Sie sind auf Seite 1von 18

ALUNO(A): Carla Ellen Lima Lemos

SALA: M3MR01

TÍTULO: A formação política e social do Estado brasileiro.

RESUMO:

O artigo apresenta algumas particularidades e informações da formação do Estado


brasileiro obtidas através de revisão bibliográfica, incluindo o parasitismo
manifestado durante o período colonial e estudado por Manoel Bomfim. Também
decorre acerca do patrimonialismo, definição presente na teoria política weberiana e
desenvolvida por Sérgio Buarque de Holanda, que a descreve como uma
característica do homem brasileiro. Inclui-se ainda uma análise sobre o passado
escravocrata e algumas das suas influências no cenário político, além do
distanciamento da população com a política do país. Enfim, o artigo pretende revelar
algumas características do passado brasileiro e suas práticas corruptas.

PALAVRAS-CHAVE: Parasitismo. Brasil. Patrimonialismo. Corrupção. Escravidão.


Colonização.

SUMÁRIO

1. Introdução
2. Características da Formação Política e da Origem da Corrupção no Brasil
2.1. A Formação Política da Nação e o Parasitismo Social
2.2. Patrimonialismo
2.3. Consequências da sociedade escravista
2.4. Conservadorismo
2.5. Exclusão política
3. Conclusão
Referências
2

1. Introdução

A corrupção é um grande problema na sociedade atual. A utilização do poder


público, incluindo não só dinheiro público como também o favorecimento de certas
entidades (físicas, jurídicas ou empresariais) em detrimento de outras, o uso de
cargos em instituições públicas como moeda de troca e prática de atos ilícitos, como
suborno, para manipular eleições, são crimes e prejudicam em muito a moral política
do nosso Estado e dificultam o progresso e o alcance do potencial que a nação
possui.

Quando se olha para o cenário público caótico brasileiro, a origem desses


problemas é um dos primeiros questionamentos que surgem na mente do cidadão. É
óbvio que a corrupção tem raízes sociais e culturais em uma sociedade, mas
também tem raízes históricas que foram construídas desde a origem da nação.
Afinal, o passado é fator importante na construção do presente.

O conceito de parasitismo, trabalhado por Manoel Bomfim, traz consigo um


vasto arsenal de objetos de estudo sobre o passado colonial do Brasil. A influência
direta do Estado português sobre a colônia e os próprios primeiros colonos,
delinquentes e rejeitados, que a Coroa enviou para o Brasil podem ser usados como
argumento na construção de uma análise histórica acerca do atual estado da política
e sociedade brasileira. A hereditariedade social e os vícios e marcas deixados por
um parasitismo são construídos e descritos pelo autor que, de maneira bem simples
e objetiva, nos mostra seus traços na sociedade brasileira.

Outra definição proveitosa, desenvolvida pelo sociólogo Max Weber e


utilizada pelo autor brasileiro Sérgio Buarque de Holanda, é a do Patrimonialismo,
uma característica própria do brasileiro – o “homem cordial”. No contexto brasileiro,
essa prática se encaixa como uma luva ao se apresentar como fruto de um passado
pautado na educação familiar e patriarcal, desenvolvendo no indivíduo uma
deficiência perante o âmbito social e político de distinguir as questões públicas das
privadas. Assim, este sempre confunde as duas o que acaba em uma mistura
prejudicial para o âmbito público. O patrimonialismo, diante desse campo fértil em
que foi desenvolvido, traz consigo o nepotismo e a corrupção para beneficiar o
detentor do poder público.
3

O passado colonial regido pela escravidão também trouxe sérios danos


morais e sociais. Sérgio Buarque de Holanda já salientava que o português não
tinha muita afinidade com o trabalho manual devido ao passado medieval que
enaltecia o ócio improdutivo, assim como Bomfim enfatizou o fato do parasitismo ter
reforçado essa prática de modo violento. Toda a construção em volta da escravidão
teve raízes fortes na sociedade brasileira. Os governantes, durante várias gerações
seguidas, se acostumaram a tratar o povo como um grupo de animais, sem
considerar que tinham necessidades próprias. Aproveitavam-se da situação
decadente dos escravos para tirarem proveito, mesmo quando estes já estavam
libertos. A exploração política não era muito seletiva.

Esse cenário de favorecimentos produziu uma classe que, ao se acostumar


com os benefícios e privilégios, desenvolveu um parasitismo sedentário, onde o
único esforço seria para conservar seu estado atual, sem nenhum desejo de
progresso. Essa classe acabou por excluir ainda mais a população da participação
política. As mudanças de regime político mais importantes, a Independência e a
República, foram feitas pela elite e não tiveram participação popular. Essa sequer
sabia direito o que estava acontecendo. Muitas se recusaram a aceitar a
independência, tal era a indisposição política presente entre elas e, com a
República, mesmo após algum tempo da instalação da mesma, muitas pessoas, em
diversos lugares do território brasileiro, não tinham noção do que estava
acontecendo. Esse distanciamento da população para com o próprio governo é um
problema grave, já que facilita com que o sistema eleitoral seja pouco eficiente,
contribui para a esterilização dos votos e estes fatores, por sua vez, provocam a
ineficácia da democracia.

A partir disso, conclui-se que a corrupção não tem apenas explicações


sociais, mas também históricas. São coisas que contribuíram para essa formação e
merecem ser analisadas. Portanto, esse artigo tem a intuição de introduzir o leitor
nesse universo, levando a conhecer, mesmo que superficialmente, um pouco do
passado do seu país e de como, historicamente, ele adquiriu as atuais
características políticas. De onde vem a corrupção? Quais são suas causas
históricas e como elas continuam tão firmes na nossa sociedade? Qual a ligação da
colonização com esse processo? Essas são perguntas que formam a base para a
4

construção desse artigo. Portanto, cabe agora analisarmos os argumentos citados


anteriormente.

2. Características da Formação Política e da Origem da Corrupção no Brasil

2.1 – A Formação Política da Nação e o Parasitismo Social

As origens do Brasil giram em torno de Portugal e constroem consequências


que perduram até os dias atuais. Manoel Bomfim em seu livro “América Latina:
males de origem” descreve como o passado colonial influenciou na construção
social e política da nação brasileira. O autor descreve tal processo como um
parasitismo social, sendo Portugal o parasita e Brasil, o parasitado. Bomfim compara
a nação ibérica a um crustáceo que, ao parasitar outro ser vivo, perde toda a sua
organização complexa e, mal possuindo a partir de então um aparelho digestivo
completo, se limita a comer, sugando os nutrientes de sua vítima, e defecar, sem
qualquer desenvolvimento intelectual ou ação produtiva.

Bomfim analisa o Estado português à procura das razões que o levam a tal
comportamento e encontra no seu passado uma justificativa. Para o autor, Portugal
sofria dos resultados de um parasitismo que o tinha afetado anteriormente, vivendo
de guerras e depredações por muito tempo, o tornando cheio de cobiça e sequioso
de riqueza. Esses aspectos foram o impulso para que os portugueses se
aventurassem além-mar à procura de fortuna e esplendor, que encontraram na
África (principalmente através do tráfico negreiro), nas Índias (com o comercio de
especiarias) e, finalmente, na América (com o estabelecimento de uma colônia).

Certas características de Portugal herdadas do passado também são


exploradas por Sérgio Buarque de Holanda em “Raízes do Brasil”, onde ele diz que,
para o português, o trabalho manual, por ser exterior ao indivíduo e significar a
submissão a um objetor exterior a ele, não é exigido por Deus, nada acrescenta à
sua glória e não aumenta nossa própria dignidade. Ainda sobre a concepção de
trabalho manual entre os povos ibéricos, Buarque de Holanda (2014, p.44) afirma

É compreensível, assim, que jamais se tenha naturalizado entre gente


hispânica a moderna religião do trabalho e o apreço à atividade utilitária.
Uma digna ociosidade sempre pareceu mais excelente, e até mais
nobilitante, a um bom português, ou a um espanhol, do que a luta insana
pelo pão de cada dia. O que ambos admiram como ideal é uma vida de
grande senhor, exclusiva de qualquer esforço, de qualquer preocupação [...]
O que entre elas predomina é a concepção antiga de que o ócio importa
5

mais que o negócio e de que a atividade produtora é, em si, menos valiosa


que a contemplação e o amor.

A partir desse aspecto, é possível estabelecer importantes observações,


como a do próprio Buarque de Holanda (2014, p. 45) que diz: “Também se
compreende que a carência dessa moral do trabalho se ajustasse bem a uma
reduzida capacidade de organização social”. Pontos como esse seriam, mais tarde,
importados para o Brasil, onde os Portugueses, com uma administração falha e
desorganizada, aliada ao ócio improdutivo, ajudariam na construção de uma base
política deficiente e corrupta. Era a introdução do parasita dentro do parasitado,
como sugere Bomfim (2008, p. 91-92)

Não há na sociedade da metrópole uma classe, um órgão, que não participe


dessa vida parasitária a que se entregou a nação. Ela apresenta o todo
perfeito de um organismo social preso a outro, sugando-o. E o pior é que
parte deste organismo degenerado transborda necessariamente sobre a
colônia, e vai viver lá: são os agentes da administração, os representantes
dos monopólios, os próprios colonos em grande parte. [...].

Essa visão dos portugueses sobre a colônia como apenas uma fonte de
lucros aliada à desafeição pelo trabalho produtivo fez com que desenvolvessem nela
não só uma organização social falha, como previu Sérgio Buarque de Holanda, mas
também a exploração exacerbada da população a fim de manter os luxos da
metrópole e o nascimento de um sentimento claro entre os políticos, que veem a
política como não como um meio de promover o progresso e a ordem coletivos, mas
sim como uma porta de entrada para o lucro pessoal e a obtenção de poder sem
que seja necessário maior esforço – nem físico, nem psicológico.

Um dos primeiros portugueses a pisar em terras brasileiras, Pero Vaz de


Caminha, na carta que escreve diretamente ao rei descrevendo a terra que acabara
de encontrar, pede emprego para um parente (Vaz de Caminha, 1500, folha 14)

[...] E pois que, Senhor, é certo que assim neste cargo que levo como em
outra qualquer coisa que de vosso serviço for, Vossa Alteza há de ser de
mim muito bem servida, a ela peço que por me fazer singular mercê mande
vir da ilha de São Thomé Jorge Dosoiro, meu genro, o que dela receberei
em muita mercê. Beijo as mãos de Vossa Alteza. [...]

Mesmo não sendo considerado um ato corrupto para a época, onde os cargos
públicos só eram alcançados através de indicações, essa pequena atitude de Vaz de
Caminha é o antecedente do nepotismo que marcaria a política brasileira. Outro
caso curioso é do português Martim Afonso, um dos organizadores do regime
6

colonial português em terras brasileiras, que vendia o auxílio nas colônias indígenas.
Bem se vê que o nascimento da colônia não foi o dos mais honestos.

Desde o princípio, uma característica marcante do Brasil, como subjugado de


Portugal, foi ser uma colônia de exploração. O primeiro sistema administrativo que o
Estado português implementou na colônia foram as Capitanias Hereditárias, um
modelo extremamente similar ao feudalismo. O donatário tinha plenos poderes
dentro da sua capitania como o monopólio da justiça, autorização para fundar vilas,
doar sesmarias e arrecadar impostos. A doação de sesmarias é importante, pois deu
origem à formação de vastos latifúndios. Entretanto, a descentralização de poder
causada pelas capitanias deu espaço para uma grande desorganização política.

Vindo com o objetivo de corrigir as falhas do sistema predecessor, o Governo


Geral trouxe consigo uma centralização do poder e uma maior organização estatal.
No entanto, com ele também ficou claro que a rachadura na base política só
aumentaria. O primeiro governador-geral, Tomé de Sousa, desembarcou no Brasil já
marcado pelo envolvimento na corrupção de uma verba pública, e era acompanhado
por Pero Borges que vinha para ser o ouvidor-mor, algo equivalente ao Ministro da
Justiça nos dias atuais, e que, não distante do companheiro no quesito moral, tinha
sido acusado, três anos antes, de desviar verba pública na construção de um
aqueduto.

Assim se deu o início da colonização. “A princípio, limitam-se a enviar para


aqui os criminosos e bandidos, e as prostitutas chegadas à última degradação”
(BOMFIM, 2008, p. 95). Vinham para as colônias portuguesas aventureiros e
especuladores gananciosos, sem outro pensamento que não fosse o de enriquecer
depressa e sem muito trabalho, como descreve Bomfim em sua obra. Ainda
segundo ele, a metrópole não teria outros intentos senão cobrar os tributos e, dito
isso, deixa ao colono toda a plenitude de ação para o mal; ele é livre para fazer o
que quiser, contanto que pague e não pense em modificar o regime social e político.

2.2 – Patrimonialismo

Patrimonialismo é um conceito desenvolvido na teoria política de Max Weber


referente a um modo de exercício legítimo de poder político, pautado na “dominação
tradicional”. É definido quando as esferas públicas e privadas se confundem, não
7

havendo o conhecimento da divisão entre elas. A administração pública é tratada


pelo líder político como um assunto pessoal e o poder público é tido como um meio
do progresso pessoal e uma posse privada, concedendo ao senhor a manutenção
dos próprios interesses.

Sergio Buarque de Holanda, em “Raízes do Brasil” descreve o brasileiro como


“homem cordial”, indivíduo cujo desenvolvimento inicial pautado em um núcleo
familiar patriarcal influi diretamente no seu posterior convívio no âmbito social e
político. Ele descreve como essa característica em particular pode moldar uma
sociedade em específico (Holanda, 2014, p. 172-73)

Com efeito, onde quer que prospere e assente em bases muito sólidas a
ideia de família – e principalmente onde predomina a família de tipo
patriarcal – tende a ser precária e a lutar contra fortes restrições a formação
e evolução da sociedade segundo conceitos atuais.

Sobre o brasileiro inserido nessa condição e participante da esfera pública o


autor afirma (2014, p. 175)

Não era fácil aos detentores das posições públicas de responsabilidade,


formados por tal ambiente, compreenderem a distinção fundamental entre
os domínios do privado e do público. Assim, eles se caracterizam
justamente pelo que separa o funcionário “patrimonial” do puro burocrata
conforme a definição de Max Weber. Para o funcionário “patrimonial”, a
própria gestão política apresenta-se como assunto de seu interesse
particular; as funções, os empregos e os benefícios que deles aufere
relacionam-se a direitos pessoais do funcionário e não a interesses
objetivos, como sucede no verdadeiro Estado burocrático, em que
prevalecem a especialização das funções e o esforço para se assegurarem
garantias jurídicas aos cidadãos. A escolha dos homens que irão exercer
funções públicas faz-se de acordo com a confiança pessoal que mereçam
os candidatos, e muito menos de acordo com as suas capacidades próprias.
Falta a tudo a ordenação impessoal que caracteriza a vida no Estado
burocrático. [...].

Para ele o patrimonialismo é um dos atributos do “homem cordial”, fazendo


parte de uma cultura familiar tradicional herdada de Portugal, cuja ação parasitária
sobre o Brasil, como descreve Bomfim, deixou várias marcas e vícios no parasitado.
É a herança de um sistema monárquico onde os bens públicos e do príncipe não se
distinguem, pelo contrário, o tesouro real é tido como fortuna da Coroa. Um exemplo
disso é quando o príncipe regente Dom João, em 1807, esvazia os cofres de Lisboa
ao partir em direção ao Brasil para fugir das investidas do exército francês e, em
1821, ao retornar para Portugal, quebrava o Banco do Brasil por levar consigo todo o
dinheiro, desconsiderando completamente o povo nas duas situações. Além disso, o
nepotismo, prática onde se beneficia familiares de um determinado detentor de
8

poder público e que era fortemente presente na estrutura de poder portuguesa,


também faz parte dessa herança, como foi mencionado anteriormente. Ainda sobre
esse assunto, Sérgio Buarque de Holanda (2014, p. 175-76) afirma

No Brasil, pode dizer-se que só excepcionalmente tivemos um sistema


administrativo e um corpo de funcionários puramente dedicados a
interesses objetivos e fundados nesses interesses. Ao contrário, é possível
acompanhar, ao longo de nossa história, o predomínio constante das
vontades particulares que encontram seu ambiente próprio em círculos
fechados e pouco acessíveis a uma ordenação pessoal. Dentre esses
círculos, foi sem dúvida o da família aquele que se exprimiu com mais força
e desenvoltura em nossa sociedade.

A organização feudal inicial da colônia, onde o donatário era representante do


Estado em sua capitania também favoreceu essa formação por atribuir a uma figura
individual e patriarcal, parte dos poderes do Estado para que usasse como bem
entendesse, desde que pagasse à Coroa os devidos impostos. Era o surgimento
inicial de um grupo que entenderia o poder público como uma fonte para alcançar
seus desejos pessoais e sua elevação social. É o desvirtuamento do governo, que
deveria beneficiar toda a população, para favorecer apenas uma elite com ambições
individualistas. Bomfim (2008, p. 89) escreve

Os governos, por sua vez, arranjaram logo a máquina administrativa de


modo a sugar a colônia o mais possível. Não havia outra preocupação. Os
territórios e os privilégios eram dados ou vendidos segundo os interesses da
corte ou dos seus representantes.

Encontra-se nessa prática patrimonialista um dos fortes fatores que


propiciaram a instauração endêmica da corrupção no país. O patrimonialismo é a
origem do que hoje se faz a forma mais escancarada de desvio moral na política e
está presente em práticas antigas que predominam ainda na atualidade, como a
“indústria da seca”, onde políticos se aproveitam da miséria vivenciada pela
população nordestina afetada pela seca para benefício próprio.

2.3 – Consequências da sociedade escravista

Outra base importante que esteve presente em grande parte da história do


Brasil foi o sistema escravocrata. Este constitui um importante marco entre o
parasitismo depredador e o sedentário, onde o parasita se acomoda e se contenta
em explorar o parasitado sem desenvolver qualquer esforço.

Os escravos formaram grande parcela da população brasileira durante muito


tempo, tendo em vista que a escravidão perdurou no Brasil por mais de trezentos
9

anos, resistindo até mesmo ao processo de Independência. Nos dados contidos no


livro “História do Brasil”, de Boris Fausto, a população de escravos constituía quase
um terço do total em 1819. Trata-se de indivíduos destituídos de quaisquer direitos,
privados da liberdade e sem qualquer aparato humanitário ao qual recorrer diante
daqueles que os exploravam. Ou seja, muitos dos habitantes do país, na grande
maioria das vezes, sequer eram vistos como pessoas, sendo tratados como coisas,
vistos como um patrimônio. O escravo era um indivíduo considerado um animal
humano, como descreve André Barreto Campello no “Manual Jurídico da
Escravidão”, já que as Ordenações Filipinas, uma compilação jurídica, regulavam a
compra e venda de escravos no mesmo capítulo dedicado aos animais.

Ainda de acordo com o que escreveu Campello, esse regime raramente tinha
um fim para essas pessoas. Mesmo quando o escravo conseguia sua alforria ele
vivia sob uma constante insegurança jurídica, pois existia uma grande ameaça de
perda da liberdade alcançada caso fosse constatado um caso de ingratidão diante
de seu antigo senhor. Essa possibilidade de perda da liberdade alcançada, no caso
a alforria, encontrava fundamento no § 7º, Título 63, do Livro IV, das Ordenações
Filipinas:

Se alguém forrar seu escravo, livrando-o de toda a servidão, e depois que


for forro, cometer contra quem o forrou, alguma ingratidão pessoal em sua
presença, ou em sua ausência, quer seja verbal, quer de feito e real, poderá
este patrono revogar a liberdade, que deu a este liberto, e reduzi-lo a
servidão, em que antes estava. E bem si por cada uma das outras causas
de ingratidão, porque o doador pôde revogar a doação feita ao donatário,
como dissemos acima.

Portanto, mesmo depois de alforriado, o agora ex-escravo continuava a ter


uma rotina de servidão para com o ex-senhor. Diante desta situação, um político
escravista conseguia construir uma parcela de homens obrigatoriamente dedicados,
podendo aumentar o número de votos que controlava nas eleições primárias. Ou
seja, nas eleições, os libertos votavam em candidatos antiabolicionistas e, por medo
de serem acusados de ingratidão, denunciavam as conspirações escravas.

Tal dinamismo se estabelece como um sistema cruel de controle da


população que a obrigava a ajudar em processos políticos corruptos que a
prejudicariam no final. Como mesmo descreve Bomfim (2008, p. 84): “É fato inegável
verificado que o parasita obriga sempre a sua vítima a prestar-lhe uns tantos
serviços acessórios”. Tal prerrogativa observa-se no caso do feitor, um escravo
10

escolhido pelo senhor, que lhe metia o chicote nas mãos, para que forçasse os
outros a trabalharem o máximo possível. Era a submissão de um indivíduo como
opressor de seus semelhantes, prática mais que comum na sociedade brasileira. O
autor ainda afirma (2008, p. 85)

As modificações adaptativas do parasitado são também de tal modo


evidentes que se dispensam demonstrações demoradas. Um organismo –
qualquer que seja, para que viva, tem de adaptar-se às condições de
existência que se lhe oferecem.

Portanto, todo esse grupo desenvolveria esses hábitos como uma tradição de
sobrevivência, e esta, por si só, agiria como um objeto do qual os políticos corruptos
e mal intencionados usufruiriam para fazer a manutenção de seus privilégios.

Fora tais fatores mencionados, a violência sobre esse grupo, utilizada para
controla-lo, impedindo que o mesmo se rebelasse, é absurda. Segundo Campello
(2018, p. 213-14)

Para limitar revoltas, desobediências, controlar insubordinações e,


sobretudo, evitar que essas evoluíssem para insurreições, o Estado
brasileiro admitia que agentes públicos, semipúblicos e privados
empregassem a violência a fim de manter os milhões de escravos
submissos.

A elite que estava incluída no âmbito público sempre esteve acostumada a


tratar com violência – física ou moral – aqueles abaixo de si para manterem o regime
que os beneficiava. Esse comportamento se cristalizou quase como uma tradição
entre estes, permanecendo intacto mesmo quando o progresso clamava para que
fosse abandonado. Era a construção de um personagem muito presente na política
brasileira, o latifundiário, o senhor de engenho, o barão do café. Personagem este
que durante várias gerações depredou toda uma população, a oprimiu, torturou e
que, ultrapassando os limites éticos, a governou como bem entendesse. “Nos
campos, o colono fazendeiro, arremedo do senhor feudal, constituiu desde logo uma
fidalguia territorial, pretenciosa, arrogante, brutal, ignorante e onipotente, sobre a
camada de escravos, índios ou africanos” (BOMFIM, 2008, p. 103).

Daí parte a ideia de Manoel Bomfim de que a escravidão deixou


consequências graves para a nação, ele expõe esse caráter cruel que assumiram os
colonos, a violência e o ócio característico deles que, ao escravizarem milhares de
pessoas, se transformaram em parasitas sedentários, sugando as forças de outrem
para que pudessem obter lucros e viverem sem qualquer esforço produtivo. Essa
11

marca autoritária e superior que carregaram e transmitiram se impôs não somente


aos escravos, mas também, como a história nos mostra, aos imigrantes que vieram
para o Brasil, seduzidos e enganados, e até mesma à própria população brasileira,
que teve que lidar com esse fardo que seus governante carregavam, fardo esse não
para eles, mas sim para aqueles que dependiam da sua vontade para que o bem
público fosse difundido. Bomfim completa dizendo (2008, p. 110)

Lutas contínuas, trabalho escravo, estado tirânico e espoliador – qual seria


o efeito de tudo isto sobre o caráter das novas nacionalidades? Perversão
do senso moral, horror ao trabalho livre e à vida pacífica, ódio ao governo,
desconfiança das autoridades, desenvolvimento dos instintos agressivos.

2.4 – Conservadorismo

A partir dos assuntos abordados anteriormente, percebe-se que a história do


Brasil produziu uma elite privilegiada politica e socialmente e que, a partir disso, não
mede esforços para conservar tais privilégios. Assim como o parasitismo, Bomfim
(2008, p. 118) aborda esse tema e discorre sobre os “conservadores”:

Há “conservadores” – esses cujos esforços se dirigem todos no sentido, não


de defender a sociedade contra supostas destruições impossíveis, mas de
conservar para uma classe, para certos grupos, umas tantas vantagens,
ligadas a abusos e iniquidades. Onde quer que surja a oposição
conservadora, há um privilégio que se quer manter.

Ele considera que essa característica foi herdada dos povos colonizadores,
que o parasitismo tornou conservadores ferrenhos. Essa seria a essência do
parasitismo: desde que um organismo passa a viver à custa de outro, cessa de
progredir, não tem mais essa necessidade, pelo contrário, sua prioridade agora é de
não alterar sua situação. O parasitismo torna o indivíduo incompatível com o
progresso, imobilizando-o.

O próprio Estado se faria uma realidade à parte, em vez de ser um aparelho


nascido da própria nacionalidade, refletindo os seus interesses. No entanto, as
autoridades só viam os interesses da metrópole, contrários aos da colônia. Após a
Independência, tal devoção se voltou em nome dos direitos e prerrogativas da
Coroa. Ou seja, não houve uma mudança em si, apenas substituíram-se no poder os
representantes da metrópole por nacionais e com exceções, já que não havendo
alteração essencial no regime governativo, não foi destituído um só dos altos
funcionários. Bomfim chama isso de falsa independência; foi uma jogada, uma
artimanha para que as tradições perseverassem. Ele ainda cita um trecho do livro “O
12

Brasil e as colônias”, de Oliveira Martins, onde este diz que D. Pedro dizia para
Portugal que o seu propósito era evitar com que se perdesse a melhor joia da Coroa
portuguesa; o autor do trecho em questão ainda considera provável que fora sincero
o pacto feito entre o pai e o filho para explorarem em proveito próprio a situação. O
Estado permanecia ali, imutável, sem quaisquer perspectivas de uma verdadeira
mudança. O regime político vigente, a monarquia, sequer foi destituído. Mesmo
quando se achava que daria um passo adiante, como a elaboração de uma
Constituição, se achou um jeito de corrompê-la: fizeram-na subordinada ao
imperador, desvirtuaram o propósito dos Três Poderes, criados por Montesquieu no
objetivo de que houvesse o mínimo possível de concentração de poder, ao criarem o
poder Moderador, que estaria acima de todos os outros; ou seja, o absolutismo
ainda era uma presença marcante. Consoante Bomfim (2008, p.179)

Fez-se a independência da colônia exclusivamente para os refratários. No


momento, toda a separação se reduziu a substituir o título do chefe do
governo – não é mais rei, é imperador; a nação passa a ter uma
Constituição sua, copiada da antiga, copiada pelo próprio imperante, eterno
distribuidor de constituições; deram-lhe um parlamento seu, que o monarca
dissolveu quando quis; e fez-se tornar a Portugal alguns centos de
soldados. Tudo mais aqui fica: “todas as pessoas de ordem civil,
eclesiástica e militar que a corte portuguesa deixou no Rio de Janeiro
ocupando os altos cargos”. A mesma máquina administrativa, com os
mesmos processos, e privilégios, e parasitas; os mesmos costumes, e até a
mesma freguesia financeira – a Inglaterra. [...].

As classes dirigentes preocuparam-se exclusivamente com os próprios


interesses, sem cogitar as necessidades efetivas da população. Assim se fazia o
Estado: repleto de indivíduos cheios de regalias e com um único objetivo – se não
fosse possível conquistar mais, ao menos manter a todo custo os privilégios já
adquiridos. As máquinas governamentais são, dentre os diversos aparelhos sociais,
as mais resistentes ao progresso e às reformas. Os regimes políticos passam e
transformam-se; as instituições sociais desaparecem, são substituídas; mas as
tradições governamentais e os costumes administrativos permanecem os mesmos,
como descreve Bomfim, que ainda afirma em um trecho que leva traços não só do
conservadorismo como também do patrimonialismo (2008, p. 146):

Mudem os nomes aos cargos, suprimam estes, criem outros – que os


indivíduos chamados a ocupa-los, uma vez ali, logo se acomodarão à feição
clássica do Estado, e imediatamente o considerarão como uma entidade à
parte, com interesses seus, obrigado, apenas, a tratar da sua própria
conservação.
13

Essa era a feição do Estado brasileiro: uma instituição elitista e conservadora


que visava sempre manter os privilégios do grupo que a compunha. Esses traços,
tão recentes, deixaram marcas que se encontram na política brasileira até os dias
atuais. A corrupção é tida como um privilégio entre os componentes desse grupo
que, ao se introduzirem nessa esfera pública, ao invés de almejarem contribuir para
o bem social e político do seu país, apenas ambicionam interesses próprios.

2.5 – Exclusão política

A população brasileira não é a mais participativa no quesito política. Como foi


visto nos tópicos anteriores, o parasitismo e a política colonial, a tradição
patrimonialista, o regime escravocrata e a conservação de privilégios não deixavam
muito espaço para a expressão do povo. Este era o último a ter opinião e raramente
suas necessidades eram atendidas. Esse processo teve início nos primórdios da
colonização: os funcionários vinham sempre de Portugal e evitava-se com muito
cuidado empregar até os próprios descendentes de europeus, nascidos na América.
Ou seja, vedar aos nacionais a participação política é uma prática muito antiga.
Soma-se a isso a violência empregada para fortalecer essa exclusão política, tão
usada pelos povos colonizadores e até mesmo depois da independência. Todos
esses fatores corroboraram para a formação de um sentimento de antipatia do povo
com o próprio governo, além da distância ampliada entre os dois. Segundo Bomfim
(2008, p. 102)

O Estado existe para fazer o mal, exclusivamente; e esta feição, com que
desde o primeiro momento se apresenta ele às novas sociedades, tem uma
influência decisiva e funestíssima na vida posterior destas nacionalidades: o
Estado é o inimigo, o opressor e o espoliador; a ele não se liga nenhuma
ideia de bem ou de útil; só inspira ódio e desconfiança... Tal é a tradição;
ainda hoje se notam estes sentimentos, porque, ainda hoje, ele não perdeu
o seu caráter, duplamente maléfico – tirânico e espoliador. [...].

E mais adiante enfatiza (2008, p. 157)

Abandonadas pelo Estado, sofredoras e infelizes, natural que as


populações lhe paguem em ódio e má vontade a dureza com que são
tratadas. Elas vêm as coisas como estas se lhes apresentam: o Estado só
existe para o mal – extorquir e tiranizar, e o povo desconfia dele, tem-no
como inimigo, quer-lhe mal; está sempre disposto a desobedecer-lhe,
porque sabe que, dos atos e resoluções do poder público, lhe vêm, quase
sempre, danos e opressões. [...].

Para ele, toda essa indisposição e ódio contra o Estado vêm dos primeiros
dias da colônia. É a reação natural do organismo parasitado contra o parasita. E, de
14

fato, o Estado, as instituições públicas e os governantes nunca foram bons com a


população. Esta sempre foi oprimida, extorquida, tiranizada e ignorada. Isso
provocou não só o ódio, mas também o desinteresse, afinal, “Não lhe davam
ocasião, nem direito, nem estímulos para vir interessar-se pelo Estado; davam-lhe
motivos, apenas, para odiá-lo” (BOMFIM, 2008, p. 162).

As relações do povo com o Estado resumiam-se em pagar tributos,


desrespeitá-lo e revoltar-se quando a exploração era excessiva. A má vontade
contra o Estado não desapareceu, assim como não desapareceu o desamor pelas
coisas públicas. A influência exercida por essa situação fez com que a população
desacreditasse o seu governo e, tomando como exemplo aqueles que lhes
governavam, vissem esse como um meio de tirar proveito. A política, o Estado e o
governo eram uma gangorra, e todos querem arrumar um lugar nos grupos da
gangorra, sem terem as melhores das intenções ou, pelo menos, as necessárias
para participar do âmbito público.

Já foi citado que a Independência foi um processo crucial para conservar


privilégios dos grupos no poder. Portanto, já que foi um movimento elitista, a
participação popular foi nula. Muitos sequer sabiam o que estava acontecendo e
outros, que sabiam do processo, sequer quiseram aderir ao mesmo, como foi o caso
do Grão-Pará, que não queria fazer parte da nação independente, continuando a
pertencer a Portugal. Ainda que com a Independência as eleições passassem a ser
uma realidade em território brasileiro, elas eram, ao decorrer de todo o processo,
muito excludentes, sendo estabelecido o voto censitário, tal qual descreve Boris
Fausto (2002, p. 151)

A eleição para a Câmara de Deputados se processava da seguinte forma.


Nas eleições primárias, votavam os cidadãos brasileiros, inclusive os
escravos libertos, mas não podiam votar, entre outros, os menores de 25
anos, os criados de servir, os que não tivessem renda anual de pelo menos
100 mil-réis provenientes de bens de raiz (imóveis), indústria, comércio ou
emprego. Os candidatos, por sua vez, só podiam ser pessoas que, além
dos requisitos dos votantes, tivessem renda de, no mínimo, 200 mil-réis
anuais e não fossem escravos libertos. Os escolhidos nessas eleições
primárias formavam o corpo eleitoral que elegeria os deputados. Para ser
candidato nessa segunda etapa, as exigências aumentavam: além dos
requisitos anteriores era necessário ser católico e ter uma renda mínima
anual de 400 mil-réis. [...].

Com a República não mudou muita coisa. Substituiu-se o sistema censitário


pelo sufrágio universal; entretanto, a restrição do direito ao voto seguiu a mesma
15

tendência praticada no Império: só podiam votar os brasileiros adultos, do sexo


masculino e que soubessem ler e escrever. É como afirmam Heloisa M. Starling e
Lilia M. Schwarcz em “Brasil: uma biografia”:

Contudo, certas características vindas de longa data persistiam e foram até


aprimoradas. Uma delas era o perfil oligárquico da nação: novas leis
eleitorais mantiveram o número reduzido de eleitores e cidadãos elegíveis
para os cargos públicos.

E logo após elas descrevem algumas das características que dão à Primeira
República seu caráter oligárquico e corrupto, como a Política dos Governadores que
reconhecia a plena autonomia das elites regionais e fazia vista grossa às infrações
cometidas por estas; em troca, as unidades federativas deveriam agir de acordo com
as decisões do poder central e, se houvesse algum conflito, ele estaria confinado à
esfera regional. Outras práticas desse período também são bem conhecidas,
especialmente o coronelismo – praticamente uma manutenção de um processo
eleitoral que tentava controlar as disputas locais. As fraudes eram frequentes e
alguns procedimentos ficaram famosos; assim descrevem Starling e Schwarcz

[...]. A eleição de “bico de pena” vem do Império e diz respeito às diversas


manipulações feitas pelas mesas eleitorais, como a falsificação de
assinaturas e adulteração das cédulas eleitorais. A “degola” significava o
não reconhecimento do eleito pela Comissão de Verificação da Câmara dos
Deputados – procedimento que eliminava os adversários, anulando sua
eleição. O “voto de cabresto” era quase uma prática político-cultural – um
ato de lealdade do votante ao chefe local. Por fim, o “curral eleitoral” aludia
ao barracão onde os votantes eram mantidos sob vigilância e ganhavam
uma boa refeição, dali só saindo na hora de depositar o voto – que
recebiam num envelope fechado – diretamente na urna.

Mesclem-se todos esses fatores, e mais alguns outros, e estava formada a


política do café com leite, onde o governo e o poder eram divididos entre São Paulo
e Minas Gerais. O regime político mudava e novamente o povo estava de fora,
sendo apenas usado pela elite para que esta se sustentasse no poder, beneficiando
a si mesma. Como prorroga o historiador Leandro Karnal, política é, historicamente,
um exercício de poder para beneficiar ou favorecer um grupo, para impedir seu
adversário de alcançar o poder. “Historicamente a política é a administração real do
poder e dos benefícios que ele possa trazer” (Karnal, 2017, p. 122).

É a partir de tais fatos que ocorre a esterilização dos votos, ou seja, os


eleitores votam com determinados objetivos e determinadas crenças e, no entanto,
vê seu voto anulado diante disto já que o indivíduo em quem votou não tem a
16

mínima pretensão de cumprir com o prometido. O voto torna-se então uma moeda
de troca, já que o sistema político se encontra em total descrédito com o eleitor, que
não consegue obter os resultados pretendidos com seu voto e então passa a
acreditar que esse não trará nenhum benefício a não ser que seja usado
corruptamente. É a exclusão política por parte do eleitorado. Assim, o sistema
eleitoral e a desonestidade e individualismo dos governantes dificulta a efetivação do
regime democrático, aumentando ainda mais o favorecimento de um sistema
corrupto.

3. Conclusão

Esse artigo tem por objetivo adentrar no assunto da corrupção ao longo da


história brasileira, fazendo uma análise breve, porém que instigue o leito a procurar
entender as raízes históricas dessa prática. Toda a temática do parasitismo de
Portugal sobre o Brasil, parasitismo este que deixou raízes no território brasileiro,
contribuiu para que a nação mantivesse certos vícios e práticas mesmo depois de
independente. Esses vícios se manifestam em processos históricos como o
patrimonialismo, característico do homem cordial que é o brasileiro. Esse
patrimonialismo, proveniente das raízes familiares e patriarcais, causa a confusão
entre as esferas pública e privada, levando o indivíduo a utilizar-se do seu poder
público para benefício próprio.

A escravidão também deixou suas marcas, não só sociais, mas também


políticas. Durante muito tempo os governantes trataram grande parte da população
como animais, não se importou com suas necessidades e abusava dela das piores
formas possíveis. Instituíram-se parasitariamente sobre esse grupo, sugando-o
como pôde e, mesmo quando este conseguia sua liberdade, ainda encontravam
uma forma de explorá-lo. É o conservadorismo do parasite que não o deixa largar
seus privilégios, que ele defende a todo custo. A elite, mesmo com todas as trocas
de regime político pelas quais passou o Brasil, arrumou um jeito de se manter no
poder e de conservar e fazer a manutenção dos privilégios. A renovação política era
a renovação da exploração.

A partir disso a população foi desenvolvendo, desde o início da colonização,


certo distanciamento e uma indisposição para com a política do seu país. O povo foi
extremamente violentado, grupos foram torturados e dizimados, para que se
17

mantivesse submisso ao governo e não desse palpite. Nunca lhe abriram espaço
para a participação política. No início os governantes eram importados de Portugal,
a fim de manter longe qualquer indivíduo nascido na América. Depois, mesmo que
fossem admitidos os nacionais e que houvessem eleições, estas eram excludentes e
fraudadas pela elite para que essa se mantivesse no poder, não fazendo nada pelo
benefício público. Assim a democracia deixa de fazer diferença para o bem estar do
cidadão e cai em total descrédito. Não foi cultivado, entre o povo brasileiro, o amor
pela coisa pública.

Todos esses fatores contribuíram para a não efetivação do regime


democrático em território brasileiro e o estabelecimento da corrupção como uma
prática endêmica. Esta foi uma herança social em decorrência do parasitismo que o
Brasil por tanto tempo. É fruto do patrimonialismo e patriarcalismo, além do
autoritarismo que regeu a nasceu durante a maior parte da sua história. Todo esse
registro histórico contribuiu para que a desonestidade no sistema público ainda seja
um problema na nossa sociedade.

Referências

FAUSTO, Boris. História do Brasil. São Paulo: Edusp, 2013.

SCHWARCZ, L. M.; STARLING, H. M. Brasil: uma biografia. São Paulo:


Companhia das Letras, 2015.

HOLANDA, Sérgio Buarque de. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia


das Letras, 2015.

BOMFIM, Manoel. A América Latina: males de origem. Rio de Janeiro:


Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2008.
18

NETO, L. H. A formação do Estado brasileiro: patrimonialismo,


burocracia e corrupção. Revista do Mestrado em Direito da Universidade Católica
de Brasília, Brasília, vol. 2, nº 1, p. 204-230, 2008.

CAMPELLO, André Barreto. Manual jurídico da escravidão: Império do


Brasil. Jundiaí, [SP]: Paco, 2018.

KARNAL, Leandro. Todos contra todos: o ódio nosso de cada dia. Rio
de Janeiro: LeYa, 2017.

LOBO, Valéria. Pressupostos poliárquicos e democracia no Brasil:


notas em torno das distorções do sistema político brasileiro. LOCUS: revista de
história, Juiz de Fora, vol. 8, nº 1, p. 93-108, 2002.

KARNAL, Leandro. As raízes da corrupção no Brasil. Disponível em:


<https://www.youtube.com/watch?v=8qsXU3973fA&t=91s>. Acesso em: 29 jun.
2019, 20h.

Das könnte Ihnen auch gefallen