Sie sind auf Seite 1von 8

0

A CONDIÇÃO FEMININA REPRESENTADA NA LITERATURA

Fabiana de Araújo e Silva


fabiarasilva@gmail.com
Gizelda Ferreira do Nascimento
gizelda.letras@yahoo.com.br

Um breve percurso sobre a Crítica Literária Feminista

Durante séculos, as mulheres foram discriminadas pelos costumes, preconceitos e


valores ditados pela sociedade. A mulher era vista como um ser inferior - muitas vezes
impedida de escrever, pensar e agir com liberdade - o que a tornava dependente do sexo
masculino em todos os sentidos. E as que ainda se atreviam a escrever usavam
pseudônimos ou tinham seus escritos apropriados por homens próximos, como maridos e
irmãos.

Com a simples constatação de que a experiência da mulher enquanto escritora


apresentava diferenças em relação às experiências vividas pelo homem escritor, houve uma
verdadeira revolução intelectual, devido à descoberta de um novo horizonte de
expectativas, pois até então os estudos literários baseavam-se no conceito da
universalidade, que se pautava no paradigma masculino.

Segundo Funck (1994) foi através do ativismo político de algumas mulheres


americanas, na década de 60, que se iniciou um forte questionamento à prática acadêmica
patriarcal, que excluía as mulheres escritoras do cânone literário. A crítica feminista se
concentrou em investigar e descobrir uma literatura feita por mulheres, além de exigir uma
revisão sobre os estudos literários masculinos, já que a crítica masculina não seria eficiente
para a leitura das obras escritas por mulheres.
1

Com a descoberta de várias obras escritas por mulheres, surgem críticas e


pesquisadoras a favor do conceito de uma escrita feminina, que mesmo ainda hoje havendo
objeções a esse conceito, não há como negar que foi a partir dele que se reconheceu a
existência de uma consciência literária especificamente feminina. Houve também o
surgimento de outro conceito, o de gênero, na década de 80, importante para a categoria de
análise do discurso literário feminino.

Como na década de 80 os estudos literários sobre a masculinidade e a


homossexualidade também começaram a ganhar destaque, estes se juntaram aos estudos da
mulher, permitindo que o estudo de gênero se firmasse cada vez mais como categoria de
análise crítica literária. Entretanto, no Brasil, durante este período, os estudos de gênero no
campo literário não tiveram o mesmo destaque que tiveram nos países europeus - França e
Inglaterra - e nos Estados Unidos, devido ao feminismo em nosso país não ter penetrado
com tanta força no meio acadêmico.

Escrita de Autoria Feminina

A escrita feminina nem sempre é produzida por mulheres. Segundo coloca Funck
(1994), a crítica literária francesa acreditava na existência de uma escrita feminina
produzida tanto por homens quanto por mulheres. Por isso, precisamos logo neste
momento fazer a distinção entre o que muitos teóricos entendem por escrita feminina –
tipo de escrita que traz marcas do feminino, podendo ser escrita por homens e mulheres – e
autoria feminina – escrita produzida por mulheres.

Em relação às questões de escrita literária de autoria feminina, Xavier (1994) diz


que a narrativa produzida por mulheres, em sua maioria, traz a marca do sexo de suas
autoras, pois apresentam em suas obras conflitos inerentes à condição feminina.

Aos homens sempre coube escrever sobre a humanidade e suas complexas redes
sociais, refletindo em seus escritos uma postura de visão masculina sobre o mundo,
enquanto que às mulheres cabia falar apenas sobre seus sentimentos ou assuntos
relacionados a si-mesmas.
2

Para a escritora americana Elaine Showalter apud Xavier, a literatura feminina


apresenta três fases principais. A primeira ela denomina de feminine (feminino), quando há
um prolongamento da tradição dominante; a segunda de feminist (feminista), que como o
próprio nome sugere é marcada por protestos; e a terceira fase é chamada de female
(fêmea), vista como a fase da auto descoberta feminina. Claro que essas três etapas,
segundo a própria Elaine Showalter, não são categorias rígidas, afinal podem se sobrepor e
estarem todas presentes em uma única escritora.

É justamente por volta de 1960 que percebemos a presença da fase feminista


denominada por Showalter, pois as escritoras começam nesse momento a questionar os
papéis sociais impostos à mulher. A escritora francesa Simone de Beauvoir - autora da
obra A mulher Desiludida, que escolhemos como corpus do nosso trabalho - faz isso de
forma peculiar, pois questiona o papel da mulher na sociedade, e mais precisamente no
casamento, através da representação de uma mulher caracterizada pelo discurso masculino.

Sendo assim, embora alguns teóricos sejam contra a afirmação de que a escrita
tenha sexo e defendam que esse assunto já deveria ter sido encerrado, pretendemos analisar
a representação da condição feminina na literatura e expor o porquê e de que maneira a
escritora francesa deixa a marca do seu sexo na obra escrita por ela.

Simone de Beauvoir e sua personagem desiludida

No ano de 1967, a escritora francesa Simone de Beauvoir publicou o livro A


Mulher Desiludida. As três histórias contidas nesse livro são narradas por suas
protagonistas e apresentam em comum o tema da solidão e do fracasso, sendo que para
cada uma das histórias é dado um enfoque específico.

Na primeira história, que traz o título A Idade da Discrição, a protagonista passa


por uma crise de meia idade, na qual cada vez mais se distancia de seu marido; na segunda,
intitulada Monólogo, a personagem principal encontra-se sozinha e cheia de ódio após o
suicídio da filha, o que a faz perder a guarda de seu outro filho para o ex-marido; na última
3

- que traz o mesmo título dado ao livro - temos como protagonista uma mulher traída por
um marido que já não a ama mais, porém, devido a uma forte dependência conjugal não
consegue deixa-lo.

Embora o livro apresente três histórias, nossa proposta é analisar apenas a última,
que como já foi citado anteriormente, traz o título de A mulher desiludida, o mesmo dado
ao livro. Toda a história é contada em forma de diário por sua protagonista, tendo início na
Segunda-feira de 13 de setembro e fim no dia 24 de março.

Monique mora na França, é casada com Maurice há mais de vinte anos, e tem duas
filhas com ele: Collete - que está casada e assim como sua mãe não trabalha fora de casa -
e Lucienne - que mora sozinha na América. Maurice é médico e insiste que sua esposa
volte a trabalhar, mas ela mesma admite em seu diário que prefere viver à disposição das
pessoas que necessitam dela.

No dia 26 de setembro Monique escreve sobre a descoberta de que seu marido a trai
com Noellie Guérrard, uma advogada bonita, atraente e bem sucedida. Ele chega em casa
de madrugada e ao ser questionando por Monique se há uma mulher em sua vida responde
naturalmente que sim. Apesar da descoberta chocante de que Maurice a estava traindo,
Monique prossegue com seu casamento, e pede conselhos à sua amiga Isabelle, que a
aconselha a ser compreensiva e paciente, pois em breve Maurice perderá o encanto por
Noellie, pois o que seduz os homens é a novidade.

Agora que Monique já sabe de toda verdade, Maurice se divide entre noites e fins
de semana em sua casa e em casa de Noellie. E embora ela “concorde” com essa situação,
escreve sempre em seu diário sobre o quanto sofre quando pensa no marido e na amante
juntos.

No dia 1º de dezembro Monique e Maurice brigam por causa de Noellie, e no calor


da discussão Maurice diz que já não há ama há mais de oito anos e acaba lhe confessando
outras traições. Sua amiga Isabelle lhe diz que uma fidelidade de vinte anos para um
homem é algo impossível.
4

Depois desse episódio Monique começa a ficar obcecada em descobrir porque seu
marido não a ama mais - apesar de ele ter lhe pedido desculpas e jurado que só disse que
não a amava porque estava zangado – e passa a acreditar que a culpa é sua. Ela também
começa a perder a vontade de viver e escreve em seu diário que apesar de não querer
morrer, não consegue mais viver.

Continua a morar com seu marido - mas vive sob efeito de remédios e álcool
quando ele não está - e a pedido dele começa a frequentar um psiquiatra, o que a faz
apresentar uma leve melhora, até o dia em que ele sugere ir morar sozinho. Ela não aceita e
faz um escândalo, diz que ele quer deixá-la. Maurice pede que ela o compreenda, afinal
continuarão a se ver com a mesma frequência, e não irá viver com Noellie, apenas precisa
ficar um tempo sozinho.

Enquanto Maurice se muda, Monique vai à Nova York visitar Lucienne e tem a
esperança de que sua filha saiba o motivo que levou Maurice a não amá-la mais, mas não
obtém nenhuma resposta e ainda se surpreende com as opiniões de Lucienne, que diz achar
absolutamente natural que depois de quinze anos de casamento o marido não ame mais sua
mulher.

Monique então volta para casa, no dia 24 de março – que é quando termina a
história - e escreve em seu diário sobre o que está sente, agora que irá morar sozinha: que
tem medo e não tem a quem pedir socorro.

A marca do sexo

Ao ler essa história não há como negar que nela existem conflitos que são próprios
da condição feminina: uma mulher dona de casa, que se considerava bem casada, e que ao
descobrir as traições do marido não consegue deixa-lo, dividindo-o então com a amante,
mesmo sofrendo e desconfiando que ele não a ama mais. Perde até a vontade de viver
depois que descobre as traições e julga-se culpada por seu marido ter deixado de amá-la.

A própria Simone de Beauvoir disse que essa história deve ser lida como um
romance policial, pois traz em suas páginas indicações sutilmente disfarçadas, que
5

permitem ao leitor descobrir o porquê Monique esforça-se tanto para manter seu
casamento.

As últimas palavras que a personagem escreve em seu diário, após voltar para sua
casa e encontra-la vazia é que ela tem medo e não tem a quem pedir socorro. Apesar de
não especificar o que realmente a faz sentir medo, se relembrarmos que Monique nunca
quis voltar a trabalhar porque preferia estar à disposição daqueles que ela ama – marido e
filhas – podemos compreender que todo esse tempo ela não quis abandonar seu casamento
porque era nele que encontrava motivos para viver, e com o fim ela sente medo, pois acaba
por perder a finalidade da sua vida.

Como afirma Morgado (1987) em seu livro A Solidão da Mulher Bem-Casada: um


estudo sobre a mulher brasileira, a mulher da década de 60 foi programada para o
casamento, e o mito “mulher de um homem só” e da “natureza poligâmica do homem”
permite que o adultério masculino seja socialmente aceito.

Apesar de Morgado ter formulado esses conceitos a partir de situações vividas por
mulheres brasileiras, compreendemos que ela é aplicável à situação que se encontra a
personagem francesa criada por Beauvoir, sendo também comum às mulheres francesas – e
do mundo - da década de 60 serem programadas para o casamento e também para aceitar
as traições de seus maridos.

Inclusive, a amiga de Monique ao lhe aconselhar sobre o que fazer em relação à


traição do seu marido, diz que ela deve ser compreensiva, afinal não se pode esperar
fidelidade de um homem casado há mais de vinte anos. Tendo Simone de Beauvoir
chamado esses padrões de comportamentos cobrados às mulheres pela sociedade de
destino de mulher.

Até mesmo o diário – onde a personagem escreve sobre suas descobertas e


angústias - é um gênero específico escrito por mulheres, que ainda hoje, mas muito mais
comum antigamente, servia como um lugar onde as mulheres podiam se expressar sem
serem recriminadas.
6

Portanto, não podemos esquecer que Beauvoir é mundialmente conhecida por seu
caráter feminista, e que a representação de uma mulher submissa em sua obra com base em
valores culturais, sociais e morais de sua época, serve para questionar essa condição
feminina, pois como afirma Cândido (2008) a obra literária é resultado das escolhas
individuais do escritor, a partir do repertório que a sociedade e o tempo oferecem, pois arte
e sociedade estão inseridas num vasto sistema solidário de influências recíprocas.

E, se as escritoras femininas ao escreverem sobre conflitos que são inerentes à


situação da mulher são consideradas autoras que trazem a marca do seu sexo para a obra,
como coloca Xavier (1994), podemos após a análise da história da Mulher Desiludida
afirmar que Simone de Beauvoir traz também essa marca, e que talvez, até que se encontre
solução para estes conflitos, muitas autoras continuarão a carregar o peso das relações de
gênero, pois embora tenhamos visto que a escrita feminina também pode ser elaborada por
homens, é certo que a maioria dos textos com marcas de feminino é de autoria feminina,
até porque a maioria dos homens nunca esteve preocupada em representar em suas obras
problemas femininos.

REFERÊNCIAS

BEAUVOIR, Simone de. A Mulher Desiludida. Trad. Helena Slveira e Maryan A. Bom
Barbosa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira,1986.

CANDIDO, Antonio. Literatura e Sociedade. 10 ed. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul,
2088.

FUNCK, Susana Bornéo. Da Questão da Mulher à Questão do Gênero. In: FUNCK,


Susana Bornéo (Org). Trocando Ideias Sobre a Mulher e a Literatura. Florianópolis:
Universidade Federal de Santa Catarina, 1994.
7

MORGADO, Belkis. A Solidão da Mulher Bem-Casada: um estudo sobre a mulher


brsileira. 4 ed. Rio de Janeiro: Olympio,1987.

XAVIER, Elóida. A Narrativa de Autoria Feminina: Ontem e Hoje. In: FUNCK, Susana
Bornéo (Org). Trocando Ideias Sobre a Mulher e a Literatura. Florianópolis: Universidade
Federal de Santa Catarina, 1994.

Das könnte Ihnen auch gefallen