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exííio dourado nos Estados Unidos, nem se marginalizou na


Grã-Bretanha. Terminou instalado como Sir ou Lorã Karl
Popper, tomando seu chá e pontificando, durante gerações,
na "Lonãon School of Economics"...
É neste contexto que temos de entendei] seu Anti-Histo-
ricismo, apresentado n'A sociedade aberta e seus inimigos,
bem como na Lógic a da pesquisa c ientífi ca, um traduzido
para o português no Brasil há certo tempo e outro aparecido 1

há pouco. Agora Tempo Brasileiro apresenta esta coletânea A LÓGICA DAS CIÊNCIAS SOCIAIS
de ensaios, entregues pessoalmente ao autor destas linhas,
após discussão inesquecível quando nem sempre concorda-
mos, porém da qual guardarei para sempre a lembrança de Proponho começar me u trabalho sobre a lógica das ciên-
flexível exatidão, calor humano e generosidade intelectual, cias sociais com duas teses que form ula m a oposição entre
naquela tarde de outono entre as longas e largas árvores de nosso conhecimento e nossa i gn o râ n c i a .
Fallowfield em 1976.
Primeira tese: Conhecemos m uit o. E conhecemos nã o
só muitos detalhes de interesse intele ctual duvidoso, porém ,
coisas que são de um a significação pr á t i c a considerável e,
o que é mais importante, que nos oferecem um profundo
discernimento teórico, e um a co m pr ee ns ão surpreendente do
mundo.

Segunda tese: Nossa i gno r â n ci a é sóbria e ilimitada.


De fato, ela é, precisamente, o progresso titubeante das ciên-
cias naturais (ao qual alude m i n h a prim eir a tese), que cons-
tantemente, abre nossos olhos mais um a vez à nossa igno-
râ nc ia , mesmo no campo das pr óp ri a s ciê ncia s naturais. Isto
d á ' u m a nova virada na idéia s oc rá ti ca de ignor ância . A cada
passo adiante, a cada problema que resolvemos, nã o só des-
cobrimos problemas novos e n ã o solucionados, por ém , tam-
bém , descobrimos que aonde a c r e di t á v am o s pisar em solo fir-
1 me e seguro, todas as coisas são , na verdade, inseguras e. em
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estado de alteraçã o c o nt í nu a .
Minhas duas teses concernentes ao conhecimento e à
Ignor ânc ia , só aparentemente contradizem um a à outra.
A c ontra dição aparente é, pr imeiramente, devida ao fato de
que as palavras "conhecimento" e " i g n o r â n c i a " n ã o são usa-
sm das nestas duas teses como perfeitos c ont r ár i os . Todavia, am-
1. Isto foi a contribuição de abertura ao simpósio de TUBINGEN, seguida
da réplica do Professor Adorno. A tradução foi revista e aumentada
pelo autor para a presente publicação.

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bas as idé ia s sã o importantes, e t a m b é m assim o sã o ambas coberta de um a c ont ra di çã o aparente entre nosso suposto
as teses; tanto que proponho fazê-las explíc itas nas t r ês teses conhecimento e os supostos fatos.
seguintes. Enquanto minha s primeiras t r ê s teses, talvez por causa
de seu ca rá t e r abstrato, cria m a impressã o de que estão algo
deslocadas do nosso tópic o — isto é, a lógica das ciências
Terceira tese: É uma tarefa de fundame ntal i m p o r t â n -
sociais •— eu' gostaria de dizer que com minha quarta tese
cia par a qualquer teoria do conhecimento, e, talvez, a t é um
requisito cruci al, fazer justiç a às nossas primei ra s duas te- atingimos o cerne de nosso t ópic o. Isto pode ser formulado
ses, esclarecendo as relações entre nosso ad mi r áv e l e cons- em mi nh a quint a tese, como se segue.
tantement e aumentado conhecimento e nosso f r e q ü e n t e m e n t e
acrescido discernimento de que realmente nada conhecemos. Quinta tese: Como em todas as outras ciências, esta-
mos, nas ciências sociais, sendo bem ou m al sucedidos, i n -
Se se refletir um pouco sobre isso, torna-se quase óbvio teressantes ou m a ç a n t e s , frutíferos ou infrutíferos, na exata
que a lógica do conhecimento tem que discuti r esta t e n sã o pr oporçã o à signifi cânci a ou interesse dos problemas a que
entre conhecimento e ignorâ ncia . U m a c o ns e q üê n ci a impor - estamos ligados; e t a m b é m , é claro, na exata proporç ão à
tante deste- discernimento está formulada em m i n h a quarta honestidade, 'retidão e simplicidade com que atacamos estes
tese. P or ém , antes de apresentar esta quarta tese, eu gostaria problemas. Em tudo isto n ã o estamos, de modo algum, con-
de me desculpar pelas minhas teses numeradas que aind a finados a problemas teóricos. Sérios problemas prát icos, como
estão por vir . M i n h a desculpa é que me foi sugerido pelos os problemas de pobreza, de analfabetismo, de supr essão po-
organizadores desta conferência que eu montasse este tra- lítica ou de incerteza concernente a direitos legais são i m -
balho sob a forma de teses numeradas (para tornar ma is portantes pontos de pa rtida pa ra pesquisa nas ciências so-
fácil ao segundo confereneista apresentar suas contra-teses ciais. Contudo, estes problemas prát ic os conduzem, à espe-
crític a s mais acuradamente). Ache i muit o ú ti l esta suges- culaç ão, à teoriz ação , e, portanto, a problemas teóricos. Êm
tã o , a despeito do fato de que este estilo pode c ria r a i m - todos os casos, sem exce ção, é o ca r át e r e a qualidade do
pr essão de dogmatismo. M inh a quarta tese, e n tã o , é a se- problema e t am b ém , é claro, a a ud áci a e a originalidade da
guinte. solução sugerida, que determinam o valor ou a ausência do
valor de um a empresa científ ica .
Quarta tese: Se é possível dizer que a ciência , ou o co- Ent ão , o ponto de partid a é sempre um problema e a ob-
nhecimento, "c o m eç a " por algo, poder-se-ia dizer o seguinte: servação torna-se algo como um ponto de partida somente
o conhecimento n ã o começa de percepções ou observações ou se revelar um problema; ou em outras palavras, se nos sur-
de coleção de fatos ou números , porém , c omeç a , mais pro- preende, se nos mostra que algo nã o e stá , propriamente, em
priamente, d e problemas. Poder-se-ia dizer: n ã o h á nenhu m ordem com nosso conhecimento, com nossas expectativas,
conhecimento sem problemas; mas, t a m b é m , n ã o há ne- com nossas teorias. U m a observaçã o cria um problema so-
nhu m problema sem conhecimento. Mas isto signif ica que o mente se ela se conflit a com certas expectativas nossas, cons-
conhecimento c om eça da t ensã o entre conhecimento e igno- cientes ou inconscientes. Ma s , o que, neste caso, constitui o
r ânc i a . Portanto, poderí amos dizer que, n ã o h á ne nhu m pro- ponto de partida de nosso trabalho científico é nã o tanto a
blema sem conhecimento; mas, t a m b é m , n ã o há nen hum pura e simples observação, p or é m , mais adequadamente, um a
problema sem igno r ânc ia . Pois cada problema surge da des- observação que desempenha um papel particular, isto é, um a
coberta de que algo nã o e st á em ordem com nosso suposto observação que cri a um problema.
conhecimento; ou, examinado logicamente, da descoberta de
um a co nt ra di çã o interna entre nosso suposto conheciment o Alca ncei agora o ponto onde posso formular a m inha
e os fatos; ou, declarado talvez mais corretamente, da des- principal tese, a de n ú m e r o seis. E l a consiste do seguinte:

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Sexta tese: apelo ao fato de que a t é aqu i nossas soluções tentadas pare-
a) O métod o das ciências sociais, como aquele das ciên- cem contrariar a t é nossas mais severas tentativas de c rí ti c a .
cias naturais, consiste em experimentar possíveis soluções Não há ne nhu ma justific ativ a positiva; nenh uma justi -
para certos problemas; os problemas com os quais iniciam-se ficativa que ultrapasse isto. Em particular, nossas sol uçõe s
nossas investig açõe s e aqueles que surgem dur ante a inves- experimentais n ã o podem ser apresentadas como prov áv ei s
tig aç ão . , (em nenh um sentido que s at isf aç a as leis do cálcul o de pro-
As soluções são propostas e criticadas. Se um a solução babilidades) .
proposta n ã o est á aberta a uma crítica pertinente, en tã o è Talvez poder-se-ia descrever essa po sição como "a abor-
excluída como nã o científica, embora, talvez, apenas tempo- dagem c r í t ic a " ( " c rí ti ca " alude ao fato de que existe aqui
rariamente. uma r el açã o com a filosofia de K a n t ) .
b) Se a solução tentada está aberta a cr ít ica s perti- Para ensejar um a melhor idéi a de m in ha tese pri ncip a l
nentes, en tã o tentamos refutá-la; pois toda c r ít ic a consiste e sua i m p o r t â n c i a para a sociologia; pode ser ú t i l c onf ro ntá -
em tentativas de refutaçao. la com outras determinadas teses que pertencem a u m a me-
c) Se um a solução tentada é refutada a tr a v é s do nosso todologia largamente ut ilizad a que, fr eq üent em ente , tem sido
criticis mo, fazemos outra tentativa. aceita e absorvida de forma praticamente inconsciente e
d) Se ela resiste à crítica, aceitamo-la temporariamen- acrítica.
te; e a aceitamos, acima de tudo, como digna de ser discutida Existe, por exemplo, a equivocada e errône a abordagem
e cri ticada mais além. metodológica do naturalism o ou cientificismo, que frisa que
e) Portanto, o método da c iência consiste em tentativas está na hor a das ciên c ia s sociais aprenderem das ciência s
experimentais para resolver nossos problemas por conjecturas naturais o que é m ét o d o cient ífico.
que sã o controladas por severa crítica. É um desenvolvimento Este naturalismo equivocado estabelece exigência s tais
crítico consciente do método de "ensaio e erro". como inicia r com observações o medidas; isto signific a, por
f) A assim chamada objetividade da ciê nci a repousa exemplo, co me ça r por coletar dados e sta tí sticos; prossegue,
na objetividade do método crítico. Isto significa, acim a de logo após, pela i n d u ç ã o a generalizaçõe s e à form açã o de
tudo, que nenhuma teoria está isenta do ataque da crítica ; e, teorias.
mais ainda, que o instrumento principal da c rít ic a lógica —- Declara-se que, a t r a v é s deste caminho, você se aproxima-
a co ntr ad içã o lógica — é objetivo. rá do ideal da objetividade científi ca, na medida em qu ê isto
A idéia básica que se encontra por t r á s de mi nh a tese é possível nas ciências sociais.
central pode t am b é m ser colocada da seguinte forma. Procedendo deste modo, você deve estar consciente do
fato de que a objetividade nas ciências sociais é muito mais
Sétima tese: A tensão entre conhecimento e i gn or ân - difícil de a l c a n ça r (se puder totalmente ser atingida) ,do
cia conduz a problemas e a soluções experimentais. Contudo, que nas ciência s naturais, pois um a ciência objetiva deve ser
a t e ns ã o n ã o é nunca superada, pois revela que nosso conhe- "isenta de valores", isto é, independente de qualquer j uíz o
cimento sempre consiste, meramente, de sugest õ es par a so- de valor. Mas, apenas nos casos mais raros pode o cientista
luções experimentais. social libertar-se do sistema de valores de sua p róp ri a classe
social e assim a tin gi r um grau mesmo limita do de " ise nç ão
Assim, a próp ria idéia de conhecimento envolve, em prin-
de valores" e "objetividade".
cípio, a possibilidade de que revelar-se-á ter sido um erro e,
portanto, um caso de ign or ância. E a ún i c a form a de "jus- Qualquer u m a destas teses que se atribui a este natura -
tificar" nosso conhecimento é, ela pró pri a, meramente pro- lism o equivocado est á, em m in h a opinião, totalmente errada.
visória, porque consiste em crític a ou, mais precisamente, no Todas essas teses sã o baseadas em uma má compre en sã o dos

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método s das ciências naturais, e, praticamente, èm um mito,
sociólogo teórico, contudo, deve estar contente por enc on-
um mit o infelizmente muito largamente aceito e muito in-
trar emprego como trabalhador de campo e um especialista;
fluente. :É o mito do caráte r indutivo do mét odo das ciências
sua funçã o é observar e descrever os totens e tabus dos na -
naturais, e do c ar áte r da objetividade das ci ênc ias naturais.
tivos da ra ç a bra nca na Europa Ocidental e nos Est ados
Proponho, no que se segue, devotar um a pequena parte do
Unidos.
tempo precioso a minha disposição, a uma crí tica a este na-
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turalismo equivocado . Mas , provavelmente, n ã o se deve reconhecer esta mu -
da n ç a no destino do cientista social muit o seriamente, par-
Reconhecidamente, muitos cientistas sociais rej eitarão ticularmente porque nã o existe nada como a e s sê nc i a de
um a ou outra destas teses que tenho at rib uíd o a este natu- um assunto científico. Isto me leva à m in h a non a tese.
ralismo equivocado. Não obstante, este naturalism o parece,
presentemente, ter atingido um poder m aior nas ciências so- Nona tese: U m , assim chamado, assunto cie ntí fic o é,
ciais, exceto, talvez, em economia; ao menos nos países de meramente, um conglomerado de problemas e sol uçõe s ten-
lí n gu a inglesa. Desejo formular os sintomas desta vitória na tadas, demarcado de um a forma artificial. O que rea lmente
m i nh a oitava tese. existe sã o problemas e soluções e t radiç õe s cie nt íf ica s.
Nã o obstante esta nona tese, a i nve rsã o completa entre
Oitava tese: Antes da Segunda Guerr a Mun di al , a so- sociologia e antropologia é extremamente interessante, n ã o
ciologia era considerada como um a ciênci a social geral e teó - por causa de suas especialidades ou de seus t ítu lo s , ma s por-
rica, comparável, talvez, com a física teórica, e a antropolo- que ele conduz à vitória de um método pseudo-c ientífic o.
gia social era considerada como um tipo mui to especial de Assi m chego à mi n h a pró xi m a tese.
sociologia — uma sociologia descritiva das sociedades pri-
mitivas. Hoje 3, essa relação tem sido, completamente, inver- Décima tese: A vitóri a da antropologia é a vitóri a de
um m é t o do supostamente observacional, supostamente des-
tida ; um fato para o qual se deve chamar a ate n ção .
cri tiv o e supostamente mais objetivo, e, portanto, do eme é
A antropologia social ou etnologia tem se tornado uma tomado por m éto do das ciências naturais. É um a vitó r ia de
ciênci a social geral, e a sociologia tem se resignado, mais e Pirro . Outr a vitóri a dessas, e nós — isto é, ambas a antro-
mais, a desempenhar um papel de um tipo especial de antro- pologia e a sociologia — estamos perdidos.
pologia social, a antropologia social das altamente indus- M i n h a dé cim a tese pode ser formulada, admito de pron-
trializadas formas de sociedade americana ou européia-oci- to, um pouco intencionalmente demais. Admito , é cla ro , que
dental. Redeclarando mais sinteticamente, a relaç ão entre a mui t o do interesse e da i mpo rt ânc i a tê m sido descobertos pela
sociologia e a antropologia tem se invertido. A antropologia antropologia social, que é um a das mais bem sucedidas ciên-
social tem sido promovida de um a aplicada disci plin a descri- cias sociais. Alé m disso, admito prontamente que pode ser
ti va para uma ciência teórica chave e o ant rop ólog o tem sido fascinante e significativo para nós europeus, vermo-nos, par a
elevado de um descritivo trabalhador de campo, modesto e variar, at r a v é s dos aspectos da antropologia soc ial. P o ré m ,
de horizontes curtos, a um profundo teórico social de vistas embora estes aspectos sejam, talvez, mais coloridos do que
largas e a um psicólogo das profundezas sociais. O antigo outros, dificilmente seriam, por esta razão , mais objetivos.
O ant rop ól o g o n ã o é observador de Marte que, f re qü e nt e -
mente, ele se acredita ser e cujo papel social, geralmente, ten-
2. (Nota à edição inglesa). O que meus opositores de F R A NK FU R T cha- ta desempenhar (e nã o sem prazer), bastante desassociado
mam positivismo parece-me ser o mesmo que chamo aqui de "natura-
lismo equivocado", Eles tendem a ignorar minha rejeição do fato de que n ã o há ra zã o para se supor que um habitante
3. (Nota à edição inglesa). Desde que isto foi escrito em 1961, tem havido de M ar t e nos veria mais "objetivamente", do que nós , por
uma forte reação às tendências aqui criticadas
exemplo, nos verí amos .
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Neste contexto eu gostaria de contar uma es tória que é pessoa ou outra tenta dominar o grupo e como suas tentativas
reconhecidamente extrema, mas, de nenhum modo, única são rejeitadas pelos outros, seja individualmente ou atra vé s da
embora seja um a es tória verídica , isto é, sec undári a no con- formação de uma coalisão; como depois de várias tentativas
deste tipo, uma ordem hierárquica, e, portanto um equilíbrio
texto presente. Se a estóri a lhes parecer improvável, por fa- grupai, e também um rito grupai de verbalização se desenvol-
vor, tomem-na como um a i nvenç ão, como um a ilus tração l i - vem; estas coisas são sempre semelhantes, não importa quão
vremente inventada, destinada a esclarecer um ponto impor- variada a questão pareça ser, que serve como tó pico de dis-
tante, por inte rm édi o de um exagero crasso. cussão".

Anos at r ás , eu era um participante em uma conferência Nós ouvimos nosso antropól og o visitant e de Ma rt e e tudo
de quatro dias organizada por um teólogo, na qual partici- o que.t inha a dizer; e, ent ão, fiz-lhe duas perguntas. Em pri -
pavam filósofos, biólogos, ant ropólogo s e físicos — um ou meiro lugar, se ele teria qualquer co m e n tá r i o a fazer sobre
dois representantes por c ada 'disciplina ; ao todo oito partici- o verdadeiro conteúdo e o resultado de nossa dis cuss ão ; e, en-
tã o , se ele nã o poderia ver que existiam coisas como razõe s
pantes estavam presentes. O tópi co era, eu acho, "Ciência
impessoais ou argumentos que poderi am ser váli do s ou i nvá -
e Humanismo". Depois de várias dificuldades iniciais e a eli- lidos. Ele replicou que havia se concentrado muit o na obser-
m i na ç ã o de um a tentat iva de nos impressionar com uma pro- vaçã o do comportamento de nosso grupo, o que o im pediu
fundidade exaltada ( " E R H A H E N E T I E F E " é um termo de de seguir em detalhes, o nosso argumento; mais ainda, se
H E G E L qu.e falhou em ver que uma profundidade exaltada assim o tivesse feito, ele teria posto a perigo (assim declarou)
é somente um chavão) os esforços conjuntos de quatro ou sua objetividade; pois poderia ter se envolvido pelo argumen-
cinco áspera s participantes conseguiram, ao cabo de dois to; e se ele tivesse permitido ser guiado por isto, ele teria
dias, elevar a di scuss ã o a um nível invulgarmente alto se tornado um de nós — e aquele, teri a sido o fi m de sua
Nossa conferênci a t inh a atingido o estági o — ou assim me objetividade. Além disso, ele foi treinado nã o para jul ga r o
pareceu, enfim no qual e stávamos mutuamente, apren- cont e úd o litera l do comportamento verbal (ele usava, cons-
dendo algo. tantemente os termos "comportamento verbal" e "verbal i-
za ç ão " ) , ou t omá-l o como importante. O que se relacionava
a ele, disse, era a função social e psicológica deste compor-
De qualquer forma, nó s es távamo s imersos no assunto
tamento verbal. E adicionou algo como o s eguinte:
de nosso debate, quando, inesperadamente, o antropólogo so-
cial deu sua contribuição. •
Enquanto os argumentos ou razões impressionam vocês
como participantes de uma discussão, o que nos interessa é o
Vocês ficarão, talvez, surpresos — ele disse — por eu não fato de que através destes meios vocês podem impressionar-se
ter dito nada até agora, nesta conferência. Isto é devido ao e influenciar-se mutuamente; e também, é claro, os sintomas
fato de que eu sou um observador. Como antropólogo, eu vim desta influência.
a esta conferência não tanto para participar de vosso 'compor- Estamos interessados em conceitos como a ênfase , a hesi-
tamento verbal, porém, mais propriamente, para estudar vosso tação, a intervenção e a concessão. Não estamos verdadeira-
comportamento verbal. Isto é o que tenho conseguido fazer mente interessados no conteúdo pactuai da discussão, mas ape-
Concentrando-me nesta tarefa, eu não estava sempre apto a nas, com os papéis que são desempenhados pelos vários parti-
seguir o verdadeiro conteúdo de vossa discussão Mas a W é m cipantes, como a interação dramática como tal. Em relação
aos assim chamados argumentos, eles são somente, é claro, um
como eu, que tem estudado dúzias de grupos de debate apren-
aspecto do comportamento verbal nã o mais importante do que
de com o tempo que o tópico discutido é relativamente sem
os outros. A idéia de que pode se distinguir entre argumentos
importância. Nós, antropólogos, aprendemos — isto é quase
e outras verbalizações impressionantes é uma ilusão puramente
a
literal (até onde eu me lembro) — considerar estes fenô-
subjetiva; e assim é a idéia da distinção entre argumentos ob-
menos sociais de fora, e de um ponto de vista mais objetivo jetivamente válidos e objetivamente inválidos. Sob pressão, po-
O que nos interessa não é o quê, o tópico, porém, mais ade- der-se-ia classificar os argumentos de acordo com as sociedades
quadamente, o como: por exemplo, a maneira pela qual uma ou grupos em que eles são aceitos em determinados momentos,
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como válidos ou inválidos. Que o elemento tempo desempenha Todavia, minha tese t a mb é m possui um lado positivo e
um papel, é també m revelado pelo fato de que argumentos este é mais importante. Ele forma o c on t e úd o da mi nh a dé-
aparentemente válidos, -que são aceitos em um momento, em
um grupo de debate como o presente, podem, contudo, serem cima-segunda tese.
atacados ou rejeitados em um estágio posterior por um dos
participantes. Décima-segunda tese: O que pode ser descrito como
objetividade científica é baseado unicamente sobre uma tra-
Eu n ã o quero prolongar a descrição deste incidente. Eu dição crítica que, a despeito da resistência, f re q üe nt e me n t e
imagino que n ã o ser á necessári o declarar nesta r eun ião , que torna possível criticar um dogma dominante. A fim de co-
a posição, algo extremada, de meu amigo an tropólo go de- locá-lo sob outro prisma, a objetividade da ciênci a n ã o é um a
monst ra em sua origem i ntelectual a influência , nã o só do m atér ia dos cientistas individuais, poré m , mais propriamen-
ideal "B EH AV IO RÍ ST IC O" da objetividade, mas t a m bé m te, o resultado social de sua crítica recíproca , da divis ão hos-
de certas idé ia s que t ê m florescido em solo a lem ão .. Refiro- til-amistosa de trabalho entre cientistas, ou sua cooper ação
me à idéia do relativismo filosófico, do relativismo histórico, e t a mb é m sua competi ção. Pois esta ra z ã o depende, em par-
que acredita n ã o existir verdade objetiva, p or ém , ao cont r ári o , te, de um núm er o de ci rcuns tânc ia s sociais e políticas que
meramente verdades para esta ou aquela era e do relativis- fazem possível a crítica.
mo sociológico, que ensina a exi stênci a de verdades ou ciên-
cias para esta ou aquela classe ou grupo ou profissão , como Décima-terceira tese: A assim chamada sociologia do
a ciênc ia pr o le t ár i a e a ciênc ia burguesa. T a m b é m acredito conhecimento, que tenta explicar a objetividade da ciência
que a sociologia do conhecimento tem sua grande parc ela de pela atitude de desapego impessoal de cientistas individuais
responsabilidade, pois c ontribuiu para a pré-hist óri a dos dog- e a falta de objetividade em termos de " H A B I T A T " social do
mas repetidos pelo meu amigo a nt ropól ogo. Reconhecida- cientista, falha completamente no seguinte ponto decisivo:
mente, elo adotou uma posição algo extremada naquela con- o fato de que a objetividade repousa, unicamente, sobre uma
ferência. P o ré m esta posição , especialmente se for um pouco crí tic a recíproca. O que falta à sociologia do conhecimento
modificada, n ã o é nem a t ípi c a nem irrelevante. é nada menos do que a própri a sociologia do conhecimento
Mas esta posi ção é absurda. Já que tenho criticado o re- — o aspecto social da objetividade científ ic a e sua teoria. A
lativismo hist óric o e sociológico e ta m bé m a sociologia do co- objetividade pode, somente, ser explicada em termos de idéias
nheciment o em outros trabalhos, deixarei de crit icá-los aqui. sociais como a competição (ao mesmo tempo, de cientistas
Ater-me-ei a debater, bem resumidamente, a idéia , i n g ê n u a individuais e de vária s escolas); t rad içã o (principalmente a
e equivocada, de objetividade ci entífica que forma a base des- tradiçã o crítica) ; a instituiçã o social (por exemplo, a publi-
ta posição. cação em vários jornais concorrentes e atr avés de vários edi-
tores concorrentes; discussão em congressos); o poder do
Décima-primeira tese: íi um erro a dmi ti r aue a objeti- Estado (sua tolerância com o debate livr e) .
vidade de um a c iênci a dependa da objetividade do ci entista. Alguns detalhes menores, como, por exemplo, o " H A -
E é um erro acreditar que a atitude do cientista na tura l é B I T A T " social ou ideológico do pesquisador, tendem a ser
mais objetiva do que a do cientist a social. O cientista nat u- eliminados com o correr do tempo; embora, reconhecidamen-
ra l é t ão pa r t i d ár i o quanto as outras pessoas, e a n ã o ser que te, eles sempre desempenhem um papel imediato.
pe r te nç a aos poucos que estão, constantemente, produzindo De um modo semelhante à quele no qual temos resolvido
novas idéias, ele e stá , infelizmente mui to inc linado, em ge- o problema da objetividade, podemos resolver o problema aná -
ra l, a favorecer suas idé ias preferidas de um modo parc ial logo da liberdade da ciência no envolvimento em juízo de
e unilateral . Vários dos físicos contemporâneos de maior pro- valores (isenção de valores); e o podemos fazer de uma ma-
je ção t ê m fundado, t a m b é m , escolas que estabelecem um a re- neira mais livre, e menos dogm áti ca , do que é feita geral-
sistênci a poderosa a novas idéias. mente.

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Décima-quarta tese: Em uma discussão crí ti ca pode- Isto nã o pode, é óbvio, ser conseguido de um a vez só e
mos disting uir ques tões tais como: 1) a que stã o da verdade para sempre, por i nt er mé d i o de um decreto; contudo, perma-
de uma asserção ; a questão de sua relevância, do seu inte- nece como um a das mi ssões permanentes do m ú t u o critic is-
resse e da sua significação em relação aos problemas nos mo científico. A pureza da ciênci a p ur a é um ideal presumi-
quais estamos interessados; 2) a qu estã o da sua relevânci a e damente in a lcan çável ; mas é um ideal para o qual estamos
do seu interesse e da sua signi fi cância para vário s problemas lutando constantemente — e devemos lutar — por i nt erm é -
extra-científicos, por exemplo, problemas de bem-estar hur- dio da crítica.
mano, os problemas estruturalmente bem diferentes, da defe-
sa na cio nal; ou (por contraste) de u ma agressiva política Ao formula r esta tese eu disse que é, praticamente, im -
nacionalista; ou de expansão industrial; ou de aquisição de possível conseguir a el i mi n a ç ã o dos valores extra-científicos
riqueza pessoal. da atividade científica. A s i t u a ç ã o é semelhante com respeito
à objetividade; nã o podemos roubar o partidarismo de um
É claramente impo ssível eliminar tais interesses extra- cientista sem t a m b é m roubá-l o de sua humanidade, e n ã o
científicos e evitar sua influênci a no curso da pesquisa cien- podemos suprimir ou destruir seus juí zos de valores sem des-
tífica. E é tanto impossível eliminá-los da pesquisa nas ciên- truí-l o como ser humano e como cientista. Nossos motivos
cias naturais — citemos a pesquisa em física — quanto da e at é nossos ideais puramente científicos, inclusive o ideal de
pesquisa nas ciências sociais. uma desinteressada busca da verdade, estã o profundamente
enraizados em valo rações extra-cientí fica s e, em parte, reli-
O que é possível e o que é importante e o que empresta giosas. Portanto, o cientista "objetivo" ou "isento de valores"
à ciência o seu ca rá te r especial nã o é a elim inaçã o dos i n - é, dificilmente, o cientista ideal. Seni paixão n ã o se consegue
teresses extra-científico s poré m, mais propriamente, a dife- nada — certamente n ã o e m ciê nc i a pura. A frase "a paixã o
renciação entre os interesses que nã o pertencem à pesquisa pela verdade" nã o é uma mera me tá fo ra .
para a verdade e para o puro interesse científico na verdade.
Mas, embora a verdade seja nosso valor científ ico decisivo, • Portanto, nã o é que, apenas, a objetividade e a liberdade
ele n ã o é nosso únic o princíp io. Relevância, interesse e sig- de envolvimento com valores (isenção de valores) sejam inal-
nificância (a significação de declarações relativas a um a si- cançávei s na prá t ic a , pelo cientista individual, porém, mais
tu a çã o pr o b le mát ic a puramente cientí fica), são, igualmente, adequadamente, que a objetividade e a liberdade em rel açã o a
tais d ependê ncias , são valores em si mesmos. E, desde que,
valores cie ntífic os de primeira ordem; e isto é t a m b é m ver-
a liberdade de valores é, ela pr óp ri a , um valor, a exigência
dadeiro acerca de valores como fecundidade, força explica-
incondicional de liberdade em rel a çã o a qualquer ligaçã o a
tiva, simplicidade, e precisão. valores é. paradoxal. Não considero este argumento como
muito importante; mas deveria ser notado que o paradoxo
Em outras palavras, existem valores e desvalores pura- desaparece, totalmente, por sua p róp ri a iniciativa, se subs-
mente científicos e valores e desvalores e xíra- científicos. tituirmos a e xigênci a pela liberdade de dep en dê nc i a a todos
E, embora seja impossível separar o trabalho científico de os valores pela exigência de que deveria ser uma das tarefas
aplicações e avaliações, é uma das tarefas do criticismo cien- do criticismo científico, apontar as confusões de valores e se-
tífico e do debate científico, lutar contra a confusão das es- parar os problemas de valores puramente científicos como ver-
calas de valores e, em particular, separar avaliaç ões extra- dade, relevânci a, simplicidade, etc , dos problemas extra-cien-
científicas das questões de verdade. tíficos.

24 25
Eu tenho, a t é agora, tentado desenvolver, resumidamen- Este resultado tri vi a l poré m decisivamente important e
te, a tese de que o m étodo da ciênci a consiste na escolha dos pode t a m b é m ser expresso da seguinte m a ne i ra : a l ógic a de-
problemas interessantes e na crí tic a de nossas permanentes dutiva é n ã o só a teoria da transmissão da verdade das pre-
tentativas experimentais e provis ória s par a solucioná-los . missas à conc lus ão , mas é, t a m b é m , ao mesmo te mpo, a
Tenho tentado demonstrar mais al ém , usando como exem- teoria da retransmissão da falsidade da c on clu sã o a t é , ao me-
plos duas questões de mét odo muito discutidas nas ciências nos, uma das premissas.
sociais, de que esta abordagem crí tic a a m é to do s (como po-
deria ser chamada) conduz a resultados m etodológi co s bas- Décima-oitava tese: Desta forma, a lógi ca dedutiva
tante razoáveis. Mas , embora eu tenha dito umas poucas pa-
torna-se a teoria da c rít ic a racional, pois todo cri tic ism o ra-
lavras sobre epistemologia, sobre a l ógi ca do conhecimento,
cional t oma a forma de u m a tent ati va de demons trar que
e outras poucas palavras crí ticas sobre a metodologia das
conclusões inaceitáve is podem se derivar da a f ir ma ç ã o que
ciências sociais, tenho, at é agora, dado apenas u m a pequena
contribuição positiva para o meu tópico, a lógica das ciên- estivemos tentando critic ar . Se tivermos sucesso em deduzir,
cias sociais. logicamente, conclusões inaceitáveis de um a af irma çã o ,
ent ão , a a fi rm a çã o pode ser colocada como di gn a de ser
recusada.
Nã o desejo deter os ouvintes oferecendo razõe s pelas
quais acho importante o método cient ífi co, ao menos à p r i r
Décima-nona tese: Nas ciências, trabalhamos c o m teo-
meira a proximação, com o método crítico. Ao invés disto, eu rias, isto é, com sistemas dedutivos. Há duas razões para isso.
gostaria de ir direto a algumas quest õe s e teses puramente
Em primei ro lugar, um a teoria ou um sistema dedutivo é u m a
lógicas.
tentativa de expl icaçã o e, c o ns eq ü en t em e n t e , u m a t entativ a
de solução de um problema científico — um pr oblema de
Décima-quinia tese: A função mais importante da pura explicação. Em segundo lugar , um a teoria, um si stema dedu-
lógica dedutiva é a de um sistema de cr ític a. tivo, pode ser criticado racionalment e at r av é s de suas con-
seqüências. É, en tã o , uma soluç ão exper imental, o objeto da
Décima-sexta tese: A lógica dedutiva é a teoria da va- críti c a raciona l. Tant o quanto o sistema de cr í t ic a o é para
lidade das deduções lógicas ou da re laç ão de cons eqüência a lógica formal.
lógica.' Um a cond ição necessária e decisiva para a validade
de um a conseqüência lógica é a seguinte: se as premissas Duas idéia s fundamentais que tenho usado aqu i reque-
de uma deduçã o válida são verdadeiras, e ntã o a conclusã o rem um a breve el uc id aç ã o : a idéia de verdade e a idéia de
deve t a m b é m ser verdadeira. explicação.

Isto t am b é m pode ser expresso como se segue. A lógica Vigésima tese: O conceito de verdade é ind isp ens áve l
dedutiva é a teoria da t ran smis s ã o de verdade, das premissas para a abordagem cr ít i c a aqui desenvolvida. O que cri ticamos
à conclusão. é, precisamente, a p r e t e n s ã o de que um a teoria é verdadeira.
O que tentamos demonstrar como cr íti ca de u m a teoria é,
JDécima-setima tese: Podemos dizer: se todas as premis- claramente, que essa p r et e n s ã o é infundada, que el a é falsa.
sas são verdadeiras e a dedução é válida , e n t ã o a conclusão A importante idéi a metodológi ca que podemos aprender
deve t a mb é m ser verdadeira; e se, c on s e qü e n te m en t e , a con- de nossos erros n ã o pode ser entendida sem a idé ia regula-
clusã o é falsa em uma dedução válida, en t ã o, n ã o é possível dora da verdade; qualquer erro simplesmente consiste em
que todas as premissas sejam verdadeiras. um fracasso em viver de acordo com o pa d rã o da verdade ob-

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jetiva que é nossa idéia reguladora. Denominamos "verda- 4
tem num a teoria e em algumas condições i n i c i a i s , e cuja
deira" uma proposi ção, se ela corresponde aos fatos, ou se conclusã o é o "expl ieandum".
as coisas são como as descritas pela proposição. Isto é, o que
O esquema básico tem um nú m er o n otá ve l de aplica -
é chamado de conceito absoluto ou objetivo da verdade que
ções. Pode se apontar com sua ajuda, por exemplo, a distin-
cada um de nós usa constantemente. A reabilitação bem su-
ção entre uma hipótese "ad-hoc" e um a hi pótes e independen-
cedida deste conceito absoluto da verdade é um dos resulta- temente testáve l. Mas alé m — e isto poderia ser de mais in -
dos mais importantes da lógica moderna. teresse p ara vocês •— pode-se analisar logicamente, de um
Esta o bservação alude ao fato de que o conceito de ver- modo simples, a dis tinçã o entre problemas te óricos, proble-
dade tem sido desprestigiado. Realmente, isto foi a forma mas histór ic os e problemas de ciência aplicada. Outro re-
matriz que produziu as ideologias reiativistas dominantes em sultado é que a famosa distinção entre ciências teóric as ou
nosso tempo. nom oté ti ca s e histórica s ou ideográficas pode ser justificada
logicamente — contanto que se entenda aqui sob o termo
Esta é a razão pela qual estou inclinado a descrever a "ciência" n ã o meramente " ciência natural " (como em i n-
reabilit açã o do conceito de verdade pelo m at e má ti c o e lógico glês) mas, qualquer tentativa para solucionar um conjunto
A L F R E D O T A R S K I como, filosoficamente, o mais importan -
de problemas definido e logicamente diferenciável.
te resultado da lógica m ate mát ica .
O mesmo se aplica para a elucidação dos conceitos ló-
É claro que nã o posso discutir este resultado aqui. Me- gicos que tenho empregado at é agora.
ramente posso dizer, bastante dogmaticamente, que T A R S K I
obteve sucesso da maneira mais simples e mais convincente, Os dois conceitos sob debate, aquele relativo à verdade,
ao explicar onde repousa a adequaç ã o entre as asserções e e aquele concernente à explicação, to rnam possível a a n álise
os fatos. Porém, isto foi, precisamente, a tarefa cuja apa- lógica dos demais conceitos, talvez 'mais importantes para a
rente dificuldade desanimadora conduziria ao relativismo cé- lógica do conhecimento ou metodologia. O primeiro desses
tico com conseqüências sociais que nã o preciso aqui decifrar. conceitos é aquele da aproximação da verdade e o segundo
O segundo conceito que tenho utilizado e que pode re- aquele do poder explicativo ou o conteúdo explicativo de um a
querer elucidaçã o é a idéia da explicação ou, mais precisa- teoria.
mente, a idéia da explicação causai. Estes dois conceitos são puramente lógicos, visto pode-
Um problema puramente teórico — um problema de ciên- rem ser definidos com a ajuda dos conceitos puramente ló-
cia pur a — consiste sempre na tarefa de achar uma explica- gicos da verdade de um enunciado e do co nt eúd o de u m a
ção, a explicação de um fato ou de um fenômeno ou de uma afirmaçã o — isto é, a classe das conseqüências lógicas de
regularidade destacada ou de uma notável excessão à regra. um a teoria dedutiva. Ambos são conceitos relativos. Embora
Aquilo que pretendemos explicar pode ser chamado de cada enunciado seja simplesmente verdadeiro ou falso, um
"explieandum". A solução tentada do problema, isto é, a ex- enunciado pode representar uma melhor a pr ox im a çã o da
plicação, consiste sempre n uma teoria, em um sistema dedu- verdade do que um outro enunciado. Isto a co nt ec e rá se,
tivo que nos permite explicar o "explieandum" relacionando-o por exemplo, um enunciado tiver conseqüênci as lógic as
a outros fatos (as assim chamadas condições iniciai s). U m a "mais" verdadeiras e "menos" falsas.do que outro. (E st á
expl icação integralmente ex plícita consiste em demonstrar a pressuposto aqui que os subconjuntos verdadeiros e falsos
deriva ção lógica (ou derivabilidade) do "explieand um" da
teoria reforçada por algumas condições iniciais. 4. (Nota à edição inglesa). Nas ciências sociais, as premissas da expli-
cação usualmente consistem em um modelo situacional e de um, assim
O lógico esquema básico de toda explicação consiste chamado, "princípio de racionalidade". Estas explicações de lógica situa-
cional" estão brevemente discutidas nas minhas teses número vinte e
numa mferênci a dedutiva (lógica) cujas premissas consis- cinco e vinte e seis.

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do conjunto de conseqüência s de dois enunciados são com- Vigésima-terceira tese: A Sociologia é a u t ô n o m a , no
p a r á v e i s ) . Pode ser, então , demonstrado facilmente porque sentido em que, a uma d is tâ n ci a c ons iderável , ela pode e
assumimos, corretamente, que a teoria de N E W T O N é uma deve tornar-se independente da psicologia. A parte da de-
melhor a prox im a çã o da verdade do que a de K E P L E R . Igual- pendência da psicologia em relação às idéias sociais (men-
mente pode ser demonstrado que o poder explicativo da cionada em min ha vigés i ma-s e gund a tese), deve-se ao i m -
teoria de N E W T O N é maior do que a de K E P L E R ^ portante fato de que a sociologia es tá, constantemente,
diante da tarefa de explicar as conseqüênci a s i n v o lu n t ár i a s
Portanto, analisamos aqui idéias lógica s que enfatizam a e geralmente indesej ávei s da açã o hum ana. U m exemplo:
av al ia çã o de nossas teorias e que nos permitem falar, sig- a competição é um fenômeno social que é, usualmente, i n -
nificativamente, de progresso ou regresso com rel ação às
desejável, pelos competidores, mas que pode e deve ser ex-
teorias científicas.
plicado como um a co nseqü ênci a i nv o lu nt ár i a (geralmente
O mesmo podemos dizer da lógica geral do conhecimen- inevitável) das ações (conscientes e planejadas) dos compe-
to. Referindo-me, em particular, à lógic a das c iência s sociais, tidores. Logo, muit o embora possamos estar aptos a explicar
eu gostaria de formular algumas outras teses. psicologicamente algumas das ações dos competidores, o fe-
nômeno social da competição é uma conseqüência psicologi-
Vigésima-primeira tese: Não existe nenhum a ciência camente inevitá ve l destas ações .
puramente observacional; existem somente ciência s nas quais
teorizamos (mais ou menos consciente e criticam ente). É Vigésima-quarta tese: Poré m , a sociologia é t a m b é m
claro que isto t a m b é m serve para as ciê ncia s sociais. au tô n om a em um segundo sentido, isto é, n ã o podemos re-
duzir à psicologia o que tem sido, fr eqü ent em ent e , denomi-
Vigésima-segunda tese: A psicologia é uma ciênci a so- nado " V E R S T E H E N D E SO ZI O L OG I E " (a sociologia da com-
cia l visto dependerem, grandemente, nossos pensamentos e preensão objetiva ?).
ações, de nossas condiçõe s sociais. Idéias como (a) a imita -
ção, (b) a linguagem, (c) a fa mília , são obviamente idéias Vigésima-quinta tese: A invest igaçã o l ógica da Econo-
sociais; e es t á claro que a psicologia da aprendizagem e do mia culmin a com um resultado que pode ser aplicado a to-
pensamento e t a m bé m , por exemplo, a psi canális e , não po- das as c iência s sociais. Este resultado mostra que existe um
dem exi stir sem utilizar um a ou outra dessas idéias sociais. método puramente objetivo nas ciência s sociais, que bem pode
Port anto, a psicologia press upõe idéi as sociais, o que demons- ser chamado de mét od o de compreens ão objetiva, ou de l ó-
tr a ser imposs ível explicar a sociedade exclusivamente em gica situacional. U m a ciênci a orientada para a c om pre ens ã o
termos psicológicos, ou reduzi-la à psicologia. Logo, nã o po- objetiva ou lógica situaci onal pode ser desenvolvida mdeperir
demos considerar a psicologia como a base das ciência s so- dentemente de todas as idéia s subjetivas ou ps icol ógicas.
ciais. Este mét od o consiste em analisar suficientemente a si tua çã o
O que nã o podemos, a princípio, explicar psicologica- social dos homens ativos para explicar a açã o com a ajuda
mente, e o que devemos pressupor em toda explicaçã o psi- da s itu ação , sem outra ajuda maior da psicologia. A com-
cológic a é o ambiente social do homem. A mi ss ão de descre- preensão objetiva consiste em considerar que a ação foi obje-
ver esse ambiente social (isto é, com a ajuda de teorias ex- tivamente apropriada à s i tua ção . Em outras palavras, a s i-
plicativa s — como declaradas anteriormente — visto que des- tuaçã o é analisa da o bastante para que os elementos que pa-
criçõe s livres de teorias não existem) é a tarefa fundamental
da c iência social. . r /«-t a, à edição Inglesa). Para uma discussão mais completa (inclusive
alFuns exemplos) de uma objetiva teoria da compreensão, ver minha
Poderia ser apropriado atribuir essa m iss ão à sociologia. nota "Sobre a Teoria da Mente Objetiva" que forma o capitulo quarto
Po r conseguinte, i ncümbo-m e disso no que se segue. do meu livro Conliecimento Objetivo.

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recém, inicialmente, ser psicológicos (como desejos, motivos, tém, digamos, recursos fisicos que estão à nossa disposi-
lembranças e associações), sejam transformados em elemen- ção e sobre os quais sabemos algo, e barreiras físicas sobre
tos da situaçã o. O homem com determinados desejos, por- as quais t a m b é m sabemos alguma coisa ( f r e q ü e n t e m e n t e n ã o
tanto, torna-se um homem cuja s i t u aç ã o pode ser caracteri- muito). Além disso, a lógica situacional t a m b é m deve admi-
zada pelo fato de que persegue certos alvos objetivos; e um tir um mundo social, habitado por outro povo, de cujas me-
homem com determinadas l e m b r a n ç a s ou associações torna¬ tas sabemos algum a coisa (muito pouco), e, deve admitir ,
-se um homem cuja si tua çã o pode ser caracterizada pelo fato a lé m de tudo, as instituições sociais. Essas in s ti tu i ç õ e s sociais
de que c equipado, objetivamente, com outras teorias ou com determinam o peculiar caráte r social de nosso meio social.
certas informações. Essas inst ituiçõe s sociais consistem de todas as realidades so-
Isto nos permite compreender, e n t ã o , a ções em um sen- ciais do mundo social, realidades que, em algum grau, cor-
tido objetivo, a ponto de podermos dizer: reconhecidamente, respondem às coisas do mundo físico. Um a r m a z é m ou um
possuo diferentes alvos e sustento diferentes teorias (de, por instituto universitári o ou uma forca policial ou u m a lei são,
exemplo, Carlos Magno) , mas se tivesse sido colocado nesta nesse sentido, institui ções sociais. A Igreja, o Estado e o ca-
situação, logo, analisado — onde a s it ua çã o incl ui metas e samento t a m b é m são instituiçõ es sociais, como sã o certos
conhecimento — ent ã o eu, e presumidamente vocês tam bé m , costumes coercitivos como, citemos, o har a-ki ri no J a p ã o .
teria agido de uma forma semelhante a dele. O método da Mas na sociedade européia, o suicídio nã o é u m a i ns t it u iç ã o
anális e situacional é, certamente, um mé to d o individua lista social no sentido em que usei o termo, e em que declarei que
e, contudo, nã o é, certamente, um m ét o d o psicológico, pois a categoria possui importâ ncia.
exclui, em princípio, todos os elementos psicológicos e os Esta c mi nha últ im a tese. O que se segue é uma suges-
substitui por elementos objetivos situac ionais. Eu chamo isto, tão e uma pequena nota conclusiva.
usualmente, de "lógica da s it ua ç ã o " ou "lógic a situacional"!
Sugestão: Podemos, talvez, aceitar provisoriamente, co-
mo problemas fundamentais de uma sociologia puramente
Vigésiina-scxta lese: As e xplicaçõe s da lógic a situacio-
teórica, a lógica situacional geral e a teoria das in sti tui çõe s
nal aqui descritas são r econst ruç õe s racionais e te óricas . Sã o c das tradições . Isto incluiria problemas tais como os se-
simplificadas c esquematizadas por alto, e, c ons eqüe nte men - guintes:
te, são geralmente falsas. Apesar disso, podem possuir um
conteúd o verdadeiro conside ráve l e podem, no sentido estri- 1 — As instituições não agem; ao invés, só os indivíduos
tamente lógico, ser boas ap rox im açõ e s da verdade e melho- agem, dentro ou para ou atr avés das ins tit u iç õe s . A lógic a
res do que outras explicações tes táv eis . Nesse sentido, o con- situacional geral destas ações será a teoria das q ua se-açõe s
ceito lógico de ap r ox im aç ã o da verdade é indispensável para das instituições.
uma ciência social que usa o mé to do da aná li se situacional. 2 — Poderíamo s construir uma teoria das cons eqü ên-
Sobretudo é racional, empiricamente criticável, e capaz de cias institucionais, planejadas ou não, de açã o intencional.
melhorias. Podemos, por exemplo, encontrar um a carta que Isto t a m b é m conduziria à teoria da criaç ão c do desenvolvi-
demonstre que o conhecimento à disposição de Carlos Magno mento das instituiçõe s
era diferente do que admitimos em nossa an áli se . Por con- Finalmente, um comentário adicional. Acredito que a
traste, as hipóteses psicológicas ou ca ract eri ológic as são di- epistemologia é importante não só par a as c iênc ias i n div i-
ficilmente criticáveis por argumentos racionais. duais mas t am b é m para a filosofia, e que a i n t r a nq üi l id a d e
filosófica e religiosa dos nossos tempos, que, seguramente,
Vigésima-sétima tese: Geralmente a lógica situacional concerne a todos nós , é, em um grau c onsiderá vel , o resul-
admite um mundo físico no qual agimos. Este m undo con- tado da i ntr anq ü il ida d e da filosofia do conhecimento h uma -

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no. N I E T Z S C H E chamou este fato de nihilismo europeu e
B E N D A de a t r a i ç ã o dos intelectuais. Eu gostaria de carac-
terizá- lo como u m a cons eq üênc i a da descoberta socrát ica de
qu e m â o sabemos nada; isto é, que nã o podemos nunca j usti -
ficar nossas teorias, racionalmente. Porém essa descoberta i m -
portante, que tem produzido, entre muitas outras indisposi-
ções, a indisp osição do existencialismo, é só a metade de u m a
descoberta; e o nihi lism o pode ser superado. Pois, embora,
nã o possamos justi fic ar nossas teorias racionalmente e n ã o
RAZÃO OU REVOLUÇÃO ?
possamos, nem mesmo, provar que são prováveis, podemos
criticá-las racionalmente. E podemos, constantemente, dis-
tingui-las de teorias piores. ,
As considerações críticas que se seguem são reações ao
livro Der Positivismusstreit in der deutschen Soziologie
Porém, isto era conhecido, antes mesmo de Sócra te s, por ("A disputa do Positivismo na Sociologia A l e m ã " ) , publicado
1
XENOPHANÉS que nos disse 6 : no ano passado (para o qual escrevi o texto original) .
Os deuses nã o nos revelaram todas as coisas, de Inicio; 1. Começare i contando algo da hi s t ó ri a do liv ro e de seu
Mas no curso do tempo. t í t u l o equívoco. Em 1960, eu fora convidado a abrir a dis-
Através da procura, poderemos aprender cus sã o sobre "A Lógica das Ciênc ias Soc iais" no Congresso
E conhecer melhor as coisas...
dos Sociólogos Alemães em G õ t t i n ge n . Eu aceitei e recebi o
aviso de que a minha co mun ic açã o de abertura seria seguida
por urna ré plica do.Professor Theodor Adorno, de Fr an kf ur t.
Os organizadores haviam-me e n t ã o sugerido, de modo a sus-
Tradução de Apio Cláudio Muniz Acquarone Filho, do citar um debate frutuoso, que eu formulasse meus pontos de
original "The logic of the social sciences", in.; The po- vist a e m um n ú m e r o determinado de teses. T a l o fi z: minh a
sitivist dispute in é^man sociology. London, Heinne- c o m u n i c a ç ã o de abertura par a o debate, apresentada em
mann, 1976. 1961, consistia em 27 teses formuladas em termos precisos,
acrescidas de uma form ulaçã o p r o g r a m á t i c a da tarefa das
ciên cia s sociais teoréticas. Aquelas teses foram formuladas,
sem dúv i d a de maneira a torn á-la s dificilmente aceitávei s por
um hegeliano ou por um marxi sta (como A dorno), e eu as
fundamentei, tanto quanto pude, com argumentos. Atenden-
do ao pouco tempo disponível, restringi-me ao fundamental,
evi tando repetir o que já havia dito em outros lugares.
A rép lica de Adorno foi lida co m ênfase, mas ele dificil -
mente respondeu ao meu desafio — isto é, às minhas 27 te-
ses. No debate que se seguiu, o Professor Ra l f Dahrendorf ex-
p r i m i u seu profundo desapontamento. Ele disse que fora a
i n t e n ç ã o dos organizadores colocar a descoberto algumas di¬
i Este artigo foi publicado originalmente nos "Archives européennes de
6. (Nota à edição inglesa) "Conjeturas e Refutações", p. 152 (a tradução
é minha). Sociologie" X I (1970) 252-262 e revisto para a presente publicação.

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