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Rembrandt - Aristóteles com o busto de Homero [1653]. Óleo sobre tela, 143,5 cmX 135,5 cm. Metropolitan Museum of Art, New York. http://www.wga.hu/art/r/rembran/painting/z_other/aristotl.jpg
À GUISA DE INTRODUÇÃO preservadas, mantendo-se fiéis à tradicionalidade da gramá-
tica normativa.
Causou certo alvoroço1 uma cartilha do MEC, na qual Conforme exposto, pretende-se neste trabalho, estabe-
era tratado o fenômeno da (não) concordância gramatical na lecer uma relação entre o objetivo e a função da gramática
expressão “os livro”. E, durante as discussões sobre o assun- tradicional e o paradigma teórico do contexto vigente. Sendo
to na mídia paulista, das quais destacamos a coluna e o arti- assim, iniciamos nosso percurso histórico pelo período da
go jornalísticos de Rossi (2011) e Gois (2011), respectivamen- Antiguidade.
te, abordaram-se os conceitos (tais como, o de ‘certo/errado’,
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que, a Ilíada narra o amor e a ira de Aquiles e a Odisséia, as pensaram os filósofos, nesta outra, deram lições os propria-
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peregrinações e a volta de Ulisses. mente chamados gramáticos. A imagem do usuário da lín-
A civilização helênica propriamente dita chegou ao gua está na obra dos últimos: eles oferecem ao usuário uma
seu termo com a morte de Alexandre Magno, em 323 a.C. descrição que lhe permite conhecer o padrão a ser seguido
no uso da língua.
A fusão de culturas e a mistura de povos, resultante das
conquistas de Alexandre, pôs fim à maior parte dos ideais
encarnados pelos gregos dos primeiros tempos. Aos poucos, Foi na Grécia, por volta do século V a.C., que se ini-
foi surgindo uma nova forma de civilização baseada num ciaram, como ramo da Filosofia, os estudos linguísticos que,
misto de elementos gregos e orientais. desenvolvidas pelos romanos, pelos trabalhos especulativos
A essa nova civilização, que se estendeu até aproximada- da Idade Média e pelo estudo normativo dos gramáticos dos
mente o início da era cristã, costuma-se dar o nome de helenís- períodos subseqüentes, constituem o que no ocidente se tem
tica. (Neves, 1987). A disciplina gramatical aparece na época chamado “gramática tradicional”. (Lobato, 1986: 77-79)
helenística, que se diferencia da época helênica tanto na orga- À Filosofia, especialmente aos filósofos Platão, Aristó-
nização política e social, como no modo de vida e na cultura. teles, aos estóicos e aos Alexandrinos devemos as primeiras
e mais importantes contribuições para a Gramática Tradi-
A Literatura na civilização helenística cional. Os alexandrinos, eram assim chamados por terem
desenvolvido seus estudos na colônia grega de Alexandria,
A literatura helenística é significativa sobretudo onde, no século III a.C., floresceu um grande centro de estu-
pela luz que lança sobre a fisionomia dessa civilização. dos literários e linguísticas.
Grande parte de seus escritos eram pobres em origina- Considera-se que foi nesta época que se codificou a cha-
lidade ou em profundidade de pensamento, mas saíram mada gramática tradicional do grego: nos séculos III e II a.C.,
das mãos dos copistas numa profusão quase incrível, se os sábios de Alexandria escreveram glossários e compêndios
considerarmos que era desconhecida a arte de imprimir. gramaticais, com o fim de tornar possível, pelos contemporâ-
Os nomes de pelo menos 1100 autores já foram ca- neos, a leitura dos textos clássicos, sobretudo os de Homero,
talogados, e outros mais são adicionados todos os anos. cuja língua diferia bastante do grego falado então.
Grande parte do que escreviam era de ínfima qualidade, Essas primeiras gramáticas, ainda incompletas e pouco
sendo comparável aos suplementos dominicais e às no- sistemáticas, baseadas na língua escrita, tinham os dois obje-
velas baratas de nossos dias. Contudo, houve obras bem tivos citados a seguir: 1) elucidação da língua dos textos lite-
acima da mediocridade e umas poucas que alcançaram rários arcaicos; 2) proteção do grego clássico, que deveria ser
os mais altos padrões estabelecidos pelos gregos. resguardado de corrupções, surgindo daí a noção do “certo
x errado” (Lobato, 1986).
A Filosofia na civilização helenística Essa postura dos alexandrinos vem ao encontro do que
foi exposto anteriormente em PRIMEIRAS PALAVRAS, ou
As primeiras e mais importantes filosofias helenís- seja, a preocupação da educação no período helenístico, ao
ticas foram o epicurismo e o estoicismo, ambas surgidas transmitir um patrimônio literário, especificamente a exege-
mais ou menos em 300 a.C. Seus fundadores foram res- se homérica;
pectivamente Epicuro e Zenon, que residiram em Atenas,
embora o primeiro tivesse nascido na ilha de Samos e o úl- para facilitar a leitura dos primeiros poetas gregos, os gra-
máticos publicaram comentários e tratados de gramática,
timo em Chipre, sendo provavelmente de origem fenícia.
que cumpriam duas tarefas: estabelecer e explicar a língua
Para a história da linguística, a mais importante es-
desses autores (pesquisa) e proteger da corrupção essa lín-
cola filosófica é a dos estóicos. Os estóicos trabalharam gua “pura” e “correta” (docência), já que a língua falada
em vários campos que já tinham sido cultivados por quotidianamente nos centros do helenismo era considerada
Aristóteles, mas em alguns pontos de filosofia e retórica “corrompida. (Neves, 1987: 104/105)
desenvolveram seus próprios métodos e doutrinas.
Uma escola também muito importante foi a dos A Idade Média retoma a Antiguidade, em muitos
alexandrinos, que será tratada na parte que se refere à aspectos, principalmente na Filosofia. São comentados os
origem da gramática. mesmos textos de Aristóteles, e as mesmas disciplinas (dia-
lética, retórica, lógica) formam o alicerce da vida intelectual.
A Linguistica na civilização helenística – Alguns autores como Santo Agostinho pertencem aos dois
a origem da gramática mundos, o antigo e o medieval.
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filósofos. A grande tentativa da época foi a de invenção de A GRAMÁTICA NOS SÉCULOS XX E XXI
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uma língua filosófica universal e geral, com base no pressu-
posto de que há um sistema lógico e racional preexistente a No século XX
todas as línguas e do qual todas elas não são senão variantes,
sendo a estrutura da língua um produto da razão, um refle- No século XX temos os estruturalismos linguísticos:
xo do pensamento. As gramáticas de Port Royal e de Soares europeu e americano, cujos representantes são: Ferdinand
Barbosa são tentativas nesse sentido. de Saussure e Noam Chomsky, respectivamente.
O século XVIII desenvolveu um estudo linguístico ba- O estruturalismo europeu prega a linguística imanen-
seado nos mesmos pressupostos filosóficos dominantes do te, o estudo da língua por si mesma. O representante do es-
século anterior: continuou a se pensar em categorias grama- truturalismo americano, Chomsky, criou a Gramática Gera-
ticais universais, na existência de um sistema lógico subja- tiva, partindo do pressuposto que suas regras são universais
cente a qualquer língua, numa sintaxe baseada na ordem das linguísticos.
palavras e na função precípua de toda língua de expressar os A Teoria chomskyana está perfeitamente identificada
pensamentos. Por outro lado, prosseguiu também o trabalho com a corrente filosófica do racionalismo que tem sustenta-
descritivo das línguas asiáticas, americanas e africanas. do que os fundamentos da linguagem são inatos no homem,
Desse período é importante a Gramática de Fernão Oli- o qual, ao nascer, traz como bagagem biológica as proprie-
veira (1536) por ser a primeira da Língua Portuguesa. Também dades estruturais e de organização que todas as línguas
conforme exposto, temos gramáticas representantes das “gra- compartilham. Posição contrária é definida pelo empirismo
máticas filosóficas”, como a de Jeronymo S. Barbosa (1822). (o estruturalismo, de modo geral) para quem, conhecer é ex-
perimentar. A língua é vista como um sistema, ela parte da
O Século XIX: a gramática comparada observação de que todo conceito é determinado por outros
do mesmo sistema e nada significa por si só. Daí as famosas
No século XIX, o parentesco linguistico foi objeto de dicotomias saussuriana: langue/parole/sintagma/paradig-
estudos altamente especializados, que utilizam método de- ma, etc.
nominado comparativo. A esse tipo de estudo é comum atri- Chomsky, embora tenha desenvolvido suas primeiras
buir-se o rótulo de gramática (ou filologia) comparada ou de idéias ao longo da tradição “bloomfieldiana”, adotou posi-
linguística histórica. Na verdade, a preocupação com a ori- ção crítica em relação a Bloomfield, linguistica americano,
gem das línguas, sua semelhança, a etimologia das palavras convicto behaviorista, bem como a todo o estruturalismo:
é bem anterior, mas só a partir da descoberta do sânscrito, este limita a sua indagação ao nível da estrutura superficial,
em fins do século XVIII, é que os estudos comparativistas descartando o estudo dos mecanismos e processos profun-
passaram a ter o objetivo de identificar as famílias de línguas dos que geram os fatos descritos.
e mostrar ser a mudança linguística um processo regular. No Brasil, a Gramática Gerativa eclodiu nas décadas
Foram os neogramáticos que formularam mais siste- de 70-80, através das adaptações ao Português, por estu-
maticamente os princípios e métodos da gramática compa- diosos brasileiros, entre os quais destacamos Koch e Silva
rada, se bem que muitos deles tenham sido modificados a (1983). É o ensino da análise sintática pelo modelo, arbóreo,
luz dos desenvolvimentos posteriores da linguística. Sua bastante comum nos livros didáticos da época.
principal tese vai de encontro ao pensamento de Grimm no
que concerne às exceções à lei de mudança fonética regular: A Nomenclatura Gramatical Brasileira (NGB)
Grimm admitia as exceções, mas os neogramáticos conside-
ravam que as leis fonéticas tinham caráter absoluto. Nesse Para colocar em ordem a confusão terminológica que
aspecto, estavam eles adotando o pensamento vigente na reinava ainda no final do século XX (mistura de terminolo-
época para a biologia, em sua abordagem positivista, - mo- gia) o então Ministro da Educação e Cultura, Prof. Dr. Cló-
delo darwiniano -, de que a evolução biológica se processa vis Salgado da Gama, designa uma comissão para elaborar
segundo leis imutáveis. Outro princípio do movimento dos um projeto que simplifique e unifique a terminologia gra-
neogramáticos era o de que o único método científico de es- matical. Essa comissão foi constituída por cinco professores
tudo da língua é o histórico. Nesse ponto, colocaram-se eles catedráticos do Colégio Dom Pedro II, que por nessa época
em posição contrária à dos filósofos cartesianos dos séculos era frequentado pelos filhos da elite carioca, sendo o Rio de
XVII e XVIII, que, seguindo uma trilha que teve início na an- Janeiro a capital brasileira. Os cinco professores designa-
tiguidade clássica, com Platão, Aristóteles e os estóicos, de- dos foram: Antenor Nascentes (Presidente), Clóvis do Rego
fendiam o princípio de que a língua é reflexo do pensamento Monteiro, Cândido Jucá Filho, Carlos Henrique da Rocha
e que, assim sendo, as diferentes línguas compartilham pro- Lima (Secretário) e Celso Ferreira da Cunha.
priedades universais que deveriam decorrer de proprieda- Outro aspecto a ser considerado nesse período é a
des universais da mente humana. discussão entre os gramáticos, pois uns queriam manter a
As gramáticas desse período priorizam a palavra, en- adoção de autores de prestígio a fim de manter a hegemonia
fatizando a sua origem, formação, sentido e relações. No do uso padrão e outros queriam considerar as variações lin-
Brasil, um exemplo de gramática histórica é a de Eduardo guísticas portuguesas e brasileiras.
Carlos Pereira (1935), que assim a conceitua: “Grammática
histórica da língua portuguesa é o estudo da origem e evolu-
ção do portuguez no tempo e no espaço”. (op cit: 17)
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