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UNIVERSIDADE TIRADENTES

DIRETORIA DE PESQUISA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO
MESTRADO EM DIREITOS HUMANOS

Lídia Carla Araújo dos Anjos

FÓRUM DE DEFESA DA CRIANÇA E DO


ADOLESCENTE DE SERGIPE/FÓRUM DCA-SE:
PALAVRAS QUE NÃO SILENCIAM,
POSSIBILIDADES QUE EMANCIPAM

ARACAJU, SE
2016
ii

Lídia Carla Araújo dos Anjos

FÓRUM DE DEFESA DA CRIANÇA E DO


ADOLESCENTE DE SERGIPE/FÓRUM DCA-SE:
PALAVRAS QUE NÃO SILENCIAM,
POSSIBILIDADES QUE EMANCIPAM

Dissertação apresentada, como requisito parcial para a


obtenção do título de Mestre em Direito, ao Programa de
Pós-Graduação em Direito, da Diretoria de Pesquisa da
Universidade Tiradentes.

Orientadora: Profª. Dra. Gabriela Maia Rebouças

ARACAJU, SE
2016
iii
iv

FOLHA DE APROVAÇÃO

Lídia Carla Araújo dos Anjos


Fórum de Defesa da Criança e do Adolescente de Sergipe: Palavras que não
Silenciam, Possibilidades que Emancipam.

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação


em Direito, da Diretoria de Pesquisa da Universidade
Tiradentes para a obtenção do título de Mestre.

Área de concentração: Direitos Humanos.

Aprovada em: 16 de junho de 2016

Banca Examinadora

Profª. Dra. Gabriela Maia Rebouças (Orientadora)


Universidade Tiradentes Assinatura

Profª. Dra. Verônica Teixeira Marques


Universidade Tiradentes Assinatura

Profª. Dra. Karyna Batista Sposato


Universidade Federal De Sergipe Assinatura

Profª. Dra. Leslie Shérida Ferraz


Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Assinatura
v

A todos aqueles que lutam


pela dignidade humana de
todo o povo oprimido,
principalmente as crianças e os adolescentes
pobres e negros do Brasil,
dedico este trabalho.
vi

AGRADECIMENTOS

Agradeço:

a minha mãe, Darci Araújo, a dedicação, a alegria, a energia contagiante e as palavras


incentivadoras ;
a meu pai, Nivaldo dos Anjos, a cumplicidade e a sensibilidade;
a meus irmãos, Júnior e Igor, os momentos em família;
a minhas cunhadas Shirlene e Carol, as alegrias proporcionadas em minha vida;
a meu sobrinho Marquinhos;
a minha pequena Giullia;
a Patrícia Sales, minha irmã e comadre, e sua família, nas pessoas de José Albuquerque e
Nininha;.
a meu esposo, Thiago Oliveira, companheiro de sonhos e de luta;
às famílias Carvalho e Martins, em especial Tatiana e Tassinha, Lívia, meu sogro Eriosvaldo,
e Angélica - ‘tia Nina’ (in memoriam);
a minha filha Lara Anjos, fonte inspiradora de luta por um mundo mais justo;
à minha família “dos Anjos”, nas pessoas de meus tios Antônio e José Francisco;
à minha família “Araújo”, especialmente à matriarca vó Dagmar e minhas tias Del, Dene, Cris
e Sueli, o acreditarem em mim, torcerem e estarem sempre do meu lado em todos os
momentos;
a meu avô Juracy Manoel Araújo (in memoriam);
a meu tio Vicente (in memoriam);
a minha orientadora, Gabriela Maia Rebouças, a afinidade política e ideológica;
a Paulo Freire, o ensinamento de que nada no mundo está dado ou pronto;
a Verônica Marques, a atenção permanente, a acolhida e as reflexões teóricas;
a Karyna Sposato, a militância por direitos da criança e do adolescente em Sergipe;
a Liziane Paixão;
ao professor David Sanchez Rubio, as reflexões sobre a teoria crítica dos direitos humano;
a Thênisson Dórea, Manuella Vergne, Afonso, Ellen, Caio Dórea, Leonardo Menezes, da
turma 2014-2016, e especialmente Adriana Caetana, a disponibilidade para ouvir;
à professora e amiga Vera Núbia, o ter aceitado dialogar sobre algumas categorias teóricas;
à Capes/Fapitec, a bolsa-estudo;
vii

à Legião da Boa Vontade, nas pessoas de Valdenir Ferreira, Claudinei e Jandyra Prana, Vânia
Bandeira e Shirlei Lazari;
ao Fórum DCA-SE, na pessoa de Robson Anselmo, minha primeira influência para embarcar
nesse desafio envolvente da militância política;
ao prof. Dr. José Humberto de Góis Júnior (Betinho), seu incentivo e suas reflexões;
a Kátia Azevedo e Ana Maria Resende, a militância na coordenação do Fórum;
a Roberta, Débora, Sanádia Gama, Alessandra Góes, Andréa Fernandes e Aragão, Candice,
Gean de Paula, Conceição Branco, Eraldo, Marli Ribeiro, Ednaldo, Marisa Barros, Joilda,
Marcos Cabral, as irmãs Lucinha, Sandra e irmã Diva, as vivências enriquecedores da vida
militante;
ao Dr. Silvio Eusébio, à Dra. Conceição Figueiredo, à Dra. Lilian Carvalho e a Glícia
Salmeron, Danival Falcão e Nathália Dalto, a atuação comprometida na promoção da justiça;
aos amigos do UNICEF, em especial seu ex-coordenador para Bahia e Sergipe, Rui Pavan, as
oportunidades de aprendizado;
aos coletivos Instituto Braços e Fóruns Estaduais e Nacional DCA, na pessoa de Tiana Sento
Sé (in memoriam); Criança Não é de Rua, nas pessoas de Adriano Ribeiro e Bernardo
Rosemeyer; CUT; SINTESE; FACTUS e MNDH-SE, nas pessoas de Rosiana Queirós e
Oscar Gatica;
a todos aqueles que, utopicamente acreditando na possibilidade da mudança, fazem do seu
cotidiano espaço de luta por melhores condições de vida em comunidade, principalmente para
crianças e adolescentes pobres, indígenas e negras da periferia do mundo.
viii

Na verdade, porém, por paradoxal que possa parecer,


na resposta dos oprimidos à violência dos opressores
é que vamos encontrar o gesto de amor.
Consciente ou inconscientemente,
o ato de rebelião dos oprimidos,
que é sempre tão ou quase tão violento quanto a violência que os cria,
este ato dos oprimidos, sim, pode inaugurar o amor.

Enquanto a violência dos opressores faz dos oprimidos homens proibidos de ser,
a resposta destes à violência daqueles se encontra infundida
do anseio de busca do direito de ser.

Os opressores, violentando e proibindo que os outros sejam,


não podem igualmente ser;
os oprimidos, lutando por ser,
ao retirar-lhes o poder de oprimir e de esmagar,
lhes restauram a humanidade que haviam perdido no uso da opressão.

Por isto é que, somente os oprimidos, libertando-se, podem libertar os opressores.

Paulo Freire
ix

RESUMO

Esta dissertação de mestrado analisa e discute a importância do Fórum Estadual de Defesa da


Criança e do Adolescente de Sergipe/Fórum DCA-SE enquanto espaço exclusivo de
articulação e interlocução da sociedade civil organizada. Para tanto, debruça-se sobre suas
práticas; resgata sua trajetória histórica; analisa o sentido da criação dos Fóruns DCA de
modo geral e identifica estratégias de participação política utilizadas pela sociedade civil para
promover direitos nos moldes pensados pelas entidades de defesa da criança e do adolescente
recepcionados pelo Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA. O recorte teórico-
metodológico se ampara nas reflexões trazidas pela teoria social crítica dos Direitos Humanos
e dos novos Movimentos Sociais. Os dados da pesquisa provêm da vivência pessoal da autora
na composição da coordenação do Fórum e de documentos (atas e relatórios de reuniões,
entrevistas divulgadas em meios eletrônicos de comunicação, material informativo produzido
pelo Fórum DCA-SE, regimentos internos, atos normativos, registros fotográficos, além de
atas, leis e resoluções aprovadas pelos Conselhos Estadual e Municipal de Aracaju de Direitos
da Criança e do Adolescente de Sergipe) que indicam a ampliação, a capacidade organizativa,
o fortalecimento e o protagonismo da sociedade civil na política infanto-juvenil nos anos de
2000 a 2009 em Sergipe.

PALAVRAS-CHAVE: Participação Social. Criança e Adolescente. Fórum DCA-SE.


Direitos Humanos Infanto-Juvenis.
x

ABSTRACT

This dissertation analyzes and discusses the importance of the State Forum for the Defence of Child
and Adolescent in Sergipe/DCA-SE Forum as unique space for the articulation and communication of
organised civil society. To do so, it focuses on its practices; it rescues its historical trajectory; it
analyzes the sense of the creation of the DCA Forums in general and it identifies strategies of
political participation used by civil society to promote rights in the manner designed by the
entities of the defense of children and adolescents hosted by the Statute of the Child and
Adolescent - ECA. The theoretical-methodological cutout has support on the reflections
brought about by the social critique theory of Human Rights and by the new Social
Movements. The survey data come from the personal experience of the author in the
composition of the Forum coordination and from documents (minutes and reports of
meetings, interviews disclosed in electronic communication midia, informational material
produced by the DCA Forum, internal regulations, normative acts, photographic records, in
addition to the acts, laws and resolutions passed by the State and Municipal Aracaju Councils
of Rights of the Child and the Adolescent of Sergipe) that indicate the magnification, the
organizational capacity, and the role strengthening of civil society in policy for children and
adolescents in the years 2000 to 2009 in Sergipe.

KEYWORDS: Social Participation. Child and Adolescent. DCA Forum. Children and Youth
Human Rights.
xi

LISTA DE QUADROS E GRÁFICOS

QUADROS

N°s Títulos Páginas


1 Doutrina da Situação Irregular/Doutrina da Proteção Integral: 47
Diferenças
GRÁFICOS
1 CEDCA-SE: Resoluções Publicadas no Período de 2002 a 2014 100
2 Atuação do Fórum DCA-SE: Matérias Publicadas na Imprensa no 115
Período de 2000 a 2014
xii

LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS

AMABA - Associação de Moradores do Bairro América


ABRINQ - Associação Brasileira de Fabricantes de Brinquedos
CBIA - Fundação Centro Brasileiro da Infância e Adolescência
CESEP - Centro Sergipano de Educação Popular
CEDCA-SE - Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente de Sergipe
CF - Constituição Federal
CENAM - Centro de Atendimento ao Menor
CMM - Código de Melo Mattos
CMDCA - Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
CNBB - Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CONANDA - Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
CRAS - Centro de Referência de Assistência Social
CREAS - Centro de Referência Especializada de Assistência Social
CRP - Conselho Regional de Psicologia
CRESS - Conselho Regional de Serviço Social
DESIPE - Departamento do Sistema Penitenciário do Estado de Sergipe
DUDH - Declaração Universal dos Direitos Humanos
ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente
FACTUS - Fórum Associativo de Conselheiros Tutelares de Sergipe
FEBEM - Fundação do Bem-Estar do Menor
FNDCA - Fórum Nacional Permanente de Entidades Não-Governamentais de Defesa dos
Direitos da Criança e do Adolescente/Fórum Nacional de Defesa da Criança e do Adolescente
FÓRUM DCA-SE - Fórum De Defesa da Criança e do Adolescente do Estado de Sergipe
INESC - Instituto Nacional de Estudos Socioeconômicos
LBV - Legião da Boa Vontade
LICRE - Lar Infantil Cristo Redentor
LOAS - Lei Orgânica da Assistência Social
MNMMR/SE - Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua de Sergipe
MNMMR - Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua
MNDH/SE - Movimento Nacional de Direitos Humanos de Sergipe
MOTU - Movimento Organizado dos Trabalhadores Urbanos
xiii

NAIA - Núcleo de Apoio à Infância


NMSs - Novos Movimentos Sociais
ONGs - Organizações Não Governamentais
ONU - Organização das Nações Unidas
PIDHESC - Pacto Internacional pelos Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais
PNAS –-Política Nacional de Assistência Social
SACI - Sociedade Afro-Sergipana de Estudos e Cidadania
SEDH/PR - Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República
SEIDES - Secretaria Estadual de Inclusão, Assistência e Desenvolvimento Social
SEJUC - Secretaria Estadual de Justiça e Cidadania.
SEMASC - Secretaria Municipal de Assistência Social e Cidadania
SGD - Sistema de Garantia de Direitos
SINAJUVE - Sistema Nacional da Juventude
SINASE - Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo
SUAS - Sistema Único de Assistência Social
UBM - União Brasileia de Mulheres
UFS - Universidade Federal de Sergipe – UFS
UNICEF - Fundo das Nações Unidas para a Infância
xiv

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................15

2. DIREITOS HUMANOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE ............................................................23

2.1. A POLÍTICA PÚBLICA DIRECIONADA À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE NO BRASIL ..........................................................23


2.2.O SENTIDO DOS DIREITOS HUMANOS E DA EMANCIPAÇÃO À LUZ DA TEORIA CRÍTICA ...................................................32
2.3. MUDANÇA PARADIGMÁTICA DA POLÍTICA DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: LUTA DOS FÓRUNS DCA ..........39

3. O SENTIDO DA CRIAÇÃO DOS FÓRUNS DCA ....................................................................................50

3.1. SOCIEDADE CIVIL SERGIPANA E SURGIMENTO DO FÓRUM DCA-SE .........................................................................50

4. PALAVRAS QUE NÃO SILENCIAM, POSSIBILIDADES QUE EMANCIPAM: A TRAJETÓRIA


POLÍTICA DO FÓRUM DCA-SE .................................................................................................................80

4.1. FÓRUM DCA-SE: RELAÇÃO COM OS CONSELHOS DE DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO SISTEMA DE GARANTIA DE
DIREITOS - SGD ................................................................................................................................................81
4.2. FOMENTO DA PARTICIPAÇÃO SOCIAL NA PROMOÇÃO DOS DIREITOS HUMANOS INFANTO-JUVENIS: TRAJETÓRIA E
ESTRATÉGIAS POLÍTICO-PEDAGÓGICAS DO FÓRUM DCA-SE ........................................................................................93
4.2.1. Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente: A Incidência Política do Fórum DCA-SE....96
4.2.2. Construção da Unidade do Fórum DCA-SE: Investimento na Formação dos Sujeitos Individuais e
Coletivo ..................................................................................................................................................104
4.2.4. Violação de Direitos Humanos Infanto-Juvenis no Estado de Sergipe: Denúncia Constante .....116

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................................................128

REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................137

APENSOS ......................................................................................................................................................148

APENSO A. FÓRUM DCA-SE NA MÍDIA (205 A 20013)...........................................................................................148

ANEXOS ........................................................................................................................................................152

ANEXO A - FÓRUM DCA-SE: REGIMENTO INTERNO.................................................................................................152


ANEXO B - FÓRUM DCA-SE: ENTIDADES FILIADAS (2008) .......................................................................................158
1. INTRODUÇÃO

Esta dissertação de mestrado apresenta os resultados de análise da importância do


Fórum Estadual de Defesa da Criança e do Adolescente de Sergipe - Fórum DCA-SE no que
refere à participação da sociedade civil organizada no exercício do controle social das
políticas de promoção de direitos humanos infanto-juvenis nesse Estado. A noção de criança e
adolescente evocada neste trabalho é a que rompe com a concepção do “menor”1 e inaugura o
novo paradigma da proteção integral do “sujeito de direitos”, em condição peculiar de
formação e desenvolvimento, consagrada no Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, Lei
nº 8.069, de 13 de dezembro de 1990.
Ela resgata a trajetória histórica do Fórum DCA-SE, principalmente o período
compreendido entre 2000 e 2009, em que houve maior participação política dessa rede2 de
defesa da criança e do adolescente; discorre sobre o processo de construção dos direitos
humanos infanto-juvenis, incluindo o período de redemocratização do país (décadas de
1970/1980/1990) e suas repercussões no Estado de Sergipe nos anos 2000; levanta algumas
iniciativas da sociedade civil, que, na década de 1990, antecederam a criação do Fórum DCA-
SE; e considera algumas de suas estratégias político-pedagógicas no que concerne à
ampliação, ao fortalecimento e ao incentivo do protagonismo da sociedade civil no segmento
da criança e do adolescente.
Para o levantamento dos dados, foi realizada uma pesquisa qualitativa em
documentos disponíveis no CEDCA - Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do
Adolescente de Sergipe 3 . Esses documentos reúnem todas as resoluções publicadas pelo
referido órgão (disponíveis também no Diário Oficial do Estado) nos anos de 1991 a 2014, o
registro de composição do conselho, as atas de reuniões e os relatórios, bem como
documentos encontrados em entidade filiada ao Fórum DCA-SE, Instituto Braços4, referentes
à memória do Fórum DCA-SE, como convocações, atas e relatórios de reuniões, registros

1
Segundo essa concepção, o ser humano não adulto, ou seja, aquele que o Estatuto da Criança e do Adolescente
define como criança (menor de 12 anos) e adolescente (menor de 18 anos), não era reconhecido como sujeito de
direitos, dotado de dignidade e necessitado de uma proteção específica em razão de seu estado psicológico
especial.
2
Redes são estruturas abertas capazes de expandir de forma ilimitada, de integrar novos nós, desde que
compartilhem os mesmos códigos (por exemplo, valores ou objetivos de desempenho). Uma estrutura social com
base em rede é um sistema aberto, altamente dinâmico, suscetível de inovação sem ameaças ao seu equilíbrio.
Nesse sentido, o DCA-SE constitui uma rede.
3
A sede atual do CEDCA se encontra no Edifício Estado de Sergipe, conhecido por “Maria Feliciana”, Edifício
Travessa Baltazar Gois, 86, Aracaju, SE - CEP. 49010-500.
4
A sede atual do Instituto Braços está localizada na rua Itabaiana, nº 426, no centro de Aracaju/SE - CEP:
49010-170.
16

fotográficos, regimentos internos, matérias jornalísticas, convites, ofícios recebidos e


expedidos, folders produzidos pelo Fórum DCA-SE, entre outros.
A pesquisa qualitativa buscou também informação relacionada ao Fórum DCA-SE
(foco desta dissertação) e ao FNDCA – Fórum Nacional de Direitos da Criança e do
Adolescente em sítios da internet, conforme links constantes nas referências deste trabalho.
Foram, ainda, acessados e examinados dados e estudos específicos sobre outros Fóruns
Estaduais DCA, como dissertação de mestrado e teses de doutorado e artigos científicos,
identificados nas referências desta dissertação.
A escolha do período de 2000 a 2009 se justifica por ter nele ocorrido a atuação mais
intensa do Fórum DCA-SE, com avanços e recuos.
A pesquisa considera também a nossa memória de participação no Fórum DCA-SE,
para, de acordo com Brandão (1999; 2001; 2003), valorizar a memória militante e a
experiência para compreensão de fatos passados ao serem revisitados. Nossa experiência
abrange o Fórum DCA-SE (inicialmente enquanto membro filiada e posteriormente enquanto
coordenadora) e os conselhos de direitos da criança e do adolescente (CMDCA Aracaju e
CEDCA) e constitui parte substancial de análise neste trabalho. Buscou-se primordialmente
identificar potencialidades, contradições, limites e fragilidades desse Fórum com vista a
vislumbrar possibilidades de fortalecimento da participação social e de atuação pedagógico-
dialógica na promoção da criança e do adolescente no Estado de Sergipe.
Assim, situações não registradas em documentos formais 5 se transformam, nesta
pesquisa, em oportunidade real de seu fazer, amparada na ideia de que “onde e quando tudo o
que se vive, tudo o que se diz, tudo o que se convive e interage é algo relevante e digno de ser
registrado como um dado e um valor participante de investigação” (BRANDÃO, 2003, p. 25).
As reflexões se amparam em linha de raciocínio inspirada por autores que apostam
nas práticas inovadoras, críticas, criativas e, portanto, emancipadoras do ponto de vista do
protagonismo dos sujeitos coletivos. As análises realizadas se fundamentam na teoria social e

5
Por ser o Fórum DCA-SE espaço sem personalidade jurídica e sem recursos financeiros próprios, a dificuldade
de registrar muitos momentos de sua atuação foi sempre uma realidade. Os registros ficavam por conta da
disponibilidade dos participantes, pois o Fórum DCA-SE nunca contou com secretaria ou uma estrutura básica
mínima nesse sentido. Por vezes, alguns dos participantes se sentiam inseguros em fazer o registro de reuniões
ou não tinham como assumir essa tarefa em virtude da demanda de atividades nas entidades. Aliado a esse fato, a
não existência de sede própria dificultava a constituição de um acervo fixo que sempre dependeu da
disponibilidade de suas filiadas, levando a perdas e extravios de documentos. Por isso a reconstrução da
memória por parte dos que vivenciaram aquele momento se torna fundamental, mesmo que na época a
participação se tenha dado apenas como membro filiado e não como pesquisador.
17

crítica dos Direitos Humanos6 e dos Novos Movimentos Sociais7, cujos autores denunciam as
centralidades eurocêntricas de tradição liberal e apontam para uma ampliação dos horizontes
discursivos dos Direitos Humanos, com compromisso emancipatório estabelecido a partir dos
sujeitos negados da História.
Assim, sobre o sentido dos direitos humanos e da libertação são evocadas ideias de
Rubio (2008; 2013; 2014), de Santos (1999; 2002; 2003; 2005; 2007), de Dussel (1995) e de
Flores (2008; 2009); relativamente aos processos pedagógicos de aprendizagem e
emancipação que permeiam as iniciativas de cunho coletivo para além dos espaços formais de
educação, como o objeto em estudo - o Fórum DCA-SE -, as reflexões se aprofundam em
Freire (1990; 1992; 1996; 2003); no tocante a políticas públicas, participação e movimento
social, a referência principal é Gohn (1997; 2003; 2005; 2007; 2010).
A análise da conjuntura se ampara no pensamento de Marx e Engels (1961; 1979;
1996; 2007) e Gramsci (1995; 1999) e a análise específica do direito da criança e do
adolescente tem fundamento nas reflexões de Faleiros (2009), de Rizinni (2009) e de Pilotti
(2009).
O materialismo histórico e dialético proposto pela teoria marxista e a ideia da
pesquisa participante constituem a diretriz metodológica desta dissertação, opção que prioriza
a análise qualitativa no processo empírico da investigação, mas que acolhe também a
memória militante da autora enquanto sujeito desta história, que se transforma
concomitantemente com o meio em que atua com outros sujeitos com quem compartilha
processos de luta por direitos desencadeados coletivamente.
Nesse sentido, os fundamentos buscados nas ideias de Carlos Rodrigues Brandão
sobre a pesquisa participante reafirmam a necessidade de sistematizar ações e práticas de
sujeitos sociais com projetos políticos voltados para intervenções de benefício coletivo. Nossa
participação busca contribuir na compreensão dos envolvidos no processo vivenciado pelo
Fórum DCA-SE, como totalidade.

6
É a teoria que considerada o homem agente criador do direito e não mero destinatário e defende a procura
conceitos e estratégias que permitam a constante mutação do direito, para que os homens possam, conforme sua
necessidade, procurar e reivindicar cada vez mais direitos.
7
São movimentos surgidos no final do século XX que têm na transformação cultural grande parte dos meios e
fins de sua ação; que incorporam tanto segmentos da classe média quanto pessoas à margem do mercado de
trabalho e da sociedade; que se articulam através de redes sociais com pautas reivindicatórias coletivas
orientadas para a convergência de interesses, a organização de ações conjuntas e a consecução de visibilidade
social; e que, diferentemente dos movimentos tradicionais, não visam “tomar o poder”, mas geralmente
constituem espaços políticos não institucionais que buscam alterar hábitos e valores da sociedade de modo a
interferir nas políticas estatais.
18

Nosso entendimento de totalidade é aquele buscado em Marx que a considera como


uma categoria de caráter claramente ontológica, com o raciocínio de que o ser social se
constitui como uma totalidade formada de um complexo de totalidades, à medida que o ser
consciente se dá em processo de descoberta e compreensão da vida real enquanto pode atuar
sobre o mundo. É produto de sua práxis – atuação com reflexão (MARX, 2008). Ainda sobre
a memória militante, vale destacar que, como enfatiza Brandão (1999), não se trata de
inventar uma pesquisa que justifique uma ilusão sobre um trabalho, mas da responsabilidade
política desta e da coparticipação científica na criação de um saber necessário, muitas vezes
negado pela academia como saber científico e, portanto, como conhecimento válido sobre
determinado fato, condição, processo histórico e ação em dado tempo.
Trata-se, primeiro, de reconhecer que, enquanto atua, o ser humano produz
conhecimento e, segundo, que pesquisar significa dar sentido a uma práxis, compreendê-la e,
em meio a essa análise, desenvolver novas ações, reflexões e sistematizar o conhecimento
produzido. Ou seja, pesquisar é conscientizar, é reconhecer o conhecimento produzido na
práxis, que, muitas vezes, vai se constituindo, sem lugar para a sua escrita e/ou organização
nos cânones acadêmicos, a partir das perspectivas gnosiológicas anteriores. Trata-se de
utilizar a memória militante para tornar a pesquisa um instrumento científico, pedagógico e
político de participação nos trabalhos de produção do poder popular (BRANDÃO, 1999,
p.250). Por outro lado, há que se considerar também a possibilidade de produzir ciência tendo
como base as experiências de sujeitos que foram impedidos de “dizer sua palavra” (FREIRE,
1998), de sujeitos que não puderam ocupar os espaços, como a universidade, de produção de
verdades legitimadas pela ciência.
Considerando ainda que o materialismo histórico de Marx e Engels (2007) se
desenvolve sobre uma base cultural definida e impulsionada pelas lutas políticas circundantes,
tem-se que a lógica é apreender o mundo sensível como atividade humana, concreta e prática.
É a interpretação historicamente validada que permite transformar o mundo. Nessa
concepção, a prática é fonte, impulso e sanção epistemológica da teoria, que condensada e
guiada por aquela, converte-se em força da História. Assim, o referencial teórico utilizado
elucida a necessidade de dar visibilidade a outros espaços de produção de saberes existentes
fora da academia, com foco na diversidade cultural e na valorização das vozes dos sujeitos
historicamente oprimidos, exilados, por sua vez, epistemologicamente do ambiente científico.
Na visão de Dussel (1995), libertação e emancipação têm a conotação de luta social
que se operacionaliza mediante uma práxis crítica e transformadora por parte dos sujeitos
históricos, que, dessa forma, assumem o protagonismo de suas vidas considerando o seu
19

território cotidiano, sua realidade concreta, seu contexto histórico e social e se formam como
sujeitos coletivos situados na periferia do mundo - na América Latina, no Brasil, em Sergipe.
Quanto a outras categorias teóricas, pode-se dizer que a concepção de direitos
humanos infanto-juvenis aqui empregada parte da ideia de que esses direitos, apesar de terem
sido alcançados na lei, só se efetivam plenamente no cotidiano das lutas coletivas dos
agrupamentos específicos por condições dignas de vida, na perspectiva crítica apontada por
Joaquín Herrera Flores (2005) e David Sánchez Rubio (2008; 2013; 2014), a que se liga a
contribuição de Paulo Freire (2009) de que só há chances efetivas de superar as condições de
opressão por meio e a partir da “palavra que não silencia”, ou seja, da expressão da voz (que é
práxis) daquelas pessoas que vivem diretamente os efeitos da opressão, pois são os que
conhecem efetivamente o seu próprio sofrimento.
De Boaventura de Sousa Santos (2002), busca-se a importância de se reconhecerem
outras experiências e saberes, para que, do ponto de vista do conhecimento, nenhum saber se
coloque superior a outro reforçando as relações opressoras. Essa importância se torna
relevante frente a uma realidade, apontada por Sousa Santos (2002), de desvalorização e
desperdício de saberes considerados, sobretudo pelo saber científico europeu moderno, como
incredíveis (sem crédito algum). É a atitude de evidenciar, na diversidade as experiências
existentes no campo da criatividade organizativa de diferentes grupos sociais, que tal
realidade deve ser enfrentada (SOUSA SANTOS, 2002).
As concepções de hegemonia e de sociedade civil são buscadas em Gramsci (1999),
que considera a “direção intelectual e moral” de sua dimensão, situando-a na superestrutura
juntamente com a sociedade política (o Estado) e compreendendo-a como espaço de
organização da cultura que está inserida nessa superestrutura social. Nesse sentido, a
hegemonia não se estabelece apenas na esfera econômica (infraestrutura), mas principalmente
no campo cultural. Enquanto necessidade de materialização da direção, consciência e
identidade de classe, e de valores éticos, a disputa pela hegemonia ocorre, com
complementação a sociedade política, no espaço da sociedade civil, em que as classes buscam
ganhar aliados para obter essa hegemonia mediante direção e consenso.
As concepções de “movimento social”, “controle” e “participação social” assentam-
se nas reflexões de Maria da Glória Gohn (2005), para quem, após as décadas de 1970 de
1980, emergem novos atores e cenários políticos e novos formatos de participação social
como os diversos fóruns, que evidenciam a diversidade de pautas e contribuem para a
formação de novos sujeitos coletivos. Com base em algumas de suas reflexões, se analisa a
atuação do Fórum DCA-SE, bem como sua contribuição para a promoção dos direitos da
20

criança e do adolescente de Sergipe. Alguns cuidados foram aqui tomados, principalmente,


quanto à identificação de redes de articulação, a exemplo dos fóruns, como movimento
social8.
Na vivência de um fórum, em muitos momentos, as entidades e pessoas que o fazem
tendem a identificá-lo como movimento social. No entanto, após a realização desta pesquisa,
como se verá, essa categorização não está evidente, o que não impede que se trabalhe a partir
de Gohn, aproveitando a análise das pautas identitárias, para examinar em que contextos
surgem os novos formatos de participação e como essas redes sociais se manifestam e atuam.
Em que pesem algumas ponderações nesse sentido, que serão aprofundadas ao longo
desta dissertação, suas reflexões são relevantes para perceber o novo cenário político
brasileiro e, no caso em análise, as potencialidades do Fórum DCA-SE nos anos de 2000 a
2009, com suas contradições e fragilidades decorrentes de razões várias, entre as quais a
dinâmica de mercado imposta pelo projeto político do capital seguida por muitas ONGs,
inclusive por filiadas ao Fórum DCA-SE.
Quanto à análise específica das ações do Fórum DCA-SE, identificam-se entre as
estratégias diversas:
(I) sua incidência política sobre os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente;
(II) a construção da unidade a partir do investimento na formação dos sujeitos individuais e
coletivos;
(III) a conquista da visibilidade pública enquanto espaço fundamental de intervenção para o
segmento infanto-juvenil em Sergipe, seja pela ocupação dos espaços políticos e meios
de comunicação, seja por sua postura propositiva;
(IV) a realização constante de denúncias de violações de direitos humanos de crianças e
adolescentes no Estado de Sergipe.

8
Por não haver concordância com esta análise específica de que redes de articulação, como os Fóruns, possam
ser identificados enquanto movimentos sociais e, mediante a ausência de categoria teórica que melhor os
definam, neste trabalho é utilizada a terminologia “movimentação social” para identificar o conjunto das ações e
iniciativas promovidas pelas entidades que compõem o Fórum DCA-SE. A terminologia “ação contundente” é
utilizada para enfatizar períodos de maior visibilidade e protagonismo deste Fórum na conjuntura política de
Sergipe, a partir de uma ação mais unificada em torno das políticas infanto-juvenis. Vale ressaltar que esta
movimentação social é ao mesmo tempo reativa e/ou propositiva diante das problemáticas sociais apresentadas.
Do mesmo modo, a ação contundente ora é preponderantemente reativa, ora é propositiva ou ambos
concomitantemente. Em geral a ação contundente reativa se dá em virtude do próprio contexto de luta por
direitos, que é dinâmico e, portanto, exige uma ação imediata reativa àquele cenário. A movimentação do Fórum
DCA-SE, em vários momentos, exige uma ação contundente que se dispõe a ser propositiva como constatamos,
por exemplo, na ação do Plano de Gestão de Medidas Socioeducativas. Embora este Plano tenha sido elaborado
como reação à forma como estava se operacionalizando a política socioeducativa local representou, ao mesmo
tempo, uma proposição de constituição de situações que antes não existiam, como veremos no capitulo 4 desta
dissertação.
21

Priorizam-se, na análise dessas estratégias, o fomento da participação social e a ótica


pedagógica do Fórum DCA-SE traduzida na busca constante do diálogo, característica da
educação não formal enquanto processo que se ampara na vivência concreta das experiências
criadas, estratégica e coletivamente, por seus integrantes. O entendimento é de que, dessa
forma, o coletivo adquire melhores condições para incentivar políticas de promoção infanto-
juvenis para a implementação da proteção integral de direitos. Identifica-se empiricamente
que, entre os anos de 2000 e 2009, em especial nos anos de 2007 a 2009, a forma de atuação
do Fórum DCA-SE provocou alterações e intervenções importantes no cenário estadual, ainda
que a quase totalidade de suas ações estivesse concentrada em Aracaju. Por essa razão, o
presente trabalho se preocupa em analisar esse período.
A percepção inicial da trajetória do Fórum DCA-SE permite a formulação de
algumas questões desafiadoras, que se colocaram no cenário desde a vivência pessoal da
autora nesse espaço. Essas questões podem ser sintetizadas em:
1) Qual a importância do Fórum DCA-SE na luta pelos Direitos Humanos enquanto espaço
de intervenção e/ou controle social no âmbito das políticas públicas para a infância em
Sergipe?
2) Qual a importância do Fórum DCA-SE nos espaços de definição das políticas públicas da
criança e do adolescente?
3) Qual o seu lugar no Sistema de Garantia de Direitos – SGD - e sua relação com os
Conselhos de Direitos?
4) Quais estratégias sócio-pedagógicas de promoção da participação social estiveram em
processo nesse espaço?
5) Quais os desafios e as possibilidades de ampliação e fortalecimento dessa participação?
6) Que concepção de Direitos Humanos, movimentos sociais e participação estiveram
imbricados nesse processo?
Todas essas questões conduzem a outra, central e norteadora: É possível
compreender a atuação do Fórum DCA-SE como referência de atuação emancipatória capaz
de fomentar a participação e o controle social para a elaboração e implementação de políticas
aos Direitos Humanos infanto-juvenis em Sergipe?
Em face de essas questões, o objeto deste estudo é o próprio universo do Fórum
DCA-SE: seu histórico, sua importância, seu papel e sua atuação, no período de 2000 a 2009,
para a superação do contexto vivenciado por grupos oprimidos, entre os quais a criança e o
adolescente, para a valorização humana e para a produção democrática de saberes e cultura
enquanto projeto político de emancipação e libertação social infanto-juvenil.
22

Constata-se escassez de estudos enfatizando a importância e a função social de


espaços específicos, como o do caso em estudo, e, relativamente a Sergipe, pode-se afirmar
que há pouca tradição de pesquisa no âmbito dos Movimentos Sociais em defesa dos Direitos
Humanos, em especial sobre a práxis por condições dignas para a infância. Esse fato, aliado à
experiência da autora no Fórum DCA-SE e atualmente no Movimento Nacional de Direitos
Humanos de Sergipe - MNDH/SE - motivou a elaboração, no período de 2014 a 2016, desta
dissertação de mestrado, que tem foco na pesquisa em Direitos Humanos da Universidade
Tiradentes - UNIT.
Este trabalho, ao considerar a práxis elemento fundamental de transformação da
sociedade pela ação e o movimento social ator coletivo estratégico, ressalta a importância do
Fórum DCA-SE em seu papel de fomento da participação da sociedade civil, na medida em
que atua como agente de mobilização e pressão por mudanças sociais, que se educa e educa
enquanto se constrói e constrói o processo de reivindicação por direitos (GOHN, 2009).
Esta dissertação está dividida em três capítulos. O primeiro capítulo, intitulado
“Direitos Humanos de Promoção à Criança e ao Adolescente”, é dedicado a refletir sobre a
política pública direcionada à criança e ao adolescente no Brasil; a enfatizar o sentido dos
Direitos Humanos e da emancipação considerados nesta pesquisa; e a resgatar a luta dos
Fóruns DCA para concretizar o projeto político da mudança paradigmática, consagrado no
ECA, para o segmento da criança e do adolescente enquanto sujeitos de direitos.
No segundo capítulo, intitulado “O Sentido da Criação dos Fóruns DCA no Brasil”,
contextualiza-se o surgimento e o sentido da criação dos Fóruns DCA de um modo geral,
através do levantamento de iniciativas de participação da sociedade civil sergipana na
promoção dos direitos humanos infanto-juvenis e se apresentam o Fórum DCA-SE: metas,
diretrizes, princípios e missão, entre outros aspectos, e algumas categorias teóricas que
definem a concepção considerada neste trabalho.
Por fim, no terceiro capítulo, com o título “A Trajetória Política do Fórum DCA-SE:
palavras que não silenciam, possibilidades que emancipam”, resgata-se a trajetória histórica e
as estratégias político-pedagógicas utilizadas pelo Fórum DCA-SE no fomento à participação
social nos anos de 2000 a 2009; demonstra-se a relação do Fórum DCA-SE com os Conselhos
de Direitos no Sistema de Garantia de Direitos – SGD; e se descreve a atuação que marcou a
incidência do Fórum DCA-SE na conjuntura política infanto-juvenil de Sergipe.
A pesquisa, de que resulta esta dissertação, insere-se no Programa de Pós-Graduação
de Direito da UNIT e é financiada pela CAPES/FAPITEC.
2. DIREITOS HUMANOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

Neste capítulo, brevemente se contextualiza a invisibilização da infância e da


adolescência no Brasil e a atuação das políticas públicas nesse contexto, bem como se discute
a concepção de política pública e de criança e adolescente e o tratamento a eles dispensado,
no âmbito das políticas públicas, por autoridades responsáveis pela promoção e garantia de
seus direitos. Contribuem para esse resgate, principalmente, as reflexões de Irene Rizzini, Eva
Faleiros, Vicente de Paula Faleiros e Francisco Pillotti, inscritas na obra intitulada “A Arte de
Governar Crianças (a): a história das políticas sociais, da legislação e da assistência à infância
no Brasil”.
Aborda-se, também, o sentido dos direitos humanos e da emancipação, promovidos
pela atuação do Fórum DCA-SE e evidenciados na luta dos Fóruns DCA, para concretizar
projeto político da mudança paradigmática da criança e do adolescente, tornando-os sujeitos
de direitos.

2.1. A Política Pública Direcionada à Criança e ao Adolescente no Brasil

Crianças e adolescentes como sujeitos de direitos, como pessoas em condição


peculiar de formação e desenvolvimento, passíveis de tratamento prioritário e preferência
pelas políticas públicas com prioridade absoluta e de garantia de proteção especial e integral
por parte da sociedade, da família e do Estado, é situação muito recente no Brasil. A relação
estabelecida ao longo dos anos entre políticas públicas e infância no país é de descaso,
omissão e violência9, necessitando de articulação da sociedade civil para enfrentar e, talvez,
reverter esse processo que envolve a invisibilização do segmento infanto-juvenil.
Os registros históricos 10 apontam para uma realidade de crianças e adolescentes
tratados com indiferença pelas políticas e instituições públicas e pela própria sociedade, como
se não pudessem expressar suas impressões e necessidades acerca do mundo e propor
instrumentos para superar essa condição. É nesse processo que se consolida, no imaginário
coletivo, uma ideia de criança enquanto ser inferior. Ideia que coloca esse segmento em lugar
de vulnerabilidade social, de risco pessoal, social e de abandono.

9
Ver COSTA (1993), DEL PRIORE (1999) e RIZZINI (2000; 2007).
10
Ver ALBERTON (2005), BARROS (2005), FALEIROS (1995) e FREITAS (1997).
.
24

As políticas públicas direcionadas ao público infanto-juvenil sempre foram políticas


reprodutoras de ciclos de violência, meramente assistencialistas, de cunho caritativo, repressor
e punitivo. Jamais, antes da década de 1980, ousaram aproximar-se da promoção da infância e
da adolescência brasileira no sentido do fomento da emancipação futura dos jovens,
principalmente pobres e negros, principais alvos da inoperância das políticas públicas,
enquanto protagonistas de sua própria história. Relata Neuza Mafra que,

(...) os séculos XVI, XVII e XVIII, ao registrarem o período da assistência e do


atendimento, registram igualmente a orfandade, a exploração, a escravidão e a
exposição de crianças e adolescentes que eram enjeitadas e abandonadas nas ruas em
locais públicos. Nesse período, as ações assistencialistas eram de cunho caritativo,
asilar e executadas por diferentes ordens religiosas que atuavam no Brasil. As
crianças não constituíam uma preocupação de ordem política, o Estado era omisso e
a assistência pública inexistente (MAFRA, 2007, p. 368).

Rizzini e Pilotti (2009), por sua vez, fazem breve relato de como crianças e
adolescentes pobres e negros alvos da assistência pública e privada no Brasil foram
historicamente tratados. Na obra A Arte de Governar Crianças (a), os autores acabam por
“revelar disfarces, distorções e mitos, que se criaram em torno da infância-problema,
contribuindo para que novas propostas e políticas, condizentes com possíveis e distintas
perspectivas”, pudessem “surgir e florescer em nossa sociedade” (RIZZINI e PILOTTI, 2009,
p. 30).
A partir das exposições trazidas por Rizzini e Pilotti (2009), percebe-se que, durante
anos, a infância pobre foi considerada problema e caso de polícia, enquanto política pública.
Ao provocarem reflexões sobre de quem é efetivamente a responsabilidade sobre a criança
órfã, negligenciada, abandonada, maltratada e delinquente no Brasil, Rizzini e Pilotti (2009)
fazem retrospectiva significante acerca das ações direcionadas às crianças por meio das
diversas mãos (responsabilidades) pelas quais passaram em todos os tempos.
Nesse sentido, Rizzini e Pilotti (2009) revelam que nas mãos dos jesuítas, no período
colonial, o objetivo da intervenção era somente a evangelização. Nas mãos dos senhores, as
crianças eram as escravas e, expostas à precariedade dessa condição, morriam com
facilidade11. Sobre esse período, analisa Vicente Faleiros que “a criança escrava não era, pois,

11
Ver em “A Arte de Governar Crianças (a)”, de Rizzini e Pilotti, 2009, que era muito mais vantajoso,
economicamente falando, importar um escravo do que criar uma criança escrava. Mesmo após a Lei do Ventre
Livre, em 1871, que garantia a liberdade aos/às filhos/as das escravas nascidos após essa data, as crianças
continuaram nas mãos dos senhores. Estes optavam por mantê-las até os 14 anos, quando poderia ressarcir-se
dos “gastos” tidos durante anos com “trabalho gratuito”, para não dizer escravo, até os 21 anos. Assim, a prática
do abandono de crianças, escravas ou não, era uma prática cotidiana, mesmo nos países considerados
“civilizados”.
25

objeto de proteção por parte da sociedade. Sua sina estava traçada como propriedade
individual do senhor seu dono, como patrimônio e mão de obra” (FALEIROS, 2009, p. 206).
Ainda na mesma linha de raciocínio, nas mãos das Câmaras Municipais e da Santa
Casa de Misericórdia, no século XVIII, as crianças enjeitadas eram as crianças expostas nas
Rodas dos Expostos12. Com mortalidade bastante elevada, ficavam a mercê da determinação
do Juiz. Nos asilos, séculos XIX e XX, as crianças órfãs eram as abandonadas ou desvalidas
que precisavam ser regeneradas de acordo com as conveniências morais da época.
Ao passarem pelas mãos dos higienistas e dos filantropos, a única preocupação era
com as condições de higiene nas instituições de regeneração de crianças, consolidando a
importância do papel do médico nas instituições no século XIX. Nas mãos dos tribunais
passaram a ser alvo dos reformatórios e casas de correção; nas mãos da polícia, alvo de defesa
nacional, a que estava ligada a ideia de “limpeza” das ruas.
Nas mãos dos patrões, no século XIX, sob a alegação de que dessa forma retiravam
as crianças do ócio, argumento válido até os dias atuais para tentar justificar o alto índice de
exploração do trabalho infantil, elas foram exploradas, juntamente com as mulheres, como
trabalhadoras com salários baixíssimos no trabalho fabril.
Ainda, de acordo com essa mesma linha de pensamento, nas mãos do Estado, a
intervenção era meramente clientelista de encaminhamento das crianças pobres e negras às
poucas instituições oficiais públicas e privadas para serem “cuidadas”. Nessa perspectiva, só
restavam a esses “delinquentes” as escolas privadas de reforma, as colônias correcionais e os
presídios. Passadas (as crianças) à responsabilidade das forças armadas, na década de 1960, o
entendimento dos militares é de que a infância (pobre) era um problema que precisava ser
enfrentado como questão de segurança nacional.
Nas mãos dos juízes de menores, as ações eram direcionadas às crianças tidas como
em situação irregular, no sentido de se identificar as suas intenções, consideradas “menores”,

12
No século XVIII, surgem as Santas Casas de Misericórdia conhecidas como Roda dos Expostos ou dos
Enjeitados, a primeira em Salvador (1726) e depois no Rio de Janeiro (1738) (RIZINNI e PILOTTI, 2009, p. 19).
A motivação maior das Santas Casas era higienizar as ruas e diminuir o constrangimento social em lidar com a
exposição de restos de crianças mortas nas ruas, que serviam de alimento aos animais, quando não, uma forma
de exercer o controle sobre a infância abandonada naquele tempo, invisível e perdida. Muitas crianças, inclusive,
adoeciam dentro das Santas Casas e não conseguiam sobreviver, vítimas da fome e também de outros tipos de
maus tratos. Dessa forma, percebe-se que não havia preocupação em si com a criança e o adolescente, mas com
os estigmas de uma sociedade patriarcal, machista, conservadora e preconceituosa em relação não só aos filhos
nascidos fora do casamento, mas também em relação às mulheres. A Roda dos Expostos também funcionava
como uma tentativa de esconder os filhos fruto dos abusos sexuais e violências com que eram tratadas as negras
escravas, principalmente. Muitas dessas casas eram mantidas por ajuda social dos mesmos senhores dos
escravos. Como anteriormente exposto, o pano de fundo era exercer o controle social da não reconhecida
infância que insistia em aparecer na forma do aumento do abandono. Sobre o assunto, ver Rizzini e Pilotti
(2009).
26

para se saber o melhor encaminhamento a lhes direcionar: se a uma entidade de caridade ou


de correção 13 . Nas mãos da família (pobre), os “menores” foram negligenciados pelas
políticas públicas de trato meramente assistencialista e, posteriormente, essas famílias foram
tratadas pela elite brasileira como um segmento incapaz de cumprir com o papel de educar as
crianças, como ocorre até os dias atuais.
Assim, as mães foram estigmatizadas como prostitutas e os homens, como
alcoólatras. Ainda se veem, na realidade atual, famílias serem negligenciadas pelo Estado em
termos de fomento de políticas públicas eficazes à emancipação. Por consequência, a pobreza
e suas instâncias são revitimizadas, culpabilizadas e estigmatizadas como desarranjadas e
desestruturadas.
Segundo Rizzini e Pilotti (2009), consideradas avessas ao trabalho e sem condições
de exercerem boa influência sobre seus filhos, as famílias pobres foram sendo culpabilizadas
pelos problemas das crianças, entendidas como “menores”. Mitos que justificaram a violenta
intervenção do Estado sobre essas famílias empobrecidas com apoio de parcela das elites
políticas e de juristas. Para Rizzini e Pilotti (2009),

a primeira tentativa do governo em regulamentar a “assistência e proteção aos


menores abandonados e delinquentes”, no início da década de 1920, legitimou a
intervenção do Estado na família, não só através da suspensão do pátrio poder, mas
também pela apreensão dos menores ditos abandonados, mesmo contra a vontade
dos pais. Tal medida foi consequência da percepção que certos setores da sociedade
tinham das famílias pobres. Por isso, na lei, as situações definidas como de
abandono, tais como: não ter habitação certa; não contar com meios de subsistência;
estar empregado em ocupações proibidas ou contrárias à moral e aos bons costumes;
vagar pelas ruas ou mendigar etc., só se aplicava aos pobres (2009, p. 25).

Percebe-se que a prática atual de criminalização da pobreza e culpabilização das


famílias pobres têm raízes profundas em um passado não muito distante e que perdura no
nosso tempo. A falta de investimento público efetivo comprometido com as classes
desfavorecidas economicamente, composta por maioria negra, impacta diretamente na
sociedade civil. As consequências são o aumento e o acirramento da desigualdade e da
questão social.

13
Em 1941 foi criado o Serviço Nacional de Assistência a Menores – SAM, instituição que deveria orientar a
Política Pública para a infância e que em 1944, através do Decreto-Lei nº 6.865, vincula-se ao Ministério da
Justiça e aos juizados de menores para orientar e fiscalizar educandários particulares para fins de internação e
ajustamento social em entidades privadas, como os abrigos de “menores”. Após várias críticas realizadas por
parte da sociedade civil e do governo, alguns juízes condenaram o SAM como fábricas de delinquentes, escolas
do crime, lugares inadequados. O SAM dá lugar, em plena ditadura, à FUNABEM – Fundação Nacional de
Bem-Estar do Menor, criada em 1964, com o objetivo de “reeducar” o “menor” delinquente. A partir daí,
espalharam-se pelos Estados as conhecidas FEBEM - Fundação Estadual de Bem-Estar do Menor. Com ênfase
na segurança, essas instituições na prática funcionaram como verdadeiras penitenciárias (VICENTE FALEIROS,
2009).
27

Vale ressaltar que a criança e o adolescente são segmentos da sociedade, que, diante
de situação de maus-tratos, necessitam, na maioria das vezes, de um terceiro que intervenha
oficialmente por/sobre/com ele, no sentido de denunciar violações de direitos humanos.
Colocando a infância e a adolescência pobre no bojo da discussão dos agentes formuladores
de política pública, detentores de poder, Vicente Faleiros (2009) chama a atenção para a
necessidade de se levar em conta elementos significativos de análise das relações políticas em
uma sociedade. Nesse contexto, Faleiros afirma que,

As dimensões particulares para o aprofundamento da questão levam em conta a


relação Estado/sociedade como um confronto do econômico e do político, do
privado e do público, do poder clientelista/autoritário e do movimento pelos direitos
de cidadania nas relações de hegemonia que foram se construindo de acordo com os
blocos de poder. É na proposição e confronto de propostas desses agentes que
emergem as estratégias de ação, que se evidenciam as dimensões aqui referidas,
colocando o pleito entre trabalho e educação, público e privado, domínio sobre a
criança e direito da criança (FALEIROS, 2009, p. 33).

Em face dessa reflexão, cabe considerar que “a cidadania da criança e do adolescente


foi incorporada na agenda dos atores políticos e dos discursos oficiais muito recentemente, em
função da luta dos movimentos sociais no bojo da elaboração da Constituição de 1988”
(RIZZINI e PILOTTI, 2009, p. 35). No entanto, a herança cultural de políticas públicas
inexistentes ou inoperantes direcionadas à infância no Brasil, com seu formato clientelista e
estigmatizante da pobreza, dificulta a efetivação na prática do novo paradigma inaugurado sob
a égide da Constituição Cidadã, como ficou conhecida, e, posteriormente, do Estatuto da
Criança e do Adolescente.
Historicamente, constata-se que o termo “menor” foi utilizado durante anos para se
referir a crianças e adolescentes pobres, associados a uma representação de perigo social e
moral para a classe economicamente privilegiada, necessitados, portanto, de tratamento
diferenciado - como criminosos - por parte do poder público. Apontam Anjos e Rebouças
(2014) que, apesar de o ECA prever garantir-se infância e juventude com proteção integral
para uma parcela significativa das crianças e adolescentes do Brasil, “os efeitos sobre as
classes pobres de meninos e meninas é a permanência da velha simbologia do “menor”“
(2014, p. 194).
Em que pese qualquer criança e adolescente estar em condição de vulnerabilidade
por sua condição peculiar de ser em desenvolvimento e formação, há parcela significativa que
28

fica à mercê da concepção menorista14, segmentando e estigmatizando o todo em crianças


(classes favorecidas economicamente) e “menores” (os pobres tidos como desestruturados,
marginalizados, delinquentes, criminosos, incapazes, os que não têm mais jeito). Essa
concepção enxerga diferenciadamente as crianças e os adolescentes segundo critérios de
ordem econômica.
As crianças, desprovidas dos meios econômicos, nessa concepção, recebem das
políticas públicas as piores formas de tratamento, motivo pelo qual alguns autores, como Irene
Rizzini, Vicente de Paula Faleiros e Eva Teresinha Silveira Faleiros (2014) denunciam essa
forma de lidar com o segmento infanto-juvenil enquanto oferta de política para pobre e
política para rico. As consequências advindas dessa forma de conceber a infância e a
adolescência são políticas públicas pautadas em práticas repressivas, punitivas e autoritárias,
além de assistencialistas, revitimadoras, estigmatizantes e excludentes para a classe
empobrecida.
Essa situação, longe de promover a igualdade de condições a todas as crianças e
adolescentes: pobres e ricas, negras e brancas, meninas e meninos, acentuam a desigualdade
histórica de tratamento, tanto no campo das decisões judiciais quanto, principalmente, no
campo das políticas públicas de promoção e defesa da criança e do adolescente, o que amplia,
como consequência imediata, múltiplos universos de violências (ANJOS e REBOUÇAS,
2014, p. 95).
Rizzini e Pilotti (2009) apontam que a “omissão e paternalismo são as dimensões que
caracterizam a política para a infância pobre na conjuntura da Proclamação da República,
decorrentes não só da visão liberal, mas da correlação de forças com hegemonia do bloco
oligárquico/exportador” (2009, p. 36). Ainda segundo esses autores,

a relação entre ordem e cidadania se expressa na articulação de políticas públicas


para os perigosos, nas políticas repressivas, seja com ênfase na tutela pessoal da
criança seja com ênfase na ordem geral a ser preservada, seja na consideração da
criança como menor ou incapaz, seja na defesa da raça e da sociedade (RIZZINI e
PILOTTI, 2009, p. 35).

É, pois, inquestionável a importância de se pensarem políticas públicas que sejam


realmente eficazes no campo do fomento ao protagonismo infanto-juvenil, que levem em
conta a necessidade de ouvir crianças e adolescentes para que sejam construídas
coletivamente possibilidades alternativas de superar a condição de violência a que estão

14
Concepção que vigorou entre 1927 e 1979 e consistiu em coisificar a infância sob controle repressivo estatal
para meninos e meninas compreendidos na “situação irregular”, culpabilizando e punindo principalmente a
família e as crianças e adolescentes empobrecidos.
29

submetidos. Desse modo, é possível conhecer as causas de suas dores físicas e emocionais, de
que resultam, muitas vezes, altos índices de evasão escolar, desaparecimento, cometimento de
atos infracionais, inserção na rede de tráfico de pessoas, de órgãos e de drogas e suicídios,
entre outros.
Na linha da teoria da ação dialógica 15 de Paulo Freire, seria construir a política
pública a partir da realidade concreta do oprimido. Nesse sentido seriam dados, na prática,
passos efetivos para o rompimento com o antigo paradigma que concebia o segmento infanto-
juvenil como um “menor”16. A importância da política pública para a promoção de direitos
humanos de crianças e adolescentes está justamente na perspectiva crítica de entender os
direitos humanos enquanto participação/luta dos grupos mais vulneráveis para terem
realizadas concretamente suas principais reivindicações.
A operacionalização da política pública infanto-juvenil a partir dessa concepção só se
efetivará quando internalizada nos moldes de uma lógica emancipadora e libertadora, assim
como nos orienta Enrique Dussel. Essa lógica se relaciona diretamente com a ideia de contar a
História a partir da realidade concreta do “escravo que nasceu escravo e que nem sabe que é
uma pessoa” (DUSSEL, 1995, p. 19). Nesse contexto, nos alerta Dussel (1995) que

O pobre, o dominado, o índio massacrado, o negro escravo, o asiático das guerras do


ópio, o judeu nos campos de concentração, a mulher objeto sexual, a criança sujeita
a manipulações ideológicas (também a juventude, a cultura popular e o mercado
subjugados pela publicidade) não conseguirão tomar como ponto de partida, pura e
simplesmente, a “estima de si mesmo”. O oprimido, o torturado, o que vê ser
destruída a sua carne sofredora, todos eles simplesmente gritam, clamando por
justiça: - Tenho fome! Não me mates! Tem compaixão de mim! - é o que exclamam
esses infelizes (1995, p. 19).

Passo importante na implantação e implementação de políticas públicas mais efetivas


foi a criação dos conselhos tutelares17, dos conselhos de direitos, de Fóruns da sociedade civil
e de um Sistema de Garantia de Direitos 18 que envolve, além dos órgãos já citados, os

15
Teoria que se funda na colaboração, na união e na organização dos oprimidos entre si, para consecução de sua
libertação, através de síntese cultural que quebre as estruturas alienantes da sociedade. Ela defende que a
realidade social objetiva é resultante da ação subjetiva dos homens, que eles têm, portanto, o poder, o dever e o
direito de transformá-la.
16
Ser menor de idade é ter menoridade, isto é, como inscrito no ECA , ser criança, enquanto a idade for inferior
a 12 anos, ou ser adolescente, enquanto a idade for superior a 12 e inferior a 18 anos. “Ser um menor” tem
subjacente, mais que a menoridade, a ideia de insignificante, de menor valor, de pouco apreço, quando não de
desprezível, não merecedor de maior consideração.
17
De acordo com o ECA, art. 131, “o Conselho Tutelar é um órgão permanente e autônomo, não jurisdicional,
encarregado pela sociedade de zelar pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos nesta
Lei”.
18
O Sistema de Garantia de Direitos é composto por todos os agentes públicos e da sociedade civil que atuam
em torno do melhor interesse da criança no sentido de garantir sua proteção integral e especial. Para tanto, esse
sistema deve exercer as suas funções em rede articulada a partir de três eixos estratégicos de ação: promoção,
defesa e controle social dos direitos humanos de crianças e adolescentes.
30

aparatos de justiça todos pensados para assegurar o melhor interesse da criança e do


adolescente. Outros avanços importantes se situam no campo da descentralização político-
administrativa. Os municípios passaram a ter responsabilidade direta na oferta de serviços
antes da responsabilidade do dos governos federal e estaduais.
Assim como “desde o início dos tempos, a capacidade de dotar de caráter e sentido
as próprias produções e a possibilidade de criar e recriar mundos plurais foi diferente e
desigual entre os seres humanos” (RUBIO, 2014, p. 16), as duas doutrinas – da situação
irregular e da proteção integral da criança e do adolescente – caracterizam a forma de
conceber a infância de modo diferenciado, totalmente oposto. Percebe-se, a partir daí, que as
políticas públicas direcionadas à infância podem ser trabalhadas de modos distintos conforme
distintas e contraditórias forem as concepções assimiladas.
É somente em 1988 que a criança passa a ser tratada juridicamente enquanto
prioridade da política pública, uma vez que o modo de conceber a infância foi alterado a partir
da luta da sociedade civil. Reconhece-se, a partir da Constituição Federal - CF e do ECA, que
a prioridade das políticas públicas para o segmento infanto-juvenil deve ser absoluta.
Valoriza-se a convivência familiar e comunitária19.
A costumeira colocação de crianças em orfanatos, por exemplo, por condições de
pobreza da família torna-se inviável, bem como a retirada de crianças de suas comunidades
para trabalharem em “casas de família” 20 sob o argumento de que com as novas famílias
economicamente bem favorecidas teriam também melhores condições de vida.
As políticas públicas devem ser operacionalizadas não apenas no sentido de ofertar
serviços para o outro, mas de pensá-los com o outro, no caso em pauta, a criança e o
adolescente, a partir de sua fala e iniciativas comportamentais. De acordo com o ECA, é
preciso promover políticas públicas que considerem diagnósticos sobre as diversas realidades

19
Rompe-se nesse momento a tradicional forma de lidar com a pobreza no sentido de retirar crianças e
adolescentes do ambiente familiar por quaisquer motivos, entre estes, a falta de condição econômica da família,
abrigando-as ou colocando-as sobre os cuidados dos antigos orfanatos. Dessa forma, transfere-se a
responsabilidade da educação das crianças para um ente público ou privado e se institucionaliza a infância, o que
ainda ocorre, mas em dimensão menor devido aos incentivos promovidos pelo ECA. Ver Plano Nacional de
Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária de
2006.
20
Era comum antigamente, e ainda hoje persiste em algumas realidades, crianças e adolescentes serem retirados
de seus lares para trabalharem em “casas de família” economicamente favorecidas. O argumento, mais uma vez,
é a condição de pobreza de algumas famílias para cuidarem de seus filhos, mediante promessas de tratamento e
cuidados semelhantes aos direcionados a uma pessoa da família consanguínea. Desse modo, várias crianças
pobres, a partir do interesse no estudo, roupa e alimentação, são submetidas a maus tratos, inclusive ao abuso e à
exploração sexuais, uma vez que muitas crianças e adolescentes eram obrigados a iniciar sexualmente filhos dos
patrões quando não, o próprio patrão, além de outras situações. Esse procedimento frustra a esperança inicial por
melhores condições de vida de crianças e adolescentes, com gravíssimas consequências psicológicas, físicas e
emocionais. Sobre o assunto ver Luciane Potter Bitencourt, 2009, indicada nas referências deste trabalho.
31

e contextos sociais vivenciados por crianças e adolescentes. Isso se faz com sensibilidade e
leitura crítica, para ler e entender as entrelinhas quando adolescentes, por exemplo,
respondem com “rebeldia” para além da própria fase da adolescência, nos espaços de
educação formal ou fora deles. Isso significa desenvolver habilidades para entender os
diversos gritos e vozes, abafados por anos, de crianças e adolescentes, principalmente, as
pobres e negras.
Nas palavras de Dussel (1995), é ter consciência ética para dar resposta ao grito que
somente comove quando há sensibilidade para com a dor daquele que grita. Essa
sensibilidade, de acordo com esse autor, é anterior a qualquer atitude reflexa. Assim, para
Dussel (1995), a “responsabilidade” pelo “Outro” emerge como “ato de justiça”, enquanto
resposta exigida antes pelo “Outro”. É nesse sentido que o ECA provoca uma série de
possibilidades de ação concreta em relação ao segmento infanto-juvenil. Essas iniciativas
orientam para proteção integral de crianças e adolescentes, consideradas todas as suas
vulnerabilidades.
No entanto, mesmo com todo o esforço da Política de Assistência Social e a
implantação e implementação do Sistema Único de Assistência Social - SUAS, essa proteção
integral ainda não aconteceu, uma vez que a Política Pública para a Infância e a Adolescência
não recebeu dos gestores púbicos a atenção necessária, inclusive quanto a seu financiamento.
Muitos gestores, ao invés de entenderem que os recursos financeiros para essa área
representam investimentos na sociedade, os compreendem como gastos desnecessários e,
assim, apostam no assistencialismo que não emancipa, pelo contrário, vicia, tornando
dependente quem dela usufrui. As famílias pobres continuam sendo culpabilizadas pelos
insucessos da educação das crianças e adolescentes. Reproduzem com as crianças os famosos
“cala a boca”, muitas vezes expulsando do ambiente familiar e comunitário crianças e
adolescentes que não suportam esse universo revitimatizante.
Aliado à lógica de uma cultura baseada na relação binomial de inferior/superior,
oprimido/opressor, criança-adolescente/adulto, entre outras, o contexto capitalista neoliberal
contribui para o aumento das desigualdades entre as classes sociais e para a ampliação dessas
relações. As consequências são, como se viu, a oferta de políticas para ricos e políticas para
pobres. Uma categoria com todos os direitos garantidos e a outra com todas as carências e,
consequentemente, com a culpa e responsabilidade pelos ônus decorrentes. Desse modo, não
se consegue dar o salto necessário para promover direitos humanos de crianças e adolescentes
numa concepção crítica e libertadora. Sobre esse assunto, Dussel (1995) aponta que,
32

o Estado capitalista é um Estado de guerra, ele precisa ter um inimigo, com I


maiúsculo, um inimigo total; porque a perpetuação da escravidão, a perpetuação da
luta pela sobrevivência, ao constatar as novas possibilidades de liberdade e ação,
está intensificando nesta sociedade tais extremos de agressividade primitiva que,
penso eu, a história até agora não havia conhecido (DUSSEL, 1995, p. 20).

Pelo já exposto, infere-se que é imprescindível haver a organização da sociedade em


coletivos de participação política, como as redes de defesa da criança e do adolescente. O
desafio de superar essa realidade precisa ser assumido por todas as instâncias da sociedade,
especialmente pelos movimentos sociais. É necessário que se questione a ordem vigente e
que se proponham alternativas, para o que é preciso ter disposição, coragem e acreditar que
vale a pena essa participação. Diante do contexto levantado, em outras palavras, é preciso ter
utopia e ser utópico ao mesmo tempo. Como bem nos orienta Boaventura de Sousa Santos, é
preciso utopia para seguir em frente com criatividade e respeito às diversas formas de
produção de saberes ainda desconhecidos.
Tudo isso passa também pelo fomento de espaços de articulação da sociedade civil
como os Fóruns DCA, de discussões permanentes sobre direitos humanos infanto-juvenis, que
contemplem, sem perder de vista outros espaços de atuação política, a efetiva participação nos
conselhos deliberativos da política pública de promoção dos direitos da criança e do
adolescente, como se aborda neste trabalho. Nesse sentido, vale considerar o sentido de
direitos humanos e da emancipação que norteia a nossa concepção.

2.2.O Sentido dos Direitos Humanos e da Emancipação à Luz da Teoria Crítica

Consideradas as ideias de Marx, Nietzsche e Freud, quanto à reafirmação da razão


fundada no princípio da subjetividade, é possível denunciar as estruturas sociais de opressão,
de exploração, de inferiorização e de alienação do ser humano. Por essa lógica, Marx no
conceito da luta de classes; Freud, no do inconsciente e da sexualidade; e Nietzsche, no da
verdade, fomentam os contextos de uma crítica que à frente vão impulsionar os fundamentos
da teoria crítica21 dos direitos humanos, mudando todo o seu sentido clássico, cuja democracia
estava diretamente relacionada aos direitos da burguesia e a serviço do capital.
Desse modo, sob a bandeira de luta da democracia ou em nome dos direitos
humanos, há iniciativas afinadas a concepção clássica ligada aos princípios liberais do
capitalismo ou crítica ligada à luta cotidiana para concretizar direitos na prática, para além dos

21
Abordagem teórica, desencadeada por ensaio-manifesto de Max Horkheimer intitulado Teoria Tradicional e
Teoria Crítica, publicado em 1937, que, em contraposição à teoria tradicional, de matriz cartesiana, busca aliar
teoria e prática. Ela propõe a dialética como método para entender a sociedade, através de investigação analítica
dos fenômenos estudados, relacionando-os fenômenos com as forças sociais que os provocam.
33

dispositivos legais. Embora o Fórum DCA-SE não tivesse consciência coletiva de que, em
muitos momentos, atuou nessas perspectivas, ainda assim se faz necessário comprendê-las
para que se possam relacionar momentos de fluxo e refluxo dessa rede relativamente à
hegemonia da concepção predominante, em determinados momentos numa linha mais crítica
de Direitos Humanos e de emancipação e em outros não. Considera-se que a atuação política
do Fórum segue na linha de raciocínio de Gohn, que compreende movimentos sociais
enquanto

ações sociopolíticas construídas por atores sociais coletivos pertencentes a diferentes


classes e camadas sociais, articuladas em certos cenários da conjuntura
socioeconômica e política de um país, criando um campo político de força social na
sociedade civil. As ações se estruturam a partir de repertórios criados sobre temas e
problemas em conflitos, litígios e disputas vivenciados pelo grupo na sociedade. As
ações desenvolvem um processo social e político-cultural que cria uma identidade
coletiva para o movimento, a partir dos interesses em comum. Esta identidade é
amalgamada pela força do princípio da solidariedade e construída a partir da base
referencial de valores culturais e políticos compartilhados pelo grupo, em espaços
coletivos não institucionalizados. Os movimentos geram uma série de inovações nas
esferas públicas (estatal e não estatal) e privada; participam direta ou indiretamente
da luta política de um país, e contribuem para o desenvolvimento e a transformação
da sociedade civil e política. Estas contribuições são observadas quando se realizam
análises de períodos de média ou longa duração histórica, nos quais se observam os
ciclos de protestos delineados. Os movimentos participam, portanto, da mudança
social histórica de um país e o caráter das transformações geradas poderá ser tanto
progressista como conservador ou reacionário, dependendo das forças sociopolíticas
a que estão articulados, em suas densas redes; e dos projetos políticos que constroem
suas ações. Eles têm como base de suporte entidades e organizações da sociedade
civil e política, com agendas de atuação construídas ao redor de demandas
socioeconômicas ou políticos-culturais que abrangem as problemáticas conflituosas
da sociedade onde atuam (GOHN, 1997, p. 251-2520).

Ressalte-se que a concepção crítica dos direitos humanos, ao interpassar a


denominada filosofia da suspeita e ao se inspirar nas ideias de Joaquín Herrera Flores, abre o
horizonte de construção das possibilidades contra-hegemônicas de sociedade, mostrando que
são heterogêneas as perspectivas alternativas de transformação social (FLORES, 2009). Desse
modo, os componentes de novo paradigma dos direitos humanos são (re) inventados enquanto
“processos institucionais e sociais que possibilitem a abertura e a consolidação de espaços de
luta pela dignidade humana” (FLORES, 2009, p. 24). Nesse sentido, identificou-se, em várias
intervenções realizadas pelo Fórum DCA-SE, atuação diretamente relacionada à ideia de
libertação dos povos oprimidos e subordinados, que, neste trabalho, se restringe ao grupo
crianças e adolescentes. Essa perspectiva crítica representa lutas, processos de luta e
resultados destas enquanto práticas coletivas e democráticas de participação política,
produzidas pelos/nos movimentos sociais na busca por emancipação e libertação social.
34

É por meio dessa perspectiva que as iniciativas da sociedade civil, representadas


pelos mais diversos grupos culturais e sociais, dentre estes o Fórum DCA-SE, passam a ser
valorizadas. Isso se dá pelo entendimento de que somente a partir daquele que vivencia as
mazelas sociais que se manifestam através das expressões populares é que se podem alcançar
possibilidades de efetivação dos direitos humanos. Desse modo, se valorizam as articulações
como as promovidas por fóruns de debates permanentes da sociedade civil sobre temáticas
específicas (LGBT, gênero, criança e adolescente, entre outras), a exemplo dos Fóruns de
Defesa da Criança e do Adolescente, enquanto espaços democráticos de efetivação de lutas
contra-hegemônicas, de produção de saberes diversos e de construção de formas mais
autônomas e emancipatórias de participação, intervenção social, política e de organização
coletiva.
Os sujeitos históricos dessa luta buscam superar a condição de opressão a que estão
submetidos diferentes agrupamentos humanos, por questões sociais que envolvem múltiplas
facetas da diversidade. E devem, ao final, considerar que “[...] os limites impostos ao longo da
História pelas propostas do liberalismo político e econômico exigem uma reformulação geral
que os aproximem da problemática pela qual passamos hoje em dia”. (FLORES, 2009, p. 23).
Espaços como esses podem fomentar e instigar sujeitos históricos a identificar o
denominador comum que unifica os diferentes grupos sociais, além de analisar as causas que
levam às generalizações binomiais do poder hegemônico: inferioridade/superioridade,
dominado/dominador. Isso pode acontecer quando essas redes coletivas passam, sob essa
perspectiva crítica, a contemplar a práxis da ação-reflexão-ação em seus fazeres e modos de
pensar. Essa práxis contempla a reflexão sobre as relações antagônicas de dominação,
dependência, hierarquia, exploração, discriminação, colonialismo, emancipação, autonomia,
libertação, que, entre outras coisas, sugerem à sociedade em geral mudanças profundas
sociopolíticas, econômicas e ambientais. Segundo Flores, “devemos, nos reapropriar do
mundo para poder propor-lhe novas problemáticas e postular novas possibilidades de ação”
(FLORES, 2009, p. 28).
Assim é que a própria atuação política adotada como estratégia pedagógica pelo
Fórum DCA-SE, principalmente quanto ao fomento de debates, diálogos e formação política,
no período entre 2000 a 2009, parte da valorização da autoestima e da apresentação de pautas
que elucidam realidades opressoras e reivindicatórias de direitos que se evidenciam nessa rede
como ações de prevenção a situações violadoras de direitos. No entanto, em nossa sociedade,
35

que juridicamente se movimenta apenas quando há uma violação 22, as ações pré-violatórias
são pouco valorizadas e muitas vezes descredibilizadas em detrimento das ações pós-
violatórias, forma de atuação sobre a qual o Fórum também se debruçou por meio das
denúncias.
Nesse sentido, autores críticos, como Boaventura de Sousa Santos, por exemplo,
chamam a atenção para o fato de existirem tradições e costumes de diferentes valores e moral
diferenciada. Sousa Santos (2002) faz referência a iniciativas empreendidas pelos múltiplos
saberes, advindos de vários agrupamentos e que na prática são pouco valorizadas, inclusive
pelo saber científico. Sob esse aspecto, iniciativas como as do Fórum DCA-SE são, em Sousa
Santos (2002), uma experiência de produção de saber que precisa ser conhecida antes de ser
tratada ou julgada como vivência ou saber inferior. Esse autor argumenta que quando uma
cultura classifica outra como inferior se fortalecem as relações opressoras do ponto de vista
do conhecimento. Assim, se condenam vidas e saberes significantes e hegemonicamente tidos
como incredíveis (sem crédito algum).
Destaca Sousa Santos (2002) que nem todo conhecimento é efetivamente conhecido.
Por esse motivo, há muitas experiências desperdiçadas que precisam ser compartilhadas com
outros. Por isso a importância de se buscar reconhecê-las em seus valores, fomentando a troca
constante dos saberes identificados e diversos. Incorporado a esse sentido crítico dos direitos
humanos, Sousa Santos (2002) evoca a sensibilidade para perceber que a teoria crítica reflete
sobre o desafio de como intelectualmente se podem internalizar as culturas, de como elas se
diferenciam socialmente (de forma ética), razão da importância de se historicizar, estudar e
dar conhecimento da experiência de luta pelos direitos humanos e de quaisquer experiências
que se pretenda fazer conhecer, como a do caso em análise.
Nesse sentido, a teoria crítica busca estimular a ideia da necessidade que se tem
frente aos valores do fazer humano, do verdadeiro papel do intelectual em trazer o conceito de
espaço cultural enquanto lugar de encontro que se tem de construir. Na linha de pensamento
de Sousa Santos (2002), nenhuma cultura deve impor a sua dinâmica a nenhuma outra. Para
isso, é necessário perceber criticamente e de forma reflexiva os direitos humanos como

22
Para que o sistema de justiça brasileiro atue é necessário que seja provocado. Para tato será sempre necessário
que antes um direito seja violado. Dessa forma, se atua prevendo sempre a violação de direitos humanos e o
investimento nesse sentido são as ações pós-violatórias que acabam acumulando processos jurídicos que refletem
conflitos morosos de serem resolvidos pela justiça burocrática legitimada em nossa sociedade. Daí porque as
ações pré-violatórias de mediação de conflitos e de prevenção de violações, a partir da movimentação social que
se dá nos espaços de articulação da sociedade civil, serem tão importantes. São verdadeiros conhecedores de
suas realidades e capazes de propor o que lhe é mais útil, considerando a dignidade humana.
36

produtos culturais, para seguir firmando compromissos e deveres com o reconhecimento


destes e reagir culturalmente com respeito, reciprocidade e redistribuição.
É justamente nesse ponto de tensão que a teoria crítica sofre questionamento quanto
à alegada falta de cientificidade, uma vez que, em virtude da valorização, por exemplo, da
interdisciplinaridade, tenderia a dar crédito excessivo aos demais saberes, inclusive ao saber
popular e a valores não científicos, contemplando no processo crítico até mesmo a arte, a
poesia, a linguagem e a cultura populares. Na deflagração desse conflito, Flores (2008) afirma
que nas tensões em que prepondera a superioridade de um saber não há intervenção das
minorias hegemônicas.
Flores (2008) chama ainda a atenção para o fato de que a ideia de mercado livre
abafa a liberdade, destacando essa realidade como totalitarista, e que esse processo condena
os indivíduos a viverem na barbárie 23 . Wolkmer (2008), ao tratar dos processos de
globalização e do neoliberalismo, afirma que ambos os projetos políticos de sociedade
geraram processos de exclusão. Por isso, ele defende que os diálogos interculturais e
transculturais surjam exatamente do reconhecimento de um sistema que não parta
exclusivamente do Estado, mas da ideia de pluralismo que ultrapasse as fronteiras, sem
processos de anulação ou inferiorização do outro24.
Esse entendimento de Wolkmer (2008) trata do pluralismo que deve estar pautado
em elementos multiculturais de reconhecimento das normas em favor das minorias com todos
os seus saberes. Pelo exposto, fica claro que quanto mais se investe no diálogo intercultural,
na valorização dos diferentes saberes, inclusive na linha do pensamento de Sousa Santos, nos
saberes incredíveis, com consciência ética e crítica, mais é possível promover mecanismos
emancipatórios dos sujeitos e das organizações políticas. É esse sentido de emancipação que
essa dissertação dialoga. No sentido da busca permanente do diálogo e da reflexão.
Por essa razão, valoriza-se, nessa dimensão, fomentar a criação de novos espaços
participativos de construção de saberes críticos e de valorização dos já existentes. Esses
espaços são possibilidades concretas e reais de os grupos oprimidos, como povos tradicionais
(indígenas, ciganos, quilombolas), os coletivos de mulheres e os movimentos por moradia e
dos direitos da criança e do adolescente, entre outros, confrontarem a lógica opressora.
23
Flores (2008) compara essa visão ao que ocorreu no neoconservadorismo, em que se precisava de controle
social por parte dos intelectuais, que passaram a agir difundindo a ideia de que os Estados Unidos, por exemplo,
e a Europa não podiam ser contrariados e que, caso isso ocorresse, haveria guerra. Com o intuito de controlar as
massas, vários intelectuais publicaram ideias absolutistas que induziram a população a acatar as decisões
daqueles.
24
Sobre essa atuação para além das instâncias estatais, como se verá no capítulo 3, embora a atuação do Fórum
tenha ultrapassado no período analisado essa perspectiva, sua ação se fixou predominantemente em função dessa
instância, o que constitui fragilidade própria.
37

Nesse contexto, Marilena Chauí chama a atenção, quando enfatiza a sociedade


democrática. Segundo a autora, a criação dos novos espaços e conquista da ampliação de
novos direitos se dá pela instituição da sociedade democrática e esta possibilita a abertura do
campo social, pois

a democracia é a sociedade verdadeiramente histórica, isto é, aberta ao tempo, ao


possível, às transformações e ao novo. Com efeito, pela criação de novos direitos e
pela existência dos contrapoderes sociais, a sociedade democrática não está fixada
numa forma para sempre determinada, ou seja, não cessa de trabalhar suas divisões e
diferenças internas, de orientar-se pela possibilidade objetiva (a liberdade) e de
alterar-se pela própria práxis. Por isso mesmo, a democracia é aquela forma da vida
social que cria para si própria um problema que não pode cessar de resolver, porque
a cada solução que encontra, reabre o seu próprio problema, qual seja, a questão da
participação (CHAUÍ, 2008, p. 69).

Acrescidas a essa reflexão as ideias de Rubio (2008), é possível perceber que o


confronto entre as conquistas na lei e as conquistas de direitos no campo prático deve-se dar
no campo da reafirmação das identidades25 coletivas em contraposição às identificações que
se fazem dessas mesmas lutas a partir de quem está fora e acima delas, distante, portanto, e
em posição de superioridade. Na perspectiva gramsciana, a velha forma de identificar as lutas
sociais relaciona-se com poder hegemônico exercido pelos que detêm os meios de produção e
ocupam os seus espaços formais26.
Sob esse prisma, os novos espaços democráticos de participação social representam
alternativas de se contrapor democraticamente a essa forma de perceber as lutas sociais para
concebê-las a partir de quem está dentro e na base da situação, de baixo para cima. Essas
afirmativas se relacionam diretamente com a defesa radical de processos democráticos, a fim
de que haja participação efetiva da população na tomada de decisões. Isso é necessariamente
um princípio político. Contudo, é preciso compreender como viabilizar esse processo por
meio dos movimentos sociais, que estejam impregnados do valor democrático partido da base,
para a construção de modo de vida com centralidade em projeto político de emancipação
(PINI, 2007, p. 19).
Daí porque se diz que a reinvenção dos direitos humanos, enquanto valorização das
lutas concretas, ao se inspirar nas ideias de Joaquín Herrera Flores, abriu o horizonte de
proposição de caminhos a partir de outros saberes não hegemônicos, demonstrando que são

25
Numa perspectiva crítica de direitos humanos, há uma diferença entre identidade em que o próprio sujeito é
quem se autoafirma e se autodeclara, como o é (negro, quilombola, gay, outro), e identificação, em que esses
sujeitos são identificados, definidos por um olhar externo a ele. Daí as estigmatizações e estereotipações sobre os
sujeitos individuais e coletivos. As identificações podem levar à produção de estereótipos que, por sua vez,
produzem e reproduzem discriminações e violações de direitos humanos.
26
Numa lógica marxista somada a uma lógica crítica de direitos humanos, essa maioria do ponto de vista do
poder hegemônico é composta por uma minoria elitizada, branca e masculinizada.
38

diversas as alternativas de intervir e transformar a realidade social. Destacam-se, na


atualidade, novos formatos de participação social, como os fóruns, tão enfatizados por Maria
da Glória Gohn, a partir dos Novos Movimentos Sociais27.
Diante desse paradigma, as práticas sociais também se transformam e os novos
movimentos sociais que se destacam são justamente os das práticas coletivas que se pautam
por “uma nova forma de fazer política e a politização de novos temas” (GOHN, 1997, p. 124).
São, por exemplo, as redes de luta, como as pautas LGBTT (lésbicas, gays, bissexuais,
transexuais e transgêneros), feminista e étnico-racial e as articulações para promover direitos
humanos de crianças e adolescentes, como os Fóruns DCA.
Nos campos do direito e da educação não formal 28 , avança-se, respectivamente,
quando se alcança a dimensão além da letra da lei (ideia do pluralismo jurídico29) com todos
os seus artigos, parágrafos e incisos e quando se amplia a dimensão e se atua além dos muros
exclusivamente institucionais das escolas e universidades.
Desse modo, propõe-se o investimento na prevenção das mazelas sociais. Para tanto,
é necessária maior interação entre o direito e as vivências populares, como, por exemplo, as
30
experiências de escritórios populares e as universidades e escolas com as ações
desenvolvidas na própria comunidade, partindo-se, como defende Sanches Rubio (2008), da

27
Ver nota 7.
28
Ideia de educação informal e popular que se constrói no desenrolar das práticas coletivas.
29
Sobre o pluralismo jurídico, ver Antônio Carlos Wolkmer, indicado nas referências deste trabalho. Segundo
Wolkmer (2010), há uma tensão entre a norma e a realidade. Um abismo entre o dever ser e o ser que se revela
em diversos temas afetos e demonstram os limites do direito positivo. A teoria crítica dos direitos humanos
responde a essa contradição afirmando que a norma, enquanto direito humano positivado, é apenas um elemento
de propulsão e garantia, mas não é o único. E é nesse sentido que o pluralismo jurídico é priorizado. Para
Wolkmer, “É necessário, portanto, transpor o modelo jurídico individualista, formal e dogmático, adequando
conceitos, institutos e instrumentos processuais no sentido de contemplar, garantir e materializar os “novos”
[grifo do autor] direitos de natureza humana” (WOLKMER, 2010, p. 26). Sendo assim, embora se reconheça a
centralidade da lei, a sua efetivação depende de vários conjuntos de ações e mudanças socioculturais e
ambientais, das quais a legislação é apenas uma parte na busca para eliminar a tortura, a violência doméstica etc.
Nesse contexto, a interdisciplinaridade é uma forma de entender a complexidade dos diferentes contextos
socioculturais, demonstrando que no interior do direito também há questões políticas, econômicas, sociais que
precisam dialogar e se relacionar com outras áreas do conhecimento, como a sociologia, a filosofia, a economia
e, inclusive, os saberes populares. Tudo se complementariza e, assim, se, de um lado, tem-se que o campo do
direito não é tão eficiente, do outro, se percebe que tão pouco ele pode ser ignorado.
30
As práticas de escritórios populares de direito e centros de defesa de direitos humanos que, usando a lacuna
deixada pelo direito na norma jurídica, fazem, em conjunto com os movimentos sociais, interpretações das
complexidades de suas bandeiras de luta, que muitas vezes sensibilizam a sociedade e até mesmo o sistema de
justiça, em sua maioria reduzida exclusivamente à letra morta da lei. Nessa seara, de modo geral, o que a teoria
crítica vai apontar é que o investimento das lutas sociais ampliou e elevou o debate dos direitos humanos,
chegando a positivar muitos direitos. Isso apenas, no entanto, não basta, pois nem tudo o que está positivado é
efetivado. Sobre o assunto, ver leituras ligadas às expressões, “direito alternativo” (Brasil-positivismo de
combate), “pluralismo jurídico”, “crítica legal de estudos”, “uso alternativo de direito”, “outros direitos”, “crítica
jurídica”.
39

sensibilização de outros coletivos, cujas diversidades e complexidades históricas infelizmente,


na maioria das vezes, são simplificadas e reduzidas.
Para Flores (2008), é preciso mostrar as causas da miséria no mundo associadas ao
próprio capitalismo (o gerador das mazelas sociais). Assim, Flores (2008) critica o
capitalismo, afirmando que, ao controlar o comportamento humano, esse projeto segue se
alimentando da marginalidade, consequência dele próprio.
É necessário, portanto, fazer mais do que esperar que os direitos sejam violados
(lógica do mecanismo de justiça que só atua mediante provocação). É preciso apostar nos
debates, diálogos, reflexões e ações que se manifestam no campo dos direitos humanos
enquanto projeto ético de sociedade, com foco nas ações também pré-violatórias que
representam alternativas para uma transformação realmente efetiva no campo do respeito às
coletividades e seus saberes e da valorização da dignidade humana, para além do direito
positivado.

2.3. Mudança Paradigmática da Política dos Direitos da Criança e do Adolescente: Luta


dos Fóruns DCA

A história da situação da criança e do adolescente no mundo exige discussão


permanentemente, nas mais diversas áreas. Essa necessidade decorre da complexa trajetória
que os envolve e que passa por processo de assujeitamento,31 subjetivação e o próprio status
de crianças e adolescentes predominante no Brasil e no mundo, uma vez que, na expressão de
Marilena Chauí, crianças e adolescentes são invisíveis e invalidados socialmente.
No campo científico, a publicação do livro de Philippe Ariès (1961), L’enfant et la
vie familiale sous l’ancien regime, lança as bases para a mudança paradigmática, nas décadas
de 1980 e 1990, nos Estudos Sociais da Infância (tradição anglo-saxônica) e na Sociologia da
Infância (tradição francófona), na medida em que progride da ideia de infância enquanto

31
Foucault, nos chama a atenção para o cuidado em relação à conformação do indivíduo de suas próprias ideias
moldadas por saberes dominantes. Quando isso ocorre, tem-se o que Foucault chama de processo de
assujeitamento. O autor destaca formas de os sujeitos se confrontarem com o saber dominante ou de lidar com
esse tipo de situação de conformação. Por esse motivo, em Microfísica do Poder, Foucault (1979) valoriza o
local da crítica enquanto produção teórica não centralizada. Destaca que o reaparecimento de saberes que se
configuram como “saberes em baixa” (saber do delinquente, do marginal e outros) representam a crítica que
enuncia um confronto ou uma retomada. Nesse sentido, também aponta a genealogia do saber como descoberta
das lutas e memórias dos combates, no sentido do acoplamento do conhecimento com as memórias locais que a
ciência por si só acaba desqualificando para referendar unicamente os saberes, de um modo geral, dominantes. A
genealogia do saber é importante porque evidencia as problemáticas que estão em processos de luta e se
configura enquanto um empreendimento para libertar da sujeição os saberes históricos advindos desta, contra o
discurso meramente teórico e científico. Para superar o processo de assujeitamento, a subjetivação também seria
uma possibilidade do despertar de uma consciência do sujeito. Em resumo, para Foucault: "Temos que promover
novas formas de subjetividade através da recusa deste tipo de individualidade que nos foi imposto há vários
séculos" (1995, p. 239).
40

construção social. Nesse contexto, a infância torna-se objeto legítimo das Ciências Humanas e
Sociais, que rompe com modelos predominantes e tradicionais de concebê-la meramente
desenvolvimentista. Desse modo, a infância passa a ser concebida como ator social 32
(ROSEMBERG e MARIANO, 2010, p. 294).
Internacionalmente, no campo jurídico, constitui marco fundante do reconhecimento
de um novo olhar relacionado à infância, a Declaração dos Direitos da Criança33, promulgada
pela Organização das Nações Unidas – ONU, em 1959. Entretanto, apesar de todos os
dispositivos legais que, de algum modo, explicitam os direitos infanto-juvenis no mundo,
somente aos poucos os países, e mediante pressão social, vão aderindo ao novo paradigma e
de modo ainda muito incipiente.
Concomitante com toda essa movimentação internacional pelos direitos da criança e
do adolescente, enquanto em 1979 um grupo de trabalho estabelecido pela Comissão de
Direitos Humanos da ONU iniciava a elaboração da Convenção sobre os Direitos da Criança
e do Adolescente, o Brasil vivia uma série de mobilizações sociais e populares pela
democracia e, consequentemente, pela garantia da dignidade infanto-juvenil e contra o regime
imposto da ditadura militar.
As alterações constitucionais ocorridas em 1988, mais precisamente, no campo da
criança e do adolescente, consubstanciadas posteriormente no ECA (1990), são fruto dessas
articulações da sociedade civil (SILVEIRA, 1998, p. 54). É nesse sentido que se entende que
inicialmente a mudança paradigmática na forma de conceber a criança e o adolescente
enquanto sujeito de direitos partiu de projeto político da sociedade civil organizada.
A abordagem do movimento da infância no país, mais precisamente articulados em
Fórum de Defesa da Criança e do Adolescente 34 , impulsionou a origem do Estatuto da
Criança e do Adolescente – ECA e suas bases doutrinárias. São vários os intelectuais que
32
Para se ter uma ideia de como se deu esse processo, Philippe Ariès, a partir da análise das obras de arte do
período, observou que as pinturas, até o século XVI, destacavam as crianças de modo “adultizado”, com a
mesma vestimenta dos adultos, apenas menores. No início do século XVII, ocorre uma inversão dessa tendência
artística. A criança passa a ser destacada com vestimentas diferentes e a ocupar a posição central na vida da
família. De acordo com Ariès, “foi no século XVII que os retratos de crianças sozinhas se tornaram numerosos e
comuns. Foi também nesse século que os retratos de família, muito mais antigos, tenderam a se organizar em
torno da criança, que se tornou o centro da composição (...) A descoberta da infância começou sem dúvida no
século XIII, e sua evolução pode ser acompanhada na história da arte e na iconografia dos séculos XV e XVI.
Mas, os sinais de seu desenvolvimento tornaram-se particularmente numerosos e significativos a partir do fim do
século XVI e durante o século XVII” (1978, p.65).
33
A Declaração da Criança de vinte de novembro de 1959 teve sua base e fundamentos nos direitos à liberdade,
à educação, ao lazer e ao convívio social. No entanto, suas disposições são consideradas de natureza
programática, sem caráter coercitivo de obrigar o Estado a promover sua aplicação.
34
Foi criado em março de 1988 com a denominação de Fórum Nacional Permanente de Entidades Não
Governamentais de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum Nacional DCA), como espaço
democrático da sociedade civil brasileira dedicado à articulação e à mobilização, sem distinções religiosas,
raciais, ideológicas ou partidárias, em prol dos direitos da infância e da adolescência.
41

registram a luta dos Fóruns DCA pelo Brasil para inserir no dispositivo legal uma concepção
de infância pautada no projeto político de promoção e proteção integral da criança e do
adolescente.
As percepções em relação à luta dos Fóruns DCA, de um modo geral, são também
atribuídas aos 'personagens' que formam o movimento de defesa dos direitos da criança e do
adolescente, que ganhou força no cenário nacional nos anos de 1980, acumulando ganhos
dentre os quais a inclusão da condição da criança e do adolescente como "prioridade absoluta"
e como “sujeito de direitos” na Constituição Federal de 1988.
É nesse sentido que se afirma que os registros demonstram a importância do trabalho
de diversas ONGs na organização e articulação em torno da elaboração, aprovação e
publicação desses dispositivos legais, que traduzem efeito da luta da própria sociedade civil
por uma nova concepção de infância enquanto integrada por sujeito de direitos.
Deve-se ressaltar a importância, no Brasil, das mobilizações sociais nos anos 1980
para enfrentar a ditadura militar. Com a criação, em 1983, pela CNBB – Conferência
Nacional de Bispos do Brasil, da Pastoral do Menor, desenvolve-se no país o trabalho direto
nas ruas, de educação popular baseado nos princípios do educador Paulo Freire. A propagação
da pedagogia freiriana35 motivou o estabelecimento de uma nova forma de lidar com crianças
e adolescentes em situação de rua no Brasil. E, em 1986, outro acontecimento muito
importante se deu com a criação do MNMMR - Movimento Nacional de Meninos e Meninas
de Rua, precedido, no início da década, pelo I Encontro Nacional dos Meninos e Meninas de
Rua, que contou com a participação de 500 crianças e adolescentes de todo o país, o que se
constituiu fato inédito no mundo inteiro. Sua relevância encontra-se no fato de que não eram
adultos que estavam reunidos para discutir as problemáticas da infância e propor alternativas a
elas, mas as próprias crianças e adolescentes em situação de rua, os próprios oprimidos, sem
interlocutores ou representantes (FÓRUM NACIONAL DCA, 2015).
Em 1987, é remetida à Assembleia Nacional Constituinte emenda “Criança
Prioridade Nacional”, em que se destacava a relevância das entidades se articularem e
consequentemente fortalecerem a pauta da infância. Criadas as condições favoráveis, em
março de 1988, diferentes grupos interessados na defesa da criança e do adolescente criaram,

35
Paulo Freire ganhou reconhecimento mundial por sua pedagogia do oprimido (1968), também conhecida como
pedagogia da libertação, da esperança (1992) e sua pedagogia da autonomia (1996). O ponto comum entre as
pedagogias é a ideia da necessidade de uma educação que deve ocorrer na simultaneidade entre os indivíduos e o
mundo, que mediatiza esse processo. Uma educação que valoriza a libertação dos cidadãos pelo fomento da
participação dos que estão em condição de oprimidos, contando com a realização conjunta da leitura crítica das
várias realidades existentes em cada local e não apenas teórica e nem em uma relação de via única em que um
indivíduo se sobrepõe ao outro com superioridade do saber.
42

em encontro ocorrido em Genebra, o Fórum Nacional Permanente de Entidades Não


Governamentais de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente – Fórum Nacional DCA
ou FNDCA, evento que contou com a participação de integrante do Fórum de Defesa da
Criança Internacional (DCI), Daniel O’Donell. (FALEIROS, 2009).
A atuação desse Fórum, mobilizada principalmente pelo MNMMR, impacta
diretamente nas letras da lei que vai traduzir a nova concepção da criança e do adolescente no
Brasil. É nesse sentido que se entende a dimensão político-normativa estabelecida no ECA
como expressão da luta dos Fóruns DCA para concretizar o projeto político de mudança
paradigmática da criança e do adolescente, enquanto sujeitos de direitos e em formação, para
proteção integral. No ver de Silveira,

o Fórum DCA passou a reunir Organizações Não Governamentais representativas


das demandas sociais emergentes e da indignação frente às mais variadas formas de
violência cometidas contra crianças e adolescentes configurando–se num movimento
nacional de defesa dos seus diretos (DARLENE SILVEIRA, 2008, p. 45).

Espalhados pelo Brasil, par além de serem caracterizados como redes de


reivindicação, os Fóruns DCA tornaram-se articulações propositivas, necessitando, em função
disso, de visão macro de sociedade, “pondo a democracia a serviço da liberdade criadora de
cada um e da construção de uma solidariedade coletiva” (SCHALLER, 2002, p.163).
Após a criação do FNDCA, o movimento da infância no Brasil ganhou ainda mais
fôlego no sentido de superar a concepção “menorista”. Une-se às mobilizações populares pela
redemocratização do país, que culmina na promulgação da Constituição Federal de 1988,
trazendo, em seu arcabouço legal, possibilidades de participação política e social por parte da
sociedade civil.
A Constituição Federal, nos artigos 204 e 227, explicitou de forma especial a política
de assistência social, buscando romper com a lógica assistencialista, e a política da infância
brasileira, exaltando a prioridade absoluta das políticas públicas e de tratamento direcionado à
criança e ao adolescente, definindo ainda a responsabilidade compartilhada entre família,
sociedade em geral, comunidade e poder público.
O artigo 227, em seu caput, enuncia:

É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente,


com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à
convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda a forma de
negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (BRASIL,
COSNTITUIÇÃO FEDERAL, art. 227).
43

A partir da definição dos textos dos Artigos 227 e 204 da Constituição Federal, em
1990, é promulgado o Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA, em substituição à lei
6.697, de 10/10/197936 (II Código de Menores). O FNDCA, ao longo de sua trajetória, tem
atuado decisivamente nas mobilizações e intervenções pela aprovação do capítulo da criança e
do adolescente na Constituição Federal de 1988 e na elaboração do ECA, articulando
campanhas importantes como “Criança Constituinte” e “Criança Prioridade Nacional’’ e
incentivando a implementação do ECA, no que tange à criação dos conselhos de direitos da
criança e do adolescente, nos âmbitos nacional, estadual e municipal, e a criação dos Fóruns
Estaduais e Municipais DCA37.
Segundo Vieira (1998), o ECA incorpora expectativas no âmbito dos direitos e das
políticas sociais, assim como inaugura novas relações e níveis de participação social, sendo
que “o processo de democratização possui um importante componente, que é o controle social
da administração pública. Isto significa dar grande interesse ao que vem da sociedade,
sobretudo da maioria dela” (VIEIRA, 1998, p. 17).
É a atuação política das ONGs articuladas em rede, analisada à luz do pensamento de
Sader, que leva à compreensão de que a atuação do Fórum DCA aponta para a ação de “uma
coletividade onde se elabora uma identidade e se organizam práticas através das quais seus
membros pretendem defender interesses e expressar suas vontades, constituindo-se nessas
lutas” (SADER, 1995, p.11). Nesse sentido, a dimensão político-normativa consubstanciada
no ECA é consequência da defesa do projeto político das entidades da sociedade civil do
campo infanto-juvenil articuladas no FNDCA, que conta também com a articulação e
mobilização concomitante dos Fóruns DCA nos Estados, fomentados especialmente pelo
MNMMR.
Assim, em âmbito nacional, esse paradigma foi construído pelo Fórum Nacional
38
DCA , e sua articulação em vários Estados serviu de parâmetro para os fóruns estaduais. A
partir dessa luta, com a promulgação do ECA, considerado na época acontecimento histórico,

36
O II Código de Menores, de 1979, adotou a doutrina jurídica de proteção do “menor em situação irregular”,
que abrangia os casos de abandono, prática de infração penal, desvio de conduta, falta de assistência ou
representação legal, entre outros. Essa lei de menores era instrumento de controle social da infância e da
adolescência vítima de omissões da família, da sociedade e do Estado em seus direitos básicos.
37
Além de realizar ações de mobilização política junto ao Congresso Nacional e à sociedade, resultando na
promulgação do ECA, que revoga o Código de Menores (Lei Federal 8.069 de 13 de julho), o FNDCA
participou das articulações e mobilizações para a criação, em 1991, do Conselho Nacional dos Direitos da
Criança e do Adolescente – CONANDA, principal órgão deliberativo de política pública para a criança e o
adolescente no Brasil (FÓRUM NACIONAL DCA, 2015).
38
Ressalte-se que, por sua vez, o FNDCA foi criado a partir da impulsão de entidades como a Pastoral do
Menor, mas principalmente do MNMMR, que posteriormente com o FNDCA fomentou processo de mobilização
e articulação das próprias entidades nos Estados, a criação dos Fóruns Estaduais. Sobre o assunto, ver Darlene
Silveira (2008); Barbetta (1993).
44

o país inaugura no campo do direito na América Latina um novo paradigma no que diz
respeito ao modelo tutelar de 1919.
Vale ressaltar que apesar de a criança passar a ser tratada juridicamente enquanto
prioridade da política pública no Brasil em 1988, é somente em 1990, com o ECA, que se
instituiu no direito brasileiro a expressão “criança e adolescente enquanto sujeito de direitos
em condição peculiar de formação e desenvolvimento”, com garantia de proteção integral e
prioridade absoluta nas políticas públicas.
Em 1991, a Lei nº 8.242 criou o Conselho Nacional de Direitos da Criança e do
Adolescente, órgão diretamente responsável pela formulação de políticas públicas
especificamente para a criança e o adolescente. As articulações e mobilizações realizadas pelo
FNDCA, para incentivar a criação nos Estados de Fóruns DCA, foi relevante, no sentido de
mobilizar o máximo de entidades ligadas à infância em âmbito local a pensarem e discutirem
a infância a partir do novo paradigma, pensado pela sociedade civil a partir da luta social e
preceituado nos artigos 227 e 228 da Constituição Federal e 203 e 204 do ECA, que tratam
diretamente dos direitos da criança e do adolescente, e da Lei Orgânica da Assistência Social
- LOAS.
Toda a atuação do FNDCA, além de outras iniciativas, abrangeu participação no
Fórum Social Nordestino e Mundial; articulação de diagnósticos e relatórios sobre a situação
dos direitos da criança e do adolescente no Brasil, apresentado pela sociedade civil;
articulação com os organismos internacionais em discussões relevantes, como o Sistema
Nacional de Atendimento Socioeducativo - SINASE; realização de seminários temáticos39,
eventos que colocaram o FNDCA no cenário político brasileiro como importante interlocutor
na promoção de políticas públicas de direitos humanos infanto-juvenis. Nas palavras do
Secretariado do Fórum Nacional DCA, em 2012:

A caminhada pela efetivação do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA tem


sido um dos maiores investimentos, no que se pode aqui registrar seu processo de
elaboração demonstra que o Fórum Nacional DCA foi o seu principal articulador,
desde aquele momento de apresentação aos parlamentares do esboço do projeto de
lei, a fim de garantir o direito de votação preferencial, à criação do grupo de trabalho
composto por juristas, educadores, técnicos e militantes, que lhe deu origem
(FÓRUM NACIONAL DCA, 2012).

A título de complementação da análise que traduz a força da sociedade civil para


colocar a criança e o adolescente na pauta nacional no formato de conquistas jurídicas, em

39
Entre as temáticas se encontram a luta contra a redução da maioridade penal, 18 anos do ECA, Plano Nacional
de Convivência Familiar e Comunitária, Plano Decenal dos Direitos da Criança e do Adolescente, encontros de
adolescentes do FNDCA etc.
45

2009, a Lei nº 12.010 estabeleceu a prioridade na ação voltada à infância para o


fortalecimento da convivência familiar. Em 2010, o art.227 da Constituição Federal ganhou
nova redação para inserir os jovens de 15 a 29 anos de idade, reconhecendo a importância da
juventude no âmbito da proteção integral, alteração de que resultou, através da Lei nº 12.852,
de 5 de agosto de 2013, instituir-se o Estatuto da Juventude e o Sistema Nacional de
Juventude - SINAJUVE40, fruto de mobilização dos movimentos de juventude deflagrada em
virtude do aumento do índice de extermínio no país, principalmente de jovens negros e
pobres. Em Anjos e Rebouças (2014), lê-se que o SINAJUVE,

colocou os adolescentes entre 15 a 18 anos de idade sob o manto de dois


dispositivos legais, que legitimamente caminham para a garantia da proteção
integral deste segmento. No entanto, no que pese os avanços históricos alcançados
na perspectiva do direito, a sociedade não acompanhou do mesmo modo essas
mudanças. Daí o conflito entre um período jurídico novo que chega, mas que não é
reflexo (ainda) da prática e realidade a que se almeja conquistar. Esta realidade
decorre do fato de existirem outras esferas no campo da vida que interferem
significativamente em sua formação como a cultura, a economia, a política, a moral,
a religião, as questões de gênero, étnico racial, outros. Para os que se encontram no
campo dos contextos de imensa desigualdade e desigualdade histórica, como as
vivenciadas pelas crianças e adolescentes no Brasil, desafiar essa condição pode
trazer consequências ainda mais excludentes (2014, p.293).

Quanto às disposições no âmbito da lei, Herrera Flores (2008) chama a atenção para
a enorme corresponsabilidade do jurista crítico acerca do sentimento de impotência e
desilusão que as reformas legais ao longo da história produzem em relação à cidadania.
Segundo esse autor, é necessário saber os limites de um instrumento para descobrir,
especialmente em tempos de crise, como usá-lo convenientemente e como complementá-lo
com outras formas de lutar (FLORES, 2008, p. 236). Assim, embora se compreenda, na linha
de Herrera Flores, que nenhum movimento se pode conformar com o direito de ter direitos
recepcionados na lei, esses instrumentos são importantes em termos de exigibilidade dos
direitos humanos até então não reconhecidos.
No caso da CF - Constituição Federal e da Lei 8.069, de 1990, ambas são marcos
referenciais de avanços significativos na luta infanto-juvenil, inclusive para legitimar a
importância da participação da criança e do adolescente diretamente no processo de
construção de políticas voltadas a eles, em contexto em que a realidade se tem mostrado

40
A Lei institui o Estatuto da Juventude e dispõe sobre os direitos dos jovens, os princípios e diretrizes das
políticas públicas de juventude e o Sistema Nacional de Juventude - SINAJUVE. Para os efeitos desta, são
consideradas jovens as pessoas com idade entre 15 (quinze) e 29 (vinte e nove) anos de idade. Aos adolescentes
com idade entre 15 (quinze) e 18 (dezoito) anos, aplica-se a Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da
Criança e do Adolescente, e, excepcionalmente, o Estatuto da Juventude, quando não conflitar com as normas de
proteção integral do adolescente (Lei nº 12.852, de 5 de agosto de 2013 - Estatuto Nacional da Juventude -
SINAJUVE).
46

diversa, com denúncias de torturas e maus tratos em diferentes dimensões, como castigos
físicos, violência psicológica e até extermínio de jovens e registros de mortes em unidades de
internação para adolescente 41.
Esse marco político legal rompe, juridicamente, com a concepção do “menor” 42 para
inaugurar um novo tempo: a era dos direitos, da promoção e proteção integral e absoluta da
infância, anteriormente invisível. Em outras palavras, pode-se afirmar que a partir dos
instrumentos legais consagrados na CF e, posteriormente, no ECA surgem efetivamente a
criança e o adolescente enquanto sujeitos da história, enquanto pessoas, enquanto seres
capazes, não mais inferiores, seres que sentem, que pensam, que têm direitos violados que
precisam ser respeitados e promovidos integralmente 43 pelas políticas públicas e com
prioridade especial - prioridade absoluta.
Traduz-se que a década de 1980 foi extremamente relevante, no ecoar de vozes antes
silenciadas. No que tange à luta dos movimentos sociais, sindicatos, fóruns DCA, militantes e
vários setores independentes da sociedade civil, entre estes crianças e adolescentes, esse
período representou forma de enfrentamento ao que estava posto hegemonicamente. As
iniciativas populares representaram produção de uma contra-hegemonia que denunciava as
diversas realidades opressoras em que se situavam vários segmentos da sociedade, as crianças
e os adolescentes.
É nesse período de mobilização e fortalecimento das lutas coletivas para
redemocratização do país pelas diretas-já, contra as formas ditatoriais de ofertar a política,
como a tortura, a repressão, o autoritarismo, entre outras, que algumas conquistas se deram.

41
Nossa experiência na coordenação do Fórum DCA-SE permite compartilhar situações também nas unidades
de internação para adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa testemunhadas no Centro de
Atendimento ao Menor – CENAM, como adolescentes nus, algemados, sendo agredidos com fortes jatos de
pressão de água advindos de mangueiras de bombeiros para apagar incêndios enquanto apanhavam com os
famosos cassetetes; ambientes insalubres, com jovens cumprindo internação em virtude da inoperância das
políticas públicas para prestar atendimento ao adolescente, por exemplo, em condição de deficiência mental ou
psicológica ou por uso de drogas, privados do direito à saúde, à educação, ao lazer, entre outros.
42
Vale ainda ressaltar, em que pese a discussão sobre o termo “menor de idade” ser justificada, que ele não é
referido apenas no código penal, mas também relacionado ao código civil. Ainda assim, o termo finda por
confundir a perspectiva da criança e do adolescente enquanto sujeitos de direitos, pois no Brasil, até bem pouco
tempo, o termo “menor” evocava a ideia apenas de referência ao código penal. O código civil reduziu a idade de
emancipação para os 18 anos apenas em 2002, o que demonstra que a utilização do termo, para fins de
contribuição para o rompimento com a concepção menorista, no sentido de ver a criança como um inferior,
incapaz, poderia ser substituída pelos termos criança e adolescente, mas a resistência a essa mudança ainda é
muito presente.
43
O ECA sugere que, para haver essa proteção integral, a política de atendimento à infância e à adolescência
seja substituída por um conjunto de ações integradas e articuladas. Assim, define os moldes dessa política de
atendimento o artigo 87 do ECA, que destaca: “são linhas de ação da política de atendimento: I- políticas sociais
básicas; II- políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo para aqueles que deles necessitem;
III - serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus tratos,
exploração, abuso, crueldade e opressão; IV – serviço de identificação e localização de pais; V – proteção
jurídico-social por entidades de defesa dos direitos da criança e do adolescente”.
47

As mudanças legislativas acima elencadas, por exemplo, foram avanços importantes no


sentido da mudança de paradigma especialmente na forma de conceber a infância.
Em quadro comparativo apresentado por Leoberto Narciso Brancher, destacando as
principais diferenças entre o antigo paradigma do menor (doutrina da situação irregular)44 e da
criança e do adolescente sujeito de direitos (doutrina da proteção integral) 45 contidas nas
legislações, é possível perceber que essas doutrinas impulsionam a promoção de políticas
públicas diferenciadas no campo dos direitos humanos infanto-juvenis. Segue o quadro:

Quadro 1- Doutrina da Situação Irregular/Doutrina da Proteção Integral: Diferenças

Aspectos Situação Irregular Proteção Integral


(anterior ao ECA) (posterior ao ECA)
Caráter Filantrópico Política Pública
Fundamento Assistencialista Direito Subjetivo
Centralidade local Judiciário Município
Competência Executória União/Estados Município
Processo Decisório Centralizador Participativo
Inserção Institucional Estatal Cogestão Sociedade Civil
Estrutura Piramidal Hierárquico Rede
Gestão Monocrática Democrática
Fonte: Adaptado de BRANCHER, Leoberto Narciso. Organização e Gestão do Sistema de Garantia de Direitos da Infância e
da Juventude, in Encontros pela Justiça na Educação. Brasília: Fundescola-MEC, 2001, p.126.

No entanto, é importante estar ciente de que, apesar de registros significativos terem


ocorrido no campo da jurisdição, é preciso avançar nas demais áreas que envolvem o
reconhecimento efetivo da criança e do adolescente enquanto pessoa. É nesse sentido que se
identificam na atualidade os desafios para se conceber a ideia da criança como ser pensante e
com dignidade, que necessita ser respeitada.
É possível perceber, à luz de uma teoria crítica dos direitos humanos, que a
positivação desses direitos em si é apenas um elemento de propulsão e garantia. Embora se
reconheça a centralidade da lei, a efetivação dos direitos humanos, no caso em questão, da
44
Doutrina, vigente antes do estabelecimento do atual Estatuto da Criança e do Adolescente e sustentada pelo
antigo Código de Menores (Lei 6,697/79), que admitia situações absurdas de não proteção à criança e ao
adolescente, afastando menores infratores da sociedade, segregando-os, de forma generalizada, em
estabelecimentos como a FEBEM – Fundação Estadual de Bem-Estar do Menor; desrespeitando a dignidade da
pessoa e emprestando ao termo “menor” significado pejorativo.
45
Doutrina consagrada na Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança e da Organização das Nações
Unidas (1989) e na Declaração Universal dos Direitos da Criança (1959), bem como pela Constituição da
República Federativa do Brasil (1988) e pelo Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (1990), que designa
sistema em que crianças e adolescentes, até 18 (dezoito) anos de idade, são considerados titulares de interesses
subordinados frente à família, à sociedade e ao Estado. A concepção de proteção integral parte da compreensão
de que as normas que cuidam de crianças e de adolescentes devem concebê-los como cidadãos plenos, porém
sujeitos à proteção prioritária, tendo em vista que são pessoas em desenvolvimento físico, psicológico e moral.
48

criança e do adolescente depende de um conjunto de ações e de mudança sociocultural da qual


a legislação é um elemento, mas não é o único. Por isso, mais uma vez, a importância de
ressaltar a relevância das redes de interlocução e discussão permanentes advindas das
iniciativas da sociedade civil, a exemplos dos Fóruns DCA.
No Brasil, essas duas etapas se traduzem em como, ao longo dos anos, a criança e o
adolescente foram pensados e, consequentemente, tratados no campo jurídico, estendendo-se
ao patamar social, de um modo geral, como um “menor”. Romper com esse paradigma requer
tempo e mobilização constante, envolvendo diálogos, estudos, pesquisas e unidade.
No âmbito da promoção de direitos, o desafio é compreender a importância de
inciativas pré-violatórias, de prevenção à violência, que passa pelo fomento de iniciativas que
incluam e atraiam esse jovem a construir sua própria história como protagonista dela e não
como mero coadjuvante e espectador. Está aí o grande desafio: pensar espaços mais lúdicos e
democráticos, envolvendo a articulação com as redes locais, bem como a melhoria das formas
de atenção direta. O pano de fundo dos desafios e perspectivas é a mudança da velha
concepção, ou seja, aquela vigente anteriormente à instituição do Estatuto da Criança e do
Adolescente.
Pensar e entender a criança e o adolescente enquanto sujeito de direitos implica
entender o papel de qualquer adulto enquanto mediador desses direitos. A responsabilidade
diante das várias violações vivenciadas por crianças e adolescentes passa a ser da família, da
sociedade em geral e do Estado. Nessa lógica de responsabilidade compartilhada entre
sociedade civil e Estado, estes devem buscar alcançar a dimensão de seus papéis na
responsabilidade de formar esses cidadãos e fomentar sua promoção a partir da valorização da
dignidade e da efetivação dos direitos humanos.
É necessário alterar a visão dos profissionais que atuam diretamente com crianças e
adolescentes, para ver, entender e agir. Na prática, a oferta das políticas públicas voltadas para
a infância ainda é permeada de mitos e preconceitos em relação ao segmento infanto-juvenil
quanto a se incentivar a participação destes na construção das propostas. São ações que
partem do princípio de que um agente sabe o que é melhor para o outro, sem questioná-lo nem
ouvi-lo. Nesse sentido, Méndez (2006) destaca que a proteção integral da criança e do
adolescente se relaciona diretamente com o direito de participação da criança e do adolescente
para formar uma opinião e expressá-la livremente, de forma progressiva, em conformidade
com seu grau de maturidade. Os profissionais que lidam com crianças e adolescentes devem
mudar a conduta histórica marcada pela prática assistencialista, corretiva e, na maioria das
vezes, meramente repressora e reprodutora de violência. A sociedade civil necessita
49

compreender outra lógica de educar que não seja a punitivo-repressiva, em que adultos,
muitas vezes, aplicam sua superioridade física para oprimir e promover violências. Reflexos
da ditadura militar reforçada pelos meios midiáticos de comunicação46.
Por fim, com base no exposto, vale considerar que, em que pese o Brasil ter uma das
mais avançadas leis da América Latina, o direito sozinho não consegue determinar todas as
práticas sociais. Por isso, é necessária a sensibilidade de um olhar atento para as demais
iniciativas, entre estas, as práticas político-pedagógicas que perpassam as instituições sociais,
como a escola, a comunidade e a família. Diante dessa realidade, a mudança exige “aceitar,
reconhecer, respeitar e promover o potencial e a capacidade humana, continuamente,
considerando as formas criativas e alternativas de enfrentar e transformar o mundo”
(FLORES, 2012, p. 238).

46
Atualmente existe por parte da sociedade civil ampla luta para democratizar os meios de comunicação. O
principal argumento dos que defendem e fazem essa luta é que as redes de comunicação são concessionárias
públicas e deveriam estar a serviço da população de um modo geral. Ocorre que na prática essas concessões
estão nas mãos de alguns grupos de empresários que estão a serviço de uma classe favorecida economicamente,
motivo pelo qual utilizam o recurso da concessão pautando algumas questões no sentido de sua criminalização. É
o caso do incentivo à criminalização da pobreza, da juventude pobre e negra, dos movimentos de luta pela
moradia, da comunidade LGBTT e do fomento da tolerância zero na sociedade, que leva por aceitar, por
exemplo, a prática de linchamentos públicos em nome de uma sociedade dividida estrategicamente entre cidadão
do bem (brancos e ricos) e cidadão do mal (pobres e negros).
3. O SENTIDO DA CRIAÇÃO DOS FÓRUNS DCA

3.1. Sociedade Civil Sergipana e Surgimento do Fórum DCA-SE

Em Sergipe, apesar de haver registros de iniciativas sociais pela mudança


constitucional, foi na década de 1990, a partir de uma atuação mais incidente do MNMMR-
SE, com o advento do ECA, que se teve mobilização social mais unificada das entidades da
sociedade civil em prol das políticas públicas para a infância, com vista à articulação do
Fórum DCA. Até então, não se pode afirmar a existência de uma atuação orgânica e em rede,
como se deu a partir dos anos 1990.
Como exemplo de iniciativas exitosas, pode-se citar a atuação articulada, na década
de 1990, entre o Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua de Sergipe
(MNMMR/SE), a Associação dos Moradores do Bairro América (AMABA), a Sociedade
Afro-Sergipana de Estudos e Cidadania (SACI), o Centro Sergipano de Educação Popular
(CESEP) e o Fórum DCA-SE. Essas instituições se aliaram em torno da problemática do
extermínio de crianças e adolescentes em Sergipe na década de 1990.
Na obra de Emanuel Rocha e Antônio Wanderley de Melo Corrêa (2009) intitulada
“Bairro América: A Saga de uma Comunidade”, há registros de parte dessa história,
destacando algumas estratégias de participação da sociedade civil na promoção de direitos
humanos infanto-juvenis nos anos 1990 em Sergipe.
De acordo com os autores, em 1990, estrategicamente, a AMABA articulou o
Juizado de Menores, a Visão Mundial, a Fundação Centro Brasileiro da Infância e
Adolescência - CBIA, a Universidade Federal de Sergipe - UFS, e a antiga FEBEM -
Fundação do Bem-Estar do Menor, além de políticos, e, em parceria com o CESEP, realizou
passeata com a participação de dez mil pessoas. Esse evento de denúncia foi relevante para o
movimento social da infância em Sergipe. A “Passeata Contra a Violência” e o Lançamento
da Campanha “Não Matem Nossas Crianças”, além da articulação interinstitucional, foram
parte das estratégias coletivas adotadas e representam exemplo da mobilização social liderada
pela associação de moradores do Bairro América em Aracaju (ROCHA e CORRÊA, 2009,
p.146).
Era a expressão da força social pelos Direitos da Criança e do Adolescente que se
insurgia contra, sobretudo, a execução de cento e quarenta crianças e adolescentes no Estado
de Sergipe em 1990 por ação de grupos de extermínio, segundo informação organizada na
51

época pela Ordem dos Advogados do Brasil em Sergipe (OAB/SE), que, de acordo com
Rocha e Correa (2009), havia mapeado as mortes.
Em torno dessa mesma temática, direito à vida de crianças e adolescentes,
articularam-se MNMMR/SE, Movimento Nacional de Direitos Humanos de Sergipe -
MNDH/SE e Anistia Internacional para lançar o “Dossiê sobre o Grupo de Extermínio de
Crianças e Adolescentes em Sergipe”. Essas mesmas entidades se encarregaram de divulgar e
fazer repercutir nacional e internacionalmente as informações coletadas e organizadas sobre o
tema.
Posteriormente, algumas dessas entidades passaram a se organizar em torno do
Fórum DCA-SE, cujo objetivo inicial era articular as entidades para criarem e ocuparem os
Conselhos de Direitos e, dessa forma, incidirem mais diretamente sobre a política pública para
a infância no Estado de Sergipe. Ainda no começo da década de 1990, o Fórum DCA-SE foi
constituído por representantes de entidades não governamentais e governamentais47.
Esse formato de participação se deu em razão da própria conjuntura, naquele
momento estimulada a operacionalizar alguns dos dispositivos consubstanciados no ECA,
como a criação dos conselhos paritários de direitos. Nesse contexto, o Fórum DCA-SE atuou
em 1990 com esse perfil até o cumprimento, naquele mesmo período, do seu objetivo maior: a
criação do conselho municipal dos direitos da criança e do adolescente - CMDCA e do
Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente - CEDCA-SE, conforme
previsto no ECA.
Foi desse modo que o Fórum DCA-SE contribuiu na criação, em 1991, dos dois
Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente (CEDCA-SE e CMDCA Aracaju)48, que
passaram a funcionar oficialmente com a composição paritária de participação e gestão
compartilhada entre os órgãos do governo e entidades da sociedade civil. Esse fato, de certo
modo, acabou desarticulando o Fórum DCA-SE, como se a razão de existir desse espaço fosse
única e exclusivamente a criação dos conselhos.
Em uma das reuniões do Fórum DCA-SE, o ex-presidente da Sociedade Afro-
Sergipana de Estudos e Cidadania – SACI, Robson Anselmo, relatou que, após as Leis
Estadual e Municipal de Aracaju, que finalmente criaram os conselhos de direitos, o Fórum

47
Nesse período algumas reuniões do Fórum DCA-SE chegaram a ser convocadas pelo próprio ente
governamental, representado pela Secretaria Municipal de Ação Social e Trabalho.
48
O CEDCA-SE foi criado pela Lei Estadual nº 3.062, em 11 de outubro de 1991, e o CMDCA de Aracaju, pela
Lei Municipal nº 1.764, em 3 de dezembro de 1991.
52

DCA-SE naturalmente se desarticulou, porquanto, a partir de então as entidades passaram a se


reunir em ambos os conselhos.
Contudo, a partir do cotidiano das deliberações do CMDCA de Aracaju, se constatou
a necessidade da qualificação, de modo geral, dos conselheiros de direitos, no sentido da
formação política para uma participação mais ativa, consciente e crítica nas discussões
relativas à infância. Em virtude dessa constatação e desse propósito, novamente passa a existir
movimentação de retomada da rearticulação do Fórum DCA-SE, dessa vez mobilizada
unicamente pelas entidades da sociedade civil. Assim, o Fórum DCA-SE assumiu o papel de
formação política das entidades da sociedade civil para além daquelas integrantes dos
conselhos.
Os registros do Fórum DCA-SE 49 mostram que essa formação se deu através da
realização constante de cursos, oficinas e debates, além da realização de reuniões da
sociedade civil organizada para pensar a realidade da criança e do adolescente de Sergipe com
as especificidades municipais. Nesse contexto, evidencia-se uma preocupação com a
organização operativa do Fórum DCA-SE. A partir daí, as entidades se organizaram no
sentido de filiar mais entidades da sociedade civil e posteriormente aprovaram conjuntamente,
em 4 de setembro de 2000, o seu primeiro Regimento Interno50, consolidando o Fórum DCA-
SE enquanto “espaço democrático de participação, articulação, diálogo e interlocução
exclusivo da sociedade civil organizada que atuam na área da promoção e defesa da criança e
do adolescente” (FÓRUM DCA-SE, 2000).
Nesse contexto, o Fórum DCA-SE surgiu com a missão de “garantir a efetivação dos
direitos da criança e do adolescente, por meio da proposição, articulação e monitoramento das
políticas públicas e da mobilização social, para construção de uma sociedade livre, justa e
solidária” (FÓRUM DCA-SE, 2015), constituindo sua finalidade essencial,

I - defender como diretriz prioritária o Estatuto da Criança e do Adolescente, tendo a


Doutrina de Proteção Integral como Princípio; II - criar um espaço de articulação,
proposição e monitoramento de políticas públicas voltadas à criança e ao
adolescente; III - proporcionar um espaço de participação de crianças e adolescentes
nas discussões e formulação de propostas, enquanto fortalecimento do protagonismo
juvenil; IV - divulgar informações referentes à criança e ao adolescente, bem como
participar de eventos correlatos; V - promover estudos, cursos, campanhas,
seminários e outras atividades afins à capacitação e formação na área da criança e do
adolescente (FÓRUM DCA-SE, 2000).

49
Atas de reunião, entrevistas, notícias publicadas (ver Apenso A desta dissertação), manifestos etc.
50
Ver Anexo A desta dissertação.
53

Embora surgido informalmente na década de 1990 e aprovado o seu primeiro


Regimento Interno em 2000, o Fórum DCA-SE aprovou a Carta de Princípios das Entidades
Sociais em 2002, que pactuou os seguintes princípios para a atuação das entidades:

1 - O Fórum DCA-SE tem compromisso com a Declaração Universal dos Direitos


Humanos, dos Direitos da Criança e do Adolescente e demais normas internacionais
relativas à infância e juventude; 2 - O Fórum DCA-SE tem como diretriz maior a
Constituição Federal do Brasil e o Estatuto da Criança e do Adolescente e a doutrina
de Proteção Integral; 3 - O Fórum DCA-SE é constituído exclusivamente por
entidades da sociedade civil organizada e a participação no mesmo é de natureza
institucional; 4 - O Fórum DCA-SE é um espaço de articulação, proposição e
monitoramento de políticas públicas relativas à criança e ao adolescente; 5 - O
Fórum DCA-SE tem como requisito básico para o seu funcionamento a participação
do adolescente, enquanto espaço de fortalecimento do protagonismo juvenil; 6 - O
Fórum DCA-SE é um espaço aberto às entidades da sociedade civil de promoção de
defesa dos direitos da criança e do adolescente (FÓRUM DCA-SE, 2002).

A partir da experiência acumulada no processo de sua própria construção na linha do


fomento da participação da sociedade civil, o entendimento das entidades não governamentais
sobre o papel do Fórum DCA-SE foi aos poucos se estabelecendo nas reuniões, em que eram
definidas as estratégias de atuação para intervir na realidade política de Sergipe. Nos anos de
2000 a 2002, a rearticulação mais direta do Fórum DCA-SE foi protagonizada pela SACI e
pelo Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua de Sergipe – MNMMR/SE. Vale
ressaltar que, nacionalmente, o MNMMR foi um dos principais responsáveis pela criação dos
Fóruns DCA, tanto em âmbito nacional quanto estadual (BARBETTA, 1993; SILVEIRA,
2008).
Em algumas localidades, o surgimento dos Fóruns DCA contou com o estímulo do
FNDCA e, em outras, os Fóruns surgiram por iniciativa de entidades locais, provocada pela
conjuntura estadual e inspirada na criação do FNDCA. No entanto, de um modo ou de outro, a
atuação dos Fóruns DCA contou com o apoio recíproco, seja para a criação nos lugares onde
não existiam, seja para seu fortalecimento nos lugares em que já haviam sido criados
(FÓRUM NACIONAL DCA, 2015).
A estratégia do FNDCA era identificar, nos Estados, as entidades com perfil para
articular as demais instituições a se reunirem e acompanharem a política da infância em seus
locais através do Fórum DCA. Isso permitiria formar uma rede de defesa e promoção dos
direitos da criança e do adolescente e, assim, garantir o comprometimento do poder público
com o segmento infanto-juvenil.
O FNDCA efetivava essa política realizando oficinas regionais com os Fóruns DCA
estaduais para incentivar a participação qualificada da sociedade civil nas Conferências dos
Direitos da Criança e do Adolescente, bem como em todo espaço cujo objetivo fosse intervir
54

na realidade infanto-juvenil, a exemplo dos conselhos de direitos. Nesses conselhos


deliberativos, as entidades aprovam resoluções, propõem pautas prioritárias para infância e
provocam, sob a ótica da sociedade civil, reflexões importantes junto aos entes
governamentais.
Importante frisar que a formalização no âmbito legal de espaços específicos de
participação social, como o Fórum DCA-SE, não constituiu prioridade, não obstante a
importância de sua ação e intervenção política. Dessa forma, o Fórum DCA-SE passou a
existir independente de uma estrutura jurídica que lhe desse forma. A importância do seu
papel está justamente em ser articulador, aglutinador e provocador de reflexões sobre a
infância na sociedade civil.
Sob esse prisma, as reflexões promovidas pelo Fórum DCA-SE se deram no sentido
de sensibilizar o coletivo sobre a necessidade de entender a participação social dos sujeitos
coletivos nos movimentos e nos diversos formatos da sociedade civil organizada para a
ocupação e ampliação do espaço público e a promoção da socialização da política e da riqueza
cultural e material (KAUCHAKJE, 2002, p. 165).
Outro ponto a ser considerado é que em Sergipe se pode perceber, a partir da análise
documental, que a prática de articulação-desarticulação-rearticulação do Fórum DCA-SE é
recorrente. Esse fato não deve ser interpretado separadamente da conjuntura política que se dá
no ambiente externo ao Fórum DCA-SE. A depender da dinâmica política dos Estados e
nacional ou até mesmo no âmbito interno das instituições, é possível que os impactos
conjunturais recaiam sobre a forma de organização e atuação do espaço coletivo e vice-versa.
Na trajetória histórica dos movimentos sociais no controle das políticas públicas, vê-
se que suas intervenções se manifestam de forma mais ou menos efetiva. A depender da
conjuntura sociopolítica em que estejam inseridos, esses momentos, segundo Gohn (2002),
são caracterizados como períodos de articulação-desarticulação-rearticulação, fluxo e refluxo
dos movimentos.
De acordo com Gramsci (1995), isso ocorre porque o Estado ampliado é também
repleto de contradições, mantido por certo "tecido hegemônico", que, por sua vez, é recriado a
todo instante em um processo materialista que, além de ser histórico, é também dialético.
Assim, no momento em que a sociedade civil é agregada ao Estado-coerção, tudo passa a ser
Estado e, nessa concepção, o Estado é entendido como um bloco hegemônico composto pela
sociedade política, representada pelas instituições políticas e de controle legal, que
representam o âmbito da força, e pela sociedade civil, percebida como esfera “não estatal”,
que inclui a economia e que representa o âmbito do consentimento. Há momentos, porém, em
55

que a sociedade civil ganha espaço na luta contra-hegemônica e consegue conformar o poder
de modo a garantir maior espaço para as reivindicações sociais.
Na dialética desse processo de produção contra-hegemônica, Gohn (2009) destaca que
os movimentos sociais são os principais sujeitos da sociedade civil organizada, na qual “o
tema dos direitos é fundamental porque eles dão universalidade às questões sociais, aos
problemas econômicos e às políticas públicas, atribuindo-lhes caráter emancipatório”
(GONH, 2009, p.42). Apesar dos fluxos e refluxos destes movimentos, suas práticas são
educativas e não restringem ao aprendizado de conteúdos específicos transmitidos através de
técnicas e instrumentos do processo pedagógico, mas também abarcam que a luta pelos
direitos tem caráter histórico e processual e ocorre dentro e fora de espaços
institucionalizados, pois são parte da construção da cidadania, fontes e agências de produção
dos saberes e contra-hegemonia.
É nessa perspectiva que se analisa o período compreendido entre 2000 e 2009, no
qual as articulações em torno das exigências para colocar em prática os direitos da criança e
do adolescente se dão a partir das ações diretas promovidas pelo Fórum DCA-SE, após
determinado período de refluxo51. Nesse contexto, o Fórum DCA-SE debateu a necessidade
da participação popular enquanto força política social. A motivação maior era a preocupação
com a intervenção qualificada nas problemáticas gerais relacionadas à criança e ao
adolescente, através do fomento do diálogo permanente e enfrentamento qualificado das
arbitrariedades que frequentemente incorriam em graves violações.
Em suma, o Fórum DCA-SE buscou atuar de forma articulada, a partir de iniciativas
de intervenção nos espaços públicos externos e internos, de posicionamento em favor dos
direitos infanto-juvenis, de promoção de debates públicos e da incidência nos conselhos de
direitos, principalmente nos anos 2000 a 2009.
As estratégias adotadas pelo Fórum DCA-SE fizeram esse coletivo ser protagonista
na política da infância e da adolescência no Estado de Sergipe, tornando-se referência política
no Estado de Sergipe na defesa dos direitos humanos da criança e do adolescente, conforme
se verá no próximo capítulo.

51
Sobre o assunto, Maria da Glória Gohn (2002) explica que, a depender da conjuntura política que se estabeleça
em um período ou noutro, é possível que um movimento social ou determinada articulação social possa estar
mais ou menos mobilizada, pois, assim como esta pode impulsionar determinada pauta, também pode esmorecer
sem que, com isso, deixe de existir. A esse movimento, Gohn denomina fluxo e refluxo.
56

3.2 Fóruns de Defesa da Criança e do Adolescente: Surgimento e Sentido

A perspectiva da gestão compartilhada e democrática de participação entre o poder


público e a sociedade civil, a partir da década de 1990, fomentou as formas inéditas de
representatividade. Segundo Gohn, nesse período, “cria-se um senso comum de que a
sociedade civil não é apenas espaço para ações individuais, mas ela deve construir um senso
coletivo de obrigações sociais, de responsabilidade social” (GOHN, 2005, p.68). Nessa linha
de pensamento, novos movimentos sociais com perfis diversos foram surgindo, na medida em
que as políticas neoliberais foram avançando, como tática de enfrentamento da crise
socioeconômica.
Esses novos movimentos começaram a atuar como grupos de pressão social com
ênfase em pautas específicas, por exemplo, em favor da criança e do adolescente. De acordo
com Gohn (2005), a perda de visibilidade dos movimentos sociais, que atuavam numa
configuração mais estruturada e de massa, cedeu destaque às ONGs – Organizações Não
Governamentais, que mudaram os discursos dos movimentos a partir de posturas mais ativas e
propositivas, com atuação articulada em rede, como os Fóruns de um modo geral. É nessa
conjuntura que os Fóruns DCA passaram a atuar.
É válido considerar que, de um ponto de vista menos heterodoxo, só é possível
realizar a transformação da realidade com a chegada da sociedade civil ao poder e,
consequentemente, a tomada desse poder, que findaria com a extinção do Estado e da
sociedade de classes, momento em que se mudaria o projeto político capitalista para outro
modo de vida em comunidade. Na linha dessa perspectiva, somente com a posse dos meios,
modos e instrumentos de produção seria possível exercer a plena liberdade e emancipação.
Essa linha de raciocínio, segundo Gohn (2003), subsidiou os discursos empreendidos
pela maior parte dos movimentos sociais e sindicais no Brasil, principalmente até os anos
1990, quando o novo cenário político brasileiro incentivou a alteração na mudança dos
discursos de muitos movimentos. Há polêmica sobre esse assunto e a própria atuação
empreendida pelos novos atores sociais na nova conjuntura.
Autores alinhados com o pensamento marxista criticam a capacidade de mudança
estrutural que esses novos personagens possuem, considerando a ausência ou inexpressividade
da consciência de classe em seus discursos e reflexões, os debates sobre a alienação do
trabalho e a conquista efetiva do poder. As críticas perpassam ainda a dúvida sobre se ONGs,
fóruns e conselhos podem efetivamente ser considerados novos movimentos sociais; se esses
novos atores, interclassistas, teriam, com os novos discursos, condições de alterar
57

significativamente a estrutura basilar de uma sociedade nos moldes neoliberal e capitalista


completamente opressora.
Com o objetivo de mostrar o descrédito quanto à transformação radical da sociedade
pela tomada do poder, Boaventura de Sousa Santos (1999) afirma que:

(...) a primazia explicativa das classes é muito mais defensável que a primazia
transformadora. Quanto a esta última, a prova histórica parece ser por demais
concludente quanto à sua indefensabilidade. Dando de barato que é fácil definir e
delimitar a classe operária, é muito duvidoso que ela tenha interesse no tipo de
transformação socialista que lhe foi atribuído pelo marxismo e, mesmo admitindo
que tenha esse interesse, é ainda mais duvidoso que ela tenha capacidade para
concretizá-lo. Essa indicação que parece hoje indiscutível tem levado muitos a
concluir pela impossibilidade ou pela indesejabilidade de uma alternativa socialista
(SANTOS, 1999, p. 41).

Na perspectiva de Gohn, adotada neste trabalho, os movimentos sociais progressistas


são “ações coletivas de caráter sociopolítico e cultural que viabilizam distintas formas da
população se organizar e expressar suas demandas. São fontes revitalizadas para a construção
do novo com agenda emancipatória52" (GOHN, 2003, p. 13). Essa agenda, nessa concepção,
se constrói mediante a práxis enquanto possibilidade real de transformação da realidade.
Autores53 que se encontram sob o manto da teoria dos novos movimentos sociais entendem
que estes constituem espaços políticos (institucionais ou não) que procuram alterar hábitos e
valores da sociedade de modo a interferir nas políticas estatais. É nesse sentido que Gohn (2013) vê
possibilidades reais de mudança promovidas pelos movimentos sociais contemporâneos,
importantes no novo cenário pós-1990.
Ainda que, de fato, os novos espaços de organização e participação social sejam
incapazes de provocar a transformação estrutural necessária para enfrentar a política
neoliberal, não se pode perder de vista a importância desses novos atores na sociedade do

52
No materialismo histórico e dialético de Marx e Engels, a perspectiva transformadora da práxis e as
contradições impostas pela relação de dialeticidade permitem aos homens (e nós acrescentamos a terminologia
“mulheres”, pactuando com os movimentos feministas que entendem a dimensão política dessa inserção para
também visibilizar a importância das mulheres na transformação da sociedade) atuar de formas diferenciadas em
vários contextos da história. Nessa perspectiva, a emancipação humana é traduzida pelas relações sociais que
têm por característica primordial o domínio dos homens (e “mulheres”) sobre os processos históricos. Esse
domínio só é possível, em Marx, quando a responsabilidade da direção é coletiva e, ao mesmo tempo, consciente
do seu processo, e essa consciência, enquanto uma dimensão subjetiva, exerce um papel fundamental na
construção da emancipação dos homens e das “mulheres”, para a revolução do capital e do trabalho. É gerada em
diferentes espaços de formação do homem (e da “mulher”) e cabe a essa subjetividade (consciência) construir
uma sociabilidade que permita aos homens (e mulheres) a efetividade de sua emancipação e liberdade plena, a
partir das determinações históricas. Contudo, não basta a mera consciência de condição de ser explorado. É
preciso compreender ainda que a transformação ocorre em uma relação dialética. Isso implica dizer que a criação
de uma teoria revolucionária é uma questão objetiva (material) e subjetiva, sendo esta subjetividade gerada pela
práxis (MARX, 1961).
53
Ver Gohn (1997, 2009 e 2010); Castells (1999); Ricci (2010) eScherer- Warren (2006).
58

capital, principalmente no que tange à inserção das novas pautas, que incluem, denunciam e
anunciam elementos novos como as problemáticas e questões relacionadas às políticas da
criança e do adolescente, de gênero, de raça, de etnia, de meio ambiente e moradia, entre
outras. Ressalta-se, ainda, a perspectiva pedagógica e educativa que têm esses novos
movimentos sociais. São capazes de empreender mudanças entre os atores envolvidos que
permitam a estes dar, coletivamente, saltos significativos em momentos específicos da
conjuntura política, mesmo que limitados.
É nessa conjuntura que surge o FNDCA enquanto “espaço democrático da sociedade
civil dedicado à articulação e mobilização, sem distinções religiosas, raciais, ideológicas ou
partidárias e aberto à cooperação com instituições nacionais e internacionais 54 ” (FÓRUM
NACIONAL DCA, 2009, p. 51). De modo geral, os Fóruns DCA representam experiências de
fomento da participação das entidades não governamentais que atuam com crianças e
adolescentes. A realização de debates internos, cursos de qualificação e reuniões
permanentes, entre outros, significa investimento em uma participação, na linha de Paulo
Freire, dialógica e uma perspectiva de educação não formal voltada para o protagonismo de
suas organizações na luta pela garantia de direitos no segmento infanto-juvenil.
Isso não quer dizer que não haja e/ou não houve internamente forças contraditórias,
tensões e conflitos nesse espaço. Pelo contrário, pela própria definição do FNDCA é possível
considerar que sob o manto da bandeira da defesa dos direitos da criança e do adolescente há
espaço para vários projetos societários. Assim, do mesmo modo que há possibilidade para a
concretização de projeto coletivo pela proteção integral infanto-juvenil, há também projetos e
concepções individualistas de participação voltadas exclusivamente para a promoção pessoal
e/ou institucional, que atentam para a lógica neoliberal do capital.
São contradições e fragilidades encontradas nos Fóruns DCA, que, internamente,
contribuem para o acirramento de tensões e conflitos interinstitucionais, os quais, a depender
do que vigora em determinados períodos, podem levar a movimentos extremos com pautas
mais ou menos democráticas55. Nesse sentido, é que se reafirma a importância das reflexões e

54
A criação do FNDCA ocorreu no ano internacional da criança, por ocasião do Encontro da Criança
Internacional, na cidade de Genebra. Ver em “História do FNDCA”, disponível em:<
http://www.forumdca.org.br/historia>.
55
Um exemplo ocorrido recentemente no Brasil de como discursos conservadores podem se travestir de
democracia, esconder intenções autoritárias e descambar para intervenções igualmente ditatoriais foram as
manifestações de 2013 ocorridas no Brasil. As manifestações de junho de 2013 são um exemplo da disputa entre
dois projetos antagônicos que inicialmente apareceu sob a forma da luta pela qualidade e a tarifa zero do
transporte público. Paralelamente, pautas contra a corrupção, entre outras, foram-se evidenciando nas
manifestações até a divisão nas ruas de grupos distintos, em que os mais extremistas passaram a reivindicar
também uma sociedade apartidária e a intervenção militar, entre outros aspectos.
59

da dialogicidade no fomento da participação e da compreensão desse desafio numa realidade


brasileira caracterizada por anos de cultura de não participação e outras contradições que
envolvem se manifestar em uma sociedade capitalista neoliberal.
Embora o diálogo sempre estivesse em voga nos espaços dos Fóruns DCA, a
preocupação com a consciência de classe, o projeto político de sociedade, a conjuntura
política do país e do próprio Estado de Sergipe eram sempre assuntos que incomodavam,
como o pode testemunhar frequentes vezes a autora deste trabalho no Fórum DCA-SE, parte
de seus integrantes, sob o argumento de que o único objetivo dos participantes era a defesa
integral da criança e do adolescente, podendo determinadas discussões levar a
posicionamentos político-partidários que eram apontados como desnecessários.
Percebe-se assim, no caso do Fórum DCA-SE, que o discurso do “apartidarismo” e
mesmo a definição do FNDCA, que se repete entre integrantes dos Fóruns estaduais, de ser
uma organização “sem distinções partidárias”, findam por representar uma tentativa de
neutralização política e, em alguma medida, se liga ao fortalecimento das ideias neoliberais.
Quanto ao Fórum DCA-SE, pode-se dizer que, sobretudo em momento posterior ao ano
201356, prevalece uma despolitização manifestada nos recuos na ação emancipatória.
Isso levou o Fórum DCA/SE a se manter no foco específico, por exemplo, na
distribuição de recursos públicos e no atendimento realizado pelas instituições não
governamentais, ao tempo em que, em alguns momentos, se promovem campanhas contra a
redução da maioridade penal e em favor de crianças e adolescentes em situação de rua, sem se
faça, porém, um debate capaz de reunir a discussão sobre diferença e desigualdade, opressão e
exploração sociais, mesmo sendo possível compreender que, no Brasil, a pobreza tem cor, tem
idade, tem sexo57 e representa uma moral que foi rechaçada como forma de naturalizar a
pobreza como um problema de incapacidade individual (TELLES, 1993; RIZZINI, 2009).
Para Maria da Glória Gohn (1999) e Boaventura de Sousa Santos (2003), é
importante o que ocorreu com os chamados “Novos Movimentos Sociais”, na década de 1990.
Com esses personagens, desloca-se o centro da práxis de transformação baseada na luta de

56
Nesse período, apesar de haver na coordenação entidades comprometidas com o processo emancipatório, a
coordenação se ampliou em número de instituições e burocratizou a participação, a coordenação e o seu próprio
funcionamento interno.
57
De acordo com o relatório do UNICEF (2010) sobre o impacto do racismo na infância, no Brasil vivem 31
milhões de meninas e meninos negros e 140 mil crianças indígenas. Eles representam 54,5% de todas as crianças
e adolescentes brasileiros. Vinte e seis milhões de crianças e adolescentes brasileiros vivem em famílias pobres.
Representam 45,6% do total de crianças e adolescentes do país. Desses, 17 milhões são negros. Entre as crianças
brancas, a pobreza atinge 32,9%; entre as crianças negras, 56%. A iniquidade racial na pobreza entre crianças
continua mantendo-se nos mesmos patamares: uma criança negra tem 70% mais risco de ser pobre do que uma
criança branca. O estudo conclui que a pobreza costuma ter sexo e cor, atingindo sobretudo, mulheres e pessoas
negras, índias ou pardas.
60

classes, adotada pelos movimentos sociais clássicos (sindicatos), para as pautas identitárias.
Segundo Gohn, os movimentos sociais têm caráter político (não partidário), “que criam e
desenvolvem um campo político de forças sociais na sociedade civil, contribuindo para seu
desenvolvimento político. Eles politizam as demandas socioeconômicas, políticas e culturais,
inserindo-as na esfera pública da luta política” (GOHN, 1999, p. 252). De acordo com Sousa
Santos,

A novidade dos NMSs não reside na recusa da política, mas ao contrário no


alargamento da política para além do marco liberal da distinção entre Estado e
sociedade civil. Os NMSs partem do pressuposto de que as contradições e oscilações
periódicas entre o princípio do Estado e o princípio do mercado são mais aparentes
do que reais, na medida em que o trânsito histórico do capitalismo é feito de uma
interpenetração sempre crescente entre os dois princípios, uma interpretação que
subverte e oculta a exterioridade formal do Estado e da política perante as relações
sociais de produção (...) A politização do social, do cultural e, mesmo, do pessoal
abre um campo imenso para o exercício da cidadania e revela, no mesmo passo, as
limitações da cidadania de extração liberal, inclusive da cidadania social,
circunscrita ao marco do Estado e do político por ele constituído. Sem postergar as
conquistas da cidadania social, como pretende afinal o liberalismo político-
econômico, é possível pensar e organizar novos exercícios de cidadania – porque as
conquistas da cidadania civil, política e social não irreversíveis e estão longe de
serem plenas – e novas formas de cidadania – coletivas e não meramente individuais
(...) (SOUSA SANTOS, 2003, p. 263).

Apesar de importantes, os impactos trazidos pelos chamados Novos Movimentos


Sociais, sobretudo quanto a temas que, ao longo da história, tinham pouca expressividade nas
ações políticas (GOHN, 1999; SANTOS, 2003), não se pode negar que, em lugar de provocar
ações capazes de unir o debate de classe com as discussões sobre respeito às distintas
expressões de identidade, o que se teve, no ocaso do século XX e aurora do século XXI, foi a
abertura para a captação da pauta identitária para o projeto neoliberal de sociedade, sobretudo
no que concerne à compreensão da liberdade como liberdade individual, dissociada, portanto,
de uma perspectiva de construção da igualdade social.
Essa observação é plausível ao se analisarem, como possíveis efeitos históricos da
separação entre a luta por igualdade e a luta pela diferença, as manifestações de junho de
2013, em que havia um rechaço aos partidos políticos, uma descoordenação e, até, uma
divergência quanto às reivindicações, o que deu espaço, por um lado, a múltiplas vozes, e, por
outro, a uma contradição de projetos de sociedade e, no vácuo deixado pelo rechaço à
transformação social e o que a representa, à prevalência de ideias conservadoras.
Sem retirar o papel exercido pelo poder midiático, que captou as diferentes pautas
das manifestações, concepções que podem ser classificadas como conservadoras e/ou
fascistas, por discordarem de políticas de inclusão social e mesmo propagar discursos de ódio
contra minorias políticas, foram-se avolumando durante o processo eleitoral para a
61

presidência da República em 2014, com tentativas, tão logo passado o pleito eleitoral, de
desestabilizar e derrubar o governo do Partido dos Trabalhadores por meio de diversos
pedidos de destituição da presidenta Dilma Rousseff.
No caso específico dos Fóruns DCA, as contradições do discurso do apartidarismo se
traduzem na abertura de espaço para concepções que levam a entendimentos contraditórios
sobre a criança e o adolescente. Dá-se a abertura ainda para que sejam filiadas entidades que,
embora afirmem defender a criança e o adolescente, possuem representantes organizados em
partidos políticos que defendem, por exemplo, a redução da maioridade penal, além de outras
pautas desvinculadas da utopia transformadora e, mais grave, próprias de projetos de
dominação historicamente hegemonizados no Brasil.
Não se pode negar que, desde os anos 1990, ao se evitar o debate de transformação
e/ou ao se restringir a ação apenas ao atendimento e à distribuição recursos a entidades não
governamentais para a atenção direta, desobrigando o Estado quanto ao trabalho com crianças
e adolescentes, houve perda do protagonismo pautado em projeto da proteção integral efetiva
da criança e do adolescente e de sua compreensão como sujeitos de direitos no bojo de um
projeto de sociedade. Abre-se espaço, assim, para projetos individuais e/ou institucionais que
desalinhados, ou pouco alinhados, com a perspectiva emancipatória.
Em meio às contradições, após 2009, como pode constatar a autora deste trabalho, o
Fórum DCA-SE ainda conseguiu promover algumas intervenções importantes no campo das
discussões, principalmente em relação às medidas socioeducativas para adolescentes privados
de liberdade, promovendo audiências públicas em parceria com a OAB-SE e conselhos de
direitos. Gradativamente, porém, até os dias atuais, o Fórum DCA-SE foi deixando de ser
uma referência política para os atores e órgãos que atuam com o segmento infanto-juvenil. A
nosso ver, isso ocorreu porque, politicamente, o Fórum DCA-SE não se incorporou à luta de
classes58 e de transformação.
Se a pauta identitária, por um lado, foi importante, por outro, foi negativa do ponto
de vista do coletivo das entidades, por não perceber que essas pautas estão inseridas na luta de

58
Luta de classe, denominação criada pelo filósofo alemão Karl Marx, significa a oposição entre as diferentes
classes da sociedade. A luta de classes não é apenas um conflito, ela envolve a economia, a política e a sociedade
como um todo. As lutas de classes, que existem desde a Idade Média, ocorrem quando as classes dominantes
lutam contra os trabalhadores, exercendo seu poder de forma autoritária, o que acaba gerando conflitos, muitas
vezes violentos, com os representantes das classes inferiores ou dominadas. Marx e Engels acreditam que as
lutas de classes só acabarão com o fim do capitalismo e, por consequência, o fim da divisão da sociedade em
classes.
62

classes sociais. Afinal, quem é a população mais explorada e excluída? Estatisticamente, a


classe oprimida tem cor, cara e identidade fixa: ela é negra, pobre e vive nas periferias.
Nesse contexto, os desafios colocados para os Fóruns DCA correlacionam
diretamente as contradições, que, na realidade concreta, perpassam várias situações, entre as
quais se destacam, como já se referiu neste trabalho, uma cultura de exploração,
discriminação e conservadorismo de uma classe social sobre a outra 59. Essa cultura, na linha
de raciocínio de Telles (1993), é própria de

Um país caracterizado por uma história regida por um privatismo selvagem e


predatório, que faz da vontade privada e da defesa de privilégios a medida de todas
as coisas, que recusa a alteridade e obstrui, por isso mesmo, a dimensão ética da vida
social, pela recusa dos fundamentos da responsabilidade pública e da obrigação
social (Telles, 1993, p. 2-4).

Em relação à infância e à adolescência no Brasil, os desafios se refletem ainda em


uma concepção “menorista” existente no país e o reconhecimento de direitos negados antes da
Constituição Federal de 1988. A herança cultural desse processo histórico, deflagrado
principalmente na era dos códigos de menores e da vigência das doutrinas de Segurança
Nacional e da situação irregular, respectivamente implantados no Brasil nos anos de 1927 e
1979, se agrava com a dinâmica da ditadura civil-militar. Deflagrada na década de 1960, a
ditadura se efetiva com o golpe militar e recoloca no cenário político brasileiro as práticas da
tortura, submissão e opressão, baseadas em assassinatos, perseguições, prisões, violações
diversas, dentre estas a proibição de toda e qualquer forma de participação social 60.
O pano de fundo desse processo foi a legitimação de poderes e grupos
conservadores e patriarcais para a manutenção do controle e do poder em todos os sentidos.
De acordo com Fernandes (1976), o resultado do desenvolvimento do regime de classes no

59
Vera da Silva Telles (1993), em livro intitulado “Pobreza e cidadania”, afirma que ao longo dos anos a lei foi
usada para produzir a dominação e a exclusão dos pobres. Nessa obra, Telles reflete como se deu esse processo,
afirmando que o paradoxo da sociedade brasileira se revela na lógica que preside a atribuição de direitos
descompassada entre a existência formal destes - a lei; e a realidade da destituição das maiorias. Segundo Telles
(1993), o modelo de cidadania que coloca como dever do Estado a proclamação da justiça se constitui nesse
paradoxo, que finda desfazendo os efeitos igualitários dos direitos e repondo na esfera social desigualdades,
hierarquias e exclusões, o que revela o “ponto cego” da recente democracia brasileira.
60
Vale referendar aqui as reflexões trazidas por Florestan Fernandes (1987) em sua obra “A revolução burguesa
no Brasil: ensaio de interpretação sociológica”. Segundo Fernandes, no processo de efetivação da ditadura
militar, foi deflagrado um modelo capitalista, cujo pano de fundo foi a aceleração econômica, a partir da
dependência do capital externo e de uma dinâmica de organização de sociedade, cujos benefícios eram limitados
aos diversos estratos da burguesia em detrimento das massas populares, do povo oprimido, principalmente, dos
trabalhadores. Desse modo, ainda em Fernandes, encontra-se a análise de que esse processo aperfeiçoou as
formas de atuação autocráticas e sincréticas do Estado, consequentes daquilo que denomina de antigo regime.
Esse regime, que absorveu diversas formas políticas, tinha como manto a democracia restrita, oligarquismo e
fascismo, regimes políticos caracterizados por Fernandes como favorecedores da interlocução política dos
estratos burgueses com o Estado. Desse modo, eram reduzidas ao silêncio as classes subalternas e destinada aos
opositores políticos a submissão ou a repressão mais brutal (FERNANDES, 1987, p. 289-366).
63

Brasil foi um modelo de dominação autocrático, motivo pelo qual esse autor considera que a
sociedade de classes, no modelo capitalista dependente, deu continuidade a uma estrutura
social, que funcionou como um circuito fechado61.
Nesse contexto, algumas questões tornam-se desafiadoras, por exemplo: como
movimentos sociais, mesmo incorporando pautas novas, mantiveram o véu, de fato,
emancipador? O que a expressão “sociedade civil” significa do ponto de vista da perspectiva
“ongueira” e neoliberal? Qual a diferença para pensar a sociedade civil como “povo” ou como
“excluídos”, “classes subalternas”, “classes dominadas”, “classes oprimidas”?
Percebe-se, a partir da atuação do FNDCA e mesmo do Fórum DCA-SE, que ambos
se inserem no contexto da perspectiva “ongueira” de concepção, em que prevalece nesses
espaços a necessidade da captação de recursos financeiros para manter a ação política,
gerando também, para algumas entidades, a lógica da participação pela possibilidade de
captação de recursos e pelo domínio de entidades religiosas como, por exemplo, aquelas
vinculadas à igreja católica, sem denominação, porém, referente à Teologia da Libertação62.
Sobre o perfil de entidades militantes, vale considerar que Gohn (2013) buscou
demarcar as diferenças entre dois tipos de ONGs nos anos 90: as ONGs oriundas ou herdeiras
da cultura participativa, identitária e autônoma dos anos 70/80, intituladas militantes; e as
ONGs propositivas, que atuam segundo ações estratégicas, utilizando‐se de lógicas
instrumentais, racional e mercadológica, ONGs do terceiro setor63 (GOHN, 2013, p. 244).
Segundo Gohn (2013), as do segundo tipo surgem com maior articulação junto a
empresas e fundações ligadas aos programas e projetos das ONGs, que, face ao aparecimento
das novas pautas, como a de se trabalhar com os excluídos sobre questões de gênero, etnia,
idades, entre outros, “alteram seus planos de atuação voltados a projetos sociais patrocinados

61
Sobre o assunto ver, FERNANDES, Florestan. Circuito Fechado: quatro ensaios sobre o “poder institucional”.
São Paulo: Globo, 2010. (1ª Ed. 1976).
62
A teologia da libertação tem como propósito principal a libertação dos oprimidos, dos pobres e injustiçados,
primeiramente contra a fome, a miséria, a degradação moral, cuja realidade pertence aos bens do Reino de Deus
e estava nos propósitos de Jesus. Posteriormente, com “a reflexão sobre este dado real: em que medida aí se
realiza antecipatoriamente o Reino de Deus e de que forma o cristianismo, com o potencial espiritual herdado de
Jesus, pode colaborar, junto com outros grupos humanitários, nesta libertação necessária (...) o decisivo é que o
fato da libertação real ocorra” (BOFF, 2013). Disponível em <https:// leonardoboff. wordpress.com
/2013/04/26/papa-francisco-e-a-teologia-da-libertacao/>. Acessado em 26 de julho de 2015.
63
Segundo Gohn (2013), a atuação do Terceiro Setor tem gerado muitas contradições: de um lado, ele reforça as
políticas sociais compensatórias ao intermediar as ações assistenciais do governo; de outro, ele atua em espaços
associativos geradores de solidariedade e que exercem papel educativo junto à população, aumentando sua
consciência quanto aos problemas sociais e políticos da realidade. Para aprofundar a reflexão sobre as diferenças
entre os perfis das ONGs, ver Maria da Glória Gohn, em “Sociedade Civil no Brasil: movimentos sociais e
ONGs”.
64

por empresas e bancos, dentro de programas de responsabilidade social, no âmbito da


cidadania corporativa” (GOHN, p. 244).
Já as ONGs militantes, com perfil ideológico e projeto político definidos, atuam nos
anos 1970/1980 em apoio aos movimentos sociais e populares, contra o regime militar e pela
democratização do país. Desse modo, ajudam a construir um campo democrático popular,
uma vez que se preocupam em fortalecer a representatividade das organizações populares,
com a ajuda na estruturação da própria organização, muitas voltadas à conscientização dos
grupos organizados. Esse perfil caracteriza o que Gohn chama de ONGs cidadãs,
movimentalistas, militantes (GOHN, 2013, p. 243).
Vale ressaltar, porém, que há problemas na visão “ongueira”, que se encontram
justamente nas diferenças existentes entre seus próprios perfis de atuação. Elas não
constituem movimentos sociais da forma como tradicionalmente se pensou, numa perspectiva
de massa, e grande parte delas atua não em enfrentamento ao Estado, mas como parceiras e
financiadas por este ou por grandes empresas financiadoras, o que limita sua ação de controle
social. As consequências disso são justamente a perda de autonomia por parte das entidades
com perfil do Terceiro Setor frente ao Estado e/ou demais financiadores.
Contudo, na construção coletiva, registra-se que, em todo o período da história do
Brasil, as resistências para enfrentar a opressão e a exploração sempre se fizeram presentes,
bem como os reflexos culturais do investimento autoritário. Um desafio, como se apontou,
refere-se à consciência da luta de classes dentro do Fórum DCA-SE e reflexão permanente
sobre ela, embora algumas vezes o tema tivesse sido colocado na pauta pelas entidades
militantes que compunham a coordenação, principalmente no período de 2005 a 2009.
Nesse processo dialético de construção, como se viu, há avanços e recuos.
Momentos, de um lado, em que prevalecem as contradições e, de outro, onde há maior
homegeneização. Assim ocorreu com o Fórum DCA-SE, gerando uma série de tensões e, por
consequência, desconfortos diversos entre as entidades filiadas. A disputa interna se dava pela
busca da hegemonia. No entanto, é preciso entender que os desconfortos fazem parte de um
processo imerso na lógica do capital. Essa lógica interferiu na retórica dos movimentos
sociais, dando uma guinada em suas configurações e modos diferenciados de atuar. As novas
formas de atuação, como os Fóruns DCA, em que pesem todas as contradições expostas,
constituem importantes espaços de formação não formal e, também, de emancipação pelas
palavras enunciadas, que denunciam realidades opressoras, sem que isso os isente de
determinadas críticas.
65

Nos momentos de maior unidade e formação político-pedagógica dos espaços de


participação social é que se contribui para outro projeto de hegemonia, através de uma
sociedade civil politizada (NOGUEIRA, 1999). É possível afirmar que a defesa de crianças e
adolescentes, como sujeitos de direitos, surge como um projeto político dos Fóruns DCA,
valendo-se do seu processo pedagógico. Como tal, traz consigo a necessidade de promover,
internamente e na sociedade, a reflexão crítica para a mudança de concepção sobre questões
específicas que envolvem crianças e adolescentes, principalmente quanto àquelas que
vivenciam situações de vulnerabilidade em várias regiões do país.
Frente a essa realidade, é preciso garantir sua importância histórica e social, como
igualmente é preciso que se compreenda o seu significado e potencial na conjuntura projetada.
Isso permite visibilizar caminhos possíveis em cada momento da conjuntura política em um
Estado que dicotomizou os movimentos sociais após 1990, conforme se viu em Gohn. É
preciso perceber, ainda, que, embora a escola tenha lugar privilegiado para a formação dessa
consciência, ela não constitui o único lugar.
Aliás, a educação que, na linha de Paulo Freire, deve ser humanista, tem que ser, ao
mesmo tempo, libertadora. Desse modo, deve representar o aprofundamento da tomada de
consciência que se concretiza nos homens e nas mulheres enquanto agem e trabalham.
Segundo Freire (1983), o aprofundamento da tomada de consciência, que se faz mediante a
conscientização, jamais possui um sentido de caráter intelectualista e nem individualista.
Freire (1983) nos chama a atenção não só para uma perspectiva de educação
ampliada, que se estende para além das instituições formais (e, nesse sentido, o Fórum DCA
constitui espaço pedagógico de apreensão de novos saberes), mas também para a necessidade
da compreensão dos significados, para a tomada de consciência acerca da realidade concreta.
Para Freire, os significados e suas descobertas estão diretamente relacionados com o
processo de conhecimento pela “descodificação” da realidade pelo homem (e pela mulher) 64.
Essa descodificação é como “um momento dialético, em que as consciências, cointencionadas
à codificação desafiadora, re-fazem seu poder reflexivo”, mediante a descoberta do mundo,
que ele chama de “ad-miração” e vai-se tornando uma forma de “re-ad-miração”65, momento

64
O termo “mulher”, nesse trabalho, é acrescentado ao lado das expressões que, resumidas na palavra “homem”,
buscam dar sentido a noção de humanidade em que se insere a mulher. A desvinculação do termo mulher, ao
lado da expressão homem é uma escolha política nossa, como forma de retirá-la da subjetividade que a
inviabiliza do processo de transformação da realidade concreta como protagonista na História.
66

em que se toma ciência de seres trans-formadores do mundo por parte de quem reflete ou “re-
admira” o objeto ou realidade cognoscível (FREIRE, 1983, p.63).
Para ilustrar como ocorre a tomada de consciência e da conscientização, Freire, em
sua obra intitulada "Extensão ou Comunicação?" (1983), ao refletir sobre o processo de
aprendizado do homem do campo sobre as técnicas agrícolas, levanta a seguinte reflexão:

Se, antes, cortar uma árvore, fazê-la em pedaços, transformá-la em tábuas e construir
com elas mesas e cadeiras podia significar algo pouco mais além do que o trabalho
físico mesmo, agora, na “re-ad-miração”, estes atos ganham a significação
verdadeira que devem ter: a da práxis. A mesa e as cadeiras já não serão nunca mais
simplesmente mesa e cadeiras. São algo mais: são produtos de seu trabalho.
Aprender a fazê-las melhor, se este fosse o caso, deveria começar por esta
descoberta (FREIRE, 1983, p. 63).

Assim, a consciência se dá no momento em que a pessoa mira determinado objeto ou


realidade a que Freire (1983) chama de “ad-mirar”, sendo necessário refletir sobre o que se
“ad-mira” para se chegar à conscientização daquele. Essa re-admiração é comparada por
Freire ao momento de reflexão que, seguida da recodificação do seu significado, efetiva o
processo de conscientização do homem (e da mulher) enquanto práxis transformadora da
realidade concreta (FREIRE, 1983). Assim,

se a tomada de consciência, ultrapassando a mera apreensão da presença do fato, o


coloca, de forma crítica, num sistema de relações, dentro da totalidade em que se
deu, é que, superando-se a si mesma, aprofundando-se, se tornou conscientização
(...) Este esforço da tomada de consciência em superar-se a alcançar o nível da
conscientização, que exige sempre a inserção crítica de alguém na realidade que se
lhe começa a desvelar, não pode ser, repitamos, de caráter individual, mas sim social
(FREIRE, 1983, p. 53).

É nesse sentido que os Fóruns DCA atuam igualmente como agentes pedagógicos,
para além de si mesmos, e abrem espaço para o debate público sobre temas diversos66, sempre
tendo como centro a prioridade absoluta na proteção integral dos direitos humanos infanto-
juvenis. Sobre a condição pedagógica de formação interna do Fórum, na tese de doutorado de
Maria Irene Gerassi (2007), cujo objeto de estudo é o Fórum DCA-Santo Amaro/SP, a
pesquisadora apresenta relatos que apontam para essa capacidade pedagógica do Fórum junto
a seus integrantes. Em entrevista transcrita naquele trabalho de pesquisa, lê-se:

66
São exemplos de temáticas e atividades promovidas pelos Fóruns DCA nos Estados, a exploração sexual de
crianças e adolescentes; as políticas públicas; a formação em orçamento público e fomento da criação das
Frentes Estaduais Parlamentares de Defesa da Criança e do Adolescente junto às casas legislativas, além da
mobilização e articulação de processos eleitorais da sociedade civil para comporem os conselhos de direitos.
67

quando eu falo que me formei politicamente no Fórum foi uma experiência


política. Quando eu digo política, refiro-me à arte de fazer política, da
negociação, de saber ouvir, de saber se posicionar, de defender ideias. Essa
experiência [de fazer política], de fato, mais concreta surgiu para mim no Fórum
no sentido de compromisso com a construção e a dimensão coletiva (GERASSI,
p.119).

Sobre a interação entre formação interna e debate público acerca do atendimento e


realização de direitos de crianças e adolescentes, é importante o relato de um dos integrantes
fundadores do Fórum DCA-SE, transcrito em artigo publicado na Revista Tempos e Espaço
em Educação:

O FDCA tem uma razão de existir: que as ONGs possam ter esse momento de
construção conjunta, entendendo que o que as entidades fazem com as crianças,
se algum dia se bastou em seus atendimentos, na atualidade existe um Estado
que dita para estas um ordenamento que por sua vez estabelece a prática que
deve ser direcionada às crianças e aos adolescentes. Principalmente depois do
ECA todos devem estar adequados a essas diretrizes e princípios que norteiam a
política que envolve a criança e o adolescente. Essa política não se basta no
atendimento nas entidades (...) é importante estar em sintonia, estar regrado e
compreendendo a política que norteia a prática em questão (ANJOS, 2010, p.
173).

Compreendendo que “a sociedade civil não é imediatamente política. Ela é o mundo


das organizações e particularismos” (NOGUEIRA, 1999, p.81), a criação dos Fóruns
contribuiu diretamente para a formação de sujeitos que saem do universo particular para a
atuação coletiva. Esse processo possibilita a condução de um pluralismo de indivíduos
atomizados para a formação de um “sujeito político coletivo” (COUTINHO, 1980), no caso
em pauta - o coletivo dos Fóruns DCA.
A identidade do sujeito político coletivo é construída na dimensão individual
(quando os sujeitos individualmente tendem a unir-se com os seus pares em torno de
interesses comuns) e na dimensão coletiva (quando os interesses comuns são executados e
pensados na coletividade), processo que ocorre concomitantemente numa construção
compartilhada de unidade na totalidade (GERASSI, 2007, p. 28). Na tese de doutorado de
Gerassi, que analisa especificamente a construção do Fórum DCA de Santo Amaro enquanto
sujeito político coletivo, evidencia-se que “os indivíduos para se constituírem como sujeitos
políticos, portadores de uma vontade coletiva que os leve posteriormente a se unificarem
como um Sujeito Político Coletivo, necessitam de um espaço político onde possa ocorrer essa
formação” (GERASSI, 2007, p. 144).
Desse modo, o que caracteriza o Fórum DCA-SE, como esse sujeito político
coletivo, é, justamente, a unidade na totalidade dos sujeitos individuais em torno de objetivos
68

comuns, com interesse de executá-los na coletividade, mesmo que em alguns momentos a


unidade esteja comprometida por divergência de concepção. Os momentos em que o Fórum
DCA-SE se coloca na sociedade, enquanto espaço de articulação, negociação de contestação
da lei e demonstração de suas divergências, evidencia certa noção de coletividade ou de uma
subjetividade que se constrói e une as pessoas em uma só, sobretudo nos momentos em que a
unidade prepondera.
O Fórum DCA-SE, como o vivenciou a própria autora deste trabalho, age como
sujeito coletivo em muitos momentos, mas em outros não, quando a pauta se fixa em torno
dos recursos financeiros. No entanto, enquanto espaço de reivindicação e de proposição, que
se faz na unidade coletiva, os Fóruns DCA caminham provocando uma visão macrossocietária
e, por conseguinte, estimulam leitura mais crítica e consciente da realidade em uma noção de
“coletividade”.
A dialética da participação vai formando um sujeito político no interior do sujeito
coletivo. E, ao que parece, um não existe sem o outro. Na verdade, um sujeito coletivo só
pode existir enquanto como tal assume a característica de sujeito político, uma vez que o ser
sujeito político capacita a estar nesses espaços, que constroem também a dimensão política de
cada participante, pois “são eles que permitem reconhecer o outro enquanto portador de
direitos, reconhecer a existência e a legitimidade do conflito e assim adicionar elementos
fundamentais na constituição da cidadania” (GERASSI, 2007, p. 48).
Desse modo, o coletivo do Fórum DCA encontra a possibilidade de concretizar ações
que permitem a construção de sujeitos políticos, podendo-se inferir a partir daí “que há
necessidade de espaços políticos para que se formem sujeitos políticos, ou ainda que sujeitos
políticos se constroem em espaços políticos”. (GERASSI, 2007, p. 57).
Considerando todas as críticas direcionadas para sua atuação, principalmente quanto
à inexpressividade do debate de classe social, o Fórum DCA-SE não deixa de ser pedagógico,
pois, na contradição dialética do seu processo, há espaços para avanços.
Esse fato demonstra que a pauta identitária não se sobrepõe à luta de classes,
principalmente quando instituições militantes, que estão à frente da coordenação, não deixam
de debater a classe na infância, momentos em que se percebe que o coletivo do Fórum DCA-
SE se torna mais coeso e, portanto, atua com mais unidade, em uma espécie de solidariedade
coletiva, em que cada um se percebe no outro. Para Schaller (2002), o processo formativo se
torna fundamental quando se reconhece “(...) ao Outro, como a si mesmo, o direito de ser
Sujeito e pondo a democracia a serviço da liberdade criadora de cada um e da construção de
uma solidariedade coletiva” (SCHALLER, 2002, p.163).
69

Mesmo não sendo foco de análise deste trabalho, ainda assim vale considerar que,
especificamente, atuando no espaço do FNDCA algumas entidades reconhecem publicamente
a interinfluência entre o Fórum e as entidades e as entidades e o Fórum, com atuação do
FNDCA na conjuntura política do país ou na contribuição das entidades para o fortalecimento
do coletivo e vice-versa. Assim, destaca a Fundação Abrinq que,

a participação efetiva da Fundação Abrinq nos Fóruns Estadual e Municipal de


Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de São Paulo, assim como no
Fórum Nacional Permanente de Entidades Não Governamentais de Defesa dos
Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum DCA) foi importante para fortalecer
um movimento que resultou na ratificação da Convenção Internacional dos Direitos
da Criança. Seminários temáticos e a continuidade das atividades de mobilização
política garantiram o sucesso das propostas iniciais desta Fundação” (FUNDAÇÃO
ABRINQ, 2015).
Uma vez que o Fórum é formado por entidades (militantes e não militantes) e estas
contribuem, também financeiramente, para o fórum, são vários os exemplos que se têm de
como o apoio múltiplo se deu. Assim fez o MNMMR, com a emenda ao orçamento público; a
Legião da Boa Vontade - LBV, em Sergipe, ao disponibilizar uma pessoa exclusivamente
para acompanhar e dar encaminhamento às decisões do Fórum DCA-SE, entre outros. Nas
palavras destacadas pelo INESC – Instituto de Estudos Socioeconômicos, na introdução de
uma das publicações do Fórum Nacional DCA, intitulada “Aconteceu 2006 e 2007”,

O Fórum Nacional DCA é estratégico para a missão do INESC, tendo em vista


sua importância no cenário e o grande número de entidades filiadas que auxiliam
a identificação de demandas dos movimentos sociais e demais organizações da
sociedade civil, foco em políticas de crianças e adolescentes. É com muito
orgulho que o INESC assessora o Fórum Nacional DCA nos seminários de
orçamento público auxiliando o controle social e a promoção de uma sociedade
civil mais justa e igualitária (...). O Fórum Nacional DCA com suas entidades
filiadas e os Fóruns Estaduais DCA tem grande responsabilidade na função do
controle social para uma sociedade que respeite os direitos da criança e do
67
adolescente (INESC) .

É assim que a ação desse coletivo, nas diversas localidades em que se fez presente,
tornou-se aos poucos expressiva, repercutindo também nas práticas das entidades engajadas

67
Essa citação está registrada na introdução de uma das publicações do Fórum Nacional Permanente de
Entidades Não Governamentais de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Fórum Nacional DCA),
sobre a temática, Orçamento Público. Nos anos 2006 e 2007, o FNDCA realizou uma série de seminários em
parceria com os Fóruns Estaduais DCA e entidades filiadas. Esses seminários resultaram em uma coletânea de
publicações intituladas, “Aconteceu em 2006 e 2007”. Cada publicação aborda uma temática específica debatida
durante a realização dos seminários estaduais. São estas as temáticas: Orçamento Público – sistematização e
debates dos seminários sobre Orçamento Público; Gestão 2006 e 2007; Sistema Nacional de Atendimento
Socioeducativo – SINASE – sistematização e debates dos seminários sobre SINASE nos Estados; Plano
Nacional de Convivência Familiar e Comunitária.
70

nesse espaço de formação política e controle social68, sobretudo no âmbito dos conselhos de
direitos e da discussão sobre políticas públicas.
Em termos de avanço, atuando em meio a todas as contradições e tensões próprias,
nos anos 1980 e 1990, o FNDCA é considerado “a mais importante rede de articulação de
entidades da sociedade civil brasileira de defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente,
com aproximadamente mil entidades, entre organizações filiadas, Fóruns e Frentes Estaduais”
(FÓRUM NACIONAL DCA, 2009, p. 59). Segundo Faleiros (2009), o seu processo de
criação contou com a articulação de um coletivo de entidades atuantes e, por isso, é
significativo e representativo do ponto de vista da defesa da infância brasileira.
A partir da análise de registros, como boletins eletrônicos, relatórios e atas de
reuniões do Fórum DCA-SE, encontrados na sede do Instituto Braços 69 , e do FNDCA,
encontrados por meio de endereços eletrônicos, e, ainda, da memória militante, percebe-se
que, desde sua criação, o FNDCA atua na ampliação e aplicação dos direitos assegurados à
criança e ao adolescente, através do fomento da participação e do fortalecimento da sociedade
civil organizada, além de se destacar nesse processo de fomento enquanto espaço que educa
enquanto se educa pedagogicamente. Sua contribuição passa pela inclusão dos direitos da
criança e do adolescente nas constituições estaduais e leis orgânicas municipais, oportunidade
que se colocou após a aprovação por unanimidade da Convenção Internacional dos Direitos
da Criança e do Adolescente 70 , demonstrando que havia uma compreensão de que era
necessário tomar o espaço da institucionalidade.
A participação em espaços como os conselhos, por exemplo, passa a ser concebida
como intervenção social periódica e planejada, ao longo de todo o circuito de formulação e
implementação de uma política pública, uma vez que a ênfase passa a ser dada às políticas

68
No entanto, não é foco do trabalho estudar a mudança nas práticas internas de atendimento promovidas pelas
entidades.
69
O acervo de registros documentais relacionados ao Fórum DCA-SE estão dispostos na sede de uma de suas
entidades filiadas, denominada Instituto Braços, situada na rua Itabaiana, 426, no centro da cidade de Aracaju,
Estado de Sergipe. Diversas matérias relacionadas ao Fórum DCA-SE foram encontradas por meio de endereços
eletrônicos de meios de comunicação, conforme referências. As informações sobre o FNDCA foram encontradas
em livros e endereços eletrônicos. Essas informações constam nas referências desta dissertação. Ambos são
registros de pessoas que integraram o processo de criação dos Fóruns DCA, realizadas como forma de relatar um
tempo. No caso do FNDCA, as publicações relatam sistematizações de experiências, história do Fórum, entre
outros aspectos. Algumas dessas publicações contaram com o apoio de pessoas que integravam a academia. A
documentação relacionada a atas e relatórios de reuniões dos conselhos de direitos da criança e do adolescente
está disponível nos próprios conselhos e no Diário Oficial da União.
70
Logo após a realização do II Encontro Nacional dos Meninos e Meninas de Rua e a consequente ocupação do
plenário do Congresso Nacional ocorre a promulgação simbólica do Estatuto da Criança e do Adolescente. A
partir daí, o FNDCA articula a elabora o anteprojeto de regulamentação dos artigos 227 e 228 da Constituição
Federal (FÓRUM NACIONAL DCA, 2015).
71

públicas (GOHN, 2013). É nesse sentido que o termo sociedade civil é apropriado não só
pelos conselhos de gestão, mas também por fóruns diversos, como do Fórum DCA-SE.
A tendência à institucionalização 71 surgiu então como consequência e principal
característica desse tipo de participação, entendida como “inclusão no arcabouço jurídico
institucional do Estado, a partir de estruturas de representação criadas, compostas por
representantes eleitos diretamente pela sociedade de onde eles provem” (GOHN, 2013, p.
241).
Os Fóruns DCA trabalham com a perspectiva de fortalecimento da sociedade civil,
considerada em duas vertentes: de um lado, as organizações da sociedade civil ligadas às
entidades do Terceiro Setor e, do outro, as organizações voltadas ao exercício pleno do
controle social sobre as políticas públicas. Desse modo, fortalecer a sociedade civil através do
Fórum DCA-SE, em algum momento, também se faz mediante contradições próprias das
distinções dessas vertentes.
Isso ocorre porque, por um lado, fortalecer a sociedade civil para algumas entidades
do Fórum DCA-SE significa maior quantidade de recursos financeiros e, por consequência,
maior possibilidade de firmar parcerias com o Estado e todas as limitações anteriormente
refletidas neste trabalho. Por outro lado, fortalecer a sociedade civil, para outras entidades,
significa atuar como componente da ideia gramsciana de Estado 72. Disso decorre uma atuação
com foco para a formação completa do conceito de políticas públicas e da consolidação da
democracia por via da democracia participativa. Entendemos que se o Fórum DCA-SE atingiu
seu momento de efervescência política nos anos 2007 a 2009, que se deve a atuação alinhada
a esse último pensamento.
No entanto, nem sempre a visão gramsciana é a preponderante no Fórum DCA.
Assim, em determinados períodos da história, há também o enfraquecimento das ações deste
coletivo do ponto de vista da atuação para uma participação efetivamente democrática (sem
condicionamentos relacionados a uma atuação nivelada à execução de políticas públicas pelas
71
Nos Estados, de modo geral, a incidência política das entidades não governamentais nas questões relacionadas
à infância, após a criação dos Fóruns DCA, deu-se principalmente no campo do monitoramento da implantação
das exigências acolhidas pelo ECA, pela implementação institucional. Entre estas, pode ser notado o movimento
pela criação e implementação dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente (CEDCAs e CMDCAs),
pela regularização das entidades de atendimento à criança e ao adolescente e pela criação, no âmbito municipal,
dos Conselhos Tutelares. Esses propósitos, além de justificarem o receio dos grupos de defesa e promoção de
direitos da criança e do adolescente quanto à não aplicação do ECA, assumem a condição de propósito da
participação de entidades governamentais e não governamentais.
72
Estado é a própria sociedade organizada de forma soberana, ou seja, é uma organização constituída de
instituições complexas, públicas e privadas, articuladas entre si, cujo papel histórico varia através das lutas e
relações de grupos específicos e poderes, que se articulam na busca da garantia da hegemonia dos seus
interesses.
72

próprias entidades da sociedade civil e não por quem tem o dever de sua execução – o
Estado).
Vale ressaltar que não constituíam preocupação do FNDCA nem do Fórum DCA-SE
debates sobre participação da “sociedade civil” relacionada à expressão popular de “povo”.
Em 1990, com o entendimento de que os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente
se fortalecem com a atuação da sociedade civil organizada, o FNDCA e, seguindo a mesma
lógica, o Fórum DCA-SE - experiência vivenciada por esta autora - buscaram
estrategicamente construir os meios para que a eleição de conselheiros, representantes dessa
sociedade em âmbito nacional e nos Estados, se desse mediante processo realizado a partir
dos atores que permanentemente se debruçam sobre a temática da infância no próprio interior
dos Fóruns DCA.
É desse modo que, em 1991, o FNDCA passou a atuar como colegiado eleitoral dos
representantes da sociedade civil para compor o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e
do Adolescente – CONANDA (FÓRUM NACIONAL DCA, 2015). Essa estratégia tinha por
objetivo de ação política ampliar o interesse das entidades para participarem dos Fóruns DCA
e, posteriormente, ocuparem os espaços deliberativos de políticas públicas como os conselhos,
mas somente após a efetiva participação destas dos debates referentes à infância e à
adolescência nos parâmetros do ECA.
Essa estratégia fortalece a atuação dos conselheiros de direitos da sociedade civil, a
partir da formação e participação qualificada destes no FNDCA, e, consequentemente,
fortalece a atuação do próprio conselho. Em Sergipe, esse fortalecimento se verifica pela
quantidade e qualidade das proposições de políticas públicas encaminhadas ao Executivo,
principalmente nos períodos de 2007 a 2009, pelos conselhos estadual e municipal de
Aracaju, conforme se verá mais adiante.
Sobre as reuniões ocorridas no FNDCA com representantes da sociedade civil do
CONANDA, elas ocorriam frequentemente e funcionavam do seguinte modo: mensalmente
os conselheiros representantes da sociedade civil se reuniam com a coordenação colegiada
nacional do FNDCA, antecipadamente às reuniões do CONANDA 73, para traçar uma linha de
ação e prestar contas acerca das prioridades definidas em planejamento anual pelo coletivo de
entidades filiadas ao FNDCA. Nesse momento, eram compartilhadas as discussões e as
disputas de concepções travadas com os conselheiros representantes das organizações

73
O CONANDA é um conselho paritário de participação, com função deliberativa sobre as políticas públicas
nacionais relacionadas à criança e ao adolescente, sendo, portanto, órgão de consultoria do Executivo. Sua
composição é paritária, com metade dos conselheiros indicados pelo poder público e metade eleitos pela
sociedade civil em fórum específico para essa finalidade.
73

governamentais, os consensos e desafios da própria política e definidos novos parâmetros para


a intervenção da sociedade civil. Essas reuniões, táticas do ponto de vista da oportunidade de
pensar, avaliar e repensar as estratégias de ação, constituíam, sem dúvida, espaços da ação
pedagógica que contribuiu para a formação e fortalecimento da participação e dos conselhos.
Do ponto de vista da ação pedagógica, as reuniões dos conselheiros nacionais
representantes da sociedade civil no CONANDA com o FNDCA ou dos conselheiros
estaduais representantes das organizações não governamentais no CEDCA-SE e no CMDCA-
Aracaju com o Fórum DCA-SE contribuíram, como pôde vivenciar a autora desta dissertação,
para a formação dos conselheiros e o fortalecimento do conselho, porque constituíam
oportunidades de diálogo e reflexão que, por sua vez, resultavam em definição e redefinição
de novos e antigos pactos pela criança e adolescente. A tentativa de regularizar encontros
através da realização permanente de reuniões contribuiu para aprofundar o conhecimento
sobre as temáticas infanto-juvenis e suas contradições, entre outros aspectos.
Esse tipo de estratégia de formar na práxis, através, a exemplo, de mobilizações de
rua, marchas, cursos de formação política, debates públicos e visitas as entidades, era
compartilhada com os demais Fóruns nas assembleias nacionais e nas visitas aos Estados,
momentos em que se compartilhavam também as tensões existentes no âmbito dos conselhos
entre os representantes da sociedade civil e os representantes do governo. No campo das
tensões é valido considerar que os conselhos gestores, a serem abordados mais adiante,
representam o maior exemplo da existência do confronto (que se supõe democrático) entre
diferentes posições político‐ideológicas e projetos sociais. Segundo Gohn (2013), é por meio
de interpelações recíprocas que os novos sujeitos políticos se constroem.
As tensões, que ocorrem entre representantes governamentais e não governamentais
em todos os sentidos, mas principalmente na relação Estado-sociedade civil, se devem ao fato
de que, no âmbito da democracia brasileira, os direitos são desenvolvidos a partir de uma
compreensão aprisionada ao universo jurídico, que tende a ser mais conservador. Fóruns,
conferências e demais espaços participativos ainda não conseguem alcançar as garantias reais
de atendimento aos direitos. Eles se configuram como espaços de participação direta, que até
interferem na decisão de algumas políticas públicas, mas não têm o poder de alterar a
realidade concreta na perspectiva da alteração significativa da ordem das coisas preexistentes
na relação entre Estado e sociedade.
Oportunidades para construção de acordo, repactuação, ação, reflexão, debate,
ressignificação da realidade, avaliação das estratégias e da própria conjuntura política da
infância nacional ou estadual, desde a atuação dos atores sociais, como instituições e órgãos
74

públicos e privados, representam relevantes elementos pedagógicos para um processo de


conscientização crítico-coletiva. Os posicionamentos advindos desses mecanismos político-
pedagógicos repercutem nos conselhos sob a forma de aprovação de resoluções que colocam
o campo da política pública como prioridade enquanto foco da atenção do Executivo e
repercutem na sociedade, sob a forma de posicionamentos públicos divulgados em notas
imprensa ou entrevistas, que desmistificam ou fazem o contraponto sobre temas
aparentemente petrificados, como maioridade penal, realidade da juventude pobre e negra e o
abuso e exploração sexuais.
Repercutem ainda no interior das entidades não governamentais que passam a
repensar as ações de cunho assistencialista-caritativo74, sem contar os impactos, não avaliados
em tempo real, na vida dos sujeitos políticos envolvidos nesse processo pedagógico, que será
ainda refletido em suas ações futuras. Esses elementos pedagógicos dialogam com a
pedagogia freiriana, na medida em que os sujeitos político-coletivos são compreendidos
dentro das próprias relações com o mundo, na expressão de Freire como um “ser-em-
situação”, do trabalho e da transformação do mundo, e, portanto, como um ser das “práxis”,
da ação e da reflexão (FREIRE, 1983, p. 17).
As oportunidades de diálogo em Freire são necessárias para a problematização do
mundo que abre caminhos para a passagem livre da criatividade, que se processa como
resultado das tentativas de encontrar respostas para o que é problematizado. A criatividade,
segundo Freire, não se desenvolve em meio ao formalismo oco, mas na práxis dos homens (e
das mulheres), interagindo entre si, no mundo e com o mundo em uma espécie de “práxis na
qual a ação e a reflexão, solidárias, se iluminam constante e mutuamente (...) na qual a
prática, implicando na teoria da qual não se separa, implica também numa postura de quem
busca o saber, e não de quem passivamente o recebe” (FREIRE, 1983, p. 55).
Entretanto, mesmo havendo dificuldades, próprias dessa relação, esses espaços ao se
fazerem participativos se fazem igualmente pedagógicos na medida em que promovem
possibilidades para o exercício da contra-hegemonia em um ambiente hegemônico e
aparentemente consolidado na figura da classe dominante, como quer Poullantzas (1980).
De acordo com esse autor, na medida em que o Estado faz concessões à classe
dominada, mesmo que primordialmente esteja a serviço da classe dominante, fica
demonstrada existência, de alguma forma, da possibilidade de que pressões populares

74
Assistencialismo caritativo é ajuda dispensada, às vezes pelo governo, mas mais usualmente por entidades
religiosas e filantrópicas, por caridade, por compaixão, por piedade, sem intuito de promover a emancipação do
assistido.
75

provoquem alterações em favor das classes subalternas na estrutura do Estado - na ossatura


material deste, que seria relacional. Sua materialidade institucional se encontra na separação
relativa deste Estado e das relações de produção sob o capitalismo. O fundamento dessa
separação “consiste na especificidade das relações de produção capitalistas e na divisão do
trabalho a que induzem” (POULANTZAS, 1980, p. 59), ou seja, no próprio processo de
constituição das classes em luta.
Isso quer dizer que a condição relacional do Estado abarca a capacidade de
determinada classe conquistar seu interesse específico sempre em oposição à capacidade e
interesses de outras. De fato, como ainda afirma Poullantzas (1980), não há como deixar de
considerar a tentativa de cooptação para manter as classes dominadas em situação opressora.
Por meio do Estado75, as classes dominantes e mesmo integrantes dele que estão a serviço das
ideias hegemônicas buscam a adesão das classes subalternas ao seu projeto de poder pela
absorção de demandas reais destas.
Enquanto isso, as classes dominantes assumem papel fundamental de educadores dos
grupos oprimidos e explorados da sociedade, desenvolvendo, através das suas práticas e
aparelhos, intensa atividade pedagógica de conformação. Em outras palavras, exercitam uma
“pedagogia da hegemonia”, baseada na organização/desorganização estratégica das classes
dominadas em luta (NEVES, 2005). Para Poulantzas (1980), o fato de o lugar de classe não
estar determinado por natureza ou nascimento, faz com que o Estado assuma papel de
distribuidor como Estado educador, que, na concepção de Gramsci, significa, “criar novos e
mais elevados tipos de civilização, de adequar a “civilização” e a moralidade das mais amplas
massas populares às necessidades do contínuo desenvolvimento do aparelho econômico de
produção e, portanto, de elaborar também fisicamente tipos novos de humanidade”
(GRAMSCI, 2000 p. 23).
No entanto, do mesmo modo, os processos de reivindicação são lugares de ensino-
aprendizagem e de retroalimentação da cidadania, que se faz na ação política e, nesta, torna-se
espaço pedagógico de novas intervenções sociais76. Assim, a pedagogia da hegemonia inspira

75
Ao se analisar a correlação de forças entre Estado e sociedade, definida por Poulantzas, percebe-se que o
Estado não possui poder próprio, sua força política está sediada no poder de classe, especificamente em meio à
luta de classes, motor fundamental de uma formação social dividida entre dominantes e dominados.
76
As tensões ocorrem entre segmentos da sociedade civil e representantes estatais porque, mesmo considerando
o estágio de respeito e representatividade alcançado ao longo da trajetória do próprio movimento pelos direitos
da criança e do adolescente para o processo de priorização e reconhecimento desse segmento social, passados
mais de vinte e cinco anos de aprovação do ECA, a sociedade civil, ainda encontra necessidade de se colocar na
condição de ator estratégico de tensão para fazer avançar a política de atendimento à população destinatária dos
direitos humanos infanto-juvenis. Para isso, faz-se necessário atuar de forma articulada e pedagógica.
76

a necessidade de uma pedagogia contra-hegemônica, enquanto ações que servem de


“instrumentos para criar uma nova forma ético-política, em origem de novas iniciativas”
(Gramsci, 1999, p. 314). Essas iniciativas denunciam e tentam reverter as condições de
opressão impostas a amplos estratos sociais pelo modo de produção capitalista. Desse modo,
pauta-se no contraditório da relação hegemônica que não é uníssona, estável, enfim
monolítica.
A contra-hegemonia ocorre em longo processo de lutas, contestações, vitórias
cumulativas e argumentações alternativas de contraposição ao senso comum, o que finda por
aprofundar e aperfeiçoar o conhecimento crítico da realidade para intervir nesta no sentido de
efetivar o que o líder comunista italiano define como “a crítica real da racionalidade e
historicidade dos modos de pensar” (GRAMSCI, 1999, p. 111).
Numa perspectiva de educação ao estilo de Josué de Castro (1959), que afirma ser
uma educação libertadora ao que aspiram os povos do Terceiro Mundo como forma de
superar todas as formas de opressão, percebe-se a necessidade de iniciativas capazes de
intervir politicamente nas questões que dizem respeito à vida concreta das pessoas. Essas
intervenções passam pela capacidade de interferir nos processos de tomada de decisão da
gestão pública, fomentando o debate e a construção da crítica pública para a promoção de
uma educação mais participativa e garantidora de direitos. Nesse sentido, mesmo que muitas
vezes o Fórum DCA-SE não tivesse consciência plena de atuar numa perspectiva contra-
hegemônica, ao denunciar as condições de exploração vivenciadas por crianças e
adolescentes, atuava nessa linha pedagógica.
Segundo Gramsci (1999):

o desenvolvimento político do conceito de hegemonia representa, para além do


progresso político-prático, um grande progresso filosófico, já que implica e supõe
necessariamente uma unidade intelectual e uma ética adequada a uma concepção do
real que superou o senso comum e tornou-se crítica, mesmo que dentro de limites
ainda restritos” (GRAMSCI, 1999, p. 104).

Como exemplo de uma atuação dentro do contexto do aprendizado político, em


relação à atuação dos Fóruns DCA, pode-se citar a realização das visitas do FNDCA aos
Fóruns Estaduais DCA. Enquanto essas visitas aconteciam, o CONANDA promovia
encontros de articulação com os conselheiros estaduais e municipais dos direitos da criança e
do adolescente, além dos conselheiros tutelares. Essa estratégia, que tinha por objetivo alinhar
o pensamento entre os órgãos e atores que atuam com crianças e adolescentes sob a política
infanto-juvenil, ao ser implementada, aos poucos direcionou os rumos da política específica
no Brasil nos anos 2006 a 2010 (FÓRUM NACIONAL DCA, 2015).
77

Isso significa, para o aprendizado político, uma ilustração de como o Fórum DCA
pode ser ou se apresenta enquanto agente desse processo de formação política, dessa
pedagogia da contra-hegemonia.
Desse modo, à medida que o FNDCA e o Fórum DCA-SE cresciam, motivavam suas
entidades filiadas, ampliavam o debate, qualificavam os discursos e fortaleciam a ação na área
da infância nos locais de sua existência, concomitantemente com a criação de novos Fóruns
DCA, que se reproduziam pelos municípios.
Nos anos 2000, o FNDCA, além de manter a agenda de incidência na organização
das conferências da criança e do adolescente e no Plano Nacional de Enfrentamento da
Violência Sexual Infanto-Juvenil, participou dos processos de elaboração e aprovação do
“Orçamento Criança”, na Câmara dos Deputados, e começou a desenvolver melhores
mecanismos de comunicação sobre a infância e adolescência, como boletins eletrônicos,
páginas na rede mundial de computadores, produção de cartazes, folders, jornais, manifestos
políticos, artigos, assessoria de imprensa e publicações77.
É verdade que nem sempre as entidades absorviam o caráter pedagógico do FNDCA,
algumas, inclusive, almejavam apenas impor o caráter pedagógico de suas próprias entidades
para que servissem de projeto político. Essas iniciativas geravam conflitos e tensões também

77
Nos anos de 1990 a 2000 foram realizadas várias Assembleias Nacionais do FNDCA, com pautas que
priorizam o papel político das entidades não governamentais; a importância da participação nos conselhos
deliberativos de direitos, atribuições e competências do FNDCA; a sustentabilidade das organizações não
governamentais; a articulação e mobilização de campanhas nacionais importantes, como a erradicação do
trabalho infantil e a proteção ao trabalho do adolescente; a violência e exploração sexual contra crianças e
adolescentes; o ato infracional e medidas socioeducativas; a redução da maioridade penal; a importância dos
conselhos tutelares; o orçamento público e fundos e o fortalecimento dos Fóruns Estaduais, entre outros temas.
As pautas evidenciam possibilidades de avanços sobretudo pelo fomento da participação institucional para o
exercício do controle social. No entanto, por outro lado, evidenciam de igual modo um caráter contraditório do
Fórum em termos de autonomia frente a este controle social, uma vez que fica evidente a necessidade de
financiamento que as entidades têm para sua própria sustentabilidade, caso em que em grande parte são firmados
convênios com o próprio Estado. Em relação às campanhas, que também se fazem pedagógicas em seu processo
de mobilização e evidenciamento das problemáticas sociais, em 1994, o FNDCA articulou Campanha Nacional
com o tema “Não Toquem em Nossos Direitos”, em defesa dos direitos da criança e do adolescente e pela
moralização do Congresso Nacional, deflagrada em 1994. O FNDCA participou ainda de protestos importantes
como o da chacina da Candelária no Rio de Janeiro na reunião de Cúpula dos Governadores pela Infância; das
iniciativas para a criação em 1993 da Frente Parlamentar pela Criança e pelo Adolescente no Congresso
Nacional e instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) no Congresso Nacional para investigar a
exploração sexual infanto-juvenil, que resulta na criação das CPIs da exploração sexual comercial de crianças e
adolescentes e de trabalho infantil de 1996 (FÓRUM NACIONAL DCA, 2015). Em relação à luta pela
erradicação do trabalho infantil, em 1997, foi criada a Comissão Interinstitucional da Região Centro-Oeste de
Combate à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, com a participação de 1628 municípios. Em 1998, a
luta passou a ser travada em diversas frentes, com maiores expressões na Marcha Global Contra o Trabalho
Infantil, no Fórum pela Erradicação do Trabalho Infantil e nos fóruns estaduais e municipais sobre o tema. Logo
depois, foi realizada a Marcha Global pela Erradicação do Trabalho Infantil no Mundo. A Marcha saiu de vários
países rumo a Genebra, na Suíça, onde aconteceu a Conferência da Organização Internacional do Trabalho. No
mesmo ano, a Emenda Constitucional nº 20 proibiu o trabalho de crianças e adolescentes menores de 16 anos,
salvo na condição de aprendiz (FÓRUM NACIONAL DCA, 2015).
78

no coletivo das discussões, pois, através de perfis diferenciados de ONGs, conforme se


destacou, algumas almejavam apenas que o Fórum DCA, seja nacional ou de Sergipe, lhes
servissem em seus próprios projetos políticos.
Isso decorre também de um processo de disputa de concepção política. De um lado, as
ONGs com perfis militantes, com projeto político- ideológico bem definido para a defesa da
proteção integral da criança e do adolescente, compreendendo o papel da participação
coletiva, e, de outro, ONGs com perfis do Terceiro Setor, motivadas pela busca da
visibilidade institucional, ainda que discursivamente enfatizando a solidariedade com os
excluídos, com vistas a possíveis financiamentos futuros. De um lado, entidades
compreendendo o Estado como o foco do direcionamento das críticas públicas pela
inoperância de algumas de suas políticas; de outro, entidades na linha da parceria com o
Estado, para obtenção do benefício de projetos e convênios, ou sem condições de opinar pelo
compromisso firmado com o Estado.
O mesmo ocorria com o Fórum DCA-SE, em que, a depender da concepção
predominante, os rumos do Fórum DCA-SE eram mais questionadores ou não. É lógico que
esse processo se relacionava diretamente com o caráter pedagógico da construção de
estratégias e da práxis do Fórum – uma práxis bem complexa. Os debates em conflito
motivavam sempre novas reflexões, problematizações e, nessa linha, é que se diz que o Fórum
DCA-SE atuava na perspectiva dialógica freireana, pois as inquietações e a construção
reflexiva e problematizadora sempre foram a tônica, mesmo que naquele momento muitos não
soubessem que atuavam nessa linha.
O sentido da criação dos Fóruns DCA, que inicialmente significou luta por conquista
de direitos, posteriormente a essa conquista, na Constituição de 1988 e no ECA, passou a ser
a garantia desses direitos, a sua implementação. Nesse aspecto, passou pela necessidade
permanente de se estimular a reflexão crítica acerca dos problemas sociais que afetam a
infância brasileira para colocar em prática os dispositivos legais atinentes à infância e à
adolescência. Considerando que, na prática, é na oportunidade da participação, no contato
com outros atores envolvidos na dinâmica coletiva dos movimentos e movimentações sociais
que cada ator social vai se apropriando das funções de cada rede de articulação da infância e
dos Direitos Humanos e o papel de cada um nesta, foi nesse instante que o papel dos Fóruns
DCA também se foi definindo na sociedade em um processo de movimentação e ação
contundente de transformação mútuo para a construção de identidades individuais e coletivas.
Essa conjuntura de busca para se estabelecer uma identidade sem perder de vista as
especificidades presentes, contribui para que a sociedade civil se torne ainda mais complexa
79

em um universo de atores cada vez mais heterogêneos. Foi justamente desse modo que a
participação coletiva e individual dos sujeitos inseridos no Fórum se intensificou, os
significados foram surgindo e também apareceram na ação de cada um. Enfim, nesse
contexto, a criação dos Fóruns DCA, com base em Santos (2007), também se relacionou com
a produção de saberes informais que partiam do bojo da sociedade civil e se colocavam nos
espaços de troca de saberes. Por outro lado, a formação política da sociedade civil se dá
enquanto se produzem experiências políticas que têm como pretensão propor alternativas
contra-hegemônicas para a realidade cotidiana vivenciada. Afinal, a transformação deve-se
dar no campo dos processos culturais abertos, que tendem a potencializar a capacidade
humana da criatividade e da transformação do mundo: “hitos básicos de todo el processo de
humanización e de la humanidad” (FLORES, 2012, p. 238).
Mediante essa compreensão, que considera a dimensão do sentido de criação e luta
dos Fóruns em função da defesa dos direitos consagrados na lei e na promoção e proteção
integral dos direitos infanto-juvenis, vale especificar como essa atuação se deu no âmbito do
Estado de Sergipe, o que se fará no próximo capítulo.
4. PALAVRAS QUE NÃO SILENCIAM, POSSIBILIDADES QUE
EMANCIPAM: A TRAJETÓRIA POLÍTICA DO FÓRUM DCA-SE

Este capítulo enfoca principalmente a relação estabelecida entre o Fórum DCA-SE e


os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente do Estado de Sergipe e do município
de Aracaju, elencando a importância, as atribuições e o significado de cada um desses espaços
de participação. É valido explicitar, em que pese a importância dos conselhos, que a relação
do Fórum DCA-SE não se restringe a esse espaço de construção de políticas públicas. Por ser
um ator social político organizado e constituído pela sociedade civil, sua atuação vai além
disso. Realiza ações de formação e de fiscalização; contribui com o trabalho dos conselhos
tutelares e mobiliza organizações não governamentais para discutirem o atendimento a
crianças e adolescentes e orçamento público (nesse caso, discute também com parlamentares a
construção de emendas ao orçamento, de modo a garantir recursos para política da infância).
Em um segundo momento, realiza-se resgaste histórico da trajetória do Fórum DCA-
SE nos anos de 2000 a 2009, identificando e analisando as estratégias político-pedagógicas
utilizadas por esse coletivo e que marcaram a sua atuação na política infanto-juvenil de
Sergipe, com foco em denúncias e na luta pela manuntenção das unidades de medida
socioeducativa na pasta da Política de Assistência Social do Estado de Sergipe. Segundo
nossa análise, essa atuação foi a de maior impacto na política pública da criança e do
adolescente sergipana78 e deu ao Fórum DCA-SE dimensão ainda maior do que já havia no
campo da promoção de direitos humanos, participação e controle social por parte da
sociedade civil organizada sobre as políticas infanto-juvenis.
Neste capítulo, considerada-se a análise realizada por Gohn de que “os elementos
internos básicos de um movimento social a ser pesquisados, enquanto parte de suas categorias
de análise, são: suas demandas e reivindicações e os repertórios de ações coletivas que geram,
sua composição social, suas articulações” (GOHN, 1997, p. 255), concepção que grande parte
dos integrnates do Fórum tinha sobre sua própria atuação.

78
Essa atuação é considerada da maior importância por ter revertido uma decisão de governo a partir das
pressões sociais realizadas por iniciativa do Fórum DCA-SE. Uma decisão governamental que contrariava
direitos conquistados.
81

4.1. Fórum DCA-SE: Relação com os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente


no Sistema de Garantia de Direitos - SGD

A relação dos Fóruns DCA, de modo geral, com os conselhos de direitos tem sido de
parceria e cooperação, com ações articuladas e propositivas, sem perder a autonomia e a
possibilidade de questionar as decisões tomadas por esses órgãos 79.
Na tese de doutorado de Francisca Rodrigues Pinni, intitulada Fóruns DCA: fios que
tecem o movimento da infância e da adolescência na construção de caminhos para a
democracia participativa, a autora analisa depoimentos de articuladores dos Fóruns Estaduais
e conclui que a relação dos Fóruns, em geral, com os conselhos de direitos varia de Estado
para Estado, “tratando-se da interlocução dos Fóruns com os Conselhos dos Direitos da
Criança e do Adolescente, o entendimento é heterogêneo” (PINNI, 2006, p. 131).
Para alguns Fóruns, a interlocução é considerada boa e bem consolidada, com
diálogo sobre as pautas a serem trabalhadas nos conselhos, integração entre as entidades de
ambos os espaços (Fóruns e conselhos), incentivo ao fortalecimento e crescimento da
sociedade civil e contribuição recíproca para o avanço da pauta da infância. Nas palavras de
alguns representantes de fóruns estaduais, citados por Pinni (2006), é uma relação política
importante para promover as reflexões realizadas pela sociedade civil que atua diretamente
com crianças e adolescentes e colocar a ideologia do Fórum nos conselhos de forma mais
politizada a partir dos consensos produzidos pela sociedade civil (PINNI, 2006, p. 132).
O Fórum Estadual DCA-PR e o Fórum Estadual DCA-MS, por exemplo, constroem
uma interlocução com os conselhos estadual e municipais, de modo a favorecer a participação
social. Especificamente quanto ao Fórum DCA-PR, um de seus coordenadores afirmou ser
uma relação de “muito respeito por parte do Conselho e dos conselheiros governamentais. Em
vários momentos chamam o Fórum para acompanhar as ações” (PINNI, 2006, p. 132). Em
outros Estados, os próprios conselheiros de direitos solicitam o parecer do Fórum DCA sobre
assuntos mais específicos, como o orçamento público, ou levando suas pautas para serem
discutidas no Fórum, bem como ampliando os debates nos conselhos (nesse contexto, há
fóruns que se entendem como parte do conselho por causa das entidades da sociedade civil
que ocupam ambos os espaços).

79
A depender da conjuntura vivenciada em cada localidade, essa relação se dará de forma diferente. Ainda que
em determinado Estado ou município essa relação se dê de forma cooperativa, ocorrem momentos de tensão e
embates, o que altera essa relação do Fórum com os conselhos. Afinal, isso depende da configuraçãoassumida
por um espaço ou outro, mesmo considerando haver uma atuação similar em alguns aspectos, como a formação
continuada, a atuação política, o incentivo à participação social e o controle sobre as políticas públicas, entre
outros.
82

Por fim, sobre a interlocução Fóruns/conselhos em alguns Estados, os relatos dão


conta de uma ligação frágil e de dificuldade. Apesar disso, os coordenadores de Fóruns DCA
entendem a importância de se estabelecer uma relação próxima na perspectiva da cooperação
mútua entre fóruns e conselhos, como parte do processo de participação social 80 (PINNI,
2006, p. 132).
Para compreender melhor como se processa essa relação dentro do SGD – Sistema
de Garantia de Direitos e porque em determinados momentos as tensões se evidenciam com
maior ou menor vigor, vale explicitar brevemente as características de cada um dos espaços
políticos, seus papéis, sua importância, suas atribuições e funções e seus pontos comuns e
diferenças. Iniciando pelo SGD, este é um conjunto articulado de órgãos e entidades, também
da sociedade civil, com atuação em rede para realizarem os direitos da criança e do
adolescente nos seguintes eixos: I - defesa dos direitos humanos81; II - promoção dos direitos
humanos82, e III - controle da efetivação dos direitos humanos, podendo cada um de seus
integrantes exercer funções em mais de um eixo (CONANDA, RESOLUÇÃO 113, Art. 5º).
Em resumo, o SGD se constitui:

na articulação e integração das instâncias públicas governamentais e da sociedade


civil, na aplicação de instrumentos normativos e de funcionamento dos mecanismos
de promoção, defesa e controle para a efetivação dos direitos humanos da criança e
do adolescente, nos níveis Federal, Estadual, Distrital e Municipal (CONANDA,
resolução 113, art. 1º).

Dentro desse Sistema, os conselhos de direitos são os órgãos responsáveis pela


elaboração das diretrizes da política de atendimento aos direitos da criança e do adolescente,
bem como pelo acompanhamento, controle social e avaliação dos programas, projetos e ações
desenvolvidas (CONANDA, 2007, p. 21). Compostos de forma paritária, ou seja, metade dos

80
Nesse trabalho, Pinni cita ainda as considerações trazidas por integrantes do FNDCA, segundo os quais, no
caso deles, as interlocuções ocorrem por meio de reuniões mensais em que o secretariado senta com os
representantes da sociedade civil no CONANDA. Debatem-se temas considerados importantes pelo Fórum,
inclusive questões que deverão ser discutidas e votadas no âmbito do CONANDA. Em razão, sobretudo, de ser
grande parte das entidades presentes nessa reunião membros do Conselho Nacional. (PINNI, 2006).
81
Conforme o artº 6 da Resolução nº 13 do CONANDA, a defesa de direitos humanos está diretamente
relacionada à garantia do acesso à justiça por meio dos seus instrumentos jurídicos de proteção legal e à atuação
das entidades públicas e privadas para operacionalizar esse eixo. Pauta-se por assegurar a impositividade desses
mecanismos e sua exigibilidade, em concreto).
82
Conforme o art. 14 da Resolução nº 113, a promoção dos direitos humanos se refere à política de atendimento
dos direitos da criança e do adolescente, prevista no art. 86 do ECA, que é operacionalizada tanto pelas entidades
públicas como por entidades da sociedade civil organizada. Para a melhor efetividade desse eixo, deve articular
todas as políticas públicas no sentido de garantir a proteção integral da criança e do adolescente. O
desenvolvimento dessa política pública implica a satisfação das necessidades básicas do público infanto-juvenil;
a participação da população, por meio de suas organizações representativas; a formulação e controle das políticas
públicas; a descentralização político-administrativa; e o controle social e institucional (interno e externo) da sua
implementação e operacionalização.
83

conselheiros representantes do poder público e metade representantes da sociedade civil, os


conselhos de direitos (ECA, ART. 88, INCISO II) devem cumprir: a) a função de garantir a
participação popular no processo de discussão, deliberação e controle social das políticas de
proteção integral à criança e ao adolescente; b) deliberar sobre políticas sociais básicas e
demais ações necessárias à execução das medidas protetivas e socioeducativas dispostas nos
artigos 87, 101 e 112 do Estatuto da Criança e do Adolescente (CONANDA, 2007, p. 21).
Para tanto, como está descrito no art. 88, inciso 4, do ECA, é fundamental para a
ação dos próprios Conselhos de Direitos da Criança a mobilização da opinião pública, de
modo a incentivar e ampliar a participação da sociedade por meio de seus diversos segmentos.
É importante perceber que o papel dos Conselhos é assegurar a existência e a
efetividade de políticas direcionadas à população infanto-juvenil, de forma descentralizada e
com participação popular. Sua configuração paritária cria, ainda que formalmente, uma
espécie de gestão compartilhada e fomenta debates de concepções e formas mais
democráticas de organização e participação da sociedade civil e sua relação com o poder
público, ainda mais se observado o caráter vinculante de suas decisões, tendo em vista o
cumprimento dos princípios constitucionais da prioridade absoluta e da proteção integral à
criança e ao adolescente (CONANDA, Resolução nº 105/2005, art. 2º, § 2º). “O poder
vinculante do conselho é aquele que cria a obrigação de o prefeito ou autoridade responsável,
como o governador ou presidente da República, por exemplo, acatarem o que for decidido e,
portanto, deliberado pelo referido órgão” (CONANDA, 2007, p. 21).
Sobre a forma da participação nos conselhos,

(...) a ideia de gestão compartilhada (...) é a que reflete a ideia de um processo que
requer tempo, por esse motivo não podendo ser imposta. Os percalços que
possivelmente surgem nesse processo, como as resistências, devem ser quebrados
como uma maneira de ir solidificando essa nova modalidade de construção conjunta
com base na vontade, criatividade e adequação a cada realidade e demanda
(MONTEIRO et al, 2002, p. 57).

Nesse formato de organização, cada conselheiro 83 goza de prerrogativas e da


presunção da idoneidade moral para construir uma política municipal, estadual ou nacional,
de proteção integral para a criança e para o adolescente. Essas tarefas exigem do conselheiro o
conhecimento das realidades diversas vivenciadas pelo público infanto-juvenil em suas
localidades. Nesse aspecto, o integrante do conselho de direitos precisa desenvolver e
exercitar habilidades básicas, como a capacidade de decidir; de se expressar e defender

83
O ECA, em seu artigo 89, definiu que a função de membro do Conselho de Direitos é considerada de interesse
púbico relevante e não será remunerada.
84

propostas; de articular e negociar; de informar com transparência e disponibilidade; de


elaborar textos; fazer interlocuções diversas; enfim, de ter criatividade institucional e
comunitária(CONANDA, 2007, p. 40).
Isso significa considerar as realidades específicas de crianças e adolescentes
indígenas, afrodescendentes, quilombolas e portadoras de deficiência e as questões de gênero
e de orientação sexual, entre outras, nas diferentes regiões do Brasil, detentoras das mais
diversas culturas. Sobre o distanciamento da realidade concreta na elaboração e promoção de
políticas públicas de direitos humanos, Rubio84 (2014) chama a atenção para o fato de que na
dinâmica do distanciamento dos contextos socioculturais,

(...) há um esvaziamento e isolamento do humano em sua dimensão corporal,


indivíduos com nomes e sobrenomes com necessidades e sujeitos que produzem
realidades, considerados, assim, seres sem atributos, fora de contexto e subordinados
as suas próprias produções sócio-históricas (...) (RUBBIO, 2014, p.27).

Daí a importância da formação política e dos diagnósticos com a devida leitura


crítica das realidades que envolvem a criança, o adolescente, suas famílias e a comunidade em
que estão inseridos. Considera-se ainda que nem todo conselheiro tem a mesma concepção
sobre a infância e adolescência, o que amplia o campo das tensões vivenciadas dentro do
próprio universo do conselho, seja entre conselheiros da sociedade civil, seja entre aqueles do
governo.
Afere-se, pelo exposto, que tensões, conflitos nos novos espaços de participação
democrática ocorrem também porque, embora a Constituição de 1988 tenha contemplado a
responsabilidade compartilhada entre o ente governamental e a sociedade como protagonistas
na promoção dos direitos sociais, até a década de 1980 as decisões públicas eram tomadas
85
sem a participação da sociedade civil. Foi somente a partir de 1988 , mediante
reconhecimento constitucional, posteriormente afirmado no ECA e em outras leis, que o

84
Rubio defende que as complexidades devem ser consideradas, rompendo com a lógica cultural da
simplificação de realidades nada simples, “por que quanto mais mutilador é um pensamento, mais mutila seres
humanos e suas vidas” (RUBBIO, 2014, p. 76). Rubio (2014) trata dessa questão quando se refere ao paradigma
da simplicidade pensada pelo sociólogo Francês Edgar Morin. Esse paradigma se baseia na ideia de que “todo
ser humanos faz simplificações e significa parcial e limitadamente o real”, absolutizando, simplificando e, desse
modo, amputando tudo e sacrificando muitas vidas (RUBBIO, 2014, p. 76). Esse processo não é construído de
uma vez só e nem de uma vez por todas. É sutil e provoca muitas injustiças, uma vez que as pessoas vão aos
poucos simplificando as realidades e transformando essas simplificações em verdades absolutas, sem atentar
para as complexidades que envolvem cada uma delas. No caso dos conselheiros de direitos, muitas das tensões
advêm da própria falta de conhecimento em relação a essas realidades, por exemplo, vivencidas pelos grupos
vulneráveis e essas tensões se evidenciam através tentativas de cumprir suas próprias funções deliberativas:
decidir sobre as políticas públicas.
85
No âmbito do Executivo, no que tange à formulação e fiscalização de políticas públicas, a Constituição de
1988 prevê a participação da comunidade nos setores como saúde (CF, art. 198, III), a assistência social (CF, art.
204, II), educação (CF, art. 206, VI), cultura (CF, art. 216, § 1º) e criança e adolescente (CF, art. 227, § 1º), além
de prever a participação do usuário na Administração Pública direta e indireta (CF, art. 37, § 3º).
85

poder público passou a contar com representantes não governamentais na tomada de decisões,
na definição, acompanhamento, fiscalização e avaliação de resultados de políticas públicas.
Desse modo, tem-se que, culturalmente, a participação social não era priorizada
pelos governos; pelo contrário, o país – como já exposto – vivenciou processos ditatoriais
duradouros. Por meio do novo modelo de construção coletiva, os desafios e perspectivas se
evidenciaram em virtude de uma sociedade recém-saída desses contextos autoritários,
repressores e inibidores da participação e de processos democráticos. Acresce-se a esse
contexto, o modo conservador e centralizador de gestar os recursos e os assuntos públicos por
parte dos representantes do Estado, estabelecidos há muitos anos, sempre com olhar mais
atento para as políticas de segurança nacional, com foco no militarismo.
É por isso que se afirma que a efetiva assimilação, por parte de todos os atores
envolvidos nesse contexto, depende de uma mudança de cultura na forma de se conceberem a
política pública e a participação popular na composição de espaços decisórios de poder
público, além de repensar a forma como sempre foi concebida a criança e o adolescente,
diferentemente da concepção do “menor”, que foi construída ao longo da história do Brasil,
especialmente no século XX86.
Tomar decisões públicas com a sociedade civil não era uma prática, pelo contrário,
nunca foi sequer um desafio. Ao longo da história, foram muitas as perseguições e conflitos,
advindos das tentativas de participação e das reivindicações políticas por parte de grupos
sociais organizados. O processo de luta pela redemocratização do país é um exemplo, tendo
em vista as tentativas de anulá-lo e de evitar o avanço da democratização do Estado, ou seja,
que os valores democráticos se institucionalizassem, de modo a não mais se admitir a
presença do autoritarismo na condução do Estado (CARVALHO, 2002, p. 43). Por outro lado,
como dito anteriormente, para a grande maioria da sociedade, controlada por uma política
assistencialista, que cria e estimula o acomodamento frente a “pacotes e serviços prontos”,
esse fato transforma em desafio a necessidade de participar.
José Murilo de Carvalho (2002), em sua obra intitulada “Cidadania no Brasil: O
longo caminho”, descreve como se deu o processo de construção da cidadania e de
participação brasileira ao longo dos anos, desde o período colonial. Desse modo, Carvalho
(2002) demonstra o enraizamento cultural das nocivas práticas de intimidação, exploração,
submissão, perseguição, anulação e violência a que foram submetidas as camadas populares
no Brasil historicamente. Essas práticas se refletiram em um modelo de participação que, em

86
Sobre o assunto, ler artigo “Da concepção do “menor” ao surgimento da criança e do adolescente enquanto
sujeito de direitos: uma compreensão histórica”, de autoria de Anjos e Maia, 2014.
86

grande parte, foi fragmentado, por ter sido um processo de conquista “ingênuo e viciado” a
receber os comandos de um Estado e das camadas dominantes da sociedade despreparadas
para formas de gestão democráticas.
Sobre o processo desencadeado com a construção e, posteriormente, com
promulgação da Constituição de 1988, segundo Carvalho,

Havia ingenuidade no entusiasmo. Havia a crença de que a democratização das


instituições traria rapidamente a felicidade nacional. Pensava-se que o fato de termos
reconquistado o direito de eleger nossos prefeitos, governadores e presidente da
República seria garantia de liberdade, de participação, de segurança, de
desenvolvimento, de emprego, de justiça social. De liberdade, ele foi. A
manifestação do pensamento é livre, a ação política e sindical é livre. De
participação também. O direito do voto nunca foi tão difundido. Mas as coisas não
caminharam tão bem em outras áreas. Pelo contrário, já 15 anos passados desde o
fim da ditadura, problemas centrais de nossa sociedade, como a violência urbana, o
desemprego, o analfabetismo, a má qualidade da educação, a oferta inadequada dos
serviços de saúde e saneamento, e as grandes desigualdades sociais e econômicas ou
continuam sem solução, ou se agravam, ou, quando melhoram, é em ritmo muito
lento. Em consequência, os próprios mecanismos e agentes do sistema democrático,
como as eleições, os partidos, o Congresso, os políticos, se desgastam e perdem a
confiança dos cidadãos (CARVALHO, 2002, p.07-08).

Dessa forma, em um espaço de atuação como o dos conselhos de direitos, por


exemplo, as tensões e conflitos provocados pela cultura de não participação, bem como pelas
concepções distintas quanto aos direitos humanos, direitos da criança e do adolescente e o
papel das entidades não governamentais, entre outras, parecem exigir a superação e a abertura
para alterações conceituais e de práticas de participação política. Para Boaventura de Sousa
Santos (2005), os problemas modernos87 necessitam de soluções que ainda não existem, sendo
necessário inventá-las ou “reinventar a emancipação social”, uma vez que, em contexto de
profundas transformações, as respostas têm que ser dadas em nível capaz de promover
mudanças igualmente profundas. O desafio é produzir a complementaridade entre as
democracias representativa e participativa 88, em superar o confronto que se dá na atualidade
entre ambas as formas, em que a primeira rejeita a legitimidade da segunda, levando,
inclusive, ao desestímulo desta. Está em causa nesse processo “a constituição de um ideal
participativo e inclusivo como parte dos projetos de libertação do colonialismo” (SOUSA

87
Para Sousa Santos, os problemas modernos se relacionam diretamente como novo regime de acumulação do
capital expresso pela globalização neoliberal, que “dissocializa o capital, libertando-o dos vínculos sociais e
políticos que no passado garantiram alguma distribuição social” (SOUSA SANTOS, 2005, p. 30). Além disso,
esse regime, mais intenso que no passado, promove a submissão da sociedade ao valor de que toda atividade é
mais organizada se estiver atrelada e organizada sob as regras do mercado. Em ambas as situações, as
consequências nefastas são a “distribuição extremamente desigual dos custos e de oportunidades produzidos pela
globalização neoliberal no interior do sistema mundial, com aumento das desigualdades sociais entre países ricos
e pobres e entre ricos e pobres no interior do mesmo país” (SOUSA SANTOS, 2005).
88
Para aprofundar esse debate, ver Boaventura de Sousa Santos, em “Democratizar a Democracia: os caminhos
da democracia participativa”.
87

SANTOS, 2005, p. 57), o que implica questionar uma gramática social e estatal de exclusão e
propor, como alternativa, outra gramática social, mais inclusiva (SOUSA SANTOS, 2005).
Com base na relação entre a prática política e o direito consubstanciado na lei, ou
seja, na atuação dentro dos cânones da legalidade, Antônio Carlos Wolkmer afirma que “é
fundamental destacar, na contemporaneidade, as novas formas plurais emancipatórias e contra
hegemônicas de legitimação do Direito” (WOLKMER, 2008, p. 180). Nesse sentido,
Wolkmer considera ainda que o empenho maior que se deve ter frente ao cenário de
mundialização neoliberal, sem deixar de estar consciente e de agir no âmbito cultural da
diversidade e da legitimidade local, é

repensar um projeto social e político contra-hegemônico, capaz de reordenar as


relações tradicionais entre Estado e Sociedade, entre o universalismo ético e o
relativismo cultural, entre a razão prática e a filosofia do sujeito, entre o discurso de
integração e de diversidade, entre as formas convencionais de legalidade e as
experiências plurais não formais de jurisdição (WOLKMER, 2008, p. 179).

Com isso, Wolkmer (2008) chama a atenção para a necessidade de se ter consciência
e de lutar contra imposições padronizadas. Sugere o pluralismo democrático como
instrumento de luta para combater as mazelas da globalização e legitimar, como estratégia
contra-hegemônica, a afirmação dos direitos humanos emergentes. Apesar de todas as
ponderações, a interferência direta dos indivíduos e da sociedade civil na tomada de decisão
sobre as políticas públicas, típica do modelo de administração participativa, enuncia o
coroamento da democracia participativa (CAPACITASUAS, CADERNO I, 2013, p. 130),
necessitando apenas a sua colocação em prática efetiva.
Embora não se possa afirmar que se enraizou essa concepção de participação nos
Fóruns DCA e no Fórum DCA-SE especificamente, no período estudado, os fóruns em geral
atuam para o incentivo à ocupação dos espaços de discussão e deliberação de políticas
públicas para que estes sejam ocupados de forma efetiva e crítica por parte dos atores sociais,
que devem desenvolver a capacidade de construir consensos e lidar com os dissensos.
Denota-se que, apesar dos ganhos na letra da lei, na prática, a cultura da democracia
participativa ainda é um desafio que precisa ser estimulado, aprendido e fortalecido, seja nos
conselhos, seja nos Fóruns DCA. No caso dos conselhos, na percepção de Vitalle, há uma
compreensão por parte dos fóruns de que estes

contribuem para a extensão horizontal da democracia, isto é, do lócus onde esta


ocorre, na medida em que permitem a participação política diretamente na gestão de
políticas públicas. A criação desses instrumentos possibilita, assim, a
democratização de outro espaço de poder, a administração pública, introduzindo
88

uma nova cultura política, menos hierarquizada e mais aberta aos anseios da
sociedade civil (VITALLE, 2011, p. 14).

É no sentido de atuar pelo fortalecimento desses espaços de participação da


sociedade civil e dela própria que a atuação dos movimentos sociais, dos sindicatos e,
especificamente, dos fóruns de direitos da criança e do adolescente se faz relevante. No caso
de Sergipe, para uma interlocução consolidada com os conselhos de direitos estadual e
municipal de Aracaju, o Fórum DCA-SE, principalmente nos anos de 2005 a 2009, atuou
compreendendo que o exercício do controle social representa o compartilhamento do poder
pela sociedade civil, que o efetiva por meio de ação junto a órgãos e entidades estatais na
elaboração e execução de políticas públicas para a infância e a adolescência. O fortalecimento
dos conselhos constitui pauta importante para o do Fórum DCA-SE.
As principais diferenças entre o Fórum DCA-SE e os conselhos de direitos passam
pela composição e pela própria natureza de cada um dos espaços. Enquanto os conselhos de
direitos são órgãos do Estado, o Fórum DCA-SE é de natureza não estatal e de participação
exclusiva da sociedade civil. Qualquer representante de entidade não governamental que atue
com crianças e adolescentes pode integrar esse espaço. Sua função é mobilizadora e
aglutinadora de agentes sociais com fomento à reflexão crítica sobre a realidade política que
envolve a criança e o adolescente e do pleno exercício do controle social sobre as políticas
públicas direcionadas a esse segmento da população. Em complemento, operacionaliza sua
participação em um contexto dialético e, portanto, repleto de contradições, conflitos e tensões
que, por outro lado, também o constituem como lugar de oportunidade e possibilidade de
formação político-pedagógica, seja em reuniões internas, seja na atuação externa em
processos de reivindicação de direitos.
Por não estar vinculado ao Estado, o Fórum DCA pode atuar com autonomia frente a
governos e autoridades estatais, embora, na sua atuação, tenha-se restringido à interlocução
institucional, sobretudo à ação junto ao Estado para evitar a perda de direitos e/ou tornar
efetivos aqueles legalmente reconhecidos, ou seja, não tem sido e não foi, no período
estudado, uma atuação para além do Estado, com vistas à construção de transformações
sociais e estruturais profundas.
Apesar disso, levando em conta a dinâmica na totalidade do processo, não se pode
deixar de pontuar que a criação dos conselhos de direitos em todos os Estados do país e em
quase todos os municípios é um avanço quanto à possibilidade de envolvimento da sociedade
civil no debate de questões relativas a um segmento da população que deve ter a prioridade
absoluta da ação governamental. Esses espaços foram pensados por pressão da própria
89

sociedade civil, que se colocou na condição de ator estratégico para a construção conjunta da
política pública, sem abrir mão de outras formas de organização exclusivamente da sociedade
civil, como o Fórum DCA-SE89.
Nesse contexto, os representantes do Fórum DCA-SE assumem a responsabilidade
de manter sintonia em sua ação política, provocando debates e reflexões que envolvem sua
organização interna, seus instrumentos emancipatórios e inibidores de participação, além de
buscar compreender a dinâmica estatal e as contradições da relação Estado-sociedade,
promover denúncias de violações de direitos e compartilhar informações sobre a realidade
vivenciada pelas crianças e adolescentes nas ONG,’s e nas entidades públicas de
atendimento. Em complemento, o Fórum DCA-SE ajuda a construir alternativas coletivas,
tendo como meio a promoção de diálogos interinstitucionais e com outros movimentos
sociais, sindicatos, conselhos e gestores públicos.
Especificamente sobre a relação do Fórum DCA-SE com os conselhos de direitos
(CEDCA-SE e CMDCA-Aracaju), depois de criados com a contribuição do Fórum DCA-SE,
no início dos anos de 1990, essa rede da sociedade civil se desarticulou, conforme será
explanado no próximo item. No entanto após sua reorganização, nos anos 2000, preponderou
uma relação de recíproca, porém crítica, parceria pela efetivação dos direitos humanos
infanto-juvenis. Os documentos analisados, como atas de reunião, resoluções, regimento
interno do CEDCA-SE e alguns documentos do CMDCA-Aracaju, além de relatórios do
Fórum DCA-SE, bem como registros feitos por alguns veículos da mídia sergipana 90 ,
mostram que, principalmente do período de 2005 a 2009, o Fórum DCA-SE contribuiu para a
efetividade do trabalho de ambos os conselhos. Essa atuação passou também pela construção
conjunta de modelos de conferências dos direitos da criança e do adolescente, em âmbito
municipal e territorial, bem como pela formação de jovens, publicação de notas conjuntas91,
formação de conselheiros da sociedade civil sobre orçamento público e reuniões conjuntas do
Fórum DCA-SE, do CEDCA-SE e do CMDCA-Aracaju, entre outras iniciativas.
Por haver constantes discussões, sobretudo entre conselheiros não governamentais
integrantes do Fórum com outros membros de articulação da sociedade civil sobre as pautas
e/ou temas debatidos nos conselhos, em vários momentos, deu-se um nivelamento crítico de
89
Os conselhos de direitos representam espaços legítimos desse exercício ainda em disputa, considerando que a
sua criação e implantação nos Estados e municípios, nos moldes previstos em lei, não representam efetivamente
a concretização de uma cultura participativa para a promoção dos direitos sociais, mas uma tentativa de
implementação.
90
Ver Apenso A desta dissertação.
91
Disponível no CEDCA-SE. Ata da 5ª (quinta) Reunião Ordinária do Conselho Estadual dos Direitos da
Criança e do Adolescente. Pauta: reunião conjunta com CMDCA-Aracaju para tratar das medidas
socioeducativas de privação de liberdade para adolescentes. Aracaju, 27 de maio de 2009.
90

concepções sobre a infância. Isso refletia no posicionamento político institucional, ainda que
esse acordo sobre os fundamentos e as práticas a serem desempenhadas pelos órgãos se desse
de forma temporária.
Assim, atuando com papéis bem definidos: os conselhos encarregados por deliberar
sobre a política pública e o Fórum DCA-SE responsável por articular a participação da
sociedade civil, tanto nos conselhos quanto em espaços externos a ele, além de incentivar o
exercício do protagonismo social quanto à formulação e execução de políticas públicas, este
adotou, como uma de suas principais estratégias político-pedagógicas, a incidência sobre
esses espaços, como se verá adiante.
Por não estar vinculado ao Estado, sem se confundir com órgão ou entidade do poder
público, o Fórum DCA pôde atuar com maior autonomia frente a governos e autoridades
estatais, embora, na sua atuação, tenha-se restringido à interlocução institucional, sobretudo à
ação junto ao Estado para evitar a perda de direitos e/ou promover a efetivação daqueles
legalmente reconhecidos, ou seja, não vem sendo e não foi, no período estudado, uma atuação
para além do Estado, com vistas à construção de transformações sociais e estruturais
profundas. Para Gohn, essa característica parece ser uma vantagem dos movimentos sociais
contemporâneos.
Ao analisar, por exemplo, a relação entre sociedade civil e os conselhos da área da
educação, Gohn afirma:

A exigência de uma democracia participativa deve combinar lutas sociais com lutas
institucionais e a área da educação é um grande espaço para essas ações, via a
participação em conselhos, fóruns e, no novo século, em conferências nacionais.
Consideramos estes últimos como parte de um novo modo de gestão dos negócios
públicos – que foi reivindicado pelos próprios movimentos sociais nos anos 80,
quando eles lutaram pela democratização dos órgãos e aparelhos estatais –; eles
fazem parte de um novo modelo de desenvolvimento que está sendo implementado
em todo o mundo – da gestão pública estatal via parcerias com a sociedade civil
organizada objetivando a formulação e o controle de políticas sociais; eles
representam a possibilidade da institucionalização da participação via uma de sua
forma de expressão – a cogestão; a possibilidade de desenvolvimento de um espaço
público que não se resume e não se confunde com o espaço governamental/estatal; e,
finalmente, a possibilidade da sociedade civil intervir na gestão pública via parcerias
com o Estado. Os conselhos ampliam o espaço público, sendo ainda agentes de
mediação dos conflitos. Como tal, carregam contradições e contraditoriedades.
Podem alavancar o processo de participação de grupos organizados como podem
estagnar o sentimento de pertencimento de outros – se monopolizados por
indivíduos que não representem de fato as comunidades que os indicaram/elegeram.
Eles não substituem os movimentos de pressão organizada de massas, que ainda são
sempre necessários para que as próprias políticas públicas ganhem agilidade
(GOHN, 2013, p. 242).

É válido considerar que, mesmo ressaltando a importância das análises de Gohn para
entender o Fórum DCA-SE no período de 2000 a 2009, como proposto neste trabalho,
91

sobretudo por ser Gohn uma referência no campo dos estudos sobre espaços de participação,
como fóruns e conselhos, é preciso lançar uma divergência teórica quanto a suas ideias.
Primeiro, não parece adequado classificar redes de articulação, como fóruns de defesa de
direitos, como “movimentos sociais”, mesmo que sob novos formatos.
O Fórum DCA-SE, por exemplo, não tem a capacidade de mobilização de massas
própria dos movimentos sociais e, também, não coloca em debate a maneira como está
constituída a ordem social. No máximo, consegue levantar alguns pontos para debates
públicos de concepções, porém, parece absorver os efeitos da relação que o Estado impõe à
sociedade civil, a quem é atribuída responsabilidade pelo atendimento direto a crianças e
adolescentes, o que a coloca em uma situação de pragmatismo. O debate se acomoda às
preocupações com a promoção cotidiana e com a administração de conflitos acerca do que
acaba se tornando “prestação de serviços” na perspectiva de consumo de políticas públicas.
Nesses moldes, a luta política acaba limitada à ação para evitar a perda direitos e, em
alguns casos, para impedir a perda e/ou redução de recursos públicos para o desempenho de
ações de atendimento. Do mesmo modo, a noção de gestão delineada na citação acima parece
invocar um formato de tomada de decisão governamental que a confunde com
“gerenciamento” do que se chama “negócios públicos”. Com isso, insere-se a participação da
sociedade civil em um contexto que anula a compreensão dos problemas sociais em meio à
análise de como está estruturada toda a sociedade, além de reduzir os processos de
reivindicação ao que se poderia chamar de reivindicação de direitos situada no espaço do
Estado. Em outras palavras, ao pensar a participação nesses moldes, a autora não se
desvencilha da forma neoliberal de relação entre Estado e sociedade civil (LYRA FILHO,
1980).
No caso do Fórum DCA-SE, essa modalidade de ação política compreendida dentro
do que Gohn (2013) denomina “gestão dos negócios públicos” representa uma limitação de
sua própria práxis. Do ponto de vista da luta política, percebe-se que a atuação do Fórum em
estudo não se deu para criar nada novo. Talvez, sua ação tenha sido importante para manter
direitos e, com isso, evitar retrocessos nas políticas públicas. Por essa razão, é possível
afirmar que o Fórum DCA-SE se coloca em uma linha de ação que, no fundo, é desenhada
pelo próprio Estado, especialmente, porque essa articulação de entidades não governamentais
não atua no campo da tentativa da superação da ordem estabelecida, mas projeta uma ação
dentro dessa ordem, para colocar em prática o que está previsto na lei, sem apontar para
possibilidades além disso.
92

Com base no método de análise proposto pelo materialismo histórico-dialético,


portanto, procurando refletir sobre os limites e as potencialidades do Fórum DCA-SE dentro
da história e do contexto social em que está inserido, é possível afirmar que, em uma
conjuntura em que a mobilização política e o poder popular estão reduzidos, fica difícil
encontrar espaço para uma construção coletiva que vise mudanças mais estruturais do ponto
de vista da luta de classes e para uma atuação que se pense para além dos marcos definidos
pelo próprio Estado.
Por um lado, o poder público transfere para a sociedade civil a responsabilidade
sobre a execução direta de políticas públicas, condiciona a sua sobrevivência institucional ao
recebimento de recursos estatais para que possa atender, com um montante reduzido, uma
demanda crescente de crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, e, sob essas
condições, impõe limites às entidades não governamentais no processo de negociação de
tomada de decisões públicas. Por outro lado, estando as organizações da sociedade civil mais
voltadas para a execução direta da ação do poder público, sua preocupação se volta para o
debate sobre o atendimento. Estabelecem-se sobre a coletividade problemas de ordem prática,
como o número de crianças e adolescentes atendidos, a quantidade de recursos para o
desempenho de atividades, a prestação de contas, meios de captação de recursos, entre outros.
Parece ocorrer uma limitação à autonomia política das ONGs e do Fórum que elas
constituem. Afinal, as possibilidades de construção e mobilização política coletiva se reduzem
diante do pragmatismo que se instaura nesse processo, o que obriga o Fórum DCA a atuar
apenas como meio para evitar a perda de direitos. Sem desconhecer essas limitações dadas
pelo contexto sócio-histórico-político, é importante compreender a ação do Fórum e suas
estratégias. Não é porque no seio da pesquisa se descobre que a ação junto ao Estado pode
restringir o impacto de uma práxis política que esta perde a necessidade de ser compreendida.
Ao contrário, é preciso estudá-la sem perder de vista as circunstâncias em que se deu, até para
que seus atores, em contato com as conclusões de pesquisa, se as considerarem plausíveis,
possam conscientizar limites e criar mecanismos para estimular potencialidades desse espaço
de articulação. Nesses termos, adiante, serão identificadas as estratégias político-pedagógicas
do Fórum DCA-SE relativas a sua trajetória de existência na sua relação com o Estado e
dentro dos limites que essa relação estabelece.
93

4.2. Fomento da Participação Social na Promoção dos Direitos Humanos Infanto-


Juvenis: Trajetória e Estratégias Político-Pedagógicas do Fórum DCA-SE

O Fórum DCA-SE, inicialmente, era constituído por representantes da sociedade


civil e do poder público. Sua atuação, na década de 1990, se centrou basicamente na criação e
no funcionamento dos conselhos de direitos (CEDCA-SE e CMDCA Aracaju). Logo após,
houve processo de desarticulação, uma vez que as entidades, de modo geral, passaram a focar
a sua participação apenas nos novos órgãos criados. Em artigo publicado pela Revista Tempos
e Espaços em Educação, um dos fundadores do Fórum DCA-SE, Robson Anselmo, relata
que:

Após a criação da lei estadual e municipal de Aracaju e, finalmente, a criação dos


conselhos de direitos, o Fórum DCA-SE naturalmente se desarticula, passando as
entidades a se reunirem apenas no conselho de direitos de Aracaju, que no cotidiano,
percebia a importância de uma qualificação dos conselheiros de direitos, dos
representantes das entidades de atendimento na formação política de participação
ativa nas discussões relativas à infância, e novamente passa a existir um novo
movimento de retomada e tentativa de rearticulação do Fórum DCA-SE, dessa vez
mobilizada pelas entidades da sociedade civil e não mais pelo município, em
especial pela SACI e MNMMR e contando com a participação exclusiva de
representantes da sociedade civil e não mais de ambos os órgãos, resultando na
elaboração do Regimento interno e assinatura pelas entidades da Carta de Princípios
do Fórum DCA-SE (...) (ANJOS, 2010, p.172).

Foi somente no ano de 2000 que se formalizou o processo de rearticulação e


reorganização do Fórum DCA-SE, como consequência das investidas do MNMMR-SE e da
SACI para motivar as entidades da sociedade civil a entenderem a importância da participação
social. A cultura assistencialista de muitas entidades não governamentais, no trato com as
questões relacionadas à infância, denotando pouca compreensão sobre a concepção do sujeito
de direitos e da própria política de Assistência Social, fomentou o desafio da qualificação dos
atores da sociedade civil para uma participação mais efetiva nesse processo.
Vale destacar que a Lei Orgânica de Assistência Social - LOAS propiciou, em com a
Constituição Federal e o ECA, campo fértil para a existência de espaços democráticos de
participação popular. Além dos avanços nas questões que envolvem a defesa de direitos e os
novos espaços de participação da sociedade civil, a gestão de políticas sociais foi
redimensionada para outra lógica de formulação e execução destas.
Direcionou-se para uma condição de política pública enquanto dever do Estado e
direito do cidadão, sob o modelo descentralizado do Sistema Único de Assistência Social –
SUAS e a Política Nacional de Assistência Social – PNAS, e não mais como uma “caridade”
(perspectiva assistencialista) de quem oferta o serviço, “por reconhecer que superar uma dada
94

necessidade é do âmbito do dever do Estado e não uma concessão de mérito eventual face a
uma fragilidade de um indivíduo” (CAPACITASUAS, CADERNO I, 2013, p. 22).
Esse novo modelo orientou toda iniciativa, seja do poder público ou da sociedade
civil, no que tange à oferta de serviços públicos direcionados aos grupos vulneráveis, em
específico a criança e o adolescente, quanto às “funções de proteção social, vigilância social e
defesa de direitos socioassistenciais” (CAPACITASUAS, CADERNO I, 2013, p. 62). Essa
discussão deve permear sempre os espaços deliberativos de políticas públicas ou de entidades
que se propõem a realizar o controle social. O objetivo é romper com a lógica assistencialista
de prestar serviço a crianças e adolescentes para efetivar mecanismos potencializadores dos
sujeitos em sua dimensão coletiva, tendo como fundamento a realização de direitos.
Sendo assim, o Fórum DCA-SE, provocado por suas coordenações, atuou nessa
direção motivando as entidades sociais a refletirem sobre sua atuação imediata no campo da
política de atendimento e, com isso, assumirem uma preocupação com o cumprimento de
direitos de todas as crianças e adolescentes do município de Aracaju e do Estado de Sergipe.
Nesse contexto da dinâmica da política pública para a infância, o Fórum buscou orientar
também as entidades filiadas sobre a necessidade de adequação das instituições de
atendimento aos pré-requisitos exigidos pela lei, contribuindo também com a função
fiscalizadora do CMDCA Aracaju92.
Entre os anos de 2000 e 2009, o Fórum DCA-SE utilizou estratégias políticas e
pedagógicas que, do ponto de vista do investimento na participação social, permitiram a
possibilidade conjunta de conferências, reuniões, denúncias e formação técnica e política,
entre outras. Essas ações colocaram o Fórum DCA-SE em lugar de destaque no cenário
político sergipano e o transformaram em ator estratégico na política infanto-juvenil do Estado.
A retomada do processo de articulação, fundado na qualidade da participação das
entidades da sociedade civil nos espaços institucionais, se deu no ano 2000, quando a
coordenação do Fórum DCA-SE foi assumida pelo MNMMR-SE 93 e pela SACI (essa

92
Os conselhos municipais da criança são os órgãos responsáveis pela concessão de registros às organizações da
sociedade civil sediadas em sua base territorial, que prestam atendimento a crianças e adolescentes e suas
respectivas famílias, bem como monitoram as ações das entidades de atendimento para efetivação do PNAS
(CONANDA, 2007, p.23).
93
De modo geral, é o MNMMR que instiga a criação do FNDCA e posteriormente contribui com o FNDCA para
a criação e fortalecimento dos demais Fóruns estaduais. A existência do MNMMR em quase todos os Estados
brasileiros facilitou todo o processo de articulação para a criação e fortalecimento dos Fóruns DCA nacional e
estaduais. Por ser seu fomentador mais expressivo assume as primeiras coordenações desses espaços nos locais
onde foram criados. De acordo com Darlene Silveira (2008), “o MNMMR torna-se um importante articulador,
em 1988, da formação do Fórum Nacional Permanente de Entidades Não governamentais de Defesa dos Direitos
da Criança e do Adolescente – Fórum DCA. Este Fórum expressa a necessidade de “uma articulação nacional de
95

coordenação se estendeu até meados de 2004, ano em que ocorreu o fechamento do


MNMMR-SE). Durante esse período, as ações do Fórum DCA-SE se voltaram
eminentemente para o estímulo e a formação política das entidades, com vistas a que
ocupassem, sobretudo, os conselhos de direitos. Por outro lado, o Fórum se ocupou com a sua
própria organicidade, partindo assim para a produção de regimento interno, carta de princípios
e outros documentos que podiam configurar essa articulação. Nesse período, algumas
entidades, que já participavam ativamente dos Conselhos (estadual e municipal de Aracaju)
passaram a compreender a necessidade de também estarem organizadas em um espaço
exclusivo da sociedade civil – o Fórum DCA-SE. O fechamento do MNMMR-SE provocou
outro momento de dispersão no coletivo do Fórum DCA-SE.
Aos poucos, as entidades se desarticularam e abriram uma lacuna na atuação política
organizada pela infância e adolescência no Estado de Sergipe. A partir daí, passou a ser um
desafio, assumido principalmente pela SACI, na pessoa do seu então presidente, constituir
uma nova coordenação e manter a ação política do Fórum 94 . Mais uma vez, na linha de
raciocínio de Maria da Glória Gohn (2005), o Fórum passou por novo período de refluxo.
Para GONH (2010), “A presença dos movimentos sociais é uma constante na história política
do país, mas ela é cheia de ciclos, com fluxos ascendentes e refluxos (alguns estratégicos, de
resistência ou rearticulação em face à nova conjuntura e às novas forças sociopolíticas em
ação)” (GOHN, 2010, p.41).
Somente em 2005, após várias investidas para que algumas entidades filiadas se
responsabilizassem pela rearticulação do Fórum DCA-SE, a Legião da Boa Vontade - LBV
foi assumindo a coordenação provisória dessa rede de entidades e contou, principalmente,
com a colaboração inicial do LICRE - Lar Infantil Cristo Redentor e da UBM - União
Brasileira de Mulheres e, posteriormente, do Instituto Recriando e Centro Dom José Brandão
de Castro. Embora não tivesse sido formalmente eleita, a LBV, com o apoio tácito das
organizações que frequentavam as reuniões para recompor o Fórum e sua coordenação, além
de militantes da causa com apoio político, assumiu provisoriamente e permaneceu na
articulação da rede em 2005 e 2006. Ao final desse período, quando ocorreu a eleição para

entidades atuantes na área de defesa e promoção dos direitos da infância e juventude”, cujos propósitos
voltavam-se também para a “alteração no plano legal ” (DARLENE SILVEIRA, 2008, p. 45).
94
Sobre o assunto é válido ressaltar que, ao assumir a coordenação provisória do Fórum DCA-SE em 2005, não
foi encontrado qualquer registro de memória de reunião do Fórum DCA-SE produzido pela coordenação
anterior, salvo o regimento interno e a carta de princípios. O que se sabe em relação a esse processo de
desarticulação do Fórum DCA-SE, em virtude do fechamento do MNMMR-SE, é através de memórias obtidas
por diálogos informais com o ex-presidente da SACI, Robson Anselmo, também integrante do MNMMR-SE.
96

compor a coordenação definitiva do Fórum DCA, nos moldes regimentais95, e a LBV foi
escolhida para coordenar o Fórum até 200996.
No que concerne às estratégias97 , quatro preocupações se destacaram no fazer do
Fórum entre constituição e retomadas: 1- a incidência política do Fórum DCA-SE sobre os
conselhos de direitos da criança e do adolescente; 2 - a construção da unidade a partir da
formação do sujeito individual e coletivo; 3 - a conquista da visibilidade pública do Fórum
DCA-SE enquanto espaço fundamental de intervenção na área infanto-juvenil de Sergipe pela
ocupação dos espaços políticos e meios de comunicação; e, por fim, 4 - a realização constante
da denúncia qualificada das violações de direitos humanos infanto-juvenis no Estado de
Sergipe. Sobre cada uma dessas estratégias, discorrer-se-á adiante, buscando analisá-las com
base em referenciais críticos da teoria social.

4.2.1. Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente: A Incidência Política do Fórum DCA-SE

Para realizar essa estratégia, o Fórum DCA-SE utilizou, como tática política,
constituir-se enquanto colegiado eleitoral das entidades a disputarem os referidos conselhos.
Isso foi possível devido às próprias orientações do CONANDA e do FNDCA e à atuação
articulada das entidades da sociedade civil com os conselhos do Estado e do município de
Aracaju. Em 2005, o Fórum DCA-SE articulou a escolha das entidades não governamentais
para compor o CMDCA-Aracaju. Estando no conselho, as entidades filiadas ao Fórum DCA

95
O Fórum DCA-SE conta em sua organização também com a expedição de atos normativos, cujo fim é
publicizar suas decisões coletivas. Os atos normativos dispõem sobre organização de eleição do Fórum DCA-SE,
bem como convocação de assembleias ordinárias e extraordinárias para realização de eleição da coordenação,
elaboração de planejamento estratégico, de critérios de filiação ao Fórum DCA-SE, entre outros. Para participar
das reuniões do Fórum DCA-SE, por exemplo, a entidade não precisa necessariamente ser registrada em algum
conselho. Após a filiação, essa iniciativa é fomentada a todo o tempo. No caso da coordenação do Fórum DCA-
SE, somente podem assumi-la as entidades que: “forem registradas no Conselho Municipal dos Direitos da
Criança e do Adolescente-Aracaju”, conforme, art. 5º do Ato normativo nº 001/2006, do Fórum DCA-SE que
dispõe sobre o processo de eleição da coordenação colegiada do Fórum.
96
No início da coordenação provisória exercida pela LBV, havia cinco entidades filiadas ao Fórum DCA-SE,
que eram aquelas que compareciam às reuniões convocadas para tratar da reorganização do Fórum. Ao final de
2009, estavam filiadas à articulação trinta e cinco instituições.
97
Para colocar em prática as estratégias, por exemplo, de ocupar espaços de participação política da sociedade
civil, o Fórum DCA-SE participou de debates e atividades, como reunião descentralizada do CONANDA; posse
da nova presidência do Tribunal de Justiça; discussões sobre o reordenamento dos abrigos, através da Casa Santa
Zita e Cristo Redentor; da alteração da resolução do CMDCA-Aracaju sobre o desempenho das funções do
Conselho Tutelar; coordenou a eleição de representantes da sociedade civil do CEDCA e CMDCA-Aracaju;
integrou o seminário regionalizado de avaliação dos 18 anos do ECA, ocorrido em Recife, com a participação de
vinte representantes; além de fiscalizar as unidades de cumprimento de medidas socioeducativas de Sergipe.
Outra ação do Fórum foi o incentivo ao protagonismo juvenil, com a realização de formação continuada
exclusivamente para adolescentes, realização de oficinas de construção de propostas de adolescentes em
conferências Estadual, territoriais e municipais. Em 2007, o Fórum DCA-SE mobilizou-se para garantir a
participação de adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de internação nas conferências. Pela
primeira vez na história de Sergipe, houve adolescentes nessa condição como delegados nas conferências
municipal de Aracaju, estadual e nacional dos direitos da acriança e do adolescente.
97

passaram a intervir na formulação da política municipal diretamente por meio da aprovação


de resoluções.
Normalmente, decisões importantes dos conselhos gestores excedem seus limites e
encontram dificuldades para se perpetuar, necessitando, em função dessa realidade, do
diálogo dos órgãos com o poder legislativo para transformar ideias e resoluções em leis
municipais, ampliando as discussões sobre o objeto de deliberação e aprimorando-o98.
Na ampliação desse diálogo, a sociedade civil exerce papel fundamental: “ao
interagir nos conselhos, a sociedade pode favorecer a transparência das ações governamentais,
a mudança de práticas e concepções e, ainda, a coerência e a viabilidade de programas
públicos” (OLIVEIRA, PEREIRA e OLIVEIRA, 2010, p. 434). Como dito, essa iniciativa
foi estimulada pelo próprio CONANDA e o FNDCA. Ambos orientavam essa forma de
organização como estratégia para fortalecer espaços de participação da sociedade civil, em
especial os Fóruns DCA existentes. Essa prática foi orientada pelo CONANDA, em 2007,
com a seguinte diretriz:

Para a representação da sociedade civil, as entidades deverão ser escolhidas por


meio da organização de um fórum próprio, ou do Fórum de Defesa da Criança,
quando este já existir. Nesse caso, será preciso constituir uma Comissão
Organizadora do Processo de Escolha, que ficará encarregada de convocar e
conduzir a assembleia para a sessão dos representantes. Esta comissão – deve ser
composta exclusivamente por representantes da sociedade civil (CONANDA, 2007,
p. 33).

Em 2006, o Fórum DCA-SE ocupou indiretamente a presidência do CEDCA-SE,


através do representante da OAB, que participava das reuniões do Fórum. Diz-se
indiretamente porque, apesar de seu presidente eleito participar dos processos de articulação e
debate de ideias no Fórum, as entidades integrantes do CEDCA-SE são definidas em lei99.
Somente no curso desse mandato, deu-se a alteração da lei estadual que trata do conselho de
direitos para permitir a rotatividade na representação da sociedade civil e a constituição do
Fórum como colégio eleitoral próprio para essa escolha. Por outro lado, a ocupação indireta
da presidência se deveu ao fato de o Fórum DCA-SE não estar constituído no formato de uma

98
Sobre este assunto ler, OLIVEIRA, Virgílio Cézar da Silva e; PEREIRA, José Roberto; OLIVEIRA, Vânia A.
R. DE. Os conselhos gestores municipais como instrumentos da democracia deliberativa no Brasil. CADERNOS
EBAPE. BR, v. 8, nº 3, artigo 3, Rio de Janeiro, set. 2010 p. 422-437.
99
Por meio da Resolução nº 06/2007, o CEDCA-SE manifesta a necessidade de alteração da Lei 3.062, de 1991,
que trata da criação do Conselho Estadual, para que não mais devam existir entidades fixas como membros do
órgão. Em 2008, a Lei 6.446 foi aprovada na Assembleia Legislativa de Sergipe nos termos da resolução nº
06/2007. Isso demonstra a atuação das entidades do Fórum DCA-SE para o fortalecimento da política pública
para criança e adolescente em Sergipe, uma vez que a Lei democratiza o processo de composição do CEDCA-SE
e abre espaço para a constituição do Fórum DCA-SE como colégio eleitoral para a escolha das entidades da
sociedade civil (Art. 4º, II).
98

entidade, o que constituía impedimento para seu assento no conselho. Sua atuação se deu por
meio das entidades filiadas e parceiras que carregavam consigo as concepções e pautas
elaboradas e pactuadas no espaço de articulação da sociedade civil.
Contar com um representante da sociedade civil na presidência do CEDCA-SE,
atuando articuladamente com o Fórum DCA-SE, favoreceu o fortalecimento da participação
social em prol da infância, uma vez que esse ator estratégico tinha a compreensão política do
papel de ambos os espaços. Essa relação trouxe como resultado também uma atuação mais
politizada do próprio conselho em sua dimensão externa. O próximo passo foi eleger as
entidades da sociedade civil para compor o conselho com instituições que participavam
constantemente das discussões sobre a infância no Fórum DCA-SE como colégio eleitoral100.
No âmbito do CMDCA-Aracaju, as entidades conselheiras já haviam sido eleitas a
partir de um pacto estabelecido internamente no Fórum DCA-SE em 2005. Faltava apenas a
formalização dessa escolha por meio do colégio eleitoral e a eleição para a presidência com o
apoio do Fórum DCA-SE, o que se concretizou em 2007.
As entidades conselheiras apoiadas pelo Fórum DCA-SE buscavam intervir e
participar das deliberações desse coletivo atentas ao que era pactuado coletiva e
antecipadamente pela própria sociedade civil organizada, levando em consideração a doutrina
da proteção integral à criança e ao adolescente e a PNAS. Uma tática utilizada pelo coletivo
foi realizar, antes e/ou após as reuniões de ambos os conselhos, discussões internas acerca dos
temas e da conjuntura política do Conselho específico, de modo que os conselheiros da
sociedade civil compartilhassem com as demais entidades integrantes do Fórum DCA-SE os
conteúdos debatidos nas reuniões e suas dinâmicas. Com isso, o coletivo avaliava e definia
novas estratégias de inserção, reflexão, introdução de novas pautas e intervenções que
entendia necessárias.
Quanto ao CEDCA-SE, os registros demonstram que, nos períodos compreendidos
entre os anos de 2007 a 2009, sua gestão aprovou o maior número de resoluções com
preponderância direta para a política pública infanto-juvenil, diferentemente de anos

100
Ainda em 2008, através da Resolução nº 015/2008, o CEDCA-SE regulamentou o processo de escolha das
entidades da sociedade civil para ocupar vagas no Conselho. Por esse ato, o Fórum DCA-SE passou a ser o
colégio eleitoral das entidades da sociedade civil. Isso somente ocorreu porque as organizações conselheiras do
CEDCA representantes não governamentais eram também membros do Fórum DCA-SE e defenderam ser esse
espaço o mais apto para sediar essa escolha, uma vez que, além de ser um lugar de formação, também permitia
reconhecer as instituições mais preparadas para o exercício da representação da pauta da infância e da
adolescência frente ao governo.
99

anteriores, em que as resoluções tratavam quase exclusivamente do funcionamento interno do


Conselho e do Fundo Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente101.
A partir de pesquisa realizada por Tatagiba em 2002, é possível observar que esse
fenômeno parece se repetir em todo o Brasil, pois, quando da implantação dos conselhos e
primeiros anos de seu funcionamento, havia uma preocupação mais voltada para a
organização interna: “os temas mais relacionados ao controle social, ao desenho da política
pública ou as prioridades de investimento público, apesar de importantes, eram menos
presentes nas pautas de discussão dos conselhos” (ALMEIDA e TATAGIBA, 2012, p. 25).
Na década de 1990, houve um grande investimento dos movimentos, das ONGs, das
universidades e do governo no sentido de que os conselhos completassem seu processo de
institucionalização com a elaboração de suas regras internas. Isso se refletiu no predomínio de
temas mais burocráticos e técnicos do ponto de vista da organicidade desses espaços, o que
era esperado, visto que se tratava de criar a própria estrutura participativa (ALMEIDA e
TATAGIBA, 2012).
Nos anos posteriores, essa tendência de uma atuação voltada para dentro continuou e
“as questões relativas à relação do conselho com seu ambiente externo foram pouco
debatidas” (ALMEIDA e TATAGIBA, 2012, p. 85).
Em Sergipe, no entanto, essa interlocução entre conselho e Fórum DCA-SE permitiu
que as reuniões passassem a contar com um maior número de representantes da sociedade
civil, para além dos conselheiros. Além disso, o poder público, compreendendo a importância
do espaço e pressionado pelo Fórum DCA-SE, viu-se na iminência de também fomentar a
participação de seus representantes (em muitos momentos, intensificou-se o campo de
tensões, de acordo com a preponderância de concepções mais emancipatórias em torno de
algumas pautas). Nesses termos, é possível afirmar que o Fórum DCA-SE contribuiu para o
processo de politização do conselho. As mudanças na forma de atuar do conselho estadual
deslocaram a dinâmica interna de exclusiva ou quase exclusivamente técnica, operacional e
burocrática para uma dimensão política.
Se, por um lado, permitiu a assunção de sua função efetiva de pensar a realidade de
crianças e adolescentes sergipanos fazendo o contexto local interagir com o contexto geral do
país, por outro, deu-se a inserção do Conselho da Criança e do Adolescente em um contexto
concreto de democracia, tanto pela abertura à participação quanto pela função que assumiu de
ser meio de realização concreta de direitos, ou seja, de deliberação de políticas públicas com

101
Esses dados são resultado de uma pesquisa realizada por TATAGIBA, em 2002, sobre as deliberações dos
conselhos de direitos pelo Brasil.
100

fundamentos e capacidade de intervir na realidade vivenciada pelo segmento infanto-juvenil


da população. Nesse contexto, absorveu demandas por justiça que questionam consensos e
regras instituídas e que legitimam e armam conflitos na sociedade visando, através de
processo de mediações e negociações públicas, a redefinição dos termos sobre os quais se
organizam o Estado e a sociedade.
É válido ressaltar que, em alguns momentos nesse processo, houve apoio recíproco
entre Conselho e Fórum. Decisões do órgão deliberativo, tanto quanto ocorria com o
CMDCA-Aracaju, eram apoiadas pelo Fórum DCA-SE e vice-versa. Mas, a articulação da
sociedade civil, como dito, não abria mão de exercer pressão quando isso era necessário. Essa
pressão é o que o pode ter gerado uma mudança no teor das resoluções, e, por assim dizer, um
reflexo na qualidade das deliberações de ambos os conselhos. O número de resoluções passou
a se ampliar com a incidência do Fórum DCA-SE, conforme se vê no gráfico abaixo:

Gráfico 1- CEDCA-SE: Resoluções Publicadas no Período de 2002 a 2014

Fonte: Construção da autora baseada nas Resoluções do Conselho Estadual dos Direitos da
Criança e do Adolescente de Sergipe, no período de 2002 a 2014.

Esse processo de democratização do Conselho pela participação do Fórum DCA-SE,


por seu turno, gerou ainda a interiorização do órgão deliberativo, uma vez que antes seus
membros estavam situados na capital e, agora, passavam a contar com instituições com
atuação em outros municípios 102 . Assim, ao que parece, pela primeira vez na história do
CEDCA-SE, este passou a contar com entidades do interior trazendo a realidade dos
municípios para o seu debate interno acerca das políticas públicas para a infância:

102
Para, juntamente com a articulação de instituições, proceder à análise e compreensão mais complexa das
condições de crianças e adolescentes em todo o Estado de Sergipe, com vista à tomada de decisões, o Fórum
DCA-SE estimula a participação das entidades do interior nos conselhos municipais de suas localidades.
101

Para efeito deste instrumento, estarão habilitadas a concorrerem às vagas da


sociedade civil, as entidades sociais de promoção, defesa e controle social que se
enquadrem em um dos seguintes pré-requisitos: Atuação em âmbito nacional, em
pelo menos cinco (05) estados brasileiros dentre eles, o estado de Sergipe; b)
atuação em pelo menos um (01) município de quatro (04) regiões territoriais do
estado; c) atuação em pelo menos (06) municípios em uma mesma região territorial
do estado de Sergipe (...) o processo de escolha obedecerá à seguinte dinâmica: a) os
trabalhos serão abertos pela coordenação do Fórum DCA-SE que fará explanação
sobre o papel do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente e as
atribuições de conselheiros estaduais (...) (CEDCA-SE, RESOLUÇÃO Nº 15/08,
arts. 4º e 7º).

No que concerne às Resoluções, aquelas aprovadas nesse período refletem o


diálogo/conflito entre Conselho e Fórum DCA-SE e, portanto, expressam uma concepção
mais politizada da ação pública e o fortalecimento da sociedade civil para além das entidades
inseridas no Fórum DCA-SE. Quando as reuniões do Conselho Estadual de Sergipe –
CEDCA-SE, por exemplo, aconteciam, todas as entidades da sociedade civil que compunham
o Fórum Estadual já haviam debatido a pauta principal, que muitas vezes era construída a
partir de sugestões dos conselheiros que as representavam. Nas tensões que vez ou outra
ocorriam frente às colocações dos conselheiros governamentais, quase sempre a sociedade
civil obtinha resultados positivos em virtude dos estudos realizados no Fórum DCA-SE
antecipadamente. Nesses momentos, esses conselheiros apresentavam os resultados dos
debates e estudos referentes às temáticas inscritas na pauta do CEDCA.
Desse modo, os conselheiros apresentavam posicionamentos, argumentos e posturas
firmes e aparentemente conscientes em relação ao conteúdo a ser deliberado pelo conjunto do
CEDCA-SE e frente a pautas mais polêmicas, como a necessidade de realização de
conferências municipais e territoriais da criança e denúncias acerca das omissões do Estado
frente às unidades de cumprimento de medida socioeducativa de privação de liberdade, entre
outras.
Sobre a disputa de concepção, por exemplo, no âmbito do CEDCA-SE para a
realização das conferências municipais e territoriais dos direitos da criança e do adolescente,
vale explanar que até 2007, essas conferências em Sergipe eram realizadas apenas no âmbito
do Estado e alguns municípios, como a capital de Aracaju. A partir de encaminhamentos
retirados nas reuniões do Fórum DCA-SE e levados ao CEDCA-SE, todos os municípios
passaram a realizar conferência municipal. Em 2008, além das municipais, foram realizadas
ainda conferências territoriais dos direitos da criança e do adolescente.
As tensões para deliberar sobre esse formato de participação ocorreram em virtude
da alegação, por parte dos representantes do governo, de que não havia recursos financeiros e
nem disponibilidade de pessoal para executar tais atividades. Além disso, se questionava a
102

importância da realização de debates territoriais para além dos debates municipais. No contra-
argumento, os conselheiros representantes da sociedade civil e integrantes do Fórum DCA-SE
defenderam a importância de fomentar a prática da participação e do diálogo local sobre as
problemáticas específicas da infância e da adolescência e depois reunir os municípios
próximos para estimular neles a prática da avaliação de suas realidades no conjunto, no
sentido de identificarem situações similares e diferenciadas em cada realidade para tentar
propor alternativas a partir dos atores que vivem suas próprias realidades concretas. Após
deliberação do CEDCA-SE pela realização dessas conferências, as próprias entidades do
Fórum DCA-SE se motivaram a participar na disponibilização militante de pessoal, além dos
conselheiros, para contribuir no processo dialógico no âmbito do formato das conferências,
ensejando o fomento da participação comunitária na leitura crítica de suas realidades, a partir
do conhecimento das pautas infanto-juvenis, e da descoberta dos problemas que afligem a
infância e a adolescência.
Existem outros exemplos que refletem a politização do CEDCA-SE e sua ação
articulada com o Fórum DCA-SE nas políticas públicas e no fomento à participação das
entidades no Fórum. Assim, pode-se citar, entre outros, o encaminhamento de indicações à
Assembleia Legislativa do Estado para mudanças na Lei nº 3.062/1991, que dispõe sobre a
criação do CEDCA-SE; a Resolução nº 15/2008, que dispõe sobre o processo de escolha das
entidades da sociedade civil para compor o colegiado eleitoral 103 CEDCA-SE; a Resolução nº
07/2008, que trata de procedimentos para garantir a integridade física de adolescentes
encaminhados às unidades de medida socioeducativa de internação e de internação provisória;
a Resolução nº 09/2009, que trata da criação do grupo de trabalho para monitorar,
contextualizar e atualizar o plano de gestão do sistema socioeducativo de Sergipe; a
Resolução conjunta CEDCA-SE e CMDCA-Aracaju nº 10/2009, que dispõe sobre o
cumprimento do preceito legal da prioridade dispensada às crianças e adolescentes no
atendimento do Instituto Médico Legal/IML em caso de violência sexual.
Além dessas Resoluções, foi necessário regulamentar o processo interno de escolha
da presidência do Conselho, tendo em vista as repercussões geradas pela presença da
sociedade civil atuando de forma articulada entre si e por meio do presidente do órgão na
constituição das pautas e das concepções que foram sendo implantadas nas políticas para a
infância e adolescência no Estado. Se antes esse era espaço que não importava muito porque

103
A legitimação, por parte dos conselhos de direitos, definindo em Lei o Fórum DCA-SE como colegiado
eleitoral das entidades a comporem esses espaços coroou a incidência política do Fórum DCA-SE sobre os
conselhos de direitos estadual e municipal de Aracaju.
103

não tinha impactos para o governo estadual, não expunha as fragilidades das políticas
públicas, não se constituía como lugar de denúncia e não provocava a opinião pública para
discutir a violação de direitos, com a atuação do Fórum, formando, mobilizando, debatendo e
incitando uma posição coerente com a legislação e com discussões emancipatórias sobre a
infância, agora ele passou a merecer atenção por parte dos governantes, que impuseram aos
seus representantes a impossibilidade de faltar a reuniões, ademais de criar meios para
assumir a presidência do órgão. Em complemento, agentes do governo passaram a tentar
destituir a coesão das entidades da sociedade civil no Conselho, que atuavam como expressão
de uma articulação maior, promovida nas reuniões do Fórum DCA-SE. Ofereceram-se cargos
a determinados integrantes, tentou-se evitar uma candidatura de instituições não
governamentais para a sucessão à mesa diretora do órgão e, ao que parece, se estabeleceu
como meta vencer a sociedade civil, provocando empate na votação até que algum
representante não governamental mudasse o seu voto, faltasse à assembleia de eleição ou que
houvesse uma desistência coletiva da disputa pela presidência do Conselho. Por meses, as
eleições foram remarcadas devido à previsão de empate no número de votos de cada chapa.
Em complemento, o governo tentava criar condições para que a sociedade civil
desistisse de se manter na disputa pela presidência do órgão deliberativo. Todas as vezes que
algum membro indicado pelo governo parecia aberto à negociação ou demonstrava simpatia
pela candidatura não governamental, havia troca desse representante para sustentar o empate.
Enquanto isso, o governo, por meio da não liberação de recursos e/ou não
contratações necessárias (de empresas, de lugares, compra de material, entre outras) tentava
impedir que se realizassem conferências e outros eventos programados pelo Conselho para
discutir a política pública e, como era comum nesses momentos, realizar as denúncias de
violação de direitos de crianças e adolescentes e mobilizar a opinião da população sergipana.
Ao expor a presidência e o Conselho como um todo, que não conseguia manter seus
compromissos de debate como outros agentes governamentais e não governamentais pelo
Estado, o governo tentava minar a confiança e o prestígio social dos membros não
governamentais do órgão deliberativo, adquiridos após a atuação mais efetiva do CEDCA-SE.
Nesse sentido, a Resolução nº 11/2009, que redefiniu o processo de eleição para a
presidência do Conselho para o biênio 2009/2011 e, entre outras coisas, determinou que as
chapas apresentassem programa de trabalho, mais do que uma Resolução preocupada com a
organização interna do Conselho Estadual, acabou revelando o impacto que o Fórum DCA-
SE, com a práxis política de seus membros, possuía quanto ao tema da infância nesse
momento histórico.
104

Em outras palavras, a Resolução nº 11/2009 foi a síntese de um conflito que, de um


lado, tinha um governo que possivelmente esperava pela condescendência de militantes de
direitos humanos 104 em um espaço de representação que não costumava causar impactos
políticos relevantes, e, de outro, uma sociedade civil mais atenta, querendo avançar na
promoção de políticas públicas emancipatórias. Ambos tinham como pretensão assumir a
hegemonia do órgão de deliberação.
Por fim, observando-se o Gráfico 1, com indicativo do número de resoluções
publicadas pelo CEDCA-SE por ano no período de 2002 a 2014, é importante mencionar que,
mesmo após o ano de 2009, abrangido por esta pesquisa, houve reflexos da ação de anos
anteriores do Fórum DCA-SE, com a elaboração de resoluções em número considerável em
anos posteriores. Isso pode indicar que, apesar do refluxo do Fórum após o período estudado,
os efeitos da ação política não governamental seguiram vigendo por algum tempo e atuaram
de forma pedagógica sobre o Conselho.
Além disso, não é possível negar que o Fórum permanece existindo. Essa reflexão
não nega a experiência e a capacidade desenvolvida por seus integrantes, ao menos, nos
espaços institucionais de deliberação de política pública para a infância e adolescência e para
outros seguimentos vulneráveis da população brasileira, pois, ao que se sabe, vários
participantes que constituíram o Fórum no seu momento de maior efervescência têm atuado
em outros conselhos setoriais e em outras redes de ação política e/ou técnica, em que a
sensibilidade desenvolvida no âmbito do Fórum DCA acaba, talvez, influenciando a maneira
como esses sujeitos desempenham as suas atividades.

4.2.2. Construção da Unidade do Fórum DCA-SE: Investimento na Formação dos Sujeitos Individuais e
Coletivo

Construir uma unidade entre as entidades da sociedade civil foi um dos primeiros
desafios que se colocou para o Fórum DCA-SE. Assim, para o cumprimento dessa intenção
estratégica, inicialmente pensada pela coordenação do Fórum, as táticas utilizadas passaram
pela necessidade de ampliar o número de entidades filiadas e qualificar a participação. Para
tanto, o Fórum DCA-SE investiu na realização de visitas às ONGs e no diálogo com seus
presidentes sobre a importância da filiação, participação e acompanhamento efetivo das
reuniões do Fórum DCA-SE e dos conselhos de direitos.

104
O governo da época era liderado pelo Partido dos Trabalhadores e trocava todos aqueles que produzissem
discordâncias públicas quanto ao seu modo de gestão como agentes capazes de desestabilizar o governo. Por
isso, agia na tentativa de neutralizar as discordâncias.
105

Vale lembrar que as primeiras reuniões da sociedade civil para rearticulação do


Fórum DCA-SE em 2005 e consequente definição das estratégias contavam com cerca de
quatro (4) ou cinco (5) entidades apenas. Ampliar essa participação tornou-se desafiador em
uma conjuntura em que participar, como já exposto neste trabalho, não é uma cultura e, em
espaços coletivos, como movimentos sociais de toda ordem, exige a solidariedade entre seus
membros. De acordo com Gohn, “o princípio da solidariedade é o núcleo de articulação
central entre os diferentes atores envolvidos, a partir de uma base comum de valores e
ideologias construídos na trajetória do grupo ou advindos dos usos e tradições e
compartilhados pelo conjunto” (GOHN, 1997, p. 253).
O processo de filiação, aliado à formação interna cotidiana e, às vezes, centrado em
cursos específicos, tinha como fundamento a construção da solidariedade de seus membros
em torno de uma luta política pelos direitos da criança e do adolescente sob a perspectiva
emancipatória, isto é, tinha como pretensão produzir alianças, que eram também pedagógicas,
para afirmar a condição de sujeitos e construir condições concretas de existência para pessoas
com a negação histórica de seus direitos, como o segmento infanto-juvenil, sobretudo o mais
pobre, sem isolá-las do conjunto da população. No entanto, isso não quer dizer que esses
espaços são harmoniosos e homogêneos, pelo contrário, como afirma Maria da Glória Gohn:

O usual é a existência de inúmeros conflitos e tendências internas. Mas, a forma


como se apresentam no espaço público, o discurso que elaboram, as práticas que
articulam nos eventos externos, criam um imaginário social de unicidade, uma visão
de totalidade. A solidariedade é princípio que costura as diferenças fazendo com que
a representação simbólica construída e projetada para o outro – não movimento –
seja coerente e articulada em propostas que encubram as diferenças internas,
apresentando-se, usualmente, de forma clara e objetiva (GOHN, 1997, p. 253).

Algumas instituições, inicialmente, sentiam necessidade de se aproximar do Fórum


por causa da limitação imposta pelo edital de eleição das entidades integrantes do CMDCA-
Aracaju e/ou devido à exigência imposta pela Resolução n. º 27/2005, do CMDCA de
Aracaju, que colocava como condição para acesso a recursos do Fundo Municipal dos
Direitos da Criança e do Adolescente a filiação ao Fórum. À medida que iam assumindo
compromissos e cumpriam tarefas do coletivo, desenvolviam sentimento de pertença;
resolviam investir como instituição no espaço de articulação “pública não estatal” da
sociedade civil; internalizavam a dinâmica e os propósitos reais do Fórum também em sua
ação interna e acabavam formalizando sua filiação à rede de defesa dos direitos da criança e
do adolescente. Ao final de 2005, as reuniões contavam sempre com a presença de cerca de
doze (12) a quinze (15) entidades, que usufruíam desse espaço para também compartilhar
dificuldades vivenciadas nas entidades de atendimento, trocar experiências e construção
106

conjunta de alternativas (FÓRUM DCA-SE, 2015). Naquele momento, muito em função da


concepção da própria coordenação do Fórum DCA-SE, conhecer a dinâmica desse coletivo
significava participar ativamente dessa rede numa perspectiva coletiva, crítica e
comprometida com a proteção integral da criança e do adolescente enquanto sujeitos de
direitos.
Significava, também, por outro lado, disputar concepções. Cada novo integrante
tinha uma percepção diferenciada sobre a infância que, muitas vezes, divergia de integrantes
que estavam mais familiarizados com a temática nos moldes do novo paradigma infanto-
juvenil. Com a participação nas discussões realizadas em reuniões, incentivada por meio da
leitura crítica da realidade por meio do exercício contínuo da análise de conjuntura sobre os
assuntos correlatos e contando permanentemente com uma postura pautada no diálogo, na
reflexão e na ação, os conflitos sempre existentes eram dirimidos. Passavam a preponderar
entendimentos que se afinavam com o paradigma da infância e adolescência enquanto
instâncias integradas por sujeitos em condição peculiar de formação e desenvolvimento.
Essa postura e dinâmica metodológica adotada pela coordenação do Fórum para
conduzir a atuação política desse coletivo impactou sobremaneira na formação política e na
práxis dos sujeitos (em sua dimensão individual e coletiva). Essas iniciativas foram
imprescindíveis para a construção da Unidade do Fórum DCA-SE, em alguns momentos, de
modo a afirmar que essas posturas atuaram como investimento social, ético e político de cada
um e de todos ao mesmo tempo naquela rede de atuação. Quanto aos impactos do Fórum para
o funcionamento interno das instituições, muitas vezes, algumas organizações tinham como
parte de seu trabalho distribuir cestas de alimentos, refeições, enfim, administrar ações de
cunho assistencialista que não promoviam a infância na perspectiva emancipatória, pelo
contrário, mantinham atitudes de estigmatização de crianças e adolescentes como “menores”,
“incapazes”, “inferiores”, “abandonados”, “carentes” “coitadinhos”, quando não, como
“delinquentes”. Com a participação de integrantes dessas entidades no Fórum DCA-SE, essa
visão assistencialista passou a ser questionada e foi dando lugar a uma perspectiva crítica
atenta às orientações da Política de Assistência Social, sobretudo nas pessoas que eram
indicadas para atuar diretamente nesse espaço de articulação. Em certos casos, alguns
dirigentes das organizações foram sendo igualmente influenciados pelas discussões teóricas e
práticas incitadas pelo Fórum – ainda assim, não sem conflitos internos nas instituições, que,
em alguns casos, questionavam e colocavam publicamente em dúvida a participação de seu
representante na rede da sociedade civil.
107

Em outros casos, apesar de aceitar a participação de seu integrante, que se refletia na


legitimação da instituição perante a rede, com efeito, no aumento da possibilidade de obter
recursos públicos, o modo de pensar que se produzia no contato com o Fórum era motivo de
conflitos internos nas organizações. Se, por um lado, a participação desse integrante, que,
quando passava a compreender efetivamente a dimensão de cada espaço político (Fórum,
ONG, Conselhos – de direitos e tutelares – SGD, outros) e a infância e adolescência integrada
por sujeitos de direitos, contribuía para o crescimento do Fórum e fomentava ainda mais
construções coletivas na mesma direção política, por outro, no interior das instituições, nem
sempre se amparava a pessoa que atuava na articulação. Quando a entidade, em
reconhecimento à atuação de seu membro, era considerada apta pelo Fórum a assumir uma
vaga no Conselho, o dirigente acabava tomando a fala da instituição no órgão de deliberação
(algumas vezes, após a eleição, a instituição encaminhava o nome do dirigente institucional
para compor os conselhos) ou era ele mesmo contatado pelo Estado para informar se
endossava a posição de seu integrante no Fórum e/ou no Conselho, bem como para enquadrá-
lo naquilo que era considerado esperado pelo poder público. Não se pode deixar de perceber,
ainda nesse contexto, que, para certas instituições, ocupar uma vaga no órgão de deliberação
de políticas públicas era visto possivelmente como uma oportunidade de exercer poder que
não lhe era permitido com a atuação no Fórum, além de ter conhecimento dos meios e, quem
sabe, realizar convênios e ter acesso a recursos.
Em virtude desse tipo de atitude, o Fórum estabeleceu acordo político entre os
participantes institucionais, segundo o qual seriam votadas as entidades que se
comprometessem previamente a encaminhar ao conselho o nome daquele que participava e
acompanhava as discussões da política da infância diretamente no Fórum DCA-SE. Embora
esse acordo possa ter sido eventualmente quebrado após a eleição das entidades de 2007,
funcionou, contribuindo para a unidade do Fórum no espaço do Conselho e possibilitou
diálogos com os dirigentes institucionais.
É certo que as vivências nos espaços de formação política evidenciavam os conflitos,
por um lado, mas, por outro, significavam oportunidades de diálogo e mudança na forma de
pensar e de agir. Os conflitos sinalizam quais pontos merecem destaque no investimento da
ação. Trabalhados de forma construtiva podem promover perspectivas emancipatórias do
ponto de vista da mudança dos sujeitos políticos e da realidade que se quer transformar à
medida que permite que os sujeitos expressem sua forma de pensar e de agir, mas também
recebam contribuições e estejam em contato com visões críticas de outros sujeitos. Esse
processo é que permite constituir uma identidade coletiva.
108

Com respaldo nas ideias de Martinelli sobre a identidade no materialismo histórico e


dialético proposto por Marx e seus seguidores, em especial as definições de Goldman,
Gerassi, ao falar da identidade da Comissão Executiva do Fórum DCA-Santo Amaro,
reafirma a ideia de que esta é uma categoria sócio-política que se constrói no jogo das forças
sociais e na trama das relações. Por esse motivo, é dotada de movimento na medida em que
continuamente se faz e se refaz mediante determinações políticas, sociais, econômicas,
históricas e culturais (GERASSI, 2007).
Relativamente ao Fórum DCA-SE, nota-se que, de modo geral, a identidade coletiva
desse movimento é algo em construção decorrente do seu processo e da própria forma como a
sociedade vai se apropriando dessa formulação. No entanto, não se pode negar que essa
identidade coletiva gera conflitos com as instituições e seus dirigentes e é, ao mesmo tempo,
produto dessa relação conflituosa interna no Fórum, porque, nesse espaço, a hegemonia das
ideias se constrói também a partir de pessoas que historicamente estão inseridas na luta pelos
direitos da criança e do adolescente. Nesse sentido, Pini afirma que “no espaço social dos
Fóruns, a hegemonia105 do debate do projeto político de transformação social continua sendo
dos sujeitos coletivos que contribuíram historicamente para a conquista dos direitos da criança
e do adolescente” (PINI, 2006, p. 105).
É no processo formativo de suas relações e na promoção de ações para
transformar a realidade que esses sujeitos são transformados por ela, dando origem a novas
iniciativas, tornando-se, afinal, um sujeito coletivo consciente de sua história e dos processos
ideológicos e hegemônicos que estão imbricados na sociedade (GERASSI, 2007). Em Sader,
esses sujeitos estão implicados nas estruturas objetivas da realidade e o seu conceito estaria
associado a um projeto comum que não nega a noção de autonomia, como possibilidade de
elaboração da própria identidade e de projetos coletivos de mudança social a partir de suas
próprias experiências sociais, numa espécie de desenvolvimento da capacidade de poder dar-
se, além de tudo o que tiver dado (SADER, 1995). Nesse contexto, e no período por ora
considerado, à medida que o Fórum DCA-SE ampliava a filiação e se inseria nos espaços de

105
O sentido de hegemonia neste trabalho é buscado em Gramsci, que combinou a força e o convencimento com
cada um desses aspectos do poder existente. Para Gramsci, tanto as classes dominantes quanto as classes
dominadas podem exercer o seu poder hegemônico a partir de sua capacidade de persuasão e de direção, muito
mais do que pela força da dominação. No caso das classes dominantes isso ocorre quando estas “passam a se
apoiar na capacidade de difundir sua ideologia e fazer com que as classes dominadas e exploradas – ou uma
parte delas – consegue impor sua hegemonia sobre o conjunto da sociedade, dando uma base sólida de seu
poder”. Essa forma de impor a hegemonia traz consequências desastrosas para a classe trabalhadora no campo da
dominação e cooptação desta (SADER, 2005, p. 8). Já as classes dominadas e exploradas o fazem mediante a
necessidade de organizar não apenas sua força, mas também a sua capacidade de que sua ideologia, seus valores
e sua visão de mundo possam conquistar outros setores populares da sociedade.
109

discussão da política da infância, se fortalecia e ocupava novos espaços de participação. Desse


modo, a rede compartilhava a ideologia da sociedade civil e propunha alternativas para a área
temática nos moldes discutidos previamente nas reuniões internas. A consequência do
fortalecimento da sociedade civil foi o fortalecimento também de suas pautas para evidenciar
a infância, bem como os espaços em que se fazia participativa.

4.2.3. Estreitamento de Relações com o Sistema de Garantia de Direitos e a Mídia: Conquista de


Visibilidade Pública do Fórum DCA-SE

A participação do Fórum DCA-SE em atividades relacionadas à infância e à


adolescência promovidas por entes públicos e privados e/ou atores sociais integrantes do SGD
– Sistema de Garantia de Direitos, além da realização de suas próprias atividades,
favoreceram o relacionamento com setores da mídia, que contribuíram para dar visibilidade às
pautas do Fórum DCA-SE.
Em 2005-2006, o foco da atuação política da articulação de entidades da sociedade
civil era cumprir a missão institucional de se constituir efetivamente como referencial político
na temática da infância em Sergipe. Para tanto, era necessário acompanhar, o quanto fosse
possível, as discussões correlatas e ocupar os espaços abertos para debate sobre políticas para
infância e adolescência. Esse propósito motivou as entidades filiadas ao Fórum a se fazerem
presentes em todas as atividades a que fossem convidadas. Por outro lado, com o
reconhecimento e a legitimação da rede de defesa de direitos da criança e do adolescente para
os debates que enfrentava, a ausência em certos eventos passou a causar estranhamento,
também por jornalistas, que tinham no Fórum uma voz qualificada para entrevistas e/ou
consultas sobre temáticas relacionadas à infância e à adolescência. De fato, a participação nos
eventos, a postura propositiva, cooperativa, inovadora e, ao mesmo tempo, crítica do Fórum
DCA, o contato de suas entidades filiadas com órgãos e atores integrantes do SGD, bem como
com os meios de comunicação, favoreceu a colocação em evidência das pautas da infância,
antes obscurecidas pela ausência de sua discussão em espaço público e em virtude do não
posicionamento dos órgãos públicos ou mesmo de instituições sociais.
Um exemplo de como se realizava essa estratégia se deu em 2006. Nesse ano, o
Fórum DCA-SE lançou a campanha “Criança Não é de Rua”106. Além de trazer à tona um

106
Campanha de âmbito nacional, coordenada pelo Comitê Nacional de Enfretamento a Situação de Moradia nas
Ruas, vivenciada por crianças e adolescentes pelo Brasil. Tem como objetivo criar e implementar a estrutura
política, institucional, humana e operativa para o desenvolvimento de uma política nacional de enfrentamento a
situação de moradia nas ruas, vivenciada por crianças e adolescentes em todas as regiões do país. Para tanto,
busca criar condições permanentes de articulação com os agentes públicos e privados e a sociedade civil
organizada para um diálogo sobre o fenômeno da moradia de rua de crianças e adolescentes; criar as condições
110

tema relevante para a discussão pública da violação de direitos da criança e do adolescente,


essa atividade recolocou oficialmente a articulação de entidades no cenário político-social
sergipano107. A partir desse momento, o Fórum DCA-SE começou a pautar, para a sociedade
em geral e para os atores do poder público, não só a condição de “moradia” nas ruas
vivenciada por muitas crianças e adolescentes no Brasil, mas também outras questões que
estavam relacionadas a esses sujeitos, como o abandono, a violência doméstica, as políticas
públicas de abordagem de rua e de acolhimento institucional em abrigos e o apoio familiar,
além da maneira como agiam o Poder Judiciário e o Ministério Público nesses casos.
Em razão dos desdobramentos da campanha, o Fórum DCA-SE passou a propor
reuniões que deveriam ajudar a refletir e construir soluções ao atendimento a crianças e
adolescentes. Integraram esses encontros representantes do Ministério Público,
especificamente o Núcleo de Apoio à Infância – NAIA; da 16ª Vara da Criança e do
Adolescente; da 17ª Vara de Apuração de Cometimento de Ato Infracional e Execução de
Medidas Socioeducativas; técnicos da SEMASC – Secretaria Municipal de Assistência Social
e Cidadania; representantes de entidades não governamentais e de órgãos públicos, conselhos
de direitos e conselhos tutelares e outros agentes com atuação em outros municípios do
Estado de Sergipe.
O Fórum DCA-SE, com essa atuação, deixou de atuar exclusivamente na capital e
incluiu nos debates públicos sobre os direitos da criança e do adolescente representantes de
Japaratuba, de Itabaianinha e da Grande Aracaju. Colocar em discussão o cenário brasileiro
trazido por articuladores nacionais da campanha “Criança Não É de Rua”, bem como o que
acontecia no Estado de Sergipe e em seus municípios, estimulou a sociedade civil a reafirmar
seu papel mobilizador, articulador, interlocutor e controlador das políticas públicas de modo
geral. Por outro lado, como mostram os registros, esses eventos permitiram o envolvimento de
prefeitos, parlamentares, organizações não governamentais e órgãos e entidades
governamentais com pertinência à causa da criança e do adolescente em situação de rua, que
assumiram, em falas públicas e em Carta de Adesão, compromissos propostos pela sociedade
civil. Por exemplo, no ano seguinte, a SEMASC apresentou resultados de pesquisa realizada

de priorização para destinação de recursos aos programas e entidades de acolhimento como ferramenta eficaz de
combate à moradia de rua de crianças e adolescentes; nos Estados, formular mecanismos convencionais de
pesquisa sobre o fenômeno de crianças e adolescentes de rua para construção de intervenções pautadas em
diagnósticos fundamentados e, portanto, mais precisos (sobre o assunto ver sítio da campanha na internet:
http://www.criancanaoederua.org.br/).
107
Há registros de entrevistas concedidas pelo coletivo e de matérias divulgadas pelos meios de comunicação
sobre esse evento, uma vez que, a partir desse momento, os meios de comunicação televisivos também
começaram a solicitar a posição do Fórum DCA-SE sobre temáticas envolvendo crianças e adolescentes.
111

sobre a população em situação de rua de Aracaju 108 . Esse diagnóstico, posteriormente,


embasou as decisões do CMDCA-Aracaju e fomentou outros debates, tanto no interior do
Fórum DCA-SE quanto entre os demais órgãos de acompanhamento da política infanto-
juvenil em todos os âmbitos.
Não se pode deixar de analisar que é na oferta das políticas públicas direcionadas à
população e no modo como essas políticas são trabalhadas em cada localidade que se percebe
a prioridade de cada governo, pois as políticas públicas expressam intenções de governo,
comunicadas à sociedade e ratificadas por ela em processos eleitorais, que buscam contemplar
demandas coletivas e assegurar direitos estabelecidos (CHRISPINO, 2005). Nesse sentido,
assessorar o poder público com informações relevantes da realidade, percepções e
proposições é também papel da sociedade civil, apesar de muitos espaços de participação
serem subestimados e não conseguirem viabilizar ideias, produzir deliberações, enquanto
outros são completamente destituídos de sentido, autonomia e recursos.
As mobilizações da sociedade civil, nessa linha de raciocínio, quando exercidas de
forma autônoma e libertária do ponto de vista do fomento da emancipação, acabam sendo
importantes também porque restabelecem a dignidade política de alguns instrumentos de
participação e permitem que a população, de fato, possa atuar na elaboração de políticas
públicas. De alguma forma, nesse processo, o Fórum DCA-SE acaba sendo legitimado como
uma voz que representa os interesses de crianças e adolescentes e passa a ser constantemente
convidado para falar sobre temáticas relativas à infância nas casas legislativas (Câmaras
Municipais e Assembleia Legislativa)109.
Essa presença ocorre também nos meios de comunicação. Pelo respeito alcançado,
em 2007 e 2008, o Fórum DCA-SE publicou notas que se tornaram efetivamente públicas e
cumpriram sua função de fomentar o debate público quanto às concepções relacionadas à
infância, bem como de estimular a participação e o controle social 110. Além disso, ora no
embate político com o governo do Estado de Sergipe, ora com as posturas propositivas e
cooperativas junto a ele, em suas instâncias representativas e deliberativas, as pautas
relacionadas à criança e ao adolescente passaram a ter maior visibilidade. O Fórum DCA-SE,

108
Ver matéria relacionada em: “Semasc e UFS trabalham diagnóstico para população em situação de rua”.
Disponível em <http://www.institutomarcelodeda.com.br/semasc-e-ufs-trabalham-diagnostico-para-populacao-
em-situacao-de-rua/>. Acessado em 25 de maio de 2015.
109
Nessas oportunidades, também provocavam o vereadores e deputados a pensar na necessidade de criação e
efetivação de Frentes Parlamentares pela Criança e pelo Adolescente. Anos depois, foi efetivada a Frente
Parlamentar no âmbito da Assembleia Legislativa de Sergipe.
110
Ver, no Apenso A desta dissertação, relação de matérias e entrevistas divulgadas pela imprensa sergipana
sobre esse assunto.
112

por seu turno, com posicionamentos, participações e exposições frequentes de um projeto


político defendido pela sociedade civil, preencheu lacuna no campo da produção de outro
olhar sobre a infância, isto é, ajudou a colocar em questão a visão assistencialista e
“menorista” que se propagava e se hegemonizava nos meios de comunicação de massa.
Essa visibilidade, aumentada com ações do Fórum DCA-SE realizadas no interior do
Estado, além da Grande Aracaju, projetou a articulação da sociedade civil para outros espaços
do poder público e teve como efeito ampliar as responsabilidades e as tarefas da rede no
âmbito do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente. Em 2008, o Fórum
DCA-SE foi incitado a realizar seminário no Município de Indiaroba 111 para discutir a
“criança e adolescência na agenda política” e mobilizou cerca de mil e duzentos integrantes
do SGD. Posteriormente, realizou audiências públicas no Estado de Sergipe, com destaque
para aquela ocorrida na região centro-sul em parceria com o CMDCA de Poço Verde. A
metodologia dessa audiência contou com a realização de visitas pelas entidades do Fórum
DCA-SE, que se dividiram para conhecer os equipamentos sociais públicos dos cinco
municípios dessa região e obter informações capazes de fomentar o debate entre a sociedade
civil e os representantes do Estado e dos municípios sobre o atendimento a crianças e
adolescentes.
O contato das instituições com cada um dos municípios foi subsidiado por
instrumental elaborado pelo Fórum DCA-SE para entender como funcionavam as políticas de
saúde, educação, assistência social e o Sistema de Garantia de Direitos e o Fundo da Criança e
do Adolescente. Do ponto de vista dos efeitos da audiência sobre a comunidade, embora não
se possa medir completamente seus impactos, também não se pode negar que tem um
potencial pedagógico. Afinal, iniciativas como essas representam meios de a comunidade
poder, de forma organizada e com o auxílio de outros olhares e saberes, analisar,
problematizar e conhecer mais profundamente a sua realidade (FREIRE, 2005). Tal iniciativa
pode ser considerada também como forma de enfrentamento dos “medos ocultos e
silenciados” (SPOSATO e MATOS, 2015) não só em relação à temática do adolescente autor
de ato infracional ou em relação à maioridade penal, mas também quanto a diversas outras
temáticas que atingem o cotidiano da comunidade e que demandam reflexões acerca da
cultura de violência, pela crença de que só é possível educar batendo etc. A oitiva interativa

111
O seminário estadual foi uma parceria entre o Fórum DCA-SE e o Conselho Municipal de Indiaroba, o que
demonstra também a relação das entidades do Fórum com outros conselhos municipais. Alguns representantes da
sociedade civil desse conselho já estavam filiados ao Fórum DCA-SE e vários outros conselhos municipais de
direitos já compreendiam a necessidade da atuação articulada com outras organizações, inclusive aquelas que se
dedicavam exclusivamente à mobilização da sociedade civil.
113

da comunidade e a participação recíproca dos profissionais, técnicos, ONGs, agentes públicos,


como parlamentares, contribuem com a desconstrução de alguns mitos e com a promoção de
novos valores e conhecimentos do fazer-pensar-agir comunitário, no caso em questão, de um
território, apesar de, como dito acima, não ser possível avaliar completamente os impactos da
ação, por não integrar ela o foco desta pesquisa.
Durante a audiência em si, agentes públicos e da sociedade civil tiveram a
oportunidade de se manifestar sobre os mais diversos temas relacionados à infância. Alguns
problemas foram evidenciados, entre os quais, apontaram-se a estigmatização de adolescentes
tidos como “menores infratores” e a resistência 112 da comunidade local em aceitar o
cumprimento de medida socioeducativa de prestação de serviços à comunidade no próprio
município; a dificuldade das escolas de adquirir equipamentos e investir na qualificação dos
professores, principalmente para lidarem com crianças com deficiência; e problemas na
comunicação entre conselheiros tutelares e municipais de direitos e, ainda, entre conselheiros
tutelares e a própria gestão municipal. Quanto às soluções, algumas propostas foram
construídas, como a promoção, pelo poder público, de formação conjunta para os integrantes
do sistema de garantias de direitos, entre os quais educadores e profissionais da saúde; a
melhoria do funcionamento do fluxo de atendimento à criança e ao adolescente vítimas de
maus-tratos e também a crianças sob medida protetiva e adolescentes sob medida
socioeducativa; e a repactuação do fluxo de atendimento para o cumprimento da medida
socioeducativa em meio aberto pelo adolescente em município vizinho concomitante a um
processo informativo e educativo à comunidade sobre o caráter pedagógico da medida
socioeducativa para a relação do adolescente com a comunidade e vice-versa, além de outras.
Do ponto de vista interno, a audiência pública em Poço Verde contribuiu para
aglutinar ainda mais as entidades do Fórum DCA-SE, que compareceram em número
representativo e, com essa demonstração de coesão, incitaram as instituições dos municípios a
priorizarem a pauta da infância e até mesmo se aproximarem da rede de ONGs, ou seja, nesse
aspecto, a visibilidade do Fórum com o desenvolvimento de ações junto aos municípios criou
novos contatos e permitiu à articulação ampliar, ainda que de forma pontual e não mensurável

112
Sobre o medo utilizado como política estratégica, vale considerar que, em nosso continente, a utilização
política dos medos ocultos e silenciados, mas representados no crime, têm alimentado o debate da redução da
idade penal, concretizando propostas legislativas e de emendas às constituições que visam o endurecimento do
castigo aos menores de 18 anos. Ao se indagar sobre a solução que se estaria produzindo para o problema do
cometimento de atos infracionais por adolescentes, “trata-se, inevitavelmente, de enfrentar-se com a pesada
definição da finalidade do castigo e dos fundamentos que legitimam a intervenção do sistema penal sobre a vida
– presente e futuro – de um sujeito” (SPOSATO; MATOS, 2015, p. 192).
114

pelos instrumentos admitidos no presente trabalho, de caráter qualitativo, os efeitos da luta


política pelos direitos da criança e do adolescente no Estado de Sergipe.
Importante mencionar que já em 2007 o UNICEF convidou o Fórum DCA-SE para
auxiliar na construção de fóruns comunitários, cujo propósito era permitir que a comunidade
local conhecesse e avaliasse políticas públicas desenvolvidas nos municípios sergipanos de
menores índices de desenvolvimento infantil e humano para a realização de direitos da criança
e do adolescente. A parceria foi firmada por ocasião da atribuição do “Selo UNICEF
Município Aprovado”113 e exigiu que o Fórum DCA-SE, mais uma vez, por meio de alguns
de seus representantes, percorresse o interior do Estado e contribuísse para a construção do
protagonismo de sujeitos locais quanto ao conhecimento, avaliação e luta por políticas
públicas para a infância nos municípios e ao Estado de Sergipe. Além disso, apesar de
algumas dessas pessoas do Fórum serem representantes de entidades não governamentais no
Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, essa foi uma oportunidade para
conhecer ainda mais a situação da infância em Sergipe, sobretudo porque, além de a maior
parte das instituições integrantes do CEDCA-SE ser da capital, também não havia um
conhecimento pleno das condições vivenciadas por crianças e adolescentes na maior parte dos
municípios do interior do Estado.
Tendo logrado êxito na parceria, o UNICEF provocou o Fórum DCA-SE a também
desenvolver oficinas de Participação Política e Orçamento Público para Adolescentes da
região do semiárido. Essa nova aliança com o UNICEF deu oportunidade ao Fórum DCA-SE
de lançar reflexões pertinentes acerca de problemas distintos daqueles mais presentes na
capital e na região da Grande Aracaju. Essas iniciativas contribuíram com o crescimento e
aprimoramento dos debates e diálogos com a sociedade e poder público. Ao mesmo tempo,
tanto quanto em outras atividades, conhecendo mais, debatendo essas realidades e sempre
contando com a repercussão da mídia local e estadual, foi possível dar visibilidade a questões
municipais, regionais e de todo o Estado para que o atendimento a crianças e adolescentes
fosse aprimorado. O Fórum DCA-SE passou a ser conhecido e se tornou referência na ação
coletiva de luta por direitos da criança e do adolescente, a ponto de ser demandado para
denúncias de violação de direitos, bem como para busca de informação sobre os mecanismos
de filiação e participação e sobre o próprio UNICEF sobre as ações desenvolvidas pelo Estado

113
O “Selo UNICEF Município Aprovado” é um reconhecimento internacional que o município pode conquistar
a partir de um diagnóstico e de dados levantados pelo UNICEF. Os municípios que se inscrevem conhecem
melhor sua realidade e as políticas voltadas para a criança e o adolescente. Com dados concretos e participação
popular, o município tem condições de avaliar suas políticas e repensar estratégias para alcançar os objetivos que
estão relacionados aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. Mais informação, acessar:
<http://www.unicef.org/brazil/pt/where_9763.htm>.
115

para a infância. Sobre isso, em dado momento, a coordenação do UNICEF, quando visitava
Sergipe, realizava reuniões com a coordenação do Fórum DCA-SE para análise da conjuntura
política do Estado e construção de discursos a serem empregados nas reuniões com o
governador. Após esses momentos, nova avaliação era promovida pela coordenação do Fórum
DCA-SE com o UNICEF para planejar ações futuras em busca da melhoria das condições de
vida de crianças e adolescentes. Os resultados dessa relação se davam na propagação do
discurso do Fórum DCA-SE em entrevistas concedidas pelo UNICEF sobre suas reuniões
com o governo do Estado e/ou com outros gestores públicos, além de negociações realizadas
que priorizavam as pautas anteriormente destacadas pelo coletivo da sociedade civil. O
gráfico 2 demonstra a divulgação dada às pautas do Fórum, bem como o período de maior
repercussão destas na imprensa sergipana114.

Gráfico 2 - Atuação do Fórum DCA-SE: Matérias Divulgadas na Imprensa no Período de


2000 a 2014

Fonte: Construção da autora baseada no levantamento de matérias disponíveis na internet


sobre a atuação do Fórum DCA-SE ou matérias relacionadas às reivindicações realizadas
pelo Fórum.

Pela ilustração, afere-se que os anos de 2007 a 2009 constituíram marcos da atuação
política do Fórum DCA-SE. Havia legitimidade para a chamada de reuniões, publicações,
posicionamentos públicos, articulações e interlocuções, seja com os atores do SGD, seja com
os gestores públicos, incluindo-se o governo do Estado e também a imprensa. Além disso,
ainda como resultado da visibilidade, pode-se dizer que, além dos conselhos de direitos115,

114
Ver, no Apenso A desta dissertação, relação das matérias publicadas.
115
No âmbito dos conselhos, várias atas mencionam o reconhecimento do CEDCA-SE da importância do
coletivo do Fórum DCA-SE acompanhar suas discussões. Na 4ª (quarta) Reunião Ordinária do Conselho
Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, por exemplo, realizada em junho de 2009, os conselheiros
propuseram a “formação de uma Comissão para a analisar a Organização e Relatório das Conferências,
sugerindo a participação do Fórum DCA-SE e do FACTUS” (CEDCA-SE, 2009), explicando que a Comissão de
Políticas Públicas responsável por essa pasta estava sobrecarregada; Na 6ª (sexta) Reunião Ordinária do
116

somam-se parcerias com outra articulação pelos direitos da criança e do adolescente, com o
Fórum Associativo de Conselheiros Tutelares de Sergipe (FACTUS), que, como instituição
da sociedade civil, acabou se filiando ao Fórum DCA-SE, confirmando a disposição dessa
articulação maior em pensar a política pública para a infância em todos os seus aspectos; com
a rede de reordenamento dos abrigos e a rede cidade criança, que possibilitou discussões sobre
a atuação dos operadores de direitos em sua relação com os conselhos tutelares; e com os
agentes atuantes nas unidades de cumprimento de medidas socioeducativas em meio fechado.

4.2.4. Violação de Direitos Humanos Infanto-Juvenis no Estado de Sergipe: Denúncia Constante

Diante da formação realizada, da dimensão política alcançada pelo Fórum DCA-SE e


da constatação das muitas violações de direitos humanos vivenciadas por crianças e
adolescentes em Sergipe, como crianças nas ruas, nas sinaleiras, nas lixeiras, vítimas de
exploração e abuso sexuais, violência policial, exclusão da escola, entre outras, o Fórum
DCA-SE não abriu mão da palavra que denuncia. Para fazê-la ecoar na sociedade em geral,
bem como nas autoridades públicas competentes, além daquilo que se apresentou
anteriormente, o Fórum utilizou como tática repercutir todas as informações recebidas e/ou
construídas sobre violação de direitos e a relação estabelecida com a mídia e nos meios de
comunicação. Ao mesmo tempo, o ato de denunciar exigia discussão coletiva para
organização e convergência de argumentos, o estudo da legislação e o conhecimento de
questões técnicas relacionadas aos temas, que iam dando ao Fórum um caráter pedagógico.
Nesse sentido, várias denúncias e ações jurídico-políticas, algumas fundamentadas em
arcabouço jurídico e outras de cunho mais político, contaram com a contribuição de
representantes da OAB-SE e de entidades de outros estados, como o Centro de Cultura Luiz
Freire e o UNICEF, enfim, representações que mantinham diálogo com o Fórum DCA-SE e
estavam envolvidas permanentemente na dinâmica da construção coletiva.
Entre as denúncias promovidas, destacam-se: a constatação de descumprimento do
princípio da prioridade absoluta na destinação de recursos do Orçamento Público Estadual
para políticas relacionadas à criança e ao adolescente; a truculência do Estado de Sergipe no
despejo de famílias ligadas ao MOTU – Movimento Organizado dos Trabalhadores Urbanos,

Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente, realizada em julho de 2009, foi sugerido por
conselheiro da sociedade civil que fosse realizada uma atividade conjunta do CEDCA-SE com outros segmentos
da sociedade, entre estes, o Fórum DCA-SE. Os trechos acima demonstram a relação de parceria entre o
CEDCA-SE e o Fórum DCA-SE sem que fosse comprometida a postura autônoma do Fórum DCASE frente ao
CEDCA no que tange, quando necessário, a realização da crítica ao poder público, por exemplo. A autonomia do
Fórum estava justamente em sua postura de não abrir mão nem da crítica pública nem das disputas de
concepções.
117

que estavam acampadas em área pública; a transferência das Unidades de Medidas


Socioeducativas de Internação e semiliberdade para administração do DESIPE e da polícia
militar; a recusa do Estado de Sergipe em realizar a Conferência Estadual de Direitos
Humanos; e, por fim, a ameaça à vida de representante do Fórum DCA-SE por sua atuação no
município de Barra dos Coqueiros. A seguir, discorrer-se-á sobre cada uma dessas denúncias.
Quanto ao não cumprimento do princípio da absoluta prioridade na destinação de
recursos do Orçamento Público Estadual, o Fórum DCA-SE116, em 2007, realizou estudos
sobre o orçamento público de Sergipe e outros municípios. Investindo em formação
específica117, as entidades foram municiadas a identificar com clareza as prioridades do poder
público para a infância nas peças orçamentárias. Como consequência dessa iniciativa, o
Fórum DCA-SE passou a inserir em seu discurso também a necessidade da prioridade
infanto-juvenil no orçamento e a exigir melhor distribuição dos recursos financeiros para esse
segmento, apontando valores e sugerindo fontes de recursos.
Como parte da denúncia, o Fórum DCA-SE confeccionou dois projetos de emendas
ao orçamento proposto pelo governo estadual. Estrategicamente, até por causa do poder
vinculante de suas decisões, foi definido que essas propostas seriam encaminhadas à

116
Em 2007 e 2008, o FNDCA, em parceria com o INESC – Instituto Nacional de Estudos Socioeconômicos, a
ANCED - Associação Nacional de Centros de Defesa da Criança e do Adolescente e a SEDH/PR - Secretaria
Especial de Direitos Humanos da Presidência da República, promoveu curso aprofundado sobre o orçamento
público. A formação foi dividida três módulos de quatro dias cada um e em momentos distintos e foi direcionado
às entidades nacionais filiadas ao FNDCA e aos Fóruns Estaduais DCA, que assumiram o compromisso de
reproduzir a experiência nos Estados.
117
A iniciativa da formação contou ainda com a parceria de algumas entidades. Dentre estas, é preciso
considerar o apoio político e técnico promovido pelo Centro de Cultura Luiz Freire - CCLF nesta atividade. O
CCLF é entidade filiada ao FNDCA e, entre tantas especialidades institucionais, tornou-se referência em análises
orçamentárias para a criança e para o adolescente. Mediante o convite realizado pelo Fórum DCA-SE para ajudá-
lo a se debruçar sobre as questões que envolvem contas públicas e desse modo realizar a leitura crítica do
orçamento público estadual, a entidade logo se prontificou em um compromisso militante com esta pauta. Assim,
o curso foi realizado em Aracaju em um módulo de três (3) dias. Seu conteúdo programático foi definido
conjuntamente com a entidade parceira com o objetivo de sensibilizar os participantes a identificarem nas peças
orçamentárias as prioridades do governo, o quantitativo financeiro destinado à infância e adolescência e quais os
caminhos possíveis para negociações em favor da criança e do adolescente. A formação direcionada às entidades
filiadas e parceiras do Fórum DCA-SE, como sindicatos, a exemplo da CUT (Central Única dos Trabalhadores),
SINTESE (Sindicatos dos Trabalhadores da Educação em Sergipe) e CTB (Central Trabalhadores Brasileiros);
representantes de movimentos sociais, a exemplo do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra),
além de assessores parlamentares afinados com a pauta infanto-juvenil, incentivou os participantes a levantar
informações quanto aos temas mais relacionados às suas pautas de reivindicação 117 nas peças orçamentárias,
como o Plano Plurianual (PPA), Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e Lei Orçamentária Anual (LOA).
Desse modo, embora o curso tenha sido dado em um módulo de três dias em Aracaju, na prática, a formação se
iniciou muito antes com a busca pelas entidades dos documentos que poderiam subsidiar a formação, tendo sido
necessário para tanto articulação política, pois, ao iniciar a busca por esses dados, o Fórum DCA-SE encontrou
várias dificuldades no que tange ao diálogo com gestores públicos e disponibilização das peças orçamentárias.
Estas somente foram repassadas ao coletivo mediante pressões políticas realizadas com o apoio do CEDCA-SE.
No entanto, nem todos os municípios conseguiram adquirir tais peças, ficando o aprendizado de que lidar com as
questões orçamentárias exige articulação, “jogo de cintura” e capacidade para negociar. Essa iniciativa
possibilitou ao coletivo um conhecimento sobre os dados reais de recursos financeiros manejados pelo poder
público, subsidiando inclusive as decisões do CEDCA-SE nas discussões sobre as políticas públicas.
118

Assembleia Legislativa de Sergipe pelo CEDCA-SE, com a pretensão de que fossem


ampliados os recursos destinados às políticas públicas para o segmento infanto-juvenil. No
dia da votação, as entidades realizaram ato público para denunciar o percentual irrisório do
orçamento reservado para a infância e chamar a atenção dos parlamentares quanto às
disparidades entre valores destinados a políticas públicas de atendimento a crianças e
adolescentes e os recursos para a realização de eventos e divulgação das ações do governo,
por exemplo. A proposta orçamentária para 2008 previa para a Fundação Renascer118 cerca de
R$ 12 milhões, sendo que aproximadamente R$ 10,5 milhões estavam destinados à folha de
pagamento dos servidores e manutenção do órgão, sobrando R$ 1,5 milhão para o custeio das
ações e novos investimentos durante aquele ano. Ao Fundo Estadual da Criança e da
Adolescência estavam previstos apenas R$ 42 mil. Em contrapartida, as entidades, por meio
do CEDCA-SE, propunham aos parlamentares transferir para o atendimento à criança e ao
adolescente R$ 2,6 milhões dos cerca de R$ 19 milhões destinados para Secretaria de Estado
da Comunicação, que deveria promover a divulgação das ações do Governo (R$ 13,1
milhões) e eventos (R$ 6 milhões). Desses recursos transferidos, R$ 1,6 milhão seria para
Fundação Renascer e R$ 1 milhão para o Fundo Estadual.
As entidades tinham pleno conhecimento de que dificilmente as emendas seriam
aprovadas, mas o objetivo era dar visibilidade à pauta, fazendo repercutir nos meios de
comunicação as informações estudadas e disponibilizadas pelo Fórum. Apesar da denúncia 119
e das propostas apresentadas conjuntamente pelo CEDCA-SE, Fórum DCA-SE e CMDCA-
Aracaju, somente em 2009 houve êxito na ampliação dos recursos no orçamento para a
Fundação Renascer e para o Fundo Estadual da Criança. Em seguida, deu-se a reprodução
desse método de analisar o orçamento em outras localidades, a exemplo do município de São
Cristóvão120.

118
A Fundação Renascer do Estado de Sergipe é o órgão responsável pelo planejamento e execução da Política
Pública voltada à Criança e ao Adolescente do Estado. Nesta, inclui-se a atenção quanto à execução das medidas
protetivas (abrigos para crianças) e socioeducativas (unidades de internação permanente, semiliberdade e
internação provisória para adolescentes autores de ato infracional).
119
Para ver as matérias relacionadas a esse momento referente à formação, as divulgações, a realização do ato
público na AL, os conteúdos debatidos e denunciados, ver nas referências matérias intituladas: “Entidades
cobram mais recursos para crianças e adolescentes”; “Fórum Convoca Entidades Para Acompanhar votação do
Orçamento Público amanhã”, “Entidades cobram mais recursos para crianças e adolescentes”. Embora essa
pauta tenha sido bem repercutida pela imprensa sergipana, esta pesquisa não contemplou a busca de informações
sobre o Fórum DCA-SE nos meios de divulgação impresso, motivo pelo qual não constam nas referências outras
fontes de divulgação além das matérias encontradas na internet.
120
No município de São Cristóvão, estudantes do curso de direito da UFS – Universidade Federal de Sergipe,
que participaram de minicurso sobre orçamento público ministrado pelo Fórum DCA-SE, realizaram
posteriormente o mesmo curso com uma comunidade dessa localidade. De posse das informações sobre os dados
orçamentários desse município, a própria comunidade, juntamente com os estudantes, ocupou a Câmara de
Vereadores a fim de chamar a atenção dos vereadores acerca da necessidade de melhores investimentos para os
119

Sobre as questões orçamentárias, o próprio CONANDA atenta para o necessário


monitoramento do SGD em relação à participação e controle social sobre a elaboração e
execução do orçamento público, uma vez que é a partir dos recursos financeiros disponíveis
que se operacionalizam os investimentos nas áreas que se pretendem priorizar (CONANDA,
RESOLUÇÃO Nº 105). No entanto, contraditoriamente, é justamente a partir da percepção de
que as deliberações dos conselhos de direitos perpassam a intervenção no orçamento público
que se tem uma intensificação ainda maior das tensões, pois a criança e o adolescente
parecem nunca ter sido prioridade 121 governamental, nem na perspectiva do atendimento,
muito menos do financiamento público. É também nessa direção que a atuação dos
conselheiros deve se orientar: conhecer os mecanismos orçamentários e financeiros do custeio
da política pública.
Quanto à truculência do Estado de Sergipe, trata-se do despejo, em 2008, de sem-teto
de área pública - prédio localizado em bairro da zona sul da cidade de Aracaju que estava
abandonado havia mais de vinte anos -, que famílias integrantes do Movimento dos
Trabalhadores Urbanos de Sergipe – MOTU, na época também filiado ao Fórum DCA-SE. As
negociações do poder público com as famílias representadas pelo MOTU foram mediadas
pelo Ministério Público do Estado de Sergipe, que propôs um Termo de Ajustamento de
Conduta, segundo o que haveria cadastro das famílias para programas de moradia e o
deslocamento temporário para uma área autorizada pelo governo do Estado.
No fim de semana seguinte ao acordo e ao direcionamento das famílias para uma
área pública, o governo do Estado, representado pela Secretaria de Segurança Pública, a
pedido da Secretaria de Estado do Desenvolvimento Econômico e da Ciência e Tecnologia,
que na área pretendia instalar o Sergipe Parque Tecnológico – SERGIPITEC, com o aval do
Governador, deslocou a polícia de choque, que retirou violenta e arbitrariamente as famílias
do local. Em virtude do número de crianças e gestantes agredidas e com impedimento de

povoados deste município, a exemplo do saneamento básico. Embora os recursos não tivessem sido ampliados
para essa comunidade, o êxito da vivência se deu no campo da experiência adquirida para a realidade específica
e, mais ainda, no campo do empoderamento da comunidade para realizar a denúncia, o que ocorreu também em
outras localidades do Estado de Sergipe.
121
A concepção de que a prioridade absoluta da criança e do adolescente deve se dar também no orçamento
público buscou fomentar a ampliação dos recursos para a infância e adolescência. Entretanto, os gestores
públicos ainda não conseguiram colocar essa ideia em prática efetiva. Segundo o CONANDA (2007), nesse
processo ter capacidade para informar com transparência e disponibilidade dos recursos, diagnósticos, planos,
projetos, gestão orçamentária por parte dos representantes do poder público e incentivar o levantamento de
informações pelas organizações da sociedade civil é fundamental (CONANDA, 2007), mas não é uma realidade
ainda, pois, como se viu, as mudanças levam tempo para se efetivarem na prática, mesmo que estas tenham se
dado no campo da letra da lei. Por esse motivo, as iniciativas da sociedade civil de chamar a atenção para essa
realidade e para a necessidade de a sociedade e os gestores entenderem que a leitura crítica do orçamento deve-
se tornar uma prática cotidiana na ação, tanto dos cidadãos quanto dos agentes públicos, são muito relevantes
para fomentar a mudança de cultura em relação às questões que envolvem recursos da comunidade.
120

retirar da área evacuada alimentação e pertences pessoais, a coordenação do Fórum DCA-SE


se deslocou para a o local chamado de “antigo kartódromo de Aracaju”, articulou o apoio da
OAB-SE, dos Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente de Sergipe e do Município
de Aracaju e convocou as entidades filiadas para prestarem solidariedade ao MOTU.
Sobre esse momento, o Fórum DCA-SE se expressou, na época, por meio da
seguinte nota pública122:
Conselhos e Fóruns da Criança e Adolescente lançam carta aberta sobre Cenam

O CEDCA, CMDCA, Fóruns DCA-SE e FACTUS manifestam em carta os últimos


acontecimentos no Cenam. O Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do
Adolescente de Sergipe – CEDCA, o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e
do Adolescente de Aracaju – CMDCA, o Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da
Criança e do Adolescente – Fórum DCA-SE e o Fórum Associativo de Conselheiros
Tutelares – FACTUS, conforme deliberação da reunião conjunta realizada no dia 27
de maio de 2009, vêm, através desta CARTA ABERTA se manifestar sobre os
últimos acontecimentos no Centro de Atendimento ao Menor do Estado de Sergipe –
CENAM – nos seguintes termos: 1- A sociedade civil elaborou um plano de gestão
para as unidades de medida socioeducativa do Estado de Sergipe com o intuito de
colaborar com o Governo na execução das medidas. Este plano não foi
implementado em sua totalidade; 2- Naquele momento, fora acordada a saída de
policias militares, que seriam os responsáveis por promoverem a transição da
segurança interna para os agentes concursados em conformidade com o preceituado
no SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo; 3- Ocorre que
infelizmente até a presente data não fora apresentado a nenhum dos Conselhos um
plano de Segurança para as Unidades e a transição sequer fora iniciada; 4- Por
isso, com o intuito de, mais uma vez, colaborar com a Gestão Governamental, vem
a Sociedade Civil em conjunto com os Conselhos de Direitos e Tutelares, propor que
o processo de transição se inicie IMEDIATAMENTE com a
consequente DESMILITARIZAÇÃO das Unidades de Medida Socioeducativas do
Estado de Sergipe, para que as mesmas possam ser dirigidas por civis. Afinal, não se
deve militarizar a política de atendimento para criança e o adolescente no Estado de
Sergipe; 5- Para isso, será necessário um esforço conjunto dos Militares que estão
desempenhando as suas atividades nas Unidades e dos Agentes de Segurança para
que possa ser construída uma alternativa efetiva de promoção e execução das
medidas socioeducativas em conformidade com o Plano de Gestão elaborado e o
SINASE; 6- Vale frisar que a alternativa construída deve prezar pela unicidade de
comando de todos os atos na Presidência da Fundação Renascer, condição
indispensável para o sucesso.

Quanto ao processo de construção e ao conteúdo do Plano de Gestão, vale considerar


que produzir o documento exigiu reuniões semanais na sede da OAB/SE e debates constantes
sobre a concepção da infância, que estava sendo e que deveria ser empregada no cumprimento
da internação, e da semiliberdade de adolescentes em conflito com a lei. As entidades da
sociedade civil conseguiram inserir no plano uma perspectiva de segurança submetida à
122
Nota intitulada, “Fórum DCA lança nota pública: Fórum lança nota sobre desocupação de kartódromo”.
Disponível em <http://www.infonet.com.br/noticias/ler.asp?id=74128> acessado em 25 de abril de 2015.
121

compreensão pedagógica das medidas, apesar dos conflitos de concepção ocorridos entre os
agentes de segurança das unidades de medida socioeducativa e militantes do Fórum DCA,
principalmente devido à tentativa das entidades de aproximar a função de segurança da
dimensão pedagógica. Os agentes de segurança alegavam que não eram agentes
socioeducativos e que se sentiam diminuídos quando se tratava de aliar seu trabalho ao caráter
educacional, sobretudo após terem sido recepcionados e formados inicialmente pelo
DESIPE123. Foi importante, por exemplo, inserir nos debates, que contaram com a presença de
muitos agentes de segurança e também de policias militares, a concepção da disciplina e
segurança da sociedade civil a partir da perspectiva pedagógica, conforme o trecho a seguir
destacado no item “III – DA ROTINA DE SEGURANÇA”, do plano de gestão das unidades:

Embora seja necessário reiterar a prevalência das condições pedagógicas sobre as


posturas punitivas, não há como se negar que faz parte do cumprimento da medida
socioeducativa, sobretudo a internação e semiliberdade, a segurança. Nesta se inclui
a segurança dos adolescentes (grifo nosso), da unidade, da equipe técnica, da equipe
de socioeducadores, demais funcionários e dos visitantes. A segurança deve atuar de
forma proativa (...) garantindo com a sua presença atenta e constante o
desenvolvimento estável e tranquilo das atividades. O sistema de segurança em uma
unidade socioeducativa se viabiliza basicamente mediante o controle de acesso e
circulação de pessoas, de veículos e de materiais envolvendo as tarefas de conferir,
registrar, comunicar, monitorar, revistar, acompanhar e autorizar (PLANO DE
GESTÃO, 2007).

123
A transferência da gestão das unidades se deu justamente no momento em que o Estado chamava os
concursados aprovados para o cargo de agente de segurança das unidades de medidas socioeducativas de
internação, internação provisória e semiliberdade. Sem qualquer formação sobre a função da socioeducação e
segurança em unidades de privação de liberdade para adolescentes, após a transferência da gestão e entrada dos
policiais e agentes penitenciários no CENAM, os concursados findaram sendo recepcionados e acolhidos
inicialmente por esses profissionais. Com eles, aprenderam a dinâmica cotidiana do fazer a segurança sem
qualquer preocupação com a perspectiva pedagógica, causando uma série de prejuízos ao campo da concepção
socioeducativa. Em trabalho de conclusão de curso de especialização [Lato Sensu] em Violência, Criminalidade
e Políticas Públicas, realizado por Carla Correia (2009) e intitulado “A In(Ter)Venção Do Corpo De Agentes
Policiais Militares No Centro De Atendimento Ao Menor De Aracaju”, que teve por objetivo avaliar o que
significou a presença dos policiais militares no CENAM para o processo de ressocialização dos adolescentes,
pode ser encontrado o seguinte depoimento coletado em entrevista: “A questão do concurso e a forma como ele
foi elaborado, para substituição dos agentes que eram contratados há muito tempo, foi muito mal feito. Foi muito
mal elaborado. Foi um concurso onde não se cumpriram as metas e ocorreu que não se capacitou quem deveria
estar trabalhando lá e aconteceu isso que a gente viu: fugas, rebeliões. O que se compreendia, o que estava claro
era que não existia um projeto político-pedagógico para o adolescente que se encontrava lá. E quando você não
sabe pra onde caminha, qualquer caminho serve. E eles utilizaram um caminho que aparentava ser o da violência
física e psicológica. Foi um dos momentos mais críticos, com intervenção dos conselhos, da OAB, do Fórum
DCA” (Depoimento de um representante da sociedade civil) (CORREIA, 2009, p. 49). Nesse sentido, concorda-
se com a análise da pesquisadora quanto ao fato de que esse processo demonstra em grande parte o dano que foi
para a concepção pedagógica da medida socioeducativa a transferência da gestão da unidade de socioeducação
para adolescentes em cumprimento de medida de internação, internação provisória e semiliberdade, ao DESIPE
e aos militares. Para a formação dos agentes de segurança em especial, “não foi planejado um curso de seis
meses antes para o pessoal adquirir técnicas de segurança. Eles simplesmente foram pegos e colocados lá”
(CORREIA, 2009, p. 49). O prejuízo já havia sido muito grande em relação à formação e acolhimento dos
agentes de segurança.
122

Embora essa ação do Fórum DCA-SE tenha marcado a sua efervescência política,
contando com a atuação articulada dos conselhos de direitos, cujos presidentes participavam
ativamente da construção de estratégias e táticas políticas em prol da infância, a
operacionalização do Plano de Gestão não é alcançada em sua totalidade. Segundo avaliação
posterior feita pelo coletivo das entidades, houve ganhos importantes e algumas experiências
exitosas124 com a aplicação parcial do Plano, que, porém, foi posteriormente engavetado pelo
governo estadual 125 e mesmo o grupo de trabalho, que deveria ter sido criado para sua
elaboração e monitoramento, acabou não sendo formalmente criado pelo Governador, apesar
do trabalho realizado pela sociedade civil e da entrega efetiva dos resultados de suas
discussões em forma de Plano de Gestão.

124
Em 2008, a Fundação Renascer, na gestão da Secretária Ana Lúcia, investiu em oficinas de hip hop para
adolescentes e, nesse mesmo ano, vários adolescentes iniciaram práticas de confecção de grafites, mudando o
visual interno das unidades, dando a identidade dos jovens. Além disso, os adolescentes começaram a compor
letras de música que descreviam suas próprias realidades e fomentavam ainda reflexões importantes do ponto de
vista das causas que levam o adolescente a cometer atos infracionais. Era exposta a realidade de violência
vivenciada durante a infância por parte da família ou mesmo nas instituições por que eventualmente tinham
passado. Essas composições resultaram no lançamento de dois CDs, a realização de vários shows no Estado e
apresentação durante VIII Conferência dos Direitos da Criança e do Adolescente (esferas Municipal, Estadual e
Nacional).
125
No dia 27 de maio de 2009, foi realizada reunião conjunta CMDCA-Aracaju e CEDCA-SE, com participação
da coordenação e das entidades do Fórum DCA-SE, para tratar de outras denúncias relacionadas às medidas
socioeducativas de privação de liberdade para adolescentes. Essa reunião, que contou ainda com representação
de conselheira do CONANDA e dos conselheiros tutelares, integrantes do Fórum DCA-SE e do CEDCA-SE,
teve o relato de maus-tratos a adolescentes em unidades de internação. Apresentou-se ainda o fato de os
presidentes dos CEDCA-SE e do CMDCA-Aracaju junto com a coordenadora do Fórum DCA-SE terem
pessoalmente se dirigido ao juiz substituto da 17ª Vara de Execuções de Medidas Socioeducativas para relatar a
existência de adolescentes com marcas de violência e tortura e solicitar que este determinasse o exame corpo de
delito em dezessete adolescentes, cujos nomes lhe foram entregues pelos representantes do CEDCA, CMDCA e
Fórum. Após o relato dos fatos testemunhados e a denúncia realizada, os Conselhos aprovaram, tendo a presença
majoritária de representes da sociedade civil, os seguintes encaminhamentos: 1 - carta aberta assinada pelo
CEDCA, FACTUS, CMDCA e FÓRUM DCA; 2 - comissão de sindicância mista composta por 05 pessoas;
sendo 03 do CEDCA (esfera não governamental: Ana Cristina e Marcelo Leite e governamental: Danival Falcão)
e 02 do CMDCA (José Humberto de Góes Junior – organização não governamental – e um representante do
município a ser indicado posteriormente). A comissão teria como foco a apuração da fuga (24/05/2009) e a
rebelião ocorrida no dia 18/05. Seu prazo de trabalho seria de trinta dias, podendo ser prorrogado pelo mesmo
período; 3 - criação do grupo de trabalho para monitorar, contextualizar e atualizar o plano de gestão do sistema
socioeducativo do estado de Sergipe, formado pelo CEDCA, Fórum DCA, FACTUS, OAB, SEIDES, Polícia
Militar, CMDCA/Aracaju, sendo coordenado pela comissão de políticas públicas para a infância e a adolescência
do CEDCA (CEDCA, 2009). Nessa reunião ainda foi aprovada a Resolução nº 10/2009 a respeito do
cumprimento do princípio da absoluta prioridade no atendimento de crianças e adolescentes, sobretudo nos casos
de violência sexual.
123

Vale ressaltar que, durante todo esse processo, já havia uma compreensão por parte
das entidades integrantes do Fórum que os resultados poderiam não ser alcançados conforme
a proposta ou que outros efeitos poderiam surgir de toda a ação política desempenhada. O
mais importante era o processo, era desenvolver a ação tendo clareza do que se buscava, de
quais eram os princípios que a moviam e perceber que alguns resultados são visíveis no
momento histórico em que se dá ação política e outros necessitam de anos para serem
produzidos e assimilados.
Quanto à recusa do Estado de Sergipe em realizar a Conferência Estadual de Direitos
Humanos, em 2008, chegou ao conhecimento do Fórum DCA-SE, através de integrante do
Fórum DCA-SP que Sergipe seria o único Estado do país a não realizar a Conferência
Estadual de Direitos Humanos, sob a justificativa da não previsão orçamentária para esse fim
por parte da Secretaria de Justiça – SEJUC. A partir dessa informação, o Fórum DCA-SE
iniciou uma série de articulações para denunciar a situação e, ao mesmo tempo, sensibilizar a
sociedade em geral sobre a importância das Conferências. Por meio destas, viabilizaram-se
debates, diálogos e reflexões crítico-coletivas com o poder público acerca das realidades
vivenciadas por diversos grupos que se encontravam em condição de vulnerabilidade e
opressão, como era o caso da maioria dos participantes da Conferência de Direitos Humanos.
Essas discussões tiveram por objetivo a busca de alternativas conjuntas com vistas à melhoria
das condições de vida da população mais oprimida, como a criança e o adolescente.
Para a realização da Conferência de Direitos Humanos, o Fórum DCA-SE iniciou
articulações e contatos com parlamentares (do âmbito Estadual e Federal) sensíveis à pauta
dos direitos humanos. Estes atuaram como mediadores do diálogo entre a sociedade civil,
representada pelo Fórum DCA-SE e pelo Movimento de Direitos Humanos, e o governo do
Estado, por meio do Secretário de Justiça. Desse modo, foi possível reverter a decisão do
governo que instituiu GT - Grupo de Trabalho para organizar o evento.
Apesar disso, o Fórum DCA-SE produziu uma Carta Aberta126, que foi veiculada nos
meios de comunicação, para informar a população sobre o conturbado processo de realização
da Conferência. Ao mesmo tempo, fez críticas à postura do governo em relação a algumas
temáticas de direitos humanos, como a situação enfrentada pelas famílias do MOTU e pelos
adolescentes privados de liberdade, e, por último, expôs os motivos que fizeram o Fórum
DCA-SE se negar a integrar o GT instituído pelo governo.

126
Ver “Carta Aberta - Posicionamento do Fórum DCA-SE Sobre a Conferência de DH Em SE”, disponível em
<http://infanciaurgente.blogspot.com.br/2008/08/carta-aberta-posicionamento-do-frum-dca.html>. Acessado em
25 de abril de 2014.
124

Constatado que a conferência não permitiria com o seu formato abarcar a pluralidade
de temas que envolvem a pauta dos direitos humanos e/ou contemplar uma participação ampla
e plural dos vários segmentos da sociedade, o Fórum DCA-SE decidiu não integrar o GT
constituído pelo governo para organizar a Conferência Estadual de Direitos Humanos.
Contudo, participou do evento e apresentou para aprovação pela plenária moção de exigência
para a criação de uma Secretaria de Direitos Humanos vinculada diretamente à pessoa do
governador 127 , bem como moção de repúdio ao governo, que, por meio da Secretaria de
Segurança Pública, empreendeu a violação de Direitos Humanos contra o MOTU -
Movimento Organizado dos Trabalhadores Urbanos.
Quanto à ameaça à vida de membro do Fórum DCA-SE por sua atuação no
município de Barra dos Coqueiros, em 2009, o representante de associação do município
Barra dos Coqueiros foi eleito presidente do CMDCA-Barra dos Coqueiros. Desde então,
formalizou ao Ministério Público denúncias quanto à falta de estrutura para funcionamento do
conselho de direitos e do conselho tutelar, que resultou em bloqueio das contas da prefeitura
da Barra dos Coqueiros para que fosse priorizado o investimento em políticas públicas à
infância e adolescência; ao transporte escolar clandestino de crianças, que contava com a
participação de policiais e tinha a conivência do município (resultou na realização constante
de blitz de fiscalização e apreensão de veículos); à falta de merenda escolar em todas as
escolas do município e dos povoados, que resultou em um Termo de Ajuste de Conduta
assinado pelo prefeito da Barra dos Coqueiros, Gilton dos Anjos, em audiência no Ministério
Público; à existência de uma rede de abuso e exploração sexuais infanto-juvenil, que resultou
também na realização de blitz para o combate da situação e ao uso de drogas. Não muito
depois das denúncias, o militante teve seu estabelecimento comercial invadido por homens
armados e encapuzados. O militante conseguiu fugir, mas sua irmã foi violentamente
agredida.
Diante do caso, o Fórum DCA-SE realizou denúncias, buscou o apoio político de
entidades e órgãos de âmbito nacional e local, de parlamentares e, ainda, emitiu notas, entre as
quais, conforme o seguinte excerto de uma delas:

O Movimento Social da Infância, através do Fórum Estadual de Defesa dos Direitos


da Criança e do Adolescente – Fórum DCA-SE – vem tornar público os
acontecimentos envolvendo a AÇÃO VIOLENTA, ILEGAL, DESUMANA E
COVARDE quem vem acontecendo contra o Cidadão (nome omitido), membro
deste Fórum, através da entidade (nome omitido), Presidente do Conselho Municipal
dos Direitos da Criança e do Adolescente da Barra dos Coqueiros e da Associação

127
Essa Secretaria foi criada no ano de 2011, com o argumento do governador de que estaria atendendo a uma
sugestão do Secretário de Justiça e da Ministra de Direitos Humanos.
125

de Bares deste município (...) Preocupados com a situação, nós entidades filiadas ao
Fórum DCA-SE, vimos por meio desta Nota Pública solicitar PARCERIA, APOIO
POLÍTICO E PROTEÇÃO para (nome omitido), a toda rede de comunicação, aos
órgãos locais competentes e organismos de âmbito nacional e internacional no
sentido de dar VISIBILIDADE PÚBLICA à situação relatada, que vem acontecendo
na atual administração do município da Barra dos Coqueiros do Estado de Sergipe, a
fim de que possamos também, fortalecer e garantir os princípios constitucionais da
democracia, da participação político-popular e combater o movimento nacional de
criminalização e perseguição aos movimentos sociais através de suas lideranças, que
vem crescendo no país. Por fim, o Fórum DCA-SE entende que os acontecimentos
relatados se constituíram e se constituem em atentados contra a vida de (nome
omitido) e, portanto, se eles continuarem a acontecer, as autoridades públicas devem
ser responsabilizadas, uma vez que os fatos já foram narrados e o caso já se tornou
público, tendo sido inclusive divulgado pela mídia e no próprio parlamento
128
sergipano (FÓRUM DCA-SE, 2015) .

Após as denúncias feitas pelo Fórum DCA-SE, o caso ganhou repercussão nacional
e uma série de articulações ocorreu para tentar garantir proteção à liderança, entre estas,
reuniões com o Secretário de Segurança Pública, com o Comandante-Geral da Polícia
Militar e com a promotoria de controle externo da atividade policial, todas articuladas com
apoio da Frente Parlamentar Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente. Ainda
assim, a liderança teve seu empreendimento comercial incendiado, sendo o defensor, em
seguida, inserido no Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos ameaçados de
morte, da Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República.
Com a pressão da sociedade civil, deu-se o afastamento dos policiais civis e militares
que estavam relacionados às denúncias e, talvez, às novas ações contra a liderança. Acabou,
porém, prevalecendo, nesse caso específico, a versão constituída pela polícia civil de que os
atos praticados contra o integrante do Fórum DCA-SE na Barra dos Coqueiros haviam sido
praticados por sobrinho seu, supostamente envolvido com o tráfico de drogas. Isso foi
utilizado para desacreditar o Fórum, bem como todos que lhe davam apoio para garantir a
integridade física e psicológica do militante.
De volta à ação em geral do Fórum, é importante destacar que as exposições públicas
na mídia eram acordadas entre os dois conselhos (Estadual e Municipal de Aracaju) e o
Fórum DCA-SE. Essa forma de trabalho garantiu a pressão social sobre os governos, chamou
atenção de outras instituições para se filiarem e recorrerem à articulação da sociedade civil,

128
Por motivos de segurança, este trabalho preservará o nome da pessoa que sofreu violência, bem como outras
fontes dessas informações relacionadas. Apenas informa que o caso foi encaminhado para o governo do Estado
de Sergipe, CONANDA, ANCED, FNDCA, Conselho Federal da OAB, UNICEF, MNDH, Justiça Global, Rede
ANDHI, Frente Parlamentar Nacional pela Infância e Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da
República – SEDH/PR.
126

que se evidenciou, nesse processo, como espaço de união, articulação, interlocução e força da
sociedade civil organizada, além de foro legítimo para tratar de assuntos referentes à criança e
ao adolescente.
No final de 2008 e início de 2009, o Fórum já não conseguia participar de todas as
demandas que lhe eram trazidas devido à ausência de recursos financeiros que possibilitassem
a logística e a presença nos espaços. Frise-se que as atividades eram, em sua maioria,
executadas com dificuldades e financiadas a partir da consciência crítica e política das
entidades e militantes do Fórum DCA-SE. Com a participação de entidades não
governamentais situadas no interior do Estado, promoveu-se a descentralização e
interiorização das ações do coletivo. Dessa forma, o Fórum passou a apoiar a atuação das
entidades filiadas nos municípios de Indiaroba, Poço Verde, Estância, São Cristóvão, Barra
dos Coqueiros, Simão Dias e Ribeirópolis, também a partir da consciência crítica e política
das entidades e militantes dessas cidades.
Considerando o conjunto das iniciativas do Fórum DCA-SE, avaliar sua atuação em
algumas situações é possível frente ao que é imediatamente perceptível, a exemplo das
iniciativas destacadas nesta dissertação. No entanto, o impacto de seu investimento em muitas
situações, como em relação à mudança de cultura, é difícil mensurar, uma vez que os seus
resultados ainda não aconteceram ou, se já tiverem ocorrido, não são perceptíveis por
completo. O mais importante é observar que a postura política adotada pelo Fórum DCA-SE
foi o que gerou todo o processo de construção promovido nesse período. No entanto, também
cabe destacar que não se abriu mão do diálogo, da problematização, da reflexão e da ação
conjugadas, o que permite afirmar que a luta política e a denúncia, desempenhadas nos anos
de 2007 a 2009, tiveram uma conotação pedagógica para todos os integrantes do Fórum e para
agentes públicos que puderam conviver com toda a ação.
A participação unificada e, com a formação contínua no processo, cada vez mais
qualificada da sociedade civil, fortaleceu-se e se deu visibilidade não apenas ao próprio
espaço do Fórum DCA-SE, mas também aos conselhos deliberativos de políticas públicas
infanto-juvenis, que passaram a assumir de fato seu papel no Estado de Sergipe, no município
de Aracaju e, possivelmente, com a interiorização do Fórum, em outros municípios
sergipanos.
É nesse sentido que o Fórum DCA-SE pode ser pensado também enquanto espaço
pedagógico de dimensão política, que compreende a educação e as questões mais essenciais
da existência humana, pois atua sobre o pensar, o fazer e o sentir dos sujeitos. Como afirma
Paulo Freire (2005), o processo de libertação exige de homens e mulheres a comunhão de
127

ações a partir do diálogo, que só se concretiza por meio da humildade nas relações mantidas
na busca conjunta do conhecimento. Assim, nesse processo, o diálogo é o encontro de homens
e mulheres para ser cada vez mais. No caso do Fórum DCA-SE, o diálogo se inicia desde a
escolha das pautas a serem refletidas e dialogadas até a ação concreta realizada e avaliada
posteriormente.
Nesse contexto, percebe-se que, “promovendo a percepção da percepção anterior e o
conhecimento do conhecimento anterior, a descodificação, desta forma, promove o
surgimento de nova percepção e o desenvolvimento de novo conhecimento” (FREIRE, 2005,
p. 127). Mediante o novo e no encontro dos sujeitos, promovidos pelo diálogo e mediatizados
pelo mundo, se pronuncia e se modifica o mundo. Em outras palavras, na tentativa de
pronunciar o mundo novo, modifica-se a realidade, pois “o mundo pronunciado, por sua vez,
se volta problematizado aos sujeitos pronunciantes, a exigir deles novo pronunciar”
(FREIRE, 2005, p. 90), sem que exista palavra verdadeira que não seja na práxis.
Daí se dizer, em Freire, que a “palavra verdadeira seja transformar o mundo” em um
contexto em que problematizar deve ser o pano de fundo das investigações e descobertas,
rumo à libertação de homens e mulheres, de crianças e adolescentes, enfim dos oprimidos,
pois nenhuma “ordem” opressora suportaria que os oprimidos todos passassem a dizer: por
quê? Esta é a razão por que a concepção problematizadora da educação não pode servir ao
opressor.
Nesse contexto, cada pessoa que constrói na coletividade necessita vivenciar as
etapas de formação, tanto na ação como na reflexão. Essa formação, entendida como prática
de educação não formal, pois se situa além do espaço exclusivamente escolar, trata de uma
educação que valoriza estrategicamente o caráter político da construção social e a perspectiva
pedagógica que a caracteriza como práxis autêntica do trabalho, da ação-reflexão, da palavra.
Afinal, “não é no silencio que os homens se fazem, mas na palavra (...)” (FREIRE, 2005,
p.90).
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho analisou a trajetória do Fórum DCA-SE no período compreendido entre


os anos de 2000 a 2009. Com o suporte da teoria social crítica dos direitos humanos e da
teoria dos novos movimentos sociais129, o levantamento de dados ocorreu a partir da avaliação
de documentos elaborados pelo Fórum DCA-SE, como relatórios, atas, notas públicas,
ofícios, chamadas de reuniões, entre outros; atas e resoluções expedidas pelos Conselhos de
Direitos da Criança e do Adolescente (Estadual e Municipal de Aracaju); matérias
jornalísticas disponíveis na internet e memória militante da autora, para demonstrar a
importância dessa rede de defesa da criança e do adolescente, bem como suas limitações,
fragilidades, contradições e potencialidades.
Inicialmente é importante considerar o desafio de refletir sobre um campo em que se
atuou e se engajou durante os anos estudados. Era preciso pensar sobre a própria atuação
política amparada em referenciais teóricos e críticos que auxiliassem o entendimento sobre
essa ação, seja individual, seja coletiva. Na prática, a luta dos que ousam atuar militantemente
em articulações e construções coletivas por causas sociais exige atuação contínua, e as
reflexões nesses espaços vão se dando apenas no sentido de pensar e repensar as próximas
ações, sem aprofundamento sobre os seus significados no contexto da história e da conjuntura
em que essas iniciativas vão acontecendo.
Era preciso enfrentar algumas ideias preconcebidas acerca dos Fóruns, fruto das
cristalizações da prática e ao mesmo tempo assumir o compromisso de devolver ao coletivo as
reflexões sobre sua trajetória. Este trabalho, portanto, além do campo científico, contou com o
apoio e ajuda de outros militantes que integraram a coordenação do Fórum DCA, no sentido
de rememorarem e “re-vivenciarem” as experiências em análise, agora sob um prisma
diferenciado de voltar ao tempo para “re-ad-mirarem” o objeto cognoscível e “re-codificá-lo”
para compreendê-lo melhor, colocando-o sob a perspectiva investigativa, motivo pelo qual
este trabalho assume um horizonte coletivo. Segundo Freire, não somente por representar o
conjunto dos que participaram desta iniciativa, mas também por ser expressão dos que foram
buscados a “re-significar” esse espaço de participação.
Do ponto de vista pedagógico, o esforço e desafio dos sujeitos políticos em relembrar
um contexto vivido na coletividade e reconfigurar sua participação, colocando-a em análise,
para traduzi-la posteriormente para esse mesmo coletivo, entre outras redes de semelhante

129
Ver Alonso (2009), Nunes (2014) e Gohn (2009).
129

atuação, aponta para uma práxis que busca superar os verbalismos próprios dos que refletem
sem atuar e os ativismos próprios dos que atuam sem refletir.
O engajamento nas lutas sociais seguiu, paralelamente à construção deste trabalho,
no Movimento Nacional de Direitos Humanos de Sergipe, catalisando, nesse cenário de tantas
ameaças às instituições democráticas e aos direitos humanos, ainda mais a reflexão sobre a
dimensão democrática e de atuação de espaços como o Fórum DCA.
Este diálogo crítico com a academia, entre os saberes populares e os científicos, entre
o discurso e a ação, precisa ser constantemente incentivado e alimentado, posto que a
realidade somente vai tomar o curso de uma ação transformadora em direitos humanos se
tanto a academia for chamada à luta quanto os militantes forem chamados a refletir sobre suas
ações.
Desse modo, considerando o histórico de lutas desde a década de 1980, que culminou
em 1990, com o Estatuto da Criança e do Adolescente, salienta-se que a implementação do
projeto político de proteção, promoção e defesa integral da criança e do adolescente, dentro de
um Sistema de Garantia de Direitos, integra o sentido da existência e da luta dos Fóruns DCA,
tanto nacionalmente quanto nos Estados.
A percepção inicial era de que o Fórum DCA-SE se caracterizava enquanto
movimento social capaz de transformar radicalmente as estruturas basilares da sociedade. No
entanto, o processo de investigação levou a perceber que o Fórum chamou a atenção para
pautas importantes e até conseguiu alcançar certas conquistas, no entanto, além de não ter
como elementos uma perspectiva de movimento de massa, os impactos de sua luta vão no
sentido da manutenção dos direitos já adquiridos, o que por si só é relevante e significativo,
mas não alcança o sentido inicial projetado.
Em que pese a teoria dos novos movimentos sociais considerar que fóruns 130 e
conselhos tenham atuado enquanto parceiros dos movimentos ou mesmo substituído alguns
dos movimentos sociais de massa característicos das décadas anteriores a 1990, mediante a
nova conjuntura social de fomento da criação de novos espaços de participação, com ênfase
nas pautas identitárias, como a criança e o adolescente, nossa percepção é de que essas redes,
bem como outras configurações de participação social do período pós 1990 não parecem se
constituir enquanto tais.

130
Fórum Social é um espaço de debate democrático de ideias, aprofundamento da reflexão, formulação de
propostas, troca de experiências e articulação de movimentos sociais e redes, ONGs e outras organizações da
sociedade civil que se opõem a toda forma de dominação.
130

Pondera-se que fóruns e conselhos sejam importantes do ponto de vista das


denúncias e do evidenciamento das pautas que chamam a atenção para questões atualmente
opressoras, como o abuso e a exploração sexuais de crianças e adolescentes, os debates sobre
a redução da maioridade penal e o extermínio da juventude negra, entre outros. Eles, no
entanto, não são ou não têm sido capazes de promover mudanças profundas e significativas no
conjunto da estrutura da sociedade, uma vez que não discutem ou pelo menos não se
aprofundam nos debates que envolvem a luta de classe social e/ou não têm pensado um
projeto político de sociedade com destaque para as contradições promovidas pela política
capitalista neoliberal, que acirra as desigualdades sociais, multiplicando a distância entre os
mais pobres e os mais ricos.
Por um lado, fica evidente a necessidade do direcionamento das pautas para o
incentivo à consciência crítica dos envolvidos sobre a própria relação entre a sociedade civil e
as consequências opressoras de uma realidade regulada por um projeto capitalista de
sociedade. Mas, por outro lado, sabe-se que essa consciência crítica de classe, embora
incentivada pela coordenação do fórum, na direção a apontar para a dialética dessas
contradições, que envolvem o papel do Estado, as políticas sociais e as questões públicas
relativas à criança e ao adolescente, não se opera para todo o coletivo do mesmo modo.
Afinal, cada sujeito tem sua particularidade, sua história e, portanto, sua própria forma de
perceber e apreender a realidade concreta.
E é justamente na diversidade dos sujeitos e dessas percepções e concepções que se
exteriorizam as diferenças e, por consequência, os conflitos, as contradições, as tensões e
fragilidades. No entanto, as reflexões provocadas por essa rede, mediadas por suas
coordenações no interior do Fórum DCA-SE, possivelmente contribuíram para a formação
política dos participantes desse coletivo e conseguiram, em muitos momentos, alcançar
hegemonia e unidade, considerado o fato de que na sociedade em que se vive o processo é de
luta contínua.
As análises realizadas neste trabalho nos conduziram a afirmar que o Fórum DCA-
SE representa uma mobilização social 131 ou uma ação contundente importante sob a
perspectiva pedagógica de luta pela promoção e defesa dos direitos da criança e do
adolescente, com incidência nas políticas públicas.

131
A mobilização social é a confluência um grupo de pessoas, de uma comunidade ou de uma sociedade para
decidir e agir com objetivo comum, em busca de resultados decididos e desejados por todos.
131

No caso do Fórum DCA-SE, percebe-se que essa rede conseguiu alcançar algumas
vitórias relevantes no sentido, como dito, de não se retroceder nas conquistas já adquiridas no
campo dos direitos. Entretanto, do ponto de vista da análise e da reflexão do Fórum, são
perceptíveis também os limites dessa atuação frente a sua condição de espaço interclassista
atuando em uma sociedade capitalista. Na sociedade capitalista neoliberal, a lógica do
mercado influencia boa parte das instituições da sociedade civil, o que define os limites da
atuação do Fórum DCA-SE, pois, enquanto para algumas entidades filiadas ao Fórum
fortalecer a sociedade civil significasse atuar com foco nas políticas públicas e na
consolidação da democracia participativa, para outras talvez tivesse significado a
possibilidade para obtenção de maior quantidade de recursos financeiros e, por consequência,
maior possibilidade de firmar parcerias com o Estado, como refletido neste trabalho.
Por esses contextos, é inevitável constatar que, a depender da hegemonia
preponderante no Fórum, podem-se abrir espaços eventualmente para projetos individuais
e/ou institucionais não alinhados com perspectiva emancipatória, comprometendo a
autonomia das entidades e do próprio Fórum DCA, principalmente se nesse momento a
preocupação das entidades for seguir alinhamento com as ações do governo.
Por outro lado, vale chamar a atenção para a natureza não estatal do Fórum DCA-SE,
como ponto relevante na análise que o coloca em condição de maior independência e
autonomia frente aos agentes e instituições públicas, em que pese isso, ao mesmo tempo,
colocar em evidência suas contradições. Apesar da natureza não estatal do Fórum DCA-SE,
ele atuou, em alguns momentos, em função de exercício na instrumentalidade do Estado, sob
a forma de luta para se inserir nos conselhos de direitos. A contradição não se encontra em
atuar na esfera estatal com vistas a interferir nas políticas públicas voltadas à infância e à
adolescência, mas na intenção de ocupar esse espaço em função de obter algum “benefício”
pessoal, político ou financeiro, em favor de sua própria organização. Chama-se a atenção,
assim, para a limitação de algumas entidades do Fórum DCA de não perceberem
possibilidades de mudança para além dessa institucionalidade, o que indica momentos de
fragilidade do Fórum DCA-SE, evidenciados, principalmente, quando entidades filiadas
recebiam do governo estadual ou municipal recursos financeiros ou possuíam o interesse em
receber tais benefícios, sob a forma de convênios.
Interessa destacar o fato de que essas e outras contradições, limites e fragilidade do
Fórum geraram disputas internas de concepções sobre o seu fazer coletivo, o fazer das
próprias entidades nos seus locais de atendimento, a perspectiva assistencialista e não
132

assistencialista da política infanto-juvenil e mesmo a concepção da criança e do adolescente,


principalmente nos debates relativos à maioridade penal.
Talvez tenha sido esse um dos motivos pelos quais, a partir de 2011, o Fórum DCA-
SE foi gradativamente deixando de ser referência política para os sujeitos coletivos, atores e
órgãos que atuam com o segmento infanto-juvenil. A nosso ver, isso ocorreu porque, além de
o Fórum DCA-SE não se incorporar à luta de classes e de transformação, parece ter havido
um processo posterior de despolitização e/ou restrição dos debates sobre direitos a políticas
públicas encaradas como prestação de serviços a um público colocado na condição de
“consumidor”.
Sem desconhecer essas limitações dadas pelo contexto sócio-histórico-político, é
importante compreender a ação do Fórum e suas estratégias. Como exposto no corpo desta
dissertação, não é porque no seio da pesquisa se descobre que a ação junto ao Estado pode
restringir o impacto de uma práxis política que esta perde a necessidade de ser compreendida,
ao contrário, é preciso estudá-la sem perder de vista as circunstâncias em que esse prejuízo se
deu, até para que os sujeitos da ação coletiva, em contato com as conclusões de pesquisa, se
as considerarem plausíveis, possam se conscientizar sobre os seus limites e criar mecanismos
para estimular potencialidades dessa rede de articulação.
Nesse contexto é preciso ainda avaliar que, por outro lado, o Fórum sozinho não
pode ter a responsabilidade de transformar a sociedade - e não a tem. Não se pode atribuir a
ele a reponsabilidade que é de um todo. Em que pesem as críticas realizadas aos teóricos que
refletem sobre os novos formatos de participação social, não há como desconsiderar as
mudanças do próprio perfil dessa participação em face da conjuntura que se apresentou nos
pós 1990, com relações de poder e de força muitas vezes desfavoráveis à participação e à
reflexão para além das pautas de gênero, étnico-racial e LGBTT, entre outras.
Contudo, mesmo em meio a todas as contradições e limites ocorridos no período
analisado, o Fórum DCA-SE contribuiu para o processo de politização do Conselho. As
mudanças na forma de atuar do Conselho Estadual deslocaram a dinâmica interna de um
modo quase exclusivamente técnico, operacional e burocrático para uma dimensão política.
Entende-se que, se o Fórum DCA-SE atingiu seu momento de efervescência política
nos anos de 2007 a 2009, foi em razão de sua atuação alinhada com o pensamento mediado
pelo processo da ação-reflexão-ação. A postura de parceria e proposição do Fórum DCA-SE
frente aos Conselhos de Direitos e mesmo de outros órgãos e agentes públicos foi assumida
sem que se abrisse mão, quando necessário, da crítica pública a esses mesmos órgãos e
agentes públicos.
133

Em virtude da concepção preponderante de enfrentar esses conflitos na formação


política, nos debates permanentes e no diálogo reflexivo mediado pela coordenação do
Fórum, prevaleceu nesse período a hegemonia propagada pelas entidades militantes com seus
projetos ideológicos definidos em razão de uma práxis caracterizada por uma atuação
político-pedagógica de compreensão sobre a educação não formal, entendida como aquela que
se estende para além dos muros institucionais de educação formal - as escolas.
Por isso a importância de sua ênfase na adoção de uma postura permanentemente
dialógica de construção de uma práxis pautada no diálogo, com vistas à criação de condições
para horizontalizar as relações, denunciar as opressões, anunciar e pronunciar outro mundo,
com forma mais humildade e fraternidade de viver em sociedade.
Nota-se que, no período estudado, o Fórum DCA-SE soube ocupar lugar estratégico
no SGD, como articulador, aglutinador e mobilizador da sociedade civil para o
monitoramento da execução da política da criança e do adolescente, como reflexo da relação
teórico-prática da ação que foi avaliada continuamente para qualificar as intervenções futuras
e voltar a ser objeto de reflexão coletiva. Assim, enfatiza-se a importância da atuação pautada
na práxis enquanto atividade real, transformadora do mundo, sob a forma de ação contundente
que corresponde a uma necessidade prática de transformar pontualmente a realidade na qual o
Fórum DCA-SE atuava.
Destaca-se a promoção permanente pelo Fórum DCA-SE da crítica pública, de
debates, de reflexões, de avaliações, de proposições, de formação, de reivindicações e de
denúncias pela efetivação dos direitos humanos infanto-juvenis. Identificam-se, como
principais estratégias político-pedagógicas, que o fizeram promover mudanças significativas
na política da criança e do adolescente no Estado de Sergipe, no período analisado, entre
outras, a incidência política sobre os Conselhos de Direitos da Criança e do Adolescente; a
construção da unidade a partir do investimento na formação política dos sujeitos individuais e
coletivo; a conquista da visibilidade pública enquanto espaço fundamental de intervenção para
o segmento infanto-juvenil de Sergipe, com a participação efetiva de seus integrantes nos
espaços políticos e públicos de discussão sobre a criança e o adolescente; o estreitamento da
relação com alguns meios de comunicação; e, por fim, a realização constante de denúncias de
violação de direitos humanos de crianças e adolescentes no Estado, como o descumprimento
do princípio da prioridade absoluta na destinação de recursos do Orçamento Público Estadual
para políticas relacionadas à criança e ao adolescente; a truculência do Estado de Sergipe no
despejo de famílias ligadas ao MOTU, que estavam acampadas em área pública; a
transferência das Unidades de Medidas Socioeducativas de Internação e semiliberdade para
134

administração do DESIPE e da polícia militar; a recusa do Estado de Sergipe em realizar a


Conferência Estadual de Direitos Humanos em 2008; e, por fim, a ameaça à vida de
representante do Fórum DCA-SE por sua atuação no município de Barra dos Coqueiros.
Essas estratégias fomentaram o amadurecimento dos sujeitos políticos por meio do
investimento nas trocas de experiências, de afetos, de relações de conhecimento, de
solidariedade, de reconhecimento de identidades, de significados e de reestruturação da
unidade do grupo em relação às propostas coletivas pretendidas. Essa identidade foi
construída no processo do aprendizado, no desenrolar da atuação política e coletiva do Fórum
DCA-SE, pode-se dizer, “durante o caminhado”, e trouxe à tona o conhecimento e o
reconhecimento da consciência crítica dos sujeitos coletivos envolvidos nessa rede sobre as
coisas e o universo infanto-juvenil. Um reconhecimento que estimulou, pelo processo interno
e subjetivo, os sujeitos envolvidos nessa causa coletiva a darem sentido às suas ações, fossem
elas individuais ou coletivas.
Estimulou-se, também, a postura de enfrentamento e proposição de seus integrantes
junto à rede que integra o SGD, o que, por consequência, proporcionou uma formação e um
discurso coletivo mais nivelado sobre a história e as formas de situar a infância e a
adolescência no tempo e no espaço enquanto segmento oprimido que precisa saltar dessa
condição para a concepção de crianças e adolescentes sujeitos de direitos. Desse modo, seus
integrantes militantes foram capazes, em alguns momentos, de impedir retrocessos na
condução da política infanto-juvenil no sentido da garantia da proteção integral e da
promoção dos direitos da criança e do adolescente, por meio de pressões políticas pela
aprovação de Resoluções sobre a matéria em pauta.
A práxis que constituiu o Fórum DCA-SE nos anos de 2000 a 2009 se evidenciou
como uma potencialidade que fez dessa rede um sujeito político coletivo estratégico na
conjuntura política sergipana nesse período. É nesse sentido que se torna possível
compreender a atuação do Fórum DCA-SE como referência de atuação emancipatória capaz
de fomentar a participação e o controle social para a elaboração e aplicação de políticas de
direitos humanos infanto-juvenis em Sergipe. Em que pesem suas contradições, o Fórum foi
capaz de promover reflexões e mudanças significativas na problemática da criança e do
adolescente desse Estado.
Ficou evidente que em dado momento a atuação do Fórum DCA-SE foi contundente
e significativamente relevante na política infanto-juvenil do Estado de Sergipe,
principalmente entre os anos de 2005 a 2009, e que, posteriormente, por volta dos anos 2011,
houve arrefecimento dessa contundência e relevância, cuja ocorrência é igualmente
135

importante analisar ou entender. É preciso compreender se esse arrefecimento se deu por


conta da conjuntura política ou em função de essa ser uma rede focada na atuação sobre
pautas que, embora direcionadas para a infância e adolescência, não se debruçam sobre a luta
de classe social e as formas de organização política da sociedade, entre elas, o significado da
luta em um contexto neoliberal capitalista.
De outro modo tem que se pensar como seria ou quais seriam as condições
necessárias para uma ação futura desse Fórum que o coloque na mesma dimensão que
alcançou nos anos de 2000 a 2009, principalmente entre os anos 2005 a 2009, em que sua
atuação o projetou no cenário político sergipano enquanto referência de luta social.
O Fórum DCA-SE provocou nesse período mudança de posturas, de concepções e de
atitude nas entidades não governamentais e governamentais e provocou efeitos na ação
individual e coletiva dos seus sujeitos e, ao que parece, na qualidade das deliberações
aprovadas no âmbito dos conselhos de direitos. É preciso que se pesquise ainda como e/ou
quais foram os efeitos produzidos pela sua atuação após 2009, tanto na política da infância e
adolescência quanto em outros espaços de construção social coletiva. Que outros
efeitos/impactos pode ter tido essa atuação em outras políticas? Onde estão os militantes que
atuaram no período de efervescência do Fórum DCA-SE? O que fazem? Continuam ou não a
produzir ações em outras frentes de luta? Por quais razões continuam ou não? Ao mesmo
tempo é interessante entender o que aconteceu com as entidades posteriormente. Que
comportamentos preservaram? Qual a dimensão de suas atuações na atualidade? Elas
continuam promovendo luta social? Se sim ou não, por quais motivações? Essas perguntas
podem movimentar outras respostas e propostas de pesquisa. Elas nos vieram depois de
refletir o espaço do Fórum DCA-SE e seu momento mais contundente.
O diálogo que certamente ocorre por meio da palavra que não deve silenciar e que,
por isso mesmo, significa possibilidade para anunciar novas realidades, se constituiu no
Fórum DCA-SE como possibilidades de emancipação dos sujeitos oprimidos. Nesse aspecto,
define-se o Fórum DCA-SE enquanto espaço de articulação de defesa da criança e do
adolescente com propósito principal de fomentar a participação da sociedade civil organizada
representada pelas entidades não governamentais, mas com influência também sobre outros
segmentos da sociedade sergipana, como atores e órgãos do Sistema de Garantia de Direitos,
em especial, conselhos tutelares e espaços deliberativos de políticas públicas, a saber, os
conselhos de direitos.
Enfatiza-se, desse modo, a importância da valorização das lutas sociais pela
transformação da realidade a partir dos grupos historicamente oprimidos e de seus locais de
136

vivência. Luta, como dito, compreendida como processo contínuo de relação direta entre os
envolvidos, que se faz mediante a ação-reflexão-ação, visando a mudanças mais estruturais do
ponto de vista da luta de classes e atuação que se pense para além dos marcos definidos pelo
próprio Estado, através de demonstração das causas da miséria no mundo, que se descortina
para a sociedade em geral em volta ao próprio capitalismo gerador das mazelas sociais, e da
denúncia do capitalismo, controla o comportamento humano e segue se alimentando da
marginalidade e de suas consequências.
Na linha do exposto nesta dissertação, é preciso, portanto, apostar nos direitos
humanos numa dimensão crítica, enquanto projeto ético-político de sociedade, com foco no
respeito às coletividades e seus saberes e na valorização da dignidade humana, para além do
direito positivado. Desse modo, é possível romper com o silêncio que não transforma,
pronunciar outro mundo mais fraterno. O diálogo, que se estabelece nos gestos e nas palavras
que denunciam a opressão na periferia do mundo, impulsiona possibilidades emancipadoras,
criativas e de respeito às diversas formas de produção de saberes, inclusive os que ainda são
desconhecidos. Decorrem daí a necessidade de se continuar investigando o tema e a
importância deste trabalho e, bem ao estilo freireano, o protagonismo do Fórum Estadual de
Defesa da Criança e do Adolescente, como fonte de palavras que não silenciam e de
possibilidades que emancipam.
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machucam torturam e matam! Porto Alegre, Rio Grande do Sul: AGE, 2005.

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_____. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. São Paulo: Cortez,
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147

ZEA, Leopoldo. América en la historia. México: FCE, 1957.


APENSOS

Apenso A. Fórum DCA-SE na Mídia (205 a 20013)

Anos Assuntos Datas Entidades/Mídias


2005 Resolução 27/2005 do CMDCA Aracaju 14 de dez. Prefeitura Municipal
(Coloca como critério para acessar recurso do fundo ser de 2005 de Aracaju/CMDCA
entidade filiada ao fórum DCA-SE) Aracaju
2006 Hoje tem reunião sobre Fórum DCA-SE | inclusão social 8 de Inclusão Social
agosto de Notícias
2006
Lançamento da Campanha Nacional - Site Da Campanha
“Criança não É de Rua" em Sergipe Nacional Criança
Não É De Rua
Ações da Semasc com crianças e adolescentes em 26 de mai. Site Prefeitura de
situação de rua são elogiadas por membros do Comitê De 2006 Aracaju
Nacional
Campanha 'Criança Não é de Rua' é tema de sessão 05 de jun. INFONET
plenária: A Câmara Municipal de Aracaju realiza na de 2006
sessão de hoje a plenária especial sobre a Campanha
Nacional de Combate à Situação de Moradia nas Ruas de
Crianças...
2007 Sergipe oficializa sua Frente Parlamentar 16 de out. INTERLEGIS
de 2007
Entidades entregam plano de gestão do Cenam ao 17 de out. INFONET
governador de 2007
Governador recebe proposta de plano de gestão para o 17 de out. Agencia Sergipe
Cenam de 2007 governo estadual
Governo e entidades vão elaborar gestão para o Cenam 30 de ago. Instituto Marcelo
de 2007 Déda
“Semasc e UFS trabalham diagnóstico para população em 01 de jun. Instituto Marcelo
situação de rua de 2007 Déda
Governador recebe plano de gestão integrada da 06 de jun. Site Itabaiana
segurança de 2007 Sergipe
ARACAJU-SE"MENOR INFRATOR CUSTA R$ 1,8 - Destak News Brasil
MIL AO ESTADO
Com o objetivo de estruturar a rede de atendimento sócio - Sociedade Semear
educativo no Estado de Sergipe, foi lançado no dia 09 de
dezembro, o projeto “TÁ NA MEDIDA”.
Fórum convoca entidades para acompanhar votação do 11 de dez. Fórum DCA-MT
orçamento público amanhã de 2007
Fórum lança moção de repúdio à redução da maioridade 03 de ago. INFONET
penal: O Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da De 2007
Criança e do Adolescente (Fórum DCA/SE) lançou na
última quinta-feira...
Manifesto de repúdio ao rebaixamento da maioridade 13 de fev. ABONG: Associação
penal de 2007 Brasileira de
Organizações Não
Governamentais
Dia da mobilização nacional contra a redução da 27 de nov INESC: Instituto
maioridade penal de 2006 Nacional de Estudos
Socioeconômicos
149

Matéria sobre prostituição infantil - UFBA/TECCIÊNCI


A: Universidade
Federal da Bahia
Missão do Fórum DCA-SE 22 de Blogspot Fórum
novembro DCA-SE
de 2007
Entidades cobram mais recursos para crianças e 28 de nov. INFONET
adolescentes de 2007
Direitos da Criança e do Adolescente são discutidos em 19 de nov. INFONET
evento de 2007
ECA Completa 18 anos Jul. de Blogspot
2007
Lançada na AL frente em defesa da criança e do 08/10/200 INFONET
adolescente 7
2008 Fórum DCA lança nota pública 11 de jun. INFONET
Fórum lança nota sobre desocupação de kartódromo de 2008
Carta Aberta – posicionamento do Fórum DCA-SE sobre 25 de Blogspot Infância
a Conferência de DH em SE agosto de urgente
2008
Retirada do DESIP do CENAM 08 de abril Câmara Dos
de 2008 Deputados
Audiência Pública debateu os direitos da criança e do 13 de Blogspot Prefeitura
adolescente dezembro Municipal De Poço
de 2008 Verde/SE

Abertas inscrições para candidatura a função de 02 de CRESS-SE


conselheiro estadual dos direitos da criança e do março de
adolescente de Sergipe 2011
Seminário debate inclusão da infância e adolescência na - UNICEF
agenda política
Novas leis contra pedofilia 08 de Blogspot a vida
janeiro de contra a pedofilia
2011
Fórum DCA repudia redução da maioridade penal - Ministério Público
Do Paraná
Frieza do judiciário afasta vítimas: Entidades de defesa 12de out. INFONET
dos direitos da criança falam da relação de 2008
Onde estão as soluções para atender vítimas de pedofilia? 12 de out. INFONET
Última matéria da série aborda as soluções para os de 2008
problemas que envolvem o atendimento das vítimas da
pedofilia
Abuso de crianças e adolescentes: quem procurar? 08 de out. INFONET
Primeiro atendimento as vítimas de violência é no de 2008
Conselho Tutelar, mas ela ainda terá que passar no IML e
por tratamentos
Carta de Reconhecimento sobre a importância do 23 de Blogspot psi.se
Conselheiro Tutelar novembro
de 2008
Seminário debate inclusão da infância e adolescência na UNICEF
agenda política
Seminário discute direitos da criança e do adolescente: O 25 de abril INFONET
Seminário Estadual Criança e Adolescente na Agenda de 2008
Política acontece em Indiaroba
Crianças e adolescentes são tema de seminário em 25 de abril Instituto Marcelo
150

Indiaroba de 2008 Déda


Seminário sobre o ECA será realizado em Indiaroba: 17 de abril Agencia. Gov.se
Evento será realizado no próximo dia 25 de abril de 2008
Seminário irá debater o Estatuto da Criança e do 16 de abril SEED.gov
Adolescente de 2008
Municípios debatem a pauta da infância e adolescência na 23 de abril Inclusão social -
agenda política de 2008 municípios
Participação do orador no Seminário "Criança e 24 de abril Câmara dos
Adolescente na Agenda Política: no Município de de 2008 deputados
Indiaroba, Estado de Sergipe. Transcurso do 18°
aniversário do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Prioridade governamental às políticas públicas destinadas
à população infanto-juvenil
Pronunciamento do Deputado Federal Iran Barbosa, do 24 Câmara dos
PT/SE, na Sessão Plenária da Câmara dos Deputados, no de abril de deputados
dia 24 de abril de 2008 2008
Entidades sergipanas ligadas à infância pedem 10 de Inclusão social.com
compromissos de candidatos julho de
2008
2009 Matéria relacionada à denúncia envolvendo ameaça à - INFONET
vida de defensor de direitos humanos
Informe-se em seu Estado: Informações Sobre Os Planos 18 de Bloggdaro blogspot
Estaduais 15/05/2009 maio de
2009
Seminário lembra Dia de Combate ao Trabalho - Direitos da Criança
Infantil: Em Sergipe, 58 mil crianças e adolescentes entre .gov
5 e 17 anos trabalham
Governo não cumpre ações em benefício de crianças 30 de jul. Click Sergipe
de 2009 Jornal da cidade
"Prostituição infantil movimenta 4 milhões de reais por Blogspot Maria
ano " Juselina
Conselhos e Fóruns da Criança e Adolescente lançam 02 de jun. INFONET
carta aberta sobre Cenam de 2009
O CEDCA, CMDCA, Fóruns DCA-SE e FACTUS
manifestam em carta os últimos acontecimentos no
Cenam
Representantes de proteção a criança e adolescentes 09 de out. INFONET
visitam o Cenam de 2008
O objetivo é avaliar as condições físicas e educacionais
do local
PM recaptura cinco fugitivos do Cenam 29 de jul. INFONET
Jovens escaparam na noite de ontem, 28, e foram 2009
recapturados nas primeiras horas dessa manhã
Situação do CENAM é tema de audiência públicas 29 de Blogspot
julho de socioeducação Brasil
2009
Prostituição Infantil: Meninas Sem Futuro - Blogspot loslon
Pornografia infantil movimenta 4 milhões de reais por - Dourados agora
ano notícias Brasil
Novas leis contra pedofilia - Blogspot a vida
contra pedofilia
Vítimas de exploração enfrentam problemas no IML - CHILDHOOD:
programa na mão
certa
151

Aracaju é notícia: Audiência Pública na OAB discute 29 de Comunidade dos


situação no CENAM julho de vereadores
2009 brasileiros
OAB/SE: “medidas socioeducativas resolvem problemas - OAB-SE
do Cenam”
Órgãos pedem proteção para conselheiro: Em reunião 26 de nov. NE Notícias
nesta tarde, o Fórum DCA e a Secretaria Especial dos 2009
Direitos Humanos pedirá ação do Estado ao governador
Belivaldo Chagas
Braços, o Fórum DCA e o Movimento Nacional de 30 de jul. Blog do Roberto
Direitos Humanos: estranho mesmo! de 2012
A questão da criança, além do assistencialismo 02 de dez. Site Deputada
de 2009 Estadual na Lúcia
Audiência Pública na OAB discute situação no CENAM 29 de jul. INFONET
de 2009
Governo não cumpre ações em benefício de crianças 30 de jul. Click Sergipe
de 2009
Matéria relacionada à denúncia envolvendo ameaça à -
vida de defensor de direitos humanos INFONET
Advogado renuncia o cargo de presidente do CEDCA: O 23 de out. INFONET
advogado Thiago Oliveira renunciou a presidência do de 2009.
Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do
Adolescente
Matéria relacionada à denúncia envolvendo ameaça à - INFONET
vida de defensor de direitos humanos
2010 Prioridade para a infância começa nas políticas públicas - MNDH
Edital 006/2010 Convoca Concurso Público De Projetos 14 de abril Prefeitura Municipal
Sociais A Serem Financiados Com Recursos Do Fundo de 2009 de Aracaju-
Municipal Dos Direitos Da Criança E Adolescente. CMDCA/Aracaju
(Coloca Como Critério Para Acessar Recurso Do Fundo
Da Criança A Participação Da Entidade No Fórum
DCAESe)
Fórum DCA cancela debate com candidatos a 13 de abril INFONET
conselheiros de 2010
"Rua Não É Casa Para Crianças E Adolescentes", Diz A 31 de Blogspot Acontece
Deputada Ana Lúcia março de em Sergipe
2010
2011 Ação Nacional Criança Não é de Rua”: caminhada é uma - Portal Dos
mobilização em defesa dos direitos de crianças e Conselhos/Ação
adolescentes que vivem em situação de moradia nas ruas Nacional/Direitos Da
Criança
2012 A vergonhosa política socioeducativa do Governo de 24 de jul. BlogspotRoberto
Sergipe de 2012 Silva
O "Fantástico" denuncia: Em Sergipe, há jovens 23 de jul. NE notícia
encarcerados em solitárias de 2012
2013 Escola de Conselhos de Sergipe - Sociedade Semear

Busca realizada por palavras-chaves tais como: “Fórum DCA/SE”; “cenam fórum dca-se”; “plano de gestão cenam
governador”; “lançamento Campanha Criança não é de rua em Sergipe”; “Seminário criança e adolescente na
agenda política 2008”. A busca ainda foi realizada a partir de nomes de antigos e recentes coordenadores do Fórum
DCA-SE, como: “Robson Anselmo Fórum DCA-SE”; “Lídia Rêgo Fórum DCA-SE”; “Lídia Anjos Fórum DCA-
SE”; “Sanádia Gama Fórum DCA-SE”; “Nathália Dalto Fórum DCA-SE”
ANEXOS

Anexo A - Fórum DCA-SE: Regimento Interno

TÍTULO I – DA CONSTITUIÇÃO

DOS OBJETOS E FINALIDADE

Art.1º - O Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Sergipe,


resumidamente chamado de FÓRUM DCA-SE, é constituído por entidade da sociedade civil
organizada que atuam na área de promoção e defesa dos direitos da criança e do adolescente.

Parágrafo Único- A participação no Fórum DCA-SE é exclusivamente de natureza


institucional.

Art. 2º - O Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Sergipe


tem como finalidade a defesa dos direitos humanos da criança e do adolescente tendo os
seguintes objetivos:

I- Defender como diretriz prioritária o Estatuto da Criança e do Adolescente, tendo a


Doutrina de Proteção Integral como Princípio;
II- Criar um espaço de articulação, proposição e monitoramento de políticas públicas
voltadas à criança e ao adolescente;
III- Proporcionar um espaço de participação de crianças e adolescentes nas discussões
e formulação de propostas, enquanto fortalecimento do protagonismo juvenil;
IV- Divulgar informações referentes à criança e ao adolescente, bem como participar
de eventos correlatos;
V- Promover estudos, cursos, campanhas, seminários e outras atividades afins à
capacitação e formação na área da criança e do adolescente.

DA FILIAÇÂO

Art.3º - O Fórum DCA-SE terá um número ilimitado de entidades filiadas, sendo sua adesão
realizada através de solicitação em formulário especifico.

Parágrafo Primeiro- As entidades participantes do Seminário de rearticulação do Fórum DCA-


SE e que assinaram a Carta de Princípios, estão automaticamente filiadas.

Parágrafo Segundo- Todas as entidades aludidas no parágrafo anterior deverão apresentar à


Secretaria Executiva do Fórum DCA-SE, através de oficio encaminhado à Coordenação
Colegiada, o nome do seu representante, em até 60 (sessenta) dias após aprovação deste
Regimento Interno.

Parágrafo Terceiro- As entidades que solicitarem inscrição ao Fórum DCA-SE, ao fazê-la,


devem, no ato, indicar o nome do seu representante.
153

DA DESFILIAÇÃO

Art.4º - As entidades que ferirem os princípios e objetivos do Fórum DCA-SE serão


desligadas do mesmo após aprovação em plenária;

Art.5º - As entidade que faltarem a quatro (04) reuniões seguidas do Grupo Temático ou a três
(03) Assembleias Gerais consecutivas, sem devida justificativa, serão desfiliadas;

Art.6º - Serão desfiliadas as entidades que solicitarem por escrito o seu afastamento.

CAPÍTULO II – DA ESTRUTURA ORGÂNICA

Art.7º - o Fórum Estadual de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente de Sergipe é


constituído pelas seguintes instâncias deliberativas e operativas:

I- Assembleia Geral;
II- Coordenação Colegiada
III- Grupos Temáticos
IV- Secretaria Executiva

DA ASSEMBLEIA GERAL

Art.8º - A Assembleia Geral é a instância de deliberação máxima do Fórum DCA-SE,


constituída por todas as entidades filiadas há pelo menos (1) um mês antes de sua realização.

Art.9º - A Assembleia Geral ocorrerá a cada (03) três meses, sendo precedida de convocação
expedida pela Coordenação Colegiada constando dia, horário, local e assuntos a serem
debatidos.

Parágrafo Único – A Convocação deve ser encaminhada às entidades com pelos menos (08)
dias de antecedência.

Art.10º - A Assembleia Geral será instalada pela Coordenação Colegiada do Fórum DCA-SE,
em primeira chamada com a presença de (2/3) dois terço das entidades filiadas. E (01) uma
hora depois com a presença de (20%) vinte por cento das entidades filiadas.

Art.11º - A Assembleia Geral tem caráter deliberativo e normativo, além de aprovar a


composição dos Grupos Temáticos e realizar a eleição e posse da coordenadoria colegiada,
em expediente extraordinário.

Art.12º - As Assembleias Gerais extraordinárias poderão ser convocadas pela Coordenação


Colegiada ou ainda por (2/3) dois terço das entidades filiadas, sendo que cada convocação
deverá ser feita com (08) oito dias de antecedência, com pauta pré-definida e nela somente
poderão ser votados assuntos definidos em pauta.

Art.13º - As discussões e deliberações das Assembleias Gerais serão registradas em Ata,


lavrada em livro próprio e assinada.
154

DA COORDENAÇÃO COLEGIADA

Art.14º - A Coordenação Colegiada é uma instância paritária, constituída por entidades de


promoção e defesa, representadas por pessoas adultas e por entidades juvenis, representadas
por adolescentes.

Art.15º - A Coordenação Colegiada será constituída por quatro (04) entidades de promoção e
de defesa e por quatro (04) entidades juvenis, bem como por quatro (04) entidades suplentes,
sendo duas (02) por cada categoria de entidades.

Art.16º - São Atribuições da Coordenação Colegiada:

I- Representar o Fórum DCA-SE nos diversos espaços;


II- Viabilizar a implementação das decisões das Assembleias Gerais;
III- Dirigir as Assembleias Gerais, com exceção da Assembleia Geral extraordinária
para eleição da coordenação;
IV- Prestar contas das ações do Fórum DCA-SE através de Relatórios de Atividades,
Balancetes e Relatórios Financeiros.

Art.17º - A Coordenação Colegiada se reunirá uma vez por mês, em primeira convocação com
a presença de (2/3) dois terço dos membros e em segunda convocação, meia hora depois, com
a presença de (20%) vinte por cento dos seus membros.

Art.18º - As deliberações da Coordenação Colegiada serão tomadas por maioria simples de


votos.

Art.19º - Em caso de vacância do cargo de membro titular da coordenação assumirá o


primeiro suplente.

Art.20º - As discussões e deliberações serão sistematizadas em relatórios e assinadas pela


Coordenação Colegiada.

DOS GRUPOS TEMÁTICOS

Art.21º - Os Grupos Temáticos são espaços permanentes ou provisórios, com função de


promover estudos e debates internos a partir de temáticas afins, atuam subsidiando a
intervenção do Fórum DCA-SE.

Art.22º Os Grupos Temáticos devem propor os pontos de discussão para as reuniões da


Coordenação Colegiada e das Assembleias Gerais.

Parágrafo Único – Toda entidade filiada ao Fórum DCA-SE deve estar vinculada
organicamente a pelo menos a (01) um Grupo Temático. Sendo vedada a não vinculação a
qualquer um deles.

Art.23º - Os Grupos Temáticos permanentes são:


155

a) Grupo de Estudos e Debate sobre o Trabalho Infantil e Proteção ao Trabalhador


Adolescente;
b) Grupo de Estudos e Debate sobre o Abuso e Exploração Sexual de Crianças e
Adolescentes;
c) Grupo de Estudos e Debates sobre o sistema de Garantia de Direitos da Criança e do
Adolescente;
d) Grupo de Estudos e Debates sobre o Protagonismo Juvenil;
e) Grupo de Estudo, Capacitação e Formação de Educadores Sociais.

Art.24º - A depender das necessidades serão constituídos novos grupos temáticos.

Parágrafo Único – O grupo temático sobre o Protagonismo juvenil não poderá ser constituído
somente por entidades juvenis, com representação exclusiva de adolescentes.

Art.25º - Os grupos temáticos se reunirão mensalmente para estudar, debater e formular


proposta na área da criança e do adolescente.

Art.26º - Cada grupo temático deverá apresentar a conclusão sobre o seu tema e ou demanda
proposta no prazo de no máximo (30) trinta dias, prorrogáveis por mais (10) dez dias.

Art.27º - A sistematização dos trabalhos realizados pelos grupos devem ser entregues à
Coordenação Colegiada com o parecer assinado por seus membros.

DA SECRETARIA EXECUTIVA

Art.28º - A Secretaria Executiva é uma instância permanente, de caráter meramente operativo,


responsável pela infraestrutura necessária ao funcionamento do Fórum DCA-SE, atuando
como um órgão técnico e assessor da coordenação colegiada.

Art.29º - A Secretaria Executiva será exercida por qualquer uma das entidades que compõem
a Coordenação Colegiada. Sendo que a eleita deve oferecer as condições estruturais para o
exercício do encargo.

Art.30º - São Atribuições da Secretaria Executiva:

I- Executar serviços de comunicação, correios, fax, e-mail e digitação;


II- Expedir e receber correspondências às entidades filiadas e outros atores;
III- Zelar pelos documentos e registros do Fórum DCA-SE;
IV- Viabilizar locais para realização das Assembleias Gerais;
V- Oferecer apoio técnico aos grupos temáticos.

Art.31º - A entidade que ocupa a função de Secretaria Executiva não tem direito a voto nas
Assembleias Gerais, enquanto Secretaria.

CAPÍTULO III – DO PROCESSO DE ELEIÇÃO E POSSE

Art.32º - A eleição da coordenação colegiada ocorrerá a cada dois (2) anos, quando se conclui
o mandato em vigor.
156

Art.33º - Será constituída uma comissão eleitoral para cada pleito a pelo menos seis (06)
meses antes da Assembleia Geral extraordinária incumbida de realizar a eleição.

Art.34º - A Comissão Eleitoral será composta por duas (02) entidades de promoção e defesa e
por (02) entidades juvenis, conforme alude o art.15.

Art. 35º - No dia da Assembleia Geral Extraordinária para eleição da coordenação colegiada,
a Comissão Eleitoral assume a Direção e Coordenação da referida Assembleia.

Parágrafo Único – A primeira eleição da Coordenação Colegiada acontecerá na Assembleia


Geral de aprovação deste Regimento Interno, obedecendo as normas definidas na própria
Assembleia Geral.

Art.36º - São Atribuições da Comissão Eleitoral

I- Propor a forma de eleição conforme diretrizes deste Regimento Interno


II- Fazer o Registro das candidaturas conforme documento normativo aprovado em
Assembleia Geral;
III- Expedir relação de entidades em condições de votar;
IV- Solicitar suporte e apoio de pessoal para contribuir com o processo eleitoral;
V- Dirigir e coordenar a Assembleia Geral Extraordinária de Eleição.

Art.37º - Após apuração dos votos, no mesmo dia da votação, a chapa vencedora será
aclamada e automaticamente empossada, sendo desfeita a Comissão Eleitoral.

Art.38º - Para que as entidades possam concorrer ao cargo de coordenação colegiada serão
analisados os seguintes pontos, sob efeito de impugnação de candidatura:

a) Se a entidade está com sua anuidade paga;


b) Se a entidade tem mais de quatro (04) faltas consecutivas nas reuniões dos grupos
temáticos não justificadas;
c) Se a entidade tem mais de três (03) faltas consecutivas em assembleias gerais não
justificadas.

CAPÍTULO IV – DOS DIREITOS E DAS OBRIGAÇÕES DAS

FILIADAS DOS DIREITOS

ART.39º - As entidades filiadas ao Fórum DCA-SE têm direito a:

a) Voz e voto nas Assembleias Gerais;


b) Propor ideias e sugestões para o trabalho;
c) Participar das atividades promovidas pelo Fórum DCA-SE;
d) Conhecer o Regimento Interno e a Carta de Princípios;
e) Concorrer às instâncias deliberativas e operativas do Fórum DCA-SE;
f) Receber informações sobre recursos, projetos e convênios;
g) Participar das atividades realizadas pelo Fórum DCA-SE.
157

DOS DEVERES

Art.40º - As entidades filiadas ao Fórum DCA-SE têm deveres de:

a) Conhecer o Regimento Interno e Carta de Princípios do Fórum DCA-SE;


b) Integrar-se organicamente a pelo menos um grupo temático;
c) Participar das reuniões dos grupos temáticos;
d) Participar e votar nas assembleias gerais;
e) Cumprir as deliberações e normas das assembleias gerais;
f) Pagar a contribuição anual do Fórum DCA-SE.

Art.41º - As entidades filiadas devem contribuir financeiramente com o Fórum DCA-SE,


pagando uma anuidade correspondente à (50%) cinquenta por cento do salário mínimo em
vigência.

Parágrafo Primeiro – A entidade que assume a Secretaria Executiva está liberada de


pagamento de anuidade.

Parágrafo Segundo – O pagamento da anuidade ocorrerá da seguinte forma:

a) Em uma única parcela durante o ano para todas as entidades;


b) Em duas (02) parcelas, vencendo no mês de janeiro e a segunda no mês de agosto do
ano fiscal para as entidades filiadas até dezembro do ano de aprovação deste
Regimento Interno;
c) Em duas (02) parcelas, sendo que a primeira no primeiro mês de filiação e a segunda
seis (06) meses após a filiação, para entidade que se filiarem após o mês de dezembro
do ano de aprovação deste Regimento Interno.

CAPÍTULO V – DAS DISPOSIÇÕES GERAIS TRANSITÓRIAS

Art.42º - O Fórum Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente de Sergipe não pode
acumular patrimônio material e financeiro.

Art. 43º - Em processo de dissolução, a Assembleia Geral Extraordinária, convocada


especialmente para este fim, deliberará sobre a transferência de bens patrimoniais para uma
ou mais instituições que atuam na área da infância e juventude não governamental.

Art.44º - Este Regimento Interno não pode ser alterado para atender interesses específicos e
corporativos das entidades filiadas ao Fórum DCA-SE.

Art.45º - Este Regimento Interno só pode ser alterado para permitir o alcance dos objetivos
do Fórum DCA-SE e para ampliar o processo democrático interno.

Art.46º - Os casos omissos serão discutidos e deliberados em Assembleia Geral.

Art.47º - Este Regimento Interno entra em vigor na data de sua aprovação em Assembleia
Geral.

Aracaju, 04 de setembro de 2000.


Anexo B - Fórum DCA-SE: Entidades Filiadas (2008)

Entidades Representantes
LEGIAO DA BOA VONTADE LÍDIA ANJOS E TATIANE
SILVA
CENTRO DOM JOSÉ BRANDÃO DE CASTRO ELIS E SIMONE
INSTITUTRO RECRIANDO DÉBORA
LAR FABIANO DE CRISTO FATIMA E CANDICE
LAR INFANTIL CRISTO REDENTOR ROBERTA
INSTITUTO E CRECHE MENINO JESUS ANDRÉA ARAGÃO
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO E ESTUDO AFRO-BRASILEIRO --
“LELIA GONZALEZ”
GRUPO ABAÔ VAL
CRILIBER - CRIANÇA E LIBERDADE ASSOC. DE CULTURA, LUIZ BONFIM
ARTE E EDUCAÇAO
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