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jurisprudencial:
Dierle Nunes
Doutor em Direito Processual (PUC-Minas/Università degli Studi di Roma"La Sapienza").
Mestre em Direito Processual (PUC-Minas). Professor-adjunto na PUC-Minas e UFMG.
Membro do IBDP, ABDPC e IAMG. Advogado.
Helen Almeida
Mestranda em Direito Processual pela PUC-Minas. Advogada.
Marcos Rezende
Mestrando em Direito Processual pela PUC-Minas.
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
Essa situação é gravíssima e se agrava a cada dia quando a própria doutrina passa a se
contentar em apenas comentar superficialmente os julgados proferidos.
Assim, é importante apresentar e repensar o que se entende por doutrina e sua atual
posição no sistema jurídico brasileiro, uma vez que além de não cumprir as suas
funções, a mesma se limita a justificar a“jurisprudência instável“, de forma a legitimar e
fortalecer a atuação desta, como se fosse a principal fonte argumentativa para os
operadores do Direito.
A preocupação é urgente, uma vez que a aprovação do novo Código de Processo Civil e a
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
Ao longo do trabalho se faz a crítica da posição que a doutrina assumiu na atual quadra
histórica e defende-se que a mesma volte a atuar na sua função, de forma a contribuir
participativamente para a construção do processo constitucional no Estado Democrático
de Direito.
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na elaboração das leis, ou sobre aqueles que exercem a função jurisdicional.
Na Alta Idade Média preponderou uma escassa produção científica no campo jurídico.
Por outro lado, na Baixa Idade Média, a partir do século XI, com a escola de Bolonha, a
doutrina demonstrou significativa proeminência, perdurando até a modernidade, com o
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advento das codificações, traço indelével do positivismo.
Por fim, na edição de 1960 da Teoria pura do direito, o autor reduz, de forma
inequívoca, o ato de criação do direito a um ato de vontade. E decorreu daí, a brutal
desvalorização da doutrina em relação à aplicação do direito.
Não se pode descurar, pois, que a teoria kelseniana foi amplamente acolhida pela
comunidade acadêmica, influenciando indiscutivelmente os processos de produção,
interpretação e aplicação do direito, até os dias atuais.
“Os espaços públicos nacionais são, ao mesmo tempo, atravessados e completados por
correntes de comunicação planetárias. Esse espaço constitui a caixa de ressonância para
os problemas da sociedade como um todo, que não podem mais ser percebidos da
perspectiva dos sistemas funcionais fechados e autorreferenciais. O tecido difuso de um
espaço público ancorado na sociedade civil é, portanto, o lugar em que sociedades
altamente complexas ainda podem desenvolver uma consciência de si mesmas e tratar
os problemas que as obrigam a agir politicamente sobre si mesmas. Por certo, muitos
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atores trazem temas e contribuição“.
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
Nesta perspectiva, a doutrina, para se adequar aos perfis democráticos, deve deslocar o
seu eixo de orientação, afastando-se do excessivo caráter dogmático, fixando-se em
posições democrático-argumentativas, sob o pálio, agora prevalente da zetética, em
uma combinação dogmática reduzida, uma vez que seria utópico afastá-la
completamente.
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Sustenta-se mais: com base nos estudos de Dworkin o Direito não pode ser reduzido
apenas ao que foi decidido no passado, porque se assim o fosse se caracterizaria como
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um simples fato (plain fact) e se desvincularia totalmente do dever ser. Dworkin
procura demonstrar que a técnica jurídica é um exercício de interpretação, uma prática
linguística, cuja interpretação é construída a partir de proposições jurídicas.
A construção do Direito depende das críticas das teorias existentes, bem como da
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elaboração de novas, sempre testificadas num ciclo infinito. A doutrina, na construção
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discursiva do direito, assume uma posição autoral, pois capítulos da construção e da
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aplicação do direito também lhe são destinados. A ausência ou a modesta participação,
como se verifica no atual cenário brasileiro, encarcera o discurso jurídico à arbitrariedade
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e a discricionariedade.
Com efeito, não há argumento que justifique a monopolização do Direito pelos tribunais,
notadamente, no caso brasileiro, pelos tribunais superiores e que estes funcionem como
guardiões absolutos da racionalidade, quando na alta modernidade, prevalece a
consciência falibilista, que se apoia na concepção de cooperação científica, na qual todos
os atores contribuem para a construção participativa da racionalidade e do
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conhecimento.
Eis o problema que se pretende enfrentar, pois ao se acomodar a uma simples posição
de comentadora de julgados, a doutrina desvaloriza-se, intimida-se na sua função de
interpretar. E a exigência de sua participação é de fundamental importância,
especialmente em um momento no qual se destaca não a qualidade dos julgados, mas,
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
O direito precisa ser compreendido a partir de uma visão participativa e integradora, que
não se restrinja a discursos oficiais e discricionários, fechados em si mesmos,
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comumente adotados em Estados que, apenas aparentemente, se dizem democráticos.
Não há dúvida que à doutrina incumbe contribuir qualitativamente para as decisões.
Nesse cenário, mais preocupante ainda, é a técnica que os órgãos julgadores adotam, ao
proferirem as suas decisões, essencialmente apoiadas em excertos de julgados
anteriores ou, apenas, em ementas e dispositivos que fundamentam, tourt court, as
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decisões. E nesta mesma onda jurisprudencial corrompida seguem também as partes
do conflito, ao fundamentarem as suas teses tão somente na“jurisprudência“. Essa
técnica de repetição de julgados gera como consequência o empobrecimento do discurso
jurídico, no qual prevalece, em detrimento da doutrina, apenas, o entendimento dos
tribunais superiores.
“(…) duas posturas são costumeiras no Brasil ao se usar os julgados dos tribunais como
fundamento para as decisões: (a) a de se repetir mecanicamente ementas e enunciados
de súmulas (descontextualizados dos fundamentos determinantes), como bases
primordiais para as decisões, seguindo uma racionalidade própria da aplicação das leis,
encarando esses trechos dos julgados como 'comandos’ gerais e abstratos ou (b) de se
julgar desprezando as decisões anteriormente proferidas, como se pudesse analisar
novos casos a partir de um marco zero interpretativo; num e noutro caso o juiz
discricionariamente despreza os julgados, a doutrina e o próprio caso que está julgando.
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Dworkin ensinou que o intérprete deve analisar o direito como um romance em cadeia,
com integridade e coerência, de modo a decidir o novo caso diante de si, como parte de
um complexo empreendimento em cadeia do qual os capítulos passados (julgados
passados e entendimentos doutrinários) devem ser levados em consideração, para que
se escreva um novo capítulo, em continuidade, que o respeite ou o supere, com
coerência. É dizer, para ele a interpretação do direito é construtiva: a decisão, ao
mesmo tempo em que foi uma resposta aos postulantes elaborada por um grupo num
certo período, é também produto de várias mãos e dá continuidade (sem ruptura)
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àquela construção referida. O Juiz, assim, não pode ser só a boca da jurisprudência
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(como já fora da lei, ao tempo dos exegetas), repetindo ementas ou trechos de
julgados descontextualizados dos fatos, ou usar julgados pontuais porque precisa ter
uma noção do que os julgadores do passado fizeram coletivamente. Não dá para se usar
julgados isolados como se estes representassem a completude do entendimento de um
tribunal. Isto, além de uma simplificação odiosa, está em desconformidade com a práxis
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do common law de onde se diz estar buscando inspiração“.
Conforme se verá adiante, o exercício da jurisdição não pode limitar o seu conteúdo
discursivo apenas à interpretação normativa e jurisprudencial. Ao agir neste sentido, os
órgãos julgadores desprezam as relevantes contribuições da doutrina, fecham-se em si
mesmos e concebem um círculo vicioso e corrompido.
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
Parece que a doutrina não se apercebeu de suas novas atribuições democráticas, cujos
fundamentos não podem desconsiderar o Estado Democrático de Direito, o processo
constitucional e o giro linguístico. Os tempos são outros e os ventos empurram a
doutrina para uma nova postura, que exige dela mais atuação. A doutrina não pode
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subjugar-se ao ativismo judicial seletivo.
A doutrina, ao recusar o seu papel institucional, descerra um espaço a ser ocupado por
uma função estatal, que naturalmente pode se tornar (seletivamente) discricionária e
arbitrária. O déficit na atuação do cientista do direito tem contribuído eficazmente para a
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sua própria desmoralização. Em vez de construir teorias aderentes ao espaço
democrático e se valorizar, as construções doutrinárias se propõe a apenas comentar e a
estudar o“trabalho“ dos tribunais superiores. Ao se ocupar, somente, em justificar e citar
a“jurisprudência“, explicando-a, a doutrina em nada contribui para a construção do
Direito democrático, tornando-se, na verdade, um apêndice servil.
A doutrina, assim, não tem contribuído, como deveria, na aplicação do direito. Para
confirmar esta situação deficitária apresentam-se duas hipóteses: (a) a mesma não está
cumprindo a sua função em criar teorias, conceitos, entendimentos sobre as normas e
institutos jurídicos e não serve de auxílio aos sujeitos processuais no suporte
argumentativo do caso concreto; (b) os juízes, de forma consciente ou inconsciente, não
estão utilizando a doutrina como contribuição para a formação das decisões, por
entenderem que esta colaboração é inexpressiva e de pouca valia e nada acrescenta na
solução dos casos concretos.
Por outro lado, como qualquer outro contributo científico, a doutrina deve passar pelo
crivo da falseabilidade e ser corrigida por meio de teorias discursivas, de modo se
identificar e a eliminar os seus erros e lacunas, evitando os argumentos de autoridades,
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que pouco ou nada acrescentam ao conhecimento científico e à democracia. É nessa
perspectiva que a doutrina é essencial para a construção e aplicação do direito no Estado
Democrático do Direito.
A doutrina sempre orientou a formação das decisões jurisdicionais. Porém, no Brasil dos
tempos atuais, a mesma está cedendo o seu lugar, como aporte na aplicação do direito,
em favor do direito jurisprudencial. A jurisprudência, ao ocupar o lugar da doutrina, vem
contribuindo de forma negativa, como técnica tout court de motivação decisional, em
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simples atos de enumerar decisões, em flagrante ofensa ao princípio constitucional da
fundamentação das decisões, art. 93, IX e X, da CF.
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
“Essa cultura 'standard’ vem acompanhada da indústria que mais cresce: a dos
compêndios, resumos e manuais, muitos deles já vendidos em supermercados e outras
casas do ramo. Aparecem obras de todo o tipo, com 'verdadeiros’ 'pronto-socorros
jurídicos’ (SOS do direito), ao lado de livros que buscam simplificar os mais importantes
ramos do direito. Tenho receio que, em seguida surjam livros denominados, por
exemplo, de 'direito penal (já) mastigado’, inclusive com o charme dos parênteses..!
(…).
Que tempos vive(ncia)mos…A maior parte da produção doutrinária, com aspas e sem
aspas, coloca-se como caudatária das decisões tribunalícias. Parcela considerável dos
livros apenas reproduz o que o Judiciário diz sobre a lei. Esse 'já dito’ é
condensado/resumido em verbetes (ou, se quisermos ser mais sofisticados, 'enunciados
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assertóricos’). Mas, então, porque escrever livros?“.
Tal disfunção pode ser atribuída à lógica de mercado, que encampou o sistema estatal e
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repercutiu no sistema processual, a partir da década de 1990, a partir do fenômeno
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denominado“neoliberalismo processual“.
“Insisto: temos que redefinir o papel da doutrina. Nós podemos mais que isso…! E temos
que aprender a criticar as decisões dos tribunais, principalmente quando se trata de
decisões finais, daquelas que representam o 'dizer final’. E temos que ser veementes.
Caso contrário, podemos fechar os cursos de pós-graduação, as faculdades etc. E parar
de escrever sobre o direito. Afinal, se o direito é aquilo que o Judiciário diz que é, para
que estudar? Para que pesquisar? Doutrina(r)? Para quê(m)? Vamos estudar apenas
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'case law’“.
“O direito não é aquilo que o Judiciário diz que é. E tampouco é/será aquilo que, em
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
Certo é que, no sistema de common law, a aplicação do precedente não tem o condão
de funcionar como ponto de encerramento do debate jurídico, a partir de uma solução
automática de casos, ao contrário“para que um precedente seja aplicado há que se fazer
exaustiva análise comparativa entre os casos (presente e passado, isto é, o precedente),
para se saber se, em havendo similitude, em que medida a solução do anterior poderá
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servir ao atual“.
“(1) se a solução é duvidosa, os juízes devem ser cuidadosos ao impor seus próprios
remédios; (2) a precaução deve prevalecer se o Parlamento rejeitou oportunidades de
clarear uma conhecida dificuldade ou legislou deixando a dificuldade intocada; (3) as
disputas envolvendo políticas sociais são menos adequadas à intervenção judicial, que
problemas puramente legais; (4) fundamentos doutrinários não podem ser desprezados;
(5) juízes não devem empreender mudanças, a menos que possam alcançar a finalidade
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e a certeza (Grifos acrescidos)“.
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Nesse aspecto, Dworkin apresenta um contraponto entre uma abordagem jurídica de
ordem teórica e outra de ordem prática. Segundo o autor, a abordagem teórica, não é
apenas mais sedutora, é também necessária, haja vista que a alternativa prática padece
do mal de não ter absolutamente nada de prática. Assim:
Ainda que o direito norte-americano tenha como centro a construção do direito pelo
Judiciário, a partir da defesa da abordagem teórica é possível concluir que a pretensão
de Dworkin é inserir a reflexão teórica para o campo de produção do direito, em crítica
ao sistema positivista que vivenciava, mesmo porque, o autor sustenta que os juízes não
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
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devem ser encarregados da interpretação final e definitiva da Constituição.
No entanto, somente a melhoria das técnicas processuais não gerará qualquer melhoria
se não acompanhada de uma nova literatura jurídica (doutrina crítica) que demonstre a
vinculação essencial com as normas fundamentais, inclusive com a indução da promoção
de mudanças sensíveis nos regimentos internos dos tribunais e do modo de produção do
direito jurisprudencial.
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Observa-se que a“importação“ de institutos de outros sistemas pode ser benéfica,
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entretanto, não se pode fazê-la de forma automática e precipitada, pois, corre-se o
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risco de potencializar a desestruturação e o desequilíbrio do sistema jurídico.
Resta claro que o precedente caracteriza-se pela necessidade de uma abordagem ampla,
no sentido de utilizar todo o aporte teórico discutido em um caso para que seja aplicado
em casos futuros. Nessa perspectiva, a doutrina deve ser atuante, no sentido de
problematizar e fornecer substratos teóricos, para a dinamização e permanente
construção do Direito a partir dos pronunciamentos jurisdicionais.
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
Dessa forma, pode-se afirmar que a doutrina tem papel indispensável para que as
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decisões sejam formadas por meio de um fluxo discursivo, desenvolvido dentro da
estrutura procedimental.
É preciso, pois, com suporte nas lições de Streck, aproveitar o momento de elaboração
do Novo Código de Processo Civil, a fim de que a doutrina reassuma seu papel
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de“constranger epistemologicamente“ o Judiciário e apresentar fundamentos fortes
para reflexão e reformulação das condições de possibilidade de produção, interpretação
e aplicação do Direito.
7. Considerações finais
de caráter imperativo.
O direito, como pontua Dworkin, não pode ser reduzido apenas ao que foi decidido no
passado. A técnica jurídica é um exercício de interpretação, construída a partir de
proposições jurídicas. A doutrina, na construção discursiva do direito, assume uma
posição autoral na construção e na aplicação do direito e a sua modesta participação, tal
como verificada no atual cenário brasileiro, encarcera o discurso jurídico à arbitrariedade
e a discricionariedade.
Tal tendência consagra uma atuação protagonista sui generis, não se podendo garantir,
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
Resta claro que o precedente caracteriza-se pela necessidade de uma abordagem ampla,
no sentido de utilizar todo o aporte teórico discutido em um caso para que o mesmo seja
aplicado em casos futuros (Integridade).
* O problema ora enfrentado surgiu a partir das discussões desenvolvidas durante o ano
de 2013 nas disciplinas de Direito Processual Civil Comparado e Fundamentos
Constitucionais da Execução Civil, ministradas pelo primeiro autor, no curso de Mestrado
em Direito Processual da PUC-Minas. Agradecemos ao Prof. Dr. Flávio Quinaud Pedron
pela profícua interlocução.
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
7 STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência? Protogênese
do protagonismo judicial. In: MACHADO, Felipe; CATTONI, Marcelo (coords.).
Constituição e processo – entre o direito e a política. Belo Horizonte: Editora Fórum,
2011, p. 225, 227.
10 Idem, p. 76.
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
12 Idem, p. 252.
14 Idem, p. 116.
17 Frisa-se que, neste ensaio, não se pretende adentrar na discussão acerca das“fontes
do Direito“, nem tampouco as reflexões que envolvem o contexto histórico do
positivismo jurídico, no que toca ao desenvolvimento das ciências pautadas em uma
racionalidade moderna instrumental.
21 Idem, p. 171.
22 Idem, ibidem.
23 Note-se que este é um grande salto empreendido por Kelsen até então. KELSEN,
Hans. Teoria pura do direito. Trad. João Baptista Machado. 6. ed. 5.ª tir. São Paulo:
Martins Fontes, 2003, p. 387-397.
25 Idem, p. 31.
26 Idem, p. 37.
27 Idem, p. 39.
28 Idem, p. 40.
29 KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. Trad. João Baptista Machado. 6. ed. 5. tir. São
Paulo: Martins Fontes, 2003. p. 395.
30 “A interpretação feita pelo órgão aplicador do Direito é sempre autêntica. Ela cria
Direito“ KELSEN, Hans. Teoria pura do Direito. Trad. João Baptista Machado. 6. ed. 5. tir.
São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 394.
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
32 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. 20. ed. atual. ampl. São
Paulo: Saraiva, 1998, vol. 1, p. 183.
33 O linguistic turn, a partir do século XX, empreende uma ruptura com o sistema de
pensar até então vigente. Rejeitou-se o padrão racional sujeito objeto para se adotar a
linguagem como elemento fundamental da compreensão. Segundo Streck“é na
linguagem que se dá a ação; é na linguagem que se dá o sentido (e não na consciência
de si do pensamento pensante). O sujeito surge na linguagem e pela linguagem“.
STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência? 4. ed. rev. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2013. p. 14.
34 GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria geral do processo. 2. ed. Belo
Horizonte: Del Rey, 2012, p. 13.
35 GADAMER, Hans Georg. Verdade e método. Petrópolis: Vozes, 1997, vol I, p. 404. Na
mesma obra, o autor trabalha a historicidade de Heidegger, dizendo que o ser é sempre
um ser em construção. A partir daí, Gadamer aduz que a experiência hermenêutica
possibilita o diálogo (integração) entre a obra e o intérprete, e, por isso, o problema da
hermenêutica não é outro, senão, a compreensão da obra. O processo dinâmico entre
obra e intérprete é circular. Cada processo hermenêutico é limitado, único, então, cada
experiência posterior é ampliada e alterada a partir da anterior. Tal processo gera
mudança no intérprete e, paradoxalmente, haverá a transformação do intérprete, a
partir dos elementos obtidos no próprio processo hermenêutico, na forma de analisar a
obra. Todo o processo hermenêutico depende da pré-compreensão e da pré-disposição
do intérprete em estabelecer a uma relação de afinidade com a obra (filia). Daí se
conclui que, sempre haverá reconstrução e re-elaboração de preconceitos. Por isso,
Gadamer afirma que a compreensão só ocorre quando o intérprete mergulha no
horizonte da obra e retorna ao seu, só que agora, ampliado. Para Gadamer, o ato de
compreensão envolve necessariamente a dimensão da aplicação.
36 GOMES, Orlando. Introdução ao direito civil. 11. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1995, p.
48.
37 Idem, ibidem.
39 “Hoje, porém, todos nós vivemos em sociedades pluralistas que se afastam muito do
formato de um Estado-nação fundado numa população relativamente homogênea em
termos culturais. Já é enorme a diversidade das formas culturais de vida, dos grupos
étnicos, das visões de mundo e das religiões, ou no mínimo em franca expansão“.
HABERMAS, Jürgen. O Estado-Nação europeu frente aos desafios da globalização: o
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
40 DWORKIN, Ronald. Law’s empire. Cambridge: Harvard University Press, 1986, p. VI.
41 Idem, p. 228.
configura-se como um dever-ser (como deve ser algo?). Por isso, o enfoque zetético visa
saber o que é uma coisa. Já o enfoque dogmático preocupa-se em possibilitar uma
decisão e orientar uma ação“. FERRAZ JUNIOR, Tercio Sampaio. Introdução ao estudo do
direito – Técnica, decisão, dominação. 4. ed. rev. ampl. São Paulo: Editora Atlas, 2003.
p. 39 e 41.
49 Idem, ibidem.
52 Idem, p. 49.
53 “O importante aqui é a ideia de que uma investigação zetética tem como ponto de
partida uma evidência, que pode ser frágil ou plena. E nisso ela se distingue de uma
investigação dogmática. Em ambas, alguma coisa tem de ser subtraída à dúvida, para
que a investigação se proceda. Enquanto, porém, a zetética deixa de questionar certos
enunciados porque os admite como verificáveis e comprováveis, a dogmática não
questiona suas premissas, porque elas foram estabelecidas (por um arbítrio, por um ato
de vontade ou de poder)“. Idem, p. 43.
55 Idem, p. 7.
58 “We can find an even more fruitful comparison between literature and law, therefore,
by constructing an artificial genre of literature that we might call the chain novel. In this
enterprise a group of novelists writes a novel seriatim; each novelist in the chain
interprets the chapters he has been given in order to write a new chapter, which is then
added to what the next novelist receives, and so on. Each has the job of writing his
chapter so as to make the novel being constructed the best it can be, and the complexity
of this task models the complexity of deciding a hard case under law as integrity. (…).
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
Television soap operas span decades with the same characters and some minimal
continuity of personality and plot, though they are written by different teams of authors
even in different weeks. In our example, however, the novelists are expected to take
their responsibilities of continuity more seriously; they aim jointly to create, so far as
they can, a single unified novel that is the best it can be“.“Podemos encontrar uma
comparação ainda mais fecunda entre literatura e Direito, construindo, por conseguinte,
um gênero artificial de literatura que podemos chamar de romance em cadeia. Neste
projeto, um grupo de escritores escreve um romance em série, cada escritor da cadeia
interpreta os capítulos que recebeu e escreve um novo capítulo, o qual é, então,
adicionado ao próximo escritor, e assim por diante, cada escritor tem o trabalho de
escrever seu capítulo de modo a tornar o romance que está sendo construído o melhor
possível. E a complexidade destas tarefas modela a complexidade de decidir um hard
case sob a concepção do Direito como Integridade. (…). Novelas televisivas se estendem
por décadas com os mesmos personagens e mínima continuidade de personalidade e
enredo, embora sejam escritas por diferentes times de autores mesmo em diferentes
semanas. No nosso exemplo, no entanto, os escritores devem assumir as suas
responsabilidades de continuidade mais seriamente, pois eles visam criar
conjuntamente, tanto quanto possível, um único e unificado romance, que é o melhor
que pode ser“ (tradução livre). DWORKIN, Ronald. Law’s empire cit., p. 229.
61 NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático: uma análise crítica
das reformas processuais. 1. ed. 4. reimpr. Curitiba: Juruá, 2012.
65 DWORKIN, Ronald. O império do direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 287 e
ss.; DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. São Paulo: Martins Fontes, 2001. p.
221 e ss.
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A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
300.
78 STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência? cit., p.
82-83.
82 Idem, p. 159.
83 Idem, ibidem.
84 Idem.
85 Idem, p. 163.
86 Idem, p. 164.
87 Idem, p. 167.
88 STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência? cit.
89 Nesse sentido, a crítica de Bahia e Nunes:“O que se critica é que após todos os
avanços da teoria do direito e da ciência jurídica, se aceite a reprodução, mesmo sem se
perceber, de uma peculiar aplicação do positivismo normativista da jurisprudência dos
conceitos (Begriffsjurisprudenz), que defendia a capacidade do Judiciário criar conceitos
universais; um sistema jurídico fechado que parte do geral para o singular e que chega a
'esse’ geral com a negligência às singularidades. Perceba-se: nos séculos XVIII e XIX
acreditava-se que o legislador poderia fazer normas 'perfeitas’, gerais e abstratas de tal
forma que seriam capazes de prever todas as suas hipóteses de aplicação. Descobrimos
no século XX que isso não é possível (que, e.g., por detrás de toda pretensa objetividade
da lei estavam os preconceitos daquele que a aplicava). Agora, em fins do século XX e
início deste apostamos, mais uma vez, no poder da razão em criar regras perfeitas,
apenas que agora seu autor não é mais (só) o legislador mas (também) o juiz“. BAHIA,
Alexandre; NUNES, Dierle. Falta aos tribunais formulação robusta sobre precedentes.
Revista Conjur. Disponível em:
[http://www.conjur.com.br/2014-jan-07/falta-aos-tribunais-formulacao-robusta-precedentes].
Acesso em: 21.01.2014.
da edição da Súmula Vinculante 14/2009“a súmula vinculante não era algo passível de
interpretação, pois deveria ser suficientemente clara para ser aplicada sem maior
tergiversação“. Disponível em:
http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=102548. Acesso
em: 20.07.2013.
91 STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência? cit., p. 116.
94 STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência? cit.
96 STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – decido conforme minha consciência? cit., p. 83.
97 Idem, p. 117.
98 GONÇALVES, Aroldo Plínio. Técnica processual e teoria geral do processo. 2. ed. Belo
Horizonte: Del Rey, 2012. p. 173.
102 NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre. Falta aos tribunais formulação robusta sobre
precedentes. Revista Conjur. Disponível em:
[http://www.conjur.com.br/2014-jan-07/falta-aos-tribunais-formulacao-robusta-precedentes].
Acesso em: 21.01.2014.
103 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. O processo civil brasileiro entre dois mundos.
Temas de direito processual civil: oitava série. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 45, 49, 52.
104 WHITTAKER, Simon. Precedent in English law: a view from the citadel. In:
HONDIOUS, Ewoud (editor). Precedent and the law. Utrecht: Bruylant Bruxelles, 2007,
p. 29-73.
106 WHITTAKER, Simon. Precedent in English law: a view from the citadel cit., p. 29-73.
Tal aspecto possibilita vislumbrar a dimensão do Direito como Integridade.
107 “This statement is too concise because it does not indicate that the only part of a
previous case which is binding is the ratio decidendi (reason for deciding)“.“Essa
declaração é muito concisa, porque não indica que a única parte de um caso anterior,
que é vinculativa é a ratio decidendi (razão de decidir)“ (tradução livre). CROSS, Rupert;
HARRIS, J. W. Precedent in english law. 4. ed. reimpr. New York: Oxford University
Press. 2004, p. 39.
108 WHITTAKER, Simon. Precedent in English law: a view from the citadel cit., p. 29-73.
112 Tradução livre. No original:“(1) if the solution is doubtful, the judges should beware
of imposing their own remedy; (2) caution should prevail if Paliament has rejected
opportunities of clearing up a know difficulty or has legislated while leaving the difficulty
untouched; (3) disputed matters of social policy are less suitable áreas for judicial
intervention than purely legal problems; (4) fundamental legal doctrines should not be
lightly set aside; (5) judges should not make a change unless they can achieve finality
and certainty“. WHITTAKER, Simon. Precedent in English law: a view from the citadel
cit., p. 65.
113 DWORKIN, Ronald. A justiça de toga. Trad. Fernando Santos; revisão técnica Alonso
Reis Freire. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010.
Página 27
A contribuição da doutrina na (con)formação do direito
jurisprudencial:
121 NUNES, Dierle José Coelho. Processo jurisdicional democrático. Curitiba: Juruá.
2008. p. 159.
122 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Notas sobre alguns aspectos do processo (civil e
penal) nos países anglo-saxônicos. Temas de direito processual civil: sétima série. São
Paulo: Saraiva, 2001. p. 155-159.
124 Humberto Ávila exemplifica esta situação a partir do instituto da modulação dos
efeitos na ação direta de inconstitucionalidade, que transferido do sistema normativo
alemão, que adota o sistema do civil law, para o Brasil, teve a sua aplicação distorcida
pelo Supremo Tribunal Federal. In: Relativização da Coisa Julgada e a Modulação
Temporal das Decisões do STF. Palestra proferida pelo Professor Humberto Ávila durante
o IV Congresso Brasileiro de Direito Tributário, realizado nos dias 31.10.2011 e
01.11.2011 em Salvador, Bahia. Disponível em:
[http://www.humbertoavila.com.br/site/category/palestra/]. Acesso em: 07.06.2013.
125 NUNES, Dierle; BAHIA, Alexandre. Falta aos tribunais formulação robusta sobre
precedentes. Revista Conjur. Disponível em:
http://www.conjur.com.br/2014-jan-07/falta-aos-tribunais-formulacao-robusta-precedentes.
Acesso em: 21.01.2014.
129 “Assim, toda decisão deve ser resultado de um fluxo discursivo balizado por um
procedimento embasado nos princípios fundamentais (processo) que permita uma
formação processual de todo exercício de poder“. NUNES, Dierle José Coelho. Processo
jurisdicional democrático… cit., 2012, p. 203.
130 STRECK, Lenio Luiz. Porque agora dá para apostar no projeto do novo CPC. Revista
Conjur. Disponível em:
[http://www.conjur.com.br/2013-out-21/lenio-streck-agora-apostar-projeto-cpc].
Acesso em: 21.10.2013.
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