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da Mortalidade Violenta:
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Mestre em Saúde Pública pelo Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães da Fundação Oswaldo Cruz e doutorado em Sociologia
pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) sob orientação de Dr. José Luiz de Amorim Ratton. É pesquisadora do Núcleo
de Estudos e Pesquisas sobre Criminalidade, Violência e Políticas Públicas de Segurança desde 2009 e consultora nas áreas de
gênero, violência, saúde e políticas públicas.
aportella37@gmail.com
Resumo
O crescimento das mortes violentas vem sendo observado no Brasil desde o final dos anos 1970. No país e em Pernam-
buco, as principais vítimas dos homicídios são jovens negros, do sexo masculino, com pouca escolaridade e baixa renda,.
Em 2011, 86,2% das mulheres assassinadas em Recife eram negras e, em 2009, 47,2% dos casos de homicídios de mu-
lheres concentraram-se em apenas dez bairros dessa capital. Foi apenas em 2007 que a questão da violência letal ganhou
prioridade na agenda do governo do Estado, por meio da implementação da primeira política pública de segurança do
Estado, o Pacto pela Vida (PPV). Nesse mesmo ano, instituiu-se a Política de Enfrentamento da Violência contra a Mulher,
pela Secretaria da Mulher. O PPV vem alcançando bons resultados, as metas globais de redução dos crimes violentos letais
intencionais têm sido alcançadas, mas há diferenças importantes quando se observa a variação de acordo com o sexo da
vítima e com a região de ocorrência dos casos. Os homicídios de mulheres apresentaram redução menor ao longo do tempo
e oscilação entre crescimento e redução que pode se dever à pouca sensibilidade do PPV para as diferentes situações nas
quais as mulheres são assassinadas, que requerem linhas de ação específicas do ponto de vista da política de prevenção
e repressão. Este artigo se propõe a apresentar e analisar estas diferenças e a refletir sobre possíveis hipóteses capazes de
explicá-las, reconhecendo a eficácia do PPV como política pública de segurança, mas também a necessidade de reorientá-
-lo para que seja capaz de responder às diferentes configurações da violência letal contra as mulheres em Pernambuco.
Palavras-Chave
Violência contra a mulher; políticas públicas de segurança; homicídios
no Brasil são marcadas por diferentes expressões dos os casos de homicídios de mulheres con-
da violência de gênero. A “explosão de litigio- centraram-se em apenas dez bairros da capital;
sidade” ou a sociabilidade violenta, portanto, essa mesma proporção de casos com vítimas do
afetam as interações entre homens e mulheres, sexo masculino distribuiu-se por 16 bairros no
podendo ainda reconfigurar valores e normas mesmo ano (SDS-PE, 2013)2.
de gênero. Além disso, se, como diz Adorno,
Impactos de Gênero na Redução da Mortalidade Violenta:
“o tecido social encontra-se sensível a tensões e No Brasil, embora alguns estudos tratem
confrontos que, no passado, não pareciam con- da mortalidade por homicídios entre homens e
vergir tão abruptamente para um desfecho fa- mulheres, poucos trabalhos se dedicam a ana-
tal”, pode-se pensar que as tensões e confrontos lisar esta forma de violência entre as mulheres.
conjugais e familiares entre mulheres e homens, Dada a magnitude e as características da violên-
especialmente nos contextos mencionados ante- cia perpetrada por parceiros ou familiares – com
riormente, também apresentem a tendência de seu perfil de longa duração, intenso sofrimento
convergir para desfechos fatais. físico e psíquico, ocorrência no ambiente da
vida privada e forte legitimidade social graças
No Brasil e em Pernambuco, as principais à persistência da dominação patriarcal –, os
vítimas dos homicídios são jovens negros, do homicídios, geralmente associados à violência
sexo masculino, com pouca escolaridade e bai- urbana, têm despertado pouca atenção quando
xa renda (WEISELFISZ, 2012a). Entre as mu- as vítimas são mulheres. Exceção deve ser feita
lheres que são vítimas de homicídio, a maioria aos estudos sobre crimes passionais (CORRÊA,
é também jovem, negra e com baixa escolari- 1981; 1983; TEIXEIRA, 2009), parte deles vol-
dade. Além disso, os homicídios – tanto de ho- tada para o modo seletivo como a justiça trata
mens quanto de mulheres – concentram-se em este tipo de delito. Destaque deve ser dado ao
áreas onde são precárias as condições sociais de estudo coordenado por BLAY (2008), no qual
existência coletiva e onde a qualidade de vida são analisados homicídios de mulheres ocorri-
é acentuadamente degradada. As mulheres que dos em São Paulo, no período de 1995 a 2003,
aí residem estão expostas a múltiplas vulne- ao acompanhamento dos homicídios feitos pelo
rabilidades, possivelmente encontrando inú- SOS Corpo, entre 2004 e 2008 (PORTELLA et
meras dificuldades para evitar ou sair de uma al, 2004-2008) e aos estudos de Pasinato (2011)
situação de violência doméstica. Este diferen- e Meneghel e Hirakata (2011) sobre femicídio.
cial de risco para as negras e pobres evidencia,
também para as mulheres, a “distribuição de- O homicídio de mulheres pode ser – e fre-
sigual do direito à vida” (ADORNO, 2002). quentemente é – o desfecho de uma situação
Em Recife, dados do Datasus e de outros estu- de violência vivida entre o casal. Em Pernam-
dos (PORTELLA et al, 2011) indicam a per- buco, o número de mulheres assassinadas qua-
sistência desse perfil e a concentração territo- se triplicou entre 1979 e 2010, passando de 94
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modo articulado elementos da subordinação distantes do padrão aceitável pela ONU – me-
de gênero e raça e da situação socioeconômica nor que 10/100 mil habitantes – e maior do
em contextos de criminalidade urbana, o que que as taxas observadas em vários conflitos
cria uma nova condição de “vítima” para as armados no mundo. No período de 2004 a
mulheres. Essa condição não pode, ao menos a 2007, a mais alta taxa de morte violenta em
princípio, nem ser imediatamente identificada conflitos armados foi encontrada no Iraque, de
com o Poder Judiciário, o Ministério Públi- ações de todas as áreas que compõem o
co, a Assembléia Legislativa, os municípios e Pacto. (PERNAMBUCO, s.d.)
a União. A primeira atividade do PPV foi a
elaboração do Plano Estadual de Segurança O PPV organiza-se em seis linhas de ação: re-
Pública. A partir daí, foram definidos 138 pressão qualificada; aperfeiçoamento institucio-
projetos estruturadores e permanentes de nal; formação e capacitação; informação e gestão
Impactos de Gênero na Redução da Mortalidade Violenta:
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prevenção, proteção, punição, assistência e de articulação com outros órgãos governamen-
produção de conhecimento. A Política se pro- tais – como a Justiça, a SDS, as Polícias e as
põe a instalar e ampliar no Estado a rede de redes de saúde e assistência social.
serviços prevista pela Lei Maria da Penha, nas
áreas da justiça, segurança pública e de políti- Hoje, há no Estado 10 delegacias especiali-
cas sociais – e, de fato, nos últimos cinco anos, zadas de atendimento à mulher, quatro casas-
são os dados reais do Estado, porque a gente dos casos, de modo a identificar possíveis im-
só tem daquelas dez delegacias. pactos diferenciais da política pública de segu-
rança sobre homens e mulheres. A análise aqui
Esse fluxo é revelador das dificuldades de apresentada está centrada nos CVLI, dado que
articulação entre as duas áreas de políticas, a variação na ocorrência destes crimes é toma-
que serão tratadas com mais atenção adiante. da pelo PPV como o indicador prioritário para
Nesse ponto, cabe registrar apenas que a po- o monitoramento e a avaliação da situação de
lítica da Secretaria da Mulher volta-se para a criminalidade e violência.
violência doméstica e não toma o homicídio
como prioridade. Os dados aqui analisados são provenientes
do Sistema de Informação Policial/Infopol, da
Já o PPV, ao longo de seus cinco anos de Secretaria de Defesa Social de Pernambuco,
implementação tem alcançado bons resultados por meio dos Boletins Trimestrais da Conjun-
e, a despeito de algumas variações em momen- tura Criminal, disponíveis na página eletrônica
tos específicos, as metas globais de redução dos da SDS-PE, e do Datasus. Os dados referem-
CVLI tem sido alcançadas. Não obstante, há -se ao número e às taxas de CVLI no perío-
diferenças importantes quando se observa a va- do de 2006 a 2011, de acordo com o sexo da
riação de acordo com o sexo da vítima e com a vítima, região de ocorrência, municípios com
região de ocorrência dos casos. Os homicídios menos e mais de 100 mil habitantes e maiores
de mulheres diminuíram menos e oscilaram ao municípios do Estado. Para esse período foi
longo do tempo, o que pode se dever à pouca analisada a variação na ocorrência dos CVLI,
sensibilidade do PPV para as diferentes situa- procurando-se identificar as diferenças nesta
ções nas quais as mulheres são assassinadas, que variação de acordo com o sexo da vítima e as
requerem linhas de ação específicas do ponto de variáveis mencionadas anteriormente. As taxas
vista da política de prevenção e repressão. estaduais das mortes por agressão para 2009 e
2010, de acordo com o sexo da vítima, tiveram
Este artigo se propõe a apresentar e analisar como fonte o Datasus e o Mapa da Violência
estas diferenças e a refletir sobre possíveis hipó- 2012, que também usa dados do Datasus. As
teses capazes de explicá-las, reconhecendo a efi- informações foram trabalhadas no programa
cácia do PPV como política pública de seguran- Excel 2003-2007.
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por agressão em que as vítimas são mulheres mulheres, o que leva a pensar na existência de
tem oscilado em torno de 8%, nas duas últi- contextos ou fatores comuns que favorecem a
mas décadas. O mesmo ocorre com relação às vitimização de pessoas de ambos os sexos. A
taxas, que são bem menores entre as mulheres Tabela 1 apresenta os Estados brasileiros com
do que entre os homens. Como a literatura já as mais altas taxas de homicídios do país, em
tem fartamente demonstrado, o problema da 2009, e já reflete a queda que vem sendo ob-
Tabela 1 - Taxas
de morte por agressão (por 100 mil habitantes) de acor-
do com o sexo nos dez estados brasileiros de maior ocorrência
2009
Ano de ocorrência
Sexo Total
2006 2007 2008 2009 2010 2011
Em Pernambuco, o número de CVLI vem ção anual. No caso das mulheres, há oscilação,
declinando desde 2007, e em 2010 observou- com crescimento no número de casos em 2008,
-se a maior redução, de 12,6%, com relação 2009 e 2011 – neste último ano o aumento
ao ano anterior. Considerando o período de ultrapassou os 10%. O ano de 2010 foi o de
2006 a 2011, foram registrados 24.789 CVLI, maior redução, com 17,1% de diminuição no
sendo que 1.713 (6,9%) com vítimas do sexo número de casos com vítimas do sexo feminino
feminino. O ano de 2006 representou o pico e 12,6% entre os casos que vitimaram homens.
da série temporal, com 4.624 casos – mas, para
os casos que vitimaram homens, esse pico se Em 2011, os homicídios de mulheres cres-
deu em 2007. Quando se trata de vítimas do ceram em oito regiões7 e recuaram em quatro.
sexo feminino, o ano inicial da série tempo- A maior variação (64,3%) correspondeu ao
ral, 2006, concentra o maior número de casos Agreste Meridional, que, em 2010, havia re-
(319). Ao longo do período, como se verá a gistrado 14 casos de CVLI com vítimas mu-
seguir, o número oscila, mas em nenhum mo- lheres e, em 2011, registrou 23 casos. No caso
mento volta a alcançar esse patamar inicial. A dos CVLI com vítimas do sexo masculino, em
Tabela 2 apresenta os números absolutos de cinco regiões elevou-se o número de ocorrên-
CVLI a cada ano e os gráficos seguintes apre- cias, mas na Mata Norte esse crescimento foi
sentam as variações temporais. de apenas 0,5%. As maiores variações – 50% e
31% – foram encontradas no Sertão Central e
Já no primeiro gráfico observa-se a tendên- no Sertão do Araripe, respectivamente.
cia que se repete na maioria das regiões e mu-
nicípios analisados. Os casos com vítimas do O ano de 2011 foi problemático para o al-
sexo masculino apresentam uma tendência con- cance das metas do PPV. É de se esperar que,
sistente de redução, mostrando-se sob controle nos primeiros anos de implementação de uma
durante todo o período, ainda que nem sem- política de controle de CVLI, o número de
pre se tenha atingido a meta de 12% de redu- casos se reduza consideravelmente, graças, por
Artigos
15,0
10,0
5,0
0,0
-5,0
-10,0
-15,0
-20,0
2006-2007 2007-2008 2008-2009 2009-2010 2010-2011
Homens 0,1 -1,7 -12,3 -12,6 -0,5
Mulheres -13,2 3,2 4,5 -17,1 11,3
80,0
60,0
40,0
20,0
0,0
Metropolitana
-20,0
Sertão Central
Mata Norte
Meridional
-40,0
Mata Sul
Sertão de
Sertão do
Sertão do
Sertão do
São Franscisco
Agreste
Agreste
Itaparica
Central
Setentrional
Moxotó
Araripe
Região
-60,0 Pajeú
Sertão do
Agreste
Homens Mulheres
exemplo, a ações repressivas voltadas para indi- não retornarão à atividade criminosa e que os
víduos ou grupos que, em função de suas ativi- territórios antes vulneráveis não voltarão a abri-
dades criminosas, são responsáveis isoladamente gar práticas que levam ao CVLI. Assim, as in-
por um grande número de homicídios. O foco tervenções de segurança pública devem passar
sobre territórios específicos, que concentram a por reorientação para alcançar os casos que se
maior proporção de casos, também pode levar distribuem de forma mais difusa no território
à rápida diminuição no número de casos, au- e cujas motivações são também mais diversas.
xiliando o alcance das metas. Passada essa fase Nessas circunstâncias, espera-se que o ritmo de
inicial, políticas preventivas e estruturadoras de- redução no número de casos se desacelere até
vem garantir que aqueles indivíduos e grupos que se implementem as novas medidas.
de à Justiça. Assim é que, como parte deste pro- mulheres, a variação acumulada nos cinco
cesso, um número grande de homicidas retornou anos permanece problemática na Zona da
às ruas, em função de irregularidades em seus pro- Mata Sul (+9,1%), no Agreste Meridional
cessos. Parte importante deles, especialmente os (+64,3%), no Sertão de Itaparica (+25%),
líderes de grupos, voltou às atividades criminosas e no Sertão do Araripe (+25%) e no Sertão do
à prática do homicídio, o que constituiu um obs- Pajeú (+33,3%). No caso das vítimas do sexo
Impactos de Gênero na Redução da Mortalidade Violenta:
táculo para o alcance da meta do PPV. Esse pro- masculino, as regiões que apresentaram cres-
cesso foi enfrentado pelo governo do Estado por cimento no número de casos foram o Sertão
meio de ações emergenciais realizadas no final do Central (+105,3%), o Sertão de Itaparica
segundo semestre de 2011 e que, embora não te- (+5,3%) e o Sertão do Araripe (+57,6%).
nham logrado alcançar a meta de 12% de redução, No conjunto do Estado, a variação acumula-
mas tão somente 0,06%, podem ser consideradas da foi negativa para ambos os sexos: 25% de
bem-sucedidas na medida em que não se obser- redução no número de casos com vítimas do
vou crescimento no número global de homicídios. sexo masculino e 13,5% de redução nos ca-
Mas, conforme o Gráfico 1, essa mínima redução sos com vítimas mulheres. Observe-se que,
– que representa apenas um caso a menos – deu-se caso a meta anual de 12% tivesse sido alcan-
entre as vítimas do sexo masculino. Nos casos em çada todos os anos, a variação acumulada no
que as vítimas eram mulheres houve aumento de período deveria ser de 40%, o que não foi
11% de um ano para o outro. alcançado em nenhum dos casos (Gráfico 3).
Gráfico 3 - V
ariação no nº de CVLI, de acordo com o sexo da vítima e
região de ocorrência
Pernambuco, 2006-2011
120,0
100,0
80,0
60,0
40,0
20,0
0,0
Sertão de Itaparica
-20,0
Sertão Central
Sertão do Araripe
Meridional
Mata Sul
Agreste
Setentrional
Metropolitana
Central
Sertão do
-40,0
Agreste
Pernambuco
Mata Norte
Sertão do São
Agreste
Pajeú
-60,0
Sertão do
Região
Franscisco
Moxotó
-80,0
Homens Mulheres
Artigos
5,0
0,0
-5,0
-10,0
-15,0
2008-2009 2009-2010 2010-2011
Homens -3,0 -10,4 -7,6
Mulheres -3,7 -8,4 1,6
Gráfico 5 - V
ariação anual no nº de CVLI, municípios com mais
de 100 mil habitantes
Pernambuco, 2008-2011
30,0
20,0
10,0
0,0
-10,0
-20,0
-30,0
2008-2009 2009-2010 2010-2011
Homens -19,1 -14,5 5,7
Mulheres 9,1 -23,8 20,3
Homens Mulheres
Gráfico 6 - V
ariação anual no nº de CVLI
Recife (PE), 2008-2011
30,0
20,0
10,0
0,0
-10,0
-20,0
-30,0
-40,0
2008-2009 2009-2010 2010-2011
Homens -18,8 -15,4 1,6
Mulheres 9,1 -36,1 10,9
Homens Mulheres
rém, que a Região Metropolitana e a capital regis- homens e mulheres sofrem violência e são as-
traram crescimento dos dois tipos de caso em 2011 sassinados em circunstâncias nem sempre se-
melhantes. Se é verdade que tem aumentado o
Mais uma vez, porém, ao se analisar a va- número de mulheres envolvidas com atividades
riação total ao final do período – e incluindo criminosas e, assim, expostas aos riscos ine-
agora os municípios mais populosos do Estado rentes a este universo, é verdade também que
–,nota-se que apenas os casos com vítimas mu- parte importante das mulheres continua sendo
lheres cresceram. Isso aconteceu nos municípios vitimada em situações de violência conjugal e
de Camaragibe (+66,7%), Caruaru (+18,2%), doméstica. Para ilustrar este raciocínio e auxiliar
Jaboatão dos Guararapes (+3,8%), Paulista na compreensão dos dados analisados, a seguir
(+100,0%) e Vitória de Santo Antão (+80%). descrevem-se as características dos homicídios
No caso dos homicídios de homens, o espec- de homens e de mulheres ocorridos em Recife
tro de redução foi de -7,4%, no Cabo de San- em 20099 (PORTELLA et al, 2011).
Gráfico 7 - V
ariação no nº de CVLI, municípios selecionados
Pernambuco, 2006-2011
150,0
100,0
50,0
0,00
-50,0
Até 100 mil hab.
Mais de 1 milhão
Cabo
Camaragibe
Caruaru
Jaboatão dos
Recife
Santo Antão
Olinda
Paulista
Petrolina
Garanhuma
Guararapes
-100,0
Vito´ria de
Homens Mulheres
Artigos
região metropolitana e na capital. Em 2009, Outra diferença importante entre os dois
52,6% (ou 2.114) dos casos do Estado aconte- tipos de crime refere-se ao local em que é co-
ceram nessas áreas. Sozinha, a capital concen- metido: 82,4% dos homens morrem em via
trou 20% de todos os casos e 24,4% daqueles pública; entre as mulheres, esse percentual,
cujas vítimas eram do sexo feminino. O con- ainda muito alto, corresponde a 68,1%. Pouco
junto da Região Metropolitana reuniu pratica- mais de um quinto das mulheres (22,2%) é as-
Em Recife, neste mesmo ano, acontece- Com relação ao período do ano, verifica-se
ram 818 CVLI, 746 dos quais com vítimas do que os casos envolvendo homens distribuem-se de
sexo masculino e 72 (8,8% do total) com víti- modo mais uniforme entre o trimestre de menor
mas mulheres. Ao se compararem os casos de ocorrência – julho a setembro, com 21,3% dos ca-
acordo com o sexo da vítima, verificam-se al- sos – e aquele de maior ocorrência – janeiro a mar-
gumas semelhanças e diferenças importantes. ço, com 29,2% dos homicídios. Entre as mulhe-
Em comum, o fato de que a quase totalidade res, muda a amplitude entre os períodos e o início
dos casos refere-se a homicídio: apenas 1,9% do ano, com menos casos registrados, é também
dos homens e 1,4% das mulheres foram assas- aquele com mais casos (30,6%), mas é o trimestre
sinados em situação de latrocínio. Nenhuma de abril a junho que apresenta a menor propor-
mulher e apenas um homem morreu como ção de homicídios (16,7%). Os finais de semana
decorrência de uma lesão corporal. – especialmente o domingo, que reúne um quarto
dos casos, independentemente do sexo da vítima
Os homicídios de homens se distribuem –, constituem o momento mais arriscado para
por praticamente todo o território da cida- ambos os sexos, com a pequena diferença de que
de: dos 94 bairros do Recife, 81 registraram há mais vítimas mulheres na sexta-feira (20,8%) e
casos de homicídios cujas vítimas eram ho- mais homens no sábado (19,0%). Com relação ao
mens. No caso das mulheres, os casos con- período do dia, em geral, homens e mulheres são
centraram-se em 39 bairros. Como resultado mortos à noite, mas há diferenças com relação à
desse padrão de distribuição territorial, qua- madrugada e à manhã: 27,8% dos casos que viti-
se 50% dos casos em que as vítimas são mu- mam mulheres ocorrem na madrugada e apenas
lheres concentraram-se em apenas 10 bair- 9,7% pela manhã; entre os homens, esses percen-
ros. No caso dos homens, esse percentual é tuais são de 23,6% e 15,8%, respectivamente.
10% menor. Porém, com uma única exceção
(Campo Grande para os homens e Jardim Homens e mulheres morrem principalmente
São Paulo para as mulheres), os bairros de em decorrência de disparos de armas de fogo, mas
maior ocorrência de casos de homicídios são 20,8% das mulheres e apenas 10,4% dos homens
Gráfico 8 - Motivos
relacionados aos homicídios, segundo o sexo
da vítima
Recife (PE), 2009
7,2
Conflitos interpessoais com drogas 10,7
0,0 5,0 10,0 15,0 20,0 25,0 30,0 35,0 40,0 45,0
Masculino Feminino
Artigos
mentos e estrangulamentos, encontram-se 8,3% 14,3% dos casos com vítimas mulheres. As
das vítimas do sexo feminino e 5,6% dos homens. demais motivações se distribuíram de forma
semelhante para os dois sexos (Gráfico 8).
Finalmente, há algumas diferenças tam-
bém com relação à motivação do crime. Os Esses dados indicam que os homicídios de
conflitos interpessoais sem envolvimento de mulheres compartilham certas características
Quadro 1 - C
aracterísticas dos homicídios, de acordo com o sexo da vítima
Recife (PE), 2009
corrência de disparo de arma de fogo, con- Assim, o PPV acerta em sua estratégia
centrando-se no primeiro trimestre do ano. para enfrentar os CVLI que são decorrentes
A maior parte dos casos aconteceu em via das situações de criminalidade e que consti-
pública e os conflitos interpessoais foram o tuem a maioria dos casos no Estado. É pos-
principal motivo que levaram à morte vio- sível ainda que parte importante da redução
lenta. Em cerca de 10% dos casos, vítimas nos casos que vitimam as mulheres tenha se
Impactos de Gênero na Redução da Mortalidade Violenta:
ou agressores fizeram uso de álcool ou outras dado justamente entre os que ocorrem nas
drogas no momento do homicídio. Ao se situações de criminalidade e de conflitos de-
compararem os casos de acordo com o sexo correntes do uso de drogas. A partir da análise
das vítimas, verifica-se que os crimes que vi- dos dados, pode-se, ainda, levantar a hipóte-
timaram mulheres apresentaram maior con- se de que as dificuldades de redução no nú-
centração territorial, uma parte considerá- mero de homicídios de mulheres se deve ao
vel aconteceu na residência da vítima e, em peso dos casos que ocorrem em situações de
comparação com os casos masculinos, houve violência cometida por parceiro íntimo, que
maior uso de arma branca e outras armas. Os requerem uma estratégia diferenciada daque-
conflitos passionais figuraram como a prin- las implementadas pelo PPV e que, até en-
cipal motivação dos crimes que vitimaram tão, não foram incorporadas à política. Em
as mulheres. Para os homens, a dinâmica da contrapartida, aparentemente, a Política de
criminalidade foi o segundo maior motivo Enfrentamento da Violência contra a Mulher
que levou ao homicídio. não inclui uma linha específica voltada para
a violência letal, a ser implementada em par-
Conclusões ceria com a Secretaria de Defesa Social. Essa
O PPV pode ser considerado uma políti- questão é reconhecida pela gestora da Secre-
ca bem-sucedida, no sentido de que, de fato, taria da Mulher, que afirma que a concepção
tem logrado alcançar as metas propostas de de violência letal que orienta as estratégias e
redução do CVLI. As dificuldades encontra- ações da SDS está fortemente ancorada na
das nos últimos cinco anos foram superadas, problemática da criminalidade urbana e, mais
de tal forma que se pode afirmar que é uma especificamente, do tráfico de drogas. Assim,
política adequada para a contenção da cri- o PPV não logrou instituir mecanismos efi-
minalidade e da violência em Pernambuco. cazes de identificação dos diferentes tipos de
A análise dos dados, porém, demonstrou situações que levam à vitimização de homens
que há impactos diferenciais das ações do e mulheres e, com isso, não é possível definir
PPV sobre os homicídios de homens e mu- estratégias específicas para lidar com algumas
lheres: é maior a redução entre os primeiros, destas configurações, como é o caso do ho-
e menor ou inexistente nos casos em que as micídio cometido por parceiro íntimo ou da
vítimas são mulheres, com diferenças impor- violência sexista. Nas palavras da gestora,
Artigos
acontecem mensalmente. Só que eles traba- diata e unívoca da segurança pública com a
lham por AIS, área de abrangência de cada ação de polícia e, mais especificamente, com
batalhão e discutem o índice de violência em as ações de repressão. Como se viu, metade
cada AIS. A violência contra a mulher não dos casos de homicídios de mulheres não cabe
dá pra tratar da mesma forma. [...] Hoje, na rubrica “violência doméstica” e nada au-
depois da discussão, da nossa participação, toriza a pensar que não há, nessas situações,
ocupa-se dos homicídios, especialmente dos que portante na área de segurança pública, exigin-
vitimam homens. Para os homicídios de mulhe- do maior esforço por parte dos entes governa-
res, portanto, resta ainda a tarefa de se produzir mentais para a redefinição das estratégias e das
um lugar para a reflexão e a intervenção. ações comuns.
Impactos de Gênero na Redução da Mortalidade Violenta:
1. Além do homicídio, os CVLI incluem o latrocínio e a lesão corporal seguida de morte, de acordo com definição adotada pela
Secretaria Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça em 2006
7. A informação sobre o Sertão Central não aparece no gráfico porque, em 2010, a região não havia registrado homicídio de
mulheres e, em 2011, registrou quatro casos. Não há como representar graficamente este tipo de aumento.
8. Aqui o período analisado é de 2008 a 2011 porque, para o período anterior, os Boletins de Conjuntura Criminal só disponibilizam as
taxas de CVLI e não os números absolutos.
9. A fonte destas informações também foram os dados da SDS-PE, mas desta vez por meio dos bancos de dados do Sistema de
Informação Policial – Infopol e do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa, cuja base são os inquéritos policiais.
ADORNO, Sérgio. Exclusão socioeconômica e violência PINHEIRO, P. S. (Org.). Crime, Violência e Poder.
Artigos
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Resumen Abstract
Impactos de género en la reducción de la mortalidad violenta: Impacts of Gender on the Reduction of Violent Death:
reflexiones sobre el Pacto por la Vida en Pernambuco Reflections on the Pact for Life in Pernambuco
Impactos de Gênero na Redução da Mortalidade Violenta:
El crecimiento de las muertes violentas viene siendo observado en An increase in violent deaths can be observed in Brazil since
Brasil desde finales de los años 70. En el país y en Pernambuco, the end of the 1970s. In the country and in the state of
las principales víctimas de los homicidios son jóvenes negros, del Pernambuco, the main victims of homicide are low-income,
sexo masculino, con poca escolaridad y de baja renta. En 2011, low-education level, male black youth. In 2011, 86.2% of
el 86,2% de las mujeres asesinadas en Recife eran negras y, the women killed in the city of Recife were black, and in
en 2009, el 47,2% de los casos de homicidios de mujeres se 2009, 47.2% of female homicide cases were concentrated
concentraban en solo diez barrios de esa capital. Tan solo en 2007 in just 10 neighborhoods of the capital city. It was only in
saltó la cuestión de la violencia letal a las prioridades en la agenda 2007 that the issue of lethal violence was given priority on
del gobierno del Estado, por medio de la implementación de la the state government’s agenda, through the implementation
primera política pública de seguridad del Estado, el Pacto por la of the first state policy for public safety, the PPV (Pact for
Vida (PPV). En ese mismo año, la Secretaría de la Mujer instituyó Life). In this same year, The Policy to Combat Violence Against
la Política de Enfrentamiento de la Violencia contra la Mujer. El Women was instituted, by the Secretary for Women. The PPV
PPV ha alcanzando buenos resultados, las metas globales de has achieved good results. Overall goals for the reduction
reducción de los delitos violentos letales intencionales han sido of intentional violent, lethal crime have been reached, but
alcanzadas, pero hay diferencias importantes cuando se observa there are important differences when observing the variation
la variación de acuerdo con el sexo de la víctima y con la región according to sex of the victim and in what regions cases
donde suceden los hechos. Los homicidios de mujeres presentaron occur. Female homicides showed both a lower reduction rate
una reducción menor a lo largo del tiempo y una fluctuación entre and a fluctuation of rate over time. The fluctuation of this rate
crecimiento y reducción que puede deberse a la poca sensibilidad may be due to PPV’s low sensitivity to the varying situations
del PPV para las diferentes situaciones en las que las mujeres son in which women are killed, and which require specific lines
asesinadas, que requieren líneas de acción específicas desde el of action from a prevention and repression policy standpoint.
punto de vista de la política de prevención y represión. Este artículo This article aims to present and analyze these differences and
se propone presentar y analizar estas diferencias y reflexionar reflect upon possible hypotheses which may explain them.
sobre posibles hipótesis capaces de explicarlas, reconociendo la This article also recognizes the efficiency of PPV as a policy
eficacia del PPV como política pública de seguridad, pero también for public safety, but also the need to refocus it in order to be
la necesidad de reorientarlo para que sea capaz de responder able to respond to various forms of lethal violence against
a las diferentes configuraciones de la violencia letal contra las women in Pernambuco.
mujeres en Pernambuco..
Keywords: Violence against women; public safety
Palabras clave: Violencia contra la mujer; políticas públi- policies; homicides.
cas de seguridad; homicidios.