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A minha terra sabe a saudade

Homenagem a todos os que sentiram e sentem


a terra de “Cima Côa”
Percurso da Raia

1. Barca D’Alva

O nome de Barca D’Álva tem a sua origem numa das atividades


mais antigas desta terra: a de barqueiro. Consta que era na
pequena margem onde hoje se espraia a aldeia que existia uma
barca que realizava a travessia para a margem oposta. A sua
partida era à hora da Alva, ao romper do dia. Assim ficou
conhecida a zona, por haver a Barca da Alva.

O lugar de Barca d’Alva atravessa discreto o livro dos tempos, não


sendo martirizado nas Guerras da Restauração – por não ser
ponto de passagem ou de ameaça – nem protagonista de milagres
e aparições. Mas esta discrição vê o seu fim quando se delineou a
passagem do comboio por Barca d’Alva. Última estação de
Portugal para quem sai e primeira para quem entra, era a porta da
Europa para o Atlântico. A pequenina Barca d’Alva era maior que
dois mundos, porque os unia: a vastidão do mar e da aventura
com o requinte da Europa e da oportunidade. Habituada a unir, e
não a separar, daqui partiam esperança e aqui chegavam ideais.
Seria por isso escolhida a Barca o lugar escolhido por Agostinho
da Silva para lhe chamar “seu”?, esse eterno paradoxo que é o
todo?1

1
“Não sou do ortodoxo nem do heterodoxo: cada um deles só exprime metade da vida. Sou do
paradoxo que a contém no total”, Agostinho da Silva, Filósofo de Barca d’Alva
O comboio durou cem anos. E apenas um século bastou para
definir e moldar a personalidade dos seus habitantes. Sem
guerras, sem muralhas e sem mosteiros. Apenas serra e água – e
caminho de ferro! A prosperidade da Barca era a prosperidade de
Figueira, de Freixo – uma vez mais, a Barca une e não separa. Por
isso mereceu uma ponte, porque era ela própria uma ponte, há
muitos e muitos anos. E depois mereceu outra ponte, agora
Portugal e Espanha unidos. Porque se a natureza dividia, haveria
um túnel ou uma ponte. E depois estradas. Mas a realidade é uma
só: se há pontes e estradas e caminhos e barcos, é porque se quer
ir a Barca d’Alva. E sempre se quis ir. O próprio Jacinto 2 se
admirou com a beleza da pequenina estação de Barca d’Alva, ele
que tinha visto Paris! O que diria se a visse agora, sem comboio,
tão despida de si?

Chegamos a Barca d’Alva de carro. Pode ser assim. E paramos


no cais. Há onde estacionar.

Viramos a nossa face para o rio. Em frente Trás os Montes. Ainda


temos os pés na Beira. E o coração.

2
Protagonista da “Cidade e as Serras”, de Eça de Queirós
2. “Honra” de Escalhão

Escalhão, o guardião do planalto de Ribacoa. Ou Cimacoa, como


referido bastas vezes nas Memórias Paroquiais.

Escalhão mudou o seu nome, adaptando-se à geografia. Consta


que em tempos idos tinha por nome Vila da Silveira. Mas a terra
era seca e água, só a da ribeira de Aguiar, ao sul, ou no Douro, a
norte. Então era seco, seco, secalhão. Por força do conforto
linguístico se tornou Escalhão.

Escalhão fala de sabores, de amêndoa e de azeite. Dos bolos que


se tornam esquecidos, do pão que alimenta a alma.

Na nossa chegada, um imponente palacete rouba o nosso olhar.


Não é de reis nem de princesas,

Logo à entrada, a prova da valentia, materializada no cruzeiro.


“Honra de Escalhão”. Honra e glória, pela bravura com que se
destacou nas guerras da Aclamação – ou Restauração. E honra
que seja feita. Ficam as memórias distantes de uma guerra sem
fim, onde militares e povo eram um só coração. E foi do próprio
povo que surgiu o herói, Janeiro. Neste dia, 17 de outubro de
1642, socorreu-se o Janeiro do badalo do sino para matar o
capitão de Zamora, delapidando as intenções sanguinárias dos
invasores. Viva o Janeiro e a sua porra! Outros heróis sem nome
têm o seu lugar no panteão da memória de Escalhão, Honra de
Escalhão. Honra concedida por D. João IV em 1648. E se um dia
foi a maior aldeia de Portugal, só por despeito e receio não foi Vila
de Escalhão.

E vemos uma rua larga, moderna – rua digna de dois nomes: Rua
Bordalo Velho, antiga Rua do Touro. E para dois nomes duas
histórias: a antiga rua do Touro tinha, num dos seus recantos, um
curral que albergava um famoso touro de cobrição, a quem muitos
lavradores do concelho confiavam as suas vacas para uma
cobrição fértil, na esperança de obter valentes vitelos – a sabedoria
popular aplicada à selecção da espécie. E tão conhecido era o
Touro, que ganhou uma rua em sua homenagem. Perdeu-a anos
mais tarde – mas só nas placas, porque se perguntarem aos
escalhonenses como se chama a rua, é a Rua do Touro, claro. O
outro nome vem de mais perto: Bordalo Velho, um benemérito da
terra, dotou a velhinha rua do Touro de calçada e, pasme-se!,
sargetas, coisa muito moderna e inédita no concelho. É com
vaidade que em Escalhão se fala destas sargetas, que fizeram ver
aos de Figueira – a partir daqui, todos foram os segundos!

Continuamos a nossa viagem para cima, em direcção ao cimo do


povo: casas que contam histórias: um audaz contrabandista, um
crime de sangue aqui se cometeu, caso de polícia e de horror…

Entramos na rua 21 de Outubro. Chama-se assim a esta rua para


lembrar o dia em que a luz eléctrica chegou a Escalhão, vinda de
Espanha via Almofala – Mata de Lobos, no limiar do século XX.
Em Escalhão celebra-se a modernidade, guardam-se as datas,
vive-se o presente com um tremendo orgulho nos feitos passados.

Descemos de novo, pela 21 de Outubro. E chegamos ao largo da


Igreja, imponente fortaleza inexpugnável.

À volta da igreja, referências à política de seiscentos: um cu virado


para Castela, simbolizando a eterna rivalidade. Para Castelo
Rodrigo, culpado por não permitir a elevação de Escalhão a
concelho, aponta-se um canhão. Formas diferentes de manifestar
o desagrado, mas equivalentes no sentimento.

Virada a norte, não menos provocadora figura. Uma mulher de


pedra contempla a aldeia, com uma mão atrevida na sua
intimidade.

O sino de Nossa senhora das Dores encima a porta principal da


Igreja. Quando alguma mulher entrava em trabalho de parto,
reuniam-se ali sete Marias virgens que rezavam pela parturiente
uma avé maria a cada badalada, para uma hora pequenina, para
um parto com menos dor. Entramos. Imponente por fora e por
dentro.

(breve descrição da Igreja – pontos de interesse )

No cemitério contam-se histórias, pedras que trazem aos homens


dores de antigamente. Uma, de uma mãe e da sua filha bebé. A
mãe morreu dois dias depois da filha nascer; a filha seguiu-se-lhe
duas semanas depois. O pai as honrou e repousam juntas.

Uma outra, a homenagem de um pai que perdeu a sua filha…


perdeu-a duas vezes: a primeira, para o marido, que nunca
aceitou, de quem nunca gostou. Mas de nada valeu opor-se àquele
casamento negro. A segunda vez perdeu-a para sempre, no dia do
casamento. Na noite das suas núpcias, foi brutalmente
assassinada pelo marido, que se matou também. Dizem as
pessoas do povo que o sangue corria por baixo da porta – dando
trágica notícia do desfecho daquela história. Em letras gravadas
na pedra fria para a eternidade, chorou o seu pai a dor de perder a
sua filha única, a sua pedra mais preciosa…

A rua acolhe-nos de novo. E era a rua, sala de convívio onde as


conversas privadas se tornavam públicas. Ali mesmo ao lado, na
sombra da Igreja, a cruz da Má Língua. Lugar de encontro e
dissecação da vida privada, escrutinada pela língua dos homens,
conversas marotas de fazer corar os santos. O nome ficou para a
posteridade, para nos lembrar que as redes sociais apenas
continuam aquilo que durante séculos foram as calçadas sociais.

No largo antes dançava-se, vendia-se ao turista e comprava-se ao


caixeiro.

A rua do Vaz – mistério de nome – serpenteia por entre as casas;


fronteira entre o bairro dos galegos e o resto do povo. Na rua do
Vaz se encontram autênticas jóias da arquitectura setecentista,
dominando a nossa imaginação: por fora, uma porta, uma
janela… pouco mais e raros casos. Mas por dentro, ruínas
labirínticas a indicar planos de fuga, caso fosse preciso!
O Bairro dos Galegos apresenta-se como o mais antigo bairro de
Escalhão; pelo nome, que remete para o povoamento leonês; pelas
casas, com fortes traços da arquitectura setecentista; pelas ruas,
estreitas e quase labirínticas… Facilmente se associa este bairro a
um gueto judaico: uma entrada, única saída… mas não agora, que
a modernidade impõe-se e é preciso circular. Dizem-nos memórias
antigas que havia ali uma casa redonda em pedra, com laje por
cima, onde as crianças hoje já velhinhas brincavam. Uma anta,
portanto. Desaparecida, não há muitos anos, mas só já edificada
na memória dos velhos. Os novos parecem duvidar…

Cantos e recantos de Escalhão, quadras a dar as boas vindas mas


também a por os pontos nos is: que venham por bem os que vêm
aos Galegos!
3.Mata de Lobos
Álamo, fala!
Chegamos a Almofala pelo norte. Do alto, vêm-se terras de
Espanha. S. Felizes dos Galegos, esses galegos que povoaram as
nossas terras e nos deixaram a genética e o falar. Os próprios
foros leoneses são galegos!3 Estende-se a oriente o planalto
salamantino, gémeo do planalto ribacudano, separados por um
rio, duas línguas e dois países…mas foram já um só, unidos por
um rei – e mais que uma vez. Daqui se avista a Penha de França,
aonde se peregrinava. E peregrinava-se também a S. Felizes, às
festas do Divino. e peregrinava-se à Boiça, mas desta vez não para
alimentar a alma e sim o corpo, matar a fome aos filhos com a
fogaça contrabandeada.

Para poente, a Marofa, com Castelo Rodrigo no regaço. Antes, a


Barragem. Vamos por aqui, para já, e já regressamos à raia.

A construção remonta aos finais da década de 70, tendo sido


concluída em 80. Situada à entrada do Parque Natural do Douro
Internacional, delimitado pela Ribeira de Aguiar até esta chegar ao
Douro, recebe-nos assim com um espelho de água, de céu e de
serra. As hortas do vale de S. Felizes – porque era de S. Felizes,
perdeu o domínio, ficou o nome – deram lugar à felicidade e à
riqueza da água. Noutros tempos, lavava-se ali, mesmo por baixo
da Ponte Nova – por oposição à ponte velha, medieval. Noutros
tempos era diferente. O casarão era medieval, hoje é romano;
Figueira era quinzenal, hoje é diária.

3
Lindley Cintra refere, no estudo da Linguagem dos Foros de Castelo Rodrigo, a diferença linguística
entre estes, nos quais se “nota neles ao primeiro contato, uma extraordinária mistura de traços galego-
portugueses com leoneses sem que seja possível indicar facilmente quais os que predominam.”, e os
foros de outras vilas de Riba Côa, como os de Alfaiates, Castelo Melhor e Castelo Bom, os quais são
fundamentalmente redigidos em leonês, coincidente com a pertença deste território ao reino Leonês.
Entramos em Almofala, onde as árvores denunciam assassinos,
onde os olmos falam.

A descida é grave, como se ousássemos entrar no ventre da terra.

O adro, sala de visitas, convida ao descanso do viajante; as


dolentes badaladas do sino relembram que mesmo ali, onde tudo
parece parar, o tempo também passa. O sino de Almofala, que
também já repicou em Sobradilho, descaradamente roubado para
calar o rebate das invasões, silenciando o patriotismo.

Um monumental S. Pedro guarda as chaves do paraíso. Mas o


paraíso onde queremos chegar não tem porta, é só seguir a rua de
Cantalarrana. Cantalarrana…mais galego (ou leonês, ou
castelhano, ou tantas outras línguas que outrora disseram
Almofala, ou Al Mahalla, ou Almofalla…). O que se sabe é que foi
ali que beberam os castelhanos derrotados por Pedro Jaques de
Magalhães – pelo menos foi ali que ouviram cantar la rana…

Avistamos a capela de Santo André. Mas antes, ainda passamos


pela porca e o touro – que indicam o tesouro d’el rei mouro. Duas
esculturas zoomórficas, do tempo dos Vetões. O lugar, cercado por
uma parede de pedra, ainda lá tem os lírios roxos que tanto
fascinaram Frei Bernardo de Brito, quando o visitou. E tem a
Capela Nova, contemporânea dos nossos tempos. Simboliza a fé de
um povo materializada por um homem. E lá poderia estar um
santuário, se não fosse a dissidência com uma mulher.

Ali à frente, o vale das loiras; onde, se conta, ainda hoje estão as
formas das moedas da cidade de Combadão – no tempo dos
mouros, dos visigodos, que à luz dos anos e das memórias são
quase a mesma coisa… vale das loiras, que deu de beber à
armada de Vasco da Gama, licoroso das arribas do Águeda.

O rio Águeda ao fundo, serpenteando entre as gargantas


escarpadas das arribas. O seu nome aponta dois nascimentos:
Águeda de AQUILAE - como a TURRIS, Águeda de ad Gata (da
Gata, pois nasce na Serra da Gata.

Em dia de festa, toca a banda. Por Santo André, pelos nossos


pecados, pela fé que atrai…
Escarigo, por um grão de trigo…

Reza a história que era tal a prosperidade desta terra de fronteira,


que ombreava com Lisboa na riqueza. Se dúvidas havia, nada
melhor que comparar a fortuna de cada uma das terras. Em tudo
iguais: cabeças de gado, habitantes, comerciantes, lavradores… a
prova final era contar o cereal – trigo, nobre trigo que tanta fome
matava naquelas terras ricas! E começa-se a contagem: empate,
daria? E foram dias e dias a contar os grãos de trigo, rigor que não
se obtinha em nenhuma pesagem. Mas eis que no último
punhado, Escarigo tem um grão de trigo a menos que Lisboa! E
assim se instalou a capital à beira mar, e não à beira da Ribeira
de Tourões!

Introduz-se com esta história alguma verdade sobre a


prosperidade desta terra raiana, estrangulada por guerras,
invasões e medos. A fronteira era perigosa, difícil…

Entrando por Escarigo, entra-se no passado. Quem lá mora, ainda


fala nos tempos de antigamente, da lavoura, da Guarda Fiscal, do
contrabando... terra de passagem para o governo da vida. Ida e
volta, na mesma noite, com o contrabando escondido ao rés do
corpo, nos chiqueiros, nas pedras falsas, longe dos olhos e dos
ouvidos dos Guardas Fiscais e dos Cravineiros (Carabineros). Ida e
volta para o sustento. Anos mais tarde, só ida. Para França,
Alemanha, para outro mundo onde as bocas não se fechavam
vazias de fome. Linhas de fronteira esbatidas pelos passos
apertados de quem fugia… às vezes de si mesmo.
Vermiosa
Vilar de Turpino
Aqui nasceu a Reigada!

“As portas da Reigada


Estão mal encracavilhadas
Quem as encracavilhou
Mau encracavilhador seria
Porque se as bem encracavilhasse
Bem encracavilhadas estariam”

Poderia ser este o mote para entrar pela Reigada. A entrada da


Reigada foi homenageada com um
Cinco Vilas
Aldeia da Luz – Luzelos
Bizarril
Colmeal das Donas
Penha d’Águia
Quintã de Pêro Martins
Freixeda do Torrão
Vilar Doce, Vilar de Amargo
Vale de Afonsinho
Algodres

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