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As Divisas, as Empresas e as Companhias:

notas para uma história da cultura empresarial no Brasil

Professor Luís Armando Bagolin


Instituto de Estudos Brasileiro da Universidade de São Paulo

Aluno Tomás Domschke Tomic


Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo
Em disciplina cursada no IEB-USP

2019
0. Apresentação
A expansão espacial de um império não ocorre sem esforço. Se, por um lado, a
expansão espacial de um império, que alcança terra longínquas, exprime riqueza, poder
e força, por outro, só o pode representar pelo desgaste que isto representa a um grupo,
ou, ainda, a um povo. A expansão portuguesa, por exemplo, que estabeleceu o império
colonial e mercantil da Coroa portuguesa, está, nas artes, sempre representada em
referência a textos clássicos que exprimem poder, força e grandeza.
A articulação de instrumentos, atividades, conhecimento, mercadoria e pessoas
para a geração, durável e estável, de valor e de riqueza será matéria do presente
trabalho. Isto e o papel-lugar das representações gráficas e objetos artísticos nesta
articulação. Buscar-se-á relacionar as empresas militares medievais às empresas que
têm a gravura como um de seus elementos e às empresas contemporâneas, capitalistas,
e modernas, outrora burguesas.
Não que se pretenda realizar uma teoria do valor ou algo parecido, mas estritamente
buscar notas subsidiárias para a elaboração de uma teoria da geração de valor e da
manutenção da riqueza. Isto buscando, através do signo da linguagem e de dinâmicas
socioculturais, colocar lado a lado, a fins de comparação crítica, fenômenos simultâneos
e complementares que, apesar de sua não óbvia relação.
Se, por um lado, o aparente distanciamento entre universo do comércio da arte e os
demais ramos da atividade comercial ocorre pela especificidade de sua mercadoria, por
outro lado insere-se no macrocosmo da atividade comercial. O trabalho que se pretende
cá fazer é a elaboração de, como já dito, notas subsidiárias para uma teoria da geração
e manutenção de valor e de riqueza de modo a vincular os fenômenos do poder político,
do poder comercial e da arte, sem, no entanto, desconsiderar suas particularidades e
seus traços distintivos.
O filósofo espanhol Ortega y Gasset observa que “no sabemos lo que nos pasa y esto
es precisamente lo que nos passa: na saber lo que nos passa”. A compreensão de
fenômenos que se estendem no tempo e no espaço passa a ser uma tarefa árdua e difícil
frente às tentações a conclusões fáceis e imediatas do conhecer de narrações e das
pistas que as estórias da história sugerem em suas buscas particulares pela construção
de linhas narrativas que ora cortam e carregam o sentido do tempo, ora constituem os
seus interiores sem poder-se extrair da narração qualquer sentido que transcenda o
tempo.
Assim, o que se busca não é uma estrutura comum aos universos permeados, mas
relações, e, tendo em mente a observação de Ortega y Gasset, de que modo os traços
de interseccionais entre eles (os universos do poder, da mercatura e da arte) podem nos
servir de subsídio para uma compreensão ampliada da experiência humana.

1. As divisa, as empresa e as companhia – dimensões militar, comercial e artística


a. A mudança de sentido das palavras
No ensaio Como as Palavras Mudam de Sentido1, Antoine Meillet teoriza sobre a
mudança de sentido das palavras estar ligado a usos particulares das palavras, de modo
a haver a formação de novos sentidos às palavras segundo o binômio pluralidade
semântica x unidade significante, ou ainda heterogeneidade conotativa x
homogeneidade denotativa.
Diz o autor:

“Com efeito, os grupos que se formam no interior de uma


sociedade, em especial os grupos profissionais, são
compostos de pessoas que não são necessariamente
oriundas de uma mesma localidade, nem de uma mesma
região, e cuja língua, por conseguinte, não é idêntica. Essa
ausência de homogeneidade, por ela mesma, e sem que se
faça intervir aí a ação de qualquer língua local em questão,
é evidentemente uma causa de instabilidade e de
incerteza, sendo (...) uma das principais causas, talvez a
principal, de todas as mudanças linguísticas, as relativas à
pronúncia, a gramática e ao vocabulário, assim como das
mudanças espontâneas e dos empréstimos.”

1
A. Meillet. Como as Palavras Mudam de Sentido.
Fica claro, então, que não é apenas semântica a diferença que constitui a
heterogeneidade que coloca a língua constantemente em crise, mas a própria
pluralidade fonética contribui para as dinâmicas transformacionais da língua. E, se por
um lado, os grupos sociais ao formarem-se e aglutinarem-se, valem-se dos trejeitos
linguísticos para manterem-se coesos, sua existência interna, como grupos
relativamente fechados é fundamental para a vitalidade da língua, na medida em que,
colocando-a em constante transformação pela interação dos grupos particulares entre
si, e dos grupos particulares com a ideia de uma língua única, atualiza-a e faz da língua
única em seu constante presente inédito.
Afirma Robert Klein em seu ensaio A Teoria da Expressão Figurada nos Tratados
Italianos sobre as Imprese, 1555-1612, publicado no livro A Forma e o Inteligível, editado
pela edusp em 1998, que não havia em francês uma palavra equivalente à italiana
imprese, “empresa”. A palavra franacesa para designar tal espécie de artifício expressivo
que mescla texto e imagem, sem no entanto constituir relação ilustrativa, é divise.
No dicionário etimológico da língua portuguesa de Antônio Geraldo da Cunha
encontramos para “dividir”, raíz etimológica da palavra “divisa”, o verbete “partir ou
distinguir”, e remete à palavra latina divisus, “partilha, divisão, repartição”, tal como
“separado, dividido”. Por “empresa”, temos “empreendimento, sociedade, firma”, e
remete às palavras latinas que significam “desejar, suplicar, invocar” e carregar, apertar,
pressionar, atacar. No mesmo ensaio já mencionado, Klein busca no Dialogo
dell’imprese militari et amorose de Giovio a moda das imprese havia sido introduzida na
Itália pelos homens de guerra, que cravavam em suas armas uma marca que distinguia
um grupo de soldados de outros.
Da correspondência entre o fenômeno das imprese e das divise, na Itália e na França,
respectivamente, extraímos um campo semântico composto por dois gêneros de
palavras: aquelas que distinguem, que repartem e criam um em oposição a outros e
aquelas que são algo pela projeção da vontade, a canalização das ações de um grupo
pelo sentido de uma vontade comum. Num e noutro grupo, encontramos um traço
comum, que é uma identidade, seja daquilo que é marcado pelo sinal distintivo, seja
aquilo que é movido por um mesmo sentido de vontade.
Esta identidade marcada pela distinção, seja simbólica, seja volitiva, é consagrada
por seu caráter a um só passo obscuro e revelador, de modo a restringir o grupo que
reconhece a estória à que se remete a obra, status adquirido pela impresa no século
XVII, tendo-se tornado, a impresa conceptista, “uma obra cujo principal mérito consistia
na riqueza das significações e das alusões que seria possível esconder ou descobrir em
sua estrutura complexa”. Isto depois de Andrea Chiocco defini-la como “um instrumento
de nosso intelecto, composto de figuras e de palavras que representam
metaforicamente o conceito interior do acadêmico” (Discorso delle Imprese, Verona,
1601 – apud. R. Klein). Faremos carregar de todo este complexo de significações que
compõem a história das palavras impresa e divise para tentar esboçar o constructo ao
qual, cá, nos pretendemos.

b. As imagens-texto e o intelecto: o pacto social e a marca


Se entendemos o intelecto como uma característica que permite o movimento em
grupo coordenado, que coloca em relação dois seres com, no mínimo um deles dotados
das virtudes do intelecto, e se entendemos a sociedade como um grupo finito, fundado
pelo acordo de vontade – que é como os chamados contratualistas dos séculos XVI, XVII
e XVIII, como Hobbes, Locke e Rousseau, apesar de significarem de maneiras distintas o
contrato social, o fazem – ou, ainda, por um pacto social, teremos que uma sociedade é
um todo articulado por meio do intelecto, que coordena as ações do grupo constitutivo
desse todo para a realização, ou perseguição, do fim ao qual aponta o sentido da
vontade que os constitui como grupo social.
Segundo esta definição, temos uma empresa social tanto nas empresas militares,
por meio das quais a moda da impresa entra no costume italiano, e que tem nesta, uma
expressão estética de um fenômeno real de atividade coordenada e que encerra nas
qualidade estéticas (o obscurantismo que caracteriza este “instrumento do intelecto”)
sua constituição como grupo finito. A exclusividade deste grupo frente ao que não é
parte de si cria uma regra de validade interna que nem sempre é conforme os modo de
ser de seu exterior – o não-social, ou, ainda, o não pertencente ao grupo social que se
constitui pelo acordo de vontades que constitui uma empresa social.
Este não-social pode ser, tanto um outro-social, quanto um não-social propriamente
dito, isto é, um não-social que se distingue, não em espécie, mas em gênero do social,
isto é, seriam dinâmicas fenomênicas não composta por grupos humanos e que
poderiam ser encerradas pelo termo natureza, segundo a oposição social x natural, que
muito comumente orienta a compreensão sociológica – apesar dos questionamentos a
esta distinção pela sociologia contemporânea2. Para os fins aos quais nos propomos,
buscaremos investir mais atenção ao não-social qualificado como um outro-social, ou
seja, o não-social que é meramente outro grupo de pessoas que coordena suas ações
por orientação de uma comunidade volitiva dotada de sentido não idêntico.
Da coexistência de grupos que se constituem como empresas sociais e que têm fins
próprios e nem sempre congruentes entre si, podemos extrair um substrato teórico que
pode servir para imaginarmos tanto as dinâmicas medievais das empresas militares, que
carregavam brasões que marcavam a identidade do grupo social ao qual pertenciam os
homens de guerra que se colocavam no campo de batalha para enfrentar os outros
grupos sociais – as dinâmicas medievais das guerras entre reinos; quanto as formações
e conflitos entre as várias organizações comerciais que tinham como fim o trânsito
comercial entre os respectivos grupos sociais, reinos ou impérios aos quais serviam, as
Companhias das Índias Orientais – Austríaca, Britânica, Dinamarquesa, Francesa,
Portuguesa, Sueca ou a famosa Companhia Holandesa das Índias Orientais.
Se, em termos ideias, percebe-se que as várias Companhias das Índias têm um fim
comum, isto é, o estabelecimento de vínculos comerciais que permitam o trânsito de
mercadorias com o objetivo de gerar riqueza, em termos reais, temos que seus sentidos
são conflitantes na medida em que têm, no mesmo gênero de atividade, a comercial,
fins diversos para a geração de valor. Enquanto o valor gerado pela Companhia
Portuguesa das Índias Orientais tem por fim o enriquecimento do Império comercial
português, o gerado pela Companhia Holandesa, tinha por fim o enriquecimento do
Império comercial holandês.

c. A articulação intertemporal do nome empresa


Com o advento da modernidade, e com o advento do sistema capitalista, burguês ,
notadamente comercial, o fenômeno das Companhias das Índias é usado pelos juristas
teóricos do, assim chamado pelo Professor Tulio Ascarelli, direito do capitalismo, o
direito comercial, que tem por principal fenômeno sócio-humano a ser normatizado, as
Sociedades Anônimas, ou, ainda, as Macroempresas3. O direito comercial é a parte do

2
B. Latour, Jamais Fomos Modernos.
3
F. K. Comparato. Aspectos jurídicos da Macroempresa.
direito privado que tem por atribuição o regramento das atividades humanas
organizadas que têm por fim a geração de lucro aos particulares, sejam eles coletivos ou
individuais, que fazem do comércio um ofício.
Tal como as empresas militares medievais, as macroempresas contemporâneas
dotam-se de símbolos que as identificam ao intelecto, e que permitem as pessoas em
lugares, tempos e situações diversas reconhecerem um mesmo, um isto, um id. Um
mesmo que se refere a um grupo empresarial (lato sensu) constituído por acordo de
vontades. Esse acordo social constitutivo da qualidade de grupo dessa forma específica
de sociedade empresarial é fundado no affectio societatis, fundamento jurídico que
referencia a congregação de vontades que é usada tanto para a constituição quanto
para a dissolução desses grupos econômicos – as Sociedades, tal como reguladas pelo
direito societário.
O nome jurídico a esse símbolo que referencia uma identidade de grupo é marca,
que representa simbolicamente um grupo. Se o processo ligado à conquista militar que
leva uma empresa militar a carregar sua identidade nas armaduras e armamentos é o
de estabelecer o domínio sobre um território e sobre os grupo sociais que nele vivem
estabelecer um império, análogo é o processo ligado às macroempresas a conquistarem
mercados em territórios ao longo do globo terrestre.
Um dos princípios que orientam a proteção das patentes, por exemplo, que
encerram as garantias jurídicas da comercialização de inventos tecnológicos por grupos
sociais (“sociais”, aqui, refere-se às sociedades econômicas, as reguladas pelo direito
societário, e que é o gênero que, na maior parte das vezes, da realidade jurídica às
chamadas macroempresas, ou empresas transnacionais), é o da terriotorialidade. Assim,
quando inscreve-se uma patente em um sistema de registros de patentes, deve-se ter
em conta a abrangência territorial à qual o sistema no qual a patente foi registrada tem.
É claro que têm naturezas diversas, as dinâmicas e a lógica específicas das empresas
militares medievais e as macroempresas modernas e contemporâneas, mas tal
similitude, a vinculação histórica dos fenômenos das empresas militares medievais com
os fenômenos das Companhias de comércio da ascensão dos impérios comerciais
modernos, e a vinculação destas com as macroempresas modernas permitem-nos tanto
vislumbrar a história da palavra empresa no tempo e no espaço, quanto conceber o
complexo que é aquilo abarcado pelo macroconceitos Sociedade ou Humanidade, que
buscam dar nome a um grande conjunto de seres vivos, que, apesar das diferenças,
sugere-se, guardam essência ou natureza comuns.
A marca estética à que se pode referir a impresa, seja ela composta por imagem e
texto ou, em sua versão primitiva, apenas por imagem, é signo finito que, tal como os
mitos, necessitam de sua constante transformação para fazerem-se perenes no tempo4.
A vinculação de uma história a um signo estabiliza um estado de coisas produzido por
um processo histórico que o estabelece. O embate entre grupos sócio-empresariais
medievais (militares) e a vitória de um por outro leva ao domínio deste sobre aquele, e
a simultânea, nesta relação de domínio justo pela guerra, consagração da impresa como
sinalizadora desta relação de dominância produzida pelo embate marcial.
A reprodução de representações de empresas (a figura estética) tem, portanto, a
função de estabelecer e informar, primordialmente, qual é o hegemon, isto é o grupo
social organizador dominante, do território no qual circula. A marca, então, assume um
tom de celebração da confusão à qual os homens de guerra submetem-se em conflitos
belicosos e dos caminhos que os levou ao triunfo. A representação artística da merca
empresarial medieval assume, assim, uma função articuladora e estabilizadora de
valores por meio da afirmação simbólica de um império. É uma maneira de reiterar um
estado de dominância, reiterando, pela circulação de imprese, a vitória em combate.
A história da palavra empresa, que se enlaça com a das palavras divisa e
companhia, como vimos, aponta, assim para uma articulação dos fenômenos do poder
político, econômico, técnico e artístico, e o seu aprofundamento deverá ser de grande
valia para a compreensão de processos históricos de grande importância para a
raciocinar-se o mundo contemporâneo e os rumos que vem tomando e poderá tomar.

d. A gravura na formação da identidade brasileira


Nesta chave, é interessante notar os livros-objetos produzido por artistas
franceses, tais como Jean-Baptiste Debret e Nicolas-Antoine Taunay, que representaram
e imprimiram em texto e imagem o por eles testemunhado nas terras brasileiras, de
modo a cultivar uma identidade da nacionalidade que se pretendia nelas formar. Em
cada um dos livros, nota-se, ao fim, um mapa, que registra à inteligência uma

4
W. Jaeger. Paideia.
autorreflexão, uma autoconsciência, tal como a representação das moedas que cá
circulavam, e das modas, dos costumes, da fauna e da flora que havia nas terras
brasileiras.
É análogo ao processo de geração e manutenção de valor e riqueza através da
articulação pelo intelecto de ações coordenadas segundo uma comunidade – um
mesmo impulso volitivo infinito marcado pela representação simbólica distintiva finita
– de interesses, uma vez comungados os sentidos das vontades pactuadas na
constituição de um grupo unitário.
Este projeto ideal permeia e impulsiona a produção de cultura brasileira pelos
artistas franceses que vêm ao Brasil na, posteriormente construída como, Missão
Artística Francesa – construção ideológica a qual confirma o sentido constitutivo de uma
identidade de grupo trabalhada pela informação artística do vivido nas terras sob o
império das atividades empresariais (em seu sentido amplo e complexo acima
elaborado) portuguesas.

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