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Campanhas ineficazes e moralismo levam a aumento

de casos de HIV entre jovens, dizem especialistas


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February 17, 2019

Ministério da Saúde não divulga investimentos em ações de


conscientização

Isabela Aleixo* e Renato Grandelle

17/02/2019 - 04:30 / Atualizado em 17/02/2019 - 07:49

Salvador Corrêa, portador do vírus HIV, narrou sua vida como soropositivo
em blog, depois transformado em livro e peça: para ele, falta de
campanhas impulsionou maior número de casos Foto: Gabriel Monteiro /
Agência O Globo

RIO — Salvador Corrêa recebeu o diagnóstico de HIV aos 27 anos, após


uma relação sexual. Não sabe se foi em um episódio em que não usou
preservativo, ou em outro em que a camisinha estourou. Abatido, isolou-se
da família e dos amigos. Resolveu, então, desabafar a angústia em seu
blog, onde escrevia anonimamente como era carregar o estigma de uma
“pessoa contaminada”.

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— É um sentimento de solidão total, de carregar um segredo que não pode


ser revelado porque há muito preconceito — revela Salvador, hoje com 34
anos. — Parece que você é o vírus. Que não pode mais tocar ou se

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aproximar de ninguém. Primeiro, sofri por ser homossexual. Depois,
aparece este novo desafio.

Avanço do HIV
8.086
Detecção de casos pelo Ministério da Saúde explodiu em apenas dez anos
2.629
8.129
1.348
2.355
2.489
988
332
823
2007
2012
2017
Total
2.668
5.807
18.704
Fonte: Ministério da Saúde
A história de Salvador comoveu seus leitores, que o mostraram que, devido
ao avanço dos tratamentos médicos, o medo de ver o rosto e o corpo
transformados pelo HIV não condiz com a realidade. Salvador reuniu os
textos em um e-book, “O segundo armário”, adaptado recentemente para

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uma peça teatral — uma nova temporada está prevista para abril, no Rio.
Hoje, ele é ativista no combate ao vírus e identifica os jovens como o
público mais carente de assistência.

De fato, o Boletim Epidemiológico HIV Aids 2018,


divulgado pelo Ministério da Saúde, mostra como a
detecção do vírus entre os jovens aumentou em
apenas dez anos. Entre 2007 e 2017, a notificação de
casos de HIV de pessoas com 15 a 24 anos aumentou
aproximadamente 700%. Especialistas acreditam que a explosão de
ocorrências se deve à maior disponibilidade de testes e a campanhas de
conscientização cada vez mais acanhadas:

— O jovem não usa mais camisinha, mas o discurso não deve ser restrito a
isso. É fato que as campanhas e o debate têm sido silenciados por forças
conservadoras.

Diretor-presidente da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia),


Richard Parker acredita que o país vive uma epidemia de HIV. Nos últimos
anos, campanhas voltadas para os públicos mais vulneráveis à infecção
pelo vírus, como transexuais e profissionais do sexo, provocaram protestos
entre setores da sociedade.

— Não considero que as pessoas perderam medo, mas sim acesso à


informação — avalia. — Desde 2012, as campanhas são cada vez menos
explícitas e não direcionadas ao público que mais precisa de
esclarecimentos.

Sem planejamento
Parker alerta que o panorama pode piorar este ano. A duas semanas do
carnaval, o site do departamento do Ministério da Saúde responsável pela
prevenção e controle de HIV/Aids não cita as ações especiais previstas para
o feriado.

— Os ministros falam sobre necessidade de se respeitar a família brasileira


e deixar o debate sobre a educação sexual para os pais. É a receita para o
desastre — condena ele. — Nos anos 1990 e 2000, havia grandes
mobilizações, investimentos e programas nacionais constantes. Hoje, nega-
se o debate público, não há iniciativas como o combate à homofobia nas
escolas.

Procurado pelo GLOBO, o Ministério da Saúde não forneceu informações


sobre o investimento em campanhas contra o HIV para este ano.

Para Marcio Villard, coordenador geral do Grupo pela Valorização,


Integração e Dignidade do Doente de Aids (Pela Vidda), “um rapaz e uma
moça de 16 ou 17 anos que se infectou não foi promíscuo nem relaxado”.

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— No mundo em que vivemos, com tanta tecnologia e informação, às vezes
um tema pode passar batido. Daí a necessidade de haver programas
específicos para um público — sublinha. — A juventude não vivenciou o
momento forte da epidemia, não tem percepção sobre o risco, não
conhece métodos de prevenção, como a Profilaxia Pré-Exposição ao HIV
(PrEP). As escolas deixaram de falar sobre saúde e doenças sexualmente
transmissíveis.

Antes um modelo internacional, ao promover gratuitamente a distribuição


de drogas retrovirais no SUS, o Brasil vem perdendo prestígio na luta
contra o HIV.

— Em todo o mundo, o número de casos caiu 11%, segundo um relatório


do Programa das Nações Unidas sobre HIV/Aids de 2017. No Brasil, cresceu
3% — lamenta Villard. — A sociedade voltou a ter a percepção de que HIV é
coisa de gay, prostituta e drogado.

A pediatra e infectologista Maria Letícia Cruz ressalta que o diagnóstico e a


adesão ao tratamento são ainda mais problemáticos entre adolescentes.

— Os jovens têm um comportamento que, de alguma forma, os coloca em


situação de maior risco — destaca Maria Letícia, que é doutora em saúde
coletiva pela Fiocruz. — É uma faixa etária que não viu a epidemia da
década de 1980. Já nasceram em uma época em que o HIV tem tratamento,
então não têm muita noção da gravidade dos problemas que a infecção
pelo vírus pode causar. São o pior grupo de adesão ao tratamento. Aceitar
o diagnóstico nem sempre é uma coisa fácil.

Nova abordagem
Doutora em psicologia clínica pela USP, Vera Lúcia Mencarelli destaca que
a abordagem ao atendimento aos jovens mudou.

— No passado, procurávamos dimensionar corretamente o sofrimento


psíquico do paciente soropositivo, mostrando que ele não vai morrer
amanhã — recorda. — Agora, precisamos dizer: “Cuidado! Tem que tomar
o remédio direito”. Devemos mostrar aos jovens como é grave não aderir
ao tratamento.

A psicóloga acredita que a falta de uso de preservativo está associada a


outras condutas de risco características dessa faixa etária, como o aumento
dos casos de depressão, tentativas de suicídio e automutilação. Já a maior
vulnerabilidade dos homens poderia ser atribuída à maior liberdade sexual
masculina, em comparação às mulheres, além da dificuldade de diálogo
entre os parceiros sobre o uso da camisinha.

— Quando há envolvimento com uma mulher, a negociação sobre o


preservativo é reforçada porque se considera a possibilidade de uma
gravidez. Isso não acontece em uma relação entre dois homens. Neste
4/5
caso, segundo alguns pacientes, um dos parceiros pode provocar um
desconforto caso sugira o uso da camisinha — explica Vera Lúcia.

*Estagiária, sob supervisão de Eduardo Graça

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