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WELINGTON JUNIOR JORGE

ALINE EVELIN FABRÍCIO DE MACEDO


Organizadores

POSSIBILIDADES E DESAFIOS DA EDUCAÇÃO NO SÉCULO XXI

Maringá – Paraná
2019
2019 Uniedusul Editora

Copyright da Uniedusul Editora


Editor Chefe: Profº Me. Welington Junior Jorge
Diagramação e Edição de Arte: André Oliveira Vaz
Revisão: Os autores

Conselho Editorial
Alexandra Fante Nishiyama – Faculdade Maringá
Aline Rodrigues Alves Rocha – Pesquisadora
Ana Lúcia da Silva – UEM
André Dias Martins – Faculdade Cidade Verde
Brenda Zarelli Gatti – Pesquisadora
Carlos Antonio dos Santos – Pesquisador
Cleverson Gonçalves dos Santos – UTFPR
Constanza Pujals – Uningá
Delton Aparecido Felipe – UEM
Fabio Branches Xavier – Uningá
Fábio Oliveira Vaz – Unifatecie
Gilmara Belmiro da Silva – UNESPAR
João Paulo Baliscei – UEM
Kelly Jackelini Jorge – UNIOESTE
Larissa Ciupa – Uningá
Lourival Domingos Zamuner – UNINGÁ
Marcio Antonio Jorge da Silva – UEL
Márcio de Oliveira – UFAM
Pâmela Vicentini Faeti – UNIR/RM
Ricardo Bortolo Vieira – UFPR
Rodrigo Gaspar de Almeida – Pesquisador
Sâmilo Takara – UNIR/RM

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autores.

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nenhuma forma ou utilizá-la para fins comerciais.
www.uniedusul.com.br
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1......................................................................................................................................6
ALFABETIZAÇÃO FINANCEIRA: OS CINCO PILARES DA FORMAÇÃO DO CONHECIMENTO
E COMPORTAMENTO FINANCEIROS
EDUARDO WARTCHOW
ROBERTA DALL AGNESE DA COSTA
CARINE GELTRUDES WEBBER

CAPÍTULO 2....................................................................................................................................25
CONCEPÇÕES DA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM
ALISANDRA APARECIDA FRESE FAGUNDES
DIEGO DA SILVA

CAPÍTULO 3....................................................................................................................................36
CONCEPÇÕES SOBRE ALFABETIZAÇÃO NAS PRÁTICAS ESCOLARES
GERSI PEREIRA LOPES
DIEGO DA SILVA

CAPÍTULO 4....................................................................................................................................46
DESENVOLVIMENTO DE JOGOS DIGITAIS: O USO DO SCRATCH COMO FERRAMENTA DE
ENSINO DE MATEMÁTICA
JHONNY NUNES DA CUNHA
RODRIGO MIYASAKI

CAPÍTULO 5....................................................................................................................................55
DIFICULDADES NA GESTÃO DE ESCOLAS PÚBLICAS: UM ESTUDO DE CASO EM CURITIBA-
PR
VIVIEN KANIAK
ANANDA SINGH
RAQUEL MOMM
ADRIANA ROSELI WÜNSCH TAKAHASHI

CAPÍTULO 6....................................................................................................................................68
EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NO BRASIL: INICIATIVAS, MOTIVAÇÕES E PRERROGATIVAS
LEGAIS
ANA PAULA DE SOUZA SANTOS
CLÉBER SANTOS GONÇALVES
MARIA LUÍSA FURLAN COSTA
WELINGTON JÚNIOR JORGE

CAPÍTULO 7....................................................................................................................................77
INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E ENSINO: USO DAS GEOTECNOLOGIAS NO ESTUDO DO
ESPAÇO GEOGRÁFICO
MARCIO SILVEIRA NASCIMENTO

CAPÍTULO 8....................................................................................................................................83
NEGRO E O CONTEXTO ESCOLAR: DESAFIOS
CARLOS THIAGO CRUZ DA SILVA
ODINO FERREIRA NETO
THOMAS ANDREW HOLMES GOODMAN
CAPÍTULO 9....................................................................................................................................96
OS DESAFIOS DA PROFISSÃO DOCENTE PARA O PROFESSOR NO SÉCULO XXI, NA
MODALIDADE DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA. UM ESTUDO DE CASO NOS CURSOS
TÉCNICOS, EIXO TECNOLÓGICO GESTÃO E NEGÓCIOS NA REGIÃO DO VALE DO RIO DOS
SINOS
DIANA RAQUEL SCHNEIDER GOTTSCHALCK
GISELLY SANTOS MENDES
.
CAPÍTULO 10 ............................................................................................................................... 111
PERCEPÇÕES E PRÁTICAS DE PROFESSORES DOS ANOS INICIAIS SOBRE O ENSINO E
APRENDIZAGEM DE GEOGRAFIA NO CONTEXTO DA BNCC
ROBERTA DALL AGNESE DA COSTA
GRAZIANE SILVEIRA DUTRA
KAOANE DA SILVA FEITEN
KELLY DA SILVA MATIELLO
LAIANE MOSCHEN BRANCO
LARISSA MORAES DOS SANTOS
LUANA ANTONIOLI
SIMONE MORAES DA SILVA
SUÉLEN FORTUNA
VERÔNICA DOS SANTOS MARTINS
.
CAPÍTULO 11................................................................................................................................125
POLÍTICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NO ENSINO SUPERIOR: DESAFIOS A SEREM
SUPERADOS
RAUL DA SILVEIRA SANTOS
GEISA BRUNA MOURA FERREIRA
FRANCISCO PEREIRA DE OLIVEIRA
ADRIANE BEATRIZ LIMA DE SOUZA
RAQUEL AMORIM DOS SANTOS
ROGÉRIO ANDRADE MACIEL
.
CAPÍTULO 12 ...............................................................................................................................136
POSSIBILIDADE DE MELHORIA PARA A DOCÊNCIA NO ENSINO SUPERIOR: SEMINÁRIOS
COMO FERRAMENTA FACILITADORA
ERICA ROBERTA LOVO ROCHA WATANABE
MATHEUS LOPES DEMITO
PRISCILA DOS SANTOS GASCHI LEITE
SIMONE DELEZUK INGLEZ
.
CAPÍTULO 13 ...............................................................................................................................145
BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A HISTÓRIA DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
VIVIANE RIEDNER
LEONNE BRUNO DOMINGUES ALVES
JAIRO DOS SANTOS RODRIGUES
VICTOR DA CRUZ PERES
CÁSSIO FURTADO LIMA
CAPÍTULO 1
ALFABETIZAÇÃO FINANCEIRA: OS CINCO
PILARES DA FORMAÇÃO DO CONHECIMENTO E
COMPORTAMENTO FINANCEIROS

EDUARDO WARTCHOW FINANCIAL LITERACY: THE FIVE PIL-


Universidade de Caxias do Sul
LARS OF THE TRAINING OF FINANCIAL
ROBERTA DALL AGNESE DA COSTA KNOWLEDGE AND BEHAVIOR
Universidade de Caxias do Sul
CARINE GELTRUDES WEBBER
Universidade de Caxias do Sul
ABSTRACT: Financial Literacy comprises a
body of finance knowledge that can lead an in-
RESUMO: A Alfabetização Financeira com-
preende um conjunto de conhecimentos sobre dividual to better financial decisions. Education-
finanças que pode conduzir um indivíduo a me- al processes have been considered as a way to
lhores decisões financeiras. Os processos edu- make individuals literate financially, so that they
cacionais têm sido considerados uma forma de achieve balance in their financial lives. In this
tornar os indivíduos alfabetizados financeira-
mente, para que atinjam equilíbrio em suas vi- context, it is understood that Financial Educa-
das financeiras. Neste contexto, entende-se que tion is a complex subject to be developed ped-
a Educação Financeira é um tema complexo a agogically, as it involves cultural and behavioral
ser desenvolvido pedagogicamente, pois envolve
issues that go beyond the limits of a classroom.
questões culturais e comportamentais que ultra-
passam os limites de uma sala de aula. Diante Therefore, this paper proposed, as a dissertation
disso, este trabalho propôs, enquanto recorte de cut, from a bibliographical review, the pillars for
uma dissertação, a partir de revisão bibliográfica, financial literacy. Thus, the research focused pri-
os pilares para a alfabetização financeira. Assim,
a investigação se concentrou primeiramente em marily on the fundamentals that guide the process
elencar os fundamentos que norteiam o proces- of financial literacy, analyzing factors relevant to
so de alfabetização financeira, analisando fatores its scope. With this study it was possible to iden-
relevantes para seu alcance. Com este estudo foi tify and divide the formation of financial knowl-
possível identificar e dividir a formação do co-
nhecimento e comportamento financeiros em cin- edge and behavior in five pillars: mathematical
co pilares: técnica matemática, comportamento technique, intrapersonal behavior, or interperson-
intrapessoal, ou relação interpessoal, produtos e al relationship, financial products and concepts,
conceitos financeiros, compreensão e lógica eco-
understanding and economic logic.
nômica.

PALAVRAS-CHAVE: Alfabetização financei-


ra; conhecimento e informação financeira; cinco KEY WORDS: Financial Literacy; knowledge
pilares; economia. and financial information; five pillars; economy.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 6


1. INTRODUÇÃO

O tema Educação Financeira vem se tornando bastante presente ao longo dos últimos anos. O
estudo sobre a ela engloba tanto o processo de análise e reflexão sobre alternativas de consumo, ana-
lisado por Lindstrom (2009), assim como de alternativas de investimento e planejamento financeiro,
analisado por autores como Zaremba (2007) e Cerbasi (2009). Há portanto, um vasto campo de estu-
do onde pode-se buscar informações a respeito. Isto é relevante, visto que a relação com o dinheiro se
faz em todos os momentos na vida de um indivíduo.

Erros podem facilmente ser cometidos no momento que ele busca obter recursos financeiros,
ou quando realiza gastos por meio do consumo e ainda quando investe o excedente obtido ou busca
financiamento por ter gastos superiores às suas receitas. Portanto, informações financeiras são neces-
sárias ao longo de toda a vida de um indivíduo, para que ele possa tomar decisões corretas e melhores
para a sua vida.

Segundo Zaremba (2007), o caminho para uma vida confortável e plena de realizações de-
pende de muito trabalho, de uma boa qualificação profissional, da capacidade de conseguir uma boa
remuneração em seu ramo de atividade, de gastar com sabedoria os recursos ganhos, da capacidade
de acumular recursos continuamente, aliando a isso uma educação que permita a gestão dos recursos
que são acumulados. Observando-se, porém, as facilidades do crédito, o nível elevado de endivida-
mento das famílias, o aumento na oferta de alternativas de consumo e de investimento, percebe-se
que as informações que vêm sendo produzidas nesta área não estão tendo repercussão no cotidiano
das pessoas. A necessidade de transformar tais estudos em produtos que possam apoiar processos de
Educação Financeira é a principal motivação deste trabalho.

Um dos problemas que este trabalho procura evidenciar está relacionado com a complexidade
do tema Educação Financeira, tendo em vista que ele engloba diferentes aspectos técnicos e compor-
tamentais, os quais costumam ser abordados de forma independente. Tal visão compartimentada difi-
culta o alcance de uma compreensão global da Educação Financeira. Sem ela, o processo educacional
corre o risco de não contribuir para melhor preparar o indivíduo para tomadas de decisão apropriadas.

Além disso, a diversidade de pensamentos entre os principais autores da área contribui para
que não haja um consenso, uma visão unificada de como elaborar um projeto de Educação Finan-
ceira, até mesmo porque as pessoas são distintas em relação a níveis de conhecimento, preferências,
padrões socioculturais e econômicos.

Pensar a Educação Financeira envolve refletir sobre padrões de vida e de consumo. Este fato
fica evidenciado quando Zaremba (2007) menciona que é importante não confundir conforto com
luxo e, na medida do possível, o indivíduo deve ser racional nas suas decisões de consumo e estilo
de vida. Tal racionalidade é questionada por autores tais como Kahnemann (2012), que sustenta que
os seres humanos têm como preponderante o viés emocional na tomada de decisão. Portanto, mesmo
quando um indivíduo recebe uma instrução financeira, não há garantias que ele necessariamente fará
uso deste conhecimento.

Este trabalho considera que além da técnica e dos cálculos financeiros, devem receber atenção

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 7


o estudo sobre o comportamento humano e as finanças comportamentais, e observa referências de
autores da escola austríaca de economia, que tem na sua base a praxeologia, que representa a ação
humana por meio do comportamento propositado (HOPPE, 2010; MISES, 2010). Não há garantia de
que um aluno que receba instrução sobre questões financeiras em época escolar, e que depois passe a
lidar com seu orçamento, não vá cometer os mesmos erros que as pessoas sem tal instrução natural-
mente cometem. A ação humana é baseada em diferentes momentos, nos níveis de conhecimento que
cada pessoa possui, sendo impossível prever antecipadamente o nível que uma pessoa alcançará no
futuro (MISES, 2010).

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 EDUCAÇÃO FINANCEIRA

A criação de programas de Educação Financeira é vista como solução para mitigar problemas
financeiros que pessoas e famílias enfrentam (HUSTON, 2010), (BRUHN et al., 2013). É importante
trazer um outro conceito que se aproxima da Educação Financeira, o de Alfabetização Financeira,
sobre os quais há preocupação na diferenciação (DONADIO, CAMPANARIO e RANGEL, 2012),
(HUSTON, 2010).

Segundo Huston (2010), a Alfabetização vai além da Educação Financeira, pois engloba tanto
o entendimento, que representa o conhecimento financeiro pessoal, quanto a Educação Financeira
em si, como a sua utilização e a aplicação dos conhecimentos na gestão das finanças pessoais. Desta
forma, a Educação Financeira representa um caminho que junto do capital humano (representado
pelas aptidões pessoais, inteligência e experiências), possibilita alcançar a Alfabetização Financeira.
A partir disso é que a pessoa sujeita a diversas questões comportamentais particulares como autocon-
trole, planejamento e ambiente sociocultural entre outros, tomar decisões que a conduzam para um
bem-estar financeiro.

Fernandes, Lynch e Netemeyer (2014) definem a Alfabetização Financeira como o conhe-


cimento dos conceitos básicos de finanças pessoais relacionados a empréstimos/endividamentos, e
poupança/investimentos que conduzem para melhores tomadas de decisões financeiras para a vida.
Os indivíduos são considerados alfabetizados financeiramente se eles são competentes e se conse-
guem demonstrar que utilizaram o conhecimento que adquiriram. A alfabetização é obtida por meio
da experiência prática e da ativa integração do conhecimento, mas é muito difícil de ser medida. Con-
forme as pessoas se tornam mais alfabetizadas, elas se tornam cada vez mais sofisticadas financeira-
mente podendo significar que o indivíduo se torne mais competente. A sofisticação financeira implica
no desenvolvimento e conhecimento por meio da experiência prática em conjunto com a educação
(MOORE, 2003).

Na literatura, a Alfabetização Financeira tem recebido uma variedade de significados, sendo


usada para indicar o conhecimento sobre produtos financeiros (diferenciar ações de títulos de dívi-
da), o conhecimento sobre conceitos financeiros (inflação, juros compostos, diversificação), aptidões

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 8


matemáticas ou habilidades com números requeridas para tomada de decisão, e o envolvimento em
certas atividades como planejamento financeiro (HASTINGS, MADRIAN e SIMMYHORN, 2013).
Sendo assim, pode-se dizer que a Educação Financeira é a iniciativa pela qual busca-se atingir a Alfa-
betização Financeira, quando o indivíduo é efetivamente capaz de tomar melhores decisões.

Para Remund (2010), a Alfabetização Financeira pode ser classificada em cinco categorias:
conhecimento de conceitos financeiros; habilidade de se comunicar utilizando estes conceitos; apti-
dão em administrar suas finanças pessoais; habilidade em tomar decisões financeiras apropriadas e
confiança em planejar-se efetivamente para necessidades futuras. O autor destaca que outras inicia-
tivas relacionadas ao tema ampliam o campo de atuação da alfabetização para temas relacionados a
fraudes, ou mesmo para uma visão mais global do mundo.

Remund (2010) observa ainda não ter sido construído pelos pesquisadores um modelo opera-
cional para avaliar a Alfabetização Financeira que utilize, simultaneamente, todas as quatro variáveis
mais utilizadas para definir o conceito da mesma: orçamento (budgeting), poupança (saving), em-
préstimos ou endividamento (borrowing) e investimento (investing) (DONADIO, CAMPANARIO e
RANGEL, 2012).

Lusardi e Tufano (2009) concluíram que indivíduos com menor grau de Alfabetização Finan-
ceira estão mais propensos a terem problemas com endividamento, e consideraram que indivíduos
mais alfabetizados tendem a incluir ações em seus portfólios, compreendendo melhor os princípios de
diversificação de riscos. Por outro lado, a ignorância a respeito de conceitos financeiros pode ser re-
lacionada com a falta de planejamento para planos de aposentadoria, nenhuma participação em mer-
cados de ações, comportamentos errôneos relacionados à tomada de empréstimos (LUSARDI, 2008).

A falta de Alfabetização Financeira constitui-se um problema para indivíduos incapazes de


otimizar seu próprio bem-estar, especialmente diante de questões relevantes, ou para exercer pressão
competitiva como consumidores conhecedores do mercado. Isto provoca consequências tanto para
o indivíduo como para a sociedade em que se inserem (HASTINGS, MADRIAN e SIMMYHORN,
2013).

Este trabalho também considera que aspectos como a compreensão sobre os vieses compor-
tamentais, devam ser informados/abordados dentro dos projetos de Educação Financeira, tendo em
vista que a ação humana está intimamente ligada a heurísticas e vieses comportamentais. Entender
sobre o comportamento humano não pode ser desconsiderado ao tratar do tema, pois mesmo que sa-
bidamente a condição de influência de aspectos comportamentais continue sendo presente, a melhor
informação sobre estes aspectos aumentará a possibilidade de maior reflexão nas diversas situações
em que o indivíduo está diante de decisões econômicas.

3. METODOLOGIA

Mises (2010) destaca que a ciência econômica se distingue das ciências naturais. Ela não
deve, para Mises, se basear em investigações empíricas pois as expectativas sobre o comportamento
humano, nas ciências econômicas, não podem ser confirmadas ou refutadas por métodos predominan-

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 9


tes nas ciências naturais.

A ciência econômica lida com humanos, que agem a partir de seus propósitos. Por isso, o
cientista social, pode chegar a conclusões por pura dedução lógica, tanto na análise de experimentos
como em casos em que o processo de análise lógica indica serem desnecessários tais experimentos,
tendo em vista um conjunto presente de informações suficientes para o encaminhamento de dedu-
ções. Desta forma, esta pesquisa busca reflexões que permitam utilizar deduções a partir da revisão
bibliográfica.

Sabendo-se que não há uma linha de pensamento que aborde todos os elementos, devido à
complexidade de compreender a alfabetização financeira, torna-se necessário uma integração entre as
diferentes abordagens ao tema agrupando os pontos convergentes e inserindo aspectos comportamen-
tais. que segundo autores como Mises (2010), são imprescindíveis, mas acabam sendo ignorados pela
complexidade em se lidar com eles. A solução construída compreende pensar em termos de pilares
fundamentais, que incorporam os princípios do processo de alfabetização financeira proposto, e po-
dem me dar sustentação ao desenvolvimento de produto educacionais concretos.

4. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Denominou-se de pilares para formação do conhecimento e comportamento financeiro cinco


grupos de conceitos importantes para o processo. A seguir são desenvolvidos cada um dos pilares, a
fim de apresentá-los.

4.1 PRIMEIRO PILAR: TÉCNICA MATEMÁTICA / NUMERACIA

A técnica matemática compreende conjunto de regras e modos de processar que consta nos
livros de matemática ou matemática financeira. Ela descreve a habilidade em realizar as operações
matemáticas. A numeracia ou habilidade de se lidar com números tem sido estudada como um pré- re-
quisito para uma boa tomada de decisão. Aqueles que têm menor habilidade na utilização de números
possuem menor capacidade de retenção, de compreensão e uso apropriado de raciocínio matemático
(FERNANDES, LYNCH e NETEMEYER, 2014).

Estudos mencionam a relação existente entre a habilidade em lidar com números (numeracy)
ou habilidades cognitivas, em geral, com resultados financeiros. Embora sejam conceitos distintos,
numeracia e Alfabetização Financeira (financial literacy), tendem a ser positivamente correlaciona-
dos, visto que indivíduos com elevado nível de habilidade cognitiva tem maior facilidade no trato
com números ou cálculos numéricos e assim, tem maior nível potencial de alfabetização (HASTIN-
GS, MADRIAN e SIMMYHORN, 2013).

O uso da contagem e dos números, do cálculo e da numeração impeliram uma tendência a


racionalização do pensamento humano que não se apresenta em outra cultura que não faça uso de
dinheiro (WEATHERFORD, 2000). Para esse autor, o dinheiro não torna as pessoas mais espertas,
mas as faz pensar de forma diferente, em números e seus equivalentes, tornando o raciocínio poten-

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 10


cialmente mais abstrato, como pode ser constatado a partir do uso de cartão de crédito ou visualização
de dados eletrônicos.

Zaremba (2007) destaca que muitas pessoas agem como se desconhecessem que pagar juros
abusivos, para bancos ou cartões de crédito, representa receita infalível para o fracasso financeiro.
Adicionalmente, desenvolver a técnica matemática, auxiliar na realização de cálculos, corresponde
apenas a uma das habilidades que devam ser foco no processo de alfabetizar financeiramente um
indivíduo. Isto porque como demonstra Kahnemann (2012), um indivíduo pode saber calcular e ao
mesmo tempo apresentar comportamentos desaconselháveis em termos financeiros, tendo em vista
que o ser humano tende a decisões sujeitas a vieses e comportamentos emocionais. Neste sentido é
preciso alertá-lo para o comportamento natural dos seres humanos, de modo que ele esteja ciente e
possa evitar cometer erros e preparar-se para enfrentá-los.

4.2 SEGUNDO PILAR: COMPORTAMENTO INTRAPESSOAL

Comportamento intrapessoal, tal como abordado em livros de finanças comportamentais,


apresenta a reação humana diante de situações de tomada de decisão, relacionada a situações de con-
sumo e investimento. O ser humano é resultado mais das emoções do que de suas habilidades técnicas
e esta relação não é diferente no trato com o dinheiro (MARTINS, 2004, p.48).

Mais importante do que se questionar um mundo consumista como apontado nos trabalhos
de Barroso (2013) e Augustinis, Costa e Barros (2012), cabe cada pessoa fazer sua reflexão de como
ela vai consumir, como pode consumir, como vai poupar, como formará sua reserva de aposentado-
ria, entre outras questões, pensando numa vida planejada em equilíbrio. Para Cerbasi (2009), poupar
demais pode ser tão perigoso quanto não poupar. Avaliar os comportamentos, as ações em relação a
objetivos estabelecidos, é importante na busca pelos melhores resultados.

Neste aspecto, cada pessoa vive uma realidade única. Quando o ser humano tem a liberdade
de escolher, está mais inclinado a tomadas de decisões condicionado por vieses de comportamento
emocionais. Kahnemann (2012) menciona o fato da estrutura cerebral apresentar um lado rápido,
intuitivo, emocional e outro, lento, racional, descrevendo os mesmos como sistemas 1 e 2 respecti-
vamente. A tendência de comportamento induz pela utilização do sistema 1. Quando operações que
o cérebro está executando são trabalhosas nele é gerada tensão cognitiva e mobilizado o sistema 2,
mudando a abordagem que as pessoas fazem de um problema de um modo intuitivo e casual para um
modo mais empenhado e analítico, o qual exige esforço.

A necessidade de simplificação nas informações, indicada por Thaler e Sunstein (2008), foca
na busca por repassá-las de maneira mais simplificada, a fim de que possa ser entendida pelos usuá-
rios. Mas Montier (2010) destaca que por mais que um investidor saiba, o que na verdade é simples,
como por exemplo, comprar algo com valor intrínseco maior do que o ofertado, os vieses comporta-
mentais nos impedem de fazer o que sabemos que deveríamos ter feito.

Cabe também questionar até que ponto vários dos temas relacionados podem implicar em
simplificação em sua abordagem, como no exemplo em que investimentos em renda variável são con-

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 11


siderados indicativos de Alfabetização Financeira, algo visto em testes nos quais as pessoas devam
considerar que no longo prazo a bolsa de valores tende a performar melhor que outras alternativas de
investimento, como visto em Fernandes, Lynch e Netemeyer (2014), Lusardi e Tufano (2008).

Pode-se esconder o fato de que os comportamentos efetuados nas operações em bolsa de valo-
res pelo indivíduo não sejam saudáveis e este esteja, por exemplo, jogando e não investindo, sem ter
a clara noção do que está fazendo, como lembra Kahneman (2012). Uma das sugestões apresentadas
por este autor, é de que o indivíduo, sabendo que sofre de desconforto ao visualizar sua carteira de
ações diariamente, o que lhe conduz a fazer constantemente negócios, deveria acompanhar o desem-
penho do mercado com maior distanciamento.

Ao observar com menor frequência, tenderia a fazer menos negócios, o que lhe seria bené-
fico a longo prazo. Para tanto, Kahnemann (2012) cita trabalhos dos pesquisadores Terry Odean e
Brad Barber, os quais demonstraram que investidores mais ativos tinham piores resultados. Tal fato
demonstra como é importante uma maior compreensão sobre o comportamento humano, no sentido
de se buscar medidas protetivas.

Uma alternativa é trabalhar mais a consciência sobre o lado comportamental, buscando assim
melhorar as habilidades cognitivas, o que pode ser alcançado também com atividades e jogos que
exercitem funções não cognitivas como paciência, disciplina, concentração, autocontrole, e que são
igualmente relevantes para o amadurecimento do indivíduo como mencionado por Tough (2014).

O sistema cognitivo por si só não é capaz de produzir ações, e para influenciar o comporta-
mento, precisa operar por meio do sistema não cognitivo (afetivo) (CAMERER, LOEWENSTEIN e
PRELEC, 2005). Estes autores lembram que o cérebro consciente interpreta erroneamente comporta-
mentos automáticos, afetivos, acreditando que sejam resultados de deliberações cognitivas.

Ariely (2010) destaca que quando as pessoas tornam-se capazes de observar seus vieses, de
observar estas influências sobre suas atitudes, tem condições de decidir de forma melhor. Há nota-
do desencontro entre a velocidade de desenvolvimento tecnológico e o ritmo da evolução humana,
onde instintos e capacidades que antes eram de grande importância agora não mais o são (ARIELY,
2010). As características de formação do cérebro humano, desenvolvidas a milhares de anos atrás,
indicavam que era necessário pelo próprio instinto de sobrevivência uma resposta rápida a um perigo
aparente, visto que era condição necessária para a sobrevivência (MONTIER, 2010).

Se autores destacam que se a impulsividade é ruim, vale destacar que o excesso de análises
tornaria a vida menos dinâmica, porque uma pessoa ficaria presa a decisões simples como a escolha
do que comer, qual filme assistir, onde a decisão não necessita de uma análise mais aprofundada, e
assim, a interação existente no cérebro neste processo de tomada de decisão é fundamental e mui-
to importante para a maior parte das decisões relacionadas a rotina de uma pessoa (CAMERER,
LOEWENSTEIN e PRELEC, 2005).

A complexidade do processo decisório conduz a evidências de que resultados de experimen-


tos muitas vezes contrariam a lógica esperada pela teoria econômica, a qual consideraria a racionali-
dade como motor do processo decisório. Um dos experimentos de Yerkes e Dodson citado por Ariely

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 12


(2010), reflete sobre a relação que existe entre remuneração, motivação e desempenho no mercado de
trabalho. Neste experimento, identificou-se que incentivos oferecidos, feitos até um certo ponto, mo-
tivam aprendizado e desempenho eficaz. Porém, além desse ponto, as pressões motivacionais podem
ser tão altas que, na realidade, dispersam o foco do indivíduo na execução da tarefa (ARIELY, 2010).

O autor demonstra a existência de uma curva descendente de desempenho a medida em que


incentivos aumentam, após certo ponto. Em exercício de simulação de remuneração com bônus,
Ariely trabalhou com alunos do MIT, identificando que quando as tarefas propostas para recebimento
de bônus exigiam habilidades cognitivas, um incentivo mais alto indicava efeito negativo sobre o
desempenho. Tal fato contraria a expectativa que naturalmente economistas poderiam ter, mas indica
a forma como os seres humanos reagem.

Outro ponto é que os seres humanos possuem dificuldade de lidar com decisões voltadas
ao longo prazo, como demonstrado por pesquisadores que observaram que a consciência cognitiva
isoladamente é insuficiente para retardar a gratificação, pela forte presença das emoções no contexto
de tomada de decisão (CAMERER, LOEWENSTEIN e PRELEC, 2005), (ARIELY, 2010), (KAH-
NEMANN, 2012), (POUNDSTONE, 2015). Esta dificuldade na tomada de decisão de escolhas in-
tertemporais se reflete em outras ações não desejadas como gastos excessivos, falta de planejamento
(MISCHEL, 2014).

Os trabalhos de Mischel (2014) indicaram anos após ser efetuado o chamado marshmallow
test que, aqueles indivíduos que indicavam ter maior autocontrole por ocasião do teste, se mostravam
em situação financeira melhor muitos anos depois. Neste experimento, havia recompensa para aque-
les que retardavam o desejo de consumir o marshmallow imediatamente, recebendo uma quantidade
maior algum tempo depois.

Quando autores como Zaremba (2007) ou Cerbasi (2009) mencionam várias ações que devem
ser adotados por um investidor como: cortar prejuízos, não ser levado pela ganância, ter atenção com
diversificação entre outros, acabam não detalhando motivações comportamentais que bloqueiam o
investidor quando estas situações de fato acontecem, e que fazem com que o indivíduo tenha a ten-
dência a errar como qualquer humano. Por mais que se diga para alguém o que ela deveria talvez ter
feito, deveria se dizer porque ela não o fará provavelmente.

Kahnemann (2012) e Montier (2010) demonstram que as pessoas têm tendência a conside-
rarem-se, quando em comparação às demais, como sendo superiores à média quando estimam seu
desempenho, por exemplo, nas habilidades para dirigir automóveis. São comportamentos que de-
monstram o desejo de diferenciação, o que muitas vezes pode ser positivo, mas pode gerar igualmente
comportamentos perigosos, como ações mais agressivas em investimentos, ou mesmo estabelecimen-
to de padrões elevados de consumo por um julgamento precipitado das capacidades de pagamento ou
mesmo comparações indevidas com padrões de consumo assumidos por pessoas próximas.

Exames de trabalhos voltados ao tema Educação Financeira como o de Fernandes, Lynch e


Netemeyer (2014) demonstram que se sentir seguro, confiante, é um traço positivo para que pessoas
assumam posições no mercado financeiro, no entanto, deve-se considerar que não é nada fácil avaliar
se estes comportamentos de fato correspondem a ações que tiveram a devida dose de racionalidade

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 13


e consciência de riscos, restando uma análise muito subjetiva a partir de quem aplica o experimento,
mesmo pela grande dificuldade de se acompanhar efetivos comportamentos futuros e suas conse-
quências sobre o bem- estar dos indivíduos.

Os trabalhos de Meier e Sprenger (2010) e Hastings e Mitchell (2011) indicaram que pessoas
com maior disposição a serem pacientes, com capacidade de foco no longo prazo ou que voluntaria-
mente participavam de projetos de Educação Financeira eram mais propensas a investir em questões
relacionadas a saúde ou poupar, o que demonstra que comportamentos devem ser estimulados (HAS-
TINGS, MADRIAN e SIMMYHORN, 2013).

Mas mesmo as ações que indicam que a paciência ou autocontrole pode ser treinado em cada
indivíduo, há evidências de que estes precisam ser recarregados (MONTIER, 2010; CAMERER,
LOEWENSTEIN e PRELEC, 2005). Experimentos apresentados pelos autores demonstraram que
pessoas expostas a situações em que tiveram que ser pacientes, posteriormente agiam de forma mais
impulsiva que grupos que não tiveram que resistir a um desejo prévio. Com isso, concluíram que nem
mesmo a força de vontade é suficiente para nos defender de vieses comportamentais.

4.3 TERCEIRO PILAR: REAÇÃO INTERPESSOAL E MARKETING

A reação ou comportamento interpessoal pode ser vista em livros sobre finanças comporta-
mentais, marketing, técnicas de venda, sendo representada pela forma como a pessoa interage ativa
ou passivamente com o mundo e as pessoas ao seu redor. A este pilar podem se relacionar disciplinas
como marketing, publicidade, psicologia. O que há são ações de pessoas e marcas pelo uso da publi-
cidade, procurando direcionar ações, desejos, atitudes, onde cabe o questionamento sobre se o que a
pessoa faz cumpre propósitos e desejos próprios ou dos terceiros que estão agindo sobre ela.

Há um aspecto paternalista que se encontra sob a alegação de que é legítimo que arquitetos de
escolhas tentem influenciar o comportamento de pessoas para que elas tenham vidas mais longas, me-
lhores e mais saudáveis (THALER e SUNSTEIN, 2008). Os autores lembram que em muitos casos
indivíduos tomam péssimas decisões, as quais não teriam feito se conseguissem prestar total atenção
e possuíssem informações completas, habilidades cognitivas infinitas, e absoluto autocontrole. Mas
aqui pode-se criticar a forma como fazer isso, visto que é polêmico o julgamento de uma pessoa que
se julgue capaz de melhor decidir por outras, ou seja, o direcionamento proposital pode transformar-
se em mera manipulação.

A verdade é que as pessoas podem ser muito influenciadas. Existe uma incapacidade cogni-
tiva para que percebam fatores exógenos que alteram seus estados emocionais e influenciam seus
comportamentos (CAMERER, LOEWENSTEIN e PRELEC, 2005). Estes autores citam exemplo em
que uma pessoa por se sentir confiável produz uma substância chamada oxitocina em seu cérebro.
No entanto, se ela recebesse uma massagem, por exemplo, a substância seria igualmente produzida,
provocando uma reação de maior envolvimento que não será percebida pelo indivíduo.

Mischel (2014) destaca que as aptidões não cognitivas, relacionadas aos traços de personali-
dade, podem ser trabalhadas exercitando nas pessoas a sua capacidade de avaliarem racionalmente as

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 14


alternativas a partir de métodos como por exemplo o desviar o foco daquilo que provoca o impulso ao
imediatismo. Essa plasticidade cerebral revela a importância da educação voltada à busca do desen-
volvimento destas habilidades, visto que as pessoas vão reagir aos impulsos, as ofertas de consumo
ou investimento que vão receber de outros a sua volta, que estão constantemente avaliando a melhor
forma de fazer isso com êxito. Thaler e Sunstein (2008) lembram que o mercado oferece fortes incen-
tivos para que as empresas atendam as demandas dos consumidores, e elas vão competir para atender
estas demandas, sejam ou não estas demandas representativas de sábias escolhas.

Ariely (2008) cita um caso de um consultor de restaurantes que considerava alterações nos
preços dos cardápios como forma de aumentar as receitas do estabelecimento. Como isso era feito?
Eram estabelecidos preços altos para alguns pratos, que funcionavam com uma espécie de âncora de
expectativas. Os clientes acabavam não optando por estes pratos, mas eram induzidos a escolher o
segundo mais caro, o qual já era elaborado com uma margem mais alta de resultado. Quando uma
pessoa sabe da forma como ela pode ser influenciada, significa que ela também pode buscar utilizar
estas informações buscando influenciar outras pessoas, até porque qualquer pessoa, pode estar tanto
em posição de comprar como de vender um produto ou serviço. Empresas monitoram o comporta-
mento dos consumidores que não percebem muitas vezes que seus comportamentos são estimulados.
Se tivessem um mínimo de conhecimento sobre o assunto, teriam a chance de refletir criticamente
antes de fazer suas escolhas (FRENKEL, 2015).

Experiências demonstram que o que os consumidores estão dispostos a pagar pode ser facil-
mente manipulado, e isto significa que eles não têm grande controle sobre as próprias preferências e
sobre os preços que estão dispostos a pagar por mercadorias e serviços (ARIELY, 2008), (POUNDS-
TONE, 2015). O cérebro humano está programado e, ao fazer a compra de algum produto, efetua
uma ancoragem ao preço que pode ser pago por ele, de forma irracional (POUNDSTONE, 2015),
(ARIELY, 2008), (KAHNEMANN, 2012).

Este processo implica em uso de estratégias visando atrair o consumidor. Esta ancoragem que
faz a pessoa se atrair por determinado produto, também pode fazer com que ela se atraia mais por
uma loja em comparação a outra, por variáveis como ambiente, atendimento, ou seja, a âncora não
precisa ser o preço apenas.

Thaler e Sunstein (2008) indicavam em seus trabalhos que estratégias assumidas nas quais a inclusão
de participantes em planos de previdência era automática, dependendo da manifestação individual
para que os participantes deixassem o plano, tinham maior êxito do que aquelas em que as pessoas
estavam de fora e deviam optar por serem incluídas. Este ponto mostra que uma decisão que pode
ser considerada adequada, a geração de poupança para o futuro, reserva por outro lado o uso de uma
estratégia visando atingir este objetivo, direcionando a forma de apresentar uma alternativa para que
a pessoa faça o que se deseja dela, o que se julga mais adequado.

O estudo de Hastings, Hortacsu e Syverson (2012), demonstrou em relação a planos de previ-


dência privado no México, que havia por parte dos gestores uma maior preocupação com marketing
e associação dos clientes a uma marca de confiança com a qual tivessem um sentimento de lealdade,
o que contribuiu para o aumento médio das taxas de gestão cobradas. Este trabalho indicou que era

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 15


recomendada regulação no mercado, tanto na apresentação de informações, como das propagandas
ofertadas, como forma de garantir que os indivíduos com limitada capacitação financeira tivessem
acesso a informações necessárias para tomada de decisão e que fosse minimizado o potencial uso per-
suasivo de questionáveis táticas de propaganda (HASTINGS, MADRIAN e SIMMYHORN, 2013).

Segundo Ariely (2008), as pessoas moldam seus comportamentos comparando situações fi-
nanceiras de pessoas próximas. Ele destaca em sua obra alguns casos de pessoas que abandonaram
vocação profissional por alimentar desejos de maior ganho financeiro, o que mostra uma reação da
pessoa ao ambiente externo, porque nem sempre ela resultará positivamente para quem mudou de
vida. Uma sugestão apresentada por autores é a pessoa procurar limitar seus sonhos de consumo a
suas condições, como no processo de compra de um automóvel ou casa nova, mensuração que por
óbvio não é nada fácil (ARIELY, 2008), (SCHWARTZ, 2004).

Pensar de forma mais ampla é igualmente uma alternativa, mas difícil de ser superada pela
natureza humana (ARIELY, 2008). O autor cita o exemplo da pessoa que não se preocupa em gastar
mais dinheiro para colocar bancos de couro em um carro, porque o valor disso é observado em termos
relativos sobre o preço a ser pago pelo automóvel. Ela poderia avaliar com calma se não valeria a
pena destinar estes recursos para livros, viagens etc. Este viés também é destacado por Kahnemann
(2012) e Poundstone (2015), sendo chamado de arbitrariedade coerente, que significa que os compra-
dores são principalmente sensíveis às diferenças relativas, e não aos preços absolutos, fazendo com
que possam ser influenciadas por um vendedor que entenda como se aproveitar deste viés para melho-
rar sua venda. Fica claro que as técnicas de venda estão à frente da Educação Financeira, no sentido
de entender como obter resultados a partir da compreensão do comportamento humano.

As pessoas lidam com dificuldade no processo de escolhas porque ao decidirem por um


produto, avaliam os similares que precisarão deixar de lado, as portas que precisarão ser fechadas, e
tudo isso afeta suas emoções (SCHWARTZ, 2004). A maior oferta tanto para o consumo como para
alternativas de investimento, torna o indivíduo assim, alguém potencialmente insatisfeito, pelo fato
de precisar sempre abdicar de uma escolha por outra.

Thaler e Sunstein (2008) lembram que a liberdade de escolha é a melhor defesa contra uma
arquitetura de escolhas negativa. Quanto maiores forem as informações relacionadas ao comporta-
mento do indivíduo e seu grau de compreensão em relação não só a como ele se comporta, mas como
ele reage aos estímulos externos, maiores as chances de decisões mais bem fundamentadas. Os au-
tores concluem que se a arquitetura de escolhas se faz presente, que se procurem criar estímulos que
conduzam as pessoas a boas escolhas e não a escolhas que lhes causem danos.

Akerlof e Shiller (2015) consideram que há duas barreiras para o indivíduo: a psicológica e
a de conhecimento. A psicológica foi tratada nestes pilares comportamentais e se relaciona, para os
autores, com a incapacidade de melhor julgamento a partir dos vieses comportamentais e a predomi-
nância do aspecto emocional nas decisões. A de conhecimento, será tratada nos próximos dois pilares,
e se relaciona a falta de informações e entendimento que acaba por confundir os indivíduos que não
possuem o claro conhecimento do que lhes é ofertado, seja para consumo, seja para investimento.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 16


4.4 QUARTO PILAR: PRODUTOS E CONCEITOS FINANCEIROS

O pilar relacionado a produtos e conceitos financeiros corresponde ao entendimento de forma


mais ampla, de conceitos, regras, leis, relacionadas a produtos de consumo e de investimento, pre-
sente nos livros, contratos, regulamentações, que abordam diversas alternativas existentes. Pode ser
considerada uma visão mais global de todos os aspectos relacionados aos produtos, onde a técnica
presente mais importante é a da correta interpretação e compreensão, e não a matemática. Aqui temos
a presença forte da língua portuguesa, a fim de se compreender o funcionamento dos diversos produ-
tos financeiros.

O nível de risco aceitável depende de sua experiência, do conhecimento acumulado sobre o


mercado, da sua idade e do valor de seus ativos, portanto, a percepção de risco se alterará ao longo
da vida do investidor (ZAREMBA, 2007). Este autor lembra que riscos maiores podem trazer ganhos
maiores, mas também perdas maiores. Quando um investidor não compreende o risco, as característi-
cas dos mercados onde atua, se expõe em condição desfavorável. O maior bem que uma boa situação
financeira pode proporcionar é a liberdade, a condição de escolher onde e quanto trabalhar, as alter-
nativas para gozar a vida, alcançando independência financeira (ZAREMBA, 2007).

A ignorância impede que as pessoas façam aquilo que fariam se tivessem melhor informação,
assim dizemos que “o conhecimento liberta” (HAYEK, 1983). O autor lembrava que a possibilidade
de uma pessoa ser ou não capaz de uma escolha inteligente entre alternativas, ou de agir em confor-
midade com a resolução por ela tomada, é distinta da possibilidade de outras pessoas lhe imporem
ou não seus desejos. Portanto, será com a educação, melhor qualidade de informação, que melhores
ações humanas poderão ser esperadas.

Montier (2010), por outro lado, destaca o impulso que gestores tem pela tomada de risco,
buscando retornos acima da média do mercado, para que despertem o interesse de potenciais clientes.
O indivíduo que não tiver conhecimento do risco ao qual está exposto, das regras presentes nos inves-
timentos ou mesmo na obtenção de crédito, ficará cedo ou tarde em grande risco. Diferente de uma
cirurgia que rapidamente mostrará seus resultados, a má gestão de recursos poderá trazer respostas
negativas muito tempo a frente.

É igualmente importante saber em relação aos investimentos possíveis alternativas de escapar


de uma tributação maior, incidentes em aplicações como fundos de investimento (ZAREMBA,
2007). São aspectos legais que implicam em maior conhecimento dos produtos com os quais se está
trabalhando que sugerem planejamento prévio, para não se realizar prejuízos desnecessários, algo que
depende de conhecimento técnico.

Autoridades não exercem a função de capacitar a população adequadamente para a tomada


de decisões no âmbito financeiro. Organizações privadas e algumas empresas e bancos desenvolvem
práticas para preencher essa lacuna e orientar seus clientes (SAVOIA, SAITO e SANTANA, 2007).
No entanto, muitas vezes não se fica livre que este viés de orientação esteja mais direcionado aos
objetivos daqueles que oferecem a informação, em vez de seus usuários.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 17


Clark et al. (2006), apud Savio, Saito e Santanna (2007), lembram que os indivíduos serão
cada vez mais responsáveis pela sua renda na aposentadoria e, para que isso ocorra adequadamente,
é necessário um certo nível de conhecimento financeiro, de forma a dimensionar os impactos das
decisões tomadas. Os autores mencionavam que a falta de conhecimento financeiro pode provocar:
o adiamento da formação da poupança previdenciária; a incapacidade de tomar decisões corretas de
investimento, consumo e poupança; e o aumento da insegurança em relação ao risco e ao retorno dos
produtos de investimento.

Donadio, Campanario e Rangel (2012) questionam se os indivíduos estão conscientes quanto


ao cartão de crédito, de suas tarifas, taxas e outros custos que incorrerão ao não realizar o pagamento
total da fatura. Para os autores, as respostas a essas questões são extremamente importantes para que
se entenda corretamente o motivo do considerável crescimento do endividamento dos consumidores
brasileiros, o qual pode gerar consequências relevantes em seu bem-estar, seus relacionamentos pes-
soais e convívio social, além, é claro, de gerar externalidades para a economia e sociedade como um
todo.

Cerbasi (2009) menciona outro critério, falando da chamada “regra dos 80”, na qual o indiví-
duo deve diminuir este número de sua idade para saber quanto deve investir em renda variável. Cada
livro e cada autor podem apresentar opiniões distintas, assim como cada indivíduo é único e deverá
fazer suas escolhas. Não há respostas prontas!

Cerbasi (2009) destaca que quanto mais fácil o acesso e mais baratos os juros de uma ope-
ração, maiores podem ser as armadilhas embutidas nos contratos. No Brasil, a legislação obriga as
instituições financeiras a informarem, antes da contratação, o Custo Efetivo Total (CET) da operação.
Este autor destaca estratégias relacionadas a investimentos, como a observações de prazos de aplica-
ções visando menores alíquotas de imposto de renda, ou seja, somente quem conhece os produtos tem
melhores condições de fazer bom planejamento.

Há trabalhos demonstrando que conselheiros financeiros agiam de acordo com seus próprios
interesses quando isso lhes beneficiava independente do que fosse de interesse aos seus clientes, as-
sim como vendedores de seguros de vida que preferiam comercializar planos com menor qualidade e
melhores condições de comissionamento, se aproveitando em especial de clientes com baixo grau de
compreensão dos produtos financeiros (HASTINGS, MADRIAN e SIMMYHORN, 2013).

No trabalho de Souza (2012) está presente o seguinte comentário: “vários alunos, ao pensa-
rem em investimento, ainda estavam presos somente à Caderneta de Poupança. Sem especificar o tipo
de investimento, apenas três grupos se referiram a investimentos mais rentáveis do que a Poupança”.
Importa observar o fato de que não se explica no trabalho apresentado, como funciona o investimento
da caderneta de poupança, quais os riscos envolvidos, bem como os riscos existentes em outras alter-
nativas tidas como mais atraentes, ou os motivos que potencializam um resultado superior em relação
a poupança.

Para compreender sua inserção em um ambiente capitalista, cada indivíduo seja na posição de
cliente, seja na posição oposta de quem está ofertando produtos e/ou serviços, deverá compreender
os conceitos relacionados ao tema que é tratado. Se por exemplo estiver negociando um produto de

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 18


previdência privada, deverá compreender o que significam as regras presentes no regulamento do
produto. Se está comprando um automóvel, deverá conhecer o contrato e regras de amortização de um
eventual financiamento. Se faz algum investimento deve conhecer os riscos relacionados. Será por
meio do processo de educação que maiores ferramentas estarão à disposição dos diversos indivíduos
que partem em busca de seus objetivos pessoais.

Sem conhecer os produtos o indivíduo consumidor pode ficar sem condições de fazer me-
lhores julgamentos. Em uma venda por exemplo de um plano de previdência privada, seria mais
facilmente persuadido por aquele vendedor que fizesse uma simulação usando rentabilidades mais
agressivas para projeção de formação de reservas futuras. Sem entender dos regulamentos e regras
atuariais poderia trocar um plano por outro sem considerar de fato quais as regras vigentes em cada
uma das alternativas oferecidas, em virtude do critério de conversão de suas reservas financeiras em
benefício de aposentadoria.

Poderia também contratar um tipo de benefício no momento da aposentadoria sem considerar


outras alternativas existentes, efetuar resgates e ficar exposto a obrigação de pagamento de impostos
de forma desnecessária. O não entendimento das “regras do jogo” faz com que muitos indivíduos
atuem sem a devida compreensão, ficando mais sujeitos a ações a partir dos seus vieses comporta-
mentais, ou mesmo da persuasão de terceiros, os quais podem direcionar a ação dos indivíduos em
sentido contrário aos seus interesses. Aqui se destaca que além do conhecimento matemático, da ca-
pacidade de se ter maior conhecimento sobre questões comportamentais, cabe também ao indivíduo
conhecer melhor conceitos e produtos que ele consome ou investe. E todo este conjunto de conheci-
mentos torna o indivíduo mais apto para o que será tratado no próximo pilar.

4.5 QUINTO PILAR: COMPREENSÃO E LÓGICA ECONÔMICA

Este pilar está relacionado a uma visão ampla da economia, a formação da cultura empreen-
dedora, ao posicionamento que cada indivíduo tem em relação a sociedade em que vive, suas con-
cepções em relação as visões de diferentes escolas econômicas, o livre mercado, o intervencionismo
estatal, o capitalismo, a busca pela compreensão lógica. É quando além de conhecer os conceitos, a
pessoa é capaz de estabelecer relações lógicas de conexão, de dedução.

Está relacionado a conteúdos de história, de economia, ciência política, filosofia, além da


matemática. Barroso (2013) culpa as instituições financeiras pelo endividamento dos indivíduos, con-
siderando que os juros praticados pelos credores jurídicos são uma forma pela qual os ricos se tor-
nam mais ricos sem derramar uma gota de suor, pelas suas palavras. Mas agindo assim, o autor não
questiona por que os juros são altos, visto que há alto nível de risco para quem empresta, assim como
pouca poupança interna no país que aumente a oferta de crédito disponível, ou mesmo condições
para maior concorrência no mercado para que haja maior oferta de crédito. Não questiona também
por que as pessoas pegam valores emprestados se os juros são altos. Mais do que criticar a partir de
um viés ideológico, é preciso colaborar para construir uma visão global, dar um sentido lógico e de
compreensão econômica, o que torna relevante este pilar.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 19


Por outro lado, Barroso (2013) destaca também que a tomada de decisão do indivíduo- consu-
midor em um banco exige dele a compreensão de como é o funcionamento dessa instituição que lhe
oferece crédito. De onde saem os recursos (dinheiro) que são emprestados, como se determina a taxa
de juros que é cobrada?

A questão passa a ser como construir respostas sem ficar preso a vieses ideológicos, assumindo pos-
tura mais pragmática.

A relação com o dinheiro nunca foi tranquila, seja por influência religiosa por frases como “é
mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no céu”, ou pela difu-
são de teorias socialistas, sempre doutrinando para raiva contra ricos e tratando a pobreza como vir-
tude (MARTINS, 2004). Se existe desejo em fomentar cultura empreendedora, devem ser superados
preconceitos. Mises (2010) destacava que o lucro empresarial não é uma “recompensa” assegurada
pelo cliente ao fornecedor que lhe serviu melhor do que outro fornecedor indolente e rotineiro, ele é o
resultado da avidez dos compradores em sobrepujar outros que estão igualmente ansiosos em adquirir
bens cuja oferta é limitada.

Os dividendos das companhias são comumente chamados de lucros, sendo em realidade, juros
sobre o capital investido mais uma parte dos recursos que não são reinvestidos nas empresas (MISES,
2010). A melhor compreensão do papel das empresas, dos indivíduos, dos governos, é necessária para
que se construam raciocínios capazes de exercer verdadeira compreensão e análise crítica.

Martins (2004) menciona que a soma da poupança das pessoas é igual a soma do que é produ-
zido em bens de capital, bens que se destinam a produção de outros bens ou serviços, enaltecendo a
moralidade do ato de poupar. Conclui que este ato tem dupla função: além de permitir que a sociedade
enriqueça, serve como um seguro para a pessoa, pela aplicação de dinheiro em ativos que são capazes
de gerar renda, como ações de empresas ou imóveis (MARTINS, 2004). É importante o trabalho que
ao educar indique o que significa o ato de poupar e sua importância para a pessoa e a sociedade.

Além de poupar teremos o que a pessoa faz com o que poupou. Cerbasi (2009) afirma que
investir é multiplicar as reservas financeiras. São utilizadas então ferramentas como estudos de va-
lorização imobiliária, indicadores de desempenho econômico de empresas e de ações negociadas
em bolsa de valores, relatórios de rentabilidades de fundos de investimento, dados sobre crédito e
inadimplência, estudos sobre inflação, juros e moeda. O autor destacava que para desempenho dife-
renciado em investimentos é preciso ter acesso a conhecimentos complexos.

Neste quinto pilar está a capacidade que os indivíduos têm de interpretar as informações e
desta forma criar um julgamento lógico, olhar os números e o que está a sua volta e entender o que
significam, analisando por exemplo o contexto econômico.

Para demonstrar que são alfabetizados financeiramente, indivíduos devem demonstrar que
tem as habilidades necessárias para fazer escolhas dentro de um mercado que todos enfrentam com
suas características particulares, relacionadas muitas vezes a condições diferentes de estilos de vida,
estágios de vida, objetivos entre outros. Desta forma, não se pode apresentar soluções universais e
aplicáveis a todos da mesma forma (HUSTON, 2010).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 20


Por outro lado, a chamada escola austríaca de economia representada por autores como Mises
(2010), critica o fato de muitos economistas procurarem efetuar cálculos matemáticos para projeções
de resultado, de risco de investimentos entre outros, quando a visão de Mises direcionava maior im-
portância a compreensão dos riscos observando estes de fato com maior atenção. Procurar entendê-
-los seria melhor do que tentar fazer previsões futuras baseadas em modelos matemáticos que depen-
derão de respostas, as quais não podem ser garantidas dentro das ciências sociais, visto que lidamos
com comportamentos humanos.

Mesmo o que antes era considerado base para o mundo das finanças como a teoria moderna
de portfólio (modern portfolio theory), a hipótese dos mercados eficientes (the efficient Market hypo-
thesis) ou modelo de precificação de ativos (capital asset price model) são questionadas ou mesmo
responsabilizadas por muitos dos problemas no mercado, e fazem com que se procurem respostas no
mundo das finanças comportamentais (MONTIER, 2010).

Igualmente pode ser questionar a sustentabilidade da previdência social. Quando se trata desta
questão, Domingos (2011) avalia a dificuldade de sustentabilidade financeira futura para quem che-
gue a idade avançada porque os próprios governos estão endividados e, cedo ou tarde, podem não ter
como pagar suas contas, entre elas a Previdência Social, que hoje sustenta (de forma bastante precá-
ria) milhões de pessoas em todo o mundo, mas depende de contribuições daqueles que não sabem se
no futuro terão algo a receber.

A análise em sentido lógico deste problema, indica que a sustentabilidade depende de ava-
liações que demonstrem que pessoas receberão como aposentadoria valores coerentes com os quais
contribuíram ao longo dos anos. No entanto, este debate costuma ser limitado à busca pela defesa de
interesses pessoais, sem uma efetiva verificação lógica da viabilidade de regras que se pretende sejam
aplicadas.

Desenvolver comportamentos voltados a esta compreensão lógica que conecta diversos seg-
mentos relacionados a filosofia, política, cultura empreendedora, lógica matemática e econômica,
será fundamental para que os indivíduos sejam capazes de criar julgamentos críticos que lhes permi-
tam um posicionamento diante da complexidade do mundo e das relações entre as pessoas.

Será a compreensão lógica que permitirá que menores sejam os números de indivíduos víti-
mas de golpes financeiros, que permitirá que se compreenda a importância com a geração de poupan-
ça de longo prazo, que dificultará a existência de bolhas de preços de ativos, entre outros problemas.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho buscou contribuir em vários aspectos com a Educação e Alfabetização Finan-
ceiras. Identificados os cinco pilares de formação do conhecimento financeiro, cabe considerar que,
abordar iniciativas sob a ótica destes pilares apresentados, aumentará a chance de sucesso das inicia-
tivas voltadas a alfabetizar financeiramente, pelo trato mais abrangente que passa a ser observado.

Não basta encontrar os números, as respostas, é importante entender a lógica, o contexto, en-

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 21


tender como se chegou a uma resposta e como se pode buscar uma resposta desejada. Desta forma, a
informação gerará aprendizagem pois possuirá significado. Além da técnica matemática, usualmente
apresentada em projetos de Educação Financeira, é importante inserir as questões comportamentais
(intra e interpessoal), as noções sobre produtos e conceitos, e a lógica econômica.

Estes aspectos foram abordados nesta iniciativa, mas os pilares mencionados poderão ser avaliados
em quaisquer projetos a serem desenvolvidos, avaliando de que forma os mesmos nelas estarão inse-
ridos. Muitos projetos de Educação Financeira pecam por não considerar que todos estes pilares de
formação do conhecimento, descritos neste trabalho, atuam de forma sistemática. Trazer explicações,
em especial sobre aspectos relacionados a lógica e a economia comportamental, se mostra muito
relevante.

Os cinco pilares identificados da formação do conhecimento e comportamento financeiro


envolvem muitas informações, sendo difícil tratá-los todos com a devida profundidade em alguma
iniciativa isolada. E em meio a isso, há um cenário econômico complexo, em que seres humanos mo-
vidos por interesses pessoais tomam diversas decisões.

Procurar assim acreditar em um mundo apenas com indivíduos perfeitos, assim como acre-
ditar em mercados plenamente eficientes, só levará a frustração. Aceitar que o máximo que se pode
esperar ao educar de forma mais ampla os indivíduos, é que o ambiente competitivo voltado aos inte-
resses de consumo e investimento se tornará ainda mais complexo, pode ser uma observação racional
e lógica do que se vê no dia a dia. A questão então passa a ser como melhor preparar os indivíduos
para esta difícil realidade, reconhecendo na educação a sua relevância como melhor alternativa.

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Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 1 24


CAPÍTULO 2

CONCEPÇÕES DA AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM

ALISANDRA APARECIDA FRESE reforçam sua condição de massa expropriada dos


FAGUNDES bens produzidos pela humanidade, ao longo da
Grupo Rhema de Educação história. As possibilidades de fazer da avaliação
elemento/subsidio para construir conhecimento
DIEGO DA SILVA está presente em diversas propostas avaliativas,
Grupo Rhema de Educação- Centro Universitário surgida nos últimos anos, fundamentados em
Campos de Andrade uma concepção emancipatória. A avaliação, por-
tanto, deve enfocar não só o aluno, mas também
o currículo, o modo de ensinar e como cada alu-
RESUMO: Este artigo tem como objetivo anali- no desenvolve sua aprendizagem em respostas
sar a relação entre as concepções pedagógicas e às experiências que lhe são proporcionadas pela
os significados assumidos pelas práticas da ava- escola.
liação no contexto escolar. A pesquisa baseada
em teóricos clássicos e atuais foi objeto das dis-
sensões para que pudéssemos entender o proces- PALAVRAS-CHAVE: Concepções. Avaliação.
so de avaliação desde as suas primeiras práticas e Aprendizagem.
a avaliação utilizada nos dias de hoje nas escolas.
Os resultados apontam a relação direta entre con-
cepções/ práticas avaliativas e visão do professor ABSTRACT: This article aims to analyze the
sobre o processo de construção de conhecimen- relationship between the pedagogical concep-
to/ensino aprendizagem. A análise de bibliogra- tions and the meanings assumed by the evalua-
fia permite identificar três grandes tendências de tion practices in the school context. The research
praticas de avaliação nos meios escolares: classi- based on classical and current theorists was the
ficatória, diagnóstica e emancipatória. Embora a object of dissension so that we could understand
ênfase dos estudos esteja na concepção emanci- the evaluation process from its first practices and
patória com o objetivo de promover a reconstru- the evaluation used today in schools. The results
ção do saber, o fracasso e o sucesso dos alunos point to the direct relationship between concep-
encontram-se ainda hoje cristalizados na cultura tions / evaluation practices and teacher’s view on
escolar entrando em choque com a filosofia ex- the process of knowledge construction / teaching
pressa nos Parâmetros Curriculares Nacionais. learning. The bibliography analysis allows us to
A prática pedagógica da avaliação da aprendi- identify three major trends in evaluation practi-
zagem, visando à melhoria do processo educa- ces in school settings: classificatory, diagnostic
cional, é um pressuposto básico para que a edu- and emancipatory. Although the emphasis of the
cação pública se torne realmente uma educação studies is on the emancipatory conception with
democrática que acolha a todos e que responda the objective of promoting the reconstruction of
às necessidades dos filhos da classe trabalhado- the knowledge, the failure and the success of the
ra, este grupo que tem na escola as possibilida- students are still crystallized in the school cultu-
des e compreender as grandes da sociedade que re today, clashing with the philosophy expressed

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 25


in the National Curricular Parameters. The pedagogical practice of learning evaluation, aimed at
improving the educational process, is a basic presupposition for public education to become truly a
democratic education that welcomes all and that responds to the needs of the children of the working
class, this group that has in the school the possibilities and understand the great ones of the society
that reinforce its condition of expropriated mass of the goods produced by the humanity, throughout
the history. The possibility of making the element / subsidy evaluation to build knowledge is present
in several evaluative proposals that have emerged in recent years, based on an emancipatory concep-
tion. Evaluation, therefore, should focus not only on the student, but also on the curriculum, the way
of teaching and how each student develops their learning in response to the experiences provided by
the school.

KEYWORDS: Conceptions. Evaluation. Learning.

INTRODUÇÃO

Avaliar é uma atividade constante na vida cotidiana. Todas as atividades desempenhadas pelos
homens são objetos de avaliação, seja propositalmente ou não, mas sempre sujeitas ao julgamento
para tirada de uma conclusão ou tomada de decisão.

“Num passado não muito distante a avaliação escolar fazia parte das interações normais do
dia-a-dia sem ser considerada como uma função separada do ato de educar”. (ETGES. 19Pp7). Ao
longo da história, por diversas contingencias, a avaliação tem sido usada de diferentes formas, com
distintas funções, objetivos e metodologias.

A avaliação atravessa o ato de planejar e de executar; por isso, contribui em todo o percurso
da ação planificada. A avaliação se faz presente não só na identificação da perspectiva político
social, como também na seleção de meios alternativos e na execução do projeto, tendo em
vista a sua construção. (...) A avaliação é uma ferramenta da qual o ser humano não se livra.
Ela faz parte de seu modo de agir e, por isso, é necessário que seja usada da melhor forma
possível (LUCKESI, 2002, P118).

A prática pedagógica da avaliação da aprendizagem, visando à melhoria do processo edu-


cacional, é um pressuposto básico para que a educação pública se torne realmente uma educação
democrática que acolha a todos e que responda às necessidades dos filhos da classe trabalhadora, este
grupo que tem na escola as possibilidades e compreender as grandes da sociedade que reforçam sua
condição de massa expropriada dos bens produzidos pela humanidade, ao longo da história.

Na antiguidade, não havia nenhuma organização institucional da avaliação. O discípulo


acompanhava o mestre, o saber transmitia-se sob forma de diálogo e interrogação. Esta
abordagem supõe o sujeito como lugar de construção do saber, o que levou, por um lado, a
centrar o ensino nele; mas também considerar de certa maneira, o saber como se fosse algo
previamente inscrito no sujeito. (CHARDENET, 2007 p.147).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 2 26


Anos recentes, ela tem sido alvo de discussões acaloradas entre os diversos atores sociais, em
um contexto onde os resultados dos processos avaliativos promovidos pelo Estado são indicadores de
qualidade da aprendizagem e, ainda, de eficácia da aplicação de recursos públicos. Chardenet (2007)
relata que as primeiras investigações sobre avaliação se deram na Europa, na década de 1930, quando
Henri Piéron criou a ciência da medida em exame.

As concepções atuais sobre avaliação foram desenvolvidas a partir de 1980 quando a avalia-
ção, tendo entrado nos discursos sociais, especializados ou não, adquiriu certo reconhecimento púbi-
co. A análise dos discursos dos professores mostra que os procedimentos que há cerca de vinte anos
eram designados pelo termo que os engloba: avaliação (CHARDENET, 2007).

Mas, para, além disso, houve uma mudança na própria percepção dos docentes e da sociedade
quanto aos fins e meios da avaliação, incorporada à escola por seu caráter pedagógico e político.

Fazendo um recorte da década de 1980, podemos observar que a avaliação e suas concepções
eram denunciadas como instrumentos repressor, alienante, por que não dizer autoritário,
contrariando o que era posto, ou seja: a escola como espaço de construção da cidadania, de
autonomia e exercício do direito à democracia (CIPRIANO, 2007, P45).

O presente texto, elaborado com suporte em estudo bibliográfico, debate as principais concep-
ções de avaliação da aprendizagem destacada pela literatura especializada nas ultimas três décadas.
Busca desta forma, fazer conhecer as mudanças de perspectivas efetuadas nas práticas avaliativas,
ainda, debater suas implicações para os processos informativos. Ao final, são feitas breves considera-
ções sobre possibilidades e dificuldades da avaliação constitui-se efetivamente como instrumento de
emancipação e de reconstrução do saber.

AS CONCEPÇÕES SOBRE AVALIAÇÃO DA APRENDIZAGEM

A avaliação no contexto escolar, para Chueiri (2008), constitui-se em praticar intencional e


organizada e se realizar a partir de objetivos pedagógicos, claros ou velados, que são o reflexo de
valores, códigos e conversões sociais. A prática de avaliar perpassa todo o processo pedagógico ao
inicia-lo com a coleta da informações indispensáveis para conhecimento da realidade, durante a exe-
cução do trabalho, até a sua finalização. Portanto, não pode ser realizado em momentos estanques.

Embora tenha tido tratamento diferenciado através dos tempos, a avaliação ainda hoje é con-
cebida e vivenciada nas escolas como um mecanismo de sustentação da lógica de organização do
trabalho escolar e, portanto, quase sempre, legitimador do fracasso, constituindo-se num perverso
instrumento de discriminação seletividade do processo escolar, classificando o aluno por meio de
provas e notas, causando o fracasso do aluno rotulando-os como incapazes.

(...) Não se restringe aos educadores em geral. É idêntica a visão dos alunos a respeito desse
tema, das famílias e da sociedade. O significado da avaliação na escola alcança um significado
próprio e universal, muito diferente do sentido que se atribui a essa palavra no nosso dia-a-
dia. Percebe-se o aluno sendo observado apenas em situações programadas (HOFFMANN,
2009, p24).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 2 27


Não se trata de fazer a defesa da abolição da avaliação formal, mas de fazer a critica as formas
de avaliar segundo em lógica seletiva e excludente, apenas baseadas em provas e notas com fim em
si mesmas.

Os métodos de avaliação, sem dúvidas são elementos relevantes no conjunto das práticas
pedagógicas realizadas no processo de ensino e aprendizagem. Porém avalia, neste sentido, não se re-
sume apenas ao ato formal e estatístico; não é simplesmente atribuir notas que indicaram uma decisão
de avanço ou retenção nesta ou naquela disciplina. É necessário que haja, por parte dos envolvidos no
processo avaliativo, a compreensão de que a concepção de conhecimento determina o direcionamento
da prática pedagógica. Questionar o objetivo da avaliação, isto é, qual é o sentido desse ato, levar a
resposta de qual é o sentido atribuído ao conhecimento.

A resposta para essa pergunta é essencial para a compreensão de como ocorre a avaliação no
meio educativo, em seus objetivos e estratégias. E, de forma geral, apesar de existirem diversas cor-
rentes e nomenclaturas para identificar as práticas avaliativas nos meios escolares, podemos dizer que
a literatura aponta três grandes tendências: classificatória, diagnóstica e emancipatória.

Quando a avaliação tem por foco a capacidade de reprodução de determinado conteúdo repas-
sado pelo professor, são bons alunos os de maior capacidade mimética. Nessa perspectiva, ela é rea-
lizada apenas no final de aprendizagem, a fim de medir seu produto final, atuando como instrumento
de coleta de “nota” Luckesi (2000) que classifica os alunos como “bom”, “médio” ou “Inferior” sem
considerar um processo de reflexão autônoma. Por isso diz-se que esta avaliação tem caráter classi-
ficatório.

A avaliação classificatória é, portanto, herança do ensino tradicional em que a metodologia de


ensino é centrada na reprodução de uma técnica/conteúdo e na aquisição de habilidades, de modo que
há processo de reconstrução do saber, mas, sim, a preocupação com avançar no conteúdo previsto nas
unidades do livro. Ou seja: o papel e a função da educação, para o qual contribui a avaliação, é fazer
dos alunos cópias fiel do que foi ditado pelos professores, chegando á perfeição original.

Como é realizada apenas no final do processo de aprendizagem, tendo o poder de impedir a


trajetória escolar do estudante, também se diz que avaliação classificatória possui caráter frenador e
que traz danos a este.

Sua função constitui-se num instrumento estático e frenador do processo de crescimento.


[...] O educador como sujeito humano e histórico; contudo, julgado e classificado, ficará
para o resto da vida, do ponto de vista do modelo escolar vigente, estigmatizado, pois as
anotações e registros permanecerão, em definitivo, nos arquivos e nos históricos escolares,
que se transformam em documentos legalmente definidos (LUCKESI, 200, p.35).

Para Luckesi (2000), com esta perspectiva o professor apenas domestica seus alunos, sem
contribuir para desenvolver seu potencial. O instrumento de avaliação tem ênfase quantitativa (pois
mensuram o acúmulo de informações) e as notas finais, coletadas em geral por meio de provas, visa
apenas aprovar ou reprovar o aluno, não intervindo para o crescimento do estudante.

Mas, à medida que o professor tira o foco da transmissão de conteúdos e avança em estratégias

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 2 28


que promovam a aquisição de conhecimento de forma que, paulatinamente, os estudantes desenvol-
vam mecanismo para busca e reflexão sobre informações e se mostrem capazes de atribuir a estes
significados diversos, a avaliação passa a ter outros objetivos.

Nessa perspectiva, a princípio, a avaliação adquire caráter de diagnóstico. Para Penna Firme
(1994), avaliações diagnósticas são conduzidas como propósito de identificar as fraquezas e as poten-
cialidades dos estudantes, com o intuito de informar futuras estratégias ao professor e ao aluno. Este
conceito está fundamentado na ideia de que, para o professor, a atenção ao desempenho do estudante
é elemento primordial à prática pedagógica; ou seja, a perspectiva emancipatória privilegia a avalia-
ção processual, em que o docente analisa todas as atividades do estudante ao executar uma tarefa de
avaliação e, após a mesma, faz considerações relevantes para um processo de reconstrução e aprimo-
ramento do saber. Para tanto, os instrumentos são diversificados, contínuos, e os alunos respeitados
em suas diferenças. (HOFFMANN, 2000; SAUL 2000).

Nos anos recentes têm sido elaborados diversos estudos que, a fim de promover estratégias
para atingir a avaliação segundo a concepção emancipatória e com o ideal de formação humana,
propõem modelos avaliativos com focos e elementos específicos. Apresentamos alguns deles, que as-
sumem denominações diversas, visando propiciar ao leitor uma visão das possibilidades de promover
processos avaliativos em perspectiva bastante diversa da tradicional abordagem classificatória.

CONCEPÇÃO TRADICIONAL DA AVALIAÇÃO

No século XIX o estudo era concebido como forma de ascensão o ensino tinha caráter verba-
lista, extremamente autoritário, inibidor da ação ativa por parte do aluno, não permitia o desenvolvi-
mento da iniciativa ou espontaneidade na realização de qualquer criação dele. O ensino era centrado
no professor que apresentava os conteúdos totalmente desvinculados da realidade, não havendo ne-
nhuma articulação com o contexto social ou com o momento histórico que estava sendo vivenciado.

A avaliação, nesta concepção, tem a função de exame, pois valoriza os aspectos cognitivos
com ênfase na memorização; a verificação dos resultados se dá através de provas orais ou escritas nas
quais o aluno deve reproduzir exatamente aquilo que lhe foi ensinado. A tradição dos exames escola-
res que conhecemos hoje, em nossas escolas, foi sistematizada nos séculos XV e XVII, com as confi-
gurações da atividade pedagógica produzida pelos padres Jesuítas(Séc.XVI) e pelo Bispo John Amós
Comênio (fim do Séc. XVI e primeira metade do séc. XVIII) ( LUCKESI, 2003; SAVIANI, 2005).

Cabe ao educador desenvolver estratégias que lhe permitam conhecer os erros e acertos do
aluno a fim de promover o seu objetivo cognitivo.

Neste sentido, os dados adquiridos numa abordagem classificatória não possibilitando a superação
diante do conhecimento (ato de reconstrução de saberes), mas é mecanismo de diagnóstico da situa-
ção e ponto de partida para o avanço e o crescimento, não a “estagnação disciplinadora”. (LUCKESI,
2000, p.32).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 2 29


O diagnóstico propiciado pela avaliação pode ser, portanto, a depender de como o professor
interage com o aluno depois da avaliação, limitado ao seu caráter classificatório ou, ainda anteceden-
do a tomada de decisão quanto à continuidade dos processos pedagógicos, a partir do diagnóstico
estimular o aluno para reflexão do saber.

Dessa forma, o ato de avaliar não serve como pausa para pensar a prática e retornar a ela;
mas sim como um meio de julgar a prática e torna-la estratificada. De fato, o momento de
avaliação deveria ser um “momento de fôlego” na escalada, para, em seguida, ocorrer a
retomada da marcha de forma mais adequada, e nunca como um ponto definitivo de chegada,
especialmente quando o objeto da ação avaliativa é dinâmico como, no caso, a aprendizagem.
Com a função classificatória, a avaliação não auxilia em nada o avanço e o crescimento.
Somente com a função diagnóstica ela pode servir para essa finalidade. (LUCKESI, 2000,
p.34-35).

O diagnóstico é essencial para chegar à avaliação emancipatória que visa, basicamente, a


promoção de sujeitos. As discussões em torno dessa avaliação foram propostas no final de 1960, por
Scriven, tendo como principio que os alunos pudessem ser capazes de se orientar por si, ao analisar
suas dificuldades e agindo para superá-las (HADJI, 2002, p.15).

Para Luckesi (2000) a avaliação emancipatória visa promover os sujeitos, a libertação dos mo-
delos classificatórios e de estagnação social, proporcionando seu crescimento. Deste modo, não pode
ser o momento final da aprendizagem, mas, sim, parte deste processo, de modo que haja a percepção,
a crítica e a prática dos agentes ( aluno e professor). Cabe ao professor mediar a interação do aluno
com o objeto de conhecimento, proporcionando-lhe meios para que a construção dos saberes ocorra.
E professor e aluno devem aprender com a avaliação: o primeiro, ao perceber os limites e o estágio
de conhecimento do aluno em relação a determinado tema/assunto; este, por sua vez, ao detectar os
temas em que tem dificuldade.

A avaliação emancipatória caracteriza-se como um processo de descrição, análise e crítica


de uma dada realidade, visando transformá-la. [...] Está situada numa vertente político-
pedagógico cujo interesse primordial é emancipador, ou seja, libertador, visando provocar
a crítica, de modo a libertar o sujeito de condicionamentos deterministas. O compromisso
primordial desta avaliação é o fazer com que as pessoas direta ou indiretamente envolvidas
em uma ação educacional escrevam a sua “própria história” e gerem suas próprias alternativas
de ação. (SAUL, 1995, p.61).

Os jesuítas (século XVI), nas normas orientações dos estudos escolásticos, seja nas classes
inferiores ou nas superiores, ainda que definissem com rigor os procedimentos a serem levados em
conta num ensino eficiente [...], tinham um atenção especial com o ritual das provas e exames [...].
(2008. P.22).

Portanto, como ponto de partida para considerações posteriores, é importante analisar cuida-
dosamente o aspecto problemático da avaliação da aprendizagem, pois em muitas escolas brasileiras,
os professores fazem a defesa das provas como único instrumento e, ainda, como verificador qualita-
tivo e punitivo, tendo definidos períodos exclusivos para essa finalidade.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 2 30


Segundo analise histórica de Luckesi (2002), a ação de acompanhamento da avaliação da
aprendizagem do aluno denomina-se “avaliação da aprendizagem escolar”, mas na prática o que se
constata, nas escolas brasileiras desde a educação básica, e a realização de exames. Para este teórico
tem sentido servir-se de exames como instrumentos classificatórios em situações especificas como
concurso ou quando é exigida a certificação de conhecimentos pontuais, mas na sala de aula a avalia-
ção é um recurso para diagnosticar, acompanhar e reorientar a aprendizagem, e não se devem utilizar
exames para proceder à classificação de alunos.

CONCEPÇÃO TECNICISTA E A AVALIAÇÃO

A concepção tecnicista teve inicio no século XX, nos Estados Unidos, com estudos do teórico
Thorndike sobre os testes educacionais, com influência da psicologia. Os testes psicológicos de inte-
ligência têm a função de mensurar os comportamentos e a aprendizagem pode ser então quantificada.
Segundo Chueiri (2008, p.56), essa forma de conceber a avaliação, oportunizou a “expansão de uma
cultura dos testes e medidas na educação”; nessa pedagogia se comprova o rendimento com base
nos objetivos comportamentais, os quais se reduzem a uma medida e, portanto, separa o processo de
ensino de seu resultado. Para esta “autora” a ideia de avaliar, não só para medir mudanças compor-
tamentais, mas também a aprendizagem, portanto para quantificar resultados, encontra-se apoiada na
nacionalidade instrumental preconizada pelo Positivismo “(2008 p56)”.

A ideia de avaliação, como medida do desenvolvimento do aluno, segundo Chueiri, funda-


mentada em Hadji (2001), está muito presente no imaginário de professores, pais e dos próprios
alunos, “e a dificuldade para superação dessa concepção reside na suposta ‘confiabilidade’ das me-
didas em educação e nos parâmetros ‘objetivos’ utilizados pelos professores para atribuir notas aos
alunos”(2008,p56). A credibilidade que se dá Às medidas inseridas no processo e nos padrões estabe-
lecidos pelos educadores, com vistas à atribuição de valores às atividades dos alunos desemboca em
uma tese equivocada: de que todos os efeitos, ganhos ou prejuízos do aluno durante o processo, são
produtos de uma operação e são expressos de forma neutralizada e, por isso isentam o professor da
responsabilidade no momento da avaliação. Medir significa determinar qual é o valor de um objeto a
partir de um instrumento determinado para este fim.

Uma medida é objetiva no sentido de que, uma vez definida a unidade, deve-se ter sempre a
mesma medida para o mesmo fenômeno. Certamente, um erro é sempre possível, devido às
imperfeições da instrumentação, pois ele resulta então das condições de operacionalização
dos instrumentos. Ele provém da operação de medida e, portanto neutralizado (HADJI, apud
CHUEIRI, 2008, P.56).

A avaliação reduzida a uma medida, ou seja, à veracidade da prova, supõe aceitar a prova
como um instrumento, não levando em conta que a subjetividade de quem avalia pode, embora não
devesse influenciar no resultado; assim:

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 2 31


(...) a avaliação não é uma medida pelo simples fato de que o avaliador não é um instrumento,
e por que o que é avaliado não é um objeto no sentido imediato do termo. Todos os professores
avaliadores deveriam, portanto, ter compreendido definitivamente que a “nota verdadeira”
quase não tem sentido (HADJI,2001,apud CHUEIRI,2008,p.56).

Este conceito de avaliação tem caráter excludente, pois os resultados dos testes tinham função
de explicar a eliminação dos “retardados mentais”, bem como o ingresso segundo as condições cog-
nitivas da cada sujeito.

SOBRE OS LIMITES E POSSIBILIDADES DA AVALIAÇÃO

A análise sobre o sistema de avaliação, com o objetivo de compreender as práticas avaliativas


a partir da concepção de sociedade, de educação, de escola e de aluno, nos leva à discussão e à refle-
xão que aponta as possibilidades de um afastamento essencial que permite olhar de longe e focalizar
criticamente as práticas que vem sendo desenvolvidas, fortalecer as que são significativas e produti-
vas e reorientar aquelas que ajudam realmente o aluno a aprender e o professor a ensinar, pois,

[...] avaliação só faz sentido se favorecer a aprendizagem. Todavia, não se realiza


aprendizagem qualitativa, sem avaliar. Quando se combate o tom classificatório, [...]
pretende-se, no fundo, superar abusos da avaliação, no que estamos todos de acordo, mas
não se poderia retirar dai que avaliação, de si, não é fenômeno classificatório. Será mister
distinguir acuradamente entre abusos da classificação, de teor repressivo, humilhante e
punitivo, e efeitos classificatórios implicados em qualquer processo avaliativo, também
quando dito qualitativo (LUCKESI,2002,p.23).

No entanto, embora diversos estudos recentes sob a concepção de avaliação emancipatória


anunciem, em múltiplas vertentes, estratégias para promover o ideal de aprendizagem e crescimento
intelectual e cidadão dos sujeitos, as práticas avaliativas das escolas e das políticas – visíveis em exa-
mes de larga escala, como o SAEB e ENEM – permanecem privilegiando procedimentos meramente
classificatórios.

Embora Luckesi (2003) reconheça a utilidade e a necessidade dos exames nas situações que
exigem classificação, como os concursos, e naquelas que requerem certificação de conhecimentos,
para ele, a sala de aula é o lugar onde, em termos de avaliação, deveria predominar o diagnóstico
como recurso de acompanhamento e reorientação da aprendizagem, em vez de predominarem os exa-
mes como recursos classificatórios (Luckesi, 2003, p.47).

Desta forma, mesmo que seja defensável a atribuição de notas/conceitos por docentes em
busca de elementos indicativos da promoção dos estudantes, assim como a elaboração de índices de
desemprego pelos governos, permitindo gerar uma referência nacional de qualidade do ensino, cabe
reconhecer que os processos avaliativos em vigor pouco ou nada contribuem para construção de co-

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 2 32


nhecimento dos estudantes.

Para a dificuldade de avançar nessa perspectiva concorre tanto a cultura avaliativa herdada da
escola tradicional quanto a falta de conhecimento dos professores sobre as concepções de avaliação
presentes nos procedimentos que empregam – ou seja, falta de formação quanto às possibilidades de
contribuição da avaliação para os processos de ensino-aprendizagem.

No que diz respeito á cultura avaliativa, não podemos esquecer a base autoritária e discipli-
nadora que constitui e que ainda fundamenta a organização pedagógica e burocrática das escolas de
ensino fundamental. As práticas educativas, inclusive as avaliativas, refletem o caráter sócio-históri-
co-cultural da educação, do mesmo modo que esta perpetua e alimenta determinadas práticas sociais.
Sendo assim, como ressalta Cipriano (2007, p.45), embora tenhamos nas escolas um discurso de
desejo de formação dos alunos por meio de processos de aprendizagem significativas, de promover
sujeitos, emancipar mentes e transformar o meio social via formação reflexiva e crítica, a avaliação
permanece repressora – conteudista, sem considerar o histórico e o processo de cada aluno, sem au-
xiliar o docente a elaborar estratégias para práticas de ensino futuras.

“A avaliação na sala de aula tem que estar para além do autoritarismo” fundamentada numa
concepção de conhecimento, sociedade e educação, que possibilite ampliar a compreensão
do processo avaliativo para além da verificação. O autoritarismo da avaliação exclui ou
ignora um fazer com a responsabilidade pelo aprender. Ela não é para dominar, não é para
o professor, mas para a emancipação do aprendiz. [...] (LUCKESI 1980 apud CIPRIANO,
2007, P.45).

Endossando a mesma posição, Álvarez Mendez (2002), ao indagar a respeito do objetivo da


avaliação, ou sobre o porquê e para que avaliar, sustenta que a resposta nos remete, necessariamen-
te, ao sentido que tenha o conhecimento ou que a ele seja atribuído. Segundo o autor,

(...) o conhecimento deve ser o referente teórico que dá sentido global ao processo de
realizar uma avaliação. Aqui está o sentido e o significado da avaliação, como substrato, o
da educação. (p.29).

Portanto, para esse autor, a avaliação está estritamente ligada a natureza do conhecimento, e
uma vez reconhecida essa natureza, a avaliação deverá ajustar-se a ela se quiser ser fiel e manter a
coerência epistemológica.

Nessa direção, partimos do pressuposto de que a avaliação, como prática escolar, não é uma
atividade neutra ou meramente técnica, isto é, não se dá num vazio conceitual, mas é dimensionada
por um modelo teórico de mundo, de ciência e de educação, traduzida em prática pedagógica.

Um segundo pressuposto é que a prática de avaliação dos processos de ensino e de aprendiza-


gem ocorre por meio da relação pedagógica que envolve intencionalidades de ação, objetivadas em
condutas, atitudes e habilidades dos atores envolvidos.

Na condição de avaliador desse processo, o professor interpreta e atribui sentidos e significa-

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 2 33


dos a avaliação escolar, produzindo conhecimentos e representações a respeito da avaliação e acerca
de seu papel como avaliador, com base em suas próprias concepções, vivencia e conhecimentos.
Nesse sentido, Sordi (2001) afirma:

Uma avaliação espelha um juízo de valor, uma dada concepção de mundo e de educação,
e por isso vem impregnada de um olhar absolutamente intencional que revela quem é o
educador quando interpreta os eventos de cena pedagógica. (p.173)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo deste texto, procurou-se discutir a compreensão que temos do processo de avaliação
da aprendizagem, com base na Lei de Diretrizes e bases da Educação Nacional nº 9394/96 e o que
ocorre dentro dos sistemas de Ensino.

Observasse também que avaliar tem-se confundido com a possibilidade de medir a quantidade
de conhecimentos adquiridos pelos alunos e alunas, considerando o que foi ensinado pelo professor
ou professara.

A complexidade das questões relativas à avaliação, assim como a multiplicidade dos atores
envolvidos nos seus processos, não permite propor ações imediatas com o intuito de rever dificulda-
des no curto prazo. Distante de imaginar que a mera inclusão de uma disciplina/conteúdo na grade de
formação seja capaz de alterar o quadro aqui descrito, para que avanços ocorram tanto na teoria quan-
to na prática, parece-nos necessários que instituições encarregadas na formação de professores, em
todos os níveis (graduação, pós-graduação, formação continuada), atentem para a importância deste
tema. Do mesmo modo, cabe aprofundar pesquisas sobre como os professores pensam e elaboram os
processos avaliativos, investigando os fundamentos das suas práticas. Tais medidas devem merecer
atenção das políticas públicas, podendo ser chave para elevar os índices resultantes dos testes de larga
escala.

Mas, ainda que os objetivos dos diversos atores sociais envolvidos nestes processos estejam
imbuídos do ideal emancipatório, ou seja, de promoção de sujeitos e contribuição para a aprendiza-
gem, a herança cultural da avaliação classificatória da escola tradicional, aliada à falta de formação e
conhecimento dos professores sobre práticas formativas, não permite contemplar estes objetivos.

De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96, que vigora
atualmente no país,

A verificação do rendimento escolar deve se dar por meio de uma avaliação contínua e
cumulativa do desempenho do aluno, com prevalência dos aspectos qualitativos sobre os
quantitativos e dos resultados ao longo do período sobre os de eventuais provas finais (art.
24, inciso V).

Como se pode notar, com base na lei, o processo avaliativo deve ser contínuo e os critérios
qualitativos prevalecem sobre os quantitativos. Mas, na verdade, isso não acontece. Atribuir uma

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 2 34


nota é apenas parte do processo. A avaliação deve assumir um papel de investigação e reflexão das
ações desenvolvidas na sala de aula, ocorrendo durante todo o percurso do aluno e não apenas do seu
término.

Como vimos às possibilidades de fazer da avaliação elemento/subsidio para construir conhe-


cimento está presente em diversas propostas avaliativas, surgida nos últimos anos, fundamentados
em uma concepção emancipatória. A avaliação, portanto, deve enfocar não só o aluno, mas também
o currículo, o modo de ensinar e como cada aluno desenvolve sua aprendizagem em respostas às ex-
periências que lhe são proporcionadas pela escola.

REFERÊNCIAS

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Superior. Campinas, SP: Papirus, 2001.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 2 35


CAPÍTULO 3

CONCEPÇÕES SOBRE ALFABETIZAÇÃO NAS


PRÁTICAS ESCOLARES

GERSI PEREIRA LOPES lidade de criar um ambiente alfabetizador rico


Grupo Rhema de Educação em materiais apropriados, levando em conta o
conhecimento prévio dos alunos, garantindo um
DIEGO DA SILVA trabalho contínuo e gradativo para o processo de
Grupo Rhema de Educação; Centro Universitá- aprendizagem. O aprendizado que a criança traz
rio Campos de Andrade. em sua bagagem, é fundamental para aperfeiçoar
o mesmo e construir outros conhecimentos. Pois
ao refletir sobre o processo de integração dos
RESUMO: O presente artigo propõe uma refle- alunos na escola acontece através da obtenção
xão sobre as concepções da alfabetização nas práti- da leitura e escrita. Para desenvolver esse artigo
cas escolares, focando, letramento, docente alfabe- foi realizada uma pesquisa bibliografia, baseando
tizador e o ambiente alfabetizador. Desse modo, nos autores Emília Ferreiro, Adelson Carvalho,
os estudos e as pesquisas em alfabetização têm Magda Soares, entre outros.
seus objetivos relacionados na importância da
PALAVRAS-CHAVE: Alfabetização. Letra-
concepção da alfabetização em ambiente escolar,
mento. Leitura e Escrita.
para o desenvolvimento e aprendizagem, uma
vez que ao se alfabetizar a criança ou cidadãos
adquirem melhores condições de vida tanto pes-
soalmente quando socialmente. Neste contexto, ABSTRACT: This article proposes a reflection
conhecer as concepções que o processo de alfa- on the conceptions of literacy in school practices,
betização nos dá é fundamental para podermos focusing on literacy, literacy teacher and literacy
compreender o quanto é essencial e difícil para environment. Thus, studies and research in lite-
as crianças atingir esse processo. Entretanto na racy have their related objectives in the impor-
atualidade percebe-se que os termos alfabetiza- tance of the conception of literacy in the school
ção e letramento tem alcançado uma proporção environment, for development and learning, once
importante, visto que os mesmos devem cami- the children become literate or citizens acquire
nhar juntos para que o processo de alfabetização better living conditions both personally and so-
aconteça de maneira ampla e com significado na cially. In this context, knowing the conceptions
vida dos estudantes. Outra questão importante no that the process of literacy gives us is fundamen-
ato de alfabetizar está ligada ao professor alfabe- tal to understand how essential and difficult it is
tizador, pois o mesmo acaba tendo a função de for children to achieve this process. However,
proporcionar esses conhecimentos, através das nowadays it is perceived that the terms literacy
mais variadas formas e estratégias. Além, de tudo and literacy have reached an important propor-
isso para trabalhar a alfabetização é fundamental tion, since they must move together so that the
considerar o ambiente alfabetizador, pois assim, literacy process happens in a broad and meaning-
as crianças terão acesso à aprendizagem de ma- ful way in the students’ lives. Another important
neira prazerosa e ilustrativa. Os professores como issue in the act of literacy is linked to the literacy
guiadores deste processo possuem a responsabi- teacher, because it ends up having the function

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 36


of providing this knowledge through the most varied forms and strategies. In addition to all this, in
order to work on literacy, it is fundamental to consider the literacy environment, since children will
have access to learning in a pleasurable and illustrative way. Teachers as guiders of this process have
the responsibility of creating a literacy environment rich in appropriate materials, taking into account
the prior knowledge of the students, ensuring a continuous and gradual work for the learning process.
The learning that the child brings in his luggage is fundamental to improve it and build other know-
ledge. For reflecting on the integration process of students in school happens through the acquisition
of reading and writing. To develop this article a bibliography research was carried out, based on the
authors Emília Ferreiro, Adelson Carvalho, Magda Soares, among others.

KEYWORDS: Literacy. Literature. Reading and writing.

INTRODUÇÃO

O artigo em questão distende através de uma pesquisa bibliografia de diversos autores que
apresentam acerca o processo de alfabetização, tendo como objetivo compreender o processo da al-
fabetização pelo quais as crianças passam suas dificuldades e aprendizagem no processo educacional
e escolar. Por isso, no desenvolvimento deste trabalho apresentaram-se as discussões que vem sendo
realizadas nos âmbitos da alfabetização e daquelas que estão sendo feitas na linguística, voltados para
os aspectos que envolvem a aquisição da linguagem escrita e aprendizagem da leitura.

Polemizaram as concepções sobre a alfabetização, numa perspectiva onde a criança cons-


trói seus conhecimentos e aprendizagem através do convívio com o adulto e com os objetos, como
ainda na sociedade que se encontra inserida. Exerce uma reflexão sobre o processo de alfabetização e o
letramento, considerando os aspectos de suma importância para a alfabetização dos alunos. Conforme
Tfouni (2000), a alfabetização refere-se à aquisição da escrita como aprendizagem de habilidades
para a leitura, escrita e as chamadas práticas de linguagem e o letramento enfatiza o aspecto sócio
históricos da aquisição da escrita.

De acordo com Soares (2000) quando acercamos o assunto alfabetização estamos nos re-
trogradamos a consecução da leitura e da escrita, enquanto que ao tratamos de letramento estamos
alegando a requisito de quem não apenas sabe ler e escrever, mas que realiza atividades que usam a
escrita.

Salienta a importância do professor alfabetizador para que este transcurso seja trabalhado de
modo competente, onde ele seja capaz de alcançar alternativas e estratégicas diversificadas para que
a aprendizagem da leitura e escrita aconteça amplamente. Valorizar os ambientes alfabetizador pode
apresentar-se como um suporte fundamental para que o processo de alfabetização seja alcance os
objetivos com coerência, e assim as crianças atinjam seus objetivos, tornar-se cidadãos atuantes na
sociedade.

Segundo Teberosky (2003) os professores como guiadores deste processo possuem a res-

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 3 37


ponsabilidade de criar um ambiente alfabetizador rico em materiais apropriados, levando em conta
o conhecimento prévio dos alunos, garantindo um trabalho contínuo e gradativo para o processo de
aprendizagem.

CONCEPÇÕES SOBRE ALFABETIZAÇÃO

O processo de alfabetização busca concepção que oportunizam estratégias para apropriação


da aprendizagem. Segundo Sopelsa (2012) a alfabetização é uma das etapas que contribui para a
evolução intelectual do aluno, e é um processo contínuo que ocorre de maneira gradativa. Visto que a
criança é considerada como um sujeito ativo que interage com os outros objetos e com outras pessoas,
e, constrói conhecimentos, na sociedade em que está inserida. Assim, Ferreiro (1996). “O desenvol-
vimento da alfabetização ocorre, sem dúvida, em um ambiente social. Mas as práticas sociais assim
como as informações sociais, não são recebidas passivamente pelas crianças”.

Portanto a forma de compreender o avanço pelo qual o estudante percorre no processo de


alfabetização progride e atingem graus diferenciados, o que faz aperceber o vínculo desse processo
e o entendimento que a alfabetização, o ler, o escrever e o desenvolvimento cognitivo são de suma
importância para o aprendizado dos mesmos.

O processo da alfabetização deve considerar que o mesmo inicia, antes da criança iniciar sua
vida escolar, pois ela vive em constante aprendizagem. De acordo Palhares (2016) crianças de socie-
dades como a nossa, muito centradas na escrita, já iniciam seu processo de alfabetização e letramento
antes mesmo de chegar às instituições de ensino formal. Aprender a ler e escrever faz parte dessa
aprendizagem. Neste contexto Ferreiro (1999, p.47) afirma que “a alfabetização não é um estado ao
qual se chega, mas um processo cujo início é na maioria dos casos anterior a escola é que não termina
ao finalizar a escola primária”.

Ainda ressalta que,

Há crianças que chegam à escola sabendo que a escrita serve para escrever coisas inteligentes,
divertidas ou importantes. Essas são as que terminam de alfabetizar-se na escola, mas
começaram a alfabetizar muito antes, através da possibilidade de entrar em contato, de
interagir com a língua escrita. Há outras crianças que necessitam da escola para apropriar-se
da escrita. (FERREIRO, 1999, p.23).

O aprendizado que a criança traz em sua bagagem, é fundamental para aperfeiçoar o mesmo e
construir outros conhecimentos. Pois ao refletir sobre o processo de integração dos alunos na escola
acontece através da obtenção da leitura e escrita. Compreender o processo de alfabetização das crian-
ças da leitura e escrita, situação está importante para a inclusão na vida social, proporciona entendi-
mento e respeito do universo da ligação que influencia na construção da vivencia da criança, e é neste
momento que o desenvolvimento humano se dá a partir da compreensão mundo.

De acordo com Batista,

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 3 38


O objetivo da alfabetização vai além da decodificação, pois ler e escrever tem como fim
último promover a compreensão: compreender o que se lê; o que se fala; como funciona
o mundo. É correto dizer, como sugere a professora Marisa Lajolo, que se deve “partir do
mundo da leitura do mundo”, e que não basta decodificar, é preciso compreender o sentido
da palavra e do texto no contexto (BATISTA, 2006, p.19).

ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO

As discussões em torno letramento no Brasil surgiram na década de 80. O debate envolveu


questões sobre o que é ser alfabetizado e o que é ser letrado. Para diferenciar os dois termos Carva-
lho (2007) menciona, “[...] uso a palavra alfabetização no sentido restrito de aprendizagem inicial de
leitura, isto é a ação de ensinar (ou o resultado de aprender) o código alfabético, ou seja, as relações
entre letras e sons.” (p.65). Observa-se que a autora aponta para uma especificidade da alfabetização
que seria a ação do professor ensinar e do aluno aprender o código alfabético. Por outro lado, letrado
seria aquele sujeito que conhece a leitura e a escrita e consegue utilizá-las para resolver situações do
dia a dia. Carvalho explica a diferença,

Uma pessoa alfabetizada conhece o código alfabético, domina as relações grafo fônicas, em
outras palavras, sabe que sons as letras apresentam, é capaz de ler palavras textos simples,
mas não necessariamente é usuário da leitura e da escrita na vida social. Pessoas alfabetizadas
podem, eventualmente, ter pouca ou nenhuma familiaridade com a escrita de jornais, revistas,
documentos, e muitos outros tipos de textos; podem também encontrar dificuldades para
se expressarem por escrito. [...] Letrado, no sentido em que estamos usando esse termo,
é alguém que se apropriou suficientemente da escrita e da leitura a ponto de usá-las com
desenvoltura, com propriedade, para dar conta de suas atribuições sociais e profissionais
(CARVALHO, 2007, P.66).

Neste contexto, pode-se considerar que o alfabetizado conhece o código, lê e escreve, mas têm
pouca familiaridade com textos que circular nas diversas instâncias sociais. A aquisição do código
pode ter ficado restrito ao material didático e a pessoa acaba construindo a ideia de que somente este
tipo de texto serve para aprender ler e escrever. Enquanto, o letrado, por sua vez usa a leitura com
desembaraço para resolver situações na vida social e profissional, mas desconhece o funcionamento
do código.

Ao pensarmos em alfabetização devemos ter em mente que as crianças possam atingir seu
desenvolvimento de forma continua, onde seus conhecimentos consiga interagir socialmente com
o outro, ter acesso aos bens culturais e agir no mundo letrado. Pois a alfabetização e letramento são
palavras chave para o mundo social, porque é através da alfabetização e do letramento que as pessoas
conseguem participar diretamente do mundo no exercício de suas funções sociais, buscando o domí-
nio do código convencional da leitura e da escrita em suas práticas sociais.

Soares (1990) em sua concepção de alfabetização, sintetiza que:

Alfabetizar é propiciar condições para que o indivíduo-criança ou adulto tenham acesso


ao mundo da escrita, tornando-se capaz não só de ler e escrever, enquanto habilidade
de decodificação e codificação do sistema de escrita, mas, sobretudo, de fazer uso real e

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 3 39


adequado da escrita em todas as funções em que ela tem em nossa sociedade, também como
instrumento de luta pela conquista da cidadania (SOARES, 1990, p.17).

Magda Soares (2004) apresenta o seguinte posicionamento para o letramento.

Letramento é usar a escrita para se orientar no mundo (o atlas), nas ruas (os sinais de transito)
para receber instruções (para encontrar um tesouro... para consertar um aparelho... para tomar
um remédio), enfim, é usar a escrita para não ficar perdido (SOARES, 2004, p. 43).

Ainda segundo Soares (1998): Alfabetizar e letrar são duas ações distintas, mas não insepará-
veis, ao contrário, o ideal seria alfabetizar letrando, ou seja, ensinar a ler e a escrever no contexto das
práticas sociais da leitura e da escrita (SOARES, 1998, p. 47). 

Nesta perspectiva, percebe-se em uma sociedade letrada as crianças mantém-se uma interliga-
ção com a linguagem escrita, compreendendo sua utilização, características e modalidades, bem antes
do seu ingresso na escola. Letramento e alfabetização são processos distintos, porém interdependen-
tes e indissociáveis. Soares aponta que no letramento ocorre,

[...] imersão das crianças na leitura e na escrita, participação em experiências variadas com
a leitura e a escrita, conhecimento e interação com diferentes tipos e gêneros de material
escrito – e o que é propriamente da alfabetização, [...] consciência fonológica e fonêmica
das relações fonema-grafema, habilidades de codificação e decodificação da língua escrita,
conhecimento e reconhecimento dos processos de tradução da forma sonora da fala para a
forma gráfica da escrita [...] (SOARES, 2003, p.15)

Aprender a ler significa aprender a ler o mundo, a leitura é o princípio de discernimento


que assentam de grande incentivo e motivação com a finalidade para a criança goste da escola e de
estudar. Desse modo torna um desafio às escolas e aos profissionais da educação que atuam nelas,
particularmente no que diz respeito aos processos de alfabetização e letramento, visto que requer
organizar propostas de ensino que colaborem efetivamente para o desenvolvimento das capacidades
linguísticas implicadas no processo de aquisição da linguagem escrita e da leitura. A escola, nessa
concepção, deve trabalhar de maneira adequada, buscando a relação entre alfabetizar e letrar, para
assim, sistematizar o saber, favorecendo, a formação crítica e reflexiva dos indivíduos. Assim, ocorre
principalmente à troca de informações, fator esse determinante no processo de ensino e de aprendi-
zagem.

Quando a criança inicia o processo de alfabetização passa a ampliar sua visão de realidade,
com isso torna-se fundamental que esse processo seja estimulado e ofertado subsidio para que se tor-
ne importante e com ênfase na vida das crianças. Pois uma proposta de alfabetização requer organi-
zar rotinas, em projetos sequenciais e atividades permanentes e escolhas de bons materiais de leitura
e escrita, como ainda saber estudá-los, fazendo uma reflexão sobre a escrita e com práticas sociais
de leitura e produção de textos torna-se bem mais efetivo neste processo que requer o conhecimento
propriamente dito. (HANCK , 2006)

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 3 40


Neste sentido, o PCN-Língua Português (1997) é condição necessária a todo o ser humano,
para se chegar à possibilidade de plena participação social, o domínio da língua, já que é por meio
dela que se pode ter o acesso à informação, obter conhecimentos, construir visões de mundo, posicio-
nar-se, enfim, fazer parte do mundo e exercer de forma ativa a sua cidadania, é, portanto, responsabi-
lidade da escola, ensinar e garantir o acesso aos conhecimentos que se fazem necessário para que de
fasto seja estabelecido o a formação do cidadão pleno.

Pode-se observar que o desenvolvimento das crianças dá-se através das mais variadas ma-
neiras diferentes suportes como placas, outdoors, rótulos de embalagens, escutam histórias e nessas
experiências culturais com práticas de leitura e escrita a criança vai se constituindo como sujeito
letrado, construindo seu aprendizado com significado, tornando-se um cidadão atuante na sociedade.
(KLOSINSKI,2003).

Morais e Albuquerque (2004) contribuem quando ressaltam que: As crianças vivem em am-
bientes ricos em experiências de leitura e escrita, não só se motivam para ler e escrever, mas come-
çam, desde cedo, a refletir, ter sobre as características dos diferentes textos que circulam ao seu redor,
sobre seus estilos, usos e finalidades.

Nesse entendimento, Morais e Albuquerque (2004) afirmam que para alfabetizar letrando fa-
z-se necessário democratizar a vivencia de práticas de uso da leitura e escrita e ajudar a criança a
ativamente reconstruir essa invenção social que é a escrita alfabética. Esses autores referem–se sobre
os aspectos constitutivos de uma prática de alfabetização na perspectiva do letramento, pois entende-
-se que ser letrado é empregar a leitura e/ou a escrita, nas diferentes situações sociais, tanto público
quanto privadas. Assim, a ampliação dos modos de acessos e de intervenção no universo letrado
estará vinculada à dimensão sistêmica e discursiva da língua configurando – se na alfabetização e no
letramento.

O PROFESSOR ALFABETIZADOR

Após a reflexão sobre a alfabetização e letramento, torna-se importante compreendermos o


papel o professor alfabetizador frente a esse processo, visto que estes são considerados responsáveis
para que as crianças consiga ler e escrever, principalmente nas séries iniciais do Ensino Fundamental.

O professor alfabetizador precisa de outros dons para se sair bem. Ele deve ter respeito pelos
alunos, evitar o papel de cúmplice de um sistema interessado em manter esmagada uma grande parte
do seu povo, confiar na capacidade de desenvolvimento dos alunos e ter criatividade, inventividade,
iniciativa, combatividade e fé em sua capacidade de tornar este mundo melhor. (LEMLE, 1988, p.6)

O docente precisa compreender como o sistema da escrita funciona. Deve entender que a fala,
a leitura são processos distintos, porém, interligados, pois a aprendizagem da escrita tem com a fina-
lidade a leitura. Esta, por sua vez focaliza a fala.

O alfabetizador necessita-se conscientizar que a criança ao se alfabetizar, reflete sobre a lín-

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 3 41


gua escrita, formula hipóteses e cria suas formas de registro recorrendo sempre à linguagem oral.
Oralidade, leitura e escrita são processos interligados. Um interfere no outro durante o processo de
alfabetização.

Macedo e Freire (1990) abordam o processo de alfabetização apresentando duas importantes


dimensões,

As duas dimensões da alfabetização: a) a alfabetização do aluno deve iniciar-se com


experiências e a cultura de seu meio b) depois apropriar-se dos códigos e culturas dominantes.
Ambas, subjetividade e objetividade não podem ser separadas. Por isso é que Freire diz que
é impossível levar avante um trabalho de alfabetização, separando completamente a leitura
da palavra do mundo. Por isso, a escola deve fazer diferente do que faz e deixar de reprimir o
aluno, mas deixá-lo aflorar sua subjetividade, sua criatividade e enfatiza que uma pedagogia
crítica não deve reprimir a criatividade do aluno (a expressão à criatividade vem sendo uma
verdade no correr de toda a história da educação). A criatividade precisa ser estimulada, não
só no nível de sua individualidade, mas também no contexto social. Em vez de sufocar esse
ímpeto de curiosidade, os educadores deveriam estimular ou arriscar-se, sem o qual não
existe criatividade. Em vez de reforçar as repetições puramente mecânicas de frases e listas
de fatos ou acontecimentos, os educadores deveriam estimular os alunos a duvidar. (FREIRE;
MACEDO, 1990, p.38-39).

Cagliari (2007) diz que, “[...] a alfabetização é a aprendizagem da leitura e da escrita. [...] ler
e escrever são atos linguísticos”. Portanto, ao professor alfabetizador, é de fundamental compreen-
der como a linguística aplicada à alfabetização explica certas situações que ocorrem no ato de ler e
escrever, principalmente, os aspectos relacionados à variação linguística. Contudo, faz-se necessário
entender que os atos que o ato de ler e escrever não são tão simples como parecem “[...] a escrita é
algo com o qual nós, adultos, estamos tão envolvidos que nem nos damos conta de como vive alguém
que não lê e não escreve, de como a criança encara essas atividades...” (CAGLIARI, 2007, P.96).

Umas as grandes dificuldades do professor alfabetizador é justamente perceber que a criança


lida com o processo de aprendizagem da leitura e da escrita. Até iniciar sua escolarização, ela utiliza
a linguagem oral para comunicar-se com as outras pessoas e com o mundo à sua volta. Na escola,
descobre outra forma de comunicação, a escrita, mas para compreender esse novo processo, precisa
assimilar uma série de convenções que, muitas vezes, está distante do seu universo de compreensão.
Ao escrever, passa a utilizar de signos que representam os objetos. Além de formar a ideia sobre o
objeto, precisam entender que as palavras são formadas por letras e que essas podem ser representa-
das de várias formas. E no inicio do processo de alfabetização, o contato das crianças com a escrita
causam confusões em suas compreensões.

Segundo Cagliari,

Para nós, adultos quaisquer A é A, seja ele escrito como for. Quando a criança começa a
aprender a escrever, ninguém lhe diz isso e, muitas vezes, ela fica admirada diante das coisas
que a professora (e os adultos) fazem com as letras. (CAGLIARI, 2007, P.97).

A alfabetização é um processo de muitas descobertas e muitas dessas descobertas são feitas


pela criança sem que ela se dê conta disso, pois “a escola ensina a escrever sem ensinar o que é escre-
ver, joga com a criança sem lhe dizer as regras do jogo.” (CAGLIARI 2007).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 3 42


É fundamental que o professor alfabetizador considere que a criança em processo de alfabe-
tização descobre, aos poucos, como a linguagem funciona. Quando o professor trabalha esse aspecto
com os alunos possibilita que eles percebam que à língua falada pode ser segmentada, ou seja, tudo o
que falamos pode-se registrar. E assim vai construindo seus conhecimentos com significados amplos
e seguros. (SOUSA, 2016).

Uma boa proposta de alfabetização requer que do professor alfabetizador um bom planeja-
mento o que pressupõem saber como os alunos escrevem, organizar rotinas em projetos, sequências
e atividades permanentes e escolher bons materiais de leitura e estudá-los, Além disso, não podem
faltar em sala as letras do alfabeto, a lista de nomes dos estudantes, livros e os textos à gostos das
crianças. Assim na hora de escrever, eles terão onde se apoiar ou verificar palavras conhecidas oficiais
e se as antecipações realizadas estão corretas.

IMPORTÂNCIA DO AMBIENTE ALFABETIZADOR

O processo ensino aprendizagem deve estar pautado entre a teoria e a prática, neste sentido
ter os ambientes alfabetizadores nas salas é importante visto que nossos alunos apreendem das mais
diversas formas e tempos. Assim sendo, este processo deve contemplar atividades aos alunos que
permitam observar, comparar, operar, experimentar, pesquisar, aplicar e manusear objetos reais.

Assim, nas palavras de Souza (2005):

(...) a oportunidade de estar em um ambiente planejado e cuidado para elas, pensando de


forma humanizadora, buscando ser um espaço de promoção da vida, do crescimento, do
desenvolvimento e da aprendizagem, sem perder de vista que isso terá também consequências
positivas para todos os demais atores envolvidos nesse processo de promoção/construção da
qualidade, no âmbito da instituição educativa e das famílias dessas crianças (SOUZA, 2005,
p. 122).

Propiciar ambientes alfabetizadores é ofertar um recuso externo, imprescindível para atingir


sua aprendizagem de maneira ampla e significativa. São também instrumentos valiosíssimos para
nossa prática em sala de aula.

Neste sentido, ao refletirmos sobre o ambiente alfabetizador nos remetemos imediatamente


às salas de aulas completamente ilustradas com cartazes, alfabeto, figuras, numerais, aliando-se a isso
o livro didático e as atividades pedagógicas propostas diariamente. Pois, devemos ter em mente que
o conhecimento não é algo que vem de cima para baixo, mas sim adquirido com as trocas de expe-
riências, através das vivências com o outro e com o meio. E é justamente esse meio que pode fazer a
diferença quando se trata de atribuição de significado, ou seja, no ambiente, no espaço proporcionado.

Deste modo, Moreira afirma que:


O ambiente de aprendizagem escolar é um lugar previamente organizado para promover
oportunidades de aprendizagem e que se constitui de forma única na medida em que é
socialmente construído por alunos e professores a partir das interações que estabelecem entre
si e com as demais fontes materiais e simbólicas do ambiente (MOREIRA, 2007, p. 43).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 3 43


Percebe-se que através dos ambientes alfabetizadores nossos alunos tem acesso a momentos
interessantes e criativos e atrativos, visando além do aspecto cognitivo, o social, o afetivo, o psico-
motor, com o intuito de atingir com êxito a aprendizagem.

Ambientes alfabetizadores precisam ser antes de tudo, apresentados às crianças, não como
mais um espaço disponível, mas como “o lugar”, do saber, do aprender, do criar, do produzir, da troca,
da calmaria, da explosão, da construção do conhecimento.

CONCLUSÃO

Ao concluir este artigo percebe-se que o processo de alfabetização das crianças através de
leitura e escrita, torna-se condição necessária para a integração na vida social. É preciso assimilar e
situar em práticas levando aos nossos estudantes leituras interessantes que forneçam uma identifica-
ção com a vivência diária de cada um.

Como pode-se observar, letramento e alfabetização são processos distintos, mas que não de-
vem ser dissociados. Não se trata de alfabetizar sem letrar ou vice-versa. É importante ressaltar que,
na alfabetização, não se trata de agora em diante, retornar os métodos sintéticos ou analíticos, mas de
selecionar textos significativos que circulam na sociedade e promover uma reflexão sobre a língua.

Enquanto, professor alfabetizador necessita apresentar óbvios em suas ações o objetivo que
pretende atingir, como concebe a alfabetização e o letramento, percebeu também que alfabetizar
letrando, é ensinar a ler e escrever no contexto das práticas sociais da leitura e da escrita, assim o
educando deve ser alfabetizado e letrado para assim construir a aprendizagem de forma ampla e sig-
nificativa. Além do que professor deve ter consciência que alfabetizar não é apenas ensinar a ler e
escrever, o aluno precisa sair da escola, sabendo ler, escrever, inferir, se expressar, compreender, fazer
uso social da escrita.

Pode-se constatar que o ambiente alfabetizador é um importantíssimo suporte para tornar a


alfabetização um momento prazeroso, onde as crianças terão ao seu alcance diversos materiais que
auxiliaram na aprendizagem da leitura e escrita. Portanto, este local necessita ser apresentado aos
alunos como um local disponível de aprendizagem, de saber, onde eles poderão criar, recriar, produzir
e construir conhecimento.

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SOARES, Magda. A reinvenção da alfabetização. ​Disponível em:http://www.meb.org.br/bibliote-


ca/artigomagdasoares.Acesso em: 23/10/2016.

SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 1998.

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SOUSA.D.R.V.E . Alfabetização e letramento na educação infantil, disponível em http://www.bi-


bliotecadigital.ufmg.br/dspace/bitstream/handle/1843/BUBD-AAQEU6/disserta__o_vers_o_final_.
pdf?sequence=1.Acesso . Acesso em 13/04/2018.

__________ Letramento: um tema em três g​ êneros / Magda Soares. 2. ed. 8. Reimpor. Belo Hori-
zonte: Autêntica 2004.

SOARES, Magda. Letramento: um tema em três gêneros. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2000.

PALHARES.I 2016, A alfabetização deve começar na educação infantil, disponível em: http://
sao-paulo.estadao.com.br/noticias/geral,a-alfabetizacao-deve-comecar-na-educacao-infantil-
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TEBEROSKY, Ana. Aprender a ler e escrever: uma proposta construtivista. Porto Alegre: 2003.

TFOUNI, Leda Verdiani. Letramento e Alfabetização. São Paulo, Cortez, 1995.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 3 45


CAPÍTULO 4
DESENVOLVIMENTO DE JOGOS DIGITAIS: O USO
DO SCRATCH COMO FERRAMENTA DE ENSINO DE
MATEMÁTICA

JHONNY NUNES DA CUNHA 60% nos estudantes dinumeraram sua aversão


Faved - MG a matemática e melhoraram seu despenho em
aula de aula de nas provas, a medias dos alunos
aumentaram em 30% depois da aplicação da
RODRIGO MIYASAKI eletiva.

RESUMO: O projeto se deu depois de observar PALAVRAS-CHAVE: Desenvolvido de jogos.


a disparidade de participação dos estudantes entre Ensino de matemática. Aversão a matemática.
as disciplinas de filosofia e matemática. Atuando
como professor de filosofia desde 2012, sempre
tive envolvimento de mais de 90% da durma no
decorrer da aula, em 2017 após concluir minha
formação em matemática e fui ministrar aulas de 1. INTRODUÇÃO
matemática, para minha surpresa o envolvimento
da turma não era o mesmo. Só então notei
a aversão dos estudantes a disciplina de
matemática, visando aproximar a matemática dos O ensino de matemática no Brasil enfren-
estudantes desenvolvemos uma eletiva de criação ta sérios problemas. É comum encontrar alunos
de jogos eletrônicos, onde a matemática pode ser que tem grande aversão as aulas de matemáticas,
trabalhar de formas mais lúdicas, minimizando a
que chegam no ensino médio sem saber o bási-
visão negativa que os estudantes têm da mesma.
Optamos por utilizar para criação dos jogos o co, como multiplicação, divisão e operações com
Scratch, uma ferramenta de simples utilização, números negativos, conteúdo esse que foi exaus-
mas com auto potencial educativo. Com o tivamente trabalhando do ensino fundamental.
Scratch pode-se trabalhar com os estudantes
raciocínio logico sem aplicação de regrar Mas afinal, porque o aluno não consegue interna-
rígidas, já que existe uma infinidade formar para lizar esse conteúdo? A essa questão essencial que
programar o mesmo jogo. A meta foi desenvolver se propõe esse artigo, para isso será proposto uma
no estudante a capacidade de analisar situações
genealogia do ensino de matemática, na tentativa
problemas e procurar uma solução para a mesma,
tal capacidade é indispensável na disciplina de identificar na origem se haviam problemas e
de matemática. Em um primeiro momento se quando eles começaram a surgir.
observou o envolvimento das estudantes com os
meios tecnológicos, se percebeu que 95% dos A Matemática surge com a necessidade de
estudantes gostavam de jogos, mas não tinham se guardar informações comerciais feitas entre fa-
ideia de como era o processo de criação, o que mílias ou tribos. Nos primórdios seu ensino ocor-
tornou viável a criação de um componente
curricular para contemplar o interesse dos re na informalidade, o conhecimento é repassado
estudantes. Os resultados foram bem satisfatórios, pela tribo ou pela família. Embora não se tenha

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 46


grandes informações sobre esse período, pode-se perceber de forma clara a primeira metodologia de
ensino de matemática.

A história dos números tem alguns milhares de anos. É impossível saber exatamente como
tudo começou. Mas uma coisa é certa; os homens não inventaram primeiro os números para
depois aprenderem a contar. Pelo contrário, os números foram se formando lentamente, pela
prática diária das contagens. (VITTI ,1999, p. 50).

A aprendizagem se dava de forma prática. Tem-se um problema a ser resolvido, e a matemá-


tica é aplicada naquela solução. Como é impossível ao homem permanecer no mesmo estado para
sempre, tendo em vista a faculdade da perfectibilidade1. Com o desenvolvimento das cidades novos
problemas foram surgindo e matemática continua dando suporte a resolução.

Schopenhauer, filósofo alemão do século XIX, defende que a evolução do ser humano nem
sempre é gradual, a raça humana pode retroceder com o passar dos anos. Fora o que aconteceu com
o ensino de matemática, por um lado os problemas se multiplicaram de forma monstruosa, mas o en-
sino não foi associado a resolução de problemas reais, que podem ser visualizados pelos aprendizes.
Criou-se uma matemática desconectada do real, que na maioria das vezes não é compreendida pelo
aluno.
Charlot, pesquisador francês dos processos de aprendizagem afirma:

Aprender é uma relação entre duas atividades: a atividade humana que produziu aquilo que
se deve aprender e a atividade na qual o sujeito que aprende se engaja — sendo a mediação
entre ambas assegurada pela atividade daquele que ensina ou forma. Em termos simples: para
apropriar- se de um saber, é preciso introduzir-se nas relações que permitiram produzi- lo.
O essencial não é repetir a própria atividade humana, tal como ela ocorre ou ocorreu, mas
adotar, durante a atividade de aprendizagem, a postura (relação com o mundo, com o outro e
consigo mesmo) que corresponde a essa atividade humana. Esta é uma condição necessária,
mas não suficiente: é preciso, a partir dessa postura, dominar as operações específicas de tal
atividade -aquelas que constituem sua normatividade. Por outro lado, o processo pode ser
invertido: o domínio progressivo das operações permite, pouco a pouco, assumir a postura.
(CHARLOT, p. 20. 2001).

Falta no ensino de matemática uma situação problema, os conteúdos estudados para fazer parte da
vivência dos estudantes, não é possível aprender algo que não faz parte da sua realidade, por isso a
aversão ao ensino matemático.

O professor que atua no ensino regular sempre é desafiado a ensinar matemática para não-ma-
temáticos, o que torna o processo ainda mais completo. O processo ensino aprendizagem pressupõe
alguém que quer ensinar e outrem que deseja aprender, como a utilidade da aprendizagem matemática
não é demonstrada o processo é falho. Na maioria das vezes tem-se de um lado o educador que deseja
ensinar, mas falta do aluno o querer aprender, no mundo da liberdade é impossível subjugar o desejo
do outro.

1 Teoria defendida por Rousseau no Século XVI, diz respeito a capacidade de mudança, o homem não pode per-
manecer no mesmo estado.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 4 47


2 - Tecnologias da Informação e Comunicação na Educação (TICs)

O professor do século XXI precisa estar disposto a lidar com as novas tecnologias em sala
de aula, a maioria dos professores ainda veem a tecnologia como empecilho para o processo de
aprendizagem tradicional. É praticamente impossível lidar com educação neste século sem o uso
da tecnologia, o ensino bancário não chama desperta a curiosidade do estudando, a curiosidade é o
principio fundante do processo de aprendizagem.
2
O PNC recomenda diretamente o uso de tecnologia na educação:

É indiscutível a necessidade crescente do uso de computadores pelos alunos como instrumento


de aprendizagem escolar, para que possam estar atualizados em relação às novas tecnologias
da informação e se instrumentalizarem para as demandas sociais presentes e futuras.”
(BRASIL, 1998, p. 96)

Entretanto o simples uso das TICs em sala de aula não resolve a questão, é preciso colocar a
tecnologia a favor da educação.

2.1 Apresentação do Scratch

O Scratch é um sistema open source que foi desenvolvido pelo professor Mitchel Resnick,
do grupo MIT Edu em 2007 para fins educacionais. Segundo a empresa desenvolvedora o sistema é
usado em mais de 150 países e está disponível em mais de 40 línguas. A média de idade dos usuários
varia entre 8 e 16 anos. A maior concentração de usuários se encontra nos Estados Unidos, onde a
programação com Scratch é introduzia como componente curricular nas primeiras fases do ensino.

O programa possibilita que o usuário trabalhe com programação de forma simples, podendo
aliar em um mesmo projeto gráficos, animações, músicas e sons. A interface é intuitiva e composta
por três áreas principais, a saber: Palco, que é a interface gráfica do sistema; Bloco de comandos, par-
te que contém os todos comandos que podem ser utilizados; Área de comandos, nessa parte é criada
a programação.

2 Parâmetro Nacional Curricular

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 4 48


Figura 1: Interface do Scratch em scratch.mit.edu

Todas as ações e movimentos do aplicativo saem do bloco de comando e são arrastadas para
a área de comandos. Os comandos são prontos, cabe ao usuário organiza-los da forma desejada. No
exemplo a seguir quando o usuário clicar em iniciar seu personagem vai andar 1 passo e essa ação vai
ser repetida 10 vezes.

Figura 2: Área de comandos: ação correta.

Como pode ser visto acima, as peças precisam estar devidamente encaixadas para que ação
se realizada. O Scratch tem varias formas de encaixe conforme visto na figura 3. No caso abaixo o
personagem não ira executar nenhuma ação, já que as peças não estão devidamente encaixadas.

Figura 3: Área de comandos: programação incompleta.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 4 49


2. MATERIAL E MÉTODOS

O artigo em questão trata-se de pesquisa qualitativa de caráter exploratório descritivo. Segundo


Gil (1999, p.43) “As pesquisas exploratórias têm como principal finalidade desenvolver, esclarecer e
modificar conceitos e ideias, tendo em vista, a formulação de problemas mais precisos ou hipóteses
pesquisáveis para estudos posteriores”.

O Campo de atuação se deu no laboratório de informática do Colégio Estadual de Período


Integral Professor Pedro Gomes em Goiânia. O laboratório tem 24 computadores com sistema com
o Linux Educacional, fora instalado o Scratch nos mesmos, também foi utilizado a versão web do
Scratch.

A pesquisa contou com estudantes do 7ª ano ao 9ª ano do ensino fundamental, na faixa etária
3
de 11 a 15 anos. Os encontros se deram durante a eletiva de Criação de Jogos Digitais. Foram três
turmas de 17 alunos cada com duas aulas seguidas uma vez por semana.

Em um primeiro momento o software livre Scratch foi apresentado aos estudantes, bem como
seus comandos básicos e a lógica para criar blocos de ação. Os alunos também foram orientados
quando a postura em sala de aula, não sendo permitido a abertura de sites não relacionados os Scratch
e o uso de celulares.

Em um segundo momento fora proposto aos estudantes a criação de algumas ação e jogos
específicos disponíveis no Apêndice A. As aulas sempre tinham como principio que o estudante
aprendesse a logica de programação criando um jogo pre estabelecido pelo professor, depois um
momento livre para criatividade, podendo o aluno criar um jogo ou animação de sua preferência, já
que aprendeu a programação e consegue pensar logicamente sozinho.

Para coleta dos resultados os alunos foram submetidos a resolução de questionário de pesquisa
utilizando o Google Forms. Depois aplicou-se o método de análise quantitativo para analise e junção
dos dados.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

O problema gerador desta pesquisa foi a aversão dos alunos ao ensino de matemática tradicional,
é comum encontrar alunos até mesmo no ensino médio com grande dificuldade nas operações básicas.
A maioria dos professores ensinam o conteúdo de forma mecânica, sem se preocupar com uma
matemática que nasce dos problemas enfrentados no dia-a-dia do aluno. Na eletiva os problemas
lógicos matemáticos tinham notória semelhança com o dia a dia dos estudantes, já que todos gostavam
de jogar.
3 O grande diferencial das disciplinas eletivas é que os estudantes têm a opção de se matricular na eletiva de sua
preferência.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 4 50


3.1 A aulas

3.1.1 Aulas 1 e 2: Conhecendo a História da computação

Na primeira aula foi apresentado aos estudantes a história da computação. Desde a criação
do primeiro computador até a o desenvolvimento da internet. Durante a apresentação os alunos foram
convidados a pesquisar os fatos na internet, a cada nova descoberta via-se a empolgação dos mesmos.
4
Os estudantes ficaram muito impressionados com o fato do ENIAC ter cerca de 180 m² e pesar 30
toneladas.

O Espanto é a ponto central do processo de aprendizagem já afirmava Aristóteles. Tal ação


aconteceu varias vezes durante essa primeira aula de forma especial quando lhes foi pedido que
descobrissem como uma foto pode ser enviada de um computador para outro e como é feita a
comunicação por aplicativos de comunicação. Não demorou muito chegamos ao conceito de pixel,
servidor e linguagem binaria.

3.1.2 Aulas 3 e 4: O que é programação e como era o mundo antes dela.

Apresentamos a linguagem de programação e sua finalidade, neste momento os estudantes


acharam muito complexo e com frequência se ouvia a pergunta “vamos ter que aprender isso para fazer
jogos?”. Por fim apresentamos a ferramenta a ser utilizada para criação dos jogos.

Os estudantes puderam desbravar o Scratch sem os conceitos de certo ou errado. Rapidamente


já surgiram desenhos autorais e o primeiro comando no Scratch, mova 10. A reação dos dissentes
ao conhecer algo novo e condizente com a realidade foi surpreendente. Agora a pergunta mudou
“Programar é só isso?”.

3.1.3 Aulas 5 e 6: Introdução a algoritmos.

Algoritmo é o passo a passo de como fazer cada coisa. Com esse conceito simples iniciamos a
aula e pedimos os estudantes que criassem um algoritmo para as ações de vir a escola, fazer uma prova,
tomar banho, conversar no WhatsApp, dentre outras ações. Cada passo foi exemplificado de forma
detalhada pelos alunos.

Definido o conceito de algoritmo agora é possível criar um jogo ou animação com sequência
lógica. Nesta aula já surgiram as primeiras animações, o personagem se movia e falava alguma frase.

3.1.4 Aula 7 e 8: Criação do primeiro jogo, labirinto.

A ideia de movimento já era concebida pelos estudantes, foi preciso então introduzir a ideia
condicional. Sempre – Se, tocar na cor, volte, conforme exemplo abaixo.

4 Primeiro computador criado em 1946 pelo exército dos Estados Unidos da América.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 4 51


Figura 4: Criação de jogo com labirinto.

Esse foi o primeiro jogo bom objetivo, o jogador não deveria chegar ao final do jogo, mas cada
vez que ele encostava na borda do labirinto ele voltava para o inicio do jogo de tinha de refazer seu
caminho.

3.1.5 Aula 9 e 10: Implementação do primeiro jogo, labirinto.

Depois do primeiro jogo ficar pronto, os estudantes foram convidados a colocar mais algumas
funções para aumentar o grau de dificuldade do jogo, para isso foi introduzido um novo personagem.
O novo personagem que ficariam andando na tela e sempre que o personagem principal o tocasse teria
que iniciar o jogo voltando para a posição de início. Foi apresentada também a ideia de fases no jogo,
sempre que o personagem principal chegar a tal ponto do jogo o mesmo trocaria o plano de junto do
Scratch passando assim para outra fase.

Por fim os estudantes vendo a função som no Scratch ficaram curiosos para ver seu
funcionamento, optamos então por colocar som nesse jogo. Não foi necessário explicar para cerca
de 50% da turma como funcionava, alguns por intuição outros por que olharam na internet como
implementar o som, alguns estudantes chegaram a baixar músicas e sons da internet para seus jogos.

Figura 4: Jogo de labirinto com obstáculos.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 4 52


3.1.6 Aula 11 e 12: Criando um jogo com as operações básicas.

Fora proposto aos alunos a criação de um jogo com as operações básicas da matemática.
O jogo deveria sortear dois números aleatórios, perguntar qual seria a soma, adição, subtração ou
multiplicação dos mesmos, pedir ao jogador que informe qual a resposta correta e por fim verificar se
a resposta informada estava correta ou não.

Nesta aula introduzimos o conceito de variável, os estudantes criaram 3 variáveis N1, que
armazena o primeiro número sorteado, N2 que armazena o segundo número e pôr fim a variável
resultado, que armazena a relação entre os dois números.

Os estudantes se sentiram desafiados a fazer um jogo mais complexo, alguns nunca imaginaram
que seriam capazes de fazer tal programação, entretanto 100% da turma conseguiu realizar com
maestria. Alguns ainda foram além sempre que o jogador errava a questão o jogador mudava de
feição, o mesmo acontecia quando a resposta estava correta.

Figura 5: Jogo com as operações básicas.

4. CONCLUSÃO

O projeto é bem simples de ser replicado por outros professores, o professor pode acessar
o site http://scratch.mit.edu e criar sua conta gratuita possibilitando assim a criação dos jogos, caso
não tenha internet na escola também é possível usar o Scratch de forma offline. Também é possível
encontrar vídeo aulas ensinando como utilizar a ferramenta.

Para que a experiência seja aplicada basta que se tenha na escola laboratório de informática,
como já mencionado não necessitante precisa de ter acesso a internet. Esse projeto pode ser aplicado
por professor de qualquer área, não necessariamente ligado as ciências exatas, já que o Schatch é
interdisciplinar.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 4 53


Como demostrado a criação de jogos eletrônicos ajuda de forma significativa no processo de
aprendizagem de matemática. É perceptível aos estudantes a praticidade dos conteúdos estudados.

5. AGRADECIMENTOS

Agradeço em especial aos estudantes pela dedicação e envolvimento com as aulas propostas e
a coordenação do CEPI Professor Pedro Gomes pelo apoio no desenvolvimento deste projeto.

6. REFERÊNCIAS

Charlot, B. Os jovens e o saber. Perspectivas mundiais. Porto Alegre: Artmed, 2001.

BRASIL, ministério da educação. secretaria de educação básica. Parâmetros nacionais de quali-


dade para a educação infantil. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Básica: Brasília.
2006.

VITTI, C. M. Matemática com prazer, a partir da história e da geometria. 2ª Ed. Piracicaba – São
Paulo. Editora UNIMEP. 1999. 103p.

SADOVSKY, P. Falta Fundamentação Didática no Ensino da Matemática. Nova Escola. São


Paulo, Ed. Abril, Jan./Fev. 2007.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 4 54


CAPÍTULO 5

DIFICULDADES NA GESTÃO DE ESCOLAS


PÚBLICAS: UM ESTUDO DE CASO EM CURITIBA-PR

VIVIEN KANIAK além de alguns conflitos interpessoais. Na


Universidade Federal do Paraná (UFPR) gestão pedagógica foi citada a rigidez e falta
de autonomia da escola para realização de suas
ANANDA SINGH ações bem como a escassa participação dos
Universidade Federal do Paraná (UFPR) pais nas discussões das ações pedagógicas. No
que tange a gestão das condições de trabalho
RAQUEL MOMM muitas foram as dificuldades evidenciadas tais
como deficiências na estrutura física da escola,
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
limpeza, segurança, manutenção, falta de espaço,
carências na infraestrutura e principalmente
ADRIANA ROSELI WÜNSCH
nas questões de acessibilidade para deficientes
TAKAHASHI
que são inexistentes na escola na escola
Universidade Federal do Paraná (UFPR)
estudada. Entretanto, pode-se constatar que,
embora as evidentes dificuldades enfrentadas,
os profissionais da escola mantêm um esforço
constante para manter o bom funcionamento da
RESUMO: Este estudo objetivou investigar as mesma.
principais dificuldades de gestão de uma escola
pública brasileira situada na cidade de Curitiba-
PR. Primeiramente foi realizada uma revisão
bibliográfica sobre o tema e subsequentemente PALAVRAS-CHAVE: Gestão escolar;
foi realizado um estudo de campo em uma dificuldades gestão; escolas públicas.
escola estadual do ensino fundamental e médio
localizada na área central da cidade. A abordagem
de pesquisa utilizada foi a pesquisa qualitativa.
Na escola foram realizadas observações in INTRODUÇÃO
loco registradas pelos pesquisadores em diários
de campo, pesquisa documental e entrevista
semiestruturada com 3 gestores de diferentes
áreas: administrativo, pedagógico. As entrevistas O atual cenário da educação brasileira
foram transcritas e analisadas de acordo com as enfrenta inúmeros desafios em relação à qualidade
técnicas de análise de conteúdo de Bardin (1977).
do ensino, à falta de qualificação dos docentes,
Os resultados apontam que os maiores problemas
encontrados na gestão financeira foram: o excesso deficiências na infraestrutura das escolas e
de procedimentos burocráticos, a escassez de as diversas lacunas em termos de políticas
recursos e as adversidades provenientes da pouca educacionais efetivas (RUSSO, 2009). Para os
autonomia na organização escolar. Na gestão
de pessoas os problemas apontam para a alta gestores escolares fica o desafio de organizar,
rotatividade, faltas constantes de professores administrar e coordenar os processos de trabalho

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 55


dentro das instituições escolares, tarefa que, por si só, revela alta complexidade perante o quadro
educacional público brasileiro.

Dentro deste contexto é de suma importância levantar as principais dificuldades encontradas


pelos gestores escolares das escolas públicas a fim de aumentar o debate em direção a ações de
melhorias. Uma vez que compete ao gestor escolar responsabilidade múltiplas e complexas como
oferecer um ensino de qualidade aos discentes, gerir as necessidades e a motivação dos colaboradores,
atender as reivindicações dos pais de alunos, cabe analisar quais são os principais desafios deste
importante profissional.

Com esse objetivo este estudo realizou uma pesquisa em uma escola estadual da rede pública
de Curitiba que, por meio de entrevistas com a diretora da escola, com o secretário administrativo e
uma pedagoga, além de observação em campo e pesquisa documental, buscou levantar as principais
dificuldades relacionadas a gestão, categorizando-as em 4 dimensões. As dimensões foram: gestão
financeira, gestão de pessoas, gestão pedagógica e gestão das condições de trabalho.

Espera-se com esta pesquisa contribuir para uma melhor compreensão das barreiras que
envolvem a gestão escolar e o exercício do diretor escolar na prática que podem prejudicar a prestação
de um ensino de qualidade para a comunidade. Além disso pretende-se mostrar quais são as iniciativas
e ações desenvolvidas por este profissional a fim de superar as dificuldades encontradas e que podem
servir de inspiração para outros gestores na educação que encontram os mesmos embaraços em suas
práticas no dia a dia.

REFERENCIAL TEÓRICO

A GESTÃO ESCOLAR E SUAS VARIADAS DIMENSÕES

A gestão escolar, responsável pelas etapas de planejamento, organização, liderança, mediação,


coordenação, monitoramento e avaliação de processos relacionados às ações educacionais, consiste
também em um meio para orientar os princípios e ações das escolas, de forma a contribuir para
um ensino de qualidade ofertado a seus alunos (LUCK, 2009). A partir da literatura relacionada à
gestão de escolas públicas, observa-se que a gestão pode ser dividida nas seguintes áreas: (a) Gestão
financeira (VELLOSO, 2001; DOURADO, 2007; ADRIÃO; PERONI, 2007; AGUIAR, 2009); (b)
Gestão de pessoas (GRILLO, 1982, LOTTA, 2002); (c) Gestão pedagógica (OLIVEIRA; FONSECA;
TOSCHI, 2005; RUSSO, 2009; RODRIGUES; SOLANO, 2016) e (d) Gestão das condições de
trabalho. (GONÇALVES; SPOSITO, 2002, FRANCO; BONAMINO, 2005; VIDAL et al., 2015).

No que tange à gestão financeira relacionada a educação pública no Brasil é importante


destacar que origem dos recursos financeiros provém de receitas de impostos próprios das três
esferas federativas, receitas de transferências constitucionais, receitas do salário educação; receitas
de contribuições sociais; receitas de incentivos fiscais; e receitas provenientes de outros recursos
previstos em lei. (BRASIL, LDB, 1996). O salário educação é cobrado sobre a folha de pagamentos de
salários das empresas sendo uma das fontes de financiamento educacional, que a partir de Constituição
de 1988, financia exclusivamente o ensino fundamental público. A captação de outras verbas para o

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 5 56


financiamento da educação além das usualmente relacionadas, são previstas em lei sob a forma de
contribuições sociais, incentivos fiscais e outros recursos previstos em lei. (BRASIL, PARECER
26/97/MEC/CNE, 1997).

Em 2007 o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização


dos Profissionais da Educação (Fundeb), passou a substituir o Fundef - Fundo de Manutenção
e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério, que esteve vigente
entre os anos 1998 e 2006. Com o Fundeb a metodologia de redistribuição de impostos entre
estados e municípios a partir do número de matrículas é ampliada para todo a Educação Básica
(da educação infantil ao ensino médio) e não apenas em relação ao ensino fundamental como
acontecia anteriormente. O menor valor distribuído pelo fundo aos estados e municípios, por
aluno, no ano de 2018 foi fixado em R$3.016,67, de modo que se um fundo estadual tiver
um valor aluno/ano menor é feito um repasse pela união de modo a garantir esse mínimo. É
importante destacar que o repasse de valores não é igual para todas as etapas de ensino; alunos
de creches, por exemplo, tem um repasse de trinta porcento maior que alunos de meio período
das séries iniciais do ensino fundamental. (TODOS PELA EDUCAÇÃO, 2018). Além do Fundeb
outras formas objetivam que os recursos financeiros destinados ao financiamento à educação, sejam
direcionados efetivamente às escolas de educação básica. Além disso, a Lei de Diretrizes e Bases da
Educação, descreve nos artigos 70 e 71, respectivamente, quais são as despesas que podem e que não
podem ser consideradas como de manutenção e desenvolvimento do ensino.

Ademais existem os recursos recebidos diretamente nas escolas que, se por um lado possibilitam
maior transparência e agilidade no suprimento das necessidades mais urgentes da escola, por outro,
representam para os gestores novos desafios no sentido de conhecer quais financiamentos sua escola
pode ter acesso, aprender as regras de utilização de cada um dos fundos, e o conhecimento necessário
para realizar as adequadas prestações de contas. Desta forma administrar recursos escassos passa a ser
uma das atribuições frequentes dos gestores escolares brasileiros (VELOSO, 2001).

Em relação a gestão de pessoas considera-se que atua como elemento-chave para que as
organizações escolares possam obter desempenho satisfatório (MEMON; MANGI; CHANDAN,
2009). Nas escolas públicas, a gestão de pessoas diz respeito à aspectos como o ingresso dos
colaboradores na escola, a influência dos líderes sobre os colaboradores, a avaliação de desempenho
dos mesmos e os relacionamentos existentes entre os gestores e os funcionários da escola.

Romão e Padilha (1997) apontam que as formas de provimento de cargos de diretores escolares
no Brasil são a nomeação (indicação), o concurso público, a eleição ou o esquema misto. Nesse
último, avalia-se a competência técnica do candidato e na sequência, realizam-se eleições por parte
da comunidade. Já no diz respeito ao ingresso dos demais funcionários das escolas como professores
e colaboradores em geral o ingresso de dá por meio de concurso público (THOMAZINI; JACOMINI,
2019).

Outro aspecto concernente à gestão de pessoas se refere à liderança e sua influência sobre
os colaboradores. Evidencia-se relevante o papel dos líderes sobre a motivação de seus liderados.
Neste exercício dos líderes, que sabem comunicar-se são capazes de motivar e inspirar as pessoas a

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 5 57


colocarem ações em prática, estabelecendo cooperação e confiança (GOMES, 2012). Nesse cenário,
o líder não só deve saber se comunicar com os colaboradores da escola, mas também incentivar
sua participação nos processos de gestão, de forma a aproximá-los da gestão democrática (LUCK,
2009). Até mesmo a participação dos stakeholders é evidenciada em alguns estudos, como o de Singh
(2016) como sendo benéfica e contributiva para que as práticas de gestão prescritas se aproximem
das práticas de gestão reais. Assim, deve se estimular a participação da comunidade nos eventos da
escola, dos pais e responsáveis pelos alunos, de outras escolas, e de outros grupos de interesses para
desenvolver o relacionamento entre os interessados pela escola.

Não obstante, encontra-se a importância de gestão pedagógica nas escolas principalmente


no que se refere a elaboração dos principais documentos que norteiam os rumos da escola que são o
Projeto Político Pedagógico (PPP) e o Regimento Escolar. Eles devem ser elaborados em conjunto
com a comunidade escolar, com especial atenção a efetiva participação de todos os professores. O
Projeto Político Pedagógico de cada instituição deve ser único, elaborado a partir da realidade de cada
escola. Esse documento registra e perpetua a compreensão de qual é a história daquela escola, de qual
o posicionamento dela em relação à comunidade onde ela está inserida, a visão de mundo, os valores,
e os princípios filosóficos e educacionais que norteiam as atividades ali desenvolvidas. Além disso
este documento versa sobre a avaliação não somente de alunos, mas de toda a equipe escolar, de modo
a garantir a realização dos objetivos propostos (BARBOSA; MARTINS, 2011).

Para Veiga (2013), as principais dificuldades na gestão pedagógica estão relacionadas


ao conhecimento, à elaboração e à implementação das normas contidas no PPP e no Regimento
Escolar. Já para Oliveira (2016), uma dificuldade comum ao gestor escolar, no que concerne à gestão
pedagógica, é promover as modificações necessárias nas práticas pedagógicas, de modo a garantir
uma educação de qualidade e o alcance dos objetivos da instituição de acordo com a identidade da
escola.

Em termos da gestão das condições de trabalho nas escolas Vidal et al. (2005) apontam que
esse representa um fator de sucesso para o aumento da criação de valor na escola. Outros autores
como Lee, Franco e Albernaz (2004) e Soares e Sátyro (2008) corroboram a ideia e complementam
que, quando adequada, a infraestrutura física das escolas influencia positivamente o desempenho
dos alunos. Entretanto a condição da maior parte das escolas brasileiras é de deficiente infraestrutura
física e quantidade escassa de equipamentos para o desenvolvimento do trabalho dos colaboradores
como carteiras, lousas, equipamentos, dentre outros (GONÇALVES; SPOSITO, 2002). Além disso,
a segurança daqueles que estudam e trabalham nas escolas merecem atenção. Autores como Codo
(1999) e Batista e El-Mor (1999) evidenciaram que dentre as situações frequentes relacionadas à
insegurança nas escolas estão depredações, roubos; agressões físicas entre alunos e de alunos para
com professores. Neste contexto, além dos desafios de angariar recursos e direcionar ações para
melhoria das instalações físicas da escola, contribuindo para o melhor desempenho dos alunos e
melhoria das condições de trabalho dos colaboradores da escola, também é necessário desenvolver
planos de ação para garantir a segurança dos alunos e colaboradores da escola.

Diante do exposto, ficam claros os desafios enfrentados pelos gestores de escolas públicas
brasileiras e a importância de aprofundar o estudo e os debates em relação a esse tema relevante para

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 5 58


a construção do futuro do país.

METODOLOGIA

A presente pesquisa foi realizada em uma escola estadual da rede pública de Curitiba-PR e
caracteriza-se como qualitativa e descritiva. Esta técnica foi selecionada por incluir as duas grandes
vertentes em investigação científica que são o rigor da objetividade e a riqueza da subjetividade,
permitindo ao pesquisador aprofundar-se no caso estudado. De acordo com Creswell (2010) são
típicos da pesquisa qualitativa a coleta de dados no ambiente natural, o pesquisador como coletor dos
dados e observador do comportamento dos entrevistados, a utilização de várias fontes de dados como
documentos, observações e entrevistas, além é claro, da possibilidade de investigação interpretativa.
Portanto, partindo-se de uma abordagem qualitativa é possível abordar um fenômeno e conhecê-lo
no contexto em que ele ocorre permitindo assim uma visão mais integrada de vários pontos de vista
importantes dentro do contexto; além disso, o pesquisador pode se manter no que Thiollent (1982)
intitula “situação flutuante” durante a entrevista, permitindo estimular o entrevistado e entender o seu
universo.

Inicialmente a escola foi contatada via telefone e os objetivos da pesquisa foram explicados
a diretora, que aceitou contribuir com a pesquisa. Foram feitas 3 visitas a escola em dois diferentes
turnos (manhã e tarde). Durante as visitas realizadas foram feitas observações, registradas pelos
pesquisadores em diários de campo, e entrevistas com os três principais gestores da Escola: a diretora,
o secretário e a pedagoga. Para isso, foi utilizado e um roteiro de entrevistas e gravador de voz.
Além disso, foram acessados alguns documentos apresentados pelos entrevistados além de pesquisa
na internet a fim de se obter outros dados relevantes da escola.

As entrevistas foram realizadas com os seguintes membros da comunidade escolar, nominados


de entrevistada 1, entrevistado 2 e entrevistada 3. As características/cargos de cada entrevistado são:

• Entrevistada 1: diretora da escola; formação em física pela UFPR; especialista em educação


de jovens e adultos e Gestão Pública; trabalha na educação estadual desde 2007 – ingressou
como PSS – e efetivou-se via concurso em 2009.

• Entrevistado 2: secretário da escola; formação em direito e técnico de enfermagem


(trabalho anterior ao ingresso no estado); ingressou no estado via concurso no ano de
2010 e trabalhou em outras escolas; na escola atual está desde o ano de 2016, no cargo de
secretário.

• Entrevistada 3: pedagoga da escola – período vespertino; formação em pedagogia pela


UFPR no ano de 2004; desde a formação, sempre trabalhou como pedagoga, atuando
também na secretaria de educação e em escolas; trabalhou no município de São José dos
Pinhais, mas pediu exoneração e ficou só com o Estado; anterior à formação superior
atuava no comércio como vendedora.

As entrevistas foram gravadas, transcritas e submetidas à análise de conteúdo de acordo

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 5 59


com as técnicas sugeridas por Bardin (1977) que envolvem três etapas: a) pré análise, em que são
organizados os dados, b) exploração em que são codificados os dados e categorizados, c) tratamento
e interpretação em que são atribuídos significados aos dados, possibilitando a caracterização do
processo e seus elementos.

CARACTERIZAÇÃO DA ESCOLA

Construída em 1911, no governo Francisco Xavier da Silva, inicialmente para atender ao Ensino
Primário atualmente o colégio atende ao Ensino Fundamental, Ensino Médio, EJA Fundamental e
Médio. Ao todo estão matriculados 557 alunos, divididos em 3 períodos e 21 turmas.

Em relação à estrutura física a escola está localizada em um terreno de pequeno porte no


centro de Curitiba-PR. A escola conta com oito salas de aula, laboratórios, uma sala de artes, uma
biblioteca, quadra poliesportiva além da sala de professores, sala da secretaria, e sala da direção. Além
disso existem o pátio, uma pequena cozinha, o refeitório e uma sala de depósito de materiais

Em relação à estrutura de recursos humanos a escola possui 5 agentes educacionais que se


dividem em serviços administrativos, monitorar os alunos fora de sala de aula, fazer a limpeza da
escola e a merenda, 1 diretora, 1 vice-diretora, 1 pedagoga. Quanto ao número de professores não
foi possível dimensionar, pois como são alocados pelo Núcleo de Educação, sem interferência da
escola na escolha, os números variam muito. Foi relatado pela diretora que muitas vezes os professores
precisam dar aula em até três escolas para conseguir fechar sua carga horária. Assim é comum
acontecerem faltas de professores devido a dificuldades de deslocamento de uma escola para outra.
Durante todos os dias em que a escola foi visitada para realização da pesquisa, pode-se observar faltas
de professores, o que exigiu da diretora e da pedagoga que substituísse a falta de professores com
tarefas extra a fim de não deixar os alunos sem aula.

Em relação à capacitação dos servidores constatou-se que são muito qualificados. Os professores
possuem graduação, sendo que 2 professores possuem mestrado e 1 possui doutorado. Foi relatado
que o governo do estado oferece diversos cursos para capacitar os profissionais e que esses cursos
são satisfatórios. As capacitações acontecem através da Secretaria Estadual de Educação e o Núcleo
Pedagógico do Estado e professores e funcionários fazem os cursos regularmente para se capacitar e
para aumentar a pontuação de carreira a fim de alcançar elevação de nível salarial a cada dois anos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Assumindo o pressuposto de que a gestão financeira de uma organização escolar pública se


configura em um processo de aquisição, gestão, aplicação e procedimentos relacionados ao aspecto
financeiro na gestão escolar (DRAIBE, 1999; GONÇALVES; LUZ; CRUZ, 2004; FRANÇA, 2005;
DOURADO, 2007; FNDE, 2017), buscou-se conhecer como os recursos chegam até a organização,
como são geridos, de que maneira são distribuídos, dentre outros fatores que possam caracterizar a
gestão financeira. Os recursos financeiros chegam à escola estudada através dos repasses dos fundos

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 5 60


do estado e também via repasse federal – para o estado que repassa às escolas. Segundo a Entrevistada
1, a escola também possui uma APMF – Associação de Pais, Mestres e Funcionários – que pode
realizar eventos para captar recursos financeiros externos, como festas e outros que integrem a escola
com a comunidade. Segundo a entrevistada, esses recursos, juntamente com um pequeno montante
arrecadado pela cantina, acabam “salvando” a escola em casos eventuais, como a necessidade de uma
reforma emergencial, troca de algum equipamento, e outros que precisam ser rápidos.

Isso acontece porque, segundo a diretora, as empresas prestadoras de serviço cobram até valores
mais altos para a escola devido aos procedimentos burocráticos excessivos, pois elas precisam prover
documentações diversas, algumas com custo considerável para pequenos prestadores de serviços,
para poder ser fornecedoras de uma escola do Estado. A escola, por sua vez, é obrigada a fazer três
orçamentos em empresas diferentes, e às vezes, por fazer vários orçamentos com uma empresa e não
contratar os serviços dela, a empresa termina por não mais atender a escola. Devido a essas dificuldades
quando há necessidade de alguma ação emergencial, como trocar o vidro de uma janela, por exemplo,
a escola faz com o recurso financeiro próprio da APMF. Entretanto se o valor for mais alto, a escola
precisa contar com os recursos do Estado, o que pode ser bastante demorado e burocrático adiando os
serviços. A diretora acrescenta que a burocracia é necessária para o Estado, pois traz transparência e
legitimidade nas ações perante a sociedade, mas que isso acaba por complicar a solução de consertos
que, na maioria das vezes, poderiam ser mais facilmente resolvidos.

Além disso a diretora comenta que os professores e funcionários sempre são consultados
acerca da aplicação dos recursos financeiros da escola, sendo eles que decidem o que é prioridade e
o que pode esperar um pouco mais para ser resolvido. O entrevistado 2 complementa que a escola
recebe três tipos de verbas, o Fundo Rotativo Estadual, o Programa de Manejamento da Escola e o
Programa Mais Educação. Segundo o secretário, os repasses sempre vem para a escola, as vezes com
uma certa demora, mas nunca deixam de receber.

A escola também conta com uma cantina mantida pela APMF que rende cerca de R$ 90,00
ao dia sendo que a maior parte é destinada ao capital de giro da própria cantina, sobrando um valor
pequeno para utilização em eventualidades, como manutenções emergenciais das instalações.
O entrevistado 2 relata que os recursos para ações emergenciais são os mais complicados, pois é
necessário fazer uma solicitação de cota extra para o governo do estado, e as vezes demora para ser
liberado, bem como é algo burocrático. O procedimento burocrático complica-se devido a linguagem
do sistema on line ser difícil, e que isso exige muita atenção e tempo para realizar a solicitação. Em
alguns casos, os próprios professores e funcionários realizam os reparos necessários, dependendo da
complexidade.

Pelo exposto, pode-se perceber, a partir dos entrevistados, que a responsabilidade pela gestão
financeira da escola é da diretora, com participação do secretário e dos demais que podem auxiliar nos
tramites necessários. Essa dinâmica da gestão financeira da escola apresenta desafios à diretora e aos
envolvidos, tais como a excesso de procedimentos burocráticos e a escassez de recursos, que acabam
por dificultar o processo. Este achado coaduna com a visão de outros autores em que os desafios à
gestão financeira elencados a partir da realidade das escolas pautadas em um sistema centralizado, de
dependência do poder público mantenedor dos recursos e também a pouca autonomia da organização

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 5 61


escolar para captar recursos e fazer a gestão de acordo com suas necessidades (RUSSO, 2009; FLACH,
2012; YANAGUITA, 2016).

A gestão de pessoas no espaço escolar público possui características particulares, uma vez
que a escola não tem autonomia para intervir por exemplo na demissão ou admissão de funcionários,
uma vez que estes são concursados. Em relação à problemas com rotatividade e assiduidade dos
colaboradores da escola, foi relatado pelos entrevistados que os professores estão com suas cargas
horárias muito elevadas e às vezes acabam faltando ao trabalho por não conseguir se locomover de
uma escola a outra. Os docentes chegam a lecionar em até três escolas diferentes no dia para conseguir
fechar sua carga horária de aulas e o tempo de locomoção acaba se tornando um entrave. Durante
todas as visitas à escola, os pesquisadores atestaram falta de professores. Nessas situações, os alunos
eram supridos por atividades passadas pela diretora ou pela pedagoga para não ficassem com o tempo
ocioso. Ainda, segundo a diretora, muitas vezes os professores acabam faltando sem justificativas
plausíveis e a escola precisa se adequar para que os alunos não sejam prejudicados pela falta de aula.

Outra questão que influencia é que os contratados temporários não possuem vínculo definitivo
com a escola e mudam constantemente de instituição até para atender as demandas da secretaria de
educação. Isso termina por causar a fragilização do vínculo entre os colaboradores com a escola
(Costa et al., 2012; Flach, 2012).

Outra dificuldade relatada é a avaliação de desempenho dos colaboradores. A diretora


relata que os profissionais são avaliados por assiduidade, produtividade e participação. Todavia são
avaliados segundo uma nota atribuída por eles mesmos em um auto avaliação. Porém para que possam
ter progressão salarial, é necessário ter nota 10 em todos os quesitos, o que acarreta que os professores
acabem atribuindo sempre notas altas, o que nem sempre condiz com a realidade. A entrevistada
sugere que uma solução para este problema seria ter um modelo de avaliação on line e sigiloso com
nota atribuída pela própria diretora e demais colegas.

Em termos de relacionamentos, os três entrevistados alegam que os profissionais interagem


e se relacionam bem no ambiente escolar, o que também foi constatado por observações na sala dos
professores e durante as entrevistas. No entanto, observou-se dificuldades relacionada à comunicação
da diretora com os professores, conforme apontado por um dos entrevistados:

“Outra situação é a comunicação, o diálogo com o professor que as vezes é difícil. Eu prezo
por dar um atendimento de qualidade na secretaria tanto para o professor quanto para a
comunidade, mas para isso acontecer tem que obedecer a algumas regras. Então a gente pede
para o professor que encaminhe a sua atividade, sua avaliação com 24h de antecedência para
que a gente possa preparar este material. E muitas vezes ele chega em cima da hora pedindo
85 cópias de página frente e verso” (Entrevistado 2).

As dificuldades de comunicação, bem como a ausência de informações úteis fornecidas em


tempo adequado entre os líderes e liderados pode comprometer a cooperação e a confiança entre eles,
gerando transtornos para a gestão da escola (GOMES, 2012).

No que se refere à gestão a pedagoga entrevistada argumenta que o acompanhamento

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 5 62


pedagógico é realizado de perto, especialmente para com os professores em termos de planejamento de
aulas, atividades e avaliações. Para os alunos, o atendimento é voltado ao aprendizado e rendimento,
cruzando informações com a metodologia adotada pelo professor. Segundo a entrevistada, tudo isso
precisa estar de acordo para que as partes envolvidas possam obter resultados satisfatórios. Além
disso as ações e iniciativas promovidas pela escola são amparadas por seu regimento, que, segundo a
Entrevistada 3, está em consonância com os demais documentos que norteiam o trabalho pedagógico
na organização escolar. Ela acrescenta que a escola possui autonomia para escrever os documentos
de acordo com sua realidade e que essa flexibilidade é positiva. Entretanto os demais entrevistados
alegam que os documentos sempre acabam ficando submissos ao núcleo e a secretaria estadual, o que
afeta de alguma forma a autonomia da escola.

Em relação à participação dos professores e funcionários, bem como dos pais e da comunidade
externa nas discussões dos documentos norteadores da escola, em especial do PPP, todos os três
entrevistados argumentam que são feitas discussões coletivas para que sejam elaboradas propostas a
serem avaliadas para compor o projeto. A pedagoga, entretanto, afirma que a participação dos pais no
espaço escolar é baixa, considerando que eles trabalham e possuem pouco tempo para interação com
a escola de seus filhos:

“Geralmente quando tem a elaboração do PPP, quem participa são os representantes do


conselho escolar e da PMF. Então geralmente participa dois pais, mas é muito difícil trazer
os pais pra participar da documentação, porque pra eles é uma leitura muito grande e eles não
tem essa disponibilidade de tempo” (Entrevistada 3).

Em relação a infraestrutura observou-se que mesmo o prédio sendo antigo e com pontos
de deterioração no geral é limpo, organizado, com boa iluminação e ventilação. O pátio, mesmo
pequeno, atende as necessidades da escola, pois os alunos são divididos em turnos para o intervalo e
atividades físicas. Entretanto no que tange à segurança os três entrevistados foram unânimes em dizer
que a escola não possui vigia ou guarda, tendo somente algumas câmeras no interior da escola e que,
segundo a Entrevistada1, não funcionam perfeitamente. Isso traz riscos a integridade dos alunos e já
houve histórico de furto.

Considerando os aspectos relacionados à acessibilidade, a escola enfrenta pontos críticos


para a acessibilidade para portadores de necessidades especiais. Não existem rampas de acesso para
cadeirantes nem banheiros adaptados. Segundo a Entrevistada 1, este ponto é de difícil solução, já que
o prédio é muito antigo e uma reforma para adaptação seria inviável financeiramente no momento.
Outro ponto citado é a falta de espaço para ampliar a construção uma vez que o terreno já está sendo
utilizado em sua totalidade. As dificuldades na infraestrutura encontradas estão em consonância com
as citadas por outros autores que estudaram escolas públicas brasileiras (VIDAL et al., 2005; LEE;
FRANCO; ALBERNAZ, 2004).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 5 63


CONSIDERAÇÕES FINAIS

A gestão escolar é fundamental e essencial como base do sistema educativo pois é a partir
dela que se sedimenta uma educação de qualidade que pode estabelecer as bases para promover um
aprendizado com valor e equidade para todos. Portanto é necessário um direcionamento efetivo por
parte dos agentes públicos em direção à superação das atuais barreiras que impedem um modelo mais
efetivo de escola.

Sem a pretensão de aprofundar ou esgotar o tema, esta pesquisa visou investigar as principais
dificuldades de gestão de uma escola pública brasileira na cidade de Curitiba-PR. Através dos
resultados obtidos é possível afirmar que a escola estudada apresenta diversas dificuldades em termos
de gestão financeira, gestão de pessoas, gestão pedagógica e das condições de trabalho. Em relação a
gestão financeira as maiores dificuldades encontradas foram o excesso de procedimentos burocráticos,
a escassez de recursos e as adversidades provenientes da dependência do poder público mantenedor
dos recursos que acarreta em pouca autonomia na organização escolar. Em relação a gestão de pessoas
as maiores dificuldades evidenciadas foram a alta rotatividade, as frequentes ausências de professores
e escassez de recursos humanos.

Em relação à gestão pedagógica encontrou-se que dificuldades em termos de autonomia para


elaboração do PPP além da escassa participação dos pais nas discussões das ações pedagógicas e
consequentemente no acompanhamento dos alunos, o que gera uma distância entre família e escola.
Por fim, as dificuldades encontradas nas condições de trabalho foram muitas tais como deficiências na
estrutura física da escola, limpeza, segurança, manutenção, falta de espaço, carências na infraestrutura
e principalmente nas questões de acessibilidade para deficientes. Os entrevistados atrelaram as
dificuldades enfrentadas tanto a escassez de recursos financeiros repassados pelo Estado quanto a
questões burocráticas envolvidas no processo que, muitas vezes, acabam por inviabilizar a compra de
equipamentos, a realização da manutenção e novas obras ou melhorias na estrutura.

De maneira geral, encontrou-se que os desafios para a gestão da escola são constantes, mas
é importante frisar que as iniciativas desenvolvidas pelos profissionais da educação conseguem
muitas vezes suprir as demandas ou ao menos, driblar as dificuldades. O esforço e a dedicação desses
profissionais devem ser destacados e merecem maior atenção por parte do poder público e em termos
de reconhecimento da sociedade.

De forma geral os achados dessa pesquisa estão em consonância com a literatura atual sobre
o tema que discorre sobre as mesmas dificuldades encontradas por outros pesquisadores em outros
contextos público escolares. Dentre as limitações da pesquisa destaca-se que o estudo foi realizado em
apenas uma escola o que não permite fazer generalizações sobre os resultados encontrados. Sugere-se
a realização de estudos futuros envolvendo vários casos, de várias escolas e ampliando-se o número
de entrevistados dentro da escola.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 5 64


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Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 5 67


CAPÍTULO 6

EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA NO BRASIL: INICIATIVAS,


MOTIVAÇÕES E PRERROGATIVAS LEGAIS

ANA PAULA DE SOUZA SANTOS pelo uso das Tecnologias Digitais da Informação
UEM e Comunicação (TIDCs).

Neste sentido, buscamos, a partir deste


CLÉBER SANTOS GONÇALVES texto, resgatar aspectos históricos da EaD,
UEM compreendendo as práticas de ensino (quando do
período anterior à sua formalização) e as iniciativas
integradas à educação formal, permitidas a partir
MARIA LUÍSA FURLAN COSTA
UEM da contemplação da modalidade por meio das
políticas públicas ligadas à temática. Apesar de
termos por foco o recorte geográfico brasileiro,
WELINGTON JÚNIOR JORGE sentimos a necessidade de discutir, em alguns
FEITEP
pontos, ligações com o movimento percebido
em todo o mundo para transformações no campo
educacional.
INTRODUÇÃO
Nos guiamos, portanto, a partir do
seguinte questionamento: Quais motivações
As mudanças advindas da modernidade históricas, econômicas e políticas influenciaram
reestruturaram toda a sociedade. No decorrer e determinaram a formalização da EaD no
da contemporaneidade, ocorreram e ocorrem cenário brasileiro? Para responder à indagação,
modificações em diversos aspectos da vida social: buscamos destacar registros históricos de ensino
relacionados a hábitos, valores e organizações e aprendizagem para além do aspecto presencial,
sociais. A área da Educação acompanha tais
antes mesmo da legalização da modalidade;
transformações, reinventando-se, por exemplo,
acontecimentos políticos e econômicos atinentes
a partir de novas metodologias de ensino-
à temática; principais legislações que norteiam
aprendizagem (PAIVA et al.: 2016) e novos
instrumentos de promoção desta aprendizagem. a atuação na área; e as expectativas sobre o
Nesse cenário, observa-se o avanço da Educação desenvolvimento da prática educacional a
a Distância (EaD), potencializado principalmente distância.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 68


INICIATIVAS DE ENSINO A DISTÂNCIA ANTES DO RECONHECIMENTO DA
MODALIDADE NO BRASIL

De maneira consensual, não existe, na literatura sobre a história da EaD no Brasil, um marco
histórico que seja apontado taxativamente como sendo o de início das práticas da modalidade. Dessa
forma, na tentativa de compreensão desse percurso, lançamos mão de aspectos destacados com
regularidade entre pesquisadores da área, sem podermos, porém, afirmar que estes sejam únicos.

Segundo Saraiva (1996), desde a Antiguidade existe a prática de ensino-aprendizagem entre


sujeitos fisicamente distantes, por meio da escrita de cartas. Podemos encontrar essa instrução via
correspondência na história da Grécia e da Roma e depois em diferentes regiões do planeta, possibilidade
impulsionada pela imprensa escrita: há registros de anúncios de instrução via correspondência desde
1728, em Boston. A partir daí, o ensino por correspondência é concebido como prática de extensão
universitária e instrumento de diferentes institutos educacionais.

A exemplo do cenário global, no Brasil, também não há a definição clara do momento em


que práticas de ensinamentos a distância passam ser verificados. Podemos, todavia, destacar algumas
ações que tiveram destaque em diferentes momentos históricos.

Alves (2001) salienta que há alguns registros que apontam iniciativas isoladas de ensino
a distância já no final do século XIX, em nosso país. Tais experiências faziam uso de materiais
impressos, sendo divulgadas em jornais e outros materiais/recursos de circulação.

[...] o Jornal do Brasil, que iniciou suas atividades em 1891, registra na primeira edição
da seção de classificados, anúncio oferecendo profissionalização por correspondência
(datilógrafo), o que faz com que se afirme que já se buscavam alternativas para a melhoria da
educação brasileira, e coloca dúvidas sobre o verdadeiro momento inicial da EAD (ALVES,
2001, p. 2).

Apesar disso, é no século XX que se concentra a atenção quanto à organização e expansão de


práticas de ensino a distância. De acordo com Costa (2006), a criação da Rádio Sociedade do Rio de
Janeiro, no ano de 1923, constituiu-se como um dos pilares da modalidade. A rádio, idealizada por
Edgar Roquette-Pinto[1], passou a ser usada em iniciativas privadas e públicas, com o objetivo de
levar informação e conhecimento a lugares longínquos. A partir desse momento, o uso desse meio de
comunicação passou a ser pensado com a finalidade de preparo das mentes, para além de uma mera
transmissão de conteúdos isolados e fragmentados.

Doravante as propostas de ensino a distância são intensificadas, não só pelo veículo rádio,
mas de maneira cada vez mais ampliada. Segundo Silva e Costa (2017), no ano 1939, por exemplo,
entra em cena o Instituto Rádio Técnico Monitor (hoje Instituto Monitor[2]), ofertando cursos
profissionalizantes a distância. Em 1940, foi criada a Universidade do Ar, direcionada a orientação
metodológica de professores secundários. No ano de 1947, esta foi incorporada ao Serviço Nacional
de Aprendizagem Comercial(Senac)[3]. Em 1941, foi criado o Instituto Universal Brasileiro[4], que
oferta educação em diferentes etapas e intensidades, abrangendo os Ensinos Fundamental e Médio,
por meio de cursos supletivos e profissionalizantes.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 6 69


No decorrer das décadas 1950 e 1960, com o apoio da Igreja Católica, há a promoção
deliberada de cursos de alfabetização via correspondência, auxiliados por televisão e rádio. Aliás,
por falar em TV, cabe destacar que na década de 1970, as iniciativas de ensino a distância passam a
contemplar sobremaneira o veículo, que, aos poucos, começava a se popularizar e, além do alcance em
massa, oferecia a possibilidade de ensinamentos não só por áudio, mas também por vídeo. Uma das
experiências desse momento que podem ser citadas é a criação do Sistema Nacional de Teleducação,
que ofertava cursos com base em materiais instrucionais (ALVES, 2010).

Dentro deste contexto, Saraiva (1996) aponta que a concepção do Projeto Satélite Avançado
de Comunicações Interdisciplinares (Projeto Saci)[5], em 1969, e do Projeto Minerva[6], em 1970
ocupava-se de proporcionar formação a alunos de séries iniciais e professores sem formação.

A partir de 1978, por meio do empenho da Fundação Roberto Marinho, junto à Fundação Padre
Anchieta, criou-se o Telecurso 2º Grau, que posteriormente absorveu também o ensino fundamental,
por meio do Telecurso 1º Grau. Em 1995 o projeto passou a ser conhecido como Telecurso 2000 e
opera até os dias de hoje [7].

Quando analisamos a educação superior, também encontramos em destaque alguns marcos


históricos relacionados à EaD, dentre os quais a criação de cursos veiculados por jornais e revistas,
pela Universidade de Brasília, em 1979, e a criação da Universidade Aberta de Brasília, já em 1992.
Vale destacar, também, o “Jornal da Educação – Edição do Professor”, que passa a integrar a TV aberta
em 1992, sob o nome “Um Salto para o Futuro”, sendo referência entre as propostas de formação
continuada (RODRIGUES, 2010).

No final do século XX, especificamente na década de 1990, já se encontrava em discussões


propostas legais para a formalização/regularização da EaD, enquanto modalidade, o que encontra
respaldo mais consistente com o advento das TDICs. Cabe destacarmos, uma vez mais, que isso
foi demandado a partir de uma série de acontecimentos históricos, sociais e econômicos, como as
iniciativas isoladas contemplando as ações de aprender e ensinar de maneira não limitada ao aspecto
presencial e os movimentos e orientações políticas para o aumento dos índices de acesso à educação
– em especial a superior.

A INSERÇÃO DA EAD NA PAUTA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

Sobre a história brasileira da educação a distância, Pimentel afirma:

“Segundo Belloni (1998), a história da modalidade pode ser resumida como uma série de
ações nem sempre coerentes e muitas vezes contraditórias ligadas a políticas fragmentadas
sem bases estruturantes de médio e longo prazos” (PIMENTEL: 2017).

Pode-se dizer que houve, ao longo dos anos, uma série de tentativas legais de implantação da
EaD no Brasil, em especial no nível de educação superior. A exemplo, temos a investida brasileira
na criação de uma universidade aberta aos moldes da Open University[8] na Inglaterra no ano de

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 6 70


1972. Os parlamentares brasileiros foram motivados pelo crescente número de cursos superiores a
distância em diversos lugares do mundo. Entretanto, a comissão designada para analisar a viabilidade
desse sistema não aprovou seu projeto. Segundo Martins e Costa (2015), a década de 1970 somou ao
todo 70 projetos de lei rejeitados sobre um programa de Universidade Aberta no Brasil (MARTINS;
COSTA: 2015).

Vem a ser apenas no ano de 1996, com a aprovação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB 9.394/1996), o início da normatização da modalidade. Segundo Burci et al, toda
a regulamentação da EaD é feita por meio de diferentes modalidades de textos, como decretos,
pareceres, portarias e resoluções (BURCI et al: 2017). Entretanto, não podemos dizer que há sempre
ações coerentes ou bases estruturais de médio e longo prazo.

O artigo 80 da LDB foi pioneiro na conceituação da EaD como modalidade de ensino e em


trazer a organização da sua oferta pelas instituições de ensino, centralizando a regulamentação desta
no Poder Público (BRASIL: 1996).

Com a criação do Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB), por exemplo, por meio
do Decreto nº 5.800/06, sendo esta cristalização de diferentes documentos anteriores, o Estado
brasileiro amplia as discussões acerca das conceituações da EaD e, principalmente, traz o atrelamento
da modalidade à educação pública. Passa-se, então, a haver, sistematicamente, a oferta de ensino
superior público a distância no país.

A ampliação da EaD no Brasil nos anos 2000 corresponde ao seu alinhamento com as prescrições
dos organismos internacionais (BURCI et al: 2017) e a um contexto mundial de políticas públicas
educacionais articuladas “ao discurso da modernidade, da globalização, do acesso à sociedade da
informação” (PIMENTEL: 2016, p. 134). Esta se encontra amplamente relacionada ao uso das TDICs
e interfere “cada vez mais na estruturação da educação presencial, nos níveis de graduação e pós-
graduação, nas esferas pública e privada” (PIMENTEL: 2016, p. 134).

A respeito da UAB, sistema principal pelo qual a EaD é expandida e interiorizada pelo viés
público, recorremos ainda a Costa (2012), que, amparada na obra de Otto Peters (2003), aponta
que o empenho brasileiro se deu na implantação de sistemas de ensino a distância Dumodais – ou
de dual mode. Isso significa que a concepção da oferta de cursos a distância se deu por meio de
universidades já consolidadas na modalidade presencial, se utilizando de sua já consistente estrutura
física e de recursos humanos. No caso do Brasil, inclusive, buscou-se integrar a educação a distância
a instituições de ensino superior públicas, pelo sistema UAB.

A UAB tem sido comumente denominada como Sistema Universidade Aberta do Brasil,
conforme assinala Costa (2012), em referência ao seu design. O sistema é integrado pela parceria
entre Instituições públicas de Ensino Superior (IES) de todas as esferas, configurado como sistema
nacional .

Como já exploramos aqui, a tentativa de implantação de um projeto de universidade aberta


no Brasil data desde a década de 1970. Inspirado na então recém criada Open University, o então
coordenador de assuntos internacionais no Ministério da Educação (MEC), Newton Sucupira

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 6 71


“defendeu a criação de uma universidade aberta no Brasil por entender que esta poderia
ampliar as oportunidades de acesso à educação superior, bem como contribuir para a
construção de um processo de educação permanente, em nível universitário” (COSTA: 2012,
p. 283).


Apesar da rejeição da proposta em sua tramitação no Congresso Nacional, abriu-se caminho
para “tudo o que se tem no país em termos de EaD” (COSTA: 2012, p. 283).Todavia, importa
ressaltar, segundo a autora, que, na implantação de sistemas de ensino a distância, outros países
também encontraram resistência.

Reconhecida apenas em 1996, por meio da LDB – Lei nº 9.394/96, a EaD passa então a ser
pauta prioritária de discussões no MEC. Em 1999, houve a articulação de setenta instituições de
educação superior pública, que passaram a reunir-se no intuito de buscar maneiras de melhorar o
ensino público no Brasil através da educação a distância: foi então criada a Universidade Virtual
Pública do Brasil (UniRede). Foram diversas reuniões, sendo esse consórcio integrado às ações do
Programa Sociedade da Informação, lançado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia.

Segundo Costa (2012), em agosto de 2000, foi finalmente assinado, pelos ministros da
Educação, da Ciência e Tecnologia e das Comunicações, um termo de adesão de lançamento do
consórcio. Formalizou-se a UniRede, que contava então como sessenta e duas instituições de ensino
superior públicas de diferentes denominações: Universidades Federais, Estaduais e Centros de
Educação Tecnológica.

No ano de 2004, por meio da parceria entre a UniRede e a Secretaria de Educação a Distância
(Seed), pertencente ao Ministério da Educação, foi publicado um edital público para chamada das
universidades públicas a desenvolverem cursos de graduação a distância. O Edital 001/2004-SEED-
MEC explicitava a

“necessidade de as instituições estarem organizadas em consórcios para a oferta de cursos


superiores na modalidade a distância, voltados para a formação de professores em áreas
consideradas prioritárias na época” (COSTA: 2012, p. 285).

O edital originou o Programa Inicial de Formação de Professores – Pró-Licenciatura I, que teve


um segundo momento no ano seguinte, 2005. A viabilidade dos projetos possibilitou a implementação
do Sistema Universidade Aberta do Brasil no mesmo ano.

Após a organização do Fórum das Estatais pela Educação, em 2005, foi publicado o documento
Fórum das Estatais pela Educação: Diálogo para a Cidadania e Inclusão, que teve como proposta a
“criação de uma fundação de direito privado, sem fins lucrativos, denominada Fundação de Fomento
à Universidade Aberta do Brasil” (COSTA: 2012, p. 286). Em 2006, por meio do Decreto nº 5.800,
de 8 de junho, o sistema UAB foi finalmente instituído.

O artigo 1º do supracitado decreto concebe a UAB como um sistema “voltado para o


desenvolvimento da modalidade de educação a distância, com a finalidade de expandir e interiorizar

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 6 72


a oferta de cursos e programas de educação superior no País”, que tem como objetivos

“I- ofertar, prioritariamente, cursos de licenciatura e de formação inicial e continuada de


professores da educação básica;

II- oferecer cursos superiores para capacitação de dirigentes, gestores e trabalhadores em


educação básica dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;

III- oferecer cursos superiores nas diferentes áreas do conhecimento;

IV- ampliar o acesso à educação superior pública;

V- reduzir as desigualdades de oferta de ensino superior entre as diferentes regiões do País;

VI- estabelecer o sistema nacional de educação superior a distância ; e

VII- fomentar o desenvolvimento institucional para a modalidade de educação a distância,


bem como a pesquisa em metodologias inovadoras de ensino superior apoiadas em tecnologias
de informação e comunicação” (BRASIL: 2006).

O Sistema é coordenado pelo Ministério da Educação no que concerne a implantação,


acompanhamento, supervisão e avaliação dos cursos. Segundo Costa (2012), em 2012, o Sistema
UAB contava com oitenta e oito instituições públicas de ensino superior e setecentos e vinte e três
polos de apoio presencial, distribuídos nas cinco regiões do país.

A partir do exposto, percebemos que as defesas ideológicas que embasaram a normatização


da EaD no Brasil abarcavam aspectos ligados à democratização do acesso à educação, esta vista
como responsabilidade do Estado. Todavia, como elemento jamais estático, a área registrou nos anos
seguintes muitas mudanças.

ENSINAR E APRENDER A DISTÂNCIA NA EDUCAÇÃO SUPERIOR: PERCEPÇÕES


E EXPECTATIVAS

Apesar da defesa e do desenvolvimento da EaD na educação superior sob esse viés, com
vínculo à esfera pública, seguindo a transformações e movimentos nacionais e internacionais, a
modalidade, pouco mais de 20 anos após o início de sua regulamentação, é destaque nos números
de ingressantes e matrículas gerais no último nível de ensino, superando, ano após ano, os dados
quantitativos da modalidade presencial, principalmente na iniciativa privada.

Sendo a modalidade incorporada, principalmente, pela educação superior, consideramos


importante destacar que, de acordo com o Censo da Educação Superior 2017 (Inep, 2018), cerca de
88% das Instituições de Ensino Superior (IES) do país são da iniciativa privada. Ainda de acordo
com o documento, a EaD foi a modalidade responsável pelo aumento no número de matrículas na
educação superior em 2017, no comparativo com 2016. Isso porque, na modalidade presencial,
houve um aumento insignificativo, de 0,5%, na quantidade de ingressantes, indo de 2.142463 para
2.152.752. Já nos cursos ofertados por meio da EaD, houve um aumento expressivo de um ano para
o outro, passando de 843.181 para 1.073.497, uma alta de 27,3%.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 6 73


Se forem considerados os números relativos às matrículas no geral (e não só dos ingressantes),
os dados chamam bastante atenção. Considerando os cursos de graduação, de 2016 para 2017, houve
uma redução de 0,4% no número de matrículas na modalidade presencial, enquanto na EaD foi
registrado aumento de 17,6%, o maior aumento já registrado desde 2008.

De posse de tais dados, em consonância com o que se tem observado ano após ano, é possível
inferir que a proporção de expansão da EaD é muito mais acentuada e na contramão do que ocorre
com a modalidade presencial. Uma pesquisa realizada pela Associação Brasileira de Mantenedoras
de Ensino Superior (ABMES) em 2018 apontou que, nesse ritmo, em 2023, o número de matrículas
na modalidade a distância será maior que o da presencial, o que aponta para a viabilidade, aceitação
e adesão a essa nova forma de aprender e ensinar.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Considerando a intensidade com que as desigualdades sociais se manifestam no Brasil, a


educação a distância pode ser vista como um dos meios para se promover a democratização do ensino,
especialmente no nível superior, como apontam Burci et al (2017) e Bondioli e Carvalho (2015).

De acordo com levantamento bibliográfico publicado por Bondioli e Carvalho, pode-se afirmar
que a EaD

“é uma ferramenta educacional inclusiva desde sua criação, pois permite o acesso a formação
e especialização a cidadãos impossibilitados de dar continuidade a sua educação por outros
métodos” (2015, p. 93).

Podemos dizer que esta parcela da população que passa a ter acesso à educação formal,
especialmente a superior, pela ampliação da EaD, corresponde a diferentes grupos. São elas as pessoas
com deficiência, maiores de 25 anos, de baixa renda, que moram longe das instituições presenciais
ou que possuem incompatibilidades de horários com as aulas presenciais (BURCI et al: 2017). São
pessoas que antes estavam excluídas do processo de escolarização e que, dificilmente teriam acesso
ao ensino sem as especificidades trazidas pela EaD.

Sendo assim, segundo as autoras, a educação a distância se torna mais uma possibilidade para
acesso dos estudantes brasileiros a um ensino de qualidade. Trata-se de uma forma de garantia dos
direitos sociais assegurados pela Constituição Federal de 1988, que, em seu artigo 205, considera a
educação como um direito de todos (BRASIL: 1988).

Mais do que o simples acesso ao ensino formal, a EaD pode ir além. Utilizando como objeto
os Institutos Federais, as autoras Basso e Costa (2018) trazem como proposta a crescente utilização da
EaD para promoção de atividades de extensão universitária. O potencial de tal associação é reiterado
pelas palavras:

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 6 74


“Com ações aliadas ao ensino e à pesquisa, que se voltam às organizações e população, a
extensão aufere com a EaD condições de ampliação das ações possibilitando que em tempos
e espaços diferentes, etapas ou programas inteiros possam ocorrer de forma não-presencial”
(BASSO; COSTA: 2018).

As autoras defendem que, considerando os efeitos positivos das atividades de extensão para
toda a comunidade e considerando também as dificuldades enfrentadas pelas instituições em promover
tais atividades, a educação a distância pode contribuir com sua manutenção.

Contudo, levando em consideração que a partir da formalização da EaD houve uma rápida
e intensa expansão dos cursos ofertados pela modalidade, num momento em que as instituições da
iniciativa privada passam a ter destaque e crescimento, preocupa-nos o fato de a educação superior –
e em especial aquela ofertada na modalidade a distância – estar concentrada nos espaços em que os
lucros ocupam local de destaque.

Para além das defesas de um lado ou outro a respeito do desenvolvimento econômico do país,
acreditamos ser necessário pautar, de maneira cada vez mais sistemática e responsável, o crescimento
da EaD no Brasil. Só assim, será possível contribuir para que os ganhos da modalidade, a curto,
médio e longo prazos, sejam observados não apenas nos aspectos quantitativos.

REFERÊNCIAS

ASSUMPÇÃO, Zeneida Alves de. O rádio ontem e hoje: promotor de educação e cultura. Anais do
1º Encontro Nacional da Rede Alfredo de Carvalho. Rio de Janeiro: Alcar, 2003.

BASSO, Silvia Eliane de Oliveira; COSTA, Maria Luísa Furlan. Ampliando as possibilidades da
política de extensão na educação profissional por meio da educação a distância. Revista brasileira
da educação profissional e tecnológica. V. 1, n. 14, 2018.

BRASIL. Presidência da República. Constituição (1988). Brasília, DF: Presidência da República,


1988.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº


9.394, de 20 de dezembro de 1996. Brasília, DF: 1996.

BURCI, Taíssa Vieira Lozano; BASSO, Silvia Eliane de Oliveira; RESENDE, Stela Galbardi de;
COSTA, Maria Luísa Furlan. Educação a Distância: o uso das tecnologias como instrumento de
inclusão educacional e social. Colloquium Humanarum, v. 14, n. 4, p. 46-51, 2017.

COSTA, Maria Luísa Furlan. História e políticas públicas para o ensino superior a distância no Brasil:
o programa Universidade Aberta do Brasil em questão. Revista HISTEDBR On-Line, n. 45, p. 281-
295, mar. 2012.

MAIA, Marta de Campos; MEIRELLES, Fernando de Souza. Educação a distância: o caso Open
University. RAE- Eletrônica. V. 1, n. 1, jan./jun. 2002.

MARTINS, Simone Maria Martins; COSTA, Maria Luísa Furlan. Perspectivas históricas e concepções
de qualidade e acesso ao ensino superior a distância no Brasil. Revista HISTEDBR On-Line, n. 16,
p. 154-165, mar. 2015.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 6 75


MENEZES, Ebenezer Takuno de; SANTOS, Thais helena dos. Verbete Projeto Saci. Dicionário
Interativo da Educação Brasileira – Educabrasil. São Paulo: Midiamix, 2001. Disponível em:
<https://www.educabrasil.com.br/projeto-saci/>. Acesso em 20 de março de 2019.

________, Verbete Projeto Minerva. Dicionário Interativo da Educação Brasileira – Educabrasil.


São Paulo: Midiamix, 2001. Disponível em: <https://www.educabrasil.com.br/projeto-minerva/>.
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PAIVA, Marlla Rúbia Ferreira; PARENTE, José Reginaldo Feijão; BRANDÃO, Israel Rocha;
QUEIROZ, Ana Helena Bomfim. Metodologias ativas de ensino-aprendizagem: revisão integrativa.
SANAE. V. 15, n. 2, jun./dez. 2016.

PIMENTEL, Nara Maria. O desenvolvimento e o futuro da educação a distância no Brasil. Inc. Soc.
V. 10, n. 1, p. 132-146, jul./dez. 2016.

________. A modalidade a distância no Brasil: aspectos conceituais, políticos e tecnológicos. In:


PEREIRA, Maria de Fátima Rodrigues; MORAES, Raquel de Almeida; TERUYA, Tereza Kasuko.
(Orgs) Educação a distância (EaD: reflexões críticas e práticas. Uberlândia: Navegando
Publicações, 1ªed., p. 25-39, 2017.

SARAIVA, Terezinha. Educação a distância no Brasil: lições da história. Em aberto. Ano 16, b. 70,
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SILVA, Helen Camila; COSTA, Maria Luísa Furlan. A educação profissional e tecnológica na
modalidade a distância: história, bases legais e cursos nessa modalidade de ensino. Revista brasileira
da educação profissional e tecnológica. V. 1, n. 12, 2017.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 6 76


CAPÍTULO 7
INOVAÇÃO TECNOLÓGICA E ENSINO: USO DAS
GEOTECNOLOGIAS NO ESTUDO DO ESPAÇO
GEOGRÁFICO

MARCIO SILVEIRA NASCIMENTO mized with the help of technology. Being indis-
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecno- pensable for some teaching activities in the dis-
logia do Amazonas – IFAM cipline of geography. Innovation in the teaching
of geography is of great importance, there are
many subsidies, but it needs a direction, a simple
guideline or base on which to support the chang-
es brought about by the insertion of the technolo-
RESUMO: O ensino de geografia sempre en- gies. According to some authors, by geoprocess-
ing, a set of techniques that have the function of
frentou algumas dificuldades no que se refere ao
collecting, processing, analyzing and offering in-
estudo do espaço, o qual necessita de precisas
formation with geographic (or spatial) reference,
informações sobre os lugares. Parte dessas difi- can help in the process of teaching-learning, es-
culdades pode ser minimizada com o auxílio da tablishing a dynamic and interactive classroom
tecnologia. Sendo indispensáveis para algumas environment to raise the learning of geographic
atividades de ensino na disciplina de geografia. A phenomena and teacher-student communication.
inovação no ensino de geografia é de grande im-
portância, existem muitos subsídios, mas precisa KEY WORDS: Geotechnologies, Methodolo-
de um direcionamento, uma simples diretriz ou gies, Teaching.
base em que se apoiem as mudanças provocadas
pela inserção das tecnologias. Assim esta pesqui-
sa abordará como as geotecnologias (ou tecno- INTRODUÇÃO
logias espaciais), conhecidas também, segundo
alguns autores, por geoprocessamento, conjunto As inovações tecnológicas dinamizam o
de técnicas que tem como função coletar, proces- espaço geográfico nas diferentes escalas, do local
sar, analisar e oferecer informações com referên- ao global, molduram a relação do homem com o
cia geográfica (ou espacial), podem auxiliar no
meio, nos seus modos de produção logística e pa-
processo de ensino-aprendizagem, estabelecendo
um meio dinâmico e interativo em sala de aula drões de consumo. Os recursos tecnológicos não
para a elevar a aprendizagem dos fenômenos são apenas ferramentas (máquinas), não substi-
geográficos e a comunicação professor e aluno. tuem o profissional de educação, na verdade deve
PALAVRAS CHAVES: Geotecnologias, Meto- haver a integração da tecnologia (conhecimento)
dologias, Ensino. e sistema técnico (combinação especifica de má-
quinas e métodos empregados para obter um re-
sultado desejado) (GONÇALVES, 1994). A utili-
ABSTRACT: The teaching of geography has al-
zação das geotecnologias no ensino da geografia
ways faced some difficulties regarding the study
of space, which needs precise information about é de extrema importância, surgindo como uma
the places. Part of these difficulties can be mini- ferramenta de suporte, visando o desenvolvimen-

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 77


to cognitivo e social do educando e a construção de uma aprendizagem prazerosa e significativa.

Nesse contexto a tecnologia está cada vez mais inserida em todos os setores da sociedade, e
a escola não fica excluída, portanto a tecnologia deve ser utilizada como um meio, que visa o me-
lhor desempenho do profissional da educação e, ao mesmo tempo despertando o interesse do aluno
pelo conhecimento cientifico. (CORREA et al, 2010). Dessa maneira, propõe-se verificar a utilização
dessas inovações tecnológicas em sala de aula. A preocupação surgiu a respeito da manipulação des-
ta tecnologia, atualmente, as pesquisas agrícolas, geológicas, ecológicas, de planejamento urbano e
regional estão intrinsecamente ligadas a estas tecnologias. No entanto, esta interação (tecnologia e
prática pedagógica), deve percorrer todas as etapas escolares, do básico ao superior. Embora o acesso
ao conhecimento tecnológico, esbarra nas políticas públicas, que infelizmente priorizam outras di-
mensões, especialmente nos países subdesenvolvidos (FITZ, 1999). Vale ressaltar que neste artigo,
alertamos ao leitor, que não estamos propondo substituir o professor pela ferramenta, e sim a integra-
ção para um melhor ensino aprendizado no ensino de geografia.

O ENSINO TRADICIONAL DA GEOGRAFIA

A geografia tradicional seguiu o método científico desenvolvido através da observação, da


descrição e da classificação dos fatos, focou-se aos aspectos visíveis e mensuráveis do estudo. A ado-
ção dessa postura contribuiu para uma descrição separada dos aspectos natural e humano, eliminando
qualquer relação entre eles. Dessa forma, a geografia não se preocupava com a análise das relações
sociais, mas, sim, com o estudo dos aspectos.

Dessa forma durante anos, o ensino da disciplina geografia, se regulava no modelo tradicional
em que admitia a descrição, a enumeração, o repasse de conhecimentos, e, que, excluindo as comple-
xidades e contradições do espaço. Esse modelo se consolidou em um estudo meramente descritivo
das paisagens naturais, sem estabelecer vínculos com o social com o humano. Os métodos didáticos
baseavam-se na memorização e na descrição de conceitos que compõem a disciplina.

Na geografia tradicional valorizava-se a exigência da memorização de inúmeras informações


descritivas sem a interferência humana. Segundo Gebran:

Não havia preocupação em articular e estabelecer relações entre conteúdo ensinado e as


relações sócio espaciais cotidianas, como se os conteúdos não pudessem explicar e/ou
compreender a dinâmica da sociedade, impedindo de vê-la historicamente construída
(GEBRAN, 2003, p.82).

Notadamente a geografia tradicional apresentava a ausência de reflexão a respeito do contexto


social das humanidades, mera descrição, como se o homem não interferissem na natureza. Porém a
partir da década de 80, mudanças ocorreram na ciência geográfica, esse movimento de reformulação
da ciência geográfica contribuiu para o surgimento de uma nova proposta de ensino, baseada em
fundamentos críticos, que se estruturaram a partir de um conjunto de reflexões. Assim, há algumas
décadas, a educação tinha o caráter de transmissão e assimilação de conteúdos. Atualmente, vivemos

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 7 78


num momento importante na educação, que envolve um processo de mudanças com relação ao seu
papel, visto que a construção do conhecimento deve se constituir como um meio de aperfeiçoamento
humano. Portanto, o conhecimento geográfico deve contribuir para a reflexão crítica e possibilitar
ao educando o desenvolvimento da cidadania. É nesse contexto que queremos pensar o ensino da
geografia.

A FUNÇÃO DAS TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO

A insatisfação dos alunos em relação a aulas ditas “tradicionais”, ou seja, aulas expositivas
nas quais são utilizados apenas o quadro e pincel. Argumenta-se que os alunos de hoje precisam saber
para que e por que precisam saber determinado assunto. Essa é a típica aprendizagem utilitária, isto é,
só aprendo se for útil, necessário para entrar no mercado de trabalho, visando ao retorno financeiro.
A internet faz ainda mais o mundo ser digital e acessível aos jovens, é possível encontrar softwares
que fazem uma navegação pelo corpo humano e visualização da Terra do espaço sem sair do lugar. É
difícil, portanto, prender a atenção do aluno em aulas feitas do conjunto quadro + professor.

O papel das tecnologias na educação é de ferramenta enquanto recurso mediador para o ensino
de geografia, assim é necessário a instrumentalização básica dos usuários, neste caso o professor e o
aluno, uma vez que não se irá ensinar sobre as tecnologias, mas como utilizá-las para aprender/ensi-
nar as abordagens geográficas. Ensinar geografia, então, não pode ser confundido com ensinar sobre
as tecnologias de informação e comunicação. Estas darão o suporte que a geografia hoje necessita
para ser entendida na escola. O conhecimento geográfico exige a mediação de recursos educacionais
digitais para ser assimilado em todas as suas possibilidades e dimensões (STURMER, 2011).

GEOTECNOLOGIA E O ENSINO DE GEOGRAFIA

As geotecnologias são as novas tecnologias ligadas às geociências. Sua aplicabilidade traz


diversos benefícios para os seus usuários, no desenvolvimento de pesquisas, planejamentos e tantos
outros aspectos com foco espacial (FITZ, 2005). As ferramentas de análise espacial estão à disposição
da Geografia e do ensino há certo tempo, conforme demonstra a Tabela 1, elaborado por Matos (2001)
e adaptado por Fitz (2005).

Tabela 1. Fatos marcantes vinculados à geografia e às geotecnologias.

Época Fato característico


3.800 a. C. Utilização de coordenadas esféricas
Séc. III a. C. Representação plana
Séc. II Uso de projeções cartográficas
Séc. XVII Noção de geoide
Séc. XVIII Utilização de isolinhas
192 Surgimento da aerofotogrametria
1960 Surgimento da cartografia digital e dos SIGS

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 7 79


1963 Surgimento do Canada Geographic Information System (CGIS)
1969 Surgimento do ESRI - Environmental Systems Research Institute
1972 Tecnologia do sistema Landsat
1979 Surgimento do GPS – Global Position System
1981 Surgimento da internet
1997 Tecnologia do Landsat TM 7
1999 Tecnologia do satélite Ikonos (1m de resolução)
2001 Lançamento do Google Earth
2005 Lançamento do Google Maps
2007 Lançamento do Street View
2015 Tecnologia do satélite WorldView-3 (30cm de resolução)
Fonte: Matos (2001) apud Fitz (2005). Org Nascimento, 2015.

Percebemos o quanto as tecnologias foram aperfeiçoando o estudo da ciência geográfica. A


inserção da geotecnologia no ambiente escolar permite aos professores e alunos, romper com a geo-
grafia tradicional, permitindo uma nova maneira de analisar a relação entre homem e a natureza
(SANTOS, 2008). No entanto, geralmente o aluno de geografia resisti a disciplinas de conhecimentos
matemáticos e físicos, não aspiram exercer atividades técnicas. Essa visão tem limitado a atuação
dos profissionais, fundamentado na legislação que exige que o profissional exerça atividades de reco-
nhecimentos, levantamentos, estudos e pesquisas, também de caráter físico-geográfico (FITZ, 1999).

Para tal o professor apresenta-se como um mediador entre o aluno e as geotecnologias, no en-
sino aprendizado da geografia. Então o professor deverá ter subsídios para expor ao aluno o conteúdo
e a prática de todas essas ferramentas.

Na prática pedagógica, percebe-se que o professor de Geografia tem por objetivo ensinar a
ciência geográfica ao aluno, despertar nele a vontade de conhecer, compreender e assimilar
a análise do espaço vivido, além das relações sociais e naturais do planeta. O desafio do
professor de Geografia consiste em explicitar os mecanismos de ordem global/regional e as
interferências humanas (CORREA et al, 2010, p. 94).

Os parâmetros nacionais curriculares discorrem também sobre o assunto, conforme Brasil


(1998) demonstra:

Os PCN’s trazem entre outras diretrizes, a necessidade do desenvolvimento de trabalhos


que contemplem o uso das tecnologias, para que alunos e professores, possam se apropriar
e delas usufruir; e ainda, ampliar a visão de conteúdo para além dos conceitos, inserindo
procedimentos, atitudes e valores como conhecimentos tão relevantes quanto os conceitos
tradicionalmente abordados. Estas diretrizes explicitam a necessidade de os educadores
buscarem novos recursos para preparar os educandos para as exigências do mundo
globalizado, onde se valoriza o indivíduo que compreende a complexidade do meio em
que vive, desenvolve habilidades e novas aptidões, tem percepção das interdependências e
pensamentos autônomos e críticos (BRASIL, 1998, p.114).

Dessa forma, estudiosos como Callai (2000), Cavalcanti (2002) e Lacoste (1993) afirmam que
a geografia deve ajudar na construção do cidadão crítico, para que saiba pensar não apenas seu espaço

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 7 80


vivido, cotidiano, rotineiro, mas como ele é determinado por eventos externos, isto é, como a escala
local se relaciona com a escala global na produção e transformação do espaço geográfico. E, também,
que a geografia deve fazer com que o aluno perceba a importância desta disciplina, e se reconheça
sujeito que produz e é produzido pela sociedade (STURMER, 2011).

Ciência, tecnologia e informação estão a dispor de todos os ramos e setores da sociedade, se


tratando da educação é imprescindível considerar que esses fatores unidos com a capacidade do pro-
fessor de relacionar os recursos humanos com os informacionais pode modificar bastante a qualidade
de ensino tornando-o mais prazeroso (SANTOS, 2001).

Por isso a geotecnologia aplicada na educação, sobretudo especialmente no estudo do espaço


geográfico, possibilita ao aluno a apropriação do conhecimento por vários meios, podendo testar o co-
nhecimento em diferentes modos ou hipóteses, fazendo com que o educando desenvolva os diversos
pensamentos, um olhar crítico, incluindo o seu mundo abstrato, todavia relacionando-o sempre com o
mundo real. Existem inúmeros recursos tecnológicos que podem facilitar o processo de aprendizagem
do ensino da geografia. O computador, o principal produto das tecnologias de comunicação, ganha
destaque e importância neste quesito. Rico em recursos audiovisuais possibilita o entrecruzamento
de imagens, sons e textos. Os Atlas digitais, por exemplo, estão sendo muito utilizados na educação
geográfica, assim como diversos softwares educativos de apoio aos conteúdos curriculares, de jogos
e simulações para o ensino de Geografia que podem estimular os alunos na aprendizagem dessa dis-
ciplina.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

É importante destacar que há diferenças quanto à estrutura das escolas no ensino de geografia,
em escolas públicas é diferenciado e mais crítico pela falta de recursos didáticos atualizados e
em número adequado. Os investimentos em tecnologias e capacitação profissional são pontos
insuficientemente atendidos, o que resulta em dificuldades para os professores de geografia.

Independentemente do recurso tecnológico em questão, o professor é o sujeito capaz de me-


diar o aprendizado e torná-lo mais atrativo, divertido e interessante para os alunos. Os recursos tec-
nológicos, bem mais do que aguçar a curiosidade do aluno em relação ao que está sendo ensinado,
ajudam a prepará-lo para um mundo em que se espera que ele conheça, além dos conteúdos escolares,
todos os recursos por meio dos quais esses conteúdos foram trabalhados.

Portanto o estereótipo atual de ensino aos poucos está mudando por conta do ingresso das
inovações tecnológicas na educação, professores mais tradicionais enfrentam dificuldades em mudar
sua rotina e sua didática associando a mesma com as novas tecnologias, em contrario a isso, os alunos
estão cada vez mais ligados aos meios digitais e com isso seus comportamentos alteram em favor da
multimídia, interação digital etc., fato este que consequente gera nos professores uma sensação de
impotência devida suas práticas utilizadas atualmente não se tornarem mais vigentes ao período em
que se encontram e com isso os incentivam a buscar novas metodologias e possivelmente possam en-

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 7 81


contrar nas geotecnologias uma ferramenta no auxílio para o aperfeiçoamento das aulas de geografia.

REFERÊNCIAS

BRASIL, Geografia. In: Parâmetros curriculares nacionais. Brasília, MEC/SEF, 1998.

CALLAI, H. C. Aprendendo a ler o mundo: a geografia nos anos iniciais do ensino fundamental.
São Paulo: Scielo, 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ccedes/v25n66/a06v2566.pdf>.
Acesso em: 26 nov. 2010.

CAVALCANTI, L. de S. Geografia e práticas de ensino. Goiânia: Alternativa, 2002.

CORREA, M. G. G.; FERNANDES, R. R.; PAINI L. D. Os avanços tecnológicos na educação: o


uso das geotecnologias no ensino de geografia, os desafios e a realidade escolar. Acta Scientiarum.
Human and Social Sciences. Maringá, v. 32, n. 1, p. 91-96, 2010.

GEBRAN. R. A. A geografia no ensino fundamental. Trajetória histórica e proposições pedagógicas.


Colloquim Humanarum. Presidente Prudente, v. 1, n. 1, p. 81-88, jul./dez. 2003.

GONÇALVES, J. E. L. Os impactos das novas tecnologias nas empresas prestadoras de serviços.


São Paulo, RAE, v. 34, n. 1, p. 663-681, jan/fev. 1994.

FITZ, P. R. Geoprocessamento no ensino médio. Mérida. Anais da CONFIBISIG -Conferencia


Iberoamericana sobre Sistemas de Información Geográfica. Mérida, Venezuela 1999.

FITZ, P. R. Novas tecnologias e os caminhos da Ciência Geográfica. Diálogo Tecnologia, v. 6, p.


35-48, 2005.

LACOSTE, Y. Geografia: isso serve em primeiro lugar para fazer a guerra. 3. ed. Campinas:
Papirus, 1993.

SANTOS, Milton. Ensaios de Geografia Contemporânea. São Paulo: Hucitec, 2001.

SANTOS, A. R. A geotecnologia e sua aplicabilidade no ensino de geografia na educação básica.


Monografia (Pós-Graduação), São Paulo: Centro Universitário Nove de Julho - Uninove, Curso de
Formação de Docentes Para o Ensino Superior. 50p. 2008.

STURMER, A. B. As tic’s nas escolas e os desafios no ensino de geografia na educação básica. Geo-
saberes, Fortaleza, v. 2, n. 4, p. 3-12, ago. / dez. 2011.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 7 82


CAPÍTULO 8

NEGRO E O CONTEXTO ESCOLAR: DESAFIOS

CARLOS THIAGO CRUZ DA SILVA ABSTRACT: This article presents a study about
UERJ blacks and the school context. The study was
established within the Colegio Municipal Amaral
ODINO FERREIRA NETO Peixoto, located in the city of rio de janeiro. A
UENF
bibliographical research was done in order to
THOMAS ANDREW HOLMES GOODMAN enrich the work with relevant data and ideas in
Universidade Santa Úrsula society. In addition to bibliographical references,
a field research was carried out in order to know
the local environment to which the school is
inserted. The study addresses the following
RESUMO: O presente artigo traz um estudo
problem question: the lack of a didactic sequence
acerca do negro e o contexto escolar. O estudo
addressing the black as an important character in
foi estabelecido no âmbito do Colégio Municipal
the school context. It is hoped that the article will
Amaral Peixoto, localizado no município de
promote relevant reflections to debate racism,
Rio de Janeiro. Foi realizada uma pesquisa although legally prohibited, but that, according
bibliográfica a fim de enriquecer o trabalho com to the data pointed out in the study, exists and
dados e ideias relevantes na sociedade. Além is present not only in the school but in different
de referenciais bibliográficos, foi realizada sectors of society. It is hoped that the various actors
uma pesquisa de campo a fim de conhecer o of the schools will understand their importance
universo local o qual a escola está inserida. O for the establishment of true citizenship and be
estudo aborda seguinte questão problema: A promoters of the empowerment of citizenship.
falta de uma sequência didática abordando o
negro como personagem importante no contexto
escolar. Espera-se que o artigo promova reflexões
relevantes para se debater o racismo, embora KEYWORDS: Education. Racism. Black.
legalmente proibido, mas que, segundo os dados
apontados no estudo, existe e está presente, não
somente na escola, mas em diversos setores da
sociedade. Espera-se que os diversos atores das 1. INTRODUÇÃO
escolas compreendam a sua importância para o
estabelecimento de uma verdadeira cidadania e
sejam promotores da potencialização do acesso
à cidadania. As ações afirmativas e legislações são
passos importantes para atenuar desigualdades
em diversos setores sociais que ocorrem por
PALAVRAS-CHAVE: Educação. Racismo. um determinante: a cor da pele. Foram quase
Negro.
quatro séculos de escravidão que ocasionam
diversos impactos sociais até os presentes dias. A

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 83


população negra se depara com diversas barreiras a uma verdadeira inserção social. Esses obstáculos
estão presentes em relação ao direito a um ambiente seguro para se viver, ao direito a possuir uma
moradia, ao direito a um padrão econômico justo e ao direito a uma educação de qualidade. Nesse
cenário, apoiado nessas questões, sobretudo, as questões educacionais, o presente artigo aborda a
seguinte questão problema: A falta de uma sequência didática abordando o negro como personagem
importante no contexto escolar.

O objetivo geral do artigo consiste em promover uma reflexão sobre a forma que a instituição
de ensino trata as questões raciais dentro do espaço escolar e estabelecer propostas de intervenção
para se trabalhar a questão racial no contexto escolar. O estudo tem como objetivos específicos:
realizar uma pesquisa bibliográfica; realizar uma pesquisa de campo no Colégio Municipal Amaral
Peixoto; construir um mapa da empatia de professores e alunos; conhecer mais acerca dos alunos que
estão inseridos em uma unidade escolar; construir saberes acerca das relações estabelecidas entre
alunos negros e o contexto escolar da unidade escolar pesquisada; analisar os dados obtidos e propor
formas de intervenção.

O presente artigo consiste em um estudo a partir de referenciais teóricos e pesquisa de campo.


A pesquisa de campo se caracteriza pela coleta de dados de professores e alunos acerca da percepção
da participação do negro na sua escola e na sociedade brasileira. Os dados coletados, embora por
meio de questionários, passaram por uma análise qualitativa e quantitativa.

Espera-se que o artigo promova reflexões relevantes para se debater o racismo, embora
legalmente proibido, mas que, segundo os dados apontados no estudo, existe e está presente, não
somente na escola, mas em diversos setores da sociedade.

2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 A História do Negro no Brasil

A escravidão com prática legal durou quase quatro séculos no Brasil e suas marcas são sentidas
até os presentes dias. Observa-se temporalmente que a inserção da população negra em um estado de
direito de fato caminha a passos curtos. Dessa forma, apesar de completar-se 130 anos da abolição da
escravatura no Brasil, constata-se que boa parte da população negra vive às margens da sociedade em
relação a vários direitos sociais básicos (AMARAL, 2011).

Portugal, na época da colonização do Brasil, foi um Estado patrimonialista em que os bens


públicos se confundiam com os bens privados e as riquezas eram distribuídas segundo a origem
familiar. Portanto, vigorava em Portugal um estatuto da pureza do sangue para determinar que teria
direito a cargos públicos, eclesiásticos e títulos honoríficos. Nesse cenário, antes mesmo de usar a
pureza do sangue para justificar a legitimação da escravidão, essa estigmatização era usada para
orientar a distribuição de bens e direitos. Logo, não parecia estranho que no Brasil, país com forte
influência portuguesa, no ano de emancipação política, 1822, e estabelecimento de uma primária
cidadania, existir umas das maiores populações escravas das Américas (MATTOS, 2000).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 84


No Brasil, não houve nenhuma política de promoção efetiva de cidadania e de inclusão
social dos ex-escravizados, resultando em uma enorme população de africanos e seus descendentes
relegados à própria sorte. A prevalência por muitos séculos de um sistema caracterizado pela violência
e no arbítrio da propriedade de um indivíduo por outro acabou por legitimar uma rígida hierarquia.
O determinismo racial de finais do XIX – que naturalizava a diferença –, fundamentou uma série de
discriminações que são produtos da própria sociedade. Em uma nação marcada pela desigualdade de
oportunidades, a escravidão, embora formalmente extinta, encontrou espaço para continuar existindo
e produzindo efeitos (ARCZ & NETO, 2011).

2.2 Impactos do Racismo

Podemos considerar o racimo como um dos elementos maliciosos mais segregadores de nossa
sociedade, a qual o Brasil é fruto do período colonial e escravocrata imposto severamente na época
da exploração dos colonizadores.

A partir do século XVI a escravidão tomou força e ação no país, ganhando traços
no período colonial até o império. Tornou-se um ponto forte nas expedições negreiras da época,
resultando em consequente comércio de escravos para serem vendidos ao Brasil.

E os impactos do racismo no país tomaram desenhos preconceituosos, a partir das condições


de vida e do trabalho dos escravos. A começar pelas condições indignas nos navios, eram como
mercadorias, trabalhavam de sol a sol, não tinham alimentação adequada, viviam em locais insalubres,
as negras eram exploradas sexualmente.

Após muitas reivindicações e luta dos escravos, o tráfico foi abolido oficialmente com a Lei
Eusébio de Queiroz, em 1871, a Lei do Ventre Livre garantiu liberdade aos filhos dos escravos, mais
adiante, a Lei dos Sexagenários (1885) garantiu liberdade aos escravos maiores de 60 anos de idade.
E, por conseguinte, não última etapa, a abolição foi concedida pela Lei Áurea, assinada em 13 de
maio de 1888.

Será que o Brasil, um país com uma das maiores populações negras no mundo, ainda torna
o negro o centro dessas contradições? Ao que parece o país conseguiu ao longo de sua história
produzir um quadro de extrema desigualdade social e racial, mas a despeito de toda essa tentativa de
silenciamento, podemos destacar o fortalecimento e a resistência negra em busca de uma democracia
verdadeiramente racial.

Mas qual é a dificuldade em falar sobre racismo? Difícil porque em nosso país,
há uma larga dificuldade em reconhecer a existência do racismo no Brasil, em especial, os casos
que acontecem nas escolas, empresas, organizações sociais e na sociedade como um todo. Sempre
escutamos, aqui ninguém é racista, mas se conhecem muitos racistas.

ADORNO (1995, P.108/109):

Quero deixar bem claro, todavia, que o retorno ou não ao fascismo é, em definitivo, uma
questão social, não uma questão psicológica. Se me detenho nos aspectos psicológicos,

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 85


é exclusivamente porque outros momentos, mais essenciais, escapam, em boa medida,
precisamente à vontade da educação, senão já à intervenção dos indivíduos em geral.

Ainda hoje, presenciamos muitos negros dominados e submissos de determinados grupos,


como exemplo: no meio empregatício-trabalhar horas excessivas, ganhar menos que os “brancos”
entre outros na escola, por intermédio das relações entre os indivíduos, sofrer discriminação e até
mesmo segregação.

Nesse caminho, há consequências diretas e devastadoras no âmbito escolar, meio onde relações
são construídas e podem ser permeadas por ações positivas e negativas, integrantes ou excludentes

Notamos nos textos acima, um toque de silêncio torna-se imperador, vale ressaltar que
qualquer omissão diante desses fatos, estaremos fadados ao racismo, tangenciando uma forma velada
de observar os acontecimentos. No cotidiano escolar, o racismo cresce, gera produção e reprodução
de práticas vexatórias e discriminatórias, acima de tudo criminosas.

A escola e a família devem repensar suas práticas e contribuir para suscitar indivíduos plenos
em suas reflexões e críticos sobre o racismo. Algumas práticas podem ser enriquecedoras, tais como:

1)Educar para o respeito de todos, da diferença;

2)Lembre-se e eduque, pois racismo é crime;

3)Não deixe de denunciar o praticante do racismo;

4)Aprender sobre história e cultura dos povos negros e indígenas.

Destacaremos abaixo, algumas ferramentas pedagógicas que podem ser inseridas no contexto
sobre o racismo, como: alguns filmes e vídeos:

• Filme “Ó Pai, Ó”;

• Vídeo Vista minha Pele;

• Vídeo Cores & Botas;

• Vídeo “Quando o Crioulo Dança”.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 86


2.3 O Negro e o Currículo Escolar

De acordo com Canen e Xavier (2008):

quando falamos em uma educação inclusiva para as nossas escolas, a partir do olhar
multicultural, temos que ter em mente dois aspectos importantes: primeiramente, que as
diferenças não constituem incompletudes, defeitos, falhas ou caracteres de anormalidade, e
sim, que elas se caracterizam como uma pluralidade de formas legítimas de ver, de ser e de
estar no mundo. E, em segundo lugar, que se faz necessário e urgente olhar para o interior de
nossas salas de aulas, não apenas procurando os que estão ausentes fisicamente desse local,
mas também buscando os grupos e os indivíduos a quem os processos educativo e social têm
negado espaço, representação, voz, permanência e sucesso.

Conforme a Lei de Diretrizes e Bases, é obrigatória a inclusão, no currículo oficial da rede


de ensino, da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. Em 10 de março de 2008, o
presidente Luiz Inácio Lula da Silva sanciona a Lei nº 11.645 alterando as anteriores deixando, por
força de seu Art. 1o o art. 26-A e seus dois parágrafos, com a seguinte redação:

“Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino médio, públicos e


privados, torna-se obrigatório o estudo da história e cultura afro-brasileira e indígena.

§ 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá diversos aspectos da


história e da cultura que caracterizam a formação da população brasileira, a partir desses
dois grupos étnicos, tais como o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos
negros e dos povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o negro e o
índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas contribuições nas áreas social,
econômica e política, pertinentes à história do Brasil.

§ 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos povos indígenas


brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de
educação artística e de literatura e história brasileiras.”

Iniciativas que visam a implementação do Currículo Escolar no sentido de reconhecer e


valorizar a cultura e identidade negras, essas políticas educacionais, na visão de... representam a
pertinência e a necessidade de se viabilizar uma prática pedagógica na qual a diversidade cultural seja
trabalhada visado a formação de uma sociedade híbrida e plural em que o diálogo entre as diferenças
culturais possa enriquecer os espaços de aprendizagem.

3 MATERIAL(IS) E MÉTODOS

3.1 Descrição dos sujeitos do estudo

A presente pesquisa foi realizada com alunos e professores de uma turma de Educação Básica
para Jovens e Adultos (EJA), do turno noturno entre os dias 18 e 22 de junho de 2018, no Colégio
Municipal Amaral Peixoto.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 87


O colégio fica situado no bairro Lindo Parque em São Gonçalo, RJ. Atende a 951 alunos de
ensino em três turnos, sendo 277 no terceiro turno distribuídos em 5 turmas de EJA.

O grupo de alunos tem composição socioeconômica de baixa renda, tendo 19 integrantes, dos
quais, 5 são do sexo feminino e 1 do sexo masculino. A idade dos alunos varia entre 14 e 63 anos.

Já os professores, com idades variando entre 31 e 47 anos, são em número de seis, sendo 15
do sexo feminino e 4 do sexo masculino. Sua formação acadêmica inclui Normal (1), Graduação (1)
e Pós-Graduação (4) em diferentes áreas de conhecimento.

3.2 Delineamento da pesquisa

O presente trabalho é uma pesquisa aplicada, uma vez que propõe ferramentas que ataquem
o problema. É exploratória apresentando características de pesquisa bibliográfica tipo desktop com
consulta a artigos e periódicos, especialmente no ambiente virtual, acerca dos tópicos da fundamentação
teórica e sobre outros trabalhos que se fizeram abordando o mesmo tema. Soma-se a isso, um estudo
de campo para coletar dados sobre como alunos e professores percebem a participação do negro na
sua escola e na sociedade brasileira. Os dados coletados, embora por meio de questionários, passaram
por uma análise qualitativa e quantitativa.

3.3 Procedimentos específicos

O trabalho teve como ponto de partida a observação participante onde alunos e professores
eram observados no ambiente da escola no tocante ao tema, negro e o currículo escolar. A partir dessas
observações foram definidas as hipóteses a respeito da percepção do papel do negro no currículo e na
sociedade brasileira, e traçados os procedimentos.

Foi feita a apresentação, para os alunos, do vídeo da música “A vida é um desafio” da banda
Racionais MC. Seguiu-se, então, questionários (anexos 1 e 2) de coleta de dados de caráter aberto
e predominantemente subjetivo, em função tempo e do tamanho do grupo. Os questionários foram
entregues pelo professor/pesquisador para que os alunos preenchessem em casa e retornassem no dia
seguinte. Já os questionários dos professores foram entregues, respondidos no ambiente do Colégio
e retornados no mesmo dia. Ambos os questionários, além de conter perguntas objetivas como idade,
sexo, grau de instrução, envolviam questões subjetivas a respeito de como os integrantes de ambos os
grupos viam e sentiam as questões de racismo no colégio e na sociedade brasileira e de que maneira
e de que maneira esse tema poderia ser trabalhado no colégio. Todos os questionários de alunos e
professores foram retornados.

Foram feitos, com base nesses dados organizados, um quadro de empatia dos alunos e outro
dos professores como personagens centrais. A partir desses quadros foram pensadas práticas que
pudessem atender aos anseios mais frequentemente manifestados por ambos os grupos.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 88


4 RESULTADOS

Os dados obtidos pelos questionários distribuídos aos professores e alunos foram consolidados
em gráficos, trazendo uma abordagem quantitativa, e foram consolidados em mapas da empatia,
trazendo uma característica mais qualitativa.

Em relação aos docentes, os dados obtidos trouxeram informações relevantes. No gráfico


1, observa-se que 100% dos professores que atuam na educação de jovens e adultos constatam que
o preconceito racial ainda existe em nossa sociedade. O gráfico 2 mostra que 80% dos professores
apontam que a música pode contribuir para a disseminação do racismo, 10 % dos docentes acreditam
que a música não contribui para o racismo e outros 10% não souberam responder. Cabe acrescentar,
que nos questionários muitos professores disseram que a disseminação do racismo irá depender da
abordagem da música.

Gráfico 1 – Opinião dos professores acerca da existência do racismo na sociedade.

Gráfico 2 – Opinião dos professores acerca da influência da música na disseminação do racismo.

O gráfico 3 traz a opinião dos alunos em relação a presença personagens negros nos livros
didáticos. Pode-se observar que 47,37% dos discentes já observaram personagem negros nos livros
didáticos, 42,10 % disseram que não perceberam personagens negros nos livros e 10,51 % não soube-
ram responder. Cabe ressaltar que muitos estudantes disseram não receber livro didático, fato justifi-
cado por opção pedagógica de não uso do material por parte de alguns docentes.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 89


Gráfico 3 – Opinião dos alunos acerca da presença de negros nos livros didáticos.

Em relação ao gráfico 4, 47,06% disseram não conhecer nenhum personagem negro na história
do Brasil. Em contrapartida, 41,18% disseram conhecer personagem negros. Muitos alunos citaram
pessoas negras importantes de outros países, não citando nenhum personagem brasileiro.

Gráfico 4 – Opinião dos alunos referentes ao conhecimento de algum personagem negro na história
do Brasil.

Em relação a exclusão de pessoas por conta cor da pele (gráfico 5), 78% dos alunos disseram
não conhecer nenhuma pessoa que tenha sido excluída e 26,32% disseram conhecer.

Gráfico 5 – Opinião dos alunos sobre a exclusão de pessoas em atividades escolares por conta da
cor da pele.

Quase 80% dos entrevistados, conforme observado no gráfico 6, acreditam que pessoas negras

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 90


têm maiores dificuldades em concluir os estudos. Muitos discentes, como pode ser visto no mapa da
empatia dos alunos (imagem 2), apontaram a gravidez precoce, forças do passado, o racismo e a falta
de oportunidades com as principais causas da dificuldade em terminar os estudos.

Gráfico 6 – Opinião dos alunos sobre a dificuldades das pessoas negras em concluir os estudos.

Apesar da criação da Lei Áurea, 78,99% dos alunos afirmaram que as pessoas negras não
estão realmente libertas (gráfico 7)

Gráfico 7 – Opinião dos alunos sobre o fato dos negros estarem ou não realmente libertos.

No gráfico 8, pode se constar que 78,95% dos estudantes disseram que não observam atividades
escolares que trabalhem o tema racismo. Os discentes, conforme mostrado no mapa da empatia dos
alunos (Imagem 2), apontaram que gostariam que fossem desenvolvidas as seguintes atividades:
feiras, projetos, debates, atividades em grupo e trabalhos sobre consciência negra.

Gráfico 8 – Opinião dos alunos sobre a abordagem do racismo em atividades escolares

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 91


Abaixo seguem, respectivamente, os mapas da empatia de professores alunos que foram
construídos por meio da análise das respostas dos questionários.

Imagem1: Mapa da empatia dos professores.

Imagem 2: Mapa da empatia dos alunos.

5 DISCUSSÃO

Entendemos por consciência o ato de entender e reconhecer os aspectos cotidianos, designado


por diversidade de estados, disposições e atitudes, como por exemplo: pensamentos, emoções e
crenças.

A desintegração de uma cultura sob o efeito destruidor da dominação técnico civilizacional é


uma perda para toda a humanidade, cuja diversidade cultural constitui um dos mais preciosos tesouros
(MORIN, 2000). A representação ou a falta de representação de determinado grupo social lança mão
de sentidos e ações, provocando efeitos e consequências que se abatem na sociedade. Paulo Freire
em seus escritos, já citava que a falta de representação /opressão, faz o indivíduo se marginalizado

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 92


na sociedade.

[...] se faz necessário, neste exercício, relembrar que cidadão significa individuo no gozo os
direitos civis e políticos de um Estado e que cidadania tem que ver com dizer, com o uso dos
direitos e o direito de ter deveres de cidadão. (Freire, 2001:45).

Assim, olhando os dados coletados na entrevista, podemos notar, que por mais que
nossa educação tenta viabilizar o processo de inclusão, ainda é tênue a falta de diálogo com principais
fontes históricas da construção do país. Culmina-se, em uma prática não libertadora, pois ainda não
conjuga o homem o domínio de sua própria história e cultura.

As relações humanas que não se baseiam na aceitação do outro como um legítimo outro na
convivência não são relações sociais (1998). Nesse contexto, ainda existe uma invisibilidade muito
grande em relação aos escritores e personagens negros na sociedade a reflexão de Ana Thais é digna
de ser levada em consideração:

É tão triste saber que se declarar negro é motivo de discriminação, de chacota, de redução.
Vocês brancos têm o péssimo costume de se meter em tudo, querer validar tudo, dizer amém
ao que acham que lhes convém, ao que acham que é da sua alçada também, mas tenho uma
coisa a lhes dizer: não é. [...]

E essa invisibilidade no cotidiano escolar pode suscitar inúmeros fatores, como: discriminação
racial, segregação racial e reconhecimento da própria história /identidade, evasão escolar, desestimulo
para os estudos entre outros aspectos desafiadores.

Para minimizar os efeitos do racismo inteorizado no cotidiano, nossas escolas deveriam criar
reflexões didáticas sobre o tema, tais como: História e Identidade, daí enveredar-se para costumes,
personagens negros importantes dentre outras questões.

O Património cultural, como realidade complexa, tem que ser devidamente considerado –
desde o código genético e do genoma humano, até às tradições, às comunidades,
às instituições, aos hábitos e costumes, num conjunto vasto do que designamos como
Património imaterial (o modo como os artesãos trabalham, como a culinária se desenvolve,
como as pessoas e as comunidades se relacionam), passando pelos vestígios arqueológicos,
pelos monumentos, pelo modo de organização das populações e das 9 cidades, mas também
pela valorização da criação contemporânea […] (Martins, 2007, p. 17).

E outros aspectos podem ser levantados, como: comida-feijoada-, religião-Candomblé,


Umbanda -, hábitos, costumes, danças e crenças.

Os alunos demonstraram grande interesse em atividades coletivas e feiras para o


desenvolvimento de atividades relacionadas à cultura negra. Assim, sugere-se o desenvolvimento de
atividades culturais trabalhando os costumes, a música, dança, hábitos, gastronomia e crenças oriundos

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 93


da África. Cultura que não se manteve inalterada em solo brasileira, mas sofreu forte interferência
da diversidade que existe no Brasil. A redes sociais é uma eficaz ferramenta para divulgar todos os
projetos e atividades desenvolvidas dentro do espaço escolar.

Nesse contexto, é relevante repensar o negro e sua importância para a sociedade. A escola
deve assumir esse protagonismo para disseminar a cultura negra e mostrar toda a riqueza que há
nessa cultura. Nessa perspectiva, há proposição de construção de uma página no Facebook, intitulada
“Cultura Negra: luz, câmera, ação.” A fim de servir com ferramenta para divulgar todas as produções
e projetos relacionados ao povo negro construídos no espaço escolar.

Imagem 3: Página construída a fim de divulgar para a comunidade as atividades culturais


desenvolvidas na escola

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir de todo o trabalho desenvolvido podemos concluir:

• O Brasil encontra-se atrasado no tocante a um ideal realmente libertador da população


negra;

• Há desigualdade entre brancos e negros em vários setores da sociedade;

• O contexto social que a população negra herda é resultado de séculos de exploração;

• O povo negro como sujeito de construção de identidade em nosso país foi muito importante,
mas se deparam ainda com situações marginalizadas, que excluem e geram preconceitos;

• Os dados educacionais revelam índices mais baixo da estudante negros em relação aos
estudantes brancos;

• É relevante que a escola seja protagonista e viabilize, dentro do contexto escolar, ações
pedagógicas que coloquem o negro como personagem importante na escola, na comunidade
e em diversos segmentos sociais.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 94


REFERÊNCIAS

ADORNO, Sérgio. Violência e Racismo: Discriminação no acesso à justiça penal. Em: Lilia Moritz.
Raça e Diversidade. São Paulo: Edusp: estação Ciência, 199.

AMARAL, S.P. História do Negro no Brasil. Salvador: Centro de Estudos Afro Orientais, 2011. 114
p.

ARCZ, L.S.; NETO, H.M. Quando o passado atropela o presente: notas de um Brasil que insiste
no racismo. Cadernos de Campos, São Paulo, n.25, p.31-35, 2011.

FREIRE, Paulo. Política e Educação. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2001.

LEI Nº 11.645, DE 10 MARÇO DE 2008. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_


Ato2007-2010/2008/Lei/L11645.htm#art1 Acesso em: 27/06/2018.

Martins, Guilherme. Património, herança e memória: a cultura como criação’. Gradiva:


Lisboa,2007.

MATTOS, H.M. Escravidão e Cidadania no Brasil Monárquico. 2.ed. Rio de Janeiro: Zahar, 2000.
p. 7 – 54.

MORIN, Edgar. Os sete saberes necessários à educação do futuro / Edgar Morin; tradução de
Catarina Eleonora F. da Silva e Jeanne Sawaya; revisão técnica de Edgard de Assis Carvalho. – 2.
ed. – São Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNESCO, 2000.

XAVIER, Giseli Pereira de Moura & CANEN, Ana. Multiculturalismo e educação inclusiva:
contribuições da universidade para a formação continuada de professores de escolas públicas
no Rio de Janeiro. Pro-Posições, 2008.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 8 95


CAPÍTULO 9
OS DESAFIOS DA PROFISSÃO DOCENTE PARA O PROFESSOR NO
SÉCULO XXI, NA MODALIDADE DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA. UM
ESTUDO DE CASO NOS CURSOS TÉCNICOS, EIXO TECNOLÓGICO
GESTÃO E NEGÓCIOS NA REGIÃO DO VALE DO RIO DOS SINOS

DIANA RAQUEL SCHNEIDER GOTTS-


CHALCK ABSTRACT: The present study seeks to identi-
Universidade de Minho/Portugal fy, what are the challenges that teachers who tea-
GISELLY SANTOS MENDES ch in Technical Courses, Management and Busi-
Universidade FEEVALE/RS
ness Axis, in the form of Distance Education are
RESUMO: O presente estudo busca identificar, constantly faced.
quais são os desafios que professores que minis-
tram em Cursos Técnicos, Eixo Gestão e Negó- In order to verify teachers’, directors’ and studen-
cios, na modalidade de Educação a Distância se ts’ perceptions regarding the challenges, a targe-
deparam constantemente. ted interview was conducted with teachers and
Afim, de constatar quais seriam as percepções principals, however, because there were a large
dos docentes, diretores e alunos em relação aos number of students, there was a need to apply a
desafios, realizou-se entrevista direcionada com specific questionnaire. The interviews provided
professores e diretores, contudo, por existir uma significant information regarding perceptions,
quantidade de alunos elevada, para estes houve both from the perspective of the teacher, the ma-
a necessidade da aplicação de um questionário nagement and the student.
específico. As entrevistas realizadas forneceram
informações, significativas quanto às percepções, Among the findings of this research it was veri-
tanto sob a ótica do docente, quanto da gestão e fied that the respondents have a conception about
do discente. the context of the teaching challenge. Among the
Entre os achados desta pesquisa constatou-se que challenges, not all teachers share the same un-
os respondentes possuem uma concepção sobre derstanding, but the divergence of perceptions
o contexto do desafio docente. Entre os desa- about challenges is certainly related to the fact
fios, nem todos os docentes compartilham dos that some teachers work fewer hours and others
mesmos entendimentos, mas a divergência de have a large weekly workload. The selection of
percepções acerca de desafios, certamente, está
the theoretical reference served as a guide for the
relacionada ao fato, de alguns professores traba-
lharem menos horas, e outros terem uma grande development of this study and, at the same time,
carga horária de trabalho semanal. A seleção do to relate it to the empirical study.
referencial teórico serviu como norteador para o
desenvolvimento deste estudo e ao mesmo tem- KEYWORDS: Challenges of the teaching
po, relacioná-la com o estudo empírico.
profession - Management and business.
PALAVRAS CHAVES: Desafios da profissão
DistanceEducation.
docente – Gestão e negócios. Educação à Distân-
cia.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 96


INTRODUÇÃO

Este estudo tem como objetivo conhecer as dificuldades encontradas, no exercício da profissão,
pelos professores que trabalham em escolas privadas, nos cursos técnicos, no Eixo Tecnológico Gestão
e Negócios, na modalidade de educação a distância, região do Vale do Rio dos Sinos (estado do Rio
Grande do Sul, Brasil), em contexto de Educação a Distância (EAD). Devido à experiência e ao
mesmo tempo, a acessibilidade a este universo, considerou-se desenvolver um estudo que permitisse
conhecer quais os desafios que o docente encontra, diariamente, na sua profissão.

A modalidade de EAD cresce de forma significativa, promovendo uma grande revolução na


educação tradicional, consequentemente, exigindo dos professores novas formas de pensar quanto à
sua formação, à adoção de tecnologia, bem como suscitando novas práticas pedagógicas.

Embora a literatura referencie diversas designações e definições, sinônimas ou complementares,


para a EAD, tais como B-Learning1, ensino híbrido, ensino semipresencial, neste estudo será utilizada
a expressão “Educação a Distância” (EAD) que é aquela adotada e utilizada pelas instituições de
ensino da região do Vale do Rio dos Sinos.

Com o crescimento da EAD, surge a possibilidade de muitos estudantes de cidades vizinhas se


deslocarem até as escolas, tendo acesso à capacitação contínua, bem como a facilidade de encontros
presenciais durante a semana. Tal modalidade de educação facilita tanto no desenvolvimento da
qualificação educacional desses estudantes, quanto em seus respectivos orçamentos, uma vez que o
custo nesta modalidade apresenta-se inferiores aos valores das taxas praticadas nos cursos presenciais.

Ao analisar esse contexto educacional, constata-se que os professores necessitam saber fazer
uso das ferramentas disponíveis e, ao mesmo tempo, desenvolver o papel pedagógico, respeitando
o desenvolvimento individual de cada estudante, de forma a orientar quais são os respectivos papeis
nesse contexto. Verifica-se, ainda, a crescente evolução da tecnologia na comunicação educacional
e a quebra de paradigmas do ensino tradicional, tendo o professor um novo desafio na sua profissão
docente: o de se preparar para este novo cenário de avanço tecnológico em sala de aula.

O objetivo geral deste trabalho compreende caracterizar os desafios da profissão docente,


para o professor que trabalha na Educação a Distância, modalidade B-Learning, Eixo Gestão e
Negócios, na região do Vale do Rio dos Sinos. De modo a contribuir à construção desta investigação
estabeleceram-se os seguintes objetivos específicos: a) identificar as dificuldades dos professores
na utilização dos recursos tecnológicos de apoio ao ensino aprendizado; b) identificar as principais
barreiras que dificultam a formação continuada dos professores; c) descrever as implicações do
ensino, na modalidade de Educação a Distância, na vida pessoal do professor.

ESCOLHA DA PROFISSÃO DOCENTE.

Para muitos professores, a escolha da profissão ocorre ainda na infância, quando os futuros
professores, em suas brincadeiras infantis, já se imaginavam mestres, ou mesmo quando identificam

1 B-Learning -

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 97


em si próprios este desejo de querer ensinar e, ao longo da vida escolar, acabam por se espelhar em
alguns professores que se tornaram referências em suas caminhadas.

Buscando relacionar essa perspectiva, Tardif (2012) descreve que os saberes experienciais do
professor não são somente baseados na sua experiência em sala de aula, mas, em grande parte, trazem
na bagagem a cultura herdada na vida escolar na infância.

Ainda segundo Tardif (2012, p. 72) ao longo de sua história de vida pessoal e escolar, supõe-se
que o futuro professor interioriza certo número de conhecimentos, de competências, de crenças, de
valores, etc., os quais estruturam a sua personalidade e suas relações com os outros (especialmente
com as crianças) e são reatualizados e reutilizados, de maneira não reflexiva, mas com grande
convicção, na prática de seu ofício.

Este contexto de escolha da profissão mais voltada à docência em cursos técnicos, não foge à
regra em relação aos professores que são professores por formação. Esta observação se faz necessária,
uma vez que alguns dos professores, durante a entrevista, de modo informal, relataram o sonho de se
tornarem professores no início de sua trajetória profissional.

No entanto, por uma exigência familiar e uma cultura impregnada, na sociedade, que
relacionava à docência com salários baixos, automaticamente, os futuros professores escolhiam
outras profissões, em busca de melhores salários e deixavam a docência para um futuro próximo, fato
que ocorre nos dias de hoje.

DESAFIOS NO INÍCIO DA PROFISSÃO

Existem, neste contexto, duas perspectivas que precisam ser consideradas: a) A primeira
refere-se aos desafios no início da profissão para os professores que são oriundos de formação em
licenciatura, e buscam conquistar seu espaço e experiência na docência, passando pelas áreas da
educação infantil e ensino fundamental;

b) Na segunda perspectiva, é preciso considerar os desafios encontrados pelos professores


que iniciam sua trajetória docente, após a experiência profissional em outras áreas, que, no entanto,
ingressam na docência como profissão com a qual gostariam de finalizar sua trajetória profissional.

Sobre os desafios no início da profissão Nóvoa (2003, p. 109) destaca que,

O professor novato sente-se desarmado e desajustado ao constatar que a prática real do ensino
não corresponde aos esquemas ideais em que obteve a sua formação; sobretudo, tendo em
conta que os professores mais experientes, valendo-se da sua antiguidade, os irão obsequiar
com os piores grupos, os piores alunos e as piores condições de trabalho.

Sabe-se que são muitos os desafios enfrentados pelo professor em seu início de carreira, uma
vez que o autor descreve que a realidade encontrada pelo professor novato não condiz com a realidade
ensinada em sala de aula. Portanto, a realidade se opõem, em muitos casos, aos ensinamentos recebidos.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 98


Imbernón (2016) destaca que entre os problemas mais comuns que os professores recém
formado se deparam na atividade estão: manter a organização em sala de aula, tratar as diferenças
individuais, assim como trabalhar com materiais didáticos insuficientes, entre outros.

Contudo, é preciso ponderar que um fator positivo nos cursos de licenciatura refere-se aos
estágios obrigatórios, quando o aspirante a docente necessita, obrigatoriamente, conviver com a
realidade da sala de aula ao longo do seu curso, nos mais diversos níveis de ensino, sejam eles
educação infantil, ensino fundamental anos iniciais ou, até mesmo, ensino fundamental anos finais.

Os desafios para o professor em início de carreira docente, oriundo do mercado de trabalho,


tendo experiência em outra área, requerem um posicionamento um tanto quanto complexo,
primeiramente tendo que aprender a lidar com a crítica imediata, ora construtiva, ora não.

Este profissional precisa, entre outros tantos desafios, desaprender algumas atitudes
desenvolvidas ao longo da sua trajetória profissional. Por ser tratar de docência em cursos técnicos,
o profissional precisa, necessariamente, desta experiência profissional, para que ele consiga com
sucesso aproximar o aluno do mercado de trabalho, sendo esse o propósito dos cursos técnicos.

Segundo Freire (2011, p. 47),

É preciso insistir: este saber necessário ao professor – de que ensinar não é transferir
conhecimento – não apenas precisa ser apreendido por ele e pelos educandos nas suas razões
de ser – ontológica, política, ética, epistemológica, pedagógica, mas também, precisa ser
constantemente testemunhado e vivido.

Sob esse ponto de vista, o professor tem um grande desafio em sua carreira, qual seja o de
colocar-se no lugar do aluno, buscando compreender uma melhor forma de ensinar e aprender. O
autor referenciado estabelece, ainda, que é preciso criar possibilidades para a sua própria construção,
uma vez que não detém, em muitos casos, conhecimento pedagógico, o que facilitaria sua entrada na
profissão docente.

MUDANÇAS E TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO A EAD

A EAD vem ganhando cada vez mais importância por conta de sua relação estrutural com
muitas formas de aprendizado online, visto que anteriormente se estudava ou se comunicava através
de correspondências. Em 1970, começou uma nova era na EAD, na qual se inaugurou a comunicação
através de dois pontos importantes, o rádio e a televisão, e, em seguida, vieram vídeos e fitas cassetes.

Para Castells (2017, p. 87)

o processo de transformação tecnológica expande-se exponencialmente em razão de sua


capacidade de criar uma interface entre campos tecnológicos mediante uma linguagem digital
comum na qual a informação gerada, armazenada, recuperada, processada e transmitida.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 99


Outros aspectos, ainda apresentados pelo autor, referem-se à centralidade do conhecimento e
da informação que, segundo este, não vem a ser característica da revolução tecnológica, justamente
por ser esta revolução que permite o compartilhamento desses conhecimentos gerados.

Segundo Peters (2009) os avanços destas tecnologias são inestimáveis e tornaram a educação
a distância ainda mais relevante. Atualmente, esta forma de aprendizado não foi apenas reconhecida,
mas também incentivada pelos governos. Para Wilson et. al. (2013, p. 28), “a produção de conteúdo e
uso das mídias devem promover uma pedagogia focada nos alunos, capaz de estimular a investigação
e o pensamento reflexivo por parte dos estudantes”.

Ainda de acordo com Wilson et al. (2013), a alfabetização mediática e informacional


é necessária para todos os cidadãos, sendo um fator determinante para a nova geração, isto é, o
desenvolvimento da proficiência tecnológica dos indivíduos.

O que se afirma na literatura e na experiência, até o presente momento, trata-se do cenário


escolar integrado e com vivências em multimídias, estas gerando a dinamização e a ampliação das
habilidades cognitivas, devido à riqueza de objetos e sujeitos com os quais se permitem interagir,
possibilitando, assim, uma melhoria na amplitude do conhecimento (SOUSA, MOITA, CARVALHO,
2011).

Segundo Castells (2017, p. 101),

A tecnologia digital permitiu o empacotamento de todos os tipos de mensagens, inclusive


de som, imagens e dados, criou-se uma rede que era capaz de comunicar seus nós sem usar
centros de controles. A universalidade da linguagem digital e a pura lógica das redes do
sistema de comunicação geraram as condições tecnológicas para a comunicação global
horizontal.

Para Moran (2013, p. 63) “a educação a distância (EAD), antes vista como uma modalidade
secundária ou especial para situações específicas, destaca-se hoje como um caminho estratégico para
realizar mudanças profundas na educação”.

O docente deste novo cenário vem a ser o protagonista, pois as mudanças que estão acontecendo
na sociedade, mediadas pelas tecnologias, são tão grandiosas que implicam, em médio prazo, a
necessidade de reinventar a educação em todos os níveis e formas.

Segundo Horn e Staker (2015) a tecnologia digital abre a possibilidade para os grandes
educadores alcançarem mais alunos, pois é possível coordenar de tal forma que seja possível atender
um grande número de alunos na modalidade B-Learning.

Kenski (2013) traz uma reflexão e comenta a urgência de um novo modelo de formação; na
sua concepção, as novas tecnologias digitais de comunicação refletem diretamente na necessidade de
adoção de novos tipos de formação e escolarização. Ainda de acordo com Kenski (2012, p. 88), “as
tecnologias ampliam as possibilidades de ensino para além do curto e delimitado espaço de presença
física de professores e alunos na mesma sala de aula”. O autor traz inúmeras contribuições sobre a
tecnologia, seja do ponto de vista de formação docente, ou sob a ótica da contribuição no processo de

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 100


mudança da educação.

Para Bacich, Neto e Trevisani (2015) a atualidade requer um docente que promova a mediação,
discussão e problematização, ao passo que estimule o protagonismo individual, estimulando-os a
ensinarem a si mesmos, e uns aos outros. Diante das definições por parte destes autores, é possível
perceber a responsabilidade que o professor possui em suas mãos, sendo que se espera muito desse
profissional.

Para Kenski (2013, p. 19),

[...], há uma série de obstáculos no caminho: a formação intelectual valoriza mais conteúdo
oral e textual, separando razão e emoção. O professor não costuma ter uma formação
emocional, afetiva. Por isso, tende a enxergar mais os erros que os acertos.

A partir das contribuições dos autores consultados, que afirmam a importância da formação
docente para o sucesso da educação na modalidade B-Learning, e de forma a compreender como
esses elementos, em síntese, são de grande importância, Castells (2017) retrata, em sua obra, que
computadores, assim como sistemas, são geradores de informação, sendo alimentados pela mente
humana, ou seja, o que pensamos e como pensamos pode ser transmitido dos mais diversos meios,
como bens, produção de materiais, serviços, entre outros.

Nesta concepção, se um professor apresentar-se mais preparado para estar em sala de aula,
este poderá, através do seu conhecimento, alinhado com a tecnologia, produzir materiais didáticos que
contribuam ao conhecimento do aluno. As mudanças ocorridas nos últimos anos têm sido impactantes
na vida das pessoas, assim como, na educação principalmente.

As mudanças atreladas às tecnologias, de acordo com Jenkins, Ford e Green (2014) partem das
novas tecnologias que possibilitam ao público exercer um impacto muito maior em suas produções,
bem como permitem às instituições controlarem o comportamento. Ou seja, é preciso estar atento, ao
mesmo tempo em que a tecnologia torna as informações imediatas, esta demandará do professor ou
aluno, a constante atenção às informações disponibilizadas e selecionadas.

De acordo com Fullan (2009) a implementação da mudança educacional requer o envolvimento,


além dos níveis professor e escola. É necessário analisar amplamente o cenário de tal mudança, a
fim de conhecer, com profundidade, quem de fato está, e precisa estar envolvido nessa mudança
educacional.

Ainda segundo Fullan (2009, p. 39),

A dificuldade é que a mudança educacional não é uma entidade única, mesmo que
mantenhamos a análise no nível mais simples de uma inovação em uma sala de aula. A
inovação é multidimensional e existem, pelo menos, três componentes ou dimensões em
jogo, na implementação de qualquer novo programa ou política:

a) O possível uso de materiais novos ou revisados (recursos instrucionais como materiais ou


tecnologias curriculares;

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 101


b) O uso possível de novas abordagens de ensino (i.e. novas, estratégias ou atividades de
ensino);

c) A possível alteração de crenças (p.ex.: premissas e teorias pedagógicas subjacentes a certas


políticas ou programas novos).

O autor, no entanto, compreende que o processo de mudança para esta transformação está
atrelado a três fases: a) A primeira delas, chamada de início, deve trazer uma análise das necessidades
e a decisão de aderir, ou não, ao processo de mudança; b) Já a fase dois refere-se à implementação,
que ocorre geralmente nos dois ou três primeiros anos de uso; c) Por último, a fase três, denominada
pelo autor de fase de continuação ou rotinização, é aquela em que é preciso avaliar se a mudança será,
ou não, parte contínua do processo.

Diante desse desafio na mudança educacional, é preciso compreender que a inovação faz parte
do processo de transformação, seja ele educacional ou social, e que, segundo Kenski (2012, p.19), “as
tecnologias invadem as nossas vidas, ampliam a nossa memória, garantem novas possibilidades de
bem-estar e fragilizam as capacidades naturais do ser humano”.

Em síntese, é preciso buscar a compreensão desta dimensão de conhecimento e transformação


que ocorre constantemente e trazê-la, não somente para o nosso meio, mas para a nossa vida,
considerando a tecnologia como um auxílio às nossas decisões e, para isto, fazer com que ela seja um
fator a somar e não algo que nos impeça na busca constante pelo conhecimento.

FORMAÇÃO CONTINUADA

O constante aperfeiçoamento e atualização por parte dos professores tornam-se imprescindível,


isto é, o professor demanda estar ciente de que o contexto no qual está inserido exige que,
constantemente, vá em busca de novas formas de ensinar e, ao mesmo tempo, deve propor, por meio
de novas metodologias, um aprendizado mais significativo.

Segundo Imbernón (2010, p. 47), ”a formação continuada deveria promover a reflexão dos
professores, potencializando um processo constante de auto-avaliação sobre o que faz e por que
faz”. Autores como Nóvoa (1997) e Imbernón (2009) compreendem que a formação dos professores
faz parte do desenvolvimento profissional, no qual, são necessários a continuidade da prática e o
compartilhamento de informações.

Na concepção de André (2016, p. 264), “a formação continuada transforma-se no espaço


desejado para a concretização do desenvolvimento profissional delineado pelos estudiosos e, por
meio desse espaço, órgãos educacionais iniciam reformas em suas políticas de formação para alcançá-
la”. As colocações de Imbernón (2009) reforçam, ainda, que, além do desenvolvimento profissional,
a formação permanente ou continuada deveria fomentar e incentivar o desenvolvimento pessoal e
institucional do professorado, de modo a potencializar o trabalho colaborativo e transformar a prática
existente.

Dentro dessa ótica, Imbernón (2006, p. 15), destaca que:

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 102


[...] a formação assume um papel que transcende o ensino que pretende uma mera atualização
cientifica, pedagógica e didática e se transforma na possibilidade de criar espaços de
participação, reflexão e formação para que as pessoas aprendam e se adaptem para poder
conviver com a mudança e a incerteza.

Ainda de acordo com Imbernón (2006, p. 55),

[...] a formação deve apoiar-se em uma reflexão dos sujeitos sobre sua prática docente, de
modo a lhes permitir examinar suas teorias implícitas, seus esquemas de funcionamento, suas
atitudes, etc., realizando um processo constante de autoavaliação que oriente seu trabalho.

Em síntese, Imbernón (2006) complementa que a formação deve contribuir para que o professor
adquira conhecimentos e atitudes, a fim de despertar no profissional um espirito investigativo e,
acima de tudo, reflexivo.

Ainda em suas obras, Imbernón (2006, 2009, 2010) faz diversas reflexões, em grande parte
voltadas à formação continuada, mas do ponto de vista coletivo, salienta que a formação requer um
clima de colaboração entre os professores, no qual os professores podem se apoiar uns aos outros,
assim como um profissional que possa auxiliá-los durante as aulas, enfim, precisam seracompanhados,
despertados para irem em busca de conhecimento.

Imbernón (2010, p. 33) afirma que “a formação dos professores influi e recebe a influência
do contexto em que se produz e, por sua vez, condiciona os resultados”. E, por fim, Imbernón (2010)
traz uma importante reflexão, encontrada em muitas escolas de formadores, que se refere à formação
continuada, realizada através de “treinamentos”, onde um palestrante, ou algum profissional renomado
exemplifica em uma sala de “treinamento” um caso de sucesso e espera que o professor utilize este
exemplo em sala de aula, com o intuito de mudar a prática e a metodologia de ensino. Contudo,
esquece que o perfil do aluno não é o mesmo em que tal “case de sucesso” foi aplicado.

Quando se fala em formação continuada, mas na visão coletiva, as instituições compreendem


que esta formação se dá, em muitos casos, através desse preceito; isso constitui um grande engano,
sendo que o autor, inclusive, utiliza a expressão “poção mágica”, através da qual reflete a forma
ilusória que esta didática proporciona.

De acordo com Fullan (2009, p. 240), “apesar de retórica sobre a formação docente na sociedade
atual, não parece haver uma crença ou confiança real de que investir na formação de professores traria
resultados”, então, como mudar este pensamento, como fazer com que as instituições possam de fato
mudar essa concepção? Talvez a busca por esta resposta seja longa e um tanto quanto desafiadora.

Há um “lapso” por parte dos professores, instituições e governo, visto que muitos professores,
atualmente, atualizam-se somente, quando ao término do mês, houver sobra de algum recurso
financeiro; caso não ocorra, a forma de atualização acontece através de cursos gratuitos e com emissão
de certificado.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 103


Se existe uma qualidade nesses cursos, não se tem total conhecimento, mas o ponto positivo
desse contexto é que o professor, mesmo não tendo feito o curso preferido, mantém-se reflexivo.

Em relação às instituições, são raras as que proporcionam cursos “pagos” aos seus professores.
Em grande parte das vezes ocorre o que já foi citado anteriormente: trazem um “palestrante” e esperam
que as experiências por ele colocadas sejam, de imediato, aplicadas na sala de aula, o que, em muitos
casos, proporciona aos professores uma imensa frustração, notoriamente sentida no ambiente escolar.

Na região em estudo, há somente uma instituição que trabalha diretamente com o professor,
mas voltado ao coletivo. Existe o desenvolvimento de reuniões pedagógicas, porém direcionadas
ao desenvolvimento pessoal e profissional do professor, não trazendo palestrantes externos, mas,
construindo uma parceria sólida entre professor e escola.

ADMINISTRAR SUA PRÓPRIA FORMAÇÃO

Segundo Nóvoa (2003) nos últimos vinte anos houve uma grande fragmentação da atividade
do professor: muitos profissionais fazem mal o seu trabalho, menos por incompetência mais por
incapacidade de cumprirem, simultaneamente, um enorme leque de funções.

Ainda, segundo o autor, este leque ao qual se refere, trata de destinar tempo a programar aulas,
avaliar os alunos, corrigir trabalhos e atividades fora da sala de aula, ao mesmo tempo, estar disponível
para esclarecer dúvidas, orientar os alunos, esclarecer dúvidas dos pais, sempre que necessárias,
relativas à vida escolar do aluno, participar de reuniões pedagógicas, atualizar-se periodicamente,
aprender e fazer uso das tecnologias em sala de aula.

No entanto, há vinte anos, Nóvoa (2003) fez tal reflexão, porém, considerando que estamos
no ano de 2018, houve poucas mudanças. Pelo contrário, as responsabilidades tendem a crescer;
atualmente o professor precisa estar atento, inclusive, ao comportamento do aluno em sala de aula.
Ainda, segundo, Nóvoa (2003) que afirma que vários autores possuem a mesma concepção de que os
professores estão sobrecarregados e, por este motivo, não conseguem desenvolver bem suas funções.

Imbernón (2006) menciona que entre os obstáculos encontrados na formação de professores,


um dos motivos pela busca e atualização está relacionada ao retorno financeiro, ou seja, ao fazer
uma analogia entre as palavras dos autores, é possível identificar que, muitas vezes, os professores
mesmo sobrecarregados, acabam por assumir mais atribuições, pelo fato de terem um aumento em
sua remuneração ao término do mês, algo que é comum no meio em que convivemos.

A realidade que encontramos no Brasil é de sobrecarga de trabalho para os professores, sejam


eles estaduais, municipais ou da rede privada. Porém, os professores que mais “sofrem”, sem dúvida,
são os professores da rede estadual, que além das várias atribuições que lhes são imputadas, muitas
vezes, encontram pela frente um aluno agressivo. A situação agrava-se, ainda, pelo fato de, em alguns
estados, os professores receberem seus salários atrasados ou parcelados.

Já o ensino privado não evidencia atrasos de salários e, tampouco, um aluno agressivo, mas
recebe um aluno de nível médio, sedento por conhecimento, com turmas, geralmente, por volta de 40

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 104


alunos. Este contexto exige do professor uma preparação mais profunda, tendo que estar atualizado
e, ao mesmo tempo, fazendo uso da tecnologia e de práticas pedagógicas diferenciadas, para que o
aluno se sinta atraído e motivado pela aula.

O professor que exerce sua profissão voltada ao ensino profissional possui uma grande
dificuldade em administrar sua própria formação, primeiro, porque a média de idade dos professores
é acima dos trinta anos, geralmente são noivos, casados e possuem filhos. Ao mesmo tempo, precisam
saber administrar o tempo entre a família, a constante atualização e qualidade do ensino desenvolvido
na modalidade da educação a distância.

DESAFIOS DA PROFISSÃO DOCENTE

Muitos são os desafios na profissão docente e a relação que Hargreaves, Earl, Moore e
Manning (2002) fazem ao afirmar como seus alunos, os docentes não são papéis em branco a serem
preenchidos, e o aprendizado não é osmótico. Mudar crenças e práticas é um trabalho extremamente
difícil. Quando a mudança envolve cultura, não basta impor é preciso fazer com que o docente
realmente acredite na mudança, e entenda o real significado da necessidade de transformação.

Segundo Imbernón (2006, p. 61)

Os futuros professores e professoras também devem estar preparados para entender as


transformações que vão surgindo nos diferentes campos e para ser receptivos e abertos a
concepções pluralistas, capazes de adequar suas atuações às necessidades dos alunos e alunos
em cada época e contexto.

Para Moran (2013) quanto mais tecnologias, maior será a importância de profissionais
competentes, confiáveis, humanos e, também, criativos, pois a educação é um processo de profunda
interação humana, com menos encontros presenciais e múltiplas formas de orientar, motivar e
acompanhar o aluno.

Na concepção de Freire, Freire e Oliveira (2014), não se pode ter medo de cometer erro, pois o
erro é consequência de tentativas, e arriscar é algo extremamente necessário para enfrentar os desafios
da sociedade tecnológica. Além disto, estes autores (p.105) citam que “um bom educador faz com que
os estudantes se cansem e que fiquem curiosos. Eu não acredito muito em educadores que mantém
suas turmas bem-comportadas”.

Atualmente, um dos grandes desafios do professor é manter o estudante motivado com seu
aprendizado, não é algo que seja fácil, mas se trata de um grande desafio, senão o maior.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 105


ANÁLISE DOS DADOS OBTIDOS

A população objeto deste estudo contemplou 361 alunos, 17 docentes e quatro diretores das
escolas técnicas privadas que ofertam cursos técnicos no Eixo Gestão e Negócios, na modalidade de
EAD, localizadas nas cidades pertencentes à região do Vale do Rio do Sinos.

Quanto à abordagem este trabalho caracteriza-se como qualitativo e quantitativo, uma vez que
tais abordagens fundamentam-se na possibilidade de coleta de informações, ao mesmo tempo, em
que permite o confrontamento, via entrevistas de dados que não seriam possíveis apenas por meio da
aplicação de questionários.

A caracterização do perfil dos estudantes respondentes revelou que 38% são residentes da
cidade de Canoas; seguido por Novo Hamburgo com 19%, São Leopoldo com 17%, sendo 26%
residentes em outras cidades que não pertencentes à Região do Vale do Rio dos Sinos.

As respostas obtidas indicaram que as competências esperadas pelos alunos compreendem o


domínio das competências técnicas (domínio do conteúdo e domínio da tecnologia), competências
pedagógicas (quando ele precisa fazer com que o aluno se sinta acolhido e saiba fazer a articulação
entre teoria e prática), e competências comportamentais, neste caso, quando se espera que o professor
tenha atitude em sala de aula. Sendo estas competências indicativas dos desafios diários que os
docentes confrontam-se.

Por compreender o foco de estudo deste trabalho, o ensino técnico, no qual o docente compartilha
com o aluno a experiência por ele vivenciada no mercado de trabalho, houve a necessidade de avaliar
qual a formação acadêmica que o corpo docente apresenta. Ao analisar as respostas dos professores
respondentes, identificou-se que dos 17 respondentes, 14 são formados na área de gestão e negócios
e possuem experiência profissional relevante para estarem em sala de aula.

Constatou-se que alguns docentes buscam a formação pedagógica, em muitos casos,


por exigência das instituições em que ministram aulas. Já outros docentes o fazem, por escolha
própria, buscando tal formação de forma a proporcionar ao profissional segurança na organização e
planejamento escolar. Bem como, compreende um complemento necessário à formação.

Faz-se necessário a formação de ambas, isoladamente, não há como desenvolver o papel docente
com qualidade e assertividade. Na formação técnica, não se constrói o conhecimento pedagógico, e
sim o técnico, no qual o profissional precisa saber fazer e fazer corretamente; ao contrário, muitas
vezes, da formação pedagógica, na qual o aluno desenvolve o conhecimento respeitando seus limites
de aprendizagem.

Justamente por trabalhar com metodologias diferentes, e buscar o melhor de ambas as


metodologias, alguns dos docentes respondentes almejam, também, melhorar sua qualificação, através
da realização de Mestrado e Doutorado voltados para a área acadêmica e não profissional.

Durante a entrevista realizada, alguns dos docentes que não cursavam Mestrado ou Doutorado
destacaram que não o fazem por motivos financeiros, mas pretendem fazê-lo futuramente, tanto que
se preparam para este processo, pois almejam bolsas de estudos que exigem preparo, dedicação e

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 106


conhecimento.

Também se identificou que frente a modalidade de EAD, seis docentes possuem entre 13
meses e 24 meses de experiência, sendo esta a maior representatividade. Os docentes que possuem
até um ano de experiência na modalidade, sentem-se desafiados, e por este motivo permanecem na
educação a distância.

As experiências profissionais voltadas à modalidade devem ser tratadas com bastante cuidado,
uma vez que são profissionais que iniciaram e permaneceram no ensino, consequentemente procuram
formas de se adequar, ao mesmo tempo em que desejam exercer seu papel de forma diferenciada no
ambiente escolar.

Quanto à carga horária que cada docente dedica à modalidade EAD, no que tange sua
organização, bem como frente ao conteúdo que será abordado em sala de aula. Observou-se que
eventualmente docentes ministram uma disciplina diferente a sua área de formação, o que requer do
docente uma dedicação à parte, quando ocorre.

Frente a este desafio constatou-se que muitas vezes, a carga horária não prevista para
preparação de material, impacta diretamente em processos de atualização profissional, a percepção
dos docentes respondentes reflete exatamente esta realidade, sendo que 11 professores dedicam de 5
a 10 horas da sua semana na organização das aulas; quatro docentes destinam até 4 horas semanais;
já quanto à dedicação está acima de 11 horas semanais, o número reduz para dois docentes.

Em grande parte das escolas, em que estes profissionais atuam tais horas não são remuneradas,
ou seja, esta dedicação de forma gratuita, o que faz com que, em muitos casos, os docentes acabem
por se desmotivar, pois ocupam parte de seu período de lazer na preparação de material.

Entre os principais desafios identificados pelos docentes, constam a falta de ferramentas


tecnológicas, a oscilação da internet, assim como os equipamentos defasados. Em muitos casos,
alguns dos computadores que poderiam ser utilizados pelos docentes para realizarem atividades com
os alunos não se encontram em condições de uso, dificultando demasiadamente o planejamento, bem
como a realização do mesmo.

Como o docente precisa ter sempre um plano alternativo, em muitos casos, este procura
utilizar o celular do próprio aluno, contudo, há outro desafio, o da internet apresentar-se estável e
com velocidade suficientemente necessária para que o aluno possa utilizar o seu próprio equipamento
como forma de consulta, na falta de um computador.

Outro desafio, na percepção dos docentes, está no uso das ferramentas, porém neste item os
profissionais têm consciência de que precisam ir à busca de qualificação, ou seja, a competência em
proficiência tecnológica.

Quando questionados a respeito dos principais obstáculos, as respostas apontadas pelos


docentes retratam exatamente a mesma situação em relação a todos os respondentes, o tempo.
Organizar-se para se atualizar requer muito mais que organização, requer uma melhor gestão do
tempo, especialmente, por parte dos empregadores.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 107


Durante a entrevista dos docentes respondentes, 14 relataram que os deslocamentos entre suas
aulas, muitas vezes, ocupam de duas até três horas diárias, e consideram este tempo como “perdido”,
uma vez que não podem aproveitá-lo para se atualizarem, justamente por estarem em trânsito ou em
deslocamento em transporte público.

Alguns dos entrevistados ainda relataram, de forma espontânea, que se tivessem a oportunidade
de trabalharem mais próximos às suas residências, certamente, demandaria menos tempo, e
consequentemente proporcionaria não somente o tempo livre, mas uma melhor qualidade de vida,
inclusive, para sua própria saúde.

Bem como, poderiam realizar mais cursos e melhorem sua performance em sala de aula. Em
relação aos docentes que não responderam, foram consideradas somente as respostas adequadas às
questões, no caso, estes docentes reportaram informações que não condiziam com o enunciado da
questão proposta.

Ao serem questionados quais os canais que utilizam para a sua atualização, foram identificadas,
as mídias, mais precisamente leituras digitais e vídeos, outro canal bastante utilizado pelos entrevistados,
são os cursos, sejam pagos ou não. Alguns dos entrevistados procuram atualizar-se com palestras,
trocas de experiência, estas últimas são muito importantes, pois a escola tem como propósito formar
para o mercado de trabalho, estar próxima e proporcionar ao aluno esta relevante experiência. Os
entrevistados que não responderam, não consideraram exatamente a pergunta, portanto suas respostas
não estavam de acordo.

CONCLUSÃO

É notável que a profissão docente passa por inúmeros desafios, percebe-se que as bibliografias
que identificam os desafios da profissão, formação inicial e a formação continuada buscam identificar
quais são as principais definições de cada etapa.

A escolha pelo tema este estudo “os desafios da profissão docente para o professor no século
XXI, na modalidade de educação a distância”, buscou realizar um estudo de caso, cuja população em
estudo compreende os professores que trabalham com a educação a distância, na Região do Vale do
Rio dos Sinos.

Ao longo da investigação, foram consideradas as observações, em alguns casos a rotina de


alguns professores, no ambiente escolar, através de depoimentos informais, com o propósito de
identificar mais precisamente quais eram os desafios com que o professor se depara constantemente;
relacionando com as entrevistas realizadas, foi possível identificar, quais, de fato, são os desafios.

Um dos maiores desafios, talvez o maior, está na própria gestão do tempo, embora, alguns
professores não o identificam como sendo um desafio, talvez pelo fato de exercerem a docência,
trabalhando um ou dois dias na semana, totalizando neste caso, o máximo de 6 horas em sala de aula
como professor no EAD.

Outro desafio, que está relacionado à gestão de tempo, está no conciliar a vida pessoal com

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 108


a profissional, como um professor que trabalha 18 horas por semana como professor do EAD, que
ministra disciplinas variadas em um mesmo tempo, pode conciliar o tempo? Talvez a resposta esteja
no comprometimento que o professor tem com o seu próprio trabalho, com a sua Instituição e com o
aluno, ou seja, prepara-se para estar em sala de aula, aproveita todo o tempo que consegue e direciona-
se para a sua própria organização escolar, deixando de lado, muitas vezes, a rotina da família.

O que talvez nós todos, professores de EAD, não soubéssemos antes de ingressar no universo
da educação a distância, seriam os desafios, as necessidades, a busca necessária e constante pela
formação continuada. Vale ressaltar que, por mais desafios que os professores desta investigação
tenham, todos fazem seu trabalho com o maior comprometimento, buscando absorver para si próprios
os desafios, jamais imaginando abandonar o trabalho nesta modalidade.

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Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 9 110


CAPÍTULO 10
PERCEPÇÕES E PRÁTICAS DE PROFESSORES DOS
ANOS INICIAIS SOBRE O ENSINO E APRENDIZAGEM
DE GEOGRAFIA NO CONTEXTO DA BNCC

ROBERTA DALL AGNESE DA COSTA RESUMO: O objetivo desta pesquisa foi cola-
Docente do Instituto Educacional do Alto Uruguai – borar com a construção de um corpus de conhe-
Unidade de Caxias do Sul cimento que abrange desde o perfil do professor
(formação inicial e continuada), suas percepções
GRAZIANE SILVEIRA DUTRA
Acadêmica do curso de Pedagogia do Instituto Edu- sobre a implantação da BNCC na escola em que
cacional do Alto Uruguai atua até a compreensão das intervenções pedagó-
gicas propostas para o ensino e aprendizagem de
KAOANE DA SILVA FEITEN Ciências Humanas nos anos Iniciais do Ensino
Acadêmica do curso de Pedagogia do Instituto Edu-
Fundamental. Para a coleta sistemática dos da-
cacional do Alto Uruguai
dos optou-se por um questionário composto de
KELLY DA SILVA MATIELLO perguntas fechadas e abertas. Trata-se, portanto,
Acadêmica do curso de Pedagogia do Instituto Edu- de uma pesquisa qualitativa, de caráter explorató-
cacional do Alto Uruguai ria e do tipo estudo de caso. As perguntas abertas
foram tabuladas e analisadas utilizando um pro-
LAIANE MOSCHEN BRANCO
tocolo baseado na análise de conteúdo. Dentre os
Acadêmica do curso de Pedagogia do Instituto Edu-
cacional do Alto Uruguai principais resultados observa-se que os professo-
res participantes da pesquisa são em sua maioria
LARISSA MORAES DOS SANTOS pedagogos com pelo menos um curso de pós-gra-
Acadêmica do curso de Pedagogia do Instituto Edu- duação. Além disso, como opinião geral a respei-
cacional do Alto Uruguai to da BNCC, os professores indicaram que é um

LUANA ANTONIOLI documento que procura oportunizar a igualdade


Acadêmica do curso de Pedagogia do Instituto Edu- de qualidade para a Educação nacional e que ain-
cacional do Alto Uruguai da faltam formações e informações nas escolas
sobre sua implantação. A partir destas e outras
SIMONE MORAES DA SILVA
informações detalhadas no texto, conseguiu-se
Acadêmica do curso de Pedagogia do Instituto Edu-
elaborar e discutir com outros autores acerca das
cacional do Alto Uruguai
especificidades do ensino de Geografia nos Anos
SUÉLEN FORTUNA Iniciais.
Acadêmica do curso de Pedagogia do Instituto Edu-
cacional do Alto Uruguai

VERÔNICA DOS SANTOS MARTINS PALAVRAS-CHAVE: Percepções e práticas;


Acadêmica do curso de Pedagogia do Instituto Edu- professores dos anos iniciais; ensino de Geogra-
cacional do Alto Uruguai fia.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 111


PERCEPTIONS AND PRACTICES OF TEACHERS OF THE INITIAL YEARS ON GEOG-
RAPHY EDUCATION AND LEARNING IN THE CONTEXT OF BNCC

ABSTRACT: The objective of this research was to collaborate with the construction of a corpus of
knowledge ranging from the profile of the teacher (initial and continued formation), his perceptions
about the BNCC’s implantation in the school in which it operates until the understanding of the ped-
agogical interventions proposed for teaching and learning of Human Sciences in the Early Years of
Elementary School. For the systematic collection of data, a questionnaire composed of closed and
open questions was chosen. It is, therefore, a qualitative research, of exploratory character and of the
type of case study. The open questions were tabulated and analyzed using a protocol based on con-
tent analysis. Among the main results it is observed that the teachers participating in the research are
mostly pedagogues with at least one postgraduate course. In addition, as a general opinion about the
BNCC, teachers indicated that it is a document that seeks to give equal quality to National Education
and that there is still a lack of training and information in schools about its implementation. From
these and other detailed information in the text, it was possible to elaborate and discuss with other
authors about the specificities of Geography teaching in the Early Years.

KEY WORDS: Perceptions and practices; teachers in the early years; Geography teaching.

1. INTRODUÇÃO

As proposições sobre o ensino de Ciências Humanas nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental
têm mudado muito nos últimos anos (ARESI, 2018). Estes processos de mudança têm sido
impulsionados pela aprovação de novos documentos acerca do ensino no Brasil, por exemplo, a Base
Nacional Comum Curricular (BNCC).

A BNCC é um documento normativo de caráter obrigatório que define os direitos de


aprendizagem dos estudantes de todo o país e, por isso, é o fundamento para a reelaboração dos
currículos escolares (BRASIL, 2018). Durante o processo de implementação, surgem muitos
questionamentos sobre como, por que e o que deve ser ensinado, conforme observado por Triches e
Aranda (2016) em seu texto sobre a BNCC como ação da política educacional. Atualmente, em nível
nacional, as escolas estão em fase de transição dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para a
BNCC, sendo que, sua obrigatoriedade passa a valer a partir do ano de 2020, em que todas as escolas
deverão ter redefinido seus currículos e, por consequente, suas práticas.

Estes questionamentos sobre como, por que e o que ensinar acerca de determinado objeto
de conhecimento, devem ser trazidos para o contexto de formação de professores em nível superior
para que novas sínteses sejam propostas. Assim, considerando a importância da pesquisa durante o
processo de formação acadêmica, principalmente no que diz respeito a construção e autoria de uma
história acadêmica, foi proposta e executada esta investigação (CHAER et. al., 2012).

Nela, acadêmicas do curso de Pedagogia de uma faculdade privada do município de Caxias

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 112


do Sul, Rio Grande do Sul, foram convidadas a planejar e executar uma investigação qualitativa,
de caráter exploratória, do tipo estudo de caso, com o objetivo de levantar percepções e práticas
de professores em exercício sobre a docência nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental a partir da
área do conhecimento das Ciências Humanas, especificamente do componente curricular Geografia.
Esta investigação foi planejada e executada no âmbito das atividades da disciplina de Fundamentos
Teórico-Metodológicos do Ensino de Ciências Humanas que, na grade curricular do referido curso,
encontra-se no quinto semestre.

A pesquisa acadêmica, enquanto estratégia de ensino e aprendizagem tem como objetivo


aproximar os estudantes do universo real de trabalho, considerando as diferentes formas de atuação
que os profissionais da área podem executar. Espera-se que, por meio desta estratégia e, no caso desta
pesquisa, as estudantes possam problematizar e refletir sobre o ensino e a aprendizagem de Geografia,
enquanto componente curricular das Ciências Humanas.

Enquanto investigação em si, visa colaborar com a construção de um corpus de conhecimento


que abrange desde o perfil do professor pedagogo (formação inicial e continuada), suas percepções
sobre a implantação da BNCC na escola em que atua até a compreensão das intervenções pedagógicas
propostas para o ensino e aprendizagem deste componente específico.

Para tanto, as acadêmicas-pesquisadoras foram convidadas a elaborar um questionário,


apresentá-lo para pedagogos em exercício, tabular as respostas e analisar os dados. Durante o processo
de construção da pesquisa, destaca-se a vivência de elaboração, execução, tabulação e análise de
dados de investigações qualitativas, tão importantes no âmbito da Educação.

2. CARACTERIZAÇÃO DA PESQUISA

Segundo Denzin e Lincoln (2006) a pesquisa qualitativa envolve uma abordagem que destaca
uma visão interpretativa do mundo, analisando cenários naturais, tentando entender os fenômenos e os
significados que as pessoas atribuem a eles. No caso específico desta pesquisa, o cenário corresponde
a sala de aula, enquanto, o fenômeno analisado trata das percepções e práticas dos professores sobre
os processos de ensino e aprendizagem de Geografia nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Quanto aos objetivos, enquadra-se como pesquisa exploratória, definida por Gil (2009) como
um meio de proporcionar maior familiaridade com o tema pesquisado. Estas pesquisas podem ser de
caráter bibliográfico ou estudo de caso. O estudo de caso caracteriza-se como a análise de uma unidade,
ou um pequeno grupo (ALVES-MAZZOTTI, 2006). No caso desta investigação, os professores dos
Anos Iniciais do Ensino Fundamental constituem-se como o grupo de análise e suas percepções e
práticas como os dados de pesquisa.

Os dezesseis professores respondentes da pesquisa são tanto de escolas públicas quanto de


escolas privadas do município de Caxias do Sul, Rio Grande do Sul. Todos eles estavam, durante o
desenvolvimento da pesquisa, em exercício da docência nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 113


Quanto ao planejamento da pesquisa seguiu-se o esquema indicado por Marconi e Lakatos
(1999), composto por três etapas: a) preparação da pesquisa; b) fases da pesquisa e c) execução da
pesquisa.

Na fase de preparação da pesquisa, houve, em um primeiro momento, uma exposição-


dialogada para as acadêmicas-pesquisadoras sobre a pesquisa qualitativa em Educação, elaboração
e aplicação de questionários e técnica de Bardin (2011) para análise de conteúdo. Em seguida, as
acadêmicas produziram, no contexto da disciplina de Fundamentos Teórico-Metodológicos do Ensino
de Ciências Humanas, perguntas acerca de suas inquietações sobre esta práxis educativa nos Anos
Iniciais do Ensino Fundamental.

Na fase da pesquisa, para a coleta sistemática dos dados, por se tratar de percepções de sujeitos
sobre determinada temática, optou-se por um questionário. No caso desta pesquisa, os sujeitos são
professores em exercício nos Aos Iniciais do Ensino Fundamental e as suas opiniões sobre a BNCC
(de forma geral) e o ensino de Geografia, de acordo com as proposições da BNCC. O questionário,
enquanto instrumento de coleta de dados de pesquisas qualitativas, é definido conforme Gil (2009),
como a técnica de investigação composta por um número de questões que são apresentadas por
escrito às pessoas, tendo por objetivo o conhecimento de opiniões, crenças, sentimentos, interesses,
expectativas, situações vivenciadas etc.

A execução da pesquisa, por sua vez, incluiu tanto a tabulação dos dados quanto a análise e
interpretação dos resultados. Para análise dos dados seguiu-se o protocolo sistematizado por Costa
(2018) baseado em Bardin (2011). Este protocolo, utilizado também por Costa et al. (2018a), Costa
et al. (2018b) e Reis e Costa (2018), é composto por três etapas: I - Pré-análise – organização do
corpus da pesquisa (trata da elaboração dos indicadores que nortearão a interpretação final); II -
Exploração do material – codificação e categorização (compreende a codificação, na qual os dados
são transformados em unidades e categorização, na qual são definidas as unidades de registro. O
critério assumido foi léxico – classificação das palavras segundo seu sentido, com emparelhamento
dos sinônimos ou sentidos próximos); III - Tratamento dos resultados – atribuição de significado aos
resultados (é o tratamento dos resultados é a atribuição de significado a eles).

Nas tabelas 3, 4, 5, 6, 7 e 8 em todas as subcategorias foi considerado o total da amostra, pois


os participantes poderiam indicar mais de uma em suas respostas. Todas as etapas foram executadas
pelas acadêmicas-pesquisadoras em colaboração com a professora responsável pela disciplina, de
modo a corroborar com a escrita do presente artigo.

3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

O questionário, enquanto instrumento de coleta de dados, estava organizado em três blocos


de perguntas, conforme anteriormente explorado por Costa (2018). O primeiro bloco consistiu em
perguntas relacionadas ao perfil docente, nomeadamente sobre a esfera de trabalho (pública ou privada),

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 114


formação inicial e pós-graduação, além do tempo de docência. O segundo bloco englobava questões
sobre a BNCC: leitura prévia do documento, opiniões gerais e específicas, processo de transição dos
PCNs para a BNCC e implantação nas escolas. Já o terceiro bloco, por sua vez, apresentava questões
específicas sobre o ensino de Ciências Humanas nos Anos Iniciais do Ensino Fundamental quanto
aos objetivos e os fundamentos do ensino de Geografia, as intervenções pedagógicas realizadas nas
aulas para o desenvolvimento das competências socioemocionais, as informações do livro didático
(manual do professor), os principais desafios do dia-dia, a abordagem dos objetos de conhecimento,
as estratégias para que o aluno estude e aprenda, os procedimentos de investigação e pesquisa e, por
fim, o papel da Geografia na formação crítica do estudante. Os resultados da interpretação dos dados
são expostos a seguir.

BLOCO I

Dentre os participantes da pesquisa, a maior representatividade da amostra foi em relação


à educação pública, constituída por 82% dos professores, dos quais 85% atuam exclusivamente na
esfera municipal, 15% exclusivamente na esfera estadual e 15% do total da rede pública trabalham
em ambas esferas.

Em relação à formação dos professores, 82% são graduados em Pedagogia (tabela 1) e 31%
possuem pós-graduação voltada para a gestão escolar e suas áreas derivadas (tabela 2). A maioria dos
professores trabalha em média a mais de dez anos (68%) com a docência.

Tabela 1: Cursos de formação inicial dos professores participantes da pesquisa.

Categoria Subcategorias n F(%)


Formação inicial Pedagogia 13 82
História 1 6
Letras 1 6
Magistério 1 6
Fonte: a pesquisa, 2019.

Tabela 2: Cursos de pós-graduação dos professores participantes da pesquisa.

Categoria Subcategorias n F(%)


Título da especialização Psicopedagogia 3 18
Não possui 4 25
Educação Inclusiva 2 12
Possui mais de uma pós-graduação 2 12
Cursando 2 12
Educação Infantil e Ludicidade 1 6
Alfabetização e Letramento 1 6
Gestão e Supervisão Escolar 1 6
Fonte: a pesquisa, 2019.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 115


Em relação aos cursos de pós-graduação escolhidos pelos participantes da pesquisa, observa-se
que 19% voltaram-se para a grande área da gestão escolar. Este fato pode ser relacionado a formação
inicial do pedagogo que compreende uma vasta gama de possibilidades, desde a atuação na Educação
Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental até a gestão (LUCINDO; ARAÚJO, 2019).

BLOCO II

Quando questionados sobre a leitura da BNCC, 56% dos respondentes indicou ter lido apenas
a parte referente aos anos iniciais, 31% indicou não ter lido e apenas 13% responderam positivamente.
Estes dados se aproximam daqueles obtidos por Maciel et al. (2017) em que os participantes
desconheciam o documento como um todo.

Quando perguntados a respeito da opinião, de maneira geral, sobre a BNCC, 50% dos docentes
indicaram que ela procura oportunizar igualdade (ideia de educação mínima) e/ou melhorias no
ensino. Porém, cabe ressaltar que 13% deles indicaram que a BNCC não abrange todas as realidades.
Outras subcategorias de respostas podem ser identificadas na tabela 3.

Tabela 3: Opinião geral sobre a BNCC dos participantes da pesquisa.


Categoria Subcategorias n F(%)
Opinião geral sobre a Procura oportunizar igualdade (educação mínima)/melhorias 11 69
BNCC Poderia ser feito mais mudanças 4 25
Objetivo é bom/significativo 3 19
Não abrange todas as realidades 2 12
Formas complementares 1 6
Desenvolvimento de competências e habilidades 1 6
Diretriz necessária 1 6
Deve haver cobrança para ser cumprida 1 6
Fonte: a pesquisa, 2019.

O texto da BNCC referente à necessidade da construção de um norteador para sustentar as


aprendizagens mínimas ganha ainda mais importância quando se analisam os resultados de avalições
nacionais como, por exemplo, o Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB). Os dados obtidos
por este sistema indicam o atual distanciamento entre a Educação pretendida na forma da lei (Art. 206,
I e VII), que assegura igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, além da garantia
do padrão de qualidade, e aquela executada pelas escolas do país (RAMOS; NASCIMENTO, 2019).
Da mesma forma, e corroborando com a questão anterior, quanto perguntados sobre a efetividade
da Base em constituir-se um instrumento legal para a garantia das condições da aprendizagem, 50%
responderam negativamente e 38% destacaram em suas respostas a importância das definições,
construções e da condução de cada escola para a efetivação da garantia de igualdade. Destaca-se
a necessidade da reconstrução dos currículos em função dos alinhamentos à Base. Isto por que, o
documento nacional não se trata de um currículo em si, ele propõe às redes municipais, estaduais e
privadas a revisão de seus currículos, usando a BNCC com um núcleo comum para a nova elaboração,
ou seja, ela explicita os direitos de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos, mas não a maneira

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 116


como os professores, escolas e sistemas de ensino irão trabalhar para concretizá-los (BRASIL, 2017).

Sobre a transição dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) para a BNCC, os professores
indicaram que percebem a falta de formação adequada para a compreensão das novas diretrizes (37%),
apenas 6% responderam que não há necessidade de formação e 4% que tem sido realizados estudos
nas escolas. Outras categorias de respostas podem ser identificadas na tabela 4.

Tabela 4: Percepções acerca da transição dos PCNs para a BNCC dos professores participantes da
pesquisa.

Categoria Subcategorias n F(%)


Transição dos PCNs para Falta de formação 6 38
a BNCC Estudos nas escolas 4 25
Necessidade de mudanças 2 12
Informações desencontradas 1 6
Avaliações inadequadas 1 6
Não é necessária formação 1 6
Resposta inespecífica 1 6
Fonte: a pesquisa, 2019.

A BNCC propõe grandes mudanças na Educação, a definição do ensino por competências,


por exemplo, vem a romper com o tradicional modelo fundamentado em conteúdos estáticos e sem
uma evidente conexão entre si (do ponto de vista do aluno). O ensino por competências, segundo
Bordenave e Pereira (2015), pressupõe que todos os estudantes atinjam um domínio total dos objetivos
específicos mínimos. Esta proposta de ensino alinha a Educação nacional a documentos e formas
internacionais de avalição como, por exemplo, o Programa Internacional de Avaliação de Estudantes
(PISA) (SACRISTÁN, 2011).

Cabe ainda destacar que, o conceito de competências já aparecia no texto da Lei de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional (artigos 32 e 35), portanto, essa diretriz de ensino já estava prevista
para o sistema nacional de Educação (ARESI, 2018). Ademais, quando ao ensino por competências e
a formação inicial e continuada de professores para a execução do disposto na BNCC, cabe a União as
ações de fiscalização do processo de formação de professores, bem como a coordenação do processo
de implantação e correção das desigualdades existentes nas diferentes regiões (ARESI, 2018).

Neste contexto de transição, algumas escolas já estão com seus documentos alinhados à Base,
enquanto outras, ainda estão na fase de construção e implementação. Assim sendo, sobre a implantação
da Base na escola em que trabalha, 50% dos professores indicaram que os planos de estudos já
foram atualizados, 31% que já ocorram discussões sobre a temática nas reuniões pedagógicas e 19%
que ainda estão vivenciando a fase de implementação. Outras subcategorias de respostas podem ser
identificadas na tabela 5.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 117


Tabela 5: Percepções acerca da implantação da BNCC dos professores participantes da pesquisa.

Categoria Subcategorias n F(%)


Implantação da BNCC Planos de estudos 8 50
Reuniões pedagógicas 5 31
Fase de implementação 3 19
Cursos de formação 2 12
Trocas de experiências 1 6
Início do processo 1 6
Não foi discutido 1 6
Fonte: a pesquisa, 2019.

Antes da BNCC, vigoravam os PCNs, que não se caracterizavam como pressuposto legal, mas
como uma recomendação que evidenciava os conteúdos mínimos de cada área do conhecimento. A
BNCC surge, então, em função da necessidade de melhoria da Educação brasileira e a partir de uma
grande consulta às bases educacionais brasileiras, pesquisadores das Instituições de Ensino Superior
e educadores de todos os níveis.

Assim, conforme também verificado por Maciel et al. (2017), os professores concordam sobre a
necessidade de capacitações personalizadas por unidade escolar e formação continuada na perspectiva
do seu cotidiano. Essas informações corroboram com a resposta apontada pelos participantes desta
pesquisa sobre a importância do trabalho de cada escola na efetivação da renovação dos currículos em
face as necessidades de cada realidade.

BLOCO III

Quando questionados sobre o que o ensino de Geografia deve promover, os professores


indicaram que deve colaborar com o desenvolvimento do pensamento espacial/raciocínio geográfico
(50%), deve desenvolver a cidadania (50%), informar sobre a sociedade e natureza (25%) e
proporcionar a compreensão da localização no mundo (25%). Outras subcategorias de respostas
podem ser identificadas na tabela 6.

Tabela 6: Percepções acerca do Ensino de Geografia dos professores participantes da pesquisa.

Categoria Subcategorias n F(%)


Ensino da Geografia e a Pensamento espacial/raciocínio geográfico 8 50
BNCC cidadania 8 50
Sociedade e natureza 4 25
Localização do mundo 4 25
Estudo do meio 2 12
Em branco 1 6
Resposta inespecífica 1 6
Visão socio-econômica 1 6
Fonte: a pesquisa, 2019.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 118


A principal mudança trazida pela Base em relação ao ensino de Geografia no Ensino
Fundamental é a ênfase na aplicação do raciocínio geográfico. Esta ênfase possivelmente se justifica
pela importância deste raciocínio para a compreensão do mundo atual e pelo lugar secundário que
ele tem ocupado nas práticas escolares, que privilegiam uma lógica de planejamento pautado no
conteudismo e na repetição (GIROTTO, 2015).

Aliado a ele, o desenvolvimento do pensamento espacial também é citado na BNCC como


um dos desdobramentos das noções de espaço e tempo, que são conceitos fundamentais da área
das Ciências Humanas, e que também foi citado por grande parte dos respondentes desta pesquisa
(BRASIL, 2018). Cabe destacar que, tanto o raciocínio geográfico quanto o pensamento espacial
perpassam as cinco unidades temáticas (nomeadamente: o sujeito e seu lugar no mundo; conexões e
escalas; mundo do trabalho; formas de representação e pensamento espacial; natureza, ambientes e
qualidade de vida) que estruturam o componente Geografia (BRASIL, 2018).

A respeito dos fundamentos relacionados ao ensino de Geografia que norteiam as práticas


dos professores, o maior índice de respostas esteve voltado a construção de uma perspectiva social
por meio da estratégia da localização espacial (37%). Outras subcategorias de respostas podem ser
identificadas na tabela 7.

Tabela 7: Fundamentos do ensino de Geografia segundo os professores participantes da pesquisa.

Categoria Subcategorias n F(%)


Fundamentos do ensino de Localização espacial e geográfica para a construção social 6 38
Geografia Espaço vivido 4 25
Legislação local 1 6
Resposta inespecífica 2 12
Em branco 2 12
Fonte: a pesquisa, 2019.

O termo espaço vivido como fundamento, foi apontado por 31% dos professores, indicando
alguma aproximação com o previsto pela BNCC. Esta percepção sobre o espaço vivido é citada na
BNCC e envolve as categorias fundamentais a serem trabalhadas na Geografia escolar: elas, as de
lugar, de paisagem, de território e de região (BRASIL, 2018, GUIMARÃES, 2018).

Em relação as intervenções pedagógicas para desenvolver as competências socioemocionais,


a resposta com a maior frequência indica levar a reflexão sobre a sociedade e sua vivência nela (44%),
seguida do diálogo com 19% e outros 19% para o uso de gráficos econômicos, culturais e sociais.
Outras subcategorias de respostas podem ser identificadas na tabela 8.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 119


Tabela 8: Intervenções pedagógicas para desenvolver as competências socioemocionais segundo os
professores participantes da pesquisa.

Categoria Subcategorias n F(%)


Intervenções pedagógicas Levar a reflexão sobre a sociedade e sua vivência nela 7 44
para desenvolver as com- Gráficos econômicos, culturais e o sociais 3 19
petências socioemocionais Diálogo 3 19
Em branco 2 12
Resposta inespecífica 1 6
Fonte: a pesquisa, 2019.

Das dez competências gerais estabelecidas na BNCC, têm-se três competências ligadas ao
conhecimento, nomeadamente a primeira, segunda e a terceira, outras três ligadas às habilidades,
quarta, quinta e sexta, e mais quatro ligadas a atitudes e ao caráter, sete, oito, nove e dez. Assim, as
competências ligadas ao conhecimento dizem respeito, principalmente, ao pensamento científico,
crítico e criativo – para investigar, analisar problemas e criar soluções; e ao senso estético – para fazer
fruir diversas manifestações artísticas e culturais. Enquanto, as competências relativas as atitudes
relacionam-se com a comunicação – para produzir sentidos que melhorem o entendimento mútuo; a
argumentação – para formular, negociar e defender ideias; a cultura digital – para comunicar-se, resolver
problemas e disseminar conhecimentos. Já as competências socioemocionais indicam a necessidade
de autogestão – para fazer escolhas em relação ao futuro com liberdade; de autoconhecimento e
autocuidado – para cuidar de si e dos outros; de empatia e cooperação – para respeitar e promover o
respeito ao outro; e, por fim, autonomia – para tomar decisões seguindo princípios éticos, democráticos,
inclusivos, sustentáveis e solidários (BRASIL, 2018). Diferente de outros documentos anteriores, a
BNCC explicita claramente a intenção de romper com uma Educação que coloque o foco do currículo
apenas no desenvolvimento cognitivo, valorizando, portanto, as competências socioemocionais do
sujeito para o processo de aprendizagem (BRASIL, 2018).

Em épocas passadas, o manual do professor já foi considerado o principal aliado do exercício


da docência, com orientações e sugestões sobre como proceder o ensino de determinado conteúdo.
Atualmente, com a popularização das tecnologias digitais, os meios de o professor obter informações
tem se diversificado bastante. Os professores participantes desta investigação apontaram que ele ainda
é uma ferramenta valiosa (44%), porém que não é o suficiente (19%) e outros 19% que não há livros
de Ciências Humanas como um todo. Outras subcategorias de respostas podem ser identificadas na
tabela 9.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 120


Tabela 9: Opinião sobre o manual do professor presentes nos livros didáticos segundo os professores
participantes da pesquisa.

Categoria Subcategorias n F(%)


Manual do professor Sim, é uma ferramenta valiosa 7 44
Sim, mas não é o suficiente 3 19
Não há livros de Ciências Humanas 3 19
Não livros didáticos 1 6
Não foi trabalhado com livros atualizados com a BNCC 1 6
Em branco 1 6
Fonte: a pesquisa, 2019.

Em relação aos desafios atuais em protagonizar o processo de ensino de Geografia na


atualidade, observou-se um número importante de respostas em branco, 38%. Além destas, 25% dos
professores indicou a dificuldade de provocar o interesse dos alunos no conteúdo, e 19% de trabalhar
determinado objeto de conhecimento (conteúdo específico). Outras subcategorias de respostas podem
ser identificadas na tabela 10.

Tabela 10: Percepções sobre os principais desafios da docência de Geografia atualmente segundo os
professores participantes da pesquisa.

Categoria Subcategorias n F(%)


Desafios da docência Em branco 6 38
Provocar o interesse no aluno 4 25
Trabalhar determinado objeto de conhecimento 3 19
Ludicidade 2 12
Interdisciplinaridade 1 6
Fonte: a pesquisa, 2019.

Quanto às abordagens em relação aos objetos de conhecimento e para o desenvolvimento


do raciocínio geográfico e do pensamento espacial, a BNCC apresenta os recursos: analogia,
diferenciação, conexão, distribuição, extensão, localização e ordem (BRASIL, 2018). Nas respostas
dos professores pode-se observar uma expressão grande de abordagens, totalizando dezesseis opções
diferentes: questionamentos, leituras, imagens, realidade do indivíduo, análise, observação, pesquisa,
entendimento, interpretação, analogia, diferenciação, conexão, distribuição, extensão, localização e
fragmentação. Dentre todas as opções, somente encontramos respaldo na BNCC para 38% delas,
nomeadamente: analogia, diferenciação, conexão, distribuição, extensão e localização, sendo que,
ordem, por exemplo, não foi citado.

A BNCC, quando elenca as dez competências gerais para o ensino e aprendizagem, cita, na
competência de número dois, o pensamento crítico, científico e criativo para exercitar a curiosidade
intelectual, recorrendo à abordagem própria das ciências, incluindo a investigação, a reflexão, a

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 121


análise crítica, a imaginação e a criatividade (BRASIL, 2018). Nesta perspectiva, os professores
foram questionados sobre suas práticas de sala de aula que instigam a investigação ou a pesquisa. As
práticas mais citadas foram a problematização, o uso dos questionamentos e o estímulo à criatividade,
os desafios e as atividades de interesse, que juntas totalizam 54% da amostra. Outras subcategorias de
respostas podem ser identificadas na tabela 11.

Tabela 11: Práticas de sala de aula que instigam a investigação ou a pesquisa dos professores partici-
pantes da pesquisa.

Categoria Subcategorias n F(%)


Práticas de sala de aula Problematização 3 19
que instigam a investiga- Questionamentos 3 19
ção ou a pesquisa
Estimulando a criatividade/desafios/atividades de interesse 3 19
Atividades para exposição 2 12
Diálogos/entrevistas 2 12
Aulas práticas 2 12
Resposta inespecífica 2 12
Vídeos 1 6
Celular 1 6
Desenhos 1 6
Temas norteadores 1 6
Integrando os conteúdos de Geografia com temas atuais 1 6
Fonte: a pesquisa, 2019.

Observa-se que, o que a BNCC chama de abordagem própria das ciências, a investigação, a
reflexão e a análise crítica não foram citadas explicitamente pelos professores. Apenas a abordagem
voltada para a criatividade foi lembrada por 18% deles. Cabe destacar que, especificamente na área
das Ciências Humanas, os procedimentos de investigação devem contribuir para que os alunos
desenvolvam a capacidade de observação de diferentes indivíduos, situações e objetos, trazendo à
tona dinâmicas sociais em razão de sua própria natureza (BRASIL, 2018).

Para além da BNCC, pode-se considerar o exposto por Bassoli (2014), e classificar como ensino
por investigação as diferentes denominações que ele recebe na literatura, como questionamentos e
resolução de problemas (problematização). De qualquer modo, ao professor, cabe o planejamento
de atividades que se diferenciem fundamentalmente por envolver, obrigatoriamente, a discussão de
ideias, elaboração de hipóteses explicativas e experimentos para testá-las (CAMPOS; NIGRO, 1999).

Como resultado de um ensino voltado à investigação, a reflexão, a análise crítica, a imaginação


e a criatividade pressupõem-se um estudante com o desenvolvimento progressivo de habilidades
necessárias para uma atuação crítica na sociedade. Neste sentido, a Base força a ideia da Geografia
como um componente importante para entender o mundo, a vida e o cotidiano (BRASIL, 2018).

Para compreender as percepções dos professores participantes da pesquisa sobre a importância


da Geografia para favorecer a atuação crítica do estudante, destaca-se àquela relativa à reflexão sobre

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 122


o mundo, com 31% dos respondentes. Ainda foram apontadas as ações diante dos problemas da
comunidade, comparação com outras realidades e a criação de novos olhares e caminhos, todos com
13% dos participantes.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa teve como objetivo colaborar com a construção de um corpus de conhecimento
que abrange desde o perfil do professor pedagogo (formação inicial e continuada), suas percepções
sobre a implantação da BNCC na escola em que atua até a compreensão das intervenções pedagógicas
propostas para o ensino e aprendizagem deste componente específico. Para tanto, acadêmicas-
pesquisadoras do curso de Pedagogia elaboram um questionário que foi respondido por professores
em exercício dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental.

Após a análise e tabulação dos dados pode-se traçar um perfil profissional sobre os professores
participantes da pesquisa, compreender sobre seus entendimentos a respeito da BNCC e da transição
dos PCNs para a nova normativa educacional. Além disso, e como principal enfoque da pesquisa,
conseguiu-se elaborar e discutir com outros autores acerca das especificidades do ensino de Geografia
nos Anos Iniciais.

A partir desta investigação, as professoras-pesquisadores puderam explorar o universo da


pesquisa em ensino e analisar de forma direta as práticas declaradas pelos pedagogos participantes
da pesquisa. Todas estas informações constituem um corpus de conhecimento que pode ser revisitado
por outros pesquisadores a fim de contribuir com as práticas de ensino de Geografia.

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Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 123


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Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 10 124


CAPÍTULO 11

POLÍTICAS DE AÇÕES AFIRMATIVAS NO ENSINO


SUPERIOR: DESAFIOS A SEREM SUPERADOS

RAUL DA SILVEIRA SANTOS histórico de negação do negro e da negra. O tra-


Universidade Federal do Pará balho traz em sua discussão nos resultados algu-
mas considerações, entre as considerações estão:
GEISA BRUNA MOURA FERREIRA a exclusão do negro, no que diz respeito ao pro-
Universidade Federal do Pará cesso escolar, tem início ainda na educação bási-
ca. Isso acontece devido há alguns fatores, como
FRANCISCO PEREIRA DE OLIVEIRA por exemplo, o não reconhecimento, a desvalo-
Universidade Federal do Pará rização e o desrespeito para com a cultura afro-
-brasileira. Nos dia de hoje, fica nítida a exclusão
ADRIANE BEATRIZ LIMA DE SOUZA social, política e econômica de alguns grupos. No
Universidade Federal do Pará entanto, essa desigualdade deve ser combatida
através de políticas de ações afirmativas. Prelimi-
RAQUEL AMORIM DOS SANTOS narmente, conclui-se que os objetivos traçados ao
Universidade Federal do Pará decorrer do trabalho foram alcançados de forma
parcial, por entendermos que a pesquisa não foi
ROGÉRIO ANDRADE MACIEL concluída. Decerto, o fim da escravidão no Bra-
Universidade Federal do Pará sil, não ocasionou por parte do Estado o interesse
por políticas de integração da população negra,
pelo contrário, os negros ficaram à margem da
sociedade. Portanto, afirma-se que é importante
RESUMO: O presente trabalho tem como obje-
fomentar o ingresso de alunos(as) negros(as) no
tivo analisar questões referentes às políticas de
ensino superior.
ações afirmativas no sistema de educação supe-
rior, para, além disso, no que diz respeito à cul-
tura do negro e da negra no espaço acadêmico,
bem como as contribuições que esta política pode PALAVRAS-CHAVE: Cultura; Ações afirmati-
oportunizar em relação à valorização e o respeito vas; Negro.
para com o diferente. Além, de disponibilizar uma
produção científica, com o intuito de contribuir
com as literaturas já disponíveis sobre a temática
ABSTRACT: The objective of this study is to
que é proposta no presente trabalho. Metodolo-
gicamente o trabalho foi desenvolvido por meio analyze questions related to affirmative action
de pesquisa bibliográfica e qualitativa, sendo policies in the higher education system, in addi-
embasada em autores que dialogam sobre esses tion to the black and black culture in the acade-
conceitos, a saber: Gil (2002), Minayo (2001), mic space, as well as the contributions that this
Bauer (2014), Severino (2007). Outros auto- policy can offer in relation to valuing and respect
res, como por exemplo, Gomes (2001), Candau for the different. In addition, to make available a
(1997, 2000, 2002, 2003), Laraia (2006), Araújo scientific production, with the intention of con-
e Silva (2005). Foram usados no trabalho para re- tributing with the literature already available on
ferenciar ações afirmativas, cultura e o contexto the theme that is proposed in the present work.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 125


Methodologically the work was developed through bibliographical and qualitative research, being
based on authors who dialogue on these concepts, namely: Gil (2002), Minayo (2001), Bauer (2014)
and Severino (2007). Other authors, such as Gomes (2001), Candau (1997, 2000, 2002, 2003), Laraia
(2006), Araújo e Silva (2005). They were used in the work to refer affirmative actions, culture and the
historical context of black and black negation. The work brings in its discussion in the results some
considerations, among the considerations are: the exclusion of the black, with regard to the school
process, still begins in basic education. This is due to some factors, such as non-recognition, devalua-
tion and disrespect for Afro-Brazilian culture. Today, the social, political and economic exclusion of
some groups is clear. However, this inequality must be addressed through affirmative action policies.
Preliminarily, it is concluded that the objectives drawn during the course of the work were partially
achieved, because we understand that the research was not completed. Certainly, the end of slavery in
Brazil did not cause the State to take any interest in policies for the integration of the black popula-
tion. On the contrary, the blacks were marginalized. Therefore, it is important to encourage the entry
of black students into higher education.

KEYWORDS: Culture; Affirmative actions; Black

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho tem como objetivo analisar questões referentes às políticas de ações
afirmativas no sistema de educação superior, para, além disso, no que diz respeito à cultura do negro
e da negra no espaço acadêmico, bem como as contribuições que esta política pode oportunizar
em relação à valorização e o respeito para com o diferente. Além, de disponibilizar uma produção
científica, com o intuito de contribuir com as literaturas já disponíveis sobre a temática que é proposta
no presente trabalho.

Consideramos a temática abordada de grande relevância, haja vista as desigualdades que


historicamente atingem vários segmentos da nossa sociedade, inclusive na área da educação, Araújo &
Silva (2005) embasam esse pensamento ao afirmarem que: “desde o início da colonização a educação
brasileira apresenta uma gestão problemática e discriminatória”. Colaborando com esse histórico
de discriminação “podemos dizer também sociedade racista, na medida em que negros e mestiços,
escravos, libertos e livres, eram tratados como “inferiores” aos brancos europeus ou nascidos no
Brasil” (ALBUQUERQUE & FILHO, 2006, p. 68).

No entanto, as cotas podem servir como um instrumento valioso para a inserção do negro
no espaço acadêmico, porém, as universidades devem estar prontas para ajudar na ampliação de um
mundo mais tolerante e de ampla riqueza simbólica.

Assim, acredita-se que por meio de políticas de ações afirmativas, teremos uma sociedade
mais justa no que concerne o respeito e a valorização das diferenças, e consequentemente, será dada
a devida importância às “minorias” que sempre estiveram à margem da sociedade, tendo em vista que
esse tipo de política visa corrigir, mesmo que parcialmente, as desigualdades históricas impostas a
esses grupos.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 11 126


Destarte, é importante conceituar o termo “cultura”, por entendermos que um dos desafios
das políticas de ações afirmativas, além de possibilitar o acesso, é de assegurar a permanência, e
entender esse sujeito como ator principal de determinada cultura e não apenas passivo e receptor de
uma cultura “dominante”, mas que para além disso, há no cerne das relações sociais os processos de
resistência.

O conceito de cultura possui vários significados, tomando em seu amplo sentido etnográfico
“cultura” é este todo complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou
qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade
(Laraia, 2006, p.25). Candau (1997, 2000, 2002, 2003, 2004, 2005, 2006) ao longo dos anos tem
procurado identificar e quantificar os desafios que precisam ser enfrentados, se de fato, quisermos
promover uma educação intercultural dentro de uma conjuntura crítica e emancipatória, que valorize,
respeite e promova os direitos humanos. Segundo a autora algumas características permeiam esse
conceito:

Uma primeira, que considero básica, é a promoção deliberada da inter-relação entre


diferentes grupos culturais presentes em uma determinada sociedade. Nesse sentido, essa
posição situa-se em confronto com todas as visões diferencialistas que favorecem processos
radicais de afirmação de identidades culturais específicas, assim como com as perspectivas
assimilacionistas que não valorizam a explicitação da riqueza das diferenças culturais.
(CANDAU, 2008, p. 51).

Ainda segundo a autora, outra característica é importante de ser enfatizada é que a cultura:

Está constituída pela afirmação de que nas sociedades em que vivemos os processos de
hibridização cultural são intensos e mobilizadores da construção de identidades abertas, em
construção permanente, o que supõe que as culturas não são puras. Sempre que a humanidade
pretendeu promover a pureza cultural e étnica, as consequências foram trágicas: genocídio,
holocausto, eliminação e negação do outro. A hibridização cultural é um elemento importante
para levar em consideração na dinâmica dos diferentes grupos socioculturais. (CANDAU,
2008, p. 51).

Candau deixa evidente a importância do diálogo entre os diferentes grupos culturais que
configuram a sociedade contemporânea. Portanto, é necessário um diálogo que reconheça e acima de
tudo respeite as diferenças, que não tente homogeneizar a pluralidade cultural, tentativa esta que já
trouxe sérios problemas para a humanidade como bem deixa claro a autora.

Outro fator importante na construção do presente trabalho, é a política de ações afirmativas


e os desafios na contemporaneidade. Portanto, a princípio, justifica-se o uso das medidas de ações
afirmativas com o argumento que essa prática é uma política social, com intuito de alcançar uma série
de objetivos específicos numa dada realidade e num contexto sociocultural. As ações afirmativas
começam a ganhar força no final dos anos oitenta e início dos anos noventa do século passado,
a intenção era e ainda é, a superação das desigualdades, dentro desse contexto, as cotas com
características de políticas compensatórias surgem como respostas a problemas de discriminação e
desigualdades presentes na sociedade ainda nos dias de hoje (MOEHLECKE, 2002).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 11 127


Vale ressaltar que nesse período, as ações afirmativas já tinham sido adotadas por outros
países, na intenção de beneficiar determinados grupos da sociedade. O termo “ação afirmativa” se
originou nos Estados Unidos da América tidos como referência no assunto, tal medida ocorreu,
devido à enorme pressão dos grupos organizados pela sociedade norte-americana, principalmente
pelos movimentos negros, que requeriam que medidas compensatórias fossem tomadas. As ações
afirmativas foram empregadas no contexto do mercado de trabalho, na educação superior e nos
contratos governamentais.

As ações afirmativas nos dias correntes é um termo de amplo alcance que designa um
conjunto de estratégias, iniciativas ou políticas que visam favorecer grupos ou segmentos
sociais que se encontram em piores condições de competições em qualquer sociedade em
razão, na maior parte das vezes, da prática de discriminação negativas, sejam elas presentes
ou passadas (MENEZES, 2001, p. 27).

As ações afirmativas surgiram como possíveis respostas aos problemas criados pela
discriminação e desigualdades que estão presentes, desde um passado distante até os dias atuais na
sociedade. Nesse sentido, as ações afirmativas estão voltadas para grupos que são considerados vítimas
de processos históricos de exclusão e discriminação, ou seja, geralmente abarcam as “minorias”
étnicas, raciais, mulheres e deficientes. Bergman (1996, p. 7) entende que a:

Ação afirmativa é planejar e atuar no sentido de promover a representação de certas pessoas


em determinados empregos ou escolas. É uma companhia de seguros tomando decisões para
romper com sua tradição de promover a posições executivas, unicamente homens brancos.
É a comissão de admissão da Universidade da Califórnia em Berkeley buscando elevar o
número de negros nas classes iniciais. Ações afirmativas pode ser um programa formal e
escrito, um plano envolvendo múltiplas partes.

Ainda sobre o referido tema Gomes (2001) exprime o significado:

Consistem em políticas públicas (e também privadas) voltadas à concretização do princípio


constitucional da igualdade material e à neutralização dos efeitos da discriminação racial.
De gênero, de idade, de origem nacional, de compleição física e situação socioeconômica.
Impostas ou sugeridas pelo Estado, por seus entes vinculados e até mesmo por entidades
puramente privadas, elas visam a combater não somente as manifestações flagrantes de
discriminação, mas também a discriminação de fundo cultural, estrutural, enraizada na
sociedade.

Fica claro a ideia e principalmente a necessidade de promovermos a ascensão de grupos que


foram historicamente inferiorizados, e com essa promoção começar a construção de uma sociedade
mais justa, considerando que as políticas de ações afirmativas possuem um importante papel dentro
da conjuntura de uma sociedade desigual e excludente de várias minorias.

Para a promoção de uma educação intercultural é necessário penetrar no universo de pré-


conceitos e discriminações que impregna – muitas vezes com caráter difuso, fluido e sutil –
todas as relações sociais que configuram os contextos em que vivemos. A naturalização é um

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 11 128


componente que faz em grande parte invisível e especialmente complexa essa problemática.
Promover processos de desnaturalização e explicitação da rede de estereótipos e pré-conceitos
que povoam nossos imaginários individuais e sociais em relação aos diferentes grupos
socioculturais é um elemento fundamental sem o qual é impossível caminhar. (CANDAU,
2008, p. 53).

Ademais, conforme apontado pela autora, é necessário que ocorra uma inserção profunda no
contexto da educação intercultural, como caminho a ser seguido para romper com os pré-conceitos e
discriminações que estão intrínsecos na sociedade. Para além disso, é preciso desnaturalizar processos
marcados pelos estereótipos que ajudam a caracterizar a sociedade brasileira de uma forma negativa.

METODOLOGIA

Portanto, sendo o conhecimento a construção do objeto que se conhece, a atividade de


pesquisa torna-se elemento fundamental e imprescindível (SEVERINO, 2007). Corroborando com
esse pensamento Oliveira (2014, p.35) afirma que “ciência quer dizer conhecimento e implica
racionalidade, objetividade, sistematização de ideias e possibilidades de verificação e apresentação
através das informações obtidas no processo de estudo e/ou pesquisa”.

Metodologicamente o trabalho foi desenvolvido por meio de pesquisa bibliográfica, que para
Gil (2002, p.44), “[...] a pesquisa bibliográfica é desenvolvida com base em material já elaborado,
constituído principalmente de livros e artigos científicos”. Em consonância a essa assertiva, afirma
Bocatto (2006, p. 266):

[...] a pesquisa bibliográfica busca a resolução de um problema (hipótese) por meio de


referenciais teóricos publicados, analisando e discutindo as várias contribuições científicas.
Esse tipo de pesquisa trará subsídios para o conhecimento sobre o que foi pesquisado, como
e sob que enfoque e/ou perspectivas foi tratado o assunto apresentado na literatura científica.

Assim, foram feitas pesquisas em sites, revistas eletrônicas, livros e textos já publicados no
sentido de compreender e obter mais base teórica sobre o tema proposto.

Recorreu-se ainda a abordagem qualitativa, que para Minayo (2001, p. 32) “é uma pesquisa
que trabalha com o universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que
corresponde a um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos”. Ademais,
“a pesquisa qualitativa evita números, lida com interpretações das realidades sociais” (BAUER,
2014, p. 23). Nesse sentido, foram catalogadas diversas publicações sobre cultura, inclusive trabalho
de conclusão de curso, dissertações de mestrado e teses de doutorado e artigos. Essas escolhas “se
definem pela natureza dos temas estudados e pelas áreas em que os trabalhos se situam” (SEVERINO,
2007, p.134). Logo, destaca-se a coerência na escolha das obras para balizamento teórico do presente
trabalho.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 11 129


A Pesquisa Bibliográfica forneceu base teórica para o assunto a ser estudado permitindo a
reflexão e elaboração de conclusões. Em seguida, as informações foram compiladas para referenciar
cultura e ações afirmativas, as quais foram dispostas nesta produção dissertativa.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Albuquerque e Filho afirmam que “por mais de trezentos anos a maior parte da riqueza
produzida, consumida no Brasil ou exportada foi fruto da exploração do trabalho escravo” (2006,
p.65). Essa assertiva ajuda a entender um pouco o contexto de exclusão e negação dos direitos dos
negros no Brasil. Portanto, foi séculos de negação, o que ocasionou em uma sociedade desigual e que
sempre enxergou os negros como inferiores.

Ademais, com toda certeza, a exclusão do negro, no que diz respeito ao processo escolar,
tem início ainda na educação básica. Isso acontece devido há alguns fatores, como por exemplo, o
não reconhecimento e consequentemente a desvalorização e o desrespeito para com a cultura afro-
brasileira. Cavalleiro deixa claro que:

(...) foi possível comprovar que a existência do racismo, do preconceito e da discriminação


raciais na sociedade brasileira e, em especial, no cotidiano escolar acarretam aos indivíduos
negros: auto-rejeição, desenvolvimento de baixa autoestima com ausência de reconhecimento
de capacidade pessoal; rejeição ao seu outro igual racialmente; timidez; pouca ou nenhuma
participação em sala de aula; ausência de reconhecimento positivo de seu pertencimento
racial; dificuldades no processo de aprendizagem; recusa em ir à escola e, consequentemente,
evasão escolar.

Os acontecimentos históricos no decorrer dos séculos passados privilegiaram e ao mesmo


tempo desprivilegiaram outros grupos sociais, e esses fatores contribuem para os desafios que são
desencadeados no contexto educacional ao perpassar dos anos.

Nos dia de hoje, fica nítida a exclusão social, política e econômica de alguns grupos. No
entanto, essa desigualdade deve ser combatida através de políticas públicas. Precisamos de ações
que garantam os direitos da cidadania, e as políticas públicas são, constitucionalmente, uma forma
de assegurar esses direitos. Como ressaltado por Pedro Demo (2000, p. 14) “Os direitos humanos
são inalienáveis, e devidos por natureza”. Como reverter ou amenizar esse quadro de injustiça e
desigualdades raciais?

Medidas foram sendo tomadas ao longo dos anos e a Lei 10/639 foi um importante avanço.
Essa lei foi sancionada pelo então presidente Luís Inácio Lula da Silva em 2003. Com isso, a Lei de
Diretrizes e Bases da Educação (LDB) foi alterada e a partir desse momento tornou-se obrigatório o
ensino da História e Cultura Afro-Brasileira. Consolidando-se mais um importante passo na construção
de uma sociedade mais justa e que reconheça a importância dos negros para esse país, importância
essa que vai além da mão de obra, mas que perpassa por produção de variados conhecimentos que
contribuíram para a cultura brasileira.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 11 130


Alguns fatores apontam que as políticas de cunho compensatório proporcionam benefícios
evidentes. Edward Telles (2003, p.279) nos mostra que em decorrência de tais medidas, ocorreu
uma diminuição da desigualdade racial nos Estados Unidos entre 1960 e 1996, em contrapartida,
no mesmo período, aumentou a distância entre negros e brancos no Brasil. Apenas após 13 anos de
tramitação, o Congresso Nacional aprovou a Lei de Cotas sancionada pela então Presidente Dilma
Rouseff, em 29 de agosto de 2012, com o seguinte texto:

Art. 1o As instituições federais de educação superior vinculadas ao Ministério da Educação


reservarão, em cada concurso seletivo para ingresso nos cursos de graduação, por curso
e turno, no mínimo 50% (cinquenta por cento) de suas vagas para estudantes que tenham
cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas. No preenchimento das vagas de
que trata o caput deste artigo, 50% (cinquenta por cento) deverão ser reservados aos estudantes
oriundos de famílias com renda igual ou inferior a 1,5 salário-mínimo (um salário-mínimo e
meio) per capita.Art. 3o  Em cada instituição federal de ensino superior, as vagas de que trata
o art. 1o desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e
indígenas e por pessoas com deficiência, nos termos da legislação, em proporção ao total de
vagas no mínimo igual à proporção respectiva de pretos, pardos, indígenas e pessoas com
deficiência na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo
o último censo da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. (BRASIL.
Lei 12.711 em 29 de agosto de 2012).

 A aprovação da Lei 12.711 foi um importante passo na concretização dessa política de acesso.
“A política de igualdade racial é parte essencial da construção da democracia, e, as políticas de ações
afirmativas têm se demonstrado um caminho importante” (RIBEIRO, 2012, p. 49). O sistema de cotas
reserva de um determinado percentual das vagas disponíveis nas instituições de ensino superior. A
referida Lei deixa claro que os institutos técnicos federais e as universidades públicas devem reservar
50% das suas vagas para os estudantes que vieram de escola pública e, dentro desse grupo há critérios
de renda, raça e classe social. Para que o indivíduo tenha direito a esta política, é necessário que o
mesmo se enquadre pelo menos em um dos critérios exigidos por lei.

Sendo assim, um dos grandes desafios a ser vencido – para que de fato ocorra igualdade na
sociedade – é apontado por Florestan ao enfatizar que:

As estruturas raciais da sociedade brasileira só poderão ser ameaçadas e destruídas


quando ‘a massa de homens de cor’, ou seja, todo elemento negro, puder usar o conflito
institucionalmente em condições de igualdade com o branco e sem nenhuma discriminação
de qualquer espécie, o que implicaria em participação racial igualitária nas estruturas de
poder da comunidade política nacional. (1979, p.72).

Nesse momento do trabalho adentraremos especificamente em uma política de ação


afirmativa, provavelmente a mais polêmica, que é o programa de cotas, que nada mais é a reserva de
um percentual de vagas para um determinado grupo, como os negros, mulheres, índios, etc. Antes das
cotas para negros serem criadas, já existiam outras políticas de ações afirmativas no Brasil. No âmbito
da educação, o Rio de Janeiro foi um dos primeiros a adotar a política compensatória como forma de
democratizar o acesso ao ensino superior.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 11 131


As lutas que são travadas nos dias atuais por reconhecimentos, geralmente estão atreladas a
lutas por causas sociais, como igualdade de direitos, ou seja, a busca por justiça frente às desigualdades
que permeiam a sociedade e que atingem as minorias, tais como os negros.

Justiça, hoje, requer tanto redistribuição quanto reconhecimento; nenhum deles, sozinho,
é suficiente. A partir do momento em que se adota essa tese, entretanto, a questão de
como combiná-los torna-se urgente. Sustento que os aspectos emancipatórios das duas
problemáticas precisam ser integrados em um modelo abrangente e singular. A tarefa, em
parte, é elaborar um conceito amplo de justiça que consiga acomodar tanto as reivindicações
defensáveis de igualdade social quanto às reivindicações defensáveis de reconhecimento da
diferença. (Fraser, 2007, p.103)

Mais do que oportunizar ao negro a chance de adentrar a universidade – constitui-se como


um dos principais desafios – é fazer com que os mesmos tenham suas especificidades reconhecidas e
principalmente respeitadas. Que em um espaço de ricos debates como é a universidade, proporcione o
diálogo com o diferente, que fomente a discussão acerca das mais variadas culturas, e as contribuições
que podem acontecer no processo de uma educação que seja emancipatória.

Através das políticas de cunho compensatório, entre elas as cotas raciais, o negro vem tendo
uma maior representatividade no ensino superior. Historicamente o ensino superior público era e ainda
é caracterizado pela parte mais abastada da população, a elite brasileira, no entanto, essa realidade,
mesmo que a passos lentos, vem mudando. O pensamento que será abordado no que se refere à
representação social vem do meio sociológico, psicológico. Que segundo Moscovici (2003, p. 23),
citado por Naiff e Souza (2009).

É no universo sociocultural que estão e são continuamente produzidas às representações


sociais. Se quisermos compreender por que uma pessoa é de um jeito e não de outro devemos
ver as relações sociais embutidas em seu cotidiano. Nossas reações frente a outras pessoas
e objetos sociais estão em grande mediadas pela percepção e representações sociais que
fazemos dela.

Percebemos na sociedade brasileira que a imagem do negro causa certa indiferença no que
diz respeito à igualdade, se considerarmos que a identidade negra sempre foi negada, discriminada.
Todavia nos últimos anos, o acesso ao ensino superior desses sujeitos por meio das políticas públicas,
vem proporcionando ao negro uma maior visibilidade dentro de um espaço extremamente elitizado.

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a porcentagem de


universitários que se declararam pretos ou pardos tem crescido e em 2014 chegou a 42%. Ainda
referente à mesma pesquisa, no período entre 2001 e 2014 a população negra no ensino superior
aumentou de 31% para 44%, é evidente que as cotas tiveram um papel importante nesse crescimento.
É Valido salientar que não consideramos suficientes essas políticas frente a séculos de escravidão,
menosprezo da cultura, estereótipos preconceituosos, etc. Tendo em vista que:

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 11 132


O trajeto dos estudantes brasileiros pelo sistema público de ensino está marcado por uma
trágica repetição de histórias de insucesso. Mas o fracasso da escola atinge sobretudo
os estudantes negros. É sobre eles que recai o peso dos grandes números da exclusão.
(QUEIROZ, 2004, p.74).

Este é um dos exemplos no qual é perceptível o histórico prejudicial no que se refere à educação
voltada para a população negra, o que é ocasionada por inúmeros motivos, dentre eles, por exemplo, o
racismo cotidiano e a marginalização do negro, fatores estes que contribuem na perpetuação de uma
história de fracasso escolar do negro desde a educação básica, refletindo na disputa das vagas para
adentrar no ensino superior. As desvantagens sociais vivenciadas pelos negros são flagrantes, por isso
a necessidade de políticas que amenizem esse déficit histórico de exclusão. Como bem explica Bernd
(1987), pensar sobre os caminhos percorridos pelo os negros é importante, pois:

Permanecer no nível dos signos, isto é, se resumir a combater os signos do poder branco, não
haverá um real enfrentamento do problema. É necessário chegar à estrutura profunda: lá onde
os estereótipos se constroem como causa e consequência de preconceito. (p.33).

Salientamos a crença de que o negro em um espaço amplo e rico em debates que é a


universidade pode contribuir de forma satisfatória com a valorização da sua cultura, no entanto, é
de grande importância o próprio negro valorizar sua ancestralidade, seus saberes, sua cultura, as
suas representações sociais. Representações são construções sempre ligadas ao lugar a partir do qual
os sujeitos representam, estando, portanto intimamente determinadas por identidades, interesses e
lugares sociais (GUARESCHI, 1999). Levando em consideração o pensamento do autor, fica nítido
que as representações sociais estão ligadas ao contexto em que a pessoa faz parte.

A implementação de políticas de ações afirmativas traz a possibilidade de superação da


exclusão resultado das práticas racistas que fazem parte da sociedade. Sendo assim, mais do que
oportunizar ao negro e a mulher negra a chance de adentrar a universidade, é fazer com que os
mesmos tenham suas especificidades reconhecidas e principalmente respeitadas.

CONCLUSÃO

Consideramos que os objetivos traçados ao decorrer do trabalho foram alcançados de forma


parcial, por entendermos que a pesquisa não foi concluída. Com isso, preliminarmente concluímos
que as políticas que possuem um caráter compensatório – entre elas, estão às cotas raciais – têm
contribuído de forma eficaz no processo de maximização do acesso do negro em um espaço que é seu
por direito, mas que durante muito tempo esteve restrito a uma enorme parcela da população.

O fim da escravidão no Brasil, não ocasionou por parte do Estado o interesse por políticas de
integração da população negra, pelo contrário, os negros ficaram à margem da sociedade. É importante
refletirmos sobre a cultura negra e levarmos em consideração suas especificidades construídas ao

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 11 133


longo da história. Perpassar pelo campo do debate, estimular a discussão sobre a temática com o
intuito de assegurar o respeito para com o diferente, é de grande valia.

A diminuição da desigualdade racial no país ainda é um processo em construção, que caminha


a passos lentos, mas passos importantes, destarte, para acompanharmos esse processo, é preciso olhar
não somente para os indicadores da presença dos negros no ensino superior, mas também para o perfil
dos cursos, e até que ponto o currículo oportuniza o reconhecimento e a valorização do indivíduo
negro.

Preliminarmente, conclui-se, que é importante fomentar o ingresso de alunos(as) negros(as)


no ensino superior, mesmo diante de muitos conflitos ideológicos, o que por conseguinte, pode atrasar
o processo, no entanto, é consenso de que a educação é um dos caminhos a serem percorridos em
busca de vencer os desafios e alcançar igualdade entre todos(as) os cidadãos.

REFERÊNCIAS

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Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 11 135


CAPÍTULO 12
POSSIBILIDADE DE MELHORIA PARA A DOCÊNCIA
NO ENSINO SUPERIOR: SEMINÁRIOS COMO
FERRAMENTA FACILITADORA

ERICA ROBERTA LOVO ROCHA meros. Alguns pontos que foram orientados aos
WATANABE alunos discutirem em suas redações são: a im-
Universidade Tecnológica Federal do Paraná, portância de conhecer esses temas antes do início
UTFPR das aulas prática, o quão familiarizado o aluno já
estava com o tema e práticas, além disso pediu-
MATHEUS LOPES DEMITO -se dicas de melhoria para as próximas turmas e
Universidade Tecnológica Federal do Paraná, avaliação sobre o uso de seminários. Os alunos
UTFPR apresentaram desafios e possibilidades para essa
maneira de ensino, sugerindo modificações para
PRISCILA DOS SANTOS GASCHI LEITE os próximos semestres como forma de melhoria
Universidade Tecnológica Federal do Paraná,
da ferramenta, em prol da educação. De manei-
UTFPR
ra geral, concluiu-se que o uso de seminários em
disciplinas de graduação é de extrema necessi-
SIMONE DELEZUK INGLEZ
Universidade Tecnológica Federal do Paraná, dade, pois além de facilitar a interiorização dos
UTFPR conteúdos pelos discentes, desenvolve nos alu-
nos qualidades e outras características necessá-
rias para o profissional no mercado de trabalho.
RESUMO: Esse trabalho consiste em uma dis-
cussão reflexiva sobre a importância dos semi-
nários como ferramenta facilitadora no processo PALAVRA-CHAVE: Docência no Ensino Supe-
de ensino-aprendizagem. O conteúdo abordado rior; Normas de Segurança de Laboratório; Me-
pelos discentes foram as Normas de Segurança todologia de ensino-aprendizagem; Educação.
de Laboratório. Trabalhou-se com uma turma de
30 alunos, na disciplina de Química Geral Ex-
perimental do primeiro período de Engenharia
Química de uma Universidade Federal do Para- ABSTRACT: This paper consists of a reflective
ná. Dividiu-se a turma em 5 grupos e trabalhou discussion about the importance of the seminars
temas específicos com cada grupo. A discussão as a facilitating tool in the teaching-learning pro-
apresentada foi desenvolvida considerando re- cess. The content addressed by the students was
dações de avaliação feitas pelos próprios alunos. the Laboratory Safety Standards. We worked with
Após a análise das respostas dos alunos notou que a group of 30 students, in the discipline of Exper-
73% dos alunos não se consideravam cientes das imental General Chemistry of the first period of
Normas de Segurança de Laboratório antes dos Chemical Engineering of a Federal University of
seminários e apenas 27% desses alunos julgaram Paraná. The student’s class were divided into 5
já ter um contato prévio com o tema. A relação groups and worked on specific topics with each
de alunos que já tiveram contato com aulas práti- group. The discussion presented was developed
cas de química anteriormente ao ensino superior considering essays written by the students them-
em engenharia química segue esses mesmos nú- selves. After analyzing the students’ responses,

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 136


they noticed that 73% of the students did not consider themselves to be aware of the Laboratory
Safety Standards before the seminars, and only 27% of the students judged they had previous contact
with the subject. The students who have had contact with practical chemistry classes prior to higher
education in chemical engineering follows these same numbers. Some points that were directed to
the students to discuss in their essays are: the importance of knowing these subjects before the begin-
ning of the practical classes, how familiar the student already had the theme and practices, and asked
for improvement tips for the next ones classes and evaluation of the use of seminars. The students
presented challenges and possibilities for this way of teaching, suggesting modifications for the next
semesters as a way of improving the tool, in favor of education. In general, it was concluded that the
use of seminars in undergraduate courses is of extreme necessity, since in addition to facilitating the
internalization of contents by students, develops in students qualities and other characteristics neces-
sary for the professional.

KEYWORDS: Teaching in Higher Education; Laboratory Safety Standards; Teaching-learning


methodology; Education.

1. INTRODUÇÃO

O reconhecimento dos perigos é o primeiro passo a ser dado para minimizar a exposição
aos agentes químicos nos ambientes em que são manipulados. Se o perigo não é identificado
adequadamente, ou o consenso sobre o que é perigoso não está claramente definido, o objetivo de
reduzir a exposição certamente não será alcançado (Uema, 2015).

Dentre os diferentes ambientes de trabalho, os laboratórios universitários são locais que são
voltados para o ensino, pesquisa e extensão. Nestes ambientes laboratoriais estão presentes máquinas,
equipamentos e produtos químicos, considerados fatores de risco em potencial, tais como riscos
físicos, químicos, biológicos, ergonômicos e riscos de acidentes. Com isso, sujeitos as leis e normas
de segurança do trabalho (Muller e Mastroeni, 2004).

As normas de segurança em laboratórios devem ser seguidas para que qualquer tipo de risco
a integridade física seja minimizado. Para isso, o uso de equipamentos de proteção coletiva (EPC),
equipamentos de proteção individual (EPI) e treinamento em segurança laboratorial são de extrema
importância para reduzir os riscos associados a este ambiente.

As causas de acidentes em um laboratório têm motivos variados. A manipulação de certos


materiais sem a observância das normas de segurança é uma das causas que contribui efetivamente
para a ocorrência de acidentes (Carvalho, 2000). Descuido e falta de conhecimento são outros aspectos
que estão relacionados a acidentes de laboratório.

Estudantes de graduação em suas aulas práticas de laboratórios estão sujeitos a perigos


provenientes da manipulação de diversos produtos químicos e materiais. Uma das formas de se
reduzir estes riscos é a implementação de um processo de reconhecimento e identificação de perigos.
Diante desses aspectos, as ferramentas de comunicação exercem papel de fundamental importância,
uma vez que são, geralmente, a fonte mais direta de informação (Uema e Ribeiro, 2017).

O seminário é uma dessas ferramentas de comunicação de ensino coletivo, que tem como
método a interação, o diálogo e a parceria dos alunos, enfatizando a troca de conhecimentos e a

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 12 137


discussão como meta para atingir vários níveis cognitivos de aprendizado. Além disso, é um processo
dinâmico de produção do saber que possibilita explorar meios e condições diversas favoráveis a uma
efetividade na aprendizagem (Rodrigues et al., 2015).

É essencial acrescentar que a elaboração, apresentação e discussão no decorrer dos seminários


corroboram com o desenvolvimento das habilidades exigidas ao profissional de engenharia química.
O processo de ensino aprendizagem envolvido nos seminários exigem do discente pesquisa,
organização, equilíbrio emocional para lidar com pessoas e construção de raciocínio lógico para ser
compreendido pelos outros alunos, além de outras características imprescindíveis para formação e
atuação enquanto profissional.

De maneira geral, podemos dizer que o engenheiro químico precisa unir capacidade analítica,
pensamento lógico e senso prático em suas ações no dia a dia. Isso porque, no trabalho, ele terá que
lidar com ciências exatas. Um bom profissional da área é muito atento aos detalhes e isso permite
atuar nos projetos com maior segurança (Schaid et al., 2001). Diante disto surge o seminário como
facilitador para desenvolver essas características aos estudantes desde os períodos iniciais de curso.

2. METODOLOGIA UTILIZADA

Com o objetivo de utilizar os seminários como ferramenta de aprendizagem para conscientizar


sobre a importância das normas de segurança em laboratório nas práticas de ensino em química o e
o que isto representa para os alunos, foram atribuídos seminários com temas específicos para os
alunos do primeiro período da disciplina de Química Geral Experimental de um curso de Engenharia
Química de uma Universidade Federal do Paraná, durante o primeiro semestre de 2019.

A turma é composta por trinta alunos que foram divididos em grupos de seis integrantes,
totalizando cinco grupos de trabalho para apresentação dos seminários. A Tabela 1 relaciona os temas
específicos de cada grupo e o motivo de estudar estes temas no primeiro contato universitário.

Para a elaboração desse trabalho os alunos assinaram um termo concordando em participar


com fornecimentos de dados e tiveram o prazo de uma semana para desenvolver a pesquisa correlata
com o seu tema, estruturar e montar a apresentação na forma de seminário e lecionar de maneira
didática para a turma. No dia estipulado das apresentações, cada grupo teve um tempo de quinze
minutos para apresentar o tema de seu trabalho. Após isso destinou o tempo necessário para perguntas
e debates sobre o que foi exposto.

A finalização da pesquisa foi através de um levantamento dos saberes cognitivos desenvolvidos


pelos alunos por meio de uma redação final e individual sobre os temas abordados e o trabalho
como um todo. Esse levantamento foi facilitado por meio de questionamentos feitos pelo professor
estimulando possíveis discussões a serem tratadas no texto. Orientou-se que os alunos dissertassem
sobre a importância de conhecer esses temas antes do início das aulas prática, o quão familiarizado o
aluno já estava com o tema e práticas, além disso pediu-se dicas de melhoria para as próximas turmas
e avaliação sobre o uso de seminários como ferramenta nesse processo de ensino-aprendizagem.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 12 138


Os seminários foram avaliados pelo professor por quesitos técnicos e desenvolvimento
pessoais. Os parâmetros técnicos foram sobre a profundidade do tema, segurança e senso crítico dos
alunos durante a apresentação e os parâmetros interpessoais foram relacionados com o trabalho em
equipe, sintonia da apresentação e desenvolvimento da redação final.

Tabela 1: Relação dos temas dos seminários trabalhados pelos grupos com os respectivos obje-
tivos.

Grupo Tema Objetivo


Ensinar os alunos sobre os
riscos físicos químicos e
biológicos, os quais eles
Riscos químicos, físicos e
1 estarão expostos durante a
biológicos em laboratórios
vida acadêmica e profissão
enquanto engenheiros quí-
micos.
Mostrar a importância do
Equipamentos de proteção uso de equipamentos pre-
2
individual e coletiva ventivos no dia a dia labo-
ratorial.
Proporcionar que o aluno
Sinalização em laborató-
consiga interpretar as sina-
3 rio incluindo diagrama de
lizações presentes no labo-
Hommel
ratório.
Preparar os alunos para
Acidentes, prevenção e pri-
4 reagir em possíveis situa-
meiros socorros
ções adversas.
Conscientizar os estudantes
sobre os perigos existen-
Exposição à agentes quími- tes em um laboratório e a
5 cos, resíduos e norma regu- necessidade de trabalhar a
lamentadora número 15 educação ambiental para o
desenvolvimento de profis-
sionais sustentáveis.

3. A REAÇÃO DOS ALUNOS SOBRE NORMAS DE SEGURANÇA EM LABORATÓRIOS

Os alunos de engenharia química, ao escolherem um curso intimamente ligado à química e


seus experimentos, chegam no ensino superior com grande ansiedade para iniciar as aulas práticas e
começar a conviver com a profissão escolhida. Como visto, muitos acidentes de laboratório acontecem
por descuido, falta de conhecimento das medidas preventivas e por euforia, fazendo com que essa
atividade sobre normas de segurança em laboratório se torne ainda mais necessária no início da
jornada acadêmica dos futuros engenheiros químicos.

O laboratório de química como ambiente de estudo, pesquisa e trabalho, os expõem a vários


riscos. Para evitar incidentes ocorridos por falta de conhecimento, optou-se por exibir as normas de
segurança em laboratório aos alunos antes das práticas começarem efetivamente. Todos os alunos
concordaram que pesquisar, entender e apresentar sobre o tema proposto é de fundamental importância
para o bom andamento da vida em laboratório e que esse conhecimento deveria ser comum a todos os

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 12 139


profissionais da química.

Destaca-se algumas frases escritas pelos próprios discentes ao avaliar o tema estudado:

“Antes da primeira prática em laboratório, foi pedido a apresentação de um seminário sobre


segurança no laboratório. Assunto de extrema importância quando se trata de um curso onde
teremos diversas aulas práticas num local perigoso se não usar as precauções necessárias.
Não estava totalmente familiarizado com o sistema de segurança, sendo assim foi de suma
importância conhecer todos os procedimentos, proteções e perigos que lidamos durante as
aulas práticas. (...). Foram poucas as vezes que tive a oportunidade de entrar em laboratório
antes do ensino superior. ”

“Normas de segurança em laboratórios é um tema do qual eu tive muito pouco contato, pois
não realizei muitas aulas práticas de química em laboratórios anteriormente, tendo realizado
somente uma prática no ensino médio (o teste de chama). Durante essa prática, o tema
sobre as normas de segurança em laboratórios não foi abordado, pois a prática foi feita pela
professora, e os alunos apenas observaram. Portanto, abordar esse tema antes de começarmos
a efetivamente ter aulas práticas é de grande importância, pois a falta desse conhecimento
pode prejudicar a segurança dos alunos, uma vez que não estariam familiarizados com o
significado dos símbolos de laboratório, ou com os procedimentos de primeiros socorros em
caso de acidentes no laboratório, por exemplo. É também importante pois um engenheiro
químico pode ter muito contato com laboratórios, portanto abordar esse tema durante o curso
de graduação ajuda não somente durante o curso, como também pode ajudar ao trabalhar em
laboratórios no futuro. ”

“Primeiramente, segurança em laboratórios não é um assunto muito bem abordado nas escolas,
especialmente no ensino médio, sendo muitas vezes simplesmente ignorado. Por exemplo,
eu não tive aulas de prevenção de acidentes e primeiros socorros em laboratório, apesar de
ter constantes aulas de química em laboratório, portanto, caso tivesse acontecido algum erro,
ninguém saberia o que fazer. Seguidamente, dada a quantidade de aulas experimentais que
teremos ao longo do curso, e da chance de continuarmos trabalhando em laboratórios depois
do fim do curso, torna-se essencial sabermos como lidar com situações de emergência. ”

Com relação ao apresentado pelos discentes, pode-se dizer que os alunos reagiram bem à
atividade proposta pelo professor e desenvolvida por eles. Todos os acadêmicos conseguiram perceber
que é de fundamental importância discutir as normas de segurança em laboratório antes do início das
aulas práticas e conseguem relacionar a necessidade desse conteúdo com sua futura profissão como
engenheiro químico.

Após a análise das respostas dos alunos notou que 73% dos alunos não se consideravam
cientes das normas e seguranças em laboratório antes dos seminários aplicados e apenas 27% desses
alunos julgaram já ter um contato prévio com o tema. A relação de alunos que já tiveram contato com
aulas práticas de química anteriormente ao ensino superior em engenharia química segue esse mesmo
resultado. Nesse sentido, para grande maioria, o primeiro contato com assuntos relacionados aos
acidentes em laboratório, perigos existentes, ações e comportamentos preventivos, equipamentos de
segurança e primeiros socorros, se dá justamente através desses seminários iniciais.

Trabalhar esses temas transversais em aulas de laboratório de química desenvolve


profissionais capazes de apontar necessidades de melhoria, contrapõem-se à ideia de que é preciso
estudar determinados assuntos porque um dia eles serão úteis, faz com que os discentes entendam
que a construção dos conhecimentos vai além do conteúdo ministrado, das leituras feitas e está em
cada lacuna observada ou que passa despercebida na rotina universitária. A preocupação com o

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 12 140


desenvolvimento de atividades seguras e com o bem-estar dos estudantes deve partir não apenas da
instituição de ensino ou docentes, mas também dos seus colegas de turma, e, principalmente, deve ser
de conhecimento e vontade individual.

O educador é um dos principais representantes entre o elo da vida universitária e a vida


adulta dos novos profissionais e cabe a ele inovar em técnicas de ensino e arriscar nas metodologias
para desenvolver de maneira intrapessoal e interpessoal os alunos e destacar seus discentes como
profissionais.

4. SEMINÁRIOS COMO FERRAMENTA DE APRENDIZADO: VIÉS DO DISCENTE

Uma ferramenta muito utilizada nas salas de aula e apresentações em geral é o seminário. Ter
contato com essa ferramenta desde o começo da vida acadêmica é importante aos alunos para que eles
desenvolvam aptidões cada vez mais necessárias no mercado de trabalho, como boa comunicação,
facilidade em falar em público, desenvolver e seguir linhas de raciocínio específicas, além de prestar
atenção nos outros.


O seminário encontra-se como uma boa alternativa para possibilitar aos discentes o
desenvolvimento de tomadas de decisão ao que tange o processo ensino-aprendizagem, servindo como
um incentivador à pesquisa, uma vez que toda a apresentação deve ser procurada e bem embasada; ao
ensino, uma vez que os alunos devem preocupar-se com a melhor maneira de transmitir seus dados
ao resto da turma; e à extensão, mostrando a realidade do tema pesquisado faculdade a fora, em
comunidades, empresas e outras universidades.

Pelo viés dos próprios discentes, o seminário foi uma peça indispensável nesse primeiro
momento universitário tanto para começar a desenvolver as características citadas acima, como para
relacionar-se com os colegas da nova turma. Alguns relatos estão expostos, abaixo:

“A abordagem em forma de seminário é eficaz, uma vez que os alunos devem pesquisar e
depois apresentar, o conteúdo é aprendido e repassado de uma forma mais compreensível
para os demais colegas. [...] os seminários foram bem apresentados e, de forma clara e direta,
tivemos contato com todas as normas e medidas de segurança dos laboratórios. ”

“[...] apresentações deste modo ajudam bastante a mostrar a forma como serão enfrentados os
semestres seguintes e a dar mais confiança para os alunos, principalmente os mais tímidos. “

“A apresentação na forma de seminários, ajuda o acadêmico a perder a vergonha, e também


ganhar confiança para apresentações futuras que é muito importante em toda sua formação. ”

“[...] a apresentação do seminário não foi uma experiência edificante apenas por motivos
técnicos: a prática da comunicação verbal e da convivência em grupo é um diferencial para
nós, futuros engenheiros, que em breve ingressaremos no mercado de trabalho.”

Como discutido pelos alunos, os seminários se mostraram de grande valia para compreender
e interiorizar os conteúdos trabalhados. Além de proporcionar aprendizado técnico, também
proporcionou desenvolvimento interpessoal, contato com a turma e facilitou esse primeiro momento
com o universo universitário, um mundo completamente novo para grande maioria da turma.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 12 141


De maneira geral, os alunos sugeriram melhorias para aplicação desses seminários nos próximos
semestres, visando a melhoria e otimização da ferramenta. Algumas das sugestões elaboradas pelos
alunos estão dispostas, abaixo:

“Nos próximos semestres seria interessante conciliar a apresentação de seminários com a


apresentação prática dos objetos e temas tratados, mostrando fisicamente a presença desses
itens em outros laboratórios. ”

“[...] imagino que seria mais proveitoso se tivessem temas mais específicos, como exposições
a ácidos, bases, sais, solventes, entre outros. Para que os alunos pudessem ter maior noção
dos perigos específicos de cada composto. Mantendo essa mesma forma de apresentação, já
que é de fundamental importância para o melhor domínio possível da dicção e capacidade de
apresentação de cada aluno. “

“[...] seria interessante se, valendo parte da nota, os alunos tivessem feito um resumo dos
temas dos outros grupos para serem entregues na próxima aula. “

“ [...] considero viável que nos próximos semestres algumas partes dos seminários serem
explicadas por alguém com mais experiência na área, e não somente alunos. ”

Como exposto, algumas sugestões dos discentes para melhorar a metodologia de seminários
aplicados são: expor na realidade dos laboratórios os objetos, símbolos e equipamentos tratados nos
seminários, criar outros temas específicos de apresentação, escrever resumos sobre a apresentação
dos outros grupos e chamar profissionais da área para reforçar alguns ensinamentos. Para os
próximos semestres pretende-se estudar, adaptar e aplicar algumas dessas sugestões, de acordo com o
cronograma da ementa da disciplina e avaliar se foi ou não melhor para os alunos em termos técnicos,
interpessoal e desenvolvimento de perfil requerido no curso.

5. PERFIL ALMEJADO DE UM ENGENHEIRO QUÍMICO E SUA LAPIDAÇÃO DESDE


OS PERÍODOS INICIAIS DA GRADUAÇÃO

Com o passar dos anos o cenário político e socioeconômico muda e o perfil do profissional
requerido na área da engenharia química é efêmero e transcende a maneira tradicional de ensino das
universidades. Por conta disso é cada vez mais necessário formar profissionais aptos a trabalharem nos
diferentes momentos do mercado e por isso se dá a importância de arriscar metodologias alternativas
de ensino.

Pensamento lógico, capacidade analítica e senso de avaliação são algumas das características
necessárias para um bom profissional de engenharia e que foram perceptíveis através das redações. As
duas melhores redações desenvolvidas pelos alunos estão expostas na íntegra, abaixo:

“Pesquisando os temas para o seminário, aprendemos de forma eficaz e concreta as práticas


laboratoriais, os cuidados necessários para a manipulação dos objetos e dos materiais,
a sinalização exigida para o espaço. Com as apresentações, desmistificamos o ‘falar em
público’ que assusta no início, mas é extremamente fundamental para nosso futuro como
estudantes e posteriormente profissionais.

Na prática tivemos a oportunidade de aprender algumas técnicas para evitar acidentes pessoais
e contaminações por substâncias químicas. Hoje me sinto parcialmente familiarizadas com o
tema laboratório e com as aulas práticas de químicas, graças à forma efetiva e eficiente com

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 12 142


que os assuntos foram abordados no seminário, produzindo bons ensinamentos e melhorando
o relacionamento e convivências com os colegas, me recordando das aulas do ensino médio
e a evolução do aprendizado que hoje desejo.

Será de grande importância a permanência dos seminários, com novos temas e com diferentes
formas de montagem das equipes, para que aprendemos a trabalhar com diferentes grupos
e opiniões, com o objetivo nos aproximar da realidade que teremos fora da universidade. ”

“O laboratório de experimentos químicos é regido por diversas normas, as quais garantem a


segurança dos seus utilizadores. É de grande importância tratar da segurança no ambiente de
trabalho, pois dessa forma o risco de acidentes é reduzido.

Durante o ensino médio, quase não tive contato com as normas de segurança, pois as aulas
práticas eram escassas. Dentre as normas apresentadas, tive bastante contato com as normas
referentes à sinalização do local, reagentes e resíduos. No ensino superior tive contato com as
mesmas normas apresentadas durante o seminário, porém essas normas foram apresentadas
pelo professor da matéria. Ao envolver os alunos, acredito que o engajamento seja maior,
consequentemente o conteúdo não é esquecido facilmente.

No ensino superior tive um roteiro com práticas semelhantes às apresentadas no material


didático, o método de ensino é igual. Primeiro uma introdução teórica e em seguida a pratica
em si.

A utilização de seminários desenvolve atributos valiosos para o mercado de trabalho como:


liderança, planejamento e oratória. Sendo assim é possível aprimorar várias áreas com uma
atividade.

Acredito que para os próximos semestres, o seminário deve ser mantido, mas ele deve ser
acompanhado de uma dinâmica de grupo para assim envolver mais os estudantes. ”

Note-se que as linhas de raciocínio para a escrita das redações seguiram um caminho
convergente entre elas, todos os alunos abordaram temáticas sobre a importância do tema, vivencia
com práticas e o tema, análise dos seminários e as características positivas dos mesmos.

6. CONCLUSÕES

Os três tópicos analisados foram sobre a reação dos alunos frente às Normas de Segurança de
Trabalho, o viés do discente no desenvolvimento de seminários e a lapidação do perfil do engenheiro
químico através dessas ferramentas.

Com relação a reação dos alunos, notou-se que a grande maioria da turma nunca tinha tido
contato com o tema e tampouco com aulas práticas laboratoriais, o que enaltece a necessidade de
trabalhar esse quesito nas turmas de primeiro período. No entanto, ao analisarmos as redações dos
discentes para definir o quão efetivo foram os seminários para lecionar os assuntos, bem como
desenvolver características, vimos que é uma ferramenta útil, facilitadora e que foi bem recebida e
elogiada pelos alunos da graduação. Algumas sugestões de melhoria foram dadas aos alunos e serão
adaptadas e implementadas nos próximos semestres.

Por fim, é consenso geral da turma que estudar diferentes conteúdos de maneira cognitiva
através de seminários, como foi o caso das Normas de Segurança em Laboratório, desenvolve e lapida
o perfil necessário para um profissional de Engenharia Química, como por exemplo, uma pessoa líder,
comunicativa e que saiba falar em público.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 12 143


7. REFERÊNCIAS

Carvalho, P. R. Riscos Químicos em Laboratório. In: Teixeira P. (org). Cursos de aperfeiçoamento


em biossegurança. Rio de Janeiro: Educação à Distância – Ead-Ensp. 2000.

Muller, I. C.; Mastroeni, M. F. Tendência de acidentes em laboratórios de pesquisa. Revista Biotec-


nogia Ciência e Desenvolvimento, v. 33, p. 101-108. 2004.

Rodrigues, F. R. A.; Cunha, G. A. A.; Bruno, R. C. Seminários temáticos como estratégia interdis-
ciplinar de aprendizagem e desenvolvimento de competências em formação avançada. Enciclopédia
biosfera. Centro Científico Conhecer - Goiânia, v.11, n.20, p. 761-771. 2015.

Schnaid,F.; Barbosa, F. F.; Timm, M. O Perfil do Engenheiro ao Longo da História. Universidade


Federal do Rio Grande do Sul. Cobenge, 2001.

Uema, L. K. Comunicação de perigos: compreensão dos pictogramas de Rotulagem de produtos


químicos por estudantes de graduação. Dissertação (mestrado). Fundação Jorge Duprat Figueiredo
de Segurança de Medicina do Trabalho, São Paulo. 2015.

Uema, L. K; Ribeiro, M. G. Pictogramas do GHS e sua aplicação como ferramenta de comunicação


de perigos para estudantes de graduação. Química Nova, v. 40, n. 3, p. 353-361. 2017.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 12 144


CAPÍTULO 13

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A HISTÓRIA DA


FORMAÇÃO DE PROFESSORES

VIVIANE RIEDNER Palavras-chaves: Educação; Formação de pro-


IFPA1
fessores; Letras; Sociologia da educação.

LEONNE BRUNO DOMINGUES ALVES


ABSTRACT: This work is a theoretical research
IFPA2
developed within the framework of the Group of
JAIRO DOS SANTOS RODRIGUES3 Studies in Education, Culture and Territory (GE-
CULT) at the Federal Institute of Pará and aims
to present some historical considerations regard-
VICTOR DA CRUZ PERES4
ing teacher education. Where it is permeated with
conditioned contradictions from the church to the
CÁSSIO FURTADO LIMA State itself. In this process, the training of teach-
IFPA5 ers has presented itself as a challenge, since it
must always be accompanying the development
of society itself.
RESUMO: Este trabalho trata-se de uma pesqui-
sa teórica desenvolvida no âmbito do grupo de
Estudos em Educação, cultura e território (GE-
KEYWORDS: Education; Teacher training;
CULT) no instituto federal do pará e tem como
Letters; Sociology of education.
objetivo apresentar algumas considerações histó-
ricas a respeito da formação de professores. Onde
esta é permeada de contradições condicionadas
desde a igreja até o próprio Estado. Nesse pro- INTRODUÇÃO
cesso, a formação de professores tem se apresen-
tado como um desafio, uma vez que, precisa es- Pesquisar sobre a história brasileira da
tar sempre acompanhando o desenvolvimento da profissionalização do professor e da formação de
própria sociedade. professores parece ser um caminho permeado por
1 Professora EBTT de Língua Espanhola no Instituto Federal de Educação, Ciência e tecnologia do Pará (IFPA).
Mestre em Desenvolvimento Rural Sustentável pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE)
2 Professor EBTT de sociologia no Instituto Federal de Educação, Ciência e tecnologia do Pará (IFPA). Mestre em
Sociologia e Antropologia pela Universidade Federal do Pará (UFPA)
3 Professor EBTT de Direito no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará (IFPA), Especialista
em Gestão Pública pela Faculdade Educacional da Lapa, Especialista em Docência para Educação Profissional, Cientifica
e Tecnológica pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Pará – (IFPA).
4 Professor EBTT de informática no Instituto Federal de Educação, Ciência e tecnologia do Pará (IFPA). Mestre
em Gestão de Risco e Desastres Naturais pela Universidade Federal do Pará (UFPA)
5 Professor EBTT de Engenharia Florestal no Instituto Federal de Educação, Ciência e tecnologia do Pará (IFPA).
Mestre em Ciência Florestal pela Universidade Federal de Viçosa (UFV).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI 145


constatações de que os instrumentos de pensamento, usados pela humanidade ao longo de seu proces-
so civilizatório, mudaram e continuam em constante evolução, em contínuo movimento dialético.6
Nosso primeiro momento de pesquisa constituiu-se em uma tentativa de compreensão, uma reflexão,
acerca da base teórico-estrutural do(s) modelo(s) de formação de professores adotado(s) no Brasil.
Certamente, tal base encontra respaldo na legislação educacional do país, a qual, por sua vez, sustenta
políticas e programas de formação dos professores. Conduzimos nossa pesquisa para entendermos
como se constituiu o campo da profissionalização da profissão professor historicamente.

HISTÓRIA DA PROFISSÃO E PROFISSIONALIZAÇÃO DO PROFESSOR

Ao longo da história da humanidade sempre houve a preocupação em ensinar a arte de


bem viver às novas gerações. Essa preocupação incentivou a construção de novos pensamentos e
instrumentos de trabalho dessa arte, bem como conduziu o surgimento de novas estruturas sociais.7

No início do processo civilizatório era a tribo, a família, que se encarregava de ensinar sua
prole. Com o tempo, aos poucos, essa tarefa foi dividida com mestres itinerantes das academias
de Artes e, pouco mais tarde, com a instituição escola, que se encarregou de ensinar/transmitir a
bagagem cultural valorizada às novas gerações. Basicamente, até o século XI, não se pensava na
preparação para a função docente, preparação daquele(a) que ensina. Para Nóvoa (1995), foi durante
o século XII que a Igreja Católica, administradora da educação, mostrou suas primeiras expressões
relativas à formação de professores, visto que, naquela época, o docente era um teólogo. Mas a
demanda pela escola começou a esboçar crescimento, indicativo da necessidade de formar maior
número de docentes.

O crescente fenômeno da escolarização associado à ocorrência de várias transformações


socioeconômicas, século XVI, motivou o surgimento dos primeiros colégios administrados pelas
igrejas católicas, protestantes ou antigas Academias de Artes, que buscaram dar resposta às exigências
da sociedade vigente. Explica Nóvoa (1995) que, naquela época, tais colégios apresentaram inovações
como instituições escolares porque eram locais específicos destinados ao ensino, que deveria
ocorrer em salas divididas em classes seriadas, matérias específicas, grades curriculares e horários
de aulas predefinidos. As transformações na estrutura educacional atraíram vários grupos sociais
que abandonaram outras atividades profissionais e começaram a se dedicar à atividade de ensino,
modificando as relações escolares. Em decorrência, surgiu a função docente propriamente dita, não
mais restrita ao clérigo e teólogos.

6 A concepção marxista de dialética, influenciada pelo pensamento hegeliano, implica em uma prática que se faz
mediante a teoria e uma teoria que se robustece com a prática, onde, se parte da realidade material para o confronto com
os conceitos e se volta para a realidade material afim de transformá-la (MARX, 1985). Por essa concepção, o mundo
somente é compreendido na perspectiva de um todo, na sua totalidade, em que cada movimento reflete uma ideia a outra
contrária até chegar ao conhecimento da verdade, e não se compreende a vida social fora da existência de antagonismos,
dos conflitos. (BLOIS, 2006).
7 Em um sentido restrito, referimo-nos à estrutura social para designar os elementos estruturais da organização
socioeconômica e cultural das sociedades, que se sobrepõe aos elementos culturais, como valores e representação que,
comum a grupos sociais distintos – nesse caso, campesinos e os professores, especificamente – constitui uma superestru-
tura (MARX, 1982) (HARVEY, 2002).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 13 146


A partir da metade do século XVIII, em um contexto de secularização e de estatização do
ensino, menciona Nóvoa (1996), o Estado passou a controlar os processos educativos a fim de orientar
a maneira pela qual os homens deveriam conceber o mundo. Com isso, prolongaram as formas e os
modelos escolares elaborados sob a tutela da Igreja Católica, só que, daí em diante, dinamizados
por grupos de educadores, recrutados pelas autoridades estatais. Mas, devido ao controle do Estado
sobre a educação, os professores eram vistos como “clérigos-leigos”, cuja característica principal
deveria ser a ‘vocação’ para ensinar. Nesse meado de século, o educador fora incentivado a ser um
profissional para se dedicar especificamente ao ensino que, por sua vez, o Estado exigia determinada
formação, fato esse, motivador da criação das Escolas Normais.

No contexto mundial do século XVIII, explica Saviani (2009), a Revolução Francesa (1789-
1799) teve grande influência na criação das Escolas Normais para preparo de professores a fim de
atender à crescente demanda pela instrução popular. Não sem razão, a França foi pioneira na criação
das Escolas Normais, seguida pela Itália, Alemanha, Inglaterra, Estados Unidos. Tais Escolas, no
entender de Nóvoa (1995, p. 15), “passam a contribuir de forma decisiva, produzindo a profissão
docente (a nível coletivo), para a gênese de uma cultura profissional, além da socialização dos seus
membros”.

O emergente corpo profissional dos professores passou a exigir do Estado alguns direitos
como, por exemplo, autonomia e independência. Em contrapartida, informa Nóvoa (1995), o Estado
passou a exigir e oferecer uma permissão para ensinar, que somente era obtida por meio de concurso ou
de exame classificatório. Aos concursos e exames poderiam se submeter todos os que apresentassem
alguns requisitos como, por exemplo, conhecimentos literários, idade, bom comportamento moral.
Conforme o autor, a licença para lecionar significava o aval do Estado para o professor que, de posse
dessa licença, legitimava seu papel social nas ações educativas da escola e se firmava como um grupo
ocupacional que, pouco mais tarde, lançou-se na luta pela melhoria de seu estatuto sócio profissional.

Na explanação de Nóvoa (1995, p. 17), a segunda metade do século XIX foi posta como
um momento decisivo no processo de profissionalização do professor. Naquela época, firmes
concepções ideológicas delineavam a formação e traçavam um perfil profissional dos professores:
não são burgueses, mas também não são povos; não devem ser intelectuais, mas possuir “um bom
acervo de conhecimentos”; não são notáveis locais, mas devem desempenhar papel importante na
sociedade, manter relações com todos os grupos sem privilegiar nenhum deles; não podem ter uma
vida miserável, mas devem evitar toda a ostentação; não exercer seu trabalho com independência,
sendo inútil que usufruam de alguma autonomia.

Para Nóvoa (1995), foi no final do século XIX, como estratégia do Estado, que se organizaram
grupos de inspetores para assegurar controle sobre o ensino e professores que passaram a reivindicar
a conjugação, diante dos privilégios de funcionários estatais, em relação àqueles que possuem os
trabalhadores livres. Nesse mesmo período, mostrou-se crescente a demanda pela instrução, cabendo
aos professores assegurar a integração política e social por meio da escola. No final desse século, deu-
se início ao ingresso das mulheres no magistério e novos posicionamentos do Estado em relação às
reivindicações de melhoria salarial, condições para prosseguimento de estudos e formação profissional.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 13 147


No século XX, especificamente no final da década de 1980, conforme Nóvoa (1995, p. 15),
iniciaram-se estudos e pesquisas com o mérito de “recolocar os professores no centro de debates
educativos e das problemáticas da investigação”. Com base nas reflexões registradas nos parágrafos
anteriores, observamos que, durante logo período da história da humanidade, não houve preocupação
com a formação docente, até porque a arte de bem viver da prole era atribuição da tribo, da família. No
decorrer do processo civilizatório, essa responsabilidade começou a ser dividida com outros grupos
sociais sob a tutela da Igreja e de Estado: mestres teólogos e professores. Especialmente o preparo
profissional do professor foi motivado pela evolução da sociedade que, ao longo do tempo, sentiu
a necessidade de investir na instrução de seus membros. Mas, a formação profissional do professor
começou a ganhar importância somente com o advento do Estado moderno8, formulador e executor
de políticas públicas.

PROFISSÃO PROFESSOR E A FORMAÇÃO PROFISSIONAL

Historicamente, a formação de professores se configurou por modelos formativos, emergidos


a partir do final do século XVII, notadamente quando ocorreu a instalação dos sistemas nacionais
de ensino para resolver o problema da instrução popular. Basicamente, essa formação se firmou em
dois aspectos constitutivos do ato docente: o conteúdo e a forma. Tais aspectos deram origem a
maneiras distintas de encaminhar as políticas públicas de educação, o que determinou a formação de
professores e definiu os contornos de novos instrumentos de trabalho.

No âmbito mundial, caminhos distintos orientaram a formação de professores: o caminho


da racionalidade técnica ou o da “epistemologia positiva da prática”. 9O caminho da racionalidade
técnica, conforme Imbernón (2009; 2010), introduziu uma visão determinista e uniforme à atividade
docente e instituiu o treinamento como seu principal procedimento metodológico. Tal caminho,
exceto por seu cunho tecnicista, no entender do autor, trouxe contribuições significativas para a área
da educação. No meio universitário, por exemplo, a racionalidade técnica despertou o interesse por
estudos acerca da formação de professores, incentivou o professorado a mostrar maior consciência e
a apresentar maior comprometimento com a atividade docente, possibilitou o surgimento de modelos
alternativos à formação docente, viabilizou o aumento da produção e disponibilização de textos
com análises teóricas, relatos, experiências, a realização de encontros, jornadas, congressos e outros
eventos similares, para discussão sobre questões relativas à educação e à prática docente.

Na base teórico-estrutural-metodológica do modelo de racionalidade técnica identificam-se,


pelo menos, três estratégias de formação de professores, aplicadas em vários países: treinamento de
habilidades comportamentais, transmissão de conhecimento e estratégia acadêmica tradicional.

Essas estratégias foram explicadas por Diniz-Pereira (2010). No entender do autor, a


estratégia de treinamento de habilidades comportamentais tem o objetivo de treinar professores para

8 É o resultado de um processo histórico e sociopolítico, nascido em meados do século XV. É uma criação da mo-
dernidade que nasceu do pensamento jusnaturalista de Thomas Hobbes (1588-1679) e se formou em John Locke (1632-
1704), Immanuel Kant (1724-1804), que impõem uma visão racionalista idealista do direito, revista por Hans Kelsen
(1881-1973). (BOBBIO; MATTEUCCI; PASQUINO, 1998).
9 Denominação empregada pelo pesquisador norte-americano Donald Schön, cuja expressão mais conhecida é
“racionalidade prática”. (DINIZ-PEREIRA, 2010).

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 13 148


desenvolverem habilidades específicas, observáveis, singulares. A estratégia de transmissão supõe
que o conteúdo científico-pedagógico é transmitido aos professores em processo de formação, mas
ignora a prática de ensino. A estratégia acadêmica tradicional pressupõe que o conhecimento do
conteúdo disciplinar e/ou científico é suficiente para o ensino, sendo que seus aspectos relativos à
prática docente podem ser aprendidos em serviço.

Em sua análise, Schön (2000) responsabiliza o modelo de racionalidade técnica, e outros


fatores interferentes nas escolas profissionais, pela crise da formação de novos profissionais da
educação, e advogou pela construção de uma epistemologia alternativa da prática. No entender de
Diniz-Pereira (2010), a epistemologia alternativa da prática, posta por Schön, voltou-se à valorização
da prática profissional docente. Na compreensão do autor, pela concepção do modelo de formação
proposto por Schön, a prática docente é concebida como momento de construção de conhecimento,
pois se valoriza e reconhece como válido o conhecimento tácito10, presente nas soluções que os
profissionais encontram no ato de ensinar e refletir sobre a prática da docência. Conforme o autor, tal
construção ocorre por meio da reflexão, análise e problematização da prática docente que se associa
ao conhecimento tácito apreendido no desenvolvimento dessa prática.

A epistemologia alternativa da prática proposta por Schön, conhecida como modelo de


racionalidade prática, independentemente da estratégia adotada, expõe Duarte (2003), recebeu severas
críticas por ter sido apontado como um modelo de formação docente que desvaloriza o conhecimento
teórico-científico-acadêmico e privilegia o conhecimento tácito, cotidiano, e por se esquecer de que
esse conhecimento caminha junto ao conhecimento explícito11, uma vez que ambos estão intimamente
interligados, são indissociáveis.

Ao analisar a formação inicial de professores, Saviani (2011) explica que, em relação ao


conteúdo e a forma, há duas maneiras de conceber tal formação. Essas maneiras são constitutivas
de dois modelos que se contrapõem entre si. De um lado situa-se o modelo em que a formação de
professores se esgota na cultura geral e no domínio específico de conteúdos da área de formação, ou
seja, daquela área que habilita o professor para a docência na Educação Básica, Educação Profissional
Técnica de Nível Médio e Ensino Superior, na Educação Profissional e Tecnológica. A concepção desse
modelo supõe que o domínio dos conteúdos do conhecimento já está organizado e sistematizado, por
isso a formação didático-pedagógica deve ser adquirida na prática docente ou mediante mecanismos
de formação, em geral, do tipo treinamento em serviço, semelhante ao pressuposto evidenciado por
Imbernón (2009; 2010) ao comentar acerca da racionalidade técnica.

A racionalidade técnica foi denominada por Saviani (2011, p. 9) como “modelo dos conteúdos
culturais-cognitivos 12 de formação de professores”. Na adoção desse modelo compete às instituições
formadoras apenas a organização e sistematização do conhecimento já apreendido pelo acadêmico
durante sua formação.

Na concepção do segundo modelo explicitado por Saviani (2011), a formação de professores

10 Refere-se ao conhecimento que o indivíduo adquire ao longo de sua vida, pela experiência.
11 Refere-se ao conhecimento formal, claro, regrado e facilmente comunicável. (HOUAISS; VILAR, 2008).
12 Nesse artigo, às vezes, o autor também se reporta à expressão “modelo cultural-cognitivo” com o mesmo signi-
ficado.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 13 149


se completa com o preparo didático-pedagógico. Assim, além da cultura geral e da formação
específica na área do conhecimento necessário para a prática docente, as instituições formadoras
devem assegurar, por meio do currículo, a preparação didático-pedagógica dos professores. O autor
denominou esse modelo de “modelo pedagógico-didático de formação de professores”.

Pela exposição de Saviani (2011), nas instituições formadoras de professores para atuação
nos anos finais do Ensino Fundamental, Ensino Médio e Ensino Superior predomina o modelo de
conteúdos culturais-cognitivos. Enquanto que o modelo pedagógico-didático prevalece em instituições
formadoras de professores para atuação na Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental.

Todavia, há forte preocupação mundial em elevar a formação de professores para atuação na


Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental para o Ensino Superior, explica Saviani
(2011, p. 9), mas essa tendência, “corre o risco de frustrar a expectativa de uma adequada formação
didático-pedagógica, prevalecendo a força do modelo dos conteúdos culturais-cognitivos”.

No Brasil, tradicionalmente, os cursos de formação inicial de professores da Educação Básica,


as licenciaturas, estruturaram-se a partir da separação curricular, da fragmentação entre disciplinas
específicas de conteúdo, conhecidas disciplinas científicas, e as disciplinas pedagógicas. Essa
estruturação evidenciou sensível separação/fragmentação entre conteúdo, isto é, o conhecimento a
ser ensinado, e a forma, ou seja, as maneiras como tal conteúdo pode ser mediado/ensinado. Essa
estruturação parece não considerar que há conteúdo científico nas disciplinas científicas de igual
maneira que há conteúdo científico nas disciplinas pedagógicas. Tal desconsideração, no entender
de Saviani (2011), evidenciou uma dicotomia entre as concepções norteadoras desses modelos de
formação, conteúdos culturais-cognitivos e pedagógico-didático, adotados por instituições formadoras
do país.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Apresentamos, ao leitor, neste trabalho, brevemente, a história de formação dos professores


que, no processo de formação passa pelo controle da igreja até o controle do Estado. Não obstante
a estes controles, a profissão de professor fora marcada pelas contradições na sua formação “não
são burgueses, mas também não são povos; não devem ser intelectuais, mas possuir “um bom
acervo de conhecimentos”; não são notáveis locais, mas devem desempenhar papel importante na
sociedade, manter relações com todos os grupos sem privilegiar nenhum deles; não podem ter uma
vida miserável, mas devem evitar toda a ostentação; não exercer seu trabalho com independência,
sendo inútil que usufruam de alguma autonomia”. Contudo, a crescente especialização da profissão
acaba por exigir que a profissão seja objeto de investimentos. Diversos caminhos – “racionalidade
técnica ou o da “epistemologia positiva da prática” – são apontados como seguidos nesse processo.
No Brasil, esse processo, portanto, se dá, a partir de uma separação entre conteúdo e forma. Esses
processos históricos apontam para o desafio histórico da profissão na sua organização.

Possibilidades e Desafios da Educação no Século XXI Capítulo 13 150


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