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Autoridade autoritária
Telma Pileggi Vinha (novaescola@atleitor.com.br), professora do Departamento de Psicologia Educacional da
Faculdade de Educação da Unicamp
Ao entrar em sala após o intervalo, para dar aula no 8º ano, o professor depara-se com
brincadeiras comuns entre os adolescentes. Alguns imitam os outros e remedam gestos e falas.
Borrachinhas e papéis voam na busca de alvos móveis que tentam se defender com cadernos e
livros. Outros três jogam uma bolsa para lá e para cá, entre eles, enquanto uma garota tenta
pegá-la, pedindo em vão para que a devolvam e parem com aquela “brincadeira idiota”. Assim,
entre risadas e protestos, o professor dá um grito exigindo que parem, manda devolver a bolsa
para a aluna, ameaça colocar um ou dois para fora da sala e rapidamente os estudantes se
sentam e fazem silêncio.
Pouco depois, no decorrer da explicação, um celular toca e o professor ordena que o aparelho
seja entregue. O dono diz que tinha se esquecido de acionar o modo silencioso, que “foi mal” e
que não iria entregá-lo. O professor insiste, dizendo que eram as regras da escola, ameaçando
enviar um bilhete aos pais e encaminhar o garoto à direção. O aluno responde que ele não tem
esse direito e, exaltado, insulta-o. Diante disso o professor expulsa o garoto da sala, que se retira
dizendo um palavrão entre os dentes. Disfarçadamente, alguns colegas conferem se os celulares
estão devidamente silenciados.
A reação
Diversos estudos nacionais e internacionais indicam que essa forma de lidar com os conflitos
contribuem, em longo prazo, para formar jovens com baixo índice de habilidade social,
apresentando dificuldades para emitir opiniões, argumentar, ouvir perspectivas diferentes sem
que se sintam ameaçados, tomar decisões, expor e discutir sentimentos e coordenar perspectivas
em ações efetivas. Na resolução de seus próprios conflitos, empregam mecanismos ainda
primitivos, entre eles, as reações impulsivas, submissas ou agressivas, a não interação, as
soluções unilaterais, a mentira...
Adolescentes aparentemente afáveis agem de forma impulsiva e violenta longe dos olhos dos
adultos. Outros empregam formas submissas para resolver seus problemas, curvando-se à
vontade de um terceiro, desconsiderando os próprios sentimentos, valores e perspectivas.
Muitos utilizam os meios de comunicação eletrônica para insultar, vingar-se ou intimidar os
colegas. Pesquisas internacionais recentes indicam que por volta de 23% dos alunos de 11 a 19
anos já foram intimidados ou ameaçados pela internet (em 2000, eram apenas 6%).
É isso que queremos para nossa sociedade? Até quando vamos adotar esse modelo de Educação
que em nada contribui para que nossos jovens aprendam a se relacionar de forma mais
respeitosa e satisfatória? Até quando vamos abrir mão de ajudá-los a desenvolver a capacidade
de expressar perspectivas sem causar dano aos outros e de buscar soluções não violentas e
cooperativas para seus conflitos?
Diante da notícia recente de duas adolescentes que se agrediram fisicamente tendo o incentivo
da mãe de uma delas, muitas pessoas ficaram perplexas e espantadas... As questões que
apareceram nas reportagens demonstravam preocupação com a forma como nossos jovens estão
resolvendo conflitos. Por que parecem utilizar cada vez mais estratégias violentas para lidar com
as desavenças? O que está acontecendo com as famílias? Como uma mãe pode estimular sua
filha a bater diante de um conflito? Deve-se retirar a guarda da mãe?
Esse tipo de questão reflete um paradigma ainda bastante presente entre os profissionais de
Educação, de que a escola é vítima de uma sociedade violenta, de famílias permissivas ou
negligentes... Então a escola se isenta de responsabilidade sentindo-se impotente para lidar com
tais problemas, ainda mais quando ocorrem “fora dos muros da instituição”. Como colocamos
anteriormente, apesar de contribuir expressivamente com tais situações, a escola não se dá
conta desse fato, impossibilitando-a, devido à força dessa crença, de realizar uma séria revisão
interna, de transformar-se.
O resgate da autoridade em educação, Gérard Guillot, 192 págs., Ed. Artmed, 44 reais
Quando a Escola é Democrática – Um Olhar Sobre a Prática das Regras e Assembleias na Escola, Luciene
Regina Paulino Tognetta e Telma Pileggi Vinha, 144 págs., Ed. Mercado de Letras, 32 reais
Relação Pedagógica Disciplina E Indisciplina na Aula, Maria Teresa Estrela, 128 págs., Ed. Porto,
www.portoeditora.pt, 53,17 reais (à venda na Livraria Cultura)
Resolução de Conflitos e Aprendizagem Emocional, Genoveva Sastre e Montserrat Moreno, 296 págs., Ed.
Moderna, 44 reais
Internet
A Qualidade da Educação sob Olhar dos Professores, da Fundação SM e da Organização dos Estados Ibero-
americanos (OEI)
Tese de doutorado O Processo de Resolução de Conflitos entre Pré-Adolescentes: O Olhar do Professor, de
Sandra Cristina Carina
Tese de doutorado Os Conflitos Interpessoais na Relação Educativa, de Telma Vinha
Dissertação de mestrado A Construção da Solidariedade em Ambientes Escolares, de Luciene Tognetta
Anais do I Congresso de Pesquisas em Psicologia e Educação Moral
Texto A Dimensão Ética na Obra de Jean Piaget, de Yves de La Taille
Texto Moralidade e Violência: A Questão da Legitimação de Atos Violentos, de Yves de La Taille
Pesquisa Valores dos Jovens de São Paulo, da Fundação SM
Projeto institucional:
Repensar a indisciplina
Saiba como estimular a equipe a refletir sobre a própria postura e orientá-la
para atuar frente a situações de conflito na escola.
2. Não agir de improviso. Manter-se calmo e controlar suas reações. Os problemas não precisam
ter uma resposta imediata por parte da equipe escolar. Agir de improviso pode levar a atitudes
pouco adequadas.
3. Reconhecer sentimentos e orientar comportamentos. Ficar bravo e com raiva é uma reação
natural de qualquer ser humano. Dizer ao aluno "você não pode se sentir assim" ou "você não
pode ficar com raiva do seu amigo" é, portanto, inadequado. Oriente-o dizendo algo do tipo:
"Você deve mesmo ter ficado muito bravo, mas bater no colega resolveu o problema?"
4. Acreditar que o conflito pertence aos envolvidos. Isso não significa aceitar qualquer
alternativa de resolução ou se alienar do problema. Você deve ser um mediador, ajudando-os a
descrever o problema, incentivar que falem sobre os sentimentos e as ações e busquem soluções,
sempre incidindo sobre a causa e respeitando princípios. Acompanhe, a seguir, uma proposta de
formação para a equipe, fundamentada na bibliografia indicada em cada etapa.
Objetivos
- Promover uma mudança de olhar em relação à indisciplina, estudando conceitos de
desenvolvimento moral e ético e adotando-os como conhecimento necessário ao processo
educacional
- Estimular a equipe a refletir sobrea própria postura.
- Conhecer os princípios de um ambiente de cooperação.
- Analisar o regimento da escola.
- Orientar a atuação da equipe frente a situações de conflito.
Conteúdos
- Desenvolvimento moral.
- Ética.
- Valores humanos.
Tempo estimado
No mínimo um ano, com reuniões semanais no horário de trabalho coletivo. Os problemas não
acabam depois desse período. O objetivo é que todos aprendam a lidar com eles.
Desenvolvimento
1ª etapa
Para começar, levante com a equipe quais as principais situações de indisciplina na visão deles.
Organize o grupo em duplas. Cada uma deverá classificar as situações em categorias e
apresentá-las. Anote os resultados e guarde-os para retomá-los no fim da formação. O próximo
passo é aproximá-los do significado de indisciplina. O que a distingue da violência, por
exemplo? Para isso, além de consultar a bibliografia, use o mapa conceitual disponível no site
para orientar a discussão dos seguintes pontos:
- A indisciplina escolar é um sintoma de que algo não vai bem. Se há conflitos, a falha está na
relação e não nas pessoas.
- O comportamento indisciplinado é algo a ser alterado, mas isso só vai acontecer se as
responsabilidades forem divididas entre todos. Não é mais possível dizer que "aqueles alunos do
professor X são bagunceiros". Os alunos são de todos e deve haver parceria para transformar a
situação.
Bibliografia O Mapa do Problema Escolar: Quando a Cidadania Parece Não Ser Possível
(Anais do XXII Encontro Nacional de Professores do Proepre - Educação e Cidadania),
Luciene Tognetta
2ª etapa
O foco da discussão se desloca para a origem da indisciplina. A ideia é discutir a prática da
equipe escolar, as propostas didáticas, o domínio do professor sobre o conteúdo, sua postura
frente ao aluno e sua ação em situações de conflito (como citado na introdução).
Bibliografia Estratégias de Intervenção nos Processos de Desenvolvimento Profissional e
Pessoal Docentes (II Congresso Internacional do CIDInE: Novos Contextos de Formação,
Pesquisa e Mediação), Ana Aragão e Idália Sá-Chaves
3ª etapa
Realize o acompanhamento direto do trabalho docente em sala de aula, com gravação em vídeo
ou observação e registro realizado pelo coordenador durante as aulas, momentos de recreio,
entrada e saída, dependendo de onde o problema se localiza. Em seguida, o grupo deverá
discutir a postura do professor e dos alunos com base nos conceitos estudados. Aqui, é
obrigatório que o observado consinta em ser objeto de análise e discussão.
Bibliografia Autoscopia: Um Procedimento de Pesquisa e de Formação (Educação e
Pesquisa, São Paulo, v. 30, n. 3, p. 419-433), Ana Aragãoe Priscila Larocca
4ª etapa
Para seguir uma regra, é preciso entender sua razão de ser. Se não houver explicação que a
justifique, a restrição pode e deve ser questionada. A ideia, nessa etapa, é analisar o regimento
da escola. Os problemas têm mais a ver com as regras morais ou com as convencionais? Os
princípios que fundamentam o projeto pedagógico devem ser discutidos. Como sugestão, tome
como base a Declaração Universal dos Direitos do Homem.
Bibliografia Viajantes Destemidos sem Mapas Precisos: Professores-Formadores
(Professor Formador: Histórias Contadas e Cotidianos Vividos, Ed. Mercado de Letras),
Vera Lucia Sabongi de Rossi
Avaliação
Por meio de questionários, peça aos alunos, funcionários e pais que analisem se houve avanços.
Resgate a listagem feita no começo do projeto e peça que a equipe docente altere o que achar
necessário, revendo as categorias definidas anteriormente.
Criança e Adolescente
Comportamento
Janeiro 2002
Ano novo, novos desafios. O maior deles, provavelmente, é conquistar a turma, fazê-la produzir
mais do que o esperado, criar condições para que todos aprendam. Por isso, preparamos duas
reportagens para começar as aulas com o pé direito. Veja aqui sugestões para transformar o
pátio num verdadeiro ambiente educativo, capaz de reduzir a agressividade dos estudantes e
ajudá-los a se tornar mais participativos e menos indisciplinados, o tema desta página.
Como lidar com os grupinhos que não param de conversar e não participam das atividades? E
com os que, semana após semana, deixam de fazer a lição? Sem falar nos problemas mais
graves, como a falta de respeito dentro da classe, os xingamentos e, o pior, as agressões verbais e
físicas. Pesquisa realizada no ano passado pelo Observatório do Universo Escolar, em parceria
com o Ministério da Educação, constatou que a indisciplina é uma das causas mais apontadas
pelos professores para o fracasso do planejamento inicial.
"A família não impõe limites!" "É a televisão que educa as crianças." "Eles não estão a fim de
nada, não têm jeito!" Quantas vezes você já não ouviu (ou proferiu) essas frases? Não há dúvidas
de que boa parte do problema passa mesmo pela família, ausente e desestruturada, pelos
programas de TV, cada vez mais violentos, e pelo próprio jovem, cujo caráter ainda está em
formação. Mas saber disso não resolve o problema. Nesta reportagem, são apontados três
caminhos para compreender e resolver a questão: a diferença entre autoridade e autoritarismo,
a importância de compreender a necessidade que o jovem tem de se expressar e as vantagens de
construir pactos com a garotada (tema também da coluna de estréia de Julio Groppa Aquino).
Tudo para transformar a indisciplina em aliada.
Autoridade se constrói
Ana Kennya Félix, que leciona Língua Portuguesa na Escola Crescimento, em São Luís, dá uma
boa amostra de como fazer isso. Certo dia, ela encontrou sua classe de 7ª série em pé de guerra
por causa de uma discussão entre os meninos. Um deles desafiou-a a "botar moral".
Calmamente, ela pediu que todos se sentassem e deu início a uma conversa sobre o sentido de
"moral" (no caso, ordem). "Eles não esperavam esse encaminhamento e o debate serviu para a
gente pensar sobre os limites de nossos atos", constata a professora.
O professor precisa desempenhar seu papel o que inclui disposição para dialogar sobre objetivos
e limitações e para mostrar ao aluno o que a escola (e a sociedade) esperam dele. Só quem tem
certeza da importância do que está ensinando e domina várias metodologias consegue desatar
esses nós. Maria Isabel Fragoso, professora de História do Colégio Albert Sabin, em São Paulo,
sabe que sua disciplina requer muitas aulas expositivas. Mas ela notou que não conseguia
atenção suficiente ao falar diante do quadro-negro. A saída foi propor à garotada a criação de
encenações sobre alguns períodos históricos. Resultado: o desinteresse e a bagunça logo se
transformaram em mais concentração.
Bagunça ou inquietação?
Cintia Copit Freller, professora de Psicologia Escolar do Instituto de Psicologia da USP, nos
ajuda a compreender essa pergunta. "A indisciplina é uma das maneiras que as crianças e os
adolescentes têm de comunicar que algo não vai bem". Por trás de uma guerra de papel podem
estar problemas psíquicos ou familiares. Ou um aviso de que o estudante não está integrado ao
processo de ensino e aprendizagem. Cerca de 95% dos casos atendidos pelo Serviço de
Orientação à Queixa Escolar, coordenado por Cintia, são resolvidos na própria classe. O truque é
transformar a contestação em aliada, dando atenção ao jovem e ajudando-o a entender o que o
incomoda.
Ok, a contestação é natural em crianças e jovens, mas como lidar com ela? Ana Paula Gama,
regente de uma turma de 4ª série da Escola Municipal de Ensino Fundamental Vianna Moog,
em São Paulo, conta o que fez para "domar" um garoto tido como o terror em pessoa. "Augusto*,
então com 12 anos, era conhecido desde a 1ª série como agressivo e desinteressado. A mãe
freqüentemente assistia às aulas a seu lado e ajudava nas lições de casa. Tudo em vão", lembra a
professora.
"Quando há relacionamento afetuoso, qualquer caso pode ser revertido em pouco tempo",
afirma Tânia Zagury, psicóloga e pesquisadora em educação. Ana Cely Monteiro da Silva, da
Escola Municipal Ciro Pimenta, em Belém, precisou de apenas três meses para incluir Márcio*
na turma de 2ª série. Com 13 anos, ele não tinha amigos, ameaçava os colegas e se dizia "do
mal". Faltava muito e, quando aparecia, contestava tudo.
Cely sabia que o problema estava em casa. Por ocasião do Dia dos Pais, ela decidiu trabalhar um
texto sobre relacionamento familiar. Na hora do debate, Márcio expôs o próprio drama: pai
desempregado, alcoólatra e violento. "Ele tinha bom vocabulário e gostava de expor suas idéias",
lembra a professora. O passo seguinte foi elogiar as colocações do menino e propor discussões
sobre outros temas. Ao ver seus interesses contemplados na classe, o jovem se tornou assíduo e
participativo. "Aliar as necessidades de ensino-aprendizagem às preferências da turma é uma
estratégia que sempre dá certo", garante Nívea Maria de Carvalho Fabrício, presidente da
Associação Brasileira de Psicopedagogia.
Contrato pedagógico
Finalmente, chegamos ao contrato pedagógico. Como todos os acordos que celebramos na vida
(aluguel, casamento etc.), este também é um pacto com aspirações e obrigações. Como escreve
Julio Aquino, não se trata de definir o que não é permitido fazer na sala de aula e na escola, mas
de abrir um diálogo entre professor e alunos para estabelecer o que é bom para todos e aqui, o
exemplo de uma escola talvez não sirva para outra.
"É nossa função dizer à turma tudo o que cabe a ela para facilitar o ensino", diz. "Em
contrapartida, devemos mostrar empenho em fazer todos aprenderem. Só assim os jovens
encontram sentido nos conteúdos e participam mais."
Com responsabilidade, todos devem dizer o que querem e o que não querem que aconteça neste
ano letivo que se inicia. Vale a pena redigir essa carta de intenções. Pode chamar de contrato
mesmo, ou de combinado. As regras podem valer para o ano todo ou para uma atividade
específica. Como em todo diálogo, esse também pressupõe a possibilidade de rever posições, se
necessário. Assim, todos vão incorporar e cumprir as normas de conduta. E a indisciplina, que
antes incomodava, se transforma numa grande aliada.
Os especialistas e o nó da disciplina
Serviço de Orientação à Queixa Escolar do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, Av.
Prof. Lúcio Martins Rodrigues, bl. D, CEP 05508-900, São Paulo, SP, tel. (11) 3818-4172
BIBLIOGRAFIA
Adolescência na Escola, Margarete Parreira Miranda, 223 págs., Formato Editorial, tel. (31) 3413-1720, 14,90
reais
Histórias da Indisciplina Escolar, Cintia Copit Freller, 251 págs., Casa do Psicólogo Editora, tel. (11) 3062-
4633, 30 reais
Indisciplina na Escola Alternativas Teóricas e Práticas, Julio Groppa Aquino (org.), 148 págs., Summus
Editorial, tel. (11) 3872-3322, 21,30 reais
(In)Disciplina, Escola e Contemporaneidade, Maria Lúcia M. Carvalho Vasconcelos (org.), 259 págs., Ed.
Mackenzie, tel. (11) 3236-8666, 15 reais
Indisciplina: Um Signo Geracional, Daniel Sampaio, publicação do Instituto de Inovação Educacional do
Ministério da Educação de Portugal, disponível no site www.iie.min-edu.pt/biblioteca/ccoge06/
À beira do caos
Sabe aqueles momentos em que você acha que perdeu o controle sobre a
turma? Calma, todos já passaram por isso. E sempre tem uma solução
Tudo estava planejado: você iniciaria o dia com a roda de conversa e, depois, desenvolveria
atividades artísticas. Os pequenos fariam desenhos, sentados nas carteiras, até a hora do recreio.
De repente, um tumulto, uma agitação. Em segundos, eles corriam de um lado para o outro,
gritando, chorando, chamando por você. Que desespero! Você pede a atenção de todos, mas o
barulho é tamanho que ninguém escuta a sua voz pedindo silêncio. O que fazer? Gritar também?
Sair correndo? Sentar e chorar?
Nessas ocasiões, somente calma, jogo de cintura e conhecimento sobre as causas da desordem
ajudam a encontrar a melhor saída. NOVA ESCOLA ouviu cinco professoras que ficaram à beira
de um ataque de nervos. Especialistas comentam os episódios, explicando os motivos que
levaram à desordem, dão dicas de como agir e indicam a melhor maneira de evitar que episódios
desse tipo se repitam.
- OS FATOS "Perdi o controle da classe em uma situação bastante inusitada. Uma garota foi
viajar com a família no período de aulas e prometeu aos colegas que traria chocolates para todos
na volta. A turma de 4 anos aguardou ansiosamente o retorno. No dia em que a viajante chegou,
estávamos sentados no chão, terminando uma roda de conversa. Ela apareceu na porta, com
uma enorme caixa enfeitada.
- O QUE FAZER? Como é difícil para os pequenos controlar emoções e reações, a melhor
atitude é tentar conciliar os interesses do grupo. "A professora poderia ter distribuído a
guloseima ao mesmo tempo em que a garota contava sobre os lugares visitados", sugere Macedo.
2 "Ops... Caiu..."
Típico teste de limites
- OS FATOS "Eu já era professora há oito anos e, apesar disso, passei um sufoco danado
quando precisei lidar com um menino de 3 anos que me testava o tempo todo. Havia na sala
uma bancada repleta de brinquedos. No meio das atividades, ele se levantava, colocava a mão
sobre o móvel e me lançava um olhar desafiador, ameaçando derrubar tudo no chão. Não dava
outra: era só eu falar que não podia para ele colocar tudo abaixo. Eu ou a assistente
reorganizávamos o espaço. Uma vez, fiquei a seu lado até que ele mesmo arrumasse a bagunça.
Mas, quando estava quase terminando, o garoto derrubava tudo novamente. Nesse dia, não
demorou muito para as outras crianças se agitarem, falando alto, puxando e empurrando uns
aos outros. Percebi que elas também queriam a minha atenção. Pedi, então, para a auxiliar levá-
las ao parque até a hora da saída. Já o menino permaneceu meia hora a mais na sala, mas
colocou todos os brinquedos no lugar."
Thais Silva, Escola Baby Mel, Salvador, BA
- COMO EVITAR? Sempre haverá crianças que necessitam de atenção mais individualizada em
alguns momentos. "Aliás, este conflito diário acontece em todas as escolas: como atender o todo
e cada um ao mesmo tempo?", reflete Lino de Macedo. Por isso, é importante ter sempre dois
educadores em sala para um dar cobertura ao outro.
- OS FATOS "Durante a Semana do Livro na escola, uma das atividades programadas para a
minha turma era montar uma maquete do Sítio do Picapau Amarelo. Como nem todas as
crianças se interessaram, realizei o trabalho com apenas algumas. Às outras, sugeri que lessem
ou brincassem. Assim que abri o primeiro pote de tinta para pintar a base da estrutura, quem
havia ficado de fora foi se aproximando. O burburinho aumentou quando os personagens
começaram a surgir dos recortes no papel-cartão. Todos queriam participar, mas não havia
material. Parei tudo, coloquei a maquete no meio da sala e fui relembrando as histórias de
Monteiro Lobato. Só assim conseguimos terminar o projeto."
Rosiane Perovano, EMEI Teresita Borrini Farina, João Neiva, ES
- O QUE ACONTECEU? A classe foi dividida em dois grupos, porém os objetivos de um não
estavam relacionados à atividade principal, para a qual havia mais dedicação da professora.
- COMO EVITAR? A situação relatada poderia não ter ocorrido se tivessem sido adotados
critérios didáticos durante a organização da classe. A divisão das crianças em grupos para a
realização de diferentes tarefas não é um problema em si. Porém todas precisam estar
relacionadas ao mesmo objetivo. O psicólogo espanhol César Coll, professor da Universidade de
Barcelona, aponta que em atividades em grupos o professor precisa ficar atento às condições de
trabalho. Isso inclui cuidar da composição das equipes e da distribuição de tarefas, dar as
instruções iniciais, explicar o que será feito, construir possibilidades de interações entre os
grupos e, principalmente, fazer com que todos participem do resultado final coletivo.
4 "Foi ele quem começou!"
Briga entre os pequenos
- OS FATOS "Quando eu trabalhava com uma sala de 5 anos, costumava ter como primeira
atividade do dia uma roda de conversa. Às segundas-feiras, falávamos sobre o fim de semana.
Naquele dia, todos chegaram muito agitados e, nem bem iniciamos o bate-papo, duas crianças
começaram a se provocar. Achei que não ia dar em nada e continuei a ouvir os outros. Mas a
briga iniciou rapidamente e a turma se dividiu em duas torcidas. Eu e a outra professora
seguramos os 'brigões' e, quando tudo se acalmou, sugeri que fôssemos ao parque extravasar."
Maricélia Rocha, CEI Grão da Vida, São Paulo, SP
- COMO EVITAR? É preciso ficar atento a esse tipo de situação e isolar as crianças antes que o
conflito se espalhe para o resto da classe. Além disso, o episódio rende assunto para uma
próxima roda de conversa sobre, por exemplo, atitudes amistosas entre os colegas e dificuldades
no convívio. "Manter um bom relacionamento é difícil para todo mundo. Imagine, então, para
quem tem 5 anos", diz Zilma de Oliveira.
- OS FATOS "Sou professora de uma turma de 4 anos e conto com a ajuda de uma auxiliar.
Certo dia, ela se ausentou para ir ao médico. Como ficaria sozinha durante um longo período
depois da hora do recreio, quando os pequenos voltam bem agitados, organizei uma atividade
que, na minha opinião, seria bem tranqüila: finalizar um trabalho de arte iniciado na semana
anterior. Quando as crianças já estavam de volta à sala, fui procurar os desenhos e não os
encontrei. Enquanto buscava desesperadamente o material, pedi que a turma pegasse os gibis e
livros que tínhamos espalhados pelos cantos, o que não estava programado. Os pequenos
ficaram muito confusos e em pouco tempo estavam em polvorosa. Bateu aquele desespero!
Coloquei-os em roda e sugeri cantar uma música mágica: a música do silêncio. Foi a salvação!"
Mariana Cardoso, Escola Espaço Nossa Casa, São Paulo, SP
- O QUE ACONTECEU? A falta de organização antecipada dos materiais e de um plano B
foram os motivos do tumulto. As crianças se sentiram desorientadas porque provavelmente não
tinham o hábito de usar livros e gibis em sala - a atividade que foi sugerida. A professora ainda
teve de lidar com o próprio emocional, que estava abalado: a inquietação dela certamente foi
percebida pela garotada, e um nervosismo alimentou o outro. Junte-se a isso os elementos de
frustração da professora, e está instalado o caos.
- O QUE FAZER? Apesar de não estar preparada para um contratempo, uma vez que o tumulto
foi instaurado, a professora conseguiu ref letir e agir corretamente. Ao propor uma atividade
envolvendo música e canto, ela começou a mudar a atmosfera emocional não apenas das
crianças, mas principalmente a dela, o que também ajudou a estabelecer novamente a calma e a
reorganizar tudo.
- COMO EVITAR Heloísa Dantas, professora da Faculdade de Educação da USP, alerta: estar
preparada para a sala de aula significa não só ter o planejamento em mãos, antecipando
possíveis contratempos, mas também ter o ambiente arrumado com antecedência. E nem tudo
precisa ser resolvido pelo professor. Uma possibilidade é familiarizar as crianças com um espaço
planejado para que elas tenham autonomia e atuem de maneira exploratória em qualquer
situação, mesmo as não previstas ou combinadas.