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Veitch foi uma figura pendular na Madeira do início do século XIX, defensor da
paz e da harmonia política e social. Num tempo de conflitos múltiplos, nacionais e
internacionais, revelou-se, inclusive, um apoiante da autonomia.
Verificamos, assim, que foi na Madeira que Veitch passou a maior parte da sua
vida (mais de 70% da sua vida total, ou acima dos 95%, se considerarmos
apenas a sua vida adulta), circulando pelas suas propriedades, entre as quais
se podem destacar as actuais Quinta Calaça, o Instituto do Vinho e a sempre
muito citada Quinta do Jardim da Serra, autêntico retiro romântico. Homem de
forte personalidade e de muitos inimigos (entre nacionais e estrangeiros), teve
uma vida privada algo atribulada, a respeito da qual ainda hoje se especula.
Para isto, muito terá contribuiu o seu feitio austero e, a partir de certa altura, o
seu afastamento ou ausência das reuniões e festividades comunitárias, sem
esquecer o seu pendor liberal, associado à circunstância de ter exercido
funções consulares durante um período muito atribulado do ponto de vista
político, caracterizado por conflitos intensos e de vária ordem.
Na prática, isto significa que se é certo que o governo britânico, através do seu
cônsul, contribuiu, por um lado, para o não desenvolvimento da ideia
independentista (por motivos que aqui não cabe desenvolver), não é menos
verdade que também sustentou as reivindicações autonomistas do poder
insular. Não porque gostasse mais ou menos dos madeirenses, mas apenas
porque quanto maior fosse o grau de autonomia dos poderes insulares, menor
era a necessidade dos interesses britânicos no espaço atlântico madeirense - e
na própria Ilha - ficarem dependentes das flutuações do poder central, em
Lisboa.
Neste sentido, a defesa dos interesses madeirenses por parte de Veitch (os
quais, note-se, não eram necessariamente coincidentes com os interesses
britânicos ou sequer com os dos portugueses do Reino) vai destacar-se, pela
sua maior premência, a partir da revolução liberal, desde logo porque esta, no
caso português, significou, antes de mais, um processo de centralização do
poder, contra o qual, a partir da Madeira, muitos se manifestaram.
A partir de meados dos anos 20, Veitch passou a contar com a assistência do
seu primogénito, Robert Harrisson, no consulado, mas a morte inesperada
deste, numa deslocação a Inglaterra, em Outubro de 1833, abalou-o de
sobremaneira, tanto física, como financeiramente, pelas dívidas do filho que
teve de assumir. Para o substituir ainda se serviu de outro dos seus filhos,
George Waterloo (assim chamado por ter nascido em 1815). Porém, se até
então Veitch fora um homem frio, amargo e ressentido, cada vez mais sozinho,
aquela perda e as disputas de poder intestinas, contribuíram para que se
afastasse, cada vez mais, do meio social onde preponderara durante quase
três décadas.
No fundo, seguido por uns e detestado por outros, acabou por se revelar, como
ele próprio muitas vezes afirmou, um elemento essencial quer para a
manutenção da harmonia no seio da multifacetada comunidade britânica local,
quer para um relativo bom entendimento entre esta e a madeirense, durante
mais de três décadas. Fê-lo quase sempre na defesa de interesses comuns,
isto é, madeirenses. A demonstrá-lo, aliás, parecem estar as disputas que se
deram após à sua retirada.
Acrescente-se, por último, que casou por duas vezes: a primeira com Margaret
Antoinette Harrison, de quem ficou viúvo em Julho 1837; e a segunda com a
madeirense Carolina Joaquina de Freitas. Teve vários filhos. Ainda a título de
curiosidade, acrescente-se que foi o único residente na Ilha a cumprimentar
Napoleão, quando este passou pela Baía do Funchal, a caminho do exílio.
DN Madeira