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0001

Representação discursiva e sequência


argumentativa: dimensões de uma análise
textual

Discursive representation and


argumentative structure: dimensions of a
textual analysis
Rosita Maria Bastos dos Santos*

Resumo: A análise textual, com enfoque para aquele desenvolvido no campo da Análise
Textual dos Discursos, propõe que sejam observadas as questões de estruturação e
organização textual, atentando para o caráter pragmático-comunicativo do texto. Este
artigo apoia-se no princípio de que o propósito comunicativo, sobre o qual está pautada
a argumentação, tem como objetivo obter de uma pessoa, ou auditório, adesão de um
ponto de vista adotado (defendido) e expresso em uma alegação, na forma de tese. A
construção argumentativa é examinada neste trabalho tendo como ponto de partida
o fato de que a estrutura, tratada aqui a partir da noção de sequência argumentativa
esta, necessariamente, associada à perspectiva discursiva. Para tanto, adotamos como
fundamento teórico de base a proposta de Jean Michel Adam sobre análise textual
dos discursos.
Palavras-chave: Texto argumentativo. Responsabilidade discursiva. Sequência
argumentativa.

Abstract: Textual analysis, from the perspective developed in the field of Textual
Discourse Analysis proposes that structuring issues and textual organization should
be observed taking into consideration the pragmatic-communicative character of the
text. This article is based on the principle that the communicative purpose, on which
argumentation is guided, aims to get a person´s or an auditorium´s attention to an
adopted perspective (defended) and expressed in a claim in the form of a thesis. The
argumentative construction is examined in this article having as a starting point the
fact that the structure, understood in this study from the notion of argumentative
sequence, which is necessarily associated with the discursive perspective. This study
adopted as a theoretical support Jean Michel Adam´s proposal about textual discourse
analysis.
Keywords: Argumentative text. Discursive responsibility. Argumentative structure.
*
Doutora. Universidade Estadual de Ponta Grossa – UEPG – ro.uepg@gmail.com

Uniletras, Ponta Grossa, v. 37, n. 1, p. 11-26, jan/jun. 2015


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Rosita Maria Bastos dos Santos

Introdução aspectos e dos efeitos das situações de inte-


ração nos lugares sociais, nas línguas e nos
Este trabalho tem como objetivo central
gêneros que influenciam os enunciados.
abordar aspectos argumentativos em textos
Adam (2008) estabelece, então, um modelo
de opinião e resultam de estudos1, que tive-
de Linguística Textual que tem como preocu-
ram como aporte teórico alguns princípios
pação delimitar o campo de análise textual
apresentados por Jean-Michel Adam. Com
dos discursos.
apoio de Adam (2008), propomos a observa-
Consideramos pertinente focar que o
ção do texto dessa categoria, o de opinião,
autor empenha-se em defender que um texto
sob dois pontos abordados pelo autor: as
configura-se como unidade complexa e hete-
noções de representação discursiva e de se-
rogênea. É bastante forte em sua tese a ideia
quência argumentativa. Podemos dizer que
de que o texto é constituído de sequências
a primeira questão, a representação discur-
organizadas por operações de enlace entre
siva, encontra-se nos domínios pragmáti-
o que é linguístico com o que é discursivo. A
cos através dos quais se dá a configuração
partir daí, a Adam apresenta um aporte teóri-
textual, enquanto que a segunda noção, a de
co pautado na linguística textual e análise do
sequência argumentativa, aponta para a es-
discurso em que essas duas teorias conver-
truturação/organização do texto.
gem para uma análise textual dos discursos.
Em sua obra, após revisão sobre o con-
À materialidade linguística se integram os
ceito de frase e período, Adam (2008, p. 104)
efeitos advindos de condições socioculturais,
considera que a gramática não fornece me-
políticas e históricas que em muito orientam
canismos suficientes para delimitar uma
a estruturação que se apresenta na organiza-
unidade textual. Para ele, enquanto o plano
ção textual. Por essa razão, o autor apresenta
de delimitação for a gramática, não se obterá
uma unidade de base para a análise textual,
uma unidade de análise textual. Nessa linha
a proposição-enunciado, pois:
de raciocínio, o autor nos mostra que “é sobre
novas bases que propomos, hoje, articular Temos necessidade, metalinguistica-
uma linguística textual desvencilhada da mente, de uma unidade textual míni-
gramática de texto e uma análise de discurso ma que marque a natureza do produto
de uma enunciação (enunciado) e de
francesa (ADF)” (ADAM, p. 43). Isto porque,
acrescentar a isso a designação de uma
segundo o autor, a linguística textual pas- microunidade sintático-semântica (a
sa a desempenhar papel de subdomínio da que o conceito de proposição atende,
análise do discurso. O recado talvez seja de finalmente, bastante bem). (ADAM,
que a linguística textual não prescinde dos 2008, p. 106. Grifo do autor).

Em nosso entendimento, ao incidir so-


1
As pesquisas com textos, constituintes de gêneros do ar- bre um refinamento na delimitação de uma
gumentar, fizeram parte de projeto de pesquisa “Aborda- unidade mínima do texto, o autor visa justa-
gem sobre estruturas e níveis de argumentação no texto
escrito” desenvolvido na Universidade Estadual de Ponta mente dizer-nos que:
Grossa por esta autora

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a) Qualquer análise de texto recobre (aqui tratada, com mais especificidade, a ar-
análise de um ato de enunciação. gumentativa). Os dois aspectos aqui abor-
b) Não existe enunciado isolado. dados são “alocados”, na teoria de Adam, em
c) Um texto deve “ser observado como espaços diferentes (um configuracional e um
um conjunto de atos ou de comporta- estrutural). Pautamo-nos no princípio, como
mentos” (p. 107) aponta o autor, de que o caráter estruturante
do texto motiva-se pelo o que ele chama de
Elencando uma unidade mínima de
força centrífuga, ou seja, a influência dos da-
análise textual aponta-se para o fato de que
dos externos à constituição do texto.
na organização de enunciados há, também,
A partir da análise de um grupo de vin-
uma organização enunciativa. Nesse sentido,
te textos, de caráter argumentativo (textos
consideramos pertinente destacar o que o au-
de opinião escritos, de ampla circulação em
tor nos mostra a respeito da noção de texto:
mídias escritas.), propôs-se observar o com-
um composto de unidades interligadas (já
portamento da argumentação tendo como
que não existe enunciado isolado) e:
aporte teórico a proposta da ATD, sob dois as-
Em grande parte, determinada pelo pectos principais: a perspectiva enunciativa
que chamaremos de orientação argu- e a perspectiva da organização estrutural do
mentativa (ORarg) do enunciado. As texto, numa concordância a respeito do fato
três dimensões complementares de
de que, na constituição textual o estrutural
toda proposição enunciada são: uma
não prescinde do discursivo.
dimensão enunciativa [B] que se en-
carrega da representação construída
verbalmente de um conteúdo referen- Propondo uma análise textual dos
cial [A] e dá-lhe uma certa potenciali- discursos
dade argumentativa [ORarg] que lhe
confere uma força ou valor ilocucucio- Para Adam (1992, 2008), o texto merece
nário [F] mais ou menos identificável. ser tratado como ato linguístico socialmente
(ADAM, 2008, p. 109. Grifos do autor) organizado. Em suas obras, sustenta que há
a necessidade de uma proposta de análise
Assim, partimos da noção de que o tex- textual dos discursos em que os elementos
to deve ser tratado como conjunto de atos textuais se relacionam entre si construindo
enunciativos entre proposições-enunciados relações de sentido (o que difere de uma re-
organizadas hierarquicamente (níveis ascen- lação de sucessividade apenas, como já pen-
dentemente mais complexos)2 em estruturas sado em outras fases da Linguística Textual
entre as quais se encontra a sequência textual (LT)).
A Análise Textual dos Discursos - ATD
2
Dadas entre os segmentos: palavras-signos, proposi- terá o papel de conciliar duas linhas teóricas
ções enunciadas, frases e/ou versos, períodos e/ou sequ-
ências, parágrafos ou estrofes e partes de um plano de que, embora tenham se desenvolvido inde-
texto associados por operações textualizadoras capazes pendentemente, oferecem, de seus planos
de garantir o princípio da continuidade (processos de li-
gação). (ADAM, 2008)

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próprios de análise e metodologia, princí- Fica claro que são da LT as funções de


pios que podem ser articuladas para uma descrever as formas de articulação e os me-
análise textual dos discursos. Assim, um canismos de organização da textualidade e
dos fundamentos básicos para Jean-Michel a ela cabe o papel, na análise de discurso, de
Adam (2008) em sua proposta teórica será teorizar e descrever os encadeamentos de
considerar, tanto para uma definição de enunciados elementares no âmbito da unida-
objeto (o texto) como para um empreendi- de de grande complexidade que constitui um
mento metodológico de análise deste obje- texto (ADAM, 2008). Numa relação com essa
to, que a Linguística Textual e a Análise do perspectiva é que Adam organiza a ATD em
Discurso se articulam. A ideia é que dessas níveis de análise textual. Como apresentado
duas linhas teóricas possam ser fornecidas em Passeggi (2010), os principais níveis de
condições para dar ao texto um tratamento análise propostos por Adam para uma ATD
condizente com a organização sequencial podem ser assim resumidos:
que, por sua vez, será inseparável da organi-
a) Um nível sequencial-composicional,
zação configuracional-pragmática, já que são correspondente à própria estruturação
“dois princípios tão complementares quanto linear do texto;
repetição, ligação e segmentação”. (ADAM, b) Um nível enunciativo, baseado na no-
2010, p. 10. Grifos do autor). ção de responsabilidade enunciativa
Tendo por base tal especificação, Adam (PdV);
(2008) afirma que o texto não se dissocia do c) Um nível semântico, apoiado na noção
discurso por compreender que à materialida- de representação discursiva (Rd);
de linguística se integram os efeitos advindos d) Um nível argumentativo correspon-
de condições socioculturais, políticas e histó- dente aos atos de discurso realizados
ricas que em muito orientam a estruturação no texto e que exprimem uma orien-
que se apresenta na organização textual. A tação argumentativa (Oarg).
partir daí, o esforço do autor é demonstrar
Esses níveis são organizados na teoria
quais aportes teóricos tanto da Linguística
da ATD em duas dimensões: a dimensão se-
Textual (LT) quanto da Análise do Discurso
quencial (correspondente ao item a) e a di-
(AD) podem compor a análise textual dos
mensão configuracional ou pragmática (cor-
discursos (ATD). Por isso, na sua visão, será
respondente aos itens b, c e d). Cada uma das
necessário considerar que:
dimensões tem participação na textualização
Postulando, ao mesmo tempo, uma se- e é descrita na teoria de Adam por seus ele-
paração e uma complementaridade das mentos constituintes além da forma como se
tarefas e dos objetos da linguística tex- organizam na composição de unidades mais
tual e da análise do discurso, definimos complexas.
a linguística textual como um subdo-
A textualização, que sustenta um discur-
mínio do campo mais vasto da análise
das práticas discursivas. (ADAM, 2008,
so materialmente falando, se deve aos com-
p. 43). ponentes inerentes à situação de produção

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que lhe é externa, porém, pertinente. Forças o preceito de texto como todo organizado de
internas ao texto (campo teórico da LT) e sentido só poderá ocorrer tendo em vista o
forças externas a ele (práticas discursivas) leitor/ouvinte para o qual se projeta ações de
são reguladoras na constituição estrutural do textualidade.
texto e ambas devem ser consideradas como Ao descrever o campo de trabalho da
bases para uma análise textual. Adam (2010, LT, Adam justifica o estabelecimento de um
p. 97), fazendo referência ao fato de que texto campo de análise (textual) responsável pela
e contexto são campos em associação diz que: descrição e pela definição das diferentes uni-
dades textuais bem como das operações em
[...] todo texto é, por definição, um
campo de forças centrífugas (dados ex-
todos os níveis de complexidade realizadas
ternos que vão da intertextualidade às sobre os enunciados e, dessa forma, a tex-
condições materiais e sócio-históricas tualização se constitui como um processo
de produção, passando pela identidade a partir do qual o texto se estabelece como
do orador encenada na enunciação e unidade de sentido, pois segundo o autor:
nas escolhas relativas ao gênero) e de
forças centrípetas que garantem a uni- É contra essa visão fixista da
dade do texto e sua dinâmica interna. textualidade que trabalha a análise
(ADAM, 2008, p. 97. Grifos do autor) textual dos discursos, questionando
as próprias fronteiras da textualidade
Com o objetivo de associar à análise do (peritextualidade) e a ideia de um exte-
texto os efeitos de uma perspectiva discur- rior (contexto) que se oporia ao seu in-
siva (que atua tanto para a formação quanto terior (fechamento estrutural). (ADAM,
2008, p. 73)
para a depreensão de sentidos), Adam con-
sidera justificável (e necessário) pensar em Adam (1992, 2008) considera que a cons-
uma teoria de “produção co(n)textual de sen- tituição do texto deve ser compreendida por
tido, que deve fundar-se na análise de textos sua complexidade e heterogeneidade e ad-
concretos”. (ADAM, 2008,p.23). mite que os vários planos acionados no pro-
Metodologicamente, o autor elege o es- cesso de textualização, lembrando que dois
tudo das regularidades pertinentes ao campo campos agem nessa organização: o textual e
da análise textual (por conseguinte da LT), o discursivo.
mas sempre salienta que é preciso reconhe-
cer que o texto não pode deixar de estabelecer
A representação discursiva
conexão com o contexto em que foi produ-
zido. Seria o mesmo que dizer que palavras, Uma proposição-enunciado está asso-
enunciados, sequências não se apresentam ciada a um valor enunciativo que leva a certa
numa relação com elas mesmas. Tais compo- interpretação. A responsabilidade enunciati-
nentes estão “significando” porque se subme- va que caracteriza esta dimensão correspon-
tem a processos de textualização perpassa- de ao ponto de vista (PdV) a partir do qual
dos por um discurso que os sustenta. Assim, damos conta das possíveis interpretações. É

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aqui que encontramos os sinais ou as marcas representa a relação entre as três dimensões
através das quais o locutor se posiciona em complementares de toda proposição enun-
relação ao conteúdo referencial [A]3 . ciada e é apresentado por Adam (2008) como
É da relação entre a proposição enun- forma de resumir sua a discussão a respeito
ciada [A] (um dito) com um ponto de vista da construção de uma proposição-enuncia-
[B] (um dizer) que derivam os valores ar- do. Eis o esquema sobre o valor enunciativo
gumentativos [C1] e os atos ilocucionários subjacente ao enunciado:
[C2] dos enunciados. O esquema a seguir4

Figura 1 - esquema da representação de proposição-enunciado como microunidade enunciativa


Responsabilidade enunciativa
da proposição
Ponto de vista [PdV]
B

Proposição-
enunciado
Representação Valor ilocucionário
A Resultante das
discursiva [Rd]: Proposição-
Construída a partir do enunciado potencialidades
conteúdo proposicional argumentativas dos
A C enunciados [Oarg]

Fonte: ADAM, 2008, p. 111.

Assim como o autor, salientamos que


3
A sequência argumentativa
a disposição dos elementos não representa
A fim de tratarmos o texto como conjun-
nenhuma hierarquia. A disposição assim
to de ações advindas dos processamentos dis-
apresentada situa [A] e [C] na mesma linha
cursivos e estruturantes, transitamos, agora,
correspondendo à codificação da pragmáti-
por uma camada de natureza organizacional:
ca para os atos do discurso, pois para todo
a unidade chamada sequência textual.
enunciado [A] há uma força ilocucionária [C],
mediados pela enunciação [B].
4
A seguir, apresentamos o texto que nos
permitirá ilustrar um pouco dos princípios
teóricos apontados por Jean-Michel Adam.
presentação gráfica do esquema. Aqui, optamos por
manter as disposições explicativas para cada ângulo do
3
Seguimos, aqui, as convenções propostas por Adam. triângulo e alteramos a ordem das letras A e B. Com isso,
4
A edição consultada para este trabalho apresenta uma a letra B, neste trabalho, ocupa o espaço da letra A da edi-
inconsistência entre o texto explicativo do autor e a re- ção consultada.

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Quando Adam (192, 2008) demonstra o original quanto a complementação de Adam


processo argumentativo, ele retoma o mode- representam uma célula argumentativa, a
lo de Toulmin (2006) e acrescenta um lugar saber:
para a contra-argumentação. Tanto o modelo

Figura 2 - Esquema da sequência argumentativa baseado em Adam (2008)

Tese Dados
Por isso,
anterior + Fatos
provavelmente
Conclusão
P.arg.0 P.arg.1 (Nova tese)
P.arg.3

Apoio
(Princípios de Restrição
base) (a menos que)
P.arg.2 P.arg.4

Fonte: Adam (2008, p. 234)

Em termos de ação argumentativa o Segundo Adam (1992), o processo arran-


que se visa é intervir nas opiniões, atitudes ja-se a partir de uma unidade de base (dado-
ou comportamentos do interlocutor ou audi- -conclusão) e o movimento (lei de passagem
tório (ADAM, 1992). O esquema prototípico ou licença para inferir) com que se garan-
desta ação prevê uma combinação formada te essa relação advém de procedimentos
na relação dado-conclusão, evidenciando um argumentativos (espaço das justificativas:
processo em dois movimentos: encadeamento de argumentos-provas, mi-
crocadeias de argumentos ou movimentos
Demonstrar-justificar uma tese e re-
futar uma tese ou certos argumentos
argumentativos encaixados), valendo, na
de uma tese adversa. Nos dois casos, o mesma medida para a refutação, caso em
movimento é o mesmo, pois se trata de que a tese que está sendo defendida (ou tese
partir de premissas (dados, fatos) que anterior) pode sofrer restrições.
não se poderia admitir sem admitir
também esta ou aquela conclusão-as-
Um caso ilustrativo
serção (C). Entre os dois, a passagem
está garantida pelos procedimentos ar- A versão apresentada deste texto foi
gumentativos que tomam a forma de publicada pelo jornal O Globo no dia 23 de
encadeamentos de argumentos-provas outubro de 2000, segundo aquela edição,
que correspondem aos suportes de
tratava-se de um texto transcrito por Kleuber
uma lei de passagem ou a microcadeias
de argumentos, ou movimentos argu-
Matta, já que originalmente o texto teria sido
mentativos encaixados. (ADAM, 1992, pronunciado oralmente.
p. 232, grifos do autor)

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Como bem ressalta Cristovam, o fato (Cristovam Buarque, que chamaremos de


de o debatedor (chamaremos de enunciador enunciador 2 – E2), aceitando a condição com
1 – E1) traçar a ótica através da qual ele de- que deveria responder à pergunta, segue ar-
veria proferir sua resposta criou um relevo gumentando de modo a não perder de vista a
curioso, no sentido de condicionar a respos- proposta feita (responder como humanista e
ta, o raciocínio. Então, a partir daí, o locutor não como brasileiro). Segue o texto:

O MUNDO PARA TODOS

Cristovam Buarque
O Globo, Opinião, 23/10/2000

[1] Durante debate recente, nos Estados Unidos, fui questionado sobre o que pensava da
internacionalização da Amazônia. O jovem introduziu sua pergunta dizendo que esperava
a resposta de um humanista e não de um brasileiro. Foi a primeira vez que um debatedor
determinou a ótica humanista como o ponto de partida para uma resposta minha.
[2] De fato, como brasileiro eu simplesmente falaria contra a internacionalização da
Amazônia. Por mais que nossos governos não tenham o devido cuidado com esse patrimô-
nio, ele é nosso. Respondi que, como humanista, sentindo o risco da degradação ambiental
que sofre a Amazônia, podia imaginar a sua internacionalização, como também de tudo o
mais que tem importância para a Humanidade. Se a Amazônia, sob uma ótica humanista,
deve ser internacionalizada, internacionalizemos também as reservas de petróleo do mundo
inteiro. O petróleo é tão importante para o bem-estar da humanidade quanto a Amazônia
para o nosso futuro. Apesar disso, os donos das reservas sentem-se no direito de aumentar
ou diminuir a extração de petróleo e subir ou não o seu preço. Os ricos do mundo, no direito
de queimar esse imenso patrimônio da Humanidade.
[3] Da mesma forma, o capital financeiro dos países ricos deveria ser internacionaliza-
do. Se a Amazônia é uma reserva para todos os seres humanos, ela não pode ser queimada
pela vontade de um dono, ou de um país. Queimar a Amazônia é tão grave quanto o desem-
prego provocado pelas decisões arbitrárias dos especuladores globais. Não podemos deixar
que as reservas financeiras sirvam para queimar países inteiros na volúpia da especulação.
[4] Antes mesmo da Amazônia, eu gostaria de ver a internacionalização de todos os
grandes museus do mundo. O Louvre não deve pertencer apenas à França. Cada museu do
mundo é guardião das mais belas peças produzidas pelo gênio humano. Não se pode deixar
que esse patrimônio cultural, como o patrimônio natural amazônico, seja manipulado e
destruído pelo gosto de um proprietário ou de um país. Não faz muito, um milionário japo-
nês decidiu enterrar com ele um quadro de um grande mestre. Antes disso, aquele quadro
deveria ter sido internacionalizado.

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[5] Durante o encontro em que recebi a pergunta, as Nações Unidas reuniam o Fórum
do Milênio, mas alguns presidentes de países tiveram dificuldades em comparecer por
constrangimentos na fronteira dos EUA. Por isso, eu disse que Nova York, como sede das
Nações Unidas, deveria ser internacionalizada. Pelo menos Manhattan deveria pertencer
a toda a Humanidade. Assim como Paris, Veneza, Roma, Londres, Rio de Janeiro, Brasília,
Recife, cada cidade, com sua beleza específica, sua história do mundo, deveria pertencer
ao mundo inteiro.
[6] Se os EUA querem internacionalizar a Amazônia, pelo risco de deixá-la nas mãos
de brasileiros, internacionalizemos todos os arsenais nucleares dos EUA. Até porque eles já
demonstraram que são capazes de usar essas armas, provocando uma destruição milhares
de vezes maior do que as lamentáveis queimadas feitas nas florestas do Brasil. Nos seus de-
bates, os atuais candidatos à presidência dos EUA têm defendido a ideia de internacionalizar
as reservas florestais do mundo em troca da dívida. Comecemos usando essa dívida para
garantir que cada criança do mundo tenha possibilidade de ir à escola. Internacionalizemos
as crianças tratando-as, todas elas, não importando o país onde nasceram, como patrimônio
que merece cuidados do mundo inteiro. Ainda mais do que merece a Amazônia.
[7] Quando os dirigentes tratarem as crianças pobres do mundo como um patrimô-
nio da Humanidade, eles não deixarão que elas trabalhem quando deveriam estudar; que
morram quando deveriam viver. Como humanista, aceito defender a internacionalização
do mundo. Mas, enquanto o mundo me tratar como brasileiro, lutarei para que a Amazônia
seja nossa. Só nossa.

Deste texto, gostaríamos de destacar um acordo, ao qual E2, dialogicamente, aco-


que a voz que questiona Cristovam Buarque lhe em seu discurso.
representa a voz de um grupo para o qual a Interessante observar que, neste caso,
Amazônia deve ser internacionalizada por há um cenário predefinido para o debate,
duas razões principais: por se tratar da maior qual seja: o de que Cristovam assumir a voz
área verde biodiversificada do planeta e por de uma humanista e não de sua situação nata
não ser preservada pelo governo brasileiro de brasileiro. A proposta de que E2 argu-
com o cuidado e a legislação necessário. mente segundo um humanista, previne que
Consideramos que um dos pontos-cha- argumentação recaia explicitamente sobre
ve para o debate é perspectivar um ponto de a defesa do ponto de vista brasileiro como
vista controverso, questão essencial para a bem mostra o enunciado: “De fato, como
construção argumentativa do texto. A solici- brasileiro eu simplesmente falaria contra a
tação por parte de E1 de que a resposta seja internacionalização da Amazônia.”.
enunciada por um ponto de vista específico Podemos considerar que a voz
(humanista e não brasileiro) consubstancia que aponta para a conveniência em se

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internacionalizar a Amazônia está subjacen- (inferido) que representa o ponto de vista de


te à proposta de E1 que questiona E2, delineia que a Amazônia deve ser internacionalizada,
uma tese anterior, sobre a qual E2 precisa podemos sugerir a seguinte representação:
contra-argumentar. Tomando o enunciado

Figura 3 - esquema representativo da perspectiva enunciativa de E1 – a favor da internacionalização


da Amazônia

O governo brasileiro é irresponsável


no cuidado com a mata.
A Amazônia é o pulmão do mundo.
B

Proposição-
enunciado C1 = OArg: A Amazônia
é um patrimônio natural
A para toda a humanidade,
Proposição- logo não deve ficar
enunciado apenas nas “mãos” dos
(Seja humanista) brasileiros. (se p então q)
A Amazônia deve ser A C
internacionalizada C2 = Força ilocucionária:
intimidação, ordem

baseado em ADAM, 2008, p. 111

Já [E2] enuncia, através de uma rede ar- fugindo do previsível (de que, como brasi-
ticulada de proposições-enunciados, o pon- leiro, certamente E2 diria que a Amazônia
to de vista a respeito da internacionalização é nossa).
da Amazônia, supondo-se humanista, numa Os argumentos são construídos de
contra-argumentação. modo que se sustente uma relação tensio-
Observando o que se apresenta no nada entre o ponto de vista humanista e o
discurso de E2, vemos que a defesa é para ponto de vista de ser brasileiro a respeito
que a Amazônia seja nossa. O percurso pelo do tema internacionalização da Amazônia.
qual se chega a esta defesa, no entanto, não Destas sequências, destacamos o seguinte
é tão direta como imaginaria E1, porquanto enunciado-argumento: “Se a Amazônia, sob
se tece uma rede de contra-argumentos em uma ótica humanista, deve ser internacio-
relação à tese de que a Amazônia precisa ser nalizada, internacionalizemos também as
internacionalizada. Assim, faz-se presente reservas de petróleo do mundo inteiro”.
no texto um conjunto de sequencias argu- A construção argumentativa resultante
mentativas que formam a resposta de E2, é a de que não se justifica a internacionali-
zação da Amazônia pelo ponto de vista de

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que seu “potencial verde” faz parte da hu- Exercitando uma vez mais a aplicabili-
manidade. Se outros patrimônios, também dade do que propõe Adam (2008), propomos
importantes para a humanidade não são in- uma visualização do segmento acima, tecen-
ternacionalizados, portanto, nessa configu- do, assim, a seguinte disposição:
ração, o que respalda a internacionalização
da Amazônia?

Figura 4 - esquema representativo da perspectiva enunciativa de E2


PdV-E2
A Amazônia não é o único bem
universal.
B

C1: legitimar a
Proposição- internacionalização da
“Como humanista aceito enunciado Amazônia é, na mesma
defender a internacionalização medida (e consequência)
do mundo. Mas, enquanto o A internacionalizar outros
Proposição-
mundo me tratar como enunciado patrimônios universais.
brasileiro, lutarei para que a
Amazônia seja nossa. Só A C C2: negociação
nossa”

baseado em ADAM, 2008, p. 111

Observemos que a orientação argu- observar, também, que E2 se propõe a cons-


mentativa de E1 refuta a orientação argu- truir, através das sequências argumentativas,
mentativa de E2. Ambos constroem o mes- a refutação da condição imposta na pergun-
mo esquema lógico (se p então q), o que não ta, ou seja, ele (o povo) enquanto brasileiro,
significa que as orientações argumentativas, não usufrui de nenhum benefício que tenha
fator este que leva à identificação de repre- sido destinado pela mesma lógica com a qual
sentações discursivas particulares para cada ele teve que raciocinar sobre a internacionali-
enunciador, sejam pautados por pontos de zação da Amazônia e assim ele conclui: “Mas
vista opostos sobre o mesmo problema. enquanto o mundo me tratar como brasilei-
O locutor que responde à questão (E2) ro, lutarei para que a Amazônia seja nossa.
reconhece as condições com que deve se pro- Só nossa.”
nunciar a respeito da internacionalização Até o momento consideramos ape-
da Amazônia. Além disso, percebe a lógica nas alguns enunciados, mas devemos es-
embutida na pergunta e a usa em favor da clarecer que uma análise textual se cons-
construção de seus argumentos. Interessante trói a partir de redes de conexão entre

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proposições-enunciados e aí, torna-se ne- A concepção de sequência apresentada


cessário considerar outro princípio orien- por Adam considera ainda que, conforme
tador: o de que “passamos da série de pro- a combinação com a qual se estruturam as
posições-enunciados ao seu agrupamento macroproposições se obtém formatações que
semântico em unidades textuais de níveis podem ser narrativas, argumentativas, expli-
crescentes de complexidade” (ADAM, 2008, cativas, dialogais e descritivas organizadas
p. 203). Segundo o autor, é neste nível que de modo tipificado, ou seja, hierarquicamen-
a linguística textual se dissocia da gramáti- te organizadas.
ca transfrasal, uma vez que o todo textual é À medida que identificamos a premissa
muito mais que uma combinatória seriada e de que a Amazônia deve ser considerada um
depende de configurações mais complexas bem universal e, por isso, deve ser interna-
das unidades. Ainda, segundo Adam: cionalizada, observamos que o discurso de E2
contra-argumenta, tendo como suporte um
As sequências são unidades textuais
complexas, compostas de um número
princípio de equidade sobre a importância
limitado de conjuntos de proposições- da Amazônia e outros bens da humanidade.
enunciados: as macroproposições. A O que se compõe aí é um movimento tipica-
macroproposição é uma espécie de mente argumentativo, ou seja, há um conjun-
período cuja propriedade principal é to de justificativas que sustenta a tese, então,
a de ser uma unidade ligada a outras defendida por Cristovam Buarque (E2), que
macroproposições, ocupando posições parte de uma tese anterior cujo princípio de
precisas dentro do todo ordenado das base é a importância universal da Amazônia.
sequencias. Cada macroproposição
Consideremos o seguinte argumento:
adquire seu sentido em relação
às outras, na unidade hierárquica
“De fato, como brasileiro eu simplesmen-
complexa da sequencia. Nesse aspecto, te falaria contra a internacionalização da
uma sequência é uma estrutura, isto é: Amazônia. Por mais que nossos governos
• Uma rede relacional hierárquica: uma não tenham o devido cuidado com esse pa-
grandeza analisável em partes liga- trimônio, ele é nosso. Respondi que, como
das entre si e ligadas ao todo que elas humanista, sentindo o risco da degradação
constituem. ambiental que sofre a Amazônia, podia ima-
• Uma entidade relativamente autôno- ginar a sua internacionalização, como tam-
ma, dotada de uma organização inter- bém de tudo o mais que tem importância
na que lhe é própria, e, portanto numa para a Humanidade.”
relação de dependência-independên- Se aplicarmos ao texto um esquema
cia com o conjunto mais amplo do
com base em Adam (2008), podemos ter a
qual faz parte (o texto). (ADAM, 2008,
seguinte configuração:
p. 204. Grifos do autor)

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Representação discursiva e sequência argumentativa: dimensões de uma análise textual

Figura 5 - esquema argumentativo com base no texto “O mundo para todos”


ESQUEMA ARGUMENTATIVO
Refutação da
tese anterior

“Eu simplesmente falaria contra a


PdV internacionalização da Amazônia.
como Por mais que nossos governos não
Amazônia é nossa
brasileiro tenham o devido cuidado com esse
Tese anterior patrimônio, ele é nosso.”

Internacionalização “Sentindo o risco da degradação


Amazônia e tudo o mais
da Amazônia ambiental que sofre a Amazônia,
PdV que tem importância
como podia imaginar a sua para a humanidade deve
humanista internacionalização, como também de ser internacionalizado
tudo o mais que tem importância para
a Humanidade.”

Conclusão
Justificativas Nova tese
(argumentos)

Podemos entender que um arranjo mundo). Os argumentos assim apresentados


assim composto caracteriza uma macro- são pautados em valor hipotético, através do
proposição, constituída por proposições qual se deduz que o mundo não está nem po-
argumentativas. liticamente nem eticamente preparado para
Na composição acima, entendemos que tratar da internacionalização da Amazônia.
o locutor exercita dois raciocínios. O primei- Assim, o argumento final (de que o mundo
ro assumindo a posição de brasileiro e a outra o trata como brasileiro e por isso ele defen-
como humanista. Aceitando a condição do da que a Amazônia seja nossa) introduz uma
questionador (E1), o locutor (E2) fideliza-se nova realidade, ou seja, se antes o posto era
com a proposta e atrai a atenção para sua de que o mundo precisa da Amazônia, com a
argumentação. rede de argumentos exposta no texto, a cada
Esse procedimento cria uma padrão parágrafo, fica legitimado que o mundo pre-
na forma de construir o argumento a partir cisa da Amazônia e muito mais.
do raciocínio: internacionalizar a Amazônia
desde que se internacionalizem também ou- Plano de texto
tros patrimônios importantes para a humani-
dade (reserva de petróleo, capital financeiro, As sequências argumentativas do texto
grandes museus do mundo, cidades históri- têm um relevo mais ou menos semelhante,
cas, arsenais nucleares, crianças pobres do ou seja, é possível verificar que a sequência

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que estrutura boa parte dos períodos corres- mais cuidadoso e pormenorizado, optamos,
ponde a orações que combinam o SE (hipo- por uma questão de espaço, resumir num
tético) A então B (condicionamentos) Ainda plano de texto a constituição argumentati-
que cada uma delas mereça um tratamento va do texto.

Figura 6 - esquema do plano de texto de “O mundo para todos”

“Roteiro” de como será


Contextualização Sequência
Dinâmica a argumentação. Encerramento
Exposição da argumentativa
interna ao Dá forma aos discursos Final
pergunta e (eixo das
discurso subsequentes
condicionamento hipóteses) [7]
(prepara o auditório)
da resposta. [3-7]
[2]
[1]

Política internacional (inexistente) de Crianças pobres é o


Dinâmica
reconhecimento e distribuição de Domínios e destaque desta
externa ao
riquezas e, ainda: subjaz a denúncia de especulações sequência. Eis aí razão
discurso
desigualdade entre países ricos X países dos países ricos. legítima para agirmos
(Análise do
pobres de forma humanista.
discurso)

Reforçando o foco a sobre construção de vista do locutor. Ainda mais, indica a res-
discursiva do texto, podemos salientar que o ponsabilidade enunciativa derivada do acor-
discurso contém modalizações estabelecidas do que se estabelece na abertura do debate.
pelo futuro do pretérito. Esta modalização A título de exemplificação destacamos
não deixa de estar relacionada com o univer- alguns modalizadores:
so de sentido e certamente indica um ponto

Tabela 1 - exemplos de modalizadores presentes em “O mundo para todos”


continua
ENUNCIADOS OArg Responsabilidade enunciativa
“SE a Amazônia, sob uma
ótica humanista, deve
ser internacionalizada,
internacionalizemos também as
reservas de petróleo do mundo SE com valor condicionador Posto como condição, o ônus
inteiro.” da responsabilidade de pensar
(está dentro da proposta
como humanista retorna para
“SE os EUA querem hipotética sugerida pelo
o questionador (e a voz que ele
internacionalizar a Amazônia, locutor)
representa)
pelo risco de deixá-la
nas mãos de brasileiros,
internacionalizemos todos os
arsenais nucleares dos EUA.”

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Tabela 1 - exemplos de modalizadores presentes em “O mundo para todos”


conclusão

ENUNCIADOS OArg Responsabilidade enunciativa


Na sequência enumerada de
Há uma refutação da ideia
bens universais, o conectivo DA
“DA MESMA FORMA, o capital de que a Amazônia é o único
MESMA FORMA demonstra
financeiro dos países ricos patrimônio que merece uma
que tanto um como outro item
deveria ser internacionalizado.” discussão a cerca do processo
da enumeração devem receber
de internacionalização.
o mesmo tratamento
O locutor sugere que há
“ANTES MESMO da Antes de uma discussão sobre a
negligência quanto ao valor
Amazônia, eu gostaria de ver a Amazônia, na visão do locutor,
que outros bens universais
internacionalização de todos os os museus já poderiam ter sido
representam para a
grandes museus do mundo.” alvo de internacionalização
humanidade
Aponta para a
responsabilidade de países Embora o locutor queira
que devem à humanidade chamar a atenção (além de
“DEVERIA”
a internacionalização de embutir uma crítica), mantém-
patrimônios mais importantes se distanciado
para o bem comum

Esta última exposição tem como pro- análise textual dos discursos (2208). O au-
pósito ilustrar, a partir do texto em análise, tor parte de uma discussão que remonta a
o “processamento enunciativo” do texto que abordagens originárias sobre o valor do texto
tem como propósito comunicativo, argu- como objeto de estudo e segue com a delimi-
mentar a respeito da internacionalização da tação das unidades que devem ser dimensio-
Amazônia. nadas numa análise textual.
Nosso recorte teve como objetivo apre-
Conclusão sentar dois itens basilares da teoria proposta
de Adam e por isso destacamos a noção de
Propomos uma pequena análise textual proposição-enunciado. Entendemos que,
com base nos princípios da representação falando de proposição-enunciado eviden-
discursiva e sequência argumentativa. ciamos que o texto é constituído de unida-
Evidentemente esses dois aspectos des organizadas para comporem unidades
estão inseridos entre outras discussões as maiores.
quais, em boa parte, revelam uma ordem e Entendemos que uma organização ar-
uma metodologia com a qual Adam distribui gumentativa e um ponto de vista sejam ele-
os aspectos teóricos apresentados por ele em mentos que perpassam tanto uma dimensão
sua obra A Linguística Textual: introdução à (o da unidade) quanto outra (dos arranjos das

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A proposta de analisar textos de opinião, da conversação: panorama das pesquisas no
tendo como aporte teórico as concepções de Brasil. São Paulo: Cortez, 2010.p. 262-314.
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gumentativa, permitiu evidenciar a tese de Paulo: Martins Fontes, 2006.
que o aparato textual está indissociavelmente TRASK, R. L. Dicionário de linguagem e
atrelado a questões discursivas. linguística. São Paulo: Contexto. 2011.
SASSERON, L. H.; CARVALHO, A. M. P. Uma
Referências análise de referências teóricas sobre a estrutura
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récit, descirption, argumentation, esplication Horizonte, v.13, p. 243-262, 2011.
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