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PUC-SP
Mestrado em Direito
São Paulo
2012
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Mestrado em Direito
São Paulo
2012
Ficha Catalográfica
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Dedico este trabalho ai miei cari genitori: Ao meu
pai Mário, de quem herdei o amor pelo Direito e,
máxime pelo tema.
À minha mãe Isa, pelo incondicional apoio e
confiança.
À minha cidade, Santos, cuja realidade, foi fonte de
inspiração para esta dissertação.
AGRADECIMENTOS
Em especial, ao meu orientador Prof. Eduardo Alvim, quem muito admiro e sempre
Científico e Tecnológico (CNPQ), pela bolsa integral de estudo com que fui contemplada.
Santos
A Constituição Federal incluiu os terrenos de marinha entre os bens pertencentes à União (art.
20, VII). Contudo, sua definição é extraída do art. 2º do Decreto lei n. 9760/46. Orientada
pelos critérios temporal (preamar média do ano de 1831) e espacial (33 metros), sua
delimitação está relacionada ao próprio conteúdo do conceito das marinhas. É, pois senão o
mais tormentoso tema correlato, o principal cerne da problemática. Sem embargo,
característica comum às diversas espécies de terrenos de marinha são as águas salgadas, -
sempre – à mercê da influência do regime luni-solar.
São bens dominicais que constituem o patrimônio disponível da União, cujo título remonta
aos tempos imemoriais, pelo direito de conquista. Também conhecidos como terras de
marinha, salgados ou terras salgadas, a primeira menção que se tem notícia - sob a alcunha
de salgados - foi feita na Carta Régia de 04 de dezembro de 1678, embora as mais famosas
datem de 21 de outubro de 1710 e 10 de janeiro de 1732.2 Praxe administrativa do Brasil-
Colônia, sua primeira figuração em corpo legislativo, ocorreu somente com a edição da Lei
Orçamentária de 15 de novembro de 1831. Seus principais contornos são encontrados nas
lezírias portuguesas – também, poeticamente intituladas filhas do Tejo - cuja figura
tipicamente reinol, guarda os traços do aforamento, com resguardo da propriedade pública
marginal. Da necessidade de existência de faixas livres à beira-mar para embarque e
desembarque de mercadorias, importou-se o modelo implantado nas áreas destinadas às
marinhas do sal ou salinas portuguesas. Assim, da associação das lezírias com as marinhas do
sal, criou-se o instituto por nós conhecido como terrenos de marinha. Contrariamente ao
sustentado pela doutrina, similar instituto é encontrado em terras lusitanas – são bens que
compõem o domínio público hídrico do Estado, com resguardo de faixa de 50m (Decreto-lei
468/71, art. 3º), cedido por intermédio de licenças ou concessões, mediante pagamento de
1
SANTOS, Rosita de Sousa. Terras de Marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 77
2
CALVANCANTI, Themistocles Brandão. op. cit., p. 407
taxa. Com vistas mais econômicas, do que de salvaguarda, percorridos séculos, a finalidade
das marinhas brasileiras permanece inalterada: trata-se de importante fonte arrecadatória
estatal. À míngua de critérios seguros para determinação da linha de preamar de 1831, cede-se
espaço ao sistema de presunções, tomando-se por público o que é alodial, e vice-versa, ao
arrepio da lei. Transcorridos mais de 180 anos da primeira referência legal - e mais de 500
anos do descobrimento do Brasil - não há completa demarcação.3 Tal quadro permanece
inalterado.4Apenas isto, já por si, justifica a necessidade do presente estudo: carente de idônea
sistematização, a segurança jurídica cede espaço às interpretações arbitrárias e subjetivas,
quer dos órgãos públicos, quer dos aplicadores do Direito. Bastante aquém de sua extrema
relevância, as poucas passagens encontradas nos manuais e artigos destinados ao tema, não
condizem com seus reflexos sociais diretos. Constatou-se, enfim, a premente necessidade do
estudo. Assim, ante a extensão do tema e na tentativa de trazer singela contribuição,
restringiu-se, a presente dissertação, à análise dos terrenos de marinha costeiros. Para tanto,
foram pesquisados os diversos aspectos jurídicos que envolvem o tema, não se olvidando do
viés prático-procedimental. Ilustrativamente, foram inseridas – pontualmente - algumas
reproduções de quadros do pintor santista Benedito Calixto, trazendo-se cores e contornos à
teoria. Buscou-se, enfim, demonstrar quão precário é nosso sistema de demarcação,
abandonado ao alvedrio fiscal, com repulsa à legalidade. Tal é nosso desiderato: um estudo
histórico e útil acerca dos terrenos de marinha costeiros.
3
SANTOS. Rosita de Sousa. Terras de Marinha, Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 122
4
KIOITSI CHICUTA e outros, Terrenos de Marinha – Instituto Jurídico Tipicamente Brasileiro, IRIB, 2001,
pg. 80.
ABSTRACT
“...and the report tells us of how many and of the lot that has ambitioned
them, although there was not missing those whom, such as the fox on the
tales, had christened the ridiculous extension of 3 meters, which no one
knows neither where it begins nor where it ends.”5
The Federal Constitution has included the naval coastal lands as property belonging to the
Union (art.20, VII).Nevertheless, its definition is extracted from the article Decree-law
9760/46. Oriented by the temporal criteria (average high tide of the year 1831) and spatial (33
meters), its delimitation is related to its own content of the concept of marine. It is because if
not the most stormy theme correlate, the main core of the problematic. Nevertheless, common
characteristic to the many species of marine lands are the salty waters, - always – subject to
the natural influences of the lunar-solar scheme. They are governmental property which
constitute available goods of the Union, which title goes back to immemorial times, by the
right of the conquest. Also known as marine lands, salty or salty lands, the first mention of
which there is notice of – under the denomination of salty – was made at the Royal Letter of
the 4th of December of 1678, although the most famous date back from the 21st of October of
1710 and the 10th of January of 1732.6Administrative practice in the Brazil-Colony, its first
appearance in the legislative body, occurred only with the first edition of the Budget Law of
the 15th of November of 1831. Although without counterparts in the foreign legislation –
found in the Portuguese lezirias – also, poetically referred to as the daughters of the Tejo –
which figure is typically kingly, bears the traces of tenure, with respect to the marginal public
property. With regards to the existence of free coastal areas for loading and unloading of
merchandise, the implemented model was imported from the areas designed for the salty
marines or Portuguese salty marines. Therefore, from the association of the LEZIRIAS with
the salty marines, it was created the institute by us known as marine lands. Contrary to the
supported by the doctrine, similar institution is found in Portuguese lands - they are goods that
comprise the hydric public domain of the State, with guard band of 50 meters (Law Decree
467/81, article 3rd), yielded by means of licenses and concessions, by means of tax payments.
5
SANTOS, Rosita de Sousa. Terras de Marinha. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 77
6
CALVANCANTI, Themistocles Brandão. op. cit., p. 407
With further economic vision, rather than of safeguard, throughout centuries, the purpose of
the marines remain unaltered: it refers to important source of state tax collecting. Lacking safe
criteria for the determination of the high tide line of 1831, it is given space to the system of
presumptions, becoming public what is allodial, and vice-versa, in defiance of the law.
Elapsed more than 180 years of its first legal reference – and more than 500 years of the
discovery of Brazil – there is no complete demarcation.7Such situation remains unaltered, as
reiterated in recent study.8 Just this, by itself, justifies the need of the present study: in need of
suitable systematization, the legal security gives margin to arbitrary and subjective
interpretations, being from the public organs, being from the law enforcers. Furthermore and
far beyond its extreme relevance, the few and sparse passages found in the manuals and
articles destined to the subject, do not suit its direct social relexes. It was thus found, the
primordial need of such study. Being so, given the extension of the subject and in the attempts
of making a candid contribution, it was restricted to the present dissertation, to the analysis of
the marines. Moreover, it was researched the various legal aspects which entail the subject,
not forgetting the practical procedural aspects. By way of illustration, it was inserted paintings
from the painter, Benedito Calixto, from Santos, giving colours and contours to the theory. It
was thus aimed, to demonstrate how precarious is our system of demarcation, abandoned to
the tax discretion, with repulse to legality. Such is our aim: a historical and useful study
regarding the marines.
7
SANTOS. Rosita de Sousa. Terras de Marinha, Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 122
8
KIOITSI CHICUTA e outros, Terrenos de Marinha – Instituto Jurídico Tipicamente Brasileiro, IRIB, 2001,
pg. 80.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO................................................................................................................ 14
Capítulo IV – Enfiteuse................................................................................................... 93
4.1. Evolução do instituto ............................................................................................ 93
4.2. Características ....................................................................................................... 99
4.3. Enfiteuse nos terrenos de marinha......................................................................... 103
4.4. Ocupação................................................................................................................ 104
4.5. Laudêmio, foro e taxa de ocupação........................................................................ 106
4.6. Extinção do aforamento......................................................................................... 111
CONCLUSÃO.................................................................................................................. 114
Introdução
São mais de 8.500 km de zona costeira neste país, onde se concentram ¼ (um quarto)
Nesta vasta faixa litorânea, aproximadamente 700.000 (setecentos mil) imóveis são
Assim, são milhares de cidadãos que possuem seus imóveis localizados nos
Exemplo desta realidade, é a cidade do Recife com cerca de 60% (sessenta por cento)
de sua área, sob alegação de domínio público. Na Baixada Santista seriam cerca de 40.000
(quarenta mil) imóveis tidos como pertencentes à União. Já no Estado de Santa Catarina,
estima-se que 150.000 (cento e cinquenta mil) imóveis pertencem ao domínio público, sendo
público, a escrever já em 1913, que hoje decorridos 81 (oitenta e um) anos da execução dessa
1
J. X. Carvalho de Mendonça, “Os Terrenos de Marinha e os Interesses da União, dos Estados e das
Municipalidades”, Revista O Direito, vol. 85, p. 87
2
RODRIGUES, Rodrigo Marcos Antônio. Curso de terrenos de marinha e seus acrescidos. São Paulo: Nelpa, p.
93
3
CASTRO, Juliana Maria Cerutti. PASTORE, Rodrigo Reis. Terrenos de Marinha: Abordagem Catarinense de
um problema nacional. Disponível no endereço eletrônico:
<http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/19224-19225-1-PB.htm>
15
lei, não se encontram elementos que permitam marcar ou afirmar qual era a linha do preamar
Com efeito, passados mais de dois séculos, ainda não houve completa demarcação.
de legalidade.
Esta tardia decisão administrativa acarreta – muita vez - importante consequência aos
Consequentemente, para além dos efeitos individuais gerados, a ordem jurídica toda
- nascido como garantia do indivíduo frente ao próprio Estado, cede espaço aos atos
Mas, não é só: estes tardios atos demarcatórios são eivados de graves vícios, posto
que lastreados em critérios acientíficos que, para além de utilização de critérios ilegais – com
aumento do nível do mar.Em suma: toma-se por público o que é alodial – e vice-versa - em
repulsa da lei.
4
RODRIGUES, Jorge Martins. A lei e a realidade na questão dos terrenos de marinha. Publicado no jornal
Atribuna, em 28-09-1976
16
costeiros.
devolutas.
demarcação dos terrenos de marinha, para ao final, no quarto capítulo, encerrarmos com o
esclarecimento de tema tão obscuro, quanto desconhecido, quer seja pelo público em geral,
1.Definição
Muitos acreditam que são áreas de propriedade da Marinha, ou seja, relacionado ao Ministério
da Marinha. Contudo o adjetivo marinha tem origem em mar, sem qualquer relação com as
5
Decreto lei 9760/46, art. 2º.
6
Código de águas, art. 13; O ponto a que se refere considera-se ao estado e ao tempo da execução do art. 51,§14,
da lei de 15/11/81
7
MELO, Lia dos Reis. PUGLIESE, Roberto J. Dos terrenos de marinha e seus acrescidos. São Paulo: Letras
Jurídicas, 2009, p.62, em citação à PUGLIESE, Roberto J. Terrenos de Marinha. Jornal de Iguape, 1979, Iguape,
São Paulo.
18
influência exercida pelas marés, até a distância de 33 metros contados da linha da preamar
A fixação está, pois, relacionada com a influência direta ou indireta das marés nas
Vale dizer: em áreas banhadas por águas salgadas, sob influência do regime luni-
solar.
Afora a influência das marés às margens dos rios e lagoas, são terrenos reservados e
Outrossim e embora a definição trazida pelo art. 2º, do Decreto 9.760/46 esteja
vigente, há quem entenda que os 33 metros foram revogados pelo §3º, do artigo 49 dos Atos
8
CAVALCANTI. Themistocles Brandão. Tratado de Direito Administrativo. vol. III, 3ª ed., Livraria Freitas
Bastos S.A., São Paulo, 1976, p. 406
9
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo.21ª ed.,São Paulo: Malheiros,
2006, p. 874/875
19
decreto, restando, portanto, ainda, à lei definir o conceito de faixa de segurança, inadmitindo,
Sem embargo, não nos parece que tenham razão. A aludida faixa de segurança
constante na ADCT, nada mais é que uma referência ao conceito legal estatuído pelo decreto
9760/46. Aliás, admitindo a correção desta corrente, terrenos de marinha, somente existiriam
na orla marítima, o que, embora seja objeto exclusivo deste trabalho, não corresponde à
Nada obstante, sua primitiva caracterização foi esboçada pela Ordem Régia de 10 de
“ (...) da linha d’agua para dentro sempre são reservadas 15 braças pela
borda do mar para serviço publico, nem entrão em propriedade alguma dos
confinante com a marinha e tudo o quanto allegarem para apropriar do
terreno é abuso inattendivel.”
10
MELO, Lia dos Reis. PUGLIESE, Roberto J. Dos terrenos de marinha e seus acrescidos. São Paulo: Letras
Jurídicas, 2009, p.62, em citação à CAZETTA, Luís Carlos. Legislação imobiliária da união: anotações e
comentários à lei básica, p. 27
20
Neste contexto, craveiro era instrumento apto a mensurar a altura, braça era medida
utilizada, à época, correspondente aos atuais metros ( 2,20 m) e preamar, a maré alta.
1831, regulamentada pela instrução normativa n. 348 - que os terrenos de marinha passaram a
Sua expansão deu-se com o Decreto lei 2.490, de 16 de agosto de 1940, que acresceu
ao clássico conceito das marinhas as faixas de terras marginais situadas em rios e lagoas, até
Com efeito, não se desnaturou: isto porque a influência das marés acabam por tornar
Logo, à existência das marinhas remete-se sempre a idéia de água salgada (influência
das marés).
Nada obstante, distinguem-se as terras de marinha das praias, pois estas, desde os
11
RODRIGUES, Jorge Martins, op. cit.
12
Pelo decreto 4120/42 buscou-se alterar a linha do preamar para máxima atual, em substituição ao ano de 1831.
Contudo, revogado em pouco tempo pelo decreto 9760/46, cuja opção foi pela tradição – ou seja, preamar do ano
de 1831.
13
Revista de Direito Administrativo, vol. 2, p. 282
21
Já no Direito Romano a res humani juris, dividia-se em res publicae, que eram os
bens tidos como propriamente de uso comum do povo, como rios, estradas, portos, e res
corrente, mar e seu litoral, como visto no Digesto de Justiniano: “Algumas coisas são por
Esta ideia presente no Direito Romano e vista até os dias atuais foi reproduzida na
“Me parece odernar-vos não consintaes se aproprie pessoa alguma das praias do
mar por ser commum para todos os moradores e assim o mandareis declarar por
edital e quem violentamente obrar o contrario procedereis contra elle.”15
porção de terra necessária ao desenvolvimento das marés e, é isto que está disciplinado no
“Art. 10. As praias são bens públicos de uso comum do povo, sendo
assegurado, sempre, livre e franco acesso a elas e ao mar, em qualquer
direção e sentido, ressalvados os trechos considerados de interesse de
segurança nacional ou incluídos em áreas protegidas por legislação
específica.
§ 1º. Não será permitida a urbanização ou qualquer forma de utilização do
solo na Zona Costeira que impeça ou dificulte o acesso assegurado no caput
deste artigo.
§2º. A regulamentação desta lei determinará as características e as
modalidades de acesso que garantam o uso público das praias e do mar.
§3º. Entende-se por praia a área coberta e descoberta periodicamente pelas
águas, acrescida da faixa subseqüente de material detrítico, tal como areias,
14
RODRIGUES, Curso de Terreno de Marinha e seus acrescidos, op. cit., p. 123
15
OTÁVIO. Rodrigo. Do domínio da União e dos Estados segundo a Constituição Federal. 2ª ed., 1942, Livraria
Acadêmica, Saraiva & Editores, Largo do Ouvidor, SB, São Paulo, nota de rodapé n. 79, p. 72
22
à mercê das marés, que se prolonga, sem solução de continuidade, na praia até o limite da
maré alta.16
Desta forma, é praia – spiaggia - a porção de terra coberta pelo mar nas maiores
Nesta senda, importa acrescer que a zona costeira é patrimônio nacional “e sua
contados horizontalmente para a parte da terra, a partir da preamar média do ano de 1831.
As praias são bens de uso comum do povo, inalienáveis e de livre acesso à todas as
Nesta linha de raciocínio, importa salientar que a modificação do nível das águas e a
utilização da linha do preamar do ano de 1831, pode gerar curiosa situação: a confusão das
faixas de marinha com as praias. Assim, em que pesem os institutos serem diferentes algumas
vezes podem misturar-se a tal ponto em que as marinhas, serão de uso comum do povo.
Isto porque, mister se faz a proteção do livre acesso às praias e ao mar, razão pela
qual, embora inicialmente as faixas de marinha sejam bens dominicais – como veremos – a
tendência será considerá-la como de uso comum do povo, ante a confusão fática com o
ambiente praial.
16
TÁCITO, Caio. Temas de Direito Público (Estudos e Pareceres). 2º vol, Rio de Janeiro: Renovar, 1997, p.
1739
17
Art. 225,§4º, CF: A Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Matogrossense e a Zona
Costeira, são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro das condições que assegurem
à preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.”
23
Diferem-se os terrenos de marinha dos acrescidos de marinha, por serem estes uma
acessão natural ou artificial, para o lado do mar ou dos rios e lagos, além dos limites e em
São formações, sem extensão definida, fruto da ação da natureza, por força do
deslocamento feito pelos ventos ou águas de materiais detríticos, ou, ainda, pela ação humano,
os terrenos de marinha são tidos pela doutrina como figura tipicamente brasileira.
Para esta, seus contornos – faixa marginal de titularidade pública com extensão pré-
definida - não encontram pares no direito alienígena, como leciona Rosita de Sousa Santos:
“Não existe este conceito, nem mesmo sua figuração, por mais tênue que seja, mas fontes
portuguesas.”18
18
SANTOS, Rosita de Sousa. Terras de Marinha. Rio de Janeiro: Forense. 1985, p. 4
19
OCTÁVIO. Rodrigo. Op. cit., p. 72, nota de rodapé n. 79
24
como ensina Manoel Madruga:“Pelo antigo direito portuguez, segundo o qual as praias eram
Esta suposta ausência de figura análoga, levou Rosita Santos a afirmar que tornar-se-
ia sem significação a criação de expressões como marine land ou rivage de la mer, ou outra
semelhante. Verbis:
Logo, para pouca doutrina existente sobre o assunto, mesmo ao buscarmos suas
raízes no direito luso – cuja criação, nos restou como legado - não encontraríamos figura
análoga, muito embora no Direito Romano, fosse permitida a edificação por particulares nas
dos institutos nas chamadas marinhas do sal ou salinas, terras estas que em Portugal, eram
reservadas ao patrimônio público, para preparo do sal, (Ordenações Filipinas, L. II, Tít.
20
MADRUGA, Manoel. Terrenos de Marinha. Vol. 1. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1928, p; 65
21
SANTOS, Rosita de Sousa. Op. cit., p. 9.
22
OCTAVIO. Rodrigo. Op. cit., p. 73
23
SANTOS, p. cit., p. 4.
25
Assim, defendem que bastante provável que delas – as marinhas do sal - tenha-se
mercadorias. 24
se até onde alcançar o colo da máxima praiamar das marés vivas, estabelecendo-se, ainda,
uma faixa de 50 m a contar da praia para fiscalização das autoridades marítimas (art. 14,§3º).
Embora este decreto buscasse a regulamentação dos bens de domínio público, sua
disciplina era de sobremaneira tormentosa. Desta sorte, sobreveio o decreto-lei 468/71, a reger
“ARTIGO 1.º
(Âmbito de aplicação)
Os leitos das águas do mar, correntes de água, lagos e lagoas, bem como as
respectivas margens e zonas adjacentes, ficam sujeitos ao preceituado no
presente diploma em tudo quanto não seja regulado por leis especiais ou
convenções internacionais.
ARTIGO 2.º
(Noção de leito; seus limites)
24
Eram zonas protegidas no litoral português. Remontando à época pré-romana, na Etrúria as áreas de onde era
extraído sal não podiam ser objeto de apropriação privada. De outra parte, há indícios de enclaves ou zonas de
exclusão no litoral das ex-colônias portuguesas, como Angola, Moçambique e etc., as quais podem ter origem
nos antigos decretos reinóis.
26
ARTIGO 3.º
(Noção de margem; sua largura)
1. Entende-se por margem uma faixa de terreno contígua ou sobranceira à
linha que limita o leito das águas.
2. A margem das águas do mar, bem como a das águas navegáveis ou
flutuáveis sujeitas à jurisdição das autoridades marítimas ou portuárias, tem
a largura de 50 m.
3. A margem das restantes águas navegáveis ou flutuáveis tem a largura de
30 m.
4. A margem das águas não navegáveis nem flutuáveis, nomeadamente
torrentes, barrancos e córregos de caudal descontínuo, tem a largura de 10
m.
5. Quando tiver natureza de praia em extensão superior à estabelecida nos
números anteriores, a margem estende-se até onde o terreno apresentar tal
natureza.
6. A largura da margem conta-se a partir da linha limite do leito. Se, porém,
esta linha atingir arribas alcantiladas, a largura da margem será contada a
partir da crista do alcantil.”
27
– esta linha é contada a partir da linha da máxima preia-mar das águas vivas equinociais até
privada aos que comprovadamente demonstrem posse ou propriedade anterior ao ano de 1864
ou 1868, conforme o caso, como se observa da leitura do art. 8º, deste mesmo decreto. Verbis:
“ARTIGO 8.º
(Reconhecimento da propriedade privada sobre parcelas de leitos ou
margens públicos)
1. As pessoas que pretendam obter o reconhecimento da sua propriedade
sobre parcelas de leitos ou margens das águas do mar ou de quaisquer
águas navegáveis ou flutuáveis devem provar documentalmente que tais
terrenos eram, por título legítimo, objecto de propriedade particular ou
comum antes de 31 de Dezembro de 1864 ou, se se tratar de arribas
alcantiladas, antes de 22 de Março de 1868.
2. Na falta de documentos susceptíveis de comprovar a propriedade dos
terrenos nos termos do n.º 1 deste artigo, presumir-se-ão particulares, sem
prejuízo dos direitos de terceiros, os terrenos em relação aos quais se prove
que, naquelas datas, estavam na posse em nome próprio de particulares ou
na fruição conjunta de indivíduos compreendidos em certa circunscrição
administrativa.
3. Quando se mostre que os documentos anteriores a 1864 ou a 1868,
conforme os casos, se tornaram ilegíveis ou foram destruídos por incêndio
ou facto semelhante ocorrido na conservatória ou registo competente,
presumir-se-ão particulares, sem prejuízo dos direitos de terceiros, os
terrenos em relação aos quais se prove que, antes de 1 de Dezembro de
1892, eram objecto de propriedade ou posse privadas.
4. Não ficam sujeitos ao regime de prova estabelecido nos números
anteriores os terrenos que, nos termos da lei, hajam sido objecto de um acto
de desafectação.”
28
Seu uso, igualmente como sucede na legislação pátria, é admitido através de licenças
ou concessões do poder público (art. 18), sob pagamento de taxa (art. 24). É prevista, também,
a forma de ocupação.25
dispõe em seu art. 15, que os particulares que pretendam reconhecimento de sua propriedade
privada, o façam mediante ação judicial até 01 de janeiro de 2014, comprovando que tais
terrenos eram por título legítimo, propriedade particular ou comum antes de 31 de dezembro
25
Diversos diplomas posteriores buscam esclarecimentos da matéria, conquanto as diretrizes permaneçam sob à
égide do Dec.468/71. Ver Decreto-lei 70/90
26
CORDEIRO, Antonio Menezes. Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, Tomo II, Coisas, 2ª ed.,
Coimbra: Almedina, 2009, p. 65.
29
resguardo de uma faixa de terras marginais, sob titularidade do domínio público, em harmonia
a legislação brasileira.
legítimo até o ano de 1864 ou 1868, conforme o caso, demonstra que antes disto a
aos colonizadores.
Todavia não se pode dizer que, embora, transplantado o regime jurídico das marinhas
brasileiras para o solo português, tratava-se de inovação lusitana para o solo nacional.
apontam para as lezírias ou lizírias, cuja figura é tipicamente reinol, com elementos do
aforamento e resguardo público de terras marginais fluviais, inicialmente com vistas à defesa
e povoamento.
Sua etimologia do árabe (al-jazira – ilha), tem significação de ilhas de terra que o rio
São, pois, porções de sedimentos fluviais que emergem ligeiramente acima do nível
médio das águas, às margens do rio Tejo – por isso, poeticamente intituladas filhas do Tejo.
os primórdios. Verbis:
27
BEIRANTE, Maria Ângela. O Tejo na construção do poder na idade média portuguesa – de D. Afonso I à D.
João I. Disponível em: http://ler.letras.up.pt/uploads/ficheiros/4034.pdf
30
Enfim, por ser rio navegável e de grande extensão, o Tejo teve importância no
deslocamento mouro pela península ibérica, daí a preocupação da defesa e povoamento das
áreas marginais, tidas como pertencentes à Coroa, pelo direito de conquista.30 Neste sentido:
“Os textos que documentam o contencioso das lezírias provam que, por
necessidades de defesa e povoamento os primeiros reis portugueses
concederam algumas destas terras aos concelhos e ordens militares.”31
A partir do século XII, D. Dinis, conhecido como rei lavrador, cedeu grande parte
das lezírias à Ordem do Templo e outras menores, despendendo grande fortuna na proteção e
28
MADALENO, Isabel Maria. Companhia das Lezírias: passado e futuro. Hispania nova, revista de historia
contemporânea. Disponível em: http://hispanianova.rediris.es/6/articulos/6a001.pdf
29
BEIRANTE, Maria Ângela. O Tejo na construção do Poder Real na idade média portuguesa – de D. Afonso I
à D. João I, Revista da Faculdade de Letras, p.774
30
A importância do rio Tejo, está também relacionada à fundação da cidade de Lisboa. Conta a lenda que
Ulysses após o fim da guerra de Tróia, chegou às terras hoje em que se localizam a cidade, pelas águas do Rio
Tejo.
31
BEIRANTE, Maria Ângela. Op. cit., p. 775
31
concessão de benefícios, com dispensa dos serviços militares e isenção de impostos, aos
domínio útil operada pelas cartas de doação e cobrança de rendas, tudo em nome do Poder
O chefe desta repartição era o provedor, a quem incumbia a concessão das terras,
com delegação de funções de cobrança e jurisdição contenciosa aos almoxarifes, como visto
“Toda a pessoa que lavrar terras das lizirias (de Villa Franca), seja por
arrendamento ou sub-arrendamento, matação ou doação, seja lavrador ou
parceiro do lavrador, ou seareiro, ou qualquer outro título, não levante o
pão da eira sem primeiro o partir, e pagar os direitos da R. fazenda dos
Almoxarifes, sob as penas do Regimm. as quaes os mesmos Almoxarifes logo
executem. Rgm.II,322.”34
Outrossim, as regras gerais, então vigentes, eram disciplinadas pelo Regimento das
Pelo regimento do juízo do Tombo, n. 115, do ano de 1586, acerca dos usos dos bens
32
BEIRANTE, Maria Ângela. Op. cit., p. 77. Assinala a autora que a doação feita a D. João Peres de Aboim, era
jure hereditario.
33
Arquivo nacional da Torre do Tombo. Disponível em: http://digitarq.dgarq.gov.pt/details?id=4310504
34
CARNEIRO, Manoel Borges. Resumo Chronologico das leis mais uteis no foro e uso da vida civil. Tomo I,
1818, p.280
32
Cosme Rangel que vá fazer o tombo dos bens e cousas na dita Comarca,
regulando-se pelo presente regimento.”35
Assim, quando o assunto eram lezírias, diversos eram os contratos que disciplinavam
as questões, sendo ora regulados pelos arrendamentos, e outrora por aforamento. Em regra,
aos pequenos cultivadores os contratos eram de arrendamento, aos grandes a concessão dava-
se por aforamento.
agravada pelas invasões francesas, fuga da família Real ao Brasil, e abandono das terras.
Contudo, as lezírias foram alienadas pela Coroa Portuguesa, para satisfação das
despesas correntes do tesouro, em hasta pública, tendo sido arrematadas em 1836, pela, ainda,
Nada obstante, e embora não tenhamos encontrado na pouca doutrina existente sobre
terrenos de marinha, a alusão à figura das lezírias como origem do instituto, da análise
Esta estrutura jurídica, política e fiscal para concessão de terras e cobrança de suas
rendas é vista claramente nos poderes outorgados aos donatários das capitanias hereditárias no
Brasil.
35
CARNEIRO, op. cit, p. 286
33
De todo modo, acredita-se que a origem dos terrenos de marinha, seja proveniente do
regime jurídico e de defesa implantado nas lezírias do Ribatejo, tendo sido posteriormente, em
virtude da proibição da concessão das marinhas por sesmarias, associado às faixas livres
Desta sorte, tudo está a indicar que a ideia das marinhas brasileiras, cuja origem
provável remonta às lezírias do Ribatejo, foi no século XIX transplantada para Portugal,
Português, aos particulares que comprovem por título legítimo, que os terrenos eram
1.3 Finalidade
povoamento e defesa das recém-descobertas terras, por intermédio das cartas de doação e
pela ocupação destas faixas de terras, culminou com a proibição real das concessões, como
36
Deste tópico, trataremos com mais vagar no item destinado às sesmarias.
34
desembarque, e livre passagem das rendas,38 assim como ocorria com relação ao sal nas
Logo, o sal, a pesca, o pau Brasil, o ouro e os lucros trazidos por estes produtos à
Até mesmo a defesa do território tida como função primária do instituto, era
Ruy Cirne Lima: “Do começo, nada éramos mais, na verdade, do que uma grande
feitoria...”40
Tal retrato foi bem representado por Benedito Calixto, neste quadro denominado
trapiche:
37
SANTOS, op. cit., p. 117
38
Este motivo consta na Ordem Régia de 7 de maio de 1725
39
SANTOS, op. cit, p. 5
40
LIMA, Ruy Cirne. Sesmarias e Terras Devolutas (Parecer). Porto Alegre: Oficinas Graficas Thrumann, 1931,
p. 24
41
CALVANCANTI, op. cit., p. 407
35
econômica no Brasil-Colônia.
“(...) a preocupação com a defesa do litoral e das zonas adjacentes foi uma das
preocupações que levou a Coroa Portuguesa a reservar as marinhas. Essa era a
idéia mater nos diversos países que instituíram esta limitação ao direito de
propriedade. Essa diretriz permanece, mas acrescida da idéia de livre acesso ao
mar e de proteção ao meio ambiente litorâneo.”44
É nesta linha de raciocínio que o art. 225, §4º da Constituição Federal, prevê a
República, que o patrimônio público, quanto à sua origem e estrutura, pode-se dividir em duas
espécies: aquele pré-existente oriundo da natureza e outro erigido com tributos pagos pelos
cidadãos. Verbis:
43
ROMITI, Mário Müller. Terrenos de Marinha, Revista do Advogado, São Paulo: Associação dos Advogados
de São Paulo, n. 62, p. 10, mar.2001.
44
MACHADO, Direito Ambiental Brasileiro, p. 132/133
37
da natureza que tão generosa foi conosco. E aí esta para atestá-lo o numero
infinito de praias, de rios navegáveis, de florestas vastíssimas e
impenetráveis. Os numerosos portos e as estradas produto dos nossos
antepassados.
(...)
Esta parte do patrimônio é por assim dizer um legado que o Estado recebeu.
Outra parte do patrimônio teve origem nos tributos do povo.”45
pelo reino português e posteriormente transferidas ao Estado, temos que as terras brasileiras
propriedade privada.
Sob esta ótica, aos bens que restaram sob o domínio público, quanto à sua
Os bens de uso comum do povo são destinados por lei ou por sua natureza ao uso
Pública. Estas duas espécies de bens são classificadas, sob o aspecto jurídico, de bens do
domínio público do Estado, ao passo que ambas as espécies são destinadas aos fins públicos.
Por outro lado, os bens dominicais são considerados como bens do domínio privado
do Estado, posto que sua destinação é indefinida, de modo que podem ser aplicados pelo
45
MADRUGA, Manoel. Op. cit. P. 668
38
afetados ao uso comum ou ao uso especial, como ensina Hely Lopes Meirelles:
Todavia, podem ser disponibilizados pelo Estado aos cidadãos, mediante aforamento
Assim, admite-se a aplicação das normas de direito privado quanto a esta espécie de
46
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 33ª ed, São Paulo: Malheiros, 2007, p. 522
47
MADRUGA. Manoel. Op. cit., p. 167
48
CAVALCANTI, Themistocles. Curso de Direito Administrativo.3ª ed., Livraria Freitas Bastos: São Paulo,
1954, p.451
49 49
CAVALCANTI, op. cit., p. 451
39
Este regime jurídico misto é o que acontece, verbi gratia, quando do aforamento,
processo especial de execução contra a Fazenda Pública, com exclusão de penhora dos bens
Nesta senda, importa notar que, no que tange aos terrenos de marinha, embora bens
públicos dominicais, insuscetíveis de usucapião (Súmula 340, STF), tem-se entendido cabê-lo
50
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 17ª ed., São Paulo: Atlas, 2004, p. 573.
51
SANTOS, Rosita de Sousa. Op. cit. P. 66
52
DI PIETRO, Op. cit., p. 573-574
40
Verbis:
53
RIBEIRO, Benedito Silvério Ribeiro. Tratado de Usucapião. Vol. 1, 2ª ed., São Paulo: Saraiva, 1998, p. 421-
423
54
RE-AgR n. 218324/PE, 2ª Turma, v.u., rel. Joaquim Barbosa, DJe 28/05/2010.
41
o domínio útil não constitui julgamento extra petita, por haver deferido
apenas menos do que pedido.”55
plena.
Sem embargo, conclui Hely Lopes Meirelles que as normas civis são usadas de
ambiente praial. Conforme vimos, a utilização da linha do preamar médio do ano de 1831 e o
crescente aumento do nível das águas, faz com que, por vezes, ambas as porções de terras
Embora não hajam estudos a respeito do tema, nos parece que ante a natureza
jurídica da praia ser bem de uso comum do povo, este deve sobrepujar frente seu interesse
público. Aliás, este entendimento está em consonância com o art. 11, do Código das Águas.
55
REsp 262071/RS, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, 4ª turma, j. 16/03/2004, DJ 03/05/2004.
56
MEIRELLES, Op. cit. P. 518
42
direito privado, estas, mormente, aplicadas no tocante a disciplina dos contratos enfitêuticos,
1.4. Classificação
Tal crença advém do adjetivo marinha, que remete ao substantivo mar, olvidando-se,
em regra, que a influência das marés podem ser sentidas em locais outros, tais como fozes de
rios e lagos e, é nesta medida, que também são tidos como terrenos de marinha, somente onde
os possa sentir.
É por esta razão que são diversas as espécies de marinhas, diferindo-se por dois
costeiras as localizadas na costa marítima. Insulares as que se situam nas ilhas oceânicas e
costeiras.
Sob o critério das águas que banham, podem ser: lacustres, fluviais e marítimas.
As marítimas são as banhadas pela água do mar. As lacustres, por lagos e fluviais,
rios.57
No tocante às duas últimas espécies, hão de sofrer a influência das marés, a tornar
57
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 11ª ed., São Paulo, Saraiva, 2006, p. 863
58
Revista de Direito Administrativo, vol. 2, p. 282
43
59
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Tratado de Direito Administrativo. vol. III. 3ª ed., São Paulo: Livraria
Freitas Bastos, 1956, p. 437
44
morto – focuo mortuo – consistente no direito adquirido por aquele que, queimando os
Era também forma de extinção da propriedade, porque pelo fogo morto o antigo
proprietário que abandonara a terra sem cultivo, perde-a pelo simples abandono, como anota
agrícola no reino lusitano, que publicada a Lei das Sesmarias, em 26 de junho de 1375.
aos que cultivassem sob pagamento de modesta renda, fixada na sexta parte dos frutos – as
60
MADRUGA, Manoel, op. cit., p. 14
61
LIMA, Ruy Cirne. Op. cit., p. 5-6
62
MADRUGA, Manoel. Op. cit, p. 14
45
de qualquer cousa, ou ainda, para outros do latim “caesina”, que quer dizer
incisão, corte.”63
E, conclui:
Estes imensos lotes de terras, com cerca de 300km de largura, eram doados pela
que legitimava a doação, era a denominada carta de doação, que tinha como função
estabelecer os limites geográficos das áreas doadas pela Coroa. Por sua vez, o foral
estabelecia os direitos e deveres dos donatários, conferindo-lhe poderes para exercer diversas
funções, tais como: jurisdicional, cobrança de impostos e dízimas, bem como concessão das
sesmarias.
63
LIMA, Ruy Cirne. Op. cit., p.8
64
LIMA, Ruy Cirne. Op. cit., p. 7
65
Ordenações Manuelitas, Liv. IV, Tít. 67; Ord. Filipinas, Liv. IV, Tít. 43.
46
observa na carta:
Ordem de Cristo.
Esta carta de doação e foral ela lida em praça pública, como forma de dar
artisticamente por Benedito Calixto, na leitura da carta de doação e foral concedida à Brás
Cubas:
66
CAVALCANTI, Themístocles. Op. cit., p. 439
67
A figura do rei de Portugal confundia-se com a Igreja, nesta época.
47
que coubessem, sendo numerosos os alvarás, decretos e ordens que regulavam a concessão de
Sesmeiros, para o regime implantado no Brasil, eram aqueles a quem eram cedidas
terras.
limite certo: ora cedia-se uma légua quadrada, ora apenas meia, pois variava de acordo com a
província e costume, em que pese tenha havido tentativa de fixação do alvará de 25 de janeiro
de 1809.69
68
MADRUGA, Op. cit., p. 38
69
CAVALCANTI, Themístocles. Op. cit., p. 443
48
sendo as mais conhecidas as cedidas por Martim Afonso de Souza, fundador da Vila de São
Vicente.
12 de novembro de 1698:
A análise isolada desta Carta Régia conduz à idéia – errônea – de que as sesmarias
No entanto, como se lê na ordem de 1628, não foi sempre assim, sendo a afirmação
Este quadro é reforçado pela legislação portuguesa dos bens de domínio público
hídrico, que reconhece a propriedade particular aos que tivessem títulos legítimos anteriores
aos anos de 1864 ou 1868, conforme o caso, em estreita harmonia as concessões das marinhas
por sesmarias.
70
SANTOS, op. cit., p. 117
49
pagavam o dízimo, as terras não eram medidas, nem demarcadas e muito menos cultivadas –
Ao lado desta realidade, colonos ocupavam terras e nelas cultivavam para a própria
devolutas:
“Art. 5º: São devolutas, nas faixas de fronteira, nos Territórios Federais e
no Distrito Federal, as terras que não sendo próprias, nem aplicadas a
algum uso público federal, estadual ou municipal, não se incorporaram ao
domínio privado: a) por força da Lei 601, de 18.9.1850, Decreto 1318, de
30.01.1854 e outras leis e decretos gerais, federais ou estaduais; b) em
virtude de alienação, concessão ou reconhecimento por parte da União ou
dos Estados; c) em virtude de lei ou concessão emanada de governo
estrangeiro e ratificada ou reconhecida, expressa ou implicitamente, pelo
Brasil, em tratado ou convenção de limites; d) em virtude de sentença
judicial com força de coisa julgada; e)por se acharem em posse contínua e
incontestada com justo título e boa-fé, por termo superior a 20 (vinte) anos;
50
Antigamente as terras devolutas eram dadas por sesmarias, (Ord. Liv. 4.º Tit. 43,
A concessão de terras devolutas foi primeiro regulada pela Lei Imperial n. 601 de 18
Logo, consideravam terras devolutas as que, não se achando sob domínio público e
conformação e cultura.
Pela mesma lei – primeira que disciplina as terras públicas - restou proibida a
aquisição de terras devolutas por outro título que não fosse o da compra.
como regulamento de 1854 – este último criando o Registro Paroquial - constituem ambos
Estado.
Foi com a Constituição de 1891 (art. 60) que os Estados ganharam o domínio das
Em seguida a carta de 1937, consolidou o domínio nas mãos dos Estados federados,
71
CAVALCANTI, Themistocles Brandão. Op. cit., p. 459
72
Vide art. 130 da constituição de 1934
52
1946.
Atualmente é disciplinada pelo art. 20, II, e art. 26, IV, da CF e art. 5º, do Decreto
pertencem aos Estados federados, conforme art. 26, inciso IV, da Constituição Federal.
Janeiro representou ao Governo de Lisboa contra as muitas edificações que se faziam nas
áreas de marinha.
Seguiu-se a esta, a Ordem Régia de 7 de maio de 1725, em que El Rei demonstra sua
73
Ordem Régia de 21 de outubro de 1710.
54
“Determina porém o mesmo Senhor que Vm. faça continuar a mesma obra,
na certeza de que tudo o que toca a água do mar e accresce sobre ella é da
Coroa, na forma da Ordenação do Reino; e de que da linha dagua para
dentro sempre são reservadas 15 braças pela borda do mar para serviço
publico, nem entrão em propriedade alguma dos confinante com a marinha
e tudo o quanto allegarem para apropriar do terreno é abuso inattendivel;”
de 1826, de 13 de julho de 1827, onde, segundo, Manoel Madruga, conclui-se que se designou
instruções, resoluções, editais, circulares, avisos, ordens e portarias, como ensina Rosita de
Sousa Santos:
74
MADRUGA,op. cit., p. 68
75
SANTOS, op. cit., p. 6
55
Foi assim que em 04 de outubro de 1831, foi publicada lei sobre a Organização do
Da leitura das leis, conclui-se que a competência do Tribunal era mais ampla, do que
a do Ministério.
como foi permitido ao Ministro da Corte e aos Presidentes das Províncias, o aforamento, à luz
56
do que fosse mais conveniente segundo o maior interesse da Fazenda, inclusive com
das terras.
Ainda neste mesmo ano decisão assinada por Nicolau Vergueiro, Presidente do
Outra Lei, também desta, época determinou a demarcação dessa faixa em todo o
litoral brasileiro.78
76
SANTOS, op. cit., p.13
77
Jornal A Tribuna, 28/09/1976. “A Lei e a realidade na questão dos terrenos de marinha”. Jorge Martins
Rodrigues
78
Jornal A Tribuna, op. cit.
79
Cf. Anexo, p.
57
Segundo Rosita de Sousa Santos, esta lei teve vigência por 104 anos, até ser
“(...) daí, por diante, a terra de marinha apareceu sempre como o elemento
gerador de uma renda registrada nas leis orçamentárias, e a regulamentação de
todos os casos que surgiram, foi toda ela feita por meio de atos administrativos.
(...)
Os atos administrativos conduziam a vida dos terrenos de marinha e dos foreiros,
através de uma algaravia, que hoje classificaríamos como casuística, atendendo e
resolvendo situações formadas por uma vivência que muito distante já se achava
das regras ditadas pelas ordenações filipinas, que continuariam em vigor até a
constituição outorgada por D. Pedro I, e que permaneceram como embasamento
da atuação do judiciário até 1916.”80
expedido pelo Presidente do Tribunal do Tesouro Nacional, dirigido pelo Sr. Presidente da
Província da Bahia:
80
SANTOS, op. cit., 13/14
81
SANTOS, op. cit., p. 15
58
2.2. Império
marinha:
Esta descentralização culminou por gerar verdadeiro imbróglio, aquecido por Ordem
que os Inspetores das Tesourarias da Fazenda remetessem à Presidência das províncias lista
dos foreiros das marinhas e acrescidos e das extintas aldeias indígenas, como anota Rosita
Santos:
assunto:
Municípios.
O pleito dos Estados da Bahia e Espírito Santo, restaram famosos pelo exame do
Neste famoso acórdão, ressalta-se que os terrenos de marinha são bens nacionais.
2.3.República
ocupação aos possuidores de imóveis localizados nas áreas da marinha, sem qualquer título
firmado pela União, dispensando-se a necessidade de cadastro para os fins do decreto, bem
terrenos de marinha.
61
União retomou a arrecadação dos foros e laudêmios relativos aos terrenos de marinha do
de junho de 1940, decreto 2490 de 16 de agosto de 1940, este último veio aperfeiçoar as
situações obscuras deixadas pelo decreto lei n. 710, de 1938, como o estabelecimento de
Este último (decreto 2.490) foi ainda ampliado pelo 3.438, de 17 de julho de 1941,
fevereiro de 1942, onde, para além de limitar-se a concessão de novos aforamentos para fins
úteis, restritos e ilimitados, adota-se a linha da preamar máxima atual, como linha de
A este seguiu-se o decreto 5.666 de 15 de julho de 1943, que visava ampliar o campo
de atuação do anterior.
Aos 29 de janeiro de 1945, novo decreto (n. 7278), concedendo novo prazo aos
7.937, voltou a permitir a concessão de aforamentos de quaisquer áreas para divisão em lotes
construções, com extensão da permissão aos posseiros, ocupantes e ao foreiro desde que
regularizados.
62
aos terrenos de marinha – traz a idéia, sobre algumas das muitas dificuldades enfrentadas.
questão: terrenos de marinha são bens nacionais, sobre os quais a União exerce um direito de
nacionais.
Contudo, foi somente com a edição do decreto lei n. 9.760/46, que a questão restou
definitivamente pacificada.
anteriores, com impressão dos traços já assentados da experiência jurídica pregressa, como
82
SANTOS, Rosita de Sousa. Op. cit. P. 52
63
anteriores não fizeram expressa alusão a esta espécie de bens. Esta omissão legislativa
culminou em verdadeiro imbroglio jurídico, acerca de quem seria o real titular destas terras,
com fundamento no art. 64, da Constituição Federal de 1891, o que restou pacificado pela já
Portanto, a inclusão constitucional pela Carta vigente, em seu art. 20, VII, foi grande
Relevante questão, embora afora o objeto do presente trabalho, foi trazida com a
Emenda Constitucional n. 46 de 2005, que excluiu as ilhas costeiras com sede de municípios,
excetuando as áreas afetadas ao serviço público e à unidade ambiental federal, do rol dos bens
da União. Verbis:
Esta exclusão das ilhas costeiras com sede de municípios acendeu importante
Ambos os pontos de vista tem sido defendidos, tendo já Ação Civil Pública (n.
Federal.
A ação foi julgada procedente, sob o fundamento de que a parte final do inciso IV,
em que tratam das exceções, não elenca os terrenos de marinha e acrescidos, mas tão somente,
tela, hão de ser interpretados restritivamente e não há qualquer ressalva relativa aos terrenos
de marinha.83
terrenos de marinha e acrescidos situados nas ilhas costeiras, com sede de município,
83
Pende ainda o julgamento de recurso de apelação interposto pelo União Federal.
65
9760/46. Verbis:
problema relacionado às ilhas costeiras com sede de municípios, bem como a delimitação das
84
RODRIGUES, op. cit., p. 121-22
66
Inicialmente, cumpre esclarecer que a exclusão das ilhas costeiras com sede de
municípios do rol dos bens da União, teve como motivação o tratamento isonômico dos
cidadãos que residiam tanto nas áreas continentais, como nas ilhas costeiras.
Isto porque, aqueles que residiam nas ilhas costeiras tinham apenas o domínio útil
dos bens, com obrigação de pagamento dos foros ou taxas de ocupação e laudêmio, afora o
imposto predial territorial urbano (IPTU), enquanto os moradores das áreas continentais tinha
Conquanto a intenção fosse nobre, restou a polêmica acerca dos terrenos de marinha
das áreas continentais aos das ilhas costeiras com sede de municípios, qual a razão da
85
RODRIGUES, op. cit., p. 120
67
exclusão das marinhas no perímetro lacustre costeiro e não das áreas continentais? Não seria
igualmente desigual?
À toda luz, nos parece que sim, mormente da leitura conjugada com o inciso VII do
mesmo artigo que inclui entre os bens da União os terrenos de marinha e seus acrescidos, sem
qualquer ressalva no tocante aos situados nas ilhas costeiras, com sede de municípios.
que os terrenos de marinha e acrescidos localizados nas ilhas costeiras com sede de
problemática.
Ou seja, sem sua delimitação, não é possível precisar-se com exatidão que são
terrenos de marinha.
influência de forças astronômica - vis atractiva luni-solar – ou mesmo pela força dos ventos,
ou pressão.
Em verdade, é o resultado das forças gravitacionais exercidas entre Terra, Sol e Lua.
Assim, o nível das águas, em determinado ponto, sobe – enchente – até seu ponto
de nível médio.
Regra geral, há duas preamares e duas baixamares por dia lunar, com elevações
Mas, existem também as marés do tipo diurno (com única preamar e baixamar por
dia lunar) e intermediária (em que há dias com uma e dias com duas preamares e duas
baixamares).87
86
LIMA, Obéde Pereira. Op. cit. p. 16
70
desprezo de valores, conforme prejudiquem ou não o resultado final dos níveis médios, como
Outrossim, há uma crescente variação global do nível do mar nos últimos séculos,
influenciando diretamente nos níveis das marés e, por conseguinte, as alturas das preamares.
São diversos os fatores que contribuem para esta discrepância, tais como: diminuição
Estes elementos estão todos associados ao aumento crescente do nível do mar, como
conclui Obéde Pereira de Lima: “(...) é inegável a constatação de que o nível médio do mar
Sobre a costa brasileira encerra o especialista, ilustrando sua conclusão com gráfico:
“De acordo com o estudo feito pelo Potsdam Institute for Climate Impact
Research, da Alemanha, publicado no site “Sciencexpress” <
www.sciencexpress.org/14December2006 >, as cidades litorâneas
brasileiras, onde vivem na zona costeira cerca de 42 milhões de pessoas
(25% da população), serão possíveis vítimas dos impactos da elevação do
nível do mar. Nas cinco principais metrópoles à beira-mar – Fortaleza,
Recife, Salvador, Rio de Janeiro e Belém – residem mais de 22 milhões de
indivíduos.
Ainda, segundo os referidos estudos, nos últimos 50 anos foi observada uma
tendência na costa brasileira de um aumento do nível relativo do mar de
87
LIMA, Obéde Pereira. Op. cit. p. 14
88
LIMA, Obéde Pereira. Op. cit. p. 14
89
LIMA. Obéde Pereira Lima. Op. cit., p. 19
71
Assim, a preamar média do ano de 1831 está, hoje, encoberta pelas águas do mar.
Sul (SC):
90
LIMA. Obéde Pereira Lima. Op. cit., p.30
72
no valor de +64,98 cm. Isto equivale a dizer que o nível médio do mar no
ano de 1831, nestas localidades, encontrava-se 65 cm abaixo do nível médio
atual.”
Para além dos elementos naturais, a que todos os locais estão sujeitos, há ainda
elementos acidentais que dificultam precisar qual a exata localização da linha preamar do ano
de 1831.
Exemplo destes elementos são os aterros artificiais feitos nas praias de Santos –
jardins – como se observa nas considerações feitas no agravo de petição n. 439, em outubro
Assim, aliam-se aos aterros naturais, aqueles produtos das mãos do homem, como se
91
Agravo de petição n. 439, em outubro de 1948, ao Tribunal Regional de Recursos, Agravante: José Bento de
Carvalho e Agravado: Fazenda Nacional, Revista dos Tribunais ltda., São Paulo, p. 14
92
Op. cit., p. 20, Revista dos Tribunais ltda., São Paulo
73
Assim, a preamar atual, já afetada pelos inúmeros fenômenos naturais e, por vezes
também os artificiais, dista daquela preamar utilizada como parâmetro legal, não podendo ser
Preamar médio é a linha, traço ou vestígio deixado na praia pelo bater incessante e
mar avançar (enchente) e recuar (refluxo), no vai e vem das ondas, de dia para outro, e assim
Este fenômeno deve ser observado em uma ou várias lunações94, como se observa na
Ordem n. 373, de 12 de julho de 1833: “deve observar-se a maior e menor enchente da maré
93
MADRUGA. Manoel, op. cit. p. 505
94
Ciclo completo das fases das lunares, compreendido entre duas luas novas consecutivas;
95
RDA, vol. 2, p. 283
74
Não destoa do parecer elaborado pelo Dr. Armando Godoi Filho, diretor do Serviço
de Patrimônio da União:
“Para as variações máximas e mínimas do nível das águas dos mares, lagos
ou rios, possam ser consideradas marés, devem elas na sua periodicidade,
no que diz respeito ao intervalo de tempo decorrido sucessivamente entre
aqueles acontecimentos, corresponder, pelo menos aproximadamente, ao
ciclo periódico de uma lua, como principal agente das marés, nas suas
passagens repetidas pelo meridiano do lugar.”96
“Na falta de marés regulares que produzam o preamar médio dentro de uma
lunação, para assim achar os pontos de contagem para as quinze braças
determinadas no regulamento, sirvam para o mesmo fim os pontos aonde
chegam as águas na sua elevação médio no decurso de um ano, produzida
esta elevação, ou pela ação dos ventos em algumas das estações do ano, ou
por maior cópia de águas nas fontes, que alimentam os rios que banham o
litoral.”97
96
RDA, vol. 2, p. 279
97
RDA, vol. 2, p. 283
98
MADRUGA. Manoel. Op. cit., p.. 542
75
Madruga:
“A lei quis evitar que para linha onde se contam os 33 metros de marinha,
fosse adoptada a que corresponde ao logar onde as águas do mar só
chegam em marés excepcionalmente grandes, para adoptar a que
corresponde ao limite onde chegam as marés normaes de preamar;”100
preamar durante uma ou várias lunações, em condições normais, como assinala Aarão Reis:
99
SANTOS. Rosita de Sousa. Op. cit. p. 120, em Revista n. 12, 1905, do Clube de Engenharia
100
MADRUGA, Manoel. Op. cit, p. 505
101
Instrução normativa n. 1, de 30 de março de 1981 (Serviço do Patrimônio da União)
76
consecutivos durante uma lunação, pelo menos, todas as vezes que o mar
estiver em condições normaes. – Si se trata de praias inclinadas estas
observações devem ser feitas por meio de estacas graduadas fincadas em
fileiras, no sentido normal à linha do litoral, tendo o cuidado de referi-las
previamente a um ponto fixo da terra e, si além disso, a costa extensa e de
sensível irregularidade, deve-se fixar ao longo do litoral, em diversos
pontos, outras tantas estacas em sentido normal à linha do llitoral, de forma
a ter-se em cada observação o preamar no próprio logar em que se
necessita determina-lo – E si se trata de uma costa abrupta, determina-se o
preamar ainda por meio de estacas, ou por meio de maregrapho registrador
em local abrigado, mas onde o phenomeno da maré se possa manifestar
livremente.
No terrenos marginais de um rio sujeito à maré, as operações devem ser
feitas estando o rio em seu regimen normal e próximo ao local onde
interessa a determinação o preamar.”102
Assim, a linha do preamar médio é o traço ou vestígio deixado na praia pelo bater
incessante e contínuo das águas do mar, a ser medido em uma ou várias lunações e calculado
como média aritmética das maiores enchentes ordinárias compreendidas neste período.
Diga-se, a limine, que a extensão das faixas marginais há de ser contada da linha do
Curiosamente, apontam que a origem dos 33 (trinta e três) metros, seria a distância
estabelecimento da soberania marítima, cuja delimitação era dada pelo alcance de um tiro de
102
SANTOS. Rosita de Sousa. Op. cit. p. 121
77
canhão colocado na costa portuguesa: esta foi a regra adotada pelo reino lusitano, no alvará de
04 de maio de 1805.103
Sob esta mesma ótica, agora no tocante ao critério temporal, explica-se que o ano de
1831 foi utilizado em razão da tradição de quase dois séculos, iniciada com a lei orçamentária
de 15 de novembro de 1831.
4.120/42 (art. 3º), utilizando-se como parâmetro a preamar máxima atual, retomou-se, com a
“A lei citada de 1831 teve por fim determinar no litoral do Império a zona
constitutiva de marinhas. Na falta de legislação expressa, que fixasse os
limites de tais terrenos, o governo lançou mão da tradição que a tal respeito
havia na repartição de Marinha, por onde se expediam as concessões e
deliberou que por ela se entendesse toda a superfície compreendida entre os
pontos a que chegam as águas na alta da maré nas costas do mar e margens
dos rios navegáveis e a linha que daqueles dista 15 braças (Relatório do
Ministério da Fazenda de 1833, pág. 24 e Instruções de 14 de novembro de
1832, art. 4º).”104
103
CORDEIRO, Antonio Menezes. Tratado de Direito Civil Português. I Parte Geral, Tomo II, Coisas, 2ª ed.,
2009, Coimbra: Almedina, p.62
104
CAVALCANTI. Themistocles Brandão. Op. cit., p. 508
78
não servindo a linha atual, como ressalta, ainda, Themistocles Cavalcanti citando resolução
imperial:
Por esta razão, foi disposto no art. 10 do Decreto-lei 9.760/46, que a linha do
irrecusável relativos a esse ano, ou, quando não obtidos, da época que do mesmo mais se
aproxime.”
“Essa linha deve ser tanto quanto possível a do estado do lugar em 1831, e
o conhecimento de sua posição dependerá principalmente da iniciativa
pessoal do engenheiro, visto serem variadíssimos dos elementos a que
poderá recorrer em cada caso particular: em virtude do que, apenas são
indicadas aqui, de modo geral, as referências que podem orientar o estudo a
que se refere o item 7, para locação, em planta, da linha do preamar. Tais
referências são: a observação da natureza do terreno, das obras municipais
executadas, de velhos edifícios e da vegetação; o exame de plantas antigas,
títulos, concessões e processos, bem como informações de moradores
locais.”106
105
CAVALCANTI. Themistocles Brandão. Op. cit., p. 509
106
RDA, vol.2, op. cit., p. 291
79
Contudo, mesmo com a utilização de critérios suplementares, a tarefa não será menos
“Nos termos do Dec.-lei 9.760, de 05.09.1946, devem ser usadas como base
“plantas de autenticidade irrecusável relativas àquele ano, ou, quando não
obtidas, à época que do mesmo se aproxime. É evidente a enorme
dificuldade de localização de tais plantas, tendo em vista o longo tempo
decorrido.”107
remansosa doutrina.
particular.
107
FREITAS, Mariana Almeida Passos. Zona Costeira e meio ambiente, 2006, p. 174
108
MADRUGA, Manoel. Op. cit., p. 503
80
Interessante alternativa é a utilizada por Portugal, cuja linha de testada não é pautada
através de datas.
“Jundu s.m. vegetação rasteira do litoral, próxima às dunas e aos areais das
praias; nhundu, etim. Segundo Nascentes, tupi jun’du, atestado em Teodoro
Sampaio e em Silveira Bueno como nhu tu, campo sujo.”109
Trata-se de linha deixada por pequenina vegetação - o jundu -, sempre existente além
das praias e para o interior das terras que com elas confinam.
Vale dizer: nas áreas de restingas - cordões litorâneos - descortina esta espécie de
Com efeito, sua aparência, como a etimologia sugere, remete a um areial sujo pela
109
Dicionário Houaiss da língua portuguesa, Edit. Objetiva Rio de Janeiro, 2001, 1ª ed., p. 1692
110
AZEVEDO, Aroldo de. Brasil – A Terra e o Homem. v. 1. 2. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional. p.
545).
81
Contudo, embora largamente utilizada até os dias atuais, mesmo ante a ausência de
critérios aptos a demarcação, não legitima sua substituição, como assinala Diógenes
Gasparini:
111
Processo n.
112
MADRUGA, Manoel. Op. cit., p. 504, cit. Ramos, Daniel de Souza, Terrenos de Marinha, p. 29-30
113
GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 11ª ed., Ed. Saraiva, 2006, São Paulo, p.865.
83
Outrossim, neste sentido acórdão citado por Jacintho Guglielmi, de lavra do Des.
Bonfim Pontes, onde afirma-se textualmente: “os terrenos de marinha deveriam ser medidos
Tal recomendação ainda é vista nos dias atuais: “Se houver a existência de jundu
Este critério para além de não ser apropriado, é de flagrante ilegalidade, pois
114
Cf. citação de Jacintho Guglielmi, na obra A propósito dos terrenos de marinha, Palácio do Livro, 1968, p.
164-8.
115
RODRIGUES, Rodrigo Marcos Antônio. Curso de Terrenos de Marinha e seus acrescidos, São Paulo: Nelpa,
2012, p.144
84
Assim, segundo Madruga, os traços gravados nos rochedos, seriam forma mais
Aliás, via de regra, a linha de jundu estará localizada bastante a frente da linha da
preamar do ano de 1831, apenas considerando-se o aumento do nível do mar, sem qualquer
já capaz de precisar, senão com exatidão, com grande aproximação a linha da preamar do ano
Enfim, importa destacar que a ausência de parâmetro científico, não poderia ser
utilizada como escusa para utilização de critério tão dissonante, qual seja: a linha de jundu.
E diga-se mais, o simples fato de ter sido empregado há anos, tanto pelo Serviço do
Patrimônio da União, quanto pelo próprio judiciário, não legitima critérios contrários à
própria lei.
117
MADRUGA, Manoel. Op. cit., p. 511
85
Por força disto, inseriu-se a ressalva contida no artigo 10: “a determinação será feita
a adoção de critérios outros - que não o legal – com margem às arbitrárias demarcações
presumidas.
002/01”.118
tecnológicas.
equívocos.
na demarcação dos terrenos de marinha estão definidos especificamente nos itens: 4.6
Básica.
Várias incoerências estão contidas nesta norma. Calha ao exame, v.g., o item 4.6.1.1,
necessariamente, enxutos.
Isto porque, conforme visto, a preamar é a média das maiores enchente ordinárias.
Sendo assim, parte do terreno é coberta pelas águas do mar durante as preamares,
tornando-os encharcados.
Desta forma, não há como afirmar-se que as marinhas são terrenos enxutos.
Outro ponto que merece destaque é o item 4.8.2, ao qual a cota da preamar média é
118
ON-GEADE: Orientação Normativa da Gerência de Área de Cadastramento e Demarcação
87
Preamar média, a ser medida nas enchentes ordinárias, não pode ser confundida com
tese de Doutorado para Universidade Federal de Santa Catarina, defende método científico
para determinação da linha do preamar do ano de 1831. Divide-o em 5 (cinco) etapas, a saber:
Embora – por nós - não se possa precisar a eficiência do método defendido pelo
verdadeira delimitação.
119
LIMA, Obéde Pereira. Op. cit. p. 32
89
Conquanto não haja, ainda, comprovação de sua eficácia, é método científico que, no
Consoante disposto no artigo 11, com redação dada pela Lei 11.481/2007, a
Secretaria do Patrimônio da União deve convidar os interessados, por edital, para que no
Esta decisão seguiu a linha das já reiteradas decisões do Superior Tribunal de Justiça. Verbis:
E, ainda:
120
Medida Cautelar na Ação Direta de Inconstitucionalidade n. 4.264, relator Ricardo Lewandowski, j.
16/03/2011
91
Sem embargo, pelo teor do artigo 13, determina-se que sejam realizados trabalhos
topográficos, para que, assim, o Chefe do órgão local da Secretaria do Patrimônio da União
Esse despacho deve ser publicado por meio de edital, dando-se ciência aos
autoridade local deve reexaminar a sua decisão e, ex officio, recorrer ao Diretor da Secretaria
preamar-média de 1831, é ilegal e pode ser considerado nulo de pleno direito, pois ofende os
Capítulo IV – Enfiteuse
4.1.Evolução do instituto
Vocábulo derivado de futón, que juntamente com o afixo-prefixo em, aliado ao afixo-
antiga Grécia.
Maria Helena Diniz, ensina que suas origens encontram-se no próprio direito grego,
cujo translado deu-se para o direito romano, por volta do século V a.c., em fusão com a ager
121
GUIMARÃES, João de Freitas. Vocabulário Etimológico do Direito. Santos: Gráfica Atribuna, 1991, p.106
122
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, vol. 4. 6ª ed., São Paulo: Saraiva, 1989, p. 241
94
migração do instituto deu-se por intermédio das províncias helênicas, com existência concreta
Luiz da Cunha Gonçalves, leciona que, sua origem grega, data das repúblicas e dos
públicos faziam aos particulares, com vistas no cultivo de terras públicas incultas, ante a
instituição jurídica na Roma antiga, embora a denominação fosse diversa ( locação perpétua ),
enfitêutico à antiga Grécia – até mesmo pela etimologia da própria palavra - o certo é que não
fundação da colônia de Brea, na antiga Grécia, com data de 445 a.c., que trata justamente
123
BARROS, Washington de Barros.Curso de Direito Civil, 3º vol., 17ª ed., São Paulo: Saraiva, 1977, p. 269
124
Não destoam as opiniões de Clóvis Bevilacqua, José Carlos Barbosa Moreira, dentre outros. Para estes a
concepção mais conhecida da enfiteuse viria de uma fusão do jus emphyteuticon dos gregos e do ager vectigalis,
dos romanos.
125
GONÇALVES, Luis da Cunha. Tratado de Direito Civil. vol IX, tomo I, 2ª ed., São Paulo: Max Limonad,
1956, p.286-7
95
possível. A terra consagrada aos deuses continuará sendo sagrada, mas não
deverá ser consagrada nenhuma outra terra. A colônia deverá mandar um
boi ao festival das Panatéias e um phallós para o festival das Dionísias.
(...)”126
utilizada para povoação do território, com cláusulas relativas à distribuição e governo, sem
contudo dispor nada sobre pagamento do cânon, característica marcante dos contratos
enfitêuticos.
Assim, embora a etimologia da palavra seja de origem grega – o que está a indicar
instituto.
Nada obstante, anota, Menezes de Cordeiro, que a enfiteuse tem suas raízes no
direito pessoal. Sua introdução no ordenamento romano coincide com período de decadência e
abandono da agricultura.127
Neste mesmo sentido, Eva Cantarella, leciona que embora com raízes grega, na
Em que pesem suas origens controversas, que ora norteiam para antiga Grécia, ora
para Roma, ou mesmo para o antigo Egípcio, nos parece que o mais acertado é concluir que a
plantio e povoação de terras incultas, ante a impossibilidade direta estatal ou dos grandes
126
ARNAOUTOGLOU, Ilias. Leis da Antiga Grécia. Tradução: Ordep Trindade Serra, Rosiléa Trindade
Carnelós. São Paulo: Odysseus, 2003, p. 130
127
CORDEIRO. Menezes. Direitos Reais, vol. I. Imprensa Nacional, Casa da Moeda, 1979, p. 167
128
CANTARELLA, Eva. Diritto Romano, istituzioni e storia. Milano: Mondadovi Education S.P.A., 2010, p.
422
96
que todos estariam corretos – ou seja, ao mesmo tempo, porém em espaços diversos, com
Doutra sorte, e aí, sim possível a afirmação, a evolução do instituto - nos moldes
alçou o status de direito real perpétuo iura in re aliena, protegido por ação real (actio
vectigalis).
Nesta concepção galgada no período de Justiniano – como direito real sobre coisa
Isto porque, a fragmentariedade do domínio não é idéia dos romanos, mas influência
bárbara – para estes ( romanos ) imperava a construção unitária do domínio, por nós herdada.
alheio mediante módica pensão ânua (cânon) e de aproveitá-la como se proprietário fosse –
Imperador Zenão.130
129
Alves, José Carlos Moreira. Direito Romano, vol. I, 6ª ed., Rio de Janeiro: Forense, 1987, p. 428
130
ALVES, José Carlos Moreira. Op. cit, p. 430
97
enfiteuse romana.131
Já sob novas vestes, na Idade Média, teve ampla aplicação na propriedade feudal.
feudo.133
amplos ao senhorio direito (v.g.: caducidade, aumento de pensões e laudêmios), o que acabou
social – somada aos ideais da classe em ascensão – burguesia - levaram à noção do domínio
dividido.
131
ALMEIDA, Francisco de Paula Lacerda. Direito das Cousas. Rio de Janeiro: J. Ribeiro dos Santos, 1908, p.
421
132
ALMEIDA, Francisco de Paula Lacerda. Op. cit. p. 420
133
ALMEIDA, Francisco de Paula Lacerda. Op. cit. p. 421
134
ALMEIDA.Franciso de Paula Lacerda de. Op. cit. p. 423
98
Por outro lado, o domínio direto do senhor acaba por se degradar num mero ônus -
Ante as faculdades amplas do foreiro, deu-se – tempos mais tarde - azo a criação da
teoria do quase domínio – quasi dominio - por obra dos doutrinadores italianos.135
Contudo, o crescimento das cidades e o êxodo rural, ambos incentivado pelos ideais
com prestações e privilégios dos senhores sobre as terras), donde deflui a propriedade alodial,
mais tarde.
Tal como ocorreu no Império Romano, o Reino lusitano era titular de inúmeras terras
além-mar.
direito de propriedade, com percepção de renda – como sucedeu cá, com relação às marinhas.
Foi somente com as Ordenações Afonsinas (IV, 81), que ingressaram no corpo
legislativo.
135
PIRRO, Vito de. Della enfiteusi, 2ª ed., Milão: Societa Editrice Libraria, 1907, p.9
99
No entanto, embora sua figura não esteja mais presente no diploma privado, ficam
Sem embargo, há expressa exceção legal, no que concerne aos terrenos de marinha
4.2. Características
Direito real sobre coisa alheia, a enfiteuse é o mais amplo dos jus in re aliena - é
cultivador, por uma renda módica, ao domínio útil dos terrenos incultos, tornando viável, em
136
FRAGA, Álvaro Moreira Carlos. Direitos Reais. Lisboa: Livraria Almedina, p. 226
137
LIMA, Pires de. VARELLA, Antunes de. Código Civil Anotado, vol. III, Lisboa: Coimbra editora limitada,
1987, p. 688
100
Seus moldes atuais, tem origem no Direito Romano, com contornos dados pelo
É, pois contrato por meio do qual transfere-se ao foreiro o jus utendi, jus fruendi e o
direito real sobre coisa alheia, tal e qual em sua origem: o enfiteuta tem poder jurídico sobre a
coisa de outrem.
138
Não foi assim em todos os países que se utilizaram do regime enfitêutico: na França, proibiu-se
expressamente o contrato perpétuo. Já na Itália, era permitida a enfiteuse perpétua e temporária. Em Portugal, as
disposições eram análogas ao do Código Civil de 1916.
139
ALMEIDA, Francisco de Paula Lacerda. Op. cit., p. 420
140
BEVILACQUA, Clovis. Código Civil dos Estados unidos do Brasil comentado. 7ª tiragem, edição histórica,
Rio de Janeiro: editora Rio, p. 1145.
101
“(...) vem a ser o direito real sobre coisa alheia que autoriza o enfiteuta a
exercer, restritiva e perpetuamente, sobre coisa imóvel, todos os poderes do
domínio, mediante o pagamento ao senhorio direto de uma renda anual.”141
prédio sujeito ao regime enfitêutico – rústico ou urbano – dá-se o nome de prazo, designação
Foro representa a prestação, o cânon a ser pago pelo enfiteuta ao senhorio direto, em
A enfiteuse constitui-se por ato inter vivos ou por disposição de última vontade (art.
Seu conteúdo similar ao direito de propriedade, fez surgir a teoria do quase domínio,
fato.
Esta bipartição do domínio, própria desta espécie contratual, foi por muitos
Sucede que embora a terminologia por nós utilizada faça menção a dois domínios,
Isto porque nosso modelo de propriedade é unitário – assim como no direito romano
141
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil, 4º volume. 8ª ed., São Paulo: Saraiva, 1993, p. 255
142
BEVILACQUA, Clovis. Op. cit., p. 1145
102
pagamento do laudêmio.
Não há, por assim dizer, um duplo domínio, mas um domínio único e pleno, cujo
Conquanto, o mais extenso de todos os direitos reais, com exceção feita ao direito de
evolução pelos séculos – a interpretação mais justa sempre será aquela que são considerados
In prima facie, oportuno ressaltar que os terrenos de marinha são bens públicos
dominicais e seu aforamento é regido por lei especial - o Decreto-lei 9760/46 – com utilização
64, §2º, 99, parágrafo único; 101, 102, 117 e 103, deste decreto.
O senhorio direto é a União e o enfiteuta, por sua vez, são as pessoas com imóveis
da propriedade pública.”
Sem embargo, para que imóvel da União seja aforado, necessária se faz, ainda, a
Para além, as alíneas do artigo 100 do mesmo Decreto-Lei exigem a audiência dos
décimos por cento) do valor do respectivo domínio pleno, o qual será anualmente atualizado
consentimento da União, que poderá exercer direito de preferência (caput e § 1º do artigo 102
4.4. Ocupação
sempre - após a análise da conveniência e oportunidade administrativa (art. 7º, lei 9363/98).
(art. 7º, §3º, lei 9363/98), gera a obrigação de pagamento anual da taxa de ocupação, sem,
Em verdade, é situação mais vantajosa à Administração Pública, pois, para além dos
valores pagos pelos ocupantes serem maiores do que para os enfiteutas, permite-se, ainda, a
105
decreto.
Neste caso, “até a efetiva desocupação, será devida à União indenização pela posse
ou ocupação ilícita, correspondente a 10% (dez por cento) do valor atualizado do domínio
pleno do terreno, por ano ou fração de ano em que a União tenha ficado privada da posse ou
ocupação do imóvel, sem prejuízo das demais sanções cabíveis”, este é o teor do parágrafo
Desta sorte, contrariamente ao que ocorre nos casos de aforamento constituído, aos
ocupantes não são conferidos muitos dos privilégios garantistas gozados pelos enfiteutas – é
De todo modo, ainda que sem resguardo de direitos, os ocupantes ficam obrigados ao
respectivo pagamento da taxa, em nada alteram a situação precária do ocupante (artigo 131 do
tempo, na posse dos imóveis então ocupados (artigo 132 do mesmo Decreto-Lei).
Pelo art. 9º, da Lei 9363/98, são vedadas a inscrição de ocupações que:
Laudêmio provém do vocábulo latino “laudo emtio ou emptio”, que significa aprovo
a compra.143
domínio pleno.144
Assim, o laudêmio é indenização devida pelo foreiro ao senhorio direto, pelo não
Themístocles Cavalcanti:
Sua natureza jurídica não é de imposto, embora inscrito em dívida ativa e sua
cobrança feita mediante executivo fiscal, como ressalta Manoel Madruga, citando o Decreto
143
GONÇALVES, Luis Cunha. Op. cit., p. 322
144
GONÇALVES, Luiz da Cunha. Op cit. p. 324
145
CAVALCANTI, Themistocles, op.cit. p. 485
107
Esta conclusão, impõe importante consequência jurídica – não sendo uma obrigação
propter rem, sua responsabilidade não é do titular do direito real, mas dos respectivos
propter rem.
146
MADRUGA, Manoel. Op.cit, p. 416
147
CAVALCANTI, Themistocles. Op. cit., p. 486
108
– que deve contar com o assentimento da União, que inclusive exerce direito de preferência -,
e seu valor corresponde à 5% (cinco por cento) do valor do domínio pleno e benfeitorias (art.
Isto porque, não se pode realizar a preferência em venda que, em verdade, não se
realizou.
Esta conclusão tem importantes consequências, haja vista que nos termos do art. 3º
direitos sobre benfeitorias neles construídas, bem assim a cessão de direito a eles relativos.”
Este decreto tem sua regulamentação dada pela orientação normativa n. 01, a qual
dispõe em seu item 3.4.2 que além da compra e venda, o laudêmio incide também na
pessoas jurídicas e nas desapropriações de domínio útil de imóveis da União, para além das
inexistente, o direito de preferência pela não constituição do aforamento, não há que se falar
Verbis:
Lei 2.398/87, por seu art. 9º, revogou expressamente o art. 130 do Decreto-
Lei 9.760/46, que dava ensejo à cobrança do laudêmio para os imóveis
nãoforeiros, submetidos ao regime de mera ocupação".148
Bem de se ver que para os casos de ocupação, entendem os Tribunais que por se
domínio útil ao foreiro, e deve ser paga anualmente à União, na razão de 0,6% (seis décimos
por cento) sobre o valor do respectivo domínio pleno (caput do artigo 101 do Decreto-Lei nº
9.760/46).
sobre o valor pleno do terreno, corresponde à 2%, (dois por cento) para as ocupações já
inscritas e para aquelas cuja inscrição seja requerida, ao SPU, até 30 de setembro de 1988, e
148
TRF4, AC 2006.72.08.005281-0, Quarta Turma, Relator Márcio Antônio Rocha, D.E. 16/06/2008)
149
Resp n. 1.190.970 – SC (2010/0073560-8), 2ª Turma Rel. Ministra Eliana Calmon, j. 15/06/2010
111
5% (cinco por cento) para as ocupações cuja inscrição seja requerida ou promovida ex officio,
dívida ativa. Trata-se de dívida ativa não tributária, nos termos do §2º, art. 39, da lei 4.320 de
17 de março de 1964.
foro, taxa de ocupação e laudêmio às pessoas carentes, consideradas como aquelas que
tenham renda familiar igual ou inferior a 5 (cinco) salários mínimos mensais (art. 1º, §§ 2º e
4º).
Primeiramente, cumpre destacar que este rol não é exaustivo, existindo hipóteses
outras não reguladas pela norma, como verbi gratia, sucederá com o falecimento do enfiteuta
sem deixar herdeiros, caso em que haverá a consolidação do domínio na figura do senhorio
direto.
É sanção imposta ao foreiro pelo não pagamento do foro por determinado período de
deve notificar o enfiteuta por edital ou quando possível por carta registrada, concedendo-lhe o
pode ser negado na hipótese de necessidade comprovada do terreno para o serviço público,
nº 9.760/46).
113
Particularmente, no tocante aos terrenos de marinha é permitida, desde que não mais
subsistam os motivos determinantes para aplicação do regime enfitêutico (art. 103, III,
Decreto-lei 9760/46).
Patrimônio da União notificará o foreiro por edital, na forma do parágrafo único do art. 104,
(dezessete por cento) sobre o domínio pleno do terreno (art. 123), e será lançado certificado
CONCLUSÃO
3. São diversas as espécies de marinhas, sendo comum a todas elas as águas salgadas,
conquista.
5. Sua origem, ao que tudo indica, aponta para as lezírias do rio Tejo em associação
6. Sua criação tinha vistas no interesse econômico dos colonizadores, deixando livres
arrecadatória estatal.
lusitanas, existe instituto análogo – são bens que compõem o domínio público hídrico do
Estado.
10. Em Portugal, as faixas destinadas as marinhas hão de ser contadas em 50m para
terra, a partir da linha da máxima preia-mar das águas vivas equinociais até 50 m, aplicando-
115
lhes diversas regras. Há o reconhecimento da propriedade privada, aos que comprovarem por
11. A primeira menção que se tem notícia, sob a alcunha de salgados, é feita na Carta
10 de janeiro de 1731.
12. Era, pois, praxe administrativa do Brasil-Colônia, com sua primeira figuração
a eles.
14. Os terrenos de marinha não se confundem com as terras devolutas como restou
15. O conceito das marinhas é orientado por duplo critério: temporal (preamar média
16. Preamar, deriva do latim plena mare, e significa média da maré cheia.
17. É linha variável à mercê das influências astronômicas – vis attractiva luni-solar, a
18. Há variação crescente do nível global do mar, afetando as alturas das preamares
atuais.
19. São diversos os fatores naturais que tem contribuído para o aumento do nível do
mar, tal como o aquecimento do planeta, com o consequente derretimento das calotas polares.
20. Aliam-se aos fenômenos naturais, outros elementos acidentais, como, v.g., os
aterros artificiais realizados nas praias litorâneas, que dificultam a precisão da linha da
preamar de 1831.
116
21. É possível dizer com grau de certeza satisfatório que os terrenos de marinha, nos
equivocadas.
23. A linha de jundu, consistente em pequena vegetação sempre existente para além
24. Contudo, é critério apto a determinar apenas a preamar média atual e não a do
25. Os traçados deixados nos rochedos são mais seguros para determinação da linha
de preamar do ano de 1831, porém não se mostram suficientemente eficaz para a precisão.
linha do preamar.
28. Há estudo científico proposto pelo engenheiro Obéde Pereira Lima para
legítimo para aceitação de métodos ilegais e acientíficos, como os adotados pela Secretaria de
Patrimônio da União.
30. A adoção dos critérios contidos na Orientação Normativa n.02, gera importantes
consequências jurídicas aos particulares – tomando-se por público, o que é alodial, em afronta
ao direito de propriedade.
117
concluído.
consoante art. 11 do decreto lei 9760/46, sob pena de nulidade, consoante entendimento do
34. Esta decisão será publicada por meio de edital dando ciência aos interessados que
36. A enfiteuse é o mais amplo direito real sobre coisa alheia, pelo qual transfere-se o
domínio útil do imóvel ao enfiteuta, permanecendo o domínio direto nas mãos dos senhorio.
anual e, nos casos da transferência onerosa, deve após consentimento e não exercido o direito
38. Os aforamentos dos terrenos de marinha, são regidos por lei especial o decreto
9760/46.
39. O domínio direto do bem pertence à União, e o enfiteuta são as pessoas que tem
40. O foreiro deve pagar à União o foro de 0,6% sobre o domínio pleno e
42. O Laudêmio não é obrigação propter rem, mas indenização paga pelo não
45. Não goza dos mesmos privilégios dos enfiteutas, podendo a União pedir a
46. O valor pago pelo ocupante, a título de taxa de ocupação, é maior do que o
enfiteuta.
47. Embora a União cobre laudêmio nas cessões dos direitos do ocupante, os
Tribunais vem entendendo que não é caso de pagamento, pois não há direito de preferência a
ser exercitado.
48. Comisso ou caducidade é sanção imposta ao foreiro pelo não pagamento do foro
por determinado período de tempo e forma de extinção da enfiteuse, com reversão do domínio
49. No caso dos aforamentos dos terrenos de marinha, dá-se o comisso pela
51. É direito do enfiteuta, que somente pode ser negado na hipótese de necessidade
comprovada do terreno para o serviço público, devendo, então, indenizar o foreiro pelas
52. O aforamento também pode extinguir-se pelo acordo entre as partes (senhorio e
foreiro).
É permitida, desde que não mais subsistam os motivos determinantes para aplicação
Patrimônio da União notificará o foreiro por edital, na forma do parágrafo único do art. 104,
(dezessete por cento) sobre o domínio pleno do terreno (art. 123), e será lançado certificado
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