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Ciências Biológicas

F
iel a sua missão de interiorizar o ensino superior no estado Ceará, a UECE,
como uma instituição que participa do Sistema Universidade Aberta do
Brasil, vem ampliando a oferta de cursos de graduação e pós-graduação
na modalidade de educação a distância, e gerando experiências e possibili-
dades inovadoras com uso das novas plataformas tecnológicas decorren-
Ciências Biológicas

Genética
tes da popularização da internet, funcionamento do cinturão digital e
massificação dos computadores pessoais.
Comprometida com a formação de professores em todos os níveis e
a qualificação dos servidores públicos para bem servir ao Estado, Genética
os cursos da UAB/UECE atendem aos padrões de qualidade
estabelecidos pelos normativos legais do Governo Fede-

Universidade Estadual do Ceará - Universidade Aberta do Brasil


ral e se articulam com as demandas de desenvolvi-
mento das regiões do Ceará.

Valberto Barbosa Porto

Geografia

12

História

Educação
Física

Ciências Artes
Química Biológicas Plásticas Computação Física Matemática Pedagogia
Ciências Biológicas

Genética

Valberto Barbosa Porto

Geografia

2ª edição 9
12

Fortaleza - Ceará 3

História

2015
Educação
Física

Ciências Artes
Química Biológicas Plásticas Computação Física Matemática Pedagogia
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Biblioteca Central Prof. Antônio Martins Filho
Francisco Welton Silva Rios – CRB-3 / 919
Bibliotecário

P853g Porto, Valberto Barbosa.


Genética / Valberto Barbosa Porto . – 2. ed. – Fortaleza
: EdUECE, 2015.
132 p. : il. ; 20,0cm x 25,5cm. (Ciências Biológicas)
Inclui bibliografia.
ISBN: 978-85-7826-377-5
1. Genética. 2. Mendel, Gregor – 1822-1884. 3.Interação
gênica. 4. Citogenética. 5. Bases genéticas da evolução. I.
Título.
CDD 575.1

Editora da Universidade Estadual do Ceará – EdUECE


Av. Dr. Silas Munguba, 1700 – Campus do Itaperi – Reitoria – Fortaleza – Ceará
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Secretaria de Apoio às Tecnologias Educacionais
Fone: (85) 3101-9962
Sumário
Apresentação......................................................................................................5

Capítulo 1 – Introdução à Genética.................................................................7


1. Considerações preliminares.................................................................................9
2. A redescoberta das Leis de Mendel...................................................................10
3. Genética Molecular: da molécula à célula.........................................................13
4. A teoria cromossômica da herança....................................................................19

Capítulo 2 – Monoibridismo (1a Lei de Mendel)...........................................27


1. O trabalho de Mendel..........................................................................................29
2. A segregação dos fatores – Monoibridismo (1a Lei) .........................................31
3. Termos e símbolos...............................................................................................33
4. Modificações nas proporções do monoibridismo..............................................36

Capítulo 3 – Segregação Independente (2a Lei de Mendel).......................43


1. Segregação independente dos fatores (2a Lei).................................................45
2. Diibridismo............................................................................................................46
3. Monoibridismo e segregação independente......................................................48
4. Poliibridismo.........................................................................................................51

Capítulo 4 – Interação Gênica.........................................................................59


1. Tipos de interação...............................................................................................61
2. Epistasia...............................................................................................................62
3. Interações não-epistáticas..................................................................................66
4. Herança quantitativa............................................................................................67

Capítulo 5 – Experimentos de Morgan..........................................................73


1. Considerações Preliminares...............................................................................75
2. Ligação gênica ....................................................................................................77
3. Mapeamento genético.........................................................................................80
4. Genética e sexo...................................................................................................83

Capítulo 6 – Citogenética, Desenvolvimento e Comportamento.............95


1. Considerações preliminares...............................................................................97
2. Citogenética.........................................................................................................98
3. Desenvolvimento do ciclo de vida....................................................................105
4. Comportamento dos seres vivos......................................................................107
Capítulo 7 – Outros aspectos de relevância na Genética........................113
1. Bases genéticas da evolução........................................................................... 115
2. Bases bioquímicas e cromossômicas das doenças genéticas......................120
3. Aplicações da Genética....................................................................................123
Sobre o autor...................................................................................................131
Apresentação
O presente livro, produzido para o curso de Ciências Biológicas, tem por ob-
jetivo introduzir o conhecimento de genética como a parte da Biologia que
estuda a hereditariedade. A Genética é o ramo do conhecimento que busca
o entendimento dos processos iniciados com a informação hereditária, pre-
sentes em moléculas especiais, entre as quais o DNA figura como core do
processo, por portar os genes.
Gregor Mendel, em 1865, introduziu as bases matemáticas no estudo
da Genética, aplicando na prática seus conhecimentos de probabilidade ad-
quiridos por meio de experimentos com ervilhas, que resultaram nas leis men-
delianas de transmissão da herança por meio de fatores, comparáveis aos
genes, bases para a compreensão da variabilidade genética nos indivíduos e
nas populações.
A citogenética estuda como os materiais genéticos se comportam nas
células, possibilitando o entendimento de como a mutação permite incontá-
veis formas de expressão do DNA e de arranjos cromossômicos, via de regra
aumentando a variabilidade genética; porém, em outros casos, fixando arran-
jos que expressem conjuntos de genes protegidos contra tal variabilidade, por
recombinação genética.
O desenvolvimento é regulado pela expressão gênica, permitindo que
um homem seja um homem; um chimpanzé, um chimpanzé; e que um juazei-
ro seja um juazeiro. O comportamento se manifesta por padrões, muitos deles
são explicados pela genética. Sabe-se ainda que as mutações, incorporando
novos caracteres às estruturas, ao serem fixadas nos seres vivos, por meio do
processo de seleção natural, ao longo do tempo geológico, foram deixando o
rastro de ancestralidade e de descendência, expresso numa história única, ou
seja, na filogenia, o que resultou nas miríades de formas de vida, constatada
na atual diversidade de seres vivos, tornando evidente a evolução da vida.
Por fim, é mostrado que a genética tem inúmeras aplicações na vida
moderna, influindo desde a medicina, quando procura entender, prevenir e
tratar as doenças genéticas, até a biotecnologia, lócus de aplicação da En-
genharia Genética, que, aliada à tecnologia de clonagem e ao uso de células
tronco, constituem-se em promissoras áreas de pesquisa, que ascendem a
esperança de dias melhores para a humanidade.
O autor
Capítulo 1
Introdução à Genética
Genética 9

Objetivos
• Iniciar-se no estudo da Genética;
• Usar conceitos e termos apropriados à genética;
• Reconhecer as bases moleculares sobre as quais a genética se assenta.

1. Considerações preliminares

Os princípios básicos da genética foram estabelecidos entre 1865


(quando o trabalho de Mendel foi completado) e 1900 (quando esse
trabalho foi descoberto). Por que as importantes descobertas de Mendel
não foram reconhecidas por um longo período de tempo (35 anos) após
seus estudos estarem completos e publicados? (GARDNER e SNUS-
TAD, 1986).

A história da Genética é o ponto de partida para que se possa iniciar seu es-
tudo de modo contextualizado, entendendo como se edificaram suas bases?
A Genética estuda a hereditariedade. Desta forma, iniciaremos seu es-
tudo fazendo uma análise retrospectiva à procura do entendimento dos fatos
que levaram o mundo científico a interessar-se pelas leis que regem a heran-
ça das características hereditárias.
O presente capítulo foi aberto com a seguinte indagação: “Por que
as importantes descobertas de Mendel (1822 – 1884), realizadas em 1865
não foram reconhecidas por um longo período de tempo (35 anos) após 1
Pasteur realizou, em
1860, um experimento,
seus estudos estarem completos e publicados?”. (GARDNER e SNUS-
no qual ele usou frascos
TAD, 1986). Analisando-se o contexto histórico daquela época, é possível com gargalos alongados
buscar-se o entendimento para essa questão. Pasteur1, por volta do início como pescoço de cisne.
Esse gargalo funcionava
da década de 1860, havia dado o golpe final na Teoria da abiogênese, en- como filtro, não deixando
quanto a Teoria Celular, proposta com base nos estudos de Mathias Jakob os microorganismos
Schleiden (1804 - 1881) e de Theodor Schwann (1810 - 1882), dava os penetrarem no caldo
nutritivo que permanecia
seus primeiros passos rumo à aceitação da célula como a unidade mor- estéril e em contato com
fofuncional dos seres vivos. Entretanto, outra proposição causou um im- o ar. O experimento de
pacto atordoante ao mundo científico, foram as ideias evolucionistas de Pasteur foi considerado
o golpe final na Teoria da
Darwin presentes no seu livro A Origem das Espécies, editado um pouco Abiogênese.
antes das descobertas de Mendel.
10 PORTO, V. B.

Saiba mais
Antiguidade da Terra
Veja como a escala, na qual acontecem os fenômenos, é um conceito fundamen-
tal para a compreensão do mundo natural: “Darwin não teria concebido a teoria da
evolução por seleção natural caso não tivesse entendido que a Terra é muito antiga”
(PURVES, 2002).
Outros conceitos fundamentais
Além da escala, as transformações, as regularidades e a energia são conceitos
fundamentais que, se forem adequadamente aplicados, permitem uma compreensão
clara e unificardira dos fenômenos naturais

Portanto, no mundo científico, efervesciam estas ideias, não havendo


espaço para se alcançar as importantes descobertas de Mendel, já que todas
essas novas ideias combateriam as ideias fixistas, que eram mais aceitas na-
quela época, causando uma sombra que perdurou até o início do século XX,
quando o processo de seleção natural, proposto por Darwin, passou a ser
explicado com base na variabilidade genética.
Assim sendo, hoje se aceita que a Teoria da Evolução emoldure o co-
nhecimento biológico, sendo as transformações genéticas as responsáveis pelo
rastro de mudanças que permitiram o surgimento da diversidade contemporâ-
nea de seres vivos, como regularidades que se expressam no mundo natural.
A manutenção dessa diversidade, como herança ancestral, depende da
energia que percorre os sistemas vivos, tendo o Sol como fonte inesgotável da
entrada de energia nesses sistemas.

2. A redescoberta das Leis de Mendel


Gregor Mendel2, meritoriamente, é considerado o “pai da genética”, em con-
2
Gregor Mendel (1822-
1884) é considerado o pai
sequência dos seus experimentos realizados com ervilhas que existiam nos
da genética pelas suas jardins do mosteiro de Altbrünn, na Áustria, onde Mendel desempenhava
formulações matemáticas as funções de professor substituto de Matemática. Nesse período, ele apli-
sobre a herança que
resultaram nas “Leis de cou as regras de probabilidade às observações que realizou no cultivo de
Mendel” (CURTIS, 1977) diversas gerações da planta estudada, estabelecendo construtos lógicos,
denominados de Leis de Mendel.
A Teoria Cromossômica da herança, elo fundamental para a redesco-
berta das Leis de Mendel, começou a ser formulada por Wilhelm Roux, que,
“por volta de 1883, postulou que os cromossomos dentro do núcleo da célula
eram os portadores dos fatores hereditários”. (GARDNER e SNUSTAD, 1986)
Essas conclusões de Roux podem ser consideradas como embrionárias na
formulação da Teoria Cromossômica da herança e se coadunam com as pro-
posições de Mendel, que postulara a presença de fatores pareados, presen-
tes nas células, como responsáveis pela transmissão da herança genética.
Genética 11

Os trabalhos dos botânicos Hugo de Vries3, na Holanda; Carl Correns4, 3


Hugo de Vries (1848 –
na Alemanha; de Eric von Tschermak-Seysenegg5, na Áustria, evidenciaram 1935), botânico holandês
que participou da
as Leis de Mendel quando realizaram, no ano de 1900, independentemente, redescoberta dos trabalhos
experimentos a partir de investigações próprias, fundamentadas nas publica- de Mendel, (GARDNER e
SNUSTAD, 1986)
ções de Mendel, que foram consultadas, fornecendo as explicações que ser-
viram de base para as suas conclusões pessoais.
4
Carl Correns (1864 –
O termo Genética foi empregado, pela primeira vez, por William Ba-
1933), botânico alemão que
tenson6, que, em 1905, deu o nome à ciência que surgia, inspirando-se no participou da redescoberta
significado grego da palavra Genética que remetia à geração. Os méritos de dos trabalhos de Mendel,
(AMABIS e MARTHO,
Batenson não ficam por aí, já que ele também empregou o termo alelomor- 2006)
fo, encurtado para alelo, para permitir a visualização dos fatores pareados
propostos por Mendel.
A denominação gene, para o fator mendeliano responsável pela trans-
5
Eric Von Tschermak-
Seysenegg (1871 – 1962),
missão da herança, foi cunhado pelo Dinamarquês W. L. Johannsen7, no botânico austríaco que
começo de século XX. Esse termo se refere às unidades transportadoras da participou da redescoberta
informação hereditária. dos trabalhos de Mendel.
(AMABIS e MARTHO,
Outros expressivos expoentes na Genética, conforme Gardner e Snus- 2006)
tad (1986) foram:
• O francês Lucien Cuénot:, que no início do século XX, mostrou o controle 6
William Bateson (1861 -
genético na cor da pelagem em camundongos; 1926) usou, pela primeira
vez, os termos genética
• O americano W. E. Castle; que, também no início do século XX, relacionou e alelo, (GARDNER e
genes ao sexo, ao padrão e à cor da pelagem em mamíferos; SNUSTAD, 1986)

• Thedor Boveri8 e W. S. Sutton, que, em 1902, trouxeram evidências com-


probatórias de que um gene é parte de um cromossomo;
7
W. L. Johannsen
(1857 – 1927), botânico
• A. E. Garrod, que indicou, em 1902, que os genes nos seres humanos fun- dinamarquês que
cionavam através de enzimas; reconheceu o significado
de linhagens puras,
• Thomas Hunt Morgan, que estabeleceu, a partir de 1910, que o gene era a (GARDNER e SNUSTAD,
unidade transportadora da informação hereditária; 1986)

• H. J. Muller, que criou a citogenética, na década de 1920, pela fusão da


citologia com a genética;
8
Theodor Boveri (1862
– 1915) reconheceu os
• G. W. Beadle, B. Ephrussi, E. L. Tatum, J. B. S. Haldane, entre outros, que, na cromossomos como
década de 30 do século XX, forneceram as bases para o entendimento das transportadores dos genes,
(GARDNER e SNUSTAD,
propriedades funcionais do gene, caracterizando-o, equivalentemente, como 1986)
unidade de estrutura indivisível, unidade de mutação e unidade de função;
• O. T. Avery e colaboradores, A. Hershey e M. Chase que, na década de
40 do século XX, identificaram macromoléculas que carregavam a infor-
mação genética em bactérias e em vírus, estabelecendo que o DNA era a
molécula transportadora da informação hereditária.
12 PORTO, V. B.

9
J. D. Watson e F. H. C. • H. Fraekel-Conrad e B. l. Singer que, ainda na década de 1940, mostraram
Crick, que ledearam o que o RNA é o material genético nos vírus do mosaico do tabaco. Presume-
modelo de dupla hélice,
célebre descoberta que -se, portanto, ser o RNA a molécula precursora da informação hereditária.
explica a estrutura do DNA. • J. D. Watson e F. H. C. Crick9, que, na década de 50 do século XX, des-
(CURTIS, 1977)
vendaram a dupla hélice do DNA, estrutura que permite a compreensão
que o DNA é o transportador da informação hereditária, sendo, portanto, o
responsável pelo transporte dos genes.
Ultimamente, o biólogo cearense, Dr. Francisco Linhares Arruda Ferreira Go-
mes, professor de Genética e de Evolução da Universidade Estadual do Ceará,
que cursa o pós-doutorado no Canadá e trabalha com uma equipe de cientistas
canadenses, descobriu que as células-tronco usam coreografias próprias para se
diferenciarem nos respectivos tipos celulares. O trabalho científico Computational
prediction of neural progenitor cell fates, do qual Gomes é um dos primeiros co-
-autores, foi publicado na prestigiada revista Nature Methods (fator de impacto > 15),
no mês de março de 2010. Vejamos a foto 1 a seguir (COHEN et al., 2010):

Foto 1 – Dr. Gomes à direita com Dr. Cayouette mais à frente. Ao fundo, estão Dr.
Roysan e Dr. Cohen, dos Estados Unidos.
Em fevereiro de 2010, Gomes divulgou, via e-mail, o seu feito entre co-
legas: “esta pesquisa surgiu da observação do movimento que células-tronco
retinianas fazem quando são cultivadas in vitro. Como as células-tronco da
retina dão origem a 7 tipos de neurônios nos olhos de mamíferos quando elas
se dividem e como percebi que as células-tronco realizavam 'danças' diferen-
tes antes de se dividirem, tive o insight de que provavelmente nós poderíamos
prever que tipo de divisão a célula-tronco realizaria baseado em nuances par-
ticulares de cada 'coreografia' celular. Gomes completou ainda: 'Meu orien-
tador, Dr. Michel Cayouette, acreditou na minha intuição e engendrou uma
colaboração com dois especialistas em análise de imagem por computador,
os Dr. Badrinath Roysan e Dr. Andrew Cohen dos USA”.
Genética 13

Para refletir
1. Conceitue os seguintes termos: genética, genes, mutação, hereditariedade, diversi-
dade e evolução.
2. Como os conceitos fundamentais, as transformações, as regularidades, a energia e a
escala permitem a compreensão adequada e unificada dos fenômenos naturais?
3. Faça uma tabela com duas entradas que apresente os principais feitos de pesquisa-
dores na área da Genética, relacionando-os às datas de publicação. Parta dos feitos
apresentados no capítulo e os amplie consultando a bibliografia e as informações
contidas em sites específicos.
4. Diário reflexivo: Faça o seu diário reflexivo, a partir das discussões realizadas no de-
correr da disciplina, registrando os aspectos que levem-no a agir de forma crítica e
reflexiva. Em ato contínuo, construa o seu Portifólio, alimentando-o com os diários
produzidos após cada capítulo.

3. Genética Molecular: da molécula à célula


A pesquisa biológica está em uma fase de crescimento exponencial do
conhecimento, motivada pela percepção inovadora de uma unidade
básica, comum a todas as formas de vida. As ciências moleculares
estão nos mostrando como reconhecer e explorar essas interações,
levando-nos a refletir sobre as origens ancestrais de todos os com-
ponentes que nos constituem. Pesquisando a biologia celular e mo-
lecular, ficamos maravilhados com a variedade sem fim de sistemas
vivos com similaridade fundamental dos mecanismos com os quais as
células operam. (LODISH et al., 2002)

O entendimento de que a informação hereditária surge a partir do ma- 10


DNA: Atualmente o DNA,
terial genético presente no nível de sistemas moleculares, em que o DNA10, ácido desoxirribonucléico, é
considerado o transportador
como o continente dos genes11, é fundamental para desvendar a grande da informação hereditária.
variabilidade evidente na diversidade biológica? Ele funciona em conjunto
com o RNA, ácido
No nível dos sistemas celulares, a teoria cromossômica da herança ribonucléico, na produção
nos faz perceber que os genes fazem parte dos cromossomos, os quais se de proteínas, os quais
segregam em divisões celulares específicas, a meiose. Esses conhecimen- são estruturas básicas
para a evidenciação das
tos são de relevância para a compreensão dos mecanismos de transmissão características hereditárias.
das informações hereditárias?
Sabe-se que o DNA é a molécula que transmite as informações here- 11
Gene é a unidade
ditárias dos ancestrais para a descendência. Tais informações estão distri- transportadora da
informação hereditária,
buídas em unidades fundamentais, os genes.
estruturalmente representado
Considerando a Filogenia, ou seja, a história única de ancestralidade e por uma porção da molécula
de descendência dos seres vivos (AMORIM, 2002), infere-se que as caracte- de DNA capaz de interagir
com o RNAm, na produção
rísticas mudaram ao longo do tempo na sua forma de se expressarem, sendo de proteínas.
os caracteres as variações, ou melhor, os estados dessas mudanças que re-
sultaram em novas condições para as estruturas.
14 PORTO, V. B.

12
Exemplo de padrão Vale a pena abrir um parêntese para se compreender a relação hierárqui-
de organização: ca que existe entre padrão de organização12, estrutura, característica e caráter:
Olho: células receptoras da
luz, que trazem a imagem • Padrão de organização; é a configuração de um sistema pelas relações
dos objetos, são conduzidas entre os seus componentes;
pelos neurônios e percebidas
pelo sistema nervoso. • Estrutura13: é a expressão física do padrão de organização de um sistema.
Em genética, a estrutura pode ser considerada a parte de um organismo
Exemplos de
13

estruturas: que tem função definida, podendo se relacionar à morfologia, ao comporta-


a) morfológica: olho mento e à bioquímica;
de um vertebrado;
b) comportamental: • Característica14: é aspecto da estrutura sujeito à mudança;
comportamento sexual entre • Caráter15: é a variação apresentada pela característica.
patos; c) bioquímica: genes.
No presente texto, padrão de organização, estrutura, característica e ca-
Exemplos de
14
ráter serão usados nos sentidos descritos acima, embora alguns autores usem
características:
a) morfologia do olho: cor; o conceito de característica como o de variação e o conceito de caráter como
b) comportamento sexual: o de aspecto.
coreografia da corte; e c)
genes: composição dos Analisando-se a origem das variações, ou seja, dos caracteres, chega-
alelos. mos às mutações16, mudanças que se processam nos genes, as quais são
consideradas os motores da implantação gradual da diversidade biológica.
15
Exemplos de caracteres:
a) cor do olho: variação da Assim sendo, como as mutações ocorrem nos genes e os genes são
cor – azul, castanho, preto
parte da molécula do DNA, o estudo da genética molecular deve ser introdu-
e suas nuances;
b) coreografia da corte: tório, no trato da informação hereditária.
tipo de dança realizado por
É também importante ressaltar, para se compreender como se proces-
cada espécie; e
c) composição dos alelos: sam as relações nos e entre os diversos níveis sistêmicos que ocorrem na
diversas composições, natureza, que os sistemas se relacionam formando uma rede de relações,
caracterizando a polialelia.
na qual se observa a hierarquização de níveis de organização sistêmicos,
16
Mutações são quaisquer isto é, um sistema está dentro do outro. Dessa relação, revelam-se proprie-
mudanças que acontecem dades de qualidades próprias, que brotam das interações ocorridas naquele
na estrutura de um gene,
alterando-lhe a sequência nível hierárquico. Essas propriedades são denominadas propriedades emer-
de bases nitrogenadas, gentes, que são responsáveis pelos padrões de organização dos sistemas e
resultando, episodicamente, que se expressam por meio de estruturas físicas, os objetos (Figura 1).
em variações nas
características das
estruturas, os caracteres.

Figura 1 – Modelo representativo do padrão em rede


(linhas cheias), que evidencia a importância das
relações entre os diversos níveis sistêmicos, os quais
devem ser vistas em primeiro plano, mostrando que
os objetos (círculos pontilhados) devem ser vistos de
forma desfocada, em segundo plano, por conterem
as relações e por serem tão somente, a expressão
observável como estrutura física dessas relações.
(CAPRA, 1995)
Genética 15

Observe que tudo parte das relações. São elas que configuram os pa- 17
O nucleotídeo é a unidade
drões de organização sistêmicos, devendo ser o foco das atenções, isto é, elas formadora das moléculas
devem ser vistas em primeiro plano, quando se deseja compreender o mundo de ácidos nucléicos, RNA
ou DNA. Ele é composto
natural: enquanto os objetos, como representam a manifestação em estruturas de um açúcar, que pode
físicas do resultado dessas relações, devem ser vistos em segundo plano. ser a ribose, no RNA, e a
desoxirribose, no DNA; ligado
São as interações nos e entre os objetos, isto é, a teia de relações as a um grupo fosfato PO4-2; o
quais permeiam os sistemas, que se encontram em transformações contínu- açúcar está também ligado
as e que mantêm as regularidades sistêmicas percebidas nos objetos. a uma das quatro bases
nitrogenadas, três das quis
A abordagem molecular da genética nos remete, portanto, ao nível estão presentes no DNA e
molecular de organização dos sistemas biológicos e de suas relações, em no RNA e são denominadas
adenina, citosina e guanina,
que o padrão de organização do DNA, que se configura pela interação de enquanto a uracila está
nucleotídeos17, é um fator preponderante para que se possa compreender presente só no RNA e a
timina está presente só no
como estão estruturados os genes.
DNA.
Portanto, rever os conhecimentos explanados pela Biologia Molecular é
Pontes de Hidrogênio:
18
crucial para o bom entendimento do comportamento dos genes como fatores
são ligações consequentes
hereditários. da atração eletrostática
ente partes negativas
Quanto ao padrão de organização do DNA, é importante lembrar que:
das moléculas ou de
• Os nucleotídeos se ligam entre si pelos grupos fosfatos, os quais são li- oxigênio ou de Nitrogênio e
partes positivas de outras
gados à posição 3’ do nucleotídeo subsequente, denotando que a fita do
moléculas localizadas no
DNA, que está sendo formada, desenvolve-se de uma extremidade 5’ para Hidrogênio.
uma extremidade 3’;
19
É fácil detectar o
• Os nucleotídeos se associam em cadeia de dupla fita, as quais se ligam por antiparalelismo entre as
pontes de hidrogênio18, que são formadas entre as bases nitrogenadas. As fitas de DNA, observando-
se o oxigênio na parte
fitas desenvolvem-se em sentidos opostos, isto é, de forma antiparalela19. circular da desoxirribose.
Esse fato pode ser percebido pelo exame das extremidades 3’ e 5’ de ambas Numa das fitas, o oxigênio
as fitas, que são dobradas em espiral, formando a dupla hélice do DNA; estará para cima, enquanto,
na outra, estará para baixo.
• As bases nitrogenadas não se pareiam por acaso. A Adenina sempre se
pareia com a Timina, enquanto que a Citosina sempre se pareia com a
Guanina. Isso ocorre devido às especificidades das pontes de hidrogênio;
• As informações genéticas carregadas pelo DNA de um indivíduo são herdadas
dos progenitores, de modo que cada um contribui com um conjunto completo
de informações, denominado de genoma. Na espécie humana, os dois geno-
mas herdados chegam a atingir 1 m de comprimento, com uma quantidade de
3 x 109 nucleotídeos, que podem ser representados por meio de um alfabeto
de quatro letras, as iniciais das denominações das bases nitrogenadas. O ge-
noma humano totalmente sequenciado comporia uma biblioteca com cerca de
1.000 livros, com 1.000 páginas cada um, escritos em fonte 12;
• As fitas de DNA são exatamente complementares, fator determinante para
que se processe a sua replicação e para que ele funcione como armaze-
nador da informação hereditária;
16 PORTO, V. B.

• O processo de replicação do DNA é dito semiconservativo, porque as fi-


tas que servem de base para a síntese das fitas complementares, isto é,
as fitas-mãe conservar-se-ão inalteradas nas novas fitas replicadas. Cada
uma das duas novas fitas passa a possuir uma das fitas-mãe, ou seja, cada
nova molécula conserva a metade da estrutura da molécula original;
• O aparato enzimático que envolve a replicação do DNA é muito complexo,
sendo um indicador de que, nos primórdios da vida, outros sistemas mole-
culares mais simples foram os transportadores das informações hereditá-
rias; entre elas, inclui-se o RNA ou mesmo os precursores do RNA;

Saiba mais
Sistemas moleculares
“Quanto aos ácidos nucléicos, o DNA, embora armazene a informação genética, não é
capaz de se replicar com cada uma de suas fitas, servindo de molde para a formação
da fita complementar, sem a presença de enzimas, as quais ainda não existiam nas
condições da Terra primitiva. Restou, então, o RNA, que, além de conduzir a informa-
ção genética, também apresenta atividade catalítica, a exemplo do RNA ribossômico
de protozoário, batizado de ribozima.
A partir de muitas outras descobertas que se sucederam, o RNA foi eleito como
o polímero primordial, parecendo ter sido resolvido, definitivamente, o problema do
ovo e da galinha. Porém uma pergunta intrigou os cientistas nos finais dos anos 80:
poderia o RNA, com todos os seus componentes, ser sintetizado em condições primi-
tivas, numa velocidade maior do que a sua velocidade de decomposição por radiação
ultravioleta, por hidrólise ou por reações com outras moléculas do ambiente? A res-
posta é não. Supõe-se, hoje, que o polímero primordial seja composto de substâncias
primitivas análogas ao RNA”, (PORTO e BONILLA, 2001)

• Qualquer que fosse a molécula transportadora da informação hereditária,


ela foi submetida a erros na sua replicação, que resultaram em novidades
evolutivas, ou seja, no aparecimento de novos caracteres, os quais se con-
figuram como as mutações;
20
Replicação do DNA:
o genoma deve ser • As mutações protagonizaram a história de ancestralidade e de descen-
copiado, com fidelidade dência, denominada filogenia, expressa na diversidade de seres vivos;
infalível, a cada divisão
celular, para que a • Embora a replicação do DNA20 esteja protegida por um sofisticado meca-
informação genética nismo de reparo bem estudado em Biologia Molecular, quando as falhas se
possa ser transmitida com
precisão às células-filhas. tornam permanentes, elas viram mutações;
O DNA, organizado em • As mutações são incorporadas ao material genético quando selecionadas
dupla fita, revelou-se como
estrutura própria para pelo meio. Elas produzem caracteres, novas condições nas estruturas, as
cumprir essa função, e a apomorfias, que são produzidas pela variação das características ances-
esse processo denomina-se
trais. Os caracteres que variaram, ou seja, os aspectos das características
replicação.
que foram modificados nas estruturas precedentes, são as plesiomorfias;
Genética 17

• Ao longo do tempo geológico, episódios de especiação foram ocorrendo


21
O prefixo “apo” quer dizer
"longe de", no sentido
por conta dessas mudanças. Esses episódios ficaram conhecidos como de que as modificações
apomorfias. As apomorfias21, ao surgirem numa espécie ancestral, passa- estruturais estão longe do
ram para toda a sua descendência. O resultado desse encadeamento de ancestral, isto é, pertencem
à descendência, incluindo o
transformações, advindo do aparecimento de novidades evolutivas, foi a ancestral comum, no qual a
diversidade biológica, condicionando a evolução; modificação ocorreu. Já o
prefixo “plesion” quer dizer
• As mutações, que podem ser referidas como responsáveis pelo surgimento "próximo de", no sentido de
dos caracteres, são condicionadas, nas respectivas estruturas por produ- proximidade do ancestral,
tos gênicos. A ação dos genes inicia pela transcrição do RNA e é seguida isto é, são as estruturas que
pertencem à ancestralidade
pela sua tradução em proteínas. Quando incluímos, nesse contexto, a repli- e que resultaram em
cação do DNA, estamos diante do dogma central22 da Biologia Molecular; apomorfia.

• Existem três tipos principais de moléculas de RNA23 que podem ser trans-
critas a partir do DNA. São elas: a) o RNA mensageiro (RNAm ou mRNA),
envolvido na tradução das proteínas; b) o RNA ribossomal (RNAr ou rRNA), O dogma central da
22

Biologia Molecular é o
o qual forma a estrutura dos ribossomos; e c) o RNA transportador (RNAt esquema que representa
ou tRNA), que leva os aminoácidos para serem incorporados à proteína; os processos de replicação
do DNA, de transcrição do
• O RNA, em bactérias, atua de forma direta, já que é produzido no cito- DNA em RNA e de tradução
plasma, com os ribossomos, ligando-se à sua extremidade 5’, em que tem do RNA em proteínas.
início o processamento da síntese protéica;
• Nos organismos eucariontes, embora a forma de transcrever o RNA seja
similar a dos procariontes, o RNA é processado antes de ser usado na
tradução, o que difere muito da forma como o RNA atua em bactérias.
Nos eucariontes, como o DNA encontra-se segregado no núcleo, então,
o RNA é produzido naquele compartimento da célula. Entretanto, para
deixá-lo, passando pelos poros nucleares em direção ao citoplasma, o
transcrito primário é processado em várias etapas. No caso do RNAm,
são duas as etapas de processamento: formação da sequência líder e
poliadenilação do RNA; 23
O RNA é bem menor que
o DNA, pois, enquanto este
• Os genes de eucariontes são interrompidos por sequências não codifican- carrega a informação para
tes, os íntrons, observados em RNAm, que, por sua vez, são inconfundíveis miríades de proteínas, por
por possuírem a sequência líder e a cauda poli-A. O RNAm encurta como meio dos seus genes, o
RNA, presente nos seres
consequência da remoção dos íntrons. E apenas cerca de apenas 5% do eucariontes, carrega a
RNAm transcrito no núcleo chega ao citoplasma, são os éxons; informação de apenas um
gene. Já nos procariontes,
• Desta forma, o procedimento de remoção dos íntrons foi denominado de a informação de um único
splicing do RNA. O resultado é a produção de uma molécula de RNAm RNA poderá conter a
funcional, muito menor que o transcrito primário24, a qual está pronta para informação presente em
vários genes adjacentes.
traduzir proteínas no citoplasma;
• A tradução de proteínas se faz pela decodificação do código genético25, o
qual é constituído de uma sequência linear de três bases nitrogenadas do
RNAm, o códon;
18 PORTO, V. B.

24
Transcrito primário: • Os códons, no ribossomo, são capazes de interagir com outra sequência
molécula de pré-RNAm, complementar, o anticódon, presente no RNAt. Dessa interação, um ami-
recém transcrita, que ainda
não foi processada por noácido é elongado na proteína por uma ligação peptídica26, que o liga à
splicing. cadeia polipeptídica em formação;
25
Código genético: • A proteína estará totalmente formada quando o ribossomo encontrar um
sequência de três bases dos códons de terminação previstos no código genético;
nitrogenadas no RNAm,
denominada códon, capaz • As proteínas, como produtos gênicos, podem compor os próprios carac-
de traduzir em aminoácido teres, como um tendão composto da proteína colágeno; ou, então, podem
na proteína. O código
exercer uma série de atividades para a expressão desses caracteres, como
genético é dito degenerado,
embora esse termo seja o transporte de substâncias; ou ainda, elas podem agir na catalisação das
pejorativo. Seu significado reações químicas que resultem em caracteres, dando-se o nome de enzi-
para o código genético está
longe do seu significado
mas às proteínas que agem dessa forma.
usual e quer dizer que Por sua vez, sabe-se que os genes fazem parte da molécula do DNA, es-
existe mais de um códon
que pode traduzir um
tando eles contidos numa estrutura bioquímica denominada cromatina, formada
mesmo aminoácido. por filamentos distribuídos como um retículo, que se coram no núcleo, durante a
vida normal da célula, naquele intervalo que precede a divisão celular.
26
Ligação Peptídica: é a
ligação química que é Portanto, do nível molecular chegamos ao nível celular, palmilhando
feita entre um aminoácido as bases que permitem compreender os mecanismos de transmissão da
e outro que se sucede na
proteína. informação hereditária.
Examinando-se agora o contexto celular, é possível verificar que to-
das as células de um indivíduo multicelular carregam a mesma informação
genética, presente no núcleo na forma de cromatina, que foi obtida a partir
da célula-ovo, por meio do processo mitótico de divisão celular. Assim sen-
do, o DNA deve se replicar de forma precisa, fato que acontece incontáveis
vezes no desenvolvimento de indivíduos complexos, como o homem, já que,
em determinadas fases de sua vida, ele contém trilhões de células, muitas
das quais se renovam continuamente.
No sítio celular, é durante a divisão celular que a cromatina se condensa
em corpos que também podem ser corados, denominados de cromossomos,
os quais são resultantes da espiralização27 contínua de uma única molécula
27
Na espiralização do DNA,
de DNA, a qual se associa, nas células eucarióticas, a proteínas básicas, de-
a unidade de dobramento
é o nucleossomo, nominadas histonas, obedecendo a uma dinâmica de contínua espiralização,
representado por intervalos cujo resultado é o aparecimento daquela estrutura, o cromossomo. A figura 2
moleculares de 200nm,
que se espiralizam sobre
nos mostra como acontece o processamento do DNA em cromossomos.
histonas, denotando Concluindo, pode-se assegurar que os cromossomos contêm os ge-
o primeiro nível de
espiralização da molécula
nes, sendo por esse motivo, importantes estruturas a se considerar no estu-
de DNA. Para mais do da genética. A Teoria Cromossômica da Herança reúne todos esses fatos
detalhes, consulte o numa explicação convincente acerca dos mecanismos de transmissão das
compêndio de Biologia
Molecular. informações hereditárias.
Genética 19

Figura 2 – Empacotamento do DNA, no processo de divisão celular, denotando a


unidade estrutural de dobramento, o nucleossomo. O corpo que finalmente se forma
e aparece corado na divisão celular é o cromossomo. (PURVES, 2002)

4. A teoria cromossômica da herança


A Teoria Cromossômica da Herança é aquela cujas inferências se baseiam nos
cromossomos como o continente dos genes. Enfatiza-se que os
28

cromossomos homólogos
Durante a divisão celular, os cromossomos podem ser distribuídos existem aos pares nas
igualmente para células-filhas; desta forma, temos o processo mitótico de células somáticas e no
divisão celular, no qual os dois genomas recebidos dos progenitores perma- plasma germinativo –
antes da formação dos
necem inalterados. gametas. Eles carregam o
De outra forma, pode acontecer o processo meiótico de divisão celular, mesmo tipo de informação
para a expressão de
quando a disjunção dos pares de cromossomos homólogos resulta na forma- características, que variam
ção de novos genomas, segregando-se um membro de cada par daqueles cro- se o par alelo expressar
outra condição para a
mossomos, para formar cada gameta, que não terá genoma nem igual ao do pai
mesma característica. Os
nem igual ao da mãe, mas será o resultado da recombinação de ambos. cromossomos homólogos
se pareiam durante a
Os cromossomos homólogos são aqueles que carregam informações
meiose, separando-se em
para expressarem as mesmas características, podendo haver variação nos ca- gametas diferentes, o que
racteres, já que os genes ocupantes de mesmas posições relativas nos pares explica, convincentemente,
o princípio da segregação
de cromossomos homólogos28 podem ser iguais ou diferentes, sendo as dife- dos fatores mendelianos.
renças o resultado das mutações. Portanto, reconhecer como se processa a
formação dos gametas é essencial para que se compreenda a referida teoria.
20 PORTO, V. B.

Sabe-se que a célula atravessa um ciclo de vida denominado de ciclo


celular, o qual compreende a interfase, fase na qual a célula realiza o seu meta-
bolismo próprio e se prepara para a divisão celular; seguida da fase de divisão,
a mitose, que compreende a divisão nuclear seguida da citocinese29. Assim sen-
do, duas células-filhas se formam a partir da divisão de uma célula-mãe, come-
çando novamente a interfase, dando continuidade ao ciclo celular.
A citocinese corresponde
29
A figura 3 nos apresenta o ciclo celular, enfatizando o destino de um
à divisão do citoplasma,
enquanto a cariocinese cromossomo parental único de uma célula eucariótica, que é exibido na forma
corresponde à divisão do condensada, para que se compreenda o processamento de sua distribuição
núcleo. pelas células-filhas. Essa visão de cromossomo condensado só acontece du-
rante a divisão celular.

Figura 3 – O ciclo celular. (LODISH et al., 2002)

A mitose proporciona a formação do corpo de um indivíduo a partir de uma


célula-ovo gerada pela fecundação de dois gametas: um masculino e um femini-
no, que foram produzidos pelos organismos parentais do novo ser em formação.
Os gametas, por sua vez, foram produzidos pelo processo denominado
gametogênese, que acontece no plasma germinativo dos organismos paren-
30
As gônadas são as tais, situados nas suas gônadas30. Naquele lócus, inicialmente, as células se
estruturas do aparelho dividem por mitose, porém o processamento final de formação dos game-
reprodutor animal, em que
tas se dá por meiose. A meiose é um tipo de divisão especial, na qual os
são produzidos os gametas.
As gônadas masculinas são cromossomos são reduzidos à metade, pela separação dos cromossomos
os testículos, enquanto as homólogos, que, novamente, juntar-se-ão durante a fecundação, quando da
femininas são os ovários.
formação da célula-ovo.
Genética 21

A figura 4 nos permite comparar a meiose com a mitose, observando-se


que a meiose se processa por duas divisões sucessivas: a primeira é reducional e
se dá pela segregação dos pares de cromossomos homólogos nas células-filhas
geradas, as quais passarão a possuir a metade dos cromossomos das células
originais, embora estejam ainda duplicados; e a segunda é equacional, onde
acontece a separação das cromátides-irmãs, gerando novos cromossomos.

Figura 4 – Comparação da meiose com a mitose. (ALBERTS et al., 2002)

Divisão análoga à mitose ocorre nos organismos que se reproduzem


assexuadamente, em que um único organismo dá origem à sua descen-
dência pelo processo de divisão celular, conservando a mesma constituição
genética do organismo parental.
A meiose ocorre nos organismos que se reproduzem sexuadamen-
te, observando-se, nesses organismos, a recombinação genética que gera
22 PORTO, V. B.

Os genes pareados nos


31
variabilidade genética, decorrente da separação dos cromossomos homó-
cromossomos homólogos,
ou seja, aqueles que
logos31 durante a divisão meiótica. A variabilidade é, ainda, aumentada pelo
ocupam as mesmas entrecruzamento de cromátides32, quando do pareamento dos cromosso-
posições relativas, são ditos mos homólogos durante a divisão reducional.
genes alelos.
A posição ocupada pelos Desta forma, há troca de fragmentos entre cromátides-não-irmãs, que
genes é o lócus gênico, pertencem a cromossomos homólogos diferentes, gerando cromossomos-
cujo plural é loci.
Portanto, os genes alelos -filhos diversos, mesmo os que resultam da disjunção das cromátides-irmãs,
ocupam os mesmos loci por elas estarem recombinadas. Essa troca denomina-se permutação ou
gênicos nos pares de crossing-over (Figuras 4 e 5).
cromossomos homólogos.

O cromossomo duplicado
32

é formado por duas


moléculas idênticas unidas
num local denominado
centrômero. Cada molécula
é chamada de cromátide.
A sobreposição de uma
cromátide sobre a outra,
em pontos distinguíveis ao
microscópio, é denominada
de quiasma.
33
Haploidia: refere-se
à portabilidade de um
único genoma pelas
células. Isso acontece nos
gametas dos organismos
que se reproduzem
sexuadamente, como
resultado da separação dos
cromossomos homólogos.
Figura 5 – Entrecruzamento de um par de cromossomos homólogos, evidenciando a
34
Diploidia: refere-se à troca de fragmentos entre cromátides-não-irmãs, formando cromátides recombinantes
portabilidade de dois (PURVES, 2001)
genomas pelas células.
Isso acontece como A meiose pode ocorrer tanto em organismos de constituição haploide33
resultado da fecundação, quanto em organismos de constituição diploide34, manifestando-se nos diver-
quando os gametas se
unem com a célula-ovo, sos ciclos de vida dos seres vivos que se reproduzem sexuadamente.
resultante dessa união. Os ciclos de vida podem ser:
Portando, assim, dois
genomas, um do pai e outro • Haplôntico: presente nos organismos de constituição haploide, como de-
da mãe, apresentando, terminados fungos, cujo único estágio diploide é o zigoto. Nesses organis-
portanto, pares de
cromossomos homólogos. mos, a meiose é dita zigótica porque ocorre no zigoto;
• Com alternância de gerações: comum em plantas que apresentam um es-
tágio de vida haploide. O gametófito produz gametas, alternando com um
estágio diplóide, o qual é resultante da fecundação desses gametas. Em se-
guida, ocorre o do desenvolvimento do esporófito, em que há a meiose e em
que os esporos haploides são produzidos, voltando a gerar os gametófitos;
Genética 23

• Diplôntico: presente em metazoários, cujo estágio duradouro é o diploide,


que produz, por meiose, seus gametas, o qual é o único estágio de vida
haploide destes organismos.
Os ciclos de vida se apresentam esquematizados na figura 6, conforme
Purves et al. (2002).

Figura 6 – Ciclo de vida dos seres vivos que se reproduzem sexuadamente: à esquer-
da, vê-se o ciclo de vida haplôntico; ao centro, observa-se a alternância de gerações;
à direita, verifica-se o ciclo de vida diplôntico. (PURVES et al., 2001)

Síntese do Capítulo
Este capítulo tratou de aspectos históricos. Aqui, foram apresentados, de for-
ma sucinta, os principais acontecimentos que deram impulso à produção do
conhecimento em Genética e das bases moleculares em que se assenta a
Genética. Quanto às bases da biologia molecular sobre as quais a Genética
está assentada, elas foram expostas para permitir uma visão geral da estrutu-
ra do gene, unidade transportadora da informação hereditária.
24 PORTO, V. B.

Essa visão mostrou como o gene está estruturado no DNA e como ele
se replica para passar adiante a informação genética. No processo de repli-
cação, vimos, inclusive, que o DNA está sujeito a erros, os quais podem vir a
tornarem-se mutações.
Ainda foi tratado, neste capítulo, sobre forma como o gene age na
transmissão dos caracteres hereditários, que são passados pela interação
do DNA, sendo, posteriormente, transcritos em RNA, o qual, por sua vez, é
traduzido em proteínas, que, pelas suas qualidades, condicionarão as estru-
turas, impondo-lhes suas características. Esse é o dogma central da Biolo-
gia Molecular, que foge ao escopo deste trabalho e que, por isso, não são
aprofundados.
Finalizando o capítulo, abordou-se a Teoria Cromossômica da Herança,
a qual se baseia na presença dos genes nos cromossomos, sendo o processo
meiótico fundamental para a compreensão da forma como os gametas são
produzidos e manifestados nos diversos ciclos de vida dos seres vivos.

Atividades de avaliação
1. Como está estruturado o DNA?
2. Por que a replicação do DNA é semiconservativa?
3. Caso você conheça a sequência de bases de uma fita de DNA, é possível
conhecer a outra? Exemplifique.
4. O que significa o termo “dogma central” para a biologia molecular?
5. Quais são os tipos de RNA e quais suas funções?
6. Quais as similaridades e as diferenças entre os processos de replicação do
DNA e de transcrição do RNA?
7. Por que seria mais adequado denominar o código genético de redundante
em vez de degenerado?
8. Como se processa o splicing do RNAm?
9. Como estão estruturadas as proteínas? Descreva suas unidades constituintes.
10. De que consiste a Teoria Cromossômica da Herança?
11. O que são pares de cromossomos homólogos e como se dá a sua distri-
buição entre os gametas?
12. Como acontece o ciclo celular?
13. Descreva o processo de divisão mitótico comparando-o com o processo
de divisão meiótico.
14. Quantos genomas possuem uma célula haploide? E uma célula diploide?
Justifique sua resposta.
Genética 25

15. De que consiste a permutação ou crossing-over?


16. Descreva os ciclos de vida encontrados na maioria dos seres vivos.
17. É certo afirmar que os genes são os fatores mendelianos?
18. Construindo o meu portifólio: faça o seu diário reflexivo a partir das dis-
cussões realizadas no decorrer da disciplina, registrando os aspectos que
levem você a agir de forma crítica e reflexiva. Junte, ao presente diário, os
que serão produzidos nos próximos capítulos. Assim, seu portfólio será ali-
mentado com os diários produzidos após cada capítulo deste livro.

Leituras, filmes e sites


Livros
WATSON, J. D. DNA: o segredo da vida. São Paulo: Companhia das Letras,
2005. 472 p. “Desde que a estrutura da molécula do DNA foi identificada,
há pouco mais de cinquenta anos, a biologia moderna passou por grandes
transformações. O cientista James D. Watson, ao lado de James Crick, foi
um dos responsáveis pela descoberta da dupla hélice, e viveu essa revolu-
ção na condição de protagonista. Em DNA: o segredo da vida, ele resume
os principais acontecimentos que marcaram a biologia, desde os experi-
mentos pioneiros de Mendel e da busca pela eugenia até as pesquisas mais
recentes sobre o funcionamento da molécula de DNA e a intervenção ge-
nética. O livro também mostra como a interferência no genoma de outros
organismos abre as portas não só para a biotecnologia e para o advento dos
transgênicos, mas também para a terapia gênica e a medicina do futuro. Em
linguagem simples e com dezenas de fotos e esquemas ilustrativos, Watson
apresenta os principais personagens dessa história, aponta as perspectivas
que podemos esperar do estudo do DNA e discute suas implicações éticas”
(texto de apresentação do livro pela Livraria Colombo).
DAWKINS, R. O gene egoísta. São Paulo: Companhia das Letras, 2007. 544
p. “O gene egoísta foi publicado em 1976. Propunha-se a condensar o enor-
me corpo teórico já produzido para compreender como espécies surgem e se
diversificam, como indivíduos se relacionam e colaboram entre si - e a ir além.
Nesse livro, Richard Dawkins inovou de muitas maneiras. Ele introduziu uma
linguagem informal e metafórica numa área dominada por reflexões densas e
por fórmulas matemáticas, e subverteu a percepção intuitiva da importância
dos organismos e dos grupos: o gene é quem comanda, quem busca perpe-
tuar-se. Em sua obra, Dawkins trata os organismos como máquinas de so-
brevivência construídas pelos genes, num processo competitivo de construir
26 PORTO, V. B.

a máquina mais eficaz. E a influência dos genes não para aí. Os organismos
interagem entre si e com o mundo inanimado, e assim alteram seu ambiente e
promovem a propagação de genes presentes em outros corpos. O gene ego-
ísta é, sem dúvidas, um dos livros mais aclamados da história da divulgação
científica”. (texto de apresentação do livro pela Livraria Colombo)

Sites
http://www.nature.com/nmeth/journal/vaop/ncurrent/abs/nmeth.1424.html
Este site apresenta o artigo do Professor Francisco Linhares Arruda Ferreira
Gomes sobre células-tronco, publicado na revista Nature Methods.
http://www.ircm.qc.ca/en/nouvelles/statique/nouvelle256.html
É um site do instituto de pesquisa IRCM, que apresenta comentários sobre o
artigo do Professor Francisco Linhares Arruda Ferreira Gomes sobre células-
-tronco, publicado na revista Nature Methods.

Referências
ALBERTS, B.; BRAY, D.; LEWIS, J.; RAFF, M.; ROBERTS, K.; WATSON, J. D.
Fundamentos da biologia celular: uma introdução à biologia molecular da cé-
lula. Tradução Carlos Termignoni et al. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2002. 760 p.
AMABIS, J. M.; MARTHO, G. R. Biologia das populações: genética, evolu-
ção biológica e ecologia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2006. 443 p.
AMORIM, D. S. Fundamentos de sistemática filogenética. Ribeirão Preto:
Holos, 2002. 156 p.
BONILLA, O. H. PORTO, V. B. Vida e Ambiente. Fortaleza: Edições Demócri-
to Rocha e Editora da UECE, 2001, 113 p.
CAPRA, F. A Teia da Vida: uma nova compreensão científica dos sistemas
vivos. São Paulo: Editora Cultrix, 1995, 256 p.
COHEN, A. R.; GOMES, F. L. A. F.; ROYSAM, B.; CAYOUETTE, M. Computatio-
nal prediction of neural progenitor cell fates. Disponível em: <http://www.nature.com/
nmeth/journal/vaop/ncurrent/abs/nmeth.1424.html>. Acesso em: 31 mai. 2010.
CURTIS, H. Biologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1977. 964 p.
GARDNER, E. J.; SNUSTAD, D. P. Genética. 7. ed. Rio de Janeiro: Guana-
bara Koogan, 1986, 497 p.
LODISH, B.; LIPURSKY, M.; BALTIMORE, D. Biologia Celular e Molecular.
4. ed. Rio de Janeiro: Revinter, 2002. 1084 p.
PURVES, W. K.; SADAVA, D.; ORIANS, G. H.; HELLER, H. C. Vida:
a ciência da biologia. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2002. 1126 p.
Capítulo 2
Monoibridismo
(1 Lei de Mendel)
a
Genética 29

Objetivos
• Aplicar as Leis de Mendel ao conhecimento de Genética;
• Reconhecer as diversas formas de interação entre os genes;
• Identificar grupos de ligação e construir mapas genéticos;
• Verificar como a herança está relacionada ao sexo.

35
Intuição e
1. O trabalho de Mendel conhecimento:
intuir é agir com
A genética é uma ciência de potenciais. Trata da transferência de informa- subjetividade, ou seja, é
ção biológica de célula para célula, de pais para filhos e, assim, de gera- colocar em funcionamento
a imaginação criativa.
ção para geração. Os geneticistas preocupam-se com as formas e com
A imaginação criativa
as razões dessas transferências, que são a base para certas diferenças e integrada ao conhecimento
semelhanças reconhecidas nos grupos de organismos. Muito antes de os corresponde a uma
seres humanos começarem a admirar-se com relação aos mecanismos interação sinérgica, isto
é, de efeitos multiplicados
genéticos, esses mecanismos, efetivamente, já operavam na natureza.
para produzir o novo
Gregor Mendel (l822-1884) é apropriadamente considerado "o pai da Ge- conhecimento.
nética". Seus experimentos com ervilhas de jardim (Písum satívum), publi-
cados em 1866, foram realizados em um espaço limitado, em um jardim de
36
Segregação:
separação em sítios
um mosteiro. As conclusões tiradas de sua interessante investigação cons- distintos. No caso dos
tituem o fundamento da Genética atual (GARDNER e SNUSTAD, 1986). fatores mendelianos,
corresponde à sua
A genética mendeliana abriu o caminho para as investigações sobre he- separação nos gametas.
reditariedade, estando fundamentada na Teoria Cromossômica da Herança? 37
Fatores:
A 1 Lei de Mendel explica como um par de genes alelos expressa o
a na concepção de Mendel,
seu fenótipo? A intuição35 de Mendel não falhou no momento de escolher o seriam as unidades
transportadoras da
organismo que serviria de base para suas experimentações, no caso, usan- informação hereditária. Eles
do a Písum satívum, ou ervilha de jardim. corresponderiam aos genes
atuais, conforme foi visto no
Alguns aspectos da ervilha favoreceram Mendel na formulação do racio- capítulo anterior.
cínio, que o levou a propor as leis da segregação36 dos fatores37 hereditários:
• A planta apresentava ciclo relativamente curto, no caso anual;
• Os caracteres escolhidos por Mendel, para a realização de suas observações,
eram bem definidos, condicionando estruturas facilmente reconhecíveis;
• A planta podia ser cultivada e cruzada com facilidade (Figura 7);
30 PORTO, V. B.

Figura 7 – Forma de cultivo realizado por Mendel.


• Os órgãos reprodutores apresentam flores perfeitas38, que realizam a auto-
São flores dotadas
38
fertilização. No entanto, dificilmente, uma flor polinizava outra flor (Figura 8);
da capacidade de
autofertilização. É o caso
das flores de ervilha.

Figura 8 – Flor de ervilha hermafrodita39, em que ocorre autofertilização.


40
Quando o órgão • Embora o pólen de uma flor raramente fertilize a outra flor, ele pode ser
reprodutor masculino e
o feminino se localizam experimentalmente introduzido no estigma dessa outra flor, realizando-se
na mesma estrutura a polinização cruzada. As anteras das flores que produziriam as sementes
organísmica, ela é dita seriam removida, para que se evitasse a autofertlização, ocorrência que
hermafrodita. Outra
denominação pertinente comprometeria o experimento (Figura 9);
seria a de flores monoicas,
para as flores de ervilha,
por possuírem numa única
flor aparelho reprodutor
masculino e feminino.

Figura 9 – Na polinização cruzada, usa-se o pincel para transferir o pólen de uma


flor para outra e remove-se as anteras da flor produtora de sementes para não ocor-
rer a autofertilização.
Genética 31

• A ervilha é uma planta diploide, com apenas dois grupos de cromossomos; 40


Na realização dos
seus experimentos,
• As características expressavam variações contrastantes, que podiam ser Mendel escolheu sete
claramente distinguidas, com um caráter dominando o outro. Portanto, a características, a partir
alteração de um estado apresentado pela característica era percebido com das quais averiguou como
se expressavam os seus
facilidade. estados ou caracteres
Mendel40, para prosseguir com a sua experimentação, obteve, primeira- (variações distinguíveis de
determinada característica)
mente, linhagens puras, pelo cultivo de muitas gerações autofertilizadas, cujos nas estruturas observadas:
resultados expressavam sempre as mesmas variações das características.
Característica Estado
Durante o seu trabalho, Mendel usou sua intuição no momento de ex-
Alta
perimentar, realizando cruzamentos entre indivíduos que diferiam em apenas Altura da haste
Anã
uma característica a ser observada. Nem sempre isso foi possível, porém ele Verde
procurou observar uma característica de cada vez quando obtinha linhagens Cor da vagem
Amarela
com mais de uma característica contrastante. Intumescido
Aspecto da vagem
Constrito

2. A segregação dos fatores – Monoibridismo (1 Lei) a


Posição das flores
Axial
Terminal
Durante os seus experimentos, ao observar o cruzamento entre plantas al- Amarela
Cor da semente
tas e anãs, ambas puras, Mendel verificou que, na 1a geração da descen- Verde
dência, prevalecia o caráter planta alta, desaparecendo a variação planta Aspecto da semente
Liso

anã. Quanto à geração cruzada, Mendel denominou-a de geração parental, Rugoso


púrpura
ou seja, geração P. A primeira geração obtida foi denominada por Mendel de Cor das flores
branca
geração F-1, onde ocorreria a autofertilização.
Tipo de cruzamento no
41
O resultado da autofertilização foi a produção de uma 2a geração, deno- qual se observa a ação
minada por Mendel de geração F-2, na qual reapareceu o estado planta anã, de um determinado fator
na proporção de 3 plantas altas para 1 anã, ou seja, 3/4 da descendência era mendeliano, isto é, de
determinado loci gênico
constituídos de plantas altas, enquanto 1/4 era constituído de plantas anãs. de um par de cromosomos
Essa conclusão se deu a partir da contagem realizada por Mendel, que obteve homólogos de cada vez.
uma F-2 de 1.064 indivíduos, entre os quais 787 eram plantas altas, enquanto Termo usado para
42

277 eram plantas anãs, uma proporção quase perfeita de 3/4 : 1/4. expressar os efeitos de
um único par de fatores na
Mendel prosseguiu com os experimentos, deixando que F-2 se autofertilizas-
herança genética.
se, obtendo uma F-3. Ele queria comprovar o que sua intuição supunha acontecer.
A hipótese de Mendel previa a presença de fatores hereditários duplica-
dos nas células. Os fatores se separariam para formar os gametas (o que cor-
responde à 1a Lei de Mendel, ou à Lei da segregação dos fatores), que, ao se
juntarem por fecundação, resultariam em indivíduos com fatores duplicados.
Entretanto, o estado de um dos fatores desapareceria em F-1, prevalecendo
somente a variação do outro fator, o qual Mendel chamou de fator dominante
(lembre-se que Mendel estava observando a expressão de um fator de cada
vez, por isso, deu-se a denominação de Monoibridismo41 ou de Herança Mono-
fatorial42 a esse procedimento).
32 PORTO, V. B.

No caso estudado, prevaleceu o caráter planta alta. Essas plantas apre-


sentavam os dois fatores em suas células, sendo que somente um se expres-
sava na descendência.
43
Outra previsão importante Ao prosseguir com o experimento, Mendel43 previu que o estado condi-
realizada por Mendel é
cionado pelo outro fator reapareceria na geração F-2, nos indivíduos em que
que os indivíduos que
expressavam o aspecto os dois fatores, estando presentes em suas células, condicionariam o reapa-
recessivo, em F-2 ou em recimento do caráter desaparecido. Quanto ao fator que necessitava estar em
qualquer geração, só
produziriam descendência dose dupla para se expressar e que reapareceu em F-2, Mendel denominou-o
expressando aquele de fator recessivo. O pesquisador foi ainda mais além, prevendo a proporcio-
aspecto, já que a pureza nalidade de 3 indivíduos expressando o caráter condicionado pelo fator domi-
dos fatores seria restaurada
em indivíduos recessivos. nante para 1 expressando a variação condicionada pelo fator recessivo. Essa
contagem revelou uma proporcionalidade quase perfeita para suas previsões.
Na geração F-2, haveria indivíduos com fatores dominantes duplicados
que eram puros para expressar o aspecto condicionado pelo fator dominante,
perfazendo 1/4 dos indivíduos, os quais eram indistinguíveis dos indivíduos
com fatores híbridos, um dominante em relação ao outro. Esses indivíduos
deveriam compor 2/4 da descendência, enquanto o outro 1/4 restante seria
de indivíduos que portavam os fatores recessivos duplicados, expressando,
obrigatoriamente, o aspecto condicionado pelo fator recessivo.
Ao deixar as plantas se autofertilizarem para produzir F-3, Mendel es-
peraria seis oportunidades de expressão dos caracteres condicionados pelos
fatores. De acordo com Mendes, 1/6 dos indivíduos seriam puros dominantes,
Indivíduos puros são
44
resultantes do cruzamento de indivíduos puros44 dominantes de F-2. Os indi-
aqueles que apresentam
genótipos homozigotos.
víduos híbridos45 de F-2 produziriam também 1/6 de indivíduos puros domi-
nantes e 2/6 de indivíduos híbridos, também dominantes, enquanto 1/6 seria
45
São os indivíduos constituído de indivíduos puros recessivos. Os indivíduos recessivos de F-2
produzidos pelo
cruzamento de puros cruzados entre si seriam responsáveis por 1/6 da descendência F-3, apre-
dominantes com puros sentando o aspecto condicionado pelo fator recessivo. Portanto, 4/6 da pro-
recessivos e apresentam gênie, ou seja, 2/3 seriam de indivíduos com estado condicionado pelo fator
genótipos heretozigotos.
dominante, e 2/6, ou seja, 1/3, expressaria a variação condicionada pelo fator
recessivo. A realidade foi favorável às previsões de Mendel, que verificou,
em F-3, 2/3 de plantas altas, enquanto 1/3 era constituído de plantas anãs.
Mendel observou também que a descendência resultante da autofertilização
de plantas anãs era constituído somente de plantas anãs. A segregação dos
fatores nos gametas, isto é, a 1a Lei de Mendel estava, então, confirmada.
Posteriormente, Mendel partiu para a observação do comportamento de
outras características, realizando cruzamentos nos quais considerava uma carac-
terística de cada vez, para consolidar as regras do monoibridismo. Mendel obteve
os mesmos resultados quando os comparou com aqueles obtidos no cruzamen-
to, em que levou em conta a característica altura das plantas (Quadro 1).
Genética 33

Quadro 1
RESULTADOS OBTIDOS POR MENDEL NO CRUZAMENTO REALIZADO
Cruzamento (Dominante X Recessivo) Dominante Recessivo Total Razão
Planta Alta x Planta Anã 787 277 1.064 2,84:1
Vagem Verde x Vagem Amarela 428 152 580 2,82:1
Vagem Intumescida x Vagem Constrita 882 299 1.181 2,95:1
Flor Axial x Flor Terminal 651 207 858 3,14:1
Semente Amarela x Semente Verde 6.022 2.001 8.023 3,01:1
Semente Lisa x Semente Rugosa 5.474 1.850 7.324 2,96:1
Flor Púrpura x Flor Branca 705 224 929 3,15:1

3. Termos e símbolos
Mendel e seus sucessores criaram uma linguagem de termos e de símbolos
cujas convenções facilitam sobremaneira a compreensão do conhecimento
em Genética.
Como vimos no capítulo anterior, as unidades transmissoras da infor-
mação hereditária estão nos cromossomos: são os genes, os quais corres-
ponderiam, de modo generalizado, aos fatores mendelianos.
O genótipo é a representação por letras dos genes. O gene dominante
é representado por letra maiúscula, enquanto o gene recessivo é represen-
tado por letra minúscula e serve de base para escolha da letra denotativa
do genótipo. Como os genes existem aos pares em indivíduos diploides, o
genótipo desses indivíduos é formado por pares de letras.
O genótipo homozigoto é aquele formado por dois genes dominantes,
representados por duas letras maiúsculas, ou por dois genes recessivos,
representados por duas letras minúsculas. Por sua vez, o genótipo hetero-
zigoto é aquele que apresenta um gene dominante e um gene recessivo,
constituído em indivíduos híbridos, cujos genótipos são representados por
uma letra maiúscula e por uma letra minúscula.
Ao local ocupado pelo gene no cromossomo, denomina-se de lócus 46
Observe que os
fenótipos recessivos
gênico, cujo plural é loci. Genes alelos estão lado a lado, condicionando a
sempre podem ter os seus
expressão das mesmas características nos indivíduos; portanto, ocupam os genótipos identificados,
mesmos loci gênicos. já que são puros, ou
seja, homozigotos. Já os
O fenótipo corresponde à expressão do genótipo. É a variação (ou es- fenótipos dominantes, que
tado) da característica, ou seja, o caráter, que é observado em determinada apresentam genótipos
dominantes, os quais
estrutura de um indivíduo. Os genótipos dominantes, que podem ser homo- podem ser homozigotos ou
zigotos ou heterozigotos, expressam fenótipos dominantes; portanto, não po- heterozigotos, necessitam
dem ser distinguidos a partir do fenótipo. Os genótipos recessivos só podem da aplicação da técnica
do retrocruzamento ou
ser homozigotos; portanto, a observação de um fenótipo recessivo46 permite do cruzamento-teste para
que se assegure, com certeza, qual é o genótipo do indivíduo que o porta. serem identificados.
34 PORTO, V. B.

A geração parental, ou seja, a geração P, é aquela em que os indivídu-


os são homozigotos, porém apresentam fenótipos diferentes, sendo cruzados
entre si para se obter uma 1a geração de indivíduos híbridos, ou seja, de indiví-
duos heterozigotos. Essa geração é denominada de F-1. Os indivíduos de F-1
cruzados entre si produzem uma F-2; os de F-2, uma F-3; e assim por diante.
O retrocruzamento é aquele realizado com um indivíduo parental re-
cessivo com a finalidade de determinar o genótipo portado pelo outro par
do cruzamento, que poderá ser ou homozigoto dominante ou heterozigoto.
Caso os indivíduos parentais homozigotos recessivos não estejam disponí-
veis para o cruzamento, pode-se utilizar qualquer outro indivíduo que apre-
sente o fenótipo recessivo. Neste caso, o cruzamento será denominado de
cruzamento-teste, e não de retrocruzamento.
Os gametas são representados por letras circuladas, enquanto que, para se
realizar os cruzamentos monoíbridos, usa-se o artifício do quadrado de Punnett47.
R. C. Punnett (1875
47
Exemplificaremos o uso da simbologia e da terminologia ora apresen-
– 1967) foi um dos
colaboradores de Batenson tadas, aplicando-as ao experimento de Mendel referente ao cruzamento de
e o inventor do quadrado plantas altas com plantas anãs.
de Punnett, artifício muito
usado nos cruzamentos em O primeiro cruzamento realizado por Mendel foi entre plantas altas e plan-
Genética. tas anãs. Os genótipos dessas plantas foram representados pela letra “d”, de
down, que significa, em inglês, baixo, ou seja, anão, indicando o fenótipo reces-
sivo. O cruzamento entre plantas altas e anãs é apresentado desta forma:

Quadrado de Punnett
Genética 35

Genótipos de F-2 – 1/4 DD : 2/4 Dd : 1/4 dd


Fenótipos de F-2 – 3/4 plantas altas : 1/4 plantas baixas (anãs)
O cruzamento monoíbrido de Mendel apresenta os seus resultados su-
marizados na tabela 1.
Tabela 1
Frequência Frequência
Fenótipos Genótipos
genotípica fenotípica
DD 1
Alta 3
Dd 2
Baixa (anã) Dd 1 1

Mendel também realizou o retrocruzamento, o qual pode ser assim es-


boçado:
a) No caso do genótipo ser homozigoto dominante, o cruzamento se
comporta como um cruzamento parental:

b) No caso do genótipo dominante ser heterozigoto temos:

Quadrado de Punnett

Genótipos do Retrocruzamento – 1/2 Dd : 1/2 dd


Fenótipos do Retrocruzamento – 1/2 plantas altas:1/2 plantas baixas (anãs)
36 PORTO, V. B.

48
Os casos de
4. Modificações nas proporções do monoibridismo
codominância e de 4.1. Proporção 1 : 2 : 1
semidominância
podem ser percebidos, Em vez de 3 : 1, aparece a proporção 1 : 2 : 1 nos casos48 de codominância e
respectivamente, na de semidominância.
herança dos grupos
sanguíneos ABO e na A codominância pode ser percebida na herança de grupos sanguíneos
herança da cor de flores em no sistema ABO. Esse fenômeno acontece entre os alelos que condicionam o
boca-de-leão.
sangue do tipo A e B. Ambos os alelos produzem, respectivamente, os antíge-
nos A e B, e o tipo de sangue resultante é o AB. Quando indivíduos de sangue
AB são cruzados entre si, os fenótipos resultantes na descendência são de 1
indivíduo com sangue A : 2 com sangue AB : 1 com sangue B.
Vejamos como fica a representação simbólica do cruzamento codomi-
nante. Como o antígeno é uma imunoglobulina, chamaremos de IA o gene que
produz o antígeno A (produtor da imunoglobulina A) e, de modo semelhante,
chamaremos de IB o gene que produz o antígeno B. Vejamos que, nesses
casos, todos os genes são representados por letras maiúsculas.

Quadrado de Punnett

Genótipos de F-2 – 1/4 IAIA : 2/4 IAIB : 1/4 IBIB


Fenótipos de F-2 – 1 sangue A : 2 sangue AB : 1 sangue B
Genética 37

A semidominância ocorre quando ambos os alelos produzem, em


quantidades inferiores ao produto do alelo dominante, o seu produto gênico.
O heterozigoto expressa, então, um outro fenótipo, que é intermediário ao
expresso pelos homozigotos com genótipos diferentes para aqueles loci. É o
caso da herança da cor da flor em bocas-de-leão: enquanto um dos indivíduos
homozigotos expressa o fenótipo flores brancas, o outro expressa o fenótipo
flores vermelhas.
Quando se cruzam indivíduos que produzem flores brancas com indi-
víduos que produzem flores vermelhas, o heterozigoto descendente produz
flor rosa, fenótipo intermediário entre branco e vermelho. O cruzamento entre
dois indivíduos que expressam o fenótipo cor de rosa resulta numa proporção
descendente de 1 indivíduo expressando o fenótipo flores brancas: 2 flores
rosas : 1 flores vermelhas.
Vejamos como fica a representação simbólica do cruzamento semido-
minante. Chamaremos de B o gene que produz a cor branca nas flores e de V
o gene que produz a cor vermelha. Percebamos que, nesses casos, todos os
genes também são representados por letras maiúsculas.

Quadrado de Punnett

Genótipos de F-2 – 1/4 BB : 2/4 BV : 1/4 VV


Cores da flor em F-2 – 1 branca : 2 rosas : 1 vermelha
38 PORTO, V. B.

4.2. Proporção 2 : 1
A herança de genes letais
49
A proporção 2 : 1 aparece no caso de genes letais49. Quando esses genes se
pode ser observada em
galináceos, exemplo que
juntam no cruzamento, o indivíduo com dose dupla é inviável. Nesse caso, o
será descrito adiante. gene é chamado de letal recessivo, porque precisa acontecer em dose dupla
para produzir a inviabilidade do organismo.
No caso dos fenótipos rastejantes em galináceos, todos são heterozi-
gotos do tipo Nn (o “n” vem de normal, indicando fenótipo recessivo). Quando
dois organismos rastejantes são cruzados entre si, na descendência, são pro-
duzidos 2 fenótipos rastejantes : 1 normal.
Vejamos como fica a representação simbólica do cruzamento envol-
vendo genes letais. Chamaremos de N o gene que produz o fenótipo raste-
jante em galináceos e de n o gene que produz o fenótipo normal. Nesse caso,
não existem indivíduos com genótipo NN, já que são inviáveis.

Quadrado de Punnett

Genótipos do cruzamento com genes letais – 1/4 NN letal : 2/4 Nn : 1/4 nn,
resultando em 2/3 Nn : 1/3 nn
Fenótipos produzidos – 2 rastejantes : 1 normal

4.3. Outras proporções


A polialelia50 contribui para modificar as proporções mendelianas do monoi-
Exemplificaremos os
50

casos de polialelia com bridismo. Embora somente dois alelos possam ocupar o mesmo loci; podem
a herança de grupos existir mais de dois alelos para ocupá-los. É o caso da herança de grupos
sanguíneos no sistema
ABO e com a herança da
sanguíneos no sistema ABO. Além dos alelos produtores dos antígenos A e
cor dos pelos em coelhos. B, existe, também, o alelo que não produz nenhum antígeno. Nesse caso, ele
funciona como gene recessivo em relação aos alelos A e B.
Genética 39

Se for cruzado um indivíduo de sangue AB com outro de sangue O,


a proporção fenotípica é de 1 indivíduo de sangue A : 1 indivíduo de sangue
B; portanto, desaparecem, na descendência, os fenótipos AB e O parentais.
Representa-se o genótipo dos indivíduos com sangue do tipo O, como ii, já
que os indivíduos portadores desse tipo de sangue são recessivos em relação
aos que produzem imunoglobulina.
Façamos o cruzamento:

Quadrado de Punnett

Genótipos produzidos – 1/2 IAi : 1/2 IBi


Fenótipos correspondentes – 1 sangue A : 1 sangue B

Outro caso de polialelia acontece com a herança da cor de pelos em


coelhos51. Existem 4 quatro genes alelos que condicionam os fenótipos selva-
gem, chinchila, himalaia e albino, sendo representados, respectivamente, por
C, cch, ch e c, com a seguinte relação de dominância: C > cch > ch > c (o “c” vem
da inicial da palavra cor). 51
Polialelia em coelhos
O cruzamento entre um indivíduo selvagem heterozigoto para himalaia Quadro que apresenta os
tipos de genótipos com seus
com um indivíduo chinchila heterozigoto também para himalaia produzirá uma respectivos fenótipos:
prole de 2 selvagens : 1 chinchila : 1 himalaia. Os indivíduos são monoíbridos, Genótipos Fenótipos
entretanto a proporção fenotípica obtida é de 2 : 1 : 1, que é diferente da propor- CC, Cc , Cc e Cc
ch h
Selvagem
ção 3 : 1, a qual é esperada nos cruzamentos monoíbridos. cch cch, cchch
Chinchila
e cchc
Vejamos o cruzamento proposto:
chch e chc Himalaia
CC Albino
40 PORTO, V. B.

Quadrado de Punnett

Genótipos obtidos – 1/4 Ccch : 1/4 Cch : 1/4 cchch : 1/4 chch
Fenótipos produzidos – 2 selvagens : 1 chinchila : 1 himalaia

Síntese do Capítulo
No presente capítulo, objetivou-se aplicar as Leis de Mendel ao conhecimento
de Genética, particularmente no que se refere ao monoibridismo, quer dizer,
à 1a Lei de Mendel ou à Lei da disjunção dos fatores. Aqui, foi descrito como
Mendel realizou seu trabalho com a planta ervilha, que lhe permitiu realizar ob-
servações até chegar, com base nos dados observados, a enunciar a referida
lei. Assim sendo, a genética mendeliana abriu o caminho para as investiga-
ções sobre hereditariedade.
A 1a Lei de Mendel explica como um par de fatores mendelianos, hoje
reconhecidos como genes alelos, expressa características hereditárias, ou
seja, o seu fenótipo. Para um melhor entendimento a respeito desse conteúdo,
neste capítulo, foram introduzidos os conceitos relacionados à terminologia,
como genótipo, fenótipo, dominância, recessividade, homozigoto, heterozigo-
to, retrocruzamento ou cruzamento-teste, entre outros. Foi também explicada
a forma como a simbologia é usada, como o modo como letras são usadas
para representar os genótipos; os gametas são representados; o quadrado
de Punnet é usado etc.. Tudo isso é abordado para facilitar sua compreensão
acerca da Genética.
Por outro lado, sabe-se, pelos estudos posteriores a Mendel, que a Ge-
nética está fundamentada na Teoria Cromossômica da Herança, a qual ex-
plica as diversas formas de interação entre os genes. Assim, as proporções
encontradas nos cruzamentos de Mendel foram comprovadas com base na
formação dos gametas, que são resultantes do processo meiótico. Vimos tam-
bém que as modificações nessas proporções se justificam pela ausência de
dominância, por genes letais e por polialelia.
Genética 41

Atividades de avaliação
1. Reproduza o raciocínio matemático de Mendel, realizando o cruzamento
monoíbrido, em que é observada a característica cor da flor.
2. Sabe-se que o pelo preto em camundongos é um caráter dominante sobre
a outra variação, a de pelo branco. Quando um camundongo preto puro é
cruzado com um branco, que razão, correspondente ao fenótipo preto de
F-2, pode ser prevista como heterozigota?
3. Ao realizarmos um cruzamento-teste com um camundongo preto, cuja pro-
le é de cinco filhotes em cada uma das cinco barrigadas, nas quais todos
também nascem pretos, qual será seu provável genótipo?
4. Sabendo que o albinismo se deve à expressão de um alelo recessivo, respon-
da: do casamento entre pessoas normais, em que o marido tem mãe albina e a
esposa é filha de pais normais, qual a probabilidade de os dois primeiros filhos
serem albinos?
5. Sabendo que os grupos sanguíneos no sistema ABO são expressos por
alelos com semidominância para os grupos A e B e por um alelo recessivo
para o grupo O, qual a frequência fenotípica expressa na prole de um casal,
em que o homem B heterozigoto e a mulher é A também heterozigota?
6. A característica tamanho da asa em Drosophila se evidencia pelos ca-
racteres tamanho longo e tamanho vestigial, sendo este um fenótipo re-
cessivo em relação àquele. Realizando-se um cruzamento-teste com uma
fêmea de asas longas, obteve-se uma progênie de 38 indivíduos com asas
longas e 36 com asas vestigiais. Cruzando-se esta mesma fêmea com
seu irmão de asas vestigiais, qual a proporção genotípica e fenotípica es-
perada na progênie?
7. O gado Gir apresenta-se com pelagem vermelha e branca. Quando se cru-
za um macho vermelho com fêmeas brancas, toda a progênie é chitada
(coloração vermelha com pintas brancas). Qual a frequência genotípica e
fenotípica que se espera de um cruzamento entre dois indivíduos chitados?
8. Suponha que, na herança da cor da pelagem em camundongos, o alelo
que determina a cor amarela seja dominante e letal recessivo. As cores
marrom, preto e branco são recessivas em relação ao amarelo, sendo a
relação de dominância entre elas: A > M > P > B.
a) Faça uma tabela em que constem todos os fenótipos e genótipos possí-
veis, baseando-se na herança para a cor de pelos em coelhos;
b) Qual o resultado de um cruzamento entre um camundongo amarelo,
filho de uma mãe branca, com um marrom heterozigoto para preto?
42 PORTO, V. B.

9. A genética da cor do pelo nos coelhos é dada no item outras propor-


ções. Qual a frequência genotípica e fenotípica esperada do cruzamen-
to Ccch x cchc?
10. Explique como a herança de grupos sanguíneos do sistema ABO poderia
ser usada judicialmente, para exclusão da paternidade em casais com
dúvidas em relação ao assunto?
11. Construindo o meu portifólio: Continue o seu diário reflexivo a partir das
discussões realizadas no decorrer do presente capítulo, registrando os as-
pectos que levem você a agir de forma crítica e reflexiva. Em ato contínuo,
construa o seu portifólio, alimentando-o com os diários produzidos após
cada capítulo.
Capítulo 3
Segregação Independente
(2 Lei de Mendel)
a
Genética 45

Objetivos
• Conhecer a segunda Lei de Mendel;
• Identificar as principais caracteristicas do diibridismo, monohibridismo e
segregaçao independente;
• Compreender os principais aspectos relacionados aos polihibridismo.

1. Segregação independente dos fatores (2a Lei)

Quando dois diíbridos são cruzados, quatro tipos52 de gametas são pro- 52
Os tipos de segregação
duzidos com iguais frequências tanto no macho como na fêmea. Um ta- independente podem
buleiro gamético de 4 x 4 pode ser utilizado para demonstrar todas as ser identificados como
16 possíveis combinações desses gametas. Esse método é trabalhoso e diibridismo, triibridismo ou
poliibridismo, dependendo
consome muito tempo, oferecendo maiores oportunidades para erros que
de quantos sejam os loci
outros métodos, como o de dois cruzamentos monoíbridos ocorrendo ao heterozigotos apresentados
mesmo tempo. (STANSFIELD, 1985) pelo indivíduo. Se forem
apresentados dois loci é
A 2a Lei de Mendel explica como dois ou mais pares de genes alelos, situa- diibridismo; se forem três é
triibridismo; se forem 4 ou
dos em pares de cromossomos homólogos diferentes, expressam os seus mais, é poliibridismo.
respectivos fenótipos?
Mendel também observou como se comportavam dois pares de fatores,
responsáveis por expressar duas características distintas entre aquelas que
ele havia escolhido para suas observações no seu experimento com ervilhas.
Quando Mendel cruzou plantas parentais que produziam sementes
amarelas e lisas com aquelas que produziam sementes verdes e rugosas,
verificou que a F-1 produzia somente plantas amarelas e lisas.
Entretanto, a geração F-2, resultante da autofertilização53 de progeni- 53
Lembre-se que, na
tores F-1, produziu sementes amarelas e lisas e sementes verdes e rugosas autofertillização, a
na razão de 9/16 amarelas e lisas, para 3/16 amarelas e rugosas, para 3/16 fecundação ocorreu entre
pólen e óvulo da mesma
verdes e lisas, para 1/16 verde e rugosa. Essa proporção foi obtida da seguin-
planta.
te forma: de 556 sementes produzidas por F-2, 315 eram amarelas e lisas,
101 amarelas e rugosas, 108 verdes e lisas e 32 verdes e rugosas. Portanto,
aproximadamente, 315/556 ≅ 9/16, enquanto 101/556 ≅ 3/16, 108/556 ≅ 3/16
e 32/556 ≅ 1/16.
46 PORTO, V. B.

Analisando os dados, Mendel atribuiu os resultados obtidos à segrega-


ção independente dos pares de fatores, a partir do seguinte raciocínio:
• Os pares de fatores agiam independentemente, como se fossem dois cru-
zamentos monoíbridos ocorrendo ao mesmo tempo; por isso, ele denomi-
nou-o de cruzamento diíbrido.
• Como o resultado do cruzamento monoíbrido é uma frequência fenotípica
de 3 : 1, então, o resultado de dois cruzamentos monoíbridos resultaria num
54
Mendel verificou que
quadrado perfeito da soma dos termos dessa proporção, ou seja, o resultado
o resultado 9+3+3+1 seria (3 + 1)2 = 9 + 3 + 3 + 154, já que, segundo a Lei da Probabilidade “a regra
correspondia aos do produto postula que a chance de dois ou mais eventos independentes
numeradores das razões
obtidas experimentalmente, ocorrerem ao mesmo tempo é o produto das probabilidades de eles ocorre-
enquanto o denominador rem separadamente”. (GARDNER e SNUSTAD, 1986)
(16) resultaria da soma dos
numeradores, chegando- A determinação da frequência genotípica é obtida desenvolvendo-se a
se à unidade quando se expressão (1 + 2 + 1)2 = 1 + 2 + 2 + 4 + 1 + 2 + 1 + 2 + 1, onde 1 corresponde
somassem tais frações, ao genótipo homozigoto dominante obtido no cruzamento monoíbrido; 2, aos
o que, em probabilidade,
corresponde a 100% da 2 genótipos heterozigotos; e 1, ao genótipo homozigoto recessivo.
amostra selecionada para Aplicando-se, então, a teoria cromossômica da herança aos achados
observação, corroborando de Mendel, pode-se esclarecê-los de uma forma relacionada ao processo
os resultados com a Lei das
Probabilidades. de reprodução sexuada, e não simplesmente matemática, como denota
aquela descoberta.

2. Diibridismo
Destarte, representa-se o cruzamento diíbrido de plantas que produzem se-
mentes amarelas e lisas com aquelas que produzem sementes verdes e ru-
gosas pelos seus genótipos, considerando-se o gene recessivo que produz a
cor verde como “v”, enquanto seu alelo dominante “V” produz a cor amarela.
Já o gene recessivo que produz o estado rugoso da semente é representado
por “r”, enquanto seu alelo dominante “R” produz o caráter liso.
Desta maneira, o cruzamento parental de organismos puros para os
caracteres dominantes amarelo e liso, com plantas recessivas que produzem
sementes verdes e rugosas, pode ser assim representado:

A autofertillização das plantas de F-1 resultou no cruzamento diíbrido ora


apresentado:
Genética 47

Usando-se o recurso do quadrado de Punnett para realizar o cruzamento, temos:

Quadrado de Punnett

Genótipos obtidos: 1/16 VVRR; 2/16 VVRr; 2/16 VvRR; 4/16 VvRr; 1/16 VVrr;
2/16 Vvrr; 1/16 vvRR; 2/16 vvRr; 1/16 vvrr.
Fenótipos produzidos: 9/16 amarelos e lisos; 3/16 amarelos e rugosos; 3/16
verdes e lisos; 1/16 verdes e rugosos.
O cruzamento diíbrido de Mendel apresenta os seus resultados
sumarizados na tabela 2.
Tabela 2
SÚMULA DOS RESULTADOS DO CRUZAMENTO DIÍBRIDO
Fenótipos Genótipos Frequência genotípica Frequência
fenotípica
VVRR 1
Amarelas VVRr 2
9
e lisas VvRR 2
VvRr 4
Amarelas VVrr 1
3
e rugosas Vvrr 2
vvRR 1
Verdes e lisas 3
vvRr 2
Verdes e rugosas vvrr 1 1

Quando se aplica o retrocruzamento ao indivíduo diíbrido de F-1, retrocru-


zando-o com um progenitor recessivo, obtém-se a proporção 1 : 1 : 1 : 1, como
se pode observar a seguir:
48 PORTO, V. B.

Do quadrado de Punnett, temos:


Quadrado de Punnett

Genótipos obtidos: 1/4 VvRr; 1/4 Vvrr; 1/4 vvRr; 1/4 vvrr.
Fenótipos produzidos: 1/4 amarelos e lisos; 1/4 amarelos e rugosos; 1/4 ver-
des e lisos; 1/4 verdes e rugosos.

55
Dois cruzamentos
monoíbridos observados
3. Monoibridismo e segregação independente
ao mesmo tempo resultam Afirmou-se, anteriormente, que Mendel compreendeu o cruzamento diíbrido
num cruzamento diíbrido,
enquanto três cruzamentos como dois cruzamentos monoíbridos55 realizados ao mesmo tempo. Portanto,
resultam num cruzamento passemos a interpretá-lo desta forma:
triíbrido e quatro ou mais,
num cruzamento poliíbrido. 1) Cruzamento monoíbrido entre plantas, considerando a característica cor
das sementes

Quadrado de Punnett
Genética 49

Genótipos de F- 1/4 VV : 2/4 Vv : 1/4 vv


Fenótipos de F-1 – 3/4 sementes amarelas: 1/4 sementes verdes.
2) Cruzamento monoíbrido entre plantas, considerando a característica as-
pecto externo das sementes:

Quadrado de Punnett

Genótipos de F-1 – 1/4 RR : 2/4 Rr : 1/4 rr


Fenótipos de F-1 – 3/4 sementes lisas : 1/4 sementes rugosas.
3) Cálculo matemático das razões mendelianas do diibridismo
Mendel, para calcular as razões genotípicas e fenotípicas do diibridis- 56
Mendel chegou aos
mo, aplicou regras matemáticas de cálculo de probabilidades56 a eventos mo- mesmos resultados obtidos
noíbridos: a regra do “e” e regra do “ou”: no caso do cruzamento
considerar as duas
Regra do “e”: a regra probabilística do “e” possibilita o cálculo de probabilida- características ao mesmo
des de eventos acontecerem independentemente um do outro. tempo.
Compare a Tabela 2 com
Portanto, assim como no cruzamento considerado anteriormente, a proba- o Quadro 2, os quais
bilidade de, em F-2, surgirem os genótipos VV e RR resulta de eventos indepen- apresentam a súmula dos
dentes. Desta forma, o cálculo da probabilidade de acontecerem esses eventos cruzamentos diíbridos
realizado, considerando
ao mesmo tempo é calculada multiplicando-se as probabilidades de eles aconte- respectivamente, as duas
cerem independentemente, como eventos extraídos do monoibridismo. características ao mesmo
tempo ou como dois
Assim sendo, a razão genotípica pode ser representada por 1/16 VVRR cruzamentos monoíbridos.
= 1/4 VV x 1/4 RR.
O mesmo raciocínio aplica-se aos outros eventos independentes.
50 PORTO, V. B.

A partir desse cálculo, temos os resultados do diibridismo, calculados a


partir de eventos independentes do monoibridismo sintetizados no quadro 2.
Quadro 2

SINTESE DOS EVENTOS INDEPENDENTES DO MONOÍBRIDISMO QUE RESULTAM EM DIIBRIDISMO


Genótipos Genótipos Fenótipos Fenótipos
diíbridos monoíbridos diíbridos monoíbridos
1/16 VVRR 1/4 VV x 1/4 RR
3/4 amarelas
2/16 VvRR 2/4 Vv x 1/4 RR 9/16 amarelas x
2/16 VVRr 1/4 VV x 2/4 Rr e lisas 3/4 lisas
4/16 VVRR 2/4 Vv x 2/4 Rr
1/16 VVrr 1/4 VV x 1/4 rr 3/4 amarelas x 1/4
57
Observe que cada 3/16 amarelas e rugosas
2/16 Vvrr 2/4 Vv x 1/4 rr rugosas
termo do primeiro
membro das expressões 1/16 vvRR 1/4 vv x 1/4 RR
3/16 verdes e lisas 1/4 verdes x 3/4 lisas
ao lado (Quadro 3 e 4) 2/16 vvRr 1/4 vv x 2/4 Rr
representam eventos 1/16 vvrr 1/4 vv x 1/4 rr 1/16 verdes e rugosas 1/4 verdes x 1/4 lisas
independentes, calculados
pela multiplicação de suas
razões genotípicas ou
Regra do “ou”: aplica-se a regra probabilística do “ou” a eventos mutuamente ex-
fenotípicas monoíbridas,
conforme está expresso clusivos, como no caso do exame de genótipos diferentes ou de fenótipos diferen-
no segundo membro de tes. Neste caso, somam-se as probabilidades57 de esses eventos acontecerem.
cada expressão (regra do
“e”). Contudo, dois termos Portanto, extraindo-se, do quadro 2, as probabilidades dos eventos
consecutivos são somados acontecerem independentemente e somando-os, termo a termo, temos a to-
porque representam
eventos mutuamente
talização da probabilidade dos eventos como um todo, obtendo, como resul-
exclusivos (regra do “ou”). tado, as expressões dos quadros 3 e 4, onde foram aplicadas as regras do “e”
e do “ou”.

Quadro 3
Expressão das razões genotípicas do diibridismo, aplicando-se a regra do “e” e a regra do “ou”.

Quadro 4
Expressão das razões fenotípicas do diibridismo, aplicando-se a regra do “e” e a regra do “ou”.
Genética 51

4. Poliibridismo
Os cruzamentos que consideram a expressão genotípica e fenotípica de três
características heterozigotas ao mesmo tempo são denominados de cruza-
mentos triíbridos, enquanto a expressão de quatro ou mais características he-
terozigotas evidenciam cruzamentos poliíbridos.
O resultado de cruzamentos triíbridos pode ainda ser obtido, sem muito
transtorno, recorrendo-se ao recurso do quadrado de Punnett, como se obser-
va no cruzamento mendeliano, que considera a expressão das características
altura da planta, aspecto da semente e cor da semente.
Os organismos parentais puros são, respectivamente, dominantes e re-
cessivos. Os dominantes são altos, de sementes lisas e amarelas, enquanto
os recessivos são baixos, de sementes rugosas e verdes.
O cruzamento triíbrido pode, então, ser representado a partir do cruza-
mento parental, como se observa adiante:

A autofertillização das plantas de F-1 resultou no cruzamento triíbrido


representado a seguir:

A determinação direta dos gametas já congestiona o esquema de cruza- 58


Diagrama da árvore
ou método das linhas
mento. Por isso, aplica-se o diagrama da árvore58 para determiná-los. Vejamos
ramificadas é um modelo
um exemplo no quadro 5. matemático para se
determinar combinações
de dada sequência, como a
determinação dos gametas
de cruzamentos genéticos
(Quadro 5).
52 PORTO, V. B.

Quadro 5
Diagrama da árvore

Usando-se o recurso do quadrado de Punnett para realizar o cruza-


mento, temos:
Quadrado de Punnett

Genótipos obtidos: 1/64 BBRRVV; 2/64 BBRRVv; 2/64 BBRrVV; 4/64 BBRr-
Vv; 2/64 BbRRVV; 4/64 BbRRVv; 4/64 BbRrVV; 8/64 BbRrVv; 1/64 BBRR-
vv; 2/64 BBRrvv; 2/64 BbRRvv; 4/64 BbRrvv; 1/64 BBrrVV; 2/64 BBrrVv;
2/64BbrrVV; 4/64 BbrrVv; 1/64 BBrrvv; 2/64 Bbrrvv; 1/64 bbRRVV; 2/64
bbRRVv; 2/64 bbRrVV; 4/64 bbRrVv; 1/64 bbRRvv; 2/64 bbRrvv; 1/64 bbrr-
VV; 2/64 bbrrVv; 1/64 bbrrvv;
Genética 53

Fenótipos produzidos: 27/64 altas, lisas e amarelas; 9/64 altas; lisas e


verdes; 9/64 altas, rugosas e amarelas; 3/64 altas, rugosas e verdes; 9/64
baixas, lisas e amarelas; 3/64 baixas, lisas e verdes; 3/64 baixas, rugosas e
amarelas; 1/64 baixas, rugosas e verdes.
O diagrama da árvore também permite que se determinem as frequên-
cias genotípicas e fenotípicas triíbridas. Vejamos como se determina as frequ-
ências fenotípicas, aplicando-se o diagrama da árvore no Quadro 6.
Diagrama da árvore aplicado ao cruzamento BbRrVv x BbRrVv.
Quadro 6

O cruzamento triíbrido de Mendel apresenta os seus resultados sumari-


zados na tabela 3. Vejamos:
Tabela 3
SÚMULA DOS RESULTADOS DO CRUZAMENTO TRIÍBRIDO
Frequência
Fenótipos Genótipos Frequência genotípica
fenotípica
BBRRVV 1
BBRRVv 2
BBRrVV 2
Altas, lisas BBRrVv 4
27
e amarelas BbRRVV 2
BbRRVv 4
BbRrVV 4
BbRrVv 8
54 PORTO, V. B.

Cont. Tabela 3
SÚMULA DOS RESULTADOS DO CRUZAMENTO TRIÍBRIDO
Frequência
Fenótipos Genótipos Frequência genotípica
fenotípica
BBRRvv 1
Altas, lisas BBRrvv 2
9
e verdes BbRRvv 2
BbRrvv 4
BBrrVV 1
BBrrVv 2
Altas, rugosas e amarelas 9
BbrrVV 2
BbrrVv 4
BBrrvv 1
Altas, rugosas e verdes 3
Bbrrvv 2
bbRRVV 1
bbRRVv 2
Baixas, lisas e amarelas 9
bbRrVV 2
bbRrVv 4
bbRRvv 1
Baixas, lisas e verdes 3
bbRrvv 2
bbrrVV 1
Baixas, rugosas e amarelas 3
bbrrVv 2
Baixas, rugosas e verdes bbrrvv 1 1

Matematicamente, o resultado fenotípico do cruzamento triíbrido pode


ser determinado como três cruzamentos monoíbridos, resultando numa po-
tência de 3. Escrito de forma algébrica, seria (3 + 1) x (3 + 1) x (3 + 1), ou seja,
(3 + 1)3 = 27 + 9 + 9 + 9 + 3 + 3 + 3 + 1. A frequência genotípica é determinada
desenvolvendo-se a expressão (1 + 2 + 1)3, que resulta da frequência genotí-
pica monoíbrida (1 + 2 + 1) multiplicada 3 (três) vezes.
Os resultados dos cruzamentos poliíbridos podem ser determinados
como cruzamentos monoíbridos, de mesma ordem correspondente aos loci
heterozigotos observados. Desta forma, pode-se determinar a quantidade de
gametas como sendo 2n, sendo “n” a quantidade de loci heterozigotos. É pos-
sível constatar esse fato, recorrendo-se ao diagrama da árvore, que pode ser
visto nos quadros 5 e 6, e raciocinando-se indutivamente para determinação
dos resultados nos cruzamentos poliíbridos.
Procedendo-se desta forma, verifica-se que a quantidade de gametas,
de genótipos, de fenótipos e de eventos possíveis, obtidos segundo o qua-
drado de Punnett, podem ser determinados conforme está demonstrado no
quadro 7. (GARDNER e SNUSTAD, 1986)
Genética 55

Quadro 7

RELAÇÃO ENTRE PARES DE ALELOS INDEPENDENTES, GAMETAS, GENÓTIPOS NA F-2, FENÓTIPOS NA F-2 E
EVENTOS POSSÍVEIS NA F-2, QUANDO HÁ DOMINÂNCIA.
Quantidade
Loci Eventos Possíveis
Tipos de Gametas Genótipos em F-2 Fenótipos em F-2
Heterozigotos em F-2
1 2 3 2 22X1 = 4
2 4 9 4 22X2 = 16
3 8 27 8 22X3 = 64
4 16 81 16 22X4 = 256
. . . . .
. . . . .
. . . . .
10 1.024 59.049 1.024 22X10= 1048576
. . . . .
. . . . .
. . . . .
n 2n 3n 2n 22n

O exame acurado do quadro 7 e do quadrado de Punnet do cruzamento


triíbrido permitem a constatação que cruzamentos poliíbridos de ordem supe-
rior a 3, isto é, que tenham mais de 3 loci heterozigotos, devem ser trabalha-
dos como se fossem cruzamentos monoíbridos separados, haja vista que é
muito trabalhoso tratá-los, diretamente, como cruzamentos poliíbridos.

Síntese do Capítulo
Neste capítulo, continuamos a discussão sobre as leis de Mendel. Aqui,
abordamos, mais especificamente a 2a Lei de Mendel, conhecida como Lei
da Segregação Independente, que justifica as proporções mendelianas do
diibridismo, do triibridismo e do poliibridismo.
Para compreender a 2a Lei, foram realizados cruzamentos diíbridos,
envolvendo características estudadas por Mendel em ervilhas. Ao cruzar-se
plantas que produziam sementes amarelas e lisas puras com as que produ-
ziam sementes verdes e rugosas, as plantas, em F1, só produziam sementes
amarelas e lisas. Cruzando-se essas plantas diíbridas para essas caracterís-
ticas, observou-se, em F2, que apareciam a proporção 16 amarelas e lisas: 3
amarelas e rugosas: 3 verdes e lisas: 1 verde e rugosa. Neste capítulo, foram
também utilizadas as mesmas terminologias e simbologias estudadas no ca-
pítulo anterior, assim como a técnica do quadrado de Punnet para a realização
dos cruzamentos.
56 PORTO, V. B.

Vimos ainda que o cruzamento diíbrido funciona como dois cruzamen-


tos monoíbridos, aplicando-se os conhecimentos de probabilidade, que cor-
respondem à regra do “e” e à regra do “ou”, àqueles cruzamentos.
Além do quadrado de Punnet, usou-se o diagrama da árvore para a
realização de cruzamento diíbridos. Quantos aos cruzamentos triíbridos e po-
liibridos, constatou-se que o diagrama da árvore é mais adequado porque o
quadrado de Punnet exige muitas lacunas há serem preenchidas.
Encerrando-se o capítulo, foi apresentado um quadro que sumariza a
forma de calcular a quantidade de gametas, de genótipos, de fenótipos e de
eventos possíveis, obtidos segundo o quadrado de Punnet, demonstrando
que cruzamentos poliíbridos de ordem superior a 3, isto é, que tenham mais
de 3 loci heterozigotos, devem ser trabalhados como se fossem cruzamen-
tos monoíbridos separados, haja vista que é muito trabalhoso tratá-los, dire-
tamente, como cruzamentos poliíbridos, pelo quadrado de Punnet.

Atividades de avaliação
1. Reproduza o raciocínio matemático de Mendel, realizando o cruzamento
diíbrido, no qual são observadas as características forma da vagem e posi-
ção das flores.
2. Em determinada raça de cachorros, sabe-se que a cor preta dos pelos é
expressa por um aleIo dominante, enquanto a cor vermelha, por seu aleIo
recessivo. O padrão de uma única cor é determinado por um alelo domi-
nante, enquanto o padrão malhado é determinado por seu aleIo recessivo,
que se situa em outro locus, segregando-se, independentemente, do alelo
para a cor. Levando isso em consideração, qual os genótipos dos genitores
de uma descendência de 8 cachorros, sendo 2 pretos de único padrão de
cor, 2 vermelhos de único padrão de cor, 2 malhados (preto e branco) e
2 malhados (vermelho e branco), sabendo-se que o pai e a mãe têm um
único padrão de cor, sendo ele preto e ela vermelha?
3. Calcule a quantidade de gametas produzidos por um indivíduo inteira-
mente heterozigoto, cujos loci se segregam independentemente quando
estão envolvidos:
a) Dois pares de genes alelos;
b) Cinco pares de genes alelos;
c) Oito pares de genes alelos;
d) “n” pares de genes alelos.
4. Sabe-se que a sensibilidade ao PTC em humanos (gosto amargo sentido
Genética 57

na presença de pequenas dosagens da substância fenilcarbamida) é de-


terminada por um gene dominante e que o albinismo é determinado por
um gene recessivo. Ambas as características são expressas por alelos
que se situam em pares de cromossomos homólogos diferentes. Saben-
do disso, responda qual a probabilidade de um casal normal e sensível
ao PTC, ambos filhos de pais insensíveis, terem o seu primeiro filho, in-
dependente do sexo:
a) Sensível e albino?
b) Insensível e albino?
c) Insensível e normal?
d) Sensível e normal?
5. Supondo-se que, em certo animal, o tamanho dos pelos é determinado
por um par de alelos em que o fenótipo pêlos longos domina o de pelos
curtos, e que o padrão malhado para a cor resulta da expressão de alelos
codominantes para a cor preta e para a cor branca; qual o resultado do
acasalamento de diíbridos de pelos longos e malhados?
6. Supondo-se que, na cor dos pelos em camundongos o alelo que determina
a cor amarela seja dominante e letal recessivo; que as cores marrom, preto
e branco são recessivas em relação ao amarelo, sendo a seguinte a rela-
ção de dominância entre elas: A > M > P > B; que catitas e camundongos
anões sejam consequência da expressão de alelos dominantes situados
em loci de outro par de homólogos em relação à cor; e que do cruzamento
entre catitas amarelas nasceram camundongos normais e marrons; res-
ponda qual é o genótipo dos pais.
7. Sabendo que a cor das flores de certa planta resulta de ausência de do-
minância, sendo o rosa, por exemplo, a cor resultante da expressão de
alelos para a cor branca e para a cor vermelha; e que a altura da planta é
expressa por alelo dominante para o caráter planta alta e por alelo reces-
sivo para a variação planta baixa, situados em outro par de cromossomos
homólogos em relação à cor da planta; informe a proporção de plantas
baixas e de flores rosa de um cruzamento-teste realizado com estas plan-
tas diíbridas.
8. Construindo meu Portifólio: Continue o seu diário reflexivo a partir das
discussões realizadas no decorrer do presente capítulo, registrando os as-
pectos que levem você a agir de forma crítica e reflexiva. Em ato contínuo,
construa o seu portifólio, alimentando-o com os diários produzidos após
cada capítulo.
Capítulo 4
Interação Gênica
Genética 61

Objetivos
• Conhecer e compreender os tipos de interações gênicas;
• Identificar e descrever as interações epistáticas e não epistáticas.

1. Tipos de interação
Até este ponto, tratamos do fenótipo de um organismo, com respeito a
um dado caractere, como um resultado simples do seu genótipo, su-
gerindo que uma única característica resulta de um alelo de um único
gene. De fato, vários genes podem interagir para determinar uma ca-
racterística fenotípica. A epistasia ocorre quando a expressão fenotípi-
ca de um gene é afetada por outro gene. As interações não epistáticas
surgem quando resultam classes fenotípicas diferentes em determi-
nada estrutura. Algumas vezes, vários genes agem aditivamente, e o
fenótipo pode ser prognosticado sabendo quantos desses genes estão
ativos. (Texto adaptado de PURVES et al 2002)

As interações gênicas resultam em modificações fenotípicas da expressão


dos genes que se segregam independentemente e são do tipo epistasia, inte-
rações não epistáticas e interações que resultam no efeito aditivo dos genes?
Na segregação independente, pode acontecer interação entre os ge-
nes de cromossomos não homólogos. Os cruzamentos realizados resultam
em frequências genotípicas similares aos dos cruzamentos sem interação gê-
nica, entretanto, as frequências fenotípicas são alteradas conforme o tipo de
interação que aconteça.
Os principais tipos de interação são: a) as interações epistáticas, estu-
dadas pela epistasia; b) as interações não epistáticas; e c) as interações que
resultam do efeito aditivo provocado pelos genes ao interagirem, estudadas
pela herança quantitativa.
62 PORTO, V. B.

2. Epistasia
As interações epistáticas acontecem quando há efeito inibidor de determinado
locus gênico de um par de cromossomos sobre outro locus de um outro par de
59
Segundo Gardner e
Snustad (1986): “A epistasia cromossomo não homólogo. A epistasia59 acontece quando um gene masca-
não deve ser confundida ra a expressão do outro gene não alélico, sendo o que mascara considerado
com dominância. Epistasia epistático sobre o que é mascarado.
é a interação entre genes
(não alélicos). Dominância Examinando-se a via metabólica de certos produtos gênicos, é possível
é a interação entre compreender como se processa a epistasia. Suponha-se que uma mesma
diferentes alelos do mesmo
via metabólica, como a da produção do pigmento antocianina, que resulta na
gene”.
coloração vermelha em flores da planta ervilha de cheiro, Lathyrus odoratus,
seja condicionada por dois loci gênicos.
O primeiro locus apresenta o gene dominante C, que produz a enzima
C, que, por sua vez, permite a expressão da cor, agindo sobre um composto
precursor e resultando num produto intermediário.
O gene dominante P, situado em outro locus de um par de cromosso-
mo não homólogo, age sobre o produto intermediário, tendo, como resultado,
a produção do pigmento.
Destarte, os loci C_P_, que possuem genes dominantes, expressarão
a cor vermelha nas flores da ervilha. Entretanto, quando acontece um locus
recessivo cc, a enzima produzida não condiciona o produto intermediário e a
cor vermelha não se expressa, resultando em flores brancas.
De outra forma, quando está presente outro locus recessivo pp, embo-
ra haja a produção do composto intermediário, não há produção de pigmento
condicionado pela enzima produzida por pp, resultando também em flores
brancas. Esse caso de epistasia é denominado epistasia recessiva duplica-
da, pois quaisquer dos loci recessivos inibem a manifestação do fenótipo.
Vejamos, na figura 10, como acontece a via metabólica descrita ante-
riormente:

Figura 10 – Via metabólica para a produção do pigmento Antocianina.


Genética 63

Desta maneira, o cruzamento diíbrido com epistasia, que envolve a pro-


dução do pigmento antocianina em flores de planta de ervilha, pode ser re-
presentado a partir de um cruzamento parental de organismos puros, ambos
os membros do casal produzindo flores brancas, que decorre do fato de cada
indivíduo portar um locus recessivo, assim discriminado:

Partindo-se para o cruzamento diíbrido, temos:

Usando-se o recurso do quadrado de Punnet para realizar o cruzamen-


to, temos:
Quadrado de Punnet

60
Alterações fenotípicas
Quantidade: no caso,
apareceu somente uma
Genótipos obtidos: 1/16 CCPP; 2/16 CCPp; 2/16 CcPP; 4/16 CcPp; 1/16 CCpp; característica resultante da
interação entre dois loci,
2/16 Ccpp; 1/16 ccPP; 2/16 ccPp; 1/16 ccpp.
em vez de duas ocorridas
Fenótipos produzidos: 9/16 flores vermelhas; 7/16 flores brancas. no diibridismo normal;
Classes: diminuíram para
Nesse cruzamento diíbrido com epistasia, pode-se observar que a fre- duas, e não para quatro;
quência genotípica permaneceu inalterada, enquanto que, no que concerne Frequência: foi 9 : 7,
aos fenótipos60, houve as seguintes alterações: na quantidade de característi- diferente de 9 : 3 : 3 : 1,
observada no diibridismo
cas; no número de classes fenotípicas; e na frequência fenotípica; sem interação gênica.
64 PORTO, V. B.

As interações epistáticas e de dominância entre alelos e não alelos que


resultam em modificações da proporção mendeliana de 9 : 3 : 3 : 1 de cruzamen-
tos diíbridos, do tipo AaBb, com cada par de alelos segregando-se independen-
temente; pode ser sumarizada, usando-se o diagrama da árvore no quadro 8.
Quadro 8
Diagrama da árvore, mostrando as possibilidades de interações epistáticas, para formação de classes fenotípicas

Vejamos, agora, um caso de epistasia dominante, que acontece quan-


do um gene dominante de um locus, no caso, o gene A é epistático sobre outro
loci. É o caso da herança da cor em frutos de abóbora:

Partindo-se para o cruzamento diíbrido, temos:


Genética 65

Usa-se o quadrado de Punnet para realizar o cruzamento. Vejamos:


Quadrado de Punnet

Genótipos obtidos: 1/16 AABB; 2/16 AABb; 2/16 AaBB; 4/16 AaBb; 1/16 AAbb;
2/16 Aabb; 1/16 aaBB; 2/16 aaBb; 1/16 aabb.
Fenótipos produzidos: 12/16 frutos brancos; 3/16 frutos amarelos; 1/16 fruto verde.
Algumas classes fenotípicas decorrentes de interações epistáticas são
apresentadas no quadro 9, a seguir:
Quadro 9
Interações epistáticas mais frequentes, adaptado de Gardner e Snustad (1986).
66 PORTO, V. B.

3. Interações não epistáticas


O caso clássico de interações não epistáticas é exemplificado com a herança
em cristas de galinhas.
61
Noz acontece quando os Os fenótipos61 expressos na herança de cristas em galinhas são em
dois loci que interagem, número de 4 (quatro): noz, ervilha, rosa e simples (Figura 11).
estando situados em pares
de cromossomos não
homólogos apresentam,
ambos, genes dominantes.
Quando apenas um locus
apresenta gene dominante
os fenótipos ou são ervilha
ou rosa.
Quando os dois loci são
recessivos o fenótipo é
simples.

Figura 11 - Tipos de crista de galinha: (a) Rosa; (b) Ervilha; (c) Noz; (d) Simples (GARD-
NER e SNUSTAD, 1986).

Examinemos um cruzamento entre galináceos ervilha e rosa puros:

Partindo-se para o cruzamento diíbrido, temos:

Usa-se o quadrado de Punnet para realizar o cruzamento


Genética 67

Quadrado de Punnet

Genótipos obtidos: 1/16 EERR; 2/16 EERr; 2/16 EeRR; 4/16 EeRr; 1/16 EErr;
2/16 Eerr; 1/16 eeRR; 2/16 eeRr; 1/16 eerr.
Fenótipos produzidos: 9/16 crista noz; 3/16 crista ervilha; 3/16 crista rosa; 1/16
crista simples.

4. Herança quantitativa
A frequência genotípica até agora estudada não se altera, nem quando há 62
Monoibridismo: ausência
interação entre os genes. Por outro lado, vimos que a frequência fenotípica se de dominância, de genes
letais e de polialelia.
altera tanto no monoibridismo62 como no poliibridismo63. Entretanto, até o pre-
sente momento, soube-se que as variações fenotípicas eram descontínuas, Poliibridismo: Interações
63

apresentando-se como fenótipos contrastantes. gênicas epistáticas e não


epistáticas.
Contudo, existe um outro tipo de variação, contínua, que é explicada
pela herança quantitativa ou de poligenes. Entre elas, estão “características
economicamente importantes, como o ganho de peso dos animais, a altura
das plantas adultas, a produção de ovos e de leite por animal ou variedade, a
produção de cereais por hectare”. (STANSFIELD, 1985)
O processamento da herança quantitativa pode ser compreendido a
partir do exemplo clássico, que estudou o cruzamento entre duas varieda-
des de trigo, uma que produzia grãos vermelhos, decorrente da ação de dois
pares de cromossomos não homólogos com loci homozigotos, cujo genótipo
pode ser representado como AABB; e outra que produzia grãos brancos, sen-
do representada como A’A’B’B’.
Quando se cruzaram as duas variedades, a F-1 apresentava uma cor
intermediária, a qual foi denominada de grãos médios, podendo ser represen-
tada como A'A'B'B'. Ao se cruzarem os F-1 entre si, obtiveram-se 1/16 verme-
lhos e 1/16 brancos. Os restantes 14/16 apresentavam cores intermediárias,
sendo 4/16 mais escuros que os médios, ao que se denominou de grão escu-
ros, 6/16 de mesma coloração que os grãos médios, enquanto os outros 4/16
eram mais claros que os médios, sendo denominados de grãos claros.
68 PORTO, V. B.

Vejamos a representação desse cruzamento para compreendermos in-


teiramente como se processa:

Partindo-se para o cruzamento diíbrido, temos:

Usa-se o quadrado de Punnet para realizar o cruzamento. Vejamos:


Quadrado de Punnet

Genótipos obtidos: 1/16AABB; 2/16AABB’; 2/16AA’BB; 4/16AA’BB’; 1/16AAB’B’;


2/16 AA’B’B’; 1/16 A’A’BB; 2/16 A’A’BB’; 1/16 A’A’B’B’.
Fenótipos produzidos: 1/16 grãos vermelhos; 4/16 grãos escuros; 6/16 grãos
médios; 4/16 grãos claros; 1/16 grãos brancos.
No cruzamento acima, houve o efeito de genes múltiplos, no caso, quatro, locali-
zados em dois pares de cromossomos não homólogos, que interagiram entre si.
Os quatro genes são denominados de poligenes64, cuja interação resul-
ta em cinco classes fenotípicas distintas e graduadas, estendendo-se de um
64
Poligenes fenótipo parental extremo para outro. Portanto, deduz-se que o n0 de classes
São também denominados fenotípicas = n0 de poligenes + 1.
de genes múltiplos, e
seus efeitos apresentam As classes fenotípicas são obtidas como médias das variações dos fe-
continuidade na expressão nótipos parentais extremos. Assim, suponhamos que quatro poligenes atuam
fenotípica. Outro exemplo na expressão da altura de plantas, cujos fenótipos parentais extremos sejam
é a herança da cor da pele
em seres humanos. 2 m e 14 m. Então, as classes intermediárias seriam calculadas dividindo-se
Genética 69

a diferença de altura dos fenótipos extremos pelo n0 de poligenes, ou seja:


(altura máxima – altura mínima)/n0 de poligenes. Como exemplo, temos: (14
– 2)/4 = 3 m, onde o valor obtido representaria a variação condicionada por
cada alelo. A partir daí, cada alelo ativo adicionaria 3 m aos 2m herdados do
genótipo parental baixo. Assim, as classes fenotípicas intermediárias apre-
sentariam 5 m, 8 m e 11 m. Vejamos a tabela 4, que sintetiza os resultados
do cruzamento de F-1, AA’BB’ X AA’BB’:
Tabela 4
SÚMULA DOS RESULTADOS DO CRUZAMENTO F-1.
Fenótipos Genótipos Frequência genotípica Frequência fenotípica
14m AABB 1 1
AABB’ 2
11m 4
AA’BB 2
AA’BB’ 4
8m AAB’B’ 1 6
A’A’BB 1
AA’B’B’ 2
5m 4
A’A’BB’ 2
2m A’A’B’B’ 1 1

Saiba mais
Pigmentos de melanina
A raça humana difere com respeito à
quantidade de pigmentos de melanina
em sua pele. Existe uma grande variação
na quantidade de melanina entre dife-
rentes pessoas, mas grande parte dessa
variação é determinada por alelos em
diferentes loci. Nenhum alelo nesses loci
demonstra dominância. É claro que a cor
da pele não é determinada inteiramen-
te pelo genótipo, a exposição ao sol em
pessoas de pele clara, por exemplo, pode
causar a produção de mais melanina (isto
é, bronzeamento). Vejamos o gráfico ao
lado, o qual expressa um modelo de he-
rança poligênica para a cor da pele em hu-
manos, baseada em três genes. Os alelos
A, B e C contribuem para a produção de
melanina, enquanto seus respectivos pa-
res a, b e c, não. Quanto maior a quanti-
dade de alelos A, B e C, maior será a pigmentação da pele. (PURVES et al, 2002)
70 PORTO, V. B.

Síntese do Capítulo
Quando os genes interagem, verifica-se que as proporções mendelianas
quanto às classes fenotípicas se alteram. As interações epistáticas aconte-
cem mediante o efeito inibidor de um determinado locus gênico de um par de
cromossomos homólogos sobre outro locus de um par de cromossomos não
homólogos, àquele. Essa interação resulta na expressão de apenas um tipo
de característica fenotípica, e não de duas, como no diibridismo normal.
Já em cristas de galinha, o cruzamento entre indivíduos puros, para
uma certa forma de expressão de um determinado gene, resulta no apare-
cimento de outra forma (galináceos de crista rosa cruzados com o de crista
ervilha resultam em progênie com crista noz), caracterizando interações não
epistáticas (observe, ainda, que, quando os dois loci são homozigotos reces-
sivos, eles resultam num outro tipo de crista, a simples).
A herança quantitativa expressa-se por efeito aditivo do gene sobre o fe-
nótipo. É o caso da herança da cor da pele em organismos humanos. Da forma
como acontece esse tipo de herança, um indivíduo humano negro puro neces-
sita de ter todos os genes envolvidos na produção do pigmento melanina, que
são ditos genes efetivos, os quais determinam o aparecimento da cor negra.
Enquanto isso, o indivíduo branco, por não possuir genes efetivos, não produz
esse pigmento. Assim, as variações na cor da pele se dão pela quantidade de
genes efetivos na produção do pigmento, aparecendo tantas classes fenópticas
quanto apresentarem as somas referentes às quantidades de genes efetivos
mais um. No caso em questão, estão presentes 4 genes efetivos e 5 classes
fenotípicas, quais sejam: negro (4 genes efetivos), mulato escuro (3 genes efe-
tivos), mulato médio (2 genes efetivos), mulato claro (1 gene efetivo) e branco
(nenhum gene efetivo).

Atividades de avaliação
1. Suponha que, em certos tipos de animais, a cor da pelagem seja expressa
pelas variações branca, preta e marrom; que dois pares de genes situados
em pares de cromossomos homólogos diferentes interajam na expressão
da característica; que a expressão da cor é evitada por um dos alelos que
ocupa o locus de um dos cromossomos, sendo um alelo dominante, resul-
tando em animais brancos; e que, quando a condição recessiva existe no
loci inibidor, os alelos do outro cromossomo poderão produzir a cor preta
que é dominante sobre a cor marrom. Baseado nisso, responda:
Genética 71

a) Que tipo de interação está em evidência? Justifique a sua resposta.


b) Quando animais brancos e diíbridos são cruzados entre si, quais propor-
ções genotípicas e fenotípicas que podemos prever para a progênie?
c) Entre as proporções genotípicas, quais as possibilidades de selecionarmos,
entre os descendentes brancos, um genótipo homozigoto em ambos os loci?
2. Sabendo-se que dois loci situados em pares de cromossomos homólogos
diferentes interagem em galináceos para a determinação da cor da pela-
gem; que foram cruzadas duas linhagens, uma branca pura e outra colo-
rida também pura, produzindo uma F-1 branca; e que, cruzando-se, ao
acaso, os brancos de F-1, obteve-se uma progênie com 117 aves brancas
para 9 aves coloridas das 126 totalizadas em F-2. Pergunta-se:
a) Qual é a proporção fenotípica apresentada por F-2?
b) Que tipo de interação está envolvido neste problema?
c) Quais foram os prováveis genótipos das linhagens parentais?
3. Em periquitos australianos, um periquito de plumagem branca homozigota
recessiva para dois loci situados em pares de cromossomos homólogos di-
ferentes foi cruzado com outro de plumagem verde de linhagem que vinha
produzindo animais verdes geração após geração, obtendo-se uma F-1
de animais verdes. Cruzando-se aleatoriamente os verdes entre si, apa-
receram, na progênie, periquitos azuis e amarelos na proporção de 3/16
para cada uma dessas duas tonalidades diferentes. Tendo isso em vista,
pergunta-se:
a) Quais as proporções de verdes e de brancos de F-2?
b) Quais os genótipos de cada uma das tonalidades de cor de F-2?
c) Quais os genótipos dos parentais? E de F-1?
d) Que tipo de interação está em jogo?
4. Sabe-se que a coloração dos grãos de trigo é produzida por interações não
epistáticas de dois pares de alelos, em que a cor vermelha corresponde ao
duplo heterozigoto e a branca corresponde ao duplo homozigoto recessivo.
Quando um dos loci é homozigoto recessivo, verifica-se a cor marrom. Se
uma variedade homozigota vermelha é cruzada com uma variedade branca,
quais os fenótipos que aparecem em F-1 e em F-2? Em que proporções?
5. Duas variedades homozigotas de certa planta apresentam o comprimento
do estame variando entre 4 e 10 cm. Suponha que quatro poligenes agem
nesse tipo de herança. Pergunta-se:
a) Quantas classes fenotípicas aparecerão?
b) Qual o comprimento da classe fenotípica intermediária?
c) Cruzando-se dois indivíduos médios, duplos heterozigotos, separou-se as
72 PORTO, V. B.

classes fenotípicas e contou-se os indivíduos com os menores estames,


perfazendo um total de 10. Quantos indivíduos você esperaria encontrar
nas outras classes fenotípicas?
d) Apresente todas as frequências fenotípicas e genotípicas correspondentes ao
cruzamento de indivíduos médios duplos homozigotos de genótipos distintos.
e) Expresse, por meio de um histograma, a herança questionada no presen-
te problema.
6. Construindo o Portifólio: Continue o seu diário reflexivo a partir das dis-
cussões realizadas no decorrer do presente capítulo, registrando os as-
pectos que levem você a agir de forma crítica e reflexiva. Em ato contínuo,
construa o seu portifólio, alimentando-o com os diários produzidos após
cada capítulo.
Capítulo 5
Experimentos de Morgan
Genética 75

Objetivos
• Apresentar as experiências de Morgan;
• Compreender como se dá a ligação gênica;
• Entender os aspectos que relacionam a genética e o sexo.

1. Considerações preliminares
Muitas novas descobertas em Genética vieram das respostas para
perguntas tais como: qual é o padrão de herança de genes que ocu-
pam loci próximos no mesmo cromossomo? Como determinamos a
ordem dos genes em um cromossomo e a distância entre eles? Por
que todos os portadores de hemofilia na família da rainha Vitória eram
mulheres e por que todos os seus descendentes que tiveram hemofi-
lia eram homens? A resposta para essas e muitas outras indagações
começaram a ser elucidadas, por meio dos experimentos de Morgan.
Essas questões genéticas foram resolvidas em estudos com a mosca
de frutas Drosophila melanogaster. O tamanho pequeno, a facilidade
de ser cultivada e o tempo curto entre gerações dessa espécie fize-
ram desse animal um atrativo objeto experimental. Em 1909, Thomas
Hunt Morgan e seus colaboradores estabeleceram a Drosophila como
um organismo de laboratório altamente utilizado na famosa "sala de
moscas" da Universidade de Columbia, onde descobriram, entre outros
fenômenos, o da ligação gênica, a partir do qual passaram a mapear
os genes nos cromossomos. (Texto adaptado de PURVES et al, 2002) 65
A intuição de R. C.
Punnett (1875 – 1967) –
Os experimentos de Morgan realçaram alterações das frequências fenotípicas um dos colaboradores de
Batenson e inventor do
esperadas 9 : 3 : 3 : 1 dos cruzamentos diíbridos, possibilitando a descoberta quadrado de Punnett –
de genes ligados no mesmo par de cromossomos homólogos e permitindo a levou-o a indagar por que
confecção de mapas genéticos de um cromossomo? A genética do sexo foi apareciam “derivações
estranhas da razão
elucidada a partir dos experimentos de Morgan? esperada 9:3:3:1 em alguns
Thomas Hunt Morgan merece ser acrescentado à galeria das celebri- cruzamentos diíbridos”
realizados com ervilhas
dades pioneiras da Genética. Os seus esclarecedores experimentos abriram o doces. (PURVES et al,
caminho para a elucidação de observações até então consideradas estranhas, 2002).
como as realizadas por Punnett65 em 1906, quando, colaborando com Baten-
76 PORTO, V. B.

66
Thomas Hunt Morgan son, achou estranho os resultados alcançados num cruzamento diíbrido em
(1866 – 1945) foi um dos ervilhas doces, mesmo que não tenha atribuido a genes ligados os efeitos da
pioneiros a usar a Teoria
Cromossômica da Herança sua observação.
para resolver problemas Os casos de ligação gênica foram pioneiramente detectados quando
em Genética, (GARDNER e
SNUSTAD, 1986) Morgan66, realizando experimentos com Drosophila melanogaster na sua cé-
lebre sala das moscas, registrou o primeiro caso de ligação gênica, explican-
do que os genes ligados são aqueles pares de alelos que, quando observado
67
Alfred H. Sturtvant (1891 o seu cruzamento, verifica-se que eles estão situados no mesmo par de cro-
– 1970) era colaborador mossomos homólogos. Morgan acrescentou que ocorria permutação entre as
de Morgan e pioneiro na
idealização da construção
cromátides desses pares na meiose, comportamento inteiramente diverso da
de mapas genéticos. Ele se segregação independente já estudada.
encontra na célebre sala
Na sala das moscas, muitas importantes descobertas pioneiras foram
das moscas, onde vemos,
ao fundo, um quadro que realizadas. Entre essas descobertas, destacam-se as iniciadas em 1911,
mostra os resultados das quando, ao usar sua imaginação criativa, Sturtevan67, um dos estudantes de
experiências realizadas
ali. (AMABIS e MARTHO, Morgan, propôs que era possível determinar a posição relativa dos genes nos
2006). cromossomos, observando os casos de ligação gênica. Estavam, por conse-
guinte, estabelecidas as bases do mapeamento genético.
Calvin B. Bridges (1889
68

– 1938) foi colaborador A genética do sexo teve um impulso acentuado com as investigações
de Morgan e pioneiro na de Bridges68, outro colaborador de Morgan que mostrou que os determinantes
determinação do sexo em
femininos do sexo em drosófila69 estavam localizados no cromossomo X, en-
drosófilas, (GARDNER e
SNUSTAD, 1986) quanto os determinantes masculinos estavam nos cromossomos autossomos.
Contudo, os feitos pioneiros não devem ser só creditados a homens.
69
Nos machos de drosófila, Mulheres também se destacaram no caminho das descobertas pioneiras da
não acontece a permutação Genética. É um dever de justiça citar, por exemplo, os feitos da norte-america-
entre cromátides durante a
meiose. Desse modo, não
na Bárbara McClintock70 e da britânica Mary F. Lyon71.
são produzidos gametas McClintock confirmou, em milho, os resultados obtidos por Morgan em
recombinantes.
drosófilas, entre outras descobertas inéditas. Já Lyon, trabalhando a genéti-
70
Bárbara McClintock ca do sexo, propôs a hipótese da compensação de dose, que será explicada
(1902 – 1992) era norte oportunamente.
americana e foi pioneira
na comprovação da Enfim, muitas novas descobertas em Genética resultaram das inves-
Teoria Cromossômica da tigações experimentais realizadas por Morgan e por seus colaboradores na
Herança, a partir de seus
experimentos com milho. sala das moscas quando traçaram os caminhos metodológicos para respon-
(AMABIS e MARTHO, der perguntas, como: qual é o padrão de herança de genes que ocupam loci
2006) próximos no mesmo cromossomo? Como determinamos a ordem dos genes
em um cromossomo e a distância entre eles? Por que todos os portadores de
Mary Lyon provou a
71
hemofilia na família da rainha Vitória eram mulheres e por que todos os seus
hipótese da compensação
descendentes que tiveram hemofilia eram homens?
de dose que envolve
a genética do sexo.
(GARDNER e SNUSTAD,
1986)
Genética 77

2. Ligação gênica
A ligação gênica acontece quando os genes não alelos, que são responsá-
veis por expressões fenotípicas, encontram-se no mesmo par de cromosso-
mos homólogos e não se segregam independentemente, como no caso de
estarem localizados em pares diferentes de cromossomos homólogos, que
foi evidenciado nos estudos até aqui realizados. Assim, os pares de genes
alelos se segregam ligados por fazerem parte do mesmo par de cromosso-
mos homólogos.
Os experimentos com Drosophila melanogaster realizados por Morgan
permitiram observar os primeiros casos de ligação gênica.
Morgan, ao cruzar fêmeas selvagens de corpo cinzento-amarelado e
com asas normais, genótipo PPVV, com machos produzidos em laboratório,
mutantes de corpo preto e com asas vestigiais, genótipo ppvv, obteve uma F-1
de organismos selvagens, genótipo PpVv. Ao realizar um cruzamento-teste,
novamente com fêmeas, agora de F-1, genótipo PpVv, com machos pretos
cujas asas eram vestigiais, ppvv, obteve as seguintes percentagens:
• 41,5% cinzentos-amarelados com asas normais;
• 41,5% pretos com asas vestigiais
• 8,5% cinzentos-amarelados com asas vestigiais;
• 8,5% pretos com asas normais
Quando cruzava machos heterozigotos cinzentos-amarelados, PpVv,
com fêmeas mutantes, ppvv, obtinha os percentuais:
• 50% cinzentos-amarelados com asas normais;
• 50% pretos com asas vestigiais.
Analisando-se os dois casos, verificou que, nas fêmeas heterozigotas,
eram produzidos gametas recombinantes por permutação durante a prófase
I da meiose (Figura 5), quando os cromossomos homólogos se pareavam e
trocavam partes entre si, o que não ocorria com os machos.
Os gametas recombinantes eram responsáveis pela divergência de
percentuais entre os dois cruzamentos, que, entretanto, não se igualavam aos
percentuais da segregação independente, que deveriam ser 25% cinzentos-
-amarelados com asas normais, 25% cinzentos-amarelados com asas vesti-
giais, 25% pretos com asas normais e 25% pretos com asas vestigiais, como
fora evidenciado por Mendel.
Hoje se sabe que os sete genes estudados por Mendel se localizam em
quatro, e não em cada um dos sete pares de cromossomos da ervilha, portan-
to, torna-se evidente que, em certos casos de genes ligados, esses genes se
comportam como se estivessem se segregando independentemente.
78 PORTO, V. B.

72
Por que, então, Mendel Os resultados alcançados por Mendel72, acrescidos de estudos pos-
não detectou segregação teriores, explicam que a distância entre os genes é o fator determinante de
ligada de alelos dos
pares de genes nos seus obtenção dos percentuais diferenciados da ligação gênica. Se a distância for
cruzamentos diíbridos e muito grande, o percentual de recombinação se aproximará dos 25% espera-
triíbridos? Para maiores dos para a segregação independente.
esclarecimentos sobre os
estudos de Mendel, veja a O cruzamento realizado por Morgan, na sua sala das moscas, pode ser
leitura complementar no fim assim representado:
deste capítulo.

Do quadrado de Punnett, temos:


Quadrado de Punnett

73
Realize o cruzamento-
teste para macho selvagem
heterozigoto e para fêmeas
mutantes, considerando os
resultados já apresentados
anteriormente e a
interpretação meiótica do A interpretação meiótica para os cruzamentos-testes73 é apresentada
que ocorre com machos e nas figuras 12 e 13.
com fêmeas de drosófila.
Genética 79

Figura 12 – Meiose em machos heterozigotos, adaptado de Purves et al. (2002).

Figura 13 – Meiose em fêmeas heterozigotas, adaptado de Purves et al. (2002).


80 PORTO, V. B.

74
O fato de a recombinação Enfatizamos que as observações das figuras 12 e 13 permitem cons-
de alelos acontecer tatar que a recombinação entre alelos74, no caso estudado pelos experi-
somente em fêmeas de
drosófila já deveria ter mentos de Morgan, só acontece nas fêmeas de drosófila.
sido constatado ao se
realizar o cruzamento-
teste envolvendo machos 3. Mapeamento genético
heterozigotos. A partir
da frequência fenotípica Os experimentos de Morgan abriram o caminho para o mapeamento gené-
encontrada na progênie de tico, procedimento metodológico que estabelece a posição dos genes num
machos heterozigotos, que determinado cromossomo.
foi de 50% cinza-amarelado
com asas normais e 50% Desta forma, esse procedimento baseia-se na frequência de recombinação
pretos com asas vestigiais, que é associada à distância entre os genes, proposição feita, em 1911, por “um
comprova-se esse fato.
dos estudantes de Morgan, A. H. Sturtevant”. (GARDNER e SNUSTAD, 1986)
Usando-se o exemplo do cruzamento com drosófila, a frequência de
recombinação seria de 8,5% para pV e de 8,5% para Pv; portanto, perfazen-
do um total de 17% ou de 0,17. Tendo isso em vista, teremos que a distância
75
O centimorgan entre os genes P e V é de 17 unidades75 de recombinação, ou seja 17cM (de-
corresponde à unidade
de mapa genético, sendo
zessete centimorgan). Vejamos o mapa representado na figura 14:
representado por cM e
calculado da seguinte
forma:
Distância em cM = 100 x
freq. de recombinação.
Corresponde ao percentual
de recombinação entre Figura 14 - Mapa dos genes para cor do corpo e tamanho das asas presentes em
dois loci do mesmo par de determinado cromossomo de drosófila.
cromossomos homólogos.
O exemplo que segue ilustra como se procede para construir mapas
genéticos.
Suponhamos que desejamos construir o mapa que envolve três loci dife-
rentes de um mesmo par de cromossomos homólogos (loci dos genes A, B e C):
1) Primeiramente, não sabemos nem a distância nem a posição relativa entre
os genes. Existem, então, várias possibilidades, entre as quais ABC, CBA,
ACB, etc. (Figura 15)

Figura 15 – Os genes podem ocupar posições variadas no cromossomo.


Genética 81

2) Cruzando-se indivíduos puros AABB x aabb, obter-se-á uma geração F-1


de indivíduos heterozigotos para os dois loci envolvidos, que, retrocruzados
com o parental recessivo, apresentam os seguintes resultados: 450 AABB,
450 aabb, 50 Aabb e 50 aaBb, para os primeiros 1000 indivíduos observa-
dos na progênie.
Para mapear esses dois genes, calculamos a frequência de recombina-
ção, que é: (50 + 50)/1000 = 0,1
Como a distância é 100 vezes a frequência de recombinação, temos: d =
100 x 0,1 = 10 cM. Assim sendo, A e B estão mapeados, como se observa
na figura 16.

Figura 16 – Mapeamento dos cromossomos A e B.


3) Observemos agora o cruzamento entre os indivíduos puros AACC x aacc.
Nesse cruzamento obtivemos uma geração F-1 de heterozigotos, que, quan-
do retrocruzada com o parental recessivo, apresentou os seguintes resul-
tados: 460 AACC, 450 aacc, 40 Aacc e 40 aaCc, para os primeiros 1000
indivíduos observados na progênie. Deduz-se, assim, que a frequência de
recombinação é:
(40 + 40)/1.000 = 0,08 com a distância d = 100 x 0,08 = 8cM
Vejamos, então, os dois cromossomos mapeados na figura 17.

Figura 17 – Mapeamento dos cromossomos A e C.


4) Calculando-se agora a distância entre os genes B e C pelo mesmo proces-
so anterior, temos:
BBCC x bbcc produz o heterozigoto que, retrocruzado, produziu:
490 BbCc, 490 bbcc, 10 Bbcc e 10 bbCc, para os primeiros 1000 indi-
víduos. Portanto, a frequência de recombinação é:
(10 + 10)/1.000 = 0,02 com a distância d = 100 x 0,02 = 2cM
Observe, na figura 18, o mapeamento dos cromossomos B e C.

Figura 18 – Mapeamento dos cromossomos B e C.


82 PORTO, V. B.

5) Dos resultados obtidos, conclui-se que o gene C está entre A e B, porque


A e B estão mais afastados, finalizando-se, desta forma, o mapa que deve
ser representado de acordo com a figura 19:

Figura 19 - Mapeamento dos cromossomos A, B e C concluído.

Saiba mais
Cruzamentos triíbridos
Caso se examine, diretamente, um cruzamento triíbrido, o resultado do cruzamento-
teste AaBbCc x aabbcc será:
Genótipo Progênie Permutas

ABC/abc 370
Parentais s/
permuta
Abc/abc 385

Abc/abc 45
1 permuta
Intervalo I
aBC/abc 50

ABc/abc 2
2 permutas
Intervalo I;
abC/abc 3 Intervalo II.

AbC/abc 70
1 permuta
Intervalo II
aBc/abc 75

TOTAL 1000 INDIVÍDUOS

É possível afirmar corretamente que o gene que se posiciona no meio é o “c”, visto
que o gameta recombinante que apresenta dupla permutação, isto é, a quantidade
de permutação mais baixa, só difere do parental pelo gene “c”.
Conhecendo-se a ordem, constrói-se o mapa:
- Distância entre A e C = (45 + 50 +2 +3)/1000 = 0,10 = 10cM
- Distância entre C e B = (2 + 3 + 75 + 70)/1000 = 0,15 = 15cM
Genética 83

4. Genética e sexo
Os experimentos de Morgan também contribuíram para os esclarecimentos
relacionados à genética do sexo. Na sala das moscas, Bridges descobriu
como o sexo se manifestava em drosófila. Contudo, os estudos pioneiros so-
bre o assunto começaram a partir das observações de reprodução em inse-
tos, feitas por H. Henking, um biólogo alemão que descobriu, em 1891, uma
estrutura, a qual denominou corpúsculo X.
Algum tempo depois, o corpúsculo X de Henking veio a ser chamado
de cromossomo X, um dos cromossomos determinantes do sexo. O outro é o
cromossomo Y, no sistema de determinação XY.
A determinação do sexo é baseada na presença de um par de cromos- 76
Os cromossomos
somos sexuais76 iguais em um dos sexos, sendo que, no outro sexo, existe sexuais denominam-
um par de cromossomos sexuais diferentes, só que um dos cromossomos é se alossomos, por não
apresentarem homologia
igual ao do sexo oposto. O que faz a diferença entre os sexos é o cromosso- completa entre os pares
mo sexual diferente, que pode até não existir. Assim sendo, comparando-se diferentes, enquanto todos
os cromossomos sexuais, foram estabelecidos sistemas de determinação do os outros são denominados
autossomos, por serem
sexo, entre os quais estão o X0, XY e o ZW. inteiramente homólogos.

4.1. O sistema X0
O sistema X0 é encontrado em gafanhotos77, cujos machos determinam o 77
Nos gafanhotos, as
sexo por portarem um único cromossomo sexual, o cromossomo X, enquanto fêmeas possuem 24
as fêmeas apresentam um par de cromossomos homólogos X. Todos os ou- cromossomos, sendo 11
pares de autossomos e
tros cromossomos de machos e de fêmeas apresentam-se em duas cópias. 1 par de cromossomos
São os cromossomos autossomos. (Figura 20) sexuais XX, enquanto
os machos possuem
somente 23, sendo 11
pares de autossomos e
1 cromossomo sexual X,
caracterizando o sistema
X0 de determinação do
sexo.

Figura 20 – Determinação do sexo em gafanhotos. Vejamos como a fêmea é maior


que o macho. (PURVES et al., 2002)
Vale a pena ressaltar que os gametas produzidos no sistema X0 pos-
suem sempre o mesmo número de autossomos, quer sejam masculinos ou
femininos: entretanto, enquanto a metade dos espermatozoides apresentam o
cromossomo X e a outra metade não, todos os óvulos portam o cromossomo X.
O sexo masculino se manifesta quando um espermatozoide sem o
cromossomo X fecunda um óvulo, passando o zigoto a possuir a constitui-
ção X0, no que diz respeito aos cromossomos sexuais. Se um espermato-
zoide com o cromossomo X fecunda um óvulo, então, na prole, nasce uma
fêmea, restaurando-se o par de cromossomos sexuais XX.
84 PORTO, V. B.

4.2. O sistema XY
No sistema XY, o sexo é determinado pelo cromossomo Y, que se encontra
no indivíduo de sexo masculino. O cromossomo Y é, via de regra, menor que
o cromossomo X.
Os gametas femininos apresentam sempre o cromossomo X e um con-
junto de autossomos herdados da mãe, enquanto a metade dos espermato-
zoides possui o cromossomo X e a outra metade possui o cromossomo Y.
Assim, quando um espermatozoide portando o cromossomo X fecunda um
óvulo, o zigoto é XX e o sexo na progênie é feminino. A situação inverte-se
quando um espermatozoide com o cromossomo Y fecunda um óvulo, sendo
o zigoto XY, resultando num filho do sexo masculino.
O sistema XY está presente na maioria dos animais e das plantas, in-
cluindo-se, entre os animais, nós, os humanos. (Figura 21)

Figura 21 – Sistema de determinação do sexo XY, presente nos organismos huma-


nos78 e na maioria dos animais. (PURVES et al., 2002)

Sabe-se que os
78
4.3. Determinação do sexo por balanceamento
organismos humanos
apresentam 46 Bridges, como se sabe, foi um dos colaboradores de Morgan, que idealizou
cromossomos, sendo 22
pares de autossomos o modelo do balanceamento cromossômico para explicar como o sexo se
presentes em ambos manifestava em drosófila.
os sexos. O par XX de
cromossomos sexuais está Apesar de pertencer ao sistema XY, o cromossomo Y não é o deter-
presente na mulher e o minante do sexo masculino em moscas das frutas, como o é na maioria dos
par XY está presente no animais portadores desse par de cromossomos sexuais. O cromossomo Y
homem. Assim sendo, todos
os óvulos apresentam 22, funciona, então, como um fator de fertilidade naqueles insetos. (Figura 22)
cromossomos autossomo e
1 cromossomo X; metade
dos espermatozoides
possuem 22 autossomos e
1 cromossomo X e a outra
metade, 22 autossomos e 1
cromossomo Y.

Figura 22 – Veja que o segundo espécime é macho e estéril. Ele não possui o cromos-
somo Y, que é o fator de fertilidade. (PURVES et al., 2002)
Genética 85

Bridges produziu várias combinações entre cromossomos X e autos-


somos e verificou que, quando a razão era menor ou igual a 0,5, o indivíduo
produzido era do sexo masculino, que, quando as razões eram iguais ou su-
periores a 1, produziam indivíduos do sexo feminino e que quando as razões
apresentavam valores entre 0,5 e 1, resultavam em indivíduos de sexo inter-
mediário entre machos e fêmeas (Tabela 5).
Tabela 5
BALANCEAMENTO GENÉTICO PARA DETERMINAÇÃO DO SEXO EM DROSOPHILA
MELANOGASTER. A PRESENTE TABELA FOI ADAPTADA DE GARDNER E SNUSTAD (1986). QUANTIDADE DE X
Conjunto de autossomos Balanço X/A Tipo de Sexo
1X 3A 1/3 = 0,33 Supermacho
2X 2A 1/2 = 0,5 Macho
2X 4A 1/2 = 0,5 Macho tetraploide
2X 3A 2/3 = 0,67 Intermediário
3X 4A 3/4 = 0,75 Intermediário
2X 2A 2/2 = 1 Fêmea
3X 3A 3/3 = 1 Fêmea triploide
4X 4A 4/4 = 1 Fêmea tetraploide
4X 3A 4/3 = 1,33 Superfêmea
3X 2A 3/2 = 1,5 Superfêmea

4.4. Corpúsculo de Barr e a compensação de dose


O corpúsculo de Barr corresponde a um dos cromossomo X que sofre es- 79
A heterocromatina é a
região do cromossomo que
piralização, transformando-se em heterocromatina79. Ele foi percebido pela
permanece espiralizada
primeira vez por M. L. Barr, que “observou corpúsculos de cromatina nas cé- durante o intervalo G-0 ou
lulas nervosas de gatos que não estavam presentes nas células dos machos” G-1 da Intérfase, sendo
que seus genes não
(GARDNER e SNUSTAD, 1986). As pesquisas prosseguiram e foram encon- codificam proteínas. Já a
trados os corpúsculos semelhantes nos núcleos dos organismos femininos, eucromatina corresponde
enquanto que, nos machos das respectivas espécies, essas estruturas não a região desespiralizada
onde os genes são ativos.
eram observadas. Os corpúsculos de Barr foram relacionados, então, ao cro- No corpúsculo de Barr,
mossomo X, que se espiralizava, tornando-se heterocromatina. todo o cromossomo
X se transforma em
Lyon formulou a hipótese da compensação de dose para explicar heterocromatina, para
porque os corpúsculos de Barr se transformam em heterocromatina. Ela proporcionar um balanço
fundamentou sua hipótese após observar que fêmeas homozigotas para equilibrado entre os
cromossomos das fêmeas
genes contidos no cromossomo X não expressam determinadas carac- e dos machos, o que é
terísticas com maior intensidade que os organismos masculinos, que são chamado compensação de
dose.
hemizigotos, possuindo um gene a menos. Isto só poderia ser consequên-
cia da inativação do gene que estaria presente no corpúsculo de Barr, para
compensar a dosagem dos genes entre machos e fêmeas, ou seja, as
fêmeas homozigotas teriam apenas um gene funcional da mesma forma
que os machos hemizigotos.
86 PORTO, V. B.

A transformação que ocorre na compensação de dose é


inteiramente comprovada quando se observa as fêmeas de gatos
que possuem três cores (Figura 23, extraída de CURTIS, 1977). A
explicação para a ocorrência do padrão de três cores baseia-se
na hipótese de Lyon.
Nos gatos, os genes responsáveis por expressar a pigmen-
tação do pelo estão no cromossomo X, e as fêmeas de três cores
possuem genótipo heterozigoto, que expressam alelos para duas
cores. Por isso, nas fêmeas verifica-se a expressão das 3 cores, que
correspondem a dois pigmentos se manifestando em fundo branco.
Os machos, como são hemizigotos, só possuem um alelo
para expressar pigmentação no seu único cromossomo X, verifi-
cando-se a expressão de somente duas cores, ou seja, uma cor
pigmentada se manifestando em fundo branco.
Figura 23 – Gata com 3 cores
Isto ocorre porque, em certos locais do corpo de uma fêmea,
um dos cromossomos X é inativado, tornando-se parte da heterocromatina. Os
genes que expressam as cores são alelos e estando localizados no cromosso-
mo X. Um deles expressará uma cor e o outro, a cor contrastante, as quais se
manifestarão em um fundo branco. Como a distribuição da heterocromatina é
aleatória, em determinado local, só se expressa uma cor tendo como consequ-
ência um padrão em mosaico observado nas fêmeas com três cores.
Nos machos, o pigmento se expressa em fundo branco porque, como
eles são hemizigotos, só possuem um gene para expressar o pigmento co-
lorido. Isso acontece devido à inexistência da parte do genoma feminino do
cromossomo X, no cromossomo Y, dos organismos masculinos. Desta forma,
a parte não homologa do cromossomo Y não possui o outro alelo que expres-
saria a cor, portanto, machos nunca manifestarão um padrão de três cores.

Saiba mais
Hemizigoze
Na hemizigoze, só há um locus para expressar de-
terminada característica, já que não existe parte
pareada no outro constituinte do par de cromos-
somos homólogos.
A figura ao lado (publicada em GARDNER e
SNUSTAD, 1986) mostra o cromossomo de Me-
landrium álbum, onde se pode ver a região IV do
cromossomo X, correspondendo à parte homó-
loga de Y, e a região V, que apresenta os loci hemizigotos. Vejamos que, nessa planta,
o cromossomo Y é maior que o X, o que não é a regra.
Genética 87

4.5. Sistema ZW
Os organismos machos de aves, mariposas e borboletas apresentam dois
cromossomos sexuais iguais, enquanto que, nas fêmeas, os dois cromos-
somos sexuais são diferentes. Portanto, denominou-se de ZW o sistema de
determinação do sexo nesses organismos, para diferenciá-los dos XY, pois,
como vimos, é a fêmea que possui os dois cromossomos iguais (Figura 24).

Figura 24 – Sistema ZW de determinação do sexo em galináceos80 (PURVES et al., 2002) Em galináceos, a


80

determinação do sexo
é comandada pela
4.6. Herança e sexo galinha, por ela possuir
os cromossomos sexuais
A herança ligada ao sexo foi demonstrada pelos experimentos de Morgan, diferentes.
realizados em 1910, na sala das moscas, quando ele descobriu mutantes de
olhos brancos e experimentou cruzá-los com organismos de olhos vermelhos,
ditos selvagens.
Quando Morgan cruzou fêmeas homozigotas de olhos vermelhos com
machos de olhos brancos, toda a progênie apresentou olhos vermelhos, como
se esperaria de um cruzamento de organismos puros homozigotos.
Contudo, quando a situação se inverteu e ele cruzou fêmeas de olhos
brancos com machos de olhos vermelhos, então todos os machos passa-
ram a possuir olhos brancos, enquanto as fêmeas apresentavam olhos ver-
melhos (Figura 25)
88 PORTO, V. B.

Figura 25 – Experimento de Morgan com comprovação de que o gene para a cor dos
olhos está ligado ao cromossomo X. (PURVES et al., 2002)

Observando a figura 25, verifica-se que ficou sobejamente demonstra-


do por Morgan que o alelo mutante que condiciona a cor de olhos branca em
drosófila tem o seu lócus presente no cromossomo X.
O daltonismo81 e a hemofilia82 são dois distúrbios hereditários que po-
dem ser considerados como herança ligada ao sexo. Seguindo esse cami-
Daltonismo
81

Basta substituir, no genótipo nho, encontraremos a resposta para aquela pergunta inicial: Por que todos os
do hemofílico, o H pelo D, portadores de hemofilia na família da rainha Vitória eram mulheres e por que
maiúsculo ou minúsculo, todos os seus descendentes que tiveram hemofilia eram homens?
e teremos os respectivos
genótipos.
Para refletir
Hemofilia:
82
Explique por que a hemofilia e o daltonismo são distúrbios genéticos que acome-
XHXH, XHXh: mulheres
tem mais homens. Aplique as regras do monoibridismo para os cruzamentos entre
normais;
XhXh: mulheres hemofílicas;
homens e mulheres considerando os seguintes genótipos:
XHY: homens normais
XhY: homens hemofílicos.
Genética 89

Saiba mais
Ambiente externo e a determinação do sexo
Em alguns animais inferiores, a determinação do sexo não é genética, mas depende
de fatores do ambiente externo. Os machos e as fêmeas têm genótipos similares, mas os
estímulos de origem ambiental direcionam o desenvolvimento para um sexo ou para ou-
tro. Os machos do verme marinho Bonellia, por exemplo, são pequenos e degenerados e
vivem no interior do aparelho reprodutivo de fêmea, que é bem maior. Todos os órgãos do
corpo dele são degenerados, exceto os órgãos do aparelho reprodutor. F. Baltzer observou
que um verme jovem originário de um ovo isolado se tornou uma fêmea. Por outro lado,
se ele liberava vermes jovens de uma ninhada na água, contendo fêmeas maduras, alguns
vermes jovens eram atraídos pelas fêmeas e se ligavam à sua prosbóscide. Esses vermes
jovens se transformavam em machos e, normalmente, migravam para o aparelho repro-
dutor feminino, onde se tornavam parasitas. Aparentemente, os determinantes genéticos
para ambos os sexos estão presentes nos vermes jovens. (GARDNER e SNUSTAD, 1986)

Ginandromorfos
O comportamento cromossômico anormal em insetos pode resultar em mosaicos
sexuais denominados ginandromorfos. Algumas partes do animal expressam carac-
terísticas femininas, enquanto outras partes expressam características masculinas.
Alguns ginandromorfos, em Drosophila, são intersexos bilaterais com padrão de colo-
ração, forma do corpo e pente sexual masculino numa metade do corpo, e com carac-
terísticas femininas na outra metade. Tanto a genitália quanto as gônadas masculina
e feminina podem estar presentes.
Os ginandromorfos bilaterais têm sido explicados com base numa irregularidade
na mitose da primeira clivagem do zigoto. Pouco frequentemente, um cromossomo
se atrasa na divisão e não chega ao polo da célula a tempo de ser incluído no núcleo
reconstruído. Quando um dos cromossomos X de um zigoto XX (fêmea) se atrasa no
fuso, um núcleo-filho recebe apenas um cromossomo X, enquanto o outro recebe XX.
Assim, um padrão em mosaico é logo estabelecido. Um dos núcleos, no estágio de dois
núcleos, seria XX (fêmea), e o outro seria XO (macho). Se o plano de clivagem é orien-
tado de forma que um núcleo-filho se volta para a direita, esse núcleo dará origem a
todas as células que compõem a metade direita do corpo do adulto, enquanto a outra
dará origem à metade esquerda. Se a mesma perda cromossômica ocorreu numa divi-
são celular tardia, pequenas porções do corpo do adulto serão masculinas, portanto, a
posição e o tamanho da região em mosaico são determinados pelo local e pela época
da anormalidade na divisão. Em Bracon hebetor, os ginandromorfos podem ocorrer no
plano anterior-posterior, dando origem a vespas com arranjos muito peculiares, como
cabeças masculinas em abdomes femininos e vice-versa. (GARDNER e SNUSTAD, 1986)

Herança ligada ao cromossomo Y: genes holândricos


Na espécie humana, os poucos genes localizados no cromossomo Y são herdados
apenas pelos homens, passando diretamente de pai para filho; são, por isso, denomi-
nados genes holândricos (do grego holos, completamente, e andros, masculino). Al-
guns autores chamam a herança dos genes localizados no cromossomo Y de herança
restrita ao sexo, uma vez que esses genes estão presentes apenas em indivíduos do
sexo masculino. O gene SRY, que desencadeia a diferenciação do testículo nos em-
briões de mamíferos, é um exemplo de gene holândrico. (AMABIS e MARTHO, 2006)
90 PORTO, V. B.

Genes com expressão limitada ao sexo


Alguns genes, apesar de estarem localizados em autossomos e, portanto, de esta-
rem presentes em ambos os sexos, expressam-se apenas em um deles. A expressão
desses genes é, em geral, controlada pela presença ou pela ausência de hormônios de
um ou de outro sexo. Um exemplo de gene com expressão limitada ao sexo na espécie
humana é o que condiciona hipertricose auricular (do grego hiper, excesso, e trichos,
pelos), ou seja, a presença de longos pelos nas orelhas. Até pouco tempo atrás, achava-
-se que esse gene estivesse localizado no cromossomo Y, sendo, portanto, um gene
holândrico. Estudos recentes, porém, sugerem que o gene responsável por essa carac-
terística localiza-se em um autossomo.
Os genes envolvidos na produção de leite em mamíferos são outros exemplos de
genes com expressão limitada ao sexo. Em gado bovino, por exemplo, conhece-se
diversos genes que influem na maior ou na menor produção de leite. Um touro de
uma raça produtora de leite transmitirá genes para essa característica a seus descen-
dentes. No entanto, esses genes não se expressam no touro, que, apesar de tê-los,
não produz leite. (AMABIS e MARTHO, 2006)
Genes com expressão influenciada pelo sexo
Alguns genes expressam-se em ambos os sexos, porém de maneira diferente. Um
exemplo é o gene que condiciona a calvície hereditária na espécie humana, caracte-
rística muito mais comum em homens que em mulheres. Além de rara, a calvície em
mulheres manifesta-se mais como uma diminuição generalizada do número de fios
em todo o couro cabeludo, em vez de se manifestar como uma perda total do cabelo
do topo da cabeça, o que geralmente ocorre em homens.
A partir da análise de famílias, chegou-se à conclusão de que o padrão de heran-
ça da calvície pode ser explicado por um alelo autossômico que se comporta como
dominante no homem - basta ter um deles para ser calvo - e recessivo na mulher,
pois somente mulheres homozigóticas para o gene são calvas. Essa diferença no com-
portamento do gene é determinada pelo ambiente hormonal do corpo da pessoa: o
alelo C só atua como dominante na presença de hormônios masculinos. (AMABIS e
MARTHO, 2006)

Os fenômenos sexuais nas plantas


Geralmente, as plantas portadoras de flores são monoicas e, portanto, não têm
cromossomos sexuais. A habilidade das células produzidas mitoticamente, com os
mesmos dotes genéticos para produzirem os tecidos com diferentes funções sexu-
ais numa flor perfeita, demonstra claramente a bipotencialidade das células dessas
plantas.
Exemplos bem conhecidos de plantas dioicas demonstram que essa característica
está usualmente sob o controle genético de um único locus gênico. Entretanto, pelo
menos um caso bem documentado de sexualidade cromossômica é conhecido em
plantas do gênero Melandrium (um membro da família das Cravinas). Neste caso, o
cromossomo Y determina uma tendência à masculinidade exatamente como no ho-
mem. Plantas pistiladas são XX e plantas estaminadas são XY.
A habilidade dos gametas produzidos pelo mesmo indivíduo unirem-se e produzi-
rem descendentes viáveis e férteis é comum entre muitas famílias de plantas porta-
doras de flores. Também é do conhecimento geral que a autofecundação ocorre em
alguns grupos de animais inferiores. As flores perfeitas de algumas plantas monoicas
abrem-se somente após o pólen ter amadurecido e depois de haver se realizado a
autofecundação (cleistogamia). A autofecundação é obrigatória na cevada, no feijão,
na aveia, nas ervilhas, no feijão de soja, no tabaco, no tomate, no trigo e em muitas
outras plantas cultivadas. Em algumas espécies, a autofecundação, assim como a fe-
Genética 91

cundação cruzada, pode ocorrer em graus variáveis. Por exemplo, o algodão e o sorgo
comumente apresentam mais de 10% de fecundação cruzada. Outras espécies mo-
noicas, além disso, desenvolveram mecanismos genéticos que evitam a autofecun-
dação ou o desenvolvimento de zigotos produzidos pela união de gametas idênticos,
tornando a fecundação cruzada obrigatória. A autoincompatibilidade, nas espécies
monoicas, pode tornar-se tão eficiente na execução da fecundação cruzada como se-
ria sob mecanismo dioico de determinação do sexo. (STANSFIELD, 1985)

Heredogramas
O heredograma é o modelo gráfico que representa genealogias. Vejamos como a
herança dominante pode ser ilustrada pelos resultados de um estudo de dentinoge-
nesis imperfecta (dentina opalescente) em um grupo familiar, representado abaixo:

A genealogia acima, expressa pelo heredograma, está mostrando a distribuição de


dentina opalescente em um grupo familiar. As gerações são identificadas com algaris-
mos romanos na sequência vertical à esquerda. As linhas horizontais, em que podem
ser vistos de quadrados e círculos, mostram os indivíduos em cada geração. Os qua-
drados representam os machos e os círculos, as fêmeas. Uma linha sólida conectando
horizontalmente um macho e uma fêmea representa um casamento. As linhas descen-
dentes verticais ilustram a progênie em ordem de idade para cada descendente, da
esquerda para a direita. Os números horizontais identificam os membros das gerações
juntamente com seus cônjuges. Quadrados e círculos sombreados representam indiví-
duos que expressam um caráter particular, isto é, sombreado, representa dentina opa-
lescente; não sombreado, dentes normais.
Examinando-se o heredograma, pode-se constatar que, entre os descendentes de
I: 1 - 2, 16 pessoas possuem a condição dentes opalescentes. Quinze irmãos e irmãs
destes 16 possuem dentes normais. Assim, aproximadamente metade das crianças
que possuem um dos progenitores com dentinogenesis imperfecta expressa esse ca-
ráter. Esse é o resultado previsto de cruzamentos entre pessoas heterozigotas com
dentinogenesis imperfecta e pessoas que são homozigotas para o alelo recessivo para
dentes normais brancos. Todas as 16 pessoas com a condição tinham um progeni-
tor afetado. Entre os descendentes dos membros de famílias com dentes normais,
nenhum caso de dentes opalescentes ocorreu. Assim, os dois critérios usados para
identificação de alelos dominantes foram satisfeitos. Radiografias de dentes afetados
mostraram que a cavidade central da polpa da maioria dos dentes estava preenchida
92 PORTO, V. B.

com dentina. Estudos histológicos confirmaram que a dentina, que está completa-
mente coberta em dentes normais, podia ser vista através do esmalte deficiente, o
que dava ao dente o aspecto opalescente.
A partir do modelo esboçado, o heredograma, e com base na probabilidade dos fato-
res envolvidos, é possível prever esse padrão de herança dominante nas futuras gerações
daqueles que possuem dentinogenesis impertecta (presumivelmente heterozigotos) e
se casam com indivíduos com dentes normais. Aproximadamente metade de seus filhos
poderá apresentar o defeito. Indivíduos que não expressam o caráter não irão transmití-lo.
Fonte: Gardner e Snustad (1986).

Síntese do Capítulo
Ao serem estudados os conhecimentos gerados pelas pesquisas que par-
tiram dos experimentos de Thomas Hunt Morgan, verifica-se que, de sua ima-
ginação criativa, surgiu um laboratório denominado sala das moscas, cujos
ensaios, os quais usavam como organismo experimental a mosca das frutas,
Drosophila melanogaster, abriram caminho para importantes descobertas no
campo da ligação gênica, do mapeamento genético e da genética do sexo.
Por ter um tempo de geração curto, por apresentar poucos cromossomos
e por expressar mutações com frequência, logo se percebeu que a ligação gê-
nica caracterizada pela expressão de pares de genes alelos presentes em mais
de um locus de um mesmo par de cromossomos homólogos manifestava uma
proporção fenotípica diferente da segregação independente. Durante a meiose,
a permutação (crossing over) de genes entre esses pares de cromossomos ho-
mólogos impunha o aparecimento de gametas recombinantes, cuja proporção
presente nesse tipo de herança era muito menor que a dos gametas parentais,
os quais são produzidos sem permutação. Dos estudos da frequência de recom-
binação presente nos gametas recombinantes, surgiu o mapeamento genético.
Em sequência aos estudos de Morgan, foram determinados os sistemas
de determinação do sexo X0, no qual o macho apresenta apenas um cromos-
somo X, enquanto a fêmea apresenta dois; o sistema XY, no qual o sexo é deter-
minado pelo cromossomo Y do macho (em drosófila, o sexo se manifesta pelo
balanceamento entre os cromossomos XY), sendo que, nas fêmeas, um dos
cromossomos X se transforma em corpúsculo de Barr, virando heterocromati-
na, como forma de compensar a dose de DNA a mais nas fêmeas; e o sistema
ZW, cujo sexo é determinado pelo cromossomo W da fêmea.
Finalizando o capítulo, abordamos os casos de herança relacionada ao
sexo, enfatizando a hemofilia e o daltonismo. Em “Saiba mais”, tratamos dos ca-
sos do ambiente externo influenciando no sexo; dos ginandromorfos como mo-
saicos sexuais, nos quais determinadas partes do organismo expressam carac-
terísticas masculinas e outras partes apresentam características femininas; da
Genética 93

expressão dos genes holândricos, como aqueles localizados no cromossomo


Y; dos genes com expressão limitada ao sexo (como o leite produzido somente
pelas fêmeas de mamíferos) e dos genes com expressão influenciada pelo sexo
(como a calvície em humanos); dos fenômenos sexuais nas plantas, chamando
a atenção para o hermafroditismo presente em plantas ditas monoicas, nas quais,
com frequência, ocorre a autofertilização; e tratou-se, ainda, da forma de construir
heredogramas como modelos gráficos para representar genealogias.

Atividades de avaliação
1. Supondo-se que, em determinado tipo de animal, o gene que expressa
certa movimentação do dedo é dominante em relação àquele que não
expressa o movimento e que a pelagem crespa é dominante em relação à
pelagem lisa, retrocruzou-se um indivíduo que movimenta os dedos e que
apresenta pelos crespos, o qual é heterozigoto para os dois loci com o seu
parental recessivo, e obteve-se a progênie do quadro abaixo:
CLASSE FENOTÍPICA PROGÊNIE
Com movimento e pelo crespo 123
Com movimento e pelo liso 28
Sem movimento e pelo liso 127
Sem movimento e pelo crespo 22
Total 300

Analise os dados do problema e responda:


a) Estamos diante de que tipo de herança? Justifique sua resposta;
b) Calcule a percentagem de gametas parentais e de gametas recombinantes;
c) Localize os genes num mapa cromossômico.
2. Sabe-se que, em Drosophila, a cor preta do corpo, o formato do olho em
forma de rim e a cor alaranjada dos olhos são expressas por genes reces-
sivos não alelos que se situam no cromossomo três. O cruzamento-teste
realizado com o triplo heterozigoto produziu a seguinte progênie:
CLASSES FENOTÍPICAS PROGÊNIE
Cor selvagem, olho em rim, olho alaranjado 3522
Cor selvagem, olho em rim, olho vermelho 194
Cor preta, olho em rim, olho alaranjado 12
Cor preta, olho normal, olho vermelho 3546
Cor preta, olho em rim, olho vermelho 256
Cor selvagem, olho normal, olho vermelho 16
Cor selvagem, olho normal, olho alaranjado 276
Cor preta, olho normal, olho alaranjado 178
Total 8000
94 PORTO, V. B.

Analise os dados do problema e responda:


a) Determine os gametas produzidos pelos triíbridos;
b) Faça a distinção entre os gametas parentais e os recombinantes;
c) Construa o mapa genético para os três loci.
3. Qual o sexo de uma drosófila 2AX0? Esse organismo é fértil ou estéril?
Justifique sua resposta.
4. Caracterize os sistemas de determinação do sexo X0, XY e ZW.
5. É possível garantir o sexo de espécimes de gatos de três cores? Justifi-
que sua resposta.
6. Construindo meu Portifólio: Continue o seu diário reflexivo a partir das dis-
cussões realizadas no decorrer do presente capítulo, registrando os aspectos
que levem você a agir de forma crítica e reflexiva. Em ato contínuo, construa o
seu portifólio, alimentando-o com os diários produzidos após cada capítulo.

Leituras, filmes e sites


Livros
AMABIS, J. M.; MARTHO, G. R. Biologia das populações: genética, evolu-
ção biológica e ecologia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2006. 443 p.
Caso você tenha muitas dificuldades no aprendizado de Genética, vale a
pena recorrer a essa obra, por se tratar de um livro de nível médio que pode
proporcionar o embasamento necessário para a compreensão dos assuntos
tratados na presente unidade.

Referências
AMABIS, J. M.; MARTHO, G. R. Biologia das populações: genética, evolu-
ção biológica e ecologia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2006. 443 p.
CURTIS, H. Biologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1977. 964 p.
GARDNER, E. J.; SNUSTAD, D. P. Genética. 7. ed. Rio de Janeiro: Guana-
bara Koogan, 1986. 497 p.
PURVES, W. K.; SODAVA, D.; ORIANS, G. H.; HELLER, H. G. Vida: a ciência
da biologia. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2002. 1126 p.
STANSFIELD. W. D. Genética. Tradução Temis R. Saiz Jabardo. 2. ed. São
Paulo: McGraw-Hill, 1985. 515 p.
Capítulo 6
Citogenética,
desenvolvimento e
comportamento
Genética 97

Objetivos
• Identificar as formas de arranjo do material genético na célula;
• Explicar como se processa o desenvolvimento nos seres vivos;
• Reconhecer os diversos tipos de comportamento condicionados pela Ge-
nética.

1. Considerações preliminares
Wilhelm Roux, por volta de 1883, postulou que os cromossomos dentro
do núcleo da célula eram os portadores dos fatores hereditários. Expe-
rimentos de T. Boveri e W. S. Sutton, em 1902, trouxeram evidências
comprobatórias de que um gene é parte de um cromossomo. A teoria
do gene como uma unidade discreta de um cromossomo foi desen-
volvida por T. H. Morgan e por seus colaboradores, em estudos com
a mosca das frutas, a Drosophila melanogaster. H. J. Muller83, poste- 83
H. J. Muller (1890 – 1967)
riormente, promoveu a fusão de duas ciências que muito contribuíram - promoveu a fusão da
Citologia com a Genética,
para a teoria cromossômica – a Citologia (o estudo das células) e a resultando na citogenética,
Genética – na Citogenética, (GARDNER e SNUSTAD, 1986) (GARDNER e SNUSTAD,
1986)
Os indivíduos diferem entre si pela quantidade de cromossomos que apre-
sentam, pela diversidade de genes, com diferentes formas alélicas, que
resultam em genomas diferentes. É importante ressaltar que nem todos
os genes presentes no núcleo de uma célula diferenciada são sempre
expressos ao mesmo tempo. Nos eucariontes superiores, por exemplo,
apenas 10% ou menos dos genes é sempre expressa ao mesmo tempo.
Todos esses aspectos são explicados pelo desenvolvimento dos organis-
mos. (GARDNER e SNUSTAD, 1986)

O estudo do comportamento se torna mais complexo porque a sua ma-


nifestação tem origem molecular. Além disso, as características com-
portamentais de qualquer animal se desenvolvem sob o efeito conjunto
do ambiente e da hereditariedade. A Genética do Comportamento se
preocupa com os efeitos do genótipo no comportamento e com o papel
que as variações genéticas representam na determinação de diferenças
comportamentais em uma população. (GARDNER e SNUSTAD, 1986)

O genoma de um indivíduo está sujeito a uma série de formas de ma-


nifestação, de acordo com a forma de arranjo do seu DNA nos genes, e dos
genes nos cromossomos, que podem ser explicados pela Citogenética, pela
Genética do Desenvolvimento e pela Genética do Comportamento?
98 PORTO, V. B.

No presente capítulo serão estudados os aspectos relevantes da Cito-


genética, da Genética do Desenvolvimento e da Genética do Comportamento,
para que se possa compreender como se manifesta o genoma de um indivíduo.
Na Citogenética, veremos como os arranjos cromossômicos podem ini-
bir certas formas de recombinação dos genes, influindo na variabilidade gené-
tica. Muitas aberrações cromossômicas, no homem, resultam de variação no
número ou nos arranjos dos cromossomos.
No desenvolvimento, o estudo será focado nas diferenças de genoma
que os indivíduos apresentam entre si, variando de acordo com a quantidade
de cromossomos e com a apresentação dos diversos genes, com diferentes
formas alélicas. Ademais, o estudo do desenvolvimento explica porque nem
todos os genes presentes no núcleo de uma célula diferenciada são sempre
expressos ao mesmo tempo.
Já o comportamento será estudado considerando a sua complexidade,
haja vista que sua manifestação tem origem molecular. Além disso, levar-se-á
em consideração que as características comportamentais de qualquer animal
se desenvolvem sob o efeito conjunto do ambiente e da hereditariedade.

2. Citogenética
A Citogenética resultou da fusão de duas ciências que muito contribuíram
para Teoria Cromossômica da Herança – a Citologia (o estudo das células)
e a Genética (o estudo da hereditariedade). Esse feito foi creditado a H. J.
Muller, estudante e colaborador de Morgan, célebre por seus experimentos
sobre os efeitos mutagênicos da irradiação com raios X em cromossomos
sexuais de drosófila e por outras pesquisas que muito contribuíram para
impulsionar a Genética no rumo dos conhecimentos atuais.
Segundo Stansfield (1985), “a Citogenética é a ciência híbrida que
tenta correlacionar os eventos celulares, especialmente aqueles dos cro-
mossomos, com os fenômenos genéticos”. Entre os casos dos estudos cito-
genéticos, serão abordadas as mutações cromossômicas pelos efeitos que
causam aos genomas dos indivíduos, influindo na variabilidade genética. As
mutações cromossômicas podem ser numéricas ou estruturais.

Saiba mais
Cromossomos alterados
Indivíduos de uma mesma espécie podem variar no número de cromossomos sexu-
ais (sistema X0); podem ter cromossomos de certas células somáticas duplicados (células
triploides do endosperma do fruto de plantas angiospermas); e podem ocorrer em popu-
lações naturais e experimentais, com diferenças menores (no desenvolvimento inicial do
verme Ascaris lumbricoides, o semaforonte tem apenas um par de cromossomos).
Genética 99

As modificações no número de cromossomos podem ser refletidas em uma alta invia-


bilidade e em anomalias fenotípicas quando os indivíduos sobrevivem. Isso constitui uma
ferramenta útil para identificar a influência de cromossomos específicos. Por exemplo,
indivíduos fenotipicamente distinguíveis com diferentes números cromossômicos podem
ser identificados em populações naturais ou produzidas experimentalmente, sendo possí-
vel determinar o efeito da adição ou da remoção de determinados cromossomos.

2.1. Mutações numéricas


Sabe-se que células diploides são encontradas no corpo de plantas e de ani-
mais superiores, isto é, elas têm, normalmente, cromossomos formando pa-
res, ou seja, elas são ditas 2n; dizendo de outra forma, verifica-se a presença
de um número n de pares de cromossomos homólogos, aqueles pares que
expressam as mesmas características em cada célula.
Os gametas, células germinativas que foram submetidas à meiose no
plasma germinativo, portam apenas um cromossomo de cada par, portanto,
são denominados de n, ou seja, eles são células haploides.
Contudo, a multiplicação da quantidade de cromossomos do genoma
de um indivíduo, quer seja planta ou animal, é observada com certa frequ-
ência na natureza. Até mesmo as áreas específicas do tecido somático de
um indivíduo estão sujeitas a mudanças numéricas de seus cromossomos
resultantes da multiplicação genômica. Infere-se que esses efeitos se devem
à duplicação cromossômica durante a divisão celular.
Outra assertiva básica garante que todo organismo de uma espécie,
quer sejam plantas ou animais, apresenta-se com o mesmo número cromos-
sômico básico que, de acordo com Gardner e Snustad (1986):
vai de 2 pares num platelminto de vida livre, como em Gyratrix hermaphro-
ditus e alguns ácaros, mosquitos e insetos, a mais de 100 pares em algu-
mas borboletas e em Crustacea. O crustáceo Paralithodes camtschatica,
por exemplo, tem 208 cromossomos ou 104 pares. A variação registra-
da em plantas vai de 2 pares na pequena planta composta Haplopappus
gracilis a várias centenas em alguns fetos. Foi registrada uma espécie
de planta semelhante a um feto, do gênero Ophioglossum, que tem 768
cromossomos.

A diversidade biológica se apresenta com espécies de animais, mos-


trando variações do número cromossômico que podem ser consequentes da
adição de um genoma inteiro ou, então, resultar da perda ou da adição de
cromossomo(s) individual(is), ou de partes deles.
Deste modo, as euploidias se referem à adição de genomas inteiros,
enquanto as aneuploidias se referem à adição ou à perda de partes ou de
cromossomos individuais “(do grego 'ploid', significa ‘unidade’; enquanto 'eu',
significa ‘verdadeira ou mesma’; e 'aneu', significa ‘diferente’). (GARDNER
e SNUSTAD, 1986)
100 PORTO, V. B.

As euploidias são mais comuns em plantas, sendo o número haploide


(n) o número básico dos indivíduos euploides. O número haploide é calculado
dividindo-se o número diploide (2n) por dois, ou seja, o número haploide é a
metade do número diploide.
Nas plantas poliploides, o número haploide reduzido funcional (n) não pode
representar o menor número (x) que pode compor uma série cromossômica, ou o
genoma. Esse menor número x caracterizará os organismos monoploides.
Os euploides podem ter “complementos cromossômicos consistindo
em séries inteiras, ou genomas. Os euploides com mais que um genoma (mo-
noploide) podem ser diploides (2n), triploides (3n), tetraploides (4n) e assim
por diante”. (GARDNER e SNUSTAD, 1986)
As aneuploidias, frequentemente, resultam em anomalias fenotípicas,
podendo até inviabilizar os organismos que as contêm.

Saiba mais
Modificações numéricas
Algumas plantas com um número cromossômico aumentado têm modificações
fenotÍpicas nas características morfológicas e fisiológicas que são de importância prá-
tica para o homem. Os tomateiros, por exemplo, com números cromossômicos acima
de 2n são maiores e produzem mais frutos do que as variedades correspondentes
com o número comum, 2n.
O trigo de pão Triticum aestivum, por exemplo, tem 2n = 42 cromossomos, n = 21.
Os 21 cromossomos segregam-se para cada um dos gametas na meiose. As pequenas
plantas com sementes que, algumas vezes, ocorrem num campo de trigo, possuem um
genoma com 21 cromossomos. Mas o trigo emmer, T. dicoccum, tem n = 14, e o einkorn,
T. monococcum, tem n = 7 e 2n = 14. Sete é um número estranho para representar o
genoma completo dessa espécie. Ele não pode ser dividido em séries iguais de cro-
mossomos inteiros. O símbolo x representa o menor número possível (monoploide)
de um genoma. O trigo do pão é um hexaploide com 6x = 42. Em ervilhas de jardim, n
(haploide) = x (monoploide) = 7, e 2x = 2n = 14 (diploide). (GARDNER e SNUSTAD, 1986)

Particularmente, no homem, o aumento ou a diminuição do número de


cromossomos, principalmente os dos grupos A, B e C, que são cromossomos
maiores, resulta, com muita frequência, em letalidade.
No caso do grupo G, que contém o cromossomo 21, se acontecer a
presença de 3 cromossomos 21, em vez da presença de 2 cromossomos no
genótipo diploide, que é o normal, os indivíduos portadores dessa aneuploidia
serão viáveis, porém apresentarão muitas anomalias simultâneas com trans-
torno à saúde, serão portadores de Síndrome de Down.
O quadro 10 apresenta as principais aneuploidias resultantes da não
disjunção cromossômica na população humana, com enumeração das sín-
Genética 101

dromes resultantes, evidenciadas nos indivídudos viáveis (GARDNER e


SNUSTAD, 1986) Esse assunto ganhará destaque mais adiante, no item ba-
ses bioquímicas e cromossômicas das doenças genéticas.
Quadro 10

Nomenclatura Fórmula Síndrome


Cromossômica cromossômica clínica
47, + 21 2n + 1 Down
47,+ 13 2n + 1 Trissomia do 13
47,+ 18 2n + 1 Trissomia do 18
45, X 2n - 1 Turner
47,XXY 2n + 1
48,XXXY 2n + 2
48,XXYY 2n + 2 Klinefelter
49,XXXXY 2n + 3
50,XXXXXY 2n + 4
47,XXX 2n + 1 Triplo X

2.2. Mutações estruturais


Sabe-se que os cromossomos são quebrados para que possam ocorrer as
mudanças estruturais. A ocorrência de mais de uma parte quebrada por cro-
mossomo pode acontecer, como também vários cromossomos podem so-
frer quebras. Deste modo, novas estruturas cromossômicas podem se formar
pela união das partes quebradas, quando se observa novos arranjos cromos-
sômicos decorrentes dessas emendas. Assim, os arranjos acontecem com a 84
Os genes só não
manutenção de toda a estrutura, ou com perda84 de parte(s) da estrutura ou serão perdidos se forem
com a adição de um segmento cromossômico à estrutura mutante. soldados em outra porção
cromossômica que tenha
Ademais, mais de um tipo de mutação cromossômica estrutural tem a centrômero. “Sem um
possibilidade de acontecer simultaneamente. Exemplo: poderá haver perda centrômero, uma seção
de parte quebrada e o que sobrou poderá ser soldado no outro pedaço de cromossômica não pode se
mover para um dos polos
forma invertida. do fuso durante a divisão
Determinar o tipo de mutação cromossômica estrutural se constitui celular, mas pode se
retardar na divisão celular
numa das principais problemáticas a ser analisada pelos citogeneticistas. As e ser excluída do grupo
mutações cromossômicas estruturais podem ser: deleção, duplicação, inver- cromossômico quando a
membrana nuclear se forma
são e translocação, ou ainda a combinação de mais de uma forma de mudan-
ao redor dos cromossomos
ça estrutural e até mesmo a combinação com a variação numérica. de uma célula-filha”.
(GARDNER e SNUSTAD,
1986)
a) Deleção
Quando as quebras acontecem, é possível que parte(s) cromossômica(s)
seja(m) perdida(s), isto é, seja(m) deletada(s). Seria mais comum que a quebra
fosse única e próxima à extremidade do cromossomo, resultando numa dele-
102 PORTO, V. B.

A deleção é também
85
ção ou deficiência86 terminal. Contudo, duas quebras e perdas de partes inter-
chamada de deficiência
porque envolve perda mediárias dentro do cromossomo são mais frequentes, porque as terminações
cromossômica. cromossômicas são protegidas de quebras e de religações.
A consequência da deleção é a perda dos genes, visto que estavam
presentes na parte perdida. Não há, então, pareamento entre as porções ho-
mólogas, formando uma alça no cromossomo homólogo normal, para pos-
sibilitar o pareamento das porções intactas dos cromossomos, assim, essas
alças ficam protegidas da recombinação genética. Então, esses genes se ex-
pressam em hemizigoze, dando a impressão de que são dominantes, porque,
mesmo recessivos, expressar-se-ão em dose única, fenômeno denominado
de pseudodominância.

b) Duplicações
As adições de partes perdidas de
um membro do par de homólogos ao ou-
tro membro podem caracterizar as dupli-
cações, gerando deleção no outro mem-
bro do par (Figura 26).

Figura 26 – A duplicação pode vir associada à


deleção. (AMABIS e MARTHO, 2006)

Neste caso, a consequência da duplicação é o ganho dos genes que


estavam presentes na parte perdida. Os genes duplicados podem funcionar
como dominantes ou como recessivos com relação a determinados fenóti-
pos. Ausência de dominância e ainda efeitos cumulativos podem também
ser observados, revelando que modificações nas proporções monoíbridas e
diíbridas podem resultar de duplicações nos cromossomos.

Saiba mais
Duplicações cromossômicas
A primeira duplicação a ser criticamente examinada envolveu o locus B (bar) no cro-
mossomo X de Drosophila. O olho de uma fêmea heterozigota B/B+ é um tanto menor
do que o olho normal, e os lados são retos, dando uma aparência oblonga ou em barra.
Na condição de hemizigoto ou homozigoto, o olho é consideravelmente menor. Bridges
e Muller descobriram independentemente que o fenótipo bar foi resultado de uma du-
plicação envolvendo uma parte do cromossomo X já presente nas moscas tipo selvagem.
Ambos os investigadores observaram não apenas o efeito de uma duplicação que produ-
Genética 103

ziu olho bar, mas também uma duplicação que resultou em um decréscimo extremo no tama-
nho do olho, a qual foi chamada de "bar duplo". Através do exame do cromossomo politênico
salivar, eles identificaram os segmentos do cromossomo envolvidos realmente na duplicação.
Outras duplicações que foram encontradas em Drosophila trabalham na direção
oposta, suprimindo os efeitos de genes mutantes e fazendo as moscas parecerem mais
próximas do normal com respeito a certos traços. Estudos posteriores demonstraram
que as duplicações não precisam ocorrer na vizinhança imediata da seção duplicada
para exercerem uma influência. Os fragmentos cromossômicos podem se tornar ligados
a cromossomos inteiramente diferentes. Por intermédio da segregação desses cromos-
somos nos gametas, as duplicações podem ser transmitidas às gerações subsequentes.

c) Inversões
A rotação de 1800, nas partes quebradas dos cromossomos, antes
que eles sejam emendados, caracterizam as inversões. Nas inversões, a
ordem dos genes no cromossomo é invertida.
Na inversão, formam-se alças duplas entre os pares de cromosso-
mos homólogos durante o pareamento meiótico. Esse fato permite o posi-
cionamento dos genes lado a lado. As alças protegem as partes invertidas
da permutação, suprimindo a recombinação genética.
Observe as inversões e o pareamento de partes invertidas na figura 27.

Figura 27 – Inversão e sua forma de pareamento cromossômico.


104 PORTO, V. B.

Saiba mais
Inversões
As inversões têm sido associadas com a supressão de crossing over [permutação].
Antes que os cromossomos de Drosophila tivessem sido estudados extensivamente,
pesquisadores tinham já identificado supressores de recombinações genéticas nesse
organismo. Esses supressores foram primeiramente considerados como genes que, de
algum modo, interferiam no crossing over. Foi demonstrado que as localizações das in-
versões e dos supressores de recombinação coincidiam e que a supressão aparente de
crossing over estava diretamente associada com inversões. O principal processo não é
uma supressão de crossing over, ainda que a frequência física de crossing over possa ser
reduzida. Os gametas recombinantes que realmente ocorrem não são recuperados; isto
é, os zigotos morrem antes que possam ser detectados. (GARDNER e SNUSTAD, 1986)

d) Translocações
A ligação de uma parte de um cromossomo à outra parte de um par de
cromossomos não homólogo caracteriza a translocação.
Portanto, pode-se constatar que a translocação pode resultar da parte
deletada de um cromossomo que foi emendada em outro cromossomo não
homólogo ao deficiente.
Outro caso de translocação é a translocação recíproca, que acontece
quando dois pares de cromossomos homólogos perdem partes que se sol-
dam, as de um par no outro e vice-versa. Foi constatado que esse fator é im-
portante na “evolução de certos grupos de plantas”. (GARDNER e SNUSTAD,
1986) Vejamos a figura 28 a seguir:

Figura 28 – Representação esque-


mática da translocação recíproca,
adaptado de Amabis e Martho (2006).
Genética 105

3. Desenvolvimento do ciclo de vida


O ciclo de vida de um organismo abrange estágios progressivos que são
alcançados mediante o processo de desenvolvimento. Esses estágios per-
ceptíveis na vida de um organismo são denominados semaforontes86, termo Segundo Hennig, op cit
86

Amorim (2002), é a forma


cunhado por Hennig, mas de pouco uso na literatura biológica (Figura 29). pela qual se expressa
um indivíduo, durante
determinado estágio de
desenvolvimento.

Figura 29 – Estágios de desenvolvimento de uma planta e de um animal, mostrando


diversos semaforontes desses organismos. (PURVES et al., 2002)

No tocante à Genética, o desenvolvimento compreende a expressão dife-


rencial de genes. Sabe-se que os genomas de organismos eucariontes são muito
parecidos, favorecendo o estudo do desenvolvimento, uma vez que a conclusão
que se tira à respeito de um organismo estudado serve para os demais. Desta
forma, estudos com a planta Arabdopsis thaliana, com a mosca das frutas, Droso-
phila melanogaster, apresentadas na figura 29, e com outros organismos têm se
revelado muito esclarecedores quanto ao processamento do desenvolvimento.
Os estudos realizados permitiram concluir que as células somáticas, aque-
las que formam o corpo de um indivíduo, são portadoras de conjuntos de genes
idênticos, os quais foram herdados da célula-ovo ou zigoto, portanto não se perde
106 PORTO, V. B.

87
São células DNA das células quando um organismo se desenvolve. Com isso, conclui-se que
indiferenciadas que
permanecem assim nos
é a expressão diferencial dos genes que resulta em diferenciação celular.
diversos estágios de As células-tronco87 evidenciam que um genoma permanece indiferenciado
desenvolvimento para dar
origem a determinados
durante toda a vida de um organismo. É o caso das células hematopoiéticas,
tipos de células. ou seja, células-tronco tais como os eritroblastos, cujos genes funcionais, após
As células-tronco têm a sua diferenciação, darão origem aos glóbulos vermelhos, os quais produzem a
potencialidade para originar
qualquer tipo de célula. hemoglobina, sendo que, nos mamíferos, o núcleo é expulso para acomodar me-
Assim como as células- lhor essa proteína. Contudo, a diferenciação do osteoblasto, outro tipo de célula-
ovo, elas são totipotentes, -tronco, não produz hemoglobina por pertencer a outro tecido, o tecido ósseo.
portanto, sua presença
em organismos adultos é Destarte, concluímos que, na expressão diferenciada dos genes, que
uma prova inconteste da compreende a regulação diferencial da transcrição, os eventos pós-transcri-
herança genética do ovo ou
do zigoto. cionais, como o splicing do RNA e a tradução, estão entre os fatores primários
que proporcionam a diferenciação das células.
Contudo, a diferenciação não inclui uma mudança irreversível do ge-
noma, apesar de ser irreversível em determinados tipos de células, como as
hemácias de mamíferos e os traqueídes das plantas vasculares – em outros
tipos de células que conservam o núcleo sob determinadas condições am-
bientais, a diferenciação também é irreversível. Porém, em outras condições,
pode-se fazer com que a célula retorne ao estágio embrionário e possa dar
origem a um organismo inteiro. Esse princípio de retornar ao estágio embrio-
88
A capacidade para clonar nário é usado em Biotecnologia para realizar a clonagem88.
uma planta de cenoura a
partir de uma célula de raiz Experimentos como o transplante nuclear em rãs (o qual é descrito na
diferenciada indica que a seção Saiba Mais) e em ovelhas (similar ao experimento com rãs, cujo caso
célula contém o genoma
inteiro de cenoura e que ela mais conhecido foi o da ovelha Dolly, o primeiro clone a ser produzido), as-
pode expressar os genes sim como a clonagem em células vegetais (clonagem de células de cenoura)
adequados na sequência reforçam a inferência de que o genoma é constante e equivalente em todas
certa. Muitas células de
outras espécies de plantas as células somáticas de plantas e de animais, levando a concluir que são os
mostram comportamento genes que são expressos de forma distinta nos organismos.
semelhante no laboratório,
e essa capacidade para
gerar uma planta inteira a
partir de uma única célula
tem sido inestimável em Saiba mais
biotecnologia agrícola.
"Esses experimentos Transplante nuclear
com plantas provam que Uma demonstração mais direta de que todo o material genético está presente em
uma célula somática é
células diferenciadas tem vindo de experimentos de transplante nuclear realizados,
totipotente".
inicialmente, por Robert Briggs e por Thomas King, que removeram o núcleo de um
ovócito não fecundado de rã, fazendo assim um ovócito enucleado.
Com uma pipeta de vidro muito fina, os pesquisadores puncionaram uma célula
de um embrião precoce e tiraram parte de seus componentes, incluindo o núcleo,
que foi injetado no ovócito enucleado.
Mais de 80% dessas operações de transplante nuclear resultaram na formação, a
partir do ovócito e do seu novo núcleo, de um embrião precoce normal, sendo que mais
da metade se desenvolveram em girinos e em adultos normais. (PURVES et al., 2002)
Genética 107

4. Comportamento dos seres vivos


A etologia é a ciência que estuda o comportamento, o qual pode ser molda-
do pela herança ou pode ser aprendido. Os animais apresentam comporta-
mentos estereotipados e específicos, revelando a sua natureza genética de
moldagem pela herança. Já no homem, pelo desenvolvimento da linguagem,
grande parte da sua forma de se comportar revela que foi o aprendizado que
moldou aquele tipo diferenciado de comportamento.
A genética do comportamento trata da forma como o genótipo se ma-
nifesta no comportamento, esclarecendo quanto ao “papel que as diferenças
genéticas representam na determinação das diferenças comportamentais em
uma população” (GARDNER e SNUSTAD, 1986)
Observando determinados tipos de comportamentos animais, pode-
-se afirmar corretamente o caráter genético que prevalece naquela forma
de se comportar.
Alguns exemplos evidentes de relacionamento com a herança se re-
velam em comportamentos, como a construção da teia pela aranha, que,
embora necessite de sequência certa de miríades de movimentos, cada es-
pécie executa da mesma maneira, apresentando um movimento de cada
vez. A natureza genética do comportamento é revelada quando, por exem-
plo, mesmo que estejam mortas as aranhas-mães, no momento em que as
aranhas-filhas eclodem de seus ovos, elas se dispersam e constroem a teia
da mesma forma que as aranhas-mães construíam, embora não haja ne-
nhum modelo para se espelhar. Cada espécie realiza a construção da teia
com o seu desenho específico
Outro tipo de comportamento herdado é a coreografia praticada por patos
e marrecos durante os acasalamentos. Ainda que os patos e marrecos mallar-
ds, teals, pintails e gadwalls sejam intimamente aparentados e potencialmente
intercruzantes, na natureza, não acontece o intercruzamento porque a fêmea
não aceita o macho que não execute a coreografia perfeita da espécie.

Saiba mais
Liberadores
A necessidade de receber uma noz pelos esquilos para desencadear os seus com-
portamentos de cavar e de enterrar permitem inferir que estímulos simples podem
desencadear comportamentos. Os estimulos específicos são necessários para eliciar a
expressão de muitos comportamentos herdados geneticamente.
Dois etólogos pioneiros, Konrad Lorenz e Niko Tinbergen, que conduziram estudos
clássicos da natureza dos estímulos que eliciam tais comportamentos, chamaram esses
estímulos de liberadores (releasers). Os liberadores são, usualmente, um subconjunto
simples de toda a informação sensorial disponível para um animal.
108 PORTO, V. B.

Os machos adultos do sabiá europeu, por exemplo, têm penas vermelhas em seus
peitos, as quais servem como liberadores de comportamento agressivo por outros ma-
chos. Durante a estação de acasalamento, a visão de um macho adulto de sabiá estimu-
la outro macho a cantar, a realizar exibições agressivas e a atacar o intruso se ele não
prestar atenção nesses avisos. Um macho imaturo de sabiá, cujas penas são completa-
mente marrons, não elicia esse comportamento agressivo.
No entanto, um tufo de penas vermelhas em um pedaço de pau é suficiente para
liberar o comportamento agressivo em sabiás machos. (PURVES et al., 2002)

Se forem produzidos indivíduos híbridos resultantes do intercruzamen-


to entre variedades diferentes, os machos desenvolvem uma coreografia
que mistura movimentos das variedades envolvidas no cruzamento e de ou-
tras variedades que, embora não envolvidas, praticam aqueles movimentos
manifestados pelos híbridos, portanto, os machos são estéreis, não pela sua
capacidade de cruzamento, mas pela não aceitação da fêmea que recusa o
seu comportamento sexual. Conclui-se, então, que a coreografia que prece-
de o ato sexual foi selecionada naturalmente pelo ambiente onde vivem as
variedades, sendo estereotipado e específico das variedades que cruzam.
Em abelhas, o comportamento também tem origem genética. Vejamos
como Gardner e Snustad (1986) abordaram esse assunto:

W. C. Rothenbuhler, por exemplo, encontrou evidências de que um inte-


ressante padrão de comportamento nas abelhas produtoras de mel é con-
trolado por dois pares de alelos recessivos na forma mendeliana simples.
Duas raças diferentes de abelhas diferem do comportamento "higiênico".
As abelhas operárias da linhagem Brown, uma raça higiênica, abrem com-
partimentos na colmeia que contém pupas mortas por determinado agente
infeccioso e as transferem. Aquelas da linhagem Van Scoy, uma raça não
higiênica, deixam as pupas mortas nos compartimentos fechados e des-
te modo, permitem que aqueles agentes infecciosos se propaguem na
colônia. Rothenbuhler cruzou as duas raças e obteve abelhas operárias
F-1, todas não higiênicas. Quando zangões F-1 (a partir de gametas F-1
não fertilizados) foram retrocruzados com rainhas higiênicas, quatro tipos
de colônias retrocruzadas foram obtidas em aproximadamente iguais pro-
porções: (1) abelhas higiênicas, (2) abelhas que abriam cavidades nos
favos, mas não removiam as pupas mortas, (3) abelhas que não abriam
cavidades nos favos, mas removiam as pupas mortas quando cavidades
eram abertas pelos apicultores e (4) abelhas não higiênicas. Se um sim-
ples gene recessivo “u” controla o padrão de comportamento de abertura
dos compartimentos e um outro único gene recessivo “r” controla o padrão
de comportamento para remoção de pupas mortas, os resultados obtidos
por Rothenbuhler podem ser explicados por segregação independente
mendeliana. Embora muitos genes e influências possam estar associados
com o complicado mecanismo de neurônios que sustenta os padrões de
comportamento de não fechamento e de remoção, a reação limiar é deter-
minada primariamente pelos alelos simples.
Genética 109

Concluindo-se, é importante ressaltar que o exemplo da higiene em col-


meias aliado ao dos liberadores de estímulos, ao da coreografia em patos e
ao da construção da teia pela aranhas são suficientes para demonstrar que o
comportamento é fruto de fortes componentes hereditários.

Saiba mais
Mais sobre Liberadores
Tinbergen e A. C. Perdeck examinaram cuidadosamente os liberadores envolvidos nas
interações entre gaivotas e suas crias durante a alimentação. Uma gaivota adulta tem um
ponto vermelho no final de seu bico. Quando a gaivota retorna para o ninho com alimen-
to, as crias bicam o ponto vermelho, estimulando, dessa forma, o adulto a regurgitar o
alimento para elas comerem.
Tinbergen e Perdeck levantaram a hipótese de que o ponto vermelho era o liberador
do comportamento de pedido das crias. Para testar essa hipótese, confeccionaram mo-
delos de papel de cabeças e bicos de gaivota, variando as cores e as formas. Então, classi-
ficaram cada modelo de acordo com o número de bicadas recebidas de filhotes ingênuos
recém-eclodidos.
A forma ou a cor do modelo de cabeça não fez diferença. De fato, uma cabeça nem era
necessária, pois as crias responderam da mesma forma a modelos apenas de bicos - des-
de que eles tivessem o ponto vermelho. Surpreendentemente, o liberador mais efetivo
do comportamento de bicar dos filhotes era um objeto longo e fino com uma ponta preta
que não apresentava qualquer semelhança com uma gaivota adulta.
Claramente, as crias herdaram a habilidade de reconhecer um estímulo simples e res-
ponder a ele com seu comportamento de pedido também herdado. Para os etólogos,
isso representou um excelente exemplo de um comportamento que era geneticamente
determinado ao invés de aprendido. (PURVES et al., 2002)

Síntese do Capítulo
O presente capítulo tratou da Citogenética, ramo da Genética fusionado com
a citologia. O tema focado foram as mutações cromossômicas que podem
ser de natureza numérica ou estrutural. As de natureza numérica resultam da
multiplicação dos genomas, sendo denominadas euploidias, muito comuns
em plantas. Desta forma, organismos com 1 genoma são denominados mo-
noploides; com 2, diploides; 3, triploides; 4, tetraploides; e com 5 ou mais,
poliploides. Quando são alterados, os números de cromossomos contados in-
dividualmente, temos as aneuploidias, que se revelam como determinantes de
fenótipos anormais em organismos humanos. Assim, as síndromes de Down,
de Klinefelter e de Turner resultam de aneuploidias.
110 PORTO, V. B.

As mutações estruturais, também denominadas de aberrações cromossô-


micas, são a deleção, a duplicação, a inversão e a translocação, que se carac-
terizam por formar arranjos cromossômicos com pareamento de homólogos du-
rante a meiose, por serem alterados, tendo como consequência a diminuição das
permutações em cromátides não irmãs de pares de cromossomos homólogos. O
desenvolvimento se caracteriza por estágios, em progressiva mudança, durante o
ciclo de vida de uma espécie, decorrente da expressão diferencial dos vários tipos
de células que comporão os diversos tecidos do corpo de um organismo.
É relevante ressaltar que todas as células originam-se da célula-ovo ou
zigoto, portando a mesma carga genética. Muitos tipos de organismos foram
usados experimentalmente para que se pudesse compreender as várias eta-
pas do desenvolvimento, já que o processo de desenvolvimento é similar nos
animais. Entre eles, citamos a planta Arabdopsis thaliana e a da cenoura; o
verme Caenorhabidites elegans; a mosca das frutas, Drosophila melanogas-
ter; as rãs; os ouriços do mar; as ovelhas e as células-tronco, cujos resultados
proporcionaram um melhor conhecimento sobre o desenvolvimento, além de
possibilitar avanços significativos na área da Biotecnologia.
Os mecanismos genéticos do comportamento também entraram em dis-
cussão, concluindo-se que ambiente e genótipo interagem na determinação
do tipo de comportamento. Contudo, determinados tipos de comportamento,
como a construção de teias pela aranha, na coreografia de acasalamento em
patos e em marrecos, e a higiene em colmeias, apresentam forte componente
hereditário. Dando sequência, vimos que os liberadores são estímulos simples
para desencadear comportamentos hereditários.

Atividades de avaliação
1. Sabe-se que a hipótese de Lyon infere que os cromossomos sexuais se
transformam em corpúsculos de cromatina sexual (corpúsculos de Barr)
em fêmeas, sendo inativados, mas permanecendo ativo somente um cro-
mossomo X para compensar a dosagem quando se comparam machos
com fêmeas. Tendo isso em vista, quantos corpúsculos de Barr são espe-
rados nas pessoas portadoras dos seguintes conjuntos cromossômicos:
a) 2AXYY – Supermacho
b) 2AX0 – Síndrome de Turner
c) 2AXXX – Superfêmea
d) 2AXXY – Síndrome de Klinefelter
e) 2AXX + 1(23) – Síndrome de Down
Genética 111

2. Sabendo que a trissomia do 18 ocorre numa frequência de 1/8.000, res-


ponda: numa cidade de 2.000.000 habitantes, seriam portadores da sín-
drome do 18? Qual a razão esperada para o nascimento de dois bebês
no mesmo dia naquela cidade? Qual a chance de que sejam registrados
três casos num hospital de uma cidade no mesmo dia?
3. Sabendo que as euploidias resultam da multiplicação de genomas, por
que os euploides com número par de genomas se perpetuam mais fa-
cilmente nas populações do que os de números ímpares?
4. Quanto às mutações numéricas e estruturais, identifique a quantidade
de cromossomos que possuem os indivíduos com os seguintes arran-
jos cromossômicos:
a) Haploides e) Trissômicos
b) Diploides f) Tetrassômicos
c) Monossômicos g) Triploides
d) Monoploides h) Tetraploides
5. Disserte sobre as inversões como supressoras da recombinação genética.
6. Quais são e como aparecem as mutações cromossômicas estruturais?
7. Como se manifesta o desenvolvimento nos organismos?
8. Como podemos concluir que os genes são expressos de forma distinta
nos organismos?
9. Em geral, como está relacionado o comportamento animal com a Ge-
nética e com os fatores ambientais?
10. Por que as teias de aranhas e as coreografias no acasalamento de
patos e de marrecos podem ser comportamentos geneticamente de-
terminados?
11. Levando em consideração os mecanismos genéticos do comporta-
mento, o que são liberadores?
12. Construindo o seu Portifólio: Continue o seu diário reflexivo a partir
das discussões realizadas no decorrer do presente capítulo, registran-
do os aspectos que levem você a agir de forma crítica e reflexiva. Em
ato contínuo, construa o seu portifólio, alimentando-o com os diários
produzidos após cada capítulo.
Capítulo 7
Outros aspectos de
relevância na Genética
Genética 115

Objetivos
• Conhecer as bases genéticas associadas à evolução;
• Entender as bases bioquímicas e cromossômicas de algumas doenças ge-
néticas;
• Discutir sobre as principais aplicações da Genética: Genética aplicada à evo-
lução; Genética e as doenças herdadas; Engenharia Genética.

1. Bases genéticas da evolução


Figuram, entre os aspectos de relevância na Genética, as bases da
evolução biológica, as bases moleculares das doenças genéticas e as
aplicações da Genética na área da Biotecnologia.
Charles Darwin (1809
89
Felizmente, por volta de 1900, os seguidores de Darwin89, que passaram – 1882) foi o pioneiro
a ser conhecidos como neodarwinistas, redescobriram as publicações de no estudo da evolução
Mendel e começaram a aplicar a Genética à evolução, pavimentando um por seleção natural,
(GARDNER e SNUSTAD,
caminho que desembocaria no desenvolvimento da genética de popula-
1986).
ções, um campo que fornece grande sustentação para a teoria da evolução.

Atualmente, centenas de doenças derivadas de defeitos em genes e em


cromossomos já foram identificadas. Como será visto neste capítulo, a
Biologia Molecular e a Citogenética trouxeram mais esclarecimentos para
essas doenças, por meio da descrição dessas anomalias em nível de DNA
e de cromossomos, respectivamente. Foi demonstrado que até mesmo
o câncer pode, em muitos casos, ser provocado por anomalias gênicas.

O surgimento da “engenharia genética” figura entre os aspectos rele-


vantes que permitem vislumbrar as aplicações da Genética à vida mo-
derna. Situações que envolvem a terapia gênica e o Projeto Genoma
Humano são reflexos desses avanços. Nesse campo da Biotecnologia,
observa-se a fabricação de produtos, variando desde as drogas que
salvam vidas – e que não há nenhuma outra maneira de produzir em
quantidades adequadas – até plantas de colheita com características
agricultáveis melhoradas. (Texto adaptado de PURVES et al, 2002).

Saber onde se assentam as bases da evolução biológica, as bases molecu-


lares das doenças genéticas e quais as aplicações da Genética na área da
Biotecnologia são aspectos de relevância da Genética, cujo conhecimento se
reflete na melhoria da qualidade de vida moderna?
116 PORTO, V. B.

Anagênese seguida de
90
Explicar os fundamentos do processo evolutivo90 é uma das aplicações
Cladogênese gera evolução
da Genética. Sabe-se que a teoria da evolução foi formulada por Charles Da-
biológica.
rwin em meados do século XIX, quando ainda efervesciam as ideias fixistas
de criação divina para a vida. Contudo, embora Darwin percebesse diversi-
dade e adaptabilidade, ele não enxergou que a variabilidade genética era o
motivo principal para resultar num mundo tão diverso em seres vivos.
Cerca de meio século depois de expostas as ideias de Darwin, ou seja,
somente no início do século XX, é que a variabilidade genética veio à tona, e
os mecanismos genéticos passaram a explicar como a seleção natural age
nas espécies para lhes conferir diversidade.
A genética das populações é o caminho que foi palmilhado pelos gene-
ticistas para explicar o processo de diversificação das espécies.
As populações naturais vivem em equilíbrio. Isso foi postulado “em
1908 por um matemático inglês, G. H. Hardy, e por um físico alemão, W.
Weinberg, que descobriram, independentemente, o princípio relativo às fre-
91
Como vimos no quências dos alelos em uma população, chamado de princípio de Hardy-
livro Fundamentos de -Weinberg”. (GARDNER e SNUSTAD, 1986) No final deste capítulo, esse
Geociências, a Terra
é muito velha, ela, assunto é novamente abordado em um texto complementar.
provavelmente, tem uma O rompimento deste equilíbrio, produzindo mudanças nas frequências
idade de 4,56 bilhões de
anos. Durante esse tempo,
alélicas das populações, é que gerou mudanças evolutivas graduais. A per-
o planeta esteve sujeito a sistência dessas mudanças numa espécie resultou em especiação, ou seja,
mudanças ambientais de na formação de nova espécie a partir de uma espécie ancestral.
ordem química, física e
biológica. Citando somente Entre os fatores responsáveis pelo rompimento do equilíbrio de Har-
algumas, comecemos dy e Weinberg, figuram as mutações como fatores primários. Outros fatores
com uma de natureza
química: o surgimento de importantes são o tempo geológico91, a recombinação genética, a oscilação
uma atmosfera peculiar foi genética, o isolamento geográfico, a deriva genética e a seleção natural.
fator determinante para o
aparecimento de sistemas Observando-se o mundo natural, nota-se uma enorme diversidade
moleculares bioquímicos entre formas de vida (veja o texto complementar “Desvendando a Di-
que propiciaram a origem versidade Biológica”). Seriam os fatores evolutivos os responsáveis por
da vida. No âmbito do
estudo da física, podemos essa diversidade?
citar o tectonismo de Comecemos a responder a esta questão, tendo como ponto de par-
placas, movimento
imperceptível no cotidiano, tida as mutações e inferindo que tal diversidade resulte de um processo de
mas consequente da mudanças iniciado com a origem dos seres vivos, haja vista que o material
enorme energia acumulada genético está sujeito a erros na replicação do DNA, que são as mutações, as
nas entranhas da Terra,
gerando vulcanismos, quais, como vimos no capítulo 2, são deletérias.
terremotos e deriva Contudo, uma minúscula fração das mutações, quando é “aproveitada”
continental. O oxigênio livre
na atmosfera é um produto pela seleção natural, gera mudanças graduais nas características dos seres vivos,
de origem biológica, em consequência da expressão de novos genes alelos produzidos, resultados
resultante do processo de
das mudanças no DNA, processo evolutivo que é denominado de anagênese.
fotossíntese.
Genética 117

Quando a especiação acontece, isto é, quando as mudanças são tão


acentuadas que impedem o cruzamento entre os indivíduos mutantes e a
população original, outro processo evolutivo se instala: é a cladogênese, que
consiste na fragmentação das espécies, isto é, na especiação.
Somente um tempo geológico tão longo entremeado por mudanças
ambientais drásticas poderia explicar como apareceram novos nichos eco-
lógicos para selecionar novas espécies e até mesmo como espécies foram
extintas. Darwin soube muito bem usar a escala temporal nas suas inferên-
cias sobre seleção natural, entretanto, não soube explicar como apareciam
as variações nas espécies.
A recombinação genética é outro fator evolutivo que condiciona a va-
riabilidade das espécies. No capítulo 1, estudamos as diversas formas de
variabilidade genética, partindo da genética mendeliana. Segundo Gardner
Snustad (1986), sabe-se que “uma população mendeliana é um grupo inter-
cruzante de organismos que compartilham um conjunto de genes (pool gêni-
co) comum”. Quando o equilíbrio populacional é rompido por alterações nos
genomas, novas formas alélicas surgem e incrementam as possibilidades
de recombinações genéticas, que se expressam no fenótipo das espécies,
aumentando-lhes a variabilidade, e evidenciando o processo anagenético de
mudanças graduais que se perpetuam nas espécies.
A oscilação genética pode ser constatada em populações, quando são
analisados na área geográfica que ocupam. A frequência genética não é a
mesma quando se examinam os genomas individuais da periferia para o cen-
tro da área ocupada. Verifica-se uma maior uniformidade entre os genomas
do centro da área, enquanto a periferia apresenta maior diversidade de geno-
mas em relação ao centro.
Caso aconteça isolamento geográfico, os novos nichos ocupados propor-
cionarão uma fixação diferencial de alelos, o que acentuará o processo de diversi- 92
Quando causas naturais,
ficação na população por deriva genética, conduzindo a população à especiação. como a fragmentação
de um continente, são
O isolamento geográfico pode acontecer por vicariância92 ou por dispersão. responsáveis pelo
Quando a deriva genética resulta do isolamento geográfico das peque- isolamento geográfico
de populações, neste
nas populações periféricas, denominadas isolados periféricos, as variações caso temos a vicariância.
no pool genético desses isolados é maior ainda, levando a uma especiação Outro modo de isolamento
mais rápida, o que caracteriza o efeito do fundador. geográfico resulta da
ultrapassagem voluntária
A seleção natural é outro fator evolutivo que é transversal, agindo sobre de uma barreira, por parte
todos os demais, em todos os momentos. É consequente da variabilidade da população, o que
caracteriza a dispersão.
ambiental e fixa variações genéticas que se adaptam a um ambiente em
constante transformação.
Acontecendo desta forma, a história de ancestralidade e de descen-
dência, ou a filogenia, é explicada com bases genéticas.
118 PORTO, V. B.

Saiba mais
Desvendando a diversidade biológica
É impossível compreender plenamente uma área do conhecimento ou uma teoria
sem saber precisamente qual é o problema subjacente que se pretende resolver.
Constitui-se problema do conhecimento em Biologia compreender a diversidade bio-
lógica, ou seja, as diferenças entre a miríade de grupos de plantas, animais, organis-
mos unicelulares e procariontes.
O conhecimento da diversidade biológica parece ser tão antigo quanto o próprio
conhecimento humano. Expondo-se a história do conhecimento da diversidade bio-
lógica ao longo do desenvolvimento da cultura, especialmente ocidental, segundo
PapaVero e Balsa (1986) e PapaVero (1989, 1991), o Gênesis, por exemplo, refere-se
à origem das espécies por um processo de criação e relata a atribuição de nomes às
espécies de animais. De fato, esse é um dos exemplos mais antigos conhecidos de
preocupação formal do homem com a elaboração de nomes para os organismos.
Platão e Aristóteles, ainda antes de Cristo, foram filósofos que trataram da di-
versidade, levando em conta a imutabilidade dos seres vivos. Lineu, no século XVIII,
conhecido como o pai da classificação dos seres vivos e da nomenclatura binomial,
acreditava no criacionismo. Entretanto, no século XIX, Lamarck e Darwin/Wallace fo-
ram outros expoentes do mundo científico que trataram da diversidade dos seres
vivos, já levando em conta a possibilidade de evolução das espécies. Hennig, mais
recentemente, já na década de 60 do século XX, propôs uma metodologia de classi-
ficação dos seres vivos baseada na filogenia, isto é, na história da ancestralidade e na
descendência das espécies.
As ideias de evolução, como são entendidas hoje, tem certas consequências im-
portantes. Uma delas é que quaisquer duas espécies devem ter, pelo menos, uma
espécie ancestral comum. De quaisquer três espécies atuais, duas têm uma ancestral
comum que não é comum à terceira – exceto se as três foram originadas simultane-
amente. Se aplicarmos esse raciocínio a todas as espécies, obteremos a imagem de
uma enorme sequência de divisões que se fragmentaram desde a primeira espécie
ancestral – ancestral de todos os seres vivos – até as espécies existentes hoje em dia
(supondo-se que a vida na Terra tenha surgido uma única vez). Ao conjunto dessa
história de ancestralidade e de descedência entre todas as espécies, denominamos,
genericamente, Filogenia. Posteriormente, chamamos de Filogenia o diagrama que
representa essa história. Talvez valha a pena realçar que existe apenas uma história
das relações entre as espécies.
O primeiro passo para dominar o método filogenético é entender o conceito de
Homologia. À luz da teoria da evolução, a afirmação de que estruturas de diferentes
espécies são homólogas implica que essas espécies têm um ancestral comum que
também apresentava essa estrutura. A existência de estruturas homólogas em es-
pécies diferentes deve ser entendida como o resultado de cópias da estrutura que
existiu em sua espécie ancestral comum mais recente e que foi perpetuada na sua
descendência, com ou sem modificações.
Estruturas homólogas podem ser iguais ou não. Os braços direitos de dois homens
são homólogos e são virtualmente idênticos; do mesmo modo, o bico de um papagaio
é homólogo ao bico de um beija-flor e são bastante diferentes. Assim, estruturas ho-
mólogas podem ser virtualmente idênticas ou bastante diferentes.
De um ponto de vista evolutivo, o bico de um papagaio e de um beija-flor po-
Genética 119

dem ser considerados homólogos, mesmo sendo diferentes entre si, porque a espécie
ancestral comum às duas espécies supostamente também apresentava bico. Nesse
caso, o que houve foram modificações diferenciais na forma do bico a partir da es-
pécie ancestral comum mais recente entre elas, ao longo da história que acabou por
originar o papagaio e o beija-flor. A semelhança entre o braço direito de dois indivídu-
os humanos é devido a sua ancestralidade comum, sem que surgissem características
diferenciais evidentes.
As asas de um morcego e as asas da ema, por outro lado, não podem ser consi-
deradas homólogas. Uma comparação cuidadosa entre a forma e a posição das asas
de um morcego e a das asas da ema mostra que elas diferem de diversas maneiras:
na ave, as membranas alares ligam a parte distal do membro anterior ao tórax; em
um morcego, as membranas estendem-se entre dedos extremamente alongados do
membro anterior. A semelhança é superficial. Como há um grande número de outros
caracteres que mostram que os morcegos formam um subgrupo de mamíferos, pode-
-se inferir que as modificações genéticas que produziram aquilo que se chama de
"asa" em um e em outro desses grupos surgiram duas vezes, em ancestrais indepen-
dentes. Além disso, há muitas evidências de que a espécie ancestral mais recente co-
mum a aves e a morcegos – o ancestral de todos os Amniotas – não apresentava asas.
Essa conceituação genérica de homologia não é particularmente complexa e é
de assimilação relativamente direta. Apenas é necessário ter conhecimento de que,
dentro de um paradigma evolutivo, ao se fazer uma afirmação de homologia de uma
estrutura em grupos distintos, está sempre implícita uma afirmação de que essa es-
trutura supostamente esteve presente na espécie ancestral comum mais recente en-
tre os grupos envolvidos.
É necessário, agora, discernir entre os conceitos de "caráter" e de "estrutura", uti-
lizados muitas vezes de modo impreciso na literatura. Estrutura pode ser considerada
qualquer parte do corpo, no sentido de qualquer expressão fenotípica (morfológica,
comportamental, fisiológica etc.) ou qualquer porção do DNA, por exemplo, um cro-
mossomo, um gene, um conjunto de bases ou uma única base. Assim, pode-se falar
em estrutura comportamental, estrutura bioquímica etc. Estrutura é uma entidade
concreta. Por outro lado, fala-se em caráter quando são consideradas as diferenças
entre estruturas homólogas de organismos diferentes, ou seja, fala-se em caráter
quando há modificações envolvidas. Assim, não faria sentido falar em "caracteres
homólogos”, "mas sim em estruturas homólogas ou em condições homólogas de
caracteres”. Caráter, consequentemente, corresponde àquilo que foi modificado em
uma estrutura, é a diferença entre uma condição derivada correspondente a modifi-
cação de uma condição primitiva. Muitas vezes, na literatura, utiliza-se caráter como
sinônimo de novidade evolutiva ou mutação, o que seria correto. O que importa, no
entanto, é diferenciar entre a mutação em si (o caráter) e a forma particular de uma
estrutura, gerada pela mutação.
A simples constatação de que estruturas consideradas homólogas são diferen-
tes entre si não resolve a questão da reconstrução das relações de parentesco en-
tre táxons. A homologia apenas indica que é razoável proceder à comparação entre
determinadas partes que não são iguais em indivíduos distintos. A questão que se
coloca, agora, já ligeiramente modificada em relação à anterior, é: qual é o método
que permite, analisando estruturas homólogos e diferentes entre si, inferir relação de
ancestralidade comum?
A resposta a essa questão é uma das contribuições mais importantes de Willi Hen-
nig, para quem a solução do problema é aplicar o Método Filogenético na classifica-
ção dos seres vivos e corresponde a um verdadeiro ovo de Colombo.
Fonte: Amorim (2002).
120 PORTO, V. B.

2. Bases bioquímicas e cromossômicas das doenças


genéticas
As doenças causadas pelos defeitos genéticos quase sempre se manifestam
como síndromes, que são transtornos à saúde e que se apresentam por meio
de efeitos múltiplos. A bioquímica explica síndromes causadas por alterações
em vias metabólicas, devido à ausência de proteínas ou à mutação de prote-
ínas em tais vias.
Segundo Purves et al (2002), “em 1909, o Dr. Archibald Garrod cunhou
o termo ‘erros inatos do metabolismo’ como descrição geral de doenças nas
quais aspectos genéticos e bioquímicos encontravam-se claramente interli-
93
Menino com 11 anos que
apresenta sérios efeitos
gados”, associando essa interligação à doença genética alcaptonúria, que é
da fenilcetonúria, por não caracterizada pela coloração preta apresentada na urina dos pacientes, em
ter sido detectada a tempo decorrência da presença de ácido hemogentísico naquela excreção.
(PURVES et al., 2002)
Em 1934, o Dr. Asbjorn Folling descobriu a fenilcetonúria, doença de-
tectada quando ele adicionou cloreto férrico à urina de crianças que apresen-
tavam os sintomas anômalos, obtendo uma coloração verde, indicativa da
presença de ácido fenilpirúvico.
A genética foi inferida como participante do processo porque os pais
eram normais, enquanto seus filhos acometidos, por expressarem a patoge-
nia, pareciam portar fenótipos recessivos. Portanto, essa anomalia trata-se de
uma doença autossômica recessiva, na qual genes em dose dupla, cada um
herdado de ambos os pais, são necessários para expressá-la.
A fenilcetonúria93 e a alcaptonúria são duas doenças genéticas que de-
correm da ineficiência do organismo de degradar a fenilalanina. Ao primeiro
caso, é a tirosina; no segundo caso, ambas as proteínas participantes de uma
mesma via metabólica.
Criança com fenótipo A figura 30 mostra que a fenilcetonúria acontece por ineficiência enzi-
normal, irmã do menino
acima, também acometida mática na degradação da fenilalanina, que, em vez de produzir tirosina por
de fenilcetonúria, mas que, ação da enzima fenilalanina hidroxilase nos indivíduos afetados, produz ácido
por ter sido tratada a tempo,
fenilpirúvico porque a enzima fenilalanina hidroxilase PKU, que substitui a fe-
apresenta desenvolvimento
e inteligência normais. nilalanina hidroxilase normal, é inativa.
(PURVES et al., 2002)
Genética 121

Figura 30 – Rota metabólica explica a expressão da fenilcetonúria, adaptado de Pur-


ves et al. (2002)

A alcaptonúria resulta da interrupção da mesma rota metabólica da figu-


ra 30, entretanto, verifica-se ineficiência enzimática em fase mais adiantada
da rota, depois da produção de tirosina (Figura 31).

Figura 31 – Deficiência enzimática que leva à alcaptonúria, adaptado de Purves et al. (2002)

Sabe-se que muitas outras doenças genéticas resultam de defeitos em


estruturas bioquímicas, que, uma vez afetadas, causam a doença. O quadro
11 apresenta algumas delas.
122 PORTO, V. B.

Quadro 11

ALGUMAS DOENÇAS GENÉTICAS DE NATUREZA BIOQUÍMICA


Estrutura afetada Defeitos Doença
Hemoglobina Substituição de aminoácido na proteína Anemia falciforme
Colesterol do sangue em níveis mais
Hipercolerestomia familiar
elevados do que o normal
Proteína da membrana celular Muco espesso e seco recobrindo os órgãos
que servem de vias para o aparelho Fibrose cística
respiratório
Proteína muscular, a distrofina, não Distrofia muscular de
Enfraquecimento muscular progressivo
funcional Duchenne
Proteínas de coagulação do sangue Deficiência na coagulação do sangue Hemofilia94
94
Rainha Vitória, a mais Encefalopatias resultantes da ingestão de
ilustre das celebridades No cérebro, ocorre a substituição de Doença da vaca louca
carne bovina contaminada
anônimas, era portadora proteína normal, a PrPc, por uma proteína
de gene para hemofilia. afetada, a PrPSC, ou seja, o príon Encefalopatias resultantes da ingestão de
Kuru
cérebros contaminados – canibalismo
(CURTIS, 1977)
Desdiferenciação das células somáticas,
gerando tumores, que, se forem malignos,
Células somáticas podem levar à morte do indivíduo. 80% Câncer
desse processo se devem a mutações
genéticas.

A detecção de defeitos genéticos com base bioquímica pode ser obtida


por exames laboratoriais. A colheita de líquido amniótico permite, por exemplo,
detectar tanto defeitos bioquímicos como defeitos cromossômicos.
A amniocentese, que consiste na cultura de células fetais do líquido am-
niótico de mulher grávida, possibilita a realização de cariótipo, que consiste na
Criança com síndrome de
95
obtenção de cromossomos em metáfase, os quais são fotografados e depois
deleção no cromossomo 5.
(GARDNER e SNUSTAD, arrumados num diagrama, no qual coloca-se lado a lado, os pares de cromos-
1986) somos homólogos, para o diagnóstico precoce dos defeitos cromossômicos.
Esse exame é de importância no aconselhamento genético.
Os exames revelaram que as bases cromossômicas das doenças ge-
néticas se assentam nas aneuploidias e nas mutações estruturais, que, muitas
vezes, são verdadeiras aberrações cromossômicas, no sentido de resultarem
em síndromes para o organismo.
Algumas síndromes, que são resultado de aneuploidias, foram mostra-
das no quadro 10, no item 2.1 do capítulo 6. O quadro 12 completa o estudo,
referindo-se às anomalias causadas não só por aneuploidias mas também a
outras doenças resultantes de mudanças estruturais nos cromossomos.

Criança com síndrome de


96

deleção e duplicação no
cromossomo 3. (GARDNER
e SNUSTAD, 1986)
Genética 123

Quadro 12
ALGUMAS DOENÇAS GENÉTICAS

Defeito Frequência estimada


Aspectos anômalos Doença síndrome clínica
cromossômico ao nascimento

Choro lamentoso, semelhante ao miado do gato; microcefalia; face larga e nariz Deleção no cromossomo
46, XX, 5p– raro arqueado; olhos muito espaçados com dobra epicânticas; aspecto facial único; 595. Cri-du-chat ou miado
retardamento físico e mental. de gato
Natimortos, mortos neonatais e abortos espontâneos. Se sobrevivem; não podem
46, XY, rec (3)
sentar, virar ou comer comida sólida. Apresenta cabeça torta, sobrancelhas Deleção e duplicação do
dup q inv (3) (p raro
baixas e espessas, cílios grandes, veias dilatadas no couro cabeludo, entre outros cromossomo 396
22q21)
aspectos
Mãos largas e curtas com uma prega simiesca na palma, baixa estatura,
47, + 21 1/700 hiperflexibilidade das articulações, retardamento mental, cabeça larga com face Trissomia do 21. Down
redonda, boca aberta com língua grande, prega epicântica.
Deficiência mental e surdez, convulsões, palato e/ou lábio fendido, polidactilia,
47,+ 13 1/20.000 Trissomia do 13
anomalias cardíacas, proeminência posterior no calcanhar.
Malformações congênitas múltiplas de muitos órgãos; implantação baixa de
orelhas malformadas; mandíbula recuada; boca e nariz pequenos; como o das
47,+ 18 1/8.000 Trissomia do 1897
fadas; deficiência mental; rim duplo ou em forma de ferradura; esterno pequeno.
90% morrem nos primeiros 6 meses.
Mulheres com o desenvolvimento sexual retardado, estéreis, baixas, pescoço
45, X 1/2.500 Turner98
alado, anormalidades cardiovasculares, defeitos auditivos.
1/500 bebês do sexo Homens subférteis com testículos pequenos, desenvolvimento de seios, voz com
47,XXY Klinefelter99
masculino timbre feminino, membros longos, joelhos trêmulos, verbosidade sem conexão.
Mulheres geralmente com genitália normal e fertilidade limitada. Leve retardo
47, XXX 1/700 Triplo X
mental

3. Aplicações da Genética
O conhecimento genético é aplicado em vários campos da atividade humana,
desde a simples identificação de um fenótipo recessivo causador de anomalia
até a solução de crimes por meio de testes com o DNA.
Contudo, deteremo-nos em três tópicos de relevância, que são a) o me-
lhoramento genético; b) o aconselhamento genético; e c) a engenharia genética.
Criança com Trissomia
97
3.1. Melhoramento genético do 18. (GARDNER e
SNUSTAD, 1986)
O melhoramento genético se caracteriza pela produção de novas variedades
de plantas ou de animais, que sejam mais produtivas e que, por isso, resultem
em benefícios para a humanidade.
Variedades de trigo e de milho, assim como gado melhorado para a pro-
dução de leite e de carne e ovelhas com mais capacidade de produzir lã são
algumas das melhorias, em que as técnicas genéticas de aperfeiçoamento
seletivo de indivíduos com maior produtividade se aplicam.

Mulher com Síndrome


98

de Turner. (GARDNER e
SNUSTAD, 1986)
124 PORTO, V. B.

O vigor híbrido, obtido cruzando-se variedades homozigotas de distintas


origens, para se obter heterozigotos mais vigorosos e produtivos, foi larga-
mente empregado no cruzamento de milho e depois foi estendido para outras
culturas, como a de tomate, algodão, morango ou a cultura de galinhas, de
mulas, etc.
As mulas, mais conhecidas entre nós como burros, são um híbrido esté-
ril, resultante do cruzamento entre o jumento e a égua. Essa espécie tem mais
força e aguenta, por mais tempo, trabalhos forçados.
Por outro lado, os cruzamentos endogâmicos ajudam a fixar nas varie-
dades produzidas por alelos desejáveis. Nas plantas monoicas, a natureza se
encarrega de viabilizar o melhoramento, por meio da autofecundação. Em ani-
mais, determinadas características desejáveis podem ser fixadas através do
cruzamento consanguíneo, o qual permite a fixação de genótipos homozigotos.
Homem com Síndrome de
99

Klinefelter. (GARDNER e 3.2. Aconselhamento genético


SNUSTAD, 1986)
Sabe-se que muitas das doenças que acometem a espécie humana são
hereditárias. Assim sendo, o aconselhamento genético é muito importante
para casais que potencialmente possam vir a ter filhos anômalos ou que já
tenham tido algum filho com defeito genético.
A identificação de portadores de alelos que expressam características
defeituosas pode ser obtida por meio do heredograma familiar, no qual se
pode detectar se determinado caráter é dominante ou recessivo, se está liga-
do ao sexo etc. Uma vez detectado o problema, cabe, ao casal, decidir pela
concepção do filho, que é um caminho sem volta, já que o aborto terapêutico
é proibido pela legislação brasileira.
Contudo, uma alternativa para a concepção de uma prole sadia, sem
riscos de doenças causadas por genes deletérios, seria a fertilização in vitro,
pois, com as avançadas técnicas de exame de DNA, embriões normais po-
deriam ser separados daqueles portadores de anomalia, sendo apenas os
embriões saudáveis usados na implantação no útero da mãe.
A consanguinidade é outro fator de risco, no sentido de aparecerem,
na descendência, indivíduos portadores de anomalias hereditárias, sendo
oportuno que seja evitada. A consanguinidade, como vimos anteriormente,
pode ser usada no melhoramento genético, por permitir a fixação de genó-
tipos homozigotos desejáveis.
Porém, como também existem os genótipos indesejáveis, resultantes
da presença de alelos recessivos, que carregam informações para a ex-
pressão de caracteres indesejáveis, no casamento consanguíneo, há uma
maior probabilidade desses alelos se encontrarem para expressar o caráter
defeituoso. É o caso do albinismo, do daltonismo e da hemofilia, sendo que
Genética 125

as duas últimas anomalias, como estão ligadas ao cromossomo X, deixam


os homens em desvantagem, pois o alelo anormal se expressará em hemizi-
gose, isto é, em dose única, já que o locus do gene não tem correspondente
no cromossomo Y.

Saiba mais
Doenças genéticas
A maioria dos tratamentos de doenças genéticas tenta aliviar os sintomas que afe-
tam o paciente. Porém, para tratar de forma efetiva doenças causadas por genes - se
elas afetam todas as células, como em desordens genéticas, como PKU, ou como em
células somáticas, como no câncer; os médicos devem ser capazes de diagnosticar a do-
ença com exatidão, devem saber como a doença funciona em nível bioquímico e devem
ser capazes de intervir cedo, antes de a doença causar destruição ou matar o indivíduo.
A pesquisa básica tem proporcionado o conhecimento necessário para testes
diagnósticos precisos, assim como um princípio para entender a patogenia (a causa
das doenças) em nível molecular. Os médicos, agora, estão aplicando esse conheci-
mento para tratar doenças genéticas.
Contudo, a medida mais efetiva é a profilaxia, isto é, evitar que a doença se insta-
le. Isso pode ser obtido pelo aconselhamento genético.
(Texto adaptado de Purves et al, 2002).

3.3. Biotecnologia
100
Se o trabalho de Mendel
A Biotecnologia envolve, entre outras técnicas, aplicações como as de tecnologia foi o evento mais importante
de recombinação do DNA100 (Engenharia Genética), clonagem e, mais atualmen- na Genética do século XIX,
possivelmente, um trabalho
te, o manejo de células-tronco. Embora seja um tema sobejamente tratado igualmente importante
pela Biologia Molecular, ela merece ser destacada como fecho dos assuntos em Genética Aplicada
teóricos do presente livro, pela sua importância para a humanidade. foi publicado no início do
século XX por G. H. Shull,
Thomas R. Malthus (1766 - 1834) foi um vigário inglês que, no final intitulado A composição
do século XVIII, fez previsões pessimistas para o futuro da humanidade, em de um campo de milho.
Por séculos, sabe-se
virtude da previsão de escassez de alimentos, já que os alimentos eram pro- que, se duas espécies
duzidos em escala aritmética, enquanto a população humana crescia em pro- puras, de linhagem
genética homozigota
gressão geométrica. (AMABIS e MARTHO, 2006)
de planta ou de animal,
Até agora, o homem está conseguindo adiar esse futuro obscuro, ten- cruzam-se, o resultado
do, nas aplicações da Genética, um contribuinte de peso. O melhoramento é uma descendência
fenotipicamente muito mais
genético veio a desencadear a dita revolução verde, proporcionando um gran- forte, grande e, em geral,
de incremento da produção de alimentos no século XX. O aconselhamento mais "vigorosa" do que a
dos pais. É o vigor híbrido,
genético está permitindo um maior controle da natalidade, e não se vê mais que resulta de novas
casais com prole numerosa. Se antes era regra ter muitos filhos, hoje é exce- combinações e interações
ção! A Biotecnologia é tida como a novidade da vez, ou seja, o fruto da imagi- gênicas. (PURVES et al.,
2002)
nação criativa do homem, cujo resultado será um promissor futuro que tornará
claras as trevas vislumbradas por Malthus.
126 PORTO, V. B.

As enzimas de restrição, que permitem cortes e emendas no DNA,


foram os fatores primários que proporcionaram o surgimento da Engenharia
Genética, ou seja, da tecnologia de recombinação do DNA.
Destarte, com o uso desta tecnologia, podem-se introduzir genes, pro-
duzindo genomas que repliquem produtos ou estruturas que venham a ter di-
versas aplicações práticas, como a introdução do gene da insulina no geno-
ma da bactéria Escherichia coli, proporcionando o incremento da produção
de insulina para combater a diabetes.
A reboque das descobertas, veio a tecnologia de amplificação do DNA,
denominada de PCR, que permite aumentar, em grande escala, a produção
de determinada molécula de DNA, ou seja, permite que genes possam ter a
sua produção ampliada e ser sequenciados. Através de outra técnica, a de
bandeamento do DNA, moléculas podem ser comparadas, para se deter-
minar com precisão a sua origem, é o famoso teste do DNA, que tem larga
aplicação na área do Direito.
A clonagem, como vimos no capítulo 7, consiste numa tecnologia que
reproduz um genoma inteiro a partir de uma única célula. Integrando-se à
Engenharia Genética, que permite a obtenção de genoma modificado com
as técnicas de clonagem, obtém-se um efeito multiplicador de vantagens,
resultando naqueles tão falados organismos transgênicos – “organismos nos
quais um gene novo foi introduzido, ou aqueles cujos genomas foram altera-
dos de outros modos usando técnicas de DNA-recombinante” (ALBERTS et
al., 2002) – cuja discussão ética relacionada à sua aplicação preenche os
tribunais, resultando em novas leis e normas de conduta.
Finalizando, as recentes descobertas que revelaram as células-tronco,
descritas também no capítulo anterior, como células embrionárias, com geno-
mas ainda indiferenciados, abriu os caminhos para o emprego da Engenharia
Genética associada à clonagem, tornando-se um vasto campo de pesquisa.

Síntese do Capítulo
As aplicações da Genética enfocaram as bases genéticas da evolução, em
que se constatou que as mutações são os fatores primários de desencade-
amento do processo evolutivo, por permitirem o aparecimento de novidades
que resultam em mudanças na diversidade de seres vivos. Essas mutações
são selecionadas pelo ambiente em constante transformação, e fatores como
a recombinação genética e a deriva genética foram relevantes contribuintes
para o acontecimento dessa história de ancestralidade e de descendência ao
longo do tempo geológico.
Genética 127

Outro tópico abordado foi o das bases bioquímicas das doenças genéti- Consulte o livro sobre
Biologia Molecular para
cas, verificando-se, nesse item, que um simples exame pode ser um forte aliado
recordar sobre a tecnologia
na descoberta de doenças, cujo tratamento pode até resultar numa vida normal de recombinação do DNA,
se for realizado a tempo. Finalizando, o melhoramento genético, o aconselha- sobre como se processa a
técnica do PCR etc.
mento genético e a biotecnologia foram os temas tratados, revelando as poten- Você terá oportunidade
cialidades do homem para melhorar a qualidade de vida contemporânea. de lembrar que o Projeto
Genoma Humano se
baseia nessas técnicas
usadas pela Engenharia
Genética.

Texto complementar
Princípio do equilíbio de Hardy-Weinberg
Em 1908, um matemático inglês, G. H. Hardy, e um físico alemão, W. Weinberg, des-
cobriram, independentemente, o princípio relativo às frequências dos alelos em uma
população, chamado princípio do equilíbrio de Hardy-Weinberg. Ele postula que, no
equilíbrio, as frequências gênica e genotípica permanecem constantes de geração
para geração. Isso ocorre entre organismos diploides que se reproduzem sexuada-
mente, sem superposição de gerações em grandes populações intercruzantes, nas
quais os cruzamentos são ao acaso e nenhuma seleção ou outro fator está presente
para alterar as frequências alélicas.
A segregação mendeliana é representada matematicamente pela expansão do
binômio (a + b)n, onde a é a probabilidade de que um evento ocorra e b é a probabili-
dade de que ele não ocorra. A conhecida proporção de 1:2:1, que representa a segre-
gação de um único par de alelos (Aa) em um cruzamento monoíbrido, pode ser repre-
sentada pela simples expansão de (a + b)n = (A + a)2 = 1AA + 2Aa + 1aa. Para expressar
a relação, em termos mais gerais, aplicáveis a qualquer frequência de alelos em uma
população, os símbolos "p" e "q" serão introduzidos. No equilíbrio, as frequências das
classes genotípicas são p2(AA), 2pq(Aa) e q2(aa). Uma frequência é a proporção do
número real de indivíduos englobados em uma única classe em relação ao número
total de indivíduos; uma probabilidade representa a possibilidade de ocorrência de
qualquer forma particular de um evento. As possíveis combinações de espermatozoi-
des e de óvulos a partir de um conjunto de gametas de uma população inteira, onde
os genótipos podem ter qualquer distribuição de AA, Aa e aa, e p e q podem assumir
quaisquer valores, desde que eles somem 1, são mostradas no quadro abaixo.

Espermatozoides
Óvulos
A(p) a(q)
A(p) AA(p2) Aa(pq)
a(q) Aa(pq) aa(q2)
Resumo: p2(AA) + 2pq (2Aa) + q2(aa) = 1

Em uma grande população, que inclui os genótipos AA, Aa e aa, um equilíbrio é


estabelecido para um único par de alelos após uma geração de cruzamentos ao acaso
128 PORTO, V. B.

(panmíticos). As proporções genéticas de uma população em equilíbrio são inteira-


mente determinadas pelas suas frequências alélicas, como ilustra algebricamente o
quadro que se segue:
Quadro 16-2

Comprovação algébrica do equilíbrio genético numa população que se cruza ao acaso para quaisquer dois alelos (isto é, p + q – 1) na populaçãoa
Cruzamentos parentais AA x AA 2(AA x Aa) 2(AA x aa) Aa x Aa 2(Aa x aa) aa x aa

Frequência dos
p xp
2 2
2(p x 2pq)
2
2(p x q )
2 2
2pq x 2pq 2(2pq x q )2
q2 x q2
cruzamentos parentais Somatório

Frequência da progênie AA p2q2 ΣAA = p2


2p3q
Aa p4 2p2q2 2p2q2 2pq3 ΣAa = 2pq
2p3q
aa p2q2 2pq3 q4 Σaa = q2

+2p2q2 +4p2q2 =Σ=1


Total
p4 + 4p3q +4pq3 q4
+ (2p3q + 4p2q2 + 2pq3) =
Frequências totais da (p4 + 2p3q + p2q2) +(p2q2 + 2pq3 + q4)
+2pq(p + 2pq + q2)
2
=
progênie p (p + 2pq + q2)
2 2
+ q (p + 2pq + q )
2 2 2
+2pq =
p2 +q2
(p + q)2 =1

É necessária uma geração de panmixia para que o equilíbrio seja alcançado


a

Quando apenas dois alelos estão envolvidos, p + q = 1. Uma vez que p + q = 1


então, p = 1 – q. Agora, se 1 – q substitui p, todas as relações na fórmula podem ser
representadas em termos de q, como a seguir: (1 - q)2 + 2q(1 – q) + q2 = 1. Essa altera-
ção permite uma maneira de resolver um problema onde q é a única incógnita.
Se o alelo A tem uma frequência de 1 – q e o alelo “a” tem uma frequência de q,
a distribuição esperada desses alelos, sob condições de cruzamento ao acaso em ge-
rações sucessivas, pode ser calculada com a fórmula de Hardy-Weinberg; ela se aplica
a qualquer par de alelos, se a frequência de um membro do par na população puder
ser determinada.
Quanto ao equilíbrio, sabe-se que os genótipos em uma população tendem a atin-
gir um equilíbrio recíproco, expresso por p2: 2pq: q2. A frequência absoluta de cada
genótipo depende dos valores de p e q. Por exemplo, se dois alelos ocorrem em pro-
porções iguais em uma população grande e isolada reprodutivamente, e não havendo
nenhuma vantagem seletiva de um sobre o outro, espera-se que eles permaneçam
em iguais proporções, geração após geração. Isso seria um caso especial, porque os
alelos em populações naturais raramente ocorrem com frequências iguais.
Entretanto, pode-se esperar que eles mantenham suas frequências relativas,
quaisquer que sejam, a menos que sofram a ação de fatores, como seleção natu-
ral, taxas de mutação diferencial, migração, deriva genética e desvio meiótico, cada
um deles podendo alterar o nível das frequências alélicas. Um equilíbrio nas frequ-
ências genotípicas é mantido através de cruzamentos ao acaso, com as frequências
absolutas dos genótipos sendo determinadas pela frequência alélica. Contanto que a
frequência alélica não se altere e que os cruzamentos sejam ao acaso, as proporções
genotípicas permanecem constantes.
Fonte: Gardner e Snustad (1986).
Genética 129

Atividades de avaliação
1. Disserte sobre o princípio de Hardy-Weinberg, elucidando sobre a sua rele-
vância para a Genética.
2. Quais os tipos de isolamentos geográficos de populações naturais?
3. Em que consiste o efeito do fundador?
4. Por que devemos acompanhar o aparecimento das novidades evolutivas
Transgênicos são
para sabermos contar a história de ancestralidade e de descendência dos organismos que resultam
seres vivos? da interferência no genoma
de outros organismos,
5. Como o Dr. Asbjorn Folling descobriu a fenilcetonúria? Explique como se pro- transferindo para os
cessa a via metabólica, que resulta em doença e discorra sobre como tratá-la. primeiros as parte dos
genomas julgadas úteis.
6. Por que o câncer figura entre as doenças genéticas de natureza bioquímica? Esta técnica do campo
7. Em que consiste o melhoramento genético? da engenharia genética,
embora suscite discussões
8. Por que o aconselhamento genético é importante na profilaxia das doenças acaloradas quanto à sua
genéticas? aplicação, integrada com
as de uso de células-tronco
9. Como a biotecnologia pode resultar em melhoria para a qualidade de vida e de clonagem abrem as
da humanidade? portas da biotecnologia,
para além do incremento da
10. Confeccione o álbum das celebridades da genética, produzindo, pelo me- produtividade, permitindo o
nos, 50 figurinhas dos mais diversos tipos de celebridades. Use a imagina- advento da terapia gênica,
que será a medicina do
ção criativa. futuro.
11. Concluindo o seu portifólio: Conclua o seu diário reflexivo sobre Gené-
tica a partir das discussões realizadas no decorrer do presente capítulo,
registrando os aspectos que levem você a agir de forma crítica e reflexiva.
Em ato contínuo, conclua o seu portifólio que, alimentado com todos os
diários anteriores, deve ser entregue ao professor da disciplina.

Leituras, filmes e sites


Livros
ALBERTS, B.; BRAY, D.; LEWIS, J.; RAFF, M.; ROBERTS, K.; WATSON, J.
D. Fundamentos da biologia celular: uma introdução à biologia molecular
da célula. Tradução Carlos Termignoni et al. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.
760 p. No capítulo 10 dessa obra os autores abordam a tecnologia do DNA,
em que é descrita, com muita clareza, a ação das endonucleases de restrição
nos cortes e nas emendas do DNA, técnica inovadora que repercute em to-
dos os aspectos da Biologia Celular, fornecendo novas maneiras de estudar a
função dos genes, das moléculas de RNA e das proteínas.
130 PORTO, V. B.

Referências
ALBERTS, B.; BRAY, D.; LEWIS, J.; RAFF, M.; ROBERTS, K.; WATSON, J. D.
Fundamentos da biologia celular: uma introdução à biologia molecular da cé-
lula. Tradução Carlos Termignoni et al. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2002. 760 p.
AMABIS, J. M.; MARTHO, G. R. Biologia das populações: genética, evolu-
ção biológica e ecologia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 2006. 443 p.
AMORIM, D. S. Fundamentos de sistemática filogenética. Ribeirão Preto:
Holos, 2002. 156 p.
CURTIS, H. Biologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1977. 964 p.
GARDNER, E. J.; SNUSTAD, D. P. Genética. 7. ed. Rio de Janeiro: Guana-
bara Koogan, 1986, 497 p.
PURVES, W. K.; SADAVA, D.; ORIANS, G. H.; HELLER, H. C. Vida: a ciência
da biologia. 6. ed. Porto Alegre: Artmed, 2002. 1126 p.
STANSFIELD. W. D. Genética. Tradução Temis R. Saiz Jabardo. 2. ed. São
Paulo: McGraw-Hill, 1985. 515 p.
Genética 131

Sobre o autor
Valberto Barbosa Porto: possui licenciatura plena e bacharelado em Ciên-
cias Biológicas pela Universidade Federal do Ceará (1989/1990) e mestrado
em Saúde Pública pela Universidade Estadual do Ceará (2000). Atualmente, é
professor adjunto da Universidade Estadual do Ceará, atuando como regente
das disciplinas de Paleontologia Básica e Sistemática Geral e de Filogenia.
A não ser que indicado ao contrário a obra Genética, disponível em: http://educapes.capes.gov.br, está licenciada
com uma licença Creative Commons Atribuição-Compartilha Igual 4.0 Internacional (CC BY-SA 4.0). Mais
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gratuita. O conteúdo do livro publicado é de inteira responsabilidade de seus autores, não representando a posição
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Ciências Biológicas

F
iel a sua missão de interiorizar o ensino superior no estado Ceará, a UECE,
como uma instituição que participa do Sistema Universidade Aberta do
Brasil, vem ampliando a oferta de cursos de graduação e pós-graduação
na modalidade de educação a distância, e gerando experiências e possibili-
dades inovadoras com uso das novas plataformas tecnológicas decorren-
Ciências Biológicas

Genética
tes da popularização da internet, funcionamento do cinturão digital e
massificação dos computadores pessoais.
Comprometida com a formação de professores em todos os níveis e
a qualificação dos servidores públicos para bem servir ao Estado, Genética
os cursos da UAB/UECE atendem aos padrões de qualidade
estabelecidos pelos normativos legais do Governo Fede-

Universidade Estadual do Ceará - Universidade Aberta do Brasil


ral e se articulam com as demandas de desenvolvi-
mento das regiões do Ceará.

Valberto Barbosa Porto

Geografia

12

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Ciências Artes
Química Biológicas Plásticas Computação Física Matemática Pedagogia

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