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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora

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20 de Setembro de 2019

Teoria da Regulação e Agência Reguladora

1. Teoria da Regulação
A regulação econômica por parte do Estado é vista basicamente como
forma de estabelecer regras, ou até mesmo de direcionar o campo de
desenvolvimento da atividade econômica. Para uma maior e mais
preciosa compreensão do tema é interessante realizar uma descrição
das duas principais escolas regulatórias: a americana e a francesa.

A escola de regulação econômica americana atualmente analisada pelo


Direito, como instrumento de controle da economia, não guarda
qualquer relação com a Escola de Regulação Francesa.

O contexto histórico em que as duas teorias se desenvolvem é situado


entre as décadas de 70 e 80 do século passado, entre o fim da Guerra
Fria e o inicio da Globalização. Como sabemos desde o Ensino Médio,
os Estados Unidos da América surgiram como a grande potência
mundial e o capitalismo como o grande vencedor frente ao socialismo
estatal difundido pela União das Repúblicas Socialistas Soviéticas.

Desde o final da Segunda Guerra Mundial, o modelo econômico mais


amplamente adotado pelos Estados em geral era baseado no fordismo.
Por mais que as inovações de Henry Ford nos campos da produção
industrial, planejamento econômico, marketing e administração de
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empresas, todas, datassem dos idos de 1900, quando lançou seu
primeiro automóvel, o Ford Modelo T, que marcou uma imensa
transformação no modo de produção capitalista, principalmente em
relação aos bens de consumo duráveis, que estavam longe do alcance
da população em geral. Henry Ford mudou essa história, trazendo o
automóvel para as massas e fazendo com que o empregado pudesse
comprar aquilo que ajudou a produzir.

O termo “fordismo” foi cunhado por Antonio Gramsci (GRAMSCI,


1980, p. 285-322), em 1922, cerca de 10 anos após a implementação de
todas as referidas inovações no sistema de produção e distribuição de
riquezas capitalista, perpetradas por Henry Ford. Gramsci define o
termo por ele mesmo criado ao descrever um sistema de acumulação
de riqueza surgido nos Estado Unidos, caracterizado por um modelo de
massificação da produção, que demandava um consumo também em
massa, combinado com um método taylorista de organização da
atividade laborativa, descrito como uma forma de qualificação do
trabalho estritamente técnico, onde o empregado realizava tarefas
repetitivas e simples, sem desperdício de energia ou tempo, alienando-
se cada vez mais do processo produtivo e desenvolvendo uma certa
cultura industrial.

O sistema de produção e distribuição de bens de consumo e valores


descrito por Gramsci se caracterizou por um modo de acumulação
intenso, apoiado no consumo de massa, que estaria sincronizado com
os ganhos de produtividade, que por sua vez influenciariam a fixação
dos salários e a obtenção dos lucros nominais. De uma forma mais
simples, o empregador pagaria bem os seus funcionários para que estes
pudessem comprar os produtos de sua fábrica e aquecer o mercado, o
que levaria a um aumento na produção e no emprego. Ocorre que todo
esse ciclo de vantagens enfrentava a barreira do lucro; a partir do
momento em que o salário pago aos funcionários diminuísse
excessivamente os lucros do dono da fábrica, algo teria de ser feito
rapidamente. Para o empregador restavam duas opções: demissões em
massa ou drásticas reduções nos salários. Qualquer uma das duas
opções geraria grandes conflitos, greves, diminuição da produção,
paralisações, arrefecimento do mercado, aumento do desemprego. E
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foi exatamente isso o que ocorreu. Próximo do fim da década de 60, e
consequentemente do fim dos “anos dourados” pós guerra, esse
regime, ao lado do modelo taylorista de trabalho entrou em uma grave
crise, como aponta Lipietz. (LIPIETZ, 1989, p. 307-308).

Com a grave crise do modelo fordista, os ideais liberais ganharam


fôlego (o que em regra ocorre sempre que a economia de um país vai
mal), colocando o Estado norte-americano, macrocefálico e
extremamente arrecadador, que buscava entregar a todos os cidadãos
tudo o que prometia, e o seu modelo de bem estar social como
verdadeiros freios ao desenvolvimento da economia, ou óleo na pista
do “possante” americano. Foi nesse contexto que surgiram 2 teorias de
regulação antagônicas, com suas diferentes visões sobre intervenção e
regulação.

1.1 A Teoria da Regulação Americana

Para Martins é possível expor o conceito de regulação típico da escola


americana, comparando-o ao conceito de regulação de um
eletrodoméstico, em que a regulação atuaria como o termostato de uma
geladeira, administrando o funcionamento do mecanismo de
refrigeração, evitando uma produção de frio excessivo e, ainda,
desligando o motor da geladeira no momento em que atingir certo grau
de temperatura ideal, promovendo um funcionamento equilibrado e
eficiente do sistema (MARTINS, 2011, p. 86).

O equilíbrio do sistema é atingido quando o Estado, por meio de seu


poder regulador, como uma mão no termostato do eletrodoméstico,
consegue equalizar as variáveis eficiência e equidade no âmbito da
economia. A eficiência é descrita por um máximo de valor dentro de
um mínimo de custo, contendo também o conceito de bem-estar, sendo
que a eficiência existe quando há o maior bem estar possível. (op. Cit.
P. 88-89).

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De outra banda, cumpre destacar que a regulação apresentada pela
Escola Americana também se ocupa de um tipo de atuação mais
voltado ao social. Tal regulação não se preocupa com os aspectos
estruturais da economia, sendo mais direcionada à certos pontos
específicos, relacionadas ao zelo com o meio-ambiente, proteção para
os trabalhadores no ambiente de trabalho e proteção dos
consumidores.

É útil salientar que no âmbito da teoria da regulação americana, nos


deparamos com a diferenciação entre as teorias regulatórias positivas e
normativas. As primeiras buscam explicar a regulação e apresentar
uma análise crítica de cada situação. As normativas, por outro lado,
dão muita importância à eficiência das atitudes regulatórias do Estado,
tendo como seu principal objetivo a tarefa de descobrir qual forma de
regulação geraria os melhores resultados, mormente relacionados ao
bem estar social, ao mesmo tempo em que importasse no mínimo de
despesas para o Estado.

Pode-se dividir a análise da Teoria da Regulação americana em duas


categorias: as de interesse público e as de interesse privado.

1.1.1 Teorias de Regulação de Interesse Público

Essas teorias destacam que a regulação dos agentes econômicos é um


meio para se alcançar a promoção do interesse público, colocando-o
em evidência e como objetivo principal. Cumpre salientar que interesse
público aqui deverá ser entendido como a melhor maneira de se
distribuir os recursos escassos entre os integrantes da sociedade,
coordenando os mecanismos do mercado, de maneira a corrigir falhas
de mercado e principalmente, equalizando os preços e os custos
marginais, com o intuito de dar equilíbrio ao mercado. O que bastaria
para dar o desejado equilíbrio ao mercado seria uma regulação
proveniente do Estado, já que quanto maior o nível de intervenção,
menor a perda no âmbito do setor privado (HERTOG, 2010, p. 6-7).

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Em conclusão, as teorias de regulação mais direcionadas ao interesse
público partem de três premissas, sendo estas, a existência de falhas
constantes no mercado, a presença de um processo político eficiente e,
juntamente à isso, a escolha de instituições regulatórias também
eficientes (HERTOG, 2010, p. 8).

A mão invisível do mercado de Adam Smith não foi (e nunca seria)


suficiente para equilibrar eficiência econômica e equidade econômica,
isso em razão das falhas às quais todos os mercados estão sujeitos. A
regulação efetivada pelo Estatado, busca corrigir as falhas constantes
do mercado e criar condições que incentivem a concorrência, sendo
esta o valor mais importante a ser atingido, com o objetivo de se
efetivar a redistribuição de renda e a eliminação da pobreza, e ainda
resguardar os interesses dos agentes econômicos sujeitos à intervenção
(MARTINS, 2011, p. 95-97).

A regulação econômica como matéria de interesse público seria


caracterizada pela utilização de instrumentos legais para a efetivação
de política de objetivos socioeconômicos estipulados por cada Estado
soberano, na qual indivíduos ou organizações podem ser forçadas a
adotar determinadas condutas, sob pena de sofrerem sanções ou
restrições, como por exemplo, congelar preços, abster-se de participar
de certos mercados, utilizar técnicas específicas ou até mesmo pagar
multas (HERTOG, 2010, p. 3)

Em contrapartida, existe a possibilidade de ocorrer o que chamamos de


“captura”, onde o Estado ao efetivar sua função reguladora passa a
beneficiar indevidamente e de forma desigual os destinatários da
regulação, ou seja, as grandes empresas e multinacionais, por meio dos
famosos lobbys. Essa problemática é colocada no âmbito do direito
econômico como um dos grades desafios da regulação pelo Estado.
(HERTOG, 2010, p. 22-29).

Esse é um dos motivos para que as agências reguladoras brasileiras


tenham uma característica tão destacada: independência em relação ao
governo.
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Trata-se de uma contundente crítica efetuada pelos teóricos da
regulação no âmbito do interesse privado. A Teoria de Regulação de
interesse privado determina que os governos, a bem da verdade, não
deveriam intervir na economia de maneira direta, mas de maneira
indireta, limitando-se a regular as atividades econômicas, gerando
assim um maior bem estar geral da população.

1.1.2 A Teoria do Interesse Privado da Regulação

A teoria do interesse privado de regulação, com relação à regulação


social no âmbito da teoria da regulação americana, não vai atrás de
explicações para os fenômenos sociais, deixando-os em segundo plano.
Temas como a imposição de regras e normas legais à empresas, são
vistas como errôneas, defeituosas, um verdadeiro “tiro no pé”, já que o
modelo que prevalece na regulação social é aquele relativo ao interesse
das empresas que já estão atuando no mercado, sendo que e as regras
existentes já encontram-se ajustadas a estes grandes agentes
econômicos. Outrossim, as grandes empresas acabam se beneficiando
das aplicações de medidas onerosas por parte do Estado, já que quando
isso ocorre, as primeiras a serem conduzidas para fora do mercado são
as pequenas empresas, visto que não possuem condições de suportar os
imensos custos de adequação. A conclusão lógica de tudo isso é que a
imposição de regras e normas legais, principalmente quando estas
geram grandes gastos para as empresas acaba sendo prejudicial à um
dos objetivos principais da escola americana, qual seja, a livre
concorrência. (HERTOG, 2010, p. 28).

De acordo com Martins, a regulação americana de interesse privado é


basicamente liberal, defendendo a intervenção mínima do Estado na
economia, sendo que, quando esta ocorrer, deverá ser direcionada aos
interesses dos grandes grupos econômicos, com grande influência
política. Por fim, entende a teoria americana que, na busca da
eficiência econômica e do melhor funcionamento dos mercados, a
intervenção do Estado deve ser evitada sempre que possível, e quando
necessária, deve ocorrer apenas para defender os interesses dos
agentes econômicos privados. (MARTINS, 2011, p. 100).
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O que fica claro na análise da Teoria da Regulação americana é que
existe um real confronto entre as teorias de interesse público e de
interesse privado, na medida em que essas duas buscam uma forma de
guiar, controlar, direcionar a mão invisível descrita por Adam Smith,
só que cada uma delas faz isso de maneira distinta, com diferentes
abordagens. As de interesse público tentam controlar as tendências do
mercado com o escopo de distribuir as riquezas de forma igualitária
entre os indivíduos. Por outro lado, as teorias de interesse privado
buscam apenas direcionar o mercado, regulando-o apenas com o
objetivo de proporcionar uma maior eficiência na produção, o que
consequentemente (na visão dessa teoria), geraria uma melhor
distribuição das riquezas; o que, em tese, acabaria equilibrando o
sistema financeiro. Em poucas palavras, a teoria do interesse privado
confia quase que plenamente no mercado em si, adotando uma visão
liberal, apostando suas fichas nos grandes agentes econômicos,
entendidos aqui como os grandes grupos de empresas com grande
influência política.

Essa abordagem da regulação econômica pela Escola americana vai


influenciar e inspirar o surgimento de uma doutrina que terá como
escopo relacionar questões jurídicas ao rumo da economia de um
Estado. Nesse contexto surge a obra denominada Análise Econômica
do Direito, escrita por Richard Posner, jurista e economista norte-
americano de posições liberais e conservadoras, que foi responsável
por difundir esse tipo de abordagem em relação à regulação, que
analisa o poder de transformação do Direito em relação à Economia. O
centro dessa teoria é utilizar o Direito para abordar a problemática da
eficiência econômica estatal, melhor dizendo, é questionar a própria
eficácia do direito quanto ao seu papel diante do sistema econômico, de
maneira que as normas, atos normativos e instrumentos legais sejam
analisados do ponto de vista dos seus efeitos práticos na economia e
não só do ponto de vista do Direito e seus princípios, isoladamente,
como em uma gaveta.

Posner busca explicar quais os efeitos produzidos pelas normas


existentes e se elas estão sincronizadas com algum princípio ou critério
econômico. O grande questionamento apresentado é se a eficiência
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econômica pode fundamentar, influenciar e justificar as decisões
tomadas no âmbito jurídico. A eficiência econômica aqui citada deve
ser entendida como o aumento das riquezas de um país, numa
referência clara às teorias de regulação americana.

Podemos, humildemente dizer que esse visão de eficiência econômica


pode ser comparada com aquela colocada pelo Economista brasileiro
Delfim Netto, quando este era Ministro de Economia durante o regime
militar, tendo resumido seu entendimento de “desenvolvimento
economico e social” com a frase “É preciso esperar o bolo crescer, para
depois didivi-lo”, ou seja, quando questionado sobre a situação
econômica de prosperidade experimentada pelo Brasil da década de
70, figurando como 7º potência mundial, em contraste com suas duras
realidades sociais, de mazelas, pobreza e miséria extrema em muitas
regiões afastadas dos grandes centros, o então Ministro expôs seu
posicionamento, muito similar ao entendimento de “eficiência
econômica” de Escola americana, qual seja, o de que um pais
primeiramente deve ser rico e poderoso, para depois resolver seus
problemas sociais com os recursos que conquistou.

Voltado à Posner, em sua análise e posicionamento o Direito é


entendido como uma variável que pode influenciar a economia do
Estado, de forma a privilegiar os destinatários diretos de suas normas,
ou seja, as grandes empresas em geral; ou para buscar a equidade e
harmonia no funcionamento da economia, tendo o cidadão como o
principal beneficiário desta regulação. Posner, sendo um dos difusores
da análise econômica do Direito, insere a economia como um
mecanismo para a resolução de questões jurídicas, adotando uma
posição claramente pragmática. (PACHECO, 1994, p. 25-65).

1.2 A Teoria da Regulação Francesa

Navegando em direção oposta, aparece a Escola da Regulação


Francesa, nas cadeiras das universidades de Paris, seus pesquisadores
analisavam constantemente os efeitos da teoria da regulação

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americana, até então dominante, porém já em decadência; tendo como
contexto histórico a crise econômica dos anos 70 e a falência do
“Welfare State”.

Para os defensores da teoria de regulação francesa, a teoria econômica


americana, até então dominante, era antiquada pois suas abordagens e
soluções eram viciadas, na medida em que não se preocupavam com a
complexidade das relações sociais e rejeitavam os dados históricos e
modificações estruturais, dando uma feição estritamente normativa e
alienada em relação à realidade econômica da época, servindo como
argumento à disposição de quem estava no poder no momento e
precisava manter o status quo da conjuntura econômica mundial.
(THERET, 1998, p. 10).

A Escola Francesa critica a metodologia adotada pelos economistas


após os anos 50, que desconsiderava a relação entre economia e
historia e possibilitava a criação de teorias e modelos cômodos às
elitas, sem se preocupar com a complexidade das relações sociais
envolvidas. A escola americana, em resumo, baseava-se em
proposições normativas e adotava um posicionamento mais positivista,
dando menos importância às questões sociais relacionadas à economia
e ao Direito. (BOYER, 1998, p. 51-68).

De forma antagônica em relação à Escola Americana, a Escola de


Regulação Francesa entende que a economia é dependente de outras
disciplinas, mormente a sociologia, a historia, e as ciências políticas,
sendo que um de seus objetivos primordiais e inerente às suas análises
é traçar um mapa histórico das teorias econômicas. A história ocupa
um papel de destaque nesta escola, já que para ela muitos dos
problemas econômicos podem ser resolvidos se estudarmos o que deu
certo e o que deu errado no passado. (BOYER, 1998, p. 61-62).

Sucintamente, se por um lado a Teoria da Regulação americana tem


por escopo a perseguição de instrumentos e formas de se acabar com o
“Welfare State” do período pós-guerras, a Teoria da Regulação
francesa, por outro lado, tenta compreender de que maneira os meios
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de regulação estatal aparecem em razão das crises enfrentadas pelo
sistema econômico, ou de maneira mais estrita, da crise do modelo
fordista e taylorista norte-americano.

Na teoria de regulação francesa, o objetivo principal é buscar definir


quais são ou deveriam ser as ferramentas aptas a garantir a coerência e
viabilidade de um Estado Regulador de características “francesas”
frente às diversas instituições inerentes ao sistema capitalista.

As relações entre Estado e economia são questões primordiais para a


escola francesa, que aborda tais relações partindo de fórmulas como, e.
G, a utilização da política para definição do regime monetário de um
determinado Estado, tomando por base o fato de que até os bancos
centrais atuais, que mesmo se dizendo independentes dos governos dos
Estados, permanecem demonstrando que suas ações são fortemente
influenciadas pela política.

Temos ainda como exemplo de aspectos que explicitam a relação entre


Estado e economia, a necessidade de intervenção pública na
concorrência, já que, de acordo com esta escola, caso a concorrência
seja entregue apenas aos cuidados do mercado, de seus agentes
econômicos, invariavelmente teríamos um movimento no sentido de se
criarem alianças, oligopólios, enfim, um movimento de concentração
benéfico aos grandes agentes econômicos, porém prejudicial aos
integrantes da sociedade em geral, fazendo com que os consumidores
se tornem vítimas desse processo, levando-os a tomar atitudes
políticas, de protesto, de indignação; com relação a seus salários e
direitos como cidadãos. Situação na qual o Estado se encontra obrigado
a interferir de forma direta em relação ao fomento da cobertura social
ou ainda conciliando as relações entre sindicatos e empregadores
(BOYER, 2009, p. 48-53)

A escola francesa enxerga o Direito como sendo um importantíssimo


dispositivo regulatório, de conciliação, que realizaria a conexão
indissociável entre economia e política. Em outras palavras, ao
contrário do que pensam os americanos, a economia não deve ser
destacada dos interesses da coletividade.
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Cumpre salientar que os teóricos da referida escola, ao se referirem ao
Direito tratam-no de forma um tanto quanto reduzida, fazendo menção
tão somente ao Estado como produtor de normas ou ações e políticas
estatais. É evidente que o Direito positivo que tem sua existência nos
dias de hoje é basicamente resultado da competência legislativa do
Estado, que é exercida em regra pelo poder legislativo e
extraordinariamente pelos poderes executivo e judiciário, por uma
questão Constitucional. Mas o fato de não existir ainda uma teoria
jurídica elaborada sob as bases da Teoria da Regulação francesa está
diretamente relacionado ao caráter aberto em que ela se desenvolve. Os
estudos realizados pela Teoria da Regulação francesa são estruturais,
diferentemente daqueles realizados pela escola americana, mais
pontuais. Observe-se que pensar Direito de forma estrutural ainda é
uma das limitações encontradas pelo jurista até o presente momento.

Concluindo, não-obstante o fato de que ambas as escolas fazem o uso


do termo “regulação”, faz-se mister delimitar os significados das
palavras utilizadas por cada uma das teorias apresentadas até o
momento. O substantivo “regulação”, quando traduzido do Francês
para o Inglês, levou os leitores a reduzirem o conceito de regulação,
para algo parecido com o termo “regulamentação”. Essa redução levou
os estudiosos de língua inglesa que liam a teoria francesa traduzida a
crerem que muitas vezes a teoria da regulação estava relacionada
apenas a um controle administrativo e legal da economia, algo muito
parecido com o conceito exposto pela Teoria da Regulação americana.
Entretanto, A Teoria da Regulação francesa aparenta ser mais
complexa e aprofundada em suas análises, buscando explicações para
as irregularidades do comportamento econômico com a realização de
uma pesquisa histórica, política e social. (JESSOP, 1997, p. 228)

2. O Estado Regulador
O termo “Estado Regulador” parece até pleonástico, visto que todo
estado dotado de ordenamento jurídico tem ao menos a possibilidade
de impor regulamentos e realizar atos normativos para garantir a

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efetividade de suas políticas públicas, bem como a busca pelo bem
estar social.

Os elementos que integram a análise do tema “regulação” localizam-se


nas discussões travadas sobre os conceitos de “justo preço” e “interesse
público”. O interesse público, de acordo com SOUZA,

é identificado como outro motivo de regulação (que nesse contexto


não se confunde com a regulação analisada no presente estudo) da
‘ação’ no sistema dos grêmios medievais. Essas corporações
obedeciam a regulamentos rígidos e eram obrigadas a cobrar
preços razoáveis pelos seus serviços, recebendo, em compensação, o
direito ao monopólio de sua atividade. Wilcox e Sheperd vêem neste
‘aparente’ intercâmbio de regulação por monopólio a forma
desnuda de regulação de serviços públicos nas épocas recentes,
lembrando o contrato social básico. (SOUZA, 1999, p. 335)

De acordo com CAMARGO, a regulação é “um processo consistente na


restrição da eleição da atividade de um sujeito, restrição esta que é
mais o produto da interação e dos processo de ajuste dos interesses em
conflito, decorrente preferencialmente, de uma mediação do que de
uma aplicação coercitiva de um comando” (CAMARGO, 2000, p. 24).
Este conceito parece mais voltado à uma intervenção mínima do
Estado, principalmente quando afirma n ã o ser a regulação decorrente
de uma aplicação coercitiva de um comando, que é o inverso do que
ocorre no atual sistema brasileiro de regulação econômica, realizada
por meio de suas diversas Agências Reguladoras, ja que estas possuem
alto poder normativo, acompanhado de poder de polícia.

Vicente Bagnioli nos apresenta um conceito mais amplo e voltado a


uma maior participação do Estado, o que torna-o mais adequado ao
sistema brasileiro de regulação por órgãos da Administração Indireta, a
saber as Agências:

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As acepções do termo regulação referem-se às formas de
organização da atividade econômica pelo Estado, tanto pela
concessão de serviços públicos quanto pelo poder de polícia.
Especificamente no campo econômico, diz respeito à redução da
intervenção direta do Estado e à concentração econômica.

Contudo, em que pese normalmente utilizar-se a expressão


regulação econômica, cumpre observar que a regulação econômica
é concomitantemente uma regulação social, ou seja, regulação
econômico-social.

(...)

A importância da regulação como forma do Estado intervir no


âmbito econômico para promover os valores sociais, estaria
relacionada com a evolução e transformação do Estado de Bem
Estar Social para um Estado Regulador. (BAGNOLI, Vicente.
Direito Econômico. 5º Ed. São Paulo: Atlas, 2011, p. 53)

Outro conceito de regulação pelo Estado, vem brilhantemente exposto


pelo catedrático da Faculdade de Direito da Universidade Presbiteriana
Mackenzie, Fabiano Del Masso (2003, p.82), que para tanto cita outro
grande jurista, Calixto Salomão Filho (2001), em sua obra intitulada
Direito Econômico:

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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
Qualquer atuação do Estado frente à atividade econômica é uma
forma de promover a sua organização por intermédio da
regulação. Assim, qualquer modalidade de participação do Estado,
em sentido amplo, seria uma forma de regulação. Entretanto, nas
lições de Calixto Salomão Filho encontramos os limites exatos do
termo regulação em seu significado jurídico, no qual explica que a
regulação: ‘Engloba toda forma de organização da atividade
econômica através do Estado, seja a intervenção através da
concessão de serviço público ou de exercício de poder de polícia. (...)
Na verdade, o Estado está ordenando ou regulando a atividade
econômica tanto quando concede ao perticular a prestação de
serviços públicos e regula sua utilização - impondo preços,
quantidade produzida etc. - como quando edita regras no exercício
do poder de polícia administrativo.’ (DEL MASSO, Fabiano. Direito
Econômico - Rio de Janeiro: Elsevier, 2007. Pgs. 82 e 83)

Continua o professor Del Masso, afirmando que no Brasil a regulação


pelo Estado se traduz em atos administrativos de autorização,
concessão e permissão de serviços públicos pela iniciativa privada, bem
como a normatização e fiscalização de determinados setores do
mercado, cuja regulação Estatal se julga importante.

Para o professor Ricardo Antônio Lucas Camargo, a atividade


regulatória é verdadeira materialização de políticas públicas por parte
do Estado. Através dessa atuação, a administração busca obter um
equilíbrio entre situações conflitantes, decorrentes de interesses
distintos, que possam prejudicar o desejado equilíbrio entre agentes
econômicos, seus usuários e consumidores. Tal situação pode ocorres
quando, os agentes econômicos buscam lucro exacerbado em suas
atividades, restringindo o acesso da população ao serviço público e,
consequentemente, comprometendo seu caráter universal. O inverso
também pode acontecer, de forma que o agente econômico que se
dispôs a realizar um serviço público não está obrigado à receber por
isso preço injusto ou vil, devendo ser remunerado corretamente.
(CAMARGO, 2000, p. 38)

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O que se tem, basicamente, em ambas as situaões brilhantemente
expostas pelo professor Camargo é o exercício de uma das funções do
Estado, qual seja, a correção de distorções do mercado, atuando dessa
forma como agente regulador, como previsto no artigo 174 da
Constituição Federal. Dessa forma, as entidade encarregadas do
exercício dessa atividade não apenas fiscalizam, como tambem tem
poder regulamentar, editando atos normativos que conferem maior
exequibilidade à outras leis de nosso ordenamento, que podem
preceder até mesmo a criação de referida entidade.

Novamente recorre-se às lições do professor Vicente Bagnoli, que


citando o nobre doutrinador Fábio Nusdeo, explicita o posicionamento
deste último no sentido de que o operador público, ao exercer a
atividade regulatória, pode vir a ser compelido a tomar decisões
favoráveis à uma minoria detentora do poder econômico, em
detrimento de uma maioria não tão privilegiada pelo sistema.
Exemplificando tal possibilidade, Nusdeo, citado na obra de Bagnoli,
apresenta uma hipótese em que duas proposições diametralmente
opostas são apoiadas com grande empenho por grupos minoritários
que encontram oposição pouco coesa por parte de uma maioria menos
combativa. À esta hipótese Nusdeo dá o nome de teoria da cooptação
ou da captura, na qual a Agência Reguladora competente ou seus
funcionários podem ser “capturados” pelos agentes privados e
cooptados por interesses individuais de uma minoria, em prejuízo do
interesse da coletividade.

Podemos observar um exemplo claro do problema exposto por Nusdeo,


ocorrido em solo brasileiro e em relação ao setor dos transportes
aéreos, diretamente relacionado ao tema deste estudo. É o polêmico
caso dos subsídios governamentais sobre o combustível de aviação ou
QAV (querosene de aviação), derivado do petróleo.

O governo brasileiro começou a subsidiar o querosene de aviação em


fevereiro de 1999, em decorrência da desvalorização do real, ocorrida
em janeiro. Com o aumento do dólar, as passagens aéreas subiriam
muito, pressionando a inflação. O subsídio diminuiu o efeito do
aumento do dólar nas passagens, mas custava ao Tesouro
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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
aproximadamente R$ 30 milhões por mês. O subsídio para o
querosene de aviação usado em vôos domésticos era de cerca de 24%
do preço, o que caracterizava uma bela ajuda do governo às
companhias aéreas que operavam na época. Como a concessão de tal
subsídio gerava um alto impacto aos cofres públicos, especialmente em
um momento de crise e recuperação lenta do mercado após o plano
real, o subsídio acabou sendo retirado em 2001.

Desde então, a concessão de tal subsídio vem sendo suplicada pelas


companhias aéreas, de maneira mais evidente em 2006, 2008 e mais
recentemente, em 2013, em decorrência da alta do dólar, que já atingiu
o patamar R$ 2,30. Basta observar os anos em que essa reivindidação
tornou-se mais evidente, 2006 e 2008 eram anos de crise econômica e
2013 é um ano de recuperação leve da assombrosa crise de 2007,
porém com o real à época da confecção do presente estudo sofrendo
grave desvalorização.

Por esses motivos o setor aeroviário brasileiro voltou a pressionar a


ANAC, para que realize estudos de redução de custos operacionais,
mais especificamente sobre o combustível, e tome atitudes em
sincronia com a Petrobrás, que é responsável por estabelecer o preço
do QAV em território nacional. As companhias alegam que a fórmula
de fixação dos preços do combustível é prejudicial ao setor, pois varia
muito conforme o Dollar. A ANAC não possuí competência para alterar
o preço, que como já foi dito, é estipulado pela estatal Petrobrás
(produtora de 85% do QAV utilizado em todo setor), que por sua vez é
regulada e fiscalizada pela ANP (Agência Nacional de Petróleo); mas
nada impede que as duas últimas, principalmente a Petrobrás, tomem
atitudes em decorrência de estudos e pareceres apresentados pela
ANAC, que comprovem a necessidade de se alterar a fórmula do custo
do combustível de aviação, como foi o caso da NOTA TÉCNICA
PL3/SPL emitida pela de abril de 2003, logo após o corte do subsídio
em 2001.

Ante toda a problemática em relação ao preço do QAV, faz-se o


seguinte questionamento:
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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
De acordo com a hipótese levantada por Nusdeo, qual seja, a utilização
dos poderes de regulação da ANAC pelos grandes agentes econômicos,
entendidos nesse contexto como as companhias aéreas, para obter
benefício próprio em detrimento de uma maioria; não estariam as
grandes companhias buscando tais incentivos, como o subsídio dos
combustíveis, com o único propósito de reduzir custos, sem que isso
seja necessariamente repassado ao consumidor, destinatário final do
serviço público? Seriam tais reivindicações do setor apenas uma
tentativa de aumentar os lucros, onerando ainda mais o Estado, que
deixará de arrecadar e perderá capacidade de investimento em serviços
públicos considerados próprios e de suma importância como saúde,
educação e segurança pública? Fica aqui o questionamento.

Cumpre destacar a questão da delimitação do espaço em que o Estado


pode exercer sua atividade regulatória. Sobre o tema, como bem
ressaltou Marçal Justen Filho, é preciso delimitar o espaço onde o
Estado atuará como regulador e o espaço onde não poderá haver
regulação, e neste último o Estado prestará o serviço, chamado de
serviço público próprio. Nas palavras do autor supracitado:

Somente incumbe ao Estado desempenhar atividades diretas nos


setores em que a atuação da iniciativa privada, orientada à
acumulação egoística da riqueza, colocar em risco valores coletivos
ou for insuficiente para propiciar sua plena realização. Já em
setores nos quais os serviços podem ser prestados pela iniciativa
privada, faz-se necessária a difusão do conhecimento econômico,
que assim está sistematizada: (i) due process clause -
regulação/não intervenção; desenvolvimento das atividades
econômicas em condição de igualdade material entre os agentes
econômicos; (ii) regulação institucional: intervenção ativa, com a
criação da utilidade pública (concorrência); (iii) regulação
neoclássica: possibilidade de escolha; a concorrência é o valor
institucional a ser protegido, e não o mercado. (JUSTEN FILHO,
2005, p. 450)

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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
A regulação por meio do Estado não versa apenas sobre a concorrência
no mercado, mas também, como já dito anteriormente, busca atendar
ao interesse público, garantindo que determinados setores do mercado
ofereçam um serviço ou produto ao cidadão com qualidade, segurança
e por preço justo. Ademais, proteger apenas a concorrência e acreditar
que esta é o único remédio para a melhoria dos setores regulados é um
grande erro.

Exemplificativamente, no caso das companhias aéreas, caso a ANAC


(Agencia Nacional de Aviacao Civil) buscasse apenas a proteção da
concorrência entre as operadoras de linhas exploradas sob o regime de
concessão, o que teríamos seriam apenas passagens mais baratas ou
com melhor custo-benefício, pois o cidadão comum, o homem médio,
não conseguiria avaliar a segurança da aeronave em que embarcaria,
pois trata-se de atividade que exige grande conhecimento técnico.

Ademais, “a companhia mais segura” nem sempre será a mais bem


sucedida no mercado. Infelizmente o consumidor e o mercado
normalmente não premiam as empresas que colocam a segurança em
primeiro lugar. O consumidor, homem médio e sem conhecimento
técnico algum sobre aviação, normalmente só enxerga como fatores de
compra o preço e o benefício, este entendido no exemplo em tela como
conforto, serviços adicionais, horários flexíveis, bom atendimento, etc.
Sendo assim, caso não fossem obrigadas pelo poder de polícia da
ANAC, as companhias aéreas investiriam muito pouco em segurança,
provavelmente o mínimo para reduzir a perda de aeronaves em
acidentes gravíssimos. Para elas (as companhias) o risco de não se
investir em segurança é coberto pelo lucro das passagens.

Podemos citar como exemplo de companhia aérea que operava


irregularmente a argentina LAPA (Líneas Aéreas Privadas Argentinas),
dona da Aeronave Boeing 737 (vôo 3142) que explodiu depois de uma
decolagem mal sucedida. Após a investigação pela JIACC (Junta de
Investigaciones de Accidentes de Aviación Civil) restou comprovado
que o acidente foi causado por total negligência dos pilotos, que
ignoraram diversos avisos de problemas graves nos flaps, também por
culpa da companhia, que além de operar uma aeronave que já contava
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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
29 anos de uso no dia do acidente, não realizava a devida manutenção
preventiva nesta, sendo que era prática comum dentre os pilotos da
companhia decolar ignorando avisos de grave perigo, além de ser
comprovado após o acidente que a companhia em questão não treinava
seus pilotos para situações de risco.

O acidente sucintamente descrito no parágrafo acima mostra


claramente que, ausente a fiscalização do estado, não só no setor
aeroviário, como também em outros setores como transportes
terrestres, as companhias operam “em risco” até o ponto em que lhes
for conveniente, não levando em consideração a integridade física de
seus usuários. Em casos como este, a regulação do setor, com amplo
uso do poder de polícia por parte das Agências Reguladoras
competentes se faz imperiosa e é medida de justiça.

No que tange à transição ocorrida anteriormente, tanto no Brasil


quanto a nível global, nas décadas de 80 e 90, esta não ocorreu
simplesmente para se obter uma economia mais eficaz, mais
competitiva. É claro que essa foi uma dentre as várias consequências
obtidas com a transição de um estado que participava e/ou controlava
determinados setores da economia para um modelo de regulação, onde
o estado observa o que ocorre no mercado, como se estivesse em “stand
by”, em um “repouso alerta”, prevenindo eventuais riscos, projetando
futuros investimentos e ocasionalmente remediando situações que
possam vir a tirar determinado setor da economia de seu estado de
funcionamento ideal.

Como bem salienta Marcelo Figueiredo (p. 201), em sua obra “As
Agências Reguladoras - O Estado Democrático de Direito no Brasil e
sua Atividade Normativa”; nesse novo sistema de participação do
estado, onde esta é mínima, a competência regulatória é privilegiada. O
Estado continua presente no domínio econômico, mas desta vez não
aparece em primeiro plano. Pelo contrário, ele se utiliza de permissivos
legais do direito público para intervir de forma leve, regulando o
mercado, indicando as melhores condutas para os particulares, para

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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
que o bem comum seja atingido. Esse papel vem sendo desempenhado,
desde os Estados Unidos do século XIX, de forma satisfatória, pelas
agências reguladoras.

Quando analisamos a atuação do estado na forma de seus entes da


administração pública indireta, quais sejam, as agências, vemos que até
intervenções mais drásticas podem ser realizadas com o fim de se
atingir o interesse público, atendendo-se até mesmo ao princípio
homônimo. Por óbvio, tais condutas por parte dos agentes da
administração pública evitam que alguns setores da economia
continuem a explorar os cidadãos de forma escancarada, buscando
apenas o lucro puro e simples, sem qualquer preocupação com a
coletividade. É essa lógica perversa do capitalismo que o Estado, na sua
face reguladora, tenta coibir, almejando sempre a supremacia do
interesse público e a efetivação da justiça social.

Não precisamos voltar muito no tempo, ou pesquisar muito a fundo


para observarmos casos em que o Estado brasileiro, por meio de suas
agências reguladoras, resolveu atuar de forma mais incisiva para coibir
alguma prática igualmente agressiva de algum particular, entendido
nesse caso como pessoa jurídica de direito privado que presta serviço
público ou de caráter importante e/ou estratégico para a nação e que,
por se enquadrar nessas características, está submetido à fiscalização e
bem como aos mandamentos das agências relacionadas à sua atividade
econômica principal.

Como um exemplo concreto do que foi descrito no parágrafo anterior,


podemos citar o ocorrido com a operadora TIM-Brasil, que foi multada
pela Agência Nacional de Telecomunicações em R$ 9,6 milhões por ter,
de acordo com as investigações da agência, derrubado milhões de
ligações propositadamente, para que os consumidores realizassem
novas chamadas e, com isso, a operadora pudesse cobrar um novo
minuto iniciado, já que o contrato previa que “apenas o primeiro
minuto seria cobrado”. O que se viu nesse caso foi uma elogiável
atuação por parte da ANATEL, em autuar uma empresa transnacional
de vultuoso capital, impondo a autoridade estatal reguladora em defesa
de seus cidadãos consumidores, claramente ludibriados pelas práticas
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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
vergonhosas da gigante das telecomunicações. Observou-se ainda a
efetivação do poder de polícia das agências, tanto na investigação
quanto na autuação da empresa.

3. Agências Reguladoras
Basicamente, as agências reguladoras cumprem um papel que o Estado
decidiu não realizar sozinho, delegando parte das suas prerrogativas,
como por exemplo o poder de polícia, à tais órgãos da administração
indireta.

Sobre o surgimento das Agências Reguladoras tal qual conhecemos


hoje, Vicente Bagnoli (BAGNOLI, 2011) relembra que na Inglaterra o
Parlamento já criava seus entes autônomos para aplicar o ordenamento
vigente e resolver conflitos, em todas as situações em que um assunto
de grande relevância era estudado. Lembra também o referido autor
que 2 características dos órgãos da Administração pública inglesa, os
chamados Quasi Autonomous non Governamental Organizations
(QUANGOS), a saber, o grande policentrismo aliado à autonomia
destes, até os dias atuais impedem que as agências reguladoras sejam
dotadas de características que possam distingui-las de outros órgãos da
administração.

Continua Bagnoli a dizer que desta forma, quando alguma lei que
versasse sobre questão de interesse público era editada, acompanharia
a edição do ato normativo a criação de um órgão para efetivar tal lei.
Nesse contexto surgem os entes autônomos, como por exemplo o
Monopolies and Merger Comission, atualmente denominado
Competition Comission, ao qual incumbe a defesa da concorrência,
bem como o British Council, encarregado de promover a cultura
britânica no exterior.

Ainda nas palavras do autor supracitado, o estudo das Agências


também incluí o surgimento dessas nos Estados Unidos, que apesar de
influenciados pelo sistema Commom Law britânico, possuem uma

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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
Constituição rígida e escrita, quase intocável, que consagra a separação
dos poderes e define o país como presidencialista.

As primeiras agências de que se tem notícia nos Estados Unidos datam


do ano de 1887, quando o governo decidiu criar a Interstate Commerce
Commission, com o objetivo de regular os serviços interestaduais de
transporte ferroviário. Tal atitude do governo ocorreu em meio à
marcha para o oeste, quando produtores rurais entraram em conflito
com as prestadoras de serviços ferroviários por causa dos altos preços
cobrados. Tal reação da população fez com que a Administração
pública daquela época adotasse algumas medidas, no sentido de
regular a atividade econômica exercida em aparente desencontro com o
interesse da população em geral. Como bem observou Bagnoli, as
Agências nos Estados Unidos já surgiram com a pretensão de regular,
organizar e racionalizar o mercado em determinado setor, de modo a
evitar a concorrência desleal ou predatória e contribuir para um
melhor aproveitamento dos recursos. Esse modelo inovador de
regulação e organização setorial da economia viria a influenciar, após
muitos anos, o Direito Administrativo francês.

O surgimento das Agências Reguladoras nos Estados Unidos como


uma nova forma de intervenção estatal na economia é explicado pela
saída do forte liberalismo do Século XIX e a intensa regulação estatal
em consonância com a política econômica do New Deal, atenuada após
a Segunda Guerra Mundial.

Em relação às agências reguladoras independentes dos Estados


Unidos, cumpre ressaltar o emblemático Administrative Procedure Act
(APA), datado de 1946, que buscava regulamentar as próprias agências
reguladoras, pois fixava para estas um padrão para que a uniformidade
da máquina administrativa norte-americana fosse garantida, e além
disso almejava garantir a participação dos indivídous sujeitos às
decisões das agências em todos os procedimentos decisórios por estas
adotados.

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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
O Administrative Procedure Act (APA) é aplicado às agency e
authority norte-americanas. Nesse contexto, o vocábulo agency
significa qualquer autoridade do Governo dos Estados Unidos da
América, que esteja ou não sujeita ao controle de uma outra agência,
com exclusão do Congresso, dos Tribunais, Governos das Posses,
Territórios ou Distrito de Columbia.

Tal legislação submeteu as agências reguladoras aos comandos


diretivos lá assinalados e a análise dessa Lei é de fundamental
importância à compreensão do que são esses organismos e como eles
funcionam na prática, no país que as criou

Em relação aos países com tradição francesa em seu Direito


Administrativo, o contexto político social e econômico predominante
no século XX, principalmente a intensa estatização no pós Segunda
Guerra, dificultou sobremaneira a implantação das agências
reguladoras, e tal situação só cambiou por volta da década de 1980,
com os intensos movimentos de desestatização e privatização dos
setores da economia, ideia que veio a refletir em nossa própria
economia, no governo do sociólogo Fernando Henrique Cardoso, do
qual trataremos mais adiante.

Tratando-se diretamente de países do continente europeu e suas


experiências regulatórias, podemos destacar que na França as agências
reguladoras possuíam a denominação de “autoridades administrativas
independentes”, e eram caracterizadas por exercerem atividades
decisórias e regulatórias, tendo ampla competência para tanto e por
outro lado, carecendo de personalidade jurídica, pois era ligadas às
estruturas orçamentárias de seus respectivos ministérios, o que não
impedia a sua total autonomia em relação à estes últimos.

Sobre o modelo de agências reguladoras francês, Bagnoli cita as lições


no renomado Alexandre Santos de Aragão:

https://rafaelucchesi.jusbrasil.com.br/artigos/152015530/teoria-da-regulacao-e-agencia-reguladora 23/30
20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
uma característica peculiar das autoridades administrativas
independentes francesas é que, ao contrário de muitos países, tais
como o próprio Brasil, não se limitam à regulação de setores
econômicos ou serviços públicos delegados à particulares,
abrangendo também funções de proteção de direitos fundamentais
e de proteção dos cidadãos frente à Administração Pública, não
sendo, portanto, no seu conjunto, vinculadas exclusivamente ao
Direito Econômico. (BAGNOLI, 2011, citando ARAGÃO, Alexandre
Santos de. Agências Reguladoras e a evolução do direito
administrativo econômico. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, pg.
240)

Complementando a observação do nobre autor, vê-se que no Brasil as


agências são quase longa manus do Estado, agindo na maioria das
vezes de acordo com o interesse deste, e não necessariamente com o
interesse do público, haja vista as taxas fiscalizatórias, autos de
infração, imposições de multa e processos administrativos decorrentes
de sua atividade fiscalizatória, todos estes atos geram receita para o
Estado, que tem grande interesse em continuar arrecadando
indiretamente por meio de suas agências.

Para citar outro país europeu que adota a figura das agências, a
Espanha vem a calhar com este estudo, pois de acordo com o seu
modelo, as agências são autoridades administrativas independentes
criadas a partir da década de 1980, no contexto supracitado de
desestatização, possuindo, diferentemente do sistema francês,
personalidade jurídica de Direito Público e, agora alinhadas ao sistema
francês, ocupando-se não só da regulação econômica, como também da
proteção dos direitos fundamentais dos administrados.

A Itália, fonte de grande inspiração para o Direito em todo sistema


Continental, ao seguir a tendência de desestatização e privatização que
se espalhava pela europa e pelo mundo em meados de 1980, criou suas
próprias agências reguladoras, as quais eram denominadas de
autoritá, possuindo o status de autoridades administrativas
independentes, que atuariam em setores até então pertencentes
exclusivamente ao Estado, que na conjuntura econômica daquele
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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
momento passaram a ser explorados pela iniciativa privada. É
importante ressaltar que, assim como na Espanha e na França, tais
agências também buscavam a tutela dos Direitos Fundamentais dos
administrados.

Alaxandre Santos de Aragão, brilhantemente observa características


em comum entre as agências dos 3 países europeus acima citados, que
claramente inspiraram a criação das agências reguladoras brasileiras:

a independência de que são dotados consiste na realidade em uma


autonomia reforçada em relação ao aparato tradicional da
Administração Direta e Indireta; a restrição ao poder de
exoneração dos dirigentes dos órgãos ou entidades independentes
de regulação não compromete o poder de direção do Governo,
sendo este compreendido nos termos das respectivas leis criadoras;
todas elas concentram poderes fiscalizatórios, sancionatórios,
compõem conflitos e editam regulamentos; e os amplos poderes
regulamentares que geralmente possuem são admitidos desde que
a lei fixe os standards em que deverão se desenvolver. (BAGNOLI,
2011, citando ARAGÃO, Alexandre Santos de. Agências
Reguladoras e a evolução do direito administrativo econômico. 2
ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, pg. 261)

Sobre o surgimento das agências reguladoras em território brasileiro,


pode-se começar pela análise das transformações ocorridas na década
de 1990, que ocorrem nos ditames do que vem descrito nos artigos 173
e 174 da então recém editada Constituição Federal de 1988. Observa-se
que em meio a essas transformações o Estado que até então era
caracterizado como interventor, fixador de preços e participante direto
da economia, passa a operar como Estado regulador de determinados
setores da economia, exercendo seu poder normativo, fiscalizando,
incentivando e até planejando determinadas rotas na economia.

Como já observado acima, sobre o surgimento das agências no


continente europeu, a década de 1980 trouxe consigo uma onda de
desestatização, e nesse contexto o Brasil, mesmo que tardiamente,
aderiu à tendência mundial, mormente no governo de Fernando Collor
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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
de Mello, com seu agressivo Programa Nacional de Desestatizacao
(PND), que foi continuado de forma mais sutil por Itamar Franco,
atingindo seu ápice no governo do sociólogo Fernando Henrique
Cardoso, lembrado principalmente por essa política, muito aclamada
por uns e da mesma forma atacada por outros. O projeto de diminuição
da máquina estatal brasileira, que alguns, críticos do modelo até então
adotado, definiam como estado macrocefálico, estado gigantesco ou até
mesmo “cabide de empregos”; envolvia reformas no direito tributário,
administrativo e previdenciário, bem como uma ampla reforma
econômica acompanhada obviamente das famosas privatizações, todas
essas medidas sincronizadas com a ideia de diminuição do aparato
estatal e confiança na iniciativa privada.

Começando pelas reformas na ordem econômica, estas acabaram com


o monopólio estatal nos setores de prospecção, exploração e refino de
petróleo, telecomunicações, geração e distribuição de energia elétrica.

A política de privatizações no governo de Fernando Henrique Cardoso


foi justificada de várias formas por seus defensores, e pode-se dizer que
até mesmo ratificada por seus próprios resultados, na maioria das
vezes satisfatórios. Justificavam-se tais processos primeiramente pela
defesa da livre iniciativa, tida naquele momento econômico como um
dos pilares da salvação econômica dos países em crise, em segundo
plano, alegava-se com certa razão que as empresas estatais existentes
não tinham eficiência para atuar no mercado, em decorrência de sua
gestão politizada e burocrática, que dificilmente seguiria as leis do
mercado. Em terceiro lugar destacava-se a incapacidade de o Estado
investir em determinados setores que demandavam imenso
planejamento, pesquisa e investimentos em novas tecnologias, como as
telecomunicações. Por outro lado, haviam setores que não se
justificavam mais como “estratégicos”, primeiramente porque já não se
falava em um governo de militares, demasiadamente preocupados com
a segurança nacional e em segunda análise porque haviam setores
muito mais importantes e carentes da atuação do Estado, como saúde e
educação, que não poderiam ficar a míngua enquanto a Administração

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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
realizava gigantescos investimentos com veículos bélicos (a exemplo da
extinta Engesa), aviões (observe-se a imensa transformação da
Embraer após a privatização), e minérios.

Tratando-se do mercado, a iniciativa privada no Brasil já se encontrava


madura para adentrar nesses setores até então de atuação exclusiva
estatal, e para isso só precisavam de um incentivo do governo, qual
seja, eliminar o concorrente desigual, em outras palavras, eliminar o
próprio Estado da disputa, que atuava por meio de suas Estatais,
privilegiadas pelos investimentos constantes e benefícios tributários.
Tais atitudes do governo da época certamente atraíram os investidores
para a nossa economia, o que fortaleceria o mercado de capitais,
abasteceria os cofres do Estado, que consequentemente abateria suas
dívidas com esse dinheiro e acabaria com a necessidade de constantes
investimentos da Administração em suas Estatais, librando-a para
investir nas áreas sociais, extremamente carentes naquele período.

Nesse sentido, fez-se imperiosa a atuação do Estado nos setores


recentemente desestatizados ou privatizados, fiscalizando,
incentivando e planejando. Entretanto, mesmo com a pretensão inicial
de se criar tais agências para regular os setores recém privatizados,
observa-se que cada vez mais tais agências surgiram para atuar em
setores sensíveis à opinião pública.

A privatização das telecomunicações e de outros setores merece elogios


aos seus idealizadores, apesar das suspeitas de favorecimentos quando
da distribuição das concessões à determinadas empresas privadas. Tal
iniciativa popularizou o acesso à vários bens e serviços antes
inimagináveis à grande parcela da população, como transporte aéreo
de qualidade e tecnologia internacionais e serviços de
telecomunicações como os de voz e de internet 3g. Esta estratégia
econômica, apesar de sofrer duras críticas de simpatizantes mais
alinhados à esquerda brasileira, se mostrou útil e eficaz em relação ao
momento vivido por nossa nação quando da implementação de tais
políticas de “desestatização”. Esse processo também deixava claro a
tendência de abertura econômica no Brasil dos anos 90.
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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
Ocorre que tais setores, por serem considerados estratégicos para o
governo, a segurança nacional e bem como para o crescimento da
economia; não poderiam ser deixados “largados”, ao sabor e humor do
mercado, sob o controle de empresas multinacionais controladas por
investidores de países “rivais” ou que possuem grande interesse nas
riquezas e no potencial econômico brasileiro. Vale ressaltar, que a
atividade passada as mãos da iniciativa privada, continua sendo dever
do Estado, que apenas transfere a sua execução para estas empresas.
Portanto, em última instância, o serviço prestado continua sendo
público, pois a iniciativa privada atua como uma "longa manus" do
poder estatal. Havia a necessidade de se criar uma forma de controle
desses setores, sem que isso afugentasse os investimentos ou levasse ao
fracasso do processo de privatização. Eis que surge a grande ideia de
copiar um órgão americano já existente desde o século XIX e que
funcionava muito bem por lá: As agências reguladoras, objeto principal
do nosso estudo, uma para cada setor estratégico que seria privatizado.

Sobre tais mudanças na atuação do Estado brasileiro em meados dos


anos 90, Vinícius Marques de Carvalho faz ótimos comentários:

O que se pôde observar no Brasil, a partir do início da década de


90, foi o deslocamento da relevância atribuída às modalidades de
intervenção estatal. Enquanto, por um lado, se iniciou um
esvaziamento das funções do Estado empresário por intermédio do
processo de privatização das empresas estatais, por outro
constituiu-se um novo aparato regulatório formado pelas agências
de regulação. Tais agências teriam como função garantir, lançando
mão de um aparato decisório fundado no seu caráter técnico e
legitimado pela sua independência em relação às injunções
políticas, a satisfação do interesse público regulando setores até
então afeitos à prestação direta do estado. (CARVALHO, 2002, p.
13-14 )

Quanto aos desafios enfrentados naquele momento de transição, a


nosso ver, um dos mais difíceis de se enfrentar seria a harmonização, a
conciliação entre a lógica da atividade econômica privada e as
características inerentes ao que conhecemos por “serviços públicos”,
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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
quais sejam: u n iv er sa lida de, ig u a lda de e co n tin u ida de n a
pr esta çã o . Abordaremos uma por uma dessas características para
que a visualização do problema fique mais clara:

Quanto à universalidade: Ora, aí está uma das características mais


cruéis do capitalismo, com a qual nos deparamos constantemente em
nossas vidas, muitas vezes sem nem mesmo perceber. Tomemos por
exemplo uma loja de roupas. Tal empresa obviamente aluga ou é
proprietária do espaço em que funciona, e pela lógica privada dos
negócios pode vender seus produtos a quem quiser e pelo preço que
quiser, desnecessário salientar que tais práticas devem se sujeitar à
regras mínimas de concorrência e de bom funcionamento do mercado.
Notem que existem pouquíssimas regras de cunho social no âmbito dos
negócios. Pois bem, da porta do estabelecimento para dentro, via de
regra, é a empresa quem decide quem pode entrar, sem necessidade de
justificativa, nesse caso o direito constitucional à propriedade fala mais
alto. Mas imaginemos o caso de uma companhia de celular da década
1990 que acabara de obter do governo, dentro dos processos de
privatização, a concessão para operar em território brasileiro. Tal
sociedade, em seu estabelecimento, poderia restringir a entrada de
determinadas pessoas? Com base em que critério? Traje? Poder
econômico? Nacionalidad? Como ficaria a universalidade do
atendimento? Resta claro que tal atitude seria incompatível com a
prestação de um serviço de caráter público.

Quanto à igualdade: tal conceito se insere praticamente na mesma


situação apontada logo acima. A empresa que recebeu a concessão para
operar em território brasileiro, exercendo atividade considerada
serviço público deverá tratar todos (universalidade) os cidadãos da
mesma forma. No caso da empresa de telefonia móvel (inserida em
telecomunicações, que é considerado um serviço público), o atendente
do estabelecimento não poderia tratar o cidadão de parcos recursos de
forma diferente da que tratou o empresário rico que havia atendido há
poucos minutos. Tal característica do serviço público é muito difícil de
se fiscalizar e até mesmo de se efetivar, por questões inerentes ao ser
humano em essência. O ser humano é falível, ele enxerga os outros de
forma diferente, trata de forma diferente, julga pela aparência. Enfim,
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20/09/2019 Teoria da Regulação e Agência Reguladora
não se pode exigir que o homem médio seja extremamente imparcial
no seu tratamento com todos, basta atentar para que não ocorram
injustiças quando da prestação de um serviço público.

Quanto à continuidade na prestação: nada mais comum de se


encontrar, nas mais diversas atividades empresariais, do que uma
empresa que fecha por algum tempo para experimentar novos
negócios, que muda de área para tentar lucrar mais ou até mesmo que
resolve paralisar ou diminuir suas atividades para subir os preços de
suas mercadorias; sejam elas produtos, serviços ou uma mistura dos
dois. Tais atitudes não poderiam ser aceitas quando da prestação de
serviço público pela iniciativa privada. O serviço público deve ser
contínuo e a sua interrupção, caso ocorra, deve ser breve, programada
e justificada. Nada mais justo.

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