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Caio Prado Júnior e o povo

brasileiro
As obras de Caio Prado Jr., publicadas nas décadas de 1930 e
1940, foram marcos importantes na mudança de perspectiva da
historiografia e da sociologia brasileiras. Elas, dentro de uma
perspectiva materialista, a partir do que foi denominado
Caio Prado concentrou suas análises na forma particular que o país se inseriu
na divisão internacional do trabalho desde os meados do século XVI. O Brasil ,
ao contrário dos Estados Unidos, se constituiu uma economia colonial voltada,
exclusivamente, para produção e comercialização de produtos primários
(agrícolas ou minerais) e para cumprir essa finalidade montou-se uma estrutura
econômico-social assentada na grande propriedade rural e na mão de obra
escrava.

Na contramão de outros autores, particularmente Gilberto Freyre, não partiu de


uma região determinada (nordeste) – ou de uma perspectiva senhorial (a Casa-
Grande) – para daí generalizar e procurar construir uma definição de povo e
“caráter brasileiro”. Dante Moreira Leite chegou a dizer: “Caio Prado Jr.
representa um momento decisivo na superação do pensamento ideológico: as
características da colônia não são determinadas por misteriosas forças
impostas pelo clima ou trazidas pelas raças formadoras, mas resultam do tipo
de colonização imposto pela economia européia (...) já não se trata de explicar
a situação do país através de um ou outro fator – a raça, o clima, a escravidão,
as características psicológicas dos colonizadores – mas de interpretá-la em
função do sentido da colonização.”

A relação desigual que foi se constituindo historicamente entre colônia e


metrópole (centro-periferia) – que tem suas origens remotas no século XVI - e
perdura até os dias de hoje -, tem centralidade no seu esquema teórico. Por
isso não tem sentido as afirmações de que Caio Prado teria subestimado o
papel do colonialismo (e do imperialismo) e, portanto, da própria “questão
nacional”. Pelo contrário, foi um dos primeiros que abordaram o problema da
dependência externa e a necessidade de superá-la.

O povo em Evolução Política do Brasil

Como já vimos nos artigos anteriores, a noção de povo de Caio Prado e


Werneck Sodré se insere no interior de uma antiga tradição marxista. Mas,
apesar de partirem de uma mesma matriz teórica e política, os dois principais
historiadores marxistas brasileiros não definem o povo de uma única e mesma
maneira.

Se para Sodré partes (frações e camadas) das classes economicamente


dominantes podem, em determinadas fases do desenvolvimento histórico, se
constituir em povo, (ex. a classe latifundiária durante a luta pela
independência), para Caio Prado existiria uma separação entre os setores
economicamente dominantes e os agrupamentos sociais que ele definiria como
povo. Para ele a definição de povo estaria vinculada à situação de dominação
política e, fundamentalmente, econômica. Vejamos, então, como Caio Prado Jr.
procurou definir a noção de povo na sua primeira obra Evolução Política do
Brasil de 1933.

Durante o processo da nossa Independência, o “partido brasileiro” teria sido o


representante das “classes superiores da colônia, grandes proprietários rurais e
seus aliados” e, por isso, não compunham as forças populares. Estas eram
representadas pelas “camadas oprimidas da população”. Essas duas forças,
que muitas vezes lutaram juntas pela conquista de um objetivo comum, tinham
projetos de sociedade bastante distintos – em muitos casos antagônicos. A
primeira queria apenas “o estabelecimento de um regime constitucional e as
vantagens, liberdades e autonomia adquiridas pelo Brasil”. A segunda
“enxergava na constituição que lhe era oferecida perspectivas de libertação
econômica e social”. Continuou Caio Prado: “A posição das classes pobres na
revolução da Independência é por isso radical ao extremo”.

Em outro trecho afirmou: “Estes (‘os nativistas’), contudo, se tinham um alvo


comum – o combate à reação portuguesa – dividiam-se internamente em
tendências distintas que refletem a posição própria na revolução da
Independência das várias camadas sociais que o compunham. O partido que
representava a classe abastada dos proprietários rurais e, como vimos,
dominava na Assembléia Constituinte, era, natural, socialmente conservador
(...) Mas ao lado dele figuravam os democratas radicais, que, representando as
classes populares, aspiravam por reformas sociais profundas”. E concluiu: “a
composição nacionalista do primeiro reinado (...) de um lado estão as classes
abastadas, principalmente os grandes proprietários rurais (...) de outro, as
classe populares”.

Segundo Caio Prado as massas populares foram derrotadas naquele processo:


“Sim. Logrado foi o povo (...) vendo que tinha lutado para os outros”. A principal
razão foi que as massas populares “não se encontravam politicamente
maduras para fazerem prevalecer suas reivindicações; nem as condições
objetivas do Brasil eram ainda favoráveis para sua libertação econômica e
social.” Assim, “fez-se a Independência praticamente à revelia do povo”.
No Brasil do início do século XIX ainda não se poderia falar em classe social
num sentido forte; ou seja, grupos sociais populares com alguma consciência
de pertencimento de classe. Referindo-se aos escravos, escreveu: “Privados
de todos os direitos, isolados nos grandes domínios rurais (...) e cercados de
um meio que lhe era estranho, faltavam aos escravos brasileiros todos os
elementos para se constituírem (...) fatores de vulto no equilíbrio político
nacional. Só com o decorrer do tempo poderia a pressão de idênticas
condições de vida transformar esta massa escrava numa classe politicamente
ponderável, em outras palavras, transforma-la de classe em si noutra para si.”

Não apenas aos escravos faltavam os requisitos indispensáveis para formação


de uma classe social no sentido exposto acima. Continuou ele: “Quanto à
população livre das camadas médias e inferiores não atuavam sobre elas
fatores capazes de darem coesão social e possibilidades de uma eficiente
atuação política. Havia nela a maior disparidade de interesses, e mais do que
classes nitidamente constituídas, formavam antes simples aglomerados de
indivíduos”. Aqui ele expressou a mesma opinião de Marx sobre os
camponeses parcelares franceses durante os movimentos revolucionários da
primeira metade do século XIX.

Em “O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte” Marx escreveu: "Na medida em


que milhões de famílias camponesas vivem em condições econômicas que as
separam uma das outras e opõem o seu modo de vida, os seus interesses e a
sua cultura aos das outras classes da sociedade, estes milhões constituem
uma classe. Mas, na medida em que existe entre pequenos camponeses
apenas uma ligação local e em que a similitude de seus interesses não cria
entre eles comunidade alguma, ligação nacional alguma, nem organização
política nessa medida não constituem uma classe (...) são incapazes de fazer
valer seu interesse de classe em seu próprio nome".

Se, de fato, existia uma simplificação das relações sociais durante os primeiros
séculos da colonização, que nos permite em falar em “massas populares” de
maneira quase indistinta e se, também, é verdade que inexistiam classes no
sentido forte do termo – classe para si – não podemos afirmar que as classes
(ainda que no sentido fraco – classe em si) também não existissem. Esta é
uma conclusão que Caio Prado parece chegar em alguns momentos de sua
obra.

Entre outras coisas, escreveu: “É assim extremamente simples a estrutura


social da colônia no primeiro século e meio da colonização. Reduz-se, sem
suma a duas classes: de um lado os proprietários rurais, a classe abastada dos
senhores de engenho e fazenda; de outro a massa da população espúria dos
trabalhadores do campo, escravos e semi-livres. Da simplicidade da infra-
estrutura econômica (...) deriva a da estrutura social: a reduzida classe de
proprietários, e a grande massa que trabalha e produz, explorada e oprimida.
Há naturalmente no seio desta massa gradações, que assinalamos. Mas, elas
não são contudo bastante profundas para se caracterizarem em situações
radicalmente distintas. Trabalhadores escravos ou pseudo-livres; proprietários
de pequenas glebas mais ou menos dependentes, ou simples rendeiros, todos
em linhas gerais se equivalem. Vivem do seu salário, diretamente de suas
produções ou do sustento que lhes concede o senhor; suas condições
materiais de vida, sua classificação social é praticamente a mesma”.

A afirmação acima não me parece correta. Escravos, proprietários de


pequenas glebas, assalariados dependentes não compõe uma única e mesma
classe e não têm o mesmo status no mundo colonial e, principalmente, durante
o Império. O escravo estava no último degrau da escala social que todos
pretendiam se afastar, inclusive o negro escravizado. Mesmo as massas
populares se dividiam em classes sociais.

Em Evolução Política do Brasil, Caio Prado Jr. dedicou grande parte de suas
atenções às lutas populares no período regencial e início do II Reinado. Entre
elas se destacavam a cabanagem, a balaiada, a revolução praieira e
farroupilha. Logo no início de seu livro ele deixou expresso o seu grande
objetivo. Para defini-lo utilizou-se de um trecho do prefácio da obra de Max
Beer, História Geral do Socialismo: “há muito se faz sentir a necessidade de
uma história que seja a glorificação das classes dirigentes” e concluiu o próprio
Caio Prado: “traçar uma tal história é tudo quanto pensei fazer.”

Mais à frente esclareceu sua opção metodológica: “A Cabanagem do Pará


(1833-36), a Balaiada do Maranhão (1838-41) e a Revolta Praieira de 1848 em
Pernambuco – que são as principais revoluções populares da época – não
passam, para a generalidade dos nossos historiadores, de fatos sem maior
significação social, e que exprimem apenas explosão de ‘bestiais’ sentimentos
e paixões das massas. Isto principalmente com relação às duas primeiras (...)
É por isso, dado a importância primordial destas agitações para a compreensão
da história política da época, julguei útil analisá-las com mais detalhes.”

Já foi observado por alguns autores que Caio Prado Jr., em geral, tendia a
subestimar a luta dos escravos e as conseqüências sociais e políticas desse
estado de guerra civil larvar que predominou durante o período colonial e
imperial. Isso, no entanto, não significa dizer que ele ignorou completamente a
resistência dos negros escravizados, pois não é verdade.

“A condição dos escravos, escreveu ele, é outra fonte de atritos. Não se julgue
a normal e aparente quietação dos escravos (perturbada, aliás, pelas fugas,
formação de quilombos, insurreições mesmo por vezes) fosse expressão de
um conformismo total. É uma revolta constante que lavra surdamente entre
eles, e que não se manifesta mais porque a comprime todo o peso e força
organizada da ordem estabelecida”. No entanto é verdade que ele não tirou
todas as conseqüências dessa importante constatação.

Diga-se a favor de Caio Prado que não existiam, naquela época, estudos
exaustivos sobre as revoltas escravas no Brasil. A obra pioneira de Clóvis
Moura, Rebeliões na Senzala, somente viria a público no final da década de
1950.

Formação do Brasil Contemporâneo

Quanto aos aspectos étnicos do nosso povo Caio Prado se rendeu ao


esquema consagrado da integração das “três raças formadoras”. Um fato por
demais óbvio para ser negado pelo autor marxista. Escreveu ele: “A
mestiçagem, que é o signo sob o qual se forma a nação brasileira, e que sem
dúvida o seu traço característico mais profundo e notável foi a verdadeira
solução encontrada pela colonização portuguesa”.

Não é possível, também, deixar de sentir uma leve influência de Gilberto Freyre
sobre sua principal obra Formação do Brasil Contemporâneo (1942). O
sociólogo pernambucano havia lançado poucos anos antes o seu memorável
Casa-Grande e Senzala (1933). Afirmou Caio Prado, seguindo o “mestre de
Apicucos”, a “mestiçagem, signo sob o qual se formou a etnia brasileira, resulta
da excepcional capacidade do português em se cruzar com outras raças (...)
Teria contribuído para aquela aptidão o trato imemorial que as populações
ocupantes do território lusitano tiveram com raças de compleição mais escura.”

Caio Prado, no entanto, apresentava uma pequena, e significativa, diferença de


opinião em relação à Freyre. Afirmou ele, “muito mais importante, contudo,
entre os fatores da mestiçagem brasileira, foi o modo com que se processou a
emigração portuguesa para a colônia. O colono português emigra para o Brasil,
em regra, individualmente (...) E daí se verem os colonos destituídos de
mulheres brancas. Isto, e mais a facilidade dos cruzamentos com mulheres de
outras raças, de posição social inferior e, portanto, submissas, estimulou
fortemente e mesmo forçou o colono a ir procurar aí a satisfação de suas
necessidades sexuais” e “as uniões mistas se tornam a regra.”

Assim, seria a forma particular pela qual se deu a colonização portuguesa na


América que explicaria a mestiçagem. Ela não seria mais explicada,
fundamentalmente, pela índole do colonizador português – um homem
desprovido de preconceitos sociais e de cor. Caio Prado estava correto, pois a
colonização portuguesa na África, iniciada séculos depois, não produziu uma
população miscigenada. Em alguns casos, a colonização lusitana produziu
fenômenos muito próximos ao apartheid sul-africano.

Também não é possível deixar de notar os tributos que a obra pioneira de Caio
Prado foi obrigado a pagar à ideologia elitista de seu tempo. Nenhum autor
marxista esta isento de passar por esse processo de transição. Sem, por algum
tempo, conviver com teorias e ideologias em decomposição.

Em Formação do Brasil contemporâneo ele chegou mesmo a se referir aos


negros africanos e indígenas como “raças exóticas”, “povos de nível cultural
ínfimo”, “povos bárbaros e semi-bárbaros”. Falava, por exemplo, do “baixo nível
intelectual dos escravos” e afirmou que “a contribuição do escravo preto ou
índio para a formação brasileira é, além daquela energia motriz, quase nula”.

Certo espírito preconceituoso – ainda predominante no seu tempo - também


pode ser detectado num longo parágrafo da mesma obra: “o que pesou muito
mais na formação brasileira é o baixo nível destas massas escravizadas que
constituirão a imensa maioria do país. No momento que nos ocupa, a situação
era naturalmente muito mais grave. O tráfico africano se mantinha, ganhava
volume, despejando ininterruptamente na colônia contingentes maciços de
populações semi-bárbaras (...) Certas conseqüências serão mais salientes:
assim o baixo teor moral nela reinante, que se verifica entre os outros sintomas
de relaxação geral dos costumes, assinalada por todos os observadores
contemporâneos, nacionais e estrangeiros. Bem como o baixo nível e
ineficiência de do trabalho e da produção, entregues como estavam aos pretos
boçais e índios apáticos”.

Em algumas passagens parece mesmo culpar o escravo e a escrava pela


promiscuidade que reinava sob o manto da família patriarcal: “O sistema de
vida a que dá lugar, a promiscuidade com os escravos, e escravos do mais
baixo teor moral, as facilidades que proporciona às relações sexuais irregulares
e desbragadas,a indisciplina que nela reina (...) tudo isto faz da casa-grande,
antes uma escola de vício e desregramento (...) que de formação moral. A
família perde aí inteiramente, ou quase, as suas virtudes; em vez de ser o que
lhe concede razão moral básica de existência e que é de disciplinadora da vida
sexual dos indivíduos, torna-se pelo contrário campo aberto e amplo para o
mais desenfreado sexualismo”. Para Caio Prado, pelo menos nesta obra, a
família deveria ter, necessariamente, “o grande papel de formador dos
indivíduos e do seu caráter”. Não é possível deixar de notar nesta passagem a
influência do idealismo e do moralismo aristocrático de Paulo Prado, autor de
Retrato do Brasil.
Entretanto, em outros trechos ele nos ajuda a desvendar as razões mais
profundas para as “vicissitudes morais” da maioria nosso povo. A principal dela
é a existência da escravidão. Seria um erro atribuir a “indolência” como
característica inata dos indígenas brasileiros, pois na “sua vida nativa, mesmo
na civilizada quando se empenha em tarefas que conhece, e, sobretudo, cujo
alcance compreende, o selvagem brasileiro é tão ativo como os indivíduos de
qualquer outra raça.” Em outros trechos ele é ainda mais explícito: “O negro e o
índio teriam tido certamente outro papel na formação brasileira, e papel amplo
e fecundo, se diverso tivesse sido o rumo dado a colonização; se se tivesse
procurado neles, ou aceito uma colaboração menos unilateral e mais largar que
a do simples esforço físico.” A escravidão excluía “tudo que o negro ou índio
poderiam ter trazido como valor positivo e construtor da cultura”.

Apesar dos limites que possam ter, podemos afirmar que os livros de Nelson
Werneck Sodré e Caio Prado Júnior representaram um salto de qualidade na
historiografia brasileira. Por isso merecem um lugar destacado entre as obras
fundamentais que nos ajudaram a entender mais e melhor o Brasil. Elas
continuam sendo leituras obrigatórias para todos aqueles que se colocam a
difícil e nobre tarefa de construir um país democrático, soberano e socialista.

* Historiador, mestre em ciência política pela Unicamp

Resenha Livro - 222- “Evolução Política do Brasil e Outros Estudos” – Caio Prado Júnior
- Ed. Companha das Letras

Costuma-se dizer que o pai da história ou o fundador desta disciplina foi o grego Heródoto
que no século V a.C redigiu uma história das invasões persas na Grécia divididas em 9
volumes. Mesmo antes e depois de Heródoto, muitos foram os cronistas que testemunharam
e deixaram sob a forma de documentos históricos valiosas fontes primárias acerca da
conjuntura que observaram ou anotaram as reminiscências orais de uma memória que se
pôde resguardar em documentos.

Entretanto, a ideia de Heródoto como o pai da história é só parcialmente verdadeira. A


História enquanto uma disciplina autônoma, com suas próprias formas metodológicas,
pensada enquanto um campo científico particular, um ofício propriamente dito, é um
fenômeno muito mais recente, expressão de fins do século XIX, quando nasce também a
sociologia e outras disciplinas do gênero das Ciências Humanas. Pode-se dizer que seu
fundador é o alemão Leopold Von Ranke que está inserido dentro do pensamento positivista,
tão marcante naquele período e que influenciará decisivamente a metodologia da história
dentro de seus primeiros momentos de desenvolvimento. “Die geschichte wie es eigentlich
gewesen hat” ou “a história como ela de fato aconteceu”, pontuaria Von Ranke, e aqui a
orientação positivista teria como norma retratar o passado se servindo sempre dos
documentos oficiais, prioritariamente de fontes oficiosas, bem como dos grandes eventos,
dentro de uma expectativa de neutralidade diante do passado. Estamos diante de uma
história portanto baseada no inventário de datas e grandes fatos políticos
supostamente baseado numa neutralidade por parte do historiador. Quando Caio Prado
Júnior escreveu e publicou sua primeira edição de “Evolução Política do Brasil” este modelo
de história positivista ainda era dominante, ao ponto do historiador brasileiro, que
inaugurava uma nova historiografia com seu livro, iniciar seu trabalho dizendo não se tratar
de um livro de “História do Brasil” mas um ensaio.

Uma segunda questão preliminar importante. Como se sabe, o Brasil foi um país em que o
Estado nacional que exsurge com a Independência decorre de conflitos entre o partido
brasileiro (grandes proprietários de terras, a elite tradicional), setores democráticos médios
e estrangeiros na sua maioria portugueses favoráveis a restauração. Não havia todavia uma
unidade nacional, mas um divisão de interesses muito perceptível: as províncias do norte por
exemplo foram muito pouco receptivas à independência, havendo resistência com armas,
diante de sua maior proximidade com a corte – diferenças do mesmo tipo pode-se falar de
Pernambuco e Bahia. A divisão do país em províncias, que remete ao período colonial é uma
realidade que perpassa a independência e todo o séc. XIX. Em outras palavras, enquanto na
Europa, o sentimento de união e os laços de solidariedade que conformam a nação são
anteriores à conformação dos estados nacionais (ver especialmente a Alemanha com sua
unificação em 1871), no Brasil ocorre o inverso, com a conformação do estado nacional
estando ausente o sentimento de Nação. Será nos anos 1930 com os modernistas que recairá
de certa forma esta tarefa de buscar uma identidade nacional. Se no plano das artes, desde a
semana de 1922, a questão nacional esteve presente, nas ciências sociais, Caio Prado Júnior,
Sérgio Buarque de Holanda e Gilberto Freire mais ou menos no mesmo período também
terão cogitações semelhantes: a busca pela identidade nacional envolve o olhar para o nosso
passado colonial e cada um destes autores irá, a sua maneira, avançar nas análises do nosso
passado.

"Evolução Política do Brasil” é um estudo sobre a revolução da independência política do


Brasil. O Ensaio divide nosso processo histórico em dois momentos decisivos – da descoberta
e particularmente a partir de 1530 quando os portugueses efetivamente passam a se ocupar
da atividade colonial diante dos riscos de se perder esta vasta porção de terras até então
inexploradas para outras nações, daquele período inicial do extrativismo vegetal e da
concessão das capitanias hereditárias até 1808, com a vinda de D. João VI e sua corte em
fuga de Napoleão, fato político decisivo que colocaria em marcha a Independência com o fim
do regime do pacto colonial (exclusividade de comércio com Portugal e abertura dos portos
às nações amigas), elevação do Brasil a Reino Unido de Portugal, transferência
administrativa de toda coroa portuguesa para o Brasil e as transformações daí decorrentes
com a fundação do Banco do Brasil e Casa da Moeda, cancelamento de lei que proibia
estabelecimento de indústrias no Brasil, entre outros.

Como dizíamos, a interpretação original deste livro reside no fato de sair de uma exposição
sumária de fatos, datas e grandes eventos e buscar fazer uma interpretação crítica da
evolução política do Brasil. Nesse sentido, o historiador se volta para análises da economia,
sociedade e instituições políticas do Brasil colonial e suas transformações decorrentes dos
choques de partidos diante das agitações políticas particularmente importantes com a
independência e no período regencial.

Uma leitura marxista da independência é possível de ser destacada:

“Já vimos como a emancipação política do Brasil resultou do desenvolvimento econômico


do país, incompatível com o regime de colônia que o peava e que por conseguinte, sob sua
pressão, tinha de ceder. Em outras palavras, é a superestrutura política do Brasil Colônia
que, já não correspondendo ao estado das forças produtivas e à infraestrutura econômica
do país, se rompe, para dar lugar a outras formas mais adequadas às novas condições
econômicas e capazes de conter a sua evolução. A repercussão desse fato no terreno político
– a revolução da Independência – não é mais que o termo final do processo de diferenciação
de interesses nacionais, ligados ao desenvolvimento econômico do país, e por isso mesmo
distintos dos da metrópole e contrários a eles.”
Em 1953, as edições posteriores do livro passaram a contar com “Outros Estudos” com
ensaios, palestras e prefácios de temas de geografia e história. Há estudos sobre o fator
geográfico no desenvolvimento de São Paulo onde se observa como é justamente o aspecto
espacial acima de tudo, diante da posição de rios e do relevo das serras, a origem remota da
ocupação do território paulista; estudos sobre as fronteiras meridionais do Brasil, com
algumas reflexões sobre os limites de fronteira do nosso território ao sul diante da histórica
busca da prata no Peru; estudos sobre a imigração em que desde os anos 1940 Caio Prado
Júnior já reivindica tanto a necessidade de uma Reforma Agrária quanto da conformação de
cooperativas – ambos pendentes pelo poder público até hoje; e artigos mais históricos, como
a publicação do periódico “Tamoio” em defesa do ministro José Bonifácio e a vida do
aguerrido Cipriano Barata, um baiano formado em medicina em Coimbra que participou
ativamente de inúmeras insurreições populares em Pernambuco e Bahia e passou anos a fio
na prisão.

Evolução Política do Brasil é um livro debutante de interpretação materialista da história do


Brasil. Deve ser reivindicado e saudado como um ponto de partida da historiografia
materialista do brasil, para além da história dos grandes eventos de Leopold Von Ranke.

CAIO PRADO JR. - Evolução Política do Brasil (Colônia e


Império)*
Caio Prado Jr., influenciou toda a nossa historiografia e marca os estudos relacionados
sobre a colônia e o império.

Colônia
A análise feita pelo autor é de como Portugal resolveu os
problemas na colonização e como os portugueses serão peça fundamental na
nossa colonização.
Primeiramente, relata os avanços de Portugal na conquista da
África e posteriormente da América.
A defesa, depois da conquista do Brasil, vem a preocupação para
a defesa do território.
“Cogitou-se então da única forma de defesa: a colonização. Já então alguns
projetos tinham sido apresentados. Partida um deles de Cristóvão Jaques,
comandante da arma guarda-costas que em 1526 percorrera o litoral brasileiro,
expurgando-o de traficantes intrusos.” (PRADO JR., 1994: 13)
Essa defesa gerou então as capitanias hereditárias.
“Resolveu-se os problemas com a criação das capitanias hereditárias, repetindo-
se em larga escala o processo adotado anos antes na colonização dos Açores e
da Madeira.” (Idem, 1994: 13)
Mas, como sabemos não tiveram sucesso absoluto às capitanias
hereditárias, apenas a de São Vicente e Pernambuco. Podemos dizer que as
capitanias não vingaram por completo, mas as que conseguiram êxito,
incentivaram uma das principais atividades econômicas do Brasil no período
colonial: a cana-de-açúcar.
Essa exploração da riqueza do Brasil, segundo Caio Prado, vai ser
baseado na grande propriedade rural.
“A economia agrária colonial sempre tece por tipo a grande exploração rural.
Estão aí as lavouras de cana e os engenhos de açúcar — nossa principal riqueza
de então — os extensos latifúndios dedicados à pecuária; (…)
A pequena propriedade não encontrou terreno favorável para se desenvolver na
economia da colônia.” (PRADO JR., 1994: 18)
Sendo assim, a sociedade brasileira vai ser um retrato fiel dessa
organização econômica do Brasil no período Colonial.
“A sociedade colonial brasileira é o reflexo fiel de sua base material: a economia
agrária que descrevemos. Assim como a grande exploração absorve a terra, o
senhor rural monopoliza a riqueza,e com ela seus atributos naturais: o prestígio,
o domínio.” (Idem, 1994: 23)
Essa sociedade é marcada, como sabemos, talvez, por culpa de
Caio Prado Jr., que a sociedade colonial é marcada também pelo escravismo,
onde ele justifica a utilização da mão-de-obra escrava da seguinte forma:
“Sem escravos não era possível aos colonos abastecerem-se de mão-de-obra
de que necessitavam. A imigração branca era escassa, e tornava-se assim
indispensável o emprego do braço escravo de outras raças.” (Idem, 1994: 23)
Realmente esse trabalho escravo vai se estender até o império e será a mão-de-obra
mais utilizada, senão a única, feita no Brasil. Caio Prado Jr. então se relata sobre os
assalariados da seguinte forma:
“Não falamos nos assalariados porque seu contingente é mínimo, Encontramo-
los em algumas funções mais qualificadas do engenho de açúcar etc. — e em
outras ocupações.” (Idem, 1994: 28)
Politicamente o governo na colônia era precário, apenas havia
algumas instituições rudimentares. A que mais se tinha poder era a câmara de
vereadores. “Mantinha ela na colônia apenas uma administração rudimentar, o
estritamente necessário (…)”. (Idem, 1994: 29)
Nessas câmaras havia os homens bons que eram os grandes proprietários de terras
que eram os verdadeiros comandantes da colônia.
“Tais circunstâncias condicionam a estrutura política da colônia. São elas que
explicam a importância das câmaras municipais, que constituem a verdadeira e
quase única administração da colônia. (…) Dominam portanto nela os
proprietários rurais. Nas eleições para os cargos de administração municipal
votam apenas os homens bons, a nobreza, como se chamavam os
proprietários.(Idem, 1994: 30)
Durante, ainda na colônia, houve o período da mineração onde a ordem social e política
manteve-se, apenas começa-se uma pequena urbanização na região mineira e uma
queda na produção de açúcar devido os conflitos com os holandeses.

Império
Quando falamos do império brasileiro, e tomamos como base os escritos de Caio Prado
Jr., temos que verificar, que para ele, a independência do Brasil acontece quatorze anos
antes, em 1808, com a chegada da família real no Brasil.
“A transferência da Corte portuguesa para o Brasil em 1808 veio dar à nossa
emancipação política um caráter que a singulariza no conjunto do processo histórico da
independência das colônias americanas.” (PRADO JR., 1994: 45)
O Brasil, então com a chegada da família real, passaria a ser a sede do Império
português e para que isso realmente acontecesse, criou instituições que desse suporte
para o governo de D. João VI como o Banco do Brasil, melhorias no Rio de Janeiro e
também começa a realizar negócios com as “nações”, mais especificamente a
Inglaterra.
“O primeiro ato do regente, apenas de desembarcado no Brasil, foi justamente franquear
os seus portos ao comércio das ‘nações amigas’ , o que queria dizer — a Inglaterra.
Quanto ao Brasil, e é isto que aqui nos interessa, vaio a manobra inglesa alterar
profundamente suas condições políticas e sociais. A transferência da Corte
constituiu praticamente a realização da nossa Independência” (Idem, 1994: 46)
Esses primeiros atos iram mudar a história do Brasil, que depois com a revolução do
porto e tendo D. João VI tendo que voltar para Portugal, deixa seu filho e futuro
imperador do Brasil Pedro, o futuro D. Pedro I.
O governo de D. Pedro I será muito conturbado até que ele não agüentando a pressão
de ambas as partes do governo abdica do trono em favor de seu filho.
“Para fazer face a estes acontecimentos, na esperança de ainda resolver a crise com
um golpe de audácia, resolve D. Pedro chamar novamente os absolutistas, (…). Foi a
gota de água no copo transbordante da revolução. Dois dias depois assinava o
imperador sua abdicação, sob ameaça do povo e da tropa reunidos no Campo de
Santana.” (Idem,1994: 45)
Após sua abdicação o Brasil irá passar por uma face de regências. Esse período será
mais conturbado que o primeiro reinado de D. Pedro, vários levantes aconteceram nas
diversas partes do Brasil, não aceitando as más condições e o novo governo.
“Em 28 de agosto e 6 de novembro novos levantes se desencadeiam no Rio de Janeiro.
Não era melhor a situação nas províncias. No Pará, no Maranhão, na Paraíba e em
Pernambuco são depostas as autoridades.” (Idem, 1994: 69-70)
A revolta dos cabanos no Pará, a balaiada no Maranhão e a Revolução Praieira em
Pernambuco, têm as mesmas origens e causas “(…) a luta das classes médias,
especialmente urbana, contra as grandes propriedades rurais, senhores de engenho e
fazendeiros, que se implantara no país.” (Idem, 1994: 79)
O segundo reinado será longo e terá vários acontecimentos que iram mudar nossa
condição de trabalho escravo e também a nossa nova riqueza, que será o café. Todas
essas mudanças serão influenciadas por momentos de transição no campo mundial.
O fim do trabalho escravo será de fundamental importância para Caio Prado Jr:
“Abre-se a segunda metade do século passado [XIX] com um fato que se pode
considerar o ponto de partida de toda nossa evolução posterior: é a abolição do tráfico
de escravos em 1850. Nenhum outro acontecimento da nossa história teve talvez
repercussão tão profunda. Por suas conseqüências, mediatas ou imediatas, ele se fez
sentir até os últimos anos do Império.” (PRADO JR., 1994: 90)
O café será no final do império nossa maior riqueza e utilizará mão-de-obra
assalariada.

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