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1894

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O Theatro, 20/09/1894

Destina-se esta secção que apparecerá regularmente ás quintas-feiras, a


trazer os leitores da Noticia a par do movimento dos nossos theatros. Quando
estes não medepararem assumpto sufficiente para encher as necessárias tiras
de papel – o que naturalmente succederá muitas vezes – recorrerei aos estados
e ao estrangeiro.
Em todo caso, o Theatro será o objeto exclusivo e obrigado desta chronicas.
***
Chego tarde para dizer que se realizou, em beneficio da Adalgisa Gabbi, o
ultimo espetaculo da companhia Mancinelli.
Infelizmente esse espectaculo não passou sem desgostos, mas os factos
estão longe de ter a importancia que lhes quiseram dar, e o melhor é não
insistir sobre elles.
O tenor De Marchi, accusado de haver promovido o inqualificavel
procedimento da orchestra, que exigiu 2:500$000 da beneficiada, defendeu-se
dessa arguição com um longo artigo.
Melhor faria o insigne artista defendendo-se com uma aria. Um dó de peito
calaria melhor na opinião pública.
A interesseira orchestra, receiosa de uma manifestação de desagrado, que
aliás seria muito justa, desistiu de dar o concerto anunciado para domingo no
club Synphonico. A attitude da imprensa desconcertou os musicos.
E hai está como terminou a estação lyrica de 1894, – anno que ficará
famoso nos annaes do nosso theatro, pelo facto, extraordinario e quase
inverosimil, de um emprezario ter-se suicidado por não poder solver os seus
compromissos.
***
O activo emprezario Milone, uma da victimas do incencio do Polytheama,
trouxe-nos de São paulo a companhia Tomba (opera, opera-comica e opereta),
que estreará depois de amanhã no theatro Lyrico.
Está aberta uma assignatura de 12 recitas, e os preços são convidativos.
A companhia é já conhecida do nosso público.
É por isso que o Milone, apesar de supersticioso como todo o italiano, se
animou a contractal-a. Nem o atemoriza o theatro entenebrecido pela morte
do Mancinelli, nem esse nome de Tomba, que significa tumba.
***

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A companhia Modena, depois de passar do São Pedro para o Recreio e
do Recreio para o Lucinda, dá hoje o seu ultimo espectaculo no Lyrico, em
beneficio das escolas italianas.
Parte amanhã ou depois para Juiz de Fora, a bella cidadezinha mineira,
que depois de ter sido (theatralmente fallando) inventada pelo Novelli,
tornou-se uma espécie de porto de salvação para as companhias theatrais que
naufragam no Rio de Janeiro.
Juiz de Fora possue um elegante theatrinho que tomou o nome do grande
artista acima citado. O theatro Novelli é bem construido, bastante comodo e
todo illuminado a luz electrica.
Estou certo de que os habitantes da “princesa do Parahybuna” farão o
melhor acolhimento à companhia Triozzo, ao Snr. Cuneo e aos demais artistas
da companhia Modena.
***
O Variedades e o Sant’Anna fizeram ambos reprise dos Sinos de Corneville,
e, pelos modos, nem um nem outro tiveram que se louvar dessa idéa, pois a
opereta de Planquette desta vez não se demorou nos cartazes.
Ambos os theatros variam agora os seus espectaculos com o Periquito, a
Niniche, a D. Juanita, e outras velharias, enquanto não ficam promptos, no
Variedades, o Diabo Coxo e no Sant’Ana o Surcouf, que servirá de ponte para a
Cornucópia do Amor, a nova magica de Moreira Sampaio.
O Solar dos Barrigas, apesar do engraçado libretto – um tanto descosido
– de Gervásio Lobato e D. João da Câmara, e da bonita partitura de Cyriaco
de Cardoso, não justificou as esperanças dos dois theatros que o exhibiram
simultaneamente.
O Recreio, que já o havia substituido pelo Patriota, vae de novo substituil-o
pelo Mundo da Lua, revista de Figueiredo Coimbra, o aplaudido auctor da
Carta Anonyma.
O Apolo substituiu-o pela Vovó, e, ao que parece, apanhou com essa revista
de Moreira Sampaio e Vicente Reis um sucesso que talvez se iguale ao do
Abacaxi, dos mesmos autores.
O theatro enche-se, de modo que tão cedo não teremos o Rapaz de Saias,
cuja primeira representação será dada em benefício da Rosa Villiot, nem o Gato
Preto, cuja primeira representação será dada em benefício de Mattos.
Inegavelmente é a Vovó um espectaculo que satisfaz a massa popular.
Eu seria um dos apologistas da peça, senão houvesse a última scena
repugnantíssima, aliás desnecessária, passada no Rocio, e se a atriz Mathilde

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Nunes – cujo talento os auctores da Vovó não souberam, não quizeram ou não
puderam aproveitar – tivesse um bom papel.
***
Ha muito tempo não vinha ao Rio de janeiro uma companhia equestre tão
completa como a que trabalha actualmente co São Pedro, sob a direção do
popularissimo Frank Brown.
Fazem parte déssa companhia alguns artistas que podem ser considerados
de primeira ordem.
O clown Laplace (Tony, o imbecil) tem muitissima graça. É um achado,
um verdadeiro achado aquella escova que tanto o preocupava, e de que elle se
serve do princípio ao fim do espectaculo sem se tornar monotono, sem fatigar o
espectaculo.
Uma companhia assim, com habeis artistas, mulheres bonitas, clowns
engraçados e bons animaes, leva-me quasi a perdoar a sacrilega transformação
do theatro de João Caetano em circo de cavalhinhos.
***
Hoje, estréa, no Lucinda, de uma nova companhia de operetas que tem
como estrella a Pepa e como estrello o Brandão. Representa-se o Tim tim por
Tim tim, de Souza Bastos.
A. A.

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O Theatro, 27/09/1894

Acho-me seriamente embaraçado para escrever a chronica theatral dos


ultimos sete dias, e melhor seria não escrevel-a, porque ha uma semana que
estou prohibido de sahir de casa á noite, sob pena de aggravar os calamitosos
effeitos de um resfriamento.
Entretanto, quantas novidades em sete noites!
***
Não assisti ao espectaculo da estréa da nova companhia do Lucinda; perdi a
1a representação do Tim tim por tim tim e o ensejo de cumprimentar a graciosa
Pepa, que desempenha nada menos de dezoito papeis n’aquella revista.
Olhem que dezoito papeis são muitos papeis para uma artista só! Emfim...
a peça é de Souza Bastos, e o Souza Bastos, que durante muito tempo foi o
emprezario da Pepa, sabia perfeitamente o que ella dava, e conhecia-lhe todos
os recursos.
***
Não assisti a nenhum dos espectaculos da companhia Tomba de que toda a
gente diz maravilhas; perdi [t. i.]
Ahi está uma companhia que não póde deixar de agradar, porque, segundo
me consta, os artistas são bons, a enscenação é magnifica, e, segundo vejo, os
bilhetes são baratos e o repertorio eclectico.
O nosso publico dá o cavaquinho pelo eclectismo no theatro,
principalmente quando se trata de musica. Não póde deixar de seduzil-o esse
amalgama de Verdi, Suppé, Chapi e os irmãos Ricci.
E para mais frisar o seu cosmopolitismo, a companhia Tomba annuncia a
Carmen, de Bizet.
***
Não assisti á representação do Mundo da lua no Recreio Dramatico,
mas lá irei, nem poderia deixar de fazel-o, tratando-se de uma peça em que
figura o nome de Figueiredo Coimbra, escriptor nosso, que me merece toda a
consideração.
No meu proximo artigo communinicarei aos leitores da Noticia as
impressões que me deixarem o Mundo da lua, e as reprises, annunciadas ambas
para hoje, do Diabo coxo, no Variedades, e do Surcouf, no Sant’Anna, com o
Peixoto no papel de Jacaré, que até hoje só tinha sido representado [p. i.]
E é [p. i.] póde-se dizer [t. i.] que elle era emprezario, o personagem
que mais o seduziu na opereta de Chivot, Duru e Planquette foi, não o de

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Jacaré, mas o de Kerbinious, e, se não se atirou a este como gato a bofes, foi
simplesmente por não ter na companhia um collega a quem pudesse confiar
aquelle.
Factos d’essa ordem são muitos freqüentes em theatro. O grande Frédérick
Lemaître (trarei um exemplo illustre) ficou muito contrariado quando Victor
Hugo, depois de ler o Ruy Blas aos artistas do Renaissance, lhe distribuiu o
papel do protogonista, em vez do de D. Cesar de Bazan, que lhe agradava mais,
e com o qual contava. Entretanto, sabem todos que Lemaître foi prodigioso na
representação de Ruy Blas.
Releva dizer que, apezar do exito colossal que elle conseguiu n’esse
difficil papel, pezaroso ficou de não haver desempenhado o outro, o que levou
Adolpho D’Ennery a escrever e offerecer-lhe o seu drama Dom Cesar de Bazan,
que foi um novo triumpho para o grande e incomparavel actor.
***
O principal attractivo da reprise do Diabo Coxo é a estréa do actor Alberto
Augusto.
Trata-se de Alberto Pires – conhecem? – amador notavel que resolveu agora
transformar em profissão [t. i.]
O novo actor era ainda ha pouco mezes amanuense da secretaria da
industria, viação e obras publicas.
_________
O meu resguardo impediu-me igualmente de dar uma chegada ao S.
Pedro para apreciar miss Taylor nos seus trabalhos de “serpentina equestre”
e “serpentina voadora, e de ir ao Tivoli bater palmas ao transformista e
cançonetista Casthor, que no seu genero é um magnifico artista.
***
A proxima semana reserva-nos duas novidades, que não são precisamente
novas: a estréa do actor Joaquim de Almeida no Lucinda, e no Apollo a
primeira representação do Rapaz de saias, em beneficio da Rosa Villiot.
***
Os nossos theatros vivem principalmente dos de Pariz; por isso, creio
que terá certo interesse para os meus leitores a noticia da peça que acaba de
inaugurar a estação theatral pariziense de 1894 – 1895.
É uma comedia em 3 actos, de Maurice Hennequin, filho do defunto
Hennequin dos qüiproquós. Intituila-se Les joies du foyer, e foi representada no
theatro [p. i.] Palais-Royal em 1o do corrente.

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O assumpto é o seguinte:
[p. i.], um solteirão que levou a [p. i.] na pandega sentindo-se velho e
cançado, resolve viver em familia, e corta relações com uma cocotte, Angela
Pinteau, que lhe custa rios de dinheiro.
Entretanto, como Therillac já se não considera em idade de comprar um
bilhete na loteria do casamento, vai ter com seu sobrinho Adriano, paga-lhe as
dividas, dota-o, e casa-o com Mlle. Annette de La Thibaudière, filha de Mr. e
Mme. de La Thibaudière, um velho casal tão unido que faz lembrar Philemon e
Baucis.
De volta da classica viagem de nupcias, Adriano e Annette vão morar n’uma
bella casinha que Therillac alugou e mobiliou. Ahi viverão juntos todos tres,
como Deus com os anjos, e o tio, que será sempre para elles um santo-antoninho-
onde-te-porei, conhecerá, finalmente, as alegrias do lar, – les joies du foyer.
Acontece, porém, que, durante a viagem, os noivos desavieram-se por um
motivo futil, e essa desavença azeda-se agora nos penates. Intervem a sogra, mas
só consegue irrital-os ainda mais um contra o outro.
Desesperado, Adriano revolta-se, e o seu exemplo arrasta o velho La
Thibaudière, pobre diabo que ha 20 annos é opprimido pela cara-metade. Genro
e sogro vão de sucia para a pandega, e La Thibaudiére toma um [p. i.: “pinto”?].
A desharmonia torna-se completa entre os dous casaes, transformando n’um
verdadeiro inferno a casa de Therillac que, arrependido, procura de novo a sua
cocotte.
E emquanto o solteirão vai reatar em Nice o frio dos seus interrompidos
amores, Adriano faz as pazes com Annette, e os dous velhos se reconciliam.
Como veem os leitores, a comedia não dá o que o titulo promette. Uma peça
que se intitula as Alegrias do lar e é exhibida no Palais-Royal, faz esperar uma
pintura ironica da vida conjugal, uma satyra mais ou menos viva que mostre o
reverso d’essa medalha, a familia. O auctor, que d’esta vez não mostrou engenho
nem observação, explorou o assumpto de um modo muito indirecto, ou por
outra, não o explorou. Uma vez que Therillac, apezar do seu desejo de viver em
familia, se conserva solteiro e livre como um passaro, todo o comico da situação
é sensivelmente attenuado. Por isso, a comedia agradou mediocremente.
O eximio actor Sant-Germain foi muito elogiado no papel do velho La
Thibaudeère. Do de Annette encarregou-se a actriz Kerwich, que aqui esteve por
duas vezes, ambos com o grande Coquelin. O da cocotte foi bem interpretado por
Alice Lavigne, uma das atrizes mais estimadas em Pariz, e que no Rio de Janeiro
– lembras-te, Lulú Senior – passou quasi despercebida quando trabalhou no
saudoso Alcazar[ps. is..: “da rua”?] Uruguayana.
A. A.

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O Theatro, 11/10/1894

Tivemos no Lyrico, pela companhia Tomba, Carmem, opera em 4 actos, de


Meilhac e Halévy, musica de Bizet; La mascotte, opereta em 3 actos, de Chivot e
Duru, musica de Audran, e Le petit duc, de Meilhac e Halévy, musica de Lecocq,
– tres peças bastante conhecidas da nossa platéa, o que naturalmente me
dispensa analysal-as aqui.
***
O annuncio de Carmem, que ha muito tempo não era cantada no Rio de
Janeiro provocou um grande movimento de curiosidade, e o theatro encheu-
se de um publico animado das melhores disposições. Infelizmente o resultado
não correspondeu á espectativa. A enscenação era o que se podia exigir de
me melhor, mas a orchestra, insufficientissima, claudicou por vezes, os córos
estiveram de um indisciplina lastimável e todos os papeis foram mais ou menos
sacrificados.
A Sra. Paoli tem voz, sabe cantar e não é destituida de talento, mas nem
as suas aptidões artisticas nem o seu physico se compadecem com o typo da
Carmem, que é, talvez, o personagem mais complexo, mais difficil e mais
esmagador de todo o repertorio lyrico moderno.
O publico applaudiu, levado, sem duvida, pela justa consideração da
modicidade dos preços dos bilhetes; mas o chronista, que vai de graça ao
theatro, nada tem que ver com isso; o mais que póde fazer é repetir o que diz
a sabedoria das nações: o barato sai caro. As pessoas que não conheciam a
Carmen e foram ouvil-a pela companhia Tomba tiveram apenas uma pallida
idéa do que é a primorosa e incomparavel opera que traçou novos e amplos
horizontes á escola musical franceza.
***
A companhia desforrou-se com a Mascotte.
As operetas francezas por via de regra só me satisfazem quando
interpretadas pelos proprios francezes; entretanto, força é confessar
que, graças á Sra. Gori Pascuali e aos Srs. Milzi e Poggi, sahi do theatro
satisfeitissimo.
A Sra. Pascuali – que parece ter, pelo menos, uma costella pariziense
– representou e cantou o papel de Beltina, a mascotte, com a petulancia, a
desenvoltura e a graça da Montbason; o Sr. Milzi mostrou os seus magnificos
dotes de actor comico, principalmente na engraçada scena do 2o acto, quando o
principe Frittelini vem ler ao principe de Piombino a carta que recebeu do pai;
o Sr. Poggi, outro comico insigne, fez rir devéras no personagem de Rocco, o

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lavrador que na engenhosa traducção de Eduardo Garrido figura com o nome
de Crispim.
***
Não me agradou tanto a representação de Il duchino.
Tenho ainda muitos louvores para a Sra. Pascuali, um duquesinho de
agradar aos espectadores mais exigentes; mas o Sr. Poggi, que na Mascotte se
mostrára de uma sobriedade louvavel, apalhaçou lamentosamente o papel
do preceptor Baccello (Frimousse no original) e escangalhou – é o termo – o
famoso duettino C’est une idylle, um dos trechos mais apreciados da mimosa
partitura de Lecocq.
O barytono Tosi cantou com toda a força dos seus invejaveis pulmões o
papel de Montlandry, como cantára o de Pipo, da Mascotte. Com que surpreza
lhe ouvi expectorar as delicadas coplas do 2o acto – Vous menacez! a Dieu ne
plaise... – e as do 3o – Il était um petit bossu – com todo aquelle vigor, como
se cantasse trechos dramaticos de grandes operas pretenciosas, pondo no
final das coplas umas cadencias que nunca passaram pela imaginação do
compositor! Verdade seja que o publico applaudiu com enthusiasmo...
A Sra. Cattaneo, que tanto me agradou no Vendedor de passaros,
encarregou-se do interessante papel de Diana de Castel Lansac, a directora do
collegio de meninas do 2o acto, e fez-me saudades da Henry, que era impagavel
n’esse papel. Não lhe perdôo, aquelles gritos inopportunos durante a valsa do
solfejo, outro delicadissimo trecho.
O traductor italiano accrescentou ao Petit duc scenas e falas que destoam
do espirito geral da peça, escripta, como se sabe, por dous dos mais acreditados
mestres do theatro contemporâneo.
E que instrumentação barulhenta! Pobre Lecocq!
***
Apezar de todos esses senões, que nada valem comparados com os
horrores que todas as noites presenciamos em nossos theatros, cada uma das
representações da companhia Tomba constitue um bom espectaculo.
É para louvar no emprezario o apuro da enscenação, a propriedade dos
scenarios e petrechos, a riqueza dos vestuarios etc., cousas a que não nos
habituaram as companhias de arribação.
N’outro ponto não se parece esta com as outras que cá têm vindo, e muito
menos com as nossas: trouxe algumas coristas bonitas, a julgar pelo meu
binoculo, em que, aliás, não tenho grande confiança. Em todo caso, de longe
são um verdadeiro regalo para os olhos. Nos nossos theatros os córos estão a
pedir accento circumflexo.

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***
A companhia Tomba só attrahe grande concurrencia quando representa
operas. A Filha do regimento encheu o theatro, encheu-o a Carmem e ha de
enchel-o a Lucia, que está annunciada para hoje. As operetas não chamam
tantos espectadores.
Por que? Por causa do theatro. O publico entende que nos annuncios de
uma companhia italiana, que trabalha no Lyrico, só devem figurar operas
lyricas. Se ainda houvesse o Polytheama, o Sr. Tomba apanharia uma enchente
por noite, como no anno passado. Mas felizmente o Polytheama ardeu.
Felizmente digo, porque quero crer que se construa um theatro decente no local
outr’ora occupado por aquelle desgracioso barracão.
***
Nos outros theatros nada de novo: no Recreio os Irmãos das Almas,
continuam a servir de léver de rideau ao Mundo da lua; no Lucinda as
representações do Tim tim por tim tim, e no Variedades as do Diabo Coxo
proseguem desassombradamente; o Apollo e o Sant’Anna variam os seus
espectaculos com peças vistas, emquanto não nos dão – aquelle Naná Kan-
kan, e este a Cornucopia do Amor; no S. Pedro o Frank Brown e os seus artistas
continuam a deliciar o publico.
***
Conversemos agora um pouco sobre a estação theatral de 1894-95, na
Comédie Française. Presumo que interesse aos meus leitores o que se passa no
primeiro theatro do mundo.
A estação foi inaugurada com uma réprise de Severo Torelli, de François
Coppée, peça que se transferiu do Odéon para a casa de Molière. Em Pariz, a
Comédie e o Odéon são para o theatro o mesmo que os museus do Luxembourg
e do Louvre são para a pintura.
Ao nosso publico não é estranho o drama ou, antes, a tragedia de Coppée;
viu-a representada pelos artistas da companhia de theatro de D. Maria II, de
Lisboa, traduzida em versos por Macedo Papança.
A critica pariziense acha que o auctor de Le passant está contrafeito
no meio do material e dos accessorios da tragedia. A peça é perfeitamente
correcta, mas molle, emphatica e invertebrada.
Ao Severo Torelli succederá Vers la joie, comedia em 3 actos, em verso, de
Richepin, a qual já é indiscretamente apontada como a obra prima do poeta
das Blasphemias e das Caricias.
Quasi ao mesmo tempo se fará uma reprise de Le chandelier, de Musset,
depois virá Le pardon, comedia em 3 actos, em prosa, de Jules Lemaître.

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Diz-se tambem, mas não se afiança, que no fim do anno será representada
uma nova peça de Dumas Filho, mas não é ainda a tão annunciada Route de
Thèbes.
Além d’essas, tem a Comédie promptas para entra em ensaios, entre outras,
as seguintes peças: Fredegonde, 5 actos, em verso, de Dubout, um poeta que é
banqueiro; Madame Roland, 4 actos, em verso, de Bergerat; Le fils de Aretin, 5
actos, em verso, de Bornier; Les tenailles, 3 actos, em prosa, do Paul Hervien.
***
Diz-se, no ultimo numero de um periodio publicado n’esta cidade, que
a Noticia está sendo roubada por mim. É um desaforo, é; como, porém, no
mesmo numero do mesmissimo periodico é atrozmente insultada uma senhora
que não tem, para defendel-a, nem marido, nem pai, nem irmão, nem filho, –
eu considero-me sobejamente vingado.
A.A.

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O Theatro, 18/10/1894

Os espectaculos da companhia Tomba succedem-se... e não se parecem.


A Lucia de Lammermoor, de Donizetti, foi um verdadeiro triumpho para
a Sra. Cappellaro, que interpretou perfeitamente a heroina de Walter Scott e
cantou muito bem o famoso rondó do 3o acto. O publico fez-lhe uma ovação.
***
Depois da Lucia, Colombo, opera em opera em 1 acto, de Campo-Arana,
musica de Llanos.
É uma peça de momento, escripta e representada em Madrid, por occasião
das festas que se fizeram ao quarto centenario de Christovão Colombo.
O auctor do libretto não deu muito que fazer á imaginação, e o da partitura
– talvez pela pressa com que se desobrigou da encommenda – copiou que foi
um gosto.
Um bravo ao barytono Pozzi, que nos deu uma bella figura de Colombo.
Rodolpho Bernardelli, que na platéa occupava uma cadeira ao lado da
minha, disse-me que em Chicago, durante a exposição, viu uma infinidade de
Colombos, e, como typo, nenhum lhe agradou mais do que este.
Não sei qual seria o physico do famigerado almirante. Ha d’elle innumeros
retratos que não se parecem nada uns com os outros, e nos Estados-Unidos
em vão quizeram averiguar qual de entretantos seria o real; mais facil foi
a Colombo descobrir a America, do que á America descobrir Colombo.
Entretanto, o typo que nos deu o Sr. Pozzi é tal, que o espectador diz comsigo:
– Devia ser assim mesmo.
***
Depois do Colombo vieram os Salteadores, de Offenbach.
Acerca d’esta opereta ainda ha pouco tempo dizia um dos melhores criticos
francezes: “...cette pièce ravissante, bourrée d’esprit, pleine de talent, ces trois
actes étincelants où la fantaisie se mêle à l’observation la plus fine; cette musique
parisienne, spirituelle, endiablée, adorable; cette partition inouïe, dans laquelle il
n’y a pas une défaillance...”
Pois bem; um traductor italiano, desalmado e inconsciente, agarrou na
peça franceza, tão engenhosa, tão harmonica, e tranformou-a n’uma ignobil
moxinifada, supprimindo as situações e os ditos de mais espirito, mutilando as
scenas e os numeros de musica
A’s pessoas que já viram representar ou já leram Les brigands, direi apenas
que n’esta traição italiana, entre outros attentados imperdoaveis, supprimiram
a scena do 2o acto em que apparece a embaixada hespahola, trazendo ao

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principe de Mantua a princeza de Granada, e alteraram completamente
o magnifico dialogo do 3o entre o famoso caissier e Falsacappa, o chefe da
quadrilha de salteadores, disfarçado em conde de Gloria-Cassis.
Nunca assisti a uma representação theatral que me indignasse tanto! Com
que direito se desfigura tão estupidamente um libretto e uma partitura de
mestres? Crimes identicos têm se praticado no Rio de Janeiro e ninguem deu
por elles, mas isso não admira porque, em materia de theatro, nós vivemos
quasi segregados da civilisação européa; o que admiro é que essas cousas se
façam na Italia, e não sejam severamente punidas.
***
A magnifica opereta a que me refiro não é feliz n’esta terra. Representada
em francez, e bem representada, quer no Alcazar quer no Cassino Franco-
Brasileiro (hoje Sant’Anna), jamais obteve o successo que alcançaram o Barba
Azul e a Gran-duqueza, dos mesmos auctores, apezar de nada lhes ficar
devendo. Traduzida em portuguez e representada, em setembro de 1884, no
theatro Principe Imperial (hoje Variedades) passou despercebida, e ha dous
annos, no theatro Sant’Anna, em vão tentaram impol-a ao publico. É verdade
que a representação era detestavel.
E que lastima! os excellentes artistas da companhia Tomba dar-nos-hiam
uns magnificos Brigands, se tivessem no seu repertorio a peça franceza e não
aquella babozeira sacrilega.
***
Apezar de termos opera italiana desde a época da Independencia, e em que
peze a grande popularidade de Paiziello, que foi o mais fecundo compositor do
seu tempo, pois só operas deixou algumas cem, creio que esse nome illustre só
hontem figurou n’um programma de espectaculos no Rio de Janeiro.
Giovanni Paiziello nasceu em Tarento em 1741 e morreu em Napoles em
1816, depois de percorrer triumphantemente toda a Europa, demorando-se em
algumas côrtes. Foi contemporaneo e rival de Cimarosa e Piccinni. A sua opera
que mais agradou intitula-se La Frascatane. Dizem que as suas composições
eram tantas, que elle proprio não sabia o numero d’ellas.
O seu Barbeiro de Sevilha, hontem cantado pela companhia Tomba,
constitue um espectaculo muito agradavel, não obstante o caracter ingenuo
e primitivo da partitura e a exiguidade da orchestra. Se de vez em quando
nos fizessem ouvir uma opera assim, ao cabo de tres ou quatro audições não
resistiriamos á monotonia e ao cansaço; uma audição isolada, como a de
hontem, é um bello derivativo, que nos transporta a uma época mais calma e
sobretudo mais elegante que a nossa.

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Ouvindo hontem essa opera, de vez em quando eu fechava os olhos, não
para dormir, creiam, mas para imaginar-me n’um salão do tempo de Luiz XV,
cheio de bellas mulheres vestidas e empoadas á Pampadour, como as pintava
Wateau, e de fidalgos de cabelleira de rabicho, chapéo de tres bicos debaixo do
braço, florete á cinta e talon rouge.
E nesse salão cantava-se a opera. Os artistas estavam separados dos
espectadores por um cordão de seda. A um lado, o quartetto de musicos de
camera, e sentado ao cravo o proprio auctor da partitura, dando o lamiré aos
cantores.
Dizem que Rossini pagou com uma pateada a sua audacia de ter posto em
musica, depois de Paiziello, a comedia de Caron de Béaumarchais. Entretanto,
que abysmo entre os dous Barbeiros! Paisiello era um talento; Rossini era um
genio, e a sua opera incomparavel ha de durar emquanto houver no mundo um
ouvido que ouça e um coração que pulse!
***
Tivemos hontem no Variedades a primeira representação da opereta em 3
actos Fogo no convento!, de Ordonneau e Keroul, musica de Serpette.
A peça intitula-se no original Cousin-cousine, e foi traduzida pelo Iriel do
Jornal do Commercio, pseudonymo e que mal se esconde Jayme de Séguier, um
dos bons escriptores da lingua portugueza.
No meu proximo folhetim fallarei do Fogo no covento!
***
Nos outros theatros nada de novo, a não ser, no Recreio, uma reprise da
Festa na roça, de Martins Penna, e no S. Pedro a pantomina Cendrillon, que
todas as noites faz as delicias da criançada. Ri-me a perder vendo o czar da
Russia, na côrte do principe Arthur, perder a gravidade e avançar gulosamente
para uma bandeja de doces, empurrando a rainha Victoria.
A. A.

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O Theatro, 25/10/1894

Já vão longe os excellentes artistas da companhia Tomba; venho tarde para


fallar da Somnambula, de Donizetti, do Fra Diavolo, de Auber, e do Orpheu, de
Offenbach.
Dizem-me que o emprezario Tomba partiu com disposições de voltar em
1895, trazendo-nos uma nova companhia de opera, opera comica e opereta, da
qual fará parte o actor cômico Marchetti, que o anno passado tão applaudido
foi no Polytheama. Ainda bem.
***
Tivemos no Variedades, em beneficio do Machado, a primeira
representação da opereta em 3 actos Fogo no convento, de Maurice Ordonneau
e Henri Kéroul, musica de Gaston Serpette, traducção de Iriel, pseudonymo de
Jayme de Séguier.
A peça original intitula-se Cousin-cousine e foi representada pela primeira
vez em Pariz, no theatro das Folies Dramatiques, aos 23 de dezembro do anno
passado.
A sua unica originalidade consiste no papel de Tapenotte, um typo que,
sendo ao mesmo tempo tabellião e presidente de uma sociedade coral, põe
musica em todos os documentos do seu cartorio e solfeja quando se dirige
aos escreventes, que são todos membros da tal sociedade, e cantam em côro a
lettra dos editaes.
Em casa d’esse melodioso serventuario publico, o elegante Pomerol, official
de caçadores a pé, encontra-se por acaso com sua prima Thereza Courtelin,
que elle não conhece, porque as respectivas familias desavieram-se como os
Capuletti e os Montechi.
Sabendo que Pomerol se acha prevenido contra ella, a prima, que
ainda está no collegio, apresenta-se ao primo com o nome de uma de suas
condiscipulas, Henriqueta de Bellefontaine.
A este qüiproquó cumpre accrescentar outro: Henriqueta de Bellefontaine
é requestada, sob o nome de Thereza Courtelin, por Gontran Jolivet, tambem
official de caçadores a pé e amigo de Pomerol.
As collegiaes são acompanhadas por uma das professoras, Veronica de
Sant-Castel, ex-cocotte, conhecimento antigo do tabellião, que, desejando
matar saudades, consegue introduzir-se á noite no proprio collegio. Má idéa,
porque esse singular estabelecimento de educação péga fogo, e as educandas,
aterradas pelo incendio, fogem dos seus dormitorios e vão refugiar-se n’um
quartel actualmente desocupado.

15
Para poder tambem fugir, o pobre tabellião tem que se vestir com roupas
de mulher. Tomam-no por uma nova inspectora que era a todo o momento
esperada.
Os dous officiaes enamorados chegam ao quartel com o seu destacamento,
e d’ahi por diante as peripecias e os quiproquós succedem-se de forma tal que é
impossivel contal-os.
O terceiro acto é ainda mais engraçado que os precedentes. A situação dos
dous rapazes diante das namoradas com os nomes invertidos, o espanto do
tutor das meninas, velho gaiteiro que persegue as criadas de servir, o receio
que tem o tabelião de que lhe descubram a falcatrua, e a apparição imprevista
dos membros da sociedade coral, que a proposito de qualquer cousa entoam
os seus cantos, – tudo isso são elementos que arrancam boas gargalhadas ao
publico.
A partitura é muito bem feita, se bem que ligeira e despretenciosa como
convém ao libreto.
No desempenho destaca-se o Machado, que representa muito bem o papel
de Tapenotte, o tabellião, e melhor o representará quando o souber na ponta
da lingua.
Este actor – um dos melhores que ainda nos restam – tem o defeito de só
decorar os seus papeis durante as representações. Só depois das oito ou dez
primeiras, começa elle a dar-lhes uma interpretação definitiva.
Quem quizer verificar quanto é exacta essa observação, compare o que faz
o Machado nos seus papeis novos com o que faz nas Andorinhas, no Periquito,
nas Furias do amor e n’outras peças em que é simplesmente inimitavel.
O consciencioso Rocha desempenha muito satisfatoriamente o papel do
velho gaitairo; a graciosa Lopiccolo, que faz bisar uns couplets bregeiros do 2º
acto, parece-me um tanto contrafeita no da priminha Thereza; a Leonor Rivero
é uma bonita Veronica, e os demais artistas, se não prejudicam os seus papeis,
nenhum relevo lhes dão.
A peça, que está bem posta em scena, tem agradado bastante e dará tempo
á empreza para cuidar vagarosamente da annunciada reprise do Frei Satanaz.
***
Em 16 de janeiro de 1892 foi representado pela primeira vez, no theatro
das Nouveautés, em Pariz, o vaudeville em 3 actos Nini Fauvette, de Charles
Clairville.
Esse vaudeville, transformado em opereta por Eduardo Garrido, que
lhe mudou o titulo para Naná Kan-kan, e posto em musica pelo applaudido
maestrino Costa Junior, foi ante-hontem representado no Apollo, em beneficio
do Mattos.

16
A peça tem muita analogia com a Família Pont-Biquet, comedia de Bisson,
representada em Pariz quatro dias antes, e exhibida o anno passado no Recreio
com o titulo o Homem-peixe.
Náná-Kan-kan é uma cantora da moda, uma especie de Yvette Guilbert.
Armando, um rapaz muito simplorio, está apaixonado por ella; no entanto,
urge que esses amores tenham um termo, porque elle vai casar-se com a filha
do advogado Galinois, homen austero, a quem os collegas chamam a “vestal
do foro”.
Imaginem que o proprio advogado se encarrega de ir á casa da actriz
negociar com esta a liberdade do futuro genro, e que, por circumstancias cuja
narração seria longa, é apanhado como amante de Náná pela policia e pelo
marido d’ella, que, desejando divorciar-se, quer a todo transe arranjar um
flagrante delicto de adulterio.
No 3o acto tudo se desembrulha: Galinois justifica-se, Náná e Armando
separam-se e faz-se o casamento.
A peça é engenhosamente urdida, tem muita observação e muito espirito,
accrescentado ainda pela magnifica traducção de Eduardo Garrido, o rei dos
traductores theatraes.
A empreza do Apollo devia ter posto esta opereta em scena com mais
confiança, mas foi levada a excessos de economia, creio, pela repulsão que de
tempos a esta parte o publico tem manifestado pelas peças que não sejam de
grande espectaculo.
Entretanto, ha muito que não viamos nos nossos theatros uma comedia
representada com tanta igualdade de desempenho.
Rosa Villiot é insigne no papel da protogonista, Adelina Nunes satisfaz
plenamente no da noiva, Balbina é perfeita no de Mme. Galinois, Maia
apresentou no de Chignon de La Tronchère, tio de Armando, a quem substitue
no coração de Nánaá, um bello typo de vieux beau, e Rangel não encontra no
Rio de Janeiro competidor no papel de Armando.
Mas as honras do desempenho cabem ao Mattos, que tem no austero e
ridiculo Galinois mais um bom papel para a sua já numerosa collecção. O
distincto actor, sem recorrer a exaggeros, sem se afastar uma polegada do
bom caminho, não perde nenhum dos effeitos comicos do seu personagem.
A sobriedade com que o representa é digna dos applausos que o publico lhe
dispensou ante-hontem.
Náná Kan-kan não é uma peça de grande espectaculo; conto, porém, que o
publico não deixe o Apollo ás moscas.
***

17
No Lucinda é a Miola quem agora representa no Tim tim por tim tim os
dezoitos papeis da Pepa, que se zangou com os emprezarios e deixou de fazer
parte da companhia.
Nos demais theatros não houve maior novidade.
_____
A companhia do Recreio, que já poz em scena os Irmãos das almas e a Festa
na roça, de Martins Penna, está, segundo me consta, ensaiando Quem casa quer
casa, e vai ensaiar o Caixeiro da taverna, do mesmo auctor.
Applaudo com enthusiasmo essa resolução, artistica e patriotica, de
mostrar á geração actual que nós, brasileiros, possuimos um comediographo
notavel. Quem casa quer casa vale mais que quanta Náná Kan-kan e quanto
Fogo no convento possamos importar dos boulevards parizienses.
A. A.

18
O Theatro, 01/11/1894

Ante-hontem espalhou-se rapidamente n’esta capital a noticia do


fallecimento do actor Xisto de Paula Bahia.
Deu-se o infausto acontecimento em Caxambú, onde o artista se achava
em tratamento da grave affecção cardiaca que ha mezes o accommetêra e
nenhuma esperança deixava á sua família e aos seus amigos. Effectivamente,
quem nos ultimos tempos o viu representar no Sant’Anna o papel do vigario da
opereta Abel-Helena – o seu ultimo papel, – entristecia-se encontrando n’elle
apenas o doloroso vestigio de um talento comico de primeira ordem.
Sou, talvez, um pouco suspeito para fallar de Xisto Bahia. A nossa amizade
durou mais de trinta annos; eu era um fedelho quando o vi pela primeira vez,
em 1863, no Maranhão, mas nós conheciamo-nos desde esse tempo, porque elle
era muito amigo de meu pae e o visitava a miudo. Eu tinha-lhe, por isso, um
affecto quasi filial.
Xisto Bahia fôra levado á minha provincia pela empreza Colás & Couto
Rocha, Iniciava a sua carreira artistica.
Nasceu na capital da Bahia. Por morte do pae, velho e honrado militar,
abandonou os estudos em 1857 e empregou-se no commercio. Mas o theatro
attrahia-o. Fez-se corista n’uma companhia lyrica italiana e mais tarde actor.
Durante dous annos exhibiu-se, em todos os generos, nas principaes
cidades do norte, e a pouco e pouco foi adquirindo grande popularidade. Em
1875 veiu ao Rio de Janeiro, fazendo parte da companhia dramatica de Vicente
Pontes de Oliveira. Trazia um nome feito. O publico fluminense confirmou o
juizo das platéas do norte.
No mesmo anno regressou aos “seus dominios”, d’onde voltou ao Rio de
Janeiro em 1881, contractado de Furtado Coelho. Reappareceu no theatro
Lucinda em 29 de janeiro, representando o papel do velho Fourchambault da
primorosa comedia de Emile Augier; mas a sua verdadeira estréa foi a 2 de
fevereiro, na Vespera de Reis, por elle representada pela primeira vez no theatro
S. João, da Bahia, em 15 de julho de 1875.
Durante dez annos Xisto Bahia percorreu todos os nossos theatros e
tornou-se um dos nossos actores mais queridos e festejados.
De vez em quando desapparecia. Ia por ahi, ao Deus dará – S. Paulo,
Rio de Janeiro ou Minas – pondo em acção o Romance comico de Scarron,
vagabundeando de logarejo em logarejo, improvisando theatros; mas, sempre
que voltava, o publico fluminense fazia-lhe muita festa, recebia-o de braços
abertos.

19
Em 1891, desgostoso do theatro, abandonou-o e fez-se empregado publico,
devido á protecção do Dr. Francisco Portella; mas com a deposição do primeiro
governador do Estado do Rio de Janeiro perdeu em 1892 o modesto emprego
que exercia na penitenciaria de Nictheroy e voltou para o palco. Trabalhou
no Apollo e depois no Santa Anna, onde o accometteu a molestia que o devia
matar.
***
Xisto Bahia era o mais brasileiro, o mais caracteristico dos nossos actores,
o actor nacional por excellencia. Dava boa conta de certos papeis do repertorio
estrangeiro, mostrando aptidão em variados generos; mas o seu forte era
a comedia brasileira; ahi era verdadeiramente inexcedivel. Que o digam as
producções de Martins Penna, principalmente os Irmãos das almas e o Noviço;
a Torre em concurso, de Macedo, Direito por linhas tortas e Como se fazia
um deputado, de França Junior; a Mascotte na roça, o Capadocio, as revistas
de anno, e, sobretudo, a sua esplendida creação do papel de Bermudes, da
Vespera de Reis, creação notavel, completa, sufficiente para fazer a reputação
de um artista.
“Se tivessemos um theatro nacional (escrevi eu ha tempos), Xisto Bahia
seria o seu mais prestimoso auxiliar; é um artista nosso, completamente
sacrificado á invasão da litteratura dramatica dos outros paizes”. Quem o
visse tão mal á vontade n’um rei de magica ou n’um patife de melodrama, não
calculava o que elle valia nos seus papeis brasileiros, papeis que ninguem até
hoje desempenhou com tanta perfeição.
Era tambem musico, poeta e comediographo. Compunha bonitas e singelas
melodias brasileiras para modinhas e lundús que com muita graça cantava
ao violão. Quem não conhece o mavioso e popularissimo Lundú do Pescador?
É d’elle. Que alma do norte são se comoveu ouvindo a modinha Quiz debalde
varrer-te da memoria? É d’elle. Fazia versos; publicou alguns, rasgou bastantes.
Escreveu para o theatro; deixou, entre outras producções de menos fôlego,
uma comedia em 3 actos, Duas paginas de um livro, que foi representada com
muito exito no norte.
Direi tambem que elle foi um valoroso soldado da campanha abolicionista,
e era, não só um bom amigo, como um bom pai de familia.
Eu vi-o afflictissimo, desesperado, no morro de Santa Thereza, na manhã
de 9 de fevereiro do corrente anno, de oculo assestado para a Armação,
durante o memoravel combate que feriu de morte a desgraçada revolta de 6 de
setembro. Seu filho assentára praça no heroico batalhão Tiradentes e tinha sido
destacado para Nictheroy... Presumo que foi n’esse dia que o coração do artista
começou a estalar.

20
Era preciso vel-o como eu o vi n’aquelle momento historico. Quando o
trapo branco dos revoltosos desappareceu do terrivel reducto, Xisto Bahia,
que era um velho republicano e um legalista exaltado, manifestou o seu
enthusiasmo, deu vivas á Republica, mas exclamava em lagrimas; – E meu
filho? meu filho estará vivo?
Seu filho vive; o jovem defensor da Patria será o arrimo de sua mãe e
de sua irmã, porque – escusado é dizel-o – Xisto Bahia deixou essas dignas
senhoras na mais completa penuria.
***
Descança em paz, honesto e desventurado artista que tanto trabalhaste e
tanto soffreste! Dorme o teu ultimo somno, mais agradavel, mais doce que a
tua peregrinação de palco em palco, de esperança em esperança, de miseria
em miseria! Deixas o theatro brasileiro n’um estado visinho do aniquilamento
definitivo, e eu sei quanto essa rutna te compungia... Mas tenho fé que a
memoria de teu talento surgirá do passado, quando algum dia a consciencia
nacional despertar e reagir contra o menosprezo a que está condemnada a
pobre arte dramatica.
***
Depois do meu ultimo folhetim, os nosso theatros não deram novidades
alguma, a não ser uma “pantomima aquatica” no theatro de João Caetano.
Dizem-me que essa pantomima agradou extraordinarimente.
***
Tinha-me constado que a Aurelia Delorme ia casar-se e abandonar o
theatro. Vejo que me enganaram. É possivel que ella se tenha casado, mas
com certeza não abandonou o theatro, pois acaba de reapparecer no Recreio,
figurando no Anjo da meia noite e na Aimée ou o assassino por amor.
Qualquer noite d’estas tel-a-hemos no Bendegó... Os artistas no Rio de
Janeiro estão sujeitos a essas alternativas incongruentes. Já vi n’aquelle mesmo
theatro do Recreio uma primeira actriz representar á tarde o “elegante Chiado”
da Grande Avenida e á noite a Ignez de Castro.
***
Depois do ruidoso successo de Madame Sans-Gêne, no Vaudeville, Sardou,
o portentoso Sardou, voltou a estar em moda nos theatros parizienses, e bem o
merece, porque, n’um periodo dramatico de trinta annos, brilhante e fecundo,
foi o mais brilhante de todos os auctores francezes. Escreveu peças sobre peças,
creou uma centena de personagens, desde o typo até a silhouette e a caricatura.

21
E não se contentou com a comedia contemporanea: foi buscar no passado e nas
reconstituições historicas obras ardentes, cheias de força e de paixão.
Falla-se de reprises de velhas peças do celebre dramaturgo em quasi
todos os theatros de Pariz: nous aurons, diz um chronista, une saison curieuse
et excepcionelle, l’Hiver-Sardou; mas falla-se principalmente da Duqueza de
Athenas, o seu grande drama, escripto para Sarah Bernhardt, e que a estas
horas já deve estar em scena no theatro da Renaissance.
A peças, que tem 4 actos, passa-se em Athenas, durante o periodo de 1205 a
1454, que começou com a tomada de Constantinopla pelos cruzados e terminou
com a volta dos turcos.
O papel de Sarah é o de Gismonda, a ultima duqueza de Athenas, viuva
de Nerio II. Dizem que, na composição d’esse personagem, Sardou aproveitou
ainda com mais habilidade que na Tosca, não só as qualidades como os proprios
defeitos da encantadora actriz.
***
Uma vez que lhes fallei de Sarah, porque não lhes hei de fallar da Judic?
A’s ultimas datas a diva reapparecera no palco do Varietés, representando
a Lili ao som de estrepitosos applausos, e preparava-se para interpretar a
protogonista de uma nova comedia de Blum e Toché, La rieuse.
La rieuse... Se os dous autores imaginaram fazer rir a Judic durente tres
actos inteiros, foi provavelmente porque a viram e ouviram rir n’aquella
inolvidavel cançoneta das cocegas, que tantas vezes nos deliciou.
A. A.

22
O Theatro, 08/11/1894

Depois do meu ultimo folhetim, houve certo movimento nos nossos


thetros. O S. Pedro ainda está “debaixo d’agua” (pobre S. Pedro!); – no Recreio
continua a centesima revista dos melodramas do opulento repertorio do Dias
Braga; – no Variedades proseguem as representações do Fogo no convento; –
mas, em compensação, no Sant’Anna fez-se uma curiosa reprise da comedia
Como se fazia um deputado, de França Junior; no Lucinda puzeram em scena
o Brasileiro Pancracio, peça em 3 actos, de Sá d’Albergaria; e os artistas do
Apollo partiram para São Paulo, sendo substituidos por uma companhia lyrica
italiana, que com certeza não levará o emprezario ao suicidio...
***
Há no theatro dous generos de peças que não admittem meio termo: a
tragedia e a opera. A melhor tragedia nada vale quando não é representada
por artistas excepcionaes, e uma opera – seja ella qual fôr – torna-se detestavel
desde que a executem sem os elementos imprescindiveis.
E, como o tiro que matou Marino Mancinelli ha de repercurtir por muito
tempo, e como na actualidade uma companhia lyrica de primeira ordem é
absolutamente insustentavel no Rio de Janeiro, o que já foi demonstrado
por [ps. is.] de suas fulgurantes [ps. is.], o publico fluminense [ps. is.]ue
me eu engane) está condemnado a ter, durante muito tempo, em que pese
ao telegramma de Buenos-Ayres publicado hoje pelo Paiz, uma idéa falsa e
imcompleta do genio musical do nosso seculo.
No theatro lyrico deve se fazer questão de bons cantores, de boa orchestra,
de bons córos, de bons bailados e até de bons scenarios e boas vestimentas.
Quando me acontece ouvir uma opera nas condições em que foi cantada a
Lucrecia no Apollo(não ouvi o Hernani), debalde procuro, na barateza dos
bilhetes e na sympathia que me inspiram os artistas, uma attenuante para o
pessimo effeito da representação.
***
Comquanto eu seja partidario de todas as economias da administração
publica, não se me dava que o Estado, ao menos a titulo de experiencia,
subvencionasse uma boa companhia lyrica, porque está provado que a musica é
indispensavel á civilisação intellectual do povo.
O que não admitto é que o Estado subvencione uma companhia lyrica...
depois de extincta, como pretende o Sr. Sansone, é verdade que abroquelado
na promessa de um ministro.

23
Fez mal o ministro em prometter o que não era seu, e fez mal o emprezario
em confiar na promessa.
Ninguem mais do que lamenta o desastre de que foi victima o Sr. Sansone;
mas não me parece que ao thesouro coubera, n’essa emergencia terrivel, o
papel do hollandez que paga o mal que não fez.
Desenganado da promessa ministerial, o Sr. Sansone, que tenciona trazer
ao Rio de Janeiro uma companhia lyrica, e para isso empenhou a sua palavra
e o seu credito, recorre para o publico. D’esta vez não me parece que o Sr.
Sansone ande errado: o publico é o unico ministro que lhe poderá valer.
***
Em 1882, França Junior, que foi um quasi continuador de Martins Penna,
andava muito arredio do theatro.
No anno anterior, achando-nos – elle e eu – reunidos para escrever de
sociedade uma revista de 1879, revista que, depois de prompta, foi prohibida
pela policia... a pedido do emprezario que promettera pol-a em scena... França
Junior teve a bondade de ler-me uma interessante comedia de sua lavra,
intitulada Como se faz um deputado.
Terminada a leitura, elogiei a peça, mas observei francamennte ao meu
saudoso collega que o seu 2o acto parecia-se alguma cousa com o 2o acto da
Torre em concurso. França Junior asseverou-me que não conhecia a comedia de
Joaquim Manuel de Macedo, e, portanto, era fortuito qualquer encontro
de idéas.
– E, como tenho a consciencia tranquilla, accrescentou elle, não altero o
meu trabalho.
N’aquelle anno de 1882, tendo-se formado no Recreio Dramatico uma
associação de artistas na maior parte nacionaes – Xisto Bahia, Galvão, Colás,
Fanny, Cleia, etc., lembrei-me de indicar-lhes a comedia de França Junior, e fui
eu mesmo pedil-a ao auctor para leval-a ao theatro.
A peça entrou logo em ensaios. Effectivamente, o auctor não lhe fez
nenhuma alteração. Minto: alterou-lhe o titulo. Tinha sido votada a lei da
eleição directa: em vez de como se faz, era preciso dizer como se fazia.
A comedia agradou extraordinariamente. Na primeira representação
França Junior foi muito victoriado, e – caso unico, talvez, nos annaes do
theatro – no fim do 3o acto muitos jornalistas e litteratos subiram ao palco
para cumprimental-o, levando á frente Quintino Bocayuva, que proferiu um
pequeno discurso.
Coube-me ainda a honra de ser o edictor da comedia: publiquei-a
em folhetins no meu jornal a Gazetinha, e, aproveitando a composição

24
typographica, mandei preparar uma bonita edição de mil exemplares, que
entreguei ao auctor e elle vendeu ao editor Cruz Coutinho.
Religiosamente conservo entre os meus papeis preciosos um cartão
concebido nos seguintes termos:
“A seu amigo e collega A.A. agradece J.J. de França Junior. Está provado
que o melhor amigo é o official do mesmo officio.”
***
Como se fazia um deputado não é, certamente, a melhor comedia do illustre
auctor do Direito por linhas tortas e das Doutoras; entretanto, o publico nunca
se cançou de applaudil-a, não só no Rio de Janeiro como em todo o Brasil, e foi
sem duvida essa consideração que levou a empreza do Sant’Anna a pol-a agora
em scena.
O actual desempenho dos papeis, sem ser de todo máo, não vale o da
primitiva. A propria Gabriela Montani, que tão á vontade se acha no typo
de Rosinha, não faz esquecer a Fanny, que, segundo me consta, volta para o
theatro, contractada pela empreza do Recreio Dramatico.
***
Pancracio é um minhoto que vem para o Brasil, faz fortuna, volta
endinheirado para a sua aldeia, é recebido com foguetorio e commenda,
apaixona-se pela Christina, moça engeitada que encontra em casa do irmão,
e casa-se com uma fidalga, a fidalga de Mil Fontes, porque descobre que a
pequena é sua filha. Esta casa-se com um morgadinho de quem gosta. Ao que
parece, ainda há morgadinhos em Portugal.
Como o que ahi fica difficilmente daria para uma comedia, mesmo nas
mãos de Sardou, que do nada faz uma peça, o Sr. Sá d’Albergaria encheu o
Brasileiro Pancracio de typos episodicos e episodios typicos, desviando assim da
ligeira trama toda a attenção do espectador e desarticulando a peça.
Infelizmente, nem esses typos nem esses episodios são interessantes.
Entretanto, vale a pena ir ver e ouvir no papel de regedor o Joaquim de
Almeida, que se mostrou actor consummado, seguro de sua arte, quer n’um
brinde do 1o acto, quer na leitura de uma carta no 2o, – scena que aliás deve ser
reduzida a menos de metade. Ahi está como nas mãos de um bom artista se
valorisa um papel escripto com imperdoavel monotonia de effeitos!
Mencionarei ainda o Francisco de Mesquita, muito bom no seu personagem
de lavrador abrutalhado; o Leonardo, que faz rir, mettido na pelle de um cabo
de ordens, compadre do regedor; a Carmem, que dá muita vida ao seu papel
de Engracia; e o Alfredo Lopes, um actor que eu não conhecia, e me pareceu
perfeito n’um typo de labrego namorado.

25
A Miola foi uma exuberante Custodia, e a Laura Corina um morgadinho
chibante, embora desafinado.
O Brandão, aquelle desengonçado e hilariante Brandão do Tribofe e
do Abacaxi, tem na peça um papel de homem sério! Imaginem! – um actor
burlesco por excellencia apaixonado por uma cachopa, com ciumes de um
morgadinho, e a expectorar artigos de fundo sobre a confraternisação de
Portugal e Brasil!
A musica do maestro Stichini está ao sabor da nossa platéa, os córos são
bons e os scenarios não são máos.
A proposito dos scenarios: não me dirão que idéa foi aquella de navegação
maritima ou fluvial em S. Torquato, um logarejo perto de Braga?
A. A.

26
O Theatro, 16/11/1894

Veremos se na situação politica inaugurada hontem alguma cousa se fará


em prol do theatro brasileiro...
Na primeira mensagem dirigida pelo Marechal Floriano Peixoto ao
Congrsso nacional, o pobresinho era recommendado á attenção dos
legisladores; estes, porém, naturalmente preoccupados com assumptos de
maior monta, nenhum caso fizeram da recommendação.
Pouco se importou com isso o marechal, que, pelos modos, não morre
de amores pelo theatro. S. Ex. não assistiu a nenhuma representação das
companhias lyricas Ducci e Mancinelli; S. Ex. não foi ver a Sarah Bernhardt
nem a Judic!
Se o marechal assistiu no Apollo a uma representação do Barbeirinho
de Sevilha, não foi porque lhe interessassem profundamente as proezas de
Figaro, mas para ser agradavel a um dos seus maiores amigos, o senador
Abdon Milanez, pai do applaudido auctor da musica d’aquella opereta.
Não me consta que o grande Floriano, durante o seu governo, fosse a outro
espectaculo além d’esse.
***
Quero crer que o novo chefe do Estado seja mais amigo do theatro que o
seu glorioso predecessor. Ouvi dizer, [p. i.], que o Sr. Prudente de Moraes, na
[p. i.] juventude, em Piracicaba, fez parte do corpo scenico de uma sociedade
de amadores e tomou parte no desempenhor de algumas peças escriptas pelo
Sr. Dr. Barata Ribeiro.
Se os annos e a politica não apagaram de todo esse enthusiasmo artistico
da mocidade, talvez ainda vejamos o presidente da Republica interessar-se
pelo levantamento do theatro brasileiro e prestar d’esse modo um inolvidavel
serviço á civilisação intellectual da nossa patria.
***
A commissão dos festejos que durante cinco dias fizeram as delicias da
população d’esta capital de tudo se lembrou, menos dos theatros. Entretanto,
com vinte contos de réis, desviados dos oitocentos da famosa verba, poderia
haver alguns espectaculos gratuitos, que seriam um verdadeiro ragabofe
para a gente pobre e fariam muito bom arranjo ás emprezas theatraes, que
atravessam n’este momento uma tremenda crise, e bem mereciam alguma
protecção official.
No Sant’Anna, cujos artistas acabam de verificar dolorosamente que este
bom publico já não quer saber como se fazia um deputado, houve ha dias um

27
espectaculo que apenas rendeu duzentos mil réis! De muito não havia na rua
do Espirito Santo notica de tão desanimadora receita.
Contavam os nossos emprezarios que durante as festas houvesse muita
affluencia aos theatros; enganaram-se redondamente: as festas foram
negativas. O publico tinha cá fora espectaculos de graça...
***
O máo tempo tem tambem concorrido para afastar os espectadores. Na
Europa, quando chove, os emprezarios levantam as mãos para o céo; aqui
o máo tempo é o peior inimigo da industria theatral. Comprehende-se que
assim aconteça, porque infelizmente os nossos theatros, excepção feita do
Lyrico e do S. Pedro, não offerecem ao publico sufficiente resguardo em tempo
chuvoso, e á sahida os espectadores não encontram, como na Europa, carros
de praça que por preços razoaveis os transportem ás suas residencias. Entre
nós a tabella dos carros é feita a bel-prazer dos avidos cocheiros, e com estes
não ha discussão possivel.
É verdade que temos os bonds... Mas haverá maior massada para um
filho de Deus que a de esperar um d’esses vehiculos ou ir tomal-o ao ponto de
partida, debaixo d’agua, depois do espectaculo, principalmente se leva comsigo
senhoras e crianças?
No ponto o bond é assaltado, e inutil me parece insistir sobre os
inconvenientes d’esses assaltos; se é esperado, vem cheio ou quasi cheio, e no
melhor dos casos a familia divide-se: o marido faz com que a senhora fique
sentada n’este banco, com o menino ao collo, n’aquelle a sogra, n’aquelle outro
a cunhada, e o pobre diabo faz a viagem de pé, no estribo, agarrado a uma
columna, encharcado, com a água a escorrer-lhe pela manga abaixo!
Ora ahi está um cidadão que nunca mais, em ameaçando chuva, irá ao
theatro, nem mesmo para ver a Pepa em trinta e seis papeis!
***
A inauguração da bella estatua de Osorio me daria ensejo para contar aos
leitores alguns casos em que figurasse o grande cabo de guerra e que tivessem
tal ou qual relação com o theatro; infelizmente não os ha ou não os conheço.
Osorio é muitas vezes mencionado pelo seu nome no Capiotão Hippolyto,
scena dramatica escripta por Francisco de Paula Barros, que falleceu em 1891,
representada em 1877, no theatro Pedro II, pelo actor Amoedo (hoje guarda-
livros), por occasião das festas que houve quando o marquez de Herval veiu
pela primeira vez a esta cidade. Toda a scena se resume n’um panegyrico feito
ao heróe do Passo da Patria.

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Na revista O Rio de Janeiro em 1877, escripta por Lino de Assumpção
de sociedade com o auctor d’este artigo e representada no theatro S. Luiz,
havia um quadro que punha em scena o ilustre Osorio, azoinado pelos seus
admiradores e pelos reporters das folhas diarias, que não o deixavam descançar
da viagem. O actor Rangel, que trabalha actualmente no Recreio, caracterisou-
se com muita felicidade. Osorio assistiu a uma das representações da revista e
riu-se bastante do seu proprio typo. Era um homem de espirito.
***
No Apollo continuam os espectaculos da companhia lyrica Verdini;
proseguem no Lucinda as representações do Brasileiro Pancracio: no Sant’Anna
revesam-se os espectaculos; exhibe-se ainda no S. Pedro a famosa pantomima
aquatica; no Variedade temos agora o Capadocio, velharia pouco interessante,
uma das manias do Machado; no Recreio entra hoje o Mundo da lua em nova
phase; na Phenix – que foi o theatro mais popular do Rio de Janeiro e ha muito
tempo estava fechado – estreiou-se hontem, com a Estatua de Carne, uma nova
companhia dramatica, de que fazem parte alguns artistas estimaveis, entre
os quaes se distingue o sympathico Eugenio de Magalhães. No meu proximo
artigo direi alguma cousa d’essa companhia.
***
Alguns moços da Escola Polytechnica, auxiliados pelos Colás, estão
organisando uma grande matinée, que se effectuará domingo, no theatro
Sant’Anna, em beneficio da viuva e dos filhos do mallogrado Xisto Bahia.
Peço com muito empenho aos meus leitores que concorram a esse
espectaculo de caridade, em cujo programma vão figurar os nossos mais
apreciados artistas. Entre outras attracções, dizem-me que o Brandão recitará
um monologo inteiramente novo, e Joaquim de Almeida, o magnifico regedor
do Brasileiro Pancracio, tomará parte n’uma comedia que será pela primeira
vez aqui representada.
***
Xisto Bahia deixou a familia em extrema penuria. O seu enterro foi feito a
expensas de um amigo...
Esse é o destino dos artistas dramaticos, e, digamol-o, não só aqui como
nas outras partes do mundo, ainda as mais civilisadas.
Trata-se agora em França de erguer um monumento a Mlle. George, a
celebre rival da Duchesnois e da Rachel, a gloriosa interprete da Maria Tudor e
da Lucrecia Borgia de Victor Hugo.

29
Pois bem: essa actriz genial, que foi Rodoguna, Clytemnestra, Cleopatra
e Agrippina, essa formosa mulher, que foi amante de Napoleão Bonaparte e
Alexandre da Russia; essa interessante creatura que tivera em Pariz, na capital
do mundo, um passado deslumbrante, quer como mulher, quer como artista,
– em 1857, para não morrer á fome, era obrigada a acceitar o emprego de
depositaria de bengalas e guarda-chuvas á porta da exposição!
A. A.

30
O Theatro, 22/11/1894

No banquete que segunda-feira os admiradores e amigos de Rodolpho


Bernardelli offereceram ao grande esculptor, o Sr. Dr. Leoncio de Carvalho,
fazendo um brinde ao Congresso Nacional, proferiu algumas palavras, poucas,
mas eloquentes, em prol do theatro brasileiro, tão esquecido pelos poderes
publicos. Aqui lh’as agradeço em nome dos que n’este paiz ainda sonham com a
regeneração da arte dramatica.
Durante o banquete, o Sr. vice-presidente da Republica, n’um eloquente
discurso, assegurou aos circumstantes que o governo tudo fará pela Arte.
N’essas palavras, que encontraram echo em todos os corações, ha, pelo
menos, uma promessa, e um homem da estatura moral de Manoel Victorino
não promette debalde. Portanto, esperemos... Que seria de nós se não fosse a
esperança?
***
A proposito de uma das peças representadas no theatro S. José, de S.
Paulo, pela companhia do Apollo, Tony Bobeche atira á imprensa fluminense,
pelas columnas do Estado de S. Paulo, umas verdades que, por serem duras de
roer, não deixam de ser verdades. Confesso ingenuamente que as applaudi, não
obstante as culpas que possa ter no cartorio.
“Entre os grandes defeitos da imprensa fluminense, diz Tony Bobeche,
não ha nenhum que se possa comparar ao seu espantoso desprezo pela
critica artistica, principalemnte pela critica theatral. O que os jornaes do Rio
geralmente escrevem sobre theatro e sobre artistas de theatro é extraordinário
de inepcia.”
E acrescenta:
“Quando em um jornal ha um redactor que não serve para nada, um
redactor que não arranja noticias, um noticiarista que não as sabe redigir,
arvoram-no logo em critico dramatico. D’ahi os numerosos disparates que
aqui lemos frequentemente nos compte-rendus das primeiras representações a
respeito dos autores, das peças e dos artistas que as representam”.
Hão de achar, talvez, que Tony Bobeche é exaggerado e fala de um modo
muito absoluto; mas é preciso convir que á imprensa fluminense cabe,
realmente, a maior culpada do descalabro em que se acha o theatro no Rio de
Janeiro e em todo o Brasil... inclusive S. Paulo.
Aqui, em vez da imprensa dirigir a opinião do publico, o publico dirige a
opinião da imprensa...

31
Não insisto, porque com a demonstração d’essa e de outras verdades
tenciono encher um dos meus proximos folhetins.
Não nos zanguemos com Tony Bobeche: o que arde cura.
***
Ainda ahi ha quem se lembre do Brazilian Garden?
Assim se chamava a principio o Recreio Dramatico. Foi o emprezario
Guilheme da Silveira quem lhe mudou o nome.
O theatrinho era fluminense; foi construido por um hespanhol, o Escudero;
os artistas que o estreiaram eram francezes; que lembrança foi então essa de
lhe darem um nome inglez? Mysterio impenetravel...
Antes de 1883, houve n’aquelle theatro magnificos espectaculos, quer
nacionaes, quer estrangeiros.
Alli repicaram pela primeira vez no Rio de Janeiro os Sinos de Corneville;
alli assistimos ao successo litterario do Filho de Coralia, a bella comedia de
Albert Delpit; alli o publico applaudiu os titeres do Lupi; alli provocaram
sonoras gargalhadas o Piperlin, os Provincianos em Pariz, Como se fazia um
deputado e outras engraçadissimas comedias.
Em 20 de novembro de 1883 formaram uma associação n’aquelle theatro,
estreiando-se com o Remorso Vivo, os artistas de uma companhia dramatica
ambulante, de que fôra emprezario o Braga Junior (hoje capitalista e
visconde), e algum tempo depois a associação se tranformava em empreza:
a empreza Dias Braga, que ante-hontem festejou o seu decimo primeiro
anniversario.
Ocioso seria lembrar aqui a historia d’essa empreza e os fados que tem
corrido. Dias Bragas é o mais eclectico dos emprezarios theatraes havidos e
por haver. No opulento repertorio do seu theatro figuram todos os generos:
a opera, a tragedia, o melodrama, o drama de capa e espada, o drama sacro,
o drama intimo, a comedia classica, a alta comedia moderna, a comedia
burlesca, o vaudeville, a opereta, a magica, a revista de anno, a parodia, a
farça.. Só escapou a pantomima!
Tem alli havido successos litterarios como o do Grão-Galeoto e o das
Doutoras, successos populares como o do Conde de Monte-Christo­, successos
de gargalhadas como o das Tres Mulheres para um marido e o da Família
fantastica, successos musicaes como o da Grande avenida, e até mesmo
successos inqualificaveis, como o do Bendegó e o do Sarilho!
***

32
Para a festa de ante-hontem o Dias Braga não podia ter escolhido melhor:
representou-se o Mundo da lua, que tem agora 3 actos, e abriu o espectaculo
Quem casa quer casa de Martins Penna.
Todos sabem que esse leve e delicioso entremez é um quadro dos nossos
costumes domesticos profundamente observado e amargo, bem amargo, em
que peze á intensidade comica do assumpto, claramente indicado pelo titulo.
O auctor, se hoje vivesse, eliminaria as tiradas moralistas de Fabiana contra
a carolice, daria outra fórma ao monologo de Eduardo e inventaria um final
menos rococó; mas, ainda assim, que magnificos typos! que movimento! que
certeza de effeitos! que sobriedade de dialogo! que technica da primeira á
ultima scena!...
Quando, ha poucos annos, se representou em Pariz a comedia Durand
et Durand, foi muito elogiada a idéa molieresca do auctor, fazendo um
personagem gago recorrer ao canto para exprimir-se melhor. Pois bem:
a mesma situação lá está, no Quem casa quer casa: Sabino é gago e canta
para que o entendam, – e canta zangado, o que o torna mais irrisorio que o
personagem da peça franceza.
Tony Bobeche, o articulista do Estado de S. Paulo, torceria o nariz ao
desempenho dos papeis de Fabiana, Olaya e Paulina, confiado a tres actrizes
portuguezas, que os representariam satisfatoriamente se a comedia fosse
portugueza. A mim fazem-me o mesmo effeito que a Miola na compania do
Brasileiro Pancracio.
Entretanto, Tony Bobeche daria palmas ao França, um Sabino acceitavel,
e ao Ferreira, que dá muita vida ao ingrato papel de Eduardo, visivelmente
escripto para um actor que tocava rabeca.
Dê-nos o Dias Braga outras comedias de Martins Penna, embora com
pessoal portuguez. Quand on a pas ce que l’on aime...
***
Falleceu ontem, repentinamente, n’esta cidade, Thomaz Antonio Espiuca,
que teve, como actor, a sua epoca de notoriedade n’este paiz, principalmente
no norte, onde trabalhou, durante alguns annos, ao lado de Xisto Bahia e
outros que já lá se foram tambem.
Nasceu em Portugal, mas veiu muito novo para o Brasil e fez-se brasileiro.
Na vida real era um homem bastante delicado e regularmente instruido,
mas, no theatro, os unicos papeis em que devéras agradava eram os dos
personagens abrutalhados e incultos. Lembra-me de o ter admirado no
lavrador da Filha do lavrador, de Anicet Bourgeois, no Manuel Escota, da
Probidade, de Cesar de Lacerda, e n’outros papeis d’esse genero.

33
Muita gente se deve recordar ainda do triumpho que elle alcançou n’esta
capital, quando aqui se estreiou, ha vinte e tantos annos, ao lado do Valle, o
insigne actor portuguez.
Representava-se o Mestre Jeronymo, de Aristides Abranches. A estréa do
Valle tinha sido annunciada por todos os tambores da réclame, e o nome de
Thomaz Espiuca apenas figurava nos annuncios. Entretanto, todas as palmas,
todas as ovações do publico foram para elle. O Valle, que mais tarde, em outras
peças, se mostrou o artista incomparavel que era, e ainda é, n’essa noite foi
esmagado pelo tio Jeronymo!
Por esse tempo Espiuca abandonou o theatro e fez-se dentista, diplomado
pela faculdade de Medicina da Bahia.
Depois de exercer durante muitos annos a sua profissão em Pernambuco,
onde era muito querido, teve a nostalgia do palco e veiu para o Rio de Janeiro
fazer-se de novo actor.
Aqui só o esperavam dissabores e desillusões. O actor já não existia: tinha-o
matado o dentista. A ultima peça em que elle figurou foi, creio, o Grude, uma
revista de barulhenta memoria.
Desempregado, pauperrimo, sem theatro nem gabinete dentario, na
expectativa de nunca mais arrancar palmas e de nunca mais arrancar dentes,
recorreu Espiuca á protecção de um bom amigo, o Sr. senador João Barbalho,
que era então ministro da agricultura. Foi nomeado amanuense da Inspectoria
Geral das Estradas de Ferro, emprego que exerceu até ante-hontem.
Não deixou sulco a passagem de Thomaz Espiuca pelas lettras; entretanto,
elle produziu, além de um romance, algumas peças de theatro que foram
representadas; entre estas um drama sacro, S. Benedicto, escripto ha muitos
annos de colloboração com o poeta das Idéas e sonhos, o illustre advogado
Souza Pinto. Esse drama, que teve boa acceitação no norte, foi aqui
representado no Gymnasio, em 1882.
A ultima vez que me encontrei com Thomaz Espiuca foi ha dias, na igreja
de S. Francisco. Rezavam-se missas por alma de Xisto Bahia, que mourejara
com elle nos theatros de provincia e fôra seu amigo intimo. O pobre Espiuca
chorava. Mal sabia que tão de perto acompanharia o velho collega na
mysteriosa viagem do infinito!
***
Prometti no meu ultimo folhetim occupar-me da nova companhia
dramatica da Phenix. Reservo a minha apreciação para depois de representada
a peça nova, O pacto de Satanaz. Não tenho hoje mais espaço.

34
Todavia, não quero concluir este artigo sem louvar o Sr. chefe de policia
pelas acertadas providencias que tem dado no sentido de evitar a escandalosa
invasão dos theatros pelos innumeros guaderios que assistiam aos espectaculos
de borla, sob pretexto de uma auctorisação official que nunca existiu.
É justo que os emprezarios sejam senhores em suas casas.
A. A.

35
O Theatro, 29/11/1894

A nova peça de Victorien Sardou, intitulada a principio a Duqueza de


Athenas, foi afinal representada em Pariz, aos 30 do mez passado, no theatro
da Renaissence, com o titulo de Gismonda.
A imprensa pariziense é quasi unanime em dizer que o celebre dramaturgo,
durante a sua longa carreira, assignalada, aliás, por tantas victorias, não tivera
ainda um triumpho tão absoluto e completo.
A escolha da época e do meio em que se desenvolve a acção da peça, de
uma intensidade dramatica e de um pittoresco admiraveis, revela mais uma vez
a predilecção de Sardou pelas restituições historicas.
A heroina do drama é a viuva de Nerio II, cujo ducado – o ducado de
Attenas – é o ultimo vestigio da occupação da Grecia pelos barões francos e
italianos da quarta cruzada.
Regente do ducado por morte de seu esposo, Gismonda não dá ouvidos
aos galanteios com que, nova Penélope, é assaltada pelos barões seus visinhos,
mais occupados em requestal-a que em defender as suas [p. i.], assoladas pelos
piratas. O filho e pupillo da duqueza, Francesco, uma criança de cinco para seis
annos, franzina e doentia, absorve todos os seus cuidados.
Gismonda está convencida de que é mister um braço mais vigoroso que
o seu para defender o ducado contra as sedições da populaça e as correrias
dos turcos; mas é em vão que todos instam com ella para casar-se outra vez.
Não se decide a viuva, porque a sua mão de esposa só a dará ella a um homem
valoroso e forte, capaz de defender o seu throno ameaçado.
Entretanto, sente Gismonda ligeira inclinação pelo formoso veneziano
Zaccaria Franco, alliado e amigo secreto do sultão, sem que ella o suspeite.
Esse Zaccaria, que é um ambicioso capaz de todas as infamias, premedita
apoderar-se, do ducado, esposando a duqueza, depois de supprimir o herdeiro
legitimo, o pequeno Francesco.
Para isso concerta-se com um servo de Gismonda, um tal Gregoras, a quem
está confiada a guarda do menino.
Gregoras deixa cahir Francesco, como por acaso, n’uma cova em que se
acha um tigre. A mãi, desvairada, jura pela cruz, erguida diante do Acropolio,
que a sua mão e a sua côroa ducal serão de quem salvar a criança. Os barões
recuam diante do perigo; mas Almerio, um homem do povo, um simples
falcoeiro, apparece como um deus ex machina, pula para dentro da cova e
consegue matar a fera no momento em que o principe vai ser devorado.
Esse é o 1o acto. O 2o transporta os espectadores a um convento de
benedictinos, onde Gismonda se retirou para rezar por seu filho, gravemente

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enfermo depois do accidente, e esperar um mensageiro que enviou a Roma
com o fim de perdir ao Papa que a desligasse d’aquelle juramento, feito n’um
instante de allucinação.
É o venerando bispo Sophron quem lhe traz a resposta do Papa. Sua
santidade recusa formalmente fazer a vontade á duqueza; o juramento é
sagrado; só um homem poderá desligal-a d’elle, e esse homem é o proprio
Almerio.
Este acaba de fazer o que não fizeram os fidalgos: livrou Athenas de uma
invasão de piratas. O povo acclama-o com enthusiasmo e vai para defronte do
convento exigir da duqueza, em altas vozes ameaçadoras, o cumprimento de
sua promessa. Almerio chega, dispersa a multidão e, altivo, intrepido, entra
sósinho no convento para reclamar a mão de Gismonda, que o manda prender.
Quando o levam, ella murmura: – Este é um homem! – e fica pensativa..
No 3o acto a duqueza manda vir o prisioneiro á sua presença, afim de obter,
por qualquer meio, que elle desista da enorme recompensa a que tem direito.
Propõe-lhe as mais tentadoras compensações, e Almerio tudo recusa. Que lhe
importam honras e dinheiro? Que lhe importa mesmo esse ducado de Athenas?
O que elle quer, não é a posse do ducado, mas a posse da duqueza... Que ella
lhe pertença uma noite, uma hora, alguns instantes, e elle se contentará d’essa
ventura ephemera!
Ouvindo tal declaração de quem quer tudo e nada quer, Gismonda, cheia
de alegria, manda-o embora: – Vai-te, villão, – vai-te, bastardo! Volta para a tua
choupana e... deixa a porta aberta...
Passa-se o 4o acto em frente á choupana do ditoso falcoeiro. Gismonda tem
deixado o seu amante de uma hora, quando vê que Zaccaria e seu cumplice
Gregoras se approximam. Ella esconde-se.
Gregoras vem matar Almerio a mando de Zaccaria, mas o miseravel
confessa agora que lhe falta a coragem. O outro irrita-se contra o servo,
e exproba-lhe essas hesitações, as mesmas que elle tivera antes de atirar
Francesco á cova do tigre.
Ouve Gismonda essa revelação terrivel e, emquanto Gregoras foge,
lançando por terra o machado que empunhava, e Zaccaria se resolve
a apunhalar o falcoeiro, sem o auxilio de ninguem, e para isso vai se
approximando da choupana, ella apanha o machado, ergue-o e mata o
veneziano.
O ultimo acto é na igreja de Santa Maria, onde o bispo Sophron vai
celebrar o officio de Ramos. Toda a côrte se acha presente. Almerio, fiel á sua
promessa, vem desligar Gismonda do seu juramento.

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Apparece um dos barões, trazendo a noticia da morte de Zaccarias, e
Gregoras, accusado do assassinato, accusa por seu turno o falcoeiro. Este
não se defende: sabe que quem matou foi a duqueza e não quer perdel-a.
Gismonda, entretanto, põe tudo em pratos limpos e, tomando Almerio pela
mão, condul-o ao altar, onde recebem ambos a benção nupcial do bispo.
Tal é o drama.
No papel esmagador de Gismonda, Sarah Bernhardt, diz Henri Fouquier,
o critico do Figaro, attingiu á perfeição de sua arte, e Henri Bauer, que não
tem o elogio facil, escreve, no Echo de Paris, que não lhe consta que n’outras
épocas nenhuma artista levasse tão alto a creação e a interpretação de um
personagem. La création de Gismonda, conclue Bauer, est peut-être la plus
miraculeuse entre toutes. Todos os demias criticos afinam pelo mesmo diapasão.
Sobre a peça alguns fizeram certas restricções; nenhum as fez sobre a artista.
A riqueza da enscenação é indescriptivel. Causou profunda sensação
a igreja bysantina de Santa Maria, no ultimo acto. Maurice Ordonneau, a
proposito do scenario, das roupas e dos accessorios d’esse acto, escreve o
seguinte no Matin: “É talvez o espectaculo mais artistico e mais sumptuoso que
nos tem sido dado ver n’um palco pariziense.”
Entretanto, eu creio piamente que, se tivesse o prazer de assistir a uma
representação de Gismonda no Renaissance, preferia, ainda assim, o Sardou
dos Íntimos e a Sarah da Phedra.
Na mesma noite da primeira representação de Gismonda em Pariz,
representava-se em Berlim, tambem pela primeira vez, a Bala, comedia em 5
actos, de Max Nordau.
Ante-hontem, n’uma d’aquellas imcomparaveis Cartas da Allemanha, que a
Gazeta de Noticias tem o orgulho de publicar, o auctor da Bala, a proposito da
ultima [t. i.]lha das borboletas, implacavelmente pateada, referiu-se em termos
acerbos ao publico do Lessing-Theatre e aos criticos dramaticos de Berlin.
D’esta vez não terá o grande escriptor que dizer mal d’elles: o publico
applaudiu-o enthusiasticamente, chamando-o seis vezes á scena, e os criticos
levam ás nuvens a sua nova comedia.
Trata-se nesses cinco actos de um advogado ambicioso, Fritz Sickart, que se
envergonha de ser filho de uma ex-cosinheira, e diz que sua mãi, a quem deve,
aliás, a educação que recebeu e a posição que occupa, é uma bala que traz
amarrada á perna e não o deixa andar.
Entretanto, é ella quem, desprezada embora pelo filho e separada d’elle,
o salva na occasião em que o ingrato, depois de mil peripecias, está resolvido
a procurar no cano de um revólver a solução de umas tantas vergonhas que
praticou.

38
O pobre diabo arrependeu-se e promette á mãi que d’alli em diante sempre
a terá comsigo.
– Como uma bala? Pergunta a pobre velhinha.
– Como uma ancora de salvação, responde elle.
E vem o panno abaixo.
***
Cheguei ao fim do meu artigo sem fallar dos nossos theatros, que,[p. i.]
nenhuma novidade exibhiram [p. i.] ultimos sete dias.
A. A.

39
O Theatro, 06/12/1894

No primoroso livro “Estudos Brasileiros”, com que José Verissimo acaba de


enriquecer as nossas bibliothecas,figura um capitulo que se intitula o Theatro
nacional e não é outra cousa mais que a repetição das velhas jeremiadas
provocadas pela ruina da nossa litteratura dramatica.
“O que por ahi vai em materia de theatro, diz José Verissimo, é uma cousa
anonyma e amorpha, sem patria nem nacionalidade, que escapa a qualquer
tentativa de classificação. A lingua, o espirito, a inspiração, o estylo, a indole
d’essas peças e tambem das suas representação é uma mistura tal, que a gente
não chega, por mais esforço que faça, a lobrigar e descobrir alguma cousa
nitida n’esse embaralhamento.
E continua assim:
“Esse estado do nosso theatro, reduzido desde muito ao expediente das
traducções, nem sempre bem feitas, do que de peior ha no theatro estrangeiro,
ou das imitações e adaptações, nem sempre felizes, de peças e generos
exoticos e extranhos ao nosso viver e aos nossos costumes, prova mais do que a
decadencia da nossa literatura. Prova tambem que, longe de ganharmos, com
o evoluir da nossa vida historica, originalidade e caracter, estamos perdendo
essas qualidades que distinguem entre si individuos e povos.”
E mais adiante:
“Eliminados pela morte os nossos poucos auctores dramaticos, ficou o
nosso theatro exclusivamente entregue á exploração do theatro estrangeiro.
Não vingou um ou outro tentamen isolado feito por algum raro escriptor, essas
peças cahiram ou não ficaram no repertorio ordinario dos theatros.”
Essas palavras, escriptas com tanta elevação de linguagem, são, não ha
negar, a genuina expressão da verdade; mas eu quizera que José Verissimo
completasse a sua analyse, apontando as verdadeiras causas d’essa ruina.
O illustre critico allude ao sentimento do exotico, que nos domina, e ao
facto dos nossos escriptores terem posto fóra de suas preoccupações litterarias
o theatro. E diz que “o publico d’esta capital não gosta de theatro dramatico”
e affirma que “se o theatro chegou a esse ponto, a culpa é um pouco d’aquele
publico que tornou systematico o seu pouco apreço pelo theatro dramatico em
lingua portugueza.”
Dizer que o nosso publico não gosta de theatro dramatico é fazer-lhe uma
clamorosa injustiça. O que elle exige é que lhe não dêem gato por lebre, e com
isso não faz senão exercer um direito muito legitimo.
O fluminense vai ao theatro sempre que o convidam para ouvir uma
comedia ou um drama bem feito e bem representado.

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Ainda não ha muito annos, Furtado Coelho conseguiu realisar, durante
longo tempo, magnificas receitas no theatro Lucinda, porque soube cercar-
se de um pessoal muito acceitavel e punha o maior cuidado tanto na escolha
como nos ensaios e na enscenação das peças que exhibia.
Está na memoria de todos o successo que obtiveram no Recreio – para
só citar duas peças e um theatro – o Grão Galeoto, um drama litterario, e as
Doutoras, de França Junior, esforçado comediographo que José Verissimo
se esqueceu de citar no seu capitulo. Mal representadas, essas duas peças
não teriam feito carreira. E como o publico tem costas largas, diriam logo: –
Decididamente as nossas platéas não querem litteratura!
Se o fluminense prefere assistir à representação de uma magica, de uma
opereta ou de uma revista de anno a ir ouvir um drama ou uma comedia, é
porque n’aquelles generos inferiores o desempenho dos respectivos papeis
satisfaz plenamente, ao passo que no drama ou na comedia os nossos artistas
não dão, em regra, a menor idéa dos personagens nem dos sentimento que
interpretam. O que afugenta o espectador não é a peça, mas o modo por que a
peça é representada e posta em scena.
Appareçam nos nossos palcos as comedias mais finas, mais litterarias,
menos espectaculosas, de sorte que não fique absolutamente desfigurada a
intenção do auctor, e ira muita gente applaudil-as e consagral-as.
Observa José Verissimo que as classes superiores da nossa sociedade só
vão ao theatro lyrico. Ahi a culpa é dos emprezarios, que a pouco e pouco
foram deixando que os theatros se transformassem em verdadeiros fócos de
libertinagem. Um emprezario conheci eu que teve a idéa, digna d’aquelle seu
collega da Naná, de franquear a porta do seu theatro às prostitutas. – Ellas
trazem atrás de si muita gente, dizia elle, é justo que não paguem!
O estado lastimoso em que se acha a arte dramatica no Rio de Janeiro é
devido, em grande parte, ao modelo de construcção adoptado para os nossos
theatros. Não ha talento de auctor nem de actor que resista a um theatro
aberto, onde a vozeria dos jardins e botequins se confundem com os dialogos e
monologos das peças que se representam.
Entretanto, o theatro aberto representa n’esta infeliz cidade uma victoria
tamanha que o S. Luiz e o Gymnasio desappareceram por serem fechados e o S.
Pedro foi transformado em circo de cavallinhos.
Dizem que os theatros fechados são incompativeis com o nosso clima. É
porque ignoram a existencia de modernos apparelhos, que dão a um sala de
espectaculo a temperatura que se deseja. Se tivessemos um theatro munido de
apparelhos como os ha em Vienna d’Austria, apparelhos que enthusiasmaram
o velho Sarcey quando alli foi, ha dous annos, visitar a Exposição do Theatro,

41
poderiamos, durante o nosso terrivel fevereiro, gozar da mais agradavel
temperatura assistindo a um espectaculo.
Outro motivo do nosso atrazo em materia de theatro é a imprensa, que
menoscaba tão ponderavel objecto; mas a causa fundamental, a grande causa,
está no criminoso desprezo com que o theatro brasileiro foi e é tratado pelos
poderes publicos.
Sobre esse ponto quizera eu que José Verissimo, com a sua alta
competencia e o seu magnifico estylo, dissesse algumas palavras. É absurdo
que n’esta grande capital, onde ha uma Escola de Bellas-Artes e um Instituto de
Musica, não se faça alguma cousa pelo theatro.
Do governo, e só do governo, pode vir o remedio a este penoso estado de
cousas. Isto é o que ha muito annos não me tenho fartado de repetir, e hei de
repetil-o até a saciedade.
Artistas e homens de lettras offerecem hoje um banquete ao Sr. Dr. Manuel
Victorino Pereira, vice-presidente da Republica, e ao Sr. Dr. Carlos Augusto de
Carvalho, ministro das relações exteriores, em signal de regosijo pelas palavras
que SS. EEx. proferiram durante o banquete Bernardelli, e que redundam
n’uma promessa official de animação ás artes e ás lettras brasileiras.
Permita Deus que esse banquete seja o prodromo de uma era de
prosperidade, e que o theatro, o misero theatro, não seja esquecido na
repartição dos beneficios.
***
Tivemos esta semana duas novidades em nossos theatros: no Lucinda a
reprise do Burro do Sr. alcaide, com uma distribuição de papeis completamente
nova, e no Sant’Ana a primeira representação da Cornucopia do amor, magica
em 3 actos e 19 quadros, original de Moreira Sampaio.
Fui ante-hontem ao Lucinda, mas a concurrencia era tal que não
pude metter a cara entre o povo e apreciar ao menos um fragmento da
representação. Os espectadores que viam e ouviam soltavam risadas e batiam
palmas. É tudo quanto posso dizer.
Senti-me hontem adoentado e, como chovesse, não me animei a sahir.
No proximo folhetim me occuparei com a magica do meu velho amigo e
collaborador.
***
Entre os espectaculos da semana houve a récita do auctor do Mundo da lua,
a engraçada revista de Figueiredo Coimbra.
Foi mais uma occasião que se deparou ao espirituoso folhetinista das Notas
de um Simples para ver a boa conta em que é tido pelos seus admiradores e

42
pelo publico. Do principio ao fim do espectaculo, Figueiredo Coimbra foi muito
applaudido e obsequiado.
Eu dou-lhe sinceros parabens pela brilhante manifestação de que foi alvo
e faço votos para que o seu talento desabroche em producções que honrem
o nosso theatro, como a Carta anonyma, deliciosa bluette que toda a gente
appaudiu.
***
Conto que a estas horas já tenha sido revogada a esquipatica medida
policial, determinando que nos theatros os bilhetes só possam ser vendidos das
4 horas da tarde em diante, e postando uma sentinella em cada bilheteria.
Essa medida não só é um attentado contra a liberdade de commercio,
como um vexame para o publico. Muito freqüentador de theatro têm por
costume comprar o seu bilhete antes de ir jantar, e fica-lhe tarde esperar até
aquella hora.
Dizem-me que essa ordem tem por objectivo dar cabo dos cambistas; mas –
que diabo! – desde que tambem a estes fique livre a compra dos bilhetes depois
das quatro horas não percebo como esse rigor policial os possa exterminar.
Não insisto, para não parecer que defendo os cambistas, com quem aliás
sympathiso na minha qualidade de fazedor de peças do theatro.
Elles são uns pobres diabos, creiam, e na sua profissão nem sempre as
cousas correm pelo melhor. Muitas vezes é annunciado um espectaculo cheio
de attractivos e chamarizes de toda a especie. Os cambistas compram um
grande numero de bilhetes. À tarde toldam-se as nuvens, á noite chove e elles
não conseguem vender uma senha!
Quando não chove desforram-se. Ninguem lhes deve querer mal por isso.
Mas.. não é que os defendi?... Ora adeus!...
Quando passares, leitor, por um theatro e não os vires á porta, condóe-te
do emprezario, lamenta o auctor da peça annunciada; mas, se os vires, pódes
ficar certo de que lá dentro todos estão satisfeitos.
Eu gosto dos cambistas, porque eles annunciam o bom tempo: são as
andorinhs dos theatros.
A. A.

43
O Theatro, 13/12/1894

A Cornucopia do amor está longe de ser uma magica sem pés nem cabeça,
como tantas que têm sido representadas nos nossos theatros; confesso,
entretanto, que esperava muito mais de Moreira Sampaio, um auctor que
tem talento bastante para não se deixa ficar nunca em plano inferior ao
scenographo e ao machinista.
Em toda a magica bem feita deve haver uma comedia, e infelizmente essa
não foi a preoccupação de Moreira Sampaio ao escrever a Cornucopia do amor.
O auctor dos Botocudos e de tantas outras comedias cheias de observação e
de graça, bem podia, se quizesse, ter inventado cousa mais interessante que a
familia do rei “Pindahyba 27 noves fóra nada.”
Outra condição indispensavel – litterariamente fallando – nas peças d’esse
genero é um pouco de poesia, e eu não a encontrei no texto da Cornucopia
do amor. Não se comprehende que Moreira Sampaio, que tem o sentimento
poetico bem desenvolvido e sabe até fazer magnificos versos, idealisasse tão
mal o typo d’aquella princeza e o do caçador, seu namorado, que durante toda
a peça é tratado por “seu Olho”.
Ha na Cornucopia uma scena em que o rei Pindahyba previne claramente
ao publico de que vai ao bastidor exercer a mais repugnante das funcções
physiologicas. – Agora estou mais alliviado! diz elle quando volta do matto,
sem se lembrar, não sei por que, de vir abotoando as calças.
Noutra scena o principe Felicissimo engole um rato e corre ao mesmo
bastidor (esquerda, primeiro plano) para dar liberdade ao bicho, depois de
dizer ao publico estas extraordinarias palavras: – O diabo é se elle não acerta
com a sahida!
Essas duas scenas talvez agradem a um publico especial, mas não me
parece que, para fazer rir a uma parte da platéa, ou antes, das galerias,
tenhamos o direito de trazer ao palco as indecencias que se toleravam
na Grecia, ha dous mil annos, e que já se não compadecem com a nossa
civilisação moral.
Se, escrevendo a Cornucopia do Amor, Sampaio só teve em mente
conquistar as gargalhadas e os applausos dos illettrados e dos inconscientes,
que formam, não ha duvida, uma legião capaz de lhe levar a peça a tres ou
quatro centenario seguidos, confesso que se houve com uma grande habilidade
e uma audacia ainda maior; mas se préza o bonito nome que adquiriu no
theatro, se tem em alguma conta a approvação intelligente dos espectadores
que veem um palmo adiante do nariz e procuram no theatro alguma cousa que
lhes falle ao espirito, a Cornucopia foi um erro deploravel.

44
Escrevo com esta franqueza por tres motivos: 1o, porque sou amigo de
Moreira Sampaio e estou livre de que me attribuam a intenção de hostilisal-o;
2o, porque elle é homem de espirito e reconhecerá que tenho razão; 3o, porque
os meus reparos não podem de modo algum fazer mal á peça, que tem segura
uma brilhante carreira.
Moreira Sampaio, que tão á vontade se acha na comedia nacional, e que
tão profundamente conhece o nosso povo, o seu caracter, os seus costumes e
a sua linguagem, não preparou convenientemente o espirito para este ensaio
n’um genero tão diverso d’aquelle que lhe valeu a reputação de goza no nosso
meio theatral. Estou certo de que, se elle algum dia se deixar tentar de novo
pelo maravilhoso, saberá encontra os elementos que faltam á Cornucopia do
amor.
N’esse genero, mais que em nenhum outro, um poeta comico póde dar azas
á fantasia, e ser verdadeiramente poeta, sem prejudicar – antes pelo contrario –
o que a magica possa conter para attrahir o grosso do publico.
Costa Junior escreveu para a Cornucopia do amor uma partitureta muito
graciosa, em que se notam, além de um delicioso quartetto e de uma valsa que
está destinada a todos os pianos d’esta Pianopolis, alguns bailados bem feitos,
que são, diga-se a verdade, carinhosamente tratados pela orchestra.
Passarei como gato por brazas sobre o desempenho dos papeis, que
não fornecem aos artistas ensejo de manifestar o seu talento, e apérto com
enthusiasmo as mãos ao Carrancini, que nos apresentou uma prodigiosa serie
de scenografias.
É um extraordinario artista o Carrancini! Quando elle aqui appareceu,
em 1885, com o Genio do Fogo, eu suppuz que a sua opulenta fantasia ficasse
completamente esgotada depois de imaginados e concluidos os numerosos
scenarios d’aquela magica. Entretanto, durante nove annos elle tem pintando
sem interrupção para os nossos theatros, e, que eu saiba, nunca se repetiu!
O seu forte são justamente os scenario de magica, – os palacios encantados,
deslumbrantes de ouro, estofos e pedraria, de uma architectura revolucionaria,
só delle, – as praças exoticas de cidades imaginarias,-as cavernas tenebrosas, –
os bosques mysteriosos, – as grutas infernais,etc.
As suas apotheoses nunca deixam de apresentar alguma novidade, e
elle as tem pintado ás centenas. Ahi o scenario é sempre machinado, e o
scenographo reclama a collaboração subalterna do carpinteiro; ha flores que
se transformam em estrellas, columnas que gyram, aguas que jorram, grupos
maravilhosamente combinados, harmonia de côres, effeitos de projecções
luminosas, etc.

45
Trabalhador incansavel, de sol a sol, o Carrancini adoptou a divisa de
Nicolet: De mieux en mieux. É assim que na Cornucopia do amor elle excedeu-se
a si mesmo.
Ha alli um aldeamento de indios antropophagos, onde os rochedos têm a
configurção de cabeças humanas, – uma floresta negra, medonha, atterradora,
que se tranforma, sem que o espectador saiba como, n’uma paizagem risonha
e animada, onde palpitam todas as alegrias da natureza, – salões esplendidos,
– apotheoses.. Oh! as apotheoses!... A ultima então!... Que lindissima
caranguejola arranjou o Carracini para a Sra. Amelia Athayde, muito bonita no
seu papel de fada Generosa, levada ou trazida n’um movimento mysterioso, de
modo que o espectador pasmado não sabe se a machina avança ou recua.
Só para admirar os scenarios do Carrancini, que leva o publico de surpreza
em surpreza, todo o publico do Rio de Janeiro irá ao Sant’Ana; e se a nova
empreza Heller & Colás dispendeu trinta contos de réis com a Cornucopia do
amor, o que acredito, é muito provavel que ganhe sessenta.
***
Façamos uma rapida visita aos demais theatros:
– A companhia de opera Verdini continua a dar espectaculos no Apollo.
Não tenho lá ido porque em materia de theatro lyrico o meu dilettantismo
adoptou esta regra: Tudo ou nada. O publico, felizmente para os emprezarios,
não é de minha opinião, e com qualquer cousa se contenta.
– No Variedades voltou à scena o Frei Satanaz com um novo chamariz: o
fantasma Iris executando a dansa chamada serpentina, com a sala ás escuras e
o palco illuminado a luz electrica.
– O Recreio passa em revista o seu opulento e eclectico repertorio, e no
Lucinda continuam as representações fructuosas do Burro do Sr. Alcaide.
– O São Pedro está ainda occupado pela companhia Gardner, da qual faz
parte um artista phenomenal, o deslocador Frank Naska.
***
No meu ultimo artigo fiz uma ligeira referencia á famosa medida policial,
ordenando que a venda dos bilhetes nos theatros só começasse depois das 4
horas da tarde, e postando uma sentinella ao pé da bilheteria.
Segundo me consta, essa medida foi revogada, pelo menos em parte. Só
ficou a sentinella. Coitada!
Dizem-me agora que a policia intimou as emprezas theatraes para darem
começo aos espectaculos ás 8 horas precisas e vedarem a entrada da caixa do
theatro ás pessoas estranhas ao serviço da representação.

46
A exigencia das 8 horas em ponto é vexatoria, tanto para as emprezas como
para o publico. Isso fez-se no tempo do Onça, quando se jantava entre as 3 e as
4 horas. Sabem todos que não ha nada mais desagradavel nem mais perigoso
que metter-se a gente no theatro logo depois de comer.
Entretanto, os emprezarios têm um meio muito simples de remediar o
inconveniente, adoptando o systema pariziense de lever de rideau: façam
representar as 8 horas uma comedia em 1 ato e as as 9 deem começo á peça
de resistencia. D’esse modo não se alteram os habitos nem se desobedece à
auctoridade.
Eu – francamente – fujo das caixas de theatro como o diabo da cruz, porque
cada uma d’ellas é um fóco de intriga e maledicencia. Se tivesse um filho
moço, faria o possivel para que elle nunca as frequentasse... Entretanto, acho
extraordinaria a prohibição da policia! Aonde vamos parar, senhor Deus? Pois
já não é permittido ao cidadão receber em sua casa quem bem lhe pareça?
Oh, democracia! democracia!...
A. A.

47
O Theatro, 20/12/1894

Moreira Sampaio deu-me a honra de responder, por estas mesmas


columnas, á apreciação franca e sincera que no meu ultimo artigo fiz da
Cornucopia do Amor.
Infelizmente, a defeza do meu presado collaborador e amigo pecca pela
base: eu não acoimei a sua magica de immoral; não ha no meu folhetim um [p.
i.], uma palavra que tal intenção [p. i.]; não me preoccupei absolutamente das
“phrases ambiguas e das scenas equivocas” da sua peça.
Se a Cornucopia do Amor é immoral, não fui eu que o disse: foi Moreira
Sampaio que o confessou.
Se me passasse pela cabeça trazer á [p. i.] a immoralidade da peça, eu,
em vez de citar as scenas em que o rei Pindahyba e o principe Felicissimo “vão
[p. i.: “por”?] fóra”, scenas que nada têm de immoraes, citaria o episodio da
barraca no [p. i.: “reino”?] da Bilontragem.
Não, eu não faço nem nunca fiz ca[ps. is.]as liberdades d’essa especie que a
comedia contenha, porque entendo [p. i.] como eu, entende muita gente boa –
[p. i.] theatro não deve ser freqüentado [ps. is.]nhas solteira nem por crianças.
[ps. is.] theatro lyrico [ps. is.] innocencia, desde [ps. is.] como o Rigoletto, [t.
i.] Sampaio, e á da barraca da Cornucopia do amor.
Entendo igualmente que as moças e as crianças devem ter as suas leituras
especiaes, e é por isso que de vez em quando me animo a publicar no Paiz os
contos a que Moreira Sampaio allude com tanto rigor.
A moça que se achar auctorisada pelos pais a ler as folhas diarias, e que
com certeza nunca lhes perguntaria, como a Agnés, de Molière:

Si les enfants qu’on fait se faisaient par l’oreille,

nada, absolutamente nada aprenderá com a leitura de contos e anedoctas.


Bastam os annuncios para edifical-a.
Já vê Moreira Sampaio que eu não trouxe á bulha os equivocos da
Cornucopia do Amor, e um pedaço d’asno seria se o fizesse, depois de figurar (e
muitas vezes de sociedade com elle) como auctor de tantas bregeirices, de que
aliás não tenho remorsos.
O que me desagrada na magica do Sant’Anna não é o que a peça tem de
immoral, mas o que tem de mandongueira; não é o que n’ella possa offender
o pudor das donzellinhas, mas sim o que possa repugnar ao bom gosto dos
espectadores discretos.

48
Pode uma peça, qualquer que seja seu genero, ser livre, liberrima e
encantar o espirito de quem a ouve pela arte com que foi concebida e escripta.
Quem haverá que se não delicie com a famosa scena do leito na Lysistrata, de
Aristophanes? Não ha nada mais delicado, mais gracioso, mas fino – e não ha
nada mais immoral, na accepção que este adjectivo encontrou no theatro.
Nas comedias do poeta grego ha, entretanto, innumeras passagens que não
são immoraes, mas causam nauseas. Citarei apenas uma: o dialogo entre os
dous escravos de Trygeu, na primeira scena da Paz.
Não encontrei na Cornucopia do Amor a poesia indispensavel a uma peça
phantastica; mas o auctor acha que ha um pouco de poesia “na scena de
Geraldina com o principe, ao cahir da noite, quando contam os seus amores,
em plena floresta.”
Não, meu caro Sampaio; no theatro – sabel-o tu melhor do que eu – tudo
é convenção; poesia não a póde haver n’um homem que engole um rato em
scena e vai desengolil-o no bastidor, que faz protestos amorosos a uma mulher
e tem com outra (é a famosa scena da barraca) aquillo [ps. is.] Natureza, de
hilaridade [t. i.] mas a meu ver o nosso comediographo poderia, se quizesse,
dar-nos uma peça muito mais interessante sob o ponto de vista artistico, sem
prejudicar o seu trabalho sob o ponto de vista industrial.
Diz elle que quando tivermos um theatro, “as revistas cahirão por terra, as
magicas não terão mais razão de ser.”
Por que? Todos os generosos são bons, á excepção do fastidioso, lá disse
o poeta. O theatro litterario não exclue a magica nem a revista, e injusto será
privar o publico dos seus generos predilectos, desde que o auctores, que, como
Moreira Sampaio, saibam onde têm o nariz, lhe deem magicas feitas com
todo o cuidado e revistas que justifiquem aquelle verso que nós escrevemos no
prologo do Mercurio.
“Póde haver arte nas revistas de anno”
Concluindo, dou sinceros parabens a Moreira Sampaio, pelo esplendido
subcesso, que dia a dia mais se accentua, da Cornucopia do Amor.
***
Como se sabe, a preoccupação do theatro exotico russo, allemão,
dinamarquez, belga, etc., – é hoje, em Pariz um dos signaes mais evidentes da
decadencia da litteratura dramatica franceza.
Entre os numerosos macaqueadores de Antoine, o creador do famoso
Theatro Livre, que tanto barulho fez, conta-se um actor de alguma habilidade,
Lugné-Poé, muito elogiado pelos nephelibatas de Montmartre.

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Esse actor fundou ultimamente o Theatro da Obra, – titulo que na nossa
lingua perde a euphonia e mesmo a expressão que tem em francez: Théâtre de
l’Oeuvre.
Para inaugurar a presente estação de inverno, Lugné-Poé acaba de
representar, sob o titulo Annabella, a peça em 5 actos É pena que seja uma
prostituta, de John Ford, compatriota e quasi contemporaneo de Shakspeare,
adaptada á scena franceza por Moeterlink, o celebre symbolista belga.
O assumpto da peça é o incesto, não o incesto inconsciente de Oedipo, obra
do inexoravel destino, mas um incesto proposital, premeditado e commettido
por dous entes que medem toda a extensão do crime e não ignoram quaes são
as suas terriveis consequencias.
Comquanto sejam irmãos, Giovanni e Annabella sentem um pelo outro
amor carnal, e satisfazem-no. A moça casa-se, o marido descobre que ella está
gravida, injuria-a, e quer vingar a sua honra ultrajada. Giovanni apunhala-a.
Annabella expira satisfeita e feliz por morrer ás mãos do seu amante, e este vai
provocar o cunhado no meio de uma festa.
A’ parte a scena, de uma grande intensidade dramatica, em que Soranzo,
o marido de Annabella, maltrata e invectiva a desgraçada, que confessa o
seu crime sem invocar outro movel senão o amor, a peça de John Ford não se
recommenda por qualidades extraordinarias que justifiquem a sua exhumação.
O drama, de uma psychologia estranha, não tem, como pretende
Moeterlink, a grandeza do theatro shakspeareano. “É, diz um critico, uma
obra barbara e informe, semelhante a esses idolos selvagens, grosseiramente
talhados n’um tronco de arvore.”
Se Annabella precedesse de um seculo ou dous o genio que produziu
Hamlet, o drama poderia ser considerado como uma fórma embryonaria do
theatro inglez; mas Shakspeare já era morto quando John Ford fez representar
a sua primeira peça.
Eu imagino como Francisque Sarcey pulou de contente depois de assistir á
exhibição d’esse monstro.
*
**
Depois do meu ultimo artigo, os nossos theatros nenhuma novidade
offereceram ao publico.
A. A.

50
O Theatro, 27/12/1894

Anicet Bourgeois é uma figura sa[p. i.: “sagrada”?] na historia do theatro


francez no [p. i.: “século”?] XIX. As suas peças, que se tor[p. i.: “tornaram”?]
popularissimas, fizeram a for[p. i.: “fortuna”?] de muitos emprezarios do
boule[p. i.: “boulevard”?] Crime e foram traduzidas em [p. i.: “diversos”?]
idiomas, não primam, certa[p. i.: “certamente”?] pelo merito litterario, nem
pela [p. i.: “psycologia”?]logia, mas são engenhosamente [p. i.]ctadas, e
quantas conheço, não [p. i.: “poucas”?], têm o condão de interessar o publico
desde a primeira até a ultima scena.
A’s vezes Anicet Bourgeois descançava de um melodrama escrevendo um
vaudeville e não se mostrava menos habil n’este genero; que o diga Le prémier
coup de canif.
Elle escreveu quasi todas as suas peças em collaboração com outros
dramaturgos, mas o seu companheiro predilecto, o mais constante, foi Michel
Massom, escriptor de grande imaginação, a quem [p. i.] alguns trabalhos
publica[p. i.] o nome glorioso do velho [p. i.]
***
[ps. is.]cial-Bourgeois & Mas[p. i.] outros muitos, o ma [t. i.] tarefa que
exigiria uma paciencia que não tenho e um espaço de que não disponho n’esta
folha. Basta que saibam o essencial: a peça, de uma urdidura interessante e
complicada, foi escripta com toda a technica do theatro: o dialogo é incisivo; as
scenas são rapidas, succedem-se logicamente e estão bem articuladas umas ás
outras; as situações dramaticas abundam, sem que os auctores se esquecessem
do imprescindivel elemento comico; os personagens são desenhados com arte.
O desempenho dos papeis tem os seus altos e baixos, mas não compromette
absolutamente a peça, que, a julgar pelos applausos do publico, me parece
destinada a ficar no repertorio do Dias Braga como tantas outras do mesmo
genero.
Não quizera citar nomes para não estabelecer preferencias, mas não
posso eximir-me de dar os parabens á actriz Adelaide Coutinho pelos viziveis
progressos que revela no desempenho do papel de Valentina.
***
Uma das curiosidades theatraes d’es[ps. is.] dias foi a D. Ignez de Castro, [p.
i.] Branndão no papel de Affonso IV. [t. i.]
Pois assim não succedeu: o Brandão é positivamente máo no Affonso IV,
mas não fazer rir. O seu physico protesta contra o personagem, o seu orgão
aspero e nasal não se presta a nenhuma inflexão dramatica, todo elle é comico

51
da cabeça aos pés, – mas é um actor experimentado, com bastante habilidade
para escapar ao ridiculo.
Accresce que elle estava senhor do papel, isto é, sabia-o na ponta da lingua.
Sem duvida já o representou muitas vezes, e com agrado, no interior de Minas,
Rio de Janeiro e S. Paulo, durante as suas innumeras excursões pelas cidades,
villas, freguezias e povoações d’aquelles Estados. Não mutilou um verso, não
engoliu uma syllaba, não fez esperar uma deixa.
***
Apezar de representada um pouco a trouxe-mouxe, n’um d’esses
espectaculos que em gyria theatral se chamam tiros, a Castro causou-me
extraordinario prazer, e foi para o meu espirito um excellente derivativo.
Abstrahi da peça o desempenho dos papeis, que são de uma difficuldade
esmagadora, e ouvi o poema verso por verso.
[t. i.]
Pois bem, – João Baptista Gomes deixou uma tragedia, uma só, e essa
mesma em muitos pontos imitada de sua predecessora; mas que revolucionario
do theatro portuguez elle seria, e como a sua influencia ainda hoje se faria
sentir, se a morte o não levasse na flor dos annos!
Leia-se uma opinião esquecida, a de Garrett, que transcrevo do Bosquejo da
historia da poesia portugueza:
“João Baptista Gomes, auctor da Castro, mostrou n’ellla muito talento
poetico e dramatico. D’entre os bastos defeitos d’essa tragedia sobresahem
muitas bellezas. Desvaira-o o elmanismo; desmanda-se por madrigaes,
quando a austeridade de Melpomene pedia concisão, força e naturalidade;
perde-se em declamações, extravaga em logares communs, inverte a dicção
com antitheses, destróe toda a illusão com versos a miudo sexquipedaes e
entumecidos; mas por meio de todas essas nevoas brilha muita luz de engenho,
muita sensiblidade, muita energia de coração, predicados que com o estudo da
lingua, que não tinha, com a experiencia, que lhe [p. i.] triumpharia ao cabo do
[t. i.] panhia logo depois da segunda representação da Castro.
Os artistas reuniran-se e, sob a direcção do Affonso IV, organisaram uma
associação, que inaugurou brilhantemente os seus trabalhos – com a reprise do
Tim tim por tim tim.
O annuncio dos dous primeiros espectaculos é muito curioso; merecia ficar
registrado n’estas columnas como um traço da physionomia do theatro no Rio
de Janeiro em 1894, sexto da Republica. Não posso transcrevel-o todo, mas não
resisto ao seguinte seguinte topico:

52
“O que? Adivinhem! Toca as raias do impossivel! Inesperado!
Imprevisto! De chofre assim, quando menos se espera, zás!... nada menos
de duas mirabolantes representações do celebre, do invejavel e invejado,
do remechedor e remechido, do disputado Tim tim por tim tim, com a
sua immensa e rutilante cauda de mimos e delicias, de estupefaciencias e
encantos!”
E mais abaixo se annunciam as rabanadas do Brandão!
Hão de convir, meus senhores, que não estamos longe de ver o zabumba na
porta do theatro para [t. i.] possuir um voz de tenor ou de barytono.
Mesmo sem voz, poderia, como tantos outros arranjar a vida; mas como
todo Rio de Janeiro o applaudiou no Demi-monde, no Filho de Coralia, no D.
Juan Tenorio, na Dalila, no Gran Galeoto e em tantas outras peças litterarias,
elle entendeu que não devia transigir com o gosto do publico, e até hoje não
transigiu.
Ainda ultimamente foi convidado para fazer parte de uma companhia
dramatica na Phenix e reappareceu na Estatua de Carne; mas teve que [p.
i.] immediatamente, porque a empreza queria que elle entrasse nos Dois
proscriptos.. com os Andrades da [p. i.].
No espectaculo de amanhã será representada a Doida de Montmayor,
conhecido drama dos dous auctores francezes de quem me occupei no comçeo
d’este artigo, – Anicet Bogueois e Michel Masson.
[ps. is.] attrativo d’essa [ps. is.] reappareceu [t. i.]
A. A.

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