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Ganapati

DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

Ecologia - Vegetarianismo - Ética - Espiritualidade

ABRIL 2010 Nº7

A Sociedade Mundial da Cegueira Leonardo Boff

O
poeta Affonso Romano de Sant’Ana e o prêmio No- dos e toda uma visão de mundo.
bel de literatura, o portugues José Saramago, fizeram É ilusória a independência dos territórios da física, da
da cegueira tema para críticas severas à sociedade química, da biologia, da mecânica quântica e de outros. Todos
atual, assentada sobre uma visão reducionista da realidade. os territórios e seus saberes são interdependentes, uma função
Mostraram que há muitos presumidos videntes que são cegos do todo. Desta percepção nasceu a ciência do sistema Terra.
e poucos cegos que são videntes. Dela se derivou a teoria Gaia que não é tema da New Age
Hoje propala-se pomposamente que vivemos sob a socie- mas resultado de minuciosa observação científica. Ela oferece
dade do conhecimento, uma espécie de nova era das luzes. a base para políticas globais de controle do aquecimento da
Efetivamente assim é. Conhecemos cada vez mais sobre cada Terra que, para sobreviver, tende a reduzir a biosfera e até o
vez menos. O conhecimento especializado colonizou todas as número dos organismos vivos, não excluidos os seres huma-
áreas do saber. O saber de um ano é maior que todo saber nos.
acumulado dos últimos 40 mil anos. Se por um lado isso traz Emblemática foi a COP-15 sobre as mudanças climáticas
inegáveis benefícios, por outro, nos faz igno- em Copenhague. Como a maioria na nossa cul-
rantes sobre tantas dimensões, colocando-nos tura é refém do vezo da atomização dos saberes,
escamas sobre os olhos e assim impedindo-nos o que predominou nos discursos dos chefes
de ver a totalidade. de Estado eram interesses parciais: taxas de
O que está em jogo hoje é a totalidade do carbono, níveis de aquecimento, cotas de in-
destino humano e o futuro da biosfera. Obje- vestimento e outros dados parciais. A questão
tivamente estamos pavimentando uma estrada central era outra: que destino queremos para
que nos poderá conduzir ao abismo. Por que a totalidade que é a nossa Casa Comum? Que
este fato brutal não está sendo visto pela maio- podemos fazer coletivamente para garantir as
ria dos especialistas nem dos chefes de Estado condições necessárias para Gaia continuar
nem da grande mídia que pretende projetar os habitável por nós e por outros seres vivos?
cenários possíveis do futuro? Simplesmente Esses são problemas globais que transcen-
porque, majoritariamente, se encontram en- dem nosso paradigma de conhecimento es-
clausurados em seus saberes específicos nos quais são muito pecializado. A vida não cabe numa fórmula, nem o cuidado
competentes mas que, por isso mesmo, se fazem cegos para os numa equação de cálculo. Para captar esse todo precisa-se de
gritantes problemas globais. uma leitura sistêmica junto com a razão cordial e compassiva,
Quais dos grandes centros de análise mundial dos anos pois é esta razão que nos move à ação.
60 previram a mudança climática dos anos 90? Que analistas Temos que desenvolver urgentemente a capacidade de
econômicos com prêmio Nobel, anteviram a crise econômico- somar, de interagir, de religar, de repensar, de refazer o que
financeira que devastou os países centrais em 2008? Todos foi desfeito e de inovar. Esse desafio se dirige a todos os es-
eram eminentes especialistas no seu campo limitado, mas idi- pecialistas para que se convençam de que a parte sem o todo
otizados nas questões fundamentais. Geralmente é assim: só não é parte. Da articulação de todos estes cacos de saber, re-
vemos o que entendemos. Como os especialistas entendem desenharemos o painel global da realidade a ser comprendida,
apenas a mínima parte que estudam, acabam vendo apenas amada e cuidada. Essa totalidade é o conteúdo principal da
esta mínima parte, ficando cegos para o todo. Mudar este tipo consciência planetária, esta sim, a era da luz maior que nos
de saber cartesiano desmontaria hábitos científicos consagra- liberta da cegueira que nos aflige.

“Mas por onde eu começo? O mundo é tão grande. Devo começar pelo
país que eu melhor conheço, o meu próprio. Mas meu país é tão grande.
É melhor eu começar pela minha cidade. Mas minha cidade é tão grande
também. É melhor eu começar pela minha rua. Não, minha casa.
Não, minha família. Esqueça, eu devo começar por mim mesmo.”

Elie Wiesel

01
Onde obtenho informações e ajuda
para parar de comer carne?

H
á inúmeros motivos para se dei- rianismo/veganismo através de eventos tros, pode ser encontrada nas bancas ou
xar de consumir carne e outros e fornecendo suporte às pessoas em recebida por correio. Outras informa-
produtos de origem animal. O transição: ções em http://www.europanet.com.br/
principal é o ético, já que este consumo vegetarianos/.
provoca danos a outros seres do planeta - PETA: www.peta.org
(inclusive aos próprios humanos), seja - www.vista-se.com.br/artigos Vídeos
pela ação direta de maus-tratos e mor- - www.vegvida.com.br
te que ocorrem nas linhas de produção, - www.guiavegano.com.br - A Carne é Fraca - Instituto Nina Rosa
seja pelos impactos ambientais que afe- - www.institutoninarosa.com.org http://br.youtube.com/view_play_list?p=
tam a todos. - www.sbv.org.br 84CA7BAC8418D665&playnext=1
Se você quer se tornar vegetariano - Terráqueos - http://www.youtube.com/
/vegano (não comer qualquer produto Profissionais especializados watch?v=3VrdKZlPXN0
de origem animal) ou mesmo se já é, em nutrição vegetariana - Meatrix - http://www.youtube.com/
mas quer obter maiores informações watch?v=zhsy2-sWyk4
sobre o tema, listamos abaixo diversas Ana Ceregatti
fontes de consulta e outras indicações. Tel.: (11) 9196.2696 Restaurantes Vegetarianos
Sites
anaceregatti@uol.com.br em Recife
consultas@anaceregatti.com.br
www.anaceregatti.com.br - O Vegetariano: R. Conde D´Eu, 118, Boa
- Sítio Vegetariano: www.vegetarianismo.
Vista.
com.br Eric Slywitch - Govinda: Templo Hare Krishna, R. Ber-
- Guia Vegano: www.guiavegano.com.br Tel.: (11) 3628.8360 nardo Guimarães, 144, Centro.
- Alimentação s/ Carne: www.alimenta- ericslywitch@yahoo.com.br - Oasis: Av. Norte, 3828, Encruzilhada.
caosemcarne.com.br www.alimentacaosemcarne.com.br
- Vida Vegetariana: www.vidavegetaria-
na.com Restaurantes com opções
Dr. George Guimarães
- Centro Vegetariano: www.centrovegeta- Tel. (11) 5585.3475
veganas e vegetarianas
riano.org NutriVeg: nutriveg@nutriveg.com.br
- SVB/Sociedade Vegetariana Brasileira: - Papaya Verde: R. Santo Elias, 419, Espi-
www.nutriveg.com.br
www.svb.org.br nheiro, Recife/PE. Tel.: (81) 3241.8637
- Tortaria: R. das Pernambucanas, 265,
Revista Graças.
Além destes, há sites de grupos de de-
fesa animal vegetarianos/veganos que - Ultraleve: R. Alberto Paiva, 174, Graças.
Revista dos Vegetarianos - específica
também disponibilizam informações sobre vegetarianismo - com informa-
sobre o tema e promovem o vegeta- ções sobre produtos alimentícios e ou-

Fundamentalismo D
efender os direitos dos animais de que isso pudesse estar errado.
não é ser fundamentalista, an- Obviamente, ser radical não é ne-
http://www.pelosanimais.org.pt tes pelo contrário. Defender os cessariamente mau. A violação de uma
direitos dos animais é aplicar nas nos- mulher é um bocadinho má, bastante
sas vidas o princípio da não-violência má ou completamente má? A nós
e respeitar os outros (humanos e não- parece-nos completamente má. Isso faz
humanos) como seres únicos e merece- de nós radicais? Provavelmente quem
dores de respeito que são. tem um problema é quem acha que a
Nós defendemos que é importante violação não é completamente má.
ser-se tolerante para com quem pensa Quando algo é completamente er-
de forma diferente. Afinal de contas, rado, devemos opor-nos em absoluto,
quase todos nós já estivemos do outro não apenas em parte. Se a exploração
lado, também comíamos animais e de seres sencientes é completamente
também contribuíamos para a sua ex- má, o justo é opormo-nos a ela em ab-
ploração sem colocar sequer a hipótese soluto.

“Temos de nos tornar a mudança que queremos ver no mundo.”


MAHATMA GHANDI

02
Momento de Reflexão
“A filosofia dos direitos dos animais, por outro lado, defende que os animais não devem ser utiliza-
dos como recursos dos humanos. Os animais valem por si mesmos e não pelo valor instrumental
que possam ter para nós. Quem defende os direitos dos animais não defende reformas na forma
como estes são explorados, mas sim a abolição dessa exploração, começando por aplicar essa
fiolosofia abolicionista na sua própria vida. Tal como o movimento pela abolição da escrava-
tura não pedia que os escravos fossem explorados de forma mais “humana”, também o movi-
mento pelos direitos dos animais não pede jaulas maiores, mas sim jaulas vazias.”
http://www.pelosanimais.org.pt

Olhar Literário: Quando Nietzsche Chorou


Laerte Fernando Levai

O
filósofo alemão quem sofre. Em outras línguas, a força secreta de sua etimo-
Friedrich Nietzsche logia banha a palavra com uma outra luz e lhe dá um sentido
(1844-1900), decep- mais amplo. Essa compaixão designa, portanto, a mais alta
cionado com a civilização capacidade de imaginação afetiva”.
ocidental, dizia em seu últi- Milan Kundera fala desse sentimento sublime no capítulo
mo livro Assim Falou Zara- “O sorriso de Karenin”, ao tratar da doença e da morte da
tustra (1891) que a humani- cachorra do casal Tomas e Tereza. Ali ele critica a teoria ma-
dade é doentia, feia e infeliz, china animata de Descartes para demonstrar todo o sentir da
enquanto os animais livres, pequena Karenin, que se despede da vida com a melancolia
ainda não contaminados pelo de um sol poente. Cabe aqui registrar uma das mais belas pas-
homem, são sadios, bonitos sagens desse romance: “A verdadeira bondade do homem só
e felizes. Tido como louco, pode se manifestar com toda a pureza, com toda a liberdade,
ele acabou sendo equipara- em relação àqueles que não representam nenhuma força. O
do a um “profeta do mal” ao verdadeiro teste moral da humanidade são as relações com
criticar o falso moralismo e aqueles que estão à nossa volta: os animais”.
o intelectualismo horizontalista que impedem a ascensão hu- A Insustentável Leveza do Ser descreve, em seguida, a cena
mana. Suas outras obras foram A Gaia Ciência (1882), Além vivenciada por Nietzsche um ano antes de morrer, já bastante
do Bem e do Mal (1885), A Genealogia da Moral (1887) e desiludido com os homens. O filósofo sai de um hotel em Tu-
Ecce Homo (1888). rim e vê diante de si um cavalo sendo violentamente chicote-
Na tentativa de decifrar a alma atormentada do filósofo, o ado pelo cocheiro. Nietzsche então se aproxima do animal e,
psicoterapeuta Irvin Yalon pôs-se a escrever, em 1992, o livro sem dizer nada, abraça-lhe o pescoço e cai em prantos. Foi a
Quando Nietzsche Chorou. A narrativa ficcional trata do en- partir daí que se declarou sua suposta doença mental, embora
contro entre Nietzsche e seu médico particular Joseph Breu- para Kundera o significado mais profundo desse gesto o da
er, no verão de 1882, em Leipzig. Naquela época Nietzsche, compaixão não tenha sido devidamente compreendido pelos
professor da universidade local, apaixona-se por Lou Salomé homens.
sem, entretanto, ser correspondido. Em suas confidências a Milan Kundera mostra
Breuer, mentor de Sigmund Freud, ele alega que a melancolia assim, pelas lágrimas do
faz parte de sua vida e que acredita ter vindo ao mundo antes filósofo, a insustentável
do tempo, daí a sua irremediável solidão. leveza que deveria exis-
Esse livro inspirou um filme homônimo, cujo roteiro é tir na alma das pessoas:
uma profunda sondagem da psique humana na busca do que “É este Nietzsche que eu
se pode denominar autoconhecimento. O filósofo- paciente e amo, da mesma forma
o médico que se torna, paradoxalmente, paciente do filósofo. que amo Tereza, acari-
A doença que afasta o professor da cátedra e os alunos que ciando em seus joelhos a
o abandonam. O médico que se vê, subitamente, doente da cabeça de uma cachorra
alma. Conversações. Descobertas. Frustrações. Muros de si- mortalmente doente. Ve-
lêncio. E uma presença perturbadora que se mistura à própria jo-os lado a lado: os dois
paixão. Amar o amor fugidio e belo, o amor triste e desespe- se afastando do caminho
rançado, o amor carnal que se imortaliza e morre. Mas depois no qual a humanidade,
disso tudo, o que nos resta? ’senhora e proprietária da
Resta-nos descobrir aquilo que, na hierarquia dos sen- natureza’, prossegue sua
timentos, é o sentimento supremo. A resposta é dada pelo marcha para a frente”.
escritor Milan Kundera, nas páginas memoráveis de A In-
sustentável Leveza do Ser: “Nas línguas derivadas do latim, Laerte Fernando Levai - é integrante do Ministério Público do Estado de
São Paulo, é promotor de Justiça em São José dos Campos, com atuação na
compaixão significa que não se pode olhar o sofrimento do área criminal, ambiental e defesa dos animais. Especialista em Bioética pela
próximo com o coração frio, ou seja, sentimos empatia por Universidade de São Paulo.

03
Junte-se aos Bons: Inventores e Cientistas Vegetarianos
1- Lineu Carolus Linnaeus, (1707 5 - John Harvey Kellog - (1852 -1943)
-1778) botânico, zoólogo e médico médico estadunidense. Dirigiu um
sueco, criador da nomenclatura bino- sanatório em Battle Creek, no qual
mial e da classificação científica, sendo aplicou métodos holísticos, com ên-
assim considerado o “pai da taxonomia fase na nutrição, exercícios, era um
moderna”. defensor do vegetarianismo e é conhe-
cido pela invenção do cereal matinal de
“A estrutura do homem, externa e interna, com- milho ― Kellogg’s ― junto com seu irmão
parada com a de outros animais, mostra-nos que as frutas e Will Keith Kellog.
os vegetais suculentos constituem sua alimentação natural.”
“Uma vaca morta ou ovelhas caídas numa pastagem são
2 - Charles Darwin - foi um notável reconhecidas como carniça. O mesmo tipo de carcaça
cientista do Séc. XIX (1809 -1882), au- vestido e pendurado em um açougue se passa como co-
tor da teoria da evolução das espécies. mida”.

“ Os animais que você come não são aque- 6 - Will Kellogg ( 1860 - 1951) den-
les que devoram outros, você não come as
tista americano, que junto com o seu
bestas carnívoras, você as toma como padrão.
Você só sente fome pelas criaturas doces e gentis
irmão inventou o cereal matinal.
que não ferem ninguém, que o seguem, o servem, e que são
“ Como é que podes comer alguma coisa
devoradas por você como recompensa de seus serviços.
com olhos?”
“Não há diferenças fundamentais entre o homem e os animais
nas suas faculdades mentais (...) os animais, como os homens, 7 - Thomas Edison (1847-1931) - In-
demonstram sentir prazer, dor, felicidade e sofrimento.” ventor norte-americano que revolu-
cionou a vida humana com invenções
3 - Nikola Tesla (1856-1943) - inventor como a lâmpada elétrica, o fonógrafo
nos campos da engenharia mecânica e a máquina de cinema.
e eletrotécnica, em texto publicado
na Century Illustrated Magazine, em “A não-violência leva-nos aos mais altos con-
Junho de 1900) . ceitos de ética, o objetivo de toda evolução. Até pararmos
de prejudicar todos os outros seres do planeta, nós con-
“É certamente preferível produzir vegetais, tinuaremos selvagens.”
e penso, por isso, que o vegetarianismo é um
louvável abandono de um hábito bárbaro instituído. Que po-
demos subsistir com alimentos vegetais e fazer o nosso tra- Você sabia?
balho até com vantagens não é uma teoria, mas sim um fato
bem demonstrado. Muitas raças vivem quase exclusivamente
à base de vegetais e são superiores psicologicamente e em - Uma vaca de corte libera diariamente na atmos-
força. (...) Tendo em conta estes fatos, todos os esforços de- fera a quantidade de gases poluentes equivalente
vem ser feitos para parar o abate cruel e desnecessário de a de 85 carros novos.(Revista National Geographic,
animais, que deve ser destrutivo para os nossos princípios outubro de 2007)
morais.”
- Animais Carnívoros tem o comprimento do in-
4 - Benjamin Franklin (1706 - 1790) testino de apenas 3 vezes o tamanho do corpo,
jornalista, editor, autor, maçon, filan- afim de eliminar rapidamente a carne em estado
tropo, abolicionista, funcionário públi- de putrefação, enquanto o comprimento do intes-
co, cientista, diplomata, inventor e en- tino dos Seres Humanos é de 12 vezes o tamanho
xadrista americano. Foi um dos líderes do corpo, assim como dos animais vegetarianos,
da Revolução Americana, conhecido uma vez que frutas, cereais e legumes não apo-
por suas citações e experiências com a drecem tão rápido, podendo ser eliminados do
electricidade. corpo mais lentamente. (http://www.veganos.org.br/
curiosidades.htm)
“Naquela ocasião a pesca de cada um daqueles peixes
afigurou-se-me, como ao meu mestre Tryon, uma espécie de
assassinato sem provocação, uma vez que nenhum daqueles - 1000 Kg de PET (plástico) permitem produzir
animais tinha cometido ou poderia cometer qualquer ofensa 2000 calças em poliéster. (http://ambiente.maiadigi-
contra nós, susceptível de justificar semelhante carnificina.” tal.pt/ambiente/residuos/mais-informacao-1/algumas-curi-
osidades/)

04
Alienação Conceição Cavalcanti

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“A forma mais baixa que podemos conceber de um uni- Sabe-se que existe uma indústria de entretenimento onde o
verso de homens é aquela (...) em que nos deixamos aglome- importante não são os conteúdos e sim os “acessórios” que
rar quando renunciamos a ser pessoas lúcidas e responsáveis; possam ser consumidos. A televisão produz uma sensação de
mundo da consciência sonolenta, dos instintos anônimos, das integração e agregação e cria um sentimento de pertencimen-
opiniões vagas, dos respeitos humanos, das relações mun- to e coletividade. Dessa forma, ser diferente passa a ser um
danas, do “diz-que-diz-que” cotidiano, sofrimento, porque sugere que o diferente está fora da coleti-
do conformismo social ou político, da vidade. Embalados por esta sensação de
mediocridade moral, da multidão, das fazer parte de um todo, somos envolvi-
massas anônimas, das organizações ir- dos e seduzidos pelos mais variados pro-
responsáveis. Mundo sem vitalidade e dutos e pelas muitas mensagens que nos
desolado, onde cada pessoa renunciou dizem: como devemos ser; o que deve-
provisoriamente a sê-lo, para se transfor- mos comprar, onde temos que ir; como
mar num qualquer, não interessa quem, devemos nos relacionar e quais os valo-
de qualquer forma”. Emmanuel Mounier res prioritários para vivermos felizes. Na
Em um país que precisa urgentemente soma disso tudo, temos a influência de
melhorar sua qualidade de ensino e in- conteúdos televisivos que estimulam a
vestir em programas de formação de lei- invasão de privacidade, constroem mo-
tores capazes de refletir criticamente sua Emmanuel Mounier delos de comportamento contrários aos
realidade, elevar o nível de programas valores éticos os quais refletem a digni-
televisivos é uma questão de lucidez. Nos processos de mas- dade humana. Não desejo aqui levantar bandeiras “moralis-
sificação o sujeito se descaracteriza, perde sua autenticidade e tas”, mas provocar uma reflexão de como anda a nossa capaci-
autonomia e no entender de Paulo Freire fortalece na “popu- dade crítica em relação ao que consumimos intelectualmente
lação uma mentalidade cada vez mais ingênua, despreparada, e como o nosso precioso tempo está sendo empregado. Cabe
emocionalizada e alienada”. Por mais que se deseje mostrar a cada um integrante dessa rede social avaliar se os conteúdos
em alguns programas de TV que os mesmos podem ser educa- que “invadem” suas casas através dos aparelhos de TV são
tivos, o que vemos é um verdadeiro processo de deseducação. “lixo” ou “luxo”.

O Exercício do Discernimento e a Busca


da Paz e Felicidade Jeanine Japiassu

A
busca da paz e da felicidade é algo que almejamos, servação com maior acuidade, enfim com um exercício maior
que nos mobiliza e que no nosso cotidiano, acredi- do discernimento.
tamos buscar caminhos que nos levem a encontrá- Discernir por qual caminho adentrar, em muitas situações, não
las, nem que sejam em momentos pontuais e alguns espaços é tão simples, mas a prática do discernimento vai nos deixar
maiores de tempo. mais ricos em sabedoria e com uma percepção mais rápida e
Não confundir aqui o prazer com a felicidade... O prazer clara daquilo que nos faz BEM.
é algo momentâneo, passageiro e fugaz e que pode nos levar Nessa busca pela paz e felicidade podemos encontrar
tanto a uma grande alegria e felicidade, como a uma profunda grandes alegrias na contemplação do belo, na vivencia afetuo-
dor e momentos de infelicidade e sofrimento. sa entre nossas relações afetivas, no nosso comprometimento
Como distinguir, entre os prazeres, aqueles que nos levam em fazer o bem e até em outras atividades mais simples.
à paz e felicidade? As alegrias provenientes do contato com a Beleza da Natu-
A partir da observação e da reflexão sobre as ações da reza - a Arte do Divino, com a beleza da música e das demais
nossa vida podemos perceber aquelas ações que nos fazem artes, podem nos proporcionar também momentos de uma in-
bem, gerando felicidade para nós e os outros e as que geram tensa felicidade.
sofrimento. O discernimento nos permite perceber com maior As alegrias provenientes de atitudes mais amorosas nos
clareza a distinção entre as ações que nos fazem bem e aque- encantam - os verdadeiros gestos de amor. O amor e a beleza
las que fazem mal a nós e aos outros. surgem como determinantes nos nosso melhores momentos
Quando não atentamos para o impacto das nossas ações de paz e felicidade, e são os mais duradouros...
sobre os outros, podemos ferí-los de forma muito contunden- Se há uma finalidade no que fazemos no nosso cotidiano,
te. Devemos sempre estar atentos a isto... que essa seja “O BEM”, que será alcançado através das nossas
Em algumas ações podemos perceber facilmente as con- ações. E que as nossas ações sejam fundamentadas na bela e
seqüências delas, em nós e naqueles que nos cercam, enquan- forte afirmaçaõ: “ama ao próximo como a ti mesmo” e “não
to que outras não são tão claras e necessitam de uma análise faças ao outro o que não queres que façam a ti”.
mais apurada, de uma união do coração e mente para uma ob-

05
TERRÁQUEOS
U
ma vez que todos nós habitamos coisas. Moralmente, tratamento desrespei- maior sucesso, Enemies, o seguinte “Por
a Terra somos todos considerados toso ocorre quando aqueles que se encon- mais que Herman tivesse testemunhado o
terráqueos. Não há sexismo, racis- tram no poder e têm uma relação de poder, abate de animais e peixes, ele sempre tinha
mo ou especismo no termo “terráqueo”. Ele tratam os menos poderosos como se fossem o mesmo pensamento no seu comportamen-
abrange cada um de nós de sangue quente meros objetos. O estuprador faz isso com to em relação aos animais: todos homens
ou frio, mamífero, vertebrado ou inverte- a sua vítima. O pedófilo faz isso com as são nazistas. A presunção com a qual o ho-
brado, pássaro, réptil, anfíbio, peixes e hu- crianças que ele molesta, o senhor com seu mem pode fazer o que quiser com outras es-
manos. Humanos, então, não sendo a única escravo. Em todos estes casos, os humanos pécies exemplifica as teorias racistas mais
espécie no planeta, compartilham este mun- que têm poder exploram aqueles que não o extremas a lei do mais forte.” A compara-
do com outros milhões de criaturas vivas, já têm. ção com o Holocausto é intencional e óbvia.
que todos vivemos aqui juntos. Entretanto, Um grupo de seres vivos angustia nas mãos
é o terráqueo humano que tende a dominar de outro. Embora alguns possam argumen-
a Terra. Freqüentemente tratando outros ter- tar que o sofrimento de animais não possa
ráqueos e seres vivos como meros objetos. ser comparado ao sofrimento dos judeus e
Isso é o que significa “especismo” escravos, há de fato um paralelo. E para os
prisioneiros e vítimas deste assassinato em
massa o seu holocausto está longe do fim.
Em seu livro, The Outermost House, Henry
Beston escreveu que “Nós precisamos de
um conceito mais novo, sábio, e talvez mais
místico dos animais. Longe da natureza e
vivendo através de artifícios complicados,
o homem na civilização vigia as criaturas
Pode o mesmo ser verdade para como através do vidro do seu conhecimento e vê,
Por analogia ao racismo e ao sexismo, os humanos tratam os outros animais? Ou portanto, os detalhes de uma pena, mas uma
o termo “especismo” é um preconceito ou os outros terráqueos? Sem dúvida existem imagem geral distorcida. Nós os padroniza-
atitude tendenciosa em favor dos interes- diferenças, uma vez que humanos e ani- mos por serem incompletos, pelo seu trági-
ses dos membros de sua própria espécie e mais não são iguais em todos os aspectos. co destino de terem se formado tão abaixo
contra os membros de outras espécies. Se A questão da igualdade usa uma outra face. de nós. E nisto nós erramos gravemente.
um ser sofre, não há justificação moral para Concordamos que estes animais não têm Pois os animais não podem ser avaliados
se recusar a levar esse sofrimento em con- todos os desejos que um humano tem. Con- pelo homem!
sideração. Não importa a natureza do ser, o cordamos que eles não compreendem tudo
princípio de igualdade requer que um sofri- que nós humanos compreendemos. No en-
mento deva ser considerado igual a um so- tanto, nós temos alguns desejos em comum
frimento semelhante de qualquer outro ser. e compreendemos coisas que eles também
Racistas violam o princípio de igualdade compreendem. Os desejos por comida e
dando maior valor aos interesses de sua pró- água, abrigo e companhia, liberdade de mo-
pria raça, quando há conflito entre os seus vimentos e de não sentir dor. Esses desejos
interesses e o interesse de uma outra raça. são compartilhados por animais não-huma-
Sexistas violam o princípio de igualdade nos e humanos.
favorecendo os interesses de seu próprio Como os humanos, muitos animais não-
sexo de forma similar, especistas permitem humanos entendem o mundo no qual vivem. Num mundo mais velho e mais com-
que os interesses de sua própria espécie Senão eles não poderiam sobreviver. Então, pleto que o nosso eles se movem completos
se sobreponham aos interesses maiores de apesar de todas as diferenças, há igualdade. e confiantes, dotados com extensões dos
membros de outras espécies. Em cada um Como nós, esses animais incorporam o sentidos que nós perdemos ou nunca possu-
dos casos, o padrão é idêntico. maravilhoso mistério da consciência. Como ímos, guiando-se por vozes que nós nunca
nós, eles não somente estão no mundo, mas ouviremos. Eles não são irmãos, eles não
estão cientes dele. Como nós, eles são o cen- são lacaios. Eles são outras nações, presos
tro psicológico de uma vida que é somente conosco nesta vida e neste tempo, prisionei-
sua. Nestes princípios fundamentais, huma- ros do esplendor e trabalho da terra.”
nos estão lado a lado com porcos, vacas, ga-
linhas e perus. Qual é nossa obrigação para
com esses animais, como devemos tratá-los
moralmente, são perguntas cujas respostas
começam com o reconhecimento da nossa
Eles estão entre os números da família semelhança psicológica com eles.
humana que reconhece o imperativo moral O vencedor do Prêmio Nobel, Isaac
do respeito. Cada humano é alguém e não Bashevis Singer, escreveu em seu livro de

06
tudo, nosso modo de pensar. Se há alguma
verdade no antigo dito popular, “tudo que
vai, volta”, então o que eles ganham pela
Aumento de Furacões
sua dor? Nós ao menos refletimos um pou- Revista Galileu
co? Eles são terráqueos. Eles têm tanto di-
reito de estar aqui quanto os humanos. Tal-
vez a resposta esteja em outro dito popular,
que é igualmente verdadeiro “nós colhemos
o que plantamos”.
Então é claro que animais sentem e é
claro que experimentam dor. Afinal, a natu- Novo modelo prevê aumento de fu-
reza abençoou esses animais com uma fonte racões conforme planeta se aquece. Fórmu-
de sentimentos para que eles não sentissem la matemática relaciona aquecimento global
nada? Ou os animais tem nervos para serem à incidência de furacões e consegue anteci-
insensíveis? A razão pede uma resposta me- par sua magnitude e local de ocorrência por
lhor. Mas uma coisa é certa, animais usados Redação Galileu
para alimentação, usados para vestuário, Um físico da Universidade de George
usados para entretenimento e em experi- Mason de Washington DC acaba de criar
O que acontece nos abatedouros é uma mentos científicos e toda opressão que eles uma fórmula matemática capaz de pre-
variação do tema da exploração dos fracos sofrem sob o sol, todos eles morrem de dor. ver a intensidade e locais de incidência de
pelos fortes. Mais de 10 mil vezes por mi- Cada um deles. tempestades e furacões antes que eles se
nuto, 6 bilhões de vezes por ano, apenas Já não é o suficiente que animais de todo formem. E quer saber a pior notícia? As
nos Estados Unidos, a vida é literalmente o mundo vivam em isolamento permanente primeiras previsões do modelo já anun-
drenada dos animais que utilizamos para do progresso e expansão humana? E para ciam que o número de tempestades vai au-
a alimentação. Tendo o poder, os humanos muitas espécies, simplesmente não há mais mentar drasticamente conforme o planeta
decidem quando esses animais vão morrer, para onde ir. Parece que o destino de muitos se aquece. Segundo o pesquisador Robert
onde eles vão morrer e como vão morrer. animais é: não são desejados pelo homem Ehrlich, a cada dois graus de acréscimo na
Os interesses desses animais não fazem a ou são desejados demais. Nós chegamos temperatura média do planeta, o número de
menor diferença na determinação do seu como senhores da terra, com estranhos po- furacões irá crescer 11 vezes.
destino. O ato de matar um animal é, em deres de terror e misericórdia! E o aumento não fica só no número de
si, um ato perturbador. Dizem que, se nós O ser humano devia amar os animais ocorrências: também crescerá “o potencial
tivéssemos que matar nossa própria carne, como o experiente ama o inocente, e como destruidor dos furacões e do impulso das
seríamos todos vegetarianos. Com certeza, o forte ama o vulnerável. E quando nós so- tempestades, devido à subida do nível do
poucas pessoas já visitaram um abatedouro. mos tocados pelo sofrimento de animais, mar, o que invariavelmente acontece em um
E filmes que mostram o interior dos abate- aquele sentimento fala bem de nós. Mesmo mundo mais aquecido”, diz ele.
douros não são populares na TV. As pessoas se o ignoramos. E aqueles que dispensam o Há algum tempo meteorologistas sabem
esperam que a carne que compram venha de amor pelas outras criaturas como puro sen- que dois fatores principais atuam na forma-
um animal que morreu sem dor. Mas eles timentalismo, ignoram uma parte importan- ção de furacões: a temperatura do mar e a
não querem saber da verdade! No entanto te e boa da nossa humanidade. Mas nenhum latitude. Como isso acontece? Quando as
as pessoas que, através de suas compras, so- humano vai perder nada ao ser gentil com águas do mar estão superaquecidas, o ar
licitam a morte de animais não merecem ser um animal. E, na verdade, faz parte de nós próximo ao mar fica quente e, como é mais
protegidos deste ou de qualquer outro as- dar-lhes uma vida feliz e longa. leve, sobe, gerando fortes correntes de ar.
pecto da produção da carne que compram. Na mata, o Rei Lear pergunta a Gloster, Essas correntes colaboram para o surgi-
Então de onde vem a nossa comida? Ou nós “Como você vê o mundo?” E Gloster, que mento tempestades. Se essas correntes sur-
fazemos mudanças ou a natureza nos força- é cego, responde “Vejo-o porque o sinto”. gem na linha do Equador, não há nenhum
rá a fazê-las. Três forças primárias existem nesse planeta: risco de gerarem furacões. Já se o fenômeno
Chegou a hora de todos reconsiderar- a natureza, os animais e a humanidade. Nós acontece mais próximo aos pólos, a história
mos nossos hábitos alimentares, nossas tra- somos os terráqueos. Faça a conexão! é outra. A latitude determina a intensidade
dições, nossos estilos e modas e, acima de da força que provoca a rotação da tempesta-
de, a Força Coriolis.
A descoberta de Robert Ehrlich foi a de

TERRÁQUEOS
que essas duas variáveis, sozinhas, com-
põem uma fórmula capaz de prever a in-
tensidade de tempestades e furacões. Para
chegar a essa conclusão, Ehrlich analisou
imagens de satélite entre 1960 e 2007. As
Este filme variáveis se influenciam da seguinte forma:
quanto maior a latitude (ou mais próximo
mudará aos pólos) e quanto mais longe dos 25oC a
temperatura do mar chegar, mais chances há
sua vida. de ocorrer um furacão. Pobre sul do Brasil,
tão perto do oceano, e tão longe da linha do
www.vista-se.com.br/terraqueos/ Equador...

07
Cuidando do Ambientalista
Traduzido do livro “The World We Have”, por Samuel Cavalcante Thich Nhat Hanh

U
m estudante me perguntou “Existem tantas problemas ger o meio-ambiente sem este insight?
urgentes, o que devemos fazer?” e eu disse “Escolha A segunda noção do Sutra do Diamante nos recomenda jo-
uma coisa, faça-a muito profundamente e com muito gar fora é a noção de pessoa, de ser humano. Isto também não
cuidado, então você estará fazendo tudo ao mesmo tempo”. é difícil. Ao olharmos para o ser humano, poderemos ver os
Muitas pessoas estão cientes do sofrimento da Terra e seus ancestrais humanos, os ancestrais animais, os ancestrais ve-
corações estão cheios de solidariedade. Eles sabem o que é getais e os ancestrais minerais. Poderemos ver que o humano
necessário fazer e se engajam em atividades políticas, sociais é feito de elementos não-humanos. Usualmente, costumamos
e ambientais para mudar as coisas. Mas, depois de um período discriminar entre humanos e não-humanos, pensando que so-
de intenso envolvimento, frequentemente muitos se sentem mos mais importantes que as outras espécies. Mas já que so-
desencorajados por que lhes falta a força necessária para sus- mos feitos de elementos não-humanos, para protegermos a nós
tentar uma vida de ação. O intelecto sozinho não é suficien- mesmos temos que proteger todos os elementos não-humanos.
te para guiar uma vida de ação solidária. Para efetivamente Não existe outro jeito. Se você pensar que Deus criou os seres
influenciar o futuro de nosso mundo, precisamos de mais. A humanos à sua imagem e semelhança e que Ele criou todos os
verdadeira força não pode ser encontrada no poder, dinheiro outros seres para uso deles, então você já está discriminando e
ou nas armas, mas em uma profunda paz interior. Quando te- tornando as pessoas mais importantes que os outros seres. Ao
mos insight suficiente, não nos deixamos apanhar mais pelas vermos que os seres humanos são desprovidos de eu, vemos
muitas situações difíceis. Podemos sair dessas situações mui- também que ao cuidar do meio-ambiente (dos elementos não-
to facilmente. Quando mudamos as nossas vidas cotidianas a humanos) cuidamos da humanidade. Temos que respeitar e
maneira que pensamos, falamos e agimos mudamos também proteger as outras espécies para podermos ter uma chance. A
o mundo. É importante para nós viver de modo a que, em cada melhor maneira de tomar conta dos seres humanos de modo a
momento, estejamos profundamente nele com nossa verda- que eles fiquem verdadeiramente saudáveis e felizes é tomar
deira presença, sempre vivos e alimentando o insight do inter- conta dos outros seres e do meio-ambiente.
ser. Sem paz e felicidade, não poderemos tomar conta de nós, Conheço ecologistas que não estão felizes com suas fa-
nem das outras espécies e nem do planeta. Por isso a melhor mílias. Eles trabalham duro para melhorar o meio-ambiente
maneira de cuidar do meio ambiente é cuidar do ambientalis- parcialmente por que querem escapar de sua vidas familiares
ta. infelizes. Mas se alguém não é feliz consigo mesmo, como
Existem muitos ensinamentos budistas que podem nos poderá ajudar o meio-ambiente? Proteger os elementos não-
ajudar a compreender nossa interconectividade com a Mãe humanos é proteger os seres humanos e proteger os seres hu-
Terra. Um dos mais importantes é o Sutra do Diamante, es- manos é proteger os elementos não-humanos.
crito sob a forma de um diálogo entre o Buda e um de seus A terceira noção que devemos quebrar é a noção de ser
mais importantes discípulos, Subhuti. O Sutra do Diamante é vivo. Pensamos que os seres vivos são diferentes dos objetos
o texto mais antigo relativo á ecologia profunda. Começa com inanimados, mas , de acordo com o princípio do interser, se-
uma pergunta de Subhuti: “Se filhas e filhos de boas famílias res vivos são compostos de seres não-vivos. Quando olhamos
quiserem gerar a mente mais desperta e realizada, em que eles para dentro de nós, podemos ver os minerais e outros seres
devem se basear e o que eles deveriam fazer para dominar não-vivos. Por que discriminar contra aquilo a que chamamos
seus pensamentos?”.Isto é o mesmo que perguntar “Se eu qui- de inanimado? Para proteger os seres vivos temos que prote-
ser usar todo o meu ser para proteger a vida, que métodos e ger as pedras, o solo, os oceanos...
princípios eu devo usar?”. Os átomos estão sempre se movimentando. Elétrons se
O Buda respondeu “Devemos fazer o melhor possível para movem quase à velocidade da luz. De acordo com o ensina-
ajudar a cada ser vivo a cruzar o oceano do sofrimento. Mas, mento do budismo, átomos e consciência são eles mesmos a
depois de todos terem chegado às margens da libertação, ne- própria consciência. É por isso que essa discriminação entre
nhum ser em absoluto foi carregado até o outro lado. Se você seres vivos e não-vivos deve ser descartada.
se deixar apanhar pelas idéias de eu, pessoa, ser vivo ou tem- A última noção é a de tempo de vida. Costumamos pensar
po de vida, você não será um autêntico bodhisattva”. que nossa vida começa num determinado ponto do tempo e
Eu, pessoa, ser vivo e tempo de vida são as quatro noções que antes deste momento nossa ela não existia. Esta distinção
que nos impedem de ver a realidade. entre vida e não-vida não é correta. A vida é feita de morte e
A vida é uma unidade, não precisamos cortá-la em peda- a morte é feita de vida. Temos que aceitar a morte; ela torna
ços e chamar este pedaço de “eu”. O que chamamos de eu a vida possível. As células do nosso corpo estão morrendo
é feito de elementos não-eu. Quando olhamos uma flor, por todos os dias, mas nunca pensamos em organizar um funeral
exemplo, podemos pensar que ela é diferente das coisas que para elas. A morte de uma célula permite o nascimento de
são “não-flor”. Mas se olharmos com mais profundidade, po- outra. Vida e morte são dois aspectos da mesma realidade.
deremos ver que tudo no cosmos está na flor. Sem algum dos Precisamos aprender a morrer em paz para que outros possam
elementos não-flor sol, nuvens, terra, jardineiro, minerais, viver. Esta profunda meditação produz o não-medo, a não-
rios e consciência uma flor não pode existir. É por isto que o raiva, o não-desespero, as forças que precisamos para nosso
Buda ensina que o eu não existe. Temos que descartar todas trabalho. Na ausência do medo, mesmo que o problema seja
distinções entre eu e não-eu. Como é que alguém pode prote- grande não perderemos o controle. Saberemos dar pequenos e

08
firmes passos.
Se aqueles que trabalham para proteger o meio-ambiente
olharem profundamente para essas quatro noções, eles sabe-
rão como continuar e como agir...
Existe muito sofrimento no mundo e é importante que nós
O jornal também canta
estejamos em contato com esse sofrimento para sermos soli-
dários. Mas para sermos fortes, também precisamos abraçar
os elementos positivos. Quando vemos um grupo de pessoas
vivendo de maneira consciente, sorrindo e se comportando
com amor, ganhamos confiança no futuro. Quando praticamos Planeta Sonho
a respiração, o descanso, o caminhar e o trabalho conscientes, Flávio Venturini
nós mesmos nos tornamos um elemento positivo na sociedade
e inspiraremos confiança em todos que estão à nossa volta.
Esta é a maneira de evitar que o desespero tome conta de nós.
Aqui ninguém mais ficará depois do sol
Também é uma maneira de ajudar as jovens gerações a não No final será o que não sei mas será
perderem a esperança. É muito importante que possamos vi- Tudo demais, nem o bem, nem o mal, só o
ver o dia-a-dia de nossas vidas de tal modo a demonstrar que brilho calmo dessa luz
o futuro é possível. O planeta calma será Terra, o planeta sonho
Para produzir uma mudança real na situação ecológica
global, nossos esforços devem ser harmoniosos e coletivos,
será Terra
baseados no amor e no respeito por nós mesmos e pelos ou- E lá no fim daquele mar a minha estrela vai se
tros, e pelos nossos ancestrais e futuras gerações. Se a raiva apagar
causada pela injustiça é a fonte de nossa energia, iremos pro- Como brilhou, fogo solto no caos
vocar mais danos, coisas que iremos nos arrepender depois. Aqui também é bom lugar de se viver
De acordo com o budismo, a solidariedade (Karuna, NT) é a
única fonte de energia que é útil e segura. Com a solidarieda-
Bom lugar será o que não sei mas será
de, nossa energia nasce do insight; não é uma energia cega. Algo a fazer, bem melhor que a canção mais
Somente sentir compaixão, não é suficiente, temos que apren- bonita que alguém lembrar
der a expressá-la. É por isso que o amor tem andar sempre A harmonia será Terra, a dissonância será
junto com a compreensão. Compreensão e insight nos mos- Terra
tram como agir...
É importante que ao mesmo tempo em que nos tornemos
E lá no fim daquele azul os meus acordes vão
voluntários ou tomemos parte no ativismo ambiental, encon- terminar
tremos uma maneira de continuar nossa prática de respirar, Não haverá outro som pelo ar
caminhar e falar com plena consciência. Não nos deixemos O planeta sonho será Terra, a dissonância será
cair na raiva ou no desespero ao refletir sobre o estado atual bela
do mundo, ou quando confrontados com aqueles que se en-
gajam no desperdício dos recursos naturais. Pelo contrário,
E lá no fim daquele mar a minha estrela vai se
podemos fazer de nossa vida um exemplo de vida simples. A apagar
escuta profunda e a fala amorosa podem nos ajudar a apoiar Como brilhou, fogo solto no caos
a transformação dos indivíduos e da sociedade e nutrir o des-
pertar coletivo que irá salvar nosso planeta e nossa civiliza-
ção...
22 de Abril - Dia da Terra
A prática da plena consciência nos ajuda a ficarmos vi-
gilantes sobre o que está acontecendo. Uma vez sejamos ca-
pazes de olhar profundamente no sofrimento e reconhecer
sua raízes, seremos motivados a agir e a praticar. A energia
que precisamos não é o medo ou a raiva ou mas a energia da
compreensão e da solidariedade. Não há necessidade de cul-
par ou condenar. Aqueles que estão destruindo a si mesmos,
a sociedade e o planeta não o fazem intencionalmente. A dor
e a solidão deles é avassaladora e eles querem escapar. Eles
precisam de ajuda e não de punição. Somente a compreensão
e a solidariedade no nível coletivo pode nos libertar.

09
Rogers Yates Guilherme Rosa - Revista Galileu
Entrevista

S
ociólogo Rogers Yates defende pelo bem-estar animal e pela libertação Eu não quero banir nada, quero uma
o fim da propriedade dos ani- dos animais. Por exemplo, defendemos mudança de consciência. É um tanto
mais. Militante pelos direitos o veganismo, não o vegetarianismo. É utópico, os direitos animais são ba- se-
dos animais chegou a ser preso nos um movimento que foi inspirado pelas ados numa mudança cultural.
anos 80. idéias de Gary Francione.
Devemos fazer o que então?
Os direitos dos animais estão sendo Quais deveriam ser os direitos Abandonar nossos cães e ga-
cada vez mais discutidos, e seus mili- dos animais? tos?
tantes defendem os mais diversos pon- Falamos simplesmente de um direito: É obvio que devemos cuidar dos que
tos de vista. O sociólogo Roger Yates é o direito a não ser uma propriedade. já existem, mas não deveríamos pro-
um defensor dos animais desde os anos Podemos destrinchá-lo em outros: o di- duzir mais. Você pode dizer que é uma
70 e recentemente se juntou ao Aboli- reito à integridade, a não sofrer, a ser questão de oferta e demanda. Quando
cionismo, uma das vertentes mais ra- deixado sozinho sem a interferência a demanda diminuir, a oferta vai di-
dicais do movimento. Eles defendem o humana. Moralmente, devemos lem- minuir também. Porque a criação de
fim de toda propriedade humana sobre brar que não podemos ser seus donos. animais virou um negócio, existem
os animais e o pacifismo como forma Quando vemos uma árvore, tendemos a muitos criadores por aí. Mas hoje em
de luta. Ele explicou suas idéias numa pensar que ela é nossa. Isso vem da te- dia os cachorros só sobrevivem em
entrevista à Revista Galileu: ologia, porque pensamos que o mundo convivência com humanos. É por isso
é nosso, foi dado pra gente por Deus. que eles deveriam diminuir aos poucos.
Você é um sociólogo. Como O que penso é que existem outros seres É claro que alguns animais até podem
a sociologia pode nos ajudar que têm tanto direito à Terra quanto a existir livremente sem nossa interferên-
a entender a questão dos ani- gente. cia, mas esse não é o caso de Poodles
mais? e Chihuahas. Temos que pensar nesse
A sociologia nos ajuda a entender como problema que criamos, e o primeiro
tratamos os animais porque ela olha a passo é mostrar para as pessoas que é
sociedade e pensa suas atitudes. Ela um problema.
olha o modo como as pessoas se adap-
tam às regras e valores, o modo como Qual seria a relação perfeita
somos levados a olhar de modo dife- entre homem e animais?
rente os humanos e não-humanos. Nós Precisamos entender que temos respon-
ensinamos nossas crianças que é certo sabilidades com eles, e, obviamente,
usar os animais, mas sem causar sofri- eles não têm responsabilidades conos-
mento desnecessário. A sociologia nos co. Devemos respeitá-los como possui-
ajuda a entender o especismo: porque O que você pensa sobre os ani- dores de direitos. No momento estamos
pensamos que somos mais importantes, mais domésticos? fundando essa nova relação entre huma-
porque valorizamos as vidas de formas O problema com esses animais é que nos e animais, somos pioneiros. Muitas
diferentes. nós os geramos e selecionamos sua pessoas se frustram com a demora das
raça. Alguns animais de pedigree não mudanças sócias. Eu, como sociólogo,
Então a gente não é mais im- podem fazer sexo, seus olhos caem, entendo que a mudança é geracional.
portante que os animais? têm problemas horríveis de esqueleto As pessoas têm que estar acostumadas
Precisamos ver o quanto racionalizamos por causa de seu formato. Nossa técni- às novas ideias antes de aceita-las. Meu
nossa importância. Os não-humanos ca de cruzamento de cães tem causado trabalho é fazer essa fundação, para que
querem viver o tanto quanto a gente, é muitos problemas para eles: cachorros os que vierem depois de mim façam seu
um mal matar um animal e há um senso muito pequenos, muito grandes, ca- trabalho.
de igualdade quando comparamos nos- chorros que têm problemas de pele. Se
sas vidas. Somos treinados socialmente você olhar para os animais de pedigree, Você só luta pelos direitos dos
a resistir a essa idéia e achá-la tola e verá uma situação de pesadelo. animais?
sentimental. Eu estive envolvido em movimentos
E temos o direito de ser donos tanto pelos direitos dos animais quanto
A resposta então é o Abolicio desses animais? pelos humanos. Sempre me envolvi em
nismo? Acho que não. Muita gente pensa que movimentos contra o tráfico de huma-
O Abolicionismo está deslanchando, nossa relação com os animais é sim- nos e a escravidão moderna, isso é que
se tornando um movimento substancial biótica e que não há problema, mas a mais me incomoda. Se as pessoas ainda
nos EUA e na Europa. É uma idéia nova, instituição de possuir um animal já desrespeitam os direitos dos outros ho-
que existe há uns cinco anos. É diferen- é problemática. Eu sei que é uma das mens, isso explica nossa incapacidade
te dos movimentos dos anos 70, 80 e questões mais complicadas dos direitos de respeitar os animais.
90; uma versão radical dos movimentos dos animais, porque é um tanto radical.

10
Justiça Social - Justiça Ecológica Leonardo Boff

E
ntre os muitos problemas que assolam a humanidade, ção) são responsáveis por apenas 7% das emissões”.
dois são de especial gravidade: a injustiça social e a in- Esta injustiça ecológica dificilmente pode ser tornada invisí-
justiça ecológica. Ambos devem ser enfrentados con- vel como a outra, porque os sinais estão em todas as partes,
juntamente se quisermos pôr em rota segura a humanidade e nem pode ser resolvida só pelos ricos, pois ela é global e atin-
o planeta Terra. ge também a eles. A solução deve nascer da colaboração de
A injustiça social é coisa antiga, derivada do modelo eco- todos, de forma diferenciada: os ricos, por serem mais respon-
nômico que, além de depredar a natureza, gera mais pobreza sáveis no passado e no presente, devem contribuir muito mais
que pode gerenciar e superar. Ele implica grande acúmulo com investimentos e com a transferência de tecnologias e os
de bens e serviços de um lado à custa de clamorosa pobreza pobres têm o direito a um desenvolvimento ecologicamente
e miséria de outro. Os dados falam por si: há um bilhão de sustentável, que os tire da miséria.
pessoas que vive no limite da sobrevivência com apenas um Seguramente, não podemos negligenciar soluções técnicas.
dólar ao dia. E há, 2,6 bilhões (40% da humanidade) que vive Mas sozinhas são insuficientes, pois a solução global remete a
com menos de dois dólares diários. As consequências são per- uma questão prévia: ao paradigma de sociedade que se reflete
versas. Basta citar um fato: na dificuldade de mudar es-
contam-se entre 350-500 tilos de vida e hábitos de
milhões de casos de ma- consumo. Precisamos da
lária com um milhão de solidariedade universal,
vítimas anuais, evitáveis. da responsabilidade cole-
Essa anti-realidade foi tiva e do cuidado por tudo
por muito tempo mantida o que vive e existe (não
invisível para ocultar o somos os únicos a viver
fracasso do modelo eco- neste planeta nem a usar
nômico capitalista feito a biosfera). É fundamen-
para criar riqueza para tal a consciência da inter-
poucos e não bem-estar dependência entre todos
para a humanidade. e da unidade Terra e hu-
A segunda injustiça, manidade. Pode-se pedir
a ecológica está ligada à às gerações atuais que se
primeira. A devastação da rejam por tais valores se
natureza e o atual aque- nunca antes foram vivi-
cimento global afetam dos globalmente? Como
todos os países, não respeitando os limites nacionais nem os operar essa mudança que deve ser urgente e rápida?
níveis de riqueza ou de pobreza. Logicamente, os ricos têm Talvez somente após uma grande catástrofe que afligiria
mais condições de adaptar-se e mitigar os efeitos danosos das milhões e milhões de pessoas poder-se-ia contar com esta ra-
mudanças climáticas. Face aos eventos extremos, possuem dical mudança, até por instinto de sobrevivência. A metáfora
refrigeradores ou aquecedores e podem criar defesas contra que me ocorre é esta: nosso pais é invadido e ameaçado de
inundações que assolam regiões inteiras. Mas os pobres não destruição por alguma força externa. Diante desta iminência,
têm como se defender. Sofrem os danos de um problema que todos se uniriam, para além das diferenças. Como numa eco-
não criaram. Fred Pierce, autor de “O terremoto populacional” nomia de guerra, todos se mostrariam cooperativos e solidá-
escreveu no New Scientistde novembro de 2009: “os 500 mi- rios, aceitariam renúncias e sacrifícios a fim de salvar a pátria
lhões dos mais ricos (7% da população mundial) respondem e a vida. Hoje a pátria é a vida e a Terra ameaçadas. Temos
por 50% das emissões de gases produtores de aquecimento, que fazer tudo para salvá-las.
enquanto 50% dos pais mais pobres (3,4 bilhões da popula-

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Produzido e Publicado pelo Grupo Ganapati

Ganapati
E-mail: grupo.ganapati@gmail.com | Blog: http://grupoganapati.blogspot.com
João Asfora Neto (81) 9697.6629, Jorge Terto (81) 8639.0642, Simone Nassar, Sérgio
Pires, Cynthia Silveira, Mariana Hoblos, Paulo Lins, Pedro Santos, Liney Dias,Luciana
Asfora, Roberta Lima, Jeanine Japiassu, Isadora Dias e Conceição Cavalcanti.

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