62781975

fls.
373
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
Registro: 2019.0000203123
Para conferir o original, acesse o site https://esaj.tjsp.jus.br/pastadigital/sg/abrirConferenciaDocumento.do, informe o processo 1001112-11.2018.8.26.0566 e código B6C22FF.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº

1001112-11.2018.8.26.0566, da Comarca de São Carlos, em que são apelantes
SANCALHAS INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE FERRO E AÇO LTDA e ANDERSON
FABIO GUERREIRO, é apelado ITAÚ UNIBANCO S/A.
ACORDAM, em 14ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de

São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso, com diferimento
Este documento é cópia do original, assinado digitalmente por CARLOS HENRIQUE ABRAO, liberado nos autos em 21/03/2019 às 12:24 .
das custas de preparo. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este
acórdão.
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores LÍGIA

ARAÚJO BISOGNI (Presidente sem voto), ACHILE ALESINA E MELO COLOMBI.
São Paulo, 20 de março de 2019
CARLOS ABRÃO
RELATOR
Assinatura Eletrônica
fls. 374
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
VOTO Nº 37448 (Processo Digital)
Apelação nº 1001112-11.2018.8.26.0566
Comarca: São Carlos (5ª Vara Cível)
Apelantes: SANCALHAS INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE FERRO E
AÇO LTDA. e ANDERSON FABIO GUERREIRO
Apelado: ITAÚ UNIBANCO S/A
Juiz sentenciante: Vilson Palaro Júnior
APELAÇÃO - EXECUÇÃO CONTRA DEVEDORES
SOLVENTES - CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO -
COBERTURA SECURITÁRIA E CESSÃO DE RECEBÍVEIS
- DEVEDORA PRINCIPAL EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL -
VENCIMENTO ANTECIPADO DA DÍVIDA - CLÁUSULA 11ª
- EMBARGOS OPOSTOS, PROCESSADOS SEM EFEITO
SUSPENSIVO - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA -
RECURSO - GRATUIDADE PROCESSUAL - NÃO
CABIMENTO - DIFERIMENTO EXCEPCIONALMENTE
CONCEDIDO - TELEOLOGIA DA CLÁUSULA 11ª
COLIDENTE COM O PRINCÍPIO DA RECUPERAÇÃO E
PRESERVAÇÃO DA EMPRESA - DÉBITOS
COMPROVADAMENTE LIQUIDADOS, INCLUSIVE
ANTECIPADAMENTE - CREDOR APELADO NA RELAÇÃO
DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL - RECUPERAÇÃO DO
CRÉDITO REFRATÁRIA À RECUPERAÇÃO DA EMPRESA
- QUEBRA DA ISONOMIA DOS CREDORES - TEORIA DO
GOTEJAMENTO - PROCESSO SOBRESTADO CONTRA A
EMPRESA RECUPERANDA - EXECUÇÃO QUE DEVE
SER JULGADA EXTINTA E ACOLHIDOS OS EMBARGOS,
COM INVERSÃO DOS ÔNUS SUCUMBENCIAIS, FEITO O
DIFERIMENTO - RECURSO PROVIDO, COM
DIFERIMENTO DAS CUSTAS DE PREPARO.
Cuida-se de apelo tirado contra a r. sentença
prolatada de fls. 260/263, julgando improcedentes os embargos aos
devedores, reconhecendo o crédito performado pelo banco, haja vista
a cláusula 11ª do contrato, resultante do vencimento antecipado da
Apelação nº 1001112-11.2018.8.26.0566 - São Carlos - VOTO Nº 2/9

fls. 375
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
dívida, R$ 275.717,00, impondo custas, despesas processuais e
verba honorária de 15% sobre o total do débito indexado, integrada
pelos declaratórios não conhecidos (fls. 275/276), de relatório
adotado.
O devedor solidário recorrente, em preliminar,
reclama gratuidade, relata dificuldade e asfixia financeira, o débito
está literalmente em dia, não se conforma com sua responsabilização
diante da recuperação da devedora principal, busca realinhar a verba
honorária, aguarda provimento (fls. 279/312).
Recurso tempestivo, com pedido de gratuidade (fls.
313/326).
Regularmente processado (fls. 328/329).
Contrarrazões (fls. 330/359).
Determinação de remessa (fls. 360), materializada
(fls. 364).

fls. 376
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
É O RELATÓRIO.
O recurso comporta provimento, com o diferimento
das custas de preparo.
Emblemática e definitivamente, o devedor solidário
responsável não faz jus ao benefício da gratuidade processual
estampado na Lei nº 1.060/50, porquanto não se qualifica na
qualidade de hipossuficiente financeiro ou descortina estado de
miserabilidade. Entretanto, por celeridade e economia processuais,
excepcionalmente concedo o diferimento para fins de recolhimento
das custas de preparo ao final do processo, sob pena de inscrição na
Dívida Ativa junto ao Cadin.
Com razão, a instituição financeira promoveu
execução respaldada em cédula de crédito bancário e constituição de
dupla garantia, do seguro no valor de R$ 1 milhão e na cessão de
recebíveis. Em agosto de 2017, a principal devedora teve deferido
seu processamento da recuperação, sendo que o Banco Itaú consta
como credor de R$ 2.725.524,33 (fls. 61).

fls. 377
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
Preside o caso telado, antes de mais nada, a
integração das normas, inclusive de cláusula contratual, para assim
cogitarmos da regularidade e legalidade do procedimento promovido
em virtude do vencimento antecipado proveniente da cláusula 11ª do
contrato celebrado. Induvidosamente, a mencionada cláusula permite
que seja considerada como vencimento antecipado a propositura de
recuperação judicial ou extrajudicial (fls. 67), daí porque, ao promover
a mencionada execução contra devedor solvente, a casa bancária se
encarregou de disponibilizar planilha desde o vencimento da primeira
parcela em julho de 2016, registrando estarem absolutamente em dia
os pagamentos e vindo a cobrar R$ 275.717,00 (fls. 96).
Ao nosso sentir, no entanto, estando a instituição
financeira revestida de dupla garantia, do próprio seguro e dos
recebíveis, estando incluída no rol dos credores, cuja soma atinge
quase 10 vezes aquela exigida, e a execução estando sobrestada em
relação à principal devedora, conflita literalmente a conduta acenada
pelo banco, a qual tem natureza do seu interesse subjetivo,
diferentemente do espírito coletivo do procedimento recuperacional.
Piero Pajardi, saudoso doutrinador italiano, de há

fls. 378
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
muito escrevia que a reestruturação societária é princípio universal,
estando inclusive disciplinada no recente diploma normativo italiano
cuidando da crise da empresa, o Codice Della Crisi e Dell'Insolvenza.
Os demais países europeus são signatários do mesmo princípio,
demonstrando assim a predominância do interesse coletivo sobre
aquele individual.
No momento mais agudo da crise, de asfixia do
crédito, ao invés de as instituições financeiras abrirem os olhos para
fazer renegociação das dívidas ou realizar a injeção de dinheiro novo,
refratariamente hospedam-se em cláusula contratual abusiva,
destoante da realidade, na medida em que, estando a devedora em
dia com os seus pagamentos, conforme a própria planilha trazida pelo
exequente, cogitar do vencimento antecipado seria o mesmo que
rasgar a fila da isonomia e privilegiar o credor banco, o qual já ostenta
dupla garantia, reportada ao seguro com cobertura de R$ 1 milhão e a
cessão de recebíveis.
O estado de crise não representa, em absoluto,
insolvência e muito menos inadimplemento, já que as parcelas têm
sido pagas pontualmente, até de forma antecipada tese essa

fls. 379
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
corroborada, sem a menor dúvida, pela planilha acostada pela
instituição financeira.
Em agosto de 2017, com o processamento da
recuperação judicial, o banco permitiu-se exigir as parcelas vincendas
em função de cláusula contratual que derrui, por si só, todo o
organograma estabelecido mediante a preservação e salvamento da
empresa em crise. Significa dizer que o credor, além de não cooperar,
colaborar ou renegociar seu crédito, pretende mesmo assim, de forma
paralela, a latere, exigir integralmente o valor da obrigação sem
amortizar as parcelas adimplidas no período. Não se pode aplaudir
em absoluto, portanto, esse comportamento diagramado pela
instituição financeira, a qual busca exclusivamente recuperar seu
crédito, em detrimento da recuperação da empresa e da isonomia
entre todos os credores.
Cabe ainda ponderar que o preceito da blindagem
da empresa é exatamente o de suspender ações e execuções pelo
prazo de até 180 dias, e pela teoria do gotejamento não poderia o
sócio solidário ser confundido por meio do vencimento antecipado,
principalmente quando as prestações estão em dia e o recebimento

fls. 380
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
buscado mostra-se assimétrico com a recuperação prevista na Lei nº
11.101 de 2005.
Merece, portanto, ser julgada extinta a execução,
reconhecida a abusividade da cláusula e sua total impertinência e
inoportunidade, descasada da regra de Lei Complementar, assentada
no Diploma Normativo nº 11.101/05.
Os valores bloqueados deverão ser soerguidos,
respondendo o banco integralmente pelas custas e despesas
processuais da ação, da execução e dos embargos, fixando-se verba
honorária à soma de R$ 20.000,00, nos termos do artigo 85, § 2º e
seus incisos, do CPC, considerando a qualidade do trabalho, tempo
de duração do processo e grau de complexidade da causa, diferidas
as custas de preparo.
O vencimento antecipado da dívida perde
substância, fruto da novação recuperacional, mediante duplo aspecto:
o primeiro, do pagamento em dia; e o outro, por classificada na
relação de credores disponibilizada pelo próprio Juízo da recuperação
encarregado da execução singular.

fls. 381
PODER JUDICIÁRIO
São Paulo
De tal sorte, não se conciliam os preceitos
metodologicamente declinados pelo banco, representando, em tese,
quebra normativa por cláusula contratual impositiva e notadamente
abusiva (cláusula 11ª do contrato).
Isto posto, pelo meu voto, diferidas as custas de
preparo, DOU PROVIMENTO ao recurso, julgando extinta a
execução, com apoio no art. 485, IV e VI do CPC, registrando
abusividade e qualidade leonina da cláusula 11ª do contrato,
incidentalmente, levantando-se os valores bloqueados, acolhendo os
embargos, custas e despesas processuais pelo banco e verba
honorária fixada à luz do artigo 85, § 2º e seus incisos, do CPC, à
soma de R$ 20.000,00, corrigida desta data, juros de mora de 1%
a.m. do trânsito em julgado, velando o Juízo pelo exato pagamento
das custas, inclusive aquelas do diferimento.
CARLOS HENRIQUE ABRÃO

Relator

62781975

Hochgeladen von

Dokumentinformationen

Originaltitel

Copyright

Verfügbare Formate

Dieses Dokument teilen

Dokument teilen oder einbetten

Freigabeoptionen

Stufen Sie dieses Dokument als nützlich ein?

Sind diese Inhalte unangemessen?

Copyright:

Verfügbare Formate

62781975

Hochgeladen von

Copyright:

Verfügbare Formate

fls.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº

ACORDAM, em 14ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores LÍGIA

São Paulo, 20 de março de 2019

VOTO Nº 37448 (Processo Digital)

Cuida-se de apelo tirado contra a r. sentença

prolatada de fls. 260/263, julgando improcedentes os embargos aos

devedores, reconhecendo o crédito performado pelo banco, haja vista

a cláusula 11ª do contrato, resultante do vencimento antecipado da

Apelação nº 1001112-11.2018.8.26.0566 - São Carlos - VOTO Nº 2/9

dívida, R$ 275.717,00, impondo custas, despesas processuais e

pelos declaratórios não conhecidos (fls. 275/276), de relatório

reclama gratuidade, relata dificuldade e asfixia financeira, o débito

está literalmente em dia, não se conforma com sua responsabilização

diante da recuperação da devedora principal, busca realinhar a verba

honorária, aguarda provimento (fls. 279/312).

Recurso tempestivo, com pedido de gratuidade (fls.

Regularmente processado (fls. 328/329).

Contrarrazões (fls. 330/359).

Determinação de remessa (fls. 360), materializada

Apelação nº 1001112-11.2018.8.26.0566 - São Carlos - VOTO Nº 3/9

das custas de preparo.

responsável não faz jus ao benefício da gratuidade processual

estampado na Lei nº 1.060/50, porquanto não se qualifica na

qualidade de hipossuficiente financeiro ou descortina estado de

miserabilidade. Entretanto, por celeridade e economia processuais,

excepcionalmente concedo o diferimento para fins de recolhimento

das custas de preparo ao final do processo, sob pena de inscrição na

Dívida Ativa junto ao Cadin.

Com razão, a instituição financeira promoveu

execução respaldada em cédula de crédito bancário e constituição de

dupla garantia, do seguro no valor de R$ 1 milhão e na cessão de

recebíveis. Em agosto de 2017, a principal devedora teve deferido

seu processamento da recuperação, sendo que o Banco Itaú consta

como credor de R$ 2.725.524,33 (fls. 61).

Apelação nº 1001112-11.2018.8.26.0566 - São Carlos - VOTO Nº 4/9

Preside o caso telado, antes de mais nada, a

cogitarmos da regularidade e legalidade do procedimento promovido

em virtude do vencimento antecipado proveniente da cláusula 11ª do

contrato celebrado. Induvidosamente, a mencionada cláusula permite

recuperação judicial ou extrajudicial (fls. 67), daí porque, ao promover

a mencionada execução contra devedor solvente, a casa bancária se

encarregou de disponibilizar planilha desde o vencimento da primeira

parcela em julho de 2016, registrando estarem absolutamente em dia

os pagamentos e vindo a cobrar R$ 275.717,00 (fls. 96).

Ao nosso sentir, no entanto, estando a instituição

financeira revestida de dupla garantia, do próprio seguro e dos

recebíveis, estando incluída no rol dos credores, cuja soma atinge

quase 10 vezes aquela exigida, e a execução estando sobrestada em

relação à principal devedora, conflita literalmente a conduta acenada

pelo banco, a qual tem natureza do seu interesse subjetivo,

diferentemente do espírito coletivo do procedimento recuperacional.

Piero Pajardi, saudoso doutrinador italiano, de há

muito escrevia que a reestruturação societária é princípio universal,

cuidando da crise da empresa, o Codice Della Crisi e Dell'Insolvenza.

Os demais países europeus são signatários do mesmo princípio,

demonstrando assim a predominância do interesse coletivo sobre

No momento mais agudo da crise, de asfixia do

crédito, ao invés de as instituições financeiras abrirem os olhos para

fazer renegociação das dívidas ou realizar a injeção de dinheiro novo,

refratariamente hospedam-se em cláusula contratual abusiva,

destoante da realidade, na medida em que, estando a devedora em