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Conectando historiografias:
a escravidão africana e o Antigo Regime
na America portugtesa'
Silvia Hiinold Lara

Durante rnuito tempo, ao menos urna parte dos estudiosos da História do Brasil
tendeu a pensar a "colônia" como uma hornogeneidade temporal e geográfica. Do
ponto de vista bistoriográkico, essa concepco unvoca da colônia parece ter surgido
do desdobrarnento das propostas do Instituto Histdrico e Geogiifico Brasileiro e,
especialrnente, da primeira e grande História geral do Brash, publicada pot Varnhagen
em 1854.1 Para esse auto; a aço colonizadora portuguesa havia gerado uma nação
independente e o Brash surgia como o tesultado de urn "caminho colonial", que teth
sido percorrido sob a tutela de Portugal. Sern estabelecer uma ruptura radical entre o
aritigo e o moderno, como em outras interpretaçoes contempor.neas, Varnhagen em-
preendeu uma avallaço politica da passagern do tempo e tratou de opor ao moderno
0 colonial.
Ainda que negasse a idéla de tuna ruptura corn a Independência e que sua obta
tenha uma abordagem emineritemente polIrica e administrativa, esse autor foi o pri-

Este texo apresenta resultados de utna pesquisa mais ample, que conta corn o financiamento do Consetho
Nacional de Desenvovixnento Ciencifico e Tecnológico - CNPq.
2
Publicada iniclslmente em 1854, a Hi#6i.iagera/do Brarilfoi posterlormente acrescida de urn tomo especi-
fico sobre "a história da iodependência do Brash", cujos originals perniarseceram inéditos ate a publicacao
póstuma cm 1917. Uma breve snas interessante anlise da obra de Vsrnhagen pode see encontrada em José
Honórlo Rodrigues. HfrId,ia da MsIdna do Brad A histotiografla conservadora. So Paulo: Ed, Nacional, INL,
1978-1988. p.13-27. A respeito do Instituto Histddco e Geogthflco Brasileiro, ver, entre outtos, Manoel Luis
Salgado Guimarges. 0 IHGB e o projeto de uma hlstória nacional. Exudes Histdricos, v.1, p.5-27, 1988; e Lilia
M. Schwaccz. 0 eipetdcido das rafas. Cientistas, instieuicocs e questao racial no Brasil, 1870-1930. Sgo Paulo:
Comparthia das Letras, 1993. cap.4.
22 MoDos DO Govnrt
CONOCrANDO H1sTotuocd(Ar/,s,., 23

)
) meixo a expo± solidarnente tat oposição.3 Os debates posterior's sobre a ava1iaço do
frouxido nas relaç6es socia.is e nas insdtuicôes (corn dificuldades para o desetivolvi-
) legado histórico ou politico do perlodo da dominaço poreuguesa ou ate mesrrio sobre rnento das relaçôes interpessoais e, portanto, do Estado), onde h6 repuisa pelo traba-
) os litnites temporais que separavarn este xnornento do perIodo pós-Indeperidêrtcia Iho regular, pelas atividades "'ixeis" - utna civi]iaaço tradicional, na qual predomina o
) acabaram, de cetto modo, consolidando esse principlo interpretadvo.
corpóreo, o patriarcalismo, a regional e o paroquial. Dc certo modo, a persistência
Essa concepção tornou-se hegemôthca nas décadas de 1880 e 1890, quando as dessas raizes do Brasil teve dois- moment os significativos que impeliram a sua própria
propostas vitotiosas dos abol1c1on1staunJgtas ta emrecorrer0p
superacto: 1808, quando a vinda da Famflia Real assinalota "novas tempos" e "os
do veihos padröes c loniais" se viram pela primeira vez arneaçados; e 1888, que marcou
Y trabatho livre dos hnigrantes. Nos d.iscursos• da elite nesse perIodo, apesax das nuanças "o Lim do predotninio agrário no Brasil'- momenta denbminado pelo autor de "nos-
programádcas, era cjuase consensual a oposiçao entre dois universos irreconcilatyexs, sa revolução".4
que opunham a escravido a liberdade, o arcaico ao moderno, o colonial ao nacional. Tal caracterlzaçiio, que associa a "vida colonial" a "escravido" e a outras caracte-
- "escravo" passou a set diretamente associado ao "negro", a "escravjdo" a "barbrie", risticas problematicas, no interior de balizamentos cronológicos rrnixcados pelo
o "traba.Lho livre (ou assalariado)" a CCjyffi
" Tais verdades consolidaram-se em imbricamento dos eventos de 1808 e 1888, também esteve presente nas obras de Gil-
termos politicos e passaram a estar presentes na mator parre das interpretag6es berto Freyre (nutria verso monarquista noscilgica e coriservadora) e de Coin Prado
) historiograficas, como se fossem "naturals".
Jiior (numa versao progressista e ate revolucionria).' Se, em Sergio Buarque de
) Foi assim que a "colôiaia" começou a set ideutificada como uma unidade temporal Holanda, 1808 e 1888 aparecein como' marcos cronológicos equilibrados, em Gilberto
relativairiente homogénea, coma se mats de três séculos de histórla pudessern set resu- Freyre o mundo da casa grande e da senzala 56 termina em 1888 (e, mesmo assim, para
midos etu urna dnica expresso. Tratava-se de urn passado a set esquecido, superado; dar continuidade a seus equivalentes urbanos dos sobrados e dos mocambos). Em
quando muito, urn passado em que se loca1iavam as origens de certos males que Caio Prado Jt'inior, é o final, do sCculo XVIII e especialmente 1808 que predomina,.
assolayam o Brasil.
embora a "heranca colonial" so possa set suplantada corn a realizaçao da revoluço
) c
No século XX, a oposico entre a mundo arcaico e colonial da escravidão e o brasileira - nico modo do alcançar a plenitude da naçao. -
outro moderno e civilizado, do trabaiho livre, continuou a set a base da ret1exo histó- Esses marcos cronol6gicos - e sobretudo os significados que des carregain -
rica sobre o Brash. Precedendo o "nacional", a colônia passou a see vista como o em- tambérn aparecem nas obras da chamada Escola de So Paulo.' Preoc.upado em estu-
brio do naço, mos foi esta iltima que the deu inteligibilidade e sentido. Creio que se daro momenta crucial de urna "reforma de base" reaiizada no passado, coma obsetva
possa situar no cixcuito intelectual existente entre as obras de Gilberto Freyre, Sérgio Richard Graham,' esse conjunto de trabaihos densos e originals ptoduzidos no inlcio
Buarque de Holanda e C2iO
Pralo Junior a consoidaçao definitiva desse paradigma,
)
dos marcos cronológicos e concepçoes a ele correspondentes. Para no nos estender-
) mos demasiadarnente, é possivel recuperar vrios desses elernentos em RaIes
do Brcjsil. S&glo Buarque dc Holanda. P.dr/e.r do Bnui/. 8.ed. Rio de Janelto: José Olymplo, 1975.
) Nas polatidades que articulam os sete capftulos desse livto magistral, a cMlizaçao Re(ito-me, aqui, cspecialmente as obras clissicas de Gilberto Freyre. Casa grands a senala. 19.ed Rio do
Janeiro: José Olympia, 1978,c Sobradare yeaneber. 7,ed. Rio de Janeiro: José Olyrnpio, 1985; ede Cola Prado
rural (no-agrIco1a, para set flel a formuJaço do autor) é caracterizada pot tuna socie- J/inior. BtiolçaobolOica do Bras/I. 9,ed, Sao Paulo: Brasiliense, 1975, e Farma;lIo do Bras/I eoniess?pordneo. Med. SSo
dade sern coeso social, na qual esto presentes fortes traços de personaiisrno e de Paulo: Btasiliense, 1977.
A expresso designs cspecialmentc os trabaihos clâssicos de Florestan Fernando,, Octavio Ianni, Fernando
Heneiquc Cardoso, Emilia Viotti do Costa e Paula Beiguelman. Vet, entre outros, Florestan Fernandes. A
i/stegraç3o do negro na saciedade de classes. Zed. So Paulo: Atica, 1978; Oct/vi lanni. As metamefoses do escravo. Sao
Para uma avalioc5o da fortuna crltica a respcic do obra de Varnhagen, vet Nib Odália.
A.rformas domeo#o, Paulo: DiEd, 1962; Fernando Henaique Cardoso. Capitalbino e e.rcravidao no Bras//meridional. Sbo Paulo: DiEd,
Ensaios sobre o pensameoto hlstoriográco do Vatrthagen e Oliveira Vianna,
1997; Astor Antonio Diehl. Sao Paulo: Editota Unesp, 1962; EmIlia Viotti da Costa. Da .re,rala dee/in/a, Sbo Paulo: Difel 1966; e Paula Beiguelman. FormaçJe pc/li/ca
.4 c,,fr,,pa h/rio rc,, brasi/qjra do IHGB no: an,: 1930, P55,0 Fwulo: Editor" tie Braid. Sao Paulo: Pioneira, 1967.
Universidade do Passo Pundo, 1998; e Arno Wehling.
} dade national. Rio do Janeiro: Nova Ftonteira, 1999, Egd4 b/:iddq, metvd,ia: Varahagen e a con:irnço tie ide nil- CE Richard Graham, Brazilian slavery re-examined. A review article. fmernalof Seda/H/rterj, v.3 ti.4, p.431-
)
53, 1970.
24 M000s DU GovanR
) CoNacr0o ftrsroaxooa,u's... 25
)
) dos anos 1960 acabou pot constxuir uma matriz interpretativa Para o momento da
) "transiço" do trabaiho escravo Para o trabaiho Jivre. Apesar das diferenças entre os capltulo é examinar alguns desses movimnentos historiográflcos, mostrar a amplitude
) autores, essa escola acabou tarnbérn pot definir uma cronologia Para a transiço do das mudanças interpretadvas que eles trouxeram e propor caminhos analiticos que,
Brash "colonial e arcaico" Para o Brasil "capitalista e rnoderno". As ariálises sobre a estabelecendo conexôes entre novos camnpos investigadvos, possarn oferecer suges-
mudança na natureza da exploraco do tma'atho alargararn-se Para o terreno da toes Para a continuidade das pesquisas histdricas.
)
periodizaço, conformando uma leitwa do passado colonial que o associava direta-
) merite a experiênoia da escravido.
) Mas foi sobretudo a ênfase nas análises inacroestruturais, que matcaram os anos
) 1970, que acabou pot cristajizar a irnagem da "colônia" como urn todo homogneo. A parth da década de 1980, os estudos sobre a escravidâo dos africanos e seus
Nos debates marxistas dessa época, a expresso "Brasil colonial" passou paticamente descendentes no Brasil passaxam par transformaçOes que redimensionaram a aborda-
a desconsiderar diversidades 'politicas, geográflcas, populacionais, econôinicas e cro- gem do tetna. Questionando as amarras esttuturais de paradigmas explicativos fixadog na
nológicas. Privilegiando o debate conceitual, muitos empreenderaméJjses nas qunis década de 1960, virios pesquisadomes enfatizaram a necessidade de procurar Qutras pets-
) exam referericiados lado a lado documentos dos sCculos XVII e XIX ou que diziam pectivas de ani1se. Ao criticar 0 enfoque estritatnente macroeconôm.ico e a ênfasc no
) respeito a Bahia, no Rio de Janeiro ou ao MaXanhO.' caráter violento e inexorável da escmavido, observaram que o resultado da maior parte
) Nasanálises histói-icas, predorninou a abordagern quase exclusivamente econômi- da pxoduco sobre o tema era uma história que, mesmo scm o desejat, apolava-se
ca, e a oposiço entre colônia e metrópole tornou-se urn elemento central, adquirindo xiurna óptica senhorial que era, inevitavelrnente, excludente. Recuperando movimentos
significados sistêniicos. Embora as perspectivas analIticas privilegiassem a escravidho e ambiguidades que antes poderiam parecer surpreendcntes, valorizararn a experiência
Para caracterizar a sociedade ou o modo de produço que haa se formado nas Amé- escrava, que passou a set analisada corn base em outros parmetros. Asaim, os valores
) e as açOes dos escravos foram incorporados comno eletnentos irnportantes Para a corn-
ricas, a dimensão "colonial" era necessarjamente Invocada Para deflnir o fib condutor
) e explicativo da histórja. Em xFiuitos trabalhos, a idéia de uma "unidade nacional" ainda preenso da própria escravido e de suas tmansformaçoes?
) continuou a set projetada Para a "colônia", construindose uma história que era do Muitos estudos voltatam-se ento para a anilise das pradcai coddianas, costumes,
"Brash" colonial, no dos domfnios portugueses na America; que era da Nacao, no de enfreritamentos, resistências, acómodaçOes e solidariedades, modos de vet, viver,pensar
sujeitos históricos mi1tiplos, desiguais e diferentes. For 1830, e agir dos escravos. Procurando incorpomar as visOes escravas da escravido, as diversas
a oposição que separava
raclicaimente o arcajco-escrav1stacoJo do modernocapjajjstanacjon conitjnuou monograflas, teses e livros produzidos tins iMtimas décadas tm discutido os significados
) de certo modo a sex a base das reflexôes bistóricas das lutas escravas e das muitas esferas da vida dos cativos que florescerarn sob o dominio
sobre o perfodo colonial ate bern
) pouco tempo atrás. escravista. Além das relaçoes entre os senhores e seus escravos, erifocarn-se tambCm
) Nos ülthnos vinte anos, esse quadro se tmansforrnou de forma significariva, a partir aquelas que mantinharn corn seus cornpanheiros de cativeiro, corn outros serihores,
de alguns desdobramentos historiográficos asshnétridos, rican todos ligados cliretamente corn ex-escravos e pessoas livres pobres, invesigando laços familiares e de compadrio
aos estudos sobre o perlodo da dominaçao portuguesa na America. 0 objethro deste ou prificas econôrnicas que estiveram na base de muitas estratégias de so-brevivência
e de projetos de liberdade durarite a escravidão e depois dela.
)
Taiscatactedsca5 so marcanes sobredo 005 ttos em qua preece a
sobre os modo5 thsxss3o 6dcu, como nos debates
de produçso no "&asil colonial". Para alguns exemptos, ver Tho A. Sandago. (Oeg) Para uma abordagem mais detaihadadesse terna, vet Silvia Huriold Lara. Escravido no Brash: balanço
c.iloniai En.raici. Rio de Janeiro: Pallas, 1975 J. R. do Amaral La A,dWca
) pa. (Otg) Modos derodtqaa e reahdade brasi/èira. h.istoriogtáfico. LPH, Roth/a do Madrid (Ouro Preto), v.3, ni, p.215-44, 1992, e Blowln' in the wind:
Petnipolis: Voazs, 1980; e Paulo Sérgic Pinheiro. (Org)
Terra, 1984. Trabatho osimv evnomia a sodsdada Rio de Janeiro: Paz e Thompson e a experléncla negra no Brazil Pre;vto HiM/p/a, v.12, p.43-6, out. 1995. Vet tanibém Stuart B.
Schwartz. A hisror1ogtafa recente da escravid5o beasilefra. In:_. Esrrauas, raui,w a robe/des. flacxru: Eduoc,
2001, p.21-82.
CONCCrANOO uus'roIuOGttAtb\S... 21
) 21 M000s Dc Goviuua

) presente tambémn em obras cliissicas da bistória africana,ci vern se desenvolvendO em


) Se nos anos 1960 as teses sobre a ariotnia social produzida pelo cativeiro impedi- varias direçöes, para abarcat outras relaçôes comercials e socials entre Brasil e Africa, que
am o aprofundamento dos estudos sobre a familia escrava, pot exemplo, hoje este é
apenas rnmcrginaimente vinham interessando aos pesquisadores.'5
urn campo que possui uma densa flteratura e vários estudos iniportantes, apoiados em
Notavel, na znesma direço, tern sido a retomada do interesse pot questôes
extensa investigaco documentaL ° As roças e outras atividades econômicas inforrnais,
identitârias e étnicas, agora redirnensionadoPelo novo contexto historiografico sobre
) que sustentavarn urn certo grau de autoriotnia ou permitiam a acutnu1aç(o do pecilio,
a experiência dos cativos e afro-descentetites no Novo Miindo." Pan aI&n dos debates
) gonhararn importncia nas anJises que se desenvolveram paralelamente ou associadas
teóricos suscitados pelas zelacôes interdisciplinares corn a antropologia, As questôes
) aos estudos sobre diferentes dimensôes da experiência escrava. As lutas cotidianas
levantadas pot pesqaisas recentes sobre o papel desemperthado pelas procedências
sornaram-se aos estudos sobre os grandes quilornbos e insurreiçóes, redimensionando
africanas e pelas diferencas éttiicas no interior da cornunidade escrava tern propordo-
a cornpreensao das dimensôes da resistência escrava,'2 Longe dos estereótipos, os pes-
' nado utna abordagem mais complexa do tema, corn interrogacôes que escaparn ao
quisadores encontrararn rn6ltiplas formas de riegociaço e conflito que mediavam o
âmbito de urna bistória pensada a partir de urna ópdca exdusivatnente 05nacionalI.'4
) cativeiro e a conquista da liberdade, tanto pot meio de fugas e quiloinbos ou pela
Assirn, a famllia escrava, as fugas e revoltas, as irmandades, as relaçôes dos escra-
) instrurnentalizaçâo de canals institucionais, como os tribunals, quarito pot movimen-
vos corn as insdtuicôes senhoriais, e tantos outros aspectos passatam a set objeto de
) tos sociais mais arnplos, associados ou no a crescente politizacao abolicionista do vfrios estudos, corifigurando terrenos histotiograficos corn debates próprios. Ji tiao
final do século bastava "mostrar" que os escravos haviarn constituldo famfijas ou se rebelado an longo
Temas tradicionais nessa area de estudos, corno o do tráflco negreiro, obviamente de toda a vigCncia da escravidao, pot exemplo. Novas fontes e procedimentos atiallti-
conainuaram interessando aos pesquisadores. Mas cada vez mais eles foram se conectando
cos foram incorporados as possibilidades da pesquisa e tCmn fornecido meios para
a novas abordagens, cotno a que problematiza as relaçôes entre Africa e Brasil e enfatiza
descobrir variantes nas açôes de resistência ou espacoS de autpnomia para o
) o imbricarnento dos processos históricos nas duas margens do Atlâritico,'4 Tal visada,
florescimento da cultura escrava. Escapando das dicotomias simplificadoras e perse-
gui.ndo as estratégias de cativos e libertos ao longo do tempo, tern sido poss(vel corn-
IS
Como exemplo, basta menclonar aqui o recente debate entre Manolo Garcia Florecidno, José Roberto preender seus significados e perceber mudancas confortne os contextos detnográflcos,
Gdes. Apt dat senr<a/as. Families eicravas e trlfico adlntico. Rio do Janeiro, c.1790-c.1850. Rio do Janeiro:
I Civilizaçlo Btasllera, 1997; e Robert W. Slenes, Na senrala, amafler. Espetanças e eecordaçôes no formaco da econôtnicos, socials e ternporais diversos.
famflia escrava. Brash, sudeste, slculo XIX. Rio do Janeiro: Nova Fronteira, 1999.
11
Ver, entre outros, Maria Odila Loire do Silva Dies. 2ao/Id/ano epoder em SJo Pa#Io no i/rio/n XIX Sao Paulo:
Braslhiense, 1984; Leila Mezan Aigrand. Oft//or aasenI. Petrópolis: Vozes, 1988; Joao José Reis, Eduardo Silva,
)
Neodaçan e confi/to A tesisténcia negro no Brasil escravlstos. Sao Paulo: Companhia des Letras, 1989; Carlos
Euginlo Libenc Soares. Zaiign: n/mar do ma//as vocr. Rio do Janeiro: Arquiva Pciblico do Estado, 1998, 1400-1680. Cambridge:
)
2 "Como no caso deJohn Thornton. Afdca and Aft/cant in the nsakingof IheA//allhiCWO&,
Vet especialmerite Joao José Role. Robe/Mo escrava no Brat/I, Sbo Paulo: Brasiliense, 1983; Celia Maria
Cambridge University Press, 1992. Negro:, es/range/rot. Os escravos
) Marinho do Azevdo. One/a nefa, mode brnco. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987; Maria Helena Pereira 16 0 eatudo pioneiro, nessa dlreçbo, é o de Manuela Carneiro do Cunha.

Toledo Machado. Oplano e opdniro. Rio de Janeiro: UFRJ, Edusp, 1994; Flávio dos Santos Games. HWdn'as rica. Sao Paulo: Btasiliense, 1985.
-' libettos e susvolta kAf v.18, p6-29, jun.-ju1.agO. 1993; Maria Ines
do qsi/Iombelas. Rio de Janeiro: Arqulvo Naclonal, 1995; Joao José Reis, Fldvio dos Santos Gomes (Qrg.) ' VerJoboJosC,Reis. A grove negro do 1857 na Bahia. Rev/i/a fJSP,
Liberdeide per oem fin. Sbo Paulo: Companhia das Letras, 1996; e Marcus J. M. de Carvalho, Liberdadv. Re//na, Cones do Oilvelra. Viver e morrer no meio dos seus. NaçSes e cornunidades do africanos no sCculo MX,
) v.28, p.174-93, dcx. 1995 - fevj99C, e Quern cram os. "negros do GuinC"? A odgem dos
rlI,ptura.r do esrrauismo, Recife: Ed. Uhiversitlria da UFPE, 1998.
Rev/c/a de U$P, v.19-20, p.37-73, 1997; Matiza do Carvalho Sosres. Mine, Angola e GuleiCs:
° Cf. Silvia Hunold Lars, Camper da mi/el/ne/a. Rio de Janeiro: Paz e Tetra, 1988; Keila Grinberg. Liberota: a Id Bahia. Afro-Aria,
africanos no
do ambigflidada. Rio de Janeiro: Relunie-Dumarl, 1994; Joseli Maria Nunes Mendonça. En/re a man e no anile. A nomes d'Afdca no Rio de Janeiro setccendsta. Tempo, v.6, p.73-93, 1998.
.) lei dos sexagenlrios e os caminhos do abollcbo no Brash. Campinas: Editors do Unicamp, Cecult, 1999; to Exemplos signlficadvos de inovoccs interpretadvas a partir da incdrpotacho de ursia perspectiVa afdcana
Eduardo Spiller Pea, Ojogn do face. A astücia escrava (recite cos senhores e a lei no Curitiba provincial, no an/disc do experiência do cadvos e ex-escravos podem 5cr colhidos 0105 trabsihos do Sidney Chaihoub.
j Curitiba: Acs Quotro Veotas, 1999. Companhia dos Letras, 1998; Robert W Slenes. Na
14 C/dade Febri/. Core/core epidemim na cone imperial. Sic Paulo:
Vet, pot exemplo, Manolo Garcia Florentixio, Em cotta, negran usna histótia do trlfico ntléndco de escravos Reis negro! no Brasil escravisla. Hlstótia do fasts do coroacbo do eel
senala, unra fist...; e Marina do Mello e Souza. tambCm a segundo edlcbo revisada e anipliada do Joao
entre a Africa e o Rio de Janeiro, sCculos XVIII e XIX. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1995; eLuix Felipe Congo. Belo Horizonte: Editors UFMG, 2002. Vex
) do .Alencastro. 0 frata do: v/von/es. Formaçbo do Brash no Adbntico Sul, sCculos XVI e XVIL Sao Paulo: Sao Paulo: Companhia dos Letras, 2003.
José Reis. Robe/lie escrava no Bras/I.
Companhia das Letras, 2000,
) 30 MOODS on GOVEBNAR
CONISCTANOO HISTORIOGRAMAS. 31
) ---- - --- ---

) Ao mesmo tempo, impulsionados pot movi,mentos historiograflcos mais arnplos,


conio no caso dos estudos feministas ou daqueles sobre as cidades, ou derivados do alistas de destaque. Obras i.rnportantes sobre diversos aspectos da econornia e da soci-
edade na America portuguesa, algumas de sintese, outras de caráter monográfico, fo-
próprio questionamento do reducionisrno interpretadvo das esttuturas sociais do pen-
odo colonial, começaram a aparecer anlises que EocaEzavarn novos personagens e ram publicadas - muitas das quais foram logo tradualdas para o português. °
) Olhando o conjunto de toda essa produco, é possivel perceber que, erifatizando
expeniêxiciassociais diversificadas. mndios aldeados, administradores coloniais, hornens
) livres pobres, cornerciantes de pequenio e grosso trato, lavradores de cana e de alirnen- continuidades, muitos pesquisadores buscarain elementos cornuns capazes de catac-
tos foram sendo estudados no Norte, no Sul, nas minas, nas areas de lavoura e nos terizar praticas especificarnente colonials, enquanto outros procuravarn diferericiar
)
sertâes.V Ganhando perspectiva e incorporando novas fontes, as anáLises passaxam experiências sociais e culturais diersas no tempo e no espaço. Como kesultado desse
duplo .movimento, o i.miverso colonial Se tornou cada vez mais conhecido em suas
também a inquinir as pxojecães politicas presentes nas construçöes explicativas e a
propria liistoriografia começou a set posta em causa, 2' dimensôes polidcas, sociais e culturais, e ganhou densidade, variaçôes e nuanças. Pas-
) Esse crescirnento foi acompanhado palo fortalecimento dos estudos sobre o Brasil sou a set possivel tanto buscar permanências e similitudes quanto perceber diferenicas
no exterior. Exnbora fruto de outros desdobramentos, a partir de meados dos anos 1970, e mudancai entre conjutituras e nigiôes diversas. Os elos que levavam a conceber a
a pub1icaço de obras importarites na Franca e, sobretudo nos Estados Uthdos sobre o colônia como uma unidade temporal, espacial e social ou que identificavani a colôriia a
)
escravido foram rompidos, e a história começou a escapar do irnpCrio da naç.o.
perlodo colonial ajudou a consolidar uma produçao continuada sobre a história da Âme-
Assim, novas diniensôes da vida colonial foram exploradas a partir de documeri-
rica portuguesa.' Muitas vezes desenvolvida no interior de un-ia ref1eo sobre a America
Latina, aos poucos o corijunto foi delimitando urn campo de estudos corn areas e especi- tos cada yea mais diversificados, e o conhecimerxto das dina.micas sociais se tornou
) cada vez mais complexo. Mais recentemente, sob inspiraço da revitalizaço dos estu-
dos sobre a sociedade do Antigo Regime português, novas abordagens sobre as rela-
Dentre todos os campos, talvez o tools siguificativo seja aquele referente sos estudos sobre as relacôes de
çôes de poder no mundo colonial também se desenvolveram.
)
gnero e as experincias femininas. Vet, pot exemplo, Mary del Ptiore. Em Portugal, no inIcio dos anos 1980, a analise do Antigo Regime português
mcsiornidaa'es mental/dade: no Bradl:olönia. Aa sal do cwpo. Condiiüoftrnin/na,
) Rio dejanciro: Jos6 Olymplo, EdtJnb, 1993; Luciano Figueiredo. 0
ovesso do memd,ia. passou pot grandes transformacôes. A idéla da existência de urn poder "centralizrdo"
Cotidiano e trabatho da mulhet em Minas Gerais no século XVIIL Rio de Janeiro: José
Olyrnpio, EdUob, 1993; Lula Mott, Rosa egtidaca. Urns san/a aftand no Braid, e "absoluto" foi serido substituida pot uma abordagem que enfatizava as redes de
1993; Ldila Mezan Aigranti. Horn-ada: o devotav mu/here: da co//n/a. Rio Rio dejaneiro: Bertrand Brash,
27 de Janeiro: José Olympic, EdUnb, 1993, poder existerites na Monarquia portuguesa do Antigo Regime. V.rios estudos sobre as
Urn balanço dessa diversidade pods set traçado corn base nag dlssertaçoes dc tnestrado e teses de douto-
rado defendidas nos diversos programas de pás-graduaçOo do pals, nas iltimas décadas, e catalogadas em casas aristoctáticas, os funcionénios rCgios, as fortunas e os direitos que atravessavam a
/ Maria Helena Rolim Capelato. Produç90 his/chico MO Brasil,
1985-1994. São Paulo, 1995,.3v. Dentre os trabathog sociedade politica portuguesa nos sCculos XVII e XVII aprofundaram a perspectiva
) publicados deseaco, a titulo de exemplo, Laura de Mello e Souza. Deic/ss4ficados do oi,ro.
A pobreza mineira no
século XVflI. Rio dejanefro: Graal, 1982;Joio Fragoso.
Homes: dero:,raav,niiipm acumidacão e hietazquias na aberta inicialmente pot António Manual Hespanha,n abrindo riovos carnpos a investi-
) praca mercantil do Rio dejaneiro (1790-1830). Rio dcJaneiro:Arquivo Naclonsi, 1992;John Manuel Mont&o,
N4gros do terra.
lndios e bandeirantes nas otigens de São Paulo. São Paulo: Companhia das Leeras, 1994; Jtinia
gacâo.22 Investigando as grades junidicas e institucionais das hierarquias sociais, vários
) Ferteira Furtado, Horns,: do uoSddo.
A interiotizaçOo da metrdpole e do cométcio nas Min&a setecentistas. São
Paulo: Hucirec, 1999; Vera Ferllni. Tm-re, o'raba//jo o,podcr o
-' Edusc, 2003. mundo dos engenhos no Nozdeste colonial. Bauru:
° Vex, por exemplo, Rogério Forastieri da Silva. Ce//n/a e nat/slime: 30
Urn panorama dos principals autores e dos resuhados da peoducão histothogidfica francesa a norte-americana
' a hlstdda corno "biografia da naçOo". São
Paulo: Hucitec, 1997; e Joao Pinto Furtado, 0 memo do Pm//spa. sobre o pedodo colonial, bern como de sua integracSo corn os trabaihos produzidos no Brasil, pods ser obtido rio..
Histótia, niito e rnethódn da Inconfidéncia
) taineira de 1788-1789. Sao Paulo: Companhia das Letras, 2002. 0 tema torna-se mais candcntc nos estudos icitura dos capituloa rcferentcs an Brash e respectivos ensalos bibliogriflcos escritos pot John Hemming, H. B.
voltados Para o pet/odo da Independéncia. Urn panorama dos desdobramentos dsa perspectjva pode 5cr Johnson, Frédéric Mauro, Andréc Mansuy-Diniz Silva, Stuart B. Schwartz, A.J.R. Russell-Woods Dauxil Alden em
)
encontrado nos artigos da coletOnea organizada por Istvin Jancso. (Org.) L Bethel (Org). Am/rica La//na colonial. Zed. São Paulo: Edup, Fuisdo.ção Alexandre tie Gusrnão, 1998. 2v.
Sic Paulo: Hucitec, Inujzij, Fapeep, 2003. Brat/li formaçao do es/ado # da na,cio. it
J Antonio Manuel 1-Icapanha. As idsperas do Leo/a/i. lnsdtuicoes c poder politico. Portugal, século XVII.
Para urn balanço da producão forte-americana sobre o Brasil colonial, vet A, J. B. Russell-Wood, United Coimbra: Alrncdina, 1994.
States scholarly contributions to the historiography of colonial Brazil, 32
HiqpanicAmerican Historical Ratios;, v.65, Pars urn panorama dos temas tratados nesre c nos prdxirnos partigrafos, vet os diversos artigos do volume
-' ci.4, p.683-723,1985.
IV — 0 Antigo Regime (1620-1807), coordenado pot Antonio Manuel Hespnha em José Mattoso (Dir.)
) His//i/a de Portugal. Lisboa: Estampa, 1991.
)
32 M000s os GoyaAa 00NOcvANDO NISTOiUOGRAI'XAS... 33

autores mostraram a existência de poderes concorrentes entre si, que lutavarn pela cia entre os diversos poderes na rnetrópole e nas Leas colonials, tenias clássicos como
) obtenço de terms, tftulos, offcios e privilégios cornerciais. 0 estudo do rnodo comb Sc a adrninlstraçao colonial, que antes apareciam secundariamnente em obras de caráter
) enlacavarn Os interesses piiblicos e particulates, poderes locals e centrals, economia e geral, ganharam historicidade e passaram a set- examninados em comijunturas especfficas
polidca, hierarquizacao social e acumulaço de riquezas transformou a viso ate ento e na relacao corn as dinamicas itnperiais.3' Do mestno tnodo, as telacôes entre a econo-
vigente sobre os modos de governar o reino - também o Ixnpério pox mia e a politica começaram a set analisadas de modo a integrar o papel das redes de
Tais concepcöes também se desenvolveramn na historiografla brasileira, sobretudo parentesco e de dlientelagern no controle dos mercados e na acumulaço de niquezas.38
) a pardr dos anos 1990, e a história poiftica, que ate ento ha'via passado pradcamente Tais caracteristicas deixaram de set encaradas como "anornaijas" e pass.ram a set dis-
) incólume pot aquele movimeneo de transformaçoes, começou a mover-se corn veloci- cutidas como modos importanres do ordenamento econôrn.ico e da concentraçao de
) dade. Novas abordagens sobre as relaçôes de poder no !nundo colonial começaram a riquezas nas areas colonials e mnetropolitanas.
sutgir. As pesquisas sobre as formas de governar e sobre o funcionatnento das diver- Em segundo lugar, mas simultarieamente, a dualidade Brash-Portugal, que havia
sas insdtuiçôes que agregavarn e davam consistência as redes hierárquicas que ligavam presidido boa parte de nossa producâo bistoriográfica, pôde ganhar outras dimensôes
horizontal e verticairnente a sociedade colonial foram se desenyolvendo em conexo e conectar-se a outras regiôes do ImnpCrio. As Izocas at1nticas passaram a set compre-
) corn estudos realizados para outras Leas do Impexio portuguCs.' Aos poucos, os ne- endidas também a partir de suas conexes corn os mercados asiaticos, e os snecanis-
) xos imperiais das politicas metropolitanas e das dinmicas colonials foram se irnpondo nios do poder podiamn set agora estudados na sua dirnenso imperial. Em vários send-
) nas anJises, fazendo que eventos "brasilefros" pudessern set analisados em conexo dos, näo se trata mais de pressupor uma separaco irredutivel entre Portugal e o Brash,
corn outros ocorridos na Africa ou na lnc]ia.' nern de considerar uma "realidade" colonial que, desde o inIcio, como uma semerite a•
Essa atnpliaco na perspectiva das análises históricas é bastante importante em germinar, se contrapunha ao domfrilo rnetropolitano. Ganhando tivanças temnporais e
tetmos historiograflcos. Elas significani, em primeiro lugar, que a aniuise das relaçôes perspectivas mais amnplas, a história do perlodo colonial deixou de set concebida como
)
de poder no universo colonial ultrapassou a visão liberal que impunha uma avaliaçâo a prirneira etapa da formacao da naço e desvinculou-se do paxadigrna que havia se
) depreciativa do que ento era notneado como "ineficiência", "desgoverno" e "caos cristallzado nos anos 1960-1970.
administrativo", Na temitativa de compreender a lógica da distribuiço e da concorr6n-

Partindo de posiçôes tedricas divetsas e corn objetivos difetentes, no entarito,


" Verjoio Fragoso, Maria de Fatima Silva Gouvea, Maria Fernanda Baptists Bcalho. Urns leituta do Brasil esses dois tnovimentos historiográficos tern permanecido restritos aos seus eixos
colonial. Bases da materialidade e da governabilidade no Impétlo. Penelope, v.23, p67-88, 2000.
Para urn balariço dessa bibliografla, vet Antonio Manuel Hespanba. A consdtuiço do império portuguCs.
temádcos mais especIficos. A quebra do nexo que opunha o arcaico-escravista-colo-
Revisbo de alguns enviesamentos correntcs. Li:Jobo Fragoso, Maria Fernanda Bicalho e Maria deFátims GouvCa. nial ao moderno-capitaiista-nacional decorreu e, ao mesmo tempo, fez riascer dois
(Org.) 0 Aa490 Ro,gimo no: fr4pico:: a dindniica inperia/porIugtie:a
(sCculos XVI-XVIII). Rio de Janeiro: Civilizaçbo conjuntos historiográficos que tern se desenvolvido urn tanto separadamente: de urn
) Brasileira, 2001. p.163-88.
Urn panorama dos trabaihos realizados nessa direçbo pode str encontrado em duas coleteneas receares:
) Joao Fragoso, Maria Fernanda Bicalho, Maria de Fádm& GouvCa (Ot&) 0 Aniigo Re,gime no: Irdj,ico:..;
Fetreira Furtado (Org.) Dia?ogos ocadnico:. c JOnia
Minas Gerais a as novas abordagens pare urna histOxia do ImpCtio
ukramathio português. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2001. 0 conjunto dos trabsihos apresentados no
) SixnpOsio TemnCtico "Modos 37
Vet, pot exemplo, Maria Fernanda B. Bicaiho. A ddade e o iab6,io. 0 Rio de Janeiro no sCculo XVIII. Rio
de Govcmnar: Politica, NegOcios e Representaçoes no ImpCrlo Luso-Brasileiro",
durante a XXII SirnpOsio Nacional de His mOna (ANPUN) realizado emjobo Pessoa, em juiho de 2003, é urn de Janeiro: Civilizacbo Brasilcira, 2003.
born indicadvo da vitalidade dasa area rim estudos floe tiltirnos anos, " E o caso, pox eicemplo, de Jobo Fragoso. Mercados a negodantcs Imperials: urn ensaio sabre a econornia do
Eocaso, pot exemplo, de Luciano Raposo de Alrndda Figusiredo. 0 i41,io em ajrnrc.i. impédopormuguês (sCrubs XVII eXVIII). Histdria: quesm6es e debates, v.36, p.99-127,2002; a Antonio CerboeJuclde
alcersçOes ultramarinas a des Notas para o estudo das
prémicas politicas no irnpétho colonial pontuguês, sCculos XVII e XVIII. In: JOnia Sarnpaio. Na enrrurf/bada do ,Jda Hieranqulas socials e conjunturaa econOmnicas no Rio de Janeiro (c. 1650-c.175.
Ferreina Furtado (Org) DidIa,go: orednims.., p.197-254.
Rio de Janeiro: Arquivo Nadonal, 2003.
r' ir
) GOVJRNAP. CorrcrANDo r-usTOluooa,\L't,\s,.. 35

lado, os estudos sobre a escravido, centrados, sobretudo, no século XIX, e, de Isso significa dizer basicamente que, de urn lado, nao se pode deixar de olhar
)
tro, aqueles sobre o perfodo colonial, que Se ampliararn para abarcar urna mithtde de para os governados; de outro, é necessário considerar que as relaçöes de poder sao,
temas, mas cujo interesse pela escravidâo tern permanecido relativatnente restrito, tarnbém e necessariamente, relaçôes de dominacao. Assim, poderernos, pot exem-
Creio não set exagerado dlizer que, de certo modo, a his toriografia brasileira plo, verificar como aqueles que "nao tinharn poder" (do ponto de vista das represen-
) mais recente sobre o perlodo colonial tern se voltado para o estudo das camadas taçôes do Antigo Regime) se apropriavam de instituiçes e rnecanisrnos da politica e
) dorninantes. Cada vez mais conhecernos os modos de governar; os homens bons, do governo, pata faze-los funcionar de algurn modo na direçao de seus objetivos e
murido dos letrados e as formas de icr e sentir, os poderes locals, a nobreza e as elites interesses. Em vez de simplesmerite ficarmos presos a certas oposicaes, procurando
)
coloniais, mas continuamos a saber pouco sobre a história social dos séculos XVII e decidir se as irmandades OU os terços negros e pardos cram mecanismos de acomo-
XVIII. Scm düvida aigurna, ha estudos sobre revoltas populates, sobre quilombos e daçao ou resistência, pot exemplo, poderernos investigar como tais insdtuices
movirnentos indIgerias, mas sâo trabaihos esparsos, que ainda no chegam a consti- rnesmo servindo a interesses senhoriais e xnetropolitanos - funcionavam como irn-
) tuir urn campo de investigaco." portantes canals de preservacão c expressäo de valores e anseios dos africanos e de
) Na malor parte das vezes, esses traballios tern dado continuidade a questôes seus descendentes, livres ou escravos." Poderernos tambérn nos perguntar como e
postas pot tradiçôes historiográficas dliferentes. 0 estudo das revoltas colonials, pot de que modo a ação dos governados impôs limites e levou os governantes a transfor-
)
exemplo, lida mais corn questoes advindas das leituras nadvistas ou da história das mar seus modos de governar... As frigas e os quilombos, pot exemplo, fizeram que
idéias e dos cori-iportamentos das elites, do que estabelece relnçôes corn a movimen- senhores e autoridades colonials aprimorassem os tnecanismos de controle sobre a
tação das carnadas populates e, sobretudo, corn as reivindicaçôes dos negros e mula- escravaria, criassem riovos cargos e oflcios no n(vei local (como no caso dos capi-
) tos livres e libertos. Enquanto ISSO, os estudos sobre alforria e quilombos estào atre- taes-do-mato) e alterassern o sistema de colaboracão entre as forças militates priva-
) lados a questoes mais gerais dos estudos sobre aescravidão, como a reiaco entre os das e pblicas.
) projetos de liberdade dos escravos ou a influência das divisôes étnicas no interior Ao inesmo tempo, é preciso lembrar que o "governo" tatnbém foi pensado
das comunidades escravas, deixando muitas vezes de lado a possibilidade de perisar como dominacao no perlodo colonial. A questao não era exterior ao mundo metro-
os significados da experiência desses homens e muiheres que conseguiram obter a politano ou colonial - ao contrário: basta-nos lembrarmos dos vários textos que
) discutiam o governo do senhor sobre seus escravos. Letrados e autoridades da admi-
liberdade na sociedade colonial - tao diversa em relaçao as dinmicas oitocentistas.
) Ficarnos, rnuitas vezes, presos a auto-representacao da sociedade do Antigo Re- t,istraçao imperial refletiarn tanto sobre o meihor modo de continuar a manter seu
gime, que considerava o "povo" como algo genético, equivalente a todos aqueles domlnio sobre genres e regiôes tao diversas quanto sobre a necessidade de reformas
) que nao tinham cabedais nern nobrea ou se rebelavam contra os poderes institul- e equilIbrios necessários para a continuidade do domInio senhorial. Nesse sentido,
dos. Ora, muitos estudos tern mostrado que os motins "populates" no Antigo Regi-
me nern sernpre eram efetivamente "populates" - no sentido que damos a essa pala-
vra hoje em dia,.. Pot isso, precisarnos it além das relaçôes entre a nobreza e o rei,
entre a cabeça e os mernbros do corpo polItico, para lidar também corn aqueles que ° Desde os estudos clássicos dejulita Scrano e Cola BoscH, a bibliografia tern discutido or as irmandades
constitufam instruxnentos do dominlo colonial ou espacos de tesisténcia das comunidades negras no Novo
) cram considerados exciuldos da po]Itica. Mundo, Certarnente cram as doss coisas ao mesmo tempo, arnorrecendo tensôes mas também servindo
como canal de Identidades e solidariedades carte homens e mulheres africanos e afro-descendentes. Cf. Julita
Scarano. Davaç3o ea:araeidña. Sao Paula: Ed. Nacionsl, 1976. p.79-95; e Caio Botchi. 0: /ego: a apodar. Irmanda-
des leigas e polldca colonlzadora em Mines Gerais. Sio Paulo: Adcs, 1986. p.168-76. Russell-Wood considers
que as Irniandades, iinlcas advidades comuniti,rias permitidas aos hornens de cot na America portuguesa,
39
Vet, pot exernplo, Roneldo Vainfas. A baretia dos India:. Catolicismo e tcbeldia no Brasil colonial. So Paulo: rornararn-se ountamente corn as tercos de pardos e negros) urn porta-vos dos aspiracôes a demandas dos
) Companhia das Letras, 1995; e Carla Maria J. Anastasia. I/aim/c: a-abe/des. Violência coletiva nas Minas na negros e mulatos livres (A. J. R. Russell-Wood. The BIaait Man in S/avarj andfreedom. New York: St. Martin's
primeira meesde do sécula XV1II. Bela Horizonte: Editora C/Atte, 1998. Press, 1982. p.93).
)
36 Moms Di! GovstAa CoNJzcralloo IJsroluooa,W1As... 37
)

no deixa de set interessarite observar como os temas da legitimidade da escravido o poder se distribula em várias direçôes? Como relacioriar as disputas entre as elites
indLgena ou africana tern sido abordados a parth de uma pérspectiva que busca locals, colonials e metropolitanas corn relaçao ao controle dos escravos? Quais os
mais exaniinar o encatninhamento do pensamento aritiescravista do que estabelecer significados da escravizaç.o dos africanos num mundo errs que a escravidão dos
) a re1aco entre esses debates e os tnodos como a legitimidade do próprio poder era mndios era questionada pela legislacao rnas praticada em muitas regiôes? Como cram
) concebida naquele perlodo. Inversamerite, a suiálise sobre as idéias polldcas do Anti- apreendidos os significados da presenca dos negros, das culturas africanas nurn mundo
go Regime portuguCs deixa de lado freqüentemente o tema da escravidão, como se em que o racisrno airida no havia deitado rafzcs? -
sua existência no reino e nas conquistas nâo fosse fundamental para a dinmica das Certamente ha estudos que vm se desenvolvendo nessas direçaes e que procu-
relaçôes sociais no Império portuguès. -Ngo seria o caso de tentar aproximar essas ram responder a muitas das questoes em aberto. Aos poucos vern se consolidarido
5.)
duas perspectivas de análise? urn grupo de pesquisadores voltados para a história da escravidao africatia nos sécu-
) Scm diivida algurria, o txáfico atlântico de escravos tornou-se urn negócio cen- los XVII e XVIII, corn destaque para aqueles voltados para o estudo das irmaridades
tral na economia imperial portuguesa nos séculos XVII e XVIII. Airida que houves- nëgras, das condiç6es de alforria em diferentes conjunturas e das diferenças étnicas
) se urn nümero significativo de escravos e libertos de origem africana cm Portugal, na escravaria. Esse rnovimetito tern sido refoxçado pot pesquisas sobre temas
capaz de surpreender muitos viajantes europeus que estiveram em Lisboa, pot exern- correlatos, como no caso dos estudos sobre o cativeiro indigena,42 fazendo que uma
plo, o impacto da escravido no reino foi bern diferente nas conquistas - e sobretu- perspectiva arialldca centrada nos sujeitos e preocupada corn as relacöes entre cuitu-
do na America portuguesa, onde a maior parte da populaco era constitulda pot ras diversas Se consolide cada vez mais." Assirn, creio que o quadro composto pebos
africanos e seus descendentes (escravos, forros ou livres). Assim, mesmo que a natu- dois conjuntos historiográficos aqul descdtos vern se abteratido.
reza das relaçôes sociais e das instituiçôes de governo nas col6nias pudesse seguir a Mas é preciso mais. A aproximacao entre os estudiosos da escra-vidâo e do perIo-
mesma sintaxe da metrópole, no podemos ignorar as diferenças entre elas: a pre- do colonial não é apenas uma questao de passar a estudar o terna numa outra crono-
sença maciça de escravos e de libettos nas conquistas possula uma forca disruptiva bogia ou de incluir mais urn item na pauta de quest6es acercada. 'v-ida nas Conquistas.
que precisa set levada em conta e set mais bern investigada. Como espero ter apontado, ha elementos interpretativos e teóricos importantes que
Tais questôes, no entarito, não tern sido colocadas pela bibliografia dedicada a podem beneficiar os dois lados se a aproximacäo se fizer pot meio dos problernas
escravidão. Majoritariamente conduzidas no universo das fontes oitocentistas,4' as históricos que ordenam as pesquisa. Se os estudos sobre os inodos de governar so
pesquisas sobre o tema acabaram criando generaliracoes que parecem se esquecer tern a ganhar se passarern a incorporar em suas reflexOes as açôes e Os valores da-
) das alteraçöes ctuciais que separam a Monarquia brasileira do XIX do mundo colo- queles que aparentetnente cram exciuldos das redes do poder, tatnbém as pesquisas
nial do Antigo Regime. Quais seriam as especiflcidades das telaçôes entre senhores e sobre a escravidao seräo beneficiadas se vobtarem a olhar mais cuidadosamente para
escravos nurna sociedade em que as hierarcjuias sociais erani tao marcadas e em que

42 . . - -
4 Além da obra dejohn Montalto, Negro: da terra, vet tanibem Nadia Fatage. As mu,ralha,r dos seutoes. Os povos
A presenca tnaciça de estudos voltados para a o perfodo oirocendsta pode set fadilmente verificada em indigenas no Rio Branco a a co1onizaco. Rio de Janeiro: Paz e Terra, Anpocs, 1991; Angela Domingues.
) arrolamentos bibliogrficos sobre o tema, como cm Lula Claudia Barcelos. at al. (Org.) Eseraviddo # re/apies ,Qsuanda as bid/os cram vassalos. CalonlzaçSo e eelsçaes de poder no forte do Brasil na segunda metade do século
eizdth #o Brasil, Cadastto da produc5o intelectual (1970-1990). Rio deJaneito Centro de Estudos Afro-Asia-
XVIII. Iisboa CNCDP, 2000; a Maria Regina Celestino Alineida. Metamoafoses ind(gena:. Identidade a cultura
ticos, 1991, Urn panorama dos rrabalhos recerites sobre a escravidSo no perlodo colonial pode see e7contra- ass aldelas colonials do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Amquivo Nacional, 2003
-)
5
do na coletlnea organizada pot Maria Beattiz Nizza da Silva (Org.) Bras/I. Coloaka,ao escravidio Rio de 43
As dlferencas étnicas a cultumais entre os africanos teazidos coma escravos a entre des e os aqui oascidbs
Janeiro: Nova Fronteira, 2000. Dentre as obras recenternente publicadas, ver, pot exemplo, Mariza de Carva- rem sido cada vet mais exploradas pela bibilografla sabre a escravidgo no Brasil, no sfculo XIX. Para urn
) tho Soares. Dove/os da ar. Identidade étnica, reigiosidade e escrcwid5o no Rio de Janeiro, século XVIII Rio de
panorama das questoes abertas Poe essa perspectiva para o peelodo colonial, vet A. J. R. Russell-Wood.
Janeiro: ClviliraçSo Brasileita, 2000; Eduardo Franca Paiva. Escravidijo em/verso cultural aa coli#ia Minas Ge-
Array/s do cia prisma aflicano: uma nova abordagein so estudo da diaspora afeicana no Brasil colonial. Tempo,
mis, 1716-1789. Bela Horizonte: Editora UFMG, 2001.
v.12,p.11-50,2001.
38 Moaas na Govrnp.

O comportamento dos senhores e das autoridades coloniais. Certarnente, a leitura


das fontes tradicionalrnerjte utilizadas pelas duas areas Se tornath mais sofisticada,
assim coma os resukados instigantes que cada urn desses corijuntos h.istoriográficos
vein obtendo ilurninarao novas cjuestoes que 56 poderào set respondidas pela asso-
ciação entre as duas perspectivas analIticas.
Mais que sirnplesmente juntar as metades de urna laranja, trata-se de estabelecer
Governo, elites e cornpetência social:
conexôes que permitam pensar relaç5es bistóricas cada vez mais cornplexas. Certa- sugestöes para urn entendimento
mente, a prcsenca maciça da escravido diferenciava a experiència colonial da metro- renovado da b.istória das elites
politana, redimensionando e dando novo significado as práticas hierárquicas que
Antonio Manuel HesJanba
ordenavam as sociedades no Antigo Regime. Conhecer o modo como isso se deu e
quals as dinârnicas desse processo ao longo do tempo, no entanto, é urn caminho
que so pode set trilhado conectando historiografias, indagando sobre o modo como
a escravidão e o Antigo Regime estFcreram intrinsecamente ligados e conviveram na
America portuguesa. o tema das elites foi, a certa altura, a forma de urn duplo dlistanciamento, no
mnio da história do poder.
o prinieixo distariciarnento ocorreu em re1aço aos tradicionais dtulares da his-
do poder, que, durante geracöes, tinha pertencido aos historiadores do direito.
Ora, tanto uns como as outros - mais os primeiros do que as segundos - ti-
z urna idela muito restritiva do que fosse o poder. Para eles, o poder eta algo
fuzido pelo direito, nos Iugares designados pelo direito, coin os agentes nomea-
pelo direito e sob as formas prescritas pelo direito. Este encerramento juridico
oder ateriuou-se urn tanto cam o advento da histOria das instituiçôes que, pelo
ins, distingulu mais claratnerite o direito dos livros (law in the books) do direito tel
io ele era vivido no quotidiano (law in action).
Como coisa formal, este poder lido sob a óptica do direito no tinha rostos, Ocu-
i.-se apenas de lugares institucionais, transitoriamente ocupados pot pessoas, rnas
pessoas cujas idiossincrasias cram irrelevantes.
Ora, a nova história social tinha descoberto que, na história, Os "rostos" contavarn
[escricao do que era o poder. Einbora, para eta, "rosto" fosse qualquer coisa de to
co (internamente) pessoal e idiossincrático como a class; o grupo social, a profis-
a parentela, a rede.
A história das elites, ocupando-se de pessoas, dava - fosse dc qual fosse - urn
o a história politica. E, coin isto, quebrava a sua moriotonia formalista, localiza-
em tempos e em espacos, fazia-a perceber diferenças de contexto, aproximava-
cjuoticliano dos mecanismos do poder vivido.

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