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CRÍTICA

marxista

ARTIGOS
Criptomoedas: do
fetichismo do ouro
ao hayekgold
PAULO NAKATANI * E GUSTAVO MOURA DE CAVALCANTI MELLO **

Ouro! Ouro vermelho, fulgurante, precioso!


Uma porção dele faz do preto, branco; do feio, bonito;
Do ruim, bom, do velho, jovem, do covarde, valente,
do vilão, nobre.
... Ó deuses! Por que isso? Por que isso deuses;
Ah, isso vos afasta o sacerdote e do altar;
E arranca o travesseiro do que nele repousa;
Sim, esse escravo vermelho ata e desata;
Vínculos sagrados; abençoa o amaldiçoado;
Faz a lepra adorável; honra o ladrão,
Dá-lhe títulos, genuflexões e influência,
No conselho dos senadores;
Traz à viúva carregada de anos pretendentes;
... Metal maldito,
És da humanidade a comum prostituta.
(Shakespeare, Timão de Atenas, apud Marx, 1985, p.252)

* Professor titular do Departamento de Economia da Ufes e do Programa de Pós-Graduação em


Política Social da Ufes.
** Professor adjunto do Departamento de Economia da Ufes e do Programa de Pós-Graduação em
Política Social da Ufes.

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O ouro é coisa maravilhosa! Quem o possui é
senhor de tudo o que deseja. Com o ouro pode-se até
fazer entrar almas no paraíso.
(Colombo, em carta da Jamaica, 1503, apud Marx, 1985, p.112)

1. Introdução
No primeiro livro de O capital, Marx ilustra claramente o fetichismo do dinhei-
ro ao tratar do entesouramento como uma das consequências do desenvolvimento
do mundo das mercadorias. Demonstra ele aí que “a circulação se torna a grande
retorta social, na qual lança-se tudo, para que volte como cristal monetário. E não
escapam dessa alquimia nem mesmo os ossos dos santos nem a res sacrosanctae,
extra commercium hominum”1 (Marx, 1985, p.112).
O dinheiro se torna cada vez mais fetichizado a partir do desenvolvimento do
modo de produção capitalista e, sob o domínio do capital, vira a principal forma
de expressão da riqueza como um fetiche, inclusive disfarçando o capital. Em
suas diversas modalidades de existência,2 e desde os seus primórdios, a riqueza
autonomizada como dinheiro assumiu as mais variadas formas de moedas e mer-
cadorias cuja materialização máxima ocorreu sob a forma de moedas de ouro,
desde a Antiguidade.
Entretanto, a diversidade de moedas e de padrões monetários, assim como
a contradição fundamental entre o seu conteúdo nominal (seu nome) e o seu
conteúdo real (a quantidade de ouro), abriu caminho para a sua substituição por
representantes, signos de valor. A história das moedas é extremamente rica na
descrição dessas contradições e nos problemas criados por elas. A desvalorização
decorrente do desgaste natural das moedas e de falsificações no processo de sua
cunhagem foi discutida e criticada desde Nicole Oresme (2004), em 1355, até os
dias atuais, junto com os problemas de controles e determinações sobre o “valor
das moedas” nacionais. Em 1526, Nicolau Copérnico (2004) escrevia “Sobre a
moeda”, um pequeno texto que trata de uma proposta de “reforma monetária”,
em que destaca a variedade de nomes e padrões monetários, cujos problemas
derivavam não só da desvalorização e das falsificações, como também da enorme
confusão que se originava dessa coexistência.
De modo a se reduzirem os custos de circulação e com vistas ao incremento
da segurança, com a intensificação das transações mercantis foram desenvolvidos

1 “Coisas sacrossantas excluídas do comércio humano.”


2 Consideramos, segundo Marx, o dinheiro como uma categoria abstrata e as moedas como formas
de existência do dinheiro que surgem historicamente em diferentes reinos e territórios e são pos-
teriormente centralizados pelos reinos, governantes e Estados nacionais. “Da função do dinheiro
como meio circulante surge sua figura de moeda. [...] Assim como a fixação do padrão dos preços,
a cunhagem é uma incumbência do Estado. Nos diversos uniformes nacionais vestidos pelo ouro
e pela prata enquanto moedas e dos quais são desvestidos no mercado mundial...” (Marx, 1985,
p.107).

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locais para a guarda do ouro. Contra esses depósitos, os ourives, e posteriormente
os comerciantes de dinheiro e os bancos, passaram a emitir certificados,3 um dos
precursores do papel-moeda conversível e, a seguir, do papel-moeda de curso
forçado. Mas, desde o princípio, a possibilidade de emitir mais certificados do
que a quantidade de ouro guardada foi sendo exercida pelos guardiões dos metais
preciosos, constituindo-se assim um capital usurário que multiplicava escritu-
ralmente a quantidade de ouro em depósito. Esses certificados adicionais eram
emprestados com a cobrança de juros.4
A história dos bancos também é rica em descrições das crises monetárias que
se manifestavam nas corridas bancárias, na medida em que passaram a emitir ou
criar papel-moeda ou notas de banco além de suas possibilidades, com ou sem
reservas metálicas. Ou seja, as crises bancárias evidenciavam a contradição entre
a quantidade de ouro em depósito e a quantidade de certificados ou de notas de
banco emitidas.
Essa enorme confusão criada pelos diferentes sistemas, com crises recorren-
tes, colapsos e bancarrotas bancárias, fez com que alguns bancos, em função de
seu poder econômico e político em seus respectivos países, passassem a exercer
funções que atualmente são dos Bancos Centrais.5 Essas funções eram atribuídas
pelos diferentes governos aos bancos privados que foram sendo sucessivamente
estatizados ao longo da história, a maioria entre o final do século XIX e início do
XX. Uma das exceções até os dias de hoje é o Federal Reserve System (FED),
que permanece privado.
Por conseguinte, a história das moedas é longa, heterogênea e extremamente
atribulada. Sua natureza é privada, ao contrário do que se imagina ou se defende
correntemente, pois é fruto da expressão do valor das mercadorias em uma mer-
cadoria especial (Marx, 1985, p.212). As contradições próprias a essa mercadoria
a levaram a ser substituída por signos fictícios (Marx, 1985, p.249), sem relação
com reservas metálicas, além daquela parte que aparece como papel impresso,
mais aquela parte que, mais recentemente, aparece como sinais magnéticos nas

3 Esses certificados eram títulos de dívida que passaram a funcionar como meio de circulação e meio
de pagamento, como se fossem dinheiro. Sempre que os certificados eram resgatados pelo ouro
em depósito, inicialmente com ourives e/ou comerciantes de dinheiro, eles eram cancelados.
4 Aqui está também a origem do que Marx chamou de capital bancário fictício. Atualmente, pode-se
fazer uma analogia entre os depósitos de ouro e os depósitos à vista nos bancos. “Na medida em
que o banco emite notas, que não são cobertas pela reserva metálica guardada em seus cofres, ele
cria signos de valor que constituem para ele não apenas meios de circulação, mas também capital
adicional, ainda que fictício, no valor nominal dessas notas sem cobertura. E esse capital adicional
proporciona-lhe lucro adicional” (Marx, 1986, p.69, grifos nossos).
5 O Riksbank, da Suécia, fundado em 1668, e o Banco de Londres, fundado em 1694, são considerados
os primeiros Bancos Centrais. Este último, cuja origem é privada, passou a exercer gradativamente,
a partir de leis reguladoras, as funções de financiador do governo, de emissor monetário e guardião
das reservas, e posteriormente de redesconto e de emprestador de última instância. Foi estatizado
em 1946. A maior parte dos países capitalistas criaram seus Bancos Centrais na primeira metade
do século XX (Freitas, 2000).

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contabilidades das empresas ou dos bancos. Além disso, de uma propriedade pes-
soal e privada, elas foram sendo todas substituídas por títulos de dívida especiais,
que não rendem juros nem têm data de vencimento, o papel-moeda estatal (um
desdobramento da forma dinheiro de crédito) (Marx, 1986, p.69). Esses títulos
receberam os nomes das respectivas moedas nacionais e são criados por meio de
créditos pelo sistema bancário comercial privado ou público. Trata-se de dinheiro
fictício,6 que se generaliza com o fim da conversibilidade (de fato e de direito) do
dólar em ouro, em meio ao colapso do sistema de Bretton Woods.
Mais precisamente, a forte onda de internacionalização produtiva, sob bases
“fordistas”, e financeira, com destaque para a emergência dos euromercados, deu
azo a uma sobreacumulação de capital que se manifestou na forma de “crises de
estagflação”, e que acirrou o ímpeto de autonomização do capital, cuja reprodução
passa a depender cada vez mais de promessas de futura valorização do valor, na
forma de capital portador de juros e de capital fictício. Com isso, reforçou-se o
caráter desmedido do capital, que se exprime no pulular de crises econômicas que
caracteriza o capitalismo contemporâneo.
2. As criptomoedas
Por conseguinte, é nesse contexto, em que as crises do capital explicitaram as
contradições próprias às moedas, que surgem as criptomoedas, ou moedas virtuais,
que também deveríamos chamar de dinheiro fictício, caracterizadas por extrema
instabilidade e volatilidade das taxas de câmbio que aguçaram enormemente os
riscos cambiais.
A primeira delas, chamada de bitcoin, foi criada e lançada em 2009 por um
indivíduo fictício, chamado Satoshi Nakamoto, cuja identidade – ou identidades,
pois pode ser um grupo – permanece desconhecida até o momento, segundo se
divulga nas redes de informação. Uma das expectativas é que o bitcoin se torne
uma moeda mundial à medida que aumenta de forma acelerada o número de
pessoas e empresas que o aceitam como moeda. Mas, para tanto, deveria cumprir
as condições para funcionar como medida do valor, padrão de preços, meio de
circulação, meio de pagamento e de capital-dinheiro, submetida às determinações
fundamentais de produção, circulação, realização do capital e apropriação da
mais-valia produzida.
Após o exitoso lançamento do bitcoin, saíram outras centenas de moedas
virtuais em uma rede descentralizada criada a partir de uma tecnologia chamada
de blockchain. Em 17 de dezembro de 2017, encontramos uma lista de mais de

6 Trata-se, segundo Prado (2013, p.139), de “uma forma de valor que ‘não’ possui valor, pois ape-
nas o representa”; ao apresentar tal categoria, o autor estabelece uma analogia com o conceito
de capital fictício, “uma representação nominal de capital inexistente”, pois “mesmo não sendo
efetivamente real, o capital fictício é negociável como se o fosse, ou seja, ele ‘circula normalmente
como valor-capital’” (p.148).

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1.360 criptomoedas7 no site Cryptocurrency Market Capitalizations,8 às quais ou-
tras se juntam quase que diariamente, cuja capitalização total de mercado somava
algo próximo de US$ 600 bilhões. Além do bitcoin, responsável por mais da me-
tade dessa capitalização, destacavam-se também a ethereum (totalizando cerca de
US$ 70 bilhões) e a bitcoin cash (com pouco mais de US$ 31 bilhões). A maior parte
delas foi lançada como uma espécie de meio de circulação ou meio de pagamento,
entre as diferentes moedas nacionais. Sua especificidade é permitir o contato direto
entre um credor e um devedor, escapando dos mecanismos centralizados do sistema
bancário mundial e, mais importante, também dos diferentes sistemas tributários
nacionais. Mais recentemente, em 2015, foi lançado o hayekgold, que se propõe
conversível em ouro, mas não se encontra cotada nesse mercado de criptomoedas.
O que mostra que os novos fetiches não conseguem escapar do fetiche áureo.9
3. A criação e circulação do bitcoin
Em primeiro lugar, deve-se tentar explicitar a natureza dessas moedas virtuais,
tendo como fundamento a questão da natureza do dinheiro. Dessa forma, todas as
moedas virtuais possuem uma natureza privada, e, pela forma como são postas
em circulação, permanecem como dinheiro de crédito criado de forma fictícia,
mesmo que sua produção implique custos.
A criação do bitcoin tem como base um processo extremamente sofisticado
e complexo de processamento de dados em rede, em escala mundial, chamado,
não por acaso, de “mineração”.10 Aqui encontramos uma analogia com o antigo

7 A enorme dificuldade, e mesmo a impossibilidade, até o momento, de falsificação do bitcoin


ensejou, em um mercado livre, a criação de outras moedas virtuais, num processo semelhante ao
ocorrido nos Estados Unidos, no período referido na nota seguinte, em que, da falsificação dos
dólares existentes, os criminosos passaram a criar seus próprios dólares em nome de empresas-
-fantasmas. Atualmente, qualquer pessoa com os devidos equipamentos e conhecimentos sobre o
desenvolvimento de softwares complexos pode criar sua própria criptomoeda, e multiplicá-la por
meio de “mineração” ou de outros mecanismos.
8 https://coinmarketcap.com/all/views/all/. Essa disseminação acelerada de criptomoedas parece se
assemelhar à criação descontrolada de dólares nos Estados Unidos no século XIX, quando cada
banco podia imprimir e emitir suas próprias notas de dólares, além de grandes empresas como as
ferroviárias e mineradoras. Ver: https://www.mdig.com.br/?itemid=10519.
9 Costuma-se apontar Nick Szabo como o precursor das criptomoedas, tendo lançado a ideia do bit
gold, buscando “mimetizar no ciberespaço, o mais fielmente possível, a segurança e a confiança
características do ouro e, sobretudo, o fato de ele não depender da confiança em uma autoridade
central” (Szabo apud Peck, 2012). Orlieb (2018) também tem como referência a crítica marxiana
à economia política, e analisa as criptomoedas à luz do fetichismo da mercadoria e do dinheiro,
guardando diversas semelhanças com o presente texto.
10 “A mineração de bitcoin é bastante parecida com uma gigante loteria em que você compete, por meio
de seu hardware de mineração, com todo mundo na rede, visando ganhar bitcoins. Um hardware
de mineração mais rápido é capaz de realizar maior número de tentativas por segundo para ganhar
essa loteria, enquanto a rede bitcoin se ajusta ela própria a cada duas semanas, aproximadamente,
para manter a taxa de descoberta de um hash de um bloco vencedor a cada dez minutos” (Estevão,
2017). Mas nem todas criptomoedas são passíveis de ser mineradas, ou seja, devem ser criadas e
postas em circulação por algum agente particular.

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fundamento das moedas metálicas, a mineração de ouro e de prata. Mas, em
vez de buscar a riqueza material na própria natureza, por meio do trabalho, esse
processo é realizado com complicadíssimos algoritmos matemáticos que exigem
máquinas mais ou menos sofisticadas para resolvê-los.
Segundo o artigo assinado por Nakamoto (2008), em que se expôs a ideia do
bitcoin alguns meses antes de seu lançamento, o desafio foi estabelecer um meio
de circulação e de pagamentos que não dependesse da regulação e da fidúcia de
uma autoridade central.11Além da aceitação voluntária, seria necessário garantir
mecanismos descentralizados de emissão da moeda e de vigilância do sistema,
de modo a evitar fraudes e, particularmente, o “duplo gasto”, ou seja, o uso, por
parte de um indivíduo mal-intencionado, de uma mesma moeda virtual em mais
de uma transação.
Sem entrar em minúcias técnicas, a solução foi a criação de uma rede peer-
-to-peer (“ponto a ponto”), em que cada “ponto” ou cada computador que a cons-
titui é ao mesmo tempo cliente e servidor, tal qual a rede torrent, por exemplo,
que serve para o compartilhamento de músicas, filmes etc. Tal rede é conectada
em torno de um software de código aberto e cada membro recebe duas chaves,
uma “pública”, conhecida por toda a rede, e outra privada, sigilosa. Ao transferir
bitcoins, cria-se um registro criptografado composto pela chave pública do recep-
tor e a chave privada daquele que os cede, o que legitima a transação – tornada
“pública” –, sem, entretanto, ligá-la a quem a realizou. O sigilo das identidades
é assim preservado, o que torna as operações com bitcoins propícias à prática de
lavagem de dinheiro e pagamentos de atos ilícitos.12
Cada transação deve ser verificada pela rede e registrada em um “bloco”;13
de modo a atestar sua autenticidade, o usuário (“minerador”) precisa resolver
um complexo problema criptográfico (a “prova de esforço”), e o primeiro que
obtém êxito nessa operação recebe como recompensa novos bitcoins (hoje são
25 por prova), bem como uma taxa sobre as transações. Resolve-se, assim, dois
problemas de uma só vez: o da emissão da criptomoeda e o do zelo descentraliza-
do pela manutenção do sistema, supostamente por meio da “livre concorrência”.
Depois desse processo, o bloco verificado se insere no blockchain em uma ordem
definida cronologicamente, recebendo um código (hash) único e criptografado,
e a introdução de um novo bloco pressupõe a verificação desse código. Assim, o

11 Tratava-se de criar “um sistema de pagamento eletrônico baseado em provas criptográficas em vez
da confiança, permitindo que duas partes interessadas quaisquer pudessem transacionar diretamente
entre si sem a necessidade da sanção de uma terceira parte” (Nakamoto, 2008).
12 “O público pode ver que alguém está enviando um montante [de bitcoins] para outra pessoa, mas
sem a informação ligando essa transação a alguém” (Nakamoto, 2008).
13 Que foi projetado para ter um tamanho máximo de um megabyte, o que equivale a cerca de sete
transações por segundo. Essa limitação serviria para evitar a proliferação de transações falsas
(spams) e para permitir a sua verificação por computadores domésticos, de modo a preservar a
descentralização do sistema.

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blockchain seria um imenso registro de todas as transações realizadas em cripto-
moedas, mantido não por uma instituição, mas por cada membro da rede.14
Conforme a sua configuração inicial, cada bloco deveria ser publicado a
cada dez minutos; ocorre que, quanto mais extensa a rede, maior sua capacidade
de processamento, e nesse sentido o algoritmo do bitcoin foi projetado para in-
crementar progressivamente a complexidade da “prova de esforço”. Ou seja, a
ideia é tornar cada vez mais difícil a “mineração”, simulando assim a mineração
real e o esgotamento das jazidas. Dessa forma, podemos, por analogia, associar
a criação do bitcoin à antiga produção das mercadorias metálicas, ouro e prata,
que, ao entrarem na circulação das mercadorias e ao mesmo tempo do capital,
passam a funcionar como dinheiro e como moeda em suas formas particulares de
existência. Da mesma forma, atenderia a um dos principais requisitos da antiga
teoria quantitativa da moeda.
A criação de bitcoins implica um custo de produção decorrente dos desgastes
de equipamentos e consumo de energia, além do tempo de trabalho de cada “mi-
nerador”. Essa moeda tem como padrão de preços o mesmo utilizado atualmente
por todas as moedas nacionais, o sistema numérico decimal, que substituiu a
medida de peso do metal, ouro ou prata, contido em cada moeda. O mecanismo
para colocá-la em circulação, sem a qual não adquire um status de existência, é
o mesmo de qualquer outra moeda, seja por meio da compra de mercadorias ou
serviços, seja de empréstimos ou de pagamento de dívidas. Como todas essas coisas
são cotadas ou denominadas em seus respectivos padrões monetários nacionais,
como o dólar, deve-se estabelecer uma determinada taxa de câmbio entre o bitcoin
e as respectivas moedas nacionais.

14 A despeito da sofisticação do sistema, ele está longe de ser inexpugnável. Ao contrário, já foram
relatadas inúmeras fraudes; só para citar algumas: a) desaparecimento de US$ 31 milhões da car-
teira da Tether, a empresa que gere a moeda virtual USDT, em 21 de novembro de 2017; b) roubo
de mais de R$ 15 milhões em criptomoedas da Youbit, empresa sul-coreana de compra e venda de
criptomoedas, em abril de 2017, e de 17% de suas divisas digitais, em dezembro do mesmo ano, o
que resultou em sua falência, e repercutiu sobre as cotações de outras criptomoedas nos mercados
asiáticos (o bitcoin, por exemplo, caiu 15%; ver: https://brasil.elpais.com/brasil/2017/12/20/inter-
nacional/1513760990_056377.html); c) roubo de US$ 60 milhões da plataforma de mineração
NiceHash, em 6 de dezembro de 2017; d) em julho de 2017, US$ 32 milhões foram roubados da
empresa Parity, em ethereum; e) roubo de 120 mil bitcoins (equivalente a US$ 72 milhões) da casa
de câmbio Bitfinex, em agosto de 2016; f) roubo de 19 mil bitcoins da carteira da Bitstamp, uma
espécie de bolsa de criptomoedas, que correspondia a US$ 5,1 milhões em janeiro de 2015; g)
roubo de US$ 473 milhões em bitcoins da MtGox, que à época, março de 2014, concentrava mais
de 70% das transações em bitcoins de todo o mundo; h) ainda em seus primórdios, em agosto de
2010, o desenvolvedor do Bitcoin Core, Jeff Garzik, percebeu que um hacker realizou uma transação
de 184 bilhões de bitcoins em apenas um bloco. Cabe destacar o roubo de US$ 101 milhões em
ethereum em junho de 2016, que fez com que o criador e CEO da Ethereum, Vitalik Buterin (que
tinha apenas 19 anos quando criou a criptomoeda, em 2015), reiniciasse o sistema, retrocedendo
no tempo para o momento antes do roubo. Com essa alteração na própria blockchain, tida como
definitiva e inexpugnável, abalou-se a noção de que as criptomoedas são imunes aos desígnios
de qualquer tipo de autoridade monetária. Para esses e outros roubos, ver, por exemplo: https://
portaldobitcoin.com/os-maiores-roubos-de-criptomoedas/.

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Em seu ponto de partida, o custo de produção de cada bitcoin era bastante baixo,
elevando-se à medida que maiores quantidades foram sendo mineradas.15 Conforme
a procura foi aumentando, essa diferença também passou a crescer. O aumento da
procura especulativa elevou essa diferença a níveis estratosféricos. De acordo com
o site da Blockchain (https://blockchain.info/charts), desde sua criação, em 2009,
até o início de 2011, o bitcoin valia centavos de dólar.16 A partir desse momento até
o início de 2013, sua cotação sofre então uma apreciação significativa, passando
a valer umas poucas centenas de dólares. Finalmente, a partir da segunda metade
de 2016, tem início uma forte elevação; para se ter uma ideia, de U$ 995 no dia
4 de janeiro de 2017, cada bitcoin passa a valer U$ 19.499 no dia 15 de dezembro
2017, portanto, vinte vezes mais (!), tendo uma oferta total de 16.476.025 unidades
(atualmente o teto para sua emissão é de 21 milhões de unidades, que, estima-se,
seja atingido por volta de 2140). Como resultado dessa alta, e reforçando essa tra-
jetória, no dia 10 de dezembro de 2017, os bitcoins passaram a ser comercializados
no mercado de futuros, nas poderosas Chicago Board Options Exchange (CBOE)
e o Chicago Mercantile Exchange (CME), o que repercutiu de forma expressiva
sobre a cotação corrente dessa criptomoeda. Não obstante, em 29 de dezembro
de 2017, a cotação do bitcoin caiu para US$ 13.216, e sua capitalização total se
reduziu a US$ 221.600; no dia 6 de fevereiro de 2018, a cotação ficou abaixo dos
US$ 6 mil, o que corresponde a uma queda de mais de 70% em relação ao pico
de 2017. De todo modo, é gritante a discrepância entre o preço dos bitcoins em
dólares e o volume de transações que eles intermedeiam.
A diferença entre o custo de produção e a cotação, em dólares, atingida pelo
bitcoin se assemelha aqui à antiga senhoriagem no processo de cunhagem das
moedas metálicas ou à impressão das notas de papel-moeda.17 Essa diferença pode

15 Diga-se de passagem, uma das alegadas vantagens das criptomoedas, um suposto barateamento dos
custos de transações graças ao seu caráter descentralizado, parece não se sustentar, ao menos no
curto prazo. De acordo com estimativas de Malmo (2015), uma transação com bitcoins gastava, em
2015, cinco mil vezes mais energia elétrica do que uma transação com cartão de crédito, e gastava
diariamente, em média, o equivalente da eletricidade consumida por 1,5 família norte-americana.
Ou ainda, segundo Roberts (2017), a “mineração de bitcoins já está consumindo mais energia
computacional do que o consumo anual [de eletricidade] da Irlanda”. E, sob o atual padrão tec-
nológico, esse gasto tenderia a aumentar fortemente com o passar do tempo. Ademais, da maneira
como está constituído, o sistema do bitcoin pode realizar no máximo o irrisório número de sete
transações por segundo, enquanto o sistema do cartão de crédito Visa pode chegar hoje a 56 mil
transações por segundo.
16 A primeira negociação envolvendo o bitcoin ocorreu na segunda metade de 2009, a uma taxa de
1 BTC = 0,0007 dólar, que seria o seu custo estimado da produção, considerando a capacidade
computacional e a energia então exigidas para tanto.
17 Por exemplo, se o custo de impressão de uma nota de US$ 100 fosse de US$ 1, a senhoriagem
seria de US$ 99, pois o agente emissor poderia comprar mercadorias e serviços ou pagar dívidas e
empréstimos no valor nominal da nota impressa. Atualmente, a senhoriagem é estimada por meio
de uma taxa média de juros que incide sobre os títulos da dívida pública, pois a criação de dinheiro
em todo o mundo é efetuada através dos registros de operações contábeis entre o sistema bancário
e o resto da economia.

16 • Crítica Marxista, n.47, p.9-25, 2018.

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ser uma das explicações para o estímulo à mineração de bitcoins, em função do
frenético desenvolvimento de seu mercado.
Como mencionado, a hayekgold, lançada em 2015, originalmente denominada
de hayekcoin, se diferencia das demais criptomoedas. A rigor, a despeito de se
basear na tecnologia do blockchain, a hayekgold não pode ser considerada uma
moeda virtual; é, antes, um derivativo do ouro: um título cotado em ouro, com
cada hayekgold equivalendo a um grama de ouro, garantido pelas reservas de uma
empresa especializada no comércio de ouro, a Anthem Vault.18 Assim, funciona
como um ativo, cujo preço está vinculado ao mercado de ouro, se valorizando
ou se desvalorizando conforme o preço do ouro. Mas poderia ser, supostamente,
um retorno às moedas conversíveis em mercadoria, como propugnam alguns
nostálgicos.19 Tem-se aqui o retorno explícito ao fetiche ouro.
4. O bitcoin pode substituir as funções do dinheiro no capitalismo?
a) Medida dos valores
A primeira função do dinheiro, como medida de valor e padrão de preços, já
se encontra plenamente resolvida e desenvolvida em suas contradições próprias
pelas moedas nacionais. Pois todas as mercadorias, dívidas e contratos já se en-
contram denominados nessas moedas. Atualmente, a moeda mundial é o dólar
americano, apesar de todas as contestações e suas próprias contradições. Por isso,
considerando a existência de uma taxa de câmbio entre o bitcoin e cada moeda,
em que todas as transações econômicas passassem a ser denominadas em bitcoin,
cujo padrão de medida também é decimal, nesse mesmo processo as moedas
nacionais poderiam ser substituídas pelo bitcoin (da mesma maneira que o euro
substituiu todas as moedas nacionais existentes na área). Como o padrão de medida
é o mesmo, a troca ocorreria com a mudança de nome e o valor seria convertido
pela respectiva taxa de câmbio. A maior dificuldade decorre das determinações
dessa taxa de conversão, devido ao espetacular crescimento da taxa de câmbio ou
do preço de mercado do bitcoin, assim como de sua volatilidade e instabilidade,
próprias de um mercado essencialmente especulativo.
Dessa forma, mesmo que essas mercadorias especiais, virtuais, as criptomoe-
das, pudessem, então, assumir e substituir o papel que o dinheiro cumpre como
medida do valor e padrão de preços, a volatilidade e a instabilidade na determinação
de seus preços, ou taxas de câmbio, seriam transferidas para os preços cotidianos
dos bens e serviços em geral. Ocorreriam uma enorme balbúrdia e confusão gene-
ralizada, em vez de refletirem a variação relativa na produtividade dos diferentes

18 Após a hayekgold, outra empresa lançou a bitgold. Ver: https://www.anthemvault.com/; https://


bitcoinmagazine.com/articles/hayekgold-anthem-vault-represents-physical-gold-bitcoin-block-
chain-1433455153/; https://www.bitcoinmining.com/bitgold-goldmoney-review/.
19 Recentemente, a China anunciou que seus pagamentos na conta de petróleo seriam em renminbi
conversíveis em ouro, em uma complexa engenharia financeira. Ver: http://resistir.info/eua/robert-
s_18out17.html.

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produtos, internos e internacionais, pois trariam junto a especulação no mercado de
moedas virtuais fictícias. Nesses poucos anos de existência do bitcoin, cujo valor
passou de alguns centavos de dólar para mais de US$ 19 mil, todos os preços de
mercadorias e serviços, cotados em dólares, teriam sofrido uma brutal deflação.
Da mesma forma, todos os produtos anteriormente cotados em dólares, assim
como o faturamento das empresas, a massa de lucros e a arrecadação do Estado,
sofreriam as mesmas quedas.
b) Meio de circulação
As informações disponíveis indicam que o bitcoin vem sendo utilizado, com
frequência cada vez maior e em escala mundial,20 como meio de circulação e meio
de pagamento, ou seja, participa da metamorfose final do capital, da mercadoria em
dinheiro virtual. Mas, como meio de circulação, o mundo das mercadorias exige a
existência de uma determinada quantidade de moeda21 decorrente dos preços das
mercadorias a serem transacionadas. Como a criação de bitcoins simula a minera-
ção do ouro, sua quantidade já está com um teto previamente determinado e o seu
uso, até o momento, muito limitado. O desenvolvimento do capital, no período do
padrão ouro, acelerou o surgimento de novas formas de crédito em substituição
aos limites impostos pela produção do dinheiro ouro ou prata. Este teria que ser
o caminho: a criação de bitcoins como dinheiro de crédito virtual (fictício).
O dinheiro de crédito, como criação privada entre bancos e empresas san-
cionadas pelo dinheiro de crédito estatal, é fundamental e determinante atualmente
no mundo capitalista. Esse dinheiro de crédito é uma criação imaginária, fictícia,
para expressar os valores das mercadorias em um padrão de medida decimal.
Sua existência é efêmera, determinada pelos prazos dos contratos nos quais têm
sua origem e é cancelado assim que o prazo termina. Na circulação do capital,
ou seja, em sua contínua metamorfose, toda a gigantesca massa de riqueza em
circulação é representada por registros de débito e crédito, nas empresas e nos
bancos. “O dinheiro serve aqui como dinheiro de conta para expressar os valores
das mercadorias em seus preços, mas não se confronta materialmente com as
próprias mercadorias” (Marx, 1985, p.132). Dessa forma, o dinheiro fetiche, tenha
o nome de ouro, de dólar, de libra esterlina ou de bitcoin, como crédito, se torna
uma representação puramente ideal e idealizada da riqueza, dinheiro de conta ou
dinheiro fictício. Ou seja, da denominação dos valores à circulação deles, há a
necessidade de criação de crédito, seja em bitcoin ou em qualquer outra cripto-

20 A lista das pessoas e empresas que o aceitam como meio de circulação ou meio de pagamento
pode ser consultada em: https://coinmap.org/#/world/29.53522956/-19.33593750/2. Por exem-
plo, recentemente uma construtora brasileira, a Valor Real (!) Empreendimentos Imobiliários,
passou a aceitar pagamento em criptomoedas em imóveis do Programa Minha Casa Minha Vida.
Ver: http://www.infomoney.com.br/mercados/bitcoin/noticia/7144657/construtora-brasileira-acei-
ta-pagamento-criptomoedas-imoveis-minha-casa-minha-vida.
21 O moderno sistema de crédito foi capaz de ultrapassar todas essas exigências do processo de
circulação das mercadorias-capital.

18 • Crítica Marxista, n.47, p.9-25, 2018.

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moeda, ou em todas, totalmente livre de qualquer restrição ou de regulação, como
ocorre atualmente. Suas taxas de câmbio deveriam ser determinadas em mercados
virtuais com milhares de moedas.
c) Dinheiro propriamente dito
O dinheiro, como dinheiro, tem como funções a de entesouramento,22 a de
servir como meio de pagamento e a de dinheiro mundial. Dessa maneira, todos
os possuidores de bitcoins, mineradores ou compradores, podem manter sua ri-
queza sob essa forma particular, de um ativo negociável em um mercado virtual
bastante desenvolvido por meio das redes mundiais informatizadas, que permite
a negociação ponto a ponto, ou seja, de um possuidor a outro, sem nenhuma in-
termediação e fora dos sistemas tributários nacionais. Mas o entesouramento de
bitcoins tem implicações: como ele só pode ser obtido via mineração ou compra
de outros possuidores, significa que um minerador só pode realizar sua riqueza
por meio de sua metamorfose, ou seja, com a compra de mercadorias, ou pela sua
conversão em uma moeda convencional, dólares, euros, libras ou ienes. Não há
outra forma de realização e usufruto dessa riqueza criada ficticiamente a não ser
a superação do bitcoin como uma forma de entesouramento. Nesse momento, a
diferença entre o custo de produção e o preço de mercado constitui uma forma
de transferência da riqueza acumulada em quaisquer das moedas para os bitcoins.
Nos primórdios do modo de produção capitalista, assim como nos modos de
produção anteriores, o entesouramento exercia um papel importante na acumulação
de riqueza. Com o desenvolvimento do capital e, em particular, em sua forma autô-
noma de capital portador de juros, o entesouramento passou a ser substituído pela
nova determinação que o dinheiro adquiriu, a de se tornar capital, capital-dinheiro.
Assim, desenvolveu-se, igualmente, um sistema bancário e de crédito que passou
a reunir toda a riqueza excedente e acumulada sob a forma dinheiro, sobretudo a
parcela ociosa, sob a forma de capital portador de juros. Ademais, como se viu, o
sistema de crédito passou a produzir, criar dinheiro de crédito de forma autônoma,
uma forma fictícia de riqueza. Decorre daí a atual exacerbação da alienação do
fetiche no qual todo o dinheiro adquire uma propriedade misteriosa de gerar mais
dinheiro,23 como é a aparência das cotações do bitcoin. Isso, atualmente, ocorre de

22 O entesouramento sob a forma de dinheiro metálico ou mesmo de notas bancárias, além de servir
como uma forma de acumulação de riqueza, também exercia um papel importante na regulação
da quantidade necessária de dinheiro para a realização do valor das mercadorias no processo de
circulação do capital. Cada vez que o compartimento de circulação de mercadorias exigia mais
dinheiro, uma parte do dinheiro entesourado era desentesourado, entrando no processo de meta-
morfose da riqueza. Todo o dinheiro excedente, desnecessário à circulação, voltava aos tesouros
particulares dos possuidores de riqueza, bancos, empresas ou famílias.
23 “O dinheiro como tal já é potencialmente valor que se valoriza, e como tal é emprestado, o que
constitui a forma de venda dessa mercadoria peculiar. Torna-se assim propriedade do dinheiro criar
valor, proporcionar juros, assim como a de uma pereira é dar peras. E como tal coisa portadora
de juros, o prestamista de dinheiro vende seu dinheiro. Mas isso não é tudo. O capital realmente

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maneira cotidiana, além do sistema bancário, nos mercados de moedas e títulos de
dívida ou de propriedade, desenvolvidos e acelerados pela própria acumulação de
capital, não importando qual forma específica de moeda nacional. Nesse processo,
o bitcoin e todas as demais criptomoedas surgem e se desenvolvem como outras
formas alternativas para a acumulação de riqueza fictícia.
Um minerador que cria bitcoins e os acumula sob essa forma sem nunca os con-
verter em mercadorias ou capital fica fora da circulação e da reprodução global do
capital. Pode se tornar um bilionário fictício e jamais usufruir das melhores coisas
que o capitalismo já produziu, como mercadorias especiais voltadas às camadas
mais privilegiadas da burguesia internacional, propriedades espetaculares, iates,
jatos e aviões particulares. A única forma é superar o fetiche do entesouramento
e colocá-los na circulação global do capital.
As outras funções, como meio de pagamento e dinheiro mundial, poderiam
ser exercidas pelo bitcoin, ou qualquer outra moeda virtual, se suas taxas de
câmbio com todas as demais moedas mantivessem alguma estabilidade para
não ocasionar flutuações excessivas e acelerar os riscos cambiais. Nesse caso, o
sistema tenderia a substituí-lo por moedas cuja cotação no mercado tendesse a
uma maior estabilidade.
d) O dinheiro como capital
No processo dinâmico, contínuo e global da reprodução do capital em geral,
o dinheiro funciona apenas como dinheiro em dois momentos da metamorfose do
capital, o primeiro na conversão em mercadorias e o segundo na reconversão das
novas mercadorias em dinheiro. À medida que se processa e avança a acumulação,
o capital se autonomiza em suas formas de capital-dinheiro, capital produtivo e
capital-mercadoria. Na acumulação, sob a forma autonomizada de capital-dinheiro,
ele adquire uma nova propriedade, ou seja, se converte em dinheiro-capital. Uma
nova mercadoria especial na qual o seu valor de uso é de ser capital, com seu
valor sendo determinado pela sua expressão de valor quantitativa em termos de
tempo de trabalho socialmente necessário. Mas, em sua forma mais desenvolvi-
da, o capital portador de juros, seu valor será determinado pela capitalização de
seu rendimento, da parcela de mais-valia que ele se apropria na forma de juros
capitalizada a uma taxa corrente ou média de juros. Essa forma de capital não
é dinheiro, mesmo que apareça como se o fosse. O capital portador de juros se
acumula fundamentalmente, e em maior quantidade, como dinheiro de crédito,
em suas mais variadas formas de registros e de títulos de crédito (dívida).
A questão principal e decisiva é como as moedas virtuais substituiriam as
atuais moedas correntes, entre as quais o dólar, funcionando ainda como dinhei-
ro mundial, na dinâmica da circulação. A resposta é que o bitcoin, assim como

funcionante se apresenta, conforme se viu, de tal modo que proporciona o juro não como capital
funcionante, mas como capital em si, como capital monetário” (Marx, 1986, p.294).

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qualquer das criptomoedas, poderia substituir as moedas nacionais e também o
dinheiro mundial. A condição necessária é que qualquer uma das criptomoedas que
venha a assumir esse papel, ou as funções de padrão de valor, passe a exercê-lo
cotidianamente como meio de circulação, capital-dinheiro e dinheiro mundial, no
lugar das moedas que já fazem essas funções no sistema capitalista mundial con-
temporâneo. Seria um processo semelhante a de países que reformaram seu padrão
monetário, inclusive o nome da moeda nacional, como ocorreu com a criação do
euro. A condição suficiente seria a aceitação e a incorporação da criptomoeda no
próprio imaginário social, como o novo fetiche.
Para tanto, seria necessário que a maior parte das unidades particulares de
capital e os Estados nacionais substituíssem suas moedas, seja como dinheiro de
conta, seja como dinheiro de crédito ou como meio de pagamento, no interior
dos Estados-Nações, assim como entre eles, e fossem sancionadas e aceitas como
tal. Associado a isso, as redes que produzem, fazem circular e controlam essas
moedas virtuais, no sistema conhecido como blockchain, teriam que substituir o
sistema de crédito atual, com a superação dos bancos centrais, a interligação dos
mercados de crédito e, inclusive, do sistema bancário, desde que esse sistema
não entrasse em uma partilha dentro do processo global de circulação do capital.
Entretanto, além das dificuldades já apontadas, tais desenvolvimentos esbar-
rariam em dificuldades econômicas e geopolíticas decorrentes do interesse dos
Estados Unidos em preservar o dólar como dinheiro mundial, e de outros países
que eventualmente almejem, de alguma forma, esse posto. Ademais, conforme
exposto, a fragmentação e a multiplicidade das criptomoedas conflitam com
a exigência de unificação e de padronização monetária, posta pela dinâmica
concorrencial capitalista, bem como com a crescente mobilização do Estado no
sentido de catapultar os mercados financeiros e de impedir o colapso da produção
de capital fictício.24 Aliás, a tendência à concentração e à centralização inerente
à forma capital também se verifica nos mercados de criptomoedas. Assim, atual-
mente China, Geórgia, Suécia e EUA, nessa ordem, abrigam os mais importantes
“mineradores”, totalizando cerca de 80% da produção mundial. Os três mais
importantes “pools de mineração”, todos de origem chinesa, são o BTC.com, o
AntPool e o BTC.TOP, que detêm, respectivamente, 20,2%, 16,5% e 15,2% do
mercado de bitcoin.25
Um dos mecanismos para alavancar essa centralização, que ademais abre
brechas para toda sorte de fraudes, é o chamado cloud mining, que consiste na
terceirização do serviço de geração de bitcoins. Em vez de investir diretamente em

24 Cf. Paulo Nakatani (2017).


25 Cabe mencionar ainda que até o início de janeiro de 2017, a quase totalidade das compras de
bitcoins (mais de 90%) era realizada com o renminbi chinês; a partir do final do mês, esse quadro
se altera drasticamente, e o iene japonês passa a dominar as aquisições de bitcoins, seguido pelo
dólar norte-americano e o won coreano (o renminbi desaparece desse quadro; ver: https://block-
chain.info/charts).

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equipamentos e insumos necessários, firma-se um contrato junto a um fornecedor,
definindo a mobilização de certa capacidade computacional por certo período de
tempo. Em tese, mediante o pagamento de uma taxa, o fornecedor empregaria
os meios correspondentes à capacidade contratada, e o investidor receberia os
bitcoins gerados. Por fim, estão disponíveis serviços de carteira on-line por parte
de empresas que pagam juros por depósitos realizados em criptomoedas, de modo
que ocorre aí a transferência de posse e controle desses ativos.
Logo, a despeito dos anelos piedosos dos ultraliberais, e como já havia cons-
tatado o jovem Engels (1981, p.69), é próprio à concorrência capitalista a mono-
polização, que, por sua vez, tende a intensificar a concorrência entre capitais cada
vez mais portentosos. Tal dinâmica tende, por conseguinte, a minar um dos pilares
das moedas virtuais, a produção e o controle descentralizados, que pretensamente
lhes garantiria a vantagem em relação às moedas nacionais.
Como se sabe, articularam-se em torno das criptomoedas visões muito distin-
tas, desde utopistas que enxergavam nas tecnologias envolvidas um instrumento
de construção de relações igualitárias, até vorazes especuladores. À medida que
as transações com as criptomoedas se intensificam, que seus preços incham, e que
pessoas se tornam milionárias da noite para o dia, a suposta harmonia se esfacela,
e a verdadeira natureza desses mercados se manifesta, sans phrase. A lógica tec-
nocrática de considerar a produção de dinheiro uma questão meramente técnica,
concebida em termos estritamente matemáticos, cai por terra, diante da verdade
iniludível:26 o dinheiro é uma forma social,27 um momento da forma capital, eivado
de contradições e tributário da turbulenta dinâmica de acumulação de capital.
5. Considerações finais
Pelo que vimos, qualquer criptomoeda pode se tornar uma nova moeda na-
cional e até mesmo substituir o dólar e outras moedas como dinheiro mundial.
Entretanto, o papel desempenhado pelo dólar como o principal dinheiro mundial
decorre do poderio da economia estadunidense. Não mais como dinheiro, mas
como dinheiro-capital. A rigor, não há impedimentos para a substituição das
moedas nacionais e do dinheiro mundial por qualquer moeda privada virtual na
dinâmica de reprodução e expansão do capital, desde que atendam aos requisitos
das leis gerais da circulação monetária sob as determinações do capital e às leis
gerais da acumulação capitalista.
Mas a conclusão final que não pode ser eludida é que a plena e total dominação
do fetichismo sobre a produção, a circulação e a apropriação da riqueza capitalista

26 A esse respeito, cabe recordar Herbert Marcuse (1998, p.132): “O conceito de razão técnica é
talvez em si mesmo ideologia. Não só a sua aplicação, mas já a própria técnica é dominação
metódica, científica, calculada e calculante (sobre a natureza e sobre o homem). Determinados
fins e interesses da dominação não são outorgados à técnica apenas ‘posteriormente’ e a partir de
fora – já se inserem na própria construção do aparelho técnico”.
27 Cf. Ben Gliniecki (2014).

22 • Crítica Marxista, n.47, p.9-25, 2018.

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atingiu limites inimagináveis. O capitalismo contemporâneo está resolvendo os
sonhos mais loucos dos alquimistas, de produzir riqueza, mesmo que fictícia e
ao mesmo tempo real, por meio da gigantesca retorta social que permite criar
dinheiro do ar e de transformar papel em ouro. Esses são os grandes fetiches de
nossa época, muito além do bezerro de ouro.
Ocorre que, ao criticar o fetichismo do dinheiro, Marx também logrou apreen-
der aí elementos que indicam, negativamente, a possibilidade de construção de
relações sociais não coisificadas e não aviltadas pelo rolo compressor do capital,
que tudo busca submeter ao seu movimento tautológico de reprodução ampliada.
Em suas palavras,

o ouro e a prata não possuem apenas o caráter negativo de objetos supérfluos, sem
utilidade prática; suas qualidades estéticas fazem deles a matéria natural do luxo,
do adorno, da suntuosidade, da roupa domingueira, em resumo, a forma positiva
da superabundância e da riqueza. Aos nossos olhos, eles aparecem como a luz
virginal arrancada às entranhas da terra: a prata refletindo todos os raios luminosos
em sua mistura original, o ouro refletindo apenas a mais elevada potência da cor, o
vermelho. Ora, o sentido das cores é a forma mais popular do sentido estético em
geral. A conexão etimológica dos nomes dos metais preciosos com os nomes das
cores, nas diferentes línguas indo-germânicas, foi demonstrada por Jacob Grimm.
(Ver a sua História da língua alemã) (Marx, 1982, p.111, tradução modificada com
base em Romano, 2004, p.16)28

Nem mesmo isso pode ser dito do fetichismo próprio às criptomoedas, que
repõe o fetichismo do ouro como mero simulacro. Seus eventuais méritos tecno-
lógicos e técnicos são forçosamente subsumidos à febre especulativa, aguda em
particular nos contextos como o atual, marcado por imensas massas de capital
sobreacumulado e por uma reprodução ampliada claudicante, em escala mundial.
Longe de serem uma saída para as contradições do capitalismo contemporâneo, as
criptomoedas são, a um só tempo, seu produto e alimento. Mais temível do que a
esfinge, não basta decifrar o enigma dessas formas sociais tresloucadas; enquanto
não se superar os seus fundamentos, seguiremos sendo devorados.29

28 Ao que comenta Romano (2004, p.16): “Sob o mecanismo e o intelecto impiedoso, existem corpos
vivos, almas que sentem e vibram com o belo e o verdadeiro. Corpos que, se pudessem, envergariam
cosméticos com muito luxo, enfeites, suntuosas roupas domingueiras. Almas que se desdobrariam
no devaneio dos sonhos despertados pelos cinco sentidos, em todas as artes. Mas o capitalismo
impede a festa somática e anímica. Ele produz o seu oposto”.
29 Como se disse alhures (Nakatani e Mello, 2018), “a deificação do ouro, que conduziu ao extermínio
e à escravidão e ao suplício de milhões ao longo da história do capitalismo, e que nalguns lugares
continua catalisando conflitos militares, genocídios, e submetendo multidões a condições aviltantes
de trabalho; tal deificação, dizíamos, ressurge aqui como farsa, uma pseudonostalgia, uma ode ao
fetichismo, que assume as formas mais tresloucadas de manifestação”.

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24 • Crítica Marxista, n.47, p.9-25, 2018.

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ROMANO, Roberto. Apresentação. In: MOURA, Mauro Castelo Branco de. Os merca-
dores, o templo e a filosofia. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2004. p.11-23.

Resumo
As vertiginosas flutuações na cotação do bitcoin e de outras criptomoedas,
sobretudo a partir da segunda metade de 2016, estimularam amplos debates aca-
dêmicos e midiáticos em torno de sua natureza e de suas perspectivas num futuro
próximo: trata-se rigorosamente de moedas? Possuem potencial de suplantar as
moedas nacionais ou mesmo de usurpar do dólar o estatuto de dinheiro mundial?
Seriam ativos meramente especulativos? Neste artigo, tais questões serão consi-
deradas à luz da crítica marxiana da economia política, em particular da análise
marxiana sobre o dinheiro e suas distintas determinações. Além de lançar luz
sobre a atual configuração do dinheiro e sobre algumas salientes características do
capitalismo contemporâneo, que em meio às sucessivas crises de sobreacumulação
catapulta a sua dimensão financeira, pretende-se retomar a crítica de Marx ao
fetichismo do dinheiro como chave para compreender a existência e a dinâmica
de produção das criptomoedas.
Palavras-chave: criptomoedas; fetichismo; capitalismo contemporâneo; Marx.
Abstract
The dizzying fluctuations in the price of bitcoin and other cryptocurrencies,
especially since the second half of 2016, have stimulated broad academic and
media debates about their nature and prospects in the near future: are they strictly
currencies? Do they have the potential to supplant national currencies or even to
usurp the world money statute from the dollar? Was it a merely speculative asset?
In this article, such questions will be considered in the light of the Marxian critique
of political economy, in particular the Marxian analysis of money and its various
determinations. In addition to shedding light on the current configuration of money
and on some salient features of contemporary capitalism, which amidst successive
crises of over-accumulation catapults its financial dimension, it is intended to re-
take Marx’s critique of money fetishism as a key to understand the existence and
dynamics of cryptocurrencies production.
Keywords: cryptocurrencies; fetishism; contemporary capitalism; Marx.

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