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A condição necessária ao nascimento de um novo modo de pensar, surgido por volta do século VI,
alicerçado no pensamento racional, no questionamento e na livre análise, foi domínio o próprio
surgimento da polis. É na polis onde estão reunidas todas características de uma vida social (advindas
de uma ruptura com o modelo das monarquias palacianas anteriores) que fundamentariam aquilo que
conhecemos por filosofia. Dentre essas condições, podemos citar a ideia de "espaço público", lugar
de debate sobre os negócios da cidade em que as disputas se dão através da oratória. É importante
salientar, que o próprio "espaço público", o fazer político (que no desenvolvimento histórico grego
expressou-se na agora) era o que definia o sujeito como participante da sociedade, já que não havendo
uma separação entre o social e o político, os gregos só alcançariam o status de cidadão no momento
de emancipação da "ditadura das necessidades" do ambiente privado, emergindo numa democracia
direta que constituía o fundamento do sujeito social da polis. A superação do privado emanciparia os
gregos pois seria o do homem sobre a natureza, o momento em que as condições necessárias a
manutenção da vida (incluindo a própria prática da escravidão) seriam realizadas e o grande grupo de
famílias, que constituem a polis, poderiam participar do espaço político e público da cidade. A
superação do privado demarca também o nascimento da cultura. Em oposição à natureza, a cultura
surge a partir do que faz com que os humanos diferenciem-se dos animais: o trabalho. Em outros
termos, o homo faber, diferente do animal laborans, seria justamente o que consegue através de sua
ação transformar a natureza. Isso se dá, de modo simplificado, através da própria instrumentação
desenvolvida por essas comunidades. É importante explicitar tais questões para sinalizar que o
fundamento da filosofia e da própria política, a palavra (o logos), se dá num contexto de nascimento
da cultura. Essas questões são fundantes no pensamento socrático/platônico e respondem a oposição
que a filosofia experimentará em relação à cidade e que terá como expressão mais radical a morte de
Sócrates.
O mundo sensível demarca uma contradição com o mundo inteligível pois seu foco na aparência, nas
formas transitórias e na destruição da unidade apontam para uma impossibilidade de conhecimento.
O conhecimento, platônico/socrático, deriva de uma busca pela aplicação de uma ordem num mundo
dominado pelo caos da instabilidade. Dessa forma, só pode derivar de formas imateriais. Ou seja, o
que se apresenta desde o surgimento da cultura e, consequentemente, o nascimento da polis
impossibilita qualquer forma genuína de conhecimento. A injustiça, que tem por fundamento o
domínio do mais forte, porém desqualificado em relação ao mais fraco e qualitativamente superior,
legitima-se justamente a partir do mundo sensível, já que para o desqualificado sobrepor-se ao
qualificado, o enfoque nas aparências, na guerra e, consequentemente, no fim da unidade deve ser
valorizado. A justiça, por outro lado, seria a melhor forma de conduta para uma cidade, pois
conseguiria estabelecer uma coesão social e, portanto, uma ordem no mundo. Partindo do método
desenvolvido por Platão e Sócrates, é necessário buscar em primeiro lugar a natureza da justiça no
Estado (no maior), para depois procura-la nos indivíduos (no menor). Analisando o surgimento do
Estado, os dois filósofos, percebem que o mesmo surge da necessidade humana de associação para
suprir as necessidades e manter a existência. Para que isso aconteça, é fundamental, a distribuição
das funções na cidade e que todo produto dos trabalhos desenvolvidos reverta-se à comunidade
inteira. É imprescindível perceber que a produção dos bens necessários a vida na Grécia não se dava
através de uma indústria desenvolvida como conheceremos a partir da Revolução Industrial. O próprio
modo de produção escravista desenvolvido na antiguidade colocava limite para o desenvolvimento
de tal espécie de produção em larga escala, já que os escravos em sua maioria presos ao ambiente
privado e os senhores dados ao ócio da contemplação ou a vida pública na política, não conseguiam
produzir uma base para que o desenvolvimento tecnológico florescesse. Assim, a defesa de socratico-
platônica, é de que a produção se reverterá com qualidade à polis através de uma divisão do trabalho
que valorize a dedicação exclusiva do trabalhador a uma única função. Dessa forma, é a valorização
do mundo inteligível, através da busca por uma ordem, eticamente representa no ideal de justiça, que
garante a polis não só sua existência, mas uma boa existência.
A reforma pedagógica platônica tem por objetivo expressar na educação o projeto político
desenvolvido pelo autor. A educação tem por intento valorização de uma ética da justiça e
fortalecimento da ideia de ordem social nas gerações futuras. Dessa forma, os principais aspectos que
guiariam uma boa educação fundamentam-se na divisão de seu conteúdo entre a ginástica e a música.
Por música, onde o autor começa sua explanação, deve-se entender as artes de modo geral. A música,
que serviria de "educação para a alma", busca erigir a moral dos jovens através da literatura outras
práticas culturais. Esses elementos culturais devem ser submetidos à censura do Estado para que
sigam à risca os preceitos que devem guiar a pedagogia da polis e não desvirtuem a formação dos
jovens. Quando os estudantes conhecerem as divindades, por exemplo, devem saber da importância
da unidade, de que todos os deuses visam unicamente o bem e a justiça e, consequentemente, não
se apresentam no mundo sensível. Por outro lado, os guardiões devem ser impetuosos, pois devem
defender os interesses de sua localidade contra os inimigos e serem mansos com os cidadãos. Logo,
precisam de um treinamento devotado à arte da guerra. Dessa união entre ginástica e música,
teríamos por consequência a temperança, que para Platão, simboliza-se na atitude do cão, que pode
ser afável ou raivoso a depender de quem o acaricia, se é um amigo ou um inimigo.
A dicotomia indivíduo e sociedade em Platão está posta a partir do momento em que todos indivíduos
devem colocar sua ação em favor da sociedade para que a mesma possa seguir existindo e que o ideal
de justiça seja mantido. A ordem deve reinar, pois a cidade é um todo formado por partes com
diferentes interesses. E a necessidade da unidade da alma é a necessidade da luta do Bem comum
contra a injustiça e ignorância do bem individual, dos interesses das partes. Para que a justiça exista e
a cidade e as partes que a compõem mantenham-se, é necessário que o homem vise elevar seus
objetivos ao mundo inteligível que busca a construção da ordem em meio ao caos que existe no
mundo sensível.