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ANAIS:
ARTIGOS COMPLETOS
BELO HORIZONTE
2011
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
Edições Uberlândia e Belo Horizonte
Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em
C749a Direito (1. : 2010 : Belo Horizonte ; Uberlândia, MG)
Anais : artigos completos / I Congresso da Associação
Mineira de Pós-Graduandos em Direito. – Belo Horizonte :
AMPD : Pergamum, 2010.
3392 p.
Inclui bibliografias
CDU: 34(061.3)
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COMISSÃO ORGANIZADORA
COMISSÃO CIENTÍFICA
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APRESENTAÇÃO
A AMPD
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I CONGRESSO DA AMPD
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SUMÁRIO
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PREFÁCIO
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se pesquisa e como se pesquisa, está bem realizado. A publicação tem o formato ideal
para que se aviste o quanto de produção os vários autores materializam ou insinuam.
Como expusemos ao início, a trajetória é indicativa de vários outros
eventos. Com muita honra, a Universidade Federal de Uberlândia e o curso de
mestrado em direito públicos estarão prontos e, solícitos, receberemos os - futuros -
congressos da AMPD participando, assim como participamos este ano, deste palco
privilegiado, recebendo este público qualificado.
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CIDADANIA,
CRIMINALIZAÇÃO E
PRÁTICAS PUNITIVAS
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RESUMO
1 Advogada, graduada pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais.
E-mail: dri_x@yahoo.com.br
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1 - INTRODUÇÃO
2 Além da seletividade Eugênio Raul Zaffaroni apresenta como características estruturais do sistema
penal: a reprodução da violência, a criação de condições para maiores condutas lesivas, a corrupção
institucionalizada, a concentração de poder, a verticalização social e a destruição das relações
horizontais ou comunitárias.
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outros fatores, pelo reduzido espaço social conferido aos sujeitos, tornando-os mais
suscetíveis a assumir o papel de delinqüentes que lhes é atribuído pela sociedade.
De fato, as causas da criminalidade são várias e, dentre elas, não se pode
ignorar a falta de apoio estatal no combate à pobreza, vista esta em sentido amplo.
Da falha estatal e, portanto, da sociedade como um todo, surge a sua co-
culpabilidade no delito, emergindo da omissão estatal um dos fatores criminógenos.
Em outras palavras, ao negar aos indivíduos marginalizados oportunidades de vida
dadas a outros cidadãos, atribuindo-lhes o papel de delinqüentes, a sociedade torna-
se parcialmente responsável pela prática do delito por eles.
Dessarte, o princípio da co-culpabilidade é corolário do princípio
constitucional da igualdade, uma vez que, reconhecido um menor grau de
determinação do indivíduo que não dispõe, ou dispõe precariamente, de condições
econômicas, educação, alimentação, moradia, lazer, etc., impõe-se que a resposta
estatal ao delito praticado por ele leve em conta, no momento de individualização da
pena, a omissão da sociedade.
Diante da parca abordagem da doutrina sobre o tema, a despeito da sua
importância, objetiva o presente trabalho compreender o conceito de co-
culpabilidade e a sua influência na fixação da pena do deliquente, tendo-se em vista
que cada vez mais circunstâncias têm que ser consideradas na atividade judicante,
para a realização da justiça material.
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situação normal, o indivíduo deve ser livre para agir de acordo com sua
autodeterminação, dentro do âmbito de exigência da norma jurídica, ou seja, não ser
exigível comportamento distinto no caso concreto. Presentes tais elementos, impõe-se que
a sanção estabelecida no momento da individualização da pena seja proporcional ao
fato cometido (VALLEJO, 1999, p. 42; ZAFFARONI, 2003, p. 246).
Na lição de ZAFFARONI, PIERANGELI (2004, p. 571) “Um injusto, isto é,
uma conduta típica e antijurídica, é culpável quando é reprovável ao autor a realização desta
conduta porque não se motivou na norma, sendo-lhe exigível, nas circunstâncias em que agiu, que
nela se motivasse. Ao não ter se motivado na norma, quando podia e lhe era exigível que o fizesse, o
autor mostra uma disposição interna contrária ao direito”.
Por sua vez, CAMARGO (1994, p. 10) ressalta a influência da culpabilidade
nos demais elementos do crime, ao afirmar que “Antes mesmo da fixação da pena, há que
definir-se pela reprovação penal do agente. Numa etapa posterior, a pena, fundamentada nos
princípios da proporcionalidade e necessidade, será fixada através dos critérios previstos na lei
penal”. 4
A culpabilidade apresenta-se assim, como a terceira categoria na teoria geral
do delito correspondente ao pressuposto da aplicação da pena ao autor de um fato já
classificado como típico e antijurídico. Em suma, atua culpavelmente quem pratica
uma conduta tipificada no nosso direito penal, sem a presença de qualquer causa de
exclusão da ilicitude, quando podia atuar de maneira diversa, ou seja, conforme o
direito.
Não é fácil, entretanto, verificar concretamente que o agente mostra uma
disposição interna contrária ao direito, ou seja, não agiu conforme a norma quando
podia e lhe era exigível que o fizesse. Nesse diapasão, o livre-arbítrio, como
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3 - DO PRINCÍPIO DA CO-CULPABILIDADE
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5 No campo do Direito Penal, a garantia de liberdade do indivíduo consubstancia-se especialmente
nos princípios do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, da legalidade, da
irretroatividade, da intervenção mínima, da culpabilidade e da individualização da pena.
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desejável, ou ainda, para um plano no qual o Estado tem muito pouco a fazer, por
estarem os fatos fora do âmbito de relevância jurídica.
Nas palavras de ZAFFARONI e PIERANGELI (2006, p. 715), “os
habitantes dispõem de distintas margens sociais de autonomia ou de distinto espaço social, em razão
das desigualdades socioeconômicas, de instrução etc., isto é, existem pessoas que dispõem de meios
econômicos e de graus de instrução superiores aos dos outros, estes, frequentemente, em graus de
carência bem marcados”.
Diferente de outras circunstâncias, os meios econômicos e sociais,
constitucionalmente garantidos ao cidadão, constituem fatores objetivamente
verificáveis, e que, portanto, interessam ao reconhecimento da co-culpabilidade.
Dessarte, o Estado omisso torna-se parcialmente responsável quando um indivíduo
pratica um delito impulsionado por necessidades cujo atendimento lhe foi negado
pelo governo, sendo sua conduta menos reprovável do que seria em condições ditas
“normais”.
Portanto, de acordo com a teoria da co-culpabilidade, as condições sociais
desfavoráveis são determinantes na anormal motivação da vontade nas decisões da
população marginalizada, razão pela qual a sociedade é responsável pela prática de
delitos por tais indivíduos, na medida em que nega a estes a igualdade de acesso às
oportunidades sociais.
Conforme posicionamento de SANTOS (2004, p. 255-256), um dos
primeiros estudiosos a fomentar a ideia, “é admissível a tese da co-culpabilidade da sociedade
organizada, responsável pela injustiça das condições sociais desfavoráveis da população
marginalizada, determinantes da anormal motivação da vontade das decisões vida. Em sociedades
pluralistas, as alternativas de comportamento individual seriam diretamente dependentes do status
social de cada indivíduo, com distribuição desigual das cotas pessoais de liberdade e determinação
conforme a respectiva posição de classe da escala social”.
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6 Para um aprofundamento sobre a legislação de outros países que consagram expressamente a co-
culpabilidade, vide MOURA (2005).
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delituoso, notadamente aquelas que a própria lei diz que sempre alteram a pena, como
é o caso das atenuantes legais (CAMARGO, 1994, p. 148-152).
Com base nessas considerações, não há dúvidas quando à possibilidade de
aplicação da co-culpabilidade como atenuante legal genérica, uma vez que constitui
circunstância relevante anterior ao crime, a qual deve obrigatoriamente ser analisada
pelo julgador.
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exigências históricas já superadas, mas cuja adoção, hoje, prejudica toda sistemática da
culpabilidade”.
A partir dessa premissa, de que a inexigibilidade de conduta diversa
constitui uma causa supralegal de exclusão da culpabilidade, torna-se possível a
exculpação com fulcro na co-culpabilidade quando se comprovar que a ausência de
condições materiais, fruto da omissão do Estado em cumprir seus deveres
constitucionais, influiu de forma incisiva no âmbito de autodeterminação do autor do
fato, compelindo-o à prática do crime.
Sendo assim, “Somente através da extensão da utilização do conceito de inexigibilidade
de conduta diversa às reais condições de vida do povo, independentemente desta hipótese estar prevista
ou não expressamente em lei, é que conseguiremos desenvolver uma culpabilidade efetiva, traduzida
no conceito de co-culpabilidade, que garanta a iguadade” (RODRIGUES, 2009, p. 250).
Por fim, embora a situação de inexigibilidade de conduta diversa esteja
abarcada pelo nosso direito como excludente “genérica” de culpabilidade,
consideramos de suma importância a positivação da co-culpabilidade como causa de
exculpação, de modo a garantir sua inequívoca aplicação pelo julgadores.
5 – CONCLUSÃO
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6 - REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral, v. 1., 5 ed. São
Paulo: Saraiva, 2007.
CASTRO, Carla Rodrigues Araújo de. Co-culpabilidade. Revista do MP. Rio de Janeiro.
n.º 21, jan. - jun. 2005.
CONDE, Francisco Muñoz. Teoria Geral do Delito. Porto Alegre: Fabris, 1988. Trad. e
notas de Juarez Tavares e Luis Regis Prado.
GOMES, Luiz Flávio. Vitimologia e Justiça Penal Reparatória. In: LEAL, César Barros e
MOURA, Grégore Moreira de. Do princípio da co-culpabilidade no direito penal. Niterói:
Impetus, 2006.
REALE JR., Miguel. Instituições de direito penal, v. 1. Rio de Janeiro: Forense, 2004.
ROCHA, Fernando Antônio Nogueira Galvão da. Direito Penal - Parte Geral. Niterói,
RJ: Impetus, 2004.
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SANTOS, Juarez Cirino dos. A moderna teoria do fato punível. 3 ed. Curitiba: Fórum,
2004.
VALLEJO Manuel Jaén. Cuadernos Luis Jiménez de Asúa, 5. Los princípios superiores del
Derecho Penal. Madrid, España : Dykinson, 1999.
ZAFFARONI, Eugénio Raul. Direito Penal Brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 2003. v. I,
p. 246.
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RESUMO
∗
Graduanda do 9º período em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 1019, apud ESTEFAM, André. Crimes Sexuais: Comentários à
Lei n. 12015/2009. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 57.
12 ESTEFAM, André. Crimes Sexuais: Comentários à Lei n. 12015/2009. São Paulo: Saraiva, 2009. pp.
57-58.
13 TRINDADE, Jorge; BREIER, Ricardo. Pedofilia: aspectos psicológicos e penais. Porto Alegre: Livraria do
12.015/2009, p. 09.
15 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual: comentários à lei 12.015, de 7 de
agosto de 2009. São Paulo: RT, 2009, p.34. Defensor do caráter absoluto daquela presunção,
MIRABETE leciona que “a primeira hipótese de violência presumida, indutiva ou ficta, é de ser a vítima
menor de 14 anos. Embora seja certo que alguns menores, com essa idade, já tenham maturidade
sexual, na verdade não ocorre o mesmo com o desenvolvimento psicológico. Assim, o fundamento do
dispositivo é a circunstância de que a menor de 14 anos não pode validamente consentir, pelo
desconhecimento dos atos sexuais e de suas conseqüências, o que torna seu consentimento
absolutamente nulo”, In: MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código Penal Interpretado, São Paulo: Atlas,
1999, p. 1314. Defendendo a relativização, por sua vez, afirmava TELES: “é evidente que essa norma é
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inconstitucional. Viola o princípio da legalidade. Ninguém pode ser punido senão quando pratica o
fato descrito na norma incriminadora. O tipo descreve um acontecimento real, em abstrato. O fato
deve a ele se ajustar. O tipo de estupro contem a violência como elementar. Ela deve ser real. Se não
existiu não pode haver estupro. Nem a lei pode mandar que seja presumida, porque aí o sujeito será
punido pelo que não fez, pelo que não aconteceu, por algo apenas imaginado na norma”. In: TELES,
Ney Moura. Direito Penal – Parte Especial, vol. 3, 2ª Ed, São Paulo: Atlas:, 2006, pp. 7-8.
16 DUPRET, Cristiane. Manual de Direito Penal. Niterói: Editora Impetus, 2009, Adendo Lei nº
12.015/2009, p. 09.
17 DUPRET, Cristiane. Manual de Direito Penal. Niterói: Editora Impetus, 2009, Adendo Lei nº
12.015/2009, p. 21.
18 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal– Parte Especial. Niterói: Editora Impetus, 2009, Adendo Lei
nº 12.015/2009, p. 03.
19 A noção de sexualidade é complexa. Apenas a título ilustrativo, o conceito estabelecido pelas
Ademais, foi criado um capítulo exclusivo para tratar dos crimes cometidos
contra as vítimas vulneráveis, entendidas como tal as crianças e adolescentes em
determinadas faixas etárias21. Nesse contexto, atendendo aos anseios da doutrina no
que concerne à necessidade de se dar tratamento jurídico diferenciado aos crimes
sexuais cometidos contra a criança, passou a figurar como delito autônomo o estupro
de vulnerável22, cujo sujeito passivo é o menor de 14 anos23. Tornou-se ilícito,
portanto, simples fato de ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com
esses indivíduos, sem que para a configuração do delito seja exigível que a conduta
seja praticada mediante violência ou grave ameaça24.
dimension of being human which includes sex, gender, sexual and gender identity, sexual orientation,
eroticism, emotional attachment/ love, and reproduction. It is experienced or expressed in thoughts,
fantasies, desires, beliefs, attitudes, values, activities, practices, roles, relationships. Sexuality is a result
of the interplay of biological, psychological, socio-economic, cultural, ethical and religious/spiritual
factors”. In: ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Promotion of Sexual Health: Recommendations
for Action, Maio, 2000, p. 8.
20 GROFF, Alcione Maria. Sexualidade e Contexto Escolar. EDUCERE – Revista da Educação, vol. 2,
vulnerável (art. 217-A), corrupção de menores (art. 218) e satisfação de lascívia mediante presença de
criança ou adolescente (art. 218-A) considera-se vulnerável o menor de 14 anos. Esse patamar etário é
mais rigoroso apenas quanto ao delito de favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração
sexual de vulnerável (art. 218-B) no qual se entende serem vulneráveis os menores de 18 anos.
22 “Art. 217-A, verbis: Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 (catorze)
deficiência mental e dos que não podem oferecer resistência à prática do ato à vulnerabilidade
decorrente da faixa etária, o presente estudo, por razões metodológicas, não abordará tais hipóteses.
24 DUPRET, Cristiane. Manual de Direito Penal. Niterói: Editora Impetus, 2009, Adendo Lei nº
12.015/2009, p. 02.
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ordenamento jurídico brasileiro, estando presente também no artigo 4º, inciso I, da Lei nº 8.078, de 11
de setembro de 1990, que estabelece o Código de Defesa ao Consumidor.
26 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2ª Edição. Rio de
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28 FORSTER, Jacques. Reversing the spiral of vulnerability. In: International Review of the Red Cross,
Genebra, International Committee of the Red Cross for the International Red Cross and Red
Crescent Movement, nº 301, 1994, p. 319.
29 Segundo a Federação Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho, os indivíduos mais
vulneráveis são “aqueles com maior risco de situações que ameaçam a sua sobrevivência ou sua
capacidade de viver com um mínimo de segurança social e econômica e dignidade humana”. No
original: “those at greater risk from situations that threaten their survival or their capacity to live with a
minimum of social and economic security and human dignity”. In: Federação Internacional da Cruz
Vermelha e do Crescente Vermelho. Improving the situation of the most vulnerable -Strategic Work Plan for the
Nineties, revisado e adotado pela Assembléia Geral em sua IX Sessão, Birmingham, 25-28 de Outubro
de 1993, p.7, trad. livre.
30 GRAZ, Liesl. A question of vulnerability. In: Red Cross, Red Crescent, International Red Cross and
próprias do sujeito – a saúde, a idade ou o sexo, entre elas -; outras, de circunstâncias sociais – a
condição de indígena, estrangeiro, detido, por exemplo.” Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Caso Ximenes Lopes vs. Brasil. Sentença de 4 de julho de 2006. Série C No. 149. Voto fundamentado do
Juiz Sergio García Ramírez, p. 01, §5º, trad. livre.
33 GRAZ, Liesl. A question of vulnerability. In: Red Cross, Red Crescent, International Red Cross and
vulnerabilidade é o resultado de causas naturais, há pouco, se houver alguma, diferença entre ser
‘vulnerável’ e estar ‘em risco’.” No original: “When vulnerability is the result of natural causes, there is
little, if any, difference between being ‘vulnerable’ and being ‘at risk’.” In: HOFFMASTER, Barry.
What Does Vulnerability Mean. In: The Hastings Center Report, Vol. 36, Nº 2 (Mar. - Abr., 2006), p. 41,
trad. livre.
35 Nesse sentido, manifestou-se a Corte Interamericana de Direitos Humanos: “(e)m virtude de sua
empobrecido da população do país continua muito vulnerável, mesmo que possa ter apenas os meios
para sobreviver. Os pobres estão à mercê dos acasos da vida familiar (doenças, acidentes, morte de um
chefe de família, perda de emprego). Apenas ‘redes de segurança’, tais como os fornecidos pela
seguridade social e solidariedade de grupo ou família podem impedir que eles sejam atraídos para a
espiral de adversidade cumulativa. A relação entre pobreza relativa e vulnerabilidade, portanto,
depende não só do rendimento médio, mas também sobre a natureza do tecido social No original:
“The impoverished sector of a country's population remains very vulnerable, even though it may have
the bare means to survive. The poor are at the mercy of the hazards of family life (illness, accidents,
death of a breadwinner, loss of employment). Only ‘safety nets’ such as those provided by social
security and group or family solidarity can prevent their being drawn into the spiral of cumulative
adversity. The relationship between relative poverty and vulnerability therefore depends not only on
average income but also on the nature of the social fabric.” In: FORSTER, Jacques. Reversing the
spiral of vulnerability. International Review of the Red Cross, Genebra, International Committee of the Red
Cross for the International Red Cross and Red Crescent Movement, nº 301, 1994, p. 319, trad. livre.
37 Por serem em certa medida temas conexos, as ponderações de CANÇADO TRINDADE sobre as
(Villagrán Morales y otros) Vs. Guatemala. Mérito. Sentença de 19 de novembro de 1999. Serie C No. 63.
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39 Corte Interamericana de Direitos Humanos. Condición Jurídica y Derechos Humanos del Niño. Opinião
Consultiva OC-17/02 de 28 de agosto de 2002. Serie A No. 17, Voto fundamentado do Juiz Cançado
Trindade, p. 02, §5º, trad. livre. No original: De modo general, es al inicio y al final del tiempo
existencial que uno experimenta mayor vulnerabilidad, frente a la proximidad del desconocido (el
nacimiento y la primera infancia, la vejez y la muerte). Todo medio social debe, así, estar atento a la
condición humana.
40 COSTA, Antonio Carlos Gomes. Natureza e implantação do novo Direito da Criança e do
Adolescente. In: SILVA PEREIRA, Tânia da. (Coord.). Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei
8.069/90: estudos sociojurídicos. Rio de Janeiro: Ed. Renovar, l992, p. 26. Apud SILVA PEREIRA,
Tânia da. Direito da criança e do adolescente: uma proposta interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 1996.
p.28.
41 AGUIAR, Beatriz; SANTOS, Joseleno. Desenvolvimento da Sexualidade de Crianças e
Adolescentes. In: Castanha, N. (org.). Direitos sexuais são direitos humanos. Brasília: Comitê Nacional de
Enfrentamento à Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes, p. 26.
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42 NEDEFF, Cristiano Carvalho. Contribuições da sexologia sobre a sexualidade do adolescente: uma
revisão bibliográfica. Psico Utp Online – Revista Eletrônica de Psicologia, nº03, Curitiba, out. 2003, p.04.
Disponível em: < http://www.utp.br/psico.utp.online/site3/contribsexologia.pdf>. Acesso em:
08/05/2010.
43 Tratando da construção da sexualidade da criança e de sua suscetibilidade a aceitar diversos tipos de
prática sexual sem oferecer resistência, assevera FREUD: “É instrutivo que a criança, sob a influência
da sedução, possa tornar-se perversa polimorfa e ser induzida a todas as transgressões possíveis. Isso
mostra que traz em sua disposição a aptidão para elas; por isso sua execução encontra pouca
resistência, já que, conforme a idade da criança, os diques anímicos contra os excessos sexuais — a
vergonha, o asco e a moral — ainda não foram erigidos ou estão em processo de construção. (…) Em
condições usuais, ela pode permanecer sexualmente normal, mas, guiada por um sedutor habilidoso,
terá gosto em todas as perversões e as reterá em sua atividade sexual.” FREUD, Sigmund. Obras
Psicológicas completas de Sigmund Freud: Volume VII: Um caso de Histeria, Três ensaios sobre a
sexualidade e outros trabalhos (1901-1905). Rio de Janeiro: IMAGO, 1972, p. 196.
44 AMAZARRAY, Mayte Raya; KOLLER, Silvia Helena. Alguns aspectos observados no
desenvolvimento de crianças vítimas de abuso sexual. Psicol. Reflex. Crit., Porto Alegre, v. 11, n. 3,
1998 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
79721998000300014&lng=en&nrm=iso>. Acesso em: 05/05/2010. doi: 10.1590/S0102-
79721998000300014.
45 Na Classificação de Transtornos Mentais e de Comportamento da CID -10, a pedofilia é incluída
por essa patologia têm como alvo crianças em idade pré-puberal ou que acabaram de
ingressar na puberdade46.
Nesse sentido, afirmam KAPLAN & SADOCK que a pedofilia “envolve
impulso ou excitação sexual recorrente e intensa por crianças de treze anos de idade
ou menos, persistindo por, no mínimo, seis meses.”47 Corroborando essas
afirmações, em estudo sobre os aspectos psicológicos da pedofilia, TRINDADE
assevera que “os pedófilos preferem as crianças que são bem infantis, ou seja, que
parecem ser totalmente inocentes, não são muito conscientes do mundo que as cerca,
e que se mostram mais imaturas para a sua idade. (…) tendem a escolher as crianças
que mostram maior grau de vulnerabilidade”48.
A impossibilidade de se afirmar com absoluta certeza que a reunião desses
fatores internos e externos aumenta o risco de os menores pré-puberes sofrerem esse
tipo de violência reside unicamente no fato de que a determinação de qualquer risco
não pode estar dissociada do cálculo de probabilidades, e esse, por sua vez, só pode
ser realizado com base em dados matemáticos que se aproximem ao minimamente da
realidade. Ocorre que, a existência de elementos estatísticos seguros, infelizmente,
não se verifica no contexto das investigações sobre o abuso sexual, muito menos
quando se trata dos delitos cometidos contra crianças. Ao contrário, os estudos sobre
o tema são enfáticos ao declarar que o silêncio imposto às vítimas tanto pelos
abusadores quanto por seus próprios representantes legais é uma das características
46 No Manual de diagnóstico e estatística das perturbações mentais, em seu texto revisado em 2000
(DSM-IV-TR) define-se que “o foco parafílico da Pedofilia envolve atividade sexual com uma criança
pré-púbere geralmente com 13 anos ou menos). O indivíduo com Pedofilia deve ter 16 anos ou mais e
ser pelo menos 5 anos mais velho que a criança.”
47 KAPLAN H. & SADOCK B. J. Compêndio de Psiquiatria. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990, p. 379,
apud TRINDADE, Jorge; BREIER, Ricardo. Pedofilia: aspectos psicológicos e penais. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2007, p. 19.
48 TRINDADE, Jorge; BREIER, Ricardo. Pedofilia: aspectos psicológicos e penais. Porto Alegre: Livraria do
mais marcantes dessa natureza de delitos49 e que acaba por ocultar grande parte de
suas ocorrências50. Ao tentar estabelecer as razões pelas quais a violência contra a
criança é oculta, não denunciada e, consequentemente “sub-registrada”, a ONU
asseverou que:
49 Cf. a esse respeito, BRAUN, S. A violência sexual infantil na família. Do silencio à revelação do segredo.
Porto Alegre: Editora Age Ltda., 2002.
50 Nesse sentido, cf. MARCHIORI, Hilda. Victimas vulnerables: niños víctimas de abuso sexual.
ILANUD Al Día, San José, Instituto Latinoamericano de las Naciones Unidas Para la Prevención del
Delito y el tratamiento del Delincuente, Ano 14, Nº27, pp.281-291, 2006, p. 281.
51 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Rapport de l’expert indépendant chargé de l’étude
des Nations Unies sur la violence à l’encontre des enfants, A/61/299 (2006), p. 09. No original: “(…)
beaucoup d’enfants ont peur de signaler les incidents de violences dont ils sont victimes. Souvent, les
parents, qui devraient protéger leurs enfants, restent silencieux si l’acte de violence est commis par un
conjoint ou un membre de la famille, un membre plus influent de la société tel qu’un employeur, un
policier ou un dirigeant de la communauté. La peur est intimement liée à la stigmatisation qui entoure
souvent le fait de dénoncer la violence, notamment dans les milieux où « l’honneur de la famille » est
placé au-dessus de la sécurité et du bien-être de l’enfant. En particulier, le viol ou d’autres formes de
violence sexuelle peuvent entraîner l’exclusion, d’autres violences ou la mort.”
59
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Washington, DC: U.S. Department of Justice, Office of Justice Programs, Office of Juvenile Justice
and Delinquency Prevention, 2006.
54 SNYDER, Howard N.; SICKMUND, Melissa. Op. cit. p. 32
55 SNYDER, Howard N.; SICKMUND, Melissa. Op. cit. p.. 31
60
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Washington, DC: National Center for Juvenile Justice, Jul. 2000, p. 02. trad. livre. No original: “One
percent of victims of these crimes was age 54 or older. Seven percent of victims were over age 34
(table 1). Another 12% were ages 25 through 34, and 14% were between ages 18 and 24. The
remainder, over two-thirds (67%) of all victims of sexual assault reported to law enforcement
agencies, were juveniles (under the age of 18 at the time of the crime). More than half of all juvenile
victims were under age 12. That is, 33% of all victims of sexual assault reported to law enforcement
were ages 12 through 17 and 34% were under age 12. Most disturbing is that one of every seven
victims of sexual assault (or 14% of all victims) reported to law enforcement agencies were under age
6”
57 MARCHIORI, Hilda. Victimas vulnerables: niños víctimas de abuso sexual. ILANUD Al Día, San
José, Instituto Latinoamericano de las Naciones Unidas Para la Prevención del Delito y el tratamiento
del Delincuente, Ano 14, Nº27, pp.281-291, 2006, p. 282.
58 No original: “Es muy grande el número, de niñas, niños y adolescentes que son víctimas de esta
forma de violencia. La edad de mayor incidencia es alrededor de la pubertad (de 9 a 12 años de edad)
pero la vemos a cualquier edad, inclusive en bebes”. GORGAL, Alicia Casas. ¿De Qué Hablamos
Cuando Hablamos De Violencia Sexual Hacia Niños, Niñas Y Adolescentes? In: CESARE, Luis A.
(Org). La protección de los derechos de los niños, niñas y adolescentes frente a la violencia sexual. Instituto
Interamericano da Criança, Out. 2003, p. 67. Disponível em:
<http://www.iin.oea.org/La_proteccion_de_los_derechos.pdf>. Acesso em 09/04/2010.
59 Idem.
61
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de todas essas circunstâncias faz com que as crianças sejam alvos mais fáceis de
abuso sexual, determinando-se, assim, a necessidade de serem consideradas
especialmente vulneráveis no que diz respeito à sexualidade.
Uma vez definidos os contornos do conceito de vulnerabilidade e
explicitada sua aplicabilidade no caso das crianças em idade pré-púbere, nos resta
determinar quais são as implicações jurídicas decorrentes da atribuição dessa
característica a uma determinada parcela da população.
De modo geral, verificada a vulnerabilidade de uma parcela da população,
surge para o Estado a obrigação de adotar políticas de compensação capazes de
reduzir as desigualdades de fato em favor dos setores menos favorecidos60. Sobre o
tema, declarou GARCÍA RAMÍREZ que:
60 Sobre a diferenciação de tratamento discriminatório e diferenciado, cf. MACHADO, Isabel Penido
Haven: The Yale Law Journal Company, Vol. 109, No. 3, pp. 507-539, Dez., 1999. pp. 509-510.
63 Idem.
63
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64 No original: “La coerción está presente a través de diferentes maneras, ya sea por presión,
amenazas, chantaje, premios y castigos, seducción, engaño, o más raramente a través de la fuerza
física”. GORGAL, Alicia Casas. ¿De Qué Hablamos Cuando Hablamos De Violencia Sexual Hacia
Niños, Niñas Y Adolescentes? In: CESARE, Luis A. (Org). La protección de los derechos de los niños, niñas y
adolescentes frente a la violencia sexual. Instituto Interamericano da Criança, Out. 2003, p. 54. Disponível
em: <http://www.iin.oea.org/La_proteccion_de_los_derechos.pdf>. Acesso em 09/04/2010.
65 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual: comentários à lei 12.015, de 7 de
68 ESTEFAM, André. Crimes Sexuais: Comentários à Lei n. 12015/2009. São Paulo: Saraiva, 2009. p.
58.
69 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 6. ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p.
481.
70 BARROS, Francisco Dirceu. Vulnerabilidade nos Novos Delitos Sexuais. Jornal Carta Forense,
71 NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual: comentários à lei 12.015, de 7 de
agosto de 2009. São Paulo: RT, 2009. p. 37.
72 A título exemplificativo, cf. NUCCI, op. cit., p. 37 e ESTEFAM, op. cit., p. 59.
66
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74 No original: “The notion of 'innocence' and, therefore, the potential for the loss of innocence can
also facilitate further victimization: The sexually victimized child may be viewed neither as a child nor
as an adult but rather as a piece of'damaged goods' lacking the attributes of both childhood and adult
(…)(Sgroi, 1982: 114). A child who is known to be a victim of sexual abuse is often subject to further
exploitation: 'a bizarre spin-off of the labelling process is the fascination the girl presents to others....
Publicly deflowered as she is, she is regarded as no longer deserving respect or protection' (Summit
and Kryso, 1978: 244). Innocence, then, is a problematic concept because it is itself a sexual
commodity and because a child who is anything less than 'an angel' may be seen as 'fair game', both by
the courts and by other men who will avail themselves of a child they know has previously been
abused (Ward, 1984: 159; Sarnacki Porter et al., 1982: 114)”. KITZINGER, op. cit., p. 81.
68
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3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
75 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quinta Turma. REsp 252827/GO , Rel.: Min. Ministro
FELIX FISCHER , ac. de 08/08/2000, DJ de 04/09/2000 p. 183, LEXSTJ vol. 137 p. 390.
76 GUERRINA, Britton. Mitigating Punishment for Statutory Rape.The University of Chicago Law Review,
BARROS, Francisco Dirceu. Vulnerabilidade nos Novos Delitos Sexuais. Jornal Carta
Forense, 02/03/2010. Disponível em:
<http://www.cartaforense.com.br/Materia.aspx?id=5314>. Acesso em:
10/05/2010.
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quinta Turma. REsp 252827/GO , Rel.: Min.
Ministro FELIX FISCHER , ac. de 08/08/2000, DJ de 04/09/2000 p. 183, LEXSTJ
vol. 137 p. 390.
DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 6. ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro:
Renovar, 2002.
DUPRET, Cristiane. Manual de Direito Penal. Niterói: Editora Impetus, 2009, Adendo
Lei nº 12.015/2009.
70
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FORSTER, Jacques. Reversing the spiral of vulnerability. In: International Review of the
Red Cross, Genebra, International Committee of the Red Cross for the International
Red Cross and Red Crescent Movement, nº 301, 1994, pp 318-326.
FRANCO, Alberto Silva; SILVA, Tadeu. Código Penal e sua Interpretação Jurisprudencial.
8ª Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
GORGAL, Alicia Casas. ¿De Qué Hablamos Cuando Hablamos De Violencia Sexual
Hacia Niños, Niñas Y Adolescentes? In: CESARE, Luis A. (Org). La protección de los
derechos de los niños, niñas y adolescentes frente a la violencia sexual. Instituto Interamericano
da Criança, Out. 2003. Disponível em:
<http://www.iin.oea.org/La_proteccion_de_los_derechos.pdf>. Acesso em
09/04/2010.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal– Parte Especial. Niterói: Editora Impetus,
2009, Adendo Lei nº 12.015/2009.
GRAZ, Liesl. A question of vulnerability. In: Red Cross, Red Crescent, International Red
Cross and Red Crescent Movement, Genebra, nº03, 1997, Disponível em: <
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HAREL, Alon; PARCHOMOVSKY, Gideon. On Hate and Equality. The Yale Law
Journal, New Haven: The Yale Law Journal Company, Vol. 109, No. 3, Dez., 1999,
pp. 507-539.
HOFFMASTER, Barry. What Does Vulnerability Mean. In: The Hastings Center Report,
Vol. 36, Nº 2 (Mar. - Abr., 2006), pp. 38-45.
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MIRABETE, Júlio Fabbrini. Código Penal Interpretado, Ed. Atlas, SP, 1999,
NUCCI, Guilherme de Souza. Crimes contra a dignidade sexual: comentários à lei 12.015,
de 7 de agosto de 2009. São Paulo: RT, 2009.
73
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SNYDER, Howard N.; SICKMUND, Melissa. Juvenile Offenders and Victims: 2006
National Report. Washington, DC: U.S. Department of Justice, Office of Justice
Programs, Office of Juvenile Justice and Delinquency Prevention, 2006.
TELES, Ney Moura. Direito Penal – Parte Especial, vol. 3, 2ª Ed, São Paulo: Atlas:
2006.
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RESUMO
O presente estudo tem por objetivo fazer uma análise das garantias processuais do
réu no processo penal do Estado Democrático de Direito, bem como a efetividade
destes direitos no Brasil. Sabemos que, no nosso direito, o devido processo penal é o
procedimento pelo qual o Estado aplica a pena de forma legal. Tal procedimento
necessita, para ser legítimo, atender aos princípios e garantias processuais previstos
na lei vigente, principalmente a Constituição Federal. O que vemos, porém, embora
estejam a igualdade e a imparcialidade entre os mandamentos de maior expressão, é o
réu ocupando a posição de parte mais fraca, visto que precisa “lutar” contra todo o
aparato punitivo estatal, contando, muitas vezes, apenas com um defensor dativo
com o qual não articulou uma boa defesa. Faz-se necessário, portanto, rígida
observância de princípios como in dubio pro reo, legalidade (CF, art. 5º, II), vedação ao
tratamento desumano ou degradante (CF, art. 5º, III), juiz natural (CF, art. 5º,
XXXVII ), honra e intimidade (CF, art. 5º, X) , entre outros, sem a qual o processo
padecerá de vícios capazes de causar sua ilegitimidade. Vale destacar, também a
moderna concepção do direito penal mínimo, segundo a qual o direito penal deve
buscar o máximo bem-estar possível dos não desviantes e o mínimo mal-estar
necessário dos desviantes. Enfim, num Estado que consagra como objetivos
fundamentais “construir uma sociedade livre, justa e solidária” (Art. 3º, I) e livre (IV),
não se deve conceber as flagrantes violações aos direitos e garantias fundamentais do
réu que temos visto nos noticiários.
1 Graduando do 3º ano de Direito da Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) – Campus
Franca.
Membro do Grupo de Pesquisas Avançadas em Direito Processual Civil Brasileiro e Comparado da
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Campus Franca.
E-mail: rafael.aroucarosa@hotmail.com .
Lattes: http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalheest.jsp?est=9419860194836307.
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oriundos das classes mais abastadas) e aquele que se senta no banco dos réus (na
maioria dos casos advindo das classes desfavorecidas economicamente).
Tais obstáculos não podem ser admitidos na atual fase da instrumentalidade
em que se encontra o processo, que passa a ser, além de meio para compor a lide,
instrumento de participação política (compreendida esta na cidadania), e de busca
para a consecução dos objetivos do Estado, elencados no artigo 3º da Constituição,
entre os quais a erradicação da pobreza e a construção de uma sociedade livre e
igualitária.
Paralelamente a isto, os nossos já altíssimos índices de criminalidade
continuam a subir, chegando, em alguns casos, a afrontar a soberania e as bases de
nosso sistema democrático. Isto é o que ocorre nos interiores de algumas das grandes
favelas brasileiras, nas quais traficantes de drogas e milícias ditam as regras,
chegando, até mesmo, a impedir a entrada da polícia.
Como forma de frear a expansão desordenada da criminalidade, surgem
muitas vezes, sugestões que não encontram amparo em nosso sistema constitucional,
nem nas modernas doutrinas de direitos humanos, tais como penas de morte, prisão
perpétua e afins, as quais, como se demonstra a cada dia, falham no desempenho da
atividade de prevenção dos delitos.
A tais proposições, se opõem, também, a teoria do direito penal mínimo,
que defende a intervenção do Estado somente no que for estritamente necessário, de
forma contrária à banalização do direito penal e à agravação das penas como formas
de conter a expansão da criminalidade.
O presente estudo tem por objetivo fazer uma análise de alguns dos direitos
processuais do réu em nosso sistema jurídico, análise esta que tem sua importância
no fato de o acusado ocupar a posição de parte mais frágil da relação processual
penal, e, consequentemente, ter suas garantias constitucionais desrespeitadas com
freqüência consideravelmente maior.
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2. Princípios
2 NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios de processo civil na Constituição Federal. 8. ed. rev.,
158.
4 MACHADO, op. cit., p. 158.
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A observância de tal princípio é conditio sine qua non para a aplicação de penas
em nossa ordem constitucional, seja o processo de natureza civil, militar, administrativa,
penal, etc.
2.2 O princípio da justa causa
5 Idem, op. cit., p. 168.
6 Idem, op. cit. p. 167.
7 CARNELUTTI, Francesco. As misérias do processo penal. Trad. José Antonio Cardinalli. [s.l.]:
CONAN, 1995.
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10 BRASIL, STF, Plenário, HC 100.311/RS, Rel. Min. Cezar Peluso. 09 mar. 2010.
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11 DIÁRIO DE CUIABÁ. Lavrador é preso por raspar casca de árvore. Cuiabá: Diário de Cuiabá,
2000.
Disponível em: <http://www.diariodecuiaba.com.br/detalhe.php?cod=9595>. Acesso em 20 mai.
2010.
12 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: Teoria do garantismo penal. 2. ed. ver. e ampl. Tradução
de Ana Paula
Zomer et al. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. passim.
13 DESTAK. Prisões do ES são denunciadas na ONU. São Paulo: Destak, 2010. Disponível em:
14 MACHADO, op. cit., p. 161.
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atuais, embora seja a segunda a ser defendida pelo direito penal, juntamente com a
primeira, de prevenir os delitos.
Embora o sistema elaborado por Ferrajoli choque à primeira vista por trazer
um novo paradigma, uma vez que defende, ao invés do aumento desenfreado com
fins de prevenção, a redução e o controle das penas, tal ideia mostra-se muito mais
coerente com o nosso ordenamento constitucional, de viés garantista, e que preza
pela dignidade da pessoa humana (CF, art. 1º, III), ao qual a realidade dos sistemas
processual e de execução penal brasileiros tem se mostrado paradoxalmente
indiferentes.
4. Conclusão
BRASIL, STF, Plenário, HC 100.311/RS, Rel. Min. Cezar Peluso. 09 mar. 2010.
BRASIL, STF, Plenário, HC 100.574/MG, Rel. Min. Celso de Mello, DJE 218, nov.
2009.
MACHADO, Antônio Alberto. Teoria geral do processo penal. 3. ed. São Paulo:
Atlas, 2010.
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RESUMO
Todo o sistema penal, portanto, gira em torno de qual será a pena aplicada
ao réu considerado culpado ao fim do processo. Ele assim foi construído para poder
realizar tal tarefa de forma justa, estabelecendo princípios e normas que devem ser
obedecidos continuamente.
Uma vez que a pena e, mais especificamente, o quantum desta é o objetivo
final da prestação jurisdicional do Estado, o seu estudo é de fundamental
importância. As diversas interpretações do texto legal podem gerar resultados de
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O juiz, pois, nos limites que a lei impõe realiza uma tarefa de
ajustamento da resposta penal em função não só das
circunstâncias objetivas, mas principalmente da pessoa do
denunciado, e, também, do comportamento da vítima. (2003, p.
53)
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Pelo texto supra percebe-se que a posição do STJ em vedar que a atenuante
reduza a pena abaixo do mínimo legal fundamenta-se no sentido de ser aquele (limite
cumulado ao tipo penal) uma barreira intransponível em virtude dos princípios
constitucionais penais da legalidade (art. 5º, inc. XXXIX) e da pena cominada (art. 5º,
inc. XLVI).
O princípio da legalidade configura-se como verdadeira restrição ao poder
estatal de intervir na esfera das liberdades individuais, isso porque ele determina que a
elaboração de normas incriminadoras e suas respectivas sanções constituem matéria
reservada ou função exclusiva da lei (TOLEDO, 2007, p. 21).
Ao entendimento do STJ, o inciso II do art. 59 do CP, que impede o juiz de
ultrapassar os limites legais da pena cominada ao tipo no momento da determinação
da pena, é aplicável tanto na fase das circunstâncias judiciais quanto na aplicação das
atenuantes e agravantes. Dessa forma, o reconhecimento da atenuante de maneira a
reduzir a pena abaixo do mínimo legal ou de uma agravante que ultrapassasse o teto
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máximo entraria em choque com o referido princípio, visto que, nestas fases o
quantum da variação da pena não foi estipulado pelo legislador, mas sim é calculado
de acordo com a faculdade que o juiz tem de se determinar conforme seu livre
convencimento.
Alega ainda que tais limites somente podem ser ultrapassados em razão das
causas de aumento ou de diminuição, quando o legislador, afastando a
discricionariedade do juiz, expressamente estabeleceu as frações de variação
aplicáveis às penas.
Contudo, a fundamentação apresentada pelo egrégio Tribunal Superior
apresenta falhas graves, especialmente quando leva-se em conta sua função
primordial como tribunal garantidor das leis infraconstitucionais.
Haja vista que o atual Estado Democrático de Direito fundamenta-se num
conjunto de normas que formam o ordenamento jurídico e que tal grupo normativo
deve ser coeso sob pena de tornar-se ineficaz, ao se deparar com uma polêmica cabe,
tanto ao doutrinador quanto ao magistrado, buscar refúgio e inspiração dentro
daquele aglomerado, realizando uma interpretação conjunta das normas existentes e
buscando a coesão do todo.
Desde o princípio geral do Direito Processual Penal do in dubio pro reu até a
defesa da imposição da prisão somente como ultima ratio, por todo o ordenamento
espalham-se diversas normas que se traduzem em benefícios concedidos ao
condenado. Tal fato decorre da política criminal existente que procura reduzir os
profundos danos que naturalmente decorrem do encarceramento.
A Constituição Federal assinala como direitos fundamentais o direito à vida,
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Essa limitação intransponível não deve ocorrer nas atenuantes, haja vista que
o seu reconhecimento pode vir a levar a pena provisória abaixo do mínimo legal. No
caso da agravante, ao contrário, isso exacerbaria a pena por demasiado, prejudicando
imensamente o condenado – o que não merece prosperar, como explanado acima.
Sobre o tema refletem Jorge de Oliveira Vargas e Felipe Heringer Roxo da Motta:
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4 CONCLUSÃO
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não há no Código Penal qualquer referência sobre qual é o quantum a ser utilizado
na segunda fase da dosimetria.
A doutrina e a jurisprudência, agindo de forma a tentar completar as lacunas
do ordenamento, procurou estabelecer parâmetros ultra legem, via de regra utilizando-
se da analogia. Dessa forma, o STJ publicou a súmula 231, que veda a utilização da
circunstância atenuante para fixar a pena abaixo do limite inferior cominado e, em
decisões recorrentes, os tribunais vem adotando a fração de 1/6 sobre a pena-base
fixada como quantum aplicável tanto às atenuantes quanto às agravantes.
No tocante à súmula, ao analisar o disposto pelo STJ, percebe-se que a
Corte realiza uma leitura contra legem do artigo 65 do CP, completamente ignorando o
texto do dispositivo retro em clara negativa de vigência ao texto infraconstitucional.
Ainda, num processo de analogia in malem partem, o STJ expandiu o alcance do inciso
II do artigo 59, buscando dar ares de legalidade à interpretação feita. Como se
demonstrou no desenvolvimento deste trabalho, a analogia no Direito Penal possui
aplicação restritíssima, apenas podendo ser feita a favor do réu. Novamente, patente
é a violação dos princípios constitucionais.
Além disso, em função do texto expresso do art. 65, CP, que diz que tais
circunstâncias “sempre” atenuam a pena, e do art. 68, CP, que impõe a realização
obrigatória das três fases da dosimetria, não há duvida sobre a validade da aplicação
das atenuantes para fixar a pena provisória abaixo do mínimo legal. Não há, no caso,
qualquer espaço para uma leitura diversa da aqui apontada, haja vista a cristalina
posição adotada pelo legislador, obviamente deturpada pelo STJ.
A súmula 231, dessa forma, fere o principio da legalidade, ao ignorar a
orientação expressa do legislador presentes nos artigos supra citados; e
simultaneamente, o princípio da individualização da pena, haja vista que não permite
que o juiz sopese os pormenores do fato e calcule a real culpabilidade do agente.
Também, na medida que a súmula francamente impõe a realização do processo da
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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GOMES, Luiz Flávio. Reformas penais (XV): pena abaixo do mínimo legal. In Juris
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GRECO, Rogério. Curso de Direito Prnal: parte geral. 4. ed. Niterói: Impetus,
2004.
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NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 8. ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2008.
NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal: parte geral parte especial.
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OLIVEIRA, Eugenio Pacelli. Curso de Processo Penal. 10. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2008.
PRADO, Luiz Regis. Comentários ao Código Penal. 2. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003.
QUEIROZ, Paulo. Pode o juiz fixar pena abaixo do mínimo legal? In Boletim
IBCCRIM nº 112. Março 2002. Disponível em <http://www.ibccrim.com.br>
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RESUMO
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INTRODUÇÃO
1Durante nossa participação como estagiária do CJS, a Cadeia Pública de Batatais/SP era ainda
masculina, e o Projeto Cadeia era realizado no anexo da Delegacia de Polícia de São José da Bela
Vista/SP. Devido à intervenção do Ministério Público Estadual de Franca, a unidade prisional de São
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Paulo César de Souza) cujo original, em 1878, inaugura a maturidade do pensamento de Nietzsche
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4 FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. História da violência nas prisões. 30ª edição. Petrópolis:
Vozes, 2005.
5GOFFMAN, Erving. A representação do eu na vida cotidiana. Petrópolis: Vozes.
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8Informações on-line em http://www.mj.gov.br/depen. Acesso aos 20 de outubro de 2009.
9BEAUVOIR, Simone de. O Segundo Sexo. 6ª ed. Traduzido por Sérgio Milliet. Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 1980.
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Nesse sentido, crucial foram as leituras das obras de Olga Espinoza10, Judith
Butler11 e Julita Lemgruber, que trazem á tona os problemas de gênero como
instrumentos de subversão da identidade feminina. O mote, comum, é o cárcere
enquanto instituição total.
Por entendermos ser crucial que o escritor situe-se no tempo e no espaço,
restringimos o nosso olhar territorialmente sobre a hipótese paulista, e,
historicamente, às políticas penitenciárias implementadas a partir da segunda metade
da década de setenta. Os estudos de Fernando Salla12 desenvolvidos junto ao Núcleo
de Estudos da Violência (NEV) da USP13 inspiraram nossa compreensão dos
acontecimentos políticos e governamentais em São Paulo.
Nossa tentativa é vislumbrar uma aproximação entre a filosofia da
libertação, cujo lastro teórico não poderia ser outro que não Enrique Dussel14, e o
Direito, fomentando uma nova hermenêutica e concepção da cidadania à luz de sua
fundamentalidade no Estado Democrático de Direito brasileiro. Recorrendo a Michel
Miaille15, buscaremos contribuir para “fazer aparecer o invisível”, a partir de uma
categoria de exterioridade. Propugnamos pelo gozo necessário dos direitos
fundamentais, inclusive, pelas mulheres encarceradas. Para tanto, cumpre denunciar
que o Estado, através de seu sistema e políticas carcerárias, voltadas única e
exclusivamente ao paradigma masculino hegemônico, impede a eficácia expansiva e
10 ESPINOZA, Olga. A mulher encarcerada em face do poder punitivo. São Paulo: IBCCRIM,
2004.
11 BUTLER, Judith. Problemas de gênero: feminismo e subversão da identidade. 2ª ed. Rio de
Maissiat. 3 ed. São Paulo: Paulus, 2005. Do mesmo autor: Ética da libertação na idade da
globalização e da exclusão. 2 ed. São Paulo: Vozes, 2002.
15 MIAILLE, Michel. Introdução crítica ao direito. 2ª edição. Trad. Ana Prata. Lisboa/Pt: Estampa,
1994. P.21.
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(13.491, 3%) e Santa Catarina (12.654, 3%) somados! Em um ranking dos Estados
com maior população carcerária, São Paulo desponta em primeiro lugar com uma
população igual à soma dos 2º à 8º colocados.
Embora os números não possam expressar em sua completude a dimensão
humana do sistema prisional, podemos, a partir da plataforma on-line do DEPEN,
adquirir uma compreensão mais concreta de nossa realidade penitenciária, uma vez
que o InfoPen disponibiliza regularmente dados atualizados e detalhados sobre a
população carcerária e respectiva estrutura prisional.
Conforme foi dito, São Paulo possui uma população carcerária de 158.704
pessoas, sendo que sua capacidade é de 99.074 presos. A superlotação das cadeias e
penitenciárias paulistas é uma constante, já que o seu trabalha com um déficit de 33%
de suas vagas. Quanto à sua estrutura, precária, o sistema conta com 132
estabelecimentos penais, sendo 121 masculinos e apenas 11 femininos. Desses
recintos, 77 são penitenciárias, 13 são colônias agrícolas, 38 são cadeias públicas e há
ainda quatro hospitais de custódia e tratamento. Inexistem casas de albergados.
Os dados revelam ainda uma insuficiência no número de servidores
penitenciários. São Paulo conta atualmente com 29.011 servidores16, sendo que 1.862
pertencem ao quadro administrativo, 25.583 são agentes penitenciários (estima-se um
agente para cada grupo de seis presos), 341 são assistentes sociais e apenas 1.225 são
profissionais da área da saúde. São números alarmantes por demonstrarem a escassez
de servidores para tratar significativa parcela dos cidadãos.
16 De acordo com os indicadores do InfoPen – referência 6/2009 – não há estimativas de quantos
destes servidores (funcionários públicos na ativa) estão lotados em presídios masculinos ou femininos.
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17 Nesse sentido, desconsideramos, ainda, o fato de a extensão territorial do Estado de São Paulo
dificultar o deslocamento desses médicos da Capital (onde provavelmente encontram-se lotados) para
o interior. Consideramos que referido deslocamento, se existente, é realizado em outro horário, que
não o do expediente.
18 Muito provavelmente referidos ginecologistas trabalham no tratamento antes do que na prevenção e
manutenção da saúde feminina, pois não teriam tempo hábil para atender a demanda e ainda se
deslocar pelos inúmeros municípios paulistas, ou sequer na Grande São Paulo.
125
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19Lembrando que estamos trabalhando com um total de 148.943 pessoas encarceradas.
204.257 homens não informaram o seu grau de instrução (cerca de 3% do total dos homens
encarcerados).
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21 VARELLA, Drauzio. Estação Carandiru. São Paulo: Companhia das letras, 1999. P.90 e 91.
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corroboram o relato de Varella. A cadeia em pauta possuía quatro celas de 6m² cada,
e era destinado à uma população carcerária flutuante de 45 a 60 pessoas. As celas
eram dispostas uma ao lado da outra, em fila única, dispostas no mesmo corredor.
Ventilação, iluminação e água potável eram “luxos” com os quais o sistema
penitenciário “não podia arcar”. Amontoadas, as mulheres passavam a maior parte
do tempo deitadas no chão encostadas umas às outras. O ar estagnado aliado à
precária higiene das presas e limpeza do local não poderia acarretar outra
conseqüência: doenças de pele, das mais variadas. A sarna reinava triunfante e a
maior reclamação das presas era a insuficiência de remédio para combater a “praga”.
Aliás, as reclamações eram ironicamente entonadas para sugerir que o remédio,
quando existente, tinha destino certo: as “queridinhas” do cárcere.
Outra consideração a ser feita é que o presidiário brasileiro é um cidadão
em idade produtiva, já que mais da metade dos encarcerados possui entre 18 e 29
anos de idade. Críticas a parte sobre os impactos que este fato causa na realidade
brasileira – mormente no que tange á condição social e econômica das famílias
dependentes destes detentos e que acabam sofrendo grande impacto em seu nível de
vida via reflexa ao encarceramento – centremos nosso olhar sobre o dia-a-dia desses
cidadãos. São raras as instituições que investem em programas de trabalho (somente
41.863 presos têm acesso a algum tipo de trabalho interno ou externo ao sistema
prisional) e, quando os estabelece, o faz de modo insatisfatório, já que o número de
vagas oferecidas é insuficiente para alocar todo o contingente carcerário e,
principalmente, não atende as particularidades profissionais dos presos.
Os trabalhos dispostos aos presos, além daqueles comumente dispensados à
manutenção do próprio prédio prisional (faxina, pequenos trabalhos burocráticos,
cozinha, pequenos reparos...), são muitas vezes subempregos que atendem antes aos
interesses do particular explorador dessa “mão de obra” do que à própria legislação
trabalhista. Má remuneração (quando existente), exploração e trabalhos artesanais
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22DUSSEL, 1980, p.11.
23BEAUVOIR, Simone de. O SEGUNDO SEXO. 6ª edição. Traduzido por Sérgio Milliet. Rio de
Janeiro: Nova Fronteira, 1980. P.9.
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24 BEAUVOIR, Simone de. Op. Cit. P.12.
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25 BEAUVOIR, Simone de. Op. Cit. P.13.
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28 ESPINOZA, Olga. A mulher encarcerada em face do poder punitivo. São Paulo: IBCCRIM,
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31 Acesso aos 20 de novembro de 2009.
http://www.jornaldeluzilandia.com.br/pontocritico.php?dia=01&mes=10&ano=2009
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reside na própria visão que a totalidade impôs á mulher, enquanto “outro”. Segundo
Beauvoir32:
32 BEAUVOIR, Simone de. O SEGUNDO SEXO. 6ª edição. Traduzido por Sérgio Milliet. Rio de
Editora Nova Fronteira. Obra em fascículos encartados na Folha de S.Paulo, 1995. P. 344 e 446.
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35CHIES, Luiz Antônio Bogo et al. A prisão dentro da prisão: sínteses de uma visão sobre o
encarceramento feminino na 5ª região Penitenciária do Rio Grande do Sul. In Revista brasileira
de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos Tribunais, ano 17, n.79, jul.-ago./2009. P.262.
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a um segundo plano: são as últimas a receber refeições, ficam na pior cela, utilizam os
espaços coletivos (pátios) nos piores horários e em menor tempo. Outra constatação
deplorável é a utilização do mesmo “seguro” (local onde o preso cumpre pena de
castigo por infração disciplinar) para homens e mulheres. Segundo relato das presas,
o uso comum do “seguro” propicia, inclusive, a disseminação de doenças nas
mulheres.
Ainda segundo o Gitep, o encarceramento feminino possui alguns
desdobramentos específicos, pois tanto as questões psicossociais como as
socioculturais, como questões conjunturais, agregariam outras dimensões, mais
potencializadas, por assim dizer.
A mulher passa por um processo de estigmatização desde a infância36.
Beauvoir chega mesmo a afirmar que ninguém nasce mulher, torna-se. Com isso, a
filósofa existencialista introduz o questionamento do processo cultural de
estigmatização feminina. Desde o seu nascimento, o indivíduo do sexo feminino
passa a ser “educado” (adestrado) para incorporar vários valores “femininos”: desde
o processo de identificação (nomes), até o processo de “catalogação” (vestuárias
diferenciadas, cores específicas, posturas sociais necessárias). Findo o processo (se é
que possui fim), o indivíduo é mulher (o verbo “ser” é aqui empregado no sentido de
ter-se tornado).
Homens e mulheres são iguais. Não obstante a evidência da afirmação retro,
a especificidade do gênero feminino atuou e atua como um peso no desenvolvimento
da mulher em sua potencialidade humana, funcionando mesmo como empecilho, em
determinados casos, para a sua realização enquanto “homem”, no sentido amplo.
36 Segundo Mariana Bachin: “As relações de gênero surgem a partir de representações estereotipadas
do que vem a ser o feminino e o masculino. Se elaboram como parte do processo de identificação de
gênero, que perpassa espaços como a família, a escola e o contexto social. (Ninguém é mulher
impunimente: a opressão de gênero no sistema prisional brasileiro. TCC, Unesp/Franca, 2007.
P. 19).
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DUSSEL, Enrique. Filosofia da Libertação: crítica à ideologia da exclusão. Trad. Georges
37
DUSSEL, Enrique. Op. Cit. P.49.
38
39BRAGA, Ana Gabriela Mendes. A identidade do preso e as leis do cárcere. Dissertação de
mestrado. Usp, 2008.
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CONCLUSÕES
feminino;
h) As mulheres encarceradas passam a constituir um “outro”
estigmatizado;
i) Uma nova categoria é possível, sendo a exterioridade uma importante via
de visibilização feminina;
j) Referida visibilização é necessária para a humanização da humanidade.
Referências Bibliográficas
BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo. 6ª edição. Traduzido por Sérgio Milliet.
Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1980.
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CHIES, Luiz Antônio Bogo et al. A prisão dentro da prisão: sínteses de uma
visão sobre o encarceramento feminino na 5ª região Penitenciária do Rio
Grande do Sul. In Revista brasileira de Ciências Criminais. São Paulo: Revista dos
Tribunais, ano 17, n.79, jul.-ago./2009.
FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir. História da violência nas prisões. 30ª edição.
Petrópolis: Vozes, 2005.
VARELLA, Drauzio. Estação Carandiru. São Paulo: Companhia das letras, 1999.
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RESUMO
Período.
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1 INTRODUÇÃO
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2 EXACERBAÇÃO PUNITIVA
3 SÁNCHEZ, Jesús-María Silva. A expansão do Direito Penal: aspectos da política criminal nas
sociedades pós-industriais. Trad. Luiz Otavio de Oliveira Rocha. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. – (Série as ciências criminais no século 21; v. 11). p. 38.
154
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155
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de ser o mais relevante, volvendo-se os olhos para quem a pratica, logo, Direito
Penal do autor e não do fato.
3.1 Apresentação
5 SANTOS, Juarez Cirino dos. O direito penal do inimigo – ou o discurso do direito penal desigual.
Disponível em: < www.icpcjur.com.br/images/direito_penal_do_inimigo.pdf>. Acesso em: out.
2009.
6 JAKOBS, Günther. 2008. p. xxv.
7 Ibidem, p. xxv.
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3.2 Conceito
8 JESUS, Damásio de. Direito Penal do Inimigo[1]: Breves Considerações. Disponível em: <
sociedades pós-industriais. Trad. Luiz Otavio de Oliveira Rocha. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. – (Série as ciências criminais no século 21; v. 11). p. 150.
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10 JAKOBS, Günther. 2008, p. xxv.
11 Ibidem. p. 1.
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[...] mas sim provocar um efeito, o que quer dizer que ela não se
aplica ao sujeito de direito, mas sim ao indivíduo perigoso. Isso
deveria ficar especialmente claro quando se passa do efeito
assegurador da pena privativa de liberdade para a custódia de
segurança como medida; nesse caso, o olhar volta-se não apenas
para trás, para o fato a ser julgado, mas também, principalmente,
para frente, para o futuro.13
12JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel Cancio. Direito Penal do Inimigo: noções e críticas. org. e trad.
André Luís Callegari, Nereu José Giacomolli. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008. p. 21.
13 JAKOBS, Günther. 2008. p. 2-3.
14 Ibidem, p. 3.
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observa os mesmos parâmetros, posto que ele não está inserido nesse vínculo
jurídico. Assim, o tratamento a ele destinado não é determinado pelo Direito. Aos
inimigos, a coação. Jakobs fundamenta ainda, com apoio em Hobbes e Kant, que o
status de cidadão não é necessariamente algo que não se pode perder, posto que “não
se trata como pessoa quem me ‘ameaça... constantemente’, quem não se deixa coagir
ao estado de civilidade”15.
Para que um sujeito possa ser considerado pessoa, na perspectiva de Jakobs,
deve se comportar de tal maneira que nele se observe participação,
comprometimento, e lealdade jurídica suficiente. A convivência social cria
expectativas de comportamento pessoal e quando essas expectativas são frustradas de
maneira duradoura, isto é, o indivíduo “não age de maneira relativamente confiável
prestando e prometendo lealdade jurídica, deixaria de ser considerado pessoa, seria um
indivíduo perigoso a quem o Direito Penal do Inimigo se destinaria”16.
O Direito Penal do Cidadão, nessa ótica, estaria destinado a regular a vida
daqueles que prometem lealdade jurídica e não delinqüem de “modo contumaz por
princípio - e um Direito Penal do Inimigo contra aqueles que se desviam por
princípio; este exclui, enquanto aquele deixa intocado o status de pessoa”17.
Entretanto, não é demais lembrar, que esses modelos de Direito Penal subsistem
dentro do mesmo contexto e
15 Ibidem, p. 7.
16 CHAMON JUNIOR, Lúcio Antônio. O Direito Penal do Inimigo e o Constitucionalismo: mise-em-scène de
uma proposta funcionalista. Artigo analítico inserido ao final da obra de Jakobs (2008, p. 131).
17 JAKOBS, Günther. 2008. p. 7.
18 Ibidem, p. 47.
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19 Ibidem p. 41.
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23 SÁNCHEZ, Jesús-María Silva. 2002. p. 149.
24 JAKOBS, Günther; MELIÁ, Manuel Cancio. 2008. p. 29.
25 JAKOBS, Günther. 2008. p. 38.
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32Ibidem, p. 71-72.
33ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro: Parte
Geral. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 117-118, apud MORAES, Alexandre Rocha Almeida
de. Direito Penal do inimigo: a terceira velocidade do Direito Penal. Curitiba: Juruá, 2008. p. 266.
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garantias de todos os cidadãos diante do poder punitivo, dado que não sabemos ab
initio quem são essas pessoas”34.
Jakobs teorizou sobre a necessidade de todos os indivíduos ofertarem
segurança cognitiva mínima, isto é, demonstrarem determinado grau de fidelidade à
norma para que possam ser considerados pessoas. Entretanto, o posicionamento de
Zaffaroni se assenta também na impossibilidade de relativização do conceito de
pessoa, pois “a negação jurídica da condição de pessoa ao inimigo é uma característica
do tratamento penal diferenciado que lhe é dado, porém não é a sua essência, ou seja,
é uma conseqüência da individualização de um ser humano como inimigo, mas nada
nos diz a respeito da individualização em si mesma”35.
O catedrático argentino afirma ainda que
Juarez Cirino dos Santos aponta que “a ingenuidade desse direito penal do
inimigo não está em apostar na violência do Estado sobre o indivíduo - afinal, um
dado universal, mas em ignorar as aquisições científicas sobre crime e controle social
nas sociedades atuais” 37. Além disso, destaca no mesmo texto:
38 SANTOS, Juarez Cirino dos. O direito penal do inimigo – ou o discurso do direito penal desigual.
Disponível em: < www.icpcjur.com.br/images/direito_penal_do_inimigo.pdf> Acesso em: out. 2009.
39 ZAFFARONI, 2007. p. 192.
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40 CARVALHO, Amilton Bueno de; CARVALHO, Salo de. Aplicação da pena e garantismo. 3. ed. ampl.
41 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. p. 84-85.
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I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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pretende do processo afeta os pressupostos das condenações e das penas e não das
absolvições e da ausência de penas”42.
Zaffaroni salienta que “referir-se a um direito penal garantista em um Estado
de direito é uma redundância grosseira, porque nele não pode haver outro direito penal
senão o de garantias, de modo que se supõe que todo penalista, nesse marco, é
partidário das garantias, isto é, garantista”43. E arremata:
Para que seja possível trilhar o mesmo caminho percorrido pelo juiz ao fixar
a pena é preciso saber qual direção ele seguiu. Decisões que não possibilitam essa
digressão ferem previsão constitucional, uma vez que os julgamentos do poder
judiciário serão públicos e as decisões fundamentadas, consoante o disposto no art.
93, IX, da Constituição Federal.
42 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. p. 85.
43 ZAFFARONI, Eugenio Raúl. 2007. p. 173.
44 Ibidem.
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45 FAYET, A Sentença Criminal e suas Nulidades, p. 49-50, apud CARVALHO, Amilton Bueno de;
CARVALHO, Salo de. Aplicação da pena e garantismo. 3. ed. ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004. p.
32.
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não pode ser confundida com arbitrariedade. Nucci assim conceitua a fixação da
pena:
Não basta ao juiz apenas fazer referência ao art. 59, CP, pois o acusado tem
o direito de saber qual a razão da punição e o porquê desta e não daquela pena. Citar
de forma genérica as circunstâncias previstas no artigo não realiza seu desiderato.
Sentenças dessa natureza, por vezes, acobertam razões de decidir que não se
amoldam aos princípios e garantias fundamentais em matéria penal. Os Tribunais
têm anulado repetidamente decisões que aplicam a pena acima do mínimo sem a
46 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 9. ed. rev. atualiz.. ampl. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2008. p. 388.
47 LUISI, Luiz. Os princípios constitucionais penais. Porto Alegre: Sérgio Fabri, 1991, apud GALVÃO,
Fernando A. N. Direito Penal: Parte Geral. Rio de Janeiro: Impetus, 2004. p. 691.
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176
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6 CONCLUSÃO
51 CHAMON JUNIOR, Lúcio Antônio. O Direito Penal do Inimigo e o Constitucionalismo: mise-em-scène de
uma proposta funcionalista. Artigo analítico inserido ao final da obra de Jakobs (2008, p. 131).
51 JAKOBS, Günther. 2008. p. 7.
52 FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. p. 86.
177
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53 SÁNCHEZ, Jesús-María Silva. A expansão do Direito Penal: aspectos da política criminal nas
sociedades pós-industriais. Trad. Luiz Otavio de Oliveira Rocha. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2002. – (Série as ciências criminais no século 21; v. 11). p. 151.
179
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7 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Código Penal: Legislação Penal, Constituição Federal. 12. ed. rev. ampl.
atualiz. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1007.
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2002.
MORAES, Alexandre Rocha Almeida de. Direito Penal do inimigo: a terceira velocidade
do direito penal. Curitiba: Juruá, 2008.
GALVÃO, Fernando A. N. Direito Penal: Parte Geral. Rio de Janeiro: Impetus, 2004.
180
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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JAKOBS, Günther; Meliá, Manuel Cancio. Direito Penal do inimigo: noções e críticas.
org. e trad. André Luís Callegari, Nereu José Giacomolli. 3. ed. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2008.
JESUS, Damásio de. Direito Penal do Inimigo[1]: Breves Considerações. Disponível em:
< http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10836f> Acesso em: out. 2009.
JÚNIOR, Otávio Binato. Do Estado social ao Estado penal: o direito penal do inimigo
como novo parâmetro de racionalidade punitiva. 2007. 198f. Dissertação (Mestrado
em Direito) – Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2007.
MORAES, Alexandre Rocha Almeida de. Direito Penal do inimigo: a terceira velocidade
do Direito Penal. Curitiba: Juruá, 2008.
MORAES, Vinícius Borges de. O Direito Penal do inimigo e a concretização dos direitos
fundamentais: um estudo sobre a presença da teoria de Günther Jakobs no
ordenamento jurídico brasileiro. 2009. 187f. Dissertação (Mestrado em Direito) -
Universidade do Vale do Rio dos Sinos, São Leopoldo, 2009.
NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 9. ed. rev. atualiz. ampl. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2008.
SANTOS, Juarez Cirino dos. O direito penal do inimigo – ou o discurso do direito penal
desigual. Disponível em: <www.icpcjur.com.br/images/direito_penal_
do_inimigo.pdf> Acesso em: out. 2009.
181
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
Edições Uberlândia e Belo Horizonte
ZAFFARONI, Eugenio Raúl. O inimigo no direito penal. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan,
2007.
182
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RESUMO
1 Pós-graduada em Segurança Pública e Complexidade pela Rede de Altos Estudos em Segurança
Pública do Ministério da Justiça e pela Escola Superior Dom Helder Câmara
(http://lattes.cnpq.br/2923150491618126).
183
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Uma história
Vários são os autores brasileiros que afirmam ter a história do Direito Penal
sido iniciada em “tempos primitivos”, “envoltos em ambiente mágico”
(MIRABETE, 2004, p. 35), período no qual prevaleceu, em ordem cronológica, a
“vingança privada”, a “vingança divina” e a “vingança pública”. A sobrevivência
desta narrativa sem indicação de tempo nem de lugar, talvez resultante de uma
simplificação dos dados históricos2, contada e recontada para os estudantes dos
cursos jurídicos Brasil afora através dos manuais mais populares, dos reprodutores do
direito, merece aqui um breve registro tão somente para lembrar que as prisões nem
sempre estiveram presentes na trajetória dos vários direitos de punir, ao menos como
item indispensável para suas práticas. A privação de liberdade, se nem sempre
constituiu uma prática punitiva, conferiu ao Direito Penal moderno uma razão de
existir, desde quando se tornou um marco na chamada humanização das penas em
meados do século XVIII - com a introdução dos princípios da legalidade, do devido
processo legal e da proporcionalidade -, e até os dias atuais, quando continua sendo
apontada como principal instrumento de controle social ou, como muitos (juristas,
inclusive) costumam dizer, um “mal necessário” (BITTENCOURT, 2004), embora
seja óbvio que, tratando-se de um mal, não pode haver espaço para considerá-lo
necessário.
A história que se conta aqui começa na Europa da Idade Média, mais
precisamente no que se conhece hoje como Inglaterra, França e Países Baixos,
durante a vigência do modo de produção pré-capitalista, momento em que o cárcere
como pena ainda não existia, servindo apenas de custódia preventiva e para acautelar
2 Na obra de BATISTA (2000), percebe-se que tal simplificação corresponde às práticas punitivas
dos povos germânicos antigos (século I d.C.), fontes históricas mais remotas do sistema penal
brasileiro.
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disciplina dos antigos camponeses com o trabalho operário – afinal, embora expulsos
do campo, eles ainda estavam acostumados com o modo de produção feudal -,
sujeitando-os a condições de trabalho terríveis, contra as quais era quase impossível
resistir. Na Inglaterra, por exemplo, chegou-se ao ponto de obrigar seus súditos a
aceitação da primeira oferta de trabalho que lhes fizessem, sob pena de ser
severamente punido com trabalho forçado (MELOSSI e PAVARINI, 2006). Porém,
em verdade, tal estratégia não era de todo exitosa, na medida em que não havia
capital suficiente para empregar todos os pobres, servindo, então, o cárcere para
abrigar todo esse “exército de reserva3”.
Com o avanço capitalista, as relações de produção ganham legitimidade a
ponto de se naturalizarem, fazendo com que a violência física seja usada apenas
excepcionalmente, o que abre um flanco para que ganhasse força o clamor iluminista
pela legalidade, pela proporcionalidade das penas à gravidade do delito cometido e
pela humanidade das penas. Ora, a fonte ideológica de tais inquietações também
serviu para combater o abuso de poder consubstanciado nas monarquias absolutas e
para inaugurar o chamado Estado moderno. Ao fundar uma ordem política fundada
naqueles princípios, refinou-se a técnica jurídica da punição, ao mesmo tempo em
que se promoveu a aceitação dos direitos civis fundamentais que, de fato,
contribuíram para conter os ânimos exaltados das massas populares, antes tão
interessantes para burguesia que pretendia ascender ao poder. A maior conquista da
burguesia, portanto, não foi sobre o Estado absoluto, que de alguma maneira já
3 O exército de reserva, ou a superpopulação relativa de trabalhadores sem qualificação profissional,
foi percebido por Karl Marx ao examinar a formação do capitalismo na Inglaterra (quando da
acumulação primitiva do capital). Ele observou que havia um contingente expressivo de trabalhadores
sem ocupação fixa que tendia a aceitar as condições de trabalho piores do que as praticadas no
mercado de empregos regulares. Assim, tal massa era prontamente convocada quando necessária e
mantinha sob a pressão os trabalhadores ativos (o “exército ativo”), e quando não era, servia para
conter as pretensões de melhoria de condições de vida dos últimos (MONTENEGRO, 2009).
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estava por ela dominado, mas sim a sua consolidação de sua hegemonia frente ao
proletariado.
Com a Revolução Industrial, iniciada no século XVIII na Inglaterra,
possível graças à acumulação primitiva do capital, observa-se o crescimento da
população e outro grande movimento de expulsão dos campos. O desenvolvimento
industrial faz desaparecer o trabalho no cárcere ou torna-o improdutivo ante a
competição com o mercado livre, cujas tecnologias passam a sobrepor-se às
manufaturas. No entanto, a coação exclusivamente econômica não consegue ser mais
capaz de conter a resistência, ora menos desorganizada, do proletariado. Mais uma
vez, o aparelho estatal é mais uma vez acionado para promover tal contenção.
Assiste-se, então, à retirada dos potenciais trabalhadores no interior das casas de
correção e a permanência dos incapacitados nas casas de assistência, já que a
abundância de mão-de-obra livre faz com que o trabalho forçado perca sua função
reguladora, sobrando-lhe apenas a função disciplinante.
É por isso que, em meados do século XVIII, verifica-se que o trabalho
deixa de ser a tônica do cárcere na Inglaterra que, em 1770, inaugurou a deterrent
workhouse, a casa de trabalho “terrorista”, assim denominada por se destinar somente
àqueles que não tinham outra opção. As condições de vida lá eram propositadamente
piores do que as oferecidas ao trabalhador livre – orientação do princípio da less
eligibitity, consagrado na Poor Law Amendment de 1834 – e assim o era também como
forma de o Estado se posicionar (com a intimidação) frente às primeiras lutas
operárias. O trabalho lá desenvolvido era improdutivo, inútil, insignificante, restando
tão-somente a finalidade punitiva e disciplinadora do cárcere.
A invenção penitenciária
manufatureiro até chegar, ainda no século XIX, a assumir a indústria como principal
atividade. Assim como a européia nos séculos anteriores, a sociedade estadunidense
pós-colonial tinha o pobre como o único responsável por sua condição – já que as
oportunidades estavam acessíveis a todos - e a pobreza como a fonte de
criminalidade, sendo, então, ambos combatidos não mais com a assistência privada,
mas sim com os mesmos instrumentos de repressão já experimentados no Velho
Mundo: internamento e trabalhos forçados.
Foi assim que os Estados Unidos “inventaram” a penitenciária: em 1790, na
mesma Pensilvânia dos quakers, que num ato de filantropia, mobilizaram a opinião
pública e as autoridades locais para a construção de um lugar que oferecesse
condições para que os criminosos salvassem suas almas - isolamento, oração e total
abstinência de bebidas alcoólicas. Conseguiram, assim, fundar um modelo de
instituição no qual, declaradamente, o trabalho não tinha outra função senão a de
ocupação de tempo, vez que o isolamento celular, por si só, não permitiria a
introdução de uma atividade verdadeiramente produtiva no seu interior. O solitary
confinement tinha por finalidade promover no interno o “processo psicológico de
introspecção” (MELOSSI e PAVARINI, 2006, p. 189) necessário para que o
condenado se arrependesse do seu crime. Em pouco tempo, contudo, o
confinamento mostrou-se mais eficaz para o crescimento do número de suicídios e
de encarcerados acometidos pela loucura.
Olvidadas as razões humanitárias, e em vista da industrialização da
economia que, somada ao decréscimo na importação de escravos, fez com que
crescesse a necessidade de mão-de-obra, o sistema pensilvânico passou a ser
criticado, já que reduzia o número de trabalhadores livres e deseducava os presos ao
obrigá-los a trabalhar sem fins produtivos. Dessa forma, tentou-se primeiramente
introduzir o trabalho produtivo nas prisões mantendo-se o isolamento celular, o que
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5 A pretensão do atual governo mineiro em estabelecer uma parceria público-privada para
administrar as prisões, portanto, não pode ser vendida como uma novidade: novo mesmo é
transformar em matéria-prima o preso e do seu sofrimento retirar a mais-valia.
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operárias. Assim, o trabalho artesanal e, muitas vezes inútil, voltou a ser a tônica das
prisões, até porque não mais havia real necessidade de treinar a população carcerária
para ocupar mercado de trabalho, mas sim, e tão somente, reproduzir no cárcere a
idéia corrente de que empregado sempre está subordinado ao patrão.
As reinvenções do cárcere
imprimindo-lhe com o signo das ciências uma moralidade burguesa que pretendia,
sob o engodo de ressocializar ou de reinserir à sociedade, subjugar as classes
subalternas, tanto para adestrar seus corpos para produzir, quanto para moldar seus
espíritos à ordem.
Isso vale notadamente para os saberes psi, cujos técnicos se destacam na
tarefa da avaliar e o diagnosticar os presos7, e, assim, compõem, como qualquer
“funcionário do cárcere”, o seu aparato de segurança: a indisciplina do sujeito é,
invariavelmente, tomada como sintoma de sua não regeneração ou de doença mental,
ao passo em que a normalidade restringe-se àqueles que apresentam bom
comportamento, seja ele dissimulado ou não (RAUTER, 2003).
A partir da segunda metade do século XIX, a melhora das condições de
vida dessa classe influencia no decréscimo ou, ao menos, na manutenção nos índices
de criminalidade. Também ressurge a demanda por mão-de-obra com a expansão da
produção industrial em tempos de imperialismo. Simultaneamente a tais fatos, o
desenvolvimento de uma abordagem sociológico-naturalista sobre a questão criminal,
o que, por sua vez, altera o enfoque da punição:
“[...] o problema dos métodos punitivos não era mais visto como
um problema de manutenção de uma proporção justa entre o
crime e a pena; ele era agora examinado sob o ponto de vista do
criminoso, a expectativa de reabilitação e as precauções que valiam
a pena de serem tomadas. [...] A concepção de culpa social
envolvia a idéia de garantir a volta do maior número de forças
7 A Lei de Execuções Penais, em seu art. 5º, manda classificar os condenados, segundo os
antecedentes e a personalidade, para orientar a individualização da execução penal. Tal mister incumbe
à Comissão de Técnica de Classificação, que deve ser presidida pelo diretor do estabelecimento e em
cuja composição deve haver, no mínimo, um psiquiatra e um psicólogo (art. 7º). Apesar de haver sido
revogada a obrigatoriedade do exame criminológico para reconhecimento dos direitos à progressão de
regime e ao livramento condicional (alteração da Lei 10.792/03), as decisões dos técnicos continuam
exercendo forte influência na sorte dos condenados quanto ao gozo desses direitos, já que seus
saberes subsidiam o julgamento das faltas disciplinares, faltas essas que pontuam o comportamento
carcerário a ser avaliado em juízo.
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O açoite reservado8
liberdade por uma infração estatal, ainda eram sujeitos à punição de seus senhores dentro das prisões.
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experiências que não foram seguidas fielmente), mas sua finalidade corretiva era
reservada aos presos não escravos, pois, a estes, a pena
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novidade, pois o mesmo já fora previsto no Código Penal de 1890, em seu art. 509),
bem ainda uma espécie de período de estágio para o livramento condicional
(MUAKAD, 1998), para os condenados de “bom procedimento”, a ser cumprido em
colônias penais e estabelecimentos similares (então art. 30, §2º), os quais nunca
“saíram do papel”.
Observa-se, assim, uma curiosa insistência em obedecer a um projeto
disciplinar que, mesmo nunca tendo sido efetivamente seguido à risca, continua
preservado enquanto discurso até hoje - ainda que tenha perdido completamente seu
sentido.
A invenção brasileira
9 “Art. 50. O condemnado a prisão cellular por tempo excedente de seis annos e que houver
cumprido metade da pena, mostrando bom comportamento, poderá ser transferido para alguma
penitenciaria agricola, afim de ahi cumprir o restante da pena.
§ 1º Si não perseverar no bom comportamento, a concessão será revogada e voltará a cumprir a
pena no estabelecimento de onde sahiu.
§ 2º Si perseverar no bom comportamento, de modo a fazer presumir emenda, poderá obter
livramento condicional, comtanto que o restante da pena a cumprir não exceda de dous annos”
(SENADO..., 2010).
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iniciativas bem sucedidas tomadas pelos juízes de primeira instância durante os anos
cinqüenta, inclusive em outros estados-membros.
Em 1954, foi promovida uma campanha em prol da prisão aberta pelo
Corregedor-Geral do Tribunal de Justiça de São Paulo, “impressionado com a
promiscuidade e com o abandono espiritual” das prisões paulistas (MUAKAD, 1998, p. 83).
Apesar de inspirar-se em experiências estrangeiras10, a denominação “prisão-
albergue” não foi importada: a Casa do Albergado, a dimensão espacial do regime
prisional aberto no Brasil, é uma “invenção” brasileira, pelo menos na sua
denominação.
O regime, criado pela jurisprudência paulista, mandava o condenado
dedicar-se ao trabalho durante o dia e, nas horas de repouso, à noite, e nos fins de
semana e dias de folga e nos feriados, recolher-se em estabelecimento especialmente
destinado a tal fim – a Casa do Albergado – ou, na falta deste, em seção isolada
reservada para tal fim em presídios, cadeias públicas ou distritos policiais. Também
exigia o cumprimento de condições, tais como proibição de freqüentar certos lugares
“incompatíveis com o regime” (casa de jogo, lupanares, etc.) e de ingerir bebidas
alcoólicas, o cumprimento dos horários de saída do trabalho e de retorno ao
estabelecimento onde o condenado deveria recolher-se quando não estivesse
trabalhando, e o comparecimento periódico perante o juiz para comprovar a
satisfação dos encargos familiares e o efetivo exercício do trabalho. A depender de
seu comportamento, teria acesso a algumas “regalias” como visitar a família em datas
especiais, freqüentar curso profissionalizante de segundo grau ou superior, ir à igreja
ou participar, fora do estabelecimento, de outras atividades que concorressem com
“sua emenda e reintegração ao convívio social” (MÉDICI, 1979, p. 44). Interessante ver tais
10 A prisão-albergue é a versão nacional da “semiprisão ou semiliberdade na França e Bélgica, o
regime de meia liberdade em Portugal, saída livre na Suécia e o Day Parole ou liberação condicional
diurna nos Estados Unidos” (MUAKAD, 1998, p. 85). A sua originalidade restringe-se às
denominações “albergue” e “Casa do Albergado”.
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normas reproduzidas no art. 115 da atual Lei de Execução Penal: lá subsistem todas
as condições elencadas, exceto a expressa proibição de freqüentar certos lugares e de
ingerir álcool - o que não impede que o juízo da execução a imponha como uma
condição especial, mediante oitiva do Ministério Público (art. 115). A LEP
acrescenta, ainda, a condição de não se ausentar da comarca sem expressa
autorização judicial.
Destaca-se, também, que o ingresso no regime aberto, como já dispunha o
Provimento XVI, “supõe a aceitação de seu programa e das condições impostas pelo juiz” (art.
113 da LEP), não podendo ser progredido o condenado que não os aceita
expressamente ou caso “se deduza, por seu comportamento, que não os aceita” (MIRABETE,
1993, p. 289): a entrada na Casa do Albergado revela-se um “contrato” que não
contempla a hipótese de consentimento tácito, mas tão só de recusa tácita!
Por fim, a fiscalização direta dessas condições incumbiria aos conselhos da
comunidade, aos patronatos ou similares ou, à falta, às “pessoas idôneas nomeadas
pelo juiz” (art. 29). A Lei 7.210/84 mantém, em seu art. 78, a incumbência expressa
somente aos Patronatos, cujo nome em si parece dispensar comentários!
A ressocialização pelo trabalho é o móvel do instituto, destinado a propiciar
aos condenados a oportunidade de conquistar uma profissão cujo aprendizado, na
maioria das vezes, não seria possível no interior do cárcere. Os primeiros
experimentos com a prisão-albergue ocorreram em tempos de grande
desenvolvimento industrial em São Paulo (anos cinqüenta do século passado), o que
pode ter impulsionado a liberalidade. Os braços do “exército de reserva” brasileiro,
àquela época, tinham menos dificuldade de acesso ao mercado de trabalho, (a
industrialização avançava a passos largos), ainda menos exigente quanto ao nível de
escolaridade e aos atributos dos candidatos às tarefas mais subalternas.
A experiência da prisão-albergue foi mantida e, inclusive, consolidada na
década seguinte, período marcado por uma forte crise econômica e atravessado pelo
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sentido de trabalho for reduzido àquele que ajuda o preso a se manter ocupado no
interior do cárcere, e não fora dele, pois, ainda, que seja um trabalhador, tal condição
não o deixa imune à seleção do Direito Penal12.
Outra razão de ser para o gozo da prisão-albergue residiria na superlotação
dos cárceres paulistas (MUAKAD, 1998), e tal justificativa vem expressamente
anunciada nas considerações do Conselho da Magistratura paulista no Provimento
XCII, de 1975 (MÉDICI, 1979).
Se a necessidade da época era esvaziar as prisões e desonerar o Estado da
adequação do aparato penitenciário à população que devia abrigar, de fato, para isso
não serviria o já positivado livramento condicional, que então exigia o cumprimento
de mais de metade da pena, se primário, e mais de três quartos da pena, se
reincidente nas penas superiores a três anos (o extinto art. 60 do Código Penal).
Assim, com a criação da prisão-albergue, os julgadores paulistas acabaram
proporcionando um benefício tanto para os presos, que ganharam outra chance, e
menos demorada, de sair do cárcere antes de cumprida a pena, quanto para o Estado-
administração que deles se livrava, ao menos temporariamente.
As Casas do Albergado, por não exigirem o rigor penitenciário das demais
unidades prisionais (art. 57 da Lei Estadual paulista 1. 819/78, que tem hoje como
correlato o art. 94 da LEP), permitiam que o Estado não dispusesse dos elevados
custos para manter os presídios. Tal vantagem, contudo, não foi o bastante para
convencer os gestores públicos a assumir a solução da magistratura paulista no
campo da execução penal. Aliás, até hoje, trinta anos após a positivação do regime
aberto no Brasil, pouca foi a mobilização do Poder Executivo para instalar as Casas
12Vale aqui a referência ao trabalho de MATTOS (2008) no Complexo Penitenciário Feminino
Estevão Pinto de Belo Horizonte: 69% das internas, em 2005, exerciam atividade laborativa lícita antes
de ingressar no sistema. Desse número, 54% sustentava sozinha a família e 74% trabalhava sem
carteira assinada.
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13 Antes da LEP, já havia o dispositivo do Código de Processo Penal, art. 668: “a execução, onde não
houver juiz especial, incumbirá ao juiz da sentença, ou, se a decisão for do Tribunal do Júri, ao seu
presidente. Parágrafo único. Se a decisão for de tribunal superior, nos casos de sua competência
originária, caberá ao respectivo presidente prover-lhe a execução”.
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de 1975), o que, nos casos elencados, presumia-se existir, sem qualquer chance de
prova em contrário. No caso das penas superiores a três anos e um dia, o juiz poderia
concedê-la ainda na sentença, com base em elementos para aferir a periculosidade do
agente, colhidos durante a realização dos atos processuais da ação penal,
especialmente o interrogatório (art. 5º do Provimento XCII, de 1975). Se quisesse, a
autoridade judicial poderia instaurar uma sindicância para realizar tal aferição (art. 6º,
idem). Já segundo o art. 15 do mesmo diploma, no caso de condenação não superior a
cinco anos, tal sindicância era obrigatória e era realizada por pessoa de confiança do
juiz, de preferência assistente social, a qual investigava o condenado, sua família e até
a idoneidade do empregador (MÉDICI, 1977).
Se o candidato à prisão albergue estivesse cumprindo medida de segurança
em casa de custódia e tratamento (semi-imputáveis), ou fosse multirreincidente,
“criminoso habitual ou por tendência”, deveria ser submetido a exame de aferição da
periculosidade no Instituto de Biotipologia Criminal ou no Manicômio Judiciário. Se
a periculosidade já fosse declarada na sentença condenatória, passaria o condenado,
então, por um exame para apurar se ela foi cessada. Oportunizava-se, ainda, um
reforço no assujeitamento dos albergados com a permissão para que o juiz, antes ou
durante o regime aberto, determinasse seu tratamento psicoterápico ou psiquiátrico,
com ou sem internamento (art. 32 do Provimento XCII, de 1975)15. Assim, acionava-
se o arsenal ideológico da defesa social para farejar aqueles que, minimamente, teriam
internalizado a ordem das coisas, bem como para selecionar, dentre a clientela das
penitenciárias, aqueles cuja personalidade foi transformada, com êxito, para, enfim,
obedecer ao patrão.
15 O dispositivo era compatível com o sistema do duplo trilho (a pena privativa de liberdade poderia ser
seguida de aplicação de medida de segurança para os “incorrigíveis”), ainda em vigor à época
(FRAGOSO, 2010).
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Hoje, a Lei de Execuções Penais dispõe, em seu art. 114, II, que um dos
requisitos de ingresso no regime é a apresentação, “pelos seus antecedentes ou pelo resultado
dos exames a que foi submetido, fundados indícios de que irá ajustar-se, com autodisciplina e senso
de responsabilidade, ao novo regime”. É só um jeito diferente de dispor aquilo que a
magistratura paulista já ditava! E para avaliar a pertinência do regime aberto ao caso
concreto, Mirabete (1993) alerta não ser o bastante a mera análise dos registros na
folha de antecedentes criminais do condenado, já que neles não constam “todos os fatos
da vida pregressa do condenado com relação ao comportamento familiar, trabalho, atividades sociais,
etc”. E afirma mais: é necessário submeter o sentenciado a exames de personalidade,
pois não basta a comprovação de bom comportamento carcerário, “que não deve ser tão
valorizado, porque é sabido que a periculosidade ou antissociabilidade na prisão sofre controles
inibitórios” (p. 290). Mas não seria a função do cárcere justamente manter sob controle
ou inibir tais idiossincrasias? Independente da resposta, é de se observar o “esforço”
do legislador na LEP para, com outras palavras, manter em ação o eterno e
incansável “periculômetro” (MATTOS, 2005)!
O Conselho Superior da Magistratura de São Paulo elencou, ainda no
Provimento XCII, de 1975, em seu art. 40, as hipóteses em que o condenado em
regime aberto poderia cumprir o restante da pena em sua própria residência,
moldando, assim, o que hoje se conhece por prisão domiciliar. Aquele dispositivo
previa a possibilidade de cumprimento de pena no próprio domicílio quando faltasse
estabelecimento adequado na comarca onde o condenado cumpria pena, por certo
uma aplicação analógica da Lei 5.256, de 06 de abril de 1967, destinada aos indiciados
ou denunciados que fazem jus à prisão especial em localidades que não dispusessem
de estabelecimentos adequados ao seu recolhimento.
Sem dúvida, causa certo estranhamento a possibilidade de aplicar na
execução penal de qualquer condenado uma hipótese de prisão provisória que,
claramente, visava privilegiar o elenco de “autoridades” ainda previsto no art. 295 do
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últimas, sim, podiam dar-se ao luxo de serem histéricas e loucas, concessões que a
moralidade burguesa lhes conferiu para exprimir-se contra o patriarcado (COSTA,
1979), enquanto às subalternas só parecem ter restado o nobre papel de mãe - e que
as torna merecedoras dessa espécie de licença (maternidade). Para não deixar dúvidas
quanto ao tom patriarcal da norma, basta conferir o dispositivo do art. 2º da Lei
Estadual paulista 1.819/77, in verbis: “as mulheres cumprem pena em regime fechado,
semi-aberto ou aberto, em estabelecimentos apropriados, ou, à falta, em Seção
especial de penitenciária ou prisão comum, sujeitas a trabalho interno, admitido o
benefício do trabalho externo, sempre em atividades profissionais compatíveis com o seu sexo”.
Com o tempo, não respeitado o comando legal que determinava a
construção das Casas do Albergado, os Tribunais se dividiram: passaram a mandar o
“albergado” recolher-se em local reservado a este fim em cadeias públicas ou
presídios comuns, ou a permitir que o mesmo, mediante condições, cumprisse o
regime aberto em seu próprio domicílio. Os que defenderam e continuam a defender
a primeira alternativa opõem-se em deixar o sentenciado totalmente livre e sem
qualquer fiscalização, o qual, ao menos, seria mantido sob algum controle quando
recolhido à noite. Já a outra corrente alega que o condenado não pode sofrer com a
desídia do Poder Público e não ficar sujeito a regime mais grave do que faz jus. Em
comum em ambos os posicionamentos, condena-se o desrespeito à lei.
No embate de idéias, parece estar em vantagem a linha do argumento de
que, na ausência de estabelecimentos adequados e de qualquer controle ou
fiscalização sobre os condenados, desvirtuou-se o regime aberto, o que passou a ser
uma forma de impunidade velada. Isso porque, no atual projeto de reforma da Parte
Geral do Código Penal, não mais se contempla a hipótese deste regime inicial,
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Conclusão
17 O Projeto de Lei nº 3.473, de 2000, pretende dobrar o lapso temporal necessário para obtenção do
livramento condicional.
18 O artigo de Nilo Batista (2000) é cópia integral da carta enviada em 11 de setembro de 2000 a Ivete
Lund Viégas, então Secretária de Assuntos Legislativos do Ministério da Justiça, em que requer a
retirada do seu nome da Exposição de Motivos do citado Projeto de Lei.
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19 Em Minas Gerais, já foram testadas tornozeleiras eletrônicas em condenados em regime semi-
aberto da comarca de Nova Lima (RUBENS, 2010). Isso indica que o sistema progressivo pode até
continuar existindo, mas deixando de lado seu sentido original, que é construir o senso de
responsabilidade no condenado. Ora, a Lei de Execuções Penais em vigor prevê a fiscalização do
cumprimento da pena em regime semi-aberto ou aberto, porém garante ao condenado sua saída da
unidade prisional sem qualquer escolta. Seria o monitoramento uma mera forma de fiscalizar ou uma
espécie de escolta?
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20 Não resta claro qual das unidades, de fato, atende o público feminino, afinal, só há uma vaga, e
obviamente não pode ser dividida por duas!
21 O lado de fora, na gíria carcerária.
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obra, cada vez mais mal remunerada e descartável, pela contínua negação da
assistência (não-oferta de bens básicos para se viver: saúde, educação, moradia, etc.) e
pela invisibilidade de sua existência.
Diante de tudo que foi aqui demonstrado, não se enxerga outra saída senão
uma verdadeira ruptura do sistema punitivo vigente, culminando com o fim do
encarceramento, o que vai exigir, a princípio, que o Direito Penal dispa-se de toda
sua irracionalidade e, a partir de então, talvez não lhe sobre qualquer sentido político
ou social, ou lhe reste o papel de impor sanções tomadas de empréstimo de outros
ramos do Direito (Administrativo, Civil, por exemplo) até com estes se confundir. E
pior que o fim das prisões não é o suficiente, ou melhor, não seja um dia alcançado
enquanto sobreviverem as demais instâncias penais estatais e, principalmente, as que
ultrapassam o âmbito estatal, infiltradas que estão nos meios de comunicação, nas
relações sociais, na cultura.
Para tanto, é imprescindível a promoção do debate sobre o significado
político da repressão penal, vez que o cometimento do crime e a conseqüente
resposta do Estado não podem ser encarados como um mero conflito entre o
indivíduo e a sociedade, no papel de vítima. É preciso, sim, desvelar a forma
maniqueísta como se trata a criminalidade que, além de mascarar os conflitos sociais,
econômicos e culturais envolvidos na questão, também justifica a implementação de
práticas repressivas violadoras de direitos e garantias fundamentais, inclusive as que
pretendem transformar o condenado em matéria-prima, e de seu sofrimento retira a
mais-valia para lucrativas empresas de administração carcerária.
Tal discussão política, portanto, vai além da necessidade de melhoria das
condições de vida oferecidas nas prisões e de tratamento digno aos seus amigos e
familiares, alcançando o próprio sentido (ou melhor, a sua falta) das penas privativas
de liberdade. Se, na sociedade industrial, a prisão prestou-se a disciplinar os corpos
ora para o trabalho, inscrevendo-o no universo da subalternidade, na sociedade atual,
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REFERÊNCIAS
COLON, Leandro. Juiz que libertou assassino de Luziânia rebate críticas. Estadão.
Disponível em: <http://www.estadao.com.br/noticias/geral,juiz-que-libertou-
assassino-de-luziania-rebate-criticas,539629,0.htm>. Acesso em: 18 abr 2010.
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COSTA, Jurandir Freire. Ordem médica e norma familiar. Rio de Janeiro: Graal,
1979.
FRAGOSO, Heleno. Sistema do duplo binário: vida e morte. Disponível em: <
http://www.fragoso.com.br/cgi-bin/heleno_artigos/arquivo19.pdf>. Acesso em: 16
mar. 2010.
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PRADO, Daniel Nicory do. Sobre a natureza jurídica da execução penal. Jus
Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1468, 9 jul. 2007. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10124>. Acesso em: 11 dez. 2009.
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RESUMO
O presente trabalho trata da concepção de Direito Penal Mínimo, passando por uma
análise do princípio da intervenção mínima, para, posteriormente, aprofundar o
estudo em relação aos princípios que dele decorrem, quais sejam, o princípio da
insignificância e o princípio da irrelevância penal do fato. Por meio de uma digressão
teórica, abordam-se os elementos componentes do conceito tripartite de crime e,
posteriormente, secciona-se a composição do fato típico, com o estudo focado na
tipicidade. Analisam-se as características comuns a ambos os princípios, apontando
suas diferenças e peculiaridades.
1 – INTRODUÇÃO
1 Advogado. Pós-graduando em Direito Público pela Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da
2 FERRAJOLI, Luigi. El derecho penal mínimo, in “Poder y control”, nº 0, 1986.
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quando os demais ramos do Direito forem insuficientes à proteção dos bens jurídicos
em conflito.
A teoria aqui abordada defende a proporcionalidade na aplicação de um tipo
penal. Analisemos, a título de exemplo, a seguinte situação: o artigo 155 do Código
Penal dispõe que é crime subtrair coisa alheia móvel; entretanto, não é crível atribuir
ao legislador, quando da criação desse tipo penal, a intenção de atingir também
aquele que subtrai um simples chiclete de um imenso hipermercado. Parece ser
incoerente movimentar toda a máquina judiciária por conta de uma mera goma de
mascar, até pelo fato de ser economicamente inviável ao Estado tutelar bens jurídicos
tão ínfimos.
Para Ferrajoli3 o Direito Penal Mínimo:
335.
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4 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. São Paulo: Saraiva, 2005, pág. 22.
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5 BATISTA, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. Rio de Janeiro: Revan, 1990, pág. 87.
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Por seu turno, o princípio da irrelevância penal do fato vai além e considera,
ainda, o desvalor da ação e o desvalor da culpabilidade. Assim, presente qualquer
deles o fato torna-se penalmente relevante, devendo o agente ser sancionado.
A diferença entre os dois princípios supra mencionados, cuja co-existência é
absolutamente impossível, é assim explicada pela doutrina6:
6 GOMES, Luiz Flávio. Delito de Bagatela: Princípios da Insignificância e da Irrelevância Penal do Fato. In sítio
do princípio da insignificância.
Necessário, portanto, que o magistrado analise o caso que se lhe apresenta
com bom senso a fim de selecionar qual dos dois princípios melhor rege a questão,
sendo temeroso adotar, a priori, qualquer deles e prescindir do outro.
4 – CONCLUSÃO
7 Disponível em:
http://www.advocaciabittar.adv.br/index.php?option=com_content&task=view&id=75 &Itemid=1;
Acesso em 25 de março de 2010.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BATISTA, Nilo. Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. Rio de Janeiro: Revan,
1990;
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RESUMO
1
Graduando em Direito pela PUC Minas.
2
Mestre em Direito pela PUC Minas.
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DESENVOLVIMENTO
A sociedade, desde tempos remotos, tem procurado punir aqueles que não
se enquadram em suas normas, neste sentido Teles:
Apesar de haver passado por várias fases, o que podemos afirmar com
certeza é que, conforme Carvalho Filho (2002, p.21), o cárcere faz parte de quase
toda trajetória histórica da humanidade, porém, suas finalidades mudaram. O fim da
pena era apenas a punição do indivíduo consubstanciada na vingança, como exemplo
a Lei de Talião. Porém, com o passar dos tempos e com a evolução social, foram
nascendo princípios e garantias, mudando-se o conceito e as finalidades da punição
do sujeito.
Uma mudança notável é a passagem do Estado Absolutista para a ascensão
do Estado de Direito, onde foi possível a criação dos Direito Fundamentais, marco
fundamental dessa transição no que se refere às penas. De acordo com Freitas (ano),
o Estado Absolutista baseou-se na doutrina da monarquia divina, respaldada no
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Portanto, isso não tem ocorrido, pois temos visto situações não condizentes
com o Estado de Direito, mesmo a nossa Constituição resguardando os direitos
fundamentais e proibindo penas desumanas e cruéis, como podemos encontrar no
art. 1º , III e art. 5, III.
Em tempos passados, o direito de punir não era apenas do Estado,
principalmente na era da vingança privada, porém, a partir do Estado de Direito, o
Estado é indubitavelmente o único titular do direito de punir, sendo que ocorrem
inúmeros casos de punição aplicada por particulares, o que nada mais é do que uma
ilegalidade e inconstitucionalidade. Mas ao exercer o Jus Puniendi, deve atentar para os
direitos fundamentais do condenado e observar os limites constitucionais de sua
atuação e interferência.
De acordo com Julio Fabrini Mirabete, jus puniendi pode ser definido
como direito que tem o Estado de aplicar a pena cominada no preceito secundário da
norma penal incriminadora, contra quem praticou a ação ou omissão descrita no
preceito primário, causando um dano ou lesão jurídica. (MIRABETE, 2006)
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“Costuma-se dizer que há, aqui, uma ‘co-culpabilidade’ com a qual a própria
sociedade deve arcar” (Zaffaroni; Pierangeli, 2007, p. 525).
A grande preocupação sobre a crise do Sistema Penitenciário Brasileiro e
suas conseqüências, gera a busca de medidas alternativas e soluções efetivas para os
problemas deste sistema. O Sistema Punitivo apresenta vários problemas de fato,
como as superlotações nos presídios, falta de atividades laborativas, tratamento
médico inexistente ou insuficiente, além de inúmeras outras situações generalizadas
de desrespeito aos direitos dos condenados.
A crescente preocupação do Estado e da sociedade fez surgir propostas de
mudança do Sistema Carcerário, sendo os mais constantes a Proposta de Privatização
das Penitenciarias e as ASSOCIAÇÕES DE AMPARO E PROTEÇÃO AO
CONDENADO - APAC´s, que vem ganhando força no Brasil e no exterior,
principalmente em Minas Gerais.
Segundo Carvalho Filho (2002, p.62), a privatização de presídios foi
implantada nos Estados Unidos da América a partir da década de 1980, quando as
penitenciárias estavam superlotadas e a Justiça exigia adequação do número de vagas
ao número de presos e não havia recursos para gerenciar e construir novos presídios.
Após a idéia foi se espalhando pelo mundo, sendo introduzida também em
países como Austrália, França e Inglaterra, chegando ao Brasil na década de 1990.
Nos países indicados, exceto o Brasil, embora tenham unidades prisionais
privadas, estas são minoria frente ao sistema estatal, e cada país adota um modelo
diferente de privatização, com maior ou menor participação do empreendedor
privado, destacando-se os Estados Unidos como o modelo em que se constata maior
participação, ou seja, quase total, do empresário na administração do presídio,
diferentemente do que ocorre na França, que adota o modelo segundo qual o Estado
está, juntamente com o empreendedor, administrando a unidade prisional, numa
verdadeira co-gestão (Carla Renata, 2006, p.44).
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É melhor que esse lixo que existe hoje. Nós temos depósitos
humanos, escolas de crime, fábrica de rebeliões. O estado não tem
recursos para gerir, para construir os presídios. A privatização
deve ser enfrentada não do ponto de vista ideológico ou jurídico,
se sou a favor ou contra. Tem que ser enfrentada como uma
necessidade absolutamente insuperável. Ou privatizamos os
presídios; aumentamos o número de presídios; melhoramos as
condições de vida e da readaptação social do preso sem
necessidade do investimento do Estado, ou vamos continuar
assistindo essas cenas que envergonham nossa nação perante o
mundo. Portanto, a privatização não é a questão de escolha, mas
uma necessidade indiscutível, é um fato". (Capez, 2007)
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ARAÚJO JUNIOR, João Marcello de (Org.). Privatização das prisões. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1995.
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D`URSO, Luiz Flávio Borges. Direito criminal na atualidade. São Paulo: Editora
Atlas, 1999.
PRADO, Luis Regis. Curso de direito penal brasileiro: parte geral. 2º edição.
São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2001
TELES, Ney Moura. Direito penal: parte geral. São Paulo: Atlas, 2004.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
1 Mestre em Ciências Penais e Doutorando em Direito pela FDUFMG
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2 ROXIN, Claus. Estudos de direito penal, p. 134.
3 ROXIN. Estudos..., p. 135.
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4 ROXIN. Estudos..., p. 138; _____. Derecho penal: parte general, p. 806.
5 ROXIN. Derecho penal..., p. 807.
6 Entre os mais proeminentes defensores desta concepção de culpabilidade no Brasil está Francisco de
fenômeno empírico que, afinal, não se pode constatar, o princípio “in dubio pro reo”
imporá sempre a absolvição, inviabilizando um direito penal da culpabilidade.7
Dessa forma, Roxin limita a culpabilidade e, afinal, a imputação subjetiva do
injusto ao agente, à constatação de que ele atou com imputabilidade e potencial
consciência da ilicitude. Ambas as circunstâncias demonstráveis empiricamente, com
maior ou menor dificuldade. Nessas condições, o livre arbítrio do agente é
simplesmente presumido, e se pode – a princípio – responsabilizar o agente pela
adoção da conduta ilícita em prejuízo das alternativas lícitas que em princípio lhe
eram psiquicamente acessíveis.8
As causas de exclusão da culpabilidade, no sentido estrito que lhe confere
Roxin, serão então apenas aquelas previstas nos §§ 17 e 20 do Código Penal (CP)
alemão.9
Tal não significa desconsiderar a relevância das circunstâncias conhecidas
como excesso escusável em legítima defesa ou estado de necessidade exculpante para
a exclusão da pena. Isso iria de encontro às disposições expressas nos §§ 33 e 35 do
CP alemão.10 Antes, Roxin lhes dá a merecida atenção, reconhecendo nelas hipóteses
7 ROXIN. Derecho penal..., p. 800.
8 ROXIN. Derecho penal..., p. 808.
9 § 20. Incapacidad de culpabilidad por perturbaciones psíquica. Actúa sin culpabilidad quien en la
comisión de un hecho es incapaz por una perturbación síquica patológica, por perturbación profunda de la conciencia o
por debilidad mental o por otra alteración síquica grave de comprender lo injusto del hecho o actuar de acuerdo con esa
comprensión. § 17. Error de prohibición. Sí le falta al autor en la comisión de un hecho la comprensión de lo
injusto de su actuar entonces actúa sin culpa si el no pudo evitar ese error. Si el autor pudo evitar el error, entonces puede
atenuarse la pena conforme al § 49, inciso 1. (Código Penal Alemán. Trad. Claudia López Diaz)
10 § 33. Exceso en la legítima defensa. Si el autor excede los límites de la legítima defensa por confusión temor o miedo,
entonces no será castigado. § 35. Estado de necesidad disculpante. (1) Quien en un peligro actual para la vida, el cuerpo
o la libertad no evitable de otra manera, cometa um hecho antijurídico con el fin de evitar el peligro para él para un
pariente o para otra persona allegada, actúa sin culpabilidad. Esto no rige en tanto que al autor se le pueda exigir
tolerar el peligro, de acuerdo con las circunstancias particulares, porque el mismo ha causado el peligro o porque el estaba
en uma 12 especial relación jurídica. Sin embargo, se puede disminuir la pena conforme al § 49 inciso l., cuando el autor
no debería tolerar el peligro en consideración a una especial relación jurídica. (2) Si el autor en la comisión del hecho
supone erróneamente circunstancias que a él lo puedan exculpar conforme al inciso primero, entonces sólo será castigado
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13 ROXIN. Estudos..., p. 152.
14 ROXIN. Estudos..., p. 153.
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15 ROXIN. Estudos..., p. 158-159.
16 JAKOBS, Günther. Derecho penal: parte general, p. 566.
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Trata-se de um conceito simples, mas que não diz muito, e por isso é
tratado como um conceito formal. Pois se o déficit de motivação jurídica dominante
decorre simplesmente do comportamento ilícito, a culpabilidade será definida
exclusivamente em função do que seja determinante para a responsabilização do
culpável por esse déficit.
A abertura de tal conceito de culpabilidade reside justamente ai. Para Jakobs
essa responsabilidade se dá sempre que a falta de disposição do agente para se
motivar conforme a norma que descumpre não possa ser compreendida sem abalar a
confiança geral nessa norma.17 Como se vê, a culpabilidade não é definida a partir de
características da conduta, de um juízo sobre ela, mas segundo fatores extrínsecos. O
que fundamenta e determina a medida da culpabilidade de um comportamento
antijurídico, em Jakobs, é o abalo que ele possa gerar no reconhecimento geral da
norma defraudada.
Dessa forma Jakobs concebe a culpabilidade como uma categoria
totalmente funcional, cuja determinação e a medida serão sempre coincidentes com a
oportunidade e necessidade da pena no caso concreto.
Com efeito, Jakobs reconhece na pena exclusivamente a finalidade de
manter o reconhecimento geral da norma e, conseqüentemente, a expectativa social
de que a norma é vinculante. Atribui-lhe, pois, um caráter preventivo geral,
convencionalmente referido como positivo, em oposição à clássica teoria da
prevenção geral negativa, que espera da pena uma eficácia de intimidação. Nas
palavras desse autor, “se pune para manter a confiança geral na norma; para exercitar
o reconhecimento geral da norma”.18
Ora, quando o comportamento antijurídico do autor não pode ser
compreendido senão como uma demonstração de infidelidade ao direito, haverá
17 JAKOBS. Derecho penal..., p. 566.
18 JAKOBS. Derecho penal..., p. 581. Tradução nossa.
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culpabilidade e a pena terá lugar como mecanismo para exercitar a fidelidade devida,
estabilizando expectativas em torno da ordem jurídica violada.
Na medida em que o conceito de culpabilidade está voltado para as
repercussões que o comportamento antijurídico possa ter sobre as expectativas
sociais de vinculação da norma, torna-se irrelevante o questionamento do livre
arbítrio. Com efeito, a verificação do livre arbítrio, ou mesmo a sua consideração
como um pressuposto indemonstrável da culpabilidade, só faz sentido quando por
esse juízo não se visa unicamente lograr um efeito social, mas também a
reprovabilidade do indivíduo, o que não ocorre na perspectiva de Jakobs.19
O poder agir de outro modo só pode ser entendido na perspectiva de
Jakobs como uma construção normativa. Significa simplesmente que o âmbito da
culpabilidade, por ser o âmbito da responsabilidade, é justamente aquele da
autonomia do indivíduo. O âmbito sobre o qual ele não necessita suportar
ingerências, exatamente porque ali será responsável por suas escolhas, “por suas
motivações defeituosas”. Em suma, a culpabilidade coincide com a liberdade do
culpável, não no sentido de livre arbítrio, mas da ausência de obstáculos
juridicamente relevantes para sua atuação; para seus “atos de organização”.20
Os críticos do conceito de culpabilidade formulado por Jakobs acusam-no
de ser inidôneo a limitar a punibilidade, que ficaria sempre à deriva de necessidades
preventivas.21 Jakobs, todavia, vê na função da pena um limite seguro para a
punibilidade, acreditando que a necessidade de punição e a medida necessária da
pena podem ser objetivamente definidas segundo padrões gerais, com independência
e prejudicialmente à opinião pessoal do julgador.
19 JAKOBS. Derecho penal..., p. 585.
20 JAKOBS. Derecho penal..., p. 585
21 Nesse sentido ROXIN. Derecho penal...., p. 806.
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Para esse autor o princípio nulla poena sine culpa impõe justamente que entre
o suposto fático e sua conseqüência jurídica deve haver uma proporção adequada,
determinada pela necessidade. O limite que a culpabilidade estabelece para a pena
não gira em torno do que o delinqüente “mereceu” segundo a opinião geral – ou
pessoal do julgador, acrescentaríamos – mas do necessário à manutenção da
confiança.22 Desse modo, só se imporá pena quando estiver descartada a
possibilidade de resolver o conflito sem castigar o autor e, sendo esta necessária,
vinculará para sua medida o padrão válido para casos semelhantes. Nesse sentido, o
princípio da culpabilidade atuaria limitando o arbítrio nas decisões judiciais, uma vez
que as decisões particulares sobre a culpabilidade estariam vinculadas “pelas
exigências do sistema de exculpação e inculpação que se pratica em geral”.23
Resta-nos, então, descrever em seus traços essenciais o “sistema de
inculpação e exculpaçao” proposto por Jakobs. Em outras palavras, as condições
mediante as quais seria plausível supor uma disposição geral a aceitar ou negar a
responsabilidade do autor pelo seu déficit de motivação jurídica.
Trata-se do “tipo total de culpabilidade”, composto por elementos
positivos, determinantes da deslealdade ao direito do autor, que conformam o “tipo
de culpabilidade”, e por elementos negativos da inexigibilidade, que conformam o
“tipo de exculpação”.24
Como elementos positivos, determinantes do tipo de culpabilidade, Jakobs
se refere primeiramente ao próprio injusto, que é, afinal, a expressão do déficit de
motivação jurídica do autor. O comportamento típico evitável, doloso ou
22 RAMOS, Enrique Peñaranda; GONZÁLEZ, Carlos Suárez; MELIÁ, Manuel Cancio. Um novo
sistema do direito penal: Considerações sobre a teoria de Günther Jakobs, p. 63.
23 JAKOBS. Derecho penal..., p. 588-589.
24 JAKOBS. Derecho penal..., p. 596.
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imprudente, que não está justificado é, assim, para Jakobs, simultaneamente objeto e
elemento do juízo de culpabilidade.25
Depois, Jakobs trata da imputabilidade como condição geral para se atribuir
responsabilidade ao autor de um injusto pelo déficit de motivação que revela. Como
essa responsabilidade ocorrerá sempre que a falta da motivação segundo a norma
puder abalar as expectativas gerais sobre a vinculação desta, serão imputáveis todos
os sujeitos definíveis como iguais.26
Isto porque em situações motivacionais semelhantes, a infração da norma
por um sujeito determinado exemplifica a infração da norma por qualquer outro a ele
equiparável, ofendendo assim a validade da norma em relação a todos esses.27 O
indivíduo “igual” que não se motiva conforme a norma, atuando antijuridicamente,
apresentará uma alternativa de comportamento capaz de abalar a confiança na
vinculação da norma infringida.
O mesmo não ocorre quando o autor do fato antijurídico puder ser
qualitativamente definido como “anormal” sob o ponto de vista psíquico, ou quando
lhe faltar a “igualdade” em razão da menoridade. As condições determinantes dessa
anormalidade Jakobs reconhece nas hipóteses centrais previstas no § 20 do CP
alemão, que reúne também, segundo ele, causas de inexigibilidade. Já a presunção de
desigualdade e, pois, inculpabilidade, das crianças e pré-adolescentes pelo
desenvolvimento social incompleto se dá nos termos do §19 do mesmo diploma.28
25 JAKOBS. Derecho penal..., p. 598.
26 JAKOBS. Derecho penal..., p. 598.
27 JAKOBS. Derecho penal..., p. 598
28 JAKOBS. Derecho penal..., p. 598 e 599. Aqui transcrevemos esses dispositivos, correspondentes no
essencial aos artigos 26, caput, e 27 do Código Penal brasileiro: § 19. Incapacidad de culpabilidad del nino:
Es incapaz de culpabilidad quien en el momento de la comisión de un hecho aún no ha llegado a la edad de los catorce
años.
§ 20. Incapacidad de culpabilidad por perturbaciones psíquicas: Actúa sin culpabilidad quien en la comisión de un
hecho es incapaz por una perturbación síquica patológica, por perturbación profunda de la conciencia o por debilidad
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mental o por otra alteración síquica grave de comprender lo injusto del hecho o actuar de acuerdo con esa
comprensión.(Código Penal Alemán. Trad. Claudia López Diaz)
29 JAKOBS. Derecho penal..., p. 599. Com base nessa idéia os defensores de sua teoria pretendem
responder a crítica segundo a qual esse conceito puramente funcional de culpabilidade ofenderia a
dignidade dignidade do culpável ao trata-lo como mero objeto da pena necessária e, neste sentido,
como instrumento de estabilização de expectativas sociais. (a respeito vide RAMOS; GONZÁLEZ;
MELIÁ. Um novo sistema..., p.65 e segs.)
30 JAKOBS. Derecho penal..., p. 600.
261
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1.3 Confronto
por um e outro para que o injusto seja um fato punível, há muito mais semelhanças
que diferenças.
Antes de tudo é preciso pontuar que a comparação entre os conceitos e
respectivos pressupostos da culpabilidade nesses dois autores é tarefa equivocada e
infrutífera, uma vez que pelo mesmo termo cada um se refere a categorias
sistemáticas diferentes, uma mais abrangente que a outra. Por “culpabilidade” Roxin
se refere apenas a uma das condições – necessária, mas não suficiente – para a
responsabilização penal do autor do injusto, enquanto Jakobs se refere a todas as
condições para tanto. Consequentemente, só faz sentido comparar, pela semelhança
dos papeis que desempenham no sistema desenvolvido por cada um, o conceito de
culpabilidade de Jakobs com o de responsabilidade penal, de Roxin.
A responsabilidade penal, para Roxin, resulta da conjugação entre
idoneidade do agente para ser destinatário de normas e a verificação de necessidades
preventivas da pena, sendo essas duas condições totalmente independentes entre si,
enquanto a culpabilidade de Jakobs é integralmente concebida segundo a necessidade
da resposta penal ao injusto.
Por esta razão esses autores divergem quanto à possibilidade de a
culpabilidade do agente estar aquém da necessidade preventiva da pena. Enquanto
Roxin admite essa possibilidade sempre que as exigências de prevenção fizerem
desnecessária ou mesmo desaconselhável a pena no limite máximo da culpabilidade,33
Jakobs a rejeita, por considerar essas variáveis coincidentes. Em suas palavras, “a
pena adequada à culpabilidade é por definição a pena necessária para a estabilização
da norma”.34
Quanto a essas necessidades preventivas, também não estão inteiramente
conformes, já que Roxin não atribui à pena somente a função de prevenção geral
33 ROXIN. Estudos..., p. 155.
34 JAKOBS. Derecho penal..., p. 589
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35 ROXIN. Derecho penal..., p. 879.
36 ROXIN. Derecho penal..., p. 811.
37 ROXIN. Derecho penal..., p. 866
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38 ROXIN. Derecho penal..., p. 866
39 Como bem sintetiza Luís Augusto Sanzo Brodt, para essa teoria as normas jurídicas são normas de
cultura reconhecidas pelo Estado. Assim, do conhecimento das normas de cultura resultaria a
inferência das normas jurídicas e, conseqüentemente, da ilicitude. (BRODT, Luis Augusto Sanzo. A
consciência da ilicitude no direito penal brasileiro, p. 25-26).
40 ROXIN. Derecho penal..., p. 866
41 ROXIN. Derecho penal..., p. 867.
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44 ROXIN. Derecho penal..., p. 871
45 ROXIN. Derecho penal..., p. 864
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46 ROXIN. Derecho penal..., p. 864.
47 ROXIN. Derecho penal..., p. 864.
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48 ROXIN. Derecho penal..., p. 878-879.
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49 ROXIN. Derecho penal..., p. 879
50 ROXIN. Derecho penal..., p. 892.
51 ROXIN. Derecho penal..., p. 880
52 ROXIN. Derecho penal..., p. 880
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53 ROXIN. Derecho penal..., p. 892
54 ROXIN. Derecho penal..., p. 813-814.
55 ROXIN. Derecho penal..., p. 814.
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56 ROXIN. Derecho penal..., p. 892-893.
57 JAKOBS. Derecho penal..., p. 668
58 JAKOBS. Derecho penal..., p. 667.
273
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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59 JAKOBS. Derecho penal..., p. 668.
60 JAKOBS. Derecho penal..., p. 669.
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61 JAKOBS. Derecho penal..., p. 656.
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via revolucionária, do erro que recaia sobre as normas que compõem o âmbito
“disponível” desse ordenamento, para usar a expressão do autor.62 Essas últimas são
as normas cujo conteúdo não está desde logo determinado pelos princípios básicos
do ordenamento e que, portanto, são modificáveis em um processo de evolução,63
conforme as contingências sociais, diríamos.
A inevitabilidade do erro sobre normas que componham o núcleo
fundamental de um ordenamento jurídico só é concebível para Jakobs em situações
muito excepcionais. Praticamente só reconhece a escusação de um erro dessa
natureza quando partir de pessoas pertencentes a outras culturas. Pois para Jakobs
pessoas assim poderiam ser reconhecidas de forma análoga aos inimputáveis. Em
razão de sua “socialização exótica”, as conduta e motivações que manifestam não
servem de parâmetro para as expectativas sociais a respeito do comportamento geral;
elas não podem “servir de norma”. Assim, conforme os exemplos de Jakobs, a idéia
de que uma pessoa tenha suposto equivocadamente que, por princípio, a alta traição,
a coação ao Parlamento, o homicídio, as lesões ou até mesmo os danos estejam
permitidos só é aceitável se esta pessoa é cometida de grave perturbação psíquica ou
se seu estado psíquico é determinado pela estranheza de sua socialização.64
A escusa do erro sobre “os fundamentos”, além desse caso “extremo de
inimputabilidade”, poderia também se admitir na hipótese ainda mais rara da
consciência e motivação do agente ter sido determinada por regimes de governo
totalitários, marcados pela injustiça. Jakobs se lembra aqui do nacional socialismo, o
regime nazista, cuja atuação instigadora de comportamentos essencialmente injustos,
eficiente ao ponto de tratá-los como legais, seria idônea à exculpação do sujeito que
realiza suas demandas. Pois o contexto social imposto por regimes como esse, se
62 JAKOBS. Derecho penal..., p. 659-660.
63 JAKOBS. Derecho penal..., p. 661
64 JAKOBS. Derecho penal..., p. 659-660.
276
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67 JAKOBS. Derecho penal..., p. 661.
68 JAKOBS. Derecho penal..., p. 661-662.
69 JAKOBS. Derecho penal..., p. 662.
278
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70 JAKOBS. Derecho penal..., p. 683.
279
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definidos por outros ramos do direito, parcela da doutrina defendia, como informa
Brodt, a equiparação do erro de direito extrapenal ao erro de fato.71
Mas tampouco essa solução se firmou como satisfatória. Primeiramente pela
dificuldade em se delimitar o que seja o erro de direito penal em relação ao que seja
um erro de direito extrapenal. Depois, por que o fato de uma matéria estar regulada
exclusivamente no âmbito do direito penal não justifica por si só a irrelevância do
erro que sobre ela recaia. Como argumenta Frank72, citado por Roxin, não é razoável
atribuir conseqüências diversas ao erro sobre as condições e limites da auto tutela,
correspondente ao nosso desforço necessário, e ao erro sobre os pressupostos da
legítima defesa, simplesmente pelo fato daquele instituto estar previsto no Código
Civil e este no Código Penal.73
Acabou se impondo, segundo Roxin, a opinião científica de que também o
erro de proibição deve desculpar o agente, pelo menos quando inevitável. Não
obstante, permaneceu a divergência sobre a relevância do erro evitável sobre a
ilicitude do fato. E por traz de uma e outra posição divergente estão justamente as
teorias do dolo e da culpabilidade.
Para a primeira, que teve em Binding um de seus mais consistentes
defensores, a essência do delito consistiria na rebelião consciente do sujeito contra a
norma. Consequentemente, só haveria culpabilidade dolosa – nota-se que tal
concepção parte de um modelo causalista de delito – quando o sujeito atuasse com
efetiva consciência da ilicitude do seu comportamento. Essa teoria converte, assim, a
71 BRODT. Da consciência da ilicitude..., p. 56.
72 FRANK, StGB, 1931, §59 III 2 apud ROXIN, Derecho penal..., p. 862.
73 No fundo, como bem observa Jakobs, a fluidez e imprecisão da distinção entre erro de fato e erro
de direito, serviu para que o Tribunal Imperial (Reichsgericht) decidisse conforme o “sentimento
jurídico”, considerando “extrapenal” o erro “sentido” como exculpante, e “penal” o inescusável.
(JAKOBS. Derecho penal..., p. 658) Nisso a jurisprudência do Reichsgericht muito se aproxima, em seus
resultados, da concepção de Jakobs sobre a relevância do erro de proibição, baseada em que ele recaia
sobre normas fundamentais ou sobre normas “disponíveis” do ordenamento jurídico.
280
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74 ROXIN. Derecho penal..., p. 863.
75 ROXIN. Derecho penal..., p. 863.
76 JAKOBS. Derecho penal..., p. 663.
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acessório ou secundário,77 que se daria nos termos da teoria do dolo; com exclusão
do dolo independentemente do erro do agente, evitável ou inevitável, recair sobre as
circunstâncias do fato ou sobre a sua ilicitude. Trata-se de proposta capitaneada por
Klaus Tiedemann, a partir da constatação de que nesse âmbito do direito penal os
tipos de delito se constituem essencialmente a partir de elementos normativos, de tal
forma que a consciência da prática do fato típico, pelo agente, pressupõe a
consciência simultânea da sua ilicitude. Essa proposta, como bem observa
Tiedemann, embora não reconhecida na Alemanha foi concretizada pelo legislador
português, que equipara o erro de proibição ao erro sobre o fato em todo caso no
qual a consciência da ilicitude em abstrato seja racionalmente indispensável para
tornar o agente consciente da realização do tipo concreto de injusto que pratica.78
A crítica de Jakobs leva em conta que, por detrás da proposta de limitação
da teoria da culpabilidade ao direito penal central, descansa a tese segundo a qual a
consciência da realização dos elementos objetivos do tipo no direito penal central
importa quase sempre na consciência da perturbação social que o fato gera, enquanto
no direito penal especial ou contravencional o fato típico não possui coloração ético-
77 Segundo Jorge de Figueiredo Dias, a distinção, sempre relativa, entre o que se pode chamar direito
penal clássico e o direito penal secundário, ou entre direito penal de justiça e direito penal
administrativo vai buscar sua legitimação última à dupla função desempenhada pelo homem no
contexto do Estado de Direito. Em suas palavras: “surgindo embora sempre como concreto e
socializado, o homem realiza a sua personalidade na dupla esfera da sua actuação pessoal e da sua
actuação comunitária, sem que uma se sobreponha à outra no seu relevo ou na sua validade originária;
à proteção daquela se dirige o direito penal clássico (e, só nesse sentido, “primário”), à proteção desta
o direito penal administrativo (hoc sensu, “secundário”)”. (FIGUEIREDO DIAS, Jorge de. Para uma
dogmática do direito penal secundário. Um contributo para a reforma do direito penal económico e
social português. In: PODVAL, Roberto (org.). Temas de direito penal econômico. p. 45.)
78 TIEDEMANN, Klaus. Sullo stato della teoria dell’errore, com particolare riferimento al diritto
penale dell’economia e alle leggi speciali: considerazioni di diritto comparato e conclusioni. In Rivista
Trimestrale di Diritto penale dell’economia, p. 85-86. Com efeito, assim dispõe o art. 16, I, do CP português:
“O erro sobre elementos de facto ou de direito de um tipo de crime, ou sobre proibições cujo
conhecimento for razoavelmente indispensável para que o agente possa tomar consciência da ilicitude
do facto, exclui o dolo.”
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social, de modo que o conhecimento dos seus elementos não importa na consciência
de um mandamento que se descumpre.
Mas como bem observa esse autor, tal diferença entre as normas penais
incriminadoras, que ele reconhece entre as normas fundamentais e as normas
pertencentes ao âmbito disponível do ordenamento jurídico, se bem é relevante para
o tratamento do erro, não se dá de forma clara entre as que compõem o direito penal
central e o direito penal especial.79 Sobretudo, segundo Jakobs, não são disponíveis
todas as normas positivadas fora do Código Penal. Segundo ele, são tão indisponíveis
os preceitos de direito penal tributário quanto aquele proibitivo do estelionato.
Ademais, o caráter fundamental ou disponível não varia apenas conforme o
conteúdo do preceito, mas também conforme aquele que descumpre. No exemplo de
Jakobs, para os comerciantes a proibição de vender bebidas alcoólicas a crianças ou a
pessoas ostensivamente embriagadas será sempre fundamental, independentemente
da sua posição sistemática. Por essa razão, principalmente, um tratamento
diferenciado do erro não encontra justificativa na dicotomia entre direito penal
central e direito penal especial.80
Já Roxin, mesmo reconhecendo que a teoria da culpabilidade é menos
convincente quanto à sua retidão no âmbito do direito penal acessório, no qual o
conhecimento das circunstâncias fáticas determinantes do injusto na maioria das
vezes não permite a dedução da sua lesividade social, prefere a aplicabilidade ampla
da teoria da culpabilidade, por razões de política criminal. Argumenta que a
imposição de absolvição em todo caso de ignorância da norma, conforme pleiteia a
teoria do dolo, à falta de correspondente forma culposa, paralisaria os esforços por
conhecer o direito e importaria numa revogação prática de todas as normas que
ninguém conhece. Preferível é, como arremata Roxin, resolver os casos de erro de
79 JAKOBS. Derecho penal..., p. 666.
80 JAKOBS. Derecho penal..., p. 666.
283
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CONCLUSÕES
81 ROXIN. Derecho penal..., p. 865.
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REFERÊNCIAS
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BRODT, Luís Augusto Sanzo. Da consciência da ilicitude no direito penal brasileiro. Belo
Horizonte: Del Rey, 1996.
______. Fundamentos do direito penal. Trad. André Luís Callegari. São Paulo: RT,
2003. Título original: Fundamentos del derecho penal.
MAURACH, Reinhart; GÖSSELS, Karl Heinz; ZIPF, Heinz. Derecho penal: parte
general – formas de aparición del delito y las consecuencias jurídicas del hecho.
Traducción de la 7ª edición alemana por Jorge Bofill Genzsch. Buenos Aires:
Astrea/Depalma, 1995.
286
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______. Estudos de direito penal. Trad. Luis Greco. 2 ed. Rio de Janeiro: 2008.
TIEDEMANN, Klaus. Sullo stato della teoria dell`errore con particolare riferimento
al diritto penale dell economia e alle leggi speciali: considerazioni di diritto comparato
e conclusioni. Rivista Trimestrale di Diritto Penale dell`Economia. Padova, v. 8, n.1, p. 71-
88, gen./mar.
TOLEDO, Francisco de Assis. Princípios básicos de direito penal. 5 ed. São Paulo:
Saraiva, 2000.
287
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DIREITO,
AUTONOMIA PRIVADA
E PESSOA
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RESUMO
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INTRODUÇÃO
apresentam aptos para responder aos desafios desse atual desenvolvimento. Sob a
égide de princípios jurídicos voltados à maior eficácia, garantia e legitimidade em
matérias privadas, os sistemas são desconstruídos.
No contexto atual, a superação do paradigma da modernidade, na órbita
jurídica, pode ser verificada na constitucionalização dos princípios fundamentais do
Direito privado. Passaram a constar da Constituição direitos humanos individuais
antes previstos somente pelo ordenamento privado, o que provocou uma
modificação da visão do Direito Civil e do próprio Código Civil, surgindo a chamada
publicização ou socialização do Direito particular. Aí nasce o direito civil
constitucional com a missão de harmonizar o Direito Civil aos princípios da
Constituição. Eles passam a incidir sobre as relações privadas e sobre a tutela dos
seus valores fundamentais, em especial, a pessoa humana.
O Direito privado brasileiro necessita avançar em suas teorias e reforçar
paradigmas, valores sociais e éticos para alcançar a justiça diante das novas
necessidades da sociedade contemporânea, de uma pós-modernidade – mesmo em
países emergentes – surpreendentemente aprofundada e destruidora das bases,
crenças e instituições comuns4. Nesse contexto, a autonomia da vontade sede espaço
para a autonomia privada.
4Claudia Lima Marques, Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das
livre vontade dos contratantes, por isso, indiferente era, para as partes envolvidas, a
superveniência ou não de causas imprevisíveis. O contrato era lei entre as partes, de
acordo com o princípio do pacta sunt servanda.
Observou-se, por conseguinte, uma crise da concepção voluntarista e a
necessidade veemente de se limitar a autonomia da vontade com fundamentos
constitucionais. Dessa forma, nas obrigações contratuais, o fundamental é ter em
mente a possibilidade atribuída pelo ordenamento às próprias partes de “autonormar-
se7” na esfera privada, desde que respeitados os limites e garantias fundamentais.
Portanto, trata-se de uma decadência da autonomia da vontade provocada
pela modificação e evolução dos anseios sociais uma vez que a autonomia privada
melhor se adéqua à diferente realidade pós – moderna, pois conforme conclui Rubén
S. Stiglitz, “o individualismo não admite racionalmente a necessidade de que o juiz
revise o contrato, com fundamento em que este é a resultante de um acordo entre
iguais e livres e, portanto, o acordado só é passível de ser modificado pelas mesmas
partes contratantes, celebrando outro contrato8”.
Conforme esclarece Fernando Noronha, o “princípio da autonomia
privada” é expressão que tende a substituir aquela de “princípio da autonomia da
vontade”, cunhada por Gounot em 1912, para caracterizar a concepção individualista
e liberal que ao seu tempo imperava.9
Embora alguns países ainda utilizem o termo autonomia da vontade, como
a França, por exemplo, entende-se necessária a modificação da nomenclatura, por se
7 Segundo Fernando R. Martins: “Destarte, pode-se observar até por etimologia que a expressão
autonomia significa “autonormar-se”. Assim, contextualiza a autonomia privada a liberdade das
pessoas em ditar regras primarias de convivência, desde que observados os limites traçados pelo
sistema. Por isso, diz-se que a autonomia privada deve ser entendida como um poder nos limites do
direito. 7 ( Fernando R. Martins, Estado de Perigo no novo codigo civil: uma perspectiva civil
constitucional. 2007, p. 10)
8 Autonomia de la voluntad y revision del contrato, 1992, p. 17.
9 O direito dos contratos e seus princípios fundamentais: autonomia privada, boa-fé,
Direito Civil Constitucional e a transição da autonomia da vontade para a autonomia privada. Cadernos
de Direito Civil Constitucional. Coord. Renan Lotufo. Caderno n° 2, Curitiba: Juruá, 2001, p. 174.
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12 Apud NANNI, Giovanni Ettore A evolução do Direito Civil Obrigacional: a concepção do
Direito Civil Constitucional e a transição da autonomia da vontade para a autonomia privada. Cadernos
de Direito Civil Constitucional. Coord. Renan Lotufo. Caderno n° 2, Curitiba: Juruá, 2001, p. 180.
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13 Perfis do direito civil, 1997, p. 280.
14 Tendências do Direito Civil no Século XXI. Seminário Internacional de Direito Civil, 2001, p.
15.
15 Carmen Lucia Silveira Ramos et al. Repensando fundamentos do direito civil brasileiro
17 Traité de droit civil: les obligations: principes et caractères essentiels, ordre public,
consentement, objet, cause, théorie générale des nullités, 1980, p. 144. “Tradução livre da
autora.”
299
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18 Apud GOMES, Orlando. Contratos. 20 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2000, p. 32.
19 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 4 ed., São Paulo: Revista dos
Tribunais , 2002, p. 105/115.
20 O Contrato e sua Função Social, 2004, p. X.
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A noção de função social do contrato impõe por outro lado, não apenas a
relativização de sua força obrigatória (pacta sunt servanda), mas requer ainda um padrão
de comportamento para que não haja relações contratuais injustas, o que significa
que para atender sua função social o contrato deverá ser ao mesmo tempo comutativo,
justo e equilibrado, isto é, deverá ele espelhar uma relação jurídica equilibrada na qual os
direitos e deveres de cada uma das partes estejam em condições de equivalência, o
que em última instância quer dizer que em função desse caráter social, deverá o
contrato estar em harmonia com os ditames constitucionais da dignidade da pessoa
humana e da livre iniciativa para que prevaleça o bem comum.
E essa necessidade de justiça social e distributiva nas relações jurídico-
privadas, deu origem a chamada função social do contrato, tendo o novel Código Civil lhe
reservado tratamento expresso em seu art. 420, que dispõe: “A liberdade de contratar
será exercida em razão e nos limites da função social do contrato”.
A função social não mais representa um mero principio de garantia de
circulação de riquezas e sim atende ao necessário estabelecimento de relações
jurídicas obrigacionais justas e equilibradas. O contrato deve espelhar uma
conformidade aos interesses maiores da sociedade e não apenas interesses
unicamente privados. A exigência do bem comum legitima a interferência do Estado
na limitação e correção da vontade pessoal, impondo padrões de comportamento a
fim de serem evitados contratos abusivos e injustos.
Será justamente pela necessidade de se garantir o equilíbrio de direitos e
deveres entre as partes que surgirá a noção de eqüidade contratual, como um princípio
norteador na conduta dos contratantes. Como exemplo da prevalência desse
princípio pode-se citar as normas imperativas do CDC, que proíbem o uso de
qualquer cláusula abusiva, como as que garantam vantagens unilaterais ou em
exagero para o fornecedor de bens e serviços, ou aquelas que são incompatíveis com
a boa-fé e a equidade (ex vi art. 51, inciso IV do CDC).
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CONCLUSÃO
seu desenvolvimento, sendo certo que se no âmbito das relações privadas a sociedade
atual, globalizada, tende naturalmente a exclusão de muitos, haja vista a alta
competitividade que nela se impõem, terá o Direito Civil neste aspecto, como direito
dos cidadãos, a função de garantir a primazia da dignidade da pessoa humana para
que se torne possível a construção de uma sociedade livre, justa e solidária.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COSTA, Judith Martins. A boa-fé no direito privado. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2000.
PERLINGIERI, Pietro. Perfis do direito civil. Trad. Maria Cristina de Cicco. Rio
de Janeiro: Renovar, 1997.
304
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RESUMO
Minas Gerais.
3 Discente do curso de Graduação em Direito da Faculdade de Direito da Universidade de Minas
Gerais.
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SUMÁRIO
4 Nesse sentido, cf. DINIZ, Débora & AVELINO, Daniel. Cenário internacional da pesquisa em
células-tronco embrionárias. Revista de Saúde Pública [online], v. 43, n. 3, abr. 2009, p. 541-547. O
trabalho, que objetiva a construção de um panorama da regulamentação das pesquisas científicas
envolvendo células-tronco embrionárias humanas, aponta que: “a tendência da regulação internacional
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é a de autorizar a pesquisa com células-tronco embrionárias. A pesquisa é permitida em 23 países por
marco legal ou normas éticas, dentre os quais apenas um país limita a pesquisa a linhagens
embrionárias importadas. Dentro do universo da pesquisa, a República da Itália é o único país com
capacidade tecnológica equivalente à brasileira que proíbe por lei a pesquisa com células-tronco
embrionárias.”
5 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
Movimento em Prol da Vida – MOVITAE; Anis - Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero;
e a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB. Informação disponível:
http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2299631. Acesso em:
29.04.2010.
7 Esse tema foi desenvolvido no trabalho A Fundamentação Ético-Jurídica Acerca do Uso De Células-Tronco
Embrionárias em Pesquisas no Brasil, elaborado por Nara Pereira Carvalho, Aline Rose Barbosa Pereira,
Anna Cristina de Carvalho Rettore , Carolina Penna Nocchi e Laís Godoi Lopes, cujo resumo foi
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aprovado para apresentação na 62ª Reunião Anual da SBPC, que será realizada em Natal, entre os dias
25e 30 de julho.
8 STANCIOLI, Brunello. Renúncia ao Exercício de Direitos da Personalidade ou Como Alguém se
Torna o que Quiser. Belo Horizonte: Faculdade de Direito da UFMG, 2007 (Tese de Doutorado).
9 Art. 5o É permitida, para fins de pesquisa e terapia, a utilização de células-tronco embrionárias
obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro e não utilizados no respectivo
procedimento, atendidas as seguintes condições:
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I – sejam embriões inviáveis; ou
II – sejam embriões congelados há 3 (três) anos ou mais, na data da publicação desta Lei, ou que,
já congelados na data da publicação desta Lei, depois de completarem 3 (três) anos, contados a partir
da data de congelamento.
§ 1o Em qualquer caso, é necessário o consentimento dos genitores.
§ 2o Instituições de pesquisa e serviços de saúde que realizem pesquisa ou terapia com células-
tronco embrionárias humanas deverão submeter seus projetos à apreciação e aprovação dos
respectivos comitês de ética em pesquisa.
§ 3o É vedada a comercialização do material biológico a que se refere este artigo e sua prática
implica o crime tipificado no art. 15 da Lei no 9.434, de 4 de fevereiro de 1997.
309
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10 GUENIN, Louis M. The Morality of Embryo Use. Cambridge University Press, 2008
310
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“Art. 5º - É vedado:
I - qualquer procedimento de engenharia genética em organismos
vivos ou o manejo in vitro de ADN/ARN natural ou
recombinante, realizado em desacordo com as normas previstas
nesta Lei;
II - manipulação genética em células germinais humanas e em
embriões humanos;
III – clonagem humana para fins reprodutivos;
IV - produção de embriões humanos destinados a servir como
material biológico disponível;
V- intervenção em material genético humano in vivo, exceto se
aprovado pelos órgãos competentes, para fins de:
a) realização de procedimento com finalidade de diagnóstico,
prevenção e tratamento de doenças e agravos;
b) clonagem terapêutica com células pluripotentes;
VI - intervenção in vivo em material genético de animais,
excetuados os casos em que tais intervenções se constituam em
avanços significativos na pesquisa científica e no desenvolvimento
tecnológico ou em procedimentos com finalidades de diagnóstico,
prevenção e tratamento de doenças e agravos, desde que
aprovados pelos órgãos competentes;
VI - liberação ou o descarte no meio ambiente de OGM e seus
derivados em desacordo com as normas estabelecidas pela
CTNBio, pelos órgãos e entidades de registro e fiscalização e
constantes na regulamentação desta Lei;
(...)”11
311
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No próprio Parecer o relator destaca que a eleição de tal critério foi “fruto de
acordo que objetivou resguardar os interesses estratégicos e de celeridade na tramitação do projeto”12.
É curioso notar que a emenda foi acolhida pela Comissão justamente
porque o critério dos três anos, mesmo limitando o pool de células aptas a serem
utilizadas em pesquisas com fins médicos, permitiria a seleção de um número
suficiente de conjuntos celulares embrionários capazes de viabilizar o avanço dessas,
sem, contudo, embaraçar interesses estratégicos para a tramitação da matéria junto a
todos os setores envolvidos com o tema, nem retardar a aprovação da lei.
O Projeto, quando levado à análise na Comissão de Constituição, Justiça e
Cidadania, de Assuntos Econômicos e de Assuntos Sociais, não sofreu modificações
em relação ao ponto ora destacado, ganhando apenas alguns ajustes para “permitir, de
forma inequívoca, tais procedimentos e de tornar claros os termos e conceitos científicos empregados”13.
12 Parecer da Comissão de Educação, sobre o Projeto de Lei da Câmara (PLC) nº 9, de 2004 (PL nº
2.401, de 2003, na Casa de origem. RELATOR: Senador Ney Suassuna. Disponível em:
http://www.senado.gov.br/sf/atividade/Materia/detalhes.asp?p_cod_mate=65843. Acesso em:
29.04.2010.
13 Parecer Das Comissões de Constituição, Justiça e Cidadania, de Assuntos Econômicos e de
Assuntos Sociais, sobre o Projeto de Lei da Câmara (PLC) nº 9, de 2004 (PL nº 2.401, de 2003, na
Casa de origem. RELATOR: Senador Ney Suassuna. Disponível em:
http://www.senado.gov.br/sf/atividade/Materia/detalhes.asp?p_cod_mate=65843. Acesso em:
29.04.2010.
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14 Diário do Senado Federal. Quinta Feira 7, Outubro de 2004. fl. 31544. Disponível em:
Código de Ética Médica brasileiro (Resolução CFM Nº 1931/2009), que proíbe, no art. 15 do Capítulo
III, a realização de procedimento de reprodução assistida que conduza sistematicamente à produção
de embriões supranumerários. Tais embriões, portanto, os únicos que estariam, em tese, disponíveis
para pesquisas com células-tronco embrionária humana no país, só podem ser produzidos de forma
estritamente acidental.
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17O argumento de que é muito mais nobre utilizar o embrião em pesquisas do que jogá-lo no lixo
apareceu, reiteradas vezes, nos votos dos ministros do STF durante o julgamento da Ação Direta de
Constitucionalidade n. 3.510-0, como, por exemplo, no da Ministra Ellen Gracie.
316
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excedentários na fertilização in vitro. Será que a saída para esse problema seria o
congelamento dos bebês excedentários ou o seu “cultivo” para algum fim que
beneficiasse a coletividade, como a doação de órgãos, por exemplo?
Decerto que não. Nesse caso, mesmo sendo uma técnica científica que
garantisse a reprodução humana, ela não poderia ser utilizada se criasse pessoas cujo
destino fosse o armazenamento criogênico, a instrumentalização em pesquisas ou o
descarte. A criança, ao nascer, já apresenta traços fortes de pessoalidade, como a
capacidade de interação inteligente, de aprendizado, construção de alteridade, etc,
todas condições necessárias para o livre desenvolvimento da personalidade. Logo,
deve ser tratada como pessoa humana, ainda que em formação. Supor que poder-se-
ia tratar essa criança como objeto, ou coisa, seria, desse modo, um desrespeito a sua
dignidade, que veda a sua instrumentalização heterônoma. Em outras palavras, a
pessoa nunca é um meio, mas sempre um fim para si própria, na busca da sua
autorrealização.18
Conclui-se, deste modo, que, caso o embrião fosse pessoa, em nenhuma
hipótese poderia ser instrumentalizado na realização de pesquisas, ao mesmo tempo
que, caso não seja pessoa, seria aceitável, a princípio, tal utilização. Na próxima seção,
tentaremos buscar um modelo de argumentação adequado para levar em conta tais
considerações.
18 STANCIOLI. Renúncia ao Exercício…, cit. p. 114.
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relevância moral, não sendo mera coisa. Essa posição deveria, de todo modo, ser
debatida e posta às claras pelo legislador.
Outro equívoco da lei é conferir status diferenciados aos embriões tomando
como base a data em que foram congelados. Ora, tudo indica que deveriam receber o
mesmo tratamento, por não haver diferença significativa entre eles. O critério que
toma como base única e exclusivamente a data do congelamento, foi, frise-se,
adotado exclusivamente por um critério de conveniência política, sem nenhuma
consideração acerca de outras distinções que possam existir entre tipos de embriões,
mais relevantes para a questão que se coloca.
A proposta desse trabalho, expostos os problemas no tratamento dado pela
Lei de Biossegurança à questão das pesquisas que se utilizem de células-tronco
advindas de embriões humanos, é provocar o debate em outras bases. Buscam-se
critérios adequados que possibilitem fundamentar ética e juridicamente essas
pesquisas.
Um primeiro passo na busca de critérios adequados é definir quais são os
atributos do embrião humano de interesse para as pesquisas científicas que façam uso
de células-tronco embrionárias.
Obtido um conceito, parte-se do pressuposto de que só não seria possível
realizar pesquisas com esses embriões caso houvesse um motivo relevante para tanto.
Ou seja, a restrição a essas pesquisas só se justificaria caso ferissem princípio ético ou
jurídico relevante, e não o contrário. Desse modo, a pergunta a ser feita é: “Porque
não seria permitido instrumentalizar ou destruir esses embriões humanos em
pesquisas científicas?”
A resposta a essa pergunta permite, em um segundo momento, a discussão
acerca de quais atributos os embriões humanos, dentre os que se prestam à utilização
nessas pesquisas, não podem ter, conforme as objeções aventadas.
Esquematizando o modelo de argumentação proposto:
318
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21 Sobre as possibilidades terapêuticas vislumbradas através da utilização de células-tronco
embrionárias pluripotentes em pesquisas médicas, cf. HOCHEDLINGE, Conrad. As Células que
Curam. Scientific American Brasil, São Paulo, Ano 8, nº 96, p. 24-31, mai. 2010.
22 GUENIN. The Morality of..., cit., p. 4-9.
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23 GUENIN. The Morality..., cit., p. 59-60.
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24 HABERMAS, Jürgen. O futuro da Natureza Humana; A caminho da Eugenia Liberal? 2004. Sobre
essa linha de argumentação apresentada por Habermas, cf. ATLAN, Henri & BOTBOL-BAUM
Mylène. Dos Embriões aos Homens. 2009. P. 27-39.
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25 GUENIN. Morality of..., cit., p. 27.
323
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26 Conforme o art. 2º do Código Civil Brasileiro: “art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do
nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.”
324
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5. Conclusão
Em qualquer discussão ética que ganhe a esfera pública, é essencial que todos
os interessados – afetados, nesse sentido – possam ser chamados ao debate para que
a decisão a ser tomada seja, ao menos, fruto de um consenso racional possível.27
O objetivo desse trabalho foi apresentar um modelo viável para fomentar o
debate público acerca das possibilidades ético-jurídicas do uso de embriões humanos
em pesquisas científicas e, para tanto, fez-se uso do modelo de GUENIN, como um
exemplo de proposta que parte de bases racionais e argumenta de maneira
consistente, tentando lidar com o cerne do problema que se coloca.
No Brasil, ao contrário, evitou-se a todo custo – seja no processo de
elaboração de Lei de Biossegurança, seja no julgamento da sua constitucionalidade no
STF – tangenciar os pontos centrais da controvérsia.
Muito longe de ser um modelo ideal, o “epidosembryo” demonstra que o
tratamento da questão se encontra em um estágio incipiente, de maneira que, ainda,
colocar premissas racionais, pós-metafísicas, para a discussão parece já ser um grande
avanço.
27Cf. HABERMAS, Jürgen. Teoría de la acción comunicativa I: racionalidad de la acción e racionalización
social. Madrid: Taurus, 1987.
325
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6. Referências Bibliográficas
ATLAN, Henri & BOTBOL-BAUM, Mylène. Dos Embriões aos Homens. Tradução de
Leandro Neves Cardim. Aparecida: Idéias & Letras, 2009. 183 p.
328
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RESUMO
1 Mestre e Doutorando em Direito Empresarial na UFMG.
329
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1. INTRODUÇÃO
2 VILLELA, João Baptista. Por uma nova teoria dos contratos. Revista Forense. Rio de Janeiro:
p.503; PEREIRA, Caio Mário da Silva. Idéia de Boa-fé. In: Revista Forense. vol. 72, 1937, p. 25.
4 ARISTÓTELES. Retórica. Introdução de Manuel Alexandre Júnior. Tradução e notas de Manuel
Alexandre Júnior, Paulo Farmhouse Alberto e Abel do Nascimento Pena. Lisboa: Imprensa Nacional
– Casa da Moeda, 2005, p. 144.
331
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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Emilio Betti. In: Revista Brasileira de Estudos Políticos. n. 91, Belo Horizonte: Imprensa Universitária da
UFMG, Jan-Jun 2005, p. 9.
332
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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7 FARIAS, Cristiano Chaves e ROSENVALD, Nelson. Direito das Obrigações. 2ª Ed., Rio de Janeiro:
606.
335
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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11 NORONHA, Fernando. Direito das Obrigações: Fundamentos do Direito das Obrigações, Introdução
Vertragsverletzungen, mit einem Nachwort von Eike Schimidt. Bad Homburg v.d.H.:Gehlen, 1969, n. 26, p. 93
apud DA SILVA, Jorge Cesa Ferreira, A boa-fé e a violação positiva do contrato, Rio de Janeiro, Ed.
Renovar, 2002, p. 13.
336
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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Sob essa ótica, devido à sua atualidade, merece ser explicitado o dever de o
credor mitigar os próprios prejuízos, modalidade que pode ser arrolada entre os
13 NERY, Rosa Maria de Andrade. Introdução ao pensamento jurídico e à teoria geral do direito privado. São
Paulo: RT, 2008, p. 259.
14 Nesse diapasão, Judith Martins Costa ilustra a existência daqueles deveres ao apresentar o seguinte
rol: “a) os deveres de cuidado, previdência e segurança, como o dever do depositário de não apenas
guardar a coisa, mas também de bem acondicionar o objeto deixado em depósito; b) os deveres de
aviso e esclarecimento, como o do advogado, de aconselhar o seu cliente acerca das melhores
possibilidades de cada via judicial passível de escolha para satisfação de seu desideratum, o do consultor
financeiro de avisar a contraparte sobre os riscos que corre, ou o do médico, de esclarecer o paciente
sobre a relação custo/benefício do tratamento na fase pré-contratual, o do sujeito que entra em
negociações, de avisar o futuro contratante sobre os fatos que podem ter relevo na formação da
declaração negocial; c) os deveres de informação, de exponencial relevância no âmbito das relações
jurídicas de consumo, seja por expressa disposição legal (CDC, arts. 12, in fine, 14, 18, 20, 30, 31,
entre outros), seja em atenção ao mandamento da boa-fé objetiva; d) o dever de prestar contas, que
incumbe aos gestores e mandatários, em sentido amplo; e) os deveres de colaboração e cooperação,
como o de colaborar para o correto adimplemento da prestação principal, ao qual se liga, pela
negativa, o de não dificultar o pagamento por parte do devedor; f) os deveres de proteção e cuidado
com a pessoa e o patrimônio da outra parte, como, v.g., o dever do proprietário de uma sala de
espetáculos ou de um estabelecimento comercial de planejar arquitetonicamente o prédio, a fim de
diminuir o risco de acidentes; g) os deveres de omissão e de segredo, como o dever de guardar sigilo
sobre atos ou fatos dos quais se teve conhecimento em razão do contrato ou de negociações
preliminares, pagamento, por parte do devedor etc”. COSTA, Judith Martins. A boa-fé no direito privado:
sistema e tópica no processo obrigacional. São Paulo: RT, 1999, p. 439.
337
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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deveres que são classificados como “de lealdade”. É o assunto que o próximo tópico
pretende desenvolver.
Interessante notar que, hodiernamente, ganha relevo uma espécie sui generis
de dever anexo decorrente da boa-fé objetiva que tem recebido cada vez mais
prestígio da jurisprudência brasileira: o dever de o credor mitigar seu próprio prejuízo
(duty to mitigate the loss). Segundo esse padrão comportamental, reconhece-se como
dever anexo do credor a necessidade de zelar para que seus prejuízos não sejam
majorados devido à sua ação ou omissão.15
A jurisprudência estrangeira traz interessante exemplo de violação a esse
dever. De acordo com julgado expedido pela Bundesgerichthof, em 1999, uma empresa
produtora de sementes de uva havia adquirido cera especial destinada a evitar o
ressecamento das cepas e protegê-las contra os riscos de infecções. No entanto, após
as primeiras aplicações do produto, descobriu-se que a cera estava causando danos às
cepas. Contudo, a despeito da ciência de tais danos, a empresa continuou a utilizar-se
da cera.
15 “A obrigação deve ser vista como uma relação complexa, formada por um conjunto de direitos,
Pelo exemplo que ilustrou o tópico anterior, percebe-se que a “verdade” nas
relações jurídicas negociais não é aquela que deflui imediatamente dos contornos
formais apresentados pelas partes.
Ora, muito embora se verifique o inadimplemento de certas obrigações
principais, a análise perfunctória do caso sub examine nunca é o bastante para se
determinar se a conduta da parte adimplente está realmente estribada de acordo com
as máximas que podem ser extraídas da boa-fé objetiva.
Um segundo exemplo referente ao duty to mitigate the loss corrobora a
conclusão parcial oferecida no presente tópico. Diante da quebra de sociedade
empresária, é usual – e também razoável – admitir que as obrigações de execução
continuada que não se interromperem com a decretação da falência podem ser
cobradas pelo respectivo credor no rateio dos bens que compunham o patrimônio da
pessoa jurídica.
17 Idem.
340
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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Uma vez constatada a adequação dos deveres anexos para com o direito
brasileiro, trata-se agora de examinar qual seria a natureza jurídica da
responsabilidade pelo inadimplemento dos deveres anexos provenientes da boa-fé
objetiva.
Em razão do caráter intensamente controverso do assunto, cabe mencionar
a existência de duas principais correntes quanto ao tipo de responsabilidade civil
resultante da violação dos deveres anexos decorrentes da boa-fé objetiva.
19 TARTUCE, Flávio. Sentença: a boa-fé objetiva e o dever do credor de mitigar a perda (duty to
mitigate the loss), In: A outra Face do Poder Judiciário. Decisões Inovadoras e Mudanças de Paradigmas”, 2,
Del Rey, 2007, 45 e segs., p.66.
20 NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado. 4. ed., rev., ampl.
e atual. até 20 de maio de 2006. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 236; DINIZ, Maria
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Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. V. 1, 6 ed. rev. e atual. De acordo com o novo Código
Civil (Lei 10.406, de 10-1-2002), o Projeto de Lei n. 6.960/2002 e a Lei n. 11.101/2005. São Paulo:
Saraiva, 2006, p. 86. AGUIAR, Ruy Rosado (org.) I Jornada de Direito Civil. 2002, Enunciado n. 24.
BIGOLIN, Régis In AGUIAR JR, Ruy Rosado (org.) III Jornada de Direito Civil. 2005, p. 226.
21 FRADERA, Vera Maria Jacob. In AGUIAR JR, Ruy Rosado (org.) III Jornada de Direito Civil.
Brasília: CJF, 2005, p. 175. Enunciado 169 “Viola o dever de mitigar o prejuízo o locador que não
ingressa tão logo quanto possível com a competente ação de despejo em fase do inadimplemento e
com isso permite que a dívida assuma valores excessivos. Nesse caso, serão compensadas na quantia
devida as perdas e danos decorrentes do avultamento provocado pela inércia do credor. No mesmo
sentido: FRANZOLIN, Cláudio José. A responsabilidade decorrente do inadimplemento dos deveres
anexos do contrato. Scientia Iuris. Londrina, v. 13, p. 137-153, nov. 2009, p. 150.
343
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4. CONCLUSÃO
2002, p. 268.
344
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positiva do contrato”. Esta ocorre quando uma das partes – seja ela credor ou
devedor –, infringe os deveres anexos oriundos da boa-fé objetiva.
Deste modo, há opiniões no sentido da responsabilização objetiva daquele
que descumpre dever anexo, uma vez que sua conduta tipificaria abuso de direito.
Todavia, corrente diametralmente oposta entende que depende de culpa a imputação
dos danos àquele que transgride os ditames de conduta estabelecidos pelo princípio
da boa-fé objetiva.
Contudo, depois de realizada a análise das duas alternativas acima, é
necessário ponderar que a infração de deveres anexos nem sempre consubstancia
abuso de direito e, por isso, pode ensejar tanto a responsabilidade objetiva como
subjetiva. Isso dependerá da espécie de dever anexo violado, da intensidade e da
forma com que o responsável cometeu o ilícito e, principalmente, do
comportamento exigido pela relação de confiança estabelecida com a parte contrária.
Portanto, conclui-se com Cláudio Henrique Franzolin que
23 FRANZOLIN, Cláudio José. A responsabilidade decorrente do inadimplemento dos deveres
anexos do contrato. Scientia Iuris. Londrina, v. 13, p. 137-153, nov. 2009, p. 152.
345
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5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
AGUIAR, Ruy Rosado (org.) III Jornada de Direito Civil. 2002, Enunciado n. 24.
BIGOLIN, Régis In AGUIAR JR, Ruy Rosado (org.), 2005.
346
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COSTA, Judith Martins. A boa-fé no direito privado: sistema e tópica no processo obrigacional.
São Paulo: RT, 1999.
DINIZ, Maria Helena. Tratado Teórico e Prático dos Contratos. V. 1, 6. ed. rev. e
atual. De acordo com o novo Código Civil (Lei 10.406, de 10-1-2002), o Projeto de
Lei n. 6.960/2002 e a Lei n. 11.101/2005. São Paulo: Saraiva, 2006
FRADERA, Vera Maria Jacob. In AGUIAR JR, Ruy Rosado (org.) III Jornada de
Direito Civil. Brasília: CJF, 2005
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: RT,
1992.
NERY JUNIOR, Nelson e NERY, Rosa Maria de Andrade. Código Civil Comentado. 4.
ed., rev., ampl. e atual. até 20 de maio de 2006. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2006.
NERY, Rosa Maria de Andrade. Introdução ao pensamento jurídico e à teoria geral do direito
privado. São Paulo: RT, 2008.
347
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
Edições Uberlândia e Belo Horizonte
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de Direito Civil. v. I, 20. ed., Rio de Janeiro,
Forense, 2004, p.503;
_____________. Idéia de Boa-fé. In: Revista Forense. vol. 72, 1937, p. 25.
ROSENVALD, Nelson. Dignidade Humana e Boa-fé no Código Civil. São Paulo: Saraiva,
2007.
VILLELA, João Baptista. Por uma nova teoria dos contratos. Revista Forense. Rio e
Janeiro: Forense, v. 261, 1978.
348
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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RESUMO
INTRODUÇÃO
349
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totalmente infundada, pois ele quer apenas significar um novo entendimento tanto
sobre o Direito Constitucional quanto sobre o Direito Civil. A expressão, portanto,
demonstra uma nova interpretação do Direito Civil sob o olhar da Constituição, e
também a reciprocidade desse fato, isto é, o conteúdo dito “privado” sobre a Lei
Fundamental.
É importante frisar também que duas expressões que vêm unidas a esse
novo conceito são “publicização do Direito Privado” e “privatização do Direito
Público”. Apesar dessa associação, não se deve confundir as expressões. A
hierarquização da Constituição como Lei Fundamental parte de um processo distinto
dessas duas idéias, processo esse que logo mais será apresentado no trabalho.
350
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americano. Esse caso, porém, é uma exceção no momento histórico das codificações,
porém a idéia de centralização da Constituição, já vista nos EUA, será também
aderida em outros países, o que será discutido logo mais.
Com as mudanças na sociedade, a crise do Estado Liberal de Direito e a
transição deste para o chamado Estado Social de Direito, o centro do ordenamento
jurídico também sofreu alterações, passando dos códigos para a Constituição.
isso que agora sim não há proteção aos interesses de uma determinada classe social,
como ocorria, na realidade, no Estado Liberal.
Surgem então, com essa nova perspectiva, os direitos fundamentais de
segunda dimensão, que predominaram no século XX. São chamados “direitos
coletivos”, em que há preocupação com o todo, isto é, com os direitos de
determinadas classes. Há preocupação com leis trabalhistas e também tributárias,
como se pode ver, no Brasil, com a Consolidação das Leis Trabalhistas. A reforma
agrária também é uma questão que passa a ser discutida, ante essa nova demanda
social.
Ao contrário dos direitos de primeira dimensão, os chamados direitos
sociais não têm um sujeito específico; a liberdade visada não é a individual, e sim a
coletiva. Estabelece-se, a partir de então, normas específicas sobre as relações
trabalhistas na indústria e no campo, e também questões fundamentais como
educação e saúde. Esses direitos vão acabar incorporando também as constituições
dos Estados, inclusive na Constituição Brasileira de 1988.
O Estado Social de Direito, porém, também sofreu uma dura crise. Com as
melhorias e avanços na sociedade, como aumento da qualidade e também da
expectativa de vida, o Estado não conseguiu mais arcar com todas as despesas dos
cidadãos. Houve, então, mais uma mudança da concepção do Estado: atualmente,
vivencia-se o chamado “Estado Democrático de Direito”, surgindo também os
direitos de terceira dimensão.
O Estado Democrático de Direito visa contrabalancear os direitos da
primeira e segunda dimensões. Do neo-liberalismo, busca manter a liberdade
econômica adquirida, enquanto do conceito de social-democracia, esses direitos
liberais devem ter certo teor social. Essa questão relaciona-se com a Constituição
Federal de 1988, que pode ser vista em artigos da mesma, o que será enfocado logo
mais adiante.
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4. O MOVIMENTO DE DESCODIFICAÇÃO
eficácia social. Um exemplo atual disso são os chamados “Juizados Especiais”, que
demonstram a tentativa de aproximação e resolução de conflitos sem a participação
direta do Estado.
O código civil, que era visto como infalível e fonte de todas as soluções não
conseguiu comportar a idéia da nova sociedade, sociedade essa que é amplamente
diversificada. Dado esse fato, a necessidade de leis mais específicas passou a
aumentar, causando essa ruptura com a idéia de “código imbatível”.
Algo a se considerar, porém, é que não somente o Código Civil Brasileiro é
que foi influenciado pela Constituição, mas esta também recebeu diretamente idéias
do âmbito do direito privado. A Constituição, portanto, não retira a importância da
regulamentação de relações entre pessoas, bens e seus negócios jurídicos, mas pelo
contrário, ela serve para garantir a existência de tal ordenamento, consolidando-o
com a proposta de encontrar um balanço entre os direitos adquiridos com o Estado
Liberal e os direitos sociais.
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entidade familiar conhecida por “união estável”, que, pelo Código Civil Brasileiro de
1916, era considerada algo imoral e também irregular diante do ordenamento.
As idéias, portanto, que embasaram o Código Civil também acabaram por
fazer parte da Constituição Federal de 1988. Alguns dispositivos, como a família e a
propriedade, antes vistos como exclusivos do âmbito civil, passaram também a
integrar a Constituição, até como forma de garantir os direitos associados a essas
entidades.
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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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8. BIBLIOGRAFIA
Livros
COSTA, Dilvanir José da, 1932 – Sistema de Direito Civil à luz do novo Código/
Dilvanir José da Costa – Rio de Janeiro: Forense, 2005.
364
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MORAIS, José Luis Bolzan de. Do Direito social aos interesses transindividuais:
o Estado e o Direito na ordem contemporânea/ José Luis Bolzan de Morais –
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1996.
Material da Internet
Carta Magna de 1215 criou condições para liberdades e direitos civis, por Matthias
Von Hellfeld. Disponível em: http://www.dw-
world.de/dw/article/0,,4213323,00.html
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RESUMO
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
3 SILVA, Wilson de Melo da. Responsabilidade sem Culpa e Socialização do Risco. Belo Horizonte:
5SILVA, Wilson. Op. Cit. p. 239.
6COSTA, Dilvanir José da, 1932 – Sistema de direito civil à luz do novo Código. – Rio de Janeiro:
Forense, 2005, p. 36.
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indenizável e deve ser indenizado por quem a ele se liga por um nexo de causalidade,
independentemente de culpa.
Se não bastasse, diante de inúmeras situações novas vivenciadas pelos
cidadãos face a complexidade social ora formada, surge a proteção da confiança, que
é conceituada, sucintamente, como a reparação civil pela quebra das expectativas.
Observamos que a responsabilidade civil subjetiva, fincada nos três
elementos, ato ilícito, dano e relação de causalidade, evolui para a forma objetiva,
baseada somente no ato ilícito e o nexo causal e, por fim, a responsabilidade por
proteção da confiança, norteando as relações negociais entre os indivíduos, gerando
gravames de ordem contratual e extracontratual ao infrator.
7 FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Miniaurélio Século XXI: 5ª ed. ver. Ampliada. Rio de
nosso ordenamento que possam garantir à vítima a reparação pela quebra da tutela da
expectativa.
Todavia, conceituar a confiança não é trabalho de fácil apuração, vez
englobar conceito aberto e subjetivo, o que em grande parte dos casos se torna
complexo delimitar exatamente se houve a quebra da expectativa. Ademais,
comportamento das pessoas, atitudes e aspectos culturais do local estão diretamente
relacionados na forma de confiar, alterando assim o grau ou conceito de confiança de
uma localidade para outra.
Dessa forma, apesar da relevância em buscar um conceito da confiança para
poder aplicá-la às situações concretas, ao seu campo de atuação, não menos
importante é adaptá-la a realidade no qual se encontra, tanto jurídica como perante a
sociedade.
Verdade que vivemos em uma sociedade globalizada, formando relações
entre os sujeitos de forma cada vez mais impessoal, o que obviamente dificulta a
confiança que não seja baseada em cláusulas contratuais expressas e determinadas,
havendo quebra diante da desobediência do que solidamente previsto.
Entretanto, justamente a massificação social, formando sociedades cada vez
mais complexas, com maior participação de intermediários nas relações entre as
pessoas, enfim, fortalecendo os contatos sociais, apresenta-se a necessidade do
direito tutelar tais relações, valorizando certamente um dos requisitos que ali se
encontra presente, a confiança. Se anteriormente era de fácil percepção a
identificação do comprador e vendedor, hoje, com a complexidade social e
interferência de mais intermediários nas relações comerciais, a impessoalidade
negocial se tornou fator presente e atuante, o que enseja tutelar as expectativas.
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Como bem apontado por Ricardo Luiz Lorenzetti “desde distintos campos de
conhecimento, autores como Niklas Luhmann y Francis Fukuyama se vêem ocupadso pela
importância que a confiança possui em qualquer sistema social” 8.
Manuel Antônio de Castro Portugal Carneiro da Frada já cotejava a
globalização e tutela das expectativas,
“Pode até afirmar-se que, quanto maior for, por via da referida
complexidade e diferenciação, a despersonalização e o anonimato
na vida social, mais aguda se torna a acuidade da substituição do
processo informal de coordenação dos comportamentos através
da confiança pela institucionalização de regras jurídicas
“formais”9.
Esquena de uma teoria sistêmica del contrato. Editora Revista dos Tribunais. Ano 2000. p. 34.
9 FRADA, Manuel. Op. Cit. p. 18..
10 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das
relações contratuais. 4. ed. rev. atual. e ampl., incluindo mais de 1.000 decisões jurisprudenciais. São
Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. p. 979/980.
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pois, paz jurídica e confiança possuem forte conexão, trazem em seu bojo aspectos
éticos e jurídicos.
Através de modernização reflexiva, Anthony Giddens aponta a relevância
da confiança na sociedade de risco,
11 BECK, Ulrich. Modernização reflexiva: política, tradição e estética na ordem social moderna –
Ulrich Beck, Anthony Guiddens, Scott Lash; tradução de Magda Lopes. – São Paulo: Editora da
Universidade Estadual Paulista, 1997. p. 221.
12 FRADA, Manuel. Op. Cit. p. 26.
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13 FRADA, Manuel. Op. Cit. p. 76.
14 GARCIA, Leonardo de Medeiros. Direito do consumidor. 3. ed. Niterói, RJ: Impetus, 2007. p. 30.
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15GARCIA, Leonardo. Op. Cit. p. 33.
16CANARIS, Claus, Wilhelm. Pensamento sistemático e conceito de sistema na ciência do Direito. 2.
ed. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1996. p. 136
376
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17ARCE, Alicia de Leon. Derechos de los consumidores y usuários. Editora irante lo Blanch.
Valencia, 2000. p. 716.
377
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20 MARQUES, Claudia Lima. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor, Antonio Herman V.
Benjamin, Bruno Miragem. 2. ed. Ver., atual. E ampl. São Paulo: editora Revista dos Tribunais, 2006.
p. 143.
21 LISBOA, Roberto Senise. Responsabilidade civil nas relações de consumo. São Paulo: Editora
o caráter abusivo de um contrato ou de uma clausula que traduza um desequilíbrio inaceitável entre
as partes”. 22
Com reconhecida autoridade no tema envolvendo as relações de consumo,
Cláudia Lima Marques já apontava há tempos pela necessidade de atenção ao
principio da boa-fé objetiva e o princípio da confiança, “a manifestação da vontade do
consumidor é dada almejando alcançar determinados fins, determinados interesses legítimos. A ação
dos fornecedores, a publicidade, a oferta, o contrato firmado criam no consumidor expectativas,
também, legítimas de poder alcançar estes efeitos contratuais”23.
Na mesma linha da obediência da boa-fé e delimitação da confiança,
Manuel da Frada se posicionou
A boa-fé, por sua vez, será parâmetro a ser observado nas normas de
conduta, pois na relação negocial, a principio, deverá ser ponderado e respeitado a
liberdade contratual e autodeterminação do sujeito. A norma de conduta, a forma da
condução é que deverá ser cotejada com os princípios ensejadores da boa-fé para
verificar o caso concreto, sendo talvez mais fácil buscar o que é incompatível com
ela.
22 STIGLITZ, Gabriel. Defensa de los consumidores de productos y servicios – Daños – Contractos.
Ediciones la Rocca. Buenos Aires, 1994. p. 215.
23 MARQUES, Claudia. 2002. Op. Cit. p. 979.
24 FRADA, Manuel. p. 385.
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25 GARCIA, Leonardo. Op. Cit. p. 30.
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GUARDAR SIMETRIA COM O CENÁRIO FÁTICO-JURÍDICO E EQUAÇÃO FUNÇÃO
PEDAGÓGICA X ENRIQUECIMENTO INJUSTIFICADO. FIXAÇÃO DE MULTA DIÁRIA.
POSSIBILIDADE. 1- Tutela da Confiança: o mercado de consumo reclama a observância continente
e irrestrita ao dever de qualidade dos produtos e serviços nele comercializados, amparado no princípio
da confiança, que baliza e norteia as relações de consumo. Inobservado este dever de qualidade e, via
reflexa, a tutela da confiança ¿ pedra angular para o desenvolvimento do mercado ¿ a lei impõe
gravames de ordem contratual e extracontratual ao infrator. 2- Revés moral: diagnosticada a mácula no
produto adquirido, rompe-se o laço de confiança que ata consumidor e fornecedor, ensejando a
indenização por revés moral. As provas carreadas aos autos dão conta de que a parte autora passou
por situação angustiante e embaraçosa, tudo em razão do agir censurável e imprevidente da ré
ITAGIEL LTDA. ao deixar de zelar pela qualidade de seus produtos. Ora, não se pode negar que o
consumidor, ao escolher mercadoria de sua confiança no mercado, supõe estar adquirindo produto
que, a par de sua predileção pelo aspecto visual, reúne condições mínimas ao fim almejado. 3-
Quantum indenizatório: fixação de verba indenizatória no patamar de R$ 7.000,00, que se coaduna
com a observância continente à equação função pedagógica x enriquecimento injustificado, confiada à
condenação por revés moral. 4- Fixação de multa diária: é caso de fixar multa diária à ré ITAGIEL
LTDA., na hipótese de descumprimento da obrigação de fazer imposta na sentença em desfavor
desta, no valor de R$ 300,00 (trezentos reais) por dia de inadimplemento, a contar da publicação do
presente acórdão. Apelo parcialmente provido. (Apelação Cível Nº 70025933342, Quinta Câmara
Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Umberto Guaspari Sudbrack, Julgado em 15/04/2009).
Disponível em http://www1.tjrs.jus.br/busca/?tb=juris. Acessado em 18.05.2010, às 15:07 horas.
30 TJRS, Apelação Cível n.º 70025754565, publicado no Diário de Justiça em 04 de março 2009.
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e serviços nele comercializados, amparado no princípio da confiança, que baliza e norteia as relações
de consumo. Inobservado este dever de qualidade, ante a comercialização de medicamentos com
prazo de validade vencido e, via reflexa, a tutela da confiança, a lei impõe gravames de ordem
contratual e extracontratual ao infrator. 2. Responsabilidade solidária do importador e do comerciante
do medicamento: levando em conta que, `in casu¿, aplica-se o artigo 18, §6º, do CDC, respondem
pelos danos advindos do vício de qualidade do produto, de forma solidária, o importador e o
comerciante do medicamento. 3. "Quantum¿ indenizatório, a título de danos morais: na fixação do
montante indenizatório por gravames morais, deve-se buscar atender à duplicidade de fins a que a
indenização se presta, atentando para a capacidade do agente causador do dano, amoldando-se a
condenação de modo que as finalidades de reparar a vítima e punir o infrator (caráter pedagógico)
sejam atingidas. No caso em pauta, vai mantida a indenização fixada na sentença no montante
equivalente a 20 (vinte) salários mínimos. 4. Consectários legais: relativamente à condenação por
danos morais, a correção monetária incide a partir da sentença que fixou o `quantum¿ indenizatório. Já
os juros moratórios, em se tratando de relação contratual, incidem a partir da citação, nos termos do
artigo 405 do Código Civil. Apelo do réu desprovido e provido, em parte, o apelo do autor. (Apelação
Cível Nº 70022309801, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Umberto Guaspari
Sudbrack, Julgado em 30/09/2009). Disponível em http://www1.tjrs.jus.br/busca/?tb=juris.
Acessado em 18.05.2010, às 15:12 horas.
32 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça, RESP 590336/SC, Ementa: Direito do consumidor.
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4. CONCLUSÃO
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33 BECK, Ulrich. Op. Cit. p. 222.
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inseridos. O que acontece é que “a vontade das partes manifestada livremente no contrato não
é mais o único fato decisivo” 34.
O que se pugna é pela negociação transparente, ética e clara aos sujeitos
envolvidos, tendo plena ciência da realidade concreta. Há indenização pela quebra da
confiança quando este fato seja a essência da obrigação.
Assim, uma das formas de proteção da confiança se dá através da
responsabilização da confiança, garantindo à vitima a devida reparação.
Observamos que os deveres até então considerados secundários passaram a
figura de essenciais e protegidos de forma clara através do Código de Defesa do
Consumidor, como o principio da confiança,
34 MARQUES, Claudia, 2002, Op. Cit. p. 1063.
35 MARQUES, Claudia, 2002. Op. Cit. p. 1.065.
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5. REFERENCIA
BRASIL. Código Civil (2002) Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. In: ANGHER,
Anne Joyce (Org.). Vade mecum acadêmico de direito. 2.ed. São Paulo: Rideel, 2006. p.
147-293.
391
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taFinal=20%2F02%2F2010&resultPagina=10&dataAcordaoInicial=&dataAcordaoFi
nal=&pesquisar=Pesquisar.
COSTA, Dilvanir José da, 1932 – Sistema de direito civil à luz do novo Código. –
Rio de Janeiro: Forense, 2005.
392
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DIAS, José de Aguiar. Da responsabilidade civil. V.1, 4. ed., Rio de Janeiro. Forense,
1960.
DIAS, Julio Alberto. Responsabilidade Coletiva. Belo Horizonte: Del Rey, 1998.
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RESUMO
* Doutor e Mestre em Direito pela PUC-Minas. Professor de Direito Civil nos Cursos de Graduação,
Especialização, Mestrado e Doutorado em Direito da PUC-Minas. Professor de Direito Civil na
Fundação Escola Superior do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios. Advogado.
** Graduanda em Direito pela Faculdade Mineira de Direito da PUC-Minas. Monitora de Teoria Geral
1 INTRODUÇÃO
1 ARÁN, Márcia; ZAIDHAFT, Sérgio; MURTA, Daniela. Transexualidade: corpo, subjetividade e
saúde coletiva. Psicologia & Sociedade, Belo Horizonte, v. 20, n.1, p. 71, jan./abr. 2008.
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2 Existe apenas um Projeto de Lei (n. 70-B/1995) em curso no Congresso Nacional, de autoria do
Deputado José Coimbra, que visa a descaracterizar a ilicitude do ato do médico que realiza a cirurgia
de mudança de sexo. De acordo com o projeto, “não constitui crime a intervenção cirúrgica realizada
para fins de ablação de órgãos e partes do corpo humano quando, destinada a alterar o sexo de
paciente maior e capaz, tenha ela sido efetuada a pedido deste e precedida de todos os exames
necessários e de parecer unânime de junta médica.” Além disso, de acordo com a redação atual, que
incorporou as ressalvas feitas na Comissão de Constituição e Justiça, o projeto propõe a alteração da
redação do art. 58 da Lei nº 6.015/73, permitindo a mudança do prenome mediante autorização
judicial, nos casos em que o requerente tenha se submetido à intervenção cirúrgica destinada a alterar
o sexo originário, bem como a averbação no assento de nascimento do novo prenome e do sexo,
lavrando-se novo registro. (BRASIL. Projeto de Lei n. 70-B/1995. Dispõe sobre intervenções cirúrgicas que
visem à alteração de sexo e dá outras providências. Disponível em:
<http://imagem.camara.gov.br/dc_20.asp?selCodColecaoCsv=D&Datain=23/1/1999&txpagina=33
57&altura=700&largura=800>. Acesso em: 06/04/10.)
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3 PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil. Trad. Maria Cristina De Cicco. 2.ed. Rio de Janeiro:
Renovar, 2002. p.11.
4 SARLET, Ingo Wolfgang. Dignidade da Pessoa Humana e Direitos Fundamentais na Constituição Federal de
5 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CID-10: classificação estatística internacional de
doenças e problemas relacionados à saúde. Décima Revisão. Versão 2008. Volume I. Disponível em:
<http://www.datasus.gov.br/cid10/v2008/cid10.htm>. Acesso em: 06/04/10.
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6 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE. CID-10: classificação estatística internacional de
doenças e problemas relacionados à saúde. Décima Revisão. Versão 2008. Volume I. Disponível em:
<http://www.datasus.gov.br/cid10/v2008/cid10.htm>. Acesso em: 06/04/10.
7 DINIZ, Maria Helena. O estado atual do biodireito. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 229-231.
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8 Fica fácil perceber que o transexual não se confunde com o homossexual, pois este convive com o
próprio sexo e tem a certeza de pertencer a ele, por isso, não busca a cirurgia de redesignação sexual.
9 Nesse sentido: Civil. Estado individual. Imutabilidade. Cirurgia de transgenitalização. Autorização
judicial. Pedido. Impossibilidade jurídica. O art. 13, caput, do Código Civil (Lei n.º 10.406, de 10 de
janeiro de 2002) veda o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente
da integridade física ou contrariar os bons costumes, salvo por exigência médica. A exigência médica a
que se refere o dispositivo do Código Civil deve ser entendida como a necessidade imperiosa de
transformação ou de remoção de órgão do corpo, cientificamente provada, em decorrência de
patologia grave e curável, exclusivamente, por meio daqueles procedimentos interventivos extremos.
O sexo, como estado individual da pessoa, é informado pelo gênero biológico. O sexo, do qual
derivam direitos e obrigações, procede do Direito e não pode variar de sua origem natural sem
legislação própria que a acautele e discipline. Nega-se provimento ao recurso. (MINAS GERAIS.
Tribunal de Justiça. AC 1.0672.04.150614-4/001(1). Rel. Des. Almeida Melo. Data do Julgamento:
12/05/2005. Data da Publicação: 14/06/05.
401
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Deve-se salientar que tal intervenção cirúrgica está de acordo com o artigo
13 do Código Civil brasileiro, que dispõe: “Salvo por exigência médica, é defeso o ato
de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da
integridade física, ou contrariar os bons costumes.”
A operação, de maneira alguma, importa na diminuição permanente da
integridade física. Como já explicado, a cirurgia é um tratamento médico, que se
encontra regulamentado pela Resolução do CMF n. 1.652/02, pela Portaria do SUS
n. 1.707/08 e pela Portaria da Secretaria de Atenção à Saúde n. 475/08. Possui índole
corretiva, adequando o sexo psicológico ao sexo biológico, permitindo ao indivíduo
transexual desfrutar de todos os aspectos do direito à saúde e, consequentemente, de
exercer o seu direito à vida digna, à intimidade e ao próprio corpo.
A primeira regulamentação no Brasil a respeito do transexual deu-se em
1997, quando o Conselho Federal de Medicina (CFM), que, de acordo com a Lei nº
3.268/57, detém a atribuição legal de supervisionar, julgar e disciplinar a ética médica
em todo o país, aprovou a Resolução nº 1.482/97, autorizando, a título experimental,
a realização da cirurgia de transgenitalização.
Posteriormente, o CFM aprovou a Resolução n. 1.652/0210, estabelecendo
requisitos para a identificação de transexualismo, bem como para a seleção dos
pacientes para a cirurgia de transgenitalismo.
10 Para a aprovação da Resolução nº 1.652/02, o CFM considerou, entre outros aspectos: ser o
paciente transexual portador de desvio psicológico permanente de identidade sexual, com rejeição do
fenótipo e tendência à automutilação e ou auto-extermínio; que a cirurgia de transformação plástico-
reconstrutiva da genitália externa, interna e caracteres sexuais secundários não constitui crime de
mutilação previsto no artigo 129 do Código Penal, visto que tem o propósito terapêutico específico de
adequar a genitália ao sexo psíquico; a viabilidade técnica para as cirurgias de neocolpovulvoplastia e
ou neofaloplastia; o que dispõe o artigo 199 da Constituição Federal, parágrafo quarto, que trata da
remoção de órgãos, tecidos e substâncias humanas para fins de transplante, pesquisa e tratamento,
bem como o fato de que a transformação da genitália constitui a etapa mais importante no tratamento
de pacientes com transexualismo; que o artigo 42 do Código de Ética Médica veda os procedimentos
médicos proibidos em lei, e não há lei que defina a transformação terapêutica da genitália in anima
nobili como crime; que o espírito de licitude ética pretendido visa fomentar o aperfeiçoamento de
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AMARAL, Francisco. Direito Civil: introdução. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 347.
11
PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: introdução ao Direito Civil Constitucional. 2 ed. Trad.
12
violam seus direitos humanos, dentre os quais os direitos à saúde, à dignidade, a não-
discriminação, à autonomia e ao livre desenvolvimento da personalidade; que a Carta
dos Direitos dos Usuários da Saúde, instituída pela Portaria nº 675/GM, de 31 de
março de 2006, menciona, explicitamente, o direito ao atendimento humanizado e
livre de discriminação por orientação sexual e identidade de gênero a todos os
usuários do Sistema Único de Saúde (SUS); que o transexualismo trata-se de um
desejo de viver e ser aceito na condição de pessoa do sexo oposto, que em geral vem
acompanhado de um mal-estar ou de sentimento de inadaptação por referência a seu
próprio sexo anatômico, situações estas que devem ser abordadas dentro da
integralidade da atenção à saúde preconizada e a ser prestada pelo SUS; que já existe
uma Resolução do Conselho Federal de Medicina, que dispõe sobre a cirurgia do
transgenitalismo; e que falta regulamentação dos procedimentos de transgenitalização
no SUS; instituiu, por meio da Portaria nº 1.707/08, o Processo Transexualizador, no
âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS).13
Logo em seguida foi publicada a Portaria nº 457, de 19 de agosto de 2008,
da Secretaria de Atenção à Saúde definindo as Diretrizes Nacionais para o Processo
Transexualizador no Sistema Único de Saúde – SUS.14
A cirurgia de transgenitalização nada mais é do que a materialização do
direito à saúde aos transexuais, que deve ser garantido pelo Estado, utilizando de
todos os meios possíveis para viabilizar a saúde do indivíduo.
13 BRASIL. Portaria n. 1.707, de 18 de agosto de 2008, do Ministério da Saúde. Institui, no âmbito do
Sistema Único de Saúde (SUS), o Processo Transexualizador, a ser implantado nas unidades federadas,
respeitadas as competências das três esferas de gestão. Disponível em: <
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2008/prt1707_18_08_2008.html>. Acesso em:
06/04/10.
14 BRASIL. Portaria n. 457, de 19 de agosto de 2008, da Secretaria de Atenção à Saúde. Define as
Diretrizes Nacionais para o Processo Transexualizador no Sistema Único de Saúde - SUS, a serem
implantadas em todas as unidades federadas, respeitadas as competências das três esferas de gestão.
Disponível em
http://cnes.datasus.gov.br/Portarias%5CPORTARIA%20N%C2%B0%20457%20de%2019%20de%
20Agosto%20de%202008.pdf. Acesso em: 06/04/10.
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Edições Uberlândia e Belo Horizonte
15 VASCONCELOS, Pedro Pais de. Teoria geral do direito civil. 5 ed. Coimbra: Almedina, 2008. p. 94.
16 AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 238.
17 AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 239.
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preservem em relação a isso, e para que a própria pessoa seja preservada. Trata-se de
uma limitação da esfera de ação jurídica dos sujeitos que, como conhecida por todos,
serve a permitir que as relações se deem atentas a tanto. “O estado civil é, assim, uma
18
situação subjetiva absoluta (válida erga omnes)” , razão pela qual há de ser
seguramente tornado público a fim de que seja incontestável e, nesta medida,
oponível, preservando-se a segurança jurídica.
O estado civil lato sensu da pessoa natural subdivide-se em estado individual
(idade, capacidade e sexo), estado familiar (casado(a), solteiro(a), divorciado(a),
separado(a) judicialmente, viúvo(a), pai, mãe, filho(a), irmão(ã), sogro(a), enteado(a),
cunhado(a) etc) e estado político ( nacional ou estrangeiro).
Na amplitude característica do estado civil, encontra-se o estado sexual que,
como a própria terminologia adianta, compreende a posição da pessoa relativamente
ao sexo masculino e ao sexo feminino.
Logo após o nascimento, mediante o simples exame da genitália externa,
toda criança é registrada civilmente e enquadrada em um dos dois estados ligados à
sexualidade: masculino ou feminino. Esse estado sexual irá conferir à pessoa um
novo grupo de posições jurídicas, de direitos e deveres.
Na maioria das vezes esse critério é suficiente. Porém, em alguns casos, o
simples exame da genitália externa pode não determinar adequadamente a identidade
sexual de uma pessoa.
É que a genitalidade (sexo morfológico) é apenas um dos aspectos da
sexualidade. A sexualidade humana possui conceito mais amplo e pode ser
classificada em três grandes grupos: sexo biológico, sexo psíquico ou psicossocial e
sexo civil, legal ou jurídico.
18 AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução. 5. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003. p. 238.
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19 SZANIAWSKY, Elimar. Limites e possibilidades do direito de redesignação do estado sexual. São Paulo:
registro civil do transexual operado. In: FIUZA, César; SÁ, Maria de Fátima Freire de Sá; NAVES,
Bruno Torquato de Oliveira (Coord.) Direito civil: atualidades IV – teoria e prática no direito privado.
Belo Horizonte : Del Rey, 2010. p. 114.
21 SZANIAWSKY, Elimar. Limites e possibilidades do direito de redesignação do estado sexual. São Paulo:
Cabe ao Direito encontrar uma solução para garantir a dignidade humana desta
minoria marginalizada considerada anormal, através da hermenêutica contemporânea,
da principiologia do ordenamento jurídico, dos direitos humanos e fundamentais e
dos direitos da personalidade.
Há muito tempo a sexualidade humana deixou de ser definida apenas pelo
sexo biológico, e passou a envolver aspectos históricos, culturais e psíquicos. A
sexualidade é, antes de tudo, não apenas o ato sexual ou a genitalidade, mas também
a forma de o indivíduo agir, pensar e interagir no meio social em que vive. É, em
suma, a forma pela qual o sujeito expressa a sua individualidade e, por isso,
“devemos entender a sexualidade em seu sentido mais amplo e profundo para não
reduzi-la à genitalidade, o que seria um empobrecimento das relações humanas”.22
Como bem colocam Maria de Fátima Freire de Sá e Bruno Torquato de
Oliveira Naves, o conjunto desses aspectos configura o status sexual, a partir do qual
se visualiza o direito à identificação sexual, que se insere no campo dos direitos da
personalidade.23
Por todo o exposto, parece lícito concluir que, embora o conceito de status
sexual tenha se transformado, em função das várias formas de manifestação da
sexualidade que lhe impuseram um novo significado, ele ainda não teve sua disciplina
jurídica adaptada. A existência de descompassos entre a organização proposta pelo
sistema jurídico e o universo fático que se pretende organizar é flagrante. E, com
isso, também ficam evidentes as violações ao paradigma, eleito constitucionalmente,
de proteção à pessoa humana e de instauração de um Estado Democrático de
Direito.
22 PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Direito, amor e sexualidade. In: PEREIRA, Rodrigo Cunha. A
Família na travessia do milênio. Belo Horizonte: Del Rey, 2002. p. 54.
23 SÁ, Maria de Fátima Freire de; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira. Manual de Biodireito. Belo
24 GALUPPO, Marcelo Campos. Igualdade e diferença: o estado democrático de direito a partir do
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2000, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra. Coimbra: Coimbra Editora, 1999. p. 157.
28 PINTO, Paulo Mota. O direito ao livre desenvolvimento da personalidade. In: Portugal-Brasil Ano
2000, Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra. Coimbra: Coimbra Editora, 1999. p. 152 e 158.
29 ALMEIDA, Renata Barbosa de; RODRIGUES JÚNIOR, Walsir Edson. Direito Civil: Famílias. Rio
de nascimento, pois toda pessoa que vive em sociedade tem a necessidade de ser
identificada corretamente como sujeito pertencente ao sexo masculino ou feminino.
Trata-se de um direito à identificação sexual. Segundo Elimar Szaniawski,
30 SZANIAWSKY, Elimar. Direitos de personalidade e sua tutela. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2005. p. 167.
31 VENTURA. Miriam. Transexualidade: algumas reflexões jurídicas sobre a autonomia corporal e
autodeterminação da identidade sexual. In: RIOS, Roger Raupp (Org.) Em defesa dos direitos sexuais.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 142.
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saber, “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade
ou quaisquer formas de discriminação” (CF, 1988, artigo 3°, III).
Dessa forma, esse princípio é um importante instrumental para a efetivação
dos direitos constitucionais, servindo, para o tema em análise, de justificativa para a
proteção jurídica do transexual.
Negar a alteração de prenome e de estado sexual ao redesignado
sexualmente é submetê-lo a tratamento desumano, condenando-o e discriminando-o
por ser portador do transexualismo. Visivelmente, isso não está de acordo com o
princípio da dignidade da pessoa humana e com o paradigma de Estado Democrático
de Direito.
A incorporação dos direitos da personalidade nos ordenamentos jurídicos
mundiais é resultado do desenvolvimento da concepção de que há direitos inerentes
à própria essência humana, que não possuem conteúdo patrimonial direto, mas que
são merecedores de proteção da ordem jurídica como uma expressão do ideal de
justiça. Assim, os direitos da personalidade integram os direitos fundamentais e
humanos, como direitos essenciais para a pessoa humana, sem os quais o indivíduo
não pode desenvolver todas as suas potencialidades.
A sexualidade é um dos componentes da personalidade humana. “A
sexualidade é elemento inerente à vida e, como tal, pertencerá aos direitos da
personalidade. A sexualidade humana deve estar contida no sentido de personalidade,
sob pena de extrairmos dela, personalidade, elemento essencial e vital.”32
Quanto ao nome, elemento designativo do indivíduo e fator de sua
identificação na sociedade, integrante da personalidade do indivíduo, em relação ao
transexual, deve estar adequado à sua condição, pois é através dele que a sociedade
identificará o sujeito.
32 ARAÚJO, Luiz Alberto David. A proteção constitucional do transexual. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 15.
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33 SÁ, Maria de Fátima Freire de; NAVES, Bruno Torquato de Oliveira. Manual de Biodireito. Belo
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5.1 Casamento
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36 VILLELA, João Baptista. As novas relações da família. In: Anais da XV Conferência Nacional da OAB
em Foz do Iguaçu. São Paulo: JBA Comunicações, 1995. p. 642.
37 FACHIN, Luiz Edson. Direito de família: elementos críticos à luz do novo Código Civil brasileiro.
38SAMPAIO, José Adércio Leite. Direito à intimidade e à vida privada: uma visão jurídica da sexualidade,
da família, da comunicação e informações pessoais, da vida e da morte. Belo Horizonte: Del Rey,
1998. p. 324.
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5.2 Filiação
39 TEPEDINO, Gustavo. A disciplina civil-constitucional das relações familiares. In: TEPEDINO,
Gustavo. Temas de Direito Civil. 2.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p. 352.
40 Para essa mudança, Paulo Luiz Netto Lôbo utiliza a expressão “repersonalização”. (LÔBO, Paulo
Luiz Netto. A repersonalização das famílias. Revista Brasileira de Direito de Família, Porto Alegre, v. 6, n.
24, p. 151, jun.-jul. 2004.)
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41 LÔBO, Paulo Luiz Netto. Entidades familiares constitucionalizadas: para além do numerus clausus.
In: Anais do III Congresso Brasileiro de Direito de Família. Belo Horizonte: IBDFAM/Del Rey, 2002. p. 96-
98. PEREIRA, Sumaya Saady Morhy. Direitos e deveres nas relações familiares – uma abordagem a
partir da eficácia direta dos direitos fundamentais. In: PEREIRA, Tânia da Silva; PEREIRA, Rodrigo
da Cunha. A ética da convivência familiar e sua efetividade no cotidiano dos tribunais. Rio de Janeiro: Forense,
2006. p. 520-521.
42 LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias Monoparentais: a situação jurídica de pais e mães solteiros, de
pais e mães separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2003. p. 17.
43 Nota: no presente estudo foi adotado como conceito de direito subjetivo o interesse juridicamente
protegido. Para estudar melhor esse ponto indica-se PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil:
introdução ao Direito Civil Constitucional. 2 ed. Trad. Maria Cristina De Cicco. Rio de Janeiro:
Renovar, 2002.
428
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6 CONCLUSÃO
9, n. 2, p. 57-70, 2001.
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430
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nome e sexo no registro civil do transexual operado. In: FIUZA, César; SÁ, Maria de
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atualidades IV – teoria e prática no direito privado. Belo Horizonte : Del Rey, 2010.
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dos Tribunais, 2005.
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VASCONCELOS, Pedro Pais de. Teoria geral do direito civil. 5 ed. Coimbra: Almedina,
2008.
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RESUMO
1. Introdução
437
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2 BRASIL. Lei no. 11.105, de 24 de março de 2005. Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do art. 225 da Constituição Federal, estabelece normas de
segurança e mecanismos de fiscalização de atividades que envolvam organismos geneticamente modificados – OGM e seus derivados, cria o Conselho
Nacional de Biossegurança – CNBS, reestrutura a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio, dispõe sobre a Política Nacional de
Biossegurança – PNB, revoga a Lei no 8.974, de 5 de janeiro de 1995, e a Medida Provisória no 2.191-9, de 23 de agosto de 2001, e os arts. 5o, 6o, 7o, 8o, 9o,
células-tronco embrionárias, nos termos da referida lei, não violam o direito à vida ou
a dignidade da pessoa humana.
Inicialmente, pretende-se apresentar uma análise da relação entre direitos
fundamentais e democracia, apresentando as concepções que vislumbram
complementaridade e tensão entre esses institutos. Em seguida, será demonstrada a
proposta de autocontrole judicial referente ao tratamento de situações envolvendo
desacordos morais razoáveis.
Posteriormente, será empreendido o exame da problemática através do caso
concreto da utilização de células-tronco embrionárias, analisando-se ainda o
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3510 realizado pelo Supremo
Tribunal Federal. Por fim, será apresentada a perspectiva teórica de defesa do
controle constitucional apresentada por Rodrigo Umpimny, envolvendo os vários
aspectos discutidos no presente trabalho.
Ressalte-se, por derradeiro, que não se tem aqui qualquer intenção de
resolver em poucas páginas esses questionamentos que há muito vêm sendo
debatidos no âmbito do Direito Constitucional e da Teoria do Estado. Dentro de um
recorte limitado, o que se procura nesse espaço é levantar algumas proposições e
questionamentos que possam contribuir com o cenário do debate atual acerca dos
problemas apresentados.
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3 DIMOULIS, Dimitri. Estado Nacional, Democracia e Direitos Fundamentais – conflitos e aporias.
In: CLÈVE, Clèmerson Merlin et al (coords). Direitos Humanos e Democracia. Rio de Janeiro:
Forense, 2007, p. 30.
4 Nesse sentido: TAVARES, André Ramos et al. Direitos Fundamentais e Democracia:
440
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8 BARBOZA, Estefânia Maria de Queiroz. Jurisdição Constitucional: entre constitucionalismo e
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443
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18 WALDRON, Jeremy. A dignidade da legislação. São Paulo: Martins Fontes, 2003, p. 8.
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19 LACADENA, Juan Ramón. Experimentação com embriões: o dilema ético dos embriões
excedentes, os embriões somáticos e os embriões partenogenéticos. In: MARTÍNEZ, Julio Luis (org.).
Células-tronco humanas: aspectos científicos, éticos e jurídicos. São Paulo: Loyola, 2005, p. 66.
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20 LACADENA, Juan Ramón. Experimentação com embriões: o dilema ético dos embriões
excedentes, os embriões somáticos e os embriões partenogenéticos. In: MARTÍNEZ, Julio Luis (org.).
Células-tronco humanas: aspectos científicos, éticos e jurídicos. São Paulo: Loyola, 2005, p. 66.
21 JOSÉ, Lluís Montoliu. Células-tronco humanas: aspectos científicos. In: MARTÍNEZ, Julio Luis
(org.). Células-tronco humanas: aspectos científicos, éticos e jurídicos. São Paulo: Loyola, 2005, p.
29.
22 BARROSO, Luís Roberto. Em defesa da vida digna: constitucionalidade e legitimidade das
pesquisas com células-tronco embrionárias. In: SARMENTO, Daniel; PIOVESAN, Flávia. Nos
limites da vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 245.
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23 BARROSO, Luís Roberto. Em defesa da vida digna: constitucionalidade e legitimidade das
pesquisas com células-tronco embrionárias. In: SARMENTO, Daniel; PIOVESAN, Flávia. Nos
limites da vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, p. 244, 2007.
24 Esse é o número previsto na Resolução 1358/92 do Conselho Federal de Medicina brasileiro, mas
ele é variável nos diferentes países. In PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Christian de Paul.
Problemas atuais de Bioética. São Paulo: Loyola, 1991, p. 222.
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25 PRANKE, Patricia. A importância de discutir o uso de células-tronco embrionárias para fins
terapêuticos. Ciência e Cultura, São Paulo, vol. 56, n. 3, jul/Set. 2004, p. 35.
26 Nesse sentido: LACADENA, Juan Ramón. Ob. cit., p. 68.
27 Não há, até o momento atual, uma estimativa precisa com relação ao número de embriões
criopreservados, todavia, de acordo com profissionais da área ouvidos pela Agência Brasil, durante o
período de tramitação da Ação direta de Inconstitucionalidade 3510, estimava-se estar esse número
em torno de dez mil embriões. Em: THIESEN, Adriane; SPAREMBERGER, Raquel Fabiana Lopes.
Bioconstituição e Identidade Genética na concepção dos direitos humanos. Revista Jurídica
Consulex, Brasília, n. 269, 31 mar. 2008, p. 31.
28 BRASIL. Lei no. 11.105, de 24 de março de 2005. Regulamenta os incisos II, IV e V do § 1o do art.
Diário Oficial da União, Brasília-DF, 28 mar. 2005. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2005/Lei/L11105.htm>. Acesso em: 15
ago. 2008.
29 O texto foi encaminhado, em 09.06.2004, à Comissão de Educação do Senado, passando a tramitar
em conjunto com o PLS 188/99 e com o PLS 422/99. Nessa Comissão, foi anexado o ofício do
Ministro da Ciência e Tecnologia, encaminhando manifestação da Comissão Técnica Nacional de
Biossegurança – CTNBio – e as demais manifestações sobre o projeto. Em 10.08.2004, foi aprovado
parecer no mesmo sentido do substitutivo oferecido pelo relator, Senador Osmar Dias, incorporando
a emenda de autoria dos Senadores Tasso Jereissati e Lúcia Vânia, re-inserindo, no projeto, a
permissão para pesquisas com células-tronco. Depois de encaminhado à Comissão de Assuntos
Econômicos do Senado, o projeto foi aprovado em 14.09.2004. Foram então realizadas sessões
conjuntas da Comissão de Assuntos Econômicos, da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, e
da Comissão de Assuntos Sociais, figurando o Senador Ney Suassuna como relator do projeto. In
BARROSO, Luís Roberto. Em defesa da vida digna: constitucionalidade e legitimidade das pesquisas
com células-tronco embrionárias. In: SARMENTO, Daniel; PIOVESAN, Flávia. Nos limites da
vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2007, p. 256.
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votação, o projeto de lei foi aprovado com 85% de votos favoráveis, em 04.03.2004.
Finalmente, em 14.10.2004, o projeto foi sancionado pelo Presidente, com a
conversão na Lei nº 11.105/2005.30
É importante mencionar que a revogada lei n.º 8.974/95 proibia
completamente a manipulação genética de células germinais humanas, restringindo
quaisquer pesquisas nesse âmbito. A Lei nº 11.105/05 inovou, ao tratar da questão da
seguinte forma, em seu artigo 5º:
30 BARROSO, Luís Roberto. Em defesa da vida digna: constitucionalidade e legitimidade das
pesquisas com células-tronco embrionárias. In: SARMENTO, Daniel; PIOVESAN, Flávia. Nos
limites da vida: aborto, clonagem humana e eutanásia sob a perspectiva dos direitos humanos. Rio de
Janeiro: Lumen Juris, 2007, p. 241-242.
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452
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31BRASIL, STF – ADI 3510. Rel. Min. Carlos Ayres Britto. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso
em: 30.05.2008, p. 11.
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A partir daí, são analisados em seu voto os demais pontos que envolvem a
questão – os quais não constitui objetivo aprofundá-los aqui –, com destaque para o
32 Idem, p. 5-9.
33 Idem, p. 19 (grifos da autora).
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34 Votaram acompanhando o relator da matéria, os ministros Ellen Gracie, Cármen Lúcia Antunes
Rocha, Joaquim Barbosa, Marco Aurélio e Celso de Mello. Os ministros Cezar Peluso e Gilmar
Mendes também votaram pela constitucionalidade da lei, mas com a ressalva da necessidade de uma
rigorosa fiscalização das pesquisas por um órgão central – a Comissão Nacional de Ética em Pesquisa
– ponto não foi acolhido pela Corte Constitucional. Os ministros Carlos Alberto Menezes Direito,
Ricardo Lewandowski e Eros Grau votaram pela procedência, em parte, da ADI 3510, sem retirar
parte do texto, mas firmando várias ressalvas para a liberação das pesquisas com células-tronco
embrionárias.
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35BRASIL, STF – ADI 3510. Rel. Min. Carlos Ayres Britto. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso
em: 30.05.2008, p. 2 (grifos da autora).
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“supostamente correta para todos”, indo, de fato, bem além dos limites estritamente
jurídicos. 36
Mesmo nesse contexto, Gilmar Mendes destaca o importante papel que as
Cortes Constitucionais têm exercido – e mais especificamente o Supremo Tribunal
Federal – quando chamadas a decidir sobre os direitos protegidos pela Constituição
dentro dessas controvérsias, sem implicar, em sua ótica, abalos institucionais e
democráticos. E vai além, afirmando que “certamente, a alternativa da atitude passiva
de self restraint (...) teriam sido mais prejudiciais ou menos benéficas para a nossa
democracia. O Supremo Tribunal Federal demonstra, com este julgamento, que
pode, sim, ser uma Casa do povo, tal qual o parlamento”.37
Gilmar Mendes, ao fim de suas considerações, afirma ser inequívoca a
legitimidade democrática da decisão que se fazia tomar pelo Supremo Tribunal
Federal, em sede do julgamento da ADI 3510.
36 BRASIL, STF – ADI 3510. Rel. Min. Carlos Ayres Britto. Disponível em: <www.stf.jus.br>. Acesso
em: 30.05.2008, p. 2.
37 Idem, p. 3.
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38 UPRIMNY, Rodrigo. Legitimidad y Conveniencia Del Control Constitucional a la Economia. In:
SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Jurisdição e Direitos Fundamentais, vol. I, tomo II. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2006, p. 325.
39 UPRIMNY, Rodrigo. Legitimidad y Conveniencia Del Control Constitucional a la Economia. In:
SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Jurisdição e Direitos Fundamentais, vol. I, tomo II. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2006, p. 326.
40 Idem, p. 327.
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43 DWORKIN, Ronald. Taking Rights Seriously. 18 ed. Cambridge: Harvard University, 2001.
44 UPRIMNY, Rodrigo. Op. cit., p. 330.
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6. Considerações Finais
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45UPRIMNY, Rodrigo. Legitimidad y Conveniencia Del Control Constitucional a la Economia. In:
SARLET, Ingo Wolfgang (org.). Jurisdição e Direitos Fundamentais, vol. I, tomo II. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2006, p. 330.
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46CRUZ, Álvaro Ricardo de Souza. Jurisdição Constitucional Democrática. Belo Horizonte: Del
Rey, 2004, p. 20.
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ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008.
BRASIL, STF – ADI 3510. Rel. Min. Carlos Ayres Britto. Disponível em:
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DWORKIN, Ronald. Uma questão de princípio. São Paulo: Martins Fontes, 2000.
ELY, John Hart. Democracy and Distrust. Cambridge: Harvard University Press,
2002.
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RESUMO
1 Mestranda em Direito na Universidade Federal de Minas Gerais, integrante do grupo Persona,
coordenado pelo Professor Doutor Brunello Stancioli.
2 Mestranda em Direito na Universidade Federal de Minas Gerais, integrante do grupo Persona,
I) Introdução
3 O objetivo das pesquisas nesse campo é conseguir, através da reprogramação de uma célula adulta,
que esta se comporte como uma célula-tronco embrionária, da maneira mais eficiente possível.
Entretanto, ainda não há resultados concretos nesse sentido, a ponto de se afirmar que substituirão as
células-tronco embrionárias.
4 KUNISATO, Atsushi; WAKATSUKI, Mariko; KODAMA, Yuuki; SHINBA, Haruna; ISHIDA,
Isao; NAGAO, Kenji. Generation of Induced Pluripotent Stem Cells by Efficient Reprogramming of Adult Bone
Marrow Cells. In: STEM CELLS AND DEVELOPMENT. Vol. 19, no. 2, 2010. p. 229-237. p. 229.
Disponível em: http://www.liebertonline.com/doi/pdf/10.1089/scd.2009.0149 acesso em 03 de
maio de 2010.
5 KUNISATO, Atsushi; WAKATSUKI, Mariko; KODAMA, Yuuki; SHINBA, Haruna; ISHIDA,
CRYSTAL, Ronald G. Human Embryonic Stem Cells and Gene Therapy. In: THE AMERICAN SOCIETY
OF GENE THERAPY REVIEW. Vol. 15, no. 5, mai 2007. p. 850-866. p. 850.
7EHNERT, Sabrina; GLANEMANN, Matthias; SCHMITT, Andreas; VOGT, Stephan; SHANNY,
Naama; NUSSLER, Natascha C.; STÖCKLE, Ulrich; NUSSLER, Andreas. The possible use of stem cells
in regenerative medicine: dream or reality? In: LANGENBECK'S ARCHIVES OF SURGERY. Vol. 394,
no. 6 / Nov. 2009. p. p. 985-997. p. 988. Disponível em:
http://www.springerlink.com/content/w6q0h1vt205741u3/fulltext.html acesso em 17 abr 2010.
8STRULOVICI, Yael; LEOPOL, Philip L.; O’CONNOR, Timothy P.; PERGOLIZZI, Robert G.;
CRYSTAL, Ronald G. Human Embryonic Stem Cells and Gene Therapy. In: THE AMERICAN SOCIETY
OF GENE THERAPY REVIEW. Vol. 15, no. 5, mai 2007. p. p. 850-866. p. 850
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9 Conectas Direitos Humanos; Centro de Direitos Humanos – CDH; Movimento Em Prol da Vida –
MOVITAE; Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero – ANIS, e Confederação Nacional dos
Bispos do Brasil – CNBB.
10 Não se teve acesso aos votos dos ministros Menezes Direito, Joaquim Barbosa e Celso de Mello.
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Sustentou-se na petição inicial que a vida humana acontece na, e a partir da,
fecundação. Desde esse momento, portanto, ter-se-ia a tutela constitucional da vida e
o embrião, ser humano na fase inicial, mereceria proteção do Estado, no sentido de
proibir sua manipulação.11 Em outras palavras, a partir da fecundação existiria um ser
humano completo e, portanto, já se teria uma pessoa titular de direitos na ordem
jurídica (vez que seria inconcebível, para essa doutrina, a existência de um ser
humano que não fosse pessoa).
A idéia tem por base a teoria concepcionista, de matriz ideológica
fortemente cristã, em que se acredita que a concepção seria o momento em que alma
e corpo se unem. A tese, "admitid[a] por São Jerônimo, segundo o qual cada alma é
criada por Deus no momento da concepção da criança e imediatamente infundida no
embrião”, se firmou ao longo do período medieval.12
Destaca-se que essa nem sempre foi a teoria adotada pela Igreja Católica
sobre o início da vida. Tomás de Aquino, seguindo as idéias de Aristóteles, defendia a
animação sucessiva e gradual do embrião.13 Primeiramente, ele obteria uma alma
vegetativa, no momento da fecundação, depois uma alma sensitiva, e apenas após o
40º dia da concepção, para o embrião masculino, e o 90º dia, para o feminino, ele
obteria uma alma racional, tornando-se, a partir daí, pessoa. De acordo com esse
raciocínio, no Corpus Iuris Canonici já constava, desde o séc. XII, que o aborto antes da
infusão do espírito não era homicídio.14
11 BRASIL, Supremo Tribunal Federal. ADI 3510-0 DF. Petição Inicial. Procurador-Geral da
República Cláudio Fonteles.
12 BASCHET, Jérôme. A Civilização Feudal: Do Ano 1000 à Colonização da América. Trad. Marcelo Rede.
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15 KRESS, Hartmut. Ética... cit.
16 As outras grandes religiões não corroboram a concepção católica. O Islamismo, o Judaísmo e
algumas religiões do extremo Oriente, permitem as pesquisas com células-tronco embrionárias, por
não considerarem que ai já exista uma pessoa. KRESS, Hartmut. Ética... cit.
17 POVOLEDO, Elisabetta e GOODSTEIN, Laurie. Vaticano Estabelece diretrizes bioéticas em novo
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19 MELLO, Luiz Eugênio. O STF deve proibir as pesquisas com células-tronco embrionárias? NÃO. Entre
células e pessoas: a vida humana. Folha de São Paulo, 01 de março de 2008.
20 A favor da Pesquisa. Ao reconhecer a validade da Lei de Biossegurança, STF impediu que uma ética privada, a
religiosa, fosse imposta a todos. Editorial da Folha de São Paulo, 30 de maio de 2008.
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apenas mais uma condição da pessoalidade, não garantindo, por si só, a existência
desta. E não se restringe à individualidade genética – ao contrário, abrange a
construção do ser em interação com o meio que o circunda.
No embrião, ou pré-embrião, como vem sendo chamado em suas primeiras
fases, não é possível vislumbrar essa característica, pensada, até o momento, como
inerente à pessoa: a individualidade determinada. Por certo não há ainda nenhuma
forma de interação inteligente. E não se pode falar sequer em individualidade
genética, uma vez que cada célula, se retirada, poderá dar origem a outro embrião,
com o mesmo genótipo. É o que acontece com os gêmeos univitelinos, caso que
evidencia que o pré-embrião não é ainda um indivíduo pleno nem mesmo do ponto
de vista genético, mas um conjunto indefinido de células. Com base nesse fenômeno
(da formação de dois embriões a partir de um único zigoto), alguns teólogos católicos
chegaram a afirmar que a infusão da alma deveria ocorrer apenas depois do fim da
divisibilidade, portanto após o 14º dia21.
Nesse sentido, manifesta-se Norman Ford, que concluiu em seu livro When
Did I Begin? que:
21KRESS, Hartmut. Ética... cit. P. 207.
22FORD, Normam. apud WARNOCK, Baronesa. A Ética Reprodutiva e o Conceito Filosófico do Pré-
Embrião. In Bioética: Poder e Injustiça. GARRAFA, Volnei e PESSINI, Leo. (Orgs.) São Paulo: Loyola,
2004. P. 160.
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A partir do que foi dito até agora, propõe-se que o ponto central da questão
não deva ser o início da vida, mas o início da personalidade. Em primeiro lugar,
porque com o conhecimento científico existente é impossível delimitar o momento
exato em que a vida teria início. Em segundo lugar, porque mesmo que o embrião
seja vivo isso não é suficiente para justificar sua proteção, pois a vida só é um valor
com vistas à pessoa, centro e fim de todo o ordenamento jurídico. Viver é apenas um
entre os requisitos da pessoalidade. Deve-se destacar, ademais, que a vida no pré-
embrião é tão precária que ele pode ser congelado por anos – estado em que não
possui vida, entendida esta como um processo – e depois descongelado, o que jamais
poderia ser feito com uma pessoa. Destarte, o foco deve estar no conceito de pessoa,
que é convencional e pode ser construído por meio de argumentos racionais.
Alguns afirmam, ainda, que os embriões devem ser protegidos por serem
pessoas em potencial. Todavia, aqueles utilizados para a retirada de células-tronco
não seriam usados para a reprodução, ou seja, essa não era uma alternativa válida
para eles, já que os doadores dos gametas vedaram o seu uso para fins reprodutivos
e, apenas a eles (aos progenitores), cabe decidir se um embrião poderá ou não ser
transferido para o útero da mãe ou de terceiros (ou para um “útero artificial”).
Nesse ponto, convém ressaltar que há autores contrários à fertilização in
vitro e outros contrários à criação de embriões excedentes nesses procedimentos.
Todavia, neste trabalho, parte-se do pressuposto de que ambas as práticas são lícitas
e éticas, tendo em vista o direito constitucional ao planejamento familiar (Art.226,
§7º), e o fato de que produzir apenas embriões que serão implantados e, se falharem,
repetir o procedimento, geraria enormes sacrifícios para a mãe (como novos exames,
injeção de hormônios, cirurgia para extração dos óvulos, o que pode gerar
477
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hemorragias, traumas nos ovários, câncer...), e ela pode não estar disposta a enfrentá-
los.23
Assim, uma vez produzidos embriões excedente, não é razoável que se
imponha aos progenitores o dever de iniciar uma gravidez ou de suportar uma
paternidade biológica remota compulsória,24 o que se verificaria caso eles não
pudessem decidir acerca da destinação dos embriões excedentes, sendo obrigados a
doá-los para fins reprodutivos.25
O dever de transferência intrauterina – que acarretaria aos genitores de um
embrião extracorpóreo o dever de transferi-lo para a mãe biológica ou permitir sua
implantação em qualquer outra mulher – não se sustenta, do ponto de vista moral,
quer com base no dever de resgate, quer com base no dever de não interferência.
Conforme o primeiro, se um agente encontra uma pessoa em perigo de dano
considerável, tem o dever de tentar salvá-la se e na medida em que possa fazê-lo sem
que isso lhe imponha riscos ou ônus desarrazoados.26.
Em outras palavras, o dever de resgate comanda que se tome uma atitude
ante a um perigo de dano grave. Tendo em vista que o dano consiste na lesão de
interesses, os quais se originam de vontades e desejos, um embrião não pode sofrer
dano ao lhe ser negado o uso para reprodução, uma vez que, não tendo a capacidade
de querer ou desejar, não tem interesses.27 Mas ainda que se suponha que um pré-
23 MELO-MARTÌN, Inmaculada de. On our obligation to select the best children. A reply to Savulescu.
embrião que será implantado em outra pessoa, caso em que serão pais biológicos, mas não conviverão
com seu filho.
25 O raciocínio completo que será, em linhas gerais, descrito nos parágrafos seguintes é
detalhadamente desenvolvido em GUENIN, Louis M. The Morality of Embryo Use. New York:
Cambridge University Press, 2008, cap. 2, onde se encontram muitos outros argumentos para
sustentar o direito dos progenitores de decidirem acerca do destino a ser dado a um embrião
produzido fora do corpo.
26 GUENIN, Louis M. The Morality… cit. p. 33
27 GUENIN, Louis M. The Morality… cit. p. 34
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embrião possa sofrer dano (tenha interesses), não se pode perder de vista que se
soma ao dever moral ora discutido a condição de que o resgate não imponha ao
agente ônus desarrazoados.
A paternidade é um compromisso que se estende por décadas, uma
incumbência que extrapola consideravelmente “uma reação célere a um perigo
evitável rapidamente”28 – o resgate. “O que é razoável esperar que as pessoas façam –
este é o padrão estabelecido no que tange ao ônus como condição do dever de
resgate.” 29 O ônus de criar uma criança é evidente, e a paternidade remota
compulsória impõe aos pais biológicos “ansiedade e remorso por não saber como a
criança está sendo criada, não ter notícias do bem estar da criança ao longo do
tempo, não querer confundi-la inserindo-se em sua vida, e talvez não querer que a
criança os reconheça como pais.”30 Portanto, colocar um embrião extracorpóreo
dentro do corpo de uma mulher vai além do auxílio imposto pelo dever de resgate.
Tampouco se sustenta a transferência intrauterina compulsória no dever de
não-interferência, já que, no caso do embrião resultante de fertilização in vitro, não
interferir é justamente deixar que ele pereça.
Em suma, a potencialidade de se tornar pessoa não é uma variável
independente da situação em que se insere o embrião gerado fora do corpo, pelo
contrário, só pode ser pensada em função desse contexto. E, entre as condicionantes
que podem afetar o potencial desenvolvimento deste embrião, tem-se um ato
discricionário dos genitores – a transferência intra-uterina – sem o qual ele perecerá
por volta do décimo dia após a fecundação.31 Admitida a legitimidade desse ato
discricionário, uma vez que os genitores tenham decidido proibir o uso de seus
embriões na reprodução, não há que se falar em pessoas em potencial.
28 GUENIN, Louis M. The Morality ... cit. p. 36, tradução livre.
29 GUENIN, Louis M. The Morality… cit. p. 38, tradução livre.
30 GUENIN, Louis M. The Morality… cit. p. 37, tradução livre.
31 GUENIN, Louis M. The Morality… cit. p. 30
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Afirmam Persson e Savulescu que nos embriões que não serão implantados
inexiste potencial realizável. A potencialidade se referiria ao estado interno do ser
(genes, proteínas, estruturas internas aptas ao desenvolvimento); ao passo que o
conceito de "realizável" envolveria o estado externo (as condições biológicas e sociais
extrínsecas apropriadas para que ele desenvolva sua potencialidade). Assim, um
embrião na placa petri não tem potencial realizável, diferentemente de um embrião no
útero, que o possui. Dessa forma, seria possível utilizar aqueles embriões para
pesquisa, porque eles não possuem nenhum potencial de se tornarem pessoas (uma
vez que os doadores de gametas decidiram por sua não utilização para fins
reprodutivos).32
Além disso, é sabido que tanto na reprodução natural quanto na artificial,
vários embriões morrem. Na reprodução natural, estima-se que para cada gravidez
bem sucedida que resulta em um nascimento com vida, até cinco embriões perecem
nas fases iniciais, são abortados ou sequer chegam a se fixar no útero. Isso leva
alguns autores a afirmar que o sacrifício de embriões é inerente à procriação, até
mesmo nos processos naturais.33 Se eles fossem detentores do direito a uma vida
digna, chegar-se-ia ao absurdo de considerar errada a reprodução natural, em que há
altas taxas de perda de embriões. Persson e Savulecu sistematizam esse pensamento
da seguinte forma:
Bringing Embryos into Existence for Different Purposes, or Not at All. Cambridge Quarterly of Healthcare
Ethics. 19(1), Jan 2010.
33 SAVULESCU, J. (2004) Embryo Research: Are there any lessons from Natural Reproducion?. Cambridge
Dessa forma, não obstante haja algumas vantagens no uso das células-
tronco adultas, como a ausência de problemas de incompatibilidade,
Não seria possível terminar esta seção sem mencionar um dos argumentos
mais comuns para aqueles que se opõe às pesquisas com embriões: a afirmação de
que esta atitude pode, no futuro, permitir outras ingerências na dignidade humana.
Seria dizer que, uma vez abertas as comportas, abusos poderiam acontecer. Trata-se,
na verdade, de uma falácia, conhecida como slippery slope, em que se chega a
conclusões (omitindo uma ou mais premissas) cuja verdade é meramente sugerida
pelo conteúdo das premissas fornecidas, mas não se segue necessariamente delas.
Usa-se esse raciocínio quando se quer evidenciar possíveis consequências nefastas de
determinado fato.37
Esse pensamento não é correto porque é bem possível que, conforme o
caso, paralisem-se as ações em determinado ponto, e não se avance mais. Não há
como provar que de um ato irão decorrer necessariamente as conseqüências que se
alegam. Além disso, no tema aqui analisado, não se tratando de pessoa o embrião,
fica ainda mais distante a ligação entre as pesquisas com células-tronco embrionárias
e uma possível ingerência na dignidade humana.
36KRESS, Hartmut. Ética... cit. P. 184-186.
37COLIVA, Annalisa, e LALUMERA, Elisabetta. Pensare: Leggi ed errori Del ragionamento. Roma:
Carocci, 2006, p. 110.
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42 DWORKIN, Ronald. Domínio da Vida. São Paulo: Martins Fontes, 2003. p.p. 23-24.
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43 LENT, Roberto. Quando começa e quando termina a vida? In: CIÊNCIA HOJE ON-LINE, disponível
em: http://cienciahoje.uol.com.br/118247 acesso em 18 de maio de 2009.
44 Tais limites são: uso apenas para fins de pesquisa e tratamento; só embriões produzidos
45JÚNIOR, José Gonçalves Franco. In. COLLUCCI, Cláudia. Embrião congelado por 8 anos produz bebê.
Folha de São Paulo, 09 de março de 2008.
46 ABORTAR in DICIONÁRIO ELETRÔNICO HOUAISS DA LÍNGUA PORTUGUESA, versão
1.0, 2003.
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V) Conclusão
47 BITENCOURT, Cezar Roberto.Tratado de Direito Penal: parte especial, vol. 2. 5. ed. rev. e atual. São
racionais, ou seja, em que não se aceitem dogmas e em que se ponham em jogo todas
as pré-compreensões de um Mundo da Vida irrefletido. Nesse contexto, para
determinar o início da pessoalidade e, portanto, da tutela do ordenamento jurídico,
deve-se valer de observações empíricas (biologia) e da problematização de idéias
apriorísticas, como alma – que, de resto, não é objeto da Ciência ou da Filosofia
desde a Modernidade – as quais, se não se mostrarem consistentes, devem ser
abandonadas.
Ressalta-se que a dimensão social e interativa deve ser levada em conta
como momento fundante da pessoalidade: só se pode conceber a pessoa em um
contexto sócio-interativo, em que autonomia e alteridade são co-originárias.48
Embora não seja preciso o momento a partir do qual o embrião apresenta
interação inteligente no útero materno, pode-se afirmar com segurança que esta
inexiste antes da formação de um sistema nervoso, mesmo que rudimentar – donde a
impossibilidade de se falar na existência de uma pessoa nas fases embrionárias mais
incipientes, quando os embriões podem ser usados em pesquisas.
Dessa forma, como no embrião não há individualidade e nem sinal de
sistema nervoso, inexistindo qualquer forma de interação inteligente, não se trata de
pessoa segundo um conceito pós-metafísico. Assim, as pesquisas com células-tronco
embrionárias não encontram óbice algum. Essa é a fundamentação racional e
condizente com um Estado Democrático de Direito plural e secular, que
infelizmente ficou ausente do julgamento da ADI.
Os argumentos apresentados na oportunidade careceram de cientificidade
em muitos pontos e não abordaram o cerne da questão, que seria exatamente a
elaboração de um conceito pós-metafísico de pessoa humana. Trabalhos nesse
48 Segundo Brunello Stancioli, a pessoa se fundamenta em três eixos básicos, quais sejam a autonomia,
alteridade e dignidade, além de valores que ela escolhe para sua vida, sem prescindir de uma base
sensível que medeie a interação entre os demais eixos – o corpo. STANCIOLI, Brunello. Renúncia... cit.
489
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DWORKIN, Ronald. Domínio da Vida. Trad. Jefferson Luiz Camargo. São Paulo:
Martins Fontes, 2003.
NUSSLER, Andreas. The possible use of stem cells in regenerative medicine: dream
or reality? In: Langenbeck's Archives of Surgery. Vol. 394, no. 6 / Nov. 2009. p. p. 985-
997. p. 988. Disponível em:
http://www.springerlink.com/content/w6q0h1vt205741u3/fulltext.html acesso em
17 abr 2010.
GUENIN, Louis M. Morality of Embryo Use. New York: Cambridge University Press,
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KRESS, Hartmut. Ética Médica. Trad. Hedda Malina. São Paulo: Loyola, 2008.
MELO-MARTÌN, Inmaculada de. On our obligation to select the best children. A reply to
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SAVULESCU, J. (2004) Embryo Research: Are there any lessons from Natural Reproducion?.
Cambridge Quarterly of Healthcare Ethics. 13(1);22-5 (Summer).
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PROTEÇÃO DA PESSOA:
DIREITOS DA PERSONALIDADE OU LIBERDADES JURÍDICAS?
RESUMO
1 Doutorando pela UFMG, edgardmarx@gmail.com.
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SUMÁRIO
495
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2 Enquadramentos e aproximações
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3 Relação jurídica
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4 Elementos
5 Atributos
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Referências bibliográficas
BERTI, Silma Mendes. Direito à Própria Imagem. Belo Horizonte: Del Rey, 1993.
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Horizonte: Francisco Alves, 1955.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador:
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Coimbra: Coimbra Editora, 2001.
COSTA JR., Paulo José da. O Direito de estar só: Tutela penal da intimidade. 4. ed. rev.
e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
508
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MORAES, Walter. Direito ao corpo. Revista do Instituto dos Advogados de Minas Gerais.
Belo Horizonte, n. 2 (nova fase), 1996.
MORAES, Walter. Direito à própria imagem (I). Revista dos Tribunais. São Paulo, a.
61, v. 443, set. 1972.
509
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RESUMO
∗
Mestranda em Direito Público pela Faculdade de Direito da Universidade Federal de Uberlândia.
Bolsista pela CAPES.
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INTRODUÇÃO
sendo que, de todos esses, apenas três juízes efetivamente responderam às perguntas,
que tratavam de temas como: Termo de Consentimento Informado, atuação de não-
especialista em cirurgia plástica, devolução de honorários, dentre outras questões.
Foram analisadas as “Condições Gerais de Seguro de Responsabilidade Civil
Profissional”, para profissionais da saúde, de uma seguradora que também respondeu
um questionário sobre dúvidas levantadas acerca desse produto.
RESULTADOS
cirurgia plástica foi citado em 4% das fundamentações dos julgados. Novamente esse
último dado conflita com aqueles apurados pelo Conselho Regional de Medicina do
Estado de São Paulo:
Não foram encontrados casos que fizessem menção ao fato do médico ser
segurado ou não de Seguro de Responsabilidade Civil Profissional.
Com relação às respostas dos magistrados, todas foram bastante completas
e esclarecedoras. Infelizmente a limitação de espaço não permite reproduzi-las na
íntegra. De qualquer forma, todos foram unânimes em afirmar que a
responsabilidade do cirurgião plástico é de resultado, nos casos de cirurgia
considerada estética. Quando perguntados se o médico, para realizar cirurgias
plásticas, dever ser especialista e membro da Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica
– SBCP, divergiram: dois deles afirmaram que a imperícia está ligada à tarefa
desenvolvida pelo profissional e deve ser apurada em cada caso, sendo desejável a
especialização; outra resposta foi no sentido de que o médico que realiza
procedimentos puramente estéticos deve ter especialidade comprovada e ser membro
da SBCP.
Sobre a possibilidade de o médico gravar as consultas sem consentimento do
paciente foram unânimes em condenar essa prática, recomendando o uso do Termo
de Consentimento por escrito, sendo certo que cláusula que afirma que o médico não
garante resultados será considerada nula.
1No tocante à devolução de honorários, dois juízes afirmaram que há, nesse
caso, presunção de “culpa” ou de reconhecimento de mau resultado. Foram
questionados se o uso de programas de computador que simulam resultados compele
ao médico obter o resultado simulado. Dois dos magistrados responderam que sim e
outro juiz mostrou-se mais flexível, sendo que todos alertaram que seu uso pode ser
legítimo, caso fique claro que o objetivo não é induzir o paciente a operar, e sim
ajudá-lo na compreensão da cirurgia.
Foram perguntados se existe a possibilidade de aumento de número de
demandas, de aumento de condenações e de valores de condenações para o médico
que possui Seguro de Responsabilidade Civil, todos responderam negativamente. Por
514
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fim, afirmaram que seria muito útil a aproximação do Poder Judiciário das
Instituições Médicas, fato que facilitaria o trabalho dos juízes.
No questionário respondido pela Seguradora de Responsabilidade Civil, foi
esclarecido que a denunciação à lide é obrigatória, ou seja, o segurado deve fazer com
que a Seguradora figure no pólo passivo, juntamente com o médico. Se o Segurado
não fizer a denunciação à lide, futuramente a Seguradora poderia ser isentada de
pagar a indenização por descumprimento do art. 70, III, do Código de Processo
Civil: “Art. 70 – A denunciação da lide é obrigatória: III – àquele que estiver obrigado, pela lei
ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda”.
A Seguradora respondeu que não admite cláusula aditiva ao contrato
permitindo o uso de programas de computador que simulem resultados de pós-
operatórios. No tocante aos acordos judiciais e extrajudiciais, somente poderão ser
realizados mediante autorização da seguradora.
DISCUSSÃO
516
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registrar o fato no prontuário e enviar carta registrada (AR) ao paciente. Não deixar
de registrar fotos pré e pós-operatórias das várias etapas cirúrgicas, o que pode
auxiliar, inclusive, a manter os pacientes conscientes da melhora (FERREIRA, 2004,
p. 39-40).
Impressiona o dado relativo à quantidade de processos em que houve a
influência de outro médico, ou seja, o paciente buscou parecer de terceiro sobre a
cirurgia realizada. Percebe-se que, na maioria das vezes, dessa opinião surge o
interesse do paciente em processar seu cirurgião. Recomenda-se ao médico que
receber paciente operado por colega, que analise a questão com muita
responsabilidade. Já o cirurgião que operou um paciente, e este posteriormente vem
afirmando que consultou outro profissional, o qual lhe disse, por exemplo, que a
técnica utilizada na cirurgia é ultrapassada, solicite ao paciente que volte no dito
profissional e peça um relatório por escrito e carimbado das afirmações e/ou
diagnósticos dados ao paciente. Objetiva-se provar as falsas informações.
Quanto ao uso de programas simuladores de resultados, recomenda-se
muita cautela em seu uso, para não haver um dever de resultado “reforçado”, tanto
no caso de cirurgias consideradas estéticas, quanto nas cirurgias consideradas
reparadoras.
No tocante ao Seguro de Responsabilidade Civil, o trabalho não apurou
dados concretos que o contra-indiquem. Todavia, ressalta os posicionamentos do
Conselho Federal de Medicina e demais instituições (ASSOCIAÇÃO MÉDICA
BRASILEIRA, 2003) e é contrário ao posicionamento de autores que o defendem
(GOMES, 2000, p. 158-161 e VIEIRA, 2001. p.158), tendo em vista que o seguro
não impede que o médico seja processado.
Entende-se que é possível esta análise: tendo em vista que o juiz, para fins
de condenação, analisa a capacidade contributiva das partes (CAHALI, 2005. p. 44), e
a seguradora, deve figurar no pólo passivo do processo, vislumbra-se, então, a
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CONCLUSÃO
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CAHALI, Y. S. Dano Moral. 3. ed. rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2005.
521
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KFOURI NETO, M. Culpa Médica e o Ônus da Prova. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002.
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RESUMO
1 Graduanda em Direito na Universidade Federal de Minas Gerais, integrante do grupo Persona,
coordenado pelo Professor Doutor Brunello Stancioli.
2 Mestranda em Direito na Universidade Federal de Minas Gerais, integrante do grupo Persona,
I) Introdução
“Não desejo morrer, mas também não quero viver em um corpo que não
sinto como meu.”
Corine3
3Wannabe personagem do documentário Complete Obssession, produzido pela BBC.
4MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de Direito Civil 1. Parte Geral. 42ª Ed. São Paulo: Saraiva,
2009. p. 104.
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8LÔBO, Paulo. Direito... cit. p. 148.
9BASCHET, Jérôme. A Civilização Feudal: Do Ano 1000 à Colonização da América. Trad. Marcelo Rede.
São Paulo: Globo, 2006. p. 409-445.
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II) Transexualismo
10 ARAN. M.; ZAIDHAFT, S.; MURTA, D. Transexualidade: corpo, subjetividade e saúde coletiva. In:
11 A identidade de gênero abrange o sentido psicosocialmente definido de pertencer a um sexo ou
outro - homem ou mulher na dicotomia tradicional. Por sua vez, a orientação sexual figura como a
tendência erótica e afetiva a se relacionar com pessoas do mesmo sexo, do sexo oposto ou de ambos
os sexos. Ressalva-se que não há pesquisas para averiguar que tipo de correlação existe entre opção
sexual e identidade de gênero. (CARDOSO, Luiz Fernando. Inversões do papel de gênero: “Drag Queens,
Travestismo e Transexualismo. In: Psicologia: Reflexão e Crítica, Vol. 18, No. 3, 2005) Todos esses padrões
tendem a ser relativizados, na medida em que, na Modernidade, os papéis sexuais e de gênero são cada
vez mais uma composição livremente escolhida pelo indivíduo. (GIDDENS, Anthony. A
Transformação da Intimidade – Sexualidade, Amor e Erotismo nas Sociedades Modernas. 2ª ed. São Paulo: Ed.
Unesp , 2000.)
12 CASTEL, Pierre-Henri. Algumas reflexões para estabelecer a cronologia do “fenômeno transexual” (1910-
1995). In: Revista Brasileira de História. Vol. 21, No. 41, 2001, p. 77.
13 A primeira cirurgia de transgenitalização moderna que ganhou notoriedade foi realizada Christian
14Disponível em: http://www.portalmedico.org.br/resolucoes/cfm/2002/1652_2002.htm Acesso em
30 de maio de 2010.
15Disponível em: http://apps.who.int/classifications/apps/icd/icd10online/ Acesso em 30 de maio
de 2010.
530
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16 WILLIAMS, Bernard. Problems of the self. New York: Cambridge University Press, 1999.
17 Nesse sentido, avanços importantes começam a despontar: a França em fevereiro de 2010 tornou-se
o primeiro país do mundo a retirar o transexualismo de sua lista de transtornos psiquiátricos, após
grande pressão dos movimentos transgênero. Disponível em:
http://www.lemonde.fr/societe/article/2010/02/12/le-transsexualisme-n-est-plus-une-maladie-
mentale-en-france_1305090_3224.html Acesso em 30 de maio de 2010.
18 CASTEL, Pierre-Henri. Algumas reflexões... cit
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III) Wannabe
19 Personagem do documentário Complete Obsession produzido pela BBC.
20 Existe um documentário da BBC intitulado Complete Obsession, e outro produzido por M. Gilbert,
USA, 2003, chamado Whole.
21 BAYNE, Tim e LEVY, Neil. Amputees By Choice: Body Integrity Identity Disorder and the Ethics of
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O termo Body Integrity Identity Disorder foi criado em 2005, pelo psiquiatra
Michael First, da Universidade de Columbia em Nova York. Todavia, a primeira
menção a um caso que pode ser enquadrado como BIID data de 1785, quando um
homem pediu a um cirurgião que amputasse sua perna, sem necessidade médica, e
ficou satisfeito com o resultado.23
O desejo de amputação, conforme atestado numa pesquisa com 52 wannabes
realizada pelo psiquiatra Michael First, advém da expectativa de que a cirurgia irá
corrigir a incompatibilidade entre a anatomia da pessoa e o senso que ela tem de si
mesma, a sua identidade, seu verdadeiro self.
Através dos estudos já feitos, como a pesquisa de First, sabe-se que os
wannabes são lúcidos, não são delirantes. Apesar de absolutamente capazes e de
levarem uma vida comum, possuem o sentimento de incompletude e deficiência em
um corpo capaz e, ao contrário, de completude e capacidade após a amputação.
Além disso, mantém uma idéia fixa na retirada do membro indesejado, o que os
levam a desenvolver planos de auto-lesão, e a imitarem em público ou em privado, o
estado debilitado do amputado que gostariam de ser (por exemplo, começam a andar
de cadeira de rodas ou muletas).24
Para a maioria, esses sentimentos emergem na infância ou na adolescência.
Lilly25, uma wannabe francesa, relata que, quando criança, brincava de ser amputada e,
nesse mundo, sentia-se normal, completa. Por muitos anos ela manteve esse desejo
escondido, mas seu marido afirma que já notava sinais “estranhos” no
comportamento dela. A esposa tinha atitudes aparentemente sem sentido, como
enfaixar as pernas quando não havia ninguém por perto. Lilly, que já tentou amputar
23 Disponível em: http://biid-info.org/When_was_BIID_invented%3F. Acesso em 30 de maio de
2010.
24 Disponível em: http://biid-info.org/What_are_the_symptoms_of_BIID%3F Acesso em 30 de
maio de 2010.
25 Pseudônimo.
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sozinha as pernas por duas vezes, afirma: “Não nasci no corpo correto. Minha mente
não se conecta ao meu corpo como um todo.”26
A noção de imagem corporal da pesquisa de First se aproxima da auto-
imagem de pessoas que querem fazer cirurgias plásticas, por exemplo, para aumentar
os seios. A pessoa sabe que tem seios pequenos, mas idealiza seu corpo com seios
maiores. Ela não se sente confortável com seu próprio corpo.27 Da mesma forma, o
wannabe sabe que tem o membro, mas não se sente confortável com ele e idealiza
outro corpo.
Em 1997, o cirurgião escocês Robert Smith atendeu um paciente que queria
amputar a perna esquerda por achar que ela não fazia parte do seu corpo. Após
consultar psiquiatras, o médico fez a cirurgia, e algum tempo depois o paciente disse
que se sentia muito melhor. O caso foi divulgado na mídia e outras pessoas
apareceram pleiteando a amputação. Todavia, o hospital aconselhou que o médico
não fizesse mais cirurgias semelhantes e hoje nenhum hospital realiza esse tipo de
procedimento.28
Entretanto, essa recusa em realizar a cirurgia não tem o poder de dissuadir
os wannabes a procurarem a amputação por seus meios. Karl29, professor de química,
após fazer todos os cálculos termodinâmicos e de massa dos tecidos humanos,
colocou suas pernas em um compartimento com gelo, mantendo-as ali por seis
horas. Depois, dirigiu calmamente seu carro adaptado com controles manuais até
uma central de emergência. Em poucos dias sua perna começou a escurecer com o
26 Disponível em: http://abcnews.go.com/Primetime/Health/story?id=1806125&page=2 Acesso em
30 de maio de 2010.
27 BAYNE, Tim e LEVY, Neil. Amputees By… cit.
28 BAYNE, Tim e LEVY, Neil. Amputees By… cit.
29 Pseudônimo
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Edições Uberlândia e Belo Horizonte
30Disponível em: http://abcnews.go.com/Primetime/Health/story?id=1806125&page=2 Acesso em
30 de maio de 2010.
31 BAYNE, Tim e LEVY, Neil. Amputees By… cit
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Edições Uberlândia e Belo Horizonte
32 BAYNE, Tim e LEVY, Neil. Amputees By… cit
33 BAYNE, Tim e LEVY, Neil. Amputees By… cit
34 BAYNE, Tim e LEVY, Neil. Amputees By… cit
35 BAYNE, Tim e LEVY, Neil. Amputees By… cit
536
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
Edições Uberlândia e Belo Horizonte
36BAYNE, Tim e LEVY, Neil. Amputees By… cit
37KANT, Immanuel. Resposta à Pergunta: Que é o Iluminismo? Trad. Alexandre Morão. In: MORÃO,
Alexandre (Org.). A Paz Perpétua e Outros Opúsculos. Lisboa: Edições 70, 1995.
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obstante ser a mais aceita é apenas uma hipótese), e embora a crença sobre o
membro possa ter chegado à irracionalidade, se a deliberação sobre o que deve ser
feito com essa crença é racional, ela deve ser respeitada, como forma de adequação
da realidade corpórea ao (re)fazer da identidade.
IV) Conclusão
38 STANCIOLI, Brunello. Renúncia ao exercício de direitos da personalidade ou como alguém se torna o que quiser.
2007. Tese (Doutorado em Direito) – Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais,
Belo Horizonte, 2007
39 STANCIOLI, Brunello. Renúncia... cit.
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V) Referências Bibliográficas
BAYNE, Tim e LEVY, Neil. Amputees By Choice: Body Integrity Identity Disorder and the
Ethics of Amputation. In. Journal of Applied Philosophy, Vol. 22, No. 1, 2005.
42 STANCIOLI, Brunello. Renúncia ... cit. p. 107
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une-maladie-mentale-en-france_1305090_3224.html
http://biid-info.org/When_was_BIID_invented%3F
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http://transabled.org/
http://www.ampulove.org/wannabe/BIID-documentarys/biiddocs.htm
542
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DIREITO, CONTRATOS
INTERNACIONAIS,
GESTÃO EMPRESARIAL E
REGULAÇÃO ECONÔMICA
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RESUMO
INTRODUÇÃO
3 RIBEIRO, Márcia Carla Pereira, GALESKI Junior, Irineu. Teoria Geral dos Contratos: contratos
4 MERCADO PACHECO, Pedro. El analisis Econômico del Derecho. Madrid: Centro de Estúdios
5 MARTINS, Arthur Villamil. O Empresário e a eficiência econômica: uma abordagem interdisciplinar do direito
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor;
VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento
diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e
serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação
dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
VIII - busca do pleno emprego;
IX - tratamento favorecido para as empresas brasileiras de capital
nacional de pequeno porte.
IX - tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte
constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e
administração no País. (Redação dada pela Emenda Constitucional
nº 6, de 1995)
Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de
qualquer atividade econômica, independentemente de autorização
de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.8
8BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Diário Oficial da União, 5 de outubro de
1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>.
Consulta em 20.05.2010.
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9MARTINS. Op. Cit., p.18.
10POSNER, Richard. El análisis econômico del Derecho. 4.ed. México, DF: Fondo de Cultura Econômica,
2000, p. 32. In MARTINS. Op. cit., p. 18.
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11 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, Diário Oficial da União, 5 de outubro
de 1988. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituiçao.htm>.
Consulta em 20.05.2010.
12 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2003. In DI
PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21.ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 78-79.
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13 DI PIETRO. Op. cit., p. 79.
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mais justa (justiça no sentido de eficiência, como define Posner) e maximiza riquezas.
Atende, assim, aos ditames da Ordem Econômica Constitucional, prevista no Título
VII da Constituição da República Federativa do Brasil, equalizando os direitos
fundamentais do cidadão e o exercício da atividade econômica pelos agentes do
mercado.
para o público, seja para o privado. Para o ente público representa a participação em
investimentos em setores estratégicos, v.g. energia e transportes, que na maior parte
das vezes não tem condições de assumir sozinho projetos de grande monta, mas que
são essenciais para prover a estruturação do desenvolvimento de todo o país. A
Administração Pública brasileira, com suas imensas obrigações de prover o bem estar
social, ranço do Estado do Bem Estar Social, na educação, saúde, habitação,
saneamento básico, não tem plenas condições de destinar recursos volumosos aos
diversos investimentos necessários ao desenvolvimento da economia e da sociedade
brasileira.
Nesse sentido, a associação ao ente privado figura como uma alternativa à
falta de recursos disponíveis para, por exemplo, custear a infraestrutura do projeto e
a própria mão de obra que atuará naquele empreendimento. Ademais, a estrutura
societária da iniciativa privada, em geral, é mais enxuta e mais ágil, o que facilita
sobremaneira a condução do negócio, no sentido de otimizar recursos e trabalho
para alcançar os objetivos finais de forma mais rápida e eficiente.
Assim, essa simbiose se mostra extremamente benéfica para ambas as
partes, pois passam a ter maior condição de finalizar o empreendimento mais
rapidamente e com maior eficiência, diminuindo custos tanto para a própria
sociedade entre o público e o particular, mas também para toda a sociedade.
Enumerar todas as razões pelas quais a iniciativa privada deseja a
participação da Administração Pública como parceira em seus negócios é uma tarefa
árdua, e poderíamos estender o presente artigo demasiadamente, assim como os
benefícios extraídos pela Administração Pública dessa parceria.
É evidente que não só de benefícios se constitui a participação de um ente
da Administração Pública nos grandes projetos. O regramento excessivo para a
concessão de crédito e garantias gera entraves importantes para o financiamento dos
grandes projetos, tendo em vista as restrições impostas pela Lei de Responsabilidade
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Fiscal (Lei Complementar 101/2000, artigo 40, §6º e §7º, I) e pela Resolução
2.827/2001 do Banco Central do Brasil (Regras de contingenciamento de crédito ao
setor público).
Verifica-se, da análise desses regramentos, uma excessiva rigidez quanto à
concessão de garantias pelas entidades da Administração Pública, especialmente para
os entes da Administração Indireta, impossibilitados de receber financiamentos
bancários quando não figurarem como majoritários no projeto, bem como a
impossibilidade das empresas estatais em concederem garantias às suas coligadas.
Isso se deve a uma mentalidade desenvolvida entre as décadas de 1970 e
1980, nas quais verificou-se um abuso exacerbado da estrutura estatal para beneficiar
terceiros, estranhos ao interesse público, resultando na concessão de garantias e
estabelecimento de negócios.
Assim, as legislações elaboradas a partir de meados da década de 1980
(especialmente 1986, com a edição do Decreto 2.300/1986, uma espécie de embrião
da Lei de Licitações – Lei 8.666/1993) refletiram a insegurança sentida em épocas
anteriores através de uma excessiva regulação da Administração Pública, em especial
das empresas estatais, na celebração de contratos, aquisições, contratação de
funcionários, formação de parcerias com o particular, com a edição de leis rígidas e
complexas para a atuação estrita da Administração dentro dos limites da legalidade,
atendendo aos princípios constitucionais contidos no artigo 37 da Constituição da
República Federativa do Brasil.
Entretanto, a mesma Constituição que prevê a limitação para atuação da
Administração Pública, também prevê a atuação da Administração em atividades
econômicas, através das entidades da Administração Indireta – as sociedades de
economia mista e as empresas públicas, em regime de Direito Privado, às quais deve
ser dada igualdade de condições para concorrer com a iniciativa privada.
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O que para alguns pode ser motivo de crítica, para outros é razão de
aplausos, já que participação minoritária do setor público em empreendimentos
liderados pelo setor privado conjuga a celeridade e a competitividade necessárias a
uma atuação satisfatória em mercado, permitindo, ainda, ao público exercer a
fiscalização da utilização dos seus recursos de maneira próxima e minuciosa.
Nosso compromisso, então, passa a ser com a eficiência, que acima
buscamos identificar nas parcerias entre os investidores públicos e privados. E, neste
momento, em reforço dessa mesma eficiência, ressaltamos o que de ineficiente existe
nessa união de forças.
14 MOTTA, Carlos Pinto Coelho [et al.]. Responsabilidade fiscal. Belo Horizonte: Del Rey, 2000. p. 22
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pública indireta. E é sob a ótica desse art. 173 que se deve examinar todo o
Ordenamento Jurídico infraconstitucional, sob pena de privilegiar
indevidamente as empresas estatais ou as demais sociedades privadas;
d) do § 6º e §7º, I, do art. 40 da Lei de Responsabilidade Fiscal
extrai-se que a finalidade da norma legal é evitar que as entidades da
administração indireta, especialmente as empresas públicas e as sociedades
de economia mista, transformem-se em instrumentos políticos ou
governamentais para a concessão de garantias irresponsáveis, de forma a
assegurar o cumprimento de obrigações contraídas por pessoas físicas ou
jurídicas estranhas àquelas entidades, que com elas não tenham nenhum
vínculo econômico ou societário, ou que apenas possuam alguma ligação
econômica ou societária irrelevante ou sem significação;
e) do art. 9º da Lei 11.079/2004, de editais, de contratos ou da
natureza do projeto, extrai-se que a opção, legal ou contratual, pela criação
de sociedade de propósito específico com participação minoritária de ente
estatal, torna mais efetiva a atuação e o controle estatais, de um lado, e mais
eficiente, de outro, a realização do projeto por parte dos investidores;
f) firmados esses três aspectos, determina-se o alcance da
vedação e da exceção previstas, respectivamente, no §6º e §7º, I, do art. 40
da Lei de Responsabilidade Fiscal, no sentido de também ser possível a
concessão de garantias por empresas estatais não dependentes em benefício
de suas coligadas, observadas como limite as respectivas participações
acionárias. Assim, do regime jurídico híbrido a que se sujeitam as empresas
estatais, com especial atenção para as não dependentes, decorre que a
disciplina da prestação de garantias deve observar a sujeição ao regime
próprio das sociedades privadas e assegurar a atuação competitiva das
empresas públicas e sociedades de economia mista, sem conferir-lhes
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garantias concedidas por elas em favor das instituições financeiras, ainda que
observada a proporção de suas participações societárias.
Na prática, a Resolução 2.827/2001 e a Lei de Responsabilidade Fiscal têm
apenas contribuído para aumentar o custo nas operações de crédito de sociedades de
propósito específico com controle privado e capital minoritário público ao induzir os
bancos a renunciarem às garantias dos sócios públicos ou ao exigir das sociedades
financiadas a contratação de fianças bancárias.
Duas regras com uma única finalidade, mas sujeitas a tratamento diferente.
Pois as razões que conduziram a consulta à PGFN também foram apresentadas ao
Banco Central do Brasil, a solução encontrada é que não seguiu a mesma lógica.
A PGFN, em seu parecer, deu nova interpretação aos parágrafos de uma lei
complementar, resolvendo a questão para todos os casos semelhantes que
encontrassem a mesma dúvida diante da referida norma. O Banco Central do Brasil
foi mais comedido, criando, por meio da Resolução BACEN 3.835/2010, a seguinte
exceção à regra do art. 7:
Art. 7. (...)
Parágrafo 4. A vedação prevista no inciso IV não abrange a
concessão de garantias por empresas do setor de energia elétrica,
no âmbito federal, estadual, municipal e distrital, a sociedade de
propósito específico por elas constituída, limitada ao percentual de
sua participação na referida sociedade, exclusivamente para
realização de investimentos vinculados ao Programa de
Aceleração do Crescimento (PAC).18
18BANCO CENTRAL DO BRASIL. Resolução n. 3835. Brasília, Diário Oficial da União, 28 de janeiro
de 2010. Disponível em < https://www3.bcb.gov.br/normativo/detalharNormativo.do?N=11000
7644&method=detalharNormativo>. Consulta em 14.05.2010.
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4 – CRÍTICA CONCLUSIVA
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 21.ed. São Paulo: Atlas,
2008.
RIBEIRO, Márcia Carla Pereira, GALESKI Junior, Irineu. Teoria Geral dos
Contratos: contratos empresariais e análise econômica. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.
Resumo
1 Acadêmica do curso de Direito da Universidade Federal de Uberlândia. Pesquisadora do CNPq.
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2 A expressão, utilizando a palavra “Cidadania” no sentido subjetivo, como substantivo coletivo de
cidadão, comum de dois gêneros, pode ser encontrada na tese de doutoramento do eminente Prof.
Márcio Alexandre da Silva Pinto, intitulada “Evolução do Direito Público da Cidadania”. Neste
trabalho, a palavra, por vezes, é usada com esta conotação, indicando o conjunto de cidadãos que
integram a sociedade.
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3 Trecho da palestra do Prof. Florivaldo Dutra de Araújo sobre o papel do Direito Administrativo na
relação Estado-cidadão e suas tendências, apresentada no IV Encontro de Direito Público da
Universidade Federal de Uberlândia, em Uberlândia, MG, novembro, 2009.
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empresarial, “mediante pessoas que cria com tal objetivo” e, finalmente, através de
incentivos à iniciativa privada, “estimulando-a com favores fiscais ou financiamentos
[...] ”.
Assim, no tocante à atividade interventiva do Estado na economia privada,
tendo como base o desenvolvimento doutrinário da matéria – cujo fundamento
encontra-se na ordem constitucional brasileira – pode-se afirmar que representa o
gênero, do qual a intervenção direta realizada por meio do exercício da atividade
econômica pelo próprio Estado, e a intervenção indireta, configurada através da
edição de normas que visam a regular e delimitar o âmbito da legitimidade do
exercício de direitos pelos particulares, são suas espécies. Esse o posicionamento de
MOREIRA (2007), cuja doutrina merece acolhida, para que se possa então delimitar
a alcance e as principais características da atividade regulatória exercida pelo Estado
no âmbito antitruste.
4 “Propõe-se uma definição restrita de regulação, limitada ao estabelecimento de normas (gerais e
abstratas, mas também na condição de preceitos-medida ou de atos concretos) que sujeitem terceiros
ao seu cumprimento (e respectivas sanções). Regulação econômica é a positivação de normas para o
atingimento de alguma finalidade econômica. Inclui-se no conceito a formulação de princípios e de
regras; de normas de estrutura e normas de conduta. Já a intervenção em sentido estrito é a atuação
material direta do interventor estatal no espaço econômico reservado às pessoas privadas. Dá-se
através do exercício direto de atividade econômica no domínio econômico privado.” (MOREIRA,
2007, p.3)
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econômicos, liberdade para escolherem a atividade que desejam empreender, bem como administrá-las
segundo suas próprias estratégias empresariais.” (VALÉRIO, 2006, p.65)
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na doutrina brasileira pelo eminente jurista SUNDFELD (2003), a partir das bases
delineadas pelo ordenamento jurídico interno: a administração ordenadora.
O conceito nasceu em oposição à noção de “poder de polícia”, expressão
utilizada para designar a atividade da Administração Pública voltada à restrição da
liberdade dos indivíduos no que se refere ao exercício de alguns de seus direitos.
Segundo BANDEIRA DE MELLO (2009, p.815), o poder de polícia pode ser
compreendido em dois sentidos: em sentido amplo, referindo-se à “atividade estatal
de condicionar a liberdade e a propriedade ajustando-as aos interesses coletivos”, e
em sentido estrito, relacionando-se às intervenções gerais e abstratas do Poder
Executivo, “destinadas a alcançar o mesmo fim de prevenir e obstar ao
desenvolvimento de atividades particulares contrastantes com os interesses sociais.”
A utilização da expressão “poder de polícia”, para SUNDFELD (2003,
p.11), envolve terrível problemática, principalmente pelo caráter autoritário que a
mesma suscita. Seu surgimento esteve ligado ao ideal do Estado mínimo, que
discordava da intervenção estatal na economia, e pugnava pela imposição de limites
negativos à liberdade e à propriedade dos cidadãos. Superada a fase do liberalismo
clássico, a mudança na atuação do Estado foi significativa, conforme demonstrado
nos capítulos iniciais deste trabalho. As funções administrativas foram ampliadas
sobremaneira, surgindo o assim chamado Estado Social, preocupado em prover à
coletividade seus direitos fundamentais.
A noção de administração ordenadora surge, portanto, para solucionar o
conflito gerado entre a atividade interventiva do Estado, historicamente repressora, e
os limites impostos à mesma pelo princípio da legalidade, que passou a condicionar a
legitimidade de toda e qualquer atuação administrativa na esfera jurídica da cidadania.
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liberdade de exercício da atividade econômica a função social que deve ser cumprida
pela mesma.
Segundo BRUNA (1997, p.140), a função social da propriedade dos bens de
produção deve ser encarada numa perspectiva dinâmica, uma vez que obriga os
titulares dos mesmos a “dar-lhes destino socialmente útil, que tenha em vista não
somente os interesses individuais do proprietário, mas também os interesses da
coletividade.” Dessa forma, o exercício da atividade empresarial se legitima a partir
da consecução de objetivos sociais, e não somente pelo alcance de interesses
particulares, representados pelo lucro dos agentes econômicos. Nesse sentido,
ilustres as palavras esposadas pelo autor:
objetivo primordial, senão único, o vasto interesse público”, apenas deve-se dar
espaço aos deveres sociais constitucionalmente estabelecidos.
Finalmente, como terceira espécie de condicionamento administrativo estão
as sujeições, que geram para os particulares o dever de suportar a interferência do
Poder Público na sua esfera de interesses, de que são exemplos as servidões
administrativas.
Todos os condicionamentos, em obediência ao princípio da legalidade –
entendido este como “vinculação positiva à lei” (BINENBOJM, 2008, p.42), que
norteia e legitima a atuação administrativa do Estado –, são impostos aos particulares
diretamente pela lei ou por ato administrativo. E todos eles visam à compatibilização
do exercício das liberdades públicas com os interesses da cidadania.
Interessa, para o presente trabalho, o aprofundamento da primeira espécie,
ou seja, dos limites dos direitos, visto a importância que tal condicionamento possui na
seara antitruste, já que a Lei 8.884/94, também conhecida como Lei Antitruste ou Lei
da Concorrência, que dispõe sobre a prevenção e a repressão às infrações contra a
ordem econômica, preocupa-se com a descrição das condutas que, uma vez
realizadas pelos agentes econômicos, venham a causar prejuízos ao equilíbrio do
mercado. Tais agentes têm, portanto, o exercício de seu direito à liberdade de
iniciativa limitado, no sentido de que são proscritos comportamentos que impliquem
em abuso do poder econômico, como forma de se preservar a livre concorrência e,
conseqüentemente, a própria liberdade de iniciativa.
Destacam-se, nesse contexto, os fins sociais almejados pela regulação do
comportamento dos agentes econômicos, vez que são eles que legitimam toda
atividade interventiva exercida pelo Estado na ordem econômica. O Estado intervém
para garantir o respeito aos direitos fundamentais dos cidadãos. No âmbito
antitruste, especificamente, para garantir os direitos dos particulares enquanto
consumidores, os princípios constitucionais de liberdade de iniciativa, de livre
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[...] o ilícito antitruste não é definido pela descrição dos atos, mas
pelos efeitos que possam vir a produzir, independentemente de sua
forma. [...] a Lei Antitruste não tem por fim tornar o exercício do
poder de mercado ilícito, mas sim controlar a forma pela qual ele e
adquirido e mantido. Reprime-se, tão somente, seu abuso. Ele é
lícito quando resultado de processo natural decorrente da maior
eficiência de um agente econômico em relação a seus competidores.
[...] A finalidade da Lei da Concorrência é prevenir que efeitos
anticompetitivos ocorram. (VALÉRIO, 2006, p.109-110; p.148)
7 Segundo VALÉRIO (2006, p.131), “O poder de mercado é a capacidade de um agente,
unilateralmente ou em grupo, de forma coordenada, aumentar preços, reduzir quantidades, diminuir
qualidade ou variedade de produtos ou serviços, ou ainda, restringir inovações com relação aos níveis
que vigorariam sob condições de concorrência irrestrita, por período razoável de tempo, no intento de
aumentar seus lucros. Em outras palavras, é a capacidade de agir independentemente de seus
competidores.”
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10O valor de uma Unidade Fiscal de Referência no Estado de Minas Gerais equivale, na atualidade, a
R$ 1,0641. Cf. dados disponíveis em:
http://www.fazenda.mg.gov.br/empresas/legislacao_tributaria/comunicados/ufir.htm
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Público, seja pelo não-impedimento da prática de determinado ato, seja pela não-
intervenção em situações subjetivas ou pela não-eliminação de posições jurídicas.
Os direitos fundamentais apresentam-se, também, como normas de proteção de
institutos jurídicos, quando obrigam o legislador a expedir atos normativos
concretizadores de alguns direitos, e como garantias positivas do exercício das liberdades
fundamentais, exigindo uma postura ativa do Estado para que este coloque à
disposição dos indivíduos prestações de natureza jurídica e material. (MENDES,
2004, p.4-5)
BINENBOJM (1998, p. 52), ao analisar a dimensão objetiva dos direitos
fundamentais, a associa ao mencionado processo de constitucionalização do direito,
pois, segundo o autor, ela representa “o reconhecimento dos direitos fundamentais
como bases estruturais da ordem jurídica, que espraiam sua influência por todo o
direito positivo.” Como conseqüência dessa dimensão, o autor chama atenção para a
eficácia horizontal dos direitos fundamentais, que pode ser definida como a oponibilidade
de tais direitos entre os particulares, como fundamento para restringir liberdades
individuais no âmbito das relações privadas. É o que acontece na seara antitruste,
quando, como exposto anteriormente, regula-se a liberdade de iniciativa e o exercício
do direito à atuação no mercado em prol da defesa, v.g., dos direitos dos
consumidores.
Passando-se à análise do cartel enquanto instrumento de controle de
mercado, violador da ordem econômica, cumpre, de antemão, apresentar a noção de
mercado relevante, por estar diretamente relacionada à atuação dos cartéis.
Segundo BRUNA (1997, p.83-94), mercado relevante é “o contexto onde se
manifesta o poder econômico”, sendo sua identificação, portanto, fundamental à
análise antitruste. O autor analisa a noção de mercado relevante sob três dimensões.
Primeiramente, sob a dimensão da procura, o mercado relevante inclui “todos os
produtos (ou serviços) que sejam genericamente idênticos ou, ao menos, aqueles que,
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apesar de não serem idênticos, sejam tidos pelos consumidores como relativamente
bons substitutos uns dos outros”. Sob a dimensão da oferta, o mercado relevante é
determinado pela “possibilidade de entrada de novos competidores” e pela
capacidade de expansão produtiva dos atuais concorrentes, “através do
redirecionamento de recursos produtivos”. Por fim, sob a dimensão geográfica,
“determinar qual seja o mercado relevante é determinar a área em que as empresas
nela situadas tenham uma vantagem de custo sobre as empresas localizadas fora
dessa mesma área.”
Para BANDEIRA DE MELLO (2009, p.800),
VALÉRIO (2006, p.125), por sua vez, afirma que o mercado relevante é
composto por duas dimensões distintas, mas complementares. A dimensão
produtos/serviços é “composta por todos produtos ou serviços considerados
substituíveis entre si pelo consumidor, devido às características, preços e utilização.”
A dimensão geográfica, por seu turno, “compreende a área em que as empresas ofertam
e procuram produtos ou serviços em condições de concorrência homogêneas em
termos de preços, preferências dos consumidores, características dos produtos ou
serviços.”
Por conseguinte, a noção de mercado relevante abrange fundamentalmente
uma dimensão referente aos produtos e serviços, que inclui aqueles cuja substituição
uns pelos outros os consumidores consideram possível e realizável, e uma dimensão
referente à área geográfica, que inclui os produtos e serviços que, em determinada
área, são concorrentes entre si, e cujas variações de preço e qualidade influenciam
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11 A autora diferencia acordos horizontais e acordos verticais tendentes à restrição da concorrência.
Os primeiros são celebrados por agentes econômicos atuantes em um mesmo mercado relevante e
que, por isso, encontram-se em concorrência direta uns com os outros. Os acordos verticais, por seu
turno, são celebrados entre agentes econômicos pertencentes a mercados relevantes distintos, porém
complementares, tais como entre fornecedores de matéria-prima e entre fabricantes de determinado
produto, ou entre estes e empresas distribuidoras.
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6. CONCLUSÃO
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Paulo: Malheiros, 2009.
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_____ . O poder econômico e a conceituação do abuso em seu exercício. São Paulo: RT, 1997.
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Janeiro: Lumen Juris, 2008.
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Horizonte: Del Rey, 2007.
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Malheiros, 2007.
SUNDFELD, Carlos Ari. Direito administrativo ordenador. São Paulo: Malheiros, 2003
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Cruz, 2006
VAZ, Isabel. Direito econômico da concorrência. 1ª edição. Rio de janeiro: Forense, 1993.
604
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RESUMO
1 Graduanda na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Uberlândia-UFU.
2 Doutorando na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais.
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1. Introdução
3 LOBATO, Moacyr. Falência e Recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 5.
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4 LOBATO, Moacyr. Falência e Recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 11.
5 FRANCO, Vera H. M. Manual de Direito Comercial. v. 1. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 22.
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Considera-se mercancia:
§1º A compra e venda ou troca de efeitos móveis ou semoventes,
para vender por grosso ou retalho, na mesma espécie ou
manufaturados, ou para alugar o seu uso;
§2º As operações de câmbio, banco e corretagem, expedição,
consignação e transporte de mercadorias, de espetáculos públicos;
§3º As empresas de fábricas, de comissões de depósito, de
expedição, consignação e transportes de mercadorias, de
espetáculos públicos;
6 LOBATO, Moacyr. Falência e Recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 14.
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8 RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de Direito Empresarial – O Novo Regime Jurídico – Empresarial
Civil brasileiro derroga grande parte do Código Comercial de 1850, na busca de uma
unificação, ainda que apenas formal, do direito privado”9.
Com esse novo Código Civil Brasileiro, troca-se a figura do comerciante
pela figura do empresário, que é definido como aquele que “exerce profissionalmente
atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços” (CC/02,
art. 966); com isso, aprimora-se a delimitação do âmbito de incidência do regime
jurídico empresarial.
9 RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de Direito Empresarial – O Novo Regime Jurídico – Empresarial
Brasileiro. 4. ed. Salvador: Juspodivm, 2010, p. 44.
10 CAMPINHO, Sérgio. Falência e Recuperação de Empresa. Rio de Janeiro, São Paulo, Recife: Renovar,
2006, p. 3.
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econômica deve-se entender a retração considerável nos negócios desenvolvidos pela sociedade
empresaria. Se os consumidores não mais adquirem igual quantidade dos produtos ou serviços
oferecidos, o empresário varejista pode sofrer queda de faturamento (não sofre, a rigor, só no caso de
majorar seus preços). Em igual situação está o atacadista, o industrial ou o fornecedor de insumos que
vêem reduzidos os pedidos dos outros empresários. A crise econômica pode ser generalizada,
segmentada ou atingir especificamente uma empresa; o diagnóstico preciso do alcance do problema é
indispensável para a definição das medidas de superação do estado crítico. Se o empreendedor avalia
estar ocorrendo retração geral da economia, quando, na verdade, o motivo da queda das vendas está
no atraso tecnológico do seu estabelecimento, na incapacidade de sua empresa competir, as
providências que adotar (ou que deixar de adotar) podem ter o efeito de ampliar a crise em vez de
combatê-la. A crise financeira revela-se quando a sociedade empresária não tem causa para honrar seus
compromissos. É a crise de liquidez. As vendas podem estar crescendo e o faturamento satisfatório –
e, portanto, não existir crise econômica –, mas a sociedade empresária ter dificuldades de pagar suas
obrigações, porque ainda não amortizou o capital investido nos produtos mais novos, está endividada
em moeda estrangeira e foi surpreendida por uma crise cambial ou o nível de inadimplência na
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economia está acima das expectativas. A exteriorização jurídica da crise financeira é a impontualidade.
Em geral, se a sociedade empresária não está também em crise econômica e patrimonial, ela pode
superar as dificuldades financeiras por meio de operações de desconto em bancos das duplicatas ou
outro título representativo dos créditos derivados das vendas ou contraindo mútuo bancário mediante
a outorga de garantia real sobre bens do ativo. Se estiver elevado o custo do dinheiro, contudo, essas
medidas podem acentuar a crise financeira, vindo a comprometer todos os esforços de ampliação de
venda e sacrificar reservas imobilizadas. Por fim, a crise patrimonial é a insolvência, isto é, a
insuficiência de bens no ativo para atender à satisfação do passivo. Trata-se de crise estática, quer
dizer, se a sociedade empresaria tem menos bens em seu patrimônio que o total de suas dívidas, ela
parece apresentar uma condição temerária, indicativa de grande risco para os credores. Não é assim
necessariamente. O patrimônio líquido negativo pode significar apenas que a empresa está passando
por uma fase de expressivos investimentos na ampliação de seu parque fabril, por exemplo. Quando
concluída a obra e iniciadas as operações da nova planta, verifica-se aumento de receita e de resultado
suficiente para afastar a crise patrimonial. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. v.3., São
Paulo: Saraiva, 2005, p. 231-232.
14 FILHO, Manoel Justino Bezerra. Lei de Falências – Comentada. 2ª ed. São Paulo: Revista dos
15 FILHO, Manoel Justino Bezerra. Lei de Falências – Comentada. 2. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003. Pág. 474.
16 FILHO, Manoel Justino Bezerra. Lei de Falências – Comentada. 2. ed. São Paulo: Revista dos
17 LOBATO, Moacyr. Falência e Recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007. Pág. 18.
18 LOBATO, Moacyr. Falência e Recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 19.
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Segundo o mesmo mestre, o que deveria ser feito era a mudança do foco do
ordenamento falimentar brasileiro, que ao invés de procurar quais eram as causas que
levaram a empresa à crise econômica e recolher bens para liquidar o passivo, deveria
buscar meios para possibilitar que ela pudesse se recuperar. Nessa linha, afirmou o
autor
19 FILHO, Manoel Justino Bezerra. Lei de Falências – Comentada. 2. ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2003, p. 35.
20 FILHO, Manoel Justino Bezerra. Lei de Falências – Comentada. 2. ed. São Paulo: Revista dos
22 LOBATO, Moacyr. Falência e Recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 79.
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23 FAZZIO JR., Waldo. Manual de Direito Comercial. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 615
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24 LOBATO, Moacyr. Falência e Recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 116.
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Empresas (Lei n. 11. 101, de 9-2-2005). 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. Pág. 165.
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27 MANDEL, Julio Kahan. A Recuperação Judicial de Empresas e a Fazenda Nacional. Disponível em:
– orientações dos tribunais sobre aspectos controversos. 12 de nov. de 2007. Disponível em:
<http://www.tozzinifreire.com.br>. Acesso em: 13 de maio de 2010.
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29 MANDEL, Julio Kahan. A Recuperação Judicial De Empresas e A Fazenda Nacional. Disponível em:
30 Decisão jurisprudencial do TJMG. Disponível em: <
http://www.tjmg.jus.br/juridico/jt_/inteiro_teor.jsp?tipoTribunal=1&comrCodigo=79&ano=6&txt_
processo=288873&complemento=1>. Acesso em: 13 de maio de 2010.
31 Decisão jurisprudencial do TJMG. Disponível em: <
http://www.leidefalencia.com.br/destaques/tjmg-formacao-do-quadro-geral-de-credores-fases/>.
Acesso em: 13 de maio de 2010.
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32 Decisão jurisprudencial do TJSP. Disponível no site do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.
33 MACHADO, Hugo de Brito. Certidão Negativa e Recuperação Judicial. 24 de março de 2009.
Disponível em: <http://direitoedemocracia.blogspot.com/2009/03/certidao-negativa-e-
recuperacao.html>. Acesso em: 14 de maio de 2010.
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4. Conclusão
5. Referências bibliográficas
BEZERRA FILHO, Manoel Justino. Lei de Falências – Comentada. 2. ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2003.
FAZZIO JR., Waldo. Manual de Direito Comercial. 9. ed. São Paulo: Atlas, 2008.
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REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar. vol. I, 17. ed., São Paulo: Afiliada,
1998.
<http://www.tozzinifreire.com.br/mostra_preview.php?codigo=1042&codigo_som
a=26&numeracao2=&modelo=1&enviado=1&preview=1&eng=>. Acesso em: 13
de maio de 2010.
<http://www.tjmg.jus.br/juridico/jt_/inteiro_teor.jsp?tipoTribunal=1&comrCodig
o=79&ano=6&txt_processo=288873&complemento=1>. 06 de junho de 2008.
Acesso em : 13 de maio de 2010.
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RESUMO
O consórcio é figura regulada pelos artigos 278 e 279 da Lei 6.404/76 e consiste na
união de empresas que se relacionam para a realização de um determinado objetivo,
resultando na criação de uma nova estrutura organizacional que representa o
agrupamento, sem intervir na identidade de cada sociedade, que se mantém jurídica e
patrimonialmente independente. Sua criação se justifica pela dinâmica atual das
relações comerciais e tem como objetivo a sobrevivência das empresas na economia
mundial, o incremento do desenvolvimento tecnológico e o aumento da
competitividade e da concorrência, o que estimula a atuação em parceria das
sociedades, a fim de que possam participar em determinados negócios de vulto.
Assim, através de um contrato, duas ou mais sociedades se vincularão apenas na
medida do necessário para a execução de um determinado empreendimento, sem que
desse contrato resulte a criação de uma nova sociedade. Dessa forma, por ser figura
desprovida de personalidade jurídica, o consórcio não apura lucros, nem perdas. Os
resultados obtidos são atribuíveis individualmente a cada consorciado, de acordo
com os ajustes estabelecidos no contrato. Por conseguinte, o financiamento do
empreendimento será realizado por cada uma das empresas consorciadas. Portanto,
caso haja inadimplemento de uma consorciada, as demais deverão arcar com a
inadimplência, aplicando recursos próprios, além do limite estabelecido no contrato
de consórcio, para viabilizar a continuidade do negócio. Desse modo, afigura-se
possível a diluição da participação das empresas no consórcio, tendo em vista que
nas sociedades a diluição ocorre de acordo com a participação de cada sócia, com
base no capital social? Como essa figura poderá ser aplicada aos consórcios? Partindo
dessa indagação, analisar-se-á a natureza jurídica do consórcio, bem como o instituto
da diluição societária, para verificar a possibilidade de diluição da participação das
sociedades em consórcio empresarial.
1 Mestranda em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Milton Campos. Especialista em
SUMÁRIO
1. Introdução
2 LAMY FILHO, Alfredo; PEDREIRA, José Luiz Bulhões. A lei das S.A.: pressupostos, elaboração e
aplicação. Rio de Janeiro: Renovar, 1994, p. 251.
3 TEIXEIRA, Egberto Lacerda; GUERREIRO, José Alexandre Tavares. Das sociedades anônimas no
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2. O que é um consórcio?
4 XAVIER, Alberto. “Consórcio: natureza jurídica e regime tributário”. Revista Dialética de Direito
Tributário. nº 64. Janeiro/2001, p. 7.
5 COMPARATO, Fábio Konder. Ensaios e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1978,
p. 223.
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6 À guisa de exemplo, algumas leis nas quais se encontram previsões sobre os consórcios antes do
advento da LSA: Código de Águas (Decreto-lei nº 24.643/1934), Lei de Mercado de Capitais (Lei
4.728/1965), Código Brasileiro do Ar (Decreto-lei nº 32/1966) e Código de Mineração (Decreto-lei nº
227/1967). Em todos esses diplomas, existem apenas breves referências ao consórcio, sem estipular
requisitos que caracterizem essa modalidade de colaboração interempresarial.
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Por expressa disposição legal (art. 278, §1º, LSA), o consórcio é destituído
de personalidade jurídica e deve ser constituído através de um contrato de
coordenação nominado celebrado entre titulares de sociedades independentes que
visam desenvolver conjuntamente operações.
Assim, não existe uma sociedade consórtil, mas apenas um contrato
associativo. De acordo com Lacerda Teixeira e Tavares Guerreiro, o consórcio é uma
“simples fórmula associativa de diversas pessoas jurídicas, desprovido de personalidade e de
patrimônio e com conotação marcadamente contratual”7.
Dessa forma, inquestionável a natureza convencional do consórcio.
Todavia, o contrato de consórcio não pertence ao rol de contratos bilaterais,
em que há prestações correspectivas. Trata-se de contrato plurilateral, pois os interesses
contrastantes das partes se unificam por meio de um escopo comum. No contrato
plurilateral, uma parte obriga-se perante todas as outras e em relação a elas adquire
direitos. A consequência dessa vinculação é a coordenação das partes em torno de
uma finalidade comum.
7 TEIXEIRA, Egberto Lacerda; GUERREIRO, José Alexandre Tavares, op. cit., p. 797.
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8 ASCARELLI, Tullio. Problemas das sociedades snônimas e direito comparado. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 1969,
p. 272.
9 AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Novos estudos e pareceres de direito privado. São Paulo: Saraiva, 2009,
p. 355.
10 PENTEADO, Mauro Rodrigues. Consórcio de empresas. São Paulo: Pioneira, 1979, p. 35.
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todas as obrigações assumidas pelo consórcio, sem prejuízo da definição dos compromissos e obrigações
de cada uma delas, de acordo com o objeto do empreendimento”11.
Como exposto pelo catedrático português Raul Ventura, ao tratar das
obrigações entre as consorciadas no direito brasileiro, a questão da solidariedade
influencia diretamente os terceiros que se relacionam com o consórcio: “Sucede, porém,
que a questão do regime dessas obrigações – solidariedade ou conjunção – é usualmente colocada não
nas relações internas do consórcio (onde, contudo, não seria teoricamente impossível) mas sim nas
relações externas, com terceiros. E para esta conclusão pode argumentar-se com o facto de a negação
da presunção de solidariedade das obrigações das consorciadas aparecer juntamente com a recusa de
personalidade jurídica, cuja importância é, sobretudo, externa. É óbvio, contudo, que as estipulações
existentes no contrato de consórcio não vinculam o terceiro que contratar com o consórcio, o qual pode
exigir a solidariedade das consorciadas ou contentar-se com a conjunção de duas obrigações para com
ele.”12.
O contratante público, como vimos, exige sempre a solidariedade entre as
consorciadas, por força do artigo 33, V, da Lei de Licitações. Por sua vez, o
contratante privado também não quer ter o ônus de apurar a divisão de obrigações
imputadas internamente entre as consorciadas, já que, assim como a Administração
Pública, acaba por contratar com o “consórcio” e não com cada consorciada de
forma estanque. Caso ocorra algum problema, o contratante particular também não
quer ter que provar a responsabilidade de cada consorciada e impõe, por sua posição
usualmente privilegiada, possibilidade de acionar todas as sociedades integrantes do
consórcio ou apenas a que escolher, em regime de solidariedade.
Assim, por exigência daqueles que contratam com os consórcios, a
solidariedade entre as consorciadas sempre existirá e deverá ser ajustada no contrato.
11 PAPINI, Roberto. Sociedade anônima e mercado de valores mobiliários. 3 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999,
p. 323.
12 VENTURA, Raul. “Primeiras notas sobre o contrato de consórcio”. Revista da Ordem dos Advogados.
Neste campo, é sempre bom lembrar que, ainda que a solidariedade não esteja
expressa no contrato de constituição de consórcio, sempre poderá vir no regime
negocial do empreendimento que será desenvolvido pelas consorciadas. De uma
maneira ou de outra, dificilmente o inadimplemento de uma consorciada passará sem
conseqüências para as demais parceiras.
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13JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 11 ed. São Paulo:
Dialética, 2005, p. 361.
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indenização à sociedade, ou, a critério dos demais sócios, ser excluído da sociedade
ou ter sua quota reduzida ao montante já realizado.
A essa redução de quota do sócio inadimplente se dá o nome de diluição.
Assim, a diluição a que se refere esse trabalho nada mais é do que a redução da
participação proporcional do sócio no capital da sociedade.
O instituto da diluição trata-se de uma opção que a lei defere aos sócios
adimplentes, ou seja, que se encontram em dia com as contribuições estabelecidas no
contrato social. Nos termos do parágrafo único, do artigo 1.004, do CC, verificada a
mora de um dos sócios, pode a maioria dos demais sócios deixar de exigir a indenização
correspondente e manter o sócio remisso, reduzindo-lhe a quota (ou a participação) a
montante compatível com o que já tiver colaborado. O que o dispositivo legal oferece,
em síntese, é uma solução para os casos em que ainda há a affectio societatis. Se, apesar
da inadimplência, os sócios adimplentes têm interesse em contar com o sócio
remisso, sua participação é reduzida, mas proporcionalmente preservada. Enfim, o
sócio remisso perde os anéis, mas conserva os dedos para trabalhar em prol dos objetivos da
sociedade.
Assim, o que a lei prevê não é uma penalidade para aquele que viola sua
obrigação mais essencial no contrato de sociedade. Pelo contrário. Trata-se de um
perdão ao inadimplente que vê seu débito para com a sociedade ser quitado ante à
transferência de sua participação àqueles sócios dispostos a suprir sua inadimplência.
É justamente por isso, que o instituto aparece como alternativa à exigência de uma
indenização, que jamais pode ser entendida como penalidade. Por óbvio, o objetivo é
apenas tornar indene.
Ao decidir por reduzir a quota do remisso, os sócios adimplentes podem
também determinar que aquela quota-parte reduzida seja subscrita pelos demais
sócios, respeitado o direito de preferência, observada, ainda, a proporcionalidade das
participações dos sócios adimplentes. Havendo a integralização pelos demais sócios,
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O remisso, conforme exposto no tópico acima, é aquele que não cumpre com
seu dever básico de colaboração e participação, violando a essência da própria
sociedade ao falhar na contribuição para a formação do capital social.
A idéia que queremos introduzir aqui é a do consorciado inadimplente, aquele
incapaz de colaborar com os recursos necessários para as atividades essenciais ao
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Para Mauro Penteado “subsistem algumas situações em que a melhor forma para a
consecução dos objetivos do consórcio seria o recurso ao esquema legal das sociedades, e que, nestes
casos, regras específicas poderiam ser cogitadas, a fim de melhor permitir o alcance de tais finalidades,
bem assim a tutela dos interesses em jogo”14.
14 PENTEADO, Mauro Rodrigues, op. cit., p. 68.
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esforços já não interessa apenas as consorciadas e não poderá ser alterada sem a
anuência da contratante.
Assim, a aplicação da redução da participação da consorciada inadimplente
encontrará óbice quando as obrigações a serem cumpridas pelas consorciadas forem
de caráter personalíssimo, já que não será possível a livre substituição das prestações
imputadas a cada consorciada. O ânimo associativo deverá ser mantido como no
momento da constituição do consórcio e as consorciadas deverão buscar outras
alternativas para o caso de inadimplemento de uma delas.
Ainda assim, interessa notar que o quantum da participação de cada
consorciada no consórcio costuma corresponder à respectiva capacidade econômica
e não técnica. Os dias atuais são caracterizados por um ampla transmissibilidade de
tecnologia. Por isso, a proposta de uma redução da participação da consorciada incapaz
de colaborar pode ser extremamente interessante para todo o conjunto de atores
econômicos que se relacionam com o consórcio, até mesmo o seu denominado
“contratante principal”. A redução evita a exclusão e garante que as qualidades
pessoais de todos as consorciadas continuem à disposição, sem que faltem os
necessários recursos econômicos.
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12. Conclusão
16 "Ubi eadem legis ratio, ibi eadem dispositio."
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17 AZEVEDO, Antônio Junqueira de, op. cit., p. 366.
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RESUMO
1 Pós-Graduando em Direito de Empresa lato sensu na Faculdade de Direito Milton Campos.
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1 Introdução
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2BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 10ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007, p. 25.
3 Art. 3º - Os serviços do Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins serão exercidos,
em todo o território nacional, de maneira uniforme, harmônica e interdependente, pelo Sistema
Nacional de Registro de Empresas Mercantis – SINREM, composto pelos seguintes órgãos:
I – Departamento Nacional de Registro do Comércio – DNRC, órgão central do SINREM, com
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funções supervisora, orientadora, coordenadora e normativa, no plano técnico; e supletiva no plano
administrativo;
II – Juntas Comerciais, com funções executora e administradora dos serviços de Registro Público de
Empresas Mercantis e Atividades Afins.
4 GONÇALVES NETO, Alfredo de Assis. Direito de Empresa: Comentários aos Artigos 966 a 1.195
do Código Civil. 1ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 587-592.
5 BULGARELLI, Waldirio. Direito Comercial. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 119.
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6 FERREIRA, Waldemar. Tratado de Direito Comercial, Vol. 2. São Paulo: Saraiva, 1960, p. 424.
7 Art. 1º - O Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins, subordinado às normas
gerais prescritas nesta Lei, será exercido em todo o território nacional, de forma sistêmica, por órgãos
federais e estaduais, com as seguintes finalidades:
I – dar garantia, publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos atos jurídicos das empresas
mercantis, submetidos a registro na forma desta Lei.
8 FERREIRA, Waldemar. Tratado de Direito Comercial, Vol. 2. São Paulo: Saraiva, 1960, p. 423-427.
9 MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 16ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991, p. 223.
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necessita, cautelosamente, acompanhar a evolução de seus negócios, sem perder de vista sua situação
econômico-financeira perante terceiros. A par disto, uma série de impostos incidem sobre estas
atividades, e é justamente por meio dos registros das operações realizadas que o Fisco pode aferir o
fato gerador dos diversos tributos.”
Finaliza afirmando ser este o fundamento das sanções por ausência de
registro: “Daí por que a ausência de tais registros é severamente sancionada pela lei, quer
apenando diretamente o empresário, quando sanciona a ausência desta escrituração como crime,
sujeito à pena de detenção de 1 (um) a 2 (dois) anos (art. 178 da Lei 11.101/2005, quer
indiretamente, quando o impede de requerer a recuperação judicial (art. 51, II, da Lei
11.101/2005); transformar seu tipo societário ou encerrar legalmente suas atividades”. 10
Destaque-se, portanto, que a doutrina fez interessante movimento quanto à
compreensão do escopo da publicidade gerada pelo registro: Antes, constituía
segurança para credores; posteriormente passou a ser considerada como garantia para
o comerciante; hodiernamente, pode ser entendido como garantia para ambos, além
de garantia de arrecadação para o Fisco.
É possível, até mesmo, afirmar que, na divulgação, está o embrião das atuais
idéias de governança corporativa, que exige a publicidade dos atos praticados pela
sociedade: por um lado em prol do interesse dos investidores evitando-se fraudes
contábeis, financeiras e corporativas11 e, por outro lado, visando à apuração de fatos
geradores sobre os quais incidirão tributação. É o que tem buscado o Estado, por
exemplo, com a implantação do SPED – Sistema Público de Escrituração Digital,
cuja legalidade tem sido discutida face à existência do art. 1.19012 do Código Civil de
10FRANCO, Vera Helena de Mello. Direito Empresarial I: O empresário e seus auxiliares,
estabelecimento empresarial, as sociedades. 3ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 68.
11 LOBO, Jorge. Princípios de Governança Corporativa: in Revista de Direito Mercantil, Vol. 142,
2006, p. 148-149.
12 Art. 1.190 - Ressalvados os casos previstos em lei, nenhuma autoridade, juiz ou tribunal, sob
qualquer pretexto, poderá fazer ou ordenar diligência para verificar se o empresário ou a sociedade
empresária observam, ou não, em seus livros e fichas, as formalidades prescritas em lei.
663
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2002.
4 Obstáculos Criados pelo DNRC Aplicados ao Registro do Comércio
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evidentemente, “apertar o cerco aos devedores de créditos públicos ou socialmente relevantes” 13. O
raciocínio pode ser estendido à Instrução nº 105.
Constata-se, pois, que nem sempre o descumprimento de obrigações pela
sociedade, como o dever de publicidade gerada pelo registro, decorre de atitude
desidiosa.
13 ROCHA, João Luiz Coelho da. Registro do Comércio e os Limites de sua Exigência. in Revista de
Direito Mercantil, Vol. 129, p. 70.
14 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 2006, p. 366.
15 Art. 10. Qualquer alteração na estrutura jurídica da empresa não afetará os direitos adquiridos por
seus empregados.
Art. 448 - A mudança na propriedade ou na estrutura jurídica da empresa não afetará os contratos de
trabalho dos respectivos empregados.
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16BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 2ª Ed. São Paulo: LTr, 2006, p. 366.
17COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 5ª ed. Rio de janeiro:
Forense, 2000, p. 623.
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18 Art. 53. Não podem ser arquivados:
I - os documentos que não obedecerem às prescrições legais ou regulamentares ou que contiverem
matéria contrária à lei, à ordem pública ou aos bons costumes, bem como os que colidirem com o
respectivo estatuto ou contrato não modificado anteriormente;
II - os documentos de constituição ou alteração de empresas mercantis em que figure como titular ou
administrador pessoa que esteja condenada pela prática de crime cuja pena vede o acesso à atividade
mercantil; (...)
19 BULGARELLI, Waldirio. Direito Comercial. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 1999, p. 126.
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22 Art. 34 – Instruirão obrigatoriamente os pedidos de arquivamento:
de Direito Administrativo.
Isto posto, é possível afirmar que o Poder Regulamentador do DNRC está
delimitado pela Lei 8.934/94 e pelo Decreto nº 1.800/96 devendo,
conseqüentemente, orientar sua atuação nos limites traçados pelo legislador.
Não é permitido criar ou restringir direitos que não estejam expressamente
estabelecidos na Lei 8.934/94 via Instruções Normativas, pois estas se prestam
apenas a orientar a atuação de determinado órgão da administração pública e, não, a
prescrever obrigações, limitar ou criar direitos.
Autorizar que o DNRC crie direitos ou obrigações por meio de Instruções,
equivale a outorgar-lhe competência de que dispõe apenas o Congresso e o Senado,
suprimindo instâncias legislativas.
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27 FAGUNDES, Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 5ª ed. Rio de
Janeiro: Forense, 1979, p. 235.
28 FAGUNDES, Seabra. O Controle dos Atos Administrativos pelo Poder Judiciário. 5ª ed. Rio de
líquido e certo não amparado por habeas data ou habeas corpus, contra ato praticado ou que haja receio
de ser praticado por qualquer autoridade, com ilegalidade ou abuso de poder, seja por pessoa física ou
jurídica, conforme prescreve o art. 1º da Lei nº 12.016/09.
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9 Conclusão
Diante de tudo que foi dito, é possível concluir que Instruções Normativas
não podem ser consideradas vias próprias para exigir que a sociedade ou o
empresário produzam documentos, além dos previstos no Decreto nº 1.800/96, para
praticar quaisquer atos.
Ainda, não se fazem necessárias as Instruções Normativas nº 88 e 105, já
que o ordenamento jurídico brasileiro é atento às situações por elas reguladas,
prescrevendo que créditos fiscais, trabalhistas e previdenciários não se extinguem
com o encerramento da empresa.
Portanto, as exigências impostas pelo DNRC e que extrapolem os limites
delineados pela Lei 8.934/94 ou pelo Decreto que a regulou, devem ser consideradas
ilegais. Além de ilegais, são também desnecessárias, face à existência de meios
próprios de que dispõe o Estado para cobrar créditos fiscais, trabalhistas e
previdenciários.
Isto posto, sob pena de supressão de instâncias legislativas, deverá o
judiciário pronunciar-se pela ilegalidade de toda e qualquer imposição ilegítima
30 Art. 64. O processo revisional pertinente ao Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de Direito do Trabalho. 2ª Ed. São Paulo: LTr,
2006
BORBA, José Edwaldo Tavares. Direito Societário. 10ª ed. Rio de Janeiro: Renovar,
2007
BULGARELLI, Waldirio. Direito Comercial. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 1999
COELHO, Sacha Calmon Navarro. Curso de Direito Tributário Brasileiro. 5ª ed. Rio
de Janeiro: Forense, 2000
MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 16ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 1991
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 16ª ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 1991, p. 156.
ROCHA, João Luiz Coelho da. Registro do Comércio e os Limites de sua Exigência.
in Revista de Direito Mercantil, Vol. 129
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RESUMO
1 Graduanda na Faculdade de Direito “Professor Jacy de Assis” na Universidade Federal de
Uberlândia.
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Introdução
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2 QUEIROZ, JORGE. Após cinco anos, Lei de Recuperação mostra falhas. Revista Consultor
Jurídico, São Paulo. 23 de março de 2010. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2010-mar-
23/quinto-aniversario-lei-falencias-mostra-licoes-nao-aprendidas>. Acesso em: 10 de maio de 2010.
680
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5 BRITO, Thomás Raimundo. SOARES, Gabriela. PINHEIRO, Grazieli. PEREIRA, Lívia Sampaio.
Da análise comparativa entre a recuperação judicial e a concordata. Disponível em:
<www.fesmip.org.br/arquivo/publicacao/dir_comercial.pdf>. Acesso em: 10 de maio de 2010.
6 Lei 11.101/2005 – Lei de Recuperação e Falência.
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7 FREITAS, Newton. Recuperação e Falência de Empresas. Fortaleza. Disponível em:
<http://www.newton.freitas.nom.br/artigos.asp?cod=113>. Acesso em: 10 de maio de 2010.
8 Art. 71. O plano especial de recuperação judicial será apresentado no prazo previsto no art. 53 desta
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10 CRISTO, Alexandre. Instituto aponta falhas na nova Lei de Falências. Revista Consultor Jurídico,
recuperação do crédito para empresas e melhores condições como prazos e custos.”, de acordo com a
empresa Seara Experian. E deve-se, segundo o advogado Almeida Paiva, a “mudanças nas políticas
cambial, fiscal e creditícia; criação de impostos extraordinários; surgimento de novos produtos; queda
da cotação dos produtos agrícolas nos mercados internacionais; retração do mercado consumidor;
altas taxas de juros; inadimplemento dos devedores, inclusive do próprio Estado” [...] “sucessão do
controlador; desentendimento entre sócios; capital insuficiente; avaliação incorreta das possibilidades
de mercado; desfalque pela diretoria; operações de alto risco; falta de profissionalização da
administração e do estoque; obsolescência dos equipamentos; redução das exportações; investimento
ou novos equipamentos”, [...] “maxidesvalorização da moeda nacional; situação econômica anormal da
região do pais ou do mercado consumidor estrangeiro; conflitos sociais" (grifo do autor)
12 FREITAS, Newton. Recuperação e Falência de Empresas. Fortaleza. Disponível em:
13PINHEIRO, Aline. Entrevista: Alexandre Lazzarini, juiz de Direito em São Paulo. Revista
Consultor Jurídico, São Paulo.7 de outubro de 2007. Disponível em:
<http://www.conjur.com.br/2007-out-07/lei_falencias_empresario_aprende_negociar?pagina=3>.
Acesso em: 10 de maio de 2010.
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15 Lei 11.101/2005
16 Lei 11.101/2005
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17 OCHOA, Roberto Ozelame. Plano de recuperação recusado poderá não resultar em falência?.
Jornal Valor Econômico, São Paulo. 9 de dezembro de 2005. Disponível em:
<http://www.planejaerecupera.com.br/materia.php?vIDMateria=122>. Acesso em: 19 de abril de
2010.
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tornou maior a atuação dos credores no processo, mas não transformou o juiz em
chancelador da assembléia”18, opina.
Deve-se levar em consideração, outrossim, que muitos planos apresentados
são questionáveis devido à ausência de uma lei regulamentando o modo e o conteúdo
da elaboração. Acrescenta-se a isso o fato de serem produzidos por profissionais de
outras áreas, o que acaba dando ensejo a uma recuperação ineficaz. Como exemplo,
o caso Varig, a Variglog, Vasp, Parmalat e inúmeras outras.
Outros magistrados, como a juíza Márcia Cunha, não crêem que se deva
decidir contrariamente aos credores se eles preferem aprovar um plano fraco ao
processo falimentar. No entanto, ela defende que é necessário conferir se não houve
algum tipo abuso de direito por parte do credor. Para mais alguns, seria ineficiente
descobrir abusos por parte dos credores e não decretar a falência, já que eles podem
boicotar o funcionamento da empresa não fornecendo matérias-prima, por exemplo.
O caso Parmalat Participações Ltda. ilustra um bom exemplo do uso da
razoabilidade diante da decisão de decretar ou não a quebra. Sua fundamentação se
deu com base no princípio constitucional da função social da empresa. Sendo, por
conseqüência, concedido o direito de apresentação de outro plano de recuperação.
Tal decisão foi intensamente criticada por não haver texto legal a dar-lhe
legitimidade. Não obstante, o relator do acórdão refuta a tese, afirmando que “os
princípios têm peso e densidade, devendo ser mesurados. Violar um princípio é mais
grave que violar uma regra, mercê do que, havendo um conflito entre um princípio e
uma regra, o Juiz deve dar prevalência ao princípio.”19
18 PINHEIRO, Aline. TJ-SP permitirá que Parmalat apresente novo plano de recuperação. Revista
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Conclusão
Esse posicionamento judicial é mal visto, por alguns autores, por não ter
respaldo legal. No entanto, essa postura legalista não produz efeitos desejáveis,
provocando, por vezes, insegurança jurídica, um mal estar negocial. Ao delegar a
decisão para os credores, o legislador, à sua maneira, pretendeu facilitar as
negociações entre as partes para que elas alcançassem o melhor meio de resolver a
crise, garantir seus contratos e não deixar ao arbítrio dos credores os rumos da
empresa. Essa possibilidade de definir a aceitação do plano pode originar fraudes,
posto que os detentores do crédito podem aprovar ou rejeitar o plano de acordo com
suas conveniências, como também formar conluios prejudicando os pequenos
credores e privilegiando os grandes.
Por fim, pode-se concluir que para os objetivos sociais do instituto
falimentar serem alcançados, deve ser aplicada a interpretação mais benéfica à
subsistência da empresa, ainda que por meio de recursos mínimos. Pois a falência,
pelo seu desenrolar tempestuoso, engessa a produção e circulação da riqueza, reduz a
arrecadação de tributos e desequilibra o ambiente econômico e social de um País,
trazendo um cenário de mal estar a todos que nela estão envolvidos, sejam os
devedores, os credores ou o corpo de empregados.
Bons trabalhos legislativos seriam o modo mais eficaz de auxiliar o
Judiciário a superar as adversidades da incipiente exegese da nova lei de falências. A
hermenêutica segura e equânime dos seus institutos constituiria um poderoso fator a
atuar na criação de um Estado apto a acolher investimentos e, portanto, disposto a
manter firmes as taxas de desenvolvimento.
691
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Referências Bibliográficas
2009 registra o menor número de falências decretadas desde 2005, revela Serasa
Experian. 07 de janeiro de 2010.Disponível em:
<http://www.serasaexperian.com.br/release/noticias/2010/noticia_00065.htm> Acesso
em: 17 de maio de 2010.
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. Volume 3, 10ª edição, 2009.
São Paulo: Editora Saraiva.
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JÚNIOR, Waldo Fazzio. Manual de direito comercial. 9ª Ed., 2008. São Paulo:
Editora Atlas.
Lei passou no teste, mas precisa de ajustes. Revista Consultor Jurídico, São
Paulo. 22 de fevereiro de 2010. Disponível em: <http://www.conjur.com.br/2010-fev-
22/especialistas-dizem-lei-falencias-alguns-ajustes>. Acesso em: 10 de maio de 2010.
PAIVA, José de Arimathéa Almeida. Direito Falimentar: Crises que podem levar
uma empresa à Falência. São Paulo. 20 de agosto de 2005. Disponível em: <
www.investidura.com.br/.../empresarial/937-direito-falimentar-crises-que-podem-
levar-uma-empresa-a-falencia.htm.>. Acesso em 10 de maio de 2010.
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RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de direito empresarial: O novo regime
jurídico-empresarial brasileiro. 4ª edição: 2010. Salvador: Editora JusPodivm.
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RESUMO
1Especialista em Direito Processual pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, mestranda
em Direito Empresarial pela Faculdade de Direito Milton Campos. Email: julianahorst@gmail.com.
Endereço para acessar currículo na plataforma lattes: http://lattes.cnpq.br/8040763729063780.
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1 Introdução
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mais adiante.
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2 Histórico
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Mas foi somente em 1908, com a Lei n. 2.024, cujo projeto havia
sido elaborado pelo grande jurista J. X. Carvalho de Mendonça,
que a verificação e a classificação dos créditos contra o falido
aperfeiçoaram as disposições modernas sobre falência, ‘conforme
o progresso científico e a jurisprudência dos tribunais, aplicando-
as segundo as necessidades práticas e modificando-as, quando
houver mister debelar a fraude e a má-fé’. Mais tarde, com o
propósito de aperfeiçoar a Lei 2.024, foi aprovado, em 9 de
dezembro de 1929, o Decreto 5.746, em que se introduziram
inovações como a diminuição do número de síndicos de três para
um e a instituição de porcentagem sobre os créditos para a
concessão da concordata. (SADDI, 2005, p. 201).
700
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3 Tal direito era impropriamente chamado de “favor legal”.
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4 Na realidade, muito antes da promulgação da Lei, mecanismos de preservação da empresa já estavam
5 Conhecido como “Chapter 11”.
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6Custos de transação são aqueles custos em que se incorre, que de alguma forma oneram a operação,
mesmo quando não representados por dispêndios financeiros feitos pelos agentes, mas que decorrem
do conjunto de medidas tomadas para realizar a transação. (SZTAJN, 2005, p. 230).
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7 A primeira tentativa formal de criar uma Teoria dos Jogos foi feita pelo matemático húngaro Jancsi
Von Neumann, em 1928, em um artigo seminal intitulado ‘Zur Theorie der Gesellschaftspiele’, no
qual desenvolve o conceito de interdependência estratégica. (PINHEIRO; SADDI, 2005, p. 161).
O importante é entender o conceito de Von Neumann de ‘jogo’ como simplesmente uma situação de
conflito em que alguém precisa fazer uma escolha, sabendo que há outros, ao mesmo tempo, também
em processo de escolha. Von Neumann provou matematicamente que sempre há um curso racional
de ação para dois jogadores e que os interesses (ou os motivos) de cada um deles pode ser divergentes.
(PINHEIRO; SADDI, 2005, p. 163).
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I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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law”. Estes autores utilizam a Teoria dos Jogos em Direito com a finalidade de
analisar o comportamento estratégico como componente fático do estudo jurídico.
Para compreensão sobre como se portam e também como devem atuar os
agentes econômicos vinculados a uma empresa em crise é necessário estabelecer os
elementos utilizados, ou seja: qual é o “jogo”, quem são os “jogadores”, qual o
“ganho” esperado por eles, quais as “estratégias” disponíveis para cada um e, por
fim, quais os efeitos que as diferentes estratégias de ação podem promover para o
alcance de seus próprios ganhos e dos demais envolvidos.
Em se tratando de deliberação sobre plano de recuperação judicial de
empresa em crise, há o envolvimento de dois ou mais agentes (jogo) e que
obrigatoriamente coloca todos os grupos de interesses a ela vinculados (jogadores)
diante da necessidade de decidir entre a aprovação ou rejeição do plano (estratégias).
A decisão de aderir ao plano é uma estratégia que será adotada pelos credores em
função dos proveitos que cada um deles vislumbrar nessa estratégia.
Cada jogador somente pode tomar a decisão mais eficiente a partir das
informações que detenha sobre o jogo, as suas possíveis escolhas e dos demais
participantes e os ganhos potenciais de cada estratégia.
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8 The concept of cooperation is important in game theory but is somewhat subtle. The term cooperate
means ‘act together, with a common purpose’. We might supose that, for a coalition of two or more
individuals to act together with a common purpose, the individuals would have to set aside their
separate utility functions and create somethig completely new – a collective utility function for
determining their collective behavour. (MYERSON, 1997, p. 370)
9 A coalitional game is a modelo f interacting decision-makers that focuses on the behaviour of group
of players [...] We call each group of players a coalition of all the players the grand coalition.
(OSBORNE, 2004, p. 239).
714
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10Armando Castelar Pinheiro e Jairo Saddi definem estratégia dominante como o “comportamento de
um dos jogadores que lhe permite auferir uma recompensa maior, qualquer que seja a estratégia
adotada pelo outro jogador. É influenciada pelas possíveis atitudes dos outros jogadores.”
(PINHEIRO; SADDI, 2005, p. 197).
715
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dominante sempre que possível e não escolherá qualquer estratégia que seja estritamente dominada
por outra. Esse é o mais obrigatório preceito de toda a teoria dos jogos.”11
Logo, para Eduardo Goulart Pimenta:
Para Rachel Sztajn, não se pode perder de vista que os interesses dos
credores não são homogêneos:
that is sttrictly dominate by another. This is the most compellig precept in all game theory.
716
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eficiência na alocação de recursos escassos. Conclui, assim, que a defesa que fazem
alguns doutrinadores de que seria importante preservar as empresas em crise, porque
teriam função social, não atende aos critérios de eficiência. De acordo com a sua
concepção, a função social das empresas é criar riquezas; não podendo fazê-lo, a
falência, reorganização ou recuperação, assentadas sobre premissas de
economicidade, são o meio mais adequado para estimular diligência de
administradores e credores. Ou seja: “a inversão de recursos públicos sem critérios de
eficiência, a pretexto da função social da empresa, fere a lógica econômica”. (SZTAJN, 2005, p.
56). “Função social geradora de perdas contradiz a própria idéia que preside a modelagem dessa
função”. (SZTAJN, 2005, p. 68).
Portanto, a visão da autora é no sentido de que as operações econômicas
devem ser analisadas sob a ótica de ganhos sociais e individuais, e, sem apropriação
privada dos resultados da atividade econômica, não haveria incentivos para se aceitar
riscos de atuar em mercados. Isso porque não se pode negar que a Constituição
Federal explicita que o regime econômico do país é o capitalista.
Assim, ao que parece, o legislador de 2005, ao dividir os créditos em três
classes, não considerou que as estratégias que cada uma delas pode escolher não as
fazem homogêneas. Daí surgem os problemas. Por exemplo: ao associar créditos
com privilégios aos créditos quirografários e subordinados, a lei os trata como se
fossem idênticos. Entretanto, se credores titulares de privilégios deliberam com
quirografários e subordinados, há de ser porque perderam o que os distinguia, ou
seja, a garantia. E essa perda representa o ganho de outros.
720
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5 O significado do artigo 47
14 A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico
financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos
trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua
função social e o estímulo à atividade econômica.
15 Eros Roberto Grau (1996, p. 443) define a norma-objetivo como aquela que tem a finalidade de
“fixar objetivos a serem alcançados”. Assim, pode se afirmar que a norma-objetivo define obrigações de
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resultados concretos que devem ser alcançados pelos seus destinatários. Complementarmente, as
normas-objetivo “passam a determinar os processos de interpretação do direito”. (GRAU, 1996, p. 136)
723
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aprovado por maioria de cada uma das classes de credores. Essa foi a idéia adotada
no ordenamento jurídico brasileiro, especificamente no artigo 35 da Lei n. 11.101/05.
Assim, é esclarecedora a interpretação da Lei n. 11.101/05 realizada por
Vera Helena de Melo Franco e Rachel Sztajn no que se refere à finalidade da
recuperação judicial:
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Este ‘modo mais útil’ significava a função de: concorrer para uma
melhor distribuição de renda; prover a mais ampla assistência
possível às classes menos favorecidas; e promover a composição
entre os interesses dos detentores do poder econômico e aqueles
da classe dos trabalhadores. (FRANCO; SZTAJN, 2008, p. 271).
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Logo, pode-se afirmar que não se pode atribuir um significado à “função social
da empresa” sem considerar o objetivo de lucro inerente à atividade.
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Com base no artigo 35, há doutrinadores que defendem que o Juiz não
pode examinar o conteúdo da deliberação dos credores que lhe é levada à
homologação. Outros, considerando a possibilidade de conflito de interesses,
afirmam que o poder deliberativo da assembléia dependerá da decisão final do
Judiciário.
Leciona Moacyr Lobato Campos Filho, que a recuperação judicial almeja a
harmonização dos interesses intrinsecamente conflituosos, titularizados pelos
credores, pelos empregados e pelo próprio devedor. Segundo o referido autor, o
legislador não consagrou os credores como os principais destinatários da recuperação
judicial. Do mesmo modo, a Lei não estabeleceu como objetivo principal restabelecer
a higidez econômico-financeira do devedor.
Embora a Lei não tenha elegido apenas o interesse dos credores como
relevante, a realização do crédito constitui o seu mais importante e legítimo interesse,
pautando sua atuação na Assembléia de Credores. (CAMPOS FILHO, 2007, p. 136).
A Lei prevê a participação direta e decisiva dos credores na deliberação
sobre a proposta apresentada pelo devedor. A manifestação dos credores, ressalvada
a hipótese de consentimento tácito verificado pela ausência de objeção de qualquer
credor ao plano, ocorre através do voto.
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8 Conclusão
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Referências
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Law. Chicago: Harvard University Press, 2003.
BIOLCHI. Osvaldo. In: Paulo Fernando Campos Salles de Toledo e Carlos Henrique
Abrão (orgs.), Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. 3. ed. São Paulo:
Saraiva, 2009, p. XXXVII – XLVII.
CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e recuperação. Belo Horizonte: Del Rey,
2007.
COOTER, Robert; ULEN, Thomas. Law & Economics, 4. ed. Nova Iorque: Pearson,
Addison & Wesley, 2004.
FAZZIO JÚNIOR, Waldo. Nova lei de falência e recuperação de empresas.São Paulo: Atlas,
2005.
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GRAU, Eros Roberto. O direito posto e o direito pressuposto. São Paulo: RT, 1996.
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LOBO, Jorge Joaquim. In: Paulo Fernando Campos Salles de Toledo e Carlos
Henrique Abrão (orgs.). Comentários à Lei de Recuperação de Empresas e Falência. 3. ed.
São Paulo: Saraiva, 2009, p. 94-208.
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MARZAGÃO, Lídia Valério. A recuperação judicial. In: MACHADO, Rubens
Approbato (coord.) Comentários à nova lei de falências e recuperação de empresas: doutrina e
prática. São Paulo: Quartier Latin, 2005.
VIANNA. Manoel Alva de S. Sa. Das fallencias. Rio de Janeiro: L. Figueiredo, 1907.
738
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RESUMO
1 Discente do curso de Direito da Universidade Federal de Uberlândia.
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DESENVOLVIMENTO
2 RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de Direito Empresarial – O novo regime jurídico-
A história comercial brasileira inicia-se enquanto essa nação ainda era uma
colônia portuguesa, sujeitando-se ao que a metrópole determinava. Primeiramente, às
Ordenações Afonsinas, as quais, após revistas, receberam a denominação de
Ordenações Manuelinas. Contudo, a falência do comerciante só foi regulada
expressamente a partir das Ordenações Filipinas. Estas, promulgadas em 1595,
estabeleciam a “pobreza sem culpa”. Neste caso, era desconsiderada a culpabilidade,
a qual, no caso de existência, acarretava até mesmo a pena de morte.
O instituto da falência sofreu modificações realmente revolucionárias com o
Alvará de 13 de novembro de 1756, instituído pelo Marquês de Pombal. O falido
deveria apresentar-se à Junta do Comércio, fazer a declaração de seus bens e dos
motivos da quebra financeira. Após o inventário, era feita a convocação dos
credores, para que fosse negociada a repartição do que foi arrecadado, excetuando os
dez por cento reservados à família do devedor insolvente, para assegurar sua
subsistência.
A princípio, após a proclamação da Independência, eram aplicadas no Brasil
as legislações dos países europeus, no tocante aos negócios mercantis e marítimos.
Todavia, a pressão interna por um sistema legal próprio aumentava e, após a chegada
família real, a tendência da economia nacional sofreu uma drástica mudança graças à
decisão de D. João abrir os portos às nações amigas. Esse fato intensificou as
exigências e foi criada a “Real Junta de Comércio, Agricultura, Fábrica e Navegação”,
a qual cumpriu finalmente seu propósito com a promulgação da Lei nº 556, o Código
Comercial de 1850, no qual havia a regulamentação “das quebras”. O direito
falimentar passou por sucessivas modificações até a promulgação do Decreto-lei n.
7661, de 1945, conhecido como LFC (Lei de Falências e Concordatas).
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Para que tal fim seja alcançado, faz-se necessário que o juiz, no mesmo ato
em que deferir a recuperação judicial, deverá, entre outras medidas, ordenar a
suspensão de todas as ações ou execuções contra o devedor, na forma do artigo 6º.
Novamente, não há menção expressa à figura do fiador.
O artigo 49, §1º, estabelece que “os credores do devedor em recuperação
judicial conservam seus direitos e privilégios contra os coobrigados, fiadores e
obrigados de regresso”. Tal dispositivo guarda uma relação de incompatibilidade
aparente com o artigo 59 da mesma lei, o qual dispõe que “o plano de recuperação
judicial implica a novação dos créditos anteriores ao pedido, e obriga o devedor e
todos os credores a ele sujeitos, sem prejuízo das garantias”.
Primeiramente, para uma análise satisfatória do tema, deve-se ter a
compreensão do instituto da novação. Este consiste na extinção da obrigação
estabelecida previamente, através da criação de um novo acordo entre as partes,
podendo ser alterado tanto o objeto da prestação quanto o credor ou devedor por
algum terceiro. Essas são as modalidades de novação, respectivamente, objetiva e
subjetiva.
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3 Decisão jurisprudencial do STJ. Disponível em:< http://www.leidefalencias.com.br/destaques/stj-
avalista-de-empresa-em-recuperacao-judcial-nao-responde-pelos-debitos-da-sociedade-decisao-
monocratica/> Acesso em: 20/05/2010.
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5 CONCLUSÃO
6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de falência e concordata. 16 ed., ampl. e atual.
São Paulo: Saraiva, 1998.
749
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COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. 4ª ed. rev. e atual. Vol.3. São
Paulo: Saraiva, 2003.
FAZZIO Jr., Waldo. Manual de direito comercial. 9 ed. São Paulo : Atlas, 2008.
RAMOS, André Luiz Santa Cruz. Curso de Direito Empresarial: O novo regime
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2003.
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RESUMO
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IV - SPED FISCAL
V - ASSINATURA DIGITAL
2 OLIVEIRA, Wilson J. HACKER: Invasão e Proteção 2ª edição. Florianópolis: Editora Visual Books
Ltda, 2000.
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Necessário que seja mantida uma segurança de sistema para se evitar que
seja comprometida a veracidade do documento digital.
No contexto do SPED, relevante é a atuação dos notários ou registradores
públicos, como instrumento consuetudinário para aplicabilidade da escrituração
digital na utilização da tecnologia digital. Expressões como “cartório digital” e
“cibernotórios” passam a ser comuns, entre outros, não só na realidade SPED como
na formalização jurídica da vontade das partes, na expressão de atos e negócios
jurídicos a que elas devam ou queiram dar forma legal ou autenticidade, para o que
possam autorizar a redação ou redigir os instrumentos adequados, conservando os
originais e expedindo cópias fidedignas e, por fim, autenticar fatos) ²
Nesse diapasão, o futuro dos negócios jurídicos eletrônicos (incluindo,
claro, sua abrangência, validade e a segurança) começam a ser definidos em nosso
ordenamento jurídico, ao menos quanto à sua abrangência de utilização, o que inclui
o SPED e todos os seu subsistemas.
O SPED coaduna-se na complexidade da constituição de prova nos casos
de descumprimento de uma das obrigações acessórias exigidas, ou até mesmo na
segurança do armazenamento de informações de dados sigilosos como livros digitais
e livros contábeis da empresa, que são protegidos legalmente no aspecto da
confidencialidade, credibilidade e indelebilidade.
No meio digital, a assinatura digital dá autenticidade pessoal ao
representante legal, ao contabilista que irá apresentar o livro digital ou o livro
contábil para a Junta Comercial ou ao Notário, baseada em códigos de autorização e
criptografia secretos utilizados para ‘assinar’ documentos eletrônicos.
Concomitante à exigência SPED, necessário o aperfeiçoamento da
assinatura digital eletrônica, em termos de segurança e garantia, para que sejam dadas
viabilidade e validade jurídica a esses documentos.
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VIII - CONCLUSÃO
BIBLIOGRAFIA
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DRUCKER, Peter. Desafios gerenciais para o século XXI. São Paulo:Pioneira, 1999.
EMYGDIO, Luiz; JUNIOR, F. Da Rosa. Títulos de Crédito. 4 ed. rev., amp. e atual.
Rio de Janeiro: Renovar, 2006.
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DIREITOS
FUNDAMENTAIS E
DEMOCRACIA
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RESUMO
1 Advogado, formado pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), especialista em Estudos
Diplomáticos pelo CEDIN / Faculdades Milton Campos, mestrando em Direito Público pela
Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas).
2 Advogada, formada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), pós graduanda em Direito
1 Introdução
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O ente estatal não conseguiu responder à altura os desafios que lhe foram
propostos, causando uma crise do Estado Democrático de Direito, sendo este não
mais capaz de atender as demandas da sociedade ou de pacificar seus conflitos.
Os próprios agentes sociais, empresas transnacionais, organizações não
governamentais (ONG), organismo supranacionais, passaram a atuar nesse vácuo de
poder, o que levou a um deslocamento do eixo do poder político do Estado para
esses novos centros de decisão. O próprio Direito Ambiental é fruto desse
deslocamento. Organizações transnacionais e ONG’s passaram a assumir papel
fundamental na proteção ao meio ambiente.
Os agentes sociais, contudo, não são capazes de sozinhos tutelar
efetivamente o meio ambiente de modo a preservá-lo. As necessidades sociais, frente
a fenômenos como o aquecimento global, superam a capacidade de atuação de
qualquer membro da sociedade. Somente o ente estatal, agindo democraticamente,
atuando em concerto com seus pares no cenário internacional, será capaz de
enfrentar os desafios ambientais que nos são apresentados neste início de século
XXI.
Para tanto, é necessário resgatar a eficácia do mais importante instrumento
estatal para a regulação de conflitos sociais: o Direito.
3 BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo – así una nueva realidad. Barcelona: Paidos, 1998. p. 28.
4 Dicionário Houaiss. Disponível em: <www.houaiss.uol.com.br>. Acesso em: 11/05/2010.
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5 DE GIORGI, Raffaele. Direito, democracia e risco: vínculos com o futuro. Porto Alegre: Sergio
Antonio Fabris Editor, 1998. p. 188.
6 LEITE, José Rubens Morato. AYALA, Patryck de Araújo. Direito Ambiental na Sociedade de
7 LEITE, José Rubens Morato. AYALA, Patryck de Araújo. Direito Ambiental na Sociedade de
Risco. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2004. p. 18.
8 JÚNIOR, Lúcio Antônio Chamon. Filosofia do Direito na Alta Modernidade. Rio de Janeiro:
5 Princípio da precaução
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9MILARÉ, Édis. Princípios fundamentais do direito do ambiente. vol. 756. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1998. p. 60 a 62.
10 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito Ambiental, 9 ed, Rio de Janeiro: Editora Lúmen Juris, 2006.
p. 33.
782
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11 SAMPAIO, José Adércio Leite; WOLD, Chris; NARDY, Afrânio José Fonseca. Princípios de
direito ambiental. Belo Horizonte: Del Rey, 2003. p. 60.
783
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12 LEITE E AYALA. Transdiciplinariedade e a proteção jurídico-ambiental em sociedade de risco:
Direito, ciência e participação. In: LEITE, José Rubens Morato; BELLO FILHO, Ney de Barros
(org.). Direito ambiental contemporâneo. Barueri: Manole, 2004. p. 100.
784
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13 LEITE E AYALA. Transdiciplinariedade e a proteção jurídico-ambiental em sociedade de risco:
Direito, ciência e participação. In: LEITE, José Rubens Morato; BELLO FILHO, Ney de Barros
(org.). Direito ambiental contemporâneo. Barueri: Manole, 2004. p. 115/116.
14 MILARÉ, Édis; COIMBRA, José de Ávila Aguiar. Antropocentrismo x ecocentrismo na ciência
jurídica. In: Revista de Direito Ambiental, ano 9, n. 36, out-dez/2004. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2004, p. 37.
785
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15 DALLARI, Sueli Gandolfi. Direito e ciência. In: Revista CEJ/Conselho de Justiça Federal,
Centro de Estudos Jurídicos. N.1 (1997). Brasília: CEJ, 1997. N. 16. março/2002. p. 66.
16 DALLARI, Sueli Gandolfi. Direito e ciência. In: Revista CEJ/Conselho de Justiça Federal,
Centro de Estudos Jurídicos. N.1 (1997). Brasília: CEJ, 1997. N. 16. março/2002, p. 66.
17 DALLARI, Sueli Gandolfi. Direito e ciência. In: Revista CEJ/Conselho de Justiça Federal,
Centro de Estudos Jurídicos. N.1 (1997). Brasília: CEJ, 1997. N. 16. março/2002, p. 66.
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18BARACHO JÚNIOR, José Alfredo de Oliveira. Responsabilidade civil por dano ao meio
ambiente. Belo Horizonte: Del Rey, 1999. p. 324.
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20 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco : doutrina, jurisprudência,
glossário. 5. ed., reform., atual. e ampl. -. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. p. 147.
21 BARROSO, Lucas Abreu. A obrigação de indenizar e a determinação da responsabilidade
civil por dano ambiental. Editora Forense: São Paulo, 2006. p. 04.
22 STEIGLEDER, Annelise Monteiro. Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano
ambiental no Direito brasileiro. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2004.p.80 e 81.
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Resta claro que a responsabilidade civil pelo dano ambiental, nos moldes
como aqui descrita, não se coaduna com uma sociedade pós-moderna e de riscos,
como é a sociedade atual. Em um sociedade produtora e distribuidora de riscos
globais, invisíveis, transtemporais e intergeracionais, a espera pela concretização do
dano ambiental é a verdadeira consagração da irresponsabilidade dos produtores
destes riscos.
É necessário reestruturar os clássicos conceitos da responsabilidade civil,
substituindo-se a ótica patrimonialista, centrada na indenização de um dano já
causado, pela ótica da precaução que visa evitar esse mesmo dano.
790
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Essa teoria é pautada no risco concreto, que pode ser calculado e previsto
pelo conhecimento vigente. Impossibilita, pois, a responsabilização dos sujeitos por
riscos abstratos, baseados em juízos de probabilidade acerca de danos ambientais
futuros. Tal teoria deve ser repensada, especialmente no tocante à responsabilidade
civil ambiental.
Inicialmente, em razão da gravidade da questão ambiental, que reside em
três aspectos. Em primeiro lugar, a impossibilidade de, uma vez concretizado o dano,
recuperar totalmente os ambientes degradados. Em segundo, o dano ambiental pode
ser muito extenso, envolvendo comunidades e até países diversos. O terceiro ponto
consiste no modo como o dano afetará as próximas gerações, ou seja, qualquer
solução para o problema ambiental exige uma solução pautada na responsabilidade
intergeracional.
Ademais, os Estados, após consagrarem o direito fundamental ao meio
ambiente equilibrado, utilizam de institutos sociais da sociedade industrial clássica.
Frente aos novos riscos, esses instrumentos não são satisfatórios. Pelo contrário,
podem ocultar as origens e as conseqüências desses riscos.
O problema é que, para o sistema judicial, o risco gerado só é relevante após
se concretizar em um dano.
Dessa forma, uma sociedade de risco que pauta sua responsabilidade por
instrumentos da sociedade industrial, tem por conseqüência a “Irresponsabilidade
Organizada”, conforme definido pelo sociólogo alemão Ulrich Beck, ou seja, os
sistemas político e social tornam invisíveis e, até mesmo, legitimam as origens dos
perigos ecológicos.
A ineficácia da legislação ambiental é um dos aspectos da
“Irresponsabilidade Organizada”. As leis existentes não são capazes de regular os
riscos produzidos.
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Conclusão
26CARVALHO. Délton Winter de. Dano ambiental futuro: a responsabilização civil pelo risco
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
27LEITE, José Rubens Morato; PILATI, Luciana Cardoso. Evolução da responsabilidade civil
ambiental: 25 anos da lei n. 6.938/81. In: ROCHA, João Carlos de C.; HENRIQUES FILHO,
Tarcísio H. P.; CAZETTA, Ubiratan (orgs.) Política nacional do meio ambiente: 25 anos da lei n.
6938/81. 1 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p. 260.
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Tribunais, 2005.
BECK, Ulrich. La sociedad del riesgo: así una nueva realidad. Barcelona: Paidos,
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BRASIL. Lei nº. 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional
do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras
providências. Disponível em: <www.senado.gov.br>. Acesso em: 10 de maio de
2010
BRASIL. Lei nº. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Código
Civil. Disponível em: <www.senado.gov.br>. Acesso em: 10 de maio de 2010
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PEREIRA, Caio Mario da Silva. Responsabilidade civil. 9. ed. rev. Rio de Janeiro:
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PISA, Adriana. O Direito Penal x sociedade de risco de Ulrich Beck: uma abordagem
Crítica. In Revista de Direito Ambiental, nº 54. São Paulo: Revista dos Tribunais,
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SILVA, José Afonso da. Direito ambiental constitucional. 3 ed. São Paulo:
Malheiros Editores Ltda.
802
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RESUMO
1Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia. Pós-graduado em Direito Processual
Civil pela Universidade Federal de Uberlândia. Pós –graduado em Direito Público pela Universidade
Cândido Mendes. Mestrando do Programa de Direito Público da Universidade Federal de Uberlândia.
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A CIDADANIA NO BRASIL
cidadão tem de ser cônscio das suas responsabilidades enquanto parte integrante de
um grande e complexo organismo que é a coletividade, a nação, o Estado, para cujo
bom funcionamento todos têm de dar sua parcela de contribuição. Somente assim se
chega ao objetivo final, coletivo: a justiça em seu sentido mais amplo, ou seja, o bem
comum.
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CONCLUSÃO
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cidadania, que, sendo o caso, precisam estar jungidos de meios para cobrar do Estado
a efetividade de seus direitos.
Por fim o que se pretende enfatizar é que, exerce a cidadania quem detém a
qualidade de cidadão, e este não perde essa qualidade pelo simples fato de não deter a
capacidade de votar e/ou ser votado, ao contrário, essa capacidade se dirige ao
exercício dos direitos políticos, se revelando como um atributo outorgado aos
cidadãos, não servindo para limitar a usufruição da cidadania.
REFERÊNCIAS
ALEGRE, José Sérgio Monte. Ação Popular: Direito Político? Revista Trimestral
de Direito Público. São Paulo. N. 3, p. 73-84, 1993.
BOBBIO, Norberto. Teoria Geral do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
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interesses difusos e coletivos. Posição do Ministério Público. Revista Trimestral do
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MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 18ª Ed. São Paulo: Editora Atlas,
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2001. 230p.
819
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1 Professor Substituto de direito constitucional I e mestrando em hermenêutica constitucional.
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2 Ferreira Filho, Manuel Gonçalves – O poder que edita a Constituição nova substituído Constituição
anterior ou dando organização a novo Estado – este Poder Constituinte é usualmente qualificado de
originário. Isto sublinha que ele dá origem à organização jurídica fundamental.
Esta qualificação serve também para distinguir esse Poder Constituinte, que é o único a realmente a
fazer jus ao nome, de Poderes Constituintes instituídos ou derivados. Estes impropriamente são
chamados de constituintes. Eles são constituídos pelo Poder Constituinte originário e dele retiram a
força que têm. A designação Poder constituinte só lhes vem do fato de que, nos termos da obra do
Poder originário, podem modificá-lo, completá-la (poder de revisão) ou institucionalizar os Estados
federados que dela provenham (poder constituinte dos Estados-membros). CURSO DE DIREITO
CONSTTUCIONAL – Ferreira Filho, Manuel Gonçalves – 35º ed – São Paulo: Saraiva, 2009.
822
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execução desses serviços, sendo assegurado nesses órgãos – assentos aos cidadãos
com direito de voto e veto podendo executar as políticas públicas.
Podemos citar textualmente a previsão de conselhos destinados a execução
de serviços públicos na administração pública nos serviços atinentes a saúde,
educação e gestão dos recursos ambientais.
Uma característica comum é o fato do Estado não mais fiscalizar de
maneira autônoma e solitária a destinação dos recursos públicos. O próprio Estado
descentraliza parte das suas atribuições de fiscalização, repassando competências
administrativas de fiscalização para os órgãos de gerenciamento dessas políticas.
Abaixo retiramos alguns conselhos constituídos com o claro fulcro de fiscalizar a
atuação. Observe que a composição do conselho e ampla e sua função de fiscalização
é expressa.
823
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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Nesse diapasão o Estado Atribui competências a esses órgãos para que eles
fiscalizem a origem e destinação dos recursos – No presente caso estaríamos diante
de uma hipótese de controle interno da administração, conforme expressa definição
legal, função esta exercida por um órgão colegiado que permite entre outras coisas,
que os cidadãos tomem conhecimento do funcionamento da máquina administrativa
e permita a consecução da prestação dos serviços.
Além da atuação nos órgãos colegiados criados para a execução dos serviços
públicos, o cidadão enquanto cidadão pode exigir o direito de ver a prestação de
contas do gestor público e analisar se estas se encontram em conformidade com a lei
de contabilidade pública.
Interessante frisar que a colocação do cidadão nas “luzes da ribalta”, nada
mais que uma necessidade vital do Estado Democrático de Direito, pois do contrário
ele não conseguira assegurar que o estado seja democrático3, desrespeitando assim o
nosso próprio texto constitucional.
3 SILVA, José Afonso da – A Constituição portuguesa instaura o Estado de Direito Democrático,
com o “democrático” qualificando o Direito e não o Estado, Essa é uma diferença formal entre ambas
as constituições. A nossa emprega a expressão mais adequada, cunhada pela doutrina, em que o
“democrático” qualifica o Estado, o que irradia os valores da democracia sobre todos os elementos
constitutivos do Estado e, pois, também sobre a ordem jurídica. O Direito, então, imantado por esses
valores, se enriquece do sentir popular e terá que ajustar-se ao interesse coletivo. Contudo, o texto da
Constituição Portuguesa dá ao Estado de direito democrático o conteúdo básico que a doutrina
reconhece ao Estado Democrático de Direito, quando afirma que ele é baseado a soberania popular,
no pluralismo de expressão e organização política democráticas, no respeito e na garantia de efetivação
dos direitos e liberdades fundamentais, que tem por objetivo a realização da democracia econômica,
social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa”. CURSO DE DIREITO
CONSTITUCIONAL POSITIVO – Editora Malheiros: São Paulo, 26 edição – 2006 , pág.117.
825
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4 A Lei Complementar 101/00 e a Lei 10.257/01 prevêem a realização de audiências públicas nos
processos de elaboração e discussão dos Planos, da Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei do
Orçamento Anual, o que pode vir a concretizar no âmbito municipal, o princípio constitucional da
participação popular. Pelo disposto na Lei de Responsabilidade Fiscal o poder executivo tem que
ouvir a população no processo de elaboração daquelas leis ali especificadas, o que significa dizer que
antes do envio do projeto de lei para o legislativo há necessidade de audiência pública para que a
sociedade seja ouvida, porque a transparência e o controle popular na gestão fiscal é norma de caráter
obrigatório . LOCKE, Fernando do Nascimento - Revista Eletrônica de Contabilidade Curso de
Ciências Contábeis UFSM Volume I. N∫.1 Set-Nov/2004
826
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CRFB/1967
Art. 138 - O Ministério Público Federal tem por Chefe o
Procurador-Geral da República, o qual será nomeado pelo
Presidente da República, depois de aprovada a escolha pelo
Senado Federal, dentre cidadãos com os requisitos Indicados no
art. 113, § 1º.
§ 1º - Os membros do Ministério Público da União, do
Distrito Federal e dos Territórios ingressarão nos cargos iniciais
de carreira, mediante concurso público de provas e títulos. Após
dois anos de exercício, não poderão ser demitidos senão por
sentença judiciária, ou em virtude de processo administrativo em
que se lhes faculte ampla defesa; nem removidos, a não ser
mediante representação do Procurador-Geral, com fundamento
em conveniência do serviço.
§ 2º - A União será representada em Juízo pelos
Procuradores da República, podendo a lei cometer esse encargo,
nas Comarcas do interior, ao Ministério Público local.
CRFB/88.
Art. 127. O Ministério Público é instituição permanente, essencial
à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da
827
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I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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CONCLUSÃO
seus direitos e dos direitos da sociedade, pois do contrário, por mais que queira não
irá ocupar as luzes do estrelado que o aguardam.
REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS
SAMPAIO, José Adércio Leite ,coordenador – Belo Horizonte: Del Rey, 2003, 568
p. Texto de BREVE HISTÓRICO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO
CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE BRASILEIRO de Álvaro Ricardo
de Souza Cruz.
832
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LEGISLAÇÃO
833
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A COR INEXISTENTE:
O RACISMO COMO CRIAÇÃO CULTURAL
RESUMO
1 Graduando em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais.
2 Alves, Castro. Espumas flutuantes. CEB; São Paulo. p. 218, poema Navio negreiro.
834
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3 FERNÁNDEZ-ARMESTO, Felipe. Idéias que mudaram o mundo. Trad. Luiz Araujo; Eduardo Lasserre
4 VOLTAIRE. Dicionário filosófico. Trad. Ciro Mioranza e Antonio Geraldo as Silva. São Paulo; Escala:
2008. p. 241
5 PENA, Sérgio, D. J. Humanidade sem raças?; São Paulo; Publifolha: 2008. p. 10.
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Ásia, África América passaram por dois momentos distintos em sua história
de dominação entre os séculos XIV e XX. O primeiro foi a dominação colonial
mercantilista, encabeçada pelo tráfico negreiro. “As potencias colonizadoras estavam
interessadas, sobretudo, na obtenção de produtos tropicais e metais preciosos e na
exportação de produtos manufaturados.”6 Onde a ideologia do dominador
confundia-se e sustentava-se com a religião. O final da Idade Média foi caracterizado
por uma grande crise na produção agrícola, “... a única saída para se tirar a Europa
Ocidental da crise seria expandir novamente a base geográfica e de população a ser
explorada.”7 Partiu-se da conquista do litoral africano e da implantação de feitorias ao
longo do continente por volta dos séculos XV e VXI. As feitorias praticamente
tornava desnecessária a colonização do território explorado, reduzindo a relação
entre o europeu e o nativo quase que exclusivamente em uma relação comercial.
Eram comercializadas variantes de pimenta e outras especiarias, ouro em pó, marfim
e, a partir do século XVI, sobretudo escravos. A dominação era quase que
exclusivamente voltada para a manutenção do trafico negreiro. “O escravo passou a
ser um produto tão valorizado na nova realidade econômica que os próprios grupos
tribais organizavam excursões para capturar escravos para depois vender aos
Europeus.”8 A dominação era justificada pela religião, o negro – e também o índio
do continente americano – eram dominados e subjugados porque eram “pecadores”,
ou seja, não professavam a fé católica e era a obrigação moral da Igreja evangelizar e
6 KOSHIBA, Luiz. História do Brasil, 7ª Ed. São Paulo; Atual: 2002. p. 218
7 FAUSTO, Boris. História do Brasil, 13ª Ed. São Paulo; EDUSP: 2008. p. 21
8 O trecho em questão foi retirado de um ensaio publicado no numero 175 da revista portuguesa
salvar os povos bárbaros. Essa dominação era baseada em uma interpretação bíblica,
onde Cam, ou Canaã, foi amaldiçoado e condenado a ser escravo por ter visto o
corpo nu do pai. Essa passagem serviu como justificativa para a escravização dos
negros, tidos como portadores da maldição de Cam, a escravidão seria uma forma de
purgação do pecado e, portanto, a sua salvação. Entretanto, segundo modernas
interpretações, a associação de Cam ao povo negro é uma falsificação histórica, usada
apenas como uma justificativa para a escravização e inferiorização dos africanos.
O negro africano e o indígena americano foram subjugados, escravizados e
aculturados no processo de colonização. Os nativos do novo mundo foram
dizimados pelas doenças produzidas pelo contato com o europeu, pois não tinham
defesa biológica contra doenças como o sarampo e a varíola; e pela luta contra o
dominador. Exploradores dizimaram civilizações inteiras “usando a sua força militar
com extrema violência, fazendo valer a sua superioridade técnica e espalhando o
terror.”9 O negro foi separado arbitrariamente de seu grupo de origem e lançado em
levas sucessivas em um território estranho. “Dizia-se que a escravidão era uma
instituição já existente na África e assim apenas transportavam-se cativos para o
mundo cristão, onde seriam civilizados e salvos pelo conhecimento da verdadeira
religião”10 O escravo pertencia a um sistema onde era produtor mas também era
produto. O escravismo perdurou ate o final do século XIX mas o racismo, que o
justificava, permaneceu entranhado em nossa cultura. O escravismo acabou com o
fim do mercantilismo, com a superação do pacto colonial pelo capitalismo e
liberalismo. Cada indivíduo passou a ser visto como um consumidor em potencial o
que não era permitido no sistema escravista, uma vez que o escravo não tinha renda.
O Brasil conviveu com a incoerência de um governo liberal apoiador da servidão
durante quase todo o século XIX. Os donos de escravos afirmavam que o estado não
9 TEIXEIRA, Francisco M. P. História da América, 11ª Ed. São Paulo; Ática: 1990. p. 9.
10 FAUSTO, Boris. Idem. p. 52.
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11 FAUSTO, Boris. Idem. p. 23
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12 AQUINO, Rubim Santos Leão. Historia das sociedades, das sociedades modernas às sociedades atuais. Rio de
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do racismo tinham o desejo não apenas de classificar as raças, mas também estimá-las
em termos de superioridade e inferioridade. “A critica ao Imperialismo era levada a
parecer sentimental e não-científica.”16 Mas é a história, e não a natureza que
determina o desenvolvimento desigual dos povos.
As idéias de Darwin e de seus seguidores foram um produto de sua época e
das circunstancias e serviu aos interesses de uma classe particular; o tráfico de
escravos da África para as colônias americanas movimentou enormes quantias de
dinheiro e, de uma forma ou de outra, financiou a Revolução Industrial na Europa,
aumentando ainda mais o abismo entre centro e periferia dominada. Essas idéias
reforçaram e legitimaram a dominação, fornecendo um arcabouço científico para sua
reificação. Darwin especulava que os nativos africanos teriam evoluído para uma
espécie distinta se o imperialismo não tivesse posto fim ao seu isolamento, para ele,
os africanos estavam condenados à extinção por sua inaptidão técnica e pouco
desenvolvimento tecnológico. No século XVIII o antropólogo Johann Friedrich
Blumenbach classificou a humanidade em cinco raças: a caucasóide, sinônimo de
“branco”; a americana; a malaia; e a etiópica, que se tornou sinônimo de “negro”.
Heackel, no século XIX, “...dividiu a humanidade em doze espécies (isto é, raças),
ordenando-as em uma escala de valor, na qual, como esperado, a “espécie” européia
era a superior.”17 A partir do conceito de raça e do darwinismo social, idéias
ultranacionalistas, xenofóbicas e racistas proliferaram por toda a Europa.
A justificação científica do racismo é fruto do imperialismo, é justificativa
teórica e abstrata da necessidade do sistema capitalista de dominação. O capitalismo
é excludente por natureza, toda a sua base teórica se articula na tentativa de justificar
essa exclusão. O racismo científico justifica a dominação do capitalismo europeu, já
maduro, a países em que esse capitalismo estava em formação. A crise do sub-
16 FERNÁNDEZ-ARMESTO, Felipe. Idem. p. 319.
17 PENA, Sérgio, Idem . P. 23
842
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consumo do século XIX fez com que o capitalismo expandisse de forma rápida e
violenta à procura de matérias primas industriais como o ferro, carvão e petróleo.
África e Ásia foram fragmentadas em zonas de influencia. A confêrencia de Berlin,
em 1884, definiu a partilha da África entre as principais potencias, criando fronteiras
artificiais sem respeitar as origens étnicas e tribais que antes delimitavam fronteiras
no continente. A corrida por possessões coloniais foi um dos principais fatores
motivadores da Primeira Guerra Mundial.
18 Voltaire – Cartas filosóficas – Cit. em PENA; Sérgio, Idem . P. 14-15.
843
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Argumentos como esse foram usados para justificar a dominação total dos
povos exteriores à Europa. A Europa passou a ter um Direito Absoluto ao mundo por
ser portadora do Espírito neste momento de seu desenvolvimento. A periferia se
tornou o espaço livre para que os pobres, fruto do capitalismo, se tornem
proprietários capitalistas; é o espaço que o sistema encontrou para se desafogar,
encontrando a mão de obra ou a matéria prima, que tanto lhe é cara. “Europa é um
termo elástico, uma construção mental que não corresponde a nenhuma realidade
19 Hegel – Cit. em DUSSEL, Enrique. 1492 o encobrimento do outro (a origem do “mito da Modernidade”).
Trad. Jaime A. Clasen. Petrópolis; Vozes: 1993. p. 18.
20 Hegel – Cit. em DUSSEL, Enrique. Idem. p. 20.
844
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5 Referências
ALENCAR, Jose de. Cartas a favor da escravidão. São Paulo; Hedra: 2008.
24 PENA; Sérgio, Idem . P. 61.
25 PENA; Sérgio, Idem . P. 62-63.
847
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AQUINO, Rubim Santos Leão. Historia das sociedades, das sociedades modernas às
sociedades atuais. Rio de Janeiro; Ao livro técnico: 2003.
BRAUDEL, Fernand. Gramática das civilizações. Trad. Antonio de Pádua Danesi. São
Paulo; Martins Fontes: 2004.
FAUSTO, Boris. História do Brasil, 13ª Ed. São Paulo; EDUSP: 2008.
LOPES, Nei. O racismo explicado a meus filhos. São Paulo; Agir: 2007.
848
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NICOLA, Ubaldo. Antologia ilustrada da filosofia – das origens a idade moderna. São Paulo;
Globo: 2005.
TEIXEIRA, Francisco M. P. História da América, 11ª Ed. São Paulo; Ática: 1990.
VOLTAIRE. Dicionário filosófico. Trad. Ciro Mioranza e Antonio Geraldo as Silva. São
Paulo; Escala: 2008.
849
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Camilla Capucio*
RESUMO
* Mestranda da Faculdade de Direito da UFMG. Bolsista do CNPq.
850
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De acordo com Norberto Bobbio, uma evolução das últimas décadas foi a
crescente importância atribuída, nos debates internacionais ao problema do
reconhecimento dos direitos do homem1. Embora não seja um problema recente,
somente após a segunda guerra mundial é que o debate “passou da esfera nacional para a
internacional, envolvendo pela primeira vez na história todos os povos”2.
O século XX foi marcado, portanto, pela internacionalização dos direitos
fundamentais, que passam por um processo histórico de positivação inicialmente no
interior dos Estados, para sua afirmação na esfera internacional. As liberdades e
garantias fundamentais, inerentes da condição do homem como ser humano e de sua
dignidade, passam portanto a interessar e a obrigar toda a comunidade internacional3.
Sobre esse período histórico, José Luiz Quadros de Magalhães afirma:
1 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992. p. 49.
2 Ibid.
3 DORNELLES, João Ricardo W. A Internacionalização dos Direitos Humanos. Revista da Faculdade de
5 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. São Paulo: Saraiva, 2008.
p. 15.
6 Para aprofundamento da questão dirigir-se à obra BOSON, Gerson de Britto Mello.
7 COMPARATO, Fabio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. São Paulo: Saraiva, 2008.
pag. 60.
8 Texto oficial em português disponível em: http://www.onu-
brasil.org.br/documentos_direitoshumanos.php (consulta em 01/05/10)
9 De maneira geral os principais direitos estabelecidos pela declaração são: direito à vida; à liberdade;
à segurança pessoal; de não ser torturado ou escravizado; de não ser detido ou exilado arbitrariamente;
à igualdade jurídica e protreção contra a discriminação; à julgamneto justo; à liberdade de pensamento;
à participação na política e na vida cultural da comunidade; à educação, trabalho e repouso.
853
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856
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Flávia Piovesan propõe uma tipologia dos casos julgados pela Corte, que se
classificariam em: 1) violações que refletem o legado do regime autoritário ditatorial;
2) violações que refletem questões de justiça de transição; 3) violações que refletem
desafios acerca do fortalecimento de instituições e da consolidação do Estado de
Direito e 4) violações de direitos de grupos vulneráveis.15
De maneira geral, a jurisprudência da Corte têm consolidado relevante
posicionamento de julgar os Estados por violações a obrigações positivas e negativas
de direitos humanos. Isto é, os Estados são corretamente considerados responsáveis
não somente pela obrigação de não violarem diretamente os direitos humanos
através de seus atos (legislativos, judiciários e executivos), mas também pela
obrigação de processar e julgar suspeitos, não omitindo-se mediante uma violação
perpetrada por terceiros em seu território. Nesse aspecto o sistema interamericano é
um importante parâmetro para a ação dos governos, fortalecendo a accountability dos
Estados.
13 TRINDADE, Antônio Augusto Cançado. Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Volume III. Porto Alegre: Sérgio Antonio Fabris Editor, 2003. pag. 609.
14 Ibid. pag. 610. Em referência às atas e documentos da IX Conferência Internacional Americana,
documento CB 125/C.VI 6.
15 PIOVESAN, Flavia. Temas de Direitos Humanos. São Paulo: Savaiva, 2009. Pag. 54-56.
857
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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16 MALINSKI, Tania Alexandra. A Jurisorudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos e a Trajetória
da Política Externa Brasileira em Matéria de Direitos Humanos: Pontos de Convergência. In: Os Rumos do Direito
Internacional dos Direitos Humanos. Ensaios em Homenagem ao Professor Antônio Augusto Cançado
Trindade. Tomo III. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2005.
17 PIOVESAN, Flavia. Temas de Direitos Humanos. São Paulo: Savaiva, 2009. Pag. 63.
858
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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18Ibid. Pag. 59-62.
19Carta da Organização dos Estados Americanos (Reformada pelo Protocolo de Reforma da Carta da
Organização dos Estados Americanos "Protocolo de Buenos Aires", assinado em 27 de fevereiro de
1967, na Terceira Conferencia Interamericana Extraordinária; pelo Protocolo de Reforma da Carta da
Organização dos Estados Americanos "Protocolo de Cartagena das Índias", assinado em 5 de
dezembro de 1985, no Décimo Quarto período Extraordinário de Sessões da Assembléia Geral; pelo
Protocolo de Reforma da Carta da Organização dos Estados Americanos "Protocolo de Washington",
assinado em 14 de dezembro de 1992, no Décimo Sexto período Extraordinário de Sessões da
Assembléia Geral; e pelo Protocolo de Reforma da Carta da Organização dos Estados Americanos
"Protocolo de Manágua", assinado em 10 de junho de 1993, no Décimo Nono Período Extraordinário
de Sessões da Assembléia Geral. Versão oficial em português disponível em:
http://www.oas.org/juridico/portuguese/carta.htm. (consulta em 01/05/10)
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I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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“Artigo 9
Um membro da Organização, cujo governo democraticamente
constituído seja deposto pela força, poderá ser suspenso do
exercício do direito de participação nas sessões da Assembléia
Geral, da Reunião de Consulta, dos Conselhos da Organização e
das Conferências Especializadas, bem como das comissões,
grupos de trabalho e demais órgãos que tenham sido criados.
860
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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“Artigo 1
Os povos da América têm direito à democracia e seus governos
têm a obrigação de promovê-la e defendê-la.
A democracia é essencial para o desenvolvimento social, político e
econômico dos povos das Américas.
Artigo 2
O exercício efetivo da democracia representativa é a base do
Estado de Direito e dos regimes constitucionais dos Estados
membros da Organização dos Estados Americanos. A democracia
representativa reforça-se e aprofunda-se com a participação
permanente, ética e responsável dos cidadãos em um marco de
861
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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20Carta Democrática Interamericana. Aprovada na primeira sessão plenária, realizada em 11 de
setembro de 2001. Versão oficial em português disponível em:
http://www.oas.org/OASpage/port/Documents/Democractic_Charter.htm (consulta em 01/05/10)
862
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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dos direitos humanos nos Estados Americanos, mas o respeito aos direitos humanos
é também condição primária para a concretização da democracia participativa plena.
O capítulo III do documento traça a interdependência existente também
entre a democracia, o desenvolvimento econômico-social e o combate à pobreza,
impelindo os Estados-membros a observar os direitos econômicos, sociais e culturais
como medidas de fortalecimento democrático.
Por fim, o capítulo IV, denominado Fortalecimento e preservação da
institucionalidade democrática, inaugura a parte dispositiva da Resolução, prevendo
mecanismos concretos de efetivação da democracia. O artigo 17º prevê o primeiro
desses mecanismos, o pedido de assistência à OEA feito por um governo legítimo
para impedir sua usurpação:
“Artigo 17
Quando o governo de um Estado membro considerar que seu
processo político institucional democrático ou seu legítimo
exercício do poder está em risco poderá recorrer ao Secretário-
Geral ou ao Conselho Permanente, a fim de solicitar assistência
para o fortalecimento e preservação da institucionalidade
democrática.”21
“Artigo 18
Quando, em um Estado membro, ocorrerem situações que
possam afetar o desenvolvimento do processo político
institucional democrático ou o legítimo exercício do poder, o
Secretário-Geral ou o Conselho Permanente poderão, com o
consentimento prévio do governo afetado, determinar visitas e
outras gestões com a finalidade de fazer uma análise da situação.
21 Ibid.
863
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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“Artigo 20
Caso num Estado membro ocorra uma alteração da ordem
constitucional que afete gravemente sua ordem democrática,
qualquer Estado membro ou o Secretário-Geral poderá solicitar a
convocação imediata do Conselho Permanente para realizar uma
avaliação coletiva da situação e adotar as decisões que julgar
convenientes.
22 Ibid.
23 Ibid.
864
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“Artigo 19
Com base nos princípios da Carta da OEA, e sujeito às suas
normas, e em concordância com a cláusula democrática contida na
Declaração da Cidade de Québec, a ruptura da ordem democrática
ou uma alteração da ordem constitucional que afete gravemente a
ordem democrática num Estado membro constitui, enquanto
persista, um obstáculo insuperável à participação de seu governo
nas sessões da Assembléia Geral, da Reunião de Consulta, dos
Conselhos da Organização e das conferências especializadas, das
comissões, grupos de trabalho e demais órgãos estabelecidos na
OEA.
(…)
Artigo 21
Quando a Assembléia Geral, convocada para um período
extraordinário de sessões, constatar que ocorreu a ruptura da
ordem democrática num Estado membro e que as gestões
diplomáticas tenham sido infrutíferas, em conformidade com a
Carta da OEA tomará a decisão de suspender o referido Estado
membro do exercício de seu direito de participação na OEA
mediante o voto afirmativo de dois terços dos Estados membros.
A suspensão entrará em vigor imediatamente.
865
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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Secretário-Geral, aprovada pelo voto de dois terços dos Estados membros, de acordo
com a Carta da OEA.
Outro mecanismo de fortalecimento da democracia delineado pela
Resolução consiste na assessoria por parte da OEA em processos eleitorais através
do envio de missões de observação eleitoral, a pedido e com a concordância do
Estado em questão, a ser realizada de forma objetiva, imparcial, transparente e
independente, apresentando à organização relatórios sobre a observação.
Cumpre observar, após análise preliminar dos principais mecanismos
existentes para a proteção da democracia no sistema americano, o caráter débil dessa
proteção. Isso porque, objetivando efetivar ao máximo o princípio na não-
intrevenção, a Carta Democrática coloca nas mãos dos “governos” o pedido e a
concordância para a assistência da OEA em situações de excepcionalidade
democrática, desconsiderando o fato de que em diversas situações são os próprios
governos que usurpam e ameaçam a democracia. Isso pode fazer da Carta
Democrática um instrumento de proteção dos governos, a prescindir da proteção
verdadeira da democracia, dada pelos critérios inclusive traçados no referido
documento.
5. CONCLUSÕES
866
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6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992.
COMPARATO, Fabio Konder. A Afirmação Histórica dos Direitos Humanos. São Paulo:
Saraiva, 2008.
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RESUMO
ABSTRACT
871
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consequente limitação dos poderes públicos. São direitos individuais com caráter
negativo por exigirem diretamente uma abstenção do Estado (...)” (NOVELINO,
2008, p. 227).
Contudo, é especialmente após a Revolução Industrial e com a luta do
proletariado que nasce a necessidade de instituição de direitos efetivamente ligados
ao valor igualdade, com a implementação de prestações materiais e jurídicas que
visem a reduzir as desigualdades no plano fático.
Esses direitos, por sua vez, vinculam-se à imperiosa necessidade de respeito
ao núcleo mínimo vital ou mínimo existencial do indivíduo e, embora estejam
condicionados à disponibilidade orçamentária de um Estado, as normas que os
informam não podem ser apenas programáticas, ante os anseios de sua
concretização, notadamente pelo caráter social desses direitos.
Conforme Vidal Serrano Nunes Júnior o denominado mínimo vital deve ser
“entendido como o dever do Estado, caudatariamente ao princípio da dignidade
humana, garantir a todos um ‘standard’ social mínimo incondicional” (NUNES
JÚNIOR, 1999, p. 70).
Durante o século XX, os direitos sociais são amplamente difundidos em
diversos textos normativos pelo mundo, ganhando evidente destaque em diversas
Constituições modernas, cujos marcos são a Constituição Mexicana de 1917 e a
Constituição de Weimar de 1919.
De outra banda, na concepção de Konrad Hesse (1996, p. 97), haveria uma
certa fragilidade intrínseca à natureza dos direitos sociais no que diz respeito ao seu
estatuto constitucional, pois, em seu entender, eles não consolidam direitos
subjetivos (que geram possibilidade de reparação perante o Estado), mas apenas
direitos que são realizados através de “tarefas de Estado”, programas de objetivos
sujeitos a amplas margens legislativas e políticas de configuração.
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3 Não se nega, por evidente, a distinção. Veja-se o seguinte julgado: “De acordo com o disposto no
art. 98 da Lei n. 8.112/1990, o horário especial a quem tem direito o servidor estudante condiciona-se
aos seguintes requisitos: comprovação de incompatibilidade entre o horário escolar e o da repartição;
ausência de prejuízo ao exercício do cargo; e compensação de horário no órgão em que o servidor
tiver exercício, respeitada a duração semanal do trabalho. Atendidos esses requisitos deve ser
concedido o horário especial ao servidor estudante, porquanto o dispositivo legal não deixa margem à
discricionariedade da Administração, constituindo a. concessão do benefício, nesse caso, ato
vinculado. Recurso não provido” (2002/0031578-8, DJ de 24.3.2003). Bem observadas as coisas e
tudo considerado, um grau de liberdade na avaliação dos requisitos (por exemplo, avaliação do
prejuízo), em certa medida, existe, mas há, está claro, nessa situação, mas acentuada vinculação, por
opção legislativa, ao princípio da legalidade.
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ao passo que, nos atos vinculados, emite apenas o mínimo de juízo estritamente
necessário à subordinação principiológica e ao controle interno do sistema.
Por conta disso, ganha evidente relevância a atuação do Órgão Ministerial e
do Poder Judiciário no controle das políticas públicas (conhecida como
“judicialização de políticas públicas”), as quais devem pautar-se pela concretização
dos direitos sociais, e cuja implementação nada mais representa que a própria
garantia de preservação da supremacia da Constituição Federal.
Não restam dúvidas, por outro lado, que muita polêmica existe quanto ao
controle judicial das políticas públicas, sobretudo porque alguns defendem, aí, haver
uma usurpação de competência atribuída a outros poderes que não ao Poder
Judiciário, com violação ao Princípio da Separação dos Poderes.
Contudo, em que pese esse ponto de vista, não parece ser ele o mais
adequado, notadamente porque a judicialização das políticas públicas representa uma
garantia ao indivíduo de que seu direito fundamental será concretizado, não obstante
tenha o Poder responsável pela sua concretização restado omisso. É, por assim dizer,
a busca do Órgão Julgador para fazer prevalecer um preceito constitucional, havendo
guarida no Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição.
Nossa Suprema Corte, ao enfrentar essa temática, em especial no que
concerne ao dever do Estado de assegurar vagas para crianças de até seis anos de
idades em creches e pré-escola, impôs referida obrigação ao Município de Santo
André (SP), após ação movida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, cuja
decisão resta assim ementada:
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4 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Improvimento do Agravo Regimental no Recurso
Extraordinário nº 410715/SP. Agravante: Município de Santo André. Agravado: Ministério Público do
Estado de São Paulo. Relator: Ministro Celso de Mello. Julgamento em 22/11/2005. 2º Turma.
Votação unânime. DJ 03/02/2006. p 76.
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José Geraldo Brito Filomeno (1999, p. 132), por sua vez, conceitua
cidadania como:
5-) Conclusão
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Paulo: Saraiva, 2001.
________. Direitos humanos e cidadania. 2ª ed. reform. São Paulo: Editora Moderna,
2004.
FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. São Paulo:
Malheiros, 2004, 3ª ed., pp. 216 – 237. Material da 2ª aula da Disciplina Processo
Administrativo: Grandes Transformações, ministrada no Curso de Especialização
Telepresencial e Virtual em Direito Processual: Grandes Transformações - UNISUL
- REDE LFG.
887
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MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e controle jurisdicional. 2ª ed. São
Paulo: Malheiros, 2007.
NOVELINO, Marcelo. Direito constitucional. 2ª ed. rev., atual. e ampliada. São Paulo:
Editora Método, 2008.
PINSKY, Jaime; PINSKY, Carla Bassanezi (Org.). História da cidadania. 2ª ed. São
Paulo: Contexto, 2003.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 19ª ed. rev. e atual. São
Paulo: Malheiros, 2001.
________. Aplicabilidade das normas constitucionais. 3ª ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1998.
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RESUMO
I - Introdução
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com entidades da sociedade civil organizada que atuam na defesa dos direitos
humanos. As grandes conferências que vêm acontecendo no país em nível municipal,
estadual e nacional são um exemplo de espaços de encontro e debate dentro dos
quais muitas das normatizações presentes do PNDH-3 surgiram.
Esse debate amplo com a sociedade civil pode ser verificado pela extensão
do programa e pela forma detalhada com que trata os temas abrangidos. Por outro
lado, pode ser verificado também pela postura ambígua que muitas entidades
assumem diante do programa. A igreja católica, por exemplo, que participou da
elaboração do documento e o defende em muitos pontos, apresenta-lhe críticas em
temas como o aborto e a retirada de símbolos sacros das repartições públicas. Isso
mostra que o PNDH-3 é resultado de um debate do qual participaram vozes distintas
e significativamente plurais. O que poderia indicar a existência de contradições
internas ao programa, ao receber apoio e crítica ao mesmo tempo de uma mesma
instituição, nada mais indica do que a legitimidade desse programa. Afinal, essas
aparentes contradições expressam não mais do que o caráter democrático do PNDH-
3 e sua construção aberta a atores diversos e com pontos de vista destoantes.
Composto de seis eixos orientadores e vinte e cinco diretrizes que se
dividem entre esses eixos, o programa desce a minúcias e procura responder
satisfatoriamente a demandas oriundas de setores os mais variados da sociedade
brasileira. A interação democrática entre Estado e sociedade civil; a articulação entre
desenvolvimento e direitos humanos; a universalização de direitos num contexto de
desigualdade; a segurança pública, o acesso à justiça e o combate à violência; a
educação e a cultura em direitos humanos; e o direito à memória e à verdade – isto é,
os seis eixos que compõem o programa – podem ser agrupados sob a mesma lógica
de luta e respeito pelos direitos humanos, mas mantêm entre si diferenças de foco
capazes de revelar a vastidão da abordagem pretendida pelo PNDH-3.
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a relação entre qualquer realidade social e as pretensões normativas que podem ser
reconstruídas a partir de seu interior.
Após um longo período ditatorial, as movimentações da sociedade civil em
prol das Diretas Já e sua participação na elaboração do texto constitucional de 1988
puderam mostrar um amadurecimento histórico da democracia brasileira. O período
pós-1988 tem reforçado esse amadurecimento e refutado teses tradicionais acerca de
uma incapacidade do Brasil para a democracia ou acerca da necessidade de seu
contentamento com aquilo que seria uma democracia possível (FERREIRA FILHO,
1979).
Se é verdade que não se vive no país uma democracia plenamente
estabilizada, não é menos verdade que a democracia, em si, é um regime que jamais
se estabiliza plenamente. A democracia deve ser entendida como processo, como
processo aberto a inclusões múltiplas e infinitas. Isso não quer dizer que a
democracia não possua limites. Ela os possui, e os encontra naquelas atitudes ou
demandas que ameaçam a pluralidade e a abertura à diferença que a devem
caracterizar.
Como processo, a democracia é também hipérbole. Hipérbole como exagero
em face das instituições em que se consubstanciam os princípios democráticos,
princípios que parecem sempre exigir mais do que aquelas instituições são capazes de
oferecer. E hipérbole também como busca que nunca termina, como aproximação
que nunca chega. E não chega porque não há lugar certo aonde chegar.
Democracia é processo e caminho, não chegada. Por conseguinte, se não há
um modelo perfeito a buscar e muito menos a esperar, é preciso deixar de lado tanto
a tese da incapacidade brasileira para a democracia quanto a tese da democracia
possível. A elas deve ser oposta a tese da democracia sem espera (CATTONI, 2009),
da democracia que se constrói aqui e agora, com suas dificuldades, obstáculos e
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erros, mas buscando aprender com todos esses momentos em prol da construção de
uma sociedade mais justa, mais livre e mais igualitária.
Não é na saída nem na chegada, mas no meio da travessia que o real se
dispõe. O PNDH-3 está nesse meio. E, se ele não é plenamente o real, porque este,
em termos de democracia, jamais pode ser fixado, ele é uma etapa fundamental
dentro da busca pela consolidação do projeto constituinte do Estado Democrático de
Direito brasileiro.
V - Referências Bibliográficas
ARENDT, Hannah. Entre o passado e o futuro. Trad. Mauro W. Barbosa. 5a. edição.
São Paulo: Perspectiva, 2005.
ARENDT, Hannah. Da Revolução. Trad. Fernando Dídimo Vieira. Rev. Trad. Caio
Navarro Toledo. Brasília e São Paulo: Universidade de Brasília e Ática, 1988.
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. A democracia possível. 5a. ed., rev. São Paulo:
Saraiva, 1979.
ROSA, João Guimarães. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1994.
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RESUMO
sabido que essa categoria de direitos é caracterizada por uma ínfima manifestação
constitucional, portanto, nota-se uma proteção pouco expressiva pelo Estado
Brasileiro. Destarte, pode-se inferir que esses interesses jurídicos não ultrapassam "a
órbita do Direito Internacional”, denotando a ocorrência de inexigibilidade de tais
direitos, o que deve consubstanciar-se preferencialmente no plano das ordens
internas.
SUMÁRIO
1. Introdução
2 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 6. ed. São Paulo: Malheiros Editores Ltda, 1996,
p. 514.
3 BONAVIDES, Curso de Direito..., cit, p. 515.
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algumas nações, mas para outras não há essa proteção de maneira absoluta, ao passo
do infrator ser sancionado, retirando-lhe este direito.
Historicamente, pode-se fixar a Revolução Francesa em 1789, como o
momento de reconhecimento e declaração dos direitos humanos, o que pode ser
justificado pelo lema revolucionário “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”. Tal
expressão, caracterizada pela universalidade e generalização, influenciou a
classificação geracional triádica de Norberto Bobbio, remetendo a contextos
históricos específicos.
O princípio da Liberdade refere-se à primeira geração, pois se buscava o
rompimento com as opressões estatais e religiosas. Já o ideário de Igualdade
relaciona-se com a segunda geração de direitos, uma vez que todos os homens são
iguais, o que possibilita gozar dos direitos existentes, objetivando excluir todo tipo de
discriminação. E, por fim, os direitos de terceira geração, objeto desta pesquisa,
surgiram principalmente no contexto pós-guerras mundiais, demonstrando a
necessidade de se proteger questões mais amplas no seio social, em prol da
coletividade, rompendo com o individualismo característico das primeiras gerações.
Cabe ressaltar que não houve uma sobreposição entre gerações, pelo
contrário, o caráter que as perpassa é de complementação, na medida em que a
sociedade desenvolve-se, manifestam-se novas demandas e, portanto, o Direito
adapta-se às novas condições. Diante disso, tornam-se inteligíveis as motivações em
torno dos direitos de Terceira Geração. Estes surgiram em um momento histórico de
intensa instabilidade social, em que as pessoas temiam as conseqüências de uma
possível guerra. A paz deveria ser tutelada. Patrimônios da humanidade foram
destruídos em batalhas. O capitalismo, consolidado no período, propiciava um
desenvolvimento desumano, em que o consumo exarcebado tornou-se pressuposto
para existência. As informações passaram a circular em frações de segundo.
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Renovar, 2002, p. 85 apud LIPOVETSKY, Nathália. A teoria dos direitos humanos fundamentais e o direitos
de natureza prestacional [monografia de graduação]. Belo Horizonte: UFMG, 2009
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8 DI RUFFIA, Paolo Biscaretti. Direito Constitucional: Instituições de Direito Público. Trad. Maria
Helena Diniz. 9. Ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1984, p. 515.
9 DI RUFFIA, Paolo Biscaretti. Direito Constitucional...cit, p.517.
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10 DI RUFFIA, Paolo Biscaretti. Direito Constitucional...cit, p.515.
11 DI RUFFIA, Paolo Biscaretti. Direito Constitucional...cit, p.516-517
12 DI RUFFIA, Paolo Biscaretti. Direito Constitucional...cit, p.518-519.
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13 DI RUFFIA, Paolo Biscaretti. Direito Constitucional...cit, p.518-519
14 A. de Tocqueville, láncien régime et la révolution inCEuvres complètes, Paris, 1952, tomo II, p.72. { ed.
brasileira: O antigo Regime e a Revolução, Brasília, ed. UNB, 1979. Apud BOBBIO, A Era dos
Direitos, cit., p86.
15 DE ANDRADE, Maria Inês Chaves. A Fraternidade como Direito Fundamental: Entre o ser e o dever
Para uma reflexão mais elaborada acerca dos Direitos de Terceira Geração,
é interessante traçar as características mais relevantes que os perpassam, podendo,
assim, compreender os fatores relacionados à inexigibilidade dessa categoria de
normas.
Bonavides faz uma consideração conceitual extremamente sensível e
completa de tais direitos:
16 BONAVIDES, Curso de Direito..., cit, p.522.
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17 BONAVIDES, Curso de Direito..., cit, p.523
18 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos Humanos Fundamentais. 4. ed. rev. São Paulo,
Saraiva, 2000, p.58.
19 FERREIRA FILHO, Direitos Humanos Fundamentais, cit., p.64-66.
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24 BOBBIO, A Era dos Direitos, cit., p.82.
25 ABELHA, Marcelo.Aula...cit.,. p.5-6.
26 ABELHA, Marcelo. Aula...cit.,. p.5-6.
27 FERREIRA FILHO, Direitos Humanos Fundamentais, cit., p.58.
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28 ABELHA,Marcelo. Aula...cit.,. p.4.
29 ABELHA,Marcelo. Aula...cit.,. p.5-6.
30 FERREIRA FILHO, Direitos Humanos Fundamentais, cit., p.61.
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31 DE MORAES, Alexandre.Direito Constitucional. p. 677
32 FERREIRA FILHO, Direitos Humanos Fundamentais, cit., p.62
33 BRASIL. Constituição Federal da República.
34 DE MORAES, Alexandre. Direito Constitucional, cit., p. 680
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5. Conclusão
35 BOBBIO, A Era dos Direitos, cit., p.83.
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6. Referências Bibliográficas
36 BOBBIO, A Era dos Direitos, cit., p.44-45.
37 BOBBIO, A Era dos Direitos, cit., p.83.
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BOBBIO, Norberto. A Era Dos Direitos. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de
Janeiro: Campus, 1992.
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RESUMO
Direito e Sociedade, Tempo e Direito. Membro do projeto de extensão “Universitários Vão à Escola”.
Membro da gestão diretora do Centro Acadêmico de Direito da Universidade de Brasília. Colaborador do
Programa de Educação Tutorial em Direito da Universidade de Brasília. Militante do movimento “Fora
Arruda e Toda Máfia”.
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INTRODUÇÃO
3 SOUSA JUNIOR (2009, p. 19).
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4 Veja-se, por exemplo, o discurso a seguir, de Lúcio Costa, cuja irrealidade salta aos olhos: “Ela [Brasília]
deve ser concebida não como simples organismo capaz de preencher satisfatoriamente e sem esforço as
funções vitais próprias de uma cidade moderna qualquer, não apenas como urbs, mas como civitas, possuidora
dos atributos inerentes a uma capital.” (COSTA, 1957).
5 COSTA apud SOUSA JUNIOR (2009, p. 20).
6 SOUSA JUNIOR (2009, p. 21).
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7 Aqui, ganha destaque a agressão sofrida pela Universidade de Brasília, que sofreu sucessivas invasões por
tropas militares, resultando na prisão de estudantes e professores e na supressão da liberdade acadêmica de
crítica, função fundamental num Estado Democrático.
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8 FAORO (2001, p. 718).
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9 MADISON (2003, p. 319). Tradução livre: “O método de suprir a falta de melhores motivos pela oposição
e rivalização de interesses deve ser utilizado em todas as questões humanas, sejam elas públicas ou privadas.
Pode-se verificar isso com maior clareza na distribuição dos poderes subordinados, onde o constante objetivo
é dividir e combinar os distintos interesses, de forma a cada um se tornar um contrapeso ao outro – e ainda
de modo que o interesse privado de cada indivíduo sirva de sentinela ao exercício dos direitos públicos. Essas
invenções do bom-senso [prudence] são não menos fundamentais à distribuição dos poderes superiores de um
Estado”.
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10 O sentido de contingência aqui adotado coincide com aquele evidenciado por Niklas Luhmann: “Por
contingência entendemos o fato de que as possibilidades apontadas para as demais experiências poderiam ser
diferentes das esperadas, [...] perigo de desapontamento e necessidade de assumir[em]-se riscos”
(LUHMANN, 1983, pp. 45-46). Num sistema social é necessário reconhecer uma contingência que vá além
da contingência simples do campo sensorial, mas que chegue a um aspecto de dupla contingência, imanente do
aspecto da alteridade que possibilita a própria existência do sistema social, entendido como uma diversidade
de fluxos comunicativos. Conforme Luhmann, “reconhecer e absorver as perspectivas de um outro como
minhas próprias só é possível se eu reconheço o outro como um outro eu [...]. Com isso, porém, tenho que
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conceder que o outro possui igualmente a liberdade de variar de comportamento, da mesma forma que eu.
Também para ele o mundo é complexo e contingente” (LUHMANN, 1983, p. 47).
11 Nas palavras de Luhmann, “complexidade deve ser entendida [...] como a totalidade das possibilidades de
experiências ou ações cuja ativação permita o estabelecimento de uma relação de sentido” (LUHMANN,
1983, p. 12).
12 Expectativa, no horizonte da teoria dos sistemas, pode ser percebida como espectro de possibilidades
realizáveis.
13 Sistemas, para os fins desse estudo, devem ser tomados como “conjunto de elementos inter-relacionados,
cuja unidade é dada por suas interações e cujas propriedades são distintas da soma dos elementos do
conjunto. Sendo que sistemas se apresentam, por seu turno, enquanto esses elementos, inclusive. E estes são
auto-referenciais; pois têm a capacidade de estabelecer aquelas relações entre si ao tempo em que diferenciam
essas relações das relações mantidas com seu ambiente.” (CHAI in CATTONI [coord.], 2004, pp. 571-572).
Os sistemas operam por códigos binários próprios – cada sistema possui o código que processará as irritações
que vêm do ambiente, de forma a processar essas irritações segundo seus próprios critérios. É tal
processamento que viabilizará a conformação do sistema enquanto sistema autorreferenciado. No contexto
moderno, em que se percebe uma diferenciação funcional dos subsistemas sociais, estes apresentam
mecanismos próprios de funcionamento, que caracterizarão seu fechamento funcional. Suas possibilidades de
conhecimento, contudo, não podem ser restritas – os sistemas são, e simplesmente são, irritados pelas
informações que vêm do ambiente. Mantêm-se, pois, cognitivamente abertos.
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14 Isso porque, conforme as teorias constitucionais contemporâneas, o fundamento do direito não pode ser
buscado senão dentro do próprio direito. “O mundo em si, o absoluto eu, permanece em um horizonte
inacessível, incognoscível em si mesmo, pois esse horizonte é o limite do próprio observar, não sendo
possível observá-lo como um todo unitário, indo além do horizonte. [...] Há, pois, diante de nós, um contexto
altamente mutável, que não mais admite descrições que ainda se fundamentem em pretensões “mitológicas”
da razão, as quais todos os problemas eliminaria, todas as tensões superaria, já que tais racionalidades não
fazem mais que ocultar o fato de que essas mesmas tensões são constitutivas de uma realidade por demais
complexa para deixar-se apreender por esquemas científicos oniscientes, de uma espécie de solipsismo
metodológico, não conseguindo observar a sua própria limitação, pois ainda presas a dogmas clássicos do
conceito de conhecimento, configurando, em última hipótese, mecanismos que tão-somente encobrem ou
dissimulam uma representação dessa realidade” (PRATES in CATTONI [coord.], 2004, pp. 524 e 535).
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2.2 O acoplamento estrutural entre direito e política como única saída possível
para a crise sistêmica instalada no DF
15 NEVES (2009, p. 44).
16 LUHMANN (s/d). Pode-se interpretar tal afirmação da seguinte forma: o sistema, operativamente,
autorreproduz-se, entretanto, esta autorreprodução somente pode ser viabilizada com base em informações,
irritações, que vêm do seu ambiente.
17 Idem, ibidem.
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fato de que o direito somente pode ser criado pelo próprio direito, “e não ab extra
pela natureza ou pela vontade política”18.
O instrumento fundamental para que o direito afirme sua autonomia e que,
por conta disso, lhe confere fundamentação em última instância, é a Constituição19,
constituída pelo sistema jurídico e constituinte do mesmo sistema e, por conta disso,
constituinte de si mesma. Tal afirmação leva à necessária constatação de existência de
um paradoxo interno ao sistema jurídico, trazido pela positivação que o torna
autorreferenciado.
Como é sabido, a existência da Constituição em seu sentido moderno se
deve, sobretudo, a arranjos institucionais que viabilizaram sua consolidação como
paramount law. Pode-se, então, dizer que sua existência deve-se não somente à sua
juridicidade, mas também à sua viabilização política. Cria-se, dessa maneira, um novo
paradoxo: o poder soberano vincula-se a si mesmo através de decisões políticas por
ele tomadas.
Como se pode perceber, a Constituição em sentido moderno surge de uma
necessidade de superação ou ocultação desses dois paradoxos, que aparecem a partir
18 Idem, ibidem. “O sistema se surpreende com a própria diferenciação social ao ponte de não poder
compreender em um primeiro momento (que para os filósofos do direito persiste até agora) a positividade
dada com essa diferenciação. Como no passado, o sistema jurídico continua a exigir uma instância [supra-
]regulativa, enquanto o modo segundo o qual essa instância é, a cada vez, definida, por exemplo como
política, como Estado, como authority, como povo ou como natureza, tem uma relevância absolutamente
secundária. Na positivação global do direito expressa-se efetivamente, no entanto, a independência e a
autodeterminação do sistema. De fato, a suspeição de arbitrariedade vinculada a esse processo conduz o
observador a ver apenas um sistema jurídico em que o que ali ocorre pode ser tudo menos arbitrário. O que
significa, em primeiro lugar, que toda imutabilidade, inviolabilidade, superioridade etc. deve ser construída no
interior do próprio sistema jurídico.” (Idem, ibidem).
19 “A Constituição fecha o sistema jurídico ao discipliná-lo como um âmbito do qual ela, por sua vez,
reaparece. Ela constitui o sistema jurídico como sistema fechado mediante o seu reingresso no sistema. Nas
modalidades já discutidas, isso se verifica ou através de regras de coalizão que garantem o primado da
Constituição; ou mediante a previsão constitucional de um controle de constitucionalidade do direito; e não
em último lugar: ao invocar solenemente a instância constituinte e a sua vontade como vinculantes de per se. A
Constituição reconhece a si própria (La costituzione dice io a se stessa)”. (Idem, ibidem).
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21HABERMAS (2003, p. 170).
22Em termos: Art. 34. A União não intervirá nos Estados nem no Distrito Federal, exceto para:
I - manter a integridade nacional;
II - repelir invasão estrangeira ou de uma unidade da Federação em outra;
III - pôr termo a grave comprometimento da ordem pública;
IV - garantir o livre exercício de qualquer dos Poderes nas unidades da Federação;
V - reorganizar as finanças da unidade da Federação que:
a) suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força
maior;
b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos
estabelecidos em lei;
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deve ser entendida como medida extrema, uma vez que vai de encontro a um dos
princípios fundamentais consagrados por nossa carta de princípios: o princípio
federativo.
Sua utilização, portanto, deve ser feita somente como última alternativa,
quando apenas uma suspensão do regime federativo e, consequentemente, da
autonomia da unidade afetada pode salvaguardar o regime democrático e a ordem
constitucional.
A situação vivenciada ao longo dos últimos meses no Distrito Federal,
acentuada e condicionada pela história política local, leva ao fortalecimento do
discurso de defesa da decretação de intervenção federal nos poderes Executivo e
Legislativo locais.
O primeiro motivo que justifica o decreto de intervenção vem das próprias
bases históricas do DF, onde o público foi sucessivamente vilipendiado em termos
de participação política. Embora seja largamente sabido que o poder público local
tem sido sucessivamente utilizado para que valores personalistas e privatistas fossem
reproduzidos, quase nada se sabe sobre os nefastos acontecimentos que tomaram
corpo nas estruturas governamentais locais.
Um decreto de intervenção federal, no presente momento, poderia
viabilizar uma real e efetiva investigação, bem como o reconhecimento dos
criminosos responsáveis pelos desmandos e pela corrupção sistêmica localizada em
Brasília. O amplo acesso a tais informações é um direito inegociável de todos os
VI - prover a execução de lei federal, ordem ou decisão judicial;
VII - assegurar a observância dos seguintes princípios constitucionais:
a) forma republicana, sistema representativo e regime democrático;
b) direitos da pessoa humana;
c) autonomia municipal;
d) prestação de contas da administração pública, direta e indireta.
e) aplicação do mínimo exigido da receita resultante de impostos estaduais, compreendida a proveniente
de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino e nas ações e serviços públicos de saúde.
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23Nomeadamente, o senhor Rogério Rosso (PMDB-DF), eleito por treze votos de deputados distritais, dos
quais oito estavam envolvidos nos escândalos de corrupção (inclusive um recém-saído do cárcere em
decorrência de tais escândalos.
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do direito concretiza-se [...] em direito fundamentais que criam condições para iguais
pretensões à participação em processos legislativos democráticos. Estes têm que ser
instaurados com o auxílio do poder politicamente organizado”24. Quando o poder
institucional age em contrário a essa pretensão de abertura comunicativa do espaço
público, ele converte-se necessariamente em autoritarismo, em antidireito.
Resta, ainda, o argumento textual-normativo. A desordem institucional está
flagrantemente ferindo os princípios republicano e representativo. Ao primeiro, fere
pelo fato de o poder público servir, contínua e sub-repticiamente, para atender aos
interesses privados patrimonialistas daqueles que, não satisfeitos em deterem os
meios de produção, acham-se detentores do aparelho estatal (o que configura a
subversão lógica do sistema do direito pelo sistema da economia). Ao segundo,
representa ataque direto pelo fato de que os “representantes do povo” encadeirados
na Câmara Legislativa não representam ninguém que não a si mesmos, como
demonstrado no escândalo de venda de votos no Parlamento.
A quebra de tais princípios dá causa à intervenção, como se pode ler do art.
34, VII, a, da carta de direitos. E mais: culmina com a quebra do terceiro requisito
dessa alínea, o regime democrático.
Enquanto perdurar a situação de um governo ilegítimo mantendo-se à custa
de conchavos esquizofrênicos no poder, perdurará a violência institucionalizada aos
milhões de brasileiros que aguardam uma resposta em defesa de um regime de
legalidade e institucionalidade. Como assenta Ronald Dworkin, “the Government will not
re-establish respect for law without giving law some claim to respect. It cannot do that if it neglects the
one feature that distinguishes law from ordered brutality”25. Enquanto acreditarmos que é
24HABERMAS (2003, p. 171).
25 DWORKIN (1978, p. 205). “O Estado não vai restabelecer o respeito pela lei, sem possibilitar alguma
reivindicação por respeito à lei. Não enquanto negligenciar a única característica que distingue o Direito da
brutalidade institucionalizada” (tradução minha, não revisada).
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mais seguro manter o status quo que buscar a garantia de direitos públicos políticos,
permaneceremos reféns do autoritarismo antijurídico e antidemocrático.
É preciso levar os direitos a sério no Distrito Federal. Afirmar a
independência do sistema jurídico e articulá-lo politicamente por meio da
Constituição é imprescindível para a superação de uma crise que já se revelou
avassaladora das estruturas democráticas de Brasília.
3 UMA ÚLTIMA REFUTAÇÃO
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26 BENVINDO (2009, pp. 163-164).
27 SEN (2000, p. 336).
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CONCLUSÃO
Esta não é, pois, mais que uma defesa da transparência e da publicidade dos
atos públicos que, em consequência, levará a uma necessária ampliação da discussão
sobre as estruturas governamentais do Distrito Federal.
O povo desta unidade da federação há muito está afastado – não por
vontade própria – das instituições que elegem o seu destino. A esse povo tem sido
negado, continuamente, o direito de livre participação na esfera pública democrática
e a plena realização e efetividade dos direitos políticos fundamentais. Subvertidos
pelo economicismo, os processos eleitorais não encontram mais legitimidade.
Resta, como esperança para um futuro em que se concretize a abertura
comunicativa do Estado e o pluralismo social, a alternativa institucional de uma
intervenção da União sobre os poderes locais submetida a controles que busquem
garantir “uma pluralidade de perspectivas, estilos de discurso e maneiras de expressar
a particularidade de situações sociais, bem como a aplicabilidade dos princípios”28
constitucionais.
É preciso enxergar o pós-crise como momento de oportunidade política
para uma guinada democrática, que mantenha em perspectiva a necessidade de
incremento das liberdades públicas e que tenha em mente todo o processo de
opressão no qual mergulhou o Distrito Federal ao longo de sua história.
Pensar na lógica dos direitos, no presente momento, é ter como
fundamento o próprio direito, na medida em que se realiza como ideia democrática
de autolegislação, que confere a si mesmo a validade de que necessita para uma
realização dos princípios constitucionais de igualdade e liberdade assegurados nas
lutas políticas da modernidade.
28 YOUNG (2001, pp. 385-386).
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COSTA, Lúcio. Relatório do Plano Piloto de Brasília. Anais do I Seminário de estudos dos
problemas urbanos de Brasília. Brasília: Senado Federal, 1974.
FAORO, Raymundo. Os donos do poder: formação do patronato político brasileiro. 3 ed. Rio
de Janeiro: Globo, 2001.
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MADISON, James; HAMILTON, Alexander; JAY, John. The federalist papers. Nova
Iorque: Signet Classic, 2003.
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RESUMO
O trabalho busca reconstruir a idéia de justa memória como desenvolvida por Paul
Ricoeur, a partir de uma análise sistemática e não-linear da obra "A memória, a
história, o esquecimento" e numa interpretação orgânica que leva em conta outros
momentos de sua obra. Tal esforço justifica-se ao inserir-se no contexto de debate
sobre justiça de transição no Brasil, reanimado na atualidade, por exemplo, pela
ADPF que questiona a interpretação corrente da Lei de Anistia no Supremo ou pelas
diretrizes sobre Direito à Memória e à Verdade instituídas pelo Terceiro Plano
Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3). Por justa memória Ricoeur compreende
uma memória sem excessos: nem o esquecimento absoluto, apagamento das
recordações, nem a memória obsessiva, incapaz de esquecer. Ambas as hipóteses
teriam por consequência a repetição do passado, seja pela não-assimilação de suas
lições, seja pelo que Freud chamou de "passagem do pensamento ao ato". Não se
trata, todavia, de um justo termo aristotélico da memória. A justa memória só pode
ser entendida como uma memória pública livre de coerções e abusos e na qual se
reconheçam todos os seus titulares, sendo, portanto, indissociável de uma
democracia radical.
* Uma primeira versão deste artigo foi apresentada como trabalho final da disciplina de graduação
“Tópicos em Teoria e Metodologia da História: Paul Ricoeur e a História: Tempo e Narrativa,
Memória e Esquecimento”, do Departamento de História/UFMG, ministrada pelo Prof. José Carlos
Reis no 2º semestre de 2009. Agradecimentos ao Professor José Carlos pela rica experiência intelectual
de seus seminários, e ao amigo David Francisco Lopes Gomes por sua leitura atenta e suas
importantes sugestões.
** Graduando em Direito pela UFMG.
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INTRODUÇÃO
1 RICOEUR, Paul. A memória, a história, o esquecimento. Campinas: UNICAMP, 2007.
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I JUSTIÇA E VERDADE
3 RICOEUR. Justiça e verdade, cit., pp. 63-64.
4 RICOEUR. Justiça e verdade, cit., p. 76.
5 RICOEUR. Justiça e verdade, cit., p. 77.
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10 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 292-293.
11 “Entendo por isso o sentido do desígnio poético que constitui a qualidade histórica da história e a
preserva de se dissolver nos saberes aos quais a historiografia vem se juntar”. RICOEUR, Paul. Tempo
e narrativa, tomo I. Campinas: Papirus, 1994. p. 257.
12 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 289.
13 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 289.
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Por força desse pacto, conta-se com “um leitor desconfiado, que espera dele
[do historiador] não somente que narre, mas que autentifique sua narrativa”.14 É ao
leitor que se dirige, na verdade, a confiança de Ricoeur. Se nada pode garantir, a priori,
a fidelidade ou a veracidade dos discursos que tem por referência o passado, é na
recepção desses discursos – não uma recepção passiva, mas ativa e crítica – e na sua
ampla discussão que está a chave para prevenir a cristalização de seu sentido como
verdadeiro. Na hermenêutica de Ricoeur, o que o leitor visa ao interpretar um texto
não é simplesmente compreender o texto, mas a si mesmo e a seu mundo.15 Assim,
do mesmo modo como a compreensão completa do mundo é impossível (ao menos
se aceitarmos o desafio de Ricoeur de não sucumbir à “hybris da reflexão total”), o
sentido de um texto deve permanecer aberto. É no leitor crítico que se encontra a
maior garantia – uma garantia externa – de que a representação presente do passado
é, em alguma medida, fiel a ele.
Todavia, na transição da dimensão passiva e individual da memória para a sua
dimensão pragmática e coletiva (aí incluída a história, que preserva, contudo, sua
peculiaridade), surgem novas barreiras à sua fidelidade aos acontecimentos passados.
Ricoeur propõe uma tipologia de possíveis abusos da memória exercitada. No
nível patológico-terapêutico, fala-se de uma memória impedida por recalques e/ou
traumas. No nível prático, a memória pode ser manipulada intencionalmente, tendo
seu conteúdo modificado e/ou apagado. Por fim, no nível ético-político, é possível
“obrigar” a memória pelos meios institucionais, tais como as comemorações oficiais
e o dito dever de memória, que pode ser considerado um abuso na medida em que se
impõe de modo absoluto, vinculando o futuro a jamais esquecer. Mas aqui já se
adentra na problemática da justa medida do lembrar e esquecer.
14RICOEUR. Tempo e narratica, tomo I. cit., p. 253.
15Cf. a ideia de círculo hermenêutico da tríplice mimese, capítulo 3 da parte I de Tempo e narrativa:
RICOEUR, Paul. Tempo e narrativa, tomo I. cit., pp. 85-132.
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16 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 435.
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idéia e intersubjetividade. De todo modo, escapa aos objetivos deste texto essa
discussão. Admita-se, ao menos, o caráter heurístico destes conceitos na investigação
de Ricoeur antes de se lhe dar prosseguimento.
Para Ricoeur, o trato dispensado pela neurociência à questão do
esquecimento é cientificamente irrepreensível, mas as questões que a filosofia postula
são de outra ordem17.
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20 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 437.
21 Cf. o capítulo 3 do Segundo estudo: “Reconhecer-se a si mesmo” em RICOEUR. Percurso do
reconhecimento. Cit., pp. 123-145.
22 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 438.
23 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 448.
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24 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 437.
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27 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 85.
28 FREUD apud RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 85-86.
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Assim é que se pode dizer que a justa memória de Ricoeur é uma memória de
reserva e sem impedimentos, o que só é possível mediante o trabalho público de
memória, a discussão no espaço público. É no “falar sobre”, no debate sujeito à
contra-argumentação e que não se furta de trazer à tona os assuntos mais sensíveis de
uma sociedade, que se abre a possibilidade de uma reconciliação com o passado. É
nesse trabalho público de rememoração, para ir, com Ricoeur, além de seu texto, que
o reconhecimento de si se iguala ao reconhecimento mútuo, perfazendo a lacuna
semântica na “polissemia regrada” do reconhecimento30. Se, como dito, no lembrar-
se, o sujeito se lembra de algo e, reflexivamente, lembra-se de si, reconhecendo-se na
lembrança, na rememoração pública, o sujeito que se lembra não é mais o indivíduo,
mas o coletivo social que, no trabalho de rememoração, se reconhece enquanto
coletivo de indivíduos co-partícipes de um processo histórico. O momento do
reconhecimento-reconnaissance de Bergson encontra o do reconhecimento-Anerkennung
hegeliano, esta outra acepção filosófica do termo, significando não uma simples
identificação cognitiva, “mas sim, tendo esse ato como premissa, a atribuição de um
valor positivo a essa pessoa, algo próximo do que entendemos por respeito”.31
29 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 92.
30 Cf. a introdução de RICOEUR. Percurso do reconhecimento, cit. A hipótese de Ricoeur nesta obra é que
há uma polissemia regrada, a meio caminho entre a homonímia e a univocidade, para as acepções
filosóficas do termo “reconhecimento”, da Rekognition kantiana, passando, não linearmente, pela
Reconnaissance bergsoniana, até o Anerkennung hegeliano. Estes três momentos seriam equivalentes,
respectivamente ao reconhecimento-identificação, ao reconhecimento de si e ao reconhecimento
mútuo.
31 ASSY, Bethânia; FERES JÚNIOR, João. Reconhecimento. In: BARRETO, Vicente de Paulo
(coord.). Dicionário de filosofia do direito. São Leopoldo: Unisinos; Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 705.
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32BENJAMIN, Walter. Sobre o conceito de história. In: ________. Magia e técnica, arte e política:
ensaios sobre literatura e história da cultura. São Paulo: Brasiliense, 1985. p. 224. Grifo meu.
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33 Cf. RICOEUR, Paul. Sanção, reabilitação, perdão. In _______. O justo I: a justiça como regra moral
e como instituição. São Paulo: Martins Fontes, 2008.
34 RICOEUR. A memória, a história, o esquecimento, cit., p. 465.
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pode saber. Se não for o caso, só a punição pode afrontar a ameaça do esquecimento
irrefletido.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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1 INTRODUÇÃO
1 O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos,
Culturais e Sociais foram adotados pela Resolução 2200 da Assembléia Geral da ONU, em dezembro
de 1966, e começaram a viger em 1976, quando atingiram o número mínimo de ratificações. O
primeiro impele os Estados-parte a respeitarem os direitos civis e políticos, incluindo aí o direito à
vida, a liberdade de expressão e os princípios do devido processo legal e da ampla defesa. O segundo
contempla direitos como à saúde, à educação, ao trabalho e trabalhistas, e a uma condição digna de
vida.
2 GOMES, Flavio. O Sistema Interamericano de proteção aos direitos humanos e o direito brasileiro. São Paulo:
human rights do not yet exist to consider agreements with a view to establishing within their respective regions of suitable
regional machinery for the promotion and protection of human rights.”
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6 PIOVESAN, Flávia. Direito Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais
europeu, interamericano e africano. São Paulo: Saraiva, 2006.
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hondurenha7.
Como a Corte pode impor medidas provisórias (art. 63, II) e a Comissão
medidas cautelares (art. 48, I, f) - ambas com o fim de evitar a continuação de uma
violação dos direitos humanos enquanto um caso é analisado - a Convenção
Interamericana torna-se o único mecanismo de direitos humanos no mundo a
possuir o instituto de medidas preliminares.
A Corte recebe casos contenciosos dos Estados-parte ou da Comissão (art.
61), em geral uma vez que essa tenha aguardado o cumprimento de suas
recomendações feitas a um Estado infrator e esse não o fez (art. 63, II). Tendo em
vista que a decisão do envio é faculdade discricionária da Comissão, essa pode
mesmo decidir submeter o caso à Corte juntamente com o envio das recomendações
ao país infrator.
Como a maior parte das questões tende a passar pela análise anterior na
Comissão, elas atingem a Corte já com uma decisão prévia e com recomendações
dirigidas ao Estado infrator. Não há na Convenção, no entanto, termo que afirme
que essa decisão anterior vincule os juízes do organismo – portanto, eles podem
decidir adversamente da Comissão.
Uma vez iniciado o julgamento, quando a Comissão é demandante, seu
papel é análogo ao de um Ministério Público na causa (art. 33 do Regulamento da
Corte Interamericana de Justiça - RCIJ). Ainda que a vítima não tenha acesso à
Corte, seu advogado pode participar diretamente como representante da parte, ou,
para honrar ao devido processo legal, a Comissão pode agir em sua defesa (art. 33
do RCIJ).
Finalizando o processo, a Corte emite uma sentença é definitiva, inapelável
e estabelece as medidas que o Estado deve tomar para se finalizar com as infrações
7 PIOVESAN, Flávia. Direito Humanos e Justiça Internacional: um estudo comparativo dos sistemas regionais
europeu, interamericano e africano. São Paulo: Saraiva, 2006.
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cometidas (art. 67). Algumas sentenças paradigmáticas já proferidas pela Corte foram,
no caso Loayza Tamayo8, a ordem de por a ré em liberdade porque sua prisão fora
arbitrária e não seguira o devido processo legal; e, no caso Castillo Petruzzi9, a ordem
de que fosse realizado um novo julgamento porque o que levara à condenação de
Petruzzi não seguira o devido processo. No caso Aloeboetoe10, a Corte ordenou que
fosse reaberto um poso de saúde numa aldeia indígena no Suriname.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos é um órgão principal e
autônomo da Organização dos Estados Americanos (OEA), cujo mandato surge
com a Carta da OEA e com a Convenção Americana sobre Direitos Humanos,
representando todos os países membros da OEA. Está integrada por sete membros
independentes que atuam de forma pessoal, os quais não representam nenhum país
em particular, sendo eleitos pela Assembléia Geral.
A CIDH se reúne em Períodos Ordinários e Extraordinários de sessões
várias vezes ao ano. Sua Secretaria Executiva cumpre as instruções da CIDH e serve
de apoio para a preparação legal e administrativa de suas atribuições.
Uma vez descrito, em resumo, o funcionamento do sistema interamericano
a partir dos seus dois principais órgãos, examinaremos agora a questão da sua
efetividade. Para tanto, descreveremos uma análise do real cumprimento das
resoluções emitidas pela Comissão Interamericana nos Estado Latino-americanos, no
período de 2001 a 2007.
Para a melhor compreensão de tal análise faz-se mister a conceituação do
termo efetividade. Se analisarmos o conteúdo etimológico do termo veremos que
efetividade é a qualidade do que é efetivo, é a atividade real, o resultado verdadeiro
(AURELIO,2009),. Ou seja, efetividade é a capacidade de produzir um efeito, seja ele
8Caso Loayza Tamayo Vs. Peru. Sentença de 17 de setembro de 1997.
9 Caso Castillo Petruzzi e outros Vs. Peru. Sentença de 4 de setembro de 1998.
10 Caso Aloeboetoe e outros Vs. Suriname. Senteça de 4 de dezembro de 1991.
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positivo ou negativo, um fazer ou não fazer. Neste sentido, Luís Roberto Barroso
(BARROSO,1993) assim a define:
“A efetividade significa, portanto, a realização do direito, o
desempenho de sua função social. Ela representa a materialização,
no mundo dos fatos, dos preceitos legais e simboliza a
aproximação, tão íntima quanto possível, entre o dever-ser
normativo e o ser da realidade social”.
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3 CONCLUSÃO
4 REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS
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CORREIA, Luiz Felipe de Seixas. A Palavra do Brasil nas Nações Unidas (1946-1995).
Brasília: FUNAG, 1995.
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RESUMO
ABSTRACT
This research work aims at demonstrating the formation of the principles and values
engendered by the modern state and its implications for the construction of a
democratic regime, in practice, in Brazil, goes back a political culture statesman with
adverse implications for the formation of Brazilian citizenship nowadays. Thus, we
will, initially, the concept of democracy in ancient Greece, found in the etymology of
the term democracy, whose conception of "government of the people" is its
foundation. Later, we will study the principles and fundamentals, consolidated in the
eighteenth century, which form the basis for organization of the Democratic State
Rights. And finally we check the
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É de se verificar que essa limitada ideia de povo teve seus dias contados
com o início da concepção democrática desenvolvida no sécculo XVIII por meio da
supremacia do poder político da burguesia sobre a monarquia e a nobreza, o que irá
deflagrar na substituição da democracia direta ou participativa pelo sistema
representativo.
Ao nos filiarmos a visão restrita, ora mencionada, de que o povo precisa
atender à alguns pressupostos especiais necessários à existência da democracia,
estaremos, equivocadamente, aderindo à visão elitista, a qual no dizer de Silva
( 2008, p. 126) “não é apenas uma posição distinta a democracia, governo do povo,
mas é algo a ela oposto.” Essa acepção deturpada de democracia é ainda muito
corrente no pensamento político contemporâneo e se limita a sustentar o “elitismo
de dirigentes”. Silva ( 2008, p. 127).
O legado grego para a sistematização dos princípos do Estado Democrático
foi de grande valia, uma vez terem eles questionado a competência do povo simples
para a tomada se decisões políticas. Afinal, um dos princípios da democracia grega e,
que passou a ser adotado por todos os Estados democráticos assentados na tese de
que se existem ofícios em que a capacitação técnica é um dos pressupostos essenciais,
a democracia não está entre eles. Para a decisão do bem estar comum e correta
aplicação dos valores de liberdade e igualdade há de se conceber que todos são iguais
e por isso, não há que falar em filósofo, rei e nem em tecnocrata. Silva ( 2008).
Deve-se considerar que a sociedade grega não conheceu a complexidade da
economia moderna, os cidadãos tão somente abordavam assuntos ligados a guerra e
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a paz, e políticos. Assim, vale frisar, que a maior parte de suas discussões giravam
em torno da religião e das festas. Silva (2008).
Logo, nota-se uma evidente contradição à concepção plena de democracia,
uma vez que esta pressupõe a obtenção de requisitos para a caracterização da
democracia por meio de um regime antidemocrático. Segundo a visão elitista, o
governo somente pode afirmar-se democrático quando do atendimento de
pressupostos essencialmente elitistas, tais como, destaca Silva (2008),
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Todavia é de se verificar que não foi essa a teoria adotada pelo Estado
liberal, mas sim, a teoria do mandado representativo ou livre, a qual defende haver
uma relação de confiança entre o mandante e mandatário. Por meio dessa, o
mandante recebe poderes do eleitor para decidir de forma autônoma. Assim,
Rousseau, afirmou, acertamente, a premissa de que a liberdade na democracia
representativa só existia no momento de votar. Bastos (2002).
É possível concluir que a noção de democracia enquanto governo do povo
foi essencial para o surgimento do governo democrático, no entanto, deveria esta
concepção ser readequada com vista a atender um grande número de habitantes do
Estado. Assim, conforme afirma Dallari (2005, p.147),
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Nesse sentido, é fácil constatar que essa concepção nos conduz a uma visão
do mundo hierarquizada e que, portanto, redunda em uma distorção do conceito da
expressão igualdade, uma vez que os homens, aos olhos de Deus jamais são tidos
como seres iguais. É o que claramente nos explica Haile (op. cit., p. 36),
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Referências
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SILVA. José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 30 ed. ver. e
atual. São Paulo: Malheiros, 2007.
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RESUMO
1Mestranda do Programa de Pós-Graduação da Faculdade Nacional de Direito da UFRJ (PPGD-
FND), pesquisadora do Núcleo Interdisciplinar de Ações para a Cidadania da UFRJ (NIAC/UFRJ), e
pesquisadora do Instituto de Estudos da Religião (ISER).
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4 Os critérios que serão examinados são essenciais para o julgamento também de demandas por
redistribuição. Como visto, redistribuição e reconhecimento estão integrados em uma concepção
ampla de justiça social representada pelo conceito de paridade participativa. O foco do presente
trabalho, no entanto, estará na teoria do reconhecimento.
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5 As praticas que buscam reconhecimento não podem significar uma manutenção de disparidades
participativas dentro do próprio grupo excluído. Assim, esse último requisito deve ser analisado
intergrupos (dominantes X excluídos) e intragrupos.
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etapas da Conferência. Foi composta por 37 cadeiras, divididas de maneira tripartite, com membros da
sociedade civil, poder publico e trabalhadores do setor de segurança pública.
10 Por ser o objeto do presente artigo, o processo de desenvolvimento das Conferências Livres,
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administrativa. Os presos que aguardavam julgamento são reservadas, por lei, as Casas de Custódia, e
aos já condenados as Penitenciárias.
13 O Seguro é um espaço reservado para presos cuja integridade física poderia estar ameaçada no
convívio com outros presos. São pessoas acusadas de terem praticado os crimes previstos nos artigos
213 e 214 do Código Penal, policiais, e milicianos.
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14 Dependendo do numero de presos participantes das etapas, esses eram subdivididos em grupos de
trabalho para possibilitar a melhor organização dos debates.
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• Princípios:
15 A correspondência entre alguns princípios e diretrizes não significa que a aprovação dos mesmos
tenha sido conseqüência apenas das demandas levantadas pela Conferência Livre. Os princípios e
diretrizes aprovados pela Conferência Nacional são resultado de uma ampla mobilização nacional
realizada durante as etapas preparatórias para a Conferência. Demonstra, no entanto, a importância
das demandas levantadas pelos presos durante a conferência livre, e a necessidade de se dar voz a
esses atores sociais que vivenciam no dia a dia os problemas da Política de Segurança Publica
brasileira.
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• Diretrizes:
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Referências Bibliográficas
Sites Utilizados
www.conseg.org.br
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SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO
1 Trabalho em coautoria proveniente da junção dos estudos realizados em sede de dissertação e
monografia de graduação, ambos sob orientação da Profa. Dra. Mariá Brochado.
2 Mestre e doutorando em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais.
3 Mestranda em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais.
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4 PEREZ LUÑO, Antonio E. Los derechos fundamentales. Madrid: Tecnos, 1998, p. 29-33. Para uma
discussão mais profunda sobre as raízes filosóficas da cultura dos Direitos Humanos na Antiguidade,
cf. COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos, 6. ed. São Paulo: Saraiva,
2008, p. 1-44.
5 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Direitos humanos fundamentais, 9.ed. São Paulo: Saraiva, 2007,
p. 9.
6 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. A cultura dos direitos fundamentais. In SAMPAIO, José
Adércio Leite (Org.). Jurisdição constitucional e direitos fundamentais. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 240.
7 PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 30-3.
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8 PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 30-3.
9 FERREIRA FILHO, Direitos humanos..., cit., p. 10.
10 FERREIRA FILHO, Direitos humanos..., cit., p. 10.
11 FERREIRA FILHO, A cultura dos direitos fundamentais, cit., In SAMPAIO, Jurisdição..., op. cit., p.
242.
12 PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 30-3.
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natural ao direito à liberdade enquanto esta possa coexistir com as liberdades dos
demais segundo um imperativo categórico13.
que os direitos fundamentais não podem ser reduzidos a uma única realidade, por
terem sido construídos historicamente, o que implica na impossibilidade de se
encontrar um conceito conotativo absoluto de direitos fundamentais. Para o autor, os
direitos fundamentais representam a “constitucionalização daqueles direitos humanos
que gozaram de alto grau de justificação ao longo da história dos discursos morais,
que são, por isso, reconhecidos como condições para a construção e o exercício dos
demais direitos”. Assim, pode-se dizer que os direitos fundamentais “são os direitos
que os cidadãos precisam reciprocamente reconhecer uns aos outros, em dado
momento histórico, se quiserem que o direito por eles produzido seja legítimo, ou
seja, democrático”15.
BONAVIDES entende que a expressão “direitos humanos” consagra as raízes
históricas dos direitos do homem antes de seu ingresso nos Códigos e Constituições
e que, ao passarem ao estado de concretude deixam de ser direitos naturais e se
convertem em direitos positivos, indo da área programática para o espaço normativo
dos sistemas constitucionais, mantendo seu caráter de universalidade tutelar e
passando a designar-se pela expressão “direitos fundamentais”16.
A proposta que traz PEREZ LUÑO de definição para as duas expressões se
baseia no grau de concreção positiva dessas categorias, sob a justificativa de que o
termo “direitos humanos” aparece como um conceito de contornos mais amplos e
imprecisos que a noção dos “direitos fundamentais”. Assim, “direitos humanos”
seriam “o conjunto de faculdades e instituições que, em cada momento histórico,
concretizam as exigências da dignidade, da liberdade e da igualdade humanas, as
quais podem ser reconhecidas positivamente pelos ordenamentos jurídicos em nível
nacional e internacional” enquanto a expressão “direitos fundamentais” se refere
15 GALUPPO, Marcelo Campos. O que são direitos fundamentais? In SAMPAIO, Jurisdição..., op. cit.,
p. 233-6.
16 BONAVIDES, Paulo. Os direitos humanos e a democracia. In SILVA, Reginaldo Pereira e (Org.).
Direitos humanos como educação para a justiça. São Paulo: LTr Editora, 1998, p. 16-17.
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17PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 44-6.
18 PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 47 (tradução livre). No original: “Los derechos humanos
aúnan, a su significación descriptiva de aquellos derechos y libertades reconocidos en las declaraciones
y convenios internacionales, una connotación prescriptiva o deontológica, al abarcar también aquellas
exigencias más radicalmente vinculadas al sistema de necesidades humanas, y que debiendo ser objeto de
positivación no lo han sido. Los derechos fundamentales poseen un sentido más preciso y estricto, ya
que tan sólo describen el conjunto de derechos y libertades jurídica e institucionalmente reconocidos y
garantizados por el Derecho positivo. Se trata siempre, por tanto, de derechos delimitados espacial y
temporalmente, cuya denominación responde a su carácter básico o fundamentador del sistema jurídico
político del Estado de Derecho.”
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portanto, uma demanda), por direitos econômicos e sociais frente aos clássicos
direitos individuais26.
Com o avanço do liberalismo econômico e político, o quadro social se
deteriorou, devido à concentração de riquezas nas mãos dos empresários – enquanto
a classe trabalhadora vivia na penúria. Os salários eram baixos devido à grande oferta
de mão de obra e da introdução de máquinas na produção, o trabalho de crianças
não era impedido, as jornadas de trabalho eram muito longas, dentre outros. Desse
quadro, surgiu o que se chama “questão social” ou “luta de classes”, consequência da
marginalização da classe operária e do sentimento de hostilidade que se instalou entre
esta e os empresários. Uma situação assim ameaçava a estabilidade das instituições
liberais e a continuidade do processo de desenvolvimento econômico, donde brotou
uma batalha intelectual e política visando realizar mudanças27.
No ano de 1848, foi publicado, por MARX e ENGELS, o Manifesto
Comunista, seguindo a tendência de exigência de proteção jurídica aos direitos ao
trabalho, a seus frutos e à seguridade social. Fazendo eco a estas exigências, foi
promulgada a Constituição francesa nesse mesmo ano, buscando relacionar os
princípios revolucionários de 1789 à esfera social e econômica do momento.
Enquanto a Declaração de 1789 tinha sido a declaração da liberdade, a de 1848 seria
a da igualdade28. Os direitos ao trabalho e à educação (embora com menor ênfase
para o segundo) aparecem garantidos no preâmbulo do texto constitucional daquele
que pode ter sido o principal documento em se tratando da evolução dos direitos
fundamentais para a consagração dos direitos econômicos e sociais29.
Em consonância com o Manifesto, foi publicada na então União das
Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS, a Declaração dos Direitos do Povo
26 PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 33-8.
27 FERREIRA FILHO, Direitos humanos..., cit., p. 42-3.
28 PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 38-9. Cf. ainda, COMPARATO, A afirmação..., cit., p. 167-172.
29 FERREIRA FILHO, Direitos humanos..., cit., p. 45-6.
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30 PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 38-9.
31 PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 38-9. Cf. ainda, COMPARATO, A afirmação..., cit., p. 177-188.
32 FERREIRA FILHO, Direitos humanos..., cit., p. 46.
33 FERREIRA FILHO, Direitos humanos..., cit., p. 47.
34 PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 39-40. Cf. ainda, COMPARATO, A afirmação..., cit., p. 189-199.
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35 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988, 9.ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p.
26-9.
36 PEREZ LUÑO, Los derechos..., cit., p. 41-2 e FERREIRA FILHO, Direitos humanos..., cit., p. 92-4. Para
mais sobre essas e outras Declarações, Cf. COMPARATO, A afirmação..., cit., p. 213-524.
37 FERREIRA FILHO, Direitos humanos..., cit., p. 95.
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38 SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo, 31.ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p.
168-170.
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ser aceito por todas as culturas, sem que qualquer delas renegue
suas concepções básicas.39
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42 SILVA, Curso de..., cit., p. 170-1.
43 SILVA, Curso de..., cit., p. 170-1.
44 SILVA, Curso de..., cit., p. 170-1.
45 SILVA, Curso de..., cit., p. 170-1.
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Convém ressaltar que a digressão histórica aqui realizada serviu para mostrar que
as expressões imbricam-se, e para identificar basicamente os momentos: 1) de tomada de
consciência desses direitos; 2) de positivação deles em diversos textos constitucionais; 3)
dificuldades e lutas para concretização desses dirietos. Conforme ensina JOAQUIM CARLOS
SALGADO, a evolução dos direitos fundamentais
46 BROCHADO, Mariá. Direito e Ética: a eticidade do Fenômeno Jurídico. São Paulo: Landy Editora,
2006, p. 122.
47 SALGADO, Joaquim Carlos apud BROCHADO, Mariá. A Eticidade..., cit., p. 125.
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48 BROCHADO, Mariá. Direito e Ética..., cit., p. 125.
49 Cf. BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Editora Campus, 1992.
50 Cf. nesse sentido, a título meramente exemplificativo, SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos
Direitos Fundamentais. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005 e SILVA, José Afonso da. Curso
de Direito Constitucional Positivo. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 1999.
51 BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 563.
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52 BONAVIDES, Paulo. cit., p. 564.
53 SOUZA CRUZ, Álvaro Ricardo de. Processo constitucional e a efetividade dos direitos
fundamentais. In: SOUZA CRUZ, Álvaro Ricardo de [org.]; SAMPAIO, José Adércio Leite [org.].
Hermenêutica e jurisdição constitucional. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p. 209.
54 BROCHADO, Mariá. Direito e Ética..., cit., p. 127.
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55 BONAVIDES, cit., p. 564. Vale lembrar a clássica divisão das normas realizada por José AFONSO
DA SILVA em: I – normas constitucionais de eficácia plena; II – normas constitucionais de eficácia
contida; III – normas constitucionais de eficácia limitada ou reduzida. Cf. AFONSO DA SILVA, José.
Aplicabilidade das Normas Constitucionais. São Paulo: Malheiros, 1999, p.82-3: “Normas de eficácia
limitada são todas as que não produzem, com a simples entrada em vigor, todos os seus efeitos
essenciais, porque o legislador constituinte, por qualquer motivo, não estabeleceu, sobre a matéria,
uma normatividade para isso bastante, deixando essa tarefa ao legislador ordinário ou a outro órgão
do Estado”.
56 BONAVIDES, cit., p. 564.
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57 BROCHADO, Mariá. Direito e Ética..., cit., p. 129.
58 SOUZA CRUZ, Álvaro Ricardo de. Processo constitucional e a efetividade..., cit., p. 210-11.
59 SOUZA CRUZ, Álvaro Ricardo de. Processo constitucional e a efetividade..., cit., p. 211-12.
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que se trata de uma abertura que não dispensa o bojo de regras, mas considera os
princípios como normas, a orientar e capazes de embasar decisões judiciais.
Abertura que possibilita tutelas jurisdicionais ou justiciabilidade60 de direitos a
prestações positivas do Estado, em especial dos direitos sociais. É importante
remontar à ideia de supremacia da Constituição, que a torna vetor interpretativo de
todo ordenamento. Uma vez que o próprio texto constitucional traz a aplicabilidade
imediata das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais (artigo 5º,
parágrafo 1º), não podem ser os direitos sociais relegados à esfera programática, sob
argumentação de carência de recursos, tampouco pela pendência de instituição de
norma regulamentadora capaz de conferir eficácia a normas que os garantem.
ROBERT ALEXY sustenta que
60 Cf. ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 461-70; SILVA,
Virgílio Afonso da. Direitos Fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo: Malheiros, 2009,
p. 242-244.
61 ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos fundamentais, cit., p. 514.
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62 SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos Fundamentais: conteúdo essencial, restrições e eficácia. São Paulo:
Malheiros, 2009, p. 241.
63 SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos Fundamentais..., cit., p. 243.
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condições fáticas e jurídicas, que, por sua vez, expressam a noção, utilizadas às vezes
de forma extremamente vaga, de reserva do possível”64.
O que se pretende aqui realçar é que existem custos para a concretização
sobretudo dos direitos sociais e que sua efetivação deve ser maximizada, inclusive
valendo-se da justiciabilidade, sem que isso signifique desmedida aplicação
principiológica que coloque em risco a separação dos poderes e a segurança jurídica.
Não há de prevalecer
64 SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos Fundamentais..., cit., p. 205. [sic]
65 SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos Fundamentais..., cit., p. 251.
66 BONAVIDES, cit., p. 565.
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6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos fundamentais. São Paulo: Malheiros, 2008.
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Trad. Carlos N. Coutinho. Rio de Janeiro:
Editora Campus, 1992.
67 SILVA, Virgílio Afonso da. Direitos Fundamentais..., cit., p. 243.
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COMPARATO, Fábio Konder. A afirmação histórica dos direitos humanos, 6. ed. São
Paulo: Saraiva, 2008.
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988, 9.ed. São Paulo:
Malheiros, 2004.
SAMPAIO, José Adércio Leite (Org.). Jurisdição constitucional e direitos fundamentais. Belo
Horizonte: Del Rey, 2003.
SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos Direitos Fundamentais. 5. ed. Porto Alegre:
Livraria do Advogado, 2005.
SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo, 31.ed. São Paulo:
Malheiros, 2008.
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SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16. ed. São Paulo:
Malheiros, 1999.
SILVA, Reginaldo Pereira e (Org.). Direitos humanos como educação para a justiça. São
Paulo: LTr Editora, 1998.
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RESUMO
1 Mestre em Direito Internacional pela Università degli Studi di Torino, Itália; bacharel em Direito pela
UFMG.
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SUMÁRIO
1. Introdução
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2 SHAW, Malcom N. International Law. 5 ed. Cambridge University Press. 2003.p. 247-249.
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5International Law. The Professor Series, op.cit., p. 117.
6Direito Internacional Público, op.cit., p. 218.
7 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal de Direitos do Homem. Paris,
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Insta ressaltar que, conforme assevera Malone, “although the basic concept of
international human rights law is now firmly established, its relatively recent emergence results in a
body of law characterized by evolving ideas, institutions and procedures”8.
8 International Law. The Professor Series, op. cit., p. 117. Apesar dos conceitos do direito internacional dos
direitos humanos estarem hoje firmemente estabelecidos, sua fixação relativamente recente resulta em
um corpo normativo caracterizado por idéias, instituições e procedimentos ainda em evolução.
(tradução livre).
9 PIOVESAN, Flávia. Direitos Humanos e o Direito Constitucional Internacional. 7. ed. rev. ampl. e atual.
São Paulo: Saraiva, 2006. p. 153; Neste sentido ver também: MORAES, Alexandre de. Direitos
Humanos Fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República Federativa do Brasil,
doutrina e jurisprudência. 7.ed. São Paulo: Atlas, 2006. p. 17
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8. The Committee notes that the undertaking "to take steps ... by
all appropriate means including particularly the adoption of
legislative measures" neither requires nor precludes any particular
form of government or economic system being used as the vehicle
for the steps in question, provided only that it is democratic
and that all human rights are thereby respected.
10 BROWNLIE, Ian. Principles of public international law. 6 ed. rev. atual. New York: Oxford University
Press, 2003. p. 542.
11 BEDERMAN, David J. International Law Frameworks Foundation Press, 2001. p.99.
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12 ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Convenção Americana de Proteção dos Direitos
Humanos, de 22 de novembro de 1969. Secretaria Geral da OEA, San Jose da Costa Rica, 1969.
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13 BOBBIO, Norberto. Teoria Geral da Política: A Filosofia Política e as Lições dos Clássicos. Organizado por
internacionais que os respeite, o fizeram por concordar em respeitar tai direitos, não
cabendo, portanto, isentar-se do controle da comunidade internacional na hipótese
de violação a estes direitos e, assim, no descumprimento de obrigações
internacionais16.
Em meio a tais argumentos surge um universalismo de confluência, que
demarcaria um universalismo de chegada e não como ponto de partida. O
universalismo de confluência representa a busca por um diálogo no sentido de
respeitar as culturas, mas chegando-se a um mínimo ético irredutível para proteger a
dignidade e os direitos universais. Destarte, protegem-se os direitos humanos
fundamentais, sem se olvidar das diversidades culturais de cada povo.
20Teoria Geral da Política: A Filosofia Política e as Lições dos Clássico, op. cit., p. 424.
21 DAHL, Robert. Democracy. In: Encyclopædia Britannica, Encyclopædia Britannica 2006 Ultimate
Reference Suite DVD. (1) A democracia ajuda a prevenir governos de autocratas cruéis; (2)
Democracias representativas modernas não travam guerras umas com as outras; (3) Países com
governos democráticos tendem a ser mais prósperos que países com formas de governos não
democráticos; (4) A democracia tende a estimular o desenvolvimento humano – quantificados pela
saúde, educação, renda pessoal e outros indicadores – mais integralmente que outras formas de
governo. Outras características da democracia que também seriam consideradas desejáveis pela
maioria das pessoas, apesar de que para alguns elas seriam entendidas como menos importantes que
os itens (1) a (4) descritos acima são: (5) a democracia ajuda as pessoas a proteger seus interesses
fundamentais; (6) a democracia garante aos cidadãos direitos fundamentais que sistemas não
democráticos não garantem e não podem garantir; (7) a democracia assegura aos cidadãos uma maior
gama de liberdades pessoais que qualquer outra forma de governo Finalmente, existem algumas outras
características da democracia que algumas pessoas – os críticos da democracia – jamais considerariam
desejáveis, apesar de que a maioria das pessoas, após reflexão, as consideraria ao menos de algum
valor: (8) apenas a democracia concede ao povo oportunidade máxima de viver sob leis por ele
escolhidas (9) apenas a democracia concede ao povo oportunidade máxima de suportar
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responsabilidade moral pelas suas escolhas e decisões sobre políticas de governo (10) apenas em uma
democracia pode-se ter um nível relativamente alto de igualdade política. (tradução livre)
22 Democracy, op. cit. Eleições livres, justas e freqüentes – os cidadãos podem participar nas eleições
como eleitores ou candidatos (embora restrições por idade e domicílio possam ser impostas).
Liberdade de expressão – os cidadãos podem expressar-se publicamente em uma extensa variedade de
assuntos politicamente relevantes sem receio de punições. Fontes independentes de informação –
existem fontes de informação política que não estão sob o controle do governo, ou de um grupo
único, cujo direito de publicar ou disseminar informação é protegido por lei; além disso, todos os
cidadãos têm o direito de buscar e utilizar estas fontes de informação. Liberdade de associação – os
cidadãos possuem o direito de formar e participar de organizações políticas independentes, inclusive
partidos e grupos de interesse. (tradução livre)
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23 BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. Rio de Janeiro, 1992, Campus, p.1
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24 Cabe ressaltar que atualmente a idéia de democracia meramente representativa é insuficiente para
explicar o fenômeno democrático. Isto é, em uma democracia moderna e participativa a participação
direta do cidadão na tomada das decisões políticas é cada vez mais premente. A este respeito ver:
GONÇALVES, Thomas de Oliveira. Democracia Participativa no Brasil, Estados Unidos e Suíça: Um Estudo
Histórico e Comparado. Belo Horizonte, 2006.
25 Direitos Humanos Fundamentais: teoria geral, comentários aos arts. 1º a 5º da Constituição da República
112.
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RESUMO
1 Graduanda em Ciência do Estado e da Governança Social pela Universidade Federal de Minas
Gerais (UFMG) e em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC/MG).
annacristina_3@hotmail.com.
http://lattes.cnpq.br/6566579154920043.
2 Graduando em Ciência do Estado e da Governança Social pela Universidade Federal de Minas
pluralismo político. Vale ressaltar que uma leitura de caráter leigo desse artigo
proporciona um raciocínio inadequado, associando, desde já, democracia a direitos
fundamentais, o que impossibilita análises distintas de tais conceitos, dificultando,
assim, a busca por falhas em nosso sistema estatal.
Dessa forma, perpetuada a imagem do regime democrático como um
assegurador absoluto dos direitos fundamentais, torna-se difícil acreditar que existam
desigualdades, desrespeito a dignidade da pessoa humana, desemprego e ineficiência
dos sistemas de saúde e educação. Todavia, os fatos mencionados acima se fazem
presentes na realidade brasileira, tornando-se sua ocorrência extremamente
corriqueira. Assim, a esperança e o entusiasmo que antecederam a promulgação da
Constituição em vigência tornam-se meros ideais do passado. A realidade é
completamente distinta e a ela caberia perfeitamente o conceito de ideologia utilizado
por Karl Marx. Segundo ele, ideologia é a consciência falsa da realidade. Aplicando
esse conceito ao contexto em que vivemos, é perceptível que o sistema democrático,
tal como aplicado no Brasil, é falho com relação ao asseguramento dos direitos
fundamentais. Nessa instância, merecem destaque o desenvolvimento dos direitos
bem como seus aspectos históricos:
7 BRASIL ESCOLA. Democracia Ateniense. Disponível em:
<http://www.brasilescola.com/historiag/ democracia-ateniense.htm>.
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8 FERRAJOLI, Luigi. Derecho y razón. 4. Ed. Madrid:Trotta, 2000.
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assunto. (...) entendo que o voto facultativo tem outra qualidade que
deveria ser ressaltada: quando houver voto facultativo, estados,
municípios e o próprio país poderão fazer com muito maior liberalidade,
em número muito maior, plebiscitos e referendos. Há países, como a
Suíça, que fazem plebiscito para tudo - para criar um imposto há
plebiscito, para entrar ou não na União Econômica Européia há
plebiscito, ou seja, há plebiscito para tudo na Suíça -, mas o voto não é
obrigatório. Então se pode fazer até dois plebiscitos em um dia porque
votarão as pessoas interessadas, as pessoas que estudaram o assunto. Da
mesma forma, a experiência vale nos Estados Unidos e em outros países
europeus. De modo que o voto facultativo vai aperfeiçoar essa
democracia participativa popular, vai permitir que ela seja mais ampla,
mais abrangente do que é hoje."
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Diante das respostas dadas por todos os indagados pela pesquisa, observa-
se que a maioria (51%) possui convicção da extrema importância inerente ao voto e,
assim, permaneceriam executando tão brilhante ato cívico. Ater-nos-emos a esta
parcela de entrevistados, visto que os 49% restantes aproximam-se ou já se decidiram
pela opção de não votar. Tem-se a ideia de que são necessários os votos da maioria
absoluta dos votantes para que o processo eleitoral seja legitimado. Contrapondo-se a
isso, questiona-se a conduta dessa parcela que não faz tanta questão do voto: teriam
real consciência de seu poder, da importância que possui um mero clique no
“confirma” das urnas? É evidente que um grande número de eleitores não se importa
com tal alto, escolhendo candidatos por razões completamente descabidas. Para se
permitir uma ligeira noção acerca do que foi anteriormente citado, candidatos são
escolhidos devido à aparência física, aos eventos realizados durante a campanha
eleitoral (showmícios, por exemplo, quando esses eram permitidos) bem como
outros fatores tão inimagináveis quanto aos já transcritos. O questionamento, enfim,
torna-se o seguinte: a obrigação à qual se vêem submetidos os eleitores não prejudica
a escolha de nossos governantes? A resposta, simples diante das diversas
circunstâncias aqui já trabalhadas, é positiva. O prejuízo é imenso. Fosse o voto
facultativo, exerceriam a cidadania aqueles que realmente estivessem interessados
com o processo eleitoral.
A perspectiva que aqui se tem, refere-se ao trecho, transcrito na
sequência, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:
CAPÍTULO IV
DOS DIREITOS POLÍTICOS
Art. 14. A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e
pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da
lei, mediante:
I - plebiscito;
II - referendo;
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13 WIKCIONÁRIO. Idiota. Disponível em: <http://pt.wiktionary.org/wiki/idiota>.
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14 BARCELLOS, Ana Paula de. A eficácia jurídica dos princípios: o princípio da dignidade da
pessoa humana,2002,p.59 e s.
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BIBLIOGRAFIA
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RESUMO
1Mestrando em Direito no Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG), na linha de pesquisa “Poder e Cidadania no Estado Democrático de Direito”;
Analista judiciário – área judiciária do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais (TRE-MG).
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SUMÁRIO
O texto citado acima reproduz com fidelidade o art. 15 da Portaria n.º 3/09,
de autoria do Juiz da Vara da Infância e Juventude da Comarca de Patos de Minas,
Joamar Gomes Vieira Nunes. O magistrado pretendeu com ela disciplinar o acesso
de crianças e adolescentes daquele município a locais públicos. Entre os motivos
oferecidos para tanto, numa série de considerações que precedem a parte
verdadeiramente normativa do ato administrativo, chama atenção o argumento de
que
[...] o direito da criança e do adolescente de ir, vir e permanecer
não significa que podem locomover-se nos logradouros públicos
não são absolutos, porque sua condição jurídica impõe
limitações à sua liberdade de locomoção visando a proteção
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c) boate ou congêneres;
d) casa que explore comercialmente diversões eletrônicas;
e) estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e televisão.
II - a participação de criança e adolescente em:
a) espetáculos públicos e seus ensaios;
b) certames de beleza. (BRASIL. Lei 8.069, 1990).
menos 21 cidades de oito estados – Bahia, Goiás, Minas Gerais, Mato Grosso do Sul,
Paraíba, Paraná, São Paulo e Santa Catarina –, impuseram-se restrições semelhantes à
liberdade de ir e vir de crianças e adolescentes, o que a imprensa vem denominando
“toque de recolher” (21 CIDADES..., 2009). Em todos esses casos, “Por meio de
uma medida judicial, uma lei aprovada pela Câmara de Vereadores ou uma decisão
do Executivo municipal, adolescentes e jovens dessas localidades são proibidos de
sair de suas casas no período noturno.” (MIRAGLIA, 2009).
No que interessa a este trabalho, a justificativa para tais atos normativos se
ampara num discurso que enxerga na restrição da liberdade uma estratégia de
segurança. “Manter os jovens longe das ruas evitaria que consumissem bebidas
alcoólicas, se envolvessem em episódios violentos ou com o universo infracional e
reduziria, assim, o número de crimes nessas cidades.” (MIRAGLIA, 2009). Ou seja,
por trás das decisões que restringem o direito de ir e vir de indivíduos, e dos motivos
mais imediatos e concretos alegados para sustentá-las, subjaz a premissa da existência
de um conflito entre segurança e liberdade, da incompatibilidade lógica de que ambos
os valores se realizem simultaneamente.
No âmbito da opinião pública, esse confronto adquire a forma de um
dualismo entre expectativas de liberdade e de segurança. Mas, tão logo o dualismo
ultrapassa essa esfera e ganha respaldo no debate teórico, ele assume, para muitos, a
imagem de uma antinomia jurídica, que, a depender de como resolvida pelo
intérprete, impacta a hermenêutica dos dispositivos constitucionais positivados e a
aplicação de tais normas pelo Judiciário.
É amplamente disseminada entre juristas a ideia de que, nos dizeres de
Bobbio (1999, p. 90), “[...] a garantia da liberdade causa dano, comumente, à
segurança, e a garantia da segurança tende a restringir a liberdade; em conseqüência,
um ordenamento inspirado em ambos os valores se diz que descansa sobre
princípios antagônicos [...].” Todavia, contrariando o pensamento do doutrinador
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Mas tal conclusão não admite uma concepção inicial de liberdade como a
fornecida por Berlin (2002, p. 229), da qual aparentemente decorre.
Ora, na medida em que se fala em direitos humanos subjetivos, em
pretensões ou exigências “[...] que qualquer homem pode reivindicar [...]” (HÖFFE,
2001, p. 354), pressupõe-se a existência de uma relação social coercitiva entre aquele
que reivindica o direito e os demais, que se veem obrigados a respeitá-lo. Dito de
outro modo, na medida que um indivíduo faz valer sua liberdade, ele impõe a cada
um dos membros da comunidade política uma renúncia ao exercício da liberdade
própria. Pois, como acertadamente percebe Höffe (2001), um direito humano é, em
si, um mandato para exercício da coerção contra outros homens. Aqui, porém, não se
deve entender coerção como sinônimo de opressão, agressão, ou
homem poderia fazer, caso desejasse.” (DWORKIN, 2007, p. 411). O autor propõe,
então, uma distinção entre duas concepções do termo. A primeira, da liberdade como
licença, equivale ao sentido moderno, negativo, do conceito. Diz respeito ao “[...]
grau em que uma pessoa está livre das restrições sociais ou jurídicas para fazer o que
tenha vontade [...]” (DWORKIN, 2007, p. 404). A segunda, da liberdade como
independência, refere-se ao “[...] status de uma pessoa como independente e igual e
não como subserviente.” (DWORKIN, 2007, p. 404).
Uma vez que “Toda lei prescritiva diminui uma liberdade como licença,
antes disponível para os cidadãos [...]” (DWORKIN, 2007, p. 405), a compreensão
da liberdade nesses termos só pode ser conciliada com os direitos humanos se
justificada por algum “valor contrastável”, como a segurança, que leva em
consideração, não, os direitos do próprio indivíduo, mas os interesses dos demais e
as metas da coletividade. Mas, se se supõe que as liberdades individuais são
justamente “[...] salvaguardas contra a intervenção [...]” (BERLIN, 2002, p. 231), não
se poderia admitir que elas fossem restringidas por um valor estranho interveniente,
externo a elas, e residente no outro – quiçá, como querem alguns, não em um
indivíduo, mas numa coletividade. O próprio Berlin (2002, p. 232) reconhece ser “[...]
uma confusão de valores dizer que, embora minha liberdade ‘liberal’ individual seja
jogada fora, algum outro tipo de liberdade [...] é aumentada.” Logo, se direitos
humanos nascem como pretensões de liberdade do indivíduo, eles não podem ser
justificados com base em outro valor que não a própria liberdade individual.
Como “Ainda assim continua verdadeiro que a liberdade de alguns deve ser
às vezes restringida para assegurar a liberdade dos outros [...]“ (BERLIN, 2002, p.
232), o impasse só se resolve com o abandono da concepção de liberdade como
licença.
Admitindo-se a liberdade como não submissão, pode-se considerar que as
leis proibitivas do homicídio, por exemplo, não ameaçam a independência dos
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cidadãos em geral. Antes, são necessárias para protegê-la. Nesse sentido, consideram-
se perdas de liberdade apenas “[...] situações nas quais os homens fossem [forem]
impedidos de fazer alguma coisa que [...] devem [poder] fazer” (DWORKIN, 2007,
p. 412), ou seja, restrições “[...] a atos particulares considerados especialmente
importantes [...]” (DWORKIN, 2007, p. 277), como as liberdades individuais. A
independência é ameaçada por decisões políticas que negam a qualquer indivíduo
respeito. Pois pressupõe a pretensão de ser tratado com igual consideração por todos
(DWORKIN, 2007, p. 405), e exige, “[...] contra a exploração e a humilhação, contra
o abuso da autoridade pública [...]” (BERLIN, 2002, p. 232), o reconhecimento de
liberdades concretas a cada membro da comunidade.
A distinção proposta por Dworkin (2007) remete a Montesquieu (1979, p.
148), cuja concepção de liberdade política está exposta na sentença: “Uma
constituição pode ser de tal modo, que ninguém será constrangido a fazer coisas que
a lei não obriga e a não fazer as que a lei permite.” O pensador francês, no entanto,
chamou de “independência” (MONTESQUIEU, 1979, p. 148) – ou, noutras
passagens, de “liberdade filosófica” (MONTESQUIEU, 1979, p. 170) – o que aqui se
denominou liberdade como licença, e de “liberdade política” (MONTESQUIEU,
1979, p. 147-148) – ou apenas “liberdade” (MONTESQUIEU, 1979, p. 147-148) –, a
liberdade como independência. Apenas nesses termos se pode compreender a
seguinte passagem, do Livro XI de “Do espírito das Leis”:
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2 Fazemos uso do termo pretensão, embora o autor hesite em utilizá-lo por considerá-lo
“demasiadamente forte”. (BOBBIO, 2004, p. 73).
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liberdades individuais. Pois ela só pode ser compreendida como uma pretensão
dirigida à conservação destas.
Ora, a segurança, entendida como exigência de conservação da pessoa
humana e de seus direitos, realiza-se quando esse valor se traduz nas pretensões de
juridicidade, ordem e institucionalização, por meio das quais os direitos humanos são
positivados (determinados em regras formalmente reconhecidas) e impostos por um
poder jurídico, o Estado, que detém o monopólio da coerção (HÖFFE, 2001). Não é
coincidência que imediatamente após (e quase simultaneamente a) o reconhecimento
dos direitos humanos, ocorrido nas primeiras declarações da Modernidade, no
Virginia Bill of Rights, em 1776, e na Déclaration dés droits de l’homme et du citoyen, 1789,
tenha-se dado a positivação dessas exigências nas sucessivas constituições do período
revolucionário francês e na carta norte-americana. A mera declaração dos direitos do
homem na condição de pretensões morais abstratas não lhes garante efetividade
numa comunidade real. A menos que sejam precisa e publicamente definidos, sua
realização fica a depender da disposição moral dos membros da coletividade.
(HÖFFE, 2001). Apenas com a positivação, com a delimitação exata e comum
realizada com o auxílio de um poder, pode-se superar tal “déficit de realidade”
(HÖFFE, 2001, p. 386).
Logo, o processo de determinação da segurança está intrinsecamente
ligado ao de diferenciação das liberdades em direitos fundamentais. O princípio da
segurança jurídica, a que apelam os movimentos históricos de positivação do Direito,
impõe exigências formais à passagem das pretensões morais (diretos humanos) ao
ordenamento jurídico. Para Bobbio (2004, p. 77), as condições consistem
basicamente no fato de se tornarem, “[...] de objeto de discussão de uma assembléia
de especialistas, [...] objeto de decisão de um órgão legislativo dotado de poder de
coerção.”
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um conjunto de normas como guia da própria ação.” (BOBBIO, 2004, p. 74). Ora,
uma vez que, como se tem observado com cada vez maior frequência, as decisões
judiciais são também aptas a afirmar a existência de um direito como um fato exterior
e de reconhecer a existência de uma norma como guia para a ação, ainda que nem o
direito nem a norma tenham sido “[...] objeto de decisão de um órgão legislativo [...]”
(BOBBIO, 2004, p. 77), não há razão para excluir a jurisdição das fontes do Direito.
por um órgão legiferante –, mas “[...] uma proposição evidente que é posta [pelo
intérprete] no vértice do sistema para que a ela se possam reconduzir todas as
normas.” (BOBBIO, 1999, p. 62). Ainda assim, segundo ele, ela “[...] está na base do
Direito como ele é (o Direito positivo) [...]” (BOBBIO, 1999, p. 67) e dá ao poder
“[...] uma legitimação jurídica, não moral [...]” (BOBBIO, 1999, p. 67). Isso sugere
que o autor reconhece o caráter jurídico de proposições que, embora não sejam
regras, têm força normativa. Ademais, noutra passagem, o pensador italiano atesta
que “[...] a juridicidade de uma norma se determina não através de seu conteúdo
(nem pela forma [...]), mas simplesmente através do fato de pertencer ao
ordenamento [...]” (BOBBIO, 1999, p. 69).
No que se refere à questão do conflito normativo, Bobbio (1999, p. 74),
partindo da noção de que “[...] para julgar a oposição de duas regras é necessário
examinar o seu conteúdo [...]”, sugere ser possível conservar duas normas
incompatíveis se demonstrado “[...] que a incompatibilidade é puramente aparente,
que a pressuposta incompatibilidade deriva de uma interpretação ruim, unilateral,
incompleta ou errada de uma das duas normas ou de ambas.” Nesse caso, mantêm-se
as normas e elimina-se a própria incompatibilidade. (BOBBIO, 1999).
Tal modelo de solução de conflitos entre normas, se aplicado aos princípios,
extrai conclusões diversas das de Dworkin (2007) e Alexy (2008) – ou, pelo menos,
em relação ao primeiro, das da maioria dos intérpretes brasileiros dele. Os dois
juristas reconhecem que os princípios não se aplicam de modo “tudo-ou-nada”
(ALEXY, 2008, p. 173; DWORKIN, 2007, p. 39). Todavia, não faltam na obra do
renomado teórico alemão casos em que a um princípio incidente e supostamente
conflitante não foi dada eficácia alguma (ALEXY, 2008), o que suscita algumas
questões.
Pois, uma vez que uma norma é existente e válida, ocorridos os fatos que
lhe constituem o suporte fático, ela incide “[...] incondicionalmente, fatalmente,
1121
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1132
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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RESUMO
ABSTRACT
This work intends to analyze the content of the principle of the dignity of the human
person in the context of the administrative proceeding. Starting from the
general theory of the principles, as species of fundamental rules that inform the
order of Law, the presente work focuses finally on the dignity of human person,
1 Doutora em Direito pela UFMG. Professora Adjunta da Faculdade de Direito “Prof. Jacy de
Assis” da Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
2 Bacharelando do curso de Direito da Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universidade
Keywords: (A) Administrative Process, (B) Principle of Law (C) Dignity of Human
Person.
1. INTRODUÇÃO
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mais maduro, focar-se com mais detença a dignidade da pessoa humana, que
permeia a própria razão de ser dos conceitos anteriormente abordados, vez que se
trata de princípio aglutinador de vários direitos do ser humano.
2. PROCESSO ADMINISTRATIVO
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3 As teorias privatistas são aquelas que atribuem ao processo a natureza jurídica de contrato ou
autônoma, pois sua validade independe de qualquer relação de direito material; é una, pois todos os
atos componentes do procedimento visam à emissão de um provimento imperativo.
5 De acordo com MOREIRA (2003, p. 27): “A Administração possui poderes e regalias
atrelados a um fim preestabelecido pela lei, de modo que só serão validamente exercidos se
contemplarem os específicos deveres legais.
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7 Para PEREZ apud MELLO (2006, p. 470), os requisitos para que existam um procedimento são: a)
autonomia relativa dos atos, b) conexão em vista da unidade de efeito jurídico que se expressa no ato
final e c) relação de causalidade , de tal modo que um dado ato suponha o anterior e o ato final
suponha a todos eles.
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3. PRINCÍPIOS E REGRAS
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8 “Princípio (...) é momento em que algo tem origem; é a causa primária ou o elemento
predominante da constituição de um todo orgânico” (NUCCI, 2008, p.8).
9 Brüning (2007, p.94), em arremate, nos comprova, em interessante constatação, a farta presença dos
princípios no nosso trato diário com as ciências, de modo geral: “Quem observa a natureza e todo o
Universo verá que seu funcionamento é guiado por princípios, como o da atração e repulsa, no
sistema solar, que proporciona estabilidade nas distâncias e nos movimentos dos astros. No reino
animal, algo semelhante se passa no conhecido princípio da seleção das espécies, formulado por
Darwin. As ciências físicas submetem-se a vários princípios, a exemplo do aumento dos corpos em
temperaturas elevadas, e o de Arquimedes, segundo o qual, um corpo imerso em líquido perde uma
quantidade de peso igual ao peso da quantidade de peso igual ao peso da quantidade de fluido
deslocado. As ciências humanas ou comportamentais, como a psicologia, as economia, a política e a
religião também têm seus princípios com uma certa particularidade, sendo, via de regra, instituídos
pelo homem. O Direito também possui seus princípios, a exemplo da supremacia da Constituição,
da anterioridade da lei penal, da anualidade tributária, da liberdade contratual e assim por diante.”
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jurídicas (ao lado das regras), vez que dizem o que deve ser, impondo certo
comportamento.10
O gênero norma jurídica é resultado de atividade interpretativa, por
intermédio da qual, o aplicador ou cientista do direito, pautando-se por método
de interpretação (literal, histórico, teleológico, sistemático), analisa determinado
texto (ou enunciado) normativo, atribuindo (ou não) sentido a seus dispositivos11.
Contessa (2005, p. 46), entende ser a interpretação das leis um expediente pernicioso, ou sem suas
palavras, um verdadeiro mal: “Nada é mais perigoso do que o axioma comum de que é necessário
consultar o espírito da lei. É como romper um dique à torrente das opiniões. Esta verdade, paradoxal
às mentes vulgares mais abaladas por uma pequena desordem de momento que pelas
conseqüências funestas, mas remotas, que nascem de um falso princípio enraizado numa nação,
parece-me demonstrada. Todos os nossos conhecimentos e as nossas ideias estão conectadas
reciprocamente; quanto mais complicados, mais numerosos são os caminhos que até eles
chegam e deles partem. Cada homem tem o seu ponto de vista; o mesmo homem, em épocas
diferentes tem pontos de vista diferentes. O espírito da lei seria, portanto, o resultado da boa ou da
má lógica de um juiz, de uma digestão fácil ou difícil; dependeria da violência de suas paixões, da
fraqueza de quem sofre, das relações do juiz com o ofendido e de todas aquelas mínimas forças que
mudam as aparências de cada objeto no espírito flutuante do homem.”
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incorporando núcleos de sentido àquele texto original (ÁVILA, 2005, p.34). Esse
trabalho de reconstrução conduz o intérprete a duas ordens de normas: princípios e
regras, cuja distinção será objeto do próximo item do presente capítulo.
Os princípios são assim, normas que fornecem coerência e ordem a um
conjunto de elementos, sistematizando-o (WAMBIER et al 2002, p.65). Os
princípios são, portanto, espécies de normas jurídicas, como as regras. Assim como
elas, os princípios impõem deveres e vinculam os indivíduos, mesmo quando não
expressos. Suas principais características são, segundo a compilação doutrinária de
BRÜNING (2007, p.97-100):
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princípios quanto regras são formulados com base em expressões dêonticas básicas,
quais sejam: o dever, a permissão e a proibição. Ambas as espécies de normas
também constituem razões para juízos concretos de dever-ser. (ALEXY, 2008,
p.87)
Contudo, mesmo que o expediente distintivo entre as espécies de normas
seja alvo de debate dotado de relativa longevidade na seara do Direito, faz-se mister
realizar breve análise dos critérios mais difundidos na tentativa de disseptar tais
espécies normativas, tendo em vista os fins a que se propõe o presente trabalho.
Sem dúvidas, o critério mais difundido é aquele que se atém ao grau de
generalidade ou âmbito de incidência imanente a cada espécie normativa. De acordo
com tal critério, os princípios incidem sobre alcance ilimitado, enquanto que as
regras já contêm em seus bojos a “hipótese de incidência” em que são aplicadas
(WAMBIER, 2002, p.65).
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12 Segundo Alexy (2008, p.91-92), tal critério é o dotado de maior clareza entre os critérios
diferenciadores: “A diferença entre regras e princípios mostra-se com maior clareza nos casos de
colisões entre princípios e de conflitos entre regras. Comum às colisões entre princípios e aos
conflitos entre as regras é o fato de que duas normas, se isoladamente aplicadas, levariam a resultados
inconciliáveis entre si, ou seja, a dois juízos concretos de dever-ser jurídico contraditórios. E elas se
distinguem pela forma de solução do conflito.
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Por outro lado, ainda pelo critério do conflito normativo, a colisão entre
princípios requer método de compatibilidade diverso, pois implica em
ponderações de sopesamento e atribuição de peso a cada norma principiológica em
combate.
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13 Para Ávila (2005, p.81-82), as regras constitutivas podem ser reconstruídas a partir dos seguintes
dispositivos: dispositivos relativos à atribuição de competências, dispositivos relativos ao exercício de
competência; dispositivos relativos à delimitação material de competência; dispositivos relativos à
reserva de competência e dispositivos relativos à delimitação substancial de competência.
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14 “Mesmo as teorias chamadas materialistas, que não querem aceitar a espiritualidade da pessoa
humana, sempre foram forçadas a reconhecer que existe em todos os seres humanos uma parte não-
material. Existe uma dignidade inerente à condição humana, e a preservação dessa dignidade faz parte
dos direitos humanos.” (DALLARI, 1999. p. 9).
15 Em consonância à dimensão negativa da dignidade da pessoa humana, o art.5º, III da
Constituição da República assevera que “Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento
desumano ou degradante”.
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4.2. A Dignidade
Todos os elementos, no reino dos fins, são dotados quer de preço, quer
de dignidade. O preço representa valor que permite a substituição por outro
objeto equivalente. Sendo assim, aos objetos atribui-se um preço, vez que sua
valoração está condicionada às vicissitudes do mercado. Cada objeto, por portar
um preço, acaba por revelar extrinsecamente superioridade ou inferioridade sobre
outros objetos, em cotejo de valores economicamente aferíveis. O objeto que vale
mais, ostentando preço maior, evidentemente vale mais, é superior, aos dotados
de preços mais módicos.
Por outro lado, tal raciocínio não se aplica ao ser humano, já que este não
possui um mero preço, mas sim dignidade, própria de sua condição humana. A
dignidade é superior a qualquer preço, pois é insuscetível de substituição por outra
“dignidade equivalente”. Indica valor interno, comum a todos os homens,
imiscuindo-se em sua condição existencial. Todos os homens possuem a mesma
dignidade, o mesmo “valor”, não sendo admissível qualquer tentativa de
sobreposição de um homem sobre outro, como ocorre com as coisas.
Portanto, a dignidade significa que todo ser humano revela essência por
intermédio da qual outro homem é impedido de submeter ser semelhante aos
ditames de seu alvitre. Nenhum ser humano pode ser considerado como meio para
os outros, porque é um fim em si mesmo, possuindo valor incomensurável,
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16 Kant nos diz, de acordo com a tradução de Paulo Quintela (1989): “O homem, e, duma maneira
geral, todo o ser racional, existe como um fim em si mesmo, não só como meio para o uso
arbitrário desta ou daquela vontade”. (1989, p.45)
17 No original, em inglês, “Preamble: Whereas recognition of the inherent dignity and of the equal and
inalienable rights of all members of the human family is the foundation of freedom, justice and peace in the world.
(…) Article 1: All human beings are born free and equal in dignity and rights. They are endowed with reason and
conscience and should act towards one another in a spirit of brotherhood.”
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Assim, toda e qualquer ação do ente estatal deve ser avaliada, sob
pena de inconstitucional e de violar a dignidade da pessoa
humana, considerando se cada pessoa é tomada como fim em si
mesmo ou como instrumento, como meio para outros objetivos.
Ela é, assim, paradigma avaliativo de cada ação do Poder
Público e "um dos elementos imprescindíveis de atuação do
Estado brasileiro.” (SANTOS, 2001)
18 Art.1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como
fundamentos: (...) III – a dignidade da pessoa humana
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19 “Daí decorre que a ordem econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art.
170), a ordem social visará a realização da justiça social (art.193), a educação, o desenvolvimento da
pessoa e seu preparo para o exercício da cidadania (art.205) etc., não como meros enunciados
formais, mas como indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana.
(SILVA, 1998, p.107)
20 “Ademais, sublinhar a dignidade da pessoa humana como fundamento implica agregar à própria
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21 “À medida que os suplícios se tornam mais cruéis, os espíritos humanos que, como os fluidos,
se nivelam sempre com os objetos que os cercam, endurecem, e a força sempre viva das paixões
faz com que, após cem anos de cruéis suplícios, a roda assuste tanto quanto antes a prisão assustava.
Para que uma pena produza o seu efeito, basta que o mal que ela mesma inflinge exceda o bem que
nasce do delito e nesse excesso de mal deve ser levada em conta a infalibilidade da pena e a
perda do bem que o delito devia produzir. Tudo o mais é supérfluo e, portanto, tirânico.”
(BECCARIA, 2005, p.92-93)
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apenas na esfera jurídica, mas também social, econômica, cultural, política, em suma,
em toda a vida do homem em sociedade. O processo administrativo demorado,
desleal, desonesto, tendencioso, desnecessário, tendencioso e excludente
desrespeita a dignidade da pessoa humana. (BRÜNING, 2007, p.41)
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
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REFERÊNCIAS
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RESUMO
1 Mestrando em Direito Público pela Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universidade
Federal de Uberlândia.
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INTRODUÇÃO
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soviético são exemplos marcantes de que algo estava mudando na sociedade. Era a
chegada da pós-modernidade, o momento em que os metarrelatos que orientavam a
sociedade caíram em descrédito. (LYOTARD, 2006:xvi)
Esta incredulidade que acabou por decretar que a metanarrativa totalizante
do capitalismo liberal não é suficiente para proporcionar felicidade à humanidade.
Por outro lado, também mostrou que o metarrelato marxista não deu conta da
complexidade social que deixou para traz a dicotomia burguesia vs. proletariado.
O estatuto do saber modificou-se gravemente em relação à época moderna.
Ocorre a fragmentação das ciências num movimento de especialização jamais visto.
As universidades transformam-se em um sem número de institutos. (LYOTARD,
2006:71)
É o momento da pluralidade, do império das diferenças. O que une as
pessoas não é mais o estandardizado, mas o customizado. Mais do que nunca é
imperativo tratar os desiguais na medida de suas desigualdades. Os elos comunitários
de antes que exigiam o contato pessoal dos conviventes, agora são virtualizados.
Qualquer um que tenha acesso à grande rede de computadores é um cidadão sem
fronteiras. Num click vinculam-se instantaneamente um cidadão brasileiro, outro
libanês, e um chinês. Não há mais tempo nem distância para a troca de informações.
A superação das coordenadas de tempo e espaço, condicionantes da fugacidade
humana, impacta de forma drástica o desenvolvimento da ciência e da tecnologia. As
informações trafegam em velocidade e volume fantásticos entre os cidadãos
espalhados pelo mundo. Basta um bom processador. A natureza pós-moderna é
cibernética.
A onda, ou melhor, a tsunami pós-moderna repercute em todos os
quadrantes culturais, e, obviamente, o Direito não está a salvo destas repercussões.
Ainda bem!
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p.e., do enunciado veiculador do Direito à saúde, não é por isso que o cidadão
poderá ser alijado do gozo pleno do referido Direito fundamental.
Este tipo de debate promove uma importante alteração no jogo de forças
políticas estatais. O poder estatal que já esteve centrado no Poder Executivo e já teve
no Poder Legislativo a sua maior expressão, agora encontra no Poder Judiciário a sua
manifestação justificadora e salvadora, indicando estar próxima a completude do
sentido da expressão constitucional do Estado Democrático de Direito.
Surge o neoconstitucionalismo, cujas características podem ser organizadas
em dois grupos, as metodológico-formais e as materiais. No primeiro grupo
encontram-se o reconhecimento da força normativa da Constituição, a supremacia
sistêmica de suas normas e a centralidade sistêmica da Carta Política. No segundo
grupo estão a incorporação explícita de valores e opções políticas nos textos
constitucionais e a expansão de conflitos específicos e gerais entre as opções
normativas e filosóficas encartadas no bojo do próprio sistema constitucional.
(BARCELLOS, 2005:2)
O Poder Judiciário ganha em importância política, na medida em que agora
a capacidade criativa do intérprete é fundamental para que os conceitos
indeterminados albergados nos textos normativos ganhem densidade e toquem o
plano da realidade social em erupção. O Direito não é abstraído da norma, mas
construído a partir do enfrentamento pleno dos enunciados prescritivos.
O Direito não mais é hermeticamente fechado às influências de outras
ciências afins, tais como a filosofia e sociologia. Ao contrário, os influxos filosóficos
dos Direitos fundamentais são indispensáveis para uma construção semântica
tendente à completude, à plenitude.
Luis Roberto Barroso (2005) assim manifesta-se acerca deste momento:
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(entrechoque do dever-ser com o ser), em outras palavras, o plano das normas gerais
e abstratas e o plano das normas individuais e concretas.
Feitas estas considerações, alerta-se o leitor para o fato de que está sendo
proposto um conceito para Direitos fundamentais compreensível no plano do
ambiente dos enunciados prescritivos, i.e., no plano sistêmico, geral e abstrato, enfim,
no plano do dever-ser, e frisa-se, isto nada tem de redução meramente formal, mas
traduz apenas um primeiro passo na compreensão integral do fenômeno, já que
entende-se que a compreensão adequada do plano normativo seja indispensável para
proporcionar a adequada compreensão do contato da normatividade com a
facticidade.
Desta forma, aqui, Direitos fundamentais são tomados como enunciados
prescritivos encartados na Constituição Federal, ou por ela alcançados, intangíveis
prejudicialmente pelo legislador ordinário, e que, por serem dotados de aplicabilidade
imediata, e assim serem inobstáveis sob qualquer pretexto, traduzem modelos
normativos para a efetividade dos fundamentos e dos objetivos republicanos, bem
como para os princípios de convivência internacional, em função de nota
intransponível de sua fundamentalidade, entendida como a incondicionabilidade de
sua efetividade.
Fixado o conceito aqui adotado, retomar-se-á o debate contemporâneo em
matéria de Direitos fundamentais. Eis a justificativa para a escolha.
Os enunciados veiculadores de Direitos fundamentais normalmente estão
cravados em nosso sistema jurídico com a utilização da técnica legislativa dos
conceitos indeterminados, i.e., na construção enunciativa do suporte físico textual
jurídico o legislador, ciente ou não, da necessária inexauribilidade dos textos
prescritivos em análise, optou por construí-los com palavras que admitem inúmeros
significados, termos plurissignificativos.
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(2006) afirma que para os casos fáceis, basta a justificação interna da decisão, sendo
que para os casos difíceis há de concorrer a justificação externa do julgamento. Na
primeira hipótese, o fundamento da decisão residirá em regras. No segundo caso, os
fundamentos da decisão residirão em elementos normativos que para ele,
considerando o momento em que escreveu sua Teoria da Argumentação, ainda eram
exteriores ao sistema jurídico. Refere-se o escocês aos princípios e aos valores.
Sem querer adentrar na polêmica distinção das regras e princípios, por
apreço à questão metodológica, mister adotar aqui um posicionamento acerca destas
categorias jurídicas.
As regras são enunciados prescritivos portadores de alta densidade
normativa que alocam no antecedente de sua estrutura enunciativa a previsão
hipotética de uma conduta à qual imputam uma consequência, entendida enquanto
uma situação jurídica que deverá instalar-se caso a hipótese normativa verifique-se
integralmente no plano da facticidade.
Já os princípios, são enunciados prescritivos portadores de baixa densidade
normativa, implícitos ou explícitos no sistema jurídico, que alocam em seu
antecedente ou um valor jurídico ou um limite à atuação dos sujeitos de direito
destinatários e que desempenham quatro funções, a saber:
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Tudo o quanto foi até agora afirmado não é suficiente para a aferição da
racionalidade da decisão judicial, traduzindo apenas os primeiros passos
indispensáveis para que os elementos de racionalidade estejam adequadamente
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Para que se tenha uma decisão racional, contudo, não basta a sua
racionalidade formal. É preciso invadir a essência da decisão e submetê-la a testes de
consistência e de refutabilidade. Diante desta necessidade, pode-se afirmar que uma
decisão será materialmente racional quando:
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normas que comporão a premissa maior do silogismo judicial, o juiz deve considerar
os aspectos axiológicos e teleológicos subjacentes ao sistema jurídico. Para a hipótese
de identificar desalinhamento substancial entre os enunciados potencialmente
utilizáveis como premissa maior, deverá esforçar-se a fim de construir uma
interpretação que mostre-se congruente com aqueles aspectos. Uma vez não
encontrada ou construída esta interpretação, o enunciado não deve integrar a
premissa maior do silogismo, ou porque foi declarado inválido, ou por que foi
afastado em função da incidência de outros enunciados.
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“... para alguém poder tomar uma posição, dizendo ‘sim’ ou ‘não’,
é preciso que o outro esteja disposto a fundamentar, caso se torne
necessário, uma pretensão levantada através de atos de fala. Uma
vez que os sujeitos que agem comunicativamente se dispõem a
ligar a coordenação de seus planos de ação a um consentimento
apoiado nas tomadas de posição recíprocas em relação à
pretensões de validade e no reconhecimento dessas pretensões,
somente contam os argumentos que podem ser aceitos em
comum pelos partidos participantes”.
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O homem deve agir por ter de agir e pronto. Mas este agir incondicionado
não é impensado, irrefletido, senão não seria racional, mas sim instintivo, como nos
animais irracionais. Inevitavelmente, há na base de qualquer pensamento humano, e,
portanto, na base de qualquer raciocínio, uma justificação, que repousa na idéia de
que esta possa adquirir o valor de lei universal, isto é, ser adotada para os demais
casos similares por outras pessoas em iguais condições. Sem esta característica, uma
ação passa a ser injustificável racionalmente o que levaria a sua ruína. (KANT,
2006:30)
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CONCLUSÃO
Conclui-se assim, que ter-se-á por concretizada a democracia toda vez que
houver comunicação aceita entre os sistemas que integram o sistema social, na
medida em que ter-se-ão preservados os micro-sistemas sociais conviventes e
garantida a convivência social pacífica que permanecerá na busca incessante da
felicidade humana. A racionalidade das decisões jurídicas que é aferida pela
consistência de sua fundamentação é um elemento a ser considerado para efeitos de
consecução deste objetivo republicano.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. A Ciência do Direito. 2. ed. São Paulo: Atlas,
1980.
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Resumo
1 Bacharelando em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais.
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1. Introdução
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que se baseie numa teoria normativa da sociedade e que lance mão de um transversal
conceito de justiça.
Na conclusão, retomo estes resultados, mas deixo claro que os mesmos
ainda se encontram muito distantes da solução dos problemas levantados. Há a
necessidade de se pensar criticamente uma a Teoria do Reconhecimento, visando
abrir novas perspectivas de investigação que se preocupem com uma abertura
fundamental ao outro; abertura incondicional, incalculável e que não conjugue
expectativas de reciprocidade. Anuncia-se uma orientação da cidadania em direção à
hospitalidade incondicionada de Jacques Derrida.
2. A cidadania inantecipável
2 Referir-me-ei fundamentalmente, aqui, a alguns escritos de Jacques Derrida. Penso, por exemplo, no
abandono da cidadania em prol de um hospitalidade sem condições, que é tema de obras importantes
da fase final de sua vida. Cf. DERRIDA (1994); e DERRIDA (2003).
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Ciência – ainda que não se restringindo a ele, em alguns casos. De Hans Kelsen à
Karl Olivecrona3, todos terão dificuldade para nos responder. Todos se sentirão
ameaçado por um conceito que conceitualmente seja a recriação de si mesmo.
A título de exemplo, por se tratar de um relevante filósofo do Direito, e por
seu viés de diálogo com o positivismo, mas de duras críticas à Kelsen, tomo a obra
de Alf Ross como apoio para esta discussão. Ross trabalhou a noção de conceitos
jurídicos em ao menos quatro de seus textos: “Tû-Tû”, , “Sur les concepts d'État et
organes d'État”, “La délégation de pouvoir” e“La définition en Droit”4. Em Ross, a
ideia de conceitos jurídicos é de patente importância, uma vez que é a existência de
conceitos claros que expliquem nossa linguagem cotidiana o que permite a existência
de um discursos autônomo e, portanto, de uma ciência do direito (BRUNET, 2002).
Ross baseou sua noção de conceitos jurídicos inicialmente na filosofia de
Bertrand Russel, notadamente a teoria das descrição definidas. Em seguida – e é isso
que alguns de seus comentadores resistem em observar – Ross abandonou tal linha
de pensamento, passando a se basear na escola pragmática da linguagem. O
resultado disto foi uma concepção fundada em dois axiomas: a) “os enunciados
jurídicos não se referem a realidades extra-linguísticas”; e b) “estes não podem ser
compreendidos com o auxílio de enunciados de fato” (BRUNET, 2002). Os
conceitos jurídicos só podem ser entendidos em seu uso, o que equivale a dizer que
sua análise é, e sempre é, uma análise do sistema jurídico no qual eles se encontram.
“O conceito de direito subjetivo é um instrumento para a técnica de apresentação
que serve exclusivamente a fins sistemáticos, e que em si não significa mais nem
menos que 'tû-tû'” (ROSS, 2004, p. 54).
3 Sobre as obras de referência, ver: KELSEN (2003); OLIVECRONA (1971).
4 Os três primeiros se encontram traduzidos para o francês em livro que recolhe diversos textos do
autor: ver ROSS (2002). O último deles se encontra aqui: MATZNER (2000).
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4. Os fantasmas da cidadania
sentido político, mas vão passar a se ligar muito intimamente, como não acontecia
anteriormente.
O surgimento do Estado-Nação inaugura uma cadeia de conceitos
autorreferenciais que se explicam, e só se explicam, mutuamente: Estado, Nação,
Soberania e Cidadania. Exemplo lapidar é o Capítulo VI do Livro I de Do contrato
social. Ali, Jean-Jacques Rousseau se pôs a definir esses termos, mas, por outro lado,
deixou evidente que não poderia fazê-lo sem as referência internas: conceituar, neste
caso, nada mais é do que substituir um termo do sistema pelos demais. A cidadania
se acha, portanto, não numa definição abstrata, mas no complexo de conceitos que
lhe permite vir à tona e, ademais, que lhe confere sentido. “Em relação aos
associados, eles recebem coletivamente o nome de povo; e se chamam, em particular,
cidadãos, enquanto participantes da autoridade soberana e sujeitos, como aqueles
submetidos às leis do Estado6” (ROUSSEAU, 1822, p 25) (tradução minha).
Logo, a cidadania é pensada como inclusão de alguém no contrato social,
como inclusão na comunidade política soberana. É a soberania deslocada para a
Nação que perfaz o sentido próprio da cidadania: soberania popular e autogoverno a
carregam de elementos diferenciadores em relação à civitas romana. Habermas
identifica muito bem esta relação de interdependência surgida. Para ele, a aparição
conjunta deste conceitos é o efeito do republicanismo moderno nascente que
encontrou espaço para sua expansão (HABERMAS, 1996, p. 495 et seq.). O Estado
pós-Antigo Regime precisava de um sistema de conceitos que motivassem a
integração social e o comprometimento com o espaço público que se estava criando.
A nação passava a ser identificada com o poder político, enquanto a cidadania era o
poder individualizado, dividido e recebido. Cidadania sempre fora e, desde então,
6 No original: “À l'égard des associés, ils prennent collectivement le nom de peuple, et s'appellent em
particulier citoyens, comme participant à l'autorité souveraine, et sujets, comme soumis aux lois de
l'État”.
1211
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tem sido assunto relativo ao pertencimento. Nas palavras de Derrida, o cidadão passa
a ser uma singularidade contável ligada à Nação e ao Estado (DERRIDA, 1994b, p.
40); uma unidade identificável, mas que só pode ser apreendida, contabilizada, a
partir de sua relação com o todo soberano da nação.
A pergunta fundamental que me coloco é esta: como pensar a cidadania
para além deste quadro teórico que não estamos mais dispostos a endossar?, como
pensar a cidadania numa era pós-Hobbesiana – crítica, portanto, da soberania
estatal?, uma cidadania que exceda os limites impostos por um Estado Canalha7?,
como pensar a cidadania numa perspectiva do cosmopolitismo da diferença8?, como
pensar a diferença para além do comunitarismo, da comunidade de valores?
É a partir destas questões que formulo os problemas da cidadania. Ora, por
um lado, a Filosofia do Direito e a Filosofia Moral vistas sob a perspectiva de um
pensamento pós-metafísico9, veem-se em dificuldade em face de uma remissão
metafísica ao conceito de cidadania, que o faz ser acompanhado, em sua prática, de
vários de seus fantasmas: Soberania, Nação, Estado-Nação. Por outro lado, para a
Teoria Constitucional da Democracia, localizar a cidadania como espaço de mediação
entre a autonomia pública e privada, vê-la como fruição de direitos fundamentais –
que incluem direitos comunicativos - , é muito arriscado. É muito arriscado, ao
menos, enquanto não conseguirmos retirá-la-la devidamente deste complexo de
conceitos que estão a assombrá-la.
Jürgen Habermas adota a estratégia da separação em nível conceitual : a
ocorrência conjunta destes conceitos na modernidade nascente não pode perder de
vista que eles se separam conceitualmente (HABERMAS, 1996, p. 496 et seq.). Isto
7 O uso da expressão Estado Canalha é equivalente aproximado para traduzir Rogue State. A conhecida
categoria – relembro o sentido de acusação -, cunhada no governo Bill Clinton, foi objeto das
indagações de Jacques Derrida. Cf. (2003).
8 Expressão que tomo emprestada de Giacomo Marramao. Cf. MARRAMAO (2007).
9 Sobre a noção de pensamento pós-metafísico, ver: HABERMAS (2002).
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equivale a dizer que cada um dos termos não se confundirá na ordem dos conceitos,
para além do uso histórico que deles possamos fazer. No entanto, por não
desenvolver mais a tese da autonomia conceitual da cidadania, Habermas acaba
desenhando uma teoria mais metafísica do que ele desejaria. E o faz contradizendo
toda a filosofia da linguagem que lhe serviu de suporte. Ao partir de uma separação
muito acentuada entre a prática histórica do conceito e sua autonomia num plano
abstrato, Habermas só poderá justificar a distinção em nível conceitual com recurso a
uma espécie de platonismo.
Jacques Derrida chama atenção para o retorno da metafísica quando se
pretende rejeitá-la com um simples gesto, como o fizeram Nietzsche, Heidegger ou
Freud. “Ora, como estes conceitos não são elementos, não são átomos, como eles
são tomados em uma sintaxe e um sistema, cada empréstimo determinado faz vir a
ele toda a metafísica”10 (DERRIDA, 1967, p. 413) (tradução minha). É impossível
retirar um termo de seu sistema, da metafísica de seus conceitos, com uma mera
atitude destrutiva. Não é destruindo a metafísica que podemos superá-la.
É o que ocorre com a cidadania: quando invocarmos seu nome estaremos,
ainda que muito indiretamente, fazendo vir com ele a Soberania, a Nacionalidade, o
Estado-Nação hobbesiano e toda a metafísica que o sustentou. Faremo-lo, ao menos,
se não tomarmos o cuidado necessário: uma atitude de atenção extrema, a qual
Derrida talvez desse o nome de desconstrução11.
Finalmente, são estes os problemas postos para a filosofia prática e para a
teoria constitucional democrática. Como se libertar do sistema de conceitos em que a
cidadania se viu encerrada, sem recurso a categorias metafísicas que pretendam
10 No original: “Or comme ces concepts ne sont pas des élements, des atomes, comme ils sont pris
dans une syntaxe et un système, chaque emprunt determiné fait venir à lui toute la métaphysique”.
11 De tudo o que fora escrito e não escrito sobre a desconstrução, chega a ser uma atitude arrogante
remeter o leitor a qualquer obra que vise esclarecer-lhe o sentido. Contudo, acredito que valha a pena
partilhar das interrogações de Derrida sobre sua própria obra em Le toucher, Jean-Luc Nancy. Ver:
DERRIDA (2000).
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explicá-la? Por outro lado, como pensar uma teoria constitucional da democracia,
cujo elemento central, a cidadania, responsável pela mediação entre autonomia
pública e privada, não se encontre mais submetida aos sentidos que lhe acrescentam a
Soberania, a Nação e o Estado-Nação?
12 Derrida criticou arduamente a cidadania em razão dos limites que ela representa. No ponto final de
sua proposta, Derrida propõe a substituição da cidadania, do direito de asilo, do refúgio e de outras
tantas categorias por uma única: a hospitalidade incondicionada. Cf. DERRIDA, (2003, p. 204).
1214
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p. 213). A justiça representa, neste diapasão, uma referência a estas estruturas. Uma
sociedade que realize as condições histórias de reconhecimento, postas por si mesma,
é uma sociedade justa. Isto significa que o justo em Honneth, ou ainda, a justiça
social atravessa o direito e compreende outras esferas de interação e integração. O
direito é seguramente muito importante para esta análise, mas a justiça não se limita a
ele: há um justo que excede o Direito.
13 Honneth desenvolveu as ideias sobre invisibilidade em: HONNETH (2001).
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1218
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7. Referências bibliográficas
AVRITZER, Leonardo. Democracy and the public space in Latin America. Princeton
University Press: Princeton, 2002.
DERRIDA, Jacques. Voyous – deux essais sur la raison. Éditions Galilée: Paris, 2003.
HONNETH, Axel. Luta por reconhecimento: a gramática moral dos conflitos sociais.
Ed. 34: São Paulo, 2003.
HONNETH, Axel. The critique of power. reflective stages in a critical social theory.
Cambridge: MIT Press, 1991.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. Martins Fontes: São Paulo: 2003
1221
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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ROSS, Alf. Tû-Tû. Editora Quartier Latin do Brasil: São Paulo, 2004.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Por qué Cuba se ha vuelto un problema difícil para
la izquierda?. In: El Viejo Topo, 256, 2009, p. 29-37.
1222
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RESUMO
Passados dez anos de vigência da Lei nº 9.656/98, que surgiu para disciplinar a
relação jurídica entre consumidores/beneficiários e fornecedores/operadoras de
plano de saúde, muito se discute nos Tribunais de Justiça, órgãos de defesa do
consumidor (Procon’s) e na própria Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS)
sobre a legalidade em reajustar a mensalidade dos contratos. Com base no
acompanhamento das decisões judiciais e administrativas observou-se divergência de
entendimento das leis e dos atos normativos vigentes, o que possibilita discutir sobre
os riscos que esta atividade econômica está sujeita, bem como sobre a insegurança
jurídica. O direito à informação clara e precisa consagrado no Código de Defesa do
Consumidor (art. 6º, III) e na própria Lei de Plano de Saúde deve ser respeitado
pelos fornecedores que atuam no mercado de saúde suplementar. Por outro lado,
deve ser observado, em cada caso concreto, as presenças da ilegalidade ou
abusividade do reajuste praticado, sob pena de instituir decisões meramente
protecionistas e de cunho social, gerando um paternalismo pretoriano.
ABSTRACT
After ten years of legal effect of the Law n. 9656/98, created to regulamentate the
relationship between consumers and health plans, there are still a lot of discutions on
courtes, Procon´s and ANS about de legality (or lawfulens) of the reajustement of the
mounthly payment on contracts. Based on the judicial and administrative decisions, it
can be seen the the divergency on the understanding of laws and officials acts, wich
leads to a discution about the economical riscks and juridic unsafety of that activity.
The right for the acess of clear and precise information aclamated on the CDC (code
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used to defende consumers) must be respected by the health plans suppliers.On the
other hand, in each case must be observed the presence of ilegality or abusiveness on
the use of the reajustement, avoiding protecionist and not only social decisions,
creating a harmful paternalism.
1 INTRODUÇÃO
* Mestrando em Direito Empresarial da Faculdade de Direito Milton Campos
1 Origem Rio de Janeiro (2006/00033783-6) – Recorrente: Amil Assistência Médica Internacional
1224
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3 Lei nº9.961/2000, art. 4º, inciso XVII “autorizar reajustes e revisões das contraprestações
pecuniárias dos planos privados de assistência à saúde, ouvido o Ministério da Fazenda;”
4 Lei Federal nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 (vigência 01/01/2004)
1225
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discernir sobre qual entendimento deve prevalecer para se atingir à harmonia nos
interesses desta relação de consumo.
2 FORMAS DE REAJUSTE
5 http://www.ans.gov.br/portal/upload/biblioteca/guia_reajuste_mensalidade.pdf
6 Idem 5.
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Mais uma vez nos reportamos a conceituação da ANS, agora para o reajuste
por faixa etária, a qual estabelece ser “o aumento decorre da alteração de idade do
consumidor”.
O reajuste por mudança de faixa é possível, pois está esculpido no nosso
ordenamento jurídico no artigo 157 da Lei nº 9.656/98, restando estabelecido que
para sua devida aplicação é necessário que as operadoras de plano de saúde façam a
devida previsão no contrato, tanto das faixas quanto os percentuais, preservando
assim, o direito à informação (art. 6, III e 46, ambos do CDC).
Pode-se afirmar que na grande maioria dos contratos de plano de saúde, que
foram firmados antes da Lei nº 9.656/98, consta a possibilidade do reajuste por faixa
etária, contudo, é bem verdade que não informa o percentual a ser aplicado em cada
uma delas, o que leva o assunto para o Judiciário decidir sobre sua legalidade ou não.
7 “Art. 15.A variação das contraprestações pecuniárias estabelecidas nos contratos de produtos de que
tratam o inciso I e o §1º do art. 1º desta Lei, em razão da idade do consumidor, somente poderá
ocorrer caso estejam previstas no contrato inicial as faixas etárias e os percentuais de reajustes
incidente em cada uma delas, conforme normas expedidas pela ANS, ressalvando o disposto no art.
35-E.”
1227
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2.2.1 Reajuste por mudança de faixa etária para pessoa física ou jurídica
anterior à lei nº 9.656/98
8 Recurso de Apelação nº 2.0000.00.442496-4/000(1), julgado em 20/09/2005. Trata-se de decisão
definitiva, pois não houve por parte da autora da ação interposição de recurso especial ou
extraordinário.
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reajuste máximo de 50% para todos os usuários das operadoras que mudaram de
faixa etária no curso do processo ou que irão sofrer tal reajuste ao longo do contrato.
Na referida ação foi obtida tutela antecipada impedindo que as operadoras
aplicassem qualquer reajuste por mudança de faixa etária para os clientes de contratos
“antigos”, sendo que transcorridos mais de 06 anos, o TJMG decidiu que:
1229
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2.2.2 Reajuste por mudança de faixa etária para pessoa física ou jurídica
posterior à Lei nº 9.656/98 e anterior ao Estatuto do Idoso
9 As 07 (sete) faixas etárias são: 0 a 17 anos; 18 a 29 anos; 30 a 39 anos; 40 a 49 anos; 50 a 59 anos; 60
1233
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1234
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12 Recurso Inominado nº 71001519131 – Segunda Turma Recursal Cível - Comarca de Porto Alegre.
13 Recurso Inominado nº 71001625664 - Segunda Turma Recursal Cível - Comarca de Porto Alegre
14 Multa de R$45.000,00 (quarenta e cinco mil reais) – Art. 57 da RN nº 124/2006.
1235
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15 Produto se assemelha a plano ou seguro saúde, sendo que para a comercialização pelas operadoras é
2.2.3 Reajuste por mudança de faixa etária para pessoa física ou jurídica
posterior à lei nº 9.656/98 e posterior ao Estatuto do Idoso
18 Fonte: http://www.ans.gov.br/portal/upload/biblioteca/guia_carencia_doenca_urgencia.pdf
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como para jurídicas, firmados a partir 1º de janeiro de 2004 de dez faixas etárias19 e
não sete faixas como anteriormente previsto20.
Esta nova regra trouxe consigo uma discussão para o cenário jurídico, qual
seja, a irretroatividade do Estatuto do Idoso para os contratos celebrados antes da
sua vigência.
A tese desenvolvida e sustentada em algumas recentes decisões judiciais
para não aplicação de reajuste para pessoas com idade igual ou maior de sessenta
anos foram embasadas pelo voto da Ministra Nancy Andrighi que explicou:
19 Faixas etárias: 0 a 18 anos; 19 a 23 anos; 24 a 28 anos; 29 a 33 anos; 34 a 38 anos; 39 a 43 anos; 44 a
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes”:
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Entre outras hipóteses, autorizava a ANS a conceder ou não reajuste por variação de
faixa etária aos consumidores com mais de 60 anos. A decisão consiste em preservar
o ato jurídico perfeito nos casos de reajuste de mensalidade de contrato antigo,
entendimento diferente não pode existir para reajuste de clientes que contrataram
antes do advento do Estatuto do Idoso.
Mesmo por ser tratar de uma lei de ordem pública deve-se submeter à
norma constitucional que preserva o ato jurídico perfeito e o direito adquirido. Neste
sentido GRECO FILHO (1991, pág. 380) “As normas de intervencionismo
contratual aplicam-se aos contratos celebrados a partir de sua vigência”.
Do voto do Ministro do Superior Tribunal de Justiça Castro Filho que
divergiu da Ministra Nancy Andrighi, extrai-se o seguinte texto:
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CONCLUSÃO
Vê-se que existe a legalidade do reajuste por mudança de faixa etária, sendo
que as regras para sua aplicação variam de acordo com a data de celebração do
contrato.
As regras jurídicas que surgem ao longo do tempo contribuem para
incrementar a complexidade do setor de saúde suplementar, provocando um cenário
de extrema insegurança para empresas que atuam nesta atividade econômica.
Imperioso que haja uma unificação de entendimento sobre as regras que
envolvem os contratos de plano de saúde, tornando-se necessário o julgamento da
ADIn 1.931-8, para evitar decisões contraditórias e de caráter meramente
paternalista.
O tema reajuste afeta diretamente o interesse econômico das partes, de um
lado o consumidor que é compelido a pagar um valor que não estava previsto no seu
orçamento doméstico e de outro a operadora de plano de saúde que tem interesse em
receber para manter o equilíbrio financeiro da carteira de clientes. Essa situação é
agravada quando se trata de reajuste por faixa etária
Vale lembrar que hoje temos uma acentuada intervenção estatal nos
contratos de consumo que são celebrados entre as operadoras de plano de saúde
(OPS) e consumidores, sendo que, em curto ou médio prazo, poderá acarretar um
descontrole do mercado.
Por arremate, é cediço que as normas jurídicas ou as decisões baseadas
nelas, podem predizer, estimular ou, no caso que ora mais interessa, desestimular os
conflitos entre fornecedores e consumidores.
A insegurança jurídica e econômica está instalada na relação de consumo de
plano de saúde, haja vista a falta de harmonização de entendimento entre o Estado-
Juiz e o Estado-Regulador. Daí, a necessidade da busca da equidade entre os
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participantes desta relação, com vistas a uma Justiça distributiva e não assistencialista,
preservando o equilíbrio econômico financeiro dos contratos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito Penal. Volume 1. 4ª ed. São Paulo:
Saraiva, 2004, p. 500-501
TELES, Ney Moura. Direito Penal. Volume II, São Paulo: Atlas, 2004, p. 280.
1243
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RESUMO
1 Graduanda em Direito na Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG
1244
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1. Introdução
Essencial para todo cidadão, como instrumento que lhe assegura direitos e
garantias individuais, a Constituição Federal de 1988 ainda é pouca conhecida pela
maioria da população.
Grande parte dos direitos constitucionais visa à proteção das pessoas
desfavorecidas socialmente, mas esses não se verificam na realidade. Não é porque
são garantidos que o Estado oferece possibilidades reais de aplicação. O
conhecimento desses direitos por esse grupo é de fundamental importância para sua
concretização, é o primeiro passo para o seu exercício.
O presente artigo é baseado em um trabalho realizado na cidade de Belo
Horizonte por discentes da Faculdade de Direito da UFMG. A finalidade do trabalho
foi verificar se o cidadão tem conhecimento dos direitos que lhe são assegurados pela
Constituição. A partir da pesquisa sociológica proposta foram elaboradas hipóteses e
chegou-se a conclusões. Com um questionário específico, aplicado em 96 pessoas,
foi verificada a relação dos cidadãos com os direitos constitucionais, considerando
seu nível sócio-econômico e cultural. O grupo de entrevistados representou
diferentes classes sociais e foram utilizadas duas variáveis para identificar e classificar
os mesmos: a renda mensal familiar e o grau de instrução.
Percebeu-se, após o recolhimento dos questionários de entrevista, uma
relação direta entre a informação que o entrevistado tinha acerca de seus direitos
constitucionais e o seu nível de escolaridade e de renda. Quanto mais instruídos,
maior era o percentual de pessoas capazes de reconhecer e citar os direitos
constitucionais. A maioria dos pesquisados que não sabiam ou, que não tinham
nenhuma noção acerca dos direitos lhes assegurados pela Constituição, eram de
pessoas que ganhavam até dois salários mínimos e tinham estudado até o segundo
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2. Metodologia Utilizada
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5. Referências Bibliográficas
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FUNDAMENTOS INTER
E TRANSDISCIPLINARES
DO DIREITO
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RESUMO
O texto trabalha a relação entre Direito e Literatura, analisando a obra São Bernardo,
de Graciliano Ramos, na perspectiva das obsessões de Paulo Honório, seu
protagonista. Ao escrever suas memórias, a personagem destaca o envolvimento
dramático com duas das mais relevantes causas de crime no Brasil: a “barra de terra”
e a “barra de saia”, revelando seus mecanismos violentos de conquista. Os conflitos
agrários sempre se revelaram como uma das principais causas de violência no Brasil,
desde os primórdios da colonização, que fora efetivada pelo sistema de sesmarias e
capitanias hereditárias, ou seja, tipicamente vinculada à terra. Graciliano Ramos
evidencia isto em São Bernardo, ao criar uma personagem tão arraigada aos contornos
do Brasil rural, em especial da região Nordeste. De acordo com o mapa da violência
no Brasil (IBGE) os maiores índices desta não estão concentrados em estados como
Rio de Janeiro e São Paulo, mas sim naqueles em que são frequentes as mais graves
questões agrárias, como grilagem de terras, desmatamento, tentativas de efetivação de
reforma agrária, invasões violentas de fazendas pelos sem-terra, etc. Enfim, a “barra
de terra” ainda continua sendo a grande causa de homicídios no Brasil, em especial
nas regiões Norte e Nordeste, seja pelo excesso ou pela falta dela. Por outro lado, a
obsessão de Paulo Honório pela “barra de saia”, ou seja, por Madalena, revela um
assédio psicológico e moral, que marca a vida conjugal de muitos casais,
representando a violência doméstica também uma das várias causas de crimes no
Brasil e no mundo. Essa, inclusive, foi a razão para a edição de uma legislação
específica sobre o tema em nosso País, a denominada “Lei Maria da Penha” em
salvaguarda da mulher, vítima da opressão masculina.
1 A autora é Mestre e Doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais.
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1. Introdução
2 Desenvolver um trabalho de pesquisa na era da internet, na realidade, é uma tarefa árdua e perigosa
pois, ao mesmo tempo em que o acesso às fontes é facilitado, acaba por tornar a pesquisa quase que
infinita, sobretudo quando se trata de um dos mais importantes autores de nossa literatura, haja vista a
infinidade de artigos, dissertações, teses, comentários, enfim, toda a vastidão cultural que desperta a
sua obra.
3 Arnaldo Sampaio de Moraes Godoy esclarece que “Direito e Literatura pode suscitar interações
me marcou na leitura das memórias de Paulo Honório, seu protagonista, por sua
característica emblemática, um misto de econômico, social, psicológico e moral.
Cheguei à conclusão de que dois dos maiores ícones motivadores dos
crimes, a “barra de terra” e a “barra de saia”, ganham relevo em São Bernardo e são,
sem dúvida, o cerne da vida de Paulo Honório, que o levam tanto à conquista sócio-
econômica quanto à morte psicológico-moral.
Graciliano Ramos tinha o dom de escrever sobre os vários dramas da vida
sem, contudo, ser dramático. Ao contrário, suas obras eram pautadas pela redação
clara, sem verborragia5, descrevendo o cotidiano de seus protagonistas, mesmo que
repleta de tragédias, de forma áspera mas quase cômica. Em São Bernardo não foi
diferente, pois seu conteúdo é magnificamente denso, mas a linguagem é simples e
seca, sem delongas, mesmo porque destaca a vida no agreste e no sertão brasileiros.6
Renato Lima traduz São Bernardo como uma das “obras-primas de
Graciliano Ramos”, fusão de social e psicológico:
sobreviver. Vamos ver o que Graciliano Ramos escolhe. É muito meticuloso. Quer eliminar tudo o
que não é essencial: as descrições pitorescas, o lugar-comum das frases feitas, a eloqüência
tendenciosa. Seria capaz de eliminar ainda páginas inteiras, eliminar os seus romances inteiros, eliminar
o próprio mundo.” CARPEAUX, Otto Maria. A visão de Graciliano Ramos - Uma amostra dos
Ensaios Reunidos de Otto Maria Carpeaux. Disponível em http://www.olavodecarvalho.org.
Acessado em 25/04/2010. Numa das descrições do livro na internet, encontrei esta síntese: “O autor
tem um estilo seco, conciso, direto, desprovido de qualquer marca de sentimentalidade. Ele
combinava o ambiente dos seus romances com as personalidades das personagens que neles viviam.”
Novidades da Livraria. Disponível em http://www.pco.org.br. Acessado em 26/04/2010.
6 “A atitude literária de Graciliano Ramos é, segundo ele, sua única ferramenta para diagnosticar o seu
tempo. E que tempo é esse? O resultado a que chega sua literatura é uma razão pessimista, na qual não
sobra espaço para idealizações saudosistas de passado, nem para futurismo ufanista. O Brasil e, mais
precisamente, o Nordeste que Graciliano vê nascer, não comportam idealismos de nenhuma ordem –
sejam literários ou políticos.” MENDES, Francisco Fabiano de Freitas. Ponto de fuga: tempo,
fome, fala e poder em “Vidas Secas e “São Bernardo”. UFC/História, pp. 1-204, p. 25.
Disponível em www.dominiopublico.gov.br. Acessado em 26/04/2010.
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Desde a escolha do nome São Bernardo, o autor parece querer nos dizer
algo. “São Bernardo”, o Santo, Bernardo de Claraval8, é o oposto de Paulo Honório,
do físico ao moral. Bernardo, homem belo e cheio de virtudes, que convencia as
pessoas pela argumentação inteligente e persuasiva; Paulo Honório, esteriótipo da
feiura, como o próprio o descreve9, alheio à temperança e que aprendeu a resolver as
7 LIMA, Renato. São Bernardo – Graciliano Ramos. Disponível em www.sitedoescritor.com.br.
Acessado em 26/04/2010.
8 Nos dizeres da Revista Catolicismo: “O menino era extremamente bem dotado. Além de boa
aparência física, tinha Bernardo uma inteligência viva e penetrante, elegância de dicção, suavidade de
caráter, retidão natural de alma, bondade de coração, uma conversa atraente e cheia de encanto. Ao
par disso, uma modéstia e uma propensão ao recolhimento, que o faziam parecer tímido.” “Era tão
intenso o dom de persuasão que possuía esse homem cheio do amor de Deus, que, ao pregar, as
mulheres seguravam os maridos e as mães escondiam os filhos, por medo de que o seguissem.”
Oferecido pela Revista Catolicismo. Disponível em
http://www.lepanto.com.br/dados/HagBClar.html. Acessado em 30/04/2010.
9 “Foi este modo de vida que me inutilizou. Sou um aleijado. Devo ter coração miúdo, lacunas no
cérebro, nervos diferentes dos outros homens. E um nariz enorme, uma boca enorme, dedos
enormes. Se Madalena me via assim, com certeza me achava extraordinariamente feio. Fecho os olhos,
agito a cabeça para repelir a visão que me exibe essas deformidades monstruosas.” RAMOS,
Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 221. A descrição é quase que lombrosiana,
induzindo o leitor a fazer uma relação natural entre o tipo físico e o tipo psicológico de Paulo
Honório. Cesare Lombroso, um dos precursores da Antropologia Criminal, chamado de “pai da
Criminologia”, pela sua importância na formação desta ciência, baseava a sua teoria do criminoso nato
muito nas pesquisas em “medicina legal, dos caracteres físicos e fisiológicos, como o tamanho da
mandíbula, a conformação do cérebro, a estrutura óssea e a hereditariedade biológica como atavismo”.
Prefácio do livro L’Uomo delinquente. LOMBROSO, Cesare. O homem delinquente. São Paulo: Ícone
Editora, 2007.
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Conheci que Madalena era boa em demasia, mas não conheci tudo
de uma vez. Ela se revelou pouco a pouco, e nunca se revelou
inteiramente. A culpa foi minha, ou antes, a culpa foi desta vida
agreste, que me deu uma alma agreste. 13
10 Bernando de Clavaral foi um dos maiores conquistadores da Igreja Católica pois, conforme consta
na enciclopédia livre Wikipédia, “fundou 72 mosteiros, espalhados por toda Europa: 35 na França, 14
na Espanha, 10 na Inglaterra e Irlanda, 6 em Flandres, 4 na Itália, 4 na Dinamarca, 2 na Suécia e 1 na
Hungria. Fora muitos outros que se filiaram à Ordem.” Disponível em
http://pt.wikipedia.org/wiki/Bernardo_de_Claraval. Acessado em 30/04/2010.
11 RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 203.
12 RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 207.
13 RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 117. Apesar de Graciliano
Ramos afirmar que Paulo Honório era um homem do agreste e não do sertão, nas palavras de
Francisco Fabiano Mendes, ele (Paulo Honório) “denuncia o maior esquecimento que tanto a
literatura como as ciências sociais promoveram: o sertanejo é humano e no sertão as relações de poder
1261
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E foi talvez a vastidão confusa de sua alma agreste que fez com que Paulo
Honório, ao conseguir finalmente realizar o sonho de ser proprietário da fazenda
“São Bernardo”, bem como de se casar com Madalena, passe a ter com a propriedade
e com a mulher uma relação obsessiva de conquista e poder, pautada pela violência
moral e psicológica, temperada por uma insensata insegurança.
Com o trágico suicídio de Madalena na Capela da fazenda e a decadência
econômica de sua propriedade, o protagonista resolve escrever sua saga,
conscientizando-se de seus atos.
Inicialmente Paulo Honório tenta escrever suas memórias a “várias mãos”,
por meio da colaboração dos amigos, cada qual com a incumbência de realizar a
porção do trabalho que, em princípio, ele os identificava: o padre, o jornalista, o
advogado. Destinaria a si mesmo o planejamento, o custo do trabalho, o
fornecimento dos dados, tendo, ao final, o direito de “colocar o nome na capa”14.
se dão entre sertanejos. A eterna tentativa de ver nesse homem o ‘sedimento básico da nação’ e, ao
mesmo tempo, o sertão como o lugar por excelência da ingenuidade, da permanência, da salvação do
passado e do isolamento, isso tudo levou ao equivocado olhar sempre lançado sobre o litoral,
buscando enxergar eternos ‘colonizadores e bandeirantes’ – fatores externos – por trás dos males do
torrão nordestino”. A narrativa de Graciliano Ramos demonstra, mais uma vez, como o autor narra
em seus livros um pouco da sua própria vida, não se desvencilhando também da saga difícil e
sacrificada que caracterizou o seu cotidiano. MENDES, Francisco Fabiano de Freitas Mendes. Ponto
de fuga: tempo, fome, fala e poder em “Vidas Secas e “São Bernardo”. UFC/História, p. 1-204,
p. 20. Disponível em www.dominiopublico.gov.br. Acessado em 26/04/2010. O mesmo Francisco
Fabiano Mendes descreve, em sua Dissertação, que “O autor alagoano tem sua vida e sua obra
marcadas pelo controle, pela disciplina e pela punição. Sua infância está repleta de episódios que
traduzem várias situações que mais tarde irá pôr em suas obras de ficção. Os castigos para aprender a
ler e a punição sumária sofrida por delitos não cometidos, bem como a sequidão dos pais ou a
ausência de comunicação entre os membros da família, esses acontecimentos irão formar o conceito
de justiça que estará a conviver com ele durante toda sua vida.” MENDES, Francisco Fabiano de
Freitas Mendes. Ponto de fuga: tempo, fome, fala e poder em “Vidas Secas e “São Bernardo”.
UFC/História, p. 1-204, p. 39. Disponível em www.dominiopublico.gov.br. Acessado em
26/04/2010.
14 RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 7.
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15 Conforme consta em análise da obra São Bernardo, de Graciliano Ramos. Disponível em
www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/analises_completas/s/sao_bernardo. Acessado em
27/04/2010: “Há um aspecto que atenta contra a sua verossimilhança, que é um célebre problema de
incoerência: como um romance tão bem escrito pôde ter sido produzido por um semi-analfabeto
como Paulo Honório? É uma narrativa muito sofisticada para um narrador de caráter tão tosco.”
16 Godofredo de Oliveira Neto, no Posfácio de São Bernardo, esclarece que o estilo da escrita tem
que acompanhar o “como se diz” e somente o próprio Paulo Honório tinha capacidade para fazer tal
adequação: “A língua escrita não consegue dar conta do ímpeto de contador de Paulo Honório.”
RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 226.
17 RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p.11.
18 RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 224.
19MENDES, Francisco Fabiano de Freitas. Ponto de fuga: tempo, fome, fala e poder em “Vidas
cedo, ele meteu o rabo na ratoeira e assinou a escritura. Deduzi a dívida, os juros, o preço da casa, e
entreguei-lhe sete contos, quinhentos e cinquenta mil-réis. Não tive remorsos.” RAMOS, Graciliano.
São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 30.
21 Pode-se dizer que Paulo Honório realmente efetivou melhorias em sua fazenda, podendo ser
comparado a um verdadeiro empreendedor rural. Francisco Fabiano de Freitas Mendes traduz Paulo
Honório como sendo “conectado às exigências do mercado, à política do aumento da produção e até
às relações de trabalho: ‘Devagarinho, foram clareando as lâmpadas da iluminação elétrica. Luzes
também nas casas dos moradores. Se aqueles desgraçados lá embaixo, ao pé das cercas de Bom-
Sucesso, tinham pensado em alumiar-se com eletricidade! Luz até meia-noite. Conforto! E eu
pretendia instalar telefones.’ Paulo Honório se gaba da sua condição de provedor do conforto para
aqueles ‘desgraçados’ que são hoje o que ele foi ontem. Essa condição tem uma dupla importância.
Trazer essas ‘benfeitorias’ aos trabalhadores da São Bernardo ao mesmo tempo que evidencia ser o
seu proprietário um homem de visão, de ‘planos volumosos’, projetos arrojados e modernos, rumo ao
futuro, realça também a diferença que havia entre Paulo Honório e eles.” MENDES, Francisco
Fabiano de Freitas. Ponto de fuga: tempo, fome, fala e poder em “Vidas Secas e “São
Bernardo”. UFC/História, pp. 1-204, p.54. Disponível em www.dominiopublico.gov.br. Acessado
em 26/04/2010.
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levando este a publicar um artigo sobre o fazendeiro, insinuando que o mesmo teria
assassinado o vizinho Mendonça. A imprensa defensora e que se sustenta às custas
dos “donos do poder”.
A amizade estreita com o Pároco da cidade é uma clara manifestação da
importância da Igreja Católica na formação da sociedade, marca forte da história, não
só no Brasil, mas em todo o mundo ocidental.
Por fim, a afinidade com o Poder Judiciário permite que Paulo Honório
trave autêntico tráfico de influência com o Juiz de Viçosa, Dr. Magalhães, revelando
“o poder de transformação que há nas relações sociais e econômicas via capitalismo
liberal, no qual o indivíduo depende de sua própria iniciativa” 22.
Tais relações demonstram a força dos coronéis no Nordeste, apesar do
protagonista não ser a figura típica do coronel tradicional, não possuindo sequer uma
linhagem:
não conta com símbolos ou brasões de família nobre, não traz nas
costas herança de terras ou de títulos enferrujados que datam do
Império. No entanto, a organização política e econômica que
compreende a “lactente” República permite-lhe desenvoltura
análoga à dos velhos coronéis no desfile de uma sociedade que
com ele vive em liame e parece estar sempre à soleira da porta.23
22 .” MENDES, Francisco Fabiano de Freitas. Ponto de fuga: tempo, fome, fala e poder em
“Vidas Secas e “São Bernardo”. UFC/História, pp. 1-204, p.51. Disponível em
www.dominiopublico.gov.br. Acessado em 26/04/2010. Sobre a relação com o Poder Judiciário, este
mesmo autor descreve: “Com a lei – o juiz, Dr. Magalhães – a relação era de favores envolvendo
questões de terra e vistas grossas, não enxergando ‘pequenos’ delitos, ‘pequenas violências’. Nesses
casos, aparecia a figura eficiente do advogado João Nogueira. MENDES, Francisco Fabiano de
Freitas. Ponto de fuga: tempo, fome, fala e poder em “Vidas Secas e “São Bernardo”.
UFC/História, pp. 1-204, p.37. Disponível em www.dominiopublico.gov.br. Acessado em
26/04/2010.
23 .MENDES, Francisco Fabiano de Freitas. Ponto de fuga: tempo, fome, fala e poder em “Vidas
A narrativa é marcada pela intensa obsessão que Paulo Honório tinha por
“São Bernardo”, passando a viver em função da propriedade. O seu trabalho árduo
era para o sucesso do empreendimento rural e sua personalidade dura e sem rodeios
era fruto de sua vida de privação24. Não admitia, em nenhuma hipótese, desperdícios
e malandragem 25.
A importância exacerbada que Paulo Honório dava à terra, ao trabalho na
terra, à luta pela terra levou-o ao extremo, como tantos outros latifundiários, grileiros
e trabalhadores rurais sem terra, de matar pela terra. É nessa toada que, sem maiores
remorsos, manda assassinar o proprietário vizinho, Mendonça, para usurpar uma
atendimento torna-se questão de prestígio, que, desprezado, trará represálias, as duras represálias do
sertão e do campo.” FAORO, Raimundo. Os donos do poder. Formação do patronato político
brasileiro. 3ª. ed. São Paulo: Editora Globo, 2009, p. 713.
24 Conforme consta em análise da obra São Bernardo, de Graciliano Ramos. Disponível em
www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/analises_completas/s/sao_bernardo. Acessado em
27/04/2010: “Mas Paulo Honório, por sua vez, é modalidade duma força que o transcende e em
função da qual vive: o sentimento de propriedade. E o romance é, mais que um estudo analítico,
verdadeira patogênese desse sentimento. De guia de cego, filho de pais incógnitos, criado pela preta
Margarida, Paulo Honório se elevou a grande fazendeiro, respeitado e temido, graças à tenacidade
infatigável com que manobrou a vida, ignorando escrúpulos e visando atingir o seu alvo por todos os
meios. É um homem que supervaloriza a propriedade, tipo de gente para quem o mundo se divide em
dois grupos: os eleitos, que têm e respeitam os bens materiais, e os réprobos, que não os têm ou não
os respeitam.”
25 “A princípio o capital se desviava de mim, e perseguia-o sem descano, viajando pelo sertão,
negociando com redes, gado, imagens, rosários, miudezas, ganhando aqui, perdendo ali, marchando
no fiado, assinando letras, realizando operações embrulhadíssimas. Sofri sede e fome, dormi na areia
dos rios secos, briguei com gente que fala aos berros, efetuei transações comerciais de armas
engatilhadas.” RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 17. “- Ó Padilha,
gracejei, você já fechou cigarros? Padilha comprava cigarros feitos. - É mais cômodo, concordei, mas é
mais caro. Pois, Padilha, se você tivesse fechado cigarros, sabia como é difícil enrolar um milheiro
deles. Imagine agora que dá mais trabalho ganhar dez tostões que fechar um cigarro. E um conto de
réis tem mil notas de dez tostões. Vinte contos de réis são vinte mil notas de dez tostões. Parece que
você ignora isto. Fala em vinte contos assim com essa carinha, como se dinheiro fosse papel sujo.
Dinheiro é dinheiro.” RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 24.
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parte de sua propriedade, o fazendo de maneira sorrateira, mas bem à moda dos
coronéis do Nordeste: utiliza-se de seu fiel “capanga” desde os tempos em que
trabalhava de mascate pelo sertão nordestino, Casimiro Lopes, enquanto se
encontrava em Viçosa de “prosa” com o Padre Silveira, criando um álibi autêntico.
Relação típica de coronel e jagunço.
Para Raimundo Faoro, em “Os donos do poder”:
se avilta e se anula) por todos os poros. Ajudou-o nesse campo o penoso convívio com a realidade
concreta de desequilíbrios, fome, miséria, privação, compadrio da autoridade com a corrupção e
desvios de toda ordem.” ARAÚJO, Jorge de Souza. Graciliano Ramos e o desgosto de ser
criatura. Maceió: UFAL, 2008, p. 54.
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29 Nos termos de Rui Facó: “Num meio em que tudo lhe é adverso, podia o homem do campo
permanecer inerte, passivo, cruzar os braços diante de uma ordem de coisas que se esboroa sobre ele?
Euclides da Cunha já compreendera que o ‘o homem do sertão (...) está em função direta da terra’. Se
a terra é para ele inacessível, ou quando possui uma nesga de chão vê-se atenazado pelo domínio do
latifúndio oceânico, devorador de todas as piores torpezas, que fazer, senão revoltar-se? Pega em
armas, sem objetivos claros, sem rumos certos, apenas para sobreviver no meio que é o seu. Então,
espantados, os homens das classes dominantes não sabem explicar por que ele se revoltou. Ele,
sempre tão cordato e humilde mesmo, que não falava ao senhor sem tirar da cabeça o largo chapéu de
palha ou de couro, toma de uma arma, torna-se cangaceiro, arregimenta companheiros de infortúnio e
forma um grupo – um bando. Por quê?” (...) “Xavier de Oliveira, filho do Cariri: reconhece ele
textualmente: ‘o homem honesto e trabalhador de outrora é um bandido agora, por causa de questão
de terra’...(...) Estes homens – é a conclusão lógica – tinham forçosamente que ser revoltados. Sem
terra, sem ocupação certa, a mais brutal exploração de seu trabalho, revoltar-se-iam qualquer que fosse
a dosagem de seu sangue, sua origem racial, o meio físico que atuasse sobre seu organismo.” FACÓ,
Rui. Cangaceiros e Fanáticos. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1966, p. 38-41. Modernamente,
entretanto, o movimento do cangaço vem ganhando uma nova conotação, como colacionada na
enciclopédia livre Wikipédia: “Finalmente, não podemos deixar de lembrar o movimento liderado por
Lampião no nordeste brasileiro, no período de 1917 até 1938, na medida em que este possa ser tido
como uma forma de banditismo ‘social’, cujas causas encontrariam-se na exclusão dos pequenos
agricultores - como Lampião, por origem familiar, o era - das estruturas de poder político regional
dominadas pelo latifúndio. Esta colocação, no entanto, muito favorecida pela historiografia marxista
brasileira dos anos 1960 - muito especialmente pelo historiador Rui Facó, e recuperada mais tarde pelo
historiador inglês Eric Hobsbawn tem sido severamente contestada recentemente, na medida em que
o banditismo do cangaço tem chegado a ser visto muito mais como vivendo numa relação de
comensalidade com o latifúndio do que opondo-se a ele, como o messianismo.” Disponível em
http://pt.wikipedia.org/wiki/cangaço. Acessado em 30/04/2010.
30 Na atualidade, o MST – Movimento do Trabalhadores Sem Terra - representa o que o cangaço
representava no final do século XIX, início do século XX, embora com objetivos diversos. De acordo
com a enciclopédia livre Wikipédia: “O MST é um movimento pela reforma agrária, marcando um
fase de reorganização política dos camponeses com o término da ditadura militar e da retomada da
democracia no Brasil.” Disponível em http://pt.wikipedia.org/wiki/cangaço. Acessado em
30/04/2010. Todavia, como todo movimento, por mais organizado que seja, acaba se desviando em
abusos. Um exemplo do desvio dos objetivos do MST é o excesso de violência que, muitas vezes,
pauta as suas lutas pela terra. Não são poucos os homicídos vinculados aos abusos cometidos pelas
invasões, por vezes ocorridas em terras produtivas.
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Paulo Honório não diverge, pois, dessa concepção capitalista marcada pela
exploração do lavrador pelo ruralista.31 Teve sorte pois, apesar da característica
tipicamente opressora com que se relacionava com todos os que o rodeavam, em
especial seus empregados, nenhum destes se rebelou.
Podemos mirar este comportamento opressor em face de seus empregados
na sua relação com Marciano e sua mulher Rosa. Ele, o exemplo do oprimido; ela,
além de oprimida, tinha que satisfazer a lascívia de seu patrão:
31 Conforme consta em análise da obra São Bernardo, de Graciliano Ramos: “Com o mesmo
utilitarismo estreito analisa a sua conduta: ‘A verdade é que nunca soube quais foram os meus atos
bons e quais foram os maus. Fiz coisas boas que me trouxeram prejuízo; fiz coisas ruins que me
deram lucro.’ A aquisição e a transformação da Fazenda São Bernardo levam, todavia, o instinto de
posse de Paulo Honório a arraigar-se num sentimento patriarcal, naturalmente desenvolvido - tanto é
verdade que o seu modo de agir depende em boa parte das relações com as coisas.
Disponível em www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/analises_completas/s/sao_bernardo.
Acessado em 27/04/2010.
32 RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 126.
33 Para seus propósitos, ideal seria ter se casado com Dona Marcela, a filha do Juiz, Dr. Magalhães.
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34 Isto porque, tendo em vista seu fracassado casamento, não conseguiu aceitar seu filho e o rejeitava
com uma veemente repulsa: “Se ao menos a criança chorasse...Nem sequer tenho amizade ao meu
filho. Que miséria!” RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p.221.
35 RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 101.
36 Autêntica união do econômico com o cultural: "- O seu oferecimento é vantajoso para mim, seu
Paulo Honório, murmurou Madalena. Muito vantajoso. Mas é preciso refletir. De qualquer maneira,
estou agradecida ao senhor, ouviu? A verdade é que sou pobre como Jó, entende? - Não fale assim,
menina. E a instrução, a sua pessoa, isso não vale nada? Quer que lhe diga? Se chegarmos a acordo,
quem faz um negócio supimpa sou eu." RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record,
2008, p. 102.
37 “Dinâmica e cheia de iniciativas, reveladas, essencialmente nos setores intelectual e social, Madalena
modifica o clima na fazenda do marido. A verdade é que a esforçada e competente professora não
podia relegar, à inércia, os conhecimentos e as convicções que os estudos lhe possibilitaram. Assim,
impõe-se como mulher inteligente, que sabe dizer não a um pretenso senhor todo-poderoso, com
manifestações oportunas de instrução e solidariedade.” MEDEIROS, Heloísa Marinho de Gusmão. A
mulher na obra de Graciliano Ramos. Maceió: Sargasa, 1994, p. 50.
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disso, sua cultura, beleza, aliada à insensata insegurança do marido, faz com que este
a violente moralmente com insanos acessos de ciúme.38
O assédio psicológico e moral marca a vida conjugal de muitos casais,
representando a violência doméstica também uma das várias causas de crimes no
Brasil e no mundo. Essa, inclusive, foi a razão para a edição de uma legislação
específica sobre o tema em nosso País, a denominada “Lei Maria da Penha”39, em
salvaguarda da mulher, vítima da opressão masculina:
38 No capítulo XXV, Paulo Honório reconhece: “Comecei a sentir ciúmes”. Ob. cit. p. 157. “Fui indo
sempre de mal a pior. Tive a impressão que me achava doente, muito doente. Fastio, inquietação
constante e raiva.(...) O meu desejo era pegar Madalena e dar-lhe pancada até no céu da boca.”
RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, p. 163.
39 Lei 11.340/06. De acordo com estatística divulgada na Revista Leis e Letras, “a cada 15 segundos,
um mulher é agredida no Brasil, que passa a ser o 18° país da América Latina a contar com uma lei
específica para os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher”. Leis e Letras – Direito e
Informação. São Paulo: Leis e Letras, 2007, p. 11.
40 Leis e Letras – Direito e Informação. São Paulo: Leis e Letras, 2007, p. 11.
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Nesse cenário pautado pelas relações opressoras, não soube Paulo Honório
poupar Madalena, aquela que escolhe para casar e quem, indiscutivelmente mas a seu
modo, amava, sendo a total inabilidade para lidar com este sentimento a grande causa
de sua derrocada psicológica:
5. Conclusão
Todavia, o enredo de São Bernardo nos leva a crer que, para Paulo Honório,
a conquista da “barra de saia” não foi bem sucedida quanto a da “barra de terra”, já
que não contava o protagonista com um importante diferencial: o sentimento que,
desde à primeira vista, nutriu por Madalena. Este sentimento, também obsessivo,
tinha concepção distinta daquele vinculado ao sonho de adquirir a terra. Concepções
distintas, mas não opostas pois, apesar da obsessão por “São Bernardo” fortalecer
Paulo Honório e a por Madalena enfraquecer-lhe, ambas levaram-no à destruição da
alma.43
E mais, estas duas obsessões são as condicionantes da sua tragédia pessoal.
O excessivo apego à terra levou Paulo Honório a incluir todos, inclusive Madalena,
em objetos de conquista, não aceitando transigir com ninguém, sob nenhuma
condição, mesmo porque era marcado pela dureza de sua vida e não soube se
desvencilhar dela na lida com as pessoas que o cercavam. O seu jeito excessivamente
intransigente e conservador acaba oprimindo todos os que estão ao seu redor,
afastando-os do seu convívio até o extremo do suicídio de sua Madalena.
As dificuldades passadas e a origem desconhecida fizeram um Paulo
Honório cheio de complexos, sobretudo em relação a sua condição física e cultural.
Isto se tornou um verdadeiro círculo vicioso em sua vida: quanto mais insegurança
sentia, mas apego destinava a “São Bernardo” e, quanto mais obsessivo se tornava
em relação a sua propriedade, mais afastava e amedrontava as pessoas, em especial
Madalena.
43 “Para alcançar sua ascensão social, o narrador paga um preço altíssimo, que é a destruição do seu
caráter afetivo. Na verdade, a perda de sua humanidade pode ser entendida como fruto do meio em
que vivia. Massacrado por seu mundo, acaba tornando-se um herói problemático, defeituoso (parece
haver aqui um certo determinismo, na medida em que o homem seria apresentado como fruto e
prisioneiro das condições mesológicas).” Análise da obra São Bernardo, de Graciliano Ramos.
Disponível em www.passeiweb.com/na_ponta_lingua/livros/analises_completas/s/sao_bernardo.
Acessado em 27/04/2010.
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44 RAMOS, Graciliano. São Bernardo. Rio de Janeiro: Record, 2008, pp. 216, 218, 220 e 221.
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6. Referências Bibliográficas
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Revista Leis & Letras – Direito e Informação. São Paulo: Leis & Letras, 2007.
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RESUMO
1Mestranda em Teoria do Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC/MG
Especialista em Direito Material do Trabalho pela Universidade Cândido Mendes do Rio De Janeiro –
UCAM/RJ Orientadora de pesquisas em Direito Animal e Advogada.
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ABSTRACT
This article has as main objective disserting upon the necessity of a perspective
change from animal property rights to the rights to animal guardianship in Brazilian
jurisdiction. With the goal of enriching and illustrating the discussion, we will make a
report on the construction and consolidation of the pets' Animal Rights in the city of
Belo Horizonte, state capital of Minas Gerais, Brazil. We will present a viewpoint on
the contemporary Philosophy about the necessity of the inclusion of non-human
animals in Ethics, and analyze the influence of human action on the conditioning of
animal behavior, the lack of national legislation on the animal property rights and the
necessity of its correction for the proper protection of pets against the
irresponsibility of their owners. In the scope of the studied city, we will analyze the
advance of legislation, of the public policies and of the performances of the
Government, of non-governmental entities and of the partnerships between the
public authorities and the society for the construction of the Animal Rights.
1. Introdução
2 BEGON, M.; TOWNSEND, C.R.; HARPER, J.L. Ecologia de indivíduos a ecossistemas. 4ª
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Por outro lado, alguns seres humanos desenvolvem laços emotivos com os
animais de outras espécies, fato reiteradamente justificado pela sua comoção diante
da lealdade e afetividade que eles demonstram.
O processo de domesticação de animais é também estudado pela Psicologia
Animal e Psicologia Comparada. Muitas espécies de animais não-humanos
demonstram capacidade de raciocínio e a inteligência. São capazes de aprender e de
condicionar seu comportamento conforme o que foi ensinado pelos seres humanos
em suas experiências, pela associação de fatos a conseqüências. São, portanto,
capazes de fazer escolhas e solucionar problemas.
Embora seja demonstrada a similaridade entre o processo de raciocínio e
aprendizado das espécies, o comportamento social dos animais não-humanos é
definido predominantemente pelos instintos de sobrevivência peculiares de cada
espécie. Por exemplo, a função de “guarda” determinada pelos humanos aos cães
tem sucesso não apenas pela afeição no animal aos seres humanos, mas também pelo
comportamento territorial imanente aos canídeos. Justamente por se tratar de um
instinto, explica-se a tendência de determinadas raças de cães a serem guardas mais
“eficientes” do que outras.
Por esse motivo, um cão com fortes instintos territoriais atacará aquele que
invadir seu território independentemente de ter a quem proteger. Outro exemplo de
comportamento instintivo nos cães é rosnar ou atacar aquele que ameaçar retirar-lhe
a comida. Embora seja um comportamento instintivo, cães adestrados pelos seres
humanos modificam esse comportamento.
As espécies domesticadas pelos seres humanos modificam seus hábitos e até
mesmo a sua fisiologia para adaptarem-se à humanidade – estudos de Dethier (1975)
demonstram a tendência à gradual perda de pêlos em cães e gatos domesticados,
provavelmente por se tornarem desnecessários quando eles não precisam dormir em
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locais mais frios – por outro lado, os seres humanos têm modificado a sua fisiologia
em razão das facilidades de sobrevivência proporcionada pela domesticação animal.
cães, gatos e cavalos. Para o senso comum da época, era absurdo afirmar que
quaisquer animais não-humanos pudessem ser sujeitos de direito, uma vez que estes
eram vistos exclusivamente como propriedades humanas destinadas à satisfação de
seus interesses.
Na obra intitulada Liberação Animal, Singer (2004) cita por diversas vezes o
filósofo inglês Jeremy Bentham, fundador da escola utilitarista. Este era a favor dos
direitos dos animais por uma razão diferente daquela que leva Singer a atribuí-los: a
capacidade de sofrimento. É importante ressaltar que, na época, ainda era
questionável a capacidade de sofrimento dos animais.
3 BENTHAM (1823), apud SINGER (2004) p.9.
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genéticas para que os animais maiores e mais agressivos prevalecessem. Esses animais
foram os primeiros a ganharem o nome american pit bull terrier.4
Ainda do cruzamento entre os buldogs e os terriers ingleses, surgiu uma raça
denominada american staffordshire terrier, nome dado aos indivíduos de mesma origem
dos vulgos pitbulls, mas que foram selecionados geneticamente pelas características de
obediência, comportamento mais dócil e tamanho reduzido.
Em 24 de abril de 2002 entrou em vigor a Lei Municipal 8354/02, que
dispõe sobre propriedade, importação, adoção, comercialização, criação e
manutenção de cães da raça pitbull(a lei trata os cães pelo nome vulgo da raça) e
cruzamentos da mesma. Prevê a obrigatoriedade de observação de vacinas, da
esterilização dos animais, do uso de coleira e mordaça para conduzi-los a locais
públicos, o registro dos animais, e a idade mínima de 18 anos para a condução do
animal em vias e logradouros públicos.
As sanções para os infratores da lei são a perda da propriedade do animal,
apreensão e multa no valor de R$ 500,00 (quinhentos reais). Observa-se no cotidiano
belo-horizontino que o baixo valor da multa e a falta de pessoal para fiscalização
prejudica a amplitude da sua eficácia. Durante entrevista realizada com integrante do
poder público5, foi apontado como problema a prática de combates de pitbulls dos
quais são expectadores indivíduos humanos de grande poder aquisitivo e as penas
demasiadamente brandas para os infratores da Lei 9.605/98, que tipifica penalmente
em seu art. 32 o crime de maus-tratos aos animais.
4 Note-se que o termo “bull” significa touro, em apologia aos touros que os animais enfrentavam em
combate. A tradução do nome oficial da raça poderia ser feita como “meio-touro-terrier americano”.
5 OLIVEIRA, F. S. Legislação, projetos de lei e políticas públicas sobre fauna doméstica em Belo
Horizonte. [16 de março, 2010]. Belo Horizonte. Entrevista concedida a Nathalie Santos Caldeira
Gomes.
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cadela pode originar, direta ou indiretamente (por meio de seus filhotes e gerações
provenientes destes), 67.000 cães em um período de seis anos.
A possibilidade de gerar novos filhotes a cada período estimado em 6 meses
e a gestação em média de 58 a 64 dias é um fator complicador do controle
populacional da espécie canina, o que é agravado quanto analisado o ciclo de
reprodução dos gatos. As gatas possuem um período de gestação de 60 a 64 dias,
mas a possibilidade de uma fêmea gerar novos filhotes é maior: o cio destas pode
chegar a ocorrer de 21 em 21 dias durante a primavera e o verão, e ocorre em média
de 3 em 3 meses nas outras estações do ano.
Diante dos dados estatísticos inseridos na obra de Acha (2003), torna-se
claro o motivo pelo qual a eliminação de animais abandonados não pode solucionar
o problema das superpopulações: elas tendem a se multiplicar ao invés de diminuir
quando não há controle de natividade.
Em observância ao novo Código Sanitário Municipal, publicado no ano de
2003, o CCZ começou a trabalhar na implantação do controle de natalidade animal.
Porém, foi editada no mesmo ano a Portaria 025/2003, que contrariava
manifestamente o novo Código Sanitário Municipal ao prever o extermínio de
animais sadios.
A portaria 025/2003 foi revogada somente no ano de 2008, substituída pela
Portaria 020/2008, que estabelece que somente os cães e gatos que apresentem
zoonoses que coloquem em risco a saúde da população ou dos animais serão
eutanasiados. Porém, a efetivação da portaria ainda não se tornou possível em razão
dos grandes números de animais recolhidos diariamente das ruas do Município e da
impossibilidade do CCZ de manter todos os animais vivos com os recursos que
possui.
Em 2005 teve início a esterilização e castração de cães e gatos fornecidos
gratuitamente pelo CCZ belo-horizontino. Os últimos dados estatísticos sobre o
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O Des. Caetano Levi Lopes afirma ainda que o Código Civil de 2002 dá aos
animais o tratamento de coisas, aplicando a eles o disposto em do Art. 1263 do CC,
colacionando erroneamente doutrina a respeito:
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voto do desembargador foi vencido, eis que o Revisor e o Vogal não concordaram
com a análise das provas e abordagem jurídica do Relator.
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sentido em seu inciso VII do §1º do Art. 225, quando veda submissão dos animais a
crueldade. Por fim, aponta a definição de maus tratos pelo Decreto Federal n. 24.645
de 1934, que complementa o Art. 32 da Lei 9.605/1998.
O Relator ainda faz uma apologia aos campos de concentração nazistas,
onde os seres humanos eram tratados como “bichos”, tratados e exterminados de
forma cruel:
8. Conclusão
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I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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proteger o meio ambiente. E não devemos nos olvidar, enquanto seres humanos
racionais que somos, que no conceito de meio ambiente está inserida a fauna
negligenciada pela legislação infraconstitucional, que divide – embora desigualmente
– com o ser humano a imensidão da oikos denominada Terra.
REFERÊNCIAS
AMARAL NETO, Francisco dos Santos. Direito Civil. Introdução. 6. ed. Rio de
Janeiro: Renovar, 2006.
Disponível em:
<http://portal6.pbh.gov.br/dom/iniciaEdicao.do?method=DetalheArtigo&pk=985
748> Acesso em: 15 mar. 2010.
LEVAI, Fernando Laerte. Direito dos animais. 2. ed. Campos do Jordão: Editora
Mantiqueira, 2004.
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SINGER, Peter. Ética prática. 4. ed. Tradução de Jefferson Luiz Camargo. São
Paulo: Martins Fontes, 2004.
SINGER, Peter. Libertação animal. Tradução Marly Winckler. Porto Alegre: Ed.
Lugano, 2004.
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Gabriela Barbosa1∗
RESUMO
Este artigo propõe uma discussão sobre a influência francesa no período da Belle
Époque brasileira (primeiras décadas do século XX), relacionando questões sócio-
culturais referentes aos conceitos de moda e consumo. O objetivo é apontar as
características da Belle Époque tropical a partir dos ideais franceses de modernidade e
civilidade. Nesse sentido, pergunta-se: a sociedade brasileira, durante a Primeira
República, adequou-se aos parâmetros franceses de moda e consumo? A sedução da
modernidade é expressa neste trabalho por meio de reflexões sobre o “consumo à
francesa” na Belle Époque tropical.
1 Introdução
1 Graduanda do 3º período no curso de Publicidade e Propaganda pelo Centro Universitário Newton
Paiva.
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século XIX (no caso brasileiro, nas primeiras décadas do século XX). Tais reformas
projetaram inúmeras inovações práticas para o cotidiano das pessoas, como o
telefone, o rádio e a iluminação elétrica. No final do século XIX, Paris se tornou a
capital cultural do mundo, lançando muitos artistas, escultores, pintores e,
principalmente, novos estilistas.
Com todo afã da Cidade Luz, o Rio de Janeiro, então capital do Brasil, decide
se reformar também para mostrar toda sua “civilidade” aos países estrangeiros
seguindo os padrões franceses.
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A história sobre a capital francesa da Belle Époque não estaria completa sem
um panorâmico sobre a moda, já que é nesse período que Paris se consolida como
referência em alta-costura:
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foi a mais elegante de Paris e, de repente, todas as mulheres desejavam ser como ela.
Cintura dos vestidos abaixo do busto, decotes mais cavados e saias cada vez mais
apertadas também fizeram parte da revolução do vestuário que Paul Poiret estava
propondo. A característica europeia de absorção de culturas diferentes foi uma
importante influência estética para o estilista. Roupas com motivos orientais, cores
chamativas, turbantes, véus e túnicas fizeram a cabeça das mulheres que o seguiam
fielmente. E, bem antes de Coco Chanel, foi o primeiro costureiro a lançar seu
próprio perfume.
Diante dos luxos proporcionados, os habitantes de Paris usufruíam muito
da vida cheia de novidades, cultura rica e tecnologia abundante. A aura de paz era tão
grande que quase ninguém acreditou quando a Primeira Guerra Mundial foi iniciada.
Toda a pujança burguesa se esvaiu com os anos trágicos e desastrosos da guerra.
Nesse momento, a sociedade percebeu que a tecnologia poderia tanto trazer uma
vida mais prática, quanto poderia pôr fim em grande parte da humanidade.
Para entender como emergiu o período da Belle Époque no Brasil, e como ela
influenciou no cotidiano, é necessário evidenciar o contexto político. A Belle Époque
compreende, segundo Nicolau Sevcenko (1998), o período que vai de 1889 a 1922.
No início do ano de 1889, o Brasil ainda em um regime monárquico, tendo como
imperador Dom Pedro II. O império estava perdendo sua credibilidade, já que boa
parte da população, principalmente a que detinha grande porcentagem do dinheiro,
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A mistura de desgosto e medo por parte dos homens os fazia pensar duas
vezes antes de casar. Foi uma época tensa para a relação entre homens e mulheres, já
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Essa realidade mostrava que a época não era só feita de uma elite concentrada, mas
também contava com miseráveis que não acompanhavam a extrema modernização.
O escritor João Paulo Alberto Coelho Barreto (1881-1921), conhecido pelo
pseudônimo de João do Rio, traduz crônicas em seu livro “A Alma Encantadora das
Ruas” sobre o cotidiano das pessoas presentes na Belle Époque carioca. Seu principal
espaço de inspiração era a rua. As ruas do Rio de Janeiro se tornavam personagem
principal de suas crônicas. João do Rio desconstruiu a sociedade denunciando seus
costumes e preconceitos e transcreveu a extrema desigualdade social que permeava a
vida na cidade. Se de um lado a elite brasileira vivenciava um culto aos costumes
franceses, do outro a periferia sofria com a marginalização e a miséria. A camada
mais carente da sociedade é uma parte importante de suas crônicas. João do Rio
descreveu a situação dos espaços urbanos na periferia em um texto publicado em
1904, pela Gazeta de Notícias, encontrado no artigo de Luciana Calado:
A Belle Époque foi vivenciada apenas pelas camadas mais ricas da sociedade
brasileira, elites que lucravam com a exportação, principalmente de café, e olhavam
de cima o resultado de um histórico colonialista e escravocrata. A desigualdade social
era evidente. Os costumes da população negra foram reprimidos em nome de uma
reforma na então capital do Brasil. É o caso da capoeira, que teve sua prática
proibida. Características históricas dos escravos negros foram eliminadas para a
implantação do que era chamado “civilização” nessa época: o modo de vida francês.
Em meio a esse governo tumultuado, comandado pela política café-com-
leite, com um capitalismo cada vez mais forte no país, um movimento chamou a
atenção da sociedade brasileira. O modernismo - apresentado à população por meio
da Semana de Arte Moderna de 1922 - assustou por querer renovar um ambiente
artístico totalmente conservador. A intensa influência francesa incomodava essa nova
vanguarda estética que surgia. Seus poemas e suas músicas não seguiam regras e seu
objetivo era absorver o que tinha de melhor na Europa e mesclar com a cultura
brasileira, criando um estilo único. O movimento buscava uma cultura nacional
própria, sem repetições de países europeus para, principalmente, valorizar os recursos
e talentos nacionais, o que foi inicialmente rejeitado e muito criticado, inclusive pela
imprensa. Entretanto, como este movimento trazia à tona uma nova forma de pensar
os costumes e a própria cultura nacional, acabou por questionar os antigos valores,
contribuindo para a quebra dos paradigmas da Belle Époque tropical.
4 Considerações finais
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A Belle Époque, sem dúvida, trouxe uma revolução nos pensamentos e nos
costumes que permeavam todo o século XIX, apresentando inovações tecnológicas,
que sequer a sociedade havia cogitado, e que ainda hoje fazem parte da vida
cotidiana. Mesmo com o advento da internet, o telefone continua sendo um meio de
comunicação necessário. Outro exemplo dessa perenidade é a energia elétrica, sem a
qual não se pode imaginar a vida humana.
A influência francesa marcou uma época em que o Brasil considerava
civilizado tudo que era estrangeiro. “Civilização” foi a palavra de ordem para as
profundas reformas que mudaram muito o cotidiano brasileiro. Na atualidade, essa
influência europeia permanece poderosa, mas conjugada com outra também de
visibilidade nos costumes brasileiros da atualidade: a norte-americana, principalmente
no que diz respeito à política e às relações internacionais.
No âmbito da moda, Paris não perdeu seu glamour da Cidade Luz
exportadora de talentos incríveis, porém não está só. É possível encontrar artistas em
todas as partes do mundo se destacando no cenário da moda. A influência, agora,
vem de diversos países que decidiram mostrar o esplendor de sua cultura ao mundo,
inclusive o Brasil, que possui uma evidência positiva no exterior.
As saias encurtaram, os braços estão à mostra e a mulher tem se mostrado
cada vez mais capaz de ocupar os mesmos cargos de trabalho que os homens. Não é
possível dizer, na atualidade, que ela conquistou plenamente seu espaço, mas está,
sim, em busca dele.
A sociedade passou por diversas mudanças no período da Belle Époque, e
continua a sofrê-las ainda hoje. A velocidade da informação acelerou e tornou a
compreensão do mundo acessível a todos. Todavia, com tantos benefícios, ainda é
gritante a desigualdade social. A utopia está longe de ser alcançada. Porém a
esperança hoje é maior do que há um século, pois agora existe o engajamento da
sociedade e grande parte dela luta por uma condição de vida mais humana e
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5 Referências
ARMESTO, Felipe Fernández. Idéias que mudaram o mundo. São Paulo: Editora Arx,
2004, 400 p.
BAUDOT, François. Moda do século. 3. ed. rev. São Paulo: Cosac Naify, 2002.
399p.
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FLUGEL, J. C. (John Carl). A psicologia das roupas. São Paulo: Mestre Jou, 1966.
240p.
LURIE, Alison. A linguagem das roupas. Rio de Janeiro: Rocco, 1997. 285 p.
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SEELING, Charlotte. Moda: O século dos estilistas: 1900-1999. São Paulo: Ed.
Konemann do Brasil, 2000. 655 p.
1331
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APRENDER
DEIXAR LIVRE
RESUMO
O artigo propõe uma abordagem do ensino jurídico a partir de uma leitura pouco
usual da palavra aprender. Parte-se da ideia de que a aprendizagem se daria na
linguagem, de modo a preservar a relação adequada com o meio e com os outros,
seria dependente da história e da experiência de cada um. Essa noção de
aprendizagem não descarta o papel do professor, porém reconhece que existe a
necessidade de participação, de modo que não haja autoritarismos ou negação do
outro enquanto sujeito na relação intersubjetiva. Por suas características, a
aprendizagem ocorre também no campo emocional e não puramente racional. Para
que haja aprendizagem, é importante que o professor estimule os estudantes para que
saiam de uma posição de passividade e iniciem um processo de aprendizagem
autônoma e crítica, modificando suas posturas que se encaixam no sistema de
repetição de padrões experienciados por ele.
1 Mestre e Doutoranda em Filosofia do Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Ex-
professora substituta da UFMG. Professora da Faculdade Estácio de Sá de Belo Horizonte.
Advogada.
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Linguagem e aprendizagem
3 FREIRE, Paulo. Pedagogia da Autonomia – Saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra,
4 MATURANA, Humberto. Cognição, Ciência e Vida Cotidiana. Org. e Trad. Cristina Magro, Victor
Ensino e aprendizagem
5CAPELLA, Juan Ramón. El aprendizaje del aprendizaje. Madrid: Trotta, 1995. p.30:
“Aprender no guarda una relación estricta con enseñar, como bien sabes. Hay gentes para quienes se
han realizado operaciones de enseãnza tanto como para ti y sin embargo no han aprendido lo que ti
porque no han realizado las correspondientes operaciones de aprendizaje.”
1337
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sua própria identidade, sua própria personalidade e, por isso, cada aula é diferente da
outra, ainda que a disciplina ministrada seja formalmente a mesma. Cada indivíduo é
único e cada turma é uma turma única, embora possam ser mais ou menos
semelhantes entre si.
A experiência de lecionar para graduandos em direito do primeiro período é
diferente da de lecionar para graduandos do terceiro período. E mais diferente ainda
é lecionar para turma de graduandos em “ciências exatas”.
Sendo a aprendizagem uma via de mão dupla, onde todos os seres
envolvidos na experiência possuem possibilidades de aprender, já que se faz na
linguagem, o professor, tanto quanto os alunos, aprende com as aulas. Parece retórica
a afirmativa acima, contudo a aprendizagem que o professor tem com as aulas é
diferente da dos alunos, não apenas porque se trata de seres diferentes, mas porque
aprender não significa acumular “conhecimento” padronizado, validado por opiniões
cientificas e difundido sobre um determinado assunto.
Enquanto o aluno aprende quais e como funcionam os princípios gerais do
contrato ou as técnicas legislativas que se usa no cotidiano jurídico, o professor
aprende quais as melhores maneiras de desencadear o processo de aprendizagem em
seus alunos. Não basta colocar os alunos em contato com o assunto e ministrar uma
aula expositiva, é necessário que o aluno apreenda a experiência e se transforme para
que realmente haja aprendizagem. Afinal, aprendizagem exige transformação.
seres envolvidos para que possa se dar início à comunicação. Iniciada a comunicação
entre os seres, as experiências anteriores de cada um devem ser compartilhadas para
que se tornem experiências para os demais e assim sejam criadas as condições de
possibilidades para sua aprendizagem.
Crê-se que seja impossível ocorrer aprendizagem sem que haja a
comunicação, ou estabelecimento de uma relação intersubjetiva entre os seres, a
partir de um ponto comum ou semelhante. Primeiro porque a aprendizagem se dá na
linguagem. Segundo porque a aprendizagem exige historicidade por se dar a partir de
experiências. Terceiro porque é a partir de um ponto comum ou semelhante que
identificamos e reconhecemos o outro e que, por isso, conseguimos nos comunicar e
estabelecer uma relação de troca de experiências com o outro.
Talvez seja uma conclusão prematura, mas é necessário encontrar esse
ponto de semelhança para que haja aprendizagem. Imagine-se o quanto
aprenderíamos se, conhecendo apenas a língua-pátria e as línguas componentes do
padrão curricular escolar mínimo nos deparássemos com um professor de filosofia
que lecionasse exclusivamente em mandarim. Não há como negar que pudéssemos
aprender com ele algumas coisas, como pontualidade, que um determinado símbolo
se refere à uma idéia de um filósofo ou a um objeto, e outros. Contudo, se
conseguimos aprender que um símbolo ou uma palavra se refere a determinado
objeto, nós só o conseguimos porque tanto nós quanto ele possuímos uma
experiência semelhante anterior em relação àquele objeto. Ou seja, se conseguimos
aprender que o símbolo “X” corresponde ao objeto árvore, é porque conseguimos
identificar o objeto a partir de nossas experiências anteriores, assim como ele
também consegue identificar o mesmo objeto.
Pode parecer um tanto inverossímil tal exemplo. Imagine-se, contudo,
como seria se a turma fosse composta por alunos de engenharia, já no último
semestre do curso, o professor fosse formado exclusivamente em direito e a
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disciplina fosse sobre direito e legislação. Imagine-se como seria começar uma aula
dizendo inúmeras palavras em latim, falando sobre mandado de segurança, princípio
da “primazia da realidade” ou “direito líquido e certo” para graduandos, quase
engenheiros, que jamais tiveram uma aula sobre direito ou sequer têm algum colega
próximo que cursa direito.
No exemplo, como encontrar o ponto de semelhança para que se
desencadeie o processo de aprendizagem? Repetir para alunos de engenharia
conceitos mais facilmente apreensíveis a alunos do quinto período de direito não é a
forma mais adequada de se colocar em marcha a aprendizagem deles. Daí a
importância das experiências prévias dos alunos e de se identificar pontos de
semelhança. Por exigir historicidade, a aprendizagem parte de algo já existente, não se
dá com uma inesperada “iluminação” que faça a passagem no “desconhecido” para o
“conhecimento” de maneira imediata.
Os alunos de engenharia, embora não tenham tido aulas de direito
anteriormente, possuem um contato direito com o direito em suas vidas. Eles já
fizeram ou fazem estágios, muitos trabalham, alguns já enfrentaram algum impasse
com a universidade, alguns já tiveram problemas com contratos, prestações de
serviço, consumo, alguns se interessam e se preocupam com a questão e legislação
ambiental e outros.
Como se percebe, o direito faz parte do cotidiano dessas pessoas, apenas
ainda não foi tratado de maneira sistemática e acadêmica. Essas experiências e
interesses anteriores, portanto, formam um ponto de semelhança bastante
interessante de onde se pode partir para desencadear o processo de aprendizagem
nos alunos, pois eles trabalharão sobre algo que já tiveram contato e terão a
capacidade de transformar essas experiências de maneira a construir um novo
conhecimento para si. Partir da explicação sobre o estágio e suas diferenças em
1340
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relação ao emprego/trabalho pode ser uma boa forma para dar início à
aprendizagem.
Semelhança e percepção
6PESSOA, Fernando. O Guardador de Rebanhos. Poemas de Alberto Caieiro. Arquivo eletrônico.
Disponível em <http://www.dominiopublico.gov.br/download/texto/pe000001.pdf>, acessado em
13/01/2008. p. 6: “Porque sou do tamanho do que vejo / E não, do tamanho da minha altura...”
7 Disciplina eletiva é aquela disciplina de outro curso ou área que não compõe o currículo obrigatório
do curso do aluno.
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futebol”. Provavelmente, mesmo agora sabendo o que seria o árbitro no direito, esse
aluno não se lembrará da discussão que se deu em sala e terá perdido uma chance de
aprender algo mais.
Observa-se, nesse ponto, o âmbito “individual” da aprendizagem. Não é
possível ninguém aprender por ninguém, cada um aprende por si e a partir de suas
experiências pessoais. A percepção que cada um de nós tem acerca de um objeto é
diferente e com isso aprendemos de maneiras diversas, mantendo a diferença entre
nós, embora acresçamos nossas semelhanças.
Humberto Maturana vai além e afirma que, não só possuímos percepções
diferentes, como nos é impossível diferenciar entre o que é percepção e o que é
ilusão:
8 MATURANA, Humberto. Emoções e Linguagem na Educação e na Política. Trad. José Fernando Campos
Fortes. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2005. 98p. p.44. (grifos no original)
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Criatividade
12 MATURANA, Humberto. Emoções e Linguagem na Educação e na Política. Trad. José Fernando Campos
fórmula pronta para isso, existem alguns recursos mais ou menos eficazes para cada
turma, para cada aluno.
O levantamento de problemas reais para os quais se deve procurar soluções
pode ser um bom recurso para estimular os alunos. Permitir que os alunos trabalhem
um pouco com sua área de interesse também pode ajudar – por exemplo, um
trabalho que solicite ao aluno que realize um processo similar ao legislativo, criando
um ato normativo tratando de tema a sua escolha pode ser desenvolvido de forma
interessante no ensino jurídico.
Outro recurso que pode ajudar é a intertextualidade com obras literárias e
artísticas. Trazer esse tipo de obra pode estimular os alunos a saírem dos padrões de
ensino baseados na repetição. As obras de arte estimulam as impressões de cada um e
ajudam a compreender que é possível a coexistência de várias impressões e
expressões válidas sobre o mesmo objeto, sem que se excluam mutuamente e, o fato
de às vezes se excluírem não as invalida, apenas demonstra uma preferência de
interpretação.
Quando vemos um quadro de René Magritte (1898-1967), em que está
pintada a figura de um cachimbo, com os dizeres “Isto não é um cachimbo”, somos
levados a nos perguntar a que expressão nos ater: à figura do cachimbo, ou à
inscrição que diz não o ser. Tem-se nessa situação, ao menos duas possibilidades.
Pode-se aceitar que é sim um cachimbo, portanto a inscrição estaria deslocada. Mas
esse entendimento não invalida a interpretação de que não se trata de um cachimbo,
e sim de um “quadro” com a pintura de um cachimbo. Ambas as interpretações,
portanto, seriam válidas e podem ou não se excluírem, dependendo de nossas
preferências.
Diante de tal constatação, o professor não deve, exigindo “a” resposta
correta, reprimir as impressões e expressões do aluno, desde que coerentes com suas
referências.
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13 NERUDA, Pablo. Presente de um Poeta. Trad. Thiago de Mello. Cotia, SP: Vergara & Riba Editoras,
2004. 100p. p. 80.
14 BOBBIO, Norberto. Elogio da Mittezza. In BOBBIO, Norberto. O final da longa estrada:considerações
sobre a moral e as virtudes. Trad.: Lea Novaes. Rio de Janeiro: Tempo brasileiro, 2005. p.68.
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REFERÊNCIAS
BARROS, Manoel de. in Olhar Diamantina /Clébio Maduro... [et al]; Concepção /
Coordenação Fabrício Fernandino. Belo Horizonte: DAC/UFMG, 2005. 88p.:il.
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NERUDA, Pablo. Presente de um Poeta. Trad. Thiago de Mello. Cotia, SP: Vergara &
Riba Editoras, 2004. 100p.
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RESUMO
SUMÁRIO
1- Introdução
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Tais artigos abordam esta formação plena do educando, que não deve
envolver somente a educação escolar e formal, mas também afirmar o exercício da
cidadania como uma das finalidades da educação.
Antes, porém, de adentrarmos em minúcias ao Plano Nacional de
Educação, passemos a uma abordagem da constitucionalidade da esfera da educação.
Artigo 26:
I – Todo o homem tem direito à instrução. A instrução será
gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais. A
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No artigo 6º, temos o rol dos direitos sociais, que são, todavia, direitos e
garantias fundamentais do homem. São liberdades positivas, de observância
obrigatória pelo Estado Democrático de Direito, o qual a Constituição traz em seu
bojo o consagrado direito à educação.
O artigo 205 da Constituição elucida ainda mais a necessidade da Paideia
Jurídica na escola. Isto porque, conforme se pode depreender:
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Direitos basilares como estes e vários outros não podem ser restritos aos
estudiosos do Direito. Se a educação se preocupa com a construção integral da
cidadania, deve se preocupar em fornecer esse conhecimento para a população desde
a pré-escola.
Um exemplo que merece ser destacado para exemplificar a incoerência
entre a educação positivada e a educação prática é a figura do homem médio.
Segundo doutrinas do Direito, o homem médio é aquele que, dada uma situação
jurídica, possui o discernimento de decidir pela melhor atitude, que é a atitude
juridicamente correta. Ocorre que é humanamente impossível que este homem, que
nunca teve formação jurídica básica, tome a melhor decisão, e que esta, seja a decisão
juridicamente válida. Como ponderar direitos se o chamado homem médio não
possui um padrão para ser levado em consideração, visto que não tem conhecimento
sobre os direitos básicos?
Não é justo cobrar tal incumbência da população, se a cidadania que lhe é
garantida positivamente não o é na prática. Fazer valer o direito constitucional à
educação que envolve a formação ética, é, antes de tudo, o exercício pleno do Estado
Democrático de Direito.
Um outro ponto trazido pelo artigo 205 da Constituição da República é a
qualificação para o trabalho. Tal qualificação é também objeto da Paideia Jurídica.
Isto porque, os estudantes, além da obrigatoriedade em adquirirem conhecimento
teórico para o exercício das profissões, devem ainda, conhecer do mercado de
trabalho, das condições e da legalidade que envolve os direitos básicos do exercício
de uma profissão.
Em um trabalho de campo desenvolvido em uma escola municipal da rede
de ensino de Belo Horizonte, as autoras do presente artigo puderam trabalhar com
adolescentes da faixa etária de 12 a 17 anos, onde, percebeu-se que, cem por cento
dos participantes desconheciam a legalidade acerca do trabalho do menor aprendiz.
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4 BROCHADO, Mariá. Pedagogia jurídica para o cidadão: formação da consciência jurídica a partir
de uma compreensão ética do Direito. in Revista da Faculdade de Direito. Universidade Federal de Minas
Gerais, v. 48, 2006. p. 186-187.
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5 BROCHADO, Mariá e outros (Org.) Educação em Direitos Humanos – Uma contribuição Mineira. Belo
Horizonte: Ed. UFMG: PROEX, 2009, p.43
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7- Conclusão
Face exposto alhures, conclui-se que, por ser uma questão social tratada
desde sempre, a educação merece atenção especial. E sendo que a educação não
engloba somente o ensino regular, a formação deve ser buscada em todas as searas da
vida do sujeito.
Educar para a cidadania é muito mais do que uma aprovação no exame
vestibular. Deve-se buscar a construção ética do indivíduo enquanto sujeito de
direitos.
Para tanto, além do conhecimento acerca de direitos humanos básicos, o
professor deve se valer da dialética, utilizando de técnicas de interdiscursividade para
fazer o aluno apreender o conhecimento. Desta forma, poderá o professor utilizar-se
de casos concretos em sala de aula para ilustrar os direitos humanos a serem
lecionados, e, a partir daí, ministrar os conteúdos, como foi dito no item anterior.
A problemática da educação não pode ser perpetuada como instrumento de
verborragia de final de discurso político, em que se discutem diversos problemas
sociais do Brasil, e por fim, encerra-se dizendo que o problema do país está na
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educação. Não se deve, portanto, pontuar-se desta forma sem se planejar o que deve
ser feito para reverter esse quadro.
A Paideia Jurídica vem como uma das formas de auxiliar na construção ética
do cidadão. Logicamente, existe o papel da família e da sociedade, mas a escola ainda
é um dos maiores palcos para o desenvolvimento dessa consciência ética.
No dizer de Paulo Freire, por meio da educação, os sujeitos podem se
constituir senhores de suas vidas, autores de sua história.
Cabe, portanto, ao Estado, fomentar o desenvolvimento da educação em
direitos humanos básicos, a qual, vencendo estes desafios, alcançará a almejada
paideia e formará verdadeiros cidadãos éticos.
Bibliografia
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RESUMO
1 Graduada em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais.
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1 - INTRODUÇÃO
Em obra sobre o Novo Direito Penal, datada de 1972, Roberto Lyra tece
interessantes considerações acerca da configuração deste ramo jurídico. Em palavras
quase poéticas, ressalta o “conteúdo humano”, a “palpitação social” e a “intensidade
dos dramas” com que trabalham os penalistas.
“O Direito Penal visita museus e arquivos, freqüenta lançamentos e
inaugurações. Preocupa filosofias, religiões, ciências, artes, técnicas, serviços”4,
assevera o jurista. “Perpassa, por todos os casos e fases, a majestade da dor humana
que qualquer um pode decifrar nas legendas da letra, do som, da imagem” 5.
3 FERRAZ JR., Tércio Sampaio. Introdução ao Estudo do Direito: Técnica, Decisão, Dominação. 4. ed. São
Paulo: Atlas, 2003.p.22
4 LYRA, Roberto. Nôvo Direito Penal. Vol.1. Rio de Janeiro: Editora Borsoi, 1972.p.20
5 Idem.
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6 Idem. P.56.
7 ZAFFARONI, Eugênio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro. V.1 –
Parte Geral. 6ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.p.113.
8 SERRA, Carlos Henrique. Revistas jurídicas e o debate ideológico. In Revista Brasileira de Ciências
Criminais. Ano 16, n. 72, maio-junho de 2008.p.207-252. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2008. p.209.
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Arremata a autora que “a música tem esse dom de transporte sem fronteira,
sem censura, sem constrangimento”14, revelando, como nas lendas, muita coisa
verdadeira acerca da sociedade que reflete.
O samba, por sua vez, constitui documento representativo de determinada
época. Ensina Cláudia Matos que as letras de samba por muito tempo constituíram o
principal, senão o único documento verbal que as classes populares do Rio de Janeiro
12 Idem.
13 BOMENY, Helena. Os dezessete e setecentos. In Decantando a República. – inventário histórico e político
da canção popular moderna brasileira. Berenice Cavalcante, Heloísa Maria Murgel Starling e José Eisenberg
(org.). V.2: Retrato em Branco e Preto da Nação Brasileira Rio de Janeiro: Nova Fronteira; São Paulo:
Fundação Perseu Abrano, 2004 P.135.
14 Idem.
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16 MATOS, Cláudia. Acertei no Milhar: Malandragem e Samba no Tempo de Getúlio. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1982. p. 186
17 DAMATTA, Roberto. Carnavais, Malandros e Heróis – Para uma sociologia do dilema brasileiro. 6ª ed.
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21 SOUZA, Jessé. As metamorfoses do malandro. In Decantando a República – inventário histórico e
político da canção popular moderna brasileira. Berenice Cavalcante, Heloísa Maria Murgel Starling e
José Eisenberg (org.). V3: A cidade não mora mais em mim Rio de Janeiro: Nova Fronteira; São
Paulo: Fundação Perseu Abrano, 2004.p.47.
22 Idem.
23 Idem. P.48.
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24CÂNDIDO, Antônio. Dialética da Malandragem. Disponível em:
http://www.unioeste.br/prppg/mestrados/letras/leitura/DIALETICA_MALANDRAGEM.rtf.
Acesso em 13 de outubro de 2008.
25 GOTO, Roberto. Malandragem Revisitada: uma leitura ideológica de “Dialética da Malandragem”. Campinas,
estrutural. Petrópolis, Vozes, 1973, p.154. Apud. OLIVEN, Ruben George. Violência e Cultura no
Brasil.3ªed. Editora Vozes: Petrópolis, 1986.p.34.
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tirava samba-canção
Comigo não
Eu quero ver quem tem razão
Ai patrão
Sou um homem liquidado
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5.1 – “Quem trabalha é quem tem razão, eu digo e não tenho medo de errar”
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Senhor delegado
Seu auxiliar está equivocado comigo
Eu já fui malandro
Hoje estou regenerado
Os meus documentos
Eu esqueci mas foi por distração (comigo não)
Sou rapaz honesto
Trabalhador, veja só minha mão (sou tecelão)
Se ando alinhado
É porque gosto de andar na moda
Se piso macio
É porque tenho um calo que me incomoda (na ponta do pé)
Se o senhor me prender
Vai cometer uma grande injustiça (na Lapa)
Amanhã é domingo
Tenho que levar minha patroa à missa (na Penha)
(Senhor Delegado, Moreira da Silva)
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(...)
(Averiguações, Moreira da Silva )
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penalmente, e escolher os caminhos para efetivar tal tutela”28. Não se pode olvidar,
contudo, que a política criminal, assim como a ciência jurídica, se vale de uma
ideologia que, por sua vez, pode encobrir, ocultar ou mesmo criar realidades,
"privilegiando uma ideologia e descartando (ou reprimindo, limitando o
desenvolvimento ou ocultando) as que considere perigosas ou negativas para ela."29.
Emerge, então, um papel de controle exercido pelo sistema penal. Embora
as condutas criminalizadas sejam resolvidas por um meio institucional comum, é
certo que, individualmente, cada uma apresenta um significado social distinto. Assim,
o delito não seria uma realidade social individualizável, mas uma "construção
destinada a cumprir certa função sobre algumas pessoas e acerca de outras.”30.
Haveria um processo de seleção das pessoas classificadas como "delinqüentes", e não
simplesmente uma seleção de ações e condutas qualificadas como tais.
Zaffaroni define o controle social como a "influência da sociedade
delimitadora do âmbito de conduta do indivíduo” 31. Este controle pode ser exercido
tanto por meios difusos e menos evidentes, como os meios de comunicação de
massa, a educação, as manifestações artísticas, etc., como por meios mais específicos
e institucionalizados, como o sistema penal Por meio deste sistema, por sua vez, é
empreendida uma criminalização seletiva dos marginalizados, seja para conter os demais
integrantes desta mesma classe, seja para garantir a sensação de tranqüilidade dos
setores hegemônicos.
A análise empreendida anteriormente das canções que retratam o fenômeno
da malandragem é exemplificativa da atuação do controle social tanto difuso quanto
institucionalizado. O primeiro é manifestado por meio das canções que, após o
28 ZAFFARONI, Eugênio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro. V.1 –
Parte Geral. 6ª Ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.p.114.
29 Idem. p.60.
30 Idem. p.58
31 Idem.
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dias atuais. Por certo, estas leis não foram imunes à ideologia prevalecente e foram
determinantes, também, para a definição do tratamento penal conferido aos
malandros.
Francisco Campos, um dos mentores intelectuais do Código Penal de 1940
interpretava-o como "um instrumento adequado para a repressão do crime"32. Na
exposição de motivos do Código de Processo Penal, o mesmo Ministro acentua o
objetivo de "maior eficiência e energia contra os que delinqüem", clamando por uma
"rigorosa e expedita aplicação da justiça penal" contra o indivíduo "que vem se
mostrar rebelde à disciplina jurídico-penal da vida em sociedade". Verifica-se, então,
o caráter marcantemente autoritário, compatível com a política da época.
Outrossim, o Código Penal conferiu significativa proteção ao patrimônio,
criminalizando, ainda, condutas atentatórias contra os costumes e o ultraje público ao
pudor. A Lei de Contravenções Penais, por sua vez, traz previsões nitidamente
atinentes à ideologia de valorização do trabalho e direcionadas a determinado grupo
de pessoas, como Provocação de tumulto. Conduta inconveniente (art. 40); Perturbação do
trabalho ou do sossego alheios (art. 42); Jogo de azar (art. 50); Jogo do bicho (art. 58); Vadiagem
(art. 59); Mendicância (art. 60); Embriaguez (art. 62); etc.
A música “Hino de Duran”, de Chico Buarque, e que faz parte do musical
Ópera do Malandro pode apresentar-se como uma síntese das idéias aqui apresentadas.
A Ópera se passa durante o governo de Vargas e o eu-lírico da canção mencionada –
Duran, favorável ao governo e que sustenta orgulhosamente seu status de
trabalhador e cumpridor de seus deveres legais – dirige-se a um malandro,
acentuando todo o discurso criminalizador e estigmatizante desenvolvido sobre o
personagem:
32 SERRA, Carlos Henrique. Revistas jurídicas e o debate ideológico. In Revista Brasileira de Ciências
Criminais. Ano 16, n. 72, maio-junho de 2008.p.207-252. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
2008. p.211.
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Essa letra apresenta a ideologia jurídico-penal que fez com que o malandro
fosse reprimido e progressivamente abandonasse o cenário urbano que era por ele
habitado. Tratado como um tumor que deveria se extirpado, não escapou aos braços
fortes da lei penal.
O mito, todavia, sobreviveu. E ressurge, posteriormente, com novas
feições. Mais uma vez, contudo, a malandragem não é dissociada da criminalidade e,
por esta razão, analisaremos, a seguir, “os novos malandros”, e sua relação com o
fenômeno criminal na atualidade.
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“Aquela tal malandragem, não existe mais”, prenuncia Chico Buarque nos
idos da década de 70. Na canção Homenagem ao Malandro, o compositor relata que, ao
tentar fazer “um samba em homenagem à nata da malandragem”, deparou-se com
uma nova realidade: aquele malandro, cantado nos sambas primordiais, “aposentou a
navalha”, casou-se, tem filhos, emprego. Não há mais aquele ser da liminariedade, da
dialética entre a ordem e a desordem, como descreveu Antônio Cândido. Tal figura foi
varrida do cenário cultural e substituída por um novo perfil de malandragem, mais
condizente com as atuais circunstâncias sócio-econômicas.
Surgem, então, os “malandros de colarinho branco”, conforme apresentado
na letra de “Homenagem ao Malandro”:
33ROCHA, Gilmar. “Eis o malandro na praça outra vez”: a fundação da discursividade malandra no Brasil dos
anos 70. SCRIPTA, Belo Horizonte, v.10, n.19, p.108-121, 2º sem.2006. Disponível em:
http://www.pucminas.br/imagedb/documento/DOC_DSC_NOME_ARQUI20070621145500.pdf.
Acesso em 10 de outubro de 2008 p.108/109.
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nos tão somente “uma imagem (ou imagens), muitas vezes pintada com as
tonalidades da nostalgia e de um certo romantismo, atingindo por vezes colorações
quase folclóricas.”34. Entram em cena, então, os novos malandros.
O personagem atual, conforme retratado na música de Chico Buarque,
adquire outra feição, ligada mais à associação com o crime do que com a posição
marginal e excluída. O malandro de “antigamente” transitava entre o lícito e o ilícito,
utilizando de artifícios e estratagemas para sobreviver sem precisar submeter-se ao
trabalho pesado e desvalorizado que lhe cabia na sociedade. O de hoje também
mistura atividades lícitas com ilícitas, utilizando-se destas para obter vantagens
vultosas que, mesmo com suas profissões valorizadas e com relevo social, não
atingiriam. O malandro de antes carregava consigo um estigma que ia além dos
delitos que cometiam. Os de hoje, embora possam praticar crimes de elevado
impacto, pertencem à classes mais bem favorecidas e, também, são menos (ou quase
nada) estigmatizados. São os malandros de “contrato, gravata e capital”, que “nunca
se dá mal”.
Os delitos, sobretudo, são outros. As transformações pelas quais passaram a
sociedade culminaram em novas situações para as quais o Direito Penal clássico não
apresenta resposta. Surgem novos bens que, embora estranhos ao legislador de 1940,
reclamam por proteção jurídica. Novos bens jurídicos acarretam, todavia, também
novas condutas lesivas, que apresentam o desvalor inerente às ações delituosas. É
nesse contexto que surgem, por exemplo, os crimes contra a ordem econômica e
tributária. Pertinentes, então, as considerações de Silva-Sanchez
34 Idem.
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Assim, verifica-se que resposta penal aos crimes econômicos é, por certo,
diferida. A impunidade em que resultam muitas dessas condutas, acentuada pelo
alarde normalmente empreendido pela imprensa, gera um descrédito na atuação da
Justiça e, sobretudo, uma revolta por parte da população, em especial dos grupos
sociais que estão submetidos a maiores processos de criminalização. Vê-se
institucionalizado o tradicional jeitinho brasileiro, porém em proporções cada vez
maiores. Nesse sentido, a música Pega Ladrão!, de Gabriel, O Pensador:
(...)
Tira esse malando do poder executivo!
Tira esse malandro do poder judiciário!
Tira esse malandro do poder legislativo!
Tira do poder que eu já cansei de ser otário!
Tira esse malandro do poder municipal!
Tira esse malandro do governo estadual!
Tira esse malandro do governo federal!
Tira a grana deles e aumenta o meu salário!
"- Tá vendo essa mansão sensacional?
Comprei com o dinheiro desviado do hospital.
- Ah! E o meu cofre cheio de dólar?
É o dinheiro que seria pra fazer mais uma escola.
- Precisa ver minha fazenda! Comprei só com o dinheiro da
merenda!
- E o meu filhão? Um milhão só de mesada!
E tudo com o dinheiro das crianças abandonadas.
- E a minha esposa não me leva à falência
35 SANCHÉZ, Jesús-María Silva. A Expansão do Direito Penal: aspectos da política criminal nas sociedades pós-
industriais.tradução: Luiz Otávio Oliveira Rocha. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002. -
(Série as ciências criminais no século XXI; v.11). P.76/77.
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41 MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis e SAAD, Marta. Código Penal e sua Interpretação: Doutrina e
Jurisprudência/ coordenação Alberto Silva Franco, Rui Stoco. – 8. ed. ver., atual. e ampl. – São Paulo:
Editora Revista dos Tribunaism 2007. p.773.
42 VARGAS, Beatriz. Sobre segurança pública, violência, Sherlock Holmes e capitão Nascimento. In PEREIRA,
Flávio Henrique Unes, DIAS, Maria Tereza Fonseca (Org.). Cidadania e Inclusão Social: Estudos em
homenagem à Professora Miracy Barbosa de Sousa Gustin. p.65-72. Belo Horizonte: Editora Fórum,
2008.p.67/68.
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geralmente são sustentadas pelos próprios, enquanto as negativas por pessoas que os
rodeiam.
Assim, há também canções que exaltam o malandro-traficante, ressaltando
o papel social que este cumpriria na favela, por assumir funções que, não obstante
deveriam resultar de políticas públicas, dependem da atuação dos “líderes do morro”.
Por exemplo, “Malandro Consciente”, de Bezerra da Silva:
44 RAMALHO, José Ricardo. O Mundo do Crime: a ordem pelo avesso. 3 ed. – São Paulo: IBCCRIM, 2002.
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47 Idem.p.75.
48 Idem.p.76.
49 Idem.p.69.
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Hei, malandro
Malandragem mesmo é saber viver, malandro
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que é evidenciado pela referência à Lapa e à conjugação dos dois estilos musicais: O
rap é com samba/ Então aumenta que ta bom. Emergem, todavia, outros ritmos que
constituem meios de auto-representação, de veiculação da imagem que se tem da
sociedade e, também, de afirmação social.
Verifica-se, por tudo quanto exposto, que a figura do malandro não
constitui apenas pretérito folclore em nossa cultura. Subsiste ainda hoje, tendo
passado por várias fases, conforme o contexto vivenciado: o malandro exaltado,
reprimido, regenerado... O certo é que não perdeu seu caráter de representatividade,
inclusive em relação à criminalidade de cada época, posto que, direta ou
indiretamente, sempre esteve a ela relacionado.
Hoje o discurso malandro é mais difuso. Porém não perdeu seu aspecto
elementar. Embora tenhamos nos referido aos "malandros de colarinho branco", o
discurso da malandragem continua sendo representativo das classes menos
favorecidas, marginalizadas - devendo tal expressão ser compreendida, conforme
aduz Rocha50, também como referência à população que se apresenta "à margem",
excluída da efetivação de seus direitos fundamentais.
Assim, embora possa o medo ser, atualmente, um grande fantasma que a
todos assombra, e a violência ser vista como iminente e rotineira, não se deve pensar,
todavia, em medidas simplesmente de controle e repressão. As canções apresentadas
nos auxiliam ver o "problema" sob outra ótica: uma visão interna, de quem vive mais
próximo a esta realidade, confrontando-se com ela diariamente, em uma tensão
constante entre crime e "vida honesta". Embora aquele seja, muitas vezes, o meio
mais hábil a garantir a subsistência, já que se apresenta como forma de suprir as
50 ROCHA, João Cezar de Castro. Dialética da marginalidade - caracterização da cultura brasileira
contemporânea. Disponível em: http://www.midiaindependente.org/pt/blue/2004/03/275292.shtml.
Acesso em 10 de outubro de 2008
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necessidades básicas não atendidas por meio do trabalho lícito, nem todos recorrem
às atividades delituosas.
Dessa forma, a partir dos discursos analisados, pode-se chegar a uma
conclusão comum: a questão da criminalidade - sobretudo de massas - transcende o
universo estrito do Direito Penal. Não bastam a edição de novas leis, o agravamento
das sanções, a construção de novos presídios ou a instituição de outros meios de
controle repressivos. A política criminal não pode ser identificada com a segurança
pública.Deve-se buscar soluções que, todavia, não se restrinjam a medidas
rigorosamente penais, mas, sim, que abranjam todas aquelas necessárias e suficientes
à efetivação dos direitos fundamentais, previstos constitucionalmente mas tantas
vezes negligenciados pelo sistema penal.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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LOPES, Mônica Sette. Uma Metáfora: Música e Direito. São Paulo: LTr, 2006.
LYRA, Roberto. Nôvo Direito Penal. Vol.1. Rio de Janeiro: Editora Borsoi, 1972.
MOURA, Maria Thereza Rocha de Assis e SAAD, Marta. Código Penal e sua
Interpretação: Doutrina e Jurisprudência/ coordenação Alberto Silva Franco, Rui
Stoco. – 8. ed. ver., atual. e ampl. – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007.
1410
I Congresso da Associação Mineira de Pós-Graduandos em Direito
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RAMALHO, José Ricardo. O Mundo do Crime: a ordem pelo avesso. 3 ed. – São
Paulo: IBCCRIM, 2002.
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