes e convertida a dopamina.
os efeitos colaterais podem ser significativos. A
propósito dos últimos, particularmente acentuados No entanto, apesar dessas vantagens, os
em idosos, os mais comuns são alterações pacientes com DP e em uso de levodopa tendem
cognitivas, constipação e retenção urinária. Por a desenvolver com o tempo uma série de
estas razões, o emprego dos anticolinérgicos complicações motoras, como as flutuações e as
restringe-se a pacientes não-idosos, discinesias, e complicações não-motoras, como
oligossintomáticos, em que o tremor é o sintoma distúrbios gastrointestinais e do sono. Cerca de
principal. Já a amantadina apresenta efeito sobre 20 a 50% dos pacientes com DP em uso de
a rigidez e a bradicinesa, com mínima ação sobre levodopa apresentarão essas complicações
o tremor. Os efeitos colaterais incluem confusão motoras ao final de cinco anos2,8 . As flutuações
mental, edema de tornozelo e livedo reticularis. A consistem no fato de que, ao longo do dia, há
amantadina também é empregada em pacientes momentos em que a levodopa funciona (período
oligossintomáticos em que o tremor não é o on) e outros em que seu efeito desaparece
sintoma predominante. Vale frisar que, além de (período off), determinando oscilações na
pouco eficiente, o efeito da amantadina capacidade funcional do paciente. Já as
comumente desaparece ao fim de alguns meses. discinesias induzidas por levodopa são
movimentos anormais involuntários, muitas vezes
Na fase inicial da DP, conforme a intensidade
dos sintomas, os medicamentos não- incapacitantes, geralmente observáveis durante o
dopaminérgicos podem ser insuficientes para período on.
garantir o bem-estar e o funcionamento dos A patogênese das complicações do uso da
pacientes. Surge, então, a questão bastante levodopa relaciona-se, pelo menos em parte, ao
discutida na literatura atual: qual o medicamento surgimento de modificações bioquímicas nos
dopaminérgico deve ser utilizado primeiramente neurônios de projeção do estriado.2 Em condições
no tratamento da DP? 9,10,11. fisiológicas, a sinapse nigro-estriatal produz
liberação tônica, ou seja, contínua de dopamina.
Evidências experimentais mostram de maneira
A levodopa: inequívoca que a estimulação pulsátil ou
A levodopa é um aminoácido aromático capaz intermitente dos receptores dopaminérgicos,
de atravessar a barreira hemato-encefálica decorrente da meia-vida curta da levodopa,
alcançando o sistema nervoso central. Inicialmente desempenha papel crucial no desenvolvimento
é absorvida no intestino por mecanismo ativo das flutuações motoras e discinesias induzidas por
responsável pelo transporte de aminoácidos levodopa. Esta estimulação não-fisiológica dos
neutros da dieta. Isso explica parte dos efeitos receptores dopaminérgicos ativa cascatas
clínicos negativos do consumo de proteínas citoplasmáticas neuronais que determinam a

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Neurociências 144

fosforilação de proteínas com duas conseqüências necessitar de metabolização e que têm meia-vida
principais. Primeiramente, como parte das mais longa que a levodopa (Tabela1). Para o
proteínas fosforiladas estão relacionadas a pramipexole, por exemplo, o valor desta variável
receptores de glutamato do tipo NMDA e AMPA, e farmacocinética é de aproximadamente 8h.
como esses receptores fosforilados tornam-se
hiperativos, estabelece-se um ciclo vicioso em que
há intensificação da hiperatividade glutamatérgica
basal na DP. Como comentado previamente, a
desnervação dopaminérgica dos neurônios
espinhosos médios do estriado per se determinaria
hiperatividade basal da sinapse glutamatérgica
proveniente do córtex cerebral. A segunda
conseqüência seria a ativação de proteínas, como
a CREB, que estimula a expressão de
determinados genes que, por sua vez, interferem Tabela1 – Vantagens e desvantagens associadas ao emprego dos
sobremaneira no metabolismo neuronal, processo agonistas dopaminérgicos no tratamento da doença de Parkison.
(Modificado de Jankovic, 2002.8 )
denominado priming. É muito importante ressaltar,
entretanto, que a levodopa não induz ou acelera
a morte neuronal como antes se pensava2,9 .
Confirmando a previsão teórica inicial, o estudo
CALM-PD12, realizado com 301 pacientes com DP
Os agonistas dopaminérgicos:
inicial, mostrou que a monoterapia com
pramipexole reduziu o índice de complicações
motoras de 51% (braço com a levodopa) para 28%
Face as complicações decorrentes do uso da
(braço com o agonista) em dois anos. A diferença
levodopa, a tendência atual é utilizar estratégias
de freqüência de encurtamento de dose (wearing-
denominadas “poupadoras de levodopa” nas off) foi 23,8% versus 38% (p=0,01), discinesias
fases iniciais da DP9,10,11. Apesar de desenvolvidos 9,9% versus 30,7% (p<0,001), flutuações on-off
originalmente como adjuvantes à levodopa no 1,3% versus 5,3% (p=0.11), respectivamente, nos
tratamento da DP avançada, os agonistas grupos pramipexole e levodopa12. Ressalta-se,
dopaminérgicos constituem a base desta porém, que a levodopa foi mais potente que o
terapêutica “poupadora de levodopa”. pramipexole no controle dos sintomas
Como conseqüência prática da teoria da parkinsonianos e que apenas 32% dos pacientes
iniciados em monoterapia permaneceram usando
estimulação dopaminérgica intermitente ou
exclusivamente o pramipexole ao final do estudo12.
pulsátil, postulou-se que, realizando a terapia da
DP com agente com meia-vida mais longa que a Estudos com outros agonistas dopaminérgicos
levodopa, ocorreria uma redução da incidência de ergolínicos e não-ergolínicos, como o ropinirole,
complicações motoras, como flutuações e obtiveram resultados similares ao do CALM-PD13.
discinesias. Foram realizados, então, vários Os estudos com agonistas dopaminérgicos no
tratamento inicial da DP permitem, portanto, as
estudos de monoterapia com agonistas
seguintes conclusões9,11. Primeiro, o tratamento
dopaminérgicos diretos para testar esta hipótese.
com os agonistas dopaminérgicos melhora os
O desenho destes ensaios consiste, de um modo
sintomas parkinsonianos para níveis considerados
geral, em estudos prospectivos, comparando-se satisfatórios. Segundo, os agonistas
de modo duplo-cego um braço com levodopa e dopaminérgicos são drogas geralmente bem
um outro com agonistas dopaminérgicos. A lógica toleradas, podendo ocorrer efeitos colaterais como
da escolha desta classe de compostos é náuseas, vômitos, sonolência e alucinações.
justificada por se tratarem de moléculas com Terceiro, essas drogas reduzem o
estrutura semelhante à dopamina, que agem desenvolvimento de complicações motoras, como
diretamente nos receptores dopaminérgicos sem discinesias e flutuações. Quarto, a levodopa é,

REVISTA NEUROCIÊNCIAS V12 N3 - JUL/SET, 2004


Neurociências 145

porém, mais eficaz na redução dos sintomas diretamente dois agonistas dopaminérgicos
parkinsonianos. especificamente na DP inicial, sendo que o
ropinirole mostou-se superior à bromocriptina15.
O mesmo grupo responsável pelo CALM-PD
Estudos anteriores já haviam demontrado a maior
realizou um estudo quantitativo com SPECT e o eficácia da pergolida sobre a bromocriptina na
marcador [I123]-2b-carbometóxi-3b-(4-iodofenil)- DP. 16 Acredita-se que os três principais agonistas
tropano, capaz de ligar-se ao transportador de
dopaminérgicos, pergolida, pramipexole e
dopamina, permitindo inferência sobre a ropinirole, sejam equivalentes do ponto-de-vista
preservação das vias nigro-estriatais 14. Os de eficácia. Apesar disso, se um desses
resultados mostraram que, no período de
medicamentos não se mostra eficaz ou é mal
seguimento de 2 anos, houve menor decaimento tolerado, recomenda-se a substituição por um
da ligação do [I123]-2b-CIT nos pacientes tratados outro agonista. Mais recentemente, porém,
com monoterapia com pramipexole (16% contra
demonstrou-se que os agonistas ergolínicos,
25,5% no grupo tratado com levodopa, p=0,01), sobretudo a pergolida, são associados com
o que poderia indicar efeito neuroprotetor do proliferação do endocárdio, resultando em
agonista dopaminérgico, desacelerando a morte
valvulopatia restritiva em cerca de 50% dos
neuronal e a degeneração das vias nigro- pacientes expostos a esta medicação. O
estriatais14. Entretanto, há outras interpretações mecanismo subjacente seria hiper-estimulação do
possíveis para esse dado. Primeiramente, o grupo
receptor 5HT-2A. Por este motivo, já se propõe o
de pacientes que permaneceu em monoterapia abandono do uso dos agentes ergolínicos em
com pramipexole até o final do estudo seria DP17,18,19,20 .
justamente portador de uma forma menos grave
da DP e, portanto, ocorreria menor perda das vias
nigro-estriatais. O fato de que, no início dos
estudos, os pacientes distribuídos aleatoriamente CONCLUSÕES
para os distintos grupos exibirem escores
semelhantes em escalas quantitativas como o Apesar de ser a droga mais eficaz na
UPDRS contradiz esta hipótese. Uma segunda terapêutica sintomática da DP, recomenda-se adiar
alternativa seria que o pramipexole não interferiria o uso da levodopa nas fases iniciais da doença.
na progressão da DP, mas a levodopa aceleraria Isso porque seu uso a longo prazo correlaciona-
a degeneração dos neurônios. Contra esta se com o desenvolvimento de complicações
alternativa, vários estudos demonstram não existir motoras significativas, como flutuações e
uma ação neurotóxica da levodopa.2 Uma terceira discinesias. Esse fenômeno parece estar
explicação seria que o dado resultou de um associado à estimulação intermitente ou pulsátil
artefato técnico, ou seja, houve mudança da do receptor dopaminérgico pós-sináptico pela
atividade de uma molécula, o transportador de administração da levodopa, induzindo
dopamina, mas não da estrutura propriamente da modificações no neurônio estriatal. A tendência
fibra nigro-estriatal. Esta possibilidade é mais atual é utilizar inicialmente estratégias
plausível para estudos com PET do que com “poupadoras de levodopa”. Os agonistas
SPECT, mas não está completamente descartada dopaminérgicos constituem a base dessa
no caso. estratégia, além de potencialmente exercerem
efeito neuroprotetor. Em pacientes jovens, que
Na decisão sobre qual agonista dopaminérgico estão sujeitos a maior risco de desenvolverem
empregar, dois fatores devem ser considerados, complicações motoras com a levodopa, a primeira
tolerabilidade e eficácia. Os agonistas escolha é inequivocamente os agonistas
dopaminérgicos não-ergolínicos, pramipexole e dopaminérgicos. A levodopa seria a primeira
ropinirole, são geralmente melhor tolerados que escolha em pacientes idosos acima de 70 anos
os ergolínicos, bromocriptina e pergolida. Em ou em pacientes com grande incapacidade motora
termos de eficácia, apenas um estudo comparou e prejuízo dos reflexos posturais.

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Neurociências 146

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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REVISTA NEUROCIÊNCIAS V12 N3 - JUL/SET, 2004


Neurociências 147

Artigo Original

Utilização do SF-36 em ensaios clínicos


envolvendo pacientes fibromiálgicos:
determinação de critérios mínimos de
melhora clínica
Using SF-36 in clinical trials of fibromyalgia patients: determining
minimal criterios for clinical improvement

Débora Fernandes de Melo Vitorino1; Fábio Luiz Mendonça Martins1; Alessandra de Castro
Souza1; Débora Galdino 1; Gilmar Fernandes do Prado2

RESUMO
Objetivo: Definir um acréscimo mínimo de pontuação para cada domínio do questionário de
qualidade de vida SF-36 aplicado a pacientes com fibromialgia, que possa expressar uma melhora
clinicamente significativa, almejada para esses pacientes. Método: O questionário SF-36 foi analisado,
em cada um dos seus domínios, por quatro fisioterapeutas. Cada profissional baseando-se em sua
experiência com pacientes fibromiálgicos estipulou um índice de variação mínimo para cada domínio,
considerando sempre o que exprimia cada questão. Em todos os domínios os profissionais citados
foram requeridos a supor que variação de pontuação esperariam após um tratamento fisioterápico.
Foram calculados a média, o desvio padrão e a concordância entre os fisioterapeutas e, em seguida,
foi estipulado qual o acréscimo de pontuação seria necessário para que o paciente fosse considerado
melhor clinicamente naquele domínio. Resultados: Foram determinadas as seguintes pontuações
mínimas de acréscimo em cada domínio para que o paciente fosse considerado clinicamente melhor:
Capacidade Funcional 15 pontos, Aspecto Físico 25 pontos, Dor 10 pontos, Estado Geral de Saúde
15 pontos, Vitalidade 15 pontos, Aspecto Social 12,5 pontos, Aspecto Emocional 33,3 pontos e Saúde
Mental 12 pontos. Conclusão: A menor variação positiva esperada pelos fisioterapeutas para que
considerassem melhora foi 10 pontos (dor) e a maior 33,3 pontos (aspecto emocional), compatível
com as médias de variações observadas em estudos semelhantes.

Unitermos: Fibromialgia, SF-36, Fisioterapia

Trabalho realizado UNILAVRAS/UNIFESP

1 Fisioterapeuta, Professora do Unilavras, Lavras, MG


2 Neurologista, Professor da Unifesp, São Paulo, SP

Correspondência: Débora Fernandes de Melo Vitorino - Rua Padre José Poggel, 506 - Lavras MG- Tel (35)3694-8141
Email: deboraf@navinet.com.br

Trabalho recebido em 08/09/2004. Aprovado em 09/09/2004.

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Neurociências 148

SUMMARY

Objective. To define a minimal increment for each domain of the SF-36 related to fibromyalgia
patients that can express a significant clinical improvement desired for this patients. Method . The SF-
36 was analyzed for each domain by 4 physical therapists, and each professional, based upon his/her
experience with fibromyalgia patients, suggested a minimal variation index for each SF-36 domain,
always taking in account the meaning of each question. In all domain the physical therapists were
required to suppose what positive variation they would aim after the treatment. We calculated mean,
standard deviation and agreement among physical therapists, and we presented a minimal increment-
score necessary to allow a clinical improvement in that domain. Results. The minimal increment-score
were as follow: Physical function 15; Role physical 25; Pain 10; General health 15; Vitality 15; Social
function 12,5; Role emotional 33,3; Mental health 12. Conclusion. The minimal positive variation expected
by the physical therapists associated to clinical improvement was 10 (pain) and the major increment-
score was 33.3 (role emotional), all in agreement with mean variation published in similar studies.

Keywords: Fibromyalgia, SF-36, Physical therapy

INTRODUÇÃO.
Tradicionalmente, o conceito de qualidade de um questionário multidimensional formado por 36
vida era delegado a filósofos e poetas; no entanto,itens, subdivididos em 8 escalas ou componentes:
atualmente existe crescente interesse de médicos Capacidade Funcional (10 itens) - avalia a
e pesquisadores em transformá-lo numa medida presença e extensão de limitações relacionadas
quantitativa que possa ser usada em ensaios à capacidade física; Aspecto Físico (04 itens) -
clínicos e que os resultados obtidos possam ser avalia as limitações quanto ao tipo e quantidade
comparados entre diversas populações e até de trabalho, bem como quanto essas limitações
mesmo entre diferentes doenças 1. dificultam a realização do trabalho e das atividades
Sabe-se que a sensação de bem estar é o da vida diária; Dor (02 itens) - avalia a presença
resultado final de uma série de avaliações de dor, sua intensidade e sua interferência nas
subjetivas feitas pelo paciente, muitas vezes de atividades da vida diária; Estado Geral de Saúde
forma inconsciente. Diversos instrumentos têm (05 itens) - avalia como o paciente se sente em
sido lançados e usados, com a finalidade de relação a sua saúde global; Vitalidade (04 itens) -
quantificar e padronizar as mudanças que ocorrem considera o nível de energia e de fadiga; Aspecto
após algumas intervenções, 2. Instrumentos de Social (02 itens) - analisa a integração do indivíduo
medida têm a intenção de mensurar estado geral em atividades sociais; Aspecto Emocional (03
de saúde que seja sensível o suficiente para itens) - avalia o impacto de aspectos psicológicos
detectar mudanças que ocorram com o tempo ou no bem-estar do paciente; e Saúde Mental (05
entre os grupos, ou para comparar a relativa itens) - inclui questões sobre ansiedade,
responsabilidade de diferentes doenças e o depressão, alterações no comportamento ou
relativo benefício de diferentes tratamentos 3,4 . descontrole emocional e bem-estar psicológico.
Este questionário apresenta um escore final de 0
O SF-36 (Short Form Health Survey) criando a 100, no qual zero corresponde ao pior estado
para ser um questionário genérico de avaliação geral de saúde e 100 ao melhor estado de
consiste de duas partes, sendo a primeira para saúde 1, 2, 5 .
avaliar o Estado de Saúde (com questões
relacionadas à mobilidade física, dor, sono, Muitas doenças tem sido avaliadas através do
energia, isolamento social e reações emocionais) SF-36, sendo um importante instrumento no
e a segunda parte para avaliar o impacto da acompanhamento de pacientes com fibromialgia,
doença na vida diária do paciente. Trata-se de onde está presente um alto grau de subjetividade,

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Neurociências 149

principalmente em aspectos de natureza clínica. (Coeficiente de Concordância KENDALL) e, em


Portanto, o estudo da qualidade de vida e dos seguida, foi estabelecido o delta-escore final
impactos socioeconômicos nesta doença é de baseado na média de cada domínio, estipulando
grande importância. Porém, ensaios clínicos com qual o acréscimo de pontuação seria necessário
intervenções terapêuticas exigem do instrumento para que o paciente fosse considerado melhor
de mensuração do desfecho a propriedade de clinicamente naquele domínio. Os quatro
decidir sobre a presença ou não de melhora. O fisioterapêutas reuniram-se após as análises acima
SF-36 na sua forma original só nos permite citadas, com a finalidade de discutir eventuais
comparação de um grupo com ele mesmo ao divergências. Se os valores individuais afastassem
longo do tempo e não dispõe de parâmetros já demasiadamente da média, seria considerado um
definidos de melhora para cada doença. Além valor de consenso entre os quatro fisioterapêutas,
disso, o clínico está interessado em variações de sempre que possível utilizando-se a moda e/ou
escore que sejam significativas clinicamente, e a mediana.
versão corrente do SF-36 não apresenta
parâmetros mínimos definidos para manifestar
com exatidão se as melhoras apresentadas pelos RESULTADOS.
pacientes podem ser consideradas clinicamente O coeficiente de concordância de KENDALL
significativas ou não. foi de 92,8%, demonstrando que os dados entre
Desta forma, o objetivo deste trabalho é definir os profissionais eram concordantes. A média do
um acréscimo mínimo de pontuação para cada domínio Aspectos Emocionais foi de 32,5 pontos,
domínio do questionário SF-36 aplicado a tendo se considerado, por consenso entre os
pacientes com fibromialgia, que possa expressar profissionais, o valor de 33,3 pontos, que
uma melhora clinicamente significativa, desejada corresponde a um ponto de melhora após o
para esses pacientes, sem termos que anuir tratamento. As variações dos demais domínios do
involuntariamente a diferenças de médias SF-36 ficaram dentro dos valores da média e
estatisticamente significantes, porém resultantes mediana calculados, e foram aceitos
de pequenas variações nos conjuntos de dados. consensualmente entre os profissionais (Tabela 1).

MATERIAL E MÉTODO.
O questionário SF-36 foi analisado, em cada
um dos seus domínios, por quatro profissionais
da área de saúde (Fisioterapeutas), com a
finalidade de determinar uma variação de escore
associado a alguma melhora clínica relevante para
os pacientes com fibromialgia. Foram incluídos 4
Fisioterapeutas com experiência mínima de 5 anos
atendendo pacientes fibromiálgicos e que
tratassem pelo menos 20 pacientes por ano. Tabela 1 - Média e desvio padrão dos valores obtidos em cada
domínio do SF-36, por cada fisioterapeuta, para definição do
Cada profissional preencheu independente- critério mínimo de melhora clínica.

mente o questionário, baseado em seus


conhecimentos teóricos, prática e vivência clinica
com pacientes portadores de fibromialgia, DISCUSSÃO.
supondo em cada domínio e para cada questão o Não foi encontrado na literatura consultada,
que seria desejado clinicamente para se configurar nenhum trabalho que definisse critérios mínimos
melhora. Assim, cada profissional determinou um de melhora clínica utilizando o SF-36. Ou seja, até
valor mínimo, para cada domínio do SF-36, que o momento, qualquer aumento na pontuação do
representasse uma melhora clínica do paciente. questionário é considerada como melhora clínica,
Foram calculados a média, o desvio padrão e a não havendo parâmetros mínimos definidos para
concordância entre os quatro profissionais manifestar com exatidão se este acréscimo de

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Neurociências 150

pontuação pode ser clinicamente significativo ou


não.
Analisando os trabalhos de VALIM (2001),
MANNERKORPI et al. (2002), ALVES (2OO3), que
utilizaram o questionário SF-36 para avaliar a
resposta de diferentes tratamentos fisioterápicos
em pacientes com fibromialgia, observou-se que
os autores relataram melhora em todos os
domínios do SF-36. Nestes estudos, entretanto, o Tabela 3 – Resultados apresentados por MANNERKORPI et al.
simples aumento na pontuação em cada domínio (2002) ao utilizar o questionário SF-36 antes e após o tratamento

do questionário, por menor que tenha sido, foi


considerado como melhora clínica.
Ao comparar o acréscimo de pontos obtidos
por estes estudos com o critério mínimo de
melhora clínica estipulado em nosso trabalho, não
observaríamos aumento de pontuação em alguns
domínios do SF-36 naqueles estudos que
caracterizasse melhora clinicamente significativa
(Tabelas 2, 3, 4). Comparando nosso critério de
melhora com as variações observadas no estudo
de VALIM (2001), apenas o domínino vitalidade Tabela 4 – Resultados apresentados por ALVES (2003) ao utilizar o
questionário SF-36 antes e após o tratamento fisioterápico em pacientes
não demonstrou melhora, permitindo afirmarmos fibromiálgicos, comparados ao critério mínimo de melhora clínica.
que nossos critérios não são demasiadamente
rigorosos, sendo possível esperarmos melhora
clínica apenas a partir de determinada variação. Nosso estudo também sofre a crítica de
Os resultados de MANNERKORPI et al. (2002) estabelecermos o quanto é clinicamente
ficaram abaixo do que consideramos mínimo para significativo, pois este conceito é subjetivo e
decidirmos pela presença de melhora clínica, fato grandes variações de escores para um paciente
que provavelmente não tenha ocorrido com os podem não ser percebidas como melhora e
pacientes daquele autor, pois as variações de pequenas variações para outro paciente já o
escores antes-depois foram muito pequenas. Os seriam. Entretanto, esta foi a melhor maneira que
dados de MANNERKORPI et al. (2002) são encontramos para aplicarmos o questionário SF-
exemplo típico de melhora estatística, que pouco 36 em ensaios clínicos com análise dicotômica
interessa ao clínico, pois a qualidade de vida (tabela 2x2; melhora sim/não; grupo estudo/grupo
congrega aspectos subjetivos bem além dos controle), envolvendo pacientes com fibromialgia,
parâmetros da matemática. e que tenham como desfecho a presença ou
ausência de melhora.
Este estudo não pode ser estendido para outras
doenças, pois a percepção de melhora é
dependente da vivência específica do binômio
paciente-doença, e os valores das variações são
muito diferentes. Um exemplo disso pode ser
observado no estudo de Costa et Duarte (2002)
que analisou a evolução de pacientes com AVC
tratados com fisioterapia, onde as variações foram
da ordem de 30 a 50 pontos, bem diferente da
Tabela 2 – Resultados apresentados por VALIM (2001) ao utilizar o variação que propomos para pacientes com
questionário SF-36 antes e após o tratamento fisioterápico em pacientes
fibromiálgicos, comparados ao critério mínimo de melhora clínica. fibromialgia (10 a 30 pontos).

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Neurociências 151

CONCLUSÃO.
A partir do delta escore final de cada domínio de parâmetros dicotômicos na avaliação de
do questionário de qualidade de vida SF-36 foi desfechos em ensaios clínicos randomizados e
possível se definir um critério mínimo de melhora controlados, sugerimos outros estudos com maior
para os pacientes fibromiálgicos, sendo o menor número de profissionais para se confirmar ou
valor 10 (dor) e o maior valor 33,3 (aspecto melhor definir os delta-escores acima propostos.
emocional). Em vista da utilidade e necessidade

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Neurociências 152

Artigo de Revisão

Intervenções fisioterapêuticas para pacientes


com fibromialgia: Atualização
Physical Therapy for fibromyalgia patients: atualization

Débora Fernandes de Melo Vitorino1, Gilmar Fernandes do Prado2

RESUMO
A fibromialgia é uma síndrome dolorosa, de etiopatogenia ainda desconhecida. A terapêutica orienta-
se fundamentalmente para o alívio dos sintomas. À medida que se amplia o conhecimento a respeito
da fisiopatologia e dos mecanismos de controle da dor, novas propostas terapêuticas surgem. O
objetivo deste estudo é fazer uma revisão dos diferentes métodos usados no tratamento desta síndrome
já testados cientificamente.

Unitermos: Fibromialgia, Fisioterapia, Dor.

SUMMARY
Fibromyalgia is a painful syndrome of unknown etiology. Treatment is directed to symptoms reduction.
As the knowledge regarding physiopathology and pain control increases, new therapies are proposed.
This paper reviews some different and tested ways of treatment of fibromyalgia.

Keywords: Fibromyalgia, Physical therapy, Pain.

INTRODUÇÃO
A Fibromialgia é caracterizada pela ocorrência O diagnóstico da SFM é fundamentalmente clí-
de dor músculo esquelético generalizada, crônico, nico, e não há evidências de anormalidades
não inflamatório e sensibilidade exacerbada à laboratoriais ou nos exames de imagens nesta
palpação de pontos dolorosos chamados tender síndrome, cujo diagnóstico repousa apenas nos
points. A etiologia é ainda desconhecida, apresen- critérios sugeridos pelo Colégio Americano de
tando-se de diferentes formas nos diferentes pa- Reumatologia (ACR) 1,21,22.
cientes, o que leva a caracterização de uma A característica clínica da SFM é a presença
síndrome bem mais que uma doença – Síndrome de dor difusa, referida nos ossos, articulações,
da Fibromialgia SFM) 1,2,3,5 . músculos e tendões. Em mais de 80% dos paci-

Trabalho realizado no Centro Universitário de Lavras - UNILAVRAS, Lavras - MG

1. Fisioterapeuta, Professora Adjunta do Centro Universitário de Lavras.


2. Neurologista, Professor Adjunto da UNIFESP.

Endereço para correspondência: Débora Fernandes de Melo Vitorino


Rua Padre José Poggel, 506 - Lavras- MG Fone(35) 3694-8141- Email: deboraf@navinet.com.br

Trabalho recebido em 05/01/2004. Aprovado em 07/08/2004.

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Neurociências 153

entes, a dor é acompanhada de distúrbio do sono desses tratamentos é a “eliminação dos tender
e fadiga importante, em 50% a 80% dos pacien- points”, restauração da amplitude de movimento
tes, ocorrem outros sintomas como: rigidez mati- e força muscular normais e sem dor. Além disso,
nal, sensação subjetiva de inchaço das extremi- é necessário uma educação para o paciente pre-
dades, parestesias que não correspondem a ne- venir e lidar com as recorrências e também blo-
nhuma topografia, olhos e bocas secas, fenôme- quear os fatores precipitantes e/ ou perpetuantes.
no de Raynaud, tonturas e palpitações. As carac- Mas ainda há muitas divergências nos resultados
terísticas da dor do fibromiálgico são a base da de diferentes estudos, sugerindo uma análise crí-
incapacitação funcional que acompanha a doen- tica dos mesmos e uma maior preocupação com
ça, e são consideradas como um dos grandes as metodologias empregadas 10.
stressores que afetam o ritmo de vida destes do-
entes 2,8,16,23.
Técnicas de relaxamento
Outras síndromes disfuncionais como: enxa-
queca, cólon irritável, síndrome uretral feminina e Os métodos de tratamento não-
tensão pré-menstrual, ocorrem em 30% a 60% dos medicamentosos para esta e outras síndromes
casos 2,8 . dolorosas concentram-se na acupuntura, na
hipnoterapia e nas intervenções comportamentais,
Embora alguns autores não considerem a SFM tais como o relaxamento, cujos efeitos têm sido
um distúrbio psiquiátrico, ela está solidamente in-
satisfatórios.
cluída no capítulo das doenças psicossomáticas.
Em relação à fisiopatologia, parece haver um vín- O processo de relaxamento contribui para que
culo com a regulação de determinadas substân- o paciente corrija o que está errado em suas rela-
cias do Sistema Nervoso Central, como por exem- ções com seu corpo, com outras pessoas e com
plo a serotonina e a noradrenalina ( suas próprias emoções. É uma oportunidade de
neurotransmissores envolvidos com a depressão) reorganizar e reintegrar o que é percebido como
6
. Entretanto, de acordo com KAZIYAMA (1998), a desestruturado. A calma, conseqüente do relaxa-
prevalência da depressão não é significativamen- mento, e do bem-estar obtido podem mediar esse
te aumentada na SFM quando comparada com momento de reflexão para que o paciente
pacientes com dor crônica. Estudos feitos na clí- redimensione o significado da dor em sua vida e
nica reumatológica não mostraram diferenças sig- reintegre a seu corpo as partes que estão doen-
nificativas entre pacientes com fibromialgia e pa- tes .
11

cientes de outras clínicas usadas como controle. As várias modalidades de técnicas de relaxa-
O estado psicológico anormal não é requisito para mento se constituem em um importante meio para
que o paciente desenvolva a SFM 7. que o paciente obtenha:
A SFM ocorre predominantemente no sexo fe- ? Regulação de seu tônus muscular;
minino, somente de 5 a 20% dos pacientes são
do sexo masculino. A idade varia de 40 a 50 anos ? Liberação de uma energia, até então
e a média de duração do sintoma é de seis a sete consumida por uma dinâmica corporal caracteri-
anos, quando os pacientes se apresentam à clíni- zada por pontos dolorosos ou bloqueios muscu-
ca reumatológica . 7 lares;

Apesar desta síndrome ser muito antiga, sua ? Reintegração das partes doentes a sua ima-
etiologia ainda é desconhecida, provavelmente, gem corporal, isto é, aquela representação que
como em outras síndromes, deve ser multifatorial, formou de seu corpo ao longo da vida;
podendo estar associada com outras doenças ? Identificação e assimilação de conteúdos
reumatológicas 9. que lhe possibilitem um comportamento novo e
mais adaptado 11.

TRATAMENTO
Inúmeros tratamentos têm sido propostos vi- SOUZA (2001) analisou 3 grupos de pacientes
sando a remissão do quadro clínico. O objetivo do sexo feminino, com idade entre 30 a 60 anos,
comparando duas técnicas de relaxamento e um

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Neurociências 154

grupo controle utilizando-se somente de medica- do terapeuta, imerso na água que suavemente o
mento. Verificou-se como resultado que, não ocor- levanta a cada inspiração, com um calor pene-
reram diferenças estatisticamente significantes na trante dissolvendo a tensão do corpo do pacien-
intensidade da dor quando as duas técnicas fo- te, capaz de atingir níveis cada vez mais profun-
ram comparadas entre si, o que permite dizer que dos de relaxamento à medida que seu corpo se
ambas as técnicas atuam de forma semelhante, alonga de forma cada vez mais livre. Fluindo as-
já o grupo não tratado, melhorou de maneira sim, para um estado de consciência aos quais
significante a intensidade da dor, como forma de tensão acumulada negam o acesso12.
controle das expectativas criadas pela participa- O paciente permanece completamente passi-
ção na pesquisa. vo, e muitas vezes experimenta um relaxamento
Ainda que adquirir novos hábitos seja algo di- profundo a partir da sustentação pela água e o
fícil de ocorrer imediatamente, é papel do contínuo movimento rítmico . Usualmente o
terapeuta orientar e acompanhar o paciente na terapeuta estabiliza ou move um segmento do
busca por novas atitudes e, antes de tudo, criar corpo através da água, resultando no alongamento
condições para que a psicoterapia seja um mo- de outro segmento em razão do efeito de arras-
mento em que o indivíduo reflita sobre a possível to13. O método promove um trabalho corporal em
origem de seu problema e como lidar com ele daí que o terapeuta conduz o paciente a uma
para frente 11. alternância de toques e posturas, com movimen-
tos que proporcionam alongamentos ou uma sim-
ples flutuação 14.
Watsu.
O alongamento ajuda a manter ou melhorar a
O Watsu é um trabalho corporal realizado em flexibilidade, relaxar os músculos que estão con-
piscina aquecida, com temperatura média de 35º. traídos e rígidos, diminuindo a dor. O método
É uma junção de duas palavras: Water e Shiatsu; Watsu quando bem aplicado, obtém-se melhora
literalmente massagem na água. A técnica nas- do sono e diminuição da dor, que parece ser a
ceu nos Estados Unidos, em 1980, a partir de queixa principal na SFM. Os pacientes que per-
Harold Dull, terapeuta americano, com o Zen sistem no tratamento mostram uma melhor quali-
Shiatsu. O Watsu, realiza movimentos diversos no dade de vida 14.
paciente, aliando o toque da massagem ao poder
Treinamento Cardiovascular e Fortalecimento
relaxante da água morna 16,17,18.
Muscular.
O músculo esquelético representa um impor-
tante órgão na SFM, pois muitos pacientes acre- Sabbag (2000) 15 submeteu a teste ergométrico
ditam que o músculo é responsável pela dor e ri- (TE),13 pacientes do sexo feminino com uma média
gidez que sentem. Anormalidades funcionais no de idade de 48,9 anos, portadores de SFM há mais
músculo incluem uma diminuição na concentra- de 5 anos e sedentárias há mais de 2 anos. Os crité-
ção de fosfato de alta energia, reduzida rios de interrupção do TE foram cansaço físico e dor.
oxigenação muscular e fluxo sangüíneo prejudi- Utilizou também uma escala visual para avaliação
cado 12. subjetiva da dor muscular no final de cada exame.

A utilização do método Watsu como recurso Grande porcentagem das fibromiálgicas inter-
hidroterapêutico em pacientes portadores de rompeu o TE no tempo zero por dor muscular
fibromialgia parece oferecer estratégias para aju- limitante (32%). Quinze por cento apresentaram
dar no tratamento dos mesmos, onde a água pouca dor, 23%, moderada, 15%, severa e 15%
aquecida é um meio ideal para se relaxar o corpo. terminaram o exame sem dor. Os escores manti-
Com o paciente deixando-se flutuar nos braços veram-se os mesmos em 69,2% das pacientes no

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Neurociências 155

terceiro mês e em 46,2% no sexto mês de treina- Biofeedback. MINHOTO (1999) selecionou 28
mento cardiovascular supervisionado , em maio- pacientes que preenchiam os critérios diagnósti-
res cargas de esforço; 15,4% obtiveram diminui- cos para fibromialgia. As pacientes foram avalia-
ção da algia no 3º e 6º meses; 15,4% pioraram na das no início e final do estudo. A avaliação consti-
segunda avaliação e 28,4%, na terceira 15. tuía-se de questionário de sono, exame físico do
A partir do 3º mês de treinamento pontos dolorosos. Foram investigados os níveis
cardiovascular supervisionado, as portadoras de de ansiedade e depressão por meio de escalas
Fibromialgia apresentaram maior tolerância à dor de auto-avaliação e realizadas polissonografia e
muscular e ao esforço, melhora da capacidade eletroencefalografia digital com análise quantitati-
funcional cardiovascular e muscular periférica 15. va do sono noturno.
De acordo com o treinamento recebido as pa-
A quantidade de dor experimentada está rela-
cientes foram separadas em três grupos:
cionada ao nível de condição física, e pacientes
biofeedback por eletromiografia (EMG-BFB),
com fibromialgia são geralmente física e
biofeedback por eletroencefalografia (EEG-BFB)
aerobicamente mal condicionados 12. Além disso,
e placebo- biofeedback (p-BFB). Observou-se nos
estudos do fluxo sangüíneo no músculo demons-
grupos EMG-BFB e EEG-BFB, uma diminuição da
traram que os músculos e outros tecidos em pa-
sintomatologia dolorosa, tanto em relação ao nú-
cientes com SFM sofriam de hipóxia. A falta de
mero de pontos quanto ao limiar médio de dor.
habilidade para contrair eficientemente o múscu-
Por meio da polissonografia, constatou-se uma
lo sugere uma falta de habilidade para executar
melhora dos padrões do sono no grupo EMG-BFB,
de forma adequada uma determinada tarefa 12.
no que se refere à eficiência do sono, à latência
Pacientes com SFM geralmente tornam-se do sono, à latência REM, à porcentagem do está-
mal-condicionados como resultado da limitação gio 1 e ao número de microdespertares. O grupo
dos seus exercícios em função da dor ou da fadi- EEG-BFB permaneceu sem alterações dos
ga. A redução do estágio 4 do sono, temporaria- parâmetros do sono na polissonagrafia. O grupo
mente aumentaria a fadiga, o que por sua vez p-BFB não apresentou alteração em nenhum dos
reduz a vontade de se exercitar; por outro lado, a parâmetros avaliados 22.
falta de exercício reduz a quantidade de sono re-
parador. Ambos, a diminuição da onda lenta do O biofeedback mostra-se eficaz na
sono e a inatividade reduzem a liberação do sintomatologia dolorosa da fibromialgia, e na me-
hormônio de crescimento com provável repercus- lhora do padrão do sono 22.
são sobre a síntese de proteínas 12,16.
Atra (1993), preconiza exercícios para me- Considerações Finais.
lhorar a performance cardiovascular em pacien-
De acordo com estudos relatados, o tratamen-
tes com fibromialgia. McCain, em 1990, avaliou
to da fibromialgia dever ser multidisciplinar e in-
42 pacientes com fibromialgia num programa de
clui o controle da dor e da fadiga, a melhora do
20 semanas divididos em dois grupos: 1) treina-
padrão do sono, o controle das anormalidades do
mento para melhora do desempenho
humor, a melhora de funções orgânicas e a rein-
cardiovascular e 2) exercícios simples de alonga-
tegração psicossocial.
mento muscular. Embora não tenham sido encon-
tradas diferenças estatisticamente significativas Baseado em evidências clínicas, ALARCÓN &
entre os dois grupos, houve nítida tendência para BRADLEY (1998) relatam estudos envolvendo pa-
melhora dos índices de dor no grupo em trata- cientes com fibromialgia e indicam que o trata-
mento cardiovascular. A carga física deve ser pro- mento para esses pacientes é uma combinação
gressiva, para não provocar lesões mecânicas 16. de técnicas e medicamentos.

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Neurociências 156

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Artigo de Revisão

Midazolan nasal no tratamento de


crises convulsivas
Sueli Rizzutti 1, Lucila Bizari Fernandes do Prado2, Gilmar Fernandes do Prado3.

RESUMO
Pacientes com crises agudas incluindo estado de mal epiléptico, podem apresentar dificuldades
no tratamento que geralmente envolve um benzodiazepínico. As drogas mais amplamente utilizadas
em pacientes com crises agudas incluem diazepam, lorazepam e midazolam. Nós revisamos a eficácia
e a segurança das diversas formas de administração do midazolam. A administração intranasal e
bucal do midazolam pode ser uma alternativa a administração retal e intravenosa do diazepam.

Unitermos: Administração intranasal; Administração bucal; Crises agudas; Midazolam.

SUMMARY
Patients with acute seizure, including status epilepticus, can prove difficult to treat and first line
treatment generally involves a benzodiazepine drug. The most widely used drugs in the treatment of
patients with acute seizures are diazepam, lorazepam and midazolam. We review the efficacy and
safety of the ways of midazolam administration. Intranasal and buccal midazolam could be an alternative
to rectal and intravenous diazepam.

Keywords: Intranasal Administration; Buccal administration; Acute seizures; Midazolam

INTRODUÇÃO.

No tratamento agudo de crises epilépticas o se dada por via intramuscular. Em situações


diazepam (DZP) é o benzodiazepínico (BZD) mais agudas, os benzodiazepínicos podem ser dados
amplamente usado em crianças e adultos, Henry por via retal, intramuscular e endovenosa. A
Gastaut (1965) foi o primeiro a utilizar o diazepam administração endovenosa nem sempre é bem
por via endovenosa para o controle do estado de sucedida em crianças pequenas, principalmente
mal epiléptico. Porém o diazepam (DZP) tem em situações de emergência, a administração retal
algumas desvantagens, incluindo a tendência ao pode ser difícil em algumas situações como
efeito cumulativo com doses repetidas, duração também a absorção retal pode ser muito variável.
de ação muito curta, deve ser dado por via Os benzodiazepínicos são usados rotineiramente
endovenosa ou retal e apresenta lenta absorção por via retal no tratamento de crises epilépticas

Trabalho realizado: Disciplina de Neurologia - UNIFESP. São Paulo. Brasil.

1 - Neuropediatra.
2 - Pediatra.
3 - Neurologista.

Endereço para Correspondência: Dra. Sueli Rizzutti - Rua Dorali, 72 - Guarulhos - SP - Telefone: 6461.3982 - e-mail: surizzutti@ig.com.br

Trabalho recebido em 14/07/2004. Aprovado em 09/09/2004.

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Neurociências 158

agudas, porém os cuidadores, monitores e a medicação pode ser expulsa e também pode
professores são relutantes em utilizar esse meio produzir uma sonolência prolongada pós ictal. O
de administração nas escolas, e também, as efeito colateral principal do DZP consiste na
crianças mais velhas acham esse procedimento depressão sensorial e principalmente respiratória.
muito embaraçoso. Alguns autores tem explorado
a administração intranasal e oral do midazolam 1-3 Nos últimos anos, outro BZD, o lorazepam (LZP)
vem sendo preferido em vários centros, como a
. Assim, nós revisamos a eficácia e a segurança
da administração oral e nasal do midazolam droga ideal para a abordagem inicial do EME. A
utilizado em alguns países como uma forma via utilizada é a endovenosa, na dose de 0,05 a
0,1 mg/kg/dose (máximo 4 mg), em infusão de
alternativa ao uso retal do diazepam.
um a dois minutos8,9 . A eficácia é de 80 a 100% e
os efeitos colaterais são semelhantes ao DZP. A
maior vantagem consiste na duração (12 a 24
Diazepam e Lorazepam. horas), podendo ser utilizado como droga
O estado de mal epiléptico (EME) é a antiepiléptica única. Até o momento o LZP
emergência neurológica mais freqüente, sendo endovenoso não é comercializado no Brasil.
necessário tratamento eficaz, imediato para o
controle da atividade epiléptica, no sentido de que Via de administração.
sejam prevenidas lesões neuronais e/ou outros
A administração retal de medicações pode ter
distúrbios sistêmicos associados4. Quanto mais
conotações pessoais e sociais tão importantes a
se atrasa o começo do tratamento, mais resistente
ele se torna e o tratamento precoce pode reduzir ponto de não ser utilizada pelo próprio10 paciente
principalmente adultos e adolescentes . Os pais,
a morbidade e a mortalidade. O trajeto de casa
cuidadores, monitores de acampamentos
ao hospital pode atrasar o início do tratamento e
reduzir a sua eficácia e o tratamento precoce pode geralmente recusam essa via de administração
sem uma supervisão sanitária, além de que o uso
reduzir o tempo de tratamento. Por isso é
dessa via pode ser difícil durante uma crise
importante que haja medicamentos capazes de
acabar com a crise rapidamente e que sejam epiléptica generalizada em um paciente adulto ou
adolescente. Em outros casos se teme a acusação
fáceis de administrar.
de abuso sexual em lugares públicos como
Em nosso meio, a droga de escolha para o escolas e acampamentos11,12. A administração oral
tratamento inicial do estado de mal epiléptico é o e nasal pode ser um avanço muito importante para
diazepam. Este apresenta meia-vida curta por o tratamento de crises epilépticas agudas, visto
redistribuição (menor que 1 hora) e grande volume ser muito mais fácil a aceitação pessoal e social,
de distribuição 1 a 2 l/Kg e por isso, embora seja levando a um tratamento mais precoce de crises
uma droga com penetração imediata no SNC, a epilépticas agudas.
rápida disseminação para outros tecidos leva à
queda acentuada no nível parenquimatoso Com isso, faremos uma revisão da literatura na
cerebral, acarretando duração do efeito utilização dos BZD por via intranasal e oral. O DZP
anticonvulsivante de apenas 15 a 30 minutos5,6 . é pouco solúvel em água e necessita da utilização
Portanto, é fundamental a associação de uma de propilenoglicol para solubilizar a solução
segunda droga, com vida média mais longa, após endovenosa ou de cremofor para a administração
o controle inicial das crises. A eficácia do DZP no retal, nenhum destes solventes é adequado para
controle das crises é de aproximadamente 85 a o uso oral ou intranasal. Por outro lado o
90% 6,7. A via de utilização preferencial é a midazolam é solúvel em água facilitando seu uso
endovenosa, a diluição não é necessária, não se oral e intra nasal. Faremos uma abordagem da
deve utilizar a via intramuscular , pois a absorção farmacodinâmica do midazolam como também da
é muito lenta inclusive quando comparada com a sua eficácia e segurança para o uso intranasal e oral
via oral. O uso retal leva a uma absorção irregular, (Tabela 1).

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MIDAZOLAN. Absorção.
O midazolam (MDZ) pertence a uma nova O MDZ após a administração oral é
classe de benzodiazepínicos chamado rapidamente absorvido pelo trato gastrointestinal.
imidazobenzodiazepínico (Figura 1) hidrossolúvel A sonolência tem sido observada após 15 minutos
introduzido na prática clínica em 1982, com da dose oral, com pico de efeito após 30 a 90
características farmacocinéticas e minutos 13 . A duração de ação após a
farmacodinâmicas bem conhecidas. Esta classe administração intranasal é semelhante a oral,
também inclui um receptor antagonista flumazenil. entretanto o início da sedação é mais rápido14,15.
É indicado na prática clínica em adultos e crianças A administração retal é segura e efetiva com pico
para sedação consciente antes e durante de ação em 8 a 29 minutos após a
procedimentos diagnósticos ou terapêuticos com administração15 . Ao contrário do diazepam e
ou sem anestesia local, como pré medicação clordiazepóxido, os quais tem uma absorção
antes da indução anestésica, sedação em intramuscular errática e incompleta, o MDZ é
unidades de cuidados intensivos como também rapidamente absorvido após a injeção
no tratamento de estados de mal epiléptico. O intramuscular, com uma biodisponibilidade de
MDZ difere de outros agentes por apresentar mais de 90%, o início da sedação ocorre após 5
efeitos clínicos rápidos e com curta duração de minutos da injeção com pico em 15 a 30
ação. minutos16. O início da sedação pode ser visto
em 3 minutos após a infusão endovenosa13.

Distribuição.

MDZ tem um volume de distribuição de 1,0-


2,5 l/kg em indivíduos saudáveis. É rapidamente
distribuído após a administração endovenosa.
MDZ é altamente ligado a proteínas plasmáticas,
primariamente a albumina, com uma fração livre
de 4%. A meia-vida de distribuição de apenas 15
minutos do MDZ mostra sua solubilidade
relativamente alta em pH fisiológico.

Metabolização.
Figura 1 - Midazolan
O MDZ, como outros BZP, é biotransformado
no sistema microssomal hepático através da a-
hidroxilação e glicuronização. Inicialmente o MDZ
O MDZ é um imidazobenzodiadiazepínico que é hidroxilado pelo sistema citocromo P450-3A4
é básico e solúvel em água no pH fisiológico. A para a-hidroxi-midazolam e uma pequena
base livre é pouco solúvel em água, porém no meio quantidade em metabólitos inativos. Estes
ácido da ampola que contém cloreto sódico, ácido metabólitos são então eliminados na urina como
clorídrico, hidróxido de sódio e água em um pH conjugados glicuronizados. O a-hidroxi-
de 3,3, seu anel BZP se abre e permite que o MDZ midazolam é farmacologicamente ativo e tem
seja solúvel em água de forma estável. Uma vez propriedades sedativas equivalente ao MDZ.
administrado, o anel BZP se fecha no pH fisiológico Inibidores do sistema citocromo P450 como a
e o MDZ se torna lipossolúvel permitindo uma cimetidina, fluconazol, eritromicina, ranitidina,
rápida penetração no cérebro. claritromicina podem reduzir o seu metabolismo

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Neurociências 160

diminuindo sua eliminação. A depressão do SNC BZDIII). Os BZD potencializam a ação inibitória
pode ser potencializada por outros depressores do GABA pelo aumento do fluxo dos íon cloreto
como os opióides, antipsicóticos, fenobarbital, através dos canais iônicos. O aumento do fluxo
antihistamínicos e álcool. dos íons cloretos para dentro da célula diminui a
habilidade da célula iniciar o potencial de ação.
Os BZD aumentam a freqüência de abertura do
Eliminação. canal e bloqueiam descargas mantidas de alta
freqüência, o mecanismo deste último tipo de
O MDZ tem uma meia-vida de eliminação de ação é incerto e é visto em elevadas
1,5 a 3 horas comparado com a do diazepam de concentrações terapêuticas. O MDZ é somente
mais de 20 horas. Entretanto, a duração da ação aprovado pelo FDA para a administração
farmacológica é de 60 a 120 minutos 17 . O endovenosa e intramuscular, entretanto a via retal
metabólito a-hidroxi-midazolam tem uma meia- e intranasal são empregadas freqüentemente18,19.
vida de eliminação de 1 hora em humanos. Cerca
de 90% da administração oral do MDZ é
excretada em 24 horas. A maior eliminação é
Efeitos sedativos .
realizada pelo rim e uma menor proporção
(menos de 10%) pelas fezes em 5 dias. A meia- O MDZ tem propriedades ansiolíticas,
vida se prolonga a 6-12 horas em recém- antiepilépticas, sedativas, hipnóticas, amnésticas
nascidos, mais curta de 1 a 1,5 horas em e também pode atuar como relaxante muscular.
crianças de 3 a 10 anos, 0,5 a 2 horas na É utilizado em urgência para aliviar a ansiedade
gravidez, em 10 horas em pacientes com mais e conseguir analgesia e amnésia quando se
de 60 anos e 5,9 horas em obesos. utiliza procedimentos cirúrgicos e ortopédicos em
pacientes conscientes. A sedação é conseguida
com concentração de 30-100ng/ml, por via
Farmacologia. intramuscular ou endovenosa. Ramoska et al.
(1991)20 demonstraram adequada sedação com
O MDZ tem uma alta afinidade por receptores a dose de 1 a 3mg de MDZ. A dose recomendada
benzodiazepínicos no sistema nervoso central. inicialmente endovenosa é de 1 mg ( não mais
Os receptores benzodiazepínicos tem sido do que 0,03mg/kg) lentamente. Uma dose de
identificados em vários tecidos incluindo coração 0,02 a 0,03mg/kg pode ser repetida com
e musculatura esquelética, porém o maior monitorização adequada do nível de sedação. A
predomínio ocorre no sistema nervoso central. A dose intramuscular é de 0,07 a 0,08mg/kg. Em
ação dos BZDs é no sítio receptor para o maior pacientes crônicos e em pacientes mais velhos
neurotransmissor inibitório do sistema nervoso a dose deve ser dividida pela metade. Em
central, o ácido gama-aminobutírico (GABA). estudos comparativos, o efeito sedativo do MDZ
Liberado dos neurônios GABAérgicos, o GABA endovenoso para cirurgia maxilofacial foi
se liga aos receptores GABAA e GABA B. Os semelhante ao diazepam endovenoso, porém
benzodiazepínicos aumentam a inibição mediada com menos dor no local da injeção e com mais
pelo GABA A , mas não tem ação na inibição amnésia21.O MDZ por via intramuscular foi mais
mediada pelo receptor GABAB. O receptor GABAA eficaz que o haloperidol em pacientes com
é uma proteína macromolecular que forma um agitação aguda22. Pode ser usado por via retal e
canal complexo, íon seletivo cloreto e contém oral para evitar a ansiedade causada pelas vias
sítios ligantes para GABA, barbitúricos, parenterais, principalmente em crianças. Estudos
anestésicos, BZD, esteróides. Este sítio é parte comparativos indicam que o MDZ retal tem um
do sítio receptor GABAA e existe em uma efeito mais rápido e produz mais amnésia e
variedade de número e formas (BZDI, BZDII, menos depressão respiratória do que o diazepam

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Neurociências 161

retal em pacientes que se submeteram a O MDZ pode também ser usado por via
endoscopia23 . sublingual e bucal. Tem-se sugerido que o acesso
ao cérebro através da mucosa olfatória pode ser
mais rápido quando MDZ é administrado por via
Uso do midazolam intranasal e oral. intranasal, porém não se tem encontrado
diferenças importantes da rapidez em produzir o
As vias intranasal e oral (Tabela 2) são vias de efeito sedativo entre as vias de administração
fácil acesso que podem ser utilizadas na bucal e nasal27. Connors e Terndrup (1994)2 8
urgência. A administração de 0,1 e 0,2mg/kg de compararam a eficácia da administração
MDZ intranasal alcança concentrações de 40 a intranasal e a oral em crianças para a reparação
70ng/ml em 1 a 3 minutos da administração, que de lacerações e não observaram diferenças na
são suficientes para produzir a sedação em eficácia, entretanto a administração intranasal foi
adultos. O MDZ tem um gosto amargo, mas pode associada com maior desconforto. A
ser diluído no suco. O pico de 104ng/ml se administração retal de 0,3 mg/kg diluída em 5 ml
alcança após 12 minutos da administração de de solução salina é uma alternativa de
0,2mg/kg, com uma biodisponibilidade de 55%. administração.
A mucosa nasal é altamente vascularizada
levando a uma maior absorção, sendo que pode
chegar a uma biodisponibilidade de até 83%
muito maior que a biodisponibilidade de 44-66% Toxicidade.
da via oral. Temos que levar em consideração
O MDZ foi aprovado para o seu uso em 1986,
que se deglute líquido quando se administra pela
nos Estados Unidos e após 6 meses de sua
via intranasal caindo a biodisponibilidade para
liberação, esta droga foi associada com 13
50-57%. Para a administração intranasal se utiliza
fatalidades relacionadas a depressão
da solução parenteral de 5mg/ml. O
respiratória, parada cardíaca principalmente em
procedimento mais habitual é conectar um
pacientes mais velhos29. Há também relatos de
cateter de plástico em uma seringa e gotejar o
parada respiratória em pacientes pediátricos30.
volume calculado por peso, instilando metade da
Diante dos fatos ocorridos a dose recomendada
dose em cada narina. Recentemente tem se
foi reduzida de 0,1-0,2 mg/kg para 0.03 mg/kg.
sugerido o uso de aerossóis e o uso de
A maioria dos casos fatais ocorreram durante o
solubilizantes específicos como a ciclodextrina
uso de MDZ combinado com opióides tais como
para a administração intranasal. A farmacologia
o fentanil. A associação de fentanil e MDZ foi
dos aerossóis se tem estudado em voluntários
associada com hipoventilação em mais do que
sãos 24 e em adultos que necessitam de
90% dos pacientes e apnéia em 50%31. Outros
sedação25 . Os aerossóis podem aumentar a
efeitos adversos com MDZ são menos comuns.
absorção na parte anterior e superior das fossas
Arcos relatou 3 episódios de bigeminismo e
nasais, reduzir a quantidade que se deglute e
trigeminismo e de taquicardia ventricular, as quais
passar direto ao sistema nervoso central25.
foram auto-limitadas e se resolveram em 2 a 4
O uso de solubilizantes como a ciclodextrina horas da administração de MDZ 32. Yakel et al.
permite aumentar a concentração da solução de (1992)33 relataram um caso de angioedema e
5 a 17 mg/ml e elevar o pH de 3,3 a 4,3. A maior bronco-constrição após MDZ endovenoso. Esses
concentração reduz o volume que se administra, dados sugerem a prática de monitorizar a
diminuindo a deglutição e a mudança do pH, sedação consciente com oxímetro e monitor
reduz a irritação local e acelera a absorção. A cardíaco e o equipamento de ressuscitação
absorção do MDZ intranasal não ocorre em um cardiopulmonar deve estar sempre disponível. Na
pH de 3,5 e sim de 5,5 a 7,526. O pH da solução maioria dos casos de hipoventilação e apnéia,
de ciclodextrina leva a uma absorção imediata. os pacientes respondem ao oxigênio 100% e

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Neurociências 162

depois do MDZ foi estatisticamente significante,


estimulação verbal. Outros efeitos adversos
a melhora da atividade elétrica cerebral de base
observados incluem vômitos, tosse, náuseas e
foi também estatisticamente significante. As
soluços. Em geral, os soluços desaparecem após
crianças e os pais consideraram o método
alguns minutos e são a manifestação mais
aceitável.
comum em adultos e crianças21,34.
Quando se administra o MDZ intranasal como Kendall et al. (1997)36 descrevem a eficácia
sedativo, não se descreve efeitos do MDZ intranasal em dois pacientes com estado
cardiorespiratórios graves ao utilizar a dose de de mal epiléptico. Uma criança de 2 anos que
0,2mg/kg. Tem-se descrito uma sensação de mostrou controle das crises após a administração
queimação, dor, irritação, irritação nasal, de 1,6 mg de MDZ intranasal por duas vezes, e a
sensação desagradável na nasofaringe e sabor outra paciente de 53 anos que cessou o estado
amargo, esses efeitos irritantes são atribuídas ao de mal após a administração de 10 mg de MDZ
pH ácido da solução27,28,35. intranasal.

Scott et al. (1997)37 descrevem 22 casos de


crises prolongadas em 13 crianças com epilepsia
Eficácia do Midazolam intranasal e oral .
refratária institucionalizadas em que utilizaram
A via intra nasal pode ter algumas dificuldades MDZ sublingual (0,5mg/kg no máximo 10 mg)
quando há movimentos intensos da cabeça e com uma seringa sem agulha, demonstraram
pode ser ineficaz quando há secreções nasais uma eficácia de 91%, e não observaram
abundantes, considerando esses aspectos, a alterações cardiorespiratórias.
administração por via oral é uma outra
Scheepers et al. (1998)38 descrevem o uso de
possibilidade. A absorção através da mucosa
MDZ intranasal em dois adultos com déficit
bucal mediante a administração bucal (entre os
mental no controle de crises, o primeiro paciente
dentes e a bochecha) ou sublingual é rápida; a
(25 anos) pertencia a uma instituição e o MDZ
mucosa bucal é ricamente vascularizada, a
substituiu o DZP por via retal com sucesso; a
biodisponibilidade do MDZ pode chegar a ser
segunda paciente (20 anos) foi substituído o
75% semelhante ao intranasal. Essa via pode
tratamento com BZD oral e retal pelo MDZ
facilitar a administração, pode ser dado um
intranasal com boa eficácia. O MDZ intranasal
volume maior, tem menor risco de expulsar a
foi administrado em uma seringa de 2,5ml com
medicação pela respiração, porém tem o risco
cateter nasogástrico neonatal. Os autores
de ser deglutido. Descreveremos a seguir alguns
preconizam a dose de 5mg para adultos com
estudos após revisão sobre o uso de MDZ
menos de 50kg e a dose de 10mg para adultos
intranasal e oral.
com mais de 50kg. Os pais e cuidadores não
O primeiro estudo que mostra a utilização de tiveram problemas com a administração.
medicações por via intranasal foi o de O’Regan
Lahat et al. (1998)39 mostram a eficácia do
et al. (1996)1. O estudo compreendeu 19 crianças
MDZ intranasal em um estudo aberto de 20
com a idade de 19 meses a 14 anos com
crianças com a idade de 6 meses a 16 anos, com
epilepsia de difícil controle. O MDZ foi
controle das crises em 19 de 20 pacientes (95%)
administrado lentamente gota a gota nas fossas
em 2,5 a 5 minutos sem recidivas em 60 minutos.
nasais; em 15 crianças houve melhora
eletrencefalográfica e cessação das crises, em Jeannet et al. (1999)40 mostram a eficácia do
14 crianças houve o aparecimento de uma MDZ em crianças de 1 dia a 16 anos (11 em casa
atividade beta induzida pela medicação. O tempo e 17 em hospital de urgência). A dose
médio de aparecimento da atividade beta foi de preconizada foi de 0,2mg/kg, administrou-se a
111,5 segundos. A redução dos spikes antes e metade da dose em cada narina. Em dois casos

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a administração foi sublingual, nenhuma criança com epilepsia e institucionalizados. No início foi
teve efeitos colaterais importantes, a administrado com uma seringa conectada a um
tolerabilidade foi boa, os pais consideraram a tubo nasogástrico neonatal e posteriormente se
administração cômoda e uma menor sonolência utilizou uma pipeta Pasteur. Em pacientes com
pós ictal quando comparado ao uso de DZP retal. muito movimento de cabeça se administrou via
oral; a dose preconizada foi de 5 mg para
Chattopadhyay et al. (1999)12 descrevem uma
pacientes com menos de 50kg e 10mg para
análise retrospectiva da administração do MDZ
pacientes com mais de 50kg. Não se observaram
bucal em 78 convulsões prolongadas tratadas
efeitos colaterais relevantes, nos pacientes em
ambulatorialmente (5 a 10mg). O MDZ foi
que se obteve boa resposta continuou a ser
administrado em 2 a 60 minutos do começo da
administrado pelos pais e cuidadores.
convulsão pelos pais e cuidadores e foi eficaz
em 87%, observou-se depressão respiratória em Lahat et al. (2000)2 realizaram o primeiro
7 de 78 episódios, e nenhuma reação adversa ensaio comparativo do uso de MDZ intranasal
relevante. (1,2mg/kg) com o DZP endovenoso (0,3mg/kg)
no tratamento de crises febris prolongadas (mais
Scott et al. (1999)41 realizaram o primeiro
de 10 minutos) em 47 crianças de 6 meses a 5
ensaio clínico comparando a eficácia e a
anos. O MDZ foi eficaz em 23 de 26 convulsões
segurança entre o MDZ bucal e DZP retal em 42
(88%; 21 crianças); o DZP em 24 de 26
crianças com crises prolongadas
convulsões (92%; 23 crianças): não houve
institucionalizadas (5 a 19 anos). O MDZ foi
diferença significativa. Nenhuma das crianças
utilizado na dose de 10mg em uma seringa com
apresentou efeitos cardiorespiratórios nem outros
2 ml de solução (5mg/ml). Instilou-se o MDZ por
efeitos secundários.
toda a mucosa bucal. Se os dentes estavam
fechados foi instilado entre os dentes e a Fisgin et al. (2002)43 realizaram um ensaio
bochecha. O DZP retal foi administrado na dose clínico comparando a eficácia e a segurança do
de 10 mg mediante um preparado comercial retal. MDZ intranasal com o DZP retal no tratamento
A eficácia do MDZ foi de 75%, e do DZP (59%), de convulsões agudas em 45 crianças de 1 mês
essa diferença não foi significante como também a 13 anos na urgência. Em todas as crianças foi
o tempo para cessar as crises. Não se administrado O2, foi realizada a monitorização
observaram efeitos cardiorespiratórios relevantes cardíaca, a saturação de O2, a freqüência
em nenhum dos grupos. respiratória e foi mantida uma via endovenosa
de acesso. O MDZ foi eficaz em 20 dos 23
Finsgin et al. (2000)42 administraram MDZ
episódios (87%) e o DZP retal em 13 de 22
intranasal em 16 crianças na dose de 0,2mg/kg
pacientes (59%), tendo sido significantemente
e controlaram a freqüência cardíaca, respiratória,
maior a resposta ao MDZ intranasal. Não se
a pressão arterial e a saturação de O2. Em 13
observou nenhuma reação adversa relevante. Os
crianças o MDZ foi efetivo, em 3 crianças outras
dois últimos estudos não podem ser extrapolados
medicações foram utilizadas, em uma criança
para o meio extra hospitalar e nem em adultos
houve diminuição da freqüência respiratória de
(validade externa).
40 para 26/minuto, em outra a freqüência
cardíaca aumentou de 126 para 166/minuto, sem
alteração da saturação do O 2 e com recuperação CONCLUSÃO.
em 5 minutos.
O MDZ administrado intranasal e bucal
Scheepers et al. (2000)10 administraram MDZ parece tão eficaz e seguro quanto o DZP
intranasal em 84 episódios de crises administrado intravenoso e retal 2,41,42. A
prolongadas, em 22 pacientes de 12 a 72 anos recuperação pós crítica parece ser mais rápida

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e também, pode tratar episódios de (ensaios clínicos bem desenhados) do uso de


agressividade e agitação pós-ictal, melhorando MDZ bucal em crianças pequenas e MDZ
muito a qualidade de vida dos pacientes. intranasal em adultos44-46, e também nenhum
estudo controlado em ambulatório com a
As vantagens mostradas pelos estudos
administração do MDZ por cuidadores, como
sugerem a aplicação da medicação em lugares
também o seu uso em estado de mal epiléptico.
públicos pelos pais e cuidadores sem a
conotação pessoal e social. Com a facilidade de Lembramos que a solução parenteral de 5mg/
administração pode-se reduzir o tempo do início ml para a administração intranasal produz
do tratamento em episódios agudos e irritação devido ao pH ácido, e o volume pode
prolongados de crises epilépticas, melhorando ser grande em adolescentes e adultos, podendo
a resposta e reduzindo a morbidade e facilitar a deglutição e diminuir a eficácia. A
mortalidade. Esta via de administração pode melhora do meio de veiculação como o uso de
também facilitar a utilização da medicação por aerossóis com soluções mais concentradas,
cuidadores em ambulatório, principalmente em pode minimizar os efeitos adversos locais.
pacientes adultos e adolescentes, e muitas vezes
Considerando a classificação dos níveis de
pode ser utilizado pelo próprio paciente como
evidência segundo Suzane Fletcher47 e David
profilático quando tem uma aura.
Sackett48, os resultados mostrados não devem
Os estudos 2,41,42 sugerem que o MDZ ser extrapolados para o uso ambulatorial e por
intranasal e bucal pode ser tão eficaz e seguro cuidadores sem a supervisão médica. São
quanto o DZP retal e endovenoso para o necessários ensaios clínicos mais amplos e com
tratamento precoce de crises agudas. Entretanto, maior número de participantes para a sua
não temos encontrado estudos controlados utilização de uma forma mais científica e segura.

Tabela 1 - Farmacocinética

Tabela 2 - Administração

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