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A mais perfeita tradução

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Roniwalter Jatobá, desde 1976 a


publicar livros, foi o pioneiro no
Brasil a problematizar
literariamente o proletariado. O
escritor mineiro, que viveu na
Bahia, hoje radicado em São Paulo,
teve olhos para ver, percepção para
sentir, raciocínio para concatenar e
disciplina para escrever, e
reescrever, a respeito daqueles que,
em geral, não passam de estatística,
mero número.

Jatobá deu voz aos que, mesmo que


fossem convocados, possivelmente
não teriam discurso.

Os contos, em especial os
selecionados por Luiz Ruffato para
a edição destes Contos
antológicos, funcionam
individualmente e também em
conjunto. Roniwalter Jatobá por Osvalter

Jatobá, com um olho na realidade,


onde buscou o material, matéria-prima para a ficção, e outro olho na tradição, leitor que
sempre foi (e é) do legado literário, enfim, Jatobá conseguiu elaborar uma possível síntese
do que pode ser a trajetória daqueles que estão condenados a viver: ele fala, e escreve
sobre, os pobres que, em sua maioria, migraram de rincões brasileiros rumo a grandes
centros.

Os personagens elaborados por esse mineiro-universal têm apenas nomes, nenhum


sobrenome. Eles, os personagens, são muitos, são Zélia, Jacinto, Zefim, Santina, Tonico,
Zuleide, Germano, Damião etc. Todos, sem exceção, funcionam como mão-de-obra barata.
Não tiveram oportunidade de estudar. Dedicam, então, pelo menos, oito horas por dia a
trabalhos embrutecedores, dentro de montadoras de automóveis, fábricas, empresas, lojas,

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casas (são domésticas, contínuos, moços e moças de recado), todos enfim atuam em
funções (isso quando conseguem um emprego) em que os humanos não podem imprimir,
registrar, as suas marcas, pegadas, de humanos que são.

Outra Paulicéia
O conto A mão esquerda, um clássico, e antológico, conto de Roniwalter, diz muito sobre a
visão de mundo dele, e revela o ponto central de seu projeto literário. Natanael, filho de
Elias e Marta, o protagonista da breve narrativa, nasceu em uma pequena e interiorana
cidade e migrou rumo a São Paulo, palco de muitos dos contos de Jatobá. Conseguiu um
emprego que garante apenas o salário para pagar as despesas e necessidades mínimas. Ele
perderá dedos de uma das mãos durante a jornada de trabalho. Natanael escreve e envia
cartas para a família fantasiando que, na grande cidade, tem uma vida digna, mas a sua
realidade não passa de inferno permanente.

Os personagens da literatura de Jatobá, Natanael de A mão esquerda é apenas um deles,


trocam a energia por salários indignos, pois não têm outra opção. Nenhum desses seres
ficcionais, a exemplo de muitos da realidade, consegue nem jamais conseguirá economizar
dinheiro para investir em qualquer projeto, bem pessoal ou patrimônio. As necessidades
mínimas já consomem tudo o que eles recebem. Comida, transporte e inesperado “ceifam”
todo o “tudo” que eles ganham.

Jatobá inventou uma ficção, mais do que particular, necessária, porque reflete o andar de
baixo, “misteriosamente” quase invisível na malha literária brasileira. O texto não é
panfletário, e bem que poderia ser, nem faz denúncia, e isso seria perfeitamente
compreensível, e necessário. Antes, trata-se de arte.

Os personagens, condenados à vida, como o próprio autor escreve, estão inseridos em


ambiente e contexto inóspitos. Nasceram pobres, não terão direito a estudo, nem a
relações com pessoas que poderão abrir portas e oferecer oportunidades. Esses seres
serão obrigados a morar em casas minúsculas, na periferia, distantes do local de trabalho.
Sonadas, como muitas delas aparecem na ficção de Jatobá, atravessarão o dia com sono,
pois não podem deixar o corpo deitado por muito tempo em cima de um colchão de
péssima qualidade, sobre uma cama, em um subúrbio qualquer.

O receio de vir a ser demitido, que é uma questão constante para quem faz parte de classe
pouco favorecida economicamente falando, é tema de mais de um conto. Jatobá conseguiu
captar nuances de quem faz parte dessas castas condenadas à vida.

A ficção de Jatobá traduz, para o leitor, a sensação daqueles para quem viver é apenas
sofrer, passar a maior parte da existência dentro de fábricas, barracões, ônibus, com apenas
um dia de folga por semana, sem opção de lazer, o bar da rua do bairro, a eterna tentativa

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de ganhar o prêmio da loteria, para mudar a sorte, o azar, que é ter nascido pobre em um
país como o Brasil, onde poucos desfrutam (por quanto tempo ainda?) de um bem-estar
que não é bem nem estar.

3/3

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