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50 anos
de Geologia
50
50 anos
de Geologia
Instituto
de Geociências
Contribuições
Editores
Roberto Iannuzzi
José Carlos Frantz
Patrocínio
VICE-REITOR
Pedro Cezar Dutra Fonseca
INSTITUTO DE GEOCIÊNCIAS
DIRETOR
José Carlos Frantz
VICE-DIRETOR
André Sampaio Mexias
VICE-DIRETOR
Paulo Alves de Souza
ISBN
CDU 55(81)
Catalogação na Publicação
Biblioteca Geociências - UFRGS
Renata Cristina Grun CRB 10/1113
S SUMÁRIO
PREFÁCIO | 09
6
50 50 anos de Geologia
Sistema Lagunar: Síntese dos Conhecimentos sobre a Lagoa dos Patos ........ 317
Ricardo Baitelli, Iran Carlos Stalliviere Corrêa, Elirio Ernestino Toldo Júnior,
Luiz Roberto Silva Martins, Jair Weschenfelder, Ricardo Norberto Ayup-Zouain
7
P PREFÁCIO
10
5050 anos de Geologia
11
Histórico
I
Instituto
de Geociências
O O Curso de Geologia
da Universidade do Rio Grande do Sul:
A Estirpe de Pesquisa
José Carlos Frantz
Roberto Iannuzzi
...”a Universidade do Rio Grande do Sul, fiel às suas altas e nobres finalida-
des, está vivamente empenhada na realização e patrocínio desse grande e
patriótico empreendimento que, caso se concretize, marcará mais um mar-
co no progresso do País.”...
P Professor Emérito
Irajá Damiani Pinto
Irajá Damiani Pinto nasceu em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, em 03.07.1919.
Bacharel (1944) e Licenciado (1945) em História Natural pela Faculdade de Filosofia da,
então, Universidade de Porto Alegre, e Doutor em Geologia pela Universidade de São Paulo
(1973). Foi professor do Colégio Estadual Julio de Castilhos e do Instituto Porto Alegre
(IPA). Professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS) (1948-
1951). Fundador, organizador e diretor do Instituto de Ciências Naturais (ICN) (1953-1957).
Bolsista da Rockefeller Foundation (1956) para estudo de ostracodes, nas universidades nor-
te-americanas de Louisiana, Kansas, Michigan e no American Museum of Natural History.
Organizador e coordenador do 1º Curso para a Formação de Geólogos de Petróleo, da
PETROBRAS (1957), na Universidade da Bahia, em Salvador. Organizador e diretor da Es-
cola de Geologia (1957-1969). Bolsista do British Council (1959) para intercâmbio nas univer-
sidades de Sheffield, London e Glasgow. Bolsista da Agency for International Development
(AID) (1964), para conhecimento de cursos de pós-graduação em Geologia, em 27 universi-
dades norte-americanas. Bolsista da Cooperation Technique Française (1969), em Paris, no
Conseil National de la Recherche Scientifique (CNRS), e em Pau, na Compagnie du Pétrole
d’Aquitaine. Estágio a convite da Academia de Ciências da União Soviética em Moscou e
Leningrado (1969). Fundador e diretor do Centro de Investigação do Gondwana (CIGO)
(1965-1968). Professor Benemérito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUCRS) (1973). Membro Titular da Academia Brasileira de Ciências (desde 1979). Com
mais de 100 trabalhos publicados no campo das Biociências e Geociências, foi orientador de
mestrados e doutorados no Curso de Pós-Graduação em Geociências da UFRGS, do qual foi
fundador, em 1968, e coordenador (1968-1970). Diretor-presidente da Fundação de Amparo
à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS), nos períodos 1974-1977, 1977-
1980 e 1980-1983. Presidente da Sociedade Brasileira de Geologia, nos períodos 1967-1969 e
1977-1979. Fundador, organizador e diretor do Centro de Estudos Costeiros, Limnológicos e
Marinhos (CECLIMAR) (1978-1989). Agraciado com altas distinções pela sua atividade na
pesquisa, no ensino e na administração, tais como, Medalha de Ouro José Bonifácio de Andrada
e Silva, pela Sociedade Brasileira de Geologia (1973), Medalha de Ouro Llewelyn Ivor Price,
pela Sociedade Brasileira de Paleontologia (1987), Medalha de Ouro Sylvio Torres, pela Fun-
dação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul (1987). Título de sócio hono-
rário pela International Paleoentomological Society, recebido no 3º Paleoentomological
Congress, em Pretória, África do Sul (2005). Homenageado por pesquisadores do Brasil e do
Exterior com novos gêneros e novas espécies, tanto de formas atuais como fósseis, de
ostracodes, micrósporos, insetos, malacostráceos, conchostráceos, peixe e répteis. Bolsista do
CNPq até 2006, tendo sido, também, presidente de Comissão Técnica em Geociências. Pro-
fessor Emérito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (1990). Membro Grã-Cruz da
Ordem Nacional do Mérito Científico (1998). Pesquisador Emérito do CNPq (2005).
21
Instituto de Geociências. Contribuições
P Professor Emérito
Milton Luiz Laquintinie Formoso
Milton Luiz Laquintinie Formoso nasceu em Pelotas, Rio Grande do Sul. Gradua-
do em Química (1950) pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), onde
ingressou como professor a partir de 1952. Professor do curso de Geologia da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul desde o seu início, em 1957, tornando-se Professor Titular em
1968. Fez Aperfeiçoamento em Laboratório de Espectroquímica (1950) e de Difração de
Raios X (1951, 1956), no Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), e em La-
boratório de Geoquímica (1956), no Instituto de Tecnologia Industrial, ITI. Bolsista do Pon-
to IV International Cooperation Administration (1959-1960), ICA, Estados Unidos, para
Especialização em Geoquímica, United States Geological Survey, Aperfeiçoamento em Geo-
logia e Geoquímica, na Havard University, Aperfeiçoamento em Geologia e Geoquímica, na
Pennstate University, e Aperfeiçoamento em Geologia e Geoquímica, na University of Illinois.
Fez Aperfeiçoamento na França (1967), em Mineralogia de Argilas, na Université de Strasbourg
I, em Geoquímica, no Centre de Recherches Petrographiques et Geochimiques (CRPG), e
em Mineralogia das Argilas e Minerais de Opacas, no Muséum National d´Histoire Naturelle
de Paris (MNHN). Doutor em Geologia pela Universidade de São Paulo (1973). Diretor por
três gestões (1990-1992, 1992-1994, 1994-1996) do Centro de Estudos em Petrologia e
Geoquímica (CPGq). Diretor (1981-1984) do Instituto de Geociências da UFRGS. Chefe
(1971-1972, 1972-1973) do Departamento de Geologia do instituto de Geociências da UFRGS.
Fundador (1968) do Curso de Pós-Graduação em Geociências da UFRGS, no qual orientou
vários mestrados e doutorados. Membro do Conselho de Planejamento da Fundação de
Ciência e Tecnologia do Rio Grande do Sul (1991-1993). Coordenador do Projeto CAPES/
COFECUB (108/90, 185/96 e 349/01), entre 1990 e 2004. Diretor científico interino e
Coordenador de Ciências da Terra da FAPERGS. Coordenador do Projeto FAPERGS/
PRONEX 0408253 (2005-2007). Presidente da Sociedade Brasileira de Geoquímica (1993-
1995). Membro da Association Internationale pour l’Etude des Argiles (AIPEA) desde 1978;
membro do Nomenclature Committee e da International Association of Geochemistry and
Cosmochemistry. Membro dos Comitês Assessores do CNPq e do PADCT, e Comissões de
Avaliação da CAPES. Membro Titular da Academia Brasileira de Ciências, desde 1992. Publi-
cou mais de 100 títulos, entre livros, capítulos de livros, artigos completos e resumos expan-
didos. Foi agraciado com altas distinções pelas suas atividades de pesquisa, ensino e na admi-
nistração, tais como, Mérito como Pesquisador, Governo do Estado do Rio Grande do Sul
(1982), Homenagem-Mérito Geoquímico, pela Sociedade Brasileira de Geoquímica (1997),
Comendador da Ordem do Mérito Científico, pela Presidência da República (2002), Doutor
Honoris Causa da Universidade de Poitiers, França (2005). Professor Emérito da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul (1998). Membro Grã-Cruz da Ordem Nacional do Mérito
Científico (2005). Pesquisador Produtividade em Pesquisa 1A do CNPq.
22
50 50 anos de Geologia
P Professor Emérito
Luiz Roberto Silva Martins
Luiz Roberto Silva Martins nasceu em Rio Grande, Rio Grande do Sul. Gradua-
do em História Natural (1956) pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
(PUCRS), onde foi professor do curso de História Natural (1957). Professor da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul desde 1958, onde se tornou Professor Titular em 1965. Fez
especialização em Geologia Marinha (1964) na Florida State University, Tallahassee, e em
Sedimentação (1965) no United States Geological Survey, em Denver. Doutor em Ciências
(1976) e Livre Docente em Sedimentologia (1976) pela Universidade Federal do Rio Grande
do Sul. Pós-doutorado (1982) em Geologia Marinha pelo Instituto de Tecnológico de Buenos
Aires (ITBA). Fundador (1969) e diretor do Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceâni-
ca (CECO). Fundador (1968) e coordenador (1971-1972) do Curso de Pós-Graduação em
Geociências da UFRGS, no qual orientou mestrados e doutorados. Fundador (1969) e coor-
denador científico (1969-1979) do Programa de Geologia e Geofísica Marinha (PGGM).
Coordenador Técnico do CNPq no Projeto REMAC (1972-1978). Membro Titular do Scientific
Advisory Board (SAB) da COI/UNESCO (1978-1979). Membro da Comissão Nacional de
Oceanografia (1970-1975) e do Comitê Assessor de Oceanografia do CNPq (1976-1979, 1993-
1995, 2004-2007). Membro do Consultive Panel on coastal Systems da UNESCO (1974-
1984). Especialista em Ciências do Mar do Escritório Regional da UNESCO em Ciência e
Tecnologia para a América Latina e Caribe (ROSTLAC) (1982-1983). Coordenador do 1º
Curso de especialização sobre Administração e Planejamento de Recursos do Mar (1984).
Coordenador de projetos da OEA no Atlântico Sudoeste sobre Geologia do Quaternário
(1984-1988), Recursos Minerais (1997-1998) e Erosão Costeira (1998-2000). Consultor da
Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais (CPRM) (1997-1999). Membro do Grupo de
Coordenação e Coordenador Regional para o Atlântico Sudoeste do Programme on Ocean
Science in relation to Non-Living Resources (OSNLR/IOC/UNESCO) (1985-2002). Mem-
bro da Comissão de Ciências do Mar do MCT (desde 1992). Perito em Assuntos de Ciências
do Mar junto a Comissão das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (CNUDM), indicado
pelo MCT. Participante do programa Cátedras (UNITWIN) da UNESCO. Representante do
Brasil no Scientific Committee on Oceanic Research (SCOR) (1976-2002). Publicou mais de
200 títulos, entre livros, capítulos de livros, artigos completos e resumos expandidos. Foi
agraciado com diversas distinções pelas suas atividades de pesquisa, ensino e extensão, tais
como, Medalha Centenário da Diretoria de Hidrografia e Navegação (DHN) (1976), Medalha
30 anos do CNPq (1981), Professor Honoris Causa da Universidade Federal do Maranhão
(1988), Pesquisador Emérito pela Society for Sedimentary Geology, dos Estados Unidos (2005).
Professor Emérito da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (2006). Pesquisador Pro-
dutividade em Pesquisa 1A do CNPq.
23
Departamento de Geodésia, Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
P PRIMEIRO ENCONTRO
DE GEÓLOGOS
Clóvis Carlos Carraro, Yvonne Terezinha Sanguinetti,
Nilo Clemente Eick, Heinz Peter Linsdstaedt
INTRODUÇÃO
Em 1966, o então Diretor da Escola de Geologia, Prof. Irajá Damiani Pinto,
convocava a comunidade de geologia para, sob os auspícios do Conselho Nacional de Pesqui-
sas (CNPq), participar do Primeiro Encontro de Geólogos a realizar-se na Universidade Fe-
deral do Rio Grande do Sul (UFRGS) de 21 a 26 de março. A Comissão Organizadora é
composta por Bernardo Geisel – Presidente, Rui Ribeiro Franco – Vice-Presidente, Irajá
Damiani Pinto – Secretário Geral, Milton Luís Laquintinie Formoso – Tesoureiro, e Luciano
Jacques de Moraes – Assessor Geral; além de Adolpho Kurth Hanke, Arthur Wents Scheider,
José Rafael Azambuja Jr., Mariano Sena Sobrinho, Nilo Clemente Eick e Roberto Silva Issler
- Assessoria Local. No temário constavam quatro itens a serem apresentados e discutidos: I –
Investigação sobre o Gondwana, II – A situação atual do ensino de Geologia no Brasil, III –
Criação de Centros de Estudos Geológicos, IV – Gênese e reservas dos depósitos de rochas
carbonatadas, de cobre, de estanho e de argilas do Estado do Rio Grande do Sul.
Abriu a sessão o então Magnífico Reitor da UFRGS, José Carlos Fonseca Milano,
dando a palavra ao Senhor Governador em Exercício do Estado do Rio Grande do Sul,
Alfredo Hoffmeister, ao Presidente do CNPq, Antônio Moreira Couceiro, e ao representante
do U.S. Geological Survey, bem como das entidades estrangeiras presentes, William D. Johnston.
No encerramento da sessão, assim pronunciou-se o Magnífico Reitor:
Instituto de Geociências. Contribuições
“De modo que eu desejo [...] manifestar meu aplauso à atividade da jovem
Escola de Geologia que surgiu de um esforço, em muito boa hora realizada
pela CAGE, com a modéstia de um curso inicial e que hoje é uma Escola
entre as que mais orgulham esta Universidade”.
“Embora criado dentro da UFRGS, pensamos nós, este deva ter um Con-
selho Consultivo formado não só por pesquisadores da Universidade, mas
também, por pesquisadores representantes das organizações que auxilia-
rão no financiamento e no desenvolvimento das pesquisas, como CNPq e
UNESCO. Terá ainda um Conselho Deliberativo, formado pelos pesquisa-
dores do Centro e pelo corpo de pesquisadores associados. Haverá Direto-
ria Executiva, Secretaria de Administração e Secretaria de Finanças. Pensa-
se que o Centro deva ter Museu da Paleontologia e Museu de Mineralogia
e Petrologia. Uma das partes mais fortes será a Divisão de Documentação,
com biblioteca, serviço de informação e arquivo de testemunhos e de son-
dagens com serviço de informações, secção de intercâmbio, secção de
bibliofoto e tradução Em síntese, o que pretendemos fazer é o que está
26 Clóvis Carlos Carraro, Yvone Terezinha Sanguinetti, Nilo Clemente Eick, Heinz Peter Linsdstaedt
50 50 anos de Geologia
28 Clóvis Carlos Carraro, Yvone Terezinha Sanguinetti, Nilo Clemente Eick, Heinz Peter Linsdstaedt
50 50 anos de Geologia
ENTIDADES PAR
NTIDADES TICIP
ARTICIPANTES NO EVENTO
TICIPANTES
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFIC
BIBLIOGRÁFICAA
30 Clóvis Carlos Carraro, Yvone Terezinha Sanguinetti, Nilo Clemente Eick, Heinz Peter Linsdstaedt
50 50 anos de Geologia
Figura 1
1. Antônio Moreira Couceiro, Presidente do CNPq, na abertura do Primeiro Encontro de Geólogos. Na
esquerda, Irmão José Otão, Reitor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul / PUC-RS.
Figura 2
2. Fernando Flávio Marques de Almeita [USP] e Eller Reinhard.
Figura 3
3. Antônio Moreira Couceiro [Presidente do CNPq], Irajá Damiani Pinto [Secretário Geral], Bernardo
Geisel [Presidente da Comissão] e Viktor Leinz [FFCL/USP].
Figura 4
4. Lourenço Bergstrom [CNPq], Irajá Damiani Pinto [UFRGS] e Wilhelm Kegel [Escola de Geologia/UFRJ].
32 Clóvis Carlos Carraro, Yvone Terezinha Sanguinetti, Nilo Clemente Eick, Heinz Peter Linsdstaedt
50
50 anos de Geologia
Figura 5
5. Elias Dolianiti [DNPM].
Figura 6
6. Platéia do Primeiro Encontro de Geólogos.
Figura 7.
7 Elias Dolianiti [DNPM], Llewelyn Ivor Price [DNPM] e Fernando Flávio Marques de Almeida [USP].
Figura 8.
8 Elias Dollianiti [DNPM], Eros Farias Gavronski [Escola de Geologia/UFRGS], Maurício Ribeiro
[Escola de Geologia/UFRGS] e Rui Ítalo Tessari [Escola de Geologia/UFRGS].
34 Clóvis Carlos Carraro, Yvone Terezinha Sanguinetti, Nilo Clemente Eick, Heinz Peter Linsdstaedt
50 50 anos de Geologia
Figura 9
9. Maurício Ribeiro [Escola de Geologia/UFRGS], Adolpho Kurth Hanke [Escola de Geologia/UFRGS],
Robert Reeves [NASA/USA] e Flávio Koff Coulon [Escola de Geologia/UFRGS].
Figura 10
10. Llewelyn Price [DNPM] e Othon Henry Leonardos [Escola de Geologia/UFRJ].
Figura 11
11. Josué Camargo Mendes [USP], Lourenço Bergstrom [UFRJ]
e Irajá Damiani Pinto [Escola de Geologia/UFRGS].
Figura 12.
12 Boris Alpern [Centre d’Etudes et Recherches des Charbonnages de France/
CERCHAR/França] e Benour Carneiro Bittencourt [Escola de Geologia/UFRGS].
36 Clóvis Carlos Carraro, Yvone Terezinha Sanguinetti, Nilo Clemente Eick, Heinz Peter Linsdstaedt
50 50 anos de Geologia
Figura 13.
13 Adolpho Kurth Hanke [Escola de Geologia/UFRGS], William Jonston Jr. [EUA]
e Paulo Miranda de Figueiredo Filho [Escola de Geologia/UFRGS].
Figura 14
14. Adolpho Kurth Hanke [Escola de Geologia/UFRGS] e Reinhard Maak [Instituto de Biologia
e Pesquisas Tecnológicas/UFPR].
Figura 15
15. Luciano Jacques de Morais [CNPq], Othon Henry Leonardos [Coordenador da Escola de Geologia/
UFRJ] e Fernando Flávio Marques de Almeida [USP].
Figura 16
16. Platéia do Primeiro Encontro de Geólogos.
Figura 17
17. Platéia do Primeiro Encontro de Geólogos.
Figura 18
18. Platéia do Primeiro Encontro de Geólogos.
I
Instituto
de Geociências
Centro de Estudos em Petrologia e Geoquímica, Instituto de Geociências,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
L Lamprófiros Espessartíticos
da Associação Shoshonítica
de Lavras do Sul-RS:
Litoquímica e Química Mineral
Evandro Fernandes de Lima, Lauro Valentim Stoll Nardi,
Carlos Augusto Sommer
1. IINTRODUÇÃO
NTRODUÇÃO
44 Evandro Fernandes de Lima, Lauro Valentim Stoll Nardi, Carlos Augusto Sommer
50 50 anos de Geologia
Figura 1
1. Mapa Geológico da região de Lavras do Sul, RS.
Figura 22. Características microscópicas dos lamprófiros espessartíticos: a) textura glomeroporfirítica constituída por anfibólio
(LN); b) agrupamentos de anfibólio, sugerindo acumulações localizadas (LP); fenocristal de anfibólio com zonação composicional
(LP); d) detalhe de anel de anfibólio envolvendo clinopiroxênio, definindo uma textura coronítica (LN).
definidas por Rock (1991) como lamprófiros 0,04% a 0,11% e mostram, em relação ao
cálcico-alcalinos ou shoshoníticos. SiO2, um comportamento semelhante ao do
A Figura 3 expressa a relação entre os FeO*. O CaO varia entre 5,20% e 0,90%, e
elementos maiores e menores com o índice decresce de forma, aproximadamente, regu-
de diferenciação. Nesta constata-se o cres- lar com o aumento de SiO2. Este fato, alia-
cimento dos conteúdos de Al2O3 com o au- do ao comportamento do MgO e FeO com
mento do índice de diferenciação, sugerin- o aumento da diferenciação, se
do o fracionamento predominante de fases desconsiderados os efeitos do
pouco aluminosas com pequena participa- hidrotermalismo, indica o fracionamento de
ção de feldspatos. A relação FeO* versus SiO2 fases cálcio-ferromagnesianas na evolução
mostra forte dispersão dos dados, muito dos lamprófiros. A relação entre Na2O e
embora o conteúdo absoluto de ferro SiO2 é de caráter simpatético e os teores de
decresça com o aumento da diferenciação. Na2O crescem de 4,09% até 6,10%, com a
Os teores de MgO variam de 6,50% a 0,40%, diferenciação dos espessartitos. Os teores
e decrescem, regularmente, com o aumento de K2O variam de 2,15% até 4,70% e se dis-
de SiO2. A relação antipatética entre MgO e tribuem em relação a SiO2 de maneira se-
SiO2 pode ser atribuída à separação de fases melhante àquela do Na2O. A razão K2O/
ricas em magnésio, como clinopiroxênio e Na2O varia de 0,51 até 1,02 e cresce com
anfibólio. Os teores de MnO variam de a diferenciação, o que é coerente com a
46 Evandro Fernandes de Lima, Lauro Valentim Stoll Nardi, Carlos Augusto Sommer
50 50 anos de Geologia
Tabela 1.
1 Teores para os elementos maiores e menores (% em peso), traços e ETR (ppm) para os lamprófiros espessartíticos da
ASLS. Na parte inferior são apresentados os minerais normativos (CIPW) destas litologias.
Tabela 1
1. Continuação
48 Evandro Fernandes de Lima, Lauro Valentim Stoll Nardi, Carlos Augusto Sommer
50 50 anos de Geologia
Figura 3
3. Diagrama de Harker ilustrando o padrão de distribuição geoquímico dos elementos maiores dos lamprófiros espessartíticos
de Lavras do Sul.
50 Evandro Fernandes de Lima, Lauro Valentim Stoll Nardi, Carlos Augusto Sommer
50 50 anos de Geologia
Figura 4.
4 Padrão de distribuição de ETR dos lamprófiros espessartíticos de Lavras do Sul, normalizados pelo padrão condrítico de
Haskin et al. (1968).
- não detectado
* norma CIPW= 9,19% nefelina normativa
Tabela 2
2. Composição química e fórmula estrutural (23 oxigênios) dos anfibólios das rochas da ASLS. Abaixo segue a classificação
dos anfibólios, segundo Leake et al. (1997).
espessartíticos de Lavras do Sul com os iii) os teores de Al2O3 e CaO são mais
vulcanitos shoshoníticos ricos em baixos nas rochas espessartíticas que nas
fenocristais de plagioclásio da mesma região, vulcânicas shoshoníticas típicas;
definidos no diagrama TAS, pode-se esta- iv) os conteúdos de FeO* são seme-
belecer as seguintes comparações entre es- lhantes para ambos os grupos;
tes dois grupos de rochas: v) os teores de MgO, Na2O e K2O são
i) ambos possuem teores de SiO2 ca- ligeiramente superiores nos espessartitos;
racterísticos de rochas intermediárias; vi) os teores de Rb, Ba e Y são simila-
ii) os dois grupos têm baixos conteú- res para os shoshonitos e lamprófiros
dos de TiO2 e P2O5;
52 Evandro Fernandes de Lima, Lauro Valentim Stoll Nardi, Carlos Augusto Sommer
50 50 anos de Geologia
- não detectado
* análise utilizada no modelamento magmático
Tabela 3
3. Composição química e fórmula estrutural (6 oxigênios) dos clinopiroxênios dos lamprófiros espessartíticos da ASLS.
Legenda: F = fenocristal; MF = microfenocristal; b = borda de fenocristal; c = centro de fenocristal.
Diversos autores (Cogné, 1962; Rock, de ouro e sulfetos, conforme discutidas por
1984, 1991) argumentam a favor da conta- diferentes autores. Muller & Groves (1997)
minação crustal para a geração dos consideram que a intrusão de magmas
lamprófiros cálcico-alcalinos ou lamprofíricos na crosta pode promover a
shoshoníticos, a partir de dados isotópicos circulação hidrotermal e gerar rochas ígneas
(eNd variável, baixa razão Pb206/Pb204) alia- félsicas que estão, normalmente, associadas
dos à presença comum de xenólitos de ro- com os depósitos de ouro. Rock (1991) ad-
chas graníticas. Uma investigação sobre a mite que cristalização de lamprófiros pode
origem de lamprófiros shoshoníticos gerar, ao final, fluídos ricos em S e CO2,
arqueanos de Abitibi, realizada por Wyman semelhantes a aqueles responsáveis pela gê-
& Kerrich (1988, 1993), demonstra que o nese dos depósitos de ouro mesotermais.
enriquecimento de Ba, Rb e K, nestas ro- A importância econômica destes ter-
chas, está relacionado ao metassomatismo renos é bem ilustrada no trabalho de
mantélico, enquanto que o conteúdo baixo Heithersay & Walshe (1995) e Nardi & Lima
de Sr, que determina as elevadas razões K/ (1988), onde estes autores discutem a estreita
Sr e Ba/Sr, é decorrente da contaminação vinculação dos sistemas tipo pórfiro ou Au
crustal. Foley (1992) argumenta que a ori- epiter mal com complexos vulcânicos
gem dos lamprófiros ultrapotássicos shoshoníticos e rochas espessartíticas. Esta
(minetes) pode ser explicada pela fusão de relação deve-se a um grupo de fatores como
porções do manto enriquecidas em mine- (i) a elevada temperatura destes magmas, (ii)
rais hidratados. Esta hipótese foi adotada por a fonte dominantemente mantélica e (iii) a
Nardi et al. (2007) para explicar a origem dos expressiva participação de voláteis, registra-
minetes associados ao Maciço Sienítico da especialmente nos lamprófiros e nos ter-
Piquiri, aflorante na porção nordeste do mos mais diferenciados.
Escudo Sul-rio-grandense. De acordo com
estes autores, fusões de porções do manto Agradecimentos
constituídas por clinopiroxênio-flogopita-
Ao CNPq (304541/2003-6; 306616/
apatita-anfibólio-sulfetos±granada, sob
2006-8; 471584/2001-0, 500917/2004-3) e
pressões da ordem de 5 GPa e temperatu-
a FAPERGS (03/0686.2; 05/2176.0) pelo
ras acima de 10000C, geram magmas do tipo
apoio financeiro e CPGq-IG-UFRGS. Ao
minete. O caráter ultrapotássico vincula-se
Projeto Minerais Estratégicos PRONERX/
a abundância de flogopita na fonte, enquan-
FAPERGS/CNPq.
to o caráter potássico, ou mesmo sódico,
decorre do predomínio de anfibólio no man-
to. De acordo com esta hipótese, os
4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIC AS
BIBLIOGRÁFICAS
espessartitos da Associação Shoshonítica de
Lavras do Sul podem ter como origem a
fusão de fontes similares às dos magmas
Allan, J.F. & Carmichael, I.S.E. 1984.
shoshoníticos, porém mais enriquecidas em Lamprophyric Lavas in the Colima Graben, SW,
anfibólios, conforme o modelo de manto México. Contributions to Mineralogy and
venulado proposto por Foley (1992). Petrology, 88:203-216,
Do ponto de vista econômico, desta-
cam-se as relações genéticas entre os Boff, F.E. & Ferron, F.A.1996. Mapeamento
lamprófiros shoshoníticos e mineralizações Geológico 1:25.000 das folhas Lagoa da Meia
Lua, Rufino Farias e Vila Nova - Geologia
54 Evandro Fernandes de Lima, Lauro Valentim Stoll Nardi, Carlos Augusto Sommer
50 50 anos de Geologia
da Faixa VIII. Porto Alegre. 116p. Dissertação Heithersay, P.S. & Walshe, J.L., 1995. Edeavour
de Mestrado em Geociências, Instituto de 26 North: A Porphyry Copper-gold deposit in
Geociências, Universidade Federal do Rio the Late Ordovician, Shoshonitic Goonumbla
Grande do Sul. Volcanic Complex, New Soult Wales, Australia.
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56 Evandro Fernandes de Lima, Lauro Valentim Stoll Nardi, Carlos Augusto Sommer
50 50 anos de Geologia
1. INTRODUÇÃO
entre magmas máficos de origem mantélica dos com associações de rochas que marcam
e materiais crustais (England & Thompson, a evolução de uma zona de convergência de
1986; Sylvester, 1989; Patiño-Douce, 1995; placas durante o Neoproterozóico. O limite
Liégeois, 1998; Liégeois et al., 1998, entre entre estas unidades é definido por zonas
outros). Esta interação ocorre em um am- de cisalhamento dúcteis em escala continen-
biente associado com o desenvolvimento de tal, as quais foram responsáveis pela
grandes descontinuidades crustais, como as segmentação das unidades pré-cambrianas
zonas de cisalhamento profundas que atin- e por sua configuração como faixas
gem o manto sublitosférico. Estas estrutu- alongadas, segundo a direção NE-SW, que
ras permitem a ascensão de magmatismo de passaram a constituir os Cinturões Vila
caráter variado, dominado pela série cálcico- Nova, Tijucas e Dom Feliciano (Figura 1).
alcalina alto-K, com ocorrência subordina- As associações pré-colisionais ocor-
da de magmas shoshoníticos, alcalinos, rem no Cinturão Vila Nova e estão caracte-
peralcalinos e toleíticos. rizadas por associações metavulcano-
Volumes abundantes de magmatismo sedimentares e metaplutônicas de compo-
cálcico-alcalino alto-K têm sido descritos, sição cálcico-alcalina baixo a médio K, in-
principalmente, em ambientes orogênicos, tercaladas tectonicamente com complexos
com evolução e posicionamento relaciona- máfico-ultramáficos que representam asso-
dos ao período pós-colisional (Leat et al., ciações ofiolíticas. Estas unidades evoluíram
1986; Whalen & Currie, 1987; Liégeois, entre 870-680 Ma e possuem características
1998; Bonin et al., 1998; Hadj-Kaddour et isotópicas de magmas juvenis de origem
al., 1998; Waigth et al., 1998). Este mantélica (Babinski et al., 1997; Leite et al.,
magmatismo é predominante na maioria dos 1998; Chemale Jr., 2000; Hartmann et al.,
cinturões orogênicos e apresenta uma evo- 2000; Philipp et al., 2007; Hartmann et al.,
lução final com características shoshoníticas 2007).
e alcalinas-peralcalinas. A natureza e as cau- As associações sin- e pós-colisionais
sas desta transição foram estudadas no estão restritas ao Cinturão Dom Feliciano,
Batólito Pelotas com base em 120 análises cuja porção central é constituída pelo
químicas para elementos maiores, menores Batólito Pelotas. O Cinturão Dom Feliciano
e traços, e em estudos isotópicos a partir de faz contato tectônico ao oeste com o
48 determinações dos sistemas Rb-Sr e Sm- Cinturão Tijucas e, a leste, está coberto pe-
Nd e de datação geocronológica pelos mé- los sedimentos da Planície Costeira (Figura
todos Ar-Ar, Pb-Pb e U-Pb (Philipp, 1998; 1). O Batólito Pelotas é formado por um
Philipp et al., 2000, 2002, 2003, 2005). Este complexo granítico-gnáissico e sete suítes,
conjunto de dados cobre uma ampla varie- seis graníticas e uma sienítica. Possui cerca
dade de magmas, desde suítes relacionadas de 370 km de extensão e 80 a 120 km de
a um evento de colisão até o magmatismo largura. Mais de 130 corpos estão expostos
do tipo intra-placa, passando por grandes nesta unidade que ocupa uma área aproxi-
volumes de magmas cálcico-alcalinos alto- mada de 37.000 km2.
K. Os granitos sin-colisionais ocorrem
O Escudo Sul-rio-grandense é cons- na porção noroeste do batólito e estão re-
tituído por terrenos metamórficos de mé- presentados por granítóides de afinidade
dio a alto grau que constituem as áreas de cálcico-alcalina alto-K, fracamente
embasamento Paleoproterozóico, intercala- peraluminosos a peraluminosos, com
principal período de geração entre 650 e 620 te restrito, variando essencialmente entre 625
Ma (Frantz et al., 2003). O batólito está cons- e 590 Ma. Um último período de atividade
tituído dominantemente por suítes graníticas magmática, entre 570 e 550 Ma, é registra-
de natureza pós-colisional, com ocorrência do através dos enxames de diques.
subordinada de uma associação vulcano- Apesar da presença comum de rochas
sedimentar, preservada essencialmente atra- dioríticas e da ocorrência de mistura homo-
vés de enxames de diques ácidos e básicos. gênea e heterogênea de magmas, os isótopos
Estas unidades graníticas foram desenvol- de Sr e Nd caracterizam-se por elevadas ra-
vidas num intervalo de tempo relativamen- zões iniciais de Sr87/Sr86 e valores de epsilon
Nd negativos (Philipp et al., 2003).
Figura 11. Localização do Cinturão Dom Feliciano e do Batólito Pelotas no contexto geotectônico do sul do Brasil e Uruguai: a)
Terreno Luis Alves; b) Terreno Florida, 1- Terreno Taquarembó, 2- Terreno Rivera, 3- Terreno Valentines (Modificado de Chemale
Jr., 2000).
2. C ARACTERÍSTIC
CARACTERÍSTIC AS LITOLÓGIC
ARACTERÍSTICAS AS E
LITOLÓGICAS evento de colisão entre os crátons Rio de
PERÍODOS DE POSICIONAMENTO D AS
DAS La Plata e Kalahari. Philipp et al. (2000, 2002,
SUÍTES GRANÍTIC AS
GRANÍTICAS 2005) ressaltam, através de dados estrutu-
rais, geoquímicos e geocronológicos, que o
magmatismo do Batólito é essencialmente
Grandes volumes de rochas graníticas de natureza pós-colisional. A continuidade
de idades neoproterozóica a cambriana fo- do Cinturão Dom Feliciano e deste
ram gerados na porção leste do escudo du- magmatismo para Santa Catarina já havia
rante a for mação do Cinturão Dom sido descrita por Bitencourt & Nardi (1993),
Feliciano. Fragoso-Cesar (1991), Fernandes bem como a correlação com o Rio Grande
et al. (1992), Philipp (1998), Chemale Jr. do Sul por Bitencourt & Nardi (2000).
(2000) atribuem a formação do Cinturão Este período colisional foi acompa-
Dom Feliciano a acresção de um arco de nhado pela ascensão e posicionamento de
margem continental ativa, seguido de um grandes volumes de magmas graníticos. Os
Figura 2
2. Mapa geológico do Batólito Pelotas, apresentando as principais unidades graníticas e zonas de cisalhamento dúcteis
transcorrentes.
por Philipp (1998) em micas de rochas apresentam idades, pelo método U-Pb e Pb-
miloníticas, apontam idades em torno de 540 Pb em zircão, entre 630 e 620 Ma (Babinski
Ma para este último e importante período et al., 1997; Philipp et al., 2002). Na porção
de atividade das zonas de cisalhamento. A sul do batólito, as rochas graníticas da Suíte
evolução estrutural determinada para esta Erval apresentam uma composição homo-
região é compatível com um modelo gênea, com biotita monzogranitos a
tectônico transpressivo relacionado à con- sienogranitos de afinidade cálcio-alcalina
vergência oblíqua de placas tectônicas. alto-K. Esta suíte está composta por cor-
No limite oeste do batólito, o Grani- pos graníticos que ainda não foram geolo-
to Quitéria e os plútons tipo-S da Suíte Cor- gicamente individualizados.
dilheira mostram forma alongada segundo As rochas graníticas da Suíte Viamão
a direção N30-40oE e posicionamento rela- ocorrem em várias áreas do batólito e estão
cionado ao desenvolvimento da Zona de caracterizadas por corpos de formas
Cisalhamento Dorsal de Canguçu. O Gra- alongadas, segundo a direção N40-60oE,
nito Quitéria apresenta composição comumente com foliação magmática con-
monzogranítica, caráter porfirítico definido cordante e zonas de alta deformação nas
por elevada concentração de megacristais de porções de bordo. Os biotita monzogranitos
K-feldspato e afinidade cálcico-alcalina alto- e granodioritos apresentam uma afinidade
K de caráter metaluminoso a fracamente cálcio-alcalina alto-K e uma típica textura
peraluminoso (Koester, 1995). A idade U- porfirítica marcada pelo elevado percentual
Pb SHRIMP de 658 ± 4 Ma caracteriza este de megacristais de K-feldspato envoltos por
granito como o mais antigo do Batólito matriz equigranular hipidiomórfica média a
Pelotas (Frantz et al., 2003). grossa. Estes granitos mostram estruturas
Os biotita-muscovita sieno a de mistura física (mingling) e química (mixing)
monzogranitos da Suíte Cordilheira apresen- com rochas máficas de composição diorítica
tam textura equigranular a heterogranular, a quartzo-diorítica. Os dados
composição cálcico-alcalina alto-K e cará- geocronológicos disponíveis apontam ida-
ter peraluminoso. Na região de Quitéria, os des U-Pb TIMS, em zircão, de 595 ± 1 Ma,
granitos da Suíte Cordilheira apresentaram para o Granito Arroio Moinho (Babinski et
idades U-Pb TIMS em cristais de zircão al., 1997), e de 630 ± 6 Ma, para o Granito
entre 634 e 625 ± 6 Ma, para os granitos Viamão (Philipp et al., 2007, dados inéditos).
Cordilheira e Francisquinho, e 605 ± 8 Ma, A Suíte Piquiri ocorre na região de
para o Granito Figueiras (Frantz et al., 2003). Encruzilhada do Sul e é constituída pelo
Estas idades indicam que o magmatismo Sienitos Piquiri e Arroio do Silva. Estas ro-
granítico da região de Quitéria representa o chas representam um evento magmático de
período inicial de construção do Batólito natureza alcalina potássica saturada com afi-
Pelotas. nidade shoshonítica. Os sienitos foram da-
O Complexo Pinheiro Machado tados pelo método Pb-Pb (TIMS, em zircão)
ocupa a porção central do batólito, sendo em 611 ± 3 Ma, para o Sienito Piquiri, e 612
constituído por biotita granodioritos a ± 3 Ma, para o Sienito Arroio do Silva
biotita monzogranitos, de afinidade cálcico- (Philipp et al., 2002).
alcalina alto-K, com ocorrência subordina- A Suíte Encruzilhada do Sul está lo-
da de tonalitos e dioritos (Philipp, 1998; calizada na porção noroeste do batólito, sen-
Philipp & Machado, 2005). Estas rochas do composta por biotita monzogranitos a
1. Continuação.
Tabela 1
Figura 3
3. Diagramas isotópicos para os granitóides do Cinturão Dom Feliciano (Batólito Pelotas), dos Cinturões Herciniano e
Caledoniano europeus e Himalaias chineses. Batólito Pelotas: May (1990), Philipp et al. (2003, 2007c); Cinturão Caledoniano:
Halliday (1984), Frost & O’ Nions (1985), Dempsey et al. (1990), Skjerlie (1992); Cinturão Herciniano: Downes & Duthout
(1988), Liew & Hoffman (1988), Liew et al. (1989), Pin & Duthout (1990), Williamson et al. (1992), Cocherie et al. (1994), Dias
& Leterrier (1994), Moreno-Ventas et al. (1995), Siebel et al. (1995), Azevedo & Nolan (1998), Forster et al. (1999); Cinturão
Himalaias: Vidal et al. (1984), Deniel et al. (1985), Inger & Harris (1993), Gazis et al. (1988), Harrison et al. (1999).
Figura 4
4. Diagrama isotópico para os granitóides do Cinturão Dom Feliciano (Batólito Pelotas) e do Cinturão Damara (Pan-
Africano). Batólito Pelotas: May (1990), Philipp et al. (2003, 2007c); Cinturão Damara: Dermott (1987), Dermott et al. (1996).
5. Diagrama de evolução do Epsilon Nd versus tempo, mostrando a distribuição dos campos das principais associações
Figura 5
petro-tectônicas do Escudo Sul-rio-grandense: Terreno neoproterozóico juvenil (Palma), Terreno neoproterozóico retrabalhado
(Porongos), Rochas granito-gnáissicas paleoproterozóicas juvenis de Santana da Boa Vista (Complexo Encantadas) e Rochas
granito-gnáissicas paleoproterozóicas retrabalhadas do Terreno Taquarembó (fusões crustais com fontes Arqueanas, simplificadas
de Chemale Jr. 2000). A) Diagrama Epsilon Nd versus tempo dos xenólitos e granitóides do Complexo Pinheiro Machado, B)
Diagrama Epsilon Nd versus tempo dos granitóides da Suíte Viamão, C) Diagrama Epsilon Nd versus tempo dos granitóides das
Suítes Dom Feliciano e Itapuã.
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O O Vulcanismo Neoproterozóico-Ordoviciano
no Escudo Sul-rio-grandense:
Os Ciclos Vulcânicos da Bacia do Camaquã
Evandro Fernandes de Lima, Carlos Augusto Sommer,
Lauro Valentim Stoll Nardi
1. INTRODUÇÃO
sucedem a seqüência shoshonítica; (iii) ro- estratigráficas. Com este quadro, Paim et al.
chas vulcânicas mais novas (Membro Ro- (2000) propõem que a sucessão completa
deio Velho, Ribeiro & Fantinel, 1978 ou da Bacia do Camaquã seja incluída no
Andesito Rodeio Velho, Paim et al., 2000), Alosupergrupo Camaquã, o qual pode ser
caracterizadas por depósitos efusivos de subdividido em cinco unidades principais,
composição básica-intermediária e afinida- limitadas entre si por discordâncias angula-
de moderadamente alcalina a toleítica alto- res regionais, individualizando os Alogrupos:
K. Maricá, Bom Jardim, Cerro do Bugio, Santa
Neste capítulo são discutidos dados Bárbara e Guaritas. Estas unidades, de acor-
petrográficos, geoquímicos e geocronológi- do com critérios litoestratigráficas propos-
cos dos ciclos vulcânicos Neoproterozóico- tos por Ribeiro & Fantinel (1978), são agru-
Ordovicianos da Bacia do Camaquã, com o padas no Grupo Bom Jardim, abrangendo
objetivo de apresentar uma síntese sobre a as formações Maricá, Vargas, Hilário e
evolução do vulcanismo pós-colisional do Acampamento Velho, e no Grupo Camaquã,
Escudo Sul-rio-grandense. constituído pelas formações Santa Bárbara
e Guaritas.
A seqüência sedimentar da Bacia do
2. A BACIA DO C AMAQUÃ E OS
CAMAQUÃ Camaquã é composta predominantemente
CICLOS VULCÂNICOS por siltitos, arenitos com um aumento na
NEOPROTEROZÓICOS- ORDOVICIANOS
NEOPROTEROZÓICOS-ORDOVICIANOS abundância de conglomerados e arenitos em
direção ao topo da seqüência. Representa
uma evolução de ambientes marinhos rasos
A Bacia do Camaquã pode ser inter- para continentais, onde dominam os am-
pretada como um locus deposicional, no qual bientes flúvio-lacustres e desérticos.
ocorreu a superposição de diversos tipos de O vulcanismo Neoproterozóico-
bacias que foram individualizadas em ter- Ordoviciano desempenha um papel impor-
mos tectônicos, ter mo-mecânicos e tante dentro da evolução da Bacia do
geocronológicos, apresentando registros Camaquã, na qual as características do
litológicos próprios e mecanismos de magmatismo mostram uma evolução de ter-
subsidência distintos (Paim et al., 2000). Em mos toleíticos e cálcico-alcalinos alto-K, para
termos de evolução geológica, esta bacia foi shoshonítico, até alcalino sódico, sendo a
caracterizada pela alternância de intervalos contribuição crustal representada por
onde dominaram eventos deposicionais, granitóides peraluminosos (Sommer et al.,
com o acúmulo de espessos pacotes 2006) (Figura 1).
sedimentares e vulcano-sedimentares e in- Wildner et al. (2002) organizaram os
tervalos dominantemente erosionais. Nas episódios vulcânicos da Bacia do Camaquã
fases de preenchimento, os episódios vul- em diferentes ciclos, estabelecidos em am-
cânicos dominaram, normalmente na base bientes continentais sob condições predo-
das unidades de maior hierarquia, seguidos minantemente subaéreas. Os ciclos vulcâ-
pela deposição de sedimentos predominan- nicos foram individualizados em: (i)
temente siliciclásticos. Este contexto dinâ- vulcanismos Maricá, Hilário e Acampamen-
mico, envolvendo eventos ígneos, to Velho, associados às formações ho-
sedimentares e deformacionais, gerou um mônimas; (ii) vulcanismo Rodeio Velho,
complexo padrão de preenchimento, repre- vinculado ao Membro Rodeio Velho da For-
sentado por uma série de unidades mação Guaritas (Figura 1). Ao contrário
80 Evandro Fernandes de Lima, Carlos Augusto Sommer, Lauro Valentim Stoll Nardi
50 50 anos de Geologia
Figura 1
1. Mapa geológico simplificado do Escudo Sul-rio-grandense, com a distribuição das principais ocorrências do vulcanismo
Neoproterozóico na Bacia do Camaquã (modificado de Paim et al., 2000; Wildner et al., 2002).
destas três últimas unidades, onde o volu- traquiandesitos (shoshonitos) que são espa-
me de rochas vulcânicas é expressivo, os cialmente e temporalmente associadas com
registros de vulcanismo na Formação Maricá termos hipabissais monzoníticos, quartzo-
são questionáveis e frequentemente contes- monzoníticos e lamprofíricos, além de ro-
tados (e.g. Lima, 2002). chas plutônicas epizonais graníticas e
Originalmente, a identificação da ati- leucodioritos cumuláticos (Lima & Nardi,
vidade vulcânica na Formação Maricá foi 1998), agrupadas na Associação
fundamentada na presença de fragmentos Shoshonítica de Lavras do Sul.
vulcânicos em camadas delgadas de conglo- As rochas básicas ocorrem, principal-
merados. Outras ocorrências do vulcanismo mente, nos níveis estratigráficos basais da
são controvertidas, como as descritas na re- unidade, como derrames ou pequenas
gião da Ramada, e representadas por níveis intrusões caracterizadas como olivina-
vulcânicos (lavas e rochas piroclásticas) in- basaltos porfiríticos com fenocristais de
tercalados com rochas sedimentares (San- olivina (Fo66-68), augita (Wo39-43; En44-49; Fs9-15),
tos et al., 1978; Borba et al., 2004; Borba et labradorita a andesina e ilmenita, imersos em
al., 2006). Matos et al. (2002) interpretaram uma matriz a base de andesina a oligoclásio,
os referidos níveis de lavas como riolitos apatita e vidro modificado. As rochas de
hipabissais relacionados à Formação Acam- composição intermediária são amplamente
pamento Velho, sendo os níveis piroclásticos dominantes na seqüência e representadas
considerados como porções auto-brechadas por andesitos com textura porfirítica a
destas intrusões. glomeroporfirítica, com fenocristais de
plagioclásio (labradorita-andesina) e,
2.1 Vulcanismo Hilário subordinadamente, augita (Wo38-43, En40-49,
Fs8-20), olivina (Fo62), Ti-magnetita e apatita,
O vulcanismo Hilário é caracterizado
normalmente arranjados em uma estrutura
por rochas vulcânicas e plutônicas associa-
de fluxo. A matriz é constituída por
das, intercaladas e gradualmente sucedidas
cristálitos e micrólitos de plagioclásio
por conglomerados ricos em clastos vulcâ-
(andesina-oligoclásio) e matéria originalmen-
nicos e por depósitos arenosos a pelíticos
te vítreo (Figura 2).
que, no seu conjunto, representam a For-
As rochas subvulcânicas são represen-
mação Hilário. Possui ampla distribuição na
tadas, principalmente, por monzonitos,
região de Lavras do Sul e mais restrita em
quartzo-monzonitos e, subordinadamente,
Caçapava do Sul, São Sepé, Vila Nova do
leucodioritos de origem cumulática. Ocor-
Sul e Dom Pedrito (Figura 1).
rem como pequenas intrusões ao redor do
As rochas desta unidade possuem afi-
Complexo Granítico de Lavras do Sul e exi-
nidade shoshonítica, apresentando uma
bem basicamente duas fácies: (i) uma
grande variação composicional desde ter-
porfirítica, com fenocristais de plagioclásio
mos básicos a ácidos, representados por
(oligoclásio-andesina), K-feldspato e
efusivas e, em parte, por hipabissais e
anfibólio (magnésio-hornblenda) e,
intrusivas de mesma afinidade geoquímica,
subordinadamente, biotita e Ti-magnetita,
permitindo considerá-las como um dos
envolvidos por uma matriz rica em
exemplos mais completos deste tipo de
feldspatos; (ii) uma equigranular, média a
magmatismo.
grossa, com mineralogia similar a da fácies
As rochas efusivas são representadas,
porfirítica. Lamprófiros espessartíticos são
principalmente, por traquibasaltos e
também comuns como rochas de origem
82 Evandro Fernandes de Lima, Carlos Augusto Sommer, Lauro Valentim Stoll Nardi
50 50 anos de Geologia
subvulcânica, as quais cortam toda a seqüên- tes subaquosos, abaixo do nível de atuação
cia vulcânica (Lima & Nardi, 1998). São ca- das ondas (Lima, 2002). Os dados sugerem
racterizados por textura porfirítica e um ambiente lacustre, com a rápida deposi-
panidiomórfica, com amplo predomínio de ção de piroclastos, com níveis que indicam
fenocristais de anfibólio (magnésio- baixo retrabalhamento dos fragmentos,
hastingsita a magnésio-hornblenda) e, como a preservação de anfibólios origina-
subordinadamente, piroxênio (augita à dos, provavelmente, a partir de uma fonte
diopsídio), envoltos por matriz constituída lamprofírica.
basicamente por plagioclásio (andesina à
albita) (Figura 2). 2.2 Vulcanismo Acampamento Velho
O vulcanismo Hilário também é ca-
O vulcanismo Acampamento Velho
racterizado pela presença subordinada de
sucede o magmatismo shoshonítico e cons-
depósitos vulcanoclásticos subaéreos, for-
titui uma seqüência bimodal, com grande
mados tanto em regime de queda, quanto
predomínio de vulcanitos ácidos, interpre-
em regime de fluxo. Os principais aspectos
tados como a porção extrusiva do volumo-
petrográficos das rochas tufáceas da região
so magmatismo alcalino sódico, saturado em
de Lavras do Sul, relacionadas a um regime
sílica, que é relacionado aos estágios pós-
de queda, como a presença de tufos finos a
colisionais do ciclo orogênico Brasiliano/
grossos intercalados com níveis ricos em
Pan-Africano no Escudo Sul-rio-grandense.
cristais (Figura 2) foram discutidos por Lima
Os termos intrusivos são representados por
& Nardi (1985). As rochas piroclásticas de
granitos alcalinos, dominantemente
fluxo na região de Lavras do Sul são repre-
metaluminosos, correlacionáveis a Suíte
sentadas por ignimbritos ricos em púmices
Intrusiva Saibro (Nardi & Bonin, 1991).
e cristaloclastos de plagioclásio, K-feldspato
O vulcanismo bimodal da Formação
e quartzo, envolvidos por uma matriz rica
Acampamento Velho reúne um grande vo-
em cinza. Outros depósitos vulcanoclásticos
lume de depósitos efusivos e piroclásticos
comuns dentro desta unidade são as brechas
de composição ácida, associados às lavas e
vulcânicas, que ocorrem predominantemen-
diques de composição básica. A organiza-
te intercaladas com os derrames
ção estratigráfica desta formação tem sido
traquiandesíticos, e os tufos de queda. Pos-
sugerida por diversos autores, como Wildner
suem um arcabouço constituído essencial-
et al. (1999), Sommer et al. (1999, 2005),
mente de blocos de traquiandesitos e raros
Almeida et al. (2002), e as melhores exposi-
clastos de rochas graníticas e metamórficas.
ções estão localizadas no Platô da Ramada
Registros de atividade vulcânica em
e no Cerro Tupanci, em Vila Nova do Sul,
ambiente subaquoso são raros, sendo encon-
no Platô do Taquarembó, em Dom Pedrito,
trados próximos à cidade de São Sepé, onde
e nos Cerros do Bugio e Perau, em Caçapava
se observa uma espessa seqüência com
do Sul (Figura 1).
estratificação planar, por vezes cruzada de
As principais unidades são depósitos
baixo ângulo, com fragmentos
de fluxo piroclástico, principalmente
vulcanoclásticos que, em geral, variam da
ignimbritos, brechas vulcânicas e tufos de
dimensão argila até areia média (Figura 2).
queda, normalmente cobertos por lavas
A organização dos depósitos, com a predo-
riolíticas. Nos depósitos piroclásticos pre-
minância de material fino, sugere uma ori-
dominam os componentes juvenis, princi-
gem a partir de correntes de turbidez de
palmente cristaloclastos de quartzo e K-
baixa densidade que são típicas de ambien-
Figura 2 2. Características de alguns depósitos representativos do Vulcanismo Hilário: (a) aspecto macroscópico de traquiandesito
porfirítico; (b) fotomicroscopia - LP - de traquiandesito com textura glomeroporfirítica; (c) fotomicroscopia - LP - de lamprófiro
espessartítico com textura panidiomórfica e coronítica; (d) aspecto macroscópico de ritmito vulcanoclástico relacionado,
provavelmente, à ambiente subaquoso; (e) aspecto macroscópico de ignimbrito de composição andesítica.
84 Evandro Fernandes de Lima, Carlos Augusto Sommer, Lauro Valentim Stoll Nardi
50 50 anos de Geologia
hipabissais. Observa-se uma grande varie- derrames basálticos bastante alterados, por
dade de estruturas e texturas nos depósitos, vezes ricos em xenólitos de rochas
sendo comum a ocorrência de termos sedimentares estratificadas, acompanhados
autobrechados, foliados e maciços (Figura de lavas em corda (pahoehoe) e tubos (Figura
3). Uma característica comum do 4). Os derrames são lenticulares, contendo
vulcanismo Acampamento Velho é o pre- tubos métricos nas porções distais. Nas por-
domínio dos depósitos ignimbríticos que ções de topo dos derrames foram identifi-
preservam feições típicas de processos cados pipes estreitos, indicativos de uma ele-
piroclásticos primários, como as estruturas vada atividade de voláteis. Localizadamente,
e texturas indicativas de fluxos quentes com observam-se feições de degassing pipes, geral-
grande quantidade de gases. Estas caracte- mente encontradas em depósitos
rísticas, associadas a freqüente ocorrência de piroclásticos, típicos de sistemas com ele-
fluxos de lavas e corpos hipabissais ao lon- vada permeabilidade. Nos tubos de lava, a
go de lineamentos, sugerem um vulcanismo concentração dos voláteis no teto determi-
subaéreo, estabelecido em condutos nou a deformação da superfície externa dos
fissurais. tubos, gerando padrões de intumescência
As rochas ácidas do vulcanismo acompanhados de pequenas depressões se-
Acampamento Velho são dominantemente micirculares, provavelmente originadas pelo
riolitos comendíticos, com ocorrência su- rompimento da crosta externa e conseqüen-
bordinada de rochas traquíticas de mesma te liberação dos gases (Lima et al., 2002).
afinidade. As rochas básicas desta unidade Outra feição descrita na parte externa dos
são representadas por um pequeno volume fluxos inflados é o padrão de cracks
de lavas porfiríticas e diques, cujas caracte- curvilíneos, indicativos do sentido de fluxo.
rísticas geoquímicas permitem classificá-las O desenvolvimento de crostas superficiais
como basaltos hawaiíticos e mugearíticos durante a extrusão causou a formação de
(Sommer et al., 1999; Wildner et al., 1999; túneis, pelos os quais fluíam lavas mais jo-
Almeida et al., 2002; Sommer et al., 2005). vens, gerando uma aparente inversão
estratigráfica da seqüência vulcânica (Figu-
2.3 Vulcanismo Rodeio Velho ra 4).
Na região das Minas do Camaquã, as
O último ciclo vulcânico na Bacia do
rochas do Membro Rodeio Velho ocorrem
Camaquã é representado pelo vulcanismo
como intrusões máficas, alteradas, em
Rodeio Velho, vinculado ao Membro Ro-
arenitos da base da Formação Guaritas
deio Velho da Formação Guaritas. Este gru-
(Lima et al., 2002). Diversas feições estuda-
po é caracterizado um complexo sistema
das sugerem a interação entre magma e se-
aluvial, composto por sistemas braided, fan
dimentos molhados ou de intrusões básicas
deltas e sistemas desérticos de dunas e
em arenitos parcialmente litificados e
interdunas. Nas porções basais, observa-se
saturados em água. Em afloramento, obser-
que o vulcanismo é intercalado com os de-
va-se uma nítida interação entre a fração
pósitos eólicos. As melhores exposições
ígnea e a sedimentar, que diminui em dire-
ocorrem nas regiões de Lavras do Sul e Mi-
ção ao topo da intrusão, onde blocos de
nas do Camaquã (Figura 1).
arenitos preservam as estruturas primárias.
Na região de Lavras do Sul, os
No corte perpendicular da intrusão, obser-
vulcanitos ocorrem como manifestações
va-se a presença de estruturas tipo pillow,
efusivas subaéreas, representadas por
definindo feições do tipo multiple-rind,
Figura 33. Exemplos de depósitos do vulcanismo Acampamento Velho: (a) depósitos ignimbríticos estratificados; (b) litoclasto
cognato juvenil de material vítreo em ignimbrito estratificado; (c) depósito ignimbrítico maciço, rico em litoclastos; (d) ignimbrito
soldado, rico em vitroclastos e com forte textura eutaxítica; (e) depósito de lavas riolíticas com estruturas de fluxo de padrão
complexo; (f) lava riolítica com foliação subvertical; (g) riolito com bandamento milimétrico em estágio inicial de autobrechação;
(h) autobrecha riolítica.
86 Evandro Fernandes de Lima, Carlos Augusto Sommer, Lauro Valentim Stoll Nardi
50 50 anos de Geologia
Figura 44. Exemplos de depósitos do vulcanismo Rodeio Velho: (a) detalhe da estrutura dos tubos de lava; (b) estrutura de escape
de gases, a coloração avermelhada marca alterações mineralógicas de alta temperatura; (c) corrugações e depressões circulares,
indicando feições de escape de gases; (d) janela sobre crosta de lava, revelando um antigo canal de lava subterrâneo; (e) afloramento
mostrando a intrusão de um corpo tipo pillow-sill em sedimentos, possivelmente, não consolidados da base da Formação Guaritas;
(f) estruturas tipo multiple-ring, em seção transversal de pillow-sill.
2002). São, geralmente, saturadas em sílica, & Lima, 2000). Dados de Pb-Pb em zircões,
apresentando olivina, hiperstênio e diopsídio obtidos nas rochas monzoníticas, indicam
normativos. A afinidade shoshonítica do idades de 601 ± 5Ma (Gastal & Lafon, 2001),
magmatismo é também evidenciada pelos enquanto que dados U-Pb em zircões for-
baixos teores em TiO2, conteúdos relativa- necem idades de 592 ± 5 Ma (Remus et al.,
mente elevados de Sr, Ba, Rb, Al2O3 e ra- 1997) para as rochas graníticas desta asso-
zões K2O/Na2O próximas da unidade. Esta ciação shoshonítica.
afinidade é demonstrada também no diagra-
ma, utilizando a técnica de sliding 3.2 O magmatismo bimodal alcalino
normalization de Liégeois et al. (1998) (Figura sódico do vulcanismo Acampamento
5). Velho
O empobrecimento de Nb em rela-
O magmatismo bimodal alcalino
ção aos ETRL, bem como o enriquecimen-
sódico é caracterizado por uma associação
to em ETRL e LILE (Ba, Sr, Rb, K), é típi-
de rochas básicas e ácidas relacionadas à série
co de magmas relacionados a fontes
alcalina saturada em sílica, cujo trend
metassomatizadas durante subducção pré-
composicional situa-se no diagrama TAS,
via (Kelemen et al., 1993), e as baixas razões
próximo ao limite entre os campos das sé-
Nb/La and La/Ba são comparáveis a aque-
ries alcalinas e subalcalinas. A afinidade al-
las reportadas para andesitos orogênicos. Os
calina deste magmatismo é confirmada pela
conteúdos de elementos litófilos de alto
utilização da técnica de sliding normalization
potencial iônico (HFSE) são mais elevados
(Liégeois et al., 1998) (Figura 5). Riolitos
que os observados em shoshonitos oceâni-
comendiíticos são predominantes na se-
cos e similares aos de rochas shoshoníticas
qüência vulcânica e as rochas básicas são
de margem continental (Pearce, 1983) ou de
representadas, principalmente, por hawaitos,
intraplaca pós-colisionais. Os padrões de
basaltos e raros mugearitos, e a sua caracte-
ETR são caracterizados por valores de CeN
rística sódica é indicada pelos valores de
próximos a 100, YbN ao redor de 4 e ausên-
(Na2O – 2) > K2O. O caráter peralcalino,
cia de anomalias de Eu, feições normalmen-
predominante nas rochas ácidas, é compro-
te indicativas de magmas shoshoníticos ou
vado principalmente pelos seus elevados
cálcio-alcalinos alto K (Nardi & Lima, 2000)
teores de Zr, conforme discutido por Leat
(Figura 5). As rochas ácidas são
et al. (1986).
metaluminosas, com conteúdos tipicamen-
Dois conjuntos de vulcânicas ácidas,
te elevados em Ba e Sr e moderados em
com contrastantes conteúdos de Ti-P, fo-
HFSE. O comportamento dos ETR e dos
ram identificados e referidos por Sommer
elementos traços incompatíveis são simila-
et al. (2005) como basaltos-riolitos alto-Ti-
res aos das rochas básicas e intermediárias,
P e baixo-Ti-P, respectivamente. Um tercei-
sugerindo sua cogeneticidade.
ro grupo composicional foi individualizado
Os dados isotópicos disponíveis para
pelos teores muito elevados em Nb, o que
o magmatismo shoshonítico fornecem ida-
pode representar um episódio magmático
des Rb-Sr de 608 ± 54 Ma, razões iniciais
final na Bacia do Camaquã, ainda relaciona-
de 87Sr/86Sr de 0,7048 e valores de eNd pró-
do aos estágios pós-colisionais do Ciclo
ximos a – 0,2 (Gastal & Lafon, 1998) o que,
Brasiliano-Pan-Africano.
juntamente com os padrões de elementos
As rochas menos diferenciadas desta
traços, sugere a participação de fontes
seqüência bimodal são caracterizadas por
mantélicas litosféricas do tipo EM-1 (Nardi
88 Evandro Fernandes de Lima, Carlos Augusto Sommer, Lauro Valentim Stoll Nardi
50 50 anos de Geologia
90 Evandro Fernandes de Lima, Carlos Augusto Sommer, Lauro Valentim Stoll Nardi
50 50 anos de Geologia
Figura 55. Geoquímica do magmatismo na Bacia do Camaquã. (a) Diagrama TAS com a distribuição das rochas shoshoníticas
(Formação Hilário) e Na-alcalinas (Formação Acampamento Velho); (b) amostras de rochas shoshoníticas e Na-alcalinas plotadas
no diagrama sliding normalization (Liégeois et al., 1998), círculos – associação shoshonítica (Formação Hilário), quadrados –
associação bimodal Na-alcalina (Formação Acampamento Velho); (c) diagrama multielementar para amostras representativas da
associação shoshonítica (normalizado segundo o OIB); (d) padrões de ETR, normalizados pelo condrito para as rochas shoshoníticas;
(e) diagrama multielementar para as rochas básicas da Formação Acampamento Velho (normalizado segundo o OIB); (f) padrões
de ETR, normalizados pelo condrito para as rochas básicas da Formação Acampamento Velho; (g) diagrama multielementar para
as rochas ácidas da Formação Acampamento Velho (normalizado segundo o ORG); (h) padrões de ETR, normalizados pelo
condrito para as rochas ácidas da Formação Acampamento Velho.
metassomatizados por processos relaciona- Almeida, D.P.M.; Conceição, R.V.; Chemale Jr.,
dos à subducção prévia. A variação F.; Koester, E.; Borba, A.W. & Petry, K. 2005.
composicional e a evolução deste Evolution of heterogeneous mantle in the
magmatismo são interpretadas como sen- Acampamento Velho and Rodeio Velho volcanic
events, Camaquã Basin, southern Brazil.
do, principalmente, resultado da fusão de
Gondwana Research, 8(4):479-492.
uma fonte mantélica heterogênea, e, even-
tualmente, contando com a adição de um Bonin, B. 2004. Do coeval mafic and felsic
componente astenosférico. A característica magmas in post-collisional to within-plate
metassomática relacionada à subducção das regimes necessarily imply two contrasting,
fontes mantélicas deste magmatismo pós- mantle and crustal, sources? A review. Lithos,
colisional é evidenciada pelas anomalias ne- 78:1-24.
gativas de Nb e características isotópicas, Borba, A.W.; Mizusaki, A.M.P.; Silva, D.R.A.;
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50 50 anos de Geologia
E Evolução Geotectônica
do Rio Grande do Sul no Pré-Cambriano
Léo Afraneo Hartmann,
Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
1. INTRODUÇÃO
antigas que as idades dos zircões ígneos) e O Complexo Granulítico Santa Ma-
Batólito Pelotas (retrabalhamento crustal, ria Chico ocorre no extremo oeste do escu-
idades-modelo Nd muito mais antigas que do, como um fragmento do Cráton La Plata,
as idades de zircões ígneos). Todas essas uni- e é constituído dominantemente por
dades, portanto a totalidade do escudo, fa- granulitos félsicos (trondhjemíticos) e
zem parte do Cinturão Dom Feliciano, es- máficos, além de piroxenitos, uma lente de
tabelecido durante o Neoproterozóico. A harzburgito, silimanita gnaisses, mármores
evolução pré-cambriana do estado é inte- e gnaisses cálcio-silicáticos (Figura 1). A
grada em uma sugestão de inter-relações de foliação de alto grau é subvertical, próxima
placas tectônicas no Neoproterozóico. Ar- de EW, e grada para NW, na porção norte
tigos recentes de revisão de temas são men- do complexo. As condições de
cionados e listados no final do capítulo, cujo metamorfismo foram de cerca de 10 Kbar e
conteúdo está baseado, principalmente, em 800 °C, mas as rochas foram afetadas inten-
Fernandes et al. (1992), Hartmann et al. samente por retrometamorfismo de conta-
(2000, 2007b), Chemale Jr. (2000), Philipp to, devido à intrusão de grande volume de
& Machado (2005) e Saalmann et al. (2007). magmas graníticos Neoproterozóicos. A
Revisões da evolução geotectônica regional datação SHRIMP de zircões mostra idades
durante o Pré-cambriano foram publicadas variadas de acresção dos magmas do com-
recentemente por Basei et al. (2000), plexo granulítico, entre 2,5-2,1 Ga, tendo o
Heilbron et al. (2004) e Silva et al. (2005). evento colisional gerador dos granulitos
ocorrido em 2,02 Ga (Hartmann et al., 1999,
2000).
2. UNID ADES TECTONO
UNIDADES TECTONO-- O Complexo Encantadas representa
ESTRA TIGRÁFIC
ESTRATIGRÁFIC AS
TIGRÁFICAS outro fragmento importante do Cráton La
PALEOPROTEROZÓIC
ALEOPROTEROZÓICASAS Plata e ocorre em dois locais principais. A
seção-tipo é no núcleo do Terreno Tijucas,
onde foi exposto por ação de nappes com
Fragmentos remanescentes do Cráton vergência para NW (Figura 3). O outro lo-
La Plata estão expostos na porção sudoeste cal é ao sul de Lavras do Sul, onde afloram
e oeste do Rio Grande do Sul (Figura 1). os Gnaisses Imbicuí, uma associação de
Obser vam-se exposições no Terreno gnaisses dioríticos e tonalítico/
Taquarembó, como o Complexo Granulítico trondhjemíticos. Provavelmente, constitui o
Santa Maria Chico, no Terreno Tijucas, com embasamento da Bacia do Camaquã, pois
os ortognaisses do Complexo Encantadas. as lavas dessa bacia apresentam idades-mo-
No Batólito Pelotas, ocorrem os septos do delo Nd e idades de zircão antigas. Os
embasamento, com destaque para os gnaisses Arroio dos Ratos, que ocorrem no
ortognaisses do Complexo Arroio dos Ra- Batólito Pelotas, também fazem parte do
tos e os paragnaisses do Complexo Várzea complexo. A datação de zircão por SHRIMP
do Capivarita (Figura 2). O Ciclo de rochas do Complexo Encantadas mos-
Transamazônico (2,26-2,00 Ga) é o conjun- tra o início do magmatismo em 2,26 Ga e
to de eventos mais importante no acrésci- sua continuidade até 2,1 Ga. A colisão gera-
mo de volume à crosta continental do esta- dora do metamorfismo de fácies anfibolito
do, pois as idades Nd modelo situam-se en- ocorreu em 2,03 Ga. A evolução do com-
tre 2,5-2,0 Ga, próximas das idades ígneas. plexo é, portanto, muito semelhante à dos
Figura 1
1. Mapa geológico do sul do Brasil e Uruguai, mostrando as principais unidades tectono-estratigráficas e estruturais.
Figura 2
2. Mapa geológico do Batólito Pelotas, com indicação das principais zonas de cisalhamento (modificado de Philipp &
Machado, 2005).
100 Léo Afraneo Hartmann, Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
50 50 anos de Geologia
Figura 3
3. Distribuição dos principais litotipos do Terreno Tijucas no Escudo Sul-rio-grandense (modificado de Chemale Jr., 2000).
ZCDC = Zona de Cisalhamento Dorsal de Canguçu, ZCPM = Zona de Cisalhamento Passo do Marinheiro.
102 Léo Afraneo Hartmann, Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
50 50 anos de Geologia
observadas anteriormente no escudo, mas plexo Cambaí têm idades de zircão (TIMS e
destaca outros aspectos muito significativos, SHRIMP) em torno de 735-680 Ma
como a anomalia negativa ao longo do arco (Babinski et al., 1996; Hartmann et al., 2000,
do Rio Grande (Figura 5), tanto na porção 2007b). Apresentam valores positivos de
pré-cambriana exposta quanto na parte åNd e assinalam o desenvolvimento de um
recoberta pela Bacia do Paraná. O arco do arco magmático de margem continental
Rio Grande tem direção NW e um de seus (Orogênese São Gabriel). O Complexo
pontos centrais fica na cidade de São Fran- Bossoroca, que consiste principalmente de
cisco de Assis. As anomalias Bouguer posi- rochas vulcânicas e vulcanoclásticas
tivas parecem corresponder a remanescen- andesíticas a dacíticas, representa a parte
tes aquecidos de litosfera, desde a passagem vulcânica principal desse arco. Essa relação
da pluma Tristão da Cunha no Mesozóico é corroborada pelas idades de cristalização
(135 Ma). de metadacitos (U-Pb zircão, TIMS e
O Ciclo Brasiliano foi responsável SHRIMP), em torno de 753 ±2 Ma, próxi-
pela construção do Cinturão Dom Feliciano, mas das idades dos granitóides. A idade-
e compreende três eventos tectônicos prin- modelo Nd, das rochas metassedimentares
cipais (Hartmann et al., 1999, 2000, 2007b): e das rochas meta-vulcânicas máficas e
(1) o início de atividade de subducção, ultramáficas do Complexo Palma (Figura 7),
marcada pelo metadiorito Passinho (880 é Neoproterozóica (aprox. 1,3-0,6 Ga). O
Ma), que é o evento tectônico Terreno São Gabriel (Figura 8) é composto,
neoproterozóico mais velho do sul do Bra- portanto, por rochas juvenis (meso- a
sil (evento Passinho); (2) a Orogênese São neoproterozóicas) que incluem rochas
Gabriel, que é o evento de desenvolvimen- plutônicas, cálcico-alcalinas baixo a médio-
to do arco magmático do Terreno São K de arco (Complexo Cambaí) e também
Gabriel (753-680 Ma), com a formação dos rochas meta-vulcânicas máficas e meta-
Complexos Cambaí e Palma/Bossoroca; (3) sedimentares associadas (Complexos Pal-
a Orogênese Dom Feliciano, que represen- ma/Bossoroca). As idades-modelo Nd em
ta a extensa fusão dos remanescentes torno de 1,0 Ga podem representar a pre-
crustais antigos presentes no Batólito sença de crosta grenviliana na região.
Pelotas, seguido da intrusão amplamente Há vários indicadores geoquímicos de
distribuída de granitos sin, tardi e pós- origem das rochas dos Complexos Palma/
colisionais. Bossoroca e do Complexo Cambaí em am-
biente de zona de subducção, como as con-
3.1 Terreno São Gabriel centrações de elementos maiores e traços, o
enriquecimento em ETRL, os baixos con-
O terreno São Gabriel constitui-se em
teúdos de Nb e outros elementos de alto
um prisma acrescionário gerado durante o
campo de força, o enriquecimento em ele-
Neoproteorozóico, com associações
mentos litófilos de raio iônico grande e a
petrotectônicas de ambientes de margem
composição isotópica de Sr e Nd (Babinski
passiva e de retro-arco (back-arc), ofiolitos,
et al. 1996; Saalmann et al., 2007). Os dados
arcos magmáticos vulcano-sedimentares e
indicam a possível existência de duas suítes,
plutônicos (Figura 6). As rochas cálcico-al-
representando um arco de ilhas oceânico e
calinas médio a alto-K (gnaisses tonalíticos
um arco continental. A presença de um platô
e dioríticos, meta-dioritos, meta-tonalitos,
oceânico (704 ± 2 Ma, zircão SHRIMP), na
dioritos, tonalitos e granodioritos) do Com-
104 Léo Afraneo Hartmann, Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
50 50 anos de Geologia
Figura 4.
4 A) Mapa geológico simplificado com as principais unidades geotectônicas do Escudo Sul-rio-grandense. B) Principais
estruturas geofísicas e tectônicas em nível regional do Escudo Sul-rio-grandense (modificado de Costa, 1997).
5 Mapa gravimétrico de anomalias Bouguer do Estado do Rio Grande do Sul (Zwirtes et al., 2007).
Figura 5.
Mina da Palma, é indicada pela associação metassedimentares. Sua origem foi, portan-
basalto-calcário-chert, pelo padrão to, por mistura de magmas mantélicos, com
horizontalizado de ETR e pela ausência de magmas gerados por fusão de crosta conti-
anomalia negativa de Nd nos basaltos nental antiga. Isótopos de Nd em rochas
(Lopes & Hartmann, 2003). graníticas (Gastal et al., 2005) sugerem a pre-
As rochas metassedimentares do Ter- sença de crosta neo-arqueana sob o Terre-
reno São Gabriel apresentam idades-mode- no São Gabriel, no final do Ciclo Brasiliano
lo Nd um pouco mais velhas que as rochas (aprox. 600 Ma).
ígneas, mas os valores de åNd positivo e as
baixas razões de (87Sr/86Sr)i sugerem que 3.2 Terreno Tijucas
foram derivadas de uma fonte juvenil
O Terreno Tijucas apresenta dois do-
neoproterozóica, com pequena contribuição
mínios de rochas, um de idade
de crosta mais velha. As rochas
paleoproterozóica e outro neoproterozóico
metassedimentares foram derivadas de fon-
a eo-paleozóico (Figura 3). Os
tes andesíticas e de misturas de rochas bási-
metassedimentos do Complexo Porongos
cas e félsicas de arco. As rochas granitóides
apresentam contraste com as unidades
do Complexo Cambaí têm idades (zircão,
litoestratigráficas que compõem o Terreno
SHRIMP) entre 735-680 Ma (Hartmann et
São Gabriel, pois suas unidades foram, em
al., 2007b) e valores åNd(t) positivos; o Gra-
parte, geradas entre 770-780 Ma (Chemale
nito Santa Zélia (695 Ma, zircão SHRIMP),
Jr., 2000). Nos metassedimentos, os zircões
no entanto, marca o início da presença de
detríticos mais jovens de quartzitos têm
crosta continental no Terreno São Gabriel,
idade de 1998 Ma (Hartmann et al., 2004),
pois tem valor negativo de åNd(t) e valor de
delimitando a idade máxima possível do
( 87Sr/ 86Sr) i mais alto que o das rochas
preenchimento da bacia, que é, portanto,
106 Léo Afraneo Hartmann, Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
50 50 anos de Geologia
Figura 6
6. Mapa geológico dos Terrenos São Gabriel e Taquarembó. 1 = Complexo Ibaré, 2 = Complexo Palma, 3 = Complexo
Bossoroca; CM = Ofiolito Cerro Mantiqueira. Corpos graníticos: CS = Caçapava do Sul, J = Jaguari, LS = Lavras do Sul, SA =
Santo Afonso, SR = Santa Rita, SS = São Sepé.
Figura 77. Diagrama evolutivo de isótopos de Nd para as rochas juvenis do Terreno São Gabriel (TSG), das rochas neoproterozóicas
retrabalhadas (CP= Complexo Porongos) e do Ciclo Transamazônico (CE = Complexo Encantadas) (Chemale Jr., 2000; Saalmann
et al., 2006, 2007).
108 Léo Afraneo Hartmann, Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
50 50 anos de Geologia
8. Mapa geológico do Terreno São Gabriel na região de Vila Nova (Hartmann et al., 2007b).
Figura 8
Complexo Porongos são as unidades do situada sob o Batólito Pelotas (Philipp &
embasamento arqueano e/ou Machado, 2005; Gastal et al., 2005), implica
paleoproterozóico, com contribuição menos em ambiente ensiálico para a Orogênese
importante de fontes mais jovens. A porção Dom Feliciano (650-590 Ma).
leste pode ter área-fonte mais jovem, em Três eventos tectônicos principais
parte neoproterozóica. ocorreram no Batólito Pelotas (Fernandes
Vários ambientes tectônicos foram et al., 1995; Philipp & Machado, 2005): (a)
sugeridos para o Terreno Tijucas, incluindo um evento mais antigo, de baixo ângulo (D1),
margem passiva (Jost & Bitencourt, 1980), reconhecido em xenólitos de ortognaisses
margem ativa (Chemale Jr., 2000) e bacia de contidos nos granitóides do Complexo Pi-
retro-arco (Fernandes et al., 1995; Hartmann nheiro Machado; (b) um evento longo e mais
et al., 2000). Os dados isotópicos e de ele- jovem, de alto ângulo (D3 e D4), associado
mentos-traços das rochas meta-vulcânicas às zonas de cisalhamento dúcteis que de-
e metassedimentares mostram retrabalha- formam as estruturas D1, e responsável pela
mento do embasamento pré-Brasiliano, o colocação das suítes graníticas mais antigas
que pode sugerir a deposição em crosta con- do batólito; (c) um terceiro evento (D5), tar-
tinental distendida ou um arco magmático dio, também associado às zonas de
continental, com retrabalhamento de cros- cisalhamento de alto ângulo, porém em re-
ta continental paleoproterozóica. O gime dúctil-rúptil a rúptil (Tabela 1).
vulcanismo de 780 Ma pode estar relacio- As rochas graníticas do batólito con-
nado à Orogênese São Gabriel. Fragmen- têm muitos enclaves de gnaisses tonalíticos
tos ofiolíticos ocorrem no Terreno Tijucas, e de rochas metassedimentares, com tama-
identificados ao sul de Cachoeira do Sul, e nhos variando principalmente entre 1 m e 8
podem ser cronocorrelatos com aqueles do m, que ocorrem nos corpos intrusivos mais
Terreno São Gabriel. velhos – Complexo Pinheiro Machado
(Philipp & Machado, 2005; Silva et al., 2005).
3.3 Batólito Pelotas Idades de zircão por SHRIMP indicam dois
eventos de fusão parcial no Complexo Pi-
O Batólito Pelotas consiste predomi-
nheiro Machado, um em torno de 800 Ma e
nantemente de rochas graníticas, com idade
outro entre 630-610 Ma. Um xenólito de
entre 650 e 550 Ma (Figura 2). Um comple-
gnaisse, com idade em torno de 781 Ma,
xo granítico e seis suítes intrusivas foram
apresenta valor negativo de åNd(t) e idade-
discriminados por Philipp & Machado
modelo Nd em torno de 2,24 Ga, e reforça
(2005) e Philipp et al. (2007), relacionadas à
a ocorrência de refusão de crosta antiga
atuação de zonas de cisalhamento. Valores
(paleoproterozóica) há cerca de 800 Ma.
negativos de åNd(t) e razões iniciais 87Sr/
Esse evento de fusão, em torno de 780
86
Sri elevadas (0,708-0,716) indicam contri-
Ma, é crono-correlato com a colocação do
buição significativa de crosta antiga, ao pas-
Complexo Cambaí no Terreno São Gabriel,
so que idades-modelo Nd entre 1,5-2,3 Ga
sugerindo a ocorrência de um evento
sugerem proporções variadas de misturas
colisional em torno de 800 Ma, sendo as
entre crosta antiga e material mantélico
zonas de cisalhamento de baixo ângulo as-
(Babinski et al., 1997; Frantz & Botelho,
sociadas com a Orogênese São Gabriel, mais
2000; Philipp & Machado, 2005; Philipp et
a oeste. No entanto, é provável que o
al., 2007). A presença desses componentes
embasamento do Batólito Pelotas não esti-
isotópicos antigos na litosfera continental,
vesse conectado com o Terreno São Gabriel
110 Léo Afraneo Hartmann, Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
50
50 anos de Geologia
Tabela 1
1. Principais eventos deformacionais registrados no escudo do Rio Grande do Sul.
antes de 700 Ma, o que torna mais provável Batólito Pelotas e mergulhando para leste
que o evento de fusão parcial tenha sido (Chemale Jr., 2000). Entretanto, Philipp &
causado pela distensão e desenvolvimento Machado (2005) e Philipp et al. (2007) suge-
da bacia no Terreno Tijucas, em torno de rem que a geração do magmatismo do
800-750 Ma. A deposição dos sedimentos Batólito Pelotas ocorreu em ambiente pós-
Porongos foi acompanhada por vulcanismo colisional, como também sugerido por
gerado por fusão de crosta antiga, de forma Bitencourt & Nardi (2000). O Batólito
que os dois eventos de fusão podem estar Pelotas possui uma porção muito pequena
relacionados com distensão e afinamento de de rochas neoproterozóicas juvenis, levan-
crosta continental. Em decorrência, os dois do ao questionamento de sua posição como
terrenos refletem o mesmo evento de arco magmático durante o Ciclo Brasiliano
retrabalhamento crustal, mas representam (Bitencourt & Nardi, 2000; Hartmann et al.,
diferentes níveis de exposição. Níveis pro- 1999, 2000; Philipp et al., 2005). Isso signifi-
fundos estão expostos no Batólito Pelotas, ca que a ampla remobilização do
ao passo que níveis intermediários estão embasamento Transamazônico do Cinturão
preservados no Terreno Tijucas. Dom Feliciano não foi causada pela sua
A origem do grande volume de posição acima de uma zona de subducção,
magmatismo no Batólito Pelotas, entre 650 tendo sido induzida por outros processos
e 590 Ma, foi atribuída a um ambiente de (por exemplo, ação de pluma mantélica,
arco magmático acima de zona de delaminação crustal ou processos de slab-
subducção do Oceano Adamastor, com breakoff) e que a deformação ocorreu durante
mergulho para oeste (Fernandes et al., 1995), o desenvolvimento das zonas de
ou de um oceano localizado a oeste do cisalhamento subhorizontais intra-
continentais. Esses processos podem ter cala regional, que marcam o segundo even-
sido semelhantes aos que ocorrem há alguns to colisional Brasiliano. O último evento de
milhões de anos no Himalaia. deformação, denominado D7, está caracte-
rizado pelo colapso gravitacional do
Cinturão Dom Feliciano e a formação dos
4. EVOLUÇÃO ESTRUTURAL
EVOLUÇÃO sedimentos da Formação Guaritas da Bacia
DO ESCUDO SUL -RIOGRANDENSE
SUL-RIOGRANDENSE do Camaquã.
112 Léo Afraneo Hartmann, Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
50 50 anos de Geologia
114 Léo Afraneo Hartmann, Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
50 50 anos de Geologia
Sr); (3) D6 (Cambriano) – Suíte Itapuã, 600 Estas zonas afetam os enxames de
e 550 Ma (U-Pb SHRIMP e Laser Ablation diques ácidos e básicos que ocorrem na re-
em zircão, isócrona Rb-Sr). gião sul do batólito e controlam o
O posicionamento sucessivo das as- posicionamento do Granito Bela Vista
sociações graníticas está relacionado aos (Philipp & Machado, 2005; Zanon et al.,
períodos de evolução das principais zonas 2006). Idades Ar-Ar, obtidas por Philipp &
de cisalhamento transcorrentes que Machado (2005) em micas de rochas
seccionam o batólito. Estas zonas apresen- miloníticas, apontam idades em torno de 535
tam-se orientadas segundo a direção NE- Ma para este último e importante período
SW e mostram-se reativadas em 4 estágios de atividade das zonas de cisalhamento. A
principais, inicialmente em regime evolução estrutural determinada para esta
compressivo e em condições dúcteis, evo- região é compatível com um modelo
luindo para dúcteis a dúctil-rúpteis e, poste- tectônico transpressivo relacionado à con-
riormente, em regime extensional, sob con- vergência oblíqua de placas tectônicas.
dições dúcteis a dúctil-rúpteis. O Granito
Quitéria e a Suíte Cordilheira registram este
evento dúctil precoce (D3), caracterizado por 5. CORREL AÇÃO DOS EVENTOS
CORRELAÇÃO
zonas de cisalhamento direcionais de alto ESTRUTURAIS BRASILIANOS
ângulo de extensão continental, com assem-
bléias mineralógicas compatíveis com as da
fácies Anfibolito Inferior a Médio e movi- A idade dos eventos individuais e a
mentação dominantemente lateral esquerda. comparação da evolução estrutural das gran-
Os granitóides do Complexo Pinhei- des unidades tectono-estratigráficas são uti-
ro Machado e das suítes Viamão e Erval lizadas para reconstruir a justaposição tem-
registram o segundo evento regional de de- poral dessas unidades. A idade de D1 e D2
formação D4, com a formação de zonas de no Terreno São Gabriel, representando a
cisalhamento direcionais de alto ângulo, em Orogênese São Gabriel, está bem delimita-
condições metamórficas da fácies xistos ver- da dentro do intervalo 753-680 Ma pelas
des a anfibolito inferior, com movimenta- idades U-Pb SHRIMP de zircão dos
ção também lateral esquerda. Um terceiro ortognaisses e corpos intrusivos do Com-
período de ativação tectônica D5 está asso- plexo Cambaí (Babinski et al., 1996;
ciado com o posicionamento das suítes Hartmann et al., 1999, 2000, 2007b). As ida-
Encruzilhada do Sul, Piquiri e Dom des de D1 e D2, no Terreno São Gabriel,
Feliciano, resultando na formação sob regi- podem ser deduzidas a partir das rochas dos
me transpressional e transtensional de zo- complexos Palma/Bossoroca e Cambaí que
nas de cisalhamento direcionais de alto ân- foram afetadas por esses eventos em um
gulo, dúctil-rúpteis a rúpteis, também com ambiente de arco neoproterozóico, supor-
cinemática dominantemente sinistral. Um tado pelas idades-modelo das rochas meta-
último período de atividade tectônica D6 vulcânicas máficas e ultramáficas do Com-
resultou na for mação de zonas de plexo Palma. O D-embasamento, no Terre-
cisalhamento direcionais e oblíquas, de alto no São Gabriel, ocorreu em um intervalo
a médio ângulo, em condições metamórficas de tempo entre 900-753 Ma. Esse limite tem-
da fácies xistos verdes a anfibolito inferior, poral é compatível com a idade do
com movimentação lateral direita e esquer- metadiorito Passinho (880 Ma), que registra
da. a primeira atividade de subdução e acresção
116 Léo Afraneo Hartmann, Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
50 50 anos de Geologia
registrados no Terreno Tijucas e na Bacia ilhas Passinho (Figura 10b), causando a for-
do Camaquã. mação das rochas plutônicas cálcico-alcali-
nas do Complexo Cambaí e das rochas de
arco vulcânico do Complexo Palma/
6. TECTÔNIC
TECTÔNICAA DE PL AC
PLAC AS
ACAS Bossoroca. O aporte sedimentar nas bacias
NO NEOPROTEROZÓICO associadas com esta margem continental, em
ambiente de retro-arco ou ante-arco, foi
derivado, principalmente, do arco juvenil
A interpretação integrada de todos os neoproterozóico Passinho, anteriormente
dados geológicos, geofísicos, geoquímicos acrescionado, e também das rochas do arco
e e isotópicos do Rio Grande do Sul, con- magmático, sendo que somente uma peque-
duz à descrição evolutiva do escudo em na porção do aporte sedimentar foi prove-
referencial de tectônica de placas (Figura 10). niente do Cráton La Plata, no antepaís. Isso
Dois terrenos tectono-estratigráficos do explica os valores positivos de åNd(t) e as
Ciclo Brasiliano estão expostos nos idades-modelo Nd baixas (1,1-0,8 Ga) das
cinturões de xistos situados a leste do Cráton rochas metassedimentares e também as as-
La Plata, no Rio Grande do Sul. O Terreno sinaturas juvenis do Complexo Cambaí, pois
Tijucas está localizado na margem passiva não houve contribuição significativa de cros-
do Microcontinente Encantadas, ao passo ta antiga para as fusões. Subducção para
que há duas associações de arco magmático oeste causou empurrões para SE e
– um arco intra-oceânico (arco Passinho) e empilhamento dos metassedimentos, sobre-
uma margem continental ativa (arco Vila pondo rochas metavulcânicas máficas e
Nova), no Terreno São Gabriel. A evolução ultramáficas em um prisma acrescionário
do Ciclo Brasiliano em termos de tectônica (Chemale Jr., 2000). Na margem do
de placas iniciou-se no estado com o desen- Microcontinente Encantadas, houve forma-
volvimento do arco Passinho, intra-oceâni- ção de uma margem continental ativa, com
co, em torno de 880 Ma, em resposta à o consumo do Oceano Charrua, e geração
subducção de crosta oceânica. A idade pre- de magmas cálcico-alcalinos, com forte con-
cisa da bacia oceânica que se abriu a leste tribuição crustal, representados pelas uni-
do Cráton La Plata, não é conhecida; no dades metavulcânicas do Complexo
entanto, a litosfera oceânica consumida foi Metamórfico Porongos (Figura 10b).
gerada cerca de 100 m.a. antes. Isso está de Entre 0,70 e 0,68 Ga, ocorreu a coli-
acordo com as idades-modelo Nd das ro- são do Cráton La Plata com o
chas ultramáficas do Complexo Palma, em Microcontinente Encantadas, durante os
torno de 1,2-0,9 Ga (Babinski, 1997; estágios finais da Orogênese São Gabriel
Saalmann et al., 2007). O arco Passinho foi (Figura 10c), gerando empurrões para SE,
formado acima de uma zona de subdução no cinturão São Gabriel, e dobramento
para leste e foi acrescionado ao final na isoclinal, cisalhamento e metamorfismo, no
margem passiva do Cráton La Plata (Figura Terreno Tijucas, que estava localizado na
10a). Ao mesmo tempo, na margem do parte inferior da placa. O encurtamento foi
Microcontinente Encantadas, houve a for- acomodado, em parte, por cisalhamento la-
mação de uma margem passiva. teral. O granito Santa Zélia, tardi-tectônico
Entre 850-700 Ma, houve subducção com relação ao principal período de
para leste, sob a margem continental que transcorrência, registra, pela primeira vez no
consistia do Cráton La Plata e do arco de Terreno São Gabriel, a contribuição de
Figura 10
10. Evolução geotectônica do escudo do Rio Grande do Sul no Neoproterozóico, em 5 etapas (10a, 10b, 10c, 10d, 10e),
entre 900-540 Ma.
118 Léo Afraneo Hartmann, Farid Chemale Junior, Ruy Paulo Philipp
50 50 anos de Geologia
crosta continental antiga, pois tem valores tais de zircão detríticos marcam a atuação
levemente negativos de åNd(t). Isso pode de processos arqueanos, um extraordinário
ser atribuído à fusão de crosta continental cinturão de montanhas foi estabelecido no
subductada. estado durante o Paleoproterozóico (2,26-
O cisalhamento sinistral, ao longo da 2,00 Ga). A calma tectônica que se seguiu a
Zona de Cisalhamento Dorsal de Canguçu, essa primeira cratonização do estado, em 2,0
e o empilhamento de nappes D3 para NW, Ga, posicionou o estado no interior do
no Terreno Tijucas (Figura 10c), tiveram Supercontinente Columbia, com manifesta-
início em torno de 670 Ma e cessaram em ções menores de tectônica intra-placa, em
torno de 620 Ma (Koester et al., 1997). No torno de 1,78 Ga. No Neoproterozóico
Terreno Tijucas, o cisalhamento dúctil (900-540 Ma), o estado foi novamente ce-
sinistral foi seguido de falhamento direcional nário de altas montanhas, geradas pela
sinistral rúptil, enquanto o cisalhamento acresção e colisão de crosta oceânica, platôs
direcional sinistral dúctil e a intrusão de gra- oceânicos, microcontinentes e arcos de ilhas,
nitos ainda ocorriam mais a leste, no Batólito em um cenário final de colisão de grandes
Pelotas (Philipp & Machado, 2005). As sub- massas continentais. Deste modo, grandes
bacias Camaquã foram formadas como ba- zonas de cisalhamento cortaram o estado
cias de pull-apart em ambiente transtensivo. durante a após a grande colisão de 600 Ma.
A transição da tectônica transcorrente para A segunda e definitiva cratonização da crosta
uma tectônica extensional está registrada no do estado estava completada em 540 Ma. A
Cinturão Dom Feliciano, posterior ao pe- tectônica orogênica deu lugar à tectônica
ríodo entre 630-617 Ma (Frantz & Botelho, intra-placa do Supercontinente Gondwana,
2000). Se o Batólito Pelotas é considerado com geração da Bacia do Paraná,
um arco magmático, então o soerguimento da crosta ao longo do arco
Microcontinente Encantadas pode represen- do Rio Grande e rompimento crustal ao
tar uma microplaca continental prensada longo de grandes zonas de falhas. Os terre-
entre o Cráton La Plata e o Cráton Kalahari, nos pré-cambrianos do Rio Grande do Sul
em resposta ao fechamento dos oceanos foram rompidos no Mesozóico, quando a
Adamastor e Charrua. Nesse caso, os porção leste migrou junto com a placa afri-
granitóides do Complexo Pinheiro Macha- cana. A evolução dos principais eventos
do, do Batólito Pelotas, foram formados em geológicos do Escudo Sul-rio-grandense
decorrência da subducção do Oceano pode ser interpretada e condensada a partir
Adamastor (Figura 10d). O Microcontinente da determinação de idades U-Pb em zircões
Encantadas, embasamento do Terreno detríticos das unidades geradas no final do
Tijucas, foi separado da África (Cráton Ciclo Brasiliano (Hartmann et al., 2007a), i.é
Kalahari) e anexado ao Cráton La Plata, ou sedimentos da Formação Guaritas (Figura
era parte do Cráton La Plata e foi segmen- 11), onde se podem reconhecer populações
tado dele pela abertura do Oceano Charrua de zircões principais com idades do
(Figura 10a). Paleoproterozóico (2256 Ma, 2158 Ma, 2115
O uso integrado de diversas ferramen- Ma, 2066 Ma, 2030 Ma, 2002 Ma) e
tas de medição, com forte base em geologia Neoproterozóico (839 Ma, 781 Ma, 703 Ma,
de campo, possibilita fazer uma descrição 598 Ma e 534 Ma). Idades arqueanas e
avançada dos processos responsáveis pela mesoproterozóicas ocorrem muito
evolução geotectônica do Rio Grande do Sul subordinamente, o que é típico no Cinturão
no Pré-cambriano. Enquanto poucos cris- Ribeira.
Figura 11
11. Histograma de frequência de idades U-Pb SHRIMP de zircões detríticos da Formação Guaritas. A distribuição das
idades é representativa dos eventos ocorridos na área-fonte. Dados de Hartmann et al. (2007a).
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Maria de Fátima Bitencourt
1. INTRODUÇÃO
O vínculo espacial e temporal entre tir do estudo dos granitóides deste segmen-
tectônica e magmatismo é amplamente re- to.
conhecido na literatura das últimas décadas
e, para diversos autores, como D’Lemos et
al. (1992), Hutton & Reavy (1992), 2. O MAGMATISMO GRANÍTICO
MAGMATISMO
Bitencourt & Nardi (2000), Çoban (2007), PALEOPROTEROZÓICO
entre outros, existe também uma relação
genética de causa e efeito entre os dois pro-
cessos. O aporte contínuo de magmas em O Granito Itapema, no Estado de
áreas orogênicas favorece a localização da Santa Catarina, (Bitencourt & Nardi, 2004)
deformação (D’Lemos et al., 1992; Tommasi tem dimensões superiores a 100 km2 e
et al., 1994), uma vez que a reologia da cros- intrude ortognaisses e anfibolitos
ta é modificada pela baixa viscosidade rela- paleoproterozóicos (Figura 1b). Sua idade,
tiva dos magmas parcialmente cristalizados. determinada em zircões pelo método U-Pb
Em orógenos transpressivos, o aporte de por SHRIMP, é de 2.020 ± 15 Ma
magmas é um dos fatores responsáveis pela (Hartmann et al., 2003). São hornblenda-
inversão progressiva, freqüentemente obser- biotita monzogranitos e granodioritos de
vada entre a tectônica tangencial e a granulação fina a média com abundantes
transcorrente, conforme apontado por xenólitos dos anfibolitos encaixantes e agre-
D’Lemos et al. (1992) para situações de fu- gados de minerais máficos cristalizados pre-
são crustal. Por outro lado, as cocemente. A geometria e distribuição da
descontinuidades translitosféricas podem foliação de fluxo magmático sugerem que o
influenciar não apenas a ascensão e Granito Itapema é uma intrusão tabular
posicionamento dos magmas, mas também subhorizontal, cujo posicionamento foi con-
reativar as fontes mantélicas e promover a trolado por tectônica tangencial sob condi-
fusão da base da crosta (Bitencourt & Nardi, ções metamórficas de fácies anfibolito su-
2000). perior. Composicionalmente, o Granito
No sul do Brasil, a maior parte dos Itapema é semelhante aos granitóides da
terrenos pré-cambrianos é constituída por série shoshonítica (Figuras 3a, 4a); entretan-
granitóides e seus equivalentes to, como não apresenta rochas menos dife-
metamórficos (Figura 1a), sendo, portanto, renciadas associadas, possui teores de álca-
imprescindível a sua utilização na investiga- lis inferiores aos de granitóides
ção da evolução crustal desta região. A shoshoníticos e mostra relação temporal
integração de dados estruturais, com metamorfismo de alto grau. Bitencourt
petrológicos, geoquímicos e isotópicos, em & Nardi (2004) admitiram que o mesmo
escala de detalhe e semi-detalhe, tem per- representa a fusão parcial de ortognaisses a
mitido investigar a evolução do magmatismo temperaturas superiores a 850 C. O
e de suas fontes, principalmente no metamorfismo de alto grau, relacionado
Neoproterozóico e, em menor escala, no com a anatexia e geração do Granito
Paleoproterozóico. O presente trabalho tem Itapema, é provavelmente o datado por
por objetivo reunir e integrar as informa- Harara et al. (2003) em 2.060 Ma e definido
ções relacionadas à evolução crustal do sul como de fácies granulito. Rivera et al. (2004)
do Brasil (Figura1), com ênfase no Escudo admitiu que o posicionamento deste corpo
Sul-rio-grandense (Figura 2), obtidas a par- se deu a profundidades da ordem de 15 km,
Figura 1
1. Mapas geológicos: (a) contexto geológico e geotectônico do sul do Brasil e Uruguai, (b) principais unidades geológicas
e traços tectônicos do Escudo Catarinense.
Figura 2
2. Mapa geológico simplificado, com a distribuição das associações de granitóides na porção oeste e central do Escudo
Sul-rio-grandense. Modificado de Sommer et al. (2006).
Figura 33. Diagramas discriminantes de Pearce (1996) para: (a) metatonalitos do Complexo Encantadas (cinza claro) e Granito
Itapema (cinza escuro); (b) tonalitos com SiO2 > 65%, da Suíte Lagoa da Meia Lua; (c) suítes pós-colisionais subalcalinas (cinza
claro) e peraluminosa (cinza escuro); (d) suítes pós-colisionais shoshoníticas; (e) suítes pós-colisionais alcalinas. Círculo tracejado
indica campo do magmatismo pós-colisional.
4. Diagramas multielementares, com normalização pelos valores de granitos de cadeias mesoceânicas (ORG) de Pearce et
Figura 4
al. (1984), para: (a) metatonalitos do Complexo Encantadas (cinza claro) e Granito Itapema (cinza escuro); (b) tonalitos com SiO2
> 65%, da Suíte Lagoa da Meia Lua; (c) suítes pós-colisionais subalcalinas (cinza claro) e peraluminosa (cinza escuro); (d) suítes
pós-colisionais shoshoníticas; (e) suítes pós-colisionais alcalinas.
interpretada como idade magmática, atri- seu retrabalhamento por estruturas mais
buídos a um evento de subducção precoce. jovens, como sugerido por Fernandes &
Entretanto, a escassez de dados geológicos Porcher (2000).
sobre estas rochas não permite avaliar a ex- O magmatismo sintectônico da região
tensão do seu significado. de Vila Nova é agrupado por Garavaglia et
O magmatismo da região de Vila al. (2006) em Fase Precoce (FP) e Fase Tar-
Nova foi estudado por diversos autores e dia (FT). A FP (ca. 704 Ma) compreende
interpretado, geralmente em conjunto com biotita-hornblenda dioritos e tonalitos inten-
a associação encontrada em Lavras do Sul, samente deformados, com freqüência mos-
como resultante de subducção litosférica em trando bandamento composto. A geometria
ambiente de arco magmático. Dados U-Pb, das intrusões é inicialmente controlada pela
obtidos por Babinski et al. (1996), indicam estrutura subhorizontal dos gnaisses
idade de 704 Ma para rochas dioríticas, for- encaixantes, em regime tangencial caracte-
temente deformadas, as quais representam rístico de D2, passando, nos pulsos seguin-
o magmatismo precoce desta área. Dados tes, a ser controlada por zonas de
isotópicos de Sm-Nd foram apresentados transcorrência horárias da fase D3, como a
por Babinski et al. (1996), Chemale Jr. (2000) Zona de Cisalhamento Palma-Vila Nova
e Saalmann et al. (2005), enquanto Garavaglia (ZCPVN). A FT é marcada por condições
et al. (2006) discutiram também os dados de tensão mais amenas, sendo as intrusões,
isotópicos Sm-Nd e Pb-Pb em dioritos e ao menos em parte, posicionadas em jogs
tonalitos. extensionais da ZCPVN. Os primeiros pul-
O arcabouço tectônico reconhecido sos dioríticos e tonalíticos mostram feições
na região de Vila Nova, compreende pelo de deformação de estado sólido subordina-
menos três eventos de deformação regio- das e são sucedidos por associações
nal, denominados D1, D2 e D3, reconheci- litológicas composicionalmente similares,
dos por diversos autores, embora com sig- onde as estruturas de fluxo magmático se
nificados ligeiramente distintos (conforme encontram bem preservadas (Garavaglia et
Silva Filho, 1991; Fernandes & Porcher, al., 2002). A idade magmática dos
2000; Garavaglia et al., 2006; Saalmann et al., Granitóides Cerca de Pedra, um dos corpos
2006). Sucessivos pulsos de magmatismo relacionados à FT, foi determinada por
tonalítico-diorítico sintectônico foram des- Hartmann et al. (2007) em 682 ± 1 Ma (U-
critos por Garavaglia et al. (2006), e as Pb SHRIMP).
litologias resultantes são atribuídas ao Com- O magmatismo da região de Lavras-
plexo Cambaí, abrangendo gnaisses Vila Nova (750-680 Ma) apresenta uma va-
tonalíticos e dioríticos, e à Suíte Lagoa da riação composicional compatível com a evo-
Meia Lua que reúne dioritos e tonalitos lução de um arco magmático continental
intrusivos no primeiro. O caráter cálcio-alcalino em Lavras do Sul (Kraemer,
sintectônico do magmatismo de Vila Nova 1995), passando, na região de Vila Nova,
é dado pelo desenvolvimento, em grau va- para pós-colisional típico, de afinidade
riável, de estruturas de deformação de esta- toleítica enriquecida em K. Nesta região, no
do sólido paralelas à foliação primária dos entanto, o magmatismo mais precoce ainda
dioritos e tonalitos. Não são observadas mostra composições compatíveis com
superposições de estruturas, o que permite magmatismo de arco continental altamente
descartar a formação dessas rochas em um maduro. Entre as feições composicionais
regime tectônico de temperatura mais alta e mais marcantes desta evolução estão o
caráter mais aluminoso dos magmas preco- vem sendo demonstrada por alguns autores
ces em relação aos mais tardios, bem como (Cottin et al., 1998; Bitencourt & Nardi,
suas razões FeOT/(FeOT+MgO) mais bai- 1993, 2000; Florisbal et al., 2005, 2007). O
xas, além dos menores conteúdos de ETR, magmatismo pós-colisional tem como prin-
Nb, Ta, Zr, e o caráter mais cálcio-alcalino e cipais fontes subcrustais a cunha do manto
enriquecido em Sr. O magmatismo tardio afetada pela subducção prévia, manto con-
mostra nítida afinidade toleítica e um cará- taminado por crosta inferior devido a pro-
ter intraplaca marcado pelos conteúdos cres- cessos do tipo delaminação (Kay &
centes de Na2O e K2O, e de elementos tra- Malhburg-Kay, 1991) ou a astenosfera ati-
ços como Nb, Ta, Zr e ETR. A presença de vada por ocasião do rompimento da placa
baixas razões ETRL/Nb sugere que as fon- subduzida – slab breakoff (Atherton & Ghani,
tes previamente afetadas pela subducção 2002). Assim, de modo geral, pode-se assu-
foram dominantes, confirmando o seu ca- mir como fonte mantélica, predominante do
ráter pós-colisional. Essas fontes também magmatismo pós-colisional, a mesma que
explicam o posicionamento de tonalitos do gera o magmatismo de arco, sendo, no en-
magmatismo tardio da região de Vila Nova tanto, menor o seu grau de hidratação, tra-
nos diagrama das Figuras 3b e 4b. duzido na formação de menor quantidade
A transição do magmatismo cálcio- de flogopita ou anfibólio, uma vez que a
alcalino médio a alto-K para o toleítico mé- subducção não está mais ativa. Decorre daí
dio a alto-K, provavelmente, reflete a cessa- o menor grau de oxidação das fusões e de
ção da subducção litosférica, isto é, o fecha- seu relativo empobrecimento em Al, levan-
mento de oceano ou a acresção do arco ao do à geração de magmatismo toleítico alto-
continente. Embora não seja possível pre- K, em um contexto intraplaca associado a
cisar, ou mesmo admitir, que exista um consumo prévio de litosfera oceânica.
momento exato em que ocorram estas in- Çoban (2007) observou que a geração de
versões de campos tensionais associadas magmas básicos em ambientes
com inversões ou trocas de fontes e proces- compressionais se dá as mais altas pressões
sos de geração de magmas, pode-se propor que em ambientes extensionais, o que justi-
que o magmatismo de Lavras-Vila Nova ficaria o caráter mais aluminoso dos magmas
represente uma evolução de arco magmático de ambientes compressionais, onde o
continental maduro para pós-colisional plagioclásio seria menos estável na fonte.
intraplaca.
Com base na discussão de Ulmer
(2001), pode-se admitir que a mudança do 4. O MAGMATISMO
MAGMATISMO
magmatismo cálcio-alcalino para toleítico NEOPROTEROZÓICO PÓS- COLISIONAL
PÓS-COLISIONAL
decorra do menor grau de oxidação e
hidratação nas fontes, provocado pela ces-
sação do aporte de fluidos derivados da No sul do Brasil, o magmatismo
subducção litosférica. Rochas de afinidade neoproterozóico pós-colisional (Bitencourt
toleítica, enriquecidas em potássio, são típi- & Nardi, 1993, 2000) perfaz o maior volu-
cas do magmatismo intraplaca de platôs me de rochas granitóides, expostas em uma
continentais – CFB – e sua presença em faixa de direção NE que se estende de San-
contextos relacionados com subducção ta Catarina ao Uruguai (Figura 1a), e está
litosférica é raramente referida. Entretanto, intimamente associado à tectônica
sua presença em contextos pós-colisionais transpressiva do final do Ciclo Brasiliano,
designada Batólito Pelotas, no ESRG, e sociações shoshoníticas (ca. 600 Ma) e asso-
Batólito Florianópolis, no Escudo ciações alcalinas (590-580 Ma). Granitóides
Catarinense. Esta faixa comporta sucessivos sintectônicos peraluminosos são descritos
pulsos graníticos, frequentemente associa- no intervalo de 630-617 Ma.
dos ao magmatismo máfico, representado
por enclaves microgranulares máficos, di- 4.1 Granitóides Subalcalinos Médio
ques sinplutônicos e corpos dioríticos e a Alto-K e Peraluminosos Associados
gabróicos sincrônicos.
Os estágios precoces da transcorrên-
O magmatismo plutônico foi contro-
cia no CCSb (650-620Ma) são marcados por
lado, em sucessivas etapas, pela mesma
um magmatismo básico de afinidade toleítica
descontinuidade de escala litosférica, ativa
médio a alto-K, contemporâneo e
entre 650 e 580 Ma, e referida como
cogenético com granitóides meta a
Cinturão de Cisalhamento Sul-brasileiro
peraluminosos. Este magmatismo foi iden-
(CCSb) por Bitencourt & Nardi (2000). Esta
tificado no interior do cinturão de
descontinuidade compreende diversas zonas
cisalhamento, em zonas de alta ou baixa
de cisalhamento anastomosadas, de espes-
deformação, constituindo a Suíte Paulo
sura quilométrica e cinemática dominante-
Lopes (Bitencourt et al., 2007), o Granito
mente transcorrente. A maior parte destas
Quatro Ilhas (Bitencourt & Nardi, 1993) e
zonas é subvertical, com direção variável
o Granito Quitéria (Koester et al., 2001),
entre NS e N60E, e deslocamento horário
entre outros. Esses granitóides, geralmente
ou anti-horário. Um regime de cisalhamento
porfiríticos grossos, são subalcalinos médio
compatível é registrado ao longo de zonas
a alto-K (K2O/Na 2O em torno de 2), com
de cisalhamento de direção ENE e baixo
teores de K2O + Na2O variando entre 7 e 9
ângulo de mergulho. Os dados disponíveis
(peso%), o que os torna semelhantes a gra-
apontam para condições de temperatura
nitos do tipo A. Suas razões FeO T /
compatíveis com as da fácies xistos verdes
(FeOT+MgO) variam de 0,7 a 0,9, indican-
a anfibolito inferior durante o estabeleci-
do diferentes graus de oxidação dos magmas,
mento das zonas que compõem o CCSb,
como discutido por Dall’Agnol & Oliveira
com as temperaturas sendo periodicamente
(2007).
elevadas por conseqüência da atividade
Diagramas utilizando elementos tra-
magmática continuada.
ços (Figuras 3c, 4c) ilustram um comporta-
O estudo integrado do magmatismo,
mento intermediário entre granitóides de
no interior do CCSb (Figura 1b), demons-
arco magmático maduro e intraplaca,
tra sua distribuição em zonas de alta defor-
posicionando-os como os granitóides pós-
mação, como na Zona de Cisalhamento
colisionais. O comportamento dos elemen-
Major Gercino (Bitencourt & Kruhl, 2000),
tos maiores e traços, bem como do grau de
ou em zonas de baixa deformação compre-
oxidação destes granitóides, os situa na tran-
endidas entre as zonas de cisalhamento prin-
sição de granitóides subalcalinos para os do
cipais (Peternell et al., 2007; Florisbal et al.,
tipo A. Essas variações são atribuíveis ao
2005, 2007). Os dados reunidos por
grau de interação dos magmas parentais
Bitencourt & Nardi (1993, 2000), Philipp et
toleíticos com fusões crustais, que atinge
al. (2000) e Florisbal et al. (2007) permiti-
máxima intensidade nos granitóides
ram estabelecer a dominância do
posicionados nas zonas de mais alta defor-
magmatismo subalcalino médio a alto-K, na
mação.
fase precoce (650-620 Ma), seguido por as-
Dados isotópicos (Rb-Sr, Sm-Nd, U- res de ETR (LaN 100-300, YbN 10±5), com
Th-Pb) e de elementos traços (Florisbal et anomalias negativas de Eu apenas nos ter-
al. 2005, 2007) indicam que os magmas mos muito diferenciados (SiO2 > 73 peso%).
toleíticos da Suíte Paulo Lopes provêm de Os granitóides de afinidade
fontes afetadas por subducção litosférica shoshonítica ocorrem tanto no interior do
prévia, tipo OIB e EM1, sugerindo ainda CCSb, onde apresentam caráter sintectônico,
que os granitóides cogenéticos resultam de como associados ao vulcanismo Hilário da
um grau variável de interação destes magmas Bacia do Camaquã, constituindo parte da
toleíticos com a crosta, controlada pela in- Associação Shoshonítica de Lavras do Sul
tensidade da deformação no interior das (Lima & Nardi, 1998). Seus padrões de ele-
zonas de cisalhamento. mentos traços (Figuras 3d, 4d) são similares
Associados aos estágios precoces da aos de granitóides pós-colisionais, com en-
transcorrência ocorrem também granitóides riquecimento em Sr, Ba e Rb. As idades dis-
sintectônicos peraluminosos, com duas poníveis situam-se entre 610 e 590 Ma
micas, cujas composições de elementos (Gastal et al., 2005). Os granitóides
maiores e traços são compatíveis com as de shoshoníticos, nas áreas afastadas do CCSb
magmas produzidos pela fusão crustal de e próximas das seqüências volcano-
gnaisses quartzo-feldspáticas (Bitencourt & sedimentares da Bacia do Camaquã, ocor-
Nardi, 1993; Nardi & Frantz, 1995; Koester rem associados a uma variedade de rochas
et al., 2001). plutônicas e vulcânicas cogenéticas, de bá-
Granitóides subalcalinos médio a alto sicas até ácidas. Ocorrem ainda lamprófiros
K, associados às rochas máficas, ocorrem espessartíticos (Lima et al., neste volume) que
também no interior de zonas de testemunham, ao lado das rochas básicas, a
cisalhamento mais jovens, como o Comple- importante adição mantélica que este
xo Granítico de Caçapava do Sul (Nardi & magmatismo representa.
Bitencourt, 1989), com idade de ca. 560 Ma São correlacionáveis a este
(Remus et al. 2000), sendo possivelmente magmatismo os Sienitóides Arroio do Silva
relacionados ao magmatismo pós-colisional e o Maciço Sienítico Piquiri, com granitos
do Cinturão Ribeira. ultrapotássicos comagmáticos (Plá Cid &
Nardi, 2006) e idades em torno de 611 ± 3
4.2 Granitóides de Afinidade Ma (Pb-Pb em zircão, Philipp et al., 2002).
Shoshonítica Este magmatismo sienítico, com lamprófiros
ultrapotássicos associados, tem sua origem
Granitóides de afinidade shoshonítica
por fusão do manto venulado constituído
são identificados por sua cogeneticidade
por clinopiroxênio-flogopita-anfibólio-
com rochas da série alcalina saturada em
apatita-granada-sulfetos sob pressões supe-
sílica shoshonítica (K2O > Na2O-2), dentre
riores a 3 GPa (Nardi et al., 2007). Estes
as quais os monzonitos e latitos são as mais
autores admitiram que essas porções do
características. Outras feições, em geral uti-
manto foram metassomatizadas por fluidos
lizáveis na identificação de granitóides com
relacionados com a subducção precedente
esta afinidade, são os teores de Sr > 400 ppm
(anterior a 700 Ma).
(para SiO2 < 73 peso%), razões FeOT /
(FeOT+MgO), nos granitóides e em seus
minerais ferromagnesianos, entre 0,7 e 0,9,
seu caráter metaluminoso e padrões regula-
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1. INTRODUÇÃO
Figura 1.
1 Mapa geológico de Lavras do Sul. Extraído e adaptado a partir de Reichl (1980), Gastal & Lafon (1998) e Bongiolo et al. (2006).
50 50 anos de Geologia
geocronológicos U-Pb que indicam um in- 0,705), isto é, baixas contaminações crustais.
tervalo de idade de aproximadamente 12 Ma Estes dados isotópicos são compartilhados
entre os dois tipos de rochas, havendo pelas composições shoshoníticas (núcleo do
superposição quando considerados os erros CILS). Gastal & Lafon (1998) advogam que
analíticos. No entanto, os autores admitem a transição entre os dois eventos magmáticos
que as fácies alcalinas são, relativamente, (shoshonítico e metaluminoso fortemente
mais tardias. alcalino - núcleo e borda, respectivamente,
do CILS ou CGL) poderia estar relacionada
As rochas shoshoníticas do núcleo do a heterogeneidades em pequena escala nas
CILS fazem parte da Associação fontes mantélicas, ou na interação manto-
Shoshonítica de Lavras do Sul (ASLS) crosta, cujas diferenças iniciais dos magmas
(Nardi & Lima, 1985; Lima & Nardi, 1992, parentais teriam sido posteriormente ampli-
1998). Nesta associação de rochas, estão adas durante a diferenciação magmática.
incluídos também os quartzo-monzonitos Babinski et al. (1996) apresentaram
e monzonitos, na porção norte do CILS, e resultados isotópicos em duas amostras do
o Monzodiorito Arroio do Jacques (com CGL. Uma amostra da fácies de núcleo
ressalvas devido a valores mais baixos das (shoshonítica) apresentou valor pouco ne-
razões Y/Nb, Gastal & Lafon, 1998) (Figu- gativo de xNd (t) = -0,2 e uma idade TDM de
ra 2). Lima & Nardi (1998) incluíram tam- 1.150 Ma. Outra amostra da borda alcalina
bém as rochas vulcanoclásticas da Forma- do plutão (pertita granito) mostrou um va-
ção Hilário (conglomerados vulcânicos, lor mais negativo de xNd (t) = -3,0 e uma
traquibasaltos a traquiandesitos e idade TDM correspondente de 1.350 Ma.
piroclásticas associadas), encaixadas a oeste Estes resultados levaram os autores a suge-
do CILS, bem como o Maciço Granítico rir que o granito Lavras foi derivado prima-
Santo Antônio e o Complexo Granítico San- riamente a partir da fusão de uma crosta ju-
ta Rita. venil do cinturão Vila Nova, com um grau
As rochas alcalinas que constituem o variável, mas pequeno, de contaminação a
pertita granito do CGL (sensu Nardi, 1984) partir de uma crosta mais antiga.
ou pertita granitos e sienogranitos do CILS
(sensu Gastal & Lafon, 1998) fazem parte da 3.1 Alterações Hidrotermais
Suíte Intrusiva Saibro (SIS), termo cunha- e Mineralizações Associadas
do por Hartmann & Nardi (1982) em refe-
Carvalho (1932) apresentou o primei-
rência ao reconhecimento de intrusões al-
ro estudo importante sobre as jazidas
calinas no oeste do ESRG. Segundo Gastal
auríferas de Lavras do Sul. O autor relatou
(1999), a SIS congrega rochas plutônicas
que os campos auríferos ocorrem tanto so-
(super) saturadas em sílica que evoluíram
bre o granito (Pitangueiras e Caneleira, Fi-
durante os últimos eventos do Ciclo
gura 1) como no andesito Hilário, a leste da
Brasiliano (540-580 Ma). São divididas em
cidade (Vista Alegre – na região da Volta
dois grupos: fortemente alcalinas e
Grande e Cerro Rico, Figura 1). Considera-
metaluminosas sensu strictu. As rochas do
va que o “enchimento” dos veios de quart-
pertita granito pertencem ao primeiro gru-
zo, tanto em uma região quanto na outra,
po e se caracterizam por apresentar uma
teria se dado pela ação hidrotermal e que as
forte assinatura mantélica (valores negativos
direções dos veios, tanto no granito como
de xNd, próximo à composição do manto
no andesito, eram de N50oW. Salientando,
primitivo) e baixas razões (87Sr/86Sr)i (0,704-
entretanto, que na Mina Dourada, por exem- também é encontrado nas rochas do CGL,
plo, os veios se apresentavam ortogonais a em referência às descrições de Carvalho
esta direção e que esta situação estrutural (1932) sem, contudo, mencionar o trabalho
ficava restrita às ocorrências no granito (trend do autor. Goñi (op cit.) reconheceu no CGL
N20o-40oE). O autor também apresentou o a presença de titanomagnetita, ilmenita,
primeiro relato da determinação de teores hematita, calcopirita, pirita e galena; enquan-
de ouro nos filões de diferentes frentes de to, nos andesitos, ocorrem “boas”
lavra, que oscilavam entre 5-40 g/ton. Des- magnetitas (com martitização avançada),
tacou, igualmente, a preferência do cobre em titanomagnetita, além dos sulfetos de Cu,
ocorrer no andesito em relação ao granito Fe e Pb. Apesar de o autor ter optado por
(ver Figura 1, área de Volta Grande). O tra- uma “granitização” dos sedimentos
balho de Carvalho (1932) descreveu com encaixantes como teoria para a geração do
precisão e cuidado suas observações e rela- CGL, no sentido metassomático, seguindo
tou resultados que atualmente ainda são ci- a escola francesa de Geologia do início do
tados. século XX, o trabalho foi uma primeira con-
Destaca-se a seguir o trabalho de tribuição importante na descrição da cro-
Teixeira & Leinz (1942), que apesar da in- nologia da deposição dos minerais
versão na cronologia geológica do andesito hidrotermais. Concentrando suas observa-
com o granito, mostra uma completa des- ções nos filões da Vista Alegre e Volta Gran-
crição da geologia local e das estruturas de, estabeleceu a seguinte ordem de cristali-
mineralizadas hidrotermais. Os autores zação: i) pirita; ii) hematita I e calcopirita;
posicionaram e realizaram três sondagens, iii) calcosina azul e branca, bornita rosa e
apresentando importantes descrições de lilás, hematita II, covelita primária e ouro;
campo, já que podiam contar com a exposi- iv) blenda e galena; v) covelita secundária,
ção do jazimento devido aos trabalhos de crisocola, malaquita, azurita, cuprita e
explotação que estavam em curso. Os auto- piromorfita. Como Carvalho (1932) e
res cubaram uma reserva de aproximada- Teixeira & Leinz (1942), também observou
mente 400.000 t de minério em que os teo- que as direções de posicionamento dos filões
res oscilavam em torno de 2-4 g/ton (cerca estavam, de forma mais importante, segun-
de 1.200kg de ouro). Na ocasião da pesqui- do NW. Atribuiu a origem das
sa, em 1937, a produção na área do Bloco mineralizações, tanto no CGL como nos
do Butiá era de quase 2kg Au/mês, com teor andesitos, ao granito e seus efeitos de “di-
médio de cerca de 3g/ton. Foi o primeiro fusão iônica”.
trabalho que descreveu o minério dissemi- Barbosa & Constantino (1961), estu-
nado na rocha granítica em Lavras do Sul dando o minério de cobre na região de Vol-
sendo que, na época, não havia registros de ta Grande, advogaram a “influência positi-
ocorrências similares no Brasil e estas eram va” do granito no andesito mineralizado,
inclusive raras no mundo. discutindo a influência do magmatismo
Posteriormente, Goñi (1961) apresen- granítico versus andesítico na formação das
tou um trabalho enfocando os aspectos jazidas do Seival e Camaquã. Ribeiro et al.
metalográficos, a partir da primeira análise (1966), ao estudarem as mineralizações na
detalhada ao microscópio ótico das rochas quadrícula de Caçapava do Sul, salientaram
mineralizadas de Lavras do Sul. Ele desta- que a mineralização cuprífera nas áreas de
cou que o cobre não ocorre apenas nas ro- Volta Grande e Vista Alegre (Figura 1) esta-
chas vulcânicas da Formação Hilário, mas ria “intimamente” ligada às rochas
Estas zonas de alteração seriam mais espes- aumento de perda ao fogo seria o indicador
sas na ZC e RTr do que no PG. No estágio da proximidade de mineralizações sulfetadas
mais avançado de alteração, na porção inte- e auríferas no CGL, sendo As e Ag os indi-
rior destas zonas propilitizadas, são obser- cadores mais específicos para trabalhos de
vadas rochas esverdeadas constituídas por pesquisa prospectiva.
quartzo e sericita e, localizadamente, calcita, Por fim, Mexias (1990) e Mexias et al.
contendo sulfetos disseminados e ouro. O (1990a, b) propuseram que a intrusão
autor apresentou uma discussão sobre a no- granítica teria atuado como fonte de calor
menclatura dessas rochas, chamando-as de na geração e manutenção de um sistema
beresitos. No PG, estas alterações mais in- hidrotermal cujas características, bem como
tensas foram chamadas de epissienitos, pela os padrões de zonação dos produtos de al-
primeira vez, referindo-se ao “minério teração, muito se assemelham ao que se
pirítico” disseminado. Ainda segundo o au- observa nos depósitos do tipo Cu-pórfiro.
tor, outra diferença petrográfica existente Cronologicamente, após a formação dos
entre as alterações na ZC e RTr, em relação cornubianitos junto ao contato do granito,
ao PG, é a maior abundância de sulfetos de através de fraturas interconectadas, os flui-
Cu, Pb, Zn e Mo nos primeiros. Através de dos finais do magmatismo granítico teriam
estudos de correlação e de trabalhos de cam- infiltrado a rocha encaixante, depositando
po, Nardi (1984) considerou dois tipos de as paragêneses minerais de mais alta tempe-
mineralizações auríferas associadas ao CGL: ratura do sistema hidrotermal (alteração
i) na ZC e RTr o ouro estaria associado a potássica). Muito mais sob a influência de
sulfetos de Cu-Pb e Zn, ii) no PG o ouro transferência de calor na forma condutiva,
estaria, principalmente, associado à pirita, teria ocorrido a formação de epidoto +
com pequena presença de sulfetos de Pb e clorita (+ actinolita nas porções mais próxi-
Zn. Nardi (op cit.) apresentou, hipotetica- mas do contato do granito), através da
mente, uma zonalidade para as interação dos fluidos com a rocha em
mineralizações de Lavras do Sul: i) Au-Fe microfraturas e poros estagnantes (alteração
nos pertita granitos, ii) Au-Fe-Cu na ZC e propilítica) (Mexias et al., 1993), com a com-
RTr (ocasionalmente acompanhado de Mo), posição química da rocha original influen-
iii) Cu-Au nas rochas vulcânicas próximas ciando a composição química dos minerais
ao CGL, iv) Pb-Ag (Au?) na seqüência formados no hidrotermalismo. Atuando de
vulcano-sedimentar mais afastada do CGL forma destrutiva na rocha, fluidos com
(área da Merita – Lima, 1985; Nardi & Lima, maior atividade de H+ percolaram, através
1988). Finalmente, atribuiu a geração das de fraturas, após e/ou concomitante à alte-
soluções hidrotermais à intrusão dos pertita ração propilítica, em condições de tempe-
granitos e outras intrusões alcalinas, tendo raturas equivalentes ou levemente superio-
estas sido responsáveis pelas mineralizações res (300oC), gerando mica branca + clorita
no PG, na ZC e RTr, bem como nas seqüên- + quartzo + pirita. Finalmente, encerrando
cias vulcânicas e sedimentares a leste (Figu- a atividade hidrotermal ou estando associa-
ra 2). O autor propôs para o ouro uma ori- da a um outro sistema, por exemplo, a
gem magmática, possivelmente associada à falhamentos mais recentes, ocorreu, através
fusão e lixiviação de rochas do tipo de fraturas, a circulação de fluidos com alta
greenstone belt (assim consideradas na épo- fCO2 e fO2, responsáveis pela deposição de
ca), aflorantes na região oeste do ESRG. O calcita, corrensita (Mexias et al. 1989),
Figura 2
2. Mapa geológico da região de Lavras do Sul/RS, indicando as rochas pertencentes à Associação Shoshonítica. Extraído
e modificado a partir de Lima & Nardi (1998).
Gastal et al. (1999), Remus et al. (1997, 2000), taram a idade de aproximadamente 594 Ma
Chemale (2000) e Bongiolo (2006). para todo o magmatismo, indicando que esta
Seguindo as etapas da evolução também seria a idade para a mineralização.
esquemática da Figura 3, tem-se: O nível erosional da superfície atual pode
1) Deposição dos sedimentos da For- ser representado por uma seção inclinada
mação Márica sobre um embasamento cons- com mergulho para SW, e direção aproxi-
tituído de gnaisses e metagranitóides (Figu- mada NW (Figura 3C). Esta possibilidade é
ra 3A), gerando depósitos aluviais, deltáicos aventada pela ausência das rochas extrusivas,
e marinho rasos entre 620 e 592 Ma. Segun- vulcânicas e piroclásticas, nas porções a W.
do Chemale (2000), a deposição destes A Figura 2 (Lima & Nardi, 1998) apresenta
sedimentos pode representar uma sedimen- um mapa geológico regional mostrando que,
tação de retroarco da Orogênese Brasiliana de leste para oeste, ocorre a seqüência vul-
(atrás do Arco Magmático); cânica do Hilário, passando pelo complexo
2) Ocorrência de uma instabilidade intrusivo, com as rochas da Formação
tectônica no Neoproterozóico, últimos es- Maricá no sul, até o embasamento consti-
tágios da Orogenia Brasiliana, associada a tuído pelos complexos de rochas gnáissicas
um processo de magmatismo, inicialmente e metagranitóides a oeste. A forma aproxi-
vulcânico, com seus produtos piroclásticos madamente elíptica do complexo intrusivo
e epiclásticos, porém de filiação geoquímica (Gastal & Lafon, 1998), quando considera-
shoshonítica a partir de magmas parentais do na sua totalidade (eixo maior aproxima-
basálticos (Lima & Nardi, 1998) (Figura 3B); damente NS), pode ser em razão de que a
3) O extravasamento das lavas atual exposição representa um nível
andesíticas foi seguido pela intrusão de um erosional inclinado em relação a sua forma
complexo de corpos ígneos (Gastal & Lafon, geológica natural, em geral, aproximadamen-
1998), também com filiação geoquímica te esférica.
shoshonítica, de dimensões e composições 4) Finalmente, na Figura 3D é apre-
diversas (sienogranitos, monzogranitos, sentada a configuração da geologia
monzodioritos, granodioritos, monzonitos simplificada atual, com o posicionamento
a quartzo monzonitos e quartzo dioritos) e esquemático das ocorrências minerais, se-
de caráter plutônico e também hipoabissal, gundo um controle estrutural preferencial
que geraram importante influência térmica de direção N70-80oW. Portanto, as porções
sobre as rochas vulcanoclásticas, com o a oeste e a sudoeste podem representar a
metamorfismo de contato atingindo até a exposição de rochas formadas em maiores
fácies hornblenda-hornfels (Ribeiro, 1983; profundidades do que aquelas hoje
Mexias, 1990) (Figura 3C). Provavelmente, aflorantes na porção leste, mostrando níveis
após um importante magmatismo plutônico, crustais diferentes ao longo da superfície
de caráter geoquímico alcalino, houve a co- aflorante atual da região.
locação de grande volume de rochas, pertita
granitos e sienogranitos, de distribuições
fundamentalmente circundantes ao comple- 4.1 Mecanismo proposto de circulação
xo intrusivo, aflorando principalmente nas de fluidos e mineralizações
porções W e SW. Os dados geocronológicos
É característica na área, a seqüência
não são unânimes em indicar que o
de pequenos corpos mineralizados alinha-
magmatismo alcalino foi mais recente que
dos ao longo de fraturamentos e ocorrendo
o shoshonítico. Remus et al. (2000) apresen-
Figura 3
3. Evolução geológica esquemática para a região de Lavras do Sul. A) Deposição dos sedimentos da Formação Márica
sobre um embasamento constituído de gnaisses e metagranitóides; B) Ocorrência de uma instabilidade tectônica no Neoproterozóico,
últimos estágios da Orogenia Brasiliana, associada a um processo de magmatismo; C) Intrusão de um complexo de corpos ígneos
de caráter plutônico e também hipoabissal, que geraram importante influência térmica sobre as rochas vulcanoclásticas, com o
metamorfismo de contato atingindo até a fácies hornblenda-hornfels; D) Configuração da geologia simplificada atual, com o
posicionamento esquemático das ocorrências minerais, segundo um controle estrutural preferencial de direção N70-80oW.
Figura 4.
4 Diagrama esquemático, extraído e modificado por Curewitz & Karson (1997), mostrando diferentes componentes
dentro de uma dinâmica de um sistema hidrotermal em que há a propagação da frente de uma falha onde, preferencialmente, os
fluidos poderiam ser canalizados e focalizados. Os depósitos de fontes quentes mais antigos são fossilizados para trás da linha de
propagação da falha.
de forma aproximadamente paralela (Figu- são deixadas para trás, cessam a atividade
ra 4). Em muitos locais, entre um corpo e em razão do fechamento dos caminhos per-
outro, não é mesmo observada a ocorrên- meáveis pela deposição da mineralização
cia de qualquer rocha alterada. Segundo hidrotermal. Com o desenvolvimento da
Curewitz & Karson (1997), stresses concen- falha e o avanço da área da linha de propa-
tram-se na área da linha de propagação (tip- gação, vai restar um alinhamento de depó-
line) da falha, onde é capaz de abrir fraturas sitos hidrotermais, adjacentes à falha, simi-
e focalizar o fluxo do fluido (“crescimento lar a uma trilha de pontos quentes das pla-
da falha”). Quando a falha propaga através cas litosféricas (Figura 4).
da crosta, a área da linha de propagação se Este tipo de mecanismo, proposto por
move. Fontes quentes individuais nas áreas Curewitz & Karson (1997), pode ser o res-
da linha de propagação vão morrer atrás da ponsável pelas seqüências, em direção a les-
região de quebramento, assim que o stress te, de pequenos depósitos. Entretanto, o
elevado, que mantém a permeabilidade da modelo dos autores é baseado em dezenas
fratura, migra com a área da linha de propa- de observações de depósitos epitermais de
gação. porções rasas da crosta. Fica a questão so-
Segundo aqueles autores, novas fon- bre: O que poderia ter acontecido nas por-
tes quentes vão se formar no limite da área ções mais profundas destes sistemas de fra-
da linha de propagação, assim que a região turas e de desenvolvimento de fontes quen-
de propagação migra, as fontes quentes, que tes, até mesmo nas porções internas das
intrusões magmáticas?
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1. INTRODUÇÃO
Figura 1
1. Esboço Geológico do Distrito Estanífero do Rio Grande do Sul.
2. Alteração hidrotermal associada à Suíte Cordilheira. A) Greisen gerado sobre o Granito Figueiras da Suíte Intrusiva
Figura 2
Cordilheira, constituído por mica branca, quartzo e turmalina; B) Greisen gerado em zona de mais alto strain do Granito Figueiras;
C) Turmalinito bandado e dobrado, desenvolvido em faixa de deformação milonítica, com quartzo recristalizado e turmalina
orientada.
3. A alteração hidrotermal associada aos corpos graníticos da Suíte Intrusiva Campinas. A) Greisen da Mina Campinas
Figura 3
posicionado em zona de contato com o Granito Figueiras, com presença de agregados do tipo mica fish contornados por mica
orientada; B) Greisen intra-cúpula da Mina Campinas; C) Greisen com turmalinito em posição intra-cúpula na Mina Campinas.
Ta e Sn, mesmo com uma boa correlação salinidade moderada, que acompanharam o
linear inversa, indica no núcleo da cassiterita posicionamento dos granitóides da Suíte
uma declividade negativa mais acentuada Intrusiva Cordilheira, com fluidos ricos em
que na borda dos grãos, onde ocorrem au- CO2, gerados a partir de xistos carbonosos
mentos mais acentuados de Sn. As correla- das encaixantes, mobilizados por efeitos tér-
ções que envolvem a participação de Ta, micos da injeção dos corpos graníticos da
confirmam o comportamento diferente do Suíte Intrusiva Campinas.
Ti para núcleo e borda dos grãos de As características das associações
cassiterita, com uma fraca a inexistente cor- hidrotermais, geradas durante o
relação no núcleo, sendo decrescente na posicionamento dos corpos graníticos das
borda. A relação entre Ti e Nb indica, tam- suítes intrusivas Cordilheira e Campinas,
bém, uma mudança no comportamento do indicam, além da composição dos fluidos, a
Ti na borda dos cristais. As modificações existência de mecanismos diferentes na
observadas na composição da cassiterita da atuação destes fluidos responsáveis pela al-
Mina Campinas, em particular nas diferen- teração. Na associação hidrotermal da Suíte
ças existentes entre núcleo e borda, decor- Intrusiva Cordilheira, há uma tendência de
rem do fato desta última ter mais alto Sn e distribuição mais ampla da alteração, envol-
do aumento no grau de correlação do Ti. vendo zonas com centenas de metros ao
Isto implica em uma estrutura e composi- longo das encaixantes, com um forte con-
ção próximas de uma cassiterita ideal. A trole estrutural representado por milonitos
correlação entre Ti, Ta e Nb, para a das faixas de mais alto strain da deformação
cassiterita da Mina Campinas, indica que o transcorrente. Na associação hidrotermal da
núcleo deste mineral tem composições si- Suíte Intrusiva Campinas, a circulação da
milares as da cassiterita gerada em granitos fase fluida foi restrita ao interior das cúpu-
da Suíte Intrusiva Cordilheira. A borda é las graníticas e à interface de contato entre
enriquecida, de forma relativa, em Ti, com cúpula e encaixante.
perda de Ta e Nb. A diferença no comportamento das
duas associações hidrotermais está relacio-
nada não apenas ao tempo do
4. O SISTEMA HIDROTERMAL – posicionamento dos corpos sin a tardi-
SUGESTÃO DE MODELO PPARA
ARA cinemático dos corpos da Suíte Intrusiva
MINERALIZAÇÃO Cordilheira e tardi a pós-cinemático das in-
jeções graníticas da Suíte Intrusiva Campi-
nas, ao longo das zonas de deformação
Os fluidos hidrotermais, identificados milonítica, mas pode, também, estar rela-
nas diferentes zonas de alteração que acom- cionada ao nível crustal de posicionamento.
panham os granitos das suítes intrusivas Um mecanismo que pode ter atuado
Cordilheira e Campinas, indicam a ausência na formação das associações hidrotermais,
de fluidos ortomagmáticos puros, no pro- com distribuição ampla ou restrita às zonas
cesso de formação das zonas de alteração de cúpula das intrusões, que teve conse-
hidrotermal e da mineralização. Os fluidos qüências estruturais na definição de zonas
que caracterizam os sistemas hidrotermais preferenciais de acumulação de fluidos
representam um processo de mistura de flui- (Pollard et al., 1991), está relacionado à pro-
dos magmático-metamórficos, gerados atra- fundidade em que estas ocorreram. Os de-
vés da interação de fluidos aquosos de pósitos minerais associados a zonas
Figura 4
4. Cassiterita da Mina Cerro Branco em veio de quartzo e intercrescida com mica. Os grãos são marcados pela presença de
grande quantidade de inclusões de quartzo e de mica. Indícios de recristalização são observados em parte da zona de margem
com a formação de uma cassiterita com aspecto límpido, sem inclusões. O perfil AB indica o comportamento dos principais
elementos de núcleo para borda e as modificações geradas por efeito da recristalização.
hidrotermais com distribuição ampla, em intrusão. Por seu turno, estas estão relacio-
geral, derivam de corpos graníticos nadas à profundidade de posicionamento da
posicionados em níveis mais profundos. Os intrusão (Chi et al., 1993) e a provável exis-
depósitos associados a cúpulas ou a posi- tência de um campo tensional definido. Este
ções periféricas, de forma mais comum, es- é o caso específico das zonas de alteração
tão relacionados a intrusões relativamente hidrotermal, geradas durante o
rasas. A capacidade de migração e separa- posicionamento dos granitóides da Suíte
ção das fases fluidas, com metais, está asso- Intrusiva Cordilheira.
ciada à mudança de um sistema de pressão No caso dos corpos graníticos da Su-
litostática, dentro da intrusão, para um sis- íte Intrusiva Campinas, um aumento de vo-
tema de pressão hidrostática, fora da lume associado à separação da fase fluida,
Figura 5
5. Cassiterita da Mina Campinas em veio de quartzo. Alguns grãos são marcados pela presença de uma zona de núcleo
com contatos bruscos e irregulares com uma zona de borda. O perfil AB indica o comportamento dos principais elementos do
centro para a margem dos grãos, com as modificações observadas entre as duas zonas.
politipo 2M1 indica que as micas brancas decorrente deste processo de mistura. A
presentes em greisen, dessas zonas Mina Cerro Branco pode também ter sofri-
hidrotermalizadas, foram formadas a altas do interferência deste processo, como é su-
temperaturas (Velde, 1965), possivelmente, gerido pela presença de fluidos carbônicos
em uma faixa entre 450 e 500°C. em fraturas tardias e em zonas de contatos
A intrusão dos granitóides da Suíte intergranulares de cristais de quartzo dos
Intrusiva Campinas provocou modificações veios mineralizados.
na composição de minerais das zonas de
alteração hidrotermal, associadas aos corpos
graníticos da Suíte Intrusiva Cordilheira. A 5. CONCLUSÕES
CONCLUSÕES
interação gerada pode ser demonstrada por
mudanças na composição de minerais como
turmalina, micas e, em particular, cassiterita. As principais conclusões, que podem
Este mineral, quando associado às zonas de ser apresentadas como decorrência dos
alteração hidrotermal relacionadas aos episódios geológicos e dos processos envol-
granitóides da Suíte Intrusiva Campinas, vidos na geração da mineralização de esta-
pode apresentar zonações irregulares, com nho na região leste do Escudo Sul-rio-
mudanças bruscas na composição. Tais fei- grandense, são:
ções indicam a presença de cristais - O magmatismo granítico da região
preexistentes de cassiterita que foram, par- leste do Cinturão Dom Feliciano, evoluiu
cialmente, reequilibrados por recristalização, segundo associações em estreito vínculo
ou que atuaram como núcleos de crescimen- com o ambiente tectônico e indica presen-
to de novos grãos de cassiterita. A segunda ça de crosta continental mais antiga;
possibilidade pode ser a que melhor repre- - A fase tectônica tangencial de baixo
senta os processos envolvidos. As zonas de ângulo gerou transporte de E-SE para W-
núcleo da cassiterita da Mina Campinas, têm NW, com colisão continental, e marca o iní-
composições semelhantes às de cassiterita cio do magmatismo granítico da região les-
associadas aos granitos da Suíte Intrusiva te do cinturão;
Cordilheira, enquanto as zonas de margem - A fase tectônica transcorrente tem
são mais ricas em Sn e Ti. seu registro inicial com a injeção de grani-
Os processos hidrotermais que atua- tos cálcio-alcalinos sin-cinemáticos sob re-
ram associados aos granitóides da Suíte gime traspressivo, de caráter intracontinen-
Intrusiva Cordilheira, foram responsáveis tal, e tem seguimento com a injeção dos
por amplas zonas de alteração geradas atra- leucogranitos peraluminosos da Suíte
vés da circulação de fluidos aquosos de ori- Intrusiva Cordilheira. Os granitóides da
gem magmático-metamórfica. Estes fluidos Suíte Intrusiva Cordilheira são de alta sílica
foram os prováveis formadores de depósi- e têm enriquecimentos anômalos em Sn;
tos como os da Mina Cerro Branco. A in- - Os granitóides sin-transcorrência da
corporação de fluidos carbônicos ao siste- Suíte Intrusiva Cordilheira são menos dife-
ma hidrotermal, através da injeção de ro- renciados e têm composições com biotita-
chas graníticas da Suíte Intrusiva Campinas, muscovita. As condições de cristalização
resultou em uma interação de fases fluidas mais diferenciadas, tardi-transcorrência, in-
aquosas e carbônicas, segundo um mecanis- dicam uma evolução das composições para
mo de mistura destes fluidos. A Mina Cam- tipos mais aluminosos com muscovita;
pinas representa a mineralização de estanho
1. INTRODUÇÃO
O Rio Grande do Sul tem grande destaque internacional como produtor de ge-
mas, com ênfase nos enormes depósitos de ametista e ágata nos basaltos da Formação Serra
Geral. O estado é o principal exportador desses minerais no Brasil e também o segundo
maior produtor e exportador brasileiro de gemas, ficando atrás somente de Minas Gerais,
sendo responsável por cerca de 50% do volume total de gemas produzidas no Brasil e 25% do
total das exportações (Souza, 1996). A produção mensal é da ordem de 300 a 400 toneladas
de material bruto e a comercialização atinge valores em torno de US$ 20.000.000,00 anuais.
No entanto, o setor gemológico ainda se caracteriza pela exportação de grandes quantidades
de pedra bruta e de produtos parcialmente elaborados, tendo como consequência um baixo
valor agregado ao minério. Os geodos são muitas vezes adquiridos por compradores interna-
cionais ainda encaixados no basalto, sendo depois retirados e exportados in natura.
A ágata e a ametista ocorrem em depósitos do tipo “geodo em basalto” (Bossi &
Cagiano, 1974), cristalizadas em cavidades decimétricas a métricas nas rochas vulcânicas da
Formação Serra Geral (Bacia do Paraná). No mesmo tipo de depósito podem ser encontra-
dos o quartzo cristal de rocha, quartzo róseo, calcita, apofilita, zeolitas, ônix, jaspe, opala,
gipsita (variedade selenita) e barita. Esses minerais aparecem geralmente constituindo agrega-
dos de grande beleza, sendo exportados para vários países como peças de coleção, gemas
ornamentais, ou como gemas lapidadas para o mercado joalheiro (Juchem et al.,1990).
Os principais depósitos de materiais gemológicos no Rio Grande do Sul são
mostrados na Figura 1. Além da origem dominante na Formação Serra Geral, existem outros
depósitos importantes, como os serpentinitos que ocorrem em no sudoeste do estado e as
madeiras fossilizadas na região de Santa Maria.
Instituto de Geociências. Contribuições
1. Materiais gemológicos no Rio Grande do Sul e seu contexto geológico. Modificado de Juchem et al. (2004).
Figura 1
Figura 2.
2 Esboço geológico regional da Bacia do Paraná e da Formação Serra Geral: 1) Sedimentos pós-vulcanicos; 2) Rochas do
embasamento Pré-Devoniano; 3) Rochas sedimentares da Bacia do Paraná; 4) Basaltos e andesitos (Formação Serra Geral); 5)
Rochas ácidas tipo Chapecó; 6) Rochas ácidas tipo Palmas; 7) Estrutura anticlinal; 8) Estrutura sinclinal; 9) Lineamentos tectônicos.
Modificado de Bellieni et al. (1986).
que permitem a extração de geodos mais geral estão totalmente preenchidas por ágata,
íntegros e ao mesmo tempo servem para mas, também podem ocorrem geodos par-
prospectar a continuidade da camada cialmente preenchidos (em geral, mais de
mineralizada. Os geodos são extraídos da 60%) por ágata e ágata mais quartzo inco-
rocha alterada remobilizada, com auxílio de lor. Calcita euédrica, agregados radiados de
ferramentas manuais como pás, picaretas, minerais opacos (óxidos de Fe e Mn) e mais
martelos e talhadeiras (Figura 3). raramente ametista, podem ocorrer como
Com base em dados petrológicos e minerais tardios. Óxidos de Fe e Mn em
estruturais, foram distinguidas 7 unidades agregados dendríticos também podem ocor-
vulcânicas em escala de mina nesse distrito rer como inclusões na ágata.
mineiro (Strieder & Heemann, 2006): 1a) A ágata de Salto do Jacuí é constituí-
Dacito inferior; 2 a) Basalto inferior; 3a) da de bandas sucessivas de quartzo
Dacito semi-vítreo inferior com estrutura microcristalino, granular e fibroso com
vesicular/amigdalóide; 4a) Basalto vesicular elongação negativa (calcedonia), em agrega-
mineralizado; 5a) Dacito vesicular; 6a) Dacito dos paralelos e esferulíticos. Pode ocorrer
semi-vítreo superior; 7a) Dacito superior quartzo fibroso com elongação positiva
(Figura 4). O basalto vesicular mineralizado (quartzino) e criptocristais dos polimorfos
tem uma espessura média de 4,0 a 6,0 m e é de sílica moganita e cristobalita de baixa tem-
constituído por uma rocha afanítica profun- peratura (Brum et al., 2000). A ágata pode
damente alterada, de cor cinza acastanhada ocorrer como bandas horizontais e/ou con-
e com uma estrutura vesicular/amigdalóide cêntricas em relação às paredes dos geodos,
bem marcada. Essa rocha exibe feições de por vezes, exibindo padrões complexos de
assimilação com a unidade vulcânica infe- deposição e gerando peças exóticas muito
rior (dacito semi-vítreo inferior) bem como apreciadas no comércio de gemas (Brum et
diques de arenito com metamorfismo de al., 1998). As cores nas diferentes bandas
contato, por vezes conectados a blocos ar- são cinza, cinza-azulado, azul fraco, casta-
redondados de arenito. Lentes de brecha nho, vermelho, preto e branco. A variedade
vulcânica, compostas por fragmentos de de cores e de padrões de deposição das ban-
arenito e de basalto, também foram obser- das gera um grande número de tipos de
vadas em algumas áreas mineralizadas. ágata, que são designados como “varieda-
Foram identificados também blocos des” na literatura gemológica, destacando-
de arenito com formas semelhantes aos se no Rio Grande do Sul a cornalina, o ônix,
geodos de ágata; certos geodos podem apre- a ágata dendrítica, a ágata orbicular e a ágata
sentar uma transição entre essas massas de cênica, dentre outras (Figura 5).
arenito e o preenchimento com ágata, exi- A estrutura microcristalina da ágata
bindo a seqüência arenito, seguido de inter- origina um grande número de microporos,
calações entre arenito e ágata e uma cama- os quais permitem que ela seja tingida (Fi-
da final de ágata (Strieder & Heemann, gura 5). Este é um processo industrial co-
2006). mum utilizado na ágata no Rio Grande do
Os geodos mineralizados dessa região Sul e consiste em um tratamento químico
têm formas arredondadas a elípticas e di- e/ou térmico para alterar ou acentuar suas
mensões médias entre 10 a 50 cm, mas po- cores, obtendo-se o vermelho, o azul inten-
dem ocasionalmente ocorrer geodos com so, o rosa, o violeta, o verde e o preto.
1 m de comprimento. Essas cavidades em
Figura 33. Garimpos de ágata no Distrito Mineiro de Salto do Jacuí (RS). A) Explotação de geodos a céu aberto e em pequenas
galerias subterrâneas; B) Cata manual dos geodos.
2.4 Ametista
Os principais depósitos de ametista
do Rio Grande do Sul estão localizados na
região do Médio-Alto Uruguai (norte do
Estado), na área denominada de Distrito
Mineiro de Ametista do Sul (DMAS) por
Santos et al. (1998). O distrito abrange uma
Figura 4.
4 Perfil litológico típico para as rochas vulcânicas do área de aproximadamente 500 km2, onde
Distrito Mineiro de Salto do Jacuí (RS), segundo Strieder & existem cerca de 370 garimpos ativos ou
Heemann (2006): 1) Dacito inferior; 2) Basalto inferior; 3)
Dacito semi-vítreo inferior com estrutura vesicular/ inativos, localizados em 10 municípios, com
amigdalóide; 4) Basalto vesicular mineralizado; 5) Dacito a maior produção se concentrando nos
vesicular; 6) Dacito semi-vítreo superior; 7) Dacito superior. municípios de Ametista do Sul, Planalto, Iraí
e Frederico Westphalen. Esses garimpos são
2.3 Opala desenvolvidos na rocha basáltica não
intemperizada, em galerias horizontais sub-
Opala de qualidade gemológica pode terrâneas com mais de 100 m de extensão,
ocorrer associada à ágata em Salto do Jacuí bem como em cavas e trincheiras a céu aber-
ou em municípios vizinhos, onde é extraída to (Juchem, 1999). O desmonte da rocha é
em áreas de cultivo agrícola ou em cortes feito com explosivos e os geodos extraídos
de estradas (Augustin et al., 2004). Essa opala manualmente com auxílio de martelos e
é ainda pouco conhecida, mas ocorrências talhadeiras (Figura 7).
de interesse comercial vem despertando um Em um estudo que abrangeu parte
novo interesse econômico para essa região. desse distrito mineiro, foram identificados
A opala pode ocorrer intercalada com 12 derrames basálticos, que foram separa-
camadas de ágata, cimentando brechas da dos em 2 tipos: tipo I, com 15 a 35 metros
rocha hospedeira, depositada de espessura e cor preta a cinza, e tipo II,
descontinuamente ao longo de feições de constituídos por derrames mais espessos e
fluxo da rocha vulcânica ou preenchendo de cor castanho a castanho-avermelhado
geodos milimétricos a centimétricos. As (Gomes, 1996). Dos sete derrames do tipo
Figura 5.
5 Ágata do Distrito Mineiro de Salto do Jacuí (RS). A) Geodos polidos e placas de ágata expostos em uma loja em
Soledade; B) Tingimento de geodos e placas de ágata; C) Ágata orbicular com um núcleo de quartzo macrocristalino; D) Ágata
cênica.
I (ver Figura 8), quatro deles (2, 6, 8 e 9) portador de geodos (3° derrame), possui
foram identificados como mineralizados a geodos preenchidos predominantemente
ametista (Gomes, 1996; Scopel, 1997; por cristais euédricos de calcita com dife-
Juchem, 1999). Em um estudo mais recente rentes formas, constituindo agregados de
no Distrito Mineiro de Ametista do Sul, fo- rara beleza.
ram identificados 21 derrames basálticos que Nesse distrito mineiro, são comuns os
hospedam 4 níveis portadores de geodos geodos cilíndricos alongados de dimensões
(Hammes, 2006). O nível mineralizado mais métricas, que podem chegar até a 4 metros
superior, relacionado ao 11° derrame da se- de comprimento. Em geral, estão preenchi-
qüência vulcânica, é o que apresenta a mai- dos parcialmente por uma seqüência de
or escala de produção tanto em espaço, ágata e quartzo incolor que grada progres-
quanto no tempo (Figura 8). Esse nível por- sivamente para ametista. A camada mais
tador superior apresenta uma estrutura ge- externa dessas cavidades é constituída por
ológica particular (Figura 9) e é o fornece- uma argila verde-azulada (celadonita) origi-
dor dos geodos e cristais de ametista de clas- nada, segundo Scopel (1997), por alteração
se mundial. Por outro lado, o primeiro nível hidrotermal do basalto hospedeiro.
Figura 6.
6 Opala do Rio Grande do Sul. A) Geodo preenchido por ágata e opala com jogo de cores. B) Opala com diferentes cores
e opala de fogo lapidada em cabochão.
Figura 7.
7 Garimpos de ametista no Distrito Mineiro de Ametista do Sul (RS). A) Trincheira a céu aberto; B) Galerias horizontais
subterrâneas com 2 m de altura, 3 m de largura e 200 m de comprimento; C) Entrada de uma galeria, com uma coluna de
sustentação do próprio basalto; D) Extração de um geodo bifurcado no basalto inalterado.
Figura 8
8. Representação esquemática dos 21 derrames do Distrito Mineiro de Ametista do Sul (RS) e do posicionamento estrutural
dos 4 níveis portadores de geodos, comparados com o perfil geológico de Gomes (1996). Modificado de Hammes (2006).
Figura 9
9. Estratigrafia em escala de mina do principal nível portador de geodos no Distrito Mineiro de Ametista do Sul (RS), de
acordo com Amorim et al. (2005) e Amorim (2007, em preparação).
(um positivo e um negativo) e um prisma intenso, podendo alguns cristais exibir to-
hexagonal pouco desenvolvido (Juchem et nalidades castanhas e/ou avermelhadas.
al., 2002). A cor varia desde violeta muito
claro até violeta escuro em diferentes tona- 2.5 Outros depósitos de ágata
lidades, sendo mais intensa na parte apical e ametista no Rio Grande do Sul
dos cristais. É comum a zonação de cor bem
Depósitos de ágata e ametista, entre
como distribuição irregular de cor. As prin-
os municípios de Quaraí e Santana do Li-
cipais inclusões são marcas de crescimento,
vramento, são explorados de forma esporá-
fraturas secas e cicatrizadas e inclusões cris-
dica há vários anos. Apesar da produção ir-
talinas de goethita, calcita e calcedônia, além
regular, essa região tem-se destacado como
de inclusões fluidas monofásicas aquosas e
produtora de ametista de cor violeta inten-
raras inclusões bifásicas aquosas pseudo-
so, com tonalidades azuladas e bastante
secundárias ou secundárias (Juchem, 1999;
límpida, com excelente qualidade para a
Juchem et al., 2002; Fischer, 2004).
lapidação. O derrame portador de geodos
A cor violeta da ametista é devida a
mineralizados é o terceiro de uma seqüên-
um centro de cor causado por íons Fe4+, que
cia de quatro unidades, constituído por
são gerados por ionização do Fe3+, o qual
basalto-andesitos e brechas vulcânicas, que
ocorre em pequenas quantidades nos
podem estar intercalados com arenitos
cristais de quartzo (Fischer et al., 1998). Par-
intertrápicos da For mação Botucatu
te da produção de ametista é submetida a
(Augustin et al., 2006). Os geodos
tratamento térmico, que modifica o seu cen-
mineralizados são explotados em colúvios
tro de cor, originando citrino, a variedade
e aluviões e também na rocha intemperizada,
amarela de quartzo (Figura 11). As cores ob-
de onde são extraídos manualmente após a
tidas variam de amarelo pálido até amarelo
rocha ser excavada com tratores de esteira
Figura 10.
10 Geodos do Distrito Mineiro de Ametista do Sul (RS). A) e B) Geodos mineralizados à ametista expostos em uma loja
em Soledade. O geodo maior (fotografia B) tem 3,16 m; C) Ametista e cristais prismáticos euédricos de calcita tardia.
Figura 11.
11 Minerais do Distrito Mineiro de Ametista do Sul. A) Agregado paralelo de cristais tabulares de selenita (40-60 cm)
crescidos sobre quartzo. B) Seleção de fragmentos de citrino (ametista tratada termicamente) pela cor. C) Ametista e citrino
lapidados; as pedras maiores têm 12 a 15 quilates.
Figura 12
12. Serpentinito beneficiado em Bagé (RS), observando-se um fragmento da rocha bruta e um vaso ornamental (20 cm de
altura) confeccionado artesanalmente no mesmo tipo de rocha.
Juchem, P.L.; T.M.M. Brum, C. Fischer, N.L. Alegre. 34p. Trabalho de conclusão do curso de
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e Cerro da Mantiqueira, RS, Brasil. Porto
C Caracterização Tecnológica
das Rochas Ornamentais
do Estado do Rio Grande do Sul
Ruy Paulo Philipp1, Clovis Gonzatti2, Ivone M. Agostini2,
Marcus Vinicius Dorneles Remus1, João Alberto Fiorentini2
1. INTRODUÇÃO
Figura 1.
1 Mapa geotectônico com as principais unidades que compõem a porção sul da Plataforma Sul-Americana (modificado de
Chemale Jr., 2000).
Caracterização Tecnológica das Rochas Ornamentais do Estado do Rio Grande do Sul 201
Instituto de Geociências. Contribuições
Figura 2.
2 Mapa de localização das principais jazidas dos granitos estudados no Batólito Pelotas.
Caracterização Tecnológica das Rochas Ornamentais do Estado do Rio Grande do Sul 203
Instituto de Geociências. Contribuições
composto por coxilhas alongadas, sem gran- mente, nos 1º e 2º pisos do Aeroporto In-
des áreas de exposição e com manto de al- ternacional Salgado Filho, em Porto Alegre.
teração com espessuras métricas. Deste gru- Na região de Encruzilhada do Sul, ocorrem
po é explorado um monzogranito denomi- ainda as litologias do Sienito Piquiri (comer-
nado CINZA CANGUÇU (Canguçu). cialmente denominadas de MARROM
Um segundo grupo de rochas é cons- GUAÍBA) que apresentam cor castanha e
tituído pelos granitóides das suítes Viamão se constituem na principal jazida de rocha
e Encruzilhada do Sul, caracterizados por ornamental do Rio Grande do Sul.
corpos de composição monzogranítica e Uma terceira parcela da área do
textura porfirítica, com megacristais de K- Batólito Pelotas está ocupada por corpos
feldspato de cores claras como cinza, bege, leucograníticos, de composição sienograní-
laranja e rosa. Nestas unidades, são freqüen- tica a FK-granítica, pertencentes a Suíte
tes estruturas magmáticas, como orientação Dom Feliciano. Estes granitos possuem for-
dimensional de megacristais e acumulação mas alongadas, segundo a direção N40-
de K-feldspato e/ou de minerais máficos 50ºE, e mostram um posicionamento con-
(biotita e hornblenda). Nas regiões de Ser- trolado pela reativação de zonas de
tão Santana, Cerro Grande, Canguçu, Pi- cisalhamento dúcteis de escala continental.
nheiro Machado, Piratini e Arroio Grande, Os granitos possuem texturas equigranulares
estes corpos comumente apresentam forma e cores rosadas, avermelhadas, alaranjadas
alongada, segundo a direção N40-50ºE, e e, eventualmente, castanho claro. O relevo
mostram um posicionamento controlado destacado e a presença abundante de lajea-
pelas zonas de cisalhamento dúcteis de alto dos rochosos fazem deste grupo de grani-
ângulo com a mesma direção. O relevo mais tos a principal reserva ornamental do Esta-
destacado e a presença freqüente de cam- do. Entre as unidades graníticas exploráveis,
pos de matacões e áreas com lajeados, fa- destacam-se os granitos Cerro dos Cachor-
zem com que este grupo de granitos seja ros (denominado ROYAL RED – Pinheiro
bastante explorado. Entre as unidades Machado), Ponta Grossa (COLORADO
comercializáveis, destacam-se o Granito GAÚCHO – Viamão), Serra do Herval
Barão do Triunfo (comercialmente denomi- (VERMELHO BORDÔ, BORDÔ CRIS-
nados de OURO GAÚCHO, PRATA TAL – Cristal), Dom Feliciano (VERME-
GAÚCHO, PRATA SERTANENSE, LHO GUAÍBA, ROSA GUAÍBA – Guaíba)
OURO SERTANENSE – Sertão Santana; e Cerro do Sandi (ROSA PIRATINI), e a
ORANGE KIZI – Pelotas), o Granito Ar- fácies eqüigranular do Granito Encruzilha-
roio Moinho (AZUL BOREAL – Canguçu) da (VERMELHO ENCRUZILHADA –
e o Granito Chasqueiro (CINZA ARROIO Encruzilhada do Sul).
GRANDE – Arroio Grande). Na região de Novas variedades ainda estão sendo
Encruzilhada do Sul, ocorre uma ampla ex- pesquisadas, com destaque para as rochas
posição de granitos da Suíte Encruzilhada de coloração escura (preta), como os gabros
do Sul, onde a fácies porfirítica do Granito alcalinos do Dique Rondina (Santana da Boa
Encruzilhada é muito explorada. Entre as Vista), os dioritos, associados ao Granito
unidades desta suíte que são comercializadas, Encruzilhada do Sul, e os leucogranitos de
destacam-se o ROSA ENCRUZILHADA, cor branca, como os granitos Cordilheira,
o BEGE PÉROLA, o MINUANO e o Arroio Francisquinho e Figueiras, perten-
CORAL. As variedades Bege Pérola e Rosa centes a Suíte Cordilheira (Encruzilhada do
Encruzilhada foram utilizadas, conjunta- Sul, Arroio dos Ratos e Butiá).
Caracterização Tecnológica das Rochas Ornamentais do Estado do Rio Grande do Sul 205
Instituto de Geociências. Contribuições
3. ASPECTOS IMPOR
IMPORTTANTES manchamento e a deterioração da rocha, a
NO ESTUDO D AS ROCHAS
DAS baixa dilatação térmica linear, para garantir
ORNAMENT AIS
ORNAMENTAIS estabilidade do revestimento, a alta resistên-
cia ao desgaste, quando usado em pisos, a
alta resistência à flexão, quando de sua utili-
Os estudos para a caracterização zação em revestimento fixado por ancora-
tecnológica de rochas ornamentais devem gem metálica, além do aspecto estético, ao
considerar os diferentes aspectos que envol- tornar o ambiente agradável.
vem o seu aproveitamento na construção Do ponto de vista prático, para a se-
civil, na indústria em geral, ou ainda, como leção do conjunto de ensaios capazes de
objetos de arte e decoração. avaliar convenientemente as características
De um lado, estão as solicitações e os do material, é importante conhecer, clara-
esforços que são impostos à rocha durante mente, os objetivos que estão associados às
sua extração nas jazidas, seu beneficiamento diferentes modalidades de ensaios. Cada
nas serrarias (teares), seu manuseio nas modalidade possui características próprias,
marmorarias e sua utilização final, os quais que permitem submeter a rocha a um de-
dependem das funções que a mesma irá de- terminado tipo de exigência, simulando as
sempenhar ao longo da vida útil da obra. condições de uso nas obras de engenharia.
De outro, estão as qualidades necessárias Na Tabela 1, podem ser vistos os ensaios
para que a rocha possa oferecer uma boa recomendados para a caracterização de uma
performance durante o seu uso. rocha ornamental em função da sua aplica-
Entre as solicitações impostas à ro- ção.
cha, destacam-se o corte e o desgaste na fase Por outro lado, as especificações téc-
de preparação dos blocos e chapas, a nicas estabelecem os limites aceitáveis para
alterabilidade devido à secagem e as diferentes propriedades dos materiais ro-
umedecimento, à expansão e contração tér- chosos, relacionados com os procedimen-
mica, à ação de agentes químicos e das águas tos de ensaios normalizados para a sua de-
da chuva, e os esforços de compressão, tra- terminação em laboratório. Estes limites
ção e flexão (Frazão & Paraguassu, 1998; representam a garantia de um comporta-
Frazão, 2002). Outros aspectos importan- mento ideal das rochas durante a vida útil
tes estão relacionados a própria função da da obra. No Brasil, até o presente momen-
rocha no embelezamento de fachadas, na to, não existem especificações técnicas con-
proteção contra os agentes intempéricos, no solidadas pela Associação Brasileira de Nor-
suporte das cargas impostas pela passagem mas Técnicas (ABNT). Na Tabela 2, cons-
de pedestres e veículos ou quando usada tam as sugestões de especificações feitas por
com a função estrutural em colunas ou pi- profissionais nacionais com larga experiên-
lares, além de facilitar a limpeza e manter a cia na área e constantes na literatura técnica
higidez no ambiente. nacional (Frazão & Farjalat, 1995, 1996).
Entre as qualidades desejáveis ao tipo Normalmente, as especificações téc-
de rocha, são importantes a alta resistência nicas empregadas para o enquadramento de
ao intemperismo e aos agentes químicos rochas ornamentais, como granitos, mármo-
agressivos (que ocorrem na atmosfera e nos res, gabros, dioritos, sienitos, calcários e
produtos de limpeza), quando usados em arenitos, que são as litologias mais utilizadas
revestimentos externos, a baixa capacidade para consumo no País ou para fins de ex-
de absorção de líquidos, visando impedir o portação, são as adotadas pela American
Society for Testing and Materials (ASTM). A comparado com os limites definidos no es-
Tabela 3 apresenta os limites estabelecidos tudo das rochas silicáticas brasileiras, utili-
para cada propriedade da rocha, dependen- zadas como rochas ornamentais, seguindo
do do tipo litológico, segundo a ASTM, sugestão de autores nacionais (Tabela 4).
Tabela 1
1. Solicitações impostas, funções e qualidades desejáveis às rochas ornamentais (adaptado de Frazão & Paraguassu, 1998;
Frazão, 2002).
Caracterização Tecnológica das Rochas Ornamentais do Estado do Rio Grande do Sul 207
208
Ruy Paulo Philipp et alli
Instituto de Geociências. Contribuições
Tabela 2
2. Ensaios recomendados para a caracterização de mármores e granitos em função da aplicação da rocha (adaptado de Frazão et. al., 1993).
50 50 anos de Geologia
3. Limites estabelecidos para o uso de diferentes tipos rochas ornamentais, segundo a ASTM.
Tabela 3
Caracterização Tecnológica das Rochas Ornamentais do Estado do Rio Grande do Sul 209
210
Ruy Paulo Philipp et alli
Instituto de Geociências. Contribuições
Tabela 4.
4 Limites sugeridos para especificação de rochas ornamentais, segundo Frazão & Farjallat (1995, 1996).
50 50 anos de Geologia
Figura 3
3. Resultados da massa específica aparente seca para as diferentes litologias.
Caracterização Tecnológica das Rochas Ornamentais do Estado do Rio Grande do Sul 211
Instituto de Geociências. Contribuições
Figura 4
4. Resultados da velocidade de propagação de ondas para as diferentes litologias estudadas.
Figura 5
5. Resultados da absorção de água para as diferentes litologias estudadas.
Figura 6
6. Resultados da porosidade aparente para as diferentes litologias estudadas.
Figura 7
7. Resultados do desgaste por abrasão Amsler para as diferentes litologias estudadas.
de lavra, são utilizados equipamentos rudi- cipal para o corte do matacão ou para
mentares, embasados no uso de explosivos reparos/regularização das faces dos blocos.
caseiros, associados a um ferramental carac- Somente na lavra do Sienito Piquiri
terizado por ponteiras, alavancas e marretas. (MARROM GUAÍBA), na divisa dos
Em algumas lavras, são utilizados de modo municípios de Cachoeira do Sul e Encruzi-
muito restrito, equipamentos mecanizados lhada do Sul, tem-se uma extração mecani-
como perfuratrizes roto-pneumáticas, prin- zada com características industriais (Figura
cipalmente, para a obtenção do furo prin- 11). Nesta área, o desmonte e o corte dos
blocos são feitos através de um processo
Caracterização Tecnológica das Rochas Ornamentais do Estado do Rio Grande do Sul 213
Instituto de Geociências. Contribuições
Figura 8
8. Resultados da determinação do brilho para as diferentes litologias estudadas.
Figura 9.
9 Vista geral da lavra em matacões do granito Encruzilhada, na sua variedade Bege Pérola, interior de Encruzilhada do Sul.
com características industriais, com base na competitivo. Esta extração, também consi-
utilização de perfuratrizes roto-pneumáticas dera estratégica a organização do espaço
dispostas em trilhos metálicos e em cortes da lavra e o seu planejamento para a obten-
laterais com fio diamantado (Figuras 12 e ção de uma vida útil elevada e uma diminui-
13). Esta tecnologia resulta em uma produ- ção dos custos operacionais.
tividade mensal elevada e num preço final
Figura 10.
10 Vista geral da lavra em matacões do granito Encruzilhada, na sua variedade denominada Coral, interior de Encruzilhada
do Sul.
Figura 11
11. Vista geral de uma das lavras mecanizadas do Sienito Piquiri, destacando a organização da área de extração e os
equipamentos utilizados.
Caracterização Tecnológica das Rochas Ornamentais do Estado do Rio Grande do Sul 215
Instituto de Geociências. Contribuições
Figura 12.
12 Vista em detalhe da lavra do Sienito Piquiri, destacando a delimitação do corte principal da lavra por perfuratrizes roto-
pneumáticas.
Figura 13.. Vista em detalhe da lavra do Sienito Piquiri, destacando a delimitação do corte lateral por fio diamantado.
6. CONCLUSÕES
CONCLUSÕES Agradecimentos
O primeiro autor agradece ao CNPq
Ainda que algumas litologias tenham (Proc. No 309232/2003-1, de Ruy Paulo
sido estudadas através de uma limitada quan- Philipp), pela concessão de bolsa de Produ-
tidade de ensaios, especialmente em algu- tividade em Pesquisa e a CIENTEC, em
mas modalidades, no geral, tratam-se de ti- especial dos membros do Departamento de
pos litológicos que apresentam excelente Geotecnia, pela experiência positiva da co-
qualidade nos diferentes quesitos conside- operação conjunta e pela divulgação parcial
rados para que o material tenha bom de- dos ensaios tecnológicos das rochas do Rio
sempenho quando utilizado como rocha Grande do Sul. Os autores agradecem ain-
ornamental na construção civil e para ou- da a Mineração Serra Geral Ltda., pelo aces-
tros fins. so as áreas de lavra do Sienito Piquiri.
Destacam-se, principalmente com re-
lação aos granitos estudados, suas excelen-
tes propriedades mecânicas caracterizadas 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIC AS
BIBLIOGRÁFICAS
pela baixa absorção/porosidade, elevada
resistência ao desgaste abrasivo e os eleva-
Associação Brasileira de Normas Técnicas.
dos valores obtidos para o brilho. Estes re-
1992. NBR 12766: Rochas para revestimento:
sultados ressaltam a excelente qualidade dos determinação da massa específica aparente,
granitos gaúchos para uso como revesti- porosidade aparente e absorção d’água
mentos internos, externos e como piso. aparente. Rio de Janeiro.
É importante acrescentar, ainda, que
as virtudes apresentadas pelas rochas estu- Associação Brasileira de Normas Técnicas.
dadas não significam que as mesmas não 1992. NBR 12768: Rochas para revestimento:
análise petrográfica. Rio de Janeiro.
possam apresentar mudanças de qualidade
dentro de uma única jazida. As rochas or- American Society of testing and Materials
namentais são matérias-primas sujeitas aos Standards. 2006. ASTM C 119: Terminology
ditames da natureza, sendo válidas, portan- relating to dimension stone.
to, as recomendações anteriores quanto à American Society of testing and Materials
necessidade de ensaios específicos de con- Standards. 2005. ASTM C 503: Specification
trole de qualidade do produto durante o for marble dimension stone (exterior).
processo de explotação da jazida.
As limitações relacionadas ao tipo de American Society of testing and Materials
lavra e ao processo de extração estão asso- Standards. 2003. ASTM C 568: Specification
for limestone dimension stone.
ciadas à ausência de políticas públicas e de
investimentos provenientes dos poderes fe- American Society of testing and Materials
deral e estadual, como a disponibilização de Standards. 2003. ASTM C 615: Specification
recursos para a implantação de pólos regio- for granite dimension stone.
nais de desenvolvimento industrial através American Society of testing and Materials
da criação de unidades de serrarias e lavras Standards. 2003. ASTM C 616: Specification
mecanizadas. for quartz-based dimension stone.
Caracterização Tecnológica das Rochas Ornamentais do Estado do Rio Grande do Sul 217
Instituto de Geociências. Contribuições
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Caracterização Tecnológica das Rochas Ornamentais do Estado do Rio Grande do Sul 219
Centro de Investigação do Gondwana, Instituto de Geociências,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1. INTRODUÇÃO
Figura 1.
1 Mapa de localização da Bacia do Paraná na América do Sul e geologia simplificada do Rio Grande do Sul (modificado
de Souza & Marques-Toigo, 2005).
Figura 2.
2 Sumário estratigráfico da Superseqüência Gondwana I (Milani & Zalán, 1999), compreendendo os depósitos do
Paleozóico Superior da Bacia do Paraná (modificado de Souza, 2006), com destaque à distribuição no Rio Grande do Sul.
3. UNIDADES
UNIDADES palinológicos em testemunhos de sonda-
PALINOBIOESTRATIGRÁFIC
ALINOBIOESTRATIGRÁFIC AS
TIGRÁFICAS gem e afloramentos através da bacia tem
permitido a construção de esquemas
bioestratigráficos que refletem o desenvol-
Grãos de pólen e esporos são os vimento e a evolução dos vegetais terres-
palinomorfos mais comumente registrados tres, com níveis de aparecimento e desapa-
no Carbonífero e Permiano da Bacia do recimento de táxons relacionados às contí-
Paraná e, de maneira geral, possuem com- nuas mudanças ambientais que controlaram
portamento muito semelhante aos detritos o desenvolvimento das floras ao longo do
inorgânicos nos sítios deposicionais, sendo tempo.
transportados, a partir da planta-mãe, pelo Nesse contexto, as unidades
vento ou pela água. Como resultado, eles são palinobioestratigráficas vigentes para o
amplamente dispersos em termos geográfi- Paleozóico Superior da Bacia do Paraná são
cos, o que lhes confere um dos atributos do tipo “Zonas de Intervalo” (Murphy &
essenciais para fins bioestratigráficos. Sua Salvador, 1999), ou seja, palinozonas com
distribuição através de distintos ambientes limites inferior e superior caracterizados por
permite ainda seu uso nas correlações entre níveis de aparecimento e/ou desaparecimen-
sedimentos de natureza continental e mari- to de determinadas espécies, o que atribui
nha. Por outro lado, são encontrados relati- maior operacionalidade em termos geográ-
vamente de forma abundante em determi- ficos, uma vez que reflete mudanças
nados estratos (principalmente rochas não ambientais de caráter regional.
oxidadas, de granulometria fina) e refletem As palinozonas permianas do Estado
a evolução das plantas, com presença de di- do Rio Grande do Sul foram formalmente
versas espécies de curta distribuição estabelecidas com base em limites de apare-
estratigráfica. O registro de conjuntos cimento e desaparecimento de determina-
dos táxons, conforme sintetizado a seguir.
agoulaensis e Weylandites lucifer, bem como de de Daemon & Quadros (1970), e se estende
Marsupipollenites striatus, que praticamente desde as porções superiores da Formação
ocorre por toda sua extensão. O surgimento Rio Bonito até os depósitos das formações
dessas espécies representa um significativo Serra Alta e Rio do Rastro, sendo menos
datum bioestratigráfico para a bacia. Esta representada na última unidade. Grãos de
palinozona é correlata aos intervalos K-L pólen monossacados e esporos são menos
comuns nessa palinozona.
3. Esporos e grãos de pólen selecionados ocorrentes na Zona Vittatina costabilis. a: Punctatisporites gretensis (MP-P
Figura 3
5068, coordenada England Finder Y33-4); b: Converrucosisporites confluens (5165, P45); c: Lundbladispora braziliensis (5068,
R41-1); d: Vallatisporites splendens (5061B, L57-1); e: Caheniasaccites flavatus (4033, R54); f: Vittatina costabilis (3573, G36-
2); g: Protohaploxypinus goraiensis (324, R35-1); h: Illinites unicus (4033, U50); i: Striatopodocarpites fusus (4446, H41).
Escala correspondente a 20 µm. Todas as lâminas (sob codificação MP-P) estão depositadas na Palinoteca do Departamento de
Paleontologia do Instituto de Geociências da UFRGS.
4 Esporos e grãos de pólen selecionados ocorrentes na Zona Lueckisporites virkkiae. a: Thymospora criciumensis (MP-P
Figura 4.
1447, coordenada England Finder J24); b: Alisporites nuthalensis (P344C, O25); c: Marsupipollenites striatus (4033, Q45); d:
Lueckisporites virkkiae (2541, W33); e: Lueckisporites stenotaeniatus (46, Q39); f: Vittatina subsaccata (2541, R35-1); g:
Staurosaccites cordubensis (2541, U41). Outros palinomorfos comuns. h: Quadrisporites horridus (5069, E56-1); i: Portalites
gondwanensis (5061C, R34). Escala correspondente a 20 µm. Todas as lâminas (sob codificação MP-P) estão depositadas na
Palinoteca do Departamento de Paleontologia do Instituto de Geociências da UFRGS.
e Santos et al. (2006), respectivamente. Esta do sido mapeados no passado como forma-
última datação, realizada através da razão U/ ções e membros. Por isso, nota-se que
Pb (método SHRIMP) obtida em zircões de comumente os limites de seqüências coin-
cinzas vulcânicas presentes na Formação cidem ou estão muito próximos aos limites
Irati no Estado do Paraná, datum litoestratigráficos das unidades na Bacia do
estratigráfico para a bacia, apontou idade de Paraná (Holz & Kuchle, 2003).
278,4 ± 2.2 M.a., correspondente ao Diversos autores trabalharam na
Artinskiano tardio (Cisuraliano). Esse dado estratigrafia de seqüências do Permiano no
se coaduna com datações absolutas obtidas Rio Grande do Sul. Condensando as con-
tanto em estratos de unidades correlatas da cepções e propostas, um arcabouço de se-
Bacia do Paraná na África quanto em ou- qüências de terceira ordem é mostrado na
tras bacias da América do Sul (ver síntese Figura 5 e foi baseado em Holz & Carlucci
em Césari, 2006). (2000) e Menezes (2000), cuja bioestratigra-
Desse modo, tem-se introduzido um fia é baseada em palinomorfos (Souza &
caráter mais confiável aos posicionamentos Marques-Toigo, 2003, 2005; Souza, 2006).
biocronoestratigráficos das palinozonas da Nota-se que os principais limites
Bacia do Paraná, incluindo aquelas litoestratigráficos coincidem com limites de
ocorrentes no Estado do Rio Grande do Sul. seqüências. Alguns, como no caso do limite
No entanto, o problema está longe de ser que marca a passagem do Subgrupo Itararé
plenamente resolvido, uma vez que há da- para a Formação Rio Bonito, contêm um
dos controversos. A idade de 267,1 ± 3,4 hiato bastante significativo. No entanto,
Ma obtida para a Formação Rio Bonito no ambas unidades, no Estado, incluem uma
Rio Grande do Sul por Matos et al. (2001), única unidade palinobioestratigráfica, a
por exemplo, merece melhor análise tendo Zona Vittatina costabilis. Como já exposto,
em vista que não encontra correlação com as diferenças composicionais refletem dis-
informações de estratos bioestratigrafica- tintas paleocomunidades florísticas e, por-
mente semelhantes na África e Argenti- tanto, ecozonas. Tais comportamentos fo-
na. ram observados por Holz & Dias (1998)
com base nas relações quantitativas entre
4.3 Estratigrafia de seqüências e a esporos e grãos de pólen, sendo aí possível
palinologia também a identificação da discordância en-
tre o Subgrupo Itararé e a Formação Rio
Devido à sua lenta subsidência, ba-
Bonito, relativa a uma significativa queda no
cias intracratônicas tendem a ser continen-
nível de base. Contudo, em termos de
tais a parálicas/marinhas rasas, e seu regis-
operacionalidade bioestratigráfica, os ele-
tro pode conter hiatos significativos (Einsele,
mentos guias são praticamente os mesmos,
2000). Assim, a natureza intracratônica da
relacionados à progressiva melhoria climá-
Bacia do Paraná propiciou um preenchimen-
tica ocorrida após o evento glacial permo-
to sob regime de pouca geração de espaço
carbonífero.
(i.e., accomodation reduzida em comparação
A melhor similaridade de resultado
com outros tipos de bacias) e com geome-
entre a palinobioestratigrafia e a estratigrafia
tria muito tabular, onde as mudanças
de seqüências é a discordância registrada
faciológicas geradas pela queda do nível de
entre os níveis mais superiores da Forma-
base (= geração de limites de seqüências)
ção Rio Bonito, coincidindo com o limite
produzem depósitos planos e extensos, ten-
dentre as zonas Vittatina costabilis e & Quadros, 1970; Souza & Marques-Toigo,
Lueckisporites virkkiae. Do ponto de vista 2005), abrangendo todas as seqüências
palinológico, nota-se expressiva melhoria deposicionais do Permiano Médio a Supe-
climática, com o aparecimento de inúmeras rior. Nota-se que as variações dos níveis de
espécies de morfologias indicativas de con- base mapeadas nas unidades após a Forma-
dições mais quentes (grãos de pólen teniados ção Palermo não possuem relação direta
e poliplicados). Em termos de estratigrafia com as mudanças nas paleocomunidades
de seqüências, trata-se do incremento da fase vegetais. Por outro lado, há necessidade de
transgressiva, sendo que o afogamento má- refinamento desse pacote, uma vez que os
ximo (maximum flooding surface) é marcado na palinomorfos são extremamente raros a par-
Formação Palermo. A Zona Lueckisporites tir da Formação Serra Alta, o que pode, de
virkkiae ocorre a partir desse limite Rio Bo- certa forma, esconder informações sobre
nito/Palermo, alcançando até níveis infe- mudanças paleoclimáticas com reflexos nas
riores da Formação Rio do Rastro (Daemon comunidades vegetais.
5 Quadro integrativo com geocronologia (conforme Gradstein et al., 2004), unidades litoestratigráficas, seqüências de
Figura 5.
terceira ordem (Holz & Carlucci, 2000; Menezes, 2000) e palinozonas (Souza & Marques-Toigo, 2005) identificadas no Permiano
do Rio Grande do Sul (Ï% datação de Santos et al., 2006).
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ANEX
ANEXOO 1.
BASE NOMENCL ATURAL D
NOMENCLA AS ESPÉCIES CIT
DAS AD
CITADAS
ADAS
E ILUSTRAD
ILUSTRADAS
USTRADAS
ESPOROS:
GRÃOS DE PÓLEN:
ALGAS:
FUNGOS:
1. INTRODUÇÃO
Figura 1. Mapa de localização das principais jazidas de carvão do estado do Rio Grande do Sul, com destaque para Candiota.
Figura 2. Reconstituição da unidade de paisagem relacionada à turfeira geradora da “Camada Candiota Superior” em nível relativo
de mar baixo. Comunidades vegetais representadas nas microfloras:1 - comunidade hidrófila nos corpos lagunares; 2, 3 - comunidades
higrófilas nas margens das lagunas ou em terras baixas e alagadiças, próximas ao corpo d’águas; 4 - comunidade mesófila em
terras baixas, próximas à laguna, porém melhor drenadas; 5 - comunidade xerófila em terras baixas, drenadas, mais distantes do
corpo lagunar ou em terras mais altas.
Figura 3. Reconstituição das comunidades vegetais relacionadas à unidade de paisagem apresentada na Figura 2. 1 - comunidade
higrófila (algas e incertae sedis, abundantes); 2, 3 - comunidades higrófilas(filicófitas, esfenófitas e licófitas herbáceas dominantes,
licófitas arbustivas ou arborescentes menos representadas na microflora); 4 - comunidade mesófila (glossopteridófitas e cordaitófitas,
em proporções menores); 5 - comunidade xerófila (coníferas pouco representadas na microflora ).
Figura 4. Reconstituição da unidade de paisagem relacionada à turfeira geradora da “Camada Candiota Inferior” em nível relativo
de mar alto. Comunidades vegetais representadas nas microfloras: 1 - comunidade higrófila nos corpos lagunares; 2, 3 - comunidades
higrófilas nas margens das lagunas ou em terras baixas e alagadiças próximas ao corpo dágua; 4 - comunidade mesófila em terras
baixas, próximas à laguna, melhor drenadas; 5 - comunidade xerófila em terras baixas, drenadas, mais distantes do corpo lagunar
ou em terras mais altas.
Figura 5. Reconstituição das comunidades vegetais relacionadas à unidade de paisagem apresentada na Figura 4. 1 - comunidade
hidrófila (algas e incertae sedis pouco frequentes); 2, 3 - comunidades higrófilas (filicófitas, esfenófitas e licófitas arborescentes
abundantes e bem refletidas na microflora ); 4 - comunidade mesófila (glossopteridófitas e cordaitófitas em proporção maior do
que no cenário anterior ); 5 - comunidade xerófila (coníferas também mais representadas na microflora).
3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIC AS
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A Análises Dendroclimatológicas
no Gonduana Sul Brasileiro
Margot Guerra-Sommer1, Etiene Fabrin-Pires1,
Laureen Sally da Rosa Alves2, Miriam Cazzulo-Klepzig1
1. INTRODUÇÃO
Figura 1. Mapa geológico simplificado da Bacia do Paraná com os maiores elementos tectono-estratigráficos e localização dos
afloramentos (segundo Milani, 2003).
Figura 2. a) Afloramento Pedreira de Calcário Vitti (Membro Assistência – Formação Irati - São Paulo); b) detalhe do afloramento
da Pedreira de Calcário Vitti; c) afloramento Linha São Luis (Triássico Superior – Rio Grande do Sul).
Figura 33. a) Barakaroxylon resiniferum: anel de crescimento, vista geral; b) Barakaroxylon resiniferum: anéis de crescimento: limite
entre lenho final e lenho inicial; c) Morfogênero B: anel de crescimento, vista geral; d) Morfogênero B: anéis de crescimento: limite
entre lenho final e lenho inicial; e) Morfogênero B: 1 - falso anel de crescimento, 2 - verdadeiro anel de crescimento; f) Morfogênero
B: medula solenóide com canal central e canais periféricos.
Figura 4. a) Sommerxylon spiralosus: vista transversal com evidência megascópica de anéis de crescimento; b) Sommerxylon
spiralosus: anel de crescimento vista geral; c) Sommerxylon spiralosus: anéis de crescimento: limite entre lenho final e lenho
inicial.
Tabela 1
1. Compilação dos dados sobre anéis de crescimento.
mada por dados geológicos e florísticos restrição nas precipitações. Estes ciclos sa-
(Fowell & Olsen, 1993). zonais, provavelmente anuais, eram inter-
A deposição da Superseqüência rompidos por freqüentes secas ocasionais
Gondwana II (Milani, 2003), no sul da Ba- intermediárias na estação de crescimento.
cia do Paraná, ocorreu de acordo com Holz Os diferentes ciclos anuais de crescimen-
& Scherer (1998) em condições úmidas, ca- to, influenciados por fatores endógenos, fo-
racterizadas por uma estação chuvosa bem ram afetados por fatores externos,
demarcada para o pacote Neotriássico. A centrados principalmente na disponibilida-
correlação com outras seqüências triássicas de hídrica e fotoperíodo.
permitiu observar a tendência de aumento
de umidade ao longo do Triássico Supe-
rior em diferentes regiões do Pangea. To- 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIC AS
BIBLIOGRÁFICAS
davia, o fator controlador da alternância cli-
mática verificada não é identificado pelos
autores. Alves, L.S.R. & Guerra-Sommer, M. 2005.
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Bacia do Paraná. Desta forma, a diminui- Amaral, S.E. 1971. Geologia e Petrologia da
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ção da planície aluvial teriam afetado a Paulo. Boletim do Instituto de
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ais e o estabelecimento de uma planície flu- do efeito térmico das intrusivas ígneas nas
vial arenosa, com canais e lagos rasos rochas geradoras da For mação Irati/
efêmeros favoreceriam a migração das Membro Assistência. Curitiba: Petróleo
coníferas desde ambientes meso-xerófilos Brasileiro. 260 p. Relatório interno.
afastados até esses nichos, em um clima Arnold, C.A. 1947. An Introduction to
sazonalmente árido. Paleobotany. New York: McGraw-Hill Book.
Os dados obtidos com os padrões 433 p.
reconhecidos nos anéis de crescimento de
Sommerxylon spiralosus, coadunam-se com Beck, C.N. 1953. A New Root Species of
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modelos climáticos propostos para o
40:226-233.
Triássico que indicam amplos ciclos sazo-
nais, provavelmente anuais. As fases de Brea, M.1998. Análisis de los anillos de
crescimento em cada ciclo ocorriam de crecimiento en leños fósiles de coníferas de la
forma lenta e em condições homogêneas; For mación La Meseta, Isla Seymour
por outro lado, as fases periódicas de res- (Marambio) Antártida. Asociación
trição ao crescimento eram pouco exten- Palentológica Argentina, Publicación
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1. INTRODUÇÃO
266 Roberto Iannuzzi, Paulo Alves de Souza, Claiton Marlon dos Santos Scherer, Michael Holz
50 50 anos de Geologia
Figura 1
1. Fitozoneamento para os depósitos permianos do Rio Grande do Sul como originalmente proposto por Guerra-Sommer
& Cazzulo-Klepzig (1993).
268 Roberto Iannuzzi, Paulo Alves de Souza, Claiton Marlon dos Santos Scherer, Michael Holz
50 50 anos de Geologia
270 Roberto Iannuzzi, Paulo Alves de Souza, Claiton Marlon dos Santos Scherer, Michael Holz
50 50 anos de Geologia
Figura 2.2 Perfil estratigráfico do afloramento Morro do Papaléo mostrando a distribuição dos táxons de plantas fósseis, dos níveis
fossilíferos, das unidades litoestratigráficas, dos paleoambientes, das biozonas (duas fitozonas e uma palinozona) e das seqüências
estratigráficas. Fitozonas conforme Guerra-Sommer & Cazzulo-Klepzig (1993); palinozona segundo Souza & Marques-Toigo
(2003, 2005). Modificado de Iannuzzi et al. (2003a, b).
272 Roberto Iannuzzi, Paulo Alves de Souza, Claiton Marlon dos Santos Scherer, Michael Holz
50 50 anos de Geologia
1999), que corresponde aos depósitos do Formação Rio Bonito, ocorre entre as su-
Subgrupo Itararé no Rio Grande do Sul. O perfícies SB 2 e TS 3, atravessando o limite
limite superior desta zona é, aparentemen- de seqüência SB 3; isto corresponde ao in-
te, coincidente com o limite de seqüência tervalo que vai da porção inferior da segun-
SB 2 que equivale ao limite entre as unida- da seqüência (S II) à porção inferior da ter-
des Itararé / Rio Bonito (Figura 3). Em re- ceira seqüência (S III) de terceira-ordem de
lação as duas subzonas dessa zona, i. é Holz (1997, 1999) (Figura 3).
subzonas Gangamopteris obovata e Phyllotheca Em termos do arcabouço palinológi-
indica, o limite entre elas não pode ser preci- co do Estado, delineado por Souza & Mar-
samente delimitado dentro da seqüência S I ques-Toigo (2003, 2005), a Zona Botrychiopsis
de Holz (1997, 1999). Já a Zona Glossopteris/ plantiana é equivalente à Suzona
Rhodeopteridium, que se distribui ao longo da Protohaploxypinus goraiensis da Zona de
Figura 33. Correlação entre os arcabouços cronoestratigráfico, bioestratigráfico (baseado em plantas fósseis e palinomorfos) e
estratigráfico (lito- e estratigrafia de seqüências) do Permiano Inferior da Bacia do Paraná no Rio Grande do Sul. Cronoestratigrafia:
estrela marcar idade obtida por Santos et al. (2006) para Formação Irati (278,4+2,2 Ma). Modificado de Iannuzzi et al. (2007).
Cronestratigrafia de acordo com Gradstein et al. (2004).
274 Roberto Iannuzzi, Paulo Alves de Souza, Claiton Marlon dos Santos Scherer, Michael Holz
50 50 anos de Geologia
Figura 4
4. Fitozoneamento de Guerra-Sommer & Cazulo-Klepzig (1993) modificado a partir dos trabalhos de Iannuzzi & Souza
(2005), Iannuzzi et al. (2003a, b; 2006a), Jasper et al. (2003, 2005) e Tybusch (2005). Note os novos táxons introduzidos e as
diferentes idades e distribuições estratigráficas sugeridas para as fitozonas e táxons previamente assinalados. Baseado em Guerra-
Sommer & Cazulo-Klepzig (1993).
276 Roberto Iannuzzi, Paulo Alves de Souza, Claiton Marlon dos Santos Scherer, Michael Holz
50 50 anos de Geologia
Figura 5.
5 Alguns dos principais táxons-guias das biozonas propostas no fitozoneamento de Guerra-Sommer & Cazulo-Klepzig
(1993). A) Botrychiopsis plantiana; B) Phyllotheca indica (= P. australis); C) Cheirophyllum speculare; D) Brasilodendron pedroanum;
E) Glossopteris occidentalis; F) Botrychiopsis valida; G) Asterotheca sp.; H) Coricladus quiteriensis; I) Rhodeopteridium sp.
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C Construção, Acumulação
e Preservação do Paleoerg Botucatu
Claiton Marlon dos Santos Scherer,
Luis José Tomazelli, Karin Goldberg
1. INTRODUÇÃO
2. CONTEXTO GEOLÓGICO
unidade é limitada na base por uma ral, no poço de Alto Piquiri, perfurado na
discordância regional, passível de ser região onde o pacote vulcânico é mais es-
rastreada em toda a bacia. É composta do- pesso, resultaram em idades entre 136,6 ±
minantemente por depósitos eólicos, repre- 1,5 Ma e 130,8 ± 0,6 Ma (Onstott et al.,
sentados por estratos cruzados de grande 1993). Posteriormente, Turner et al. (1994)
porte (1 a 30 m), interpretados como de- realizou datações com base em amostras
pósitos residuais de dunas eólicas (Almeida, distribuídas ao longo de toda a bacia e de-
1953; Bigarella & Salammuni, 1961). Estu- terminou uma idade de 137 ± 0,7 Ma para
dos faciológicos de detalhe, realizados na as manifestações vulcânicas mais antigas
porção sul da área de afloramentos da For- que, em concordância com o trabalho de
mação Botucatu, permitiram a reconstru- Onslott (op. cit.), indicam que o término da
ção morfológica das dunas eólicas, indican- acumulação eólica da Formação Botucatu
do dunas eólicas crescentes simples a ocorreu no início do Cretáceo. Entretanto,
localizadamente compostas e draas linea- a determinação da idade de início da sedi-
res complexos (Scherer, 2000; Scherer, mentação da Formação Botucatu é proble-
2002). Por vezes, a base da Formação mática. Tomando como base os icnofósseis
Botucatu inclui conglomerados e arenitos de vertebrados identificados nos estratos
conglomeráticos depositados por inunda- eólicos, Bonaparte (1996) atribui uma ida-
ções em lençóis e arenitos grossos a muito de Neojurássica-Eocretácea para a Forma-
grossos interpreados como depósitos de ção Botucatu, hipótese esta admitida por
lençóis de areia eólicos (Bigarella & Milani et al. (1998) para a elaboração do
Salamuni, 1961; Soares, 1975; Almeida & arcabouço estratigráfico do Mesozóico da
Melo, 1981; Scherer, 2002; Scherer & Bacia do Paraná. No entanto, conforme dis-
Lavina, 2006). A Formação Botucatu apre- cutido por Scherer et al. (2000), a íntima
senta espessuras que variam de 0 até 400 relação dos arenitos com as lavas e a
metros, sendo que as maiores espessuras inexistência de supersuperfícies dentro do
encontram-se na porção noroeste da Bacia pacote eólico sugere que a Formação
do Paraná (Milani, 1997). Os arenitos Botucatu compreende um intervalo de tem-
eólicos são sobrepostos pela sucessão de po mais reduzido. Dessa forma, conside-
rochas vulcânicas da Formação Serra Ge- ra-se que o início da sedimentação eólica
ral, com espessuras de 300 a 800 metros. da Formação Botucatu ocorreu no final do
Ao que parece, as lavas “congelaram” du- Jurássico.
nas eólicas que se encontravam migrando
ao longo da bacia, preservando integral-
mente as suas morfologias (Scherer, 2002). 3. CONTEXTO PALEOGEOGRÁFICO
Em decorrência do contato concor-
dante entre as formações Botucatu e Serra
Geral, as datações das rochas vulcânicas da Em termos paleogeográficos, o
For mação Serra Geral oferecem um Jurássico foi caracterizado pela fragmenta-
referencial geocronológico seguro para o ção do supercontinente de Pangea. Entre
término da sedimentação eólica da Forma- o final do Jurássico e o início do Cretáceo
ção Botucatu. Deter minações a separação do Gondwana e da Laurásia
radiométricas Ar/Ar realizadas em amos- encontrava-se bastante desenvolvida, com
tras das rochas vulcânicas coletadas em di- um amplo oceano separando os dois con-
versos níveis dentro do pacote Serra Ge- tinentes (Scotese, 2003). Além disso, o
284 Claiton Marlon dos Santos Scherer, Luis José Tomazelli, Karin Goldberg
50 50 anos de Geologia
nível eustático foi alto durante este inter- Superior (mais ou menos 90 milhões de
valo de tempo, com amplas regiões da anos), resultante de mudanças no campo
Laurásia sendo inundadas, possibilitando tensional que aconteceram na crosta du-
assim o desenvolvimento de extensos ma- rante a evolução do Atlântico Sul (Lelarge
res epicontinentais. O Gondwana, por sua et. al., 1994). A presença de arenitos
vez, apresenta depósitos marinhos somente correlatos em território africano
na margem oriental e numa estreita faixa (Mountney et al., 1998; Stanistreet &
da região de retroarco andino. No interior Stollhofen, 1999) indica que a área
do continente dominou uma sedimentação deposicional da Formação Botucatu era
estritamente continental, destacando-se os mais extensa que aquela circunscrita pelos
depósitos eólicos da Formação Botucatu seus atuais limites erosivos. Entretanto, a
(Figura 1). Esta ausência de mares extensão original do paleoerg Botucatu
epicontinentais no interior do Gondwana consiste em um ponto não resolvido.
é reflexo da paleotopografia do continen- A Formação Botucatu apresenta uma
te, constituindo-se de um amplo platô com nítida diminuição de espessura em direção
cotas superiores a 100 metros, desenvolvi- ao sul, indicando que o Escudo Sul-rio-
do em decorrência do alto fluxo térmico e grandense era um alto topográfico à época
do conseqüente alto freeboard continental, da acumulação eólica (Scherer, 2000, 2002).
semelhante ao que é hoje observado na Esta unidade estende-se em direção su-
África (Worsley et al., 1984). doeste, extrapolando o território brasilei-
O final do Jurássico ao início do ro. No Uruguai, o pacote eólico é designa-
Cretáceo é marcado por profundas mudan- do For mação Riveira (Ferrando &
ças tectônicas no Gondwana. Durante este Montana, 1988), enquanto na Argentina
intervalo de tempo intensificaram-se os (Bacia Chaco-Paraná) é denominado For-
processos de fragmentação do megaconti- mação São Cristobal (Padula & Mingramm,
nente, marcados pelo desenvolvimento do 1969; Pezzi & Mozetic, 1989; Garrazino,
sistemas de riftes continentais que viriam 1995), correspondendo aos níveis superio-
a dar origem ao Atlântico Sul. Enquanto res desta unidade. A presença de arenitos
ocorreu o desenvolvimento de bacias riftes grossos, interpretados como de origem flu-
na porção sul e nordeste do continente sul- vial, intercalados com as dunas eólicas de
americano, a região ocupada pela Forma- topo da Formação São Cristobal (Pezzi &
ção Botucatu consistia em uma área Mozetic, 1989), indica um contexto de
cratônica onde se desenvolveu uma ampla margem de erg que, segundo Scherer
bacia topográfica que acumulou um paco- (2000), estender-se-ia até a encosta andina,
te significativo de depósitos de dunas onde os depósitos conglomeráticos da For-
eólicas (Figura 1). mação Barranca (Bacia de Cuyo) represen-
Existem dúvidas sobre a extensão tariam as fácies mais proximais do paleoerg
original do paleoerg Botucatu. O limite les- Botucatu.
te da Formação Botucatu é claramente Na porção oeste da bacia, os arenitos
erosivo, marcado por um abrupto desapa- da Formação Botucatu são mapeados até
recimento dos arenitos eólicos contra a o Paraguai, onde são denominados Forma-
Serra do Mar. Esta tectônica deformadora ção Missiones, (Clerici et al., 1986), poden-
está relacionada a movimentos epirogené- do terem se estendido até a Bolívia, onde
ticos positivos que ocorreram em toda a Sempere (1995) descreve um pacote de
borda leste da Bacia do Paraná no Cretáceo arenitos eólicos amalgamados denominados
Figura 1
1. Mapa paleogeográfico da porção sudoeste do Gondwana durante o final do Jurássico e o início do Cretáceo. Modificado
de Scotese (2003).
286 Claiton Marlon dos Santos Scherer, Luis José Tomazelli, Karin Goldberg
50 50 anos de Geologia
(Figura 2) o que sugere uma área fonte de Botucatu ao longo de toda a faixa aflorante
sedimentos a sudoeste. Dessa forma, a hi- leste e norte da bacia (Soares, 1975) sugere
pótese mais provável é que um volume sig- a existência de drenagens locais que trans-
nificativo das areias do Botucatu resulta- portaram sedimentos para o paleoerg.
ram de retrabalhamento de sistemas flu- A disponibilidade de um grande vo-
viais, cuja área fonte estava vinculada a al- lume de areia para construção do paleorg
tos topográficos existentes na borda oci- Botucatu está diretamente vinculada à con-
dental do Gondwana. Segundo Mpdozis & figuração paleogeográfica e paleoclimática
Ramos (1988), a margem oeste da Améri- do Gondwana. A presença de uma ampla
ca do Sul apresentou um arco magmático cadeia de montanhas na borda oriental do
que se estendia de forma contínua desde a Gondwana deve ter impedido que os ven-
Bolívia até o Sul da Patagônia durante o tos provenientes do oeste deslocassem umi-
Jurássico-Cretáceo. Na região de retroarco, dade para o interior do continente, produ-
desenvolveu-se um conjunto de bacias zindo uma ampla faixa de aridez. Além dis-
extensionais que recebeu uma intensa se- so, os ventos provenientes de norte (Mar
dimentação continental. Dentro deste con- de Tétis) adentravam grandes distâncias no
texto, cabe ressaltar a Formação Barrancas, interior do Gondwana, até alcançar a área
aflorante na Bacia de Cuyo e nas regiões deposicional da Formação Botucatu, tor-
vizinhas, que se caracteriza por conglome- nando-se extremamente seco. Desta forma,
rados arroxeados os quais se encontram a existência de uma extensa região árida no
subjacentes a um espesso pacote basáltico interior do Gondwana reduziu a umidade
de idades entre 124 Ma e 131 Ma (Legarreta do substrato, diminuindo a cobertura ve-
et al., 1993). Ainda em território argentino, getal e disponibilizando assim um grande
em direção a leste, os depósitos conglome- volume dos sedimentos aluviais para o
ráticos intercalam-se com arenitos fluviais retrabalhamento eólico.
e eólicos do Grupo Gigantes (Bacia de
Beazley, Rivarola & Di Paola, 1992), suge-
rindo a existência de uma ampla planície 5. ACUMUL AÇÃO DO PALEOERG
ACUMULAÇÃO
aluvial que forneceu suprimento sedimen- BOTUC
BOTUCAATU
tar para o paleoerg Botucatu. Entretanto,
existem algumas evidências que sugerem a
presença de altos topográficos no interior A acumulação eólica refere-se à de-
Gondwana que também serviriam como posição total de sedimentos através do tem-
área fonte de sedimentos. Nos estados do po, gerando um corpo tridimensional de
Paraná, São Paulo e Minas Gerais, os es- estratos que pode ser incorporado ao re-
tratos cruzados da Formação Botucatu in- gistro geológico (Kocurek & Havholm,
dicam uma paleocorrente das dunas eólicas 1993). A existência de dunas eólicas em uma
para sul (Figura 2) (Bigarella & Salamuni, determinada área não implica, necessaria-
1961; Scherer & Goldberg, 2007), sugerin- mente, na acumulação sedimentar. A maio-
do uma área fonte dos sedimentos a partir ria dos campos de dunas e ergs são caracteri-
de sistemas fluviais provenientes da por- zadas somente pela deposição, sem que
ção setentrional da bacia (Cráton do São ocorra cavalgamento de dunas eólicas (i.e.
Francisco?). Em concordância com isto, a areia é depositada na face frontal e a duna
presença de conglomerados e arenitos con- migra, mas nenhuma sucessão vertical
glomeráticos na base da For mação ou acumulação é formada). A acumulação
288 Claiton Marlon dos Santos Scherer, Luis José Tomazelli, Karin Goldberg
50 50 anos de Geologia
Figura 2
2. Mapa paleogeográfico da Bacia do Paraná, no final do Jurássico e início do Cretáceo, mostrando o vetor médio dos
estratos cruzados e a posição inferida da zona de convergência intertropical (ZCIT). As setas maiores indicam o sentido dos
ventos previstos pelo modelo geral de circulação atmosférico para o Jurássico Superior (Moore et al., 1992). As paleolatitudes e
a palegeografia foram baseadas em Scotese (2003).
delineiam o fim da acumulação em uma de- cia de uma ampla bacia topográfica, simi-
terminada área. A arquitetura de fácies do lar ao que é observado hoje nos ergs do
paleoerg Botucatu, marcada pela Saara (Wilson, 1973). Entretanto, o padrão
sobreposição direta de estratos cruzados de ventos existentes na porção central do
de dunas eólicas sem a ocorrência de de- Gondwana, durante o final do Jurássico e
pósitos de interdunas (Scherer, 2000; 2002), início do Cretáceo, consistiu também em
permite classificar esta unidade como um um fator determinante para a acumulação
sistema eólico seco (terminologia de eólica. Conforme ressaltado por Scherer &
Kocurek & Havholm, 1993). Os sistemas Goldberg (2007), o padrão para NE do sen-
eólicos secos representam um contexto tido de mergulho dos estratos cruzados, na
onde o nível do lençol freático encontra- porção sul da área aflorante da Formação
se abaixo da superfície deposicional e ne- Botucatu, indica paleoventos dominantes
nhum fator de estabilização controla a se- que sopravam de SW, enquanto o sentido
dimentação. Sendo assim, todo o sedimen- de mergulho predominantemente para
to no substrato é potencialmente disponí- SSW, na porção setentrional da bacia, su-
vel para o transporte eólico. Os processos gere o predomínio de ventos monsonais
de deposição, bypass e erosão ao longo do oriundos de norte. Por sua vez, a região
substrato são controlados unicamente pela que hoje corresponde ao Estado do Paraná,
configuração aerodinâmica (Kocurek & marcada por uma ampla dispersão do sen-
Havholm, 1993). A acumulação em siste- tido de mergulho dos estratos cruzados,
mas eólicos secos requer, usualmente, um sugere uma zona de convergência de ven-
alto suprimento sedimentar e não ocorre tos, definindo a posição da ITCZ (Figura
até que a superfície deposicional alcance 2). Este padrão convergente gera uma de-
uma condição de saturação de areia (zonas saceleração dos ventos e uma conseqüente
saturadas), marcada pelo cavalgamento de retenção de areia no sistema, favorecendo
dunas eólicas sem o desenvolvimento de a acumulação eólica.
interdunas planas. Para que as condições O término da acumulação eólica e o
de saturação da superfície deposicional se- consenqüente desenvolvimento de uma
jam alcançadas e ocorra a acumulação supersuperfície estão relacionados a um rá-
eólica, é necessário um decréscimo na taxa pido e extenso vulcanismo da Formação
de transporte e/ou um decréscimo na con- Serra Geral. Uma série de feições preser-
centração com o passar do tempo (Kocurek vadas no contato sedimento lava (Figura
& Havholm, 1993). Em sistemas eólicos se- 3) sugere que os derrames vulcânicos da
cos, onde o influxo é constante e a maioria Formação Serra Geral recobriram campos
dos sedimentos é transportada através de de dunas eólicas ativos da For mação
dunas, a desaceleração do fluxo é a causa Botucatu, indicando que não existe um hia-
mais comum do decréscimo na taxa de to temporal entre as duas unidades
transporte e concomitante acumulação. A estratigráficas. Entre as inúmeras evidên-
desaceleração ocorre principalmente em cias de contemporaneidade entre a sedi-
virtude da expansão do fluxo ao adentrar mentação eólica e os fluxos de lavas, pode-
em uma área deprimida (bacia topográfi- se destacar: (1) a preservação dos estratos
ca) ou da convergência de ventos. de dorso das dunas (topset) (Figura 3A), (2)
A ampla área de ocorrência do o desenvolvimento de brechas vulcânicas
paleoerg Botucatu sugere que a desacele- formadas pela interação entre sedimentos
ração do vento esteja associada à existên- eólicos e lavas, formando feições similares
290 Claiton Marlon dos Santos Scherer, Luis José Tomazelli, Karin Goldberg
50 50 anos de Geologia
a peperitos (Jerran & Stollhofen, 2002) (Fi- que instantaneamente (dezenas a centenas
gura 3B) e (3) a impressão de feições no de anos?), enquanto o período de acumu-
dorso das dunas durante a movimentação lação eólica envolveu no máximo alguns
das lavas. Entre estas últimas feições, des- poucos milhões de anos. Ou seja, a For-
tacam-se as marcas em crescente, origina- mação Botucatu consiste em um caso sin-
das pela deformação das areias durante o gular, onde a acumulação representa um
avanço de lobos de lavas do tipo pahohoe intervalo de tempo maior que aquele con-
(Scherer, 2002) (Figuras 3C, D) e as estrias tido na supersuperfície.
subparalelas e estreitamente espaçadas, ge-
radas pelo atrito do fluxo de lava sobre as
areias inconsolidadas (Figura 3E). Além 6. PRESERVAÇÃO DO PALEOERG
PRESERVAÇÃO
disso, ocorrem moldes de plaquetas de BOTUC
BOTUCA ATU
basaltos formados pela fragmentação de
uma fina crosta resfriada na porção super-
ficial do fluxo que, durante o avanço da Outro conceito fundamental em sis-
lava, são encrustados nos sedimentos are- temas eólicos é o da preservação, que se
nosos subjacentes (Jerran & Stollhofen, refere ao conjunto de processos necessá-
2002). rios para que uma determinada acumula-
A direção das estrias, aliada ao senti- ção sedimentar seja incorporada no regis-
do da convexidade das estruturas em cres- tro estratigráfico (Kocurek & Havholm,
cente geradas pela movimentação dos lo- 1993). Para que ocorra a preservação de
bos de lavas, pode ser usada como uma sucessão eólica é necessário que a
indicadora de paleofluxo (Scherer, 2002). acumulação seja colocada abaixo do nível
Os dados obtidos indicam que os fluxos de base regional (Kocurek & Havholm,
de lavas canalizavam-se, inicialmente, nas 1993). A equivalência entre espaço de
interdunas (sentido preferencial da acumulação e espaço de preservação que
convexidade das marcas em crescentes para pode ser verificada em contextos marinhos,
SW, enquanto as dunas eólicas migravam não é aplicada para sistemas eólicos secos,
para NE) e avançavam progressivamente onde a acumulação ocorre acima do lençol
sobre o dorso e a face frontal das dunas freático que, em última instância, é o nível
adjacentes, até recobri-las totalmente (Fi- de base em sistemas desérticos. Sendo as-
gura 3F). sim, uma fração significativa da acumula-
A supersuperfície que limita o topo ção eólica da Formação Botucatu não se-
da Formação Botucatu difere de forma ria incorporada ao registro geológico se um
substancial dos modelos existentes, prin- vulcanismo estocástico e catastrófico não
cipalmente, no que se refere ao tempo de tivesse ocorrido na porção sul do
formação. Conforme discutido por Loope Gondwana durante o início do Cretáceo.
(1985) e Havholm & Kocurek (1994), a ge- Devido ao recobrimento das dunas eólicas
ração de supersuperfícies envolve alguns pelos derrames vulcânicos e a posterior
milhares de anos, abrangendo, normalmen- subsidência flexural decorrente do peso da
te, um intervalo de tempo significativamen- pilha vulcânica, toda a acumulação foi in-
te maior que aquele contido na acumula- corporada ao registro geológico, inclusive
ção do pacote eólico. No entanto, ao con- o intervalo que estava, inicialmente, situa-
trário disso, a supersuperfície em interesse do acima do espaço de preservação (Figu-
foi formada, em termos geológicos, quase ra 4).
Figura 3.
3 Feições de interação sedimento-lava no contato entre as formações Botucatu e Serra Geral. (A) Duna linear (vista
transversal ao fluxo) preservada pelos fluxos de lavas; (B) Brechas vulcânicas geradas pela interação entre as lavas e sedimentos
inconsolidados; (C) Marcas em crescente geradas pela deformação dos sedimentos arenosos eólicos de dorso de duna por lobos
de lavas pahohoe; (D) Detalhe das marcas em crescente, observe que entre as marcas em crescentes as marcas onduladas eólicas
são inteiramente preservadas pela lava; (E) Estrias geradas pelo atrito da lava sobre sedimentos arenosos eólicos; (F) Modelo de
recobrimento das dunas eólicas pelas lavas basálticas, as lavas fluíam inicialmente ao longo dos corredores de interdunas e
recobriam progressivamente o dorso e a face frontal das dunas eólicas.
292 Claiton Marlon dos Santos Scherer, Luis José Tomazelli, Karin Goldberg
50 50 anos de Geologia
Figura 4
4. Diagrama mostrando o espaço de preservação existente antes (A) e depois (B) das extrusões dos derrames basálticos. O
espaço de preservação foi substancialmente aumentado em decorrência da subsidência flexural causada pelo peso das rochas
vulcânicas.
7. CONCLUSÕES
CONCLUSÕES Ponçano, W.L. (Ed.). Mapa geológico do
Estado de São Paulo: nota explicativa. São
Paulo, Instituto de Pesquisas Tecnológicas. v.1,
O registro do paleoerg Botucatu res- p. 46-77.
ponde a uma sucessão de eventos que po- Bigarella, J.J. & Salamuni, R. 1961. Early
dem ser sintetizados em três fases distin- Mesozoic wind patterns as suggested by dune
tas: (1) a de construção, (2) de acumulação bedding in the Botucatu Sandstone of Brazil
e (3) de preservação. A construção do and Uruguay. Geological Society of America
paleoerg é resultado de um alto suprimen- Bulletin, 72:1089-1106.
to sedimentar, associado à presença de con- Bigarella, J.J. 1979. Botucatu and Sambaiba
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Botucatu sugerem um sistema eólico seco. Bonaparte, J.F. 1996. Late Jurassic vertebrate
Como nesse tipo de sistema, o lençol communities of eastern and western
freático encontra-se abaixo da superfície Gondwana. Geores. Forum, 1:427-432.
deposicional, a acumulação eólica é con-
trolada somente pelas condições aerodinâ- Clérici, A.M.; Suguio, K. & Fúlfaro, V.J. 1986.
micas do fluxo. Portanto, a acumulação Reavaliação da geologia do Paraguai Oriental.
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ventos, vinculada à existência de uma am-
Goiania, SBG .v. 1, p. 163-176.
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Gondwana associada a um padrão de con- Ferrando, L. & Montana, J.R. 1988. Hipotesis
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podem ser atribuídos ao extenso vulcanis-
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acumulações eólicas, por sua vez, está vin- Entre Rios, Argentina. In: CONGRESSO
culada à progressiva subsidência flexural GEOLÓGICO ARGENTINO Y
gerada pelo peso do pacote vulcânico que CONGRESO DE EXPLORACTIÓN DE
colocou as acumulações eólicas abaixo do HIDROCARBUROS, 3., 1995. Anais…
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8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIC AS
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296 Claiton Marlon dos Santos Scherer, Luis José Tomazelli, Karin Goldberg
50 50 anos de Geologia
H Hidrodinâmica e Sedimentologia
das Praias Oceânicas do Rio Grande do Sul
1. INTRODUÇÃO
O estado do Rio Grande do Sul tem uma extensa costa com orientação uniforme
NE-SW e uma pequena sinuosidade, ao longo de 630 km. Esta consiste de depósitos
Quaternários inconsolidados que não recebem contribuições de areias modernas (Martins et
al., 1973), pois toda carga de tração transportada pelos rios é retida nas lagunas e outros
ambientes costeiros, como por exemplo, a Lagoa dos Patos e a Lagoa Mirim, que se estendem
por uma área de 13.750 km2, aproximadamente um terço da Planície Costeira do estado
(Tomazelli e Villwock, 1992, Toldo et al. 2000). A Plataforma Continental é larga, com 150 a
200 km de extensão, apresentando profundidades máximas variando entre 100 e 140 m e
suave declividade da ordem de 0,5 a 1,5m/km (Martins & Corrêa, 1996). A antepraia é exten-
sa e rasa, com limite externo entre as profundidades de 10 e 15 m, e constituída por depósitos
arenosos.
Os sedimentos do sistema praial – campo de dunas, pós-praia, zona de surfe e
antepraia (Figura 1) – consistem principalmente de areias finas bem selecionadas; tamanho
médio de 0.2 mm, (Martins, 1967; Martins & Corrêa, 1996, Siegle 1996; Nicolodi et al., 2002;
Gruber 2002), exceto ao longo de 60 km no Litoral Sul onde ocorrem sedimentos bimodais
devido à presença de cascalho biodetrítico (Calliari & Klein, 1993). Incidem sobre a costa
ondulações geradas no Oceano Atlântico Sul e vagas geradas pelos fortes ventos locais de
verão e primavera, provenientes de NE. Exceto pela passagem das frentes frias de S e SE, a
agitação marítima é caracterizada por ondas de média a elevada energia, com altura significa-
tiva de 1,5 m e período entre 7 e 9 s. A maré astronômica é semi-diurna, com amplitude média
Instituto de Geociências. Contribuições
de 0,25 m, sendo que a maré meteorológica de 1963 e 1996 no Litoral Norte do estado
pode alcançar 1,20 m (Almeida et al., 1997). (Almeida et al., 1999). Conseqüentemente,
A profundidade de fechamento é estimada o transporte e a deposição dos sedimentos
em 7,5 m, calculada com base em dois con- ao longo da costa são primariamente domi-
juntos de dados de ondas coletados nos anos nados pela ação da onda.
Figura 1.
1 Vista aérea para o norte a partir da Praia de Capão da Canoa, onde se observa o perfil dissipativo - banco e cava
longitudinal, o canal principal no meio da extensa zona de surfe, e a descontinuidade da primeira linha de quebra da onda nos
locais onde ocorrem as correntes de retorno (Fotografia Sidnei Zomer, 1996).
Figura 2.
2 Fundeio do ondógrafo direcional Dataweel a 18 m de profundidade na Praia de Tramandaí (Fotografia Luiz Emílio S. B.
Almeida, 1996).
tem uma componente sazonal, governada em valores da ordem de 0,9 m/s (Toldo et
pelas variações dos parâmetros climáticos. al., 1993). Esses valores mostram-se coeren-
Nos meses de Outubro à Março é marcante tes com os valores de velocidades previstos
o predomínio de correntes para SW. Entre a partir do ângulo de incidência e altura da
os meses de Maio e Agosto o domínio é das onda na rebentação. Essas correntes atin-
correntes para NE. gem as maiores velocidades ao longo do
Medidas de velocidades das corren- canal principal dentro da zona de surfe (Fi-
tes longitudinais na zona de surfe da praia gura 1). A posição e a profundidade do ca-
de Tramandaí, para ondas com altura de 1,79 nal têm sido mapeadas com emprego de tre-
m e ângulo de incidência de 10°, resultaram nó visto na Figura 3 (Martins et al., 1998).
Figura 3.
3 Trenó para medidas do relevo do fundo da zona de surfe, empregado em levantamentos das praias do litoral norte do
estado (Fotografia Elírio Toldo Jr., 1997).
Com a migração dos bancos externo bancos em direção à praia, durante a inci-
e interno para mar aberto, durante os even- dência de ondulações com alturas inferio-
tos de tempestades, o canal principal pode res a 1,4 m em média (Toldo et al., 1999a), o
alcançar profundidades superiores a 3 m, canal principal apresenta profundidades
típica em perfis de praias dissipativos, co- menores que 3 m, e se posiciona próximo à
muns ao longo do litoral do estado (Calliari linha de praia, por vezes junto a essa linha e
et al., 2006). Sob essas condições, o canal se com profundidades variáveis.
posiciona em média a 200 m da linha de
praia. Ao contrário, com a migração dos
Figura 4
4. Intensidade e direção das correntes costeiras medidas a 5 m da superfície, em local com profundidade de 18 m, no mês
de julho de 1996 (Almeida & Toldo, 1997).
5. MAPEAMENTO D AS ZONAS
DAS ao longo da praia monitorada. Entre todos
DE EROSÃO E DEPOSIÇÃO os indicadores possíveis de serem emprega-
dos na área de estudo, a linha da água é o
mais prático, principalmente, por causa de
O mapeamento das mudanças da li- sua continuidade e também porque se cons-
nha de praia é realizado ao longo de toda a titui num indicador que possibilita a repeti-
costa com base em coleções de fotografias ção das medidas. Segundo Morton & Speed,
aéreas e levantamentos anuais com DGPS (1998, apud: Pajak & Leatherman, 2002), a
desde 1997. O plano para o levantamento principal desvantagem é que a linha não é
da linha de praia com DGPS consiste em um indicador morfológico. É um indicador
medir a posição do perfil longitudinal da li- que não mantém o mesmo plano horizon-
nha da água, tomado-o como perfil repre- tal ao longo do tempo. Os principais erros
sentativo da posição da linha de praia. Em decorrentes desse modo de levantamento da
1997, o trabalho de campo foi desenvolvi- linha de praia estão associados à amplitude
do com um par GPS, modelo GARMIN 100 das marés astronômica e meteorológica, ao
Personal Surveyors, com precisão de 10 e 3 run up e as variações da declividade da face
m para os equipamentos que operavam no praial.
modo de navegação e no modo estático, res- A linha de praia, determinada em
pectivamente. 1997, foi comparada com a linha de praia
No trabalho de campo foi instalado obtida da coleção de cartas do exército, es-
um equipamento DGPS em um veículo que cala 1:50.000, as quais são uma restituição
se desloca a uma velocidade de 50 km/h de um levantamento aerofotográfico reali-
junto à linha da água, a uma velocidade de zado em 1975. A análise temporal entre es-
50 km/h. Enquanto que outro equipamen- tes dados foi desenvolvida através de técni-
to GPS, no modo estático, foi posicionado ca de geoprocessamento usando software
em locais previamente estabelecidos na costa IDRISI (Clark University). Para a análise
e separados 100 km um do outro, de modo temporal desses 22 anos (1975-1997), não
a cobrir a área e incrementar a precisão dos foram consideradas as variações menores
dados. A taxa de aquisição para ambos os que 20 m, por não se dispor de dados para
equipamentos foi de 5 s, a qual permitiu a controle das variações da altura da onda,
geração de arquivos que após processados, maré e declividade da face praial durante os
estabeleceram uma linha do litoral com pre- levantamentos.
cisão de 3 m (Toldo et al., 1999b; Toldo & Os resultados da análise temporal de
Almeida, 2003a). 22 anos (1975-1997), mostraram que 442 km
A linha da água adotada nos levanta- da linha de praia caracteriza-se pela retração,
mentos de campo corresponde à linha de 173 km pela progradação e 6 km não apre-
espraiamento da onda ou linha de swash. Para sentam variações significativas. Os proces-
as praias oceânicas do Rio Grande do Sul, a sos erosivos, com taxas médias maiores que
linha está situada a aproximadamente 16 m 80 m, estendem-se através de 257 km, en-
do nível médio do mar, tendo em conside- quanto que as áreas progradacionais apre-
ração as características de altura (Ho = 1,5 sentam pequenos valores (Toldo et al., 1999b;
m) e o comprimento da onda em águas pro- Esteves et. al., 2002).
fundas (Lo = 80 m), bem como a declividade
média da face praial (1/30). A Figura 5 mos-
tra que essa feição é facilmente identificada
Figura 5
5. Levantamento da linha de praia com sistema de posicionamento global – GPS, fixado em um veículo que se desloca ao
longo da linha de água associada ao espraiamento da onda (Fotografia Elírio Toldo Jr., 1998).
6. ESTIMATIV
ESTIMATIVA DO TRANSPOR
TIVA TE
TRANSPORTE conjunto de dados de ondas obtidos em mar
LITORÂNEO aberto, registrados por navios comerciais e
organizados por Hogben e Lumb (1967),
aplicou-se o Método do Fluxo de Energia
O trabalho realizado por Lima et al. (U.S. Army, 1984) para estimar o potencial
(2001) teve por objetivo estimar de transporte litorâneo causado pelas on-
quantitativamente o potencial de transpor- das.
te longitudinal de sedimentos para a costa A estimativa matemática tem por base
gaúcha, através da aplicação do método do a fórmula do CERC, onde o cálculo do flu-
fluxo de energia das ondas incidentes. O xo de energia paralelo à praia e a correspon-
cálculo foi realizado ao longo de cada tre- dente deriva litorânea são obtidos da rela-
cho de reta que represente a orientação pre- ção empírica entre a componente do fluxo
dominante da linha de praia. A divisão dos de energia da onda que entra na zona de
630 km de costa em oito trechos foi feita rebentação e o peso submerso da areia em
com base na linha de praia estabelecida em movimento (U.S. Army 1984). Ambos têm
1997 por DGPS, e o alinhamento utilizado unidades de força por unidade de tempo,
foi o azimute da reta traçada. assim: Il = K.Pl.s, onde Il é a taxa de trans-
A partir de um conjunto de dados porte, K é um coeficiente adimensional, e
sedimentológicos e morfológicos de perfis Pls o fluxo de energia paralelo à praia. Este
praiais existentes, para estimar o coeficiente modelo prediz uma variação significativa
de proporcionalidade entre a energia das do fluxo de energia na zona de rebenta-
ondas e o transporte de sedimentos e de um ção devido às pequenas mudanças nos
de alinhamento da linha de praia. A partir atuando sobre o litoral desde o último even-
dos teores de pesados, percebe-se, de sul to transgressivo, ao longo dos últimos 5ka
para norte, a existência de 5 picos de con- (Dillenburg et al., 2000).
centração. Estes picos de minerais pesados
coincidem com os mesmos locais onde fo-
ram identificadas mudanças no alinhamen- 8. VARIABILID
VARIABILIDADE D
ARIABILIDADE A ANTEPRAIA
DA
to da costa e na taxa da capacidade de trans- NO LITORAL MÉDIO
porte longitudinal.
Nestes segmentos, Lima et al. (2001)
observou que existe uma diferente taxa de A topografia da antepraia ao longo do
deriva litorânea, controlada pelo ângulo de litoral médio consiste de uma larga área com
incidência da onda, principalmente, aquela superfície de fundo plana e declividade sua-
proveniente do quadrante sul. Também foi ve, da ordem de 1:100. Essa uniformidade
observado que ao final de cada alinhamen- morfológica é modificada nas proximidades
to ocorre um engarrafamento da deriva li- das praias de Mostardas e Dunas Altas, onde
torânea, de modo a produzir extensos de- a largura da antepraia passa dos seus valo-
pósitos arenosos no sistema praial (Toldo et res médios de 1 km para mais de 3 km. Es-
al., 2003b). Nestes locais foram registradas sas duas praias estão localizadas, onde ocorre
as menores concentrações de minerais pe- inflexão da linha de costa, ou seja, mudança
sados, ao passo que no início do segmento do alinhamento da praia entre 10º e 12º (Fi-
seguinte, devido à aceleração da deriva lito- gura 5). A isóbata de 10 m foi utilizada como
rânea, são observados campos extensos de limite externo da antepraia. Esse limite foi
processos erosivos e que neste trabalho iden- definido com base no cálculo da profundi-
tifica-se através do elevado teor de minerais dade de fechamento de 7,5 m (Almeida et
pesados. al., 1999) e nos dados batimétricos disponí-
Estes picos de concentração de mi- veis da carta do Ministério da Marinha de
nerais pesados encontram-se nas áreas de 1963.
erosão de praia, medida nos últimos 25 anos O mapeamento das zonas de erosão
(Toldo et al., 1999b). Estes locais coincidem e deposição, tanto em praias específicas,
com os maiores teores de minerais pesados. como ao longo do litoral médio, mostra ex-
Estes picos de minerais pesados são encon- tensivo processo de retração da linha de
trados nos locais de maior taxa de erosão, praia (Alvarez et al., 1981; Tomazelli et al.,
demonstrando que a concentração dos pe- 1996; Calliari et al. 1996, Toldo et al., 1999b;
sados está intimamente relacionada a áreas Tozzi, 1999; Barleta, 2000; Esteves et al.,
de erosão atual. 2002; Dillenburg, 2004). As elevadas taxas
Soma-se a erosão por deriva litorânea de erosão nesses trechos podem estar em
à concentração da energia de ondas (Calliari parte, relacionadas ao fato do litoral médio
et al., 1998; Calliari & Speranski, 2002; estar mais expostos ao ataque das ondas
Barletta & Calliari, 2003) pelo processo de provenientes do quadrante S, o que resulta
refração, presentes nos segmentos de Mos- num incremento no fluxo de energia para-
tardas e Farol da Conceição. Este fenôme- lelo à praia. Também, esse fluxo de energia
no amplifica o processo de erosão e a con- e o relacionado ao transporte de sedimen-
centração de minerais pesados. Estes pro- tos paralelo à praia, decrescem de sul para o
cessos de curto período associados à deriva norte com valores de 2,9 milhão m³/ano,
litorânea e refração de ondas, podem estar 2.3 milhão m³/ano e 1,5 milhão m³/ano, a
sul de Mostardas, a sul de Dunas Altas e a inverno. Segundo Tozzi (1999), a pista de
norte de Dunas Altas, respectivamente vento formada no posicionamento da zona
(Lima et al., 2001). Dette (2001), em estu- Polar Atlântica e o gradiente da Alta Tropi-
dos dos processos morfológicos e cal direcionam os ventos de sul, gerados nos
sedimentológicos ao longo de 40 km de praia sistemas frontais, sobre o litoral da Argenti-
no mar Báltico, identificou um acúmulo de na, Uruguai e Rio Grande do Sul. As carac-
sedimentos em locais de inflexão da linha terísticas desse padrão de circulação, inten-
praia. A redução do fluxo de transporte, sificado por ventos fortes de sul e sudeste,
devido a mudanças no alinhamento da cos- sobre a antepraia consiste de dois segmen-
ta, implica num engarrafamento da deriva tos, um jato direcionado para nordeste e,
litorânea. Isto significa que parte dos sedi- nessa extremidade, uma larga pluma de dis-
mentos provenientes de barlamar serão de- persão com giro no sentido horário.
positados nestes locais de inflexão e parte Uma fração da carga de suspensão
poderá ser redirecionada para a antepraia. proveniente da zona de surfe é incorporada
O processo descrito por Dette (2001) pela antepraia todos os anos, em condições
aplica-se ao balanço dos sedimentos ao lon- de desenvolver um banco de areia de exten-
go do litoral médio. Desse modo, parte do sões como aquele observado pela projeção
volume de sedimentos que foi erodido a sul da isóbata de 10 m em direção ao mar aber-
não é transferido para o trecho adjacente, à to, nas adjacências das praias de Mostardas
sotamar, e se deposita no sistema praial. e Dunas Altas. Esses largos bancos de areia
Aproximadamente, 0,6 e 0,8 milhões de m³/ têm sido descritos como shoal-retreat massifs
ano ficam retidos nas inflexões da linha de por Swift & Sears (1974, apud: Dyer e
praia nas praias de Mostardas e Dunas Al- Huntley 1999).
tas, respectivamente (Figura 5). Essas depo- Também, o processo físico que con-
sições geram modificações espaciais com trola a formação e evolução do jato costei-
amplas mudanças volumétricas, tanto do ro não foi explorado completamente, mas
campo de dunas costeiras quanto da boa correlação é encontrada entre a área de
antepraia. crescimento sobre a antepraia, por mais de
Além desses elementos morfológicos 2 km para mar aberto, e a extensão do jato
e sedimentológicos, foram identificados pro- costeiro sobre essa área, como observado
cessos hidrodinâmicos específicos associa- na imagem de satélite.
dos com as mudanças no alinhamento da Outras duas correlações, também re-
costa, como descrito a seguir. Análises de forçam a mecânica desse processo de
imagem de satélite nessa área revelam a pre- progradação. Barros et al. (2005) observa-
sença de um padrão de circulação de curto ram as mais baixas concentrações de mine-
período sobre a antepraia e sugerem que, rais pesados nas adjacências das inflexões
em algumas instâncias, esta corrente pode da linha de praia, locais onde ocorre a redu-
conduzir para a antepraia, por difusão, par- ção do fluxo de energia das ondas, deposi-
te dos sedimentos que se encontram em ção de sedimentos e progradação da zona
suspensão dentro da zona de rebentação. costeira. Absalonsen & Toldo (2005) verifi-
Um jato costeiro episódico pode estar asso- caram a progradação desses locais com no-
ciado a esse processo de difusão (Toldo et vos levantamentos de posição da linha de
al., 2003b; Nicolodi et al., 2003), e sua ocor- praia.
rência e evolução está associada à passagem
de frentes frias, principalmente durante o
9. VARIABILID
VARIABILIDADE DO C
ARIABILIDADE AMPO
CAMPO 10. ANTEPRAIA DO LITORAL NORTE
NORTE
DE DUNAS COSTEIRA NO LITORAL
MÉDIO
Tanto o setor costeiro quanto a plata-
forma continental do Rio Grande do Sul,
Em artigo publicado em 2000, possuem um bom nível de reconhecimen-
Tomazelli et al. descreveram os depósitos de to, diferentemente do quase desconhecido
praia oceânicos associados ao sistema lagu- setor de antepraia, aqui definido desde a
na-barreira IV, a barreira mais recente da zona de arrebentação até -15/-20 m. Dados
planície costeira do Rio Grande do Sul, for- de geologia, batimetria e sonografia, deta-
mada durante o Holoceno. Esse sistema as- lhados pelo projeto PETROBRAS/UFPR/
sociado ao da laguna-barreira III, separam UFSC/FURG/UFRGS, permitiram deter-
a Lagoa Patos do oceano. Segundo esse au- minar os limites de dinâmica e os aspectos
tor, sobre o sistema laguna-barreira IV de- evolutivos da antepraia junto aos sistemas
senvolve-se extenso campo de dunas cos- praiais e de plataforma, numa seção de 80
teiras, formadas, principalmente, por dunas km, ao longo, e de 30 km, ao largo do litoral
barcanóides. norte do estado, até os -50 m de profundi-
As mudanças na largura da antepraia dade. As análises estão embasadas em 6 per-
e do campo de dunas costeiras ocorrem do fis perpendiculares e 8 longitudinais à cos-
mesmo modo ao longo do litoral médio: a ta, com 887 km de perfilagem batimétrica
região com maior largura da antepraia tam- de detalhe, 770 km de sonografia, 11 perfis
bém está associada com a região onde ocorre batimétricos de antepraia, além de 284 amos-
a maior largura do campo de dunas. Em tras sedimentares da plataforma continen-
ambos, a largura é pronunciada como indi- tal e de 27 testemunhos, com 23,31 m de
cam as suas medidas (Figura 5). A largura seção (Gruber, 2002; Gruber et al., 2003).
média do campo de dunas muda de menos As características da antepraia da área
de 1 km para mais de 6 km ao longo das de estudo configuram-se pela interação da
praias de Mostardas e Dunas Altas, respec- dinâmica marinha e da morfologia da plata-
tivamente (Toldo et al., 2006b, 2006c). forma continental, num condicionamento
Devido ao grande volume de sedi- dado, tanto pela herança geológica quanto
mentos transportados pela deriva litorânea, pela morfodinâmica marinha atual,
com direção resultante para NE, e ao en- reproduzida na distribuição sedimentar e nas
garrafamento de parte desse volume junto feições de fundo. A aplicação do conceito
às inflexões da linha de costa em Mostardas de perfil de equilíbrio praial (Dean, 1977)
e Dunas Altas, a acumulação dessa areia tor- revelou, nos ajustes dos perfis, que estes sis-
na-se uma importante fonte de sedimentos temas praiais encontram-se em equilíbrio no
para o desenvolvimento da antepraia bem envelope de sedimentos, apontando para
como do campo de dunas costeiras. Em res- praias dissipativas, com o fator forma “m”
posta aos fortes e freqüentes ventos de NE, ajustado em 0,74, parâmetro “A” entre 0,063
o transporte eólico é muito ativo, o que faz e 0,0714, e Md de 2,67 a 3,34 Ô. Apesar da
as dunas de areia migrar para o interior da pequena extensão do segmento, grandes
planície costeira, na direção SW (Tomazelli variabilidades foram identificadas, refletin-
et al., 2000), desenvolvendo extensos cam- do as tendências de erosão atribuídas ao li-
pos de dunas, principalmente em Mostar- toral norte do estado. Foram caracterizados
das e Dunas Altas (Figura 6). três setores morfodinâmicos: Norte,
Figura 6.
6 Imagem do litoral do estado com destaque para as inflexões da linha de praia em Mostardas e Dunas Altas. A imagem
mostra também o alargamento do campo de dunas nessas duas praias (Banco de Imagens da NASA).
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1. INTRODUÇÃO
Figura 1
1. Mapa de localização da área de estudo, do corpo lagunar, das seções sísmicas e dos limites do sistema laguna-barreira
na planície costeira (modificado de Villwock, 1986).
Sistema Lagunar: Síntese dos Conhecimentos sobre a Lagoa dos Patos 319
Instituto de Geociências. Contribuições
base de erosão, por ação das ondas, a qual tor de subsuperfície, descrita acima, mos-
raramente excede a 4 m (Toldo et al., 2007a). tram que o nível do mar alcançou este refle-
Os registros sísmicos ao longo da tor há aproximadamente 8.000 anos (Corrêa,
margem lagunar (Figura 1), apresentam-se 1996). Considerando a espessura de 6 m dos
com ecos contínuos, bem definidos e sem depósitos lamosos, torna-se possível estimar
refletores de subsuperfície, que caracterizam uma taxa de sedimentação holocênica de,
superfícies de fundo com sedimentos de ta- aproximadamente, 0,75 mm/ano.
manhos grossos (areia a cascalho), os quais Idades determinadas pelo método do
se comportam como ótimos refletores do carbono 14, nos testemunhos de lamas
sinal acústico e, conseqüentemente, pouco holocênicas, apresentam uma taxa média de
ou nenhum som penetra em subsuperfície. sedimentação não compactada de 0,52mm/
No entanto, os registros sobre o piso lagunar ano, valor comparável com a taxa de
mostram-se semi-prolongados, com inter- 0,75mm/ano obtida por infor mação
mitentes zonas de refletores de estratigráfica (Toldo et al., 2000b).
subsuperfície, descontínuos e paralelos. As taxas de sedimentação de curto
O primeiro refletor de subsuperfície, período, calculadas em sedimentos presen-
onde o pulso de som torna-se intransponível tes no topo de dois testemunhos e obtidas
pelo sinal sísmico de 7,0 kHz, é interpreta- através de medidas com 210Pb (Martins et
do como a superfície de uma antiga planí- al., 1989), indicam valores de 3,5 e 8,3 mm/
cie, dominada por sistemas deposicionais ano, e mostram-se completamente diferen-
costeiros e constituída por materiais com tes daquelas de longo período, sendo quase
tamanhos maiores que os sedimentos que 10 vezes maiores. Estas taxas elevadas po-
caracterizam a sedimentação lagunar dem ser o resultado do desmatamento na
holocênica e que recobrem este refletor. bacia de drenagem, processo que se iniciou
O refletor desta antiga superfície, que com a colonização européia há, aproxima-
se encontra a uma profundidade em torno damente, 150 anos.
de 12 m abaixo do atual nível de água da
laguna (Toldo et al., 2000b; Weschenfelder
et al., 2005), pode ser rastreado ao longo do 5. EVOLUÇÃO COSTEIRA
EVOLUÇÃO
eixo de maior comprimento da laguna. Tam-
bém, este refletor apresenta uma pequena
declividade da ordem de 1:21.430, no senti- A análise sismoestratigráfica,
do leste-oeste, muito semelhante ao mergu- conduzida nos registros sísmicos de alta fre-
lho do piso lagunar que apresenta um gra- qüência e resolução do substrato da Lagoa
diente de 1:22.814, nesta direção. dos Patos, permitiu o reconhecimento de
A média das maiores profundidades dois importantes sistemas de
do refletor de subsuperfície é da ordem de - paleodrenagens para a planície costeira mé-
12 m, a qual equivale a uma profundidade dia do RS. O trecho do perfil sísmico levan-
de controle no tempo. Sabendo-se que a tado perto do canal da ‘Barra Falsa’, locali-
profundidade média da atual superfície de dade de Bojuru, na margem leste da Lagoa
fundo lagunar é de -6 m, podemos dos Patos, é usado como referência neste
quantificar a espessura média da sedimen- estudo (Figuras 2a, d). A interpretação sís-
tação lagunar holocênica em 6 m. mica revela que os dois sistemas de
A curva regional de oscilação relativa paleocanais, formados em períodos distin-
do nível do mar e a profundidade do refle- tos, são delineados por superfícies de
Sistema Lagunar: Síntese dos Conhecimentos sobre a Lagoa dos Patos 321
Instituto de Geociências. Contribuições
Figura 22. A análise sismoestratigráfica, conduzida nos registros sísmicos de alta freqüência e resolução do substrato da Lagoa dos
Patos, localidade de Bojuru. a) Registro sísmico de 3,5 kHz; b) Mapeamento dos elementos arquiteturais sísmicos, mostrando
dois sistemas de paleocanais delineados por descontinuidades sísmicas que truncam os estratos/refletores sotopostos; c) Correlação
das superficies erosivas delineadoras dos paleocanais (limites de seqüências) com os estágios isotópicos do oxigênio de Imbrie et
al. (1984). d) Localização da área de estudo e posição do registro sísmico em “a”. Profundidade em tempo de ida e volta, em
milisegundos (ms).
Sistema Lagunar: Síntese dos Conhecimentos sobre a Lagoa dos Patos 323
Instituto de Geociências. Contribuições
exposta, geralmente constituída por sedi- Continentale du Rio Grande do Sul,Brésil. In:
mentos inconsolidados e suscetíveis aos pro- Anais do International Symposium on Sea
cessos erosivos, é progressivamente recor- Level Changes and Quaternary Shorelines.
tada por sistemas fluviais que conectam a São Paulo, SP. Editora da USP. p. 27 28. (Special
Publication, n°3)
bacia de drenagem terrestre aos depocentros
da bacia de sedimentação. O prisma costei- Corrêa, I.C.S. 1996. Les variations du niveau de
ro depositado durante os períodos prévios la mer durant les derniers 17.500 ans BP.
de nível de mar alto é, em geral, profunda- L´exemple de la plateforme continentale du Rio
mente dissecado e recortado por um siste- Grande do Sul-Bresil. Marine Geology,
ma de vales incisos. O processo, normal- 130:163-178.
mente, evolui para períodos transgressivos Corrêa, I.C.S.; Aliotta, S. & Weschenfelder, J.
do nível do mar, com o afogamento dos 2004. Estrutura e evolução dos cordões arenosos
vales incisos e dos sistemas deposicionais pleistocênicos no canal de acesso à laguna dos
costeiros. Patos-RS, Brasil. Pesquisas em Geociências,
As descontinuidades sísmicas 31(2):69-78.
(erosionais) foram as superfícies balizadoras
Dillenburg, S.R. & Toldo Jr., E.E. 1990. Efeitos
no estabelecimento dos sistemas de induzidos por ondas na embocadura da Laguna
paleodrenagens da zona costeira do Rio dos Patos. In: CONGRESSO BRASILEIRO
Grande do Sul, marcando os limites de se- DE GEOLOGIA, 36., Natal, RN. Anais...
qüências sismo-deposicionais. É importan- Natal, RN, SBG. v.2, p. 690-699.
te que os modelos evolutivos apresentados
para ambientes transicionais considerem e Hartmann, C.; Sano, E.E.; Paz, R.S. & Moller
Jr., O. 1986. Avaliação de um período de cheia
possam predizer, da forma mais precisa
(junho de 1984) na região sul da Laguna dos
possível, a distribuição espacial e temporal Patos, através de dados de sensoriamento
das superfícies erosivas formadas durante os remoto, meteorológicos e oceanográficos. In:
períodos de rebaixamento significativo do SIMPÓSIO LATINO AMERICANO DE
nível do mar e, por conseguinte, a ocor- SENSORIAMENTO REMOTO, 4. Gramado,
rência de descontinuidades ‘cronoestratigrá- RS. Anais... Gramado, RS, [s.n.]. v.1, p. 685-694.
ficas’ limitantes de pacotes sismo-
Imbrie, J.; Hays, J.D.; Martinson, D.G.; Mcintyre,
deposicionais.
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Quaternário, provavelmente exerceram um chronology of the marine ä18O record. In:
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deposicional, na distribuição das fácies Saltzman, B. (Ed.). Milankovitch and Climate.
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32(2):57-67.
Sistema Lagunar: Síntese dos Conhecimentos sobre a Lagoa dos Patos 325
1
Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica, Instituto de Geociências,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Instituto do Meio Ambiente, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul
S Sistemas Deposicionais
e Evolução Geológica
da Planície Costeira
do Rio Grande do Sul: uma Síntese
Luiz José Tomazelli1, Sérgio Rebello Dillenburg1, Jorge Alberto Villwock2,
Eduardo Guimarães Barboza1, Flávio Antônio Bachi1, Beatriz Appel Dehnhardt1,
Maria Luiza Correa da Camara Rosa1
1. INTRODUÇÃO
Figura 1.
1 Mapa de localização e mapa geológico simplificado da Planície Costeira do Rio Grande do Sul (modificado de Tomazelli
& Villwock, 1996).
Sistemas Deposicionais e Evolução Geológica da Planície Costeira do Rio Grande do Sul... 329
Instituto de Geociências. Contribuições
seção inicia com sedimentos marinhos trola, entre outras características climáti-
miocênicos aos quais se sucedem depósi- cas, o regime de ventos, um dos agentes
tos aluviais e costeiros (Closs, 1970). mais importantes na morfogênese da pla-
Os depósitos sedimentares acumula- nície costeira.
dos na PCRS são provenientes da erosão de O regime de ventos de alta energia, é
duas áreas fontes principais. Na porção cen- de natureza bimodal. O vento dominante,
tral e sul, as fontes são representadas pe- proveniente das bordas do Anticiclone do
las rochas ígneas e metamórficas pré- Atlântico Sul, incide de NE e torna-se mais
cambrianas do Escudo Uruguaio-Sul-rio- ativo nos meses de primavera e verão. O
grandense. Na porção norte da planície, as vento secundário, associado à atividade do
fontes principais são as rochas sedimentares Anticiclone Móvel Polar, incide de W-SW e
e vulcânicas da Bacia do Paraná, de idade torna-se mais importante nos meses de ou-
paleozóica e mesozóica. Além das diferen- tono e inverno (Tomazelli, 1993).
ças composicionais, estas duas áreas fontes
apresentam também significativas diferen- 2.3 Hidrodinâmica Costeira
ças no relevo. Ambos os aspectos, compo-
A amplitude média da maré astronô-
sição e relevo, ficaram registrados nas ca-
mica na costa do Rio Grande do Sul situa-
racterísticas dos sedimentos detritais forne-
se em torno de 0,5 m. Em conseqüência
cidos à bacia.
deste regime de micromarés, o transporte e
A plataforma continental adjacente à
a deposição de sedimentos são dominados
planície costeira alcança uma largura média
pela ação das ondas e correntes litorâneas a
de cerca de 150 km e é coberta, principal-
elas associadas. O regime de ondas é carac-
mente, por sedimentos clásticos terrígenos
terizado pela ocorrência de uma ondulação
com algumas concentrações de cascalho
(swell waves) de longo período, proveniente
biodetrítico (Martins et al., 1967). A plata-
de SE, e por vagas locais (sea waves), prove-
forma interna é, na sua maior parte, cober-
nientes principalmente de E-NE (Motta,
ta por areias terrígenas de composição e tex-
1967). Especialmente durante os meses de
tura muito semelhante aos sedimentos
outono e inverno, o regime normal de on-
praiais adjacentes.
das é episodicamente perturbado pela ocor-
2.2 Clima e Regime de Ventos rência de ondas de tempestade (storm waves)
associadas à passagem de frentes frias pro-
A situação latitudinal e a proximida- venientes do sul (Calliari et al., 1996).
de do mar incluem a PCRS dentro da Zona
Sub-tropical Sul, sob o controle básico de
massas de ar marítimas de origem tropical e 3. SISTEMAS DEPOSICIONAIS D A
DA
polar. O clima é do tipo temperado úmido, PL ANÍCIE COSTEIRA DO RIO GRANDE
PLANÍCIE
com uma taxa de precipitação média de DO SUL
1.300 mm, bem distribuída ao longo do ano.
O clima da região sofre uma influên-
cia fundamental de dois centros de alta pres- 3.1 Introdução
são: o Anticiclone Semi-permanente do
De acordo com Villwock et al. (1986),
Atlântico Sul (Anticiclone de Santa Helena)
a PCRS se desenvolveu sob o controle das
e o Anticiclone Móvel Polar (Nimer, 1977).
variações climáticas e das flutuações do
A ação destes dois centros dinâmicos con-
Figura 2
2. Perfil esquemático transversal aos sistemas deposicionais da Planície Costeira do Rio Grande do Sul, próximos à latitude
de Porto Alegre. Os sistemas laguna-barreira correlacionam-se, tentativamente, com os últimos principais picos da curva isotópica
de oxigênio de Imbrie et al. (1984) (modificado de Tomazelli & Villwock, 2000).
nível relativo do mar do Quaternário, acu- incluem, na parte mais proximal do siste-
mulando sedimentos em dois tipos princi- ma, depósitos resultantes de processos
pais de sistemas deposicionais: (1) um sis- gravitacionais, como a queda livre de blo-
tema de leques aluviais, que ocupa uma cos, o rastejamento e o fluxo de detritos
faixa contínua ao longo da parte mais in- (tálus, eluviões e coluviões). Nas partes mé-
terna da planície, e (2) quatro distintos sis- dias e distais, dominam depósitos de cor-
temas deposicionais transgressivos-regres- rentes trativas (aluviões), associados a flu-
sivos do tipo laguna-barreira (Figuras 1 e xos torrenciais e a sistemas fluviais de ca-
2). nais entrelaçados (braided).
As características composicionais,
3.2 Sistema de Leques Aluviais texturais e estruturais das fácies geradas no
sistema de leques aluviais dependem, em
O sistema de leques aluviais engloba
grande parte, da natureza da área-fonte sub-
o conjunto de fácies sedimentares resultan-
metida à erosão, incluindo-se aí, principal-
tes de processos de transporte associados
mente, a composição das rochas e a energia
aos ambientes de encosta das terras altas
de relevo. No setor central e sul da planície
adjacentes à planície costeira. As fácies
Sistemas Deposicionais e Evolução Geológica da Planície Costeira do Rio Grande do Sul... 331
Instituto de Geociências. Contribuições
fases mais áridas, a destruição da vegeta- teira, desde Torres, ao norte, até o Chuí, ao
ção impulsionava a retomada da atividade sul. Assim, o desenvolvimento da Barreira
eólica. III possibilitou a formação dos grandes cor-
A ausência de material apropriado pos lagunares que ainda se destacam na
para datação dificulta a determinação das paisagem desta região costeira (Lagoa dos
idades absolutas das barreiras I e II. No Patos e Lagoa Mirim). A sucessão vertical
entanto, considerando que a glácio-eustasia de fácies revela claramente a natureza
foi o fator básico de controle das variações estratigráfica regressiva (progradante) da
do nível do mar no Quaternário, é provável Barreira III. A barreira é formada por fácies
que estas barreiras tenham se formado nos arenosas praiais recobertas por areias eólicas.
máximos transgressivos correspondentes As fácies praiais consistem em areias finas
aos estágios isotópicos de oxigênio 11 e 9, quartzosas, bem arredondadas e seleciona-
de aproximadamente 400 ka e 325 ka, res- das, com estratificação muito bem desen-
pectivamente (Villwock & Tomazelli, 1995). volvida. Em alguns locais, as areias praiais
A Barreira III, associada ao último apresentam uma alta concentração de tu-
interglacial ocorrido há 125 ka (subestágio bos de Ophiomorpha, formados, provavel-
isotópico de oxigênio 5e), é a que apresenta mente, por crustáceos do gênero Callichirus.
melhor preservação dentre os sistemas A presença destes ichnofósseis caracteriza
pleistocênicos. Os depósitos a ela correla- um paleo-nível marinho, atingido durante
cionáveis se estendem, de maneira quase o último interglacial, situado 6 a 8 m acima
contínua, ao longo de toda a planície cos- do nível atual (Figuras 3 e 4).
3. Areias praiais da Barreira III, com forte estratificação cruzada planar-tabular e tubos de Ophiomorpha (Callichirus sp.).
Figura 3
As areias são explotadas, no local, como material para a construção civil. Localização: município de Osório, Litoral Norte do Rio
Grande do Sul (Coord.: 29º54’12" S / 50º13’59" W).
Sistemas Deposicionais e Evolução Geológica da Planície Costeira do Rio Grande do Sul... 333
Instituto de Geociências. Contribuições
4 Areias praiais da Barreira III, mostrando uma alta concentração de tubos e galerias de Ophiomorpha. Estas estruturas,
Figura 4.
atribuídas à atividade de crustáceos do gênero Callichirus, marcam um paleonível marinho situado 6-8 m acima do nível atual.
Localização: município de Osório, Litoral Norte do Rio Grande do Sul (Coord: 29º52’50" S / 50º13’42" W).
Sistemas Deposicionais e Evolução Geológica da Planície Costeira do Rio Grande do Sul... 335
Instituto de Geociências. Contribuições
sugerido por Dominguez et al. (1987) para rante ciclos transgressivos-regressivos con-
a gênese de depósitos regressivos trolados por flutuações de alta freqüência
holocênicos da costa brasileira leste e su- do nível do mar, como foram as variações
deste. de natureza glácio-eustática que ocorreram
Dillenburg et al. (1998, 2003) mos- durante o Quaternário.
traram que a barreira holocênica não apre-
senta a mesma natureza morfológica ao
longo da costa. Durante o Holoceno tar- 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFIC AS
BIBLIOGRÁFICAS
dio, a barreira evoluiu de forma diferen-
ciada, devido às variações na topografia an-
tecedente à última transgressão (morfologia Calliari, L.J.; Tozzi, H.M. & Klein, A.H. 1996.
da superfície pré-holocênica) e suas in- Erosão associada a marés meteorológicas na
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sultado, os autores reconhecem quatro ti- BRASILEIRO DE GEOLOGIA., 34., 1996,
Salvador, BA. Anais... Salvador, BA, SBG. v.
pos principais de barreiras holocênicas de-
1. p. 430-434.
senvolvidas ao longo da costa da PCRS:
barreiras progradantes, de dunas transgres- Carraro, C.C.; Gamermann, N.; Eick, N.C.;
sivas, retrogradantes e acopladas. Bortoluzi, C.A.; Jost, H. & Pinto, J.F. 1974.
Mapa Geológico do Estado do Rio Grande
do Sul. Porto Alegre, Instituto de Geociências/
5. CONCLUSÕES
CONCLUSÕES UFRGS, Secretaria de Coordenação e
Planejamento/FAPERGS. 1 mapa. Escala
1:1.000.000.
O sistema de leques aluviais desen- Closs, D. 1970. Estratigrafia da Bacia de Pelotas,
volvido na parte interna da PCRS foi Rio Grande do Sul. Iheringia, Serie Geologia,
retrabalhado, durante o Quaternário, por 3:3-76.
pelo menos quatro ciclos transgressivos-re- Delaney, P.J.V. 1965. Fisiografia e geologia da
gressivos responsáveis pela formação de superfície da planície costeira do Rio Grande
quatro sistemas deposicionais do tipo la- do Sul. Publicação Especial. Escola de
guna-barreira. Cada barreira se originou, Geologia, UFRGS. Porto Alegre, n. 6, 195p.
provavelmente, no limite atingido por uma
transgressão e foi preservada devido à re- Dillenburg, S.R.; Tomazelli, L.J. & Lummertz,
C. 1998. A variabilidade morfológica das
gressão da linha de costa forçada pela sub-
barreiras costeiras holocênicas do Estado do
seqüente queda glacio-eustática do nível do Rio Grande do Sul. Geosul, 14(27):204-207
mar. Os quatro sistemas laguna-barreira são
interpretados como tendo se formado nos Dillenburg, S.R.; Roy, P.S.; Cowell, P.J. &
últimos 400 ka, assumindo-se uma corre- Tomazelli, L.J. 2000. Influence of Antecedent
lação com os períodos de mar alto repre- Topography on Coastal Evolution as Tested by
sentados pelos últimos maiores picos na the Shoreface Translation-Barrier Model (STM).
Journal of Coastal Research, 16:71-81.
curva do registro isotópico de oxigênio. A
área de estudo representa um bom exem- Dillenburg, S.R.; Tomazelli, L.J. & Clerot, C.P.
plo de como sistemas do tipo laguna-bar- 2003. Gradientes de energia de onda: o
reira podem se desenvolver e preservar em principal fator controlador da evolução costeira
costas dominadas pela ação das ondas du-
Sistemas Deposicionais e Evolução Geológica da Planície Costeira do Rio Grande do Sul... 337
Instituto de Geociências. Contribuições
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Rio Grande do Sul. Inédito.
Sistema Lagunar: Síntese dos Conhecimentos sobre a Lagoa dos Patos 339
1
Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica, Departamento de Geodésia,
Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica, Departamento de Mineralogia e Petrologia,
Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
3
Centro de Estudos de Geologia Costeira e Oceânica, Instituto de Geociências,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
1. INTRODUÇÃO
Para a obtenção de todos estes dados, porção rasa, onde o embasamento cristali-
que possibilitaram, através de suas análises, no encontra-se entre a superfície e a pro-
a compreensão da evolução e da sedimen- fundidade de 2.500 m, aproximadamente, e
tação da plataforma e talude continental do por uma porção profunda, onde o embasa-
Rio Grande do Sul, foram efetuadas várias mento pode atingir 9.000 m. Estas duas
operações oceanográficas tais como: porções da Bacia de Pelotas encontram-se
REMAC leg 1, 2 e 6; GEOMAR IV, VI, VII, separadas por um sistema de falhas de gran-
XIII, XVII e XXII, GEOCOSTA I e II e de extensão e rejeito, o qual recebe a deno-
LAGUPATOS I e II. Todas estas Opera- minação de Falha do Rio Grande (Ojeda
ções Oceanográficas fizeram parte do Pro- & Cesero, 1973).
grama de Geologia e Geofísica Marinha A origem da Bacia de Pelotas está di-
(PGGM). retamente relacionada com os processos
Baseado nos estudos efetuados a par- geotectônicos que ocasionaram a abertura
tir dos dados obtidos, tentar-se-á mostrar do Oceano Atlântico, a partir do Jurássico,
em linhas gerais o estado atual do conheci- e que resultou na ruptura do bloco conti-
mento geológico e sedimentológico da pla- nental gonduânico e a posterior separação
taforma e talude continental do Rio Gran- dos continentes africano e sul-americano.
de do Sul, desenvolvido pelo Centro de Es- A bacia de Pelotas localiza-se na cos-
tudos de Geologia Costeira e Oceânica ta do estado do Rio Grande do Sul,
(CECO), durante os seus 38 anos de exis- subjacente à margem continental, e encon-
tência. tra-se limitada pelos paralelos de 28º e 36°
Todos estes dados e informações não Sul e pelos meridianos de 46° e 54° Oeste,
teriam sido possível sem o auxilio das insti- aproximadamente (Figura 1).
tuições de fomento e pesquisa, tais como: As estruturas transversais mais impor-
CNPq, FAPERGS, CAPES, FINEP, OEA, tantes presentes na Bacia de Pelotas, con-
UNESCO, PETROBRAS e IBP. Também for me Zembruscki (1979); Asmus &
foi de fundamental importância a participa- Guazelli (1981) e Corrêa (1987a, 1990, 1994)
ção e a cooperação das instituições perten- são: Lineamento de Florianópolis o qual consti-
centes ao Programa de Geologia e Geofísica tui o limite setentrional entre a Bacia de
Marinha (PGGM), em especial, as detento- Pelotas e a Elevação do Rio Grande, Linea-
ras de embarcações oceanográficas, tais mento de Porto Alegre, o qual determina o li-
como DHN, FURG e USP. mite sul da Elevação do Rio Grande e o Li-
neamento do Chuí, o qual representa o limite
meridional da Bacia de Pelotas.
2. BACIA DE PELOTAS
PELOTAS A área emersa da Bacia de Pelotas é
formada, na sua parte meridional, pelo
embasamento cristalino, enquanto que na
A plataforma e o talude continental porção norte, ocorrem sedimentos
do Rio Grande do Sul encontram-se sobre paleozóicos e mesozóicos da Bacia do
a Bacia de Pelotas, a qual é classificada como Paraná. A região costeira é formada por uma
uma bacia do tipo marginal aberta, que se planície de baixo relevo, onde se observa o
encontra assentada sobre a borda continen- desenvolvimento de inúmeras lagoas. Em
tal sul-americana e a crosta oceânica. Esta direção a norte, esta planície costeira torna-
bacia é constituída, estruturalmente, por uma se mais acidentada e recortada por antigas
falésias basálticas.
Figura 1.
1 Mapa de localização e fisiográfico da margem continental do Rio Grande do Sul e adjacências (modificado de Projeto
REMAC, 1979).
A área submersa é formada pela pla- & Dehnhardt (1999) apresentam um estu-
taforma e talude continental. A plataforma do com base em nanofósseis calcários do
continental estende-se desde a costa até a testemunho 101, localizado neste cone. Atra-
isóbata média dos -130m, apresenta uma vés destas análises se observa uma distribui-
superfície bastante plana, ornamentada por ção não seqüencial ao longo do testemunho,
suáveis irregularidades formadas por ban- com concentrações a 670, 620, e 580 cm da
cos ou paleocanais, e com uma declividade base e a 15 cm do topo. A identificação
média de 1:1.000 (Martins et al., 1972; taxonômica destes microfósseis possibilitou
Corrêa, 1990). O talude continental apre- detectar um retrabalhamento na base do tes-
senta uma declividade que varia de 1:40 a temunho, de espécies do Eopleistoceno com
1:60, com uma forma geral convexa, a qual espécies do Plioceno e, para o topo, foi re-
revela a predominância dos processos gistrada uma assembléia Neopleistocênica.
deposicionais em sua configuração (Martins
et al., 1972).
A maior feição deposicional observa- 3. ESTABILIZAÇÕES DO NÍVEL DO MAR
ESTABILIZAÇÕES
da sobre o talude continental é a do Cone
de Rio Grande, a qual foi estudada e descri-
ta por Martins et al. (1972), Urien et al. (1973), Indícios de oscilações do nível do mar,
Martins (1984) e Corrêa (1990). Gonçalves durante o Quaternário foram observados na
Plataforma e Talude Continental do Rio Grande do Sul: Síntese dos Conhecimentos 343
Instituto de Geociências. Contribuições
Figura 2.
2 Detalhe da Carta de Pendentes da Plataforma Continental do Rio Grande do Sul para o Litoral Norte do estado,
apresentando os graus de declividades e contrastes observados na área de estudo (modificado de Corrêa, 1990, 1995).
Figura 3.
3 Curva eustática do nível do mar para a plataforma continental sul-brasileira (modificado de Corrêa, 1990,1996).
Plataforma e Talude Continental do Rio Grande do Sul: Síntese dos Conhecimentos 345
Instituto de Geociências. Contribuições
poderiam estar associados a uma paleodre- Durante este período, o nível do mar
nagem costeira (Corrêa, 1990, 1996; Corrêa subiu a uma velocidade de 1,6 cm/ano e
et al., 1989, 1992; Weschenfelder et al., continuou a deslocar a linha de costa em
2005). direção ao Oeste. Os canais de drenagem
começaram a se deslocar em direção ao con-
4.2 2ª Fase: de 16.000 anos BP há tinente, mas continuaram a manter uma co-
11.000 anos BP nexão com a plataforma continental.
Os sedimentos finos que eram trans-
A partir dos 16.000 anos BP, o nível
portados pela rede de drenagem fluvial à
do mar, segundo a Curva Eustática propos-
zona costeira da época foram depositados
ta por Corrêa (1990), começou a subir mais
sobre as zonas mais profundas, enquanto
lentamente até os 11.000 anos BP. A veloci-
que os depósitos costeiros eram formados
dade de subida do nível do mar passou de 2
pela remobilização das areias transgressivas
cm/ano para 0,6 cm/ano (Corrêa, 1990).
e não mais pelos depósitos arenosos
Esta fase, na sucessão litológica,
subjacentes de idade pleistocênica.
corresponde às areias lamosas de ambiente
Com a continuação do processo
pré-litoral situado, normalmente, na base da
transgressivo, a linha de costa começou a
seqüência transgressiva. A seqüência trans-
afastar-se mais e mais da borda externa da
gressiva atual da plataforma continental
plataforma continental, ocasionando a de-
médio-externa é marcada por superfícies
posição de sedimentos finos sobre a plata-
de erosão impostas nos depósitos pré-exis-
forma média e externa, recobrindo assim as
tentes. Ela traduz o remanejo destes sedi-
areias transgressivas. Nos sedimentos des-
mentos mais antigos no domínio de plata-
tes níveis são observadas camadas de casca-
forma interna, durante os períodos de es-
lho bioclástico e concentrações de minerais
tabilização do processo transgressivo. Nes-
pesados, os quais caracterizam os paleoníveis
ta fase são observadas rupturas de penden-
de estabilização da linha de costa durante o
tes nos níveis de -80/-90 m e -60/-70 m
processo transgressivo (Corrêa, 1990, 1996;
(Corrêa, 1990, 1996).
Corrêa et al., 1989, 1992).
O nível de -60/-70 m caracteriza, se-
gundo os biólogos, o início do período
holocênico, uma vez que, nesse momento, 5. PL ATAFORMA E TALUDE
PLA TAL
ALUDE
o clima começou a ser mais quente e oca- CONTINENT AL
CONTINENTAL
sionou um aumento na velocidade de subi-
da do nível do mar, que passou de 0,6 cm/
ano para 1,6 cm/ano (Corrêa, 1990, 1996; O conhecimento que se tem atual-
Corrêa et al.,1989, 1992; Corrêa & Baitelli, mente sobre a geologia da plataforma e ta-
1991). lude continental do Rio Grande do Sul, nes-
tas últimas décadas, resultou dos estudos
4.3 3ª Fase: de 11.000 anos BP há 6.500 efetuados por vários pesquisadores dedica-
anos BP dos, seguindo os trabalhos pioneiros de
Esta fase é caracterizada por dois ní- Zembuscki (1967) e Martins, Urien &
veis de estabilização, o primeiro a -32/-45 Eichler (1967).
m, e o segundo a -20/-25 m (Corrêa, 1990, Urien & Martins (1974) e Corrêa
1996). (1987b, 1990) classificaram a plataforma
continental do Rio Grande do Sul como
Figura 4.
4 Mapa paleo-evolutivo da Plataforma Continental do Rio Grande do Sul durante os últimos 17.500 anos AP. (modificado
de Corrêa, 1990).
Figueiredo Jr. (1975), Corrêa et al. tão associados a ambientes de alta energia,
(1977a) e Corrêa & Ponzi (1978), estudan- os quais são responsáveis pelo retrabalha-
do os sedimentos bioclásticos presentes na mento atual desses sedimentos pleistocê-
plataforma continental interna do Rio Gran- nicos e de sua distribuição e concentração.
de do Sul, constataram que os mesmos es-
Plataforma e Talude Continental do Rio Grande do Sul: Síntese dos Conhecimentos 347
Instituto de Geociências. Contribuições
Figura 5
5. Mapa de distribuição de Minerais Pesados na Plataforma Continental do Rio Grande do Sul e adjacências (modificado de
Corrêa et al., 2005).
Plataforma e Talude Continental do Rio Grande do Sul: Síntese dos Conhecimentos 349
Instituto de Geociências. Contribuições
Plataforma e Talude Continental do Rio Grande do Sul: Síntese dos Conhecimentos 351
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Plataforma e Talude Continental do Rio Grande do Sul: Síntese dos Conhecimentos 353
1
Instituto de Geociências, Universidade Federal do Rio Grande do Sul
2
Companhia de Pesquisa de Recursos Minerais
1. INTRODUÇÃO
356 Ari Roisenberg, Antônio Pedro Viero, Marco Alexandre de Freitas, José Luiz Flores Machado
50 50 anos de Geologia
para ocorrência de águas subterrâneas, dis- sam a 250 mg/l. Na área confinada, as ca-
tribuídos em seis grupos (Figura 1): pacidades específicas ultrapassam os 4 m3/
- Aqüíferos com Alta a Média Possi- h/m, alcançando até 10 m3/h/m. Os sóli-
bilidade para Águas Subterrâneas em Rochas dos totais dissolvidos variam entre 250 e 400
e Sedimentos com Porosidade Intergranular; mg/l.
- Aqüíferos com Média a Baixa Pos- Aflorando exclusivamente na região
sibilidade para Águas Subterrâneas em Ro- central do Estado, entre os municípios de
chas e Sedimentos com Porosidade Mata e Taquari, ocorre o Sistema Aqüífero
Intergranular; Santa Maria. É formado por arenitos gros-
- Aqüíferos com Alta a Média Possi- sos a conglomeráticos na base, lamitos
bilidade para Águas Subterrâneas em Rochas avermelhados, siltitos e arenitos finos a
com Porosidade por Fraturas; médios no topo. As capacidades específicas
- Aqüíferos com Média a Baixa Pos- variam de 0,5 a 1 m3/h/m, nas áreas de
sibilidade para Águas Subterrâneas em Ro- afloramento, e alcançam 4 m3/h/m, nas
chas com Porosidade por Fraturas; áreas confinadas. A salinidade varia de 50 a
- Aqüíferos Limitados de Baixa Pos- 500 mg/l e, em algumas regiões confinadas,
sibilidade para Água Subterrânea em Rochas são encontrados valores superiores a 2.000
com Porosidade Intergranular ou por Fra- mg/l e teores de flúor acima do limite de
turas; potabilidade.
- Aqüíferos Praticamente Improduti- O Sistema Aqüífero Quaternário Cos-
vos em Rochas com Porosidade Intergra- teiro I compreende todos os aqüíferos as-
nular ou por Fraturas. sociados com os sedimentos da planície cos-
teira do Rio Grande do Sul, desenvolven-
O primeiro grupo, Aqüíferos com Alta do-se desde o Chuí até Torres. Compõe-se
a Média Possibilidade para Águas Subterrâneas de uma sucessão de camadas arenosas
em Rochas e Sedimentos com Porosidade inconsolidadas, de granulometria fina a mé-
Intergranular, é composto pelos Sistemas dia, esbranquiçadas, intercaladas com cama-
Aqüíferos Botucatu/Guará I, Santa Maria, das síltico-arenosas e argilosas. As capaci-
Quaternário Costeiro I, Quaternário Barrei- dades específicas em geral são altas, ultra-
ra Marinha, Sedimentos Deltáicos e passando os 4 m3/h/m, enquanto a salini-
Quaternário Indiferenciado. dade é inferior a 400 mg/l, eventualmente
O Sistema Aqüífero Botucatu/Guará ultrapassando este valor em águas cloreta-
I possui área aflorante restrita à fronteira das.
oeste, entre Santana do Livramento e Jaguari. Localizado em uma estreita faixa de
A porção confinada pelas rochas basálticas direção nordeste, da Barra do Ribeiro, a oes-
ocorre entre os municípios de Santana do te do Lago Guaíba, até Santo Antônio da
Livramento, Alegrete, Uruguaiana, Itaqui e Patrulha, a leste, ocorre o Sistema Aqüífero
São Borja. As litologias são compostas por Quaternário Barreira Marinha. É compos-
arenitos médios a finos, quartzosos, róseos to por areias inconsolidadas, de granulome-
a avermelhados, apresentando intercalações tria fina a média, vermelho-claro a esbran-
pelíticas e cimento argiloso na unidade quiçadas, com pouca matriz argilosa. As
Guará. Na área aflorante, as capacidades capacidades específicas são elevadas, ultra-
específicas variam entre 1 e 3 m3/h/m e os passando 4 m3/h/m. O teor salino é muito
sólidos dissolvidos totais raramente ultrapas- baixo, em média inferior a 50 mg/l.
Os Recursos Hídricos Subterrâneos no Rio Grande do Sul: Uma Visão sobre a Saúde... 357
Instituto de Geociências. Contribuições
Figura 1
1. Mapa hidrogeológico simplificado do Rio Grande do Sul, mostrando os principais tipos de aqüíferos (modificado de
CPRM, 2005).
358 Ari Roisenberg, Antônio Pedro Viero, Marco Alexandre de Freitas, José Luiz Flores Machado
50 50 anos de Geologia
Os Recursos Hídricos Subterrâneos no Rio Grande do Sul: Uma Visão sobre a Saúde... 359
Instituto de Geociências. Contribuições
360 Ari Roisenberg, Antônio Pedro Viero, Marco Alexandre de Freitas, José Luiz Flores Machado
50 50 anos de Geologia
ser duras, com grande quantidade de sais de silicoso, que se comportam como péssimos
cálcio e magnésio. armazenadores de água devido à sua condi-
Compreendendo basicamente as ção topo-estrutural e cimentação, resultan-
áreas correspondentes aos limites do Em- do em poços geralmente secos.
basamento Cristalino e incluindo municí- O Sistema Aqüífero Serra Geral III
pios como Bagé, Caçapava do Sul, Encru- (riodacitos e basaltos) encontra-se nas por-
zilhada do Sul e pequena porção de Porto ções mais elevadas dos derrames da unida-
Alegre, registra-se o Sistema Aqüífero de hidroestratigráfica Serra Geral, na região
Embasamento Cristalino II. Este se rela- nordeste do Estado, e em morros isolados
ciona às rochas graníticas, gnáissicas, an- de áreas dissecadas, no noroeste do Estado.
desitos, xistos, filitos e calcários metamor- Os poços possuem vazões específicas mui-
fizados que estão, localmente, afetadas por to baixas ou são secos e as águas apresen-
fraturamentos e falhas. Geralmente, apre- tam baixa salinidade.
sentam capacidades específicas inferiores Nas áreas do centro ao leste do Em-
a 0,5 m3/h/m, ocorrendo inclusive poços basamento cristalino, entre os municípios
secos. A salinidade nas áreas não cobertas de Caçapava do Sul, Bagé, Lavras do Sul e
por sedimentos de origem marinha é infe- Vila Nova do Sul, ocorrem Aqüicludes Eo-
rior a 300 mg/l. Poços nas rochas graníticas Paleozóicos, constituídos por arenitos fi-
podem apresentar enriquecimento em flúor. nos a médios, róseos a avermelhados, mui-
O sexto e último grupo, Aqüíferos Pra- to endurecidos por cimentação ferruginosa,
ticamente Improdutivos em Rochas com Porosidade calcítica e silicosa que conferem porosidade
Intergranular ou por Fraturas, representa os muito baixa. Com isto, os poços tubulares
piores reservatórios de água subterrânea, nesta unidade são secos ou de vazão insig-
sendo representado pelo Sistema Aqüífero nificante.
Basalto/Botucatu, Sistema Aqüífero O Sistema Aqüífero Embasamento
Botucatu, Sistema Aqüífero Serra Geral III Cristalino III, localizado nas porções mais
e Aqüicludes Eo-Paleozóicos. elevadas, é composto principalmente por
O Sistema Aqüífero Basalto/Botucatu rochas graníticas maciças, gnaisses, riolitos
localiza-se na região limite entre a fronteira e andesitos pouco alterados. A ausência de
oeste e a região das missões, entre Santiago, fraturas interconectadas e a condição topo-
Unistalda e São Borja. Incluem-se, também, gráfica desfavorável inviabilizam a perfura-
aquelas áreas com morros isolados de ção de poços tubulares, mesmo para baixas
basalto sobre os arenitos Botucatu, tanto na vazões.
fronteira oeste, quanto na porção leste do
Estado. Estas são áreas desfavoráveis ao
armazenamento de água subterrânea devi- 3. QUALIDADE D
QUALIDADE A ÁGUA
DA
do a sua condição topo-estrutural, e os po- SUBTERRÂNEA NO RIO GRANDE
ços são secos ou de baixas vazões. DO SUL E IMPLIC AÇÕES NA SAÚDE
IMPLICAÇÕES
O Sistema Aqüífero Botucatu locali- DAS POPUL AÇÕES
POPULAÇÕES
za-se em cotas topográficas altas e com
morfologia escarpada, principalmente na
região central do Estado, próximo às bor- Nos últimos 15 anos, a geoquímica
das escarpadas do planalto basáltico. Com- ambiental tem dirigido crescente atenção às
preende arenitos de granulometria média, relações entre a Geologia e os estudos
endurecidos por cimento ferruginoso ou epidemiológicos, especialidade que recebe
Os Recursos Hídricos Subterrâneos no Rio Grande do Sul: Uma Visão sobre a Saúde... 361
Instituto de Geociências. Contribuições
362 Ari Roisenberg, Antônio Pedro Viero, Marco Alexandre de Freitas, José Luiz Flores Machado
50 50 anos de Geologia
Figura 2.
2 Esquema da estrutura de esmectitas (A) e matéria orgânica (B), mostrando a distribuição de cargas negativas nas
superfícies externas e internas onde ocorre adsorção, troca catiônica e formação de complexos de superfície (A - modificado de
Sposito, 1989; B - Deutsch, 1997).
1. Capacidade máxima de adsorção de solos da região metropolitana de Porto Alegre (Midugno et al., 2007).
Tabela 1
Os Recursos Hídricos Subterrâneos no Rio Grande do Sul: Uma Visão sobre a Saúde... 363
Instituto de Geociências. Contribuições
Figura 3
3. Capacidade de adsorção de metais por hidróxido ferro (Fe(OH)3) em função do pH. Concentração de metais na solução:
5*10-7 M (curvas compiladas de Dzombak & Morel, 1990).
experimento realizado (Dzombak & Morel, cilidade. O fosfato e o fluoreto, por outro
1990). Merece destaque na Figura 3 o com- lado, podem ser retidos na zona vadosa se
portamento do cromo complexado, sob a esta possuir caráter argiloso (Marimon,
forma de CrO42-, que mantém relação in- 2006). Em solos arenosos, como são os
versa com o pH, relativamente à espécie terrenos sedimentares cenozóicos da Pla-
Cr3+, demonstrando que a especiação do nície Costeira, o fosfato e o flúor apresen-
metal constitui um fator determinante de tam boa mobilidade geoquímica, tornando
sua mobilidade geoquímica. os aqüíferos freáticos vulneráveis à conta-
minação e constituindo risco à saúde das
3.2 A agricultura como fonte populações rurais (Oliveira, 2006).
de degradação das águas subterrâneas O uso de fertilizantes orgânicos à
base de dejetos animais é prática comum,
O Estado do Rio Grande do Sul é
particularmente em regiões onde a
reconhecido como um dos estados com
suinocultura e avicultura estão presentes.
maior produtividade agrícola no País, tendo
O uso deste tipo de fertilizante e o de águas
participação importante nas safras de soja,
servidas, que contêm igualmente grande
arroz, trigo, uva, entre outras culturas. A alta
quantidade de nitrogênio amoniacal rapi-
produtividade é alcançada com uso extensi-
damente convertido em nitrato, pode de-
vo de fertilizantes minerais, excrementos
gradar a qualidade das águas subterrâneas.
animais, agrotóxicos e corretivos de pH,
A contaminação de aqüíferos por
aportando anualmente ao solo milhares de
pesticidas ainda não está adequadamente
toneladas de agentes contaminantes que
dimensionada no âmbito do Rio Grande do
podem alcançar as águas subterrâneas.
Sul, devido à carência de estudos e avalia-
Os fertilizantes minerais do tipo NPK
ções específicas sobre o comportamento dos
são os mais utilizados na agricultura, cons-
produtos utilizados no solo. Por se tratarem
tituindo uma fonte de nitrato e fósforo, com
de substâncias degradáveis, o potencial de
elevadas concentrações de flúor. O nitrato
contaminação das águas subterrâneas de-
possui grande mobilidade geoquímica, so-
pende, além da mobilidade geoquímica, da
frendo fraca ou nenhuma adsorção na zona
persistência no meio ambiente. Na Tabela 2
vadosa, podendo alcançar a zona saturada
são apresentados dados referentes à meia
e poluir os aqüíferos rasos com relativa fa-
364 Ari Roisenberg, Antônio Pedro Viero, Marco Alexandre de Freitas, José Luiz Flores Machado
50 50 anos de Geologia
Tabela 2.
2 Tempo de meia vida, solubilidade e coeficiente de adsorção de pesticidas utilizados no Rio Grande do Sul (dados de
Wauchope, et al., 1992).
Os Recursos Hídricos Subterrâneos no Rio Grande do Sul: Uma Visão sobre a Saúde... 365
Instituto de Geociências. Contribuições
366 Ari Roisenberg, Antônio Pedro Viero, Marco Alexandre de Freitas, José Luiz Flores Machado
50 50 anos de Geologia
Os Recursos Hídricos Subterrâneos no Rio Grande do Sul: Uma Visão sobre a Saúde... 367
Departamento de Geodésia, Instituto de Geociências,
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
C Contribuição do Sensoriamento
Remoto na Construção do Saber Geológico
do Estado do Rio Grande do Sul
Clóvis Carlos Carraro, Nelson Amoretti Lisboa,
Dejanira Luderitz Saldanha, Norberto Dani
1. INTRODUÇÃO
visavam à soberania territorial, sendo essen- dos elementos geológicos, uma vez que a
cial, para tanto, o conhecimento da distri- aquisição das amostras para determinação
buição espacial dos elementos que compu- de atributos geológicos era de caráter pon-
nham as diversas paisagens e riquezas mi- tual e as distâncias vencidas em precárias
nerais do país. A implantação do curso de condições de deslocamento. Os limites das
graduação em Geologia teve aspecto inova- unidades geológicas eram então traçados
dor, na medida em que naquela época, no utilizando-se aferições com relação às mu-
Brasil, ocorriam poucas iniciativas gerado- danças no relevo, vegetação e solo.
ras de conhecimento sistemático do subsolo
brasileiro. As referências até então conheci-
das e de uso público sobre a distribuição, 3. O SENSORIAMENTO REMOTO
mapeamento e localização das riquezas mi- FOTOGRÁFICO 1950-1970
nerais no Estado se restringiam a escassas
publicações. Salienta-se dentre elas, o pri-
meiro “Mapa Geológico do Rio Grande do O sensoriamento remoto entra na his-
Sul”, elaborado por E. Dahne em 1903, tória evolutiva do conhecimento geológico
porém nunca publicado. Entre os trabalhos por meio dos primeiros levantamentos fo-
pioneiros, de cunho geológico, salienta-se tográficos adquiridos em plataforma aérea,
“Reconhecimento Geológico do Rio Gran- no final dos anos 30, e de dois novos
de do Sul”, de Paulino Franco de Carvalho, sobrevôos, em 1942 e 1953, que abrange-
publicado no ano de 1932, o trabalho de ram todo o Estado. Essas fotos aéreas, na
autoria de Emílio Alves Teixeira, “Cobre no escala de 1/40.000, foram utilizadas para a
Rio Grande do Sul”, de 1937, e o trabalho geração das primeiras cartas topográficas na
de Viktor Leinz, “Problemas Geológicos do escala de 1/50.000 pela 1ª Divisão de Le-
Estado do Rio Grande do Sul”, publicado vantamento do Ministério do Exército. To-
em 1939. Na década de 40, trabalhos im- davia, as cartas restringiam-se à região de
portantes foram editados: “Mapa Geológi- fronteira, bastante distante das minas de
co Caçapava – Lavras Rio Grande do Sul - Caçapava - Lavras - Encruzilhada ou das
Brasil” por Viktor Leinz e Alceu Fabio Bar- minas de Arroio dos Ratos - Leão – Butiá,
bosa, com colaboração de Emílio Alves de interesse dos geólogos. Pela inexistência
Teixeira (Leinz, V. et al., 1941) (Figura 1); de carta topográfica, obtinha-se base
“Jazidas Auríferas de Lavras e sua Gênese planimétrica pela restituição de fotos aé-
Metasomática”, por Viktor Leinz em cola- reas, usando-se o método da triangulação
boração com Emílio Alves Teixeira; “Gê- radial baseado em marcos geodésicos de 1a
nese da jazida de cobre Camaquã”, publica- e 2a ordem para o posicionamento das fo-
do no Boletim 88 da Secretaria de Agricul- tos no espaço e controle da escala. O traba-
tura Porto Alegre, e “A Jazida de Cobre Cer- lho de restituição era supervisionado pelo
ro dos Martins – Caçapava - RGS, sua geo- professor de topografia, geodésia e carto-
logia, mineralização e prospecção”, ambos grafia, Clóvis C. Carraro, e pelo professor
publicados por Viktor Leinz e Alceu F. Bar- de aerofotogeologia, Nilo C. Eick. Esse mé-
bosa. todo foi usado em mapas geológicos na es-
Os trabalhos acima mencionados, cer- cala 1/50.000, elaborados pelos alunos nos
tamente, foram elaborados por meio de trabalhos de graduação, como também em
metodologias que envolviam uma enorme mapas geológicos de detalhe da região do
intuição em relação à distribuição espacial Escudo Sul-rio-grandense, publicados em
370 Clóvis Carlos Carraro, Nelson Amoretti Lisboa, Dejanira Luderitz Saldanha, Norberto Dani
50 50 anos de Geologia
1966 pelo DNPM. A divulgação dos traba- sino sistemático da Ciência Geológica no
lhos científicos produzidos desde os Rio Grande do Sul. Na primeira fase de
primórdios do Curso de Geologia foi feita implantação do Curso de Geologia, técnica
por meio dos periódicos “Boletim”, “Publi- essencial e inovadora para a época foi a uti-
cação Especial” e “Notas e Estudos”. lização de fotografias aéreas intimamente
Certamente, a busca do petróleo e a integradas com o trabalho de campo, com
participação efetiva dos estudantes de geo- o objetivo específico de produzir dados
logia na campanha “O Petróleo é Nosso”, geológicos. Tendo como base trabalhos de
nos anos 50, incentivou sobremaneira o en- foto interpretação geológica, possibilitou aos
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Figura 2
2. Mapa Geológico das Quadrículas de Gravataí, Taquara e Rolante, Rio Grande do Sul, Brasil – 1963.
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Figura 3
3. Mapa Geotectônico da Região de Caçapava do Sul, RS (Ribeiro & Carraro, 1971).
Figura 4
4. Esboço Geológico do Rio Grande do Sul (Leinz, 1943).
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de imagens orbitais e fotos aéreas falsa-cor, rio-grandense, visando a seu uso em sala
imprescindíveis para o ensino de de aula e pesquisa.
geociências. Parceria similar criou-se mais A experiência de análise de produtos
tarde com a Agência para o Desenvolvi- do imageamento multi-espectral orbital sis-
mento Tecnológico da Indústria Mineral temático difundiu-se pelas universidades
Brasileira/ADIMB, com a participação do brasileiras e passou a ser incorporada aos
Dr. Onildo João Marini, visando ao forne- cursos de Graduação em Geologia. A
cimento de imagens digitais de radar do disponibilização das imagens orbitais facili-
Projeto RadamBrasil. Recentemente, o tou que fossem criadas disciplinas específi-
“Canadian Centre for Remote Sensing” cas de análise e interpretação de imagens de
(CCRS) tem fornecido imagens radar do sensoriamento remoto. Como exemplo, a
satélite Radarsat-1 de áreas do Escudo Sul- disciplina Fotogeologia Aplicada abrange
Figura 6. Mapa Geológico do Estado do Rio Grande do Sul (Carraro et al., 1974).
campos específicos, tais como Prospecção década, instala-se na UFRGS o Centro Es-
Mineral, Geotécnica, Hidrogeologia e Meio tadual de Pesquisa em Sensoriamento Re-
Ambiente, sendo oferecida em caráter moto e Meteorologia, com abertura de cur-
opcional a diversos cursos da Universida- so de pós-graduação em nível de mestrado,
de. Trabalhos de pesquisa baseados na aná- além do desenvolvimento de projetos que
lise visual de imagens multi-espectrais iden- envolvem processamento de imagens digi-
tificam feições geológicas peculiares e res- tais, inicialmente por meio do software
postas radiométricas não visualizáveis em SITIMÔ e, atualmente, envolvendo
fotos aéreas convencionais. Nessa mesma ERDASÔ, ENVIÔ e PCIÔ.
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1. INTRODUÇÃO
2. O EXEMPLO D A GESTÃO
DA
PAR TICIP
ARTICIP ATIV
TICIPA A NA CID
TIVA ADE
CIDADE 3. UM ATL
ATL AS PPARA
TLAS ARA
DE POR TO
PORTO ALEGRE O DESENVOL
DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL
VIMENTO
Atlas Ambiental de Porto Alegre: uma Visão Pioneira sobre a Cidade... 387
Instituto de Geociências. Contribuições
Alegre, desde 800 milhões de anos atrás ambiental num mundo em processo de ur-
(data das rochas mais antigas), até o tempo banização, da gestão ambiental pública e
presente, em que ocorre a intricada mistura dos dados de Porto Alegre. Uma bibliogra-
de gases na atmosfera devido à emissão vei- fia e um índice remissivo sobre esses te-
cular. Valendo-se de teorias científicas e mas seguem no final da obra.
tecnologias, o sistema natural e o sistema
construído do município foram considera- 3.1 A produção do Atlas: métodos e
dos a partir de sua evolução no espaço e no técnicas
tempo, utilizando-se de uma abordagem que
Os dados e modelos científicos que
é comum no conhecimento geológico. As
consideram a evolução no tempo da
mudanças locais de ambos os sistemas fo-
geosfera, da hidrosfera, da biosfera, da at-
ram entendidas dentro de contextos globais
mosfera e da antroposfera, obtidos no mu-
e regionais. Por isso, esse Atlas pode ser útil
nicípio, resultaram de pesquisas desenvol-
tanto como referência aos dados locais, para
vidas na Universidade Federal do Rio Gran-
fins de planejamento, quanto para explicar
de do Sul e foram tratados interdisciplinar-
teorias globais e regionais, utilizando exem-
mente no Atlas. Os dados sobre a cidade,
plos concretos e contextualizados.
coligidos por meio de programas técnicos
O Atlas, além de apresentar uma gran-
da Prefeitura Municipal, foram sistematiza-
de quantidade de dados, soberbamente do-
dos segundo pressupostos científicos. O uso
cumentados, sobre os parâmetros
de modernas tecnologias de representação
ambientais do município, sintetizou-os den-
da subsuperfície e da paisagem permitiu que
tro das melhores técnicas interdisciplinares.
esses dados e suas interpretações fossem
Tendo como matriz do conhecimento bá-
apresentados em 98 mapas temáticos – ela-
sico a Geologia (Menegat et al., 1998b), foi
borados em diferentes escalas e integrados
possível estabelecer uma História Natural
por programas computadorizados de
de Porto Alegre, como preconizaram os
geoprocessamento – acompanhados de 124
grandes naturalistas do século passado, mas
ilustrações em aquarela – blocos-diagramas
fazendo uso das tecnologias, das teorias e
e cenários feitos com base em dados cientí-
da cosmovisão do século atual. Os assun-
ficos – e 611 fotografias, capturadas a partir
tos são organizados em três seções: o Sis-
de um plano que utilizou aeroplanos, heli-
tema Natural – com oito capítulos que ex-
cópteros, gruas até a escala microscópica
plicam a geologia, a geomorfologia, a
(Figura 2). A precisão da linguagem técnica,
hidrografia, os solos, a vegetação, a fauna,
aliada a essas ilustrações, tornou a obra, si-
o clima e as unidades de conservação; o
multaneamente, acessível ao público não es-
Sistema Construído – com os capítulos de
pecializado e aos técnicos das mais distintas
9 a 17, que apresentam a evolução urbana,
áreas, promovendo o entendimento
o modelo espacial urbano, a evolução das
interdisciplinar e sistêmico dos assuntos tra-
áreas verdes, a arborização das vias públi-
tados.
cas, o clima urbano, as atividades que pro-
Assim, o Atlas proporcionou alguns
duzem impacto ambiental e os serviços de
avanços técnicos, científicos e institucionais,
saneamento que mitigam o impacto; por
reunidos em quatro perspectivas: (a) dos
fim, a Gestão Ambiental – que abrange três
saberes; (b) da representação das cidades e
capítulos onde são apresentados os princi-
seu ambiente (c) das instituições; (d) da ges-
pais conceitos e problemas da gestão
tão ambiental e da participação dos cidadãos.
Figura 1.
1 Capa da terceira edição do Atlas Ambiental de Porto Alegre.
Atlas Ambiental de Porto Alegre: uma Visão Pioneira sobre a Cidade... 389
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Figura 2.
2 Escalas e dimensões na representação da cidade de Porto Alegre e seu ambiente.
Figura 3
3. Representação por meio de blocos-diagramas da evolução do Quaternário de Porto Alegre.
Atlas Ambiental de Porto Alegre: uma Visão Pioneira sobre a Cidade... 391
Instituto de Geociências. Contribuições
3.4 A organicidade entre a ciência, tes das realidades e necessidades dos cida-
as instituições, o governo local dãos.
e a sociedade
3.5 A Gestão Ambiental
A elaboração do Atlas deu-se dentro e a participação dos cidadãos e cidadãs
de um contexto orgânico entre a pesquisa,
as instituições, o governo local e a socieda- O Atlas proporcionou o acesso à aná-
de. O papel social da Universidade Pública lise e cruzamento de diferentes parâmetros
ficou evidenciado pela importância, tanto da mapeados, tornando o diagnóstico de aci-
pesquisa desenvolvida, como na sua relação dentes ambientais mais preciso. Além dis-
direta com a comunidade municipal que a so, a análise macro-ambiental, a partir dos
abriga. Os saberes universais são resolvidos mapas temáticos, possibilitou que os inúme-
em termos de aplicações locais com retor- ros processos de fiscalização e legislação
no imediato ao cidadão que, através dos ambiental do município possam ser enqua-
impostos, sustenta a Universidade. Além da drados dentro de cenários e prognósticos
comunidade porto-alegrense, outras pode- construídos com base científica. Da mesma
rão usufruir dos seus benefícios. A aplica- forma, as áreas de grande interesse
ção local dos saberes retorna novamente ambiental ficaram evidenciadas, em termos
como saber universal agora enriquecido com analíticos e descritivos, aprimorando as for-
uma prática, podendo ser replicado para mas de manejo, conservação e preservação
outras localidades do país e, mesmo, do das mesmas. Evita-se, assim, o eco-
mundo. Atualmente, cerca de 50 cidades ela- ideologismo que, muitas vezes, serve de base
boraram seus próprios atlas, tendo o de Por- para o enfoque dos temas ambientais. De
to Alegre como referência, entre as quais, forma apropriada, também, contorna-se o
Viena e Barcelona, na Europa, e Recife, São urbano-ideologismo, o qual muitas vezes se
Paulo, Buenos Aires, Lima, Trujillo e abstém da análise sobre a importância real
Arequipa, na América do Sul. Além disso, a das questões ambientais na qualidade de vida
partir de 2003 foram publicados vários atlas nos meios urbanos.
de geologia urbana (ver United Nations, Com o Atlas, os cidadãos passaram a
2003a, 2003b, 2004). ter o seu melhor instrumento para a gestão
Por sua vez, a Prefeitura pode am- ambiental: o conhecimento. Com ele, os ci-
pliar seus horizontes de planejamento e ação dadãos ganharam confiança na sua capaci-
governamental, ao incorporar a análise de dade de gerir o entorno, indo muito além
elementos da dinâmica da realidade, anteci- dos receituários que, às vezes, não se apli-
pando cenários e prognósticos, ao invés de cam para a realidade imediata em que vive.
formular normas e leis quase sempre A educação ambiental pode ser desenvolvi-
exaradas a posteriori dos eventos que as fi- da em cada sala de aula com o uso de infor-
zeram necessárias. mações locais (Menegat, 2000). Houve um
Para o Instituto Nacional de Pesqui- redobrado êxito nesta perspectiva. Primei-
sas Espaciais, por tratar-se de um centro de ro, na motivação do aluno, que sempre se
alta tecnologia de pesquisa espacial, há uma interessa mais quando o objeto do apren-
visível aproximação tanto com a comunida- der parte da sua vivência. Segundo, que, ao
de acadêmica como com a sociedade, refor- compreender a sua realidade, desde cedo, o
çando, a exemplo da Universidade, o papel aluno se capacita para o exercício conscien-
social dessas atividades, por vezes, distan- te da cidadania a partir de pressupostos
Figura 4
4. Litoteca organizada pelos alunos do Laboratório de Inteligência do Ambiente Urbano da Escola Municipal de Ensino
Fundamental Judith Macedo de Araújo, no Morro da Cruz, Porto Alegre.
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Instituto de Geociências. Contribuições
Atlas Ambiental de Porto Alegre: uma Visão Pioneira sobre a Cidade... 395
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Editores:
Roberto Iannuzzi
roberto.iannuzzi@ufrgs.br
EDITORA
Comunicação e Identidade
Porto Alegre - RS
Editoração eletrônica:
Jaqueline da Silva Oliveira
jaque.silva.oliveira@hotmail.com
Fontes utilizadas:
Garamond, BakerSignet BT, Edwardian Script ITC
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