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REVISTA EDITADA PELO CONSELHO FEDERAL DE CONTABILIDADE – ANO XLVII N° 233 – SET/OUT 2018

Reportagem
Prêmio Olivio Koliver incentiva a
produção acadêmica
Artigos abordam importantes temas para a profissão
REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 3

Divulgação CFC

PALAVRA DO PRESIDENTE

A preocupação com a sólida formação acadêmica


dos profissionais e com o desenvolvimento da Ciência
Contábil praticada no Brasil sempre esteve presente
nas ações do Conselho Federal de Contabilidade, cons-
tituindo-se política de gestão que ultrapassa manda-
tos na Presidência do CFC. De fundamental valor his-
tórico para a profissão, o aprimoramento contínuo do
conhecimento técnico e científico tem auxiliado a Con-
tabilidade a passar incólume por evoluções e revolu-
ções econômicas e sociais em âmbito mundial. Zulmir Ivânio Breda
Assunto de primeira grandeza para nós, gestores Presidente do CFC
do Sistema CFC/CRCs, o desenvolvimento profissional
tem sido o objetivo principal de inúmeros eventos e
de ações que o CFC e os Conselhos Regionais de Con-
tabilidade promovem no País. São seminários, conven-
ções, encontros, congressos e vários outros tipos de da área a desenvolverem pesquisas e trabalhos acadê-
momentos que são especialmente organizados para micos. A geração de conteúdo novo, baseado em expe-
reunir a classe contábil e tratar de temas importantes, riências, evidências e análises, com metodologia e pa-
com conteúdo atualizado e significativo para o conhe- drão científico, é um fator imprescindível para o futuro
cimento de quem trabalha na área. da Contabilidade.
Mas, além disso, gostaria de ressaltar, especial- Outro ponto que faço questão de mencionar é so-
mente nesta edição, quando se destaca o Prêmio Oli- bre a homenagem que a RBC presta ao saudoso Olivio
vio Koliver, o papel que a Revista Brasileira de Con- Koliver. Falecido em 2009, ele foi professor universitá-
tabilidade vem desempenhando ao longo de várias rio, atuou em diversas entidades da área contábil, foi
décadas, servindo de veículo de ampla propagação presidente do Conselho Regional de Contabilidade do
de conteúdo acadêmico de alta qualidade. Os artigos Rio Grande do Sul (CRCRS), vice-presidente Técnico do
a serem publicados na RBC são recepcionados pelos CFC e presidente do Comitê de Investigação Contábil
membros do Conselho Editorial, que realizam um cri- da Associação Interamericana de Contabilidade (AIC).
terioso trabalho de avaliação. O Conselho é composto Koliver prestou relevantes serviços para a evolução
atualmente de professores doutores e doutorandos, da Ciência Contábil no País. Com a instituição do Prê-
representando as regiões do Brasil – e aqui faço pa- mio pela RBC, queremos demonstrar o nosso reconhe-
rênteses para agradecer este trabalho voluntário que cimento à memória do professor e, em especial, deseja-
eles fazem em benefício da profissão. mos valorizar o trabalho daqueles que dedicam tempo
A realização do Prêmio Olivio Koliver é mais uma e esforço a escrever artigos de alta qualidade.
forma de promover o aprimoramento da Ciência Con- O futuro da profissão passa pelo aprimoramento da
tábil. Ao selecionar e premiar os autores de artigos con- Ciência Contábil. Portanto, convido todos a permane-
siderados os melhores de cada ano – escolhidos pelos cerem atuantes e atualizados, lendo e escrevendo so-
membros da banca examinadora e do Conselho Edito- bre Contabilidade.
rial –, a RBC busca incentivar os estudantes de gradu-
ação ou de pós-graduação e os também profissionais Boa leitura.

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


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REPORTAGEM

Prêmio Olivio Koliver incentiva a


produção acadêmica

 Por Comunicação CFC

Ao longo de mais de um século, a Revista Brasileira de Contabilidade se consolidou como um


dos principais veículos de informação técnica e científica da área contábil do Brasil, publicando
trabalhos acadêmicos decorrentes de análises, estudos e investigações de variados campos da
Contabilidade. Com a finalidade de incentivar a produção de artigos e contribuir ainda mais
para o desenvolvimento da Ciência Contábil, a RBC criou o Prêmio Olivio Koliver, que chega
à sua quinta edição este ano.

O artigo premiado em 2018 foi São Paulo. O evento foi promovido Ribeiro destacou, ao receber o tro-
“O que pensam os reguladores sobre pelo Conselho Federal de Contabili- féu, que o prêmio é um importan-
as diferenças da contabilidade socie- dade (CFC), Academia Brasileira de te incentivo para os pesquisadores.
tária e regulatória no setor elétrico Ciências Contábeis (Abracicon) e “Minha intenção agora é continuar
no Brasil após a emissão da OCPC Conselho Regional de Contabilida- a pesquisar, trabalhar e contribuir
08”, escrito pela mestranda em Ci- de do Estado de São Paulo (CRCSP). cada vez mais para a classe contá-
ências Contábeis da Universidade Fe- A entrega do Prêmio aos auto- bil”, disse ela.
deral do Rio de Janeiro (UFRJ) Raquel res foi feita pelo presidente do CFC, Na reportagem a seguir, os au-
Damacena Ribeiro, sob a orientação Zulmir Breda, e pela coordenadora tores falam sobre a produção aca-
do professor doutor Adolfo Hen- do Conselho Editorial da RBC, Jac- dêmica no Brasil e, entre outros
rique Coutinho e Silva. O trabalho queline Veneroso Alves da Cunha. pontos, abordam a importância
vencedor foi publicado na RBC n.º “O desenvolvimento de uma das produções técnicas e cientí-
224, referente aos meses de março classe profissional não depende ficas para o aperfeiçoamento do
e abril de 2017 (leia aqui). apenas de uma prática adequada, profissional da área. Ainda, a re-
A cerimônia de entrega do tro- mas também de incentivos à pes- levância do Prêmio Olivio Koliver é
féu Olivio Koliver ocorreu durante quisa. Iniciativas como esta são ressaltada por membros da banca
o XI Encontro Nacional de Coorde- sempre bem-vindas, pois valorizam examinadora – instituída pelo CFC
nadores e Professores do Curso de a produção científica”, afirmou para avaliar os artigos concorren-
Ciências Contábeis (ENCPCCC), re- Adolfo Henrique Coutinho e Silva tes – e por membros do Conselho
alizado no dia 29 de setembro, em na cerimônia. Já Raquel Damacena Editorial da RBC.

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6 Prêmio Olivio Koliver incentiva a produção acadêmica

Autores premiados analisam a


produção acadêmica no Brasil
Atualmente mestre em Ciências “Uma das dificuldades é entrar em vo era abordar um tema atual, que
Contábeis, Raquel Damacena Ribei- contato com o profissional que está trouxesse discussões que pudessem
ro, que escreveu o artigo com base atuando no mercado e tentar pro- contribuir com o aperfeiçoamento
em sua dissertação de mestrado na mover a aproximação dele com o da prática contábil”. Ainda segundo
Universidade Federal do Rio de Ja- conhecimento que é desenvolvido a autora, além de todo o conheci-
neiro (UFRJ), considera que a pro- na academia”, ela explica, acres- mento adquirido no desenvolvimen-
dução técnico-científica, no País, centando que as produções técni- to do artigo, o resultado poderá lhe
aumentou em quantidade, acom- co-científicas são grandes auxiliares possibilitar crescimento na carreira
panhando o crescimento da oferta na educação e no desenvolvimento profissional e acadêmica.
de cursos de graduação e de pós- contínuo, possibilitando a dissemi- Iniciativas como o Prêmio Olivio
graduação ligados à área contábil nação do conhecimento e benefi- Koliver, na opinião de Raquel, favore-
nos últimos anos. “No momento, ciando tanto o profissional da con- cem o aprimoramento das produções
porém, penso que estamos bus- tabilidade como toda a sociedade. e pesquisas em contabilidade. E, para
cando aumentar a qualidade des- Sobre receber o Prêmio Olivio aqueles que desejam escrever um ar-
sas produções”, pondera a autora. Koliver, Raquel afirma que foi grati- tigo técnico-científico, ela dá uma
Raquel afirma que realizar uma ficante. Para ela, mais do que o re- dica: “Procurem por temas que sejam
pesquisa no âmbito das Ciências conhecimento, fica o sentimento de interesse dos profissionais a área,
Contábeis, no Brasil, não é fácil. de missão cumprida, “pois o objeti- que promovam debates de qualidade

Foto: Comunicação CRCSP

Da esquerda para a direita: Jacqueline Veneroso Alves da Cunha, Raquel Damacena Ribeiro, Zulmir Ivânio Breda e Adolfo
Henrique Coutinho e Silva ().

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e que efetivamente contribuam para qualidade das publicações científi- questões teóricas fundamentais,
o crescimento da Ciência Contábil no cas, o que pode ser observado no com uma abordagem científica
Brasil e no mundo”. repositório de artigos científicos adequada e robusta.
mantido pela Associação Nacio- A contribuição que essas pro-
Gestão do nal de Pós-Graduação e Pesquisa duções podem dar para o aperfei-
conhecimento em Administração (Anpad): www. çoamento do profissional da con-
spell.org.br. tabilidade, segundo Coutinho,
O professor doutor da UFRJ Na opinião do professor, atual- abrangem diversos aspectos: auxí-
Adolfo Henrique Coutinho e Sil- mente existe uma grande preocu- lio na solução de problemas práti-
va, coautor do artigo premiado pação dos pesquisadores em gerar cos; servir de material de apoio para
pela RBC, afirma que, no Brasil, publicações que sejam de maior in- professores e instrutores, de modo
já há uma vasta experiência na teresse para a classe contábil, tra- a facilitar o aprendizado por parte
elaboração de trabalhos técnico- tando de problemas práticos e de dos estudantes nos níveis de gradu-
científicos na área contábil. “Essa
produção trata de questões prá-
ticas, que são relevantes para o
dia a dia da classe contábil, assim O Prêmio
como promove uma discussão
fundamentada sobre os desafios Com a finalidade de estimular a produção de pesquisas técnicas e cien-
enfrentados e propõe novas solu- tíficas na área contábil, o Conselho Federal de Contabilidade, entidade res-
ções para os problemas identifica- ponsável pela edição da RBC, instituiu o Prêmio que leva o nome de um dos
dos”, avalia o professor. maiores expoentes da Contabilidade brasileira, o professor Olivio Koliver, que
Como exemplos, ele cita que, morreu em 2009.
nas décadas de 1980 e 1990, foram Participam da seleção para a escolha do melhor artigo, a cada ano, os
publicados artigos técnico-científi- 36 trabalhos publicados nas seis edições bimestrais da RBC. Nos primeiros
cos inovadores sobre os efeitos da meses do ano seguinte, os membros do Conselho Editorial da revista fa-
inflação sobre as demonstrações zem uma pré-seleção, atribuindo suas notas aos artigos. Após essa primei-
contábeis, assim como houve a dis- ra etapa, os seis artigos mais bem pontuados são submetidos a uma banca
cussão de novos mecanismos de examinadora especialmente instituída, pelo CFC, para fazer a análise e es-
tratamento dos problemas associa- colher o vencedor.
dos. Atualmente, segundo Couti- Conheça, a seguir, os artigos premiados nas quatro primeiras edições
nho, diversos estudos técnico-cien- do Prêmio:
tíficos abordam, por exemplo, os
novos desafios decorrentes da im- 2014. Artigo: “Consolidação da convergência das normas contábeis brasilei-
plementação das normas interna- ras: uma análise sobre o fim do Regime Tributário de Transição”. Autores: Ja-
cionais de contabilidade do Interna- nilson Antonio da Silva Suzar, Jorge de Andrade Costa e Benjamim Cristobal
tional Accounting Standards Board Mardine Acuña. Publicado na RBC nº 202.
(Iasb), no Brasil, e as questões tribu-
tárias associadas. 2015. Artigo: “Remuneração de executivos e desempenho das companhias
“Penso que precisamos fazer abertas brasileiras: uma visão empírica após a publicação da Instrução Nor-
uma melhor gestão do conheci- mativa da CVM n° 480”. Autores: Juliano Augusto Orsi Araújo, Cláudio Parisi,
mento gerado ao longo de tempo. Aldy Fernandes da Silva e Wilson Toshiro Nakamura. Publicado na RBC nº 209.
Assim, nosso atual desafio é de-
senvolver um repositório específi- 2016. Artigo: “Reputação corporativa e desempenho: uma análise nas maio-
co que facilite a consulta e a divul- res companhias abertas do Brasil”. Autores: Sylvia Rejane Magalhães e André
gação deste tipo de publicação”, Haroldo Freitas de Moura. Publicado na RBC nº 215.
afirma o professor.
Sobre a qualidade da produção 2017. Artigo: “A relação entre estrutura de custos e o desempenho econô-
científica, na área contábil, Couti- mico das empresas de construção civil listadas na BM&FBOVESPA”. Autores:
nho acredita que melhorou mui- Davy Antonio da Silva, Maria Eliana dos Santos, Elizio Marcos dos Reis e Ma-
to nos últimos anos. Segundo ele, teus Rocha Menezes. Publicado na RBC nº 218.
notadamente, é possível consta-
tar o aumento da quantidade e da

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8 Prêmio Olivio Koliver incentiva a produção acadêmica

ação e de pós-graduação; e aprimo- novas pesquisas em parceria comi- “Existem diversas revistas es-
ramento dos regulamentos e nor- go e com outros colegas”, afirma. pecializadas e científicas na área
mas desenvolvidos pelos órgãos Aos que desejam escrever artigos, contábil que oferecem um espa-
reguladores. o professor da UFRJ argumenta que ço democrático para publicação
Sobre o Prêmio Olivio Koliver, “o desenvolvimento e a valorização de estudos sobre variados temas.
ele avalia que esta é uma impor- de nossa área de conhecimento passa, Recomendo que os colegas bus-
tante forma de reconhecimento naturalmente, pelo trabalho conjunto quem desenvolver parcerias com
do trabalho de pesquisa realizado. de profissionais e acadêmicos no apri- outros profissionais ou acadêmi-
“O recebimento desta homenagem moramento e progresso da literatura cos, para tornar o processo de ela-
amplia a visibilidade da pesquisa re- contábil”. Para Coutinho, todos po- boração de um artigo técnico-cien-
alizada e serve como incentivo para dem contribuir para esse processo ao tífico uma tarefa menos complexa
a realização de novas publicações. compartilharem seus conhecimentos e para que possam gerar um mate-
Naturalmente, o prêmio aumenta o sobre questões práticas, que podem rial de maior qualidade e que será
interesse de meus alunos de gradu- ser de interesse de outros profissionais mais facilmente publicado”, expli-
ação e pós-graduação em elaborar ou dos agentes reguladores. ca o professor.

Analistas abordam a importância da


pesquisa e do incentivo à elaboração
de artigos
“Na minha percepção, a princi- denadora do Conselho Editorial da RBC, os artigos devem abordar
pal relevância de um artigo, qual- RBC, professora doutora Jacqueli- temáticas relacionadas à Conta-
quer que seja sua classificação, é ne Veneroso Alves da Cunha, Uni- bilidade e que sejam de interesse
comunicar à sociedade os resulta- versidade Federal de Minas Gerais para a classe no Brasil. “Aceitamos
dos de investigações que foram (UFMG), e membro da banca exa- tanto os artigos que contenham
realizadas, muitas delas utilizan- minadora do Prêmio. discussões de cunho teórico como
do dinheiro concedido por agên- Para serem submetidos à ava- aqueles empíricos, que se caracte-
cias de fomento”, afirma a coor- liação do Conselho Editorial da rizam por retratarem problemáti-

“Na minha percepção, a principal relevância de um


artigo, qualquer que seja sua classificação, é comunicar
à sociedade os resultados de investigações que foram
realizadas, muitas delas utilizando dinheiro concedido
por agências de fomento.

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cas vinculadas ao mundo real”, in- bilidade entre os trabalhos, sempre acrescentei que “também gostaria
forma Jacqueline. avaliando tanto o mérito científico de falar aos autores que seu artigo
O importante para a RBC, se- quanto o impacto do conhecimen- irá contribuir, sobremaneira, para a
gundo a coordenadora, é que os to no campo profissional da Con- aproximação cada vez maior e ne-
trabalhos sejam inéditos e contri- tabilidade”, explica ela. cessária entre academia e campo
buam para o avanço da Ciência A qualidade dos trabalhos indi- de trabalho”.
Contábil. Ela ressalta que, atual- cados ao Prêmio Olivio Koliver, na
mente, a RBC está listada como T4 opinião da professora Márcia, tem
no sistema Qualis da Coordenação melhorado. “Este ano senti mais di- Foco na qualidade
de Aperfeiçoamento de Pessoal de ficuldade na seleção de um único
Nível Superior (Capes), chamado melhor trabalho, pois estavam mui- Apesar das dificuldades enfren-
de Tecnológico – isso significa que to próximos em termos de nota, na tadas pelos pesquisadores, o pro-
os autores dos artigos publicados, minha perspectiva”, disse ela, acres- fessor doutor Orleans Silva Martins,
que estejam vinculados a um mes- centando que, embora seja difícil da Universidade Federal da Paraíba
trado ou doutorado profissional, selecionar um artigo em detrimento (UFPB), membro da banca examina-
recebem 50 pontos na avaliação de outro, são feitas escolhas e ava- dora do Prêmio Olivio Koliver e edi-
da Capes, que é realizada de qua- liações baseadas em critérios. tor geral da Revista de Educação e
tro em quatro anos. Aos articulistas, a professo- Pesquisa em Contabilidade (REPeC),
ra orienta para que busquem, em afirma que houve crescimento quan-
Grande responsabilidade suas pesquisas e divulgações cien- titativo da pesquisa em Contabilida-
tíficas, o mérito científico, ou seja, de, no Brasil, nas últimas décadas.
A professora doutora Márcia elaborar uma pesquisa com co- “Nos últimos 20 anos, é fato
Maria dos Santos Bortolocci Es- erência, problemática bem deli- que houve o crescimento da quan-
pejo, da Universidade Federal de neada, metodologia sistematiza- tidade de pesquisas no Brasil, mes-
Mato Grosso do Sul (UFMS), tam- da, plataforma teórica robusta e mo com todas as dificuldades e a
bém compõe a banca examinadora resultados concretos. Além dis- escassez de recursos em nosso País.
instituída para selecionar o artigo so, Márcia sugere que os autores Na área de Contabilidade, também
vencedor do Prêmio Olivio Koliver olhem para a perspectiva de ino- é possível observar esse avanço”,
em 2018. Para ela, que é editora vação e impacto de seus achados afirma o professor.
adjunta da Revista de Educação para o campo profissional contá- Uma prova disso, segundo Mar-
e Pesquisa em Contabilidade (RE- bil. “Esta é a preocupação essencial tins, é a quantidade de periódicos
PeC), participar da avaliação do da RBC: fazer a diferença na vida científicos que surgiram nos últi-
Prêmio não é uma tarefa fácil. “Sin- dos profissionais da contabilidade mos anos. “Hoje temos pouco mais
to que é uma grande responsabili- por meio de pesquisas que sejam de 30 programas de pós-graduação
dade, mas atribuo minha nota com aplicáveis de fato, de forma mais em Contabilidade no Brasil e, apro-
critérios que permitem a compara- concreta”, destaca ela. Finalizando, ximadamente metade deles têm,


A pesquisa em Contabilidade, especialmente no
Brasil, tem se transformado ao longo dos anos. É
possível observar avanços na quantidade de estudos
publicados, assim como nos métodos utilizados para
pesquisa, sejam eles quantitativos ou qualitativos.

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além do curso de mestrado, tam- qualidade’, com maiores alcances e de forma geral, os estudos de hoje
bém o de doutorado. Já as revistas fatores de impacto. têm maior relevância do que os de
científicas nacionais sobre Sontabi- “A pesquisa em Contabilidade, es- ontem, e ele espera que os de ama-
lidade, aquelas que têm tal descri- pecialmente no Brasil, tem se trans- nhã sejam ainda mais relevantes do
ção em sua nomenclatura, são mais formado ao longo dos anos. É possí- que os de hoje.
de 40”, explica o professor, citando vel observar avanços na quantidade Questionado sobre o que uma
que há ainda as revistas de adminis- de estudos publicados, assim como revista científica na área de Conta-
tração e de negócios que também nos métodos utilizados para pesqui- bilidade deseja dos autores, o editor
publicam sobre Contabilidade – sa, sejam eles quantitativos ou qua- da REPeC afirma que qualquer pe-
como a RAE, a RAUSP, a RBGN, etc. litativos. Junto a isso, o avanço das riódico que objetiva contribuir com
Martins calcula que, consideran- tecnologias tem nos permitido reali- a construção de conhecimento em
do que cada uma dessas revistas pu- zar estudos mais profundos e com al- uma área da ciência espera que seus
blica, em média, 24 artigos ao ano, cance maior. Porém, hoje ainda verifi- autores apresentem estudos com
certamente há mais de 1.000 arti- camos no País o ‘mais do mesmo’. A fortes fundamentos teóricos, mé-
gos científicos sobre Sontabilidade maior parte dos estudos publicados todos de pesquisa adequados e ele-
publicados por ano, “sem contar to- avançam pouco, cientificamente fa- vados potenciais de originalidade e
dos aqueles produzidos por pesqui- lando”, opina o professor. agregação de ‘conhecimento novo’.
sadores brasileiros e publicados em Um grande desafio para a área de Concluindo, ele explica: “Esse ‘co-
periódicos internacionais, o que tem Contabilidade, de acordo com o edi- nhecimento novo’, ou inovação do
sido cada vez mais frequente”. tor geral da REPeC, é fazer com que trabalho, é exatamente o oposto do
Para ele, é possível ver que al- as pesquisas sejam mais relevantes e ‘mais do mesmo’; uma pesquisa que
cançamos, no Brasil, um padrão de úteis para a sociedade. “Como con- conclua que ‘o aumento das receitas
‘quantidade’, e agora perseguimos o tribuir para termos uma sociedade tende a aumentar o lucro, enquanto
padrão de ‘qualidade’. Martins argu- melhor? Temos um imenso potencial o aumento das despesas tende a re-
menta que o próprio órgão que nor- para isso, seja por meio de estudos duzir o lucro’, por exemplo, é ‘mais
matiza e fiscaliza a pós-graduação que apontem a melhor evidenciação do mesmo’. E isso é lógico, não tem
no Brasil, a Coordenação de Aper- do patrimônio das empresas, que in- originalidade e não agrega conheci-
feiçoamento de Pessoal de Nível Su- diquem avanços em governança ou mento novo à ciência. Por isso temos
perior (Capes), tem feito movimen- em auditoria, dando maior confiabi- um desafio no sentido de mudar do
tos nesse sentido, uma vez que tem lidade às informações das empresas, padrão de quantidade para o de qua-
deixado de lado o ‘quanto mais me- ou mesmo por meio do avanço em lidade das pesquisas científicas, pro-
lhor’, para exigir dos professores um instrumentos de gestão e de contro- duzindo trabalhos de maior qualida-
número limitado de artigos publica- le do patrimônio público, explica ele. de, com maior potencial de contribuir
dos, mas em ‘periódicos de melhor Por causa disso, Martins acredita que, para uma sociedade melhor”.

Membros do Conselho Editorial


dizem o que a RBC espera dos autores
Para a coordenadora do Conse- o professor doutor Emanoel Mar- ainda que o Prêmio Olivio Koliver
lho Editorial da RBC, Jacqueline Ve- cos Lima, da Universidade Federal é um reconhecimento ao trabalho
neroso Alves da Cunha, a revista es- do Mato Grosso do Sul (UFMS), escolhido, “mas a publicação do
pera receber, principalmente, bons diz que a pesquisa não é um tra- artigo já evidencia o resultado de
trabalhos, “que ajudem a solucionar balho simples, mas que o esforço todo esforço e dedicação desem-
os inúmeros problemas que temos na e dedicação sempre valem a pena, penhados”.
área contábil”. pois é a partir desses estudos que Ernani Ott, professor doutor
Aos autores que encaminham metodologias, conceitos e atitu- da Universidade do Vale do Rio
trabalhos para publicação na RBC, des são modificados. Ele afirma dos Sinos (Unisinos), entende que

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“Todos os autores que submetem seus artigos


para a RBC, certamente, o fazem com o intuito de
contribuir com suas reflexões e pesquisas para o
aprimoramento do conhecimento em Contabilidade
e, por isso, merecem os cumprimentos e nosso
permanente incentivo.

“todos os autores que submetem RBC, antes de submeter os traba- ção de artigos científicos ou técni-
seus artigos para a RBC, certamen- lhos. Além disso, ele sugere que cos é uma forma de divulgar para
te, o fazem com o intuito de con- seja feito um estudo dos principais todos os profissionais o resultado
tribuir com suas reflexões e pes- temas abordados e que, principal- de novas descobertas. Dirigindo-se
quisas para o aprimoramento do mente, os autores não desistam aos autores, ela afirma: “As publi-
conhecimento em Contabilidade dos seus artigos. “Existem muitos cações poderão lhes trazer, além
e, por isso, merecem os cumpri- TCCs guardados em bibliotecas de reconhecimento, importantes
mentos e nosso permanente in- que poderiam ajudar sobremanei- benefícios para suas experiências e
centivo”. Segundo Ott, uma vez ra as empresas, por isso, não te- desenvolvimento profissional”.
aprovados para publicação, esses nha medo de submeter; não pense O doutorando José Luiz Nunes
artigos encontram na RBC um veí- que seu trabalho não esteja bom; Fernandes, professor da Universi-
culo apropriado para disseminar o espere as avaliações e, caso não dade Federal do Pará (UFPA), su-
conhecimento, beneficiando a to- venha a ser aprovado, melhore gere àqueles que planejam desen-
dos os seus leitores, em especial, e submeta-o as outras revistas”, volver trabalho acadêmico que, se
os profissionais, estudantes e pro- orienta Lucena. Para ele, o traba- possível, as pesquisas privilegiem
fessores de Contabilidade. lho de publicação é árduo, mas, a realidade brasileira, composta,
Professor doutor da Universi- sem dúvida, compensador. principalmente, de pequenas e
dade Federal da Paraíba (UFPB), De acordo com a professora médias empresas e, assim, os es-
Wenner Glaucio Lopes Lucena doutora Rosimeire Pimentel Gon- forços sejam direcionados ao estu-
lembra que os articulistas devem zaga, da Universidade Federal do do do patrimônio e do resultado
seguir as regras apresentadas pela Espírito Santo (UFES), a publica- dessas empresas.

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O rodízio de auditores independentes


e o gerenciamento de resultados em
instituições bancárias: uma análise
Econométrica de 1997 a 2013

A
Monara Reis Silva Brandão
Aluna do curso de Ciências Econômicas com
implantação do rodízio de auditores independentes Ênfase em Controladoria da Universidade Fe-
teve como intuito a preservação da independência deral de Alfenas (Unifal-MG) – Campus Var-
ginha/ MG
do auditor externo, como também a diminuição das Monara: monara_ma@hotmail.com
fraudes e erros contábeis das demonstrações financeiras. Dessa
forma, este estudo tem como objetivo analisar se o rodízio Leandro Lima Resende
de auditores independentes interfere no gerenciamento de Professor do Instituto de Ciências Sociais Apli-
cadas da Universidade Federal de Alfenas (Uni-
resultados contábeis em instituições bancárias do Brasil, que fal-MG) – Campus Varginha (MG)
tiveram rodízio das empresas de auditoria independente no Leandro: leandro.resende@unifal-mg.edu.br

período de 1997 a 2013. Após uma revisão de literatura sobre Luiz Kennedy Cruz Machado
auditoria independente, rodízio de auditores independentes, Doutorando em Administração pela Universi-
dade Federal de Lavras (Ufla)
gerenciamento de resultados e perda estimada para créditos Luiz Kennedy: luizken@yahoo.com.br
de liquidação duvidosa, efetuou-se uma pesquisa descritiva
com abordagem quantitativa com a aplicação do modelo de
regressão linear múltipla de Fuji (2004). Utilizou-se dessa
metodologia com o propósito de identificar o gerenciamento
de resultado por meio da conta de perda estimada para crédito
de liquidação duvidosa. As instituições utilizadas neste estudo
foram dois bancos múltiplos, sendo o maior de economia mista
em ativos totais e outro sendo o maior de capital privado. Os
resultados evidenciam que no exercício em que existe a troca
das empresas de auditoria independente o gerenciamento de
resultado não é necessariamente amenizado em relação ao seu
exercício anterior.

2103 – Recebido em 20/7/2018. Distribuído em 20/7/2018. Pedido de revisão não houve.


Aprovado em 27/8/2018, na segunda rodada, por dois membros do Conselho Editorial.
Publicado na edição setembro-outubro de 2018. Organização responsável pelo periódico:
Conselho Federal de Contabilidade.

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O rodízio de auditores independentes e o gerenciamento de resultados em
14 instituições bancárias: uma análise Econométrica de 1997 a 2013

1. Introdução • Existência de múltiplas estima- O gerenciamento de resulta-


tivas. dos, segundo Goulart (2007, p.30),
A Contabilidade é uma ciência • Flexibilidade, arbitrariedade e “pode ser entendido como uma
social aplicada e tem como função subjetividade na aplicação. forma de interferência de interes-
básica informar e auxiliar os usuá- • Diferentes, porém válidas inter- ses específicos dos preparadores de
rios na tomada de decisão. Segun- pretações dos princípios e nor- demonstrações contábeis no conte-
do Iudícibus (2004), o principal mas contábeis. údo ou na forma de apresentação e
objetivo da Contabilidade carac- • Conceito base de Imagem Fide- divulgação de informações por par-
teriza-se pelo fornecimento de in- digna pouco claro ou indeter- te das empresas”. Assim, o geren-
formações econômicas para os vá- minado. ciamento, mesmo não sendo fraude
rios usuários, de modo a auxiliar • Cuidados da administração na ou ato ilícito, afeta negativamente
nas tomadas de decisões. Podem- aplicação de princípios como pru- a função das demonstrações finan-
se identificar esses usuários como dência, confrontação de receitas ceiras, pois elas devem fornecer in-
sendo administradores, entidades e despesas e uniformidade. formações úteis e confiáveis para
governamentais, funcionários, in- Esses princípios e normas con- aqueles que as utilizam seja para
vestidores, emprestadores de re- tábeis precisam ser auditados. Des- qual for seu fim. Por esses motivos,
cursos, entre outros. sa forma, a Lei n.º 6.404, no ano alguns autores rejeitam a prática de
À medida que esta ciência foi de 1976, também introduziu a au- gerenciamentos de resultados.
evoluindo, viu-se a necessidade de ditoria independente para as Com- Em função do exposto acima,
se identificarem quais seriam as panhias Abertas no Brasil, a qual pode-se atrelar que essas brechas
premissas básicas que a orientaria. consiste, segundo Reis (2009, p. acabaram levando algumas organi-
Dessa forma, criaram-se os princí- 18), “no exame das operações, ati- zações a cometerem tais gerencia-
pios contábeis, sendo estes nor- vidades e sistemas de determina- mentos, o que acabou entrando em
mas padronizadas para os regis- da empresa, com vistas a verificar falência e/ou envolvendo-se em es-
tros contábeis. Essas normas foram se são executados ou funcionam cândalos. Há evidências de que há
introduzidas pela publicação da Lei em conformidade com determina- tal gerenciamento, segundo Bispo
n.º 6.404 no ano de 1976. Porém, dos objetivos, orçamentos, regras (2010), ocorre um pouco antes e
devido ao advento da globalização e normas.” Assim, a auditoria deve logo após a abertura de capital.
e em entendimento às necessida- verificar se há uma exatidão dos re- Perante a onda de escândalos
des da sociedade brasileira, muitas gistros contábeis, evidenciando se contábeis que estavam ocorrendo, a
modificações já foram feitas até os refletem adequadamente a situa- partir da segunda metade da década
dias de hoje, como, por exemplo, ção patrimonial da empresa. de 1990, envolvendo grandes empre-
a criação das Leis n.os 11.638/07 e Diante das características das sas e bancos, viu-se a necessidade de
11.941/09. Esta mudança da legis- normas contábeis, citadas ante- algumas mudanças nas normas con-
lação teve como objetivo harmo- riormente, pode-se perceber que tábeis brasileiras. Dessa forma, foi in-
nizar as normas contábeis com as elas são de ordem subjetiva, pos- troduzido o rodízio de firmas de au-
normas internacionais de contabi- sibilitando brechas no momento ditoria pelo Banco Central do Brasil
lidade, emitidas pelo International da realização das demonstrações. (Bacen) em março de 1996 pela Re-
Accounting Standards Board (Iasb). Dessa forma, alguns gestores e solução n.º 2267. Posteriormente, em
Segundo Santos e Grateron contadores conseguem manipu- maio de 1999, esta norma foi adota-
(2003), os princípios e normas con- lar, de forma legal, informações da pela Comissão de Valores Mobiliá-
tábeis apresentam algumas ca- em prol de interesses particulares. rios (CVM) por meio da Instrução n.º
racterísticas, entre elas, podem- Assim, as demonstrações finan- 308 como uma resposta à sociedade
se destacar: ceiras publicadas podem não re- para demonstrar que tais instituições
presentar de maneira fidedigna a estavam atentas à fiscalização.
realidade da entidade, mesmo es- O principal objetivo do rodízio de
tando em consonância com as leis empresas de auditoria foi com o in-
vigentes. O conceito que ex- tuito de preservar a ética e indepen-
pressa essa manipulação é dência dos auditores independentes,
o gerenciamento de resulta- bem como a eliminação dos erros e
dos, conhecido também como fraudes contábeis que estão relacio-
Earnings Management na lite- nadas com a auditoria externa das
ratura internacional. demonstrações contábeis. A alega-

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 15


Perante a onda de escândalos contábeis que
estavam ocorrendo, a partir da segunda metade da
década de 1990, envolvendo grandes empresas e
bancos, viu-se a necessidade de algumas mudanças
nas normas contábeis brasileiras.

ção dos defensores do rodízio é de A carência na produção científi- dependente no Brasil. Mas tem-se
que os relacionamentos prolongados ca de estudos, na área do rodízio de como o primeiro fato registrado so-
entre as empresas auditadas e os au- empresas de auditoria, e o gerencia- bre auditoria o balanço da São Paulo
ditores geram resultados viciados. mento de resultados são grandes, Tramway Light and Power Company,
O presente estudo foca em ins- principalmente em relação a bancos. feito entre junho de 1899 e dezem-
tituições bancárias, que, segun- A maioria dos trabalhos acadêmicos bro de 1902, certificado pela empre-
do Saunders (2000) apud Santos existentes é voltada para as compa- sa canadense de Auditoria Clarkson
(2007), pode-se destacar que elas nhias abertas não bancárias. Dessa & Cross – atualmente Ernst & Young.
são entidades especiais, com re- forma, devido aos grandes escânda- Ainda de acordo com Ricardino
gulamentação específica, voltadas los contábeis envolvendo grandes e Carvalho (2003), a primeira em-
para a atividade de intermediações corporações, a necessidade de es- presa de auditoria a se instalar no
e que perturbações ou interferên- tudos nessa área torna-se essencial. Brasil foi a Deloitte Touche Tohmat-
cias importantes podem produzir Assim, tal estudo pode ser jus- su, no Rio de Janeiro, no ano de
efeitos prejudiciais para o restan- tificado por abordar um tema de 1911. Mas, naquela época, o país
te da economia. As operações de grande relevância, atingindo os estava longe de ter preocupações
crédito, segundo Fuji (2004), repre- resultados financeiros publicados com o respectivo assunto. Os pri-
sentam a principal fonte de receitas pelas instituições bancárias, com meiros trabalhos sobre ele apenas
das instituições bancárias, principal- ampla influência no mercado brasi- surgiram a partir de 1928.
mente após o Plano Real, ante o ce- leiro. Por fim, este estudo será rea- Segundo Reis (2009), a audito-
nário de estabilização monetária e lizado em dois bancos, um privado ria consiste no exame das operações,
queda de receitas. Com este cená- e outro de economia mista. atividades e sistemas de determina-
rio, cresceu a importância de um da organização, com o intuito de
adequado reconhecimento das per- verificar se são executados ou fun-
das prováveis e um consistente di- 2. Revisão bibliográfica cionam em conformidade com de-
mensionamento do risco de crédito. terminados objetivos, orçamentos,
Neste contexto, a questão proble- 2.1 Auditoria Independente regras e normas contábeis. Ainda
ma que se objetiva a responder nes- De acordo com Pacheco et al. de acordo com Reis (2009), audito-
te trabalho é: Qual é o impacto do (2004) apud Bassetti (2011), embora ria é o ato de confrontar a condição
Rodízio de Auditores Independen- a origem da auditoria seja muito dis- – situação encontrada – com o crité-
tes no gerenciamento de resulta- cutida por especialistas, torna-se es- rio – situação que deve ser (normas
dos em instituições bancárias? Sen- sencial relacioná-la com o início das e procedimentos predeterminados).
do assim, o objetivo deste trabalho atividades econômicas desenvolvi- A definição dos critérios de auditoria
é verificar se o rodízio de auditores das pelo ser humano. Dessa forma, é de fundamental importância para
independentes interfere no gerencia- segundo Ricardino e Carvalho (2003), a realização dos exames.
mento de resultados contábeis em é difícil determinar o surgimento do O Instituto dos Auditores In-
instituições bancárias do Brasil. primeiro trabalho de auditoria in- dependentes do Brasil (Ibracon)

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O rodízio de auditores independentes e o gerenciamento de resultados em
16 instituições bancárias: uma análise Econométrica de 1997 a 2013

(1998, p. 23) define que “o objetivo Por meio da Instrução n.º então, várias medidas foram toma-
de uma auditoria das demonstra- 308/99, a CVM prevê o registro e o das por entidades reguladoras.
ções contábeis é habilitar o auditor exercício da atividade de auditoria A Instrução n.º 308 também es-
a expressar uma opinião sobre se as independente no âmbito do mer- tabelece em seu Art. 31 a respeito
demonstrações foram preparadas, cado de valores mobiliários como do rodízio de auditores indepen-
em todos seus aspectos relevantes, também define os deveres e as res- dentes, na qual o auditor deve ser
de acordo com uma estrutura con- ponsabilidades dos administrado- substituído depois de cinco anos no
ceitual identificada para relatórios res das organizações auditadas no máximo e só poderá ser recontrata-
contábeis.”. Segundo Becker et al. relacionamento com os auditores do após três anos. Para ser mais es-
(1998) apud Martinez e Reis (2010), independentes. Em relação à atu- pecífica, a instrução estabelece que:
a auditoria reduz as assimetrias de ação do auditor independente,
informação existentes entre os ges- Cunha et al. (2009) afirmam que a “O Auditor Independente - Pessoa
tores e os demais interessados na referida instrução pretende garan- Física e o Auditor Independente -
organização, possibilitando que os tir sua independência frente à em- Pessoa Jurídica não podem prestar
que se encontram externos a or- presa auditada e a qualidade de sua serviços para um mesmo cliente, por
ganização acreditem nas suas de- auditoria. A instrução impede que prazo superior a cinco anos conse-
monstrações financeiras. os auditores independentes pres- cutivos, contados a partir da data
No que se refere ao aspecto le- tem serviços de consultoria a em- desta Instrução, exigindo-se um in-
gal, a regulação da atividade de au- presa auditada e que mantenham tervalo mínimo de três anos para a
ditoria só ocorreu a partir de 1965 títulos mobiliários dela (ou de con- sua recontratação.” (Art. 31, Instru-
e apenas foi fortalecido em 1976, troladas) e também prescreve pe- ção CVM número 308, 1999)
com a Lei n.º 6.404 – Lei das Socie- nalidades como advertências, mul-
dades por Ações. Segundo Ricardi- tas e suspensão e cancelamento de Esta instrução pretende evitar
no e Carvalho (2003), esta mesma registro para o caso de má atuação o relacionamento em longo prazo
lei estabeleceu a obrigatoriedade da (ASSUNÇÃO E CARRASCO, 2008). entre auditor e empresa auditada,
Auditoria Independente para as so- A Resolução n.º 3.198/2004, do por acreditar-se que um longo re-
ciedades e as demonstrações contá- Bacen, determina, em seu artigo pri- lacionamento pode colocar em ris-
beis de grupos que incluem socieda- meiro, que devem ser auditadas por co a qualidade da prestação deste
des. De acordo com tal legislação, auditores independentes registra- serviço, como também, de acordo
os profissionais que exercem a audi- dos na Comissão de Valores Mobi- com Assunção e Carrasco (2008),
toria independente devem estar re- liários (CVM), desde que atendam ela pretende contribuir para a di-
gistrados na CVM. A CVM também aos requisitos mínimos a serem fixa- minuição da independência do
foi criada no ano de 1976, pela Lei dos pelo Banco Central do Brasil, as primeiro em relação ao segundo
n.º 6.385, com a responsabilidade demonstrações contábeis, inclusive na execução de seu trabalho. Esta
de normatizar os procedimentos notas explicativas das instituições fi- obrigatoriedade também foi insti-
contábeis e os trabalhos de nanceiras e demais instituições auto- tuída pelo Banco Central em mar-
auditoria das empresas de rizadas a funcionar pelo Banco Cen- ço de 1996 por meio da Resolução
capital aberto, como tam- tral do Brasil, exceto as sociedades de n.º 2267.
bém exercer as funções crédito ao microempreendedor; das Em adição ao rodízio, a Re-
de fiscalização, seme- câmaras e prestadores de serviços de solução n.º 3.170/2004 do Ba-
lhantes à Securitiesand compensação e de liquidação [...]. cen obriga instituições financeiras
Exchange Commision com patrimônio superior ou igual
(SEC) norte-americana 2.2 Rodízio de Auditores a R$1.000.000.000,00 (um bilhão
(PACHECO, OLIVEIRA E Independentes de reais) a constituírem comitês in-
GAMBA, 2010). Perante a onda de escândalos dependentes de auditoria. Eles são
contábeis ocorridos a partir da responsáveis pelo apontamento e
segunda metade da década de supervisão de auditores externos.
1990 que o assunto Como seus membros têm mandato
rodízio de “audi- fixo, em adição ao rodízio de audito-
tores independen- res, há uma rotatividade no comitê
tes” passou a ser de auditoria. Esse mandato fixo dos
foco de discussão membros do comitê deve se no má-
no mercado. Desde ximo cinco anos e no mínimo três.
REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 17

Porém, em 11 de setembro de Lei nlo 11.638/07, que implementou apud Silva e Bezerra (2010) como
2008, houve uma mudança em rela- alterações relevantes na contabilida- a “manipulação dos dados com o
ção ao rodízio. Os bancos e demais de das companhias que deverão ser objetivo de atender aos interesses
instituições supervisionadas pelo Ba- introduzidas até o exercício social de do administrador e, não dos acio-
cen foram dispensadas do rodízio de 2010, com a adoção plena das nor- nistas de modo geral”, sendo uma
auditoria independente. A Resolu- mas internacionais de contabilidade prática reprovada e não sendo de-
ção do Conselho Monetário Nacional (IFRS); de forma a permitir aos au- sejável pelos investidores, pois tal
(CMN) n.º 3.606/2008 modificou o ditores uma melhor avaliação sobre gerenciamento mascara a realida-
Art. 9º da Resolução n.º 3.198/2004 as informações contábeis divulgadas de patrimonial. Azevedo e Costa
do CMN, alterando o conceito de em observância ao novo arcabouço (2012) também afirmam que tal
“auditor independente”. Pela resolu- normativo alinhado as normas in- prática advém de escolhas contá-
ção de 2004, o rodízio deveria ser da ternacionais de contabilidade”. beis por razões oportunistas inter-
empresa de auditoria, mas, pela nova ferindo no resultado da instituição,
resolução, o rodízio será apenas do De acordo com o menciona- geralmente expropriando de algum
responsável técnico e sobre a equipe do por Azevedo e Costa (2012), os outro investidor, credor ou governo.
de auditores independentes das em- opositores da rotatividade de audi- Dessa forma, o único a ser benefi-
presas contratadas (Quadro 1). tores independentes defendem que ciado pela assimetria de informação
Em relação à nova resolução, a a qualidade da auditoria não é ape- seria o gestor.
CVM, por meio da Deliberação n.º nas decorrente da independência, Segundo Martinez (2008), o ge-
549/2008, dispôs sobre a rotativida- mas envolve outros fatores, como renciamento de resultados é uma
de dos auditores independentes no o conhecimento específico sobre maneira de tratar a diferença que
âmbito do mercado de valores mo- o cliente, diminuído na mudança. há entre a contabilidade pelo re-
biliários e deliberou a facultativida- Já os defensores alegam que lon- gime de caixa e a contabilidade
de para as companhias abertas da gos mandatos levam a uma maior pelo regime de competência. Essa
substituição de seus atuais auditores intimidade com o cliente, reduzin- diferença entre o lucro líquido e o
independentes até a data de emis- do a independência, bem como de- fluxo de caixa operacional é cha-
são do parecer de auditoria para as fendem que o rodízio assegura aos mada de accruals (acumulações).
demonstrações financeiras relativas auditores independentes maiores Esses accruals (acumulações) po-
ao exercício social a se encerrar em incentivos a não ceder às pressões dem ser definidos como todas as
2011. Entretanto, as companhias dos gestores, por meio da manu- contas de resultado que entraram
abertas que quiserem substituir seus tenção do “compromisso e com- na computação do lucro, mas não
auditores independentes anterior ao prometimento” dos auditores com necessariamente afetará em movi-
ano de 2011 deverão contar normal- a independência e ética na execu- mentação de disponibilidades. Os
mente, como antes, o prazo de cin- ção dos trabalhos de auditoria. accruals podem ser divididos em
co anos como instituído na Instrução discricionários (discretionary ac-
n.º 308/1999 da CVM, a partir da 2.3 – Gerenciamento de cruals) e não discricionários (non
contratação. Essa modificação para Resultados discretionary accruals).
o exercício de 2008 foi realizado Gerenciamento de resultados Os accruals não discricionários
para não comprometer o processo pode ser definido segundo Decourt, seriam os exigidos de acordo com a
de adaptação das instituições finan- Martinewski e Pietro Neto (2007) realidade do negócio. Já os accruals
ceiras aos novos dispositivos da Lei
das Sociedades por Ações, introdu- Quadro 1 - Resolução n.º 3.606/2008 versus a
zidos pela Lei n.º 11.638/2007. Esse
Resolução n.º 3.198/2004
novo critério sobre o rodízio tende a
Atual – Resolução n.º 3.606/2008 Anterior – Resolução n.º 3.198/2004
reduzir os custos de contratação de As instituições financeiras e demais instituições As instituições financeiras e demais instituições
auditorias externas. autorizadas a funcionar pelo Bacen, exceto as autorizadas a funcionar pelo Bacen, exceto as
Ainda em relação à facultativi- sociedades de crédito ao microempreendedor e as sociedades de crédito ao microempreendedor e as
câmaras e prestadores de serviços de compensação câmaras e prestadores de serviços de compensação
dade dos auditores independentes e de liquidação, devem proceder a substituição do e de liquidação, devem proceder a substituição
Cunha et al. (2009) explicita que: responsável técnico, diretor, gerente, supervisor e do auditor independente contratado, no máximo,
qualquer outro integrante, com função de gerência, após emitidos pareceres relativos a cinco exercícios
da equipe envolvida nos trabalhos de auditoria, sociais completos.
“A Comissão de Valores Mobiliários depois de emitidos pareceres relativos a, no
facultou a rotatividade dos audito- máximo, cinco exercícios sociais completos.
res independentes, em virtude da Fonte: Cunha et al. (2009).

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O rodízio de auditores independentes e o gerenciamento de resultados em
18 instituições bancárias: uma análise Econométrica de 1997 a 2013

discricionários seriam artificiais, termina que empresas sob a forma tentes e verificáveis, com base em in-
tendo como propósito “gerenciar” de sociedades anônimas deverão formações internas e externas
o resultado contábil (MARTINEZ, avaliar suas aplicações em direi- Como regra geral, a resolução
2008). Dessa forma, consideram- tos e títulos de crédito pelo “valor CMN n.º 2.682/1999 prevê que a
se os accruals discricionários como de emissão, atualizado conforme classificação das operações de cré-
uma proxy empírica para detectar o disposições legais ou contratuais, dito deverá ser revista mensalmen-
gerenciamento de resultado. ajustado ao valor provável de rea- te, ocasião na qual serão classifica-
O termo Earnings Manage- lização, quando este for inferior”. das de acordo com a quantidade de
ment, geralmente utilizado na lite- A diferença entre esses dois valores dias em atraso, conforme pode ser
ratura, consiste no gerenciamento constitui na “perda estimada para observado no Quadro 2.
de resultados dentro dos limites le- créditos de liquidação duvidosa – Segundo Goulart (2007), a discri-
gais, considerando-se a discriciona- PECLD” ou “provisão para devedo- cionariedade sobre a perda estima-
riedade e a flexibilidade permitidas res duvidosos”, que assim era cha- da para créditos de liquidação du-
pelas normas e práticas contábeis mada antes da adoção às normas vidosa e seus efeitos em relação à
(FUJI, 2004). internacionais de contabilidade. solidez do sistema bancário tem sido
Em relação ao gerenciamento Fuji e Carvalho (2005) classificam objeto de debate entre profissionais,
em instituições bancárias, Goulart a provisão para créditos de liquida- acadêmicos e reguladores. Embora o
(2007) afirma que a transparência é ção duvidosa como sendo uma das processo de determinação do nível
uma das bases para um sistema fi- contas que envolvem estimativas de de estimativa para que decorra tais
nanceiro sólido, razão pela qual os perdas e, por conseguinte, carac- perdas, necessariamente, de um jul-
bancos centrais de diversos países e teriza-se pela subjetividade e julga- gamento da administração, isso não
órgãos internacionais defendem a mento. Os parâmetros para a cons- pode ser usado para manipular os
divulgação das informações eviden- tituição da provisão para perdas resultados ou enganar partes envol-
ciando adequadamente sua respecti- são definidos pela Resolução CMN vidas. Dantas (2012) destaca a rele-
va situação patrimonial, financeira e n.º 2.682/1999, de 21 de dezembro vância de demonstrações financeiras
de resultados, além de outros aspec- de 1999, que prevê que as opera- apropriadas tanto para os investido-
tos como a estrutura organizacional, ções de crédito devem ser classifi- res quanto para a própria solidez do
controles internos e gestão de riscos. cadas por ordem crescente de risco sistema bancário.
O mesmo autor expõe que a perda de acordo com uma escala de nove Segundo Alali e Jaggi (2010)
estimada para créditos de liquidação níveis. Essa resolução da CMN tem apud Dantas (2012), há uma cren-
duvidosa (PCLD) é um potencial ins- como base o Acordo de Basileia de ça generalizada no mercado de
trumento para gerenciamento de re- 1988. A norma contempla parâme- que os administradores dos ban-
sultados por parte dos bancos. tros específicos para a classificação, cos usam extensivamente a PE-
como a determinação de que após CLD para manipular os resultados
2.4 – Perda Estimada para determinado tempo de atraso o cré- divulgados, o que tem sido foco
Créditos de Liquidação Duvidosa dito deva ser reclassificado ou baixa- de preocupação dos reguladores.
O Art. 183 da Lei n.º do, conforme o caso. Dessa forma, Essa concentração pode ser jus-
6.404/1976, alterado pela Lei n.º segundo Dantas (2012), a adminis- tificada segundo Kanagaretnam,
11.638/2007, no seu item I-b, de- tração deve utilizar critérios consis- Lobo e Mathieu (2003) apud Dan-

Quadro 2 – Classificação das operações de crédito por níveis de risco em função do atraso e percentual
de Perda Estimada para Créditos de Liquidação Duvidosa
Classificação do nível de risco Atraso em dias PECLD sobre o valor das operações
“AA” Sem atraso -
“A” Até 14 dias 0,5%
“B”, no mínimo Entre 15 e 30 dias 1,0%
“C”, no mínimo Entre 31 e 60 dias 3,0%
“D”, no mínimo Entre 61 e 90 dias 10,0%
“E”, no mínimo Entre 91 e 120 dias 30,0%
“F”, no mínimo Entre 121 dias e 150 dias 50,0%
“G”, no mínimo Entre 151 dias e 180 70,0%
“H” Superior a 180 dias 100%
Fonte: Adaptado da Resolução CMN n.º 2.682/99

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 19

tas (2012) pelo fato de essas per- o qual foi adaptado, pois foi inseri- do significativo para os dois bancos.
das estimadas representarem os da uma variável dummy, sendo ex- Porém, algumas variáveis não foram
maiores accruals (acumulações) presso por: (Figura 1) significativas para o modelo, sendo
dos bancos, desempenhando pa- Utilizou-se o software Gretl a ele ajustado, e os resultados se en-
pel fundamental nas decisões dos fim de realizar a regressão múlti- contram na Tabela 1 e 2.
gestores sobre eventuais manipu- pla ajustada pelo método dos míni- Segundo a Tabela 1, o coefi-
lações contábeis. mos quadrados ordinários e obter ciente de determinação do mode-
os resultados fornecidos pelos da- lo (R2) foi de, aproximadamente,
dos amostrais. 98,7%, com uma significância in-
3. Metodologia ferior a 1%.
Em relação ao Banco de eco-
A presente pesquisa caracteriza- 4. Análise dos Resultados nomia mista, o coeficiente de de-
se como sendo descritiva, na qual, terminação do modelo (R2) foi de,
segundo Gil (2006), tem como ob- A partir dos dados coletados, aproximadamente, 88%, com uma
jetivo classificar, narrar e descrever foi possível estimar o modelo de re- significância inferior a 1%,confor-
sobre as características de determi- gressão, no qual obteve um resulta- me a Tabela 2.
nada população. Quanto à aborda-
gem, ela se caracteriza como sendo
quantitativa, pois tem como finali-
Figura 1
dade a relação entre as variáveis. A
análise quantitativa caracteriza-se
pela objetividade das informações
Em que:
por meio da utilização de técnicas (a) DespDevDuv = Despesas – Perdas estimadas para créditos de liquidação duvidosa;
estatísticas para o tratamento dos (b) 0 = intercepto;
dados afim de generalização dos (c) Res = Resultado Líquido do Exercício, excluindo as perdas estimas para créditos de liquida-
resultados buscados (VERGARA, ção duvidosa;
(d) P = Passivo Exigível;
2008).
(e) Op.Cred = Operações de crédito;
Os dados foram anuais coleta- (f) Audit = variável dummy, que representa a auditoria independente, incorporado no modelo
dos no site da CVM e inflacionados, com valor 1 no ano da troca da empresa de auditoria e valor 0 para os demais anos; e
ou seja, trazidos a valor presente até (g) u = erro.
o ano de 2013, pelo Índice Geral de
Preços – Disponibilidade Interna (IGP-
DI), coletado no site do Instituto de Tabela 1 – Modelo Ajustado: Mínimos Quadrados Ordinários –
Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea- Banco de capital privado
data). O período de pesquisa com- Modelo Mínimos Quadrados Ordinários
preende os anos entre 1997 e 2013. Variável dependente: DespDevDuv
Variáveis Independentes Coeficiente razão-t p-valor
As instituições que foram obje-
Resultado -0,475216 -28,8684 <0,00001***
tos de estudo são dois bancos múl-
Auditoria 1.001.940 2,3172 0,03504**
tiplos, sendo o maior banco de eco-
R-quadrado 0,986612 P-valor(F) 8,92e-15
nomia mista e o segundo maior de Fonte: Dados do trabalho (2014)
capital privado, escolhidos em rela- Nota: * significativo à 10% ** significativo à 5% *** significativo à 1%
ção ao seu ativo total (BANCO CEN-
TRAL DO BRASIL, 2014). O motivo Tabela 2 – Modelo Ajustado: Mínimos Quadrados Ordinários –
pela não escolha de estudar o maior Banco de economia mista
banco múltiplo de capital privado se Modelo Mínimos Quadrados Ordinários
deu em função de ele ter passado por Variável dependente: DespDevDuv
um processo relevante de fusão no Variáveis Independentes Coeficiente razão-t p-valor
período compreendido no estudo. Constante -5.883.340 -3,7861 0,00227***
Resultado -0,836359 -8,2297 <0,00001***
A análise de regressão linear
Operação de Crédito 0,259666 5,5884 0,00009***
múltipla foi utilizada como prin-
Auditoria 2.556.570 2,0985 0,05597*
cipal método de estudo. Para este
R-quadrado 0,880107 P-valor(F) 2,96e-06
trabalho, o modelo utilizado foi o Fonte: Dados do trabalho (2014)
modelo proposto por Fugi (2004), Nota: * significativo à 10% ** significativo à 5% *** significativo à 1%

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O rodízio de auditores independentes e o gerenciamento de resultados em
20 instituições bancárias: uma análise Econométrica de 1997 a 2013

Assim, a partir das regressões, de um gerenciamento de 40,10% auditoria, há evidências de um ge-


realizaram-se os cálculos para das perdas para aumentar o lu- renciamento de resultado em rela-
identificação da existência, ou cro e em 2001 essa porcentagem ção à variável PECLD. Porém, de-
não, do gerenciamento de resul- caiu para um gerenciamento de vido a pequena quantidade de
tados nas instituições bancárias 35,34% das perdas, possivelmen- variáveis que influenciam o geren-
utilizadas no estudo exposto nas te também visando aumentar o lu- ciamento utilizados no estudo, não
Tabelas 3 e 4. cro. Já nos anos entre 2005 e 2006, se pode afirmar que há o gerencia-
Podem ser identificados na Ta- 2010 e 2011, o gerenciamento mento de resultados, apenas po-
bela 3 indícios do gerenciamento de não foi amenizado, apresentan- de-se afirmar que há indícios de tal
resultado do banco de capital priva- do no ano de 2005 um gerencia- gerenciamento.
do, considerando dois anos anterio- mento de -15,95% das despesas Podem-se identificar na Tabela
res à troca de auditoria e dois anos para diminuir o lucro e, em 2006, 4 evidências do gerenciamento de
posteriores à troca de auditoria. Os essa porcentagem aumentou para resultado do banco de economia
valores que se encontram na linha um gerenciamento de 18,07% das mista, também considerando dois
da PECLD estimado pela regressão é perdas, provavelmente objetivando anos anteriores à troca de audito-
uma previsão da regressão. também aumentar o lucro. ria e dois anos posteriores. Obser-
Analisando a tabela anterior, Também se pode observar na va-se que, nos anos entre 2000 e
observa-se que, nos anos entre Tabela 3 que nos anos que prece- 2001, do Banco de economia mis-
2000 e 2001, do Banco capital dem o processo de troca de em- ta o gerenciamento não foi ameni-
privado, há evidências que o ge- presa de auditoria, bem como nos zado, pois, no ano de 2000, hou-
renciamento foi amenizado, pois, anos posteriores, percebe-se que, ve um gerenciamento de 47,69%
no ano de 2000, houve evidência mesmo sem a troca de empresa de das perdas para aumentar o lucro

Tabela 3 – Resultado do gerenciamento do Banco de capital privado


Valores em mil reais Período Anterior Período Posterior Total
Capital Privado 1999 2000 2001 2002
PECLD conforme Demonstração Financeira 5.400.518,41 3.827.728,09 4.626.726,78 5.379.407,74 19.234.381,0
PECLD estimado pela regressão 3.480.332,98 2.292.551.38 2.991.787,44 3.934.622,79 12.699.094,6
Gerenciamento 1.920.185,43 1.535.176,71 1.634.939,34 1.444.784,95 6.535.286,4
% do gerenciamento 35,55% 40,10% 35,34% 26,86% 33,98%
2004 2005 2006 2007
PECLD conforme Demonstração Financeira 3.103.794,34 3.145.467,55 5.147.126,13 8.640.446,80 20.036.834,8
PECLD estimado pela regressão 3.105.301,62 3.647.124,19 4.216.964,58 8.804.106,41 19.773.496,8
Gerenciamento (1.507,28) (501.656,64) 930.161,55 (163.659,61) 263.338
% do gerenciamento -0,05% -15,95% 18,07% -1,89 1,31%
2009 2010 2011 2012
PECLD conforme Demonstração Financeira 12.680.548,80 8.964.636,62 9.871.222,31 10.383.299,93 41.899.707,7
PECLD estimado pela regressão 9.886.329,83 8.393.547,64 8.756.489,44 8.899.999,94 35.936.366,9
Gerenciamento 2.794.218,97 571.088,98 1.114.732,87 1.483.299,99 5.963.340,8
% do gerenciamento 22,03% 6,37% 11,29% 14,28% 14,23%
Fonte: Dados da pesquisa

Tabela 4 – Resultado do gerenciamento do Banco de economia mista


Valores em mil reais Período Anterior Período Posterior Total
Banco de Economia Mista 1999 2000 2001 2002  
PECLD conforme Demonstração Financeira 14.164.641,97 2.231.335,17 3.502.722,04 6.472.384,32 26.371.083,50
PECLD estimado pela regressão 12.327.554,94 1.167.050,52 319.829,99 5.155.137,19 18.969.572,60
Gerenciamento 1.837.087,03 1.064.284,65 3.182.892,05 1.317.247,13 7.401.510,90
% do gerenciamento 12,97% 47,69% 90,87% 20,35% 28,07%
  2004 2005 2006 2007  
PECLD conforme Demonstração Financeira 7.863.348,35 8.267.855,32 10.800.329,80 8.286.367,64 35.217.901,10
PECLD estimado pela regressão 7.375.886,22 6.155.616,52 9.770.683,91 7.639.970,20 30.942.156,90
Gerenciamento 487.462,10 2.112.238,80 1.029.645,89 646.397,44 4.275.744,42
% do gerenciamento 6,19% 25,55% 9,53% 7,80% 12,14%
Fonte: Dados da pesquisa

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 21


O principal objetivo do rodízio de empresas de
auditoria foi com o intuito de preservar a ética e
independência dos auditores independentes, bem
como a eliminação dos erros e fraudes contábeis que
estão relacionadas com a auditoria externa
das demonstrações contábeis.

e, em 2001, essa porcentagem au- 5. Conclusão resultados das instituições finan-
mentou para um gerenciamento de ceiras apresentam apenas evidên-
90,87% das perdas, possivelmente O estudo teve por objetivo ana- cias de que há gerenciamento de
também visando aumentar o lucro. lisar se o rodízio de auditores inde- resultado por meio da conta per-
Já nos anos entre 2005 e 2006, o pendentes interfere no gerencia- da estimada para crédito de liqui-
gerenciamento foi amenizado, mento de resultados contábeis em dação duvidosa, mas de forma que
apresentando no ano de 2005 um instituições bancárias do Brasil. Para não necessariamente haverá ameni-
gerenciamento de 25,55% das per- tanto, efetuou-se a pesquisa com a zação no ano em que há o rodízio.
das para aumentar o lucro e, em aplicação do modelo de regressão Ou seja, não se pode afirmar que de
2006, essa porcentagem diminuiu linear múltipla de Fuji (2004), obje- fato há tal gerenciamento devido às
para um gerenciamento de 9,53% tivando identificar gerenciamentos limitações do estudo. Também não
das perdas, provavelmente objeti- de resultados por meio da conta de se pode generalizar o resultado en-
vando aumentar o lucro. perdas estimadas para crédito de li- contrado para outros bancos, pois
Assim como no banco de capital quidação duvidosa. A partir desta o estudo se restringe a apenas duas
privado, nos anos que não ocorre- regressão, foi comprovada evidên- instituições bancárias.
ram a troca de empresa de audito- cia da existência do gerenciamento Entre possíveis sugestões para
ria também houve evidências de um de resultados nos dois bancos es- pesquisas futuras, cabe ressaltar a
gerenciamento de resultados em re- tudados, como também foi consta- incorporação de outros modelos
lação à variável PECLD. Também não tado que o rodízio de empresas de para a captura do gerenciamen-
se pode afirmar que houve de fato auditoria e a conta de perdas para to de resultados em instituições
tal gerenciamento devido à peque- créditos de liquidação duvidosa in- financeiras, incorporando mode-
na quantidade de variáveis utiliza- fluenciam o gerenciamento. los, como, por exemplo, o de
das no modelo. O estudo mostrou evidências de Jones, Jones Modificado e o
Dessa forma, conforme a aná- que, no ano em que ocorreu a troca modelo KS.
lise dos resultados, a hipótese de das empresas de auditoria indepen-
que, no ano da troca de auditoria dente, não necessariamente houve
independente, houve evidências de uma redução no percentual do ge-
que o gerenciamento de resultados renciamento de resultado.
tenha sido amenizado foi negada. Pôde-se perceber que tal estu-
Por isso, pode-se afirmar que, no do apresenta algumas limita-
ano do rodízio de auditoria, não ções devido ao peque-
necessariamente haverá ameniza- no número de bancos
ção do gerenciamento de resulta- utilizados e ao pequeno
dos. Mas pode-se afirmar que há número de variáveis utili-
evidências do gerenciamento em zadas no modelo. Dessa
todos os períodos analisados. forma, concluiu-se que os

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


O rodízio de auditores independentes e o gerenciamento de resultados em
22 instituições bancárias: uma análise Econométrica de 1997 a 2013

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 25

Análise da relação entre o modelo


Andragógico, de Malcolm Knowles, e
as características do ensino superior
em Ciências Contábeis

O
Rodrigo Wiesner
Pós-graduação em Controladoria e Gestão Fi-
ensino superior em Ciências Contábeis está nanceiras de Empresas pela UEG campus Mor-
intrinsecamente vinculado ao pragmatismo rinhos (GO); pós-graduação em Docência do
Ensino Superior pela Universidade Anhanguera
profissional do bacharelado, em contrapartida aos Uniderp (SP); bacharel em Ciências Contábeis
ensinamentos pedagógicos em licenciaturas. É notório que os pela UEG campus Morrinhos (GO). Contador
em empresa privada, nas áreas de Escrita Fiscal
princípios da Andragogia trazem benefícios para a educação e Contábil, é professor na Faculdade de Morri-
de adultos, devido à vastidão de pesquisas realizadas na área. nhos (FAM), no curso de Administração.
E-mail: rodrigowiesner@gmail.com
Porém, poucos estudos relacionados ao ensino superior
em Contabilidade foram encontrados, o que motivou o
desenvolvimento do objetivo de estudo, que é comparar os
6 princípios do modelo Andragógico, de Malcolm Knowles,
com as características do ensino superior em Ciências
Contábeis. Como metodologia de pesquisa, foi utilizado o
método dedutivo na coleta de dados bibliográficos e, por
meio do método comparativo, ressaltaram-se suas diferenças
e similaridades mediante análise de quadros comparativos. As
discussões deste estudo indicam que as diferenças identificadas
não são um empecilho para a aplicação do modelo e a grande
quantidade de características similares indicam a possibilidade
de potencializar o ensino superior de adultos na Contabilidade
e, inclusive, fomentar as práticas metodológicas para aqueles
profissionais que não obtiveram uma devida formação
complementar para o exercício da profissão docente.

2061 - Recebido em 26/3/2018. Distribuído em 29/3/2018. Pedido de revisão em 20/6/2018.


Resubmetido pelo autor em 15/8/2018. Aprovado em 20/8/2018, na quarta rodada, por três
membros do Conselho Editorial. Publicado na edição setembro-outubro de 2018. Organiza-
ção responsável pelo periódico: Conselho Federal de Contabilidade.

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Análise da relação entre o modelo Andragógico, de Malcolm Knowles,
26 e as características do ensino superior em Ciências Contábeis

1. Introdução no superior. Para Petrosino (2015), parcela de estudantes necessita de


a formação do docente é um fator metodologias de ensino diferencia-
Os alunos adultos necessitam de determinante para a qualidade do das àquelas aplicadas às crianças.
metodologias diferenciadas àquelas ensino e a crença de que um pro- Assim, a Andragogia surge como
aplicadas a crianças e adolescentes, fessor que se constitui no curso de uma vertente da teoria de ensino
de acordo com suas características. graduação não existe mais. A obra voltada às particularidades das ca-
Neste contexto, os estudos realiza- de Lab SSJ (2016) discute as pers- racterísticas de aprendizagem dos
dos por Malcolm Knowles, na dé- pectivas para a educação de adul- adultos (KNOWLES; HOLTON; SWA-
cada de 70, inserem os 6 princípios tos de maneira eficiente e inova- NSON, 2011). Beck (2018) discute,
da Andragogia, que tratam acerca dora e mostra que os princípios da segundo a teoria do Desenvolvi-
das particularidades no ensino para Andragogia são extremamente efe- mento Psicossocial, de Erik Erikson,
adultos e norteiam a ação docente. tivos para o processo de educação. publicada em 1950, que a fase
O ensino superior em Ciências Marion (2001) aborda a importân- adulta inicia-se a partir dos 19 anos.
Contábeis, assim como os demais cia da metodologia para o ensino “Enquanto na Pedagogia há
ramos das ciências, também ne- da Contabilidade e realiza uma pro- definição do que será aprendido e
cessita de técnicas que favoreçam funda reflexão acerca da necessida- quais estratégias serão utilizadas,
o desenvolvimento do processo de de de mudanças na postura didáti- na Andragogia, o adulto não tem
ensino-aprendizagem entre pro- co-pedagógica para o exercício do apenas a necessidade de saber o
fessor-aluno, diante de suas pró- papel docente. Por fim, Silva e Bruni que e como será aprendido, mas,
prias particularidades. Por se tratar (2017) contribuem com sua pesqui- muitas vezes, tem de negociá-los”
de uma área vinculada ao pragma- sa sobre as práticas pedagógicas de (ANDRADE, 2015, p. 38). “Psicologi-
tismo profissional, fortemente as- 164 professores de Ciências Contá- camente, adultos são responsáveis
sociada à atuação empresarial, os beis do Estado da Bahia, oferecen- por sua própria vida. Ao desempe-
docentes possuem déficits de co- do um vislumbre da realidade prá- nhar papéis de adultos, as pessoas
nhecimentos e práticas metodo- tica na docência. assumem cada vez mais responsabi-
lógicas de ensino, visto que sua O que se pretende demonstrar lidades por suas próprias decisões.
própria formação bacharel não en- na pesquisa é que o modelo pode- Em relação à aprendizagem, isso é
fatiza os conhecimentos pedagó- ria fomentar as práticas no ensino crucial” (LAB SSJ, 2016, p. 10). “Por-
gicos. Além disso, a realização de superior, principalmente para os tanto, Andragogia é a Ciência da
uma pós-graduação, requisito fun- docentes que não tiveram conta- educação de adultos, consideran-
damental para o exercício docente, to com a aprendizagem de técnicas do suas características e interesses”
não garante que as técnicas neces- metodológicas de ensino-aprendi- (ANDRADE, 2015, p.7).
sárias para o ensino sejam assimila- zagem. Além disso, poucos estudos Em um processo Andragógico, o
das. Diante disto, o objetivo geral foram encontrados, relacionando- diálogo entre o educador e o edu-
da pesquisa foi comparar os 6 prin- se a vertente da Andragogia com o cando acontece não só durante o
cípios do Modelo Andragógico, de ensino das Ciências Contábeis. processo de ensino-aprendizagem,
Malcolm Knowles, com as caracte- mas também na construção e no
rísticas do ensino superior em Ciên- planejamento desse processo (PE-
cias Contábeis. 2. Referencial Teórico TROSINO, 2015).
Para o estudo, foram utilizados “Na educação convencional, os
vários autores, tais como: Knowles, 2.1 A Andragogia no ensino alunos se adaptam ao currículo ofe-
Holton e Swanson (2011), Andra- superior recido, mas na educação de adultos
de (2015), Petrosino (2015), Lab Quando tratamos do ensino de os alunos ajudam a elaborar os cur-
SSJ (2016), Marion (2001) e Silva modo geral, o escopo da Pedagogia rículos (...). Em condições democráti-
e Bruni (2017), entre outros. Na é fomentar o desenvolvimento do- cas, a autoridade pertence ao grupo”
obra de Knowles, Holton e Swan- cente na educação básica infantil e (GESSNER, 1956, apud KNOWLES;
son (2011), encontramos a tradu- nos ensinos fundamental e médio, HOLTON; SWANSON, 2011, p. 52).
ção do texto original de Malcolm para crianças e adolescentes. Já, no Outro fator relevante para Pe-
Knowles, responsável pela criação ensino superior, jovens e adultos es- trosino (2015) é a experiência que
dos 6 princípios da Andragogia. tão dispostos em cursos de bacha- esse adulto já possui, pois ela tem
Andrade (2015) promove a refle- relado, licenciatura, pós-graduação, que ser a base da aprendizagem, já
xão sobre a aprendizagem do adul- mestrados e doutorados, ou no en- que não dá para construir ou pla-
to e a atuação do docente no ensi- sino tecnólogo (BRASIL, 2017). Essa nejar algo que não considere os sa-

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 27

beres previamente adquiridos. Os (especialização) como no, o processo avalia-


alunos adultos querem saber: por complementação pe- tório, o curso e a re-
que estão aprendendo? O que es- dagógica. alidade social em que
tão aprendendo? Que sentido tem atuam. Diante disto, a re-
esse aprendizado? Eles aprendem Os professores do ensino superior alização de uma pós-graduação, re-
melhor discutindo e fazendo do não passaram por uma prepara- quisito para bacharéis atuarem no
que apenas lendo, vendo e ouvin- ção pedagógica sistematizada para campo docente (BRASIL, 2017) não
do. Neste contexto, o aluno assu- o exercício da docência. No campo necessariamente garante o apren-
me um papel ativo na relação de das licenciaturas, ocorre o contato dizado de técnicas metodológicas e
construção da sua própria aprendi- com disciplinas relacionadas a con- didáticas, responsáveis pelo desen-
zagem, visto que suas expectativas teúdos didático-pedagógicos. No volvimento do processo de ensino
e interesses são valorizados. entanto, os bacharéis somente têm -aprendizagem.
Conforme Andrade (2015), a algum contato com esses conteú- Nesse contexto de déficits na
Andragogia propõe-se a educar dos quando optam por cursar dis- formação profissional docente em
adultos independentemente de ciplinas relacionadas à metodologia Ciências Contábeis, inserem-se os
um propósito específico, mas sen- do ensino superior em programas princípios da Andragogia, que, em
do aberta a vários, ela pode e deve de pós-graduação stricto sensu ou contrapartida à pedagogia, trata
ser combinada com diferentes te- buscam tal formação na área educa- da ciência da educação de adultos.
orias de ensino-aprendizagem. In- cional (MIRANDA; LEAL; NOVA, O método elaborado pelo profes-
clusive, o método precisa ser revis- 2012, p. 01). sor americano Malcolm Knowles,
to em cada situação, pois ele não é conhecido como o “pai” da Andra-
uma ideologia, mas, sim, um siste- Segundo o Art. 66 da Lei n.º gogia pela sua vasta produção so-
ma de elementos. Além disso, cabe 9.394, de 20 de dezembro de bre o tema, no início da década de
ao educador perceber e avaliar a 1996, que estabeleceu as diretrizes 1970, e pelo desenvolvimento do
melhor forma de aplicar o modelo. e bases da educação nacional, po- conceito base para a educação de
pularmente conhecida como LDB, adultos, a partir dos seus escritos,
2.2 Influências da Andragogia na a preparação para o exercício do transformou a orientação dos edu-
formação docente em Ciências magistério no ensino superior far- cadores de “educar pessoas” para
Contábeis se-á em nível de pós-graduação, “ajudar as pessoas a aprenderem”
O ensino superior em Ciências prioritariamente em programas de (ANDRADE, 2015).
Contábeis está intrinsecamente mestrado e doutorado. Entretan- Por conseguinte, é benéfico
vinculado ao pragmatismo profis- to, o conhecimento de notório sa- para o profissional da contabilida-
sional do bacharelado, em contra- ber poderá suprir a exigência do de, no exercício da profissão docen-
partida aos ensinamentos peda- título acadêmico, desde que seja te, uma complementação teórica
gógicos em licenciaturas. Segundo reconhecido pelos respectivos sis- embasada na teoria da Andrago-
Slomski (2012), pode-se verificar fa- temas de ensino, para ministrar gia, para fomentar as suas técnicas
cilmente que a grande maioria dos conteúdos de áreas afins à sua for- didáticas no ensino superior.
professores que atuam em sala de mação ou experiência profissional,
aula não contou com uma forma- atestados por titulação específica 2.3 Modelo Andragógico, de
ção sistemática para o exercício da ou prática de ensino em unidades Malcolm Knowles
profissão docente e. embora se en- educacionais da rede pública ou “Malcolm Knowles, autor do li-
contrem dando aulas, nem sempre privada ou das corporações priva- vro Aprendizagem de Resultados,
dominam as habilidades necessárias das em que tenham atuado (BRA- clássico sobre Andragogia, organi-
para atuar como professores. SIL, 1996). zou suas ideias em torno da noção
De acordo com o Ministério da Para Barbosa (2011), a discipli- de que os adultos aprendem me-
Educação (BRASIL, 2017), os cursos na Metodologia do Ensino Supe- lhor em ambientes informais, con-
de bacharelado são cursos superio- rior, resumida em 60 horas em mé- fortáveis, flexíveis e sem ameaças”
res de graduação que dão o título dia, é a única oportunidade para (LAB SSJ, 2016, p. 10).
de bacharel e não habilitam o pro- uma reflexão sobre: a sala de aula, A partir de seus estudos, Mal-
fissional a lecionar. Para atuar como o papel do docente, o ensinar e o colm Knowles conceituou o Mo-
docente no ensino superior, exige-se aprender, o planejamento, a orga- delo Andragógico em 6 Princípios
que o profissional tenha, no mínimo, nização dos conteúdos curriculares, (KNOWLES; HOLTON; SWANSON,
curso de pós-graduação lato sensu a metodologia, as técnicas de ensi- 2011):

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Análise da relação entre o modelo Andragógico, de Malcolm Knowles,
28 e as características do ensino superior em Ciências Contábeis

1) Necessidade de saber (O por- educação, a dependência de um que costumam fechar nossa


quê? O quê? Como?) – Adul- professor cria um conflito psicoló- mente a novas ideias, percep-
tos precisam saber por que ne- gico, no qual ‘aprendiz é depen- ções mais atualizadas e ideias
cessitam aprender algo antes dente’. Por isso, os educadores alternativas. De acordo com An-
de começar a aprendê-lo. Tough necessitam criar um ambiente drade (2015), quando um adul-
(1979 apud KNOWLES; HOLTON; onde o adulto tenha um aprendi- to vê um conteúdo pela primei-
SWANSON, 2011) verificou que, zado autodirigido e não depen- ra vez, ele relaciona, talvez até
quando um adulto decide apren- dente. “Isso quer dizer que o alu- inconsciente, com suas experi-
der algo sozinho, ele investe uma no adulto quer ser tratado como ências prévias àquele momento.
energia considerável para inves- adulto, com conhecimentos, ex- Quando esse novo conhecimen-
tigar seus benefícios e as conse- periência, necessidades e vonta- to é confirmado pela experi-
quências de não aprender. Esta des. Quando isto não acontece, o ência do aprendiz, ele é aceito
é a primeira tarefa do docente: a aluno adulto pode criar uma cer- como verdadeiro e, portanto,
conscientização da necessidade ta barreira com aquele professor. aprendido; quando ele não é
de saber algo, que pode ser des- ” (ANDRADE, 2015, p. 11). Para confirmado, o aprendiz o refu-
pertada por experiências reais ou Petrosino (2015), é necessário va- ta, descartando-o. Nesse con-
simuladas, ou pela confrontação lorizar esse conhecimento, pois texto, técnicas que enfatizam as
do estado atual com o qual se al- isso fará com que o aluno melho- vivências dos alunos, como dis-
meja alcançar. Segundo Andrade re sua autoestima e se engaje no cussões, exercícios de simulação,
(2015), podem ser utilizadas es- processo de aprendizagem. resolução de problemas, estudos
tratégias para engajar os alunos, 3) Papel das experiências (Recur- de caso e métodos de laborató-
como dinâmicas, perguntas, tex- so; Modelos mentais) – Qualquer rio, serão mais eficazes do que
tos, figuras, ou outras técnicas grupo de adultos será mais hete- apenas a transmissão de conhe-
que considerar relevantes para o rogêneo em termo de formação, cimentos (LAB SSJ, 2016).
grupo, e isso potencializa a con- estilo de aprendizagem, moti- 4) Prontidão para aprender (Re-
textualização do que será apren- vação, necessidades, interesses lacionado à vida; Tarefa de de-
dido com os conhecimentos pré- e objetivos, do que um grupo senvolvimento) – Adultos estão
vios dos alunos. de jovens. Desta forma, enfati- predispostos a buscar o ensino
2) Autoconceito do aprendiz (Au- za-se a individualização das es- daquilo que necessitam apren-
tônomo e Autodirigido) – Os tratégias de ensino. Entretan- der e para as quais precisam se
adultos possuem uma necessida- to, Knowles, Holton e Swanson tornar capazes de realizar em
de psicológica de serem respon- (2011) afirmam que uma expe- situações de sua vida concre-
sáveis pelas próprias decisões, riência maior também traz efei- ta. “Assim, quando a ocasião
pelas próprias vidas, e sentem-se tos negativos, como a tendência exige algum tipo de aprendiza-
resistentes a imposição de von- a desenvolver hábitos mentais, gem relacionado ao que deve
tades alheias. No processo de preconceitos e pressuposições ser executado, o adulto ad-

“É notório que os princípios da Andragogia trazem


benefícios para a educação de adultos, devido à
vastidão de pesquisas realizadas na área. Porém,
poucos estudos relacionados ao ensino superior em
Ciências Contábeis foram encontrados, o que motivou
o desenvolvimento do objetivo de estudo.

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 29

quire prontidão para apren- altos), porém os fatores motiva- po, sensibilidade para com os im-
der” (LAB SSJ, 2016, p. 14). cionais mais poderosos são as pactos de sua pratica no ambiente
Andrade (2015) também co- pressões internas (o desejo de e na sociedade, colaboração, ética
menta que ela se relaciona com ter maior satisfação no trabalho, profissional e cidadania. (SOARES;
o sentido que o aluno percebe autoestima, qualidade de vida)” ARAUJO; LEAL, 2012, p. 75)
entre o que ele precisa aprender (KNOWLES; HOLTON; SWANSON,
e o seu dia a dia. Isso quer dizer 2011, p.75). A motivação é a Para Hendriksen e Breda (2010),
que os alunos adultos têm ‘seu propulsora da vontade de querer é na teoria da Contabilidade que
tempo’ para que os assuntos se algo, e nesse sentido, o estímulo se encontram os princípios para a
tornem mais ou menos interes- do educador produz o efeito de compreensão das práticas existen-
santes. Porém, o educador não incitação ao ensino. “Para o edu- tes, além de oferecer um referencial
pode esperar a predisposição do cador, estar atendo a esses fato- conceitual, e para o desenvolvimen-
aluno. “Há maneiras de induzir a res motivacionais podem auxi- to de novas práticas e procedimen-
prontidão por meio de exposição liar em um melhor aprendizado, tos. Marion (2001) também ob-
a modelos de performance supe- além de contribuir para a dimi- serva, no curso, o fenômeno do
rior, aconselhamento de carreira, nuição da evasão no Ensino Su- conhecimento cumulativo, pois o
exercícios de simulação e outras perior” (ANDRADE, 2015, p. 17). completo domínio das disciplinas
técnicas” (KNOWLES; HOLTON; básicas como Contabilidade Geral,
SWANSON, 2011, p.74). 2.4 As características do ensino é indispensável para o alicerce dos
5) Orientação para a aprendiza- superior em Ciências Contábeis demais conhecimentos na área.
gem (Centrado no problema; A interpretação da Contabilida- O domínio da legislação é ou-
Contextual) – “Os adultos são de como ciência é tema recorrente tra vertente muito presente no ensi-
motivados a aprender conforme em diversos estudos, e vários auto- no superior em Ciências Contábeis.
percebem que a aprendizagem res já definiram suas fundamenta- Marion (2001) reconhece que o en-
os ajudará a executar tarefas ou ções epistemológicas. Para Franco sino deve ser fundamentado na te-
lidar com problemas que viven- (1997), ela é a ciência que estuda os oria da Contabilidade, em conso-
ciam em sua vida” (KNOWLES; fenômenos ocorridos no patrimônio nância com uma abordagem legal
HOLTON; SWANSON, 2011, das entidades, mediante o registro, e fiscal, os quais estão em constan-
p.74). De acordo com Petrosino a classificação, a demonstração ex- te mudança. Em seu estudo, Ferrei-
(2015), a etapa inicial para se positiva, a análise e a interpretação ra e Ferreira (2014) afirmam que ter
trabalhar dentro de uma pers- desses fatos, com o fim de oferecer conhecimento do conteúdo, bem
pectiva de aprendizagem signi- informações e diretrizes para à to- como dos procedimentos técnicos
ficativa, é o levantamento dos mada de decisões, a composição do atualizados em relação às legisla-
conhecimentos prévios dos alu- patrimônio, suas variações e o resul- ções e normas contábeis são ele-
nos e, a partir disso, desenvol- tado econômico decorrente da ges- mentos importantes para o desen-
ver temas relevantes e pertinen- tão da riqueza patrimonial. volvimento do ensino na profissão.
tes para essa aprendizagem. Além disso, o Decreto-Lei n.º
Nesse sentido, a contextuali- O mercado exige dos profissionais 9.295 (BRASIL, 1946) instituiu ao
zação do ensino com as situa- na área contábil um conhecimento Conselho Federal de Contabilidade,
ções da vida real potencializa a que transcende o processo especi- a função de editar Normas Brasileiras
percepção de utilidade e impor- fico pronto para o tecnicismo; bus- de Contabilidade de natureza técni-
tância dos conteúdos desenvol- ca-se um profissional com compe- ca e profissional e regular acerca dos
vidos. Quando não sabemos de tências para entender o “negócio”, princípios contábeis. Deste modo,
algo que precisamos, procura- visando orientar o gestor e partici- não há como desvincular o ensino su-
mos aprender e este processo é par das decisões de forma conscien- perior em Ciências Contábeis, da con-
mais produtivo quando além de te. Desta forma, recai para os pro- textualização legislativa, visto que é
precisar, queremos obter o co- fissionais a exigência de um novo nela que se encontram as diretrizes
nhecimento. perfil, mais condizente com a atu- para o exercício prático da profissão.
6) 6. Motivação (Valor intrínseco; al dinâmica assumida pelas organi- Por fim, Marion (2001) em seu
Recompensa pessoal) – “Os adul- zações, buscar conhecimentos tais livro “O ensino da Contabilidade”
tos respondem a fatores motiva- como a capacidade de resolução de aborda a característica interdiscipli-
cionais externos (melhores em- problemas e de estudo independen- nar das Ciências Contábeis, que está
pregos, promoções, salários mais te, habilidades de trabalho em gru- intimamente ligada às áreas de Eco-

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Análise da relação entre o modelo Andragógico, de Malcolm Knowles,
30 e as características do ensino superior em Ciências Contábeis

nomia e Administração, as quais ne- centralizada no professor como su- vo, com forte envolvimento discente,
cessitam utilizar e interpretar seus jeito ativo no processo de aprendi- contudo o uso pode estar ocorrendo
relatórios, com a exposição quali- zagem e a abordagem ativa ou não em uma perspectiva passiva (preen-
tativa e quantitativa dos dados eco- tradicional, centrado no aluno, con- chendo horas “ociosas” ou sem o devi-
nômicos. Ainda segundo o autor, forme Quadro 1. do envolvimento do docente e dos dis-
também são ministradas aulas de A conclusão dos autores, ba- centes). (SILVA; BRUNI, 2017, p. 228)
Contabilidade nos cursos de Direito, seadas na observação das práticas
Engenharia e aulas de Contabilida- pedagógicas utilizadas no cotidia- Diante disto, “O método utiliza-
de para não contadores na grande no de 164 professores do curso de do pelo professor no processo de
maioria das profissões liberais, como Ciências Contábeis do Estado da ensino-aprendizagem é de funda-
médicos, dentistas, advogados, que Bahia, encontrou resultados con- mental importância para o sucesso
irão desenvolver atividades em seus troversos, em relação ao ensino ati- do aluno” (MARION, 2001, p.127).
próprios escritórios ou consultórios. vo e passivo na área. Para Silva e Neto (2012), o proces-
so de ensino-aprendizagem ocorre
2.5 Metodologias de ensino- A caracterização do planejamento quando há o envolvimento do alu-
aprendizagem em Ciências das disciplinas, da maneira como são no, professor, assunto e instituição,
Contábeis conduzidas as aulas, dos recursos uti- que devem discutir em conjunto
Para Zych (2010), a Didática lizados e dos critérios adotados para e experimentar novas alternativas
constitui a disciplina integradora avaliação de desempenho dos alunos para o aumento da eficácia e da efi-
dos conhecimentos teóricos e práti- indicou a existência de práticas pe- ciência nesse processo.
cos voltados à formação profissional dagógicas ativas. No entanto, em re-
do professor, tendo em vista a me- lação ao planejamento da disciplina,
lhoria da qualidade dos resultados foram encontradas características de 3. Metodologia
das intervenções educativas, distin- um ensino passivo, com o professor
guindo como seu objeto de estudo, apresentando as regras a serem segui- Para realizar a pesquisa, foi uti-
o processo de ensino-aprendizagem. das durante o curso sem a participa- lizado o método dedutivo, que, por
Silva e Bruni (2017) discutem os ção dos alunos. Os respondentes as- meio de uma cadeia de raciocínio,
desafios e as metodologias necessá- sumem adotar práticas pedagógicas que parte de uma análise sobre o
rias para formação dos profissionais ativas. Contudo, em sua fase inicial modelo de Malcolm Knowles e as ca-
diante às novas perspectivas e habi- de planejamento pedagógico atuam racterísticas do ensino superior em
lidades necessárias na profissão. Em de forma passiva. Os recursos utiliza- Ciências Contábeis, procura-se confir-
seu estudo ‘O Que me Ensina a En- dos pelos respondentes possuem ca- mar a hipótese de que os 6 princípios
sinar?’ sobre as práticas pedagógi- racterísticas de ensino passivo. Existe do modelo de Malcolm Knowles po-
cas em Ciências Contábeis, discutem a possibilidade de que os respondentes deriam auxiliar a didática do docente
que o ensino em Contabilidade pode possam adotar práticas (como uso de no processo de ensino-aprendizagem
ser tratado sob duas abordagens: filmes ou seminários) que deveriam diante das particularidades do ensino
abordagem passiva ou tradicional, estar encaixadas em um contexto ati- superior em Ciências Contábeis. Se-

Quadro 1 – Práticas pedagógicas ativas e passivas


Ensino Passivo Ensino Ativo
Caracterização
Assume o professor como centro das atenções, o “conhecedor de todo o Assume que o conhecimento se constrói a partir de uma série de atividades para o
saber”. Existe uma reduzida participação do discente no processo de ensino desenvolvimento de estruturas organizadas de informações e construção do saber.
que, passivamente, deveriam absorver ou memorizar o conhecimento O aprendizado acontece a partir de organização esquemas de ações estruturadas
transmitido pelo professor. em função das experiências vividas e do meio onde o aluno vive.
Práticas Pedagógicas Usuais
Envolvem ações que levem os alunos a uma participação mais intensa no processo
Envolvem ações que levem os alunos a memorização de conteúdos.
de aprendizagem. Exemplos: aulas expositivas dialogadas; estudos dirigidos;
Exemplos: aulas puramente expositivas, sem participação do aluno, apostilas
aprendizagens experienciais a partir de entrevistas com profissionais no mercado,
com conteúdo sintetizado, listas de exercícios, livro texto, sem espaço para
seminários com toda a classe, mesa redonda, debates, com a participação
discussão, com critérios objetivos de avaliação de desempenho do aluno,
de todos os alunos, aprendizagem baseada em problemas (PBL); ensino em
como prova escrita, com questões de múltipla escolha, que remeta o aluno
pequenos grupos, ensino com pesquisa; ensino à distância (como grupos de
a práticas de memorização e reprodução de conteúdos sintetizados pelo
discussão online); estudo de casos; ensino com pesquisa; oficinas (laboratórios ou
professor.
workshops); escritórios, laboratórios ou empresas modelo; simulações e jogos.
Fonte: (SILVA; BRUNI, 2017, p. 217 apud SILVA, 2014)

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gundo Gil (2008), este método parte singulares, em princípios capazes 4. Comparação entre o
da observação racional de fatos ge- de explicar os fenômenos sociais. modelo Andragógico, de
rais, a fim de se descobrir princípios Além disso, pode-se classificar a Malcolm Knowles, e as
reconhecidos como verdadeiros, em metodologia do estudo da seguinte características do ensino
virtude de suas conclusões puramen- forma: (I) do ponto de vista de sua superior em Ciências
te formais e lógicas. natureza: pesquisa básica, pois visa Contábeis
Como o objetivo do estudo é gerar conhecimentos novos para o
comparar os 6 princípios do mo- avanço da Ciência, porém, sem apli- Após o levantamento bibliográ-
delo Andragógico, de Malcolm cação prática prevista; (II) quanto à fico, fundamental para o embasa-
Knowles, com as características do forma de abordagem ao problema: mento teórico, foram compiladas as
ensino superior em Ciências Con- análise qualitativa, uma vez que a principais características do ensino
tábeis, foi utilizado como meio comparação será realizada por meio superior em Ciências Contábeis no
técnico de investigação o método de avaliação dedutiva, a fim de averi- Quadro 2.
comparativo, com vistas a ressal- guar se o modelo é capaz de fomen- Diante do objetivo do estudo,
tar as diferenças e similaridades. tar a didáticas no ensino superior; que é comparar o modelo Andra-
Schneider e Schmitt (1998) consi- (III) do ponto de vista dos objetivos: gógico, de Malcolm Knowles, com
deram o método como requisito pesquisa descritiva para estabelecer as características do ensino supe-
fundamental em termos de obje- as relações e características na coleta rior em Ciências Contábeis, foram
tividade científica, pois permite a de dados, e por último; (IV) em rela- desenvolvidos quadros comparati-
construção do conhecimento por ção aos procedimentos de coleta de vos considerando as premissas si-
meio da transformação de temas dados: pesquisa bibliográfica. milares e diferentes, relacionadas

Quadro 2 – Compilação das características do ensino superior em Ciências Contábeis


Referência Características
O conhecimento contábil transcende o tecnicismo. As habilidades do profissional devem orientar os gestores na tomada de
Soares, Araújo e Leal (2012)
decisões na prática empresarial.
Os profissionais da Contabilidade possuem mais conhecimentos práticos para o exercício da profissão, do que de raciocínio
Marion (1997)
contábil, e por isso, têm dificuldades para explicar os aspectos contábeis baseados nas teorias.
No planejamento das disciplinas de Contabilidade, foram encontradas características de um ensino passivo, com o professor
Silva e Bruni (2017)
apresentando as regras a serem seguidas durante o curso sem a participação dos alunos.
Discutem que possibilitar um contato prévio entre o candidato e o curso, para que ele tenha a oportunidade de conhecer a profissão, o
Vieira e Miranda (2015) mercado de trabalho e suas atividades principais, são algumas perspectivas que contribuem para a redução do índice de evasão, pois o fato
do aluno não ter uma orientação e conhecimentos prévios sobre o curso antes de se inscrever, poderá leva-lo a uma possível frustração.
Aborda a característica interdisciplinar das Ciências Contábeis, que está intimamente ligada as áreas de Economia e
Marion (2001)
Administração, cursos de Direito, Engenharia, e aulas de Contabilidade para não contadores.
Afirmam que ter conhecimento do conteúdo, bem como dos procedimentos técnicos atualizados em relação às legislações e
Ferreira e Ferreira (2014)
normas contábeis são elementos importantes para o desenvolvimento do ensino na profissão.
Reconhece que o ensino deve ser fundamentado na teoria da Contabilidade, em consonância com uma abordagem legal e fiscal,
Marion (2001) os quais estão em constante mudança. Também observa no curso, o fenômeno do conhecimento cumulativo, pois o domínio das
disciplinas básicas como Contabilidade Geral, é indispensável para o alicerce dos demais conhecimentos na área.
Segundo os autores, é na teoria da Contabilidade que se encontram os princípios para a compreensão das práticas existentes, além
Hendriksen e Breda (2010)
de oferecer um referencial conceitual, e para o desenvolvimento de novas práticas e procedimentos.
Em seu estudo sobre a ação docente em contabilidade, aponta que os alunos demonstraram estar satisfeitos com o curso, porém
Gonçalves e Gasparin (2013) deixaram claro que a agregação de disciplinas que contemplem a preparação do profissional para atuar como docente é essencial,
pois na graduação atualmente a docência é ignorada e o curso prepara o aluno apenas para atuar como profissional contábil.
Mostrou que os principais motivadores para a busca pela educação continuada por parte do profissional da contabilidade é
Silva (2016) oriunda de causas externas: a influência dos colegas de trabalho, a pressão exercida pelas organizações, e os deveres impostos
pelas leis e normas que regem a profissão.
Segundo os autores, a aula expositiva é apontada como a técnica mais utilizada no ensino de contabilidade, sendo a metodologia
Miranda, Leal e Nova (2012)
menos significativa para o aprendizado diante da passividade dos estudantes.
Identificaram que o método mais utilizado no ensino da contabilidade é a aula expositiva, o qual dirige a atenção exclusivamente ao
Leal e Cornachione Jr. (2006)
professor, e condiciona o aluno em uma posição passiva, não despertando o espírito crítico, participativo e transformador.
Miranda, Veríssimo e Afirmam que a qualificação dos docentes para o ensino superior em Contabilidade não deve restringir-se somente ao domínio da
Miranda (2007) ciência, sendo imprescindível que a competência didático-pedagógica esteja também presente.
Consideram necessário que os cursos de Ciências Contábeis utilizem estratégias de ensino que associem os conceitos e aspectos
teóricos com a prática profissional, dinamizando o processo de aprendizagem para que melhores resultados sejam obtidos, e
Rocha et al. (2009)
indicam o ambiente de laboratório, como uma maneira de se conduzirem atividades mais próximas à realidade profissional. Isso
contribui para que o aluno construa o raciocínio contábil necessário à sua inserção no mercado de trabalho.
Fonte: Elaborado pelo autor (2018)

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Análise da relação entre o modelo Andragógico, de Malcolm Knowles,
32 e as características do ensino superior em Ciências Contábeis

aos 0 princípios do modelo, con- Conforme diz o princípio 2, os alunos podem ser a chave para o
forme Quadro 3. adultos são estimulados quando seu desenvolvimento ou uma bar-
Podemos notar que assim como incluídos em um processo decisó- reira para a mudança de perspec-
na Andragogia, o discente em Con- rio, o que gera o sentimento de au- tivas. Na Contabilidade, os vícios
tabilidade também precisa ser cons- tonomia e participação. Quando da prática podem ocasionar o de-
cientizado sobre a importância do trazemos esse conceito para o en- sinteresse na teoria, ou incentivar
aprendizado de cada disciplina para sino das Ciências Contábeis, o alu- sua aprendizagem. Podemos anali-
sua atuação profissional. É por meio no deve ser incluído no processo sar também que, mesmo os grupos
dos conhecimentos teóricos que as de planejamento, pois isso valori- de adultos sendo heterogêneos, sua
bases para o exercício prático são za seus conhecimentos prévios, seu motivação será “mais ou menos”
afixadas e, diante disto, o “Porquê?” desejo de aprendizagem em deter- homogênea, ou seja, a aprendiza-
deve ser repassado no início do pro- minadas áreas e estimula o aperfei- gem da profissão. E, neste caso, o
cesso. Marion (1997) discute que os çoamento contínuo, tão necessário conhecimento da ciência não deve
profissionais da contabilidade pos- para a profissão. Porém, tratando- ser refutado pelo aluno, mas, sim,
suem mais conhecimentos práticos se de uma graduação, os métodos adsorvido por meio da utilização
para o exercício da profissão, do que avaliativos podem não ser negociá- de técnicas ativas de ensino, como
de raciocínio contábil, e por isso, veis e, conforme o estudo de Silva exercícios de simulação, estudo de
têm dificuldades para explicar os as- e Bruni (2017, p 228), “em relação caso e resolução de problemas ba-
pectos contábeis baseados nas teo- ao planejamento da disciplina, fo- seados na atualidade (Quadro 6).
rias. Em contraposição, a falta de co- ram encontradas características de Devido à escolha do curso su-
nhecimentos anteriores pelo aluno, um ensino passivo, com o professor perior geralmente partir do próprio
pode gerar um certo desinteresse, apresentando as regras a serem se- aluno, ele chega “pronto” a apren-
mas é papel do professor utilizar-se guidas durante o curso sem a par- der, pois os conhecimentos adquiri-
de estratégias para o engajamento ticipação dos alunos” (Quadro 5). dos serão necessários para sua atu-
dos alunos, como experiências simu- Assim como nas demais profis- ação na profissão. Entretanto, isto
ladas ou reais (Quadro 4). sões, as experiências anteriores dos não descarta o papel do docente,

Quadro 3 – Princípio 1: Necessidade de saber (O porquê? O quê? Como?)


Similaridades Diferenças
• Decisão da escolha do curso pelo próprio aluno; • Dificuldade de relacionar todos os ensinamentos teóricos, com as
• Necessidade de formação superior para o exercício da profissão; necessidades práticas da profissão;
• Necessidade de conhecimentos teóricos para posterior aplicação prática; • Desinteresse em disciplinas complementares, por não agregarem benefícios
• Engajamento pelo docente, no interesse dos alunos em disciplinas optativas; práticos previstos.
• Contextualização do “porquê?” da teoria é importante.
Fonte: Elaborado pelo autor (2018)

Quadro 4 – Princípio 2: Autoconceito do aprendiz (Autônomo e Autodirigido)


Similaridades Diferenças
• Necessidade de auto atualização diante de novas Leis e Normas;
• A iniciativa do aprendizado parte dos conhecimentos do professor;
• Estudos contínuos na área;
• Estudos autodirigidos estão mais atribuídos ao ensino informal;
• Responsabilização pelos relatórios contábeis elaborados, inclusive erros;
• Imposição de Formalidades metodológicas como provas, avaliações, notas,
• Valorização do conhecimento prático por quem já atua na área;
e didáticas passivas de aprendizagem.
• Necessidade de aquisição do conhecimento para sua vida profissional;
• Autonomia para escolha do ramo de atuação profissional.
Fonte: Elaborado pelo autor (2018)

Quadro 5 – Princípio 3: Papel das experiências (Recurso e Modelos mentais)


Similaridades Diferenças
• Experiências práticas na área, tendem a interpretação da correlação teórica;
• Motivação homogênea pela aprendizagem (necessidade de formação superior);
• Preconceitos com as teorias, devido a conhecimentos e vícios práticos
• Ensino da Ciência é padronizado;
anteriores;
• Uso frequente de técnicas de transmissão de conhecimentos (método passivo);
• Utilização de técnicas ativas de ensino, como exercícios de simulação,
• O conhecimento da profissão não pode ser refutado e descartado, mas sim,
estudo de caso e resolução de problemas baseados na atualidade;
absorvido.
• Necessidade de interseção com a vida concreta.
Fonte: Elaborado pelo autor (2018)

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em despertar o interesse do aluno promoções, prestígio social, inde- lização prática e ausência de pers-
durante a realização do curso. Em pendência profissional são fortes pectivas para o exercício da pro-
compensação, para aqueles discen- fatores que levam o indivíduo a se fissão após o termino do curso, e
tes que não pretendem ingressar na especializar em uma carreira. Alia- estes, são fatores chaves para o au-
carreira, a prontidão será desperta- do a isto, a sua inclusão no proces- mento da evasão escolar.
da apenas para o cumprimento das so decisório durante o processo de
metodologias de avaliação, visto que ensino, impulsiona o interesse na 5. Considerações Finais
este é o quesito obrigatório para fi- busca do conhecimento, ocasionan-
nalizar a graduação (Quadro 7). do a incitação ao ensino. É notório que os princípios da
Os alunos tendem a absorver o O estudo de Vieira e Miranda Andragogia trazem benefícios para
que consideram importante para a (2015), ao traçar o perfil da evasão a educação de adultos, devido à
execução de suas tarefas e descartar no curso de Ciências Contábeis da vastidão de pesquisas realizadas
os ensinamentos sem utilidade pre- Universidade Federal de Uberlân- na área. Porém, poucos estudos re-
vista. Neste ponto, a falta de experi- dia, apontou que possibilitar um lacionados ao ensino superior em
ências prévias prejudica a capacida- contato prévio entre o candidato Ciências Contábeis foram encon-
de de se inserir na aplicação prática ao curso para que ele tenha a opor- trados, o que motivou o desenvol-
das fundamentações teóricas, que tunidade de conhecer a profissão, vimento do objetivo de estudo.
devem ser compensadas pela con- o mercado de trabalho e suas ativi- Observa-se que as premissas da
textualização do professor diante dades principais são algumas pers- Andragogia não estão vinculadas
das situações reais, efeitos de leis e pectivas que contribuem para a re- a uma técnica de ensino propria-
estudos de casos. Quando a aluno dução do índice de evasão escolar, mente dita, mas fundamentam-se
percebe a importância do conhe- pois o fato de o aluno não ter uma em uma maneira de analisar como
cimento, ele se torna receptivo ao orientação e conhecimentos prévios o processo de ensino-aprendizagem
processo de ensino-aprendizagem sobre o curso antes de se inscrever, ocorrerá entre professor e aluno, e
(Quadro 8). poderá levá-lo a uma possível frus- assim, ambos possam efetivamente
Talvez, a recompensa pessoal tração quanto ao curso. Portanto, desenvolver novos conhecimentos
seja a principal propulsora da mo- os alunos podem ser desmotivados pela construção conjunta do saber.
tivação em um curso superior. A pelo excesso de técnicas passivas de Após a compilação dos dados,
busca por benefícios financeiros, aprendizagem, falta de contextua- percebe-se que as diferenças apre-

Quadro 6 – Princípio 4: Prontidão para aprender (Relacionado à vida; Tarefa de desenvolvimento)


Similaridades Diferenças
• A busca do ensino superior partiu da escolha do curso;
• Para os alunos que não seguirão a profissão, a aquisição da prontidão
• Prontidão adquirida, pela correlação dos ensinamentos com a vida
estará vinculada com a necessidade do cumprimento das metodologias de
concreta profissional;
avaliação, como provas e trabalhos.
• Educador responsável por induzir a necessidade de saber do conteúdo.
Fonte: Elaborado pelo autor (2018)

Quadro 7 – Princípio 5: Orientação para a aprendizagem (Centrado no problema; Contextual)


Similaridades Diferenças
• Aprendizagem os ajudará a executar tarefas ou lidar com problemas que • Dificuldade de contextualizar pela falta de conhecimentos práticos ou
vivenciarão em sua carreira; prévios;
• Desenvolver a contextualização das disciplinas; • Desconhecimento de problemas da profissão.
• Ensino com situações reais empresariais, Leis e Normas.
Fonte: Elaborado pelo autor (2018)

Quadro 8 – Princípio 6: Motivação (Valor intrínseco; Recompensa pessoal)


Similaridades Diferenças

• Buscar benefícios financeiros (carreira, estabilidade, maiores salários);


• Técnicas de ensino passivo não despertam o interesse em aprender diante
• Recompensa pessoal pelo ensino superior;
das metodologias aplicadas;
• Conhecimentos valorizados na sociedade (empresas privadas e públicas);
• Desmotivação da aprendizagem pela falta de contextualização pratica;
• Possibilidade de independência profissional (abertura de seu próprio negócio);
• Desmotivação ocasionada pela falta de perspectiva para o exercício da
• Interdisciplinaridade com outras áreas de conhecimento/atuação;
profissão.
• Participação no processo de tomada de decisão empresarial.

Fonte: Elaborado pelo autor (2018)

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


Análise da relação entre o modelo Andragógico, de Malcolm Knowles,
34 e as características do ensino superior em Ciências Contábeis

sentadas não são um empecilho para vos sobre a Ciência e sua função na cação da Andragogia, para que haja
a aplicação do modelo no ensino su- sociedade. Além disso, a posteriori um maior aprofundamento nas
perior em Ciências Contábeis, mas, correlação com a Andragogia deno- conclusões sobre o tema, baseadas
sim, desafios que podem ser solu- ta que o estudo baseado apenas em em uma perspectiva da prática efe-
cionados por meio da aplicação do pesquisas bibliográficas é insuficien- tiva que ocorre no ensino superior.
próprio modelo. Nota-se, pela gran- te para no método dedutivo estabe- Porém, mesmo diante das limi-
de quantidade de características simi- lecer uma regra geral sobre o tema. tações da pesquisa, podemos obser-
lares, que as 6 premissas do modelo Contudo, como o objetivo do var que as bases metodológicas para
desenvolvido por Malcolm Knowles presente estudo não era esgotar um aperfeiçoamento das didáticas de
poderiam potencializar o ensino su- a pesquisa sobre o assunto, mas aprendizagem no ensino superior em
perior de adultos na Contabilidade e, criar um processo de reflexão, as Ciências Contábeis, estão em conso-
inclusive, fomentar a prática metodo- evidências indicam que novas pes- nância com o modelo dos 6 princí-
lógica para aqueles profissionais que quisas necessitam ser desenvolvidas pios de Malcolm Knowles. Conclui-se
não obtiveram uma devida forma- sob uma perspectiva prática, para que sua adoção não é uma “regra”
ção complementar para o exercício maior aprofundamento das conclu- padronizada que deve ser implanta-
da profissão docente. sões acerca da Andragogia no ensi- da, mas, sim, um caminho para dis-
Durante a pesquisa, notou-se no superior em Ciências Contábeis. cussão das ferramentas e técnicas uti-
uma grande dificuldade de compila- Sugere-se a adoção de outras me- lizadas no ensino, em um ambiente
ção das principais características do todologias, como estudos de casos propício para o desenvolvimento da
ensino superior em Ciências Contá- com professores e alunos, buscan- educação, com face à delimitação e
beis, motivada pela diversidade de do identificar as características do cumprimento dos objetivos estabe-
metodologias, estudos interpretati- curso e verificar a utilização e apli- lecidos entre os sujeitos envolvidos.

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 37

A convergência das normas


internacionais de contabilidade:
da formação dos comitês

O
Inadilson Costa Junior
Bacharel Ciências Contábeis pela Universidade
cenário de desenvolvimento econômico atual exige Federal do Piauí 
maior transparência das empresas que concorrem E-mail: inadilson_costa@hotmail.com

em nível global, de modo que o tratamento de


Orientador: Álvaro Jose Ribeiro Caldas 
seus relatórios contábeis deve atender à melhor leitura Mestre em Administração em Controladoria
para avaliação dos investidores globais. Nesse contexto, a pela Universidade Federal do Ceará é profes-
sor da Universidade Federal do Piauí.
convergência na elaboração de normas que facilite a leitura E-mail: ajrcaldas@hotmail.com
em múltiplos mercados, transpondo as diversidades regionais
de reporte financeiro, torna-se necessária para corroborar as
novas responsabilidades trazidas pelas normais internacionais
de contabilidade, para o progresso uniforme e para o
estreitamento cada vez maior das convergências contábeis
entre nações. A pesquisa tem como objetivo geral analisar
a formação dos comitês internacionais de contabilidade e
o processo da convergência contábil, corroborando para o
entendimento da formulação dos padrões contábeis no mundo,
com base em estudos levantados na bibliografia. Os estudos
empíricos apontam uma dinâmica de interesses na discussão
das normas, com satisfatória aceitação dos padrões emanados
pelo Iasb, mas necessitando de guidance.

2067 – Recebido em 20/4/2018. Distribuído em 20/4/2018. Pedido de revisão em 25/6/2018.


Resubmetido pelo autor em 25/7/2018. Aprovado em 28/8/2018, na quarta rodada, por três
membros do Conselho Editorial. Publicado na edição setembro-outubro de 2018. Organiza-
ção responsável pelo periódico: Conselho Federal de Contabilidade.

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


38 A convergência das normas internacionais de contabilidade: da formação dos comitês

1. Introdução homogênea, mudando de acordo ponto em comum nos relatórios fi-


com o contexto de cada país em nanceiros elaborados de outros pa-
A evolução da Contabilidade, que está inserida, como desta- íses e definindo métodos de adap-
no processo que se transcorre por cam Silva, Madeira e Assis (2004). tação aos padrões internacionais
toda sua história, tem acompanha- Neste mesmo sentido, como ha- a partir da contabilidade local. De
do o desenvolvimento econômico via diferentes práticas contábeis, acordo com o mencionado, houve a
e as transformações sociopolíticas decorrentes de fatores culturais, necessidade de padrões de normas
e socioculturais em cada época e, normativos, econômicos e sociais contábeis internacionais, buscando
no contexto de cada nação, como dentre os diversos países, como uma facilitação na compreensão
observado por Nagatsuka e Teles atestam Martins, Martins e Mar- dos demonstrativos, a compara-
(2002). No atual cenário em que o tins (2007), fez-se necessário bus- bilidade e a clareza que os envol-
mundo vive, com nível de competi- car um entendimento da norma- ve (MARTINS; MARTINS; MARTINS,
tividade dos negócios em escala glo- tização contábil, identificando seu 2007; FARIAS; FARIAS, 2009).
bal e a intensificação das políticas in- destinatário principal e, em virtu- Com o desenvolvimento dos
ternacionais, o sistema de comércio de do crescimento do mercado de blocos econômicos entre nações,
acelerou e a humanidade evoluiu e, capitais, adequar as informações surgiu a necessidade da harmoniza-
nesse mesmo sentido, a contabilida- contidas nas demonstrações fi- ção de normas e práticas contábeis,
de. Assim, decorreu-se uma deman- nanceiras para investidores de ou- frente às entidades econômicas e
da pela criação de um sistema con- tras nações. A convergência con- que, em função de interesses que
vergente de normas internacionais tábil atrelou-se a um trabalho em envolviam fluxos de capital e movi-
de contabilidade entre as nações, conjunto entre países, gerando um mentações econômicas, por decor-
para reportar situações financeiras multilateralismo econômico, que rentes de organizações transnacio-
de suas entidades de forma clara e desencadeou impactos positivos nais, fato que corroborou para um
comparável às partes interessadas, na atual conjuntura global. mundo competitivo no que diz res-
entre os diversos grupos de usuá- Rodrigues e Pereira (2004) lecio- peito à geração de informações ne-
rios da informação contábil. nam em sua obra sobre a proble- cessárias ao mercado global (ROSA,
Existe, por consequência, uma mática da convergência contabilís- 1999; LUCENA; LEITE; NIYAMA,
influência do meio em que a Con- tica internacional em um contexto 2004). Assim, é evidente a impor-
tabilidade está inserida, esta con- de crescentes transações em um tância das normas internacionais de
siderada como uma linguagem da momento de destaque no cres- contabilidade para o progresso uni-
informação patrimonial e finan- cimento dos mercados econômi- forme e para o estreitamento cada
ceira sobre as organizações des- cos e financeiros. De acordo com vez maior das convergências contá-
tinadas a um público, não sendo o colocado em destaque, os auto- beis entre nações.
res ainda evidenciam as vantagens O processo de interdependên-
decorrentes da adoção de normas cia entre as nações, decorrente do
de contabilidade aceitas internacio- constante crescimento da econo-
nalmente e as barreiras enfrentadas mia, ao longo da década de 1970,
pela diversidade de sistemas conta- e os avanços da globalização, du-
bilísticos existentes no mundo. rante a década de 1990, favoreceu
Com a intrínseca necessidade alguns aspectos com impacto nas
de suprir o processo de evolução relações internacionais (DEFAR-
de mercados na atual conjuntural GES, 1997; CASTELLS, 2000; ZÜRN,
global que se iniciou posteriormen- 2013). Assim, o autor considera re-
te à segunda guerra mundial, hou- levante a compreensão da relação
ve um esforço global entre as po- entre nações para um entendimen-
tências econômicas, como Estados to do destaque da Contabilidade
Unidos e União Europeia, por uma internacional no sistema macroe-
formação de comitês internacio- conômico mundial. Neste sentido,
nais de contabilidade, que se res- diante das diferenças dos sistemas
ponsabilizaram na construção normativos entre os países, bem
em buscar soluções de con- como a predominância do atendi-
vergências contábeis, co- mento das informações contábeis
locando em evidência um a determinados tipos de usuários,
REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 39

“A harmonização é um processo pelo qual demasiados


países, de comum acordo, ao refletirem sobre as
vantagens e desvantagens de determinado modo de
registro patrimonial, realizam mudanças nos seus
sistemas e normas contábeis, tornando-os, assim,
compatíveis, respeitando características de cada região.

tornou-se necessário o processo 2. Referencial Teórico gias da informação, favorecendo
de convergência das normas con- maiores fluxos econômico-finan-
tábeis, que se tornasse adequado 2.1 Convergência contábil: uma ceiros, criando novos níveis de co-
ao fluxo de transações no novo ce- necessidade global nectividade entre nações, além dos
nário econômico de mercado en- A Contabilidade é substancial limites temporários ou geográficos
tre nações, decorrentes da glo- para o auxílio da administração na to- (DEFARGES, 1997; CASTELLS, 2000;
balização (MARTINS; MARTINS; mada de decisões, responsável pela ZÜRN, 2013). As instituições políti-
MARTINS, 2007; FARIAS; FARIAS, coleta de dados, mensuração mone- cas, inclusive o Estado, têm como
2009; CALIXTO, 2010). tária e evidenciação, registrando-os objetivo propagar a competitivida-
Neste contexto, o objetivo geral em forma de relatórios, que, entre de de suas economias, pois é a con-
é analisar a formação dos comitês outros objetivos, fornecem informa- corrência nos mercados globais que
internacionais de contabilidade e o ções indispensáveis à avaliação de determina a percentagem de rique-
processo da convergência das nor- períodos e tendências, na análise da za (CASTELLS, 1999). Nesse contex-
mas internacionais. Como objetivos situação econômica e financeira da to, deduz-se a validade para as na-
específicos, buscou-se demonstrar entidade e tomada de decisões ge- ções do reporte financeiro de suas
o entendimento das normas con- renciais (MISSAGIA; VELTER, 2005; empresas em nível de comparabili-
tábeis, sua convergência aos pa- NIYAMA, 2009; IUDÍCIBUS, 2010). dade dentro do mercado global, na
drões internacionais no mundo, de Atualmente, a Contabilidade atratividade de investimentos.
modo a atender ao estreitamento está entrelaçada com uma diver- Os crescentes avanços, cujo
das relações econômicas no cenário sidade de novos desafios, ocasio- processo de internacionalização da
de mercado contemporâneo, com nados pelas constantes mudanças economia foi responsável pelo sur-
base em teorias e os estudos empí- no cenário econômico mundial, no gimento de blocos econômicos con-
ricos levantados na pesquisa biblio- qual o processo de economia globa- tinentais e regionais, buscam, por
gráfica. Portanto, apresenta-se um lizada, os avanços dos mercados de meio da cooperação, o desenvolvi-
tema atual e de repercussão para os capitais internacionais e o aumento mento socioeconômico entre os pa-
profissionais e acadêmicos da área dos investimentos estrangeiros oca- íses e, dessa forma, fortalecem de
contábil, que buscam se adaptar de sionam a necessidade de utilização forma sistemática a competitivida-
acordo com as novas responsabili- de normas e procedimentos que de em escala global (ROSA, 1999).
dades trazidas pelas normais inter- contribuam para a diminuição das Desse modo, entende-se que o
nacionais de contabilidade como diferenças nas informações contá- acelerado processo do desenvolvi-
avanço da profissão contábil, além beis entre os países (LUCENA; LEI- mento global foi um fator prepon-
de buscar contribuições relevantes TE; NIYAMA, 2004; BARBOSA NETO; derante para que os países desen-
que foram alcançadas no decorrer DIAS; PINHEIRO, 2009). volvessem maneiras de harmonizar
da atual conjuntura global e, além O processo de globalização se suas relações, de modo integrado e
disso, busca trabalhar as perspecti- aprofundou muito no cenário eco- favorável à troca de relações e, em
vas futuras. nômico, em virtude das tecnolo- contexto transnacional, fundamen-

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40 A convergência das normas internacionais de contabilidade: da formação dos comitês

tal para o processo de convergência A ausência de uniformidade das na Europa. Foi necessária uma boa
da elaboração das normas e práti- normas e procedimentos contábeis análise de amostra de determinadas
cas contábeis, em um processo de compromete a comparabilidade das companhias alemãs, concluindo que
amadurecimento das relações so- informações apresentadas por meio a qualidade e a transparência das in-
ciais e comerciais (ROSA, 1999; LU- das demonstrações financeiras, formações são bem mais eficientes
CENA; LEITE; NIYAMA, 2004; MEI- como observado por Avelino et al. no padrão contábil alemão. Isso de-
RELLES JÚNIOR; MEIRELLES, 2009; (2010). Como ressalta Lucena, Leite monstra ainda um desafio à conver-
NIYAMA, 2009). e Niyama (2004), esse processo de gência da contabilidade entre os pa-
Neste contexto, o momento tor- harmonização das normas contábeis íses, tornando essencial a pesquisa
nou-se desafiador para a contabi- ao padrão internacional dever ser re- internacional sobre a temática.
lidade internacional, na era globa- alizado com cautela, tendo em vis- Diante desse cenário, o processo
lizada, de modo a corroborar para ta alcançar o objetivo de compara- de harmonização das normas de re-
um conjunto de padrões contábeis bilidade das informações contábeis, porte de informação contábil decor-
globais para o mundo financeiro considerando os próprios princípios re, necessariamente, de uma intensa
(MIRZA; HOLT, ORRELL, 2006). Des- da teoria Contábil. rede colaborativa, em que é necessá-
ta forma, no cenário globalizado, Entre os benefícios esperados ria a convergência de interesses e mi-
evidenciou-se a finalidade da har- com a harmonização contábil, des- tigação de assimetrias, além de um
monização diante dos diversos pa- tacam-se a eliminação das práticas esforço para gerar uma informação
drões contábeis entre as nações, contábeis enganosas; a limitação contábil de qualidade, entendendo-
que apresentam disparidades na di- das habilidades dos gestores em se de modo confiável e comparável.
vulgação das demonstrações finan- distorcer os dados, a redução dos
ceiras, visando satisfazer às necessi- custos relativos à preparação e à in- 2.2 A formação dos comitês no
dades dos investidores estrangeiros terpretação das demonstrações fi- processo de convergência
que buscam oportunidades de ne- nanceiras; e as melhores condições No que se relaciona ao reporte
gócios em várias nações (MARTINS; na seleção de alternativas de inves- da Contabilidade em âmbito inter-
MARTINS; MARTINS, 2007; FARIAS; timentos por meio de maior quali- nacional, a partir da globalização
FARIAS, 2009). dade da informação contábil, com dos mercados, deixa-se clara a im-
A harmonização é um processo maior confiabilidade e comparabili- portância de os investidores com-
pelo qual demasiados países, de co- dade, favorecendo a transparência preenderem a linguagem contá-
mum acordo, ao refletirem sobre as do reporte financeiro (FALK, 1994; bil de cada país. Dentre os tópicos
vantagens e desvantagens de deter- JESUS; MORAIS; CURTO, 2008; mais pesquisados sobre Contabili-
minado modo de registro patrimo- LANTTO; SAHLSTRÖM, 2008; NIYA- dade em âmbito internacional, des-
nial, realizam mudanças nos seus MA, 2009; CALIXTO, 2010). Os resul- tacam-se a existência de diferentes
sistemas e normas contábeis, tor- tados evidenciaram a relevância das modelos contábeis no mundo e o
nando-os, assim, compatíveis, res- informações contábeis, neste pa- processo de harmonização contábil
peitando características de cada drão, além de dar maior capacida- internacional (MIRZA et al., 2006;
região. Esse processo considera a in- de de explicar o valor das empresas. MARTINS; MARTINS; MARTINS,
fluência dessas normas na economia No entanto, certos cenários ou 2007; FARIAS; FARIAS, 2009; ZEFF;
dentro de um contexto de unicida- culturas entre as nações podem ge- UNIVERSITY, 2014).
de de mercados, tornando-se mais rar desafios para a convergência. Após a Segunda Guerra Mundial,
viável ao atender às necessidades Schiebel (2008) evidenciou que o pa- cada país tinha própria prática con-
das partes interessadas da manei- drão contábil alemão é melhor que o tábil, mesmo entre países com mer-
ra mais clara possível. Isso man- IFRS que foi implantado cados de capitais ativos, dos quais
tém as relações harmônicas as companhias negociadas em bol-
no fluxo do mercado global, sa captavam recursos. Por exemplo,
sofrendo, portanto, pres- no Reino Unido, na Austrá-
sões sobre o tipo de ado- lia e na Nova Zelândia, per-
ção que favoreça seus mitia-se que empresas rea-
interesses e, por outro valiassem seus ativos fixos
lado, apresentando obs- tangíveis, enquanto que nos
táculos a sua adoção (SIL- EUA e no Canadá, as compa-
VA; MADEIRA; ASSIS, 2004; nhias aderiram ao custo histó-
MISSAGIA; VELTER, 2005). rico, fortemente influenciadas

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 41

pela tendência conservadora. Os mé- meçaram a ampliar seu alcance para tional Organizational of Securities
todos de Critério de Avaliação de Es- além de suas fronteiras, criando um Commission (Iosco), das Nações
toques também se distinguiam, pois, novo desafio para as lideranças da Unidas, da União Europeia e do Fi-
enquanto, nos EUA, o Last In First profissão contábil (ZEFF; UNIVERSI- nancial Accounting Standards Bo-
Out (FIFO) era amplamente utilizado, TY, 2014). Considerando a necessi- ard (Fasb) no desenvolvimento de
no Canadá, o mercado limitava-se a dade de comparabilidade dos relató- ações voltadas para a normatiza-
poucas indústrias. Em 1975, o órgão rios financeiros entre as empresas de ção contábil no âmbito internacio-
normalizador da Nova Zelândia regu- diversas nações, foram criados co- nal. Esses órgãos são encarregados,
lamentou sobre depreciação, exigin- mitês internacionais, envolvidos no entre outras atribuições, da emis-
do o uso do método linear, não sen- processo de harmonização de nor- são de pronunciamentos, interpre-
do repetido por nenhum outro país mas de Contabilidade entre os pa- tações, opiniões, boletins técnicos,
(ZEFF; UNIVERSITY, 2014). íses, para o surgimento de um pa- relatórios e conceitos sobre a apli-
Em função também de sistemas drão de reporte contábil (MARTINS; cação de normas contábeis em nível
normativos, como common law e o MARTINS; MARTINS, 2007; OLIVEIRA internacional; ainda têm a missão
civil law – usuário principal da nor- et al., 2008; BARBOSA NETO; DIAS; de buscar mais transparência nas
mal contábil –, uma disparidade ain- PINHEIRO, 2009; NIYAMA, 2009). informações contábeis, de forma a
da maior existia entre os países an- A existência de organismos reduzir custos dos demonstrativos
glo-saxões e aqueles em países do comprometidos com as formula- financeiros das empresas, a centra-
continente europeu e no Japão, ções de normas internacionais que lização e a uniformização da pro-
onde o imposto de renda e o lucro fossem aceitas mundialmente foi dução de procedimentos contábeis
declarado dirigiam as práticas con- essencial para estreitar as relações (BARBOSA NETO, DIAS; PINHEIRO,
tábeis, o que levavam a resultados entre os países a partir de 1973. 2009; ZEFF; UNIVERSITY, 2014).
contábeis passíveis de manipulação Nesse sentido, com o intuito de O Quadro 1 resume a criação
por meio de reservas secretas. Em buscar soluções homogêneas, os dos principais órgãos, bem como
suma, a prática contábil global era órgãos internacionais vêm mostran- seus respectivos objetivos.
bastante diversificada e a compara- do a importância de harmonizar as Entre os mais relevantes, inicial-
ção significativa entre as demons- práticas contábeis, a nível mundial, mente, o International Accounting
trações contábeis de diferentes paí- evidenciando, então, a contabilida- Standards Committee (Iasc) nasceu
ses era deveras complexa (MARTINS; de como a língua universal dos ne- no ano de 1973, com a ajuda de
MARTINS, 2007; FARIAS; FARIAS, gócios (OLIVEIRA et al., 2008). contadores de vários países, como:
2009; ZEFF; UNIVERSITY, 2014). Dentro do processo de conver- Alemanha, Austrália, Canadá, Esta-
Com o rápido crescimento do gência, ressalta-se o esforço do dos Unidos da América, França, Ir-
comércio internacional e o investi- International Accounting Board landa, Japão, México, Países bai-
mento direto estrangeiro, a partir (Iasb), do International Federation xos e Reino Unido (AICPA, 1994).
da década de 1950, as empresas co- of Accounting (Ifac), do Interna- O Iasb, sucessor do Iasc, é o órgão

Quadro 1 – Principais órgãos internacionais de contabilidade


Ano Órgão Sede Objetivo
International Accounting Formular e publicar de forma totalmente independente um novo padrão de normas
1973 Londres- Inglaterra
Standards Committee (IASC) contábeis internacionais que possa ser mundialmente aceito.
Financial Accounting Standards Norwalk- Estados Favorecer a padronização, maior eficiência na economia e nas decisões tomadas pelas
1973
Board (FASB) Unidos empresas, trazendo maior clareza nas informações divulgadas.
International Federation of Nova Iorque- Estados Visa o desenvolvimento e o aperfeiçoamento de uma profissão contábil coordenada em
1977
Accounting (IFAC) Unidos nível mundial e com normas uniformes.
Ordenar as atividades que regulam os valores mobiliários do mundo, além de estabelecer os
International Organizational of padrões globais. Desenvolve, implementa e promove a adesão a padrões internacionalmente
1983 Madrid- Espanha
Securities Commission (IOSCO) reconhecidos para a regulamentação de valores mobiliários e em estreita colaboração com o
G20 e o Conselho de Estabilidade Financeira (FSB) na agenda de reformas regulatórias globais.
Standing Interpretations Responder às dúvidas das interpretações dos usuários, como comitê técnico da estrutura
1997 Londres- Inglaterra
Committee (SIC) do IASC.
Desenvolver um conjunto uniforme de normas contábeis utilizadas na elaboração e
apresentação das demonstrações contábeis, a nível mundial, utilizando informações de alta
International Accounting
2001 Londres- Inglaterra qualidade, comparáveis e transparentes, que auxiliem na tomada de decisões econômicas;
Standards Board (Iasb)
a promoção e aplicação de forma rígida dessas normas; e, a promoção da convergência das
normas contábeis ao padrão internacional.
Fonte: elaborado pelos autores.

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


42 A convergência das normas internacionais de contabilidade: da formação dos comitês

de grande importância na busca de de 100 países, que já exigem ou per- nal Accounting Standards (IAS) e,
harmonização, sendo a promoção mitem que suas empresas adotem as atualmente, são conhecidas como
da convergência das normas con- normas contábeis do International Internacional Financial Reporting
tábeis a nível internacional uma Financial Reporting Standards (IFRS). Standards (IFRS). Emitidas pelo Iasb,
de suas funções. Formado por vá- Dessa maneira, esse procedimento essas normas são pronunciamentos
rios países, o Iasb é um organis- de adequação não é tão simples, le- baseados em princípios e, não, em
mo independente, que tem como vando em consideração as diferen- regras específicas (CALIXTO, 2010;
competência o desenvolvimento ças de ordem política, cultural e de DELOITTE, 2017).
de normas que sejam compreensí- legislação (REZAEE; SMITH; SZENDI, O Quadro 2 apresenta a sequên-
veis para o fornecimento de infor- 2010; DELOITTE, 2017). cia histórica da criação das normas
mações que vão de encontro aos internacionais pelo Iasb.
padrões da contabilidade (LEMES; 2.3 A elaboração das normas Quando se fala do IFRS, Silva, Ma-
SILVA, 2007). internacionais de contabilidade deira e Assis (2004) reforçam que es-
Movimentos voltados a favor da As normas internacionais de ses padrões emitidos pelo Iasb fo-
internacionalização das normas con- contabilidade, inicialmente, re- ram considerados uma revolução nos
tábeis já envolve, hoje em dia, mais ceberam o nome de Internatio- mercados financeiros e que, a partir

Quadro 2 – Evolução das normas divulgadas pelo Iasb


Última
Norma Título Original Situação
alteração
IAS 1 Presentation of Financial Statements 2007* Vigente
IAS 2 Inventories 2005* Vigente
IAS 3 Consolidated Financial Statements 1976 Substituído em 1989 pela IAS 27 e pela IAS 28
IAS 4 Depreciation Accounting - Withdrawn in 1999
IAS 5 Information to Be Disclosed in Financial Statements 1976 Substituído pela IAS 1 a partir de 1 de julho de 1998
IAS 6 Accounting Responses to Changing Prices - Substituído pela IAS 15, que foi retirada em dezembro de 2003
IAS 7 Statement of Cash Flows 1992 Vigente
IAS 8 Accounting Policies, Changes in Accounting Estimates and Errors 2003 Vigente
IAS 9 Accounting for Research and Development Activities - Substituído pela IAS 38 a partir de 1 de Julho de 1999
IAS 10 Events After the Reporting Period 2003 Vigente
IAS 11 Construction Contracts 1993 Será substituído pela IFRS 15 a partir de 1 de janeiro de 2018
IAS 12 Income Taxes 1996* Vigente
IAS 13 Presentation of Current Assets and Current Liabilities - Substituído pela IAS 1 a partir de 1 de Julho de 1998
IAS 14 Segment Reporting 1997 Substituído pela IFRS 8 a partir de 1 de janeiro de 2009
IAS 15 Information Reflecting the Effects of Changing Prices (Withdrawn December 2003) 2003 Vigente
IAS 16 Property, Plant and Equipment 2003* Vigente
IAS 17 Leases 2003* Será substituído pela IFRS 16 a partir de 1 de janeiro de 2019
IAS 18 Revenue 1993* Será substituído pela IFRS 15 a partir de 1 de janeiro de 2018
IAS 19 Employee Benefits (1998) 1998 Substituído pela IAS 19 (2011) a partir de 1 de janeiro de 2013
IAS 19 Employee Benefits (2011) 2011* Vigente
IAS 20 Accounting for Government Grants and Disclosure of Government Assistance 1983 Vigente
IAS 21 The Effects of Changes in Foreign Exchange Rates 2003* Vigente
IAS 22 Business Combinations 1998* Substituído pela IFRS 3 a partir de 31 de março de 2004
IAS 23 Borrowing Costs 2007* Vigente
IAS 24 Related Party Disclosures 2009* Vigente
IAS 25 Accounting for Investments - Substituído pela IAS 39 e IAS 40 em vigor em 2001
IAS 26 Accounting and Reporting by Retirement Benefit Plans 1987 Vigente
IAS 27 Separate Financial Statements (2011) 2011 Vigente
Substituído pela IFRS 10, IFRS 12 e IAS 27 (2011) a partir de
IAS 27 Consolidated and Separate Financial Statements 2003
1 de janeiro de 2013
IAS 28 Investments in Associates and Joint Ventures (2011) 2011 Vigente
Substituído pela IAS 28 (2011) e pela IFRS 12 a partir de 1 de
IAS 28 Investments in Associates 2003
janeiro de 2013
IAS 29 Financial Reporting in Hyperinflationary Economies 1989 Vigente
IAS 30 Disclosures in the Financial Statements of Banks and Similar Financial Institutions 1990 Substituído pela IFRS 7 a partir de 1 de janeiro de 2007
IAS 31 Interests In Joint Ventures 2003* Substituído pela IFRS 11 e IFRS 12 a partir de 1 de janeiro de 2013

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 43

Quadro 2 – Evolução das normas divulgadas pelo Iasb


Última
Norma Título Original Situação
alteração
IAS 32 Financial Instruments: Presentation 2003* Vigente
IAS 33 Earnings Per Share 2003* Vigente
IAS 34 Interim Financial Reporting 1998 Vigente
IAS 35 Discontinuing Operations 1998 Substituído pela IFRS 5 a partir de 1 de janeiro de 2005
IAS 36 Impairment of Assets 2004* Vigente
IAS 37 Provisions, Contingent Liabilities and Contingent Assets 1998 Vigente
IAS 38 Intangible Assets 2004* Vigente
Substituído pela IFRS 9 a partir de 1 de janeiro de 2018, onde
IAS 39 Financial Instruments: Recognition and Measurement 2003*
é aplicada a IFRS 9
IAS 40 Investment Property 2003* Vigente
IAS 41 Agriculture 2001 Vigente
IFRS 1 First-time Adoption of International Financial Reporting Standards 2008* Vigente
IFRS 2 Share-based Payment 2004 Vigente
IFRS 3 Business Combinations 2008* Vigente
IFRS 4 Insurance Contracts 2004 Será substituído pela IFRS 17 a partir de 1 de janeiro de 2021
IFRS 5 Non-current Assets Held for Sale and Discontinued Operations 2004 Vigente
IFRS 6 Exploration for and Evaluation of Mineral Assets 2004 Vigente
IFRS 7 Financial Instruments: Disclosures 2005 Vigente
IFRS 8 Operating Segments 2006 Vigente
IFRS 9 Financial Instruments 2014* Vigente
IFRS 10 Consolidated Financial Statements 2011 Vigente
IFRS 11 Joint Arrangements 2011 Vigente
IFRS 12 Disclosure of Interests in Other Entities 2011 Vigente
IFRS 13 Fair Value Measurement 2011 Vigente
IFRS 14 Regulatory Deferral Accounts 2014 Vigente
IFRS 15 Revenue from Contracts with Customers 2014 Vigente
IFRS 16 Leases 2016 Vigente
IFRS 17 Insurance Contracts 2017 Vigente
Nota: As tabelas acima listam a versão mais recente (ou versões se um pronunciamento ainda não foi substituído) de cada pronunciamento e a data em que as revisões
foram originalmente emitidas. Quando um pronunciamento foi reeditado com o mesmo nome ou um nome diferente, a data indicada nas tabelas acima é a data em que o
pronunciamento revisado foi reeditado (estes são indicados com um asterisco (*) nas tabelas). A maioria dos pronunciamentos também foi alterada através de projetos do Comitê
de Interpretação do Iasb ou IFRS, para emendas consequentes decorrentes da emissão de outros pronunciamentos, o processo de melhorias anuais e outros fatores. Nossa página
para cada pronunciamento tem um histórico completo do pronunciamento, seu desenvolvimento, emendas e outras informações.

Fonte: elaborado com base em Deloitte (2017).

do ano de 2005, muitas empresas da do informação de modo transpa- esse fato reforça a ideia de buscar
União Europeia se tornariam obriga- rente e comparável. Assim, torna-se pela harmonização de normas con-
das a introduzir essas normas, dando mais acessível atender aos interesses tábeis, para que, dessa forma, as
assim um grande passo para a har- das expansões comerciais e financei- demonstrações financeiras sejam
monização internacional. Confirman- ras das empresas no âmbito interna- adequadamente avaliadas também
do essa previsão, Carvalho, Lemes e cional. Diante disso, as demonstra- por investidores estrangeiros (BAR-
Costa (2006, p. 19) constataram que ções financeiras serão estabelecidas BOSA NETO; DIAS; PINHEIRO, 2009;
“os IFRS ganharam uma proporção com maior confiabilidade, atenden- PINHEIRO, AZEVEDO; CRUZ, 2013).
enorme quanto a sua importância, do melhor aos interesses de classes Observando a real importância
com a sua obrigatoriedade em em- de usuários da informação contábil. de tais fatos mencionados, eviden-
presas que estão na bolsa da União O entendimento sobre as exten- cia-se o processo de criação de um
Europeia a partir de 2005”. sões da internacionalidade da Con- cenário oportuno para o estudo das
Niyama (2009) destaca a impor- tabilidade é essencial para todos os direções de pesquisas quanto à har-
tância por parte do profissional da que desejem negociar por frontei- monização contábil internacional e
contabilidade em atualizar-se, adap- ras nacionais e internacionais, cujas para as investigações de como as
tando-se aos novos padrões, de for- buscas por captação de investimen- pesquisas procederão a partir des-
ma a atender ao relato das demons- tos estrangeiros demandam a uti- ses acontecimentos (BAKER; BAR-
trações financeiras de acordo com as lização de normas e procedimen- BU, 2007). Estes fatores promovem
exigências de certos países, geran- tos contábeis padronizados. Então, a ampliação do objetivo de práticas

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


44 A convergência das normas internacionais de contabilidade: da formação dos comitês

de contabilidade internacional, pro- sem o aprofundamento de uma complementar, também foram pes-
movendo informações aos usuários pesquisa explicativa. Neste estudo, quisados em anais de eventos cientí-
internos e externos da entidade, em busca-se descrever a relação da har- ficos para a área, bibliotecas digitais
função do processo de globalização. monização contábil com os fluxos de teses e dissertações em universi-
Dessa forma, para atender às ne- econômicos globais, mediante resul- dades nacionais, levantados no pe-
cessidades da classe contábil, os co- tados de estudos na literatura. ríodo de 10 de dezembro de 2017 a
mitês internacionais se constituem Por sua vez, quanto à estraté- 25 de julho de 2018.
como instrumento indispensável. As- gia de coleta de dados, a pesqui- Após uma primeira leitura, par-
sim, a regulação das normais con- sa bibliográfica promove a verifi- tindo no resumo dos artigos decor-
tábeis é fundamental tanto para a cação dos dados obtidos por meio rentes do levantamento bibliográfi-
harmonização quanto para a manu- do acervo pesquisado, confrontan- co com o alinhamento a proposta
tenção das relações econômicas har- do informações entre as diversas li- deste trabalho, parte compôs o refe-
mônicas. Portanto, são oportunas as teraturas publicadas sobre o tema. rencial teórico, enquanto que os de
pesquisas sobre contabilidade inter- A esse respeito, Marconi e Lakatos caráter empírico foram destacados
nacional, pois as normas IFRS apre- (1990) lecionam que a pesquisa bi- para análise e discussão do estudo.
sentam uma temática atual, portanto bliográfica se dá por meio da coleta A Tabela 1 apresenta a origem
relevante, e dinâmica, diante de sua de material ou de fontes secundá- dos artigos do levantamento bi-
evolução constante, que impactam rias, abrangendo bibliografia já tor- bliográfico.
tanto a avaliação dos usuários da in- nada pública em relação ao tema de O levantamento bibliográfico
formação contábil quanto os fluxos estudo, desde publicações avulsas buscou, predominantemente, coletar
de capitais e movimentações econô- até meios de comunicações orais. artigos que evidenciassem a temática
micas das empresas transnacionais. Para o presente estudo biblio- da formação dos comitês e processo
gráfico, utilizou-se de descritores ou de elaboração e discussão das nor-
palavras-chaves que tenham relação mas de contabilidade, sendo que a
3. Metodologia com o tema, como “comitês inter- maior parte dos artigos nacionais ti-
nacionais”, “contabilidade interna- veram como origem a base de dados
Este trabalho trata-se de uma cional”, “convergência contábil”, Spell, com 16 publicações, formando
pesquisa descritiva e bibliográfica, “harmonização contábil internacio- 55,2% das pesquisas nacionais. O uso
desenvolvida por meio de análises em nal”, “normas internacionais de con- predominante desta base, promovida
livros, artigos, dissertações de mes- tabilidade”, “padrões internacionais pela Associação Nacional de Progra-
trado e teses de doutorado, visando de contabilidade”, e termos correla- mas de Pós-Graduação em Adminis-
coletar o conteúdo necessário para o tos e os derivados da língua ingle- tração (Anpad), decorreu-se por sua
estudo da temática, por meio da sele- sa, especialmente “IFRS” e “Iasb”, divulgação de trabalhos em periódi-
ção e interpretação das contribuições na pesquisa em diretórios, bibliote- cos nacionais na área de Administra-
teóricas já existentes sobre o assunto. cas digitais e outras bases de dados, ção e Contabilidade.
Quanto ao objetivo do estudo, a com ênfase na busca de artigos na A distribuição longitudinal dos
pesquisa é predominantemente des- Scientific Periodicals Electronic Li- artigos, decorrentes do levanta-
critiva, conforme Gil (1999), tendo brary (Spell), e, posteriormente, na mento bibliográfico, buscou uma
como principal finalidade descrever ResearchGate, Scientific Eletronic revisão de literatura mais recente
determinada característica da po- Library Online (SciELO), além de in- sobre a temática, entre as quais se
pulação ou fenômeno ou estabele- dicações de citações quantificadas configuram 10 estudos empíricos,
cimento de relação entre variáveis, pelo Google Acadêmico. De forma analisados na seção a seguir.

Tabela 1 – Levantamento bibliográfico dos artigos acadêmicos


Fonte 1994 2004 2007 2008 2009 2010 2011 2013 2014 2015 2016 2017 2018 Total
Anais 0 0 0 1 1 0 0 0 0 0 0 0 0 2
Google Acad. 0 1 0 0 0 1 0 1 0 0 0 0 0 3
ResearchGate 0 0 1 1 0 2 0 0 0 0 0 0 0 4
ScienceDirect 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 0 0 1
Spell 0 1 1 0 2 1 1 1 3 1 2 2 1 16
Wiley 1 0 0 0 1 0 0 0 0 0 0 0 0 2
Total 1 2 3 2 4 4 1 2 3 1 2 2 1 28
Fonte: dados da pesquisa.

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 45

4. Análise dos estudos ríodo de 2011 a 2018, consideran- que as normas brasileiras tendem
empíricos recentes do que boa parte das normas IFRS a sofrer ainda modificações para
já foram emitidas pelo Iasb antes maior nível de divulgação no padrão
Com o intuito de observar al- deste período. internacional. No entanto, Khatib e
guns resultados empíricos da con- Lemes e Oliveira (2011) obser- Sayed (2013), considerando os as-
vergência contabilística no cenário vam que as normas norte-america- pectos distintos das transações islâ-
mundial, o Quadro 3 apresenta arti- nas estão com maior nível de con- micas em relação ao mundo ociden-
gos empíricos levantados para o pe- vergência ao padrão IFRS, enquanto tal, concluem que o Iasb deve emitir

Quadro 3 – Estudos empíricos no cenário mundial


Autor (ano) Objetivo País(es) envolvidos Metodologia
Pesquisa descritiva quanto aos seus objetivos e utilizando-se
Avaliar em que nível as informações contábeis
Lemes e dos procedimentos técnicos de pesquisa documental e de
divulgadas nos mercados brasileiro e norte-americano
Oliveira Brasil e EUA análise de conteúdo clássica das demonstrações contábeis
atendem aos requisitos da adoção inicial das IFRS –
(2011) para o ano de 2008 de empresas listadas simultaneamente na
International Financial Reporting Standards.
Bolsa de Valores de Nova Iorque e na Bolsa de São Paulo.
Pesquisa com abordagem qualitativa, com estratégia
Apresentar as diferenças entre as estruturas conceituais bibliográfica e documental, para comparação da estrutura
Khatib e da Contabilidade entre o International Accounting Países da Comunidade e semântica dos termos dos respectivos documentos
Sayed (2013) Standards Board (Iasb) e a Accounting and Auditing Islâmica conceituais, de modo a verificar as diferenças entre estes a
Organization for Islamic Financial Institution (AAOIFI). possível necessidade de uma norma específica para produtos
de Finanças Islâmicas por parte do Iasb.
Descrever a evolução do normativo contabilístico
Pinheiro,
português e apresentar as diferenças estruturais entre Metodologia qualitativa, assentada na análise documental
Azevedo e Portugal
o atual modelo contabilístico (SNC) e o modelo sobre a matéria em estudo e de diplomas contabilísticos.
Cruz (2013)
antecessor (POC).
 Investigar se há evidências de que a carta emitida Utilizou-se a medida de Retorno Ajustado pelo Mercado
e divulgada ao mercado pelo Iasb, alertando sobre e, através de uma abordagem de diferença em diferença,
a inadequação da contabilização dos títulos de Alemanha, Espanha, testou-se o efeito da interação entre o tempo após a data do
Calvi e Galdi
dívida soberanos de alto risco, apresentou conteúdo França, Itália e do evento e o grupo de tratamento. Para esse teste foi realizada
(2014)
informacional e causou alterações nos preços das ações de Reino Unido uma regressão para cada janela de evento, sendo aplicado
bancos da Alemanha, Espanha, França, Itália e do Reino o método dos Mínimos Quadrados Ordinários com dados
Unido, que possuíam títulos gregos em suas carteiras. agrupados (pooled data).
África do Sul, Utilizou-se da técnica da regressão logística para verificar
Carmo,
Investigar a influência de grupos de interesse (lobby) Austrália, Brasil, se as características identificadas nos respondentes das 302
Ribeiro e
no processo de normatização contábil internacional China, Índia, Japão, cartas-comentários enviadas ao Iasb tiveram influência na
Carvalho
empreendido pelo Iasb, no caso da padronização do leasign.  Suécia, França, Reino posição manifestada pelo órgão no Exposure Draft sobre
(2014)
Unido, EUA Leasing emitido logo após o Discussion Paper do Iasb.
Analisar as cartas-comentários referentes às propostas Países da Ásia,
Ayres, Costa de alterações do Iasb referentes aos critérios de América do Norte, Estudo com objetivo descrito, com desenvolvimento da teoria
e Szuster reconhecimento e desreconhecimento contábil dos Oceania, América do tendo como base a abordagem regulatória, e a análise conteúdo
(2016) elementos das demonstrações financeiras no processo Sul, África e América de 235 cartas-comentários como método de avaliação.
de revisão da Estrutura Conceitual. Central
Reino Unido, Austrália,
Analisar a percepção dos participantes do processo Pesquisa descritiva com abordagem qualitativa, com a coleta
Alemanha, EUA,
Silva, normativo do Iasb sobre a proposta de revisão da de 80 cartas-comentários e análise do DP/2013/1, proposto
Canadá, Brasil, Hong
Niyama e Conceptual Framework for Financial Reporting, a pelo Iasb para a Estrutura Conceitual, considerando suas nove
Kong, Índia, França,
Rodrigues fim de descobrir qual o nível de concordância ou seções. Foram utilizadas técnicas de tabulação, após análise
Singapura, Suíça,
(2016) discordância dos usuários perante a proposta do documental das cartas-comentários sobre a concordância ou
Espanha, Japão, Malásia,
Discussion Paper - DP/2013/1. não à opinião do Iasb e argumentação dos respondentes.
China e Coréia do Sul
Investigar a influência das propostas dos diversos
Barreto, Estudo com caráter exploratório baseado no conteúdo da primeira
constituintes na elaboração final da Seção 1 – Países da América do
Santos e questão de 233 cartas comentários, enviadas por empresas, do
Objetivo da elaboração e divulgação de relatório Norte, América do Sul,
Tavares documento base de conclusão do Iasb. Para análise dos dados foi
contábil-financeiro de propósito geral do Conceptual Ásia, Europa e Oceania
(2017) utilizado teste estatístico não paramétrico Qui-Quadrado.
Framework for Financial Reporting.
Identificar as características e perspectivas Países da Europa, Ásia, Coleta de dados secundários em 57 cartas comentários de
Haveroth et
internacionais dos diversos grupos de interesses em América, África e pré-implantação enviadas ao Iasb, objetivando ajustes na
al. (2017)
relação à IFRS SMEs. Oceania norma SMEs, com tabulação dos dados.
Investigar o ambiente normativo do Iasb com o África do Sul, Analisou-se a associação de características dos respondentes
Carmo,
intuito de identificar qual teoria de regulação, se a Austrália, Brasil, das cartas de comentário do processo de elaboração da norma
Ribeiro e
Teoria de Interesse Público ou se a Teoria dos Grupos China, Índia, Japão, IFRS 11 e sua influência na decisão do Iasb de não manter o
Carvalho
de Interesse, seria a mais adequada para explicar a Suécia, França, Reino método da consolidação proporcional para os empreendimentos
(2018)
conduta regulatória desse órgão. Unido, EUA controlados em conjunto, por meio da regressão logística.
Fonte: elaborado pelos autores.

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46 A convergência das normas internacionais de contabilidade: da formação dos comitês

normas específicas para produtos dência de concordância no âmbito bem como as associações de con-
de Finanças Islâmicas, dadas as di- geral às propostas do Iasb, observa- tabilidade foram os maiores inte-
vergências pertinentes entre os do- se inconformismo, destacando que ressados na padronização.
cumentos, principalmente nos obje- os critérios estão fragilizados em fun- Carmo, Ribeiro e Carvalho (2018)
tivos das demonstrações contábeis, ção da carência de estabelecimento evidenciaram sucesso no lobbying
dos usuários da informação contá- de conceituação robusta, evidencian- de participantes dos países com sis-
bil e no conceito da forma jurídica e do necessidade por orientações ela- tema jurídico consuetudinário (com-
essência econômica das transações. boradas em estrutura teórica robus- mon law), caracterizado pelo mode-
Relatam Pinheiro, Azevedo e ta e com utilidade prática (guidance). lo contábil anglo-americano, o que
Cruz (2013) que, inicialmente, Por- Silva, Niyama e Rodrigues (2016) traz indícios de que o processo de
tugal integrou os países de influên- destacaram que os normatizadores regulação contábil internacional se-
cia continental, reconhecidos pela figuraram, em primeiro lugar, no ria mais identificado com a Teoria
existência de um plano de contabi- envio de comment letters da Estru- dos Grupos de Interesse.
lidade, e com o passar verificou-se tura Conceitual, seguidos por asso- Desta forma, os estudos empíri-
a influência das normas do Iasb no ciações de classe, e com baixa par- cos apontam uma dinâmica de in-
normativo português. O processo ticipação da academia. A escala de teresses na discussão das normas,
de harmonização contabilística eu- concordância com o Discussion Pa- com satisfatória aceitação dos pa-
ropeu proporcionou um novo mode- per – DP/2013/1 evidenciou 69,72%, drões emanados pelo Iasb.
lo com crescente ascendência anglo- 20,91% e 9,38%, respectivamente,
saxônica, inserindo uma estrutura para o nível de concordância, discor-
conceitual, com uma filosofia mais dância e opiniões parciais. No geral, 5. Conclusão
baseada em princípios do que em re- os resultados da pesquisa evidencia-
gras, com prevalência da perspectiva ram que a maioria dos respondentes A realização deste trabalho pro-
econômica, metodologia de aborda- concorda com a proposta do Iasb e, porcionou a obtenção de maiores
gem direcionada para o relato finan- para embasar seus argumentos, fa- conhecimentos sobre a temática em
ceiro e aumento da aplicação do zem uso da experiência prática e o questão, por meio de um estudo bi-
valor justo, com o incremento da in- que pensam no tocante a determi- bliográfico que pudessem dar um
corporação de juízos de valor. nados assuntos, sem a utilização de entendimento em relação ao obje-
Calvi e Galdi (2014) encontra- argumentos teóricos que dessem su- to desta pesquisa. Portanto, pode-se
ram evidências de que a carta do porte à temática analisada. notar que a Contabilidade, em sua
Iasb impactou o retorno das ações Barreto, Santos e Tavares (2017) contínua dinamicidade, sempre bus-
dos bancos da Alemanha, Espanha, concluíram que a grande maioria cou adaptar-se às novas realidades.
França, Itália e do Reino Unido, que das empresas apoiou as sugestões Além disso, também permitiu, por
possuíam títulos do governo grego feitas pelo Iasb e solicitaram algu- meio de pesquisas, uma análise das
no período analisado. mas explicações em sua base de percepções acerca da contabilidade
Para Carmo, Ribeiro e Carvalho conclusão, onde este órgão consi- no âmbito internacional, conside-
(2014), apenas as opiniões de profis- derou necessário acatar algumas, rando o mercado globalizado para
sionais da contabilidade, normatiza- como, por exemplo, clarificar o ob- o progresso uniforme e o estreita-
dores nacionais e acadêmicos exerce- jetivo dos relatórios financeiros e mento cada vez maior das conver-
ram influência nas decisões tomadas explicar as decisões de alocação de gências contábeis entre nações.
pelo Iasb no caso dos comentários recursos, fornecer informações ne- O desenvolvimento do presen-
sobre padronização de normas para cessárias para avaliar a gestão de te estudo possibilitou uma análise
o registro contábil do Leasing. administração de recursos da en- da importância do surgimento dos
Os resultados de Ayres, Costa e tidade e melhor explicar a noção comitês contábeis para a conver-
Szuster (2016) indicaram que, quan- de prudência, dessa forma, contri- gência das normas internacionais
to à origem das cartas-comentários, buindo para o melhor entendimen- e seus impactos na atual conjuntu-
há preponderância do continente to dos interessados no que diz res- ra global de mercado. Diante disso,
europeu, dos países anglo-saxões e peito à Estrutura Conceitual. pode-se ter um entendimento dos
de participação de entidades profis- Os resultados de Haveroth et al. pontos abordados no trabalho de
sionais, setoriais e o grupo formado (2017) indicam que todos os conti- modo a alcançar os objetivos pro-
pela academia, auditoria e contábil, nentes participaram dos comentá- postos, no momento que se enfati-
indicando a influência de especialis- rios em relação às IFRS das SMEs, zou a importância da formação de
tas em Contabilidade. Apesar da ten- com uma concentração da Europa, comitês para a convergência contá-

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 47

bil no mundo globalizado, levando to para os próprios usuários que ti- para o surgimento de um padrão de
em consideração os fluxos de capi- veram que passar por uma fase de reporte financeiro, entre os diver-
tais e movimentações financeiras adaptação, a fim de melhor utilizar sos usuários da informação contábil.
internacionais, de forma a demons- esses instrumentos e se familiarizar Além disso, o processo de convergên-
trar o entendimento dessas normas, a este novo procedimento, nasceu cia tem encarado desafios entre as di-
a necessidade e a evolução de con- a necessidade de maior clareza e ferentes nações, dentre os múltiplos
vergência das nações interessadas comparabilidade entre os reportes interessados na padronização, nos
que estão em competitividade a ní- financeiros de diferentes empresas, seus sistemas normativos e no inte-
vel global e os aspectos dos fluxos de modo a favorecer aos usuários resse por guidance.
econômicos investimentos. da informação contábil, especial- No entanto, por se tratar de um
É importante mencionar que, mente os investidores globais. assunto contemporâneo, dinâmico
ao longo do trabalho, foi apresen- Ficou evidente, especialmente por e pertinente, sugerem-se novos es-
tado um panorama sobre a busca meio dos resultados do referencial te- tudos que aprofundem a temática
da convergência contábil no que órico levantado, que a influência da sobre as normas internacionais de
concerne ao processo de globaliza- formação dos comitês internacionais contabilidade, de modo a favorecer
ção, o que acabou culminando nos para a formação das normas interna- a compreensão da formulação das
avanços da Contabilidade no sis- cionais de contabilidade originou-se normas e sua adequação entre as
tema internacional. Em razão des- por meio da necessidade de compa- nações, ao mesmo tempo que fa-
sas mudanças pertinentes, tanto rabilidade dos relatórios financeiros voreça a qualidade da informação
para os profissionais da área quan- entre as empresas de diversas nações, contábil para seus usuários.

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 51

Certificados de Potencial Adicional


de Construção (Cepac): o que são e
como contabilizar

O
Janilson Antonio da Silva Suzart
Contador, possui doutorado em Controladoria
s Certificados de Potencial Adicional de Construção e Contabilidade pela Faculdade de Economia,
(Cepac) se constituem em um tipo de ativo pouco Administração e Contabilidade da Universida-
de de São Paulo (FEA-USP). É auditor federal
conhecido na estrutura administrativa brasileira. de Finanças e Controle no Ministério da Trans-
Por essa razão, tem gerado diversas confusões conceituais de parência, Fiscalização e Controladoria Geral da
União (CGU).
classificação e reconhecimento no âmbito da contabilidade E-mail: suzart@suzart.cnt.br
governamental, mormente em virtude de esse Certificado
apresentar, também, características de instrumentos Robson Zuccolotto
Contador, tem pós-doutorado em Administra-
financeiros. É, pois, objetivo deste trabalho propor um roteiro ção Pública e Governo pela Fundação Getúlio
de reconhecimento para os Cepacs, tendo por fundamento as Vargas de São Paulo (Eaesp-FGV), doutorado
em Controladoria e Contabilidade pela Facul-
International Public Sector Accounting Stardard. Em face desse dade de Economia, Administração e Contabi-
objetivo, realizou-se pesquisa de cunho qualitativo na qual lidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP)
e é professor do Departamento de Ciências
se lançou mão da pesquisa documental. Dentre as principais Contábeis da Universidade Federal do Espíri-
conclusões, destacam-se que: o Cepac não é nem instrumento to Santo (Ufes).
E-mail: robsonzuccolotto@gmail.com
patrimonial, nem instrumento financeiro, uma vez que, com
exceção das empresas estatais, as demais entidades públicas Diones Gomes da Rocha
não possuem instrumentos patrimoniais, pois o patrimônio Contador e doutor em Administração Pública
e Governo pela Fundação Getúlio Vargas de
público é indivisível; o Cepac deve ser contabilizado como São Paulo – Eaesp-FGV, é mestre em Conta-
Estoque e deve ser mensurado pelo seu custo de emissão, a bilidade pela Universidade de Brasília - UnB;
Auditor de Controle Externos no Tribunal de
não ser quando esse custo for irrisório e, neste caso, deverá Contas da União (TCU).
prevalecer a avaliação pelo valor justo. E-mail: dionesgr222@hotmail.com

2068 – Recebido em 30/4/2018. Distribuído em 2/5/2018. Pedido de revisão em 25/6/2018.


Resubmetido pelo autor em 3/7/2018. Aprovado em 25/7/2018, na terceira rodada, por dois
membros do Conselho Editorial. Publicado na edição setembro-outubro de 2018. Organiza-
ção responsável pelo periódico: Conselho Federal de Contabilidade.

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Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepac):
52 o que são e como contabilizar

1. Introdução número de pequenas firmas são in- têm se valido de parcerias com a ini-
capazes de afetar o preço de mer- ciativa privada e têm desenvolvido
É frequente ouvir a tese de que cado – e de informação perfeita modelos de negócios para captação
o setor privado é mais eficiente do da parte dos agentes econômicos de recursos que utilizem os merca-
que o governo e de que, portanto, (GIAMBIAGI; ALÉM, 2011). dos e sua eficiência para garantir a
uma economia em que as firmas Essa, no entanto, é uma visão prestação de serviços públicos e o
operem livremente funciona me- idealizada no sistema de mercado. desenvolvimento de infraestrutura.
lhor do que uma economia com for- Na realidade, existem algumas cir- Esse é o caso do Certificado de
te atuação governamental. cunstâncias conhecidas como ‘fa- Potencial Adicional de Construção
No entanto, de acordo com a lhas de mercado, que impedem (Cepac), que é uma alternativa do
teoria tradicional do Welfare Eco- que ocorra uma situação de ótimo município para captação de recur-
nomics, sob certas condições, os de Pareto. De acordo com Giam- sos a serem aplicados em investi-
mercados competitivos geram biagi e Além (2011), tais circuns- mentos públicos de revitalização
uma alocação de recursos que se tâncias são representadas por: (i) ou reestruturação de determina-
caracteriza pelo fato de que é im- a existência de bens públicos, (ii) da área da cidade. Os investidores
possível promover uma realocação a falha de competição que se re- privados, fornecedores dos recur-
desses recursos de tal forma que flete na existência de monopólios sos, recebem em contrapartida, os
um indivíduo aumente seu grau naturais, (iii) as externalidades, (iv) direitos adicionais de construção,
de satisfação, sem que, ao mes- os mercados incompletos, (v) as fa- representados pelo certificado, e
mo tempo, isso esteja associado lhas de informação e (vi) a ocorrên- estruturado e delimitado na lei es-
a uma piora da situação de algum cia de desemprego e inflação. pecífica que instituir as operações
outro indivíduo. Essa alocação de Deixando de lado questões po- urbanas consorciadas.
recursos, que tem a propriedade líticas e ideológicas, a existência do Por ser algo novo na estrutura
de que ninguém pode melhorar governo é necessária para guiar, administrativa brasileira, a conta-
sua situação sem causar prejuízos corrigir e complementar o siste- bilização dos Cepacs vem gerando
a outros agentes econômicos, é ma de mercado, que, sozinho, não diversas confusões conceituais de
denominada pela literatura como é capaz de desempenhar todas as classificação e contabilização, seja
‘ótimo de Pareto’. funções econômicas. Nesse senti- como ativo, como receita ou como
Paralelamente a esse conceito, do, o governo intervém no merca- patrimônio líquido. Além disso, re-
a teoria Econômica tradicional en- do por meio de suas políticas eco- manesce a importância de se de-
sina que, para existir uma alocação nômica, monetária e fiscal. finir se esse título possui, ou não,
‘Pareto eficiente’ de recursos, não No que tange à política fiscal, características de instrumentos fi-
é necessário que exista a figura de as ações do Governo abrangem três nanceiros e se como tal deve ser
um ‘planejador central’, já que a funções básicas: (i) a função distri- tratado.
livre concorrência, com as forças butiva, (ii) a função alocativa; e (iii) Tem-se, desta forma, como ob-
operando em um mercado compe- a função estabilizadora. Para cum- jetivo principal propor um roteiro
titivo e procurando maximizar seus prir essas funções, o governo se que permita o reconhecimento do
lucros, permitiria atingir esse ideal vale de tributos, que incidirão so- Cepac, dadas as suas peculiarida-
de máxima eficiência. bre a renda e sobre os bens das des, de acordo com as Ipsas.
A ocorrência dessa situação pessoas ou empresas.
ótima, entretanto, de- Um dos problemas da
pende de alguns pres- modernidade é o au- 2. Metodologia
supostos: (i) não exis- mento das despesas
tência de progresso públicas e a impossi- Trata-se de pesquisa qualitati-
técnico; e, (ii) o fun- bilidade dos gover- va, que, na taxionomia apresentada
cionamento do mo- nos de aumentar tri- por Vergara (2013), pode ser clas-
delo de concorrência butos, dado o desgaste sificada quanto aos seus fins e aos
perfeita, o que impli- político criado e, até seus meios. Quanto aos fins, pode-
ca a existência de um mesmo, do esgota- se classificar a pesquisa como ex-
mercado atomizado mento de alguns mo- ploratória e descritiva: Exploratória,
– em que as decisões delos tributários. por basicamente inexistir conheci-
quanto à quantidade Nesse sentido, os mento acumulado e sistematizado
produzida de grande governos modernos sobre o tema estudado; Descritiva,

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 53

por expor e descrever as caracterís- to ambiental delas decorrente, ou a emissão de prospecto, conten-
ticas do Cepac com fins a formular a regularização de construções, re- do os dados básicos da operação
um método ou modelo de reconhe- formas ou ampliações executadas e a quantidade de Cepac para alie-
cimento contábil. em desacordo com a legislação vi- nação. O município, em conjunto
Quanto aos meios, trata-se de gente. Ou seja, criam-se direitos de com a instituição líder da distribui-
pesquisa documental. Nesse tipo construir ou utilizar imóveis acima ção (geralmente um banco comer-
de pesquisa, os documentos, tais dos padrões previstos pela legisla- cial) poderá requerer o registro de
como leis, decretos, pronuncia- ção vigente de uso e ocupação do distribuição pública para realização
mentos de órgãos reguladores, en- solo ou regularizar obras em desa- de leilão dos Cepacs.
tre outros, relacionados ao objeto cordo com esses padrões. Esses di- Um ponto central a ser obser-
de estudo, tornam-se as principais reitos são chamados de direitos adi- vado é que os Cepacs não geram
fontes de investigação para a reali- cionais de construção. direito de crédito e nem de partici-
zação da pesquisa. Os municípios, ao criarem esses pação contra o município emissor.
direitos, os concedem aos interessa- Geram tão somente o direito ine-
dos mediante o pagamento de uma rente ao certificado, que pode ser
3. Desenvolvimento do tema contraprestação, representada pela repassado ou utilizado dentro das
aquisição de um certificado: o Cer- condições do plano que o criou. Ou
3.1 Certificados de Potencial tificado de Potencial Adicional da seja, não são nem títulos de dívida
Adicional de Construção (Cepac) Construção, ou Cepac. (instrumentos financeiros) e nem de
Os Certificados de Potencial Assim, a emissão de Cepac é capital (instrumentos patrimoniais).
Adicional de Construção estão pre- uma alternativa do município para Os Cepacs são valores mobiliários
vistos na Lei n.º 10.257 (BRASIL, captação de recursos a serem apli- específicos.
2001), também conhecida como es- cados em investimentos públicos Existem algumas particularida-
tatuto das cidades, a qual estabele- de revitalização ou reestruturação des dos Cepacs que precisam ser
ce diretrizes gerais da política urba- de determinada área da cidade. Os destacadas: (i) os títulos podem
na. O referido estatuto dispõe sobre investidores privados, fornecedo- ser emitidos e guardados para ven-
a possibilidade de lei municipal es- res dos recursos, recebem, em con- da futura, podendo não haver pra-
pecífica delimitar área para aplica- trapartida, os direitos adicionais de zo específico e/ou obrigatório para
ção de operações urbanas consor- construção, representados pelo cer- que a venda ocorra; (ii) não há a
ciadas, estabelecendo que: tificado e estruturados e delimita- obrigatoriedade de venda pelo va-
dos na lei específica que instituir as lor de face do título, ocorrendo a
[...] considera-se operação urbana operações urbanas consorciadas. venda abaixo deste valor quando
consorciada o conjunto de interven- Como os Cepacs são, normal- não estão atrativos para o merca-
ções e medidas coordenadas pelo Po- mente, ofertados publicamente, a do; e (iii) como outros títulos de va-
der Público municipal, com a partici- Comissão de Valores Mobiliários lores mobiliários, podem ser cota-
pação dos proprietários, moradores, (CVM) decidiu, de forma colegia- dos em mercados abertos, havendo
usuários permanentes e investidores da, no ano de 2003, que, quando variações periódicas de seus preços
privados, com o objetivo de alcançar ofertados publicamente, os Cepa- (valor de mercado).
em uma área transformações urba- cs são caracterizados como valores Nesse sentido, dadas as diversas
nísticas estruturais, melhorias sociais mobiliários e, portanto, sujeitos à possibilidades existentes na emis-
e a valorização ambiental (Art. 32, § regulamentação e à fiscalização são do título, dado que os entes
1º) (BRASIL, 2001). da autarquia. Nesse sentido, nesse subnacionais já os vêm utilizando
mesmo ano, em 29 de dezembro, a alguns anos e dada a ausência de
O § 2º da lei supracitada esta- a CVM editou a instrução CVM n.º regulação contábil nacional sobre o
belece ainda que, nas operações 401, para regulamentar os regis- tema, diversos problemas conceitu-
urbanas consorciadas, poderão ser tros de negociação e de distribui- ais e práticos são apresentados, a
previstas como forma de atrair in- ção dos Cepacs. saber: quando da sua emissão, os
vestimentos privados, entre outras De acordo com a Comissão de Cepacs são caracterizados como
medidas, a modificação de índices Valores Mobiliários (CVM, 2003), ativos? Em caso positivo, como de-
e características de parcelamento, nenhum Cepac pode ser distribuí- vem ser reconhecidos e mensura-
uso e ocupação do solo e subso- do no mercado sem prévio registro dos? Como tratar as variações no
lo, bem como alterações das nor- na CVM da operação a que estiver preço do título? Como tratar con-
mas edilícias, considerado o impac- vinculado. Além disso, deve haver tabilmente o Cepac quando o seu

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Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepac):
54 o que são e como contabilizar

“ Quando uma entidade decide pela fabricação de


uma mercadoria, ela espera que, no futuro, consiga
vender o respectivo bem, de modo a assegurar
um resultado positivo, a fim de cobrir os gastos
dispendidos no processo de fabricação.

titular exercer seu direito de poten- vos que são usados para gerar flu- de ativo contingente, o qual é um
cial adicional de construção? xos de caixa líquidos positivos são ativo possível que resulta de even-
Para responder a essas dúvidas, geralmente descritos como aqueles tos passados e cuja existência será
precisa-se, inicialmente, retomar o que contêm “benefícios econômi- confirmada apenas pela ocorrência,
conceito de ativo e os critérios para cos futuros”. Para abranger todos ou não, de um ou mais eventos fu-
seu reconhecimento e mensuração. os propósitos nos quais os ativos turos incertos não totalmente sob
podem se encaixar, a norma usa o controle da entidade.
3.2 O Cepac e o conceito de termo “benefícios econômicos futu- Todavia, o Cepac não corres-
ativos ros ou potencial de serviços” para ponde, no ato de sua emissão, ao
A IPSAS 1 – Apresentação das descrever as características essen- conceito de ativo contingente. Para
Demonstrações Contábeis (INTER- ciais dos ativos. confirmar a assertiva anterior, pas-
NATIONAL FEDERATION OF ACCOU- Assim, quando os governos sub- sa-se à comparação da emissão do
NTANTS, 2015a), em seu item 7, es- nacionais elaboram novos projetos Cepac com a fabricação de uma
tabelece que ativos: de urbanização e apoiam o desen- mercadoria, guardadas as devidas
volvimento com a captação de re- proporções.
[...] são recursos controlados por cursos com Cepac, a emissão do Quando uma entidade decide
uma entidade em consequência de referido título caracteriza, em um pela fabricação de uma mercadoria,
eventos passados e dos quais se es- primeiro momento, a formação de ela espera que, no futuro, consiga
pera que resultem fluxos de bene- um ativo, uma vez que o Cepac é vender o respectivo bem, de modo
fícios econômicos futuros ou po- um recurso controlado por uma en- a assegurar um resultado positivo, a
tencial de serviços para a entidade. tidade em consequência de eventos fim de cobrir os gastos dispendidos
(tradução livre) passados (o projeto foi elaborado) no processo de fabricação. Pode
e dos quais se espera que resultem não ocorrer a venda? Pode, por vá-
O item 11 da supracitada norma fluxos de benefícios econômicos fu- rios motivos. Pode ocorrer a venda
estabelece que benefícios econômi- turos ou potencial de serviços para a prazo e não haver pagamento?
cos futuros ou potencial de serviços a entidade (espera-se tanto a entra- Também, pode. Pode, durante o iní-
compreendem os ativos que forne- da de recursos quanto à geração de cio das vendas, ser a entidade impe-
cem meios para que as entidades serviços urbanos potenciais). dida de comercializar a mercadoria
atinjam seus objetivos. Ativos que Entretanto, há inúmeras incer- por não ter atendido às exigências
são usados para entregar merca- tezas com relação ao título emiti- de órgãos reguladores? A resposta
dorias e serviços de acordo com os do, como, por exemplo: (i) haverá novamente é: pode.
objetivos da entidade, mas que não compradores, (ii) o projeto desper- Observa-se que, apesar das
geram diretamente fluxos de caixa tará interesse da sociedade, (iii) to- respostas afirmativas para as per-
líquidos positivos, são geralmente das as exigências dos órgãos regu- guntas anteriormente apresenta-
descritos como aqueles que pos- ladores serão atendidas, etc. Essas das, uma mercadoria é reconheci-
suem “potencial de serviços”. Ati- incertezas nos remetem ao conceito da como “ativo” no momento que

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 55

acaba o seu processo produtivo e, mobiliários, geralmente, represen- b) na forma de materiais ou su-
não, no momento que é vendida ou tam instrumentos patrimoniais ou primentos a serem consumidos
quando ocorrer o pagamento. Isto instrumentos financeiros. ou utilizados na prestação de
decorre, pois, em razão de a mer- De acordo com a IPSAS 28 – serviços;
cadoria ser um recurso controlado Instrumentos Financeiros: Apresen- c) mantidos para venda ou dis-
pela entidade (foi fabricada ou ad- tação – (INTERNATIONAL FEDERA- tribuição no curso normal das
quirida por ela e a entidade tem, TION OF ACCOUNTANTS, 2015b), operações; ou
em tese, total controle sobre ela), um instrumento patrimonial “é d) no processo de produção para
derivado de um evento passado (a qualquer contrato que evidencia venda ou distribuição.
fabricação ou a aquisição) e do qual uma participação residual [..]” (tra-
se espera fluxo futuro de benefícios dução livre) nos ativos líquidos de Ainda de acordo com a supraci-
econômicos ou potencial de servi- uma entidade. À sua vez, um ins- tada norma, os estoques no setor
ços (a expectativa é de que ocorra trumento financeiro “é qualquer público podem incluir, entre ou-
a venda). Este raciocínio é também contrato que dê origem a um ati- tros exemplos possíveis, “estoques
aplicável ao Cepac. vo financeiro para uma entidade e de moeda não emitida” (tradução
No momento que ocorre a emis- a um passivo financeiro ou instru- livre). A IPSAS 12 destaca que os
são do título, um ente público pas- mento patrimonial para outra en- entes públicos podem possuir di-
sa a ter um recurso que ele controla tidade.” (tradução livre). reitos para criar e emitir ativos, tais
(podendo decidir quando, como e O Cepac não é nem instrumen- como selos, moedas e outros títu-
para quem comercializar), oriundo to patrimonial, nem instrumento los, e que tais itens devem ser re-
de evento passado (o processo de financeiro, de acordo com os con- conhecidos como ativo e tratados
elaboração do projeto de urbaniza- ceitos anteriormente apresentados. como estoques.
ção relacionado com o título) e do Ademais, segundo Suzart (2014), Segundo a Ipsas 12 (INTERNA-
qual se espera a fruição futura de com exceção das empresas esta- TIONAL FEDERATION OF ACCOUN-
benefícios econômicos ou potencial tais, as demais entidades públicas TANTS, 2015a), os estoques devem
de serviços (os títulos poderão ser não possuem instrumentos patri- ser mensurados pelo menor valor en-
vendidos ou utilizados como meio moniais, pois o patrimônio públi- tre o custo e o valor realizável líqui-
de pagamento pela aquisição de co é indivisível. Assim, o Cepac não do, dos dois o menor. O custo com-
bens ou serviços). atende a tal conceito, pois o título preende todos os gastos realizados
Outro ponto importante a ser não gera nenhuma obrigação (pas- para a aquisição ou transformação
observado no que se refere à conta- sivo financeiro) para o ente público e outros, incorridos para trazer os
bilização do Cepac, ainda relaciona- em relação ao seu adquirente. As- estoques à sua condição e localiza-
do ao conceito de ativo, diz respei- sim, o Cepac, também, não pode ção atuais. O valor realizável líquido
to à mensuração. Se um ativo não ser classificado como um instru- é aquele estimado de venda (em con-
puder ser mensurado, ele não deve mento financeiro. dições normais), menos os custos es-
ser reconhecido. No caso do Cepac, Na prática, o Cepac represen- timados para conclusão (se aplicável)
quando da elaboração do projeto, ta uma moeda fiduciária, ou seja, é e para a venda, troca ou distribuição.
deve-se estimar, por meio de mo- um título não lastreado a nenhum Observa-se que, em relação aos
delos de valuation, o valor de ven- metal precioso e que não possui va- Cepacs, os títulos devem ser men-
da do título. lor intrínseco. O valor do Cepac de- surados pelo seu custo de emissão
Percebe-se, assim, que o Cepac corre da confiança que os adquiren- que, em condições normais, será
atende ao conceito de ativo estabe- tes têm em relação ao ente público menor do que o valor de venda lí-
lecido nas Ipsas e sua mensuração emissor. Essa característica do título quido (valor bruto deduzidos dos
pode ser realizada por modelos ma- é fundamental para a classificação custos) dos respectivos títulos. No
temáticos e estatísticos. Como se do Cepac, enquanto ativo. momento que ocorrer a venda do
observa, não há impedimentos para De acordo com a IPSAS 12 – Es- título, o valor registrado no estoque
que se caracterize o Cepac como um toque (INTERNATIONAL FEDERA- passa a ser reconhecido como des-
ativo da entidade pública. Mas que TION OF ACCOUNTANTS, 2015a), pesa do período que houver o reco-
tipo de ativo seria o Cepac? estoques são ativos (tradução livre): nhecimento da receita. Pode haver,
Para a CVM, os Cepacs são valo- também, o reconhecimento de des-
res mobiliários específicos (COMIS- a) na forma de materiais ou supri- pesa quando for identificado que o
SÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS, mentos a serem consumidos no custo do estoque não poderá ser re-
2003). À luz das Ipsas, os valores processo de produção; cuperado.

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Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepac):
56 o que são e como contabilizar

De acordo, ainda, com a IPSAS um ou mais eventos futuros in- presente (legal ou não formalizada)
12 (INTERNATIONAL FEDERATION certos não totalmente sob con- derivada de evento passado; (ii) sa-
OF ACCOUNTANTS, 2015a), os Ce- trole da entidade; ou ída provável de recursos que incor-
pacs só poderiam ser avaliados pelo b) uma obrigação presente que re- porem benefícios econômicos ou
valor justo na data de aquisição, sulta de eventos passados, mas potencial de serviços; e (iii) estima-
mas se, e somente se, o respectivo que não é reconhecida porque: tiva confiável.
custo de emissão for irrisório. Além i) não é provável que uma saí- Existe uma obrigação presente
desse uso, a referida norma descre- da de recursos que incorpo- para uma entidade quando da apre-
ve que nas demonstrações contá- ram benefícios econômicos sentação das demonstrações con-
beis, o ente público deve evidenciar, ou potencial de serviços seja tábeis e essa entidade não tem ne-
em notas explicativas, o valor con- exigida para liquidar a obri- nhuma outra opção senão quitar tal
tábil de estoques pelo valor justos, gação; ou obrigação, futuramente. A obrigação
menos os custos de venda. i) o valor da obrigação não pode decorrer de contratos ou da le-
Por fim, destaque-se que o Ce- pode ser mensurado com gislação (denominada de legal) ou de
pac pode ser utilizado como meio suficiente confiabilidade.. práticas costumeiras da entidade (de-
de pagamento, sendo entregue aos nominada de não formalizada).
credores de um ente público como De acordo com o que foi abor- A obrigação presente não pode
forma de quitar suas obrigações. dado nos itens anteriores, o Cepac depender da ocorrência de even-
Para esse uso, o Cepac passa a ser não pode ser considerado como tos futuros. Desse modo, a obriga-
tratado como um item do caixa, sendo um instrumento financeiro, ção presente é sempre criada por
pois representa um numerário em pois ele não gera obrigação pecu- um evento passado, o qual elimina
espécie (o Cepac é uma moeda fi- niária para o emissor em relação as demais alternativas da entidade,
duciária). Nessa situação, deve ser ao adquirente do título. Observa-se restando apenas a alternativa de
mensurado pelo seu valor justo. que, da relação entre adquirente e quitação futura da obrigação.
emissor, não há que se falar de re- Segundo a IPSAS 19 (INTERNA-
3.3 O Cepac e o conceito de conhecimento de passivo, pois não TIONAL FEDERATION OF ACCOUN-
passivos existe uma obrigação presente para TANTS, 2015a), além de verificar
Para a compreensão da con- o ente público. a existência de uma obrigação
tabilização do Cepac, também é A Lei n.º 10.257 (BRASIL, 2001) presente, o reconhecimento de
importante definir o conceito de descreve que os Cepacs podem ser um passivo prescinde de que haja
passivo. De acordo com a Ipsas 1 alienados em leilão ou empregados possibilidade de saída de recursos
(INTERNATIONAL FEDERATION OF diretamente no pagamento das que incorporam benefícios econô-
ACCOUNTANTS, 2015a), passivos obras necessárias para a operação micos ou potencial de serviços. E,
são as obrigações presentes da tratada em lei específica. Assim sen- por fim, além dos elementos an-
entidade, derivadas de eventos já do, nota-se que os recursos obtidos teriormente apresentados, o reco-
ocorridos, cujo pagamento se es- em leilão ou o emprego direto dos nhecimento do passivo necessita
pera que resulte em saída de recur- títulos como meio de pagamentos que o seu valor seja estimável de
sos da entidade, os quais são capa- criam um uso restrito para os recur- forma confiável.
zes de gerar benefícios econômicos sos oriundos dos Cepacs. Ainda em relação ao reconheci-
ou potencial de serviços. Além da vinculação existente mento de um passivo, para a IPSAS
Dois outros conceitos são igual- para o uso dos recursos oriundos 19 (INTERNATIONAL FEDERATION
mente importantes: (i) provisão; e dos Cepacs, o ente público possui OF ACCOUNTANTS, 2015a), a identi-
(ii) passivo contingente. Segundo a o dever de realizar uma operação ficação da outra parte da obrigação
Ipsas 19 (INTERNATIONAL FEDERA- urbana consorciada. Mas esse de- não é necessária. Uma obrigação de
TION OF ACCOUNTANTS, 2015a), a ver atende aos requisitos necessá- um ente público pode ter como par-
provisão é um passivo de prazo e/ rios para ser classificado como pas- te interessada o público em geral.
ou valor incerto. À sua vez, o pas- sivo efetivo (passivo ou provisão) Diante dos conceitos e das par-
sivo contingente é (tradução livre): ou contingente? ticularidades apresentadas, veri-
De acordo com as Ipsas 1 e 19 fica-se que o dever criado pela lei
a) uma obrigação possível que re- (INTERNATIONAL FEDERATION OF específica de determinados títulos
sulta de eventos passados e cuja ACCOUNTANTS, 2015a), os con- Cepacs pode ser considerado como
existência será confirmada ape- ceitos-chave para o reconhecimen- fato gerador da obrigação, do pon-
nas pela ocorrência ou não de to de um passivo são: (i) obrigação to de vista contábil. A classificação

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do passivo em presente (passivo ou definido, a obrigação será de lon- em sua proposta orçamentária para
provisão) ou futuro (contingente) go prazo. Ressalta-se que a Ipsas o exercício de 20x1. Destaca-se que a
dependerá das condições estabele- 19 (INTERNATIONAL FEDERATION revitalização estava prevista no Plano
cidas pela lei criadora da operação OF ACCOUNTANTS, 2015a) descre- Plurianual e na Lei de Diretrizes Or-
urbana consorciada e dos Cepacs. ve que, quando o prazo for incerto, çamentárias do Município, anterior-
Quando as condições estabe- deve ser reconhecida uma provisão. mente aprovados. O orçamento foi
lecidas exigirem a ocorrência de aprovado em dezembro de 20x0.
eventos futuros para o surgimen- 3.4 Proposta de contabilização No exercício de 20x1, a Prefei-
to da obrigação, ou não, é possí- do Cepac tura do Município X resolve emitir
vel a mensuração com suficiente Nesta seção, tratar-se-á da for- os títulos Cepacs, de acordo com a
confiabilidade. Nesse caso, a emis- ma de contabilização dos Cepa- previsão legal. Para tanto, incorre
são dos títulos Cepacs implicará o cs, desde a emissão desses títulos, em gastos de $50 mil, relacionados
surgimento de um passivo contin- passando por sua comercialização com a contratação de instituição fi-
gente. De acordo com a Ipsas 19 e finalizando com a quitação da nanceira que intermediará a emissão
(INTERNATIONAL FEDERATION OF obrigação decorrente da operação dos títulos. A lei que criou a opera-
ACCOUNTANTS, 2015a), os passivos urbana consorciada. Para fins de ção urbana consorciada e os Cepacs
contingentes não devem ser reco- simplificação do exemplo, não se- prevê que os recursos obtidos com
nhecidos nas demonstrações contá- rão apresentadas as etapas de pre- a venda dos títulos devem ser apli-
beis, porém, devem ser evidencia- visão e fixação orçamentária, bem cados durante o exercício de 20x1.
dos em notas explicativas. como os registros realizados para Considerando a emissão dos tí-
Em sentido oposto, se as condi- controles devedores e credores di- tulos com o momento de ocorrên-
ções estabelecidas pela lei criadora versos (com exceção das disponibi- cia do fato gerador para o reco-
não exigem a ocorrência de even- lidades por fonte de recursos). nhecimento do ativo, a Prefeitura
tos futuros, e o valor da obrigação A Prefeitura do Município X pla- do Município X deve realizar a se-
pode ser confiavelmente mensurá- neja realizar a revitalização do bairro guinte contabilização, detalhada
vel, o ente público deverá reconhe- Z. As obras necessárias importarão no Quadro 1:
cer um passivo ou uma provisão. em $1 milhão, porém o município De acordo com o que foi apre-
Se os Cepacs emitidos forem não possui disponibilidade em seu sentado nas seções anteriores, na
utilizados como meio de pagamen- orçamento. Para dar prosseguimen- qualidade de ‘estoque de moeda’,
to, o ente público estará diante de to à revitalização, a Prefeitura do os Cepacs devem ser mensurados
uma obrigação presente e, portan- Município X resolve enviar um pro- pelo menor valor entre o custo e o
to, deverá reconhecer uma provisão jeto de lei à Câmara de Vereadores, valor realizável líquido. Somente é
relacionada com a operação urbana propondo uma operação urbana admitida a mensuração inicial pelo
consorciada, no momento da emis- consorciada e a emissão de títulos valor justo, se o custo de emissão
são dos títulos. Entretanto, se for Cepacs para custear tal operação. for considerado irrisório.
necessário o leilão dos títulos, não No ano de 20x0, o projeto de lei é Assim sendo, os Cepacs foram
deverá ser reconhecida uma provi- aprovado pela Câmara de Vereadores reconhecidos pelo custo de emissão,
são no momento da emissão des- do Município X. Após a aprovação, a visto que esse valor não foi irrisório.
ses títulos, pois o ente público esta- prefeitura adiciona as receitas oriun- Nesse momento, o ente público não
rá diante de uma obrigação futura das da venda de Cepacs e as despe- possui, ainda, uma obrigação pre-
(um passivo contingente), que se sas relacionadas com a revitalização sente, mas, sim, uma obrigação fu-
converterá em obrigação presente
no momento da venda do título.
Quando for reconhecida uma Quadro 1 – Reconhecimento do ativo pela emissão dos Cepacs
provisão, essa obrigação poderá (a) Reconhecimento do Ativo
ser de curto e/ou de longo prazo. D 1.1.5.x.x.xx.xx – Títulos Cepacs Disponível para Venda (P) $ 50.000
C 1.1.1.x.x.xx.xx – Caixa e Equivalentes de Caixa $ 50.000
Caso o ente público tenha que qui-
(b) Execução da Despesa Orçamentária
tar a obrigação nos próximos doze
D 6.2.2.1.3.01.00 – Crédito Empenhado a Liquidar $ 50.000
meses, após o reconhecimento da C 6.2.2.1.3.03.00 – Crédito Empenhado a Liquidado $ 50.000
referida obrigação, ela será uma (c) Movimentação da Disponibilidade por Fonte de Recursos (DDR)
obrigação de curto prazo. Caso o D 8.2.1.1.2.00.00 – DDR Comprometida por Empenho e Não Liquidadas $ 50.000
prazo de quitação seja superior a C 8.2.1.1.4.00.00 – DDR Utilizada por Pagamento Desp. Orçam. e Outros $ 50.000
doze meses ou quando esse seja in- Fonte: elaborado pelos autores

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Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepac):
58 o que são e como contabilizar

tura que dependerá da venda dos tí- se necessária uma observação em Para o controle de tais opera-
tulos para se converter em presente. relação ao passivo contingente. Pela ções, ter-se-iam as seguintes conta-
Desse modo, a Prefeitura do previsão inicial da Prefeitura do Mu- bilizações, conforme detalhamento
Município X, caso fosse divulgar nicípio X, a venda de 60% do seu apresentado no Quadro 3 (destaca-
suas demonstrações contábeis, de- estoque implicaria uma arrecada- se que não será demonstrada a con-
veria evidenciar, em notas explica- ção de $600 mil. Todavia, houve um tabilização da celebração do termo
tivas, um passivo contingente no ágio de $60 mil na respectiva ven- de cooperação, pois não é o princi-
montante de $1 milhão, que é o da, o que pode afetar a parcela que pal objeto em análise).
quanto se espera arrecadar com a ainda está disponível para venda e, Destaca-se que o cancelamento
venda do título para ser aplicado na consequentemente, o passivo con- dos títulos Cepacs implicou o desre-
operação urbana consorciada. tingente a ela associada. conhecimento do ativo, porquanto
Seguindo com o exemplo, veri- Caso a Prefeitura do Município X dele não fluirá mais benefícios eco-
ficou-se que, alguns meses após a entenda que houve valorização do nômicos ou potencial de serviços fu-
emissão dos Cepacs, a Prefeitura do título e que se espera que o restan- turos. De igual modo, o ente público
Município X conseguiu vender 60% te do estoque seja vendido em iguais não mais terá a obrigação futura re-
do estoque de títulos, obtendo o condições à primeira parcela, o novo lacionada com a venda do título. Por
valor $660 mil na operação. O re- valor do passivo contingente a ser isso deixa de existir o passivo con-
gistro dessa operação implicaria as evidenciado seria de $440 mil. Caso tingente. Conforme destacado an-
contabilizações, conforme detalha- contrário, o passivo contingente res- teriormente, o restante dos recursos
das no Quadro 2. tante importaria em $400 mil, consi- foi obtido em um termo de coopera-
A venda de títulos Cepacs consti- derando-se as condições anteriores. ção com o governo estadual.
tui-se em fato gerador para o registro Continuando o exemplo, desta- Ainda em relação ao cancela-
de algumas transações contábeis. A ca-se que, após alguns meses de ten- mento, ressalta-se que a contra-
primeira delas se relaciona com o re- tativas frustradas de venda da par- partida é uma Variação Patrimonial
conhecimento da variação patrimo- cela restante de Cepacs, a Prefeitura Diminutiva (VPD) diferente da uti-
nial aumentativa (VPA) e com a exe- do Município X celebrou um termo lizada na apropriação dos custos
cução da receita orçamentária (com de cooperação com a Governadoria com a emissão dos títulos, no mo-
a respectiva movimentação da DDR). do Estado W para obter recursos. mento da venda dos Cepacs. Além
A segunda, pelo reconhecimento da Por isso, também decidiu cancelar de as VPDs possuírem naturezas di-
variação patrimonial diminutiva asso- o restante dos títulos Cepacs. vergentes, o que já justifica a ado-
ciada ao custo dos títulos. E a últi-
ma, pela transformação da obrigação
Quadro 2 – Contabilizações oriundas da venda dos Cepacs
contingente em obrigação presente,
(a.1) Reconhecimento da Variação Patrimonial Aumentativa
com o uso de uma conta de provisão,
D 1.1.1.x.x.xx.xx – Caixa e Equivalentes de Caixa $ 660.000
visto que, ainda, não há possibilidade C 4.3.1.x.x.xx.xx – Venda de Títulos Cepacs $ 660.000
de se segregar as obrigações em suas (a.2) Execução da Receita Orçamentária
naturezas definitivas. D 6.2.1.1.0.00.00 – Receita a Realizar $ 660.000
Observa-se que a conversão do C 6.2.1.2.0.00.00 – Receita Realizada $ 660.000
passivo contingente em provisão ou (a.3) Movimentação da Disponibilidade por Fonte de Recursos (DDR)
passivo, conforme foi discutido an- D 7.2.1.1.1.00.00 – Disponibilidade de Recursos $ 660.000
C 8.2.1.1.1.00.00 – Disponibilidade por Destinação de Recursos a Utilizar $ 660.000
teriormente, dependerá das condi-
(b) Reconhecimento da Variação Patrimonial Diminutiva
ções estabelecidas pela lei criadora
D 3.8.x.x.x.xx.xx – Custos dos Títulos Cepacs $ 30.000
dos Cepacs e da operação urbana C 1.1.5.x.x.xx.xx – Títulos Cepacs Disponível para Venda (P) $ 30.000
consorciada. No caso em análise, a (c) Reconhecimento da Provisão
referida lei especificou claramente D 3.9.7.x.x.xx.xx – VPD de Provisão para Operações Urbanas Consorciadas $ 660.000
o prazo e a destinação dos recur- C 2.1.7.x.x.xx.xx – Provisão para Operações Urbanas Consorciadas $ 660.000
sos arrecadados com a venda dos Fonte: elaborado pelos autores

referidos títulos, o que propiciou a


identificação da mudança de uma Quadro 3 – Cancelamento dos títulos Cepacs
parcela do passivo, de contingente (a) Desreconhecimento do Ativo
para uma obrigação presente. D 3.6.5.0.1.01.00 – Desincorporação de Ativos $ 20.000
Em relação às contabilizações C 1.1.5.x.x.xx.xx – Títulos Cepacs Disponível para Venda (P) $ 20.000
anteriormente demonstradas, faz- Fonte: elaborado pelos autores

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ção de diferentes VPDs, a separação Quadro 4 – Reconhecimento e pagamento da obrigação definitiva


permite o acompanhamento do re-
relacionada com a operação urbana consorciada
sultado líquido da comercialização
(a.1) Constituição do Passivo Definitivo (no caso de aquisição de serviços)
dos Cepacs, para fins gerenciais. D 3.x.x.x.x.xx.xx – VPD com Serviços Prestados. $ 250.000
Na continuação do exemplo, C 2.1.3.1.1.xx.xx – Fornecedores Nacionais a Curto Prazo (P) $ 250.000
destaca-se que a Prefeitura do Mu- (a.2) Constituição do Passivo Definitivo (no caso de aquisição de bens)
nicípio X, após concluir a licitação e D 1.2.x.x.x.xx.xx – Ativo Não Circulante $ 250.000
a contratação da primeira etapa da C 2.1.3.1.1.xx.xx – Fornecedores e Contas a Pagar Nacionais a Curto Prazo $ 250.000
operação urbana consorciada, pre- (b.1) Reversão da Provisão (se a apropriação da provisão ocorrer no mesmo exercício)

para-se para realizar o pagamento D 2.1.7.x.x.xx.xx – Provisão para Operações Urbanas Consorciadas $ 250.000
C 3.9.7.x.x.xx.xx – VPD de Provisão para Operações Urbanas Consorciadas $ 250.000
da medição da obra à Empresa A,
(b.2) Reversão da Provisão (se a apropriação da provisão ocorrer em exercício anterior)
no valor de $250.000. As contabi-
D 2.1.7.x.x.xx.xx – Provisão para Operações Urbanas Consorciadas $ 250.000
lizações necessárias relacionadas a C 4.9.7.1.x.xx.xx – VPA de Reversão de Provisões $ 250.000
essa operação encontram-se deta- (c.1) Execução da Despesa Orçamentária – Empenho (inclui movimentação de DDR)
lhadas no Quadro 4. D 2.1.3.1.1.xx.xx – Fornecedores Nacionais a Curto Prazo (P) $ 250.000
Como se observa no Quadro 4, C 2.1.3.1.1.xx.xx – Fornecedores Nacionais a Curto Prazo (F) $ 250.000
os primeiros passos compreendem D 6.2.1.1.1.00.00 – Crédito Disponível $ 250.000
a constituição do novo passivo e a C 6.2.2.1.3.01.00 – Crédito Empenhado a Liquidar $ 250.000
D 8.2.1.1.1.00.00 – Disponibilidade por Destinação de Recursos a Utilizar $ 250.000
reversão da provisão anteriormente
C 8.2.1.1.2.00.00 – DDR Comprometida por Empeno e Não Liquidadas $ 250.000
constituída. A constituição do novo
(c.2) Execução da Despesa Orçamentária – Liquidação (inclui movimentação de DDR)
passivo permite a identificação da D 6.2.2.1.3.01.00 – Crédito Empenhado a Liquidar $ 250.000
natureza mais adequada de VPD ou C 6.2.2.1.3.03.00 – Crédito Empenhado a Liquidado a Pagar $ 250.000
o reconhecimento de um ativo. A C 8.2.1.1.2.00.00 – DDR Comprometida por Empeno e Não Liquidadas $ 250.000
reversão decorre da baixa do valor C 8.2.1.1.3.00.00 – DDR Comprometida p/ Liqu. e Ent. Comp. Não Pagas $ 250.000
anteriormente provisionado e per- (c.3) Execução da Despesa Orçamentária – Pagamento (inclui movimentação de DDR)
mite a reclassificação da VPD para D 2.1.3.1.1.xx.xx – Fornecedores Nacionais a Curto Prazo (F) $ 250.000
uma natureza específica ou o reco- C 1.1.1.x.x.xx.xx – Caixa e Equivalentes de Caixa $ 250.000
D 6.2.2.1.3.03.00 – Crédito Empenhado Liquidado a Pagar $ 250.000
nhecimento de um ativo.
C 6.2.2.1.3.04.00 – Crédito Empenhado Liquidado Pago $ 250.000
Um especial destaque para a re-
D 8.2.1.1.3.00.00 – DDR Comprometida p/ Liqu. e Ent. Comp. Não Pagas $ 250.000
versão da provisão: (i) se ocorrer no C 8.2.1.1.4.00.00 – DDR Utilizadas por Pgto. Desp. Orçamentárias. e Outros $ 250.000
mesmo exercício de constituição des- Fonte: elaborado pelos autores
sa, será feito pelo estorno do lança-
mento de apropriação da provisão; e
(ii) senão, implicará a apropriação de Quadro 5 – Reconhecimento do ativo pela emissão dos Cepacs –
uma VPA. Já as etapas de execução meio de pagamento
da despesa orçamentária, ocorrem (a) Reconhecimento do Ativo
como as das demais despesas. D 1.1.1.x.x.xx.xx – Títulos Cepacs Disponível para Pagamento (F) $ 1.000.000
Para a finalização do exemplo, C 4.3.1.x.x.xx.xx – Emissão de Títulos Cepacs $ 1.000.000

será demonstrado o reconhecimen- (b) Execução da Receita Orçamentária (inclui movimentação de DDR)
D 6.2.1.1.0.00.00 – Receita a Realizar $ 1.000.000
to dos Cepacs como meio de paga-
C 6.2.1.2.0.00.00 – Receita Realizada $ 1.000.000
mento (os títulos não são leiloa-
D 7.2.1.1.1.00.00 – Disponibilidade de Recursos $ 1.000.000
dos, mas entregue diretamente aos C 8.2.1.1.1.00.00 – Disponibilidade por Destinação de Recursos a Utilizar $ 1.000.000
credores municipais). Partindo do (c) Reconhecimento da Variação Patrimonial Diminutiva
contexto original do exemplo, su- D 3.8.x.x.x.xx.xx – Custos dos Títulos Cepacs $ 50.000
ponha-se que em vez de promover C 1.1.1.x.x.xx.xx – Caixa e Equivalentes de Caixa $ 50.000
o leilão, a Prefeitura do Município (d) Execução da Despesa Orçamentária (inclui movimentação de DDR)
X resolveu utilizar os Cepacs como D 6.2.2.1.3.01.00 – Crédito Empenhado a Liquidar $ 50.000
C 6.2.2.1.3.03.00 – Crédito Empenhado Liquidado $ 50.000
meio de pagamento. Ter-se-iam,
D 8.2.1.1.2.00.00 – DDR Comprometida por Empenho e Não Liquidadas $ 50.000
neste caso, as seguintes contabili-
C 8.2.1.1.4.00.00 – DDR Utilizada por Pagamento Desp. Orçam. e Outros $ 50.000
zações, detalhadas no Quadro 5. (c) Reconhecimento da Provisão
Observa-se pelo Quadro 5 que, D 3.9.7.x.x.xx.xx – VPD de Provisão para Operações Urbanas Consorciadas $ 1.000.000
quando utilizado diretamente como C 2.1.7.x.x.xx.xx – Provisão para Operações Urbanas Consorciadas $ 1.000.000
meio de pagamento, a contabiliza- Fonte: elaborado pelos autores

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


Certificados de Potencial Adicional de Construção (Cepac):
60 o que são e como contabilizar

ção dos Cepacs quase não dife- O cancelamento no exercício impli- patrimoniais como preveem as Ip-
re da contabilização quando ele é ca o estorno dos lançamentos an- sas, pois, com exceção das empresas
vendido em leilão. Todavia, o mo- teriormente demonstrados. estatais, as demais entidades públi-
mento de registro das operações é O pagamento da operação ur- cas não possuem instrumentos patri-
o que torna a contabilização desses bana consorciada segue os mol- moniais, uma vez que o patrimônio
títulos diferente. des anteriormente apresentados, público é indivisível (SUZART, 2014).
Na utilização dos Cepacs como havendo somente a utilização do Tendo-se demonstrado que o Ce-
meio de pagamento, a receita orça- próprio Cepac para a quitação da pac não preenche os requisitos de
mentária é reconhecida no momen- obrigação, pois, como meio de pa- um título financeiro, nem de um
to de emissão dos títulos, que nes- gamento, é um item do caixa. título patrimonial, entende-se que,
se caso passam a ser tratados como na prática, o Cepac representa uma
itens do caixa e não mais como es- moeda fiduciária, ou seja, é um tí-
toques. Como não são conside- 4. Conclusões tulo não lastreado a nenhum metal
rados estoques, os custos com a precioso e que não possui valor in-
emissão dos Cepacs são apropria- O Cepac é um título novo e pou- trínseco. O seu valor decorre, por-
dos diretamente no resultado do co conhecido na literatura técnica e tanto, da confiança que os adquiren-
exercício como VPD. Todo o mon- acadêmica no âmbito da contabi- tes têm em relação ao ente público
tante relacionado com a operação lidade pública governamental. Por emissor e essa característica do títu-
urbana consorciada é considerado essa razão, têm sido observadas di- lo é fundamental para o reconheci-
como provisão, não existindo mais versas confusões conceituais quan- mento do Cepac como um ativo.
um passivo contingente associado do se pretende classificá-lo e conta- Buscando fundamento nas nor-
à operação. bilizá-lo. Entretanto, inexiste fonte mas contábeis, especialmente na
Cancelamentos são exceções de consulta que possa balizar o cor- Ipsas 12, recomenda-se a classifi-
para o uso dos Cepacs como meio reto reconhecimento e mensuração cação do Cepac como um item do
de pagamento, pois a emissão só desse tipo de ativo. Estoque, uma vez que, de acordo
deve ocorrer quando o ente públi- Em face dessa lacuna, este tra- com a referida norma, os estoques
co possui um acordo com os credo- balho buscou especificamente pro- do setor público podem incluir, en-
res, atuais ou futuros, para quitar por uma metodologia para con- tre outros exemplos possíveis, “es-
suas obrigações mediante entre- tabilização desses títulos, com o toques de moedas não emitidas”.
ga de títulos. Caso o ente público propósito de sanear a lacuna exis- Admitindo-se o Cepac como
opte por cancelar os títulos emiti- tente e de contribuir para o aperfei- um item do Estoque, ele deve ser
dos nessa modalidade, aconselha- çoamento da contabilidade aplica- mensurado pelo seu custo de emis-
se que o cancelamento ocorra no da ao setor público brasileiro. são que, em condições normais, será
mesmo exercício de emissão de tí- Conforme se demonstrou, os menor do que o valor de venda lí-
tulo. E isso para que não afete o Cepacs não podem ser classificados quido. Apenas quando o seu custo
orçamento de exercício posterior. como instrumentos financeiros ou de emissão for irrisório é que esse


O Cepac é um título novo e pouco conhecido
na literatura técnica e acadêmica no âmbito da
contabilidade pública governamental. Por essa razão,
têm sido observadas diversas confusões conceituais
quando se pretende classificá-lo e contabilizá-lo.

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018
REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 61

título pode ser avaliado pelo valor Sendo o Cepac um ativo, con- não exigir a ocorrência de eventos
justo, na data da aquisição. Além tabilizado no estoque pelo custo futuros e o valor da obrigação pu-
disso, no momento que ocorrer a de emissão, não há que se falar em der ser mensurado com confiabilida-
venda do título, o valor registrado obrigação a ser registrada no pas- de, o ente público deverá reconhecer
no estoque passa a ser reconhecido sivo, já que da relação entre adqui- um passivo ou uma provisão.
como despesa do período que hou- rente e emissor, não existe obriga- Em suma, diante do modelo de
ver o reconhecimento da receita. ção presente para o ente público. contabilização proposto, espera-se
Adicionalmente, pode haver o reco- Entretanto, conforme preveem que este trabalho possa contribuir
nhecimento da despesa quando for as Ipsas 1 e 19, o reconhecimen- para dirimir dúvidas práticas e con-
identificado que o custo do estoque to de um passivo, de uma provisão ceituais no mundo da contabilida-
não poderá ser recuperado. ou de um passivo contingente, de- de pública. Além disso, sabe-se que
De outro modo, quando o Ce- penderá daquilo que estiver esta- a implantação de um modelo de
pac for utilizado pelos entes pú- belecido na lei criadora do Cepac. contabilidade pública patrimonial
blicos municipais, como meio de Quando as condições estabelecidas no Brasil tem gerado diversas con-
pagamento, o referido título de- exigirem a ocorrência de eventos fu- trovérsias, mas acredita-se que isso
verá ser tratado como um item de turos para o surgimento da obriga- não deve ser motivo para desânimo
caixa, pois ele representa um nu- ção e, além disso, não for possível a e sim uma oportunidade para aper-
merário em espécie. Nesse caso, mensuração com suficiente confiabi- feiçoarmos nossos sistemas contá-
o Cepac deve ser mensurado pelo lidade, um passivo contingente deve beis e, por consequência, a accoun-
valor justo. ser registrado. Quando a lei criadora tability pública.

5. Referências
BRASIL. Lei n.º 10.257, 10 de julho de 2001. 2001. Disponível em: <https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/LEIS_2001/
L10257.htm>. Acesso em: 20 fev. 2016.

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SUZART, J. A. da S. Características das pesquisas sobre o impacto das informações contábeis nas transações ocorridas nos
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VERGARA, Sylvia Costant. Projetos e Relatórios de Pesquisa em Administração. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2013.

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 63

Evidenciação das práticas de


governança corporativa nas
Instituições de Ensino Superior (IES)
fundacionais catarinenses

O
Enelise Adriana Baller
Bacharel em Ciências Contábeis pela Universi-
presente estudo teve como objetivo identificar dade do Contestado.
as práticas de governança corporativa adotadas E-mail: eneliseballer@hotmail.com

pelas fundações de ensino superior do Estado de


Fernando Maciel Ramos
Santa Catarina. A pesquisa caracteriza-se como descritiva, Doutorando em Ciências Contábeis pela Unisi-
documental e de abordagem quantitativa. Para a coleta dos nos é mestre em Ciências Contábeis pela Furb.
É bacharel em Ciências Contábeis pela Unisul e
dados, foi elaborado um check-list, composto de 19 práticas professor titular da Universidade do Contestado.
de governança corporativa, para apuração do índice de E-mail: framos@unc.br

adoção das práticas analisadas. A amostra foi composta de 27


Ivanir Salete Techio da Silva
instituições de ensino. Os resultados demonstram baixo nível Mestre em Engenharia de Produção pela UFR-
de evidenciação das práticas de governança corporativa. Frente GS é bacharel em Ciências Contábeis pela UnC
e professora titular da Universidade do Con-
ao resultado obtido, conclui-se que é necessário que as IES testado.
funcionais reavaliem a evidenciação das práticas de governança E-mail: ivanir@unc.br

corporativa de modo a proporcionar maior transparência e Sandro Vieira Soares


confiabilidade aos seus stakeholders. Pós-doutorado em Administração pela Uni-
sul e doutor em Controladoria e Contabilida-
de pela USP, é mestre em Contabilidade pela
UFSC. Bacharel em Ciências Contábeis pela
UFSC, é professor substituto no Centro Uni-
versitário Municipal de São José (USJ).
E-mail: sandrovs@usp.br

2101 - Recebido em 28/7/2018. Distribuído em 28/7/2018. Pedido de revisão não houve.


Aprovado em 25/8/2018, na segunda rodada, por dois membros do Conselho Editorial.
Publicado na edição setembro-outubro de 2018. Organização responsável pelo periódico:
Conselho Federal de Contabilidade.

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Evidenciação das práticas de governança corporativa nas Instituições
64 de Ensino Superior (IES) fundacionais catarinenses

1. Introdução dos recursos para prestar um servi- tará em uma maior segurança aos
ço de qualidade (DRUCKER, 1997; seus diferentes usuários e partes
Governança Corporativa, de FALCONER, 1999, TENÓRIO, 1999; interessadas, levando ao fortaleci-
acordo com Slomski et al. (2008), SALAMON, 2005). É neste contexto mento da marca institucional.
é um o sistema pelo qual as enti- que as práticas de governança po- Diante deste contexto e consi-
dades são dirigidas e monitoradas. dem contribuir como instrumento derando que as organizações do
Por meio de mecanismos específi- para a evolução e legitimidade das Terceiro Setor demandam de práti-
cos, gestores e proprietários pro- ações desenvolvidas pelas entida- cas que conduzam ao alcance dos
curam assegurar o bom desempe- des do Terceiro Setor. seus objetivos, mitiguem o distan-
nho da empresa para aumento de Dentro do Terceiro Setor, pode- ciamento entre a instituição e seus
sua riqueza. se destacar o trabalho exercido pe- stakeholders e legitimem as suas
Em decorrência do contínuo las Instituições de Ensino Superior atividades, esse estudo ocupa-se
crescimento das entidades do Ter- (IES) que possuem importante pa- da seguinte questão de pesquisa:
ceiro Setor, nos últimos anos, e do pel social, tendo significativa influ- Quais são as práticas de gover-
aumento da representatividade no ência no contexto político-social, na nança corporativa das Institui-
país, os gestores das organizações formação cultural e na construção ções de Ensino Superior do Ter-
do Terceiro Setor veem a necessida- da cidadania do povo brasileiro. ceiro Setor catarinense? E, para
de de demonstrar resultados aos Neste contexto, a governança surge responder à questão, a pesquisa
seus stakeholders, tais como usu- como mecanismo que visa otimizar tem como objetivo geral identificar
ários, financiadores, colaborado- o desempenho organizacional das as práticas de governança corpora-
res e órgãos fiscalizadores (FARIA; instituições, pois elas vêm apresen- tiva adotadas pelas IES do Terceiro
FONTENELE; ALVES JÚNIOR, 2009). tando, nos últimos anos, proble- Setor do Estado de Santa Catarina.
Nesse sentido, a governança corpo- mas de estrutura organizacional A implementação das práticas
rativa surge com o intuito de har- e déficits operacionais, ganhando de governança corporativa possi-
monizar esta relação. destaque no cenário brasileiro em bilita uma gestão mais criteriosa e
Entretanto, o setor ainda en- função de decorrentes escândalos transparente, buscado maximizar
frenta desafios, como a necessidade envolvendo fraudes em operações os resultados das entidades. Neste
de legitimidade, formalização legal, por membros da administração. sentido, um estudo dos princípios
formas de divulgação e comunica- Casos recentes de escândalos e práticas de governança corporati-
ção das suas atividades à socieda- veiculados na mídia nacional, en- va aplicáveis no Terceiro Setor pode
de, sustentabilidade, captação de volvendo instituições de ensino, fornecer subsídios relevantes no mo-
recursos, profissionalização da ges- demonstram que existem proble- mento da adesão ou reavaliação das
tão; accountability, a prestação de mas inerentes a gestão e fraudes práticas utilizadas pelas entidades,
contas perante a diversidade do pú- nos ambientes dessas entidades e, de modo que a pesquisa pode trazer
blico com interesses e usuários da consequentemente, prejudicam o benefícios no sentido de promover
organização e a utilização eficiente cumprimento dos objetivos insti- informações relevantes às entidades
tucionais na formação de recursos e seus stakeholders. O estudo pode
humanos intelectuais. Nesse con- ser utilizado como fonte de consul-
texto, a adoção de práticas de go- ta por gestores de entidades do Ter-
vernança corporativa pelas institui- ceiro Setor, mais especificamente
ções de ensino poderiam evitar Instituições de Ensino Superior que
ou reduzir os riscos nas possuem interesse na implementa-
falhas de gestão das ção, avaliação e discussão acerca das
organizações, contri- práticas de governança corporativa.
buindo para a sustenta- A pesquisa direcionada às IES
bilidade das instituições. de Santa Catarina permite a iden-
Enquanto a evidenciação tificação das práticas utilizadas
de tais práticas e prestação por este segmento, assim a reali-
de contas nas operações re- zação da pesquisa proporciona o
alizadas pelos administrados conhecimento da situação atual,
(gestores) das operações exer- permitindo possíveis ajustes nos
cidas na gestão das organiza- procedimentos já aplicados pelas
ções, pode gerar valor que resul- instituições de ensino.
REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 65

O Terceiro Setor tem extrema im- ceira seção a apresentação da meto- Esse setor diferencia-se do primei-
portância na sociedade, pois a sua dologia. Na quarta seção, é realizada ro setor por não estar presente na
iniciativa busca o benefício comum, a análise dos dados. Por fim, na últi- estrutura do Estado; e do segundo
nasce a partir da carência do Estado e ma seção, são apresentadas as con- setor, por não visar distribuição de
Mercado em atender as necessidades siderações finais do estudo. seus resultados aos seus instituido-
da população. De acordo com Mano- res e, sim, no reinvestimento dos
lescu e Oliveira (2010), as organiza- seus resultados na própria atividade
ções sem fins lucrativos formam uma 2. Referencial Teórico (SILVEIRA, 2007; SALAMON, 2008).
das expressões mais verdadeiras de Segundo Merege (2008), a maio-
cidadania e participação social, sendo Nessa seção é apresentada uma ria das organizações do Terceiro Se-
que o setor ganha um espaço cada discussão teórica acerca dos ele- tor nasceu a partir de projetos bas-
vez mais fortalecido na economia, mentos que compõem o Terceiro tante específicos. Segundo o autor,
com geração de renda e participação Setor e as práticas de governança estas organizações são constituídas
econômica no país. Sendo assim, é aplicáveis às organizações desse se- por verdadeiros empreendedores,
relevante estudar essas organizações, tor, e estudos correlacionados, de que, diante de situação sociais de
por conta da importância social, em modo a permitir um panorama ge- desigualdade, resolvem dedicar o seu
função de sua capacidade de mobili- ral da literatura acerca das temáti- trabalho à transformação de pesso-
zação de recursos e atendimento as cas analisadas nesse estudo. as e proporcionar melhoria nas con-
demandas sociais. dições de vida da população menos
No contexto teórico, esse estudo 2.1 Terceiro setor privilegiada. De acordo com Coelho
contribui para a o desenvolvimento Diversas são as linhas de inves- (2002), o objetivo escopo do Terceiro
da discussão acadêmica da gover- tigação acadêmica que explicam o Setor é o de orientar e estimular mu-
nança no contexto das entidades do surgimento e evolução das entida- danças na sociedade e focalizar seus
Terceiro Setor, uma vez que se ob- des do Terceiro Setor. Eentre elas, a esforços em favor da comunidade ou
serva que os estudos relacionados que parece ser mais bem aceita pela para grupos específicos.
à governança corporativa são ma- comunidade acadêmica é a decorren- Ao se tratar das características
joritariamente direcionados às en- te da Ineficiência do Estado e Falha das entidades do Terceiro Setor, a
tidades do primeiro e segundo se- do Mercado. Salamon (1998) discor- mais relevante é a de que as enti-
tor, ou seja, setor público e privado. re em seu trabalho que o surgimento dades não desenvolvem atividades
Além disso, os estudos identificados desse grupo de organizações deu-se com fins lucrativos e seus trabalhos
no Terceiro Setor voltam-se à análi- devido à Ineficiência do Estado e a Fa- focam-se na solidariedade (GARAY,
se da governança em um único ór- lha do Mercado em conseguir suprir 2011). Na visão de Salamon (2008),
gão, tais como Leal e Famá (2007), e atender às necessidades e às de- o Terceiro Setor é um amplo con-
que buscaram identificar as práticas mandas sociais plenamente. junto de organizações autônomas
de governança corporativa em uma O Terceiro Setor é composto de de caráter privado, que não distri-
instituição hospitalar; Tsai e Yama- instituições que não são nem en- buem lucros para seus membros e
moto (2005), que desenvolveram tidades governamentais, nem ini- não são ligadas ao governo. Nessas
uma análise comparativa entre o se- ciativas do setor empresarial e que organizações, as pessoas são livres
tor privado e o Terceiro Setor; e Ávi- atuam como atores intermediários para decidir se participarão, ou seja,
la e Bertero (2016), que desenvol- entre o Estado e a sociedade, na são organizações voluntárias.
veram um estudo de caso em uma provisão de bens e serviços de inte- Para Salamon e Anheir (1996),
fundação de apoio universitário. As- resse de diversos segmentos sociais para ser classificada como Terceiro
sim, esse trabalho diferencia-se dos (AMARAL, 2007). Setor, a instituição precisa apresen-
já realizados, pois o foco de análise é É possível definir a expressão Ter- tar cinco características básicas: (i)
um conjunto de organizações de um ceiro Setor como a designada para formalização e institucionalização;
segmento específico, ou seja, Insti- a definição das entidades de inicia- (ii) ser privada, separada do governo;
tuições de Ensino Superior. tiva privada sem fins lucrativos que (iii) sem fins lucrativos (sem distribui-
Este artigo está estruturado em desenvolvem suas atividades para ção de lucros); (iv) autogoverno, ca-
cinco seções, sendo a primeira aque- atender às necessidades coletivas e pacidade para controlar suas próprias
la em que são apresentados os as- públicas, de modo a contribuir para atividades, e; (v) voluntária, em que
pectos introdutórios; a sendo se- a geração de um bem comum (SA- exista participação de voluntários.
gunda, pela revisão do referencial LAMON; ANHEIR,1996; FISCHER, A qualificação das instituições
teórico acerca da temática; e a ter- 2002; SILVEIRA, 2007; CRUZ., 2010). que constitui este setor foi instituí-

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Evidenciação das práticas de governança corporativa nas Instituições
66 de Ensino Superior (IES) fundacionais catarinenses

da pela Lei n.º 9.790, de 23 de mar- ge com uma ferramenta para auxiliar de Governança Corporativa, elabora-
ço de 1999, mais conhecida como o desempenho das instituições como do pelo IBGC (2009), a governança
Lei do Terceiro setor, que traz o en- intuito da melhoria dos resultados corporativa possui quatro princípios
quadramento das organizações das organizações, além de transmi- básicos: Transparência, Equidade,
descritas com “entidades sem fins tir maior confiança aos stakeholders. Prestação de Contas (accountabili-
lucrativos”. As entidades do Tercei- ty) e Responsabilidade Corporativa.
ro Setor são regidas pelo Código 2.2 Governança Corporativa no No Quadro 1, são apresentados
Civil (Lei n.º 10.406/2002, com as Terceiro setor os conceitos dos autores relativos ao
introduções trazidas pelas Leis n.os Governança Corporativa pode princípios apresentados pelo IBGC.
10.825/2003 e 11.127/2005) e juri- ser entendida como conjunto de Considerando que as práticas de
dicamente constituídas sob a forma práticas que regem o relacionamen- governança corporativa foram de-
de associações ou fundações. to entre acionistas e cotistas a partir senvolvidas para empresas, com vis-
No Brasil, o primeiro estudo re- da distribuição de direitos e respon- tas a auxiliar o relacionamento en-
alizado sobre o setor pelo Instituto sabilidades entre os diferentes indi- tre gestores e acionistas, no Terceiro
Brasileiro de Geografia e Estatística víduos da corporação, como os ad- Setor, a sua utilização promove o
(IBGE), em 2002, apontava a exis- ministradores, acionistas, conselhos alinhamento dos interesses entre a
tência de 276 mil entidades sem e demais partes interessadas, in- gestão e os stakeholders dessas en-
fins lucrativos, correspondia a 5% cluindo empregados, fornecedores, tidades, de modo a contribuir para
do total de empresas registradas do clientes. Com o intuito de auxiliar o sucesso das mesmas (ALVES; DU-
País. Em 2005, 338,2 mil entidades no processo decisório, a governança QUE; SANTOS, 2016).
ligadas ao Terceiro Setor cadastra- corporativa é considerada mecanis- Os princípios do IBGC, inicial-
das de acordo com a classificação mo de monitoramento que permite mente direcionados às organiza-
do Cadastro Central de Empresas a asseguração do melhor funciona- ções empresariais, podem ser adap-
(Cempre), um aumento de 22,5% mento da empresa com propósito tados, objetivando-se a respectiva
comparado com os dados levanta- de aumento de sua riqueza (CARVA- aplicação às organizações não go-
dos no ano de 2002 (FASFIL, 2012). LHO, 2002; STEINBERG, 2003; AGUI- vernamentais sem fins lucrativos, as
Dados da Fasfil (2012) demons- LERA, 2005; SLOMSKI et al., 2008). quais constituem Terceiro Setor (MI-
tram que as fundações e associa- De acordo com o Relatório Ca- LANI FILHO, 2009).
ções sem fins lucrativos oficialmen- dbury (1992), a governança corpo- Em uma organização transpa-
te constituídas no Brasil, em 2010, rativa é expressa por um sistema de rente, os usuários podem ver o dire-
totalizam o conjunto de 556,8 mil valores que rege as organizações, cionamento das ações administrati-
entidades, das quais 290,7 mil eram em sua rede de relações internas e vas e operacionais adotadas por seus
Fundações Privadas e Associações externas, que refletem os padrões gestores. É possível, então, avaliar o
sem Fins Lucrativos, que emprega- da companhia, os quais, por sua vez, rumo da organização poe meio das
vam cerca de 4,9% dos trabalhado- demonstram os padrões de compor- prestações de contas, da equidade
res brasileiros, com média de tra- tamento da sociedade. De acordo e da responsabilidade corporativa
balhadores por instituições de 7,3, com o Código das Melhores Práticas (SANTOS; DUQUE; ALVES, 2016). So-
correspondendo a 2,1 milhões de
pessoas, recebendo remuneração
média mensal de R$1.667,05, que Quadro 1 – Princípios da Governança Coorporativa
envolviam um total de recursos na Princípio Descrição Base teórica
ordem de R$46,2 bilhões. Transparência
Divulgação de informações de fatores tangíveis e intangíveis que
Vargas (2008)
permitem a criação ou ao aumento de valor da organização.
Considerando os dados apresen-
Responsabilidade da organização de prestar contas perante os
tados acima, o Terceiro Setor tem im- diversos públicos que têm interesses legítimos diante delas. Refere-se a
portante papel na sociedade, pois su- Prestação de prestação de contas da fundação aos seus interessados. A atuação dos Falconer (1999);
pre necessidades ignoradas pelo setor contas agentes da governança é dotada de responsabilidades e oportunidades, Vargas (2008)
visto que o cumprimento dessa obrigação gera credibilidade e
público (Governo), auxiliando e atu- confiança, interferindo positivamente em futuras parcerias.
ando nas lacunas deixadas por este, Refere a uma concepção de distribuição justa, que respeita a
busca o bem-estar social da popula- Equidade
igualdade de direitos. Justiça e igualdade no tratamento de todos os
Vargas (2008)
stakeholders da fundação- o governo, doadores, fornecedores ou os
ção, gera considerável influência so-
beneficiários diretos dos recursos arrecadados.
cial e econômica e movimenta recur- Responsabilidade Zelo pela sustentabilidade e continuidade da fundação, preocupação Martins e
sos econômicos consideráveis. Sendo corporativa pela ordem social e ambiental em suas operações. Martins (2014)
assim, a governança corporativa sur- Fonte: Dados da Pesquisa (2017).

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 67

bre accountability, Falconer (1999) ficou que 14% das instituições têm moramento das demonstrações
considera que uma das responsabi- a conduta de publicar informações para a melhor evidenciação das
lidades da organização é de prestar relativas a Planejamentos Orçamen- ações das instituições com finali-
contas perante os diversos públicos tários e de divulgar a Prestação das dade social, necessidade tanto de
que têm interesses legítimos diante suas Contas e 29% divulgam os de- se aprimorar a transparência quan-
delas. E o autor complementa que monstrativos contábeis. to da conscientização na divulga-
um ponto muito importante da ac- O termo accountability se refere à ção das informações por parte das
countability para as organizações prestação de contas da fundação aos instituições.
sem fins lucrativos e não governa- seus interessados. Assim, a atuação Neste sentido, artigo publica-
mentais, que, além de proporcionar dos agentes da governança é dota- do por Rodrigues e Malo (2006) ar-
mais valor à entidade, apresenta-se da de responsabilidades e oportuni- gumenta que, por se tratar de um
como uma forma de estratégia com- dades. O cumprimento dessa obriga- empreendimento comunitário, as
petitiva no mercado. ção gera credibilidade e confiança, estratégias devem ser dinamiza-
De acordo com Martins e Mar- interferindo positivamente em futu- das (estimuladas), tornadas públi-
tins (2014), as entidades do Terceiro ras parcerias ou projetos, até mesmo cas, para que haja uma mobilização
Setor devem considerar o princípio internacionais (VARGAS, 2008). maior, um engajamento mais efetivo
de transparência, pois esta signifi- Cruz (2010), em sua tese voltada dos membros e sua motivação não
ca a comunicação interna e exter- à relevância da informação contábil só para a causa, mas também para a
na de seu desempenho e de suas para os investidores sociais privados gestão da própria organização.
ações para com os recursos públi- de entidades do Terceiro Setor no Bra- Tsai e Yamamoto (2005) relatam
cos transferidos para elas. Essa prá- sil, evidencia a importância da utiliza- que a competência e a eficiência das
tica não se restringe às informações ção de dados contábeis. Aborda que, entidades do Terceiro Setor, em con-
financeiras obrigatórias, mas, com com a divulgação das informações, junto com a transparência de suas ati-
ênfase, às informações voluntárias permite-se a verificação do atendi- vidades, gera um ciclo em que a evi-
de diferentes naturezas que redu- mento da entidade em relação as denciação das informações por parte
zam a assimetria entre todos os suas finalidades, e aos seus fins espe- das organizações mostra a seriedade
stakeholders (MILANI FILHO, 2009). cíficos e estimula o interesse de novos do trabalho de maneira confiável, au-
De acordo com Leal e Famá parceiros nos propósitos da entidade. menta a credibilidade da instituição e
(2007), o foco na transparência e Em estudo realizado por Silvei- agrega valor à organização.
na prestação de contas, associado à ra e Borba (2010), encontraram Em relação ao princípio da Equi-
constante avaliação da gestão, pos- como resultado um percentual dade, Tsai e Yamamoto (2005) men-
sibilita uma melhor comunicação, de 67% de conformidade das de- cionam que ele não é aplicável ao
mais resultados e maior criação de monstrações contábeis com precei- Terceiro Setor, visto que neste seg-
valor. Entre as práticas voltadas aos tos de transparência relacionados mento não há acionistas minoritá-
princípios da transparência e pres- à prestação de contas. Os autores rios e majoritários e, sim, investido-
tação de contas, a pesquisa identi- concluíram a necessidade de apri- res e parceiros que contribuem com


Casos recentes de escândalos veiculados na mídia
nacional, envolvendo instituições de ensino, demonstram
que existem problemas inerentes a gestão e fraudes
nos ambientes dessas entidades e, consequentemente,
prejudicam o cumprimento dos objetivos institucionais
na formação de recursos humanos intelectuais.

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Evidenciação das práticas de governança corporativa nas Instituições
68 de Ensino Superior (IES) fundacionais catarinenses

valores diferentes, mas não são pro- blicação de relatório anual, com in- elementos componentes da gover-
prietários da organização. formações do âmbito administrativo, nança corporativa e suas relações
O princípio de Responsabilida- contábil e social; criação e implemen- com a responsabilidade social da
de Corporativa, segundo Martins e tação do código de ética. instituição. Os pesquisadores cons-
Martins (2014), é o zelo pela susten- A governança corporativa diz res- taram que a instituição estudada
tabilidade e continuidade da fun- peito à forma de gestão estratégica está de acordo com os princípios e
dação, além da preocupação pela da organização, assim como a admi- práticas da governança corporativa,
ordem social e ambiental nas ope- nistração das relações de poder en- trazendo à tona a necessidade de
rações realizadas. Deve-se zelar pela tre as partes interessadas, tais como que as instituições, públicas ou pri-
perenidade da organização (susten- acionistas, gestores, financiadores, vadas, têm de agir de forma proati-
tabilidade, visão de longo prazo). cooperados, empregados e até agen- va em relação às demandas sociais
Schimith e Chagas (2009) men- tes externos como a sociedade, o Go- Em trabalho realizado, Mota,
cionam que a adoção dos princípios verno e órgãos reguladores. A gover- Nassif e Siqueira (2014) buscaram
e práticas da boa governança pode nança no Terceiro Setor é uma forma avaliar o modelo de gestão do espor-
ajudar o processo de gerenciamen- de auxiliar na busca por eficiência, no te educacional Instituto Passe de Má-
to administrativo e financeiro des- sentido de promove-lo alinhamento gica (IPM) frente à governança corpo-
sas entidades, seja pela reorganiza- dos interesses entre a gestão e os rativa no Terceiro Setor, tendo como
ção de sua estrutura interna, seja stakeholders; apresenta-se como im- resultado a existência de problemas
pela atração de doações motivadas portante possibilidade de aprimora- decorrentes da falta de um modelo
por essas mudanças. mento dos mecanismos de eviden- de gestão. Entretanto, algumas Prá-
Segundo Milani Filho (2009), a ciação dos preceitos relacionados à ticas de governança foram eviden-
principal diferença do Terceiro Se- gestão dessas organizações. ciadas, tais como os princípios da
tor, em relação aos outros no aspec- Transparência e da Ética e adoção de
to da governança, baseia-se na ine- 2.3 Estudos Relacionados auditoria externa. Vale destacar que
xistência de acionistas com direito Frente ao assunto proposto, são o pesquisador sugeriu a realização
ao recebimento de benefícios eco- apresentados estudos já publicados de outros estudos voltados ao mo-
nômicos, ou seja, dividendos. em que foram analisados a gover- delo de gestão e os princípios da go-
Tsai e Yamamoto (2005), em aná- nança frente às entidades do Terceiro vernança em outras organizações do
lise comparativa entre o setor priva- Setor. Leal e Famá (2007) estudaram Terceiro Setor em decorrência de ca-
do e o Terceiro Setor, identificaram a governança utilizando uma organi- rência de informações sobre o setor,
algumas práticas de governança zação que administra um hospital do sobretudo na literatura brasileira e
corporativa do setor privado que câncer, e concluíram que grande par- pela relevância deste tipo de organi-
são aplicáveis às entidades do Ter- te dos princípios e práticas de gover- zação no contexto brasileiro.
ceiro Setor, tais como: (i) Apresenta- nança corporativa, como ética, res- Silveira e Borba (2010) verifica-
ção das demonstrações do fluxo de ponsabilidade corporativa, prestação ram o nível de evidenciação contábil
caixa; (ii) publicação de relatórios de de contas e transparência, é aplicável apresentado por instituições perten-
contas, relatório anual, contendo in- ao Terceiro Setor. Em estudo de caso centes ao Terceiro Setor, tendo por
formações relevantes do ano, sejam realizado por Fáma e Leal (2007), os amostra um total de 39 fundações,
elas de âmbito administrativo, con- autores identificaram as seguintes e como objeto principal de verifica-
tábil ou social; (iii) A auditoria; (iv) práticas de governança corporati- ção da prestação de contas nos pe-
Criação do Conselho de Administra- va exercidas em uma instituição do ríodos de 2004, 2005 e 2006. Eles
ção e Conselho Fiscal; e (v) criação Terceiro Setor, sendo: conselho fis- encontraram como resultado um
de códigos de ética/ conduta. cal, profissionalização dos gestores, percentual de 67% de conformi-
Leal e Famá (2007), em estudo transparência e prestação de contas, dade das demonstrações contá-
realizado em uma instituição hospi- publicação do código de ética/condu- beis com preceitos de transpa-
talar, identificaram algumas práticas ta. E em seu estudo reiteraram que o rência ligados à prestação de
de governança corporativa aplicada princípio de equidade não é aplicável contas.
pela entidade; a existência do Conse- ao Terceiro Setor. Frente aos estudos já
lho Fiscal que fiscaliza as atividades Nogueira, Garcia e Ramos (2012) realizados direcionados à
do Conselho Deliberativo; Treinamen- realizaram um trabalho buscando in- governança corporativa
to dos conselheiros, com o intuito de vestigar, em uma Instituição de Ensi- no Terceiro Setor, obser-
profissionalização dos gestores; rea- no Superior pública, em que aspec- va-se que existe uma
lização de prestação de contas; pu- tos a sua gestão aproxima-se dos lacuna a ser preenchi-

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No contexto teórico, esse estudo contribui para
a o desenvolvimento da discussão acadêmica da
governança no contexto das entidades do Terceiro Setor,
uma vez que se observa que os estudos relacionados
à governança corporativa são majoritariamente
direcionados às entidades do primeiro e segundo setor,
ou seja, setor público e privado.

da em que se volta a avaliar as práti- ções de Ensino Superior ativas, ou ser aplicados em organizações não
cas no contexto de entidades do Ter- seja, que estão em atividade. governamentais sem fins lucrativos,
ceiro Setor com fins educacionais, o De acordo com o conceito dado as quais constituem o Terceiro Setor.
qual esse estudo visa contribuir para por Prodanov e Freitas (2013), “amos- Portanto, após conhecida a popula-
a discussão teórica e empírica. tra é parte da população ou do univer- ção e definida a amostra do estudo,
so, selecionada de acordo com uma realizou a coleta de dados para iden-
regra ou plano”. Para obtenção dos tificação de quais práticas são divul-
3. Metodologia dados relativos à amostra da pesqui- gadas pela amostra estudada.
sa, buscou-se no sítio da MEC (2017) A coleta de dados se deu por in-
Collis e Hussey (2005) definem a relação das universidades e faculda- termédio das informações publica-
que as investigações acadêmicas no des ativas sem fins lucrativos, o que das pelas instituições de ensino em
âmbito das ciências sociais aplica- originou a amostra de 49 instituições seus sítios eletrônicos, baseando-
das podem ser delineadas em rela- educacionais, sendo que dessas, ape- se no check-list elaborado a partir
ção aos seus objetivos, procedimen- nas 27 constituíram a amostra final, das pesquisas realizadas por Leal e
tos de coleta de dados e quanto à pois no relatório obtido no MEC, ele Fama (2007) e Santos (2015), e no
abordagem de análise. Frente ao apresenta todas as instituições em se- Guia das Melhores Práticas para Or-
exposto, esse estudo caracteriza-se parado, independente de serem de ganizações do Terceiro setor, dispo-
como descritivo em relação ao seu uma única rede de IES. Após verifica- nibilizado pelo IBGC (2016).
objetivo; quanto à estratégia de ob- ção, identificou-se que as instituições A coleta de dados ocorreu por
tenção dos dados, é documental e vinculam as informações em um úni- meio de consulta ao sítio eletrônico
de abordagem quantitativa. co sítio, não tendo website individual de cada instituição, no período de
por unidade, tais como: CNEC, Senai, setembro e outubro de 2017, sen-
3.2 População e Amostra Senac, UnC, Unoesc. do que, para a apuração do índice
Prodanov e Freitas (2013, p. 98) de adoção das práticas de gover-
definem que “população (ou uni- 3.3 Coleta e Análise dos Dados nança corporativa, foi utilizada uma
verso da pesquisa) é a totalidade Prodanov e Freitas (2013) rela- combinação binária, sendo atribuído
de indivíduos que possuem as mes- tam que “a definição do instrumen- peso 1 (um) para quando o quesito
mas características definidas para to de coleta de dados dependerá dos avaliado era evidenciado pela insti-
um determinado estudo”. É possí- objetivos que se pretende alcançar tuição, e 0, caso contrário. Os dados
vel delinear como população des- com a pesquisa e do universo a ser foram tabulados em planilha eletrô-
se estudo as instituições de Ensino investigado”. Conforme o contexto nica para facilitar o armazenamento
Superior do Estado de Santa Cata- apresentado sobre governança cor- e apuração dos indicadores.
rina. Conforme levantamento rea- porativa e os princípios apresenta- Para a análise dos dados, foram
lizado por meio do Ministério da dos pelo IBGC, criados inicialmente empregadas técnicas de estatística
Educação (MEC, 2017), no Estado para organizações empresariais, e de univariada (mínimo, máximo, mé-
de Santa Catarina, há 96 Institui- acordo Milani Filho (2009), podem dia, desvio padrão).

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4. Análise dos Dados desempenham, principalmente, para cursos da fundação e também revi-
o processo de prestação de contas, sões nos processos internos, sendo
O check-list desenvolvido com equidade e transparência. um órgão de controle institucional.
o objetivo de traçar o nível de di- O conselho fiscal, caracterizan- Outros pontos vistos nas insti-
vulgação das instituições de ensi- do-se por Mindlin (2009) como uma tuições foram a apresentação Es-
no foi composto de 19 práticas de parte obrigatória de governança, tatuto Social e Regime Interno
governança corporativa. A análi- este aumenta a confiabilidade na (Código de Conduta/Ética), sendo
se dos dados obtidos com a apli- administração da entidade; tem a apresentado, respectivamente, no
cação do check-list foi dividida em função de fiscalizar os administra- percentual de 32% e 25%. O códi-
duas etapas. A primeira delas tra- dores, comentar a respeito de diver- go de ética, de acordo com Tsai e
ta-se de uma etapa de análise de sas situações internas e informá-las Yamamoto (2005), disciplina a prá-
frequência, cujas frequências rela- aos stakeholders. tica profissional, ressalta princípios
tivas apresentadas de forma pen- Outro agente de boas práti- de atuação responsável e propõe
centual constam na Tabela 1. cas de governança corporativa é o condutas éticas elevadas a serem
Conforme resultado apresentado Conselho Curador, sendo que este seguidas pelos seus associados e
na Tabela 1, identificou-se que a im- agente apresenta-se em 29% das serve como referência para todos.
plantação do órgão Ouvidoria pelas instituições analisadas. Segundo Relativamente à apresentação do
instituições é a prática mais eviden- Martins e Martins (2014), órgão de Estatuto Social, Mendonça e Macha-
ciada, com um percentual de 93%. controle institucional, possui núme- do Filho (2004) apontam importân-
A prática apresenta-se como meio ro de membros maior em relação ao cia a este quesito. Em decorrência de
de intermediação, no qual é possível Conselho Fiscal e tem como funções conflitos de agência no Terceiro Se-
diálogo entre o usuário e a entidade controle dos recursos humanos, de tor, torna-se uma ferramenta para
(interessado e portador da informa- orçamentos e revisões nos planos verificação das ações exercidas pelos
ção), prática que permite que a enti- anuais, análise e aprovação dos re- gestores, se estas estão de acordo
dade possa repassar informações que latórios da instituição. com os objetivos estatutários para
sejam necessárias e de interesse de Segundo Maciel (2005), o con- os quais foi constituída a organiza-
seu usuário. De acordo com o IBGC selho curador possui atribuições, ção, sendo de interesse de doadores
(2009), a existência de canais de aces- como a aprovação de admissão e ou financiadores da entidade.
so disponibilizados a stakeholders, e controle de funcionários, de planos No que diz respeito à Missão da
ouvidorias pode conferir maior trans- de cargos e salários, de orçamen- entidade, Milani Filho (2009) cita
parência ao relacionamento da orga- tos referentes às aplicações de re- que as organizações do Terceiro Se-
nização com partes interessadas. Esse
achado pode ser explicado devido à
recomendação do Ministério da Edu- Tabela 1 – Práticas de Governança Corporativa
cação para que as IES tenham dentro Prática Quant. %
da sua estrutura organizacional a ou- Ouvidoria 26 93%
vidoria, sendo esse quesito de avalia- Missão 21 75%

ção para credenciamento e recreden- Diretoria Executiva 16 57%


Estrutura Organizacional 12 43%
ciamento das IES.
Relatório de Sustentabilidade 12 43%
Observou–se que, das institui-
Conselho da Administração 10 36%
ções na amostra, 43% divulgam pos- Calendário Atividades Desenvolvidas 10 36%
suir Estrutura Organizacional e, 57% Estatuto Social 9 32%
apresentam diretoria executiva. Rela- Conselho Curador 8 29%
tivamente aos conselhos, 36% apre- Contador Responsável 8 29%
sentam Conselho da Administração Demonstrações Contábeis 8 29%
e Conselho Fiscal (25%), Auditoria Relação Parceiros/Fornecedores 8 29%
Conselho Fiscal 7 25%
Independente (14%). Para a eficiên-
Regime Interno 7 25%
cia da governança corporativa, Leal e
Planejamento Orçamentário 4 14%
Famá (2007) destacam a atuação dos Prestação de Contas 4 14%
seguintes agentes: o conselho de ad- Auditoria Independente 4 14%
ministração, diretor executivo (CEO), Auditoria Interna 2 10%
auditoria independente e conselho Treinamentos Conselheiros 1 4%
fiscal, pela relevância das funções que Fonte: dados da Pesquisa (2017).

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 71

tor direcionam seus esforços para O ensino superior brasileiro vem bem como o uso de mecanismos de
cumprir a missão social que justifica expandindo-se, seja no âmbito pú- transparência e prestação de contas.
a própria existência, com propósito blico ou privado. Encontra-se entre Uma boa gestão nas Instituições de
de atrair recursos públicos e priva- os maiores mercados potenciais do Ensino Superior é possuir uma ad-
dos para a respectiva manutenção. mundo, sendo o maior da América ministração profissional capaz de
A evidenciação de informações so- Latina. Atualmente, estão em fun- conduzir a organização ao sucesso,
ciais deveria ser, portanto, um ato cionamento mais de 2.300 Institui- garantindo assim a sua sustentabili-
pertinente, sendo que, das institui- ções de Ensino Superior, mantendo dade perante a sociedade.
ções analisadas 75% evidenciam mais de 6 milhões de alunos matri- Conforme Eurydice (2008), não
sua missão como entidade social. culados (MONT’ALVÃO NETO, 2014). existe modelo predominante para a
Dentro das práticas identificadas Frente aos dados encontrados, governança da educação superior,
que tiveram menos divulgação pelas pode-se destacar a importância da contudo, cada vez mais, na maio-
instituições, temos Planejamento Or- utilização das práticas de gover- ria dos países, as partes interessa-
çamentário, Prestação de Contas, Au- nança pelas IES. Conforme Lopes das externas, como, profissionais de
ditoria Independente com percentual (2015), ao adotarem práticas de destaque no mercado, agentes po-
de 14%, Auditoria Interna 10% e Trei- governança corporativa, as institui- líticos e membros da comunidade
namentos Conselheiros 4%. ções elevam o interesse de poten- em que o campus se insere, têm as-
A auditoria representa um im- ciais investidores. Com uma gestão sumido papéis importantes no fun-
portante mecanismo contábil para pautada por regras claras, acessíveis cionamento interno das institui-
analisar os registros e controle con- ao mercado e alinhadas aos interes- ções, com o objetivo de reforçar o
tábeis, constituindo-se, em síntese, ses dos acionistas, as instituições elo da instituição com a economia e
um conjunto de ações de assessora- ganham em credibilidade do ponto aumentar a eficiência interna.
mento e consultoria para o usuário, de vista dos investidores. Posto que a governança corpo-
possibilitando que este possa ter De acordo com Bogoni et al. rativa preveja premissas e ações que
maior segurança acerca da veraci- (2010), a governança corporativa vão além da sustentabilidade finan-
dade das informações contidas nos propõe o uso eficiente dos recursos, ceira, as IES que adotam práticas de
relatórios e demonstrativos contá-
beis (ATTIE, 2009).
Frente à contextualização realiza- Tabela 2 – Percentual de Evidenciação por Instituição
da no que tange às práticas de go- Instituição Percentual (100%)
vernança corporativa aplicáveis ao Universidade do Planalto Catarinense (Uniplac)
78%
Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul)
Terceiro Setor, na Tabela 2 é apresen-
Universidade do Contestado (UNC) 68%
tada a lista das instituições analisa-
Faculdade Luterana de Teologia (FLT) 63%
das com o respectivo percentual de
Universidade Alto Vale do Rio do Peixe (Uniarp)
divulgação das práticas de governan- 53%
Universidade Comunitária da Região de Chapecó (Unochapecó)
ça corporativa avaliadas. Faculdade Senac
Para as instituições educacionais Universidade do Extremo Sul Catarinense (Unesc) 47%
Universidade do Oeste de Santa Catarina (Unoesc)
,o uso da Governança Corporativa
Universidade do Vale do Itajaí (Univali) 42%
torna-se uma forma de gerir suas Faculdade CNEC
atividades e apresenta melhora na Faculdade de Tecnologia Assessoritec 37%
gestão das IES, permitindo adqui- Faculdade de Tecnologia Senai

rir vantagens competitivas com re- Faculdade Católica de Santa Catarina (Facasc)
32%
Faculdade São Luís (FSL)
lação à concorrência. Neste senti- Faculdade Satc (Fasatc) 26%
do, a Tabela 2 apresenta o ranking Faculdade de Santa Catarina (Fasc)
das instituições, com percentual de Faculdade Sociesc
apresentação das práticas analisa- Faculdade Santa Rita de Chapecó 21%
Instituto de Ensino Superior da Grande Florianópolis (IESGF)
das, evidenciando que a Uniplac e Instituto Superior e Centro Educacional Luterano - Bom Jesus - Ielusc
a Unisul foram as instituições que Universidade da Região de Joinville (Univille) 16%
mais práticas elencadas apresenta- Faculdade Barddal (FB-SI)
ram (78%). Outra situação que po- Faculdade FAE Blumenau
Faculdade Guilherme Guimbala (FGG) 10%
demos destacar é que 22% das ins- Faculdade Refidim (Refidim)
tituições apresentaram mais que Faculdade de Tecnologia Pedro Rogério Garcia (Fattep)
50% das práticas verificadas. Fonte: Dados da Pesquisa (2017).

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Evidenciação das práticas de governança corporativa nas Instituições
72 de Ensino Superior (IES) fundacionais catarinenses

governança corporativa adotam so- realizada por meio de estudos já rea- ao processo de gestão e avaliação
bretudo uma conduta socialmente lizados, foi possível identificar a práti- dos interessados.
responsável, demonstrando trans- cas de governança possíveis de serem No contexto teórico, esse estudo
parência em suas ações e valores e aplicadas pelas instituições do Tercei- contribui para a o desenvolvimento
assegurando uma governança res- ro Setor, sendo que os principais re- da discussão acadêmica da gover-
ponsável em promoção dos objeti- sultados encontrados mostraram nança no contexto das entidades do
vos sociais, buscando a continuida- que todas as práticas elencadas fo- Terceiro Setor no que tange às insti-
de de suas ações. ram apresentadas ao menos uma vez. tuições de ensino, uma vez que a te-
De forma geral, identificou-se mática abordada não apresenta estu-
que um percentual baixo de institui- dos relacionados com visão global do
5. Considerações Finais ções apresentaram mais de 50% das setor, mas o que se possui são estu-
Práticas, demonstrando uma baixa dos já realizados, mas com foco em
Entende-se como Governança evidenciação das práticas de gover- análises individuais. O trabalho apre-
Corporativa conjunto de práticas que nança corporativa pelas instituições. senta-se como um instrumento de
rege o relacionamento entre acionis- Cabe enfatizar que, conforme já verificação da situação atual do setor.
tas e cotistas a partir da distribuição mencionado por Eurydice (2008), Como limitação do estudo, pode-
de direitos e responsabilidade entre não existe modelo de governan- se citar que as instituições podem es-
os diferentes indivíduos da corpora- ça corporativa. O que há é um con- tar aplicando as práticas analisadas,
ção, que tem por finalidade otimizar junto de práticas apropriáveis e que entretanto não realizam a sua divul-
o desempenho. No Terceiro Setor, a permitem a evidenciação dos qua- gação, sendo que o dados levantados
sua utilização promove o alinhamen- tro princípios básicos de gover­nança podem estar divergentes em relação
to dos interesses entre a gestão e os aplicáveis a transparência, equidade, às atividades desenvolvidas efetiva-
stakeholders, de modo a contribuir prestação de contas e responsabili- mente pela instituição. Para futuras
para o sucesso delas. dade corporativa. pesquisas e considerando o baixo ní-
Frente ao apresentado, esse es- Diante do resultado obtido, vel de evidenciação identificado nes-
tudo identificou as práticas de go- identifica-se a necessidade de que se estudo, recomenda-se estudo nas
vernança corporativa adotadas pe- todas as instituições analisadas instituições, por meio de um estu-
las IES do Terceiro Setor do Estado precisam reconsiderar a atenção do caso, buscando identificar quais
de Santa Catarina. As instituições ao tema e aprimorar seus méto- práticas são exercidas efetivamente e
de ensino analisadas são entidades dos de evidenciação e divulgação quais critérios as instituições utilizam
sem fins lucrativos, ou seja, enqua- das práticas que podem ser apli- para a divulgação ou não das prati-
dram-se no Terceiro Setor. cadas nas organizações, entretan- cas. Estudos avaliando os fatores que
A pesquisa direcionada às IES de to não estão sendo evidenciadas contribuem para a adoção das prá-
Santa Catarina permitiu a identifica- para seus usuários. As entidades ticas de governança pelas entidades
ção das práticas utilizadas por este devem atentar para a importân- do Terceiro Setor também são rele-
segmento. Frente à contextualização cia de fornecer informações úteis vantes para investigações futuras.

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 77

Análise Bibliométrica sobre


gerenciamento de resultados
no século XXI

E
Carlos Henrique Magalhães Alves
Graduando em Ciências Contábeis pela Uni-
ste artigo apresenta os resultados de uma pesquisa versidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
que visou analisar os estudos realizados no Brasil E-mail: carlosalvesmagalhaes16@gmail.com

sobre o tema “gerenciamento de resultados contábeis”


Ewerton Alex Avelar
(earnings management), publicados em periódicos nacionais Contador e professor universitário (Universi-
de Contabilidade no período de 2001 a 2017. Esses dade Federal de Minas Gerais – UFMG) é gra-
duado em Ciências Contábeis pela UFMG,
periódicos foram selecionados dentre os listados na área de Especialista em Educação pela Universidade
“Administração Pública e de Empresas, Ciências Contábeis e Federal Fluminense (UFF), mestre em Admi-
nistração pela Universidade Federal de Lavras
Turismo” com base na estratificação Qualis da Coordenação (Ufla) e doutor em Administração pela UFMG.
de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) de E-mail: ewertonalexavelar@gmail.com

A1 a B3. Para selecionar os estudos, foram realizadas pesquisas


nos sítios dos periódicos escolhidos a partir das palavras-chave Terence Machado Boina
Contador e Analista Administrativo da Agên-
“gerenciamento de resultados”, “gerenciamento de lucros”, cia Nacional do Cinema (Ancine), é graduado
em Ciências Contábeis pela Universidade Fe-
“earnings management” e “accruals”. As análises foram feitas
deral de Minas Gerais (UFMG), especialista em
por meio de estatística descritiva e análise bibliométrica. Entre Gestão Pública pela Fundação João Pinheiro e
mestre em Ciências Contábeis pela Universida-
os resultados obtidos, verificou-se que: (a) houve um grande
de Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
aumento no número de pesquisas publicadas no Brasil sobre E-mail: tmboina@gmail.com

o tópico nos últimos anos; (b) existe uma alta frequência da


produção de artigos com até três autores, o que sinaliza maior
interação entre os pesquisadores na área; e (c) há muitos
estudos similares, que abordam os mesmos temas analisados,
possibilitando, em tese, certa consolidação de uma mesma
linha de raciocínio, mas pouco contribui para uma diversidade
de áreas relacionadas ao gerenciamento de resultados.

2102 – Recebido em 25/07/18. Distribuído em 25/07/18. Pedido de revisão não houve. Apro-
vado em 27/8/18, na segunda rodada, por dois membros do Conselho Editorial. Publicado
na edição setembro-outubro de 2018. Organização responsável pelo periódico: Conselho
Federal de Contabilidade.

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78 Análise Bibliométrica sobre gerenciamento de resultados no século XXI

1. Introdução agentes econômicos que estão asso- resse e discussão nessa área temáti-
ciados ao mercado de capitais. A Co- ca, resultando em novas publicações
O principal objetivo da Contabili- missão de Valores Mobiliários (CVM) durante o século XXI, contribui para
dade é subsidiar avaliações para a to- define gerenciamento de resultados a geração de conhecimento, que
mada de decisões econômicas acerca como o “julgamento arbitrário no pode auxiliar os usuários da infor-
da posição patrimonial e financeira, processo de reportar as demonstra- mação, em suas decisões baseadas
do desempenho e dos fluxos de cai- ções financeiras, com o objetivo de nas demonstrações financeiras.
xa da entidade, auxiliando os usuá- influenciar ou manipular os números Diante do cenário apresentado, o
rios das demonstrações financeiras apresentados, ainda que dentro dos problema de pesquisa proposto pode
com informações úteis (COMITÊ DE limites prescritos pela legislação con- ser enunciado na forma da seguinte
PRONUNCIAMENTOS CONTÁBEIS – tábil e fiscal” (CVM, 2007, p. 12). Para questão: Como o gerenciamento de
CPC, 2011). Contudo, visto que os Martinez (2001, p. 13), resultados tem sido abordado nos
gestores possuem discricionarieda- artigos publicados nos principais
de na escolha de práticas contábeis, É crucial entender que “gerencia- periódicos brasileiros de Contabi-
as informações evidenciadas nas de- mento” dos resultados contábeis, lidade no período de 2001 a 2017?
monstrações financeiras podem ser não é fraude contábil. Ou seja, ope- Assim, o estudo reportado neste ar-
influenciadas (MARTINEZ, 2001). ra-se dentro dos limites do que pres- tigo teve como objetivo geral anali-
Para Martinez (2001), o poder da to- creve a legislação contábil, entre- sar os trabalhos publicados acerca do
mada de decisão e o impacto futuro tanto nos pontos em que as normas tema gerenciamento de resultados
para o gestor não mais importantes contábeis facultam certa discricio- nos periódicos de Contabilidade bra-
que o próprio lançamento nas suas nariedade para o gerente, este rea- sileiros no período de 2001 a 2017.
demonstrações financeiras. Segun- liza suas escolhas não em função do Para tal, foram propostos e cumpri-
do esse autor, os gestores efetuam a que dita a realidade concreta dos ne- dos os seguintes objetivos específi-
gestão da empresa, dentro dos limi- gócios, mas em função de outros in- cos: (a) selecionar os artigos sobre o
tes da Legislação Contábil, atenden- centivos, que o levam a desejar re- gerenciamento de resultados publi-
do aos seus interesses. portar um resultado distinto. cados nos principais periódicos brasi-
Nesse contexto, a literatura aca- leiros de Contabilidade entre os anos
dêmica da Contabilidade tem dado O gerenciamento de resultados de 2001 e 2017; (b) analisar as dife-
atenção para o tema “gerenciamento envolve manipulação lícita de infor- rentes características desses artigos
de resultados contábeis”, sendo vis- mações contábeis apresentadas aos selecionados ao longo do período
to como área crítica do estudo con- usuários (NIYAMA et al., 2015). Nes- de análise; (c) identificar os procedi-
tábil (MARTINEZ, 2001). Este tema se caso, de forma oportunista, os mentos metodológicos empregados
ganhou força durante o século XXI, gestores das empresas buscam in- no desenvolvimento dos artigos ana-
principalmente após os escândalos fluenciar conscientemente a posição lisados; e (d) analisar a produtividade
com a Enron, em 2001, e da Worl- patrimonial e financeira de uma en- dos autores envolvidos na elaboração
dCom, Inc., em 2002, que acabaram tidade, mediante seleção e aplicação dos artigos analisados.
“abalando a estrutura” do mercado de métodos contábeis aceitos (ou O estudo se justifica devido à
financeiro, reforçando assim a ideia não proibidos) pelos normativos em importância do tema gerenciamen-
da discussão sobre os gerenciamen- vigor (NIYAMA et al., 2015). Os ges- to de resultados na Contabilidade e
tos de resultados e seus impactos. tores se utilizam da flexibilidade de de sua influência na transparência
Para Martinez (2001), as informações princípios e normas contábeis para e na confiabilidade das demonstra-
contábeis colaboram no processo de obter a imagem desejada da posição ções financeiras. Ademais, a compi-
tomada de decisão e o gerenciamen- patrimonial e financeira da entidade lação dos resultados identificados
to de resultados pode influenciar (SANTOS; GRATERON, 2003). sobre esse tema no Brasil pode ser-
a percepção de riscos dos diversos Os estudos de Martinez (2001), vir como informação suplementar a
Fuji (2004) e Tukamoto (2004) exer- estudos futuros, visto que apresenta
cem muita influência para a área um quadro do desenvolvimento das
acadêmica no que diz respeito ao pesquisas na área no País. Segundo
aumento da discussão do tema ge- Rosa et al. (2010), para se alcançar
renciamento de resultados contábeis uma melhor compreensão do desen-
no Brasil, uma vez que colaboraram volvimento da pesquisa em determi-
com as primeiras pesquisas empíri- nado campo acadêmico, a pesquisa
cas publicadas. O aumento de inte- Bibliométrica é de grande valia.

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 79

2. Fundamentação teórica quatro aspectos relacionados aos exemplo) em razão do envolvimento


custos de agência: (a) problemas na de interesses políticos, econômicos e
2.1 Teoria da Agência criação das relações entre principal sociais; e (d) se adequar a regulações
O desenvolvimento das empre- e agente; (b) problemas de controle para diminuir o pagamento de tribu-
sas, por meio da ampliação dos ne- e acompanhamento desse contrato; tos (HEALY; WAHLEN, 1999; NIYAMA
gócios e abertura de novas unidades (c) problemas de mensuração de de- et al., 2015).
organizacionais, trouxe a necessidade sempenho do agente; e (d) proble- Para Martinez e Cardoso (2009),
de profissionalização da gestão. Se- mas de conclusão da relação entre o gerenciamento de resultados está
gundo Jensen e Meckling (1976), as agente e principal. relacionado com essas escolhas de
firmas se dividem em duas partes, a Salienta-se que, com raízes nos práticas contábeis e também com
propriedade e o controle, que são re- conflitos de agência e assimetria in- decisões operacionais com o obje-
presentadas em dois lados: (i) os pro- formacional entre o agente e o prin- tivo de comunicar resultados con-
prietários ou acionistas, chamados de cipal, surgiram os estudos sobre a tábeis distintos dos que seriam di-
principais, que possuem a proprieda- governança corporativa, com vistas vulgados sem a adoção de tais
de da empresa; e (ii) os gestores con- a reduzir o impacto causado pelos práticas ou decisões. Assim, Cuper-
tratados, chamados de agentes, que conflitos de interesse destacados na tino (2013) aponta que o Geren-
possuem a gestão da empresa sob teoria da agência. Santos (2011) de- ciamento de Resultados pode ser
sua responsabilidade. Dada essa rela- fine governança corporativa como classificado em duas categorias: ge-
ção, podem surgir os chamados con- os procedimentos que os gestores renciamento de resultados por ac-
flitos de agência, relacionando-se à e os acionistas devem conduzir para cruals (GRA) e gerenciamento de re-
diferença de interesses e objetivos e uma boa gestão na empresa. sultados por decisões operacionais
à divisão de trabalho em um relacio- Esse conflito entre agente e (GRDO). Tais categorias apresentam
namento cooperativo. principal, que levou os gestores de algumas diferenças fundamentais,
Segundo Eisenhardt (1989), os muitas empresas a alterarem, de entre elas, o impacto no fluxo de
conflitos de agência podem culmi- forma deliberada, os resultados fi- caixa operacional.
nar em dois problemas. O primeiro nanceiros reportados, de forma a Segundo Cupertino (2013), o
se refere à possibilidade de os desejos atingir objetivos específicos, que GRDO é realizado durante o exer-
e os objetivos do principal serem con- resulta no que é chamado de “ge- cício financeiro, de acordo com a
flitantes com os do agente, sendo di- renciamento de resultados”, pode tomada de decisão dos gestores de
fícil ou oneroso para aquele verificar contribuir com o aumento da assi- como anda o negócio ao longo do
se o agente se comportou de forma metria informacional (LOPES; TUKA- ciclo operacional. A manipulação
adequada. O segundo é o problema MOTO, 2007). da informação contábil pode es-
da partilha de risco, que surge quan- tar vinculada às despesas de ven-
do o principal e o agente preferem 2.2 Gerenciamento de resultados da, administrativas e gerais, bem
ações distintas por causa de suas di- O termo “gerenciamento de re- como à receita operacional da em-
ferentes preferências ou propensões sultados” é utilizado com maior presa (MARTINEZ, 2009). Já o GRA,
ao nível de risco (EISENHARDT, 1989). frequência nos Estados Unidos da conforme Cupertino (2013), é con-
A resolução desses conflitos em América, e o termo “contabilidade duzido principalmente entre o en-
prol de maximizar o bem-estar den- criativa” é usado comumente na Eu- cerramento do exercício social e a
tro da firma resulta em “custos de ropa (NIYAMA et al., 2015). Confor- publicação das demonstrações fi-
agência”. Para Jensen e Meckling me Fields et al. (2001), as escolhas nanceiras. Os gestores avaliam o
(1976), esses custos servem para contábeis influenciam resultados resultado das operações realizadas
que o agente não promova ações contábeis e podem induzir, por exem- ao longo do exercício e definem o
que prejudiquem o principal e as- plo, arranjos contratuais, precificação montante a ser lançado a título de
segurem que ele tome decisões de de ativos e agentes externos. A esco- gerenciamento por accruals. Mar-
nível ótimo do ponto de vista des- lhas contábeis podem, por exemplo: tinez (2013) enfatiza que a maio-
te último. Esses custos de agência (a) maximizar o desempenho e a po- ria absoluta dos trabalhos cientí-
podem ser classificados como: (a) sição financeira mais conveniente da ficos publicados no Brasil, ainda é
custos de monitoramento por parte entidade; (b) maximizar ganhos para concentrada no GRA, sendo que a
do principal; (b) custos com a con- os próprios gestores e contadores; (c) pesquisa sobre a utilização das de-
cessão de garantias contratuais por ser originadas de pressões institucio- cisões operacionais como forma de
parte do agente; e (c) custo residu- nais internas (contratos, por exem- gerenciamento de resultados não
al. Martinez (1998) ainda destaca plo) e externas (mercadológicas, por vem sendo muito abordada.

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80 Análise Bibliométrica sobre gerenciamento de resultados no século XXI

Segundo Martinez (1998), a Con- ou acima do resultado apurado (real); bem como o anseio de atrair novos
tabilidade produz informações em (ii) Income Smoothing – caracteriza-se investidores e acionistas; e (c) am-
que o principal e o agente baseiam pela suavização dos resultados apu- bição de obter bônus significativos
suas relações e a informação contá- rados, sendo que sua utilização visa (compensação), ainda que isto impli-
bil pode afetar a percepção do risco manter os resultados em determina- que sacrifício futuro da organização.
e sua distribuição entre os agentes do nível e evitar excessivas flutuações;
econômicos no mercado. O geren- e (iii) Big Bath Accountig – refere-se 2.3 Estudos anteriores
ciamento de resultados existe dentro a um conjunto de medidas tomadas Alguns estudos bibliométricos, já
dessa relação principal-agente, e se para reduzir drasticamente os resulta- foram realizados sobre o tema ge-
deve levar em consideração a ques- dos correntes da empresa, de forma renciamento de resultados em diver-
tão de que ele pode ser praticado nas a possibilitar a apresentação de lucros sos meios de comunicação científica
decisões operacionais da firma. Mar- expressivos no futuro. no Brasil, tais como: Avelar e San-
tinez (2001) classifica a prática do ge- Para Martinez (2001), os princi- tos (2010), Rosa et al. (2010), Ma-
renciamento de resultados sob três pais motivos apontados para a prá- chado et al. (2011), Martinez (2013),
formas: (i) Target Earnings – prática tica do gerenciamento de resultados Machado e Beuren (2014) e Seidler
de gerenciar o resultado para aumen- são: (a) desejo de preservar o cargo, e Decourt (2014). O Quadro 1 apre-
tar (melhorar) ou diminuir (piorar) a mesmo que isso implique compro- senta um resumo desses estudos.
lucratividade da empresa. A mani- meter a qualidade dos resultados O estudo apresentado neste ar-
pulação desses resultados tem como contábeis apresentados; (b) pressão tigo se diferencia dos demais em
principal finalidade atingir determina- dos acionistas por resultados trimes- relação ao período de análise ser o
das metas da firma, sejam elas abaixo trais cada vez maiores e melhores, mais amplo: 17 anos. Além disso,

Quadro 1 – Estudos bibliométricos anteriores sobre gerenciamento de resultados


Autores Amostra Principais resultados
Há um grande aumento do número de pesquisas publicadas sobre o tópico nos últimos anos (80% dos artigos
26 artigos de periódicos das foram publicados entre 2007. Há uma alta centralização da produção em apenas três autores (responsáveis por
Avelar e
áreas de Administração e de mais de 45% da produção analisada). As redes de cooperação existentes entre os pesquisadores são pouco extensas,
Santos
Contabilidade do país entre os dispersas e sem laços entre si. 73,08% dos artigos são empíricos. 84,21% dos tipos de gerenciamento foram baseados
(2010)
anos de 2000 e 2009. em accruals. 57,14% foram fundamentados em bases de dados. Três autores foram responsáveis por mais de 45% da
produção no período. 48% dos autores publicaram apenas uma vez.
Apesar de a pesquisa brasileira sobre Earnings Management estar em ascensão quanto ao número de artigos
39 artigos publicados nos publicados, tendo este aumentado a cada ano estudado, o campo de produção científica nessa área não está
Rosa et al. principais congressos brasileiros consolidado, caracterizando-se pela existência de redes de relacionamentos pouco coesas e integradas entre autores
(2010) ligados à Contabilidade do país e entre instituições, indicando que muitas conexões ainda podem ser estabelecidas. Foram identificados 48 autores,
entre 2004 e 2009. sendo que 30 deles publicaram apenas um artigo e seis participaram de 71,8 % dos trabalhos publicados. Em relação
às instituições, verificou-se que a USP e a FUCAPE são centrais no campo de pesquisa.
72 artigos publicados em 15 Verificou-se um maior número de artigos sobre o tema publicados em periódicos estrangeiros. 58,7% dos artigos
periódicos de divulgação foram classificados como quantitativos. Dos 128 autores, um possui de quatro publicações, outro possui três
Machado et
brasileira e internacional de publicações, 13 possuem duas publicações. Os demais 113 apresentaram apenas uma publicação sobre o tema no
al. (2011)
pesquisas em Contabilidade entre período. Sobre a temática, 40% dos estudos estiveram contidos na temática contábil, 26% de finanças e 21% de
os anos de 2000 e 2009. auditoria e estruturação societária. O autor mais referenciado foi Dechow et al. (1995).
50 artigos de periódicos da Scientific O gerenciamento de resultados revela-se num tópico diversificado e vasto, embora relativamente recente.
Martinez Periodicals Electronic Library A maioria dos estudos brasileiros no assunto foi publicada nos últimos dez anos e a produção científica
(2013) (SPELL) de 2008 até 2013, além de tem se acelerado recentemente. A maioria absoluta dos trabalhos científicos publicados no Brasil, ainda é
congressos, teses e dissertações. concentrada no GRA.
Os autores e suas redes sociais de produção se originam em sua maioria da Universidade de São Paulo. O
tema mais pesquisado foi o de métodos ou meios de realizar o gerenciamento de resultados, abrangendo
Machado 32 artigos de 10 periódicos
os modelos de mensuração de accruals, com destaque ao Modelo Kang e Sivaramakrishnan. A pesquisa
e Beuren nacionais entre o período de 2002
descritiva, com base documental e abordagem quantitativa foram as formas mais utilizadas dentre os artigos
(2014) a 2010.
pesquisados. 53% dos trabalhos, foi elaborado por dois autores, sendo reduzida a quantidade de artigos
elaborada por um único autor, 12,5%.
Verificou-se que a maioria dos estudos possui dois ou três autores, sendo a USP a instituição que apresenta maior
número de publicações. Os principais enfoques dos estudos sobre Gerenciamento de Resultados estão relacionados
com a Governança Corporativa e a Auditoria. Verificou-se, também, uma predominância de artigos empíricos
Seidler e 42 artigos publicados em os quais utilizaram a técnica desenvolvida por Kang e Sivaramakrishnan (KS) para a mensuração dos acrruals
Decourt periódicos brasileiros entre os discricionários. Os resultados revelaram, ainda, que apesar de o tema ainda ser pouco explorado no Brasil, ocorreu
(2014) anos de 2006 e 2013. um crescimento da produção cientifica em relação a 2006, especialmente, nos anos de 2007, 2009 e 2012. Os estudos
com dois autores são os de maior ocorrência no período analisado, representando 47,6% da amostra. Predominância
dos estudos empíricos (28 artigos) em relação aos estudos teóricos (14 artigos). Os estudos apresentados utilizaram,
em sua maioria, dados de empresas nacionais de capital aberto e listadas na Bolsa de Valores (BOVESPA).
Fonte: Elaborado pelos autores.

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 81

foi empregada uma série de cate- riormente, com base nos dados ta- limita somente a edições, exempla-
gorias usadas nos estudos prévios, bulados, realizaram-se as análises dos res dos livros, bem como sua quanti-
de forma a permitir uma maior artigos selecionados por meio das se- dade de palavras, mas também para
comparabilidade entre os resulta- guintes técnicas: estatística descritiva outros formatos de produção biblio-
dos. Espera-se, assim, agregar ao e análise bibliométrica. A estatística gráfica, como artigos de periódicos
conhecimento da área a partir da descritiva consiste, conforme Carlos e outros tipos de documentos. Nes-
consolidação abrangente das infor- (2004), na elaboração de tabelas, se contexto, empregou-se também
mações sobre o campo de estudo. gráficos e medidas que são explora- a Lei de Lotka, uma análise da fre-
das no intuito de facilitar o entendi- quência de publicações geradas por
mento das informações. autor (ARAÚJO, 2006), que sinaliza
3. Metodologia Por sua vez, a análise bibliomé- a consolidação ou não de uma área
trica, segundo Vanti (2002), é um temática no meio acadêmico, tendo
A pesquisa desenvolvida pode conjunto de técnicas de pesquisa em vista as publicações dos pesqui-
ser classificada como descritiva e que utiliza procedimentos mate- sadores quanto ao assunto.
de natureza quantitativa, cujos pro- máticos e estatísticos para investi-
cedimentos metodológicos foram gar e quantificar os estudos de pro-
inspirados nos trabalhos citados dução científica, bem como análise 4. Análise e discussão dos
na subseção anterior. Para o desen- comportamental dos seus respecti- resultados
volvimento da pesquisa, foram se- vos pesquisadores, para divulgação
lecionados os principais periódicos das informações. Conforme salienta Na Figura 1, dentro da lista de
de Contabilidade da área de “Admi- Araújo (2006), essa técnica não se periódicos relacionados ao tema
nistração Pública e de Empresas, Ci-
ências Contábeis e Turismo” de es-
trato A1 a B3, em consulta ao site Quadro 2 – Periódicos que apresentaram artigos relacionados
da CAPES (www.capes.gov.br), pelo ao tema
“QUALIS”. No Quadro 2, salientam- Periódico Sigla Qualis
se os periódicos analisados. Contabilidade, Gestão e Governança CGG B1
Foram feitos filtros na consulta Contabilidade Vista & Revista CVR A2
dos periódicos em seus respectivos RC&C - Revista de Contabilidade e Controladoria (UFPR) RC&C B3
RCO - Revista de Contabilidade e Organizações RCO A2
sítios, considerando apenas os pe-
REPEC - Revista de Educação e Pesquisa em Contabilidade REPEC B1
riódicos nacionais e que apresenta-
Revista Contabilidade & Finanças (Online) RCF A2
ram as palavras-chave nos campos Revista Contemporânea de Contabilidade RCC A2
de busca por título: “gerenciamento Revista de Contabilidade do Mestrado em Ciências Contábeis da UERJ RCMCC B2
de resultados”, “gerenciamento de Revista Mineira de Contabilidade RMC B3
lucros”, “earnings management” e Sociedade, Contabilidade e Gestão SCG B2
“accruals”. A amostra consistiu em Fonte: Elaborada pelos autores

63 artigos publicados nos 10 peri-


ódicos supracitados no período de Figura 1 – Número de artigos publicados por periódico
2001 a 2017 (século XXI). Salienta-
se que se escolheu esse interregno
temporal devido às produções semi-
nais no país sobre o tema terem sido
publicadas a partir dos anos 2000,
e os periódicos já terem divulgados
seus artigos publicados até o ano de
2017 durante o período da pesquisa.
Os principais dados coletados so-
bre os artigos selecionados foram ta-
bulados no software Microsoft® Ex-
cel (MS-Excel) 2013, para facilitar a
análise. Foram usadas categorias dos
estudos citados na subseção 2.3 des-
te trabalho para a tabulação. Poste- Fonte: Dados da pesquisa.

RBC n.º 233. Ano XLVII. Setembro/outubro de 2018


82 Análise Bibliométrica sobre gerenciamento de resultados no século XXI

detalhado no Quadro 2, tem-se o Trabalhos que utilizaram os méto- sultados convergem com o apresen-
número de artigos publicados por dos Não Empíricos Teóricos e En- tado por Avelar e Santos (2010) e
periódico (uma média de 6,3 ar- saios, apesar da pouca participação Seidler e Decourt (2014). Para aque-
tigos publicados por periódico). no cômputo geral, contribuíram efe- les primeiros autores, essa predo-
Salienta-se que quatro periódicos tivamente para a realização de no- minância pode demonstrar que há
(RCF, RCO, CVR e RCMCC) concen- vas pesquisas. Este fato revela a im- certa consolidação em pesquisas e
traram 65,1% de todos os artigos portância destes tipos de trabalhos, grupos de estudos na área de Con-
averiguados (41 artigos). A RCF e a que não podem ser deixados de lado tabilidade Financeira.
RCO, da Universidade de São Pau- em prol da concentração de estudos Outra métrica preponderante
lo, foram as que mais publicaram com abordagem puramente empíri- é de que as publicações tendem
artigos a respeito do tema estuda- ca. (Paula et al., 2012, p.47). a ser de caráter quantitativo. Na
do. Houve um aumento progres- análise feita com base nos da-
sivo com o número de artigos de No que se refere à abordagem, dos da Figura 4, 73,0% das publi-
Contabilidade no Brasil publicados a Figura 3 demonstra que 90,5% cações foram quantitativas, ante
no século XXI. Em 2003, verificou- das pesquisas foram estudos refe- 19,1% quali-quanti e 7,9% quali-
se apenas um artigo publicado rentes a Contabilidade Financeira, tativas. Esse resultado corrobora
ante 9 em 2017. Em média, houve com 57 artigos. Novamente, os re- aqueles apurados por Machado
um crescimento anual de 31,11%
no número de publicações a res-
peito com o tema gerenciamento Figura 2 – Classificação dos artigos em teóricos ou empíricos
de resultados entre o período de
2001 a 2017, totalizando 63 arti-
gos. Tal resultado corrobora o ex-
posto por Rosa et al. (2010), Mar-
tinez (2013) e Seidler e Decourt
(2014). Estes últimos autores, por
exemplo, ressaltam que, apesar de
ser um tema ainda pouco explora-
do no Brasil, o número de publi-
cações tem aumentado no perío-
do recente.
Na Figura 2, demonstram-se os
resultados da análise dos artigos
de acordo com a sua classificação
Fonte: Dados da pesquisa.
em teóricos e empíricos para o pe-
ríodo analisado. Observa-se uma
predominância na publicação de Figura 3 – Classificação dos artigos por área abordada
artigos empíricos comparados aos
teóricos (62 a 1). Tais resultados
coadunam com o exposto em Ave-
lar e Santos (2010) e Seidler e De-
court (2014), mesmo com recor-
tes temporais distintos. Paula et
al. (2012) destacam o crescimen-
to dos métodos e paradigmas com
base empírica, principalmente a
partir do século XXI, enquanto há
uma diminuição dos métodos não
empíricos, ou teóricos, o que nos
mostra a tendência de concentra-
ção desse tipo de método. Com
relação à diminuição das publica-
ções de pesquisas teóricas: Fonte: Dados da pesquisa.

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 83

et al. (2011) e Machado e Beuren Figura 4 – Classificação dos artigos por abordagem metodológica
(2014), que relataram que mais
de 50% dos estudos empíricos em
Contabilidade analisados, apre-
sentaram caráter quantitativo em
seu desenvolvimento.
Na Figura 5, demonstra-se a
totalidade dos estudos desen-
volvidos no Brasil sobre Geren-
ciamento de Resultados, identifi-
cando qual tipo de manipulação
era abordado nas pesquisas. Para
isso, levantou-se quais publica-
ções eram voltadas somente para
o estudo de GRA e quais aborda-
vam para ambos os casos (GRA
Fonte: Dados da pesquisa.
e GRDO). Nessa análise, não foi
possível identificar casos de es-
Figura 5 – Classificação dos artigos quanto ao tipo de
tudos dos sobre GRDO devido à
falta de artigos que abordassem
manipulação abordado
somente este tema. Conforme Ta-
bela 5, há uma superioridade de
pesquisas que adotaram, como
base de informação, as mani-
pulações somente nos acrualls,
82,5%, enquanto 17,5% para
ambos os tipos na pesquisa. Tal
resultado ratifica o exposto em
Martinez (2013) e Machado e
Beuren (2014). Aquele autor en-
fatiza que a grande maioria dos
trabalhos científicos publicados
no Brasil ainda é concentrada no
GRA em detrimento do GRDO.
Na Tabela 1, tem-se a relação Fonte: Dados da pesquisa.
dos principais métodos de cole-
ta de dados utilizados nos artigos
Tabela 1 – Quantidade de métodos usados para coleta de dados
publicados analisados. O princi-
nas publicações
pal método utilizado pelos au-
Frequência
tores para a coleta de dados em Métodos
Absoluta Relativa (%)
seus estudos foi por meio do uso Bases de dados 60 78,95
de um banco de dados (Econo- DELPHI 0 -
mática®, por exemplo). Na Tabela Entrevistas não estruturadas 0 -
1, verifica-se que 78,9% das pes- Entrevistas semiestruturadas 0 -
quisas analisadas abordaram esse Experimento 0 -
método de coleta de dados. Esse História de vida 0 -
História oral 0 -
resultado expressivo corrobora as
Observação não participante 0 -
análises de Avelar e Santos (2010)
Pesquisa ação 0 -
e Seidler e Decourt (2014). Salien- Pesquisa bibliométrica 7 9,21
ta-se que o uso de pesquisas do- Pesquisa documental 8 10,53
cumentais e bibliométricas tam- Questionário 1 1,32
bém são usualmente empregadas Total 76 100,00
nas pesquisas das áreas de Conta- Fonte: Dados da pesquisa.

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84 Análise Bibliométrica sobre gerenciamento de resultados no século XXI

bilidade que foram apuradas. 5. Considerações finais estrato A1 a B3 do Qualis, no pe-


Já, na Figura 6, tem-se o nú- ríodo entre 2001 e 2017.
mero de autores por artigo con- O estudo apresentado neste No total, foram identificados e
siderando todos os artigos averi- artigo buscou contribuir para a analisados 63 artigos. Os resultados
guados. Entre todos os trabalhos reflexão e discussão sobre como indicaram uma grande expansão
acadêmicos publicados no período tem sido tratado o tema “geren- das pesquisas publicadas sobre ge-
analisado, 87,30% dos estudos fo- ciamento de resultados em perió- renciamento de resultados no Brasil
ram feitos por 2 a 4 autores. Esse dicos de Contabilidade no Brasil.” nos últimos anos. Entretanto, o es-
dado demonstra que há uma me- Inicialmente, o trabalho mostrou a tudo também apontou que há uma
nor individualidade das pesquisas importância deste tema para a so- grande centralização da produção
e, com isso, maior participação, ciedade, abordando o crescimento dos artigos no Brasil abordando es-
interação e troca de informações acerca das publicações e estudos tudos similares. Identificou-se que
entre os pesquisadores. Essa forte do tema, tanto a nível nacional há uma hegemonia em artigos em-
integração entre os autores corro- quanto internacional. Na pesqui- píricos comparados aos teóricos,
bora os estudos de Avelar e Santos sa, analisaram-se os principais pe- bem como uma superioridade em
(2010), Seidler e Decourt (2014) e riódicos publicados brasileiros de publicações de caráter quantitativo
Machado e Beuren (2014). Contabilidade da área de “Admi- em relação àquelas de caráter qua-
Por fim, na Figura 7, aponta-se nistração Pública e de Empresas, litativo. Há, ainda, uma superiorida-
o número de publicações por au- Ciências Contábeis e Turismo” de de de estudos voltados para a área
tor observado e o estimado com
base na Lei de Lotka. Este gráfi-
co sinaliza que foram observadas Figura 6 – Número de autores por artigo
136 publicações feitas por apenas
1 (um) autor versus 94 estimadas
pela Lei de Lotka. O estimado era
de 60,80% e o observado foi de
87,74%. Tal resultado indica uma
baixa consolidação nas pesquisas,
o que tende a influenciar nega-
tivamente o desenvolvimento da
área. Tal situação já foi averiguada
em outros estudos sobre o tema,
com recortes temporais e amos-
trais diferentes, como Rosa et al.
(2010), Avelar e Santos (2010) e
Machado et al. (2011). Em todos Fonte: Dados da pesquisa.

os casos, observou-se uma gran-


de quantidade de trabalhos sen- Figura 7 – Relação entre autores e artigos considerado a Lei de Lotka
do realizadas por poucos autores
(continuants), enquanto a grande
maioria dos pesquisadores publi-
cou apenas um artigo no perío-
do (one-timers). Segundo aque-
les primeiros autores, “o campo
de produção científica nessa área
não está consolidado, caracteri-
zando-se pela existência de redes
de relacionamentos pouco coe-
sas e integradas entre autores e
entre instituições, indicando que
muitas conexões ainda podem ser
estabelecidas” (ROSA et al., 2010,
p. 189). Fonte: Dados da pesquisa.

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REVISTA BRASILEIRA DE CONTABILIDADE 85

“ Os resultados indicaram uma grande expansão


das pesquisas publicadas sobre gerenciamento de
resultados no Brasil nos últimos anos. Entretanto,
o estudo também apontou que há uma grande
centralização da produção dos artigos no Brasil
abordando estudos similares.

da Contabilidade Financeira. Entre que deveriam existir mais publica- Apesar dessas limitações, acredi-
os estudos levantados, o método de ções abordando outros pontos de ta-se que a pesquisa reportada
coleta de dados preponderante foi vista acerca de gerenciamento de neste trabalho tenha contribuído
de banco de dados. resultados. para o estudo do tema gerencia-
Dos artigos analisados, cons- Entre todos artigos publicados mento de resultados, ao destacar
tatou-se que 82,5% das pesquisas analisados, a maioria das publica- algumas das características dos
abordaram sobre o GRA. Esse re- ções foram elaboradas por mais de principais artigos sobre o mesmo.
sultado, segundo Martinez (2013), um autor, o que reforça a maior in- Além disso, identificaram-se pon-
sinaliza que as publicações traba- teração entre os pesquisadores na tos que poderiam ser mais abor-
lham mais com a questão do ge- área. Por outro lado, baseando-se dados pelos pesquisadores, a fim
renciamento de resultados pelos na lei bibliométrica desenvolvida de sustentar o incentivo ao estudo
accruals, embora existam outras por Lotka, apurou-se que há uma de outros pontos da área temáti-
áreas que podem ser estudadas e baixa consolidação nas pesquisas ca, tanto na área financeira quan-
levadas ao público, tais como os voltadas ao tema gerenciamen- to gerencial.
estudos sobre GRDO. Em parte, to de resultados, uma vez há uma Pesquisas futuras poderiam tra-
tal situação parece negativa para grande quantidade de estudos de- zer para análise estudos acadêmicos
a produção de conteúdo na área, senvolvidos por apenas um autor publicados em outros países, bem
uma vez que a grande maioria (one-timers), um aspecto negativo como em outros veículos de comu-
dos estudos é elaborada da mes- na consolidação da área. nicação pública (anais de congres-
ma forma, abordando casos simi- Salientam-se algumas limita- sos, teses, dissertações, livros, etc.).
lares. Assim, em tese, os artigos ções da pesquisa desenvolvida. Desse modo, tais estudos possibili-
seguem uma mesma linha de ra- Primeiramente, o estudo enfocou tariam uma comparação com os pe-
ciocínio, indicando certa consoli- somente periódicos, e não foram riódicos nacionais. Outra sugestão
dação, mas pouco contribui para considerados outros veículos de é de que fosse levantado quais as
uma diversidade de áreas a respei- comunicação pública de informa- causas que levam os pesquisadores
to de gerenciamento de resulta- ções científicas. Ademais, foram no Brasil a trabalharem mais com
dos a serem discutidos pela acade- consideradas somente pesquisas pesquisas voltadas ao gerenciamen-
mia. Por ser um tema prolífico de escritas em português e inglês pu- to de resultados por accruals (GRA)
possíveis perspectivas, acredita-se blicadas em periódicos nacionais. em detrimento do GRDO.

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86 Análise Bibliométrica sobre gerenciamento de resultados no século XXI

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