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O IMPOSSÍVEL CAPITALISMO VERDE – DANIEL TANURO – EDIÇÕES

COMBATE – LISBOA – 2012

Uma resenha em diálogo com outros pensadores ecossocialistas e da


ecologia política e economia ecológica

João Alfredo Telles Melo1


O AUTOR: Daniel Tanuro é engenheiro agrônomo e ambientalista, da corrente
ecossocialista, colaborador do Jornal Le Monde Diplomatique e da revista Inprecor, é
fundador da ONG belga Clima e Justiça Social, além de militante da LCR-La Gauche, seção
belga do Bureau Executivo da IV Internacional.

O LIVRO: O Impossível Capitalismo Verde foi originalmente escrito em dezembro de


2009, publicado pela Editions La Découverte, de Paris, no ano seguinte (2010). A edição
portuguesa, pelas Edições Combate, de Lisboa, é do ano de 2012.

O(S) CONTEXTO(S): Uma crise socioambiental e civilizacional planetária – tão bem


retratada pelo autor – em meio a dois eventos muito especiais nesse quadro: a 15ª.
Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Mudanças
Climáticas (COP 15), acontecida em Copenhagen, em dezembro de 2009 (abordada pelo
autor no Capítulo 11, o Epílogo) e a Conferência das Nações Unidas sobre
Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, realizada de 13 a 22 de junho de 2012, na
cidade do Rio de Janeiro, após o que o livro é lançado em Portugal (e o autor faz essa
atualização no Prefácio à edição lusitana).

INTRODUÇÃO:

Tanuro já traça aqui o quadro ideológico (ideologia enquanto visão de mundo)


de sua abordagem, que é socioambiental – onde fala, a um só tempo, das bilhões de
pessoas no mundo que vivem em condições indignas, e aos “duzentos anos de
produtivismo (que) levaram o sistema climático à beira do enfarte”, para daí questionar
como se faria para, concomitantemente (dada inclusive à urgência da questão climática)
estabilizar o clima e garantir as necessidades básicas de grande parte da população
mundial. É o que ele chama de “quebra-cabeças do século” (p.18).

Montar esse “puzzle” planetário não passa unicamente pela técnica, ou mesmo,
como adverte o autor, somente por questões de ordem física ou social (por mais
importante que sejam todas elas, inclusive como variáveis de uma totalidade sistêmica).

1
Mestre em Direito Público pela Universidade Federal do Ceará (UFC), doutorando pelo Programa de
Desenvolvimento e Meio Ambiente (PRODEMA) da UFC, professor de Direito Ambiental e advogado.
Trata-se, como bem acentua Tanuro, de uma questão de ordem política; é quando ele
coloca a seguinte disjuntiva:

Ou se restringe radicalmente a esfera da produção capitalista limitando ao máximo os estragos


do aquecimento global embora garantindo a todas e a todos um desenvolvimento humano de
qualidade, baseado unicamente nas energias renováveis, na perspectiva de uma sociedade
baseada numa outra economia de tempo;

Ou nos mantemos na lógica capitalista da acumulação, cada vez mais frenética, tornando
inevitáveis as perturbações climáticas que restringirão drasticamente o direito à existência de
centenas de milhões de seres humanos e as futuras gerações serão condenadas a remediar as
consequências de nossa fuga em frente nas tecnologias perigosas: nuclear, biocombustíveis,
transgênicos e armazenamento geológico de CO2 (p. 17).

Não se pode desconhecer – ainda que isso não esteja colocado pelo próprio
autor – que a obra, de caráter indubitavelmente interdisciplinar, poderia estar situada
dentro dos marcos conceituais dessas duas novíssimas disciplinas que são a “ecologia
política”, conceituada por Martínez Alier como o estudo dos “conflitos ecológicos
distributivos”, e a “economia ecológica”, que analisa o “enfrentamento constante entre
meio ambiente e economia” (2007, p. 15).

Esse enfrentamento meio ambiente versus economia nos coloca diante dos
limites do que o autor conceitua como “desenvolvimento quantitativo”, a partir da
constatação de que “a humanidade não produz apenas a sua própria realidade social e
ambiental local, mas, também determina o ambiente global” (p. 19). É o Antropoceno,
nova época geológica, fundamentada na ideia de que o poder do ser humano se
equipara ao das forças da natureza, proposta por Paul Crutzen e referendada por um
grupo de 25 pesquisadores2, segundo informa Marques, em sua obra seminal
“Capitalismo e Colapso Ambiental” (2015). Vale aqui citar um trecho, onde se abordam
alguns dos principais impactos da recente atividade humano sobre o ambiente natural:

No conceito de Antropoceno exprime-se a exorbitância das forças antrópicas em relação às


demais forças que intervêm na moldagem do sistema Terra. O livro de Ugo Bardi Extracted. How
the Quest for Mineral Wealth is Plundering the Planet (2014) oferece alguns dados a respeito: no
que se refere à atividade mineradora, extraímos globalmente 2 bilhões de toneladas de ferro e
15 milhões de toneladas de cobre por ano; [...] apenas em rochas e terra, os homens removem
por ano dois Montes Fuji, com seus 3776 metros de altitude, a mais alta montanha do
arquipélago japonês. Em 2000, a queima de combustíveis fósseis emitia na atmosfera cerca de
160 Tg/ano de dióxido de enxofre (SO2), o que significa a mais que a soma de todas as fontes
naturais; [..] mas da metade da água doce acessível já tinha sido utilizada pelo homem e 50% dos
mangues haviam sido perdidos nas zonas costeiras [...] (p. 399).

2
“[…] o intervalo do tempo presente no qual muitas condições e processos geológicos significativos são
profundamente alterados pelas atividades humanas” (Marques, 2015, p. 391).
Costa, na postagem “O colapso (in) evitável e o Antropoceno”, em seu blog de
divulgação científica “O que você faria se soubesse o que eu sei?” (2017), nos adverte
para o fato de que estão sendo ultrapassados os assim denominados limites planetários,
em face não só do volume do que atualmente se produz e se consome, mas, em especial
em face do aumento da velocidade do transporte e do descarte. Em suas palavras: “As
curvas de diversos parâmetros assumiram a forma exponencial, configurando o que se
convencionou chamar de ‘a grande aceleração’, particularmente nítida a partir da
segunda metade do século passado e início deste”.

Como acentua Marques, a importância do conceito não está apenas no aspecto


físico-natural, mas, especialmente, filosófico, ao abolir a “cisão, inaugural na consciência
do homem, entre a esfera do humano e do não humano” (2015, p. 400).

Por tudo isso, Tanuro, na Introdução de sua obra, reclama – na mesma linha em
que se posiciona esse novo pensamento ecossocialista – uma “ecologia de esquerda,
uma ecologia social”, dada a urgência dessa crise civilizatória em que estamos
mergulhados. Löwy, uma das vozes mais proeminentes do ecossocialismo, deixa muito
claro que “a questão ecológica é [...] o grande desafio para uma renovação do
pensamento marxista no início do século XXI. Ela exige dos marxistas uma ruptura
radical com a ideologia do progresso linear e com o paradigma tecnológico e econômico
da civilização industrial moderna (2014, p. 37)”.

Tanuro usa a expressão “ambição” para qualificar o que pretende com seu
“Impossível Capitalismo Verde”: ajudar a esquerda a avançar por esta via; a do
pensamento e da prática ecossocialista. Cremos, como pode se ver pelo
desenvolvimento de sua tese, que logrou êxito na tarefa que se impôs.

O SABER INDISPENSÁVEL À DECISÃO

“A história da Terra é também uma história do clima” (p. 33). Nesta assertiva,
poderíamos sintetizar o que pretende Tanuro neste capítulo que, ao nos advertir sobre
a desconfiança que a esquerda tem com o que ele chama “incursões da ‘Ciência’ na
política”, por temer uma “ditadura dos peritos”, nos chama a conhecer o trabalho do
Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas, o IPCC (à época do livro, ainda com
o seu quarto relatório; exatamente, o que trouxe mais impacto), especialmente os
grupos I e II do Painel, qual sejam os que tratam sobre o clima e sobre os impactos e
adaptação (pp. 25 e 26).

A crítica à crítica da esquerda se coloca em compreender não só o que é o ciclo


do carbono (para daí entender a crise climática), ou como se desenvolvem os estudos
do Painel da ONU ou mesmo as pressões que sobre ele se exercem por parte grande
capital (em especial da indústria dos combustíveis fósseis) e dos seus governos. Trata-
se de incidir, de forma consciente, sobre as políticas públicas voltadas para as mudanças
climáticas. Nas palavras do autor, ao se referir a essa “verdade inconveniente” (nome
do livro e documentário do ex-vice-presidente dos EUA, Al Gore Júnior sobre o
aquecimento global e as mudanças climáticas):

Em vez de discutir sobre a fiabilidade das projeções do IPCC, a esquerda deveria aproveitar esta
“verdade” (mais precisamente esta quase-verdade), traduzi-la em termos sociais e interpelar os
pesquisadores que a produzem, para que estes tomem partido. Na verdade, não se trata aqui
apenas de uma ciência pura, mas o que o filósofo Ernst Bloch chamou de “conhecimento
essencial à decisão”. Um tal conhecimento não pode ser “contemplativo”, porque “aborda o
processo do mundo” e deve portanto “tomar ativamente partido do Bem [...], ou seja, tomar
partido no processo do que é digno do homem” (pp. 27/28).

Se em 2009, quando o livro foi escrito, a necessidade desse conhecimento


essencial à decisão já era urgente, imagine-se agora quando, na segunda década do
século XXI, tivemos, por três anos consecutivos – 2014, 2015 e 2016 – a quebra do
recorde da temperatura média da terra, comprometendo seriamente o cumprimento
das metas do chamado Acordo de Paris3.

Abra-se aqui parêntesis para aduzir que a velocidade das mudanças climáticas é
tamanha que, com relação a alguns dados, esse capítulo e o próprio livro precisariam
ser atualizados (só como exemplo, há 7 anos atrás, a concentração de CO2 na atmosfera
não havia alcançada a assombrosa cifra de 400 ppm). No entanto, suas premissas são
ainda – e cada vez mais! – completamente atuais.

Compreender – como faz nos querer o autor – o processo de saturação de


dióxido de carbono causador das mudanças climáticas e causado pelo desmatamento,
mas, principalmente, pela queima de combustíveis fósseis, é fundamental tanto para
entender onde essa lógica está nos levando e como para tentar frear esse processo
ecocida. É o que Tanuro fará nos próximos capítulos.

A ENORMIDADE DA COISA

“Pelo que está escrito nesses resumos (Tanuro se refere ao quarto relatório do
IPCC), nenhum político nunca mais poderá dizer: ‘eu não sabia’” (p. 43). Na sequencia
do capítulo anterior, se desenvolve aqui, com mais detalhamento, todos os impactos
socioambientais listados pelo Painel da ONU, advertindo-se, no entanto, que o físico

3
Cf. https://noticias.uol.com.br/meio-ambiente/ultimas-noticias/ag-estado/2017/01/18/pelo-terceiro-
ano-consecutivo-2016-bate-recorde-de-temperatura.htm. Acesso em 16.03.2017.
sueco Svante August Arrhenius, no início do século passado, já colocava, à época ainda
como hipótese, a mudança climática causada pelo uso de combustíveis fósseis.

Costa (2017), no blog já citado, em instigante postagem denominada


“Aquecimento Global: 79 anos de evidências”, se refere a um estudo do engenheiro
Britânico Guy Stewart Callendar publicado em 1938, confirmando o que já havia sido
observado por Arrhenius 42 anos antes. In verbis:

Pela combustão, o homem adicionou cerca de 150.000 milhões de toneladas de dióxido de


carbono ao ar durante o último meio século. O autor estima, a partir dos melhores dados
disponíveis, que cerca de três quartos disto permaneceu na atmosfera. Os coeficientes de
absorção de radiação de dióxido de carbono e vapor d'água são usados para mostrar o efeito do
dióxido de carbono na "radiação celeste". A partir disso, o aumento da temperatura média,
devido à produção artificial de dióxido de carbono, é estimado em 0,003ºC por ano, na
atualidade. As observações de temperatura em estações meteorológicas do mundo são usadas
para mostrar que as temperaturas mundiais na verdade aumentaram a uma taxa média de
0,005°C por ano durante o último meio século.

Volvendo ao segundo capítulo do “Impossível Capitalismo Verde”, cremos que o


importante a se apreender aqui, além do rol desses impactos, que já são do
conhecimento público (e que já foram confirmados e atualizados pelo AR5, o quinto
relatório do IPCC), é a constatação de que “a maioria das vítimas vem – e se nada mudar,
continuará a vir – dos países (e das populações, acresceria) pobres” (p. 45).

Para se ter uma ideia da injustiça ambiental produzida pelas mudanças


climáticas, vamos aqui fazer um brevíssimo resumo do que Tanuro apresenta:

I. Sobre a perda da produtividade agrícola: “[...] a fatura mais dura deverá ser
paga pelos países da África subsaariana: atualmente estimam-se em cerca
1,1 mil milhões (bilhões, no português falado no Brasil) de hectares as terras
áridas onde o período de crescimento das culturas é inferior a 120 dias, esta
área poderá aumentar entre 5 e 8 por cento até 2080” (p. 45);
II. Sobre as pessoas afetadas por desastres meteorológicos: entre os anos de
2000 e 2004, 262 milhões foram afetados; “98% das vítimas viviam em países
em vias de desenvolvimento; enquanto que a proporção de pessoas
envolvidas foi de uma em 1.500 nos países em desenvolvidos (países da
OCDE), a proporção nos países em vias de desenvolvimento foi de uma em
dezenove – ou seja, 79 vezes mais” (p. 46);
III. “Na Etiópia e no Quênia dois dos países mais expostos à seca, as crianças
menores de cinco anos têm, respectivamente, 36 e 50% mais probabilidades
de sofrerem de subnutrição se nascerem durante um período de seca” (p.
48).
Pode-se dizer que é o desenvolvimento desigual e combinado do sistema
capitalista que acaba por gerar e distribuir, também de forma desigual e combinada, os
impactos sociais e ambientais das mudanças climáticas por todo o planeta.

Importante ainda ressaltar deste capítulo é a ideia-força – desenvolvida a partir


do impacto das mudanças climáticas sobre a biodiversidade (quando já se fala em uma
grande extinção em massa – a sexta na história geológica do planeta!4) – de que “a
humanidade não passa de uma parte da biosfera” e que, portanto, é “inadequado
considerar separadamente as consequencias humanas e ecológicas do aquecimento
global” (p. 52)

Marques (2015), cuja obra – penso – dialoga muito com Tanuro, propõe, acerca
desse processo avassalador de extinção das espécies, o neologismo “hipobiosfera”, para
“designar as áreas crescentes do planeta nas quais a biosfera tiver sido vítima de um
desmatamento e de uma defaunação que a privarão da grande maioria das formas
evolutivamente superiores de vida animal e vegetal ainda hoje presentes na natureza
(p. 405)”. Esse autor, inclusive, projeta numa escala de tempo “não geológica, mas,
histórica e discernível”, que a “hipobiosfera” pode vir a se tornar mesmo uma
“tanatosfera” – “termo que designaria a extinção de todas ou quase todas as formas de
vida terrestres” (p. 428), num alerta sombrio do que pode se transformar a vida – ou do
que restar dela – na Terra.

O fato é que, seis anos antes de Marques, Tanuro – ao se debruçar sobre os


dados relativos à subida do nível do mar e seus impactos sobre as zonas e planícies
costeiras (berço e residência da humanidade, em grande parte) – afirma que “muitas
são as razões para temer que tal (o caos climático-ambiental de que fala James Hansen,
ali citado) significaria um dobre de finados para o que comumente chamamos de
´civilização´” (p. 58).

UMA FALSA CONSCIÊNCIA “ANTRÓPICA”

“Nenhuma sociedade na história foi guiada por uma sede de lucro como a
contemporânea, que leva os proprietários do capital a acumular cada vez mais, criando
falsas necessidades [...] A chamada ‘crise ecológica’ consiste numa crise histórica na
relação entre a humanidade e o meio ambiente” (p. 64). Aqui, Tanuro situa as balizas
histórico-sociais da atual crise socioambiental planetária. Denuncia que responsabilizar
a atividade humana, da espécie humana em geral, por esse caos não é só insuficiente,
mas, esconde o fato de que o atual modo de produção que, a partir da apropriação

4
Marques (2015) afirma que “a sexta extinção ameaça ser ainda mais aniquiladora que as cinco
anteriores”, principalmente, por sua “rapidez fulminante”; calcula-se que a taxa de extinção atual sejam
de 1.000 a 10.000 vezes maior que antes da expansão humana (pp. 333/334).
privada dos bens da natureza e do crescimento econômico ilimitado, é quem ameaça a
existência da vida no planeta.

O senso comum – manipulado ideologicamente – é quem acaba reduzindo a


solução da crise a uma simples mudança individual nos costumes e no consumo,
desviando, como adverte o autor, “a atenção dos mecanismos estruturais [...] As classes
sociais, as desigualdades, os lobbies capitalistas e as estruturas de poder desaparecem
da cena como que por magia, graças à culpabilização dos indivíduos” (p. 76)5.

Não que nossa espécie, ao longo da história, não tenha causado mais impactos
de que qualquer outra sobre o ambiente natural. Mas, há uma diferença brutal, nos
adverte Tanuro, das economias baseadas na caça, na coleta ou mesmo na agricultura de
subsistência para o atual momento de “superprodução de mercadorias”, fundada na
lógica de acumulação de capital infinita (como se pudesse ser!).

Riechmann (2012) vai diretamente ao ponto, quando diz:

El choque de las sociedades industriales contra los límites de la biosfera que se está produciendo
en nuestro tiempo, que es un acontecimiento de dimensiones casi inimaginables, tiene una
fuerza motora detrás: es la acumulación de capital.

Em outras palavras, afirma o Manifesto Ecossocialista Internacional:

O atual sistema capitalista não pode regular, muito menos superar, as crises que deflagrou. Ele
não pode resolver a crise ecológica porque fazê-lo implica em colocar limites ao processo de
acumulação – uma opção inaceitável para um sistema baseado na regra “cresça ou morra” (Löwy,
2005, p. 86).

É preciso, portanto, compreender, com Foster (2005), que a relação do ser


humano com o meio ambiente natural não se dá de forma direta, mas, é mediada por
sua organização social, por sua formação sócio-econômica-cultural. Em suas palavras:
“a sociedade tem na natureza o seu meio ambiente [...] O meio ambiente do homem é
a sociedade em cujo meio ele vive; o meio ambiente da sociedade humana é a natureza
exterior” (p. 331). E essa organização social é o capitalismo, em sua fase mais
concentrada e monopolista, em que o Estado toma a forma, segundo Marques (2015)
de “Estado-Corporação, um novo modelo de simbiose entre Estado e corporação” (p
24), onde,

Destituídos cada vez mais de soberania real, ao mesmo tempo credores e devedores, sócios e
concorrentes do grande capital, os Estados são absorvidos na lógica da rede corporativa nacional
ou transnacional e tendem a funcionar e, sobretudo, a se pensar como um elo dessa dinâmica
[...] Hoje, a tal ponto os Estados amalgamam-se física, política e financeiramente com as

5
Veja o exemplo da campanha do Governo do Estado do Ceará, “Todos pela Água”, que responsabiliza o
consumidor individual e familiar pela crise hídrica: http://www.srh.ce.gov.br/#todospelaagua. Acesso
em 17.03.2017.
corporações, que começam a se borrar os limites entre eles, de modo que se torna por vezes
impossível precisar onde termina o Estado e onde começa o grande capital corporativo (p.
28/29).

Só assim se pode compreender porque, se temos avanços tecnológicos tão


importantes e há tanto tempo no setor das energias renováveis, é que a matriz
dominante ainda é das energias fósseis, e o meio de transporte dominante, o rodoviário,
especialmente, através do carro individual. Essa economia convencional, que é, a um só
tempo, tributária e fundamento do sistema produtor de mercadorias, baseada, segundo
Martínez Alier, em “um flujo entrópico de energia y materiales de dirección única”
(2011, p. 216), é quem pode explicar essa contradição. É o que faz também, a partir da
questão das matrizes energéticas, Tanuro:

Porque é muito mais barato queimar carvão, gás natural e petróleo. Porque o setor das energias
fósseis concentra um poder econômico considerável, que incide sobre os decisores políticos.
Porque o nuclear (56% dos orçamentos de investigação!) apresenta um interesse militar e
materializa melhor a fantasia prometeica de uma energia criada pelo Homem e por ele
dominada. Porque a radiação solar é difusa e o sistema econômico tende espontaneamente a
favorecer dispositivos centralizados e centralizadores, que facilitem o controle social. E porque
os combustíveis fósseis (assim como o urânio) são as energias de depósito: os investidores podem
facilmente adquirir os jazigos e conquistar uma espécie de monopólio sobre o recurso, impondo
assim preços e regras próprias a uma situação de monopólio (p 66).

É exatamente a força desses grandes conglomerados industriais vinculados,


especialmente, às energias fósseis e à indústria automobilísticas, que tem, segundo
denuncia o autor, escudado em Noemi Klein, “bloqueado a transição a um futuro de
energias renováveis” (p 71). Os exemplos das dificuldades impostas ao desenvolvimento
da energia solar, da destruição dos ramais ferroviários e das perdas do sistema elétrico
demonstram cabalmente que essa “governança das energias fósseis” não se funda,
como se tenta justificar, em um mínimo de racionalidade econômica, quanto mais
ecológica (aqui, o antagonismo é aberta e frontal!).

De forma bastante precisa, Tanuro nos chama atenção para o fato de que a
solução para o gravíssimo problema das mudanças climáticas não está na tecnologia
(que já existe, mas, se choca com os interesses das grandes corporações, como visto),
nem nos apelos à boa vontade, às gerações futuras ou mesmo à misantropia, ela se
encontra na “modificação das relações sociais” (p. 77).

O NECESSÁRIO E O POSSÍVEL

Neste capítulo, Tanuro nos coloca diante do que seria necessário e possível não
para impedir o aquecimento global (já que este é um fato consumado), mas, para
possibilitar, diante das restrições físicas e sociopolíticas existentes, que os países
consigam mitigar os fenômenos climáticos e se adaptar às suas consequências, diante
de um planeta marcado por desigualdades tão profundas e abissais. Em última análise,
como garantir uma “justiça climática”6, que leve em conta o princípio das
“responsabilidades comuns, mas diferenciadas” dos países ricos e dos países pobres (p.
86).

No que concerne às chamadas “restrições físicas”, o autor corretamente aponta


que, “para estabilizar a temperatura, não é suficiente estabilizar as emissões: é preciso
reduzi-las o mais radicalmente possível”. E veja que, à época em que o livro foi escrito,
a concentração de C02 na atmosfera estava em 385 ppm; hoje, sete anos depois, o índice
é de 400 ppm, confirmando a previsão do crescimento anual de 2ppm (p. 83).

Para Tanuro, a margem segura (uma subida de até 2 graus celsius na temperatura
média da terra; que é quase um consenso na comunidade científica) para que não possa
vir a causar o que ele chama de “derrube climático”, seria a estabilização nos (agora
atuais) 400 ppm de CO2 na atmosfera, o que implicaria em uma redução global das
emissões de dióxido de carbono entre 50 e 85% até 2050; tendo aqui como parâmetro
o ano de 1990, conforme estabelece o Protocolo de Kyoto (p. 83).

A questão – e agora estamos diante das restrições sociopolíticas – é a


desigualdade socioeconômica planetária. Por um lado, a responsabilidade maior quanto
ao aquecimento global é dos países, cuja matriz energética (de suas atividades
industriais) é de combustíveis fósseis: “especialistas consideram que 70 a 80% da
mudança climática é atribuível historicamente aos países desenvolvidos” (p. 84). Por
outro lado, as demandas sociais dos países em desenvolvimento – construção de
hospitais, escolas, centrais elétricas, estações de tratamento d’água – exige “recursos
energéticos significativos” (p. 89).

Aqui – importante ressaltar – Tanuro aponta uma espécie de “mapa do caminho”


do que poderia ser na prática a tradução do princípio das responsabilidades comuns,
mas diferenciadas, entre países pobres, em desenvolvimento, e os países ricos, tanto no
que concerne ao corte de emissões, quanto no que se refere à transferência de
tecnologia. Vejamos como isso se daria, segundo o autor:

- Os países desenvolvidos devem reduzir as emissões de 25 a 40% até 2020 e de 80 a 95% até
2050, em comparação aos valores de 1990;

6
Certamente, o termo “justiça climática” decorre do conceito de “justiça ambiental”, que assegura que
“nenhum grupo social, seja ele étnico, racial ou de classe, suporte uma parcela desproporcional das
consequências ambientais negativas de operações econômicas, decisões de políticas e programas
federais, estaduais, locais, assim como da ausência ou omissão de tais políticas [...]” (Acselrad et al,
2009, p 41).
- A curva das emissões nos países em vias de desenvolvimento deve baixar de 15 a 30% em
comparação ao cenário de referência em todas as regiões em 2050 e na maioria das regiões
(exceto África) a partir de 2020;

- As emissões globais devem atingir o seu máximo antes de 2015 e diminuir de 50 a 85% até 2050,
comparando com os valores de 2000;

- A transferência de tecnologias limpas deve permitir aos povos do Sul um desenvolvimento


econômico sem arruinar o clima (p. 89).

Entretanto, como isso se tornaria viável? O autor, então, aponta pistas que
poderiam compor esse roteiro: o fim da dependência do petróleo, do carvão e do gás
natural; o investimento maciço em energias renováveis, em especial, a solar, a partir do
conceito de “potencial técnico”, qual seja, “a fração de potencial teórico utilizável com
as tecnologias disponíveis num dado momento”. Aqui, uma informação agregada pelo
autor é fundamental para demonstrar esse potencial, qual seja, a de que “o potencial
acumulado de energia solar térmica, fotovoltaica e termodinâmica, eólica, da biomassa
e hidrelétrica pode cobrir entre cinco a seis vezes as necessidades mundiais de energia
primária” (p. 93).

Mesmo que houvesse dúvidas acerca desse potencial, Tanuro é claro e afirma,
sem qualquer sombra de ambiguidades: “a saída do problema não deverá residir
fundamentalmente em desenvolvimentos técnicos, mas numa escolha politica de tudo
fazer para evitar o derrube climático, independentemente dos custos” (p.95).

O DUPLO OBSTÁCULO CAPITALISTA

Tanuro, neste capítulo, nos adverte para o fato de que a situação é tão grave e
urgente que “se impõe, simultaneamente, reduzir o consumo de energia, e, portanto,
também, em certa medida, a transformação e transporte de materiais”. Apresenta quais
são os dois principais obstáculos para se alcançar essas metas: “a corrida pelo lucro
máximo e o crescimento da produção material (que implica necessariamente um
aumento de consumo)”. E afirma que, para salvar o clima, é “necessário produzir menos
e produzir mais próximo dos consumidores finais”.

A crítica a essa busca incessante do lucro e ao produtivismo ilimitado aproxima,


nesse aspecto, os ecossocialistas de extração marxiana, como Tanuro, dos ideólogos do
decrescimento (ainda que, ressalte-se, haja choques entre essas duas correntes, que são
– ambas, ao nosso ver, – ecologistas e anticapitalistas). Senão vejamos duas passagens
importantes de Latouche (2009), um dos teóricos mais importantes da segunda
concepção:
A palavra de ordem “decrescimento” tem como principal meta enfatizar fortemente o abandono
do crescimento ilimitado, objetivo cujo motor não é outro senão a busca do lucro por parte dos
detentores do capital, com consequências desastrosas para o meio ambiente e portanto, para a
humanidade (p. 4).

O crescimento, hoje, só é um negócio rentável se seu peso recair sobre a natureza, as gerações
futuras, a saúde dos consumidores, as condições de trabalho dos assalariados e, mais ainda,
sobre os países do Sul (p. 39).

Volvendo a Tanuro, neste capítulo, ele se volta a criticar a visão e os mecanismos


de mercado que a ideologia “ecocapitalista” (ou do “capitalismo verde”, como prefere
o autor) considera suficientes para dar conta da crise climática ambiental7. Denuncia
que os economistas liberais, insensíveis que são ao potencial técnico, “traçam suas
previsões a partir de dois outros conceitos: o potencial de mercado e o potencial
econômico”, onde esse último é a noção chave, pois “trata-se de uma vontade política
de orientar o mercado: a ideia é favorecer as energias renováveis fixando um preço para
o carbono que inclua os custos provocados pelo aquecimento global (que os
economistas chamam de ‘externalidades’) e que melhor reflita os interesses das
gerações futuras” (pp. 100/101).

As críticas que Tanuro faz a essas premissas são a de que não há como avaliar
monetariamente a perda de uma espécie, de uma paisagem ou de uma população
humana (p. 100) – o que nos remete ao que Martínez Alier chama de
“incomensurabilidade dos valores” (2007, p. 23) –, e a de que há uma contradição
insolúvel do mecanismo de “interiorização da externalidades” (uma das bases da
economia ambiental) com a própria lógica de funcionamento do mercado, utilizando-se
como exemplo a fixação de um preço para o carbono. In verbis:

[...] por um lado, a eficiência ambiental ditaria a adoção de preços muito elevados para o
carbono, a fim de penalizar as energias fósseis e para maximizar o potencial econômico das
renováveis; mas, por outro lado, qualquer custo adicional é considerado um ataque à
competitividade das empresas... que utilizam majoritariamente combustíveis fósseis (p. 104).

Outro mecanismo de mercado criticado por Tanuro – um preço mundial único


para o carbono, proposto pelo relatório Stern (ex-economista-chefe do Banco Mundial)
– poderia levar a mais um caso de injustiça ambiental, pois, “para os países em vias de
desenvolvimento, a transferência do preço mundial do carbono para o consumidor;
determinado a partir do custo dos prejuízos do aquecimento global, causado pela
indústria do Norte, significaria que estas populações se veriam obrigadas a pagar toda a

7
Pode-se dizer que a economia que fundamenta o capitalismo verde é a chamada “economia
ambiental” (que não se confunde, por óbvio, com a economia ecológica, de matriz anticapitalista). A
primeira, como aduzem Klink e Alcántara, “estudia habitualmente dos cuestiones: el problema de las
externalidades y la asignación intergeracional óptima de los recursos agotables (1994, p. 11).
fatura na proporção que consumam”. Com isso, seria anulado completamente o
princípio das responsabilidades comuns, mas diferenciadas (p. 104).

Trata-se, portanto, de defender, como faz o autor, o investimento maciço em


tecnologias voltadas para a viabilização da matriz renovável, não para suplementar as
energias fósseis, dentro de uma lógica “crescimentista”, mas, para superá-la mesmo; e
uma redução drástica – draconiana, para usa expressão do autor – do consumo nos
países do Norte. Em suas palavras:

A conclusão é inevitável: as contingencias climáticas não poderão ser respeitadas se os


investimentos necessários para um novo sistema energético não caminharem lado a lado, e
desde o início, com uma redução absoluta do consumo de energia nos países desenvolvidos (p.
109).

Kempf (2010), ao denunciar a profunda e abissal diferença entre ricos e pobres,


propõe o que seria um balanço justo, social e ambientalmente falando, acerca dessa
redução consumptiva:

Não se pode pensar em diminuir o consumo material dos mais pobres, ou seja, da maioria dos
habitantes dos países do Sul e parte dos habitantes dos países ricos. Ao contrário, ele deve ser
aumentado por uma questão de justiça [...] Juntos, América do Norte, Europa e Japão somam 1
bilhão de habitantes, ou seja, menos de 20% da população mundial. E consomem cerca de 80%
da riqueza mundial. É preciso, assim, que esse 1 bilhão de pessoas reduza o seu consumo material
(pp. 93/94).

Tanuro fala em “reflexão antiprodutivista” para que se possa vencer o desafio


das mudanças climáticas, mas, não esconde que tudo isso – redução drástica do
consumo de energia nos países desenvolvidos, diminuição da produção e dos transporte
de matérias – é absolutamente “incompatível com as leis do capitalismo”, já que este
“não pode existir sem crescimento” (p. 112).

UMA POLÍTICA GATAFUNHADA (RABISCADA)

Tanuro, aqui, faz uma crítica mais aprofundada aos mecanismos de mercado
como (falsas) soluções para a crise climática, não sem antes deixar de reconhecer alguns
avanços nessas lutas, a partir de alguns fatos ocorridos em 2007 e 2008, a saber: o
prêmio Nobel da Paz para Al Gore e o IPCC, a derrota de Bush na cúpula de Bali, a
ratificação, por parte da Austrália, do Protocolo de Quioto, o “pacote energia-clima” da
União Europeia, as promessas do então candidato Obama etc. (p. 119).

Apesar disso, o autor, com o rigor de sua análise, nos chama a atenção para as
limitações do principal acordo climático, que foi exatamente Quioto, seja porque seu
objetivo (redução, por parte dos países industrializados, de suas emissões em 5,2% no
período 2008/2012, em comparação com 1990) se reduziu a um terço em face da não
adesão dos EUA, seja porque se colocam no mesmo patamar a diminuição das emissões
com a mudança da matriz energética com aquelas causadas pela “absorção de carbono
resultantes da plantação de florestas” (p. 119).

No entanto, a crítica maior se volta aos chamados “mecanismos de flexibilidade”,


que vêm sendo “testados” (segundo Tanuro) a partir daquele protocolo e que são o
Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), a Implementação Conjunta (IC) e o
Comércio Internacional de Emissões (CIE), os quais, em tese, serviriam para alcançar os
objetivos de Quioto, mas, como bem assevera Tanuro, “servem para os contornar e
transformá-los em fontes de lucro”, a partir da “criação de um mercado de carbono que
os interligue, e a troca de direitos de emissão é a sua pedra angular” (p. 120).

O que acabou acontecendo na prática confirma a crítica de Tanuro, ao se garantir


a possibilidade de se comprar “o direito de poluir” de (e em) países em
desenvolvimento, geralmente com projetos de redução de emissões ligados à
diminuição do desmatamento (como no caso da Amazônia, por exemplo) ou em países
estagnados por crises econômicas (como no Leste Europeu), os “patrões (das grandes
corporações que mais emitem GEE) preferiram comprar licenças em vez de investir em
tecnologias limpas” (p. 121).

Um outro objetivo previsto no Protocolo de Quioto e que supostamente seria


alcançado pela comércio das emissões – a transferência de tecnologias limpas para os
países do hemisfério sul – também não logrou êxito. E aqui o caso da China, atualmente
o país que mais contribui, em termos absolutos, com emissão de gases do efeito estufa
, em comparação ao continente africano, é emblemático, conforme relata Tanuro:

Os países da África limitaram-se a acolher, em 2008, 27 dos 1.150 projetos que o MDL realizou
em 49 países. Mais de 50% dos projetos estão localizados na China. Lógica: na verdade, o objetivo
principal do MDL não é de reduzir as emissões, mas, de produzir um máximo de créditos a um
custo mínimo, e assim conseguir um máximo de lucros, por um lado, e de reduzir a fatura da
transição, por outro. A China é ideal deste ponto de vista, a sua indústria é altamente
desenvolvida, grande emissora e muito desatualizada – ou seja, modernizável a baixo custo (p.
126).

O fracasso da utilização de mecanismos de mercado – que estão presos à lógica


da busca desenfreada do lucro, da acumulação do capital, da privatização dos bens
ambientais – pode ser constatado a olho nu ao se observar o crescimento
impressionante da concentração do gás carbônico na atmosfera. Para não ir longe,
utilizemos o referencial temporal do próprio livro (385 ppm em 2009): hoje já
ultrapassamos o perigoso índice de 400 ppm e estamos, nesse processo de aceleração,
podendo ultrapassar as 410 antes do meio deste ano. É o que constata Alves (2017), em
artigo intitulado “A concentração de CO2 ultrapassou definitivamente as 400 ppm”, no
blog Ecodebate, utilizando-se dos dados da estação de Mauna Loa:
No mês de outubro a concentração mensal voltou a subir e atingiu a média mensal de 401,57
ppm. Foi o primeiro mês de outubro com concentração acima de 400 ppm. Seguindo as
tendências sazonais, a concentração de CO2 deve subir até maio de 2017, quando,
provavelmente, deve ultrapassar a marca de 410 ppm. O que mostra que o mundo está indo para
uma situação perigosa e sem precedentes pelo menos nos últimos 800 mil anos.

A “maquiagem verde” de Quioto e de seu comércio de emissões, como bem


constata Tanuro, nada tem a ver com combate ao aquecimento global, mas, se presta a
incentivar o que se chama hoje de “economia verde”, cujas políticas, além de
insuficientes, do ponto de vista ambiental, ainda “contribuem para alargar as
desigualdades sociais, não apenas entre Norte e Sul, mas, também no seio de ambas as
sociedades” (p. 130).

PÉ COLADO AO ACELERADOR

Neste capítulo, na sequencia do anterior, Tanuro faz uma abordagem crítica


tanto do “pacote energia-clima”, de 2008, da Comissão Europeia, como da política
climática apresentada pelo então presidente dos EUA, Barack Obama, ao Congresso em
junho de 2009 (neste caso, apenas a título de atualização, naquele país, se trocou a
insuficiência das propostas do ex-presidente democrata por uma política abertamente
anticlimática do atual mandatário republicano Trump).

São temáticas datadas, mas, que agora, nesta resenha, vistas em perspectiva,
demonstram o fracasso dessas políticas em termos de combate ao aquecimento global
e às mudanças climáticas, vez que se encontram presas não só à lógica da economia de
mercado, mas, também, à disputa geopolítica dos Estados-corporação (na precisa
acepção de Marques, já referida anteriormente).

Assim, o “pacote energia-clima” europeu – que tinha como objetivos 20% de


redução, 20% de ganho de eficiência energética e 20% de energias renováveis, até 2020
(incluindo 10% de agrocombustíveis nos transportes) – é considerado pelo autor como
um “balão cheio de nada” (p. 133), por uma série de razões, dentre as quais
destacamos: “o ‘pacote’ coloca-se numa posição inferior em relação às conclusões dos
relatórios do IPCC” (P.133); “originalmente, o ‘pacote’ previa substituição gratuita dos
direitos de emissão por uma venda de leilão” (medida que depois foi revertida pela
indústria fóssil) (pp. 134/135); a utilização do mecanismo da REDD+8, ou seja créditos
de carbono utilizados por empresas de (e por) países desenvolvidos para financiar
projetos de conservação de florestas no hemisfério sul, o que, além de “legitimar” a
continuidade de utilização da matriz fóssil na indústria dos países ricos, ainda tem levado
a conflitos com povos originários e tradicionais que habitam (e manejam, de forma
ancestral e sustentável) essas grandes áreas florestais (pp. 136/138).

8
Nas palavras do autor, “REDD é a sigla de Reducing Emissions from Deforestation and Foreste
Degradation. Inicialmente, apenas as práticas de exploração florestal sustentável eram consideradas
como geradoras de crédito. Com REDD+ adiciona-se a conservação” (p. 136).
Da mesma forma, Tanuro se volta a analisar criticamente a política climático-
ambiental apresentada por Obama no início de seu primeiro mandato. Primeiro, porque
a redução de 80% das emissões de gases do efeito estufa (GEE) até 2050, aprovada pelo
Congresso dos EUA em junho de 2009 , tem como referência o ano de 2005 (Quioto usa
como referência as emissões em 1990). De conformidade com nosso autor, entre essas
duas datas, foram emitidas 1,2 bilhões de toneladas de CO2 a mais (p. 139).

A segunda crítica a Obama dá-se pela escolha do mal designado “carvão limpo”
(clean coal), que está muito mais ligada à redução da “dependência do petróleo
importado e pretendendo recolocar os EUA na posição de líder mundial de energia” (p.
143), do que propriamente ao combate às mudanças climáticas.

Por último, mas não menos importante, Tanuro critica a ênfase do apoio aos
agrocombustíveis (ou biocombustíveis), especialmente, através do etanol de milho.
Aqui, a um só tempo, gera-se uma situação de injustiça ambiental (com a utilização de
um grão, que faz parte da cesta básica da alimentação de várias populações no mundo,
para produzir combustível), atende-se ao poderoso lobby do agronegócio
estadunidense e, de quebra, se acena positivamente às petrolíferas (porque o etanol é
compatível com a rede de distribuição dessa indústria) e à indústria automobilística
(porque não implicam em modificação nos motores) (pp. 144/145).9

O trágico é que, como afirmado no início deste tópico, no que concerne ao maior
contribuinte per capita do aquecimento global, passou-se do insuficiente para o
extremamente perigoso, com a política anti-ambiental e anticlimática de Trump, que,
fez toda sua campanha negando a ciência do clima e prometendo apoio amplo e
irrestrito à indústria das energias fósseis. Da promessa à realidade, já tivemos em
pouquíssimo tempo: a determinação para que a agência ambiental estadunidense
retirasse de sua página na internet dados e informações sobre o aquecimento global10;
a nomeação de um “negacionista” da mudança climática para dirigir essa agência de
proteção ao meio ambiente11; além da ameaça de “cancelar” o Acordo de Paris,
costurado na COP21 da Convenção das Nações Unidas sobre o Clima12.

Á época em que escreveu o livro que ora se resenha, Tanuro, ao analisar todas
essas contradições, perguntava (e respondia, ao mesmo tempo):

9
Interessante observar, apenas, rapidamente, a título de atualização, que, em seu segundo mandato,
Obama, mais precisamente em agosto de 2015, lançou seu “Plano de Energia Limpa”, que, por não
atacar as verdadeiras causas das mudanças climáticas (e ser tolerante com o “fracking” e permitir a
exploração de petróleo no Ártico), foi qualificado por Costa (2015), como “irrelevante e insuficiente”
(postagem: “O irrelevante, o insuficiente e o necessário”).

10
Cf. https://noticias.uol.com.br/meio-ambiente/ultimas-noticias/redacao/2017/01/26/trump-ordena-
agencia-ambiental-apagar-dados-sobre-aquecimento-global.htm. Acesso em 16.03.2017.

11
Cf. http://brasil.elpais.com/brasil/2016/12/08/internacional/1481165064_394182.html. Acesso em
16.03.2017.

12
Cf. http://www.bbc.com/portuguese/internacional-38661770. Acesso em 16.03.2017
Que podemos esperar destas políticas? Na melhor das hipóteses, uma estabilização da
concentração atmosférica de gases de efeito estufa em cera de 650 ppmCO2eq, o que implica
um aumento da temperatura compreendido entre 3,2ºC e 4ºC – no mínimo – e uma subida do
nível do mar entre 0,6 e 2,4m (sem ter em conta a desintegração das calotas glaciares (p. 147).

E nos adverte: “Apesar dos discursos que tentam sossegar os eleitores, devemos
reconhecer a evidência: ‘Temos o pé colado ao acelerador e avançamos para o abismo’.
Quem o diz não é Olivier Besancenot13, nem o subcomandante Marcos14: é o próprio
Ban Ki Mon, secretário geral da ONU” (p. 192).

POBRES EXCEDENTES E APRENDIZES DE FEITICEIRO

Aqui, neste capítulo, Tanuro, mais uma vez estabelece a relação entre a questão
ambiental e a questão social, a partir, especialmente, da análise crítica tanto daquelas
propostas reacionárias, de cunho neomalthusiano, de controle da população pobre para
a resolução da questão climático-ambiental, como das propostas tecnológicas que, ao
invés de solucionar, podem agravar os impactos causados pelas mudanças climáticas.

Tudo isso evidentemente está ligado à postura dos governos dos países ricos de
não assumirem suas responsabilidades sobre a crise climático-ambiental. O exemplo
trazido pelo autor, acerca da necessidade de se financiar os países em desenvolvimento
no processo de adaptação às mudanças climáticas, denuncia essa conduta. Senão
vejamos:

Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), a adaptação


necessitaria de uma transferência Norte-Sul de 86 mil milhões (bilhões, na língua portuguesa
falado no Brasil) por ano a partir de 2015 [...] Oitenta e seis mil milhões (bilhões), 26 milhões: a
diferença entre estes dois números pode traduzir-se em centenas de milhões de vítimas, a
maioria crianças, mulheres e idosos. 86 mil milhões (bilhões) de dólares representa apenas 0.2%
do PIB dos países desenvolvidos (p. 152).

Na mesma linha de pensamento, o Presidente da Bolívia, o indígena, da etnia


aymara, Evo Morales, quando da abertura da COP 14 do clima, em dezembro de 2008,
em Póznan, na Polônia, chamando atenção para a necessidade dos países desenvolvidos
reconhecerem sua “dívida ecológica histórica que têm com o planeta”, não mediu as
palavras ao afirmar, in verbis:

O planeta é muito mais importante que as bolsas de Wall Street e do mundo. Enquanto os
Estados Unidos e a União Europeia destinam US$ 4,1 trilhões de dólares para salvar os
banqueiros de uma crise financeira que eles mesmos provocaram, destinam apenas US$ 13
bilhões de dólares aos programas vinculados à mudança climática, um valor 313 vezes menor do
que aquele reservado aos bancos (2009, pp. 136 e 138).

13
Porta-voz da antiga LCR francesa (Liga Comunista Revolucionária), hoje incorporada ao NPA (Novo
Partido Anticapitalista).

14
Liderança do Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN), do México.
É essa visão reacionária e desprovida de qualquer preocupação social quem
explica que, segundo Tanuro, uma das maiores ongs ambientalistas estadunidenses, a
Sierra Club, tenha proposto (muito antes da ascensão de Trump!) o barramento de
imigrantes que chegavam aos EUA como a “reivindicação ‘ecológica’ prioritária do
movimento”(!) ou o controle demográfico, conforme sugeriu o relatório “Mulheres,
População e Clima”, do Fundo de População das Nações Unidas, lançado pouco antes da
Conferência das Partes de Copenhagen (COP 15) (p. 156).

Se a demografia é, como diz Tanuro, um “fator a ser levado em conta” (p. 157),
é preciso relacionar as emissões de GEE com as populações de cada um dos países. Em
um planeta marcado por uma extrema desigualdade socioambiental, não é dado
desconhecer que essa desigualdade se manifesta fundamentalmente no consumo e, em
sua origem, na apropriação – desigual (repita-se) – dos bens da Natureza. Neste sentido,
a utilização do mecanismo da pegada ecológica (“ecological footprint”) é fundamental
para compreender objetivamente como se dá a responsabilidade dos países e de suas
populações não só pelas emissões dos gases de efeito estufa (responsáveis pelo
aquecimento global e pelas mudanças climáticas), mas, pela própria apropriação dos
assim chamados recursos naturais.

O WWF (World Wildlife Fund), assim conceitua a pegada ecológica:

A Pegada Ecológica é uma metodologia de contabilidade ambiental que avalia a pressão do


consumo das populações humanas sobre os recursos naturais. Expressada em hectares globais
(gha), permite comparar diferentes padrões de consumo e verificar se estão dentro da
capacidade ecológica do planeta. Um hectare global significa um hectare de produtividade média
mundial para terras e águas produtivas em um ano. Já a biocapacidade representa a capacidade
dos ecossistemas em produzir recursos úteis e absorver os resíduos gerados pelo ser
humano. Sendo assim, a Pegada Ecológica contabiliza os recursos naturais biológicos renováveis
(grãos e vegetais, carne, peixes, madeira e fibras, energia renovável etc.), segmentados em
Agricultura, Pastagens, Florestas, Pesca, Área Construída e Energia e Absorção de Dióxido de
Carbono (CO2)15.

Ao se aplicar essa metodologia sobre dois países americanos – o mais rico e o


mais pobre – veremos quão injusta (e irreal, do ponto de vista de sua eficiência
ecológica) atribuir ao crescimento populacional, em geral, e, em especial, como faz o
pensamento antissocial, aos mais pobres, a responsabilidade sobre a crise sócio-
climático-ambiental. Os Estados Unidos da América detêm uma pegada ecológica per
capita de 8,2 gha (hectares globais), enquanto a pegada ecológica per capita do Haiti é
de apenas 0,6 gha16, quase 13 vezes menor!

15
Cf.
http://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/especiais/pegada_ecologica/o_que_e_pegada_ecologica/
Acesso em 16.03.217.

16
Cf.
http://www.footprintnetwork.org/content/documents/ecological_footprint_nations/ecological_per_ca
pita.html Acesso em 16.03.2017.
É quando se observa – por meio de outra metodologia, mas, como uma extensão
do mesmo conceito de pegada ecológica – a pegada de carbono, que fica mais clara a
responsabilidade dos EUA sobre a mudança climática. Apesar de ter sido ultrapassado
pela China em termos absolutos de emissão de GEE, ao se relacionar com a população
chega-se à seguinte situação: enquanto o cidadão estadunidense, em média, é
responsável pela emissão de 29 toneladas de carbono por ano, a média dos chineses é
de 3,1 toneladas per capita anualmente17. Tudo isso demonstra a falácia do discurso
neomalthusiano.

Volvendo a Tanuro, ele identifica três escolhas tecnológicas que, como já foi dito,
ao invés de resolver, “podem agravar os impactos ambientais e sociais assim como os
riscos de uma derrapagem bárbara da ‘política climática capitalista’” (p. 158). São essas
escolhas: a produção dos biocombustíveis, a utilização do chamado “carvão limpo” e a
energia nuclear18.

Quanto aos bio ou agrocombustíveis, a crítica se centra em dois aspectos.


Primeiro, a sua irracionalidade, já que o balanço energético só não é negativo para a
cana-de-açúcar (mas, aqui, neste caso, como no da soja, outros aspectos poderiam ser
adicionados, como o desmatamento causado por sua expansão para áreas de floresta,
a contaminação do solo e da água pela utilização de agrotóxicos, os casos de trabalho
escravo etc.).

O outro reparo do autor se dá exatamente pelos efeitos sociais e ambientais


perversos, que ele identifica da seguinte forma:

A lógica da produção para o lucro implica que a produção de etanol e biodiesel seja mais
importante que o direito básico à alimentação, mais importante que os direitos das comunidades
indígenas, mais importante que a saúde das populações (ameaçadas pelo uso massivo de
pesticidas) e mais importante que a proteção ambiental (p. 159).

A segunda escolha (ou “fuga para a frente tecnológica”, como designa Tanuro) é
o assim (mal) designado “carvão limpo”, ou seja, os processos de “captura e sequestro
de carbono”, por meio do isolamento do CO2 presente na fumaça da combustão, para
colocá-lo em um estado entre o gasoso e o líquido e, em seguida, “injetá-lo em capas
geológicas profundas, onde é armazenado” (p. 161).

São três as críticas de Tanuro a esse processo pretensamente ecológico: i) o


termo “carvão limpo” é um “mito”, dado que desconhece toda a poluição causada desde

17
Cf. http://br.reuters.com/article/worldNews/idBRSPE56L0IC20090722. Acesso em 16.03.2017.

18
Costa (2012), em seu blog já citado, na postagem “Não à rendição! Nem geoengenharia, nem nuclear,
nem transgênicos!”, identifica uma quarta opção tecnológica tão ou mais perigosa que as demais, no
caso, a geoengenharia compreendida por ele como “soluções pretensamente milagrosas de ‘conserto
do clima’”, como é o caso da fertilização dos oceanos com ferro e a colocação de espelhos imensos em
órbita na terra.
o processo de extração até a emissão de particulados e outros gases; ii) a possibilidade,
por problemas relativos ao armazenamento, da fuga, em grande quantidade, do gás
carbônico, o que é extremamente deletério; e iii) o desconhecimento dos efeitos desse
armazenamento sobre a estabilidade geológica (pp. 161/162).

Por último, nosso autor critica a adesão de ambientalistas à perigosa opção da


energia nuclear como saída para a crise climática. Primeiro, obviamente, pela ameaça
que é o próprio domínio do enriquecimento de urânio, já que a bomba atômica é a
“única causa possível de destruição da humanidade”; segundo, porque a matriz nuclear
não é “zero CO2”, que é emitido no conjunto da cadeia produtiva; e, terceiro, porque
não permite “responder com eficácia aos picos de consumo de eletricidade porque
funcional de forma contínua” (pp. 164/165).

O fato é que essas falsas soluções estão ligadas, segundo a precisa observação
de Tanuro, à “recusa (do capital) em reduzir o consumo de energia, de partilhar os
recursos e de reduzir a produção material” (p. 166), o que, por óbvio, se chocaria com a
lógica do próprio sistema.

ENVERDECER OU APODRECER

Nesse processo de desconstrução do que poderia ser (mas, na verdade, é uma


contradição em termos) um “capitalismo verde”, Tanuro, neste capítulo, procura
analisar a questão ambiental a partir da dicotomia, pensada por Marx, entre valor de
uso e valor de troca, onde o primeiro está voltado à satisfação das necessidades
humanas, e o segundo, vinculado que está à produção de mercadorias, caracteriza-se
“pela quantidade de trabalho humano que representa” (pp. 171/172).

É esse último conceito, designado por Marx simplesmente como “valor”, que
está no âmago da natureza do próprio capitalismo, quando, por sua lei – a lei do valor
(baseada na relação custo-eficiência) – é aplicado à questão ecológica, ele, o valor,
demonstra toda sua irracionalidade e inadequação à política climática (p. 174).

Ele traz como exemplo o mercado de crédito de carbono, comparando o


comércio de licença de emissões para atividades diferentes voltadas para a
neutralização de CO2: o plantio de florestas, as medidas de eficiência energética e o uso
de energia solar, por meio de painéis fotovoltaicos. Por ser mais barato e menos
complexo, “o critério da relação custo-eficiência orienta espontaneamente a economia
em direção a medidas não estruturais, produtoras de direitos de emissão mais baratos
(que, no caso, é o plantio ou a conservação de florestas no terceiro mundo), e muito
pouco na direção de uma revolução energética”. Assim
[...] em vez de promover uma transição controlada para um novo sistema energético, e de
organizar esta transição de acordo com uma visão articulada a curto, médio e longo prazo, a lei
do valor excita uma corrida às cegas pelos direitos de emissões mais baratos, que são também
os menos pertinentes do ponto de vista da qualidade ecológica (e que podem, como vimos,
resultar numa política demográfica verdadeiramente bárbara) (pp 174/175).

Em seguida, nosso autor – após relatar o que é uma verdade fática, ou seja, a
impossibilidade de um “capitalismo verde” porque é impossível que esse sistema
funcione sem a lei do valor – traz a relação entre a “destruição da natureza e a
exploração do trabalho (trabalhador) pelo capital”, que, mais que uma “analogia”, se
trata de “uma paridade absoluta de processos” (p 176).

Em nota de rodapé, a partir de Marx, Tanuro explica:

A força de trabalho é entendida como uma dupla realidade: por um lado, como recurso natural
(“todo o trabalho é, ao fim e ao cabo, um dispêndio de músculos, nervos, e do cérebro do
homem”), e, por outra parte, como recurso social criado pela cooperação entre os produtores e
o desenvolvimento dos conhecimentos (p. 176).

Marques (2015) sustenta, como uma das teses de seu “Capitalismo e Colapso
Ambiental”, que “o capitalismo é insustentável em termos ambientais e a esperança de
torná-lo sustentável pode ser considerada como a mais extraviadora ilusão do
pensamento político, social e econômico contemporâneo”. E diz por que:

O sistema socioeconômico que designamos pelo termo capitalismo define-se por duas
características: (1) um ordenamento jurídico fundado na propriedade privada do capital; (2) uma
lógica econômica segundo a qual os recursos naturais e as forças produtivas da sociedade são
alocados e organizados com vistas à reprodução ampliada e à máxima remuneração do capital.
[...] No capitalismo, ser é crescer. Ser e crescer são, no metabolismo celular desse sistema, uma
única e mesma coisa. A locução “capitalismo sustentável” exprime, portanto, num mundo de
recursos naturais finitos, uma contradição nos termos (p. 50).

É o “cresça ou morra”, como característica do sistema (conforme vimos antes,


ao citarmos o Manifesto Ecossocialista), que acabou por se transformar em outra
consigna, para o planeta: “cresça e morra”, ou melhor: “cresça e mate” (a natureza, a
vida), como melhor expressão da incompatibilidade ontológica entre capitalismo e
sustentabilidade socioambiental.

Os exemplos trazidos por Tanuro demonstram cabalmente esse antagonismo. O


que pode explicar que, enquanto estejamos à beira do abismo, as grandes petroleiras
queiram esconder o aquecimento global19 ou mesmo financiem grupos para negar a

19
Veja o caso do vídeo da Shell da década de 1990 e que veio à tona agora:
http://brasil.elpais.com/brasil/2017/02/28/internacional/1488274335_818249.html. Acesso em
16.03.2017.
existência das mudanças climáticas20, a não ser a lógica da acumulação do capital e da
busca desenfreada do lucro?

Se olharmos o setor dos combustíveis fósseis, os monopólios que o dominam


concentram a propriedade da terra e a apropriação monopolista dos recursos naturais
do subsolo, a ponto da receita petroleira ser estimada 1,3 trilhões por ano (p. 181); só
ao longo do Governo Bush, “os lucros combinados das ‘cinco irmãs’ – BP, Chevron,
Conoco Philips, Exxon Mobil e Shell – chegarem à simpática (sic) soma de 656 mil
milhões (bilhões, no português falado no Brasil) de dólares” (p. 183).

Nem mesmo, os executivos dessas corporações conseguem esconder como


funciona a engrenagem mortal do sistema produtor de mercadorias. Tanuro traz a fala
de Pavan Sukhdev, que foi banqueiro do Deutsch Bank e que, à época do livro, havia
sido escolhido para coordenar um estudo para reorientar a economia “em direção a um
modelo ‘verde’”. Suas palavras são bastante esclarecedoras, senão vejamos:

“O atual modelo atingiu seus limites, tanto do ponto de vista da melhoria das condições de vida
dos mais pobres como do ponto de vista da marca ecológica que podemos deixar ao planeta, mas
os meus clientes só investem com promessas de lucro, e isto não vai mudar” (p. 189).

Mais claro, é impossível! Não se trata de uma falha do sistema que pode ser
corrigida, por meio de mecanismos de mercado, de compensações ou das chamadas
internalização das externalidades. Como dizem Serfati e Chesnais, citados por Tanuro:
“entre o capitalismo e a natureza, entre a lei do valor e o resgate do clima, há muito
mais do que uma contradição, há um antagonismo” (p. 186).

Löwy (2014), preciso, afirma que essa “reorientação” ou “reorganização” há de


romper com a lógica do capital. Em suas palavras: “Uma reorganização de conjunto do
modo de produção e de consumo é necessária, fundada em critérios exteriores ao
mercado capitalista: as necessidades reais da população (não necessariamente
“pagáveis”) e a preservação do meio ambiente” (p. 48).

Tanuro, no livro ora resenhado, dita a sentença: “já não há projeto


emancipatório válido que não tenha em conta os condicionalismos e limitações da
natureza” (p. 192).

A ÚNICA LIBERDADE POSSÍVEL

Neste (pen)último capítulo, antes do epílogo – que é a análise da 15ª.


Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas para as Mudanças

20
Vide http://www.dw.com/pt-br/exxonmobil-confirma-investiga%C3%A7%C3%A3o-sobre-
mudan%C3%A7as-clim%C3%A1ticas/a-18833404. Acesso em 16.03.2017.
Climáticas (COP 15)21 – Tanuro se propõe a investigar a contribuição de Marx e Engels
para o debate ecológico (vez que o ecossocialismo tem, entre seus esteios, o
pensamento marxiano), não sem antes criticar outras formulações e movimentos que
se encontram no campo da ecologia política.

Inicialmente, ele aponta o que seriam os quatro movimentos simultâneos ou


“linhas de força” que conduziriam a uma “saída racional” para a crise climática. A Saber:

1. Saturar a procura de necessidades sociais reais;


2. Reduzir a produção material global, diminuindo o tempo de trabalho e suprimindo a
produção desnecessária e prejudicial, assim como uma parte substancial dos transportes;
3. Aumentar radicalmente a eficiência energética e passar completamente para as energias
renováveis, independentemente dos custos; e
4. Criar as condições políticas e culturais para uma responsabilização democrática e coletiva
sobre o que é produzido, e, portanto, consumido (p.195).

Evidentemente, que esse “programa de transição” para uma sociedade


ecossocialista, em nível mundial, deverá acontecer a partir de profundas
transformações sociais, políticas e culturais, no âmbito mesmo de uma revolução
ecológica, posto que, como afirma o autor, demandaria profundas incursões na
propriedade capitalista, extensão do setor público, criação de um fundo mundial para
adaptação às mudanças climáticas, redução do horário de trabalho, reforma agrária
democrática (e ecológica, acrescentaria) etc. (pp. 195/196).
É na análise de como se daria essa transição – e apresentando a questão se
haveria um “vício ecológico redibitório no corpus teórico do socialismo em geral, e do
marxismo em particular” (p 196) – que ele, Tanuro, se volta para os críticos, no campo
da ecologia política, do (ao) marxismo, para, em seguida, se voltar para a investigação
do próprio pensamento marxiano.
E começa sua crítica por Hans Jonas e seu “Princípio Responsabilidade” (que seria
uma contraposição ao “Princípio Esperança”, de Ernst Bloch22), o qual, apesar de, como
reconhece Tanuro, ter tido “o mérito de colocar a questão da responsabilidade para com
as gerações futuras”, o fez a partir de uma visão politicamente autoritária e moralista,
economicamente insuficiente (pois, se centra apenas no consumo e não leva em conta
a produção) e reduz a saída da crise a uma espécie de conversão do indivíduo a uma
forma de ascetismo, que seria sustentável (ou seja, alça o consumo ao centro dessa

21
Nossa opção, neste paper, foi de não incluir o Epílogo nesta resenha, não por considerá-lo de menor
importância, mas, exatamente em função de sua datação histórica; já tivermos 7 COPs (a última das
quais em Marrakesh) após Copenhagen. Além do mais, a conclusão, o fechamento da obra se encontra
exatamente neste capítulo intitulado “A única liberdade possível”.
22
Para Jonas, relata Tanuro, “o ‘princípio esperança’ de Bloch – a aspiração por um mundo melhor –
constituiria a ameaça mais temível que pesa sobre o meio ambiente, já que esta utopia implica a
promessa irrealizável de uma vida melhor para um mundo maior de pessoas” (p. 197).
mudança, que seria fundamentalmente, como já se disse, uma mudança
comportamental), sem tocar nas relações sociais de produção (pp. 197/198).
Além do mais, coloca como principal ameaça – e causa das destruições
ambientais – a tecnologia em si, independentemente de sua apropriação social. Na
crítica ao socialismo, Jonas identifica aquele sistema com sua feição deturpada,
autoritária e burocrática, que foi a existente na antiga União Soviética e em seus países
satélites23. Finalmente, Tanuro critica a visão religiosa de Jonas, por sua (dele, Jonas)
crença de que “um regresso do religioso ajudaria [...] a sair da crise ecológica, graças ao
ascetismo monástico e ao respeito pela criação divina” (p. 199).
Penso, entretanto, que é importante não desmerecer a importância das
religiões, da religiosidade, da espiritualidade ou dos cultos de povos originários e
tradicionais para a luta em defesa de uma relação mais harmônica, justa e sustentável
com a natureza não humana.
Matínez Alier (2007) situa essas cosmovisões na corrente ecologista por ele
denominada de “Culto à Vida Silvestre”, onde – após citar um santo da tradição católica
que contestou a ostentação da igreja e tinha uma afeição especial para com os pobres
e os seres da natureza, Francisco de Assis – chama atenção para “o valor sagrado da
natureza nas crenças indígenas que (nas Américas) sobreviveram à conquista europeia”.
Para ele, a “sacralidade da natureza” tem uma importância muito grande para a
economia ecológica, por contribuir com o debate acerca da “incomensurabilidade dos
valores” (valores aqui pensados em termos da economia de mercado; valor de troca)
dos bens da natureza (p. 23).
Atualmente, já se fala em um “socialismo do bem viver”, a partir dos valores,
representações e tradições dos povos nativos dos Andes, em especial no Equador e na
Bolívia, que influenciaram largamente a produção legislativa naqueles países, a ponto
de se falar hoje em um “novo constitucionalismo latino americano”, como anotam
Freitas e Moraes (2013, pp. 11/28).
No âmbito do debate ecológico, Le Quang e Vercoutére (2013) pleiteiam uma
aproximação entre as teorias do Bem Viver (Buen Vivir) andino e o ecossocialismo;
senão vejamos:

El paso del antropocentrismo al biocentrismo, una de las características de todas las corrientes
del Buen Vivir, permitiria al ecosocialismo integrar una mayor preocupación em torno de las
cuestiontes ambientales, ampliar la problemática del cambio climático a la de las crisis de la
biodiversidade, fundamental para la calidad de vida de los seres humanos y para la preservación
de las otras espécies con las que convivimos (p. 76).

23
Temos muito acordo com Tanuro, quando ele defende que o socialismo é “uma sociedade que produz
valores de uso em função das necessidades humanas reais, democraticamente determinadas” e que,
por esse critério, nem a antiga URSS, nem seus vizinhos, nem a China atual (essa, como diz Tanuro,
mergulhada em “pleno boom capitalista”) poderiam ser considerados países socialistas, mas, “estados
bloqueados no caminho de uma transição para um modo de produção pós-capitalista” (p. 201).
Seria uma via de mão dupla, onde, por outro lado, o aporte marxista do
ecossocialismo poderia reforçar o Bem Viver com o desenvolvimento de “su critica al
capitalismo y fortalecer los argumentos em torno a los câmbios necessários en las
relaciones sociales y de producción” (p. 76).

Mas, não são só os aymara e quéchua nos Andes, mas, também, os sioux norte-
americanos que se levantaram nos EUA contra um oleoduto que Trump liberou e que
pretende passar pela reserva indígena Standing Rock e as várias etnias brasileiras que
têm se levantado contra as megabarragens, como Belo Monte. Costa (2017), em
instigante artigo intitulado “Uni-vos e segui os índios” (numa atualização da consigna do
manifesto comunista: “trabalhadores de todo o mundo, uni-vos”), afirma que os
indígenas estão “Na vanguarda não apenas pela luta por sua existência, mas numa luta
em que representam toda a humanidade – e porque não dizer toda a biota – pela
sobrevivência”.

Volvendo a Tanuro, importante sua crítica à chamada hipótese da “tragédia dos


comuns”, de Garret Hardin, para quem a destruição ambiental se ligaria à apropriação
coletiva dos recursos naturais, vez que, por acreditar que a espécie humana seria
naturalmente egoísta e ambiciosa (características pequeno-burguesas, segundo nosso
autor) e, portanto, só cuidaria e preservaria aquilo que fosse propriedade privada sua
(p. 200). É só olhar em perspectiva o que foi o desenvolvimento do capitalismo industrial
nos últimos quase 200 anos para perceber, a olho nu, de quem é a responsabilidade pela
crise planetária24.

Tanuro afirma que o livro de Jonas exerceu uma grande influência nos
movimentos ambientalistas, a ponto de dizer que o que ele chama de “partidários do
decrescimento” teriam seguido a linha do “Princípio Responsabilidade” ao voltar o foco
para a “crítica cultural do consumismo”, crítica que nosso autor considera necessária,
mas, que leva a desconhecer o próprio modo de produção capitalista.

Interessante observar que Latouche, um dos formuladores desse movimento,


não só entende que o “decrescimento pode ser considerado um ‘ecossocialismo”;
sobretudo se por socialismo se entender, com Gorz, ‘a resposta positiva à desintegração
dos laços sociais sob efeito das relações mercantis e da concorrência, características do
capitalismo’”, mas, considera ainda que esse movimento é “revolucionário e

24
Como diz Tanuro: “à escala histórica, o capitalismo é, sem dúvida, o mais ecosuicidário dos meios de
produção (p. 203).
anticapitalista (e até utilitarista), e seu programa, fundamentalmente político” (2009,
pp. 131/132)25.

Apesar dessa insuficiência e das contradições anotadas por Tanuro – “já não se
denuncia o capitalismo, denuncia-se o ‘desenvolvimento’ (abusivamente equiparado ao
‘crescimento’)” – Tanuro pontua acerca desse pensamento e de outro dos seus
expoentes (no caso, Nicholas Georgescu-Roegen, um dos precursores da economia
ecológica):

{...} há que reconhecer a Georgescu-Roegen o mérito de ter sido um dos primeiros a denunciar o
mito do crescimento material infinito num mundo que é finito, e que os partidários do
decrescimento estão certos num ponto chave: a medida prioritária para estabilizar o clima não é
a implantação de novas tecnologias verdes, mas a diminuição do consumo de energia, e da
produção e transporte de mercadorias (p. 212).

Finalmente, Tanuro se dispõe a enfrentar o debate acerca da relação entre


marxismo e ecologia, a partir de uma análise muito equilibrada, se afastando tanto
daquele pensamento que nega qualquer contribuição marxiana nessa área, como
daqueles que pensam que “a ecologia está ‘no coração do marxismo’”, como Foster (p.
214).

Para nosso autor, uma grande contribuição de Marx foi o conceito de


“metabolismo social”, qual seja, a “’regulação racional da troca de matéria’ entre a
humanidade e a natureza”, a partir do trabalho humano, que é “a mediação particular
entre o Homo Sapiens e seu ambiente”. Para ele, o “caráter infinito dos recursos implica
que o aumento da produtividade do trabalho humano enquanto recurso não pode ser
infinito” e que “a única liberdade possível” consiste na “’gestão racional’ das trocas
materiais entre nossa espécie e o meio (ou ‘metabolismo social’)” (pp.213/214).

Apesar disso, Tanuro reconhece que algumas formulações de Marx e Engels são
“efetivamente ambíguas e criticáveis” (p. 212), para daí desenvolver que há “dois
esquemas” no pensamento marxiano em interface com a questão ecológica, a saber:

- um esquema cíclico evolutivo: a partir da problemática dos solos, O Capital coloca as bases de
um autêntico pensamento socioecológico, construído em torno da noção de regulação das trocas
de matérias, ou seja, da gestão racional dos ciclos naturais modificados pelo impacto humano
[...]

- um esquema linear: a abordagem circular aplicada à questão dos solos não é transponível no
caso da energia. Aqui, pelo facto de não ter compreendido a diferença entre energia de fluxo e
energia de depósito, Marx retoma de facto o esquema utilitarista – recurso > uso > resíduo (CO2)

25
Por essa declaração, em nosso entendimento, fica difícil concordar com a afirmação de Tanuro,
quando qualifica Latouche como porta-voz da “direita do decrescimento” (p. 212), ainda que se possa
criticá-lo (a Latouche) por misturar crescimento e desenvolvimento e este com capitalismo (p. 2017).
– que é da economia clássica. Não há como controlar o impacto porque as condições de
encerramento do ciclo do carbono não são tidas em conta (p. 216).

Esses dois esquemas – que, segundo, Tanuro, são “antagônicos” – vinculam-se a


duas lógicas diferentes (e contraditórias) do pensamento de Marx: a primeira, que
propõe uma “intervenção prudente nos mecanismos naturais (‘a gestão da terra como
um bom pai de família’, como diz Marx n’O Capital’)”; e a segunda, que “traz consigo a
ambiguidade produtivista (‘o crescimento das forças produtivas’ libertadas dos
‘entraves capitalistas ao desenvolvimento’)”. Acerca desse embate, Tanuro constata
que, na produção marxista do século XX, essa contradição foi resolvida em favor da
segunda linha de pensamento; daí a identificação do pensamento socialista com o
produtivismo, em sua visão amplamente majoritária (pp. 216/217).

Já fechando esse capítulo (e o livro), Tanuro apresenta que “a ecologização do


marxismo requer algo mais que uma simples ‘integração’ das questões ecológicas no
combate anticapitalista”, mas, fundamentalmente “integrar o socialismo na ecologia”
(pp. 217/218). Daí, segundo nosso autor, decorrem as seguintes “implicações”:

Primeiro: a noção de “domínio humano da natureza” deve ser abandonada. A complexidade, as


incógnitas e o caráter evolutivo da biosfera implicam um grau de incerteza incontornável [...]

Segundo: é necessário ultrapassar a visão compartimentada, linear e utilitarista da natureza


como uma plataforma física a partir da qual a humanidade opera; como uma loja onde vamos
buscar os recursos necessários à produção da nossa existência social, e como um aterro onde
abandonamos os resíduos dessa atividade [...]

Terceiro: as fontes de energia e os métodos de conversão utilizados para satisfazer as


necessidades humanas não são socialmente neutros. O socialismo, por consequência, não se
pode definir à moda de Lenine como “sovietes mais eletricidade” [...]

Quarto: [...] Numa série de áreas, a implementação de uma alternativa anticapitalista respeitosa
dos equilíbrios ecológicos exige, pelo menos nos primeiros tempos, um decréscimo da
mecanização, a substituição do trabalho morto pelo trabalho vivo (pp. 218/220).

Se Tanuro já alertava à época (2009, onde – recorde-se – a emissão de CO2


estava em 385 ppm), que a saída para a crise dever ter o caráter anticapitalista (ou seja,
“socialista e antiprodutivista” para responder “simultaneamente à urgência social e
ecológica”), imaginemos agora, no ano em que já ultrapassamos os 400 ppm e os sinais
de esgotamento são ainda mais graves (p. 220).

Marques constata que, no cenário atual, a utopia26 é a sobrevivência da


complexa sociedade humana (2015, p. 610), a ponto de retomar de Michel Serres a

26
Acerca de “utopia”, oportuno trazer aqui a bela reflexão de Löwy: “[...] as utopias, isto é, as visões de
um mundo alternativo, as imagens ideais de uma sociedade diferente, não são uma característica
necessária a todo movimento que visa a desafiar a ordem estabelecida?” (2014, p. 95).
proposição de um “contrato natural”, que, a seu ver deveria “fundar o contrato social”
[...] estabelecendo “suas condições de possibilidade” (p. 608).

Conclui Tanuro que “a única liberdade possível é a gestão racional, pelos


produtores associados, das trocas de matéria entre a humanidade e a natureza... dentro
de um cuidadoso respeito de sua complexidade” (não estaria aqui – questionamos –
uma definição de “contrato natural”?). Para aduzir: “o único socialismo possível é um
ecossocialismo” (p. 221), ou, nas palavras, mais uma vez, de Löwy, um “socialismo
verde”, um “comunismo solar” (2014, p. 96). É a essa tarefa que nos chama Daniel
Tanuro e todos e todas que ainda não perderam nem a esperança nem a disposição de
lutar. O grande desafio é a construção de uma sociedade planetária que possa vir a ser
política e radicalmente democrática, social e igualitariamente justa, ecologicamente
respeitosa e sustentável e cultural e etnicamente diversa. É da resposta a esse desafio
que depende o futuro da vida no único planeta conhecido em que ela existe.

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