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COMUNICAÇÃO
RESUMO
1
Universidade Paulista, Curso de Odontologia. Campi Campinas, Av. Comendador Enzo Ferrari, 280, Swift, 13043-900, Campinas, SP,
Brasil. Correspondência para/Correspondence to: P.F.R. BERTOLINI. E-mail: <bertolinipr@hotmail.com>.
2
Pontifícia Universidade Católica de Campinas, Centro de Ciências da Vida, Faculdade de Odontologia. Campinas, SP, Brasil.
ABSTRACT
u30 kg/m2, sendo seu desenvolvimento relacionado rido a sua relação com a Odontologia, com enfoque
à interação genética e ao ambiente, como desordens para a especialidade Periodontia21-24.
endócrinas e/ou metabólicas, estilo de vida, dieta
desfavorável e sedentarismo10.
Estudos em animais
Outra característica associada à obesidade é
a alteração na medida da Circunferência Abdominal Perlstein & Bissada25 fizeram um dos primeiros
(CA), que para os homens saudáveis deve estar em relatos sobre a relação entre obesidade e doença
torno de 102cm, e para as mulheres em torno de periodontal, após realizarem um estudo em ratos
88cm11. Zucher que sofriam de obesidade hereditária, indu-
A prevalência da obesidade tem aumentado zindo a periodontite com o uso de ligadura. Após
substancialmente, nos últimos anos, tanto nos países eutanásia e realização de exame histopatológico, a
industrializados como nos emergentes. Nos Estados reabsorção óssea foi detectada com maior severidade
Unidos, um levantamento de 2004 demonstrou que nos animais obesos, quando comparados aos não
cerca de 34,1% da população apresentava sobre- obesos.
peso, enquanto 32,2% era considerada obesa12. No Amar et al.26 avaliaram em animais o efeito
Brasil, essa característica também tem sido obser- da obesidade sobre a resposta imune inata à infecção
vada13, tanto que o levantamento de 2002-2003, causada por Porphyromonas gingivalis (Pg), um mi-
realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e crorganismo associado à periodontite. Animais ali-
Estatística (IBGE) em conjunto com o Ministério da mentados com dieta associada a obesidade e outros
Saúde, relata que no país existem cerca de 38,4 alimentados com dieta saudável foram infectados
milhões de pessoas com peso acima do recomendado com Pg, tanto oralmente, quanto sistemicamente, e
pelos médicos e especialistas em saúde, o que equi- avaliou-se a sua resposta imunológica, juntamente
vale a 40,6% de sua população adulta. Desse total, com suas características periodontais. Os animais com
10,5 milhões são obesos14. Portanto, essa condição dieta associada à obesidade tiveram fraca respos-
sistêmica vem sendo considerada como um problema ta inflamatória, com reduzida liberação de TNF-D e
de saúde em expansão no mundo13,15,16. IL-6, associada a uma severa reabsorção óssea, quan-
A obesidade é relacionada como fator de risco do comparados aos animais de dieta saudável. Esses
para o desenvolvimento de várias doenças crônicas, resultados sugerem que a obesidade interfere na
como hipertensão, diabetes Mellitus tipo 2, dislipi- habilidade do sistema imune em responder apro-
demias e doenças cardíacas17,18,19. priadamente a infecções por Pg, e que essa desre-
gulação favorece o aumento da reabsorção óssea.
Segundo Thompson & Wolf20, nos países in-
dustrializados, o custo despendido para o tratamento Em animais obesos e hipertensos, o acúmulo
de pacientes obesos e com doenças relacionadas à bacteriano específico resultou em reabsorção óssea
obesidade tem sido calculado em torno de 5% das mais exacerbada, sugerindo que a combinação de
despesas totais demandadas para a saúde. fatores de risco, semelhantes àqueles definidos como
síndrome metabólica, levou a alterações periodontais
mais severas, quando comparados a animais saudá-
Relação entre obesidade e doença veis27.
periodontal
A obesidade, por si só, não causa alterações
Além de a obesidade ser relacionada a doen- periodontais em animais que apresentam saúde
ças sistêmicas e à predisposição para várias comor- bucal, sendo necessário que primeiramente ocorra
bidades associadas a complicações que afetam a a agressão por um biofilme bacteriano específico,
saúde geral do paciente, estudos recentes têm suge- que desencadeie a resposta inflamatória e imuno-
lógica nos tecidos periodontais. Em animais obesos, Entre as alterações periodontais associadas
em que houve prévia agressão por um biofilme ao aumento do IMC estão o sangramento gengival,
bacteriano periodontopatogênico específico, tanto a um dos primeiros sinais clínicos de inflamação, e o
resposta inflamatória quanto a reabsorção óssea aumento de profundidade da sondagem, caracte-
alveolar foram mais severas25. rístico de inflamação tecidual relacionada à obesi-
dade21. Reeves et al.30 documentaram que, a cada
1cm aumentado da CA, houve aumento de 5% no
Evidências clínicas risco de desenvolver periodontite.
gengival, enquanto IL-8 atua como agente quimiotá- estudos que combinaram indicadores de obesidade
tico para neutrófilos, que são estimulados pelo TNF-D. e sobrepeso.
Em pacientes obesos, é observada uma relação dire- A precisão do IMC para avaliar a obesidade
ta da resposta imunológica exacerbada com o IMC32. é controversa, porque essa medida não leva em
Devido ao alto nível de citocinas liberadas, a consideração a distribuição da gordura corporal total.
obesidade pode influenciar na resposta inflamatória Por outro lado, essa distribuição é de suma relevância,
e imunológica do paciente, resultante da agressão pois a obesidade abdominal, geralmente mais alta
causada pelo biofilme bacteriano periodontopa- em homens, é associada com alta morbidade, quan-
togênico, o que sugere que a obesidade pode contri- do comparada à obesidade glúteo-femural, obser-
buir para a exacerbação das doenças periodontais33. vada tipicamente em mulheres11.
Alguns patógenos e seus LPS, assim como as A gordura corporal é precisamente avaliada
citocinas inflamatórias liberadas, ativam a síntese de pela medida da CA, de modo que a associação da
proteínas da fase aguda pelo fígado, as quais auxiliam CA com o IMC torna mais exata a avaliação do pa-
na manutenção do estado inflamatório34. ciente11,37.
No indivíduo obeso, a inflamação associada A CA demonstra uma íntima correlação com
com a agressão bacteriana, como também a libe- a quantidade de tecido adiposo visceral, que é
ração de adipocinas combinadas com a produção caracterizado por ser metabolicamente mais ativo e
de proteínas da fase aguda pelo fígado, pode resultar responsável por liberar grande quantidade de cito-
na alteração do processo metabólico, com elevação cinas e hormônios, quando comparado com o tecido
dos níveis de triglicérides e colesterol, resistência à adiposo subcutâneo11.
insulina e síndrome metabólica. Essas alterações pre- O hábito de fumar tem sido relacionado como
dispõem o indivíduo obeso que tem periodontite às fator de risco de doenças periodontais38. Porém, a
doenças cardiovasculares e diabetes tipo 221,35. relação entre fumo e obesidade foi caracterizada
Ao mesmo tempo, os produtos que resultam como fator de risco independente para a periodontite,
desse metabolismo alterado, conhecidos como pro- sendo que ambos demonstram que sua relação de
dutos finais da Glicação (AGE), observados em indiví- risco com a periodontite é associada com dose-res-
duos que têm resistência à insulina e diabetes tipo posta39. A análise da reabsorção óssea periodontal
2, podem estimular a produção de citocinas. Essa em radiografias tem sido significativamente associada
condição pode tornar o indivíduo mais suscetível à com obesidade em pacientes do sexo feminino e
periodontite, como também dificultar o seu controle entre não fumantes40.
glicêmico3,23. O IMC tem sido associado positivamente à
Nos pacientes obesos, o inibidor da ativação periodontite em pacientes não fumantes, não diabé-
do plasminogênio-1 (PAI-1) tem sua secreção aumen- ticos e com idade entre 30 e 49 anos22. Essa relação
tada pela gordura visceral, e induz a aglutinação do pode ser bidirecional, como indicou o estudo de
sangue, o que pode levar à redução do fluxo san- Wood et al.36, em que não fumantes que possuíam
guíneo no tecido gengival, aumentando o risco de perda de inserção periodontal severa tinham alto risco
doenças periodontais36. O sistema de ativação do de obesidade e sobrepeso.
plasminogênio desempenha função importante na Goodson et al.41 avaliaram as características
resposta inflamatória tecidual e, por induzir a agluti- da microbiota oral de pacientes do sexo feminino
nação do sangue, aumenta a chance de doenças com peso normal e obesas. Foram coletadas amostras
vasculares isquêmicas em pacientes de risco. microbiológicas da saliva de 313 mulheres obesas,
A maioria dos estudos realizados usou o IMC para serem comparadas a dados existentes de pa-
como indicador de obesidade, sendo poucos os cientes com peso normal. A análise microbiológica
foi realizada com sondas de DNA para detecção de intervenção precoce, evitando-se perdas teciduais
40 tipos bacterianos. Sete espécies bacterianas mos- severas. Portanto, consultas regulares ao cirurgião-
traram diferenças entre as pacientes estudadas, sen- -dentista ou ao periodontista devem ser indicadas
do que a espécie Selenomonas noxia mostrou-se para auxiliar na manutenção de níveis adequados
presente em 98% das pacientes obesas estudadas e do biofilme supragengival, o que resultaria em redu-
tem sido caracterizada como periodontopatogênica. ção dos riscos de desenvolvimento de doença pe-
riodontal e cárie34.
Estudos demonstram a possibilidade de asso-
ciação biológica entre doença periodontal e obesi- Rotineiramente, no consultório odontológico
dade por esta influenciar na resposta do hospedeiro, são pedidos exames laboratoriais para minimizar fato-
como também por influenciar na característica da res de risco para a saúde geral, como também para
microbiota bucal. A condição microbiológica poderia maior previsibilidade no resultado de determinados
procedimentos odontológicos, como o tratamento de
influenciar na eficiência metabólica ao longo do trato
doença periodontal. Para avaliar os riscos relaciona-
gastrointestinal, aumentando depósitos de gordura.
dos à obesidade, o cirurgião dentista deve estar atento
Outra hipótese de associação seria que um aumento
às medidas de IMC e CA42.
do apetite do indivíduo ocorreria a partir de substân-
cias derivadas do metabolismo bacteriano41. Portan- A avaliação nutricional é um componente
to, novos estudos devem ser realizados para escla- essencial no tratamento do paciente obeso, o que
recer essas hipóteses de possíveis mecanismos que também auxilia no plano de tratamento odonto-
envolvem obesidade e doença periodontal. lógico, pois indica sua exposição a carboidratos. Um
estudo composto por 402 indivíduos demonstrou que
entre os adolescentes obesos ou com sobrepeso havia
O papel do cirurgião dentista na alta incidência de cáries interproximais, quando com-
abordagem multidisciplinar para parados a adolescentes que tinham peso baixo ou
o tratamento do paciente obeso normal. O registro de um diário de dieta deve ser in-
dicado para pacientes obesos, ao levar em conside-
Comumente, o tratamento do paciente obeso ração o risco de desenvolvimento de doenças bu-
é realizado por atendimento endocrinológico e nutri- cais, como a cárie43.
cional, mas, muitas vezes, é necessária a associação
Ao atender o paciente obeso ou com sobre-
de outros profissionais para tratamento de suas co-
peso, o profissional da área odontológica deve obser-
morbidades, evidenciando uma abordagem multidis-
var as comorbidades apresentadas, como hipertensão
ciplinar16.
e diabetes Mellitus. Portanto, a cada consulta deve
Caracterizado o risco de o paciente obeso ser realizada uma cuidadosa revisão da história mé-
desenvolver doença periodontal, na presença de mi- dica do paciente, incluindo avaliações em sua mu-
crorganismos periodontopatógenos específicos dança de peso, estado cardiovascular, resistência a
associados à alteração na resposta inflamatória, o insulina e síndrome metabólica, para evitar possíveis
cirurgião-dentista deve participar da equipe multidis- complicações durante o atendimento odontológico.
ciplinar que o assiste. Uma avaliação periodontal
A educação do paciente deve incluir uma dis-
criteriosa deve ser realizada a cada consulta odon-
tológica, buscando identificar se a higiene oral se cussão sobre os riscos de saúde associados ao sobre-
encontra adequada e em níveis compatíveis com a peso e obesidade, como também sobre sua condição
saúde. Assim, reduz-se a colonização de possíveis odontológica, orientando mudanças no estilo de vida
periodontopatógenos, como também se torna possí- e comportamentos pró-ativos. O cirurgião-dentista
vel identificar sinais clínicos de inflamação periodon- pode auxiliar seus pacientes monitorando sua saúde
tal, como sangramento gengival e aumento da pro- bucal, como também informando e dando suporte
fundidade de sondagem, o que determinará uma às suas necessidades de tratamento34.
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