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CONCEITO DE INFINITO MATEMÁTICO

NA CIÊNCIA DA LÓGICA DE HEGEL

Albertino Servulo Barbosa de Sousa1

Introdução

Este artigo apresenta o conceito de infinito matemático encontrado na obra


Ciência da lógica do filósofo alemão G.W.F Hegel, que mostra uma crítica à definição
de infinito na ciência matemática. Especificamente o propósito é verificar a relação
entre o conceito de infinito matemático de Hegel e a concepção de infinito da
matemática contemporânea, em especial aquela apresentada pelo matemático George
Cantor.

A importância desse tema se deve a centralidade que o conceito do infinito


ocupa na teoria do conhecimento; pois, tanto na investigação filosófica quanto
matemática e em outras áreas, os especialistas, quando, se dispõem a explicar os
fundamentos da natureza, do conhecimento e do universo, se deparam com o problema
do infinito.

Na ciência esse problema surge na investigação sobre a origem do universo ou


na explicação dos seus limites. Na religião o problema do infinito está relacionado a
eternidade, isto é, se a morte significa o fim de tudo ou apenas uma transformação para
outra fase da vida que deve ser entendida como eterna.

Na filosofia o infinito está ligado ao problema do princípio de todas as coisas;


por exemplo, o apeiron de Anaximandro defende que o principio é também
necessariamente ilimitado. E mesmo em debates contemporâneos, como na discussão
sobre a crise ecológica, o problema do infinito está presente, quando se discute se os
recursos naturais são finitos, porque não são renováveis, ou infinitos, porque são
renováveis.

Na matemática o infinito é um problema porque fere proposições lógicas tidas


como auto-evidentes. Diante disto, alguns matemáticos sugeriram que os números
infinitos deveriam ser deixados de lado, pois não são compreensíveis.2

1
Graduação em Matemática e Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará. Doutor em Filosofia pelo
Programa de Pós-Graduação em Filosofia da Universidade Federal do Ceará. Email:
albertinoservulo@alu.ufc.br
O infinito matemático na Ciência da lógica

Em sua Ciência da lógica, especificamente na Doutrina do ser, o filósofo


alemão Hegel expressa a definição comum de infinito matemático.

A definição habitual do infinito matemático é que ele seria uma grandeza,


além da qual – se ela está determinada como infinitamente grande – não há
nenhuma maior ou – se ela está determinada como infinitamente pequeno –
não há nenhuma menor, ou seja, que é maior naquele caso ou menor neste
caso do que cada grandeza arbitrária. (HEGEL, 2016, p.259.).

Hegel crítica essa definição estabelecida de infinito matemático como uma


grandeza, pois nesta consideração não está expresso o verdadeiro conceito de infinito,
isto é, nela ainda contém a mesma contradição que aparece no progresso infinito.

Nesta definição, sem dúvida não está expresso o conceito verdadeiro, antes
apenas, como já mencionado, a mesma contradição que há no progresso
infinito. (HEGEL, loc. cit.).

Para Hegel, o progresso infinito é uma reflexão não realizada plenamente sobre o
infinito, pois, apesar de possuir as determinações do infinito verdadeiro, isto é, a oposição entre
finito e infinito e a unidade entre finito e infinito; ela não junta esses dois pensamentos, os deixa
apenas alternar.
O infinito – conforme o sentido comum da má infinitude – e o progresso para
o infinito, como o dever ser, são a expressão de uma contradição que se dá a
si mesma como a dissolução e como o último. (...) Essa reflexão não
realizada plenamente tem ambas as determinações do infinito verdadeiro – à
oposição do finito e do infinito e a unidade do finito e do infinito – diante de
si, mas não junta esses dois pensamentos; um engendra de modo inseparável
o outro, mas ela [a reflexão] os deixa apenas alternar. (HEGEL, 2016,
p.156.).

Segundo Hegel, o progresso infinito é somente a expressão da contradição que


se encontra no finito quantitativo, isto é, a oposição entre finito e infinito; mas não é a
dissolução dessa contradição; porque o progresso infinito produz apenas uma dissolução
aparente, pois há uma continuidade de uma determinidade na outra.

2
“Embora a intuição nos diga que há duas vezes mais inteiros positivos que inteiros pares, somos
obrigados a concluir que as duas infinidades são iguais. (...) Quando chegou a esse resultado, Galileu
concluiu que havia algo de muito esquisito com os números infinitos e que o melhor que tinha a fazer era
evitá-los. A infinidade, disse ele, era ‘inerentemente incompreensível’.” (MORRIS, Richard. Uma breve
história do infinito: dos paradoxos de Zenão ao universo quântico. Tradução Maria Luiza X. de A.
Borges. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1998, p.16.).
O progresso para o infinito é em geral a expressão da contradição, aqui,
daquela que o infinito quantitativo ou o quanto em geral contêm. (...) O
progresso infinito é apenas a expressão dessa contradição, não a dissolução
da mesma, mas, em virtude da continuidade de uma determinidade na sua
outra, ele produz uma dissolução aparente. (HEGEL, 2016, p.242.).

Hegel explica que na matemática a grandeza é concebida como aquilo que pode
ser aumentado ou diminuído, todavia a definição de infinito contrapõe essa concepção,
pois o infinito não pode ser aumentado ou diminuído, e, portanto, ele não pode ser
considerado uma quantidade, como postula a definição comum de infinito matemático.

Na matemática, uma grandeza é definida como algo que pode ser aumentado
ou diminuído, – em geral, portanto, como um limite indiferente. Na medida
em que, agora, o infinitamente grande ou pequeno é um tal que não pode ser
aumentado ou diminuído, assim ele não é mais, de fato, nenhum quantum
como tal.” (HEGEL, p. 260.).

Nisto consiste, para Hegel, o equívoco da definição do infinito matemático, pois


a quantidade é um limite que não é suprassumida na definição comum de infinito
matemático.

Mas a reflexão de que o quantum – e nesta observação eu denomino quantum


em geral, como ele é: o quantum finito – está suprassumido, é o que costuma
não ser feito e que constitui a dificuldade para o compreender habitual, na
medida em que o quantum, uma vez que é infinito, deve ser pensado como
um suprassumido, como um tal que não é um quantum e cuja determinidade
quantitativa, contudo, permanece. (HEGEL, 2016, loc. cit.).

Para Hegel, o infinito em seu conceito simples revela a determinação de negação


do finito. Ou seja, o infinito, explicitamente nega a delimitação. Devido a essa
concepção parcial Hegel afirma que é preciso diferenciar o conceito verdadeiro de
infinito da concepção má de infinitude. Hegel considera que o primeiro é concebido
pela razão, enquanto o segundo é produto do entendimento. O infinito é em sua
determinação simples apenas a negação do finito. Porém, o infinito na sua determinação
geral é a negação da negação, é o suprassumir do infinito com o finito como um
processo, nisto consiste o infinito verdadeiro.

O infinito, contudo, vale pura e simplesmente como absoluto, uma vez que
ele está determinado explicitamente como negação do finito; com isso, no
infinito, faz-se referência explícita e se nega a delimitação. (...) O principal é
diferenciar o conceito verdadeiro da infinitude da má infinitude, a infinitude
da razão da infinitude do entendimento. (...) O infinito é, a) na determinação
simples, o afirmativo como negação do finito; b) mas ele é, com isso, na
determinação recíproca com o finito e é o infinito abstrato, unilateral; c) o
suprassumir-se desse infinito assim como do finito enquanto um processo – é
o infinito verdadeiro.(HEGEL, 2016, p.142).

Segundo Hegel, a introdução do infinito na matemática contribuiu para a


ampliação dessa ciência e proporcionou grandes resultados nesse campo.3 Apesar disso
Hegel adverte que a matemática não explica o conceito de infinito.

O infinito matemático é, por um lado, interessante pela ampliação da


matemática e pelos grandes resultados, os quais engendrou a introdução dele
na matemática; mas, por outro lado, é digno de nota que essa ciência ainda
não conseguiu justificar-se sobre o uso do mesmo pelo conceito. (HEGEL,
2016, p.257).

Apesar dessa limitação Hegel comenta que filosoficamente o infinito


matemático é importante porque no fundamento dele se encontra o conceito de infinito
verdadeiro.4 O déficit do infinito matemático se deve ao fato da matemática
desconsiderar o aspecto metafísico do infinito. Isto fica evidente quando a matemática
ao rejeitar as objeções da metafísica a sua concepção de infinito se apóia no argumento
de que seus conceitos são próprios a sua ciência e não ao campo metafísico.

.A matemática na medida em que ela não conhece a natureza do seu


instrumento, porque ela não acertou as contas com a metafísica e com a
crítica do mesmo, não foi capaz de determinar a extensão da sua aplicação e
de se garantir contra abusos do mesmo. Mas sob o aspecto filosófico, o
infinito matemático é importante porque, de fato, está no seu fundamento o
conceito do infinito verdadeiro e ele é muito mais elevado do que aquilo que
se costuma assim chamar de infinito metafísico, a partir do qual são feitas as
objeções contra o primeiro. Contra estas objeções, a ciência da matemática
sabe se resgatar frequentemente apenas pelo fato de que ela rejeita a
competência da metafísica, na medida em que ela afirma não ter nada a ver
com esta ciência e não dever preocupar-se com seus conceitos, se ela
proceder consequentemente apenas no seu próprio terreno. Ela não deveria

3
A importância da introdução do infinito na matemática está no fato deste conceito demonstrar que a
matemática não depende da experiência para demonstrar suas proposições. “Os gregos antigos fizeram da
matemática uma ciência propriamente dita, independente, e suficiente a si mesma. Embora a moderna
pesquisa anglo-americana sobre os fundamentos da matemática, frequentemente ainda se volte (...) contra
tudo o que é apriorístico e defenda pontos de vista ‘nominalistas’, concorda com tudo com seus
adversários platonizantes na afirmação que a matemática não depende da experiência. O argumento
decisivo é a existência do problema do infinito que não tem, nem pode ter, qualquer apoio na realidade da
experiência.” (BECKER, Oscar. O Pensamento matemático. Tradução de Helmuth Alfredo Simon. São
Paulo: Editora Herder, 1965, p.82.).
4
“O conceito de infinito, como ele aqui se expôs abstratamente mostrar-se-á estar no fundamento do
infinito matemático.” (HEGEL, op.cit., 2016, p.262.).
considerar o que seria o verdadeiro em si, mas o que seria o verdadeiro no
seu campo. (HEGEL, 2016, loc. cit.).

Hegel afirma que o infinito apresentado em uma fração numérica, obviamente


ele expõe o exemplo de uma dízima periódica5, é um conceito imperfeito do infinito,
porque os números que representam o numerador e o denominador estabelecem entre si
uma relação de quantidades que são indiferentes, que não tem nenhuma relação entre si,
isto é, a relação entre ambas as quantidades é somente exterior a elas.

A apresentação que tem a infinitude em uma fração de números é, todavia,


ainda imperfeita, porque ambos os lados da fração, 2 e 7, podem ser tomados
da relação e são quanta diferentes ordinários; a relação dos mesmos, de ser
na relação e de ser momentos, é para eles algo externo e indiferente.
(HEGEL, 2016, p.263).

Por outro lado, Hegel considera que o infinito apresentado numa fração
algébrica, a qual denomina de aritmética geral, é uma representação mais correta do
infinito, pois as letras que representam o numerador e o denominador da fração são
quantidades indeterminadas, não tem nenhum valor particular. Essas letras representam
ao mesmo tempo grandezas indeterminadas e quantidades finitas. Portanto, neste caso
numerador e denominador estabelecem uma relação de quantidades que não são
indiferentes entre si.

As letras, com as quais se opera na aritmética geral, a universalidade mais


próxima, na qual os números são elevados, não têm a propriedade de ser
providos um valor determinado de números; elas são apenas signos
universais e possibilidades indeterminadas de cada valor determinado. A
fração a / b parece, portanto, ser uma expressão mais adequada do infinito,
por que a e b, tomados da sua relação um com o outro, permanecem
indeterminados e também separados, não têm nenhum valor peculiar
particular. (HEGEL, 2016, loc. cit.).

Hegel explica que tanta a fração (geratriz de uma dízima peródica), quanto a
fração da soma (infinita de potências múltiplas de uma variável) representam uma série
infinita que tem a mesma espécie de infinitude do progresso infinito, ou seja, é uma má
representação da infinitude. Pois, no valor numérico expresso na série sempre falta algo,
de tal modo que é preciso ir além do valor que foi posto; e este nunca é suprassumido na
lei da progressão.

5
Hegel apresenta a fração 2 como exemplo de infinito em uma fração. Trata-se de uma dizima periódica.
7
A fração 2/7 pode ser expressa como 0, 285714..., 1/(1 – a) como1 + a + a2 +
a3 etc. Assim, ela é como uma série infinita; a própria fração significa a soma
ou a expressão finita da mesma. (...) De qual espécie agora é a infinitude da
série, fica claro por si mesmo; é a má infinitude do progresso. (...) Sempre
falta algo, de modo que é preciso sempre ir além daquilo o que está posto, a
fim de alcançar a determinidade exigida. A lei da progressão é bem
conhecida; ela está na determinação do quantum que está contida na fração e
na natureza da forma. (...) O valor numérico pode bem ser tornado, pelo
prosseguimento da série, tão exato quanto se necessita; mas a apresentação
por ela sempre permanece um dever ser, ela está afetada por um além que
não pode ser suprassumido, porque expressar, como valor numérico, algo em
repouso na determinidade qualitativa é a contradição permanente. (HEGEL,
2016, p.264).

Na sequência infinita encontra-se a inexatidão que no verdadeiro infinito


matemático apresenta-se apenas como aparência; e como já foi dito a série infinita
expressa a má infinitude.

Nesta série infinita [séries adicionáveis] está presente, de modo efetivo,


aquela inexatidão, da qual, no verdadeiro infinito matemático, ocorre apenas
a aparência. (...) A série infinita contém, de fato a má infinitude, porque
aquilo o que a série deve expressar permanece um deve ser, e o que ela
expressa está afetado por um além que não desaparece e é diverso daquilo o
que deve ser expresso. (HEGEL, 2016, p.265).

É interessante observar que Hegel parece ter intuído uma distinção entre
infinitos, pois ao fazer a observação de que existem séries infinitas que não são
adicionáveis, ele afirma que estas contêm um tipo diferente de infinito, o qual
caracteriza como sendo um tipo mais elevado de infinito do que o infinito encontrado
nas séries infinitas que são adicionáveis. Ou seja, Hegel explica que essas séries
infinitas contem um infinito incomensurável, isto é, que é impossível representar essas
séries com um quantum, porém elas têm a mesma má infinitude das séries infinitas que
são adicionáveis.6

Pode ser observado que há séries infinitas que não são adicionáveis; com
relação à forma de séries em geral, isso é uma circunstância externa e
contingente. Elas contêm uma espécie mais alta da infinitude do que as
adicionáveis, a saber, uma incomensurabilidade ou a impossibilidade de

6
Nestas assertivas de Hegel encontra-se certamente, quando fala sobre a grandeza incomensurável, os
números irracionais, que diferente da dízima periódica não pode ser representado na forma de fração.
Pode-se observar que a distinção entre infinitos que Hegel se refere não é acerca da grandeza, pois um
não pode ser representado por um quantum. A distinção diz respeito a qualidade do infinito, isto é, um
tipo pode ser representado por um quantum e outro tipo não.
apresentar a relação quantitativa contida nelas como um quantum, seja ela
também como fração; mas a forma da série como a que elas têm contém a
mesma determinação da má infinitude, que está na série adicionável.
(HEGEL, 2016, p.266).

Hegel considera que o filósofo Spinoza apresentou uma concepção correta de


infinitude, diferenciando-a da forma incorreta por meio de exemplos. O exemplo dado
por Spinoza que Hegel atesta como correto para esclarecer o infinito verdadeiro é o do
espaço que fica entre dois círculos desiguais. Segundo Hegel, Spinoza rejeita a
representação do infinito como quantidade ou como série.

Destaca-se que Spinoza expõe o conceito de infinitude verdadeira contra o da


má e o esclarece através de exemplos. (...) O exemplo matemático, com o
qual ele esclarece o infinito verdadeiro (Epist. XII) é um espaço entre dois
círculos desiguais, dos quais um cai dentro do outro sem tocá-lo e eles não
são concêntricos. (...) Vê-se que Spinoza rejeita aquela representação do
infinito, segundo a qual ele é representado como quantia ou como série que
não está consumada e recorda que, aqui, no espaço do exemplo, o infinito não
é além, mas está presente e completo; este espaço é algo limitado, mas
infinito. (HEGEL, 2016, p.266-267).

Segundo Hegel, a incomensurabilidade que se encontra nesse exemplo dado por


Spinoza encerra em si as funções das linhas curvas e diz respeito ao infinito que a
matemática introduziu nas funções das grandezas variáveis, e que é o verdadeiro infinito
matemático no qual Spinoza também refletiu.

A incomensurabilidade que está no exemplo de Spinoza encerra em si, em


geral, as funções das linhas curvas e conduz, mais precisamente, ao infinito,
que a matemática introduziu em tais funções, em geral, nas funções das
grandezas variáveis, e que é o verdadeiro infinito matemático, quantitativo,
no qual Spinoza também pensou. (HEGEL, 2016, p.268).

O ramo da matemática que lida com esse tipo de funções para achar tangente
para uma curva e encontrar áreas é o cálculo.7 Hegel explica que a variabilidade dessas

7
“O cálculo é a matemática das taxas de variação instantâneas. (...) O cálculo diferencial fornece métodos
para calcular taxas de variação e possui muitas aplicações geométricas, em especial para achar tangentes
para curvas. O cálculo integral faz o contrário: dada uma taxa de variação de alguma grandeza, ele
especifica a grandeza em si. As aplicações geométricas do cálculo integral incluem o cálculo de áreas e
volumes. Talvez a descoberta mais significativa seja a ligação inesperada entre essas duas questões
geométricas clássicas aparentemente não relacionadas: achar a tangente para uma curva e achar áreas. O
cálculo lida com funções: procedimentos que pegam um número genérico e calculam outro número a ele
associado. O procedimento é geralmente especificado por uma fórmula, atribuindo a um número dado x
(possivelmente dentro de um domínio específico) um número associado f(x). (STEWART. Ian. Em busca
do infinito: uma história da matemática dos primeiros números à teoria do caos. Tradução: George
Schlesinger. Rio de Janeiro: Editora Zahar, 1979, p.101).
funções é diferente da variabilidade da fração geratriz, pois nesta pode-se variar os
números do numerador e denominador sem variar o valor do quociente da fração. Isto se
altera na função y2/x = p; pois nesta x e y não tem um quociente determinado, logo a
relação destes não é um quantum e nem um quociente fixo.
No que, em primeiro lugar, diz respeito à categoria da variabilidade, a qual
tanta importância se atribui, sob a qual são apreendidas as grandezas
relacionadas naquelas funções, elas não devem ser inicialmente variáveis no
sentido no qual, na fração 2/7, ambos os números 2 e 7 são [variáveis], na
medida em que (...) outros números podem ser postos no lugar deles sem
variar o valor posto na fração. Assim, ainda mais em a/b, pode ser posto no
lugar de a e b todo e qualquer número, sem variar aquilo o que a/b deve
expressar. (...) Isso essencialmente se altera, por exemplo na função y2/x = p;
aqui x e y têm, com efeito o sentido de poder ser quanta determinados; mas
apenas x e y2 têm quociente determinado, porém não x e y. Através disso,
esses lados da relação, x e y, são, em primeiro lugar, não somente quantum
nenhum determinado, mas, em segundo lugar, sua relação não é um quantum
fixo (...) nem um quociente fixo, mas ele é como quantum, pura e
simplesmente variável. (HEGEL, 2016, p.269).

Hegel explica que a relação de uma grandeza com a potência não é um quantum,
mas é essencialmente uma relação qualitativa. Ou seja, para Hegel, dessa relação das
potências emerge uma função que indica uma dimensão qualitativa do infinito no
cálculo diferencial. Hegel observa que esse conceito não foi reconhecido devido a
representação incorreta dos próprios matemáticos sobre o conceito de infinito; pois, as
operações cálculo diferencial e integral são apresentadas como inteiramente
contraditórias.
A relação de uma grandeza com a potência não é um quantum, mas
essencialmente relação qualitativa. (...) Mas há ainda um estágio ulterior, no
qual emerge o infinito matemático na sua peculiaridade. Em uma equação em
que x e y estão postos inicialmente como determinados pela relação das
potências, x e y como tais devem significar quanta; agora, esse significado se
perde completamente nas assim chamadas diferenças infinitamente pequenas;
dx e dy não são mais quanta. (...) Eles não são mais algo, algo tomado como
quantum. (...) Nesse conceito de infinito, o quantum está verdadeira e
plenamente realizado com relação a um ser aí qualitativo; ele está posto como
efetivamente infinito. (...) Contra este conceito, está direcionado todo o
ataque que foi feito à determinação fundamental da matemática desse
infinito, do cálculo diferencial e integral. Representações incorretas dos
próprios matemáticos ocasionaram o fato do conceito não ter sido reconhe
cido. (...) Mas aqui a matemática não pode (...) contornar o conceito; pois
como matemática do infinito, ela não se restringe à determinidade finita de
seus objetos – assim como, na matemática pura, o espaço e o número e suas
determinações são considerados e relacionados um com o outro apenas
conforme a sua finitude –, mas ela transfere uma determinação assumida da
matemática pura e tratada por ela para [uma] identidade com sua
[determinação] contraposta, assim como, por exemplo, ela torna uma linha
curva uma reta; o círculo, um polígono etc. As operações que ela se permite
como cálculo diferencial e integral, são, portanto, contraditórias à natureza de
determinações meramente finitas e ás suas relações e teriam sua justificação,
por isso, unicamente no conceito. (HEGEL, 2016, p.270-271).
A definição tradicional de infinito

O conceito de infinito foi introduzido na matemática grega como processos


convergentes ilimitados; é assim que ele se encontra nos paradoxos de Zenão.8

O paradoxo da dicotomia tem esse caráter, o dilema consiste em considerar que


antes que certo móvel consiga atingir o final de um trajeto, ele necessariamente terá que
percorrer sempre a metade dos caminhos no seu movimento numa série infinita
convergente que, por um lado, cresce infinitamente por partes que são menores que a
anterior, mas, que, por outro lado, a série não atinge o infinito, pois a soma das partes
sempre permanece menor do que o total da distância da trajetória.9

A contradição está no fato de algo aumentar continuamente, porém sem


conseguir atingir o seu limite. O fundamento desta suposição repousa na concepção
puramente quantitativa segundo a qual quando algo aumenta necessariamente atingirá o
seu termo.10

Considera-se que Zenão teria sido o primeiro pensador dialético, pois seus
paradoxos seriam uma oposição ao pensamento linear, pois, diferente do senso comum
ele considerou as séries convergentes infinitas.11

Uma interpretação tradicional na filosofia indica que Zenão apresentou seus


paradoxos para demonstrar que o movimento é impossível e assim defender a tese de
seu mestre Parmênides que afirmava a existência de uma única realidade.12 Porém,
existe a consideração de que na verdade Zenão argumentou contra a ideia de que tanto o

8
“Nesta questão é de grande interesse seguir os caminhos pelos quais o conceito de infinito foi
introduzido na ciência matemática dos gregos primitivos. (...) O infinito primeiramente surgiu sob a
forma de processos convergentes ilimitados. O primeiro testemunho literário disto temos em Zenão de
Eléia, discípulo de Parmênides.“(BECKER, op.cit, 1965, p.84.).
9
“O mais simples de seus argumentos é a assim chamada dicotomia: um segmento AB é dividido pela
metade em C e a parte direita CB é novamente dividida em C’, C’B em C” e assim por diante
ilimitadamente. Portanto: AC + CC’ + C’C” +... in infinitum = AB. Por um lado a série (...) cresce
ilimitadamente por partes que sempre são menores que a imediatamente anterior. (...) Mas, por outro lado,
a série não cresce até ao infinito, pois a sua soma sempre permanece menor que 1, por mais que se
continue.”(Ibid., loc.cit.).
10
“Mas, para o pensamento ingênuo da Antiguidade, considerações quantitativas tão subtis não contavam;
insiste-se no conceito puramente quantitativo segundo o qual quando alguma coisa sempre aumenta,
acabará por ultrapassar todos os limites. A possibilidade contrária, demonstrada pela dicotomia num
exemplo concreto aparece então como paradoxo.” (Ibid., p.86.).
11
“Hegel chamou Zenão de primeiro dialético na história da filosofia, e como tal sempre foi tido. (...) Mas
tal designação exprime algo de fundamental; caracteriza a oposição ao pensamento simples e retilíneo. De
fato Zenão supera o ponto de vista ingênuo na consideração da série convergente infinita não se
contentando em constatá-la, neste sentido é ele um “dialético”. (Ibid., loc.cit.).
12
“Aristóteles diz que Zenão propôs o paradoxo de ‘Aquiles e a Tartaruga’ e um outro chamado ‘A
dicotomia’ no intuito de mostrar que o movimento era impossível.” (MORRIS, op. cit, 1998, p.23.).
espaço quanto o tempo não podem ser infinitamente divisíveis.13 Este debate remete ao
problema do contínuo que surge a partir da questão da incomensurabilidade. Ou seja, a
oposição entre número e extensão contínua; a discussão consistia em dizer que,
enquanto esta última pode ser dividida infinitamente, o primeiro não pode.14 Em suma,
se há uma divisibilidade finita do espaço então não existe incomensurabilidade.15

O filósofo Aristóteles retomou essa questão do infinito e fez uma diferença entre
infinito real e infinito potencial. O primeiro, como o próprio nome indica, diz respeito
ao infinito concreto que se efetivaria na natureza; enquanto o segundo é apenas uma
representação que não tem realidade física.16

Feito esta distinção, Aristóteles considera que só se pode falar em infinito


potencial, pois o infinito não pode ser estabelecido na experiência. Portanto, nesta
consideração, o espaço é concebido como finito e o infinito matemático é reconhecido
como infinito em potência.17

As teorias do infinito e do contínuo de Aristóteles exerceram grande influência


nos problemas dos fundamentos da matemática.18

Aristóteles defende que um segmento não é composto de pontos ou partes


indivisíveis, porém de um número infinito de pontos em potência que são atualizados
em processos de operações matemáticas.19

Em suma, as considerações aristotélicas sobre o infinito rejeitam o infinitamente


grande, pois o universo é concebido como sendo finito, logo nada há fora dele. Mas,

13
“Alguns filósofos pensam que Zenão estava rebatendo a ideia de que espaço e tempo eram infinitamente
divisíveis, que seu objetivo era descrever uma situação absurda em que Aquiles tem de transpor uma série
de distâncias que ficam progressivamente mais curtas era mostrar que o espaço não podia ser dividido
dessa maneira.” (Ibid., loc.cit).
14
“De tais considerações [da incomensurabilidade de figuras geométricas] proveio a oposição entre
número (arithmos) e extensão contínua (megethos). Esta pode ser dividida pelo meio até o infinito
(dicotomia), mas não aquele.” (Ibid., p.93.).
15
“Do ponto de vista lógico a situação é a seguinte: se existe somente uma divisibilidade finita das
grandezas (extensões no espaço e no tempo), então não existe incomensurabilidade; de fato, neste caso
existe uma medida mínima para tudo.” (Ibid., loc.cit).
16
“Foi Aristóteles (384-322 a. C) quem pôs o problema do infinito em termos modernos. Estabeleceu a
distinção fundamental entre infinito real (em ação) e infinito potencial (em potência). (...) Aristóteles nega
a existência do infinito em ação. Para ele, o infinito é aquilo que não se pode percorrer, portanto só existe
em potência.” (LUMINET, J-P. LACHIÈRE-REY, M. A física e o infinito. Tradução de Fernando
Tomás. Lisboa: Instituo Piaget, 1994, p.17.).
17
“Particularmente, o espaço é finito e nada há no exterior da última esfera celeste. No entanto, Aristóteles
reconhece ao infinito uma necessidade matemática: pode ser preciso a ele recorrer nas demonstrações.
Assim para uma grandeza qualquer, há três maneiras de ser infinita (em potência).” (Ibid., loc.cit).
18
BECKER, op.cit, 1965, p.98.
19
Ibid., loc.cit.
admite o infinitamente pequeno, fundado na divisibilidade finita da matéria como sendo
potencial e não real.20

O debate sobre essa dificuldade no conceito de infinito ressurgiu com todo vigor
a partir da invenção do Cálculo diferencial, área da matemática onde quantidades
‘infinitamente’ grandes ou pequenas são usadas para avaliar limites.21

Especialistas da matemática consideram que o infinito real não existe, o que há é


um infinito potencial, isto é, a possibilidade de considerar quantidades grandes ou
pequenas. Isto significa que o infinito é apenas uma abstração, uma mera figura de
linguagem.22

A definição de infinito na matemática clássica está associada a lei de indução


matemática. Isto é, os números finitos são definidos como números que obedecem a lei
de indução matemática.23 O problema do infinito surge quando se procura considerar os
conjuntos que não tem um número indutivo de termos, a questão é verificar se esses
conjuntos têm ou não um número. Considera-se que este problema foi resolvido pelo
matemático alemão G. Cantor. 24

Na matemática o que dificultou uma concepção clara de número infinito foi o


fato de se considerar que as propriedades indutivas eram comuns a todos os números e
que se fossem negadas conduziriam a uma contradição.25

Foi a partir deste reconhecimento que ocorreu a compreensão do conceito de


número infinito, concebendo que a diferença fundamental entre o número indutivo e o
número infinito é que este último não possui as propriedades indutivas.26

20
“A cosmologia de Aristóteles responde, pois aos problemas do infinitamente grande e do infinitamente
pequeno. O infinitamente grande é de excluir, visto que o Mundo é finito e nada pode existir fora do
Mundo. O infinitamente pequeno é, pelo contrário, admissível, mas a divisibilidade infinita da matéria é
potencial e não real.” (Ibid., p.18).
21
“Muitas discussões sobre o infinito voltaram a acontecer após a invenção dos Cálculos [diferencial e
integral], quando quantidades ‘infinitamente’ grandes ou pequenas eram usadas para avaliar limites.”
(GARBI, Gilberto. A rainha das ciências: um passeio histórico pelo maravilhoso mundo da matemática.
2ªed. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2007, p.387.).
22
“Notáveis matemáticos afirmavam que o infinito real é algo que não existe, havendo apenas um infinito
potencial, ou seja, a possibilidade de se fazer com que certas quantidades sejam tão grandes quanto
desejarmos. Em 1831, Gauss escreveu: o infinito é apenas uma figura de linguagem.” (Ibid. loc.cit).
23
RUSSEL, Bertrand. Introdução à filosofia matemática. Tradução de Giasone Rebuá. 4ª ed. Rio de
Janeiro: Zahar Editores, 1981, p.79.
24
Ibid., loc.cit.
25
Ibid., p.80.
26
Ibid., p.81.
O conceito de infinito na matemática contemporânea

Acerca da concepção de infinito real a filosofia da matemática


observa que existem três posições sobre o tema. A primeira é a concepção
finitista que nega a existência do infinito real, a segunda é a posição
transfinita que defende que o infinito tem a mesma realidade do finito; e a
terceira consideração é designada de transfinitismo metodológico que
admite o infinito, porém, considerando que neste não existe um caráter
ontológico.27
O conceito de número transfinito foi apresentado no século XIX por
Georg Cantor e a principal discussão que o envolve diz respeito à existência
do infinito real.28 Como já exposto, para os matemáticos tradicionais o
infinito só existe potencialmente, isto é, como uma série infinita.29
Contrariando esse conceito tradicional os matemáticos da escola de Cantor
consideram o infinito realizado.30
Cantor descobriu, analisando séries infinitas de números, que
existem equivalências entre conjuntos e subconjuntos infinitos, o que é
paradoxal.31 Em sua análise do infinito, Cantor verifica, por exemplo, que

27
“Com relação ao emprego do conceito de infinito real, tem-se adotado três posturas filosóficas;
podemos chamá-las respectivamente de finitismo, transfinitismo e transfinitismo metodológico. Finitistas
como Aristóteles, Gauss e os antigos e novos intuicionistas negam todo conteúdo real ou mesmo
inteligibilidade a tais noções matemáticas que não são características de agregados finitos ou, quando
muito, de agregados potencialmente infinitos, ou seja, agregados progressivos, mas jamais completados
(os finitistas que não admitem sequer a concepção de agregados potencialmente infinitos poderiam ser
chamados de finitistas estritos). Transfinitistas como Cantor e seus seguidores atribuem aos conceitos
transfinitos a mesma realidade e inteligibilidade dos finitos. Transfinitistas metodológicos,
particularmente Hilbert, admitem conceitos transfinitos em teorias matemáticas sem atribuir-lhes status
ontológico.” (KÖRNER, Stephan. Introdução à filosofia da matemática. Tradução de Alberto Oliva.
Rio de Janeiro: Zahar Editor, 1985, p.113.)
28
“Infinito potencial e infinito atual. – A concepção dos números transfinitos, apresentada por G. Cantor
em 1883 provocou desde o seu aparecimento numerosas controvérsias. (...) A questão central, nas
discussões sobre o transfinito, é a da existência ou não-existência do infinito atual.” (COSTA, Manuel
Amoroso. As ideias fundamentais da matemática e outros ensaios. São Paulo: Editora da USP, 1971,
p.250.).
29
“Para muitos matemáticos, só se pode conceber o infinito como essencialmente potencial e inatingível;
um conjunto infinito não nos é dado presentemente com todos os seus elementos; o que nos nossos
raciocínios define um tal conjunto é a possibilidade de obtermos sucessivamente quantos quisermos seus
elementos.”( Ibid., loc.cit.).
30
“Os matemáticos da escola cantoriana aceitam, ao contrário, além desse infinito potencial, o infinito
atual ou realizado.” (Ibid., loc.cit.).
31
“Uma das primeiras descobertas de Cantor em sua análise do infinito foi de que o conjunto dos números
racionais (que contém o conjunto infinito de inteiros como um subconjunto e é, portanto ele mesmo
infinito) é equivalente ao conjunto dos inteiros.” (COURANT, Richard. ROBBINS, Herbert. O que é
existem conjuntos numéricos infinitos que tem partes que também são
infinitas, porém, que são partes equivalentes ao todo. Este aspecto dos
conjuntos infinitos é chamado de enumerável.32 Porém, Cantor verifica que
nem todo conjunto numérico é enumerável, fazendo cair por terra a suspeita
de que a enumerabilidade fosse o resultado fundamental da análise do
infinito. Ou seja, Cantor descobriu que existe um tipo de infinito
radicalmente diferente daquele que se constata nos conjuntos enumeráveis.33
Analisando o conjunto dos números reais, Cantor constatou que o
infinito presente nessa totalidade é mais elevado do que o daqueles, sendo
por esta razão designado de não enumerável. Portanto, tem-se um infinito
superior contrapondo um infinito inferior.
Kronecker foi contemporâneo de Cantor e se opunha ferrenhamente
a teoria dos números reais que este matemático adotou de outros
matemáticos; pois, argumentava que a teoria sobre esses números
patenteava a ideia da existência do infinito atual.34 Para Kronecker, o
conjunto dos números 0, 1, 2, 3,..., é infinito; mas não deve ser concebido
como algo realizado. Ou seja, não é possível obter todos os números dessa
série. O infinito como algo acabado ou realizado não existe, só há o infinito
potencial, somente os conjuntos de objetos finitos podem ser encarados
como inteiramente dados.
Por essa razão a tese finitista de Kronecker, inviabiliza a existência
dos números reais; ele considera que em matemática tudo é construção

matemática? Uma abordagem elementar de métodos e conceitos. Tradução de Adalberto da Silva Brito.
Rio de Janeiro, Editora Ciência moderna, 2000, p. 91.)
32
“À primeira vista parece muito estranho que o conjunto denso dos números racionais deva estar no
mesmo pé de igualdade que seu subconjunto dos inteiros, esparsamente espalhados. (...) Porém, como
observou Cantor, desconsiderando-se a relação de ordem entre elementos sucessivos, é possível dispor
todos os números racionais sucessivamente, r1,r2,r3,r4..., como os inteiros. (...) Esta disposição de um
conjunto de objetos em uma sequência como a dos inteiros é chamada de denumeração (ou enumeração)
do conjunto. (Ibid., loc.cit.).
33
“Uma vez que se demonstrou que os números racionais são enumeráveis, pode-se suspeitar que
qualquer conjunto infinito seja enumerável, e que seria o resultado fundamental da análise do infinito. Isto
não é de forma alguma verdadeiro. Cantor fez a significativa descoberta de que o conjunto de todos os
números reais, racionais e irracionais, não é enumerável. Em outras palavras, a totalidade dos números
reais apresenta um tipo de infinidade radicalmente diferente e, por assim dizer, mais elevado, do que o
dos inteiros ou dos números racionais isoladamente.” (Ibid., p.93).
34
“Convém lembrar a posição assumida por Kronecker, contemporâneo de Weierstrass e de Cantor, mas
que a eles se opunha ferrenhamente. Kronecker admitia que, em tese, a aritmetização da análise,
reduzindo-se tudo a números naturais, era correta. Porém, não aceitava as teorias de Weierstrass e de
Dedekind a respeito dos números reais, frisando que essas teorias implicavam a existência de conjuntos
infinitos como entidades realizadas, ou seja, do infinito atual, dado.” (COSTA, Newton. Introdução aos
fundamentos da matemática. 3ª Ed. São Paulo: Hucitec, 1992, p.33.).
humana a partir da intuição, posição que por outro lado também
descredencia a lógica formal como fundamento da matemática. Kronecker
como finitista condenou a teoria cantoriana do infinito lançando-lhe a pecha
de tese teológica.35
Cantor foi excluído academicamente, porém sua teoria penetrou em
quase todos os ramos da matemática e a controvérsia no século XX sobre os
fundamentos da matemática é essencialmente uma continuação do debate
entre a sua defesa em prol do infinito real contra o finitismo defendido pelos
matemáticos intuicionistas.36 A teoria de Cantor, além desse papel
fundamental no estudo dos fundamentos da matemática é importante porque
se constitui num elo entre a matemática e a filosofia.37
A teoria dos números transfinitos elaborado por Cantor foi divulgada
em revistas de matemática alemãs. Cantor rompe com a concepção
tradicional na matemática que postulava a existência de apenas um infinito e
que era usado sem critério em qualquer tipo de conjunto numérico; com sua
teoria ele introduz uma nova visão em que postula uma hierarquia para o
infinito.
Cantor partindo do conceito de equivalência afirma que se duas
totalidades são equipotentes então têm o mesmo número cardinal que no
caso de conjuntos infinitos recebe a denominação de número transfinito e a
letra alef38 para representá-lo.
Em suma, para Cantor, um conjunto é enumerável se seus elementos
podem ser escritos como uma sequência infinita.

35
“Quando Cantor começou a desenvolver a teoria dos conjuntos, Kronecker atacou-o violentamente,
sustentando que certas concepções de Cantor constituíam teologia, misticismo, ou o que se queira, menos
matemática.”( Ibid., p.34.).
36
“Seus pontos de vista encontraram oposição considerável, principalmente da parte de Leopold
Kronecker, que resolutamente se opôs aos esforços de Cantor no sentido de conseguir um lugar de
professor na Universidade de Berlim, onde Kronecker lecionava. Hoje a teoria dos conjuntos de Cantor
penetrou quase todos os ramos da matemática (...). A controvérsia do século XX entre formalistas,
liderados por Hilbert, e os intuicionistas, liderados por Brouwer, essencialmente é uma continuação da
controvérsia entre Cantor e Kronecker.” (EVES, Howard. Introdução à história da matemática.
Tradução de Higyno H Domingues. Campinas-SP: Editora da Unicamp, 2004, p.615.).
37
“Acima disso, há a enorme importância que a teoria assumiu em praticamente todo o corpo da
matemática. Ela enriqueceu, tornou mais claros e generalizou muitos domínios da matemática, e seu
papel no estudo dos fundamentos da matemática é essencial. E constitui também um dos elos de ligação
entre a matemática, de um lado, e a filosofia e a lógica, de um outro.” ( Ibid., p.662.).
38
‫ – א‬letra alef do alfabeto hebraico.
Considerações finais
O debate sobre o infinito matemático tem como substrato a questão
da existência em matemática.39 Para os defensores do infinito real pode-se
demonstrar a existência de entes matemáticos idealmente, isto é, de maneira
não-construtiva. Enquanto, os que defendem o infinito somente de forma
potencial explicam que esses entes não podem ser conhecidos de antemão,
pois eles são construídos.40 O que Cantor postula em sua teoria do infinito
matemático é um número transcendente que de fato é apresentado como
grandeza. Pois, o objetivo de Cantor com a equivalência de totalidades é
comparar conjuntos mesmo no caso deles serem infinitos. Por exemplo, dois
conjuntos infinitos são considerados de mesma grandeza se for possível
correlacionar seus elementos. Caso não se estabeleça esa equivalência um
dos conjuntos infinitos é maior do que o outro. É exatamente o que Cantor
apresenta com o conjunto dos números reais quando demonstra que este não
é enumerável; é estabelecida uma série (infinita), há um transfinito
enumerável e um transfinito não enumerável. De fato, existem nessa
concepção dois tipos de infinitos, porém, Cantor é categórico em afirmar a
hierarquia dos infinitos do tipo não enumeráveis.41 Cantor não consegui
provar a existência de um transfinito entre ‫א‬0 e ‫א‬1, apenas conjecturou que
não existe nenhum transfinito entre eles, o que é conhecido na matemática
de hipótese do contínuo.
Portanto, Cantor tenta dar uma definição construtiva do contínuo,
isto é, do quantum contínuo, quando já demonstrara que isto não é possível,

39
“No fundo dessas disputas, encontra-se o problema da existência em matemática: mediante o axioma da
escolha, prova-se a existência de certos entes, sem, no entanto, termos meios de efetivamente poder
construí-los; ora tais entidades, idealmente definidas pelo axioma de Zarmelo, não são aceitas pelos
matemáticos de tendências similares às de Kronecker.” (COSTA, op.cit., 1992, p.35.).
40
“Nem todos os matemáticos se inclinam a aceitar a demonstração dada para o Teorema 4 [Existem
números transcendentes]. A aceitação ou não da demonstração depende do que se entende por existência
em matemática. Ocorre que há matemáticos para os quais só se estabelece a existência matemática
quando efetivamente se constrói e exibe um dos objetos cuja existência está em questão. E a
demonstração anterior não estabelece a existência de números transcendentes, produzindo um exemplo
específico de um desses números.” (EVES, op.cit., 2004, p.665.).
41
“Comprovada a existência dos dois transfinitos ‫א‬o e ‫א‬1 , Cantor perguntou-se se haveria algum
transfinito entre ambos ou outros além de ‫א‬1. (....) Mas tarde, com raciocínios bastante engenhosos, ele
conseguiu provar a existência de uma hierarquia sem fim de outros transfinitos além de ‫א‬1, a que ele
denominou ‫א‬2, ‫א‬3, ‫א‬4, ‫א‬5,..., etc.” (GARBI, op.cit., 2007, p.392.).
isto ocorre, porque há nesta tentativa o mesmo equivoco de conceber o
infinito matemático como grandeza.42

“É bastante curioso que Georg Cantor, que demonstrou com uma tal força e uma tal precisão a
42

impossibilidade de definir o infinito e de construí-lo a partir de elementos mais simples, tenha acreditado,
entretanto, poder dar uma definição construtiva do contínuo, ou melhor do quantum contínuo. (...) Essa
definição pode ser considerada como uma descrição ou uma análise do sentido do termo ‘grandeza
contínua’, mas não como uma definição construtiva.” (KOYRÈ, Alexandre. Estudos de história do
pensamento filosófico. Tradução Maria de Lourdes Menezes. Rio de janeiro: Forense Universitária,
1991, p.17.).
REFERÊNCIAS
ARISTOTELES. El infinito. In. ARISTOTELES. Física. Traducción de Guillermo R.
de Echandía, Editorial Gredos S.A., 1995, p.88.

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São Paulo: Editora Herder, 1965.

COSTA, Manuel Amoroso. As ideias fundamentais da matemática e outros ensaios.


São Paulo: Editora da USP, 1971.

COSTA, Newton. Introdução aos fundamentos da matemática. 3ª Ed. São Paulo:


Hucitec, 1992.

COURANT, Richard. ROBBINS, Herbert. O que é matemática? Uma abordagem


elementar de métodos e conceitos. Tradução de Adalberto da Silva Brito. Rio de
Janeiro, Editora Ciência moderna, 2000.

EVES, Howard. Introdução à história da matemática. Tradução de Higyno H


Domingues. Campinas-SP: Editora da Unicamp, 2004.

GARBI, Gilberto. A rainha das ciências: um passeio histórico pelo maravilhoso


mundo da matemática. 2ªed. São Paulo: Editora Livraria da Física, 2007.

GÖDEL, Kurt. O que é o problema do contínuo de Cantor? In. GÖDEL, Kurt. O


teorema de Gödel e a hipótese do contínuo. Tradução de Manuel Lourenço. Lisboa:
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HEGEL, G.W.F. Ciência da lógica: doutrina do ser. Tradução de Christian Iber,


Marloren Miranda e Frederico Orsini. Petrópolis, RJ: Vozes, 2016.

KÖRNER, Stephan. Introdução à filosofia da matemática. Tradução de Alberto


Oliva. Rio de Janeiro: Zahar Editor, 1985.

KOYRÈ, Alexandre. Estudos de história do pensamento filosófico. Tradução Maria


de Lourdes Menezes. Rio de janeiro: Forense Universitária, 1991.

LUMINET, J-P. LACHIÈRE-REY, M. A física e o infinito. Tradução de Fernando


Tomás. Lisboa: Instituo Piaget, 1994.

MORRIS, Richard. Uma breve história do infinito: dos paradoxos de Zenão ao


universo quântico. Tradução Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro: Jorge Zahar
Editor, 1998.

RUSSEL, Bertrand. Introdução à filosofia matemática. Tradução de Giasone Rebuá.


4ª ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1981.

STEWART. Ian. Em busca do infinito: uma história da matemática dos primeiros


números à teoria do caos. Tradução: George Schlesinger. Rio de Janeiro: Editora Zahar,
1979.

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