Texto selecionado 1: FRAMPTON, Kenneth. Ando at the Millennium. In: ANDO, Tadao. Tadao Ando: light and water. Nova Iorque: Birkhauser Basel, 2003. p. 6-17.
Texto selecionado 2: TAKI, KOJI. Minimalism or Monotonality?. In: FRAMPTON, K. (Org.). Tadao Ando: Buildings Projects Writings. Nova Iorque: Rizzoli, 1984. p. 11-23.
1. Texto 1: Ando at the millennium
O texto em questão é a introdução feita por Kenneth Frampton ao livro “Tadao Ando: light and water”, escrito pelo próprio arquiteto, e conduz o leitor, como prenuncia o seu título, nas simbologias e na linguagem determinada pelo uso de materiais na obra de Ando: concreto, água, vidro e madeira. O texto se estrutura da seguinte maneira: inicialmente Frampton dá um panorama geral sobre a obra de Ando e o seu material principal - o concreto - e depois, faz um percurso através da produção do arquiteto, focando-se, vez ou outra, na expressão de um ou outro material em especial. O concreto, sendo o principal material da obra de Ando, é o assunto sobre o qual Frampton discorre mais. Apesar de uma parede de concreto reforçada ser uma das coisas mais materialistas que possa haver na construção de um edifício, Frampton, na obra de Ando vê-o como um elemento que em certas condições é suscetível à desmaterialização através do impacto da luz. É dessa desmaterialização do concreto que Ando se aproveita para criar uma linguagem que se perpetua ao longo da sua produção: ora o concreto é transformado em uma superfície ilusória através da ação da luz do sol, ora a irregularidade do concreto moldado faz com que a parede pareça um tecido leve contra um plano invisível. Na maioria das obras, vê-se que Ando provoca, a partir do uso do concreto, a passagem da materialidade para a imaterialidade de acordo com o movimento do sol, aproveitando-se também da responsividade do concreto ao ar e à água. Quanto à análise da água na obra de Ando, Frampton vê-a como um elemento autoconsciente, que, assim como o concreto, dependendo do horário do dia, mostra-se com qualidades totalmente diferentes: por vezes reluz como um plano uniforme, em outros casos, como aço polido. Além da água, Frampton analisa também a relação da água com outros elementos relacionados à natureza e às condições climáticas: a brisa, chuva, geada, neve, cujos efeitos são desprezados na maior parte do que se produz na arquitetura. Em suma, a obra de Ando tem como aspecto principal a transformação: o paradoxo essencial da sua arquitetura é a desmaterialização da forma através da passagem do tempo. A preocupação com enfatizar o sentido da passagem do tempo e criar composições em que a sensação de transitoriedade e passagem do tempo é parte da experiência espacial mostra a sua crença de que a convicção da contingência da existência é revelada através da presença da natureza; ou seja: a preocupação com a relação entre arquitetura e natureza leva inevitavelmente para a preocupação com o contexto temporal da arquitetura.
2. Texto 2: Minimalism or monotonality?
O texto de Koji Taki procura, num exercício de síntese, discorrer sobre as principais características de linguagem da obra de Tadao Ando. Para ele, os aspectos que são constantes na produção do arquiteto são:
➔ Internalização do exterior: para Taki, a obra de Ando gira ao redor de uma variação de um único esquema básico de articulação, que sempre inclui um espaço aberto e um método característico de articular o território do sítio, em todos os trabalhos, independente da escala ou ambiente. A concepção de "espaço aberto" de Ando é tomada como um resultado da consideração da arquitetura como tudo o que está incluído no site. ➔ Legendária harmonia entre cultura japonesa e natureza: para o autor, Ando não tenta atingir uma tradução iconográfica, mas interessa-se numa tradução tipológica. Muitas vezes, pode-se estabelecer paralelos entre seus edifícios e antigos japoneses artesãos em termos de técnicas e normas de estilo. O processo de arquitetura de Ando faz uso do senso cultural de espaço pelo qual os japoneses inconscientemente identificam-se como parte da sociedade e também do ambiente. ➔ Articulação do território: um aspecto que mostra-se constante ao longo das obras é a qualidade de articulação do espaço ➔ Retórica e vocabulário restrito: para Taki, a simplicidade na obra de Ando mostra a presença da complexidade latente. Para ele, o fato de Ando ser chamado de minimalista é não é corretamente empregado. O título deveria se referir sobretudo ao seu vocabulário arquitetural restrito, à pequena variedade de formas e o número limitado de materiais que ele usa e à sua estrutura sintática única. ➔ “Architecturalization of territory”: segundo Taki, os papéis principais na sua “arquiteturalização” do lugar é estabelecido pela "moldura"/"armação" composta por colunas e vigas de espessura uniforme e as paredes que preparam o sítio inteiro/o chão para a geração do espaço e da arquitetura. Através da uniformidade da estrutura, o lugar é tirada do aleatoriedade da ordem de sua realidade e a estrutura prepara o lugar a partir do momento que introduz a ele uma ordem. Em resumo, é o diálogo entre a armação e a parede que estabelece a presença de Ando na arquitetura.
Taki por diversas vezes contrapõe Tadao Ando aos arquitetos da época em questão - final do século XX. Para ele, Ando está mais próximo da arquitetura e da construção em si do que os outros arquitetos; principalmente pelo fato de que o segundo grupo estaria mais ligado à decoração superfícial, enquanto Ando exibia um status de master carpenter, builder e estaria, sobretudo preocupado com a correlação viver e construir, que deveria ser uma questão que deveria ser fundamental, mas estaria perdida. A arquitetura e a cidade contemporânea, para o autor, estariam se movimento em direções contraditórias, e, mesmo que os arquitetos se mostrassem conscientes com essa questão, não eram capazes de evitar a “sobreintelectualiazão” dos seus projetos: alguns absurdos atuais resultaram justamente pelo fato de se levar uma abordagem complicada de solução para os problemas de projetos. Em suma, Ando se distanciava do status quo da cidade e da arquitetura por não seguir a linha contraditória da civilização que se tornou alienada dos valores humanos em relação ao tempo e espaço.
3. Relações entre os dois textos
Enquanto o primeiro texto, de Frampton, foca-se em questões de caráter abstrato e espiritual a partir da materialidade dos edifícios da obra de Ando, o segundo texto procura teorizar a sintaxe da obra do arquiteto a partir das relações com a cidade contemporânea (em verdade, a cidade do final do século XX) e as simbologias referentes ao sítio do edifício e à concepção de “casa” do arquiteto, focando-se, evidentemente, na análise de casas, ao contrário do primeiro texto, que centra-se na análise de edifícios religiosos e outras construções institucionais. O segundo texto, ao contrário do primeiro, busca situar a obra de Ando num contexto mais geral de arquitetura: compara-o com o pensamento dos arquitetos atuais na época em questão, com a situação da cidade contemporânea e com a produção acadêmica também da época em questão, fazendo paralelos com teóricos de arquitetura e urbanismo. Fato curioso pois é o contrário do que os títulos dão a entender: “Ando at the millenium” parece querer situar o arquiteto no milênio, mas mostra-se um texto totalmente voltado para a obra do arquiteto, enquanto “Minimalism or Monotonality” parece tratar-se de aspectos unicamente de aspectos estilo, linguagem e identidade do arquiteto, mas volta-se para um contexto mais geral, o da cidade.