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Humberto Varum*, Aníbal Costa**, Henrique Pereira***, João Almeida***, Hugo Rodrigues****
*
Professor Auxiliar; ** Professor Catedrático; *** Engenheiro Civil; **** Mestre em Estruturas
Departamento de Engenharia Civil, Universidade de Aveiro, 3810-193 Aveiro, Portugal
hvarum@civil.ua.pt
RESUMO
Em Portugal a construção em adobe foi muito utilizada até meados do século XX, sobretudo
na região de Aveiro. Actualmente cerca de 25% das construções existentes na cidade são de
adobe e 40% na região de Aveiro. Dada a falta de informação técnica sobre as propriedades
mecânicas dos elementos em adobe, foram desenvolvidos ensaios para a sua caracterização
sobre amostras representativas destas construções em Aveiro. Foram ensaiadas paredes em
laboratório e in-situ. Neste artigo apresentam-se os principais resultados dos ensaios
realizados, que permitirão caracterizar as construções existentes, interpretar as patologias
estruturais mais comuns, calibrar modelos numéricos, avaliar a segurança e desenvolver
soluções de reforço adequadas.
2. CONSTRUÇÕES EM ADOBE NO
DISTRITO DE AVEIRO
Em Portugal, a construção em alvenaria
resistente em adobe encontra na região de
Aveiro a sua maior implantação.
Impulsionada em finais do séc. XIX, teve o
seu auge na primeira metade do séc. XX,
vindo a ser gradualmente abandonada nos
anos sessenta até ao seu desaparecimento
como técnica construtiva. Actualmente são,
ainda, vários os exemplos de património
histórico, sobretudo ligados à Arte Nova,
movimento artístico e arquitectónico Fig. 1 - Alguns exemplos de construções em
dominante à época, edificados neste tipo de adobe no distrito de Aveiro.
alvenaria. Do mesmo modo, pese embora o
estado de degradação patenteado, são ainda
O adobe não foi somente utilizado em
inúmeros os exemplos de edifícios de
construções pequenas e modestas, como por
habitação e serviços, alguns de dimensões
exemplo casas rurais, arrecadações, armazéns,
consideráveis, que continuam a satisfazer as
muros de propriedades ou poços de água. Foi
funções para as quais foram projectados,
também empregue em obras maiores, mais
atestando a longevidade do adobe como
nobres e ricas, tendo algumas delas nos nossos
material de construção.
dias um elevado valor patrimonial e cultural,
O emprego deste material na região era nomeadamente igrejas, casas de espectáculos,
feito sobretudo na construção de casas e grandes mansões, algumas destas com uma
muros, embora sejam conhecidas outras arquitectura de estilo Arte Nova. Os materiais
utilizações como na construção de muros de de construção, as técnicas e as soluções
suporte de terras ou poços de água (Fig. 1). construtivas tendem a ser fortemente
De tal forma se faz ainda sentir a presença influenciados pelo poder económico dos
da construção em adobe na região que, proprietários. No entanto, dada a limitação de
segundo dados da Câmara Municipal de disponibilidade de outros materiais na região,
Aveiro, cerca de 20~25% da construção o adobe foi utilizado de uma forma
existente na cidade, actualmente, é de adobe generalizada durante um largo período na
enquanto que referindo-se à região a região de Aveiro.
percentagem sobe para os 35-40%.
Nas zonas rurais havia a preocupação em
Regra geral, os blocos de adobe eram orientar as casas a sul, provendo-as de maiores
realizados com terra arenosa húmida, que ganhos solares. Também os anexos e as
depois de amassada e metida em formas, era dependências agrícolas encontravam-se
seca ao sol. Para o melhoramento do seu alinhadas e viradas a sul. As habitações são
desempenho mecânico era relativamente geralmente compostas por um corpo
frequente a inclusão de cal e, por vezes, de rectangular principal. Nos meios rurais,
palha. As dimensões correntes, pese embora a normalmente, são compostas unicamente por
existência de inúmeras tipologias identificadas, um piso térreo e em caso de necessidade de
variavam, sobretudo, consoante o uso, sendo criar novos espaços era feita uma ampliação na
de aproximadamente 0.45×0.30×0.15m horizontal. Nas zonas urbanas predominam as
quando utilizados em casas e de habitações de dois pisos.
0.45×0.20×0.15m quando utilizados na
Na execução de alvenaria de adobe,
construção de muros.
recorreu-se frequentemente à utilização de
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Caracterização do comportamento estrutural de paredes de alvenaria de adobe
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Humberto Varum, Aníbal Costa, Henrique Pereira, João Almeida, Hugo Rodrigues
2.5
Veloc. (km/s)
2.0
1.5
1.0
0.5
Tensão (MPa)
0.0
Fig. 2 – Gráfico de curva granulométrica. 0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 3.5
3.4. Ensaios de ultra-sons Fig. 4 – Resultados dos ensaios com ultra-sons para
a humidade ambiente.
Complementarmente aos ensaios
mecânicos de compressão, em prensa
No gráfico da Fig. 5 estão representados
mecânica, foram realizados ensaios de ultra-
os resultados obtidos para os provetes
sons, com recurso a um equipamento tipo
ensaiados e para os três estados
PUNDIT (Fig. 3).
considerados. Também neste gráfico é
Este ensaio não-destrutivo indirecto, foi evidente a reduzida sensibilidade das
efectuado para investigar a eventual correlação medições com o PUNDIT, o que se traduz
com a resistência dos provetes à compressão e numa tendência não clara da velocidade de
com o seu módulo de elasticidade. É propagação com o teor de humidade.
investigada a relação entre a velocidade de
propagação de ondas neste material e os
parâmetros mecânicos em estudo.
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Caracterização do comportamento estrutural de paredes de alvenaria de adobe
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Caracterização do comportamento estrutural de paredes de alvenaria de adobe
Força (kN)
4.0 0.025
3.0
0.02
-2.0 0
C2
C6
C4
C7
C8
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Caracterização do comportamento estrutural de paredes de alvenaria de adobe
15.0
Força (kN)
10.0
Direita
Esquerda
5.0
0.0
-3.0 -2.0 -1.0 0.0 1.0 2.0
Deslocamento (mm)
-5.0
-10.0
-15.0
Fig. 18 – Ensaio da parede in-situ fora do plano:
transdutores e aplicação da força horizontal.
Fig. 16 – Força versus deslocamento no topo da
parede.
0.8
0.7
1.6E-02
0.6
Direita
1.4E-02
F orç a (k N )
Esquerda 0.5
1.2E-02
0.4
Energia Dissipada (kN.m)
1.0E-02
0.3
8.0E-03
0.2 Series1
6.0E-03 Series2
0.1
4.0E-03
0
2.0E-03 0 4 8 12 16
0.0E+00
Deslocamento (mm)
devido ao comportamento não simétrico da da parede fora do seu plano deu-se para um
parede. Contudo, ambos apresentam a deslocamento de 16mm, a que corresponde
mesma tendência. De uma forma global, e um drift aproximado de 0.95%.
apesar das diferenças na evolução força-
deslocamento, a rigidez inicial medida em Comparando os resultados do ensaio no
ambas as faces da parede é semelhante. plano e fora do plano, verificam-se valores
de drift semelhantes para forças 15 vezes
superiores (no caso do ensaio no plano).
4.2.2.2 Ensaios cíclicos fora do plano Isto demonstra que a vulnerabilidade deste
Para a realização do ensaio da parede tipo de elementos estruturais face a acções
fora do plano foi montado um novo horizontais, como os sismos, é
dispositivo de ensaio, concebido para significativamente superior quando
aplicar forças apenas num sentido, ou seja, solicitadas fora do plano. O modo de rotura
ciclos carga-descarga sem inversão do sinal verificado na parede é associado a uma
da força. Foram adoptados dois rotação pela base, apesar da pronunciada
alinhamentos de transdutores. Cada fragilização da parede a meia altura.
alinhamento foi colocado a um terço do
desenvolvimento da parede em planta (ver
Fig. 18). 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS E DE-
SENVOLVIMENTOS FUTUROS
Na Fig. 19 são representados os gráficos
que relacionam a força aplicada à parede No Departamento de Engenharia Civil da
fora do plano com o deslocamento medido Universidade de Aveiro têm sido
no topo. Como se pode observar, a força desenvolvidos trabalhos de investigação em
horizontal máxima aplicada na parede foi laboratório e in-situ para a caracterização
de 0.69kN, sendo um nível de força muito estrutural da construção em adobe na região de
baixo, quando comparado com a força Aveiro. Foram estudadas várias obras
horizontal aplicada no plano (10.7kN, como representativas da construção local. No âmbito
apresentado na Secção 4.2.2.1). O colapso do projecto é realizado o levantamento
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