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PROURB
Programa de Pós-Graduação em Urbanismo
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
Universidade Federal do Rio de Janeiro
CDD 711
Tese submetida ao corpo docente Programa de Pós-Graduação em Urbanismo da Universidade Federal
do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessários para obtenção do grau de Doutor
Aprovada por:
Agradecimentos
Mesmo sendo uma tarefa solitária, realizar uma tese de doutorado é um desafio que
não podemos enfrentar sozinhos. Muitas foram as pessoas que acompanharam a
trajetória destes quatro anos, de perto e de longe, que deram o suporte acadêmico e
emocional indispensável para ter chegado, finalmente, ao momento da defesa.
Mas esta tese não teria sido possível sem o apoio dos seres queridos. Meu agrade-
cimento a Christophe, pela paciência e pelo amparo. À minha família, pelo incentivo
sempre. Aos meus companheiros de turma que compartilharam as primeiras inquie-
tações e definições do trabalho e, muito especialmente, à Monica Rocio das Neves
pela hospitalidade e boa companhia.
Não quero deixar de agradecer também aos colegas da Blac Arquitetura, com os
quais “andamos” as ruas da Baixada Fluminense. À Serla (Secretaria Estadual de
Rios e Lagoas) pelo fornecimento de informações e imagens e à Fundação Cide pela
doação das bases cartográficas.
Introdução 4
Resumo
Assinala as limitações do projeto urbano, nos moldes em que ele foi concebido até
hoje, frente aos desafios da cidade contemporânea. A escala e a condição das me-
trópoles no século XXI questionam a forma em que os projetos são formulados, de-
senvolvidos e executados. A mudança de foco do centro para o território mais amplo
da metrópole pressupõe uma revisão dos conceitos e das ferramentas até agora
experimentados na cidade consolidada. Uma abordagem paisagística - onde a lógica
projetual deriva da imbricação complexa entre sistemas naturais e processos de ur-
banização – se apresenta como resposta possível.
Abstract
The present work seeks to investigate alternative ways for the formulation of the ur-
ban project in the metropolis. It is placed as an invitation to rethink the construction of
the city and the territory from a different logic, founded in the landscape.
It points out the limitations of the urban project, in the way it has been conceived until
today, in face of the challenges of the contemporary city. The scale and the condition
of the XXI century metropolises question the form projects are formulated, developed
and executed. The change of focus from the center to the expanded territory of the
metropolis presupposes a revision of the concepts and the tools so far tried in the
consolidated city. A landscape approach - where the project´s logic derives from the
complex imbrications between natural systems and processes of urbanization - it is
presented as possible answer.
From the proposal of four operational categories/concepts, namely: layers, open spa-
ces, borders and processes; the work investigates the potential of a landscape appro-
ach for a portion of the metropolitan periphery of Rio de Janeiro.
Introdução 6
Lista de Figuras
FI-1: Buenos Aires. Infra-estruturas e novos aparatos da globalização. Fonte: Revista SCA 194.............................................................................................27
FI-2: A dispersão dos mais ricos. Esquerda: condomínios fechados da periferia de Buenos Aires. Direita: condomínios verticais na Barra da Tijuca, Rio
de Janeiro. Fonte: flirck..............................................................................................................................................................................................................29
FI-3: América do Sul, cidades com 20.000 habitantes e mais, 1950 e 1990. Fonte: Boletin especial: urbanización y evolución de la población urbana de
América Latina, 1950 – 1990. Celade - CEPAL.........................................................................................................................................................................32
FI-4: A dispersão dos mais pobres. Periferias urbanas Buenos Aires (esquerda) e Rio de Janeiro (direita). Fonte: Revista SCA 194 e flirck.........................33
FII-1 e 2: Havana, renovação do centro histórico. Plaza de Armas Fonte: Oficina Del Historiador Habana.............................................................................43
FII-4: Tambos no centro histórico de Arequipa. Planta: Fonte: Liesbeth Caymax e Esther Jacobs...........................................................................................45
FII-5: Acessos às moradias renovadas do Tambo Del Matadero, Arequipa. Fonte: Autor........................................................................................................45
FII-7: Paseo del Caminante, nas “barrancas” do rio Paraná, Rosario. Fonte: Arq. Gerardo Caballero.....................................................................................46
FII-8 e 9: Requalificação do espaço público. Programa Rio Cidade, Leblon, Rio de Janeiro. Autores: Luiz Eduardo Indio da Costa, Guto Indio da Costa,
Fernando Chacel. Fonte: Alvarenga, Andre (2009)....................................................................................................................................................................47
FII-10: CEU (Centros Educativos Unificados) Jambeiro, em Guaianazes zona leste de São Paulo, dos arquitetos Alexandre Delijaicov, André Takiya e
Wanderley Ariza. Fonte: Arcoweb_.............................................................................................................................................................................................48
FII-12: Puerto Madero, o novo cartão postal de Buenos Aires. Fonte: Autor.............................................................................................................................50
FII-13: Perspectiva do Eixo Tamanduatehy, Santo André: Fonte: Municipalidade de Santo Andre............................................................................................51
FII-14: Perspectiva do projeto Ciudad Portal Bi-Centenário, Santiago. Fonte: Ministerio de Urbanismo y Vivienda.................................................................51
FII-15 e 16: Imagem das indústrias cerealíferas desativadas e plano para Puerto Nuevo, Rosario. Fonte: Municipalidad de Rosario....................................52
FII-18 e 19: Novos espaços públicos gerados a partir da passagem do metro-cable em Medellín. Fonte: Municipalidad de Medellín....................................54
FII-20: Corredor Verde del Oeste, Buenos Aires. Fonte: Revista SCA . ....................................................................................................................................55
FII-21: Urbanização de assentamentos informais. Morro do Socó e do Portal, em Osasco, São Paulo, dos arquitetos Viglieca & Associados. Fonte:
Arcoweb......................................................................................................................................................................................................................................56
FII-22: Favela Novos Alagados em Salvador. Vista da enseada do Cabrito e do Parque São Bartolomeu, antes e depois da intervenção, com o man-
guezal recuperado. Fonte: Cities Alliance..................................................................................................................................................................................56
FII-23: Programa Favela-Bairro, equipamentos sociais na favela Fubá-Campinho, Rio de Janeiro. Fonte: Arq. Jaurequi.......................................................57
FII-24: A ocupação gradual através dos séculos e o desaparecimento do sistema lacustre na cidade do México. Fonte: Arq. Kalach....................................60
FII-26: México, Ciudad Futura, o novo litoral recriado albergará serviços, parques e infraestruturas. Fonte: Arq. Kalach........................................................62
FII-27: Riachos e pântanos, que atravessam a cidade transversalmente, regulam o equilíbrio hidrológico ao mesmo tempo em que se inserem como ...
................................................................................................................................................................................................................................................
peças dentro do sistema de espaços públicos. Fonte: Alcaldía de Bogotá................................................................................................................................63
FII-29: Redefinir o próprio paradigma do projeto de infraestrutura é a proposta de MMBB. Os piscinões são vistos como oportunidades únicas para
criar uma rede de vazios urbanos que possam qualificar as periferias paulistanas. Fonte: MMBB Arquitetos........................................................................65
FII-30: O Projeto La Aguada se insere dentro do plano mestre do Anel metropolitano de Santiago, integrando num novo parque recreativo as infraestr-
turas de mobilidade e de controle das inundações. Fonte: Ministerio de Vivienda y Urbanismo de Chile................................................................................66
FIII-1: Alguns princípios da Ecologia da Paisagem. Fronteiras. A) Fronteiras vegetais com diversidade estrutural são mais ricas em espécies animais.
B) a largura da fronteira de um fragmento difere segundo a direção dos ventos. C) Quando a fronteira administrativa ou política de uma área protegida
não coincide com a borda ecológica natural, se distingue e pode atuar como buffer atenuando o efeito do entorno no interior da área protegida. Frag-
mentos. A) Um fragmento ecologicamente ótimo provê várias vantagens ecológicas e geralmente tem uma forma de “nave espacial”, com um core
arredondado para proteger os recursos e uns dedos para a dispersão das espécies. B) Um fragmento orientado com seu eixo principal de forma para-
lela à rota de dispersão dos indivíduos terá menos possibilidades de ser recolonizado que um com seu eixo vertical. Fonte: Dramstad, Olson e Forman
(1996).........................................................................................................................................................................................................................................83
FIII-3: Ian McHarg, método ecológico para a bacia do rio Potomac. Neste mapa, idoneidade para a urbanização. Fonte: McHarg ([1969], 1992)................85
FIII-2: Rosa Kliass, inventario dos aspectos da paisagem natural e urbana de São Luis de Maranhão. (Fragmento). Fonte: Kliass (2006)...........................85
FIII-4: Paola Vigano. Água e asfalto. As camadas de hidrologia, figura-fundo e redes de infraestrutura, revelam uma esponja isotrópica densa que
integra agricultura, indústria e áreas de residência. Fonte: Vigano (2008)................................................................................................................................86
FIII-5: Florian Beigel. A leitura e decomposição em camadas do sitio provê os materiais de projeto. Leichterfelde Sud, Plano de infraestrutura urbana, o
sítio e as arquiteturas. Fonte: Rosell (2001)...............................................................................................................................................................................86
FIII-6: Fragmento do Plano de Roma de Nolli, 1748. Uma das mais antigas descrições da cidade através de seus espaços públicos. Fonte: http://nolli.
uoregon.edu/..............................................................................................................................................................................................................................88
FIII-8: Frederick Olmsted. Plano do sistema de parques The Emerald Necklace, Boston.Fonte: www.emeralknecklace.org...................................................88
FIII-9: Rem Koolhaas. Projeto para a ville nouvelle de Melun-Senart. A garantia da qualidade do espaço urbano resulta de seus sistema de espaços
livres. Em vez de projetar sobre a paisagem, o projeto se deduz dela. A) Preexistências: florestas, povoados, autopistas e a linha de TGV. B) O novo
vazio desenhado para obter o máximo de situações diversas e complexas. C) O plano síntese. Fonte: Koolhaas (1995)......................................................90
FIII-10: Emscher Park. Sistema de corredores verdes regionais interliga os terrenos reciclados e conecta povoados existentes. Detalhe Duisburg No-
ord, um novo parque cultural integra as arquiteturas industriais. Projeto de Peter Latz and Partners. Fonte: www.landschaftspark.de..................................92
FIII-11: Rosa Kliass. Parque da Juventude, São Paulo. Fonte: Kliass (2006)...........................................................................................................................92
FIII-12: Michel Desvigne. Planta geral das intervenções paisagísticas propostas para a cidade de Cergy-Pontoise. Detalhe da proposta para a interfase .
com o rio Olsen. Fonte: Desvigne (2009)...................................................................................................................................................................................96
FIII-13: Parque do Flamengo, Rio de Janeiro. A criação de uma nova interface entre o mar e a cidade. Fonte: Instituto Moreira Salles................................97
FIII-14: Parque nas margens do Rio Gallego em Zuera, Espanha. Uma fronteira flutuante que incorpora os ritmos e variações da natureza. Arq. Iñaki
Alday. Fonte: Balcells (2002)......................................................................................................................................................................................................98
FIII-15: Field Operations. Projeto ganhador para Fresh Kills. O projeto concebido como matriz para processos. A estrutura da paisagem provê o supor-
te para que sementes, biota, pessoas e atividades possam colonizar o lugar no tempo. Fonte: www.nyc.gov.....................................................................100
FIII-16: Michel Desvigne. Naturezas intermédias. Projetos que permitem a ocupação flexível em situações de incerteza sobre a ocupação urbana.
Bordeaux, margem direita. O parque é criado à medida que os terrenos são liberados. Lyon, proposta para a confluência dos rios Rohane e Soane,
rejeita a ideia de um projeto totalizador e propõe um processo gradual de construção da cidade. Fonte: Desvigne (2009)..................................................103
FIII-17: François Xavier Mousquet. Projeto Lagunage de Harnes. Paisagens que incorporam serviços ambientais, a criação de novas ecologias e no-
vos tipos de espaço público. Fonte: Arq. Mousquet................................................................................................................................................................104
FIV-1: Plano de fundação da cidade de S. Felipe de Santiago na ilha de Cuba. Arquivo Geral das Índias, M e P. Sto Domingo, 119. OrdeM e caos. A
regularidade da grelha inserida no meio da floresta desconhecida do novo mundo. Fonte: de Teran (1997).........................................................................109
FIV-2: The Naked City. Illustration de l’hipotèse des plaques tournantes de Guy Debord 1957. Decomposição cartográfica e a geografia alternativa da
deriva. Fonte : Vitruvius . .........................................................................................................................................................................................................109
FIV-3: Upside down map do artista uruguaio Joaquín Torres Garcia, desafiando as convenções cartográficas. “La escuela del sur”, foi um grupo de
artistas latinoamericanos que proclamaram o seu lugar num mundo dominado pela cultura ocidental. Fonte: Harmon (2004)............................................. 111
FIV-4: Los Angeles, Mario Gandelsonas. A escala colossal da grelha de uma milha, as montanhas e o oceano fazem o plano de Los Angeles compre-
ensível. Fonte: Gandelsonas (1999)........................................................................................................................................................................................ 112
Introdução 8
FIV-5: Los Angeles, Mario Gandelsonas: As diferentes grelhas urbanas e o bulevar Wilshire como um quebra-cabeças sobre o plano “real” da cidade.
Fonte: Gandelsonas (1999)...................................................................................................................................................................................................... 113
FIV-6: Los Angeles, Mario Gandelsonas: Descrição tipológica das diferentes paisagens urbanas ao longo do bulevar. Fonte: Gandelsonas (1999)........... 113
FIV-7: Boston, Mario Gandelsonas. Num processo de decapagem (delayaring), o plano das ruas reais é abandonado e só os elementos estruturais
são descritos. Fonte: Gandelsonas (1999)............................................................................................................................................................................... 114
FIV- 8 e 9: Boston, Mario Gandelsonas. Uma outra decomposição do aparentemente caótico tecido urbano expõe as ruas radiais versus as ruas cir-
cunferenciais. A estrutura radio-concêntrica é a força que organiza os elementos urbanos de Boston. Fonte: Gandelsonas (1999).................................... 115
FIV-10: James Corner, The survey Landscape Accrued. As medidas da terra. A pesar da aplicação mecânica e repetitiva da divisão da terra, uma
grande variedade na paisagem tem evoluído no tempo. Fonte: Corner e MacLean (1996).................................................................................................... 116
FIV-11 e 12: James Corner, Long lots along the Mississippi River. Os rios se transformaram nas principais linhas de organização dos assentamentos.
Democrático e equitativo, cada habitante recebe uma porção igual de frente de rio com solo baixo aluvial, e terra alta onde se recolher durante as
inundações. Fonte: Corner e MacLean (1996)......................................................................................................................................................................... 117
FIV-13: James Corner, Nahavo Spring-Line Fields. As medidas de adaptação. Pequenos canais e barragens captam e distribuem a pouca água que se
infiltra de entre a escarpa de uma grande meseta. A água, cuidadosamente distribuída junto à parede do barranco que protege das geadas, permite o
crescimento de um jardim verde no deserto. Fonte: Corner e MacLean (1996)...................................................................................................................... 118
FIV- 14, 15 e 16: Alan Berger, Chicago. Indicadores entrópicos: geografia de espaços residuais. Gráfico de dispersão: afastandose do centro da cidade
duas claras depressões na densidade populacional podem ser medidas. Quadro axial: desde 1977 o condado central de Chicago perdeu mais de
4000 fábricas, o que representa 35%. O maior e sustetado crescimento fabril nesta região está localizado 30 a 50 milhas do centro da cidade. Fonte:
Berger (2006)...........................................................................................................................................................................................................................120
FIV-17, 18 e 19: Raoul Bunschoten. Linz, Quadro I The Echo Chamber com atores e agentes (letras) e lugares (números). Quadro II The Loom, e
Quadro III The Agora. Fonte: Bunschoten (2001)....................................................................................................................................................................122
FIV-20 e 21: Mathur e da Cunha. Triangulating. Milhares de tanques. No território de Bangalore os tanques são uma forma de vida. Discretas linhas de
montículos com comportas formam a paisagem. Mathur e da Cunha (2006)..........................................................................................................................126
FIV-22 e 23: Mathur e da Cunha. Botanizing. Rosqueadas em cordas, as flores têm uma segunda vida na cidade ao serem distribuídas em mercados,
templos, casas e ao redor da cidade nos cabelos das mulheres. Produzidas em hectares e vendidas por quilo, as flores são menos para serem apre-
ciadas e mais para serem usadas em festivais e rituais. Fonte: Mathur e da Cunha (2006)...................................................................................................127
FV-1 e 2: A metropolização do espaço. Rio de Janeiro e São Paulo, sistema integrado de áreas metropolitanas. Fonte: Elaborado pelo autor sobre
base Google Maps...................................................................................................................................................................................................................132
FV-4: Evolução da região metropolitana de Rio de Janeiro. Fonte: Elaborado pelo autor sobre base da Fundação Cide.....................................................136
FV-5: Relevo. Contrastes. O plano enquadrado e os fundos montanhosos. A planície salpicada por colinas. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base
cartográfica da Fundação Cide................................................................................................................................................................................................139
FV-6: Condições ambientais. A paisagem foi –e continua sendo- modelada por processos de erosão e deposição. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a
base cartográfica da Fundação Cide........................................................................................................................................................................................141
FV-7: Cobertura vegetal. Um mosaico heterogêneo. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base cartográfica da Fundação Cide..........................................143
FV-8: Hidrografia. Descendo com força das serras e inundando a planície até alcançar a Baía. O amplo sistema de rios que atravessa a Baixada Flu-
minense é um dos elementos da paisagem que mais fortemente marcaram a construção de sua identidade. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base
cartográfica da Fundação Cide................................................................................................................................................................................................145
FV-9: Infra-estrutura e urbanização. Um contínuo urbano seguindo os eixos principais de conexão a São Paulo e Petrópolis. Fonte: Elaborado pelo
autor sobre a base cartográfica da Fundação Cide.................................................................................................................................................................147
FV-10: Durante o século XVIII freguesias, portos e uns poucos caminhos se organizam em função do espaço fluvial. Mapa que compara as vantagens
de uma saída alternativa do caminho de Minas para a Baía da Guanabara. Fonte: Arquivo Nacional...................................................................................150
FV-11: Rios e Trilhos, a síntese do território nos finais do século XIX. Planta da Estrada de Ferro Rio d’ Ouro. 1897. Fonte: Arquivo Nacional...................152
FV-12: Comissão de Saneamento da Baixada Fluminense. Secagem dos brejais e canalização do rio da Prata. Fonte: Goes (1934).................................154
FV-13: A malha de infraestruturas nos começos de século XX. Mapa das estradas de rodagem Rio- São Paulo e Rio- Petrópolis. Fonte: Arquivo .
Nacional....................................................................................................................................................................................................................................156
FV-14: Nova Iguaçu em 1940: “Capital da citricultura do Estado do Rio de Janeiro”. Fonte: Correio de Manhã, Arquivo Nacional.......................................159
FV-15: Bases cartográficas. Nova Iguassu. Serviço Geográfico e Histórico do Exército, 1:10.000, 1939. Fonte: Arquivo Nacional.......................................160
FV-16: Reconstituição da ocupação em 1940. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base cartográfica do Serviço Geográfico e Histórico do Exército........161
FV-17: Bases cartográficas. Nova Iguassu e Duque de Caxias. Fundrem, 1:10.000, 1975. Fonte: Fundação Cide...............................................................162
FV-18: Reconstituição da ocupação em 1975. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base cartográfica da Fundrem.............................................................163
Introdução 9
FV-19: Bases cartográficas. Fundação Cide Ortofoto. 1:10.000. Programa de Despoluição da Baía da Guanabara. Data do voo 2003. Fonte: Fundação.
Cide .........................................................................................................................................................................................................................................164
FV-20: Reconstituição da ocupação em 2003. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base cartográfica da Fundação Cide...................................................165
FVI-1: Relevo. O conjunto de morros baixos agrupados formando línguas entre os vales fluviais. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base cartográfica
da Fundação Cide....................................................................................................................................................................................................................169
FVI-2: Condições ambientais. Ao superpor as camadas das condições geológicas e da hidrografia os contrastes entre os leques fluviais e os grupos de
morros se reforçam. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base cartográfica da Fundação Cide............................................................................................170
FVI-3: As águas reclamam espaços de inundação. Áreas afetadas na grande enchente de 1988. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base cartográfica
da Fundação Cide e da COPPE, Laboratorio de Hidrologia UFRJ..........................................................................................................................................171
FVI-4: Um sistema integrado de infraestruturas duras (rodovias e ferrovias) e brandas (rios) forma a armadura de suporte do território. Como re-pensar
a relação entre elas nos futuros planes de expansão do sistema rodoviário? 1. Via Expressa Presidente João Goulart, 2. Via Expressa planejada ao
longo do rio Sarapuí, 3. Futuro Arco Rodoviário. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base cartográfica da Fundação Cide. . ............................................173
FVI-6: Espaços livres e relevo. Se a lógica rural se distinguia pela divisão entre morar a meia encosta do morro, deixando os vales livres para a produ-
ção agrícola, os usos urbanos alteraram esta lógica dando prioridade à ocupação dos vales –pela facilidade de deitar as infraestruturas- para depois
colonizar os morrotes de declividade suave. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base cartográfica da Fundação Cide......................................................176
FVI-7: Espaços livres e água. As várzeas e bordas de rios, a pesar de proteções legais, são vulneráveis à ocupação urbana. Fonte: Elaborado pelo
autor sobre a base cartográfica da Fundação Cide.................................................................................................................................................................177
FVI-8: Ocupações e resistências. Tecido compacto, os vazios que restam. Campos de futebol (Mesquita), pista de aeroporto (Nova Iguaçu). Tecido em
processo de consolidação, os vazios expectantes: áreas inundáveis (Belford Roxo), morros baixos (Queimados). Fonte: Serla (Inea)...............................178
FVI-11: Pôlder do rio Outeiro, Belford Roxo. Forma elaborada / forma recebida (matriz). Fonte: Autor..................................................................................181
FVI-12: Comissão Federal de Saneamento da Baixada Fluminense.1a Seção Estudos. Bacia do Rio Sarapuhy. 1914. Fonte: Arquivo Nacional.................182
FVI-13: Ocupações informais nas margens do rio Sarapuí. Fonte: Serla (Inea)......................................................................................................................182
FVI-14: Rio Sarapuí, 2010. Transformações: Em vermelho, superposto o trajeto segundo o levantamento de 1914. Fonte: Autor .....................................183
FVI-15: Rio Sarapuí, 2010. Oportunidades. Espaços livres remanescentes nas margens do rio. Fonte: Autor......................................................................184
FVI-17: Interfaces urbanas com os dispositivos hidráulicos. Barragem Gericinó. Forma construída / forma recebida (matriz)..............................................186
FVI-20: Interfaces urbanas com a Baía da Guanabara. Forma construída / forma recebida (matriz).....................................................................................188
FVI-22: Extrações, saibreira em atividade em Nova Iguaçu, na margem do rio Botas. Forma elaborada / forma recebida (matriz). Fonte: Autor.................190
FVI-23: Extrações. Canteira Nova Iguacu, areeiros Seropédica. Fonte: Google Maps...........................................................................................................191
FVI-24 e 25: Lixão de Gramacho na foz do rio Sarapuí. Fonte: Moscatelli / flirc.....................................................................................................................192
Introdução 10
Sumário
Introdução 12
PARTE I 17
01.Cidade contemporânea 19
Paradoxos contemporâneos: urbanização e capacidades contestadas 19
O paradigma tecnológico ou o fim da cidade 21
A rede global ou a exclusão do local 23
O discurso genérico ou o fim da identidade 24
A forma da cidade contemporânea. Metrópoles, suburbanização e novas periferias 26
O paradigma americano 27
A cidade difusa europeia 29
Megalópoles latino-americanas. Do padrão periférico à dispersão 31
A natureza da cidade 75
A questão ambiental 78
Urbanismo e ecologia 80
A questão operacional. Quatro categorias para a abordagem paisagística 84
Camadas: revelar o lugar.
Ou como desconstruir a complexidade do território urbanizado 84
Espaços livres: a armadura da cidade
Ou de como abordar a situação dispersa e fragmentada. 89
Fronteiras: o espaço das trocas
Ou de como trabalhar entre cidade e natureza 95
Processos: trabalhando no tempo
Ou como criar as condições para o futuro 101
PARTE II
05.Rio de Janeiro: Explorações no subúrbio fluminense 131
Rio de Janeiro Metrópole 131
Baixada Fluminense, um recorte 134
A forma recebida 137
Relevo 137
Condições ambientais 138
Cobertura vegetal 142
Hidrologia 144
Infraestrutura e urbanização 146
A paisagem elaborada 149
De fluvio-vias, ferro-vias e rodo-vias 150
Do engenho ao subúrbio: a ocupação do solo na Baixada Fluminense 157
Referências 198
Introdução 12
Introdução
No livro “Sobre Urbanismo” (Pinheiro Machado, 2006), Nuno Portas reflete sobre
a experiência do projeto urbano, tanto no contexto europeu como em países ditos
periféricos, e discute os novos desafios de pesquisa e projeto. Coloca a questão da
escala e abrangência dos projetos experimentados até o momento, diferenciando en-
tre uma primeira fase, nos anos 80-90, onde predominam as intervenções com foco
no espaço público e na regeneração dos tecidos existentes, contra uma geração de
projetos mais recentes, de maior dimensão e ambição programática, integrando pro-
gramas de acessibilidade, ambientais e paisagísticos de grande extensão. Enquanto
a primeira geração de projetos funciona como alavanca para novas atividades produ-
tivas, de cultura e lazer, a segunda, atravessada por demandas de sustentabilidade,
busca integrar as urbanizações e os vazios que erraticamente foram se misturando
com áreas industriais e infraestruturas de mobilidade e logística nas áreas metropo-
litanas. Portas reclama a ausência de pesquisa e avaliação de projetos deste último
tipo, tanto na América Latina como em Portugal, projetos que possam recuperar as
espalhadas periferias, marcadas por conflitos ambientais e carências sociais, de in-
fraestrutura e de transporte [...], cuja prioridade social, mas também econômica pa-
recem indiscutíveis e, em termos de custos públicos, provavelmente tão exequíveis
quanto os de maior visibilidade externa (Portas, 2006:63).
métodos de desenho urbano como foi entendido até hoje. A pergunta que norteia
esta tese se articula em função do reconhecimento desta especificidade. Que tipo de
projeto para esta nova realidade urbana?
Enquanto abundam as pesquisas com base em dados sociais, sabemos muito pouco
sobre a materialidade metropolitana. Os discursos acadêmicos sobre a metrópole se
debruçam ora sobre a exclusão e fragmentação social que caracterizam as cidades
latino-americanas, ora sobre os efeitos da globalização e suas novas manifestações
no território - os chamados aparatos da globalização (shoppings, complexos de escri-
tório e bairros fechados) (De Mattos, 2004). A inexistência de uma pesquisa voltada
para a compreensão de sua espacialidade integrada e de formulação de um projeto
possível revela um vazio que esta investigação pretende explorar.
O quarto capítulo versa sobre aspectos metodológicos que ligam a paisagem a pro-
cessos de descrição do território. Este capítulo se propõe investigar como é que
descrição, representação e projeção estão dialeticamente relacionadas; e portanto
como, através da construção e deconstrução de novas cartografias, poderemos en-
Introdução 16
O último capítulo, reservado às conclusões, faz uma síntese dos temas tratados e
reflete sobre as respostas encontradas para as hipóteses colocadas no início. O tra-
balho não pretende propor um projeto, mas sim demonstrar a sua possibilidade, abrir
caminho para a agenda de um novo tipo de projeto urbano para a metrópole.
Cidade contemporânea 17
PARTE I
Cidade contemporânea 18
Atahualpa Yupanqui
Cidade contemporânea 19
01.Cidade contemporânea
Este primeiro capítulo busca inserir a tese no contexto das discussões teóricas em torno da cidade
contemporânea. Serão discutidos os processos que contestam a forma como a cidade é apreendida,
conceitualizada e representada, e os resultados e efeitos concretos destes processos novos nas con-
figurações urbanas.
O processo não tem sido homogêneo, nem temporal nem geograficamente. Na ver-
dade, foi na segunda metade do século, e mais especialmente nos últimos três decê-
nios que os processos de urbanização e as mudanças se aceleraram marcadamente.
Se, até 1950, os maiores conjuntos urbanos se encontravam no mundo chamado
“desenvolvido”; sendo Londres e Nova York as únicas metrópoles que alcançavam
os oito milhões de habitantes; hoje o booming das megalópoles e os mais chamativos
fenômenos urbanos acontecem mormente em países pobres ou em vias de desen-
volvimento (Boeri, 2000).
Cidade global, cidade difusa, cidade em rede, cidade dual, cidade fractal, cidade
genérica são algumas das categorias que mostram a heterogeneidade das teorias
que tentam explicar as novas configurações espaciais e sociais do espaço que ha-
bitamos. A diversidade de interpretações retrata a ausência de um metarrelato unifi-
cado, substituído por uma possível coexistência de interpretações diferentes sobre
o fenômeno urbano.
Não obstante, apesar da diversidade de neologismos para denominar a cidade do
século XXI, a maioria dos autores contemporâneos parecem coincidir quando apon-
tam os processos ligados à chamada “globalização” como fatores determinantes das
mudanças no espaço urbano e no território. Estes processos, que não são novos,
estariam acontecendo de uma nova maneira fundamentalmente por duas causas
principais: a) o desenvolvimento de novas tecnologias de comunicação, b) a liberali-
zação dos mercados e financeirização da economia mundial.
Segundo o autor, a modernidade é o tempo em que o tempo não tem história. Ela se
instala quando espaço e tempo são separados e teorizados como categorias diferen-
tes e independentes. Na pré-história do tempo, longe e tarde, perto e cedo significa-
vam o mesmo, havia uma correspondência entre tempo e espaço determinada pelo
wetware, a força dos músculos do homem ou os animais para percorrer distâncias.
Continuando seu raciocínio, ele diz que a história do tempo principia quando o ho-
mem cria os dispositivos mecânicos que permitem manipulá-lo. A velocidade do mo-
vimento através do espaço transforma-se numa questão de hardware que o engenho
Cidade contemporânea 22
De acordo com Bauman o que está acontecendo neste momento é que o esforço
para acelerar a velocidade do movimento chegou a seu limite natural: o tempo se
reduziu à instantaneidade. No universo do software, da viagem à velocidade da luz, o
espaço pode ser atravessado em tempo nenhum. A quase instantaneidade do tempo
anuncia a desvalorização do espaço. Agora é o menor, o mais leve e mais portátil que
representam melhoria e progresso (Bauman, 2001).
Entretanto, como vem sendo demonstrado pelas pesquisas de autores como Cas-
tells, as relações entre tecnologia, espaço e sociedade são muito mais complexas
e escapam aos determinismos tecnológicos. As profecias do fim da cidade não têm
se cumprido, pelo contrário, intercâmbios mais intensos e a maior mobilidade têm
forçado a singularidade dos espaços fixos:
Isto não significa, porém, que as cidades não tenham mudado sua configuração. Elas
estão testemunhando transformações na estrutura física e em seu funcionamento,
sobretudo nas formas de relacionamento entre cidades conectadas globalmente em
novas redes.
Uma nova configuração espacial mundial estaria definida assim por um sistema de
cidades globais, onde os centros de comando estão vinculados entre si por redes de
comunicação e transporte (hubs and networks).
Esta parece ser a peculiaridade que distingue as megacidades como nova configura-
ção urbana da globalização. Elas concentram altos níveis de segregação e exclusão.
Como assinala Castells, o mais significativo é que elas estão conectadas externa-
Cidade contemporânea 24
Cidade dual é o termo criado para descrever essa polarização social crescente na
metrópole contemporânea. Alguns autores (Castells, 1995; Sassen, 2000) reconhe-
cem esta característica como resultante das mudanças nas estruturas laborais. Por
um lado, a deterioração do emprego, a ausência de segurança laboral, o trabalho em
tempo parcial, subcontratado e informal. Por outro, a demanda por profissionais alta-
mente qualificados, remunerados pelas companhias multinacionais (white collar), e
de um setor de serviços de salário baixo, coberto pelas camadas sociais mais pobres
e marginais. Nesse sentido esta dependência parece indicar que a declividade social,
de um indicativo da deterioração, passou a um complemento do desenvolvimento
(Garcia Vazquez, 2004).
Outros autores consideram que a evolução é para uma cena mais complexa e frag-
mentada que a do esquema bipolar da dualização, e identificam a grande metrópole
pós-fordista como uma cidade fractal ou como uma cidade organizada em múltiplos
planos, superpostos no tempo e no espaço (layered city, hypercity) 4.
A tendência predominante é para um horizonte de espaço de fluxos
Marc Augé definiu uma nova categoria para se referir a esses lugares carentes de
4_ Mattos (2002) resume assim as
identidade e história que se repetem indistintamente no contexto. Denomina-os “não-
teorias de Edward Soja e Marcuse
lugares”: e Van Kempen.
Cidade contemporânea 25
Esta se afigura uma realidade que acontece em tal escala, que para alguns autores
significa não mais um problema, mas uma liberação do “corselete” da identidade.
Rem Koolhaas tem provocativamente invertido as preocupações do urbanismo com
a busca do sentido do lugar e a relação com a história. Fazendo quase uma apologia
do pragmatismo com que a cidade contemporânea é construída, celebra a cidade
genérica que surge da nova tabula rasa:
ciclo destructivo de la dependencia: no es más que un reflejo de la 5_O não-lugar é um espaço sem
necesidad actual y la capacidad actual. Es la ciudad sin historia. Es caráter, sem relação e sem história,
é a negação do lugar antropológico
suficientemente grande para todo el mundo. Es fácil. No necesita tradicional. Hospitais, aeroportos,
mantenimiento. Si se queda demasiado pequeña, simplemente autopistas, hotéis, meios de
transporte, etc., em todos esses
se expande. Si se queda vieja, simplemente se autodestruye y se espaços característicos da cidade
renueva. Es igual de emocionante –o poco emocionante- en todas contemporânea prima o anonimato,
a solidão, o efêmero, em todos
partes. Es superficial: al igual que un estudio de Hollywood, puede eles o relato histórico é inviável já
producir una nueva identidad cada lunes por la mañana (Koolhaas, que sua essência é o desarraigo.
(Tradução do autor)
2006:12)6.
6_A Cidade Genérica é a cidade
liberada do cativeiro do centro, da
camisa-de-força da identidade. A
Cidade Genérica quebra com esse
ciclo destrutivo de dependência:
ela não é nada além de um reflexo
da necessidade e capacidade
presentes. É a cidade sem historia.
É suficientemente grande para
tudo mundo. É fácil. Não necessita
manutenção. Se ficar demasiado
pequena, simplesmente se expan-
de. Se ficar velha, simplesmente
se autodestrói e se renova. É igual-
mente estimulante e desestimulan-
te em qualquer lugar. É ‘superficial’
– como um estúdio hollywoodiano,
pode produzir uma nova identidade
a cada manhã de segunda-feira.
(Tradução do autor)
Cidade contemporânea 26
mas também culturais propostas para explorar a nova cena urbana. São concebidas FI-1: Buenos Aires. Infra-estruturas
e novos aparatos da globalização.
como plataformas desde as quais ver, entender, problematizar e julgar a complexa Fonte: Revista SCA 194
rede de inteirações no interior da qual a arquitetura tem que encontrar seu lugar e
capacidade.
Para o crítico catalão, aeroportos, malls comerciais, áreas esportivas, parques temá-
ticos, centros de intercâmbio de transporte, centros de negócios, etc. são os novos
geradores de atividade urbana, em torno dos quais a forma da cidade parece fazer-
se plástica e maleável (Sola Morales, 2002).
O paradigma americano
Mesmo sendo um fenômeno que se reconhece “globalmente”, as expressões da cida-
de contemporânea têm variações regionais particulares, segundo contextos sociopo-
líticos, diferenças geográficas e tradições urbanas. Uma imensa literatura acadêmica
tem se produzido em relação à transformação das cidades nos EEUU, com especial
atenção à cidade de Los Angeles como paradigma dos processos pós-modernos
Cidade contemporânea 28
Edge cities, cidades viradas inside-out, pós-subúrbio são termos que apontam para
uma transformação tanto do centro como do clássico subúrbio americano e anun-
ciam o fim da era da metrópole moderna (Soja, 2008). A configuração dualizada
distintiva entre um centro concentrador de funções financeiras, governamentais e
de serviços e uma periferia suburbana, basicamente residencial e habitada por uma
classe média aburguesada, já não representa a realidade americana. A antiga di-
visão regida por raça e classe é hoje um caleidoscópio mais complexo de grupos
sociais, e as formas de vida diferenciadas – vida urbana versus suburbana- estariam
se tornando ubíquas.
Segundo Garreau (1991), a expansão suburbana não tem mais nada de “sub”, já
que podemos considerar agora, de forma inversa, a cidade tradicional subordina-
da à expansão suburbana. O jornalista americano tem chamado a atenção para as
urbanizações novas que concentram espaços de trabalho, corporações e comércio
nas periferias das grandes cidades americanas e que tem batizado como Edge Ci-
ties9. Estas áreas de formação recente (nada existia ali 30 anos atrás) representam
para Garreau a conquista de uma nova fronteira, seguindo os deslocamentos fora
da cidade central da residência (sprawl dos anos 50) e do mercado (shopping mall a
partir dos anos 70). Como contraponto, muitos centros urbanos estariam perdendo
atratividade e se esvaziando, até o extremo de cidades como Houston, denominada
de “donat city” por se distinguir formalmente por um core que se desmancha e um
anel periférico – em torno dos anéis rodoviários- que se densifica.
bana. O composto Exópolis pode metaforicamente ser descrito como a cidade virada FI-2: A dispersão dos mais ricos.
Esquerda: condomínios fechados
inside-out, como na urbanização dos subúrbios, mas igualmente representa a cidade da periferia de Buenos Aires.
virada de fora para dentro, uma globalização do centro urbano que traz as periferias Direita: condomínios verticais na
Barra da Tijuca, Rio de Janeiro.
de todo o mundo para o centro (Soja, 2008:250). Fonte: flirck
Para Demattis, essas diferenças que designaram por muitos anos especificidades
históricas e culturais, hoje se apagam tendendo a convergir num modelo único, co-
mum a toda Europa, de “cidade sem centro” e estrutura reticular, cujos núcleos con-
servam e acentuam sua identidade através de processos inovadores de competição
e cooperação.
Mas as diferenças com a Europa e os EEUU, tanto nos sistemas urbanos quanto nas
características das periferias metropolitanas, são importantes acentuar. Até pouco
tempo os estudos sobre a urbanização na América Latina versavam em torno de dois 11_ Claro que con procesos de ur-
temas. Por um lado, na escala regional, a primazia em cada país de uma ou duas banización muy diferentes. Podría
argumentarse que AL se consolida
cidades concentradoras da economia e da população em grande contraste com o como territorio urbano muy tempra-
sistema de pequenas cidades que lhes dão suporte. Esta característica foi descrita namente, desde la colonización. La
mayoría de las ciudades latinoame-
pelos teóricos da dependência como macrocefalia urbana, uma disfunção do sistema ricanas que son hoy importantes
que expressaria os desequilíbrios de uma urbanização desigual (Castells, 1974). Por centros urbanos surgen como
locus simbólico y logístico de una
outro lado, na escala metropolitana, um modelo dual centro-periferia, também mar- estrategia de conquista del territorio
cado pela segregação espacial e social, seria o denominador comum das cidades y no como el resultado de un pro-
ceso gradual de transformación de
latino-americanas. una sociedad rural o feudal hacia
una organización urbana. En AL,
sobretodo en la América hispana,
As preocupações teóricas crescem nos anos 60 como consequência do forte proces- el territorio rural se desarrolla como
so de urbanização e do crescimento sem precedentes das principais capitais. Como instrumento económico dependien-
te de las sociedades urbanas.
resultado da expansão industrial e das migrações internas por melhores condições
de trabalho e serviços oferecidos pela cidade, as principais capitais viram seus limi- 12_ Boletín demográfico URBA-
NIZACIÓN Y EVOLUCIÓN DE LA
tes desbordados, suas populações contabilizadas em milhões e seus tecidos fundi- POBLACIÓN URBANA DE AMÉ-
dos com os vilarejos e municípios próximos formando um todo complexo. O rápido RICA LATINA 1950 – 1990, AÑO
XXXIII, Edición especial, Mayo
crescimento das periferias se deu muitas vezes de forma precária e sem o aporte 2001, Comisión Económica para
indispensável de serviços urbanos e de infraestrutura, consolidando a diferenciação América Latina y el Caribe, Centro
Latinoamericano y Caribeño de
qualitativa entre centro e periferia. Distingue-se então um núcleo privilegiado, onde Demografía (CELADE) - División
os serviços urbanos são considerados de qualidade, a partir do qual, em forma radial de Población, Santiago de Chile
Cidade contemporânea 32
de produção do espaço, como no tipo e características do tecido urbano. Também na FI-4: A dispersão dos mais pobres.
Periferias urbanas Buenos Aires
América Latina os estudos mais recentes das metrópoles apontam para um sistema (esquerda) e Rio de Janeiro (direi-
mais aberto e policêntrico, caracterizado pela dispersão. ta). Fonte: Revista SCA 194 e flirck.
Sem dúvida, o fenômeno mais notório dos últimos anos nas cidades latino-america-
nas tem sido o crescimento de condomínios fechados e enclaves de residência em
áreas suburbanas.
Para o caso brasileiro, Goulart Reis registra que as transformações observadas ates-
tam não só uma simples mudança de forma, mas uma completa mudança de estado.
A dispersão urbana é a passagem de um estado a outro, no qual as formas se sub-
dividem rapidamente sobre o território. As relações que regem os processos sociais
já não são as mesmas e se devem em grande parte a novos estágios do comércio
mundial, novos modos produtivos e formas mais complexas de organização capita-
lista (Goulart Reis, 2006). Goulart descreve e estuda a semelhança dos fenômenos
e as relações entre as áreas metropolitanas de São Paulo e as de formação mais
recente (Campinas, Baixada Santista e Vale do Paraíba) que formam, em conjunto,
um sistema metropolitano integrado. As mudanças identificadas pelo autor incluem: a
formação de áreas cada vez mais dispersas, separadas no território, mas mantendo
estreitos vínculos entre si; a regionalização do cotidiano com a adoção de modos de
vida da população que tem seus deslocamentos diários em escala metropolitana e
intermetropolitana; novas modalidades de gestão dos espaços urbanos; alterações
nas relações entre espaços públicos e privados; novas formas de organização do
mercado imobiliário e novos padrões de projeto.
Para o caso de Buenos Aires, Adrian Gorelik descreve a modernização recente não
apenas como meras alterações da cidade existente, mas como expressão de um
câmbio profundo com a conformação de um novo sistema urbano. Se a cidade tem
se produzido historicamente do centro para a periferia com a expansão da grelha
14_O termo “perimetropolitano” de-
isotrópica como modelo de expansão das fronteiras sociais e urbanas, hoje, com a nominaria, nesse sentido, uma área
modernização, ela está se produzindo de maneira inversa. Desde a periferia, desde de interface entre o metropolitano
e um território urbano-regional que
os pontos mais débeis do sistema anterior para o centro. O que antes era uma falha, está próximo à região metropolita-
converte-se no novo núcleo de sentido (Gorelik, 1999). na, mas que tem e mantém alguma
característica própria. (Rudolph,
2007)
Cidade contemporânea 35
Enquanto o capítulo anterior procurou apresentar o universo de discursos teóricos sobre a condição
contemporânea da cidade e seus rebatimentos na forma urbana, como contraponto, este capítulo se
concentrará no mundo da ação. Discutir-se-á a noção de projeto urbano como forma específica de
intervenção na cidade, com foco nas práticas recentes em cidades latino-americanas. Intentaremos
elaborar uma taxonomia dos projetos com base nas experiências locais que permita construir um
panorama dos temas, localizações, programas e escalas abordados. Argumentaremos que, apesar de
a maioria das experiências ter se concentrado no espaço-centro, algumas experimentações projetuais
sugerem novos enfoques para as periferias metropolitanas. A renovação do projeto urbano a partir de
uma abordagem paisagística será o tema do próximo capitulo.
Ignasi de Sola Morales, para quem a analogia histórica entre fazer arquitetura e fazer
cidade é hoje discutível ante as ingovernáveis metrópoles contemporâneas1, reco-
nhece a existência de uma prática urbanística que, sob o nome comum de Projeto
Urbano, tem reunido a experiência de um grupo de arquitetos que veem em cada
intervenção uma oportunidade para produzir uma parte da cidade, uma ocasião onde
os traços da cidade e os da arquitetura buscam tornar-se solidários.
Proyecto urbano quiere decir que la arquitectura parte de datos
estado de cosas que previamente se entiende como inacabado, 1_Ignasi de Sola Morales plantea
desvencijado, por resolver (Sola Morales, 2002:30)2. las dudas sobre la capacidad de la
arquitectura contemporánea para
hacerse con la metrópolis. Esta
Como ação concertada, o projeto urbano é visto também como mediador e incorpora relación biunívoca entre una y otra
enraizada en la naturaleza social
a negociação entre diferentes atores em prol de interesses compartidos. Em teoria, tanto de la arquitectura como de la
deve ser entendido não como fim, imagem a alcançar, mas como processo. Não é ciudad es visible para el autor en la
ciudad histórica pero no tan clara
concebido enquanto obra acabada, senão como sucessões de ações em contínua en la metrópolis contemporánea.
gestação e transformação, aberto e flexível, capaz de englobar as diferentes tempo- Ver “Hacer la arquitectura, hacer
la ciudad”, em Territorios, Gustavo
ralidades em seu desenvolvimento. Gili, 2002, pp. 37-53.
Ao mesmo tempo, o conceito de projeto urbano não se manteve invariável, pelo con-
trário, vem se adaptando nos últimos 30 anos as cambiantes condições urbanas nas
quais os projetos são formulados e desenvolvidos. Nessa medida, vários autores têm
classificado a sequência de mudanças em diferentes “gerações” de projetos urbanos
(Portas, 2004).
Uma ruptura importante ocorre em torno dos anos 60, quando, na Europa, come-
çaram a se procurar alternativas ao planejamento que preponderou fortemente no
período de recuperação pós-Segunda Guerra. A reflexão em torno da morfotipologia
introduzida pela escola italiana, a recuperação dos valores da cidade histórica, em
combinação com o fracasso do urbanismo defendido pela Carta de Atenas, promo-
veram uma nova forma de aproximação dos problemas urbanos que retomava o
protagonismo da arquitetura. Um retorno à cidade desde a arquitetura e a realidade
de sua fabricação.
Sem dúvida que existe implícita nesta concepção uma contradição conceitual, como
bem indica Françoise Choay:
Comment concilier les éléments de regulation et de durée avec
reposer sur trois projets, car la ville est une réalité triple : territoire
ay, 2005)3.
No final, um conjunto de projetos traz novas reflexões sobre os desafios das metró-
poles. Eles serão o elo de conexão com o próximo capítulo onde discutiremos orien-
tações possíveis para a renovação do projeto urbano. Este conjunto de experiências
incipientes e experimentais procura atender questões de maior abrangência, de uma
nova realidade urbana nas áreas metropolitanas.
Mas, igualmente, por detrás do renascer dos centros históricos existe uma estratégia
econômica em torno da crescente indústria do turismo. Uma estratégia que procura
promover as cidades, tendo na imagem de seus centros históricos, agora renovados
e polidos, um elemento fundamental de marketing. Algumas críticas têm apontado
para os custos sociais da renovação dos centros antigos com ênfase na “imagem”,
criando mais uma cena que reativando um patrimônio vivo. A concepção limitada e
museificante do patrimônio tem produzido, em alguns casos, o congelamento das
verdadeiras forças produtoras da cultura local.
A incorporação de novas dinâmicas sociais e econômicas sem deslocar os residen- FII-1 e 2: Havana, renovação do
centro histórico. Plaza de Armas
tes mais pobres tem sido um dos mais difíceis desafios da reconstituição urbana nos Fonte: Oficina Del Historiador
centros históricos latino-americanos. As primeiras experiências, como a renovação Habana
do Pelourinho, em Salvador (Bahia) no início dos anos 90, foram fortemente criti-
cadas por se basearem na erradicação da sua população para dar lugar a novos
programas “culturais” e turísticos. Mudanças de orientação, porém, têm procurado
melhorar as condições de habitabilidade e assegurar a permanência dos moradores.
Ao mesmo tempo, a preocupação com a imagem tem dado lugar a um entendimento
mais complexo do patrimônio. A atenção dispensada ao tecido e à tipologia vem
substituindo o simples “fachadismo”. A restauração arquitetônica e social dos tambos
de Arequipa -um tipo de residência popular originalmente hospedagem dos comer-
ciantes de passagem pela cidade- é um exemplo desta abordagem (Cidap, 2008;
Cordoba Valdivia, 2005; Ludeña, 2005; Maldonado Valz, 2004).
Não é casual que nos últimos anos os discursos em torno do urbano tenham como
protagonista o “espaço público”. Termo usado e abusado por arquitetos, prefeitos e
até empresas imobiliárias tanto para legitimar as qualidades de um projeto urbano
como para garantir seus benefícios sociais e políticos. Em contraste com a ideia da
“morte da cidade”, a reafirmação do “público” como lugar de trocas e de encontros
Sobre o Projeto Urbano 44
O espaço público recriado procura reforçar identidades locais, engendrar novas re-
lações entre partes desconexas (costuras urbanas) e em geral estimular dinâmicas
Sobre o Projeto Urbano 45
sociais, econômicas e culturais. Também aqui os investimentos públicos procuram FII-4: Tambos no centro histórico de
Arequipa. Planta: Fonte: Liesbeth
criar efeitos “contagiantes” sobre o entorno, estimulando o setor privado. Caymax e Esther Jacobs.
FII-5: Acessos às moradias reno-
vadas do Tambo Del Matadero,
Um tipo específico de projetos, dentro deste grupo, está representado por aqueles Arequipa. Fonte: Autor
que têm se focado nas bordas de contato com a natureza, com o redesenho de pas-
seios marítimos, orlas e promenades junto a rios e costas marítimas. Buenos Aires e
Rosário, por exemplo, têm lançado programas que procuram uma nova relação com
o rio, com um sistema de parques lineares e promenades ao longo da costa (Arrese,
2005, Monteverde 2005). Guayaquil, no Equador, concebeu um imenso projeto de re-
novação urbana a partir da reabilitação do Malecom, um antigo passeio ao longo do
rio Guayas. Promovido e gerido por uma fundação privada com o objetivo de resgatar
seu deteriorado centro comercial e bancário, o projeto não se reduz ao espaço públi-
co, mas incorpora várias funções comerciais (mercado, cinema, etc) (Wong, 2005).
A estratégia se fundamenta na provisão de equipamentos sociais que atuam como FII-6: Malecóm de Guayaquil. Fon-
te: Diario La Nación
catalisadores de uma transformação urbana. Sempre articulando e combinando po- FII-7: Paseo del Caminante, nas
líticas sociais com ações espaciais, neste caso, serviços necessários concentrados “barrancas” do rio Paraná, Rosario.
Fonte: Arq. Gerardo Caballero
num prédio público singular, tem início uma transformação que transcende a dimen-
são do objeto arquitetônico e se desdobra num –mínimo- projeto urbano. Aqui o papel
da arquitetura não é menor, já que o projeto se baseia no valor simbólico destas
infraestruturas sociais.
Como são programas e não projetos, o critério de localização procura atender equi-
tativamente aos diferentes bairros. Selecionamos três exemplos no contexto latino-
americano, destacando em cada caso um programa específico: bibliotecas no caso
de Bogotá, escolas em São Paulo e centros de administração municipal em Rosá-
rio.
prédios antigos ou da construção de novos, os centros administrativos foram estra- FII-8 e 9: Requalificação do espaço
público. Programa Rio Cidade,
tegicamente alocados em cada bairro para possibilitar novas centralidades, levando Leblon, Rio de Janeiro. Autores:
os serviços municipais para mais perto dos moradores, mas também incorporando Luiz Eduardo Indio da Costa, Guto
Indio da Costa, Fernando Chacel.
outras facilidades culturais, recreativas e de saúde. Em cada situação, o projeto teve Fonte: Alvarenga, Andre (2009)
um recurso específico para qualificar a área urbana: a recuperação de uma esta-
ção de trens abandonada, a criação do espaço público, a consolidação de um eixo
urbano, a complementação de redes de rua, etc. (Corea 2000; Monteverde, 2005;
Municipalidad de Rosario, 2006; Pampinella 2006).
Com o mesmo caráter distributivo Bogotá incorporou uma rede de bibliotecas. Quatro
edifícios principais, de escala metropolitana, e um conjunto de unidades menores
de bairro se espalham para atingir a maioria da população. Indubitavelmente, neste
caso a monumentalidade e a qualidade arquitetônica dos edifícios principais procu-
raram um efeito de visibilidade à escala da cidade. Entretanto, um dos projetos que
tem gerado interesse é El Tintal, uma biblioteca situada em um setor normalmente
relegado do investimento público. O projeto reutiliza um edifício para a incineração
de lixo abandonado, adaptando a estrutura industrial ao novo programa cultural. A
biblioteca assenta-se em um parque e integra, junto com pantanais adjacentes, uma
estrutura verde maior. O projeto se articula com alamedas e ciclovias, elementos
que pertencem a intervenções de maior abrangência (Alvarez , 2004; Caudo, 2009;
Martin, 2007).
de um novo cartão postal da cidade. Os 170 hectares foram reconvertidos para rece- FII-12: Puerto Madero, o novo
cartão postal de Buenos Aires.
ber novas ruas e passeios, escritórios, comércio e residências. O projeto procurou a Fonte: Autor
continuação da trama e da morfologia sugerida pela arquitetura portuária de blocos
compactos e retangulares, contrastando com acentos urbanos de prédios de altura
enquadrando e marcando perspectivas (Arrese, 2005; Gorelik, 2004; Liernur, 2007;
Martinez de San Vicente, 2004).
centros de negócios, hotéis e universidades privadas substituíram algumas velhas FII-13: Perspectiva do Eixo Taman-
duatehy, Santo André: Fonte: Muni-
indústrias. As urgências e o apoio público a atividades que pudessem trazer novas cipalidade de Santo Andre.
oportunidades de trabalho deram espaço a grandes companhias no setor comercial FII-14: Perspectiva do projeto Ciu-
dad Portal Bi-Centenário, Santiago.
e a setores de serviço, em detrimento do desenvolvimento de redes produtivas locais Fonte: Ministerio de Urbanismo y
menores e de geração de novos tecidos misturados que pudessem integrar espaços Vivienda
hectares através de parcerias público-privadas, onde as infraestruturas estão entre- FII-15 e 16: Imagem das indústrias
cerealíferas desativadas e plano
gues ao poder público e os projetos residenciais ao mercado imobiliário. Promovido para Puerto Nuevo, Rosario. Fonte:
como um lugar da inovação e desenvolvimento sustentável, com espaços públicos Municipalidad de Rosario
Enquanto o exemplo de Medellín se destaca pelo impacto visual da infraestrutura na
paisagem urbana, outros casos seguem na direção oposta: procuram ocultar, soterrar
para dispor deste espaço sobre as infraestruturas. Tal é o caso do Corredor Verde do
Oeste, na cidade de Buenos Aires. O projeto objetiva superar a barreira urbanística
que implica, para a transversalidade norte-sul da cidade, o percurso da ferrovia Geral
Sarmiento. A ideia é criar um parque linear de quase dez quilômetros de extensão
que melhore a qualidade ambiental e urbana dos bairros adjacentes. Fazem parte do
projeto novas escadas, estações, caminhos e ciclovias, praças verdes e secas para
promover atividades ao ar livre, assim como também novas regulações urbanísticas
para incentivar a transformação das fachadas que se abrem ao novo espaço público
(Arrese, 2005).
A relação complexa destes assentamentos informais com o resto da cidade tem evo-
luído nos últimos anos. Considerados por muito tempo um “câncer” urbano, graças a
mudanças na sua valorização7 e à ação de movimentos sociais houve uma reformu-
Sobre o Projeto Urbano 56
lação das políticas públicas que abandonaram ‘soluções’ violentas de remoção em FII-21: Urbanização de assenta-
mentos informais. Morro do Socó e
favor de estratégias mais progressistas de inclusão e urbanização. do Portal, em Osasco, São Paulo,
dos arquitetos Viglieca & Associa-
dos. Fonte: Arcoweb
Umtipo específico de projeto urbano vem se desenvolvendo no contexto latino-ameri- FII-22: Favela Novos Alagados em
cano em torno de experiências que procuram integrar estes assentamentos informais Salvador. Vista da enseada do Ca-
brito e do Parque São Bartolomeu,
à cidade dita “formal”. Esta integração envolve um conjunto de intervenções físicas, antes e depois da intervenção, com
mas também sociais e institucionais, que apontam para a provisão de infraestrutura o manguezal recuperado. Fonte:
Cities Alliance.
e serviços urbanos, melhoria da acessibilidade, regularização das propriedades e
criação de novos espaços públicos. As obras se articulam com ações sociais, com
programas de capacitação e educação, projetos de geração de renda, de saúde,
entre outros.
O Brasil liderou esta mudança com o programa Favela-Bairro, que nos anos 90 ga-
nhou repercussão internacional. Implementado pela municipalidade do Rio de Janei-
ro, o programa instalou com originalidade e determinação o projeto urbano nas fave-
las. Por sobre as ideias de urbanização e valorização deste espaço autoconstruído
7_“A favela não é problema, mas
foram adicionadas noções de desenho urbano. Desse modo, estratégias usadas na
uma solução” foi uma frase famosa
mais alta cultura urbana foram transladadas e traduzidas para um espaço que até de John Turner nos anos 70 que
refletiu um giro na aproximação aos
então escapava à categoria “urbano”.
assentamentos informais na Amé-
rica Latina. Anunciou o processo
de valorização da favela, por clara-
De acordo com seus promotores, o objetivo do programa não era reparar o déficit de
mente apresentar vantagens (tanto
moradia, mas o déficit urbano, ou seja, fornecer infraestrutura básica, equipamen- para seus habitantes quanto para
os agentes públicos) em compara-
to social e novos espaços públicos. Significou uma abordagem sensível de projeto
ção com os projetos fracassados
capaz de retratar em cada bairro o seu genius loci, através de intervenções estra- de habitação social fornecida pelo
Estado.
Sobre o Projeto Urbano 57
tégicas, quase cirúrgicas, que procuraram a requalificação, mas sem destruir sua
identidade e suas lógicas espaciais intrínsecas.
Outras cidades brasileiras vêm, desde então, implementando projetos análogos. Sob
a égide do novo Estatuto da Cidade através do Ministério das Cidades, a urbaniza-
ção de favelas e a regulação fundiária têm se transformado numa política de ordem
nacional. Com graus variados de sucesso, dependendo da qualidade dos projetos,
de suas modalidades de gestão e participação dos habitantes, um vasto conjunto de
intervenções constitui um corpo relevante de experiências locais. Destacam-se, entre
outros, pela qualidade da arquitetura, os projetos realizados pelo escritório Viglioco
e Associados na periferia de São Paulo, no Morro do Socó e do Portal e nas favelas
Paraisópolis e Heliópolis. Em Salvador, na Bahia, o projeto do arquiteto Anastas-
sakis para o assentamento conhecido como Novo Alagados sobressai também pela
Sobre o Projeto Urbano 58
Este novo “status” do urbanismo encontra dificuldades, porém, para abordar as com-
plexidades da metrópole. São quatro os desafios que o projeto urbano, em face ao
século XXI, deve enfrentar. Por um lado, existe um problema de escala, a própria
condição horizontal da cidade condiciona o alcance em um território cada vez mais
amplo. Por outro, há uma questão instrumental, já que os elementos clássicos do de-
senho urbano – quadra, lote, tipo - devem se renovar com a incorporação do novo vo-
cabulário da metrópole (infraestruturas, grandes vazios, fragmentos de áreas rurais
e industriais, naturezas, etc.). Em terceiro lugar, não podemos deixar de mencionar
um problema de gestão, já que muitos temas excedem as limitações administrativas
locais e requerem decisões intermunicipais, envolvendo uma complexa rede de ato-
res. Por fim, mais notável no caso da América Latina, o que poderíamos chamar de
problema ético, já que questiona a maneira como os projetos garantem a distribuição
dos benefícios com sentido de equidade.
Muitos desses projetos baseiam sua estratégia numa racionalidade ecológica. Ge-
ralmente, são projetos de uma abrangência maior que intentam relacionar o tecido
urbano ao seu contexto natural. Eles buscam reconciliar os processos de desen-
volvimento urbano com os processos ecológicos que atravessam a cidade e que
inevitavelmente fazem parte dela. A ideia é “trabalhar junto com a natureza” (McHarg,
Hough), produzindo sinergias entre as lógicas ambientais que dão sustentabilidade
ao território e ao espaço construído. Assim, os sistemas ecológicos servem de su-
porte para a cidade que, por sua vez, os incorpora como valores positivos dentro da
sua espacialidade e uso.
O trabalho propõe uma visão integral para a cidade, apoiando-se no resgate do antigo
lago Texoco. Um novo polo de desenvolvimento vinculando a nova paisagem lacus-
tre e incorporando novas infraestruturas de impacto metropolitano seria fruto de um
Sobre o Projeto Urbano 60
Uma peça importante no conjunto proposto é o novo aeroporto, concebido numa ilha,
o que traz vantagens ambientais e logísticas, ao mesmo tempo em que recentraliza a
metrópole atraindo para o centro atividades que hoje acontecem de forma dispersa.
O atual aeroporto será transformado em um parque metropolitano, com áreas de de-
senvolvimento misto complementando a ligação entre o sistema de parques urbanos
da cidade do México e a nova laguna.
envolveram o redesenho de suas bordas, com a inclusão de áreas de transição entre FII-27: Riachos e pântanos, que
atravessam a cidade transver-
a cidade e o pântano, abrangendo parques, passeios, áreas de descanso e recre- salmente, regulam o equilíbrio
ação, e nova acessibilidade. Em síntese, uma nova frente que qualifica o entorno hidrológico ao mesmo tempo em
que se inserem como peças dentro
urbano, ao mesmo tempo em que visibiliza o valor ambiental e social dos pântanos do sistema de espaços públicos.
ao integrá-los à vida cotidiana da cidade. Fonte: Alcaldía de Bogotá
Vazios de Água, São Paulo, Brasil. Mais que um projeto, a proposta dos arquitetos
MMBB para a periferia de São Paulo pode ser entendida como a tese de uma estra-
tégia possível. Fundamenta-se na potencialidade do projeto de infraestrutura, na sua
forma difusa em rede para construir pontualmente urbanidade onde, até então, só se
aportam valores funcionais. A proposta consiste na redefinição do próprio paradigma
do projeto de infraestrutura, reconhecido como articulador na escala territorial, mas
que na escala local é um agente desagregador. “Redefinir esse paradigma consiste,
para além dos serviços prestados pelas redes, em articular políticas setoriais, cons-
truir lugares adequados à vida urbana e configurar imagens referenciais na paisa-
gem, contribuindo para o estabelecimento de uma relação afetiva dos habitantes com
a cidade” (MMBB, 2007).
Os arquitetos reconhecem como uma oportunidade ímpar utilizar esses espaços pre-
vistos para os “piscinões” para criar uma rede de vazios urbanos que qualifiquem e
estruturem as periferias. Para tal são necessárias cinco ações. A primeira é dispo-
nibilizar o correto caminho para as águas e o adequado espaço para as casas. Ou
seja, realocar as favelas que estão em situação de risco ocupando as várzeas dos
rios, recompor as calhas dos córregos para as águas e implantar as residências
nos vazios previstos para os “piscinões”. Segundo, melhorar a qualidade das águas,
através de um sistema difuso de estações compactas de tratamento de esgoto para
cada microbacia, incrementando assim a qualidade e a quantidade de água nos rios.
Redefinir as fronteiras que permitam a aproximação da cidade às águas seria a ter-
ceira ação. Através da criação de nova acessibilidade, um espaço de abertura da
cidade para os rios, que conjugue parques lineares, permita circular, atravessar o rio
e integrar o tecido urbano. Reprogramar os vazios e as margens que os conformam
aportando-lhes um valor de centralidade é uma ação que envolveria diversidades de
usos e qualificaria o entorno estabelecendo uma relação de afetividade com a cida-
de. Por último, anotar uma escritura de água na paisagem remete a uma dimensão
poética e histórica do território, uma marca líquida na cartografia da metrópole, con-
ciliando um novo sistema de espaços livres e os requisitos técnicos para o controle
das inundações (MMBB, 2007).
Sobre o Projeto Urbano 65
A proposta se apoia numa lógica metropolitana imbatível. O problema das enchentes, FII-29: Redefinir o próprio paradig-
ma do projeto de infraestrutura é a
que compromete tanto bairros periféricos como a produtividade da metrópole –cor- proposta de MMBB. Os piscinões
tando vias e caminhos- tem origem em zonas geralmente desatendidas pelo poder são vistos como oportunidades
únicas para criar uma rede de
público. Os projetos de infraestrutura para o controle das inundações representam vazios urbanos que possam qualifi-
uma oportunidade única destas regiões receberem investimento. Conciliar a dimen- car as periferias paulistanas. Fonte:
MMBB Arquitetos
são metropolitana destas infraestruturas com seu impacto local é o seu fundamento.
Parque La Aguada, Santiago, Chile8. Outro caso, que surgiu como projeto de pes-
8_Agradeço muito especialmente à
quisa da Universidade Católica de Santiago, mas que já vem sendo adotado pelas
arquiteta Juana Zunino, professora
autoridades locais e está aos poucos se tornando realidade, é o Parque La Aguada. da PUC de Santiago e autora do
projeto de arquitetura e paisagis-
O parque se insere em um projeto mais abrangente, o Plano Mestre Anel Metropoli-
mo, pelas informações e as ima-
tano de Santiago, uma iniciativa do governo chileno emblemática das intervenções gens do projeto.
Sobre o Projeto Urbano 66
previstas para a celebração do bicentenário da República9. O anel consiste em uma FII-30: O Projeto La Aguada se
insere dentro do plano mestre do
estratégia de reestruturação do antigo caminho de cintura de Santiago, visando à Anel metropolitano de Santiago,
recuperação dos terrenos abandonados da ferrovia e das indústrias desativadas. integrando num novo parque recre-
ativo as infraestrturas de mobilida-
Um total de 250 hectares de terras pertencentes a vários proprietários - o governo de e de controle das inundações.
nacional, algumas municipalidades e a empresa de ferrovia entre outros- serão re- Fonte: Ministerio de Vivienda y
Urbanismo de Chile
cuperadas de forma integral para qualificar bairros, criar novos espaços públicos e
serviços, e melhorar a conectividade e o transporte. Definido como uma fronteira
interna, o anel articula as relações entre o centro e os 12 municípios adjacentes, o
que o transforma numa iniciativa metropolitana. O projeto pretende incentivar o mer-
cado imobiliário, estimulando o crescimento interno e evitando a contínua expansão
e ocupação de terrenos agrícolas (Gobierno de Chile, 2003).
9_O recente terremoto que atingiu
o Chile com certeza modificará as
O Parque La Aguada completa a borda sul do anel e incorpora o chamado “zanjon de prioridades do governo. Antes do
trágico evento, as primeiras licita-
la aguada”, um curso d´ água que –ao contrário do rio Mapocho que tem condensado
ções do parque estavam prontas
as representações nobres da cidade- leva o mote de “costanera dos pobres”, e tem para serem lançadas.
Sobre o Projeto Urbano 67
Neste capitulo procuramos examinar a abordagem paisagística enquanto uma alternativa na hora de
pensar o projeto urbano fora da cidade central consolidada, no território expandido da metrópole con-
temporânea. Discutir os fundamentos teóricos e os princípios que asseguram esta hipótese. Entender
as condições nas quais esta abordagem surge, determinar as colaborações de outras disciplinas e
destilar, através de alguns exemplos, o seu vocabulário projetual.
O termo paisagem e o paisagismo como prática vêm ganhando um lugar cada vez
maior, tanto no âmbito profissional das disciplinas que lidam com o espaço como no
vocabulário cotidiano em geral. Paradoxalmente, a reaparição da paisagem na esfe-
ra cultural coincide com certa dificuldade de compartilhar definições e teorias. Flutu-
ando entre posições culturalistas e naturalistas extremas, a paisagem abrange, com
toda a sua polissemia, dimensões ecológicas, socioeconômicas, histórico-culturais e
estéticas do território que habitamos.
Têm contribuído para esta transformação, por um lado a crescente consciência am-
biental das cidades, por outro a constatação do avanço da urbanização sobre o ter-
ritório e as novas formas de configuração urbana expandida. Fundamentalmente,
um novo entendimento da cidade como parte inseparável da natureza confere nova
racionalidade às intervenções urbanas. O desenvolvimento de disciplinas como a
ecologia e a ecologia da paisagem trazem novos conceitos e categorias sobre a
forma de organização, os fluxos e as dinâmicas existentes entre os elementos da
paisagem que são trasladadas para o urbanismo.
Projeto urbano na metrópole: a alternativa da paisagem 70
Rosa Barba, arquiteta e paisagista catalã, quem tem colaborado enormemente para o
desenvolvimento do paisagismo na Espanha, entende que há sobreposições porque
ambas as disciplinas tratam do espaço “entre” as arquiteturas, embora diferenças e
pontos em comum devam ser discernidos. Enquanto tradicionalmente se considera o
urbanismo como a disciplina cujo material de trabalho é o edilício, o mundo construí-
do, para Barba o paisagismo tem como objeto de projeto o entorno onde predominam
os fatores ambientais. Outras disciplinas tratam também do entorno natural, como a
geografia, a ecologia ou a biologia, porém só o paisagismo incorpora uma ação que
é fundamentalmente projetual (Barba, 2006).
O termo nasceu após uma conferência e exposição em Nova York, em 1997, e tem
suscitado desde então vários livros, ganhando também espaço nos cursos das esco-
las de arquitetura e urbanismo1, embora seu alcance teórico e prático ainda deva ser
comprovado. O neologismo em inglês expande a abrangência da clássica e de algu-
ma maneira redutiva landscape architecture para o urbanismo. Não que não tenham
sido urbanas as intervenções que, desde o século XIX, têm incorporado “natureza” à
cidade. A diferença, segundo os seus defensores, está na concepção da paisagem.
Enquanto Barba e outros autores ainda formulam seus discursos a partir da duali-
dade cidade/ natureza, a proposta do landscape-urbanism entende (ou quer enten-
der) ambientes culturais, sociais, políticos e econômicos como encaixados dentro e
simetricamente com o mundo natural. Segundo Corner, a promessa do landscape-
urbanism é o desenvolvimento de uma ecologia espaço-temporal que trate todas as
forças e agentes operando no campo urbano, considerando-os como redes contínu-
as de inter-relações (Corner, 2006:30).
A abordagem paisagística
Americano de origem e adotado pelos europeus, o vocábulo landscape-urbanism
não encontra uma boa tradução em português. Urbanismo paisagista, urbanismo
da paisagem não parecem refletir nem a força nem a síntese semântica do vocábulo
em inglês. Enquanto o landscape-urbanism busca definir o seu próprio lugar entre as
disciplinas que modelam o território, para o caso desta tese abordagem paisagística
parece expressar com mais rigor a intenção de explorar algumas ideias sem cair em
modismos nem em linguagens sedutoras.
Ariella Masboungi, quem tem dedicado seu trabalho ao estudo da prática do projeto
urbano na França, reconhece limitações no desenho urbano tradicional para tratar
a escala das extensas periferias urbanas. As ferramentas conceituais que tem se
experimentado até agora em escalas pequenas, devem ser revisadas à luz da ex-
tensão e dimensão do fenômeno urbano. Apoiando-se na história e na geografia do
sítio, e interpretando os traços existentes, o paisagismo poderia fornecer, segundo
Masboungi, a renovação necessária dos princípios operacionais e instrumentais do
projeto (Masboungi, 2002).
cidade, mas como atuar em áreas que vão ser afetadas pela mutação suburbana, e 3_Entre as duas, grandes questões
quais projetos deveremos empreender para abordá-las. que determinam qualquer projeto,
a saber, o programa e o lugar,
Entre las dos grandes cuestiones que determinan cualquier proyec- esta situação implica um câmbio
to, a saber, el programa y el emplazamiento, esta situación implica profundo de perspectiva. Apela
à emergência de uma disciplina
un cambio profundo de perspectiva. Apela a la emergencia de na qual a hierarquia do programa
una disciplina en la cual la jerarquía del programa frente al lugar, frente ao lugar, tradicionalmente
instaurada pelo urbanismo (a partir
tradicionalmente instaurada por el urbanismo (a partir de la lógica da lógica do encargo dominante da
del encargo dominante de la arquitectura) se invertiría, de moque arquitetura) inverter-se-ia, de modo
que o lugar se converteria na idéia
que el lugar se convierta en la idea reguladora del proyecto. A este reguladora do projeto. A este cami-
camino alternativo, y sus consecuentes determinaciones especí- nho alternativo, e suas conseqüen-
tes determinações específicas que
ficas que se perfilan de modo especialmente claro en la llamada se perfilam de modo especialmente
arquitectura del paisaje, proponemos denominarlo sub-urbanismo claro na chamada arquitetura da
paisagem, propomos denominá-lo
(Marot, 2006 p.9)3. suburbanismo. (Tradução do autor)
Projeto urbano na metrópole: a alternativa da paisagem 74
Para outros autores, este retorno ao lugar e às qualidades do sítio teria seus funda-
mentos nas preocupações contemporâneas com a perda de identidade ocasionada
pela globalização. A ideia que o substrato de suporte do projeto, o lugar, contém
4_Quatro são as pistas que orien-
uma história, uma memória e um “espírito” que o projeto não só deve revelar como
tam o suburbanismo proposto
interpretar, já tem sido explorada pela fenomenologia. O conceito de genius loci5, por Marot e que poderiam ser
interpretadas como uma orientação
desenvolvido por Norberg Schulz nos anos 80, encontra ecos contemporâneos nas
metodológica. A primeira é a me-
tentativas de outorgar à paisagem a capacidade de se opor às tendências homoge- mória ou anamnese das qualidades
do lugar; a segunda, a visão do
neizantes dos processos de globalização. A internacionalização dos mercados e das
lugar e do projeto como processos,
forças de produção do espaço estariam gerando paisagens “genéricas”, indiferentes mais que como produtos; a leitura
em espessura e não somente em
às particularidades físicas e culturais próprias de cada lugar. Depois das formulações
planta e, finalmente, o pensamento
teóricas para uma arquitetura regional crítica, Keneth Frampton assinala o poder da relativo: uma concepção do lugar
ou de projeto como campo de
paisagem como único instrumento passível de oferecer resistência ao implacável
relações mais que como disposição
“aplanamento de lugares e culturas” (Shannon, 2004). de objetos (Marot, 2006).
Como arquiteto paisagista, Corner está mais interessado no que a paisagem pode
fazer do que no que ela pode ser ou representar. O foco está nos efeitos, nos pro- 7_Analisa, descreve e oferece
leituras alternativas para três ci-
cessos que pode suscitar, na sua instrumentalidade estratégica. Nesse sentido, pro-
dades no Vietnam, com o objetivo
jeto de paisagem e projeto urbano assemelham-se, já que são pensados para poder de ampliar e testar os conceitos do
urbanismo-paisagista, até então
conduzir os processos de formação da cidade.
restritos ao mundo ocidental. A
pesquisa revela as tensões exis-
tentes entre uma milenar tradição
A natureza da cidade
de relação com a terra -através das
Os debates sobre a convergência entre urbanismo e paisagismo não podem nos paisagens produtivas arraigadas
no território- com as expectativas
iludir sobre a difícil tarefa de discutir a relação cidade / natureza. Os discursos muito
de mudança trazidas pelo rápido
raramente escapam aos pares dicotômicos. Falamos da oposição natureza versus desenvolvimento de novos modelos
econômicos. Ver “Rethorics and
cultura, natureza versus artifício, natureza versus cidade. Porém, inevitavelmente,
realities, adressing landscape
enquanto ideia a natureza –tanto como a cidade- não é nem universal, nem a-histó- urbanism. Three cities in Vietnam”.
Unpublished thesis, KULeuven,
rica, senão que, como assinala Corboz, a natureza é aquela que cada cultura define
2004.
como tal (Corboz, 2001). Como o nosso interesse concentra-se no urbanismo como
8_A ênfase desloca se da paisa-
prática não pretendemos analisar em profundidade cada conceito, mas entender me-
gem como produto da cultura para
lhor como tem se expressado esta correspondência. paisagem como agente produzindo
e enriquecendo à cultura. Paisa-
gem enquanto substantivo (como
Três posturas podem ser observadas na relação histórica do par cidade-natureza. objeto ou cena) é abandonado a
fim de enfatizar paisagem como
Uma primeira que podemos nomear como de redenção, onde a natureza é vista
verbo, como processo ou atividade.
como fonte de tudo o que é bom e virtuoso contra a cidade que, por sua vez, é a Aqui são menos as características
formais da paisagem que são des-
culpada da sua destruição. A natureza encorpada em um idealismo platônico é capaz
critas do que são os efeitos per-
de nos salvar da alienação da cidade, podendo ser o paliativo para as doenças cau- formativos da paisagem no tempo.
O foco é na agência de paisagem
sadas pela vida urbana. Reconhece-se esta corrente tanto nas reformas higienistas
em vez de sua simples aparência.
como reação aos efeitos da cidade industrial do século XIX e nos modelos de cida- (Tradução do autor)
Projeto urbano na metrópole: a alternativa da paisagem 76
in which the majority of humanity will soon live. It is, in any case, in-
else, as ecologists tend to do, and then decide that the built envi-
ronment and the urban structures that go with it are somehow out-
Paralelamente, esta mesma ignorância dos valores ambientais -mas também históri-
cos- próprios de cada lugar, aliada à desmedida confiança na capacidade tecnológica
têm levado a um consumo excessivo dos recursos naturais. Os efeitos da expansão
depredadora que acompanharam o capitalismo levaram a revisões críticas neste final
do século com consequências para a cidade, como veremos mais adiante.
the erosion of the earth and the hydrologic cycle. The city is part of
A visão sistêmica rompe com antigas percepções dicotômicas que pensam a cidade
separada da natureza, apontando para um sistema integrado que envolve processos, 11_A cidade é um jardim de granito,
é dinâmico e está em constante mutação. Neste contexto, outras disciplinas, como a composto de muitos jardins meno-
res, num mundo jardim. A natureza
ecologia e a ecologia da paisagem se vinculam ao urbanismo. na cidade é a conseqüência de
The lesson of ecology and landscape for urbanism is that we might uma interação complexa entre as
finalidades e as atividades múlti-
no longer simply see nature as something outside and remote plas de seres humanos e de outras
–fullness in the city, emptiness outside in nature- but now more as criaturas vivas e dos processos
naturais que governam a transfe-
an integrative system that is essentially soft and pliant adapting rência de energia, o movimento
in time. A soft system –whether wetland, city or economy- has the do ar, a erosão da terra e o ciclo
hidrológico. A cidade é parte da
natureza. (Tradução do autor)
Projeto urbano na metrópole: a alternativa da paisagem 78
A questão ambiental
São várias as mudanças e os fatores que ajudam a vislumbrar a possível aproxima-
ção do paisagismo ao urbanismo. A urgência da questão ambiental é um deles.
Sem dúvida, desde o final do século XX temos evidenciado uma crescente consciên-
cia mundial sobre os efeitos da atividade humana sobre o planeta. A partir dos anos
70, encontros e seminários internacionais vêm alertando sobre o rápido consumo
dos recursos naturais e as graves consequências futuras, considerando o modelo de
desenvolvimento vigente. Uma nova ordem de preocupações ambientais: esquenta-
mento global, desflorestamento, extinção de espécies, resíduos tóxicos, etc. têm cha-
mado a atenção não só dos cientistas como do público em geral. Mudanças drásticas
e uma revisão dos estilos de vida tornam-se imperativos para um desenvolvimento
menos destrutivo e a garantia da sobrevivência das gerações futuras.
netas terra) são precisos para atender a humanidade se todos vivem um determinado
estilo de vida. Segundo a Global Footprint Network, desde meados dos anos 80, a
humanidade está em ecological overshoot com uma demanda anual em recursos
que excede o que a Terra pode regenerar cada ano. Leva hoje um ano e quatro me-
ses para reconstituir o que usamos em um ano15.
Claro que este consumo não é homogêneo. Este e outros estudos, como as análises
sobre as causas do aquecimento global, vêm invertendo a geografia mundial que até
pouco tempo classificava os países segundo o seu grau de desenvolvimento. Re-
centemente, a ordem de países mais ricos entrou na lista de países ecologicamente
devedores, já que eles dependem do crédito ambiental dos países mais pobres para
equilibrar a sua demanda de consumo.
A mesma análise pode ser trasladada à escala local urbana ou metropolitana para se
entender o alcance do custo ambiental de uma cidade no seu entorno imediato. Se-
gundo Hough (1994), a sustentabilidade no contexto urbano implica que os produtos
e os sistemas de energia da vida urbana devem ser transferidos ao meio ambiente
como benefícios mais que como perdas custosas. Os trabalhos feitos pelo homem
deveriam ser desenhados para produzir ganhos líquidos em qualidade ambiental e
em qualidade de vida em geral. Circunscrever a sustentabilidade a questões quan-
titativas e de metabolismo energético tem sido fortemente criticado. A redução da
durabilidade da cidade à sua dimensão estritamente material tende a descaracterizar
a dimensão política do espaço urbano, desconsiderando a complexidade da trama
social responsável tanto pela reprodução como pela inovação na temporalidade his-
tórica das cidades (Acselrad, 2001).
Urbanismo e ecologia
Os esforços para vincular a ecologia –parte da biologia que estuda a composição
e o funcionamento dos ecossistemas- com o urbanismo não são novos: desde os
anos 60 um grande número de pesquisas acadêmicas e trabalhos aplicados têm se
dedicado a esta junção.
O trabalho de McHarg tem sido criticado, porém, por um certo determinismo ecológi-
co e uma inegável nostalgia de uma paisagem pré-industrial. Seguidores de McHar-
gh, os também paisagistas Ann Spirn e Michael Hough têm continuado seu legado e
introduzido novas colaborações. Especialmente Hough, na última edição de seu livro
Cities and natural process (1995) incorpora uma dimensão social que os trabalhos
anteriores desconsideravam. Chama a atenção para a cidade, sustentando que é
na cidade que se encontram as raízes dos problemas urbanos e regionais e onde
devem ser buscadas as soluções. A proposta é trabalhar não com a ideia de ambien-
tes utópicos onde uma relação ideal com a natureza seja restaurada, mas com os
ambientes existentes, nos quais jazem as oportunidades e onde os esforços devem
se concentrar.
Projeto urbano na metrópole: a alternativa da paisagem 81
Fragmentos ou patches são entendidos como peças do mosaico que têm carac-
terísticas homogêneas e apresentam certo grau de isolamento. Podem variar em
tamanho, localização e quantidade. Quatro origens são reconhecidas: remanescente
(áreas que remanesceram de áreas mais extensas, como florestas num campo de
agricultura), introdução (um novo desenvolvimento de moradia numa área de agricul-
tura ou uma pequena pastagem numa floresta), distúrbio (uma área queimada numa
floresta ou um ponto devastado por uma tormenta) e recursos ambientais (alagados
numa cidade ou oásis no deserto).
No manual desenvolvido por Forman, junto com Dramstd e Olson, uma série sim-
ples de diagramas e textos explicam os princípios da ecologia urbana e como eles
podem ser aplicados em diferentes escalas; seja a macroescala ou escala regional,
a mesoescala ou escala paisagística e a microescala ou escala local-urbanística. A
multiescalaridade do enfoque paisagístico é o que revela a sua pertinência.
Cada escala, porém, permite observar coisas diferentes e tem associado um tipo de
fenômeno que se torna incompreensível quando contemplado demasiado de perto
ou demasiado de longe (Folch, 2003). Poder percorrer várias escalas permite relacio-
nar uma intervenção pontual com seu contexto regional e vice-versa, corroborando
assim a legitimidade das ações e decisões. Essa vocação da paisagem, a habilidade
de mudar de escala, de localizar tecidos urbanos na sua escala regional e contexto
biótico, e de desenhar relações entre processos ambientais dinâmicos e forma urba-
na (Corner, 2006) são as suas qualidades mais relevantes.
Com base nas discussões teóricas até aqui apresentadas, a intenção é elaborar um
quadro propositivo. As categorias operacionais delineadas podem ser vistas como
ferramentas, mas também como o vocabulário com o qual decifrar a complexida-
de do território urbanizado. A intenção é descobrir possibilidades de projeto e como
explorá-las, como e o que olhar. Elas não se pretendem exaustivas, mas pavimentar
um caminho, um set básico de princípios sobre os quais trabalhar. Camadas, Vazios,
Fronteiras e Processos são as quatro instâncias propostas para uma abordagem
paisagística da cidade contemporânea. Para cada uma delas, alguns projetos são
examinados para a melhor compreensão da operacionalidade de cada conceito.
soin) le vieux texte que les hommes ont inscrit sur l’irremplacable
matériau des sols, afin d’en déposer un nouveau, qui réponde aux
2001:228)17.
O chamado método ecológico, iniciado por McHarg nos anos 60 -ponta de lança
para que o paisagismo e a ecologia integrassem o planejamento- foi pioneiro no uso
das camadas como ferramenta de análise dos componentes “naturais” do território.
Seguindo um método preciso a decomposição possibilitava: primeiro, compreender
a natureza como um processo interativo e dinâmico, em seguida, interpretá-lo como
um sistema de valores relativo e, por último, indicar os usos mais adequados ao solo.
O trabalho de McHarg se mantém no campo do planejamento estático do zoneamen-
to, fornece as informações e os critérios que facilitam a tomada de decisões sobre
o inventário de possibilidades do “armazém” que é a natureza. Mas a forma como
essa informação pode ser interpretada projetualmente fica indefinida e pendente das
demandas, oportunidades e sobretudo das intenções.
se desdobra em um conjunto de propostas para planos e projetos específicos que FIII-6: Fragmento do Plano de
Roma de Nolli, 1748. Uma das
se agrupam em duas categorias: os projetos de requalificação de espaços urbanos mais antigas descrições da cidade
e os projetos paisagísticos do sistema viário. No contexto brasileiro, a experiência de através de seus espaços públicos.
Fonte: http://nolli.uoregon.edu/
São Luiz do Maranhão se diferencia dos planos diretores que –como assinala Ruth FIII-7: Central Park, o vazio que
Verde Zein na introdução do livro sobre a obra de Kliass- tipificados em tabelas de modela a cidade. Fonte: flirck
FIII-8: Frederick Olmsted. Plano do
zoneamento apenas corroboram o status quo de um desenvolvimento disruptivo. sistema de parques The Emerald
Necklace, Boston.Fonte: www.
emeralknecklace.org
A decomposição em camadas permite, no caso do planejamento, valorizar um set
complexo de variáveis e favorece a tomada de decisões: onde ocupar, onde não
ocupar. Mas essa utilização é mais passiva, já que a relação com o projeto fica in-
definida. O que nos interessa aqui resgatar é o momento em que a exploração se
Projeto urbano na metrópole: a alternativa da paisagem 89
No caso do estudo para a região do Vêneto, dos italianos Secchi-Vigano, por exem-
plo, a desconstrução das camadas forneceu os argumentos para a formulação de
uma hipótese sobre a condição dispersa do território. Segundo os autores, esta con-
dição foi o resultado da presença de configurações de infraestrutura específicas, em
particular de uma esponja difusa e isotrópica de vias e canais. Num longo processo
histórico, diferentes “racionalizações” foram dando forma ao território: o centuriatio
romano (antiga divisão da terra), as diversificações e retificações de canais escava-
dos na lagoa, os povoados de pescadores, os aterros, a construção de vias, rodo-
vias, metrôs, etc. foram sendo superpostos uns sobre os outros, cada um criando
a sua própria paisagem. Sob esse aspecto, os arquitetos se questionam se essa
condição de isotropia é contemporânea e quais projetos poderiam interpretar hoje
essa tradição.
Por um lado, os espaços não construídos, ou seja, os espaços livres, os quais perten-
cem à tradicional interpretação da cidade na dependência entre cheio e vazio, figura
e fundo. Aos clássicos espaços livres como vias, parques e praças somam-se, na
escala metropolitana, as áreas da natureza, costas e bordas de rios e outras áreas
protegidas por seus valores ambientais. Mas também os fragmentos rurais e outros
terrenos que, por legislação ou por dinâmicas econômicas permanecem sem edifi-
cação. Cada vez em menos quantidade e menores em tamanho, os espaços livres
são distribuídos irregularmente no território urbanizado e sofrem constantemente a
ameaça de ocupação.
Mas existe ainda uma categoria mais recente de espaços livres que se define não
por oposição ao espaço ocupado (construído), mas pela sua condição de uso. Os
“vazios por esvaziamento” (Borde, 2007), terrenos ou prédios sem uso, desocupados
ou subutilizados, são produtos das dinâmicas mais modernas de transformação eco-
nômica e desindustrialização. Eles instauram um tipo singular de espaços livres, que
tem despertado nos últimos anos uma especial reflexão teórica e projetual.
Uma linha recente de projetos procura dar legibilidade ao território através da articu-
lação dos espaços livres. A estratégia se baseia em conformar um sistema estrutura-
dor em grande escala, que possa agregar um novo valor aos espaços livres. Tardim
(2008), quem na sua pesquisa tem testado uma tal abordagem para o Rio de Janeiro,
reconhece nos espaços livres o componente funcional e espacialmente mais flexível.
São os lugares mais frágeis e os mais promissores tendo em conta a possibilidade
de reestruturação do território, já que podem assumir algumas funções importantes,
por exemplo, como lugar dos ecossistemas, da percepção da paisagem e como lugar
possível para o futuro da ocupação urbana (Tardim, 2008).
Assim, o projeto para a nova cidade se ocupa em definir a locação e a qualidade dos
lugares que devem permanecer livres, deixando um arquipélago de ilhas –o resíduo-
que poderia ser desenvolvido independentemente, segundo a demanda de lugar e o
programa no tempo. A única garantia da qualidade do espaço urbano –beleza, aces-
sibilidade, serenidade e identidade- está no seu sistema de espaços não-construídos
sem importar, ou a despeito de suas arquiteturas (Koolhaas, 1995).
Numa acepção inversa, em vez de projetar sobre a paisagem Koolhaas e sua equipe
escolhem deliberadamente deduzir o projeto dela. O projeto, nessa perspectiva, res-
gata alguns dos elementos existentes, florestas, povoados, autopistas e a linha de
tgv e sobre este inventário de preexistências, bandas de espaços livres são desenha-
das para obter o máximo de situações diversas e complexas. O resultado formal, um
hieróglifo chinês, é a síntese da estrutura que dá suporte e sentido à nova cidade.
Outro exemplo que não podemos deixar de mencionar, por ser uns dos primeiros a
abordar a reutilização de areas em desuso numa escala regional, é a experiência de
Iba Emscher Park, no vale do Ruhr, na Alemanha. Desenvolvido como exposição in-
ternacional e comprometendo 17 municipalidades, o projeto significou a regeneração
econômica e ecológica de uma área de 800 km², atingindo 3 milhões de pessoas.
Em uma área seriamente afetada pelo declínio da indústria metalúrgica e mineira, o
projeto se estruturou sob o lema Câmbio sem Crescimento (Change without Growth)
e baseou-se em quatro fundamentos: reutilizar os terrenos para prevenir a explora-
ção adicional de “greenfields” ou terras ainda sem ocupação; estender a vida dos
prédios existentes através de estratégias de modernização e reuso; incorporar práti-
cas ecológicas de construção para novos prédios e reuso adaptativo, e transformar a
estrutura produtiva da região com métodos mais responsáveis ambientalmente.
grandes estruturas, depósitos, gruas e prédios para atender novos usos. A retomada
casual da natureza foi valorizada junto com outros processos que encetaram, guia-
ram e monitoraram a descontaminação e a reabilitação da paisagem degradada.
FIII-15: Field Operations. Projeto ganhador para Fresh Kills. O projeto concebido como matriz para processos. A estrutura da paisagem provê o suporte
para que sementes, biota, pessoas e atividades possam colonizar o lugar no tempo. Fonte: www.nyc.gov
Projeto urbano na metrópole: a alternativa da paisagem 101
Outro caso sugestivo é o projeto do paisagista Michel Desvigne para a cidade nova
de Cergy-Pontoise, criada nos anos 70 como cidade satélite de Paris. O projeto pro-
curou dar inteligibilidade a uma cidade de baixa densidade, inacabada, mas com
expectativa de crescimento. A resposta do projeto foi diferente de um plano e buscou
inserir algumas estruturas paisagísticas que pudessem dar qualidade e favorecer
oportunidades de desenvolvimento urbano. O foco foi nas áreas de fronteiras: três
estudos de caso fundamentam a abordagem geral. Um primeiro sobre o oeste, frente
a uma depressão natural do terreno, onde o projeto foi pensado como um marco,
uma paisagem que estabelece a condição para o futuro. A proposta vincula poma-
res e fileiras arborizadas –em terrenos com controle institucional- com um tecido de
caminhos, promenades e campos que qualificam, e mais importante, preparam para
a expansão. Uma segunda estrutura foi pensada para a interface da cidade com o
espaço da autoestrada. Neste caso, um sistema de claros e florestas é concebido
para organizar o espaço comercial que comumente floresce sem nenhuma qualida-
de. Por último, junto ao rio Olsen, a paisagem proposta recria a relação da cidade
com o espaço aquático através da reconfiguração da água, uma espécie de laguna
paralela ao rio que permite novas acessibilidades e usos.
Desvigne concebe estas paisagens nas bordas não como limites formais rígidos,
mas como uma precondição para a formação da cidade. Os materiais, muitos deles
derivados da agricultura, são leves e permitem pensar o projeto em sua condição
temporal. Isto abre a discussão para a última categoria proposta: processos.
bur rather seeks to construct a dialectical understanding of how it FIII-16: Michel Desvigne. Naturezas
intermédias. Projetos que permitem
relates to the processes that flow trough, manifest and sustain it.
a ocupação flexível em situações
(Corner, 2006:28)21. de incerteza sobre a ocupação
urbana. Bordeaux, margem direita.
O parque é criado à medida que os
Os exemplos de projetos que propõem a reabilitação de sítios contaminados se terrenos são liberados.
prestado da ecologia, de fios, tapetes e ilhas, Corner e Allen constroem a estrutura Lyon, proposta para a confluência
dos rios Rohane e Soane, rejeita
da paisagem que provê o suporte para que sementes, biota, pessoas e atividades
a ideia de um projeto totalizador
possam colonizar o lugar no tempo. O entrelaçado entre as sementes que são planta- e propõe um processo gradual de
construção da cidade. Fonte: Des-
das, a forma e o tempo em que processos ecológicos são gerados, as infraestruturas
vigne (2009).
inseridas e as atividades instigadas compõem um sistema integrado que se pretende
flexível e adaptável.
FIII-17: François Xavier Mousquet. Projeto Lagunage de Harnes. Paisagens que incorporam serviços ambientais, a criação de novas ecologias e novos
tipos de espaço público. Fonte: Arq. Mousquet
Projeto urbano na metrópole: a alternativa da paisagem 105
Por fim, outra dimensão desta categoria operacional refere-se à gestão dos ecos-
sistemas urbanos e como eles se manifestam na paisagem. A cidade é um conjun-
to dinâmico de processos sociais, econômicos, políticos e ecológicos em constante
mutação. Muitos dos processos que fazem parte da vida cotidiana são desconheci-
dos ou ignorados. Uma nova consciência de como são trasladados ao ambiente os
processos de intercâmbio de fluxos e energia da vida urbana traz também algumas
reflexões projetuais.
04.Sobre os mapas
Um grande potencial para a compreensão do fenômeno urbano contemporâneo existe latente nas
operações de descrição do território. Este capítulo procura investigar de que forma descrição, re-
presentação e projeção estão dialeticamente relacionadas, e portanto, como, através da construção
e deconstrução de novas cartografias poderemos entender, descobrir, desemaranhar as lógicas que
dão forma ao território. Intentaremos também demonstrar como essa descoberta, contida no processo
mesmo de mapeamento, pode revelar a chave de intervenção no território e englobar a possibilidade
de um outro projeto urbano.
Superadas as visões positivistas que dominaram as ciências até o século XX, quando
a teoria da relatividade, a mecânica quântica e a psicanálise, entre outros eventos,
puseram em questão a pura e simples objetividade, entendeu-se que a realidade não
existe como verdade inquestionável, mas sim em função da observação, porquanto
a aparência do objeto depende sempre dos instrumentos utilizados para descrevê-lo
(Corboz, 2001).
A história cultural tem colaborado para a compreensão das representações não como
meras reproduções de uma realidade “dada”, mas como construções culturais, filtra-
das e elaboradas segundo as visões do mundo “encarnadas” em atores sociais de
um determinado momento. No caso da representação da cidade foi percebido que
as descrições da experiência urbana não são fruto dos câmbios físicos que a cidade
experimenta, mas, como assinala Sola Morales (Sola Morales, 2002), a percepção é
um fenômeno cultural e, portanto, essa representação está ligada aos valores que
cada cultura estabelece como primordiais num determinado momento histórico.
Sobre os mapas 108
…decrier consiste à (re)construire l’object ex novo après l’avoir FIV-1: Plano de fundação da cidade
de S. Felipe de Santiago na ilha
décontruit au moyen de l’analyse descriptive elle-même. La des-
de Cuba. Arquivo Geral das Índias,
cription est le lieu de conversion entre le reel brut –là-bas, dans M e P. Sto Domingo, 119. OrdeM
e caos. A regularidade da grelha
la “nature”- et le projet, lequel reste longtemps un être purament
inserida no meio da floresta desco-
mental. (Corboz 2001 p.252)2. nhecida do novo mundo. Fonte: de
Teran (1997)
Corboz, quem tem contribuído para a compreensão da densidade do território, visto FIV-2: The Naked City. Illustra-
tion de l’hipotèse des plaques
por ele como um palimpsesto, uma superfície que é escrita e sobrescrita, raspada e tournantes de Guy Debord 1957.
apagada, borrada e reescrita, estrato sobre estrato, situa a descrição como ponto de Decomposição cartográfica e a
geografia alternativa da deriva.
passagem entre o mundo como leitura e o mundo como escritura. Ele verifica duas Fonte : Vitruvius
posições opostas de intervenção na cidade e no território em relação à descrição. A
posição que poderia ser exemplificada com os princípios modernos do CIAM, onde
a manipulação criadora do arquiteto unifica descrição de projeto e descrição do ter-
ritório. No outro extremo, o ecologismo radical que vê o território como mensagem
e onde o sujeito é quase que eliminado pela iniciativa do objeto. Segundo Corboz,
no primeiro caso o território é reformulado como escritura, o projeto substitui-se ao
milieu, chapeia-se sobre ele. No outro, a intervenção nasce do milieu mesmo, o ter-
ritório se reformula como leitura.
Assim, os mesmos autores reconhecem que não pode existir descrição sem uma
ideia prévia do território, ideia esta que é informada pela cultura. A descrição é inten-
cional, procede de um propósito determinado, uma finalidade, ela é sempre função
de uma intenção implícita ou explícita.
Por isso a descrição é seletiva, já que separa, ressalta ou negligencia os caracteres
que ela determina. Como resultado da seleção, omissão, isolamento e codificação o
mapa permanece sempre como uma abstração.
Menos interessado no que os mapas significam e sim no que eles realmente fazem,
o arquiteto paisagista James Corner tem advogado pelo mapeamento como agente
ativo de intervenção cultural. Para ele, mapear nunca é uma ação neutra, passiva
ou sem consequência, pelo contrário, talvez seja o ato mais criativo e formativo de
qualquer processo de projeto, primeiro revelando e logo produzindo as condições
para a emergência de novas realidades. Corner lamenta a indiferença para com o
mapeamento, refutando a falsa ideia de que mapear consiste numa atividade ana-
lítica e não-imaginativa quando comparada com a suposta criatividade da atividade
de projeto, que ocorre depois que todos os mapas relevantes foram realizados. Pelo
contrário, para o autor, a importância da atividade de mapeamento deve ser enten-
dida na sua capacidade performativa2, já que a base sobre a qual os projetos são
imaginados e executados deriva precisamente de como os mapas são feitos. As con-
dições sobre as quais o projeto se desenvolve se originam com o que é selecionado 3_O termo “performativo” é aqui
e priorizado no mapa, com o que é subsequentemente deixado de lado ou ignorado, utilizado para reforçar o sentido de
dar-forma, fazer, atuar.
como os materiais são esquematizados, indexados e enquadrados, e como a síntese
do campo gráfico evoca conteúdos semânticos, simbólicos e instrumentais. 4_Mapear não é secundário nem
representacional, mas duplamente
Mapping is neither secondary nor representational but doubly ope- operativo: cavando, encontrando
rative: digging, finding and exposing on the one hand, and relating, e expondo de um lado, e relacio-
nando, conectando e estruturando
connecting and structuring on the other. Through visual disclosure, do outro. Através da exposição
mapping both sets up and puts into effect complex sets of rela- visual, mapear constrói e efetiva
séries complexas de relações que
tionships that remain to be more fully actualized. Thus mapping is aguardam para serem atualizadas
not subsequent to but prior to landscape and urban formations. In plenamente. Assim, mapear não é
subseqüente, mas prévio às paisa-
this sense, mapping is returned to its origins as a process of explo- gens e formações urbanas. Neste
ration, discovery and enablement. This is less a case of mapping sentido, mapear retorna as suas
origens como processo de explo-
to assert authority, stability and control, and more one of searching, ração, descobrimento e liberdade.
disclosing and engendering new sets of possibility. Like a nomadic Este é menos um caso de mape-
amento para afirmar autoridade,
grazer, the exploratory mapper detours around the obvious so as to estabilidade e controle, e mais de
engage what remains hidden. (Corner 1999, p.225)4. buscar, revelar e engendrar novas
possibilidades. Como um pastor
nômade, o mapeador explorador
rodeia o óbvio para se envolver
No final do século XX, vários arquitetos começaram a explorar essa capacidade cria- com o que permanece escondido.
tiva do mapeamento para a exploração das condições emergentes da cidade e do (Tradução do autor)
Sobre os mapas 111
Para ele, as cidades americanas sofreram nas últimas décadas do século XX trans-
formações drásticas que deslocaram a ênfase da dimensão espacial, onde os dis-
positivos de ordem se empobreceram substancialmente, para a dimensão temporal,
onde novas e complexas estruturas ordenadoras foram introduzidas. O que o autor
chama de mutação x-urbana, que começa a acontecer nas cidades americanas nos
anos 70 e logo se alastra no resto do mundo, dificulta a articulação entre arquitetura
e cidade. A ausência de forma no plano (form-less) parece dominar, as preocupações
da arquitetura acabam no nível do edifício e as forças urbanas resistem a qualquer
intento de ver a forma arquitetônica imposta.
Nesse contexto, os desenhos urbanos foram produzidos como crítica ao papel tra-
dicional dos desenhos de representação da cidade como uma realidade urbana.
Segundo Gandelsonas, eles foram propostos como articulação entre duas práticas
diferentes, entre duas superfícies discursivas diferentes –arquitetura e cidade.
Nos seus desenhos, Gandelsonas procura uma abstração gráfica que possa tornar FIV-5: Los Angeles, Mario Gan-
delsonas: As diferentes grelhas
tangível essas tensões entre permanências e contingências. Por um lado, os mapas urbanas e o bulevar Wilshire como
trazem visibilidade às estruturas organizadoras da cidade e às lógicas internas de re- um quebra-cabeças sobre o plano
“real” da cidade. Fonte: Gandelso-
lação. O tema da grelha americana como dispositivo organizador em grande escala é nas (1999)
reiteradamente introduzido e investigado tanto quanto os elementos do plano que se
FIV-6: Los Angeles, Mario Gandel-
desviam da malha neutra. A coexistência de múltiplas configurações, grelhadas e não sonas: Descrição tipológica das
grelhadas, se torna evidente num processo de desestratificação do plano e do tecido. diferentes paisagens urbanas ao
longo do bulevar. Fonte: Gandelso-
Por outro lado, se em um nível ocorre uma análise diferenciada do plano, num outro nas (1999)
nível a atenção volta-se para os “sintomas”, anomalias, distúrbios que interrompem a
ordem do “campo”, permitindo outras leituras.
Um processo de apagamento delimita o plano para criar camadas que podem super-
por-se em formas diferentes para produzir sequências de desenhos. Os desenhos
são escritos como diálogos entre dois discursos, o plano ready-made que atua como
fundo contra o qual a escritura arquitetônica é inscrita. A atenção flutua entre descri-
ção (depiction) e reescritura (ou escritura subordinada à leitura, ou leitura à escritura)
esfumando as diferenças. É um processo no qual arquitetura e cidade ocupam e
trocam posições de analista e analisando (aquele que é analisado), uma alteração
onde cada prática atravessa a outra superfície discursiva; a arquitetura atravessa o
discurso urbano e a cidade atravessa o discurso arquitetônico.
uma milha de fundo. Numa escala, grelha, montanhas e oceano tornam o plano com- FIV-7: Boston, Mario Gandelsonas.
Num processo de decapagem
preensível. Numa outra, a malha territorial funciona como cola entre as diferentes (delayaring), o plano das ruas reais
cidades. Os desenhos explicitam os diferentes modos de relação entre as grelhas da é abandonado e só os elementos
estruturais são descritos. Fonte:
cidade e os bulevares. Estes últimos são identificados como contentores de fluxos Gandelsonas (1999)
de energia, conectores entre os vários elementos. Inúmeros estudos morfológicos do
bulevar retratam as diversas paisagens resultantes do encontro do bulevar com os
bairros que ele atravessa.
Gandelsonas se preocupa em diferenciar a capacidade transformadora de seus de- FIV- 8 e 9: Boston, Mario Gandel-
sonas. Uma outra decomposição
senhos urbanos da atividade de mapear, descrita por Michel de Certeau como uma do aparentemente caótico tecido
das políticas da prática da cidade: o mapa do geógrafo versus o mapa dos trajetos urbano expõe as ruas radiais
versus as ruas circunferenciais.
das pessoas ordinárias. Para o autor, os desenhos urbanos são concebidos como A estrutura radio-concêntrica é a
parte de uma prática capaz de transformar a cidade e não tomando a cidade como força que organiza os elementos
urbanos de Boston. Fonte: Gandel-
lugar para o desenvolvimento de táticas da vida cotidiana. sonas (1999)
As medidas da paisagem
James Corner, o arquiteto-paisagista americano que tanto tem defendido a capa-
cidade transformadora dos mapas, também tem levado a sua própria investigação
cartográfica. No seu livro “Taking Measures across the American Landscape”, Corner
junto com o fotógrafo Alex MacLean propõem uma pesquisa descritiva da paisagem
americana. O objetivo do trabalho é encontrar as imagens que melhor exemplifiquem
as várias paisagens agrícolas e tecnológicas da América e compreender como esses
ambientes têm sido construídos. O exercício serve de gatilho para uma reflexão so-
bre a medida, particularmente, sobre como as medidas usadas para olhar o mundo
afetam as ações tomadas e como tipos particulares de realidades são então constru-
ídas. Corner decompõe o ato de medir num jogo tripartido de significados: medidas
como quantum, medidas como instrumento e medidas como juízo de valor. A inter-
relação entre dimensões numéricas, instrumentais e éticas das medidas tomadas
Sobre os mapas 116
Afiliado aos princípios da ecologia, não é casual que Corner se incline pelas repre-
sentações sinópticas da paisagem de MacLean, visto que é nas fotografias aéreas
onde a dependência orgânica entre os seres humanos e o mundo natural é claramen-
te confirmada. Segundo Corner, a ecologia inter-relacional -conectando vastas regi-
ões fisiográficas- é mais bem compreendida e manipulada desde cima. Finalmente,
é isso o que interessa ao autor, instigar relações mais harmoniosas entre pessoas e
território:
One of our intentions in this book is to show how actions taken
upon the land can either precipitate or preclude the possibility for
Segundo o autor, as inscrições, adições e apagamentos que foram subsequentemen- FIV-11 e 12: James Corner, Long
lots along the Mississippi River.
te feitos nos mapas constituem um intento para reconhecer a primazia da medida ra- Os rios se transformaram nas
cional e sinóptica no forjamento da paisagem americana, ao mesmo tempo revelando principais linhas de organização
dos assentamentos. Democrático
as dimensões ficcionais e metafóricas da construção da paisagem. e equitativo, cada habitante recebe
uma porção igual de frente de rio
com solo baixo aluvial, e terra alta
Assim, os mapas-anotações-desenhos destinam-se a complementar as fotografias onde se recolher durante as inun-
ao mesmo tempo em que se distanciam delas. Os desenhos aventuram abstrações, dações. Fonte: Corner e MacLean
(1996)
visibilizam organizações estratégicas de elementos sobre o solo ou revelam algu-
ma escala e estruturas inter-relacionais. Consequentemente, os desenhos elucidam
como métodos tipicamente prosaicos e analíticos do planejamento sinóptico e siste-
matização da terra escondem um potencial mais criativo e poético.
On the surface, America is a carefully measured landscape of sur-
7_Na superfície, América é uma
vey lines, rectangular fields, irrigated circles, highways, railroads, paisagem cuidadosamente medida
de linhas, campos retangulares,
dams, levees, canals, revetments, pipelines, power plants, ports,
círculos irrigados, rodovias, fer-
military zones and other such constructions. All are efficiently laid rovias, represas, diques, canais,
oleodutos, portos, zonas militares,
out with ingenious indifference to the land, crossing desert, forest,
e outras construções como tal.
plain, marshes and mountain with a cool, detached and rational Todas estão eficientemente arran-
jadas com engenhosa indiferença
logic. These highly planned constructions are literally measures
à terra, atravessando desertos,
that have been taken across the American Landscape in order to florestas, planícies, pântanos e
montanhas com uma lógica fria,
ensure a productive human occupation of the earth and its resour-
distanciada e racional. Estas cons-
ces (Corner 1996, p. 25)7. truções altamente planejadas são
literalmente medidas que têm sido
tomadas através da paisagem no
sentido de assegurar a ocupação
Mas Corner também contrapõe às medidas tomadas pelo homem a resistência que
humana produtiva da terra e de
exercem as próprias medidas da terra. Essa tensão –entre medida humana e força seus recursos. (Tradução do autor)
Sobre os mapas 118
A sua tese defende que o desperdício é um componente natural de toda cidade que
evolui dinamicamente. Dross (escória, desperdício, resíduo) é, como tal, indicador de
crescimento urbano saudável.
Berger sustenta que sprawl é um termo obsoleto e que se estender em retóricas
polarizadas sobre sprawl –das críticas negativas à defesa- não soa produtivo para o
avanço do conhecimento sobre o urbano. O termo urban-sprawl e as retóricas pró e
contra sprawl se tornam obsoletas ante a afirmação de que não existe crescimento
sem resíduos e que crescimento urbano e desperdício andam juntos.
O trabalho faz uma análise quantitativa e visual de dez regiões urbanizadas, espa-
lhadas em diversas locações dos EEUU. Berger assinala que medir as dinâmicas de
urbanização para poder ver os efeitos na paisagem é um tema representacional.
Os mapas e imagens que compõem a pesquisa revelam as relações entre paisagem
residual e urbanização. As categorias que conformam o universo de paisagens de
Berger incluem desde extensas áreas de moradia suburbana, a edifícios transitórios
de armazenamento, espaços entre infraestruturas, lixões e aterros, grandes exten-
sões de logística e comércio, áreas contaminadas e abandonadas decorrentes dos
processos de desindustrialização, entre outras.
Essas paisagens residuais em cada uma das áreas são compostas através de re-
presentações gráficas que combinam dados geoespaciais, resultados empíricos do
censo e imaginário espacial. Em conjunto, estas representações e as combinações
de informação que elas apontam geram oportunidades para reconceptualizar paisa-
gens residuais no mundo urbano.
Para cada região Berger elabora três tipos de gráficos: o primeiro representa um
mapeamento que pretende entender a geografia das paisagens de desperdício, lo-
calizando as paisagens residuais previamente definidas; o segundo é um gráfico de
dispersão que mostra para cada quadrante da cidade os picos e depressões de den-
sidade populacional, evidenciando os espaços in-between e de fronteira; e o último
quadro axial mostra as mudanças –crescimento e decadência- das indústrias nos
últimos anos.
te, fotografias são inseridas nos gráficos para prover evidência específica do lugar,
das condições do solo reveladas no mapa e nos quadros e complementam a visão
macro com aquela da escala do indivíduo.
Sem entrar em discussões sobre projeto, Berger consegue com seus mapas inserir
uma agenda nova para o urbanismo. O trabalho é um manifesto pela emergência de
um novo paradigma que convoca desenhistas e profissionais que lidam com a orde-
nação do espaço a repensar o desenho urbano, a considerar o trabalho nas margens
mais do que no centro, atendendo ao que a paisagem significa para o urbanismo e
os processos de urbanização.
O termo Drosscape é criado para descrever uma pedagogia de desenho que enfatiza
a integração produtiva e o reuso de paisagens residuais através do mundo urbano e
transforma desperdício (real ou percebido) em paisagens mais produtivas.
como laboratório que combina prática e pesquisa, teoria e projeto, buscando respos-
tas à crescente complexidade das cidades.
O autor define a cidade como uma pele elástica e cambiante, uma forma de vida que
tem emoções. Essas emoções são denominadas condições protourbanas, que são
as condições que agitam a pele. Para reconhecer essas condições e suas manifes-
tações são necessários novos olhos, novas miradas.
Immersion in the city with new eyes means walking through it,
Para Bunschoten projetar a cidade é como brincar. Envolve escolhas aleatórias, des-
cobertas, achados. No jogo novas possibilidades podem ser exploradas. Descrição e
projeção se misturam de tal forma que não é possível diferenciar uma da outra. Buns-
choten entra na cidade à procura das condições protourbanas que são identificadas e
isoladas numa série de quadros, dispositivos de observação e de operações. Esses
quadros são ao mesmo tempo um modelo dinâmico e uma mostra em pequena es-
cala de fenômenos mais complexos que acontecem na cidade.
Uma boa ilustração da metodologia utilizada por Bunschoten nós podemos encontrar
no projeto para a cidade de Linz, na Áustria. O foco do estudo está nas mudanças
na periferia da cidade decorrentes, dentre outras causas, do declínio da indústria do
aço, do êxodo em direção aos subúrbios de grande parte da população trabalhadora,
da queda da “cortina de ferro” e do crescente afluxo de estrangeiros à cidade.
O primeiro quadro (the echo chamber) se localiza no vale norte da cidade, um es-
paço liminar em grande escala onde instituições culturais e eventos são utilizados
para reorganizar áreas da cidade carentes de câmbio e criar temporariamente uma
realidade alternativa. A proposta inclui a institucionalização do lugar e sua ligação a
uma linha de instituições culturais, desde o castelo existente até o proposto parque
do outro lado do porto, e envolve vários atores que animam ou ativam possíveis
constelações de eventos efêmeros.
O segundo quadro (the loom) é outra área industrial adjacente à cidade, flanquea-
da pelo rio Danúbio e por infraestruturas que a separam da cidade: uma paisagem
industrial altamente estruturada na qual os principais atores estão ou mudando ou
saindo. A proposta inclui o nomeado de zonas que potencialmente formam uma pon-
te entre a cidade e o rio, e o nomeado de utilidades públicas existentes, situadas
na borda original da cidade. A revelação (unfolding) prevê uma tessitura entre os
Sobre os mapas 125
O último quadro (the free house). Uma periferia cultural e social de “estrangeiros” que
não tem participação social e política, mas são ativos como economia branda. Este
quadro é o menos “formal” em aparência e pretende mapear fluxos sociais e migrató-
rios que fazem parte de uma estrutura branda que tem um papel na dinâmica urbana,
mas que ainda resiste à institucionalização. A revelação (unfolding), neste caso, inclui
o estabelecimento de uma política cultural de integração e incorpora intervenções
físicas que se justapõem aos quadros anteriores.
Deccan Traverses
Fora das especulações sobre as cidades e territórios do mundo chamado “desen-
volvido”, o trabalho do casal Anuradha Mathur e Dilip da Cunha explora técnicas de
mapeamento para compreender a formação e a valoração da paisagem no território
indiano de Bangalore. Deccan Traverses é uma exploração do território que uma vez
foi identificado como “país nu” pelos colonizadores e que, depois de várias transfor-
mações, ainda hoje é conhecido como a Cidade-Jardim da Índia.
Não só as flores têm sido cultivadas, mas também uma visão e uma forma de apre-
ender o território que tem uma história. Esta paisagem, que não é apenas superficial
mas que provê um vocabulário da terra é o tema de pesquisa. Entre arqueólogos,
topógrafos e cartógrafos Mathur e da Cunha realizam, com olhar renovado, um outro
descobrimento do território, uma versão contemporânea do gazetteer3. Essa empre-
sa descritiva procura entender como a paisagem foi sendo construída nos últimos
dois séculos a partir de materiais, ideias, imagens, habilidades e uma mirada que,
segundo os autores, são hoje desconsideradas na administração, educação e plane-
jamento da cidade.
Deccan Traverses recounts our engagement with this less evident
3_Um gazetteer é um dicionário
Bangalore, a place of potential rather than identity. It demands a ou um diretório geográfico, uma
referência importante para a in-
shift in perception from seeing a place constrained by a timeline
formação sobre lugares, incluindo
and held by the spatial limits of a municipality or metropolis, to história, geografia, flora, fauna,
etnografia, etc. Uma forma de
seeing a gathering of materials and events each exerting its own
descrição para administrar e go-
presence, trajectory and ambition for a “naked country”. It is not vernar utilizada como ferramenta
pelos colonizadores da Índia no
surprising tha there is little written about his Bangalore. Our educa-
século XIX.
Sobre os mapas 127
Esta ênfase nos processos antes que na forma –talvez menos evidente no trabalho
de Gandelsonas- demonstra uma forma renovada de entender a cidade e o território,
menos determinada formalmente e mais como expressão contingente de dinâmicos
processos naturais, sociais e políticos. A dimensão temporal e imaterial desses pro-
cessos talvez seja o maior desafio para o mapeamento da cidade contemporânea.
PARTE II
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 130
Com base nas discussões teóricas precedentes, apresentamos neste capítulo o caso específico de
estudo, a Baixada Fluminense. Concentramo-nos em compreender a materialidade e a espacialidade
próprias de uma porção da periferia metropolitana do Rio de Janeiro. O foco está na relação dialé-
tica entre a matriz biofísica (espaço “recebido”) e as transformações sofridas no tempo –o espaço
construído. Analisam-se as condições físicas (relevo, hidrografia, geologia, cobertura vegetal, etc.),
superpostas e inter-relacionadas às ações do homem. Um conjunto de mapas históricos foram utiliza-
dos como dispositivos que revelam uma forma específica de visão e representação do território e uma
ferramenta de pesquisa. Dois aspectos foram destacados, por um lado as infraestruturas que serviram
de ossatura ao território, e por outro a mudança dos usos que modificaram a paisagem no tempo.
Esse processo parece, a primeira vista, mais intenso nas redondezas de São Paulo, FV-1 e 2: A metropolização do es-
paço. Rio de Janeiro e São Paulo,
o que pode ser atribuído por um lado, à geografia, por outro à intensidade dos pro- sistema integrado de áreas metro-
cessos globalizantes da maior metrópole sul-americana em relação ao Rio de Ja- politanas. Fonte: Elaborado pelo
autor sobre base Google Maps
neiro que tem sofrido, nas últimas décadas, um esvaziamento político e econômico.
Enquanto no Estado de São Paulo a dispersão parece mais intensa e estilhaçada,
no Rio de Janeiro, podemos identificar uma organização mais linear segundo as
principais infraestruturas de mobilidade. O eixo de ligação com São Paulo, através da
rodovia Presidente Dutra e seguindo o vale do Paraíba, aparece como um contínuo
(sub)urbano, uma cidade linear de quase 400 quilômetros de extensão. Outros eixos
de expansão da metrópole carioca seguem, para o norte, em direção a Petrópolis, e
para o leste, em direção à região dos Lagos.
Flavio Villaça (1998) e Nestor Goulart Reis (2006) chamam a atenção para a necessi-
dade de estudar as áreas internas dos espaços da metropolização sob perspectivas
urbanas e não meramente de análise regional. Para Villaça, os espaços da metropo-
lização são também cidades e, como tal, devem ser objeto de análises intraurbanas.
Goulart Reis, desde sua perspectiva como arquiteto, valoriza uma abordagem de
base empírica, com análises que partem da lógica do projeto, dos espaços construí-
dos e dos modos de produção material:
As condições em que ocorrem as diferentes modalidades e for-
Politicamente, vários autores identificam a Baixada Fluminense como uma porção 2_Belford Roxo foi desmembrado
de Nova Iguaçu em 1990, do
do território da periferia metropolitana antigamente denominada Baixada da Guana- mesmo modo que Queimados. Em
bara. Um grupo de municípios, ao norte do Rio de Janeiro, que compartilham tanto 1991 foi Japeri e finalmente, em
1999, Mesquita.
características físicas como uma história de desenvolvimento similar; não obstante
a definição precisa de quais os municípios que o compõe se mantenha ambígua.
Segundo Simões (2007), existe um núcleo duro, sobre o qual não existem dúvidas
quanto à sua pertença, formado pelos municípios de Nova Iguaçu –incluindo os seus
desmembramentos mais recentes2- e Duque de Caxias. Outros autores incluem tam-
bém, para o leste, os municípios de Magé e Guapimirim e, para oeste, Seropédica,
Paracambi e Itaguaí.
1974
1984
1994
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 137
A forma recebida
Relevo
A Baixada –como o seu próprio nome indica- se caracteriza por ser um território
principalmente plano. Enquadrada, ao norte, pelo sopé da escarpa da serra do Mar,
ao sul, pelo maciço de Gericinó- Mendanha, a leste, pela baía de Guanabara e a
oeste, pela baía de Sepetiba. Esta configuração topográfica determina o seu caráter
de insularidade, de entre-deux, com abruptos contrastes entre a planície e os fundos
montanhosos. O plano, por sua vez, salpicado por colinas, configura uma superfície
de suaves ondulações que contornam as planícies fluviais.
Condições ambientais
A geologia histórica e o clima conformaram a forma básica da Baixada Fluminense, o
que nos permite também estudar e compreender a forma, a distribuição e as proprie-
dades dos solos e os ecossistemas associados a eles. Sem dúvida, a Baixada Flu-
minense é um território que foi –e continua sendo- modelado pela água. Seja por in-
vasão do mar ou por sedimentos arrastados pelos rios, a paisagem foi modelada por
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 139
processos de erosão e deposição, dinâmicas que continuam ainda hoje. Os rios que
descem com força das serras e se perdem lentamente em meandros nas planícies,
as enxurradas que arrastam sedimentos até encontrar os rios, os ritmos da maré que
nas suas oscilações diárias cria as condições para que os manguezais retenham os
sedimentos e sigam com o processo de modelação de uma nova costa, etc.
Junto às margens dos rios estão os terrenos aluviais, de formação mais recente.
Identificamos, segundo a composição do solo, dois tipos: os argilosos e os arenosos.
Os primeiros se expandem nos cursos baixos dos rios, perto do entorno da baía
de Guanabara, enquanto os arenosos predominam no interior, encaixados entre os
morros e serras do cristalino e as planícies.
Os típicos morros arredondados da Baixada são resíduos degradados de rochas cris-
talinas cobertos por solos vermelhos e siltosos, cujo substrato é predominantemente
gnáissico e migmatítico (CPRM, 2001). Este tipo de morro sofreu intensa extração
no processo de expansão urbana sobre o território da Baixada, provendo o barro e
o saibro para o aterro dos terrenos alagadiços (Leite Mansur, 2000). A extração de
saibro (como também de areia e outros minerais) continua sendo hoje uma atividade
importante, com consideráveis consequências nas condições ambientais e na paisa-
gem: uma descaracterização geral da topografia com o lento aplanamento dos mor-
ros, a perda de cobertura vegetal, ravinamentos e desmoronamentos nas encostas,
assoreamento dos sistemas pluviais, entre outras.
Junto à base e a meia encosta das montanhas e serras os solos são heterogêneos,
resultado do acúmulo de material detrítico, formando depósitos de tálus. Estão com-
postos por uma granulometria que envolve desde argila até blocos e matacões de
rocha, outorgando-lhes um caráter inconsolidado. Tal situação propicia o acúmulo e a
circulação intensa e desordenada de água, cujos fluxos variam ao longo do processo
de acomodação destes depósitos (Fundação Cide, 1995).
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 141
Condições ambientais
Também formado por acúmulo de material, o colúvio forma rampas junto à base
de morros, montanhas e serras. Constituído por material de espessura e extensão
variadas, com granulometria que envolve desde argila até cascalhos, eventualmente
contendo blocos de rocha.
Já nos morros isolados observamos dois tipos de formações, os morros gnaisses,
onde predominam gnaisses, migmatitos e xistos, e os morros de rochas graníticas e
alcalinas. Ambos apresentam solos arenosos pouco desenvolvidos e com alto grau
de erodibilidade. Nas montanhas e encostas de maior declividade, encontramos tam-
bém xistos, gnaisses e migmatitos e, localizadamente, granitos e rochas alcalinas
com afloramentos rochosos e solos pouco espessos (Fundação Cide, 1995).
Cobertura vegetal
Conhecer as condições naturais do solo permite-nos entender melhor a lógica das
atividades e usos que se instalaram no território. Porém, precisamos conhecer tam-
bém os valores econômicos, sociais e culturais que vêm transformando esse ter-
ritório no tempo. Os usos, maus-usos e desusos da terra poderão ser mais bem
compreendidos à luz da história da Baixada Fluminense.
O mapa atual da cobertura vegetal e uso do solo apresenta um mosaico heterogê-
neo.
Outra mancha que chama a atenção no mapa da cobertura vegetal da Baixada Flu-
minense é justamente a sua ausência: as áreas de encosta degradada. Original-
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 143
Cobertura Vegetal
Outra vegetação que vem sofrendo degradação é o mangue, uma típica formação
arbórea adaptada à salinidade das águas, localizada no entorno das baías de Gua-
nabara e de Sepetiba. Os manguezais crescem nos terrenos afetados pela ação da
maré formando um ecossistema de transição entre os estuários dos rios e o mar. Só
recentemente foi reconhecida a importância dos manguezais tanto para a fixação do
solo e a prevenção das erosões –como foi comentado anteriormente- quanto pela
sua diversidade ecológica, sendo o habitat natural de alimentação e reprodução de
peixes e aves.
As áreas de reflorestamento para uso comercial (eucaliptos, pino) são poucas, bem
como as áreas de cultivo agrícola. Depois do “último respiro agrícola” na região, com
o cultivo da laranja, o solo cansado e pouco fértil resultou mais lucrativo para o uso
urbano. As áreas de uso agrícola mais intensivo encontram-se hoje a leste do Estado
(Campos) e no vale do Paraíba. Podemos ainda encontrar alguns pequenos mosai-
cos no pé da serra do Mar no entorno de Japeri e Magé, e no oeste, em Santa Cruz
e Itaguaí, no pé da serra das Araras (Fundação Cide, 1995).
Hidrologia
O amplo sistema de rios que atravessam a Baixada Fluminense é inegavelmente
um dos elementos da paisagem que mais fortemente marcaram a construção de
sua identidade. É ao mesmo tempo o espaço no qual ocorreram as transformações
mais radicais e onde se concentram avultados investimentos públicos. Mais adiante,
veremos como a história da ocupação do território está ligada a forma como os rios
foram “remediados” e incorporados à paisagem.
O mapa hidrográfico da Baixada denota uma clara divisão de águas em duas bacias:
a leste, os rios que deságuam na baía de Guanabara, para oeste, os que deságuam
na baía de Sepetiba. As duas bacias principais coletam as águas que nascem nas
serras -ao norte e ao sul- e escoam buscando a saída para o mar. Entre as princi-
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 145
Hidrografia
No período de chuva, entre dezembro e março, as águas descem com força das ser-
ras, perdendo velocidade ao chegar à planície, inundando as várzeas e abrindo-se
em meandros entre os morros até alcançar a baía de Guanabara. O efeito da maré
faz com que as águas salinas entrem a contra fluxo pelos rios, criando as condições
para que se desenvolvam nessa fronteira flutuante os ecossistemas típicos desses
ambientes salobros: os manguezais. Como os rios carregam grande quantidade de
depósitos, os manguezais cumprem uma importante função ao reter parte do se-
dimento e, lentamente, ir recriando por deposição uma nova linha de costa (Serla,
1996).
Apesar das regulações em relação à não-ocupação das faixas marginais, muitas bei-
ras de rios têm sido ocupadas de forma irregular por favelas. O despejo do esgoto “in
natura” diretamente nas águas dos rios, aliado a falta de controle da poluição indus-
trial e de coleta de lixo, fazem com que os rios da Baixada Fluminense apresentem
altos graus de contaminação e assoreamento (Britto e Porto, 1998).
Infraestrutura e urbanização
Uma leitura da forma atual da cobertura da urbanização na Baixada Fluminense re-
vela uma mancha de maior densidade no limite norte com o Rio de Janeiro, onde não
existem divisões espaciais com a capital, mas se percebe como um contínuo urba-
nizado, compreendendo os municípios de Nilópolis, Mesquita, São João de Meriti e
parte de Nova Iguaçu. À medida que nos afastamos da capital, os espaçamentos vão
aumentando e o tecido se fragmentando. Reconhecemos porém três ramificações
que, através das infraestruturas, enlaçam os núcleos mais dispersos: a principal,
em direção N-W, entre o eixo da antiga ferrovia Central do Brasil e a autoestrada
Presidente Dutra que inclui os municípios de Nova Iguaçu, Belford Roxo, Queima-
dos e Japeri, e tem continuidade até São Paulo; uma outra, seguindo o caminho de
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 147
Infraestrutura e urbanização
Petrópolis em direção N-E incluindo Duque de Caxias e Magé; e uma última, mais
espaçada para o S-W, ligando os municípios de Seropédica e Itaguaí.
O abastecimento de serviços básicos tem melhorado nas últimas décadas, mas ain-
da se evidenciam precariedades na qualidade ou falta de atendimento. A provisão
de saneamento -água, esgoto e coleta de lixo- é irregular, com casos extremos em
Belford Roxo com só 66% de cobertura, e outras áreas em Nova Iguaçu, Duque de
Caxias e Japeri, onde o déficit do serviço supera 20% dos domicílios (Observatório
das Metrópoles, 2005).
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 149
A paisagem elaborada
O percurso histórico aqui apresentado não se pretende uma pesquisa detalhada de
fatos e dados, mas procura desvelar a formação do território no tempo, com especial
atenção às mediações entre o suporte natural -o que temos chamado de forma rece-
bida- e o espaço construído. O estudo focaliza dois aspectos: por um lado, as infra-
estruturas que tiveram um importante papel na organização das conexões e serviram
de ossatura para a ocupação do território, por outro lado, os usos e as modificações
que eles introduziram na paisagem.
Inicialmente, os rios em torno da baía da Guanabara serviam de conexão entre o FV-10: Durante o século XVIII fregue-
porto do Rio do Janeiro e o interior, e foi às suas margens que surgiram os primeiros sias, portos e uns poucos caminhos
se organizam em função do espaço
povoados. Os pequenos portos instalados nas beiras dos rios funcionavam como fluvial. Mapa que compara as van-
entrepostos, lugares de transbordo para barcos menores ou para lombos de burros tagens de uma saída alternativa do
caminho de Minas para a Baía da
que subiam a serra e lugares de descanso e pouso para viajantes e animais (Kamp, Guanabara. Fonte: Arquivo Nacional
2003).
Podemos observar nos mapas das travessias da época como freguesias, portos e
uns poucos caminhos se organizam em função do sistema fluvial. Alguns destes pri-
meiros locais de atividade e intercâmbio tiveram um grande incremento de população
e chegaram a formar vilas e cidades. Goes (1934) destaca, entre as que gozaram
de certa prosperidade, a vila da Estrela, ponto inicial da estrada que se dirigia aos
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 151
sertões dos estados do Rio, Minas e Mato Grosso, o Porto das Caixas, nas margens
do rio Macacu, e a antiga vila de Iguassu, às margens do rio de mesmo nome.
Traçada de forma quase paralela, do centro da capital para o interior, a malha ferro-
viária se delineia sobre o território da Baixada galgando os rios que correm de forma
perpendicular. No final de século XIX, a armadura da infraestrutura que daria suporte
à ocupação da Baixada Fluminense estava lançada. Trilhos e rios formam a malha
básica em função da qual a periferia metropolitana se organiza.
pântanos. A luta contra o pântano foi uma preocupação constante dos habitantes da
Baixada. A limpeza e dragagem dos leitos dos rios foi uma tarefa comum durante a
Colônia, muito especialmente entre os jesuítas, os quais desenvolveram a arte do
controle hidráulico com grande maestria. Os fazendeiros, através da mão escrava,
também cuidaram de manter desobstruídos os rios e canais, para escoar a produção
por via fluvial (Silveira Mendes, 1950).
Os cursos baixos dos rios tiveram seu leito aprofundado e retificado, diques e canais
marginais foram projetados para aumentar a capacidade de vazão, manguezais fo-
ram desmatados, terrenos alagadiços e parte da baía de Guanabara aterrados.
Segundo o relato do engenheiro chefe da comissão, o novo traçado dos rios em plan-
ta procurava seguir o talweg natural... só quando não havia vestígio de algum álveo,
onde os cursos d´ água se perdiam em brejais imensos, traçaram-se grandes tan-
gentes.... Esta foi a estratégia utilizada nos rios Iguassu e afluentes; Botas, Sarapuí,
Capivari. O Rio Sarapuí teve também sua foz modificada, já não mais desembocando
diretamente na baía, mas através do rio Iguassu.
Quanto aos aterros, a técnica utilizada consistia na reutilização ora do material dra-
gado, ora do material oriundo da demolição de morros adjacentes -tradicionalmente
instaurada na modernização do Rio de Janeiro. Cabe destacar as obras realizadas
na enseada de Manguinhos, no limite norte da capital, que demandou quase 4 mi-
lhões de metros quadrados de aterro para a criação, neste caso, de bens imobiliá-
rios destinados ao uso industrial. A enseada de Manguinhos foi por muito tempo um
grande obstáculo à expansão da capital e à conexão com os subúrbios da Baixada.
O aterro possibilitou, mais tarde, a montagem de novas estruturas rodoviárias (Fer-
nandes, 1998).
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 154
Algumas colônias agrícolas foram promovidas pelo governo federal com o objetivo
de tornar produtivas e ocupar as terras públicas saneadas, mas foram reduzidas
a poucas experiências e provaram ter seus objetivos desvirtuados. A colônia São
Bento foi desenvolvida na antiga fazenda nas margens do Iguassu, através da venda
de lotes que visavam garantir a “lavoura branca”. Mas, com muito pouca produção
-segundo Mendes (1950) só eram cultivados mil hectares em uma superfície de 120
mil hectares-, as terras acabaram destinadas para uso de week-end e especulação
imobiliária (Fernandes, 1998).
Se a expansão das
ferrovias e a seca-
gem dos campos
prepararam o terre-
no para a expansão
suburbana do Rio de
Janeiro, as rodovias
“abriram literalmente
o caminho” para a
sua ocupação. Sobre
a matriz da infraes-
trutura já instaurada
de trilhos e rios se
sobrepôs, a partir de
1920, um terceiro layer de mobilidade: as estradas de rodagem.
A estrada Rio - São Paulo saía do Engenho de Dentro, continuava na direção oeste
da cidade, correndo no vale entre o maciço da Tijuca e a serra de Madureira até
Campo Grande, para logo depois atravessar Seropédica e subir a serra das Araras,
no ponto mais baixo da serra do Mar. O tempo de viagem entre Rio e São Paulo
foi reduzido a dez horas, diferença notável em comparação com as 144 horas que
demorou a Bandeira Automobilística da Associação de Estradas de Rodagem, em
1925 (Diário do Vale).
Com o tempo, porém, essa intenção de complementaridade foi se perdendo. A febre FV-13: A malha de infraestruturas
nos começos de século XX. Mapa
rodoviária ganhou ainda mais força, com obras de grande impacto para o Rio de das estradas de rodagem Rio- São
Janeiro (abertura de túneis, viadutos, elevados, etc), enquanto as ferrovias ficaram Paulo e Rio- Petrópolis. Fonte:
Arquivo Nacional
relegadas, sem receber investimentos. A partir dos anos 60, logo após ser unificada
a administração de todas as linhas na sociedade anônima Rede Ferroviária Federal
(RFFSA), o sistema ferroviário sofreu um processo de desinvestimento, degradação
da infraestrutura e perda do mercado para o modal rodoviário. Nos anos 90, a RFFSA
se extingue, transferindo-se as poucas linhas ativas para mãos privadas.
No caso das linhas que atravessavam a Baixada Fluminense, elas passaram a fa-
zer parte do sistema de trens urbanos que servem à metrópole. Administradas hoje
pela companhia Supervia, operam sete linhas, todas com destino à Estação Central
do Brasil: Linha Japeri (Japeri), Linha Santa Cruz (Rio de Janeiro), Linha Deodoro
(Rio de Janeiro), Linha Saracuruna (Duque de Caxias), Linha Belford Roxo (Belford
Roxo), Linha Paracambi (Paracambi), Linha Vila Inhomirim (Magé).
116) foram interligadas no limite norte do município do Rio de Janeiro. Nos anos 90,
ambas as rodovias passaram a concessionárias privadas.
A história da ocupação do solo da Baixada Fluminense foi marcada por ritmos di-
versos, ciclos pendulares de desenvolvimento intensivo e abandono, expansão e
retração. Os diferentes períodos produtivos, as oscilações da economia nacional e
as transformações no seio do Rio de Janeiro terão manifestações no território flumi-
nense.
Segundo Silva Mendes, a partir de 1750 a cana de açúcar passa a dominar o terri-
tório da Guanabara, relegando outras atividades econômicas como a pecuária e ge-
rando uma paisagem bastante uniforme. Algumas olarias se instalam, aproveitando
o solo argiloso, na beira do rio Iguaçu para produzir as formas de barro e os tijolos
para as construções locais. Como já foi discutido, o espaço se organiza em função
do sistema fluvial que articula, a partir dos rios e da baía de Guanabara, o território e
as relações entre o interior e a capital.
A expansão se estrutura a partir dos núcleos das estações ferroviárias. Silva Men-
des descreve a paisagem da Baixada nos anos 40 como composta de dois tipos de
“povoamentos”:
...O primeiro é constituído pelas aglomerações suburbanas que
estendendo-se sob a forma de tentáculos ou varetas abertas de FV-14: Nova Iguaçu em 1940:
“Capital da citricultura do Estado do
um leque (Silva, 1950:67).
Rio de Janeiro”. Fonte: Correio de
Manhã, Arquivo Nacional
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 160
O mesmo autor afirma que, no final dos anos 40, a onda urbanizadora tinha pratica-
mente atingido os seus limites atuais. Os anos seguintes iriam se caracterizar mais
pelo adensamento dessa frente pioneira do que pelo seu avanço no espaço. O perío-
do 30-50 se constitui na fase mais marcante de expansão física da metrópole (Abreu,
1987). Muitos dos municípios da Baixada mantiveram taxas médias de crescimento
anual acima de 10% durante a década de 40-50, que permaneceram elevadas nas
duas décadas seguintes. Nova Iguaçu e Duque de Caxias, por exemplo, de uma
Rio de Janeiro: Explorações na subúrbio fluminense 161
população de menos de 30
mil habitantes em 1940, pas-
saram a 181 mil e 243 mil,
respectivamente, em 1960
(Ver tabela anexa).
O que nos interessa resgatar é o fato de que, a partir dos anos 80, os municípios da
Baixada Fluminense começam aos poucos a receber investimentos para a melhoria
da infraestrutura urbana. O perfil dos primeiros anos das cidades dormitórios vai
também se tornando mais complexo, com o avanço de outras atividades de comércio
e serviços, consolidando subcentros urbanos e multiplicando as relações que deixam
de ser monodirecionais e exclusivas para o centro do Rio de Janeiro. O tecido urbano
também se renova, com a substituição e o adensamento, como podemos verificar por
exemplo no centro de Nova Iguaçu, onde a edificação em altura está configurando
uma paisagem diversificada e contrastante com o manto horizontal e autoconstruído
de baixa densidade que caracterizava a Baixada.
micas na produção do espaço. Assim, podemos encontrar novos atores e novas for- FV-21: Paisagem metropolitana.
Vista da Baixada Fluminense desde
mas de incorporação imobiliária em empreendimentos que reproduzem os padrões a serra de Madureira
promovidos na capital, com formas condominiais de moradia. Também novos empre-
endimentos comerciais privados têm instalado a lógica do shopping mall em vários
dos municípios da Baixada.
Finalmente, as quatro categorias operacionais examinadas no capitulo 3 serão aqui utilizadas como
filtros para explorar as possibilidades de uma abordagem paisagística na formulação de um projeto ur-
bano para a periferia metropolitana. Um conjunto de amostras de tecido revelará situações específicas
nas quais as mediações entre a matriz biofísica e o tecido construído adquirem formas particulares
de expressão. O objetivo não é desenvolver um projeto, mesmo que a sua emergência fique muitas
vezes na superfície quase tangível das descrições. O projeto fica latente como um conjunto de ideias
que exprimem a potencialidade de um cenário diferente. As perguntas levantadas são um convite a
repensar a construção do território sob uma racionalidade outra, que surge da lógica da paisagem.
As águas, que nascem no alto das serras e correm no sentido oeste-leste para de-
saguar na baía, separam ritmos, intervalos: no limite com o Rio de Janeiro, os rios
Pavuna- Meriti, aproximadamente cinco quilômetros ao norte, o rio Sarapuí, e, por
último, o rio Botas que se junta com o rio Iguaçu, este com a nascente na serra de
Tinguá.
A síntese, paisagem matriz para urbanismo 168
Se, por muito tempo, a Baixada Fluminense lutou contra o pântano, hoje a revisão
das técnicas de controle das enchentes aponta para a necessidade de um exame
dos métodos utilizados. Isto implica uma mudança na relação que a cidade estabele-
ceu com o pântano, em vez de anulá-lo devemos aprender a conviver com ele.
Que projetos urbanísticos poderiam reforçar este sistema? Como conciliar a pressão
1_Algumas obras realizadas pelos
de ocupação das áreas marginais dos rios com a consolidação de corredores verdes programas Reconstrução Rio,
ao longo destes? Podemos pretender que os rios se transformem em qualificadores Baixada Viva e Nova Baixada têm
melhorado o impacto das enchen-
do entorno urbano em vez de simples “cloacas”? tes, reduzindo em alguns pontos
a mancha de inundação que é
mostrada por este mapa. Fonte:
Desafortunadamente, hoje os rios estão inutilizados para a navegação. Uma tal es- COPPE, Laboratório de Hidrologia,
trutura de superposição de infraestruturas sugere se pensar na potencialidade de UFRJ
A síntese, paisagem matriz para urbanismo 169
Relevo
Condições ambientais
A via expressa do Sarapuí, pelo contrário, atravessará uma área de densidade média
e baixa, cruzando o centro da Baixada Fluminense e atingindo diretamente os muni-
cípios de Belford Roxo, São João de Meriti e Duque de Caxias.
Algumas lições podem ser tiradas das obras já realizadas. A construção da Linha
Vermelha (Via Expressa Presidente João Goulart), por exemplo, bordejando os rios
Pavuna e Meriti, no limite entre os municípios da Baixada e a capital, representa um
clássico exemplo de formas de intervenção setoriais. Tanto o canal quanto a rodovia
foram pensados sob estritos modelos funcionais, dando prioridade ao fluxo -dos car-
ros e das águas. Juntos, eles formam uma estrutura de grande impacto que permite
relações em grande escala, mas que provoca desarticulações na escala local (Braga,
2006).
Que novas formas de integração das infraestruturas na paisagem podem criar efei-
tos contrários? Como converter um projeto de infraestrutura em catalisador de uma
transformação urbana positiva?
A síntese, paisagem matriz para urbanismo 173
FVI-4: Um sistema integrado de infraestruturas duras (rodovias e ferrovias) e brandas (rios) forma a armadura de
suporte do território. Como re-pensar a relação entre elas nos futuros planes de expansão do sistema rodoviário?
1. Via Expressa Presidente João Goulart, 2. Via Expressa planejada ao longo do rio Sarapuí, 3. Futuro Arco Rodo-
viário. Fonte: Elaborado pelo autor sobre a base cartográfica da Fundação Cide.
A síntese, paisagem matriz para urbanismo 174
No caso do arco rodoviário, as questões suscitadas pelo contexto são bem dife-
rentes. A rodovia vai atravessar, neste trecho da Baixada, áreas hoje praticamente
desocupadas. As consequências ambientais da expansão descontrolada sobre este
território já foram estudadas por Carneiro (2006). Embora a criação de vetores de
expansão urbana a partir do arco metropolitano seja um dos benefícios anunciados
pelo governo do Estado2, neste caso, a expansão só intensificaria a degradação
ambiental e a impermeabilização dos solos, com o consequente agravamento das
inundações.
moradias de áreas de risco, a reclamação de áreas inundáveis, etc. são oportunida- FVI-9: Cheios e vazios. Amostras
de tecido urbano. Fonte: Autor
des de criação de um tecido urbano mais poroso. A partir da renovação e da substi-
tuição tipológica – densidade x altura- podemos também imaginar situações urbanas
pontuais onde uma nova relação entre cheios e vazios promova a emergência de
espaços públicos.
Por último, mas não menos importante, resta a questão de como conectar os espa-
ços livres para que eles possam constituir um sistema3. São operações que procuram
articular e ligar os espaços livres entre si, de maneira a garantir a conectividade
ecológica, mas também visual e urbana. Os rios são naturalmente corredores ecoló-
gicos (Forman, 1996) que proveem conectividade ligando fragmentos de habitat. Mas
A síntese, paisagem matriz para urbanismo 180
Não é nossa posição, porém, pretender o resgate romântico de uma natureza per-
dida, mas pensar melhor como dispor dessas infraestruturas hidráulicas que cons-
tituem a interface entre a cidade e os rios, como incorporá-las à paisagem, de que
forma elas podem dialogar com o urbano.
3_Para uma metodologia de orde-
nação do território a partir do siste-
O rio Sarapuí, no coração da Baixada Fluminense, é um exemplo privilegiado das ma de espaços livres ver o trabalho
tensões entre os planos dos engenheiros, os processos de desenvolvimento urbano de Raquel Tardim, Espaços livres:
sistema e projeto territorial. Ed. 7
e as próprias dinâmicas das águas. Ele é um dos mais importantes na região, nasce letras, Rio de Janeiro, 2009.
A síntese, paisagem matriz para urbanismo 181
em Bangu, no sopé do maciço da Pedra Branca no município do Rio de Janeiro e se FVI-12: Comissão Federal
de Saneamento da Baixada
estende por mais de 30 quilômetros por uma das áreas mais populosas da Baixada, Fluminense.1a Seção Estudos. Ba-
conformando o limite entre os municípios de Mesquita e Nilópolis, entre Belford Roxo cia do Rio Sarapuhy. 1914. Fonte:
Arquivo Nacional
e São João de Meriti, e atravessando Duque de Caxias. O rio tem sofrido trans-
formações formais importantes. Os cursos médios e baixos foram retificados e sua
foz, originalmente na baía de Guanabara, foi modificada para desaguar junto ao rio
Iguaçu. O Sarapuí tem uma largura que varia entre os dez metros, em Mesquita, até
alcançar mais de 50 metros perto da foz.
O sistema hidráulico, desenhado para o controle das inundações na bacia do rio Sa-
rapuí, inclui um conjunto de dispositivos: diques, barragens, pôlderes e reservatórios-
pulmão. Os diques marginais permitem que o nível de água aumente sem afetar as
O dique marginal só foi construído na margem direita, o que tem acelerado o proces-
so de urbanização em São João de Meriti, enquanto a margem esquerda permanece
ainda hoje sem intervenção, sendo mais propícia a inundações, o que se reconhece
pela ocupação mais esparsa. Mas, ao mesmo tempo, por oferecer condições segu-
A síntese, paisagem matriz para urbanismo 186
ras, o dique na margem direita vem sendo ocupado informalmente com uma extensa
“favela linear”. Esta situação anula novamente qualquer contato da cidade com o rio
e contribui seriamente para a poluição das águas, com o lançamento direto do esgoto
das moradias improvisadas nas margens.
Por outro lado, as áreas de reservatório-pulmão não demarcadas são propícias tam-
bém à ocupação, comprometendo o saneamento e a habitabilidade de toda a Bai-
xada. Ruas improvisadas já indicam o caminho das próximas ocupações dentro dos
reservatórios, o que levará ao enfrentamento das enchentes, afetando as famílias
diretamente, como também o resto da região. FVI-18: Mangue degradado na
Baía de Guanabara. Fonte: Mos-
catelli
Que projetos urbanos podem se instalar como barreiras à expansão? Podemos ima-
ginar a criação de uma nova paisagem que incorpore novos usos, adaptáveis às
variações hidrológicas? Tempo úmido, tempo seco. Trabalhar na fronteira das águas
implica integrar os –poucos- espaços livres às margens dos rios e estabelecer novos,
que se transformem em mediadores de relações sinérgicas com o tecido urbano ao
mesmo tempo em que deem vazão à inundação que as águas exigem.
Outro espaço de fronteira que merece uma reflexão projetual está formado pela in-
terface entre a cidade e a baía da Guanabara, ecologicamente mediado pelos man-
guezais, considerado um dos ecossistemas mais ricos e diversos, mas que sofreu
e continua sofrendo importante depredação. Atravessado pela rodovia Washington
Luiz, o espaço tem sido destinado maiormente à localização de indústrias e outros
“artefatos” típicos das rodovias metropolitanas. A BR-040 conforma, por sua dispo-
sição, uma barreira importante para a expansão dos tecidos residenciais sobre os
manguezais. Ao mesmo tempo, as funções situadas na margem direita da rodovia
estão normalmente voltadas para o fluxo dos automóveis, sendo o mangue e a baía
da Guanabara espaços residuais.
A síntese, paisagem matriz para urbanismo 190
Tanto ao percorrer as ruas como numa visão aérea do território, um aspecto chama a
atenção pelo contraste das cores. É o vermelho da terra exposta. A atividade extrativa
é uma importante atividade econômica na Baixada, especialmente de saibro, argila,
areia e, em menor grau, de rocha. Segundo o registro do Departamento de Recursos
Minerais do Estado (DRM-RJ) se encontram ativas cinco empresas extrativas em
Belford Roxo, 36 em Duque de Caxias e 14 em Nova Iguaçu. A estas devemos somar
um número impreciso de atividades não registradas de empreendimentos informais
que se desenvolvem em pequena escala e sem controle do Estado.
Em outros casos, o abandono das canteiras gera grandes prejuízos nas áreas ad-
jacentes. Os morros semidemolidos ficam expostos, se formando ravinamentos e
voçorocamentos que geram situações de risco para a população, que convive com a
possibilidade de desmoronamentos dos barrancos sobre as residências. Outros pro-
blemas têm relação com a qualidade do ar e a qualidade ambiental geral, questões
de assoreamento dos sistemas pluviais e de inundações (Mansur, 2000).
A síntese, paisagem matriz para urbanismo 193
Os areeiros, por sua parte, engendram uma paisagem particular, com graves con-
sequências ambientais. Onde a extração foi praticada, como resultado das escava-
ções, se formam profundas piscinas de água verdosa que alcançam o lençol freático
e enchem as crateras. Geralmente saturadas de sedimentos minerais, as piscinas
dificilmente são ambientes capazes de gerar alguma forma de vida. O município de
Seropédica concentra a maior quantidade de estabelecimentos extrativos de areia,
com um número crescente de canteiras formais e informais.
Entre os temas que se revelaram e que podem conformar essa agenda urbana des-
tacamos:
a) dar espaço a água, uma questão de urgência para a Baixada que deve ser pensa-
da também desde perspectivas urbanas;
b) outorgar novo valor de uso aos vazios, o que implica um primeiro esforço para
identificá-los, reconhecer seus valores intrínsecos e repensar seu potencial de uso,
-o que nem sempre implica que devam ser ocupados;
c) articular os espaços livres, de maneira que possam atender questões de conecti-
vidade urbana e ecológica;
Considerações finais 196
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