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CURSO DE DIREITO

INTERNACIONAL PÚBLICO
Celso D. de Albuquerque Mello
l.ivre-docente de Direito Internacional Público da Faculdade de Direito
da Universidade Federal do Rio de Janeiro; Professor da -mesma disciplina
na PUC/RJ, UERJ, UGF e L'NIG

CURSO DE DIREITO
INTERNACIONAL PÚBLICO

PREFÁCIO DE M. FRANCHINI NETTO À Ia EDIÇÃO


Professor Catedrático de Direito Internacional Público
da Faculdade de Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro
e da Faculdade Brasileira de Ciencias Jurídicas

2° VOLUME

14a EDIÇÃO

(revista e aumentada)

R€NQVflR
Rio de Janeiro • Sao Paulo
2002
O -t ^ '

Todos os direitos reservados à


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Celso de Albuquerque Mello
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E d itoração Eletrônica O*
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4
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Sindicato Nacional dos Editores de Livros. RJ.

Mello, Celso D. de Albuquerque (Celso Duvivier de Albuquerque), 1937-


M 52c Curso de direito internacional público /Celso D. de Albuquerque
Mello; prefácio de M. Franchini Netio à I .ed. - 14.ed. (ver. E aum.) -
Rio de Janeiro: Renovar, 2002.
2v .; 23cm.
ISBN 85-7147-714-0 (vol. 1)
ISBN 85-7147-718-3 (vol. 2)
1. Direito Internacional Público. I. Título.
CDD-341

Proibida a reprodução ( Lei 9.610/98)


Impresso, no Brasil'
TRABALHOS DO AUTOR

Alguns aspectos da ratificação de tratados, in “Revista Jurídica”, vol. XIX,


1963, 1964, págs. 139-155.
Plataforma Continental — 1965 — Livraria Freitas Bastos, 160 págs.
M ar Territorial — 1965 — Livraria Freitas Bastos, 235 págs.
Ratificação de Tratados — 1966 — Livraria Freitas Bastos, 173 págs.
Genocídio: Alguns aspectos da Convenção de 1948, in “Revista Brasileira
de Criminologia e Direito Penal”, n“ 12, janeiro-m arço de 1966, págs.
99-106.
Pessoas Internacionais, in “Repertório Enciclopédico do Direito Brasi­
leiro”, vol. 37, págs. 118-136, Editor Borsói.
Evolução da Política Externa do Brasil, in “Centro de Estudos do Boletim
Cambial”, 1967, 21 págs.
A Política Externa Brasileira (1946-1966), in “Centro de Estudos do Bo­
letim Cambial”, 1967, 29 págs.
Presa, in “Repertório Enciclopédico do Direito Brasileiro”, vol. 39,
págs. 68-74, Editor Borsói.
O Poder Legislativo n a Ratificação de Tratados, in “Revista de Ciência
Política”, vol. II, ns 4, 1967, págs. 5-28.
Introdução ao Estudo da Guerra no Pensamen to Católico — A Guerra Justa,
in “Revista Verbum”, t. XXV, faces. 2-3, setembro.de 1968, págs. 221-230.
Os Direitos do Homem n a Ordem Jurídica internacional, in “Revista de
Ciência Política”, vol. II, nB 4. outubro-dezembro de 1968, págs. 144-
156.
Comentário bibliográfico à obra deM . Gordon Levin Jr. — “Woodrow Wilson
and World Politics”, in “ Revista Brasileira de Estudos Políticos”, julho
de 1969, n9 27, págs. 263-267.
Algumas observações sobre o 3° Mundo e o D l Político — O Direito Interna­
cional Público e a América Latina, in “Cadernos da PUC, Departamento
de Ciências Jurídicas” , setembro de 1969, n- 1, págs. 17-23.

895
— Curso de Direito Internacional Público, ] 968, Livraria Freitas Bastos, 672
págs.; 2a edição (revista e aumentada): vol. I (451 págs.); vol. II (405
págs.), Livraria Freitas Bastos, 1970; 3S edição (idéntica à anterior),
1972; 4a ed. (revista e aumentada), 1974: vol. I (469 págs.); vol. II (434
págs.); 5- ed. (revista e aumentada), 1976: vol. I (515 págs.); vol. II
(461 págs.); 6a edição (revista e aum entada): vol. I (529 págs.) e vol.
II (540 págs.), Livraria Freitas Bastos, 1979; 7a edição (revista e au­
mentada), 1.171 págs., 1982, Livraria Freitas Bastos; 8a edição (revista
e aumentada), 1.229 págs., 2 vols., 1986, Livraria Freitas Bastos; 9a ed.
(revista e aumentada), 1992, 1.343 págs. (2 vols.); 10* ed. (revista e
aumentada), Editora RENOVAR, 1.423 págs. (2 vols.), 1994; 11a ed.
(revista e atualizada), Editora RENOVAR, 1.556 págs. (2 vols.), 1997;
12a ed., Editora RENOVAR, 1650 págs. (2 vols.), 2000; 13a ed., Editora
RENOVAR, 1670 págs. (2 vols.), 2001.
— Organizações Internacionais. Parte Geral. Centro de Ciencias Sociais da
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, 1970, 63 págs.
(tiragem mimeografada).
— Características da Política Externa do Brasil e Os Direitos e Deveres do Homem
na ONUe OEA, in “ Estudos de Problemas Brasileiros” (obra coordenada
pelo Pe. Francisco Leme Lopes), Editora Renes, 1970, págs. 193-218.
— A ONU e o Direito Internacional, in “Tabulae”, Revista da Faculdade de
Direito da Universidade Federal de Juiz de Fora, ano IV, n9 4, dezembro
de 1970, págs. 67-77.
— O Conteúdo A tual do Direito Internacional Público, in “Revista de Ciencia
Política”, vol. 5, ns 1, março de 1971, especialmente págs. 37-42.
— Guerra Civil (Campo de Direito Internacional Público), in “Estudos das
Transformações da Ordem Política”, Editora Renes, 1971, págs. 63-97.
— O M ar Territorial Brasileiro in “Estudos do Mar Brasileiro”, Editora
Renes, 1972, págs. 117-138.
— A Norma Internacional, in “Revista de Ciência Política”, janeiro-março,
1972, págs. 51-64.
— Poluição das Aguas, in “Revista Verbum”, da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro, fases. 3-4, setembro-dezembro de 1971,
págs. 317-328.
— 80 verbetes relativos a Direito Internacional Público em Tempo de Paz, in
“Manual das Leis Marítimas”, vol. 2, págs. 11-72, 1972, editado por
Diretoria de Portos e Costas, Ministério da Marinha.
— As Sociedades Comerciais e a Ordem Internacional, in “Intervenção do
Estado no Dominio Económico”, Editora Rio, 1973, págs. 67-106. Urna
outra versão deste trabalho com o título “As Sociedades Comerciais e
o Direito Internacional Público” foi publicada no Boletim Brasileiro
de Direito Internacional, órgão da Sociedade Brasileira de DI e do
Departamento de Direito Internacional da Universidade de São Paulo,
janeiro-dezembro de 1972/74, n®s 5 5 /6 0 , págs. 105-131.

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— Phtlafomna Continental r as Pescarias no Direito Internacional Público, m
Paulo Moreira da Silva e outros — O Mar. Direito e Ecologia, respecti­
vamente, págs. 39-52 e 53-72. Fundação Gelulio Vargas, 1973.'
— O Direito Internacional e as Leis de Guerra. Escola Superior de Guerra
(tiragem mimeografada), 1973, 24 f>ágs.; publicada in ‘ Segurança e
Desenvolvimento", Revista da Associação dos Diplomados da Escola
Superior de Guerra, n- 156, 1974, págs. 77-92.
— Representação (Direito Internacional Público), in Repertório Enciclopédico
do Direito Brasileiro, t. 49, págs. 29-31, Editor Borsói.
— Capítulos: “O Território Marítimo", “Alto-mar” e “Navios’’ , in Direito
Internacional Público (obra em co-autoria de Raphael Valentino So­
brinho, Mário Pessoa de Oliveira, Vicente Marotta Rangel e Celso
Mello, 4 vols., 1974), vol. II, 236 págs., 1974. Tiragem da Escola de
Guerra Naval, Ministério da Marinha. ■ -
— O Direito Internacional Público e a Ordem Internacional e a Guerra Interna
no Direito Internacional Público, in Themístocles Brandão Cavalcanti e
outros — As Nações Unidas e os Problemas Internacionais. Fundação
Getulio Vargas, 1974, respectivamente, págs. 21-45 e 67-89.
— Princípios Acerca da Repressão dos Delitos nas Relações Internacionais, in
“Revista da Faculdade de Direito de Caruaru”, nB9, 1974, págs. 29-60.
— Novas Tendências do Direito Internacional Público, in “ Revista da Ordem
dos Advogados do Brasil”, Seção da Guanabara, setembro-dezembro
de 1974, vol. I, ne 2, págs. 261-281.
— Os Tratados n a Constituição, in As Tendências Atuais do Direito Público.
Estudos em homenagem ao Prof. Afonso Arinos. Editora Forense, 1976,
págs. 119-166.
— O Direito Internacional Público em Transformação. Editora Resenha Uni­
versitária, 1976, 106 págs.
— Extradição (participação em mesa-redonda), in “Revista de Ciência Política”
do Instituto de Direito Público e Ciência Política da Fundação Getulio
Vargas, vol. X IX , n- 4, outubro-dezembro de 1976, págs. 78-81 e 100-
101 .
— Modos Pacíficos de Solução dos Litígios Internacionais, in T ercer Curso de
Derecho Internacional — Organizado p or e¡ Comité Jurídico Intera-
mericano (julio-agosto de 1976). Secretaria General de la Organización
de los Estados .Americanos, Washington D.C., 1977, págs. 279-299.
— Contratos entre Estados e Empresas Estrangeiras, in Estudos Jurídicos em
homenagem ao Prof. Oscar Tenório. Universidade do Estado do Rio
de Janeiro, 1977, págs. 175-187.
— Discurso de Paraninfo da turma de 1977 do Curso de Pós-graduação em Direito
e Relações Internacionais — Legislação e Comércio Exterior do Instituto
de Direito Público’ e -Ciência Política da Fundação Getulio Vargas, in
“Revista de Ciência Política” da Fundação Getulio Vargas, vol. X X , ns
4, outubro-dezembro de 1977, págs. 119-122.

897
— As Relações Internacionais nas A nos 70 e Algumas Considerações sobre a Á/iiru
nas Relações Internacionais, in Curso de Relações Político-econômicas
Internacionais, coordenação de Adriano Moreira. Editora Resenha
Universitária, 1977, págs. 15-28 e 67-71.
— Terminação, Suspensão e N ulidade dos Tratados, in Cuarto C urso de De­
recho Internacional, organizado por el Comité Jurídico Interamerica-
no (julio-agosto de 1977). Secretaria General de la Organización de
los Estados Americanos, Washington D.C., 1977, págs. 283-313.
— Direito Penal e Direito Internacional — Livraria Freitas Bastos, 1978, 222
págs.
— Legado Político do Ocidente — Coordenação de Adriano Moreira, Ale­
jandro Bugallo e Celso Mello. Prefácio de Alceu Amoroso Lima. DIFEL,
1978, 343 págs.
— As Empresas no Direito Internacional Público, in “Nomos”, Revista dos Cursos
de Mestrado; Bahia, Ceará e Pernambuco Imprensa Universitária da
Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 1978, págs. 265-285. - .
— Direito Internacional Público n a Conjuntura Atual: A Política internacional
e sua influência no desenvolvimento do Direito Internacional Público,
in Quinto Curso de Derecho Internacional Organizado por el Comité
Jurídico Interamericano (agosto de 1978). Secretaria General de la
Organización de los Estados Americanos, Washington D.C., 1979, págs.
83-108.
— Prefácio ao livro de Maria Arair Pinto Paiva — A Elite Política no Ceará
Provincial, 1979, Editora Tem po Brasileiro, págs. XV-XVI.
— O Direito Internacional Público nos Anos 70, in Revista da Faculdade de
Direito da Universidade Federal do Rio de Janeiro, setembro-novem-
bro de 1979, págs. 43-56.
— A Norma Jurídica no Direito Internacional Público, in a Norma Jurídica,
obra coordenada por Sérgio Ferraz. Livraria Freitas Bastos, 1980. págs.
243-269.
— A Situação Jurídica do Estrangeiro na Nova Lei, in “ Estrangeiro, para onde
vais?”. Arquidiocese de Curitiba, CNBB, 1980, págs. 15-18.
— Os Exilados Perante o Direito Internacional Público, in Revista Brasileira de
Ciências Jurídicas, n9 1, ag o ./80-jan ./81, págs. 12-23.
— O Princípio da Igualdade no Direito Internacional Público, in Revista da
Ordem dos Advogados do Brasil — RJ, vol. X X , I a quadrimestre 81,
n5 15, págs. 11-26.
— Direitos do Homem, VI Jornada Latino-americana de Metodologia do
Ensino de Direito, tiragem mimeografada, PUC/RJ, 1981, 10 págs.
— Sujeitos de Direito Internacional Público. Organizações Internacionais e Outros
Sujeitos e Sujeitos de Direito Internacional Público. Estado e Indivíduo, in
Séptimo Curso de Derecho Internacional organizado por el Comité
Jurídico Interamericano (agosto de 1980), Secretaria General de la
Organización de los Estados Americanos, Washington D.C., 1981, res­
pectivamente, págs. 19-32 e 33-51.

898 ■
O impacto da política internacional 110 desenvolvimento tio direito
internacional, in Anuario Jurídico Interamericano 1981. Secretaría
General de la Organización de los Estados Americanos, Washington
D.C., 1982, págs. 8-29.
Prefacio ao livro de Carlos Roberto de Siqueira Castro — O Principio
da Isonomia’ e~a Igualdade da Mulher no Direito Constitucional, Editora
Forense, 1983, págs. XI-XII.
O Governo e o Direito Internacional Público, in Estudos Jurídicos em Ho­
menagem ao Prof. Haroldo Valladão, Livraria Freitas Bastos, 1983,
págs. 78-89.
Novos Enfoques e Perspectivas do Direito Internacional Público, in Noveno
Curso de Derecho Internacional, organizado p or el Comité Jurídico
Interamericano con la Cooperación de la Secretaría General de la
OEA en agosto de 1982, Washington D.C., 1983, vol. I, págs. 41-59.
Resenha do livro de A. A. Cançado Trindade — The Application o f the
Rule o f Exhaustion o f L ocal Remedies, in International Law, Cambridge
University Press, 1983, publicada in A. Augusto Cançado Trindade —
O Esgotamento de Recursos Internos no Direito Internacional, 1984, págs.
11-14, Editora Universidade de Brasilia, Brasilia. Igualmente publicada
in Revista da Faculdade de Direito, Fortaleza, vol. 24, ne 2, julho-de-
zembro de 1983, págs. 185-189. Também publicada in Revista Brasileira
de Estudos Políticos, ne 59, julho de 1984, págs. 224-228, Universidade
Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.
A Contribuição do Direito Civil ao Direito Internacional Público, in Estudos
Jurídicos em Homenagem ao Professor Caio Mário da Silva Pereira,
1984, págs. 212-220, Editora Forense.
Direitos do Homem n a América Latina, in Crítica do Direito e do Estado,
organizador: Carlos Alberto Plastino, 1984, págs. 153-160, Edições
Graal Ltda.
Resenha bibliográfica da obra Repertorio da Prática Brasileira do Direito
Internacional, de Antonio Augusto Cançado Trindade, 3 vols., Fundação
Alexandre de Gusmão, Brasília, in Revista Brasileira de Tecnologia,
vol. 16, nfi 1, janeiro-fevereiro de 1985, CNPq — Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, pág. 64.
Prefácio ao livro de Prosper Weil — O Direito Internacional no Pensamento
Ju d a ico — 1985, Editora Perspectiva, S. Paulo, págs. 7-9.
Guerra Interna eDireito Internacional, Editora RENOVAR, 1985, 229 págs.,
RJ
Aspectos Gerais do Direito Internacional Público, in Curso de Derecho
Internacional. XI Curso Organizado por el Comité Jurídico Interame-
ricano. Secretaria General. Organización de los Estados Americanos,
Washington D.C., 1985, págs. 3-28.

899
— Resenha do livro cie A. A. Caneado Trindade — The Application o fth e
Rule o f Exhaustiov o f Local Remedies, in International Law, Cambridge
University Press. 1983, publicada in A. Augusto Cançado Trindade —
O Esgotamento de Recursos Internos no Direito Internacional, 1984, Editora
Universidade de Brasília, págs. 11-14. Igualmente publicada in Revista
da Faculdade de Direito, Fortaleza, vol. 24, n- 2, julho-dezembro de
1983, págs. 185-189. Foi também publicada in Revista Brasileira de
Estudos Políticos, na 59, julho de 1984, Universidade Federal de Minas
Gerais, págs. 224-228.
— Resenha bibliográfica de Antônio Cançado Trindade — Repertório da
Prática Brasileira do Direito International, 3 vols., Fundação Alexandre
de Gusmão, Brasília, 1984, in Revista’ Brasileira de Tecnologia, vol. 16,
n- 1, janeiro-fevereiro de 1985, CNPq — Conselho Nacional de De­
senvolvimento Científico e T ecn o ló g ico , pág. 64.
— Prefácio ao livro de Paulo D. Bessa Antunes — Uma Nova Introdução
ao Direito, Livraria e Editora RENOVAR Ltda., RJ, 1986, págs. I e II.
— Constituição e Relações Internacionais, in A Nova Constituição e o Direito
Internacional, coordenação de Jacob Dolinger, Livraria Freitas Bastos,
1987, págs. 19-37.
— Algumas Considerações sobre os Direitos do Homem no Direito Internacional
Público, in Contextos, n e 2 (julho-dezembro de 1987), publicação do
Mestrado de Ciências Jurídicas da PUC-RJ.
— Prefácio ao livro de José Ribas Vieira — O Autoritarismo e a Ordem
Constitucional no Brasil, Editora RENOVAR, RJ, 1988, págs. III e IV.
— Participação no Seminário sobre “Atlântico Sul”, realizado pelo Insti­
tuto de Pesquisa de Relações Internacionais. Fundação Alexandre de
Gusmão, Brasília, 1987, págs. 28-31 (tiragem mimeografada em 1988).
— Considerações sobre oPan-americanismo, in Boletim da Sociedade Brasileira
de Direito Internacional, años XXXVII e XXXVIII, 1 9 8 5 /1 9 8 6 , n9s
6 7 /6 8 , págs. 25-46.
— Pronunciamento na Comissão da Soberania e dos Direitos e Garandas
do Homem e da Mulher na l 3 Subcomissão da Nacionalidade, da
Soberania e das Relações.Internacionais, in Diário da Assembléia Na­
cional Constituinte (Suplemento), 27 de maio de 1987, págs. 2-6.
— ODireito Constitucional Internacional na Constituição de 1988, in Contexto
Internacional, ne 8, págs. 9-21, Revista semestral do Instituto de Rela­
ções Internacionais, PUC/RJ, jul./d ez. 88.
— Comentário ao art. 4 S da Constituição de 1988, in Comentários à Consti­
tuição, Livraria Freitas Bastos, 1990, págs. 145-148.
— Princípio de Não-intervenção, in Revista de Ciência Política da Fundação
Getulio Vargas, vol. 33, maio/jul. de 1990, págs. 9-19.
— Prefácio ao livro de Benjamín do Rego Monteiro Neto — O Direito da
Sociedade H um ana, 1990, pág. 15, COMEPI, Teresina.

900
Prefácio ao livro di- |essé Torres Pereira Junior — O Direito à Defesa na
Coiistitvição de 1988, í 1>Í>1. págs. V e VI, Editora RENOVAR.
Direito Internacional Americano, 1992, Universidade Gama Filho, 205
págs., 1992 (tiragem mimeografada).
A Revisão do Direito Constitucional Internacional na Constituição de 1988,
in Seminário sobre Revisão Constitucional, Universidade Gama Filho,
1992, págs. 1-14 (tiragem mimeografada).
Apresentação (orelha) do livro de J. Haroldo dos Anjos e Carlos Ca­
minha Gomes — Curso de Direito Marítimo, 1992, Editora RENOVAR.
Direito Internacional Econômico, 1993, Editora RENOVAR, 228 págs.
A Sociedade Internacional: Nacionalismo versus Internacionalismo e a Questão
dos Direitos Humanos, in Direito, Estado e Sociedade, PU C /R J, Depar­
tamento de Ciências jurídicas, nu 2, janeiro/julho de 1993, págs. 25-36.
Foi igualmente publicado in Arquivos cfo Ministério da Justiça, a. 46,
ns 182, ju l./d ez. de 1993, págs. 115-127.
Apresentação (orelha) do livro de Celso Cezar Papaleo — Abmto de
Contracepção, 1993. Editora RENOVAR.
Prólogo ao livro de Antônio Augusto Cançado Trindade — Direitos
Humanos e Meio Ambiente, 1993, Sérgio Antônio Fabris Editor, Porto
Alegre, págs. 15-18.
O Brasil e o Direito Internacional na Nova Ordem M undial, in Revista
Brasileira de Estudos Políticos, nQ76, Universidade Federal de Minas
Gerais, 1993, págs. 7-26.
Sobre a Solução de Conflitos entre Estados ou entre Governos. Uni­
versidade Gama Filho, 1993, págs. 6-9 (tiragem mimeografada).
Considerações sobre o Mercosul, in Boletim Científico do Mestrado e
Doutorado em Direito, ano 1, ns 1, 1993, Universidade Gàma Filho
(tiragem mimeografada).
Sobre a Solução de Conflitos entre Estados ou entre Governos (deba-
tedor), in A Solução de conñilos no Ambito da Integração dos Países
do Cone Sul, 1993, págs. 6-9, Universidade Gama Filho (tiragem mi­
meografada).
A Sociedade Internacional: Nacionalismo versus Internacionalismo e
a Questão dos Direitos Humanos, in Direito, Estado e Sociedade, n-
2, janeiro-julho de 1993. págs. 25-36, PUC/Rio, Departamento de Ci­
ências Jurídicas. Foi também publicado in Arquivos do Ministério da
Justiça, ano 46, ns 182, julho-dezembro de 1993, págs. 115-127. Igual­
mente publicado no Boletim da Sociedade Brasileira de Direito Inter­
nacional, dezembro de 1992/m aio de 1993, nes 8 4 /8 6 , págs. J95-205.
Direito Constitucional Internacional, 1994, 380 págs., Editora RENO­
VAR; 2a ed. revista, 2000, 399 págs. Editora RENOVAR.
Soberania Estatal e Organização Judiciária em Zonas de Infegração
Econômica, 1994, 103 págs., Universidade Gama Filho. Curso de Pós-gra-
duação em Direito. Mestrado e Doutorado (tiragem mimeografada).

901
— Resenha Bibliográfica de Philippc Brctton — Relations Internationales
Contemporaines, in Boletim da Sociedade Brasileira de Direito Inter­
nacional, janeiro/junho de 1994, 11 -s 91/92, págs. 193 e 194.
— Análise do Núcleo Intangível fias Garantias dos Direitos Humanos em
Situações Extremas: Uma Interpretação do Ponto de Vista do Direito
Internacional Público, in Direito, Estado e Sociedade, PUC-RJ, Depar­
tamento de Ciências Jurídicas, n“ 5 agosto/dezembro de 1994, págs.
13-23.
— Responsabilidade Internacional do Estado, Editora RENOVAR, 1995,
215 págs. Em 1994 foi feita tiragem mimeografada pela Universidade
Gama Filho (199 págs.).
— Apresentação (orelha) do livro de Luiz Emvgdio F. Rosa Jr. — Manual
de Direito Financeiro e Direito Tributário — 10- ed., 1995, Editora
RENOVAR.
— Pronunciamento, in Anais do III CONPEDI — Pós-graduação em Di­
reito no Brasil: Avaliação e Perspectivas, 1995, págs. 80 e 81, Editoria
Central da Universidade Gama Filho.
— Saudação ao Pe. Laércio Dias de Moura, in Direito, Estado e Sociedade,
Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Departamento de
Ciências Jurídicas, ns 6, janeirojulho de 1995, págs. 17-20.
— “Apresentação” do trabalho de Friedrich K. Juenger — Conflito de
Leis na América e na Europa, coordenação de Nádia Araújo et allii, in
Cadernos de Direito Internacional Privado — Departamento de Direi­
to, PUC-RJ, ano I, ns 1, 1995, 2 págs. (tiragem mimeografada).
— Introdução ao Estudo das Sanções no Direito Internacional Público,
1995, 109 págs. — Publicação mimeografada do Curso de Pós-gradua­
ção em Direito da Universidade Gama Filho.
— Apresentação da obra de Adherbal Meira Mattos — Direito Interna­
cional Público, 1995, pág. III, Editora RENOVAR.
— O Mercosul e a Reunião de Ouro Preto, in Caderno Científico do
Mestrado e Doutorado em Direito — Universidade Gama Filho — Ano
II — ne 3 — 1995, págs. 4-8.
— Direito Internacional Americano — 1995 — 246 págs, Editora RENO­
VAR, em 1992 foi feita tiragem mimeografada pela Universidade Gama
' Filho (205 págs.)
— A Revisão do Direito Internacional na Constituição de 1988, in Revista
de Ciências Sociais, ano I, nfi 1, novembro de 1995, págs. 75-89, Uni­
versidade Gama Filho.
— Prefácio ao livro de José H. Fischel de Andrade — Direito Internacional
dos Refugiados, Editora RENOVAR, 1996, págs. XI e XII.
— Prefácio ao livro de Paulo Borba Casella — Mercosul: Exigências e
Perspectivas, 1996, Ltr, São Paulo, pág. 7.
— Direito Internacional da Integração, 1996, 357 págs., Editora RENOVAR.

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A Implementação do Direito Internacional Humanitario pelo Direilo
Brasileiro in A Incorporação das Normas Internacionais de Proteção
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1999, vol. I, 2000, págs. 417-428.
— O direito internacional público no direito brasileiro, in Dimensão
Internacional do Direito. Estudos em Homenagem a G.E. do Nasci­
mento e Silva, Coordenador: Paulo Borba Casella, Editora LTR, 2000,
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— Prefácio ao livro de Mariângela Ariosi — Conflitos entre Tratados
Internacionais e Leis Internas, 2000, pg. V, Editora Renovar.
— As Sanções no Direito Internacional Público. Noções Preliminares, in
Estudos Jurídicos, Políticos e Sociais. H-omenagem a Gláucio Veiga,
Coordenadores: Nelson Nogueira Saldanha e Palhares Moreira Reis,
2000, págs. 37-55. Editora Juruá, Curitiba.
— Prefácio ao livro de Dyle Campello.-— O Direito da Concorrência no
Direito Comunitário Europeu: Uma'Contribuição ao Mercosul, 2001,
2 pgs.. Editora Renovar.
— Prefácio ao livro de Ana Paula Teixeira Delgado — O Direito ao
Desenvolvimento na Perspectiva da Globalização, 2001, 1 pg., Editora
Renovar.
— Prefácio ao livro de Joaquim B. Barbosa Gomes — Ação .Afirmativa e
Princípio Constitucional da Igualdade, 2001, Editora Renovar, 2 pgs.

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— Prefácio ao livro de Ana Cristina Paulo Pereira — Direito Institucional
e Material do Mercosul. 2001, Editora Lúmen Juris. XI
— Prefácio ao livro de Luis Cesar Ramos Pereira — Limitação e a não
Aplicabilidade do Direito, 2001, Editora Renovar, 2 pgs.
— Alto Mar — Editora Renovar, 2001, 265 pgs.
— Prefácio ao livro — “Os Princípios da Constituição de 1988”, organi­
zadores: Manoel Messias Peixinho, Isabella Franco Guerra e Firly Nas­
cimento Filho, 2001, Editora Lúmen, pg. XV-XVII
— Algumas observações sobre o Instituto do Reconhecimento no Direito
Internacional Público, “in” Revista Ciências Sociais, vol. 5, nB 2 —
dezembro de 1999, publicado em 2001, Universidade Gama Filho
— Prefácio ao livro de Antônio Augusto Cançado Trindade — O Direito
Internacional Público em um Mundo em transformação, 2002, Editora
Renovar, pg. IX-XVI

905
CAPÍTULO X X X

PROTEÇÃO DA PESSOA HUMANA1

318 — Introdução; 3 1 9 — Tráfico de escravos, escravidão e trabalho


forçado; 320 — Tráfico de mulheres; 321 — Tráfico de armas, de
bebidas alcoólicas e de publicações obscenas; e repressão à falsificação
de moedas; 322 — Comércio de estupefacientes; 323 — Salvaguarda
da vida humana no mar; 324 — A Proteção Internacional do Trabalho;
325 — Minorias; 326 — Saúde; 327 — Genocídio; 328 — Crimes
contra a humanidade; 3 2 9 — A questão da Corte Internacional Cri­
minal.

318. No presente capítulo vamos estudar alguns dos aspectos da pro­


teção dada pela ordem jurídica internacional à pessoa humana. Os atos
internacionais realizados com este fim demonstram exatamente a subjeti­
vidade internacional do indivíduo, vez que o transformam em portador
de direitos e deveres perante a ordem internacional.2
319. O Dl se interessa em proteger o homem contra qualquer restrição
que se faça à sua liberdade. A escravidão é a forma mais violenta de atentado
à liberdade humana.
A primeira preocupação do mundo jurídico internacional para termi-
nar com a escravidão foi o da abolição do Jráfico de escravos^, uma vez
que aquela só existiria enquanto este subsistisse. A escravidão não é, como
pode p ãrèceí a~primeira vista, um problema ultrapassado dentro do Dl,
pelo contrário, ela ainda se mantém em alguns Estados muçulmanos, na
África, etc.3
O tráfico de escravos através da História se apresentou em duas mo­
dalidades: o de escravos brancos e o de escravos negros.
O tráfico de escravos brancos foi exercido, acima de tudo, pelos Estados
do norte da África, que faziam o comércio dos europeus prisioneiros. Ele
foi praticado, por exemplo, nas três primeiras décadas do século XIX e

907
teve fim quando, cm 1830, a Argélia foi conquistada pela Fiança1'. A
Rússia, ao donflnar a região do Mar Negro, terminou com a escravidão de
brancos ali existentes.
O tráfico de escravos negros311 foi platicado durante séculos e perdura
ainda hoje em certas regiões. Nos séculos XVI e XV I1, ele foi um monopólio
dos portugueses. A Fiança, posteriormente, também passou a realizar o
tráfico. A Inglaterra também o fez, com a proteção do governo, durante
um longo período., e obtém, em tratados internacionais, o direito de
colocar certa quota de escravos 110 Novo Mundo.
N o sécu lo XVI11 tem in ício, d en tro dos grandes Estados europeus, a
luta em favor da abolição^ do tráfico. Era a resultante do pensamento
filosófico da época. Os Estados passam a revogar as leis que davam a
proteção ao tráfico. Tal fenômeno ocorre na Inglaterra, na França, nos
EUA, etc.
O primeiro país a abolir o tráfico -de escravos foi a Dinamarca, que,
pelo edito do Rei Cristiano VII, de 16-3-1792, proibiu que seus súditos
tomassem parte no tráfico de escravos (Eugene D. Genovese — O Mundo
dos Senhores de Escravos, 1979). A Constituição dos EUA, em 1787, esta­
belecia a extinção do tráfico a partir de 1808. A lei britânica proibindo o
tráfico é de 1807. A luta da Inglaterra contra o tráfico fez com que ela
conquistasse novas colônias para servir de base para a sua luta; Serra Leoa
(1808), Gâmbia (1816) e Costa do Ouro (1821). Em conseqüência, ela
passou a ter uma situação dominante na Africa Ocidental (Harry Magdoff
— Imperialismo da Era Colonial ao Presente, 1979).
No início do século X IX (Tratado de Paris, 1814) afirma-se que a
abolição do tráfico de escravos deverá ser feita de modo internacional4.
Dentro desta orientação, no Congresso de Viena é feita uma declaração
(2-2-1815) em que o tráfico é condenado. O 2S Tratado de Paris (20-10-
1815) contém uma condenação semelhante. Essas condenações vão sendo
repetidas nos grandes congressos da época: Aquisgrana (1818) e Verona
(1822)5
Os Estados passam a concluir, durante o século XIX, uma série de
tratados em que eles admitiam o direito de visita a seus navios em alto-mar
por navios de guerra de outro Estado. E a origem do direito de visita e
tinha por finalidade reprimir o tráfico de escravos.
O Ato Geral da Conferência de Berlim (1885) proibia qualquer tráfico
ou trânsito de escravos na região da bacia do Congo6. Diante da falta de
resultados do Ato de 1885, foi reunida em Bruxelas (1889-1890)' uma nova
conferência com maior número de Estados participantes do que a anterior
(inclusive a Pérsia, Zanzíbar, etc.), que concluiu uma nova convenção
interditando o tráfico e permitindo o direito de visita aos navios em alto-
mar.
A Convenção de Saint-Germain (1919) revoga as anteriores e os Estados
se obrigaram a pôr fim à escravidão e ao tráfico de escravos. Em 1926,

908
lima nova convenção, concluída sob os auspícios da SND. proibia qualquer
forma de escravidão. O Código Bustamante (1928) colocou o tráfico de
escravos como sendo um delito internacional e punível pelo Estado que
capturasse o navio infrator. A OIT, em uma convenção, declara que tra­
balho foiçado é lodo trabalho ou seniço exigido de um indivíduo sob a
ameaça de uma pena e para o qual o indivíduo não se ofereça esponia-
neamemc* Em 1948, a Declaração Universal dos Direitos do Homem (art.
23) afirma que o trabalho deve ser livre e remunerado, bem com o a
remuneração deve dar ao trabalhador e à sua família uma existência que
seja compatível com a dignidade humana.
Os mesmos princípios figuram no Pacto Internacional de Direitos
Econômicos, Sociais e Culturais e no Pacto Internacional dos Direitos Civis
e Políticos.
A Convenção de Genebra sobre alto-mar (1958) estabelece, no seu
art. 13, que lodo escravo que se refugiar em qualquer navio está livre. Os
Estados se obrigam ainda a combater o tráfico. O art. 22 da mesma con­
venção admite que um navio de guerra exerça o direito de “visita’' em um
navio de comércio em allo-mar, quando houver suspeita de que este navio
se dedica ao tráfico de escravos51. A convenção da Baía de Montego sobre
o D. do Mar (1982), no art. 99, estabelece que todo Estado deve impedir
o tráfico de escravos, bem como todo escravo que se refugiar em um navio
ficará livre. No art. 110 consagra o direito de visita no alto-mar ao navio
que se suspeitar faça o tráfico de escravos.
A Sociedade Antiescravidão afirmava, em 1966, que havia evidência
de escravidão de várias formas em 26 países, por exemplo, no Iêmen, na
Arábia Saudita (apesar da proibição de Faiçal em 1962), etc. A Mauritânia
aboliu a escravidão em 1980.
320. O tráfico de mulheres é aquele que se destina a colocar as mu­
lheres na prostituição. Durante muito tempo, ele foi denominado de tráfico
de brancas, mas desde a Convenção de 1921 esta expressão é substituída
pela de tráfico de mulheres, com o que se demonstra que a ordem jurídica
internacional protege a mulher, independente de sua cor.
Os autores têm dividido a luta contra este tráfico em três fases: a) a
das organizações particulares que, em um congresso em 1899, constituíram
um Bureau internacional que deveria reprimir o tráfico de mulheres e de
crianças; b) os governos se interessaram pelo assunto e em 1904 concluem
uma convenção em que se obrigam a destacar funcionários para comba­
tê-lo; nesta mesma fase, outra convenção (1910) condena o aliciamento
para a prostituição de mulheres de menos de 20 anos; c) a repressão passa
a ser também obra das organizações internacionais e, em 1921, é concluída
uma convenção sob os auspícios da SDN; a idade é aumentada para 21
anos; em 1933, é assinada outra convenção sobre o mesmo assunto. Em
1949, a ONU realiza uma convenção em que o tráfico é condenado, mesmo

909
nos casos em que h;í concordância da mulher. Estas últimas convenções
invocadas condenaram igualmente o tráfico de crianças.
Ainda visando a proteção da mulher de modo ampio existe ñas NU
urn Fundo de Desenvolvimento da Mulher.
32h A iuta contra o tráfico de armas foi praticamente infrutífera. No
final do século passado, ele foi proibido em determinada zona da Africa
e criado em Bruxelas urn Burean internacional para a sua repressão. Em
1919, a Convenção de Saint-Germain proibiu o tráfico na Asia e na Africa.
A SDN procurou, por meio de uma convenção (1925), criar um controle
ao comércio internacional de armas.
Na verdade, essas tentativas fracassaram, uma vez que as duas conven­
ções citadas não entraram em vigor. P àd e-se acrescen tar que os tratados
concluídos após a P Guerra Mundial proibiram a importação e exportação
de armas para a Alemanha e para a Austria.
O tráfico de bebidas alcoólicas para a Africa foi também condenado
por diversas vezes: na Conferencia de Berlim (1885), na de Bruxelas (1890),
na de Saint-Germain (1919), sendo que nesta última foi concluida urna
convenção interditando certas zonas da Africa às bebidas alcoólicas. Estas
convenções não têm atualmente nenhum valor, a não ser para a História.
O comércio e a impressão de publicações obscenas foram reprimidos
pela Convenção de 1923 realizada pela Sociedade das Nações e o seu
protocolo (Nova Iorque, 1947); bem com o pela convenção de Paris em
1910 e seu protocolo (Nova Iorque, 1949).
A repressão à falsificação de moeda foi realizada em convenção con­
cluída em Genebra em 1929, que consagra a punição deste crime.
322. A repressão ao comércio de estupefacientes tem a sua razão de
ser no mal que estes produtos acarretam ao individuo9*.
A SDN, pelo art. 23, letra C, do Pacto, estava encarregada de controlar
os “acordos relativos ao tráfico de mulheres e crianças, do tráfico de ópio
outras drogas nocivas”. Em execução ao citado dispositivo, ela concluiu
convenções sobre o comércio de estupefacientes: 1925, 1931 e 1936. A
primeira estabeleceu um controle internacional a este tipo de comércio;
a segunda criou na própria SDN uma espécie de contabilidade do comércio
e a terceira fez uma unificação das normas sobre o comércio de estupefa­
cientes.
A ONU recebeu da SDN os’poderes que ela tinha nesta matéria. O
Conselho Econôm ico e Social é o órgão competente dentro da ONU para
tratar dos estupefacientes/ Ele possui uma comissão especializada sobre o
assunto. Em 1961, foi concluida, sob os auspícios da ONU, a convenção
única sobre estupefacientes.
Na ONU o Secretário-geral tem dependendo dele a Divisão de Estu­
pefacientes, que assegura-o secretariado da Comissão de Estupefacientes
do CES (30 membros). Existe também o Fundo das Nações Unidas para
a Luta contra os Abusos de Drogas, criado pela Assembléia Geral.

910
A cilada convenção única criou o Orgão Internacional para o Controle
de Estupefacientes (1?) membros a partir do protocolo de 1972). Os go­
vernantes fazem relatórios anuais dirigidos ao Órgão estabelecendo as
quantidades de que dispõem e os seus fins (médicos, estoque, etc.). A
sanção é o embargo, islo é, a proibição de importação e exportação. O
embargo não tem sido aplicado. Na Convenção de 1972 se estipula a
obrigação de extradição do autor do “crime de ‘com ércio” de estupefa­
cientes. Pode-se mencionar ainda a conclusão (le uma convenção sobre
substâncias psicotrópicas de 197], bem como a Convenção das Nações
Unidas con ira o tráfico ilícito de estupefacientes e substâncias psicotrópicas
(1988), que reprime a produção, extração, distribuição, venda, transporte,
etc.
323. A proteção da vida humana no mar sempre foi objeto de preo­
cupação do mundo jurídico internacional. Sempre se considerou que a
assistência no mar, aos navios ou pessoas em desgraça, era um dever
humanitário. Desde o século XII que a Igreja se preocupa com os náufragos
(Concilio de Latrão), solicitando que as populações costeiras lhes dessem
assistência.
Em 1910, a Convenção de Bruxelas sobre assistência e salvamento
transforma o dever moral acima citado em dever jurídico para os navios
privados. A partir desta, inúmeras convenções sobre salvaguarda da vida
humana no mar foram concluídas: 1914, 1929, 1948, 1960 e 1974 (todas
realizadas em Londres) e 1938 (concluída em Bruxelas). Em 1978 foi
concluído na IMCO um protocolo à convenção de 1974.
A Organização Intergovernamental Marítima Consultiva tem entre as
súas funções a de desenvolver a proteção da vida humana no mar através
da segurança da navegação.
Na Convenção de Genebra (1958) sobre alto-mar, os Estados se com­
prometem a obrigar os capitães dos navios nacionais(lO) a prestarem
assistência às pessoas que se encontrem em desgraça no mar (arl. 12 e art.
98 da convenção de Montego Bay — 1982).
A Conferência de Hamburgo, que em 1979 aprovou uma convenção
sobre busca e salvamento marítimos, dividiu o mundo em zonas de salva­
mento que não correspondem aos espaços marítimos dos Estados, mas
levando em consideração critérios operacionais.
324. A OIT foi estudada no Capítulo XXVI e ali mostramos que ela
se preocupa diretamente com o homem. A própria representação nos seus
órgãos (representantes de patrões, empregados e governos) visa atender
os interesses dos indivíduos diretamente. Assim sendo, ao contrário da
grande maioria das organizações internacionais, ela possui representantes
que não são dos Estados, mas de “verdadeiras” classes sociais (patrões e
empregados).
Ela já tratou de inúmeros aspectos da vida social relativos ao trabalho
que interessam diretamente ao homem: emprego de crianças, repouso dos

911
trabalhadores higiene industrial, desemprego. acidentes do trabalho, or­
ganização sindical. etc.
Podemos apresentar um maior desenvolvimento sobre a liberdade
sindical assegurada pelas convenções tia OIT de 1948 e 1949. A liberdade
sindical é garantida a todos os empregadores e empregados que podem
constituir livremente sindicatos. A ordem jurídica interna pode fixar os
casos de suspensão e dissolução de sindicatos. Em 1950 o Conselho de
Administração da OIT criou a Comissão de Investigação e Conciliação
sobre liberdade sindical. Os membros da Comissão são indicados pelo
citado Conselho. Ela é permanente e é um órgão comum à ONU e à OIT.
lendo em vista que a liberdade sindical interessa aos direitos do homem.
A Comissão tem nove membros que atendem às diferentes regiões geográ­
ficas, sendo que é formada por indivíduos independentes de Estado e de
organizações sindicais. Os nacionais das partes em litígio não participam
do procedimento. A Comissão tem função de investigação e de conciliação.
As reclamações podem ser apresentadas pelos governos e organizações de
empregados e de empregadores. O CES e a Assembléia-Geral da ONU
podem transmitir reclamações. Para existir a conciliação é necessário que
o governo interessado dê o seu consentimento. Existe um Comitê de
Liberdade Sindica) formado por nove membros do Conselho de Adminis­
tração (três de cada grupo social representado na OIT) que diz se a
reclamação m erece ou não um exame aprofundado. A investigação tem
três fases: a) escrita; b) oral e c) visita ao Estado. Ela é secreta, e as partes
participam. O procedimento termina por um relatório. Considera-se que
o ideal seria a conciliação não depender do consentimento do Estado.
A proteção internacional do trabalho é feita também nos pactos de
Direitos do Homem.
Já se fala atualmente em Dl da Seguridade Social, que teria a sua
origem em um tratado de cooperação sobre a matéria concluído entre a
França e a Itália, em que se consagrava a igualdade de tratamento (1904).
Em 1925 a convenção nfi 19 da OIT consagra a igualdade de tratamen­
to. A ação da OIT nesta matéria tem sido sintetizada do seguinte modo:
a) entre 1919 e 1936 gira em torno da noção de seguridade e protege
certas categorias d t trabalhadores; b) a partir de 1944 visa estabelecer um
rendimento'mínimo e assegurar a proteção médica; c) em 1952 estabelece
normas gerais sobre seguridade.
Vamos agora abrir um parênteses sobre o Dl do Trabalho que nas
palavras de Arnaldo Süssekind, é “o capítulo do DIP que trata da proteção
do trabalhador, seja como parte de um contrato de trabalho, seja como
ser humano,- com a finalidade de: a) universalizar os princípios de justiça
social; b) increm entar a cooperação internacional para proteger o traba­
lhador". A Declaração de Filadélfia da OIT (1944) afirma: que o trabalho
não é mercadoria; b) direito dos seres humanos de perseguirem o seu
bem-estar material; c) proporcionar emprego; d) facilitar a formação pro­

912
fissional: e) assegurar o direito de ajustes coletivos: f) incentivar a coope­
ração entre empregados e empregadores.
Jenks afirmava que o progresso social não é obstáculo ao progresso
econômico. O próprio preámbulo fia OIT afirma que a paz universal se
baseia na justiça social.
Alguns autores defendem que o Dl do Trabalho tem autonomia.
As convenções da OIT não podem ser ratificadas com reserva devido
a sua estrutura (governo, patrão e empregados).
O art. 427 do Tratado de Versalhes relaciona os princípios fundamen­
tais do Dl do Trabalho: a) bem-estar físico, moral e intelectual do Lraba-
lhador; b) a uniformidade absoluta só pode ser alcançada paulatinamente;
c) salário igual por trabalho igual; d) jornada de 8 horas; e) direito a
associação, etc.
O art. 23 do Pacto da Liga das Nações coloca como seus objetivos
assegurar condições de trabalho justos e humanos.
Os estados podem se retirar da OIT, mas o prazo de aviso prévio é de
dois anos.
O tratado não admite a suspensão de um membro. As convenções e
recomendações são submetidas ao Legislativo. Contudo se versasse matéria
de competência do Executivo só será submetida a este. A convenção da
OIT fala em “autoridade competente" e esta é quem pode legislar sobre
a matéria. O estado ao aceitar em parte a convenção pode fazer uma lei
regulamentando o que ele aceitou.
Para controle da aplicação das convenções há um sistema de relatórios.
Há também procedimentos contenciosos que podem ser iniciados por: a)
estado-membro; b) “ex officio:7 pelo Conselho da Administração; c) orga­
nização de empregados e empregadores; d) delegações nas conferências.
A Comissão dos Peritos tem 20 membros que representam as diferentes
regiões. Tem funções quase judiciárias. Os casos de infração não resolvidos
por ela são enviados à Conférência. E um órgão técnico-jurídico. As sessões
são secretas. A sua finalidade é fazer com que os estados cumpram as
normas da OIT.
A Comissão Tripartite é formada por representantes de governos,
patrões e empregados. E um órgão técnico-político. As sessões são públicas.
Toma como base o trabalho da Comissão de Peritos e convida os governos
interessados a dar explicações.
Existem procedimentos contenciosos: a) reclamação que é apresentada
por organizações de empregadores e trabalhadores a OIT quando não há
o cumprimento de uma convenção ratificada; b) queixa que é apresentada
por estado, delegação ou ex officio pelo conselho de administração. O
processo é de natureza judicial. E apresentada ao Conselho de Adminis­
tração que pode criar uma Comissão de Investigação.
Este item acima é em grande parte calcado na excelente obra de
Arnaldo Süssekind.

913
Pretendemos apresentar ainda algumas considerações sobre o Dl do
Trabalho. No curso da l s Guerra Mundial a idéia de concorrência inter­
nacional estava presente tanto nos governos, como nas organizações dos
trabalhadores. Ela não foi estranha à admissão da Áustria e Alemanha na
p OIT em 1919. Era um argumento que tinha certo peso (Valticos). Esta
idéia de igualização dos custos da produção desaparece. Os economistas
haviam mostrado que a situação dos países é muito diferente. A igualdade
das normas em vez de ser um fator de equilíbrio era uma desvantagem
para os países menos desenvolvidos. A legislação internacional do trabalho
não visa a igualdade de custos, mas a sua equivalência (Valticos).
As convenções internacionais de trabalho apresentam as seguintes
características:^) são adotadas em uma instituição. Elas não são precedidas
de negociações diplomáticas, mas de uma discussão no meio de assembléia
que é semelhante aos parlamentos; b) a Conferência Internacional tem
uma representação tripartite; c) as convenções e recomendações são apro­
vadas por 2 /3 e devem ser submetidas às autoridades nacionais com peten­
tes no prazo de 12 a 18 meses; d) Scelle afirmava que as convenções não
tinham aspecto contratual. As convenções são textos “quase-Iegislativos”
ou “pré-legislativos” , como tem sido afirmado; e) as convenções e reco­
mendações formam o Código Internacional do Trabalho; f) as normas são
elaboradas com flexibilidade e podem levar em consideração as diferenças
de condições econôm icas; g) há variedade nos métodos de aplicação; h)
às vezes as convenções têm alternativas; i) às vezes permitem derrogações
temporárias; j) a recomendação é feita quando não há condições para
convenção; k) as línguas das convenções são francês e inglês.
Existem também tratados bilaterais, com o os da seguridade social.
O maior problema dos representantes dos empregadores foi dos países
comunistas e se alegou que não se exigia que o empregador fosse pessoa
privada.
A data da entrada em vigor da convenção determina a data da denúncia
e ela pode ser denunciada no ano seguinte ao que completa 10 anos.
Quando a convenção não entrou em vigor e um estado a ratificou ela
pode pedir a anulação do registro da ratificação',
No caso de convenções e recomendações não ratificadas os estados
permanecem com a obrigação de fazer relatórios sobre elas.
Algumas convenções criam procedimentos especiais paia assegurarem
a sua execução,' com o é o caso da convenção sobre a liberdade sindical.
Ela criou o Comitê de Liberdade Sindical com 9 membros ( 3 'rep re­
sentantes do governo, 3 dos empregadores e 3 dos empregados).
Em 1950 para as reclamações de violações foi criada a Comissão de
Investigação e Conciliação. E formada por personalidades designadas pelo
Conselho de Administração. Ela aprecia as reclamações dos governos,
empregadores e empregados. São formados grupos de 3 a 5 miembros.
Unía característica deste procedimento é a participação de elementos não
governamentais. Todas as fases são acompanhadas de publicidade para
atingir a opinião pública.
Os dados acima são tirados de Nicolás Vallicos.
No Conselho da Europa existe uní Código de Seguridade Social (1964)
e seu protocolo. A sua revisão terminou em 1990. Ele consagra os seguintes
princípios: a) igualdade de tratamento entre nacionais e estrangeiros; b)
respeito aos direitos adquiridos e em curso de aquisição; c) cooperação
administrativa.
A ONU concluiu em 1990 a convenção internacional sobre a Proteção
do Direito de Todos os Trabalhadores Migrantes e seus familiares, onde,
por exemplo, é proibida a discriminação de direitos. Cria um Comitê de
Proteção aos direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e seus familia­
res. Ele recebe comunicações de um estado sobre outro estado.
325. O estudo das minorias voltou a ser tema importante no D1P na
década de 90 do século XX. No período entre a l s e a 2- Guerra Mundial
foi um dos assuntos mais tormentosos nas relações Internacionais. Após a
2 - Guerra Mundial, pensou-se que a proteção internacional dos direitos
humanos seria suficiente e quase não se falou mais em minorias. Contudo,
precisamente a partir de 1991, ou seja, do desmoronamento da URSS,
volta-se a falar em nacionalidades ou princípio da autodeterminação dos
povos, e vai surgir também a questão das minorias.
Na Europa Oriental, vários Estados, após um longo período de “uni­
ficação”, vão se desmembrar, como a Tchecoslováquia, a URSS e a Iugos­
lávia. Surge o problema das minorias, vez que durante o período de uni­
ficação elas haviam migrado de uma região para outra. Talvez o problema
mais grave, devido à guerra que ocorreu, tenha sido o dos servios na
Bósnia-Herzegovina.
Tem sido assinalado em diferentes obras que a globalização provoca
dialeticamente o “localismo”, ou, se quisermos, o etnocentrismo. Os dife­
rentes povos, com receio de perderem a sua identidade diante da globa­
lização, “exacerbam ” os seus traços culturais próprios. Há hoje uma glo­
balização que encontra como força contrária o “localismo”.
As minorias penetram na Idade Moderna, no DIP, na Paz de Westfalia,
através das denominadas minorias religiosas e as étnicas no Tratado de
Varsóvia (1773) que fez a primeira partilha da Polônia. N. Rouland “et
alii” afirmam que se começou a tratar deste tema desde a Antigüidade
oriental. O que não nos parece muito correto, vez que a palavra minoria
é utilizada em relação a indivíduos (nacionais e estrangeiros) em uma
situação determinada. Ora, o que vamos encontrar na Antigüidade e na
Idade Média é uma regulamentação da situação dos estrangeiros em geral,
e não a referida “ situação determinada”.
Após a Reforma, que quebra a unidade religiosa européia, é que se
vai colocar a questão das minorias. As disputas religiosas são imensas. Em
1555, na Paz de Augsburgo é consagrado o princípio “Cujus regio ejus

915
religio". que vai se espalhai pefa Europa afirmando que a religião dos
súditos é a religião do monarca. Uni dos principais Halados protegendo
minorias foi de 1606, Tratado de Paz de Viena entre o Imperador Rodolfo
II e o Príncipe da Transilvânia Steplien Bockay que previa proteção para
minorias religiosas. A evolução para o sistema de minorias é encontrada
110 Tratado de Oliva (1660). entre a Polônia e o Grande Eleitor: em que
este cedeu a Pomerãnia e a Livônia à Suécia, garantindo aos seus moradores
a liberdade de religião. Em 1881. uma convenção sobre o estabelecimento
de fronteira entre o Império Otomano e a Grécia determina que as loca­
lidades cedidas à Grécia terão respeitados a religião, os costumes, etc. e
terão*os mesmos direitos civis e políticos que os gregos. Em 1872, a Con-
v.enção de Constantinopla assinada entre a Áustria-Hungria e a Turquia
s o b r e a ocupação da Bósnia-Herzegovina, estatuía que a Áustria-Hungria
garantiria neste território liberdade para todas as religiões.
Em 1699, o Tratado de Carlowitz estabelece que a Sublime Porta
respeitará a religião católica romana onde os seus seguidores tiverem
igrejas, e é dado ao embaixador da Polônia o direito de expor junto ao
“trono imperial” todas as suas reivindicações. No Tratado de Koutchouk-
Kainardji (1774), a Rússia obteve o direito de representar os cristãos or­
todoxos junto ao Império Otomano. Em 1765, no Tratado de Paris, o rei
da Grã-Bretanha se compromete a respeitar a liberdade de religião dos
católicos. Os autores têm salientado a relevância da Paz de Westfalia (1648)
ao consagrar a liberdade do protestantismo na Alemanha.
O que se pode salientar é que a proteção das minorias religiosas vai
no século XIX se confundir com a denominada “ intervenção humanitária”,
como esta expressão era entendida nesta época: garantir a liberdade de
religião.
No tocante às minorias étnicas, Balogh afirma que elas só surgem no
Congresso de Viena, em 1815, quando, a respeito da Polônia, é estabelecido
que Rússia, Prússia e Áustria garantirão aos poloneses “uma representação
e insdtuições nacionais”.
A Grécia ao ficar independente em 1830 garantiu liberdades civis e
políticas a todos os súditos independentemente de religião.
Na Convenção de Paris, de 1858, a Turquia se compromereu a dar aos
habitantes dos principados de Valáquia e Moldávia determinados direitos.
O Congresso de Berlim (1855), ao reconhecer os Estados dos Balcãs,
estabeleceu, em relação a Bulgária, no art. 4, que esta-deveria levar em
consideração os interesses das populações turcas, romenas, gregas e outras.
Balogh assinala que a partir de 1850 surgem as reivindicações de
nacionalidades que ganham amplitude. Assim, no Império Austríaco, em
1848já é assegurado aos tchecos “igualdade no direito corti a nacionalidade
alemã” em todos “os ramos da administração e na vida pública”. Em 1867,
o Império baixa uma lei em que “todas as unidades étnicas do Estado
gozam dos mesmos direitos e têm, em particular, um direito absoluto a

916
conservar c a desenvolver a siia nacionalidade e a sua língtia . roclos os
idiomas utilizados pelas auioridades judiciárias nas províncias são reconhe­
cidos pelos Estados como tendo direitos iguais.
Na Hungria, lei datada de 1868 afuma a igualdade perante a lei de
todos os cidadãos pertencentes a diferentes nacionalidades e permite o
uso oficial de diferentes línguas.
Em 1878, no Tratado de Berlim a Bulgaria, Montenegro, Rússia, Servia
e Turquia garantiam os direitos individuais sem discriminação baseada em
raça e religião.
Durante a l s Guerra Mundial reuniram-se congressos das nacionalida­
des oprimidas (Paris, 1915, e Lausanne, 1916). O mesmo ocorre na Fila­
délfia em 1918. Em 1915 é criada, na cidade de Haia, a “Organização
Central para uma Paz Durável”, em cujo programa “os Estados garantirão
as nacionalidades compreendidas em seus territórios: igualdade civil, li­
berdade religiosa e o livre uso de sua língua”.
Wilson, nos seus 14 Princípios, propõe o da autodeterminação dos
povos que na verdade não foi consagrado de um modo geral após a 1!
Guerra Mundial. Ele só foi aplicado quando havia interesse dos Aliados.
Quando da elaboração da Paz de Versalhes, a questão das minorias
foi debatida. Este problema constava do segundo projeto de Wilson, in­
fluenciado pela propaganda judaica de que não poderia integrar a Liga
das Nações o Estado que não desejasse assegurar às minorias de raça ou
nacionalidade os mesmos direitos assegurados à população majoritária.
Entretanto, no Pacto da Liga não há dispositivo sobre as minorias. A
proteção das minorias foi inserida nos tratados.
Polônia, Romênia e Tchecoslováquia não aceitam de bom grado a
proteção das minorias. Wilson diz que tais estados, no futuro, não poderiam
solicitar o auxílio dos EUA, em caso de violação da paz, se os EUA não
tivessem obtido garantias suficientes para a manutenção da paz. Afirma
ainda que o consentimento dos EUA para a transferência de territórios
dependeria de garantias especiais visando a paz.
O primeiro tratado consagrando a Proteção das minorias foi concluído
com a Polônia em 28 de junho de 1919. Daí alguns autores considerarem
que as minorias foram uma criação do Direito Internacional Público ou,
mais precisamente, do princípio das nacionalidades que penetrou neste
ramo do Direito. Esta situação é considerada pelos citados autores um
verdadeiro “paradoxo”, vez que o mencionado princípio visava “a identi­
ficação da nação e do Estado”. No referido tratado com a Polônia, esta
aceita “as disposições que potências (aliadas e associadas) julgarão neces­
sárias para proteger na Polônia os interesses dos habitantes que diferem
da maioria da população pela raça, língua ou religião”. Esta situação,
denominada “servitude minoritária” , só foi imposta às pequenas potências.
Assim, as grandes potências, como a própria Alemanha, não tiveram esta
servidão, por exemplo, em relação à Alta Silésia, onde havia alemães de

917
origem polonesa. O mesmo também ocorreu tom a Itália, que linha eslavos
na Istria e Trieste, bem torno alemães no Tirol.
N. Rouland “et alii” agrupam os diferentes tratados visando a proteção
das minorias:
— tratados dos aliados com os países vencidos que tiveram perda
territorial: com a Áustria (Tratado de-Saint Germain, de 1919, arts. 62 a
69), com a Bulgária (Tratado de Neuilly, de 1919, arts. 49 a 57), com a
Hungria (Tratado de Sèvres, de 1920, arts. 54 a 60), com a Turquia (Tratado
de Sèvres de 1920, arts. 140 a 151, substituído pelo Tratado de Lausanne,
de 1923, arts. 37 a 45);
— o tratado com os Estados aliados que obtiveram ganho territorial:
Grécia, Romênia (devido à minoria judaica), etc.
— tratados com os novos Estados (Tchecoslováquia, Polônia e Romê­
nia).
Houve ainda uma série de atos internacionais relativos às minorias,
como, por exemplo Tratado de Praga (1920), entre a Polônia e a Tche­
coslováquia; tratado alemão-polonês (1922) sobre a Alta Silésia; convenção
de Varsóvia (1922), entre Polônia, Estônia, Finlândia e Letônia, etc.
Pode-se afirmar que com grande número de tratados, bem como o
sistema de proteção desenvolvido pela SdN, as minorias teriam penetrado
no Dl positivo.
Após a 1- Guerra Mundial foram realizados 17 atos internacionais
visando a proteção das minorias, sendo que 16 versavam sobre a Europa
e um com o Iraque para a proteção dos curdos e assírios-caldeus.
Um ponto difícil de ser resolvido e o que constitui uma m inoria(108),
bem como há, inclusive, uma questão de diversidade do conteúdo termi­
nológico. Este problema é bem explicado, de modo sintético, por Rous-
so-Lenoir.

“A noção de minorias nacional é portanto noção recente, in­


trínsecamente vinculada a de Estado-Nação. Mas os termos são
ambíguos, porque as minorias nacionais possuem juridicamente
a nacionalidade do país onde elas foram incorporadas, quando
o adjetivo que as classifica de “nacionais” envia a nacionalidade
de que elas estão separadas. Nos países multinacionais, como a
Áuslria-Hungria do século X IX ou a ex-União Soviética e a
ex-lugoslávia, a palavra nacionalidade designa pertencer a um
povo, a uma etnia, e a palavra ‘cidadania’ -é que qualifica a
relação jurídica de um indivíduo ao Estado”.

De qualquer modo, vai ser após a I a Guerra Mundial que irá surgir a
questão da definição jurídica de minoria.
Os tratados utilizavam expressões como “minorias nacionais” e “mi­
norias de raça, língua e religião”.

918
A Corle Permanente de Justiça Internacional, em uní parecer datado
de 1930 sobre as “ Comunidades Greco-Búlgaras”, versava sobre a definição
de “comunidade” que era “assimilada” à de minoría pela convenção entre
a Grecia e a Bulgaria, de 1920. O parecer afirma que é uma “coletividade
de pessoas vivendo em um país ou localidade, tendo uma raça, uma religião,
uma língua e tradições próprias, e unidas pela identidade desta raça, desta
religião, desta língua e destas tradições com um sentimento de solidarie­
dade, visando a conservar suas tradições, manter seu culto, assegurar a
instrução e a educação de seus filhos conforme o ‘Genie’ de sua raça e se
assistir mutuamente”.
A posição brasileira sobre minorias parece-nos a mais acertada. Ela foi
exposta e defendida por Afrânio de Melo Franco, na Liga das Nações, em
1925, e merece ser-transcrila:

“Uma minoria, tal como a concebem os tratados de proteção,


não é só um grupo étnico incrustado no corpo de certo Estado,
cuja maioria forma coletividade étnica distinta. Ela é também
um atributo psicológico, social e histórico, a qual constitui,
talvez, na definição a ser procurada, a característica diferencial
por excelência. A simples coexistência de grupos humanos,
formando entidades coletivas, étnicamente diferentes no terri­
tório e sob a jurisdição de um Estado, não é suficiente para que
se seja obrigado a reconhecer nesse Estado, ao lado da maioria
da população, uma minoria cuja proteção seja confiada aos
cuidados da Liga das Nações.”

“Para que exista minoria, no sentido dos tratados atuais, é


preciso que ela suija do produto de lutas entre certas naciona­
lidades e da passagem de certos territórios de uma soberania a
outra, através de fases históricas sucessivas. Ora, tais fatores não
influem da mesma forma em todos os Estados-membros da Liga
das Nações; nos países do continente americano eles são intei­
ramente inexistentes e não podem, por isso, constituir elemento
objetivo para caracterizar o fato social em questão”.

A grande preocupação era evitar que os imigrantes no continente


americano, viessem a se transformar em minorias.
Em 1938 na Conferência Pan-americana de. Lima, foi aprovada uma
declaração de que não existiam minorias no continente americano.
Historicamente poder-se-ia afirmar que a minoria católica e francófona
do Canadá seria uma minoria. Contudo, ela nunca teve este tratamento
perante a Liga das'Nações.
Tudo isto mostra que minoria era um instituto aplicado em uma região
do globo a Estados vencidos, novos Estados e a alguns Estados vencedores
(nos fracos) que tiveram acréscimo territorial.

919
Pode-se realmente observar que não se pode considerar minorías os
imigrantes. Elas estão vinculadas a? populações localizadas em territórios
cedidos por razões políticas a outros Estados. O Tratado entre as Principais
Potencias Aliadas e Associadas e a Polonia (28 de junlio de 1919) refere-se
em diversos dispositivos a súdifos alemães, austríacos, húngaros e russos.
Na verdade, o sistema de minorias ingressa a partir de 1919 no DI Positivo,
porém não como um instituto universal, mas apenas como existente onde
houver tratado específico. Esta é uma restrição que precisa ser acrescentada
à definição acima da CPJI.
No Continente americano a questão vai ser colocada apenas recente-
mente, com a noção de “povos autóctones", que na Bolívia é a maioria
da população, ou, ainda, no Equador é uma da$ etnias dominantes. Estes
casos são mencionados a título de exemplo.
Mark Mazower (Continente Sombrío. A Europa no Século X X , 2001)
assinala que durante a 2a Guerra Mundial já se falava na defesa dos direitos
humanos, mas havia uma discussão: se eles deviam ser individuais ou
coletivos. A opção foi feita em favor dos direitos humanos individuais,
porque só pequenos estados, como a Polonia e aTcheco-Eslovaquia, tinham
sido obligados ao sistema de minorias. A Alemanha, a Itália, etc., por
exemplo, não foram submetidas a ele. Daí a defesa feita pelo Presidente
Benes da Tcheco-Eslovaquia em favor dos direitos individuais.
Na ONU a definição de minoria foi bastante discutida. Em 1949 afir­
mava que a minoria poderia ter se formado das seguintes maneiras: a)
“anteriormente (era) uma nação independente organizada em Estado
distinto (ou uma Organização) tribal mais ou menos independente”; b)
“ela podia fazer parte anteriormente de uma nação organizada em Estado
distinto e ter em seguida se separado deste-Estado e se anexado a um
outro”; c) “um grupo regional ou disperso unido por alguns sentimentos
de solidariedade ao grupo predominante e que não tenha sido assimilado
por este, mesmo em um fraco grau”.
Em 1952 é estabelecida uma lista de fatores para caracterizar as mino­
rias:

“a) a existência entre os súditos de numerosos Estados de grupos de


populações distintas (...) apresentando tradições ou características
étnicas, religiosas ou lingüísticas diferentes das do resto da popula­
ção e que deveriam ser protegidas do resto da população, e que
deveriam ser protegidas por medidas especiais, no plano nacional
ou internacional, a fim de que possam conservar e desenvolver as
tradições ou características em questão;
b) a existência de um fator especial, a saber que alguns grupos mino­
ritários não têm necessidade de proteção. Tais grupos compreen­
dem notadamente aqueles que, mesmo sendo numericamente in­
teriores ao resto da população, constituem o elemento dominante
(-);
i ) o risco de adotar as medidas podendo conduzir a abusos 110 ineio
das minorias. Ctíjas aspirações espontáneas a 11111a vida tranquila de
cidadãos satisfeitos, súditos de um Estado dado, poderiam ser per­
turbadas por elementos tendo interesse de suscitar entre os mem­
bros destas minorias a deslealdade em relação a este Pistado;
d) o fato que não poderia ser indicado de assegurar o respeito de usos
que seriam incompatíveis com os direitos do homem que proclama
a Declaração Universal dos Direitos do Homem;
e) as dificuldades que engendrariam as pretensões ao estatuto de
minoria, que poderiam criar grupos tão pouco importantes que a
011 torga a estes grupos de um tratamento especial poderia, por
exemplo, onerar os recursos do Estado de urna carga sem proporção
com o seu objeto/’

Finalmente, se recomenda que minorías são “grupos de população


não-dominantes que possuem e desejam conservar tradições ou caracterís­
ticas étnicas, religiosas ou lingüísticas estáveis se diferenciando claramente
daquelas do resto da população”. Sugere-se que elas devem ser “numeri­
camente bastante importantes para serem capazes de conservar por elas
próprias tais tradições ou características”. Por fim, se recomenda que “os
membros das minorias devem lealdade ao Estado de que são súditos”.
Francesco Capotorti, em relação às minorias, dá predominância ao
elemento subjetivo, isto é, “o desejo manifestado pelo grupo de conservar
a sua individualidade”, e não se preocupa com “a dimensão numérica da
minoria”.
Bokatola afirma, com razão, que “ uma definição abstrata de minoria”
não é uma condição “prévia 110 estabelecimento de uma protèção das
minorias” .
O Pacto de Direitos Civis e Políticos da ONU (1966) menciona no
artigo 2’7'as “minorias étnicas, religiosas ou lingüísticas” e os seus direitos,
mas 110 documento não há uma caracterização de quando surgem tais
minorias. Na verdade, a existência de uma minoria e a aplicação de um
sistema de proteção é uma questão eminentemente política e que depende
do “-s.istema internacional”.
A “Assembléia Parlamentar do Conselho da Europa em uma recomen­
dação, considera corno minorias: a) um grupo de pessoas que'reside no
'Estado; b) mantém vínculos -antigos e duráveis; c) tem características ét­
nicas, culturais, religiosas ou lingüísticas; d) tem vontade de manter a sua
identidade. As diferenças assinaladas fazem com que os costumes e ideais
das minorias sejam outros que não os possuídos pela população do estado
■onde se localizam. Estes grupos encontram-se instalados em determinadas
regiões dos territórios estatais.
A proteção das minorias na ordem jurídica internacional surgiu, como
vimos, com os primeiros tratados referentes a elas. Contudo, só vai se

921
desenvolver com a Liga das Nações e os tratados concluídos após a Ia
Guerra Mundial.
Os tratados sobre minorias consagraram os seguintes direitos: a) à vida
e à liberdade; b) à nacionalidade e à opção; c) à igualdade (isto significa:
igualdade perante a lei-igualdade dos direitos civis e políticos, de admissão
nos empregos públicos, capacidade de exercer todas as profissões e “tra­
tamento igual e garantias iguais de direito e de fato”); d) liberdade reli­
giosa; e) livre exercício de religião; f) liberdade de ensino; g) livre uso da
língua; h) “direito de gozar de facilidades do ponto de vista da língua
perante os tribunais”; i) direito a uma parte justa dos orçamentos, do
Estado ou município, que seja dedicada à educação, à religião ou à cari­
dade; j) direito de autonomia.
Segundo ainda Balogh, tais direitos beneficiam diferentes categorias
de pessoas: a) alguns são dados a todos os habitantes do Estado, não
interessando saber a sua nacionalidade,' raça, etc., como o direito à vida;
b) outros são dados a todos os súditos, como o direito ao livre uso da
língua; c) outros direitos se aplicam expressamente aos súditos que inte­
gram minorias étnicas, de língua ou de religião, como o direito de fazer
uso da sua própria língua, facilidades para usá-la perante os tribunais,
dirigir e controlar as suas custas, instituições de caridade, religiosas ou
sociais, e escolas; d) há direitos que só são concedidos a minorias que
sejam bastante numerosas, com o o direito a uma parte justa dos orçamen­
tos, do Estado ou município, que seja dedicada à religião ou à caridade;
e) há certos direitos que são dados a uma certa religião, como os direitos
dos judeus na Grécia, ou, ainda, os dos mesmos judeus na Polônia, como
o direito ao sabbat; f) direitos que só pertencem, algumas minorias étnicas,
como o direito à autonomia em religião e ensino dado a comunidades
saxônicas da Transilvânia.
Uma questão interessante é que os tratados internacionais não dêem
às minorias a qualidade de pessoas internacionais. Assim elas não podem
representar e não são partes perante o Conselho da Liga das Nações. O
mesmo ocorre em relação aos indivíduos que integram as minorias. O que
se concedeu às minorias foi o direito de dar informação ao Conselho sobre
a infração ou o perigo de infração em relação aos tratados que as protegem.
Mas isto não é um direito, é somente uma possibilidade sem efeito jurídico,
suscetível de provocar a intervenção do Conselho. E ainda: “a faculdade
de chamar a atenção do Conselho sobre as violações ou os riscos de violação
dos tratados de minorias é reservado apenas aos membros do Conselho
da Sociedade das Nações”. Em conseqüência, a proteção das minorias é
privilégio dos Estados representados no Conselho.
Os direitos reconhecidos às minorias o são a título individual, vez que
elas não têm personalidade internacional. Entretanto os rutenos na Tche-
coslováquia, ocupando um território de 11.000 km2 e com cerca de 600.000
habitantes, seriam “administrados por uma Dieta autônoma dotada de
uma competência normativa cm matéria cultural: o poder executivo era
dado a um governo nomeado pelo presidente da República da Tchecos-
lováquia e responsável perante a D ieta’ .
As garantias da execução dos direitos das minorias estavam nas cons­
tituições dos Estados que tinham minorias 110 seu território, bem como
nos tratados internacionais, que uma vez ratificados integram o direito
interno e têm primado sobre este. E de se ressaltar que as constituições
da Estônia e da Letônia continham dispositivos de proteção das minorias.
Por sua vez, os tratados visando as minorias continham uma cláusula
em que os dispositivos de proteção não poderiam ser modificados sem o
consentimento da maioria do Conselho da Sociedade das Nações; por
outro lado EUA, Grã-Bretanha, França, Itália e Japão se obrigam a dar o
*seu consentimento à modificação das cláusulas convencionais quando ela
for aprovada pela devida maioria.
A “fiscalização” dos direitos das minorias é da competência do Con­
selho e da CPJI, sendo que a principal competência é do Conselho. As
reclamações são apresentadas p or meio de petições a este órgão. Têm
capacidade para apresentar as petições minorias, Estados (membros ou
não da Sociedade das Nações), organizações internacionais, ou, ainda, um
particular. Em 1920, o Conselho aprova uma resolução em que o presidente
e dois membros escolhidos por ele farão o exame de toda petição relativa
às minorias. Este comitê vai funcionar como conciliador, visando a solu­
cionar a questão. O comitê, quando recebia uma petição, transmitia ao
governo interessado, que apresentava as suas observações por escrito, e
quando estas não eram suficientes o comitê solicitava “ explicações verbais”.
Afirma Erdstein que a “criação do Comitê dos Três foi um passo de gigante
em favor da proteção das minorias”. A decisão de “caso” submetido ao
Conselho não é obrigatória, nem tem ele, em conseqüência, o poder de
executar as suas decisões. A única sanção que ele tem é ameaçar o Estado
de excluí-lo da Liga das Nações.
E preciso salientar que as petições dirigidas pelas minorias ao Conselho
só podem ser aquelas que estiverem protegidas por tratados internacionais.
As minorias não fazem parte do processo entre elas e o governo do
Estado, bem'como não têm poder-de requerer a ação do Conselho, agindo
este de ofício. O papel das minorias no procedimento perante a Liga das
Nações é inexistente, sendo de se assinalar que elas não são ouvidas, nem
pelo Comitê dos Três.
A CPJI também atua na proteção das minorias, e somente os membros
do Conselho podem submeter a questão a ela. A sua. decisão é obrigatória.
O Conselho e a Assembléia podem solicitar pareceres a ela que não são
obrigatórios.
Os mais diferentes autores consideravam o sistema de proteção insti­
tuído pela Liga das Nações com o fraco e ineficiente, devido, sobreLudo, à
ausência de ter sido reconhecida uma personalidade internacional às mi-

923
norias. Contudo, o DIP sempre esteve entre a de/esa dos direitos do lüstado
e os direitos humanos, sendo que ueste periodo histórico raros direitos
humanos tinham sofrido um processo de internacionalização, como ocor­
reu com os direitos sociais no âmbito da OIT. Havia o receio permanente
de a minoria se transformar em um Estado dentro do Estado.
Por outro lado, havia ainda a questão de várias minorias terem a
nacionalidade do Estado em que se encontravam. Ora, o DIP ainda era
muito tímido nestes casos.
Segundo Tilomas D. Musgrave o sistema de minorias fracassou: a) o
regime existente não agradava a nenhuma das partes; b) os estados temiam
pelas suas integridades; c) muitas minorias (ex.: alemães) se consideravam
superiores aos povos em cujos territórios foram colocados.
Na ONU, a proteção das minorias não foi colocada em questão, talvez
devido aos imensos problemas internacionais que elas tinham trazido. E
suficiente lembrar que elas estariam protegidas através da proteção dos
direitos humanos. Estes constituem um dos mais importantes fins da ONU.
No Pacto de Direitos Humanos (1966) só há um pequeno dispositivo
sobre minorias, contudo sem caracterizá-las:

“Art. 27
Nos Estados em que haja minorias étnicas, religiosas ou lingüís­
ticas, as pessoas pertencendo a essas minorias não poderão ser
privadas do direito de ter, conjuntamente com outros membros
de seus grupos, sua própria vida cultural, de professar e praticar
sua própria religião e usar sua própria língua.”

Como se pode verificar, o texto só consagra três direitos para a minoria:


a vida cultural, praticar sua religião e usar sua língua. Todos os demais
direitos os integrantes das minorias possuem através dos direitos humanos,
que são concedidos a todos sem discriminação. E de se salientar que o
texto acima não dá direitos às minorias, mas aos seus membros. Enfim,
elas continuam sem personalidade internacional.
O mesmo Pacto, no art. 1, estabelece:

“Todos os povos têm direito à autodeterminação. Em virtude


desse direito determinam livremente seu estatuto político e
asseguram livremente seu desenvolvimento econôm ico, social
e cultural.”

E aqui que se pode dizer surgir uma questão, isto é, se uma minoria
tem direito à autodeterminação. As diferentes declarações da ONU sobre
descolonização referem-se sempre aos denominados territórios coloniais
ou nâo-autônomos.

924
A Declaração sobre as Relações Amigáveis entre os Estados (AG 1970)
determina:

“A criação de um Estado soberano e independente, a Iivre


associação ou integração com vim Estado independente ou a
aquisição de qualquer outro estatuto político livremente deci­
dido por um povo constituem para este povo os meios de exercer
seu direito a dispor de si próprio."

O texto acima abrangeria as minorias, mas mais adiante a inesma


declaração estatui: -• .

“Nada nos parágrafos acima será interpretado como autorizan­


do ou encorajando uma ação, qualquer que ela seja, que des­
membraria ou ameaçaria, total ou parcialmente, a integridade
territorial ou a unidade política de todo Estado soberano e
independente...”

Como se pode observar, as minorias não possuem o direilo de auto­


determinação, tendo em vista o princípio da integridade territorial, que
é fundamental em certas regiões do globo, como no continente africano,
em que ele é um dos seus princípios fundamentais, no seu Dl Africano.
A questão da autodeterminação das minorias tem, contudo, se colo­
cado na Europa, como na Iugoslávia, em que os representantes da Comu­
nidade Européia afirmaram, em 1991, que não aceitariam mudanças de
fronteiras pela força. Afirmaram ainda que a Croácia, Eslovénia e Mace-
dônia não tinham exercido um direito de secessão, mas que tinha ocorrido
uma “dissolução do Estado”. Afirma que os Estados novos devem respeitar
as minorias nos seus territórios. Na verdade, a Europa acaba por daí às
minorias um direito de autodeterminação, desde que haja a intangibilidade
das fronteiras. A Rússia considerou que os chechenós são uma minoria,
portanto, sem o direito de autodeterminação, enquanto a Chechenia rei­
vindica esta direito.
As minorias estão protegidas pelos inúmeros textos visando aos direitos
humanos. A própria Convenção sobre a Prevenção e Punição do Crime
de Genocídio, de 1948, protege as minorias, vez que protege os grupos
étnicos, sociais ou religiosos.
Quando da elaboração da convenção,.houve proposta no sentido de
se defender os grupos lingüísticos, mas que'nao foi incluída no seu texto
sob a alegação de que este crime não seria praticado apenas por motivo
de língua, de modo independente da etnia, religião, etc.
O Pacto de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (ONU — 1966)
assegura a aplicação destes direitos sem qualquer discriminação.
Em 1978 a Assembléia Geral da UNESCO aprovou a Declaração sobre
Raça e Preconceito Racial, em que condena toda e qualquer discriminação

925

I
racial. Sobre o mesmo tema foi concluida na ONU convenção sobre a
eliminação de todas as formas de discriminação racial (1966). Pode-se citar
ainda as convenções internacionais do uabalho que visam também a urna
aplicação sem aspecto discriminatório. Em 1966 a Declaração da UNESCO
sobre os princípios de cooperação cultural da humanidade afirma que
toda cultura faz parte do patrimonio comum da humanidade e deve ser
respeitado.
Em 1976, na Conferencia de Argel, de origem não governamental, é
aprovada uma Declaração dos Direitos dos Povos, que consagra os direitos
das minorias.
A ONU, é de se repetir, tem protegido as minorias através dos direitos
humanos, e não a elas como uma entidade própria; daí, conforme vimos,
elas não estarem incluídas entre os povos que se beneficiam da autodeter­
minação.
Um meio que tem sido invocado para a proteção das minorias é a
denominada “intervenção humanitária”. Assim, a índia, em 1987, envia
assistência ao povo tamil no Sri Lanka, ou, em 1974, da Turquia em Chipre.
Na verdade, há uma norma imperativa no Dl Positivo, que é a de não
intervenção. A prática intervencionista viola o mais importante direito
fundamental do Estado, que é a soberania. A intervenção é uma prática
política realizada por um Estado mais forte em relação a outro, mais fraco.
Todos os grandes textos internacionais proíbem a intervenção.
A ONU só veio a cuidar das minorias em 1992, quando foi aprovada
pela Assembléia Geral a declaração sobre os direitos pertencentes a mino­
rias nacionais ou étnicas, religiosas, lingüísticas. Ela menciona no seu
preâmbulo a necessidade “de aplicar mais eficazmente ainda os instru­
mentos internacionais relativos aos direitos do homem”, bem com o que
tais direitos devem ser assegurados “sem discriminação de qualquer espé­
cie”. São proclamados os seguintes direitos: a) os Estados devem garantir
e criar condições para que as minorias promovam a sua identidade; b) o
direito de ter a sua própria cultura, religião e língua; c) devem participar
das decisões que vão se referir às minorias; d) o direito de m anter livre
contato com pessoas de sua minoria que se encontrem no território de
outro Estado; e) os Estados devem garantir a elas os direitos humanos; f)
os programas e a política nacional devem levar em consideração os “inte­
resses das pessoas pertinentes às minorias”, etc. O que se pode observar
é que as minorias finalmente ganharam um texto na ONU visando espe­
cificamente a elas, mas também não se pode deixar de frisar que não foi
possível se dar uma definição de minoria.
Um caso que nos parece paradigmático é a República do Daguestão
no Cáucaso em que não há uma “minoria”, vez que tem 1.768.000 habi­
tantes (em 1994) formados por 40 etnias e 10 línguas oficiais. A sua
constituição não gira em tomo de uma etnia dominante.

926
Na ONU existe a Subcomissão para a Prevenção de Discriminação c
Proteção de Minorias. Ela é subordinada à Comissão de Direitos Humanos
e ao CES. Ela dá pareceres ¡jara a Comissão, que elege seus ‘2 6 membros
com base na repartição geográfica. Eles atuam como " técnicos inde­
pendentes”. Ela cuida da proteção das minorias e apresenta estudos sobre
a matéria. Ela atua por meio de grupos de trabalho semipermanente: um
sobre escravidão, outro sobre populações indígenas (criado em 1982);
outro sobre detentos. Ela se reúne em sessão plenária para debates.
A Europa foi o berço para as questões de minorias serem regulamen­
tadas pelo DIP. Até hoje a questão das minorias é um problema grave no
continente europeu, que se agravou com o desmoronamento da URSS e
a crise iugoslava. A preocupação que desperta é imensa. Na Conferencia
de Copenhague, em 1980, da Conferencia de Segurança e Cooperação
Européia, as minorias ocupam um capítulo inteiro da Declaração Final.
Estabelece que pertencer a uma minoria é uma questão pessoal. As mino­
rias podem desenvolver a sua identidade étnica, cultural, lingüística ou
religiosa e desenvolver a sua cultura em todas as formas. A Conferência
de Segurança e Cooperação Européia, reunião de Helsinki, em 1992,
instituiu um Alto Comissariado para as Minorias Nacionais, que deve se
informar sobre a matéria e principalmente alertar os Estados europeus
quando do aparecimento de tensões no tocante às minorias. Ele pode
interpor entre as partes interessadas os seus bons ofícios.
Em 1992, o Conselho da Europa aprovou a Carta Européia das Línguas
Regionais ou Minoritárias. Assim, estas são reconhecidas como expressão
da riqueza cultural”. Elas devem ser salvaguardadas. No território das
minorias, a educação pré-escolar deverá ser realizada nas suas línguas, bem
como “uma parte substancial do ensino primário”. O mesmo ocorre com
o ensino técnico e profissional. As autoridades judiciárias de uma circuns-
crição em que reside “ um número de pessoas praticando tais línguas devem
cuidar que elas possam ser usadas, por exemplo, no procedimento penal.
Os Estados não podem recusar a validade de atos jurídicos, apenas porque
eles estão redigidos em língua minoritária ou regional. E obrigação do
Estado criar pelo menos uma estação de rádio ou de televisão nestas línguas
bem como encorajar programas de televisão realizados nelas. Encorajar os
programas culturais em tais línguas, etc.
Em 1992, a AG da ONU aprovou a Declaração sobre os Direitos de
Pessoas que pertencem a Minorias Nacionais ou Étnicas, Religiosas e Lin-
guísticas.
Em 1994, à Conselho da Europa, em Viena, aprovou a convenção-mol-
dura (ou convenção-quadro) para a proteção das minorias nacionais, que
foi aberta a assinaturas a partir de 1 / 2 / 9 2 . Esta convenção se limita a
estabelecer princípios. Afirma que a proteção das minorias faz “parte
integrañte-da proteção internacional dos direitos do homem”. Cada mem­
bro de uma m inoria tem o direito de escolher ser tratado com o minoria

927
ou não. É garantida a igualdade peíante a leí c o d ir e ilo d e “conservar e
desenvolver sua cultura”; O direito de manifestar a sua religião e criar
instituições religiosas. Direito a usar a sua língua. Criar e administrar os
seus estabelecimentos privados de ensino. Os integrantes das minorias
devem “respeitar a legislação nacional e os direitos de outrem, era parti­
cular aqueles das pessoas pertencentes à maioria ou às outras minorias
nacionais”. Fizemos um pequeno resum o de apenas alguns direitos con­
sagrados na citada convenção; Esta, podemos assinalar, é dirigida às partes
contratantes, isto é, aos Estados, o que significa que continua a se negar
personalidade internacional às minorias. Podemos acrescentar ainda que
a convenção não define minoria e não dá a ela o direito de autodetermi­
nação. A pessoa que integra uma minoria pode escolher ser tratado como
tal ou não.
Pode-se dizer que os problemas das minorias ainda não estão resolvidos
no DIP, apesar de terem se tornado uma questão extremamente viva.
Consagrar a personalidade internacional das minorias é minar o poder
do Estado territorial, sobre o qual está fundamentado o DIP nos últimos
500 anos. As minorias são sempre vistas pelo Estado territorial como o
enclave que ameaça a sua integridade territorial. A intenção do Estado é
sempre de assimilá-la o mais possível, enquanto a minoria luta para defen­
der as suas características.
E de se lembrar que a língua foi sempre utilizada com o um instrumento
de consolidação do poder central, por exemplo, na França e na Espanha.
Ora, manter no mesmo território estatal línguas diversas é um a a m ea ça a
tal poder.
Acrescente-se ainda que o Estado e as minorias se vêem com descon­
fiança mútua.
No DIP há ainda uma questão que tem sido considerada intransponível,
que é a definição de minorias. Não há nenhum texto que as conceitue.
Ora, se o “ instituto” das minorias se espalhar pelo resto do mundo, grupos
numerosos de imigrantes localizados em determinada região também po­
derão reivindicar o tratamento de minorias.
Atualmente já se desenvolveu na Europa a noção de povos autóctones
— que receberam personalidade internacional e têm sido vistos como
possuindo o direito à autodeterminação. No continente mencionado esta
seria a situação dos lapões.
As noções de minorias e povos autóctones podem contribuir para a
implosão do Estado territorial como atualmente o conhecemos. Por outro
lado, não se pode negar que a proteção das minorias entra nos direitos
humanos, que são o maior objetivo do DIP se nos lembrarmos que entre
eles estão os direitos à vocação comunitária, com o o direito à autodeter­
minação e o direito à paz.
O DIP está em vias de sofrer transformações que atingirão a sua própria
estrutura básica e, provavelmente, será substituído por um novo ramo do
Direito, ainda a ser construído.

928
Jean Yangoiimalé (Q u ’est-ce qu'une inmorité nationale? in Le Monde
Diplomaltique, Janvie* 1992) afirma que o que distingue um povo de nina
minoría é o seguinte: o estatuto de liberdade reivindicado. As populações
que ameaçam a integridade do Estado são um povo. As populações que
aspiram a um estátuto de liberdade (autonomia interna), mas não amea­
çam a integridade do Estado, são uma minoría. E de se observar que esta
definição é extremamente ampia e permite a qualquer minoría se trans­
formar em povo. Entretanto, mostra uma tendencia existente na sociedade
internacional.
O enfraquecimento do Estado-Nação está oferecendo novas perspec­
tivas às minorías (Jean De Munck). Para se verificar a potencialidade
explosiva das minorias é suficiente lembrar que uma análise em 184 estados
independentes constatou que há 600 grupos de línguas vivas e 5.000 grupos
étnicos (Will Kymlicka): Já Daniel Thurer fala em 3.000 grupos lingüísticos.
326. A saúde foi objeto de inúmeras convenções internacionais. Foram
concluídas no século passado, contra a cólera, convenções de Paris (1825)
e Viena (1874), Veneza (1892), Dresde (1893) e Paris (1894). Sobre a
peste bubônica, foi assinada uma convenção em Veneza (1897). Outras
convenções internacionais se seguiram e organismos internacionais foram
constituídos, até chegarmos à OMS nos dias de h oje".
Na primeira metade do século XIX surgem os conselhos de quarentena
entre os estados europeus. Ela tinha apenas função informativa. Na Se­
gunda metade do século X IX surgem por influência da França as confe­
rências sanitárias internacionais já citadas.
Na América, as convenções sobre matéria sanitária se sucedem: a do
Rio de Janeiro (1887), entre Argentina, Paraguai, Brasil e Uruguai; a de
Montevidéu (1904); a de Washington (1905), que cria a Repartição Sani­
tária Pan-americana; a de Havana (1924), onde foi concluído o Código
Sanitário Pan-americano, e o seu protocolo assinado em Lima (1927).
Em 1902 foi criado o Bureau Sanitário Pan-americano. Com vocação
universal surge em 1907 o Escritório Internacional de Higiene Pública com
sede em Paris.
O Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
reconhece “o direito de toda pessoa ao gozo do mais alto nível possível
de saúde física e mental" e determina que sejam tomadas medidas para a
redução da mortalidade infantil, o melhoramento da higiene do trabalho,
etc.
O Dl da Saúde “ consiste no estudo das regras jurídicas estabelecidas
essencialmente pelas organizações internacionais no domínio da proteção
da saúde das populações dos estados membros” . (Michel Belanger). Ele
.surge do Dl da Higiene ou do D. Sanitário Internacional. No tempo da
SdN havia a Organização de Higiene.
E elaborado pelas organizações governamentais e ONGs (como a As­
sociação Médica Mundial). É um direito misto: administrativo, econômico
L- social. O seu fundamemp é o reconhecimento (lo direito à saúde. A sua
oficialização ocorre na década de 70.
O Dl da Saúde se caracteriza por uma descentralização que existe na
própria OMS que criou seis regiões geográficas. A OMS foi criada acima
de tudo por iniciativa da Fiança, Brasil e Cilina. Várias organizações atuam
nesta área: OIT (tem um ceiuro de higiene do trabalho), IMO, AIEA,
UNESCO, etc. A OUA também tem competências sanitárias.
327. O genocídio sempre existiu através da História (as perseguições
aos judeus sete séculos antes de Cristo), mas a verdadeira revolta contra
este crime ocorreu com a matança e as perseguições praticadas pelo na­
cional-socialismo alemão.
A denominação.de “genocídio” para este crime foi dada por Lemkin,
em 1944, na sua obra intitulada “Axis Rule in Occupied Europe”. A palavra,
conforme explica o seu autor, é híbrida, uma vez que é formada do grego
“genos” (raça, nação ou tribo) e do sufixo de origem latina “occidere”
(m atar). Esta palavra foi aceita aos poucos no mundo jurídico internacio­
nal: no estatuto de Londres, constitutivo do Tribunal de Nurembergue,
esse crime foi capitulado nos “crimes contra a humanidade” sem qualquer
'nomen juris1 próprio, e as sentenças desse tribunal também não se utili­
zaram da palavra genocídio, apesar de ela ter sido usada durante os debates.
Essa exp ressão fo i finalmente consagrada na Convenção de 1948 e tem
sido adotada pela maioria dos doutrinadores.
O genocídio pode ser definido genericamente como aquele crime
perpetrado com a intenção de destruir grupos étnicos, sociais, religiosos
ou nacionais. Os termos de raça, etnia e grupo nacional são imprecisos.
A palavra raça é usada para indivíduos que hereditariamente tem deter­
minadas características. A palavra etnia é para indivíduos que têm a mesma
língua e os m esm os costumes. Para o Tribunal de Ruanda grupo nacional
é aquele que tem uma cidadania comum.
O intemacionalista espanhol Miaja de la Muela apresenta as seguintes
características.para o genocídio: a) é um delito internacional da maior
gravidade, no sentido de violar preceitos internacionais que protegem a
pessoa humana; b) é um delito comum e, portanto, o seu autor é passível
de extradição; c) é um delito intencional; d) é um delito continuado; e)
aparece como um delito individual. Há autores (Carlos Canêdo) que ad­
mitem como genocído matar apenas um membro do grupo desde que
hajã a intenção. Entretanto, seguindo Heleno Fragoso, podemos afirmar
que .ele é um crime continuado, o que deixaria de ser nesta hipótese.
'A idéia de se reprimir o crime acima caracterizado surgiu na 61 Co­
missão (assuntos jurídicos) da I a Assembléia Geral da ONU, quando foi
aprovado um projeto de resolução apresentado por Cuba, índia e Panamá.
Foi tiesignado pelo Secretariado da ONU um comitê destinado a preparar
um primeiro projeto de convenção, em que figuram Lemkin, Pella, Don-
nedíeu de Vabres e Maktos. A “ Convenção para a prevenção e a repressão -
do crime de genocídio” foi aprovada pela Assembléia Geral de 1948.

930 -
Em Nuremberg considerava-se que o genocídio só 1: 1 a praticado em
lempo de guerra. A convenção sobre genocídio é que reconheceu que tal
crime pode ser praticado em tempo de paz.
Esta convenção enumerou, no art. 2~, os atos que são considerados
genocídio. E dado o seguinte conceito: “qualquer dos seguintes atos co­
metidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um gmpo
nacional étnico, racial ou religioso, como lal: a) matar membros do grupo;
b) causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo:
c) submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes
de ocasionar-lhe a destruição física, total ou parcial; d) adotar rnedidas
destinadas a impedir os nascimentos 110 seio do grupo; e) efetuar a trans­
ferência forçada de crianças de um grupo para outro grupo”. Bassiouni
afirma que as violações sexuais podem ser consideradas genocídio, tendo
em vista a lei islâmica. A definição excluiu o genocídio cultural e o geno­
cídio político. O primeiro, ’alegando-se que a convenção trataria apenas
da “destruição física d o ’hom em” e que o “direito à vida cultural” não é
inerente à pessoa humana, mas resultante do desenvolvimento social; e,
finalmente, o assunto seria objeto da convenção sobre direitos do homem.
Tais grupos entram na proteção dos minorias. O segundo, alegando-se
que a convenção não protegeria os grupos voluntários, mas apenas aqueles
grupos a que o homem pertence a “despeito de si mesmo”. Por outro
lado, os grupos políticos não apresentam “características estáveis”. Os EUA
chegaram a propor genocídio contra grupos econômicos, mas depois re­
tiraram a proposição.
O art. 3g da convenção enumera os atos que são puníveis: o genocídio;
a associação de pessoas para cometê-lo; a incitação direta e pública para
a sua prática; a tentativa e a co-autoria. O art. 4 9 da convenção declara
que os atos mencionados no dispositivo anterior são puníveis, sejam eles
cometidos por governantes, funcionários ou particulares, enfim, por qual­
quer pessoa. Outro aspecto que merece ser estudado é a respeito da
“intenção pessoal” exigida pela convenção no art. 1 para que se configure
o genocídio e a questão da execução de “ordens superiores”. O Tribunal
de Nurembergue decidira que o cumprimento de ordens superiores não
isentava o indivíduo da prática de atos criminosos, a não ser que para o
subordinado não fosse possível “uma escolha m oral” no sentido de delin­
quir. A convenção não tratou deste problema, apenas declarando que
qualquer funcionário é responsável. Tendo sido mesmo rejeitada uma
emenda proposta pela URSS em que, expressamente, se declarava que a
execução de ordens superiores não isentava o autor do genocídio de
responsabilidade113. E de se assinalar que com .esta atitude o problema da
responsabilidade dos subordinados continua existindo: pelo art. 29, para
se configurar o genocídio é necessário que exista.o elemento intencional,
que faltará, evidentemente, no funcionário que simplesmente executa or­
dens superiores.

931
O julgamento dos criminosos será realizado pelos tribunais do Estarlo
onde o crime íoi cometido 011 pela Corle Internacional Criminal. Estas
disposições do art. 62 são inúteis, uma vez que a Corle Internacional
Criminal não existe e, por outro lado, estes crimes são cometidos normal­
mente em ditaduras, o que significa não terem os tribunais internos qual­
quer autonomia para julgar os criminosos, normalmente, os homens do
governo11B.
A Convenção de 1948 contém a denominada cláusula colonial, isto é,
ela só será aplicada a territórios que não sejam autônomos se as metrópoles
quiserem.
Esta convenção se enfraqueceu mais ainda com as reservas apresenta­
das pelo bloco soviético e pelas Filipinas, Estados onde os seus efeitos serão
quase nulos. Ela foi feita por 10 anos (a contar de 1951, quando entrou
em vigor) sendo prorrogada a cada cinco anos, sucessivamente, para os
Estados “que não a tiverem denunciado pelo menos seis meses antes do
término do prazo".
O genocídio pode assumir inclusive a forma de autogenocídio, que é
um termo adotado quando o Camboja era governado por Pol Pot (década
de 70), que matou 1 /6 da população, cerca de um milhão de habitantes
(Léon Poliakov — Les totalitarismes du XX siècle, 1987). A expressão
autogenocídio surgiu na ONU. Na verdade é crime contra a humanidade.
Ou como diz Alicia Gil Gil esta expressão só pode ser aceita em um sentido
não técnico.
No Brasil o crime de genocídio é punido pela Lei n2 2.886, de 1-10-56,
e nos arts. 208, 401 e 408 do Código Penal Militar.
Em 1985 um relatório da ONU propõe que o crime de genocídio pode
ser praticado contra qualquer “grupo defintdo”.
Em 1950 a Comissão do Dl, cumprindo determinação da Assembléia
Geral, “formulou os princípios de Dl, reconhecidos no Estatuto do Tribu­
nal de -Nurembergue e o julgamento do Tribunal”. Os princípios formu­
lados foram os seguintes:
1) “Qualquer pessoa que cometa uni ato que constituir um crime
perante o direito internacional é responsável por ele e está sujeita à pu­
nição”:
2) “O fato que o direito interno não imponha uma penalidade para
um ato que constitui um crime sob o Dl não isenta a pessoa que cometeu
o aio de sua responsabilidade perante o-Dl’’ ;
3) “O fato que a pessoa que cometeu um ato que constitui crime
perante o Dl tenha agido como chefe de Estado ou funcionário responsável
do governo não a isenta de responsabilidade perante o Dl” ;
4) “O fato que uma pessoa agiu cumprindo ordens do seu governo
ou de um superior não a isenta da responsabilidade perante o Dl, desde
que uma escolha moral era de fato possível para ela”;
5) “Qualquer pessoa acusada de um crime perante o Dl tem direito
-a um julgamento justo com base nos fatos e no direito”;
6) "Os crimes aqui enunciados são puníveis como crimes perante o
D l”;
a — Crimes contra a paz:

“ (i) Planejamento, preparação, iniciação ou prosseguimento de


guerra de agressão, ou uma guerra em violação de tratados,
acordos ou garantias internacionais;

(ii) Participação em um plano comum ou conspiração para a


realização de qualquer dos atos mencionados na letra (i).”

b — Crimes de guerra:

“Violação-de leis e costumes da guerra compreendejido, mas


não se limitando ao assassinato, maus-tratos ou deportação para
trabalhos forçados ou para qualquer outro fim, das populações
civis de/ou em territórios ocupados, assassinato ou maus-tratos
de prisioneiros de guerra, de pessoas no mar, execução de
reféns, pilhagem de propriedade pública ou privada, destruição
sem motivo de cidades, vilas ou aldeias, ou devastação não
justificada por necessidade militar.” (v. ainda: n® 608C).

c — Crimes contra a humanidade:

“Assassinato, exterminação, redução da escravidão ou qualquer


outro ato desumano cometido contra populações civis, ou per­
seguições por motivos políticos, raciais ou religiosos, quando
estes atos ou tais perseguições são cometidos em execução ou
conexão com qualquer crime contra a paz ou qualquer crime
de guerra.”

7) “A cumplicidade na realização de um crime contra a paz, crime de


guerra ou um crime contra a humanidade, como foi estabelecido no
Princípio VI, é um crime perante o D l.”
Em 1968 foi concluída no âmbito da ONU uma convenção sobre a
imprescritibilidade dos crimes de guerra e dos crimes contra a humanidade.
Entre os seus considerandos estão as afirmações de que tais crimes são os
mais graves do direito internacional, bem como que a sua repressão é
importante para a sua prevenção. Ela considera crimes de guerra os defi­
nidos no estatuto do Tribunal de Nurembergue (1949). A convenção é
aplicada a indivíduos que praticaram crimes contra a humanidade e crimes
de guerra, como representantes do Estad© ou como particulares, bem
como a seus cúmplices, ou que tenham incitado a sua prática, bem como
aos representantes do Estado que toleraram serem eles cometidos. Os

933
lisiados st- comprometem a adotar medidas necessárias pai a permitir a sua
extradição, bem como a imprescrilibilidade desles crimes. Esta convenção
foi assinada por poucos Estados, sendo que quase iodos socialistas. Em
1974, foi concluída no Conselho da Europa uma convenção sobre a im-
prescritibilidade dos crimes de guerra e dos crimes contra a humanidade.
Um novo crime internacional foi criado pela convenção de 1995 para
a segurança do pessoal das Nações Unidas e o pessoal associado, pois ela
previne e reprime as infrações contra este pessoal. O Estado onde se
desenvolve a ação das NU deve tomar as medidas necessárias para evitar
que a infração seja praticada. Esta deve ser intencional e atingir a pessoa
ou a liberdade destas pessoas, ou os locais oficiais. Os Estados devem
implementar a convenção pelo direito interno e prever as--sanções. O
Estado deve punir ou extraditar o autor da infração. A convenção, apesar
de seu título, não se aplica a ações do CS aprovadas com fundamento no
Capítulo VII.
Esta cláusula de exceção é um compromisso entre os Estados que
queriam uma aplicação ampla e os que desejavam uma aplicação restrita
(Claude Emannuelli).
Os crimes internacionais são obrigações “erga onmes” que os estados
violam, porque eles representam interesses da comunidade internacional
como um todo. Não se deve ignorar a noção de crime de estado, vez que
vários crimes tem o envolvimento de órgãos de estado. Outras observações
podem ser mencionadas. As normas do Manual Militar dos EUA de 1956
estabeleciam que era dever militar cumprir ordens superiores. Contudo,
uma nova norma diz que o militar pode desobedecer a ordens ilegais. Os
comandos podem ser responsáveis por atos dos subordinados, quando
foram praticadas em cumprimento de ordens, ou quando não tornaram
medidas para evitar tais atos. Uma questão bastante discutida é a respon­
sabilidade penal do estado, isto é, de pessoa jurídica. No “common law”
as empresas são responsabilizadas criminalmente. Por sua vez, o Comitê
dos Ministros do Conselho da Europa mandou que os estados estudassem
a responsabilidade criminal dos estados para combater a fraude. Já se tem
afirmado (John Dugard) que o Dl aceita agora a responsabilidade penal
; do estado. A responsabilidade penal da pessoa jurídica foi defendida pela
França, mas só se manteve para as corporações privadas e se excluiu os
estados, os órgãos públicos e as organizações sem fim lucrativo. Há autores
que co n sid era m as sanções do capítulo VII da Carta da ONU com o tendo
aspecto penal.
328. Os crimes contra a humanidade se distinguem do genocídio no
tocante à intenção. O elemento internacional, no sentido de querer des­
truir determinado grupo social, não existe nos crimes contra a humanida­
de.
“O crime contra a humanidade é, ... a negação da humanidade aos
membros de um grupo de hom ens em aplicação de uma doutrina”. E

934
resultado de um plano para afasiar os homens da comunidade dos homens
(Pierre Truche). O Tribunal Penal para a ex-Iugoslávia dá ao crime contia
a humanidade três elementos: a) é dirigido contra à população civil; b)
ele é generalizado ou sistemático; c) ele apresenta gravidade. O crime
contra a humanidade é aquele praticado de modo maciço contra à popu­
lação civil mesmo fora do coñflito armado.
Uma outra definição é a de Bassiouni que afirma ser a “ação política
de um Estado que visa a inquietar, atormentar, oprimir ou discriminar a
respeito de uma pessoa visando-lhe causar sofrimentos físicos ou mentais,
ou lhe prejudicar economicamente em razão das convicções ou opiniões
da vítima ou dela pertencer a determinado grupo”.
Em 1915 em uma mata da França, Rússia e Grã-Bretanha sobre o
massacre de armênios pela Turquia surge a expressão “crimes contra a
humanidade e a civilização”.
A International Bar Association, em um projeto de Código Penal Uni­
versal que elaborou, incluiu entre os crimes contra a humanidade' (-alem
do genocídio): a tortura, a escravidão, as perseguições sociais, religiosas e
raciais, a deportação de mulheres, etc. No Tribunal Militar de Nurember­
gue uma das categorias de crimes ali julgada foi o crime contra a huma­
nidade. A Declaração Universal dos Direitos do Homem proíbe, nos seus
arts. 42 e 52: a escravidão, o tráfico de escravos, a tortura, o “ tratamento
ou castigo cruel, desumano ou degradante”. Ela interdita assim a prática
de crimes contra a humanidade.
Os mesmos princípios figuram no Pacto Internacional de Direitos Civis
e Políticos, nos arts. 7- , 89 , 9a e 10.
329. A idéia de se punir os responsáveis por crimes de guerra não é
nova na História; entretanto, ela foi sempre um fenômeno esporádico e
só veio a se realizar efetivamente no século XX.
Na Antigüidade diversos exemplos têm sido mencionados e podemos
destacar, no período antes de Cristo, o dos lacedemônios: após destruir a
esquadra ateniense em Aegospótamos, julgaram os atenienses por crimes
de guerra. Os lacedemônios e seus aliados condenaram os vencidos à
m orte12.
Um outro precedente que tem sido citado é o de Sir Peter of Hagen-
bach, em 1474, que o governador da cidade de Breisach aí instalou um
regime de terror. Posteriormente, Hagenbach caiu em poder da Áustria
e foi julgado por juizes da Áustria e cidades aliadas, bem como por 16
cavaleiros que representavam a ordem da cavalaria. Em 1689 o Conde
Rosen foi destituído de seu cargo militar por James II da Inglaterra por
ter feito um sítio cruel contra Londonderry e assassinado civis.
Na segunda metade do século XVIII houve vários julgamentos em
tribunais ingleses e norte-americanos em que “indivíduos eram acusados
de com eter ofensas internacionais.” 1Sa
No século XIX, .Moynier (suíço), em 1872, propôs a criação de um
Tribunal internacional para julgar os crimes de guerra. O Tribunal seria

935
formado de cinco membros (dois nonícados pelos beligerantes e três
neutros)
A criação de urna Corte Internacional Criminal é uin verdadeiro ideal
da sociedade internacional. A repressão ao genocídio e outros crimes,
como os de guerra e os contra a paz e a humanidade, só pode ser efetiva
com a constituição de um tribunal internacional, que teria, entre outras
vantagens, a de evitar que apenas os vencidos ou os mais fracos sejam
julgados e garantiria maior imparcialidade ao julgamento.
Os autores têm assinalado que o julgamento de criminosos de guerra
pelos vencedores não é fato novo1*. Na P Guerra Mundial o governo turco
massacrou os armênios, mas estes eram cidadãos turcos e-não se aplicava,
por conseguinte, o direito das convenções de Haia. Assim, nesta guerra
ainda não existiam normas sobre o uso de submarinos. Em maio de 1915
uma declaração dos aliados considerava os crimes turcos como “crime
contra a humanidade e a civilização”, o que não era, entretanto, um
conceito legal. Todavia, foi após a P Guerra Mundial que teve início o
movimento pela criação de uma corte internacional para julgar os crimes
internacionais. Em 1919, foi constituída uma comissão para apreciar a
“responsabilidade dos autores da guerra...”, que recomendou a punição
das pessoas acusadas de crimes de guerra e a constituição de um tribunal
para julgar tais indivíduos. O TraLado de Versalhes, nos arts. 227 a 230,
regulamentou o assunto estipulando: a) o Kaiser seria julgado por um
tribunal especial com o acusado de “ofensas contra a moralidade interna­
cional e a santidade dos tratados”. O Tribunal seria formado por 5 juizes
(EUA, França, Inglaterra, Itália e Japão), mas o Kaiser não era acusado de
guerra de agressão. Era a tese de Woodrov^ Wilson; b) os criminosos de
guerra seriam julgados por tribunais militares; c) a Alemanha entregaria
os acusados e os elementos necessários para tais julgamentos. O Kaiser se
asilou na Holanda14, e os criminosos foram julgados na própria Alemanha
pela Corte Suprema de Leipzig, que absolveu alguns e condenou outros
a poucos meses de prisão, e o único que foi condenado à pena de 4 anos
fugiu da prisão. Ainda referente à P Guerra Mundial, a Bulgária julgou
seus criminosos por pressão da Iugoslávia, e na Turquia foram todos anis­
tiados pelo tratado de Lausane de 1923.
Em 1920, o Comitê de Juristas encarregado de elaborar o Estatuto da
CPJI, baseado em um projeto apresentada pelo Barão Descamps, propôs
a criação de um tribunal para julgar os crimes cometidos contra o Dl, mas
a Assembléia da SDN rejeitou o projeto, añonando que “ainda não existia
um direito internacional penal reconhecido por todas as nações” .
Em 1937, sob os auspícios da SDN, reuniu-se uma conferência em
Genebra, quando se concluiu uma convenção para a criação de uma corte
criminal internacional (julgaria crimes de aspecto internacional), que foi
assinada por 13 Estados mas não obteve nenhuma ratificação. A Corte
seria permanente e composta de cinco juizes efetivos e cinco juizes suplen-
les. Foi este projeto uin dos casos em que se admitiu o homein como parte
un jurisdição internacional. A doutrina, no período entre as duas guerras,
muito lulou pela criação de uní tribunal desta natureza: Pella, Vabres e
Quintiliano Saldanha, que propugnaran) pela criação de nina cámara cri­
minal na CPIj. Estes esforços foram inúteis.
A 2- Guerra Mundial, com os seus crimes monstruosos, trouxe à baila
novamente a questão. O Acordo de Londres de 8 de agosto de 1945 instiluiu
o Tribunal Militar Internacional de Nurembergue. destinado a jtilgar os
grandes criminosos de guerra dos países europeus do Eíxo1’. O Tribunal
era formado de quatro juizes titulares e quatro suplentes, designados pelos
Estados ali representados: EUA, França, URSS e Inglaterra. A presidencia
era rotativa. Era da sua competencia julgar: a) crimes contra a paz; b)
crimes de guerra e c) crimes contra a humanidade. E de se observar que
a palavra “Militar” na denominação do Tribunal está errada, vez que o
único militar era o juiz soviético, bem como o processo não erã tão rápido
quanto o de uma corte marcial. Alegou-se que a palavra “Militar’ foi usada
por ele julgar crimes praticados durante a guerra. Entretanto, tudo indica
que foi para evitar a submissão ao Congresso dos EUA a criação de uma
nova jurisdição, vez que as jurisdições militares são da competência do
presidente dos EUA (Jean:Marc Varaut).
No tocante a responsabilidade penal de chefe do estado, o Juiz Robert
H. Jackson, quando do julgamento do Tribunal de Nuremberg, em um
relatório ao Presidente Truman, afirma que a imunidade penal do Chefe
de Estado tem a sua origem no direito divino dos reis e que não pode ser
menor quando o poder é maior.
Em Nurembergue foram julgadas 22 pessoas: e das diferentes organi­
zações nazistas consideradas criminosas, o Tribunal desqualificou três; e
para que o seu membro fosse considerado criminoso, a acusação tinha
que provar que o ingresso nela era voluntário e que ele tinha sido infor­
mado de seus objetivos criminosos no momento de sua adesão.
O Tribunal de Nurembergue,i>Arecebeu inúmeras críticas que podem
ser resumidas nas seguintes: 1) a violação do princípio “nullum crimen
nulla poena sine lege”; 2) ser um verdadeiro “ tribunal de exceção” cons­
tituído apenas pelos vencedores; 3) que a responsabilidade no Dl é apenas
do Estado e não atinge o individuo: 4) que os aliados também tinham
cometido crimes de guerra; 5) que os atos praticados pelos alemães eram
simples atos ilícitos, mas não criminososlff. 6) que não houve instrução
criminal. No tocante ao fato de ter ocorrido a retroatividade da lei penal,
Hans Kelsen observa que o que houve foi a transformação da responsabi­
lidade coletiva em responsabilidade individual, mas havia uma consciência
comum de que os atos eram imorais e, em outras palavras, a retroatividade
neste caso não é incompatível com a idéia de justiça.
Em defesa do Tribunal tem-se argumentado que o legalismo penal só
surgiu após um certo desenvolvimento da Justiça e que inicialmente'no

937'
direito penal primeiro teria ocorrido o crime e depois a lei (Scelle, Miaja
de la Muela). O Dl Penal se encontraria nesta fase primitiva que o D.
P e n a l já ultrapassou. Por outro lado, o princípio “nullum crimen nulla
poena sine lege” não é aplicado em um direito costumeiro (S. Glaser).
Tem sido interpretado que a palavra lei nesta máxima como abrangendo
os costumes e os princípios gerais do direito. Alega-se ainda que os crimes
julgados em Nurembergue constituíam violação de normas internacionais
já existentes; o Pacto Briand-Kellog de renúncia à guerra e a conduta na
guerra terrestre foram regulamentados nas Convenções de Haia. E inte­
ressante observar que o Almirante Chester Nimitz (EUA) deu uma decla­
ração em favor de Doenitz e Raeder afirmando que a marinha dos EUA
na Guerra do Pacífico seguiu os mesmos procedimentos adotados pela
Alemanha na guerra submarina, quando’eram realizados ataques a navios
de superfície. Os próprios crimes contra a humanidade eram condenados
pelas legislações internas e se pode considerar que o D1P também os
condenava, uma vez que fazem parte deste direito os denominados “prin­
cípios gerais de direito reconhecidos pelas nações civilizadas”16'. Os aliados
teriam cometido crimes como represálias. Este é o argumento invocado
pela defesa, mas não podemos deixar de reconhecer que os aliados com e­
teram crimes de guerra que ficaram impunes. O homem como parte em
tribunal internacional não era de fato estranho ao DIP anterior ao acordo
de Londres. E de se concluir assinalando que o próprio D. Penal foi no
início aplicado apenas aos “débeis e vencidos” (Jescheck).
Finalmente, é de se salientar que o Tribunal de Nurembergue poupou
aos alemães algo que eles só poderiam fazer ao custo de grandes divisões
políticas internas (Grundler e Manikowsky).
Os julgamentos dos criminosos da 2- Guerra Mundial foram realizados
ainda no Tribunal Militar Internacional de Tóquio (criminosos japon e­
ses)168 e em diversos tribunais militares nacionais.
O Tribunal de Nurembergue tem para o Dl Penal grande importância,
uma vez que foi, embora transitório, o primeiro tribunal criminal realmente
internacional.
Os tribunais de Nurembergue e de Tóquio tentaram aplicar as leis
internas da Alemanha e do Japão adaptando-as ao DIP; O de Nurembergue
se fundamentou no fato de que as quatro potências ocupantes eram o
governo daquele território, enquanto o de Tóquio se fundamenta no
acordo realizado pelo Japão com os vencedores, que consagrava a consti­
tuição de um tribunal internacional.
Atualmente, ainda não se conseguiu realizar uma Corte Internacional
criminal.'7 Na verdade, as dificuldades são inúmeras e podemos citar uma:
cemo trazer em tempo de paz um genocida perante a Corte? Esta dificul­
dade aumentará se o acusado for um governante.
Os norte-americanos fizeram, em Nurembergue, de 1945 a 1949, doze
processos: a) o dos médicos; b) o do truste I G-Farben; c) o do Krupp; d)
o do Ministério das Relações Exteriores, etc.

938
Os diferentes governos militares julgaram 5.00(5 individuos, sendo 794
condenados à morte e 486 executados, sendo que quase lodos foram solios
até 1956.
A Lei nu 10 de 1945 do Conselho de Controle den competencia aos
Tribunais alemães para julgar os alemães. Ela estabelecia que os tribunais
aplicariam a legislação alemã, mas de preferência a própria Lei ny 10, que
passava assim a ter um efeito retroativo. Por outro lado, a Lei nr 1 do
Conselho de Controle proibia que se aplicasse a lei penal retroativamente.
A situação dos juizes alemães ficou difícil. Até o final de 1950 os tribunais
alemães proferiram 5.288 condenações. Em 1950 os tribunais alemães
receberam autorização para julgar os crimes nazistas conforme o direilo
penal.aJemão. Entre 1950 e 1955 houve 628 condenações, o que mostra
a reticência em se julgar. Em 1955 ocorreu a prescrição de vários crimes
(10 anos) e só se podia julgar o assassinato com premeditação. Outros
julgamentos ocorreram nos anos 60, com o o do pessoal de campo de
concentração. A prescrição por assassinato, que era de 20 anos, foi pror­
rogada em 1965. Os russos condenaram os soldados que eles fizeram
prisioneiros à pena inicial de 25 anos de prisão e cumpriram os trabalhos
forçados na URSS. Em 1950, os soviéticos remeteram aos alemães 10.513
prisioneiros para que cumprissem suas penas (Dennis L. Park e David R.
Gress — Histoire de 1’Allemagne depuis 1945, 1992).
Tem sido assinalado que o julgamento dos criminosos de guerra pode
ser um fator que venha a prolongar as guerras.
A Resolução n“ 808 do Conselho de Segurança de 2 2 /2 / 9 3 aprovou
por unanimidade um tribunal internacional para julgar as “violações graves
do direito humanitário internacional” praticadas no território da ex-lu-
goslávia depois de 1991. O Secretário-geral tem um prazo de 60 dias para
fazer um relatório. O Tribunal terá duas Câmaras de 3 juizes cada e uma
Corte de Apelação. Os juizes serão escolhidos pela AG. Um problema para
a efetivação deste Tribunal é como prender os criminosos e quem terá a
süa- custódia. Acresce ainda que todas as partes envolvidas na guerra da
Iugoslávia concluíram acordo em 1992 para aplicar o direito humanitário,
mas excluíram os dispositivos sobre “infrações graves”, isto é, os crimes
de guerra. A. Pellet escreve que o CS ao criar os tribunais tirou o poder
da AG e garantiu para o ele o direito de criar tribunais no futuro.
Em 1997 dez croatas-bósnios, segundo a imprensa, acusados de crimes
se apresentaram voluntariamente para serem julgados em Haia. O Tribunal
de Haia classificou as provas em: a)" as que dão uma sustentação razoável
à instrução; b) aqueles que estão acima de qualquer dúvida razoável. Não
se pode recorrer à analogia nas regras de fundo do D. Penal, mas se pode
usar a analogia no processo penal. O ônus da prova cabe ao acusado devido
ao contexto internacional em que opera o tribunal. A liberdade do juiz
restringe os direitos do acusado. Este colocado logo em regime de acusação
oficialmente por uma Câmara de P instância. O tribunal consagra o “ non

939
bis in idem' . Os presos ficariam em uma prisão internacional na Holanda.
A partir de 1994 a INTERPOL passou a auxiliar na prisão de criminosos
da antiga Iugoslávia. Em 1998 o tribunal considerou culpados, dois bós-
nios-inuçulmanos e um bósnio-croata. Em 1999. havia 25 acusados sob
custodia mais de 5 (Taguardando julgamento.
Em abril de 1993 a CIJ, no caso Bosnia v. Sérvia, ordenou que cessasse
o genocidio na Bosnia.
A questão do genocídio não é nova nesta região. A guerra na Iugoslávia
começou em 1991 entre a Servia e a Bosnia, bem como em 1993 a Croácia
atacou a Bosnia. A idéia de genocidio para encobrir o que é denominado
de “limpeza étnica” já é encontrada em 1807 e se desenvolve na guerra
de libertação contra os turcos no século XIX. Durante a 2- Guerra Mundial
a “limpeza étnica” foi defendida e, em 1941, houve massacre na Bosnia e
Herzegovina. E sempre o sonho da Grande Sérvia hom ogênea “racialmen­
te” (Mirko Grmek, Marc Gjidara e Neven Simac — Le Nettoyage ethnique.
Documents historiques sur une ideologie serbe, 1993). A limpeza étnica
que não é claramente caracterizada não tem sido considerada como crime
de genocidio, mas como crime contra a humanidade.
Algumas observações podem ser formuladas em relação ao Tribunal
Penal Internacional para a Ex-Iugoslávia. Assim, em 1999, foi formulada
acusação contra o Chefe do Estado do Servio, Slobadan Milosevic. E a
primeira vez que isto. ocorre contra um chefe de estado que se encontra
no poder. Este tribunal também afirma que todos os atentados às popu­
lações civis é crime contra a humanidade.
Em novembro de 2000 o CS aumentou o tribunal para a antiga Iugos­
lávia em 27 juizes e a Corte de Apelação aumentou de 5 a 7 juizes, tudo
isso devido ao grande número de casos.
Em 1994 o CS criou um tribunal para julgar os crimes praticados em
Ruanda.
Uma observação que se impõe é que o CS não tem função judicial e
os tribunais que têm criado se fundamentam na sua competência para
criar órgãos subsidiários (Olivier Russbach). Já Mutoy Mubiala salienta que
os tribunais instituídos para os crimes praticados na antiga Iugoslávia'e em
Ruanda foram criados pelo CS com fundamento no Capítulo VII da Carta
da ONU, alegando “celeridade e oportunidade política” . Como crítica a
este procedimento tem se alegado que: a) nenhum órgão da ONU pode
criar órgão judiciário; b) teria sidc5 melhor que a iniciativa fosse da AG,
etc.
No Tribunal para Ruanda não se fala em crimes de guerra porque se
trata de guerra intema, mas em “violações graves do Dl”, e inclui o
Protocolo II de 1977; assim são, por exemplo, violações graves: punições
coletivas, terrorismo, tomada de reféns, pilhagem, etc. Ele julga os crimes
praticados no ano de 1994. O tribunal tem duas câmaras de P instância
e uma apelação. Esta última é a mesma do Tribunal para os crimes prati­
cados na anliga Iugoslávia. O CS apresenta uma lisia à AG, que elege os
juizes. O Procurador é independente do Tribunal. As chamadas infrações
graves não previstas no Protocolo II são contudo aplicadas via o costume
nos conflitos internos. O Tribunal de Ruanda consagra esta tendência. Ela
já julgou e condenou algumas pessoas, inclusive a Jean Kamdanda, 1“
Ministro de Ruanda, condenado à prisão perpétua. No Tribunal de Ruanda
os membros das Câmaras de Apelação são os mesmos que os das Câmaras
de Apelação para antiga Iuguslávia. A sede do Tribunal é em Arusha.
Outros (Marco Sassóli) consideram que o tribunal para a antiga Iu­
goslávia é legal, porque o CS agiu dentro do seu poder de medidas coer­
citivas, bem como a sua criação contribui para a paz, tendo em vista que
o conflito é internacional. Salienta ainda o autor citado, com razão, que
a distinção entre internacionais e internos dos conflitos armados não tem
valor quando se trata de direitos humanos. O D. Humanitário é aplicado
nos conflitos internos.
Em 2000 Sena Leoa e a ONU concluíram tratado criando um Tribunal
Especial para julgar crimes internacionais e crimes que violam a legislação
penal de Serra Leoa. Ele tem juizes internacionais (indicados pela ONU)
e de Serra Leoa (indicados pelo governo). E o primeiro tribunal criminal
“ad hoc” criado em um tratado. A jurisdição é sobre pessoas com mais de
15 anos, o que tem sido criticado. O Tribunal adota padrões de justiça
juvenil para os menores de 18 anos.
E interessante registrar que uma Lei de 1993 consagra que este país
pode julgar qualquer caso de crime de guerra e contra a humanidade,
praticada em qualquer parte do mundo e qualquer que seja a nacionalidade
do criminoso. Em 1999, a lei foi estendida a violações de direitos humanos
e autores do crime de genocídio. Em fevereiro de 2002 a CIJ negou no
caso do julgamento de um ministro de Ruanda validade a esta lei.
A Conferência das Nações Unidas sobre a criação de uma Corte Cri­
minal Internacional, reunida em Roma, em 1998, aprovou a referida Corte.
Ela é permanente. Tem sede em Haia. A Corte tem personalidade inter­
nacional. Ela julga: a) crime de genocídio; b) crime contra a humanidade;
c) crime de guerra; d) crime de agressão. Para o crime de genocídio ela
usa a definição da convenção de 1948. Como crimes contra a humanidade
são citados: assassinato, escravidão, prisão violando as normas internacio­
nais, violação, tortura, apartheid, escravidão sexual, prostituição forçada,
esterilização, etc.São crimes de guerra: homicídio internacional, destruição
de bens não justificada pela guerra, deportação, forçar um prisioneiro a
servir nas forças inimigas, etc. Os estados, juizes (por maioria absoluta) e
ò Procurador podem propor emendas aos elementos constitutivos dos
crimes. A Corte só julga os crimes praticados após a sua entrada em vigor.
Aplica os princípios do direito penal: “nullum crim en, nulla poena sine
lege”; ninguém é responsável antes da entrada em vigor do estatuto. Ela
não tem competência para julgar menores de 18 anos. Os crimes de

941
compelí-acia da Corte são imprescritíveis. Ein princípio a pessoa só é
responsável se houver elemento psicológico na prática do crime. Não é
responsável quem tem deficiência mental, praticou crim e sob coação quao-
do se defendia, etc. O erro de fato e de direito não tira a responsabilidade.
O cumprimento de ordem superior não tira a responsabilidade a não ser
que tenha sido obrigado a cumprir a ordem, ou ainda se a pessoa não
sabia que a ordem era ilegal, etc. Os juizes são eleitos pela Assembléia dos
Estados-partes. Tem Seção de Apelação (Presidente e 4 juizes), Seção da
l s instância (6 juizes) e Seção Preliminar (6 juizes). Tem um escrivão. São
18 juizes com mandato de 9 anos. A pena é cumprida no estado em que
o criminoso se encontrava. O Tribunal adota o princípio da complemen­
taridade, isto é, a principal responsabilidade de investigar e julgar é dos
tribunais nacionais. A Corte Penal Internacional é um complemento do
Tribunal Nacional.
O estado pode reçusar.a competência da Córte p or crime de guerra,
por sete anos, após a entrada em vigor da convenção em relação a ele. O
CS pode submeter um litígio à Córte por cima do consentimento do estado,
bem como pode paralisar lodo inquérito e processo por 12 meses que são
renováveis, com fundamento no capítulo VII da Carta da ONU. Daí já se
tem afirmado que é um órgão judiciário sob tutela política.
As penas aplicadas são até 30 anos de prisão e prisão perpétua. Os
bens adquiridos por meio da prática do crime podem ser confiscados. A
Córte escolhe onde será cumprida a pena de prisão e a detenção rege-se
pelas leis deste estado. Um indivíduo julgado peja Côrte não pode ser
julgado por um estado.
A Côrte pode ser ativada: a) por um estado queixoso; b) Ministério
Público e c) Conselho de Segurança.
O Estatuto da C ôrte acrescenta novos crimes: violação, escravidão
sexual, prostituição forçada, gravidez forçada, esterilização forçada e todas
as formas de violência sexual. Não foram incluídos alguns crimes que estão
previstos no Protocola II de 1977 (Direito H um anitário): submeter a po­
pulação civil a fome, utilizar seres humanos com o escudos, etc.
O Estatuto não admite reservas.

942
NOTAS

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2. O nosso estudo não analisará iodos os casos 110 píesem e capítulo, outros
(com o a pirataria) serão estudados mais adiante. Sobre a proteção do indivíduo
em relação a um Estado estrangeiro, ver "proteção diplom ática" no capítulo
Responsabilidade dos Estados. A proteção do indivíduo contra o sen próprio Estado
praticam ente não exisie, a convenção européia de direiios do hom em é uma
exceção (v. Capítulo X X IX ).
2A. A palavra escravo vem de eslavo. Na Idade Média os eslavos eram consi­
derados os escravos 11por excelên cia". Desde o final do século V III que os eslavos
eram exportados pelo Ocidente para o m undo islâmico da Espanha, em particular
entre a A lem anha e o Califado de Córdoba (Francis Conte — Les Slaves, 1986).
Os eslavos foram usados como escravos porque eram pagãos e a Igreja proibia que
se reduzisse os cristãos à escravidão (Jacques Faviaux — De L ’em pire romain à la
féodalité, t. 1., 1986). Na prógria I. M édia a escravidão vai ser abolida, porque
existindo um certo desenvolvimento ela não é rentável. Assim foi suprimida nas
pequenas cidades como: Pistóia (1 2 0 5 ), Assis (1210), nas grandes cidades como
Bolonha (1 2 5 6 )-e.Florença (1299) (Friedrich H eer — L ’Univers du Moyen Age.
1970).
3. A SDN obrigava os Estados que nela procurassem ingressar a abolirem
previamente a escravidão. Este procedim ento foi utilizado em relação à Abissínia.
3A. Alguns autores contestam esta afirm ação dizendo que na Argélia não havia
escravos cristãos no fim do século X V III. com exceção de algumas centenas de
desertores da guarnição espanhola de Orã, que caiu nas mãos dos muçulmanos
em 1792. Na Tunísia e Marrocos predominavam os escravos n e g r o s (Louis Bergeron
— Les Révolutions Européenes et le partage du Monde, 19 8 5 ). A grande preocu­
pação no M editerrâneo com os Estados berberes não era a escravidão, mas a
pirataria. Os escravos brancos estavam em fase de substituição e tinham sido
substituídos por árabes e berberes. Em 1830, em Argel, só havia 2.000 escravos
negros (D enise Bouche — Histoire de la Colonisation Française, t. II, 1993. A
escravidão africana pelos muçulmanos abrange o período histórico do século IX
ao X IX e a destinada às Américas do século X V ao X IX . Os dados que são fornecidos
são os seguintes: 4 milhões foram exportados pelo Mar V erm elho, 4 milhões pelos
portos sohailis no Oceano Índico, 9 m ilhões pelas caravanas transaáricas e l l a
20 m ilhões através o Oceano Atlântico. A escravidão realizada pelos muçulmanos
era para trabalho doméstico, enquanto n o O. Atlântico visava a produção. Afirma-se
que os reinos africanos foram obrigados a aceitar o tráfico, o que acarretou o
aum ento da escravidão no interior da Africa"(Elikia M’B okolo — La Dimensión
Africaine de La Traite des Noirs, “ in ” M anière de Voir 58, ju ille t — avent 2001,
Pgs. 32 e segs.).
3B. Florestan Fernandes observa: o term o “ preto” sem pre foi usado pelo
“bran co” para designar o negro e o m ulato em São Paulo, mas através de uma
imagem estereotipada e sumamente negativa, elaborada socialm ente no passado.
Os próprios negros e mulatos preferiram , em suas primeiras m anifestações de
autonom ia — através dos movimentos reivindicatoríos — a autodesignação contida
na palavra negro. Doutro lado, im pugnam o vocábulo “ b ran co ” , alegando que a
mestiçagem im põe restrições severas às pretensões de “ pureza de sangue” dos
paulistas (A Integração do Negro na Sociedade de Classes, 1978, vol. 1, págs. 12
e 13).

947
4. Em 22-1-1815, Portugal concluía um tratado com a Inglaterra para a abolição
do tráfico de escravos na costa da Africa ao norte do Equador.
5. A Inglaterra foi a grande campeã na hita contra o tráfico negreiro. E ntre­
tanto, tem sido salientado que a sua luta não era apenas idealista, mas tinha
também razões pragmáticas: a) o tráfico despovoava as suas colonias na Africa; b)
a escravidão dava aos Estados mão-de-obra barata e os seus produtos poderiam vir
a concorrer coni os ingleses no mercado internacional: c) diminuía o m ercado
para os produtos industrializados. A principal razão parece ser a situação do açúcar
antilhano. Este entrava em fase de superprodução “determ inada pela com petição
desvantajosa para novos produtores” . Assim sendo, a idéia antiescravista passa a
ter “ repercussão na esfera governamental” . O tráfico é abolido em 1807, o que
acarreta a transferência por venda de escravos das áreas mais antigas para as mais
novas. Dessa maneira, através de uma providência que lhes propicia a valorização
do braço escravo, tornado escasso, reduz-se a participação dos setores menos
produtivos na atividade açucareira. A abolição só é realizada em. 1833 (Paula
Beiguelman — Form ação Política do Brasil, 1976). E preciso lembrar que, no
Brasil, a Lei de 1831 que proibia o tráfico de escravos e considerava livres os que
aqui entrassem ficou letra m orta. Esta lei considerava o tráfico como pirataria. O
tráfico só veio a ser abolido por uma lei de 1850. Olga Pantaleão salienta que: “A
conservação do tráfico pelo Brasil permitiria ao açúcar brasileiro ter preços mais
baixos e isso poderia dar-lhe superioridade no m ercado europeu. As colônias
açucareiras britânicas seriam então prejudicadas. A solução seria levar o Brasil a
renunciar ao tráfico de escravos..." (História Geral da Civilização Brasileira, t. II,
vol. 1, 1970, pág. 3 4 4 ). So bre a escravidão que existia na África, ao tem po do
tráfico para o Brasil, é preciso mostrar que a ali existente era muito diferente da
que houve no Brasil. Havia escravidão na África, mas o núm ero de escravos só era
grande em Benin e nas regiões sudanossaelianas. O escravo não podia ser vendido,
o que afastava a idéia de tráfico, e ele se integravã na família. No Daomé os filhos
dos escravos nasciam livres e se integravam na família do senhor. O escravo “ é
inicialm ente propriedade coletiva de uma família” e “ o escravo de um só indivíduo
é fenôm eno tardio” , bem com o eles não perdiam sua personalidade. Foi o tráfico
que levou o africano a capturar e vender escravos (Kátia de Queirós M attoso —
S er escravo no Brasil, 1982). Pode-se acrescentar que o rei de Benin enviou, em
1486, uma embaixada ao rei de Portugal com ricos presentes e mais de cem
escravos negros (Pedro Soares Martínez — História Diplom ática de Portugal, 1986).
O tráfico negreiro é um a invenção do Islã, que entrou primeiro em contato com
a África-negra. A sociedade islâmica era, por excelência escravagista, o tráfico era
sobre massas de seres hum anos maior do que o feito por europeus. E interessante
observar que a cultura negra não sobreviveu nos países do Islã (Fernand Braudel
— Grammaire des Civilisations, 1987). O que ocorreu devido ao falo de o escravo
ser assimilado no Islã e chegar a ocupar altos postos na administração. Mais algum
dados podem ser fornecidos, com o que o tráfico negreiro no Atlântico entre 1600
e 1900 foi de cerca de 11,5 m ilhões de pessoas: 1,8 m ilhão no século XV II; 6,1
m ilhões no século XVI e 3,3 milhões no século X IX . “ O tráfico de escravos saariano
(realizado pelos árabes) foi iniciado mais cedo, alcança cerca de 4 m ilhões de
pessoas; 900 mil antes de 1600” , 700 mil no século X V II; 700 mil no século X V III
e 1,8 milhão no século X IX (Marc Ferro — História das Colonizações, 1996).
O tráfico atlántico só se desenvolveu realm ente a partir do século XVII. isio
é. mil anos^após o tráfico muçulmano e trans-saárico. Já havia escravo negros no
Egito no 39 milenio A.C. A partir do século VII com a criação de um im perio
muçulmano o tráfico aum entou. Do século VII a X IX o tráfico muçulmano atingiu
12 a 14 milhões de pessoas. A igreja só condena a escravidão no Concilio de Niceia
em 325 (Olivier Pétré-G renouilleau — La T raile des N oirs,I997).
6. O tráfico passou a ser feito no Mar V erm elho e no Golfo Pérsico, isto é,
pela costa oriental da Africa.
7. Esta Conferência tem a sua origem em uma encíclica de Leão XIII.
8. A escravidão é assunto que entrou no âm bito do Conselho Econôm ico e
Social e da O IT, que por m eio de uma ação coordenada tem procurado reprimi-la.
Em 1957 a O IT concluiu^nova convenção abolindo o trabalho forçado.
9. Em 1956 a ONU concluiu uma convenção, com plem entando a de 1926,
que proíbe, entre outras coisas, o tráfico e a servidão. O seu projeto chegou a
prever dii"eito de visita e de apresar os navios que se dedicassem ao tráñeo de
escravos em determ inada região do Oceano índico. Este dispositivo foi retirado,
diante das críticas de Estados asiáticos e africanos de que ele atingiria a sua
soberania.
9A. Vamos citar um a passagem de Artaud sobre o tóxico. Artaud com eçou
por usar láudano para aplacar as suas dores de cabeça. Acabou viciado e passou
os seus últimos anos de vida em um hospicio. Ele escreveu: “Na verdade, o furor
contra o tóxico e as estúpidas leis que vêm daí: 1° é inoperante contra a necessidade
de tóxico que, saciada ou insaciada, é inata à alma e induziria a gestos decidida­
m ente anti-sociais m esm o se o tóxico não existisse; 2- exaspera a necessidade do
tóxico e o transforma em vicio secreto; 39 agrava a doença real e esta é a verdadeira
questão, o nó vital, o ponto crucial; desgraçadam ente para a doença a medicina
existe. Todas as leis, todas as restrições, todas as cam panhas contra os estupefa­
cientes somente conseguirão subtrair a todos os necessitados da dor hum ana, que
têm direitos imprescritíveis no plano social, lenitivo dos seus sofrim entos, um
alim ento que para eles é mais maravilhoso que o pão é o m eio, enfím, de reingressar
na vida” (Escritos de A ntonin Artaud, seleção e notas de Cláudio W iller, 1983).
“ O hom em que lê, que pensa, que espera, que se dedica à ‘flanerie’, pertence,
do mesmo modo que o fum ador de ópio, o sonhador e o ébrio, à galeria dos
iluminados. E são ilum inados mais profanos. Para não falar da mais terrível de
todas as drogas — nós mesmos — que tomamos quando estamos sos” (Walter
Benjam in — O surrealism o. O último instantâneo da inteligência, in W alter B en­
jam ín — Obras Escolhidas, vol. 1, 1987). Em Paris. haría, em certa fase do século
X IX , O Clube dos H achichins. Compareciam às suas reuniões. Gautier, Baudelaire,
M onet e Daumier. O haxix-e era consumido sob a form a de uma geléia esverdeada -
(Edm und White — O flâneur. Um passeio pelos paradoxos de Paris, 2001).
10. Esta convenção não faz distinção quanto aos navios. Daí entenderm os que
a obrigação existe para lodo e qualquer navio.
10A. A idéia de um a inspeção internacional em matéria de trabalho surgiu,
em 1989 quando a A ssociação Internacional dos Trabalhadores preconizou a"
instituição de inspetores nacionais e internacionais para as empresas. Pode-se
record ar que a partir do sécu lo X IX as reivindicações operárias são apresentadas-
internacionalm ente, com o nos congressos da l 9 Internacional.
1011. Alain 1'enet observa que a palavra minoria pertence à linguagem do
poder e que ela só existe porque há uma maioria. Observa ainda que a proteção
de minorias é urna concessão do poder, por causa da pressão que ele sofre.
10C. O Brasil sem pre sustentou o que ficou conhecid o como a lese de Afrânio
de Mello Franco sobre minorias: a) eslas existiam onde houve guerra, o que não
ocorreu na América; b) a proteção às minorias seria temporária até que houvesse
a sua assimilação no estado em que se encontrava.
11. V. Capítulo X X V I (OM S).
1 IA. E de se repetir um trecho de Karljaspers (La culpabilité allem ande,1990):
"a fórmula ‘uma ordem é uma ordem’ não pode ter valor decisivo. Um crim e
perm anece um crim e mesmo que ele lenha sido ordenado (ainda que, conform e
o grau de perigo, de coerção tirânica e de terror, possam ser circunstâncias
atenuantes); e de qualquer modo todo ato perm anece submetido igualm ente ao
julgam ento moral” .
11B: Caso recente de genocídio ocorreu em Burundi em 1972, em que as
pessoas da tribo Hutu foram quase todas mortas, sem que houvesse qualquer
projeto por parte dos demais países (Noam Chomsky e E. S. Hermán — Bains de
Sang, 1975). Ainda sobre o caso do Burundi, A ntônio Cassese observa que em
1965 e 1972 o grupo Tutsi exterm inou o grupo Hutu, e acrescenta ainda alguns
outros casos de genocídio, com o os índios achés no Paraguai (1970-1974), os
chams no Camboja (1975-1978), etc. Em 1988 novamente milhares de hutus foram
massacrados. Em 1994 houve em Ruanda o genocídio de tulsis, praticado pelos
hutus.
12. Aroneanu, o prim eiro a tratar destes crimes (Champs de Concentratiorj,
1945), afirma que eles se caracterizam por serem um ato de soberania do Estado
isto é, um “ato oficial” . Na verdade, esta característica pertence ao genocídio, que
durante muito tempo foi estudado dentro dos crim es contra a humanidade, tendo,
entretanto, nos dias de ho je, ganhado autonomia, com o um crime específico. Não
significa isto que o genocídio não seja um crim e con tra a humanidade, entendido
em sentido amplo.
12A. Sobre os antecedentes acima citados, tem-se observado: a) sobre o caso
grego a única fonte parece ser Xenofonte, que é contestado por outros autores
(Plutarco); b) sobre o caso de Hagenbach, “o tribunal era mais confederado do
•gue internacional” (W oetzel), vez que nem todas as cidades aliadas que partici-
pafam deste ju lgam ento eram soberanas; c) os precedentes ingleses e norte-am e-
ricanos não eram ju lg am entos por tribunais internacionais.
IS. Exemplo: ju lg am entos ocorridos na Inglaterra e EUA, na segunda m etade
do século XVIII, de indivíduos por terem com etido ofensas internacionais (W oet­
zel).
14. Ela se recusou a e'ntregar o Kaiser alegando que no caso haveria retroati­
vidade da lei penal e que o crim e era político. A idéia de se julgar o Kaiser partira
de Clemenceau. A H olanda não sofreirqualquer sanção por não extraditar o Kaiser
e, na verdade, o pedido de extradição foi m eram ente formal (Telford Taylor).
15. Desde 1942 os governos americano e inglês eram favoráveis a medidas de
punição contra H itler. Stalin propunha a execução sumária de vários nazistas. Os
ingleses e soviéticos desejavam uma solução política que seria a execu ção ou
aprisionamento sem ju lg am en to. Os EUA queriam a instauração de um processo.
Os norte-americanos queriam também ju lgar os nazista por complô contra a paz,
mas isto não era previsto em nenhum Código Penal e parecia mais um a máscara

950
para encobrir uní alo ele vingança; em relam o, os ingleses r soviéticos aceiiaram
esta tese. En» ja n e iro de 1942, 9 governos 110 exílio se encontraram no Palacio St.
Jam es e fizeram uma declaração no sentido de serení punidos os crim inosos
nazistas. Em ju lh o do mesmo ano Chnrchill e Koosevell aprovarafti a declaração.
15A. O julgam eruo foi em Nurembergue, por ter sido esta a cidade do nazismo,
vez que aí se realizava o grande congresso anual do Partido Nazista. Assinala
Jean-M arc Varaut que ela foi escolhida por ser a única a ie r “inTactos um palacio
de justiça, prisão e um grande hotel. Telford Tavlor declara que a cidade estava
destruída, mas não os seus suburbios, e o tribunal tinha sofrido danos mas podia
ser reparado. A crescenta ainda que foi em N urem bergue, em 1935, que foram
promulgadas as leis antijudaicas.
16. Este argum ento é válido quanto aos crim es contra a paz e crimes de guerra,
mas em relação aos crim es contra a hum anidade, q u e ja eram punidos nas legis­
lações internas. O art. 99 da Convenção de G en ebra (1 949), “relativa ao tratamen&o
dos prisioneiros de gu erra” , tem sido considerado com o uma reação à prática de
Nurembergue (Kunz), ao declarar que nenhum prisioneiro de guerra poderá ser
julgado por.ato que não seja catalogado com o crim e no m om ento de sua prática.
A mesma orientação está consagrada na D eclaração Universal dos Direitos do
Homem e no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos.
16A. Pode-se observar que o próprio princípio da legalidade tem caráter
retórico, “ porque o sentido das palavras da lei geral não emana de sua letra ou
dos limites de sua legislação escrita” (...) “as palavras da lei penal são sem pre
potencialmente vagas e ambíguas” (Rosa Maria Cardoso da Cunha — O Caráter
Retórico do Princípio da Legalidade, 1979).
16B. O Tribunal de Tóquio era form ado por EUA, China, G rã-Bretanha,
Austrália, Canadá, França, URSS, Holanda, Nova Zelândia, índia e Filipinas. Ele
foi instituído por um a proclam ação do G eneral M acArthur, que agiu com o Co-
mandante-em-chefe das Forças Aliadas, estabelecend o o seu Estatuto que é sem e­
lhante ao do Tribunal de Nurem bergue. Ele ju lg ou 25 acusados. O P residente do
Tribunal não era eleito pelos juizes, mas nom eado pelo Com andante Suprem o.
O Chefe da Acusação era norte-am ericano. Cada acusado tinha um advogado
jap on ês e um norte-am ericano, o que era contrad itório, porque os EUA acusavam
os indiciados. O Ja p ã o , pretendendo evitar o ju lg am en to pelo tribunal internacio­
nal, com fundam ento de que ninguém pode ser ju lg ad o duas vezes pelo mesmo
crim e, promulgou um a lei de que ele mesmo ju lg aria os seus crim inosos, o que
não surtiu efeito. Houve ainda julgam entos realizados pelos EUA, Filipinas, China,
Austrália, URSS, G rã-Bretanha, França e H olanda. No Tribunal de T ó qu io , os
criminosos foram conduzidos para os locais em que com eteram os crim es. Assim
o General Tamashila foi ju lg ad o e condenado nas Filipinas.
17. Existe um projeto elaborado pela Comissão de DI na ONU, mas que não
teve a aceitação dos Estados. Alguns doutrinadores continuam a luta pela criação
de tribunais internacionais. Assim, Richard Falk propõe a criação de um tribunal-
internacional para ju lg a r os tiranos por crimes con tra os direitos humanos e propõe
um novo crime: “a pilhagem da riqueza pública de um país para fins privados
(crim e contra o bem -estar e a riqueza p ú blica)” .

951
CAPÍTULO XXXI

NACIONALIDADE1

330 — Sentidos e definição de nacionalidade; 331 — Natureza ju rí­


dica; 332 — A nacionalidade e o DIP; 333 — Princípios gerais; 334
— Histórico; 335 — Nacionalidade originária; 3 3 6 — Nacionalidade
adquirida: a) aquisição pov beneficio de lei; b) casamento; c) mutações
tenitoriais; d) “ju s laboris ”; e) naturalização; 3 3 7 — Conflito negativo
de nacionalidade apatrídia; 33 8 — Conflito positivo de nacionalidade:
polipatridia; 339 — Perda da nacionalidade; 3 4 0 — Reaquisição de
nacionalidade.

330 — A palavra nacionalidade tem dois sentidos diferentes: a) socio­


lógico e b) jurídico.
Nacionalidade, em sentido sociológico, corresponde ao grupo de in­
divíduos que possuem a mesma língua, raça, religião e possuem um “querer
viver em comum”. Foi neste sentido que ela deu o r ig em ao princípio das
nacionalidades, em cujo nome foi feita a unificação alemã e italiana. No
sentido sociológico de nacionalidades, duas correntes se disputam: os au­
tores alemães (Gunther, Claus) realçam os elementos materiais (raça,
língua e religião), enquanto os franceses (Renan, Hauriou) realçam o
aspecto psicológico (“querer viver em com um ". mentalidade idêntica entre
os indivíduos do grupo). A corrente italiana (Mancini) concilia o pensa­
mento francês e o alemão. Foi a que adotamos acim a.IA A nacionalidade
neste aspecto deu origem ao princípio das nacionalidades, que sustentava
o direito de toda nação se organizar em Estado, ou ainda, como defendeu
Mancini, a nação seria o único sujeito de Dl. Na vida internacional a
palavra nação já teve vários sentidos, por exemplo, no Concilio de Cons-
tança, a expressão nação alemã sem a para designar os delegados da Europa
Oriental; nação inglesa para a Europa Setentrional. Parece que a origem
da palavra nação vem da Idade Média, na Universidade de Paris, onde os

953
cstudaiues st- agrupavam conforme a sua origem coimini, e cada grupo
t-ra uma nação. Finalmente, é de se salientar que o fator econômico., não
conhecendo fronteiras, fez com que o conceito de nação se tornasse ul­
trapassado."' Esta era a opinião unânime até pouco tempo atrás; entretanto,
atualmente tem ocorrido uma ressurgência relativa ao problema das na­
cionalidades: palestinos, bascos, etc.
Chantebout salienta que é a política de discriminação do Estado que
faz com que a nação tome consciência de si mesma. Daí dizer este autor:
“a nação é a comunidade de todos aqueles que são favoráveis — ou pelo
contrário, definitivamente hostis — ao Estado ao qual se acham submeti­
dos” .
A nacionalidade, em sentido jurídico, é a qufcnos interessa no presente
capítulo. Neste aspecto, o preponderante não é a -figura da nacão. mas a
do Estado (que pode abranger diversas nações). O indivíduo, que tem
uma nacionalidade, significa quê eltTtem a “qualidade de membro de um
E sS d o ” (limar Penna Marinho).
A definição de nacionalidade, no segundo sentido analisado, é a de
^ “vínculo jurídico-político que une o indivíduo ao Estado”] 2 Esta noção é
aceita por grande parte da doutrina, como veremos adiante.
331. A natureza jurídica da nacionalidade tem sido objeto de inúmeras
discussões doutrinárias.
A corrente contratualista teve à sua frente Weiss, que sustenta ser a
nacionalidade um contrato entre o indivíduo e o Estado. Deste contrato
bilatera] resultariam direitos e deveres para os contratantes. Esta teoria é
insuficiente para explicar o fenômeno da nacionalidade, uma vez que o
recém-nascido também a possui. Ora, não podemos admitir que ele conclua
um contrato, e este pressupõe manifestação de vontade, que o recém-nas-
cido não possui.
Alguns autores salientam que a nacionalidade é um vínculo jurídico
(Kalthoff). Outros declaram ser um elo político (Rodrigo Otávio).
Na verdade, ela é ao mesmo tempo um’vínculo jurídico e político que
une o indivíduo ao Estado. E a posição seguida por Podestá Costa, Pontes
de Miranda, Clóvis Beviláqua. Ela é jurídica e política no sentido de que
há ao indivíduo direitos e deveres de um modo geral e, em especial, direitos
políticos. Neste último aspecto, o nacional integra a vontade estatal. Existe
uma relação de podemdn-Estado. sobre õ indivíduo.:1
' 332. A nacionalidade é assunto que durante longo tempo pertenceu
i exclusivamente ao domínio da jurisdição doméstica dos Estados.'1 Entre-
j tanto, a partir de 1930, as convenções sobre os assuntos relativos à nacio-
[ nalidade se têm sucedido. O que não acarretou, contudo. a internaciona­
lização deste instituto, mas apenas alguns dos seus aspectos passaram a ser
regulamentados
I Ii»l ■!<! III ■!<!<■ i■*I* I' ■11
pelo DI. A nacionalidade é assunto que o Estado regula-
menta pelas suas próprias "Teis. A ordem jurídica internacional apenas
exerce um controle sobre estas leis quando surge um litígio internacional;

954
aprecia, por exemplo, se a outorga de uma nacionalidade a urn individuo
foí f'eita conforme os principios e normas internacionais. No caso Notte-
bolim, a CIJ decidiu que lima nacionalidade, para ser válida 110 campo
internacional, deve ser efetiva. ’
Este instituto é da maior importancia para o Dl,r> urna vez que a
nacionalidade faz coin que determinadas normas internacionais sejam ou
não aplicadas ao indivíduo (ex.: tratado de imigração cjue isenta indivíduos
de um Estado de certas exigências). A nacionalidade vai determinar a qual
Estado cabe a proteção diplomática do indivíduo.'
Para o direito interno o instituto também apresenta importância por­
que só o nacional: a) tem direitos políticos e acesso às funções públicas;
b) Lein obrigação de prestar o serviço militar; c) tem plenitude dos direitos
privados e profissionais; d) não pode ser expulso ou extraditado.
A ordem jurídica internacional se interessa diretamente por esta ques­
tão, tanto assim que a Declaração Universal dos Direitos do’ Homem esta­
belece no seu art. XV os seguintes princípios:

^ “ í T° d ° *lornern tem direito a uma nacionalidad^. ^N in guém será


arbitrariamente privado de sua nacionalidade, nem do direito de
mudar de nacionalidade.

O art. 24 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos determina


que “toda criança tem direito a adquirir uma nacionalidade”.
A convenção interamericana de direitos do homem estabelece: a) toda
pessoa tem direitos a uma nacionalidade; b) toda pessoa tem direito à
nacionalidade do Estado em cujo território nasceu se não lem direito a
outra nacionalidade; c) ninguém será privado arbitrariamente de sua na­
cionalidade, nem do direito de mudá-la.
Diante das observações acima, podemos concluir que a nacionalidade
tem dois-aspertos: o interno e o internacional.8
E de se assinalar no tocante à tendência à internacionalização deste
tema, que foi concluída em ]9 9 7 uma convenção européia sobre naciona­
lidade, em Estrasburgo. Ela determina, entre outras coisas, o seguinte: a)
a legislação sobre nacionalidade é de competência do estado. Os demais
estados devem respeitar a legislação; b) cada indivíduo tem direito a uma
nacionalidade; c) o casamento não é modo de aquisição e nem de perda
de nacionalidade; d) o estado deve dar a sua nacionalidade aos recém-nas-
cidos no seu território que de outro modo seriam apatridas.
333. A nacionalidade possui alguns princípios gerais que a repõem
apesar de não serem alguns deles absolutos. Podem ser resumidos nos
seguintes:
a) todo ind ivíd uo d eve t r r u m a n a rirm a lid a d e e n ã o mais que um a.
Foi enunciado pelo Instituto de Dl, na sessão de Cambridge, em 1895.

955
Esu-, na p rá tic a . n ã o é resp eitad o , c o n stitu in d o -se em um ideal da so c ie d a d e
in te rn a c io n a l;
b) a n ^ r i o i i n l i f l a f l e r i n d i v i d u a l Tem-se abandonado as “nacionaliza­
ções” e desnacionalizações coletivas. Ela atinge apenas o indivíduo e não
sH j mu ou parentes:
c) a nacionalidade não é permanente, tendo o individuo, em conse­
cuencia, o direito de mudar de nacionalidade;
d) é asstmto, de um modo ge ral, da competencia do Estado, sujeito
em certos casos ao “controle” e às normas internacionais.
334. Na Antiguidade Oriental e Clássica o critério atributivo de nacio­
nalidade era o “ius sanguinis”. isto é, a nacionalidade era dada em virtude
da filiação. Nestes períodos da Historia, a familia era a verdadeira base de
toda a organização social. O Estado, em Roma e na Grecia, era o prolon­
gamento da familia. Deste modo, o indivíduo pertencia primeiro à família
e depois ao Estado.
No Egito, em Israel, na Assíria e na índia (Código de Manu), o “jus
sanguinis” era o sistema atributivo da nacionalidade. Na Grécia, o indiví­
duo, para poder naturalizar-se, deveria primeiro ingressar em uma família
do Estado cuja nacionalidade ele pretendia adquirir. Em Roma, o indivíduo
só era considerado romano se o pai fosse romano.9 O “jus sanguinis”
ter-se-ia espalhado pelo resto da Europa através das conquistas de Roma.
No período medieval vai predominar outro sistema atributivo de na­
cionalidade, o “jus soli”: o indivíduo ^ m rín n al rio Estado onde nasceu.10
Esta predominância tem as suas raízes na organização econômica e social
do feudalismo medieval. A terra era considerada a maior riqueza e símbolo
do poder. Diversas normas e institutos (“jus albinagi”, “jus naufragi",
etc.)11 surgiram desta posição em relação à terra. A nacionalidade apenas
acompanhou a orientação geral.’2 -
A Revolnrão Francesa reagindo còntra tudo que fosse remanescente
do feudalismo abandonou o “jus soli” e fez ressurgir o “jus sanguinis”.
que é consagrado no Código de Napoleão.
A independência dos Estados da América faz com que o “jus soli” seja
novamente adotadõTTTTpãTses do\Novõ~Mundo, sendo regiõêi de imigra­
ção, têm interesse em tornar os estrangeiros membros da comunidade
nacional o mais rápido possível. Daí a adoção do “jus soli”. Por outro lado,
se este sistema não fosse o adotado, haveria no nosso continente grandes
quistos sociais que estariam sujeitos à proteção diplomática dos seus Estados
nacionais.
A Europa, ao contrário’,, sendo zona de emigração, teve interesse em
manter o “jus sanguinis”, uma vez que deste modo ela mantém um certo
controle sobre os que tenham emigrado e seus descendentes.
355. A nacionalidade pode ser: originária e adquirida.

956
A nacionalidade originária é aquela que o indivíduo tem em virtude
do nascimento. Existem três sistemas legislativos atributivos de nacionali­
dade originária: “jtts soli”, “jus sanguinis” e o sistema misto.
A “jus soli" é o sistema que dá ao indivíduo a nacionalidade do Estado
ern cujo território ele tenha nascido. E um sistema adotado na Argentina,
Austrália, etc.
O “jus sanguinis” é o sistema que dá ao indivíduo a nacionalidade dos
seus pais, independentemente do local em que tenha nascido. A denomi­
nação deste sistema não é correta, uma vez que não é o sangue que dá a
nacionalidade, mas a filiação.13 Nibovet propôs que fosse denominado
direito de filiação. E o sistema adotado na Arábia Saudita. Áustria. Bélgica,
etc.'4
O sistema misto combina os dois sistemas enunciados acima. É o
adotado na Colômbia, EUA, etc.
Na verdade, o que se pode concluir é que praticamente nenhum Estado
adota o “jus soli” ou o “jus sanguinis” de modo exclusivo. Todos ãbrem
exceções ao sistema que adotam como regra geral.
O Brasil adota o “jus soli” tradicionalmente, mas atualmente são tantas
as exceções em favor do “jus sanguinis” que se pode dizer que adotamos
q sistema misto. A legislação nacional (art. 145 da Constituição de 1969 e
a Lei nB 818, de 1 8 - 9 - 1 9 4 9 ) estabelece que são brasileiros os nascidos no
Brasil."’ Entretanto, nós abrimos algumas exceções ao “jus sanguinis”: a)
os filhos de brasileiro ou brasileira, nascidos no estrangeiro se os pais
estiverem a serviço do Brasil; b) quando não o estão e vêm residir no Brasil
antes de atingir a maioridade; ou ainda os nascidos no estrangeiro de pai
ou mãe brasileiro e registrados em “repartição brasileira competente no
Exterior”;1' c) não são brasileiros os que nasceram no Brasil de pais es­
trangeiros que aqui estejam a serviço do seu país.,7A Como se pode observar,
o Brasil adota o sistema misto.
A Constituição de 1988 mantém, no seu art. 12, os mesmos princípios.
Alguns comentários podem ser formulados. O primeiro é o que nascido
de pais estrangeiros em aeronave estrangeira sobrevoando o território
brasileñ o é brasileiro nato. A mesma hipótese pode ser aplicada ao navio
que exerce o direito, d e passagem inocente n o mar .territorial brasileiro O
que nos parece um exagero, vez que uma criança estrangeira entrando no
território brasileiro com um mês de idade será sempre um naturalizado.
J. Dolinger aponta um outro caso: o filho de brasileiro registrado em
consulado será sempre brasileiro, sem precisar entrar em nenhum, mo­
mento de sua vida no Brasil.
A nacionalidade prova-se por meio de certidão de nascimento do
registro público, onde são registrados os nascimentos, nos termos do art.
12, I, do Código Civil. Entretanto, o registro não atribui a nacionalidade
(Oscar Tenorio). E a própria prova da nacionalidade brasileira pode ser

957
feita por outra certidão que não seja a de nascimento (ex.: certidao de
casamento). A finalidade do registro é apenas a de “dar publicidade do
estado civil da pessoa”.
336. A nacionalidade adquirida é aquela que o individuo passa a possuir
posteriormen te ao seu nascimento ou, ainda, quando para conservar a
n viri o n ^ li fl i T fl e j j e p r e n s a m a n i f e s t a r a s n a vontade. La Pradelle propôs
que ela fossedenominada de nacionalidade secundaria, urna vez que toda
e qualquer nacionalidade é adquirida seja ao nascer, seja posteriormente.
Feita esta ressalva, manteremos a expressão nacionalidade adquirida, que
é a consagrada.
O indivíduo pode adquirir uma nacionalidade diferente daquela que
ele tem pelo nascimento gor diversos modos: benefício da lei; casamento;
naturalização; “jus laboris”; nos casos de mutações territoriais (cessão,
anexação); o “jus domicilií”.

a) A qu isição p o r benefício da lei

Na verdade, esta denominação não é inteiramente correta, uma vez


que nem sempre a concessão da nacionalidade por meio de um texto
legislativo é considerada pelo indivíduo como sendo um “benefício” e ele
a declina.
A aquisição de nacionalidade por benefício da lei se apresenta de duas
formas: 1) pela vontade da lei e 2) pela permissão da lei (Accjolv).
A aquisição de nacionalidade pela vontade da lei é aquela em que os
indivíduos a que a lei se dirige passam a ter a nacionalidade qne lbes é
clãda independentemente de qualquer manifestarão de vontade de sua
parte. Ela pode ocorrer na legitimação (França), na adoção (Japão, ante­
riormente à Lei de 1950).
No Brasil, apenas em raros casòs existiu esta forma de concessão de
nacionalidade. Todos eles ocorreram na Constituição de 1891 e na época
levantaram protestos dos Estados estrangeiros: a) o art. 69, alínea 4a a
estipulou que todos os estrangeiros que estivessem no Brasil quando a
República foi proclamada, seriam brasjileiros, a não ser que no prazo de
seis meses após a vigência da Carta Magna declarassem, expressamente,
que queriam ficar com a nacionalidade que já possuíam; b) art. 69, alínea
5~, determinou que seriam brasileiros: “ os estrangeiros que possuem bens
imóveis no Brasil e forem casados com brasileiras ou tiverem filhos brasi­
leiros, contanto que residam no Brasil, salvo se manifestarem a intenção
de não mudar de nacionalidade”. 2-
A aquisição por permissão da leils é aquela em que o indivíduo, para
adquirir ou conservar uma nacionalidade, necessita de manifestar a sua
vPntade.. fcJa se distingue da anterior no seguinte: na por “vontade da Ièi
o indivíduo passa a ter uma nacionalidade sem manifestar a sua vontade;
esta, entretanto, pode existir para recusar a nacionalidade que já lhe foi

958
dada; na por permissão da lei, ao conm ino, a nacionalidade. inesmo que
fia já stja do individuo, ele só a conserva após ter manifestado a sua
vontade. A Constituição brasileira de 1969, na letra r do sen inciso I, do
art. 145, prevé caso de nacionalidade adquirida por permissão da lei. ao
estabelecer: a) que são brasileiros os filhos de brasileiro ou brasileira que
nasceram 110 estrangeiro e vierem a residir 110 Brasil antes de atingir a
maioridade.19 Entretanto, o indivíduo para conservar a nacionalidade bra­
sileira deverá “optar por ela, dentro de quatro anos” após a nacionalida­
de;20 b) outro caso é o do art. 145, b, ns 1, da Constituição de 1969, que
estipula: “os nascidos no estrangeiro, que hajam sido admitidos no Brasil
durante os primeiros cinco anos de vida, radicados definitivamente no
território nacional. Para preservar a nacionalidade brasileira, deverão ma-
nifestar-se por ela, inequivocamente, até dois anos após atingir a maiori­
dade". A Constituição de 1988 alterou profundamente esta norma ao
eliminar o prazo de quatro anos para a opção, estabelecendo que a opção
pode ser feita “em qualquer tempo” . Na verdade, surge um problema:
qual a nacionalidade até que seja feita a opção? A meu ver ele é brasileiro,
como o era na vigência da Constituição anterior. Contudo, reconhecemos
que esta interpretação tira todo e qualquer valor à opção. Entretanto, há
uma norma de hermenêutica que afirma ter toda palavra em uma lei efeito
útil. Neste caso a nossa interpretação poderia produzir este efeito quando
se tratasse de tributação após a morte do indivíduo, vez que há países que
tributam os bens de estrangeiros de maneira diversa. Entretanto, se ele é
brasileiro durante a vida não poderá m udar de status após a m orte. Acresce
ainda que a Constituição anterior dava o prazo de quatro anos para opção
após a maioridade, mas a jurisprudência derrubava este prazo consideran-
do-o meramente formal, sendo essencial a proteção do brasileiro. Assim
sendo, vamos violar a norma de herm enêutica e considerar a opção como
não produzindo qualquer efeito.
A revisão constitucional de 1994 alterou esta matéria eliminando o
registro em repartição consular, bem com o que a residência no Brasil seja
antes da maioridade. Ela estabelece que são brasileiros natos: “os nascidos
no estrangeiro, de pai ou de mãe brasileira, desde que venham a residir
na República Federativa do Brasil e optem em qualquer tempo pela na­
cionalidade brasileira”.
Corre 110 Congresso Nacional emenda constitucional restaurando o
registro em repartição consular dispensando a opção.

b) C asam ento

Em algumas legislações a mulher adquire pelo casamento a naciona-


lidade do marido. Alegava-se em seu favor a unidade da família.
Sobre este modo de aquisição de nacionalidade, as legislações podem
ser classificadas em diversos grupos. Como exemplos podemos citar: a) a
mulher passava a ter automaticamente a nacionalidade do marido (Ale-

959
manila); b) o marido ou a mulher podem adquirir a nacionalidade pelo
casamento desde que assim declarem (Bulgaria na Lei de 1948); etc.
A legislação brasileira não conhece este modo de aquisição de nacio­
nalidade. F.sta é a tendencia mais moderna que está consagrada 110 art. 6"
da Convenção sobre Nacionalidade de Montevidéu de ]933.
A Convenção sobre a nacionalidade da mulher casada (1957), con­
cluida sob os auspicios da ONU, estabelece os seguintes principios: a) o
casamento ou a sua dissolução não deve afetar automaticamente a nacio­
nalidade da mulher; b) a mulher estrangeira casada com nacional pode
adquirir a nacionalidade do marido se a solicitar airavés de um processo
especial de naturaiização; c) a renuncia ou aquisição de nacionalidade
pelo marido não altera a da mulher.

c) M utações territoriais

Nos casos de cessão ou anexação de territorio a um Estado estrangeiro,


os individuos podem mudar de nacionalidade.
E dado aos habitantes deste territorio o direilo de ópção, que lhes
permite declarar a nacionalidade que pretendem ter: a antiga nacionali­
dade ou a do anexante.
E interessante observar que nos tratados em que o Brasil “permutou
territorios” como o Tratado de Petrópolis, nada se dispôs sobre “aquisição
de nacionalidade”, e não houve para os habitantes mudança de naciona­
lidade, “continuando de pé o principio latino-americano de inexistência
de nacionalização coletiva automática em caso de cessão de territorios”
(H. Valadão).

d) ‘J u s laboris”

Em algumas legislações se prevê que o individuo adquire a nacionali­


dade por exercer função pública (Haití — Lei de 1907); ou mesmo por
exercer quaisquer funções, mesmo de natureza particular, no Estado (Pa­
namá — Constituição de 1904). A nacionalidade do Vaiicaao-é em -prin­
cipio adquirida pela s que a-li desempenham fnnrões (nacionalidade fun­
cional) . Francisco Rezek contesta esta afirmação, dizendo que os dignitários
da Santa Sé conservam as suas nacionalidades de origem e apenas recebem
uma “proteção funcional”. No Brasil, este modo de aquisição de naciona­
lidade não existe. Entretanto, ele torna a naturalização “mais fácil” (Penna
Marinho).

e) N a tu raliza çã o

E a concessão, pelo Estado, de su a nacionalidade a um estrangeiro,


quando este a requer.21

960
A naturalização é um ato de soberania interna tío Eslaclo e. ponam o,
assunto regulamentado pela legislação interna. No DI existem poucos
princípios sobre ela. O primeiro a que devenios nos referir é o fixado no
caso Noltebohiir2 pela CIJ, de que a nacionalidade deve ser efetiva, apli-
cando-se, evidentemente, esta regra à naturalização. O segundo principio
é que um indivíduo não pode adquirir a nacionalidade de um Estado
estrangeiro por naturalização, se residir no Estado de queja é nacional.5'1
O terceiro principio é que a naturalização não tem efeito retroativo, isto
é. ela produz efeitos a partir da sua concessão.21
A naturalização tem como efeito mais importante o de dar a naciona-
lidade a um indivíduo que, em consjgx^uên^âar-p^F^-a--su^HacmaãIidade
anterior.*’ Este principio está consagrado nos arts. l s e 2! da Convenção
de Montevidéu de 1933.
Este modo de aquisição de nacionalidade não tem a natureza jurídica
de um contrato, apesar de ela se revestir de um aspecto bilateral. Na
verdade, ela é um ato de soberania do Estado que a concebe. Ela é um
ato que o Estado pratica no seu próprio interesse. A vontade do indivíduo
só tem importância para iniciar o procedimento da sua concessão. Não
existe um acordo dè vontades entre o indivíduo e o Estado.
No Brasil, a concessão de naturalização é ato do Executivo.26 Em outros
países, é ato do Legislativo (Bélgica) ou do Judiciário (EUA, Argentina).
A naturalização como regra geral somente atinge o naturalizado, isto
é, ela obedece ao princípio de que a nacionalidade é individual.
No Dl não tem sentido a distinção entre nato e naturalizado (Francisco
Rezek).
No Brasil a naturalização está regulamentada na Lei n" 8.815 de 18-8-80
(Estatuto do Estrangeiro) no art. 110 e segs.
A Lei n2 6.192, de 19-12-1974, eliminou toda a distinção entre brasileiro
nato e naturalizado. Nas leis e decretos passa a ser apenas brasileiro.
Entretanto, permanecem as restrições consagradas no texto constitucional.
337. A apatrídia é um dos aspectos do Dl que se procura eliminar,
uma vez que esta situação viola um dos direitos do homem, que é o de
todo indivíduo ter uma nacionalidade. Ela, entretanto, não é um “ilícito”
internacional, ao contrário, é admitida e reconhecida pelo Dl (Lauter-
pacht). Esta observação decorre do fato de que o Dl proíbe aos Estados
elaborarem leis que ocasionem a apatrídia. A luta para se eliminar a figura
do apatrida tem também um aspecto- social: é que entre tais indivíduos
eram recrutados os anarco-terroristas. uma vez que eram geralmente ho­
mens sem nenhum sen tímen to ou noção de pátria.
Em Roma já existia a figura do apatrida, havia uma categoria de
estrangeiros que entrava nela, a dos “peregrini sine civitate . Por outro
lado, a dos “dediticii”, sem gozar do “jus civile” e da proteção de uma lei
nacional, muito se aproximava do apátrida moderno.
No período medieval e na Idade Moderna o apátrida desapareceu.2'
Foi no século X IX que a apatrídia passou a existir com as inúmeras
legislações de nacionalidade no império alemão. No nosso século, o fenô-

961
me 110 se agravou com as guciras mundiais, ocasionando o deslocamento
de pessoas; a revolução comunista na URSS, o nazismo na Alemanha e o
fascismo na Itália, uma vez que todos que fugiram a estes sistemas políticos
perderam a sua nacionalidade.
A denominação de apatrida para as pessoas sem nacionalidade foi
criada por Charles Claro, advogado no Tribunal de Apehaçào de Paris, em
1918. Na Alemanha, eles eram denominados de “heimatlos”, sem pátria,
ou de “staatenlose" (sem Estado). Na Inglaterra, de “statelessness” . Outras
denominações foram propostas, como a de “apolidi” (italiana), a de “apo-
litia” (Moreira de Azevedo), a de apatria (limar Penna Marinho), etc.
Entretanto, a de apátrida e de apatrídia forani as consagradas nas conven­
ções internacionais e por grande parte da doutrina (François, Vichniae,
etc.). Entretanto, este último autor citado assinala com razão que a palavra
“apátrida” não é correta para designar o fato a que ela se refere. Na
verdadera pátria é um fator subjetivo e nada impede qu» um indivíduo
sem nacionalidade considere subjetivamente que determinado Estado é a
sua pátria.
O apátrida é o indivíduo que não tem nacionalidade. A melhor clas­
sificação dos apátridas é a dada por François: ai os que nunca tiveram
nacionalidade e b) os que já tiveram nacionalidade, mas a perderam .
Diversos fatores podem ocasionar a apatrídia:- a} contiito de legislações
consagrando “jus soli” e “jus sanguinis” ; b) o indivíduo se naturaliza
nacional de um Estado, perde a sua nacionalidade originária e, posterior­
mente, a naturalização que lhe foi concedida é retirada; c) fatores políticos,
com o a legislação da revolução comunista, que retirava a nacionalidade
russa dos emigrados, etc.
O mundo jurídico internacional tem procurado eliminar a apatrídia,
pelas razões a que já aludimos, e tem dentro desta orientação concluído
convenções internacionais.28 Em 1930 foi fixado eni Haia um protocolo
sobre “um caso de apatrídia”, em cujo art. l s se determinava que nos
países que adotassem o “jus sanguinis” o indivíduo com mãe nacional do
Estado onde nasceu e pai sem nacionalidade terá a nacionalidade da mãe.
Em 1961, em Nova Iorque, foi concluída, sob os auspícios da ONU,29 uma
“convenção para a redução dos casos de apatrídia no futuro”. Ela afirma,
como um princípio na matéria, que o indivíduo só perde a sua naciona­
lidade originária quando tiver adquirido outra e, ainda, que o indivíduo
adquirirá “a nacionalidade do Estado em cujo território haja nascido”;
nos casos em que se não for adotado o “jus soli” ele será considerado
apátrida. Entretanto, a convenção ainda admite a existência de certos casos
de retirada de nacionalidade30 por parte do Estado que pode ocasionar a
apatrídia, por exemplo, a residência de um naturalizado por longo tempo
no estrangeiro e quando o naturalizado tem uma atitude de deslealdade
com o Estado. A doutrina tem acFescentado ainda como sendo possível a
retirada da nacionalidade por parte do Estado quando a naturalização foi
obtida por fraude.31 O que se pode assinalar é que os Estados renunciam

962
m u ito p o u co d o s e u d ire i [o quase ab solu to d e (egislai sobre n a c io n a lid a d e .
A m e lh o r s o lu çã o p ara se acab ar com a a p a tríd ia seria de se a d o ta i o
c rité r io do d o m ic ílio p ara se atrib u ir a n a c io n a lid a d e
O apálrida está submetido à legislação do Estado onde ele se encontra.
Ele é regido pela lei do domicílio; em falta deste, pela da residência. Em
1954, sob os auspícios da ONU, foi concluída uma convenção, em Nova
Iorque, que deu aos apátridas os mesmos direitos e tratamento que recebem
os esLrangeiros n o território do Estado.32
338. O conflito das leis de nacionalidade pode provocar o aparecimen­
to da polipatrídia. que sempre existiu na História: Grécia, Roma, e perdura
até hoje. Polipátrida é o indivíduo que possui mais de uma nacionalidade.
A palavra polipátrida é passíve1\da mesma crítica que fizemos à de
apátrida, isto é, pátria é um conceito subjetivo; em conseqüência, o indi­
víduo pode ter mais de uma nacionalidade, mas apenas uma pátria.
A polipatrídia pode ser ocasionada por diversas causas, como o conflilo
entre o “jus sanguinis” e o “jus soli”, aquisição de nacionalidade pelo
casamento, etc. Inúmeros problemas surgem com a polipatrídia, com o no
serviço militar, na proteção diplomática.33 e tc. Em 1930, na Conferência
cie Haia" foi concluída uma convenção “concernente a certas questões
relativas aos conflitos de leis sobre a nacionalidade”, onde se fixaram certos
princípios sobre a polipatrídia: a) a proteção diplomática não pode ser
exercida por um Estado de que o individuo é nacional em relação a outro
Estado de que ele também seja nacional; b) cada Estado tem o direito de
considerar o polipátrida como seu nacional; c) em um terceiro Estado o
polipátrida deverá ser tratado como tendo apenas uma nacionalidade; d)
o polipátrida pode renunciar a uma nacionalidade que ele tenha adquirido
sem manifestar a sua vontade, se o Estado permitir, e esta autorização deve
ser dada quando ele tiver a sua residência habitual no exterior.
De um modo geral, se deverá considerar o polipátrida como nacional
do Estado onde ele tem o seu domicílio, e se ele não tiver domicílio ou
residência em nenhum dos Estados de que ele é nacional, ele deverá ser
considerado nacional do Estado que figura em seus documentos.
A China não reconhece a polipatrídia e em um tratado com a Indonésia
(1955) consagrou que a pessoa com dupla nacionalidade pode escolher.
Em 1963 o Conselho da Europa concluiu uma convenção sobre a
redução dos casos de pluralidade de nacionalidade e .sobre a obrigação
militar em caso de pluralidade de nacionalidades, estabelecendo, entre
outras coisas, que todo indivíduo que possuir a nacionalidade de -dois ou
mais Estados só é obrigado a prestar o serviço militar em um Estado.
O Brasil deu a sua atfesão ao protocolo relativo às obrigações militares,
concluído em Haia, em 1930, que estabelece que o individuo com duas
nacionalidades que prestar serviço militar em um Estado fica isento de
fazê-lo no outro.
O melhor sistema para se terminar com a polipatrídia seria o de obrigar
os polipátridas a optarem por uma nacionalidade, e esta opção teria efeito

963
obrigatório para os Estados. Esta sugestão que tem sido proposta pela
doutrina é um simples ideal. Na Espanha é aclmitufa a renúncia à nacio­
nalidade espanhola quando o indivíduo tem outra nacionalidade.
Pode-se resolver, como vimos acima, a queslão_na ordem internacional
do polipátrida com a aplicação da nacionalidade efetiva (Lapenna).34
339. O indivíduo pode perder a nacionalidade por diversas razões: a)
ao adquirir outra por benefício da lei; b) naturalização;3'’ c) por cessões
ou anexações territoriais: d) pela renúncia;36 e) por punição.
A Lei n" 818 estabelecia como causas que ocasionam a perda da na­
cionalidade brasileira (art. 22): a ) a aquisição de outra nacionalidade por
naturalização voluntária; b) “que, sem licença do Presidente da República,
aceitar de governo estrangeiro co m issã o , em p r eg o ou pensão”;3' c) “que,
por serttença judiciária, tiver cancelada a naturalização, por exercer ativi-
da'de nociva ao interesse nacional”. No Brasil nunca ocorreu este caso.
A Constituição de 1988 consagra apenas dois casos de perda da nacio­
nalidade brasileira: a) cancelamento da “naturalização, por sentença judi­
cial, em virtude de atividade nociva ao interesse nacional”; b) “adquirir
outra nacionalidade por naturalização voluntária”.
Nesta parte a revisão constitucional de 1994 realizou substancial mo­
dificação. A perda da nacionalidade brasileira ocorre quando o indivíduo
adquire nacionalidade de outro Estado. Entretanto., não haverá a perda
se a naturalização tiver sido imposta por lei estrangeira para que o brasileiro
aí residente possa permanecer em seu território ou para que possa ter “o
exercício de direitos civis”. Não perderá a nacionalidade brasileira quando
houver o “reconhecimento de nacionalidade originária pela lei estrangei­
ra” . Este caso era desnecessário ser incluído na Constituição, vez que não
é naturalização e tecnicamente ele nunca poderia perder a nacionalidade
brasileira.
A perda da nacionalidade é individual; ela não atinge os filhos, a
esposa, etc E o que está consagrado no art. 5° da Convenção de Montevidéu
de 1933.38
340. E permitido a um indivíduo que tenha perdido a sua nacionali­
dade que a readquira A Lei ng 818 regulamenta o assunto nos seus arts.
36 e 37. A reaquisição não tem efeito retroativo. O indivíduo readquire a
nacionalidade no mesmo status que possuía antes de perdê-la.
Se esta é a nossa posição, devemos assinalar que existe uma grande
discussão na nossa doutrina. Ilmar Penna Marinho, Oscar Tenorio e José
Afonso da Silva defendem a posição que apontamos. Entretanto, para
Pontes de Miranda, Francisco Rezek e Minô Fraga o indivíduo passa a ter
direitos de naturalizado. Nádia de Araújo, que também se filia à primeira
corrente, observa, com razão, que a ser adotada a tese de Pontes de
Miranda, etc., seria transformar a reaquisição em naturalização.
NOTAS

1. Jlm ar Penna Marinho — Tratado sobre a Nacionalidade. 4 vols.. 1956-1961:


Ponies de Miranda — Nacionalidade de origem e Naturalização no Direito Brasi­
leiro, 1936; Vasco Taborda Ferreira — A Nacionalidade. Alguns Aspectos Funda­
mentais. 1950, P. Weiss — Nalionaliiy and Statelessness in International Law, 1956;
E. Bourbousson — Droil Général de La Nacionalité dans les Cinq Parties du
M onde, 1931; A. Dardeau de Carvalho — Nacionalidade e Cidadania, 1950; Albert
G eouffré de La Pradelle — De La Nationalité d’Origine, 1893; Jo sé Peré Raluy
— D erecho de Nacionalidad, 1955; R. Boulbés — Droit Français de la Nationalité,
1957; Rolando Quadri — La Subbditanza ne! Diritto Internazionale. 1936; Daniel
de Follevílle — Traite Théorique* et Pratique de la Naturalisation, 1880; Higino
Arbo — Ciudadanía y Naturalización, 1926; Ferdinand Marc Dufour — La Double
N ationalité, 1933; H. F. van Panhuys — T he Role o f Nationality, in International
Law, 1959: Santiago Torres B ernárd ez — Conférence des Nations Umes pour
1'Eliminación ou la Réduction des Cas d ’Apatrídie dans TAvenir, in AFD1. 1962,
págs. 528 e segs.; A. N. Makarov — La nacionalité de la fem m e marieé, in RdC,
1937, vol. 11, t. 60, págs. 115 e segs.; Ernst Isav — De la nationalité, in RdC, 1924,
vol. IV, t. 5, págs. 429 e seg.; Marc V ichniac — Le Statut international des apatrides,
in RdC, 1933. vol. 1, l. 43, págs. 119 e segs.; A. N. Makarov — Régles Générales
du Droit de la Nationalité, in RdC, 1949, vol. 1, t. 74, págs. 269 e segs.; Joseph L.
Kunz — L ’option de nationalité, in RdC, 1930, vol. I, t. 31, págs. 111 e segs.;
Robert Redslob — Le principe des nationalités, in RdC, 1931, vol. III, t. 37, págs.
5 e segs.; J. P. A. François — Le Problém e des apatrides, in RdC, 1935, vol. III, t.
53, págs. 287 e segs.; Pierre-Louis Lucas — Les conflits des nationalités, in RdC,
1938, vol. II, t. 64, págs. 5 e segs.; N. Bar-Yaacov — Dual Nationality, 1961; André
Weiss — T raité Théorique et'P ratiqu e de Droit International Privé, t. I, 1907; F.
de Castro — La Nationalité, la Double Nationalité et la Supra-Nationalité, in RdC,
1961, vol. I, t. 102, págs. 515 e segs.; Ernesto Lapenna — La Cittadinanza nel
Diritto Internazionale G enerale, 1966; M. Albertini e outros — L ’Ide de Nation,
1969; Paul Lagarde — Nationalé, in Dalloz — Répertoire de Droit International,
publicado sob a direção de Ph. Francescakis, t. II, 1969, págs. 356 e segs.; José
Edgard Amorim Pereira — N oção de N acionalidade e de N acionalidade das Pessoas
Ju ríd icas de Direito Privado, Instituto de Direito Público, Universidade de Minas
Gerais, Cadernos de Pesquisa, n9 3, l. I, 1961, págs. l i e segs.; Aran Karamanoukian
— La double nationalité et le service militaire, in RGDIP, Avril-Juin, 1974, ns 2,
págs. 459 e segs.: Ronaldo R ebelo de Brito Poletti — Da situação ju ríd ica dos
naturalizados, in Arquiyos do M inistério da Justiça, jan eiro a março 1977, págs. 43
e segs.; Ju a n Aznar Sánchez — La D oble Nacionalidad, 1977; A. Dardeau de
Carvalho — Situação Jurídica do Estrangeiro no Brasil, 1976, págs. 203; Georges
Perrin — Les Conditions de validité de la nationalité en droit international public,
in Recueil d ’Etudes de Droit Internationa! en Hommage à Paul Guggenheim,
1968, págs. 853 e segs.; M irló Fraga — O Novo Estatuto do Estrangeiro Comentado,
1985, págs. 415 e segs.; Nádia de A raujo — Perda e Requisição da Nacionalidade
Brasileira, págs. 55 e segs.: Luis R oberto Barroso — Duas Q uestões controvertidas
sobre o Direito Êrasileiro da N acionalidade, págs. 43 e segs.; Edgar Carlos de
Amorim — A Nacionalidade, sua aquisição, perda e requisição no Direito Brasileiro.
Serviço M ilitar no Estrangeiro, Conseqüências. Mudanças Propostas, págs. 67 e
segs.; Ja c o b Dolinger — Os Brasileiros Naturalizados no P od er Público, págs. 89
e segs.; todos esses ..trabalhos in A Nova Constituição e o Direito Internacional,

965
i oordenação de Jacob Dolingcr, 1987; Jo s é Francisco Rezck — Le Droil Interna-
lional tic la Nationalité, m RdC, t. 198, 1986, vol. III, págs. 333 e .segs., separata;
João Grandino Rodas — A Nacionalidade da Pessoa Física, 1990; Francisco Xavier
da Silva Guimarães — Nacionalidade, 1995; Patrick Courbe — Le nouveau droil
de la nalionalilé, 1998. Florisbal de Souza D el’Olmo — O M ercosul e a Naciona­
lidade, 2001.
IA. Sem elhante a esta corrente é a definição de nação de Stalin: “Nação é
uma com unidade de língua, de território, de solidariedade econôm ica e de for­
mação cultural que se exprime por um certo ‘caráter nacional’.” E de se lembrar
que para M arx “os proletarios não têm pálria” . E como escreve Manuel García-
Pelayo (Las transformaciones del Estado contem poráneo, 1977): “se considerarmos
que a nação é uma ordem de participação nos bens culturais e maleriais, o 'quarto
Estado’ parece estar de fato fora da n ação ” .
IB . P or curiosidade podemos repetir um provérbio europeu citado por Karl
Deutsch: “,úma nação é um grupo de pessoas unidas por um erro comum acerca
de seus antepassados e um desgosto com um por seus vizinhos”.. Ou ainda a de
Barres: “A nação é a posse de um antigo cem itério e a vontade de fazer valer essa
herança indivisa.” Sobre a nação, ver capítulo Direitos Fundamentais do Estado.
2. Devemos distinguir nacionalidade de naturalidade e cidadania. Naturalida­
de é m eram ente o vínculo material (geográfico). Cidadania se refere apenas aos
direitos políticos; entretanto, em alguns países (EUA) esta palavra (“citizenship” )
é utilizada com o sinônimo de nacionalidade. O passaporte de um soviético tinha
com o “cidadania” (soviética) e “ nacionalidade” (russo, “uzbek” , etc.). Tem-se
observado que a confusão entre nacionalidade e cidadania advém dos EUA e os
seus autores confundem as duas noções. No Brasil Colonia falava-se em naturali­
dade. No Im pério e na l s República usava-se a palavra cidadania. O prim eiro autor
a usar a palavra nacionalidade foi P im enta Bueno. A partir de 1930 é que se passou
a distinguir cidadania, nacionalidade e naturalidade. A partir da Constituição de
1934 usa-se nacionalidade (H. Valladão).
3. lim ar Penna Marinho, fundam entando-se em Isay, acrescenta que a nacio­
nalidade é também um vínculo moral, isto é, “o apego, o interesse e o am or pelo
país”. A nosso ver, este elem ento moral não é essencial à noção de nacionalidade,
uma vez que inúmeros indivíduos podem ter a nacionalidade de um Estado e não
terem qualquer amor pelo Estado nacional. O vínculo moral é, a nosso ver, o que
deveria existir na nacionalidade, mas não é o que sempre ocorre. Daí não incluir­
mos tal elem ento na definição de nacionalidade, uma vez que ele não é da essência
deste instituto. A própria Declaração Universal dos Direitos do Homem admite
que o indivíduo pode mudar de nacionalidade. Ora, isto significa, exatam ente, a
existência, em certos casos, de indivíduos que não têm este vínculo moral (amor,
apego) que o uniria ao Estado.
4. Deste modo só estudaremos no presente capítulo alguns aspectos que
interessam ao DIP.
5. A CIJ declarou: “A nacionalidade é um elo ju ríd ico que tem em sua base
um fato social de ‘união’, uma solidariedade efetiva de existência, de interesse,
de sentim entos ju n to a uma reciprocidade de direitos e deveres. Ela é, pode-se
dizer, a expressão jurídica do fato que o indivíduo ao qual ela é conferida, seja
diretam ente pela lei, seja por um ato de autoridade, está mais estreitam ente ligado
à população do Estado que lhe con feriu a nacionalidade do que à de qualquer
outro Estado?” (Affaire N ottebohm [D euxièm e phase], A rrêt du 6 Avril .1955; CIJ

96'6
— Recueil, 1953, p. 4, pág. 23 ). P arece que a primeira vez em que o princípio da
efetividade foi utilizado em nacionalidade foi no Instituto de Dl, em virtude da
eleição, para membro, de um intem acionalista que podia ser considerado como
seitdo ao mesmo tempo alem ão e austríaco. Louis Renault propôs que o referido
m em bro teria para o Instituto a nacionalidade de que ele se utilizasse realmente
(1 888). Esta questão foi levantada em virtude de o Dl limitar o núm ero de membros
' de cada Estado. A idéia que a nacionalidade deve ser efetiva já fora consagrada
no Caso Canevaro da Corte Perm anente de Arbitragem em 1912 (H. Valladão).
6. Kelsen diminui esta im portância ao salientar que pelo Dl o Estado não é
obrigado a distinguir no seu interior estrangeiros e nacionais, isto é, “a naciona­
lidade não é necessária para o DIP. Nada impede que um Estado não tenha
nacionais, o que importa é que ele tenha indivíduos. Esta con cep ção é revolucio­
nária den tro do pensamento ju ríd ico , uma vez que a nacionalidade tem sido
considerada essencial ao Estado. P or outro lado, a proteção diplomática, instituto
da m aior importância no D l, está baseada na nacionalidade.
7. V. Capítulo XXII.
‘8. Talvez o ideal do m undo ju ríd ic o internacional seja a supranacionalidade
(nacionalidade comum) de que nos fala F. de Castro, ainda tão longe de ser
alcançada. Existe um projeto neste sentido do Instituto Hispano-Luso-Americano
de D l.
9. O filh o de uma romana com estrangeiro era estrangeiro. O filho de rom ano
com estrangeira era romano. E a figura do “pater fam ilias” que dominando a
fam ília se torna o “critério” predom inante para a outorga da nacionalidade.
10. A sua origem está no Digesto, um trecho de Paulo (“De v erb o ru m signi-
ficationum ” ), onde se declara: “são m unícipes os que nascem no mesmo municí­
pio” . Os municípios são as cidades conquistadas por Rom a que tem autonomia
(magistrados, assembléias, etc.) mas que contribuem financeira e militarmente
para Rom a (N. Rouland).
11. V. Capítulo XXVII.
12. Os germanos, no período medieval, davam a nacionalidade ao indivíduo
que se incorporava “a certa tribo” (]. Penna M arinho). La Pradelle salienta que
no fundo eles aplicavam o “ju s sanguinis” .
13. Podem os exem plificar da seguinte maneira o que acabamos de dizer: um
indivíduo de raça amarela, mas de nacionalidade francesa, o seu filho será francês.
14. O “ju s sanguinis” não é adotado de maneira uniform e: a) na Espanha, o
filho de pai ou mãe espanhol é espanhol; b) na França, é francês quem tiver pai
francês. A mãe só dá a nacionalidade francesa quando o pai não tiver nacionalidade,
etc.
15. A Constituição de 1969 (art. 145) mantém os mesmos princípios.
16. Diante deste princípio, são brasileiros os que nascem no espaço aéreo ê-
no m ar territorial nacional a bordo de navios e aeronaves nacionais, bem como
de navios e aeronaves privadas estrangeiros, o que nem sem pre é certo, upia vez
que o navio estrangeiro pode estar apenas exercendo o direito de passagem
in ocen te. Não há qualquer motivo, em nom e da paz, da boa ordem e da segurança
do Estado costeiro para que se aplique a sua lei de nacionalidade. Seria mais
correto generalizar-se a norm a aplicada aos navios de guerra em águas territoriais
estrangeiras: a criança tem a nacionalidade do pavilhão d o navio. Ou airida que
se aplicasse o “ju s sanguinis” seria ainda mais ju sto do que o “ju s soli” nestes
casos.

967
1 7. Nestes três casos são considerados brasileiros natos (art. 145 — Constituição
do 1969), e art. 12 da Constituição dc 1988.
17A. Este dispositivo já figurava na Constituição de 1946e levantou problem as,
tendo em vista que a Lei ns 818/49 estabeleceu que “quando um dos pais for
estrangeiro residente no Brasil a serviço de seu governo e o outro for brasileiro,
o filho, aqui nascido, poderá optar pela nacionalidade brasileira... ’ . Este dispositivo
foi considerado inconstitucional por lim ar P enna M arinho e Pontes de M iranda,
vez que ele abria uma exceção ao texto constitucional. A jurisprudência, contudo,
aceitou a constitucionalidade do dispositivo legal (Carlos Roberto Barbosa M oreira
— Nacionalidade O riginária. A questão da Constitucionalidade do art. 2g da Lei
ne 818/49, in A Nova Constituição e o Direilo Internacional, coordenação d e ja c o b
Dolinger, 1987, págs. 75 e segs.). Entretanto, há ainda uma imprecisão de redação:
é que. por exem plo, os agentes diplomáticos podem representar Estados de que
não são nacionais, desde que o governo a c r e d it a d o d ê o seu c o n se n tim en to . E o
que estabelece a Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas. Parece-nos
ainda que neste caso ele não será brasileiro. A Constituirão deveria substituir “seu
país" por “Esiado estrangeiro" ou qualquer coisa semelhante.
18. E também denom inada de “naturalização extraordinária’’ , uma vez que
o Estado concede a sua nacionalidade sem que tenha sido pedida pelo indivíduo.
19. Como se pode observar neste caso, o indivíduo já possui a nacionalidade
brasileira e, por conseguinte, ao lado dos nascidos no território brasileiro e filhos
de brasileiros nascidos no exterior a serviço do Brasil, eles são considerados bra­
sileiros natos.
20. Tem-se entendido que o prazo de quatro anos começa a con tar da m aio­
ridade civil (21 anos) e não da maioridade política (18 anos). A opção pelo texto
da Constituição de 1969, apesar da má redação, era considerada com o necessária
tanto para os registrados “ em repartição brasileira com petente no exterio r’’ e os
não registrados (neste sentido: Haroldo Valladão e Paulino Jacques). E n tretan to,
a jurisprudência do S T F tem sido no sentido de íju e os registrados na repartição
consular não necessitam de fazer opção.
21. Na Idade M édia se admitia a naturalização, e cabia aos reis co n ce d e r as
“cartas de naturalização" (John Gilissen — Introd ução Histórica ao D ireilo, 1988).
22. Este caso versava sobre a naturalização de Nottebohm no L iechtenstein.
23. Este prazo, em regra geral no Brasil, é de quatro anos (art. 124, inciso II,
Decreto-lei n- 491, de 1969, e art. 153 do D ecreto n® 66.689, de 11-6-1970). Este
prazo permanece na Lei n s 6.815, de 1980. A Constituição de 1969 (art. 145, inciso
II, letra b, n- 3) fixa para portugueses o prazo de um ano. Um caso interessante
de naturalização na nova Constituição brasileira é o determinado no artigo 145,
letra b. nQ2, que diz: “ os nascidos no estrangeiro que, vindo residir no País antes
de atingir a m aioridade, façam curso superior em estabelecimento nacional e
requeiram a nacionalidade até um ano depois da form atura” . Nesie caso o prazo
pode ser diminuído (ex.: curso superior de três anos). Este último caso não mais
está consagrado na Constituição de 1988.
24. Este princípio é da maior im portância no tocante à extradição. O Brasil
não dá extradição de nacional. Se um estrangeiro com eter um crim e e posterior­
mente se naturalizar brasileiro, ele não se b eneficiará da qualidade de nacional
para não ser extraditado. Neste caso, a extrad ição é possível, uma vez que a
naturalização não é retroativa (art. 77, inciso I, da Lei ne 6.815, de 1980).

968 ;
2 j. A Lei D elbrück (1914). na Alemanha, pcrm il ia que um alemão conservasse
a nacionalidade alemã ao se naturalizar nacional de um Estado estrangeiro, desde
que ele solicitasse uma autorização prévia neste sentido Esta lei provocou inúm eros
conflitos de nacionalidade e acabou tendo a sua revogação imposta à Alemanha
no Tratado de Versalhes. Na Argentina, até a Lei de 1978. que alterou a legislação
anterior, o argentino nato não perdia a nacionalidade ao se naturalizar em país
estrangeiro. A tualm ente, quem se beneficia da não perda da nacionalidade ao se
naturalizar é o espanhol.
26. A certidão de naturalização é en tregue, entre nós, pelo Judiciário, mas
este procedimento visa apenas dar maior solenidade ao ato, uma vez que a natu­
ralizas já foi concedida pelo Executivo. A C onstituição de 1969 declara que são
brasileiros naturalizados: a) “os que adquiriram a nacionalidade brasileira nos-
termos do"art. 6a, núm eros IV e V, da C onstituição de 24 de fevereiro de 1891'';
b) o caso do art. 145, inciso II, letra b, n B 2 (já m encionad o): c) os que requererem
nos termos da legislação; d) os que forem adm itidos nos primeiros cin co anos de
vida se estabelecendo “definitivamente no territó rio nacional’’ e optem pela na­
cionalidade brasileira até dois anos após atingir a maioridade (art. 145, inciso II,
letra b, n° 1). A Constituição de 1988 estabelece que são brasileiros naturalizados:
u) “os que, na form a da lei, adquirem a nacionalidade brasileira, exigidas aos
originários de países de língua portuguesa apenas residência por um ano ininter­
rupto e idoneidade m oral” ; b) “os estrangeiros de qualquer nacionalidade, resi­
dentes na República Federativa do Brasil há mais de trinta anos ininterruptos e
sem condenação penal, desde que requeira a nacionalidade brasileira” . Neste
último caso parece-nos que se a naturalização fo r requerida o Poder Executivo
não poderá negá-la. A naturalização é um ato discricionário do Estado, porque
ele cria as condições que exige. Entretanto, aqui ela não é um ato discricionário
do Executivo. A revisão constitucional realizada em 1994 reduziu o prazo de trinta
anos de residência no Brasil para quinze anos.
27. Vichniac explica este fato: “A nacionalid ade estava indissoluvelmente li­
gada ao fato de p erten cer à região dom inante, à fidelidade em relação à pessoa
do suserano, à residência em um território determ inado. Até o século X IX ou
quase, não se reco n h eceu à nacionalidade um valor independente.”
28. A doutrina tem observado que, quando duas posições forem possíveis
sobre conflitos de nacionalidade, a apatrídia e a polipatrídia, em relação a um
indivíduo, se deve optar por esta última. T al fato serve apenas para dem onstrar
como a apatrídia é malvfsta na doutrina.
29. A convenção cria um organismo na O N U , a que o indivíduo pode recorrer
“para exam inar seu pedido (de ser protegido pela convenção) e para o bter sua
assistência na introdução do pedido ju n to à autoridade com petente".
30. São m uito poucos, em termos norm ais, os casos de apatrídiq que têm por
causa a retirada da nacionalidade por parte do Estado.
31. Esta causa de retirada da nacionalidade tem sido considerada desneces­
sária, uma vez que o Estado sempre teve este d ireilo.
32. Uma convenção concluída em 1951 j á tratara dos refugiados e nela estavam'
englobados os apátridas que fossem refugiados. A de 1954 visa atender aos apátridas
que não fossem refugiados. Sobre o passaporte dos refugiados e apátridas: ver
Capítulo X X X V I.
33. V. Capítulo X X X V .

969
34. Finalm ente devemos assinalar que 110 ámbito do Conselho (la Europa foi
concluída cm 1963 ;i Convenção Européia para a solução dos casos de múltipla
nacionalidade.
35. A A rgentina, o Sião e o Egito, verdadeiras exceções, não admitiam que
um seu nacional perdesse sua nacionalidade, mesmo quando se naturalizava em
Estado estrangeiro. A Argentina já modificou sua legislação.
36. Tem-se considerado no mundo ju ríd ic o internacional que a renúncia só
deve ser admitida se o indivíduo adquirir outra nacionalidade. O Brasil não a
admite.
37. Pode-se observar sobre este dispositivo a respeito de funcionários brasilei­
ros, em em baixadas e consulados estrangeiros, o seguinte: a) quando o indivíduo
integra o quadro de funcionários do Estado estrangeiro e não pediu licença ao
Presidente da República para exercer estas funções, ele perde a nacionalidade
brasileira; b) quan do o brasileiro não integra o quadro de funcionários do Estado
estrangeiro e a sua rem uneração é por serviços prestados (ex.: serviço de advogado),
não há perda da nacionalidade brasileira.
A função ou com issão do Estado estrangeiro, mesmo que seja gratuita, acarreta
a perda da nacionalid ade brasileira, quando é exercida sem licença do Presidente
da República. O scar T enó rio observa que “ o serviço de advogado brasileiro a
governo estrangeiro” não acarreta a perda da nacionalidade brasileira e que a
comissão ou fu n ção deve ser pública. O mesmo ocorre a respeito do serviço militar
que o indivíduo faz em Estado estrangeiro muitas vezes forçado pela situação da
polipálrida. O brasileiro que presta serviço sem autorização a organismos interna­
cionais não perde a nacionalidade. Já se prestar o serviço militar com o voluntário
no estrangeiro, p erd e a nacionalidade. Parece-m e que este dispositivo de perda
da nacionalidade deve ser entendido do m odo mais restrito possível, por exem plo,
só ser aplicado qu an d o fo r função pública de aspecto político.
38. Na Suíça a renúncia atinge a m ulher e filhos menores.
CAPÍTULO X X X II

PRINCÍPIOS E NORMAS ACERCA DA REPRESSÃO


DOS DELITOS NAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS1

341 — Direito Internacional P enal e Direito Penal Internacional; 342


— Introdução aos diferentes sistemas; 343 — Sistemas de territoriali­
dade; 344 — Ai normas sobre im unidade de jurisdição (o denominado
sistema da extraterritorialidade); 345 — Sistema jurisdicional; 3 4 6 —
Principio da competencia pessoal; 3 4 7 — Princípio d a competencia
real; 3 4 8 — Principio da competencia universal; 349 — Principio da
representação; 350 — A solidariedade internacional contra o crime.

341. O DI Penal pode ser definido de uma maneira concisa como


sendo “o conjunto de regras jurídicas concernente às infrações interna­
cionais que constituem violações dp direito internacional” (S. Plawski).
AssinTsendo, só entram neste ramo do Dl os crimes definidos nas normas
f internacionais: o genocídio, os crimes de guerra, etr. O ideal é ele ser
''í>aplicado por tribunais internacionais, com o o Tribunal de Nurembergue
(v. capítulo anteriõr)~.~~Entretanto, o g i m e de pirataria é uma infração _.
internacional e o agente éjulgado pelos tribunais dos Estados, em virtude
de uma norma internacional neste senti3õ. E considerada infração inter­
nacional “um fato (ação ou omissão), contrário ao direito internacional,
e a um tal ponto nocivo aos interesses ou aos bens da comunidade, pro­
tegidos por este direito, que se estabelece nas relações entre os Estados a
convicção que este fato deve ser penalmente sancionado” (S. Glaser).
Com fundamento em Glaser, e com pequena alteração, podemos dizer
que a infração internacional tem os seguintes elementos: a) elemento
material significa que é uma “conduta humana voluntária”, isto é, “uma
manifestação de vontade no mundo exterior” . O ato pode ser por comissão
ou omissão;IA b) elemento legal no campo do DIP significa que é necessário
existir uma norm a jurídica internacional definindo determinado ato como

971
(r im e . A no rm a in te rn a c io n a l n ão prescreve p en a. D aí ter ela um c o n c e ito
d iverso d o ex iste n te n o d ir e ito in te rn o ; c) e le m e n to m oral significa q u e a
in fra ç ã o é um ato cu lp o so .
É de se salientar que este direito é extremamente fraco devido à
ausência de uma justiça internacional penal. A responsabilidade do agente
pressupõe também aqui., a exemplo do D. Penal, a culpabilidade do agente.
-JkO grande problema que se tem levantado é sobre a responsabilidade penal
do Estado (neste sentido: Pella). Na mesma orientação está Ago que alegou
serem as represálias a pena aplicada ao Estado, vez que elas não visam
uma reparação. Entretanto, esta tem sido afastada pela doutrina dominante
(Lombois, Glaser) e a própria prática internacional (convenção de geno­
cídio, etc.), tendo em vista que umapessoajurídica não tem a culpabilidade
que é um elemento psicológico, o que é próprio da pessoa física. A própria
prática internacional tem rejeitado a responsabilidade penal do Estado:
a) no Tribunal de Nurembergue; b) na Convenção sobre repressão ao
genocídio (1948); c) na convenção sobre a abolição da escravidão (1956)
e d) na convenção sobre a eliminação e repressão do crime de “apartheid”
(1973). Um problema pode ser ainda levantado, que seria o das sanções
aprovadas pelas organizações internacionais contra os Estados. Na verdade,
elas atingem um Estado quando este viola norma internacional. Para elas
serem consideradas como sanções penais, contudo, teríamos que admitir
poderem as sanções penais ser aplicadas por órgãos políticos e não por
tribunais, bem como teríamos que rever a própria natureza da sanção
penal, para admitir como tai b lo q u eio , em b arg o, etc. Entretanto, o p r o je t o
de convenção sobre responsabilidade dos Estados, em estudo na Comissão
de Dl, fala em crime internacional, mas a mencionada Comissão em seu
comentário afirma que a expressão não tem “um conteúdo penal no
sentido do direito criminal” .
O Direito Penal Internacional, ao contrário do anterior, faz parte mais
a nosso ver do D. Penal do que do Dl Público.
Ele é o ramo do D. Penal que determina a competência do Estado na
ordem internacional para a repressão dos delitos. A grande diferença entre
o Dl Penal e o D. Penal Internacional é que o primeiro é formado de
normas de origem internacional, enquanto que o segundo é formado de
normas de origem interna do Estado. E de se salientar que esta distinção
na prática não é clara, tendo em vista o entrelaçamento do D. Interno e
do D. Internacional nesta matéria (por exemplo, a extradição é tanto
regulamentada por normas internas quanto por tratados).
(342. A prática dos delitos interessa também ao Dl quando eles são
cometidos no estrangeiro ou por estrangeiro^Diversos sistemas e princípios
existem sobre a competência da punibilidade: d) sistema da territorialida­
de; b) sistema da extraterritorialidade; c) sistema jurisdicional; d) princípio
da competência pessoal; e) princípio da competência real; j) princípio da
competência universal; g) princípio da representação.

972
S e ja m quais fo re m os sistem as e p rin c íp io s a d o ta d o s, o au to r d o d e lito
d ev erá ser p u n id o , n ã o im p o rta n d o a sua n a c io n a lid a d e ou o lo cal d o
d e lito .
343. O sistema _da territorialidade é aquele cm que o delito deve ser
ptinido no território do.Esiado ein-ftiie foi praticado. O Estado, em virtude
da sua soberania, tem competência exclusiva sobre os atos praticados no
seu território.
Bentham observou em seu favor que a pena, para ser mais útil, deve
ser aplicada o mais próximo possível no espaço e no tempo do local em
que o delito foi praticado.
O sistema da territorialidade da lei penal já existia na Grécia e em
Roma. Estes povos consideravam os estrangeiros como bárbaros, daí se
originando este princípio.2 No Renascimento, com as monarquias absolu­
tas, ele tem a sua consagração. Foi desde então se desenvolvendo e na
Ordenança francesa de 1670 ele foi consagrado do modo mais absoluto.
No século XVII a jurisdição penal torna-se definitivamente territorial por
influência da concepção de soberania de Bodiu. Na Inglaterra, a sua con­
sagração ocorreu nos “judgemeni juries”.' em que cada condado só po­
deria julgar o delito que tivesse sido praticado no seu território. Levado
pelos ingleses para os EUA, ele acabou por se propagar por todo o Novo
Mundo. A Revolução Francesa também o consagrou. A doutrina alemã
dos séculos XVIII e X IX foi a grande sistematizadora deste princípio. E o
princípio que está consagrado em todas as legislações atuais. O Código
Penal Brasileiro o consagra no seu art. 59 e não o faz de um modo muito
preciso ao usar a expressão “aeronaves ou embarcações brasileiras m er­
cantes ou de propriedade privada”. Estas expressões não são utilizadas no
Direito Internacional, vez que as corretas são navios privados e aeronaves
civis.
__£n, Ele se justifica, vez que o poder estatal é o que mantém a ordem no
seu território.
Este princípio, se for aplicado de modo absoluto, conduz a uma vio­
lação do princípio de que todo crime deve ser punido, porque por ele o
Estado só se encontra obrigado a julgar os crimes cometidos no seu terri­
tório, podendo, em conseqüência, não tomar em consideração os que
tenham sido praticados no estrangeiro. Diante deste fato é que as legisla­
ções penais consagram também a existência de outros princípios (perso­
nalidade, real e universal), que veremos abaixo. E de se assinalar que o
aspecto absoluto deste sistema tende a desaparecer pela própria relativi­
dade da soberania que é entendida como subordinada ao Dl. Dentro desta
orientação é que o art. 24 da Constituição de Bonn admite que a Alemanha
transfira direitos soberanos a organismos internacionais.
344. Existem"inúmeros casos de pessoas que não estão sujeitas a juris­
dição territorial. Estas pessoas gozam de imunidade de jurisdição. E o
denominado sistema da extraterritorialidade.4 Constitui uma exceção ao

913
sistema de territorialidade. É o caso dos chefes de Estado.’ agentes diplo­
máticos/' tropas militares,' funcionarios internacionais.8
Estas pessoas, quando cometerem crimes em Estado estrangeiro, não
serão aí julgadas; entretanto, isto não significa que elas ficarão impunes,
mas apenas que serão julgadas no Estado de que são nacionais ou nos
Estados que representam.
345. O sistema jurisdicional foi o que existiu nos países do Oriente
que se encontravam submetidos aos regimes de capitulação e concessões.51
Quintan o Ripollés observa que este sistema era uma verdadeira “servidão
jurisdicional” imposta a tais países.
Neste sistema o poder jurisdicional de um Estado se exerce dentrojle
outro Estado. Assim sendo, tribunais das potencias ocidentais exerciam as
suas funções julgando os seus naciopais, conforme a lei nacional, dentro
da China, Turquia, etc.
346. O princípio da competência pessoal tem sido aplicado acima de
tudo pelos Estados totafitários, que pretendem manter uma jurisdição sobre
os seus nacionais, mesmo quando eles estão ncTestrangeiro. Ele foi consa­
grado como regra geral na Alemanha nazista e no Código Penal da URSS.
Entretanto, este princípio se encontra estipulado, de um modo ou de
outro, em quase todas as legislaçõespenais, uma vez que ele visa exatamente
corrigir os iífconvenrentes da territorialidade absoluta da lei penal. Não
se pode admitir que um^nacionffl^]»ossa com eter delitos no estrangeiro e
fique impune voltando para a sua pátria, uma vez que raros são os Estados
que concedem extradição de nacionais. Diante desta consideração é que
Donnedieu de Vabres afirma que o fundamento deste princípio é o adágio
“Interest est civitatis habere bonos subditos”. Tem^sejirgumentado-em-seu
favor que as leis penais são elaboradas_ Jevaiidí>se em consideração os
padrões morais dos nacionais. Assim sendo, nada mais justo que. elas se
aplicassem sempre, aos. nacionais, não importarujo-oJo cal do delito.
Por outro lado, se o Estado tem direito a proteger diplomaticamente
o seu nacional no estrangeiro; .ele também pode obrigar os seus cidadãos
a um comportamento quando se encontrarem no exterior (Lotika Sarkar).
Este princípio encontrou acolhida nas repúblicas italianas do período
do-Renascimento, na Alemanha antes do Império (onde os códigos ado­
tavam este princípio ao lado do da territorialidade), e teve Bartolo como
um dos seus defensores. Na Suíça, nas legislações cantonais, ele foi intro­
duzido nos meados do século XIX.
0_princípio da personalidade pode ser ativo é\passivo\ Ele é ativo
quando a lei pènal nacional e aplicada" ao"m3Ivídúo nacional do Estado
que pratica o delito em território estrangeiro. A Inglaterra só aplica o
princípio da personalidade ativa, quando se trata de crime grave, como
traição e crime de guerra. Está consagrado no art. 7B, incico II, letra b, do
Código Penal Brasileiro. E passivo quando a vítima do delito é nacional.
Neste caso aplica-se a lei penal nacional ao autor do delito, apesarcte ele

974
ser estrangeiro e o delito tenha tainbém ocorrido Tora das fronteiras iia-
CÍOnáls. Para que isto óccm a é'necessária luna série de condições: a) entrar
o agente no território nacional; b) o fato ser punível no Estado onde foi
praticado; c) ser crime passível de extradição; d) o agente não ter sido
absolvido no estrangeiro, ou não ter aí cumprido pena; e) não estar extinta
a punibilidade; g) não ter sido pedida ou negada a extradição; g) haver
requisição do Ministério da Justiça. O Código Penal brasileiro prevê a sua
aplicação no art. 1~, § 3". Talvez se possa considerar uma extensão do
princípio da personalidade ativa a competência dada ao Estado, pela con­
venção de Tóquio de 1963, para julgar crime cometido contra aeronave
por pessoa que nele tenha residência permanente. O princípio da perso­
nalidade passiva é aplicado nos EUA quando se trata de ato terrorista. A
França adotou este princípio em 1975. _
347. O princípio da competência real, ou de;\pioieção) ou objetivo,
visa a punição do autor do delito, seja qual for aliacionalidade do autor
ou do local da sua prática. ‘ -
O que interessa na aplicação deste princípio é a nacionalidade do bem
jurídico que foi atingido pela prática do delito. Na legislação brasileira ele
está consagrado no inciso I, do art. 7S, do Código Penal. A nossa legislação
inclui nesta categoria os seguintes crimes: a) contra o patrimônio ou fé
pública da União, do Distrito Federal, de Estado, etc.; b) contra a vida ou
a liberdade do Presidente da República; c) contra a administração pública;
d) de genocídio, se o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil. Nestes
crimes o__agente é punido segund.Q_.aJei brasileira, ainda que absolvido ou
condenado no estrangeiro. A doutrina tênTTOHstãSaõ’ que este princípio
tem encontrado cada vez m aior aceitação.10 Ele visa proteger o Estado
contra determinados crimes que o atingiram em assuntos de grande gra­
vidade.
348. O princípio da competência umversal é aquele que permite a
qualquer Estado punir um criminoso, não importando a sua nacionalidade,
ou a do bem jurídico atingido ou, ainda, o local em que tenha sido
cometido o delito. j
Tem sido apresentado como sendo o verdadeiro ideal da sociedade
internacional. Ele, entretanto, só está consagrado para a prática de deter­
minados delitos, conforme estipulação de normas internacionais^ como é
o caso da pirataria,11 ou ainda na repressão das infrações graves enumeradas
no Protocolo I de 1977 (Genebra), que as considera crimes de guerra.
Entretanto, enquanto a repressão à pirataria é costumeira e obrigatória
para todos os Estados, o caso do direito humanitário é convencional e
obrigatório apenas para os contratantes. O Código Penal o prevê no art.
5S, inciso II, letra a.12
349. E de se assinalar ainda que existe o denominado de princípio da
representação, isto é, o Estado julgará os crimes cometidos em aeronaves
e navios privados nacionais que se encontrem em território estrangeiro e

975
aí não tenham sido julgados. E denominado por representação quando a
punição é feita por um Estado que não é o titular do “ius puniendi”. Ele
está consagrado no art. 7“, inciso II, letra b.
Finalmente, é de se observar que para o Brasil julgar tais crimes, bem
como os que ele se obrigou a reprimir por tratados, ou, ainda, o praticado
por brasileiro, é necessário o “concurso das seguintes condições”: a ) “en­
trar o agente no território nacional”; b) se o fato for punível 110 país em
que foi praticado; c) estar o crime incluído enlre aqueles em que o Brasil
autoriza a extradição; d) não ter sido o agente absolvido no estrangeiro,
ou não ter aí cumprido a. pena; é) não ter sido o agente perdoado no
estrangeiro, ou por outro motivo não estar extinta a punibilidade, segundo
a lei mais favorável.
350. A solidariedade internacional, como temos visto, tem aumentado
nos mais diferentes setores e ocasionado uma criação de inúmeros orga­
nismos internacionais; a luta contra o crime não poderia escapar a este
fenômeno. Contudo, não se pode esquecer que a cooperação penal inter­
nacional em sentido lato já se encontra em Bártolo e, principalmente, em
Grotio, Pufendorf e Wolff. Nos Congressos Penitenciários em 1872, 1885
e 1895, já é defendida a união das polícias de diferentes Estados para se
prender os criminosos (Raul Cervini).1'2' Foi criada no Congresso de Bru­
xelas, em 1946, a Organização Internacional da Polícia Criminal (OIPC
— Interpol), que tem como antecedentes a l - e a 2 a Comissão Internacional
de Polícia Criminal. O ato de criação da Interpol não é um acordo inter­
nacional e não foi submetido a ratificação. A sede é em Paris, e a França,
a partir de 1972, dá a ela o estatuto de organização internacional. Na ONU
ela tem o estatuto de órgão consultivo. Ela tem concluído acordos com a
ONU, Conselho da Europa, OACI, etc. A Interpol combate: a) tráfico de
entorpecente e lavagem de dinheiro; b) crimes violentos (terrorismo); c)
crimes contra a segurança aérea; d) proxenetismo internacional; e) falsi­
ficação de moeda; J) crime de colarinho branco; g) roubos (armas, veículos,
pinturas de grande valor, etc.). A luta contra o crime somente será eficaz
com a cooperação internacional.13
Pode-se mencionar ainda a cooperação da justiça penal dos Estados
que se tem desenvolvido. A convenção européia sobre perseguição das
infrações contra as normas sobre circulação rodoviária de 1964 estabelece
que os Estados devem punir as infrações praticadas por seus nacionais no
estrangeiro. “O Estado onde reside o agente pode ser solicitado a se
encarregar não apenas do procedimento, mas também que execute uma
sentença penal.” A convenção européia sobre validade internacional das
sentenças penais (1970) estabelece que o Estado executa as sentenças
penais estrangeiras. A convenção européia sobre a vigilância de pessoas
condenadas cóm a suspensão condicional da pena e postas em liberdade
condicional (1964) determina que um Estado pode requerer a outro que

976
seja fc:ila a v ig ilân cia de um a p esso a nestas c o n d iç õ e s P od e ser citad a
ain d a, 110 â m b ito do C o n se lh o da E u ro p a , a C o n v en ção s o b r e A ssistência
M útua em M atéria C rim in al de 1 9 5 9 co m p ro to c o lo d e 1978.
U m caso d e c o o p e ra çã o c rim in a l é o tratad o c o n c lu íd o e n t r e o B rasil
t* o C a n a d á , em 1992, em q u e um c a n a d e n se ju lg a d o 110 B rasil c u m p re a
p en a 110 C a n a d á , e vice-versa.

977
NOTAS

. 1. H. Donnedieu de Vabres — Introduction à 1’F.tude du Droil Pénal Imer-


national, 1922; ídem — Les Principes M odernes du Droil Penal International,
1928; A ntonio Q uiniano Ripollés — Tratado de Derecho Penal Internacional e
- Internacional Penal, t. II, 1957, págs. 9 e segs.; Maurice Bourquin — Crimes et
délis com re la sureté des États étrangers, in RdC, 1927, vol. 1, t. 16, págs. 121 e
segs.; M aurice T rav ers— Le Droit Pénal International, 5 vols., 1920-1922; Santiago
Vaca-Guzmán — Reglas de D erecho Internacional Penal, 1888; Pasquale Fiore —
Tratado de D erecho Penal Internacional y de la Extradición, 1880; C. M. Tobar
y B orgoño — Du Conflit International au sujel des com pétences pénales el des
causes concom itantes au délit qui les influencent, 1910; Niño Levi — Diritto Penale
Internazionalerf 1949; Stefan Glaser — Introduction à l'Étude du D roit Internatio­
nal Pénal, 1954; Miguel P. Díaz — D erecho Penal Internacional, 1911: Salvatore
Adinolli — Diritto lnternazionale Penale, 1913; Sigismond Cybichowski — La
-Com pétence des Tribunaux à raison d ’infractions commises horas du territoire,
in RdC, 1926, vol. II, t. 251 e segs.; International Criminal Law — editado por
Gerhard O. W. M ueller e Edward M. W ise, 1965, págs. 41 e segs.; L u isjim én ez de
Asúa — T ratad o de Derecho Penal, t. II, 1964, págs. 714 e segs.; L eopoldo Braga
— Direito P en al Internacional, in Revista de Direito, n° 5, vol. I, 1968, págs. 6 e
segs.; Stanislaw Plawski — Etude des Principes Fondam eniaux du D roit Interna­
tional Pénal, 1972; Jo ã o Jo sé Leal — Perspectivas e bases para urna nova disciplina
ju ríd ica — O D ireito Internacional Penal, ¿«Justitia, 1972, págs. 143 e segs.; Manuel
A. Vieira — D erecho penal internacional y derecho internacional penal, vol. I,
1968; Claude Lom bois — Droit Pénal International, 1971; Stefan Glaser — Cul-
pabilité en D roit International Pénal, in RdC, 1960, vol. 1, t. 99, págs. 4 6 7 e segs.;
Jacques Dumas — Responsabilité Internationale des Etats, 1930; Hans Heinrich
Jesch ec — O O bjeto do Direito Penal Internacional e sua mais recen te evolução,
in Revista de D ireito Penal, n 9 6, abril/junho de 1972, págs. 7 e segs.; Dietrich
O ehler — T h e Significance o f the Principie o f Territoriality in M odern Criminal
Law, in Law and State, 1973, vol. 8, págs. 37 e segs.; Stefan Glaser — Droit
International Pénal Conventionnel, 2 vols., 1970-1978; Guillerm o J . Fierro — La
Ley Penal y el D erecho Internacional, 1977; Ludwig T. Waaldijk — Cooperatiorí.
in Criminal M atters, ¿nIX Curso de D erecho Internacional, organizado pelo Comité
Ju ríd ico Interam ericano, 1983, págs. 193 e segs.; Claude Valleix — Interpol, in
RGDIP, t. 88, 1984, n9 3, págs. 621 e segs.; Igor Karpets — Delitos de carácter
internacional, 1983; André Bossard — La Criminalite Internationale, 1988; Chris-
tophe Swinarski — A Norma e a Guerra, 1991; Instituto Superior Ibero-Americano
de Estudos Crim inais e outros — Curso de Cooperación Penal Internacipnal, 1994;
André B o n ard — La Criminalité Internacion ale, 1988; André H uet e R enée Koe-
rin g jo u lin — D roit pénal In te rn a tio n a l, 1994; Lyal S. Surga — T h e Emerging
System o f International Criminal Law, 1997. International Crim inal Law, coorde­
nado por C h erif M. Bassiouni, 3 vols., 1999; Raúl Cervini e Ju árez Tavares —
Princípios de Cooperação Judicial Penal Internacional no P rotocolo do Mercosul,
2000; Luis Ivani de Amorim Araújo — D ireito Internacional Penal, 2000. Solange
Mendes de Souza — Cooperação Ju ríd ic a Penal no Mercosul, 2001; Ali¿ia Gil Gil
— D erecho Penal Internacional, 1999.

978
IA. Segundo a concepção tradicional (causalista) podemos d efinir ação como
sendo "a conduta humana exlerna, positiva ou negativa, determ inante de uma
realização típica modificadora do mundo exterior". Para a doutrina esposando tal
concepção o resultado integra o conceito de ação, distinguindo-se nela os elem en­
tos: “subjetividade, conduta corporal e resultado. Conforme a orientação finalista
o resultado não pertence ao conceito de ação mas à estrutura do tipo, compondo-se
a ação de dois elementos; vontade e manifestação de vontade” . “T ipo e o injusto
descrito concretam ente pela lei” (João M estieri — Teoria Elem entar do Direito
Criminal, t. I, 1971, pág. 180).
2. Tem -se observado que este sistema entre os gregos e rom anos era mais um
“ procedim ento de fato”, uma vez que tais povos não respeitavam a soberania do
Estado estrangeiro, que está na base deste sistema no direito m oderno.
3. “Segundo doutrina jurisprudencial... anterior ao Estatuto de 1549, a agres­
são em um condado, se a morte linha lugar em outro, não podia ser incriminada
em nenhum dos dois” (Quintano Ripollés).
4. Com o veremos no capítulo sobre agentes diplomáticos, não se deve falar
em extraterritorialidade, uma vez que tais indivíduos não se encontram fora do
território do Estado, mas dentro dele e, na verdade, apenas gozam de imunidades
com o a de ju risd ição penal.
5. V. capítulo Chefes de Estado.
6. V. capítulo Agentes Diplomáticos.
7. V. Capítulo XX.
8. V. Capítulo XXVIII.
9. V. Capítulo XX.
10. Entretanto, ele já estaria consagrado na doutrina de Suárez.
11. A origem remota deste sistema está no Código de Ju stiniano , “que deter­
minava a ju risd ição criminal dos governadores do império rom ano pelo lugar da
prisão do culpado” .
12. A redação do Código de 1942 é imperfeita ao falar nos crim es “que, por
tratado ou convenção, o Brasil se obrigou a reprim ir”. Estes crim es em virtude do
art. 125, inciso V, da Constituição de 1969, são da com petência dos ju izes federais.
O Código se esquece de que existem certos crimes que os Estados estão obrigados
a reprim ir em virtude de uma norm a costum eira (ex.: pirataria). O mesmo defeito
se en co n tra na Lei n® 7.209, de 11/7/84.
12A. No século XVIII a França, Alem anha, Áustria e Prússia tinham polícia
apenas para a repressão política. Os EUA foram o primeiro Estado a ter força
pública para com bater o crime com um (Adriana di Giovanni).
13. Em 1905, em um Congresso da União Internacional de Direito Penal,
realizado em Hamburgo, afirmou-se pela primeira vez a necessidade da solidarie­
dade internacional para uma luta eficaz contra o crime.

979
i
CAPÍTULO XXXIII

EXTRADIÇÃO1

351 — Definição; 352 — Histórico; 353 — Razões em fa v or da


extradição: 354 — A extradição como instituto do DIP; 355 — Formas
de extradição; 356 — Princípios que regem a extradição; 357 — A
nacionalidade do indivíduo passível de extradição; 358 — Delitos que
não estão sujeitos à extradição: a) Delitos militares; b) Delitos políticos;
c) Outros delitos; 358A — Terrorismo; 3 5 9 — Condições para a
extradição; 360 — A questão da retroatividade dos tratados de extra­
dição; 361 — Preferência entre os pedidos de extradição; 362 — O
Processo de extradição.

353. A extradição pode ser definida como sendo o ato p o r m eio do


qual um indivíduo é entregue por um Estado a outro, que seja competente
para processá-lo e puni-lo.
A extradição é concedida fundamentada em tratado ou na reciproci-
dade. Em 1984 estavam sujeitos à reciprocidade com o Brasil em matéria
de extradição: Áustria, Espanha, França, Itália, Portugal, Alemanha Oci­
dental, Polônia e Austrália (Rezek)v Em 1985 o Brasil tinha em vigor 13
tratados de extradição: Argentina, Bélgica, Bolívia, Chile, Colômbia, Equa­
dor, EUA, México, Paraguai, Peru, Suíça, Uruguai e Venezuela (Mirtô
Fraga). Em 1924 o Brasil e n tre g o u um brasileiro à Grã-Bretanha com base"
na reciprocidade, mas o direito'inglês não permitia esta.
352. Na Antiguidade Oriental, a extradição já era consagrada em Israel
e no Egito. Neste último existe um dos mais antigos tratados, concluído
entre Ramsés II e Hattisuli, rei-dos Hititas, em 1291 a.C., que consagrava
a extradição. E evidente que não possuía as características que hoje apre­
senta, tanto assim que era prevista a extradição do criminoso político e
não do criminoso comum. Por outro lado, ela era um fenômeno esporá­

981
dico, que geralmente encontrava consagração após as guerras. Diante disto,
alguns autores negam que tenha existido extradição neste período da
História e a fazem datar do século XVIII (Coelho Rodrigues^ ou da lei
belga de 1833 (Villefort). Na verdade, não podemos deixar de contestar
tais opiniões, uma vez que a essência da extradição, isto é, conduzir um
indivíduo para fora de um Estado a fim de entregá-lo cTutro Estado,
existia na prática internacional da Antiguidade. O que variava eram alguns
detalhes, e é claro que um instituto jurídico não conserva as mesmas
características através dos séculos.
No mundo grego, apesar da existência do direito de asilo, a extradição
também foi praticada em relação aos criminosos que tivessem cometido
delitos graves. Dentro desta orientação, encontramos um acordo entre
Filipe da Macedônia e Atenas, em que se estipulava a extradição dos
criminosos acusados de tentar assassinar o rei.
Em Roma ela .também foi praticada, apesar de os romanos' não respei­
tarem a soberania dos Estados estrangeiros.2 O Tribunal dos “recuperato-
res” era o órgão encarregado de decidir da entrega ou não de um indivíduo
(Quintano Ripollés, Asúa). Segundo Laurent os “ recuperatores” apenas
julgavam o extraditado.
Entre os povos germânicos ela desapareceu. O Papado ou o Império,
com a sua base universal, não conheciam fronteiras para a perseguição
dos criminosos. Entretanto, inúmeros acordos de extradição foram con­
cluídos no período medieval: a) Lotário com Veneza (840); b) Inglaterra
e Escócia (1174), etc. A finalidade destes tratados era geralmente pessoal
ou de ordem política.3
Na Idade Moderna, e com o aparecimento do absoluüsmo (séculos
XVI, XVII e XVIII), os tratados de extradição vão-se caracterizar por visar
a entrega de criminosos militares (visava evitar as deserções) e a defesa
dos regimes.4
No século X IX , a extradição passa a tomar as suas características de­
finitivas. Em 1802, na Paz da Amiens (França, Espanha e Inglaterra), não
se mencionam os criminosos políticos como sendo passíveis de extradição.3
Esta orientação é definitivamente consagrada na lei belga de extradição
de 1833. A própria palavra extradição somente é consagrada no século
X IX .6
Donnedieu de Vabres salienta que a extradição atravessou três fases
na sua evolução: a) contratual — a extradição está consagrada apenas nos
tratados; b) legislativa — os Estados promulgam leis de extradição; c) a da
regulamentação internacional — que ainda não existe de um modo geral.
Somente no âmbito do Conselho da Europa foi concluída, em Paris, uma
convenção geral de extradição, em 1957 com os protocolos de 1975 e 1978,
e na América temos a de Montevidéu -(1933). É de se assinalar que a
extradição foi também regulamentada no Código Bustamante concluído

982
na Conferencia Pan-americana de Havana (1928). Em 1981, em Caracas,
foi concluída a convenção interamericana de extradição.
No Brasil, durante o Império, a extradição era concedida quando
consagrada em tratado ou em caso de promessa de reciprocidade. Era um
“sistema administrativo” (não era apreciado pelo Poder Judiciário) que
perdurou no inicio da República. A primeira lei de extradição foi a 2.416,
de 1911.
353. O instituto da extradição tem em favor da sua existência diversas
razões. A primeira delas é a própria nocão de jnsiira. que exige a punição
dQjuminiQpsos. Grotiusjá escrevia “aut dedere aut puniré” (ou extraditar
ou punir). Atualmente deve-se falar: “aut dedere, aut judicare”, vez que
nao se sabe o resultado do julgamento e o importante é que este seja
realizado. Este principio teria sido incluído'pela primeira vez na convenção
para a Supressão da Falsificação da Moeda de 1924 (Edward M. Wise).
Existe uma solidariedade entre os Estados na lula contra o crim e.' Há
ainda um dever moral dos Estados, que é o de assistência mútua, incluin-
do-se nela a repressão à criminalidade. Enquanto o princípio universal de
repressão à criminalidade não for adotado de modo amplo, o que tão cedo
não acontecerá, a extradição é um instituto necessário para que a repressão
seja eficaz. Contudo, historicamente a entrega de criminosos visava mais
a ordem interna do estado do que a uma cooperação internacional, vez
que esta última idéia só surge com Grótio.
As razões invocadas acima em favor da extradição não foram ainda
suficientes para criar um direito e o correspondente dever de extradição
na ordem jurídica internacional. O direito e o dever só existem quando
houver um tratado internacional que os consagre. Na ausência de um
tratado, pode existir um dever moral de extraditar um criminoso, mas não
um dever jurídico.8 E de se assinalar que algumas legislações estatais con­
sagram que a extradição poderá ser dada com base na reciprocidade.
Entretanto, nestes casos não existe um dever jurídico internacional, uma
vez que tais Estados podem modificar unilateralmente as suas leis de ex­
tradição e não criam uma obrigação internacional. Ao contrário dos países
do “civil law”, que dão extradição, na àusência de tratado, mediante reci­
procidade, os países do “common law” só dão extradição com base em
tratado.
A doutrina tem assinalado que atualmente os Estados têm preferido
usar da “deportação”, que é muitas vezes uma extradição disfarçada e é
um meio de fugir à proteção dada ao indivíduo nas leis 'e tratados de
extradição. Este procedimento é que explica o fato de existirem poucos
tratados e casos de extradiçào.8A
354. A colocação da extradição no DTP não tem sido pacífica entre os
doutrinadores. Bustamante y Sirven a situa no Dl Privado, salientando que
ela é um meio de se levar um individuóla seus juizes.9
Parece-nos, entretanto,'que a extradição faz parte do DIP, uma vez
que ela é uma relação de Estado a Estado (Mercier). O Dl Privado trata
do conflito de leis onde não parece enquadrar-se o instituto da extradição

983
cu) si mesmo. Só existe um direilo e um dever de extradição quando há
Halado internacional que o consagre. Nesia oriem ação estão inúmeros
autores (Beviláqua, Russomano, Accíolv).10 Gilda Russomano, ao lado de
outros argumentos, acrescenta em favor de sua posição “o interesse supe­
rior dos Estados e da Comunidade Internacional,'que nela encontram um
fator importante e decisivo na luta sem fronteira contra o crime”.
Diz Yves Chauvy com razão que “a extradição é um ato diplomático
que se realiza em um quadro do Direito Internacional Público conforme
um processo de direito interno” .
355. Existem inúmeras formas de extradição, que passaremos a estudar
em seguida:
a) 1) Extradição d^T fãto ^ - está fundamentada na “comiias gentium”,
consiste na entrega do criminoso sem que haja qualquer procedimento
jurídico. E muito utilizada nas regiões de fronteira.-No Brasil ela é cons­
tantemente empregada no Rio Grande do Sul; 2) Extradição d^ lirè itg —
ao contrário da anterior, é feita conforme as normas jurídicas internas e
internacionais. A sua denominação é um pleonasmo, urna vez que toda
extradição deve pressupor ser realizada segundo os cánones das normas
jurídicas.
b) 1) E x t r a d i ç ã o é pelo ângulo de quem formula o ppHi'Hr.
extrad ição : 2) Extradição tíS s s ^ ^ ^ é p elo â n g u lo de quem re c e b e o
pedido de extradição. Escreve~~Mirtô Fraga: “Raras vezes o Brasil pediu
extradição. Os poucos casos ocorreram, principalmente, no inicio do sé-
culo. A extradição no Direito brasileiro é predominantemente passiva.”
c) 1) Extradição instrutória — é quando o pedido de extradição é
formulado a fim de submeter o indivíduo a processo criminal; 2) Extradição
executória — é quando o pedido de extradição é formulado a fim de
obrigar o indivíduo a cumprir a pena a que foi condenado.
d) Gilda Russomano, com base na definição de extradição de Mercier,
apresenta extradição espontânea e a outra requerida. Na verdade, a extra­
dição espontânea não é propriamente uma extradição, e ela poderá ser
confundida com a extradição de fato, onde também não existe verdadei­
ramente um pedido de extradição. A extradição espontânea é contrária
ao próprio instituto de extradição, que pressupõe um pedido do Estado
interessado. A extradição requerida é um pleonasmo, porque toda extra­
dição é requerida.
e) Tem-se feito menção a uma denominada “extradição de trânsito”,
que ocorreria quando um indivíduo extraditado, para atingir o Estado
que lhe pedia a extradição', tivesse de atravessar um terceiro Estado: neste
então haveria uma extradição de trânsito. Na verdade, ela não existe,
porque o terceiro Estado não dá nova extradição. Poderíamos mesmo
dizer que o extraditado e seus acompanhantes fazèm uma simples “pas­
sagem inocente”.

984
f) A reextradição surge quando o indivíduo é extraditado para um
Estado e este dá a sua extradição a um terceiro Estado. A reextradição só
deve ser concedida se o primeiro Estado a conceder a extradição der a
sua autorização (art. 12, letra e, do Decreto-lei n9 394, de 28-4-1938, De-
creto-lei n9 941, de 1969, e Lei n9 6.815, de 19-8-1980). Durante a vigência
do Decreto-lei n9 394 se admitiam duas exceções para a reextradição ser
dada independente do consentimento do Brasil: a) se o extraditado con­
sentir; b) “se permanecer em liberdade no território” do Estado um mês
depois de julgado e absolvido ou cumprida a pena. A proibição da reex­
tradição é no fundo um respçito ao princípio da especialidade.
g) A convenção interamericana de 1981 cria a denominada “extradição
simplificada”, que é a extradição sem um processo formado quando as
leis permitem ou quando a pessoa consente.
356. A extradição é regida por dois princípios que visam dar maior
proteção áo indivíduo exlRwiúado:
a) Princípio da(especialidadè2— o indivíduo nã<~- pod** spr jn lg ^ o por
delito diferetue-do qtie fmtdãmentnn <->ppHirtn Hp PYtradiçãn A legislação
brasileira o consagrava no art. 12 do Decreto-lei n9 394, abrindo, entretanto,
duas exceções a este princípio: 1) quando o extraditado consente em ser
julgado pór outro crime; 2) quando o extraditado permanecer em liber­
dade por mais de 30 dias11 no Estado após a sua condenação (e cumprida
a pena) ou a sua absolvição.12 O Decreto-lei n9 941, de 1969, não repete
este dispositivo, apenas declara que o governo que pedir a extradição se
compromete a não prender ou processar o extraditado “por outros atos
anteriores ao pedido de extradição” (art. 98, inciso I). O mesmo princípio
está na Lei n9 6.815, de 19-8-80. A convenção interamericana sobre extra­
dição (1981) estabelece que ninguém pode ser julgado por crime que não
fundamentou o pedido dç extradição a não ser que a pessoa fique 30 dias
em liberdade no Estado requerente. Mirtô Fraga observa com razão que
não se deve aceitar o consentimento do extraditado sob jurisdição estran­
geira.
Vamos acrescentar algumas observações retiradas de Anna Zairi. O
princípio da especialidade já era respeitado pelos tribunais antes de 1830.
Em tratado, ele surge em 1844, concluído entre França e Luxemburgo, o
que o “espalhou” na vida jurídica francesa. Ele está co nsagrado no art. 14
da convenção européia de extradição. Para alguns autores (Saint Aubin)
este princípio consagra os interesses do estado. Já a teoria anglo-saxônica
diz que visa a proteger o indivíduo. A Suíça adota uma tese mista. A
convenção européia de direitos humanos (art. 6) estabelece que o acusado
tem direito de satier do que o acusam. F. Ricci afirma que as infrações
menores deveriam ficar fora do pr incipio da especialidade, mas isto violaria
os direitos do estado requerido. No caso de reextradição é preciso que
seja solicitada autorização ao primeiro estado que concedeu a extradição,

985
porque “ninguém pode dar mais do que recebeu”. As infrações praticadas
após a extradição podem ser julgadas. Na Europa pode haver recurso para
a Corte Européia de D. Humanos. Finalmente tem sido condenada a
expulsão que se transfoima em extradição.
b) Princípio da 'identidade — não se dará a extradição quando no
Estado Hè íéfúgio não se considerar crime o que tundamenta _Q_pg3Fdo
de extradição,(arE~88, II, doDècreto-lei ny 941, de 1959). Ainda dentro
da tipicidade está que o ex traditarlo porW-j <¡f‘T cnhrn^tjdo a lima pena
que não exista nn F.stodoude refúgio. O Decreto-lei n9 394 declarava que
a pena de morte ou corporal a que estiver sujeito o extraditado será
comutada em pena de prisão (art. 12, letra e). O mesmo princípio está no
art. 98, inciso III, do Decreto-lei n9 941, de 1969, e na Lei n9 6.815, de
19-8-80. A convenção interamericana de 1981 proíbe a extradição quando
há pena de morte, prisão perpétua e pena degradante.
Em 1989, a Corte Européia de Direitos do Homem, no caso Soerensen
(alemão criado nos EUA), entre a Alemanha e a Inglaterra,.condenou esta
última por tê-lo extraditado para a Virgínia (EUA), onde a legislação
consagra a pena de morte e a prisão perpétua. A Corte considerou uma
violação da convenção européia de direitos do homem, que proíbe trata­
mento cruel e desumano. Acresce ainda que o acusado era psicótico e se
julgado na Inglaterra não seria condenado.
O princípio da identidade tem sido criticado, tendei i:m vintii-rpic nm
Estado deve respeitar a legislação do outro que considera aquele fato como
crime, t'or outro lado, podem surgir problemas na sua aplicação, por
exemplo, o fato de ser punido com um “ nomen juris” diferente. Entre­
tanto, ele atende a ordem pública do Estado requerido (Shearer).
Em acórdão do ano 2000 o STF não tem exigido para deferimento do
pedido de extradição a comutação da pena Be prisão perpétua para trinta
anos que é a mais grave do direito brasileiro.
Pode-se acrescentar ainda que há doutrinadores qúe dão uma aplicação
bastante ampla a este princípio afirmando que ele deve abranger a pro­
cedimento criminal, como os elementos que compõem o crime (v.: Domi-
nique Poncet e Paul Gully — H art).
357. E princípio consagrado quase que universalmente nas mais dife­
rentes legislações que não se concede a extradicão^dejnacional. Poucos-
paises a dão quando consagrada em tratado, como os F.UA13 e a Inglaterra
A idéia de não se extraditar o nacional parece que se encontra no
século XIV, na Bula de Brabante,13A que dava a todos os cidadãos o direito
de não ser subtraídos à jurisdição dos tribunais locais. Outros atribuem a
não extradição do nacional aos costumes dos servos convertidos em bur­
gueses não poderem ser subtraídos ao juízo real, mesmo por crime come­
tido no estrangeiro. Fala-se ainda que a origem estaria nas guerras religiosas
na Europa.
A não extradição do nacional já era consagrada na jurisprudência
austríaca do século XVIII. No século XIX a mesma idéia foi defendida por
Mancini e pela doutrina alemã (Manuel Adolfo Vieira).

986
A razão principal para islo é que o Estado tem a obrigação de proteger
os seus nacionais. Outras razões podem ser acrescentadas: a) “ninguém
pode ser subtraído a seus juizes naturais”; b) o direito do nacional de
habitar o seu próprio Estado; c) a_dificuliiadj^.jde_defesa em tribunais
estrangeiros; d) falta de imparcialidade da justiça estrangeira, etc.
Na Europa (Convenção Européia de 1957), em vez de consagrar a não
entrega do nacional apenas “autoriza o Estado a não entregar o seu na­
cional”.
No Brasil, a lei de 1911 de extradição consagrava a entrega de nacional,
mediante reciprocidade. A Constituição de 1934 proíbe a extradição de
nacional,13B princípio que foi repetido na Constituição de 1946 (art. 141,
§ 3 3 ),14 na Constituição de 1967 (art. 150, § 19), na Constituição de 1969
(art. 153, § 19). Na/Donstituição de 1988, art. 5, inciso LI, está consagrada
a não extradição do nacional, mas parece abrir uma exceção para aquele
que tiver “comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes
e drogas afins, na forma da lei” .
H á um acórdão do STF de 1991 sobre extradição de brasileiro natu­
ralizado dando a entender que só este poderá ser extraditado. Contudo
o STF não deu uma decisão clara.
A não extradição do nacional não produz teoricam ente a sua impu­
nidade,'límã~ vez que ele sera processado no Brasil pelo crime cometido
no estrangeiro.
A orientação acima tem sido muito criticada no mundo jurídico inter­
nacional, alegando-se que ela é contrária à cooperação internacional para
a repressão do crime, uma vez que de fato (dificuldade de provas, a
distância do local da prática do delito, etc.) o julgam ento do indivíduo no
seu Estado nacional, e não no em que ocorre o crime, leva à impunidade.
Em 1880, o Instituto do Dl afirmou que não se deveria distinguir os
nacionais dos estrangeiros.14* A maioria da doutrina apóia esta orientação:
Travers, Olivart, Bemard, etc. No Brasil, diversos autores defenderam a
extradição do nacional: Clóvís Beviláqua, Coelho Rodrigues, Rodrigo Otá­
vio, etc. Na verdade, ainda demorará muito tempo para que a sociedade
internacional, de um modo geral, adote a extradição do nacional, uma
vez que não existe confiança entre os Estados para entregar os seus nacio­
nais a julgamento em outros Estados.
Uma situação interessante é a estabelecida na convenção sobre igual­
dade de direitos e deveres entre brasileiros e portugueses (1971) onde se
estabelece: “os portugueses e brasileiros que gozam do estatuto de igual­
dade não estão sujeitos à extradição, salvo se requerida pelo governo do
Estado da nacionalidade”. Rezek observa que este tratado cria um proble­
ma jurídico, vez que a Constituição só proíbe a extradição do nacional.
Um a questão a ser debatida é a da extradição do estrangeiro natura­
lizado brasileiro. Ele se encontra protegido pela norm a constitucional: A
naturalização pode ser cancelada por sentença judicial se o naturalizado
praticar atividade nociva ao interesse nacional.

987
Há uma tendência no Mercosul de se extraditar o nacional para outro
país integrante do Mercosul. Contudo, no Brasil a proteção do nacional
está no art. 5, que é cláusula pétrea da Constituição.
358. Existem certos crimes que_não sujeitam os seus ^utores à extra­
dição. Os principais, dentro desta categoria, são os crimes militares e os
crimes políticos:

a) Delitos m ilitares

No séculos XVII e XVIII e início do X IX os criminosos militares eram


passíveis de extradição. Os tratados de extradição visavam, acima de tudo,
estes criminosos, a fim de se evitar a deserção. Era a época da formação
dos grandes exércitos nacionais. Esta orientação existiu até a lei belga de
1833, que condenou este tipo de extradição.
São delitos militares: a deserção.1" a covardia, o desrespeito às ordens
.superiores, o abandono de um posto, etr
Eles podem ser definidos como sendo as violações de regnilarnentos e
normas puramente militares.
Eles possuem uma criminalidade relativa, porque no Estado de refúgio
eles não poderão repetir o crime, uma vez que não são mais militares.
Atualmente os textos legislativos declaram limitativamente que não são
passíveis de extradição os delitos puramente militares.
A nossa legislação atual de extradição não o incluiu nos crimes não
passíveis de extradição. Entretanto, o Brasil tem p r o p o s t o e aceito nas
conferências interamericanas a não extradição “quando o delito que mo­
tivar a extradição for exclusivamente militar” (Manuel A. Vieira).
Segundo ainda o intemacionalista uruguaio Manuel Adolfo Vieira,
que observa que a convenção européia sobre extradição não proíbe a
extradição do criminoso militar, mas o tema não é nela tratado. Entretanto,
nada impede que acordos bilaterais consagrem a não extradição. Em 1962,
uma convenção no Benelux consagrou a extradição dos desertores.

b) D elitos políticos

Os criminosos políticos não são passíveis de extradição. Existe, entre­


tanto, uma grande dificuldade para a caracterização destes delitos, o que
fez com que a maioria das legislações estatais não o definissem.
Na doutrina, dois critérios foram propostos: a) um objetivista — define
o crime político como sendo aquele perpetrado contra, a ordem política
estatal; Q.importante é que o bem jurídico atingido seja de natureza política;
b) um subjetivista — que considera crime político o que foi cometido com
a fmalidade política. Tese desenvolvida pela jurisprudência suíça. Nos dias.
de hoje, um critério misto resultante da combinação dos acima citados é
o qüe tem sido mais utilizado para a verificação da natureza política ou

988
não de um crime. Parece-me que não há qualquer vantagem e mesmo
uma impossibilidade de se definir crime político. Só a legislação da Itália
e da Alemanha definem crime político. E mais fácil dizer o que não é
crime político. Quem qualifica o indivíduo como criminoso político é o
Estado que recebe o pedido de extradição. Através da História, o criminoso
político nem sempre foi protegido da extradição. Na Antiguidade Oriental,
o criminoso político não gozava do direito de asilo, uma vez que os chefes
de Estado possuíam um aspecto sagrado e o crime político era, assim, um
sacrilégio. Em Roma, ele era passível de extradição. Este mesmo tratamento
lhe era dispensado no período medieval onde, apesar do direito de asilo,
a entrega de criminosos políticos era utilizada como “moeda de trockJ.’-
- (Reale^nas relações internacionais.1;,A Na Idade Moderna, com o fortale­
cimento do poder real e a concepção do Direito divino dos reis, a orien­
tação de se extraditar os criminosos políticos não se alterou. Na Idade
Moderna a traição e a rebelião são crimes abomináveis, tendo em vista o
aspecto sagrado do rei. A traição é um crime da maior gravidade dentro
da cultura da época, sendo de se lembrar a figura de Judas para os católicos.
O crime político é um crime contra o Príncipe. Em 1729, na obra de Provó
Klutt, foi sustentado o asilo para o criminoso político bem como foi usada
a expressão “delito político”. Sendo que antigamente se usava a expressão
“alta traição”. Heleno Fragoso atribui a Filangieri o uso pela primeira vez
da expressão “ crime político”.
Na Revolução Francesa passou-se a dar asilo ao criminoso político.158
Foi no século XIX que com eçou a se generalizar a modificação no
sentido de não se conceder a extradição do criminoso político, por in­
fluência da Suíça e da Bélgica, que lhe concediam asilo e passaram a
colocar uma cláusula, neste sentido, nos tratados que concluíam. Na dou­
trina, De Bonald defendeu este princípio. A lei belga (183S) foi a primeira
lei a proibir a extradição de criminoso político.
No tratado de 1826, que o Brasil assinou com a França, sób a amteaça
dos canhões do Almirante Roussin, o Brasil se comprometia a não dar
asilo aos acusados de crimes de alta traição. A França nunca apresentou
qualquer redam ação'e, em 1871, este tratado ainda estava em vigor (Cân­
dido Mendes: pronunciamentos parlamentares de 1871 a 1873,. 1982. T.
I., organização e pesquisa de Aurélio Wander Bastos).
A “última tentativa” realizada, segundo Egidio Reale, para obter a
extradição de criminosos políticos, foi a da Rússia e da Austria, em 1849,
com fundamento nos tratados de Passarowitz (1718), de Belgrado (1739),
de Kutschuk-Kainardji (1774), de Sistowa (1793), solicitaram a extradição
de “cinco mil súditos austríacos ou russos comprometidos na insurreição
húngara e refugiados na Valaquia”. O Império Otomano recusou-se a
entregá-los.
A não extradição do criminoso político tem o seu fundamento em
diversas razões: a) o aspecto anti-social deste crime é relativo, o que se

989
acentua no DI, que admite a validade dos inais diferentes regimes políticos
(ex.: um governo “capitalista” pode não considerar criminoso o homem
que lenta derrabar um governo “comunista” e vice-versa);16 b) o criminoso
político não teria no seu Estado nacional um julgamento imparcial; c) tem
sido apresentado como argumento decisivo em favor deste princípio a não
intervenção nos assuntos de um Estado estrangeiro.'' Na verdade, ao não
extraditar um criminoso político há também uma intervenção no sentido
de que se mantém “viva” uma facção política.
É de se reproduzir texto de Heleno Fragoso, onde assinala que “só os
regimes democráticos têm verdadeiramente autoridade para reprimir e
punir os seus inimigos”. Cita Florian, que observa: “um conceito racional
de delito político só é possível onde o regime político repousa na maioria”,
isto é, onde há liberdade. Conclui Fragoso: “as tiranias dificilmente podem
ter inimigos ilegítimos” (Heleno Fragoso — A Lei de Segurança Nacional,
in Encontros com a Civilização Brasileira, nQ2, 1978, págs. 229 e segs.).
E preciso assinalar que os crimes polítiro.s.nàn—ahrangem os-crimes
anti-sociais, nem os crimes ou atentados contra a vida de chefes de Estado.
Os crimes anti-sociais17A são aqueles praticados por
se distinguem dos crimes políticos, porque enquanto estes visam a destrui­
ção de determinada fornia de governo, aqueles visam a destruição de
qualquer governo, visam destruir a “organização social comum aos Estados
civilizados” (Accioly).18 Na verdade, esta distinção nem sempre é fácil, e
Manzini assinala que Cristo poderia ser considerado criminoso, uma vez
que era um revolucionário social. Entretanto, a distinção é tida como válida
e os autores de crimes anti-sociais são passíveis de extradição. Alguns
autores tentam aí incluir o terrorismo. Na verdade, todo crime anti-social
é crime político. Os autores mais modernos fião mencionam esta categoria
de crime anti-social.
Os autores de crimes e atentados contra chefes de Estado também são
passíveis de extradição. E a denominada cláusula belga, ou cláusula do
atentado, incluída nos tratados de extradição. A sua origem esta em um
atentado contra Napoleão III, cujo autor se refugiara na Bélgica, e que os
tribunais negaram a extradição. Em 1856, uma lei belga declara que “não
será considerado delito político, nem conexo com ele, o atentado contra
a pessoa do chefe de um governo estrangeiro ou membros de sua família”.
A partir de então ela passou a figurar nos tratados de extradição. A esta
cláusula tem sido feita a crítica de que ela faz a entrega apenas de crimi­
nosos de pessoas importantes (chefes de Estado). A legislação brasileira
sobre extradição apresenta, ao lado dos atentados contra chefes de Estado,
os contra “qualquer pessoa que exerça autoridade” (Decreto-lei ns 941,
de 1969, e Lei n9 6.815, de 19-8-80).19
Não são equiparados aos criminosos políticos os criminosos de guerra,
os autores de genocídio è crimes contra a paz. Tais criminosos são passíveis
de extradição, porque tais crimes não têm Uma criminalidade relativa, pelo
contrário, eles são violações de normas internacionais. A doutrina neste

990
sentido é unânime: Graven, De Vabres. As Convenções de Genebra de
1949 (sobre prisioneiros de guerra, proteção dos civis em tempo de guerra,
melhoria da sorte dos feridos e enfermos dos exércitos em campanha e
melhoria da sorte dos feridos, enfermos e náufragos das Forças Armadas
no mar) obrigam os Estados a processar criminalmente os ditos criminosos
ou a extra di tá-los. A Convenção de 1951, que fixa o estatuto dos refugiados,
estabelece que a convenção não se aplica: às pessoas que cometeram crimes
contra a paz, crime de guerra, crime contra a humanidade e atos contrarios
aos fins e principios da ONU, etc. O caso mais recente sobre esta materia
é o General Pinochet (1998-1999) acusado de crime contra a humanidade
praticado a espanhóis no Chile. Pinochet encontrava-se na Inglaterra, em
tratamento médico, quando a Espanha solicitou a extradição. A Câmara
dos Lordes decidiu que só a daría por crimes praticados após a conclusão
do tratado de extradição entre Espanha e Inglaterra, .que é relativamente
recente.
Não se dá a extradição de crime político conexo. O crime comum é
absorvido pelo crime político. A extradição pela lei brasileira só se dará
quando o crime comum for o principal e o político o acessório (Decreto-lei
n9 394, de 1938, Decreto-lei na 941, de 1969, e Lei nfi 6.815, de 1980). Este
último procedimento é o que alguns têm denominado de cláusula suíça,
vez que foi formulado na lei suíça de 22-1-1892. Existe urna tendencia de
se assimilar o crime complexo ao crime político quando este também existe
e não se dar extradição (Leopoldo Braga).19A
A Convenção européia de 1957 permite ao Estado requerido denegar
a extradição quando considerar que o pedido fundamentado em um crime
comum visa “punir um individuo por consideração de raça, de religião,
de nacionalidade ou de opinião”. A convenção interamericana sobre asilo
territorial (1954) não admite a extradição quando “for solicitada, obede­
cendo a motivos predominantemente políticos” (art. 49).
E mais fácil dizer o que não é crime político do que definir este.
c) Diversos outros delitos não sujeitam os seus autores a extradição:
crimes de imprensa, crimes contra a religião, delitos de caça e pesca, etc.
O Brasil não concede a extradição “quando a lei brasileira impuser, ao
ilícito, pena de prisão igual ou inferior a um ano...”.
No Brasil a Lei ne 6.815, de 19-8-1980, estabelece que pode não ser
considerado crime político: a) atentados a autoridades; b) sabotagem; c)
terrorismo; d) seqüestro de pessoas; e) propaganda de guerra ou de pro­
cessos violentos para subverter a ordem política ou social.
358A. Deixamos para estudar o íerrorismo'lem separado tendo em vista
a ^relevância que este crime tem adepairide:—

i político U " nosso seculo é aqueie da técnica terrorista", escreveu üertrana


dejouvenel (De la Politique Puré, 1977). Segundo Ignacio Ramonet (Guer-
re Totale Contre un Périh Diffus, “in” Manieré de Voir 61, Novembre —
Decembre 2001), o primeiro a propor uma teoria do terrorismo foi o

991
alemão Karl Heizen, em “Der Mord” (O assassinato), em 1848, para quem
tudo valia para se chegar à democracia.
A grande preocupação atual é com o terrorismo político, vez que o
praticado sem este tipo de finalidade é punido pela legislação penal co­
mum. Por outro lado, o terrorismo é algo eminentemente político e po­
demos dizer que a expressão “terrorismo político” é atualmente um pleo­
nasmo não somente porque ele visa fins políticos, bem como porque a
política dos governos entra nos mais diversos recantos da vida social. Qual­
quer ação acaba por interessar e atingir o Estado.
Parece que a primeira vez em que o terrorismo foi utilizado com o
arma de conquista d op o d er foi no século XI, na Pérsia, onde Hassan Ben
Sabbah fundou, em 1090, uma sociedade secreta denominada Hashishins.
Pertencia à seita dissidente dos ismailis, que era uma das duas maiores
facções guerreiras do Islame, tendo a sua maior base na Pérsia.
Alguns consideram que o seu nome veio do narcótico “hashíshi”, que
eles fumariam. Outros acham que esta palavra significa apenas os hábitos
bizarros da seita. Eles formavam uma irmandade que usava da agitação
popular e do segredo. Para uns esta sociedade teria sido a pnmjyra_ex;
pressão da nacionalidade persa, enquanto outros consideram-qiifi_era uma
defesa dosj gnliores-feudais lunlid a cenlialização.196 Outros autores (Wal-
ter Laqueur) viram manifestação do terrorismo anterior aos hashishin, nos
“sicarii”, uma organização religiosa que atuou na guerra da Palestina (66-73
d.C.). Ernest Renán (Vida dejesus, s.d.) escreve: “os ‘zelotes’ ou ‘sicários’,
assassinos frios que se obrigavam a matar todo aquele que na sua presença
não respeitasse a lei (mosaica)...”. De qualquer modo o terrorismo só
começou a ser utilizado de modo sistemático na segunda metade do século
X IX . O terrorismo foi introduzido no anarquismo por Nechaev, com o
livro “ Catecismo do Revolucionário” (1869), onde defende que o indivíduo
para ser revolucionário não deve ter piedade, que influenciou Bakunin.
O terrorismo vai ser usado pelos revolucionários russos que lutam contra
os czares. Em 1906 o Partido Operário Social-democrata Russo estabelecia
que: o partido deve reconhecer as ações militares dos guerrilheiros; elas
devem visar a destruição dos aparelhos governamental, militar e policial;
são permitidas as ações armadas para a captura de meios financeiros per­
tencentes ao adversário e as ações militares dos guerrilheiros devem ser
controladas pelo Partido (Moniz Bandeira — Lênin, 1978).
A palavra terrorismo vem do latim “terrere” (tremer) e “deterrere”
(amecTrontar), «Tparece que começou a ser usada na França no período
da Revolução e daí passada ao inglês. A palavra terrorismo foi usada em
1798 pela primeira vez, no suplemento do Dicionário da Academia Fran­
cesa, se referindo ao regime que houve na França entre setembro de 1793
e julho de 1794 (Geneviève Brisac). Parece que a palavra terrorismo surgiu
pela primeira vez no mundo jurídico, em 1930, em Bruxelas, durante
reunião da Conferência Internacional para a Unificação do Direito Penal.
Raymond Aron define ação terrorista com o aquela cujos “efeitos psi­
cológicos são desproporcionais ao seu resultado físico”. Ou então a defi­

992
nição de Levasseur: “é o emprego intencional e sistemático de meios de
modo a provocar o terror visando a atingir certos fins”. Podemos fornecer
mais algumas definições dadas pelos doutrinadores, vez que não há urna
que lenha aspecto “legal”. Para W. Laqueur “terrorista político é alguém
que sistematicamente faz uso de assassinato, causa ferimentos, destruição
e outros meios de intimidação coercitiva visando a objetivos políticos”.
Para L. Dispot é aquele “que faz política, matando”. L. Banker, B. Miller
e Ch. Russell definem terrorismo como a “ameaça de uso ou uso da
violencia ou força para atingir um fim político por meio do aumento do
medo, a coerção e a intimidação”. Para Richard Falk é “qualquer forma
de violencia política sem uma adequada justificação moral e legal”. Para
Paul Wilkinson “ é o uso sistemático do assassinato, 9 o dano e a destruição,
ou a ameaça deles, para criar um clima de terror, a fim de dar publicidade
a urna causa, e de intimidar um setor piáis ampio que satisfaça os objetivos
dos terroristas”. A. Sottile o define como “o ato criminoso perpetrado pelo
terror, violência, uma grande intimidação, visando a um fim determ inado”.
Para J. Waciorski “o terrorismo político é um método de ação delituosa
pelo qual o agente procura impor pelo terror sua dominação à sociedade
ou ao Estado para conservar, transformar ou destruir os vínculos sociais
de ordem pública”. Para Bassiouni é uma estratégia ideologicamente mo­
tivada de uma forma proibida de violência para inspirar terror em um
segmento de uma determinada sociedade para criticar algo realizado pelo
poder ou fazer propaganda de uma reivindicação e os seus autores agem
em seu próprio nome ou do estado.
O terrorismo em sua forma moderna é europeu e surgiu com a Revo­
lução Francesa.
Tem sido observado que o terrorismo atualmente é mais violento e
que os Estados não se entendem para a sua repressão.
O terrorismo tem as seguintes características: a) imprevisível e jtfbitrá-
rio; b) a vítima não tem meios cfê evitar^ e)_é am oral nõ sentido de que
não leva em consideração argumentos humanitários (v. a distinção entre
guerrilheiro e terrorismo no capítulo Guerra Civil).
Alguns autores (H. Fragoso) consideram o terrorismo sempr.e um fato
político, enquanto outros (Wilkinson) também admitem caso de terrorismo
como crime comum.
O terrorismo pode ser tanto do governo com o daqueles que contestam
o governo. O praticado pelas entidades governamentais consiste 110 uso
de terror com a finalidade de obter um determinado comportamento.190
Ele está submetido às mesmas características apontadas acima e é
praticado por serviços especializados e no início visam apenas os contes­
tadores, posteriormente a minorias e finalmente o terror vira-se contra os
“próprios revolucionários” (Wilkinson).
De qualquer rríodo, é como escreve Raymond Aron: “A partir de um
certo ponto, subversão e repressão arriscam entrar uma e outra no círculo
infernal do terror propriaménte político.” Bertrand de Jouvenel salienta

993
que “levar as autoridades a baler em testemunhas inocentes é o ponto
essencial da estrategia terrorista. Sua eficácia consiste principalmente em
provocar cóleras cegas e respostas desastradas7’ . Robert Schmelck afirma
que o terrorismo cría uma armadilha para as democracias, porque para
combaté-lo os Estados acabam por abandonar os valores da democracia.
É de se recordar que nem todos os revolucionários são favoráveis ao
terrorismo. Lênin e Guevara não o aceitavam. O primeiro sustentando que
“atos individuais de terrorismo... apenas criam alguma sensação durante
pouco tempo, mas a longo prazo acabam levando a uma apatia e à espera
passiva de mais uma sensação”. O segundo considerando que ele impede
“o contato com as massas e torna impossível a unificação para ações que
serão necessárias em um momento'crítico” . Entretanto Trotsky considerava
que o “Terror vermelho era apenas a continuação da insurreição arm ada”
e não se diferenciava desta. Para ele “o terror é eficaz contra a classe
reacionária que não se decide a abandonar o campo de batalha”, ou,
ainda, “a intimidação é o meio mais poderoso de ação política” (León
Trotsky — Terrorismo e Comunismo — O anti-Kautsky, 1969). Pode-se
recordar que Trotsky, antes dos bolchevistas subirem ao poder, escreveu
um livro contra o terrorismo. Debray sustenta que o terrorismo na cidade
tem a vantagem de aí imobilizar milhares de soldados. G. Plejánov observa
que o terrorismo “não é um meio de luta proletária”, porque o terrorista
é individualista.
Podemos fazer ainda algumas considerações sobre o terrorismo no
sentido de que ele visa “vedetizar” um determinado fato, chamando a
atenção da opinião pública para aquilo que ele defende (Maurice Denu-
ziére). Ele é urna “forma de comunicação de massa” (D. Fromkin). O
terror (praticado pelo governo) visa “à indiferença, à resignação e à apa­
tia”, enquanto o terrorismo (praticado pelos que se revoltam) visa “tirar
as massas de sua apatia e as lançar na resistência” (Friedrich H acker).,9U
A grande característica do terrorismo m oderno é a sua internacionalização,
existindo redes internacionais-e uma conexão entre os terroristas mesmo
que eles visem sfins diferentes (Pierre Lellouche). O terrorismo é a forma
mais violenta de gueixa psicológica (Gérard Chaliand).
Do ponto de vista das vítimas dos seqüestros há com o passar dos dias
uma identificação com os seqüestradores. E a síndrome do Estocolmo
surgida em 1974 quando úíü ladrão de banco manteve uma bancária sob
seqüestro e acabou por surgir um idilio entre eles.
Algumas outras observações podem ser acrescentadas com fundamento
em Bertrand Badie e- Guy Hermet (Politique Comparée, 1990): a ) o ter­
rorismo é um modo dfc agir pré-revolucionário quando o regime é pluralista
e é difícil a mobilização revolucionária. A sua finalidade é uma tomada de
consciência. No caso dos regimes autoritários, visa mostrar a sua fragilidade;
b) o terrorismo apresenta uma outra legitimidade, que pode ser ideológica
ou étnica; c) faz com que a ação política perca a sua legitimidade, vez que
ele atua fora dela.

994
No plano jurídico internacional a primeira convenção para a preven­
ção e repressão do terrorismo foi concluida em Genebra em 1937. Ela
definiu “atos de terrorismo” como sendo os fatos criminosos dirigidos
contra um Estado e cuja finalidade ou natureza é “provocar o terror em
determinadas personalidades, grupos de pessoas ou no público”. Os Esta­
dos se obrigam a punir tais crimes, bem com o a extraditar os criminosos
se for o caso. Esta convenção só foi ratificada pela India.
Atualmente o terrorismo volta a constituir uma preocupação na ordem
jurídica internacional, principalmente em duas modalidades: o seqüestro
de diplomatas e o apoderamento ilícito de aeronaves (v. capitulo Espaço
Aéreo).
A grande preocupação nos textos internacionais é não considerar os
autores destes crimes como criminosos políticos e, por conseguinte, não
os beneficiando do direito de asilo.
Em 1971, a\OEA\aprovou convenção para a prevenção e repressão de
atos de terrorismo, que é considerada com o crime de interesse interna­
cional. São irrelevantes para a caracterização do fato como crime os fins
com que ele foi praticado. E considerado crime todo atentado à vida ou
à integridade física de pessoas às quais o Estado deve dar uma proteção
especial conforme o DI (por exemplo, diplomata).
Em 1973, foi concluída convenção, semelhante à anterior, n alp N U '
visando a prevenção e a repressão das infrações contra pessoas se DeTíéfP
ciando de uma proteção internacional, ai compreendidos os agentes di­
plomáticos. Ela protege os chefes de Estado, representante, funcionário
ou personalidade oficial, etc. São protegidos também os locais oficiais, o
domicilio privado e seus meios de transporte. E considerado crime o
assassinato, o seqüestro, ataque à sua liberdade, a ameaça, a tentativa, a
cumplicidade, bem como atos contra os locais oficiais, a moradia ou os
meios de transporte. O Estado deve punir o crime praticado no seu terri­
tório, em navios e aeronaves nele registrados, ou que têm a sua naciona­
lidade. Os Estados devem cooperar para prevenir tais infrações. O Estado
que não extraditar o criminoso deve puni-lo. A convenção é considerada
como fundamento para a concessão da extradição para os Estados que
consideram necessário um tratado a fim de que a extradição seja concedida.
Em 1977 o Conselho da Europa concluiu convenção para a repressão
ao terrorismo. Considera terrorismo: a) as infrações definidas na conven­
ção de Haia (1970) para a repressão ao apoderamento ilícito de aeronave;
b) as infrações definidas na convenção de Mon treaí (1971) para a repressão
de atos ilícitos dirigidos contra a segurança da aviação civil; c) a tomada
de refém ou seqüestro arbitrário; d) atentado contra pessoa que tem pro­
teção diplomática; e) utilização de bombas, granadas, etc.-, que acarrete
perigo para as pessoas. Este crime não é considerado crime político, e o
Estado deve conceder a extradição. Esta convenção não foi bem recebida
pela opinião pública européia, vez que, ao se despolitizar um crime,'ameaça
o direito de asilo. A convenção tem um dispositivo que permite às partes

995
de não considerarem delito político “ todo ato de violência dirigido contra
a vida, a integridade corporal ou a liberdade das pessoas ou contra os
bens”. Chauvy menciona ainda no âmbito europeu uma convenção para
a repressão ao terrojnsjno, concluída em Dublin, em 1979, entre os países
da CEE.
Atualmente, dentro da prática há mais um crime que não será consi­
derado crime político: o da tomada de refém. A Assembléia Geral aprovou
uma convenção sobre esta matéria em 1979, que proíbe a tomada de
reféns. Os Estados devem cooperar para prevenir a prática deste crime.
Ele é considerado um crime comum e o seu autor deve ser extraditado, a
não ser que haja suspeita de que vai sea-punido por motivo de raça, religião,
nacionalidade e opinião política. A convenção não se aplica quando se­
qüestrador, seqüestrado e local do seqüestro são nacionais de um único
Estado. O crime é definido como sendo aquele em que “alguém se apodera
de uma pessoa ou a detém e ameaça de a matar, de a ferir ou de continuar
a detê-la a fim de constranger um terceiro, isto é, um Estado, uma orga­
nização internacional intergovemamental, uma pessoa física ou moral ou
um grupo de pessoas, a realizar um ato qualquer ou a se abster como
condição explícita ou implícita para a liberação do refém”. E punida a
tentativa e a cumplicidade.
Ao lado dos textos internacionais os Estados têm promulgado leis
internas, como, em 1976, ocorreu nos EUA com o Act for the Prevention
and Punishment o f Crimes Against Internationally Protected Persons.
A tendência é não se considerar o terrorismo como crime político,
mas como isto só tem ocorrido em tratados internacionais específicos,
ainda resta um grande campo livre para os Estados, inclusive porque muitos
ainda não ratificaram tais tratados. E de se lembrar que estando o mundo
dividido em ideologias opostas há ainda a possibilidade, bastante ampla,
de se negar a extradição nestes casos. O terrorismo é hoje uma realidade,
sendo que alguns (John Murphy) constatam que não se fala mais em
eliminá-lo, mas em controlá-lo. Outros, com o Hermán Khan, criticam o
que estaria ocorrendo atualmente: uma aceitação romântica do terrorismo.
Segundo a CIA houve, entre 1968 e 1976, 1.-152 atos de terrorismo
internacional, assim divididos: Europa Ocidental (451), América Latina
(317), Oriente Próximo e África do Norte (132), América do Norte (131),
Ásia (54), África do Sul do Saara (41), URSS e Europa do Leste (19),
Austrália e Pacífico (6). Habermas observa que o terrorismo se manifesta
de modo mais grave na Alemanha, Itália e Japão, porque estes países têm
culturas políticas menos estáveis. Acrescenta o pensador alemão: “o terro­
rismo não é um fenômeno irracional... à sua maneira (é) uma tentativa
de reafirmar o momento político diante da pura administração” (Jurgen
Habermas ■— Crise da Democracia, in Encontros com a Civilização Brasi­
leira,n 2 8, fevereiro de 1979, págs. 133 e segs.).
A personalidade do terrorista tem sido apresentada pelos autores como
possuindo um élemento profético e um elemento autodestrutivo; pertence
à família, da classe média, é jovem, geralmente homem e economicamente
marginal.
No Brasil os atos de terrorismo são considerados crimes contra a
segurança nacional.
Em setembro de 2001 o CS aprovou resolução condenando o terro­
rismo. Condena o finaciamento de atos terroristas e os estados devem
tomar medidas para preveni-lo. Os estados devem cooperar nas investiga- ■
___jçrçòes. O terrorismo não tem “status” de asilado ou de refugiado. Esta
resolução se fundamenta no Capítulo VII, o que permite o uso de força
contra o estado que não cumprir o aprovado.
359. Hildebrando Accioly resume as seguintes condições para a con­
cessão da extradição: a)--Jugar da infraçãcfr-— o indivíduo em Tegia geral
¿ extraditado para o Esjado em cujo térrítório tenha praticado-a.delito^...
contudõT riãcla impede internacionalmente que um Estado dê a extradição
de um criminoso por ato praticado no seu território (o indivíduo que
falsifica moeda de Estado estrangeiro pode ser para ele extraditado); b)
que Q_xri[ne seja punido nos Estados requeren tese requeridos (,princípio ‘
dâJdentidEidfe); c) que o indivíduo não vá ser julgado por um tribuñaT'de''
exceção;20 d) que o crime não tenha sido julgado no. Estado requerido.
Esta condição visa resguardar o princípio que condena o “bis in idem”,
isto é, evitar que o indiwluo_sej^j^gado_c]^as vezes_gelo jxie_smo crirne
(art. 9S, da Convenção Européia de 1957). Em 1990 o STF negou a extra­
dição de uma argentina, vez que ela estava sendo julgada pelo mesmo
. crime no Brasil (narcotráfico). E preciso esclarecer que ninguém pode ser
julgado duas vezes pelo mesmo crime na mesma jurisdição. Não se dá a
extradição quando houver a prescrição do crime. Três correntes existem:
a) a lei do Estado requerente; b) a lei do requerido; c) admite ambas as
leis para a caracterização da prescrição. O Brasil adota este último critério,
negando a extradição se o crime está prescrito por qualquer uma das leis.
Pode-se ainda acrescentar que a convenção, concluída sob os auspícios da
ONU, em 1984, para a repressão à tortura proíbe a extradição, devolução
ou expulsão se houver suspeita de que o indivíduo será torturado. A
convenção de 1985, concluída no âmbito da OEA, sobre o mesmo tema,
também proíbe a extradição e expulsão no caso acima.
No Brasil a concessão da extradição está submetida a uma regulamen­
tação detalhada na Lei n2 6.815, de 1980, onde se estabelece que o Estado
estrangeiro terá de computar o tempo de prisão do extraditado no Brasil.
Determina ainda que após ser concedida a extradição, se o estrangeiro
fugir e se homiziar no Brasil, a sua entrega será feita mediante pedido por
via diplomática sem maiores formalidades. Este procedimento já constava
do tratado Brasil e EUA de 1961.
360. A doutrina e a prática de um modo geral têm sustentado a
retroatividãde dos tratados de extradição, isto é, o tratado se aplica aos
indivíduos que se tiverem refugiado no território dos Estados contratantes
antes de sua conclusão. O Brasil sempre aceitou este princípio.

997
Se na prática a questão parece estar resolvida, no campo doutrinário
ela não nos parece ser a mais correta Duas razões em favor da irretroati-
ividade dos tratados de extradição21 podem ser alegadas: a) não existe
qualquer direito e dever de extradição antes da conclusão do tratado; b)
os tratados podem ser concluídos com endereço certo, isto é, apenas para
atingir determinado indivíduo. A própria prática internacional registra
alguns casos em que se sustentou a irretroatividade do trata to de extradição,
como ocorreu com a Argentina, que se recusou em entregar Beckmann
ao Brasil em 1879 Na verdade, a Argentina na sua história diplomática
registra tratados com a Bolívia e o Uruguai, consagrando a não retroativi-
dade.21A
361. A preferencia entre os pedidos de extradição é geralmente con­
sagrada em tratados e leis internas: uns dão preferência ao Estado de que
o indivfduo é nacional, outros, ao Estado em que o crime foi praticado As
• normas estipuladas em tratados prevalecem sobre os dispositivos legais.
O Decreto-lei n9 390 tratava do assunto no seu art. 6S, o Decreto-lei
ns 941, de 1969, no art. 90, e o art. 79 da Lei n9 6.815 de 1980 estabelecem
que, quando mais de um Estado requerer a extradição do mesmo indivíduo
por um mesmo fato, será dada preferência ao pedido do Estado em cujo
território foi praticada a infração. Se os fatos que fundamentam os pedidos
de extradição forem diferentes, terá preferência “o que versar sobre a
infração mais grave, segundo a lei brasileira”. Se a gravidade for igual,
será dada preferência ao Estado que primeiro apresentou o pedido de
extradição. Se estes foram apresentados simultaneamente, a preferência
será do Estado em que o indivíduo for nacional. Se ele não for nacional
de nenhum dos Estados que solicitam a extradição, será dada preferência
ao Estado em que ele tem o seu domicílio. Nos demais casos o govemo
decide a quem cabe a preferência.
362. No Brasil, é o Poder Executivo o competente para solicitar a
(extradição de um indivíduo a Estado estrangeiro.
Õ pedido de extradição apresentado por um Estado estrangeiro segue'
os seguintes trâmites: ele é apresentado por via diplomática ou de governo
a governo. O órgão encarregado de recebê-lo é o Ministério das Relações
Exteriores, que o envia ao Ministério da Justiça que elabora o Aviso Mi­
nisterial.de Solicitação de Medida da Extradição ao STF,22 que decide sojbre
a legalidade do pedido sem, entretanto, apreciar o mérito.23 O.STF apre­
ciará a legalidade do pedido ainda no caso de o indivíduo não se opor à
sua extradição. Cabe ao Poder Executivo decidir da extradição ou não de
um indivíduo. O STF “poderá deixar de considerar crimes políticos os
atentados contra chefes de Estado ou quaisquer autoridades, bem assim
os atos de anarquismo, terrorismo, sabotagem, seqüestro de pessoa, ou
que importem propaganda de guerra ou de processos violentos-para sub­
verter a ordem política ou social”. Ele pode recusar mesmo quando o STF
tenha declarado a legalidade e procedência do pedido.24
Não cabe recurso da decisão do STF e tem-se admitido apenas embar­
gos de declaração.
A doutrina (Anor Buüer Maciel) tem afirmado que a extradição no
Brasil é um ato -misto, isto é, judiciário e administrativo. Entretanto, é o
Executivo que tem atuação decisiva.
Foi a Bélgica que introduziu o controle judicial no processo de extra-
dioão. Cada Estado cria o seu próprio processo. Nos EUA existem dois
procedimentos concomitantes: a) é apresentado o pedido de extradição
fundamentado em tratado no Departamento de Estado; b) é iniciado um
processo na Federai District Court do local em que o indivíduo se encontra.
Os processos serão independentes, e só se concede a extradição quando
os dois poderes concordam. Nos EUA a extradição é medida judicial,
enquanto o asilo pertence à órbita do Poder Executivo.

999
NOTAS

1. (V. as obras citadas no Capítulo X X X I I); J . Saint-Aubin — L ’extradition et


le droit extraditionnel, 2 vols., 1913; Paul B ernard — Traité T héorique et Pratique
de l’Extradition, 2 vols., 1890; Ludovic B eau ch et — Traité de l’E xtrad itiorv 1899;
Bento de Faria — Sobre o Direito Extradicional, 1930; A m oine So ttile — Le
terrorisme international, in RdC, 1938, vol. III, t. 65, págs. 91 e segs.; A lberic Rolin
— Quelques questions relatives à l’estradition, in RdC, 1923, t. I, págs. 181 e segs.;
Gilda Maciel Correa Meyer Russomano — Aspectos da Extradição n o Direito
Internacional Público, 1960; A. Billot — T raité de I’Extradition, 1874; G. E. do
Nascimento e Silva — Deserção de tripulantes, in BSBDI, janeiro-d ezem bro, nes
19 e 20, 1954, págs. 22 e segs.; André M ercier — L ’extradition, in RdC, 1930, vol.
III, t. 33, págs. 171 e segs.; Pierre A. Papadatos — Le Délit Politique, 1954; A nor
Buter Maciel — Extradição Internacional, 1957; Arthur Briggs — E xtrad ição, 1909;
idem — Extradição de Naci'onais e Estrangeiros, 1919; C. Lom broso e R. Lasçhi
— Le Crime P olitiq u e'et les Révolutions, 2 vols., 1892; René Rodiére — Le Délit
Politique, 1931; Jerzv Waciórski — Le T errorism e Politique, 1939; C oelho Rodri­
gues — A Extradição, vols. I e III, 1930-1931; Procion S. Papathanasiou — L ’Ex-
tradition en M atiére Politique, 1954; International Criminal Law — Editado por
Gerhard O. W. M ueller e Edward M. Wise, 1965, págs. 442 e segs.; Dionisio Anzilotti
— II principio delia specialitá dell’estradizione e il diritto interno italiano, in Studi
di Diritto Processuale Internazionale e di Filosofía del Diritto, vol. IV, 1962, págs.
477 e segs.; idem — Estradizione in Transito e Diritto d’Asilo, in Scritli di Diritto
Internazionale Pubblico, t. II, vol. II, 1957, págs. 205 e segs.; L eopoldo Braga —
Direito Extradicional, in Revista de D ireito, n s 10, 1970, págs. 15 e segs.; Jo ã o
Mestieri — Crim e Político, in Estudo das Transform ações da Ordem Política (C.
A. Menezes D ireito, Celso Mello e jo ã o M estieri), 1971, págs. 99 e segs.; P. Aymond
— Extradition, in Dalloz — Encyclopédie Ju rid iq u e — Répertoire de D roit Inter­
national, t. I, 1968, págs. 808 e segs.; V incent Goussirat-Coustére e Pierre-M ichel
Eisemann — L ’enlévem em ent de personnes privées et le droit international, in
RGDIP, Avril-Juin 1972, ns 2, págs. 346 e segs.; M. C h erif Bassiouni — International
Extradition and W orld Public order, 1974; Paul Wilkinson — Political T errorism ,
1974; Charles Atala e Ethel Groffier — T erro rism e etguérilla, 1974; M ario Sbriccoli
— Crimen Laesae Maiestate, 1974; M anuel A. Vieira — Tres Aspectos Fundam en­
tales en la E xtrad ición; la nacionalidad del requ erid o, la prescripción y el principio
de la doble incrim inación, in Anuario do IH LA DI, vol. 4, 1973, págs. 241 e segs.;
Mariana H erescu — O Princípio de N ão-Extradição por Crime P olítico, in Revista
de Ciência Política, vol. 18, número especial, abril, 1975, págs. 79 e segs.; David
Fromkin — T h e Strategy o f Terrorism, in Foreign Affairs, July, 1975, vol. 53, n°
4, págs. 683 e segs.; H oracio Daniel Piom bo — Extradición de N acionales, 1974;
José Francisco Rezek — Perspectivas do R egim e Ju ríd ico da Extradição, in Estudos
de Direito Público em Homenagem a A liom ar Baleeiro, 1976, págs. 2 3 3 e segs.;
Antony Burton — U rban Terrorism, 1975; Friedrich Hacker — T e rre u r et T er­
rorisme, 1976; T e d Banks — Possible Legal Solutions to International Terrorism ,
in Revista da Faculdade de Direito da Universidade Federal de M inas Gerais,
outubro de 1975, págs. 203 e segs.; Suprem o T ribunal Federal — Extradições.
Julgam ento e Legislação Brasileira, 1976; U lpiano López (La E xtrad ición en el
Sistema Interam ericano) e Isidoro"Zanotti — Extradición, Convenciones Regiona­

1000
les Europeas. Convenciones de Carácter Mundial y Proyectos que con tien en Dis­
posiciones sobre la Materia, in T ercer Curso de Derecho Internacional, organiza­
do pelo C o m ité J u r íd ic o Interam ericano (ju n h o -a g oslo de 1976), 1977, r e sp ec ti­
vam en te, págs. SOI e segs. e 335 e segs.; G ilberi Guillaume e G eorges Levasseur
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Jurídico da Extradição, in Relações Internacionais, n9 1, janeiro-abril 1978, págs.
39 e segs.; A. Dardeau de Carvalho — Situação Jurídica do Estrangeiro no Brasil,
1976, págs. 133 e segs.; Eric Hobsbawn — Humanismo e Barbarie: Terrorism o
neste Final de Sécu lo, in Encontros com a Civilização Brasileira, n s 1, 1978, págs.
23 e segs.; H aroldo Vailadão — Problem as Ju ríd icos Penais Atuais do Terrorism o,
in BSBDI, janeiro-dezem bro, 1972-74, n9s 55/60, págs. 7 e segs.; J o h n F. Murphy
— Control o f Terrorism in International Life; Cooperation and S elf Help, in
American Society o f International Law Proceed ing o f lhe 71st A nnual Meeting,
April 21-23, 1977, págs. 17 esegs.; A ntonio Filippo Panzera — Attivitá Terroristiche
e Diritto Internazionale, 1978; Walter L aqu eu r — Terrorismo, 1977; W. D. Vervvay
— The International Hostages Convention and National Liberatio Movements, in
AJIL, January 1981, vol. 75, n9 1, págs. 69 e segs.; Jo sé Pablo L óp ez— El Terrorism o
Europeo, 1978; A lberto Ronchey — Guns and Gray Matter; Terrorism in Italy, in
Foreign Affairs, Spring, 1979, págs. 921 e segs.; Paul Wilkinson — Terrorism and
The Liberal State, 1977;Jean Servier — L e Terrorism e, 1979; Irving Louis Horowitz
— Political Terrorism and State Power, in G eorge Kourvetaris e Betty Dobratz —
Political Sociology, 1980, págs. 263 e segs.; Alain Geism ar— L ’engrenage terrorista,
1981; H eleno Fragoso — Terrorism o e Criminalidade Política, 1981; Ghislaine
Fraysse-Druesne — La Convention E u ro p éen e pour la répressión du terrorisme,
in RGDIP, t. 82, 1978, vol. 4, págs. 669 e segs.; Horácio Daniel Piom bo — Teoría
General del D erecho Extradicional e G eraldo Eulálio do Nascim ento e Silva —
O Direito Internacion al e o Terrorism o, am bos in Séptimo Curso de D erecho
Internacional, organizado pelo Comité Ju ríd ic o Interamericano (agosto de 1980),
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Rolin — Le Conseíl d ’État, Ju g e de L ’Extradition, 1999; Carmen Tiburcio e Luís
Roberto Barroso — Algumas Questões sobre a Extradição no Direito Brasileiro,
“in ” Revista Forense, vol. 354, pgs. 83 e segs.
2. A extradição se desenvolveu com o respeito à soberania dos Estados estran­
geiros e a abolição do direito de caça (um Estado prender um criminoso dentro
do território estrangeiro). »
3. O tratado entre Carlos V da França e o Conde de Savóia (1376) tem sido
apontado como o primeiro texto internacional em que a extradição surge com a
finalidade de reprimir a crim inalidade comum. Q uintano Ripollés acentua ser
uma “exceção no panorama histórico da Europa”.
4. Para se dar um exem plo do grau de “ pragmatismo” de que estavam imbuídos
os tratados de extradição, basta dizer que num tratado de 1804, entre Prússia e
Rússia, a primeira potência m encionada tentou incluir um a cláusula em que se
estipulava a extradição de cavalos.
5. Em 1765, um tratado, entre Carlos III de Espanha e Luís XV da França,
previa a entrega de desertores, mas acima de tudo visava a entrega de criminosos
comuns.
6. A palavra extradição em francês parece ter sido empregada pela primeira
vez em um decreto do governo (1791) e em uma nota do Príncipe Czartorisky
(ministro russo) em 1804. As palavras utilizadas anteriorm ente para designar a
entrega de criminosos eram: “ deditio” , “remissio” e “intercum ”. O termo extra­
dição parece se originar do latim “ ex traditione” ,1sto é, “ traditio extra territorium”
(Pessina). Outros sustentam que ela historicamente se prende ao fato de que
derroga a tradição, isto é, o asilo (Bassiouni). Em textos internacionais foi usada
pela primeira vez em 1828. O prim eiro tratado m oderno de extradição foi o de
1736, entre a França e os Países Baixos, que previa a entrega dos criminosos e
fazia uma lista dos crimes (M anuel Adolfo Vieira).
7. V. Capítulo X X X II.
8. Poucos autores (Blunlschli, Calvo) tentaram fundam entar a extradição em
obrigações de origem extracontratual.
8A. O seqüestro de um crim inoso em outros Estados, isto é, sem que seja
respeitado o instituto da extradição (caso Eichm an), apresenta uma série de vio­
lações do DIP: direitos do indivíduo e de soberania do Estado. Entretanto, apesar
dele ter sido conduzido ilegalm ente, o Estado pode julgá-lo. E o aforismo: “male
captus bene detentus”. Neste sentido está a jurisprudência norte-americana. A
própria prática internacional não condena tais atos. Contudo, a prisão deve ser
feita dentro da lei, e convenções internacionais de direitos do homem falam no
direito à liberdade e à segurança. Em 1989 o Congresso dos EUA aprovou uma
lei autorizando os representantes das autoridades americanas a prender em qual­
quer parte do mundo qualquer estrangeiro perseguido pela ju stiça americana. Em
1992 a Corte Suprema dos EUA decidiu que as autoridades norte-americanas
podiam seqüestrar estrangeiros n o exterior que estivessem envolvidos em tráfico

1002
de drogas. Houve protesto de varios países latino-am ericanos, com o o Brasil e o
M éxico. Anteriormente, o principio “mala captus bene detentus" era aplicado aos
seqüeslros realizados por particulares e geralmente com a mesma nacionalidade
do seqüestrado. A doutrina e a jurisprudência condenavam quando realizado por
autoridades governamentais. Esla prática deve ser abolida vez que viola a soberania
e os direitos do homem, com o o direito à liberdade, direito de não sofrer prisão
arbitrária. Tem sido admitido o seqüestro de um crim inoso que se encontra em
águas internacionais com a finalidade de julgá-lo. E o “Yunis case", vez que Yunis
estava em um iate em águas internacionais e tinha sido o responsável pelo seqüestro
de uma aeronave jord aniana em que morreram cidadãos norte-americanos. Assi­
nala Bassiouni que o aforismo “ mala caplus bene detentus” viola “ ex injuria ju s
non orítus” e também que só se recorre a medidas extraordinárias quando as
ordinárias falham. Nos EUA esta doutrina também é conhecida pelo nom e de
d outrina Ker — Frisbie — M achain. Os norte-americanos consideram que o se­
qüestro como um ilícito é problem a do Executivo e não do Judiciário.
9. Quintano Ripollés e o Código Bustamante a situaram no D. Processual
Penal Internacional, isto é, um ramo do Dl Privado.
10. Esta posição nao significa que a extradição não entre em outros ramos
da ciência jurídica com o no D. Penal (onde cabe a apreciação detalhada da
legislação estatal), uma vez que os Estados possuem leis internas regulamentando
o assunto e que servem de diretrizes para os tratados a serem concluídos pelos
Estados. Por outro lado, se aceitássemos a divisão do D l de Bustamante, o que
não ocorreu, a extradição deveria fazer parte do direito substantivo, isto é, do Dl
Penal, porque ela nao é um a simples realização dos interesses da comunidade
internacional (Quintano Ripollés), mas pelo contrário, faz parte do direito subs­
tantivo. Em favor desta últim a afirmação podemos citar um trecho de Coelho
Rodrigues sobre o assunto, em que declara não se poder “admitir sanção sem
direito, prática sem teoria, acessório sem principal, adjetivo sem substantivo...” .
11. A convenção européia fala em 45 dias. E de se assinalar que esta convenção
européia (1957) tem dois P rotocolos de 1975 e 1978.
12. A menção ao Decreto-lei n9 394 é meramente ilustrativa, vez que ele está
revogado.
13. Segundo Von Glahn, um dos motivos que leva a este procedimento é que
um norte-americano ao com eter crim e no exterior e voltar para os EUA não poderá
ser aí punido, porque os tribunais norte-americanos nao têm com petência para
ju lg a r crimes cometidos no exterior.
13A. A bula era cham ada de 1joyeu se entrée” . E que no século XIV a “ realeza”
se apropria do espaço urbano com a cerimônia da “entrées royales” ou de “joyeuses
en trées”, que festeja a “prim eira entrada do rei na cidade” , ou o seu retorno após
um acontecimento im portante (Jacques Le G off).
13B. Parece que inspirada na Constituição de Weimar.
14. A legislação brasileira interdita a expulsão do território nacional do es­
trangeiro que tenha m ulher ou filho brasileiro (v. Capítulo X X X IV ) em nom e da
proteção à família; entretanto o estrangeiro na mesma situação pode ser extradi­
tado. E como que se neste últim o caso a família fosse esquecida. E verdade que
a expulsão é assunto que com pete, em regra geral, exclusivamente ao Estado,
enquanto a extradição é mais internacionalizada. E ntretanto, não vemos razão
para que preceito idêntico ao da expulsão não fosse adotado para a extradição a
fim de dar maior proteção à família. No entanto, devemos reconhecer que a não
extradição de estrangeiro com esposa ou filho brasileiro conduziria à sua impu­

1003
nidade, mas tal fato poderia ser sanado se o princípio da representação fosse
estendido a ele. Entretanto, a Súmula 421 do STF não impede a extradição de
quem tem mulher e filho brasileiros.
14A. Alguns tratados medievais já admitiram a extradição do nacional, como
o concluído pelo rei da França com o Conde de Savóia.
15. Não se incluem entre os que não são passíveis de extradição os desertores
da M arinha, sejam da M arinha de Guerra ou Mercante. Nos tratados do século
XVIII já se estipulava a entrega destes desertores. Esta entrega dos desertores da
M arinha j á foi denominada de “extradição sumária”; entretanto, não existe um
processo de extradição para estes indivíduos. A sua entrega é regulamentada não
em tratados de extradição, mas em acordos de com ércio, navegação e amizade.
Na realidade, nao constitui uma extradição, vez que esta não é dada por crimes
militares. A Fiiíalidade deste procedim ento é evitar as deserções na Marinha, que
são m uito mais fáceis do que nos exércitos. Quando não existe tratado prevendo
a entrega destes desertores, os Estados onde eles se encontram não estão obrigados
a proceder a tal entrega e se o fazem é por mera “comitas gentium ". Na prática,
raram ente os cônsules pedem a entrega destes desertores. O Código Bustamante
(art. 361) assimilou os desertores das aeronaves aos desertores marítimos. Por
outro lado, tem-se restringido o conceito de deserção; esta, para se configurar, é
necessário que o seu autor tenha a intenção de fazê-lo; M anuel A. Vieira observa
que não há um direito costum eiro que obrigue a entrega de desertor na Marinha
M ercante, por analogia pode-se aplicar o mesmo raciocínio à aviação civil.
15A. Verifica-se que na Idade Média toda a legislação de Frederico II contra
os heréticos considerava a heresia um crime de lesa-majestade, vez que Deus e o
Im perador se identificavam (Ernest Kantorowicz — L ’Em pereur Fréderic II, 1987).
15B. Parece-nos que influenciou na proteção do crim inoso político o fato de
a Revolução Francesa ter quebrado a unidade do sistema de governo existente na
Europa Ocidental.
16. A sua criminalidade é relativa ainda porque o crim inoso político tem
sem pre por intenção, ao praticar o seu crime, m elhorar as condições sociais do
seu Estado.
17. Os crimes eleitorais têm sido equiparados aos políticos no tocante à-
extradição.
17A. Machelon ao analisar a França durante a T erceira República, no período
de 1879 a 1914, observa que o denominado crime social surgiu para se fazer uma
repressão mais dura ao anarquismo que fazia “ a propaganda pelo fato” (Jean-Pierre
M achelon — La République con tre les Libertés, 1976). Pode-se acrescentar que
tratados concluídos entre países, no início do século X X , sobre extradição excluíam
o anarquism o dos crimes políticos. Esta noção se explica historicam ente porque
entre 1894 e 1912 seis chefes de Estado foram assassinados: o Presidente Carnot
da França (1894); o Primeiro-Ministro da Espanha, Canovas (1897); a Imperatriz
Elizabeth da Áustria (1898); o Rei H um berto da Itália (1 900); o P resid enteMcKin-
lev dos EUA (1901) e o Primeiro-ministro da Espanha, Canalezas. Em 1881 já fora
assassinado o Czar Alexandre III. O movimento Narodniki, na Rússia, já pregava
a destruição dos membros do governo para minar o seu prestígio. Na França os
atos anarquistas começaram em 1892 e em 1893 foram aprovadas leis de repressão
a ele (Barbara W. Tuchm an — T h e Proud Tower, 1985).
18. O art. 2S, § 22, do D ecreto-lei ns 394, não considerava crim e político “os
atos de anarquismo, terrorismo e sabotagem, ou que im portem propaganda de

1004
guerra ou de processos violemos para subverter a ordem política ou social”. Tem-se
observado que a lei fala em “ atos” , não estando aí incluída a emissão de opiniões
pregando simplesmente a prática de tais atos. Neste caso, haveria crime de opinião,
que não é passível de extradição. O Decreto-lei n- 941, de 1969, 110 art. 88, § 39,
estabelece o mesmo. O § 3 9 do art. 76 da Lei n9 6.815, de 1980, declara que o
S T F “ poderá deixar de considerar crimes políticos” : atentado a chefe de Estado,
terrorism o, alos de anarquismo, etc.
19. Em 1937 foi realizada era Genebra, sob os auspícios da SDN, uma “con­
venção para a prevenção e punição do terrorismo", que entretanto jamais entrou
em vigor, tendo obtido apenas uma ratificação (índia). Esta convenção incluía
entre o terrorismo os crimes anti-sociais e os alentados a chefes de Estado.
19A. Não há uma opinião pacífica entre os autores para a caracterização do
que seja crime conexo e crim e complexo. Sendo que um a corrente (Lammasch,
B eauchet) considera que não há razão para se distinguir estes dois crimes, que
seriam apenas “delitos políticos relativos”. Entre os autores que fazem a distinção,
esta não é uniforme e nem mesmo clara. Uns (Podestá Cósta, Spiropoulos) afirmam
que crim e conexo é, por exem plo, o assassinato praticado com fins políticos, outros
(Fauchille) falam em duas infrações, “ que são unidas por um laço de conexidade” .
O crim e complexo seria um ato único (Fauchille) ou aquele crime que fere a
ordem política e ao mesmo tem po o direito comum (v. Leopoldo Braga).
19B. Hassan Ben Sabbah treinava jovens durante anos em sua vida frugal,
falando-lhes das delícias do paraíso e lhes era dado haxixe durante a refeição.
Despertava neles a vontade de atingir o paraíso, o que eles conseguiriam se mor­
ressem a seu serviço. “Os assassinos não tinham outra am bição a não ser a de
m orrer o mais rápido” (Ernest Kantorowicz — L ’E m pereur Fréderic II, 1987).
Eles surgiram no século X II em virtude de um cisma ocorrido no Islã no século
XI. Eles eram xiitas e viviam abrigados nas montanhas da Síria. O seu chefe era
conhecid o como “O velho (ou senhor) da m ontanha” . As suas maiores vítimas
eram os sunitas.
19C. Salienta Pierre Ansart (Ideologies, Conflits et Pouvoir, 1977) que na
repressão “o inimigo deixa de existir como grupo hum ano vivo e sofredor para
se tornar uma coisa, um objeto a destruir”. Podemos lem brar que a nossa polícia
denom ina o “criminoso” de “ elem ento”.
19D. Sobre a origem e o funcionam ento destes grupos terroristas podemos
repetir as observações de Hobsbawm, que são uma crítica dura ao terrorismo. A
maioria das pessoas que integram tais grupos é da classe média. “A característica
dos movimentos terroristas é a de se basear no isolamento dos cidadãos na grande
cidade tecnicizada m oderna.” Salienta este historiador: “ a vida desses grupos é
toda interna: torna-se seus próprios objetivos. No fundo, Baader-Meinhof e as
Brigadas Vermelhas tiveram, primeiro, que arranjar dinheiro (roubos, seqüestros);
depois; que gastá-lo em técnicas, em seguida, que realizar ações para libertar os
presos” . Ele ajuda a direita “na medida em que o terrorism o pode levar ao colapso
das condições democráticas de luta” . Os Tupamaros levaram o Uruguai a uma
ditadura. Eles atuam em pequenos grupos isolados e para uma revolução é preciso
mobilizar as massas. Observa ainda que as ditaduras temem pouco esses grupos
isolados. Após observar que o terrorismo alemão e italiano são contra o Estado,
observa: “parece-me que o terrorismo não é uma reação contra o Estado mais
autoritário, mas sim contra o Estado menos autoritário” . Podemos observar que
talvez esta afirmação seja válida para a Europa, mas não para a América Latina.

1005
Em sentido contrário, está Ruy Mauro Marini, que defende a possibilidade
de o terrorism o urbano ser com binado com o trabalho de massa. De qualquer
modo, a guerrilha urbana não tem área de manobra. Falta hom ogeneidade ã
população urbana, e a população rural é mais simpática à guerrilha (Paul Wilkin­
son).
Podemos lembrar que um teórico do terrorismo urbano na América Latina
foi Abraham Guillen (refugiado da Espanha), que vai influenciar os Tupamaros
(com eçaram a agir em 1963, mas as suas ações só são conhecidas em 1966) no
Uruguai, e o ERP, na Argentina. E le não apoiou nem participou destas organiza­
ções, contudo elas seguiam a sua “orientação”, como organizações em células de
cinco pessoas que poderiam lançar ataques sem com unicar ao Alto Comando,
deveriam ser empreendidas pequenas ações para obrigar as forças de segurança
a ced er terreno, bem como em preender um trabalho político para obter o apoio
das massas, etc. (Walter Laqueur). Foram os Tupamaros que se autodenominaram
de "guerrilha urbana" (Gérard Chaliand). Para Philippe Defarges a guerrilha atua
no cam po e o terrorismo na cidade; ou nos meios de com unicação de massa e
aviões^ ' '
20. "Está consagrado na convenção interamericana sobre extradição concluída
em 1933, em Montevidéu.
21. No Brasil, esta posição foi sustentada por Linneu de Albuquerque Mello.
21A. Os tratados de extradição em tempo de guerra são suspensos, com a paz
eles voltam a ser aplicados inclusive aos atos ocorridos durante a sua suspensão.
22. O Poder Executivo pode recusar-se a encaminhar ao Suprem o Tribunal
Federal o pedido de extradição, o que significa que ele não dará a extradição,
uma vez que ele não pode concedê-la sem a apreciação do STF. A tendência atual
no Brasil é que a prisão administrativa do extraditando só pode ser decretada pelo
ju iz relator.
23. Na Inglaterra, o Poder Ju d iciário aprecia o mérito. O Executivo é um
executor do Judiciário.
24. E de se assinalar que as despesas com a prisão são por conta do Estado
requerente (art. 372 do Código Bustam ante).

1006
CAPÍTULO XXXIV

EXPULSÃO DE ESTRANGEIROS1

363 — Definição; 364 — Fundamento; 365 — Natureza Jurídica;


366 — Efeitos; 3 6 7 — Princípios internacionais; 3 6 8 — A legislação
brasileira.

S 363. A expulsão é o ato político-administrativo que obriga o estrangeiro


a sair do território nacional, ao qual não pode mais voltar.
Ela se distingue d^^egErãdiçaçà) uma vez que nesta o estrangeiro e
entregue à autoridadejde determinado Estado que o reclama. NgiTxpnlsã&>
o estrangeiro recebe ordem de deixar o território do Estado, mas e livre .
para se dirigir ao Estarlo que hem entender, desde que este esteja disposto
a recebê-lo.
Por outro lado, a(.extradiçãõ)é normalmente regulamentada em trata-
dos qoie_íiuando existem a tornam obrigatória nos termos convencionais.
ÂCgxpulsãçj, ao contrário, praticamente não tem qualquer regulamentação
internacional e, em conseqüência, é um :ato soberano do Estado'; sem
maiores limitações impostas pelã ordem jurídica internacional?*
364. A legitimidade de o Estado expulsar um estrangeiro do seu ter­
ritório não é contestada pela prática, nem pela doutrina, apenas variando
as concepções que procuram fundamentá-las.
André Weiss sustentou a teoria da hospitalidade. Defende o jurista
francês que o estrangeiro dentro do Estado goza da hospitalidade e se
encontra sujeito a todos os direitos e deveres daí decorrentes. Ora, se um
estrangeiro se torna, nocivo ao Estado, ele violou-os deveres que tinha,
tornando-se sujeito a "expulsão do território estatal. Esta concepção não
pode ser aceita, uma vez que a hospitalidade não constitui um instituto
jurídico. A hospitalidade gera apenas deveres morais, tendo sido instituto
jurídico na Antiguidade.
Charles de Boeck defendeu a teoria do direito de conservação. O
Estado pode expulsar do seu território o estrangeiro que ameaçar a sua

1007
conservação. O Eslado tem de zelar pela ordem pública nacional. Deste
modo, a expulsão só seria legítima quando otstrangeiro atingisse interesses
importantes do Estado. Não seria qualquer motivo sem importância que
acarretaria a expulsão. Esta teoria deve ser rejeitada, uma vez que ela não
corresponde à prática estatal que prevê á expulsão do território estatal por
vagabundagem, devassidão, etc., isto é, pela prática de atos que não se
pode dizer que atinjam a “ conservação” do Estado. A própria expressão
“direito de conservação” é vaga e imprecisa (v. capítulo X IX ).
A melhor concepção é a que fundamenta a expulsão de estrangeiro
no direito de soberania do Estado. A soberania se manifesta em um poder
sobre os indivíduos que se encontram no território do Estado, inclusive o
de expulsar os estrangeiros que violem a sua ordem pública. E preciso
. assinalar que o Estado tem não apenas o direito, mas também o dever de
zelar pela sua ordem pública.2
365. Há dois aspectos que devemos analisar: a) se a expulsão é pena
ou não; b) se a expulsão é ato discricionário do Poder Executivo.
a) Os autores têm sido unânimes em assinalar que a expulsão não é
uma pena. Oscar Tenorio observa que, contudo, em alguns casos, ela pode
ter “caráter acessório de pena, nos casos em que a expulsão resulta do
cumprimento de determinadas penas por determinados crimes, conforme
estabelecia o art. 29, alínea k, do Decreto-lei n° 479, de 8 de junho de
1938, que dispunha, na primeira parte, sobre a expulsão do estrangeiro
que tiver sido condenado no Brasil por crime inafiançável”. Accioly a
qualifica de “ medida preventiva de polícia”.
b) A grande maioria dos nossos doutrinadores (Anor Butler Maciel)
tem sustentado que a expulsão é um ato político-administrativo discricio­
nário do Poder Executivo, que não deixa de estar sujeito à legislação em
vigor. Entretanto, o Judiciário pode apreciar a parte referente à restrição
aos direitos individuais, que estão sujeitos ao seu controle.
O Poder Judiciário verifica se a expulsão é feita dentro dos cânones
legais. Aprecia se é legal ou não. Entretanto, não considera de sua justiça.
Os “recursos” ao Judiciário são o habeas corpus e o “mandado de seguran­
ça”.3 Atualmente tem-se preferido recorrer ao habeas corpus por ser mais
rápido, vez que o tempo concedido à autoridade para informar é menor
do que o dado no caso do mandado de segurança.
366. A expulsão produz dois efeitos:
a) retira do território nacional o estrangeiro. Ela não deve se trans­
formar em extradição, isto é, deve ser dada liberdade ao indivíduo para
escolher o Estado a que deseja se dirigir;4
b) o estrangeiro expulso não pode voltar ao território nacional, porque
se voltar se sujeitará a uma pena.5 Neste particular, a expulsão se distingue
da deportação. Esta última não impede que o estrangeiro volte ao território
nacional, desde que preencha as condições necessárias.6

1008
367. O DI se interessa pela expulsão de estrangeiros, unia vez que loda
a “condição dos estrangeiros” é regulamentada internacionalmente e pode
dar origem à proteção diplomática.'
Fauchille assinala que o DI reconhece aos Estados o direito de expulsar
do seu território os estrangeiros nocivos à ordem pública. Na verdade, este
princípio foi sempre aplicado na prática internacional. A Convenção In-
teramericana sobre a condição dos estrangeiros (1928) o reconhece, de
modo expresso, no seu art. 69:

“Os Estado?.podem, por motivos de ordem ou de segurança


pública, expulsar o estrangeiro domiciliado, residente ou sim­
plesmente de passagem pelo seu territorio.”

Pode-se mesmo assinalar que a expulsão surge quando o estrangeiro


violou os seus deveres para com o Estado. Ele não pode ser expulso por
interesses privados.
Outro principio que está consagrado no mesmo dispositivo da citada
Convenção é que o Estado tem a obrigação de receber o seu nacional
expulso de Estado estrangeiro.8
O Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (1966), no seu art.
13, esdpula:

“O estrangeiro que se encontre legalmente no território de um


Estado, parte no presente Pacto, só poderá ser expulso dele em
cumprimento de uma decisão adotada conforme a lei; e a menos
que razões imperiosas de segurança nacional se oponham a isto,
se permitirá ao estrangeiro expor as razões que o assistem contra
a sua expulsão, assim como submeter seu caso à revisão perante
a autoridade competente ou perante a pessoa ou pessoas desig­
nadas especialmente pela mencionada autoridade competente,
e fazer-se representar com tal fim perante elas.”

Podemos concluir observando que existem poucos princípios interna­


cionais sobre a expulsão de estrangeiro. O.assunto é regulamentado quase
que exclusivamente pelas legislações estatais, daí grande parte dos inter-
nacionalistas não tratarem mais do assunto. 1
Em relação à expulsão, a prática internacional (nas duas guerras mun­
diais) e a ‘doutrina (Accioly) têm condenado a “xenelásia”. E a expulsão
em massa dos súditos inimigos, ao ser declarada a guerra, que se encontram
no território nacional. Ela foi muito utilizada através da História, desde a
Antiguidade até, inclusive, a Idade Moderna, tendo sido abandonada não
apenas por razões humanitárias, mas também por razões pragmáticas, uma
vez que a sua adoção somente servia para dar homens, em conseqüência,
soldados, ao.inimigo. E evidente que se a expulsão em massa não sejustifica

1009
era lempo de guerra, com muilo menos razão se justificará em lempo de
paz." Ela é proibida pelo art. 22 da Convenção liueramericana de Direitos
do Homem e pelo art. 42 do Protocolo n2 4 (1963) da Convenção Européia
de Direitos do Homem.
Os apátridas e refugiados podem ser expulsos, mas são mais protegidos.
A convenção da ONU de 1984 visando a proibição da tortura consagra
o principio de “non refoulement” para quem se encontra ameaçado de
tortura.
368. A Constituição de 1946,9A visando proteger a família brasileira,
estabeleceu, no seu art. 143:

“ O Governo Federal poderá expulsar do território nacional o


estrangeiro nocivo à ordem pública, salvo se o seu cônjuge for
brasileiro, e se liver filho brasileiro (art..129, nas I e II) depen­
dente da economia paterna.” - . -

A grande discussão em tomo deste dispositivo consistiu em saber se o


texto constitucional exigia os dois requisitos (mulher e filho brasileiros)
ou apenas um deles (mulher ou filho brasileiro). A disputa se prendia à
má redação do artigo, que possuía uma vírgula antes do “e”. Inicialmente,
o STF interpretou o texto da Carta Magna de que os dois requisitos eram
necessários para que um estrangeiro não fosse expulso. Posteriormente,
interpretação dominante, o STF passou a exigir apenas um dos requisitos.
A Constituição de 1967 não tinha nenhum dispositivo sobre expulsão de
estrangeiro; em conseqüência, o estrangeiro com mulher ou filho brasileiro
podia ser expulso do território nacional. O Decreto-lei ns 392, de 1938, então
em vigor, não tinha qualquer norma proibindo a referida expulsão.
A fim de corrigir tal coisa, foi promulgado o Decreto-lei n® 417, de
10-1-1969, que proíbe a expulsão do “estrangeiro que tenha cônjuge ou
filho brasileiro, dependente de economia paterna”.
A Constituição de 1969 também não possui norma sobre expulsão, o
mesmo ocorrendo com a Constituição de 1988 e o Decreto-lei n9 941, de
1969, estabelece que não será expulso o estrangeiro que tiver; I) “Cônjuge
brasileiro do qual não esteja desquitado ou separado; ou II) Filho brasileiro
dependente de economia paterna”. A adoção de filho ou o casamento
depois de iniciado o inquérito não impede a expulsão. A regulamentação
deste decreto-lei está no Decreto n2 66.689, de 11-6-1970, nos artigos 100
e segs. A Lei n9 6.815, de 19-8-80, que regulamenta a expulsão, não proíbe
que ela ocorra quando o indivíduo tenha mulher ou filho brasileiro. E
necessário para não ser expulso que não haja separação de fato ou- de
direito do cônjuge brasileiro e “que o casamento tenha sido celebrado há
mais de cinco anos” e que o “filho brasileiro..., comprovadamente, esteja,
sob sua guarda e dele dependa economicamente”. Esta Lei declara que
pode ser expulso o estrangeiro que atentar “contra a segurança nacional,

1010
a ordem política ou social, a tranqüilidade ou moralidade pública e a
economia popular, ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência
» e aos interesses nacionais”. Não poderá ser expulso o português que se
beneficiar do estatuto da igualdade.
A expulsão e a sua revogação são de competência do Presidente da
República, que faz tais atos por decretos (através do Ministério da Justiça).
Entre as causas que acarretam a expulsão estão as que comprometem “a
segurança nacional, a estrutura das instituições ou a tranqüilidade pública”,
a economia popular; os que forem condenados, após ter cumprido a pena,
por: contrabando, moeda falsa, venda de tóxicos e entorpecentes, lenoci­
nio, corrupção de menores, etc. Podem ser ainda expulsos, após cumpri­
mento da^pena que lhes tenha sido imposta (ex.: vagabundos), aqueles
que tenham cometido no Brasil crime inafiançável, etc.
A’ nocividade do estrangeiro é de apreciação exclusiva do Presidente
- da República, e o Poder Judiciário só aprecia a legalidade (Mirtô Fraga).
O processo de expulsão “será iniciado pela polícia, de ofício ou me­
diante representação fundamentada”. Ele tem ainda início nos casos após
a condenação criminal quando os juizes que proferem a sentença de
condenação a comunicam ao Ministério da Justiça.10

1011
NOTAS

]. Bento de Faria — Sobre o Direito de Expulsão, 1929; Emmanuel Bès de


Bere — De l'Expulsion de Étrangers, 1888; André Blondel — Expulsión, in
Répertoire de Droit International de A. de La Pradelle e J . P. Nibovet, i. VIH,
1930, págs. 105 e segs.; A nor Butler Maciel — Expulsão de Estrangeiros, 1953;
Alexis Martini — L ’expulsion des Etrangers, 1909; Charles de Boeck — L ’expulsion
et les difficultés internationales qu’en soulève la pratique, in RdC, 1927, vol. III,
t. 18, págs. 447 e segs.; Lacerda de Almeida — O D ecreto n9 1.641 de 7 de ja n e iro
de 1907 sobre expulsão de estrangeiro, 1907; P. Aymond — Expulsión des Etran­
gers, in Dalloz — Répertoire de Droit International, publicado sob a direção de
Ph. Francescakis, t. I, 1968, págs. 802 e segs.; Luis Jim én ez de Asúa — Tratado de
Derecho Penal, t. II, 1964, págs. 1.077 e segs.; Ronaldo Rebelo de Britto Poletti
— Notas sobre o banim ento e seus efeitos, in Revista de Direito da Procuradoria-
geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro^ y o l-3, n s 3, 1976, págs. 56 e segs.;
Ronaldo Rebelo de Britto Poletti — Das diferenças entre extradição, expulsão e
deportação, in Arquivos do M inistério da Justiça ns 138, abril-junho de 1976, págs.
45 e segs.; A. Dardeau de Carvalho — Situação Ju ríd ica do Estrangeiro no Brasil,
1976, págs. 109 e segs.; T é cio Lins e Silva — B anim ento. Efeitos. Prescrição, in
Revista da OAB-RJ, ano V, vol. V, 1° quadrimestre de 1979, págs. 145 e segs.; Ja c o b
Dolinger — Das Limitações ao Poder de Expulsar Estrangeiros, in Estudos Juríd icos
em Homenagem ao Prof. H aroldo Valladão,1983, págs. 119 e segs.; Mirto Fraga
— O Novo Estatuto do Estrangeiro Comentado, 1985, págs. 181 e segs.; Ja c o b
Dolinger — Direito Internacional Privado, 1986, págs. 205 e segs.; Francisco Xavier
da Silva Guimarães — Medidas Compulsorias. A D eportação, a Expulsão e a
Extradição, 1994.
IA. O banimento é a expulsão do nacional. Em princípio o banido pode
retornar ao territorio nacional se submetendo à legislação em vigor. A proibição
do banido retornar, ao territorio brasileiro seria um a violação de principio inter­
nacional que obriga o Estado a receber de volta o seu nacional. Pode-se recordar
que o art. 3e do P rotocolo ns 4 (1963) da Convenção européia dos direitos do
hom em afirma que ninguém pode ser impedido de ingressar no território do
Estado de que é nacional. Este mesmo protocolo proíbe a expulsão do nacional.
O banido conserva a nacionalidade brasileira. Cabe, assim, ao governo fornecer-lhe
passaporte. A jurisprudência entendia que não, mas isto era um absurdo, porque
a legislação brasileira determ ina que cabe a concessão de passaportes a brasileiros
sem qualquer distinção. P or outro lado, eles continuam a gozar da proteção
diplomática do Brasil. Podem os acrescentar que o banim ento existiu no Código
Criminal do Império e foi abolido pela Constituição de 1891, surgindo novamente
no Ato Institucional ns 13, de 1969, tendo sido ele revogado pelo D ecreto n s
82.960, de 29-12-78. Jo sé Francisco Rezek afirma que se tem procurado ju stificar
o banimento na ditadura militar, ou como uma represália, ou com o um meio para
libertar pessoas já processadas. Na verdade, nenhum dos argumentos justifica o
banimento, vez que o indivíduo tem o direito de habitar em seu Estado nacional.
No caso da deportação, o deportado deve se retirar voluntariamente após ter
sido notificado. Ele pode se retirar para o seu Estado nacional, ou de origem, ou
para qualquer Estado que o receba. Silva Guimarães alinha uma série de argu­
mentos em favor da deportação de estrangeiro com cônjuge ou filho brasileiro:

1012
á) haveria um incentivo ao ilícito: b) não tendo sido cumprida a lei teria um
tratamento mais benéfico; c) o deportado pode retornar, etc. Contudo, parece-nos
que a defesa da família consagrada na Constituição deve ter prioridade. No caso
Biggs, em 1980, ele não foi deportado, porque era vedada a extradição para a
Inglaterra, bem com o para qualquer Estado que tivesse tratado de extradição com
ela.
2. Existem alguns casos em que o Estado não tem, perante o Dl, o dever de
expulsar, do seu território, o estrangeiro, mas apenas persiste a sua legislação (ex.:
vagabundagem). Em outros casos, este dever existe perante a ordem ju ríd ica
internacional (ex.: o estrangeiro asilado que em seu território prepara movimentos
revolucionários em outro Estado) (Kelsen). E verdade que neste último caso nem
sempre se impõe a expulsão, uma vez que o estrangeiro autor de tal ato pôde ser
internado (v. capítulo X X X V II).
3. Existe ainda um recurso administrativo, que é o pedido de reconsideração.
4. Anor Butler M aciel, apoiado em Pontes de M iranda, declara que o estran­
geiro expulso deve ir para o seu Estado nacional. Entretanto, esta prática pode
acabar por se transform ar em uma extradição disfarçada, que é condenável. O
expulso vai para onde quer. Entretanto, se nenhum Estado quiser recebê-lo, o
Estado de que é nacional tem a obrigação de recebê-lo. Afirmam ainda os dois
juristas citados que o apatrida expulso deve ser enviado para o Estado de onde
veio. Entretanto, a mesma crítica acima pode ser dirigida a esta hipótese e, mais
ainda, o Estado de onde ele veio não tem nenhum a obrigação de aceitá-lo de
volta. Daí o Instituto de D ireito Internacional con d en ar a expulsão do apátrida.
A orientação mais recen te está consagrada nas convenções concluídas sob os
auspícios da ONU. Em 1951, a convenção relativa ao estatuto dos refugiados
estabeleceu: a) que um refugiado só pode ser expulso por motivos de segurança
nacional ou de ordem pública; b) ela só poderá ser decretada após processo previsto
em lei; c) ele deverá ter permissão para apresentar provas e recurso, bem com o
ter o direito de se representar perante a autoridade ou autoridades: tais direitos
poderão ser negados por “razões imperiosas de segurança nacional” ; d) o Estado
dará ao refugiado “um prazo razoável para procurar o bter admissão legal em outro
pais”; e) neste prazo os Estados podem adotar as medidas de ordem interna que
acharem oportunas; j ) ao mesmo tempo estabelece que nenhum Estado “expulsará
ou rechaçará, de m aneira alguma, um refugiado para as fronteiras dos territórios
em que a sua vida ou a sua liberdade estejam ameaçadas em virtude de sua raça,
da sua religião, da sua nacionalidade, do grupo social a que p er ten c e ou das suas
opiniões políticas” . Este último dispositivo só não beneficiará o.refugiado que
constituir “ameaça para a comunidade do referido país” . A Convenção sobre o
estatuto dos apátridas (1954) repetiu de um m odo gera) as normas enunciadas
acima.
A deportação e a expulsão, quando se transform am em extradição vedada
pela nossa legislação, estão proibidas pelo Decreto-lei n s 941, de 1969.
5. E de se assinalar que a expulsão pode ser revogada quando cessam as causas
que a motivaram. A volta antes da revogação da expulsão o.sujeita a uma pena.
6. O estrangeiro que se introduzir no Brasil sem estar devidamente autorizado
para isso, poderá satisfazer as condições de admissibilidade. Se não satisfizer as
condições legais, será deportado. Diz a Lei n s 6.815, de -1980: “a deportação
consistirá no regresso do estrangeiro sob coação ” . A deportação é feita “ para o

1013
país de origem, ou de procedência do estrangeiro, ou para oul.ro que consinta
recebê-lo". A deportação “só poderá ocorrer se o estrangeiro deixa de retirar-se
do Brasil voluntariamente depois de regularmente notificado’’ . “Ela só cabe nos
casos de entrada ou estada irregular” (Dardeau de Carvalho). Entretanto, pela
convenção interamericana de direitos do homem o indivíduo não pode ser devol­
vido onde haja ameaça a sua vida ou liberdade por motivos de raça, nacionalidade,
religião ou opinião política. Há uma tendência na jurisprudência de não ser
admitida a deportação de estrangeiros com esposa ou filho brasileiros.
A deportação está regulamentada na Lei ne 6.815, de 1980, nos ans. 51 e segs.
Este diploma legal determ ina: “não sendo exeqüível a deportação imediata, ou
quando existirem indícios sérios de periculosidade ou indesejabilidade do estran­
geiro proceder-se-á a sua expulsão” (art, 108). P or outro lado, estabelece que “não
se dará a deportação se esta implicar extradição vedada por lei brasileira” . A
deportação é aplicada ao estrangeiro em caso de entrada ou estada irregular no
país. A transformação da deportação em expulsão é “a critério exclusivamente do
Presidente da República” . Na verdade, escreve Mirtô Fraga, a deportação só se
efetiva se o estrangeiro não sair voluntariamente do território nacional.
7. O Instituto de D l tratou da expulsão nas suas sessões de Lausanne (1888)
e de Genebra (1892), onde se travaram grandes debates sobre se a expulsão é ou
não assunto do Dl e por conseguinte se o Instituto deveria tratar do assunto. No
sentido que adotamos: Ch. de Boeck.
8. O Instituto de D l, na sessão de Bruxelas (1 936), ao fixar o “estatuto ju ríd ico
dos apátridas e dos refugiados” , estabelece que um apátrida não refugiado não
pode ser expulso de um Estado, desde que aí se enco ntre legalmente, a não ser
que outro Estado o aceite. O refugiado só pode ser expulso se outro Estado o
aceitar. Este princípio é o da convenção interam ericana; obrigando o Estado a
aceitar o seu nacional visa evitar que pessoas fiquem sem Estado que as aceite. A
legislação brasileira (O scar Tenório) tem equiparado a ele o apátrida.
9. Um exemplo foi a expulsão em massa de súditos britânicos e súditos de
origem asiática, em 1973, realizada pelo governo de Uganda. Outros casos podem
ser citados: a) em 1969 Gana expulsou 100.000 súditos da Nigéria, Alto Volta,
Benin e Togo; b) em 1976 a Líbia expulsou m ilhares de trabalhadores tunísíos e
egípcios; c) em 1983 a Nigéria expulsou dois m ilhões de imigrantes ilegais dos
países vizinhos; d) em 1975 a Argélia expulsou 30.0 0 0 marroquinos em situação
ilegal, etc.
9A. A primeira referência a expulsão no direito brasileiro é o Aviso ns 52 de
4-4-1834. Com fundam ento em Jacob Dolinger podem os repetir que a Constituição
de 1824 assegurava a qualquer pessoa a entrada no território nacional. A Consti­
tuição de 1891 não mencionava a expulsão e surgiram três correntes: a) o Estado
pode expulsar em nom e da soberania; b)~ se não houver lei específica o Estado
nãc> pode expulsar, e neste sentido foram concedidos alguns habeas corpus pelo
STF; c) qualquer lei falando em expulsão ou qualquer expulsão deveria ser con ­
siderada inconstitucional, porque o art. 72 equiparava o estrangeiro ao nacional,
e este não podia ser expulso. Era a tese defendida por Rui Barbosa e Pedro Lessa,
mas que teve como críticos Jo ã o Barbalho, Rodrigo Otávio e Epitácio Pessoa.
10. Quanto ao histórico da expulsão no Brasil, podemos repeür observações
feitas por Edgard Carone (A República Velha, volume I, 1975, págs. 238 e segs.):
a) no Império a expulsão era realizada com fundam ento em motivos políticos ou

1014
por falla de docum entação, enquanto na República a expulsão é feita por questões
sociais; b) até 1917 poucos são os operarios estrangeiros expulsos; a partir desta
data, o número aum entou. Artur Bernardes dim inuiu o número de expulsões.
Washington Luís, seguindo a Epitácio Pessoa» ex pulsou muitos operarios estran­
geiros. Observa o historiador: “a expulsão de estrangeiros-anarquistas e revolucio­
nários é a arma da burguesia e das oligarquias para enfraquecer o movimento
operario. A pretexto de profilaxia social São banidos do país os líderes sindicais,
os dirigentes de greves, de reivindicações populares” . Durante o governo de Flo-
riano Peixoto foram expulsos 76 estrangeiros. Desses, 36 por crimes políticos, 19
expressamente sob acusação de anarquismo. As dep ortações faziam-se por simples
decreto presidencial, precedendo solicitação do ch efe de polícia. O prim eiro
decreto data de 14 de agosto de 1893 (José Murilo de Carvalho — Os Bestializados,
1987). Algumas outras observações podem ser acrescentadas a título de ilustrações.
A Lei de 1907 teria sido uma exigência das D ocas de San tos (Gaffré-Guinle),
segundo Edgar Rodrigues (Trabalho e Conflito, s.d .). Ela autorizava a expulsão
de estrangeiro que com prom etesse a segurança nacional e a tranqüilidade pública.
Em 1913, foi m odificada a Lei de 1907, por iniciativa do Deputado Adolfo Gordo,
“sob a alegação que vinte e seis associados anarquistas estavam provocando greves
em São Paulo” , é proposta e aprovada “a elim inação da proteção aos estrangeiros
tendo mais de dois anos de residência contínua no Brasil, que tivessem m ulher e
filho brasileiros” . Salienta Paulo Sérgio Pinheiro (O proletariado Industrial na
Primeira República, in História Geral da Civilização Brasileira, sob a direção de
Bóris Fausto, t. III, 2- vol., 1977): “é edificante o procedim ento do Suprem o
Tribunal Federai na questão. Apesar de continuar a achar inadmissível a expulsão
de residente há mais de dois anos no país — por causa das garantias do art. 72
da Constituição Federa) no caso dos anarquistas, em 1919, o procedimento será
diferente. Se, antes, o S T F considerava aL ei de 1913 com o inconstitucional, agora,
em 1917, pelo contrário, ele não representará nenh u m obstáculo real à expulsão
de estrangeiros, em casos legalm ente duvidosos. Nesse caso concreto, os anarquis­
tas, apesar do decurso do prazo de dois anos de residência contínua, não são
considerados residentes: por se oporem à ordem social e pretendê-la destruir
através da violência, constituíam um 'elem ento flu tu an te’, que vagava pelo país
para difundir seus m étodos e ideais". Ainda pela L ei de 1913 é eliminado o direito
de apelação para as sentenças de expulsão. Pela reform a da Constituição de 1926
a expulsão pode ser sumária. Tem sido assinalado que para as elites a deportação
era mais rápida e m enos sujeita a recursos, porqu e “vagas acusações eram sufi­
cientes” , sem ser necessário ter provas. A nacionalidade do deportado era apreciada
com impropriedade, daí ter ocorrido casos de se d ep ortar para país que não era
o dele (Sheldon Leslie Maram — Anarquistas, Im igrantes e o Movimento O perário
Brasileiro 1895-1920, 1979). Leandro Konder (A D errota da Dialética, 1988) tem
um a observação que m erece ser repetida: “os propagandistas do anarquismo e do
anarco-sindicalismo eram , com freqüência, pessoas de imensa probidade, seres
humanos generosos, abnegados, combativos. N eles era comum a tendência ao
‘ascetismo’ ligado à m oral cristã do desprendim ento ou à convicção de que os
indivíduos precisam se pôr ao serviço de um ideal grandioso, resplandecente, em
face do qual suas existências privadas acabam por se deixar reduzir ao espaço
irrelevante. Divertir-se era uma atividade pecam inosa ou corrupta...”.

1015
CAPÍTULO XXXV

CONDIÇÃO JURÍDICA DOS ESTRANGEIROS1

369 — Introdução; 370 — Histórico; 371 — Direitos e deveres dos


estrangeiros; 372 — Nacionalização de empresas; 372A — Proteção
dos investimentos estrangeiros; 373 — Contratos entre Estados e em­
presas estrangeiras.

369. Os direitos e deveres dos estrangeiros é matéria que tem sido


estudada mais no DI Privado do que no DI Público. Entretanto, este último
ramo da ciência jurídica se interessa diretamente pelo assunto, sendo
mesmo que convenções internacionais já foram concluídas sobre ele.
O presente capítulo versa sobre matéria que é regulamentada princi­
palmente pelas legislações estatais, que possuem neste setor uma liberdade
muito ampla, vez que o Dl Público fixa apenas determinados princípios
gerais. O Dl Público estabelece apenas um standard mínimo de direitos
para os estrangeiros que deve ser assegurado pelos Estados, sob pena de
serem responsabilizados internacionalmente.2 E neste aspecto que estuda­
remos os direitos e deveres dos estrangeiros.
370. Na Antiguidade Oriental, aos estrangeiros não eram reconhecidos
direitos, uma vez que eles não faziam parte da religião nacional. Na índia
eles estavam abaixo dos párias. No Egito o mesmo tratamento foi dispen­
sado,-inicialmente, aos estrangeiros para somente ser mais benéfico, com
a concessão de favores, quando as relações comerciais se desenvolveram.
No direito hebraico o estrangeiro somente adquiria direitos ao se converter
à sua religião, quando então ele passava a ter todos os direitos.
Na Grécia, os estrangeiros passaram a possuir direitos. Em Atenas são
reconhecidas quatro categorias de estrangeiros: os metecos (que possuíam
a proteção das leis, o direito de comerciar e de exercer uma profissão,
mas tinham uma jurisdição especial, chamada “polemarca”, não podiam
possuir imóveis, pagavam um imposto, na justiça são representados pelos

1Ü17
“prostates”, etc.); os isóteles (que por um tratado ou decreto popular
adquiriam os direitos privados, como o de casar, não pagar impostos a que
os estrangeiros estavam sujeitos, podiam adquirir propriedades imobiliá­
rias, etc.); os bárbaros (que não possuíam direitos nem proteção) e os
estrangeiros não domiciliados (não possuíam direitos, mas eram protegidos
pelos proxenos).
Em Roma, o estrangeiro, inicialmente, não possuía direitos nem pro­
teção. Devido ao comércio e ao imperialismo romano, os estrangeiros
passaram a possuir direitos. O “hospitium” era a convenção em que se
estipulava a proteção do estrangeiro por Roma e a hospitalidade em favor
do estrangeiro. A “amicitia”, forma mais evoluída do “hospitium” (G.
H ubert), dava ao estrangeiro'garantia de sua vida e bens e em contrapartida
ele não daria auxílio aos inimigos de Roma.
O “patronato” foi um instituto que protegeu o estrangeiro, este era
colocado sob a proteção de um cidadão romano em uma condição “aná­
loga” à de um “filius familias” (Weiss). A distinção entre o patrono e o
“hospitium” é que este tinha uma base de reciprocidade (entre estrangei­
ros e romanos), ao contrário do primeiro. Diversos tratados de amizade,
comércio e aliança foram concluídos com os estrangeiros, sendo que neles
se reconheceram a estes alguns direitos. Os estrangeiros foram divididos,
finalmente, em três grupos: a) os bárbaros — que não possuíam quaisquer
direitos; b) os peregrinos ordinários — não tinham a proteção do “jus
civile" (direitos privados e políticos), mas tinham a proteção do “juz gen-
tium” (ex.: podiam ter escravos). Eles eram os habitantes das províncias
que foram incorporadas ao Império Romano, mas que não tinham o “jus
Latii” (direito das colônias latinas), que se caracterizava pelo direito de
comércio; c) os peregrinos latinos — que se dividiam em várias categorias:
1 — “ latini veteris” o u “prisci” (habitantes do Lácio) no início eram aliados
de Roma em pé de igualdade, depois passaram a ter o “jus suffragli”, o
“connubium” e o “coijimercium” e, finalmente, passaram a ter apenas o
“commercium” e o direito de fazer testamento; 2 — “Latini coloniarii”
(ex.: “emigrante voluntário que renunciava à pátria romana”), no final
tinham o direito de comércio e de fazer testamento, isto é, regime jurídico
semelhante aos anteriores; 3 — “Latini juniani” (escravos libertados), têm
o direito de comércio mas não o de fazer testamento.
Os bárba'ros não reconheciam aos estrangeiros os direitos civis e polí­
ticos. Eles são. escapavam da arbitrariedade quando colocados sob a pro­
teção do rei ©u de um rico proprietário.
No feudalismo, o estrangeiro que não jurasse fidelidade ao senhor
feudal era transformado em servo. O estrangeiro estava sujeito a uma série
de imposições: “jus albinagii” (“droit d’aubaine”), os bens deixados em
sucessão pelo'estrangeiro passavam ao senhor feudal;2A o imposto “foris
maritagium”, que pagava quando se casava com mulher de outro feudo,
ou de condição diferente da sua.

1018
Da Idade Média em díame, iva Europa, o judeu era o símbolo do
estrangeiro, e ele era malvislo.
O fo ria le c im e n to d o p o d e r real tro u x e un ia m e lh o r ia p a ra os e stran ­
geiros.
No final do século XV1I1, por influência da Revolução Francesa e da
pregação dos filósofos sustentando a fraternidade dos hornens, as medidas
discriminatórias em relação ao estrangeiro começaram a desaparecer. É
no século XVIII apenas que o “jus albinagi” é abolido na França (Valladão).
No século XIX, os direitos privados são reconhecidos aos estrangeiros.
371. Verdross salienta que a idéia fundamental a respeito do regime
dos estrangeiros é que eles, sendo homens, devem ter sua “personalidade
humana” respeitada. Esta afirmação já se encontra em Vitória.3 Como uma
decorrência deste princípio, a doutrina (Anzilotti, Instituto de Dl) tem
declarado que eles gozam dos direitos essenciais à pessoa humana. A prática
internacional em uma série de tratados têm reconhecido aos estrangeiros
a personalidade perante o Direito. Te’m-se reconhecido, inclusive na juris­
prudência internacional, que o DIP exige que os Estados dêem aos estran­
geiros “um mínimo determinado de direitos” (Verdross). Este mínimo
podemos dizer que consistiria nos direitos do homem e nos princípios
gerais adotados nos sistemas jurídicos internos dos Estados, o que pode
ser verificado pelo D. Comparado.
O Dl, ao fixar um padrão mínimo de tratamento que deve ser dado
aos estrangeiros, não significa que a simples equiparação ao nacional isente
o Estado de uma responsabilidade internacional, porque os nacionais po­
dem ter inenos direito (é raro) do que os reconhecidos aos estrangeiros
pela ordem internacional."1
Tem sido observado (Guha-Roy) que o denominado “standard mínimo
internacional” de tratamento do estrangeiro: a) é vago; b) é uma afronta
ao sistema nacional; c) cria problemas para o Estado quando nacionais
têm menos direitos que os estrangeiros.
Os estrangeiros gozam dos direitos fundamentais do homem.3 A De­
claração Universal dos Direitos do Homem estabelece a sua aplicação para
todo e qualquer indivíduo, independente de qualquer condição pessoal
(art. 29). Deste modo os estrangeiros têm direito à vida, à liberdade, a não
sofrer castigo cruel, a comparecer à justiça, à propriedade, etc. O mesmo
regime, de um modo geral, continua com os Pactos de Direitos Humanos,
sendo de assinalar que o Pacto Internacional de Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais estipula que os países em vias de desenvolvimento,
levando em consideração “os direitos humanos e sua economia nacional,
poderão determinar em que medida garantirão os direitos- econômicos"
consagrados no Pacto em relação aos estrangeiros. Entretanto, a regula­
mentação destes direitos é feita pelas legislações estatais, que pedem assim
impedir aos estrangeiros a propriedade de determinadas empresas.'A Con­

1019
v en ção Im e r a m e r ic a n a so b re a co n d iç ã o cios estran g e iro s (1 9 2 8 ) e sta b e ­
le ce . n o art. 5 9:

“Os EsjaçJos devem conceder aos estrangeiros domiciliados ou


de passagem em seu território todas as garantias individuais que
concedem aos seus próprios nacionais6 e o gozo dos direitos
civis essenciais, sem prejuízo, no que concerne aos estrangeiros, das
prescrições legais relativas à extensão e modalidades do exercício dos
ditos direitos e garantias. ”

Os estrangeiros não gozam dos direitos políticos. Tais direitos as legis­


lações estatais reconhecem apenas aos seus nacionais. No domínio econô­
mico eles devem ser equiparados aos nacionais, isto é, o Estado não pode
fazer leis discriminatórias em relação ao estrangeiro (ex.: leis fiscais). O
Estado não deve gravar mais aos estrangeiros do que os nacionais. O Estado
deve respeitar os direitos adquiridos dos estrangeiros que não contrariem
a sua ordem pública.
De um modo geral, tem-se condenado as leis discriminatórias em
relação aos estrangeiros em setores que não afetam a segurança nacional.
O estrangeiro está sujeito às leis e à jurisdição do Estado em que se
encontra e, em conseqüência, aos deveres impostos pela legislação que
deve ser por ele respeitada. Desta maneira, eles estão obrigados às leis
fiscais dirigidas à população em geral. Os estrangeiros domiciliados podem
ser obrigados a “serviço de polícia, bombeiro 011 milícia para a proteção
do local dos respectivos domicílios, contra catástrofes naturais ou perigos
que não sejam provenientes de guerra”. O estrangeiro não está obrigado
ao serviço militar.7 Ele não deve se “ingerir nas atividades políticas privativas
dos cidadãos do país” . Estes princípios estão consubstanciados na Conven­
ção Interamericana de Havana (1928).
No Brasil a “ situação jurídica do estrangeiro” foi regulamentada no
Decreto-lei n9 941, de 13 de outubro de 1969 (Estatuto do Estrangeiro) e
no Decreto n9 66.689, de 11.6.1970, e atualmente na Lei n9 6.815, de
19.8.80 (Estatuto do Estrangeiro), e Lei n9 6.964, de 9.12.81, e ainda pelo
Decreto 11 - 86.715, de 10.12.81.
E de se m encionar a situação especial do português no Brasil e do
brasileiro em Portugal, que foi estabelecida pela Convenção sobre Igual­
dade de Direitos e Deveres entre Brasileiros e Portugueses de 1971, onde
se estabelece: a) igualdade de direitos e deveres com os respectivos nacio­
nais; b) excetuam-se da “equiparação os direitos reservados exclusivamente,
pela Constituição de cada um dos Estados, aos que tenham nacionalidade
originária”; c) a igualdade de direitos e deveres é reconhecida mediante
decisão do Ministério da Justiça aos que a requererem; d) os direitos
polídcos só são reconhecidos aos que tiverem cinco anos de residência

1020
permanente e “dependem de requerimento à autoridade com pílenle”; e)
regem-se pela lei penal do F.stado de residência; f) “o gozo dos direitos
políticos no Estado de residência importa na suspensão do exercício dos
mesmos direitos 110 Estado 11a nacionalidade” ; g) a proteção diplomática
em relação a um terceiro país é feita pelo Estado da nacionalidade; etc.
Pode-se mencionar ainda como um avanço nesta matéria uma lei de 1981
na URSS. que confere aos estrangeiros os mesmos direitos que têm os
nacionais. Entretanto, o Conselho de Ministros pode aprovar limitações
em nome da reciprocidade, quando os outros países fazem restrições aos
cidadãos soviéticos.
' 372. A nacionalização8 é um instituto jurídico que tem repercussões
da maior importância no DIP. O General Torrijos, do Panamá, em pro­
nunciamento na ONU, observou, com razão, que a palavra nacionalização
é “uma figura de estilo porque estes recursos têm a nacionalidade do país
que o possui”. Ela ocorre por razões econômicas, sociais e^políticas e no
século XX tem-se tornado bastante comum. O histórico deste instituto
começa em 1917, com a Constituição do México, onde ele figura, e também
nos primeiros decretos revolucionários da URSS. Pode-se lembrar que o
dispositivo da Constituição mexicana foi considerado como não tendo
efeito retroativo. O ’Connell declara que a palavra “nacionalização” é “em­
pregada para descrever o processo pelo qual indústrias ou meios de pro­
dução, distribuição ou troca são concentrados no poder público, como
• execução de política econômica ou social”. Este poder de o Estado nacio­
nalizar decorre diretamente da sua soberania.
A nacionalização se distingue da expropriação e do confisco. A expro-
priação ocorre quando um particular é privado de um bem (ex.: necessi­
dade pública), havendo ou não pagamento de indenização. Quando ela
é sem indenização, hã o que se denomina confisco.8' A nacionalização se
" diferencia do confisco e da expropriação, porque estes dois últimos geral­
mente ocorrem em casos particulares, enquanto a nacionalização é “me­
dida de ordem geral tendo por finalidade eliminar, por razões sobretudo
políticas,9 as empresas privadas, ou as mais importantes delas, em um ou
vários setores da vida econômica do país” (Petrén). Por outro lado, a
expropriação segue normas que são preestablecidas, respeitando-se o
direito de propriedade: enquanto a nacionalização segue normas parti­
culares, onde se realça a “propriedade coletiva” (E. Schaeffer).
A estatização ocorre quando o Estado assume diretamente a gestão do
setor econômico, enquanto na nacionalização o Estado entrega a gestão
a “entes públicos econômicos" (Gianfranco Vallati).
Tem sido assinalado que a palavra confisco não tem um sentido pró­
prio, sendo aplicado no direito penal (confisco de bens de um condenado),
na legislação aduaneira (em relação a bens não declarados) ou, ainda, em
tempo de guerra, ou como uma variante da expropriação (Ch. Rousseau).

1021
A partir de 1945 os Estados só têm utilizado a palavra nacionalização.
O DIP, durante um longo período, afirmou a inviolabilidade da pro­
priedade privada. Entretanto, esta orientação consagrada nas Convenções
de Haia (1899 e 1907) foi-se transformando no decorrer do presente
século,<JAaté a conclusão dos Acordos de Potsdam (1945). Nesles últimos
os aliados estabeleceram a liquidação e a repartição entre eles dos bens
alemães. A liquidação se estendeu não apenas aos bens localizados em
países em guerra, mas também aos localizados em Estados neutros, como
a Suécia e a Suíça.10 Em conclusão se pode observan 1) que o DIP permite
ao Estado dispor dos bens dos seus nacionais, bem como de estrangeiros,
situados no seu territorio e territórios estrangeiros; 2) o DIP admite que
um Estado entregue os bens dos seus nacionais ’a-um Estado estrangeiro,
mesmo que ele não tenha adquirido a propriedade destes bens nos termos
da sua legislação nacional.11 Não significam os principios a cima enunciados
que o DIP não proteja a propriedade privada. A própria Declaração Uni­
versal dos Direitos do Homem afirma o direito do indivíduo à propriedade
(an. XVII). Esta é a primeira regra escrita de proteção à propriedade
privada. Os Pactos de Direitos Humanos não se referem ao direito à
propriedade. Entretanto, se pode dizer que ele foi admitido implicitamente
nos referidos Pactos, vez que eles estabelecem: “Não se poderá admitir
restrição ou abandono de nenhum dos direitos humanos fundamentais,
reconhecidos ou vigentes em um país em virtude de leis, convenções,
regulamentos ou costumes, sob pretexto de que o presente pacto não os
reconhece ou os reconhece em menor grau.” Tem-se acentuado também
no DIP a propriedade como tendo “função social”. Dentro desta orienta­
ção, o DIP tem sofrido uma alteração profunda e, atualmente, o proprie­
tário é relegado a segundo plano, tendo em vista a “função social” da
propriedade. Os interesses estatais passam a ser os predominantes. O art.
1 do protocolo I de 1952 da convenção européia também consagra a
propriedade privada. A partir de 1986 as Nações Unida passa a consagrar
a propriedade privada em resoluções. Esta tendência consolidou-se com
o fim do comunismo no leste europeu (Fausto de Quadros).
Tem sido observado que o movimento de nacionalização tem dimi­
nuído e só tem ocorrido em setores chave da economia estatal. Este fato
decorre da consideração de que o 3“ Mundo tem necessidade de capitais
e, ao mesmo tempo, ele tem desenvolvido meios de controle sobre inves­
timento estrangeiro sem precisar recorrer à nacionalização. A nacionali­
zação tem um significado “ideológico e simbólico” para o 3“ Mundo, bem
como um elemento de “reconquista da identidade nacional”. Alegam ainda
que a nacionalização está fundamentada no direito interno do Estado
(Feuer e Cassan).
Alguns autores (N. Jacoby) têm assinalado que os investimentos pri­
vados após a 2- Guerra Mundial têm-se despolitizado, o que “ é desejável

1022
porque retín/, o risco de conflilos militares provocados pelo relacionamento
econômico entre nações”.
O Protocolo Adicional (1952) à Convenção de Salvaguarda dos Direitos
do Hornem e das Liberdades Fundamentais no Conselho da Europa esta­
belece:

“Toda pessoa física ou jurídica possui o direito ao respeito dos


seus bens. Ninguém pode ser privado da sua propriedade a não
ser por motivo de utilidade pública e nas condições previstas
pela lei e pelos princípios gerais do direito internacional.”

A Convenção concluída em 1955 no ámbito do Conselho da Europa


sobre condição dos estrangeiros estabelece, no art. 23:

“Os súditos das Partes Contratantes, em caso de expropriação


ou de nacionalização dos seus bens por uma óutra Parte, terão
direito a um traiam en lo, ao menos tão favorável quanto o dos
nacionais."

A Assembléia Geral da ONU, em uma resolução referente à soberania


permanente sobre os recursos naturais (1962), afirma:

“A nacionalização, a expropriação ou a requisição deverão se


fundamentar em razões ou motivos de uliiidade pública, de
segurança ou de interesse nacional, que devem predominar
sobre simples interesses particulares ou privados, tanto nacio­
nais como estrangeiros. Nestes casos, o proprietário receberá
uma indenização adequada... Em todo o caso em que a questão
de indenização der lugar a uma controvérsia, as vias de recurso
nacional do Estado que toma tais medidas deverão ser esgota­
das...”. Quando, em caso de reclamação diplomática, o litígio
será resolvido por arbitragem ou procedimento judiciário.

Para Dominique Rosemberg esta é uma resolução declaratoria de um


acordo entre Estados sobre um princípio jurídico. A resolução é formada
por normas que “conduzem efetivamente a obrigações de comportamen­
to”.
Em uma resolução de 1966, também intitulada “Soberania Permanente
sobre os Recursos Naturais”, a Assembléia Geral “reconhece o direilo de
todos os países, e em particular dos países em vias de desenvolvimento, a
assegurar e aumentar sua participação na administração de empresas que
são integral ou parcialmente operadas por capital estrangeiro”, bem como
ter uma participação maior nos seus lucros, tendo em vista as necessidades
da população e as “práticas contratuais mutuamente aceitas”. Os países

1023
investidores devem sei abster de qualquer ação que impeça o exercício
deste direito. Entende-se por recursos naturais os recursos minerais e
agrícolas, como as atividades de exploração, utilização, transformação e
comercialização das riquezas naturais.
Pelo menos dois princípios podem ser deduzidos dos textos citados:
a) a nacionalização só deve ocorrer quando houve interesse público,11' b)
deve ser paga uma indenização. A Declaração Econômica adotada em
Argel, em 1973, na 4- Conferência dos Países Não Alinhados, afirma que
cabe ao Estado, ao nacionalizar, fixar o montante da indenização, assim
como a modalidade de efetuar o pagamento, e as dívidas serão solucionadas
pelo direito interno. Entretanto, '¿declaração da Assembléia Geral sobre
os direitos e deveres econômicos do-Estado, de 1974, apenas reconhece
ao Estado o direito de nacionalizar e se refere à indenização, como devendo
ser apropriada (adequada e não integral), e que a questão será resolvida
pelos tribunais internos do Estado. Antigamente sustentou-se que a nacio­
nalização não devia fazer discriminação. Esta tese foi levantada quando a
Indonésia nacionalizou apenas os bens de holandeses e Cuba apenas os
bens de norte-americanos. Ela não tem mais sido invocada.
Diversas opiniões têm sido emitidas pela doutrina a respeito da nacio­
nalização no DI: a) o Estado é livre para nacionalizar (Schwarzenberger);
b) o Estado deve respeitar os direitos adquiridos no momento da nacio­
nalização e pagar previamente uma indenização (Bindschedler); c) a na­
cionalização só produz efeitos dentro do território estatal (Edward Re);
d) a empresa do Estado que for a sucessora da nacionalizada deve cumprir
as obrigações assumidas pela sucedida (Instituto de Dl); e) uma corrente
tem negado a aplicação da teoria do direito adquirido para proteger o
estrangeiro (Mario Bettali).
Podemos mencionar ainda que alguns autores (Nwogugu) assinalam
que o Dl costumeiro obriga ao pagamento de uma indenização pronta,
adequada e efetiva.12 O fundamento do pagamento é evitar o enriqueci­
mento injusto.
Podemos observar que as nacionalizações em relação ao Dl, podem
ter .duas situações: a) serem reconhecidas internacionalmente; b) não se­
rem reconhecidas internacionalmente (Katzarov).
A nacionalização devera ser reconhecida internacionalmente quando:
1) “atende às condições morais, econômicas e constitucionais de uma
n a c i o n a l i z a ç ã o '2 ) .é paga uma indenização justa. Esta nacionalização
deverá p ro d u z ir efeitos fora do Estado que a efetuou.14
A nacionalização não é. de um modo geral, reconhecida internacio­
nalmente: a) se ela não preencher as condições enumeradas acima; b) se
uma indenização justa não é paga.1:“ Os seus efeitos não se estendem além
do Estado que a efetliou.
Atualmente concordamos com a opinião de J. Touscoz, de que a
obrigação de indenizar não seria um requisito de validade da nacionaliza­
ção, mas uma mera conseqüência desta.

1024
Algumas observações podem ser feilas em matéria de pagamento de
indenização. Allende não negava à firma Kennecott o direito a indenização,
mas sustentava que a empresa não tinha direito a esta em nome da “teoria
de lucros excessivos”. Esta teoria foi aplicada pelos EUA durante a 25
Guerra Mundial às indústrias de gtierra e, após 1945, para a luta antitnisie.
Esta teoria foi consagrada no art. 37 do Pacto Andino. Pode-se acrescentar
que as empresas no Chile chegavam a enviar como lucros “40% do capital
investido por ano”. A teoria dos lucros excessivos faz com que a empresa
acabe por dever ao Estado. Por outro lado, a empresa teve enriquecimento
sem causa. Um dos critérios que se pode utilizar para verificar os lucros
excessivos é comparar a rentabilidade da “filial” com a matriz (Mario
Beltali). E de se recordar que o conceito de benefícios normais surgiu nos
EUA e foi introduzido pelo governo nos seus litígios com as empresas
privadas que trabalhavam para a defesa (Patrícia Buirette-Maurau). O luci o
das empresas era tão grande que se poderia aplicar a teoria do enrique­
cimento sem causa.
Calcula-se o lucro excessivo em relação à taxa de rentabilidade anual
normal de empresas do mesmo setor. Para o 3- Mundo o pagamento de
uma indenização é um empobrecimento, porque ela não é reinvestida no
Estado. O 3e Mundo defende que a questão da indenização é matéria de
direito in terno.
O próprio cálculo da indenização é difícil de ser feito. Os critérios
podem ser vários: valor real ou o valor de mercado. Por outro lado, o
próprio valor contábil é geralmente mais baixo do que o valor real, tendo
em vista que isto é feito para fugir ao fisco. Entretanto, é o sistema mais
usado na América Latina. Várias decisões da comissão mista americano-
mexicana estabelecem o valor de mercado. E igualmente a tese de Schwar-
zenberger. Outra proposta que tem sido feita é a de se levar em conta a
“expectativa de lucro”. Os doutrinadores também se encontram divididos,
como Lauterpacht e Foighel, que sustentam só ser necessária uma com­
pensação total nas “expropriações m enores”, enquanto que nas “maiores”
seria suficiente uma compensação parcial. Na verdade o DIP não estabelece
qualquer critério.
Outros, ainda, sustentam que a indenização deverá ser calculada não
apenas no interesse do proprietário, mas também no interesse do Estado,
e a cláusula “rebus sic stantibus". com a teoria de imprevisão, “permite
algumas vezes reduzir a ‘obrigação’ prevista em contrato perante um tri­
bunal internacional, quando o Estado tiver impossibilidade de pagar a
indenização”. ' .
Abd-El-Kader Boye sustenta que a denominada desigualdade a ser
compensada, defendida pelos países subdesenvolvidos (v. capítulo Direitos
Fundamentais dos Estados), deve ser aplicada no tocante à avaliação-da
indenização. Sustenta ainda este autor que o Estado que efetuar a nacio­
nalização tem competência para sozinho proceder à avaliação da indeni­

1025
zação. Nesta ele pode compensar as dívidas fiscais da empresa. A avaliaçao
deve ser sobre o valor contábil, porque a empresa não poderá reclamar,
lendo em vista que ninguém pode se valer de sua própria torpeza. Ele
pode pagar na sua própria moeda.16
Não há norma de Dl sobre o cálculo da indenização. A Conferência
dos Não Aliados, Argel, em 1973, estabeleceu que o regime de indenização
será fixado pelo Estado. Bedjaouí, na Comissão de Dl, sustentou que não
há pagamento de indenização quando a nacionalização atinge investimen­
tos realizados na época em que o Estado era colônia. No caso de investi­
mentos realizados após a independência, haveria indenização.
Na verdade, os países em vias de desenvolvimento não têm meios para
o pagamento de uma indenização “pronta, adequada e efetiva". “ Portanto,
o pedido norte-americano (neste sentido) é relevante apenas como veículo
de uma ameaça implícita de que os Estados Unidos recorrerão a outros
meios, se suà ordem forma) não for cumprida” (William AppJeman Wil­
liams). Bedjaoui observa com toda a razão que um país nacionaliza quando
ele é pobre e que, portanto, “a nacionalização supõe previamente uma
certa incapacidade de pagar”. Conclui o jurista argelino que se for criado
um dever de indenização, o poder de nacionalizar fica ilusório. Vargas
Carreno observa que os próprios EUA têm no fundo uma política contra­
ditória ao estimular a reforma agrária para evitar revoluções. O que deve
fazer um país pobre com as terras em mãos de norte-americanos?
Tudo isto é agravado pela exigência dos países investidores de que a
indenização deve ser paga prontamente.
Atualmente têm sido utilizados, em matéria de indenização, os deno­
minados “lump sum agreements”, em que o poder expropriante dá uma
indenização global ao outro Estado pelo conjunto dos bens expropriados
independente do valor dos bens. Este tipo de acordo foi utilizado pela
primeira vez entre URSS e Suécia em 1941 (Pecourt-Garcia).16A Ele é o
mais prático quando o litígio está já em vias diplomáticas. Cabe ao Estado
que recebe a indenização fazer a distribuição entre os seus particulares.
Algumas desvantagens têm sido apontadas em relação a estes acordos: a)
impedem a formação de um direito CQstumeiro em matéria de indenização;
b) só uma parte do valor da propriedade é recebida. Parece que o primeiro
acordo da indenização de soma global nas Américas foi o concluído entre
Peru e EUA em 1974. Atualmente a indenização “ não é mais uma reparação
automática e integral, mas uma compensação cu jo montante é fixado em
função das circunstâncias próprias a cada operação” (Patrick Juillard).
Alberto Pérez apresenta como características destes acordos as seguintes:
a) foi paga sempre uma compensação; b ) e m nenhum caso existiu “ rapidez,
adequação e efetividade”. Seidl-Hohenveldern vê nestes acordos um novo
costume no Dl de que eles são declaratorios. Geralmente o pagamento
deve ser feito em moeda convertível, mas têm havido acordos em que não
é feita esta exigência e se admite o pagamento em moeda local.

1026
É de se lembrar que os acordos para pagamento de indenização sao
normalmente negociados entre Estados com poderio econômico diferente.
Entretanto, o uso da força econômica nao vicia estes acordos (Baxter).
A nossa conclusão é que não existe urna norma internacional impondo
ao Estado a obrigação de pagar uma indenização. Se esta norma existiu
no Dl Clássico, ela desapareceu por dessuelude (A. Giardina). A nosso ver
a nacionalização, sendo um direito do Estado, a indenização como decor­
rência vai depender do direito interno. Cabe a cada Estado regulamentar
livremente o direito de propriedade. O último aspecto sobre a nacionali­
zação e o que diz respeito à imunidade de jurisdição do Estado estrangeiro
no tocante aos atos de nacionalização (v. capítulo XIX).
Para Remiro Broions a indenização que tem sido paga pelos Estados
é uma “indenização-compensação” calculada com base em diversos fatores
e não levando em consideração apenas o valor do mercado.
Como afirma Fausto de Quadros os “acordos de indenização global'’
não tem “modelo fixo e em regra a indenização varia em 20 a 80% do
valor do bem”.
372A. A proteção dos investimentos estrangeiros17 é realizada pelos
países investidores por meio de sanções, seguros e acordos.
Os primeiros acordos sobre investimentos estrangeiros foram criados
pelos EUA em tratados com a França (Fausto de Quadros).
No primeiro caso temos a denominada emenda Hickenlooper, incluída
em 1962 devido à expropriação de bens da ITT no Rio Grande do Sul,
no Foreign Assistance Act. Estabelece que os EUA suspenderão o auxílio
às nações em que bens de norte-americanos tenham sido expropriados
sem indenização; as firmas abrangidas por esta emenda são aquelas em
que os norie-americanos tenham pelo menos 50% de participação.
O Executivo dos EUA tem resistido a aplicar esta emenda. Ela dá aos
países em vias de desenvolvimento a impressão de que os auxílios dados
pelos EUA visam apenas proteger os interesses privados norte-americanos.
Esta emenda foi aplicada ao Ceilão em 1963. No caso do Ceilão, o Depar­
tamento de Estado cortou apenas pequena parte da assistência externa. A
emenda na época de sua aprovação teria evitado expropriações de empre­
sas norte-americanas no Paraná e Honduras, que se encontravam em an­
damento. Na mesma linha se encontra cláusula inserida no Sugar Act de
1951, em que os EUA deixam de comprar a quota de açúcar quando bens
de cidadãos ou empresas norte-americanàs são expropriados sem o paga­
mento de indenização. Ou, ainda, o González Amendment, de 1972, que
determina que o diretor norte-americano no BIRD e BID deverá votar
contra financiamentos a países que nacionalizarem ou confiscarem bens
pertencentes a norte-americanos.
Pode-se assinalar ainda, como sanções por danos causados a investi­
mentos estrangeiros; a) o congelamento dos depósitos estrangeiros; b)
reclamações junto a organismos internacionais; c) coerção econômica.

1027
Os Estados investidores no estrangeiro procuram se resguardar de
* nacionalizações por meio de acordos de garantia de investimento, que
criam nos subdesenvolvidos verdadeiros quistos econômicos. Tais acordos
tém sido bilaterais e muhilaterais. Entre os primeiros podemos citar o de
1965, entre o Brasil e os EUA. Estes acordos só são concluídos com países
em vias de desenvolvimento e de um modo geral não respeitam a regra
do esgotamento dos recursos internos. Estes acordos apresentam, entre
outras características, as seguintes: a) proíbe-se tratamento fiscal discrimi­
natório ao investimento estrangeiro; b) a indenização deve ser adequada
e efetiva caso haja expropriação ou nacionalização; c) estabelece facilidades
para a transferência cíe dinheiro para o exterior; d) arbitragem como modo
de solução dos litígios; é) eles excluem a apreciação do litígio por parte
dos tribunais internos. Entre os muhilaterais podemos mencionar a con­
venção para a solução dos litígios relativos aos investimentos entre Estados
e naturais de outros Estados, assinada em 1965 no âmbito do BIRD, em
que é prevista a criação de um Centro Internacional para solucionar tais
litígios e que oferece aos litigantes a conciliação e a arbitragem. O Centro
tem um Conselho Administrativo e um Secretariado. O Conselho tem entre
as suas funções fixar as regras de conciliação e de arbitragem. A sua sede
é em Washington. Qualquer procedimento só tem início no Centro se as
duas partes dão o seu consentimento. Sendo o litígio submetido a arbitra­
gem, os Estados não podem dar proteção diplomática ou apresentar re­
clamação. O DIP é aplicado: se as partes concordam, se o direito interno
do Estado receptor faz remissões ao DIP, se o direito interno viola o DIP
ou, ainda, quando se tratar de matéria regulamentada pelo DIP. O Estado
é obrigado a cumprir a decisão e considerá-la coisa julgada. A decisão não
é equiparada a uma sentença estrangeira. O Estado não precisa executar
a decisão quando é semelhante àqueles casos em que as decisões finais
dos seus tribunais não são executadas (devido às diferentes interpretações
de imunidade de jurisdição de Estado estrangeiro, que a convenção res­
peita). Os Estados investidores renunciam à proteção diplomática. Ne­
nhum Estado latino-americano é parte da convenção de 1965 do BIRD
(Guido F. S. soares).
Esta convenção recebeu várias críticas dos países em vias de desenvol­
vimento: á) as controvérsias não são apreciadas pelos tribunais locais; não
sendo aplicada a regra do esgotamento dos recursos internos. E verdade
que o Estado pode impedir isto; b) coloca, perante os tribunais arbitrais,
os Estados e as empresas em posição de igualdade; c) o poder de prescindir
do direito interno na solução internacional da questão. E verdade que na
letra e o Estado interessado pode impedir que isto ocorra. Admite no
procedimento de solução que pessoas físicas e jurídicas (empresa?) figurem
ao lado do Estado.
E de se recordar que a convenção européia sobre arbitragem interna­
cional comercial (Genebra, 1961) dá às partes autonomia parji.fixar a

1028
constituição do tribunal e o processo arbitral, e o direito a ser aplicado é
fixado pelas parles.
Os EUA instituíram um programa de garantia de investimento por
meio de seguros realizados junto ao governo norte-americano. Antes de
ser feito o seguro, o país onde vai ser realizado o investimento é investi­
gado.1'-' O sistema é também adotado em outros países, como a Alemanha,
cujo programa de garantia é por 15 anos e pode ser estendido a 20 anos,
enquanto o do Japão seria de 5 a 15 anos e pode ser prorrogado. Foi
criada também uma companhia ínterárabe para garantir o investimento
de uns em outros países árabes. O sistema de seguro em agências gover­
namentais faz com que. por exemplo, o povo norte-americano acabe por
pagar as nacionalizações e que ele acabe por pressionar o Executivo para
este, por sua vez, pressionar o Estado que faz a nacionalização no sentido
de pagar uma indenização.
Geralmente os Estados receptores de investimento estrangeiro reúnem
a sua legislação em Códigos de Investimento, que podem ser estimulados
ou dissuasórios do investimento. De um modo geral, os Estados não têm
respeitado o princípio de não discriminação em relação a investimentos
estrangeiros.
Desde 1998 está para ser assinado na OCDE o Acordo Multinacional
de Investimento (AMI). Este acordo é uma volta ao colonialismo. Ele
permite as empreas acionarem os governos que adotaram políticas que
diminuam o seu lucro, os governos não podem exigir a utilização da
mão-de-obra, etc. Os investidores não têm obrigações e nem responsabili­
dades. Os investidores podem adquirir tudo o que figura no tratado. Este
texto é péssimo para os países em desenvolvimento e só não foi ainda
concluído devido à crise financeira.
Nos países em desenvolvimento são comuns dois tipos de controle: a)
é preciso a existência de um sócio local com 50 % ou mais de investimento;
b) o investidor tem de assumir determinados compromissos, por exemplo,
introduzir a tecnologia no país.
373. Os contratos entre os Estados e empresas estrangeiros18 têm sido
extremamente comuns nos dias de hoje e se encontram com um regime
jurídico todo especial, vez que eles não são^nem tratados, nem contratos
de concessão submetidos inteiramente à lei do Estado. Esta situação espe­
cial decorre da própria situação econômica dos contratantes, em que
muitas vezes a empresa estrangeira é mais poderosa do que o próprio
Estado.
Entre os elementos característicos apontados por Sacerdoti estão: a)
o elemento internacional dado pela nacionalidade estrangeira: b) a natu­
reza pública e privada ao mesmo tempo da relação; c) a presença de
cláusulas arbitrais;18A d) a diversidade de sistemas jurídicos do investidor
e do receptor; e) a intervenção diplomática do Estado nacional do estran­
geiro na conclusão do contrato, etc. Estes contratos para o Estado seguem

1029
r n u i i a s vezes m n procedimento “semelhante" ao dos tratados, por exemplo,
a Companhia de Petróleo do Irã conclui acordos que para entrar em vigor
precisam ser aprovados pelo Conselho de Ministros e pelo Legislativo.
Dentro deste aspecto, pelo lado do Estado, geralmente intervém a sua
autoridade máxima, isto é, a mesma que tem o “treaty making power” .
Assim, o contrato de 1933 entre a Pérsia e a Anglb-Iianian Oil Co. declara
que só entrará em vigor após a ratificação pelo X á .ISB O aspecto interna­
cional destes contratos é dado muitas vezes pela sua própria denominação
de “acordo". A teoria dos contratos internacionais surgiu no início dos
anos 60 (Philippe Khan).
Weil, além de repetir algumas das características mencionadas pelos
autores citados anteriormente, acrescenta, ainda, a de que estes contratos
clão às sociedades comerciais contratantes “privilégios e prerrogativas mui­
tas vezes consideráveis": facilidades aduaneiras, isenções fiscais, etc.; “al­
gumas vezes elas dividem com o Estado uma certa responsabilidade para
a manutenção da ordem sobre o território, muitas vezes bastante extenso,
sobre o qual ela exerce uma espécie de controle”. Outra característica
assinalada por este jurista francês é que a redação destes contratos é
imprecisa e algumas vezes deixa de regulamentar assuntos considerados
delicados. A sua imprecisão é propositada.
Estes contratos geralmente possuem cláusulas de intangibilidade (os
contratos só podem ser alterados por consentimento mútuo) e de estabi­
lização (coloca o investidor ao abrigo de mudanças legislativas). Daí o
interesse das empresas que as mais altas autoridades participem da con­
clusão dos contratos, vez que esta cláusula só opera se o Estado se com­
prometer a ela. A doutrina tem sustentado a responsabilidade internacional
do Estado que viola tais contratos, sendo que o esgotamento dos recursos
internos não seria necessário quando a “violação” resultasse de uma lei
do Estado (Sacerdoti).
Jiménez de Aréchaga nega a existência de um Dl dos Contratos e
considera que a soberania do Estado sobre os recursos naturais se sobrepõe
a uma cláusula de estabilização.
Estes contratos são também denominados de acordos econômicos de
desenvolvimento, e segundo Hyde eles se distinguiriam de uma concessão
no sentido de que esta enfatiza algo dado pelo Estado, enquanto que estes
acordos criam uma inter-relação de direitos e deveres do Estado e do
estrangeiro.
O grande problema consiste em se saber qual o direito que rege tais
contratos, e a responsabilidade decorrente de sua violação. Na maioria dos
casos eles se regem pelo’direito intemo. A idéia da sua “desnacionalização”
começou após a 1! Guerra Mundial. Na maioria dos casos eles fazem o
reenvio aos princípios do direito. Existem diversas teses: a) aplica-se o
princípio “pacta sunt servanda”; e a sua violação acarreta a responsabili­
dade internacional (Cavaré, Shawcross). Friedmann igualmente sustenta

1030
que eles seriam regúlame nudos pelo D1P; b) o contrato perlence à ordem
jurídica interna. A sua violação não acarreta a responsabilidade interna­
cional. E a tese de Whiteman; c) uma terceira tese é ainda a de Prosper
Weil,1!l que declara que em alguns casos a violação pode acarretar a res­
ponsabilidade internacional desde que ela seja um delito internacional. E
preciso ser feita uma análise em cada caso. Esta tese tem o inconveniente
de sua imprecisão; d) McNair sustenta que eles se regem pelos princípios
gerais do direito. Para Renéjean Dupuy a menção aos princípios gerais é
uma cláusula de internacionalização; e) Verdross afirma que eles criam
uma “ordem legal própria”. Contudo é procedente a crítica de Weil de
que as partes não criam uma nova ordem jurídica. A vontade só cria direito
quando um direito anterior-a-ela, vontade, lhe concede este poder; g)
Jessup afirma que eles se regérp pelo direito transnacional, mas a sua
violação não acarreta a responsabilidade internacional. Entretanto, este
direito não tem fontes próprias (Pazarci). Dominique Carreau também
defende que eles pertencem ao D. Transnacional, que teria as seguintes
fontes: tratados; costume de origem privada (usos comerciais internacio­
nais); princípios gerais do direito; jurisprudência interna e internacional
e a doutrina que aqui tem um papel mais relevante do que no DIP. Mann
sustenta que se o contrato nada determinar ele é considerado com o in­
ternacionalizado; g) finalmente, a tese de Pazarcide que se trata de um
“direito quase internacional”. O contrato pertenceria a uma “ordem in­
termediária e mista” entre o Dl e o direito interno. Salienta este autor
que esta ordem jurídica é mista porque o seu conteúdo viria do direito
interno, dos princípios gerais do direito e da prática contratual. Seria
intermediária porque se localiza entre o direito interno e o DIP, mas estaria
submetida a esta. As suas fontes seriam: I) princípios gerais do direito; 2)
prática contratual e 3) jurisprudência. Ainda expondo a posição deste
autor, a responsabilidade internacional neste contrato surgiria das relações
interpartes e não propriamente da responsabilidade internacional, que é
entre Estados. A responsabilidade internacional aparece quando for violada
norma de Dl Positivo. Alinha Pazarci que são aceitas as seguintes regras:
a) denegação de justiça; b) a existência de um acordo; c) princípio de não
- discriminação; d) princípio do estoppel que visa garantir uma coerência.
Alinha ainda as seguintes regras como não tendo aceitação pacífica: a )
respeito ao direito adquirido; b) princípio que proíbe o enriquecimento
sem causa; c) princípio que proíbe o abuso de direito.20 Pode-se acrescentar
ainda a tese de Charles Leben de que o contrato do Estado é um novo
ato jurídico internacional.
Na arbitragem da Aramco (1958) a decisão sustentou que os contratos
do tipo de concessão são regulados pelo direito interno de quem concedeu
a concessão, submetido aos princípios de direito e não ao DIP. A CPJI no
caso dos “Empréstimos Sérvios” (1929) também sustentou que não eram
tratados internacionais e estariam “fundamentados” no direito interno de

1031
algum país. Esta é na verdade a posição que melhor atende aos Estados
em vias de desenvolvimento. Em favor da tase de que estes contratos sao
regulados pelo direito interno podemos lembrar: 1) as empresas comerciais
só têm personalidade quando há um tratado que as reconheça como tais;
2) até hoje as empresas comerciais nãtf [iodem concluir tratados; 3) são
contratos comerciais; 4) existir cláusula de arbitragem não significa que
são tratados, vez que a arbitragem está consagrada nas relações comerciais
privadas.2<IA
Pode-se recordar que a tese da internacionalização destes contratos é
encontrada na resolução de 1962 acerca da soberania permanente sobre
recursos naturais e, em 1974. no mesmo sentido, estão resoluções relativas
a NOEI, e a mesma tese foi defendida na década de 60 no Banco Mundial.
Não podemos deixar de reconhecer que o Estado poderia se “libertar”
do contrato modificando o seu direito interno (Jacque). Entretanto, isto
é um risco que qualquer particular corre ao contratar com um Estado e
que existe mesmo dentro das próprias fronteiras do Estado, quando este
contrata com os seus nacionais.
Na verdade, nesta matéria existe mais uma manifestação do conflito
entre os países investidores e os países receptores de capital. Os primeiros
sustentando que se trata de acordos internacionais, enquanto os segundos
sustentam que se trata de contratos de direito interno.
A conclusão que podemos apresentar é que estes contratos estão sub­
metidos ao direito interno2"6 do Estado receptor, tendo em vista que o
interesse público deste parece-me mais importante do que o interesse
comercial da empresa. Alegar que assim os investimentos não iriam para
o exterior seria ignorar que as empresas estrangeiras não encontram con­
dições tão vantajosas em seus países quanto as encontradas nos países
receptores. O interesse no investimento é recíproco, parece-me que o da
empresa é maior ainda (mais lucrativo) do que o do Estado onde é feito
o investimento. E verdade que no campo da política isto não funciona: os
países em desenvolvimento nem sempre conseguem fazer uma política
uniforme e cada um procura acenar com maiores vantagens para os in­
vestimentos estrangeiros. Os investimentos estrangeiros trazem vantagens,
mas não tantas quantas as que são apregoadas. Infelizmente, geralmente
os Estados se esquecem de verificar o custo político (sem falar no econô­
mico) de tais investimentos.
Roberto Ago, no seu relatório à Comissão de Dl sobre responsabilidade
do Estado, escreve que a violação pelo Estado de um contrato concluído
com uma empresa não constitui o elemento objetivo de um fato interna­
cional ilícito e não pode dar lugar à responsabilidade internacional, porque
ele corresponde a uma ordem jurídica distinta, que pouco importa seja
nacional ou não.
Prosper Weil observa que a internacionalização dos “state contracts”
é atualmente contestada em nom e da nova ordem econômica internacio-

1032
nal. Assinala este jurista que se na década de 60 a tendência foi a interna­
cionalização. esta tendência foi mudada na década de 70. que sustenta a
tese oposta.
Podemos acrescentar que. apesar de tudo o que i'oi dito, a inaioria
dos investimentos norte-americanos e japoneses são feitos nos países ricos,
por exemplo, na Europa (P. Ordonneau).
E obvio que nada impede ao Estado receptor pressionado “contratar”
expressamente algo diferente.
Finalmente, sustentamos que os contratos internacionais deveriam ser
submetidos à aprovação do Legislativo, devido às seguintes razões: a) ver­
sam sobre matéria que interessa à soberania do Estado; b) é matéria cons­
titucional (petróleo e subsolo pertencem à União); c) dar publicidade; d)
não procede alegar que quem contrata é uma empresa de economia mista,
porque ela é o próprio Estado. Não significa isto, repetimos, que os loca­
lizamos na ordem jurídica internacional.
E de se recordar, por ser um tema correlato, que pela Constituição
de 1968 (art. 52, inciso V) compele ao Senado Federal: “autorizar opera­
ções externas de natureza financeira, de interesse da Urçião, dos Estados,
do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios” .
Os contratos internacionais são sobre as mais diferentes matérias: a)
venda internacional (regulamentada pela Convenção de Haia de 1955),
com diferentes modalidades e vários contratos-tipo elaborados por dife­
rentes organismos internacionais; b) prestação de serviços; c) transferência
de tecnologia; d) operações funcionais; é) seguros de operações interna­
cionais (como com o Lloyds de Londres); g) contratos marítimos (regula­
mentados pela Convenção de Atenas, que entrou em vigor em 1987, sobre
transporte por mar de passageiros e suas bagagens; Convenção de Londres,
sobre a limitação de créditos marítimos, que entrou em vigor em 1986);
g) transporte aéreo .(regulamentado pela Convenção de Varsóvia de 1929)
(J. Touscoz).

1033
NOTAS

1. A. Vcrdross — Regles internalionales concernant le (rairement des étran-


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Barón Frederick Mari van Asbeck — Le régime des étrangers dans les colonies,
in RdC, 1937, vol. III, t. 61, págs. 5 e segs.; Ahmed Rechid — La condition des
étrangers dans la République de Turquie, in RdC, 1933, vol. IV, t. 46, págs. 169
e segs.; B. Griziolti — L'imposition fiscale des étrangers, in RdC, 1926, vol. III, t.
13, págs. 5 e segs.; André Weiss — Traité Théorique et Pratique de Droit Inter­
national Privé, t. II, 1908, págs. 1 e segs.; Suzanne Basdevant — Théorie Générale
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Pradelle, e J . P. Niboyet, l. VIII, 1930, págs. I e segs.; William Evan Davies — The
English Law Relating in Aliens, 1931; Eduardo Espinóla e Eduardo Espinóla Filho
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Brasileiro, vol. VI, 1940; Edwin M. Borchard — The Diplom atic Protection of
Citizens Abroad or The Law o f International Claims,. 1919; Jacq u es Maury e Paul
Lagarde — Etranger, in Dalloz — Encyclopédie Juridique — Répertoire de Droil
International, publicado sob a direção de Ph. Francescakis, t. 1, 1968, págs. 767 e
segs.; A. Dardeau de Carvalho — Situação Jurídica do Estrangeiro no Brasil, 1976;
Myres S. McDougal, Harold D. Lasswell e Lang Chu-chen — T h e Protection of
Aliens from Discrimination and W orld Public Order: Responsibility o f States Con-
jo in e d with Human Rights, in AJIL, July, 1976, vol. 70, n9 3, págs. 432 e segs.;
Richard B. Lillich — Duties o f States Regarding The Civil Rights o f Aliens, in RdC
1978, vol. III, t. 161, págs. 329 e segs.; Général Aram Karamanoukian — Les
Étrangers et le Service Militaire, 1978; Ja co b Dolinger — Direito Internacional
Privado, 1993, págs. 202 e segs.; Luiz Olavo Baptista — O Estrangeiro. Reflexões
para a Constituinte, ¿re A Nova Constituição e o Direito Internacional, coordenação
de Jacob Dolinger, 1987, págs. 135 e segs.; Sylvio Loreti — O Estrangeiro no Brasil
da Colonia à República, in BSBD1, 1985/86, págs. 121 e segs.; Mirto Fraga — O
Novo Estatuto do Estrangeiro Com entado, 1985; Yussef Said Cahali — Estatuto do
Estrangeiro, 1983; Francis D elpérée — Les Droits Politiqües des Etrangers, 1995.
lrineu Slren ger — Direitos e O brigações dos Estrangeiros no Brasil, 1997. François
Julien Leferriére — Droit des étrangers, 2000. Carmen Tiburcio — T h e Human
Rights o f Aliens Under International In Comparative Law, 2001 (excelente obra).
2. O D1P consuetudinario reco n h ece ao Estado o direito de proteger os seus
nacionais no estrangeiro.
2A. Este direilo surge para ser aplicado ao camponês desenraizado, “fugitivo
desconhecido". Era o “aubain” urna especie de servo “incapaz de se casar livre­
mente e de transmitir conform e a sua vontade o pouco que ele possuía". Este
direito era um dos lucros do senhor para compensar os seus camponeses que iam
embora. Entretanto, os hom ens de negocio não aceitavam que este direito se
aplicasse a eles. Nos textos de d ireilo costumeiro o direito " d ’aubaine” se reforça,
mas na prática deixa-se ele cair em dessuetude no tócam e aos hom ens de negocios
em viagem. As cidades negociaram isto com os príncipes (Jean Favier — -De l’or
et des épices. Naissance de l’hom m e d’affaires au Móyen Age, 1987). Outra inter­
pretação dada a este direito é a d e jo h n Gilissen (Introdução Histórica ao Direilo,
1988), que observa ter este direito surgido nos séculos X I e X II e que só eram.
entregues ao senhor da terra os bens do estrangeiro que tivesse falecido sem
herdeiros. No século XVI passou a ser um direito do rei, e o estrangeiro não podia

1034
dispor de seus bens por testam ento. Um outro é o “direito de herança” (“droil
d’issue”), que na Baixa Idade Média, na França e Inglaterra, os estrangeiros não
podiam adquirir bens “mortis causa” . Em outros locais (cidades flamengas) os
bens eram entregues ao estrangeiro mediante o pagam ento de um imposto. Este
direito surgiu no século X III, e 110 século XIV algumas cidades concluem tratados
abolindo este direito. Observa ainda o jurista belga que am bos os direitos foram
abolidos na França em 1790. Para Je a n Imbert “aubain” vem de “adiba 11” (que
pertence a outro “ban”) e quer dizer estrangeiro.
3. Vattel parece ter sido o prim eiro a colocar a proteção dos estrangeiros no
D1P.
4. A doutrina neste particular se dividiu: uma corrente (Calvo, Louter) defende
que o estrangeiro não pode ter mais direitos que os nacionais; outra, que é adotada
por nós, admite que o estrangeiro pode ter mais direitos que os nacionais (Pi)let,_
Pradier-F<sdéré, Eagleton). Tal fenóm en o ocorreria em Estados com legislações - -
atrasadas.
5. So b re as regalias excepcionais de que gozavam os estrangeiros na Turquia
e na China, v. capítulo X X .
6. Esta igualdade entre estrangeiro e nacional não invalida o que dissemos
acima, porque todas as legislações dos Estados am ericanos reconhecem aos seus
nacionais direitos que atendem ao padrão mínimo reconhecid o aos estrangeiros
pelo D l. Por este motivo é que a Convenção Interam ericana de Montevidéu (1933)
sobre direitos e deveres dos Estados estabelece que “os estrangeiros não poderão
pretend er direitos diferentes nem mais extensos que os nacionais” (art. 9S). Dentro
da mesma orientação, uma convenção sobre estrangeiros, concluída no Conselho
da Europa em 1955, garante aos súditos das outras parles contratantes o mesmo
tratam ento que é dado aos nacionais. A igualdade entre estrangeiro e nacional
nos direitos privados rem onta ao século X IX , com o Código Civil do Chile (1853),
que estipulava no art. 57: “A lei não reconhece diferença entre o chileno e‘ o
estrangeiro quanto à aquisição e gozo dos direitos civis...” E antes dele a igualdade
entre nacionais e estrangeiros já é encontrada 11a A m érica Larina a partir de
1811/ 1812 (H. Valladão). Na doutrina Andrés Bello foi um dos seus propugna-
dores. Atualmente os afro-asiáticos sustentam também a igualdade entre nacionais
e estrangeiros.
7. E de se acrescentar que os Estados costumam convocar os seus nacionais
que se encontram no estrangeiro para a prestação do serviço militar na sua terra
natal. E o “ju s avocandi”. E ntretanto, os Estados não têm nenhum a obrigação de
facilitar a saída de tais estrangeiros do seu território, o indivíduo que tiver também
a nacionalidade do Estado onde se encontra não deverá ser convocado para o
serviço militar no estrangeiro.
8. Konst Katzarov— T h éo rie de la Nationalisation, 1960; Fritz M unch’— Les
Effets d ’une Nationalisation à 1’É lranger, in RdC, 1959, vol. III, t. 98, págs. 41] e
segs.; S. Petrén — La Confiscation des biens étrangers et les réclamations in-
tem ationales auxquelles elle peut d onner lieu7 in RdC, 1963, vol. II, t. 109, págs.
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blic, 1962; Gillian White — Nationalization o fF oreig n Properly, 1961; Rudolf L.
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1035
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II. vol. IV. 1971, págs. 93 c segs.; Eugène Schaeffer — Nationalisation. in Dalloz
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Editor and C ontributor Richard B. Lillich, 3 vols.. 1972/1975; Renato Ribeiro —
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en Droit International Privé Comparé, 1975; J.-C . Fritz — Le gouvernem ent pe-
ruvien face aux intérêts économiques am éricaiíís, in Annuaire du Tiers Monde
1974-1975, 1976, págs. 263 e segs.; Abd-El-Kader Boye — Problèmes Actuéis poss
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nalização de Bens Estrangeiros ante o D ireito Internacional, 1977; KarI Mathias
Meesen — International Exproprialion Law in T h e Conflict Between N orth and
South, in Law and State, vol. 19, 1979, págs. 116 e segs.; Eduardo Novoa M onreal
— Defensa de las nacionalizaciones ante tribunales extranjeros, 1976; Eduardo
Novoa M onreal — Nacionalización y Recuperación de Recursos Naturales-ante la
Ley Internacional, 1974; Rudolf Dolzer — New Foundations o f the Law o f Expro-
priation o f Alien Property, in AJIL, July 1981, vol. 79, n9 3, págs. 553 e segs. ; Bum s

1036
H. Wesion — T h e Charter of Econoniic Rights and Dulics of States and The
Deprivation o f Foreign Owned Wealth, tn AJ1L, July 1981, vol. 75, n'-' 3, págs. 437
e segs.; Jo rg e Silva Cencio — Contribución al estudio de las Nacionalizaciones en
Derecho Internacional, 1977; Jacques Barde — La Notion des Droits Acquis en
Droit International Public, 1981; Oscar S ch a c h te r— Compensation for Expropria-
tion, in AJIL, Jam iar)' 1984, vol. 78, n 9 1, págs. 121 e segs.; Dominique Rosemberg
— Le Principe de Souveraineté des Etats sur leurs Ressources Naturelles, 1983;
Eduardo Jim én ez de Aréchaga — State Responsability for the Nationalization of
Foreign-owned Property, in Studies on a ju s l W orld Order, n9 2 International Law.
A Contemporary Perspective, coordenado por Richard Falk, Friederick Kratochwil
e Saúl H. Mendlovitz, 1985, págs. 546 e segs. Fausto Quadros — A Proteção da
Propriedade Privada pelo Direito Internacional Público, 1998. ’V
8A. Os autores têm razão em observar que o confisco é urna medida de
riatureza penal e pessoal, não sendo aplicada a empresas. O confisco é uma punição
e nada tem a ver cora a nacionalização.
9. Podemos observar que as razões políticas não são as únicas. O próprio
Pétren usa o advérbio “sobretudo".
9A. As primeiras nacionalizações ocorreram na URSS em 1917. Elas com eça­
ram a ser admitidas de um modo geral nas Constituições de após a l s Guerra
Mundial (Renato Ribeiro).
10. Estes dois países pretendiam se recusar a isto, mas os EUA bloquearam
os seus fundos e, fazendo “listas negras” , obrigaram-nos a aceitar.
11. Os Tratados de París (1947) com a Hungria, Romênia, Finlandia e Bulgaria,
pondo fim à 2- Guerra Mundial, estipulavam que os aliados podiam seqüestrar os
bens dos nacionais destes países que estivessem no seu território. Estes tratados
estipulavam que os Estados vencidos deveriam indenizar os seus nacionais. Esta
última estipulação não figura nos Acordos de Potsdam.
11A. Para Eduardo Novoa M onreal ela é legítima e regular, atendendo apenas
a este requisito. Pode-se salientar que o Estado é o único “ju iz” para decidir se
há ou não interesse público. Na verdade, os motivos que levam os Estados à
nacionalização são indiferentes para o DI.
12. E ntretanto, assinala Schwarzenberger, esta palavra pode ter um alcance
em cada caso.
13. Estas condições estão, de um m odo geral, enunciadas na definição que o
citado ju rista búlgaro fornece da nacionalização: “A nacionalização é a transfor­
mação por um In teresse público de ordem superior, de um bem determ inado ou
de urna certa atividade, que são ou podem ser um meio de produção ou de troca
no sentido am plo da palavra, em bem ou atividade da coletividade — Estado,
comuna ou cooperativa — em vista da sua utilização imediata ou futura no
interesse geral e não mais provado.’’
14. Esta observação baseia-se, acim a de tudo, no Direito Interno, onde a
nacionalização “abrange tudo que pertence ao objeto da nacionalização, inde­
pendentem ente do local onde se encon tra” . Tem-se, contudo, afirmado no DI
que o ato de nacionalização só produz efeitos nos limites do Estado. Alegá-se aínda
que a nacionalização pode violar a ordem pública do Estado estrangeiro.
Fouilloux, baseando-se na prálica mais recen te, observa que a nacionalização
tem produzido efeitos extraterritoriais. Assinala inúmeros.casos de jurisprudência
estatal em que se tem considerado que a nacionalização cria direitos sobre os bens

1037
que se encontram no exLcrior, bem com o se tem reconhecido a eficácia destes
direitos. Esta última posição parece-nos ser a mais acenada, uma vez que a nacio­
nalização é um procedim ento normal da vida dos Estados e não mais um proce­
dimento “odioso”, com o era encarado até alguns decênios atrás. Não reconhecer
a nacionalização praticada no estrangeiro, conform e a lei deste Estado e os prin­
cípios internacionais, é estar intervindo no Estado autor da nacionalização. E acima
de tudo uma violação da igualdade ju rídica dos Estados (“par in parem non habel
judicium” ). A própria noção de ordem pública não é válida para que um Estado
impeça uma nacionalização ocorrida no estrangeiro de produzir efeitos no seu
território.
15. O m ontante da indenização é fixado no âmbito internacional por acordo
entre as partes, por decisão arbitrai ou ju diciária. Neste particular têm surgido
grandes discussões: os Estados querendo pagar abaixo do preço e as com panhias
nacionalizadas pretendendo mais do que os seus bens realmente valem. Quando
da nacionalização das companhias petrolíferas americanas no M éxico, eles plei­
tearam indenização de 450 milhões de dólares, sendo que na realidade os bens
não valiam 25 m ilhões de dólares (Neale R onn in g). E aí que surge a denominada
Hull Rule em uma carta ao governo m exicano pedindo “pronta, adequada e
efetiva” com pensação, em 1938. O M éxico acabou por indenizar no valor do
investimento original em 24 milhões de dólares. E de se acrescentar que desde a
Conferência de Haia de 1930 que se tem manifestado uma tendência nos países
subdesenvolvidos no sentido de que não existe um “standard internacional” fi­
xando o pagam ento da indenização. O estrangeiro não teria mais direitos do que
os nacionais. E ntretanto, inúmeros casos de nacionalização nestes países (Irã, Egito
e Cuba) têm sido acompanhados de indenização. Os países exportadores de capital
têm procurado se defender por meio de acordos de garantia de investimentos,
bem com o o Estado investidor dá garantia aos seus nacionais que investem no
estrangeiro e em caso de nacionalização ele endossa as reclam ações dos seus
cidadãos (Lissitzyn). Na verdade, a questão da existência do "standard internacio­
nal” fica dim inuída de valor ao se verificar que ele não dá mais direitos aos
estrangeiros do que as legislações estatais dão aos seus nacionais na grande maioria
dos Estados.
16. A URSS, nas nacionalizações efetuadas nos países bálticos, ofereceu 25%
do valor dos bens expropriados. A URSS, Iugoslávia e Romênia rejeitam o passivo
das sociedades privadas em casos de nacionalização.
16A. Alguns autores (Francisco Francioni) vêem este tipo de acordo no con­
cluído entre a França e EUA, em 1803. Ch. Rousseau afirma que o “lump sum
agreement” parece ter sido aplicado pela primeira vez, em 1901, para indenizar
as vítimas da revolta dos boxers na China.
17. Detlev F. Vagts — Coercion and Foreign Investment Rearrangem ents. in
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Droit International — La jurisdiction internalionale perm anente, Colloque de
Lyon, 1987, págs. 363 e segs.; Hans G. Petersm ann — The Multilateral Investment
Guarantee Agency, in Law and State, vol. 38, 1988, págs. 50 e segs.; Mohammed
Abdelwahab B ek hechi — Droit International: Quelques reflexions sur les develop-
pements receñís, in Mélanges Míchel Virally, 1991, págs. 109 e segs. Nadia de
Araújo e Lauro da Gama e Souzajr. — Os acordos bilaterais de investimento com
participação do Brasil e o direito interno — análise das questões ju ríd icas, “ in”
Guerra Com ercial ou Integração Mundial pelo Comércio?, coordenadores Paulo
Borba Casello e Araminta de Azevedo M ercadante, 1998, págs. 460 e segs. Jo h n
H. Jackson, Willian J . Davey e Alan O. S y k esjr. — Legal Probiems o f International
Economic Relalions, 2000.
17A. O seguro é realizado na Overseas Prívale Investment Corporation (O PIC).
O governo norte-am ericano é o seu ún ico acionista, mas os representantes do
selor privado é que possuem a maior parte dos cargos executivos. O seguro cobre:
a) “riscos com erciais” (até 75% do investim ento); b) riscos políticos (até 100% do
investimento). Os riscos políticos com preendem : 1. expropriação ou confisco; 2.
a impossibilidacfe de conversão em dólares ou de transferência de dinheiro de um
país para outro; 3. danos resultantes de guerra interna. A OPIC significa que o
setor privado dos EUA passou a controlar a assistência externa (Luciano Martins).
Estes “acordos” de seguro são chamados “ um brella agreements”.

1039
18. Prosper Weil — Problèm es relatifs aux contrats passés entre un État ei un
particulier, in RdC, 1969, vol. III, t. 128, págs. 95 e segs.; Giorgio Sacerdoti — I
CoiU raiti tra Stati e Straniere nel Diritto Internazionale, 1972; WolfgangFriedmami
— T h e Relevance o f International Law to T h e Process o f Economic and Social
Developpment, in T h e Future o f the International Legal Order, editado por Ri­
chard A. Falk e Cyríl E. Black, vol. II, 1970, págs. 3 e segs.; Académie de Droit
International de La Haye — Les Accords de Com m erce International — Colloque
1968, 1969;Jam es N. Hyle — Economic Developpment Agreements, in RdC, 1962,
vol. I, t. 105, págs. 267 e segs ; Jean-Paul Jacque — Elem enls pour em théorie de
l’acte juridique en droit international public, 1972, págs. 266 e segs.; W ilhelm
W engler — Les accords entre Etats et entreprises étrangères sont-ils des traités de
droit international?, in RGDIP, Avril-Juin 1972, ng 2, págs. 313 e segs.; W erner
Goldschmidt — Transactions Between State and Public Firms and Foreign Privates
Firms, in RdC, 1972, vol. II, t. 136, págs. 203 e segs.; Mustafa El-Sayed — L ’Orga-
nisation des Pays Exportateurs de Pétrole, 1967, págs. 72 e segs.; Prosper Weil —
Les Clauses de Stabilisation ou d’intangibilité insérés dans les Accords de Déve-
loppement Économ ique, in Mélanges Offerts à Charles Rousseau, 1974, págs. 301
e segs.; F. A. Mann — Studies in International Law, 1973, págs. 179 e segs.: Le
contrat économique international — Travaux des V IleJo u rn ées d'étudesjuridiques
Je a n Dabin publics sous les auspices du Centre Charles de Visscher pour le Droit
International, 1975; Luiz Olavo Batista — Contrato de Risco 1976; E. Jim én ez de
Aréchaga — L’arbitrage entre Ies étals et les sociétés privés etrangères, in Mélanges
en 1’honneur de Gilbert Gidel, 1961, págs. 367 e segs.; Huseyin Pazarci — La
responsabilité In tern atio n ale des Etats à raison des contrats conclus entre Etats et
personnes privées étrangères, in RGDIP, Avril-Juin 1975, ne 2, págs. 354 e segs.;
Ahmed Sadek El-Kosheri — Le Régime juridique crée par les accordes de parti­
ciparon dans le dom aine petrolier, in RdC 1975, vol. IV, t. 147, págs. 219 e segs.;
R o b ertB . von Mehren e P. Nicliolas Kourides — International Arbitrations Between
States and Foreign Prívate Parties: The Libyan Nationalization Cases, in AJIL, July
1981, vol. 75, ns 3, págs. 476 e segs.; Gérard C o h en jo n ath an — L ’Arbitrage T exaco
— Calasiatic contre Gouvcrnem ent Libien, in A nnuaire Français de Droit In ter­
national, vol. X X III, 1977, págs. 452 e segs.; Prosper W eil — Droit International
el Contrats d’Etat, in M élanges o fferts à Paul Reuter, 1981, págs. 549 e segs.;
Georges R. Delaume — State Contracts and Transnational Arbitration, in AJIL,
vol. 75, nQ4, October 1981, págs. 784 e segs ; Ju rg en Samtleben — Cláusulas de
jurisdición y legislación aplicable en los contratos de endeudamiento externo de
los Estados latinoam ericanos,-in Revista do Direito de C o m ércio e das Relações
Internacionais, ns 1, 1989, págs. 91 e segs.; Bruno O ppetit — Autour du Contrat
International, in Droits, ne 12, 1990, págs. 109 e segs.; Contrats Intem ationaux et
Pays en Developpment, sob a direção de Hervé Cassan, 1984; Luiz Olavo Baptisia
— Dos Contratos Internacionais. Uma visão T eórica e Prática, 1994. Charles Leben
— Retour sur la notion de contrat d’ Etal et sur le droit applicable à celui-ci, “in ”
Mélanges offerts à H ubert Thierry, 1998, págs. 248 e segs.; Jean — Michel Jacq u et
— Le contrat international, 1998. A. F. M. Maniruzzaman — State Contracts in
Contemporany International Law : Monists versus Dualist Centroversies, “in ” Eu-
ropen Journal o f Intem ation Law, vol. XII, v.2, April 2001, pags. 309 e segs.
1HA. O 3" Mundo nao aceita a arbitragem porque tira a malcría de jurisdição
nacional c favorece os ricos em vifiudc do direito aplicado e da personalidade
dos árbitros (Guy Feuer f Hervé Cassan).
18B. J . Verhoeven, apesar de não defender a internacionalização dos "state
contraets" observa que entragi .nesta categoria os concluidos por companhias
estatais (ex.: “Yacimientos Petrolíferos Fiscales” — A rgentina) com outras em pre­
sas, vez que o Estado se encontra engajado “com o pessoa pública nacional” .
19. WeiJ declara que tais con tratos fariam p a r le d o Direito Internacional
Público, mas que não seriam assimilados aos tratados. Estaria em desenvolvimento
um Direito Internacional dos Contratos (“é o con ju n to de regras de direito inter­
nacional público relativas aos contratos concluídos entre um Estado e um estran­
geiro”), que teria princípios próprios em relação ao direito dos tratados, por
exemplo, “o Estado pode agir algumas vezes com o soberano para modificar, até
anular, os direitos contratuais, mas a equaçãofinanceira do contraio é considerada
com o intangível". Segundo o jurista^ francês, tal princípio estaria consagrado no
direito positivo. É de se repetir contudo que estas empresas não têm ainda uma
ampla personalidade internacional para criar um Dl.
20. Na prática a Grã-Bretanha só dá a proteção diplomática quando existe
“an denial of flagrant perversión o f justice or some gross wrong”; nos EUA, quando
existe “an arbitrary wrong” . Em sentido sem elhante está a prática da França e da
Alemanha.
20A. Tem sido assinalado que um “state con tract” prevendo arbitragem com o
modo de solução dos litígios significa que o Estado renunciou ã imunidade de
jurisdição, caso contrário, o contrato não poderia ser executado.
20B. Em sentido contrário, está a arbitragem da T exaco Calasiatic contra o
Governo libio, com sentença de 1977 de René-Jean Dupuy (árbitro único) em que
a Líbia se recusou a com parecer. A arbitragem estava prevista no contrato de
concessão e diante da nacionalização surge, em conseqüência, a arbitragem. Parece
que foi a primeira decisão arbitral que de m odo claro coloca tais contratos na
ordem jurídica internacional, aplicando o Dl dos contratos.

1041
CAPÍTULO XXXVI

DESLOCAMENTO DA PESSOA HUMANA'

374 — A imigração no DI; 375 — O sütema de quotas; 376 — A


legislação brasileira; 377 ■— 'Regime de passaportes.

374. A imigração é formada pelos estrangeiros que se dirigem a um


Estado com a intenção de nele se estabelecerem. Ela se apresenta sob duas
formas: individual e coletiva. A primeira é aquela representada por pessoas
isoladas, enquanto a segunda é por grupo de pessoas.
O direito de emigração e o seu correspondente de imigração têm sido
reconhecidos ao indivíduo. Francisco de Vitória defendeu o “jus commu-
nicationis”, isto é, o direito de emigração e imigração no plano interna­
cional. Os Estados não poderiam proibir de um modo geral a entrada de
estrangeiros no seu território. O teólogo da Espanha não considerava como
ilimitado este direito, mas permitia aos Estados impedirem a entrada de
estrangeiros com base em um motivo importante.
Os fundadores do Dl que se seguiram alteraram o pensamento de
Vitória. Wolff e Vattel sustentam que cabe ao Estado decidir soberanamente
sobre a admissão de estrangeiros, podendo proibi-la ou limitá-la. Já Grotius
defendia o direito de livre circulação.
Diante destas considerações, dois princípios têm sido enunciados: o
da interdependência dos membros da sociedade internacional e o da
soberania do Estado, que chegam aos mesmos resultados apesar de partir
de pontos diferentes. O primeiro princípio afirma que os indivíduos têm
o “jus communicatíonis" (von Liszt); enquanto o segundo princípio afirma
que os Estados não são obrigados a admitir estrangeiros no seu território
(Oppenlieim). Na prática, atingem-se resultados semelhantes com qual­
quer dos dois princípios, uma vez que eles não são aplicados de modo
rígido.
A Declaração Universal dos Direitos do Homem consagra ó “jus com-
municationis” no seu art. 13, inciso 2B:

1043
" Todo hom em tem o d ire ito de deixar q u a lq u e r país, inclusive
o p ró p rio , e a este re g re ss a r.”

O mesmo principio figura no art. 12 do Pacto Internacional de Direitos


Civis e Políticos. O Protocolo 11 .4 da convenção européia de direitos hu­
manos (1963) consagra o direito a livre circulação.
No DIP podem ser extraídos dois principios que regein esta materia:
a) admissão do “jus communicationis”; b) direito do Estado de regulamen­
tar a imigração 110 seu território.2
O primeiro se fundamenta na própria necessidade do comercio inter­
nacional e na liberdade do indivíduo. Tem-se acrescentado que a imigra­
ção. servindo para aliviar certos países do excesso demográfico, contribuiria
para a paz internacional. O segundo se fundamenta na soberania estatal
e na prática internacional já consagrada. Entretanto, tem-se afirmado que
as limitações impostas à imigração devem ser genéricas, isto é, sem discri­
minação de raça religião e nacionalidade.3
As migrações constituem objeto de preocupação da sociedade inter­
nacional, e diversas organizações internacionais tratam desta matéria. A
OIT estuda as migrações e a questão da mão-de-obra. A ONU cuida dos
aspectos sociais, econômicos e demográficos. A FAO trata da colonização
agrícola. A OMS trata sob o ângulo da saúde.
Em 1951 foi criado em uma convenção internacional (entrou em vigor
em 1954), concluída em Bruxelas, o Comitê Intergovernamental para as
Migrações Européias (CIME), com a finalidade de dar assistência técnica
e material para os emigrantes europeus.3''
375. A imigração, durante um certo período da História, caracteriza-
va-se por ser inteiramente livre, conforme consagrara a Revolução Francesa.
Esta orientação se prolongou até o final do século XIX. Pode-se lembrar
que a primeinUei de imigração na Inglaterra é de 1793, devido aos refu­
giados da Revolução Francesa e à ameaça de infiltração de jacobinos.
Contudo não se pode deixar de registrar que Bizáncio só permitia aos
estrangeiros permanecerem 110 seu território durante três meses. O Islã
fixava em um ano.
No século XX têm início as restrições à imigração e a adoção, pelas
legislações estatais, do sistema de quotas, isto é, o número de imigrantes
é fixado em certo limite. Em 1881 é estabelecida a cobrança de um imposto
aos imigrantes chineses na Nova Zelândia. Os EUA, em 1882, proíbem a
entrada de imigrantes chineses,4 e posteriormente a proibição é aplicada
aos japoneses.
Em 1992, o sistema de quotas foi adotado nos EUA,“ que fixaram um
contingente anual de imigrantes de cada nacionalidade em 3% dos indi­
víduos qué residem em território americano no ano de 1910. Não estavam
sujeitos a estas quotas os imigrantes latino-americanos e canadenses. A
quota de imigrantes nos EUA variará com as leis posteriores sobre imigra­

s1044
ção. Em 1965, nos EUA. o sistema de quotas foi substituído por um teto
de 290.000 imigrantes anuais e um máximo de 20.000 por nacionalidade. .
Atualmente os 290.000 estão divididos em categorias, e conforme a prio­
ridade, a porcentagem é maior (J. Dolinger).
Em 1905, o Aliens Act, na Inglaterra, proíbe a imigração de indivídtfos'
originários de países onde não havia inspeção médica, dos indigentes, dos
enfermos, etc.
Estas legislações influenciaram as demais legislações estatais que ado­
taram preceitos semelhantes.6
Atualmente uma das grandes preocupações, principalmente na Euro­
pa, é com o trabalhador migrante, sendo que foi concluída uma convenção,
em 1977, com a finalidade de lhe fixar um estatuto. Esta convenção euro­
péia se aplica ao súdito de um contratante que tenha sido autorizado a
residir em seu território para ocupar um emprego assalariado. O migrante ’
tem um estatuto bastante criticável, já houve quem dissesse que ele era
um “subdireito". Na verdade, a capacidade de defesa do migrante é pe­
quena. O Estado que recebe o migrante considera que a mão-de-obra deve
ser barata, adulta, jovem, com boa saúde e de preferência solteira e não
especializada. E que os considerados empregos subalternos não são aceitos
pelos seus nacionais. O Estado de origem do migrante considera que a
sua saída diminui a pressão demográfica, bem como acaba por receber a
moeda estrangeira enviada pelo migrante à sua família. Ao contrário do
Estado que os recebe, considera que eles devem se especializar no estran­
geiro. O seu estatuto estabelece, por exemplo, algumas limitações ao direito
de reunir a família, como: a) noção de família (cônjuge, filho até 21 anos
e ascendente sob sua dependência); b) possuir recursos-estáveis; c) duração
mínima de emprego; d) exigência de habitação normal.
Este problema vem sendo tratado pela OIT e se estende a outras regiões
do globo, sendo que, em 1968, foi concluída, no Cairo, no âmbito da Liga
dos Estados Árabes, uma convenção árabe sobre o deslocamento da mão-
de-obra. Em 1990, foi concluída no âmbito da ONU convenção interna­
cional para a proteção dos direitos de todos os trabalhadores migrantes e
seus familiares.
376. A legislação brasileira,6A a exemplo das estrangeiras, também
adotou o sistema de quotas para os imigrantes. O Decreto-lei nB 7.967, de
18-9-1945, estabelecia, no art. 3~:

“A corrente imigratória espontánea de cada país não ultrapas­


sará anualmente a quota de 2% sobre o número dos respectivos
nacionais que entraram no Brasil desde l 9 de janeiro de 1884
até 31 de dezembro de 1933. O órgão competente poderá elevar
a 3.000 pessoas a quota de uma nacionalidade e promover o
aproveitamento dos saldos anteriores.”7

1045
O sistema (le quotas terminou com a Constituição de 1946. que não
mais se referia a ele. Esclarece Dardeau de Canalho “que o regime de
quotas jamais foi obedecido”.
No Brasil a Lei n“ 4.504, de 30-11-1964, estabeleceu que a seleção de
imigrantes é da competencia cio Ministério das Relações Exteriores, “con­
forme diretrizes fixadas pelo Ministerio da Agricultura, em articulação com
o Ministério do Trabalho e Previdencia Social”, cabendo “a recepção e o
encaminhamento dos imigrantes ao Instituto Nacional do Desenvolvimen­
to Agrário” (art. 58, §§ 2S e 7S). Posteriormente, pela Lei n- 1.110, de
1970, a atribuição de recepção e encaminhamento dos imigrantes passou
para o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária.
A<rfi9 Lei 6.815, de 19-8-80, cria o Conselho Nacional de Imigraçã"o-
vinculado ao Ministério do Trabalho para “orientar, coordenar e fiscalizar
as atividades de imigração”.
377. O sistema de passaportes adotado por toda a sociedade interna­
cional tem por finalidade permitir ao Estado um controle dos individuos
que entram e saem do seu território. Passaporte vem do francês “passer”
e do inglés “port” (porta ou portão), é que as cidades medievais eram
muradas e tinham portas de entrada (Thelma T. Cavarzere).
O passaporte é um documento expedido pelas autoridades públicas
competentes, certificando a identidade e a nacionalidade do seu titular e
lhe permitindo viajar no território do Estado que o concedeu, ou se dirigir
a um outro Estado (Reale).8 Diante desta definição podemos assinalar que
existem dois tipos de passaportes: o interno (praticamente não é mais
utilizado) e para o estrangeiro. Este último, para produzir efeitos em
território estrangeiro, necessita de ter o visto deste Estado estrangeiro, que
é dado pelo seu cônsul. O passaporte pode ser individual (é o normal) ou
coletivo.
Na Grécia e em Roma concedia-se, às vezes, salvo-conduto mas não
propriamente passaportes. Estes não existiam, em virtude de não' haver
relações internacionais muito intensas e mesmo porque os estrangeiros
eram olhados com desconfiança.
Roma, com o aumento do seu império e do tráfico de pessoas, passou
a dar aos seus funcionários que fossem incumbidos de missão “documen­
tos”, que lhes concediam diversas facilidades, como a de requisitar, pelos
locais onde passassem, meios de transporte, etc. Eles eram denominados
de maneira diferente: “tractoria”, “combina”, “diploma”, “‘codicilli”, etc.9
Posteriormente, eles foram concedidos não apenas aos funcionários, mas
às mais diferentes categorias de pessoas. No Egito, no período da domi­
nação romana, século II d.C., já se exigia um salvo-contudo para se deixar
o Egito.
No Baixo Império, Honorius expedia documentos (“sacri apius”), que
permitiam ao seu portador entrar e sair do reino.

1046
O feudalismo, prendendo o homem à terra e gravando o estrangeiro,
fez com que o tráfico de pessoas diminuísse e os “passaportes" desapare­
cessem. Com o desenvolvimento do comércio e o aparecimento das feiras,
era dado aos comerciantes que a elas se dirigissem o “conduclus nundi-
narum", que lhes dava proteção.10
O passaporte, no sentido de como hoje o entendemos, só foi instituído
nos séculos XVI e XVII. Diversas causas contribuíram para isto: a) o grande
número de mendigos que perambulavam pela Europa; b) a necessidade,
por medida de polícia, de fiscalizar os movimentos dos súditos dentro das
fronteiras do próprio Estado; c) controlar a entrada e saída de indivíduos
do território estatal. No século VI o passaporte começa a ser utilizado na
Alemanha e, no século XVII, na França. No século XVIII é usado obriga­
toriamente em toda a Europa, com exceção da Inglaterra, Suécia e No­
ruega, que o não exigiam.
A Revolução Francesa suprime o passaporte, considerando-o contrário
à liberdade de locomoção do homem. Entretanto, por necessidade de
polícia, ela foi obrigada a restabelecé-lo. O passaporte interno foi suprimido
na França em 1791 e restaurado em 1792. Ele voltou a ser novamente
usado em 1914.
Nos meados do século X IX o regime de passaporte começa a ser
abandonado. Há um período liberal no tráfico internacional de pessoas.
Ao ser deflagrada a Ia Guerra Mundial, o regime de passaportes foi res­
taurado e não mais desapareceu.
Em 1922, a SDN instituiu o passaporte Nansen (tomou o nome do seu
idealizador) para as pessoas que não possuem documentos de viagem.
Destinava-se, inicialmente, aos refugiados russos e foi estendido depois a
outros refugiados, como os armênios, os assírios, os turcos, etc. A convenção
relativa ao estatuto dos refugiados, concluída em 1951, estipula, no seu
art. 28, a concessão de documento de viagem aos refugiados pelos Estados
onde eles se encontrarem e fixa em anexo o seu modelo. Este passaporte
foi estendido aos apátridas. Na verdade, os refugiados em grande número
eram apátridas (ex.: os russos que fugiram da Revolução de 1917). A
Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas (1954) estabelece norma seme­
lhante (art. 28) à que vimos para os refugiados e fixa modelo igual ao do
documento de viagem destes para os apátridas."
No Brasil a concessão de passaporte para estrangeiro foi regulamentada
no Decreto-lei ns 941, de'13-10-1969 (arts. 70 e segs.), e Decreto n“ 66.689,
de 11-6-1970 (arts. 96 e segs.). Sendo de assinalar que o Brasil só dá
passaporte para estrangeiro nos seguintes casos: a) apátrida; b) asilado ou
refugiado; c) a nacional de país que não tenha representação diplomática
ou consular, nem representante de outro país encarregado de protegê-lo.
Atualmente a matéria está regulamentada pela ns Lei 6.815, de 19-8-80,
que estabelece que o Brasil dá passaporte a estrangeiro: 1 — no Brasil: a)
apátrida; b) asilado ou refugiado; c) nacional de país que não tenha re-

1047
piesentação diplomálica; 2 — 110 Brasil e no exterior "ao cônjuge 011 à
viúva de brasileiro que haja perdido a nacionalidade originária em virlude
do casamento’’. O Brasil pode dar um “laissez-passer” ao estrangeiro na­
cional de um Estado que o governo brasileiro não reconheceu.
A cilada lei está regulamentada pelo Decreto n*' 86.715, de 10-12-81.
Os passaportes têm as seguintes cores: vermelho (diplomatas), verde
(comum), azul-escuro (especial), amarelo (apatrida), vermelho-escuro (co­
munidade européia), azul entre o azul claro e o azul turquesa (refugiado).

1048
NOTAS

1. (V. Bibliografia — Cap. X X X V ); Egidio Re a le — Le problern e des passeporis.


m RdC, 1954, vol. IV, i. 50, págs. 89 e segs.; idem — Le Régime des Passeports de
la Societé des Nations 1937; Louis Varlez — Les migrations internationales el leur
réglementation, in RdC 1927, vol. V. t. 20, págs. 169 e segs.; Henry Pratt Fairchild
— Immigration, 1925; Henri Vallet — Les Restrictions à l’Immigration, 1950: G.
Stammati, A. Oblath e Ugo Ginsti — Problem i Internazionali della Imigrazione,
1949; Maurice D’Hartoy — Histoire du Passeport Français, 1937; Bureau Interna­
tional du Travail — Emigration el Imigration — Législalion el Traites, 1922;
Kingsley Davis — Corrientes Demográficas Mundiales, 1960; Donald R. T afi —
Human Migraiion, 1936; Fernando Bastos de Avila, S.J. — L ’Immigralion au Brésil,
1956; P. Aymond — Passeport, in Dalloz — Encvclopédie Juridique — Répertoire
dé Droit International, publicado sob a direção de Ph. Francescakis, t. II, 1969,
págs. 564 e segs.; A. Dardeau de Carvalho — Situação jurídica do Eslrangeiro no
Brasil, 1976, págs. 105 e segs.; Societé Française pour le Droit Internaiional —;L es
Travailleurs étrangers el le droit international, Colloque de Clermont-Ferrand,
1979;Jam esA. R. Nafziger — The General Admission of Aliens U nder International
Law, in AJIL, O ctober, 1983, vol. 77, n g 4, págs. 804 e segs.; Ja c o b D olinger —
Direilo Internacional Privado, 1986, págs. 175 e segs.; Gérard Chaliand, Michel
Jan e Jean-Pierre Rageau — Atlas Historique des Migrations, 1994; Thelm a T.
Cavarzere — D ireilo Internacional da Pessoa Humana: A Circulação Internacional
de Pessóas, 1995. Thelm a Thais Cavarzere — Direito Internacional da Pessoa
Humana. A Circulação Internacional de Pessoas 2S ed., 2001.
2. A Convenção Interamericana sobre a condição dos estrangeiros (Havana,
1928) estipula, no art. I 5: “Os Estados lêrn o direito de estabelecer, por m eio de
leis, as condições de entrada e residência dos estrangeiros nos seus territórios.”
3. Este aspecto não tem sido observado na prática; com o veremos, durante
largo tempo inúm eros países excluíram a imigração de orientais. Pode-se acres­
centar que as legislações estatais excluem determinadas categorias de indivíduos,
que são denominados de indesejáveis: as prostilutas, os vagabundos, os portadores
de moléstias contagiosas, etc.
3A. E de se observar que as comunidades européias consagram a livre circu­
lação de trabalhadores para empregos “ efetivamente oferecidos” .
4. Os Estados centro-americanos copiam os EUA e proíbem a entrada ainda
de árabes, hindus, sírios, etc. No Brasil o D ecreto n s 528 de 1890 proibia a imigração
de africanos e asiáticos.
5. Em 1921 uma lei já limitara o núm ero de imigrantes em 357.000 indivíduos
anualmente.
6. A imigração, bem como a emigração, se caracteriza, nos dias de h o je, por
ser dirigida, daí a existência de órgãos na maioria dos Estados destinados ã sua
orientação.
6A. Com base em Jo ã o Camilo de Oliveira Torres (Uma Interpretação da
Realidade Brasileira, 1973, págs. S9 e segs.) podemos apresentar algumas infor­
mações sobre a história da imigração no Brasil: a) em certa época tentou-se “caiar”
(José Honorio Rodrigues) o sangue pela im igração por influência, entre outros,
de Joaquim Nabuco e Tavares Bastos; b) em 1869, Jo sé Pedro Xavier Pinheiro
propôs a “im portação” de chineses para as plantações de cana sem que esta política
fosse adotada; c) a imigração de africanos e asiáticos dependia de autorização
especial do Congresso (D ecreto n- 528 de 1890). Esta imigração não era livre
como as demais; d) projeto foi apresentado no Congresso em 1921, por Andrade
Bezerra e Cincinato Braga, no sentido^de proibir a entrada de pessoas de cor
preta. No mesmo sentido foi apresentado outro projeto, em 1923, por Eidélis Reís;
e) o Estado Novo restringiu a imigração de pessoas de raça amarela especialm ente
japoneses. Nesta época não havia imigração de africanos. Segundo Maria Luíza
Tucci Carneiro (O Anti-semitismo na Era Vargas — 1930-1945, 1988), até 1930 a
preocupação foi trazer braços para a agricultura. Após 1930 adota-se um a política
restritiva, que vinha sendo seguida desde 1921 de modo brando, e se proíbe os
indesejáveis. E ntre 1930 e 1934 foi proibida totalm ente a imigração. Em 1934 foi
criado o sistema de quotas. Foram criadas restrições aos semitas.
7. O parágrafo único deste artigo estabelecia que quando houvesse um Estado
novo na sociedade internacional lhe seria fixada uma quota.
8. Vattel foi o prim eiro a distinguir o passaporte do salvo-conduto. O passaporte
é concedido a pessoas que podem ir de um lugar para outro em segurança. J á o
salvo-conduto é fornecid o a pessoas qv¡e nao poderiam ir em segurança a deter­
minados lugares sem ele, sendo muito utilizado em tempo de guerra.
9. O “tractoria” seria ainda utilizado pelos nierovíngios. Ainda na Idade Media
a “Carta tractoria” era fornecida “pelas autoridades eclesiásticas aos peregrinos”
(Valladão).
10. Em 1555, Carlos IX , por uma ordenança, institui o “passaporte m arítim o” ,
que dava livre tránsito às mercadorias que tivessem por destino as feiras de Lião.
11. Entre nós, o D ecreto ne 18.384, de 11-9-1928, ja permitiu a concessão de
passaporte ao apátrida. A mesma orientação está na legislação atual.
CAPÍTULO XXXVII

DIREITO DE ASILO1

3 78 — Introdução: a) Asilo territorial; 379 — Conceito e evolução


histórica; 380 — Da obrigatoriedade do asilo; 381 — Refugiados:
conceito e qualificação; 382 — Fundamento do direito de asilo; 383
— A proteção internacional dos refugiados; 384 — Estatuto dos refu­
giados; 385 — Fim do asilo; b) Asilo diplomático; 386 — Definição;
387 — Evolução histórica e âmbito de aplicação; 388 — Da obriga­
toriedade do asilo; 389 — Fundamento do asilo diplomático; 3 9 0 —
Locais de asilo; 391 — Pessoas que gozam do asilo e a sua qualificação;
392 — Direitos e deveres do Estado asilante; 393 — Direitos e deveres
do Estado territorial; 394 — Fim do asilo; 395 — A C l] e o asilo
diplomático.

378. O direito de asilo2 visa dar uma proteção ao indivíduo. Gigena


Torres observa com razão “que o asilo se origina em uma ação instintiva
do indivíduo, necessidade biológica de buscar amparo para salvar a vida
ou a liberdacde”.
Ele pode apresentar-se de duas maneiras: a) o asilo territorial ou
extemo, ou internacional; e b) o asilo diplomático, ou interno, ou político,
ou intranacional, ou extraterritorial.
O asilo territorial é admitido em toda a sociedade internacional e está
consagrado no art. XIV da Declaração Universal dos Direitos do Homem:

“ 1 — Todo homem, vítima de perseguição, tem o direito de


procurar e de gozar asilo em outros países.
2 — Este direito não pode ser invocado em caso de perseguição
legitimamente motivada por crimes de direito comum ou por
atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas.”

379. O asilo territorial é aquele que o Estado concede aos indivíduos-


perseguidos'ctenüu der seu território.

1051
O iiisliuilo do asilo já é encontrado na Antiguidade. No Egito havia
q_asi]o religioso.'’ Entre os judeus, algumas cidades davam asilo ao homicida
involuntario. Na Grécia, diversos templos religiosos podiam dar asilo e
dele se beneficiava qualquer tipo de criminoso.4 Se o crime era grave,
proibia-se que a comida' chegasse ao asilado para forçá-lo a abandonar o
local de asilo. Em Roma, o asilo foi também praticado em templos e até
mesmo na estátua de Romulus.1’
O Cristianismo fez com que o asilo.passasse a ser concedido nas Igrejas,6
cuja violação era um sacrilégio e o autor da violação podia ser excomungado.'
O asilojá estava no “ espirito dos fiéis” desde os primeiros séculos da era crista
e foi codificado em 511 no Concilio de Orleães. A Igreja excluiu certas
categorias do direito de asilo, como os criminosos de alta periculosidade,
aqueles que cometessem crimes nas igrejas e suas redondezas para se bene­
ficiar do direito de asilo, etc* Os godos e visigodos também o praticaram. No
feudalismo, o asilo territorial e o religioso também foram reconhecidos. O
senhor feudal concedia asilo segundo a sua conveniência, fosse ao criminoso
comum ou ao criminoso político. O Islame também conheceu e praticou o
asilo. No século XII começa-se a destruir as garantias do asilo. As decretais
de Inocêncio III e Gregorio IX no século XIII excluem do asilo os judeus,
heréticos e apóstatas, bem como os assassinos, etc. No século IV o direito de
asilo já era reconhecido perto das estátuas do Imperador em Bizancio
(Jacques Lefort — L ’empire byzantin, in Les empires occidentaux de Rome
à Berlin, sob a direção de Jean Tulard, 1997).

para_o criminoso com um . Parece que o asilo se desenvolveu devido ao


grande número de guerras religiosas. O criminoro põlfttca nâxr gozava
deste direito, umã vez que o poder dos príncipes tinha origem divina e,
em conseqüência, qualquer atentado a este poder deveria ser punido. Se
esta foi a regra geral, não se deixou de conceder refúgio político durante
as guerras religiosas e civis. Foi a partir da Revolução Fran cesa8 q n e se
começou a admitir com o regra o asilo do o'inyjnq^.pQlítimje.j^extradição
do criminoso comum. No século XVTÍI Wolff já sustenta o asilo como
prerrogativa do estado. No século XIX esta prática tem a sua consagração, -
apesar de no período da predominância da Santa Aliança ela ter sido
restringida. E no século X IX que sé torna um princípio jurídico.
380. O direito de asilo, apesar dejexpor-i-inalidade proteger a pessoa
humana, é ainda consideradoTim direito do Estado e nao do indivíduo.
Significa isto que o Estado não é obrigado a conceder o asilo, mas apenas
o faz se assim o quiser.9
Algumas legislações estatais, como a do México e a da Itália, consa­
graram o direito de asilo.10 A Constituição brasileira de 1969, ao proibir
a extradição de estrangeiro acusado de crime político e de opinião (art.
153, § 19), dá proteção ao criminoso político. Entretanto, a interpretação
sobre o alcance destes dispositivos não é uniforme. Uns (Vischer) consi­
deram que a sua finalidade é apenas dar maior precisão à ação da autori-
darle nacional, mas sem dar um direilo ao individuo de ser asilado. Outros
(Koziebrodzki) declaram que o indivíduo passa a ter um direilo ao asilo.
Na verdade, a interpretação não pode ser genérica, urna vez que alguns
países (Guatemala) reconhecem ao indivíduo direito ao asilo. No Brasil
já não se pode afirmar isto, porque a nossa Constituição de 1969 apenas
proíbe a extradição do criminoso político, mas não significa isto que
estejamos obrigados a conceder o asilo, tanto assim que ele pode vir a ser
expulso do território nacional sem que haja qualquer proibição constitu­
cional. Por outro lado, nada impede que não concedamos asilo a deter­
minado criminoso político.
Entretanto, aj^onstituição de 1988, no seu art. 4~, estabelece entre os
principios das relações internacionais do Brasil o de “concessão de asilo
político”. A primeira observação que deve ser feita é que ela abrange o
asilo diplomático e o asilo territorial. A segunda observação é que, apesar
de tudo, não_surge uma obrigatoriedade da concessão do asilo, vez q u ea
qualificação do individuo cotno perseguido político é da competência do
Poder Executivo, que se trata de matéria de política externa. Por outro
lado, o art. 4S é uma mesma programática.
A Convenção Interamericana sobre asilo territorial (Caracas, 1954)
tam bém se encontra nesta orientação ao estabelecer no art. I9 que o asilo
é um direito do Estado e que ele admitirá “dentro do seu território as
pessoas que julgar conveniente”.
Se esta é a orientação predominante, ela não deixa de ser criticável.
A doutrina (Scelle) tem afirmado que o Estado possui o dever de conceder
o asilo. Na verdade, o asilo, instituto essencialmente humanitario, somente
atenderá completamente a sua finalidade quando se transformar em um
direito do individuo e em dever do Estado.
381. São denominadas de refugiados as pessoas que gozam de asilo
territorial; A Convenção de 1951," que estabeleceu o estatuto dos refugia­
dos, define-os como sendo aquele que “temendo ser perseguido por m o
f tivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas,
/ sè~êiícontra lora do pãís^cle sua nadõnalidade e não "pode ou, em
virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país; ou_que se
não tem nacionalida.de, e s_e, encontra fora .do país no qual tinha sua
' - residência habitual-em-.xcm^eqüêD£Ía_de,t a i s acpjoíeciniíLntos, não pode
ou. devido ao referido-temor, nao quer voltai- a ele”.12 Ela tem sido criticada,
porque não abrange os indivíduos perseguidos por participarem de greves
e manifestações políticas (Jean-Jacques de Presson). Tem siido assinalado
que ha Tima necessidade de se ampliar o conceito de refugiados para
abranger as pessoas “deslocadas", como os curdos e os palestinos.
Á 'definição mais ampla de refugiados é a da OUA, vez que abrange
os deslocamentos maciços de população que não estavam incluídos na
definição da convenção de 1951, por exemplo, as pessoas que necessitam
abandonar os seus países sem que haja perseguição. A definição da OUA
vem sendo adotada de fato em inúmeras regiões do mundo. A citada

1053
convenção concluída em 1969, além de incluir os casos da definição da
ONU, também considera refugiados: “qualquer pessoa que, devido a agres­
são externa, ocupação, domínio estrangeiro ou eventos que perturbem
seriamente a ordem pública em parte ou em todo o seu país de origem
ou nacionalidade, é obrigado a deixar seu local de residência habitual
paia buscar refúgio em outro local fora de seu país de origem ou nacio­
nalidade” (tradução de Cançado Trindade). Dentro desta orientação de
se ampliar o conceito de refugiado é que foi aprovada uma Declaração,
em Cartagena das índias, sob a égide do ACNUR, em 1984, recomendando
que se adote na América Central não apenas o conceito de 1951, e de seu
protocolo de 1967, mas “também (sejam considerados) refugiados as pes­
soas que têm fugido de seus países porque sua vida, segurança ou liberdade
têm sido ameaçadas pela violência generalizada, a agressão estrangeira, os
conflitos internos, a violação maciça dos direitos humanos ou outras cir­
cunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública”. A re­
gulamentação dos refugiados tem se regionalizado para se atender as
peculiaridades das diferentes partes do globo. O termo refugiado não é
definido “a priori”, com fundamento em considerações teóricas, mas de
modp-ftwoonal para resolver problemas concretos- (Schnyder).
( O asilojé concedido ao criminoso político, incluindo-se os que lutam
coim-a-o'coloiiialismo. Não se dá asilo aos que cometeram crime de guerra,
crime contra a paz e crime contra a humanidade.
A qualificação de tais indivíduos como refugiados, isto é, pessoas que
nao são criminosos comuns, é ato soberano do Estado que concede o
asilo.13 Cabe somente a ele a qualificação. E com ela que terá início ou
não o asilo.
A Declaração Universal dos Direitos do Homem (art. 14) proíbe a
concessão do asilo aos criminosos de direito comum e aos responsáveis
por “atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas”.
O Dl Humanitário e o Dl dos Refugiados são formados por normas
que se complementam (Jaime Ruiz de Santiago).
Pode-se acrescentar que no continente americano o conceito de refu-
/ giado é mais ampio do que o de asilado territorial. Assim sendo, todo
/ asilado territorial é refugiado, mas nem todo refugiado é asilado territorial,
í O asilo territorial, quando é concedido, é comunicado pelo Estado a aquele
3e onde saiu o indivíduo. Esta obrigação não existe para os demais refu­
giados. Há atualmente a tendência de se distinguir o asilado territorial do
refugiado. Gros Espiell salienta que asilo e refúgio são dois institutos
distintos, com regulamentações difeyentes. Salienta que os conceitos de
asilo territorial e refugiado, nos termos da Convenção da ONU de 1951,
às vezes estão unidos, mas que eles sãn Hixtintos. Reconhece o intemacio­
nalista uruguaio que no Dl Americano ambos os institutos se confundem.
Um princípio do direito dos refugiados é a “reunificação das famílias”. A
qualificação como refugiado não transforma automaticamente, a pessoa

1054
em asilado territorial. Quem cuida do refugiado é o ACNUR e (]uem cuida
do asilado é o Estado / fá Den is Alland sustenta q'fie o asilo c o estatuto do
refugiado não são tão distintos, porque o asilo é anterior ao estatuto do
refugiado e ao mesmo tempo uma conseqüência deste. A distinção entre
refugiado e asilado territorial não é clara e Paul Lagarde fala em asilo
territorial dos refugiados.
E de se acrescentar que não há definição jurídica para pessoas deslo­
cadas. Pessoas deslocadas são aquelas que tem refúgio dentro do seu pró­
prio território, ou são impedidas de transpor uma fronteira internacional
que foi fechada. São aqueles que não atravessam a fronteira internacional.
O aumento do número de pessoas deslocadas advem do fato dos estados
impedirem o aumento do número de refugiados. Nos conflitos armados
internos os refugiados e as pessoas deslocadas estão protegidas pelo art. 3
das convenções de Genebra de 1949 sobre Direito Humanitário.
Na ONU, em 1967, foi aprovada apenas uma declaração sobre asilo
territorial, mas que não é obrigatória e permite ao Estado recusar a entrada
de pessoas perseguidas se tal fato ameaçar a sua segurança nacional, a sua
população ou em caso de afluxo em massa de perseguidos, o que lhe dá
quase nenhum alcance.
382. O fundamento do asilo, conforme se depreende da Convenção
Interamericana de Caracas, reside em dois princípios: a) o Estado tem,
como já vimos (capítulo XX X V I), o direito de permitir que entrem no seu
território os indivíduos que quiser; b) no seu território a sua jurisdição é
exclusiva.13A
385. Os refugiados têm constituído um sério problema para a sociedade
internacional devido ao seu grande número em certas épocas, como após
a 1- e a 2a Guerras Mundiais.
A sua proteção, para ser eficiente, tem que ser realizada através de
organismos internacionais. Assim, no tempo da SDN foram instituídos
diversos órgãos, como o Alto Comissariado para os refugiados da Alemanha,
o Alto Comissariado para os refugiados russos e armênios, etc.
Durante a 2- Guerra Mundial foi criada a Administração das Nações
Unidas para S oco rro e Reconstrução (UNRRA), que desapareceu em 1947.
Tinha éla por objetivo repatriar as vítimas do nazi-fascismo.14
Em 1946, foi criada a Organização InternacionaLdos Refugiados (OIR),
que era um organismo especializado da ONU e desapareceu em 1951,
tendo prestado grande contribuição no auxílio aos refugiados no após-
guerra.
Em 1950, foi instituído, no âmbito do Secretariado da ONU, o Alto
Comissariado das Nações Unidas para ao Refugiados], criado pela Assem­
bléia Geral, que começou a funcionar em 1951. O Alto Comissário é eleito
pela Assembléia Geral, p or proposta da Secretaria Geral. O mandato é de
cinco anos. As despesas serão financiadas por subvenção no orçamento da
ONU e doações. Ele tem por finalidade auxiliar os governos em relação

1055
aos refugiados, repatriá-los e ajudar 11a sua assimilação. A sua sede é em
Genebra. O Alio Comissariado pode possuir organismos especiais para»
atender as regiões onde a questão dos refugiados seja mais premente.
Assim foi criada a United Nations Relief and Work Agency for Palestine
Refugees in The Near East (UNRWA), que sobrevive até hoje. Foi cóhsti-
tuído ainda na ONU o Fundo de Emergência das Nações Unidas para os
Refugiados e, de junho de 1959 a junho de 1960, foi instituído o ano do
refugiado, com a finalidade de cham ar a atenção da opinião pública mun­
dial para o assunto.l4A
A proteção não tem sido dada apenas no âmbito internacional; mas
também dentro dos Estados. Assim, a França possui órgãos destinados a
atendê-los. A Itália concluiu acordo com o Alto Comissariado da ONU,
que manda os seus representantes para lá.
A Convenção de 1951 (entrou em vigor em 1954), c o n clu íd a s o b os -
auspícios da ONU, que fixa o estatuto dos refugiados, determina que os
Estados devem cooperar com o Alto Comissariado das Nações Unidas. Esta
convenção leve um protocolo concluído em 1967.14B
Em 1987 existiam 11 milhões de refugiados. Em 1993 se fala em 15
milhões de refugiados (J. Touscoz). Em 1994 existiam 23 milhões de
refugiados e 25 milhões de pessoas deslocadas (são as pessoas que estão
dentro do seu próprio Estado). Uma outra fonte menciona a existência
de 27 milhões de refugiados em 1995. Fabienne Hara afirma, em 1999,
que existem 50.000.000 de pessoas deslocadas pela força, das quais
13.000.000 estão enquadradas na convenção de Genebra de 1951. Durante
a Guerra Fria os movimentos de refugiados foram causados por conflitos
internacionais e após a Guerra Fria por conflitos internos e as maciças
violações de direitos humanos. VillalpandoTòrnece os seguintes dados: a)
Em 1991, 1,8 milhões de curdos procuraram refúgio na Turquia e Irã; b)
Em 1992, 250.000 muçulmanos de Myanmar procuraram refúgio em Ban­
gladesh; c) Em 1992, o conflito entre Armênia e Azerbaijão provocou
800.000 refugiados; d) Em 1995, 120.000 liberianos foram para a Costa do
Marfim; e) Em 1995, 300.000 do Burundi estão no Zaire; f) Em 1995,
155.000 de Serra Leoa foram para Guiné; g) Em 1993, 280.000 do Togo
foram para Benin e Gana; h) Em 1990, 170.000 kosovares foram para
Albânia, etc.
384. O estatuto dos refugiados foi fixado na convenção acima citada.
Em linhas gerais, os refugiados gozam dos mesmos direitos e deveres que
possuem os estrangeiros. A convenção será aplicada sem discriminação de
raça, país de origem ou religião dos refugiados.
Eles têm direito à vida, à propriedade, à-liberdade de religião, de
l o c o m o ç ã o ,e x e r c e r profissões liberais, ser comerciante, liberdade de
associação, etc São assimilados aos nacionais no tocante às taxas e impostos.
Beneficiam-se da legislação do trabalho e da previdência social e da edu­
cação pública. A sua naturalização deve ser facilitada pelo Estado.16 O seu
estatuto é o da lei do domicílio ou, na falta deste, o da residência.

1056
O refugiado está isento das restrições de imigração e não sofrerá
qualquer sanção penal por ter entrado ilegalmente no país, desde que se
apresente imediatamente às autoridades do Estado e demonstre ter vindo
diretamente do país onde é perseguido;
O Estado tem o direito de tomar medidas excepcionais em relação ao
refugiado apenas em caso de guerra, circunstâncias graves ou no interesse
da segurança nacional.
Os refugiados possuem deveres em relação ao Estado que os recebe:
respeitar as leis e regulamentos e se conformarem “às medidas tomadas
para a manutenção da ordem pública”. Outros deveres podem ser acres­
centados, como o de não se intrometer na vida pública do Estado.17 A
Convenção de Caracas sobre asilo territorial não determina o estatuto dos
refugiados, mas estipula também alguns dos seus direitos e deveres:18 a)
garante ao asilado a “liberdade de expressão do pensamento” como reco­
nhecida aos demais habitantes do Estado, inclusive contra o seu governo,
desde que os conceitos expressos não constituam “propaganda sistemática
por meio da qual se incite ao emprego da força ou da violência contra o
governo do Estado” que apresentar reclamação; b) a liberdade de associa­
ção só poderá ser restringida se a reunião tiver por “objetivo promover o
emprego da força ou da violência contra o governo do Estado” que apre­
sentar reclamação; c) os que fizerem parte de movimentos subversivos
poderão ser internados a uma “distância prudente das fronteiras” do
Estado que for interessado19 e d) os internados só poderão sair do Estado
de refúgio comunicando esse fato ao seu govemò e “sob a condição de
não se dirigirem ao país de sua procedência”.20
O Estado que concede o asiio não pode permitir que o asilado pratique
atos contrários aos objetivos e princípios das Nações Unidas. Por outro
lado o Estado não pode impedir a en trada de alguém que procure asilo
no seu território, nem obrigá-lo a voltar para-,o Estado de onde ele é
pèrseguidõTEste princípicTsbrnéñte sõfríflíxceçao"em easo de imperiosas
razões de segurança nacional ou para “salvaguarda da população, como
no caso de uma massa de pessoas” procurar asilo. Entretanto, o Estado
deverá dar a estas pessoas a oportunidade de poderem ir para outro Estado
ou, ainda, lhe dar um asilo provisório.
A Convenção de 1951 prevê que o Estado onde se encontra o refugiado
deverá dar um documento de viagem com validade por um ou dois anos
e que é reconhecido pelos Estados signatários.
No Brasil o Decreto-lei n- 9 4 ], de i 969. trata da condição do asilado
(arts. 111 e segs.) e entre outras determinações estabelece que ele não
poderá se retirar do Brasil sem prévia .comunicação'“e obtenção do res­
pectivo visto”, e se encontra tal matéria regulamentada ainda nos arts. 138
e segs. do Decreto n2 66.689, de 11-6-1970.
O estatuto do refugiado foi regulado pela Lei ne 6.815, de 19.8.80,
que impunha ao asilado as obrigações do Dl, da legislação vigente e as

1057
que o governo fixar (art. 28). O asilado não podia sair do país sem prévia
autorização do governo brasileiro, e se o fizesse, seria considerado renúncia
ao asilo, impedindo que voltasse a ser considerado asilado.
Atualmente a matéria está regulamentada pela Lei 9.474 de 1997. Ela
considera refugiado aquele que teme ser perseguido por motivos de raça,
religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política encontra-se fora
do país de sua nacionalidade e não possa ou não queira aceitar a proteção
de tal país, ou não tenha nacionalidade e não possa retornar ao país em
que teve a sua residência habitual, ou ainda não pode voltar ao país, porque
aí existe grave e generalizada violação de direitos humanos. A condição
de refugiado é extensiva a ascendente, descendente e demais membros
do grupo familiar que dependam economicamente do refugiado. O indi­
víduo pode requerer a qualquer autoridade migratória a sua condição de
refugiado. E criado no .Ministério., da Justiça QjComitê..Nacional para os
Refugiados (CONARE), sendo que o ACNUR será seu membro convidado.
A repatriação deve ser voluntária. O refugiado não será deportado para a
fronteira do estado em que sua vida ou liberdade esteja ameaçada. A saída
do território brasileiro sem autorização do governo é considerada renuncia
ao asilo.
Finalmente, podemos mencionar que a Assembléia Geral aprovou, em
1967, uma Declaração sobre Asilo Territorial, determinando que deve ser
respeitado pelos Estados, que é um ato pacífico e humanitário, bem como
não pode ser concedido a autores de crimes de guerra, contra a paz e
contra a humanidade, etc. Em 1977, reuniu-se, em Genebra, uma Confe­
rência das Nações Unidas sobre asilo territorial que não conseguiu aprovar
nenhum texto da convenção.,
Em 1969, foi concluída, ria OUA, convenção regulamentando os as­
pectos próprios aos problemas de refugiados na África.
O problema é que os Estados se recusam a aceitar que o refugiado
tem um direito de ser admitido no seu território (Louis Henkin).
O princípio de “non refoulement” (não devolução) é fundamental
em matéria de refugiados e está consagrado no art. 33 da convenção de
1951. Este princípio inclui o de não proibir, na fronteira, a entrada do
refugiado. Este princípio tem sido considerado norma de “jus cogens". O
“refoulemente” não está submetido ao controle judicial, como a expulsão.
Vera Gowlland — Debbas afirma que se pensa em criar uma respon­
sabilidade internacional por um fluxo muito grande de refugiados como
violação dos direitos humanos. Não há norma internacional que proíba o
fluxo, mas este prejudica a outro estado causando-lhe dano. O estado de
onde saírem os refugiados deve criar condições para o seu repatriamento.
A convenção da ONU para supressão da tortura de 1984 consagra o
princípio de “non refoulement” (não devolução) para quem está amea­
çado de tortura.
385. O asilo pode terminar por inúmeras causas: a) a sua naturalização
no Estado de refugio; b) quando o refugiado parte do Estado de refugio;
c) a sua expulsão do Estado de refugio, o que só pode ocorrer em casos
excepcionais;21 d) quando cessa a causa que motivou o asilo; é) inorte do
refugiado.
---- 2^? 386. Nos termosticTconvenção interamericana sobre asilo diplomático
(Caracas, 1954), ele pode ser definido como “o asilo outorgado em lega-
ções, navios de guerra e acampamentos ou aeronaves militares, a pessoas
perseguidas por motivos ou delitos políticos”1 (art 1").
387. O asilo diplomático tem como antecedente o asilo religioso;22
tendo com ele coexistido por um certo período, acabou por ser o seu
sucessor.
_ 0 asilo diplomático surgiu com as Missões Diplomáticas no século XV,
propagou-se a sua prática no sécúlo XVT, quando doutrinadores o consa­
graram, como Conradinus Brunus, Álberico Gentili e Francisco Suárez
(este último no início do século XVTI). Ele se fundamentava nas imunida­
des das Missões Diplomáticas, urna vez que estas representavam os monar­
cas estrangeiros e o embaixador era olhado como sendo “a mesma pessoa
do príncipe que o enviava” (M. A. Vieira). A inviolabilidade dos embaixa­
dores, com base na teoria da extraterritorialidade, estende-se não apenas
à residencia do embaixador, mas também a todo o quarteirão em que esta
se encontra localizada (“jus quarteriorum, franchise du quartier”).
O asilo diplomático conservou até o início do século X IX a caracte­
rística do asilo religioso, isto é, de só ser c o n ce d id o a n ctiminoso f o m i i m .
Esta prática fez com que nos séculos XVI e XVII os embaixadores prote­
gessem a toda espécie de criminosos e transformassem isto em negocio
lucrativo, tima vez que alguns deles davam o asilo, isto é, alugavam casas,
por preços altíssimos, aos malfeitores. Deste modo, no século XVII o “jus
quarteriorum” começa a ser abolido, por exemplo, na Espanha. A Igreja
Católica neste mesmo século também o suprime.22A
O asilo diplomático foi desaparecendo da Europa com a supressão do
( j ‘jus quarteriorum”23 e com a humanização das penas. Nos séculos XIX e
X X ainda se encontram no continente europeu casos de asilo diplomático
a criminosos políticos; entretanto, eles são esporádicos e ocorrem sob o
protesto dos governos do Estado onde se encontra a Missão Diplomática.
Tais características fazem com que a Europa não reconheça o instituto do
asilo diplomático e apenas o tolere em certos casos.
Na América foi onde o asilo diplomático encontrou a sua consagra­
ção.24 Tal fato surgiu em decorrência da instabilidade das nossas instituições
.políticas e as constantes revoluções, acarretando a necessidade de se pro­
teger a pessoa do criminoso político.
. A regulamentação internacional na América vem desde o século XIX
com o Tratado de Direito Penal de Montevidéu (1889), que consagrou o
asilo diplomático e territorial nos seus arts. 15, 16,17 e 18. Inúmeras outras

1059
convenções foram concluídas no continente: a de asilo (Havana, 1928), a
de asilo político (Montevidéu, 1933), o tratado sobre asilo e refúgio político
(Montevidéu, 1939) e, finalmente, a convenção interamericana sobre asilo
diplomático (Caracas, 1954).2-’
j 3 iiSLLa-dipl©mátiee-ttãô-é-uma-pEática-de-Lodo o continente am erican o,
mas apenas dos Estados latino-americ.an.Qs- Os EUA não reco n h e ce m o
asilo diplõm alicõ ê n ão iem assinado as con v enções sobre o assunto.2l>A
A conclusão que podemos apresentar é que ofásilo diplomático só é
^ T e c onhecido como direito entre os países latino-americanos./ Entretanto,
isto não significa que os outros Estados também não pratiquem o asilo
diplom ático, mas o fazem esporadicamente e não lhe reconhecem o as­
pecto de instituto fazendo parte do Dl (EUA). Dentro desta orientação,
o Brasil concedeu inúmeras vezes asilo diplomático em Portugal, os lati-
no-americanos o praticaram durante a guerra civil espanhola e Estados
europeus o têm exercido na América, e os próprios EUA o tem praticado
na Europa. Apenas esta prática não chegou a formar um costume e ela
visa proteger, em determinados casos, perseguidos políticos.2’6
388. Não existe qualquer obrigatoriedade do Estado em çoncedgEjOL.-
asilo. A sua concessão é um ;ato discricionária do Estado asilante. O asilo
é um direito do Estado e não do indivíduo. Esta é a orientação consagrada
no art. 2e. Alguns doutrinadores (Quintin Alfonsin) têm criticado esta
orientação, alegando que o dever de conceder asilo é uma tradição do
nosso continente e que o instituto do asilo, tendo fins humanitários, não
deve se influenciar pelo aspecto político-diplomático (ver item 380).
389. O asilo não está sujeito à reciprocidade e protege indivíduos
independentemente de sua nacionalidade.
Não se pode falar em extraterritorialidáde da missão, uma vez que o
asilado se encontra dentro do Estado de cujas autoridades ele foge; apenas
ele não se encontra sujeito à jurisdição do Estado territorial. A teoria da
extraterritorialidade foi completamente abandonada.26 Atualmente fala-se
em inviolabilidade e imunidade de jurisdição dos imóveis da Missão Di­
plomática, o que fundamenta o asilo diplomático, uma vez que o Estado
territorial não pode mais submeter o asilado à sua jurisdição.
390. O asilo diplomático pode ser concedido em inúmeros locais.:
a) ele,pode ser dado nas legações. Éstas, nos termos da Convenção de
Caracas, abrangem “a sede de toda missão diplomática ordinária, a resi­
dência dos chefes de Missão e os locais por eles destinados para esse efeito,
quando o número de asilados exceder à capacidade normal dos edifícios”
(art. l 8);
b) nos ^navios e aerpnayx^-miliiares _x> próprio comandante é quem
concede o asilo. Entretanto, os navios e aeronaves militares que se encon­
trarem em “estaleiros, arsenais ou oficinas para ser reparados” não cons­
tituem local de asilo.27
A concessão do asilo aos criminosos políticos em navios de guerra já
era consagrada no século XIX, principalmente nos navios britânicos. Neste
mesmo século o asilo passou a ser dado aos escravos fugidos. Na Grã-Bre-
uinha, as normas sobre este asilo foram fixadas na Fugitive Slaves Circular,
de 1876, que deu poderes ao comandante para decidir sobre o assunto e
que não deveria levar em consideração qualquer pedido de entrega do
perseguido, fundamentado apenas no motivo da escravidão. O Regulamen­
to Naval dos EUA (1913) não admite o asilo de criminosos políticos a
bordo de navios e ele só poderá ser concedido em casos extremos, como
o indivíduo perseguido por multidão. O Brasil já teve em suas águas
territoriais asilo concedido por navios de guerra estrangeiros, como foi o
caso dos revoltosos comandados por Saldanha da Gama, que se refugiaram
nos navios de guerra portugueses Affonso de Albuquerque e Mindelto; bem
como a bordo do cruzador São Paulo concedemos asilo durante a revolução
republicana de 1910 em Portugal;
c)|os acampamentos militares são também locais para a concessão do
asilo diplomático. "
t Não são considerados locais de asilo as sedes das organizações inter­
nacionais. No mesmo senüdo são considerados os consulados. Entretanto,
têm havido uma reação da doutrina para qiie os consulados"possam con­
ceder o asilo diplomático. Esta foi a posição do Instituto de Direito Inter­
nacional (1950) e do 1! Congresso Hispano-luso-americano de Direito
Internacional (1951). Em favor desta concepção salienta-se que a concessão
de asilo diplomático apenas nas Missões Diplomáticas só dá proteção ao
criminoso político da capital onde estas missões se localizam, não prote­
gendo os do resto do país. Tal fato ficou patenteado quando no Brasil,
em 1964, apenas os políticos que se encontravam na capital do estado da
Guanabara, onde ainda se localizava a maioria das Missões Diplomáticas,
puderam se asilar. A concessão de asilo nos consulados, contudo, não está
consagrada no DL Finalmente, pode-se acrescentar que os automóveis da
Missão Diplomática não constituem local de asilo.
391. O asilo diplomático é concedido apenas a indivíduos que sejam
perseguidos por motivos ¿u^eüfof’polftirc^^Náo'sé^Ha^oasilo “ a pessoas
que, na ocasião em que o solicitem, teruham sido acusadas de delitos
comuns, processadas ou condenadas por esse motivo pelos tribunais ordi­
nários competentes, sem haverem cumprido as penas respectivas” (an. 3S
da Convenção de Caracas). Ele não protege também aos “desertores das
forças de terra, mar e ar”, a não ser que o ato que motiva o pedido de
asilo tenha “claramente caráter político”.
Estipula ainda o mesmo dispositivo da Convenção de Caracas que as
pessoas que se asilarem por crimes que não justificam o asilo “deverão ser
convidadas a retirar-se, ou, conforme o caso, ser entregues ao governo
local”'. Este, entretanto, não poderá julgar tais indivíduos “por delitos
políticos anteriores ao momento da entrega” .
O asilo deverá ser dado somente em rasos, de urgência, isto é, quando
o indivfduo, por motivos, políticos,_ é perseguido por multidões, pelas au­

1061
toridades, quando se encontre em perigo de vida ou a sua liberdade e
integridade pessoal estejam ameaçadas. A urgência é julgada pelo asilante
(arts. 5Q, 69 e 7S).
A qualificação do delito é feita pelo Estado asilante.29 Entretanto, ela
não tem aspecto definitivo, tanto assim que nada impede que ele altere
no futuro esta qualificação.
O asilante, na qualificação, deve levar em consideração as informações
do Estado territorial sobre o asilado. Entretanto, a decisão sobre se o
criminoso é ou não político pertence exclusivamente ao asilante (art. 99).
O asilante pode prolongar o asilo para coligir informações, a fim de
verificar da sua procedência (art. 14).
392. A primeira obrigação do asilante é a H c comunicar às autoridades
do Estado que concedeu asilo a tal indivíduo. Esta comunicação deverá
sertêíta, de preferência, por escrito. Ela somente deixará de ser feita
quando a sua realização apresentar perigo para a segurança dos asilados.
O asilante não pode permitir que o asilado exerça qualquer atividade
política. Este não deverá exercer atividade política de qualquer natureza
(art. 18).30
O asilante deve impedir que o asilado se comunique com o exterior
da Embaixada e que receba visitas. Estas só serão recebidas se forem pessoas
da família do asilado e se o chefe da missão tiver concedido autorização.
O asilo não deve ser concedido novamente se o asilado abandonar o
local do asilo e pretenda se asilar de novo. Este princípio decorre do fato
de que a Missão Diplomática não é um locai que possa ser utilizado para
o asilado simplesmente burlar as autoridades do Estado territorial.
O asilante deve entregar ao Estado territorial o asilado que for crimi­
noso comum.
O asilo não pode ser oferecido. O asilado deve atingir os locais de
asilo por seus próprios meios, isto é, sem auxílio do asilante.
O asilante pode prolongar o asilo para coligir informações sobre fatos
“que ponham em perigo a segurança do asilado durante o trajeto para
um país estrangeiro” (art. 14).
O asilante não é obrigado a conceder asilo no seu território ao asilado,
“ mas não poderá mandar de volta ao seu país de origem, salvo por vontade
expressa do asilado”. Se o Estado territorial comunicar que pedirá, poste-
‘ riormente, a extradição do asilado, este ficará residindo no território do
asilante até que este receba o pedido de extradição. O asilado não poderá
-ficar sob vigilância por mais dê 30 dias. As despesas, como a permanência
■preventiva no território do asilante, correrão por conta do Estado que o
solicitou (art. 17).
393. O. governo de que foge o asilado tem em relação ao asilo uma
Série de deveres: a) deverá conceder o salvo-conduto para a saída de asilado
quando o asilante o solicitar (art. 12); b) deverá dar garantias ao asilado
para que ele saia do território nacional (art. 52) ;31 c) e, como um dever

Í062
que decorre do DI Ge ral, podemos acrescemar que o Estado tem de
proteger as Missões Diplomáticas que se encontram no seu territorio, a
fim de que elas não sejam molestadas por terem concedido asilo a deter­
minados individuos.
Entretanto, ao lado destes deveres, o Estado territorial tem um direilo
que é da maior importancia para ele neste assunto: é o direito qpe,possui
de impedir, pelo lado de fora da missão, a entrada e saída (esta sem o
salvo-conduto) do asilado da Embaixada. O Estado territorial pode exigir
que o asilado seja retirado do país, devendo para isto conceder o salvo-
conduto e dar garantias (art. 11).
394. O asilo pode terminar por diversas causas: a) renuncia ao asilo;
b) a entrega do asilado, como criminoso comum, pelo asilante ao Estado
territorial; c) a fuga do asilado; d) a saída do Estado;32 e) a morte do asilado.
O asilo não desaparece com o rompimento das relações diplomáticas.33
Neste caso, se o Estado territorial não conceder salvo-conduto para a saída
dos asilados, estes serão entregues à guarda e proteção de Missão Diplo­
mática de outro Estado. Se este outro Estado não aceitar a incumbência
os asilados poderão ser entregues a um Estado que não faça parte da
Convenção de Caracas é que concorde em manter o asilo (art 19).
395. A Corte Internacional de Justiça já teve submetido à sua apreciação
um caso de asilo diplomático que pode ser sintetizado da seguinte maneira:
em 1949, a Embaixada da Colômbia, em Lima, concedeu asilo a Haya de
la Torre, político que o Peru considerava criminoso comum. O Peru se
recusou a entregar o salvo-conduto e a Colômbia a entregar o asilado. O
caso foi levado à CIJ, que decidiu em 20 de novembro de 1950:34 a) a
Colômbia não tem o direito de qualificar o delito; b) o Peru não tem o
direito de recuperar o asilado.
E evidente que a sentença era contraditória e praticamente inexeqüí-
vel. A Colômbia, diante deste fato, apresentou à Corte um pedido de
interpretação, que foi rejeitado em 27 de novembro de 1950. Novamente
a questão é apresentada pela Colômbia à CIJ, solicitando que fosse deter­
minada a maneira de cumprir a sentença de 20.11.1950 e que se decidisse
se a Colômbia estava obrigada ou não a entregar Haya de la Torre. A
decisão foi proferida em 13 de junho de 1951: a) a Colômbia não está
obrigada a entregar Haya de la Torre ao Peru; b) o asilo deveria ter cessado
desde a sentença de 20 de novembro de 1950; o modo de pôr fim ao asilo
seria acordado pelas partes. A decisão da Corte era novamente inexeqüí-
vel.3:> E somente em 1954, por meio de um acordo entre os dois países, é
que leve fim o asilo de Haya de la Torre. Por este acordo, a Colômbia
entregou Haya de la Torre ao Peru e este o levou para fora do país.

1063
NOTAS
I. Franchini Netto — O Asilo Diplomático e o C o slu m e Internacional, 1943;
G. J . van Heuven Goedhari — T h e Problems of Refugees, in RdC, 1953, vol. I, t.
82, págs. 265 e segs.; E. Reul-Nicolussi — Displaced persons and international law,
in RdC, 1948, vol. 11, t. 75, págs. 5 e segs.; Egídio Reale — Le droit d ’asile, in RdC,
1938, vol. I, t. 63, págs. 473 e segs.; Jacques Vernant — T h e Refugees in The
Postwar World, 1953; Robert Ginesy — La Seconde G uerre Mondiale et les Dé-
placem ents de Fopuiations — Les Organísmes de Protection, 1948; A bdollah
Bahramy — Le Droit d ’Asile, 1938; Pierre Timbal-Duclaux de Martin — Le Droit
d ’Asiie,, 1939; Leopold Bolesta-Ko 2 iebrodzki — Le Droit d ’Asile, 1962; Manuel
Adolfo Vieira — Derecho de Asilo Diplomático (Asilo P olítico), 1961; Carlos Torres
Gigena — Asilo Diplomático su práctica y su teoria, 1960; Carlos Bollini Shaw —
D erecho de Asilo, 1937; Hugo Cabral de Moneaba — O Asilo Interno em Direito
Internacional Público, 1946; Carlos A. Fernandes — Do Asilo Diplomático, 1961;
Affaire Colombopéruvienne relative au droit d’asile, A rrét du 20 Novembre 1950,
CIJ Recueil, 1950, pág. 266; Dem ande d’Interprétation de l’Arrét du 20 Novembre
1950 relative au droit d’asile, A rrét du 20 Novembre 1950, CIJ Recueil, 1950, págs.
395; Affaire Haya de la T orre, Arrét du 15 Juin 1951, CIJ Recueil, 1951, pág. 71;
F. Schnyder — Les Aspects Jurid iques Actuéis du Problém e des Réfugiés, in RdC,
1965, vol. 1, t. 114, págs. 339 e segs.; Leopoldo Braga — D ireito de Asilo, in Revista
de Direito, 1969, ne 9, págs. 15 e segs.; Alexandre Charles Kiss — Asile (droit d"),
in Dalloz — Encyclopédie Ju rid iqu e — Répertoire de Droit International, publi­
cado sob a direção de Ph. Francescakis, t. I, 1968, págs. 167 e segs.; Francesco
Francioni — Asilo Diplomático, 1975; Marc de Kock — O Direito de Asilo em
Direito Positivo Belga, in Revista do Instituto dos Advogados Brasileiros, maio de
1974, págs. 101 e segs.; Jo sé Jo aqu im Caicedo Castilla — Contribución de América
al Desarrollo del Derecho Internacional — Asilo, in Cuarto Curso de Derecho
Internacional, organizado pelo Comité Jurídiccrlnteram ericano, 1977, págs. 7 e
seg.; M. Franchini Netto — Asilo Diplomático, 1978; Sandruddin Aga Khan —
Legal Problems Relating to Refugees and Displaced Persons, in RdC, 1976, vol. I,
f. -¿49, págs. 287 e segs.; François Leduc — L ’Asile Territorial et Conférence des
Nations Unies de Genéve — Janvier 1977, in AFDI 1977, 1978, págs. 221 e segs.;
M ichel Moussalli — La P rotección Internacional de los Refugiados, in IX Curso
de D erecho Internacional, organizado pelo Comité Ju ríd ico Interamericano, 1983,
págs. 165 e segs.; Otto Kimminich — The Present International Law of Asylum,
in Law and State, vol. 32, 1985, págs. 25 e segs.; Mario B ettati — L ’asile politique
en question, 1985; M onique Chemillier-Gendreau — Droit des peuples a disposer
d ’eux-mémes et réíugies, in M élanges Charles Chaumont, 1984' págs. 161 e segs;
Luke T. Lee — The Right to Compensation Refugees and Countries of Asylum,
in AJIL, July, 1986, vol. 80, n° 3, págs. 532 e segs.; E tienne R. Mbaya — Poíitical
Asylum in the Charter o f the OEA: pretensions and reality, in Law and State, vol.
33, 1987, págs. 63 e segs.; Bogdan Wierzbicki — Poíitical Asylum in International
Law, in Revue Hellénique de Droit International, 1985-1986, págs. l í e segs.;
Claude Norek e Fréderique Dounsic-Doublet — Le Droit d ’Asile em France, 1989.
Jean-Jacques de Bresson-Heurs et Malheurs de la Convention de Geneve du 28
Ju illet 1951 sur le statut des refugiés, in Mélanges Michel Virally, 1991, págs. 147
e segs.; Jaim e Ruiz de Santiago — Consideraciones Generales acerca del Derecho
Internacional de los Refugiados, in Consejo Argentino para las Relaciones Inter­
nacionales — Jom ad a sobre los Sistemas Internacionales de Prote6ción Jurídica
de la Persona Humana, 1991, págs. 89 e segs.; Tom Farer — How T h e International
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in Human Rights Quartely, vol. 17, n? 1, February 1995, págs. 22-e segs.; Jo sé H.
Fischel de Andrade — D ireito Internacional dos Refugiados, 1996. Haut Commi-
sariat des Nations Unies pour les Refugiés — Les Refugiés dans le Monde, 1997;
Societé Francaise pour le D roit International — coloque de caens droit d'asile et
des réfugíés, 1997. Denis Alland — Textes du droit de I’asile, 1998. O Direito
Internacional dos Refugiados. Uma Perspectiva Brasileira, coordenadores: Nádia
de Araújo e Guilherme Assis de Almeida, 2000; Maria Teresa Ponte Iglesias —
Conflictos Armados, Refugiados y Desplazados Internos en el Derecho Internacio­
nal Actual, 2000. Waldo Villalpando — De los D erechos Humanos al D erecho
Internacional Penal 2000; Thelm a Thais Cavarzere — D ireito Internacional da
Pessoa Humana — A Circulação Internacional de Pessoas, 2a ed.-2Q01; Antônio
Augusto Cança‘do Trindade e Ja im e Ruiz de Santiago — La Nueva Dimensión de
las Necesidades de Protección del Ser Humano en el In icio del Siglo X X I, 2001.
2. A palavra asilo vem do latim “asylum", que por sua vez se origina de um
term ò grego que significa “sitio ou local inviolável” . No grego ela se origina de
um vocábulo que significa “ o direito de alguém apresar um barco estrangeiro, ou
a sua carga, a fim de indenizar-se pelos prejuízos sofridos por causa do seu pro­
prietário” ; com o acréscim o de um a o seu sentido é alterado e passa a significar
“sitio ou local inviolável” ( asylum) (Carlos A. Fernand es). Para Denis Alland a
palavra asilo vem do grego “asulus” .
3. Parece que também j á existia entre os hindus.
4. Na Grécia aistiu ainda o asilo territorial. De um m odo'geral, o asilo territorial
na Antiguidade se prendia à noção de hospitalitade, que era um verdadeiro direito
sagrado.
5. O asilo extem o, isto é, dado por outra potencia, Rom a não o reconhecia
aos criminosos mais im portantes, geral mente políticos, e o admitia nos demais
casos.
6. O asilo dado em tem plos pagaos era respeitado devido ao medo dos deuses;
já no asilo dado em templos cristãos, o respeito prendia-se ainda a outras razões,
com o o arrependimento, q u e reabilitava o criminoso.
7. O asilo religioso com o fortalecimento do Estado com eçou a desaparecer
(séculos X III e XA 7) . No século XVI, a França o restringe, a Espanha o suprime,
na Suécia desaparece e na Inglaterra (século X V II) é tam bém suprimido. Entre­
tanto, ele continuou a ser praticado, apesar das proibições reais, com m enor
intensidade. A Igreja sem pre lutou pelo asilo religioso e na codificação do Direito
Canónico de 1919 ele ainda está consagrado (C ânone 1.179).
8. A Constituição francesa de 1793 afirma que a França dará asilo “aos es- '
trangeiros banidos de sua patria por causa de liberdade” .
9. Deve-se lembrar que a Declaração Universal de D ireitos do Homem é um
simples enunciado de principios sem aspecto obrigatório.
10. As Constituições dos Estados do bloco soviético consagrava o asilo territorial
para os que lutassem pela liberdade ou ein favor das classes trabalhadoras.
11. Esta convenção faz referencia apenas a individuos que fossem refugiados
na data da sua conclusão. E ntretanto, ela tem a grande vantagem de servir de
m odelo para o tratam ento que for dispensado aos refugiados de depois de 1951.

1065
O proLocolo de 1967 elim inou a restrição do ano de 1951, ou seja, ela passou a
ser aplicada aos refugiados posteriores a esta data.
12. Goedhart, Alto Comissário da ONU para os refugiados, salienta a dificul­
dade de uma definição de refugiados e cita, entre outras, a definição do Dicionário
O xford: “ uma pessoa que escapa de um Estado estrangeiro por perseguição política
ou religiosa”. Esta definição se aproxim a da que é dada na Convenção de Caracas
(1954). A Liga das Nações não deu uma definição geral do que era refugiado,
mas sim uma definição em cada caso. Ela cuidava de grupos específicos, como
russos e armênios (José H. Fischel de Andrade)
13. No tempo em que existiu a OIR, dava-se ao indivíduo um direito de ser
qualificado refugiado, um a vez que a qualificação era feita por ela e existia até
mesmo no seu interior um Conselho de Recursos.
13A. Algumas criticas têm sido dirigidas ao instituto do asilp: a) o refugiado
pode se transformar em um problem a político para o Estado dê refúgio; b) pode
perturbar as relações internacionais, etc.
14. Em 1938 já havia sido criado o Comitê Intergovernam ental para os Refu­
giados (C1R), que tinha por finalidade auxiliar os refugiados da Áustria e Alemanha.
14A. Pode-se m encionar ainda um “órgão con exo” do CES que é o Comitê
Executivo do Programa do Alto Comissário das Nações Unidas para os refugiados
com trinta Estados-membros.
14B. Na ONU, em 1975, foi aprovado um projeto de convenção sobre asilo
territorial, que ainda não se to m o u realidade. Pode-se assinalar que em 1969 foi
concluída no âmbito da OUA um a convenção sobre refugiados.
15. Nesta podem ter restrições, mas que devem ser iguais às impostas aos
estrangeiros.
16. Este aspecto tem grande importância porque grande núm ero de refugiados
são apátridas. Alguns Estados, URSS, Alemanha nazista e Itália fascista, retiravam
a nacionalidade dos indivíduos que fossem buscar refúgio no estrangeiro (v. ca­
pítulo X X X I).
17. Sobre o passaporte dos refugiados, v. capítulo X X X V I.
18. Estas normas, estabelecidas na Convenção de Caracas, de um modo geral,
j á constavam da convenção sobre asilo e refúgio político concluída em 1939, em
M ontevidéu, pela Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Peru.
19. Esta distância fica a critério do Estado onde se çn co n tra o asilado. As
despesas do interamericano correm à custa do Estado que o solicitar.
20. Tal fato deverá ser com unicado ao Estado que solicitar o seu internamento.
2 J . V. sobre as limitações a expulsão de refugiados: capítulo XXIV.
22. V. acima neste capítulo.
22A. Francisco 1 aboliu, em 1593, na França, a im unidade dos edifícios de
culto em matéria de asilo. Na Inglaterra a mesma imunidade foi abolida em 1625,
e na Espanha por Filipe II.
23. Esta supressão teve grande importância, porque a inviolabilidade, abran- .
gendo apenas a casa do em baixador, fazia com 'que este tivesse de conceder na
sua própria casa o asilo a crim inosos comuns, pessoas, geralm ente, da “ pior espé­
cie” .
24. O primeiro caso de asilo diplomático na América ocorreu em 1865, quando
o representante diplomático dos EUA concedeu asilo, em Lim a, ao General Can-
seco (Franchini N etto); posteriorm ente, houve casos de concessão de asilo por
parte das Iegações européias.
25. Os artigos citados no texto, sem menção da convenção a que pertencem ,
são todos da Convenção de Caracas.
25A. E interessante observar que o Ministro das Relações Exteriores da França,
em uma declaração ao Senado, em 1970, afirmou que as Missões Diplomáticas
francesas na América Latina podem conceder asilo diplom ático, desde que ele
seja dado com “ prudencia e em condições bem determ inadas” (RGDIP, Juillet-
Septem bre, 1971, n9 3, págs. 849 e 850). Nos EUA, em 1972, foi "prom ulgado”
pelo Departamento de Estado o General Policy for Dealing with Requests for
Asylum by Foreign Nationals, que traça a política norte-am ericana em matéria do
asilo de um modo geral.
25B . É de se recordar que quando houve no Chile o golpe de Estado que
colocou o General Pínochet no poder (1973) inúmeras Embaixadas nao americanas
concederam asilo diplomático: Alemanhas Ocidental e O riental, Austria, França,
Irlanda, Noruega, Suécia, Suíça, Países Baixos, Itália, Espanha, Vaticano e Canadá.
26. V. capítulo Agentes Diplomáticos.
27. O Tratado Geral de Paz e Amizade, assinado em Washington, e m -1907,
pelas repúblicas centro-americanas, admitía o asilo a bord o de navios mercantes.
28. Sobre conceito de crim e político, v. capítulo X X X III. A Colombia, na 4 a
Reunião do Conselho Interam ericano de Jurisconsultos, propôs que não fosse
considerado crime político a rebelião de militares em serviço ativo, o que não foi
aceito pela grande maioria.
29. Existe urna certa tendência em se restringir a qualificação soberana por
parte do asilante, a fim de evitar a concessão de asilo a quem não seja criminoso
político. Nesle sentido foi aprovada uma resolução na 4- Reunião do Conselho
Interam ericano de Jurisconsultos (Santiago do C h ile), em que se solicitava ao
Com ité Jurídico Interam ericano a redação de um p rotocolo adicional à convenção
sobre asilo diplomático em que se consagrasse esta restrição.
30. Por outro lado, o asilante geralmente obriga o asilado a assinar um do­
cum ento ou ficha que contém a sua identificação e o n d e ele se compromete a
respeitar as normas do asilo. O asilado entrega as suas armas e pode guardar os
documentos pessoais e o dinheiro que for necessário para a sua subsistência.
31. O asilante pode exigir que o Estado territorial forneça as garantias por
escrito (art. 13).
32. O asilante é quem conduz o asilado para fora do país, cabendo ao Estado
territorial “escolher o itinerário preferido para a saída do asilado” (art. 13). O
asilado não pode ser desem barcado no Estado territorial nem em local próxim o
dele, a não ser que haja necessidade de transporte” (art. 16). Quando houver
necessidade de o asilado atravessar o território de um terceiro Estado, este deverá
autorizar esta passagem “sem outro requisito além da apresentação, por vía diplo­
m ática, do respectivo salvo-conduto visado e com a declaração, por parte da Missão
Diplomática asilante, da qualidade do asilado” (art. 15).
33. A Convenção de Caracas estabelece, no seu art. 10, que ela se aplica
mesmo quando não haja reconhecim ento de governo “ e nenhum ato executado
em virtude da mesma (convenção) implicará o recon h ecim en to” .
34. Nesta decisão a C orte negou ao asilo diplom ático qualquer aspecto de
instituto consuetudinário internacional.
35. Estas decisões da CIJ mereceram a ju sta crítica d e vários doutrinadores,
entre eles, a de Camilo Barcia Trelles, Koziebrodzki, etc. A Convenção de Caracas

1067
sobre asilo d i p l o m á t i c o foi u m a reação a estas sentenças que mostravam não ter
a CIJ com preendido este instituto do DI americano, cuja validade não é negada
no nosso continente, devido acima de tudo aos seus fins humanitários e à sua
consagração costumeira. A CIJ não contribuiu, praticamente, em nada para o
instituto do asilo diplomático.

1068
LIVRO VI

O TERRITÓRIO E O DIREITO
INTERNACIONAL PÚBLICO

O bs.: N este livro estu d arem os ta m b é m os navios e ae ro n a v e s q u e não


p o d e m ser assim ilados ao te rritó rio . T odavia, o fa z e m o s aqu i por
razão m e ra m e n te d id ática.

'1069
CAPÍTULO XXXVIII

O DOMÍNIO TERRESTRE DO ESTADO1

396 — Introdução; 3 97 — O papel do território através da Historia;


398 — Teoria jurídica do território: a) Território-objeto; b) Território-
sujeito; c) Territorio-limite; d) Territóruhcompeténcia; e) Soberania ter­
ritorial; 399 — Fronteiras e limites: noções gerais; 400 — A delimi­
tação; 401 — Princípio do “uti possidetis”; 401A — Transportes
ferroviários e rodoviários; 401B — Enclaves; 401C — Riquezas do
subsolo.

territorio é onde o Estado exerce a sua soberania, dentro dos limites


êstãüélerid01* pplri TY> -
O território apresenta duas características: a) é delimitado.2 no sentido
de que existem limites ao poder territorial do Estado; b) tgm estabilidade,
isto é, a sua população é sedentária e os seus limites não se alteram com
freqüência. E de se observar que os próprios nômades se movimentam
’ Tdentro de certos limites. Em nome da segurança pública a noção de
fronteira-zona não é mais aceita. Tem-se feito referência ao principio de
estabilidade das fronteiras, isto é, elas não podem ser colocadas em questão
por procedimentos unilaterais para retificá-las. Elas são permanentes e não
provisórias.
i A noção de território não é geográfica, mas jurídica, tendo em vista
I que ele “é o domínio de validade da ordem jurídica de um determinado
J E s t a d o soberano” (Künz).
i' O território estatal apresenta uma divisão que tem cunho meramente
| didático: a) território “ terrestre”; b) território marítimo; c) território aéreo.
1\ N a verdade, o território estatal é uno.3
O território é “a noção primordial do direito das gentes”, vez que ele
é “a sede da independência” e esta só pode ser defendida pela defesa dele
(René-Jean Dupuy). A globalização acarreta a desterritorialização. B. Badie
e M. — C. Smouts assinalam que atualmente há um paradoxo, faz-se

1071
reivindicações territoriais e “a capacidade reguladora dos territórios nunca
foi tão fraca” .“Assinalam ainda os dois autores que o território atualmente
serve para que as culturas se transformem em guetos.
Para Ratzel o que dava unidade ao Estado e à Nação era o território.
Raymond”Aron afirma que a ordem internacional é essencialmente terri­
torial e a soberania é uma divisão do espaço em compartimentos. Ou
ainda, como escrevia Georges Scelle, os Estados sempre tiveram uma “ ob­
sessão territorial”.
O território teria sido inventado para substituir o casos do feudalismo
e ultrapassar Os particularismos. O território começa a perder a sua im­
portância com a etnização do mundo (B. Badie) e a globalização. Salienta
B. Badie que o Cáucaso é uma mistura tão grande de etnias que parece
impossível territorializá-las.
397. O sedçntarismo na evolução da humanidade, que teria começado
com o início da agricultura e, especialmente, a cultura do trigo, veio dar
ao território importância para os povos. Assim sendo, desde a Antiguidade
o território adquiriu relevo para a vida política dos povos. A sua importância
era tai4 que os marcos de limites eram sagrados. Pode-se acrescentar, com
Robert Fossaert, que o “ território de nomadização” de uma tribo é “ um
primeiro tipo de território político”.
A concepção que predominou, praticamente, através de quase toda a
História foi a da propriedade ou direito real. O território seria objeto de
propriedade. A maioria das religiões antigas reconhecia aos deuses a pro­
priedade do território; no Egito, na Grécia, e os judeus, etc. Os homens
tinham o direito de se udlizar dele. Em Roma as terras conquistadas
pertenciam ao povo romano.
No período medieval o território adquiriu uma importância como não
tivera antes: a riqueza e o poder eram medidos pelo tamanho do território.
Desenvolve-se entre os francos a teoria do domínio eminente. Tudo per­
tencia ao rei ou ao imperador: “omnia sunt regis”. O domínio eminente
fazia parte das regalias que integravam o poder soberano. Os seus maiores
teóricos foram Zieglero e Ubero. O príncipe possuía todas as coisas acima
da propriedade particular. Esta concepção fez com que fossem desenvol­
vidos certos institutos: o “jus albinagii” e o “jus naufragii”. O primeiro,
por exemplo, se manifestava no direito do soberano de recolher os bens
do estrangeiro que tivesse morrido no seu território ou ainda os bens do
naturalizado que não deixasse herdeiros no reino. O segundo era o direito
de se apossar dos navios e mercadorias que naufragassem no seu território/
Estes direitos não existiam em Portugal (Pontes de Miranda).
Esta concepção do domínio eminente, aliada às raízes religiosas da
concepção do território, é que explica as bulas papais que doavam as terras
e mares descobertos e a serem descobertos; a terra era de Deus e o papa
era o seu representante, daí ele poder fazer tais doações.
A teoria do domínio eminente, a concepção patrimonial em favor do
príncipe, veio a desaparecer em nome da defesa dos interesses dos parti­
culares.
Atualmente têm sido apresentadas algumas razões para a diminuição
da importância do território: a) unificação legislativa; b) desenvolvimento
dos meios de comunicação; c) aumento da imigração; d) integração eco­
nômica; etc.
398. No período contemporáneo da História encontramos diversas
teorias que procuram explicar a posição jurídica do território em relação
ao Estado.

a) Território-objelo

E a mais antiga e está ligada à concepção patrimonial.6 Ela foi exposta


em 1865 por Gerber6A de modo claro e teve neste século o seu maior
formulador em Donato Donati.68 No Brasil ela foi adotada por Rui Barbosa..
Veiga Cabral, Rodrigo Octavio e Pereira do Rego.
O território é objeto de um direito real do Estado, gue tem sobre ele
um direito de propriedade. A propriedade é do Eslado_&-nãa-cKpfInopZ7
De ürrí certo 'modo, ela F ú m a adaptação à época moderna da teoria do
domínio eminente.
Esta teoria de cunho privatista está consagrada na Constituição dos
EUA (art. IV, § 3Q, cláusula 2-) e corresponde à terminologia empregada
no Dl: cessão de território, arrendamento de território, etc.'
A concepção do território-objeto recebeu inúmeras críticas: a) a noção
de propriedade não é entendida de maneira uniforme em toda a sociedade
internacional (Schoenborn); b) a soberania visa o exercício de funções de
interesse de toda a sociedade estatal, enquanto a propriedade é ainda
entendida de um modo geral como visando, acima de tudo, os interesses
do seu titular (Rousseau); c) o território não pode ser separado do Estado
para se transformar em seu objeto, ou seja, em algo exterior a ele.

b) Territário-sujeito

Foi formulada por Fricker (1867), que foi o primeiro doutrinador a


expô-la de maneira clara. Georg Jellinek foi o seu maior defensor. Segui-
ram-na Louter, Liszt, Westlake, etc. Na Argentina foram seus seguidores
Moreno Quintana e Bollino Shaw.
Ela responde à última crítica formulada à ieoria do território-objeto,
e assim, o território é considerado como sendo a qualidade do Estado-
Daí, ser támbém denominada teoria da qualidade (“Eigenshaftheorie”).
O Estado tem um poder de “imperium e não um “dominium" como
pretendía 'a teoria do térritõríó-õbjetó. Violar o território estatal é atingir
a sua personalidade. Õra, o “imperium” (poder de mando) se exerce sobre
pessoas e não sobre coisas.
A presente teoria não se coaduna com diversos fenômenos da vida
internacional, por exemplo, as cessões territoriais. Ora, a mudança terri­
torial atingiria a personalidade estatal, extinguindo-a e fazendo surgir uma

1073
ouira. Na verdade, tal fato não ocorre na prática internacional e os próprios
defensores desta teoria não a levaram a estas últimas conseqüências, com
exceção de Fricker," o que a tornou incoerente e inaceitável. Pcjr outro
lado, a crítica a esta teoria não significa que neguemos que o território
seja um elemento do Estado, que desaparece quando o território desapa­
rece por completo, mas isto não significa que ela seja a qualidade do
Estado, tanto assim é que ele pode ser alterado sem que se altere a per­
sonalidade internacional do Estado.

c) Território-limite

Foi defendida pelos juristas franceses: Carré de Malberg, Duguit, Mi-


choud. Ela não estuda qual a relação entre o Estado e o seu território.
Para os seus defensores, é suficiente a constatação de que o território é o
limite da validade dos atos emanados do Estado. 0 _ E s t a d o t e m . p o d e r e s
soBre os indivíduos e' não sobre o território. Pode-se recordar que o Estado
exerce competência também fora do seu território, por exemplo, no alto-
mar.

d) Território-competência

Foi elaborada em 1905 por Radnitzky e através da escola austríaca


(Kelsen) penetrou no Dl.
O território é onde o Estado exerce as competências que lhe são
outorgadas pelo DI. E onde o Estado exerce atos coativos^ A função do
território seria á de sér um dos meios utilizados'pelo Dl para delimitar a
competência estataljque_se exerceem reláçao aos indivíduos.
... Esta teoria tem grandes méritos: a) a competência estatal é entendida
em função do DI; b) a noção de competência, não sendo rígida, faz com
que ela seja adaptável às mais diferentes situações; c) explicando, por
exemplo, as cessões de território, ela declara que haveria apenas uma
“transferência de competência entre os Estados” (Rousseau).
Por outro lado, ela é passível de críticas. Kelsen foi obrigado a distinguir
território em sentido estrito e em sentido lato, porque pelo conceito de
território desta teoria o alto-mar seria também território estatal. Esta dis­
tinção kelseniana já demonstra a sua fraqueza. Para Kelsen o território em
sentido amplo é o “espaço onde... os domínios de validade territoriais de
diferentes ordens jurídicas nacionais se interpenetram”.

e) Soberania territorial

Esta teoria, desenvolvida por Verdross e Jiménez de Aréchaga, é uma


variante da anterior, a que procura corrigir e completar.
O território do Estado é onde ele possui-certos poderes (p. ex.: de
cessão), “que ele não tem enTrèlação ao alto-mar, ao espaço exterior, etc.”

1074
(Aréchaga). Este direito que o Estado exerce sobre o seu território, onde
o sen poder é exclusivo, a jurisprudencia internacional (caso do Canal de
Corfú) consagrou a denominação de soberania territorial.”
A soberania territorial está limitada pelo DI, de onde ela deriva. Nada
impede que um Estado ceda certas competencias sobre o seu território
(arrendamento de território) e conserve a sua soberania sobre ele.
O Estado exerce certas competências fora do seu territorio (ex.: allo­
mar), mas isto não significa que ele faça parte do seu territorio, porque
ai ele não tem um “gozo pleno”, nem dele pode excluir a “penetração e
a ação dos demais Estados".
A soberania não deixa de ser competência, mas é um feixe de com­
petência, é o conjunto de todas elas.
Esta teoria é a que melhor se adapta à vida internacional, porque, se
partirmos da noção de que o território estatal é uno, veremos, adiante,
que a maioria esmagadora dos autores declara que o Estado tem no seu
mar territorial e espaço aéreo uma soberania. Ora, esta soberania territorial
também se manifesta no dominio terrestre.PA Entretanto, a nosso ver, esta
teoria também possui as suas falhas, quem seria o titular da soberania
territorial? Seria possível um Estado desejar alienar todo o seu território;
desejando desaparecer? E verdade que se parte sempre do pressuposto de
que nenhum Estado deseja desaparecer. A natureza do direito do Estado
sobre seu território parece alguns dogmas religiosos que são explicados
mas não compreendidos.
399. O limite é a linha que separa o território entr<* rl<~iic Fctar)r»s A
fronteira é a região ao redor do limite.10 Na prática e através da História
as duas noções têm sido utilizadas como sinônimas, mas a distinção se
impõe no campo jurídico. A distinção entre fronteira e limite tem origem
norte-americana: “frontier” e “boundary” (M. Foucher).J. Nouzille, con­
tudo, observa que a noção de limite mesmo “imprecisa” é anterior à
sedentarização do homem. Fronteira vem -de “front” (está em frente). A
palavra “fronteiras”, na França, só surgiu em um ato real em 1315, para
designar a zona de castelos fortificados construídos perante a Flandres (B.
Badie).
A idéia de que o território tem limites é encontrada desde a mais
remota Antiguidade. Os hebreus os conheceram na partilha da Palestina.
No Egito, depois das conquistas, eram colocados marcos de pedras fixados
no solo. Na Núbia (1887-1850 a.-C.) são construídas estelas para fixar os
limites do Estado. Na Suméria coloca-se limites de pedra ou estacas de
madeira, sendo que as de pedra têm símbolos divinos. Os hititas colocam
a fronteira sob a proteção dos deuses e usam fatores geográficos para fixar
a sua fronteira setentrional. No tratado entre Hatusili III e Ramsés II (1283
a.C.) é estabelecida uma fronteira por critérios geográficos. Entre os he­
breus a fronteira está sob a proteção de Javé. As fronteiras da maior parte

1075
das cidades gregas são artificiais e constituem “um limite político e um
limite de mentalidade” (Jean Nouzille). Em Roma, as fronteiras eram
guardadas e a separavam dos bárbaros. Em Roma “a fronteira é um per­
pétuo devenir. Ela é apenas o ponto de parada provisoriamente atingido
pelas legiões em marcha... é uma zona de transição./ éntre o mundo
romano e o mundo bárbaro” (Claude Blümann). A grande característica
deste período da História nesta matéria é que os marcos tinham um caráter
sagrado. Ainda fundamentado no excelente livro de J. Nouzille, pode-se
acrescentar que o “limes" é uma “zona de partida para futuras operações
ofensivas ou zona fortificada defensiva". O “limes” não é estabelecido por
meio de um acordo com os Estados vizinhos, mas apenas uma linha ds
parada estratégica, sendo uma zona-tampão, ou ainda uma zona de fron­
teira provisória.- A partir do século II d.C. passa a ser uma zona mais estável
e de defesa; qtie é servida por uma rede de estradas a fim de favorecer o
avanço das tropas. Muitas vezes a fronteira do Império Romano está em
rios como no Reno, Danúbio e Eufrates. Fortificações são construídas no
“limes”, bem como acampamentos militares. Na China e no Oriente a
fronteira era uma zona-limite vaga.
No período medieval havia o conceito de “m arca” (marco, distrito
fronteiriço) e não propriamente o de fronteira. Ela era uma zona instável,
sem a presença do poder, é uma reg iã o de ninguém . Ela é despovoada ou
escassamente povoada. E colonizada por colonos-guerreiros que “só inter­
mitentemente sofrem a intervenção do príncipe vizinho” mais poderoso
(José Antônio Maravall). No Império carolíngio é utilizada a palavra “mar­
ca”, que tem origem no latim “margo”, que significa margem ou borda.
A marca tem por finalidade a proteção militar em região próxima à fron­
teira, ou ainda em região mal pacificada. A delimitação é uma “instituição
do império carolíngio” no período em que o Império Romano perde o
seu poder e ainda não ocorreu o esfacelamento do mundo feudal. Parece
ser de origem germânica, precisamente dos francos. Neste período histó­
rico a fronteira separa os germanos dos latinos. A m oderna operação de
delimitação surgiu no período carolíngio em virtude das diversas partilhas
territoriais (séc. IX). Anteriormente, a delimitação era muitas vezes .feita
unilateralmente pelo Estado interessado. Afirma Luis Weckmann (El pen­
samiento político medieval y los orígenes del derecho internacional, 1993)
que a marca carolíngia surgiu da luta contra os sarracenos, ávaros e eslavos, '
sendo então instituída a “Markgraf’ , que no Ocidente, na Espanha, chega
ao Ebro, e no Oriente está nas' planícies da Hungria.
Até o salto demográfico dos séculos XI e XII as fronteiras como espaços
desérticos são “flexíveis” (Paul Alliès).
Uma outra corrente diversa da apontada acima afirma que a idéia de
território delimitado surge no fim da I. Média ou no início da I. Moderna.
A própria palavra “ terrítorium”, que já existe no século XIII, vai ser rara-
mente utilizada até o século XVII. A idéia de fronteira viria da cobrança
de impostos sobre as mercadorias que saem do reino (século XIV) e
lambém das linhas de defesa na Guerra dos Cem Anos.
A noção moderna de fronteira vai surgir no século XVI, com o avanço
da cartografia (G. Burdeau), bem como devido à criação e fortalecimento
do Estado, em que “o homem passa a estar subordinado a urn espaço
estatal determinado" ou, ainda, com o aparecimento da imprensa.
No século XVII surgem as primeiras regulamentações de fronteiras
livremente negociadas entre Estados com ideologias diversas. No século
XVII se evoluiu para as linhas fortificadas e a procura de uma fronteira
natural (rio ou montanha). Outros (JeanNouzille) observam que no início
do século XVIII a palavra fronteira é pouco utilizada.
No século XVIII, em sua transição para o século X IX , surge a fronteira
linear na Europa. A Muralha da China é uma exceção. Ela se espalhou
pelo mundo com o colonialismo europeu. Diz M. Foucher que a expressão
“fronteiras naturais” foi usada na França no século XVIII e se referia à
noção de direito natural, em oposição ao direito divino; ela delimitaria a
região em que o povo considerava ter direitos naturais sobre ela. Já Jean-
Denis Bredin (Sièyes. La Cié de la Révolution Française, 1988) afirma que
a idéia de limites naturais vem de Júlio César, mas na Revolução Francesa
ela foi defendida por Danton e depois Carnot, Sièyes, etc. Em 1814, o
tratado de Paris estabelece os limites da França nos que eram os do Antigo
Regime, desaparecendo a idéia de frpnteiras naturais. Denis Richet (Fron-
tières Natureles, in François Furet e Mona Ozouf — Dictionnaire Critique
de la Révolution Française, 1988) observa que a noção de fronteiras natu­
rais tem a sua origem na antiga França, mas foi a Revolução Francesa que
deu a ela “um poder explosivo”. Salienta Philippe Moreau Defarges que
a idéia de fronteiras naturais é um “mito” e que no fundo é “o lamento
que tem todo Estado continental de. não ser uma ilha, isto é, de não se
beneficiar de limites territoriais incontestáveis que garantam uma proteção
em princípio absoluta”. A faixa de Aouzou, disputada entre a Líbia e o
Chade, foi decidida pela CIJ em 1994, que deu ganho de causa ao Chade
e foi aplicado o “uti possidetis” . Pode-se acrescentar ainda que no início
do século XVIII Viena instala nc5s confins do seu império’ populações de
eslavos do sul, que fugiam do Império Otomano, sendo concedido a elas
certos privilégios e em troCa elas prestavam serviço militar. Era assim uma
zona de defesa pouco dispendiosa e cujas sociedades tinham uma cultura
e leis próprias. Eram as denominadas zadrugas (Jean Nouzille).
Paul Alliès observa a necessidade da “organização do conhecimento
dos territórios para atender às necessidades dos modernos aparelhos do
Estado”. Afirma este jurista o interesse econômico nesta matéria, sendo
que no absolutismo o território não tem valor político independente do
econômico. A teoria jurídica do território só vai surgir quando ele for

1077
organizado tm espaço econômico. A fronteira é assim uma criação do
Estado burguês, esle “inventa” o território para “domesticar as interações
sociais e seu movimento espacial”.
A posição do território, que define as relações do Estado, e os seus
recursos, é a característica mais importante do território (Jean Gottmann).
Para Cari Schmitt o território é para o Estado o que a “terra natal” é para
o indivíduo, isto é, “uma noção que une o espaço físico e o espírito de
um país".
A fronteira visa dar estabilidade à nação e em conseqüência a sua
transformação em Estado. Nos novos Estados ela é artificial, abstrata e um
fator de mobilização (Claude Blumann). A fronteira “rompe uma unidade
imposta pela Geografia” (Isidro Morales Paul).
O caráter sagrado da fronteira é uma conseqüência do caráter sagrado
do poder (Trousset).
As fronteiras formam identidades, havendo quem sustente o valor
psicológico e sociológico da fronteira na imaginação e nas alusões literárias.
As vezes ela tem um aspecto de mito como nos EUA. Contudo, não se
pode esquecer que nas regiões mais desenvolvidas as fronteiras são mais
permeáveis.
A moderna operação de delimitação, isto é, realizada de comum acordo
pelos Estados interessados, só surgiu no período carlovíngio, em virtude
das diversas partilhas territoriais. Anteriormente, a delimitação era feita
unilateralmente pelo Estado interessado.
Vários tipos de fronteiras foram defendidos através da História, tais
como as fronteiras nacionais (o território do Estado deveria abranger os
indivíduos que tivessem a mesma raça, língua e religião) e as fronteiras
naturaisI0A (deveria ser a fronteira nos acidentes geográficos, foi muito
utilizado na Europa: Alpes, Reno, etc.).11
A idéia de fronteira surge quando há uma idéia de nacionalidade, ou,
ainda, um poder político que separa um povo de outro povo. Georges
Burdeau esclarece que a noção de fronteira vai aparecer no século XVI
devido aos progressos da cartografia, que avançava com os estudos de
geografia e matemática que tinham sido renovados. Lembra este autor
que é neste século que surge também a noção de Estado.
“A linha fronteira é portanto uma abstração que não tem existência
real fora do mapa geográfico” (Benedikt Zientara).11A
Em 1962 a CIJ, no caso do Templo Preah Vihear, já falava na estabi­
lidade e permanência das fronteiras.
Em 1994, no caso Líbia v. Chade, a CIJ fala em estabilidade das
fronteiras e dá a estas um caráter definitivo, isto é, elas são permanentes.
A palavra definitiva é utilizada no sentido de que ela só pode ser alterada
por meios autorizados pelo DIP, como a conclusão de um novo tratado.
A estabilidade das fronteiras deve ser mantida, mesmo que desapareça o
tratado que as consagrou (Marcelo G. Kohen).
Amaláyente os conflitos internacionais mais importantes não são sobre
território. Entretanto, estes conflitos ainda existem e tem sido atribuído o
aumento do seu número a duas razões: a) a administração tem peneirado
em áreas-onde ela não atuava; b) a independência de vários Estados em
que o colonialismo sufocava as reivindicações. As áreas disputadas atual­
mente são de menor importância. As organizações regionais têm atuado
com maior sucesso nos litígios sobre fronteiras do que a ONU (Evan
Luard). Em 1963, segundo Paul Reuter, havia 25.000 milhas de fronteiras
não demarcadas na África e 35.000 milhas na América.
Salienta B. Bardie que de 1648 a 1914 50% dos conflitos visavam
questões territoriais, mas que de 1945 a 1989 a percentagem caiu para
24% .
400. A.delimitação tem uma tríplice importância na vida internacional:
a) é um “fator de paz” (em regra geral está regulada nos tratados de paz);
b) “sinal de independência”;12 c) “elemento de segurança” (Rousseau).
A operação de delimitação tem sido dividida pela doutrina em três
fases: a) preparo; b) a delimitação propriamente dita; c) a execução. A
primeira fase apresenta aos Estados duas alternativas: a) respeito ao status
quer, ou b) a escolha de um novo limite que pode ser artificial (longitude,
linha reta, paralelo) ou natural (rios, montanhas,I2A lagos). São os limites
naturais os mais utilizados nos dias de hoje.
Nos rios contíguos diversos critérios podem ser utilizados: a) linha
mediana (o limite corre no meio do rio) — é utilizado nos rios não
navegáveis; b) condomínio (o rio pertence em comum aos dois Estados);
c) o talvegue (do alemão “ thalweg” — “caminho no vale”) — é determi­
nado na época das águas baixas pela linha da sonda mais profunda (La
Pradelle).126 Este critério é o mais utilizado nos rios navegáveis, uma vez
que permite a sua utilização pelos dois ribeirinhos. A partir do século
X IX 13 ela passou a ser mais empregada que o da linha mediana.14 No
continente africano a existência de ilhas contribui para a formação de
vários talvegues, que por sua vez se deslocam com as cheias, constituindo-se
em fronteiras móveis. Alguns tratados de fronteiras determinam a quem
pertencem as ilhas independente da mudança do talvegue (Yakemtchouk).
Daniel Bardonnet afirma existirem três critérios: a) a linha das sondas mais
profundas; b) canal utilizado pelos barqueiros (“bateliers”); c) o terceiro
critério surgiu porque os das sondas mais profundas nem sempre é o mais
usado pelas embarcações. Este critério seria uma mistura do a) e do b),
isto é, a linha mediana do canal usado pelos barqueiros, d) sistema de
calhas — o rio é cortado transversalmente (as margens são ligadas por
linhas perpendiculares) em calhas que pertencem em número igual a cada
Estado. A vantagem proposta para este critério é que ele permitiria a ambos
os Estados atingir as duas margens. Ele se encontra abandonado e só foi

1079
empregado em um rio entre as Guianas Francesa e Holandesa (onde foi
também abandonado); e) o rio pertence inteiramente a um Estado (foi
utilizado pelos Estados mais fortes em relação aos fracos). E de se assinalar
que havendo uma ponte sobre o rio geralmente se adota nela a linha
mediana, mesmo quando no rio se adota o talvegue; isto ocorre devido
ao fato de os Estados limítrofes custearem em quantias iguais a construção
da ponte. Entretanto, existem casos em que se adota o talvegue também
nas pontes.
O Brasil adota nos seus limites tanto a linha do talvegue como, em
outros casos, a linha mediana.1'1Os limites nos rios podem ser considerados
como artificiais, tendo em vista que as bacias fluviais exercem uma influên­
cia de unificação e não de separação (A. E. Moodie).
Quanto às ilhas que existem nos rios, elas pertencerão aos Estados de
cujo lado da linha mediana ou talvegue se encontrarem. Não importando
no caso do rio em que o limite é pelo talvegue saber de que Estado ela
se encontra mais próxima.
Nas montanhas também diferentes critérios têm sido empregados: a)
linha de cumeeiras — é a linha que une os cumes mais altos de uma cadeia
de montanhas. Foi adotado pelo Brasil nos limites com a Argentina e o
Paraguai; b) linha do divisor de águas (“divortium aquarum”) — o limite
passa nos locais em que se dividirem as bacias hidrográficas.16 O Brasil a
utilizou nas fronteiras com as Guianas, a Venezuela e a Colômbia; c) linha
do sopé — o limite é na base das montanhas (foi utilizado apenas na
índia). As delimitações nas montanhas parecem ser um vestígio do tempo
em que estas áreas eram pouco povoadas, o que não ocorre mais hoje,
tendo em vista a exploração da eletricidade hidráulica ou o turismo (A.
E. Moodie). A montanha é uma “fronteira'tácitamente respeitada pelos
vizinhos” e ela só será um local de enfrentamento militar se a sua travessia
for fácil (André Corvisier).
Nos lagos ou mares internos não há um processo comum de delimi­
tação. A doutrina recomendava que quando fossem muito largos, mais de
6 milhas (dobro da largura clássica do mar territorial), cada Estado ficaria
com 3 milhas e o meio seria em comum. Entretanto, nada impede que se
adote o da divisão da linha mediana, quando partes das duas margens são
costeadas por um mesmo Estado. Neste caso, traça-se um prolongamento
do limite terrestre do Estado até o meio do lago e unem-se por uma reta
os dois prolongamentos no meio do lago. O regime dos lagos é fixado em
cada lago pelos Estados interessados, não havendo um Dl Comum.
A delimitação propriamente dita pode ser realizada por meio de um
tratado ou por uma decisão judicial ou arbitrai. Ela deve preencher três'
requisitos: ter exatidão, ser precisa e completa (Rousseau).
A demarcação é a fase final da delimitação. E a parte prática da
delimitação. E a colocação de marcos. Este trabalho é realizado por co­
missões formadas de representantes dos dois Estados. Neste trabalho se
obedecem determinados princípios, como o de respeito às‘ plantações

1080
agrícolas, às tribos, etc., que não devem ser divididas. A Comissão utiliza-se
de compensações recíprocas ao longo da “ fronteira”, para que lais prin­
cípios sejam respeitados sem causar prejuízo aos Estados interessados.
Alguns autores incluem ainda uma última fase, que seria a da admi­
nistração (v. nota 10 neste capítulo).
O princípio da intangibilidade das fronteiras tem sido consagrado 11a
jurisprudência internacional, visando evitar o aparecimento de novos Es­
tados, e se encontra consagrado em resoluções da ONU e da OUA.
401. O princípio do “uti possidetis ita possideatis” (“assim como pos­
suis, continuareis a possuir”) do Direito romano1' veio a desempenhar
importante pape^na fixação dos limites na América do Sul. Ele foi levado
para o Tratado de Madri (1750) por Alexandre de Gusmão, quando passou
a ter uma influência decisiva nas fronteiras da América.I7AAfirma Julio A.
Barberis que o “ uti possidetis” foi consagrado pela primeira vez, na América
do Sul, no tratado de Venezuela e Cundinamarca (Colômbia) de 1811.
Quando os Estados que compõem a América do Sul fizeram a sua
independência, não havia nenhum direito convencional em vigor entre
Espanha e França, de um lado, e Portugal, do outro, uma vez que a guerra
de 1801 revogara os tratados anteriores a ela, e a Paz de Badajoz, que pôs
fim à guerra, não se referia aos limites ao sul do Brasil.
Tem sido atribuída a Duarte da Ponte Ribeiro a iniciativa do Brasil
adotar o “uti possidetis” e abandonar os tratados coloniais. A sua inspiração
foi uma confederação formada entre Bolívia e Peru, em que a Bolívia
rejeitava os tratados coloniais. No tratado de 1841, já está incluído o
princípio do “uti possidetis” (Amado Luiz Cervo). Este tratado com o Peru
estabelece que seria adotado o “uti possidetis” de 1821.
Deste modo, entre o Brasil e as antigas colônias espanholas passou a
ser aplicado o princípio do “uti possidetis” , isto é, o direito do primeiro
ocupante. O território pertenceria a quem o ocupasse. Era praticamente
um princípio de respeito ao status quo.
Entretanto, duas interpretações surgiram sobre o “uti possidetis”: a
do Brasil e a das antigas colônias espanholas, o primeiro sustentando o
“uti possidetis de facto” e as segundas, o “uti pcTssidetis juris”. O “uti
possidetis de facto” significava que o território pertenceria a quem tivesse,
a sua posse real e efetiva no momento da independência. O “uti possidetis
juris" afirmava que o território pertenceria a quem tivesse direito a ele,
independente do fato de o Estado ter a sua posse. Esta última interpretação
foi utilizada pela primeira vez em um tratado concluído entre a Colômbia
e o México (1823) e reafirmado nos Congressos do Panamá (1826) e Lima
(1848). Dentro desta orientação, as antigas colônias espanholas na América
do Sul fixaram por este critério os limites entre elas. Os limites seriam os
do ano de 1810 (data tida como da sua independência geral).18 Estes
Estados conservaram entre si como fronteiras a divisão administrativa es­
panhola.

1081
O “uü possidetis juris" não pôde ser aplicado em relação ao Brasil (a
nossa origem era diferente, e sempre defendemos o “de facto”), urna vez
que este era o verdadeiro “uti possidetis” que regulamentara as questões
territoriais entre Espanha e Portugal. Na verdade, o “uti possidetis juris”
é contraditório, porque ele menciona “ título jurídico” e “não o fato da
posse” (La Pradelle),19 como é o verdadeiro “uti possidetis”. Deste modo,
o “juris” só pôde ser aplicado entre as antigas colonias espanholas.20
A Carta da OUA (1963) estabelece que os Estados aceitarão os antigos
limites fixados pelas potências coloniais. Ora, estes limites são artificiais e
não levam em consideração as populações locais ou, ainda, o nomadismo
existente (Ph. Bretton). Em 1964 a OUA, em uma resolução, determinou
que as fronteiras coloniais existentes eram intocáveis.
Alguns autores (Alain Pellet) têm salientado que o “uti possidetis”
estaria sendo aplicado, pela Assembléia Geral, na África em relação ao
Saara espanhol e ao Transkei.
O “uti possidetis” foi aceito na África pela Etiópia, Nigéria e Senegal,
mas não o foi pelo Marrocos. Já se fala em “uti possidetis” africano, sendo
que tem sido apontado como inconveniente o fato de que ele conduz ao
status quo territorial. Em 1986 uma Câmara da CIJ, ao apreciar o litígio de
fronteira entre Burkina-Faso e Mali, consagra o “uti possidetis juris” como
um “princípio geral” a ser aplicado nos Estados que atingem a inde­
pendência. Em 1992, em litígio entre Honduras e EI Salvador em que
havia também a “intervenção” da Nicarágua, uma Câmara da CIJ baseou
uma larga parte da sua decisão no “uti possidetis juris”. Este mesmo
princípio foi igualmente aplicado pela CIJ em 1986 no litígio entre Bur-
kina-Faso e Mali. A CIJ em aplicado o “uti possidetis” (Gilbert Guillaume).
Em 1992 a Comissão de arbitragem sobre a antiga Iugoslávia manda aplicar
o “uti possidetis” no traçado dos limites, afirmando que ele é hoje um
princípio geral, mas não foi possível fazer tal aplicação. Por outro lado, os
Estados bálticos não o aceitam devido às anexações realizadas pela URSS.
Os novos Estados da Ásia e África não estão aplicando de modo siste­
mático o “uti possidetis juris” para resolver as questões da fronteira. Eles
preferem as negociações diretas em vez da solução arbitrai ou judiciária.
Na Europa, parece que ele também está penetrando, em 1992 a Co­
missão de arbitragem instituída na Conferência para a Paz da Iugoslávia
também afirmou a validade do “uti possidetis” em relação às populações
sérvias da Croácia e Bósnia-Herzegovina.
O “uti possidetis” consagra o statu quo. Brownlie afirma que o “uti
possidetis” é hoje um princípio geral do direito.
401 A. A ordem jurídica internacional tem-se preocupado cada vez mais
com os transportes ferroviários e rodoviários,21 devido ao aumento do
turismo e comércio entre os Estados.
Na Europa a matéria vem sendo objeto de regulamentação desde o
século XIX . Em 1886 foi elaborada uma convenção sobre a bitola das

Í0S 2
estradas de ferro (esta convenção teve um protocolo em 1907). Em 1890
um convenio foi elaborado em Berna sobre transporte ern estradas de
ferro. Em 1933 novos acordos foram concluidos. Em 19,53 foi firmado uní
acordo sobre transporte de mercadorias por estrada de ferro e um convenio
sobre transporte de pessoas por estrada de ferro. Estes tratados regula­
mentam “aspectos fragmentários”. O verdadeiro estatuto, isto é, regula­
mentando todos os aspectos, fixando um regime internacional para as
estradas de ferro, foi elaborado, em Genebra, em 1923. Ele estabelece: a)
assegurar a continuidade do serviço das linhas férreas já existentes; b)
controle aduaneiro; c) outorga facilidade ao tráfego internacional; d) o
despacho das mercadorias deve ser rápido; e) redução no que for possível
das formalidades aduaneiras e policiais.
Em 1890, foi criada a União para os Transportes Ferroviários Interna­
cionais, com sede em Berna. Nesta mesma cidade, em 1955, foi criada a
Sociedade‘Européia para o Financiamento de Material Ferroviário (Euro-
fima). Ela tem por finalidade o financiamento das estradas de ferro que
necessitam de modernização, visando que elas se integrem. A Eurofima
tem como acionistas as estradas de ferro dos Estados membros. A sua sede
é em Bâle na Suíça. São seus membros: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dina­
marca, Espanha, França, Itália, Luxemburgo, Países Baixos, Portugal, Sué­
cia, Suíça e Iugoslávia.
Os transportes rodoviários começaram a preocupar a ordem jurídica
internacional neste século. Em 1909 foi concluído, em Paris, acordo sobre
circulação automobilística que foi substituído por um convênio em 1926,
contendo normas sobre os requisitos dos automóveis autorizados para o
tráfego internacional.
A SDN criou como organismo permanente o Comitê de Circulação
Rodoviária, que convocou uma conferência européia, em Genebra, em
1931, concluindo algumas convenções: a) sobre tributação de automóveis
estrangeiros; b) unificação de sinais de tráfego, etc.
A ONU reuniu, em Genebra, em 1949 uma conferência que elaborou
uma convenção sobre tráfego de transportes rodoviários e um protocolo
sobre sinais de tráfego. E um verdadeiro “Código Internacional de Estra­
das”. Em 1950, houve um acordo europeu complementar.
Em 1954, em Genebra, um acordo foi concluído regulamentando os
transportes rodoviários internacionais e foi fixado um “caderno de obri­
gações” estabelecendo os requisitos que as empresas de transportes rodo­
viários devem cumprir. Neste mesmo ano, em Nova Iorque, foi concluído
um acordo sobre as facilidades aduaneiras para viajantes em trânsito e um
acordo alfandegário sobre-a importação temporária de veículos pesados.
Vergnaud observa que o transporte rodoviário tem um estatuto jurídico
próprio com normas do DIP e do direito das obrigações. Há uma tendência
para o direito uniforme. Salienta ainda este autor que o Estado sofre
limitação na sua soberania no transporte rodoviário internacional. Pode­

1083
mos acrescentar que., em 1958, Itália e Suíça acordaram na construção de
um túnel sob o Grande São Bernardo para comunicação rodoviária. Em
1953, França e Itália, em tratado, estabeleceram a construção do túnel sob
o Monte Branco, regulamentando o pedágio, ventilação, etc. Um acordo
adicional foi concluído em 1965.
Atualmente já se fala em um Dl dos Transportes, que segundo Serge
Sur teria as seguintes características: a) fragmentação (varia conforme os
espaços utilizados); b) empirismo (não há codificação internacional geral
e as regras são dispersas e parciais); c) desigualdade entre os Estados. O
transporte é organizado no plano nacional para se desenvolver no plano
internacional.
401B. Os enclaves têm sido objeto de estudo pelos intemacionalistas
contemporâneos. Eles podem ser definidos como “toda porção do terri­
tório de um Estado inteiramente fechado no território de um Estado
vizinho”. Existem vários casos na Europa: o espanhol de Llivia na França;
o alemão de Busingen e o italiano de Compione ná Suíça; o belga de
Baarle-Duc na Holanda e o holandês de Baarle-Nassau na Bélgica. A pla­
taforma continental de Saint-Pierre e Miquelon é um enclave na plataforma
do Canadá.
O regime de acesso é regulamentado por acordo concluído entre os
Estados. O Estado que cerca o enclave geralmente tem o direito de impedir
a passagem de forças militares. O Estado que o cerca não pode fechar a
fronteira.
401 C. Um problema que tem surgido é o da exploração das riquezas
do subsolo através das fronteiras (água, petróleo, carvão).22
Uma corrente (H. Thalmann) defende que se deve resolver a questão
em favor do Estado que primeiro se aproprie. Esta tese tem sido conside­
rada injusta, e não há fundamento para se pedir ao vizinho que deixe de
fazer a exploração.
Outra corrente (Juraj Andrassy) propõe que cada Estado explore o
que se encontra sob a sua soberania. Pode ser aplicada em caso de “massa
sólida como o carvão”. Geralmente eles param a exploração a 20m da
fronteira.
Uma terceira corrente (Barberis) defende que se estabeleça uma co­
operação entre os Estados. Esta é a tendência no Dl, mas não é uma
obrigação. Assim, existem acordos entre França e Espanha (1974); entre
Grã-Bretanha e Noruega (1976) para a exploração de gás no Mar do Norte,
etc. Talvez estes acordos conduzam a uma norma costumeira.
Barberis observa que um Estado não pode provocar prejuízo sensível
a outro Estado, e cada um deles tem direito a um volume do recurso
natural compartilhado proporcionalmente ao existente em seu território.
Pode-se ainda m encionar o intemacionalista argentino, que escreve existir
tratado de fronteira entre a Holanda e a Alemanha em que o limite na
superfície não coincide com o do subsolo, porque este vai além do esta-
b e le c íd o pava o solo . A fro n le ira de e x p lo ra ç ã o fica sujeita ã ju r is d iç ã o do
E stad o em q u e o ca n ã o é trazido para a s u p e rfic ie e nâo na fro n te ira do
E stad o s o b r e ja c e m e . S a lie n ta ain d a B a rb e ris q u e n o s recu rsos c o m p a rti­
lh ad os os E stad os s e m p re te n d e m a c h e g a r a um a c o rd o , m as se e ste não
é possível a o u tra p a n e n ã o tem o d ireito fle 'v e to so b re a e x p lo ra ç ã o .

1085
NOTAS
1. Stephen B. Jo n e s — Boundary-Making, 1954; Paul de La Pradelle — La
From ière, J928; Je a n G otim an — La Politique des États el ieur Géographie, 1952;
Mario Giuliano — Lo Stato, il Territorio e la Sovranitá Terriloriale, in Comunica-
zioni e Siudi, vol. VI, págs. 19 e segs.; G. M. Uberlazzi — Studi sui Diritti Reali
n ell’Ordine Iniernazionale, 1949; Giuseppe Barile — I Dirilli Assoluti nell Ordi-
namento Iniernazionale, 1951; Camile Vallaux — Le Sol el J’Étal, 1911; H enrique
de Brito Viana — T eo ria Ju ríd ica do Territorio, 1957; S. Wliiitemore Boggs —
International Boundaries, 1950; Juraj Andrassy — Les Relations Internationales
de Voisinage, in RdC, 1951, vol. II, t. 79, págs. 73 e segs.; Walther Schoenborn —
La nature juridique du territoire, in RdC, 1929, vol. V, t. 30, págs. 85 e segs.;
jacq u e s Ancel — G éographie des Frontiéres, ¡"938; ídem — Les frontiéres, étude
de géographie politique, in RdC, 1936, vol. I, t- 55, págs. 207 e segs.; Donato
Donati — Stato e T errito rio , 1924; Gordon Ireland — Boundaries, Possessions
and Conflicts in South America, 1938; Derwent Whitesey — The Earth and T h e
State, 1939; Hugo D. Barbagelata — Frontiéres, 1911; Arrigo Cavaglieri — Fron-
tière, 1920: Ju an Carlos Puig — Estado y territorio, in Estudios de D erecho y
Política Internacional, 1970, págs. 13 e segs.; Charles de Visscher — Problém es
de Confins en Droit International Public, 1969; A. E. Moodie — Geografia e
Política, 1965; T h e International Regulation o f Frontier Disputes, edited by Evan
Luard, 1970; Daniel Wilkes — Territorial Slability and Conflict, in T h e Future o f
the International Legal O rder, organizado por Cyril E. Black and Richard A. Falk,
vol. III, 1971, págs. 165 e segs.; Tran Van Minh — Remarques sur le Principe de
L ’Intangibilité des Frontiéres, in Cao Huy Thuan e outros — Peuples et Etats du
Tiers Monde Face a l’O rdre International, 1978, págs. 51 e segs.; P. G. de La
Pradelle — Notions de territoire et d’espace dans ram énagem ent des rapporls
internationaux contem porains, in RdC, 1977, vol. IV, t. 157, págs. 415 e segs.;
Societé Française pour de D roit International —HLa Frontiére. Colloque de Poitiers,
1980; Société Française pour le Droit International — Aspects actuéis du droit
international des transports, Colloque du Mans, 1981; Daniel Bardonnet — Equité
et Frontiéres Terrestres, in Mélanges offerts à Paul Reuter, 1981, págs. 35 e segs.;
Rainer Lagoni — Oil and Gas Deposits Across National Frontiers, in AJIL, April,
1979, vol. 73, ns 2, págs. 215 e segs.; Iftene Pop — Voisinage et Bon Voisinage en
Droit International, 1980; Paul Alliés — L’invention du territoire, 1980; Derek W.
Bowett — T he Legal Regim e o f Islands in International Law, 1979, págs. 61 e
segs.; D anierP ard onnel — Les Frontiéres Terrestres et la relativité de leur tracé
(problémes juridiques choisis), in RdC, 1976, vol. V, t. 153, págs. 9 e segs.; Isidro
Morales Paul — Las Nuevas Tendências del D erecho Internacionarpara la Soluc-
ción de controversias relativas a zonas fronterizas, in Anuario Hispano-Luso-Ame-
ricano de D erecho Internacional, vol. 7, 1984, págs. 173 e segs.; Michel Foucher
— Fronts et frontiéres, 1988; B.enediki Ziemtara — Fronteira, in Enciclopédia
Einaudi, vol. 14, 1989, págs. 3 0 6 'e segs.; Daniel Bardonnet — Les Fails Posterieures
a la Date Critique dans les Differends Territoriaux el Frantaliers, in Mélanges
M ichel Virally, 1991, págs. 53 e segs.; Jean Nouzille — Historie de Frontiéres, 1991;
M arcelo G. Kohen — L e réglem em des difierends territoriaux à Ia lum iére de
l’arrét de la CIJ dans L ’afaire Libye/Tchad, in RGDIP, 1995, n® 2, págs. 301 e
segs.; Giovani Distefano — La notion de titrejuridique et les différends territoriaux

1086
dans L ’ordre inicrnational in RGDIP, 1995, n° 2, págs. 335 e segs.; BertrancJ Badie
— La fin des territoires, 1995; Marcelo G. Kohen — Possession Contesi<■<■ rt
Souveraineté Territoriale, 1997; Malcolm Anderson — Frontiers, 1997. L ’ Inter­
national sans Terrilorie, sob a direção de Berlrand Badie e Marie Clatide Sniouts.
1996; Julio A. B arb eris— La Concepción Brasileña dei Uli Possidetis, “ in” Dim en­
são Internacional do Direito. Estudos em H om enagem a G. E. do Nascimento e
Silva, coordenador: Paulo Borba Casella, 2000. Françoise Thibaut — Les Voies de
Passage et de Com munication Internationale, 1997.
IA. A palavra territorio parece que tem a sua origem nos verbos “terrere” e
“ lerritare", que significam intimidar e espantar (Puig).
2. Esta é a posição da doutrina clássica. Entretanto, diversos doutrinadores
(Ancel) lêm considerado que pode existir um Estado sem território claram ente
delimitado.
3. Neste capítulo veremos apenas o território “ terrestre” .
4. Em sentido contrário: Jellinek.
5. O Visconde de Leão, na Bretanha, apontando para jim recife, declarava:
“Esta pedra é mais preciosa do que aquela que orna q diadema do rei.”
6. Ela substitui a propriedade do príncipe pela do Estado.
6A. Alguns autores (Rousseau) aproximam G erber da teoria d ejellin ek , lendo
em vista que ele considera o território elemento do Estado, ao contrário de Donato
Donati. Outros (Verdu) o consideram partidário da teoria do território-objeto. C.
F. V. Gerber afirma que “o território estatal é o o bjeto real da ‘signoria’ do Estado”
(Dirilto Pubblico, 1971). Entretanto é de se frisar que para o jurista alem ão o
território é elemento do Estado.
6B. Entre os autores modernos está Arangio Ruiz, sustentando que o direito
do Estado sobre o território no direito internacional é de “dom ínio” . Entretanto,
sustenta este autor que o direito do Estado sobre o território no direito interno
é “imperium”.
7. Brito Viana considera que a nossa Constituição de 1946 se utilizou da
expressão “território nacional” neste sentido.
8. O p rópriojellinek abriu exceções à exclusividade do Estado ao seu território:
a) confederação; b) condom ínio; c) ocupação m ilitar temporária; d) quando o
Estado permite a outrem praticar atos de soberania no seu território.
9. “A soberania territorial é a expressão habitualm ente adotada para designar
o direito de todo Estado ao gozo pleno do território próprio e a excluir dele a
penetração e a ação dos demais Estados” (A réchaga).
9A. Pode-se m encionar ainda a teoria do espaço vital, desenvolvida a partir
de 1935, consagrada nos preâmbulos do tratado entre Alemanha e Itália (1939)
e no Pacto de 1940 (Alem anha, Itália e Jap ão ). O espaço vital era definido por
órgãos ligados ao Ministério do Exterior da Alem anha com o “o domínio que deve
sem pre ser acessível a um povo, a fim de que o livre desenvolvimento e a manu­
tenção da existência de sua população fiquem assegurados” . Esta teoria é política
e não jurídica, bem com o traria uma grande incerteza ao DIP (Rousseau).
10. Em inglês: “fro n tier” é a fronteira-zona e “ boundary” é a fronteira-linha.
E uma zona de regime especial (p. ex.: no setor ad uaneiro), recebendo assim uma-
regulamentação própria. A Constituição de 1946, no art. 34, inciso II, inclui entre
os bens da União: ‘‘a porção de terras devolutas indispensáveis à defesa das fron­
teiras...”-A Constituição de 1969, no seu art. 4S, inciso I, repete o mesmo dispositivo,
mas, em vez de falar em “defesa das fronteiras” fala em “defesa nacional” . A

1087
Constituição de 1988 trata da matéria nos arts. 20, § 28, e 91, § l 9, III, e fala em
150km de largura a faixa de fronteiras terrestres como “fundam ental para defesa
do território nacional". Desde o Im pério a regulamentação das fronteiras já existia.
O D ecreto 1.318, de 1854, que regulamentava a Lei 601, do mesmo ano, estabelecia
que numa “zona de dez léguas contíguas aos limites do Im pério com países
estrangeiros... estabelecer-se-ão colônias militares”. A Lei 2.597, de 1955, fixou a
faixa de fronteira em 150km de largura para efeito de segurança nacional. O
regim e de fronteira para as pessoas é variado, sendo que muitas vezes se dá uma
facilidade de passagem às pessoas domiciliadas na zona de fronteira, em outros
casos é dado um “ permis” pelo seu Estado e visado pelo outro país. E permitida
a passagem de pequenos bens de um Estado a outro sem licença de exportação
ou im portação (alimentos, bebidas comuns) para se atender as necessidades con­
cretas da região. Alguns tratados fixam 'o horário em que isto pode ser feito. Cria-se
um docum ento para os que trabalham do outro lado da fronteira (na França
denomina-se de “carte du travailleur frontalier”), evitando-se a bitributação sobre
eles.
A perseguição de malfeitores além da fronteira só é possível se algum tratado
a estabelecer de modo expresso (em sentido contrário P. de La Pradelle, que o
considera um direito costum eiro). No século X IX houve tratado entre o México
e os EUA admitindo a perseguição quando ela fosse imediata e em zonas desertas
com pequena população. Em outros tratados o direito de perseguição é possível
quando o criminoso foi surpreendido em flagrante delito.
São dadas facilidades para os trens de trânsito, quando duas cidades em um
mesmo Estado ficam mais próximas, havendo passagem em território estrangeiro.
Eles não são submetidos às exigências aduaneiras. E dado um docum ento permi­
tindo a passagem de rebanhos e pessoas. J . Touscez observa que nem sempre a
fronteira política coincide com a fronteira aduaneira, com o a existente entre a
França e a Suíça em que foi criada uma zona franca fronteiriça. Em 1990 foram
concluídos os acordos de Schengen entre sete países da CEE, criando uma “tarifa
exterior comum” , e controlam de forma “harmoniosa” as fronteiras exteriores
destes países, mas criam entre elas “uma total liberdade de circulação”.
10A. Na França, Richelieu foi o primeiro grande defensor da tese das fronteiras
naturais.
11. As fronteiras naturais se’ oporiam às fronteiras artificiais (estas seriam
aquelas em que não existisse um acidente geográfico). Vallaux critica esta distinção
e observa que “as fronteiras denominadas ‘artificiais’ são verdadeiras fronteiras
naturais, isto é, aquelas que convêm à natureza e à maneira de ser das sociedades
políticas” . Na verdade, toda fronteira é natural porque visa atender interesses e
situ a çõ es d o s Estados. E n tretan to, é utilizada esta distinção (naturais e artificiais)
em relação aos limites com o meio de distinguir os acidentes geográficos dos demais
(ex.: linha reta). A observação de Vallaux é procedente, uma vez que seja o limite
um acidente geográficç’ ou artificial, ele corresponde aos-interesses do Estado. Em
conseqüência, feita a dem arcação, o Estado passa a ter “fronteiras naturais”. A
idéia de “fronteiras naturais” no seu sentido tradicional é um a política expansio-
nista. Alguns autores (Bishop, Sahoviç) falam ainda em fronteiras estratégicas que
são “aquelas ajustadas-aos objetivos militares”. Elas, contudo, não deixariam de
entrar na categoria das’ denominadas fronteiras artificiais ou na das naturais.
11 A. Parece-nos que m erece ser reproduzido um texto de Otávio Janm i (O
L abirinto Latino-americano, 1993): “ poucas vezes a nação se delimita na fronteira.
T an to pode ultrapassá-la com o manter-se aquém. O território é um espaço que a

1088
sociedade, o povo. os grupos e as classes criam e recriam, na quantidade e na
finalidade. Mas o que é singular no lerrilório da Nação é que ele c história. Por
seu povo, cultura, organização social, atividades económ icas, geopolítica, etc., a
nação transborda sua fronteira; ou nem chega a alcançá-la” .
12. O que faz com que as fronteiras se tornem um mito político (ex.: encontro
de chefes de Estado na fronteira).
12A. Até o século XVI, nas regiões montanhosas da Alem anha, os rios eram
tidos por "res nullius” . A utilização dos rios se prendeu muito à “impossibilidade
de se determ inar com exatidão a linha fronteiriça’’ (Fríedricli Ratzel — l.a Géo-
graphie politique. Les concepts fondamentaux, 1987). A própria noção de talvegue
não é uniforme, havendo textos que o definem como o meio do canal navegável.
12B. O talvegue entrou no DIP no tratado de Lunéville de 1801, que o
mencionava nos rios Adige e Reno.
13. O tratado de Munster (1648) fala já em talvegue no rio Reno, e no século
XVIII ele foi igualmente admitido.
14. Se os canais navegáveis forem m ais'de um, será escolhido o que mais
facilitar a navegação.
15. O “álveo do rio’’ , que figura em alguns tratados do Brasil, segundo Bevi­
láqua, é o talvegue.
16. A linha do divisor de águas não se confunde com a linha de cumeeiras,
com o pretendia Andrés Bello. Esta confusão deu origem a um litígio entre a
A rgentina e o Chile (o tratado de limites falava em linha de cumeeiras ou linha
do divisor de águas), que foi decidido salomónicamente por Eduardo VII, rei da
Inglaterra.
17. Era um interdito possessório que tinha por finalidade resguardar o pos­
suidor atual, desde que a sua posse fosse mansa e pacífica. No D l foi aplicado pela
primeira vez entre a Holanda e Inglaterra, na Paz de B reda em 1667 (Aréchaga),
quando da conclusão da paz (Oppenheim -Lauterpacht), isto é, as “ocupações
militares se transformam em posse com título de soberania” (Aréchaga).
17A. Ele figura no preâm bulo do Tratado de Madri, onde se estipula “cada
parte há de ficar com o que atualm ente possui” . Alexandre de Gusmão j á men­
cionara o “uti possidetis” em seus estudos em 1735 sobre a Colônia do Sacramento
(Cassiano Ricardo — Marcha para Oeste, 4- ed., vol. II, 1970).
18. A América Central fixou o ano de 1821.
19. Este mesmo autor observa que o “uti possidetis de facto ” é um “ pleonasmo”
que acaba por se confundir com o instituto da ocupação.
20. Outra interpretação do “uti possidetis” foi dada pela Guatemala, mas que
não teve aceitação. Sustentou este Estado que o limite com H onduras (em litígio
resolvido em 1933) deveria correr, conform e o “uti possidetis ju r is ” de 1821, mas
se deveria entender por este “ uli possidetis’’ " os limites tolerados pelas autoridades
da M etrópole, ainda que não correspondessem aos fixados regularm ente...’’ (Juan
Carlos Puig).
21. Pierre Vergnaud — Les transports Routiers Internationaux, 1960; Alfred
Verdross — Derecho Internacional Publico, 1963, págs. 519 e segs.
22. Jú lio A. Barberis — Los Recursos Naturales Com partidos entre Estados y
el D erecho Internacional, 1979. ’ -

1089
f

i
!

Í--
í
1
CAPÍTULO XXXIX

FORMAÇÃO HISTÓRICA DO TERRITORIO BRASILEIRO'

402 — As bulas papais e o Tratado de Tordesilhas; 403 — Tratados


do periodo colonial: a) Tratados de Utrecht; b) Tratado de Madri; c)
Tratado de El Prado; d) Tratado de Santo Ildefonso; e) Paz de Badajoz;
404 — A Independência, os limites e o seu reconhecimento; 405 —
í4í grandes questões territoriais: a) Território de Palmas; b) Questão do
Amapá; c) Os limites com a Guiana Inglesa; d) A questão do Território
do Acre; 406 — Outros limites brasileiros.

402. A historia do territorio nacional começou antes do nosso desco­


brimento. Quando Cristóvão Colombo voltou de sua viagem à América, a
primeira delas, os reis de Espanha e Portugal tentaram reivindicar para si
as terras recém-descobertas, com fundamento no Tratado de Akáçovas
(1479). Entretanto, este tratado não justificava as reivindicações de ne­
nhum deles.2 A Espanha, sabedora dos direitos de Portugal, a respeito dos
descobrimentos, outorgados pelas bulas pontifícias, começou a negociar
com o Papa Alexandre VI, espanhol, que necessitava do seu auxílio para
sua política pessoal. Destas negociações surgiu a bula “ Inter coetera”, de
3 de maio de 1493 (entretanto, na realidade, ela é do mês de abril), que
atribuía ao rei da Espanha as terras a serem descobertas, desde que não
estiveSsem sob o domínio de príncipe cristão. Os direitos de Portugal não
são mencionados na referida bula. Ele-protesta e uma nova bula3 “Inter
coetera” é “promulgada” por Alexandre VI, dando para a Espanha as
terras que ficassem a mais de 100 léguas a oeste das ilhas de Cabo Verde
e Açores. Esta bula tem a data de 4 de maio de 1493; entretanto, ela só
foi expedida em junho deste mesmo ano. Ela, na prática, não possuía
valor, uma vez que a sua execução era impossível, porque os arquipélagos
de Açores e Cabo Verde estão em meridianos diferentes. Esta segunda
bula “ Inter coetera” foi denominada de “bula de partição do mar oceano” .4

1091
A última bula “Inter costera" ainda não satisfizera a Portugal e D. João
II, cognominado o Príncipe Perfeito, prepara-se para fazer a guerra a
Castela, a fim de decidir a posse das terras.4' A Espanha cede e em 7 de
^junho de 1494 foi assinado um tratado, que recebeu o nome da povoação
de Castela, onde foi concluido o Tratado de Tordesilhas, que teve origi­
nariamente a denominação de “ Capitulação da Partição do Mar Oceano” ,1D
Foi determinado que pertenceriam a Portugal as terras a serem descobertas,
ou já descobertas, até a distância de 370 léguas a oeste das ilhas de Cabo
Verde.0 O tratado determinava que a demarcação seria feita em dez meses,
o que não foi cumprido. Existiam mesmo aigumas dificuldades para esta
demarcação, porque o tratado não estipulava qual légua a ser utilizada,
pois nesta' época não tinha medida uniforme. Por outro lado, o tratado
também não estipulava a partir de qual ilha de Cabo Verde seriam contadas
as 370 léguas.6 Os próprios astrônomos da época não tinham meios para
fixar a longitude no mar. Renato Mendonça conclui com razão que “o
Tratado de Tordesilhas foi um acordo meramente formal, pois ninguém
sabia o que dava nem o que recebia. Menos ainda se havia lucro ou perda
na transação”. Para Amo Wehling e Maria José C. de Wehling o Tratado
de Tordesilhas é o “ato inaugural da diplomacia moderna, pois foi o
primeiro acordo entre Estados sem a interferência papal” .
O Tratado de Tordesilhas, nunca demarcado, tem os seus efeitos sus­
pensos com a união das coroas ibéricas. A coroa portuguesa cai nas mãos
do rei de Espanha.7 Esta união durará de 1580 a 1640. E interessante
assinalar que mesmo neste período o Brasil continuou a ser praticamente
uma colônia portuguesa, porque os domínios coloniais de Espanha e Por­
tugal permaneciam separados. Esta separação era tão grande que nos
domínios espanhóis apenas podiam ser nomeados funcionários espanhóis
e nos domínios portugueses apenas funcionários portugueses. Esta união
pessoal acarretou uma suspensão temporária do Tratado de Tordesilhas.
Os portugueses avançaram, na América, de muito o meridiano de Torde­
silhas.8 Segundo Moniz Bandeira os brasileiros teriam ultrapassado o me­
ridiano de Tordesilhas para procurar riquezas, enquanto os espanhóis já
as tinhamencontrado e ainda tinham que vencer a cordilheira dos Andes.
Os historiadores têm assinalado que só no século XVII os brasileiros avan­
çam para o interior.
403. Inúmeros tratados foram concluídos, no período colonial, entre
as metrópoles européias (Espanha e Portugal) a respeito dos limites na
América e que, por conseguinte, interessam diretamente ao Brasil.

a) T ratados de Utrecht

Em 1713, no primeiro Tratado de Utrecht, a França renuñciou às


terras de Cabo Norte em favor de Portugal. . ..
Em 1715, o segundo Tratado de UtrechL, que terminou com um con-
flilo Iuso-espanhol, estipulou que a Espanha devolvería a Portugal a Colonia
do Sacramento.

b) T ratado de M adri

E o primeiro grande tratado a fazer referencia ao Brasil assinado por


Portugal e Espanha. Ele foi negociado por Alexandre de Gusmão, secre­
tario de D. Jo ão V, natural de Santos e cognominado por Araújo Jorge de
“avô dos diplomatas brasileiros”. Neste tratado, concluído a 13 de janeiro
de 1750, ambos os signatarios reconheceram haver violado o Tratado de
Tordesilhas. Conta ele diversas disposições inovadoras. O meridiano utili­
zado para delimitar anteriormente os dois impérios é substituido pelo
principio do “uti possidetis”. Observa Pedro Soares Martínez que o “uti
possidetis” só foi consagrado parcialmente: “pois nem a Espanha possuía
a colonia do Sacramento, desde 1680, nem Portugal possuía os territorios
a leste do Uruguai, onde se encontravam índios colonizados por jesuítas”.
A delimitação seria feita em acidentes geográficos, como os rios. O seu
artigo XX I determina que em caso de guerra entre a Espanha e Portugal
os seus dominios na América ficarão em paz. Alguns autores procuraram
ver neste dispositivo o inicio do pan-americanismo, que séculos depois
dominaria as Américas. Entretanto, a sua verdadeira razão de ser era das
maís pragmáticas: trazer a paz à Colonia do Sacramento, que em cada
guerra entre Portugal e Espanha era atacada e saqueada. Estabelecia ainda
que Portugal cedia a Colonia do Sacramento à Espanha e recebia desta
os Sete Povos das Missões. Entretanto, Portugal ficava com as “mãos livres”
para continuar a sua expansão na região amazônica (Teixeira Soares).
Portugal incorporava o Rio Grande e o sul de Santa Catarina, que não lhe
pertenciam pelo Tratado de Tordesilhas.
O Tratado de Madri ficou em vigor apenas por onze anos. A sua
demarcação jamais se realizou devido às dificuldades no tratado e sobre­
tudo às revoltas dos índios, dando início à “guerra guaranítica” nos Sete
Povos das Missões.9 O tratado levanta protestos em Portugal pela cessão à
Espanha da Colônia do Sacramento.
A morte de D. João V e o os'tracismo de Alexandre de Gusmão con­
tribuíram também para que ele não fosse demarcado.

c) T ratado d e E l P ardo

Em 1761 este tratado revoga o de Madri e anula qualquer demarcação


dele resultante. Em conseqüência, a Colônia do Sacramento voltou a Por­
tugal e os Sete Povos das Missões voltam para as mãos da Espanha. Na
verdade, Portugal não havia ainda entregue a Colônia do Sacramento.

1093
Portugal, apesar deste tratado, resolve efetivar a sua expansão no Ama­
zonas.

d) T ratado d e S an to Ildefonso

Uma nova guerra tem início na América entre.portugueses e espanhóis,


Esles, tendo Ceballos à frente, invadem o território brasileiro e destroem
completamente a Colônia do Sacramento. Em 1B de outubro de 1777 é
assinado o Tratado de Santo Ildefonso entre Espanha e Portugal. Este
tratado consagra o “uti possidetis”, como o de Madri, sendo esta a única
vantagem real que Portugal obtém com este tratado. A Colônia do Sacra­
mento e os Sete Povos das Missões ficam com a Espanha. Portugal obtém
a ilha de Santa Catarina, que havia sido ocupada pelos espanhóis
Os historiadores criticaram violentamente este tratado, denominando-
o de “câpcioso e leonino” (Visconde de São Leopoldo), ou, ainda, afir­
mando que os seus artigos haviam sido “ditados pela Espanha” (Vamha-
gen). Vinte anos depois, ele estava ainda sendo demarcado, em virtude da
inércia e do desinteresse das partes contratantes. A própria demarcação
só teve início em 1784. Os seus dispositivos eram contraditórios e errados,
escrevia São Leopoldo, mencionavam rios que não existiam, ou, quando
existiam, muitas vezes não se encontravam nos locais assinalados.

e) P az de B a d a jo z

Nova guerra surge entre Espanha e França, de um lado, e Portugal,


do outro, em 1801, tendo a duração de poucas semanas. Durante a guerra,
os Sete Povos das Missões Orientais do Uruguai são ocupados pelos por­
tugueses, auxiliados por brasileiros. A guerra termina com a Paz de Badajoz,
concluída no mesmo ano de 1801. O tratado, entretanto, é omisso no
tocante à questão de limites no sul do país. Ele não menciona o Tratado
de 1777, revalidando os limites ali fixados, nem restabelece o “status quo
ante bellum”. De qualquer modo, os brasileiros continuaram ocupando
os Sete Povos das Missões mesmo depois da paz.9A Devemos assinalar que
neste período da História as guerras extinguiam todos os tratados existentes
entre os beligerantes.
A questão de fronteira mencionada na Paz de Badajoz é que Portugal
cedeu à França as terras do Cabo Norte acima do rio Araguari (foi anulado
posteriormente: v. adiante).
404. Diante do exposto acima, ao ser proclamada a independência das
colônias espanholas e portuguesas, não existe nenhum tratado em vigor
restabelecendo os limites entre elas. O princípio do “uti possidetis” vai
reger a questão.10
Proclamada a independência do Brasil por D. Pedro II, surgiu de
imediato o problema do seu reconhecimento.11 A época não era das mais

1094
favoráveis para se obter o reconhecimento, uma vez que a Europa estava
dominada pela Santa Aliança. Em Portugal, o Rei D. João VI estava domi­
nado pelas cortes portuguesas, que se opunham ao reconhecimento. O
primeiro Estado a nos reconhecer foram os EUA, que tinham nesta época
como presidentejames Monroe. O reconhecimento foi efetuado em 1824.
A Inglaterra, interessada em m anter a sua hegemonia comercial no
Novo Mundo, faz o papel de mediadora entre o Brasil e Portugal. Em
relação ao Brasil, o interesse inglês era sobretudo na renovação do tratado
comercial de 1810, cujo prazo de validade estava prestes a terminar.12 E
enviado ao Brasil o inglés Charles Stuart, que passa antes em Portugal,
onde recebe plenos poderes de D. João VI. Portugal temia perder o auxilio
da Inglaterra. Stuart exige que D^-João aceite a nossa independência como
um fato consumado.
A missão de Stuart é coroada de êxito (consegue o reconhecimento
e a renovação do tratado comercial) e em 29 de agosto de 1825 é assinado
o tratado de reconhecimento entre Brasil e Portugal. Este tratado estipulava
algumas obrigações para o Brasil: entre elas, D. João VI conservaria o título
de Imperador do Brasil e nós nos obrigávamos a pagar dois milhões de
libras esterlinas a Portugal.13 Lilia Moritz Schwarcz (As Barbas do Impera­
dor, 2000) afirma que os primeiros a reconhecerem a independência do
Brasil foram os reis africanos; a) Obá Osemwede do Benin; b) Ologum
Ajan de Eko, Onim ou Lagos.
405. Proclamada a República e reconhecida ela pelos demais países,
o Brasil passou-a tratar das suas grandes questões de limites.

a) Territorio d e P alm as

Os argentinos costumam denominar este litígio de questão das missões.


Entretanto, o Baráo do Rio Branco conseguiu demonstrar que o território
contestado jamais fizera parte da Provincia das Missões da Companhia de
Jesus no Paraguai. Daí, devemos chamá-lo de .litígio do Território de Pal­
mas.
A questão teve início no Tratado de Madri, que estabelecia como limite
na região o rio Pequiri ou Pepiriguaçu e o rio desconhecido que fosse
mais próximo a desembocar no Iguaçu. Os comissários encarregados de
demarcar os limites nos termos do Tratado de Madri descobriram em 1759
este rio desconhecido e lhe deram o nome de rio Santo Antônio. O Tratado
de El Pardo anula'o de Madri, mas o Tratado-de Santo Ildefonso fala
novamente nos ri03-Pequiri e Santo Antônio.
Em 1788 (Delgado de Carvalho, mas para Álvaro Lins é 1789), novos
comissários demarcadores descobrem outro rio desconhecido e ao que se
encontra na sua contravertente dão os nomes de Pepiriguaçu e Santo
Antônio-Guaçu. Assinalam que os demarcadores de 1759 teriam errado.
Tais rios seriam os atuais Chopim e Chapecó.

-1095
A guerra de 1801 anula os Datados anteriores a ela e a Paz de Badajoz
não se refere aos limites. Contudo, os brasileiros durante a guerra haviam
ocupado os Sete Povos das Missões e continuaram com eles após o término
da guerra. A independencia das colonias americanas é feita e não há
tratado de limites entre as metrópoles. CP “ti ti possidetis” passa a reger as
questões de fronteiras.
Em 1857, é assinado um tratado de limites entre o Império do Brasil
e a Argentina. Este tratado, negociado pelo Visconde do Rio Branco,
menciona os ríos Pequiri e Santo Antonio, como sendo os rios assinalados
pelos demarcadores de 1759. A Argentina não ratificou este tratado apesar
de o seu Congresso tê-lo aprovado.14 Em 1881 a Argentina reivindica que
os limites são nos rios Chapecó e Chopim. '
A Argentina, em 1888, depois dos trabalhos de uma Comissão mista
brasileiro-argentina que explorara os quatro jtíqs litigiosos, passou a reivin­
dicar que o rio Chopim não era o verdadeiro limite, mas o rio Jangada,
que estava mais adentro no territorio brasileiro. Aumentava a área con­
testada.
O litígio se resumia em saber quais os verdadeiros rios do Tratado de
1750: se os rios Pequiri e Santo Antonio, ou os atuais Chapecó e Chopim
(este último substituído nas reivindicações pelo rio Jangada).
Em 7 de setembro de 1889 é assinado um acordo, ratificado em 4 de
novembro do mesmo ano, em que os dois países decidiam que o litigio
seria resolvido pela arbitragem do Presidente dos EUA.
A República, querendo obter a simpatia da América para o Brasil,
assina, em 25 de janeiro de 1890, em Montevidéu, um tratado com a
Argentina, em que a região contestada era dividida ao meio. Este tratado,
assinado por Quintino Bocaiúva, levantou protestos e foi recusado no
Congresso Nacional.15 Talvez se possa explicar o ato de Quintino Bocaiúva,
que o justificava com a “fraternidade americana” com os seguintes ele­
mentos: a) o manifesto do Congresso do Partido Republicano Federal de
1887 foi assinado, entre outros, por J. Saldanha Marinho, Quintino Bo­
caiúva e Campos Sales; b) os diferentes manifestos republicanos falam na
“fraternidade americana”, o que é uma decorrência da Doutrina de Mon-
roe (Ricardo Velez Rodríguez — A Propaganda Republicana, in Evolução
do Pensamento Político Brasileiro, organizado por Vicente Barreto e An­
tonio Paim, 1989).
A idéia de arbitragem é retomada juntamente com o Tratado de 1889.
E designado para defender o Brasil o Barão Aguiar de Andrade, que morre
antes de iniciar o seu trabalho. Fenômeno idêntico ocorre na Argentina,
que nomeara Nicolás Calvo, que também morre. Floriano Peixoto indica
então o Barão do Rio Branco, nosso cônsul em Liverpool e superintendente
do Serviço de Imigração na Europa. A Argentina designa Zeballos. A defesa
brasileira é fundamentada principalmente nas instruções de 1759, dadas
aos demarcadores espanhóis que mostravam ter o Brasil razão.15 Por outro
lado, eles servem para esclarecer o enigma do mapa das Cortes, que servia
de base à argumentação argentina. Este mapa fora elaborado em Lisboa
e sen-ira de orientação ao Tratado de Madri. Ele íoi duplicado e estes dois
exemplares eram chamados de “mapas primitivos", sendo que um deles
foi encontrado no Quai d’Orsay. Concluido o Tratado de 1750, foram
elaboradas tres copias em Madri e três em Lisboa, sendo que apenas ñas
primeiras foram colocadas as modificações feitas 110 Tratado de Madri. A
Argentina se baseava 110 mapa encontrado no Quai d’Orsay e em um outro
exemplar encontrado em Madri, mas que era urna das copias feitas em
Lisboa. O Brasil se fundamentava no exemplar que figurava na coleção de
Tratados de Borges de Castro, que nos era favorável e estava baseado em
uma das copias de Madíí,*.isto é, um exemplar onde haviam sido incluidas
as modificações do Tratado de Madri.
A missão brasileira era formada por Dionisio Cerqueira, Almirante
Guilhobel, Olinto de Magalhães e Domingos Olímpio, além do seu chefe,
o Barão do Rio Branco. Nos EUA foi contratado como consultor da missão
o grande intemacionalista Basset-Moore.
O Presidente dos EUA, Grover Cleveland, deu o seu laudo arbitral em
5 de fevereiro de 1895, inteiramente favorável ao Brasil, que incorporou
deste modo mais de 30.000 quilômetros quadrados ao seu território.17

b) Questão do A m apá

Esta questão remonta ao século XVII, quando na região já havia con­


flitos entre Portugal e França. D. Pedro II de Portugal e Luís XIV concluem,
em 1700, um tratado em que se estipula serem destruídos todos os fortes
na região contestada. Em 1715, no primeiro Tratado de Utrecht, a França
renuncia às terras do Cabo Norte, localizadas entre o rio Amazonas e
Vicente Pinzón. Os conflitos na região não desaparecem com este tratado.
Em 1808, a família real portuguesa transmigra para o Brasil, D. João
VI ocupa Caiena pòr. oito anos. Parece que a intenção de Portugal não
era anexar definitivamente a Guiana Francesa, tanto que manteve durante
a ocupação (1808-1817) o Código de Napoleão. Portugal pretendia fixar
a fronteira no rio Oiapoque (Pedro Soares Martinez). O Congresso de
Viena decide que a Guiana deveria ser devolvida à França e o limite com
o Brasil é fixado'novamente no rio Japoc ou Vicente Pinzón.
Quinze anos depois do Ato Final de Viena têm início as agitações na
região. O litígio consistia em saber qual era o verdadeiro rio Vicente Pinzón:
se o atual Oiapoque ou se o rio Aragua ri’ como pretendia a França. Se a
tese francesa fosse vitoriosa, o atual Território do Amapá seria da França.
Em 1854, o Brasil envia o Visconde do Uruguai para negociara questão
com a França, mas não chega a nenhum resultado. Na última década do
século XIX ’os conflitos na região contestada aumentam em virtude de se
ter descoberto ouro no rio Calçoene, que fica no meio dela.
A França, para reconhecer a República brasileira, havia exigido que a
questão, caso .não fosse decidida pelas negociações diretas, fosse levada a

1097
arbitragem. O compromisso arbitral é assinado em 10 de abril de 1897. O
árbitro escolhido foi o Conselho Federal suíço.,7A O árbitro somente po­
deria decidir pelo alegacio, isto é, não poderia decidir por eqüidade.
Caberia a ele dizer qual era o verdadeiro Oiapoque do Ato de Viena. Em
relação ao limite interior, ou a linha leste-oeste (o litígio abrangia uma
área da fronteira do Pará com a Guiana), o árbitro poderia decidir por
qualquer das sugestões que fossem formuladas pelos litigantes, ou, ainda,
decidir por uma terceira solução que fosse c o n fo r m e ao DIP nas suas
normas aplicadas a regiões cujas fronteiras não estivessem determinadas.1715
O advogado do Brasil foi o Barão do Rio Branco. A França designou
Ripert de Monclar e Grodet para defendê-la. A missão francesa foi asses­
sorada pelo grande geógrafo francês Vidal de la Blanche. Foram apresen­
tadas a primeira memória e a réplica (segunda memória). Na primeira
memória brasileira, Rio Branco incluiu o trabalho de Joaquim Caetano:
“L ’Oyapoc et l’Amazone”. Integraram a missão brasileira: Dionisio da
Gama e os filhos do barão, Raul e Hipólito. ’O consultor da missão foi
Virgil Rossel.
O laudo do Conselho Federal suíço foi proferido a l s de dezembro
de 1900 e foi elaborado pelo Conselheiro Eduardo Müller, que o redigiu
em alemão. Entretanto, quem o assinou foi Walter Hauser, que era o
Presidente do Conselho. O laudo foi favorável ao Brasil, considerando que
o rio Vicente Pinzón era o atual Oiapoque, como havíamos sustentado.
No tocante ao limite interior, não foram aceitas nem a proposta francesa
nem a brasileira: o árbitro decidiu que o limite seria pela serra do Tumu-
cumaque, na linha do seu divisor de aguas.

c ) Os limites com a G u ia n a Inglesa

No século XVIII a Holanda teve na região uma colônia da maior


importância. Em 1814, pela Convenção de Londres, ela cedeu uma parte
à Inglaterra. A Holanda jamais contestara qualquer região a Portugal.
Todos aqueles que estudaram a região reconheceram o domínio de Por­
tugal, que havia exercido a catequese na região, bem como aí construído
fortificações. A questão só surgiu com as viagens do alemão, naturalizado
inglês, Robert Schomburgk àquela região, onde fora comissionado pela
Royal Geographical Society de Londres em 1835, 1837, etc., para terminar
os estudos de Von Humboldt. Começou por instalar na região brasileira,
próximo da fronteira com a Guiana Inglesa, o Reverendo Youd, alegando
que os índios eram maltratados pelos brasileiros. Este reverendo foi pouco
depois expulso pelas autoridades brasileiras. Em 1839, Schomburgk se
encontrava novamente na região e comunica ao governador da Guiana
britânica que ela é de propriedade da Inglaterra, porque ali existirá forti­
ficação holandesa. Ouseley, encarregado dos negócios da Inglaterra no
Brasil, comunica ao governo imperial que Schomburgk faria a demarcação
na região. As autoridades brasileiras são expulsas e o Brasil protesta. A'
região é neutralizada em 1842.18

Í098
Durante o Segundo Imperio e a República várias tentativas de nego­
ciações diretas foram feitas (1843: Araújo Ribeiro; 1888: Barão de Penedo;
^ 1891 e 1897: Sousa Correia), todas sem qualquer resultado.
Olínto de Magalhães, ministro das Relações Exteriores, convida Joa­
quim Nabuco em 1899 para fazer a defesa do Brasil, uma vez que Lorde
Salisburyjá propusera o arbitramento para a solução do litígio, e em 1901
é assinado o compromisso arbitral (pela Inglaterra assinou o Marquês de
Lansdowne), que entregou o litígio à arbitragem do rei da Itália. Nabuco
pretendia que o árbitro fosse o Grão-duque de Badén, que não foi aceito
pelo nosso ministro do Exterior. A defesa do Brasil foi entregue ao próprio
Joaquim Nabuco19 e a da Inglaterra foi feita por um grupo de trabalho
formado pelos peritos do Colonial Office.
A defesa da Inglaterra se fundamentou em provas de que ela ocupava
a região, mas todas estas provas eram posteriores à neutralização do terri-
. tõrio contestado.
A defesa brasileira se apoiou, entre outros argumentos, em dois prin­
cípios que estavam consagrados pacificamente em toda a jurisprudência
inglesa. O primeiro deles era o do “inchoate title”, que dá ao Estado
direito sobre um território, oponível a terceiros, mesmo quando a sua
ocupação não é contínua. O segundo era o do “watershed line” (linha de
vertente), que dá ao Estado que ocupa o curso de um rio direito às terras
banhadas pelos seus afluentes e subafluentes. A defesa do Brasil foi feita
em 18 volumes, compreendendo a Memória, a Réplica e a Tréplica.
Vítor Manuel III proferiu o seu laudo a 6 de jun h o de 1904. O árbitro
dividiu a região, dando, porém, à Inglaterra um pedaço maior: 19.630
quilômetros quadrados para a Inglaterra e 13.570 quilômetros quadrados
para o Brasil. E curioso observar que o laudo arbitral nos deu menos do
que em 1898 Lorde Salisbury havia oferecido ao Brasil (mais ou menos
16.500 quilômetros quadrados).
Este laudo arbitrai do rei da Itália está errado. A comissão designada
pelo rei da Itália para estudar o caso era presidida por Buzzatti. Grandes
Intemacionalistas, como Fauchille, Politis, La Pradelle, Hoijer, etc., falaram
na sua nulidade. As críticas que lhe foram dirigidas são as seguintes: a)
excesso de poderes do'árbitro, que deveria-decidir pelo alegado e não
fazer um julgamento por eqüidade, como fez;20 b) o árbitro errou juridi­
camente porque considerou que a ocupação tinha que ser efetiva para dar
direito ao território e se esqueceu de que a efetividade da ocupação só
passou a ser-exigida em 1885 (Congresso de Berlim), e que o litígio versava
sobre ocupação ocorrida no século XVIII. Ao mesmo tempo, ele.se esquecia
de que havia áreas na região, mas não incluídas no território contestado,
onde a ocupação portuguesa também não era contínua e não havia qual­
quer contestação por parte da Inglaterra.21
A grande conseqüência deste laudo é que ele fechou a bacia do Esse-
quibo ao Brasil e abriu a do Amazonas à Inglaterra.

1099
d) A questão do Território do A cre

En ire os elementos históricos desla questão podemos assinalar que o


Tratado de Madri já mencionava como limite a “margem Oriental do
Javari" por uma linha este-oesle a partir da “boca do M amoré”.'Í1A Ao se
atingir a Independencia o Império considerava o Acre como lerritório
boliviano. Assinala Leandro Tocantins que nos mapas das cortes leriam
sido feitos erros propositais a fim de que a Espanha pensasse ser menor a
área que ficava com Portugal na Amazonia. Em 1745, o Papa Benedito
XIV pela bula “Condor L ucís ” criou as prelazias de Goiás e Cuiabá, o que
reconhecia o avanço dos portugueses que ultrapassara o estabelecido no
Tratado de Tordesilhas. Somente na segunda metade do século XIX é que
começaram a surgir alguns incidentes a respeito do Acre. Em 1867 é
concluido um tratado estipulando os limites, na região, que faz referencia
à nascente do rio Javarí. Entretanto, não se havia ainda determinado onde
estava a nascente do rio Javari. Duas interpretações foram possíveis para
este Tratado de Avacucho: urna, que tomava o Acre boliviano; a outra,
favorável ao Brasil. Expedições são enviadas para descobri-la e chegam a
resultados diferentes. Várias expedições foram feitas para a descoberta da
nascente do riojavari, como a de Cunha Gomes. Somente com a expedição
de Luís Cruls (1901) foi descoberta a verdadeira nascente.
A questão começou a se agitar quando os cearenses passaram a emigrar
para o Acre. A Bolívia cobra taxas e impostos. Os brasileiros descontentes
criam o Estado Intependente do Acre, sob a chefia de Luís Galvez Rodri­
gues de Arias. O govemo federal brasileiro declara que nada pretende
naquele territorio; todavia, o govemo amazonense começa a proteger o
Estado recém-formado.
Nesta situação, a Bolívia pensa em arrendar o Acre a urna firma es­
trangeira que o pretendesse explorar, urna vez que ele era rico em recursos
naturais. Em 1901, a Bolívia assina com uma firma norte-americana (Cary
e Whitridge) um contrato para a formação do “Bolivian Syndicate”. Este
teria poderes semelhantes aos das Companhias de Carta, tão utilizadas
para a exploração da África e da Ásia. A idéia de se criar o sindicato fora
dada pelo ministro da Bolívia em Londres: o milionário Aramayo (Afonso
Arinos).
Ao sindicato seria dado o direito de ter tropas, possuir navios, arrecadar
impostos, etc. Este sindicato seria formado com capitais franceses, alemães
e norte-americanos. Os EUA simpatizavam com o sindicato mas sempre
lhe negaram um apoio decisivo. Diante da formação deste sindicato, há
uma nova revolução na região, chefiada por Plácido de Castro (1902), e
a Bolívia envia tropas para combatê-la. O governo brasileiro muda de
atitude e movimenta também as suas tropas.
Diante desta posição firme do governo brasileiro, a Bolívia rescinde o
contrato com o sindicato e propõe que o litígio seja submetido a arbitra-
geni, o que é recusado pelo Brasil. São iniciadas as negociações diretas. O
Brasil, com a finalidade de afasiar os demais países do litigio, indenizou
o sindicato com 110.000 libras e ele renunciou aos seus direitos Em 21-2-
1903 foi concluído um modus vivendi para a região ern litígio por Eliodoro
Villazon e Eduardo Lisboa.
A missão brasileira para tais negociações era formada por Rio Branco,
Rui Barbosa e Assis Brasil. Rui Barbosa se declara “plenipotenciário ven­
cido" e se retira das negociações. Ele se opunha a que o Brasil cedesse
qualquer parte do território nacional. A missão boliviana era formada por
Fernando Gauchalla e Claudio Pinila. As negociações chegam a bom termo
e a^l7 de novembro de 1903 é assinado o Tratado de Petrópolis. fieste
tratado, a Bolívia cedeu ao Brasil a parte sul do território do Acre e cSs
seus direitos à parte norte (esta última era pretendida pelo Peru). O Acre
tinha 191.000 quilômetros quadrados. O Brasil cedeu alguns territórios na
fronteira (cerca de 3.164 quilômetros quadrados) e se comprometeu a
pagar dois milhões de libras esterlinas (em duas prestações até 1905), e
se obrigou a construir a estrada de ferro Madeira-Mamoré.
A construção desta estrada era um “sonho”, e em 1870 o governo deu
uma concessão ao inglês Coronel George Church, mas que não foi adiante.
As condições climáticas eram desfavoráveis, como demonstraram estudos
realizados por comissões designadas pelo governo brasileiro (v. Américo
Jacobina Lacombe — Afonso Pena e sua época, 1986).
O Tratado de Petrópolis levantou no nosso Congresso inúmeros pro­
testos por termos cedido território à Bolívia. Neste m omento o Ba‘rão do
Rio Branco declara ter recebido de um antigo funcionário o mapa da
Linha Verde, feito em 1860, onde se demonstrava claramente que o Acre
era território boliviano. 22 Diante disto, o tratado foi aprovado pelo Con­
gresso. Na verdade, o território nunca fora brasileiro (com o pensavam
muitos, inclusive Rui Barbosa); era um território boliviano, apenas a colo­
nização tinha sido feita por brasileiros.
406 Os demais limites, o Brasil resolveu por negociações diretas com
os seus vizinhos.
O Peru chegou a reclamar do Brasil uma área de 442.000 quilômetros
quadrados. Em 1909, por meio de um tratado, o Brasil ficou com 403.000
quilômetros quadrados.
Em 1909 assinamos um tratado de limites com o Uruguai em que
resolvemos as nossas questões com ele e, inclusive, devolvemos ao Uruguai
áreas que realmente lhe pertenciam.
O tratado de limites de 1872 e o tratado complementar de 1927 fixaram
os nossos limites com o Paraguai. Na denominada Ata do Iguaçu (1966)
Brasil e Paraguai declaram que os recursos hidráulicos-das Sete Quedas
pertencem em condomínio aos dois Estados. O mesmo foi consagrado no
tratado sobre Itaipu de 1973. Em 1976 foi assinado um protocolo adicional
ao tratado de 1927.

1101
Em 1908, o Barão do Rio Branco assinou com a Holanda o tratado de
limites entre a Guiana Holandesa e o Brasil.
Com a Colômbia, assinamos tratados de limites em 1907 e 1928. A
fixação dos nossos limites com a Venezuela remonta ao Tratado de 1859.
Em 1973 Brasil e Venezuela assinaram acordo de demarcação para a exe­
cução do tratado de limites de 1859.
NOTAS
1. (Limitar-nos-emos a citar predom inantem ente as obras específicas sobre os
nossos lim ites): Pedro Calmon — H istoria Diplomática do Brasil, 1941; Jo sé Carlos
de M acedo Soares — Fronteiras do Brasil no Regime Colonial, 1939; Luís Ferrand
de Almeida — A Diplomacia Portuguesa e os Limites Meridionais do Brasil, vol.
I, 1957; Ornar Emir Chaves — Fronteiras "do" Brasil (Limites com a República da
Colôm bia), 1943; J . M. N. Azambuja — Questão Territorial com a República
Argentina — Limites do Brazil com as Guyanas Franceza e Ingleza, 2 vols., 1891-
1892; Nery da Fonseca — Fronteiras do Sector Sul, 2 vols., 1935-1937; Anhur C.
F. Reis — Limites e Demarcações na Amazonia Brasileira, 2 vols., 1937-1948;
H ildebrando Accioly — Limites do Brasil (A Fronteira com o Paraguai), 1938;
Isidoro Ruiz M oreno — Historia de las Relaciones Exteriores Argentinas (1810-
1955), 1961; H élio Viana — Historia Diplomática das Fronteiras do Brasil, 1948;
idem — Historia Diplomática do Brasil, s.d.; Castilhos G.oycochea — Fronteiras e
Fronteiros, 1943; Delgado de Carvalho — Historia Diplomática do Brasil, 1959;
Renato de M endonça — Fronteira em Marctía," 1956; Jo ã o Ribeiro — As Nossas
Fronteiras, 1930; Renato de M endonça — Historia da Política E xterior do Brasil,
vol. I, 1945; Fernando Antonio Raja Gabaglia — As Fronteiras do Brasil, 1916; A.
G. de A raújo Jo rg e — Introdução às O bras do Barão do Rio B ranco, 1945; Affonso
Várzea — Lim ites Meridionais, s.d.; H ildebrando Accioly — O Reconhecim ento
do Brasil pelos Estados Unidos da A m érica, 1945; Oliveira Lima — O Reconheci­
m ento do Im pério, 1902; Dunshee de Abranches — Limites com o Perú, 1910;
Joaqu im Caetano da Silva — L ’Oyapoc et l’Amazone, 2 vols., 1893-1895; Fernando
Nobre — As Fronteiras do Sul, 1922; Lopes Gonçalves — A Fronteira Brasileo-Bo-
liviana pelo Amazonas, 1901; H. Accioly — O Reconhecim ento da Independência
do Brasil, 1945; Luís Santiago Sanz — L a Cuestión de Misiones, 1957; Souza Docca
— Lim ites entre o Brasil e o U ruguai, 1939; Cassiano Ricardo — O Tratado de
Petrópolis, 2 vols., 1954; Lima Figu eiredo — Limites do Brasil, 1936; Carlos A.
Aldao — La Cuestión de Misiones, 1894; Rangel Moreira — Esboço Histórico das
Nossas Questões de Fronteira, 1913; Alexandre de Gusmão e o Tratado de Madri
— D ocum entos Organizados e A notados por Jaim e Cortesão, 9 t. 1952-1963; J .
Pandiá Calógeras — A Política E xterio r do Império, 3 vols., 1927-1933. Podemos
m encionar ainda as defesas apresentadas pelo Brasil nos seus litígios, que incluem
inúm eros volumes de mapas: Rio B ran co (Exposição que os Estados do Brasil apre­
sentam ao Presidente dos Estados U nidos da América, com o Á rbitro...), em seis
volumes; M ém oire presenté par les Etats Unis du Brésil au Gouvem em ent-de la
C onfédéralion Suisse, em 11 volumes (5 da 1® memória e 6 da segunda) eJoaquim
N abuco (Lim ites entre le Brésil et la Guyane Anglaise), totalizando, nas 3 memórias,
18 volumes; A rthur Cezar Ferreira Reis — A Amazônia e a Cobiça Internacional,
1968; Teixeira Soares — Um G rande Desafio Diplomático no Século Passado
(Navegação e Limites na Amazônia. Missão de Nascentes de Azambuja a Bogotá),
1971; T eixeira Soares — História da Form ação das Fronteiras do Brasil, 1972;
Castilhos Goycochea — O Espírito M ilitar na Questão A creana, 1973; Leandro
Tocan tin s — Formação História do A cre, 3 vols., 1972; Afonso Arinos — Rodrigues
Alves, vol. I, 1973, gágs. 249 e segs.; Moniz Bandeira — Presença dos Estados
Unidos n o Brasil, 1973; Alan K. M anchester — Preem inência Inglesa no Brasil,
1973; G eneral Meira Mattos — Brasil. Geopolítica e Destino, 1975; Craveiro Costa

1103
__A Conquista do Deserto Ocidental, 1974; Wayne A. Selcher — Brazil’s Multi­
lateral Relations, 1978; J o s é H on orio Rodrigues — Independencia; Revolução e
Contra-Revolução, vol. 5 (A política internacional), 1975; A. F. de Oliveira Freitas
— Geopolítica Bandeirante, 2 vols., 1975; Stanley E. Hilion — O Brasil e as Grandes
Potências, 1977; Ja n Knippers Black — United States Penetration o f Brasil, 1977;
Roberto Gambini — O D uploJogo de Getúlio Vargas, 1977; Thom as E. Skidmore
— O papel do Brasil em face do sistema internacional: implicações com relação
à política norte-am ericana, in O Brasil na Década de 70, organizado por Riordan
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Portugueses y Brasileños hacia eí Rio de La Plata. Informe G eopolítico (1816),
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do Brasil, Fixação das raias com o Uruguai e o Paraguai, 1951; General Meira
Mattos — A Geopolítica e as Projeções do Poder, 1977; General Golbery do Couto
e Silva — Geopolítica do Brasil, 1967; Paulo Schilling — El Expansionism o Brasi­
leño, 1978; Mario Travassos — Projección Continental del Brasil, 1978; William
L. Ascher — Brazil’s Future Foreign Relations, in The Future o f Brazil, coordenado
por William H. Overholt, 1978, págs 49 e segs.; Brady B. Tyson — Brazil, in Latin
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lateral, in Revista Brasileira de Estudos Políticos, n !! 52, janeiro de 1981, págs. 147
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Rodrigues — Brasil e África; Outro H orizonte, 1982; Stanley Hilton — Brasil-Ar­
gentina, in H élio Jaguaribe e outros — Leituras de Política Internacional, 1982,
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Antônio Silva Seitenfus — O Brasil de Getúlio Vargas e a Form ação dos Blocos:
1930-1942. O processo de envolvimento brasileiro na II Guerra Mundial, 1985;
Moniz Bandeira — Brasil-Estados Unidos. A Rivalidade Em ergente (1955-1988),
1989; Pedro Soares Martínez — História Diplomática de Portugal, 1986; Sílvio
Meira — Fronteiras Setentrionais. 3 Séculos de Lutas no Amapá, 1989; Synesio
Sampaio Goes — Navegantes. Bandeirantes. Diplomatas, 1991; Gerson Moura —
Sucessos e Ilusões. Relações Internacionais do Brasií durante e após a Segunda
Guerra Mundial, 1992; Amado Luiz Cervo — As Relações Históricas en tre o Brasil
e a Itália; o Papel da Diplomacia, 1992; Moniz Bandeira — Estado Nacional e
Política Internacional na América Latina. O continente nas Relações Argentina-
Brasil (1930-1992), 1993; Vaíentim A lexandre — Os Sentidos do I m p é r io , 1992;
Temas de Política Externa Brasileira II, organizad ores Gélson Fonseca Jú n io r e
Sergio H enrique Nabuco de Castro, 2 vols., 1994; O Desafio Internacional. A
política exterior do Brasil de 1930 a nossos dias. Amado Luiz Cervo (organizador),
1994; Gonçalo de Barros Carvalho e M ello Mourão — A revolução de 1817 e a
História do Brasil, 1996; Amo W elling e Maria Jo sé C. de W elling — Formação
do Brasil Colonial, 1994;José Honório Rodrigues e Ricardo A. S. Seitenfus — Uma
História Diplom ática do Brasil, 1995; M anuela Mendonça — As Relações Externas
de Portugal nos Finais da Idade Média, 1994; Paulo G. F. Vizentini — Relações
Internacionais e Desenvolvimento, 1995; Clodoaldo Bueno — A República e sua
Política Exterior (1889 a 1902), 1995; Shiguenoli Miyamoto — G eopolítica e Poder

1104
no Brasil, 1995: Leonel Itaussu Almeida M ello — Argentina e Brasil. A balança de
Poder no Cone Sul. 1996. DemétriOaMagnoli — () Corpo da Pátria. Imaginação
Geográfica e política externa no Brasil (] 808-1912), 1997; Paulo Fagundes Vizentini
— A política externa do regime militar brasileiro. 1998; Paulo Roberto de Almeida
— Relações internacionais e política externa do Brasil, 1998; Jo sé Calvet de Ma­
galhães— Breve Histórico das Relações Diplomáticas entre Brasil e Portugal, 1999:
Samuel Pinheiro Guimarães — Quinhentos Anos de Periferia, 1999. Eugenio
Vargas Garcia — O Brasil e a Liga das Nações (1919-1926), 2000; Amado Cervo
e José Calvet de Magalhães — Depois das Caravelas. As Relações entre Portugal e
Brasil 1808 — 2000, 2000; Eugênio Vargas Garcia — Cronologia das relações
internacionais do Brasil, 2000. Historia das Relações Internacionais do Brasil;
organizadores Raul M endes Silva e Clovis Brigagão, 2001; Afonso Arinos, Filho —
Diplomacia Independente, 2001, Fernando de M ello Barreto — Os Sucessores do
Barão 1912 — 1964, 2001; Paulo Roberto de Alm eida — Formação da Diplomacia
Económica no Brasil, 2001, Sergio Dáñese — Diplomacia Presidencial, 1999.
2. Este tratado apenas reconhecia a Portugal as terras descobertas e por
descobrir abaixo das Canarias até Guiné (com exceção das próprias Canárias, que
pertenciam à Espanha). A Espanha também reconhece como sendo de Portugal
as ilhas da Madeira e dos Açores. A Santa Sé aprovou este tratado.
3. As bulas papais davam ao autor do descobrim ento direito sobre as terras
descobertas. A simples descoberta dava apenas um direito de preferência ao seu
autor. O título de “propriedade” era dado pela bula papal.
4. Por inúm eras bulas, como a “Eximiae Devotionis” e a “Dudum Sequidem ”,
ambas de 1493, A lexandre VI continuou a dim inuir e a revogar as doações feitas
a Portugal pelos papas que o antecederam .
4A. Existem várias interpretações sobre estas bulas. Para alguns (Staedler) elas
são simples projetos espanhóis. Outros (Gottschalk) falam também na influência
da diplomacia portuguesa, que impediu uma expedição definitiva da primeira bula
“Inter coetera” . Outros (Alfonso García Gallo) afirmam que houve uma “ concessão
simultánea” . E de se recordar que o Papa C lem ente VII, ao negociar com a França
em 1533, declara que a primeira bula “Inter co e te ra” náo abrangia as descobertas
de Verazano. O papa afirma que a bula apenas declarava que a Espanha ficaria
com as terras descobertas por ela e não com todas as terras que fossem descobertas
(v. Lundoff Fahl — El Principio de Ia Libertad de los Mares, 1974, págs. 44 e
segs.).
4B. Foi confirm ado pelo Papa Jú lio II pela bula “ Ea quea pr.o bono” .
5. Era dado aos navios da Espanha o direito de passarem nos mares portugueses
a fim de que pudessem atingir os seus domínios.
6. E verdade que a distância entre as ilhas era pequena.
7. D. Sebastião morrera na África e o seu sucessor, o Cardeal D. Henrique,
não deixara por sua vez sucessor.
8. A Espanha, no O riente, não respeitara o que fora estipulado em Tordesilhas,
avançando para dentro do que seria dom ínio de Portugal.
9. Observa Renato de Mendonça que há uma ironia no Tratado de Madri,
porque ele provocara uma guerra na América, quando a Europa se encontrava
em paz.
9A. Este tratado era considerado prejudicial a Portugal, porque consagrava a
conquista de Olivença e Jurum enha (na Europa) pela Espanha. D. Jo ã o VI, em
1808, no Rio de Jan eiro , o declarou nulo.

1105
10. V. c a p í t u l o X X X V I I I .
11. Esia questão não interessa diretam ente ã matéria ora estudada, mas é de
importância para o Dl.
12. Podemos acrescentar que Canning, primeiro-ministro inglês, era defensor
das antigas colônias do Novo Mundo.
13. A razão deste pagamento tem sido objeto de disputas entre os estudiosos
da nossa história. H élio Viana e André Gonçalves Pereira sustentam que nós
assumimos uma parte da dívida pública portuguesa. Lafayette Rodrigues Pereira
e H. Accioly sustentam tese contrária, afirm ando que o pagamento tinha por objeto
indenizar D. Jo ã o VI pelas suas propriedades deixadas no Brasil e, ainda, para
atender a algumas reclam ações de cidadãos portugueses. Essa última interpretação
parece-nos ser a mais certa no caso brasileiro, apesar de ela não estar de acordo
com a doutrina predom inante do Dl na matéria.
14. A Argentina queria obrigar o Brasil a auxiliá-la em uma luta civil que se
travava em seu território. E que Urquiza pretendia que o Brasil o auxiliasse a
integrar Buenos Aires, que estava revoltada, na Confederação; Dem étrio Magnoli
— O Corpo da Pátria. Imaginação Geográfica e política externa no Brasil (1808-
1912), 1997; Paulo Fagundes Vizentini — A política esterna do regim e militar
brasileiro, 1998; Paulo Roberto de Almeida — Relações internacionais e política
externa do Brasil, 1998; Jo sé Calvet de Magalhães — Breve Histórico das relações
Diplomáticas entre Brasil e Portugal, 1999; Samuel Pinheiro Guimarães — Qui­
nhentos Anos de Periferia, 1999.
15. O Im pério pouco antes havia recusado proposta argentina sem elhante.
16. Elas foram encontradas em Sim ancas por Xavier de Lima.
17. Na verdade, o direito brasileiro era perfeito e o intemacionalista argentino
Ruiz M oreno conta que Zabellos dissera que “o culto da história exige afirmar
que o Brasil tinha razão na questão das missões”. Assinala este mesmo intem acio­
nalista que a Argentina, ao contrário do Brasil, possuía um material m uito defi­
ciente para se defender. Podemos acrescentar que no recenseam ento feito na
região contestada, em 1890, a sua população era quase toda brasileira e entre os
poucos estrangeiros não havia nenhum argentino.
17A. Gabriel Piza, -diplomata brasileiro na França, reivindicou que foi ele
quem sugeriu o governo suíço para arbitro.
I7B . Escreve Caio Prado Junior: “ é por um concurso ocasional de circunstân­
cias felizes que toda esta região ao norte do rio Amazonas, no território atual do
Estado do Pará, e que nunca ocupamos, com ninguém mais, cou be ao Brasil.
Quando se discutiu’ o. Tratado de U trecht (1713) e se abordou pela primeira vez
a questão dos limites setentrionais das possessões portuguesas na América, a In­
glaterra tinha interesse em excluir a França do rio Amazonas, cujo valor estratégico
ela com preendia. Pleiteou então para seu aliado e vassalo o português, e obteve,
da França, vencida, o reconhecim ento do dom ínio lusitano em toda a bacia do
Amazonas. É este título que valeu mais tarde ao Brasil, quando discutiu com a
França a soberania da região” (Formação do Brasil Contem porâneo, 1973, pág.
69).
18. Segundo Arthur Cesar Ferreira Reis a proposta brasileira de neutralização
é de 1842, mas ela só foi aceita pela Inglaterra em 1843.
19. Integravam a missão brasileira: Graça Aranha e Raul do Rio Branco.

1106
20. No Dl o árbitro só pode decidir por eqüidade se receber pa c h e s expressos
para isto, o que não houve no caso.
Por outro lado. Tavernir assinala que há urna tendencia nos jufzcs de aplicarem
um costume novo que “corresponde à consciencia ju rídica de su a época” a casos
anteriores à form ação deste costume.
21. Alguns autores narram fatos que dem onstram ter o rei da Italia dado o
laudo sem a imparcialidade que se espera de um árbitro.
2IA. Durante a União das Coroas Ibéricas a Espanha não cuidou da A m azon ia,
o que permitiu o avanço de Portugal.
22. Este mapa é o último de três outros elaborados por Duarte da Ponte
Ribdro e por Isaltino Jo sé Mendonça de Carvalho em 1860. Serviu de base para
o Tratado de 1867. Estes mapas foram organizados para auxiliar as negociações
de Rego M onteiro. Uma destas linhas era de c o r verde. Existem linhas de cor
amarela e de cor vermelha. Eram meras hipóteses. Acrescenta ainda Leandro
Tocantins que o mapa perdeu o seu valor, tendo em vista que as negociações de
Rego Monteiro fracassaram. Alguns autores (Leandro Tocantins) consideram que
o mapa da linha verde não exerceu maior influência no Congresso, tendo em vista
que ele demonstraria ser o território boliviano.

1107
CAPÍTULO XL

MODOS DE AQUISIÇÃO DE TERRITORIO.


MODOS ORIGINÁRIOS1

407 — Classificação dos modos de aquisição de território; 408 —


Ocupação: a) Ccmceito e elementos; b) Fundamento; c) Histórico; d)
Teorias sobre o alcance da ocupação; e) Conseqüencia da ocupação; f)
O denominado direito intertemporal; g) Conclusão; 409 — Acessão: a)
Definição e classificação; b) Acessão natural; c) Acessão artificial.

407. O Estado pode adquirir territorio por diferentes modos. A clas­


sificação deles, que vem do direito romano, através do direito privado,
mais adotada, é a de originários e derivados.2
Os modos origínanos são os que permitem a um Estado adquirir
território que não pertencia a nenhum outro Estado antes da sua aquisição.
Os modos derivados são os que permitem a um Estado adquirir terri­
torio quê pertencia a outro Estado antes da sua aquisição. Nestes casos há
uma transferência de soberania, que não ocorre nos modos originários.
O territorio já tinha um dono anteriormente.
P A enumeração de quais são os modos originarios e derivados não é
/ feita de modo uniforme pelos doutrinadores.3 Para nós os modos originá-
' rios são: ocupação e acessão.
Os modos derivados são: cessão, adjudicação,1 conquista e prescrição
( aquisitiva." Na verdade, esta separação entré os diversos modos não é rígida,
¡ üma vez que a acessão não se manifesta em todos os casos como modo
originario. Esta classificação só tem valor didático, porque na prática é
--^difícil distinguir, por exemplo, a prescrição aquisitiva da ocupação.
Os modos de aquisição de territorio quanto à sua natureza são trans­
ferencias de competência entre os Estados, ou, ainda, o’ estabelecimento
de competências por uni Estado em território sem dono, como ocorre na
ocupação (Rousseau).

1109
(408'í A ocupação foi considerada por Hugo Grolius como sendo o
verdadeiro modo originário e natural de aquisição do território.
a) A ocupação aqui estudada deve ser distinguida da ocupação militar,
porque esta última não é modo de aquisição de território, vez que ela não
dá ao ocupante direito de soberania sobre o território ocupado.
A ocupação, modo de aquisição de território, é a tomada de posse ppr
umEstadcTde um território quò hão pertença a outro Estado.
À doutrina (Accioly) tem apresentado três elementos para que se
configure a ocupação:
1 — ela deve recair sobre território “res nullius” ou sobre “res dere-
licta”,6 isto é, que não pertença a um Estado.6A Incluem-se nesta categoria
os territórios habitados por tribos indígenas, mas que não pertençarrra
um Estado “civilizado”. No caso do “Western Sahara”, a CIJ, em 1975,
considerou que a presença de tribos nômades com um certo grau de
organização política e social impede que o território seja considerado
“terra nullius" (J. Crawford). Para Ammoun a noção de “terra nullius”,
desenvolvida após a Conferência de Berlim (1885), serviu para justificar a
divisão da África.68 Pode-se acrescentar ainda que ela negava os direitos
das populações indígenas, sob a alegação de que elas não eram Estados.
Segundo Bedjaoui “res nullius” era, no direito romano, o que não era
romano; na Idade Média, o que não pertencia a um soberano cristão; no
século XIX, o que não pertencesse a um estado civilizado europeu e “não
organizado ou forma o modelo político-jurídico europeu”;
2 — a tomada de posse deve ser realizada por um Estado, uma vez
^ ue só ele pode adquirir território na ordem jurídica internacional;
3 — a posse efetiva, que deve assim reunir o “corpus” e o “animus” .
A efetividade, como requisito da ocupação, foi consagrada na Conferência
de Berlim, em 1885.7 Ela não significa que o Estado necessite ocupar todos
os pontos do território, bastando que o Estado ocupe locais do território
para que possa dominá-lo (La Pradelle e Politis). Outros autores (Astoko-
letz e Fauchille) têm apresentado ainda outro elemento, que é o da noti­
ficação, que teria a vantagem de evitar conflito, uma vez que estabeleceria
sempre qual era o primeiro ocupante. Na verdade, esta vantagem é apre­
ciável; entretanto, ela perdeu muito do seu valor, já que atualmente não
existem territórios a serem ocupados.8 Nos dias de hoje não existe norma
de Dl que consagre a notificação como requisito da ocupação.
b) A questão do fundamento da ocupação tem sido abandonada pelos
modernos doutrinadores.9 Ele pode ser resumido em que'é um fato, que
reunindo certos elementos produz efeitos jurídicos. Na verdade, o funda­
mento último da ocupação é norma internacional que a consagra. Ela dá
ao fato que reúne certos requisitos o poder de produzir efeitos jurídicos.
E tal norma existiria porque não interessa para a sociedade internacional
que territórios fiquem sem aproveitamento.
c) O'histórico da ocupação tem sido dividido de maneira uniforme-
pelos estudiosos: Ia período — o das bulas papais; 2a — o do direito da
descoberta; 3a — o da influência do direito romano e da efetividade; 4a
— o que se inicia com o Tratado de Saint-Germain.
1® Período — o das bulas papais — Como já vimos, houve um período
na Historia em que os papas doavam as terras aos principes cristãos. Nesta
época a ocupação não tinha valor, uma vez que o título de propriedade
das terras era dado pela bula papal Ajurisdição universal do papa era dada
pela doutrina canônica medieval e formulada no século XIII por Hostiensis
e Augustinus Triumphus. Esta idéia foi combatida pelo Renascimento e o
Renascer do D. Romano (H. Johnson, in Colonial Brasil, coordenado por
Leslie Bethell, 1987).
Para Bodin as bulas papais tornavam o rei da Espanha feudatario da
Santa Sé. A defesa da existência de uma relação feudal está também em
Weckmann. Entretanto, a opinião dominante (García Gallo) é de que tal
não ocorreu.
O papa começou a perder a sua supremacia na segunda metade do
século XVI.
Na América, devido aos corsarios e piratas franceses, holandeses e
ingleses no Caribe, bem como em virtude de estabelecimentos destes países
no Canadá, Virgínia, Guiana, etc., a Espanha foi obrigada a abandonar os
direitos que as bulas lhe tinham conferido. Em 1670 foi concluido o
Tratado de Madri entre Espanha e Inglaterra, em que foram reconhecidos
os dominios ingleses na América (sobre este assunto, v. Mario Góngora —
Studies in The Colonial History of Spanish America, 1975).
2BPeríodo •— o do direito da descoberta — Nesta fase a ocupação não
tem ainda relevância para a vida internacional. O importante é a desco­
berta. Tem direito às terras o Estado que as descobriu. O Papado, com a
Reforma, perdera a sua influência.10 Não interessa a posse efetiva do ter­
ritório; é suficiente a tomada de posse, por exemplo, com a colocação de
um estandarte.
3a Período — o da influência do direito romano e da efetividade —
O descobrimento como meio de aquisição de território começara a ser
criticado, porque o seu conceito não era fixado: era apenas ter visto ou
necessitava ainda ter desembarcado nas novas terras? O descobrimento
passou a ser considerado, diante disto, um título embrionário (“inchoale
title”), que não era suficiente para dar ao Estado descobridor um direito
definitivo sobre as novas terras.11 No final do século XVI, a França e a
Inglaterra já negavam que o descobrimento sozinho desse direito ao ter­
ritório.
No século XVII, Grotius leva para o Dl os requisitos do D. Romano
para a ocupação: a) o “animus” (isto é, o elemento subjetivo: a “intenção
de adquirir”) e b) o “corpus” (isto é, o elemento material; “a realização
desta vontade por uma tomada de posse material”) .12

1111
A efetividade da ocupação veio encomi ar sua consagração definitiva
na conferência africana de Berlim, onde se reuniram 14 Estados (Alema­
nha, Bélgica, Itália, Rússia, Grã-Bretanha, Suécia-Noruega, Portugal, EUA,
Áustria-Hungria, Dinamarca, Turquia, Países Baixos, França e Espanha).
As suas reuniões tiveram início em 1884 e em 26 de ftfVeTeiro de 1885
assinaram o “Ato Geral”, que se destinava a “regulamentar a liberdade de
comércio nas bacias do Congo e do Niger, como as novas ocupações de
territórios na costa ocidental da África”. Os requisitos da ocupação no
litoral africano foram determinados nos arts. 34 e 35 do Ato Geral. O art.
34 fixou uma condição, de forma que era a notificação. O Estado, ao
efetuar uma ocupação, teria que notificá-la aos demais signatários do Ato
Geral. A condição de fundo foi estabelecida no art. 35: a ocupação deveria
ser efetiva. O Estado deveria dominar o território ocupado.
Procura-se cpm este requisito eliminar teorias da natureza política que
procuravam justificar as ocupações fictícias (ex.: teoria da zona hidrográ­
fica). A efetividade, entretanto, não era exigida para os protetorados, onde
se necessitava apenas de notificação. Surgiu assim a figura do protetorado
colonial, que permitia às grandes potências colocarem sob sua influência
grandes áreas territoriais sem necessitar de fazer nelas uma ocupação
efetiva.13
O alcance do Ato Geral de Berlim é contudo limitado: a) ele só é
obrigatório para os seus signatários; b) só se refere à costa africana e c) só
é aplicável à ocupação que venha a ocorrer no futuro.
Entretanto, a efetividade da posse pela jurisprudência e prática inter­
nacional passou a ser aplicada a outras regiões do globo. Dentro desta
orientação, o Papa Leão XIII, mediador na questão das ilhas Carolinas e
Palaos, entre Espanha e Alemanha, reconheceu à Espanha direito às ilhas
(1885) com base nos seus direitos históricos,14 mas instava para que a
Espanha tomasse a sua ocupação mais efetiva. A Inglaterra e a Alemanha,
de comum acordo, passaram a aplicar efetividade no interior da África,
como na região do lago Chade.
4a Período — o que se inicia com o Tratado de Saint-Germain — Foi
o tratado de Paz com a Áustria após a P Guerra Mundial. Concluído em
10 de setembro de 1919, revogou os arts. 34 e 35 do Ato Geral de Berlim.13
Tal fato decorreu, como já dissemos, da ausência de terras a serem ocu­
padas. E mesmo de se assinalar que as únicas regiões ainda a serem ocu­
padas eram as polares, onde exatamente o princípio da efetividade não
podia ser aplicado.
Ch. Rousseau observa que ó princípio da efetividade passou a ser
abandonado: a) na doutrina, que passou a sustentar não ser necessária
uma ocupação molecular; b) na Convenção de Saint-Germain, que revogou
o Ato de Berlim; c) nos litígios sobre as ilhas Spratly, em 1933 (França e
Japão), nas ilhas Paracels (1938 e 1947), entre a França e a China, nas
ilhas de Cantão e Enderbury (1937-1938), entre EUA e Inglaterra a efeti­
vidade leve pouca relevância; d) Inúmeras leorias procuraram fixar a área
abrangida peJa ocupação e tiveram um pape) preponderante até o Ato
Geral de Berlim, que foi exatamente uma reação contra elas.
Teoria da contigüidade — declarava que o Estado que ocupasse de­
terminado litoral ou uma ilha leria direilo às ilhas adjacentes (Giuliano).10
Teoria da continuidade — o Estado que ocupasse o litoral teria direito
ao território que se encontrasse no interior.
Teoria do “hinterland”,1' ou das zonas de influência — tem o mesmo
alcance e significado da teoria da continuidade. Entretanto, a palavra
“hinterland" visa mais a região que for “necessária e natural” em torno
de um núcleo de ocupação. Já a expressão “zonas de influência” surgiu
na prática diplomática para designar certas zónas que ficaram “reservadas”
a determinados Estados. Esta teoria, de qualquer modo, leva a uma ocupa­
ção fictícia. Ela foi consagrada em diversos tratados.
Teoria da meia distância — a linha divisória entre dois pontos ocupados
no litoral por Estados diferentes, cujos limites são incertos, deverá ser a
linha da meia distância.
Teoria da zona hidrográfica — o Estado que dominar a embocadura
de um rio tem direito a toda a região banhada pelo rio e seus afluentes.
Apresenta ainda uma outra formulação: o Estado, ao ocupar o litoral, teria
direito à região localizada entre ele e o divisor de águas dos rios que
deságuam no litoral ocupado. Esta teoria, evidentemente, não se aplica
quando já existe ocupação por outros Estados na região. Em 1805 os EUA
(John Quincy Adans) ocupa a Luisiana, afirmando que quem tem a foz
de um rio tem direito a toda a sua bacia (Marc Ferro — História das
Colonizações, 1996).
Teoria da zona orográfica — praticamente não encontrou aceitação.
Ela procura dar às montanhas o mesmo papel que a teoria da zona hidro­
gráfica dá aos rios.
Teoria dos limites naturais — o Estado teria direito ao território que
constituísse um todo homogêneo com o litoral ocupado.
Estas teorias só tiveram uma finalidade: a ocupação do continente
africano. A sua aceitação na doutxina foi mínima e atualmente não apre­
sentam qualquer valor.
e) A ocupação apresenta para o Dl algumas conseqüências importan­
tes: 1) o território ocupado'passa a fazer parte do território do Estado
ocupante; 2) o território ocupado entra no ámbito do Dl, uma vez que
ele passa a integrar o território de uma pessoa internacional; 3) o ocupante
passa a ser responsável internacionalmente pelos atos que nele ocorrem;
4) o território não pode ser-ocupado por outro Estado.
f) O princípio intertemporal significa que, quando existe um litígio
internacional sobre a ocupação de um determinado território, aplicar-se-á
o direito vigente na época da ocupação.

1113
A jurisprudência e a doutrina usam da expressão “período crítico”"*
“no sentido que a decisão de um modo ou de outro se fundamentaria
largamente no que seria considerado a posição do Estado àquela data”
(Jennings). Assim, na arbitragem da ilha de Palmas, os EUA afirmavam
que haviam recebida a ilha da Espanha no Tratado de Paris de 1898. Em
conseqüência, a questão consistiria'em saber se a Espanha tinha soberania
sobre a ilha naquela data para que pudesse transferi-la.19
Entretanto, este período crítico não é possível ser estabelecido em
todos os litigios, porque muitas vezes só é possível fixar a data em que ele
foi, por exemplo, submetido a arbitragem.
De qualquer modo, ele não deve ser determinado de maneira a priori
mas deve ressaltar da análise da questão.
g) Aréchaga, após analisar a jurisprudencia internacional sobre ocupa­
ção, fixa as seguintes conclusões: 1) a posse efetiva por meio de núcleos
de ocupação foi substituída pelo exercício “de funções de governo no
território”; 2) a ocupação implica no “dever de proteger os direitos de
outros Estados e de seus nacionais, assegurando a estes a proteção mínima
exigida pelo D F ; 3) a “intenção da posse”, isto é, o ocupante deve assumir
no território ocupado “a mesma autoridade e responsabilidade perante
os demais Estados, que possui em relação ao seu território originário”; 4)
os atos de particulares na região não conferem direito a ela, a não ser que
eles estejam agindo em nome de um Estado; 5) a efetividade será exigida
conforme a região ocupada, levando-se em consideração se é região habi­
tada jau não, se é acessível ou inacessível, etc.20
ÇíOÕyá) A acessão é um modo que se originou no direito privado, como
deniohstra a sua denominação. De umjxiodo geral, a regra básica do
Direito Civil neste assunto é também aplicada no Dl: “acessorium sequitur
principali” ou “accesio cedit principali” (“a coisa acrescida segue a sorte
da coisa principal”).
B) A ^cEssaõ liatural pode ocorrer em virtude de quatro fenômenos:
aluvião, avulsão, aparecimento de ilhas e desvio do leito do rio.
0(àluviã<^ ocorre nas fronteiras de água e é o aumento territorial
provocaclõ'naturalmente e de maneira gradual por “aterros naturais”.
A(ãvúlsaõsé o aumento territorial provocado por um fenômeno natural
em que pedaços de terra se desprendem de um Estado para se localizarem
em outro Estado. Ao contrário do aluvião, que é um fenômeno lento, a
avulsão é um fenômeno rápido A avulsão não é propriamente um modo
originário de aquisição do território, uma vez que as terras já possuíam
outro soberano e se tem mesmo afirmado que o beneficiário deverá pagar
uma indenização (Louter, O ppenheim ).21
O ^ij^ecim effíqcfêilhas'lé um fenômeno comum no O ceano Pacífico,
cujo leito possui inúmeros vulcões. Se a ilha surgir no limite do mar
territorial do Estado, ela passa a estar sujeita à sua soberania, e o mesmo
ocorre se ela aparecer na linha de respeito (linha que separa o mar
te rrito ria l (lo a lt o - n w ). A s o b e ra n ia d o E stad o se instala a u to m a tic a m e n te
nestas ilh as, c o m o o co rre co m os a c ré sc im o s territo riais p ro v o cad o s por
aluvião. N e ste caso estu dad o, h á a u m e n to territo rial, p o rq u e estas ilhas
p o ssu irão m a r territo rial p ró p r io .22
O desvio do leito do rio) é outro caso em que a acessão não é modo
originario cTcTaquisição, mas'sim um modo derivado. Se o rio é navegável
e o seu leito se desvia, tem-se pacificamente admitido que o limite dos
dois Estados acompanhará o leito do rio. Se o desvio trouxe aumento
considerável de território, o beneficiario disto deverá indenizar o outro
Estado. A grande questão está em saber como proceder nos rios não
navegáveis. A doutrina está dividida: uns (Bluntschli) consideram que o
limite deve permanecer no leito seco (não haveria neste caso aquisição de
território),23 outros (Anzilotti, Accioly) consideram que o limite deve acom­
panhar o novo leito do rio.2,1 Esta segunda opinião nos parece ser a mais
acertada, uma vez que o Estado pode ter interesse em conservar a sua
fronteira no curso de água e mesmo a navegação não é a única finalidade
dos rios.
A jurisprudência internacional registra sobre acessão natural um caso
dos mais interessantes, que é o “El Chamiza]”, entre os EUA e o México.
O banco de terra (600 acres) “El Chamizal” teria passado para os EUA
por avulsão (segundo o México) ou por aluvião (segundo os EUA).2’ O
tratado de limites fixava que a fronteira entre os dois países seria o talvegue
do Rio Grande. A decisão arbitrai (1911) foi salomónica, afirmando que
as alterações até 1864 tinham ocorrido por aluvião e assim pertenciam aos
EUA, enquanto as posteriores modificações teriam ocorrido por avulsão e
pertenciam ao México. Os EUA se recusaram a cumprir a decisão, ^legando
que o tribunal não poderia dar uma decisão por eqüidade.26 A questão só
veio a ser definitivamente resolvida por meio de um tratado entre os dois
países, em 1963, onde foi feito um acerto de fronteiras entre os EUA e o
México.
c) A acessão artificial é o aumento de território provocado pelo tra­
balho humano. Exemplo: aterros, diques, etc. O aumento territorial ocorre
porque o mar territorial será medido a partir destas construções. Se tais
construções são realizadas nos rios, não há o referido aumento, ocorre
apenas quç o território fluvial se transforma em território terrestre.

1115
NOTAS
]. Gastón Jèze — Étude Théorique el Pratique sur l'O ccupalion, 1896; Ch.
Salomón — L’Occupation des Territoires sans Maitre, 1889; R. Y. Jennings — T h e
Acquisition of Territory in International Law, 1963; Am onio Amaral de Sampaio
— A evolução histórica da ocupação em Direito Internacional, in BSBDI, jan eiro -
dezembro, 1958, nQs 27 e 28, págs. 70 e segs.; J . P. A. François — Réflexions sur
l'occupation, in Recueil d ’Études de Droit International en Hommage à Paul
Guggenheim, 1968, págs. 793 e segs.; Arthur S. Keller, O liverJ. Lissitzyn e Frederick
J . Mann — Creation o f Rights o f Sovereigntv through Symbolic Acts 1400-1800,
1967.
2. Outras classificações podem ser registradas: a) naturais (acessão) e ¿^jurí­
dicas (os demais), é a de Rivier; a) jurídicas (ocupação, cessão, prescrição aquisitiva
e adjudicação); b) geográfica (contigüidade); c) histórico-polílica (conquista), é a
de Rousseau.
Podemos m encionar com interesse meramente histórico os modos antigos de
aquisição de território: casam ento, sucessão hereditária, doação e o instituto me­
dieval em que um senhor cedia parte de seus territórios em troca de proteção
para o resto de seu território, etc.
3. Os modos originários sào: ocupação, acessão, conquista e prescrição (Bon-
fils); ocupação e acessão (Lawrençe); ocupação (D espagnet); etc.
4. A adjudicação também nem sempre é modo derivado.
5. Alguns autores (Verykios) assinalam que a prescrição pode ocorrer em
territórios sem dono, e dá este doutrinador um exem plo: em território que o
Estado ocupa, mas não se sabe se ele tem dono ou não. A ocupação poderia ser
contestada, o que não ocorreria com a prescrição, que resolveria a questão. Neste
caso não se sabe se a prescrição teria sido modo originário ou derivado, isto é, se
o território já teria dono ou não.
A grande confusão entre a ocupação e a prescrição é que no Dl as palavras
muitas vezes não são utilizadas no seu verdadeiro sentido (O ’Connell). A distinção
entre os dois institutos é que o segundo, para produzir efeito, precisava de uma
posse por longo tem po. Entretanto, ao lado desta, podemos acrescentar que a
prescrição visa extinguir os direitos de um outro Estado no território. Ela ocorre
em territórios que j á possuíam dono. A hipótese de Verykios é válida, mas se
apresenta raramente, o que não invalida a prescrição com o modo derivado.
6. A Inglaterra, quando ocupou a ilha da Trindade, alegou que ela era “ res
d erelicta” . Entretanto, o Brasil demonstrou que nunca tivéramos intenção de
abandoná-la. Para que se confirm e a “derelictio" é necessário não apenas o aban­
dono material do território, mas também a intenção de abandoná-lo.
6A. Tem-se considerado com toda razão que um território ocupado por po­
pulações nômades não deveria ser “ res nullius” . A tese imperialista é que sustentou
posição contrária (Bedjaoui).
6B. M. Bedjaoui traça a seguinte evolução: a) em Roma « “nullius" o que não
é rom ano; ijn o s séculos XV I e XVII é “nullius” o que não pertence a um soberano
cristão; c) no século X IX é “ nullius” o que não pertence a um Estado civilizado.
7. O “uti possidetis de facto” na América é a consagração da posse efetiva.
8. Sobre as regiões polares, v. capítulo XLII.

1116
9. Entre os mais am igos doutrinadores podernos m encionar: a) os territórios
que não fossam apropriados pertenceriam em comum a todos os Estados, a ocupa­
ção teria surgido para acabar com os inconvenientes desta "com unhão" (G roiius;:
b) o seu fundamento estaria no direito natural precisam ente na igualdade dos
Estados ^Vattel); c) o seu fundam ento seria o direito de existência, o Estado para
sobreviver poderia se utilizar dos territórios sem dono (Kluber); etc.
10. Amores católicos, com o Vitória, criticaram a atribuição de terras pelo papa
por meio de bulas.
11. Huber. no caso da ilha de Palmas (1928), declarou que “o título em brio­
nário da descoberta deveria ser completado em um período razoável” .
12. Para Grotius, descobrir (“invenire” ) significa também “aprender" (Ver-
d ross). a
13. Sobre o protetorado colonial, v. capítulo X X X IX .
14. Alguns autores (O ’C onnell) falam em “direitos históricos” com o modo
de aquisição d£ território. Esta expressão significa para o intemacionalista austra­
liano que um “título foi criado em derrogação do Dl através do processo histórico
pelo qual um Estado consolidou uma jurisdição originalm ente ilegal e com isto
concordou a comunidade das nações”. Este modo se manifesta acima de tudo em
territórios marítimos (ex.: baías históricas) e estaria consagrado na jurisprudência
da CIJ no caso das pescarias anglo-norueguesas. A prescrição ocorreria em terri­
tório pertencente a um Estado, enquanto os direitos históricos ocorreriam em
território “pertencente” à sociedade internacional.
15. Fauchille considera que este período é uma regressão em relação ao
anterior.
16. A contigüidade é considerada por Rousseau com o modo autônom o de
aquisição territorial; é o m odo geográfico na sua classificação. Ela se manifestaria,
entre outros modos, no sistema das zonas de influência utilizado pelo imperialismo,
etc. Na verdade, a contigüidade sozinha não dá território ao Estado, uma vez que
zona de influência não é integrada no território estatal, bem com o o “hinterland”
é manifestação da ocupação, com o veremos. Neste m esmo sentido, que a conti-
güidade não é um modo autônom o mas “aspecto da posse” :J e n nings. Finalmente,
podem os acrescentar que esta distinção entre contigüidade e continuidade não é
uniform e na doutrina. Aqui adotamos as caracterizações de Giuliano. Entretanto,
autores recentes (P.-M. Dupuy) ainda falam em contigüidade em relação às regiões
polares e aos Estados vizinhos.
17. “Hinterland” é um term o de origem alemã, que significa “região do
in terio r".
18. Max Huber foi o prim eiro a se utilizar desta expressão na arbitragem do
litígio da ilha de Palmas.
19. O que ocorre depois-daquela data não alteraria a questão.
20. Neste caso ocorre a distinção de O ’Connell entre “ ocupação imediata" e
“ocupação por consolidação” . Esta última ocorreria em grandes extensões (ex.:
Austrália) e só com o tem po poderia o ocupante vir a dominar por inteiro o
território ocupado.
21. Diversos autores (Fiore, Vattel) observam que ela acaba sendo no fundo
uma cessão. Esta posição, se tem um aspecto verdadeiro, não é inteiramente
acertada, uma vez que neste caso a cessão seria obrigatória em virtude de princípio
de D l, porque o Estado de onde se despregarem as terras não tem o direito de

1117
se instalar 110 icrritório do outro alegando que aquelas Ierras são s\ias. Ora, na
acessão, como veremos, nao existe norma como a acima enunciada. Entretanto,
no caso “El Chamiza)’’ o M éxico ficou com um banco de ierra que se localizara
no lado dos EUA.
22. Sobre as ilhas, pode-se acrescentar que, se elas surgirem no alio-mar,
próxim o yo mar territorial, o Estado cosieiro lem direito de preferencia sobre
elas. Se surgirem no alto-mar, longe do mar territorial do Estado costeiro, elas
necessitarão ser ocupadas. Se as ilhas surgirem nos rios, el as pertencerão ao Estado
a que pertencer aquela porção do rio. Neste caso, o território estatal não é
propriam ente aumentado, não sendo assim uma aquisição de territorio.
23. Os EUA e o M éxico, em uma convenção de 1884, afirmaram que o limite
seria o talvegue do Rio Grande, ainda que ele viesse a se desviar lentamente por
erosão.
24. O Brasil, ao fazer com o Uruguai a demarcação no Chuí, afirmou que a
fronteira seria no rio, mesmo em caso de desvio de seu leito.
25. As conseqüências das duas teses eram as seguintes: pela norte-americana,
sendo o “El Chamizal” form ado por aluvião, deveria ser aplicado o tratado de
1884, isto é, os limites acom panhariam o novo leito do rio, e tal fato estaria de
acordo com o espirito do tratado. Já segundo o M éxico, o “El Chamizal” seria
formado por avulsão e, em conseqüência, a fronte ira deveria acom panhar o banco
“El Chamizal”.
26. Aréchaga considera que o Tribunal tinha com petencia para dar a decisão
que proferiu se for levado em consideração o preâmbulo da convenção de arbi­
tragem, onde se estabeleceram os poderes do árbitro.

1118
CAPÍTULO X U

MODOS DERIVADOS DE AQUISIÇÃO DE TERRITORIO1

410 — Introdução; 411 — Cessão; 412 — Adjudicação; 413 —


Presciição aqu isitiva; 414 — Conquista.

4 1 0 .'Os modos derivados de aquisição de território são. como já dis­


semos, aqueles em que ocorre uma transferência de soberania. O território
adquirido já possuía um dono anteriormente.
São modos derivados: cessão, adjudicação e prescrição^ aquisitiva. A
História revela ainda a existência de um ou tio: a conquista.
Finalmente, podemos observar que no caso de territórios contestados
tem-se admitido que os terceiros Estados devem considerar como “sobe­
rano” aquele que tem a sua posse.
íÍ Í T j A cessão de território decorre de um acordo entre dois Estados,
em qüê é determinada a entrega de um território por um Estado (cedente)
a outro (cessionário).2 Na cessão há uma transferência de soberania. E um
modo de aquisição de território que veio do D. Privado.*
A cessão pode se apresentar sob três aspectos: a título oneroso, a título
gratuito e jjermuta. '
cessão a título oneroso tem inúmeros exemplos registrados através
da História: a venda da Luisiana pela França aos EUA por 60 milhões de
francos (1803); o Alasca vendido pela Rússia aos EUA por 7.200.000 dólares
(3 867 ).:,A
. Ou, ainda, em 1916, os EUA comprou da Dinamarca as ilhas de São
Thomás, São João e Santa Cruz, nas índias Ocicentáis. por 25.000.000 de
dólares.
A cessão a título gratuito pode ser apresentar de duas maneiras: vo­
luntária e involuntária. A voluntária é rara no mundo'internacional devido
ao egoísmo da política internacional; entretanto, alguns exemplos são
registrados pela História: a cessão da Lombardia à Itália pela França (1859);

1119
o Brasil ceden parte da lagoa Mirim e do riojaguarão ai.) Uruguai, reco­
nhecendo que estes territórios pertenciam ao Uruguai (Tratado de 1909).
A cessão gratuita involuntária é mais comum e no fundo se confunde com
a conquista hoje condenada na ordemjurídica internacional.4 Nesta última
hipótese está o Tratado de Francoforte, em que a França ceden a’ATsácia
e a Lorena à Alemanha (1871).
A permuta é, como diz o seu nome, urna troca de territórios. Esta
modalidade de cessão foi muito usada nas delimitações de fronteiras (ex.:
Brasil e Bolívia fizeram permuta de territorios no Tratado de Petrópolis),
ou, ainda, em política colonial (a Inglaterra cedeu a ilha de Helgoland —
que fechava o acesso ao porto de Hamburgo — à Alemanha em troca de
territorio e do reconhecimento do seu protetorado em Zanzíbar, em 1890).
A cessão engendra algumas questões que têm importancia para o DI.
A primeira delas é a. que. diz respeito ao momento em que o cessionário
tem direito sobre o territorio cedido. Uma corrente (Bluntschli, Fiore)
sustenta que o cessionário só possui um título completo quando toma
posse do territorio, isto é, quando o território é entregue pelo cedente.
Outro grupo de doutrinadores (Verdross, Accioly) sustenta que o cessio­
nário tem direito sobre o território desde que o tratado onde foi estipulada
a cessão teve os seus instrumentos de ratificação trocados, isto é, a entrega
do território não é necessária. A entrega seria apenas o “aperfeiçoamento”
da cessão (Verdross). Esta última posição é a que se encontra consagrada
na prática internacional;5 em 1859, a Austria cedeu à França a Lombardia,
e a França, por sua vez, a cedeu ao Piemonte, sem déla tomar posse.
A outra questão diz respeito ao plebiscito, instituto criado em defesa
da autodeterminação dos povos. Pelo plebiscito a população do território
manifesta-se sobre a cessão.6
A cessão não necessita ser reconhecida pelos terceiros Estados, a não
ser que estes sejam diretamente interessados por terem direitos envolvidos
no território.
E de se acrescentar que o cessionário só pode ter os direitos que
possuía o cedente. E uma regra do direito privado levada para o DI con­
sagrada na jurisprudência internacional no caso da ilha de Palmas. E a
aplicação da máxima “nemo dat quod non habet”. A cessão, sendo resul­
tante de um acordo, deverá ocorrer entre Estados soberanos.'
412. A adjudicação é o único modo de aquisição de território no DI,
cuja denominação não veio do direito privado, mas do direito público
interno (Rousseau). Ela pode ser definida como o modo de aquisição em
que o Estado adquire território por uma decisão de tribunal ou órgão
int e r na cío na 1.8
Estas decisões sobre territorio nem sempre são modo de aquisição,
uma vez que inúmeras delas apenas declaram quem tem direito ao terri­
tório, reconhecendo direito preexistente. Neste caso, a sentença tem um
aspecto meramente declaratorio. Entretanto, as decisões podem ter por

1120
fundamento a eqüidade, caso em que já se configura a aquisição de leí ri­
ló) io. A sentença é o "título pelo qual se adjudica o território' sobre o
qual o Estado muitas vezes não linha direilo.^
A adjudicação, para alguns Estados, opera como modo de perda de
lerriiório, por exemplo, a resolução da ONU rem ando da União Sul-afri-
cana o denominado Sudoeste Africano, que ela considerava como território
nacional.
. 4T3> A prescrição aquisiliva, ou usucapião,10 pode ser definida como
sendo o modo ele aquisição de um territorio “mediante contínuo e não
perturbado exercício de soberania sobre ele durante um lapso de tempo
necessário para criar sob a influencia do desenvolwpento histórico a con­
vicção geraDjU£-o .pre^e'hié'estado, de coisas está ern conformidade com
y orcleni internacional”. (Oppenheim-Lauterpacht).
Ela não tem sido admitida de um modo pacífico no DI. Uma corrente
(Pinto, Reuter, Sereni) nega a sua existencia, alegando que ela só existe
no D. Interno, porque ali há urna lei a consagrando. Outra a aceita (Accioly,
Delbez) e observa que o direito de prescrição existe independentemente
de urna lei o consagrando. Este instituto, que é da maior importancia para
a segurança das relações jurídicas, pertence à ciencia do direito (é um
princípio geral do direito); em conseqüência, não é monopolio do direito
interno.11 A prática internacional tem consagrado este instituto, dando
assim razão à segunda corrente acima exposta: foi utilizado nos litígios de
fronteiras entre EUA e Inglaterra (Canadá). A própria jurisprudência in­
ternacional já admitiu a prescrição: caso da Groenlândia Oriental, caso da
ilha de Palmas, etc.12
O fundamento da prescrição aquisitiva tem sido objeto de debate entre
os intemacionalistas. Os mais antigos (Grotius, Vattel) alegam que ela é
modo de aquisição de territorio porque o Estado que deixa .um territorio
seu por longo espaço de tempo ser suÜníelido a óütro é d e presumir-se
"ler ele renunciado ao seu direito sobre este territorio. Esta teoría não pode
ser aceita porque, se o Estado abandonou os seus direitos em um território,
SlêTènã üma “res derelicta” e, em conseqüência, haveria ocupação. Por
outro lado, se o Estado concordou em abandonar os seus direitos sobre
um território, haveria uma cessão. Em nenhum dos dois casos haveria uma
prescrição aquisiliva. A melhor concepção (Acciolv) é a que considera a
prescrição aquisitiva como modo de aquisição de território porque há um
interesse do DI. A prescrição é necessária para dar uma segurança jurídica
e, em decorrência, uma segurança social, que é uma das finalidades de
qualquer ramo do direito. Ela termina com as situações duvidosas, tornan­
do-as esláveis.
A prescrição aquisitiva, para ser válida, necessita preencher determi­
nados requisitos: a) a posse deve ser efetuada por Estado soberano; b) deve
ser pública; r) deve ser efetiva; d) deve ser pacífica e ininterrupta (a
Argentina periodicamente protesta junto-ã Inglaterra pela “ocupação das

1121
ilhas Malvinas ou Falkiands” ). Salienia Brownlic que esta consideração
‘elimina o tempo como um requisito especial", o que significa dizer que
de certo modo é necessária uma aquiescência (pelo menos o silêncio) do
Estado a que pertence ou pertenceria o território; e) a posse seja por
determinado período de tempo.
O último requisito enunciado acima é que tem levantado maiores
problemas. Uma corrente (Gròtius, Nys) fala em posse imemorial. OuLra
(Vattel), posse de muitos anos. Outros (Dudley Field) fixam em 50 anos.
Fauchille fala em 30 anos. Epilácio Pessoa, em 40 anos.
De fato, não existe qualquer prazo delimitado na ordem jurídica in­
ternacional. O prazo deverá ser fixado em cada caso concreto (Audinet),
levando-se em consideração as circunstâncias que o envolvem.13 Havendo
a ausência de protesto, há, assim, a aquiescência, o que transforma a
prescrição em praticamente uma “cessão disfarçada”.
Finalmente, podemos assinalar que a prescrição produz efeitos mesmo
quando existe no seu início um ato considerado “imoral” ,H como também
ocorre no direito interno. Isto decorre da própria finalidade dá prescrição
que visa dar uma estabilidade à ordem jurídica.15 O Estado lesado que a
interrompa por meio de protestos. Podemos acrescentar que isto não
significa que o fato crie o direito. O fato só adquire este valor porque
existe_um direito o consagrando nestas circunstáncias.
V 4 33^-A conquista nâo é nos dias de hoje um modo de aquisição de
territorio, daí Rousseau apresentá-la como sendo um modo histórico-po-
lítico. Entretanto, através da História, foi o principal modo de aquisição
de território, uma vez que a guerra não era proibida pelo Dl.
A conquista ocorria após as guerras de duas maneiras: a) o Estado
vencido desaparecia (“debellatio” dos latinos ou “subjugação” dos autores
ingleses)16 e o vencedor estabelecia a sua soberania no território do der­
rotado; b) ou, após a guerra, o vencido, sem desaparecer, sem ocorrer a
“debela tio”, 1' em um tratado obrigado pelo vencedor, cedia parte do seu
território ao vencedor. Neste caso nós temos uma cessão de território
obtida pela força. Alguns autores (Sereni) colocam a conquista no caso
da “debellatio” como modo originário de aquisição, uma vez que o terri­
tório seria “res nullius” e o vencedor fará a sua ocupação. Entretanto o
território do vencido não é propriamente uma “res nullius”, uma vez que
a soberania sobre ele foi destruída pela força, isto é, pela conquista. En­
quanto a conquista foi admitida no Dl, exigia-se que ela fosse feita no
momento oportuno, isto é, ela não deveria ser prematura. Ela só produzia
efeitos se fosse realizada após a cessação das hostilidades; e se o Estado
vencido continuasse a existir, deveria ser consagrada em um Tratado. S.
Korman afirma que para a conquista produzir efeito era necessário que o
território estivesse sob controle efetivo do conquistador. Isto era presumido
quando havia “debellation”,-ou a cessão por tratado de paz, ou, ainda,
pela aquiescência do vencido.

1122
No DIP não se respeita o principio “ex injuria jus non oriiur' e o s
próprios imperios coloniais foram construidos por meio da conquista,
como a Indochina conquistada pela França. Em 1864. a Rússia ialava no
seu direito de conquista em áreas na Asia Central, alegando que erain
habitadas por povos atrasados, nómades e turbulentos, em conseqüência,
a conquista visava o progresso da civilização.
O direito de conquista, segundo S. Korman, a quem estamos seguindo,
sofria certas limitações, como quando ele ameaçava o princípio do equi­
líbrio que regia a política internacional.
Nem sempre o Estado invoca o direito de conquista por não ser ele
bem-visto na sociedade internacional, que é o caso da Inglaterra em relação
às Malvinas.
Para haver conquista era necessário” uma intenção de conquistar.
A conquista deixou de ser um modo de aquisição de territorio diante
da condenação à guerra. Hayendo a renuncia à guerra,18 deixou de existir
conseqüentemente a conquista. A condenação da conquista não é novidade
na Historia do DI. Guilherme de Rochefort (1488), ao se opor à submissão
da Bretanha, já afirma que a conquista não dá direitos. No período mais
recente esta tendencia se manifestou, acima de tudo, no continente ame­
ricano. Neste sentido está uma resolução da Conferência Pan-americana
de Washington (1890).19 A Declaração de Washington (1932), que foi
dirigida à Bolívia e ao Paraguai (questão do Chaco), pelos demais Estados
americanos, em que se afirmou que não seriam reconhecidas aquisições
territoriais efetuadas pela força.20 Na Conferência Pan-americana de Mon­
tevidéu (1933) foi concluída uma convenção sobre direitos e deveres dos
Estados, cujo art. II afirma não serem reconhecidas as aquisições territo­
riais conseguidas por coação ou pela força. Na Conferência Pan-americana
de Lima (1938) foi condenado o uso da força como “instrumento de
política nacional ou internacional” . A Carta da OEA também interdita a
conquista como mòdo de aquisição de território (art. 39, letra “e”, e art.
20). No mesmo sentido está a carta da ONU (art. 25, alínea 4a), que proíbe
o “uso de força contra a integridade territorial” .21
A mais célebre concepção sobre o não reconhecimento da conquista
é a Doutrina Stimson.21' Ela surgiu em uma nota de’ Henry Stimson, Se­
cretario de Estado dos EUA, endereçada ao Japão e à China em janeiro
de 1932, afirmando que o governo norte-americano não reconheceria
"tratado ou situação” que fosse o resultado de uma violação do Pacto de
Renúncia à Guerra (Briand-Kellogg) de 1928. A sua origem está no conflito
entre o Japão e a China, durante o qual o Japão ocupou a Mandchúria,
onde acabaria por criar o Estado-tampão do Mandchuco, que só foi reco­
nhecido pelo Japão e pelo Eixo. Foi usada ainda em relação ao Anschluss
e para o protetorado alemão na Tcheco-Eslováquia.
Esta doutrina recebeu algumas consagrações, com o no art. 2“ do Pacto
Saavedra Lamas (tratado antibélico de não agressão e conciliação) con­

1123
cluído no Rio de Janeiro (1933). Foi aplicada naja citada guerra do Chaco
entre a Bolívia e o Paraguai e em inúmeros outros casos. Ela não funcionou
no caso da Etiopia, sendo que vários países reconheceram a Vítor Emanuel
III como Rei da Italia e Imperador da Etiopia.
A Doutrina Stimson, apesar das aplicações que teve, acabou por fra­
cassar. Rousseau, com muita razão, observa que ela se fundamentava em
um equívoco, porque o reconhecimento é simples constatação e não im­
plica aprovação. Na pratica, os Estados acabam por fazer pelo menos
reconhecimentos disfarçados. A conquista da Etiopia pela Itália foi reco­
nhecida por mais de 40 Estados.
Meyrowitz afirma: “em lugar da obrigação do não reconhecimento”,
afirmado pela Doutrina Stimson, o direito positivo apenas acolheu “a não
obrigação de reconhecer as modificações da ordem jurídica internacional
impostas pela ameaça ou o emprego ilícito da força".
De qualquer modo, podemos afirmar que juridicamente a conquista,22
seja pela “ debellatio”, seja pela cessão coercitiva de um território, não é
mais modo de aquisição de território, uma vez que ela é condenada pelo
DI positivo, como é o caso da Carta da ONU.
Na prática acaba por se reconhecer a conquista em nome do principio
da efetividade.
NOTAS
1. Maurice Costes — Des Cessions de Territoires, 1944: Mario Miele — I .'A g g m -
dicazione di T errilori nel Diritto Internazionale, 1940; P. A. Verykios — I,;1 Pres-
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Droit International, in RdC, 1955, vol. I, t. 87, págs. 390 e segs.; Matthew M.
McMahon — Conquest and Modern International Law, 1940; Bohdan T. H a la icz u k
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— L ’lnterdiction du Recours à la Forcé. Les Principes et les Problém es qui se
posent, in RdC, 1951, vol. I, t. 78, págs. 7 e segs.; Milton Katz — T h e Relevance
of International Adjudication, 1968; C. W ilfred Jenks — The Propects of Interna­
tional Adjudication, 1964; Sharon Korman — T h e Right o f Conquest, 1996.
2. Ela não se confunde com a cessão administrativa, porque nesta o “ced enle”
continua com soberania sobre o territorio.
3. Alguns autores (Guggenheim) negam que a cessão seja m odo derivado e
defendem que é um modo originário. Sustentam que o cedente “desocupa” o
territorio e o cessionário então o ocupa. Na verdade, eles se esquecem de que a
“desocupação” ocorre em virtude de um tratado, isto é, de um ato em que o
cedente assume o compromisso de “desocupar” o territorio, mas em favor de um
determinado Estado (cessionário).
3A. O Alasca não era rentável para o governo russo. O Barão Stroeckl, repre­
sentante da Rússia, é que oferece a sua venda. A Rússia tinha por finalidade, ao
vendê-lo aos EUA, afastar os impérios coloniais rivais, como a Inglaterra e a França.
Os EUA por sua vez, tinham interesse em comprá-lo para tornar “ precária” a
situação da Inglaterra no Canadá.
4. V. capítulo anterior.
5. Grotius assinalava que a entrega da coisa era necessária no direito interno
para dar a publicidade necessária e que no D l não havia esta necessidade, uma
vez que os tratados de cessão são logo do conhecim ento dos demais Estados.
6. V. capítulo XVIII.
7. Esta é a regra geral, mas a ju rispru d ência, acima de tudo, inglesa admitiu
casos em que os cedentes eram tribos indígenas.
8. O Conselho da SDN atribuiu o território de Mossul ao Iraque, fundamen­
tando-se no Tratado de Lausanne.
9. Alguns autores (Miele) têm observado, com certa razão, que a adjudicação
é um m odo originário de aquisição de território, uma vez que não há .uma trans­
ferência de soberania. Entretanto, devemos assinalar que a adjudicação, na verda­
de, pode ser um modo originário, bem com o derivado. O prim eiro caso ocorreria,
por exem plo, nos litígios sobre território “res nullius” ou “res d erelicta", enquanto
que o segundo caso já ocorreria nos territórios que não fossem “ res nullius" ou
“res d erelicta” (ex.: uma sentença por eqüidade dá território que na verdade
poderia p ertencer a um Estado e entregá-lo a outro Estado). E verdade que ainda
nestes últimos casos não há propriam ente uma transferência de soberania, porque
a aquisição é feita exclusivamente com base na decisão, mas isto também não
apaga um fato incontestável: o território anteriorm ente pertencera a outro Estado
e a decisão teria provocado uma transferência de soberania.
10. Sobre a prescrição aquisitiva com o m odo originário ou derivado de aqui­
sição de território, e sobre a prescrição aquisitiva e os “direitos históricos”, v.
capítulo" X I.

1125
11. Le Fur assinalava ser a prescrição uma noção da razão e da ju stiça.
12. Pinto considera que a jurisprudencia internacional dá importancia ao fato,
mas não consagra propriamente o instituto da prescrição. Este autor, que nega a
prescrição no DI, declara que no fundo tudo é o' “costume" que muda as regras
jurídicas, etc. A prescrição é “inútil”. A prescrição é instituto de sistemas jurídicos
evoluídos. O DI não teria o aparato técnico deste instituto com o a fixação do
prazo.
13. O reconhecim ento da situação pelos demais Estados, por exem plo, acelera
a prescrição, uma vez que a prescrição não será mais contestada (passa a ser
oponível) pelos autores do reconhecim ento.
14. Em sentido contrario: Fiore.
15. Neste sentido: Hall.
16. Neste-caso ficou a Etiopia derrotada pela Itália (1936).
17. Os elem entos da “debellatio” seriam : a) o governo do Estado nào exerce
mais poder efetivo: em conseqüência, o seu território passa a ser “ res nullius”; 6)
“o vencedor se apodera de fato do territorio sem dono” (“possessio” ); c) “ manifesta
o desejo de submetê-la a seu poder soberano” (“animus") (B. Halajczuk).
18. Sobre este assunto, v. capítulo XVIIL
19. O Congresso do Panamá já afirmara o respeito à integridade territorial
dos Estados am ericanos. Em 1829, Sucre teria proclamado que “a vitória não dá
direitos” .
20. Ainda em 1 932, a Assembléia da SDN, em uma resolução, afirm ou princípio
semelhante ao da Doutrina Stimson.
21. Diversas Constituições consagram a renúncia à guerra de conquista, se­
guindo a tradição iniciada com a Constituição francesa de 1791. A Constituição
brasileira, no parágrafo único do art. 7S, proíbe a guerra de conquista. Esta
interdição’é da tradição do direito constitucional pátrio. (A Constituição de 1891,
no art. 88, j á a consagrava.)
21A. Segundo H. Accioly a Doutrina Stimsón teria sido formulada pela pri­
meira vez por Cincinato Braga (delegado do Brasil) na LDN, em uma em enda ao
Pacto da Liga, e que propunha em relação ao autor da conquista “um bloqueio
jurídico universal” .
22. Na verdade, a conquista em si mesma já há longos anos não é considerada
modo de aquisição. O tratado de paz é que dava o título para a aquisição. Neste
sentido já se manifestava Vattel.

■1126
CAPÍTULO XLII

REGIÕES POLARES'

415 —_ Noção; 416 — Aí regiões polares e o D l; 4 1 7 — -Aspectos


econômicos, estratégicos e políticos; 418 — O Artico; a teoria dos setores;
419 — O Antártico.

415. A conceituação de regiões polares não é questão pacífica entre os


estudiosos. Alguns autores (Frank da Costa) consideram que o critério do
círculo polar, isto é, o paralelo de 66fi33’ de latitude, é falho, uma veizfqué
ele deixaria fora das regiões polares áreas importantes com o a Terra de
Graham. Outros defendem este critério (Mouton). Outros ainda (Nordens-
kjold) procuram determinar as regiões polares pela temperatura. R. Brown
as caracteriza como sendo as regiões que não possuem árvores; ern conse­
qüência, haveria nelas uma “unidade geográfica”. Entretanto, este último
critério não é fixo, uma vez que as árvores têm surgido em regiões que não
as possuíam. A Antártica tem sido definida, segundo Neale Ronning, “ como
a área ao sul do paralelo de 609 de latitude sul, incluindo todas as banquisas
de gelo”. E o critério consagrado no Tratado de 1959. Jessup e Taubenfeld
definem a Antartica como a área ao sul do paralelo de 60°.
Alguns autores (Rousseau, Giuliano) têm mencionado o critério dos
paralelos 66fi3 3 ’. Entretanto, é de se observar que o conceito geográfico
é de certo modo irrelevante para o DIP, como o demonstra o Tratado de
1959.
416. Elas não são regiões passíveis de uma ocupação2 como a que
ocorreu nas demais regiões do globo; em conseqüência, o Dl comum não
pôde ser aplicado em relação a elas. O que ressalta destas regiões é que
elas não podem ser objeto de uma oGupação efetiva.2* Deste modo, elas
passaram a ser regulamentadas internacionalmente de maneira diferente
3as outras “ res nullius” existentes no globo terrestre, apesar de o conceito
de efetividade não ser rígido. Questões políticas conduziram também a
isto, e a Antártica ainda não foi regulamentada definitivamente.

1127
417. As regiões polares apresentam interesse tle aspecto econômico
para os Estados. Mouton os resume em: navegação3 marítima., navegação
aérea, pesca da baleia,4 caça e pesca de um inodo geral ’ e recursos mine­
rais.6
Ao lado do aspecto econômico existe também um aspecto estratégico.
O Ártico é mais importante que a Antártica. A URSS, por exemplo, faz
por aí o seu transporte em tempo de guerra, o que lhe permite “mover
navios de guerra de um teatro para outro”. A Groenlândia é importante,
por exemplo, por permitir aos EUA uma rola mais curta com certas regiões
da Europa, bem como para obter relatórios sobre as condições meteoro­
lógicas. Os submarinos nucleares, que navegam sob o gelo, vieram dar ao
Ártico lima grande importância para a defesa dos países que se limitam
com ele. A plataforma continental no Ártico é larga e rica em petróleo.
A Antártica já não apresenta este interesse, tanto assim que o tratado
sobre ela declara que deverá ser utilizada para fins pacíficos.
Existem ainda aspectos políticos, como o desejo de aumento territorial,
o orgulho estatal, etc.
418. Em relação ao Ártico,6A a questão da sua divisão foi praticamente
resolvida pela denominada teoria dos setores.
A teoria dos setores foi proposta pelo senador canadense Pascal Poirier,
em 20 de fevereiro de 1907,7 ao apresentar moção no Senado em Otawa,
para que o Canadá fizesse uma declaração formal de posse das ilhas e
terras ao norte do Domínio até o Pólo Norte. Poirier fundamentou a sua
tese na acessão. Entretanto, temos que concordar com Frank da Costa ao
observar que a teoria dos setores nada tem a ver com a acessão, porque
esta é um “elemento dinâmico, o aumento material do território”.8 Na
verdade, o fundamento desta teoria é o “princípio” da contigüidade (Rous­
seau). A teoria dos setores foi sistematizada pelo jurista russo Lakhtine,
tornando-se doutrina oficial do governo soviético em 1926.8A Ela consiste
no seguinte: todo Estado que tem litoral no Oceano Glacial Artico Teiíi
direito às terras e ilhas, iá descobertas ou nào, que ticarem incluídas em
um_triânguio cuja base seria o litoral do Estado e o vértice do seü~cume
seria o Pólo Norte. O pólo que~seria a extrerixídadê dê tod o rõ sTriângulõs
não pertenç£Da_aI5£ií5ünrTi.stadõr~
Como se pode observar, o Dl criou uma nova base para a aquisição
de territórios no Ártico, onde em inúmeras regiões a ocupação é pratica­
mente impossível. A ocupação foi substituída por um “regime de atração”,
como propusera Lakhtine.
Esta teoria tem encontrado argumentos em seu favor, como opiniões
em contrário. Alega-se, por exemplo, que ela é prática (Smedal). Por outro
lado, observa-se que a extensão do litoral do Estado no Oceano Glacial
Ártico não dá a medida dos seus interesses na região. Observa-se ainda
que a “contigüidade” não é título suficiente para um Estado adquirir
território. Não pode ser aplicada no alto-mar.

1128
É preciso assinalar, com Smedal, que não há uma regra internacional
consagrando a teoria dos setores, uma vez que, se isto ocorresse, haveria
um “regime de monopólios”.
A teoria dos setores só foi adotada oficialmente pela URSS e pelo
Canadá. Atualmente o Canadá abandonou a teoria dos setores, mas esten­
deu as águas territoriais e fez uma legislação contra a poluição nas águas
árticas. O Canadá tem admitido o direito de passagem inocente na Passa­
gem do Noroeste, apesar de falar que a região é “água histórica”. A URSS,
em 1987, se comprometeu a abrir no futuro a Passagem do Nordeste aos
navios estrangeiros. A Noruega e a Dinamarca falam em ocupação. Os
EUA defendem a liberdade do alto-mar mesmo quando ele for ocupado,
por gelo (Ruzié). Entretanto, como assinala Dollot, os outros países inte­
ressados “a aplicaram sem mencioná-la”. Puceiro Ripoll afirma que a teoria
dos setores não foi aceita pelos EUA, Noruega, Finlândia e Dinamarca.
São cinco os países que têm zona sob sua soberania no Ártico: EUA,
URSS, Noruega, Dinamarca e Canadá.88 A Noruega nunca reivindicou a
teoria dos setores no Ártico. O que importa para ela é a ocupação. A
Dinamarca desaprova a teoria dos setores e a sua reivindicação se funda­
menta na ocupação.
Estas zonas não são reconhecidas internacionalmente e há mesmo
uma zona contestada entre a Rússia e a Noruega. Existem várias linhas
aéreas sobrevoando o Ártico, bem como uma navegação marítima que
resulta da “autorização” destes cinco Estados. A delimitação nos mares
segue a linha mediana ou dos pontos eqüidistantes, assim sendo, não é
usada a teoria dos setores. Em 1973 o Canadá e a Dinamarca delimitaram
a plataforma continental.
Finalmente, deve-se assinalar que a teoria dos setores não implicava o
abandono da liberdade dos mares.sc O Oceano Ártico está sujeito à liber­
dade dos mares. Finalmente, é de se assimilar que a partir de 1979 a
Groenlândia ganhou autonomia interna, mas a Dinamarca conservou o
controle da defesa e dos negócios externos.
^ N o Antártico as reivindicações dos Estados são inúmeras. Nela os
Estados têm as suas bases muito longe do centro do Pólo Sul, ao contrário
do que ocorre no Ártico. Assinala Frank da Costa que tais regiões, “apesar
de serem essencialmente constituídas por um continente maciço, são se­
paradas por vasto anel oceânico dos outros territórios austrais”. A teoria
dos setores não pode ser aplicada à Antártica, como foi no Ártico, uma
vez que ali não há “bases continentais" semelhantes às existentes no norte,9
bem como devido à distância dos continentes.
França, Grã-Bretanha, Noruega, URSS, Nova Zelândia e Austrália, fun­
damentadas no direito da descoberta -ou, ainda, com base na ocupação,
reivindicam zonas.10 O Chile apóia as suas pretensões na ocupação efetiva
e no “uti possidetis de ju re ”.11 A Argentina fundamenta-se na ocupação
efetiva e na continuidade geológica. Tanto o Chile como a Argentina

1129
invocam também a teoria, da continuidade. Os EUA não reivindicam ne­
nhum setor (tem a sua origem 110 Secretário de Estado, Hughes), mas
também não reconhecem direitos aos demais Estados e propuseram a
internacionalização sob o regime de tutela da Carta da ONU. O Japão,
pelo tratado de paz (1951), renunciou a suas reivindicações na Antártica.
A Alemanha, que ali teve uma base (1938-1939), não tem apresentado
mais reivindicações. E preciso salientar que os limites entre as reivindica­
ções são bastante imprecisos.
Entretanto apenas sete países “proclamaram soberania” sobre parte
do Antártico: Argentina, Austrália, Chile, França, Nova Zelândia, Noruega
e Grã-Bretanha (Roberto E. Guyer). Charles Rousseau cita como tendo
também “setores” na Antártica, além dos já mencionados, a Noruega e a
URSS (esta invoca em seu favor as viagens de Lazarev em 1812 e Belling-
hausen em 1819)
De fato, a situação no Antártico ainda não se encontra resolvida e
bases de inúmeros Estados ali existem. Na prática, os Estados que ali têm
estabelecimentos aplicam a teoria dos setores “não como fundamento de
títulos territoriais, mas com o delimitação geográfica destes títulos territo­
riais entre os Estados que os invocam por outros fundamentos” (Aréchaga).
A teoria dos setores no Antártico não dispensa a ocupação. Ela serve
para delimitar reivindicações de áreas que os Estados ainda não atingiram.
Os países que não apresentam reivindicações em relação à Antártica
sustentam que o m ar ali é alto-mar, enquanto os que apresentam reivin­
dicações falam em mar territorial e zona econômica.
O Antártico teve alguns aspectos regulamentados pelo Tratado de l 9
de dezembro de 1959, concluído em Washington por 12 nações interes­
sadas nesta região do Globo: EUA, URSS, Inglaterra, Nova Zelândia, Bél­
gica, Chile, Argentina, Noruega, França, Austrália, Japão e União Sul-Afri-
cana.’2 Neste tratado se consagra a liberdade de pesquisas, são interditadas
as explosões nucleares, só se admitem na região atividades pacificas e os
Estados podem enviar observadores para fiscalizar a execução do tratado.
Os contratantes afirmam que não renunciam a suas reivindicações de
soberania territorial.13 O tratado é aplicado à região sul de 60e de latitude.
Prevê uma reunião periódica dos signatários que decide por unanimidade.
Ela já se reuniu em Camberra (1961); Buenos Aires (1962); Bruxelas
(1964); Santiago (1966); Paris (1968); Tóquio (1970); Wellington (1972);
Oslo (1974); Paris (1976); Buenos Aires (1978); Wellington (1982) e Aus­
trália (1983). Em 1985 houve a 13a reunião, em Bruxelas, etc. Dos 16
Estados que acederam ao tratado somente Polônia, República Federal
Alemã, Brasil e índia adquiriram o “status' consultivo”, por terem desen­
volvido pesquisa substancial na Antártica. Os países em desenvolvimento
querem que os recursos da Antártica sejam explorados em benefício da
humanidade.
Algumas observações devem ser acrescentadas com base no excelente
livro de Romualdo Bermejo de onde foram tirados os dados seguintes: A

1130
Antártica tem 14 milhões de km2, oque significa um décimo da superfície
terrestre, sendo que 98% do seu território são cobertos de gelo. Ela tem
90% de águas geladas da superfície da Terra. A temperatura atinge - 80“C.
Os gelos contém 70% da reserva mundial da água doce. Existem algumas
extensões de terra que não gelam, bem com o alguns lagos. A altitude
média é de 2.000 metros e ó ponto culminante é o Monte Vinson (5.140
metros), e os ventos atingem 300km/hora.
Quando foi concluído o tratado de 1959, segundo Bermejo, o quadro
político era o seguinte: d) reivindicavam soberania (Argentina, Austrália,
Chile, França, Noruega, Nova Zelândia e Reino Unido); b) estas pretensões
territoriais eram contestadas por África do Sul, Bélgica, Japão, EUA e
URSS; c) cinco Estados reconheciam mutuamente as suas pretensões: Aus­
trália, França, Noruega, Nova Zelândia e Grã-Bretanha Às zonas reivindi­
cadas abrangem 15% do território do Antártico. A Grã-Bretanha, o Chile
e a Argentina têm conflitos no Antártico, vez que reivindicam as mesmas
áreas em certas regiões.
O tratado de 1959 foi o primeiro tratado a consagrara não mílitarização
e não nuciearização de um continente.
Em 1980, foi concluída convenção sobre a conservação dos recursos
marinhos vivos na Antártica.
Seguindo ainda a Bermejo, assinalamos que a Grã-Bretanha e a Nova
Zelândia foram os primeiros Estados a levantar, em 1970, o problema da
exploração econômica do Antártico. Finalmente, foi concluído em Wel-
lington, 1988, o tratado relativo aos recursos minerais. Ele consagra a
proteção do meio ambiente. A pesquisa, exploração e utilização dos re­
cursos devem respeitar alguns princípios: d) deve ser avaliado o impacto
no meio ambiente; b) verificar se as atividades não serão prejudiciais a
outros usos da Antártica; c) garantir a segurança das operações; d) levar
em consideração o interesse da comunidade internacional, etc. Existem
zonas especialmente protegidas, em que não será permitida a exploração
de minérios- A convenção consagra a não discriminação dos Estados partes
na convenção, isto é, os Estados que têm “posse” e os que têm estatuto
consultivo. Todas as estações e instalações estão sujeitas a inspeção. A
convenção cria uma estrutura institucional: d) Comissão que pode criar
Comitês de Regulametação; b) Reunião Especial das Partes; c) Secretariado
e, ainda, orgãos subsidiários. Parece que em um futuro próximo talvez só
possa ocorrer a prospecção. A parte pode apresentar ao Secretariado um
pedido para explorar determinada zona. O pedido deverá ser apreciado
e aprovado pelos órgãos técnicos. A convenção consagra a responsabilidade
objetiva do operador por danos causados ao meio ambiente. O Estado
pode invocar para excluir a sua responsabilidade: a) dano causado por
conflito armado; b) caso de força maior. O tratado estabelece ainda a
solução pacífica dos litígios: negociação, arbitragem, solução judiciária,
mediação, etc.

1131
Em 1 9 9 0 foi c o n clu íd o um p r o to c o lo p ro ib in d o a e x p lo ra ç ã o de m i­
n é rio s n a A n tártica por 5 0 an o s.
F in a lm e n te , é de se o b serv ar q u e p aíses do T e r c e ir o M u n d o , liderados
p ela M alásia, têm se o p o sto a q u e u m p e q u e n o gru p o d e E stad o s disponha
d os d estin o s d este c o n tin e n te .

1132
NOTAS
1. Jo ã o Frank da Costa — A teoría dos setores polares, in BSBD1. janeiro-de-
zembro, 1961, n9s 13 e 14, págs. 87 e segs.; Gilbert Gidel — Aspeéis juridiques de
la lutte pour l’Antarctique, 1948; Gustav Smedal — De L ’Acquisition de Souverai-
neté sur Ies Territoires Polaires, 1932; René Dollot — Le Droit International des
Espaces Polaires, in RdC, 1949, vol. II, t. 75 e págs. 1.115 e segs.; M. W. Mouton
— T h e International Regime o f the Polar Regions, in RdC, 1962, vol. III, t. 107,
págs. 175 e segs.; Robert D. Hayton — The Nations and Antartica, in Osterr,
Zeitschrift Für Offetliches Recht, 1960, págs. 368 e segs.; O scar Pinochet — La
Antartica Chilena, 1955; E. Aubert de la Rúe — Les Terres Australes, 1953; Juan
Carlos Puig — La Antartica Argentina ante el Derecho, 1960; E. W. H unter Christie
— The Antartic Problem, 1951; J.-F . da Costa — Souveraineté sur l’Antarctique,
1958; R. J . Dupuy — Le Statut de I’Antarctique, in AFDI, 1958, págs. 196 e segs.;
C. Neale Ronning — O Direito na Diplomacia Interam ericana, 1966, págs. 170 e
segs.; Giovanni Battaglini — Condozione dell'Antartide nel Diritto Intemazionale,
1971; Magdalena Londero — O D ireito Internacional das Regiões Polares, in
BSBDI, janeiro-dezem bro 1968, nss 47 e 48, págs. 79 e segs.; Eurípedes Cardoso
de Menezes — Os Direitos do Brasil na Antartica, 1971; Ju a n Carlos Puig — La
reivindicación antartica argentina el D erecho internacional existente, in Estudios
de D erecho y Política Internacional, 1970, págs. 39 e segs.; Jo h n Kish — The Law
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1973, vol. II, t. 139, págs. 149 e segs.; Philip C. Jessup e H ow ard J. Taubenfeld —
Controle for Outer Space and T h e A ntartic Analogy, 1959; T herezinha de Castro
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l’Inspection Internationale, organizado por Georges Fischer e Daniel Vignes, 1976,
págs. 223 e segs.; Heber Arbuet Vignali, Roberto Puceiro Ripoll, Belter Garré
Capello — Antártida, 1979; H eber A rbuet Vignali — Estatuto Ju ríd ico y Situación
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nizado pelo Comité Jurídico Interam ericano (julho-agosto de 1979), 1980, págs.
453 e segs.; Francisco Orrego Vicuña e María Teresa Infante — L e Droit de la
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Filhó — Os Direitos Brasileiros ao Continente Austral, in Revista do Tribunal de
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Ordem Antartica? Fatores Políticos, Económ icos, Estratégicos e Tecnológicos, in
H élio Jagu aribe e outros— Leituras de Política Internacional, 1982, págs. 128 e
segs.; R ainer Lagoni — The U nited Nations and the Antartic, in Law and State,
vol. 33, 1986, págs. 115 esegs.; M arie-Francoise Labouz — Les Aspects Stratégiques
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C. Jo y n er — T h e Antarctic Minerais Negotiating Process, in AJIL, O ctober 1987,
vol. 81, ns 4; Ricardo da Costa Pinto — O Regime Jurídico da Antártica, separata
da Revista Symposium, v. 30, n° 2. 1988, págs. 23 e segs.; Alain Gandolfi — Le
Systéme Antarctique, 1989; Ricardo da Cosia Pinio — A Antártica e sua importância
para a América do Sul, 1991; Rom ualdo Bermejo — L ’A ntarctique e l ses Ressources
M inérales: L e Nouveau Cadre Ju rid iq u e, 1990; Lucius Caflisch — L ’Antarctique,
Nouvelle Frontiére sans Frontiéres?, in Mélanges Michel Virally, 1991, págs. 157
e segs.; G ilberi Guille ume — L e Statut de l’Antarctique, in M élanges René-Jean
Dupuy, 1991, págs. 171 e segs.
2. Neste sentido; Lawrence, Higgins, alegando que não podiam ler estabele­
cim entos permanentes. Oulros, com o Hyde, as consideram passíveis de ocupação;
Dallot assinala que somente o A ntártico seria ocupável, porque ela é ierra coberta
de gelo, enquanto que o Á rtico é simplesmente gelo. Uns (Scolt) diziam que eram
“ res nullius"; outros (Fauchille), que eram “res communis” .
2A. Salienta Therezinha de Castro que a Antártica é a região onde mais venta
no m undo, bem como a que tem o clima mais rigoroso.
3. O Ártico é muño mais utilizado para a navegação do que o Antártico.
4. A maior parle (85% ) de produção de óleo de baleia provém da pesca
realizada no Oceano Antártico.
5. Noventa por cenio das peles de foca do mundo estão no Pacífico Norte.
6. Nas ilhas do Ártico que estão sob domínio canadense existe carvão. No
Canadá e na Sibéria, na costa Á rtica, por exemplo, há petróleo. Na Antártica foram
encontrados: carvão, ferro e urânio; entretanto, não há ainda possibilidade de se
fazer a exploração destes três m inerais. O contrário já o co rre no Ártico, onde
estão sendo explorados os m inerais. O Antártico parece ter ainda: cobre, níquel,
c o b a it o , c r o m o , m anganês, gás, petróleo, platina, etc.
6A. Vem do grego “arktikos” , que foi traduzido por “U rsa” , que era a estrela
utilizada pelos navegantes para guiá-los em direção ao Pólo N orte. Antártica vem
de “ Anti Arktikos” porque a con stelação da Ursa não era avistada quando se viajava
em direção ao Pólo Sul (Therezinha de Castro). Entretanto, o D ecreto n® 75.963,
de 1973, que promulgou n o Brasil o tratado' de W ashington de 1959, fala em
A ntártida. Esta é a tradução oficial brasileira. Entretanto, o D icionário da Língua
Portuguesa de Aurélio Buarque de Holanda Ferreira (1986) registra “antártico”.
7. Esta é a data que figura em Smedal e Gidel. Dallot dá a de 19 de fevereiro.
Segundo Madalena Londero, a divisão do Ártico em setores j ã fora discutida, no
Clube Naval de Nova Iorque, em 1906.
8. Só poderia haver acessão “ à apropriação do mar gelado...” (Frank da C osta).
8A. Autores soviéticos (Sigrist, Lakhtine, Korovine), para defender a aplicação
da teoria dos setores, interpretaram o tratado de 1-867, entre Rússia e EUA, sobre
a cessão do Alasca, como um a divisão de soberania no Ártico.
8B. O Canadá em certos m om entos tem reivindicado direitos não apenas
sobre o “ território”, mas sobre as ilhas e o “mar gelado” (“g elo ”). Donat Pharand
afirma que as ilhas de gelo poderiam ser ilhas, ilhas artificiais ou navios, mas que,
na realidade, não se enquadram em nenhum caso. Tem sido apontado que um
dos problemas da teoria dos setores é que as banquisas se movimentam de acordo
com o vento e correntes (Pontavice-Cordier).
8C. Je a n Touscoz (Atlas Geoestratégique, 1988) afirma que a idéia de dividir
o Pólo Norte em setores está abandonada, mas não diz o que a substituiu.
9. Alguns autores (Fauchille) propuseram a sua divisão em quadrantes “ame­
ricano, pacífico, australiano e african o”, e cada um deles seria governado pelos
Estados do continente. O ch ilen o P inochet de la Barra, em 1944, propôs igualmente

1134
a divisão em quadrantes: a) Sul-americano (Argentina, Chile c Grá-Brcianha): b)
Australiano (Austrália e Nova Zelandia); Africano (Franca e N oruega); d) Pacífico
(não reivindicado).
10. E interessante observar que no Brasil ja se chegou a falar que reivindica­
ríamos áreas no Antártico, considerando que somos o m aior país do hemisfério
sul e não poderíamos ficar alheios à importância econômica e estratégica daquela
região. Para isto, defenderíamos a “ teoria da defrontação", ou seja, “ as nações do
hem isfério sul, cujos litorais podem ser enquadrados em meridianos cujas projeções
term inariam no Pólo Sul, teriam direito a setores antárticos com preendidos nas
projeções destes meridianos” (v. O Globo, 2-4-1958). Os m eridianos para o setor
do Brasil seriam o de Martin Vaz e o do Chuí. Dentro dele está o arquipélago das
O rcades, reivindicado pela Argentina e pela Grã-Bretanha. A teoria da defrontação
fí5j-defendida por Delgado de Carvalho e Therezinha de Caslro. Atualmente o seu
grande defensor é o Deputado Eurípedes Cardoso dè Menezes. O que nos parece
é que o interesse do Brasil, para se firm ar em reivindicações, no futuro, deverá se
manifestar em expedições à região. O que ele passou a realizar a partir de 1983.
£ interessante observar que em uma expedição belga ao P ólo Sui (o Bélgica safra
de Antuérpia em 1897 e deixou o A ntártico em 1900) foi ali hasteada a bandeira
brasileira, dada ao Comandante De G erlache, quando de sua passagem no porto
do Rio de Jan eiro (Marcos Carneiro de Mendonça, in O Globo, 30-3-73). Dentro
desta linha histórica, no Antártico, existem três ilhas (Pernam buco, Sampaio Ferraz
e Luiz Cruz) e dois montes (Barão do Rio Branco e Alm irante Alexandrino de
A lencar) com nomes brasileiros, dados por uma expedição francesa que ali foi em
1903 e 1904 (O Globo, 2-4-73). A teoria da defrontação tem sido considerada uma
variante da teoria dos setores.
11. Carlos V, em capitulação de 1539, deu a Pedro S ancho de Hoz, que passou
. seus direitos a Valdivia, direito às terras que estivessem dos dois lados do estreito
de Magalhães.
12. Alguns destes Estados (Bélgica, União Sul-Africana e Jap ão ) não têm
reivindicações na Antártica, mas, tendo realizado pesquisas em colaboração com
o A no Geofísico Internacional, foram signatários do tratado. O Brasil aderiu ao
tratado em 1975.
13. T eria sido aplicada a denom inada técnica do “ icebox” , isto é, resolvem-se
‘inúm eros assuntos, mas não se toca no principal, que aqui é o da soberania.
Adendo:
No início a teoria dos setores no Pólo Norte foi aceita apenas pelo Canadá e
pela U RSS e não incluía os espaços marítimos. Estes esp a ço s fo r a m reivin dicados
posteriorm ente quando com preendidos no setor reivindicado. Os demais Estados
sem pre rejeitaram a teoria dos setores e “mantiveram de form a atenuada, as
exigências clássicas relativas a aquisição da soberania territorial” . O Canadá e a
URSS, atualmente, não mais fundam entam as suas reivindicações na teoria dos
setores (Lucius Caflisch — L ’A ntarctique, Nouvelle Frontière sans Fronlières?, in
L e D roit International au Service de la Paix, de la Justice et du Developpement,
M élanges Michel Virally, 1991, págs. 157 e segs.).

1135
CAPÍTULO XLIII

ÁGUAS INTERIORES. MAR TERRITORIAL.


ZONA ECONÓMICA1

420 — Introdução; 420A — Aguas Interiores; 421 — M ar territorial.'


conceito, terminologia; 422 — Evolução histórica; 423 — Direitos do
Estado costeiro no mar territorial; 424 — Direito de passagem inocente
e passagem de tránsito; 425 — A linha de base e algumas normas de
delimitação do mar territorial. Aguas arquipelágicas; 426 — O limite
exterior. O limite do mar territorial entre dois Estados; 427 — Largura
do m ar territorial; 428 — Natureza jurídica do mar territorial; 428A
— Zona económica.

Cí2Q)o D. do Mar é um dos ramos do DIP que vem-sr Ho.temcalvenrlo


há vários séculos. A sua historia é extremamente rira Nn <¡¿riilr» XX surgiu
a preocupação em codificá-lo. Ao tempo da SDN a conferencia reunida
em Haia, em 1930, tratou do mar territorial sem conseguir realizar urna
convenção. Sob os auspícios da ONU volta-se à idéia de codificação e, em
1958, em Genera, são concluídas quatro convenções: mar territorial e zona
contigua, plataforma continental, alto-mar e conservação dos recursos vivos
do alto-mar, bem como havia um protocolo para a solução dos litigios.
Entretanto, ficara em aberto uma questão extremamente importante: a da
largura do mar territorial. Nova conferência •se reúne em Genebra, em
1960, para tratar deste tema sem conseguir qualquer resultado. Para se ver
o crescimento do número de Estados podemos assinalar que: 36 Estados
participaram da Conferência de Haia (1930); 86 na Ia Conferência das
Nações Unidas (1958); 88 na 2a Conferência das Nações Unidas (1960) e
na 3- Conferência das Nações Unidas participaram 164 Estados.
Em 1973 tem início a 3a Conferência das Nações Unidas para o Direito
do Mar, que em 1982 chega a seu fim com a condusão e assinatura de
uma convenção, que foi assinada em Montego Bay (Jamaica) por 117
Estados. E preciso esclarecer que a 3a Conferencia das Nações Unidas sobre

1137
Direito do Mar adotou no seu desenrolar o consenso, porque os países
ritos eram minoria e os pobres perceberam que não seria conveniente
adotar uma convenção que não fosse aceita por aqueles.
Salienta Roger Jeannel que quatro fatores contribuíram para uma
revisão profunda do D. do Mar: a) a proclamação de Traman reivindicando
a plataforma dos EUA; b) o ato do governo do Peru e Chile -constatando
ali a inexistência de plataforma e reivindicando os recursos marinhos até
a corrente marinha de Humboldt (1947); c) os novos Estados surgidos da
descolonização vãõ endossar a linha de reivindicação dos latino-america­
nos; d) as grandes potências marinhas passam a ter interesse em colocar
um limite às reivindicações do 3g Mundo. Acrescenta ainda este jurista que
a detente en tre os EUA e a URSS veio facilitar este acordo. Esta convenção
vai além de uma simples codificação, vez que ela versa muitos assuntos
novos ainda não regulamentados pelo costume.
Tem sido assinalado (Guy de Lacherrière) que o novo D. do Mar
apresenta as seguintes características: 1) ele regulamenta de modo preciso,
sendo que os dispositivos ambíguos são poucos; 2) a regulamentação foi
necessária para atender ao 3® Mundo, porque o regime de liberdade
beneficiava as grandes potências; 3) tentou-se dar uma igualdade aos Es­
tados na apropriação dos recursos do mar; 4) visa atender os interesses
regionais; 5) houve um aumento das áreas submetidas à competência dos
Estados; 6) consagra a solução pacífica dos litígios por diferentes modos
pacíficos. ' .......
Tais modos pacíficos são:uT| Tribunal Internacional do Direito do Mar
que terá ã sua sede em Hamburgo e formado por 21 membros, que será
uma “representação dos principais sistemas jurídicos do mundo”, bem
como haverá uma distribuição geográfica eqüitativa. O mandato será de
nove anos. Poderão ser partes em litígios perante ele os Estados e as
entidades que tratam da parte relativa à área, como a autoridade e a
empresa, as empresas estatais e as pessoas físicas e jurídicas que participam
da exploração destas regiões. E prevista uma Câmara de Controvérsias dos
Fundos Marinhos com 11 membros para apreciar tais questões e que
também poderá dar pareceres consultivos a pedido da Assembléia da Au­
toridade. A sentença é definitiva e inapelável;\è) CIJ (v. capítulo ONU);
ic); a criação de um tribunal arbitrai de cinco membros, sendo que só dois
poderão ser nacionais das partes em litígio. Será elaborada uma lista de
árbitros pelo Secretário-geral da ONU, sendo que cada Estado indicará
quatro árbitros para formar esta lista; (0,-tribunal arbitrai especial para
solucionar litígios relativos a: 1) pescarias; 2) proteção e preservação do
meio marinho; 3) pesquisa científica marinha; 4) navegação, incluindo a
poluição por navios. Será formada uma lista de técnicos em cada um destes
setores: a de pescarias pela FAO, a de proteção e preservação do meio
marinho pelo Programa das Nações Unidas-para o Meio Ambiente, a de
pesquisa científica marinha pela Comissão Oceanógrafica Intergovema-

1138
mental, a de navegação e poluição pela Organização Marítima Internacio­
nal. O Tribunal Arbitral Especial será l'ormado ile cinco membros; -e^
Conciliação utilizada para as controvérsias relativas à interpretação e apli­
cação da convenção. Será mantida uma lista de conciliadores pelo Seere-
tário-geral da ONU, sendo que cada Estado indica quatro nomes. A Co­
missão de Conciliação será formada por cinco membros. A solução não é
obligatoria para as partes. Finalmente, é de se observar que os Estados são
livres para escolher o modo de solução pacífica.
Os Estados poderão declarar a qualquer momento que não aceitam
um ou varios modos de solução (acima expostos) em questões relativas a:
a) controversias referentes à delimitação de zonas marítimas ou as relativas
a baías ou títulos históricos; b) controversias relativas a atividades militares;
c) controvérsias que estejam sob apreciação d o -Conselho de Segurança.
Há, entretanto, uma obrigatoriedade do submetimento da controvérsia a
solução pacífica (não incluindo aqui a conciliação) no caso de violação
da liberdade e direilo de navegação, sobrevôo e colocação de cabos e
oleodutos submarinos, ou referentes à violação de normas relativas a pro­
teção do meio marinho, ou, ainda, relativas a pescarias, desde que não se
trate de seus direitos sobre a zona econôm ica exclusiva.
A convenção de 1982 entrará em vigor 12 meses após o 60e depósito
do instrumento de ratificação. Em 1990 existiam 43 ratificações.
Finalmente, pode-se dizer que somente agora começa a se realizar
uma observação de Charles Dupuis, que afirmava que sendo o mar um
condomínio ele deveria ser submetido “a uma legislação internacional, a
uma polícia internacional, a uma justiça internacional”.
Pode-se observar que a Convenção, apesar de ainda não estar em vigor,
está sendo aplicada de fato pelos Estados, bem como pela CIJ e a Corte
Suprema dos EUA. A convenção obteve o 60s instrumento de ratificação
em 1 6 /l l / 9 3 _ £ entrou em vigor em 1 6 /1 1 /9 4 .
420. 'Aguas in te riõ rê s Y to D l são a q u ê la s localizad as e n tre a c o s ta e q
lim ite in te r io r d o m ai^-territorial.—O lim ite in te rio r é a lin h a d e b a se a
partir_dc-Q fldfe-co m e c a a m ed ida da la rg u ra d o m ar te rrito r ia l.2
O regime jurídico destas águas é fixado peío Estado costeiro que aí
exerce a sua soberania plena praticamente sem sofrer limitações da ordem
jurídica internacional. Diante desta situação é que Laun observa, com certa
razão, que a denominação de “águas territoriais” deveria ser reservada às
águas interiores, porque somente elas se assimilariam, no tocante à sobe­
rania, ao território “terrestre” estatal.3 As águas interiores, ao contrário
do mar territorial, não estão submetidas ao direito de passagem inocente.4
E interessante observar que a Convenção, dé Genebra de 1958, ou a
convenção de 1982, não cuidam‘da delimitação de águas interiores adja­
centes, devendo-se aplicar por analogia as regras aplicáveis ao mar terri­
torial.

1139
|2T) A noção lie mar terrilorial tem sido dada de maneira mais 011
menos uniforme pela prática internacional. Uma definição é a que encon­
tramos na Convenção de Genebra sobre mar terrilorial e zona contígua
(1958),’’ cujo art. Ia afirma que “a soberanja do Estado se estende, além
do seuj.erritório, e de suas águas interiores, a uma zcfinT fie mar ^rtprt^nte
às suas cosías"-. Pode-se dizer que a mesma definição está repetida no art.
2- da convenção de 1982. C o m o bem observa La PradelJe, ele é uma criação
do direito,- sem corresponder a uma noção geográfica. Ele seria o “mar
dos juristas”. O mar terrilorial é uma noção ao mesmo tempo do DIP e
do direito interno.
A expressão “mar territorial” não é a única utilizada para denominar
este espaço marítimo. Ouiras existem, como a de m ar litoral e mar nacioTial.
Entretanto, a de mar territorial é a predominante e está consagrada nas
co n v en çõ es d e 1958 e 1982.6
^22^'A preocupação de se dar ao mar um regime jurídico já é encon-
ftada.na Antiguidade.,Na Grécia e em outros Estados marítimos da Anti­
guidade era admitida a propriedade não apenas sobre as águas próximas
à costa, mas até bem longe dela.
Em Roma, a noção de domínio sobre uma faixa de mar, isto é, de m ar
territorial, não e x i s t i u O mar estava colocado entre as “res communis
o m n w m ” e fazia parte do “jus gentium”. Esta ausência de mar territorial
no mundo romano se deu devido a dois motivos: o primeiro é a pouca
importância dada à pesca, apesar de nem sempre ela ter gozado de uma
liberdade absoluta; o segundo é que o Mediterrâneo pertencia a ela, era
o “Mare Nostrum”. Roma reivindicava a repressão à pirataria, a proteção
à navegação, a polícia das costas e dos portos e afirmava a sua jurisdição
sobre o mar. Em Roma consagrava-se a ljberdade dos mares e da pesca.
O mar era uma “res communis omnium”.
E o mar territorial, como noção jurídica, uma criação do período
medieval. Entretanto, a influência do direito rom ano impediu por longo
tempo a criação deste instituto, principalmente na região do Mediterrâneo,
que sofreu maior influência no sentido do m ar “res communis”.
Foram as cidades marítimas da Itália que tentaram estabelecer uma
base legal para o exercício da sua autoridade no mar, porque já tinham
nos séculos XIII e XIV consolidado o seu poderio na luta contra qs piratas
sarracenos e os Estados cristãos seus rivais, e procuravam assim “justificar
no direito as funções que já tinham o hábito de exercer no mar” (Raestad).
No século XIV, os Estados passaram a tomar no mar territorial medidas
sanitárias, criando estabelecimentos de quarentena.
As razões para a criação-do mar territorial podem ter sido ainda
inúmeras outras: a percepção de impostos sobre a navegação, a pescas ou
a finalidade de assegurar a paz no mar contra os ataques dos piratas.
No Mediterráneo, até o fim do~ século XVII, a pesca não era uma
atividade importante que merecesse ser tomada em consideração nas re­
lações entre os Estados.

1140
Arnold Raestad atribui a sua origem à glosa do sexto livro das Decretais.
"Liber sextus Decretalium Bonifacii VIII cum glosis” (1294-1303), no ca­
pítulo das eleições do Papa. O Papa deveria ser eleito no local em que
morrera o seu sucessor. Um problema foi “imaginado”: era o que fazer
se a morte ocorresse no mar, e a glosa respondia que a eleição deveria ser
feita no Estado a que o mar pertencesse.9 Outros autores (Simone Dreyfus)
sustentam que o mar territorial surgiu no século XIV, quando Veneza o
reivindicou com 100 milhas de largura. Neste mesmo século é reivindicada
em Flandres uma zona marítima, denominada “stroom”, que é reconhe­
cida pela França e pela Inglaterra. Um dos mais antigos acordos de pesca
data de 1351, tendo sido concluído entre o Rei Eduardo III da Inglaterra
e os deputados das cidades marítimas de Castela e de Biscaia e pelo qual
os seus súditos obtinham o direito de pescar nos portos da Inglaterra e da
Bretanha. Ainda no século XIV (1353) a Inglaterra concluiu tratado se­
melhante com Portugal.
Na Europa Setentrional, durante a Idade Média, surge também a noção
de mar territorial. As primeiras manifestações de jurisdição no mar são
dadas pelos códigos provinciais. O Código de Gulathingslagen (parte oeste
da Noruega) estabelece que o rei terá direito à metade da sucessão da
pessoa que morra aquém da “linha mediana do m ar”. O Código de Fros-
tathingslagen (parte norte da Noruega) é aplicado em relação à sucessão
quando o óbito ocorre aquém da linha mediana. Foi a pesca, entretanto,
importante recurso econômico no norte da Europa, que fez com que os
Estados reivindicassem uma zona exclusiva de pesca.10
No século XVI é afirmada a jurisdição sobre o mar territorial do Estado
costeiro e deverá este fazer a proteção da navegação.
No século XVII, Welwood sustentou que os habitantes de uma nação
têm um direito prioritário e exclusivo sobre os recursos dos mares adja­
centes. As águas costeiras (100 milhas) devem pertencer ao Estado costeiro
para evitar o esgotamento dos recursos. Do século XVII até o fim do
período napoleónico o alcance do tiro do canhão permaneceu imutável:
a) canhão real ou inglês Culverin — 250 a 280 metros; b) canhão flamengo
— 450 metros; c) canhão espanhol — 700 metros; d) o tiro de pólvora
seca, “tiro morto”., mais ou mgnos 5km.
E no século XVIII que a delimitação do m ar territorial surge de maneira
precisa.11 Em 1703. Bynkershoek, no “De Dominio Maris Dissertatio” , fala
que “potestatem terrae finiri, ubi finitur armorum vis” .12 Galiani, em 1782,
na obra “De ‘Doveri de'’ Principi neutrali verso i Princípi guerreggianti e
di questo verso i neutrali”, identifica o tiro de canhão com a légua (medida
mais conhecida), que é igual a três milhas.13 Oudendijk, autor de uma
ótima obra sobre a largura do mar territorial, afirma que Galiani não
conhecia balística, vez que os tiros na sua época atingem apenas 1.715
metros. Este limite de três milhas penetrou lentamente no direito positivo,
sendo inicialmente aplicado às presas marítimas somente. O primeiro país

1141
a adotá-lo foi o F.UA. Em 1818, o Tratado de Gand. entre os EUA c a
Inglaterra, foi o primeiro tratado a adotar o limite de três milhas a respeito
da zona de pesca reservada aos nacionais. O tiro de canhão surge para
determinar um limite de neutralidade marítima. Além do interesse pela
pesca era, acima de tudo, urna zona de segurança marítima.
No século XIX, a prática internacional se uniformiza no critério das
três milhas. No século X X , esta largura começou a ser abandonada, por
diversas razões, por inúmeros Estados.
( Í 2 3 .)0 Estado, nos je m jo sjia convenção.de 1982, tem, soberanía ao
/ mar territorial e ela se estende ao espaço aéreo sobrejacente, bem como
\ aõ lèito e subsolo deste mar.
Os Estados possuem diversos direitos exclusivos como uma decorrência
da soberania que exercem no mar territorial. O Estado tem direito sobre
o solo e o subsolo do mar territorial. Esta regrâ o_ é norij íalm en te a plata­
forma continental no sentido geográfico. Existe aqui uma dissociação entre
a Tiõça^ geográfica ê a ribçáò jurídica de plataforma. O soleré ò subsolo
do mar territorial estão sujeitos ao regime jurídico deste e não ao da
plataforma continental. A ocupação do leito e subsolo do mar não constitui
novidade, já estando consagrado no Digesto e em inúmeros autores, como
Vattel. O Jeito do mar territorial é considerado uma continuação do ter­
ritorio estatal. Este direito está consagrado no art. 2S da Convenção de
Genebra.14
O Estado tem Lambém soberania no espaço aéreo sobrejacente ao mar
territorial. Este está consagrado em inúmeras convenções sobre o espaço
aéreo, como as de París de 1919 e Chicago de 1944; ainda, no art. 2a da
convenção sobre mar territorial de Genebra de 1958.
O mais importante dos direitos do Estado sobre o mar territorial é_ q
dirèito exçlúsiypjia p e s c a ^ eleTjüêdá à noção de mar territorial nos dias
deTíoje um conteúdo eminentemente económ ico.13 A pesca foi livre até
a segunda metade do século XVIII, quando foi consolidada a criação do
mar territorial.
O Estado tem o direito de fixar o cerimonial marítimo no seu mar
territorial. Este direito já teve no passado grande importancia, que hoje
tem decaído. Era um dos modos pelos quais os Estados declaravam a sua
soberania sobre os mares. Ainda no século passado houve alguns incidentes
internacionais, em virtude do desrespeito ao cerimonial marítimo.
O_l^lddo_lem_j3jíh r e h p de estabelecer regulamentos sanitários no mar
territorial.. Este direito foi reivindicado no período medieval, quando os
navios que vinham do Oriente comumente traziam a bordo pessoas por­
tadoras de moléstias contagiosas. Atualmente, faz-se um controle nos Es­
tados de onde os navios vão sair para que não seja evitado o desembarque
de pessoas ou efetuada a apreensão de navios em águas estrangeiras. O
assunto foi objeto de diversas normas na Convenção Sanitária Internacional
de Paris de 1926 e no Regulamento Sanitário Internacional (Regulamento

1142
nB 2 da OMS) de 1951. Há uni princípio que rege esta malcría: os navios
estrangeiros não podem ser submetidos a maiores rigores que os nacionais,
uma vez qye a própria finalidade desse direito (evitar a propagação da
moléstia) não comporta distinção de nacionalidade.
As leis aduaneiras e fiscais do Estado se impõem 110 mar territorial,
uma“vez'que ele faz parte do território estatal. A tendência a respeilo
destas leis é de elas serem aplicadas não apenas no mar territorial, mas
também em uma faixa de alto-mar, dando origem assim à denominada
zona contígua. Esle direito dõ Estado se exerce plenamente nos navios
que saem~ou se dirigem para as suas águas interiores. Já o mesmo não
ocorre com os navios que apenas exercem o direito de passagem inocente
no mar territorial do Estado. A Convenção de Genebra proíbe ao Estado,
no seu artigo 18, a cobrança de taxas pela simples passagem do navio no
mar territorial, só sendo admissível a sua percepção quando constituírem
remuneração por serviços prestados ao navio,16 e deverão ser cobradas sem
discriminação de nacionalidade.
O Estado pode tomar no seu mar territorial medidas de segurança e
estabelecer zonas de defesa. Em 1970, foi concluído o tratado de desnu-
clearização do solo e subsolo do mar que é aplicável a uma distância de
12 milhas da linha de base do mar territorial. Como se pode observar, os
Estados que adotam mais de 12 milhas de largura do mar territorial não
podem colocar engenhos nucleares nas demais 188 milhas. Deste modo,
sofre uma restrição nas suas medidas de segurança.
Cabe ao Estado costeiro fixar a regulamentação da navegação no mar
territorial. Sendo comum os Estados reservarem aos seus nacionais a ca­
botagem. Ele fixa as normas sobre praticagem, etc. Foi com o mercantilismo
que o Estado começou a reservar para os seus navios o comércio. Assim,
em 1649 o Act of Navigation de Cromwell proíbe que toda importação
inglesa seja feita por navio que não seja inglês. Esta política foi abandonada
na Restauração, porque a marinha inglesa crescera muito e podia enfrentar
a concorrência. No Brasil, a emenda à Constituição de 1988, aprovada em
1995, abriu a navegação de cabotagem a estrangeiros.
O Estado exerce a jurisdição civil e criminal a respeito dos navios e
pessóas que se encontram no seu mar territorial. E um direito que decorre
da soberania do Estado. No século XVI já havia referências bastante explícitas
à sua existência em Aragão. A Convenção de Genebra procurou manter um
equilíbrio entre a soberania do Estado costeiro e a autonomia do navio.1' A
pesquisa em águas interiores ou no mar territorial depende de autorização
do Estado. No Brasil, o Decreto n9 63.164, de 1968, determina que a
autorização e o controle serão feitos pelo Presidente da República.
^2^. É o direito de passagem inocente18 um corolário da liberdade dos
mares. Sem elêT^a navegação em alto-mar dos barcos de todos os Estados
não seria possível ou careceria de sentido prático" (Aréchaga). O seu
fundamento é jusnaturalista, fazendo parte do “jus communicationis”. A

1143
sua origem foi consuetudinaria. A convenção de Montego Bay o define
como “o fato de navegar no mar territorial com o Fim de: a) atravessar
este mar sem penetrar nas águas interiores nem fazer escala em uma
enseada ou em uma instalação portuária fora das águas interiores ou b)
dirigir-se para as águas interiores ou sair delas, ou fazer escala em uma
destas enseadas ou instalações portuárias ou sair delas”.
O direito de passagem inocente é uma limitação à soberania do Estado
n o mar territorial (Fedozzi).19
São titulares deste direito todos os Estados, mesmo aqueles desprovidos
de litoral.
Este direito tem levantado alguns problemas na questão de se saber
se são seus beneficiários os navios de pesca e os narios de guerra. Quanto
aos navios de pesca, a Convenção de Genebra considerava que eles se
beneficiavam do direito de passagem inocente, mas.que eles deveriam
respeitar os regulamentos do Estado costeiro. Os navios de guerra têm
apresentado maior problema. A doutrina é divergente. A prática interna­
cional também não é uniforme (ex.: a URSS exige que haja uma autori­
zação prévia). A Convenção de Genebra não tinha propriamente um artigo
sobre o direito de passagem inocente dos navios de guerra. Ela apenas
determina que o navio de guerra deve se submeter à regulamentação do
Estado costeiro, o que não sendo feito ele pode ser intimado a se retirar
do mar territorial. Na verdade, diante deste artigo, nada impede que um
Estado, para admitir um navio de guerra estrangeiro no seu mar territorial,
venha a exigir uma autorização prévia. No Brasil, o Decreto ns 56.515, de
23-6-1965, estabelece que a visita de navio de guerra estrangeiro a porto
ou águas territoriais brasileiras deverá ser notificada previamente, mas não
diz se uma simples passagem inocente para atingir outro país deve ser
considerada uma visita e, em conseqüência, precisa ser notificada. Pode-se
dizer que existem três sistemas de passagem inocente de navios de guerra:
a) o Estado dá permissão; b) o Estado só precisa ser informado; c) não é
necessária qualquer formalidade.
Pode-se observar que na convenção de Montego Bay não há dispositivos
semelhantes relativos aos navios de pesca e de guerra.20 E que na 3- Con­
ferência de Direito do Mar, a então URSS tinha se tornado uma grande
potência naval e alterava a sua posição anterior contrária ao direito de
passagem inocente para os navios de guerra. Um grupo de Estados apre­
sentou emenda no sentido de dar ao Estado costeiro o direito de tomar
medidas de segurança que impossibilitou o estabelecimento de qualquer"
norma sobre a matéria (Hong Zeng Zhang).
Tem-se entendido que nenhum navio nuclear (de comércio ou não)
pode- penetrar em águas ou portos estrangeiros quando não há uma au­
torização específica. Esta é dada por acordo que prevê para o Estado
costeiro um direito de inspeção para controle radiológico. O não respeito

1144
por parte do navio nuclear é sancionado pela ordem dele se retirar das
aguas do Estado (Lucchini e Vollckel).
Na convenção de Montego Bay se estabelece que “os navios estrangei­
ros de propulsão nuclear e os navios que transportem substancias nucleares
<5u*ouuas substancias intrínsecamente perigosas ou nocivas deverão ter a
bordo os documentos e observar as medidas especiais de precaução”. Por
outro lado, a convenção de 1982 estabelece que os Estados costeiros poden)
fixar rotas de navegação para tais navios. Ten) sido obseivado que de um
modo geral os navios mercantes nucleares foram desativados por seus
governos.
Não será considerada em passagem inocente21 a embarcação que rea­
lizar qualquer um dos seguintes atos: a) ameaça do uso da força contra a
soberania, integridade territorial ou a independencia política do Estado
costeiro; b) qualquer exercício com armas de qualquer tipo; c) “qualquer
ato destinado a obter informação que prejudique a defesa ou a segurança
do estado costeiro”; d) “qualquer ato de propaganda destinado a atentar
contra.a defesa ou a segurança do Estado ribeirinho”; é) “o lançamento,
recepção ou embarque de aeronaves”; J) “ o lançamento, recepção ou
embarque de artefatos militares”; g) “o embarque ou desembarque de
qualquer produto, moeda ou pessoa, violando as leis e regulamentos adua­
neiros, fiscais, de imigração ou sanitários do Estado costeiro”; h) “qualquer
ato de poluição internacional e grave”; i) “qualquer atividade de pesca”;
j) “a realização de atividades de investigação ou levantamentos hidrográ­
ficos”; k) “qualquer ato visando perturbar os sistemas de comunicações
ou qualquer outros serviços ou instalações do Estado ribeirinho”; Z) “ qual­
quer outras atividades que não estejam diretamente relacionadas com a
passagem”. E ainda norma assente no DI que os submarinos, ao exercer
o direito de passagém ínõcênte, “deverão navegar na superfície e arvorar
seu pavilhão”. Esta última norma é considerada “pouco realista”, vez que
os submarinos nucleares navegam sempre debaixo d’água e só vêm à tona
para entrar e sair do porto. Pode-se ainda acrescentar que durante a
passagem inocente o navio estrangeiro não pode recuperar destroços de
navio. *>1'A
O Estado -costeiro tem o direito de promulgar normas relativas à pas- '
sagem inocente visando a: a) segurança da navegação e a regulamentação
do tráfego marítimo; b) proteção dos “ auxílios” à navegação; c) proteção
dos cabos e oleodutos submarinos: d) conservação dos recursos vivos; e)
repressão às infrações às suas leis e regulamentos de pesca; j) pesquisa
científica marinha; g) prevenir as infrações às suas leis e regulamentos
aduaneiros, fiscais, de imigração e sanitários. As leis e regulamentos do
Estado costeiro deverão ter publicidade. Finalmente, pode-se acrescerttar
ainda que o Estado costeiro tem o direito de impedir a passagem que não
seja inocente, bem como suspendê-la temporariamente em determinadas
áreas.

1145
o E s ta d o c o s te ir o
term in ad as ro las d ^ naveg ç ¿ ^ (v. acim a>. obstáculos

1,0
q u e im p eçam á passag m e r ca d o ria s em virtude - c) 0 E siado
aos navios q u e d e s ú n a l o d a l ado nã o

-P A jjassagem de parle do alto-mar ou de


navegação mte™^“ 0” oUtra parte do alto-maT ou a lo(Jos os navios
e c o n ó m i c a exclu passagem de tránsito e con uberdade de nave-

respeitarão 0 Regulamento ( R e J Z ^ T Z ^ T ^ e) aS aer<“


as aeronaves civis, bem como a s ^ o n a ^ ^ P e l e a d o pe]a OACI para
ente tais m eadas de segurança e operação” ° CWnPn r5° normal-
Çao a segurança da navegação e ‘L i ’ sempre tendo em conside-
quencia de radio designada pela a m o ! ? ! T ° Slnt° nizada sempre a fre-
t-fe g o aéreo..,”; j ) d Z n te * * > L > le do
qualquer pesquisa hidrográfica ‘‘sem a Tnm nSU° nao P°derá ser feíta
os a estes estreitos”. _ autonzaçao prévia dos Estados cos-
Os Estados costeiros poderão estah^i
Para a passagem de transito, bem como nave&a^ ° marítima
tanto, dar publicidade a tais medidas Têm " dcVendo>™ ‘re-
de promulgar leis e reguIameníos Tobre T ^ C° SteÍr° S ° direi‘°

U 4A ’
-i-'rWvj ríos Estados costeiros (los estreitos. As
fiscais, de ¡migração ou san» a - ■() discriminacóes entre as embarca-
diferenes le s e regúlam enos» » U . ^ ^ bl¡Qtlade. O «avio o«
çóes estrangeiras, bem c o m o jurisd5çào e que viole as nonnas
aeronave que goze de « resp0nsabilidade internacional por qua
estabelecidas acuna meo, o ^ j Q Eslad« costeiro tem o dever
quer daño ou prejuwo que le,iba c s com o devera d,vulgar
de nao criar obstácu.os a p a s ^ e m d c ^ ^ e maríll
os perigos existentes na ,eg»a p< silwos da convenção de 1982
É de se fazer ainda mença . Uberdade de navegaçao e de
relativos aos estreitos: a) sera de a,to_nrar ou que atravesse
sobrevôo se pelo “estre.to passa conveniente em virtude de suas
uma zona económica exclusiva b) será apiicada a passagem
características h i d r o g r á f i c a s e * 1 ^ ¿ parte do alto-mar ou de urna

i— - — ~
suspensa. ser formulados «o tocante as
nos casos de a c i d ^ l * paSSaSem í c e n t e o direifo de n
direito se anlií' j navegação, força maior tytt-........ parar e ancorar
trânsito não h ã o * í ° S naV' ° S’ incJusive os de m iminente- Este
da Diretoria de PonoT ™ r K ¿° CXpress¿‘ a este direito'M<VR pa? agem de
nacional e estranap- «C las de 3 8 /] 0 /8 3 detf> ■ rás,1>Portaría
mar territorial b r a s i l e r o macluinas ou fa ld e a r ^ j . 0 nav,° ’
mador devera r- . Comandante ou o i-pn hm ites do

qüências d a n ^ ^ J S d t c ^ ^ a * nd°

— - — ^ asa
1147
d e navegação; islo o c o rre u , (ic um m o d o gt-ral, p o r exem p lo, em re la çã o
ao Canal de Suez.
Pode-se acrescentar que a liberdade de acesso aos portos 1'oi consagrada
na Declaração de Barcelona (1921), mas que ela tem um caráter conven­
cional.
[ 425..A íinha cie base do mar territorial é aquela a partir da qual se
m ed ea largura do mar territorial em direção ao alto-mar. Ela é a linha
que separa o mar territorial das águas interiores. A sua importância tem
sido realçada porque, quanto mais mar afora, mais longe irá o mar terri­
torial, bem como mais larga será a área das águas interiores.
A linha de base normal é aquela ao longo da costa na baixa-mar. O
Pi.nâ<>define o que seja baixa-tnar. A Convenção de Montego Bay declara
que é aquela “indicada nas cartas marítimas de grande escala, reconhecidas
oficialmente pelo Estado ribeirinho” .21 No caso de costas instáveis a linha
de base não é modificada com o recuo da costa, a não ser que o Estado
se decida a modificá-la. Esta norma que figura na alínea 2 do art. 7a da
convenção foi feita para atender a Bangladesh.
O método de se traçar uma linha reta para servir de linha de base do
mar territorial nas costas muito recortadas, ou quando existe uma série
de ilhas próximas da costa, remonta a Jacques I, da Inglaterra, que em
1604 estabelecia que as “King’s Chambers” seriam determinadas craçan-
Irr/lirecao5da’c'ósW r^, os oromontórios da costa. O sistema da linha de

ao regime de águas que des tenham construçoes


só Se descobrem na mare baixa, a q ^ ^ do mar . e) na
(faróis) “que se achem p e ™ e n t e , ^ ^ consideração “os interesses
fixação da linha de base reu p importância seja confirmada poi
econômicos próprios da/ e^ a sel aplicado por um Estado de manen a

¿ ouu‘° ‘,0 “

serem tmidos por esta Unha de b a * O ^ n, 5 5 3 /6 9


entre nós, a distância máxima de 12 m , ^ lJ)98t de 25* -7 0 , revogou

“ a ^ n S l Í d a Cque q S n íò a linha de base reta tem por efeito englo ar,


como águas internas, zonas que erain antes consideradas como aguas
interiores, o direito de passagem inocente se aplica a estas aguas.'*'
Nos portos'-" o limite interior do mar territorial é traçado a partir das
“obras fixas mais avançadas do porto”. Esta regia se justifica tendo em
vista a importante função que estas têm nas operações do pono, daí serem
assimiladas estas águas às águas interiores. Entretanto as instalações “costa
afora e as ilhas artificiais não serão consideradas construções portuárias
permanentes”.
As enseadas também possuem regra especial de delimitação. As ensea­
das são aquelas áreas marítimas que são usadas para os navios ancorarem.
Elas se caracterizam por ser um local de abrigo para os navios, As enseadas,
na Convenção de 1982, não são consideradas águas interiores, mas fazendo
parte do mar territorial,26 mesmo as enseadas que estiverem “totalmente
ou.em parle fora do traçado geral do mar territorial”. Esta norma não se
refere propriamente à linha de base do m ar territorial, porque ele não é
medido a partir da enseada, mas apenas ele (mar territorial) abrange toda
a enseada.2'
Nas baías localizadas em território de um só Estado não se adota a
linha da maré baixa, porque ela é impraticável: a) se a baía possuir mais
do dobro da largura do mar territorial, acarretaria a possibilidade de os
navios de guerra penetrarem no seu interior, uma vez que seria alto-mar
na faixa que excedesse o dobro da largura do mar territorial adotado pelo
Estado; b) se a baía possuir menos do dobfò da largura do mar territorial,

- h) “ miando, em razao r irarado tomando-se


rta vccntxsincíír ? 0/ 4 * c ^ n iic jrc u lo ^ «*

perfíciè" das ilhas g u ad as no i n t^ o r d e u . * = ^ ^


sir,\nnerfície total desta ; c) ¿d 'S tan a j ^ . hnh ^
na

preender a maior superficie g Fslado não


tal comprimento . • território de mais de um ;

^ S S a ssg sse s^ z
doradas mar territorial, estando assim resguardado o direito de passagem
inocente. Entre os Estados costeiros os limites são traçados do seguinte
modo: a) se a largura da baía é menor que o dobro da do mar territorial,
adota-se a linha mediana; b) se ela tem mais do dobro, cada um fica com
seu mar territorial e o meio fica como alto-mar; r) en) outros casos adota-se
como limite o meio do canal principal; este sistema é adotado nos casos
em que se a linha mediana fosse seguida e ela deixasse para um Estado
apenas água cheia de bancos, etc., e o outro ficasse com as “águas boas";
d) nada impede que os Estados costeiros estabeleçam na baía um condo­
mínio.
As águas históricas são consideradas águas interiores e o mar territorial
é medido a partir delas. Estas águas se loc’alizam, via de regra, no território
de um único Estado,30 só havendo como exceção neste sentido a baía de
Fonseca, que se encontra no território de três Estados: Nicarágua, Hon­
duras e El Salvador.'11 A teoria das baías históricas parece ter surgido em
1793, quando um navio francês capturou um navio inglês na baía de
Delaware. O Procurador-geral dos EUA alegou em parecer que sempre o
seu país se considerara com direito a todo o estuário do Delaware e também
sobre as águas de toda a baía (B. de Villeneuve). O grande problema
consiste em sabermos quais são os elementos que transformam uma zona
marítima em águas históricas. Diante da jurisprudência internacional, po­
demos afirmar que uma “água”, para ser considerada histórica, deve ter
os seguintes elemenlos: um interesse vital para o Estado costeiro; a área
reclamada a título de soberania deve ser adjacente à costa do Estado; um
uso continuo, pelo Estado, dessas águas, como se fossem águas interiores,
por longo tem po,12 e a ausência do protesto por parte dos outros Estados.
Ela deve se encontrar no território de um único Estado. Não há direito
de passagem inocente nas águas históricas. Atualmente são reivindicadas
como águas históricas o Golfo de Sidra, pela Líbia, e a Baía de Pedro o
Grande, pela Rússia.
Na embocadura dos rios, se o “ riò-desemboca diretamente no mar, a
linha de base será uma linha reta” traçada na maré baixa na boca do rio.
As embocaduras de rios em território de mais de um Estado não foram
tratadas pelas Convenções de Genebra e de 1982. Se for um estuário,
podemos aplicar as normas sobre as baías em território de mais de um
Estado. Sc não for um estuário, a‘ prática internacional (rio da Prata —
declaração conjunta da Argentina e Uruguai em 1961 e 1964) considera
que se deveria traçar uma linha reta na sua embocadura e as águas entre
a costa e a linha reta seriam águas interiores. Este procedimento nos parece
possível quando há acordo entre os interessados; não havendo, devem ser
aplicadas as normas referentes às baías em território de mais de um Estado.
É preciso que se ressalte um amplo direito de passagem inocente para
terceiros Estados com interesse especial na região (ex.: um Estado banhado
pelo rio, mas que não é limítrofe na sua embocadura).

1150
S o b re os b a ix io s a d esco berto ( “ e n te n d e m -s e as elev ações n a u u a ts de
terreno q u e são cerca d a s pelo m a r e d e s c o b e r ta s pela m a ié Ijaix a. mas
cobertas na m aré a lia ” ) , qu an d o eles se lo ca liz a m a nina d istan cia q u e nao
seja su p erior à la rg u ra d o m ar te rrito ria l, “ a lin h a de baixa-m ar s o b r e csses
baixos pod e s e r to m a d a co m o lin h a d e b a se p a ra m ed ir a larg u ra d o m ar
territo rial” . Se os b a ix o s a d e sc o b e rto e stiv e re m fo ra do m a r te rrito ria l,
eles não têm um m a r territo rial p ró p rio .
E de se assinalar que o Estado deverá dar publicidade das linhas de
base adotadas.
As ilhas (“extensão natural de térra, cercada de agua e que fica des­
coberta na nvaré alta”) possuem mar territorial, plataforma continental e
zona económica como o continente. Não estão incluídas as ilhas artificiais
que possuem normas próprias.33 Na convenção de 1982 há uma novidade
no tocante de que as rochas que não forem aptas “para manter habitação
humana ou vida econômica própria não terão zona econômica exclusiva
nem plataforma continental’’. De um certo mocFo‘pode-se dizer que esta
última ressalva que figura na Convenção de Montego Bay segue uma
observação de Gidel que afirmava que para ser ilha era necessário que as
“condições naturais permitissem a residência de grupos humanos organi­
zados”. François, relator da Comissão de Dl cujos trabalhos concluíram
na Convenção de Genebra, afirmava, entretanto, que “qualquer rocha
poderia ser usada como uma estação de rádio ou um posto de observação
meteorológica” e, em conseqüência, “neste sentido, todas as rochas eram
suscetíveis de ocupação efetiva e controle” . Assim sendo, no tocante ao
mar territorial a convenção de 1982 manteve o conceito da convenção de
1958, mas inovou no conceito de ilha ao tratar da plataforma continental
e da zona econômica. Podemos analisar ainda algumas hipóteses em rela­
ção às ilhas: a) ilha próxima à costa, mas fora do mar territorial do “con­
tinente” — se o m ar territorial da ilha e do continente se misturam, ele
forma um todo; b) se entre os dois mares territoriais forma-se um bolsão
de alto-mar de pequena largura, ele poderá ser incorporado ao m ar ter­
ritorial. Em todos os casos a ilha possui o seu mar territorial próprio.
Os arquipélagos têm apresentado grande número de problemas. Eles
foram definidos como “a formação de duas ou mais ilhas (ilhotas ou
rochedos), que geograficamente podem ser consideradas como um todo”
(]. Evensen), à época da conferência de Genebra. A Convenção de Genebra
não tratou do assunto. No caso de arquipélagos costeiros em forma retilí-
nea, é comum se traçar a linha de base reta. Os arquipélagos não costeiros
não apresentam uma prática uniforme: alguns Estados (Filipinas, Indoné­
sia) adotaram o critério unitário e consideram o arquipélago como um.
todo, independente da distância das ilhas: o mar territorial é medido a
partir das ilhas mais externas e as águas entre as ilhas são águas interiores.34
E verdade que a aplicação do critério unitário poderá levar a algumas
situações bastante difíceis, assim, se ele viesse a ser aplicado nas ilhas gregas

1151
do Mar ligcu. a Romênia e a Bulgária, ao saírem do Mar Negro, não leriam
acesso ao alto-mar através do Mar Egeu.
Omros (EUA e Inglaterra) consideram que cada ilha tem o seu mar
territorial próprio. AJguns amores (Sorensen) consideram que as águas
interiores nos arquipélagos, se forem indispensáveis à navegação interna­
cional, deverão estar sujeitas ao direito de passagem inocente.
A convenção de 1982 dedica vários artigos aos denominados “Estados
arquipélagos”, bem como define arquipélago. Estado arquipélago é aquele
“constituído integralmente por um ou vários arquipélagos 1Tque poderá
incluir' outras ilha¿”. Arquipélago é definido c o m o “um gnjpojje_iihas,
jncluídas partes de ilhas, as águas-que as comunicam e outros elementos
naturais, que estejam tão estreitamente relacionados entre si que tais ilhas,
águas e elementos naturais formam intrínsecamente uma entidade geo-
gráfica,econômica e política ou que.históricamente tenham sido conside­
radosi çpnia~ial”-JEm termos estratégicos, o arquipélago mais importante
é o da Indonésia, porque é através dele que se faz a comunicação entre
os Oceanos Pacífico e Índico.
Inúmeras normas foram estabelecidas para as linhas de base arquipe-
lágicas: a) podem ser traçadas linhas retas “que unam os pontos extremos
das ilhas e os recifes acima da água mais distante do arquipélago, com a
condição de que dentro de tais linhas de base permaneçam compreendidas
as principais ilhas e uma área em que a relação entre a superfície marítima
e a superfície terrestre, incluídos entre os atóis, seja entre 1 a 1 e 9 a 1”;
b) a distância de tais linhas de base não excederá 100 milhas marítimas,
entretanto, “até 3% do número total de linhas de base que fechem um
arquipélago poderá exceder esta distância, até o máximo de 125 milhas
marítimas”; c) o traçado das linhas de base não se desviará de modo
apreciável da configuração geral do arquipélago; d) não serão traçadas
linhas de base em elevações que fiquem acima da água apenas nabaixa-mar,
a não ser que aí tenham sido construídos faróis ou instalações análogas
que fiquem permanentemente acima da água, ou ainda que esta elevação
“esteja situada Lotai ou parcialmente a uma distância da ilha mais próxima
que não exceda a largura do mar territorial”; é) não será aplicado o sistema
de linhas retas quando ele isolar do alto-mar ou da. zona econômica ex­
clusiva o mar territorial de outro Estado; f) “se uma parte das águas
arquipelágicas de um Estado arquipélago estiver situada entre duas partes
de um Estado vizinho imediatamente adjacente, se'manterão e respeitarão
os direitos existentes-e’ quaisquer outros interesses legítimos que este último
Estado tenha exercido tradicionalmente em tais águas g) para se cal­
cular a relação entre água e terrâ mencionada na letra a. “as superfícies
terrestres poderão irfcluir águas situadas no interior das cadeias de recifes
de ilhas e atóis, incluída a parte alcantilada de uma plataforma oceânica
que esteja fechada Ou quase fechada por uma cadeia de ilhas calcárias e
de recifes emergentes situados no perímetro da plataforma”; h) as linhas

1152
de base traçadas conforme tais normas deverão figurai cm canas com
escalas adequadas para o seu traçado ficar preciso, bem tomo lais cartas
deverão ter publicidade. A largura do mar territorial, da zona contígua,
da 7.011 a econômica e da plataforma, será medida a partir das linhas dé­
base arquipelágicas.
A soberania do Estado nas águas arquipelágicas se exerce inde­
pendente de sua profundidade ou distância da costa. A soberania se estende
ao espaço aéreo, leito e subsolo, bem como aos recursos de lais águas. O
Estado arquipélago poderá traçar linhas para determinar as águas inte­
riores dentro de suas águas arquipelágicas conforme as normas expostas
acima. Entretanto, o Estado arquipélago respeitará “os acordos existentes
com outros Estados e reconhecerão os direitos de pesca tradicionais e
outras atividades legítimas dos Estados vizinhos imediatamente adjacentes
em certas áreas situadas nas águas arquipelágicas”. Tém estes Estados a
obrigação de respeitar os cabos submarinos existentes que tenham sido
colocados por outros Estados em suas águas, bem como permitirão, após
terem sido notificados, a sua manutenção e substituição.
É assegurada a passagem inocente nas águas arquipelágicas a todos os
navios. O Estado poderá suspender temporariamente a passagem inocente
se isto for “indispensável para a proteção de sua segurança” . A suspensão
deverá ser publicada.
A convenção de 1982 estabelece ainda um “direito de passagem nas
vias marítimas (rotas) arquipelágicas” que “poderão” ser designadas pelos
Estados arquipélagos. Poderão ser “vias marítimas e rotas aéreas sobre
elas” que sejam “adequadas para a passagem não interrompida e rápida
de navios e aeronaves estrangeiros por ou sobre suas águas arquipelágicas
e o mar territorial adjacente”. “Todos os navios e aeronaves gozam do
direito de passagem” em tais vias e rotas. “Por ‘passagem pelas vias marí­
timas’ arquipelágicas se entende o exercício... dos direitos de navegação
e de sobrevôo de modo normal, exclusivamente para os fins de trânsito
ininterrupto, rápido e sem entraves entre uma parte do alto-mar ou de
uma zona econômica exclusiva e outra parte do alto-mar ou de uma zona
econômica exclusiva”. Estas vias marítimas e rotas aéreas incluirão as rotas
normais de navegação marítima e aérea. Estas rotas serão devidamente
definidas por linhas axiais e os navios e aeronaves não se desviarão mais
de 25 milhas de um ou outro lado destas linhas, etc. Foi adotada esta
largura para se permitir o desdobramento de uma esquadra com várias
embarcações. Se um Estado arquipélago “não designar vias marítimas ou
rotas aéreas, o direito de passagem por vias marítimas arquipelágicas po­
derá ser exercido através das rotas utilizadas normalmente para a navegação
internacional”. O que se pode observar é que a convenção é complexa no
tocante à passagem nas águas arquipelágicas e podemos deduzir o seguinte:
a) é assegurado o direito de passagem inocente à navegação marítima; b)
os Estados podem designar rotas de navegação marítima e aérea para o

1153
exercício do direito dt- passagem descrito acima, mas se não o fizer os
navios c aeronaves poderão exercer o citado direito “através das rotas
utilizadas normalmente pela navegação internacional". Assim sendo, a
navegação marítima vai se beneficiar da passagem inocente, que é mais
ampla do que o “direito de passagem". E interessante observar que a
Convenção de Montego Bay consagra assim a passagem inocente, a passa­
gem de trânsito e o direito de passagem, sendo que este último utilizado
nas águas arquipelágicas esLá sujeito às normas e obrigações da passagem
de trânsito. Daí W. Riphagen ter observado que os corredores de navegação
nas águas arquipelágicas têm um estatuto jurídico comparável ao dos es­
treitos que servem à navegação internacional.
A grande vantagem para o Estado arquipélago na adoção das águas
arquipelágicas é o controle sobre a pesca.
Pode-se lembrar que a I. Maurício, como Estado arquipélago que
reivindica uma zon a econômica até 200 milhas, vai multiplicar L800 vezes
a superfície terrestre em águas que ficarão sob sua jurisdição.
Um último aspecto que ainda vamos analisar neste item é o de mares
fechados ou semifechados, que são definidos como “um golfo, bacia ou
mar rodeado por dois ou mais Estados e que se comunica com outro mar
ou o oceano por uma saída estreita, ou formado inteira ou fundamental­
mente pelos mares territoriais e as zonas econômicas exclusivas de dois ou
mais Estados ribeirinhos”. A convenção de 1982 apenas estabelece que os
Estados deverão cooperar para o exercício de seus direitos.
!42(x)0 limite exterior do mar territorial tem três métodos para o seu
traçado; 0 j o traçado paralelo à costa, que é impraticável quando ela
apresenta uma série de sinuosidades, uma vez que seria impossível aos
navegantes saberem se estão ou não dentro de um mar territorial estran­
geiro; b) o traçado poligonal; consiste em fazer na linha de base no mar
territorial uma série de “retas ideais” unindo, dois a dois, os pontos da
costa, e o limite exterior seria formado de linhas retas paralelas às linhas
de base. A dificuldade deste sistema é que para o navegador se orientar
precisaria que as regras fossem “preestabelecidas e invariáveis” e daria
muita liberdade aos Estados para escolherem pontos salientes; c) método
das curvas tangentes; “consiste em traçar uma série continua de arcos de
círculos com um raio igual à largura do mar territorial em todos os pontos
da costa. O limite exterior é formado pelos arcos que se cruzam mais mar
afora’’ (Aréchaga). A jurisprudência internacional (caso das pescarias an-
glo-norueguesas) não'considera nenhum deles obrigatório. A Convenção
de Genebra apenas determina que ele é formado por uma linha cujQS
pontos extremos se situam a uma distância igual à largura do mar territorial
do ponto mais próximo da linha de base.
A Convenção de Montego Bay estabelece que o “limite exterior d.o
mar territorial é a linha” que está mais próxima de cada um dos pontos
da linha de base “a uma distância igual à largura do mar tem tçrial”.

1154
Entre rlois Eslados laterais, o limite é traçado pela linha dos pontos
equidistantes, ou método Boggs (foi quem o definiu e propôs). T o d a v ia ,
deve ser ele corrigido em determinados casos, como, por exemplo, quando
a sua aplicação desse para um único Estado todos os canais navegáveis de
uma baía ou de uma embocadura de um rio. A doutrina (Gidel) tem
proposto que se aplique nestes casos o talvegue, que no direito marítimo
significa “o canal principal em direção a um ponto dado”.
Entre Estadosfronteiros, aplica-se a linha mediana, a não ser que haja
acordo em contrário ou existam na região águas históricas.
Nos estreitos (passagem marítima que comunica dois espaços maríti­
mos)33 existem algumas normas especiais. O estreito com apenas um Estado
costeiro: a) se ele não excede em largura o dobro da largura do mar
territorial: ele pertence por completo ao Estado costeiro; b) se o estreito
possui entradas não excedendo o dobro da largura do mar territorial, nos
“bolsões” no seu interior em que esta medida é ultrapassada, seriam os
tais bolsões, normalmente, alto-mar, todavia, poderão ser eles eliminados,
uma vez que não apresentam maior interesse para a navegação. O estreito
com mais de um Estado costeiro: a) se ele tem menos do dobro da largura
do mar territorial, adota-se a linha mediana;36 b) se ele tem mais do dobro
da largura do mar territorial, cada Estado traça nele o seu mar territorial,
e o meio fica como alto-mar.
E preciso assinalar que a extensão do mar territorial para 12 milhas
fará com que 116 estreitos até agora com um corredor no meio como
alto-mar serão cobertos pelas águas territoriais.
Finalmente, podemos repetir com L. Nelson que as fronteiras maríti-
mas,.devem ser estabelecidas conforme “equitable principies”.
Mi2^. O problema da largura do mar territorial foi uma das grandes
questões do DIP do Mar nos dias de hoje. A largura tradicional, como
vimos, é a de três milhas; entretanto, na Conferência de Haia (1930),
diversos Estados já sustentavam a insuficiência deste critério A doutrina
também não tem sido uniforme.37 A pratica também não apresentava
qualquer uniformidade; um grupo defendeu três milhas (França, Inglater­
ra);38 outro, quatro milhas (Suécia, Noruega); outro, seis milhas (Itália,
Grécia); outro, 12 milhas (URSS, República Popular da China); e outro,
200 milhas (Chile, Peru,38AEquador). Posteriormente os antigos defensores
das três milhas passaram para o grupo das 12 milhas. Assim, os EUA
continuaram durante algum tempo com o mar territorial de três milhas,
mas criaram uma zona de pesca de nòve milhas. A convenção européia
de pescarias (Londres, 1964) admite 12 milhas de zona de pesca. A França,
em 1971, passou para 12 milhas. Na verdade, não havia uma uniformidade
total da largura do mar territorial já há algum tempo, vez que no Medi­
terrâneo Oriental, desde os séculos XVIII e XIX , os estados reivindicavam
6 milhas de largura e os países escandinavos 4 milhas.
Na Conferência de Genebra de 195835 as divergências se manifestaram
e na convenção sobre m ar territorial e zona contígua, aí concluída, não

1155
ex isu: nenhum dispositivo sobre a largura do mar territorial, lila leria de
modo indireto limitado o mar territorial ao fixar 12 milhas para a zona
contigua. Esta noção de zona contigua, podemos acrescentar, se encontra
hoje ultrapassada. Em 1960, uma nova conferencia, reunida em Genebra
'para este fim, não chegou a nenhum resultado.
Na América, o Conselho Interamericano de Jurisconsultos (México,
1956) afirmou que, conforme as suas necessidades, o Estado poderia de­
terminar a largura do mar territorial “dentro de limites razoáveis’". A
Comissão Jurídica Interamericana (1965) considerou que o Estado pode
fixar até a largura de 12 milhas. Atualmente (1973) aprovou resolução em
que se inclina por um mar territorial de 12 milhas e mais um mar patri­
monial de 18Í? milhas.
A disputa em torno da largura do mar territorial nas conferências de
Genebra de 1958 e 1960 prendeu-se a três fatores: estratégico, navegação
e pesca.
Quanto à pesca: o mar tem sido considerado como a grande reserva
de alimentos da humanidade. As águas próximas às costas são as mais ricas
em espécies comestíveis. Apenas 10% do mar são produtivos, e estas áreas
são as águas sobre a plataforma continental, e alguns “oásis” que também
são próximos à costa (Paulo Moreira da Silva).40 Daí os grandes países, na
pesca, defenderem um mar territorial estreito, a fim de ir pescar próximo
às costas de Estados estrangeiros. J á os pequenos sustentavam maior largura,
não só para defender as suas reservas, bem como porque não vão pescar
próximo às costas estrangeiras. E de se salientar que inúmeras populações
costeiras têm a sua alimentação essencialmente baseada na pesca.
Quanto à navegação, alegava-se que a grande maioria dos faróis só
atingiu três milhas, que muito balizamento, no mar só é avistado a esta
distância, bem como seria difícil para muitas embarcações ancorar à dis­
tância de 12 milhas, quando elas não quisessem entrar no mar territorial
estrangeiro.
Quanto ao.fatnr estratégico: n) inúmeros estreitos (Malaca, etc.) vira-
riam mar territorial e as esquadras norte-americanas teriam o seu raio de
ação reduzido; b) a aviação ficaria entravada, uma vez que não existe em
favor dela um direito de passagem inocente; eríi conseqüência, diversas
rotas aéreas se transformariam em espaço aéreo de águas territoriais;.c)
os submarinos, principalmente os atômicos, atuam com maior segurança
em uma distância de 12 milhas da costa e, em conseqüência, eles poderiam
operar em um m ar territorial de Estado neutro sem ser detectados pelo
radar e sem que os navios de superfície possam atuar em relação^a eles.
Hoje os argumentos acima têm um valor meramente histórico, sendo
suficiente lembrar que eram usados contra um mar territorial de 12 milhas,
o que é aceito atualmente por todos os Estados.
O grande fator que pesa hoje em dia na discussão em torno das 200
milhas com o mar territorial é o estratégico, no sentido de ser assegurada
a liberdade do tráfego aéreo e a liberdade de navegação para os navios

1156
de guerra. Daí a aceitação dos EUA da zona econômica. Eles próprios,
apesar de manterem o mar territorial em três milhas, acabaram por criai
uma zona de pesca que vai até 200 milhas de largura contados a partir da
costa. A própria URSS estendeu para 200 milhas a sua zona de reserva de
pesca (] 977) ou, ainda, no mesmo sentido e ano se manifestaram os países
da CEE onde os Estados tomariam medidas em comum e seria urna “zona
de pesca comunitaria”.
A grande questão no Direito consistia em saber se existia ou não uma
norma internacional fixando a largura do mar territorial. Uma corrente
(Oppenheim) considera que sim, enquanto a outra (Alexandre Alvarez)
responde que não. Na verdade, não existia qualquer norma internacional
neste sentido, bastando para isto que se veja a diversidade da prática
internacional, que não apresentava qualquer uniformidade para a forma­
ção de uma norma consuetudinária.41
E de se salientar que o Instituto Hispano-luso-americano de Direito
Internacional (Lima, 1970) reconheceu que cada Estado tinha o direito
de fixar a largura do seu mar territorial e que devia existir uma pluralidade
de regimes devido à diversidade de situação. E de se lembrar que a largura
do mar territorial não tem qualquer obrigatoriedade de ser uniforme no
mundo inteiro. Ela deve atender a condições econômicas e geográficas.
DiziaJohnston que a idéia de uniformidade é apenas um “prazer estético”.
As grandes potências têm protestado contra as larguras superiores a 12
milhas e com isto impedido que se forme uma nova costumeira. Os EUA
aplicam sanções aos países que prenderem barcos de pesca norte-ameri-
canos a mais de 12 milhas da costa, sendo que a multa paga por estes
barcos será descontada do auxílio econômico norte-americano ao país. Na
verdade, a validade do aumento vai depender da sua efetividade. Uma
tendência que se desenvolveu na América é a do mar patrimonial, como
figura na Declaração de S. Domingos (1971), firmada por países do Caribe.
A diferença entre mar patrimonial e mar territorial é que naquele o Estado
tem direito sobre todos os recursos das águas, solo e subsolo e é assegurada
a liberdade de navegação marítima e aérea (tão importante nas reivindi­
cações dos EUA). O mar territorial integra-se ao território do Estado com
todas as conseqüências daí decorrentes, enquanto que no m ar patrimonial
o Estado só tem soberania sobre os recursos. O mar territorial e o mar
patrimonial juntos não devem exceder 200 milhas.
Nenhum Estado protesta máis contra a largura de 12 milhas.41'
O Brasil adotava o critério das três milhas.416 O Decreto-lei nfi 44/66,
levando em consideração as novas tendências, aumentou o mar territorial
para seis milhas de largura e criou uma zona contígua de pesca de mais
seis milhas de largura a partir do limite externo do mar territorial. Nesta
zona, o Brasil possuía direito exclusivo de pesca e de “exploração dos
recursos vivos”. O Brasil se orientou por uma tendência de conciliação
que se manifestou nas Conferências de Genebra com a criação de uma
nova zona marítima: a zona contígua de pesca. Ela estava fundamentada

1157
cm parecer de H. Valladão. Esla legislação teve o mérito de atender alguns
dos nossos interesses; entretanto, ela já poderia ter aumentado de uma
vez o próprio mar territorial para 12 milhas (aceito pela Comissão de Dl),
onde teríamos maiores direitos do que na zona contígua de pesca.4* De
qualquer modo, ela defendeu a principal razão para o aumento do mar
territorial: a pesca. Finalmente, o Decreto-lei ne 55J5, de 1969, aumentou
o mar territorial para 12 milhas, suprimindo assim a zona contígua de
pesca.
O Decreto-lei n- 1.098, de 25-3-1970, aumentou o mar territorial bra­
sileiro para 200 milhas.
O Decreto-lei ns 68.459, de 1-4-1971, divide o mar territorial em duas
zonas de 100 milhas, sendo que uma zona mais próxima à costa é reservada
a embarcações nacionais de pesca, sendo que na outra zona “ as atividades
pesqueiras poderão ser exercidas por embarcações de pesca nacionais e
estrangeiras”. “A exploração de crustáceos e demais recursos vivos, que
mantêm estreitas relações de dependência com o furidô subjacente ao mar
territorial brasileiro, é reservada a embarcações nacionais de pesca.” A
autorização para “embarcações estrangeiras de pesca, sem contrato de
arrendamento com pessoa jurídica brasileira” pescarem na zona do mar
territorial mais afastada da costa é dada pelo “Ministro da Agricultura,
ouvido o Ministério da Marinha”. Entretanto, as disposições acima poderão
ser derrogadas “pelos acordos internacionais de pesca”. O Brasil, ao adotar
a largura de 200 milhas, incluiu no mar territorial todas as águas sobreja-
centes ã plataforma continental (200 metros de profundidade).
No Brasil a Lei ns 8.617 de 4-1-93 coloca como leg islação brasileira as
principais noratas de delimitação dos espaços marítimos consagrados na
convenção de 1982: mar territorial, zona contígua, zona econômica e
plataforma Continental. A passagem “será considerada inocente desde que
não seja prejudicialJij)az^à_boa ordem ou a segurança do Brasil, devendo
"s«^FõiTünya_e rágida^_._ Admite o direito de passar e fundear por motivo
7fé~,^ rrajT iaio r oii.difírnldaHe grave”. A pesquisa na zona econômica por
Estadõ~estrangeiro depende do consentimento do governo. Estabelece
ainda: “a realização por outros Estados, na zona econômica exclusiva do
exercício ou manobras militares, em particular as que impliquem o uso
de armas ou explosivos, somente poderá ocorrer com o consentimento do
govemo brasileiro”.
A tendência para o aumento da área marítima submetida'à soberania
do Estado manifestou-se também na Africa, onde o Conselho de Ministros
da OUA, em resolução de 1971, recomendou aos países africanos que
estendessem a sua soberania sobre os recursos do alto-mar adjacente ao
mar territorial até o limite de sua plataforma continental. Vários países
africanos ampliaram o mar territorial para 100 milhas: Senegal, Serra Leoa,
Gabão, Guiné, Costa do Marfim e Mauritânia.
A conclusão que se pode formular é que o direito do m ar se encontrou
em certo período em grande confusão. Pode-se exemplificar com o caso

1158
do Chile, que adota faixa de mar territorial, zona contigua e mar patri­
monial; o Peru exerce nas 200 milhas todos os direitos que o Estado tem
no mar territorial, mas não chama esta zona de mar territorial e fala em
“águas jurisdicionais”, “águas peruanas”, zona marítima, etc. A Argentina
fala em “mar adjacente”. Como se pode observar, a própria denominação
é das mais diferentes.
Pode-se acrescentar que atualmente não há mais oposição a uma cria­
ção de uma zona de pesca até 200 milhas. Os mais diferentes Estados a
criaram: URSS, EUA, países do Mercado Comum Europeu, etc.
A tendência atual é de se consagrar um mar territorial até 12 milhas
e uma zona econômica até 200 milhas. Esta é a orientação que foi consa-
j grada na convenção de 1982,-que determina: “todo Estado tem direito a
/ estabelecer a largura de seu mar territorial até um limite que não exceda
| 12 milhas marítimas medidas a partir das linhas de base...”. Sobre a zona
| econômica: v. adiante. Em 1988, 105 Estados tinham um limite de 12
'.milhas e 13 Estados ainda adotavam 200 milhas de largura do mar terri­
torial.
428, As teorias sobre a natureza jurídica do mar territorial podem ser
\ divididas em dois grupos: a) o mar territorial faz parte do território estatal
I (teorias da propriedade e soberania); b) o mar territorial faz parte do
/ alto-mar (teorias do direito de conservação e das servidões costeiras). Se
\ seguirmos o primeiro grupo, em caso de dúvida sobre os direitos do Estado
predominará a interpretação mais benéfica ao Estado e, caso faça parte
\ do alto-mar, dar-se-á predominância à liberdade do alto-mar.
A teoria que sustenta um direito de propriedade do Estado no mar
territorial está inteiramente abandonada. Ela foi sustentada por Valin e
Vattel. Esta teoria, se fosse aceita, levaria a conseqüências inadmissíveis,
como o direito de o Estado fechar o mar territorial a navios estrangeiros
quando bem entendesse. Por outro lado, o m ar territorial não é suscetível
de apropriação, logo não existe uma propriedade.
P A teoria mais aceita atualmente_é_a que considera ter o Estado sobe-
I rania. sobre o mar temtonaL.Ela foi consagrada na Convenção de Genebra
j (1958) e na Convenção ^ M o q ^ ^ !J^ O Jl8S T /Õ *1 n m F T iê fm õ n ã r é um
í complemento dõ território terrestre do Estado.
A teoria das servidões foi exposta por Á. G. de Lapradelle. O mar
territorial faz parte do-“alto-mar” , que seria de propriedade da humani­
dade. O Estado, Jia faíxá de mar contígua ao seu território, teria apenas
um feixe de servidões. Esta teoria não está de acordo com a .prática inter­
nacional. Não existem no Dl as chamadas servidões naturais e o alto-mar
não é propriedade'da humanidade.43
A teoria do direito de conservação considera que o Estado só age no
mar territorial para se “defender e proteger”. Ela foi exposta por Fauchille.
Esta teoria é falha porque os Estados consideram o m ar territorial como
parte do seu território e o próprio direito de conservação tem sido negado
pelos doutrinadores.41

- 1159
r^428A. A diria econômica/ surge da noção de mar patrimonial latino-
amtíricario e da zona econômica afro-asiálica“ Em uma declaração o rep­
resentante do Quênia, na 3a Conferência das Nações Unidas, afirmou que
a zona econômica foi concebida como um meio de defesa contra os países
que pilharam o mar em nome da liberdade dos mares. O primeiro a utilizar
a expressão mar patrimonial foi o chileno Edmundo Vargas Carreno, em
seu informe para o Comitê Jurídico lnteramericano (1971). Semelhante
à noção de mar patrimonial é a zona econômica adotada pelos países
africanos. Esta surgiu em 1971, pelo representante do Quênia no Comitê
Jurídico Consultivo Afro-asiático, sessão de Colombo; nesta zona os Estados
dariam licença de pesca e em troca receberiam assistêneia externa. Em
1972 o mesmo representante no citado Comitê, reunido em Lagos, propõe
que esta zona passe a ser de jurisdição exclusiva sobre os recursos minerais
e biológicos por parte do Estado costeiro. Shigeru Oda observa que a
noção de zona econôm ica foi introduzida no Comitê do Fundo dos Mares
em 1973 e em 1974 na 3? Conferência das Nações Unidas sobre D. do
Mar, tomando-se em 1975 uma firme política incluída no Texto Informal
de Negociação. Outros (Louis de Gastines) afirmam que a expressão mar
patrimonial é de Vargas Carreño, mas que foi levada para o âmbito da
ONU pelo delegado da Venezuela, em 1971, no Comitê do Fundo dos
Mares das Nações Unidas. Esta noção, segundo Beurier e Cadenat, é uma
extensão do que foi consagrado na Conferência de Genebra de 1958 com
o nome de “direitos especiais no alto-mar adjacentes ao mar territorial” ,44A
Queneudec fala que ela seria uma “zona intermediária”, ou, ainda, em
“quase alto-mar” . Wodie fala em “zona intermediária”. Uma outra noção
era a denominada de “mar matrimonial”, proposta pelos países do Caribe,
na Conferência de Caracas; ele seria uma propriedade indivisa dos Estados
ribeirinhos, bem com o haveria um organismo para fazer a sua exploração.
A idéia de mar matrimonial seria adotada naqueles casos em que inúmeras
ilhas dificultassem a divisão do mar. Semelhante a esta foi a tese da Bolívia
em Caracas, que propôs a criação do mar tributário regional em que o
Estado sem litoral participaria da exploração da zona econômica. No seu
caso específico a Bolívia sustentou que vários rios nascem em seu território
e correm para o m ar levando recursos tirados dela. Os países em desen­
volvimento têm uma concepção “ territorialista” zona econômica e assimi­
lam o seu regime ao mar territorial. Assim a pesquisa científica dependeria
de autorização expressa do Estado costeiro. Por outro lado, os países
avançados tecnológicamente consideram que ela faz parte do alto-mar.
Assim a pesquisa científica deveria ser livre. Extravour afirma que se pre­
feriu a expressão zoníL econômica em lugar da de mar patrimonial porque
esta úldma não engloba os recursos da plataforma. René-Jean Dupuy alega
que a expressão m ar patrimonial realçava a existência de direitos patrimo­
niais, enquanto a de zona econômica é mais neutra.
Alé boje, mesmo consagrada na convenção de 1982, d a aínda tem a
sua natureza bastante discutida. Assim, os intemacionalistas argentinos
afirmam: a) é urna zona “sui generis” (Julio Cesar Lupinacci); b) é “urna
zona que de algum modo é um prolongamento do mar territorial adja­
cente” (Calixto A. Aimas Barea e F. Pfirler de Armas); c) “é um espaço
marítimo independente”, nem mar territorial e nem alto-mar (Lilian C.
del Castilho). A convenção de 1982 optou por uma expressão que podemos
dizer híbrida, ao afirmar que nela o Estado tem direitos soberanos, isto é,
apenas alguns direitos ali especificados, e não uma soberania completa, o
que poderia levar a se considerar que a zona econômica pertenceria ao
alto-mar. Entretanto, esta mesma convenção exclui a zona económica do
alto-mar. Enfim, criou-se'um “espaço marítimo independente”; ou zona
“sui generis”. Para Pontavice e Cordier ela é urna “zona de soberania
limitada”. Queneudec observa, com certa razão, que a natureza da zona
'" ecoñomica vai depender da atividade que for enfocada: (a) do ponto de
vista dos recursos, ela é o patrimônio do Estado; do ponto de vista da
navegação, ela é alto-mar,(cj)do ponto de vista da pesquisa e proteção do
meio marinho, ela é um complemento dos direitos do Estado sobre os
recursos, mas o Estado não tem uma competência territorial. Ñas Comu-
i nidade Européias tem-se considerado a zona económica como incluida no
u. território dos Estados-membros.
I Vamos fazer uma exposição dos dispositivos da convenção de 1982.
/ Ela a denomina de “zona económica exclusiva” e a define como “urna
| área situada mais além do mar territorial e adjacente a este, sujeita ao
/ regime jurídico estabelecido. .” na convenção.
A sua largura é limitada em 200 milhas medidas a partir da linha de
base, de onde se mede a larguracícTmar temtõnãT. ~~~~ ™ ”
Ó Estado tem: ‘^dir^tos_de._soberania para os fins de exploração e
utilização, cpnserVação„e»adtnujistração.4Íos.jr-ecuEsoS'nateFais, tanto vivos
como não vivos, das águas sobrejacentes ao leito e do leito e do subsolo
do mar...", bem como em relação a outras atividades, como a “produção
de energia derivada da agua, das correntes e dos ventos”;[by jurisdição em
relação a: 1 — “o estabelecimento e a utilização de ilhas artificiais, insta-
laçao e estruturas”; 2 — “a investigação científica marinha”; 3 — “a
proteção e preservação do meio marinho”. Ao exercer os seus direitos o .
Esíado levará “devidamente em conta os direitos e deveres dos demais
Estados” ^No tocaPi£-ao.s..direUos no lert©-e-subsolo* eles serio exercidos
conformé o que está estabelecido na parte da convenção relativa à plata­
forma continental (v capítulo seguinte). Um outro direito do Estado é o
“cliíeiTo exclusivo de construir, assim como o de autorizir'e reguKHieñtar
a construção, operação e utilização de: a) ilhas artificiais; b) instalações e
estruturas pára exercer os seus direitos nesta zona e outras finalidades
econômicas; c) “ instalações e estruturas que possam interferir no. exercício
dos direitos do Estado ribeirinho na zona”. O Estado tem “jurisdição

1161
exclusiva" c m relação a tais ilhas e instalações, inclusive “a jurisdição em
materia de leis e regulamentos aduaneiros fiscais, sanitarios, de segurança
c de imigração”.13 A construção de tais ilhas deverá ser notificada, bem
como serão sinalizadas, e as em desuso deverão ser retiradas. Se for ne­
cessário para a segurança das ilhas e instalações, os Estados poderão criar
zonas de segurança que não poderão ir além de 500m de largura. Os navios
ficam obrigados a respeitar tais zonas. Não poderão ser instaladas ilhas
artificiais e nem zonas de segurança em “vias marítimas reconhecidas que
sejam essenciais para a navegação internacional”. As ilhas artificiais “não
têm mar territorial próprio e sua presença não afeta a delimitação do mar
territorial, da zona econômica exclusiva ou da plataforma continental”.
A situação das ilhas artificiais na zona econômica é diversa: d) h á
Estados que reivindicam uma vasta jurisdisão; b) outros consideram que a
convenção limita esta jurisdição para as mencionadas no art. 60 da con­
venção (Itália); c) para o Brasil, Cabo Verde .e Uruguai cabe ao Estado
autorizar a construção de ilha artificial de qualquer tipo, seja qual for sua
natureza e objetivo.
Outro direito do Estado costeiro é que cabe a ele “ a captura permissível
dos recursos vivos em sua zona econômica exclusiva” e deverá visar a
conservação dos recursos vivos para que “as espécies capturadas (sejam
mantidas) a níveis que possam produzir o máximo de rendimento”, levan­
do em consideração “os fatores ambientais e econômicos” e “as necessi­
dades econômicas das comunidades pesqueiras costeiras e as necessidades
especiais dos Estados em desenvolvimento”, etc. O Estado “ determinará a
sua capacidade de capturar os recursos vivos da zona econômica exclusiva”,
Se ele não tiver capacidade para explorar Toda “a captura permissível”,
dará acesso a outros Estados para o excedente Os nacionais de outros
Estados que pesquem na zona econômica deverão respeitar as leis e regu­
lamentos do Estado costeiro, tais como licença de pesca, determinação das
espécies a serem pescadas, quantidade, etc. O Estado costeiro pode em­
barcar observadores a bordo dos barcos de pesca.
Os Estados cujas espécies se encontram na zona econômica de mais
de um deles deverão cooperar para a sua conservação, o mesmo ocorre
com as espécies altamente migratórias (ex.: atum-branco, atum-vermelho,
peixe-espada). O Estado poderá estabelecer restrições mais estritas em
relação aos mamíferos marinhos. “Os Estados em cujos rios se originam
populações anádromas (espécies que sobem do mar para os rios em certas
estações) terão o interesse e responsabilidade primordiais por tais popu­
lações.” Dispositivo semelhante existe para as espécies catádromas (espé­
cies que descem do rio para o mar).
O Estado costeiro pode apresar os barcos com suas tripulações que
violarem as suas leis e regulamentos, mas deverão ser imediatamente libe­
rados uma vez paga uma fiança razoável. Este último dispositivo foi inserido
para se evitar que a indústria pesqueira tivesse grandes prejuízos com lima
detenção demorada.
Os direitos do Estado na zona econôm ica são exercidos de acordo
com a Parte VI da convenção que trata da plataforma continental. A
plataforma continental e a zona econômica se sobrepõem, e a diferença
é que os recursos da plataforma são exclusivos do Estado costeiro e os da
zona econômica ficam sujeitos a acordos com os LLS e GDS.
Entretaaío^o Estado sofre limitações, vez que são asseguradas algumas
das liberdades alto-mar (navegação., sobrevôo e colocação de cabos e
oleodutos submarinos) para os'3emãls'Estados. Ós litigios que surgirem a
rêspèíto cío exercício cie direito na zona econôm ica serão solucionados
por meios pacíficos. Uma questão que não tem procedimento uniforme é‘
se os nawos de pesca podem entrar na zona económica para outro fim
que não seja a pesca (a Nova Zelandia adm ite). Outros, como Barbados e
Irã, só admitem que exerçam o direito de navegação. E ainda outros
(Maldívias) proíbem a entrada de navios de pesca em sua zona económica.
Esta posição não nos parece realista, porque tais navios têm o direito de
passágem ¡nocen te^ncT mar témTóiíá], fogo terão quêatravessar"sTaSSiia
ecoilomíça. ....................... ‘ ”—**— - —
Uma outra limitação aos direitos do Estado na zona económica é que
“os'Estados sem litoral (LLa — Cancí^TTCketí'S'ta'tC'á) lè"r2õ dtreifo~5t-par-
titíjSãr,’'*em imalãâS^quTíârfivãr~ti'5~'aprowifãnrenfõ'"3ê uma “parte' apro-
p n a S S ^ o ^ x w ff^ te '^ o s recursos vivos das zonas económicas exclusivas
dos Einaclos costeiros da mesma sub-região ou região, levando era corita
as características económicas e geográficas pertinentes a todos os Estados
Interessados Serão concluídos acordos entre os interesados. Se a ca-
'pãcícTãdê clé cãptüfã3õ~ Estado costeiro se aproximar do nivel máximo de
captura permissível, ele deverá em cooperação com os demais interessados
estabelecer arranjos equitativos “para permitir a participação dos Estados
em desenvolvimento sem litoral da mesma sub-região ou região no apro­
veitamento dos recursos vivos das zonas económicas exclusivas dos Esta'des
costeiros da sub-região ou região”.. ]á os Estados desenvolvidos sem litoral
terão direito a participar do aproveitamento dos recursos vivos somente
nas zonas econômicas exclusivas.dos Estad'os costeiros desenvolvidos da
mésfrjã sub-região, levando em consideração as normas do Estado costeiro
eTeduando ao m ínim o'“ãs conseqüências prejudiciais para as comúnida-
des pesq’úelras e as perturbações econômicas nos Estados cujos nacionais
tenham pescado habitualmente na zona". São países em desenvolvimento
sem litoral: Botsuana, Burundi, República Centro-Africana, -Chade, Le-
sotho, Malawi, Mali, Niger, Ruanda, Uganda, Alto Volta, Suazilândia, Zâm­
bia, Zimbabwe, Afeganistão, Butão, Laos, Nepal Sikkim, Bolívia e Paraguai. -
São 21 Estados (Mohamed Bennouna). Já Lucchini e VoecRel falam em
29 Estados, sendo que três deles no territorio de um único Estado; Vaticano,
San Marino e Lesotho. Stephen C. Vasciannie fala em 30 Estados sem

1163
lito ral. O íü n d a m e n to da re iv in d ica ç ã o dos países sem lito ra l 6 a eqüid ade
(Z. H a q u a n i).
Na Conferência de Caracas (.1974). surgiu um grupo de Estados deno-
m in ã c T o tT e"tíDSTGeographica) Disadvaniuges S im es), q u e são os Estados
conjTpêc^IESS3S!ióatl,-ou- mar pobre em recursos, ou, ainda, o seu inar é
prej_udjçado pela localização de Estados próximos. Esta caracterização dos
GDS não é pacífica. Uma outra é a seguinte: a) Estados cujas populações
são especialmente tributárias dos recursos do mar para sua alimentação;
b) Estados costeiros e em desenvolvimento que não podem ter uma zon a
econômica exclusiva própria. A Holanda, por sua vez, propôs outra con-
ceitnaçào para os GDS, que seriam os Estados que não têm uma zona
econômica superior em superfície a 25% da zona econômica teórica. Esta
zona econômica teórica seria estabelecida do seguinte modo: cada Estado
tem um currículo cuja superfície é aproximadamente a do território ter­
restre. A situação do GDS foi reivindicada inicialmente por 24 Estados.
Atualmente são 26 Estados.
Não há uma definição precisa de Estado desfavorecido pela geografia.
O Peru chegou a falar em “Estados desfavorecidos geo-economicamente”,
que abrangeria Estados com amplas costas, mas grandes despesas para a
“administração" destes recursos. Contudo ele não é um desfavorecido.
/ A n o ç ã o de Estados sem litoral e Estados desfavorecidos pela geografia
/ surgiu para distribuir de modo mais equitativo a riqueza do mundo. En-
l tretanto, a “participação equitativa" é vaga.
/ A convenção de 1982 regulamenta a situação dos GDS do seguinte
/m o d o : eles têm direito a participar em “uma base eqüitativa, no aprovei­
tamento de uma parte apropriada do excedente dos recursos vivos das
zonas econômicas exclusivas dos Estados costeiros da mesma sub-região
ou região, tendo em consideração as características econômicas e geográ­
ficas pertinentes de todos os Estados interessados”. Considera Estados
desfavorecidos pelo geografia “os Estados costeiros, inclusive os Estados
costeiros de mares fechados ou_seniiiechados,"'cujã sitüaçào géõgráfica os
faça depender do aproveitamento dos recursos vivos das zonas econômicas
exclusivas de outros Estados da sub-região ou região para o adequado
abastecimento de pescado a fim de satisfazer as necessidades em matéria
de nutrição de sua população ou de partes dela, assim como os Estados
Acosteiros que não possam reivindicar zonas econômicas exclusivas pró-
\prias". A citada participação será fixada por meio de acordos. “Quando a
capacidade de captura de um Estado costeiro” se aproximar da situação
de que ele possa realizar toda a captura possível, ele deverá fazer arranjos
eqüitativos com os demais Estados da sub-região ou região “para permitir
a participação dos Estados em desenvolvimento desfavorecidos pela geo­
grafia". Os Estados desenvolvidos desfavorecidos pela geografia terão di­
reito a participar do aproveitamento dos recursps vivos somente de zonas
econômicas de Estados costeiros desenvolvidos, e ainda se deverá levar em
c o n s id e r a ç ã o que as p e r tu r b a ç õ e s e co n ô m ica s sejam m ín im as no sen tid o
d e c a u sar p reju ízo às c o m u n id a d e s pesqueiras.
Os dispositivos relativos à pesca na zona econômica de um Estado
costeiro por outros Estados sem litoral ou desfavorecidos pela geografia
não são aplicáveis quando o Estado costeiro lenha uma economia que
dependa grandemente “da utilização dos recursos vivos de sua zona eco­
nômica exclusiva".
O acesso dos estados à pesca na ZEE não é automático e depende do
volume admissível de captura e capacidade de exploração do estado cos-
; teiro. Os estados sem litoral e desfavorecidos pela geografia não podem
transferir os seus direitos para terceiros estados.
A delimitação da zona econômica deverá ser feita por meio pacífico
* de modo eqüitativo. O Estado deverá dar a devida publicidade. Os rochedos
1 que não servem para a habitação humana ou para uma vida econômica
\própria não têm zona econôm ica exclusiva e plataforma continental.
A extensão para 200 milhas do direito exclusivo de pesca abrangeu
99% dos recursos biológicos do mar, sendo exceção o atum, que está além
das 200 milhas.46 Por outro lado, não há igualdade de captura entre os
Estados, porque a pesca se encontra repartida de modo desigual, sendo
que as regiões mais ricas são: Peru, Califórnia, África norte-ocidental, África
sul-oriental, águas temperadas e subárticas dos mares austrais do Atlântico
norte e Pacífico norte, etc. (Jean Carroz).
Na década de 80 existiam 29 Estados sem litoral e 125 Estados costeiros.
Um grupo de 47 Estados, com o aumento para 200 milhas, anexarão mais
de 100.000 milhas quadradas. Outro grupo, de 37 Estados, não atingirão
25-000 milhas quadradas. Outros, de 41 Estados, anexará entre 25.000
milhas e 100.000 milhas. Os EUA aumentam mais de 2.200.000 milhas
quadradas, o Canadá e a URSS mais de 1.300.000 milhas quadradas. Os
países insulares e arquipélagos são os que mais se beneficiam. Alguns
Estados se beneficiam pouco, como o Paquistão e a Tailândia." Podemos
ainda mencionar a existência dos “shelf-locked States” , que para atingir a
zona internacional dos fundos marinhos têm de atravessar a plataforma
continental dos Estados vizinhos. São'de dois a 27 países, como a Bélgica,
Dinamarca, etc. Largas apropriações só serão feitas p or Establos insulares,
arquipélagos ou aqueles abertos para o oceano. O novo Direito do Mar
favorece os países industrializados, que já eram os que mais se beneficiavam
da liberdade dos mares. (Sobre estes dados v. Gilbert/Apollis. Se forem
medidas as áreas das zonas econômicas, os países ricos são os que mais
ganharam, os em desenvolvimento ganharam muito menos e os pobres
menos ainda [W. D. Verwey].) Alguns outros dados podem ser fornecidos
com fundamento em Pierre Gallois: a) a ilha Maurício, com um milhão
de habitantes, tem de mar 562 vezes o seu território; b) Tonga, com menos
de 100.000 habitantes, tem um mar que é 850 vezes maior que seu território:
c) Maldívias, com menos de 20.000 habitantes, tem um mar 3.210 vezes

1165
maior que o seu território; d) Namu, com menos de 10.000 habitantes,
tem um mai 20.471 vezes maior que o seu território. A superfície dos
oceanos é de 361,3 milhões de quilômetros quadrados e com a criação da
zona econômica os Estados passaram a dominar 96,5 milhões de quilôme­
tros quadrados. As maiores zonas econômicas, em ordem de tamanho são
as dos EUA, Austrália, Indonésia, Nova Zelândia, Canadá, Rússia, Japão e
Brasil.
Não podemos deixar de concordar que o critério das 200 milhas vai
criar um grupo de Estados ricos que são os que podem fazê-lo sem pro­
blemas (Queneudec).
f Uma questão que não está clara na convenção da Baía de Montego é
sobre as restrições à liberdade do alto-mar, como a repressão à pirataria,
direito de perseguição, etc., se são aplicáveis à zona econômica. A resposta
parece-me que deve ser afirmativa, caso contrário poderiam ocorrer duas
hipóteses: a zona econômica tornar-se um espaço de impunidade ou o
Estado costeiro vai aplicar a sua legislação e ela acabara por se identificar
com o mar territorial.
A zona econômica, além de ser convencional, é também costumeira,
tendo em vista o número de Estados que a adota. Os próprios tratados
mostram a existência de uma “opinio juris” em seu favor.
O Brasil considera que os Estados não podem fazer exercícios militares
na j?gí^ i.e.cQnôrnica de o u tr o Estado. Já a Itália considera que sim, porque
õ estado não tem nesta zona direitos residuais. O Brasil considera que só
se^qde^construiF-ins^lações na zona econômica e na plãtãfferma-eentk--
nental se o Estado çQsteiro..mtQ.Dzar. Já”ãTtaIiã~cÕnsidera''quea‘autorização
só é necessária para as instalações previstas no art. 60 da convenção (ilhas
artificiais, estruturas com fins econômicos, etc.).
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e sua Jurisprudencia Internacional, 1999; M aria Helena Fonseca de Souza Rolim

1171
— A Tillóla Jurídica dos Recursos Vivos cío Mar na Zona Económica Exclusiva.
1998: Adelaida de Almeida Nascimento — El D erecho Internacional de la Deli­
mitación de los Espacios Marinos de Soberanía Económ ica, 1999.
2. Estudaremos quais são estas águas ao vermos a linha de base do mar
territorial.
3. A expressão "águas territoriais" tem sido utilizada para abranger as águas
interiores e o mar territorial; ou ainda, com o prefere Laun. apenas as águas
interiores. E interessante observar que durante longo tempo se encararam as águas
entre a costa e a linha de base do mar territorial com o sendo também mar
territorial. Neste sentido estava Desapanei. Observam alguns autores (Mcdougal
e Burke) que o mesmo-ainda o c o r r e em algumas legislações, como na da Islândia.
4. Esta regra é a geral, mas não é absoluta, havendo exceções, como veremos
adiante.
5. Entrou em vigor em 1964.
6. A critica contra esta é que ela “não abrange todo o território marítimo do
Estado” (Marotta Rangel).
7. Em sentido contrário: Emílio Costa.
8. A pesca no período medieval começara a adquirir importância em virtude
do jeju m e da abstinência, que faziam aumentar o consumo do pescado. Deste
modo, inúmeros mosteiros se transformaram em empresas armadoras de navios
dedicados à pesca. Os Estados levantam impostos sobre as pescarias, conhecidos
por “piscariae” (“redditus piscationum”). Reservam direitos exclusivos de pesca
em relação às espécies mais procuradas, como o atum . “O jeju m com preende a
interdição de mais de uma refeição por dia... a interdição de carne e ovos. Pode-se
considerar que os cristãos, no Fim da Idade Média, estão submetidos a interditos
alimentares que se eStendem a cerca de cento e vinte dias” (Pierre Chaunu — Le
Temps de Reformes, 1975). Fernando Braudel (Civilisation Matérielle, Économ ie
est Capitalisme XV-XVII1 Siécle — Les Structures du Quotidien, 1979) fala em
166 dias de jeju m por ano. “ O mundo monástico ignorava a carne: a regra de São
Benedito a proibia. A sociedade laica não estava submetida a prescrições tão severas;
mas 150 dias por ano os produtos da pesca substituíam os de criação doméstica
ou da caça: a sexfa-feira e o sábado de cada semana, as vigílias de algumas festas,
os 46 dias da quarta-feira de cinzas à véspera da Páscoa” (Louis Stouff — Modes
de Vie, in La France Médiévale, sob a direção de Je a n Favier, 1983).
9. Esta glosa parece ser de autoria d ejoh an n es A ndreae. Decretais “são escritos
dos papas respondendo a uma consulta ou a um pedido emanado de um bispo
ou de uma aka personagem eclesiástica ou laica” (John Gilissen — Introdução
Histórica ao Direito, 1988). No início a resposta só era obrigatória para aquele
caso. irias a autoridade reconhecida ao Papa acabou por dar a resposta em valor
geral (Jçan Gaudemet — EgJise et Cité— Histoire du droit canonique, 1994).
10.-Alguns autores (Thorvaldur Thorarinsson) afirmam que na Islândia, no
C ó d ig o 'ú rag á s (data da 1- República, 930-1264), teria havido a primeira manifes­
tação em favor do mar territorial. A Lei de Grostathing, região de Trondheim no
extrem o norte da Noruega, é a mais arcaica. A Lei de Gulathing (região de B ergen)
é de princípio do século X II (John Gilissen — Introdução Histórica ao Direito,
1988).
11.. A nteriorm ente este limite variava: na Escócia adotava-se o limite visual
(este variava de país a país: na Escócia, 14 milhas; na França, 7 léguas; etc.). O
sueco Locenius defendera com o critério para a largura do mar territorial a distância

1172
coberta por dois dias de viagem. No século X V II, Saipi sustentou que a largura
do mar terrilorial não deveria ser fixa. mas proporcional às reivindicações dos
Estados adjacemes.
12. O sistema do "tiro de canhão" já era adotado pelos navegantes, a partir
do meio do século XVI. Ele tinha a vantagem de ser uniform e (a artilharia estava
estacionaria), ao contrario das medidas náuticas, que variavam de país em país.
Em 1610, os delegados holandeses, ao discutirem na Inglaterra uma questão de
pesca, defenderam este lim ite. Segundo Basdevani, o critério do tiro de canhão
foi formulado pela primeira vez, em 1609, pelo em baixador francês Jeannin ju n to
ao governo da Holanda.
13. Urna tese interessante é a defendida p or W alker e Kent, de que a regra
do tiro de canhão e a medida eni milhas teriam tido as suas origens em regiões
diferentes da Europa. Para Kent. por exemplo, a medida em milhas ou léguas
ter-se-ia originado nos Estados nórdicos, enquanto o tiro de canhão teria a sua
origem nos Estados m editerrâneos e_na Holanda. A França, em 1761, é que teria
unificado os dois critérios. Esta tese não penetrou de maneira definitiva na litera­
tura jurídica. A fusão dos dois critérios parece-nos ser o resultado de um a lenta
evolução. Os seus defensores não chegam a um acordo quanto à data da fusão
dos dois critérios: W alker dá a entender que foi em 1961, e Kent, em 1961. Em
1750, J . j . Surland, em uma obra, defendeu a tese de Bynkersohek.
14. Nos EUA estas regiões são consideradas com o pertencendo aos Estados e
não à União, no direito interno. Elas deram origem à denominada questão das
Tidelands, resolvida no sentido apontado em 1953 pelo Submerged Lands Act.
15. Devemos assinalar que o Estado pode dar permissão a estrangeiros de
pescarem no seu mar territorial. Ao lado desse direito de pesca dado aos estran­
geiros existem direitos acessórios (ex.: venda do prod uto), que não decorrem
automaticamente dele, mas que necessitam de um a estipulação formal para a sua
concessão.
16. Assim sendo, não podem ser cobradas taxas por iluminação, bóias, balizas,
etc.
17. Sobre este assunto, v. capítulo sobre Navios.
18. Esta denom inação não é a única; outras têm sido propostas: “passagem
inócua” (Bustamante), “trânsito inócuo” (Arias), “passagem inofensiva” (M ozo).
19. Hall o considera uma servidão. Entretanto, no Dl não existem servidões
naturais, mas apenas servidões convencionais.
20. Houve autores (Wesllake) que negaram que os navios de guerra tivessem
este direito.
21. Para alguns autores (Raestad) a qualificação de a passagem ser inocente
ou não deve ser dada subjetivamente (leva-se em consideração a intenção). Para
outros (François) a qualificação deve ser objetiva (verifica-se se houve a violação
das normas sobre a matéria sem se levar em consideração a intenção). O utros
(Gidel, Arias) com binam os dois critérios. A Convenção de Genebra, no seu art.
14, alínea 4, não se referia ao elemento intencional, preferindo assim o critério
objetivo.
2]A. Os destroços não integram os recursos do Estado nas zonas contígua e
econômica e, nem na plataforma continental.
21B. Existem no mundo cerca de 120 estreitos com largura até 24 milhas,
sendo que o mar territorial de 12 milhas transform ou as suas águas em mar
territorial sujeito ao direito de passagem inocente.

1173
‘¿ 2. Os canais têm a sua situação regulada por uma convenção (por ex.: a
Convenção <Ie Constaiuinopla de 1888 regulamentou a utilização do canal de
Suez). Sobre o direito de passagem inocente é de se assinalar que as Convenções
que regulamentaram a navegação nos canais de Suez, Panamá c Kiel reconheceram
a liberdade de navegação para navios de com ércio e de guerra (o Estado pode
regulamentar a passagem, mas não deve fazer discrim inação). Entretanto, ela só
é obrigatória para os contratantes da convenção, não existindo norma costum eira
(Baxter). O Canal de Suez é regulamentado atualm ente pela legislação egípcia de
1957, que admite a passagem de navios de todas as nações. Esta Declaração aceita
a Convenção de C onstantinopla de 1888. No mesmo sentido é a regulamentação
do Canal do Panamá pelo tratado concluído com os EUA, em 1977, que vai vigorar
até 1999. O Canal de Kiel foi aberto à navegação de navios de comércio dos países
em paz com a Alem anha pelo Tratado de Versalhes (1919).
23. Segundo M cDougal e Burke, na maioria das cartas hidrográficas a costã
figura na maré alta. Entretanto, na prática, tal fato não tem criado problemas,
uma vez que a navegação é feita sem levar, estritam ente, em consideração a maré
baixa, mas se baseia em outros elementos. Assinalam McDougal e Burke que parece
existir um “interesse na manutenção desta prática” .
24. A Comissão d e D l havia sugerido 10 milhas.
24A. O traçado de linhas de base retas é recente, sendo que na França grande
número delas só foram definidas nos fins dos anos 60. O Canadá, em 1985, uniu
por linhas de bases retas o arquipélago ártico, mas não deixou claro o direito de
passagem. Estas águas ficam uma parte do ano geladas (Lucchíni e V oeckel).
25. O Estatuto de G enebra de 1923 sobre o regim e internacional dos portos
marítimos declara: “são considerados com o portos marítimos os portos freqü en­
tados norm almente pelos navios de mar e servindo ao com ércio exterior” . Gidel
j á nos fom ece um critério mais amplo, que nos parece o acertado, e considera
com o portos m arítim os: a) os portos que entram na definição do Estatuto de
Genebra; b) os portos marítimos independenteíriente de serem freqüentados por
navios de mar; c) os portos marítimos freqüentados por tais navios, ainda que não
sirvam ao com ércio exterior.
26. Em sentido contrário está Gidel, que assinala com razão que as águas das
enseadas deveriam ser águas interiores, uma vez que o direito de passagem inocen te
deve ser mais restrito por se tratar de uma região de carga, descarga e ancoragem
de navios. Observa ainda que na prática ó Estado costeiro acabará por lim itar o
direito de passagem inocen te.
27. O Decreto-lei n 9 44, de 1966, estabelece que é a partir da linha reta unindo
os pontos da sua entrada que se começará a m edir o mar territorial, desde que
estes pontos não distem um do outro mais de 12 milhas. O Decreto-lei-ns 553, de
1969, aumenta a distância dos pontos para 24 milhas.
28. Este limite foi adotado porque esta distância corresponde “às condições
normais de visibilidade nas costas da Europa ocidental” . Signifrca isto que se o
navegador não avistar o litoral pode se considerar com o estando em alto-mar
(Gidel).
29. No Brasil, o Decreto-lei n° 44, de 1966, fala em 12 milhas e não adota as
demais normas para a configuração de baías. O Decreto-lei n2 553, de 1969, fala
apenas em 24 milhas.
30. Exemplos: golfo de Tunes (Tunísia), baías de Hudson (Canadá) e Delaware
(EUA), etc.
3 ). A baía de Fonseca, na sentença proferida pela Corte de Justiça C e n tro
Aniericana, foi considerada como co-propriedade dos tres listados (com exceção
das três milhas de m ar territorial de cada Estado). Fia não Coi considerad» ágil a
interior, pelo contrario, a Corte reconheceu nela o direito de passagem inocente.
32. Este prazo não é fixo e deverá ser analisado em cada caso concreto.
33. V. capítulo X1.1V.
34. Este critério é adotado por duas razões fundamentais: o aspecto m ilitar e
o aspecto económ ico. O aspecto militar, isto é, o da segurança estatal, é mais bem
garantido considerando-se as águas do arquipélago com o aguas interiores, urna
vez que nelas não há o direito de passagem inocen te. Por outro lado, estas aguas
são ricas em pesca. É interessante observar que em 1924 Alejandro Alvarez pro­
pusera, na Associação de DI, que os arquipélagos fossem tidos com o “form ando
uma unidade” .
35. Gidel considera que jurídicam ente não é estreito a passagem que liver
mais do dobro da largura do mar territorial. Em sentido contrario: Baxter.
36. Esta é a prática; todavia, em certos casos, o mais justo seria adotar o do
talvegue.
37. Um grupo de autores (Slorni, José Léon Suarez) defende o mar epicon­
tinental, isto é, o mar territorial deveria coincidir com a plataforma continental.
38. O criterio das três milhas teve como seus defensores tradicionais a Ingla­
terra, França e EUA. Os EUA adotaram em certa época urna zona contigua de
pesca de nove milhas após o mar territorial. A convenção européia de pescarias
reconheceu um limite de 12 milhas para a zona de pescaria. A França aum entou
o seu mar territorial para 12 milhas.
38A. O Perú, em 1947, em um decreto do Presidente da República, consagrou
200 milhas. Esta medida já fora defendida pelo com andante da Marinha de Guerra
peruana, Rafael T o rn eo , em 1934, por ser a distancia entre a costa e a corren te
de Humboldt (v. M arotta Rangel).
39. A Comissão de DI, no seu projeto enviado a esta Conferencia, afirma que
seria legítima a largura até 12 milhas.
E interessante m encionar: a primeira vez que surgiu a idéia da largura do
mar territorial ser fixada em uma convenção foi de Philip Meadows em 1869.
40. V. capítulo XLIV.
4 1 . 0 que se pode afirmar com segurança é que a regra de três milhas perdeu
a sua efetividade.
41A. Os EUA protestavam e aplicavam sanções aos Estados que aplicam du-
zentas milhas. A sua própria legislação interna consagra as sanções: Lei de Assis­
tência Externa, Lei de Proteção ao Pescador, a “ Foreign Militar)' Sales A ct” . Esta
última estabelecia a proibição de vendas de armas a Estados que detenham barcos
de pesca norte-americanos a mais de 12 milhas da costa; o Presidente pode deixar
de aplicar esta sanção se for necessário para a segurança dos EUA. Entretanto, o
Equador e o Peru continuaram a deter barcos de pesca norte-americanos, mas os
EUA só aplicaram sanções parciais e continuaram a vender armas e navios, bem
com o a dar assistência externa. Os Estados Unidos, apesar de terem consagrado
duzentas milhas de zona de pesca, mantiveram a sua proteção aos pescadores
norte-americanos que pescam no estrangeiro nos seguintes casos: a) quando o
Estado estrangeiro não leva em consideração a prática tradicional dos pescadores
norte-americanos; b) quando as restrições são maiores no estrangeiro do que nos

1175
EL'A: fie . Km 1983 os EUA fizeram n n u proclamação de zona económ ica recla­
mando direitos soberanos sobre os recursos vivos e não vivos dem ro de 200 milhas
cornadas a partir da linha de base do mar terrilorial. mas este perm aneceu em
três milhas.
4 IB . O alvará de 1805 adotava o sistema do tiro de canhão. Decreto de
17-7-1912 instituía zona de pesca de cinco milhas e o Decreto n9 5.798. de 1940,
restabeleceu a largura de três milhas (Georgenor de Sousa Franco). A Circular n9
43 do M inistério das Relações Exteriores de 25 de agosto de 1914 fixava o mar
terrilorial em irés milhas em nom e da nossa neutralidade (Maria Inés C. de
A ndrade).
42. E interessante observar que o Decreto-lei n5 227/67, ao regulamentar a
[fesca, não se refere à zona contigua de pesca, mas apenas as zonas de alto-mar
contiguas ao mar territorial "em conform idade com as disposições dos tratados e
convenções internacionais ratificadas pelo Brasil” . Ora, a zona contigua de pesca
não figurava em tratado.
43. V. capítulo Alto-mar.
44. V. capítulo XIX.
44A. O primeiro texto legal a em pregar a expressão zona económ ica exclusiva
foi urna lei malgache de 1973, mas para designar a plataforma continental, e o
prim eiro Estado a empregá-la no sentido que é hoje adotada foi Bangladesh, em
1974 (Lucchini-Voeckel).
45. Nos EUA existem os “Deepwater Ports” . que têm uma zona de segurança.
Os EUA concluem tratados com os Estados do pavilhão dos navios que querem
utilizar estes portos para reconhecer a sua jurisdição.
46. Dupuy fala em 87% da pesca mundial, salientando que ela cobre quase
todas as áreas de grande fertilidade do mar, que surgem por in flu en cia de co rren tes
marinhas e ventos.

1176
CAPÍTULO XLIV

PLATAFORMA CONTINENTAL.1AS GRANDES


PROFUNDIDADES

429 — Dados geográficos: 430 — Recursos; 431 —- Definição; 432


— Terminologia; 433 — Evolução histórica; 434 — Direitos e deveres
do Estado na plataforma; 435 — Limites; 436 — Fundamento dos
direitos do Estado na plataforma; 437 — /U grandes profundidades
marinhas.

\42Çft Os continentes não estão diretamente, de modo abrupto, sobre


o funcío dos oceanos, mas repousam em umaplataforma, geralmente, de
ligeira inclinação. O território de um Estado não desaparece de imediato
com o mar, mas prolonga-se submerso. E a plataforma continental, cuja
profundidade média vai até 200m, ou i 00 braças (1 SDm~pãrrJ*õs~ãnglo-sa-
xões), guando tem início o^Lalude continental ou rebordo oceánico, que
vai até a profundidade média de 500m e, posteriormente, vem a região
pelágica, para finalmente mergulhar nas grandes profundidades da região
abissal.
A noção geográfica de plataforma continental já é encontrada no
século X VIII com o Marqués de Marsilli. fundador da oceanografía.
A largura da plataforma varia de acordo com o relevo terrestre, sendo
normalmente menor quando o relevo for montanhoso. Em certas regiões
ela chega a 750 milhas de largura: é o que ocorre, por exemplo, entre a
Noruega e a Sibéria. Em outras regiões, como no Pacífico (Chile), ela
praticamente não existe, devido à proximidade da Cordilheira dos Andes,
onde o m ar cai, junto à costa, a grandes profundidades.
A maioria das plataformas vai até a profundidade de 133m (Shepard).
Todavia, não se pode fixaruma definição, mesmo geográfica, deplataforma
continental a partir da sua profundidade, uma vez que ela é variável. Por
exemplo, a de certas regiões da Austrália (Sahul Bank), a oeste e noroeste,

1177
atinge a profundidade de 555m. A plataforma ocuparía 7,66% da superficie
do océano (Shcpard).
Não é a plalafonna continental tão lisa como sen nome parece indicar;
é, pelo contrario, normalmente acidentada, em contraste com as grandes
profundidades marinhas, que são geralmente uniformes. Ela possui vales
formados por verdadeiras montafilííis.
Os solos marinhos enconlram-se c á b e n o s por sedimentos de duas
especies: a) terrígenos ou continentais (próximos à costa); />)~peIágicos
(longe da costa). Os sedimentos pelágicos podem ser: j — corais; 2 —
algas; 3 — argilosos (lodos calcários e lodos de silicose) (Aja Espil).
Diversas teorias procuram explicar a origem das plataformas continen­
tais: a) abrasáo marinha; b) sedimentação marinha (seria resultante de
produtos retirados do continente, por exemplo, pelos grandes ríos); c)
seria a plataforma o rebordo dos continentes cujas grandes fraturas teriam
formado os Oceanos Atlântico e Indico (Wegener); d) a plataforma tena
surgido de umajnvasão do mar no continente. Esta última teoria é a que
mais conta seguidores nos dias de hoje. Na verdade, nenhuma concepção
é inteiramente certa, uma vez que as plataformas tiveram as mais diferentes
causas, e em conseqüência todas as teorias expostas têm a sua parte de
verdade.2
A plataforma é também uma noção biológica, no sentido de que tem
25.000.000 de quilômetros quadrados. O talude vai até 5.000 metros de
profundidade e tem largura média de 15 a 50 quilômetros. A elevação
continental tem profundidade de 1.370 a 6.000 metros e a largura é variável
de 50 a 500 quilômetros (Marotta Rangel). A elevação continental é urna
inclinação suave de a 2%, sendo larga n os'Oceanos Atlántico e Indico e
estrejlano Oceano Pacífico.
f t w A noção da plataforma continental penetrou no campo do DIP
devido a fatores exclusivamente económicos. A plataforma e as suas aguas
apresentam inúmeros recursos. "
A. plataforma é também uma nor.áo biológica, no _senliij.fi..-díL.que,
criando mn meio próprio para as espécies marinhas, nela se localiza a
maioria das espécies c o m e s tíveis. Estas ali se localizam devido ao plancto,
ou plancton, que lhes sen'e de alimento. O plancton se divide em fito-
plancto (organismos vegetais) e zooplancto (organismos animais). Ele
pode ser definido como o conjunto de material orgánico constituido de
algas vagantes de mínimas dimensões e de minúsculos organismos animais
que servem de alimento para as especies maiores. Em conseqüência, estas
aí se localizam por encontrarem alimento.3 Na plataforma encontramos o
nécton, formado pelos peixes de um modo geral. O bento é formado por
aquelas espécies que estão fixas no leito do mar ou se locomovem em
constante contato com o fundo do mar.4 Existem especies bentónicas cujas
larvas ou os indivíduos não adultos nadam.
A plataforma é uimbcm rica em recursos minerais. As duas platafomias
continentais dos EUA possuem grande quantidade de petróleo, carvão,
uranio, ferro, chumbo, prata, ouro, etc. Acredita-se que a da URSS, no
Oceano Pacífico, possua níquel, tungsténio, ferro, manganês e lálio É o
petróleo, nos dias de hoje, o mais procurado e explorado dos minerais na
plataforma. Na plataforma do Brasil temos petróleo, monazita, manganês,
níquel, etc. Atualmente 35 países fazem prospecção de petróleo no mar:
Argelia, Ceilão, Tanzania, Guatemala, Brasil, etc., sendo que com o au­
méntenlo preço do petróleo o preço do extraído do mar ficará competitivo.
A geografia não nos fornece uma definição que abranja todas as
plataformas: a) o batimétrico — não pode ser aceito, urna vez que as
profundidades sáe'.variáveis; b) o geológico é também insuficiente, urna
vez que encontramos rochas de todos os tipos; c) o biológico é inaceitável,
unía vez que as especies da plataforma possuem em diversos casos um
habitat que se estende por vezes às águas mais profundas; d) o da primeira
inclinação como limite da plataforma (Bourcart) também não pode ser
adotado porque o rebordo oceânico (começa ao terminar a plataforma)
é pouco conhecido e, por outro lado, há, como já dissemos, nas platafor­
mas, grandes depressões sem que elas terminem.
A doutrina jurídica também não fomece uma definição aceita por
todos. As próprias proclamações estatais de incorporação da plataforma
muitas vezes preferem não defini-la. Pode-se salientar que a definição de
plataforma é hoje meramente jurídica, sem levar em consideração a geo­
grafia.
A_ convenção sobre plataforma continental, concluída em Genebra
(1958),6 a primeira codificação internacional deste assunto, dava a seguinte
definição:

“Para os efeitos dos presentes artigos a expressão ‘platafor­


ma continental’ é utilizada para designar:
a) o leito do mar e o subsolo das regiões submarinas adja­
centes às costas mas situadas fora do mar territorial, até liíma
profundidade de 200 metros, ou, além deste limite, até o ponto
em que a profundidade das águas sobrejacentes permita o apro­
veitamento dos recursos naturais das referidas regiões;
b) o leito do mar e o subsolo das regiões submarinas aná­
logas, que são adjacentes às costas dãs ilhas.”

Esta definição consagra dois critérios: o da profundidade e o da ex-


plorabilidade.
Diversas críticas foram dirigidas ao critério da explorabilidade: a) ele
é vago e impreciso, ao contrário do batimétrico, que fornece uma delimi­
tação precisa; b) no futuro ele será o predominante com as explorações a

1179
mais (le 200 melros de profundidade; c) a capacidade técnica de cada
Estado é variável. Ao lado desfits críticas ao critério da explorabilidade ele
tem também argumentos em seu favor: a) o critério batimétrico acabaria
por ser desrespeitado com os progressos tecnológicos; b) o falo de ele ser
impreciso e conseqüentemente de difícil reprodução nas cartas submarinas
não teria maior valor, uma vez que tais cartas não teriam nenhuma van­
tagem para a navegação; c) se a plataforma for contínua entre dois Estados,
abandona-se o critério funcional e adota-se a linha mediana como processo
de delimitação; d) a capacidade exploratória não precisa ser do próprio
Estado, leva-se em consideração a tecnologia mais avançada na sociedade
internacional. Este critério trará maior dtyrabilidade à Convenção de Ge­
nebra e corresponde às necessidades econômicas dos mais diversos países.
O critério da explorabilidade foi incluído na Convenção de Genebra por
pressão dos países da América'Latina.
Se é verdade que o critério funciona] prevaleceria no futuro, não deixa
de ter o batimétrico a sua aplicação, porque a plataforma até 200 metros
está sujeita à soberania do Estado, sem que haja necessidade de sua capa­
cidade de explorá-la.
Uma grande questão a respeito da plataforma e ainda não resolvida
consistia em sabermos se uma plataforma continental, que possui uma
depressão de mais de 200 metrõ^^nH ã^^õr^ssívêf de exploração, e que,
após esta depressão, atinge novamente uma profundidade até 200 metros,
pertence ao Estado^osteiro. A melhor rèspÕstà parece-nos ser a afirmativa,
uma vez que há certas regiões, como no sul e sudoeste da Noruega, em
que a plataforma é cortada por profundo canal para depois ficar dentro
dòs limites de 200 metros até a costa da Escócia. Neste caso dado como
exempjo, se for necessária uma continuidade da plataforma, tais regiões
pertencerão à Escócia, apesar de se encontrarem a uma distância desta
quatro a cinco vezes maior do que da Noruega.
Reproduzimos acima o conceito tradicional e as discussões em tomo
dele para que se possa sentir a profunda modificação que ocorreu. A
convenção de 1982 estabelece que: “a plataforma continental de um Estado
costeiro compreende o leito e o subsolo das áreas_submarinas que se
estender além de seu mar territorial e a o longo de todo o prolongamento
natural de seu território até o bordo exterior da margem continental, ou
até uma distância de 200 milhas marinhas medidas a partir das linhas de
base a partir das quais se mede a largura cfo mar territorial, nos casos em
que o bordo exterior não atinja a esta distância”. Entretanto, este conceito
é esclarecido e limitado pelo seguinte: “a margem continental compreende
o prolongamento submerso da massa continental do Estado costeiro e está
constituída pelo leito e subsolo da plataforma, o talude e a elevação con­
tinental”. Acrescenta ainda que não compreende a parte profunda do
fundo oceânico nem o seu subsolo. Na verdade, há aqui uma “espécie de
conciliação” vez que na 35 Conferência das Nações Unidas um grupo de
lisiados alegava q 11 e a plataforma continental cia um “ prolongamento <lo
território” do Estado, e com isso pretendiam aumentar este esforço marí­
timo. Um outro grupo de Estados afirmava que, em conseqüência, a pla­
taforma continental seria substituída pela margem continental. Entretanto,
a plataforma pode ir além das 200 milhas mencionadas acima nos seguintes
casos: a) largura até 350 milhas medidas a partir da linha de base do mar
territorial quando a espessura das camadas de pedras sedimentares for
igual ou superior a 1% da distância mais curta entre o ponto amostrado
e o pé do talude continental. E de se assinalar que a espessura das rochas
sedimentares é um índice da presença ou ausência de hidrocarburos.6'
Existem sêippre algumas particularidades, como no golfo de Bengala (Sri
Lanka e índia), sendo que a plataforma não ultrapassa 20 milhas de largura
e a camada de sedimentos aumenta ao se afastar da costa, daí tais Estados
terem feito uma “declaração de interpretação’' incluída na Ata Final (Lu-
cius Caflish): b) 60 milhas marítimas medidas do pé do talude continental,
mas não pode ultrapassar 350 milhas a partir da linha de base do mar
territorial.6B O pé do talude nem sempre é fácil de ser determinado.
Outro critério para a fixação da plataforma, que é considerado subsi­
diário, é o de se medir 100 milhas marítimas a partir de 2.500 metros de
profundidade. Ele não é úm critério autônomo, mas um limite. È preciso
salientar que se tem sustentado que neste caso a distância de 350 milhas
contadas a partir da linha de base do mar territorial pode ser ultrapassada,
desde que não se trate de cristas submarinas, quando o limite ficará dentro
das 350'milhas. O Estado poderá adotar um critério em cada local diferente
do litoral, usando assim a todos.
A observação que se pode fazer é que a definição de plataforma deixou
de ser um problema dos juristas para se tornar um problema para ocea­
nógrafos. A própria convenção prevê, no seu anexo II, a constituição de
uma Comissão de Limites da Plataforma Continental para tratar deste tema
quando" a plataforma for além das 200 milhas. A citada Comissão será
formada de 21 membros, técnicos em geologia, geofísica e hidrografia.
Ela examinará os dados fornecidos pelos Estados e fará recomendações,
bem como prestará “ assessoram en to científico e técnico”, se este for soli­
citado. O limite exterior será traçado por “meio de linhas retas, cujo
comprimento não exceda 60 milhas marítimas, que unam pontos fixos
definidos por meio de coordenadas de latitude e longitude”. Os dados
sobre os limites exteriores "da plataforma serão depositados com o Secre-
tário-geral das Nações Unidas, que dará publicidade a eles. O prazo do
Estado para apresentar a delimitação da plataforma à citada Comissão é
de dez anós após a entrada em vigor da convenção. O prazo não é contado
a nosso ver no que podemos denominar de primeira fase a partir da
ratificação, vez que a Comissão não foi nem constituída.
Na verdade, a plataforma continental passa a coincidir em boa parte
com a zona econômica, mas vários Estados com grandes plataformas rei­

1181
vindicaram a sua extensão alé o rebordo externo da margem continental,
daí a adoção do conceito acima, que eliminou a igualdade que a zona
econômica consagrava, bem como acabou por diminuir a área. Observa
Marotta Rangel que o regime da zona económica está sobretudo ligado à
coluna d’água e aos recursos vivos, enquanto a plataforma continental se
relaciona ao leito e subsolo do mar. A zona económica e a plataforma
continental podem coincidir, mas isto não ocorre: a) se a plataforma
ultrapassa 200 milhas; b) se a delimitação dos dois espaços marítimos foi
fixada em virtude de uma decisão de órgão internacional ou de um tratado;'
c) se o Estado não criar zona económica. A CIJ, no caso de delimitação
da plataforma entre Libia e Malta (1985), afirmou: “pode existir plataforma
continental sem zona económica exclusiva, mas não poderia existir zona
económica exclusiva sem plataforma continental correspondente”. Estas
observações são tiradas de Marotta Rangel. Pode-se acrescentar que geo­
graficamente a plataforma está ligada ao territorio do Estado e pode ul­
trapassar 200 milhas.
^32^yVlguns autores (Boucart) atribuem a palavra “plataforma” a Mur-
ray, que participou da expedição do “Challenger” em 1872. Outros (Rrum-
mel) a atribuem a Hugh Robert Mili, em 1887.
Este termo tem levantado inúmeras críticas, como a de não abranger
a plataforma das ilhas. Diversas denominações têm sido propostas: plata­
forma (M outon), plataforma litoral (Durante), plataforma submarina
(Constituição brasileira de 1967), áreas submarinas (Young, Lauterpacht),
plataforma continental (Constituição brasileira de 1969), etc.7
Na verdade, a denominação plataforma continental não é inteiramente
exata. Entretanto, a adotaremos por ser a_mais consagrada na doutrina e
na prática internacional, bastando lembrar que a Comissão de DI, a Con­
venção de Genebra e a Convenção de 1982 se utilizaram dela. Na verdade,
na nossa matéria, a terminologia empregada nem sempre é perfeita (basta
lembrar a de Dl). As expressões, depois de consagradas, ganham um
sentido jurídico próprio, que nem sempre corresponde ao literal.8 A grande
vantagem da expressão plataforma continental é exatamente a sua consa­
gração no Dl. E preciso lembrar que a noção jurídica de plataforma não
corresponde à noção geográfica (p. ex.: no direito ela começa depois do
mar territorial, enquanto na geografia começa na costa, etc.). Por outro
lado, a expressão continente abrange também as ilhas (ex.: as ilhas da
Gra tan ha estão no continente europeu).
. A noção de plataforma continental só encontrou ampla aceitação
no mundo jurídico após a Proclamação do Presidente Truman em 1.945;
todavia, anteriormente a esta data encontramos uma série de manifestações
doutrinárias, históricas e mesmo uma convencional, que se referiam direta
ou indiretamente à plataforma.
Vattel foi o primeiro a falar claramente na possibilidade da ocupação
do leito do mar. Todavia, é com Valin que vamos encontrar corn bastante

1182
nitidez a noção da plataforma, quando ele propõe que o mar territorial
stja delimitado pelo lugar onde a sonda não tocar mais o fundo, signifi­
cando islo que o mar territorial abrangeria a região de menor profundi­
dade, que é normalmente a plataforma.
Em 1858, o Cornwall Submarine Act estabelecia que as minas e mine-
tais do alto-mar adjacente à Cornualha pertenciam à coroa.
Km 1910, Portugal, ao regulamentar a pesca, leva em consideração a
plataforma continental como sendo a região propícia à pesca.
Em 29 de setembro de 1916 o governo imperial russo, por meio de
uma declaração dirigida às potências estrangeiras, afirma que fazem parte
integrante do Império diversas ilhas (Nova Sibéria, Wrangei, etc.), na costa
asiática do Império, uma vez que eram uma extensão p a rà p Norte da
plataforma continental da Sibéria. Esta reivindicação foi reafirmada pelo
governo soviético. Ele não usa a expressão plataforma continental no
sentido que aqui utilizamos, mas no de “uma espécie de bloco terrestre"
(Ferron). Entretanto, esta declaração tem sido encarada como um elemen­
to na história do conceito de plataforma.
Em 1916, Storni, na Argentina, descreve a plataforma e sustenta o mar
epicontinental.
Em 1918, na Espanha, no Congresso Nacional de Pesca, reunido em
Madri, Odón de Buen y dei Cos9 sustentou que o mar territorial deveria
abranger a região da plataforma Continental, uma vez que esta era a região
mais favorável para a pesca das espécies comestíveis. Ainda em 1918, José
León Suárez defende a mesma tese, que será retomada por Nágera em
1927. Em 1930, Miguel Ruelas defende apropriação da plataforma pelo
Estado, porque ela é um prolongamento dele.
Em 1942 encontramos o tratado entre a Venezuela e a Inglaterra,
firmado em 26 de fevereiro, sobre as áreas submarinas do golfo de Pária,
rico em petróleo. O tratado não fala em plataforma, mas está “inspirado
e dominado por esta noção” (Ferron). Pela primeira vez foi o leito do
alto-mar dividido contratualmente.
Foi com a Proclamação de Truman de 28 de setembro de 1945 que a
noção de plataforma entrou definitivamente no Dl. Truman invocou di­
versos argumentos que foram expostos nas considerações da Proclamação:
1) a necessidade de novas fontes de petróleo e outros minerais; 2) que o
progresso técnico permite a sua exploração ou-virá a permiti-lo em futuro
próximo; 3) que é necessário estabelecer uma jurisdição competente no
interesse da conservação desses recursos; 4) que esta jurisdição deve ser
do Estado costeiro, uma vez que as medidas necessárias para a utilização
ou conservação precisam da cooperação e proteção da costa, devendo-se
levar em consideração que a plataforma é uma extensão da ma'ssa terrestre;
assim sendo, pertence a ela, e, ainda, é necessário, para a segurança do
Estado costeiro, ser esta exploração feita por êle. Os EUA reclamaram
sobre esta área o “controle e a jurisdição” .10 A declaração de Truman foi

1183
considerada por Colliard um "equívoco”, vez que só ele linha capacidade
para explorar petróleo ao longo da costa e não tinha nenhuma razão para*
desencadear um movimento de apropriação. Entretanto, os produtores de
petróleo, através do Instituto Americano de Petróleo e o Conselho Nacional
de Petróleo, forçaram o g o v ern o a esta atitu de. Eles preferiram negociar
com um Estado do que com uma autoridade internacional monopolista
(Lucchini e Voeckel).
Os mais diferentes Estados, principalmente da América e da Ásia,
incorporaram a sua plataforma. O Brasil incorporou a sua pelo Decreto
n- 28.840, de 8-10-1950.11 A incorporação da plataforma continental cor­
respondeu a uma necessidade da humanidade.
No Brasil a Lei ns 8.617 de 4-1-93 estabelece que adotará os critérios
da já citada convenção de 1982 e que ela se estende até o exterior da
margem continental, oti -até 200 milhas de largura da linha de base dõ '
mar territorial, se o referido bordo não atingir esLa largura. Estabelece
que cabe ao governo brasileiro regulamentar a investigação científica.
Determina ainda que o traçado para a conservação de cabos e dutos
submarinos será feita pelo govemo, que poderá estabelecer condições para
a cit<ídàycolocação.
\ 34jO Estado costeiro tem “direitos de soberania” sobre a plataforma
para a exploração e utilização de seus recursos. São direitos exclusivos do
Estado independente dele fazer ou não a exploração, bem como o Estado
os possui independente de qualquer proclamação ou ocupação da plata­
forma. São recursos naturais: a) os recursos minerais e outros recursos não
vivos do leito do mar e seu ^üláloT^TJ'^s organismos vivos jjértén'céiités
às espécies sedentárias, isto é, aqueles que no período de exploração (serem
pescados) estão imóveis nó leito do mar ou~ém~séíTsüUsõTõ õlfsõ podem
se mover em constante contato físico com o leito do mar”.12
Os direitos do Estado na plataforma- não aTtórâm^ãTcõndição jurídica
das águas sobrejacentes nem a do espaço aéreo situado sobre tais águas” .
O Estado tem direito a instalar ilhas artificiais e estas se regem pelas
mesmas normas estabelecidas para tais ilhas na zona econômica (v. capítulo
anterior). Podemos acrescentar que para Hubert Charles as ilhas artificiais
apresentam as seguintes características: são obras do homem destinadas a
trabalhos em lugares fixos e são implantadas no niar.11' Tem sido observado
que as ilhas artificiais não transformam o alto-mar em “res nullius”, uma
vez que os Estados, ao colocarem ilhas artificiais, agem em nome da so­
ciedade internacional e não podem causar prejuízo aos demais Estados.
O Estado tem direito exclusivo para autorizar e regulamentar as per­
furações realizadas na plataforma.
O Estado tem direito a perfurar túneisjpara a exploração do subsolo,
independente da profundidade das águas. O Chile faz exploração de carvão
deste modo.13 ;

1184
Os direitos do Estado costeiro sofrem limitações no sentido fie que o
seu exercício “não deverá alelar a navegação nem a otaros direitos e
liberdades dos demais Estados". Uma outra limitação é que “todos os
Estados têm direilo a colocar na plataforma continental cabos e oleodutos
submarinos". O Estado costeiro tem o direito de tomar medidas razoáveis
para a exploração da plataforma, mas não poderá impedir a colocação de
tais cabos e oleodutos. O traçado da linha para a colocação de cabos e
oleo d u to s está “sujeito ao consentimento do Estado costeiro”. O Estado
costeiro poderá estabelecer condições para a sua colocação e esta deverá
levar em consideração os cabos e oleodutos já existentes.
Uma outra obrigação do Estado é que ele fará p'agamento ou contri-
buições em espécie “a respeito da exploração de recursos não vivos da
plataforma além das 200 milhas medidas a partir das linhas de base" do
mar territorial. Os pagamentos e contribuições serão anuais sobre a pro­
dução de um sítio mineiro após cinco anos de produção deste sítiç, e a
contribuição “ será de 1 % do valor ou volume da produção” do mencionado
sítio. Haverá um aumento de 1% ao ano até atingir 7%. O Estado em
desenvolvimento que será importador do recurso mineral explorado em
súa plataforma “estará isento dé tais pagamentos ou contribuições a res­
peito deste recurso m ineral". Os pagamentos serão feitos à Autoridade (v.
adiante), que fará a sua distribuição entre os Estados-partes na convenção.
'* No Brasil a concessão de pesquisas e exploração da plataforma conti­
nental é dada pelo Presidente da República (Decreto na 63.164 de 1 9 6 8 ).14
Em 1970 foi concluído o tratado de desnuclearização do fundo do
mar, aplicável a partir de uma distância de 12 milhas de linha de base do
mar territorial. Este tratado consagra o regime de consulta entre os inte­
ressados e a notificação ao Conselho de Segurança em caso de violação.
435. A Convenção de Genebra fixou as normas para a delimitação da
plataforma continental e estabeleceu, como principio fundamental, o acor-
do entre os Estados. Na ausência deste acordo, se os Estados se encontram
frente a frente, traça-se a linha mediana, se não existirem “circunstâncias
especiais” que justifiquem outra delimitação. Quando os Estados forem
limítrofes, aplica-se o “princípio da equidistancia dos pontos mais próximos
das linhas de base, a partir das quais é medidá'a largura do mar territorial
de cada um destes Estados". Salienta Pro'sper Weil que o critério da bissetriz
só é válido quando as costas formam uni ângulo claramente delineado e
que a linha perpendicular não funciona quando a costa não é retilínea,
daí ser adotado o critério dos pontos equidistantes. Oda, Jiménez de Aré-
cliaga e outros sustentam que os critérios de delimitação da..plataforma
são os mesmos adotados para a zona económica.
Estos delimitações deverão ter publicidade.
E preciso salientar que a delimitação nem sempre é simples como
pode parecer; assim, no golfo Pérsico houve grandes problemas entre o
Irã e o Iraque, uma vez que toda ilha tem plataforma e na região havia

1185
vái ios ro ch ed os m ab iláv e is q u e não se sabia a q u e m pertenc iam . Ê p re ciso
íc m b ra r pela C o n feren cia d e G en eb ra, p a ra ser co n sid erad a ilh a n ã o
p recisa ter co n d iç õ es d e habitabilidades o q u e foi a ltera d o no p ro je to da
O N U (v. cap. M ar T e r r ito r ia l).
Por outro lado a CIJ, em 1969, no caso de delimitação da plataforma
entre Alemanha O ciden tal (d e um lado) e Holanda e Dinamarca (de
outro), afirmou que o princípio da equidistancia não é obrigatório e que
não existe um método único de delimitação. Esta deve ser justa e levar
em consideração o formato da costa.HA
Na verdade têm su rgido inúm eros litígios s o b r e a delimitação da pla­
taforma: a) plataforma francesa e inglesa (submetida a tribunal arbitrai
franco-britânico); b) fronteira entre os emirados de Dubai e Shaijah (sub­
metida à CIJ); c) delimitação da plataforma entre Tunísia e Líbia (subme­
tida à CIJ); d) delimitação da plataforma entre Islândia e N oruega (sub­
metida a conciliação); e) delimitação da plataforma entre Líbia e Malta
(submetida à CIJ) e julgada em 1985; J) delimitação da plataforma entre
Grécia e Turquia (neste caso a CIJ se declarou incompetente); g) plata­
forma entre EUA e Canadá no golfo de Maine (submetida a uma C âm ara
“ad hoc” da CIJ). Foi julgada em 1984, sendo que o Canadá ficou com
1 /6 da área e o resto ficou para os EUA, e ambas as partes se declararam
satisfeitas com a decisão. O litígio surgiu porque os bancos na região são
ricos em pesca. Ou, ainda, o litigio relativo à plataforma continental entre
Guiné e Guiné-Bissau, resolvido por um tribunal arbitrai “ad hoc” formado
por três juizes da CIJ em 1985. Estaria sendo formado assim pela jurispru­
dência internacional um direito de delimitação marítima. A delimitação
tem atualmente um aspecto constitutivo. —
Lucius Caflisch assinala que a CIJ tem levado em consideração para a
solução destes litígios: a) a configuração geral da costa, a fronteira terrestre
e a presença de alguma característica especial; b) a estrutura física e geo­
lógica e os recursos naturais; c) nem sempre ela leva em consideração ser
a plataforma um prolongamento da massa terrestre; d.) a proporcionalidade
entre a plataforma e a largura da costa. Por outro lado, a jurisprudência
tem feito um constante apelo à eqüidade (P.-M. Dupuy).
A convenção de 1982 estabelece que a delimitação da plataforma deve
ser feita por comum acordo ou por um modo pacífico de solução dos
litígios e deverá ser “uma solução eqüitativa”. Na 3a Conferência das Nações
Unidas um grupo do Estado desejava manter o critério da linha mediana
ou, ainda, a noção de circunstâncias especiais, enquanto outros grupos
queriam excluir o critério de eqüidistância. Assim como uma fórmula
intermediária, se adotou a da conclusão de um acordo internacional vi­
sando obter uma solução eqüitativa. O mesmo critério foi adotado na zona
econômica.
436. Devemos agora procurar o fundamento dos direitos do Estado
na plataforma, isto é, sabermos por que a noção de plataforma se tornou

1186
obrigatória no campo jurídico. Inúmeras teorias a respeiio da plataforma
foram elaboradas:
a) Scelle propôs qut^ela fosse internacionalizada c a criação de um
órgão na ONU para a sua supervisão. Esta teoria não corresponde, eviden­
temente, à sociedade internacional em que vivemos, ainda dominada pelos
interesses políticos dos "Estados.
b) ^ teo n a.d a ocuparão — alguns autores (H. Smith) procuram fun­
damentar o direito do Estado na plataforma, fazendo aplicação da teoria
da ocupação. Se levarmos esta concepção para o Direito Marítimo, teríamos
que considerar o leito e o subsolo do alto-nrar como uma “res nullius",
que então poderia ser ocupada pelo primeiro ocupante, o que constituiria
uma fonte constante de conflitos no rpundo internacional.
c) Tentou-se solucionar esta questão com a teoria do “inchoate title”.
Na realidade, tal posição é apenas uma “nuance” da teoria da ocupação;
entretanto, a estudaremos ém separado, para m elhor análise. Os partidários
da teoria da ocupação poderiam defender a sua posição de uma ocupação
efetiva sobre a plataforma por meio de ilhas artificiais e que a proclamação
do Estado costeiro poderia ser um “inchoate title” até a exploração efetiva
da plataforma. Esta teoria é inaceitável porque os Estados possuem direitos
soberanos na plataforma independentemente de qualquer exploração, isto
é, possuem direitos completos e não apenas embrionários.
d) A contigüidade também não pode ser adotada, uma vez que ela
levaria a uma grande confusão. Ora, se assim fosse, nas plataformas con­
tínuas ou limítrofes, nada impediria que um Estado se instalasse na plata­
forma de outro, que só poderia, então, reivindicar a sua plataforma até
onde ela não tivesse sido ocupada pelo Estado estrangeiro. É preciso
lembrar que a contingüidade atua em território “res nullius”, o que não
ocorre na plataforma. A contigüidade por si mesma não é título para a
aquisição de território.
e) A teoria do prolongamento se fundamenta em inúmeras proclama­
ções estatais (México, EUA). A plataforma é um prolongamento do terri­
tório estatal. Ela conduz a uma série de imprecisões, uma vez que ela não
determina até onde vai o direito do Estado costeiro, isto é, a que distância
da costa cessa o prolongamento. A própria Convenção de Genebra, ao
fixar o conceito de plataforma, não leva em consideração se ela é prolon­
gamento ou não. Por outro lado, os Estados têm nela direitos mais limitados
do que têm no “território terrestre”.
J) A teoria dos setores, aplicada às regiões polares,15 foi levada para a
plataforma (Gidel). Entretanto, ela também não explica qual o limite da
plataforma e o que se deve considerar com o zona de atração do Estado
costeiro. A plataforma não é delimitada de maneira tão precisa como as
regiões polares.

1187
g) A teoria da acessão não pode ser aplicada na plataforma continental,
uma vez que ela não é uma área nova, mas. pelo contrário, submersa de
maneira permanente. Ela não poderia ser aplicada às plataformas que não
fossem o resultado de uma sedimentação e sim, por exemplo, de uma
abrasão marinha.
k) A teoria da “restitutio in integrum” afirma que o Estado tem direito
na plataforma, porque juridicamente se restituía ao Èstado aquilo que já
pertencera a ele e que teria submergido no mar. Esta formulação não
corresponde à realidade jurídica da plataforma, uma vez que os Estados
possuem direitos no leito e subsolo do alto-mar, mesmo onde nunca tenha
existido plataforma em sentido geológico.
i) A melhor concepção sobre o assunto é a que considera ser a plata­
forma um instituto de origem consuetudinária. O costume se teria formado
com as proclamações estatais incorporando a plataforma que não tiveram
a oposição dos demais membros da comunidade internacional. Esta norma
se teria formado em um prazo curto devido à intensidade com que os atos
(proclamações) foram praticados. Eles correspondiam a uma necessidade
de todos os Estados. E de se assinalar que, apesar das divergências existentes
nas proclamações estatais, elas possuíam a uniformidade para o apareci­
mento do costume, tanto assim que em ]958 foi possível a realização de
uma convenção sobre plataforma continental.
437. Atualmente, com o desenvolvimento, da técnica é possível a ex­
ploração a mais de 12.000 pés de profundidade. As grandes profundidades
são ricas em nodulos de manganês, que contêm ferro, manganês, cobalto,
cobre, níquel,_etc. Os nodulos de manganês do Oceano Pacífico são os
mais ricos e contêm: 25% de manganês, l%Tde níquel, 0,75% de cobre e
0,25% de cobalto. Igualmente, existem as denominadas “argilas verme­
lhas”, ricas em óxido de ferro, cobre, etc. Têm-se calculado as seguintes
reservas no fundo dos mares em bilhões de toneladas: 358 de manganês,
7,9 de cobre, 14,7 de níquel e 5,2 de cobalto (A Szekely). Os nódulos
abasteceriam 15 vezes as necessidades do mundo em níquel, 115 vezes as
de cobalto e 4,5 vezes as de manganês (F. L. La Que). Pesquisas mais
recentes (1975-1977) mostram que a quantidade é bem menor e que
haveriam 100 bilhões de toneladas de nódulos e nem todos seriam de boa
qualidade (Alexandre-Charles Kiss). Pode-se acrescentar que os minérios
manganês, cobalto, níquel e cobre são vendidos a preços especialmente
baixos no mercado mundial.
Alguns autores (Paul Tedeschi) consideram que a exploração das gran­
des profundidades trará problemas para determinados países subdesenvol­
vidos produtores de cobre (Zâmbia, Chile), cobalto (Zaire) e níquel (Nova
Caledônia). Outos (Bennouna) observam que os países industrializados é
que são os maiores produtores de níquel, cobre e manganês, enquando
os subdesenvolvidos só são maiores produtores de cobalto.

1188,
Tal fato acarretou a questão de se saber se o leito e o subsolo das
grandes profundidades marinhas estavam submetidos ao redime jurídico
da plataforma.
Tem-se argumentado que a definição de plataforma abrange apenas
as “regiões submarinas adjacentes" e que estas grandes profundidades nao
são adjacentes à costa do Estado. O próprio critério da explorabilidade se
encontra subordinado à limitação de “adjacente”, apesar da relatividade
desta noção. O critério de “adjacente" é, assim, da maior importância na
caracterização da plataforma.
A questão das grandes profundidades começou em 1967, com uma
declaração de Ar vid Pardo (Malta) perante a Assembléia Geral da ONU.
Alguns autores (Richard Young) têm salientado que a Conferência de
Genebra não teve intenção de aplicar a tais regiões o regime da plataforma
continental. Por outro lado, tem-se argumentado que ilhas quase desabi­
tadas teriam uma “plataforma” imensa, enquanto que os Estados sem
litoral nada teriam. Por outro lado, a Convenção de Genebra sobre plata­
forma continental dentro dos seus próprios termos já está aberta à revisão.
Diante destas considerações a Assembléia Geral da ONU em 1967 criou
um comitê “ad hoc” para estudar a matéria e em 1968 foi criado o “comitê
sobre as utilizações pacificas do fundo dos mares e oceanos além dos
Limites da jurisdição Nacional”, composto de 42 Estados, çom a finalidade
de estudar o regime jurídico dessas regiões. A grande tendência é a inter­
nacionalização destas áreas e a sua utilização pacífica.16
Em 1970 a Assembléia Geral, em Declaração de Princípios sobre os
Fundos Marinhos, afirmava que estes, além da jurisdição nacional, eram
“patrimônio comum da humanidade”. Pode-se recordar que em 1956 o
maritimista Mouton já propusera que o fundo do mar, além da jurisdição
nacional, pertencesse ao conjunto da sociedade internacional, bem como
que em 1966 Lyndon Johnson propôs que o solo e subsolo do mar fossem
patrimônio da humanidade. Entretanto, a humanidade não pode ser con­
siderada sujeito de DI (P. Tavernier).
Em 1970, Nixon (EUA) propôs um projeto de tratado em que os
recursos existentes além de 200 metros de profundidade seriam conside­
rados “patrimônio comum da humanidade". Ele propunha a divisão do
fundo dos mares em três zonas: na primeira, até 200 metros de profundi­
dade, o Estado conservava a sua soberania; na segunda zona, que seria o
rebordo oceânico, o Estado faria a exploração como mandatário da socie­
dade internacional, sendo que uma parte dos recursos pertenceria ao
Estado e outra parte seria destinada à sociedade internacional. Na terceira,
zona de maiores profundidades, a exploração seria feita por um organismo
internacional. Neste mesmo ano, a Assembléia Geral, em uma deciaração
de princípios, afirma: a) o fundo dos mares e dos oceanos, bem como o
seu subsolo “além dos limites da jurisdição nacional” e os seus recursos,
são “ patrimônio comum da humanidade”; b) esta zona não pode ser objeto

1189
ríe reivindicação por parte dos Estados; c) a exploração será submetida a
um regime internacional; d) a exploração será feita no interesse de lodos
os Estados, independente de possuírem litoral ou não; e) ela será utilizada
para fins pacíficos, etc.17
Varias propostas foram formuladas pelos doutrinadores: a) Stroessin-
ger propõe que a ONU pode ter rendimentos advindos de licenças para
explorar o fundo do mar; b) os cientistas Alexandre Rich (EUA) e V. A.
Englehardt (URSS) propuseram que os recursos do fundo do mar fossem
administrados pelas Nações Unidas para que se obtenha fundos para o
desenvolvimento econômico.
Varios regimes foram imaginados; a) uma autoridade internacional
que daría licenças; b) urna empresa internacional que atuaria em nome
da sociedade internacional; os Estados desenvolvidos preferem um controle
internacional mais fraco. O mesmo ocorre com os países comunistas. Os
países subdesenvolvidos preferem um sistema internacional mais efetivo.
Varios países latinoamericanos (México, Peru, Equador, Uruguai, etc.)
propõem que a autoridade internacional faça a exploração diretamente,
tese que encontra a oposição da Grã-Bretanha e outros, que consideram
isto utópico. Uma outra dúvida consiste em se saber se as licenças devem
ser concedidas a empresas ou a Estados. A URSS não aceita que elas sejam
concedidas a empresas. Estas, entretanto, se obtivessem a licença deveriam
pagar uma soma anual da quantia que incidisse sobre os lucros a fim de
que realmente elas efetivassem a exploração (Evan Luard).
A convenção de 1982 dedica inúmeros artigos às grandes profundida-
des que ela denomina de Área.17A Estabelece que esta é formada pelos
“fundos marinhos e oceânicos e seu subsolo fora dos limites da jurisdição
nacional”. “A Área e seus recursos são patrimônio comum da humanida­
de. B Nenhum Estado poderá exercer soberania ou direitos de soberania
sobre uma parte da Área e seus recursos. Ás atividades são aí realizadas
“em beneficio de toda a humanidade, independente da localização geo­
gráfica dos Estados, sejam costeiros ou sem litoral, e dando consideração
especial aos interesses e necessidades dos Estados em desenvolvimento...”.
A Área será utilizada exclusivamente para fins pacíficos. Se as jazidas se
estenderem até regiões submetidas à jurisdição do Estado costeiro, os
interesses deste deverão ser levados em consideração. A investigação cien­
tifica deverá ser realizada na Área para fins pacíficos. A autoridade (v.
abaixo) poderá realizar investigações científicas visando a Área e seus
rêcursos. Deverá a autoridade impulsionar a transmissão de tecnologia
para os Estados em desenvolvimento. Alguns autores (A. Yancov) conside­
ram que o patrimônio comum é uma ilusão, porque 40% do mar estão
sob jurisdição nacional.
Serão adotadas medidas para a proteção do meio marinho, bem como
para evitar a poluição. " .................

1190
As atividades na Área levarão em consideração as demais atividades
desenvolvidas 110 meio marinho, assim as ilhas artificiais não serão coloca­
das nas rotas de navegação, a sua construção será notificada, etc. .Será
promovida “a participação efetiva dos Estados em desenvolvimento nas
atividades na Área”.
A convenção possui inúmeros dispositivos sobre a “política geral rela­
cionada com as atividades na Área”, como a administração ordenada,
segura e racional dos recu rsos da Área; a participação da autoridade na
receita; a promoção de preços justos e estáveis; a proteção dos Estados em
desenvolvimento para que não haja uma queda no preço dos produtos
que eles exportam; etc. Trata ainda da política de produção.
Cabe à autoridade organizar e controlar as atividades desenvolvidas
na Área. Estas atividades serão realizadas pela: a) empresa; b) em associação
com a autoridade por Estados-partes ou empresas estatais ou por pessoas
físicas naturais, quando patrocinadas por seus Estados nacionais. • •
E prevista uma Conferência de Revisão para 15 anos após o l s de
janeiro do ano que “comece a primeira produção comercial”.
A convenção estabelece a criação de uma organização internacional
denominada de Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos, com sede
na Jamaica. Ela é que controlará e organizará as atividades na Área. Ela
possui os seguintes órgãos: a) Assembléia^ è) Conselho; c) Secretariado; d)
Empresa.
A Assembléia é formada p or todos os membros e terá um período
ordinário de sessões anualmente. Cada membro tem um voto. Ela estabe­
lece a política geral da autoridade, elege os membros do Conselho e junto
com este elege o Diretor Geral da Empresa. Determina as quotas dos
membros no orçamento da autoridade. Tem ainda a atribuição de “exa­
minar e aprovar, por recomendação do Conselho, as normas, regulamentos
e procedimentos sobre a distribuição eqüitativa dos benefícios financeiros
e outros benefícios econômicos obtidos com as atividades na Área”.
O Conselho é formado por 36 membros eleitos pela Assembléia: quatro
Estados que nos últimos cinco anos tenham absorvido mais de 2% do
consumo mundial ou tenham realizado mais de 2% das importações mun­
diais; quatro Estados que mais tenham investido na Área; quatro Estados
que sejam grandes exportadores de minério que seja extraído na Área;
seis Estados em desenvolvimento que representem interesse especial (gran­
de população, sem litoral, desfavorecidos pela geografia, importadores de
minérios extraídos na Área, Estados em desenvolvimento menos adianta­
dos, etc.); 18 Estados escolhidos de acordo com a repartição geográfica.
O mandato é de quatro anos. Entre as suas funções estão a de fazer
recomendações à Assembléia, fiscalizar os pagamentos da autoridade, etc.
O Conselho tem os seguintes órgãos: a) Comissão, de Planifícação Econô­
mica; b) Comissão Jurídica e Técnica.

1191
A S e cre ta ria tem à sua fre n te um S e cre tá rio -g e ra l eleilo pela A ssem b léia
com m an d ato d e q u a tr o anos, que p o d e ser re e leilo .
A empresa é o órgão que realizará atividades na Area, assim como
atividades de transporte, tratamento e comercialização de minerais extraí­
dos na Area. O seu escritorio principal será na sede da autoridade. Para
garantir o seu funcionamento a autoridade reserva para ela a produção
inicial de 38.000 toneladas métricas de níquel. A empresa terá urna Junta
Diretora (15 membros), um Diretor-geral e o pessoal necessário para a
realização de suas funções.
Consagra ainda a convenção de 1982 a submissão dos litigios a urna
solução-pacífica na Cámara de Controvérsias dos Fundos Marinhos no
T ribunal Internacional de Direito do Mar. À citada Câmara, quando soli­
citada pela Assembléia e pelo Conselho, dará pareceres.
A convenção de 1982 é conciliatoria, tendo em vista as discussões que
se desenrolaram na 3~ Conferencia, com o a de que os países ricos susten­
tavam que a autoridade daria concessões para a exploração, enquanto para
os pobres ela mesma faria a exploração.'70 Os ricos tinham medo que a
empresa ficasse com o monopolio da exploração e o seu controle pelo 39
Mundo. Os pobres defendem que as concessões a empresas particulares é
urna fórmula transitoria que deverá desaparecer. Os pobres defendiam o
primado da Assembléia sobre o Conselho. A URSS queria que o Conselho
decidisse por consenso. Entretanto, os EUA na Administração Reagan
consideraram os seus interesses insuficientemente garantidos e se retiraram
da 3- Conferencia. Assim, em 1983, os EUA fizeram uma declaração afir­
mando que além das 200 milhas as empresas podem fazer explorações
livremente dos fundos marinhos.18 A Admmistração Bush tem mostrado
sinais de que talvez seja revista a posição dos EUA. Na verdade vai ser
difícil para alguns Estados financiarem organismos internacionais que cau­
sean prejuízos às atividades de seus próprios súditos. Para se verificar o
custo' das pesquisas para a identificação de um sítio de 150.000 quilômetros
quadrados para exploração foram gastos entre 50 e 80 milhões de dólares
em um período de dez anos. Por outro lado, os EUA têm uma situação
vantajosa, porque são as suas empresas que fazem exploração nas grandes
-profundidades marinhas. É exatamente por causa da Parte XI da convenção
que trata da Área que países como EUA e Inglaterra afirmam que a
convenção não se opõe a eles se eles não a ratificarem. Abi Saab observa
que os países que não assinaram a convenção de 1982 e autorizaram as
suas empresas a explorar a Área estabeleceram em sua legislação que parte
dos lucros obtidos seria utilizada na assistência externa.
Na Área já existe um regime provisório para exploração e foram dadas
autorizações à França, índia, Japão e Rússia, bem como a quatro consórcios
originários de oito Estados (P.-M. Dupuy). A legislação norte-americana
estabelece a jurisdição dos EUA sobre navios, cidadãos e pessoas estran­
geiras que explorem a Área sob a sua licença. Em 1994 a AG aprovou um

1192
acordo de implementação da Pai te XI da Convenção de 1982. Entre miu'as
determinações, são especificadas as funções da Empresa: n) faxti a taxação
relativa à exploração; b) coletar informações; c) taxar operações de joint-
ventures, etc. A política da Autoridade será fixada pela Assembléia em
colaboração com o Conselho. As decisões dos órgãos da Autoridade serão
tomadas por co n sen so, o que elimina o receio dos EUA de ser a Autoridade
dominada pelo 3® Mundo. E criado em Comitê financeiro com 15 mem­
bros, com mandato de cinco anos, cabendo a ela fazer recomendações à
Assembléia e ao Conselho, por exemplo, no tocante ao orçamento.

1193
NOTAS
I. (V. as obras gerais de direilo marítim o no capítulo X U I1); Barry B. L.
Auguste — The C ontinental S h elf— The l’ractice and Policy of the Lalin American
States with specíal reference to Chile, Ecuador and P eni, 1960; Gastão Nascimento
Ceccaio — L'Evolution Jurid ique de la D octrine du Plateau Continental, 1955;
Tereza H. L. Flouret — La Doctrina de la Plataforma Submarina, 1952; Gilberl
Gidel — La Plataforma Continental ante el D erecho, 1951; H. Lauterpacht —
Sovereignty over Subm arine Areas, in BYBIL, 1950, vol. XXVII; H. W. M ontón —
The Continental Shelf, 1952; Raphael Valentino Sobrinho — A Plataforma Con­
tinental, in Revista Brasileira de Política Internacional, ano VI, n9 23, setem bro
de 1963; Segundo R. Slorni — Intereses Argentinos en el Mar, 1916; Jo sé León
Suárez — Diplomacia Universitaria Americana Argentina en el Brasil, 1919; Jo sé
Luis de Azcárraga — La Plataforma Submarina y el Derecho Internacional, 1952;
Celso de Albuquerque Mello — Plataforma Continental, 1965; Alfredo Eisenberg
— Los derechos exclusivos del Estados sobre los productos naturales de su plata­
forma, in Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, vol. LV1II,
1963, págs. 106 e seg.; H ubert Charles — Les íles artificielles, in RGDIP, 1967, n9
2, Avril-Juin, págs. 342 e segs.; Richard Young — T h e Legal Regime o f the Deep-
Sea Floor, in AJIL, vol. 62, n° 3, July 1968, págs. 641 e segs.; Larry G. Parks — A
Lei do Mar, acima e abaixo da superficie, in Revista Marítima Brasileira, jan eiro ,
fevereiro e março de 1967, págs. 86 e segs ; Ju ra j Andrassy — International Law
an the Resources o f the Sea, 1970; Jack Lang — Le Plateau Continental de la Mer
du Nord, 1970; Charles Vallée — Le Plateau Continental dans le D roit Positif
Acluel, 1971; C. A. Colliard, R.-J. Dupuy, J . Polvêche e R. Vassiére — L e Fond des
Mers, 1972; Jean -P ierre Leíy — L 'o rd r e in ler n a lio n a l e l le d é v e lo p p e m e n t d es
fons marins, in RGDIP, Avril-Juin, 1971, n9 2, págs. 356 e segs,; Zdeney J . Slouka
— International Custom and the Continental Shelf, 1968; Ramiro Saraiva Guerreiro
— O aproveitamento dos recursos do mar além dás jurisdições nacionais, zn BSBDI,
janeiro-dezem bro, 1969, n9s 49 e 50, págs. 5 e segs.; Raymundo N onnato L. de
Castro — Aspectos fundam entais da doutrina brasileira sobre a plataforma conti­
nental, in BSBDI, janeiro-dezem bro de 1968, n9s 47 e 48, págs. 43 e segs.; François
Eustache — L ’affaire du plateau continental de la mer du 'Nord devant la Cour
Internationale de Ju stice, in RGDIP, Juillet-Septem bre 1970, n9 3, págs. 5 9 0 e segs.;
Armand de Mestral — Le régim ejuridique du fond des mers: inventaire et solutions
possibles, in RGDIP, Juillet-Septem bre 1970, n9 3, págs. 640 e segs.; Gunther
Jeanicke — Legal Problem s o f the Exploitation and Exploration o f the Sea, in Law
and State, vol. 6, 1972, págs. 60 e segs.; Revista Brasileira.de Política Internacional
— O Fundo do Mar, setembro-dezembro de 1969, n9s 47/48; T. A. Cligan, J r . —
The Oceans, in Lawyer o f The Americas, Febniary 1972, págs. 140 e segs.; Alva
Myrdal — Preserving T h e Oceans for Peaceful Purposes, in RdC, 1971, vol. 11, t.
133, págs. 1 e segs.; R.-J. Dupuy — Souverainelé et Espaces Maritimes, in M. Betlati
e outros — La Souveraineté au X X o Siécle, 1971, págs. 77 e segs.; Paolo Mengozi
— II Regime Giuridico Internazionale del Fondo Marino, 1971; Luis Cabana —
Actual Condición Ju ríd ica de los Fondos Marinos: anteproyecto de ponencia,
IHLADI, 1974; Evan Luard — T he Control o f the Sea-Bed, 1974;José Luis M eseguer
Sánchez — Nuevas Fronteras del D erecho del Mar: investigación científica, in
Anuario do IHLADI, vol. 4, 1973, págs. 557 e segs.; L. F. E. Goldie — T he

1194
í
Management o f O cean Krsources: Regimes for stnirtnríng the Maritime Environ-
meiu, in T h e Future of the International Legal O rder, editado por Cvril K. Black
and Richard A. Falk, vol. IV, 1972, págs. 155 e segs.; D. P. O ’Connel — Admnbra-
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1974, págs. 173 e segs.; René-Jean Dupuy — Le Fonds des Mers, Héritage Coinmum
de l'Humanité et le Développement, in Colloque dAix-en-Provence — Pays en
voie de développement et transform aron du D roit International, 1974, págs. 255
e segs.; André Reynaud — Les Diferends du Plateau Continental de la M er du
Nord devant la Cour International de Justice, 1975; United Nations Third Confe-
rence on The Law o f T h e Sea: Informal Com posite Text from The Sexth Session,
in International Legal Materials, Septem ber 1977, págs. 1.099 e segs.; Reynaldo
Galindo Pohl — La zona internacional de los fondos marinos, in Prim er Curso
de Derecho Internacional organizado pelo Com ité Jurídico Inleram ericano (1974),
págs. 15 e segs.; Jo rg e A. Aja Espil — La plataforma continental y el nuevo derecho
del mar, in Primer Curso de Derecho Internacional organizado pelo Com ité Ju ­
rídico Interam ericano (1974), 1975, págs. 35 e segs.; Donald E. Karl — Islands
and the Delimitation o f the Continental Shelf: A Framework for Analysis, in AJIL,
October 1977, vol. 71, n9 4, págs. 642 e segs.; A lberto Szekely — El D erecho del
Mar y la Carta de los Derechos y Deberes Económ icos de los Estados, in Jo rg e
Castañeda e outros — Derecho Económ ico Internacional, 1976, págs. 340 e segs.;
J . Beer-Gabel — L ’exploitation du fond des mers dans l’intérét de rhum anité:
chimére ou realité?, in RGDIP, t. 81, 1977, I, págs. 167 e segs.; W olfgang Graf
Vitzthum — T lie Terrenisation o f the O cean. T h e Tendency Towards a Maritime
Law Centred on Raw Materials, in Law and State, vol. 15, 1977, págs. 124 e segs.;
M. D. Blecher — Equitable Delimitation o f Continental Shelf, ¿re AJIL, vol. 73, ns
1, January 1979, págs. 60 e segs.; Gr. J . Tim agenis — T h e legal status o f engines
operating at sea o th er than ships, in Revue H ellénique de Droit International,
1979, págs. 112 e segs.; Christian Caubet — Fundamentos Político-Económ icos da
Apropriação dos Fundos Marinhos, 1979; W alter de Sá Leitão — Aspectos Jurídicos
Internacionais da Exploração dos Fundos O ceánicos, 1979 (tiragem mimeografa-
da); Christian Guy Caubet — A Competição pelos Recursos dos Fundos Marinhos:
um aspecto do confronto Norte-Sul, in Revista Brasileira de Política Internacional,
1978, nes 81-84, págs. 73 e segs., Paul Tedeschi — De Quelques Relations du Droit
de la Mer et des Etats en voie de Développem ent quant a leur potentiel econo-
mique, in Cao Huy Thuan e outros — Peuples et Etats du Tiers M onde face a
l’Ordre International, 1978, págs. 29 e segs.; M ohamed Bennouna — Les O céans,
in RGDIP, 1980, n 9 1, págs. 120 e segs.; Felipe Paolillo — Naturaleza Juríd ica del
Principio del “Patrim onio Común de la Hum anidad” , in Anuario Hispano-Luso-
Amcricano de D erecho Internacional, vol. 7, 1984, págs. 353 e segs.; Jo n ath an I.
Chamey — O cean Boundaries between nations: a theory for Progress, in AJIL,
July 1984, vol. 78, n° 3, págs. 582 e segs.; Ja n Schneider — T h e G ulf o f Maine
Case. The Nature o f an Equitable Result, in AJIL. July 1985, vol. 79, n9 3, págs.
539 e segs.; CJiristos T heod oro Poulos — T h e W ealih o f the International Sea-Bed
Areas. Benefit o f M ankind and Private Profit, in Revue Hellénique de Droit Inter­
national, 1984, págs. 113 e segs.; Jean-Pierre Lev)’ — La Comission preparatoire
de l’Autorité Internationale des Fonds Marins et du Tribunal International du
Droit de la Mer, ¿re Collection espaces et ressources maritimes, 1986, n® 1, págs.
137 e segs.; B eneditto Comforti — L ’arrét de la Cour Internationale de Justice

1195
dans l'aflaire de la Delim ilation (lu Platean Continental entre Ia Lybie et Malte.
in RGDIP, 1981). vol. 2. págs. 313 e segs.: Alexandre-Charles Kiss — La Notion de
Patrinioine Cominnn de l H uinaniié. in RDC, 1982, vol. II. t. 175. págs. 99 e segs.;
Robert A. Goldwin — Le Droit de la Mer: sens commun contre "patrinioine
coinm un” , in RGDIP. 1985. ne 3. págs. 719 e segs.; V icem e Marotta Rangel — Le
Plateau Continenial dans la Convem ion de 1982 sur le droit de la mer, separata
do RDC, t. 194, 1985, vol. V, págs. 271 e segs.; Prosper Weil — Perspective du
Droit de la Delimilation M aritim e. 1988: Djamchid Momtaz — La Commission
Préparatoire de 1’Autorité Internationale des Fonds Marins et du Tribunal Inter-
naitonal du Droit de la Mer, in Francisco Orrego Vicuña e Djamchid Momtaz —
Droit de la Mer 2, 1990. págs. 59 e segs.; Philippe Cahier — Les Sources du Droit
R elatif a la Delimitalion du Plateau Continental, in M élallges Michel Virally, 1991,
págs. 175 e segs.; Victor A lberico Boisson Moraes — A III Conferência das Nações
Unidas sobre o Direito do Mar, 1993 — tiragem mimeografada.
2. A teoria de W egener tem sido repudiada por grande número de autores,
mas tem encontrado alguma reabilitação.
3. Todavia, é do fitoplancto que depende tal fato, uma vez que “os animais
dependem das plantas, ‘com endo-as’ direta ou indireta m ente'' (M oulon). E os
vegetais se localizam na plataform a devido à sua pouca profundidade, que permite
a entrada dos raios solares para a realização do processo da fotossíntese. A pro­
fundidade média da zona eufótica é de 80 metros. A localização das espécies
comestíveis na plataforma é também ocasionada pelas correntes de água quente,
que bordejam a costa. É de se citar Paulo Moreira da Silva: “som ente o filoplancto
com o a planta terrestre, através da clorofila, é capaz de, com a energia solar,
extrair do ar (ou da água) o carbono, transformá-lo no alim ento fundamental, o
açúcar, as gorduras, e, em assimilação paralela (e proporcional), extrair do solo
(ou da água), o nitrogênio e o fósforo... para constituir a proteína” . Os peixes se
alim entam desta proteína, gordura e açúcar.
4. A caracterização dos bentos não é pacífiea e adotamos aqui o critério de
V allaux.
5. Não constitui nenhum a novidade a extração das riquezas do subsolo mari­
nho partida da costa, tendo sido o carvão o primeiro-a ser explorado (Cumberland,
Cornuaiha). Outros minerais também foram explorados, com o o estanho em
Sumatra.
6. Entrou em vigor em 1964.
6A. Os métodos para determ inar a espessura da camada de sedimentos são:
a) gravimetria — as anom alias no campo gravitacional dão importantes informa­
ções; b) magnetometria — as rochas têm propriedades magnéticas diferentes; c)
sísmico — é o processo mais seguro e leva em consideração o tempo que uma
onda sonora produzida por um a explosão leva para voltar à superfície (Victor
A lberico Boisson Moraes).
6B. Existem três tipos de talude, segundo a Comissão Oceanógrafica Interna-
ciona: a) talude ligando tuna plataforma de pequena profundidade e o fundo
norm al dos oceanos; pode ter dorsais, canions, terraços^ tendo bruscas variações
de inclinação; b) talude ligando um a plataforma de pequena profundidade e os
grandes fundos oceânicos das fossas pelágicas — a região situada entre a borda
da plataforma e o eixo da fossa pode apresentar cristas paralelas a este eixo, dando
lugar a várias imersões da inclinação...; c) talude ligando a plataforma de pequena

1196
profundidade ao fundo norm al dos oceanos interrom pido por zonas de profun­
didade intermediária ou pouco profundas (M. Bennoim a).
7. O Decreto-lei ne 221/ 67 já fala em plataforma continental.
8. Se adotássemos a expressão "plataforma subm arina", que á primeira vista
parece mais acertada, ela, em poucos anos, também estaria ultrapassada, por
exem plo, quando se explorar a 500 metros de profundidade, porque esta região
não é na maioria dos casos nenhum a plataforma, mas uma inclinação. Na verdade,
nenhuma das denominações é perfeita.
9. A grande maioria dos autores dá a data de 1916 que, segundo Azcárraga,
teria a sua origem em Magalhães, ao formular as observações ao Relatório Schcking,
preparatório da Conferência de Haia em 1930.
10. Para uns (Gidel e Young) os EUA reivindicaram a soberania, enquanto
para outros (Hurst e Vallat) “ controle e jurisdição" é equivalente a soberania. A
razão parece-nos estar com Gidel, quando diz que o governo americano não
reivindicou totalmente a soberania na plataforma continental, tanto assim que
limitou a sua competência a determinados objetos, significando isto que ele não
dispõe integralmente da sua plataforma, mas apenas de alguns direitos sobre ela.
11. A Constituição de 1969 colocou a plataforma com o sendo um dos bens
da União (art. 4e, inciso III). Seguimos a orientação dos EUA, que pelo O uter
Continental Shelf Lands Act (1953) colocou-a na área de ju risd ição federal.
Decisão da Corte Suprem a dos EUA em 1975 determ ina que a exploração do
petróleo além de três milhas da costa é da com petência da União e não dos
Estados-membros. Na verdade, parece que a proclam ação de Truman já visava
colocar a plataforma com o propriedade da União com os recursos de gás e petróleo
(W. Extavour).
12. O Brasil teve uma questão com a França (1963) que consistia em saber
se a lagosta era recurso da plataforma ou não. A França sustentava que a lagosta
nadava e estava excluída destes recursos. O Brasil defendeu posição contrária.
Além do mais, não havíamos assinado a Convenção de Genebra e a nós cabia
determ inar os recursos da plataforma que nos pertenciam . Basta lembrarmos que
uma lei norte-americana de 1953 incluíra a lagosta entre tais recursos. Eisenberg
considera que “constante” não é permanente, bastando que haja um contato
regular com o leito do mar. A própria maneira de pescar a lagosta (covos e arrasto)
dem onstra que ela não nada.
12A. Algumas plataformas têm motores e não são fixas. No Brasil a jurispru­
dência tem assimilado as plataformas às embarcações. Na Espanha, legislação de
1992 considerou as plataformas fixas para a exploração da plataforma como inte­
grando a “marinha civil espanhola” .
13. Na Conferência de G enebra vários Estados reivindicaram infrutiferamente
o direito exclusivo de pesca.
14. É interessante observar que durante três meses uma lei brasileira afirmou
a nossa soberania no espaço aéreo sobrejacem e à plataforma (Decreto-lei 32, de
18-11-1966).
Finalmente, o Decreto-lei 234, de 28 de fevereiro de 1967, revogou o texto
em que esta soberania era consagrada.
14A. Pode-se acrescentar que neste caso estava envolvida a exploração do
petróleo do mar do Norte e acresce ainda que se tratava, na área em disputa, de
um único lençol petrolífero. Nestes casos tem-se entendido que os Estados devem
concluir acordos para a sua exploração.
15. V. capítulo XLII.

1197
16. Grande núm ero de países ern vias de desenvolvimento consideram que a
exploração deverá, apesar da internacionalização, vir a ser “aprovada” pelo Estado
costeiro.
17. V er cap ítu lo LIX^
17A. A “área" definida com o o “leito e subsolo do mar além dos limites da
jurisdição nacional” .
17B. No século X JX A ndrés Bello defendeu a não apropriação dos recursos
do mar e usou a expressão “patrim onio indivisível". G eouffre de Lapradelle (século
X X ) escreveu que “o mar territorial é como o alto-mar, patrimonio da humani­
dade” e propôs a criação de uma organização formada por todos os países costeiros
ou não com a finalidade de garantir que todos tivessem um acesso igual aos recursos
e evitar o seu desperdicio (Bernardo Zuleta). Georges Se elle já falava em “dominio
público” no Direito do Mar. Parece que foi o Presidente Johnson dos EUA o
primeiro a falar em “ patrim onio comum da hum anidade” em relação às grandes
profundidades (Pontavice-Cordier). E de se lem brar que a noção do patrimonio
comum da humanidade foi consagrada em 1966, no tratado sobre o espaço exte­
rior. A U1T considera patrim onio comum da humanidade o espectro de freqüências
e a órbita geoestacionária dos satélites. A expressão é usada nos trabalhos prepa­
ratórios de uma convenção sobre a Antártida. Foi utilizada em relação à lua e aos
corpos celestes. Em 1946 a convenção que cria a UN ESCO fala em patrimônio
universal no dominio da cultura e, em 1954, a convenção para a proteção dos
bens culturais em caso de conflito armado fala em patrim onio cultural da huma­
nidade. A expressão patrim onio comum aparece tam bém em uma diretriz das
comunidades européias de 1979 sobre a conservação dos pássaros selvagens. A
expressão patrimonio com um da humanidade significa: a) utilização não-privativa;
b) uso pacífico; c) repartição ju sta. Ela tem uma função igualitaria, e a autoridade
é apenas para gerenciar, vez que o dominio em inente é da humanidade. “A
Humanidade, com o entidade global quer no plano espacial quer no temporal, é
pois a referencia central dos novos traços de identidade do Direito Internacional,
superando o quadro individualista do Direito Internacional clássico” (José M anuel
Pureza — Globalização e D ireito Internacional. Da Boa Vizinhança ao Patrimonio
Comum da Humanidade, in Lúa Nova, n9 30, 1993, págs. 73 e segs.).
17C. Bernardo Zuleta afirma que três teorias se manifestaram sobre a autori­
dade na 3? Conferência: a) um grupo de Estados defendeu que ela teria com pe­
tência para dar concessões aos Estados ou empresas privadas e para fixar regras
gerais para uma exploração racional; b) ela poderia não apenas dar concessões,
mas ela mesma também explorar e utilizar o fundo dos-mares; c) seria urna empresa
tendo o monopolio da exploração. O acordo foi feito em to m o da segunda posição.
18. Na verdade a questão de se saber se é possível explorar a área antes da
convenção entrar em vigor é matéria muito discutida. U m a corrente afirma que
sim, tendo em vista que a declaração de 1970 sobre as grandes profundidades
marinhas é simplesmente programática e'nao tem precedentes, não podendo assim
se afirmar que ela consagre um costume (René-Jean Dupuy, Michel Virally). Urna
outra corrente afirma que não, porque a noção de “ patrimônio comum da hu­
manidade” é aceita por todos, bem como porque a declaração de 1970 foi aprovada
por todos sem oposição e h á urna “opinio ju ris” aceita por todos os Estados (Roger
Je a n n e l, Bernardo Zuleta).

1198
CAPÍTULO XLV

ZONA CONTIGUA. ALTO-MAR.


PESQUISA CIENTÍFICA MARINHA1

438 — Zona contigua; 439 — Alto-mar; 440 — Natureza jurídica


do alto-mar; 441 — Histórico da liberdade dos mares; 442 — A
liberdade dos mares na Convenção de Genebra; 443 — Liberdade de
navegação; 444 — Liberdade de pesca; 445 — Liberdade de colocar
cabos submarinos e oleodutos; 446 — Liberdade de sobrevôo; 446A —
Liberdade de colocar ilhas artificiais; 447 — Limitações à liberdade
dos mares de origem consuetudinátia; a) Introdução; b) Direito de
revista e de aproximação; c) Direito de perseguição; d) Repressão à
pirataria; 448 — Limitações de origem unilateral à liberdade dos mares;
449 — Limitações de origem convencional à liberdade dos mares; 449A
— Pesquisa científica marinha; 449B — Objetos históricos e arqueo­
lógicos.

438. A denominação completa da zona contígua era de “zona de


altomar contígua às águas territoriais”. Ela compreendia uma faixa de
a 1tom ar adjacente ao m ar territorial.
A noção de zona contígua foi elaborada através dos séculos por motivos
principalmente econômicos: o controle aduaneiro e fiscal. A sua principal
finalidade é evitar o contrabando.
Na Inglaterra ela surgiu no século XVIII. O Hovering Act2 de 1736
declarava que seriam, aplicadas as leis fiscais e aduaneiras inglesas até uma
distância de cinco milhas a partir da costa. Este Hovering Aci foi seguido
de uma legislação que aumentou neste particular a jurisdição britânica até
uma distância de 24 milhas ou oito léguas em determinadas regiões, como
ocorreu no século XIX . Esta legislação foi abolida pelo Customs Consoli-
dation Act (1876), que limitou a aplicação das leis aduaneiras e fiscais a
três milhas.

1199
Nos EUA, desde 1799, encontramos legislação semelhante à inglesa,
mas que não fof revogada no século X IX .1 O Volstead Act ("Lei Seca”)
de 1919, pelo seu Supplemental Act, de 1.921, era aplicado a todos os
territórios submetidos ã jurisdição norte-americana. As autoridades dos
EUA impuseram esta legislação a uma distância até 12 milhas, o que foi
confirmado em 1922 pelo Tariff Act, provocando o protesto de diversos
países estrangeiros. Diante disso, foram concluídos os Liquor Treaties,
sendo o primeiro assinado com a Grã-Bretanha, que fixava o limite da
jurisdição americana pelo critério do One hour steaming radious.4 O Anti-
Smuggling Act de 1935 dava ao Presidente o poder de declarar “uma zona
de execução aduaneira” nunr raio de 100 milhas náuticas.
Em 1876 uma lei brasileira autorizou os comandantes de navios de
polícia alfandegária a deterem e visitarem os navios suspeitos de contra­
bando até a distância de 12 milhas da costa.
A mesma tendência encontramos na França (que fixou em 12 milhas
em 1817), na Rússia (que em 1909 fixou em 12 milhas), na Espanha e em
Portugal (que determinaram seis milhas).
Outro fator que impulsionou a formação da zona contígua, mas com
menos importância do que o anterior, foi o estratégico, com a finalidade
de defender a neutralidade em tempo de guerra. Na Inglaterra o Territorial
Waters jurisdiction Act (1878) permitia ao governo tomar as medidas
necessárias para a defesa além do mar territorial. Na América, na Reunião
de Consulta do Panamá, em 1939, foi estabelecida uma zona marítima de
neutralidade até a largura de 300 milhas.'1A sua largura não era uniforme:
no Brasil: 300 milhas; na Argentina: 100 milhas; no Chile: 50 milhas; etc.
Esta zona de segurança continental não foi respeitada, bastando lembrar
a batalha naval contra o Graf von Spee, em Montevidéu,6 que se deu dentro
dela. Por outro lado, a zona contígua já estava consagrada desde 1930.
A noção de zona contígua foi discutida pela primeira vez em uma
conferência internacional, em Haia, em 1930, e regulamentada conven-
cionalmente na Conferência de Genebra,-que concluiu uma convenção
sobre mar territorial e zona contígua (1958).
A zona contigua se .distínguia do mar territorial por diversas razões:
a) a zona contígua faz parte do alto-mar. enquanto o mar territorial faz
parte do território do Estado; b) na zona contígua o Estado tem direitos
limitados, enquanto no mar territorial a competência do Estado é plena.
A zona contígua pela Convenção de Genebra ia até a largura de 12
milhas, contadas a partir da linha de base que serve para medir o mar
territorial. Em conseqüência, se o Estado tiver o mar territorial de 12
milhas de largura, ele não terá zona contígua.
Reproduzimos acima o conceito tradicional de zona contígua para que
se possa sentir a transformação que este instituto sofreu. A convenção de
1982 dedica um único artigo a cie. Fala em zona contígua ao mar territorial,
tirando-a do alto-mar.
-O Estado pode ‘‘tomar medidas de fiscalização necessárias paia... gre-
venir as infrações de suas leis e regulamentos aduaneiros, fiscais, de imi-
gração. ou sanitários que sejam praticados_no seu território ou 110 seu mar
territorial".'
A zona contígua não poderá ir além de 24 milhas marítimas, medidas
a partir das linhas de base do mar territorial. Lucius Caflish salienta que
o papel da zona contígua de agora em diante será mais importante, vez
que o_Estado tem nela direitos que não possui na zona econômica.
, 4 3 9 ^ 0 alto-mar é definido pela convenção de 1982 como sendo todas
as partes do mar que não estão incluídas na zona econômica exclusivaj.no
mar territorial ou nas águas interiores de um Estado, nem nas águas
intejioK^s de um Estado, nem nas águas arquipelágicas.
440.- Sobre a natureza jurídica do alto-mar surgiram inúmeras teorias:
res nullius”, “res communis”, “juridicidade” e da “utilização.razoável”.
A da “res nullius” é a mais antiga delas, tendo surgido no século XVII.
Esta teoria visava a defender o ahormar. das. reivindicações de.^btuRP.i?
dos Estados. O alto-mar não estaria sujeito a nenhuma regulamentação
jurídica. Os Estados aplicam o seu direito nacional no alto-mar exatamente
porque aí não existe nenhum direito que possa se opor ao seu direito.
Foram seguidores desta concepção: River, Nys, Wesüake, etc.
A da “res çommunis” tem sido defendida por diversos doutrinadores,
tais como La Pradelle, Politis, Mouton, etc.8 O alto-mar seria de proprie-
dade da sociedade internacional, isto é, seria de propriedade de todos os
Estados.
A teoria da juridicidade surgiu com Charles Dupuis, mas foi Gilbert
Gidel o seu maior formulador. Ao contrário da primeira teoria, estes
intemacionalistas afirmam que o alto-mar deve ser submetido a _uma._re-
gulamentação jurídica, Não haveria nenhum inconveniente em que diver­
sas ordens jurídicas esüvessem em vigor no alto-mar, porque as ordens
jurídicas não são impenetráveis. A nacionalidade dos navios era o meio de
se organizar a mencionada juridicidade.
A mais moderna das teorias sobre a natureza jurídica do alto-mar é a
dos intemacionalistas norte-americanos McDougall e N. Schlei, formulada
em 1955. Esta concepção tem uma finalidade eminentemente política, que
é a de justificar as experiências nucleares que eram realizadas pelos EUA
no alto-mar. Eles se fundamentam em diversas afirmações: a) a liberdade
do alto-mar varia de sentido e alcance com a época histórica; b) a liberdade
do altfemaT-Ifiin.um aspecto político; ç) a utilização do alto-mar deve ser
razoável. Eles alegam em favor da sua teoria uma decisão de Marshall no
caso Church v. Hubbart (1804), quando se reconheceu o direito de Por­
tugal a exercer uma fiscalização a respeito de navios estrangeiros em alto-
mar com a finalidade de defender o seu comércio com o Brasil. Alegou a
decisão que um Estado pode exercer atos de soberania no alto-mar utili-

1201
/ando ¡lit ios razoáveis d esd e q u e n e ce ssá rio s para a d efesa d os seu s d ireitos.
O s EU A , ao “ o cu p a re m " u m a p a rte d o a llo m a r , p ara ali re a liz a re m ex­
p losõ es a tô m icas, eslariam se p re p a r a n d o para se d e fe n d e r d e urna [iossível
agressão e p ro te g e r o m u n d o livre.
Feita a exposição das concepções devemos agora formular uma apre­
ciação crítica. " '
A teoría da “res nullius” é inaceitável, porque o alto-mar não é apro-
priável pelo primeiro ocupante. Por outro lado, se o aJto-mar é urna “res
nullius”, os Estados, principalmente quando beligerantes, terão uma liber­
dade sem qualquer limitação.
A teoria da “res communis”, no seu sentido moderno de que o alto-mar
é um condomínio, também não corresponde à realidade, uma vez que os
co-proprietários em um condomínio têm o direito de polícia em relação
uns aos outros. Ora, no alto-mar, a regra geral é que os Estados só têm
jurisdição nos nayios seus nacionais. Por outro lado, não seria possível nele
a guerra, porque o alto-mar sendo de todos, uns poucos não teriam o
direito de prejudicar o seu uso.
A teoria da juridicidade foi abandonada pelo próprio Gidel em um
estudo posterior sobre as explosões nucleares em alto-mar, onde ele não
mais a menciona. A Convenção de Genebra também não a endossou, uma
vez que a liberdade dos mares foi aí entendida em um sentido negativo,
isto é, ninguém exerce competência propriamente dita sobre o alto-mar.
A teoria da utilização razoável é mais política do que propriamente
jurídica. Para os seus defensores, o direito_de autodefesa é absoluto e
poderia derrogar a liberdade dos mares. Ora, se cada Estado fosse alegar
a sua autodefesa, a liberdade dos mares desapareceria.
A doutrina que mais tem encontrado seguidores é a da “res commu­
nis”, mas entendida no sentido que possuía no D. Romano: de coisa
destinada ao uso público. Todos têm nele os mesmos direitos e ele escapa
à apropriação. Este parece ser o sentido do art. 22 — da Convenção de
Genebra sobre alto-mar:9 “ o alto-mar estando aberto a todas as nações,
nenhum Estado godejegitimarnente^pretender submeter uma parle qual-
quer a sua soberania”. Jã a c o n v en ç ã o de 1982 afirma que o alto-mar “está
aberto à todos os Estados, sejam costeiros ou sem litoral”, bem como
nenhum Estado poderá submeter qualquer parte dele à sua soberania.
Determina, ainda, que o alto-mar será utilizado para fins pacíficos.
/Í 4 1 . \A liberdade dos mares consagrada atualmente é o resultado de
um atafíga evolução histórica.10 No período medieval predominou a idéia
de propriedade dos mares. Estas reivindicações surgem até nos nomes
geográficos, por exemplo, Mar de Liguria. Em Veneza havia o casamento
da República com o Mar Adriático,” o qual ela reivindicava alegando que
ela dava segurança à navegação combatendo a pirataria.
No século X , Edgard, o Pacífico, rei da Inglaterra, reivindicou o título
de Soberano do Oceano Britânico. Eduardo III se dizia rei dos mares,

1202
exigindo homenagens especiais para os navios ingleses. A Inglaterra sempre
reivindicou privilégios no mar, alegando o sen aspecto insular que lhe
daria o domínio dos mares. Desde o século XVI os reis da Inglaterra
passaram a exigir saudação à bandeira inglesa nos Briiish Seas (Mares da
Mancha e da Irlanda).12 Tal saudação era considerada como sendo o
reconhecimento pelos demais Estados' da soberania inglesa sobre estes
mares.
Sobre o Báltico, a Dinamarca e a Noruega estabeleceram a sua sobe­
rania.
O Papa, na bula “Inter Coetera’’ , faz doações não apenas de terras,
mas também dos mares. Balboa tomou posse do Oceano Pacífico para o
rei de Espanha.
No século XVI começam a surgir manifestações em favor da liberdade
dos mares. A Rainha Elizabeth, cia Inglaterra, afirma ao embaixador de
Espanha, Mendoza, que os mares pertenciam a todos. Neste mesmo sécuío,
a cidade de Dantzig defende a liberdade dos mares.
É, todavia, no século XVII que a liberdade dos mares começa a ser
afirmada. Grotius publica, em 1609. a sua obra “Mare Liberam” (era o
cap. XII do “De Jure Praedae”). Nesse livro é defendida a liberdade dos
mares. A razão de sua publicação tem ocasionado um debate entre os
doutrinadores: uns sustentam que ele visava a defender a pesca do arenque
pelos holandeses no Mar do Norte, que seria pouco depois proibida pelos
ingleses, enquanto outros defendem que ele visava defender a liberdade
de comércio dos holandeses no Oriente na Paz de Antuérpia, que estava
sendo negociada com a Espanha.12A Filiamõ-nos à segunda corrente por
diversas razões: a) a Paz de Antuérpia é do mês de abril e o livro é de
março, enquanto a Ordenança de Jacques I é de m aio;13 b) a Espanha,
durante as negociações, reivindicara a exclusão dos holandeses do comér­
cio das índias; c) o subtítulo da obra de Grotius “Mare Liberam sive de
jure quod Batavis competit and Indicana Commercia” (“Da Liberdade dos
mares ou do direito que compete aos batavos no comércio das índias”);
d) a Espanha na Paz de Antuérpia assegura liberdade de navegação à
Holanda 110 Oceano Índico (Raestad); é) a própria finalidade para que
foi escrito o “De Jure Praedae” parece justificar esta tese.
As próprias proposições de Grotiifs no “Mare Liberam ” confirmam
esta tese: a) os portugueses não eram proprietários dos mares do Oriente;14
b) os mares do Oriente não podem pertencer a uma única nação. Para
ele, o mar era “res extra commêrcium” e não estava sujeito à soberania
de nenhum Estado. Esta posição foi defendida por Basdevant.
Por outro lado, a pesca do arenque só teria vindo à baila, em 1615,
no livro de Welwood (Oudendijk).
Grotius não foi o primeiro doutrinador a defender a liberdade dos
mares. Antes dele o fizeram: Vitória (“De Indis”), Vásquez de Menchaca

1203
(“Conlravcrsiarum Illustriuni”) e Afonso cie Castro (“De Potesiale legis
Pcnalis"). Mas íoi Grotius o verdadeiro impulsionador da liberdade dos
mares.
A obra de Grotius encontrou inúmeros opositores como Frei Serafim
de Freitas (“De Insto Imperio Lusitanorum Asiático"), WilTiam Welwood
(“ De Dominio Maris...”), mas o mais sério opositor de Grotius foij. Selden,
que em 1635 publicou “Mare Clausum sive de Dominio Maris”, qtie fora
escrita por encomenda dejacques 1 da Inglaterra. Ele alega, com base no
D. Romano, que para a ocupação ser válida não precisa ser molecular, mas
basta que ocorra em um local e que o ocupante tenha a intenção de ocupar
toda a área desejada. Sustenta ainda que, pelo Direito Romano, a ocupação^
iria até onde a vista alcançasse. Selden concluía que os mares pertenciam
à Inglaterra, mas admitía que os Estados estrangeiros navegassem neles. A
liberdade d.os mares no início do século XVIII já estava definitivamente
consagrada. A liberdade dos mares foi imposta pela Grã-BretanJia no século
XVIII, vez que a sua marinha a tudo dominava.
Só no fim do século XVIII e início do século XIX é que a liberdade
dos mares foi consagrada de modo global, e até a Ia Guerra Mundial ela
só foi dada aosJetados com litoral (Lucchini e Voeckel).
Cari Schmitt observa que “o contraste entre térra e mar como contraste
de ordenações do espaço distintas é um fenómeno da época moderna que
só domina a estrutura do Direito europeu das Gentes a partir dos séculos
XVII e XVIII, ou seja, desde que foram abertos os oceanos e se formou a
prinjeira imagem global da térra”.
(44p. A convenção de 1982 estabelece as liberdades do alto-mar para
os Estados costeiros e sem litoral de modo exemplificativo: a) liberdade
de navegação: b) liberdade de sobrevôo: c) liberdade de colocar cabos e
oleodutos submarinos; d) liberdade de construir ilhas artificiais e outras
instalações; e) liberdade de pesca; f) liberdade de pesquisa científica. De
qualquer modo, é de se repetir a observação de que a liberdade dos mares
só beneficia quem tem meios para utilizá-la e explorá-la (J. Salmón).
A liberdade de navegação é a mais importante das liberdades dos
mares, Foi ela que ocasionou o aparecimento das liberdades dos mares.
Vitoria a incluía no “jus communicationis”.
A liberdade de navegação conduz à denominada regra de não inter­
ferência, isto é, o navio de um Estado não pode interferir em um navio
de Estado estrangeiro, porque no alto-mar o navio só está sujeito ao seu
Estado nacional.
Todo e qualquer Estado corn ou sem litoral tem o direito de navegação.
O mesmo direito tem sido reconhe'cido às organizações internacionais. A
convenção de 1982 admite que um navio possa navegar a serviço da ONU
ou de seus organismos especializados- ? que “arvorem o pavilhão da Or­
ganização” .
O direito de navegação tem sido exercido pelas organizações interna­
cionais e isso tem ocorrido com a ONU, por exemplo, no transporte de

1204
tropas.L' Esta prática lem levantado diversas objeções: a) a ONU não tem
tribunais para julgar os atos ocorridos a bordo dos sens navios;"' assini
sendo, não haveria jurisdição cin relação a eles; b) a bandeira é sinal
exterior da nacionalidade e a ONU não lem nenhuma nacionalidade para
atribuir; c) a ONU não assinou nenhuma convenção de direilo do mar.
Por outro lado, devemos reconhecer que as organizações internacionais
têm necessidade de navios para exercerem as funções; entretanto, não
existe nenhuma regulamentação internacional sobre o assunto.
Outra grande questão diz respeito ao direito de navegação dos Estados
que não possuem litoral. Em 1921, a Declaração de Barcelona reconheceu
aos Estados que não têm litoral o diréitò de fazerem navios navegarem
com o seu pavilhão, desde que registrados apenas no seu território, e o
local onde isto for feito será considerado o porto de registro. Esta Decla­
ração teria incorporado os princípios do Tratado de Versalhes (1919),
reconhecendo o direito à bandeira dos Estados sem litoral (Nagendra
Singh). Na verdade, este direito teria surgido no século XIX, apesar das
“reticências” da França, Prússia e Grã-Bretanha. Todo e qualquer Estado,
como já vimos, possui o direito de navegação. Entretanto, esta afirmativa
importa em uma outra questão de maior importância, que é o djreito_de
livre acesso ao mar dos Estados_desprovidos de litoral. O direito de livre
acesso tem sido consagrado na doutrina ou como uma decorrência do
direito natural, ou, como nos parece mais acertado, como sendo uma
conseqüência da liberdade dos mares.
Na Conferência de Genebra, oaf Estados que não possuíam litoral
defenderam o direito de livre acesso. Este direito, entretanto, tem inúmeras
implicações, porque, se ele for consagrado como um direito absoluto do
Estado “encravado”, a conseqüência natural será que o Estado localizado
entre ele e o mar sofrerá uma série de restrições a sua soberania. O Estado
encravado teria o direito de utilizar dos seus portos, das vias de comuni­
cações terrestres etc. Diante deste conflito de interesses, à Convenção de
Genebra sobre alto-mar não reconheceu o direito de livre acesso ao mar,
mas afirmou apenas que os Estados sem litoral “deveriam” ter livre acesso
ao mar. Os Estados entre o mar e um Estado sem litoral deverão conven­
cionar o livre trânsito, igualdade.de tratamento aos navios, etc. Em outras
palavras, a situação permanecera idêntica à anterior à Convenção de Ge­
nebra, isto é, o livre acesso ao mar dependendo exclusivamente da vontade
do Estado localizado entrç o mar e o Estado encravado. -
Em. 1965, sob os auspfcios da ONU, foi concluída uma convenção
relativa ao comércio de “trânsito dos Estados sem litoral”, onde foram
estabelecidos diversos prinçígiossobre e'sta matéria: a) o direito de acesso
ao mar pelos Estados sem litoral é “indispensável para a expansão do
comércio internacional e o desenvolvimento econômico”; b) os navios dos
Estados sem litoral devem ter os mesmos direitos no mar territorial e águas
interiores que os possuídos pelos Estados estrangeiros com litoral; c) os

1205
navios de lisiado scm litoral devem gozar, em relação à utilização e ao
acesso aos portos do Estado entie ele e o mar, dos mesmos direitos que
possuem os navios do Estado que se encontra entre o mar e o Estado sem
litoral, ou dos mesmos direitos que gozam os navios de outros Estados
nestes portos; d) o Estado sem litoral, com base na reciprocidade, deve
ter o trânsito livre e as suas mercadorias em trânsito não pagarem direitos
aduaneiros no território do Estado que se coloca entre ele e o mar; e) o
Estado onde é feito o mencionado trânsito conserva a sua plena soberania;
f) os Estados facilitarão a conclusão de acordos internacionais neste sentido;
etc. E de se assinalar que na prática os Estados sem litoral ainda não
possuem propriamente um direito de livre acesso ao mar. Os próprios
princípios enunciados acima não estão inscritos na parte dispositiva da
convenção, mas 110 seu preâmbulo. A convenção trata apenas do direito
de trânsito e a sua regulamentação; entretanto, este direito só existirá se
o Estado costeiro concordar em concedê-lo ao Estado sem litoral. Esta
questão tem adquirido relevância tendo em vista que existem ãtuaímente
cerca de 30 países sem litoral.
Finalmente, o tema foi regulado de modo mais detalhado na conven­
ção de 1982, e alterando o que existia anteriormente. Ela estabelece que
“os Estados sem litoral terão o direito de acesso ao mar”. E, “para este
fim, os Estados sem litoral gozarão de liberdade de trânsito através do
território dos Estados de trânsito por todos os meios de transporte”. As
condições e modalidades para o exercício da liberdade de trânsito serão
estabelecidas mediante acordo entre os Estados interessados. A cláusula
de nação mais favorecida não é apíicada em relação a tais acordos, o tráfego
em trânsito não está sujeito a impostos, ou direitos aduaneiros, sendo que
o citado tráfego só está sujeito a “taxas impostas por serviços prestados em
relação” a ele. Poderão ser estabelecida^ zonas francas para o tráfego de
trânsito. O Estado sem litoral poderá contribuir para a melhoria dos meios
de transporte no Estado de trânsito. Detejnmina ainda a igualdade de
tratamento entre navios de Estados costeiros e navios de Estados sem litoral.
Uma observação deve ser feita ao exposto acima: é que os Estados sem
litoral, nas convenções anteriores, só obtinham em favor de sua reivindi­
cação uma fórmula condicional “deveriam ter”. Na convenção de 1982
surge a palavra “terão”, mas na prática o exercício do direito de livre
acesso_ao mar continua dependendo de acordo com o Estado de trânsito.
\44Aj à liberdade de pesca no alto-mar é um princípio tradicional no
DIP <3o Mar. Éla partia do pressuposto de que os recürsõs' vivos-d õ mar
eram inesgotáveis^ Atualmente^ com a verificação de que esta afirmativa
não corresponde à realidade, a liberdade de pesca deixou de ser absoluta
e: passou a estar sujeita a uma regulamentação, visando a conservação dos
recursos vivos do alto-mar.1'
Segundo Serge Pannatier, 90% da pesca em alto-mar é realizada por
seis países: Rússia, Japão, Espanha, Coréia, Polônia e Taiwan. Atualmente
20% da pesca mundial (16,7 milhões de toneladas) é realizada no alto-mar.
Pode-se acrescentar que 20% dos navios de pc-sca n o alto-mar usam ban­
deira de conveniência, logo não respeitam a conseivação dos recursos vivos
e, eniconseqüéncia, 70% dos estoques de peixes são superexploi ados.
f a j y A liberdade de colocar cabos e oleodutos submarinos tambéin
já constituía urna norma costumeira. O primeiro cabo submarino foi co­
locado em 1851 no litoral francés entre Calais e Douvres. O primeiro cabo
transoceánico foi instalado entre a Irlanda (Valentine) e a Terra Nora
(Trinity Bay), em 1866. Anterior a este cabo houve uma convenção de
1864, que não teve seguimento, concluída entre o Brasil, França, Haiti,
Itália e Portugal, para unir por um cabo submarino a América á Europa.
O- Estado que coloca tais cabos deve levar em consideração os já existentes,
a fim de não impedir a sua reparação.
A liberdade de sobrevôo é unia conseqüência da liberdade dos
mares, uma Vez que o espaço aéreo segue a situação da superfície terrestre
ou marítima a que ele é sobrejaçente.
A liberdade de colocar ilhas artificiais é regulada pelas normas
sobrevesta matéria para a plataforma, continental., onde são aplicadas,
“mutatismutandis”, as mesmas normas para a colocação de ilhas artificiais
na zona econômica.
p447rÃ~ liberdade do alto-mar sofre uma série de limitações de origem
costumeira.18 Estas limitações restringem a regra de não interferência. A
finalidade delas é regulamentar de um certo modo a utilização do alto-mar,
para evitar que nele haja uma anarquia.
Diversos intemacionalistas ingleses (Hall, Colombos, Westake) funda­
mentaram estas limitações na chamada regra de Virginius,19 que consistia
no seguinte: um Estado em tempo de paz poderia intervir na navegação
de um navio estrangeiro para a sua autoproteção. Esta teoria é inaceitável,
porque ela pode conduzir a verdadeiros abusos em nome de uma pseu-
do-autoproteção.
a) O direito de revista e de aproximação estava consagrado na Con­
venção de Genebra no seu art. 22.20 O direito de aproximação e de revista
só pode ser exercido por um navio de guerra em relação a um navio de
comércio. O direito de aproximação visa a identificação do navio, e o
direito de revista21 é exercido quando, após a identificação (“a verificação
dos papéis”), as suspeitas em relação ao navio subsistem. Entretanto, tais
direitos só podem ser exercidos quando há fortes suspeitas de que o navio
faz pirataria, ou tráfico de escravos, ou quando “o navio, arvorando um
pavilhão estrangeiro ou recusando-se a içar um pavilhão, é na verdade um
navio tendo a mesma nacionalidade que o navio de guerra”. Entretanto,
se as suspeitas não têm fundamento, o navio que sofreu a revista deverá
receber uma indenização pelo dano ou perda que tiver sofrido. Já se as
suspeitas forem confirmadas, o navio de guerra poderá deter o navio.

1207
É preciso lazer uma observação neste pomo. que é sobre a denomi­
nação “direito de revista”. A Convenção de Genebra utiliza-se da expressão
“revista" em lugar de visita. Alguns autores (Manrice-René Simonnet)
afirmam que o direito de visita só existe em tempo de guerra e que no
caso o que a convenção consagra é um direito de revistar. Outros autores
(Olivier de Ferron) falam em direito de aproximação ou de visita. Adota­
mos muitas vezes neste livro a expressão do direito de visita, que é tradi­
cional, mas com o mesmo sentido de direito de revista. Na verdade, nesta
matéria os autores ainda não chegaram a um acordo sobre a terminologia
a ser utilizada. A convenção de 1982 optou pela expressão “direito de
visita”, bem como não fala em direito de verificação, isto é, um oficial
pode ir a bordo e fazer a verificação dos papéis, e se houver alguma suspeita
é que fará o direito de visita.
O citado texto convencional estabelece que o direito -de visita será
exercido por navio de guerra em relação a navio de comércio quando haja
motivo razoável para suspeitar que o navio: a) se dedica à pirataria; b) se
dedica ao trafico de escravos; c) é utilizado para efetuar transmissões não
autorizadas... (v. capítulo Telecomunicações); d) não tem nacionalidade;
e) tem na realidade a mesma nacionalidade que o navio de guerra, “ainda
muito arvore um pavilhão estrangeiro ou se negue a içar seu pavilhão”.
O navio de guerra poderá enviar uma embarcação sob comando de oficial
ao navio sob suspeita para examinar os seus documentos. Se a suspeita
permanecer, ele poderá fazer um exame a bordo. Se a suspeita não for
confirmada, o navio será indenizado por todo dano ou prejuízo que tenha
sofrido. Estabelece ainda a Convenção de Montego Bay que estas mesmas
normas serão aplicadas, “mutatis mutandis",ís aeronaves militares e, ainda,
“a quaisquer outros navios e aeronaves que tenham sinais claros e sejam
identificáveis como navios ou aeronaves a serviço de um governo”, isto é,
tais navios e aeronaves poderão exercer o direito de «sita.
b) O direito de perseguição está regulado no art. 111 da convenção
de 1982.22 Ele consiste no direito que é dado ao Estado costeiro de perseguir
um navio estrangeiro em alto-mar que tenha \iola3õ lí sdirêitos dcTEstado
costeiro, desde que o navio perseguido, ou uma de suas embarcações, se
encontre nas águas interiores, ou nas águas arquipelágicas, ou no mar
territorial ou na zona contígua do Estado costeiro. A perseguição precisa
ser imediata “hot pursuit” e ininterrupta. Ó navio perseguidor não neces­
sita se encontrar em um dos espaços enumerados. O direito de perseguição
se aplica, “mutatis mutandis”, às infrações praticadas na zona econômica,
na plataforma continental ejxiclusive nas zonas de segurança das Jlhas
artificiais na plataforma.23
A doutrina (Poulantzas) tem assinalado que o direito de perseguição
não deve ser exercido quando existe apenas suspeita, ou, ainda, quando
a ofensa não é grave.
A perseguição cessa quando o perseguido entra em mar territorial
estrangeiro, ou do Estado cie que é nacional, isto é, em águas que não
sejam nacionais do perseguidor.
A perseguição tem início após o perseguidor ter daclo um sinal visual
ou. auditivo para que ele pare.
Este direito de perseguição só pode ser exercido por navios de guerra
ou aeronaves militares, “ou navios ou aeronaves destinados a um seiviço
público e especialmente autorizados”. As mesmas normas se aplicam quan­
do a perseguição é efetuada por aeronaves. Não é suficiente que a aeronave
assinale o navio “como tendo cometido uma infração ou como sendo
suspeito de infração, se ele não tiver sido simultaneamente solicitado a
parar e perseguido pela própria aeronave ou por outras aeronaves ou
navios que continuem a perseguição sem interrupção”. Se o navio for
detido em alto-mar, sem que haja motivo para o direito de perseguição,
ele deve'rá ser indenizado pelas perdas e danos que tiver sofrido. A travessia
de alto-mar ou zona econômica de outro Estado, pelo navio detido, a fim
de o perseguidor, escoltando-o, levá-lo ao porto, não dá direito ao perse­
guidor para ser libertado.
Só podem ser objeto de perseguição os navios de comércio, uma vez
que os navios púbíicos gozam de completa imunidade de jurisdição.
O direito de perseguição tem sido encarado com o um colorário dos
direitos do Estado nas águas territoriais e na zona contígua, uma vez que
ele permite a defesa eficaz destes direitos.2SA
c) A repressão à pirataria23® sempre existiu através da história do Dl
Marítimo. A luta contra os piratas já existia em Roma, e subsiste até hoje.
A definição de pirataria apresenta grande dificuldade, que tem sido
ressaltada pelos doutrinadores que dela se ocupam.24
A Convenção de MontegoJBay estabelece, no seu art. 101, què consi­
dera pirataria os seguintes atos:

“a) Todo ato ilegal de violência, de detenção ou toda de­


predação cometida para fins pessoais pela tripulação ou passa­
geiros de um navio privado ou de uma aeronave privada, e
dirigidos:
i) no alto-mar, contra outro navio ou aeronave, ou contra
pessoas e bens a seu bordo;
ií) contra um navio ou aeronave, pessoas ou bens, em local
fora da jurisdição de qualquer Estado.
b) Todos os atos de participação voluntária para utilização
de um navio ou de uma aeronave, quando aquele que os comete
tem conhecimento de fatos que conferem a este navio ou a esta
aeronave o caráter de navio ou aeronave pirata.
c) Toda ação tendo por fim incitar os atos definidos nas
alíneas P e 2- do presente artigo ou empreendida com a inten­
ção de os facilitar.”

1209
Luis García Arias, após fazer unia análise das mais diferentes definições,
assinala que a pirataria é configurada pelos seguintes elementos: a) prática
de atos violentos contra pessoas ou bens; b) tais atos sejam ilegais e não
tenham sido autorizados por nenhum Estado; c) tenham sido praticados
por tripulantes ou passageiros; d) que estejam a bordo de navio ou aeronave
privada; e) que estejam em alto-mar; J) sejam cometidos contra outros
navios, ou contra o próprio navio;2’ g) em tempo de paz; h) fim pessoal;26
i) que traga perigo para os demais navios ou ameace a segurança da
navegação.
A pirataria atualmente não tem um interesse meramente histórico,
porque inúmeros casos foram registrados em data recente no Oriente,
'■principalmente nos mares chineses e da Insulíndia. Em 1982, a Tailandia,
de' comum acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os
Refugiados, empreendeu uma “ação de envergadura” contra os piratas no
golfo da Tailandia. A pirataria se distingue do corso marítimo. Este, na
definição de Azcárraga, é “a empresa naval de um particular contra os
inimigos de seu Estado, realizada com a permissão e sob a autoridade da
potência beligerante, com a exclusiva finalidade de causar perdas ao co­
mércio e entorpercer o neutro que mantenha relações com os ditos ini­
migos” . Em conseqüência, o corsário é autorizado por um Estado e ocorre
a prática do corso em tempo de guerra. O corsário recebia do seu governo
a denominada carta de corso (para o francés: “lettres de marque”, que
vinha do provençal “marca”, significando “apoderar-se a título de repre­
salia”). O corso foi abolido pela Declaração de Paris (1856), que estipulava:
“O corso é e fica abolido”; após esta data, ele só foi utilizado na Guerra
de Secessão americana pelos confederados: Os EUA não tinham assinado
a Declaração de Paris.26A
A Convenção de Montego Bay estigula uma séried e normas job re a
repressão àjpi rataria. Os atos estipulados no art. 101, se forem cometidos
por um navio público, qualquer que seja, ou urna aeronave pública, cuja
equipagem está amotinada, equiparam-se aos “atos cometidos por um
navio privado”, isto é, o navio será considerado pirata.
Os navios ou aeronaves que cometeram os atos enumerados no art.
101 são considerados piratas e assim continuarão sendo, enquanto estive­
rem “sob o controle das pessoas culpáveis destes atos”.
O navio, pelo fato de se transformar em pirata, não perde a sua
nacionalidade. A velha regra do direito marítimo de desnacionalização do
pirata era uma ficção que tinha por função permitir que qualquer Estado
pudesse reprimir a pirataria sem que fosse violada a regra de não interfe­
rência, que proíbe a interferência de um navio na navegação de outro que
tem nacionalidade diferente da sua. Na verdade, o navio pirata não perde
a sua nacionalidade; o que ele perde é a proteção do seu Estado nacional.
Atualmente, não há razão para mantermos esta ficção, uma vez que ãrégra
de não interferencia sofre limitações no interesse da sociedade internacio­
nal.
O navio pirata pode ser capturado por qualquer Estado. As pessoas
aprisionadas serão julgadas pelos tribunais do Estado captor, que aplicara
a legislação interna do Estado em relação às penas, aos bens. ao navio e
aos direitos de terceiros que tenham agido de boa fé. K
A camura de navio ou aeronave, sem razão, dá direito ao recebimento,
pelo navio suspeito de pirataria, de uma indenização pelo dano ou perda
que tenha sofrido com a captura.
Só podem capturar o pirata: navios de guerra ou aeronaves militares,
ou “outros navios ou aeronaves destinados a um serviço público e autori­
zados para este fim".
A pirataria que for realizada por navio público de guerra ou civil
quando tiver ocorrido motim da tripulação é assimilada à pirataria prati­
cada por navio privado. ' -
O mais célebre caso referente à pirataria nos últimos anos é o do navio
português “Santa Maria” (1961), cuja tripulação se revoltou com finalida­
des políticas. O navio chegou ao Recife e o governo brasileiro aplicou o
art. 3S da Convenção Pan-Americana de Havana (1928) sobre direitos e
deveres dos Estados em caso de lutas civis que estipula: “O navio insurreto
de guerra ou mercante, equipado pela rebelião, que chegue a um país
estrangeiro ou procure refúgio nele, será entregue pelo governo deste ao
governo constituído do país em luta civil e os tripulantes serão considerados
como refugiados políticos.28 De qualquer modo, o “Santa Maria” não podia
ser considerado navio pirata (como pretendeu Portugal), uma vez que
faltava o elemento subjetivo do art. 15 da Convenção de Genebra: “fins
pessoais”.
C. Touret aponta uma série de lacunas nas normas existentes na re­
pressão à pirataria que ressurgiu no Golfo da Tailândia com a fuga de
vietnamitas e que são atacados por piratas tailandeses, bem como em
Bom éu e Sumatra, onde atuam piratas malásios: a) não se pode limitar a
pirataria ao alto-mar; b) vai ser difícil, apesar de o Dl permitir, que um
terceiro Estado entre na zona econômica de outro para reprimira pirataria;
c) às vezes é difícil se estabelecer com precisão o local do ataque. E mais,
no caso dos vietnamitas não se tem usado as regras de salvaguarda para a
vida humana no mar. A própria Declaração de Asilo Territorial da ONU,
aprovada pela AG de 1967 também não é utilizada (v. capítulo D. de Asilo).
Pode-se observar que a Convenção de Montego Bay não fez maiores
inovações no tocante à repressão à pirataria e reproduziu as normas da
Convenção de Genebra de 1958.
V 448.)As declarações unilaterais emanadas das grandes potências marí-
timasTem originado a criação de inúmeros institutos do Direito do Mar.
Elas são encaradas como um costume em formação. Normalmente, elas
atendem aos interesses econômicos dos Estados, daí serem respeitadas.2”

1211
Há uma tendência em lodos os Estados para submeterem maiores
zonas à sua jurisdição. Em conseqüência, esles atos unilaterais visam exa­
tamente estabelecer a soberania do Eslado em zonas de alto-mar.
Desie modo, os Estados, por atos unilaterais, foram estabelecendo a
sua jurisdição alfandegária e fiscal em uma zona de alto-mar, sendo criada
em conseqüência a zona contígua.
Os Estados reivindicam unilateralmente direitos exclusivos sobre os
recursos do leito e subsolo do alto-mar, o que acabou por acarretar a
formação do instituto da plataforma continental.
Outras zonas têm sido criadas, como, por exemplo, a já mencionada
zona de identificação.
Estes institutos se transformaram inicialmente em normas costumeiras
antes de se transformarem em normas convencionais. De um certo modo,
poderíamos dizer que estas limitações, hoje convencionais, são também
de origem costumeira.
Entretanto, devemos m en cion ai a existência de limitações à liberdade
dos mares por declaração unilateral que têm sido encaradas como abuso
e não originaram nenhum instituto consagrado no sentido por elas reivin­
dicado. Neste caso estão as áreas marítimas que os Estados (EUA) criaram,
principalmente no Oceano Pacífico, para o experimento de armas nuclea­
res, chegando algumas a 400.000 milhas quadradas, que fica como uma
“zona fechada”, não podendo haver aí nem navegação, nem pesca, etc. A
França em 1973 e 1974 criou uma zona de 60 milhas de largura contígua
ao mar territorial para explosões nucleares. Ch. Rousseau menciona que
desde 1960 a URSS tem fechado, anualmente, áreas imensas para lança­
mentos de engenhos teleguiados.
\$49j Inúmeros casos de restrições à"liberdade dos mares surgiram
convencionalmente. A polícia do alto-mar em relação a certos fatos é dada
a todos os navios de qualquer Estado. Nesta situação está a repressão ao
tráfico de escravos.30 E de se assinalar que se tentou também fazer a
repressão do contrabando de armas para certas regiões do globo.3' Pode­
mos mencionar ainda o fato de um navio de guerra francês ter exercido
o direito de revistar um navio estrangeiro nas costas da Argélia, durante
a guerra da Argélia. Entretanto, como assinala Ferron, tal fato é contrário
“aos princípios do direito internacional”. Os Estados, quando são vítimas
do contrabando de armas, exercem “o direilo” de deter o navio em alto-
mar, adotando atitudes unilaterais.
Outras normas convencionais procuram regulamentar a utilização do
alto-mar:
a) a salvaguarda da vida humana no mar que está também regulamen­
tada na Convenção de Montego Bay, que determina que “todo Estado
exigirá do capitão de um navio que arvore seu pavilhão que, sempre que
possa fazê-lo sem grave perigo para o navio, siia tripulação ou seus passa­
geiros” , dê auxílio a toda pessoa que se encontre em perigo de desaparecer
no mar. Deverá em caso de abalroamento prestar toda assistência ao outro

1212
navio. O Estado costeiro desenvolverá um serviço de busc a e salvamento
eficaz (art. 9 8 ).:,1!
b) a proteção dos cab o se oleodutos submarinos. Os Estados téni
obrigação de promulgar legislação para punir os navios de sua nacionali­
dade que causem danos e cabos e oleodutos "submarinos. Por outro laclo,
deverão ser indenizados pelos proprietários dos cabos submarinos e oleo­
dutos os proprietários de embarcações que provarem ter abandonado uma
áncora, rede de pesca, etc., para não causarem danos aos citados cabos e
oleodutos (arts. 113, 114 e 115);33
c) a conservação dos recursos vivos;14
d) estabelece a cooperação gara a regressão ao tráfico ilíoto de estu­
pefacientes e substancias psicotrópicas realizado no alto-mar. Um Estado
pode pedir a cooperação de outro para fazer a repressão a um navio de
sua oacionalidade que faça tal tráfico;
é) podem ser citadas as “regras internacionais para evitar abalroamento
no mar”, por exemplo, consagradas na Convenção de Londres de 1972;
f) normas sobre poluição (v. adiante);35
g) o Tratado de Moscou (1963) proíbe explosões nucleares em qual­
quer lugar em que a queda de resíduos radioativos se dê fora dos limites
territoriais do Estado (v. capítulo L II). O utro caso de restrição convencio­
nal à liberdade dos mares é a desnuclearização do fundo dos mares (v.
capítulo XLIV);
h) pode-se citar ainda a chamada polícia de pesca, em que o navio de
um Estado pode interferir na navegação de navio de outro Estado que seja
signatário da convenção. Esta polícia de pesca está consagrada na conven­
ção de pescarias do Pacífico Norte (1952), convenção de pescarias do
Aüantico Nordeste (1959);
¿) em 1988, após o incidente do Achille Lauro,3dA foi concluída con­
venção para a repressão de atos ilícitos contra a segurança da navegação.
Ela segue a orientação consagrada no D. Aéreo reprimindo os atos que
atinjam a segurança da navegação marítima. Não é aplicada aos navios
públicos. Ela é aplicada às infrações cometidas nas águas territoriais e no
alto-mar. São punidos os atos de territorismo: a) destruição do navio ou
instalações de navegação marítima; b) os atos que atinjam alguma pessoa
forem ligados aos atos anteriores; etc. Há uma obrigação dos Estados
reprimirem tais crimes.
^ 490) A regulamentação da pesquisa científica marinha é uma das
novidades da Convenção de Montego Bay. Anteriormente este assunto era
quase que ignorado rias-convenções internacionais.
Ela estabelece que todo e qualquer Estado tem o direito de realizar
pesquisa científica marinha-e esta deverá ser feita para fins pacíficos, com
métodos e meios específicos adequados, etc. Determina, ainda, que a
pesquisa científica não será “fundamento jurídico” para reivindicações
sobre o meio marinho ou seus recursos."

1213
O Estado cosieiro icm o direito exclusivo de regulamentar, autorizar
í e realizar a pesquisa no seu mar territorial.
I Quanto à pesquisa realizada na plataforma continental e na zona
\ econômica, é necessário o consentimento do Estado costeiro, mas “em
circunstancias normáis, os Estados costeiros outorgarão seu consentimento
para que outros Estados ou organizações internacionais realizem” projetos
de pesquisa com fins pacíficos. “Os Estados costeiros estabelecerão regras
e procedimentos para garantir que não haja demora ou denegaçào sem
razão” para este consentimento. Entretanto, o Estado pode negar este
consentimento se o projeto de pesquisa: a) tiver “importância direta para
a exploração e utilização dos recursos naturais vivos ou não vivos”; b) utilize
perfurações e explosivos; c) acarrete a construção de ilhas artificiais; etc.
A letra a não se aplica quando a pesquisa for além das 200 milhas e for
ser realizada fora das áreas em que o Estado esteja fazendo exploração ou
que vá realizá-la em um “prazo razoável”. O Estado deverá dar publicidade
destas áreas. De um modo gerai, há no alto-mar liberdade para se recuperar
destroços de navios (Louis Balmond) apesar de a URSS ter tentado incluir
um princípio de que era necessário o consentimento do Estado proprie­
tário.
O Estado ou organização que vá realizar pesquisa científica deverá dar
informações ao Estado costeiro como o tipo e objetivos do projeto, o
método e meios que vão ser utilizados, as áreas geográficas em que ela vai
ser realizada, o nome da instituição patrocinadora, etc. O Estado costeiro
poderá participar da exploração, bem cómo poderá solicitar os resultados
finais da pesquisa.
O Estado costeiro poderá suspender ou fazer cessar a pesquisa se ela
é realizada de modo diverso do que consta das informações que foram
dadas a ele, etc.
Os Estados sem litoral e os desfavorecidos pela geografia serão notifi­
cados de pesquisa realizada na zona econômica e plataforma continental
realizada por outros Estados e organizações e também poderão participar
dela.
As instalações e equipamentos científicos não têm o estatuto de ilhas,
mas podem ter uma zona de segurança de 500 metros de largura. Deverão
conter sinais de idenüficação e nãoserâo colocadas em rotas de navegação.36
Quem realizar a pesquisa-será responsável pelos danos causados por
\ poluição em virtude de sua realização.
\ As controvérsias serão solucionadas por modos pacíficos.
Em conclusão podemos repetir uma observação de Tulio Treves de
que o regime jurídico da pesquisa científica repousa na oposição entre
Estados pesquisadores (defendem a ciência) e Estados em desenvolvimento
(defendem os poderes do Estado).
> 4 4 9 B ..N o to ca n te a o b je to s h is tó r ic o s e a rq u e o ló g ico s. a c o n v e n ç ã o (le
19H2 d isp õ e q u e os o bjeto s e n c o m ia d o s nu A rca “serao co n se rv ad o s ou
se d isp o rá d e le s em b e n e ficio d e io d a a h u m an id ad e , le v an d o p articu lar­
m e n te em co n sid eração os d ire ito s d e p re fe rê n c ia d o E sta d o 011 p aís de
o rig em , d o E stad o de o rigem c u ltu ra l ou d o E stad o d e o rig e m h istó rica e
a rq u e o ló g ic a ’’ .
O a rt. 3 0 3 d ete rm in a que o s E sta d o s têm a o b rig a ç ã o d e p ro te g e r os
o b je to s d e a sp e cto arq u e o ló g ico e h is tó r ic o .

1215
NOTAS
1. (V. bibliografia dos capítulos anteriores); Maurice-René Sim onnet — La
Convention sur la H aute M er. 1966; Amonio Q uiniano Ripollés — Tratado de
Derecho Penal Internacional e Internacional Penal, t. I, 1955, págs. 317 e segs.;
H. Accioly — A Liberdade dos Mares e o Direito de Pesca no Alto-Mar em face
do Direilo de Gentes, in BSBD I, janeiro-dezem bro 1957, n°s 25 e 26; Philip Grosse
— Histoire de la Piraterie, 1962; Jacques Massin — La Poursuite en Droit Maritime,
1937; William E. Masterson — Jurisdiction in Marginal Seas with special reference
to Smuggling, J 929: Cristopber B. V. Meyer — T h e Extent of jurisdiction in Coastal
Waters, 1937; Vespasien V. Pella — La T é p r e s s i o n de la piraterie, in RdC, 1926,
vol. t. 15, págs. 149 e segs.; Luis García Arias — La piratería como delito del
D erecho de Gentes, in Estudios de Historia y D octrina dei Derecho Internacional,
1969, págs. 307 e segs.; Claude Goyard — El caso del “Santa Maria” , in Estudios
de Derecho Internacional Marítimo, 1963; W. Crecraft — Freedom o f the Seas,
1935; Mario Monterisi — La Liberta dei Mari e L ’Inghilterra, 1943; Am ílcar Mar-
chesini — Liberdade dos Mares, 1925; Claude Palazzoli — Des quelques dévelop-
pements récents du droit des gens en matiére d ’accés à la mer des pays dépourvus
de littoral, in RGDIP, Juillet-Septem bre 1966, pág. 667 e segs.; H. B. Sweitzer —
Soberania e o SLBM (Mísseis Balísticos Lançados de Submarinos), in Revista
Marítima Brasileira, janeiro-fevereiro-m arço de 1967, págs. 96 e segs.;. Estudios de
Derecho Internacional M arítimo (homenagem ao Prof. José Luis de Azcárraga),
1968; H. Arbuet Vignali — El Delito de Piratería en el Derecho Internacional, in
La Revista de D erecho, Jurisprudencia y Administración, t. 71, n3s 2 e 3, 1971,
págs, 29 e segs.; N. M. Poulantzas — .T h e Right o f Hot Porsuit in International
Law, 1969; Martin Ira Glassner — Access to the Sea for Developing Land-Locked
States, 1970; G undolf Fahl — EJ principio de la libertad de los Mares, 1974; Jo h n
Kish — The Law o f International Spaces, 1973; Luis García Arias — “La Libertad
de los Mares de la H élade” , “La Libertad de los Mares en la Concepción Juríd ica
Rom ana” e “La Libertad de los Mares según Rodrigo Suárez”, in Estudios sobre
Relaciones Internacionales y Derecho de Gentes, vol. II, 1972, págs. 421 e segs.;
United Nations Third C onference o ír The Law o f T h e Sea: Informal Com posiie
Text from the Sixth Session, in International Legal Materials, Septem ber 1977,
págs. 1.099 e segs.; Jean -P ierre Beurier e Patrick Cadenat — Les positions de la
France-á l’égard du droil de la mer, in RGDIP, Ociobre-Décem ber 1975, ns 4,
págs. 1.028 e segs.; Adherbal Meira Mattos — Países sem litoral, in Revista da
Universidade Federal do Para, 1975, I s semestre, págs. 75 e-segs.; Dan Ciobanu
— Hot Pursuit from the Fisheries Zone: A Further Comment on United States v.
Fishing Vessel Taiyo Maru n° 28 and United States v. Kawaguchi, in AJIL, July
1976, vol. 70, n e 3, págs. 549 e segs.; René-Jean Dupuv — L"inspection internatio-
nale des navires, in L ’Inspéclion Internationale, coordenado por Georges Fisher
e Daniel Vignes, 1976, págs. 249 e segs.; William T . Burke — The International
Law and Politics o f M arine Science Research, in Toward World Order and Human
Dignity, Essays in H o n o r.o f Myres S. McDougal, coordenado por W. M ichael
Reisman e Burns H. W eston, 1976, págs. 473 e segs.; Jean Monnier — Désencla-
vement et Transit dans le. D roil International des Transports, in Aspects Actuéis
du droit intem ational des transports, Coloque du Maris, 1981, pág. 70 e segs.;
Malvina Halberstam — Terrorism on the High Seas: The Achille Lauro, Piracy

1216
and lhe- I.VIC Convention 011 Maritime Safety, in AJII.. vol. S2. April 1988. n" 2.
pág.s. 209 e segs.; C orine T o u rel — La Piratcrie au Vingtiòmr Sicck-. Piraicrie
Maritime ei Aérienne, 1992; Alexandra de São Rafael vou Eohm — Ainolly de
Mello — O Alto-mnr e o Princípio da Liberdade, 1991; Serge Pannatier — Pro-
blèmes Actuéis de Ia P êche en Haute Mer, “in ’' RGDIP. t. 102/1999/2, págs. 444
e segs.; José Amónio Pastor Ridrueja — La Jurisdicción Rampante de los Estados
Ribereños sobre Ia Pesca en Alto Mar, “ in" Hacia un Nueva Ordem International.
Estudios en H om enaje al Profesor Don Manuel Diez de Velasco, 1993, págs. 521
e segs.: Francisco O rrego Vicuña — T h e Changing International Law of High Seas
Fisheries, 1999.
2. Esta legislação visava reprim ir o contrabando. Os navios bordejavam a cosía,
aguardando o m om ento de passar o contrabando. Outros Hovering Acis existiram
antes de 1736, tais com o os de 1709 e 1718.
3. Em 1804 a Corte Suprema norle-am ericana reconheceu a noção de zona
contigua.
4. Segundo este critério, os EUA poderiam ‘exercer a sua jurisdição até a
distância de uma hora que o navio infrator pudesse percorrer. Os navios em pre­
gados para o contrabando de bebidas alcoólicas eram rápidos, chegando a per-
correr 50 e 90 milhas por hora (Ferron). Este dispositivo trouxe conflitos com a
lei: a) a Corle Suprema afirmou que a jurisdição dos EUA a respeilo de navios
nacionais de Estados que não tivessem concluído Liquor Treaties seria de 12
milhas; b) os Tribunais decidiram que mesmo existindo Liquor Treaties os navios
não poderiam ser apreendidos depois das 12 milhas, um a vez que tais tratados
não eram “self a executing”; c) no caso do “Mozel Tov” a Corte Suprem a dos
EUA considerou que a apreensão do navio era ilegal apesar de estar a menos de
12 milhas da costa porque o navio só tinha a velocidade de 9/10 milhas por hora
e, em conseqüência, a apreensão contrariava o tratado. Os EUA, por estes tratados,
permitiam que os navios estrangeiros transportassem bebidas alcoólicas para a
tripulação.
5. Enquanto esta reunião se realizava, o cargueiro inglês “Clem ent” foi afun­
dado entre os portos do Recife e Salvador pelo cruzador-de-bolso alemão “ Graf
von Spee”. Esta zona foi reafirmada no Tratado Interam ericano de Assistência
Recíproca (1947), estendendo-a até as regiões polares.
6. Na guerra de independência da Argélia foi criada urna zona de segurança
com 32 milhas de largura, na Argélia, pela França, com a finalidade de evitar que
os rebeldes recebessem material de guerra. Os EUA erigiram plataformas de radar
(Texas Towers) até a distancia de 100 milhas da costa, criando ai uma zona de
proteção. Os aviões que penetram nesta zona são obrigados a se identificar e a
seguir certas rotas. Estas zonas de proteção ou identificação também foram ado­
tadas no Canadá. Alguns autores (Sweitzer) consideram que estas zonas deveriam
ter a largura dependendo de alcance dos mísseis transportados por submarinos.
Estas zonas contíguas aéreas de segurança são conhecidas pelas suas abreviaturas
ADIZ (a norte-americana) e CADIZ (a canadense).
7. O Estado pode exercer estes direitos no espaço aéreo sobrejacente à zona
contígua. Esta é a opinião dominante, apesar de não haver uma regulam entação
internacional. E evidente que ao Estado interessará, acima de tudo, o aspecto de
segurança.
8. As raízes desta teoria estão no Digesto, em fragmentos de Celso, com o:
“Maris communem usuni ómnibus ut aeris.”

1217
9. E ntrón em v ig or cm 1962.
10. Em Roma, com o “ Marc Nostrum", d e possuía unía solx-r.uih sobro o
mar. Entretanto, U lpiano consagrava a liberdade dos mares. O mar é considerado
“res comnmnis dtr iuris gentim rT. Não há a dom inação do mar (mar territorial),
em conseqüência de não haver a noção de “mare libem m ” (Luis García Arias).
Na CTéfia lanibém se consagrava a liberdade do mar.
11. No século X II, o Papa Alexandre III deu ao Doge de Veneza (era unía
recompensa pelo auxilio que Venera dera ao Papa na stia hita co n tra Frederico
Barbarruiva) um anel, com o símbolo do seu dom inio sobre o Adriático, durante
a Festa de Ascensão do Senhor. O Papa leria proferido as seguintes palavras:
“Recebe este sím bolo de seu imperio sobre o mar; lodos os anos ueste día tu
contrairás casam ento com ele para que a posteridade saiba que ele pertence a ti
por direilo de conquista e que eu consagro teu poderio sobre ele com o o de um
marido sobre uma esp&sa.” Em conseqüência, anualm ente, o Doge, a bordo do
“Buceniauro” , jogava ao mar um anel simbólico. Eram os esponsais de Veneza
com o Adriático. “ O Mar simbolizava a Grande Mãe de onde provêm todo bem
e todo mal” (Friedrich H eer — L ’Univers du Moyen Age, 1970). Roland Mousnier
(Les XVI et XVII siécles, 1993) observa que a Idade M édiafoi “a época da liberdade
dos mares”. Veneza, no século X III, reivindica o Adriático; Gênova,'n o século XIV,
reivindica o Mar da Liguria; neste mesmo século a Dinamarca reivindica o mar
Báltico. A Noruega quer o O ceano até a Islândia e Groenlandia. Os Estados querem
um monopolio e cobram taxas para autorizar a passagem de pescadores e com er­
ciantes, e ainda reivindicam a saudação ao pavilhão.
12. Na verdade, a noção de British Seas variava em extensão de acordo com
o poderío da Inglaterra.
I2A. Para Fulton a origem da liberdade dos mares foi tanto a liberdade de
navegação bem com o a liberdade de pesca, porque as duas eram im portantes para
a Holanda.
13. Sustentam os defensores da primeira corrente (Gidel) que desde fevereiro
o Conselho Privado da Inglaterra já havia tratado da restrição da pesca.
14. E preciso lem brar que nesta época havia a união das coroas ibéricas.
15. A UNKRA, agencia da ONU para o soerguim ento da Coréia, mandou
construir em H onguecongue dez barcos destinados a pescadores coreanos. Eles
foram matriculados na ONU e sob o seu pavilhão navegaram de H onguecongue
para a Coréia.
16. Para corrigir isto j á foi proposto que os navios da ONU navegassem com
dois pavilhões: o seu e o de um Estado-membro.
17. V. capítulo XLVI.
18. Atualmente elas se encontram codificadas na Convenção de Genebra.
19. O “Virginius” era um navio americano de bandeira (mas não de registro)
que foi interceptado próxim o a Cuba, mas em alto-mar, pelo navio de guerra
espanhol “T ornad o”. A Inglaterra protestou pela execução precipitada de seus
súditos que se encontravam a bordo do “Virginius", mas não pelo aprisionam em o
do navio. A Espanha alegava que este navio iria fom entar revoluções em Cuba.’ .
20. A origem deste direito está no século X IX , quando a Inglaterra com eçou
a utilizá-lo para reprim ir a pirataria e o tráfico negreiro. O direito de visita e busca
nos navios suspeitos de participarem do tráfico de escravos foi reivindicado pela
Inglaterra a partir de 1810. Os países, pressionados militar ou diplom aticam ente,
reconheceram este direito mediante reciprocidade: Portugal (1817, 1842, 1843);
Espanha (1817, 1836); Brasil (1826); França (1831, 1832, 1833, 1845); Holanda
(1817, 1837, 1849); Argén lina (1839); Bélgica (1 8 4 8 ): Bolívia (1840): Cliilr (1843):
Dinamarca (1835); Cidades Hanseálicas (1 8 3 7 ); Suécia-Norvioga (182f>. 183’>);
Colombia (1851); EUA (1862); etc. A Quíntupla Aliança lam bón Imam com ía o
tráfico de escravos (Luis Henrique DiasTavares — Com ércio Proibido de Escravos.
1988).
21. Em conseqüência, para ela ser exercida, há o direito de parar o navio.
22. As origens do direito de perseguição parece que estão nas Instituías de
Justiniano, no direito que uma pessoa tinha de se apropriar de animais selvagens
e peixes após uma perseguição. Na Inglaterra ele está ligado à legislação dos
Hovering Acts. A doutrina, antes da Conferência de Haia de 1930, não era unânim e
na aceitação deste direito, que era uma prática de origem anglo-saxã. Fcdozzi
parece que foi o últim o a não reconhecer este direito. Ames dele, decisões arbritrais
de Asser também não o reconheciam.
23. O navio perseguido, ou uma de suas em barcações, quando trabalhem em
grupo e utilizem o navio perseguido como navio-mãe, precisam estar nestes espaços
marítimos. Aplica-se a este caso a denominada teoria da "presença construtiva’ ,
que teve o seu desenvolvimento nos EUA. A “ presença construtiva simples" ocorre
quando os barcos que se encontram no mar territorial ou na zona contígua do
Estado pertencem ao navio-mãe que está no alto-mar. A “presença construtiva
extensiva” é quando os barcos que se encontram no mar territorial ou na zona
contígua não pertencem ao navio-mãe que está no alto-mar, mas operam com ele.
A Convenção de 82 para estender o direito de perseguição de modo a abranger
este último caso fala em: “ou outras em barcações que trabalhem em equipe” e
usem o navio com o navio-mãe.
23A. A jurisprudência nos EUA tem consagrado um direito de perseguição
com o complementar e conseqüência do direito exclusivo do Estado em um a zona
contígua. E o “right o f hot pursuit from a fisheries zone” (“Dan Ciobanu” ).
23B. A palavra pirataria vem do grego “ peirates” , o que vai à procura de
aventuras e, por extensão, “ladrão do mar” (Azcárraga).
24. Quintano Ripolés sustenta que existem dois conceitos básicos sobre pira­
taria: a) material (alem ão): a pirataria é uma form a mais grave de roubo no mar;
b)forrmal(anglo-saxão): o que caracteriza a pirataria é o navio operar sem preencher
os requisitos fixados pelas normas internacionais (ex.: sem pavilhão).
25. Este elem ento é o que tem provocado maior discussão. A doutrina (La
Pradelle), de um m odo geral, sempre considerou pirataria os atos com etidos contra
o próprio navio. J á a Comissão de Dl considerava pirataria apenas aqueles atos
cometidos contra outros navios; os atos contra o próprio navio seriam considerados
motim. A Convenção de Genebra não é clara na letra a do inciso l 9 ao falar em
“seu bo'rdo”, não especificando se é a bordo do próprio navio ou de outro.
Finalmente podemos repelir, com Oppenheim -Lauterpacht, que para a configu­
ração da pirataria é'necessário que a violência seja contra o próprio navio e não
contra o com andante. Neste último caso haveria um motim, mas não pirataria.
Outros, como Ferron, que aceitam o pensam ento da Comissão de Dl, afirmam
que a pirataria é quando é dirigida contra outro navio; quando é contra o mesmo,
já haveria motim. Tem -se considerado que o motim abrange a revolta tanto de
tripulantes com o de passageiros.
26. Os acordos de Nyon (1937) consideraram que o ataque por submarino a
navio mercante em tem po de paz era assinalado a ato de pirataria. Entretanto, a

1219
C onversão fie Genebra n ão acena esta lese. uma vez (¡ne nestes casos falta o fim
pessoal para a co nfig u ração da p irataria.
26A. Os piratas e corsários ingleses contribuíram para a liberdade dos mares,
.v e z que libertavam o mar de “ obrigações morais e legais" (Adolf Rein, Carl
Schiniti).
27. De um modo geral, aplica-se a regra “pirata non mutai dominium". Em
conseqüência, as mercadorias encontradas em poder dos piratas são entregues aos
seus am igos proprietários. E ntretanto, nem sempre foi assim, uma vez que os
despojos dos piratas ficavam com o captor como um prêm io pela captura.
28. A aplicação desta convenção pelo Brasil prendeu-se mais ao aspecto hu­
m anitário, pois ela não era obrigatória para Portugal, porque se tratava de uma
convenção pan-afhericana.
29. Na Conferência de G enebra (1958) apenas a França se manifestou con­
trária à validade destas declarações.
30. V. capítulo X X X .
31. V. capítulo X X X .
32. V. capítulo X X X .
33. A proteção ju rídica internacional para os cabos submarinos remonta à
Convenção de Paris de 1884. Pela Convenção de Genebra, o Estado deve reprimir
p o r medidas legislativas a ruptura e a deterioração causadas aos cabos e oleodutos.
Cada Estado julga o seu navio que causar dano a cabos submarinos.
34. V. capítulo XLV1.
35. J á em 1926 encontram os em Washington uma con ferência internacional
convocada para apreciar a poluição das águas pelo petróleo. Em 1954 foi concluída
uma convenção sobre o assunto em Londres, que foi revista em uma nova con­
venção, concluída em 1962. Cabe ao Estado onde o navio está re fu g ia d o aplicar
as sanções. E de se lembrar que o petróleo apresenta perigo de incêndio e causa
danos à flora e fauna.
35A. O navio “Achille L au ro ”, de bandeira italiana, foi tom ado por uma facção
da O LP ná costa do Egito a fim de obter a libertação de 50 palestinos jjresos em
Israel. A Síria recusou que o navio ancorasse no porto de Tartous. É feito um
acordo com o Egito, em que os palestinos se entregavam desde que pudessem
partir livres para a Tunísia. Após eles se entregarem é d escoberto ter sido assassi­
nado um cidadão norte-am ericano. Os EUA solicitam a extradição e o Egito nega.
Eles partem em um avião público egípcio para a Tunísia. O avião não co n seg u e
permissão para aterrissar na G récia e na volta para o Egito é obrigado por aviões
norte-am ericanos a descer em um a base da OTAN na Sicilia. Os italianos, com as
suas tropas, cercam as norte-am ericanas e impedem que os am ericanos embarquem
em seus aviões os terroristas. Eles acabaram sendo julgados e condenados na Itália
(1 985). ^
36. É de se lembrar aqui os sistemas de aquisição de dados científicos .(SADC)
que podem ser guarnecidos ou não. Os primeiros são os navios e os segundos
podem ser fixos ou móveis. Eles têm aumentado de núm ero. A questão era a de
se saber se atentam ou não con tra a liberdade dos mares. Existem tratados que
cuidam deles, c o m o o de 1965 entre a Dinamarca e a República Federal da
Alem anha.
CAPÍTULO XLV1

PESCARIAS. CONSERVAÇÃO DOS RECURSOS


VIVOS DO ALTO-MAR1

450 — A pesca e sua importância; 451 — A liberdade de pesca; 452


— A justificação para as restrições à liberdade de pesca; 453 — A
regulamentação da pesca em alto-mar; 454 — A regulamentação con­
vencional e a unilateral; 455 — Pescarias sedentárias; 456 — A
conservação dos recursos vivos do alto-mar ñas conferencias interna­
cionais.

450. A pesca possui nos dias de hoje urna grande importância. Diversas
populações se alimentam essencialmente da pesca: os habitantes da Islân­
dia, os das costas da Noruega e do Perú, etc. Cómo já vimos, a própria
disputa em tomo da largura do mar territorial prende-se, acima de tudo,
à pesca..
Tem-se considerado que o déficit de proteínas na alimentação mundial
poderá ser eliminado co m o aumento do co n su m o de peixes.2
O comércio mundial de produtos de pesca é dominado internacional-
mente pelos países industrializados como os EUA e o Canadá (M. Ben-
nouna).
451. A liberdade de pesca foi sempre encarada como sendo urna das
liberdades do alto-mar. Esta posição decorria de se considerar os recursos
piscículas inesgotáveis.3
Através dos séculos, a liberdade de pesca foi afirmada, até que, no fim
do século XIX, diversas espécies, principalmente os mamíftyos. baleias e
focas, começaram a diminuir devido aos métodos predatorios utilizados
pelos pescadores e caçadores. Em conseqüência, começaram a surgir tra­
tados para a regulamentação da pesca de certas espécies marinhas, a fim
de evitar o seu desaparecimento.4 Salientam Pontavice e Cordier que “a
noção de gestão racional dos recursos vivos do mar e de conservação das
espécies fez o seu aparecimento na sentença arbitral de 1 5 /8 /1 8 9 3 , que

1221
colocou fim ¿10 conflito anglo-aincricano relativo às focas 110 estreito de
Behring”. Os árbitros fizeram uma regulamentação estabelecendo zonas
de proteção e a proibição de matar as fêmeas e os be£>ês, etc.
A proteção aos recursos vivos do mar, proposta pela primeira vez por
José LeoiTSuarez enTT925,"'"trouxe uma restrição à liberdade de pesca, que
não pode mais ser entendida em seu sentido absoluloT^Tía verdade, tem-se
sustentado que a liberdade de alto-mar é essencialmente liberdade de
navegação e que a liberdade de pesca leria sido acrescentada posterior­
mente, uma vez que o alto-mar não está sujeito a nenhuma jurisdição.
Em conclusão, a liberdade de pesca atualmente não é mais entendida
no seu sentido absoluto, mas com o estando sujeita a restrições.
452. Diversas teorias foram elaboradas com a finalidade de justificar
as restrições, isto é, a regulamentação da liberdade de pesca:
a) Princípio da abstenção. Foi elaborado, pela primeira vez, em 1923,
um ac.ordo entre o Canadá e os EUA para proteger o “bralibut” no Pacífico
Norte. Foi utilizado posteriormente, em 1952, em uma convenção, con­
cluída em Tóquio, entre os EUA, Japão e Canadá sobre pescaria no Pacífico
Norte. Este princípio afirma que quando um determinado estoque de
peixes é explorado por um ou vários Estados, de modo que ele produza
o máximo e esta produção assegure a conservação do estoque, os demais
Estados deverão se abster da exploração deste estoque. O Estado costeiro
não estaria
s .., —
obrigado a... se abster.
i1—--------- *-------- *— - — Q -------, --------
O fundamento do princípio da abstenção é que se outros Estados
entrarem na exploração de um estoque nas condições descritas o seu
rendimento diminuirá. Este princípio acabou sendo rejeitado na Confe-
rência de Genebra, uma vez que ele trazia maiores vantagens para os
grandes Estados pescadores, já explorando maior número de estoques, e
inclusive não há ainda um conhecimento científico perfeito que seja capaz
de dizer com exatidão se a exploração se encontra em um nível “ optimum”.
b) Alegou-se, ainda, para justificar as restrições à liberdade de pesca,
a “necessidade econômica vital”. Ela se aplicaria, sobretudo, àqueles Esta­
dos, como a Islândia, qué dependem essencialmente da pesca para a súa
sobrevivência.
Em conseqüência, deveria ser evitada uma superprodução, que baixaria
inevitavelmente o preço do produto, acarretando prejuízos ao Estado cos­
teiro.
Ela chegou a justificar, na Conferência de Genebra, a aprovação de
um dispositivo dando ao Estado “direitos preferenciais” de pesca em alto-
mar “em regiões .adjacente? à zona de pescarias costeiras” se a economia
do Estado fosse baseada fundamentalmente na pes.ca. Os seus direitos
existiriam na “medida tornada, necessária por sua dependência a respeito
da pescaria”. Este texto, aprovado em uma comissão para atender à Islân­
dia, foi rejeitado em plenário.
r) A Conferência de Genebra deu ao Estado “direitos prioritários no
alto-mar costeiro” ao seu território. Estes direitos prioritários permitem
ao Estado o direito de regulamentar a proteção e a conservação dos re­
cursos vivos no alto-mar. Alegòu-se que o Estado no “alto-mar costeiro”5
tem um “interesse especial” na região que os demais Estados não possuem;
enlretanto, ele não poderá entravar a liberdade de pesca. O “interesse
especial” do Estado costeiro consiste “em manter a produtividade dos
recursos vivos do alto-mar próximo às suas costas” (artigo 69). Tais direitos
foram dados aos Estados costeiros em virtude das reivindicações formuladas
pelos asiáticos e latino-americanos, bem como em virtude de a mencionada
Conferência não ter consagrado maior largura do m ar territorial, ou, ainda,
a existência de uma zona contígua de pesca. Esta idéia de um “interesse
especial” já é encontrada na obra de William Welwood (1613).
d) A convenção de 1982 não menciona mais os direitos prioritários
para o Estado no alto-mar costeiro, mas o obriga a adotar as medidas
necessárias em relação a seus nacionais para a conservação dos recursos
vivos no alto-mar, bem com o determina a cooperação entre os Estados
para atingir tal fim, cabendo aos Estados determinarem os limites de
captura. De um certo modo pode-se dizer que nesta convenção predomi­
nou a idéia de conservação por meio da cooperação sobre os direitos do
Estado. Por outro lado, a regulamentação desta matéria na Convenção de
Montego Bay é bem m enor do que a existente na convenção de 1958.
Parece-nos que isto decorreu de dois fatos: a) a extensão da jurisdição
nacional para 200 milhas, o que abrange quase todas as regiões de mais
densidade de pesca. A zona econômica acaba por restringir a liberdade
de pesca; b) a convenção sobre pesca e conservação dos recursos vivos do
alto-mar concluída em 1958, foi entre as quatro aí concluídas, a que teve
menos aceitação.
453. Na Conferência de Genebra, duas teses surgiram sobre a regula­
mentação da pesca em alto-jnan a regulamentação unilateral" e a regula­
mentação convencional^ .....
A regulamentação da pesca em alto-mar costeiro seria feita unilateral­
mente pelo Estado. Esta posição foi defendida, acima de tudo, pelas pe-
qtrenas potências marítimas. Ao contrário, as grandes potências propug-
naram pela segunda tese. _
A convenção sojbre pesca e conservação dos recursos vivos do alto-mar,'
concluída nesta conferência, procurou conciliar as duas posições, dando
çertos direitos ao Estado costeiro, como veremos adiante, mas também
assegurando a igualdade e interditando a exclusão de qualquer Estado de
qualquer zona piscícula.
Na Convenção de 1982, repetimos, na verdade predominou exclusiva­
mente a cooperação.internacional.
Vamos abrir aqui um parênteses para reproduzir observações tiradas
da obra de D. Vignes “ et allii”.

1223
O regime da pesca na zona económica é complexo, porque ele é regido
pela Tegíslaçãojlo estado e pelas normas da cenv. de 1982.
Õ DI das Pescarias é económico porque rege a utilização dos recursos
e também técnico e científico, porque trata cia divísãcrdos recursos entre
países pobres e ricos. E um direito político. Pode-se dizer qii‘é ele é domi­
nado pela “ creeping jurisdiction” (jurisdição crescèntê)j qüè é ã extensão
crescente dajurisdição do estado costeiro sobre as zonas de mar adjacentes
ao estado costeiro. O ano de 1882 é considerado fundamental nesta ma­
teria; é que foi concluída uma convenção sobre a pesca no Mar do Norte
entre a França, Grã-Bretanha, Bélgica, Países Baixos e Dinamarca sobre a
conservação dos recursos. Em 1995, foi concluído no âmbito da ONU
acordo sobre conservação e gestão das pescarias.
. A pesca se guia por dois critérios: o TAC (total allowable catch — total
admissível de capturaj^que-deve respeitar critérios de MSY ( ‘máximum
sustainable yield--— rendimento constante máximo).
à pésca no alto-mar está usando novos engenhos de pesca que têm
aumentado muito a captura, foi dado um alarme na Declaração de Tarawa,
em 1989, por estados do Pacífico Sul.
454. Na vida internacional, encontramos diversos casos de regulamen­
tação convencional, bem como de regulamentação unilateral.
A forma convencional é muito utilizada, a fim de evitar litígios no
mundo internacional. As convenções normalmente permitem aos Estados
contratantes exercerem poderes de polícia neste assunto não apenas nos
seus navios, mas também nos dos demais contratantes. A sua desvantagem
é que as convenções se restringem apenas aos Estados contratantes e,
muitas vezes, a não participação de um Estado na convenção põe todo o
sistema a perder. Entretanto, diversos tipos de pesca foram regulamentados
convencionalmente: salmão (EUA e Canadá em 1930 e em 1985), baleia
(com várias convenções, como a de Washington de 1946) e de focas (con­
venção de 1911 e de 1957); a convenção européia de pescaria (1964); a
convenção para a regulamentação da Pesca Pelágica da Baleia na Antárctica
(1952); convenção para a conservação do camarão (1958); a convenção
para a preservação do “halibut” no Pacífico Norte e Mar de Bhering (1953);
convenção sobre as pescarias do Atlântico Noroeste (1949 e 1963); acordo
de Conservação dos Recursos Naturais do Atlântico Sul entre Brasil e
Argentina (1967); convenção para a conservação de focas na Antártida
(Londres, 1972); acordo sobre a pesca do salmão no Atlântico Norte
(Washington, 1972); convenção proibindo a caça às focas na Ilha de S
George ao largo do Alasca (1973); convenção sobre a pesca no Báltico
(Gdansk, 1973); convenção para a conservação de recursos marinhos vivos
da Antártida (Camberra, 1980). Em 1989 foi concluída convenção proi­
bindo pesca de arrasto nò Pacífico Sul. Em 1997, foi concluída em Majuro
(Is. Marshall) uma convenção sobre a conservação e a gestão das espécies
altamente migratórias do Pacífico Centro-Oeste, etc.

1224
Um regime de pescarias estabelecido por dois ou mais Estados pode
adoiar os seguintes critérios: a) quota nacional (convenção sobre pesca da
baleia de 1962); b) o denominado de “Estado representante” (“agent
State”), em que dois Estados são encarregados de fiscalizar os “rebanhos”;
por exemplo, a convenção sobre focas ("fur seal”), entre Rússia, EUA,
Japão e Canadá, de 1957 (emendada em 1963), dava aos EUA e à URSS
esta função;'-' c) Goldie propõe a criação de empresa pública multinacio­
nal.
DizJean Carroz, em 1983, que nos últimos cinco anos foram concluídos
cerca de 200 acordos bilaterais de pesca.
Várias convenções pxèvêérhá criação de comissões de pesca, sendo
que a maioria delas opera no Oceano Atlântico. Elas apenas podem fazer
recomendações, que só são obrigatórias para os Estados participantes que
não se opuserem a elas em um lapso de tempo determinado. As poucas
comissões que podem elaborar regras obrigatórias são as que exigem una­
nimidade para as suas decisões e têm um pequeno número de membros,
tais como a Comissão de Focas do Pacífico Norte (quatro membros);
Comissão Mista de Pesca do Mar Negro (três membros); Comissão inter­
nacional de Pesca do Salmão do Pacífico (dois membros); Comissão de
Pesca Soviétioi:japonesa (dois membros). Inúmeras outras comissões de
pesca podem ser citadas: a) Comitê de Pesca para o Atlântico Centro-Oeste;
b) Comissão Internacional de Pescarias do Atlântico Noroeste (convenção
de 1978); c) Comissão de Pescarias do Atlântico Nordeste (convenção de
1959); d) Comissão Internacional de Pesca do Báltico (convenção de 1973);
é) Comissão Internacional de Pescarias do Pacífico Norte (convenção de
1952, modificada em 1978); j) Comissão de Pesca para o Atlântico Cen-
tro-Oeste; g) Comissão de Pesca para o Oceano Índico; etc. Os acordos
multilaterais não têm produzido muitos resultados na prática.
As obrigações dí>s Estados em matéria de conservação nos termos de
decisão proferida pélà- CIJ, em 1974, no caso sobre pescarias entre Grã-
Bretanha v. Islândia são as seguintes: á) adotar medidas de conservação;
b) utilizar as informações científicas; c) cooperação entre os Estados; d)
negociar visando a conservação; ej fazer a troca de dados científicos; f)
não haver discriminação entre os Estados. A sentença afirma que o “ lais-
sez-faire” em matéria de conservação foi substituído pelo dever dos Estados
na conservação para o benefício de todos.
A regulámentação unilateral tem por-fundamento o interesse econô­
mico do Èsta-do em proteger a pesca no aito-mar costeiro. Por outro lado,
estas declarações unilaterais tinham a vantagem de impedir uma pesca
predatória. Elas surgiram exatamente por inexistir uma regulamentação
internacional sobre o assunto.8
A mais célebre regulamentação unilateral é a Proclamação do Presi­
dente Truman, de 28 de setembro de 1945, sobre pescarias, divulgada no
mesmo dia da proclamação sobre plataforma. A proclamação sobre pes-

1225
carias se fundamenta no falo de que a conservação dos recursos tío alto-mar
interessa a toda a sociedade internacional. Os EUA previam dois regimes:
1) se a pesca fosse naquela área praticada pelos estrangeiros, estes conti­
nuariam a ter o direito de realiza-la e os EUA concluiriam convenções; 2)
se no local a pesca só fosse praticada por norte-americanos, eles teriam o
direilo exclusivo, mas se subordinariam à conservação das pescarias. Existe
na proclamação uma cláusula de reciprocidade e os EUA reconhecem aos
Estados estrangeiros o direito de fazer uma regulamentação semelhante.
E interessante observar que não é fixado um limite para ã produção e
apenas diz a proclamação que os EUA estabelecerão zonas para a conser­
vação das pescarias. Ela visava proteger o salmão na Baía de Bristol (Alasca)
da incursão de pescadores japoneses.
A proclamação acima, que revolucionou o direito marítimo, foi imitada
por Estados latino-americanos e asiáticos. Estes Estados, entretanto, de um
modo geral delimitaram a extensão, que varia de 50 milhas (Coréia) até
200 milhas (Chile). Por outro lado, a Proclamação de Truman se referia
apenas à conservação das pescarias, enquanto que estes últimos Estados
falam em conservação, plataforma e mar territorial, confundindo assim as
diversas noções.
455- As pescarias sedentárias estão definidas no inciso 2fi do artigo 13
da Convenção de GerieBra sõhre a pescã è~a cõ n sé rv ^ ^ dos rècürsos vívos
do alto-mar como sendo aquelas pescarias que se “utilizam de engenhos
munidos de suporte quê são fixados ño solo de modo fixo e que aí são
deixados com fins de utilização permanente, ou que, se eíes são retirados,
são recolocados em cada estação, nò mesrriõ Tócãl” .
Sobre esse conceito acima tem surgido_2l crítica de que a noção tradi­
cional de pescarias sedentárias abrangia também a pesca das espécies fixas
no leito do mar. Entretanto, estas últimas foram incluídas no regime da
plataforma continental como sendo do direilo exclusivo do Estado costeiro.
Em conseqüência, as pescarias na plataforma continental estão submetidas
a dois regimes jurídicos, que poderão trazer conflitos: a) se as espécies
forem fixas, elas pertencem ao Estado costeiro; b) se elas forem pescadas
por meio de engenhos fixos no leito do mar, o Estado costeiro pode
regulamentá-las, mas ele é obrigado a aí admitir os estrangeiros, a não ser
que somente os seus nacionais a explorem há longo tempo. A convenção
sobre conservação faz assim uma restrição aos direitos do Estado na pla­
taforma.
A Convenção de 1982 leva em consideração as críticas acima e no art.
77, alínea 4, estabelece: “os organismos vivos pertencentes a espécies se­
dentárias, isto é, aqueles que no período de exploração estão imóveis no
leito do mar ou em seu subsolõ Òü soménte podem mover-se em constante
contato com o leito do mar”. Esta definição está inserida na parte da
convenção que trata da plataforma, sendo que as normas aí aplicáveis não
o são na zona econômica.

)226
As pescarias sedentárias existem 110 Mediterrâneo desde o século VI
para a pesca das esponjas e do coral. No Oriente (pérola, coral) também
^ datam desta época. No século XIX elas apareceram na Austrália para a
pesca de pérolas.
Elas são regulamentadas dentro de diferentes sistemas:" a) liberdade
regulamentada: a pesca é livrfe para todos; apenas deve estar sujeita a certas
limitações, como o estado de pesca, o tipo de engenhos, etc. (ex.: pesca
do coral em Tunes); b) o mais utilizado é o sistema de autorização prévia,
em que a pesca só pode ser exercida após uma licença do Estado costeiro
(Austrália, índia); c) em outros casos o Estado costeiro faz um arrenda­
mento (Tasmânia).
O que se pode observar é que todos os Estados regulamentaram por
meio de at<Js unilaterais10 as pescarias sedentárias.
Os Estados se consideram, como podemos verificar, verdadeiros pro­
prietários dessas pescarias localizadas no alto-mar. Diversas teorias pro­
curam explicar os direitos dos Estados: a) o Estado teria direito a elas,
porque há a ocupação do leito do m ar (Hurst). Ora, o alto-mar não é
passível de ocupação, uma vez que ele não é “res nullius”; b) aplicar-se-ia
a leoria da prescrição aquisitiva (Scelle). O Estado, em virtude de um
longo uso,j>assaria a ter a propriedade sobre tais pescarias. Comojá vimos,"
a prescrição aquisitiva ocorre apenas em território que pertence a outro
Estado e não em território pertencente à comunidade internacional; c) as
pescarias sedentárias seriam os últimos vestígios das reivindicações dos
Estados de domínio dos mares (teoria do direito temporal). Ela não jus­
tificaria as pescarias sedentárias que surgiram no século X IX , quando a
liberdade dos mares já se encontrava estabelecida; d) a teoria das águas
históricas — seg^undo esta concepção as águas das pescarias sedentárias
são águas históricas, isto é, em virtude de um longo uso e da aceitação
pelos demais Estados elas passaram a pertencer ao Estado (Ferron).
A melhor concepção nos parece ser esta última, umavez (jiiea concepção
dos direitos históricos tem sido largamente utilizada n o Dl Marítimo.
456. A conservação dos recursos vivos do alto-mar tem sido objeto de
estudo em diversas conferências internacionais.
A 3a Reunião do Conselho Interamericano‘de Jurisconsultos, realizada
na Cidade do México (1956), aprovou os chamados “Princípios do México
sobre Regime Jurídico do Mar”, cujos trabalhos foram debatidos no seio
da l 3 Comissão, presidida pelo representante do Brasil, Professor Linneu
de Albuquerque Mello. Entre estes princípios estavam alguns sobre a “Con-
servaçáo dos recursos vivos do alto-mar”, que estabeleciam: a) o jtiireito de
os Estados costeiros adotarem medidas de conservação no alto-mar próxi­
mo às suas costas; b) estas medidas não podiam discriminar contra estran­
geiros e nem violariam os acordos internacionais existentes; c) “ q s Estados
ribeirinhos têm, ademais, o direito à exploração exclusiva das espécies
vinculadas à costa, à vida do país ou às necessidades da população” .

1227
Em 1956, a Conferência Especializada lnteramericana sobre Preserva­
ção cios Recursos Naturais: Plataforma Submarina e Aguas do Mar (Cidade
Trujillo) concluía: a) para a conservação dos recursos do alto-mar os
Estados deveriam cooperar entre si; b) "o Estado ribeirinho lem um inte­
resse especial na produtividade continua dos recursos vivos do alto-mar
adjacente ao seu mar territorial”; c) os Estados não estavam de acordo
quanto ao alcance do interesse especial; etc.
Em 1955, reuniu-se em Roma, sob os auspícios da ONU, uma confe­
rência internacional para estudar o aspecto técnico e científico da conser­
vação dos recursos vivos do aho-mar.1L’ Esta conferência realçou a necessi­
dade da cooperação internacional para uma real eficácia da conservação
dos recursos vivos.
Em 1958, reuniu-se a Conferência de Genebra, que concluiu uma
convenção sobre pesca e conservação dos rec-ursos vivos do alto-mar, que
passaremos a estudar.
Esta convenção tem como linha fundamental a conciliação entre o
“interesse especial do Estado costeiro” e a liberdade de pesca. Ela obriga
os Estados a concluírem acordos sobre a conservação. A expressão “ con­
servação dos recursos vivos do alto-mar”, segundo o art. 2S da convenção,
significa: “o conjunto de medidas que tornam possível o rendimento ‘op-
tim u m ’ destes recursos, de modo a elevar ao máximo as disponibilidades
de produtos marinhos alimentares e outros". A conservação deve visar a
alimentação humana.
Os Estados costeiros, pela convenção, possuem direitos e deveres em
relação à conservação dos recursos vivos do ãlto^mãr. L n trF os seus direitos
podemos mencionar: a) o seu “interesse'especial” na conservaçao dos
recursos vivos do alto-mar costeiro; b) têm o direito de participar nas
regulamentações que forem Feitas nesta matéria visando o alto-mar costeiro
áõ sé'ü têrntonõ;~c) direito~dé p fóm u I^rmefficBs'ufiíIgterais se não Houver
acordo entre os interessados. As medidas unilaterais só são obrigatórias
para os estrangeiros se preencherem as seguintes condições: 1) se houver
urgência; 2) se elas tiverem fundamento em elementos científicos; 3) se
não forem discriminatórias contra os estrangeiros; d) direito de participar
nas pesquisas sobre conservação 110 alto-mar costeiro ao seu território; é)
em caso de conflitos sobre medidas de conservação prevalecerá a do Estado
costeiro, uma vez que ele pode se opor à regulamentação de outro Estado
no alto-mar adjacente às suas costas. Nestes casos a prevalência das suas
medidas de conservação será por pouco tempo, uma vez que ele, Estado
costeiro, deverá iniciar negociações para que sejam tomadas medidas em
comum pelos interessados.
Os Estados costeiros têm também deveres: a ) o principal deles é o -de
cooperar na conservação; b) não podem tomar medidas discriminatórias
có~ñtra~sstrangeiros.
Devemos estudar agora a siluação de regulamentação da c o n s e r v a ç ã o
dos recursos vivos do alto-mar nos diversos tipos de exploração:
1) se a exploração é feita apenas por um Estado, ele dita as nonnas
para os seus nacionais;
2) se a exploração é feita por diversos Estados — a regulamentação
deverá ser feita em comum e levada ao conhecimento do direior-iíerai da
FAO;
3) no caso de existir uma regulamentação para determinada área e aí
chegarem novos Estados para explorá-la, estes últimos deverão se confor­
mar com a regulamentação já existente. Entretanto, se esta regulamentação
faz discriminações, a questão pode ser levantada e levada à Comissão
Especial para decisão;
4) um Estado pode pretender regulamentar uma área de alto-mar
onde os seus nacionais não pescam. Neste caso, ele requererá aos Estados
que aí percam a regulamentação da conservação dos recursos vívòs apre­
sentando as razões científicas para isto.
A Convenção, em todos os casos em que os Estados devem chegar a
um acordo sobre as medidas a respeito da conservação, dá um prazo de
doze meses para a sua conclusão. O litígio no fim deste prazo será subme­
tido a qualquer um dos modos de solução pacífica previstos no art. 33 da
Carta da ONU, se as partes concordarem, ou a uma comissão especial, a
pedido de uma das partes.
A Comissão Especial, prevista no art. 9® da Convenção, é formada de
cinco membros nomeados pelas partes. Entretanto, se no prazo de três
meses os Estados não chegam a um acordo sobre as pessoas a serem
nomeadas, caberá ao Secretário-geral da ONU indicar os membros que
não serão súditos de nenhuma das partes. Todo Estado parte no litígio
tem o direito de indicar um súdito para fazer parte da comissão sem direito
de voto.13 A comissão decide por maioria no prazo de cinco meses,.salvo
prorrogação por três meses em caso de necessidade. A sua decisão só é
obrigatória para as partes.
A convenção de 1982 estabelece poucos artigos dedicados à conserva­
ção dos recursos vivos no altõ-mar.14 Eles dêTFrmínãlm^dêveFiíeõ Esfado
tõmar medidas em relação a seus nacionais visando a conservação. Deter­
mina ainda a cooperação entre os Estados para “a conservação e adminis­
tração dos recursos vivos”. Ao determinar a capiura permissível o Estado
deverá levar em consideração os dados científicos mais fidedignos, visando
“manter ou restabelecer as populações das espécies capturadas a níveis
que possam produzir o máximo rendimento sustentável em relação aos
fatores ambientais e econômicos pertinentes, incluídas’ .as necessidades
especiais dos Estados em desenvolvimento, e tendo em conta as modali­
dades de pesca, a interdependência das populações e quaisquer normas”
internacionais, regionais, etc.

1229
As esp écies q u e e ste ja m am eaçadas d ev e rão ser m antidas em níveis
m ais altos para ser m a n tid a a sua conservação.
Não haverá discriminação em relação a pescadores de qualquer Estado.
O Estado costeiro pode fazer uma regulamentação mais estrita visando
a conservação dos mamíferos marinhos. A sua conservação deverá também
ser feita por organismos internacionais.

mo
NOTAS

1. (V. as obras gerais de Direito Marítimo no capítulo X L III); F. V. Garcia


Amador — The Exploitalion and Conservation o f the Resources of the Sea, 1963,
Shigeni Oda — International Control of Sea Resources, 1963; H. Ph. Visser T.
Hooft — Les Nations U nies et )a Conservation des Ressources de la Mer, 1958;
Philip C. Jessup — L'Exploitation des Richesses de la M er, in RdC, t. 29,1929,
vol. IV, págs. 40) e segs.; Alexandre Papandreou — La situation ju rid ique des
pócheries sedentaires en hau te mer — Contribution à l’étude du Droit Interna­
tional Maritime, in Revue Hellénique de Droit International, Janvier-Juin 1958;
André Gros — La Convéntion sur la Peche et la Conservation de Ressources
Biologiques de la Haute M er, in RdC, i. 97,1959, vol. II, págs. 1 e segs., Juan
Antonio Carrillo Salcedo — Funciones del acto unilateral en el régimen ju ríd ico
de los espacios m arítim os, in Estudios de D erecho Internacional Marítimo, 1963,
págs. 7 e segs.; Giuseppe Biscottini — L ’appropriabilitá d elle Risorce M arine e la
R ecente Prassi Internazionale, in Comunicazioni e Studi, vol. III, 1950; B. A. Bayitch
— Interamerican Law o f Fisheries, 1957; Estudios de D erecho Internacional Ma­
rítim o (Homenagem ao Prof. Jo sé Luís A zcárraga), 1968; Douglas M .Joh nston —
T h e International Law o f Fisheries, 1965; Richard A. Falk — Settling Ocean Fishing
Conflicts: The Limits o f Law Reform in a Horizontal Legal Order, in T h e Status
o f Law in International Society, 1970, págs. 540 e segs.; L. F. E. Goldie — T he
Management o f O cean Resources: for Structuring t?ie Maritime Environment, in
T h e Future o f the International Legal Order, edited by Cyril E. Black and Richard
Falk, vol. IV, 1972, págs. 155 e segs.; Evels Peyroux — Les réglemeniations inter-
nationales de protection des phoques, in RGDIP, 1976, ne 1, Janvier-Mars, págs.
104 e segs.; Evelyne PeyrouS — La chasse à la balleine dans le droit international
public actuel, zra RG D IP, Janvier-M ars 1975, n° 1, págs. 92 e segs.; United Nations
Third Conference on the Law o f the sea, Informal Com posite Text from the Sixth
Session, in International Legal Materials, Septem ber, 1977, págs. 1.099 e segs.;
Seyon Brown, Nina W. C ornell, Larry L. Fabian e Edith Brown Weiss — Regim es
para o Oceano, o Espaço E xterior e as Condições Climáticas, 1979; Melquíades
Pinto Paiva — O D ireito do Mar e a Administração dos Recursos Pesqueiros, in
Boletim de Ciências do M ar, n- 55, 1982; Anthony D ’A m ato e Sudhir K. Chopra
— Whales: Their E m erging Right lo Life, in AJIL, Janu ary 1991, vol. 85, ns 1, págs.
21 e segs.; William T . B urke — The New Iniernation al Law o f Fisheries, 1994,
Ernesto J . Rey Caro e N elson D. Marcioni — Evolución de las Pesquerías "en el
D erecho Internacional, 1998. Daniel Vignes, Giuseppe Cataldi e Rafael Casado
Raigón — Le Droit International de la Peche M aritim e, 2000.
2. Pode-se assinalar que o hemisfério norte fo rnece 10 vezes mais em pesca
que o hemisfério sul.
3. E interessante observar que Grotius admitira restrição à liberdade de pesca
no caso de esgotabilidade dos seus recursos.
4. Gross afirma que a tese da inesgotabilidade dos recursos marítimos não se
“ revelou inexata” , e a conservação teria surgido “ porque as técnicas modernas de
exploração, de um lado, e as necessidades aum entadas da Humanidade, de outro
lado, comprometem a repartidão das riquezas marítim as que não é assegurada de
m odo satisfatório pela liberdade de pesca”.

1231
4A. A idcia de conservação já existia entretanto mnito antes disso: a) em 966,
o reí dos anglo-saxões Ethelred II já proibia a venda de filhotes; b) 110 século XVIII
na Inglaterra já existiam normas regulamentando a época da pesca, o tipo de
engenho; c) em 1907 Gifford Pincho! foi o primeiro a propô-la nos EUA; etc.
Segundo O ’Connell já havía debates sobre a conservação dos recursos do mar 11a
primeira metade do século XVII. Em 1902, o Conselho Perm anente para a Explo­
ração do Mar, em Copenhague, reconheceu os riscos de uma superexploração e
da poluição (Lucchini e Voeckel).
5. Esta expressão é quase que ilimitada, não havendo um limite em milhas
alé onde o Estado pode exercer os seus direitos prioritários.
6. E de se salientar que a tese da liberdade de pesca absoluta não é mais
defendida.
7. Entrou em vigor em 1966.
7A. Esta convenção criou a N orlh Pacific Fur Seal Commission, com sede em
Washington. A sua reunião anual é cada vez em urna capital. A Comissão é assistida
por: a) Comité Científico; b) Com ité Administrativo e Financeiro; c) Comité de
Imprensa.
8. Os atos unilaterais têm uma influência considerável no D l do Mar: eles são
“um dos modos de formação de costume internacional" (J. A. Carrillo Salcedo).
9. A mais antiga regulamentação histórica é uma lei colonial de 1811, que
autorizava a detenção de navios que se encontrassem nos limites dos bancos de
pérola da índia e do Ceilão.
10. No golfo Pérsico a regulam entação é costumeira.
11. V. capítulo XLI.
12. Como antecedentes da C onferência de Roma têm sido apontadas confe­
rências internacionais sobre pescaria que se realizaram em : Sables d’Oionne
(1886), Bergen (1898), Estocolmo (1899), Paris (1900).
13. Estes súditos não estão incluídos entre os cinco m em bros, isto é, a Comissão
terá cinco membros e mais os súditos indicados pelas partes.
14. V., sobre conservação dos recursos vivos na zona econôm ica, capítulo Mar
Territorial.
CAPÍTULO XLV1I

NAVIOS1

457 — Definirão; 458 — Classificação; 459 — Navios de guerra;


460 — Navios públicos civis; 461 — Navios privados; 462 — Na­
cionalidade; 463 — Navios em águas interiores estrangeiras; 463A —
Navios privados; 463B — Navios públicos; 464 — Navios em mar
territorial estrangeiro; 464A — Navios privados; 464B — Navios
públicos; 465 — Navios em zona contigua "estrangeira”; 465A —
Navios em zona económica; 466 — Navios em alto-mar.

457. Não é fácil definirmos navio e mesmo as convenções internacio­


nais, como as de Genebra, têm evitado entrar no assunto. Gidel, basean-
do-se em uma definição dada por Valin no seu Comentário à Ordenança
de 1681, declara que a característica do navio é a aptidão para a navegação.
Após esta observação, Gidel dá a seguinte definição: “ O navio de superficie
nâo é somente todo_engenho flutuante, mas todo engenho, quaisquer que
sejam as suas dimensões e sua denominação, apto a se mover nos espaços
marítimos (excluindo-se os outros meios) com o armamento e a equipagem
que lhe são próprios, tendo em vista os serviços que comporta-a industria
a que ele é empregado.”2
Esta definição necessita de duas explicações: a) a primeira delas é que
ela apenas menciona os navios de superficie, urna vez que ela considera
o submarino como estando subordinado á. certas normas especiais, como
a de atravessar o mar territorial estrangeiro na superficie;3 b) a segunda
observaçãQ diz respeito à expressão “apto a se mover nos espaços maríti­
mos” . Gidel escreveu esta definição na sua obra sobre direito do mar. Daí
talvez a origçm do seu esquecimento da navegação fluvial e lacustre. To­
davia, grande'número de autores (Ripert) salienta que a principal carac­
terística do navio é: “navegar normalmente no mar”. As Convenções de
Bruxelas de 1924 (convenção internacional para a unificação de certas

1233
legras em matéria de conhecimento) e de Genebra de 1926 (convenção
sobre contrato <le engajamento de marinheiro) definem navio como sendo
aquela construção destinada “a navegar no mar”. Os autores franceses
(Ripert) se baseiam no aspecto da navegação do mar, urna vez que a
navegação fluvial na França apresenta diferenças em relação à navegação
marítima: a) a equipagem está sujeita a um contraio de trabalho e não
sujeila ao código d t trabalho marítimo; b) o seguro da navegação fluvial
não segue as regras do seguro marítimo, etc.
A legislação brasileira que “regula a execução dos contratos de hipo­
teca de navio” (Decreto na 15.788/22) define o navio como sendo: “toda
construção náutica destinada à navegação de longo curso, de grande ou
pequena cabotagem, apropriada ao transporte marítimo ou fluvial”.3* Ain­
da aqui os doutrinadores têm observado que o diploma legal se esqueceu
da navegação lacustre.
Como se pode observar, qualquer das definições pode ser aceita, desde
que se guardem as observações apresentadas. Entretanto, talvez seja a
melhor definição a que está consagrada no art. 11, da Lei ns 2.180, de
5 /2 / 5 4 : “considera-se embarcação mercante toda construção utilizada
como meio de transporte por água, e destinada à indústria da navegação,
quaisquer que sejam as suas características e lugar de tráfego”.
No DIP a navegação marítima tem maior importância que a fluvial ou
lacustre. Por outro lado, a palavra navio é empregada em sentido amplo
na nossa matéria, isto é, abrangendo os navios propriamente ditos e as
embarcações.4
A Convenção de Genebra e Montego Bay não definem navios. Podemos
afirmar que as ilhas artificiais não são navios a não ser que se encontrem
em processo de deslocamento. A sua tripulação geralmente não é de
marítimo, principalmente as plataformas fixas.
458. A classificação dos navios apresenta uma grande importância para
o nosso estudo, porque p regime jurídico do navio em águas territoriais
estrangeiras e no alto-mar vai depender da categoria a que o navio per­
tencer.
No século XIX já havia distinção entre navios públicos e navios pri­
vados, e tudo indica que o início foi a Declaração de Paris de 1856, que
proibiu a guerra de corso que permitia os navios de comércio se dedicarem
à guerra e, em conseqüência, só poderia ser beligerante o navio de guerra.
A caracterização_ entre navio público e navio privado era fornecida pelo
proprietário. O-Instituto de Dl, em 1898, dividiu os navios em: “marinha
militar” e “marinha mercante”. Devido ao aparecimento das frotas comer­
ciais pertencentes ao Estado, e à importância adquirida pelos navios en­
carregados do serviço público civil, foi abandonada a classificação acima
pelo próprio Instituto, em 1928, para: a) aqueles que exercem um serviço
governamental e não comercial, divididos em navios de guerra e os em­
pregados em um serviço público civil; e b) aqueles que efetuam um serviço

1234
d e c o m é rc io , a b ran g e n d o os d c p ro p rie d a d e do E stad o e o s d e p ro p ried ad e
privada.
Assinala Gidel que as duas classificações do Instiuno <le 1)1 mostram
a transformação ocorrida entre elas, a primeira inspirada na classificação
mais antiga do proprietário do navio, que prevaleceu ainda no início do
século X X , e a segunda, inspirada na atividade do navio. Esta transformação
teria ocorrido em 1910 com as Convenções de Bruxelas sobre abordagem
e de assistência e salvamento marítimos, que estipularam:

“A presente Convenção não se aplica aos navios de guerra e


aos navios do Estado exclusivamente destinados a um serviço
público.”

Levam estas convenções em consideração, conforme se vê, a destinação


do navio. É a natureza do serviço prestado o criterio adotado nos dias
atuais, pela doutrina e pela prática internacional, sendo ainda o consagrado
na Convenção de Genebra de 1958, que equipara os navios pertencentes
ao Estado e destinados ao comércio aos navios de comércio. O mesmo
ocorrendo na Convenção de 1982.
Os navios se classificam dentro deste critério em navioS públicos e
navios privados. Os navios públicos são aqueles destinados a um serviço
de natureza pública e se subdividem em: navios públicos de guerra e navios
públicos civis. Os navios privados sao aqueles destinados a um serviço de
natureza privada.
459. A definição de navio de guerra é dada pelo art. 8® da Convenção
de Genebra sobre alto-mar. “Para os fins dos presentes artigos, a expressão
‘navio de guerra’ designa um navio pertencente à marinha de guerra de
um Estado e possuindo os sinais exteriores distintivos dos navios de guerra
de sua nacionalidade. O comandante deve estar a serviço do Estado, seu
nome deve figurar na lista de oficiais da frota militar e a equipagem deve
ser submetida às regras da disciplina militar.” A Convenção de 1982, no
seu art. 29, mantém o mesmo conceito de navio de guerra.
Esta conceituação é aceita pacificamente pela prática e doutrina in­
ternacionais.'
460. Os navios públicos civis são aqueles que executam um serviço
público de natureza civil, por exemplo: os navios alfandegários, os navios-
faróis, os navios de saúde e os navios que transportam chefe de Estado. A
grande dificuldade na conceituação destes navios é a noção de “serviço
público”, cujo alcance varia de país a país. Diante disso, a Convenção de
Genebra preferiu adotar a expressão “navios do Estado destinados a fins
não comerciais”, repetida na Convenção de 1982. Deverão ser abrangidos
não apenas os de propriedade do Estado, mas ainda os que foretn fretados
ou requisitados por ele.

1235
A G rã -B re ta n h a . n a C o n fe ren cia d e G e n e b r a , tentou e n u m e ra r os
navios p ú blico s civis (navios o ce a n o g rá fico s, navios m eteo ro ló g ico s, navios
para a p ro te ç ã o d e p e sca d a s, e tc .), sem o co n se g u ir.
Algum as o b se rv a ç õ e s devem ser fe ita s em re la çã o aos navios p ú b lico s
civis:
a) A jurisprudência norte-americana consagra a prática de, quando
houver dúvidas, indagar do Estado de que o navio é nacional se ele está
exercendo ou não um serviço público. Este procedimento leva os Estados
estrangeiros a fazerem declarações de que eles executam serviço público
para escapar à jurisdição do Estado (Fedozzi), urna vez que os tribunais
aceitam como válida a referida declaração. Apesar do inconveniente apon­
tado, este procedimento nos parece ser o mais correto, porque impede os
tribunais estrangeiros de julgar os navios públicos civis por causa de um
mal-entendido. E os Estados têm entre si o dever de respeito mútuo.
b) Os navios postais não entram na categoria dos navios públicos civis.
Na prática, eles têm normalmente um aspecto misto: executam ao mesmo
tempo um serviço público e uní serviço comercial. Alguns governos (In­
glaterra, Italia) dão subvenção a companhias particulares para fazerem o
serviço postal.
461. Os navios privados são aqueles destinados às atividades comerciais.
Os navios pertencentes ao Estado, mas destinados às atividades comerciais,
têm sido equiparados aos navios privados.7 Esta foi a orientação da Con­
venção de Genebra .sobre mar territorial.
462. O navio tem uma individualidade, dada pelo nome e nacionali­
dad e. Ele só pode ter uma nacionalidade, que é a indicada pelo pavilhão./A
Cada Estado determina as condições para .um navio ser seu nacional. No
Brasil, o Decreto n g 5.798, de 11-6-1940, declara que será brasileiro o navio
que preencher as seguintes condições: a) “ser propriedade de brasileiro
nato, ou de sociedade ou empresa brasileira, na forma da legislação vigen­
te”; b) “ser inscrito nas capitanias e tripulado de acordo com as leis em
vigor”. A Lei n9 2 .1 8 0 /5 4 estabelece que a sociedade, ou empresa, deverá
ter sede no Brasil e 60% do capital deverão estar nas mãos de brasileiro
nato.8 Esta distinção não tem mais razão de ser, tendo em vista que a Lei
ns 6.192, de 19-12-74. proíbe a distinção-entre brasileiro nato e naturali­
zado. Entretanto permanece a restrição consagrada na Constituição. Con­
tudo, a Lei n" 9.432, de 8-1-97 estabelece que o capital da empresa não
precisa mais ser de propriedade de brasileiro. Na embarcação brasileira o
comandante, o chefe de máquinas e 2 / 3 da tripulação têm que ser brasi­
leiros. As embarcações estrangeiras só farão transporte de cabotagem quan­
do afretadas por empresas brasileiras. A Emenda Constitucional ns 7 de
1995 deu nova redação ao art. 178 da Consütuição e admite que o “trans­
porte de mercadorias na cabotagem e a navegação interior poderão ser
feitas por embarcações estrangeiras”, conforme regulamentação a ser es­
tabelecida-em lei. A Lei 9.432 de 1997 regulamentou o artigo 178 da
Constituição Federal. Estabelece o diploma lega) que a navegação do longo
curso está abena à embarcação de qualquer país. A navegação interior e
de cabotagem (não existe mais a grande e pequena cabotagem) está aberta
ã embarcações brasileiras. Esias são: a) as pertencentes à empresa brasileira
(é a que tem sede e foi constituída 110 Brasil; b) ü pertencente a pessoa
física no Brasil; c) podem também arvorar bandeira brasileira as embar­
cações estrangeiras afretadas a casco nu (o armador é que vai aprestá-la)
à empresa ou pessoa física brasileira. Este último caso ocasiona o que se
denomina de supressão provisória de bandeira do país de origem.
A nacionalidade decorre do porto de registro9 do navio, que é com­
provada pelos papéis de bordo.10 O sinal exterior da nacionalidade é o
pavilhão." O navio que viajar co m m ais de um pavilhão é considerado
pelas Convenções de Genebra sobre alto-mar e a de 1982 como um navio
sem nacionalidade. A obrigação que os navios têm de arvorar o pavilhão
é uma decorrência da utilização dós mares por todos os Estados, uma vez
que ele permite a identificação do navio e, em conseqüência, se saber a
que jurisdição ele se encontra submetido.
A nacionalidade do navio tem uma grande importância: a) ele será
protegido pelo seu Estado nacional e em conseqüência, quando no estran­
geiro, Jará apelo à representação diplomática e consular do seu Estado
nacional; b) os tratados relativos à navegação, concluídos pelo seu Estado
nacional, são aplicados a ele.
Meyers declara que qualquer Estado pode exercer a sua autoridade
sobre um navio sem nacionalidade, mas que os armadores, tripulantes,
etc., não cometem nenhum ilícito pelo simples fato de o seu navio não
ter nacionalidade.
A Convenção de Genebra sobre alto-mar fixava uma série de normas
sobre nacionalidade dos navios. Nos seus arts. 5B e 6S ela determina que
compete a cada Estado fixar as condições para a outorga da sua naciona­
lidade aos navios. Os navios terão a nacionalidade do Estado cujo pavilhão
eles arvoram. Os Estados devem conceder documentos de nacionalidade
a seus navios. O navio que arvorar mais de um pavilhão é considerado um
navio sem nacionalidade. O pavilhão não pode ser “mudado no curso de
uma viagem 011 de uma escala, salvo no caso de transferência real da
propriedade ou de mudança de matrícula".
A principal norma sobre este assunto da Convenção acima citada é a
seguinte:

“Deve existir um elo substancial12 entre o Estado e o navio; o


Estado deve notadamente exercer efetivamente sua jurisdição
e seu controle nos domínios técnico, administrativo e social,
nos navios arvorando seu pavilhão.”

A Convenção aplicou à nacionalidade dos navios a efetividade que já


havia sido consagrada na jurisprudência internacional em relação ao in­

1237
divíduo.11 Esta regra foi incluída como uma reação aos denominados pa-
vilhões de complacência ou bandeiras de conveniência, que surgiram após
a Ia Guerra Mundial.l:<AEstes países formam a denominada frota do Pan-
libhonco (Panamá, Libéria. Honduras e Costa Rica).14 Atualmente estão
oa-meaiaa-4^acãP^&alaaii)a v Jti^m üdas^C lum ^-Ij^JJaJananiá, Omã,
Cinyapnra e Filipinas. Tais Estados permitem que navios sem possuírem
qualquer elemento nacional arvorem as suas bandeiras. São Estados que
tinham pequena frota e cujas leis de navegação eram bastante liberais,1’
o que estimulou os armadores estrangeiros a registrar os navios com a sua
nacionalidade. Os armadores gregos e norte-americanosIfi são os que mais
se utilizam destas bandeiras. O governo japonês autorizou oficialmente os
seus armadores a usar bandeira de conveniência. Os EUA estimulam os-,
pavilhões de complacência para que a sua frota fique competitiva; 4 /5 dos
navios norte-americanos estão registrados no exterior. Cerca de 70% das
frotas so b bandeira de conveniência p e r te n c e m aos italianos, americanos
e gregos. A maior parte dos navios norte-americanos são petroleiros.
Qs-.E&tados_acimamencionados..dão o seu pavilhãp...a.Q.s.a3 yj-Os_dÊS|es
.armadores tendo em_ vista. que isto lhes traz algumas vantagens: .corno
capital e experiência técnica estrangeiros. Por outro lado, eles cobram

A luta contra as bandeiras de conveniência prende-se aos seguintes


motivos: a) sindicatos de marítimos (principalmente os norte-americanos)
protestam contra os baixos padrões de trabalho nesses navios; b) acusam
ainda que diminui a oportunidade de trabalho para os marítimos do Estado
de que o navio deveria ser nacional; c) os armadores afirmam que eles
fazem uma concorrência desleal, uma vez qye nestes Estados os ônus fiscais
são muito mais baixos; d) alega-se que por causa delas há um maior número
de navios do que as necessidades mundiais.
Os defensores do Panlibhonco alegam que a nacionalidade dada aos
navios é assunto da competência exclusiva do Estado e que eles é¿ que
permitiram a superação da crise no transporte marítimo que hoje após a
2- Guerra Mundial com a concessão de facilidades fiscais.1'
Cabe-nos agora apreciar o alcance do dispositivo da Convenção de
Genebra. O elo substancial teria a vantagem de fazer com que o Estado
cujo. pavilhão o navio arvora exerça um controle e jurisdição sobre ele.
Ora, isto só ocorrerá se o navio possuir um verdadeiro interesse "para o
Estado, que só existirá quando o navio tiver algum elemento nacional.lt!
O elo substancial significaria que o navio deve ter algum elemento nacional
do Estado cujo pavilhão arvora, com a finalidade de que o Estado exerça
nele a sua jurisdição e controle. E o princípio da efetividade.19 Em 1895
e 1896 o Instituto do Dl já mencionava a necessidade de um elo efetivo
entre o Estado e o navio cuja bandeira ele arvora. Anteriormente, em 1854,
o Ministro da Marinha da França negava à Suíça o direito de arvorar o
pavilhão francês pela ausência de um elo real.
Alguns amores (Jean-Marc Roux) chegam a considerar que um país
esirangeiro pode se recusar a aplicar em relação a um navio a lei do seu
país nacional caso não haja um elo substancial.
Na verdade, o Estado ainda conserva as mãos livres para dar a sua
nacionalidade aos navios. Tal fato decorre da circunstância de que um
Estado não pode deixar de reconhecer a nacionalidade de um navio quan­
do o seu Estado nacional exerce jurisdição sobre ele. Se fosse possível a
não aceitação de unia nacionalidade, estaria aberta a porta a um sem-nú­
mero de abusos. E verdade que isto lira qualquer efeito à Convenção de
Genebra neste particular, mas se for adotada aquela interpretação, o navio
acabaria apátrida. A Convenção de Genebra representa a tendência do Dl
neste setor e a verificação do elo substancial terá grande valor nos tribunais
internacionais, mas quase nenhum nos tribunais nacionais.
E interessante assinalar que alguns navios têm navegado apenas com
o pavilhão da ONU e, em outros casos, com o seu pavilhão nacional e
mais o da ONU, arvorando assim dois pavilhões. E o que ocorreu com
alguns navios que transportaram tropas da Força de Emergência das Nações
Unidas para Suez (Seyersted). Tem havido aceitação de que a ONU e as
organizações especializadas podem registrar as suas embarcações em um
Estado cuja bandeira será arvorada e que ajurisdição é deste Estado (Hugo
Llanos Mansilla). Também têm existido casos em que o navio usa apenas
a bandeira da organização internacional.
Segundo Max Gounelle foi em 1962, no Irã Ocidental, que a ONU
teve a sua primeira marinha formada por cinco navios com equipagem e
comandantes paquistaneses e visavam fazer patrulha para evitar a propa-
gàção de uma epidemia de cólera.
Reproduzimos acima as normas da convenção de Genebra e as discus­
sões em tom o delas por duas razões: a primeira é que a Convenção de
Montego Bay fez apenas modificações superficiais nesta matéria e a segunda
é que esta convenção, sendo recente, ainda não deu margem para um
debate tão amplo quanto a anterior.
A convenção de 1982 determina que deverá “existir um vínculo subs­
tancial” entre o Estado e o navio cuja nacionalidade ele possui. Cabe à
legislação do Estado fixar os requisitos para a concessão de sua nacionali­
dade. O Estado fornecerá os documentos dos navios. Pode-se mesmo dizer
que como uma reação às bandeiras de conveniências a cilada convenção
determina: a) o “Estado exercerá de modo efetivo sua jurisdição e controle
em questões administrativas, técnicas e sociais sobre os navios que arvorem
seu pavilhão”; b) o Estado manterá um registro com as características do
navio; c) o Estado exercerá a sua jurisdição sobre o navio; d) tomará iodas
as medidas para garantir a segurança no m ar como verificar a construção
e condições de navegabilidade do navio, a utilização de sinais, fazer vistorias
periódicas, que a tripulação e oficiais conheçam e cumpram os regulamen­
tos internacionais; etc.

1239
De qualquer modo, estas exigências não são aplicáveis aos navios que
arvorem pavilhão de organismos internacionais.
T f . n sirio o b s e r v a d o q u e 110 tocante aos pavilhões (le complacência a
tendência atual é de: a) o navio ter uma e apenas uma nacionalidade: b)
haver a possibilidade de se identificar o proprietário: d o Estado qne dá
a bandeira ter uma administração marítima capaz de fazer os navios cum­
p r i r e m as suas normas: d) participação de nacionais do Estado que dá a
nacionalidade na equipattem. Afirma-se que qs países de bandeira .de.con-

Em 1986 foi concluída convenção, sob os auspícios da ONU, acerca


cte registro de navios, visando intensificar o controle do Estado da bandeira
que deve exercer jurisdição sobre ele. O navio deve respeitar a legisla‘ção
do Estado. Este deve promulgar leis sobre a propriedade dos navios e
promover a participação de seus nacionais na citada propriedade. Regu­
lamenta ainda os dados que devem constar do registro: a) nacionalidade
do proprietário; b) as características técnicas do navio; c) nome da cons­
trutora; etc.
Em 1921. a Declaração de Barcelona reconheceu aos Estados sem
litoral de terem navios com a sua handeira.
E comum os Estados criarem para os “tripulantes" regimes simplifica­
dos: a França faz o registro nas ilhas Kerguelen; a Alemanha em Helgoland;
a Grã-Bretanha na ilha de Mann e a Espanha nas Canárias; etc., vez que
aí não se aplica a legislação de trabalho do Estado. As ilhas Kerguelen,
localizadas ao sul do O. Índico, integram as “terras austrais e antárticas
francesas”; em 1996 passaram a admitir a matrícula de um certo tipo de
navios. É admitido que estes podem ter lima proporção de marinheiros
estrangeiros como filipinos, hindus, etc. Visa diminuir as custas da explo­
ração de navios vez que nestas ilhas não são aplicadas as convenções
coletivas do trabalho francês.
Em relação ao transporte marítimo, os armadores formaram associa­
ções. A UNCTAD procura aumentar a participação do Terceiro Mundo
no transporte-marinho. As associações visam racionalizar a concorrência
e aumentar a eficácia do transporte.
463A. Os navios privados estão submetidos às leis do-Estado a que
pertencem as águas interiores onde eles se encoritram. Este princípio
remonta aos séculos XVII e XVIII. O Estado territorial tem, em relação ao
navio em suas águas interiores, deveres, como o de dar proteção ao navio,
que vem sendo consagrado desde o século X IX , quando surgiu com a
prática inglesa e norte-americana.
As leis do Estado se aplicam ao navio, como as de polícia aduaneira,
sanitária, processuais (ex.: ação intentada em nome do navio), leis fiscais,

Os navios privados gozam da igualdade de tratamento quando estive­


rem em águas interiores estrangeiras.
A jurisdição civil fio Estado costeiro, em principio, se afirma sobre o
navio privado estrangeiro, tendo a doutrina afirmado que a jurisdição do
Estado territorial não deverá prevalecer quando o litígio for entre dois
navios estrangeiros que têm a mesma nacionalidade. Quanto aos litigios
de natureza civil entre individuos que fazem parle do navio, a orientação
é diversa, mas lern predominado na prálica a que consagra a “incompe­
tência dos tribunais do Estado costeiro” .21
No aspecto penal, o Estado costeiro tem competência plena, com
exceção das infrações disciplinares da tripulação ocorridas a bordo, que
ficam sujeitas à jurisdição do Estado de que o navio é nacional. A compe­
tência do Estado em matéria criminal decorre da territorialidade da lei
penal. Esta competência muitas vezes tem deixado de ser exercida sobre
crimes ocorridos a bordo, em virtude de fatores políticos. No Brasil, temos
vários casos em que a competência foi exercida de modo absoluto.
Diversos sistemas têm sido empregados acerca da competencia penal'
a respeito dos crimes ocorridos a bordo: a) sistema dinamarqués — todos
os delitos penais estão sujeitos à jurisdição do Estado costeiro, excluindo
as medidas disciplinares; b) sistema francês — o Estado só tem jurisdição
se o autor ou vítima não faz parte da tripulação do navio ou quando o
comandante pede a intervenção do Estado costeiro, ou quando o crime
perturba a paz do Estado costeiro;21A c) sistema inglês — aplica o sistema
francês em relação aos navios estrangeiros nos seus portos; mas, a respeito
dos navios ingleses em portos estrangeiros, afirma que deveria haver imu­
nidade de jurisdição; d} o sistema do Código Bustamante é semelhante ao
francês, o Estado costeiro não tem jurisdição sobre os crimes que não
afetem em nada o Estado costeiro (o Código Bustamante foi ratificado
pelo Brasil, mas ele só é aplicado entre Estados americanos); é) regula­
mento do Instituto de Dl — o Estado costeiro afirma a sua jurisdição sobre
os crimes, com exceção dos atos referentes à disciplina.
Existe, entretanto, uma categoria de navio privado que goza de imu­
nidade de jurisdição: os navios em desgraça, ou os navios que entram em
um porto estrangeiro em virtude do mau tempo. Esta regra de imunidade
já está consagrada em Vattel e em decisão de Marshall.22 A jurisprudência
afirmou que deve ser “desgraça urgente", uma “necessidade grave” (Lord
Stowell, no caso “The Eleanor”, em 1809), e posteriormente foi acrescen­
tado que a desgraça (leve “produzir no marinheiro experimentado uma
bem fundamentada apreensão pela perda do navio, da carga ou das vidas
da tripulação” (caso “The New York". 1818).
A imunidade se refere apenas ao próprio ato de entrada e à posse de
mercadorias proibidas pelo Estado costeiro. Esta regra também se aplica
às aeronaves privadas.
463B. O estudo dos navios públicos deve ser dividido em navios de
guerra e navios públicos civis.
Os navios de guerra gozam de imunidade em relação ao Estado costeiro
e se encontram submetidos apenas à jurisdição do Estado do seu pavilhão.

1241
O fundamento desta imunidade era. dada pela teoria da extraterritoriali-
dade, isto é, estes navios eran) considerados como estando fora do Estado
costeiro. Esta teoria é uma ficção e iem sido abandonada,-1 por diversas
razões: a) se o navio de guerra estrangeiro estivesse extraterritório do
Estado costeiro, não poderia o Estado costeiro impedir que se realizassem
nesses navios certos atos de sotferãnia; todavia, a legislação de diversos
países (França, Itália, Holanda) impede que se realizem execuções de
condenados à morte nos navios de guerra estrangeiros em seus portos; b)
ao mesmo tempo, o Estado pode exigir, conforme foi consagrado na prática
internacional, a entrega de criminosos comuns que se refugiarem a bordo,
independentemente de um tratado ou processo de extradição, ao contrário
do que ocorreria se o indivíduo estivesse em território estrangeiro; c) é
também regra geral os comandantes, apesar de não existir uma obrigação,
entregarem ao Estado os indivíduos que não pertencem à tripulação, mas
que tenham cometido crimes a borde; tal crime não é tido como tendo
sido realizado fora do território do Estado costeiro; d) os navios de guerra
estão obrigados a respeitar as leis e regulamentos (p. ex.: sobre saúde) do
Estado costeiro. O fundamento das imunidades do navio de guerra é o
seu caráter representativo e o respeito mútuo dos Estados. O navio de
guerra é um órgão do seu Estado nacional.
O princípio de que os navios de guerra gozam de imunidade só foi
admitido no início do século XIX, lendo- sido reconhecido nos EUA pela
primeira vez em 1812, no caso do “The Schooner Exchange v. MacFad-
don”.2SA
Os navios de guerra possuem imunidade de seqüestro, arresto, ou
qualquer detenção, mesmo que seja tomada por uma autoridade judicial.
Qualquer reclamação contra eles deverá ser feita no seu Estado nacional.
Têm imunidade em matéria de polícia.
Eles têm imunidade de jurisdição criminal. Esta imunidade é estabe­
lecida em benefício da sua tripulação. Os crimes cometidos a bordo pela
tripulação estão sujeitos à jurisdição do Estado de que o navio é nacional.
Os atos delituosos praticados pela equipagem fora de bordo do navio têm
um regime diferente. O membro da equipagem que se encoiura fora de
bordo a título particular e comete algum ato delituoso está sujeito à juris­
dição penal do Estado costeiro onde se encontra.2,1 Se os atos delituosos
forem cometidos pela equipagem fora de bordo, mas estando a serviço
comandado, a jurisdição é do Estado do pavilhão do navio.
A imunidade de jurisdição civil da equipagem tem sido admitida quan­
do os atos são realizados no desempenho de um “ serviço público”; todavia,
quando isto não ocorre, as pessoas lesadas podem promover as suas ações
contra os membros da equipagem.
O navio de guerra pode conceder asilo diplomático a criminosos po­
líticos.20
No caso de havcr desertores do navio de guerra, o Estado costeiro
deverá entregá-los ao comandante do navio.'0 Esta entrega tem sido enca­
rada como sendo unía simples cortesia e não uma obrigação do Estado
costeiro. Entretanto, só há obrigatoriedade da entrega dos desertores se
houver tratado consagrando isto. Todavia, em hipótese alguma poderá o
comandante do navio exercer atos de autoridade em térra, como, por
exemplo, ir procurar o desertor, porque estaria violando a soberanía do
Estado costeiro. A prática da entrega dos desertores remonta ao período
medieval e se fundamenta na cooperação internacional, porque em certos
casos a deserção pode trazer graves prejuízos aos navios. Estes principios
sobre a deserção em navios de guerra são também aplicados em relação
à deserção em navios privados.
O Decreto n* 56.515, de 1965, determina que os navios de guerra em
missão comercial não gozam de imunidades e privilegios. Finalmente, este
decreto estipula que a entrada de navio de guerra estrangeiro em visita a
águas territoriais (águas interiores e mar territorial) só pode ser feita após
uma notificação prévia às autoridades brasileiras. O número de navios de
guerra de um mesmo pais em águas brasileiras que pode aí ficar ao mesmo
tempo é de três, a não ser que haja uma autorização especial permitindo
maior número. O decreto admite a entrada em águas territoriais de navios
de guerra sem notificação previa no caso de arribada “por motivo de avaria,
mau tempo ou outra causa de emergência”.
Finalmente, é de se assinalar que os navios de guerra e sua tripulação
gozam de imunidade de jurisdição mesmo quando são praticados atos
ilícitos. Assim em 1981 a Suécia expulsou um submarino soviético que
violara as suas águas territoriais. O apresamento do navio de guerra nor­
te-americano “Pueblo” pela Coréia do Norte tem sido considerado uma
violação do Dl (Ingrid Delupis).
Os navios públicos civis também gozam de imunidade e o seu funda­
mento é similar ao dos navios de guerra: é a sua destinação e execução
de um serviço‘público. Eles representam o Estado. Estes navios gozam de
imunidades que se situam entre as dos navios de guerra e o navio privado.
Existe uma tendência para a assimilação completa entre os navios de guerra
e os navios públicos civis. Entretanto, estes não podem conceder asilo
diplomático. A prática internacional é profundamente variada a respeito
destes navios, e em regra geral eles gòzam das imunidades dos navios de
guerra.
Lucchini e Voeckel fazem uma observação bastante interessante ao
assinalarem que as normas aplicadas aos navios surgiram no século XIX,
quando a sociedade internacional era homogênea, o que não ocorre mais
hoje, daí não se poder afirmar com segurança que tais regras, principal­
mente as de jurisdição penal, sejam sempre aplicadas.
464A. O Estado costeiro tem competência bem mais restrita do que
nas águas interiores sobre os navios privados estrangeiros no seu mar

1243
te rrito ria l. cin virtude do d ir e ilo d e passagem in o ce n te , cjue visa d efe n d e r
i lib e rd a d e d e navegação. O ía * e sta ú llim a seria e n lra v a d a se o Estado
c o s te iro livesse c o m p e tê n c ia s ím iiio am p ias. O E stad o c o s te ir o , se tivesse
d ireito s ilim itad o s, acab aria p o r a n iq u ila r o d ireito d e p assag em in o ce n te .
A Convenção de 1982 estabelece as seguintes normas a respeito da
jurisdição civil: a) o Estado costeiro não deve parar nem desviar da rola
um navio que passa no seu mar territorial para exercer sobre uma pessoa
que se encontra a bordo a sua jurisdição civil; b) “o Estado costeiro não
pode lomar, em relação ao navio, medidas de execução ou medidas con­
servatorias em materia civil, a não ser que estas medidas sejam tomadas
em virtude de obrigações assumidas ou de» responsabilidades incorridas
pelo navio", ao navegar ñas aguas do Estado costeiro; c) entretanto, me­
didas de execução e conservatorias podem ser tomadas em relação aos
navios que provêm das aguas inferiores do Estado ou que estacionam no
seu mar ten'iiorial.
Quanto ã jurisdição penal, a convenção acima mencionada também
fixa diversas normas: a) “ajurisdição penal do Estado costeiro não deveria
ser exercida a bordo de um navio estrangeiro passando no m ar territorial,
para a prisão de uma pessoa ou realizar investigação por causa de uma
infração penal, cometida a bordo do navio quando da sua passagem”, a
não ser quando: 1 — as conseqüências da infração atingem o Estado
costeiro: 2 — se a infração viola a paz pública do Estado ou a boa ordem
no mar territorial; 3 — se o cônsul do Estado nacional do navio ou o
comandante do navio solicitam o auxílio das autoridades do Estado cos­
teiro’ 4 — se as medidas mencionadas acima são necessárias para a repres­
são do tráfico ilítico de estupefacientes;27.^ o Estado costeiro pode efetuar
prisões e atos de instrução quando o navio estrangeiro provém das águas
interiores; c) o Estado costeiro deve avisar ao cônsul do Estado de que o
navio é nacional, quando o comandante pedir, antes de executar as me­
didas acima mencionadas; d) as autoridades do Estado, ao efetuarem pri­
sões. devem levar em consideração os interesses da navegação; e) “ o Estado
costeiro não pode tomar qualquer medida a bordo de um navio estrangeiro
que passa no mar territorial, tendo por finalidade a realização de uma
detenção ou atos de instrução em razão de uma infração penal cometida
antes da entrada do navio no m ar territorial, se o navio, proveniente de
um porto estrangeiro, apenas passa no mar territorial sem entrar nas águas
interiores’ .
O Estado pode tomar qualquer medida com fundamento em suas leis
“para proceder a detenções e investigação a bordo de um navio estrangeiro
que passe no mar territorial procedente das águas interiores”. As autori­
dades focais deverão levar em consideração os interesses da navegação.
464B. Quanto aos navios de guerra, a Convenção de 1982 não traça
normas, apenas salientando que eles deverão respeitar as leis do Estado
costeiro sobre o direito de passagem inocente. Caso isto não seja feito, o
Eslaclo cosleiro pode pedir a sua saida do mar territorial.''’* Se o navio de
guerra goza de imunidades ñas aguas interiores (onde o Estado costeiro
tem soberania mais completa), coin muito mais razão e pelo mesnio fun­
damento ele as possui no mar territorial. Aplica-se a eles o determinado
no Decreto n- 56.515, de 1965, de que os navios de guerra em missão
comercial não gozam de imunidades e privilégios. Qualquer dano ou
prejuízo causado por navio de guerra será de responsabilidade do Estado.
Quanto aos navios públicos civis, aplicam-se as normas já vistas para a
passagem inocente (v. capítulo Mar Territorial) e as normas aqui mencio­
nadas para os navios de guerra. Pode-se dizer que eles conservam os seus
privilégios e-nnunidades.
A Corle de Apelação da Virginia, em 2000, estendeu o principio de
imunidade dos navios de guerra aos seus destroços. Foi aplicada esta decisão
a duas fragatas, “Juno” e “La Galga”, que estavam no mar territorial.
465. Os navios privados estrangeiros na zona contígua só estão sujeitos
aos direitos que o Estado costeiro tem nesta zona (v. capítulo Alto-mar).
Os navios públicos estrangeiros conservam os seus privilégios e imunidades.
465A. Os navios na zona econômica não têm o seu regime jurídico
fixado na convenção de 1982. Pode-se assinalar que os navios públicos de
guerra e civis conservam os seus privilégios e imunidades, estando sujeitos
à jurisdição de seu Estado nacional.
Quanto aos navios privados, eles estão sujeitos exclusivamente ao seu
Estado nacional. Entretanto, se houver violação dos direitos do Estado
costeiro ña zona económica, este poderá detê-los (ex.: navios de pesca),
mas deverá liberá-los rapidamente, uma vez paga a multa. Pode-se dizer
que na zona econômica a navegação tem um regime jurídico muito mais
próximo daquele do alto-mar do que o do mar territorial.
466. Os navios em alto-mar encontram-se sujeitos àjurisdição do Estado
cujo pavilhão arvoram.29 Esta norm a se aplica a todos os navios. Diversas
teorías foram elaboradas para explicar àjurisdição do Estado neste caso.
A teoria do “jus protectionis”, defendida por Higgins, afirma que o Estado
exerce uma soberania pessoal, em virtude de os proprietários do navio
terem a nacionalidade do Estado. Esta teoria não explicaria os casos em
que •© proprietário do navio fosse apátrida, ou ainda quando os proprie-
- lários tivessem nacionalidade diferente da do navio.
A teoria da territorialidade do navio, defendida por inúmeros doutri-
. nadores (Wolgast, Albert Zorfi), foi a que teve maior aceitação. Ela surgiu
•ha segunda metade do século XVIII e foi defendida pela Prússia quando
de um litígio com a Inglaterra.30 O navio é considerado o território ílu-
. tuante do Es’tado. Ela foi consagrada na jurisprudência norte-americana e
•na jurisprudência da CPJI (caso Lotus). Esta teoria se encontra sujeita a
uma série de críticas: a) se o navio fosse território não estaria sujeito ao
direito de revista e aproximação; b) ele, em águas territoriais estrangeiras,
não estaria sujeito àjurisdição do Estado costeiro; t) em tempo de guerra,

1245
o contrabando de guerra pode ser apreendido em um navio neutro, o que
já não ocorre lio verdadeiro território estatal; d) se fosse território, ele
teria mar territorial e soberanía no espaço aéreo sobrejacente, etc. Diante
destas inúineras críticas, a concepção acima tem sido abandonada. D.
Carreau, entretanto, escreve que os navios continuam a ser assimilados de
fato a territorio flutuante, apesar de não o serem no direito.
Podemos, depois de expomios algumas das teorias existentes, concluir
que a melhor é a teoria defendida por Rolando Quadri, que não recorre
a qualquer ficção para explicar a jurisdição do Estado sobre um navio seu
nacional em alto-mar. Sustenta o intemacionalista italiano que o DI Geral
atribui ao Estado um “poder de gpvemo” sobre os elementos da comuni­
dade que se encontram em territorio “nullius” (ou, para nós, “res com-
munes”, mas de qualquer modo território que não está sujeito ã jurisdição
exclusiva do Estado). Este poder é “ absoluto e exclusivo”, e “ independente
da qualidade das pessoas”.
Entretanto, esta teoria não seria válida para os navios de bandeira de
conveniência, vez que o Estado cuja bandeira eles arvoram não tem ele­
mento da comunidade estatal no navio. Dentro desta orientação de Quadri
podemos assinalar que o Estado exerce jurisdição sobre um navio seu
nacional em alto-mar em virtude de uma norma internacional que lhe dá
este direito, que na verdade é um dever.
■; Os navios públicos gozam de uma completa imunidade de jurisdição
■ em alto-mar. Entretanto, os navios privados sofrem algumas restrições ao
j princípio de só estarem sujeitos à sua jurisdição nacional, como o de direito
| de revista e aproximação, etc.31
| Em caso de abalroamento entre navios de nacionalidade diferente, a
responsabilidade penal ou disciplinar do capitão ou de qualquer membro
da tripulação só pode ser apurada pelas autoridades do Estado do pavilhão
ou do Estado de que essas pessoas são nacionais. O “brevet” de comando
ou certificado de capacidade só podem ser retirados pelo Estado que os
conceder. “Nenhuma apreensão ou detenção do navio pode ser ordenada,
mesmo como medida de instrução, por autoridades diferentes das do
Estado do pavilhão.”32
NOTAS
i. (V. as obras de 0 ] M arítimo citadas nos capítulos anteriores): Claudio
Bakloni — Les Navires cíe Guerre dans les eaux territoriales c'trangéres. in RdC,
1938, vol. III. t. 65, págs. 189 e segs.; Ju lien Le Clére — Les Mesures Coerritives
sur les Navires de Commerce Etrangers, 1949; Michcl Dendias — Sur la Théorie
de Territorialité des navires de com m erce, in Mélanges en l'h on n eu r de Gilbert
Gidel, 1961; Prospero Fedozzi — La Condition Juridique des Navires de Com­
m erce, in RdC. 1925. vol. V, t. 10, págs. 5 e segs.; A. Pearce Higgins — Le Régime
Jurid iqne des Navires de Com m erce, in RdC, 1929, vol. V. i. 30, págs. 5 e segs.;
Rolando Quadri — Le Navi Prívate nel Diritto Internazionale, 1939; G. E. do
Nascimento e Silva — Deserção de Tripulantes, in BSBDI. janeiro-dezem bro, 1954.
n9s 10 e 20; Francisco de Assis T eixeira Mendes — Bandeiras de Conveniencia,
’ Separata do Boletim FRONAPE n9 133; Jean-M arc Roux — Les Pavillons de Com-
plaisance, 1961; Boleslaw Boczek — Flags o f Convenience — An International
Legal Study, 1962; Maria del Carmen de Veses — La Nacionalidad de Jas Naves,
Los Pabellones de Complacencia y el Principio de Efectividad, in Estudios de
D erecho Internacional Marítimo, 1963, págs. 143 e segs.; Meyers — T h e Nationalitv
of Ships, 1967; OCDE — F lag so f Convenience 1971 (estudo); Pedro Calmon Filho
— Posição da armação brasileira diante do problema internacional das “bandeiras
de conveniencia”, 1972 (parecer); François-Michel Fay — La Nationalité des Na-
vires en Tem ps de Paix, in RGDIP, Oclober-Décem bre, 1973, n9 4, págs. 1.000 e
segs.; Plínio Manca — Com menot alie Convenzioni Internazionali Maritime, 3
vols.: 1974/1975; Michel Koulouris — Les Aspects du Droil International en Ma-
liére des Transports Maritimes lnternationau x, 1973; United Nations Third Con­
ference on the Law o f the Sea: Inform al Composite Text from the Sixth Session,
in International Legal Materials, Sep tem ber 1977, págs. 1.099 e segs.; Nagendra-
S in gh — Maritime Fiag and Internationa) Law, 1978; E b ere Osick — Flags of
Convenience Vessels; Recent Developm enls, m AJIL, O ctober 1979, vol. 73, n9 4,
págs. 604 e segs.; Ingrid Delupis — Foreign Warships and Immunity for Espionage,
in AJIL, Janu ary 1984, vol. 78, n9 1, págs. 53 e segs.; So cieté Française pour le
Droit International —; colloque de toulorle navire en droit international, 1992.
Luisa Vierucci — Le Statut Jurid ique des Navires de Guerre ayan\ Coulé dans les
Eaux Étrangéres: le Cas des Fregates Espagnoles “Ju n o ” e “ La Galga"” Retrouvees
au Large des Cotes des Etats Unis, “ in ” RGDIP 105/2001/3, pgs. 705 e segs.
2. A palavra “indústria” é utilizada no seu sentido latino de atividade em
geral.
3. Em regra geral o submarino militar tem o mesmo tratam ento que o navio
de guerra.
3A. O Decreto n 9 76.401, de 8-10-75, define: “de grande cabotagem — entre
portos brasileiros e entre estes e portos da Argentina, do LJruguai, das Guianas,
das Antilhas e da Costa Leste da América Central, excluídos os portos de Porto
Rico e Ilhas Virgens... de pequena cabotagem — entre portos brasileiros, não se
afastando as embarcações mais de 26 milhas da costa e fazendo escala em portos
cuja distância não exceda 250 milhas. Considera-se também pequena cabotagem
a navegação realizada com fins com erciais entre a costa brasileira e as ilhas oceâ­
nicas, os terminais e as plataformas existentes na plataforma subm arina”. Atual­
m ente fala-se em cabotagem e grande cabotagem.

1247
4. Mugo Sim as co n sid era em barcação torla co n stru ção destinada a c o rre r so b re
as aguas, re s e ñ a n d o a paiavra navio para a e m b a rc a çã o utilizada na ind ústria da
navegação.
5. A definição acim a é baseada na Convenção de Haia de 1907, “ relativa à
transformação de navios de comércio em navios de guerra”, cujos artigos estalle-,
lecem os seguintes requisitos para que um navio seja considerado de guerra: a)
sinais externos dos navios de guerra de sua nacionalidade; b) com andante da
marinha de guerra; c) equipagem submetida à disciplina militar.
6. E comum que esta subvenção seja dada com a condição de que tais navios
sejam colocados à disposição dos governos em tem po de guerra. Outras vezes, eles
são construídos de m odo a possibilitar a sua transform ação em navios de guerra
rapidamente. Em tem po de guerra durante longo período (século X I X ) , excluiu-se
o direito de presa dos navios postais, o que acentuava o seu aspecto de navio
público, uma vez que o direito de presa se exerce em relação à propriedade privada
no mar. Entretanto, nos dias de hoje não existe mais tal regra e mesmo na guerra •
eles são assimilados aos navios privados.
7. No início, após a l 9 Guerra Mundial, a jurisprudência anglo-am ericana os
equiparou aos navios públicos. Entretanto, a partir da Convenção de Bruxelas de
1926, para a unificação de certas regras con cern entes às imunidades dos navios
de Estado, eles foram equiparados aos navios privados. Se assim não fosse, eles
teriam grandes vantagens sobre os navios de com ércio de propriedade privada.
Os EUA, a Grã-Bretanha e a Alemanha, durante certo tempo, reconheceram
imunidades a estes navios, sendo que a França, Bélgica e Itália nunca reconheceram
estas imunidades. A URSS é defensora da concessão de imunidades a estes navios.
7A. A O rdenança sobre Navegação de Cromwell de 1651 estabelecia que a
nacionalidade inglesa era dada aos navios construídos na Inglaterra, com arma­
dores ingleses e que a maioria da equipagem fosse inglesa.
8. A Constituição de 1967 reservava a navegação de cabotagem aos navios
nacionais, “salvo caso de necessidade pública”, e determinava: “Os proprietários,
armadores e com andantes de navios nacionais, assim com o dois terços, pelo menos,
dos seus tripulantes, devem ser brasileiros natos” (art. 165). As mesmas norm as
estão contidas no art. 173 da Constituição de 1969. Esta, entretanto, abrindo as
portas para a desnacionalização da pesca, declara que os barcos de pesca não estão
obrigados a ter proprietários, armadores, com andantes e 2/3 dos tripulantes bra­
sileiros natos. O D ecreto 68.359 de 1-4-71 perm ite que embarcações estrangeiras
arrendadas a pessoas jurídicas brasileiras pesquem nas zonas de 100 milhas pró­
ximas ã costa. O registro de propriedade de em barcações de pesca será dado a
brasileiros natos e naturalizados ou a sociedades organizadas no país. Tem-se
entendido, infelizm ente, que estas sociedades não estão sujeitas a ter 60% do
capita! nas mãos de brasileiro nato.
9. Porto de registro é o local do registro do navio, mas que não necessita
propriamente de ser um porto (v. capítulo X L V ).
10. A prova da nacionalidade é fornecida pelo registro que figura entre os
papéis de bordo (antigam ente denominados “ Iettres de m er”). Estes papéis com ­
preendem: certificado de nacionalidade, rol de equipagem, diário de bordo, etc.
A forma e a concessão os papéis de bordo dependem exclusivamente do Estado
nacional do navio. Os papéis de bordo são regulamentados pelo Estado.-
11. Tem-se salientado que nem seinpre o pavilhão corresponde ñ real nacio­
nalidade do navio: a) pavilhões de com placencia: b) a Rússia imperial permitía
que os navios pertencentes a sociedades estrangeiras hasteassem o seu pavilhão:
r) a Dinamarca dava no século XIX o direito de navios estrangeiros usarem a sua
bandeira no M editerráneo a fim de escaparem aos piratas mesmo com quein ela
tinha um acordo de garantia; d) outras vezes Estados costeiros permitiam que
Estados sem litoral usassem a sua bandeira, etc. Eles foram denominados algumas
vezes de “pavilhões de refúgio” . A figura do “ pavilhão refúgio" foi utilizado durante
a guerra Irã x Iraque em que vários petroleiros foram registrados nas Bermudas
para terem a proteção da "Roval Naw”. A doutrina lem assinalado em outros
casos: o de afreiam em o a casco nu. vez que o navio permanece registrado no
Estado do proprietário, mas pode arvorar a bandeira do armador, com o ocorre
no México, Bermudas. Filipinas, etc.
12. O projeto da Comissão de Dl falava em “ elo real” , foi substituído por “ elo
substancial” por proposta da delegação francesa, que criticava a imprecisão da
expressão originária. Na verdade, a atual expressão é lão imprecisa quanto a
anterior. Esta idéia da necessidade de um “elo substancial” já é encontrada em
1854 em um despacho do Ministro da M arinha da França, em que afirmava não
recorihecer à Suíça o direito de ter navios, vez que ela não possuía litoral e, em
conseqüência, não poderia fiscalizar e dar proteção a seus navios.
13. V. capítulo X X X J.
13A. As bandeiras de conveniência não são tão recentes, apesar da sua divul­
gação ter ocorrido no século X X . No século X V III a Grécia era dominada pelo
Império Otom ano, mas os gregos foram autorizados a usar pavilhão russo. No
século XVIII proprietários irlandeses de navios usavam bandeira francesa. No
século X IX pescadores ingleses usavam bandeira da Noruega.
14. Atualmente é Panlibhon, uma vez que a Costa Rica não é mais considerada
bandeira de conveniência. A Costa Rica foi bandeira de conveniência de 1958 a
1960, e Honduras tem dim inuído as vantagens aos navios estrangeiros.
15. O registro é feito em consulados rapidam ente.
16. Os EUA perm item o registro de navios particulares no estrangeiro. Esta
prática data da 2 a G uerra Mundial, quando, em virtude cTa neutralidade norte-
americana, os seus navios es lavam proibidos de fazer o transporte de material de
guerra. Assim, em 1939, a Standard Oil o f New Jersey, para abastecer a Inglaterra
e a França sem violar a neutralidade dos EUA, registrou os seus navios no Panamá.
Esta prática foi usada em relação aos petroleiros eutre 1939-1942 e foi usadas,
além da bandeira do Panamá, também a de H onduras:
17. Na verdade, eles deram um estímulo à construção naval. Na O ECE, os
Estados Europeus estudaram a concessão de vantagens aos navios que estiverem
registrados com seus pavilhões. O que fez Pinto observar que os pavilhões de
complacência são pavilhões de necessidade.
18. Uma quesLão levantada pelos pavilhões de com placência é em relação aos
EUA, que aplicam aos navios de propriedade de cidadãos americanos, mas regis­
trados nestes pavilhões, a doutrina do “Effective U .S. Control” . Ela consiste no
seguinte: em caso de guerra ou de em ergência nacional eles serão colocados sob
o controle dos EUA, em virtude de uma lei norte-am ericana de 1936. Existem
também contratos neste sentido dos proprietários dos navios com a administração

1249
n orte-anuí icana. co m pesadas penalidades <*m caso d e violação. F.sta d o u trin a viola
o princípio de q u e o navio só se en con tra su jeito á ju risd ição do E stad o d o sen
pavilhão. E n t r e t a n t o na prática a requisição pelos EUA só surtirá ('feito ein r e l a ç ã o
aos navios qu e eslã o nas suas águas territoriais. C o m o se pode observar, os pavilhões
de com placência n ão lêm real controle sobre os navios que arvorain o seu pavilhão,
daí a existência d esta d ou trin a (Boczek).
19. Já aplicado em relação à nacionalidade dos navios em relação ao “ ] ’m
alone” entre EUA e Canadá, que fazia contrabando no tempo da lei seca.
20. Deste m odo, todas as leis de ordem pública do Estado costeiro são aplicadas
e, em conseqüência, ele pode, por exemplo, soltar os escravos que existam a bordo.
21. É interessante observar que a legislação de patentes do Estado costeiro
não se aplica a bord o de navios estrangeiros nas águas territoriais do Estado
(Convenção de Paris de 1883, que criou a União Internacional para a Proteção
da Propriedade Industrial).
21A. A distinção entre “fatos internos” e “fatos externos” ao navio em matéria
de jurisdição surgiu em 1806, em decisão do Conselho de Estado, na França, no
caso dos navios dos EUA “Newton” e “Sally” em portos franceses. O Conselho de
Estado negou com petência aos tribunais franceses, porque os fatos tinham ocorrido
no interior dos navios (Lucchini e Voeckel). Este sistema é adotado na Espanha,
Portugal, Itália, Bélgica, Brasil, México, etc.
22. A imunidade não é absoluta; por exem plo, o comandante deve fazer um
relatório encam inhado à alfândega sobre a sua carga (os EUA isentam desta
obrigação quando o navio sai em 24 horas).
23. V. capítulo sobre agentes diplomáticos.
23A. Nos séculos XV II e XVIII (O rdenança de Marinha de 1681, Azuni e
Lampredi) sustentava-se que os navios de guerra se submetiam à autoridade local.
No século X IX é que muda esta orientação, e para justificar isto passa-se a defender
que o navio é território do Estado.
24. Quando as infrações são pequenas (ex.: arruaça), o Estado costeiro entrega
o infrator ao com andante do navio de guerra para puni-lo. Esta prática, entretanto,
é mera cortesia internacional.
25. V. capítulo XXXV11.
26. A entrega de marinheiros desertores é denominada por alguns de “extra­
dição sumária” , mas “não é prevista quase nunca em tratados de extradição, mas
em convenções ou tratados de amizade, com ércio e navegação” (Accioly).
27. A enum eração destes quatro casos é exaustiva. O último caso é o único
que dá jurisdição ao Estado costeiro sem que ele tenha sido atingido pela infração.
28. Se isto o corre com um navio privado, a doutrina tem considerado que ele
deve ser equiparado ao navio privado em águas interiores, isto é. ficar submetido
à jurisdição do Estado costeiro de modo mais com pleto.
29. A “lei do pavilhão” é uma expressão ju ríd ica que figura nos textos do fim
do século XVIII e in ício do século X IX (Lucchini e Voeckel).
30. A Inglaterra havia considerado as mercadorias em navios prussianos com o
boa presa. A Prússia se defende alegando (1752) que: “os navios prussianos, apesar
de transportarem carga de propriedade de inimigos da Inglaterra, eram um local
neutro, donde se conclui que é exatamente a mesma coisa ter tomado estes bens
nos navios ou tê-los tom ado em-território neutro” .
31. V. capítulo XLV.
32. Esta orieniação é diferente da que for;i consagrada no caso "L o m s".
decidido pela CPJ1, entre a Turquia e a l-rança. Durante a noite de 2 (le agosto
de 1 9 2 6 o navio francés “Lotus” abalroou em alto-m aro vapor turco "Boz-K otm “.
Deste abalroam enlo o vapor turco foi afundado e morreram oito turcos. O “ Lotus'
foi para Constantinopía, sendo então preso o oficial de vigília. T enente Demons.
que foi condenado a dois anos de prisão. O Código Penal Turco dava jurisdição
sobre crimes ocorridos nó estrangeiro que ocasionassem danos à Turquia ou a
um turco. A França protestou e o caso foi levado à CPJI, que decidiu em 1927,
dando ganho de causa à Turquia pelo voto de desempate de Max Huber, que era
seu presidente. A C orle sustentou que é perm itido aos Estados considerarem os
seus navios com o parte do território. Ora, o crim e assim teria produzido efeitos
em território turco. Logo, a Turquia podia punir o responsável. Esta decisão
levantou inúmeras críticas, daí a reação da Convenção de Bruxelas sobre a com­
petência penal em matéria de abordagem e oíitros acidentes de navegação (1952)
e de Genebra (1958) contra a orieniação dela.

1251
CAPÍTULO XLVIII

RIOS1

461 — Introdução; 468 — Evolução histáiica do D I Fluvial; 469 —


Rios nacionais; 470 — Rios internacionais; 471 — Política brasileira;
472 — Regime de alguns rios internacionais.

467. Os rios, sejam nacionais ou internacionais, apresentam interesse


para o DIP, sendo que estes últimos, evidentemente, têm maior relevância
para a vida internacional.
A conceituação de rio internacional não é pacífica entre os doutrina-
dores.2 A melhor definição é a que se baseia em um critério jurídico, isto
é, os cursos de agua que se encontram em territorio de mais de um Estado.
Os rios nacionais são os cursos de água que se localizam no territorio de
um único Estado. A grande importancia desta distinção é que os rios
nacionais e os internacionais se encontram submetidos a regimes diferen­
tes. Os rios internacionais podem ser contíguos e sucessivos, isto é, se eles
se encontram entre dois Estados, separando-os,3 ou se o seu curso passa
primeiro no território de um Estado e posteriormente no de outro.
468. No Direito Romano a grande maioria dõs doutrinadores considera
que era consagrada a liberdade de navegação nos rios. No curso dos rios
públicos4 os ribeirinhos não dispunham de um direito absoluto. Eles eram
“rei publicae jure gentium”. O Estado, entretanto, possuía um direito de
polícia.
Na Idade Média o regime de liberdade foi abolido. O rio passa a ser
considerado propriedade absoluta do “Estado” onde ele se encontra. A
navegação passa a ser um direito exclusivo dos nacionais do Estado onde
se acha o rio. O senhor feudal cobra uma série de impostos sobre a
navegação fluvial, que é regulamentada livremente pelo Estado ribeirinho.
Na Idade Média a fronteira nos rios era uma linha dupla e as suas aguas
eram consideradas águas neutras ou “res communis”, daí os príncipes

1253
assinarei» tratados em ilhas. No século XIV a domrina começou a sustentar
que as águas eram indivisíveis (Haritini Dipla).
A concepção medieval se manifesta ainda na Paz de Vestefália. O
Tratado de Munster (1648), entre a Espanha e Províncias Unidas, no seu
art. 14, determinou o fechamento do rio Baixo Escalda, que acarretou
graves prejuízos para Antuérpia. Entretanto, estava esta medida de acordo
com a concepção dominante na época.
A liberdade de navegação, ou o direito de passagem inocente em
matéria fluvial, começara a ser defendida no século XVII. Grotius a defen­
de. Em 1616, a Áustria e a Turquia, por meio de um tratado, estabelecem
no Danúbio, para os seus navios, a liberdade de navegação. Na própria
Paz de Vestefália, no Tratado de Osnabruck (1648), é também consagrada
a liberdade de navegação fluvial, entre a Alemanha, a Suécia e a França.
O Conselho Executivo provisório da Revolução Francesa, por decreto
de novembro de 1792," ordenou ao comandante do exército francês na
Bélgica que fosse garantida nos rios Mosa e Escalda a liberdade de nave­
gação. Alegava o referido decreto que os “rios são propriedade comum e
inalienável de todas as regiões banhadas por suas águas”. Entretanto, como
se pode observar, a liberdade era assegurada apenas aos Estados ribeiri­
nhos, não se estendendo, portanto, a terceiros.
Em 1815, o Ato Geral de Viena trata da regulamentação da liberdade
fluvial. Os Estados ribeirinhos deverão regulamentar de “comum acordo
a navegação fluvial”. A navegação será livre “e não poderá, em se [ra ta n d o
de comércio, ser interditada a ninguém”.6 “Os direitos sobre a navegação
serão fixados de m a n eira uniforme, invariável e assaz independente da
qualidade diversa das mercadorias, para tpxnar dispensável um exame
minucioso da carga, salvo em casos de fraude e contravenção.” Estas são
algumas das normas fixadas no Congresso de Viena que regulamentaram
a navegação fluvial por mais de um século.
Rousseay assinala que no século XIX o direito fluvial evoluiu em dois
sentidos: a) os Estados ribeirinhos e não ribeirinhos têm igualdade de
tratamento; 6) o rio passa a ser “administrado” por uma Comissão Fluvial,
que é um organismo internacional.7
A SDN, em 1921, reuniu sob os seus auspícios, em Barcelona, uma
conferêrtcia que tratou do direito fluvial, onde estavam representados
Estados do mundo inteiro. A convenção sobre “regime das vias navegáveis
de interesse internacional” estipula a internacionalização de todos os rios
internacionais, isto é, os que atravessarem território de mais de um Estado
e servirem à navegação. Consagra a igualdade de tratamento em relação
a Estados ribeirinhos ou não. A navegação de cabotagem é reservada ao
ribeirinho. “Taiito no percurso como na embocadura de vias navegáveis
de Interesse internacional, não poderão ser cobradas taxas de qualquer
espécie além das fixadas com o retribuição e desuñadas, exclusivamente, a
cobrir, de modo eqüitativo, as despesas de conservação da navegabilidade
ou de melhoramento da via navegável e de seus acessos, ou a prover as
despesas feitas 110 interesse da navegação.” O Estado não pode entravar a
navegação, bem como deve “afastar quaisquer obstáculos ou perigos aci­
dentais para a navegação”. O Estado regulamenta a navegação, bem como
exerce direito de polícia. A liberdade de navegação não se estende aos
navios de guerra. Esta convenção só é obrigatória para os Estados que a
ratificaram ou aderiram a ela,8 sendo que o Brasil não faz parte dela.
O D. Internacional Fluvial é dominado pelo princípio da utilização
comum dos rios internacionais, e apresenta as seguintes características: a)
a relatividade, tendo em vista a dificuldade de uma solução geral; b) a
finalidade, que é a de se constituir em um “quadro jurídico de utilizações
econômicas”.
469. Os rios nacionais, de um modo geral, não apresentam maiores
problemas para o Dl. Eles estão sujeitos à soberania estatal, como o terri­
tório “terrestre” ao qual eles se integram. Não existe nenhuma norroa
internacional que obrigue ò Estado a abrir um rio nacional à navegação
internacional.
Entretanto, a partir do século XIX, os Estados passaram a abrir à
navegação internacional os rios nacionais que apresentassem interesses
para ela. Dentro desta orientação, por decreto de 1866, foram abertos, a
partir de 7-9-1867, à navegação internacional, os rios Tocantins (até Ca-
metá) e São Francisco (até Penedo), que se encontram internamente no
território brasileiro.
Alega-se, em favor desta prática, que os Estados devem sacrificar os
seus interesses em nome da sociedade internacional de que eles fazem
parte (Fauchille). Deste modo, a Argentina, na sua Constituição de 1949,
consagrou a liberdade de navegação fluvial.
Dentro do raciocínio acima, de que não existe nenhuma norma con­
sagrando a liberdade de navegação, bem como que o Estado tem sobre o
rio soberania, decorre que o Estado tem direito exclusivo de pesca,9 bem
como que o aproveitamento industrial ou agrícola do rio é direito exclusivo
do Estado territorial.
470. Sobre a natureza jurídica do regime dos rios internacionais, o
intemacionalista alemão Berber alinha quatro sistemas.
O primeiro deles afirma que o Estado tem soberania absoluta sobre o
trecho que se encontra no seu território. Kluber a defendeu, afirmando
que o Estado podia fazer no rio as obras que entendesse, mesmo que isso
acarretasse prejuízo ao outro ribeirinho. Este sistema foi defendido pelo
Procurador-geral Harmon, dos EUA, em 1895, quando de um litígio com
o México. Na doutrina o adotaram, entre outros, Heffter e Kluber. Ele é
inaceitável, uma vez que o Estado que ficar mais próximo da nascente do
rio acabará por ter todas as vantagens e, inclusive, poderia trazer prejuízos
aos demais. A Doutrina Harmon foi abandonada pelos EUA na década de
60 do nosso século (E. Jim énez de Aréchaga).

1255
O segundo é o denominado principio da absoluta integridade territo­
rial. O Estado ribeirinho pode exigir que o rio continue o seu curso natural.
O Estado que ficar mais acima do curso do rio tem a obrigação de deixá-lo
continuar o seu curso natural. Ao contrario do anterior, este sistema só
traz beneficios para o Estado que se encontrar mais abaixo no curso do
rio, urna vez que somente ele poderá utilizá-lo, porque não tem outro
Estado mais abaixo dele para exigir a continuação do curso natural do
rio. Na doutrina, foram seus defensores: Oppenheim e Huber. Max Huber
foi o seu maior expositor e se fundamentou em decisões do Tribunal
Federal da Suíça.
O terceiro sistema é o da gestão dos rios internacionais por um orga­
nismo internacional. Ele é aplicado em alguns rios, como é o caso do
Reno. Na doutrina, Farham o pregou. Entretanto, devido à falta de inte­
gração da sociedade internacional, ele é ainda empregado excepcional­
mente.
O quarto sistema é uma conciliação dos dois primeiros sistemas ex­
postos acima. Foi sustentado por Neumeyer e Sauser-Hall. Este último
autor aplica o direito de vizinhança, salientando que existe “sémpre urna
obrigação recíproca de não lesar o Estado vizinho". Este parece-nos ser o
que mais corresponde à prática internacional dos dias de hoje. Dentro
desta idéia de teoria restritiva da soberania territorial temos a teoria de
Dahm, que fala em abuso da soberanía territorial quando um Estado faz
modificações no rio que prejudiquem ao outro ribeirinho. A grande fra­
queza deste sistema é o pequeno desenvolvimento das instituições inter­
nacionais para apreciarem os casos concretos (Albert E. Utton).
O regime jurídico dos rios internacionais é normalmente fixado em
convenções concluídas pelos Estados diretamente interessados que regu­
lamentam a sua udlização.
Quanto à navegação, tem-se admitido a sua liberdade. Entretanto, não
existe nenhuma norma costumeira do DI que a consagre (Moreno Quin­
tana).10 Na prátíca internacional, os Estados têm reconhecido uma liber­
dade de navegação em favor dos ribeirinhos e dos não ribeirinhos. Os
Estados têm reservado para si o direito exclusivo de cabotagem e têm
excluido os navios de guerra desta liberdade. O Estado que admitir a
liberdade de navegação não lhe deve criar obstáculos. Ele pode impedi-la
em tempo de guerra.
A pesca nos rios pertence ao Estado ribeirinho, que não deve utilizar
processos de pesca que venham a prejudicar os demais ribeirinhos. Apli­
cam-se aqui as normas do direito de vizinhança.
Quanto ao aproveitamento industrial ou agrícola das águas é que tem
surgido maior número de problemas.11 Se defendermos que o Estado tem
soberania absoluta sobre o trecho de rio que corre no seu território,
chegaremos à conclusão de que o Estado poderá fazer a utilização que
bem entender. Esta posição já foi criticada acima. A melhor concepção
sobre esta questão é ainda aquela que aplica a teoria tio direito de vizi­
nhança. O Estado pode se utilizar do rio desde que não traga -maiores
danos aos demais ribeirinhos. No nosso continente, na Conferencia Pan­
americana de 1933, foi aprovada uma resolução sobre o “uso industrial e
agrícola dos rios internacionais”, onde se estabeleceu que “ neñhúm Estado
pode, sem o consentimento de outro ribeirinho, introduzir nos cursos de
água de caráter internacional, para o aproveitamento industrial ou agrícola
de suas águas, nenhuma alteração que resulte em prejuízo para... o outro
Estado interessado’’.llA O aproveitamento não poderá prejudicar a liber­
dade de navegação. As obras que um Estado pretende realizar deverão ser
comunicadas aos demais ribeirinhos, que deverão, no prazo de três meses,
aceitá-las ou não. Neste último caso, será formada uma Comissão Técnica
Mista para resolver o caso. Se isto ainda não conduzir a uma solução,
deverá ser adotado qualquer um dos modos de solução pacífica dos-litígios
internacionais. Estas são as principais normas da resolução citada. Esta
resolução tem o valor de uma simples recomendação. Em 1923, foi assinada,
em Genebra, uma convenção sobre a utilização de forças hidráulicas, onde
se estabelece que, quando a referida utilização trouxer “prejuízo grave”
ao outro ribeirinho, os interessados deverão concluir um acordo para
permitir a execução dos trabalhos. Esta convenção, no seu art. I 9, reco­
nhece a liberdade dos Estados para fazer a utilização de forças hidráulicas.
Ela só exige o comum acordo no caso de a utilização acarretar “prejuízo
grave”.12 Esta convenção só está em vigor entre 11 Estados e praticamente
não é aplicada. E de se acrescentar que em alguns tratados (México e EUA
em 1944) se determinaram as águas (ex.: afluentes) que poderiam ser
utilizadas por cada Estado. Um memorando do Departamento de Estado
dos EUA de 1958 afirma que não existe regra de Dl que estabeleça a
exigência do consentimento do outro ribeirinho para a realização de obras
visando o aproveitamento das águas do rio. Por outro lado, a Carta de
Direitos e Deveres Econômicos dos Estados, aprovada em 1974, estabelece
que, na “ utilização de recursos naturais possuídos por dois ou mais Esta­
dos” , estes devem cooperar através de informações e prévias consultas do
outro. Finalmente, podemos assinalar que se tem estabelecido que deve
para obter melhor rendimento e não causarem danos aos interesses um
ser evitada a contaminação do rio pelos ribeirinhos. Alguns autores (Betiol)
preferem a expressão “prejuízo sensível’'. De qualquer modo, a consulta
a um Estado sobre a realização de uma obra no rio não dá a ele o direito
de veto, porque isto seria uma exorbitância (Jimenez de Aréchaga).
Nesta matéria pode ser ainda mencionado o laudo arbitrai no caso do
lago Lanoux, entre França e Espanha, de 1957, onde dois princípios são
estabelecidos, segundo Clóvis Ramalhete, que os formula da seguinte ma­
neira: “ l fi) não há regra de Direito Internacional que estabeleça a neces­
sidade de consulta ou permissão dos demais Estados interessados, quando
do aproveitamento do rio por um deles; 2a) o Estado, ao empreender a

1257
utilização do rio internacional, tem o dever de cercar a iniciativa de todas
as garantias, contra a produção de riscos na região, e contra efeitos sensíveis
sobre as águas, zelando por lodos os interesses em jogo por efeito do seu
empreendimento.”
Finalmente no ámbito da ONU, foi concluida, em 1997, convenção
sobre o Direito de Usos de não navegação nos rios internacionais. Ela é
aplicada quando não há tratado entre os estados ribeirinhos. O estado
deve udlizar o rio de um modo justo e razoável. Deve-se levar em consi­
deração: a) fatores climáticos, ecológicos e hidrográficos; b) as necessidades
econômicas e sociais dos estados; c) a população que depende do rio; d)
conservação e proteção dos recursos. A utilização do rio não pode causar
um prejuízo grave. Se a utilização for causar uma alteraçào'.significante-
mente grave o estado tem que notificar aos demais ribeirinhos com os
dados técnicos e um estudo sobre o impacto ambiental. Os demais estados
têm o prazo de seis meses para responderem. Se houver necessidade, este
prazo pode ser prorrogado por mais seis meses. Se no citado prazo não
houver resposta, o estado interessado pode realizar as “obras”, mas não
pode assim mesmo causar prejuízo grave e a utilização deve ser justa e
razoável. Nos mencionados prazos de seis meses o estado deve fomecer
todas as informações que lhe forem requeridas. Deve ser protegido o
ecossistema e controlada a poluição. A convenção prevê a arbitragem para
a solução de litigios que deverá ser dada em cinco meses. O Tribunal será
formado por três membros, sendo dois indicados pelas partes e estes
indicarão o terceiro membro.
471. O Brasil sempre sustentou que a liberdade de navegação nos rios
internacionais depende do consen tim en to do Estado que ele atravessa.
Esta posição está em urna nota de Limpo de Abreu, em 1854, à Legação
dos EUA.13 Em 1903, ela foi repetida pelo Barão do Rio Branco, em urna
nota ainda à Legação norte-americana.
Tem sido observado, com razão, que não podemos falar “em doutrina
brasileira sobre os rios, mas em política brasileira” (Pedemeiras-Tenório).
Na verdade, enquanto defendíamos a soberania brasileira no Amazonas,
sustentávamos a livre navegação na bacia do Prata, sem qualquer coerên­
cia.14
472. O rio Amazonas e seus principais afluentes (Madeira, Negro,
Tapajós) foram abertos à navegação internacional pelos Decretos n"s 3.749,
de 7-12-1866, e 3.920, de 3-7-1867. Os Tratados de 1750 e 1777, entre
Espanha e Portugal, haviam proibido a livre .navegação no Amazonas, e
em 1855 o Visconde de Abaeté dizia que “o governo imperial tem sempre
sustentado que (ela) só pode ser concedida por convenção especial”. Em
1870, Nascentes Azambuja afirmava que o Brasil não aceitava o princípio
de servidão nos rios e que a sua soberania era plena nos rios em seu
território. Parece que um dos primeiros a defender a abertura do Amazonas
à livre navegação foi Duarte da Ponte Ribeiro, que negociou um tratarlo
com o Peru, em 1841, que não foi ratificado pelo Brasil. Este tratado
defendia “a abertura da navegação do Amazonas a todas as bandeiras”.
Em 1978, foi concluído, em Brasília, um tratado para a cooperação na
Amazônia que consagra liberdade de navegação comercial nos rios da
Amazônia, respeitadas a legislação fiscal e de polícia. Esta liberdade não
se aplica à cabotagem.
A navegação na bacia do Prata vem sendo regulamentada por tratados
internacionais desde o império. Desde o século X IX que ela se encontra
aberta à navegação de todas as bandeiras. Os cinco ribeirinhos, em reuniões
de chanceleres realizadas em 1967 e 1968, decidiram fazer o “aproveita­
mento econômico integrado da região” e foi criado o Comitê lntergover-
namental Coordenador.1" Na verdade, a idéia da bacia do Prata ser explo­
rada em conjunto não é nova e já surgiu em várias conferências interame­
ricanas: México, Havana, Montevidéu, etc. Na reunião de chanceleres-em
1971 (Assunção) foram aprovadas as seguintes recomendações: a) nos rios
contíguos o aproveitamento deve ser feito de comum acordo; b) nos rios
sucessivos cada Estado pode fazer obras para o aproveitamento no trecho
no seu território sem causar prejuízos sensíveis aos demais ribeirinhos. A
navegabilidade deve ser sempre resguardada.
A “crise” que existiu entre Brasil e Paraguai e Argentina, no tocante
à construção da hidrelétrica de Itaipu, estabelecida em acordo entre Brasil
e Paraguai (1973), chegou a seu auge neste mesmo ano, sem que a Ar­
gentina demonstrasse de modo claro os prejuízos que esta obra lhe iria
causar. A “ crise” pelo lado argentino (governo Lanusse) foi mais emocional
do que jurídica. Aos analistas políticos parece que esta “crise” foi foijada
na Argentina (governo Lanusse) a fim de agir como um fator de união
nas forças políticas (política interna) daquele país. Não há mais razão
política ou jurídica para se estender ao século X X as dissensões que exis­
tiriam no século XIX. A questão foi resolvida em 1979 em um acordo
tripartite entre Argentina, Paraguai e Brasil. No caso de Itaipu, o Brasil
sustentou que cabia apenas a ele avaliar se estava causando “prejuízo
sensível” ao outro ribeirinho. A Argentina defendeu que em caso de
recurso compartilhado não se devia apenas evitar o “prejuízo sensível”,
mas “ também objetivar o benefício comum máximo” (Christian J. Caubet).
O Reno tem uma Comissão Central para o controle da navegação,
com sede em Manheim.15 Segundo Guggenheim, seria o único rio onde
se respeitam a liberdade de navegação e a igualdade de tratamento. Os
estatutos da Comissão do Reno foram fixados em 1963 em um protocolo.
O Danúbio está aberto à navegação e tem uma Comissão do Danúbio
que coordena as administrações dos Estados ribeirinhos, vez que cada um
administra o trecho do rio que atravessa o seu território. Esta Comissão
tem as suas origens em 1856.

1259
O Oder, o Elba e o Niemen foram abertos à navegação internacional
de Lodos os Estados pelo Tratado de Versalhes.
O Congo e o Níger foram abertos aos navios de todas as bandeiras
pelo Ato Geral de Berlim (1885). O Níger está regulamentado pelos tra­
tados de 1963 e 1964 e foi criada uma Comissão do rio Níger. O Senegal
está regulamentado por uma convenção de 1966.
Em 1978 foi criada a Organização para a Valorização do rio Gâmbia,
que é calcada na organização existente para o rio Senegal. A sua sede é
em Kaolack (Senegal); ela é entre Gâmbia e Senegal.

1260.
NOTAS
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págs. 386 e segs.; Maxwell Sohen — The Regim e o f Boundry Waters — The
Canadian-United States Experience, m RdC, 1975, vol. III, t. 146, págs. 219 e segs.,
Teixeira Soares — Um Grande Desafio Diplom ático no Século Passado. Navegação
e Limites na Amazônia. Missão de Nascentes d e Azambuja em Bogotá, 1971;
Ubirajara Targino Botto — L ’Utilisation des eaux com m unes a des fins autres que
la navegation dans le droit international general et latino-américan; le cas du

1261
barrage d ’ítaipii (B résil). 1979 (excelente tese); E rn e sto J. Rey Caro — I-as Solu­
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1982 e 1983; L aércio Betiol — llaipu: M odelo Avançado de Cooperação Interna­
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tionales contem poraines; >981, págs. 323 e segs.; Christian G. Caubet — As
Grandes M anobras d e Itaipu, 1991; Ernesto J . Rey Caro — Las Comisiones Fluviales
y su aporte al D ere ch o Internacional, 1991 (separata).
2. Rousseau considera que o rio para ser internacional necessita, ainda, ser
navegável. E ntretanto, os rios têm outras utilizações além da navegação, com o o
seu aproveitamento industrial (Sauser-Hall). De um certo modo, parece-nos que
seria mais exato falarm os de rios de regim e internacional em lugar de rio inter­
nacional, porque este pode existir sem se en co n trar submetido a um regim e
internacional, mas, pelo contrário, ele ter em cada Estado o tratam ento de um
rio nacional (exem p lo: rio sucessivo não navegável e não utilizável para outros
fins). Outros (E speche Gil) já propõem a internacionalização dos rios quando a
sua "utilização industrial ou agrícola afete interesse internacional” , o que nos
parece ser muito am plo, uma vez que bacias hidrográficas inteiram ente nacionais
podem afetar “interesse internacional” . O rio São Francisco, por exem plo, se
adotássemos esta opinião, inteiramente nacional, se no futuro o Brasil quisesse
não poderia fechá-lo à navegação internacional, pará aproveitá-lo integralm ente
na indústria ou agricultura, vez que afetaria “interesse internacional". Contudo a
International Law Association adotou em suas regras de Helsinque (1968) a de­
nominada “ teoria das bacias” . Esta tese, defendida por Edmund H artig e A. W.
Knauth, parte da consideração de que “cada bacia forma uma unidade física e
econômica”. Em conseqüêcia, o Estado tem soberania no trecho do rio em seu
território, “ na m edida em que o exercício da soberania não seja uma reivindicação
sobre o todo”. E também denominada de teoria da integridade da bacia fluvial.
Bacia hidrográfica, nas palavras de Júlio A. Barberis, é a unidade, natural consti­
tuída por todas as águas superficiais e freáticas que fluem para uma em bocadura
comum. Esta tese foi defendida pela França no caso do lago Lanoux c o m a Espanha.
Daniel B ard on net mencionou o critério da bacia de drenagem que abran ge
as águas da su p erfície, bem com o as águas subterrâneas, mas tam bém “ os
espaços terrestres propriam ente dito delim itadas pela linha do “divortium aqua-
rum””. Uma outra definição é fornecida por G .E. Nascimento e Silva: “um a bacia
'd e drenagem internacional é uma área geográfica que cobre dois ou mais estados,
d eterm in ad a p e lo s lim ites Fixados p o r d iv isores d e água, inclusive as águas de
superfície e as subterrâneas, que desembocam num ponto comum” .
3. Sobre a delimitação nos rios contiguos, v. capítulo XXXVJ1I.
4. Rio público é aquele que é perene. Rio privado é o que corre em deter­
minada época do ano. Este último fazia parte do “dominio privado".
5. Em março de 1972, Jefferson já defendera, com base no direito natural, a
reivindicação que fizera a Espanha para a Liberdade de navegação no curso inferior
do Mississippi.
6. Sobre o rio Reno, interpretou-se que a liberdade de navegação aplicava-se
apenas aos ribeirinhos. A própria doutrina se dividiu na interpretação do dispo­
sitivo, tendo em vista a expressão “tratado de com ércio”, que excluía os navios de
guerra, e considerado por varios autores (Louter, Westlake) que, não havendo a
palavra “navegação” após a de “com ércio”, bem com o as atas do Congresso, a
liberdade era apenas para os ribeirinhos, vez que fora rejeitada urna proposta que
consagrava urna integral liberdade de com ércio e navegação (Rousseau). Outros
(Bluntsthli, W heaton) já consideram que a liberdade se estendia aos não ribeiri­
nhos. Na prática predom inou a primeira interpretação, o que fez com que neste
aspecto o Ato de Viena fosse um retrocesso ao Tratado de Paris (1814), que dava
a liberdade de navegação aos ribeirinhos e aos não ribeirinhos.
7. Em 1815 o Congresso de Viena criou a Comissão do Reno. A Comissão do
Danúbio data de 1856. Gonidec considera que as comissões fluviais criadas no
século X X foram um a imposição das grandes potências. Estas tinham interesse na
navegação fluvial e lutavam para que a sua liberdade fosse consagrada n o plano
internacional.
8. Quando foi declarada a 2 i Guerra Mundial, ela só estava em vigor entre
21 Estados.
9. Pode-se acrescentar ainda que os recursos fluviais são esgotáveis em maior
intensidade que os do mar.
10. Winiarski considera que a liberdade de navegação deve ser reconhecida
ao Estado que só possa atingir o mar pelo rio. E de se acrescentar que existe pelo
menos um caso em que se admite a liberdade de navegação nos rios, é quando
há necessidade de se navegar neles para atingir um porto marítimo (ex.: porlo
de Londres no Tâm isa).
11. Na América surgiu o litígio do rio Lauca entre a Bolívia e o Chile. O seu
histórico pode ser traçado da seguinte maneira: em 1939 o Presidente do Chile
s è ‘refere ao desvio do rio Lauca para permitir a agricultura em Arica. Em 1947,
o Chile destina uma verba para o desvio. A Bolívia exige a criação de uma c o m iss ã o
mista e que lhe seja dado o conhecim ento dos planos. Em 1948, o Chile aceita a
proposta boliviana. Em 1949, os bolivianos afirmam que as informações chilenas
eram insuficientes. Em 1949, o Chile considera que estavam esgotados os três
meses da Resolução de Montevidéu sem que a Bolívia se manifestasse. Em 1953,
têm início os trabalhos de desvio do rio Lauca. Em 1960, é formada um a nova
comissão mista entre os dois países, sem que seja possível um acordo. Em 1962, o
Chile recusa a m ediação do Brasil, Uruguai, Costa Rica, Venezuela e Equador.
Neste mesmo ano, a Bolívia solicitou à OEA a reunião do Órgão de Consulta, uma
vez que o Chile teria com etido uma agressão, nos termos do art. 6 2 do Tratado
do Rio de Jan eiro , o que ela não conseguiu. O Chile alega em seu favor que só
desviou 46,7% das águas do rio Lauca, sustenta ainda que quando ele desem boca
no território boliviano, a 3.892m de altitude, as suas águas se evaporam e não são
aproveitadas. Cita ainda este país o Prof. H. Sm ith, que afirma que os rios inter­

1263
nacionais devem ser utilizados para trazer maiores benefícios à humanidade, in-
d ependentem ente'tias “divisões políticas” .
J IA. A tese da consulta prévia obrigatória "é na prática sinônim o de veio"
(U birajara Targino Botto).
12. Jim érfez'de Aréchaga salienta que não existe norma de Dl dando a um
Estado ribeirinho o direito de veto em relação a obras de outro ribeirinho.
13. Como uma reação a esta posição, Tavares Bastos, em 1862, elaborou um
projeto de lei, que foi rejeitado no Congresso. Ele mostrara a incongruência de
nossa política no Prata com a que adotávamos no Amazonas (v. A. C. Tavares
Bastos — Cartas do Solitário, 1975, págs. 187 e segs.).
14. Um dos grandes críticos desta “doutrina brasileira” foi Epitácio Pessoa,
que alegava que, se havíamos acçjtad o a liberdade dos mares, o mesmo deveríamos
fazer com os rios.
15. Diz-se a título de “ ironia” que o Tratado do Prata “contém as cinco
virtudes cardeais”: “modéstia (A rgentina), humildade (Brasil), capacidade de sín­
tese (Paraguai), conduta retilínea (Bolívia) e realismo (U ruguai)”.
16. As origens desta Comissão estão na “Administração geral das taxas de
navegação do Reno” , criada pelos Estados ribeirinhos em 1804. A Comissão do
Reno foi criada no Congresso de Viena.
CAPÍTULO XLIX

ESPAÇO AÉREO1

473 — Introdução; 474 — Natureza jurídica; 475 — A regulamen­


tação convencional; 476 — Aeronaves; 477 — As aeronaves interna­
cionais; 478 — Os “limites horizontais” da soberania estatal no espaço
aéreo; 479 — Apoderamento ilícito de aeronave e outros aimes.

estudo do D. Aéreo é bastante recente, urna vez que ele somente


começou a ser realizado quando surgiu a navegação aérea.
As primeiras obras sobre o D. Aéreo surgiram em 1891. Foram os
seguintes livros: a) Manduca — “A responsabilidade penal dos crimes
cometidos no espaço aéreo e a jurisdição instrutória” e b) Wilhelm — “A
situação jurídica dos aeronautas no DI”. Em 1901, Paul Fauchille publicou
“ O Domínio Aéreo e o regime jurídico dos aeróstatos”.
O D. Aéreo, inicialmente, foi regulado quase que exclusivamentejaor
normas do D. Marítimo à questão de saber se o D. Aéreo e o D. Marítimo
sao ramos autónomos da Ciencia Jurídica, ou se podem ser reunidos em
um único ramo (o Direito da Navegação), tem sido objeto de grande
discussão entre os doutrinadores do D. Interno. A primeira corrente tem
à sua frente Ambrosini. que defende a sua autonomia por ter ele princípios
próprios e a navegação aérea ser diferente da marítima. Já a Escola Napo­
litana do Direito da Navegação (Spasiano, Domine'do) defende a segunda
corrente. Esta discussão tem pouca repercussão no campo jurídico inter­
nacional e serve apenas para demonstrar que as normas do Dl Marítimo
são aplicadas no Dl Aéreo em maior ou menor grau. Sustentamos que o
D. Aéreo deve ser considerado cada vez mais como um direito autônomo,
em virtude do seu grande desenvolvimento e de suas normas próprias, que
aumentam a cada dia. Não significa isto que o D. Aéreo não aplique normas
nascidas no D. Marítimo, mas estas normas têm sido incorporadas ao D.
Aéreo e aí recebido feições próprias.

1265
O DI Aéreo pode ser definido romo o conjunto de normas interna­
cionais que regulamentam o espaço aéreo e a sua utilização.1 A expressão
“direito aéreo”4 tem sido criticada por ser “vaga e imprecisa ’, isto é, ela
abrange o meio aéreo e todas as suas utilizações, como a navegação, a
radiotelegrafía, etc. Entretanto, no DI esta amplitude traz a grande vanta­
gem de abranger em um único termo as diferentes utilizações 5o espaço
aéreo, cujas regulamentações vão depender da própria regulamentação
do espaço aéreo. O D. Aéreo tem sofrido um processo de internacionali­
zação, como ocorre com os mais diferentes ramos do direilo. Entretanto,
esta internacionalização é aquí das mais acentuadas, em virtude de inú­
meras razões: a) a navegação aérea não se restringe ao territorio de um
único Estado; b) todos os Estados têm espaço aéreo enquanto alguns
Estados não têm mar; c) no espaço aéreo não existem fronteiras claramente
demarcadas; d) para a segurança da navegação, há necessidade de que a
sinalização seja uniforme.
Se o D. Aéreo no seu sentido amplo abrange a navegação, telecomu­
nicações, etc., no seu sentido restrito é o conjunto de regras jurídicas
relativas à aeronave e à sua utilização. O direito aéreo está centrado na
aeronave, enquanto o direito marítimo não está centrado no nano, mas
nos espaços.
O direito aéreo pertence ao D. Público e D. Privado, possuindo normas
de D. Comercial, D. Penal, D. Interno, D. Internacional Público e D. Civil.
A grande fonte do D. I. Aéreo é o acordo entre os Estados.
474. A natureza jurídica do espaço aéreo com eçou a ser discutida em
1906, no Instituto de Dl, na sessão que realizou na cidade de Gand. Neste
conclave se defrontaram as teses de Fauchille e Westlake. O primeiro
sustentou a liberdade do espaço aéreo, enquanto que o segundo defendia
a soberania do Estado. O Instituto de Dl, por duas vezes, em 1906 e 1911,
consagrou a liberdade do espaço aéreo.
Esta questão, que foi inicialmente doutrinária, apresenta uma grande
importância, vez que a regulamentação do espaço aéreo vai depender de
ser ele livre ou sujeito à soberania do Estado.
Inúmeras teorias surgiram sobre a natureza do espaço aéreo. Elas,
entretanto, podem ser reunidas em dois grupos: o da liberdade e o da
soberania. No fundo, os seus defensores chegaram.,a conclusões bastante
semelhantes na.prática, porque os defensores da liberdade do espaço aéreo
admitem que o Estado subjacente tenha nele direitos que visem a “con­
servação” dele, Estado. Os defensores da soberania estatal sustentam que
o Estado deve permitir a “ passagem inocente”. Os primeiros, partindo da
liberdade, cheg<un_à_conclusão-de qu.e-Q-Esta.do tem .algxuis direitos no
espaço aéreo, enquanto os segundgs. p^tindo- da soberania estatal^ admi­
tem certa liberdade em favor da navegação aérea.

1266
a) 7 enría da liberdade

Paul Faucliille’ sustentou a “liberdade restrita do ar". O Estado tem


soberanía até a altura de 300 metros, que era o máximo alcançado pelas
construções do homein. Era a altura da Torre Eiffel. O Estado não poderia
“ocupar” maiores alturas; em conseqüência, não poderia ter soberania
sobre elas. Acima destes 300 melros, até a aluíra de 1.500 metros,6 o Estado
poderia proibir o sobrevôo, a fim fie evitar a espionagem, etc. Acima de
1.500 metros, o Estado teria direitos de conservação, visando os seus “in­
teresses econômicos e de segurança", mas o espaço aéreo seria livre.'
Esta teoria se justificava no início da navegação aérea, quando a defesa
:da liberdade do espaço a estimulava, vez que a tlefendia da vontade arbri-

Ela, entratanto, se mostrou inaceitável na prática internacional. O seu


próprio fundamento era errado. Ela partia da noção do Direito Romano
de que o ar era “res communis”, porque não era passível de apropriação.
Fauchille argumentava que o ar e o espaço aéreo eram duas noções inse­
paráveis. Desta confusão surgiu o primeiro erro desta teoria: o ar é real­
mente inapropriável, mas o espaço aéreo é apropriável. Os doutrinadores,
para ilustrar esta afirmação, têm dado o seguinte exemplo: ao se construir
um edifício, o espaço aéreo está sendo apropriável com o afastamento do
ar que nele se localizava. Na verdade, não podemos aplicar ao espaço aéreo
o mesmo sistema aplicado ao mar, de dividi-lo em zonas, porque no espaço
aéreo qualquer coisa que ocorra terá repercussão no território estatal (ex.:
combates aéreos em espaco aéreo de F.stado nent.ro'). ao contrário do qiip-
ocorre no alto-mar. Por outro lado, a própria noção do direito de conser­
vação é imprecisa.8

b) Teoria da soberania

Westlake foi um dos seus primeiros defensores. A soberania do Estado


se estende também ao espaço aéreo sobrejacente a ele. Esta concepção
nada mais é do que a aplicação de uma velha m áxima que diz: “cujus est
solum, ejus est usque ad coelum et ad inferos”. Ela parece ser de autoria
de Acursio (século XIII), em uma glosa do “Corpus Juris”.''
Esta teoria decorre de uma necessidade do Estado, uma vez que o
espaço aéreo se integra no seu território, como não ocorre com o mar. O
m ar é adjacente ao território “terrestre”, enquanto o espaço aéreo é so­
brejacente.
Os autores que partiram da soberania estatal para a regulamentação
do espaço aéreo chegaram a diferentes conclusões, uns (Holtzendorff)
procuraram limitá-la em altitude; outros (Westlake) defenderam o direito
de passagem inocente em favor da navegação aérea.

1267
Na prática, foi consagrarla a completa soberania tío Estado. Desde as
legislações internas promulgadas em 1911 e 1913. O próprift direito de
passagem inocente, reconhecido como norma costumeira no D. Marítimo,
só existe no D. Aéreo em virtude de texto convencional. Esta foi a orien­
tação das Convenções de Paris e Chicago.
A própria altitude até onde se estende a soberania do Estado foi
entendida até pouco tempo atrás como sendo ilimitada “usque ad coelum”.
Entretanto, atualmente tem-se entendido que ela não se estende até o
espaço exterior.
475. A regulamentação convencional do espaco aéreo remonta à Con­
venção de Paris de 1919. Esta convenção afirma que o Estado tem “a ,
soberania.completa e exclusiva sobre o espaço atmosférico acima do seu
territorio”. Os contratantes, ern tempo de paz, assegurarão a “liberdade-
de passagem - inofensiva” às aeronaves dos demais contratantes. A cilada
convenção criou. .a.Comissãõ Internacional de Navegação Aérea.
A Convenção de Chicago (1 9 4 4 )10 afirma igualmente que o Estado
tem “a soberania completa e exclusiva sobre o espaço aéreo acima do seu
território”. O art. 2S define o que seja território de um Estado: “as regiões
terrestres e as águas territoriais adjacentes colocadas sob a soberania, a
suserania, a proteção ou o mandato (atualmente: tutela) do referido Es­
tado”. A aeronave sem piloto somente pode sobrevoar território de Estado
estrangeiro com a sua autorização. O Estado pode reservar para si a cabo­
tagem. O Estado pode interditar o sobrevôo a determinadas áreas, por
razões de segurança ou interesse militar.
A respeito da navegação aérea, a Conferência de Chicago se defrontou
com três teses: a) a Austrália e a Nova Zelândia., com o apoio da França
e do Afeganistão, sustentaram a internacionalização da aviação comercial;
b) os EUA defenderam a liberdade e, em conseqüência, a livre concorrên­
cia;" c) a Inglaterra defendeu uma liberdade regulamentada, com a de­
terminação de tarifas, itinerários, etc. Esta última foi a que prevaleceu.
Deste modo, a OAC112 tem entre as suas finalidades “assegurar o desen­
volvimento ordenado e seguro da aviação civil internacional no mundo
inteiro” e “evitar o desperdício econôm ico que engendra uma concorrên­
cia excessiva”. A OACI tem seis escritórios regionais: Dakar, Paris. Bangkok,
México e Lima.
A Convenção de Chicago consagrou as chamadas cinco liberdades do
ar, que se encontravam no projeto norte-americano para os serviços regu-'
lares de navegação aérea: a) o direito de sobrevôo (corresponde ao direito
de passagem inocente do Direito'Marítimo); b) direito de escala técnica
para reparações13 (corresponde ao direito de ancora r ,do DIP d ° Mar).
Estas duas\liberdades são considera'das fundamentais e reconhecidas às
aeronaves comerciais dos signatários. Elas têm a maior importância, porque
o direito de sobrevôo e de escala técnica só existem em virtude de norma
convencional,14 ao contrário do que ocorre no D. Marítimo, onde uma

1268
norma cosumieira consagra o direito d<: passagem ¡nocente c o de ancorar.
A convenção consagra ainda três liberdades comerciais: a) o direito de
embarcar no território do Estado contratante mercadorias e passageiros i-
correio com destino ao Estado de que a aeronave é nacional; b) o direito
de desembarcar no território do Estado contratante mercadorias e passa­
geiros e correio que tenham sido embarcados no Estado de que a aeronave
é nacional: “o direito de embarcar passageiros, mercadorias e correio
com destino ao território de qualquer con tia tan te e o direito de desem­
barcar passageiros e mercadorias originarias jjo território de qualquer
_Estado contratante”.13
Estas liberdades não são outorgadas de plano às aeronaves dos Estados
signatários. Por outro lado, o Estado pode conceder uma e não dar outra.
As liberdades comerciais são concedidas por meio de uma “convenção de
tráfego” concluída entre os interessados; entretanto, só são aplicáveis às
aeronaves de seiviço regular. O verdadeiro modelo para estes acordos foi
o das Bermudas, concluído em 1946 entre EUA e Inglaterra. Em 1976 a
Grã-Bretanha denunciou este acordo, vez que ela desejava uma regula­
mentação mais rígida e restrita para a 5- liberdade, tendo assim concluído
um novo acordo (Bermudas II) ainda em 1976. A concessão de “rota
aérea’:l!>A é realizada por meio de acordo, porque ela é um abandono da
soberania (M. Folliot).
José da Silva Pacheco acrescenta ainda: 65 liberdade do ar: “embarcar
ou desembarcar passageiros, cargas e malas postais, destinados ou proce­
dentes de um Estado situado aquém ou além do Estado de bandeira da
aeronave, com escala intermediária neste último”; 7a liberdade do ar:
“embarcar passageiros ou desembarcá-los, destinados ou procedentes a
outro Estado, em aeronave sob bandeira de um terceiro Estado è operada
por empresa da mesma nacionalidade sem escala neste último Estado”; 8-
liberdade do ar: “de embarcar e desembarcar de uma única escala em
território de um mesmo Estado, sen'do a aeronave operada sob bandeira
de outro Estado (cabotagem)” . Salienta o jurista citado que estes desdo-
bramenios “não têm encontrado amplo acolhimento”.
E preciso salientar que há um aspecto político no transporte aéreo
tendo em vista que ele tem significação para a defesa e prestígio do Estado,
bem como a frota aérea tem importância estratégica. “O tra'nsporte aéreo
dá ao Estado um meio eficaz e espetacular de exprimir sua soberania”
(Michel Folliot). ■ ■ _
Em virtude de ter sido. derrubado um avião coreano de passageiros
pela URSS, a Convenção de Chicago de 1944 foi emendada pela OACI
em 1984 por meio de um protocolo. Este-determina que os Estados devem
evitar o uso de armas contraia aviação civil, e se houver interceptação desta
a vida das pessoas e a segurança da aeronave não devem ser colocadas em
perigo. Se for dada alguma ordem para a aeronave aterrissar, ela deve
atender. Estabelece ainda que as aeronaves civis não devem ser utilizadas

1269
paia fins q u e n ã o se coad u nem co m as finalid ades (lu ( ) A ( N o c u so d o
avião c o r e a n o , p a re c e ler sido p ro v ad o (]ue houve falha d o p ilo to , que
praticou e rro d e navegação. O s so v ié tic o s tentaram in te rc e p ta i o vôo, m as
não fo ram a te n d id o s pelo avião c o r e a n o .
Em relação ao transporte aéreo, podemos acrescentar umas observa­
ções extraídas de J. Touscoz. Em 1974 os EUA começaram a lutar pela
maior liberalização do transporte aéreo. Em 1978 retiram, da IATA a
isenção que ela possuía perante a legislação antitruste. As companhias
aéreas estrangeiras protestaram, porque as companhias aéreas norte-ame­
ricanas passaram a atuar em várias linhas. Tais empresas são mais compe­
titivas. Em 1980, a OACI aprovou uma cláusula de cunho liberal determi­
nado que n os a c o rd o s bilaterais as companhias devam ter possibilidades
justas e iguais, suprimir toda fonna de discriminação, etc., para que haja
livre concorrência. O transporte aéreo está regulamentado pela Convenção
de Varsóvia de 1929. Em 1975 o Protocolo da Guatemala alterou o regime
da responsabilidade em caso de transporte de passageiro e bagagem, es­
tabelecendo um limite que não pode ser ultrapassado. A convenção de
Vasórvia e seus protocolos, bem com a convenção da Guadalajara, etc
foram consolidadas na convenção de Montreal de 1999.
476. As aeronaves seguem, em inúmeros aspectos, a regulamentação
jurídica dos navios.
O Código Brasileiro do Ar (Decreto-lei na 32, de 18-11-1966)15B define
aeronave como sendo “todo aparelho manobrável em vôo, apto a se sus­
tentar, a circular no espaço aéreo mediante reações aerodinâmicas, e capaz
de transportar pessoas ou coisas”.
E de se repetir algumas observações de Sampaio de Lacerda. As carac­
terísticas da aeronave são: a) “seja... um aparelho que voe e possa ser
manobrado quando em vôo”; b) que seja aparelho “apto a se sustentar e
circular no espaço aéreo mediante reações aerodinâmicas” ; c) “que se
trate de aparelho capaz de transportar pessoas ou coisas”. Segundo ainda
este jurista brasileiro: a) o aerobarco é embarcação, porque não perde
contato com a água por meio de seus deslizadores; b) o “hovercraft”
também não é aeronave, porque o seu deslocamento não é feito por meio
de reações aerodinâmicas, mas por meio de um colchão de ar que ele
próprio expele. A própria OACI exclui de aeronave quando as reações de
ar são do próprio engenho de encontro à supeifície da terra.
Toda aeronave possui uma nacionalidade, que é dada pelo Estado da
sua matrícula. Ela não pode ser matriculada em mais de um Estado. A
matrícula é feita conforme a lei do Estado.16 A aeronave trará em local
apropriado a sua nacionalidade. Estas normas estão consagradas na Con­
venção de Chicago.
As aeronaves, à semelhança dos navios, devem ter papéis de bordo. O
art. 29 da Convenção de Chicago estabelece serem os seguintes: a) certi­
ficado de matrícula; b) certificado de navegabilidade; c) licenças apropria­
das de cada membro da equipagem; d) cam ê de rota; e) licença de estação

1270
de rádio fia aeronave; f) a lisia nominativa dos passageiros indicando o
local de embarque e destino; g) manifestó de carga.
As aeronaves se classificam em públicas e privadas, conforme a natureza
do serviço prestado. São aeronaves públicas as militares e as “utilizadas
pelo Estado a seu serviço” (art. 9" do Código do Ar). O parágrafo I9 deste
dispositivo lega] define como sendo “militares todas as aeronaves integran­
tes de Forças Armadas, inclusive as requisitadas na forma da lei, para
missões militares”.1'
As aeronaves públicas civis são as utilizadas pelo Estado em serviço do
Estado (público) que não seja de natureza mililar.,ít As aeronaves privadas
ou civis são as destinadas a atividade comercial. São consideradas aeronaves
privadas as públicas “utilizadas em serviço de natureza comercial” (art. 9-,
§ 3-, do Código do Ar). *
As aeronaves públicas, sejam elas militares ou civis, não gozam do
direito de sobrevôo ou de escala técnica. A Convenção de Paris19 salientava
que as aeronaves militares, para exercer tais direitos, precisavam de urna
autorização prévia. A aeronave militar que tivesse aterragem forçada não
gozaria de privilégios e imunidades se não tivesse obtido previamente uma
“autorização especial”. A Convenção de Chicago declara que as aeronaves
aduaneiras e de polícia estão incluídas nesta restrição. E interessante ob­
servar que a Convenção de Paris incluía entre as aeronaves públicas civis
as aeronaves postais, o que já não ocorre com a Convenção de Chicago.20
Paiece-n o s que as aeronaves postais deverão gozar do direito de sobrevôo,
tendo em vista que a Convenção Postal Universal (Otawa, 1957) garante
uma liberdade de trânsito, inclusive para a correspondência aérea. Por
outro lado, no Direito Marítimo, os navios postais têm sido assimilados aos
navios privados.
O regime jurídico das aeronaves em território estrangeiro é bastante
semelhante ao dos navios. As aeronaves militares gozam da mais completa
imunidade e podem conceder asilo diplomático. Essas imunidades, pela
Convenção de Paris, não existiriam se ela sobrevoasse ou aterrasse em
território estrangeiro sem autorização. Não interessando saber se elas es-
lavam em desgraça ou não.21 A tripulação de uma aeronave militar tem as
mesmas imunidades que a equipagem 'de um navio de guerra. O Código
Bustamante equiparou a deserção no D. Aéreo à do D. Marítimo.
O Código Brasileiro do Ar se utilizava de ficções já abandonadas n o
Dl, ao declarar que as aeronaves militares são “território do Estado de sua
nacionalidade”. Como nós.já rimos a respeito dos navios, as aeronaves
também não podem ser consideradas território do Estado, uma vez que
se aplicam a elas as criticas que ali formulamos.22 O Código Brasileiro de
Aeronáutica, promulgado pela Lei n9 7.565 de 1 9 /1 2 /8 6 , altera a ficção
e afirma que as aeronaves militar “consideram-se situadas no território do
Estado de sua nacionalidade”. E utilizada uma outra ficção, mas que con­
tinua sendo uma ficção.

1271
Quanto às aeronaves públicas civis cm território estrangeira, de um
modo geral, elas elevem possuir as mesmas imunidades das aeronaves
militares., devido ao aspecto representativo de que se revestem. Entretanto,
como os navios públicos civis, elas não podem conceder asilo diplomático.
O Código Brasileiro do Ar consagra as imunidades destas aeronaves, com-
parando-as às aeronaves de guerra.22A
As aeronaves comerciais2' em território estrangeiro se encontram su­
jeitas à jurisdição do Estado territorial.23''
Em 1963, foi concluída uma convenção sobre crimes cometidos a
bordo de aeronaves, estabelecendo: 1) o Estado de registro da aeronave
é competente para exercer jurisdição sobre crimes cometidos a bordo; 2)
a convenção não exclui a jurisdição criminal exercida de acordo com o
direito nacional; 3) um Estado que não seja o de registro da aeronave não
pode interferir em uma aeronave em vôo para exercer a sua jurisdição
criminal em relação a uni crime cometido a bordo a não ser nos seguintes
casos: a) o crime produz efeito no território do Estado; b) o crim e'foi
cometido por ou contra nacional ou residente permanente do Estado; c)
o crime é contra a segurança do Estado; d) o crim e é a violação de normas
do Estado sobrevôo ou manobra de aeronave; é) o exercício da jurisdição
é necessário para cumprir obrigação internacional.
Esclarece José da Silva Pacheco quando afirma que: “produzir efeito
significa ter eficácia, conseqüência, resultado ou repercussão material ou
jurídica no território brasileiro, significa onde ocorreu o dano” (art. 20
da Convenção de Tóquio).
Toda e qualquer aeronave, em alto-mar ou em território que não esteja
sujeito à soberania dos Estados, se encoatxa subordinada exclusivamente
à jurisdição do seu Estado nacional.
Finalmente, devemos salientar que, no tocante às aeronaves, como nos
navios, domina, de um modo geral, o princípio da igualdade, isto é, o
Estado não pode fazer discriminações em relação às aeronaves estrangeiras.
Entretanto, a prática e a maioria da doutrina não admitem o direito de
perseguição (“hot pursuit”) no Direito Aéreo. Em sentido contrário:
McDougal.
477. São denominadas aeronaves internacionais as que se encontram
a serviço das organizações internacionais. A ONU não pode dar naciona­
lidade às aeronaves, uma vez que ela não é Estado e, em conseqüência,
não pode matriculá-las.24
As aeronaves militares à disposição da ONU continuam com o seu
estatuto nacional e permanecem com os seus comandantes militares.
Quanto às aeronaves não militares, elas são fretadas pela ONU, o que
não lhes dá, via de regra, qualquer privilégio. Se qualquer delas for utilizada
para transporte, por exemplo, de funcionários, ela continua com o estatuto
de aeronave privada. Existem certos casos em que passa a ter o estatuto
de uma aeronave pública civil (p. ex.: quando utilizada em, “atividade
d ip lo m á tic a ” ou “ ativ id ad es d e co rn an d o ” ). N e ssts casos, a O N U d ev e iá
n e g o cia *, com os E sta d o s o n d e esta a e ro n a v e passará, os seus privilégios.
As aeronav es o p e ra d a s p ela O N U p recisan ) e sta r m atriculad as en) um
Estado.
"478. A soberania do Estado se exerce no espaço aéreo sobrejacente
ao sen território “ terrestre". O mesmo ocorre no espãçõ aéreo sobrejacente
às águas interiores e ao mar territorial.
O Código Brasileiro do Ar, no seu art. 2“, estipula: “O Brasil exerce
completa e exclusiva soberania sobre o espaço aéreo acima de seu territorio
e águas jurisdicionais.” A expressão “águas jurisdicionais" deve ser enten­
dida como sinônimo^de “águas territoriais” , isto é, abrangendo as águas
interiores e o mar territorial.
O espaço aéreo sobrejacente ao alto-mar é “res communis”. Deste
modo. ¿ éspaço aéreo acima da plataforma continental é “res communis1',
urna vez que as águas que a cobrem são alto-mar.
O es paco aéreo sobrejacente à zona contígua não tem o seu regime
regulamentado internacionalmente. Alguns autores (Le Gof) declaram
que o Estado tem soberanía sobre ele. A Comissão de DI considerava que
o Estado não exercia controle no espaço aéreo sobrejacente à zona con­
tigua. X?uíro^slMateescoJ_afirmam_£ue o Estado tem os mesmos direitos
que possui na zona contigua matítima.'26 Esta última concepção nos parece
.ser a mais acertada, urna vez que o espaço aéreo, de um modo geral,
acompanha o regime jurídico da superficie marítima ou terrestre.
Na 3~ Conferência das Nações Unidas sobre o Direito do Mar serão
criados novos “espaços” no mar, com repercussão no espaço aéreo. Tais
espaços são as águas arquipélagas e zona econômica. No primeiro o Estado
fixará rotas de navegação aérea, onde haverá o direito de sobrevôo. No
segundo, haverá a liberdade de sobrevôo.
479. Alguns autores (Haroldo Valladão) têm visto os constantes se-
qüestros de aviões realizados por passageiros que os obrigam a mudar a
rota como sendo um novo delito internacional: pirataria aérea.
O primeiro caso de desvio de-aeronave ocorreu n a .Peru, em 1931.
A legislação norte-americana define este crime c o m o sendo “qualquer
seqüestro ou exercício de controle pela força ou violencia ou tentativa de
força ou violencia e com maliciosa intenção, de urna aeronave de comércio
aéreo”, e prevé urna pesada punição para os autores deste crime.1'6'
No campo do DI podemos mencionar a já citada Convenção de Tóquiõ.
referente à repressão de delitos cometidos a bordo de aeronaves (1963),
em que prevé o caso em que “ilicitamente e por violência ou ameaça de
violência uma pessoa muda a exploração de uma aeronave em vôo, dela
se tenha apoderado ou exercido o controle, ou esteja a ponto de completar
tal ato”, obligando os Estados a “restituir ou conservar o controle da
aeronave ao comandante legítimo”.

1273
Varias denominações foram utilizadas: atos de interferência nos trans­
portes aéreos, atos de ingerencia ñas linlias aéreas civis, captura ou controle
ilícito de aeronave, desvio de aeronave, “hijacking”, “skvjacking”, etc. A
denominação que foi consagrada oficialmente foi de apoderamento ilícito
de aeronave. Entretanto, Corinne Touret observa que a expressão pirataria
aérea é uma expressão que faz parte da linguagem comum e que já foi
utilizada em alguns organismos internacionais, como 110 CS e no Conselho
da Europa. Observa ainda que este crime não é um apoderamento, porque
não se trata de confisco, bem como não é seqüestro, porque ninguém
contesta o título de propriedade da aeronave. Lembra ainda que as con­
venções de Tóquio (1967) e Haia (1970) não limitam a sua aplicação aos
atos praticados no alto-mar.
A Convenção de Genebra sobre alto-mar (1958) contém dispositivo
reprimindo a pirataria marítima, bem como a aérea, ao considerar como
pirataria os seguintes atos:

“ ]) Todo ato ilegítimo de violencia, de detenção ou toda


depredação cometida para fins pessoais pela tripulação ou pas­
sageiros de um navio privado ou de urna aeronave privada, e
dirigidos:
a ) no alto-mar, contra um outro navio ou aeronave, ou
contra pessoas e bens a seu bordo;

Esta mesma norma está repetida na convenção sobre direito do mar


de 1982.
Mesmo que consideremos aqui a expressão “seu bordo” como sendo
contra a própria aeronave, devemos lembrar que esta conceituação não é
perfeita, porque pirataria na Convenção de Genebra é sempre ato prati­
cado “no alto-mar” ou “em local fora da jurisdição de qualquer Estado”,
e parece-me que pela sua natureza especial a pirataria aérea deveria ser
conceituada independentemente do local onde fosse realizada. Por outro
lado, muitas vezes faltam os “fins pessoais” da pirataria. A Convenção de
Haia cria uma obrigação parase punir o criminoso, enquanto a de Genebra
apenas “permite” que o captor julgue o pirata. E preciso assinalar que
diante disto n ã o s e tem aceitado a denominação’de “pirataria aérea” e se
tem preferido'a de apoderamento ilícito de aeronaves,27 que foi consagrada
na Convenção de Haia de 1970. Esta convenção define este crime como
o ato cometido por “ qualquer pessoa que a bordo de urna aeronave em
vôo: a) ilicitamente, por força ou ameaça de força, ou por qualquer outra
intimidação, se apodera ou exerce controle da referida aeronave, ou tenta
praticar qualquer um desses atos; ou b) é cúmplice de uma pessoa que
pratica ou tenta praticar qualquer um desses atos”.

1274
Os Estados contratantes se obrigam “a tornar o crinit- pinmil coin
severas penas” . A convenção visa proteger a “segurança da aviação civil ’ .
A punição deverá ser feita no Estado: “fl) quando o crime for cometido a
bordo de urna aeronave registrada no referido Estado; b) quando a aero­
nave a bordo da quai o crime for cometido aterrar no seu território com
o suposto criminoso ainda a bordo; c) quando o crinie for cometido a
bordo de urna aeronave arrendada sem tripulação a um arrendatário que
possua o centro principal de seus negocios ou, se não possui tal centro
principal de negocios, residencia permanente no referido Estado” . O Es­
tado onde se encontrava o criminoso se não o extraditar deverá julgá-lo.
Este “crime deverá ser considerado crime extraditável em todo tratado de
extradição existente entre os Estados contratantes”. As circunstâncias do
crime, as medidas tomadas contra o criminoso, etc., serão comunicacfas
ao Conselho da OAC1. Um protocolo adicional à Convenção de 1970 e
concluido em‘ 1973 determina que a prioridade no pedido de extradição
deve ser dada' ao do Estado do registro da aeronave.
Glaser observa com razão de que estas convenções não prevêem como
exceção quando o desvio da aeronave é justo, por exemplo, dois lituanos
que, para salvar as suas vidas, tiveram que desviar uma aeronave soviética
para a Turquia. E preciso salientar que as aeronaves públicas não estão
tratadas nas Convenções de Haia e Montreal.
Edward McWhinney apresenta quatro categorias de seqüestros de aero­
naves no tocante às características psicológicas: a) “a origem dos seqües­
tros” está na guerra-fria, quando pessoas, no Leste, “seqüestraram” aero­
naves para fugir para o Ocidente. Entre 1948 e 1950 houve cerca de 17
casos de seqüestro (Heleno Fragoso); b) seqüestro de aviões norte-ameri­
canos para Cuba (1 9 6 1 /1 9 7 2 );2,A c) seqüestro por pessoas que visavam o
lucro;58 d) seqüestros no Oriente Médio ligados à causa da Palestina.
Pode-se assinalar que o transportador não tem responsabilidade pela
prática do crime, vez que as medidas de segurança são da responsabilidade
das autoridades públicas.
No tocante à punição, deveria ser adotado o princípio da competência
universal, como a pirataria marítima. Contudo Levasseur observa que nas
Convenções de Tóquio, Haia e Montreal são criadas normas em que quase
se chega ao princípio da competência universal.
No Brasil ele é considerado crime contra a segurança nacional!

1275
NOTAS
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segs.; Paul de Geouffré de la Pradelle — Les Frontiéres de l’Air, in RdC, 1954,
vol. II, t. 86. págs. 121 e segs.; Daniel Goedhuis — Conflicts o f Law and Divergencies
in T h e Legal Regimes of Air Space and O m er Space, in RdC, 1963, vol. I, t. 109,
págs. 263 e segs.; idem — Problems o f Public International Air Law, in RdC, 1952,
vol. II, t. 81, págs. 20 e segs.; Nicolás Mateesco Matte — De la M er Territoriale à
l'Air “T errito rial", 1965; Ming-Min Peng — Le statut juridique de l’Aéronef Mili-
taire, 1957; Marcel Le Goff — Manuel de Droit Aérien, 1954; Jo h n C. Cooper —
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Cateílani — Le Droit Aérien, 1912: Harold Hazeltine — T h e Law o f The Air. 1911;
Joseph Kroell — Traité de Droit International Public Aérien, 2 vols., 1934-1936;
Carlos Alberto Pasini Cosladoat — El Espacio Aéreo, 1955; Nicolás Mateesco Matte
— Traité de Droit Aérien-Aéronautique, 1964; Giuliano Enriques — Lo Spazio
Atmosférico nel Diritto Internazionale, 1931; Paul Fauchille — Le Domaine Aérien
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Traité de Droit Aérien, 1947; M ichel de Juglart — Traité Elém en taire de Droit
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La Have du 16 décember pour la répression de la capture illicite d’aéronefs, in
AFDI, 1970, págs. 35 e segs.; Sami Schubber — Is Hijacking o f Aircraft Piracy in
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1276
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nacional da Pirataria Aérea, in Estudos Jurídicos em H om enagem ao Professor
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national Law, in Essay on International Law in Honour o f Krishna Rao, 1976, págs.
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segs.; Jean-C laude Piris — De quelques controverses ju rid iques consecutives a la
destruetion du Boein 747 de la KAL le Is: Septembre 1983, in RGDIP, 1986, n° 4,
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2000. G eorges Kyriakopoulos — Statut des Espaces Maritimes et Regim e Juridique
de la Navigation Aérienne, " in ” RG DIP, t. 105, 2001, pgs. 307 e segs.
2. Na França, houve a prim eira regulamentação do espaço aéreo, em 1784
(M ateesco M atte), quando a polícia de Paris proibiu o vôo de balões, a não ser
que fosse dada uma permissão especial. Alguns autores (Le Goff) dão a data de
1724.
3. Os alemães se utilizam de duas expressões: ‘direito aéreo” (“Luftrech”),
que trata do espaço aéreo, e “direito aeronáutico” (“L uftfahrrecht” ), que trata
da navegação aérea.
4. Esta expressão foi adotada por André-Henry Couannier em 1909. Tendo
a partir d e então se divulgado entre os doutrinadores. Nesta mesma data foi criada
a Escola Superior de Aeronáutica em Paris.

1277
:>. Exporemos apenas a teoria de Fauchille e a sua evolução, por ser ele o
grande defensor da liberdade do espaço aéreo.
6. Era a maior aliimde de onde se podia fotografar o solo.
7. Posteriorm ente, Fauchille aum entou a altura de 300 metros para 330 metros,
porque esta era a altura das torres de energía elétrica.
8. E de se afirmar que alguns domrinadores que seguiram a tese de Fauchille
levaram-na mais longe ainda do que ele. E o caso de M érignhac, que comparava
a liberdade do ar à do mar; em tem po de paz, a liberdade do espaço aéreo era
igual à liberdade do alto-mar.
9. Outra origem que lem sido apontada é de ser ela de autoria do rabino
Akiba (teria morrido em 132 d.C.) e que fora utilizada em um contrato de venda
de urna casa em 1285, que seria regulado pelaleijudaica (M cNair). E de acrescentar
que no direito privado inglês os proprietários se‘ t;onsideravam donos do espaço
acima deles. Em 1815, no caso Pickening v. Rudd, há uma decisão consagrando
que a passagem inocente de um balão não violava a propriedade privada. A rede
de fios telegráficos e telefónicos com eça a atravessar o espaço das propriedades
privadas e há um abandono da concepção de que o proprietário de um imóvel
era proprietário do espaço sobrejacem e, nos mesmos termos da propriedade
“ te rre stre ".
10. Esta convenção é que regulam enta o espaço aéreo. Ela entrou em vigor
em 1947. A URSS não a assinou.
11. Nesta época ele era o ún ico Estado que possuía uma grande aviação
com ercial. Em outras palavras, a livre concorrência significaria, inevitavelmente,
o seu predomínio.
12. V. capítulo XXV- Com o organizações internacionais não-governamentais
que interessam à navegação aérea podem ser citadas: a) Associação Internacional
de Transporte Aéreo (IATA), criada em 1945 çm Havana, que reúne 104 compa­
nhias aéreas de 84 países (a U RSS não a integra); b) Federação Internacional das
Associações de Pilotos de Linha (IFALPA), criada em 1948 em Londres e reúne
44.000 pilotos (Claude Em m anueli). A IATA é um centro de intercâmbio de
inform ações de estudo e controle. Possui uma administração central e escritórios
regionais. É uma organização internacional não-govemamental. Assim a IATA tem:
a) Assembléia-geral (reúne-se anu alm ente);^ ) Diretor-geral; c) Comitê Executivo
com vários comitês perm anentes: tráfego, jutídico, financeiro e técnico.
13. O Estado pode exercer o direito de risita em uma aeronave ao aterrar ou
antes de ela levantar vôo.
14. E considerado “serviço aéreo internacional regular" uma “série sistemática
de vôos” , destinados ao transporte comercial com rem uneração e acessível ao
público, com um horário público e que'tenham uma regularidade. As aeronaves
que fazem este serviço não têm direito de sobrevôo e de escala técnica, a não ser
que acordos especiais o reconheçam . Entretanto, a Convenção de Chicago reco­
n h ece de plano, às aeronaves com erciais que não executam “serviço regular”, o
direito de sobrevôo e de escala técnica. Esta diferença de tratam ento decorreu de
a C onferência de Chicago não ter encontrado “uma fórm ula para um acordo
geral quanto à regulamentação do tráfego comercial reg u lar". Para amenizar isto,
em Chicago foi concluído, ao lado da convenção, um “ acordo relativo ao trânsito
dos serviços aéreos internacionais” ,’ cujos signatários reconhecem as duas primeiras
liberdades para os “serviços aéreos internacionais regulares” (Mateesco Matte).
Os Estados podem regulamentar o direito de sobrevôo no seu espaço aéreo.
15. Alguns Estados consideram a existência de oulras liberdades, por exemplo,
de uma qitarla liberdade com erciai, que seria a com binação das duas primeiras.
15A. “ Rota aérea é um itinerário mais oti menos flexível, geograficamente
definido por um acordo internacional e 110 qual o Estado concessionário obtém
direitos comerciais para uma exploração de serviços regulares assegurada por uma
ou várias companhias de sua nacionalidade, que ele designará” (M. FolJiol).
15B. O Código Brasileiro dò Ar foi modificado pela Lei 7.565, de 19-12-86,
que entre outras modificações passou a denominá-los de Código Brasileiro de
Aeronáutica.
16. No Brasil elas são inscritas 110 Registro Aeronáutico Brasileiro. A naciona­
lidade brasileira é dada pelas letras PP ou PT. PT é utilizado para aeronaves
particulares. PP para aeronaves de com panhias comerciais e de órgãos públicos.
As aeronaves militares usam números.
17. O Código do Ar anterior (Decreto-lei 483/1938) dava a definição de
aeronave militar como sendo a “com andada por pessoa incorporada às Forças
Armadas nacionais em serviço ativo” . Está baseada na definição da Convenção de
Paris de 1919, e na Convenção Ibero-Am ericana de 1926. Ming-Min Peng, em uma
das raras obras sobre aeronaves militares, dá a seguinte definição: “aeronaves
exploradas por um Estado com fins militares ou hostis” .
18. A Convenção de Paris de 1919 dava com o exem plo de aeronaves públicas
civis: as postais, aduaneiras e de polícia.
19. O art. 80, da Convenção de Chicago, estipula que os seus contratantes se
com prom etem a denunciar as Convenções de Paris de 1919 e Ibero-Am ericana de
1926. Entretanto, a Convenção de Chicago não trata das aeronaves públicas, daí
m encionarm os a Convenção de Paris.
20. São consideradas aeronaves públicas civis, a exem plo dos navios públicos
civis, as que se encontram transportando chefe de Estado.
21. O direito de aterrar em caso de desgraça é admitido pela convenção.
E ntretanto, ao contrário dos navios, não se reconhecem im unidades às aeronaves.
Pretendia-se evitar os abusos. O com andante, contudo, dem onstrando a “desgra­
ça”, não será punido pela “ escala técn ica” .
22. V. capítulo XLVII.
22A. Entretanto, a Convenção de Paris não reconhece im unidades e privilégios
às aeronaves de polícia e aduaneiras.
23. E interessante observar que a Convenção de Chicago não fala em aeronaves
com erciais, mas em civis, e as con trap õe às aeronaves do Estado.
23A. Poulanlzas propõe um d ireilo de perseguição no D. A éreo semelhante
ao j á existente no D. Marítimo (v. capítulo Alto-mar). Segundo este autor haveria
uma norm a costumeira em inform ação neste sentido. O Canadá intercepta quem
viola a CADIZ. A CADIZ (canadense) e a ADIZ (norte-am ericana) são zonas de
segurança respectivamente de 100 m ilhas e 200 a 300 milhas de largura, sendo
que as aeronaves que aí penetram são obrigadas a se identificar. CADIZ = Canadia n
Air D efense Identification Zones e ADIZ = Air Defense Identification Zones. Na
ADIZ o avião tem que se identificar e fazer relatório de sua localização uma hora
antes de entrar no espaço aéreo norte-am ericano.
24. Mankiewicz observa, com razão, que o art. 77, da Convenção de Chicago,
estipula que o Conselho da OACI "determ inará as modalidades de aplicação das
disposições da presente Convenção, concernente à nacionalidade das aeronaves

1279
exploradas por organismos internacionais de exploração"; em conseqüência, de­
veria (aJ organização fixar a concessão de matrícula pelas organizações internacio­
nais. Tais organismos, pela definição do Com ité de Técnicos, são aqueles que não
são " constituidos sob a lei nacional de um Estado particular”. As organizações
internacionais poderiam ser assimiladas a lais organismos, urna vez que eles não
necessitam necessariam ente ter “ natureza com ercial’’ .
25. E de se assinalar que existem m anifestações no sentido de se consagrar a
soberania do Estado no espaço aéreo sobrejacenie à plataforma. Esta tendência
se manifestou no Com itê Jurídico Interam ericano do Rio de Jan eiro , no projeto
de convenção sobre o “Sistema das Águas Territoriais e questões afins’’ . Ela,
entretanto, nao foi consagrada em nenliurçia convenção internacional. Esta ten­
dência foi co n sa g ra d a n o artigo 29 do Código Brasileiro do Ar (Decreto-lei 32, de
1966), revogado poucos meses depois, pelo Decreto-lei 234, de 1967, que adaptou
a nossa legislação às normas internacionais.
26. V. capítulo XLV.
26A. Os EUA foram o primeiro país a adotar uma lei própria para a repressão
deste crim e: Aircraft Piracy Statute (1961). Nos EUA a palavra “ hijacking” vem
do "slang” e significa assalto à mão armada por meio de interceptação de veículos.
A sua origem está na expressão “Hi Ja c k ” (Olá, otário) com que os assaltantes
saudavam as suas vítimas (Enrique Mapelli).
27. E de se salientar que a Convenção de Haia foi com plementada pela de
M ontreal (1 971). A Convenção de M ontreal (1971) para a repressão de atos ilícitos
dirigidos contra a segurança da aviação civil considera infração penal: a ) um ato
de violência con tra pessoa a bordo de uma aeronave em vôo se este com prom ete
a segurança da aeronave; b) destruir uma aeronave; c) destruir ou causar danos a
serviços de navegação aérea; d) colocar engenhos ou substâncias destinadas a
destruir uma aeronave; e) com unicar inform ações falsas que c o m p r o m e ta m a
segurança de uma aeronave em vôo: etc. Esta convenção não se aplica às aeronaves
militares ou destinadas a serviços aduaneiros ou de polícia. T od o Estado deve
tomar medidas necessárias para estabelecer a sua competência nas infrações: a)
se a infração é com etida no território do Estado; b) se a infração é com etida contra
ou a bordo de uma aeronave matriculada no Estado; <r) se a aeronave a bordo da
qual a infração é cometida aterra em seu território com o deliqüente a bordo; d)
se a infração é com etida contra ou a bordo de uma aeronave dada em locação
sem equipagem a uma pessoa que tem a sede principal de seus negócios ou, na
ausência desta, a sua residência no dito Estado. Estas infrações são todas elas
passíveis de extradição. O Estado, que não extraditar o criminoso devera julgá-lo.
Os Estados d ev e m relata'r o crime e as medidas tomadas ao C onselho da OACI.
Esta convenção considera uma aeronave em vôo desde o seu preparo até 24 horas
após a sua aterragem . Estes são alguns dos dispositivos da mencionada convenção.
Em 1988 foi concluído um' protocolo à Convenção de Montreal, para proteger os
aeroportos.
27A. Em 1973 os EUA e Cuba concluíram tratado reprimindo o seqüestro de
aeronaves.
28. Os piratas aéreos submetidos a testes psicológicos (os que praticaram este
crim e por razões políticas não foram submetidos a estes testes) demonstraram
esquizofrenia, pessoas depressivas, que fogem à responsabilidade, egoístas e de
constituição física fraca (fraedrich H a ck e r).
CAPÍTULO L

ESPAÇO EXTERIOR'

480 — Introdução; 481 — Noção de espaço exterior; 482 — Dados


geográficos; 483 — Corpos celestes; 484 — Regulamentação jurídica
internacional; 485 — A cooperação internacional na exploração espa­
cial.

{ 480. O espaço exterior só começou a ter interesse para o DI quando


a sua exploração passou a ser possível, e isto ocorreu em 1957, com os
satélites artificiais.
Surgiu, a partir desta data, um novo ramo do DIP.,A Entretanto, ele
não recebeu uma denominação que fosse aceita por todos os doutrinado-
res. A divergência terminológica tem sido grande. As denominações são
várias: Direito Interplanetário (Valladão, C occa); Direito Cósmico (Quadri,
Lodigiani); Direito do Espaço Exterior (Federação Internacional de Astro­
náutica); Direito Astronáutico (Álvaro Bauza Araújo); Direito do Espaço
(Jenks, Chaumont); Direito supra-atmosférico (Alex Mayer); etc.
A denominação que nos parece mais correta é a de Direito do Espaço
Exterior, que é a expressão consagrada nos textos internacionais aprovados
pela ONU. As demais não nos parecem perfeitas. Assim, a de Direito
Interplanetário não corresponde à realidade deste direito, uma vez que
ele não surge de uma “convivência” entre os planetas, mas é um direito
da Terra. A de Direito Astronáutico abrangerá a navegação no espaço
exterior e não abrangeria a regulamentação do próprio espaço. A de
Direito do Espaço nos parece incompleta, uma vez que o espaço pode ser
aéreo e exterior. A de Direito Cósmico também peca por imprecisão, uma
vez que a palavra “cosmo” significa “universo” enquanto que este direito
é da Terra.2
O DIP do Espaço pode ser definido como “o conjunto de regras'
jurídicas que regem as relações internacionais decorrentes da exploração
e das diferentes formas de utilização do espaçof' (M. M arcott).

1281
T e m sid o a ssin a la d o que a d ip lo m a cia esp acial está fic a n d o m ais po­
litizada em v irtu d e d o s seguintes fa to re s: a c re sc e n te im p o rta n c ia das ap li­
c a çõ e s d o s s a té lite s , os in teresses priv ad os envolvidos e o d e c lín io da bipo-
larid ad e n as r e la ç õ e s in te rn a cio n a is.
481. A delimitação do espaço exterior só pode ser clara em um aspecto
negativo, "isto é, dizendo-se o que não é espaço exterior. Não é espaço
exterior o denominado espaço aéreo.
Devemos conceituar agora o que é espaço aéreo. Em outras palavras,
procuraremos verificar qual é o “limite verücal” da soberdina do Estadp.^A
Diversas teorías surgiram para formular esta delimitação:
a) Kroell sustentou que a soberania do Estado se estende apenas até
onde existir a gravidade da Terra.
Esta concepção não pode ser aceita, porque o limite do campo de
gravidade varia de um local a outro, urna vez que “o Globo não é perfei­
tamente redondo e ele é afetado pela sua própria rotação e pela distribui­
ção desigual das massas de água e de térra na sua superficie” (Kuhfeld-
Mateesco). A atração da Terra em relação a um objeto vai depender da
sua forma e da velocidade da sua locomoção (Jiménez de Aréchaga);
b) Schachter, paründo de uma interpretação da expressão “espaço
aéreo” que figura nos textos internacionais, considera que ela se referiria
apenas à região onde fosse possível o vôo de aviões, o que ocorre até a
altitude de 20 a 25 milhas. Acima deste limite não há uma densidade que
permita o vôo dos aviões. Tem-se criticado esta teoria da zona da atmosfera
sob a alegação de que a expressão “espaço aéreo”, quando era utilizada,
queria abranger todo o espaço, sem pretender qualquer diferenciação, vez
que os conhecimentos da época não o pérmitiam (Aréchaga);
c) o s autores russos Kovalev e Cheprov sustentam que a soberania do
Estado se estende até o limite do seu poder efetivo. Esta teoria é injusta,
urna vez que os Estados mais avançados na exploração espacial teriam
maior zona;
d) outros afirmam que o Estado tem soberania até o infinito (Hingo-
rami). Esta formulação é também inaceitável, porque “pela rotação da
Terra os Estados perderiam continuamente sua soberania sobre porções
do espaço, conforme as diversas posições que nosso astro tomaria no tempo
e na sua trajetória cósmica” (Mateesco);
e) a teoria das zonas defendida por Cooper afirma que o Estado teria
uma soberania até urna-certa altura; posteriormente, haveria uma zona
contígua onde o Estado teria direitos visando a sua segurança e seria dado
um direito de passagem inocente aos engenhos não militares. Posterior­
mente, então, viria uma zona inteiramente livre. Não existe nenhuma
convenção internacional que consagre esta divisão em zonas e os Estados 1
entendem que a sua soberania não tem limites em altura, apenas admiündo
a exploração espacial devido a suas finalidades científicas. Na verdade, a
teria de Cooper, como a de Schachter, podein ser reunidas em urri único
grupo: o que procura dividir o espaço em zonas;
J) Brownlie fixa o limite do espaço aéreo em 10 a 100 milhas de altitude;
g) o cientista Theodore Van Karman propôs a denominada linha Kar-
man para dividir o espaço aéreo do espaço exterior. Esta tese foi adaptada
por Andrew Haley. A linha estaria a 52 milhas de altitude do nivel do mar.
Teria levado em consideração a existencia de ar para a aviação;
h) alguns autores (M. Dauses, Alex Meyer) consideram que “a fronteira
entre espaço aéreo e espaço exterior não é científica, mas uma fronteira
legal”;
¿) para La Pradelle o limite do espaço atmosférico é a altitude em que
um satélite passando em contato com a atmosfera se volatiliza. Esta altitude
é de cerca de lOOkm (P. Huet);
j) para Chaumont a fronteira é funcional e varia em função dos en­
genhos utilizados no espaço.
Os russos e norte-americanos teriam chegado a um acordo no Con­
gresso da Federação Internacional Astronáutica (1960) considerando es-
paçonave todo aparelho que ultrapasse a altitude de 62 milhas. A maioria
dos projetos tem proposto que o espaço aéreo vá até 90 milhas de altitude.
A URSS não queria traçar uma fronteira do espaço exterior, mas em
1979 ela propôs no Comitê do espaço extra-atmosférico de que ele come­
çaria a 100 (110)km de altitude a contar do nível do mar. Defendeu ainda
que os engenhos espaciais podem sobrevoar outros Estados a uma altitude
inferior a acima mencionada quando isto ocorrer para ele ser colocado
r em órbita ou retom ar à Terra (D. Goedhuis).
Estas são algumas das inúmeras teorias que foram formuladas sobre
este assunto. A ordem jurídica internacional ainda não consagrou qualquer
conceituacão.3 Na prática, esta ausência de conceituação não tem trazido
qualquer problema, vez que os Estados não têm considerado os satélites
artificiais ou as naves espaciais como violando o seu espaço aéreo.4
482. As camadas do espaço podem ser divididas em:5
a) troposfera (do nível do mar a lO.OOOm, aproximadamente);
b) estratosfera (de 10.000 a 40.000m, aproximadamente);
c) ionosfera (de 40.000 a 375.000m, aproximadamente);
d) exosfera (de 375.000m a 20.000km ou mais).
A atmosfera iria, segundo uns, a 300km, outros, a l.lOOkm ou, ainda
a 600km. Entretanto, se do ponto de vista jurídico consideranrios “espaço
aéreo” aquela região em que é possível o vôo de aviões, ¿evem os entender
que ele vai até a altitude de 20 a 25 milhas mais ou menos.6
Os dados de Tomasi cU Vignano e Mario Solina são um pouco dife­
rentes. A atmosfera vai se “rarefazer” até ser nenhuma no espaço exterior.
A troposfera vai até I7km; a estratosfera vai até 50-55 km; na ionosfera
(tem elétrons e eons livres) o limite é de 500 a 800km; já a exosfera é após
800 km e tem raras moléculas gasosas, e a gravidade é mínima.

1283
McDougal. Lasswell e Vlasic, na sua monumental obra sobre o clireito
do espaço, dão uma descrição desta região. Salientam estes jnristas que o
espaço é “um verdadeiro mar de radiações” (Du Bridge). As radiações são
ds raios cósmicos e as ondas eletromagnéticas. Estas radiações eletromag­
néticas, incluindo-se os raios X e os raios gama, “já são consideradas como
uma fonte potencial de energia para as atividades do homem no espaço”.
Os raios cósmicos “atravessam o espaço com a velocidade da luz e alguns
chegam a ter uma centena de milhão de trilhão de volts”.
Atualmente estes “recursos” do espaço ainda não são utilizados, sendo
que alguns deles representam apenas um perigo para os astronautas, como
os raios cósmicos. Entretanto, n o futuro acredita-se no seu emprego, como
é o caso da energia solar.
’A‘ exploração espacial tem nos dias de hoje um interesse meramente
científico, como é o caso da Lua, que ajudaria os estudos sobre a evolução
do nosso sistema solar, uma vez que ela não sofreu erosão por água ou
vento e não possui qualquer tipo de vida.
483. Os corpos celestes, antes da regulamentação internacional que
veremos abaixo, já constituíram objeto de disputa dos intemacionalistas.
Uma corrente (Schwarzenberger, Jaccobini) os considerava como sen­
do “res nullius” e em conseqüência estariam sujeitos ao primeiro ocupante.
Outra corrente (Pépin, Fenwik, Korovine) sustentava que eles eram
“res communis” e, em conseqüência, insuscetíveis de ocupação.'
A teoria da “res communis” foi a consagrada, na prática, como sendo
aquela que melhor atende às necessidades da sociedade internacional. .Eõ):,.
tro Jaclo. a da “ res nullius” seria impraticável, uma vez que se teria de
alterar toda a teoria da ocupação ou posse efetiva, iá que isto seria impos­
sível nos corpos celestes./A
484- A primeira regulamentação jurídica foi feita pela Assembléia Geral
da ONU, que adotou unanimemente, em 13 de dezembro de 1963, a
Dedarasão de Princípio^ Legais.xeguI?uiienlarLdQ -as_ataãda.des-iia-&xp]o-
ração e uso do espaço exterigr.
Em 1967, foi concluído um tratado sobre “os princípios que regerão
as atividades dos Estados na exploração e utilização do espaço exterior,
inclusive a .Lua, e. outros corpos celestes”,fi que estipula p rin cíp ios, seme­
lhantes ao da citada Declaração: a) a exploração e utilização do espaço,
bem como dos corpos celestes, deve ser feita no interesse da Humanidade;
b) todos os Estados podem explorá-los em pé de igualdade e com liberdade
de acesso a eles; c) os Estados deverão cooperar mutuamente na sua
exploração; d) eles não poderão ser objeto de reivindicação de nenhum
Estado; e) a exploração e utilização deverá ser feita conforme o DI e a
Carta da ONU, visando a manutenção da paz e segurança internacionais;
0 no espaço exterior e nos corpos celestes não serão colocadas armas
nucleares, nem armas de destruição em massa.1' A sua utilização terá ex-

K >t
1284
elusivamente fins pacíficos.1" Não poderão ser construídas bases militares.
“Não se proíbe a utilização de pessoal militar para investigações científicas
nem para qualquer outro objetivo pacífico”; g) os astronautas são consi­
derados enviados da humanidade. Deverão receber toda assistência e co­
operar entre si. Se aterrarem em Estado estrangeiro, serão devolvidos “ sem
demora ao Estado de registro do seu veículo espacial”. Os Estados deverão
informar uns aos outros dos perigos do espaço para os astronautas; h) os
Estados serão responsáveis pelas atividades nacionais de exploração espa­
cial, sejam elas realizadas por entidades governamentais ou nào-governa-
mentais. Estas últimas deverão ser “autorizadas e fiscalizadas constante­
mente pelo Estado correspondente”. As organizações internacionais e os
Estados-membros serão responsáveis pela exploração realizada por estas
organizações; i) o Estado é responsável pelos danos ocasionados por esta
exploração;11 j) os Estados têm jurisdição sobre o objeto e o pessoal lan­
çados por ele no espaço; k) deve haver cooperação e assistência mútua na
exploração e utilização do espaço exterior e corpos celestes. Quando a
exploração de um interferir na do outro, deverão ser realizadas consultas:
l) os Estados que fazem exploração do espaço devem fazer comunicações
cientificas; m) as estações, instalações, etc., que se encontrarem na Lua ou
em outros corpos celestes estarão abertas aos representantes dos outros
Estados que quiserem visitá-las, mas a visita deverá ser notificada com
antecedência.
Em 1967 foi igualmente aprovado na Assembléia Geral da ONU um
tratado sobre o salvamento e a devolução de astron au tas e a restituição de
objetos lançados ao espaço ultraterrestre adotando as seguintes normas:
a) o Estado, ao descobrir que a tripulação de uma nave está em perigo
em território não submetido à jurisdição dos Estados, deve comunicar a
quem o lançou; b) o Estado onde descer a tripulavão deverá tom ar as
medidas de salvamento; c) a tripulação e o engenho deverão ser devolvidos
rapidamente à autoridade que os lançou; d) as despesas com o salvamento
e a devolução correm por conta da autoridade Iançadora; etc.12
A ONU elaborou uma convenção sobre a responsabilidade internacio­
nal, por danos causados por engenhos espaciais (TSTSTTNela se consagra:
a) o Estado lançador terá responsabilidade absoluta e responderá pelos
danos causados na superfície terrestre; b) se não se chegar a um acordo
sobre a indenização, é constituída uma Comissão de Reclamações (cada
Estado indica um membro e o presidente é escolhido de comum acordo);
c) no caso de um dano causado a um objeto espacial lançado por outro
Estado, ele só é responsável se agiu com culpa; d) se um engenho espacial
atingir engenho espacial de outro Estado e do acidente surgirem danos
para um engenho espacial de um terceiro, os dois Estados são responsáveis
perante o terceiro. O Estado se exonera d_a responsabilidade absoluta se
ele provar que a vítima agiu com culpa. Salienta Ferrer que no D. Espacial
a responsabilidade é ilimitada: a reparação é a “restitutio in integrum”.

1285
Em 1975 foi concluída convenção sobre registro de objetos lançados
no espaço exterior. Cada Estado deve ter um registro para tais objetos. E
criado também um registro no Secretariado da ONU t^os Estados devem
fornecer a este órgão os seguintes dados: a) nome do Estado que o lançou;
b) data e território de lançamento; c) principais parâmetros da órbita (por
exemplo, perigeu e apogeu); d) função geral do objtílo. Pode-se recordar
que em 1961 uma resolução das Nações Unidas já estabelecia o registro
destes objetos no Secretariado.
Em 1979 foi concluído na ONU, em Nova Iorque, convenção regulando
as atividades dos Estados na Lua e outros corpos celestes. Ela estabelece:
a) toda atividade deve visar os interesses da manutenção da paz; b) a Lua
deve ser usada para fins pacíficos; c) não podem ser colocados na órbita
da Lua objetos com armas nucleares; d) não podem ser construídas bases
militares; í) consagra a liberdade de pesquisa científica, bem como o meio
ambíente não pode ser alterado; f) a exploração deve ser'feita em benefício
da Humanidade; g) ela não está sujeita a apropriação por parte de qualquer
Estado; h) os Estados terão responsabilidade por suas atividades na Lua;
etc. E o primeiro tratado a utilizar a expressão completa “patrimônio
comum da Humanidade” (Alexandre-Charles Kiss).
485. A cooperação internacional em matéria espacial tem-se manifes-
tado. acima de tudo, nas organizações intem acionais~Na -CRU.-desde
1958, existe uin comitê para estudar a utilização pacífica do espaco exterior...
Vimos já o trabalho desta organização visando a regulamentação jurídica
do espaco.
Na Europa, em 1960, foi assinado um-acordo em Meyrin (Alemanha
Ocidental, Suíça, Inglaterra, Bélgica, Espanha, Holanda, Dinamarca, No­
ruega, Suécia, Itália e França), que instituiu a Comissão Preparatória Eu­
ropéia de Pesquisas Espaciais. Em 1962, foi assinada, em Paris, uma con­
venção criando a Organização Européia de Pesquisas Espaciais. Em 1961,
no Conselho da Europa, foi concluída uma convenção que prevê a criação
de um Conselho Europeu para a Construção e o Lançamento de Engenhos
Espaciais.
Em 1975 foi criada a Agência Espacial Européia (Alemanha, Bélgica,
Dinamarca, Espanha, França, Irlanda, Itália, Países Baixos, Grã-Bretanha,
Suécia e Suíça), visando desenvolver a cooperação para fins pacíficos entre
os seus membros no domínio de pesquisar a tecnologia espacial. Ela tem
um Conselho e um Diretor-geral. Ela substitui as duas organizações citadas
anteriormente: ELDO (European Space Vehicle Launcher Development
Organization) e a ESRO (European Space Research Organization).
Na_América Latina, uma organização não-govemamental, Comitê In-
teramericano para a Pesquisa Espacial, se ocupa do assunto. Entre nós,
temos a Comissão Brasileira de Atividades Espaciais.
Em 1975 a Colômbia reivindicou c o m o seu território a órbita geoes-
Lacionária sobrtjaceme ao seu território. Em 1976 alguns Estados equato­
riais (Brasil, Congo, Equador, Indonésia, Uganda, Zaire e Colômbia) rei­
vindicaram em um comunicado a sua soberania sobre 35.000km de órbita
equatorial como recurso natural raro. Inúmeras críticas têm sido dirigidas
a isto, tais como, viola o tratado do espaço exterior e os citados Estados
não têm meios de tornar a sua soberania efetiva. Esta reivindicação foi
feita por Estados que se encontram na órbita geoestacionária para forçar
os Estados lançadores de satélites a associá-los na sua exploração. Os Estados
citados teriam meios para interferir nos satélites se o desejarem.
No âmbito dos países socialistas foi criado o Intercosmos, que é um
programa de cooperação “para a exploração e uso do espaço exterior para
fins pacíficos”. Foi criado em conferências realizadas em Moscou em 1965
e 1967. A sua mais recente convenção é de 1976. Ele não tem uma orga­
nização internacional para a sua execução.

1287
NOTAS

]. Charles Chaumont — Le Droit de l'Espace, 1970; C. W ilfred Jen k s — Space


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Marco G. M arcoff — Sources du Droit International de 1'Espace, in RdC, 1980,
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Charles Chaum ont, ¡984, págs. 223 e segs.; Alexandre-Charies Kiss — La Notion
de Patrim oine Commum de 1’H um anité, in RdC, 1982, vol. II, t. 175, págs. 99 e
segs.; Pierre-M arie Martin — Les T extes du Droit de 1’Espace, 1993;Jo sé Monserrat
Filho — Introdução ao Direito Espacial, 1998.
IA. A primeira obra sobre o espaço é de 1932, publicada na Alemanha, de
autoria de Vladimir Maudl.
2. Tem-se sustentado que o direito do espaço exterior possui autonomia em
relação ao do espaço aéreo (Valladâo). Esta tese tem sua razão de ser em virtude
de certas normas próprias deste direito e do meio próprio em que ele é aplicado.
Entretanto, trata-se de um direito ainda em formação que, com o veremos, ainda
não conseguiu demarcar a .“zona” onde vai ser aplicado. Daí preferirmos dizer
que ele cam inha para uma autonom ia, ainda não alcançada plenam ente.
2A. E interessante m encionarm os o problema do traçado de fronteiras dos
Estados no espaço aéreo. Se for adotada uma projeção paralela, devido à forma
esférica da T erra • — formar-se-iam verdadeiros corredores entre a fronteira de
cada Estado. Se for adotada uma projeção cônica, em que o vértice (ponto de
partida) seria o centro da Terra, estes corredores não seriam formados, mas à
medida que se afasta da Terra, m aior é a zona submetida ao Estado.
3. Je n k s lembra que as regulam entações sobre rádio definem a estação espacial
com o estando “localizada em um objeto que está além, pretende-se que vá além,
ou que tenha estado além da maior porção da atmosfera da T e rra ".
4. Um autor soviético. Zadorozhny, na época em que foi lançado o “Sputinik”,
afirmou que o satélite não violava a soberania dos Estados, uma vez que não “voa"
sobre os Estados, mas. ao contrário, são os Estados que passam por baixo do
satélite, por causa do movimento de rotação da Terra. O satélite teria uma órbita
fixa (apud Jim énez de A réchaga). Tal fato não ocorre hoje, em que as naves
espaciais se locomovem.
5. Apud Mateesco Malte. .
6. Na Conferência de Chicago e na OACI foi dada a seguinte definição:
aeronave — “aparelho que pode ser sustentado na atmosfera graças às reações do
ar” . Alguns aviões norte-americanos (“aerospace planes", X-15 e X-20) voam a
80km de altitude (X-15) e lOOkm de altitude (X-20). O X-15 levanta vôo como
um avião e depois pode ser dirigido com o foguete espacial. A diferença entre um

1289
avião c um foguete é que o avião se locomove mediante reações aerodinâmicas,
enquanto que para o foguete o ar é um obstáculo.
7. Em 1958, Hammarskjõld já sustentara a não apropriação do espaço por
um Estado.
7A. Os objetos espaciais mesmo que não sejam mais usados não são considé­
ralos “ res nullius” ou “ res derelictae” .
8. Este tratado teve o seu texto aprovado em 1967, por uma resolução da
Assembléia Geral da ONU, para ser submetido à assinatura dos Estados.
9. O Tratado de Moscou (1963) sobre proscrição de lestes nucleares já inter­
ditava a explosão de armas nucleares no espaço exterior.
10. A Assembléia Geral da ONU, em 1958, já estabeleceu que o espaço exterior
deveria ser utilizado para fins pacíficos.
11. E consagrada neste dom ínio a denominada teoria da responsabilidade
objetiva (v. capítulo X X II).
]2 . A expressão “autoridade lançadora” é utilizada para abranger Estados e
organismos internacionais.

1290
CAPÍTULO LI

TELECOMUNICAÇÕES’

486 — Introdução; 487 — A internacionalização da matéria; 488 —


Princípios; 489 — Telecomunicações por satélites; 490 — Rádios pi­
ratas.

486. O estudo das telecomunicações sempre apresentou interesse para


o DIP, sendo de se Jembrar q u e o D. d o Mar sem p r e protegeu os cabos
submarinos (v. capítulo Alto-mar). A matéria adquire um novo impulso
atualmente com a denominada telecomunicação por satélites.
487. O Estado tem soberania sobre as ondas hertzianas, vez que elas
se encontram no seu espaço aéreo. Entretanto, na prática tem-se reconhe­
cido “uma liberdade de trânsito”, em virtude de uma verdadeira necessi­
dade de todos os Estados. Por outro lado, estas zonas se estendem também
ao espaço exterior, onde não se manifesta a soberania do Estado. Pará se
obter m elhor aproveitamento destas ondas é necessário que haja uma
cooperação internacional, para se evitar, por exemplo, as interferências,-;
fazendo a distribuição de freqüências, etc. Esta cooperação se encontra
institucionalizada na União Internacional de Telecomunicações (v. capí­
tulo XXVI).
Tem razão Jiménez de Aréchaga ao afirmar que o domínio das tele­
comunicações é um “bem de uso público internacional” (v. nota 178‘dp
capítulo XLIV ).
Finalmente, é de lembrar que na ONU existe um registro dos. objetos
lançados ao espaço.
488. Haroldo Vailadão, analisando a matéria, estabelece com liase nas
convenções internacionais os seguintes princípios: a) “direito para todos,
de livre e igual utilização dos serviços de radiocomunicação, sem quaisquer
discriminações”. E o princípio básico e tem a sua origem na convenção
telegráfica de 1865; b) “limitação desse direito se representar perigo à

¡291
segurança do Estado ou for contrário às suas leis, à ordem pública ou aos
bons costumes"; c) “exploração dos serviços de radiocomunicaçào sem
interferências prejudiciais às comunicações ou aos serviços radiolelegráfi-
cos dos outros Estados, mediante distribuição internacional das freqüên­
cias”; d) “a radiocomunicação no espaço, em especia), através dos satélites,
deverá se proceder no interesse da manutenção da paz e da segurança,
da cooperação e da compreensão internacionais, impedidas quaisquer
interferências nocivas das atividades de um nas de outro Estado, proce­
dendo-se, se necessário, a um processo internacional de consultas...”; é)
“proibição de irradiação de notícias falsas, de programas perturbadores
das boas relações internacionais à organização e consolidação da paz,
contrárias à soberania e integridade das nações”. A sua origem é latino-
americana. Resolução da Assembléia Geral cTa ONU em 1982 sobre os
princípios que regem a transmissão de programas de televisão por satélites
afirma que a transmissão tem de ser compatível com os direitos soberanos
do Estado e que deve ser respeitado o p rin cíp io de n âo-in ien je n ç ã o , e o
Estado que violar este princípio lem responsabilidade. Não havendo con­
venção proibindo, o Estado é livre para emitir programas de televisão por
satélite para outro Estado. A liberdade está sujeita ao princípio da boa fé.
O Estado de recepção pode tomar medidas restritivas para a proteção de
sua soberania, e o Estado de emissão deve respeitar a exatidão e a objeti­
vidade das informações. Estas observações são de Roger Pinto.
Em 1972 a UNESCO aprovou uma declaração de princípio afirmando
que para haver o respeito à soberania cada Estado tem o direito de fixar
o conteúdo dos programas de ensino transmitidos por satélite.
489. A colocação de satélites2 para telecomunicações na denominada
órbita estacionária da Terra é um problema relativamente recente. Nem
todos os Estados podem colocar tais satélites, devido à sua posição geográ­
fica, como é o caso da URSS. Os russos, devido à sua configuração, geo­
gráfica, usam a órbita elíptica na sua série de satélites Molnya, que se
aproximam e se distanciam da Terra e só mantêm contato com a estação
na Terra quando esta se encontra à vista. E necessário maior número de
engenhos. Outros já o podem: EUA e China Continental. Os satélites
devem ser lançados de bases “situadas obrigatoriamente perto do Equador"
(Mateesco Matte). A vantagem do sistema de satélite geoestacionário em
lugar dos que se locomovem é que ele reduz o número de satélites para
uma cobertura global, bem como a complexidade das estações em terra.
Cada satélite pode cobrir um terço do Globo, sendo suficiente's apenas
três satélites e não é necessário estações terrestres de rastreio. A órbita
geoestacionária é uma órbita circular à distância aproximadamente de
22.300 milhas (35.800km) acima do Equador. Esta órbita permite cobrir
até 40% da superfície do globo (M. Lachs). Um satélite gira na mesma
direção e velocidade da Terra. E chamada também de “órbita equatorial
circular geossincrónica (le satélites". Dentro cio avanço tecnológico atual
só podem ser colocados 180 satélites, lendo em vista que é necessário
deixar um intervalo de 1.450km entre cada mn. Alguns autores salientam
que não é possível se fixar o número de satélites, porque a distância mínima
entre um e outro vai variar com o critério adotado: tamanho do satélite,
o grau de interferência eletromagnética tolerada, etc. Daí os autores sus­
tentarem diferentemente que vai de 180 a 1.800. Eles estão a urna altura
superior a 36.000km . Jean Touscoz afirma que os satélites meteorológicos
e de telecomunicações estão a 3.600km da Terra. A “sua velocidade de
translação corresponde à de rotação da T erra"; dão assim a impressão de
que e^tão imóveis. Isto tem sido denominado de “mobilidade relativa’’’"*
vez que “permanecem sempre sobre um ponto determinado" (Seara Váz­
quez). Em 1977 havia nove satélites na órbita geoestacionária e se calcula
que em 1990 aí estarão 239 satélites ativos. A órbita geoestacionária é um
círculo com 42.164 km de raio, a 150 km de altura e com 30 km de
espessura (José Manuel Pureza).
O Communications Satelite Act, aprovado pelo Congresso norte-ame-
ricano, autorizou a criação de uma sociedade anônima privada (COMSAT)
com finalidade lucrativa submetida a um controle govanamental, a fim de
explorar as telecomunucações por satélites, de que ela tem o monopolio.
O controle do governo é feito pelo: Presidente, Congresso, Departamento
de Estado, NASA e a Comissão Federal de Comunicações.
O INTELSAT (International Telecomunications Satellite Consortjum)
surgiu de um acordo entre os EUA e o grupo europeu em tratados con­
cluidos em Washington em 1964 e 1965. Estes tratados visam estabelecer
?um sistema comercial mundial de telecomunicações por satélites”. O
COMSAT foi designado “gerente de negocios da organização” (Mateesco
Matte). O lançamento destes satélites é realizado pela NASA. O INTELSAT
está aberto a todos os Estados. O INTELSAT é dominado pelos EÜA e
apesar dos países europeus possuírem cerca de 30% do seu capital, somente
6 % dos pedidos industriáis são feitos à Europa, o que já demonstra a
predominância norte-americana.
O INTELSAT, pelo acordo de 1971, possui a seguinte estrutura a)
Assembléia das Partes, reúne-se cada dois anos e trata da política'geral da
organização; b) Reunião dos signatarios — reúne-se urna vez por ano e
cuida dos aspectos técnicos. Participam deste órgão todos os que assinaram
o denominado acordo de operação, e podem ser Estados on entidades de
telecomunicações; c) Conselho de Governadores — é permanente. Tem
22 membros que representam um signatário ou um grupo de signatarios,
representando um mínimo de investimento. E o órgão supremo. E o órgão
de decisão; d) Secretário-geral, com mandato de seis anos.
O COMSAT é de fato o órgão supremo do INTELSAT, vez que como
“gerente” ele tem o direito de veto sobre as decisões do Conselho de

1293
G ov ern ad ores, a n ã o s e r q u e haja o v o lo d e todos os g o v e rn ad o re s e x c e ­
tuados dois. A se d e d o 1N TELSA T é em W ash in gto n .
Este programa de satélites tem sido criticado pelos juristas russos no
senado de que os EUA ficam com o seu monopolio. Inclusive os EUA tém
40% dos votos e com mais três Estados alcançam os 2 /3 necessários para
as decisões. A votação no INTELSAT leva em consideração os investimentos
dos Estados no “programa”. Nove satélites Intelsaf, em 1982, cobriam
todo o Planeta, “com exceção dos póJos p or m otivos técnicos e eletromag­
néticos” (Renato Ribeiro).
Em 1971, a URSS e o seu bloco firmaram acordo sobre a criação de
um sistema internacional e organização de telecomunicações espaciais
intersputnik. Ela tem: a) Conselho de Administração; b) Secretariado e c)
Comissão. A sede é em Moscou. Ela tem estações em Cuba e URSS. Os
membros (países comunistas) do Programa Intercosmos criaram em 1971
a Organização Inter-Sputnik, aberta a todos os Estados. Vários Estados
usam os seus serviços: Argélia, França, Italia, Espanha, etc.
Em 1975 foi concluída convenção para a criação da Agência Espacial
Européia, visando fins exclusivamente pacíficos e de cooperação entre os
estados europeus.
Em 1976 foi criada a Organização Internacional de Telecomunicações
Marítimas por Satélite. Ela tem os seguintes órgãos: Assembléia, Conselho
e Direção-geral. A sede é em Londres. Ela tem o programa do IMMARSAT,
que era inicialmente usado para comunicação espacial entre pontos fixos,
e posteriormente também para pontos móveis. A sua utilização é para fins
pacíficos e pode ser usado para navios de-todos os Estados. As negociações
para a sua criação foram no âmbito da IMCO e a integram Estados e
entidades privadas. A convenção foi emendada em 1985.
Em 1982 foi criada a Organização Européia de Telecomunicação por
Satélite (Entelsat), visando prestação de serviços públicos de telecomuni­
cações por satélite. Tem a seguinte estrutura: a) Assembléia das Partes; b)
Conselho dos Signatários; c) Órgão executivo dirigido por um diretor-geral.
Sobre o problema dos satélites de telecomunicações, é de se salientar
que todo Estado é livre de lançar ao espaço um satélite artificial. Entretanto,
este não deve causar dano a outro satélite já existente. Os Estados proprie­
tários dos satélites poderão cobrar aos demais Estados uma taxa pela sua
utilização. Alguns problemas jurídicos têm surgido com as telecomunica­
ções por satélites: a) a liberdade de informação é regulamentada de modo
diverso pelos Estados; b) algumas divergências podem surgir em matéria
de responsabilidade, por exemplo, divergência entre a lei do local da
prática do delito e a lei do Estado onde o delito produzir resultado; etc.
E de se salientar que em princípio o responsável é o Estado ou organismo
internacional de registro do satélite.

1294
F in a lm e n te , a O N U p ro íb e em d ife r e n te s texto s que o ssaL élites sejam
utilizados p ara p ro p a g a n d a de g u e rra , in c it a r luta d e classe e p re g a r dis­
crim in a çã o ra c ia l ou religiosa. »
Em 1971, urna conferencia U1T, reunida em Genebra, distribuiu as
faixas de freqüências dos “serviços” especiais já existentes ou a serem
criados. Até uma certa data, aplicava-se “a'teoria do direito do primeiro
ocupante ao espectro de freqüência radioelétrica. Em 1947 foi criado o
Comitê Internacional de Registro de Freqüências. Hoje a UIT considera
o espectro de freqüência como patrimônio comum da humanidade.
Em 1982, a AG aprovou resolução sobre “Princípios que regem a
utilização pelos Estados de satélites artificiais com fins de televisão direta
internacional”, estabelecendo que haja consulta entre osJLstados visando
com isto evitar interferências.
Assinala J . Touscoz que a tendência atual é uma liberalização nas
•telecomunicações por satélites, levando-se em consideração a concorrência.
490. No domínio das radiocomunicações, é interessante m encionar o
problema das “rádios piratas”. As primeiras surgiram em 1958, em águas
escandinavas, e em 1961 surgiram na Inglaterra. Cerca de 11 estações
piratas localizadas no mar Báltico, mar de Irlanda e mar do Norte opera­
vam. Elas se situavam em navios localizados em alto-mar ou em instalações
colocadas na plataforma. Estas estações tiram a sua renda de anúncios. Os
navios geralmente an/oram bandeiras, mas já houve uma na Holanda que
era ilha artificial e não tinha bandeira. Segundo informa Evensen, parece
que até aviões têm sido uülizados. Estas estações não são controladas por
nenhum Estado. Em 1965, o Conselho da Europa, em um acordo para a
repressão a estas rádios, estabeleceu para os Estados a obrigação de punir
os seus nacionais por delitos cometidos, mesmo fora da sua jurisdição. Em
relação aos estrangeiros, é estabelecido que eles podem ser punidos se os
atos ilícitos tiverem sido cometidos no território, navio ou avião, ou em
qualquer objeto sob jurisdição do Estado.3
Devemos concordar com Evensen em que, apesar de a convenção de
Genebra sobre plataforma continental não se referir à matéria, os Estados
poderão “regulamentar” as estações piratas que estiverem fixadas na sua
plataforma. E de se assinalar que a Convenção de Genebra de 1959, sobre
radiocomunicação, já proibiu o estabelecimento de estações fora dos limi­
tes territoriais do Estado, e uma recom endação nesta conferência pediu
aos governos para reprimirem tais estações.4
A convenção de D. do Mar de 1982 estabelece que “todos os Estados
cooperarão na repressão das transmissões não autorizadas efetuadas” a
partir do alto-mar, sejam elas de rádio ou televisão a partir de um navio
ou instalação.
A pessoa que fizer tais transmissões poderá ser processada no: a ) Estado
do pavilhão do navio; b) Estado em que esteja registrada a instalação; c)

1295
E stad o n acio n al da p essoa; d) E stad o que re c e b e as transmissões-. <>) Estado
t u jo s serviços de ra d io c o in u n ic a ç ã o sofram in te rfe rê n c ia s . O Estado q u e
te n h a co m p e te n c ia c o n fo r m e e x p o sto p od erá “ ap re sa r" 110 alto-m ar “ toda
p esso a ou navio q u e e fe tu e transm issões n ão au torizad as e co n fiscar o
e q u ip a m e n to e m isso r". O E stad o estará s u je ito às n o rm a fixadas p ara o
d ireito d e visita (v. c a p ítu lo A lto-m ar).
E m relação aos rad ios piratas, alguns E stad o s fazem ação de p o lícia
n o alto -m ar, j á a G rã -B re ta n h a con sid era q u e isto n ã o deve o co rrer.

1296
NOTAS

1. Rene Sienitii — La Radiophonie et le Droit International. 1932: Jean


Evensen — Aspecls o f International Law Relating to Modern Radio Communica-
tions, i ti RdC. 1965, vo!. II, t. 115. págs. 471 e segs.: La répression des émissions
de radiodiffusion effectuées par des stations hors des territoires nacionanx —
Législations nationales et accord européen — docum entação coligida por M anila
Coidan, in AFDI, 1966, págs. 470 e segs.; Centre National de la Recherche Scien-
tifique — Les Telecom m unications par Satelites — Aspects Juridiques — Prefácio
de Claude-Albert Colliard e Alexandre-Charles Kiss, 1968; The International Law
o f Communications, editado por Edward McWhinney, 1971; Nicolás Mateesco
M atte — Droit Aérospatial, 2 vols., 1969-J976; H aroldo Valladão — Problemas
Ju ríd icos Internacionais das Telecom unicações, in B SBD y janeiro-dezem bro 1971.
nes 53 e 54, págs. 81 e segs ; Jo sé Dalmo Fairbanks Belford de Mattos — Liberdade
de Radiodifusão, in Revista da Faculdade.de Direito da Universidade de São Paulo,
1954, págs. 259 e segs.; Francis Ruddy — Os Problem as Internacionais sobre
Satélites de Comunicação, in BSB D I, janeiro-dezem bro 1971, nss 53 e 54, págs. 99
e segs.; Marco G. M arcoff — T raité de Droit International public de l'espace, 1975,
págs. 579 e segs.; Luis García Arias — Alguns problemas de la Televisión, Radio
y Prensa ante el D erecho Internacional, in Luis García Arias — Estudios sobre
Relaciones Internacionales v de Gentes, vol. I, 1971, págs. 389 e segs.; Bin Cheng
— INTELSAT — The Definitive Arrangements, in Essays on International Law in
H onour o f Krishna Rao, 1976, págs. 156 e segs.: Manuel Augusto Ferrer — Derecho
Espacial, 1976, págs. 389 e segs.; C. A. Colliard — La Télévision Directe par
Satellites, in Société Française pour le Droit International — La Circulation des
Inform ations et le Droit Internacional, 1978, págs. 143 e segs.; Stephen Gorove
— T h e Geostationarv O rbit: Issues o f Law and Policy, in AJIL, July 1979, vol. 73,
ns 3, págs. 444 e segs.; Félix Fernández-Shaw — Organización International de las
Telecom unicaciones y de la Radiodifusión, 1978; Nicolás M. Matte — Aerospace
Law; Telecom m unications Satelites, in RdC, 1980, vol. I, t. 166, págs. 119 e segs.:
Renato Ribeiro — D erecho de las Telecom unicaciones Espaciales, in IX Curso de
D erecho Internacional, organizado pelo Comité Ju ríd ico Interam ericano, 1983.
págs. 293 e segs.; Martin A. R othblatt — Satellite Com m unication and Spectrum
A llocation, in AJIL, January 1982, vol. 76 n- 1, págs. 56 e segs.; Maureen Williams
— El D erecho Internacional del Mar y los Satélites de Com unicationes, ¿nAnnuario
A rgentino de Derecho Internacion al, vol. I, 1983, págs. 165 e segs.; Ignaz Seidl-
H ohenveldem — The Third World and Geo-Sttationary Satellites, in Law and
State, vol. 31, 1985, págs. 117 e segs.; Roger Pinto — La Liberté d’Information
et d ’Opinión un Droit International, 1984, págs. 279 e segs.
2. Não existe uma definição aceita por todos de satélite. Verplaetse declara:
“ engenho espacial ( ‘spacecraft ) é qualquer engenho feito pelo homem capaz de
ser usado em uma atividade no espaço exterior” .
3. A Inglaterra promulgou uma legislação punindo os anunciantes, fornece­
dores, tripulantes e proprietários destas rádios. Na prática, assinala M. Vieira, os
Estados muitas *’ezes acabaram por reprimir estações em barcos com bandeiras
estrangeiras.
4. O Brasil apresentou na ONU, em 1974, um p rojeto de tratado visando
regulam entar a “ teledetecção d e recursos naturais por satélites” , estabelecendo

1297
<)ik ' os Estados podemtomar medidas para proteger sen território de tcledetecção
¿1que não deram o seu consentim ento. Estabelece uma liberdade de acesso às
informações obtidas por leledetecção. Proíbe a transferência a terceiros de infor­
mações “sem a autorização expressa da parte contratante a que pertencem os
recursos naturais”. Este projeto é difícil de ser aprovado, porque atinge os interesses
dos grandes Estados. Existem outros projetos além do brasileiro nesta matéria. É
de se observar que há uma lese contrária à do projeto brasileiro, sustentando que
a soberania sobre os recursos naturais não inclui os dados relativos a estes recursos.

1298
CAPÍTULO LII

MEIO AMBIENTE1

491 — Introdução; 492 — Poluição-do mar; 492A — Poluição dos


rios 492B — Poluição do ar; 492C — As organizações internacionais
e a poluição; 49ZD — Legislação brasileira; 493 — Declaração de
Estocolmo e Conferência das Nações Unidas de 1992; 494 — Meteo­
rologia; 494A — População.

491. A proteção do meio ambiente tem sido uma das grandes preo­
cupações do DIP Moderno. A poluição tem-se transformado em uma gran­
de ameaça à humanidade. A visão em relação ao meio ambiente começou
a mudar sob pressão da opinião pública no final dos anos 60 (Kiss).
Contudo o direito florestal surgiu na Babilônia em 1900 a.C. O Código
Hitita, redigido entre 1380 e 1340 a.C., tem norma proibindo a poluição
da água. Em 1370 a.C. o faraó Akenaton cria a primeira reserva natural.
No século III a.C. o imperador Asoca adota um edito protegendo diferentes
espécies de animais selvagens. A Bíblia tem passagem pregando a mode­
ração e a responsabilidade no uso dos recursos naturais (François Ost).
Tem-se considerado que um Estado não pode alterar as condições
naturais de seu território, prejudicando a outro Estado. Daí a necessidade
da cooperação internacional.
Lynton K. Caldwell apresenta princípios sócio-ecológicos: 1) unidade
da biosfera; 2) universalidade da herança cultural e natural do homem;
3) obrigação do homem de conservar esta herança; 4) natureza única da
Terra; etc.
Atualmente existe uma interpretação ecológica das relações interna­
cionais (Sprout e Sprout) que parte da Terra como um sistema fechado
com recursos limitados e, em conseqüência, o que ocorre em alguma parte
do globo afetará alguma coisa em outro local. Pode-se lembrar .que a
palavra ecologia foi criada por Em est Haeckel. E visá estudar as interações
entre o homem e o meio (1866).

1299
A. Shcikh já fula ya existência de um “ Direito Internacional Ecológi­
co"; c Goldie fala ele DI do Meio Ambiente, que a nosso ver ainda não é
tuna realidade mas que se encomia em gestação. Goldie chega a propor
a criação cie uma-“»ção popular” 110 plano internacional para a proteção
do meio ambiente. Arthur Golson sustenta que a destruição permanente
do meio ambiente é um crime contra a humanidade, que pode ser deno­
minado de ecocídio. Falk propõe a conclusão de uma convenção para a
proscrição do crime de ecocíclio. Para Kiss o D.I. do Meio Ambiente
apresenta duas características: a necessidade de imerdisciplinaridade e a
dificuldade de delimitar o seu domínio. Atualmente existem mais de 300
tratados multilaterais e cerca de 900 tratados bilaterais estabelecendo regi as
de conservação.
Alguns autores têm contestado a denominação de “DI do Meio Am­
biente”, porque ele não tem fontes e métodos próprios. A expressão men­
cionada seria utilizada apenas para reunir as normas relativas ao meio
ambiente. Os próprios textos internacionais no ámbito universal não de­
finem o que é meio ambiente.
Para a Comunidade Européia “é o conjunto dos elementos que, na
complexidade de suas relações, constituem a moldura, o meio e as condi­
ções de vida do hom em ...”.
Os tratados sobre meio ambiente são geralmente tratados-moldura,
sem normas precisas. Outros sáo do tipo “umbrella” (guarda-chuva), em
que há uma convenção-moldura com vários protocolos vinculados a ela.
Este direito se preocupa não apenas com a reparação, mas também com
a prevenção.
A tomada de consciencia para a proteção do meio ambiente ocorreu
110 final da década de 60. Este ramo do Direito teria surgido em 1970,
quando Nixon declarou que 1970 era o ano do Meio Ambiente. Entre
1970 e 1972, 26 Estados criaram órgãos administrativos para a proteção
do meio ambiente. Foi quando a palavra ecologia se generalizou e no final
da década de 80 F. Guattari já falava em “ecologia mental" na “ordem
individual ou coletiva”.
A proteção do meio ambiente tem que ser internacional para ser eficaz
(M. Barnier), vez que pode ocorrer em espaços que não pertencem a
nenhum Estado. Gilíes Lipovetzki já fala em “cidadania planetaria".
Sobre os litigios relativos ao njeio ambiente, Bilder fixou os seguintes
principios: d) o da responsabilidade; b) o do conhecimento do falo; c) as
soluções são alcançadas por meio de negociações através de funcionarios
que não são de alto nível; d) as soluções não são legalistas; e) principio da
previsibilidade, os Estados devem procurar um consenso antes de fazerem
algo que possa causar poluição, a fim de evitar litígios, etc. A prática tem
consagrado o dever do Estado de informar aos demais que possam ser
atingidos pela poluição. Este princípio já se encontra consagrado em tra­
tado internacional. No tocante à “responsabilidade” tem ocorrido casos

1300
de pagamento fie indenização sem que o Estado assuma a responsabilidade,
lakando-se em “sofl responsibility”. Não se considera que haja 'vítimas"
quando a poluição é no alto-mar, Antártida e espaço exterior (Kiss). Ob­
serva este mesnio autor que o meto ambiente tem um interesse público e
portanto não é necessário que baja um dano econômico. E a proteção se
estende ao espaço exterior, Antártida, alto-mar, Area, etc. Entretanto, existe
em lodos os casos um problema, assinala Kiss, é identificar o autor e
estabelecer o nexo de causalidade. Uma outra questão é como caracterizar
o “prejuízo grave”, ou, a expressão mais recente, “p reju ízo apreciável".
Jean-Luc Mathieu aponta as seguintes fraquezas do Dl do Meio Am­
biente: a) os tratados só obrigam os Estados que são partes; b) a proteção
convencional é relativa e só de certos aspectos, porque é difícil se obter o
consentimento dos Eslados; c) ausência de órgãos da fiscalização. E mais.
o neoliberalismo com a liberdade econômica permite um aumento da
poluição e esta para diminuir necessita de um certo planejamento econô­
mico.
Pode-se definir poluição como “toda alteração do meio humano cau­
sada diretamente ou indiretamente pela atividade ou omissão do homem,
alteração que tornaria este meio menos propício em atender a um dos
usos para os quais ele mantém o seu estado natural” (Jacques-Yvan Morín).
A título de ilustração, atualmente se protege não apenas os recursos
vivos do mar, mas também outras espécies. Assim foi concluída em Bonn,
em 1979, uma convenção sobre a conservação de espécies migratórias de
animais selvagens. Existe atualmente a preocupação de se proteger a fauna,
seja por medidas diretas (ex.: proibir a captura, destruição de aves, a caça
com substâncias venenosas) e por medidas indiretas (proibir ou restringir
o comércio de peles). Existem tratados concluídos pelo Japão com os EUA
(1972) e URSS (1973), visando proteger as aves migratórias e as espécies
. em perigo. Existe também um tratado para a proteção da vicunha (1969)
(Júlio A. Barberis). Outras espécies são também protegidas: convenção
para a proteção das focas da Antártida (1972) e para a proteção do urso
polar (Canadá, Dinamarca, EUA, Noruega e URSS), concluído em Oslo
em 1973.
Em 1973 foi concluída uma convenção em Washington que regula­
menta o comércio de espécies ameaçadas de extinção.
O problema do meio ambiente, a nosso ver, tem que ser estudado
junto com o econômico, como demonstra a questão do subdesenvolvimen­
to. Até mesmo os atos de particulares devem ser atribuídos aos Estados,
porque estes é que têm os benefícios (José Juste Ruiz). Os mais modernos
autores (Antonio Augusto Cançado Trindade) têm ligado a proteção dos
direitos do homem à proteção do meio ambiente. Pode-se recordar que,
em 1990, um estudo não publicado da OMS mostra como a exposição
prolongada a poluente causa câncer nas vias respiratórias, bem como causa
dano ao sistema nervoso e às funções imunológicas (Jean-Luc Mathieu).

1301
A grande questão da proteção do meio ambiente é que ela seja ligada,
» como já assinalamos acima, aos direitos do homem, caso contrário, em
seu nome haverá o assassinato do humanismo, como declarou William
Aiken, em 1984, de que uma maçíca mortandade humana seria “uma boa
coisa”. Luc Ferry também tem alertado que a defesa do meio ambiente
será feita à custa do homem (Magazine Littéraire, decembre 1992).
Desejamos acrescentar algumas observações. Ambientalismo (“envi-
ronmentalism”) exige uma aproximação gerencial dos problemas do meio
ambiente e ele espera resolvê-los sem mudanças fundamentais na produção
e consumo. Ecologismo propõe mudanças radicais no nosso relacionamen­
to com o mundo natural não humano e também uma mudança radical
na vida pdlítica e social. Consciência ecológica significa identificação com
o mundo não humano e que a nossa própria realização depende desta
. identificação (Andrew Dobson).
492. O m ar tem sido considerado uma fonte de abastecimento para o
homem no tocante à sua alimentação apesar da sua exploração ainda não
ser realizada de modo plenamente desenvolvido e dentro de uma técnica
inteiramente científica.
A riqueza do mar não está em toda a sua extensão, mas apenas em
certas regiões. E o que demonstra Paulo Moreira da Silva ao afirmar que
o oceano tem produzido apenas 1 % da alimentação humana e que no
máximo produzirá 4%. Salienta por outro lado este autor que o oceano
tem apenas 3,6 bilhões de hectares que são produtivos (10% de sua super­
fície) e que se localizam, a maioria, nas águas próximas às costas, isto é,
menos profundas.
O combate à poluição por meio de uma legislação específica é fenô­
meno relativamente recente e visa exatamente preservar as riquezas natu­
rais dos mares, que são seriamente atingidas por ela. Por exemplo, o
petróleo impede a oxigenação da água atacando assim a vida marinha,
bem como por meio dos alimentos acaba por intoxicar o homem.
Caberia agora perguntar p or que existe a poluição e continua ela'a
existir apesar de toda a legislação visando sua repressão. E óbvio que a
poluição surgiu ou pelo menos aumentou com o desenvolvimento indus­
trial. Esta parece ser a causa que surge de modo mais evidente, sem que
deixe de existir o aspecto econômico. A poluição é lucrativa para x> polui-
dor.
No campo doutrinário podemos mencionar duas definições de poJui-
ção, uma elaborada pela International Law Association nas mencionadas
regras de Helsinque e outra do grande maritimista holandês M. W. Mouton,
que são respectivamente as seguintes:

a) “ (...) a expressão “poluição, de água" refere-se a qualquer


mudança prejudicial resultando da conduta humana na com­
posição natural, conteúdo ou qualidade das águasde uma bacia

1302
de drenagem internacional": b) “poluição é o ato de sujar o
meio ambiente com refago on sobra de material que constitui
um perigo, ou porque ele é tóxico para o liomem e outros
organismos vivos, ou porque além disso ele ocupa espaços ne­
cessários. Ele é um indesejável subproduto da indústria e outras
aplicações da tecnologia e de experimentos científicos"; c) a
convenção sobre D. do Mar de 1982 define poluição: “significa
a introdução pelo homem, direta ou indiretamente, de subs­
tancias ou de energia no meio marinho, incluindo os estuarios,
sempre que ela provoque ou possa vir provocar efeitos nocivos,
tais como danos aos recursos vivos e à vida marinha, riscos à
saúde do homem, entrave às atividades marinhas, incluindo a
pesca e as outras utilizações legítimas do mar, alteração da
qualidade da água do mar, no que se refere à sua utilização, e
deterioração dos locais de recreio”.

O que se pode verificar acima é que a poluição não se restringe à


provocada por óleo de navio, como fez a primeira convenção internacional
sobre o assunto (convenção internacional para a prevenção de poluição
do mar por óleo — Londres, 1954). A tendência nos dias dé hoje é, como
demonstram as definições retro, de se entender a poluição em sentido
amplo, isto é, qualquer elemento que seja prejudicial à vida, seja ela
humana, ou a qualquer “organismo vivo”. Há certos tipos de poluição que
ainda não foram determinados e que se encontram em estudo, como é o
caso da poluição por inseticidas ou pesticidas, no Conselho da Europa e
na Organização Mundial de Saúde (Mouton).
A ordem jurídica internacional tem se preocupado com o assunto.
Entretanto, esta preocupação é relativamente recente, remontando apenas
a duas décadas atrás. Na verdade, foi após a 2a Guerra Mundial que houve
um aumento considerável na internacionalização das mais diferentes ques­
tões devido ao progresso nos transportes e comunicações. Tal fato acarre­
tou o aumento da cooperação internacional.
Na verdade, em inúmeros casos o combate à poluição só pode ser feito
através de um regulamento internacional, como ocorre com a poluição
por dejetos radioativos, que nenhum Estado isolado teria meios de evitar
que chegassem ao seu território quando a explosão nuclear fosse feita em
Estado estrangeiro.
Entretanto, é de se recordar “que o direito internacional positivo do
mar, onde é lamentável constatar lacunas, constitui ele mesmo um entrave
ao funcionamento de uma completa cooperação eficaz: a divisão tradicio­
nal do ponto de vista jurídico de espaços marítimos em diversas zonas...”,
isto é, zonas de liberdade (alto-mar), zonas de jurisdição exclusiva do
Estado (águas interiores), etc. (Louis Cavaré).

1303
Feita esta lig e ira in tro d u ç ã o devem os ag o ra v erificar o c ó m b a le à
p o lu ição na o rd e m ju ríd ic a in te rn a c io n a l, d a n d o m a io r ên fase à p o lu içã o
das águ as do m ar, q u e tem re c e b id o nm tra ta m e n to m ais m in u cio so .
Em 1926 tentou-se realizar em Washington uma convenção sobre a
matéria sem se conseguir um resultado. Em 1930 a Conferência de Haia
estabelece que os navios em trânsito devem respeitai' a legislação do Estado
costeiro sobre a proteção das águas de poluição. A Liga das Nações con­
vocou uma conferência para o ano de 1936 para tratar da poluição no
mar, que não chegou a se reunir.
A primeira convenção internacional sobre a matéria é a concluída em
Londres, em 1954,IA destinada à prevenção de poluição do mar por óleo,
revista em 1962 (entrou em vigor em 1967), em uma conferência da IMCO.
Ela estabelece as seguintes normas: à) a convenção se aplica aos navios
matriculados em território dos contratantes e aos não matriculados que
tenham sua nacionalidade. Ela não se aplica aos navios: 1 — aos navios-
tanques que têm tonelagem inferior a 150t; e aos demais navios de menos
de 500t; 2 — aos que navegavam nos Grandes Lagos da América do Norte
e nas águas que são tributárias deles; 3 — aos navios de guerra e aos navios
auxiliares da Marinha de Guerra; etc.; b) que os navios joguem hidrocar­
buros nas águas o mais longe possível da terra; r) não é proibido o lança­
mento de hidrocarburos (petróleo, óleo diesel, “fuel oil” e óleo de pesca)
ou mistura de hidrocarburo para evitar uma avaria ou salvar vida humana
no mar; o mesmo ocorre se o lançamento provém de uma avaria onde se
tomaram todas as precauções possíveis; d) os Estados não podem punir
com penalidade m enor a poluição do alto-mar, do que a penalidade im­
posta para a poluição de suas águas territoriais; e) os navios são obrigados
a ter um registro de hidrocarburos, que pode ser examinado pelas auto­
ridades do Estado em cujo porto se encontra o navio; /) um contratante
pode comunicar a outro a violação de um navio seu nacional da presente
convenção; g) foram criadas várias zonas de interdição para os navios-tan­
ques fazerem lançamento de hidrocarburos ou mistura contendo hidro­
carburos. A regra quase geral nestas zonas é que não podem lançar tais
produtos a menos de 100 milhas da terra. Esta convenção foi emendada
em 1962, 1969, 1971. Esta convenção foi realizada para reprimir a poluição
voluntária, mas os tribunais a têm aplicado à poluição involuntária.
Um dos casos mais recentes e famosos na ordem internacional sobre
este assunto é o navio-tanque “Torrey Canvon” (1967), que encalhou e
terminou por naufragar na costa inglesa tia Comualha, que poluiu com
118.000 toneladas de óleo, ocasionando poluição das praias e acarretando
a morte de peixes e aves. Inúmeros problemas jurídicos surgiram neste
caso: o proprietário era norte-americano; o afrêtador era inglês; o navio
tinha bandeira da Libéria;- a tripulação era italiana; etc. Qual seria o
responsável pelos danos causados? A própria Convenção de Londres não

1304
abrange este caso (1c naufragio, p o iq u e cía "visa unicamente à interdição
de desgaseificação ao largo (las costas". Para se verificar a importância
desle problema é de se lembrar que já existem algumas dezenas de super-
petroleiros e se projeta a contruçáo deles com 500.000 toneladas. O Con­
selho da Europa em um documento concluiu que “é indispensável que o
direito internacional reconheça às autoridades públicas o direilo de intervir
para reduzir ao máximo as conseqüências de um acídeme”. E preciso
lembrar que a Grã-Bretanha sórnente incendiou o “Torrev Canvon”, para
evitar o aumento da poluição, oito dias após o acidente.
A IMCO, a pedido do governo britânico, após o naufrágio do “Torrev
Canvon”, criou várias comissões de estudo para-iquestão da poluição: a)
rolas delimitadas para os navios que transportem 'petróleo ou cargas no­
civas; b) medidas de segurança: velocidade menor dos navios-tanques,
orientação destes navios por estações de rádio em terra; melhor formação
profissional da tripulação; etc.; c) a responsabilidade civil em caso de
acidente.
A Convenção de Genebra sobre alto-mar (1958) estabelece normas
sobre a poluição no alto-mar. Esta convenção, no seu art. 24, determina:

“Todo Estado deve estabelecer regras que visem evitar a


poluição dos mares por hidrocarburos espalhados por navios
ou por oleodutos, ou que se derivem da utilização e da explo­
ração do solo e do subsolo submarino, tendo em conta as dis­
posições convencionais que haja sobre a matéria.'’

Por outro lado, os Estados devem: a) tomar medidas para evitar a


poluição por “imersão de resíduos radioativos” , levando em consideração
as normas internacionais: b) cooperar com os organismos internacionais
para adotar medidas a fim de evitar a poluição dos mares ou do espaço
aéreo sobrejacente ocasionado por “quaisquer atividades que comportam
o emprego de matérias radioativas ou outros agentes nocivos”.
Podemos observar que esta convenção não menciona apenas a poluição
por hidrocarburos, mas também a provocada p o r matéria radioativa, e
abrange também a poluição do espaço áéreo. E de se lembrar o caso do
pesqueiro japonês “Fukuiyo Marti”, que após experiências atômicas, em
1954, no Oceano Pacífico, foi atingido por uma chuva de cinzas.
Como bem salientaram Briltiñ-e Watson, o material radioativo pode
ir para o mar de diversas maneiras: a) resultante de explosões nucleares
feitas no mar e em terra; b) material físsil disponível como subproduto; c)
desperdícios dos navios nuclearesj.d) “descarga acidental”; etc.
A convenção menciona ainda outros agentes nocivos e visa impedir
que o mar se transforme em depósito, por exemplo, de armas venenosas
não utilizadas.

1305
É de lembrar que o alto-mar é livre, e que ele eslá aberlo ao uso de
iodas as nações, mas que isto não significa que possa ser feita uma utilização
anárquica. E de se repetir uma velha noção imprecisa, mas que é válida
nesie caso, a noção de “razoável”. O alto-mar está aberto a uma utilização
razoável.
Em 1969'foi concluída em Bruxelas convenção relativa à intervenção
en) alio-mar em caso de acidentes que causem poluição por hidrocarburos,
permitindo ao Estado agir além-mar lerritorial a fim de proteger o interesse
de sua população. A Convenção estabelece que o Estado antes de agir deve
consultar o Estado da bandeira do navio. O Direito Internacional tem se
desenvolvido no sentido de maior intervenção do Estado costeiro, que
deve ser proporcional aos danos causados (Claude Douay). A citada Con­
venção de Bruxelas tem um protocolo concluido em Londres em 1973.
Além desta convenção foi também concluida em Bruxelas, em 1969,
uma convenção sobre responsabilidade civil em caso de p o l u i ç ã o p o r óleo,
visando o pagamento de uma indenização às vítimas da poluição. E também
uma conseqüência do caso “Torrey Canyon”. Esta última convenção con­
sagra a obrigatoriedade do seguro. O limite máximo de indenização é de
15 milhões de dólares. O julgamento será realizado pelos tribunais do
Estado que sofreu o dano. O responsável é o proprietário do navio (“ow-
ner” — em n o m e de quem o navio está registrado), a não ser nos seguintes
casos: a) ato de guerra; b) causado intencionalmente por terceiro; c) culpa
do governo ou autoridade responsável; d) culpa de quem sofre o dano.16
A indenização é calculada com base na tonelagem do navio. Em 1976 foi
concluído um protocolo a esta convenção e outro em 1984.
A poluição na plataforma continental é igualmente vedada. A Con­
venção de Genebra sobre plataforma continental (1958) estabelece:

“Art. 5 —

7. O Estado ribeirinho deve tomar nas zonas de segurança


todas as medidas adequadas para proteger os recursos vivos do
m ar contra agentes nocivos.”

Na verdade, este dispositivo redigido de forma genérica não estabelece


normas detalhadas sobre a responsabilidade que só pode ser assim definida
em casos concretos, por exemplo, o incêndio de um poço de petróleo.
Esta matéria deverá ser regulamentada pela legislação interna de cada
Estado.
Existe ainda a Marpol (“Marine Pollution”) concluída sob os auspícios
da IMO em 1973 e revista em 1978 sobre a prevenção de poluição por
óleo e outras substâncias nocivas. Ela tem cinco anexos.
Em 1976 foi concluída, em Londres, convenção sobre a responsabili­
dade civil p or danos de poluição causadas por hidrocarburos resultantes

1306
de pesquisa e exploração dos recursos minerais do subsolo marinho no
Mar do Norle consagrando a responsabilidade objetiva do operador da
plataforma.
A poluição por dejetos radioativos durante muiio lempo constituiu
ameaça às águas do mar, especialmente no Oceano Pacífico, onde se
sucediam as explosões nucleares de aspecto experimental realizadas pelas
grandes potencias. A ordem jurídica internacional tem procurado regula­
mentar esta metéria em nome da segurança internacional. Entretanto, é
assunto que tem repercussões diretas no presente lema.
A primeira grande vitória nesta matéria é o Tratado de Moscou de
1963, concluido pelos EUA, URSS e Grã-Bretanha, que proibiu explosões
experimentais de armas nucleares em local que os dejelos radioativos
- possam cair fora das fronteiras do Estado que fez a explosão. Como se
pode observar, este tratado, se não engloba todas as potencias nucleares,
pelo menos engloba talvez as mais importantes.
Diretamente ligado ao Direito Internacional do Mar é o tratado apro­
vado pela Assembléia Geral da ONU em dezembro de 1970 que proíbe a
colocação de armas nucleares e outras arm as de destruição em massa ñas
profundidades marinhas e oceânicas e seu subsolo. A proibição visa as
áreas que eslejam a mais de doze milhas de distancia do limite interior
(linha de base) do mar territorial. Deste enunciado pode-se concluir que
se o presente tratado visa diretamente a segurança internacional é lambém
admissível observar que ele também terá em certos casos a vantagem de
evitar riscos de poluição por meio de armas nucleares.
E da competência de cada Estado elaborar as normas de repressão à
poluição das águas do mar. As convenções internacionais citadas acima
sobre a matéria apenas definem o ilícito sem cominarem as penas aos
infratores. Cabe à legislação interna fixar as penalidades, seja para os navios
que poluem águas territoriais, sejam eles nacionais ou estrangeiros, ou
ainda punir os navios nacionais que cometem esta infração em alto-mar.
Os únicos princípios que se pode dizer estabelecidos como limitação
à legislação estatal são os seguintes: a) os navios estrangeiros não poderão
ser submetidos a penas mais rigorosas que os nacionais; b) a infração deve
ser punida com igual rigor, seja ela praticada nas águas territoriais ou no
alto-mar.
Algumas convenções regionais estão sendo elaboradas, assim, em 1974
os países do Báltico concluíram tratado proibindo, entre outras coisas,
“que se joguem refugos sólidos” naquele mar.
Em 1971, em Bruxelas, sob os auspícios da IMCO, foi concluída con­
venção para a criação de um Fundo Internacional para Compensação de
Dano causado por poluição por óleo. Em 1976 foi assinado um protocolo
a esta convenção.
Em 1972 foi concluída Convenção em Oslo sobre a prevenção de
poluição em certas áreas do Atlântico e do Ártico provocada por navios e

1307
aeronaves. Esta Convenção equipara as plataformas aos navios. Em 1972
ítfí concluída a Convenção de Lonch es para evitar a poluição marinha que.
entre outras determinações, estabelece que os Estados devem criar óigaos
jiara estudar previamente os casos em que forem lançados resíduos no
mar. Estabelece que devem ser lomados cuidados com o lançamento de:
arsénico, pesticidas, etc. Existem três tipos de substâncias nocivas, segundo
a convenção: a) proibidas; b) sujeitas a autorização previa especial; c)
sujeitas a autorização previa geral. A jurisdição sobre o navio é do Estado
da bandeira. Ela foi emendada em 1978.
Em 1974 foi concluída em Helsinque convenção sobre a proteção do
meio ambiente marítimo do mar Báltico, entre Dinamarca, Finlandia,
Noruega, Suécia, Alemanha Ocidental, Alemanha Oriental, URSS e Poló-
nia.l<; E considerado o tratado mais completo sobre a materia (Marotta
Rangel). Ainda em 1974, 15 Estados concluíram, em Paris, uma convenção
para a prevenção da poluição marinha de origem telúrica, abrangendo a
poluição a partir das costas, vindas pelos cursos de água, por canalização,
etc.
Pode-se ainda citar que em Bonn, em 1969, foi concluída uma con­
venção “concernente à cooperação em matéria de luta contra a poluição
das águas do m ar do Norte por hidrocarburos”. Em 1976 foi concluída
uma convenção para a proteção do mar Mediterrâneo contra a poluição.
E a convenção sobre responsabilidade civil por danos causados por poluição
de óleo em virtude de operação em alto-mar. concluída em Londres em
1976.
Em 1980 foi concluído um protocolo para a proteção do mar Medi­
terrâneo da poluição causada por fontes de terra.
Pode-se mencionar uma série de outras convenções sobre poluição,
como o acordo de Copenhague, para prevenir a poluição das águas por
hidrocarburos, concluída em 1967, por Dinamarca, Finlândia, Noruega e.
Suécia. O acordo de Bonn de 1969 sobre poluição das águas do mar do
Norte.
Em 1976 foi concluída em Barcelona convenção para a proteção do
mar Mediterrâneo contra a poluição. Ela tem um protocolo de 1980.
Podem ser citadas ainda inúmeras outras convenções, como a Conven­
ção para a salvaguarda da vida humana no mar (Londres, 1 9 6 0 ),.que tem
dispositivos relativos à segurança, equipamentos, à construção do navio e
ao transporte de mercadorias perigosas. Ela foi substituída por uma nova
convenção sobre o mesmo tema em 1974, com um protocolo de.H)78.
Em 1983 foi concluída Convenção sobre a Proteção e Desenvolvimento
do Meio Ambiente Marinho da Região do Caribe.
A convenção de 1982 traça uma série de normas para a “proteção e
preservação do meio marinho”, que é estabelecida como uma obrigação
dos Estados. Assim, individual ou conjuntamente, o Estado tomará todas
as medidas “necessárias para prevenir, reduzir e controlar a poluição do

1308
u r -ío marinho procedente de qualquer f o n l e A atuação dos Estados não
poderá sei (le modo que o combate à poluição em uma área seja a trans­
ferência desta para ou ira área. No caso da área o art. 1559, alínea 2. fala
na responsabilidade dos Eslados na sua exploração, e o art. 145 determina
que cabe à Autoridade a proleção do meio marinho, e tudo indica que
este organismo pode colocai' em funcionamento a responsabilidade dos
Estados se houver prejuízos (Kiss).
Os Estados cooperarão para o combate à poluição, bem como notifi­
carão os danos ¡mínenles, farão planos de emergência e programas de
investigação e intercâmbio de dados científicos. Serão promovidos progra­
mas de assistência técnica e publicadas informações.
Os Estados promulgarão legislação para reduzir e controlar a poluição
do meio marinho procedente de fontes terrestres, rios, etc. A poluição
vinda de terra, a denominada poluição telúrica (esta noção surgiu em
1974), representa 60% dos casos de poluição (Kiss). O mesmo tipo de
legislação deve ser promulgado em relação às atividades desenvolvidas pelo
Estado na exploração dos fundos marinhos, ilhas artificiais, etc. O mesmo
ocorre na zona econômica.
Em colaboração com as organizações os Estados deverão promulgar
legislação para “prevenir, reduzir e controlar a poluição do meio marinho
vinda da atmosfera”. Os Estados deverão fiscalizar os navios que aivorem
o seu pavilhão para evitar a poluição, bem como fazera “ repressão” quando
aquela houver. O Estado fará investigação quando o navio estiver volun­
tariamente em seu porto, sobre poluição realizada por ele em suas águas
interiores, m ar territorial e zona econômica. A investigação só poderá rétel­
os navios estrangeiros pelo tempo imprescindível necessário para a sua
realização.
Os Estados poderão tomar medidas além do mar territorial para evitar
a poluição de suas costas no caso de acidentes marítimos.
Os navios estrangeiros não podem sofrer discriminações. As infrações
à legislação do Estado costeiro praticadas por navios estrangeiros fora do
niar territorial só dá lugar à imposição de sanções pecuniárias. As infrações
à legislação do Estado no mar territorial só dão lugar também à imposição
de sanções pecuniárias, “salvo no caso de um ato intencional e grave de
poluição”.
O Estado será responsável por ter aplicado sanções ilegais ou que
“excedam o razoavelmente necessário”.
O Estado costeiro tem o direito de promulgar legislação para prevenir,
reduzir e controlar a poluição em zonas cobertas de gelo dentro dos limites
da zona econômica.
Os Estados terão sistemas jurídicos que ofereçam recursos para uma
pronta e adequada indenização por danos causados por poluição.
As normas relativas a poluição mencionadas acima não se aplicam a
navios de guerra, navios auxiliares e navios públicos civis. Entretanto, o

1309
Estado nacional destes navios fará com que eles e as aeronaves cumpram
as normas sobre poluição. A convenção acima é a primeira a estabelecer
regias universais sobre poluição. «
Em 1986 foi concluída convenção para a proteção dos recursos naturais
e meio ambiente da região do Pacífico Sul.
Podemos reproduzir uma observação de Oscar Schachter e Daniel
Serwer:

“Os efeitos imediatos da contaminação marinha não são tão


graves com o os efeitos imediatos da contaminação do ar e das
águas interiores de muitos países, ainda que o potencial para
uma catástrofe possa ser maior devido ao aspecto global do
meio marinho e ao fato de que é receptáculo final de tantos
contaminadores.”

492A. No tocante aos rios encontramos uma série de tratados visando


evitar a sua poluição, como o tratado da EURATOM, que trata de proble­
mas do excesso de radioatividade na atmosfera, água e solo; o tratado
entre a França e a Alemanha Ocidental e Luxemburgo sobre o rio Mosela,
de 1956; o acordo referente à Comissão Internacional para a Proteção do
Reno contra a poluição (Berna, 1963), como podemos mencionar ainda
os arts. 9?, 10 e 11 das denominadas “Regras de Helsinque sobre a utilização
das águas dos rios internacionais”, elaboradas pela International Law As-
sociation, em 1966. Em 1976, a Alemanha Ocidental, França, Suíça e Países
Baixos concluíram convenções para a prevenção à poluição do rio Reno
por produtos químicos.
492B. A poluição do ar é igualmente uma preocupação do mundo
jurídico internacional. Há registro inclusive de litígios entre os Estados,
como o Trail Smelter Case, resolvido por arbitragem entre os EUA e o
Canadá, sobre poluição do ar. Neste caso o tribunal arbitrai em sua decisão,
em 1941, afirmou existir norma internacional no sentido de que todo
Estado tem obrigação de impedir qualquer atividade no seu território que
cause dano a outro Estado. Era o caso de uma fundição canadense de
cobre e zinco que apesar de estar no Canadá, a sete milhas da fronteira,
causava dano à agricultura norte-americana.
A aviação tem constituído também uma ameaça ao meio ambiente,
tendo em vista o barulho, o lançamento de dejetos ou, ainda, o efeito do
aeroporto na ecologia da área adjacente.
Algumas convenções bilaterais têm sido concluídas sobre poluição" do
ar. Entretanto, segundo A. C. Kiss, não existe uma regra de Dl Geral
proibindo a poluição do ar." Em 1968 o Conselho da Europa aprovou uma
declaração de princípios sobre a luta contra a poluição do ar. A OMS
possui uma rede de centros de informação sobre poluição do ar. Em 1967,
foi instalado em Londres um Centro Internacional de Informações sobre
os aspectos clínicos e epidemiológicos da poluição do ar.

1310
Em 1979 foi concluída uma convenção, em Genebra. sob os auspícios
(la ONU sobre poluição tio ar através das fronteiras. Ela considera poluição
do ar tudo aquilo que for introduzido pelo homem e que cause dano à
saúde humana e cause prejuízo aos recursos vivos. Os Estados se compro­
metem a proteger o homem da poluição do ar. Os Estados deverão co­
operar e trocar informações. E criado um Comitê Executivo para aplicar
a convenção. Esta atua no âmbito da Comissão Econômica para a Europa
das Nações Unidas. Ela define poluição atmosférica como: “a introdução
na atmosfera pelo homem, direta ou indiretamente, de substâncias ou
energia tendo uma ação nociva de natureza a colocar em perigo a saúde
do homem, que cause dano aos recursos biológicos e aos ecossistemas, ou
ainda deteriorem os bens materiais e -que atinja 011 prejudique...", outras
utilizações legítimas do meio ambiente. Esta convenção tem um protocolo
de 1985.
Em 1985, sob os auspícios do Programa das Nações Unidas para o
Meio Ambiente, foi concluída, em Viena, uma convenção sobre a proteção
da camada de ozônio. Esta camada é um cinturão de gás rarefeito que se
localiza entre 10 a 50km da superfície da terra e protege “a vida terrestre
das radiações ultravioleta, mas é vulnerável à poluição química”. Tem-se
atribuído o aumento de câncer de pele à diminuição desta camada (Jornal
do Brasil — 2 5 /3 / 8 5 ) . Esta convenção foi completa por um protocolo
concluído em Montreal em 1987 e modificado em Londres em 1991.
Em 1997 foi concluído o Protocolo de Kioto sobre mudança de clima
em que os estados se comprometem a limitar o uso de substâncias que
venham a, por exemplo, provocar o efeito estufa. Este Protocolo tem
encontrado a oposição dos EUA.
Finalmente as pessoas vítimas de tóxicos são pessoas pobres. O pro­
blema do ambiente está ligado a sua condição econômica, tendo em vista
que o povo mora mais perto dos distritos industriais.
492C. A poluição tem sido objeto de trabalho das diferentes organi­
zações especializadas. A OIT tem procurado criar uma proteção ao traba­
lhador de poluição atmosférica do local de trabalho. A FAO tem se preo­
cupado com ela nos seus estudos sobre o uso da água. A OMS, quando
define os padrões de meio ambiente. A UNESCO,2 convocando a confe­
rência para o uso e conservação dos recursos da biosfera. A OACI, ao
cuidar da poluição atmosférica pela aviação civil. E ainda o caso da IMCÓ,
que se preocupa com a poluição do mar (v. acima as convenções concluídas
sob os seus auspícios). A-AI EA também protege o meio ambiente, porque
entre os seus fins está o de reduzir ao mínimo os riscos da radiação. A
OMM fiscaliza a poluição atmosférica.
Na ONU foi criado, em 1972, o Programa das Nações Unidas para o
Meio Ambiente, com sede em Nairobi. Ele tem um Conselho e um Secre­
tariado.

1311-
O Conselho <ía Europa concluiu convenção restringindo o liso de
cel los detergentes (entrón em vigor em 1971)*. etc. Em 1968, o Conselho
da Europa aprovou uma Carta Européia da Agua visando conservar os
recursos de água doce na Europa.
O Banco Mundial leva em consideração o impacto no meio ambiente
dos projetos que ele vai financiar.
Não existe ainda uma organização internacional específica para a po­
luição. Entretanto, a cooperação internacional tein sido intensa nesta ma­
téria por meio de tratados concluidos entre os Estados. Assim, em 1972
foi concluída convenção entre EUA e URSS sobre a cooperação e troca
de informações sobre o meio ambiente, e cria um comité jnisto.
Pode-se recordar que a Ata de Helsinque também cuida da proteção
do meio ambiente.
A ¡uta contra a poluição só pode ser eficaz através da cooperação
internacional.3
492D. A Constituição Federal de 1988 contém inúmeros dispositivos
para a proteção do meio ambiente, tais como: art. 59, LXXIII; art. 225, §
3“; art. 170, VI; art. 225; art. 23. Vil; art. 225, § P : art. 24, VI; art. 216, §
2"; art. 225, § 6“; etc.
Em 29 de junho de 1961 foi promulgado o Decreto n9 60.877, que
“dispõe sobre o lançamento de residuos tóxicos ou oleosos nas águas
interiores ou litorâneas do País, e dá outras providências". Este decreto é
minucioso e determina:

“Art. l s — Os residuos líquidos, sólidos ou gasosos, domi­


ciliares ou industriáis, somente poderão ser lançados às águas,
‘in natura', ou depois de tratados, quando essa operação não
implique na poluição das águas receptoras."

Determina ainda a proibição de “limpeza de motores dos navios e o


lançamento dos resíduos oleosos dela provenientes nas águas litorâneas
do País”.
Por outro lado, define o que se considera poluição: qualquer alteração
das propriedades físicas, químicas e biológicas das águas, que possa impor­
tar em prejuízo à saúde, à segurança e ao bem-estar das populações e,
ainda, comprometer a sua utilização para fins agrícolas, industriais, com er­
ciais, recreativos e, principalmente, a existência normal da fauna aquática.
A fim de complementar este dispositivo o decreto determina ainda cien­
tificamente o que ê água poluída, fixando, por exemplo, “o índice coli-
forme”, “a média mensal de oxigênio”, etc.
As penalidades previstas para os infratores eram as seguintes: a) multa
de cinco mil cruzeiros, que pode ser elevada ào dobro; b) a retenção da
embarcação por prazo de até cinco dias sem que isto signifique exclusão
da multa. A execução é da principal competência do Ministério da Agri­

1312
cultura, através da Divisão dc- Caça r Pesca. com a colaboração de omros
órgãos federais e estaduais.
Em 17 de novembro de 1967 entrou em vigor a Lei 11- 5.357, que 0
muito mais lacônica do que a anterior. Assim estabelece.

“Ari. 1“ — As embarcações ou terminais marítimos ou flu­


viais de qualquer natureza, estrangeiros ou nacionais, que lan­
çarem delrilos ou óleo nas águas que se encontrem dentro de
uma faixa de seis milhas marítimas do litoral brasileiro, ou nos
rios. lagoas e outros tratos de água, ficarão sujeitos às seguintes
penalidades (.-.’)"

As penalidades previstas são as seguintes: “a) às embarcações a multa


de 2% (dois por cento) do maior salário mínimo vigente no território
nacional, por tonelada de arqueação ou fração; b) os terminais marítimos
ou fluviais, a multa de 200 vezes o maior salário m ín im o vigente n o terri­
tório nacional". Estabelece ainda: “em caso de reincidência a multa será
aplicada em dobro".
A fiscalização da lei fica a cargo da Diretoria de Portos e Costas do
Ministério da Marinha em cooperação com os órgãos federais ou estaduais
interessados.
Inúmeras críticas podem ser dirigidas a esta lei: a) ela não pune as
embarcações nacionais que realizarem poluição no alto-mar. E verdade,
que não somos signatários da Convenção de Genebra sobre alto-mar
(1958). Entretanto, parece-nos, pela relevância da matéria e o seu cunho
científico, isto é, não visa atender interesses de Estados particulares, que
já se pode considerar que existe uma norma costumeira obrigando os
Estados a punir os seus navios que fizerem poluição no alto-mar; b) a área
em que era reprimida a poluição era muito estreita. Naquela época a
Convenção de Londres já previra zona muiio mais larga para a prevenção
da poluição; c) a lei é profundamente lacônica, sem definir o que seja
“poluição" e pretendendo englobar iodas as formas de poluição nas pa­
lavras “detritos ou óleo”, etc. A Convenção de Londres sobre a matéria,
ou mesmo a nossa legislação anterior, é muilo mais precisa do que a nossa
nova legislação.
A lítulo-de comentário a esta lei podemos acrescentar, com o Prof.
Pedro Calmen Filho (Defesa da Vale do Rio Doce Navegação S /A —
DOCENAVE, junto à Capitania dos Portos do Estado de São Paulo, em
fevereiro de 1971), que ela só pune as ações culposas, isto é, não pune a
poluição ocasionada por um acidente fortuito. Esta interpretação se prende
à utilização na sua redação do verbo “lançar”, que significa uma ação. A
responsabilidade no DIP no caso de poluição é ainda por culpa, mas o
ideal é que se atinja a responsabilidade objetiva.

1313
Outras críticas podem ser feitas a nossa legislação: u) a lei multa com
base na tonelagem do navio e não leva em consideração a quantidade <le
poluição feita; b) a lei não prevê diminuição da mulla se o navio lomar
medidas para combater a poluição que ele fez; c) a lei é mais interessada
em aplicar multa do que em evitar a poluição (neste sentido: defesas do
Prof. Pedro Calmon Filho junto às Capitanias dos Portos).
Finalmente, o Decreto-lei n“ 1.098, de 25-3-1970, estabelece:

“Art. 3a —

2. No mar territorial todos os navios devem cu m p rir os


regulamentos brasileiros destinados a garantir a paz, a boa or­
dem e a segurança, bem como evitar a poluição das águas e o
dano aos recursos do mar/'

Em conseqüência, o Brasil evita a poluição em uma faixa de 200 milhas


de largura. Podemos acrescentar que uma passagem de navio estrangeiro
no mar territorial com poluição não é uma passagem inocente. Assim
sendo, é que para a passagem inocente de navios nucleares os Estados têm
traçado uma rota especial bem como exigido autorização prévia.
E de salientar que tendo o Brasil ratificado em 1977 a Convenção de
Bruxelas sobre responsabilidade civil em caso de poluição por óleo (1969)
o cálculo da indenização deverá ser realizado segundo a convenção quando
se tratar de navios nacionais de Estados que ratificaram a convenção.
A mais recente legislação é o Decreto-lei ns 1.413, de 14-8-1975, que
obriga as industrias a promoverem medidas para prevenir a poluição e a
contaminação do meio ambiente. Determina ainda que a suspensão ou
cancelamento do funcionamento de estabelecimento industrial é da com­
petência do Poder Executivo Federal. O citado Decreto-lei ns 1 .4 1 3 /7 5 foi
regulamentado pelo Decreto n- 76.389, de 3-10-75. No âmbito do governo
federal foi criada, no Ministério do Interior, a Secretaria Especial do Meio
Ambiente (Decreto ns 73.030, de 30-10-73).
A Lei 9.966 de 2000 estabeleceu a r esponsabilidade do proprietário,
armador, comandante ou tripulante, etc. Determina ainda que a multa
mínima é de sete mil reais e a máxima de cinqüenta milhões.
A Constituição do Brasil de 1988, no art. 225, estabelece que "todos
têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado", e dedica este
capítulo ao meio ambiente. Em diferentes dispositivos trata do tema e
admite ação popular para a proteção do meio ambiente.
493. A Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente,.reunida
em Estocolmo, em 1972, aprovou uma Declaração em que se estabelecem
os seguintes princípios: 1) o homem tem um direito fundamental a des­
frutar condições de vida adequada em um meio “saudável”; 2) devem ser
preservados os recursos naturais da Terra, incluindo-se o arr a água, a terra,

1314
a flora e a fauna; 3) deve-se, sempre que possível. “ restaurar-se ou meiho-
rar-se a capacidade da Terra para produzir recursos vitais renováveis"; 4)
deve-se evitar ()ue os recursos não renováveis sejam esgotados; í>) deve-se
acabar com a descarga de substâncias tóxicas e ontras substancias que
causem danos graves ou irreparáveis; 6) o Estado deve impedir a contami-
„ , nação dos mares; 7) devem ser destinados recursos para conservação e
melhoramento do meio ambiente; 8) deve ser feita uma planificação ra­
cional para conciliar “as exigencias do desenvolvimento e a necessidade
de proteger e melhorar o meio"; 9) deve ser desenvolvida uma educação
sobre questões de meio ambiente; 10) “De acordo com a Carta da ONU
e com os princípios do direito internacional, os Estados têm o direito
soberano de explorar seus próprios recursos aplicando a sua própria po­
lítica ambiental, e a obrigação de se assegurar que as atividades executadas
dentro de sua jurisdição ou sob o seu controle não prejudiquem o meio
de outros Estados ou de zonas situadas fora de qualquer jurisdição nacio­
nal” ; 11) os Estados devem cooperar para desenvolver o DI relativo à
responsabilidade e â indenização às vítimas de contaminação e ou tros
danos do meio ambiente, etc.
Os Estados ainda conservam o direito de estabelecer a sua política de
meio ambiente.
Em 1988, Malta propôs que se substituísse, em relação ao meio am­
biente, a expressão "patrimônio comum da humanidade” pela de “com-
mon concern” (“interesse comum da humanidade”), vez que a palavra
patrimônio levantava objeções de alguns Estados, que a consideravam como
uma ameaça à sua soberania, por exemplo, quando aplicada às florestas.
Na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvol­
vimento, realizada no Rio de Janeiro, em 1992, foram aprovados: a) con­
venção sobre clima; b) convenção sobre biodiversidade; c) declaração vi­
sando a conservação das florestas.
A conservação sobre mudança de clima considera esta matéria como
de “interesse comum da humanidade". E vedada qualquer mudança de.
clima que produza efeitos adversos para o meio ambiente e para a biota.
Considera-se mudança de clima aquela que pode ser direta ou indireta­
mente causada por atividade humana que altera a atmosfera e a “variedade
natural do clima". As Partes se comprometem a proteger o clima e a
proteger o clima e a avaliarem constantemente a emissão de gases.'.Os
Estados devem financiar pesquisas e desenvolverem programas educacio­
nais neste sentido. E criada uma Conferência das Parles que deverá apreciar
as medidas tomadas e os relatórios dos Estados. E criado um Secretariado.
A Conferência terá um órgão subsidiário de natureza científica e tecnoló­
gica para assessorá-la. E criado um mecanismo para obter recursos. O
Estado, ao ratificar a convenção, pode em um documento escrito aceitar
a jurisdição da CIJ ou a arbitragem, ou, ainda, a conciliação para a solução
dos litígios.

1315
Na mesma conferência foi aprovada a convenção sobre Diversidade
Biológica, que considera também a matéria como sendo de “interesse
comum da humanidade". Diversidade biológica significa “a variedade de
organismos vivos de qualquer origem ", assim estão incluídos os terrestres,
os marinhos, os de outros sistemas aquáticos e complexos ecológicos, bem
como recursos genéticos. O Estado tem o direito de explorar os seus
recursos conforme as suas leis de meio ambiente, mas não pode causar
danos ao meio ambiente de outros Estados. Estes devem cooperar e de­
senvolver programas para a conservação da biodiversidade. Devem criar
áreas de proteção especial, bem como restabelecer e restaurai' ecossistemas.
Criar programas científico e técnico de educação e treinamento. Coope­
ração técnica e científica entre os Estados, bem como troca de informações.
Devem ser destinados recursos para este fim e deve ser criado um meca­
nismo financeiro para atender os países êm desenvolvimento. E criada
uma conferência das Partes Contratantés, um Secretariado, bem como um
órgão subsidiário que presta assessoria no aspecto científico, técnico e
tecnologia. O Estado, ao ratificar um documento escrito, pode aceitar a
arbitragem, àjurisdição da CIJ ou a conciliação (terá cinco membros, a
não ser que se estabeleça de modo diferente) para a solução dos litígios.
A convenção tem um anexo sobre arbitragem.
Alguns comentários podem ser acrescentados à idéia de biodiversidade.
A palavra “biodiversidade” é uma contração de “diversidade biológica”
introduzida no meio da década de 80 e consagrada na Conferência do
Rio de 1992. A convenção define biodiversidade com o “a variabilidade
dos organismos vivos de qualquer origem compreendendo, entre outros,
os ecossistemas terrestres, marinhos e outros ecossistemas aquáticos e com­
plexos ecológicos de que eles fazem parte. Isto compreende a diversidade
no seio das espécies, entre espécies como os ecossistemas”. De modo mais
simples ela “é constituída pelo conjunto de seres vivos, de seu material
genético e dos complexos ecológicos dos quais eles fazem parte”. Para a
existência da biodiversidade há: a) motivos econômicos, vez que fornece
inúmeros produtos alimentares, matérias-primas para indústria, medica­
mentos, etc. Ela é a base de toda a produção agrícola. Ela cria atividade
econômica em torno do turismo; b) motivos ecológicos: ela “é indispen­
sável para manter os processos de evolução do mundo vivo, contribui para
a ferlilidade do solo”, bem como tem uma função “na regulação dos
grandes equilibrios físico-químicos”; c) motivos éticos e patrimoniais: “os
homens têm o dever patrimonial de não eliminar as outras formas de
vida”, etc. A noção de desenvolvimento auto-sustentável visa _a reintegrar
as políticas do meio ambiente em uma perspectiva de desenvolvimento
econômico. As linhas acima são de Christian Lévêque. Esta noção surgiu
na ONU para reconciliar os países industrializados e os países em desen­
volvimento. As convenções sobre poluição não falam em “fato ilícito”, mas
usam o eufemismo de “não conformidade”, que é flexível.

1316
O problema destas convenções é que seu funcionamento vai d e p e n d e r
dos recursos e transferência (le tecnologia que forem passados para os
países em desenvolvimento.
A Conferência do Rio (1992) aprovou Declaração sobre meio ambiente
e desenvolvimento afirmando: a) o ser humano está no centro de um
desenvolvimento durave e tem direito a unva vida sã e produtiva em harmonia
com a natureza; b) o desenvolvimento deve atender às necessidades das
gerações presentes e futuras e ao meio ambiente: c) a proteção do meio
ambiente não deve ser vista de modo isolado; d) todos os Estados devem lutar
contra a pobreza; é) os países em desenvolvimento devem se beneficiar de
uma prioridade especial nas ações internacionais; f) os Estados devem.coo-
perar para manter o ecossistema; g) devem ser promovidas políticas demo-
. gráficas apropriadas; h) todos os cidadãos devem participar na proteção do
meio ambiente; i) os Estados devem promulgar medidas legislativas sobre
responsabilidade por danos provocados ao meio ambiente; j) os Estados
devem promulgar legislação para a proteção do meio ambiente: k) não deve
haver transferencia de um Estado para outro de atividades e substancias que
causem dano ao meio ambiente; [) devem ser internacionalizados os custos
para a manutenção do meio ambiente; m) os Estados devem comunicar aos
demais as catástrofes que causem dano ao meio ambiente; n) os Estados
devem tomar medidas de prevenção em favor do meio ambiente; o) a guerra
é destruidora do meio ambiente; p) a paz e o desenvolvimento são indisso­
ciáveis; q) os Estados devem cooperar entre si.
Esta declaração mostra que a proteção do meio ambiente “constitui
parte integrante do desenvolvimento”.
494. A meteorologia é assunto ainda pouco desenvolvido no DIP,
apesar de existir uma organização internacional institucionalizando a co­
operação dos Estados neste dominio (v. capítulo XXVI).
Desejamos apenas apontar para alguns dos prob'emas que este setor
pode trazer para o DIP. Atualmente já é possível se regular o tempo devido
ao avanço da ciência. Entretanto, a modificação do tempo dentro das
fronteiras estatais vai ter repercussões fora delas. Baskin e Baskin chegam
a falar na possibilidade de uma “guerra meteorológica”. Alguns princípios
da Declaração de Estocolmo (acima citados) podem ser invocados para
que um Estado não possa alterar o tempo se isto tiver reper.cussões fora
de suas fronteiras, entretanto, a Declaração de Estocolmo é uma simples
afirmação de princípios e não um tratado.
Podemos repetir os princípios estabelecidos acerca desta matéria por
J. W. Samuel: a) proibição de qualquer modificação do' tempo que fosse
prejudicial ou cujos efeitos fossem incertos; b) consulta aos Estados vizi­
nhos; c) responsabilidade do Estado que causasse qualquer dano; d) os
Estados deveriam fornecer relatórios a um órgão internarcional; é) os rela­
tórios seriam examinados por especialistas; f) observação controlada inter­
nacional- Foi nesta área que surgiu a expressão “common concern” .
A Organização Meteorológica Mundial já reconheceu a necessidade de
serem concluídos novos acordos sobre a questão da modificação do tempo.

1317
Km 1977 foi concluída convenção proibindo a utilização de técnicas
de modificação do meio ambiente para fins militares ou om ros filis Iioslis.
Tem sido observado que as “nonnas” existentes não garantem os Estados,
não havendo uma responsabilidade. Em outubro de 1974 o furação Fifi
foi desviado dos EUA para Honduras pelo serviço meteorológico norte-
americano por meio de uma “cortina de iodeto de prata”. Tal falo foi
descoberto por pesquisadores da Universidade do México.
O protocolo 1 de 1977 às convenções de direito humanitário cie 1949
estabelece que na guerra se velará pelo meio ambiente contra danos ex­
tensos, duradouros e graves, bem como se proíbe o ataque ao meio am­
biente como represália.
Em 1997, foi concluído em Kioto um acordo para reduzir as emissões
na atmosfera de gases de efeito estufa que provocam mudanças climáticas.
A redução será de 5,2% nos anos 2008 e 2010 em relação aos níveis de
1990 e 1995. Entre os gases a serem diminuídos estão: metano, dióxido
de carbono, HFC, etc.
494A. A questão da população sempre foi tradicionalmente assunto
que pertenceu à jurisdição doméstica dos Estados. Entretanto, tem-se con­
siderado que atualmente, tendo em vista que os Estados não adotam uma
política “adequada”, ela deverá se internacionalizar. Alguns autores têm
escrito que o próprio homem já é hoje um elemento de poluição. Assina-
la-se ainda que a questão da população acabará por ter repercussões na
ordem internacional. E de se recordar que alguns autores (Bouthoul)
ligam inclusive as guerras a problemas populacionais.
Dentro da idéia de internacionalização da matéria é que se reuniu,
em Bucareste, em 1974, a Conferência das Nações Unidas sobre População.
Procura-se criar uma política de controle de natalidade. Resolução adotada
pela Conferência de Bucareste considera que a política demográfica é um
atributo da soberania do Estado. Em 1984 reuniu-se na Cidade do México
uma nova Conferênda das Nações Unidas sobre população. O Dl Geral
não reconheceu o direito à procriação voluntária (J. Touscoz). Na verdade
consagrar ou não o direito à reprodução era supérfluo, vez que até recen­
temente, sem os meios de controle de natalidade, podia-se dizer que a
reprodução e o instinto sexual estavam intimamente unidos. A observação
de Touscoz é válida para os últimos vinte anos. Em 1994, reuniu-se no
Cairo uma Conferência da ONU sobre população que consagrou o direito
reprodutivo da mulher. Em 1995, ein Beijing, a A7 Conferência Mundial
sobre a Mulher, também consagra o mesmo direito.
Jacques Ellul (Le bluff technologique, 1988) afirma que restringir o
direito de procriar pressupõe uma “revolução ética” (Escoffier — Lam-
biotte), vez que a criança é um d o m de Deus no judaísmo, catolicismo e
Islã e há o problema da transmigração das almas para o hinduísmo.
A Constituição de 1988 no art. 226 §_79 estabelece que cabe ao casal
o planejamento familiar.

1318
NOTAS

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págs. 37 e segs.; Conferencia Internacional de D ireito Ambiental — Rio de Janeiro
1991; Pierre Alphandéry. Pierre Bitoun e Yves D upont — O Equívoco Ecológico.
Os Riscos Políticos, 1942; Félix Guauari — Les Trois écologies, 1989; Sebastian
Oberthur — T h e Negotiations on the ON Framework Convention on Climatc-
Change, in Law and State, vol. 48, 1993, págs. 7 e segs.; Gudrun Schwarzer — The
International Long-Range Air Pollution Regim e, in Law and State, vol. 48, 1993,
págs. 76 e segs.; Patricia W. Birnie e Alan C. Boyle — Inlernational Law and The
Enviroment. 1994; Laurence Boisson de Chazournes — La Mise en Oeuvre du
Droit International dans le Domaine de. la P roteclion de l’Environnement: Enjeux
et Defis, in RGDIP. 95, n2 1, págs. 37 e segs.; Patricina Birnie — T h e UN and the
Environment, in United Nations, Divided W orld, coordenado por Adam Roberts
e Benedict Kingsburv, 2- ed.. 1995, págs. 327 e segs.; Patricia W. Birnie e Alan
Boyle — Basic D ocum enls on International Law and the Environment, 1995; Michel
Prieur — Droit de l’environnem ent, 1996; T h e International Politics o f the Envi­
ronment, coordenado por Andrew Hussel e Benedict Kingsburv. 1992; François
Ost — La Nature bors la loi, 1995; Geraldo Eulalio do Nascimento e Silva —
Direito Ambiental Internacional, 1995. Christian Lévéque — La Biodiversité, 1997;
Pierre-Marie Dupuv — Ou est la droit International de I’Environnment â la fin
du siécle? “in’' RGDIP, 1997, ne 4, págs. 873 e segs; Andrew Dobson — Green
Poíitical Thought, 1995; Rudiger Wolfrum — Liability for Environmental Damage;
A Means to E nforce Enviromental Standards? “ in ” International Law: Theory and
Practice. Essays in H onour o f Eric Suy, 1998, págs. 565 e segs.; E rn e s tJ. Rey Caro
— Temas de D erecho Internacional Ambiental, 1998; L ’Effectivité du D roit Inter­
national de l’Environnem ent, coordenador: Claude Imperiali, 1998; Le d roit com-
munautaire de I’environnem ent, sob a direção de Jacqueline Dutheil de la Ro-
chére. 1998: Jo se tte Beer-Gabel e Bernard Labat — La Protection Internationale
de la Faune et de la Flore Sauvages, 1999. Pascale Martin — Bidou — Le Principe
de Précaution en Droit International de 1’ Envionnem ent, “in” RG DIP, 1999, n.
3, págs. 631 e segs.: Paulo Jo sé Leite Faria — Com petência Federativa e Proteção
Ambiental, 1999. Guido Fernando Silva Soares — Direito Internacional de Meio
Ambiente, 2001 (a m elhor e mais com pleta obra sobre o tema); Lakshman D.
Gurusvamy, Sir Geoffrey W.R. Palmer, Burns H. W eston. Jonathan C. Carlson —
Supplement o f Basic Documents to International Environmental Law and World
Order, 1999.
IA. Entrou em vigor em 1958 e é considerada a primeira convenção interna­
cional para a proteção do meio ambiente.
IB. Tem havido divergência entre os autores sobre a natureza ju ríd ica da
responsabilidade consagrada em matéria de poluição. Marotta Rangel fala em
responsabilidade objetiva. Outros (Patrick Daillier) sustentam que não foi adotada
a responsabilidade objetiva em matéria de m eio am biente. Sustenta este autor que
os Estados preferem dividir equitativamente os efeitos de sua poluição ou o seu
custo. Salienta Ballenegger qlie as convenções geralm ente remetem em matéria

1321
de responsabilidade às regras costumeiras cio OI. Afirma aínda que as convenções
que tomam responsável o proprietário do navio não são normas cie Dl Público,
mas de Ol Privado, de direito interno. São estas normas que prevêem a responsa­
bilidade objetiva, porque o Dl Público do Mar não consagra a responsabilidade
objetiva. Pode-se acrescentar ainda, com Ballenegger. que o princípio geral é que
o Estado não será responsável por poluição, a não ser que o próprio Estado tenha
faltado a uma de suas obrigações. Só em caso de poluição nuclear é que o Estado
endossa uma responsabilidade subsidiária, a título de garantia. Contudo, pode-se
observar que as convenções relativas à responsabilidade por dano nuclear, por
exemplo, a Convenção de Viena de 1963 sobre responsabilidade civil por dano
nuclear, consagram a responsabilidade objetiva. Vamos reproduzir agora a opinião
de Pontavice e Cordier sobre a responsabilidade. .Afirmam estes autores que a
Convenção da O CDE sobre responsabilidade civil em matéria de energia nuclear
concluída em 1960, com protocolo.de 1964 e convenção complementar concluída
em Bruxelas em 1963. a convenção de Viena de 1963 relativa à responsabilidade
civiJ em matéria de dano nuclear e a convenção relativa a exploradores de navios
nucleares (Bruxelas, 1962), consagram a responsabilidade objetiva e limitam o
montante de indenização e que o sistema de responsabilidade para o caso de
poluição por hidrocarburos é análoga da responsabilidade em matéria nuclear.
Por outro lado, a Convenção de Bruxelas de 1969, sobre responsabilidade civil
por danos produzidos por hidrocarburos, também consagra a responsabilidade
objetiva, mas ela introduz elementos da responsabilidade por culpa ao declarar
que o proprietário não é responsável se ele provar que o fato é devido a uma ação
ou omissão de quem sofreu a poluição. A responsabilidade objetiva foi igualmente
consagrada na convenção de Londres de 1976 sobre responsabilidade civil por
danos de poluição por hidrocarburos resultantes da pesquisa e da expulsão dos
recursos minerais do subsolo.
1C. Os quatro primeiros países citados concluíram em 1974, em Estocolm o,
convenção para a proteção do meio am biente nórdico.
2. A UNESCO, em 1972, concluiu uma convenção para a proteção do “patri­
mônio mundial, cultural e natural” visando estabelecer princípios para uma coo­
peração entre os Estados. São considerados patrimônio cultural: obras arquitetô­
nicas, escultura, pintura, etc. O patrimônio natural é composto por “ monumentos
naturais constituídos por formações físicas e biológicas” apresentando valor uni­
versal excepcional seja do “ ponto de vista estético ou científico” . O u ainda o
habitat de espécies animais e vegetais ameaçadas de desaparecimento, etc. Os
Estados devem proteger estes patrimônios. A convenção prevê a criação de uma
Assembléia Geral e u.m Comitê Intergovernam ental de proteção do patrimônio
cultural e natural de valor universal excepcional. O Comitê deverá elaborar uma
lista do patrim ônio mundial e outra lista do patrimônio mundial em perigo. E
criado um fundo para a proteção do patrim ônio mundial.
3. O país que mais tem se interessado pela luta visando a proteção do meio
ambiente é os EUA. Pierre Chaunu procura explicar isto dizendo que os EUA
nunca tiveram o cam ponês nem uma grande ocupação do solo, com o ocorreu na
Europa. No século X IX eles desperdiçaram recursos como nenhum povo. “Mas a
América, sem o saber, sonha acordada do tem po abençoado do grande desperdício
sem com plexo.” Com o os EUA controlam os meios de comunicação, eles imporiam
as suas idéias aos demais povos (De 1’Histoire à la Prospective, 1975, pág. 227).

1322
Tem sido observado que não se pode impor aos paí.scs cm desenvolvimento as
mesmas obrigações f*in matéria de proteção ao meio ambienie qne se impõe aos
países ricos.

1323
LIVRO VII

ÓRGÃOS DO ESTADO
NAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS
i
CAPÍTULO LUI

CHEFE DE ESTADO.
MINISTRO DAS RELAÇÕES EXTERIORES'

495 — Os chefes de Estado na ardem internacional; 496 — A subida


ao poder do chefe de Estado; 497 — Títulos; 4 9 8 — Correspondencia;
499 — Imunidades; 500 — O ministro das Relações Exteriores; 50]
— Organização do Ministerio das Relações Exteriores.

495. Os chefes de Estado são os representantes do Estado na ordem


internacional. A política externa do Estado segue a sua orientação. E a
mais alta autoridade do Estado em política exterior.2
Eles não necessitam de “plenos poderes” para a negociação e assina­
tura de tratados. Entretanto, tem-se negado atualmente ao chefe de Estado
o “jus representationis omnimodae”,3 em virtude do processo de demo­
cratização. Não se considera mais que o chefe de Estado tem o poder
absoluto de engajar o Estado (Cahier, Rubens Ferreira de Mello). Isto
somente ocorre quando ele agir dentro dos limites fixados pela Constitui­
ção do Estado.4
E o chefe de Estado quem ratifica os tratados. Até 1789, e mesmo no
início do século XIX , era comum que os chefes de Estado assinassem os
tratados internacionais, posteriormente surgiu uma impossibilidade “prá­
tica” para que isto ocorresse. Por outro lado, no tratado assinado pelo
chefe de Estado, a ratificação perderia uma de suas razões de ser.(OJPoder
Legislativo, em virtude dos princípios democráticos que se instalaram na
grande maioria dos Estados, passou a aprovar o tratado antes da ratificaçãjõj)
Na Constituição Brasileira de 1988 fixa-se os princípios das relações
internacionais a serem seguidos pelo Brasil (art. 46): a) independência
nacional; b) prevalência dos direitos humanos; c) autodeterminação dos
povos; d) não-intervenção; é) igualdade entre os Estados; f) defesa da paz;
g) solução pacífica nos conflitos; h) repúdio ao terrorismo e ao racismo;

1327
í) cooperação entre os povos p.na o progresso da humanidade;^) concessão
de asilo político, l) promover a integração econômica latino-americana. A
inclusão destes princípios não os torna mais obrigatórios no plano inter­
nacional. Estes princípios evoluem e estão sujeitos a diferentes interpreta­
ções. A sua inclusão na Constituição tem valor pedagógico para educar a
opinião pública (Remiro Brotons).
496. A subida ao poder de um chefe de Estado tem interesse para a
ordem internacional, daí ser regra geral se fazer uma comunicação deste
fato aos demais membros da sociedade internacional. Esta comunicação
normalmente contém o voto de que as relações de amizade entre os dois
listados deverão continuar e a resposta é dada nos mesmos termos,- acom­
panhada de votos de felicidade.
&Não cabe ao Estado estrangeiro apreciar a legitimidade de um chefe
de Estado. Esta questão da escolha do chefe de Estado pertence ao domínio
reservado dos Estados. E a aplicação do princípio da autodeterminação.
497. Os chefes de Estado trocam entre si condecorações. Estas conde­
corações são retiradas quando os Estados entram em guerra. Deste modo,
ao ser deflagrada a P Guerra Mundial, os imperadores da Áustria e da
Alemanha e o rei do Vurtembergue deixaram de fazer parte da Ordem
d ajarreteira (Grã-Bretanha).
E preciso assinalar que no mundo internacional todos os chefes de
Estado gozam de igualdade de tratamento, tenham eles títulos de impe­
rador, rei ou presidente.5 E comum que o Papa, nos países católicos, receba
honras especiais.6
O cerimonial a ser seguido nos encontros entre chefes de Estado é
acertado previamente por funcionários dos Estados interessados.
498. Os chefes de Estado trocam entre si correspondência. Os autores
têm observado q u e a prática consagra a existência de três tipos de cartas.
Fauchille declara serem as seguintes: de Conselho, de Gabinete e cartas
autografas.
As cartas de Chancelarias são as de que o ch.efe._ile-EstadQ.sejmiliza
para reconhecer governos, comunicar a sua investidura, etc. Elas são assi­
nadas pelo chefe de Estado e referendadas pelo ministro das Relações
Exteriores. Levam o “selo grande de armas da República”. Estas cartas
podem assumir diversas denominações; por exemplo, a de “carta creden­
cial” (quando ela serve para acreditar Missões Diplomáticas); “carta revo­
catoria” (quando revoga credenciais); etc.
As cartas de Gabinete são menos solenes. São assinadas pelo chefe de
Estado, podem ser referendadas ou não pelo ministro das Relações Exte­
riores. São utilizadas, por exemplo, para a formularão de convites, agra­
decimentos de homenagens, etc.
As cartas autografas seriam aquelas informais e que não têm nenhuma
forma determinada em lei ou regulamento.

1328
499. Os chefes de Eslaclo gozam de completa i i n u n í r l a d r Tentou-se
explicar esta imunidade por meio do recurso à ficção da extraterritoriali­
dad e, como se fez com os agentes diplomáticos (Heffier. Bvnkershoek).
Contudo, esta ficção foi rejeitada por ser inteiramente desnecessária.7 O
chefe de Estado goza de imunidade em virtude do seu aspecto repre­
sentativo.'Ora, nós já vimos que os Estados gozam de igualdade jurídica,
dévênclô-se aplicar o adagio “ par in parem non habel judicium”. O mesmo
raciocinio podemos aplicar em relação ao chefe de Estado, que é um órgão
do Estado. Além desta razão jurídica, existem considerações de ordem
prática, como a conveniencia, a reciprocidade e o desejo de se evitar
conflitos internacionais. Podemos acrescentar que as imunidades e privi­
légios concedidos ao chefe de Estado e sua família têm também por fun­
damento “garantir o desempenho de suas funções’' . A extensão destes -
privilégios e imunidades à comitiva do chefe de Estado é que pode -ser -
considerada como tendo a sua origem em uma “comitas gentium”, a não
ser que consideremos a comitiva como equiparada ao “pessoal técnico e
administrativo” da Missão Diplomática (v. cap. LII) e, em conseqüência,
tendo também o fundamento dos seus privilégios e imunidades na neces­
sidade de “garantir o desempenho de suas funções”.
Ò chefe de Estado em territorio estrangeiro tem inviolabilidade pes­
soal. não podendo, em conseqüência ser preso
Do mesmo modo, ele goza da mais completa imunidade de iurisdiqip.
Em relação a esta imunidade, tem a prática consagrado algumas exceçõe$_ -
como: a) as ações relativas a imóveis que o chefe de Estado possui como
simples particular no estrangeiro; b) as ações resultantes da posição de
herdeiro ou legatario do chefe de Estado em território estrangeiro; c)
quando o chefe de Estado renuncia à sua imunidade.8 Estas exceções nos
parecem ser inteiramente justas ou procedentes, uma vez que a pessoa, ao
ser chefe de Estado, pode se livrar inteiramente delas por sua própria
vontade, vendendo os seus bens particulares, não aceitando heranças 011
legados/Nestes casos, o chefe de Estado age como particular, e qualquer
ação contra ele não atinge a dignidade do cargo/)Estas exceções, entre­
tanto, não devem ser aplicadas quando o chefe de Estado está no estran­
geiro, onde seria acionado (Cahier). Os chefes de Estado têm completa
imunidade de jurisdição criminal. Gozam de isençãolíscal. Possuem o
direito à livre comunicaçao com o seu Estado. — —-
Estas imunidades, por cortesia, têm sido estendidas às pessoas da fa­
mília e da comitiva do chefe de Estado.10
O chefe de Estado não pode exercer a sua jurisdição em território
estrangeiro. Deste modo, se alguma pessoa da sua comitiva comete um
ilícito em território estrangeiro, ela não poderá ser aí punida.”
Outra questão que tem sido levantada pelos doutrinadores é a de se
- saber se estas imunidades cobrem um indivíduo que tenha deixado de ser

1329
chefe de Estado, mas que lenha praticado os ilícitos como tal. Na respon­
sabilidade penal, pelo menos, a moderna tendência tem sido contrária à
conservação da imunidade de jurisdição. Dentro desta orientação eslava
o art. 227 do Tratado de Versalhes, que acusava o Kaiser, mas que não foi
julgado por ter a Holanda se recusado a extraditá-lo. No plano da imuni­
dade de jurisdição civil, consideramos que é perfeitamente cabível a dis­
tinção em atos públicos e privados, e apenas com relação aos primeiros as
imunidades permaneceriam.
Finalmente, podemos salientar que os chefes de Governo têm os mes­
mos privilégios e imunidades dos chefes de Estado. Na verdade, o trata­
mento dos dois é idêntico.
Denomina-se de conferência de cúpula as reuniões entre chefes de
Estado. Esta expressão foi criada por Churchill em 1953 (Jean Klein).
. 500. O ministro das Relações Exteriores tem uma dupla função. Ele é
um “órgão interno do Estado” e. ao mesmo tempo, um “órgão das relações
exteriores do Estado ”. Ele é o chefe do Ministério das Relações Exteriores.
O Ministério das Relações Exteriores começou a surgir na Inglaterra
no século XIII, no reinado de Henrique III (1253), fazendo parte da Casa
Real. No século XV (Henrique IV) são designados dois secretários de
Estado. Neste mesmo século já são denominados de Secretários principais,
o que é confirmado em 1539. Após a morte de Henrique VIII, deixou de
fazer parte da Casa Real (Satow). Na França, ele foi criado em 1589
(Henrique II), para atender à correspondência do rei com o exterior.
Louis de Revol foi o seu primeiro titular. Esta repartição político-adminis­
trativa do Estado, encarregada da vida internacional, surgiu da necessidade
que os Estados têm de estabelecer relações uns com os outros, bem c o m o
da intensificação destas relações nos tempos modernos. A sua criação se
generaliza após a Paz de Vestefália.
Em 1736 foi criada a Secretaria para Negócios Estrangeiros, em Por­
tugal, e o seu primeiro ocupante foi Marcos Antônio de Azevedo Coutinho,
que, entretanto, só assumiu em 1738.
No Brasil, o Ministério do Exterior era unido ao da Guerra, conforme
criação de D. João VI, em 1808. Em 1821, se uniu à Pasta de Negócios do
Reino, que, ao ser proclamada a Independência, passou a ter a denomi­
nação da Pasta do Império e dos Negócios Estrangeiros. O primeiro bra­
sileiro a ocupar esta Pasta foi José Bonifácio, em 1823, a de Negócios
Estrangeiros se separou da do Império e passou a ser independente, sendo
nomeado para seu chefe Luís José de Carvalho e Mèlo (futuro Visconde
de Cachoeira), que foi o nosso primeiro ministro do Exterior.’2
O Decreto nB 71.534, de 12-12-72, estabeleceas seguintes funções para
o Ministério das Relações E xteriores: a) dar execução à política exterior
fixada pelo Presidente; ¿)_ recolher as informações necessárias à formulação
da execução da política exterior; c) representar o governo brasileiro; d)
negociar e celebrar tratados; e) organizar e instruir as missões, especiais;
D organizar conferências internacionais que se realizem 110 Brasil: g) pro­
teger os interesses brasileiros 110 exterior; h) representar o governo brasi­
leiro nas relações oficiais com Missões Diplomáticas estrangeiras e junto a
organismos internacionais.
O Ministro das Relações Exteriores, ao assumir ou deixar o seu cargo,
deve comunicar tais fatos ao Corpo Diplomático estrangeiro acreditado
junto ao seu Estado.
Ele exerce inúmeras funções, que têm a maior relevância para a vida
internacional: a) prepara os atos referentes aos assuntos externos que são
assinados pelo chefe de Estado; b) designa os agentes diplomáticos e côn­
sules; c) transmite as instruções a eles; d) entra em contato e conferencia
com o Corpo Diplòípático estrangeiro; é) cuida dos interesses do seu Estado
no exterior. A vida externa do Estado, de um modo geral, se encontra sob
a sua responsabilidade.
( O ministro das Relações Exteriores, quando se encontra em território
estrangeiro, deve gozar dos privilégios e imunidadesdos agratêsrflplôimá-
ticos, para que possa desempenhar com independência as suas funções!^
Por outro lado, ele é o chefe dos agentes diplomáticos do seu Estado
nacional. Ele goza de inviolabilidade e de imunidade de jurisdição civil e
penal. Estas imunidades se estendem às pessoas de suatam iliã que sejam
seus dependentes. Cahier nega a isenção fiscal que é dada aos diplomatas:
so teriam a franquia aduaneira. Ela, entretanto, pelas razões expostas
acima, parece-nos que deve ser estendida aos ministros das Relações Ex­
teriores.
Ele, para négociar e assinar tratados, não necessita de plenos poderes.
O m in istro obriga a seu E stad o p elo s atos que praticar dentro dos
limites da sua competência. O mais célebre caso neste sentido é o do
ministro do Exterior da Noruega, Ihlen, renunciando às reivindicações de
seu país na Groenlândia Oriental.
As coletâneas de documentos diplomáticos são chamadas de livros
amarelos (FranÇa), livros azuis (Inglaterra), livros vermelhos (Espanha),
livros verdes (Itália), livros brancos (Portugal), etc.
501. A organização do Ministério das Relações Exteriores é assunto
interno de cada Estado. A própria denominação do seu “chefe” não é
uniforme entre os Estados: Cardeal secretário de Estado (Santa Sé); secre­
tário de Estado (EUA). O seu primeiro Secretário de Estado foi Thomas
Jefferson; ministro dos Assuntos Exteriores (Espanha); comissário do Povo
para jSlegócios Estrangeiros (URSS, até 1946), sendo atualmente Ministério
das Relações Exteriores; secretário de Estado para os Negócios Estrangeiros
(Grã-Bretanha); ministro dos Negócios Estrangeiros, no governo Mitterand
passou a ser Ministério das Relações Exteriores (França); chefe do Depar­
tamento Político (Suíça); etc.
No Brasil é denominado de ministro das Relações Exteriores. A palavra
“chanceler” começou a ser empregada pelos jornais para o Barão do Rio

1331
Branco, que co m ela foi chamado de Chanceler da Paz, ou, ainda, Chan­
celer de Ouro. Parece que tal fato surgiu devido à admiração do Barão
por Bismark, que era o Chanceler do Império Alemão e cognominado de
“Chanceler de Ferro” (G. E. Nascimento e Silva).
A organização do Ministerio que estudamos varia de Estado a Estado.
Podemos assinalar, apenas, que a grande tendência (EUA, Inglaterra) é a
de organizá-lo por meio de departamentos, secretarias ou divisões com
base em regiões geográficas. O mesmo ocorre com a atual organização
brasileira.
O n osso Ministério do Exterior tem passado, nos últimos anos, por
inúmeras transformações (reforma Melo Frajico, 1931; reforma Osvaldo
Aranha, 1938; reforma João Neves, 1946; etc.). A sua atual organização foi
dada pela Lei ne 3.917, de 14 de julho de 1961. O Ministério das Relações
Exteriores tem a seguinte organização: Secretaria de Estado, Missões Di­
plomáticas e Repartições Consulares.
A Secretaria de Estado “é o órgão central do Ministério” e tem diversas
divisões: Secretaria-geral de Política Exterior; Departamento de Adminis­
tração; Departamento Consular e de Imigração; Departamento de Assuntos
Jurídicos; Cerimonial; Seção de Segurança Nacional; Comissão de Coor­
denação; Comissão de Promoções; Serviço de Relações com o Congresso;
Serviço de Demarcação de Fronteiras. A que mais nos interessa é a Secre-
taria-geral da Política Exterior, dirigida por um secretário-geral. A esta
estão subordinados uma série de Departamentos: a) Geral, de Administra­
ção; b) das Américas; c) da Europa; d) da África; e) da Ásia; j) da Oceania;
g ) de Organismos Internacionais; h) de Organismos Regionais Americanos;
z) Econômico; j) Cultural; l) de Promoção-Comercial; etc.
A Secretaria-geral tem quatro subsecretarías: a) de Políticas; b) de
Administração; c) de Economia e Comércio; d) de Coordenação Geral.
Como se pode constatar, por esta reforma adaptamos a estrutura do
MRE à tendência de se criar Departamentos especializados com base em
regiões geográficas.
O MRE ocupa o denominado Palácio Itamarati.13

1332
NOTAS

1. Gustavo Barroso — Historia do Palacio Itamarati. 1956; J . Rives Childs —


American Foreign Service, 1948; Donald G. Bishop — The Administration o f British
Foreign Relations, 1961; Phillipe Cahier — Le Droit Diplomatiqiie Contem porain.
1962. págs. 333 e segs.; Daniel Antokoletz — Tratado T eórico y Práctico de Derecho
Diplomático y Consular, i. 1, 1948, págs. 95 e segs.; Raoul Genet — T raité de
Diplomaüe et de D roil Diplomalique, i. 1. 1931, págs. 43 e segs.; Satow’s Guide
to Diplomatic Practice, editado por Neville Bland, 1958, págs. 5 e segs.; José
Sebastián de Erice y O ’Shea — Derecho Diplom ático, t. I, 1954, págs. 231 e segs.;
Rubens Ferreira de M ello — Tratado de Direito Diplomático, vol. I, J940, págs.
35 e segs.; Elmer Plischke — Conduct o f Am erican Diplomacy, 1961; Graham H.
Stuart — The D epartm ent o f State, 1949; Geraldo Eulálio do Nascimento e Silva
— Os Chefes de Estado e o Direito Internacional, in BSBDI, janeiro-dezem bro,
1967, n2s 45 e 46, págs. 65 e segs.; G. E. Nascim ento e Silva — Os Chefes de Estado
e as Relações Internacionais, in Revista de Ciência Política, vol. 4, n 5 1, m arço de
1970, págs. 63 e segs.; G. E. Nascimento e Silva— O Ministro das Relações Exteriores
e a Política Internacional, in Revista de Ciência Política, vol. 4, ne 3, setem bro de
1970, págs. 5 e segs.; Jo h n MacDonald — The Role o f the Legal Adviser o f Minislries
of Foreign Affairs, in RdC, 1977, vol. III, t. 156, págs. 377 e segs.; Jo rg e Campinos
— O Ministro dos Negocios Estrangeiros, 1977; A ntonio Remiro Brotons — La
Acción Exterior del Estado, 1984; Christian D om inicé — Quelques Observations
sur l’Immunité de Jurid iction Pénale de l’A ncien C h ef d'Etat, “in” RGDIP, t.
103/99/2, pgs. 297 e segs.
2. Heffter chega ao exagero de afirmar que o chefe de Estado é pessoa
internacional. E ntretanto, ele nada mais é do que um órgão do Estado.
3. Em sentido contrário, Hildebrando Accioly defende que existe um costume
internacional que, segundo alguns autores, dataria do século XII, reconhecendo
ao chefe de Estado “urna competencia internacionalm ente ilimitada na conclusão
dos tratados” . Em favor da nossa posição é m encionado o Tratado de M adri, de
1526, entre Carlos V e Francisco I, em que se estipulava a cessão da Borgonha por
parte daTfança, o qual não foi aprovado pelo “P arlam ento” de Paris. Nesta época
o rei da França era incapaz para alienar qualquer territorio francês. Não existia,
portanto, já naquela época qualquer “jus representationis omnimodae” (Chailley).
4. A Constituição brasileira, no seu art. 84, declara que “compete privativa­
mente ao Presidente: V II) manter relações com Estados estrangeiros; V III) celebrar
tratadçs, convenções e atos internacionais ‘ad referend um ’ do Congresso Nacional;
(...) XIX) declarar guerra, depois de autorizado pelo Congresso Nacional, ou, sem
esta autorização, no caso de agressão estrangeira verificada no intervalo das sessões
legislativas; X X ) fazer a paz, coro autorização ou 'ad referendum ’ do Congresso
Nacional; (...) X X II) perm itir, nos casos previstos em lei complementar, que forças
estrangeiras transitem pelo territorio nacional ou nele permaneçam tem poraria­
m ente”.
5. Antigamente dava-se primazia ao título de im perador. Daí o rei da França,
áo negociar com a Turquía, se atribuir o título de imperador.
6. O Papa am igam ente atribuía alguns títulos aos reís católicos da Europa:
rei de França (Filho Prim ogênito ou Majestade M uito Cristã); rei de Portugal
(Fidelíssimo); rei de Espanha (Rei Católico).

1333
7. V. capítulo LU.
8. O Instituto de DI (1891) acrescentou mais um caso: o de perdas c danos
por delitos ou quase-delitos que tenham sido praticados no estrangeiro. Este caso,
entretanto, para nós deve ser rejeitado. A ju rispru d ência não é uniforme. A inglesa
consagra a imunidade absoluta e a italiana distinguía entre atos públicos e atos
particulares.
9. A jurispru d encia norte-americana desde o século passado admite que um
chefe de Estado estrangeiro pode ser autor de um a ação.
10. Estas im unidades são igualmente reconhecidas aos chefes de Estado que
se encontrarem incógnitos em território estrangeiro, isto é, em caráter particular,
desde que eles já revelem esta sua qualidade de chefe de Estado estrangeiro. A
jurisprudência j á consagrou este principio.
11. Ele pode e xercer atos que produzem efeitos apenas no seu país. Deste
modo, Eduardo V II designou Asquilh, primeiro-m inistro (1907) quando estava na
França. Durante a 2S Guerra Mundial, os governos exilados em Londres lam bém
realizaram ai atos de soberanía, mas destinados a produzir efeitos no Estado
nacional. ’ -
12. O primeiro ministro das Relações Exteriores da República foi Q uintino
Bocaiúva.
13. O Palácio Itam arati está localizado no Rio de Janeiro, e teve a sua cons­
trução iniciada em 1851, pelo Barão de Itamaraty (futuro Visconde e Conde de
llamaraty), na antiga Rúa Larga de S. Jo aqu im (atual Marechal Floriano). Procla­
mada a República, o Palácio foi comprado para a residência do chefe do Governo.
Em 1897 foi cedido ao M inistério das Relações Exteriores, que somente se transferiu
para ele em 1899, quando era ministro O linto de Magalhães. A nteriorm ente, o
MRE estivera na Rua do Passeio, na Gloria e no Campo de Santana. A sede em
Brasilia é denom inada Palacio Itamarati, tendo em vista a tradição desta denom i­
nação.

1334
CAPÍTULO LIV

AGENTES DIPLOMÁTICOS1

502 — Definição; 503 — Histórico; 504 — Direito de legação; 505


— Seleção, nomeação e recepção dos agentes diplomáticos; 506 —
Classificação dos agentes diplomáticos; 50 7 — Corpo Diplomático; 508
— Pessoal da Missão; 509 — Funções e deveres dos agentes diplomá­
ticos; 5 1 0 — Fundamento dos privilégios e imunidades diplomáticas;
511 — Privilégios e imunidades: introdução; 512 — Inviolabilidade;
513 — Imunidade de jurisdição civil e criminal; 514 — Isenção fiscal;
5 15 — Outros privilégios e imunidades; 516 — Privilégios e imuni­
dades dos agentes diplomáticos nacionais do Estado acreditado; 517
— Privilégios e imunidades da fa m ilia dos agentes diplomáticos; 518
— Privilegios e imunidades do pessoal técnico e administrativo; 519
— Privilégios e imunidades do pessoal de serviço; 520 — Privilégios e
imunidades dos empregados domésticos; 521 — Fim da Missão Diplo­
mática e das funções dos agentes diplomáticos; 522 — Os membros da
M issão Diplomática e os terceiros Estados; 523 — Missões especiais;
5 24 — Diplomacia parlamentar; 525 — Diplomacia comercial; 526
— As Missões permanentes junto às organizações internacionais; 526A
— Diplomacia não-oficial.

502. Os agentes diploniálicos são as pessoas enviadas pelo chefe de


Estado para representar o seu Estado^ perante um govemo estrangeiro.
Deste modo, eles são um dos órgãos do EstalJop áraas relações ínterna-
cionais.IA
503. A prática de enriar agentes diplomáticos não constitui falo novo
na Historia do DI. Ela existe desdé ó inicio da sociedade internacional,
vez que as colétrvidadés poluicás éxistérites, néçessitando entrar em rela-
çõesi_o_fizeram p or intermédio dos seus agentes diplomáticos.11* Eles pos­
suíam um aspecto sagrado e gozavam, em conseqüência, de proteção e
imunidades.
/V

Os agentes diplomáticos na Antiguidade e, de um modo geral, na


Idade Média, não tinham permanência, isto é. eles eram enviadosjaara
tratar de determinados assuntos que, resolvidos, faziam com que a Missão
Diplomática cessasse. Ao contrario do que ocorre atualmente, eles eram
agentes temporários.”-
Os agentes diplomáticos permanentes no período medieval consti­
tuíam uma exceção no panorama internacional. Os apocrisiários foram os
primeiros diplomatas permanentes que a Historia registra. Eles eram os
representantes do Papa e dos Patriarcas de Antioquia, Jerusalém e Alexan­
dria junto a Bizâncio. Gozavam de certas prerrogativas diplomáticas e
existiram do século V ao VIII. As suas fu n ções eram religiosas. Surgem
neste período as primeiras manifestações de institutos do direito diplomá­
tico, como as credenciais e as instruções.2
Os verdadeiros antecessores dos diplomatas permanentes atuais foram
os “procuratores in Romanam Curiam” (Weckmann). Eram eles os repre­
sentantes permanentes dos príncipes e reis junto à Cúria Romana e exis­
tiram nos séculos XIII e XIV. Gozavam de imunidades e eram geralmente
juristas.
A primeira Missão Diplomática permanente data de 1446, com o envió,
por Francesco Sforza, Duque de Milão, de Nicodemo de Pontremoli, como
seu embaixador junto a Cosme de Médicis de Florença.3 Em 1450 é esta­
belecida a embaixada de Florença junto a Milão.4 As Missões Diplomáticas
permanentes, entretanto, só têm grande desenvolvimento no século XVII,
após a Paz de Vestefália (1648), que ocasion a o in icio da p olítica denomi­
nada de equilíbrio europeu. A França difunde as missões permanentes.
Havia, assim, a mesma política que existia na Itália no século XV e que
ocasionou o aparecimento das missões permanentes. No início não eram
apenas os Estados que enviavam missões permanentes, mas também quem
não era soberano como a Borgonha. O título de embaixador só veio a ser
divulgado no século XVI. O primeiro Estado a ter urna rede de repre­
sentação diplomáüca foi Milão. O “ equilíbrio europeu” exigia a diplomacia
permanente, que procurava fazer com que as alianças existentes fossem
preservadas, bem como que os “ inimigos” fossem fiscalizados. A diplomacia
se profissionalizou, durante o Renascimento, na Itália (Mattingly).
Jis-agen ies diplomáticos constituem uma verdadeira necessidade da
vida internacional do Estado, vez que os governos necessitam de pessoas
da sua confiança para tratar corn os Estados estra n g eiros. Ã in ten sificação
da vida internacional faz com que sua importancia cresça consideravel­
mente. ' .
A partir de 1648 a diplomacia"' passou por diversas transformações e
os seus institutos foram se sedimentando. De uma regulamentação con-
suetudinária chegou-se à regulamentação convencional.
Na diplomacia entre o Ocidente e o Oriente podemos citar como a
primeira embaixada enviada por aquele a este: a de Sir Thomas Roe (da

1336
Inglaterra) junio ao imperado] de Deli em 1615. Anteriormente, em 1609
o rei do Sião enviara uma embaixada a Haia (Prakash Sinha).
O pagamento do embaixador pelo Estado só se consagrou no lim do
século XVI e início do século XVII, anteriormente eles recebiam apenas
subsidios.
504. O direito_de legação é o direito de enviar e receber agentes
diplomáticos. Direito de legaçáo ativo é o de enviar agentes diplomáticos,
enquantcTc) passivo e o de receber agentes diplomáticos. Estes dois aspectos
estão intimamente ligados, como as duas faces da mesma moeda.
Ele decorre da soberania do Estado no seu aspecto externo. Em con­
seqüência, apenas o Estado soberano o possui. O seu exercício se faz den­
tro do princípio da igualdade jurídica que domina a vida internacional.6
Os Estados semi-soberanos só o exercem se o Estado suserano ou protetor
der uma autorização. Na prática, tal fato já ocorreu. Nas uniões de Estados
o tratado que as institui regulamenta o exercício do direito de legação
(Accioly).' A Santa Sé se faz representar pelos delegados apostólicos e
núncios. Os primeiros têm por função exercer uma fiscalização nas igrejas
católicas do país, enquanto os segundos se ocupam propriamente de fun­
ções diplomáticas.''
O direito de legação só pode ser exercido pelos Estados havendo
consentimento mútuo, como afirma a Convenção de Viena soDre relações
diplomáticas (1961). Este consentimento mútuo normalmente existe em
virtude de serem as relações diplomáücas do interesse dos Estados. Por
outro lado, no mundo jurídico internacional a ruptura de relações diplo­
máticas é considerada uma medida coercitiva. Daí a Convenção de Havana
(1928) sobre agentes diplomáticos afirmar que “os Estados têm o direito
de se fazer representar uns junto aos outros por agentes diplomáticos”.8
Cahier sintetiza esta questão afirmando que para a existência de rela­
ções diplomáticas é necessário que haja personalidade internacional, re­
conhecimento de governos e consentimento mútuo'.-
A última questão a respeito do direito de legação é que modernamente
ele não é uma exclusividade dos Estados, porque as organizações interna-
cioñais também o têm exercido.9
505. A seleção e nomeação dos agentes diplomáticos é assunto regu­
lamentado pela legislaçao interna dos Estados e"Çuejyão interessã direta-"
m ern F ao Dl. No Brasil a seleção é feita através do Instituto Rio Branco,
cujo cu rso necessita ser concluído por aqueles que pretendem seguir -a
carreira diplomática, ou por concurso público direto para a carreira. Le­
gislação mais recente alterou este regime. O aluno do Instituto Rio Branco
ao entrar é nomeado 3g Secretário. O Curso é de um-ano (aulas) e um
ano de estágio. Após os dois anos fica 4 anos no Brasil antes de ser enviado
para o exterior. Entretanto, nada impede que sejam nomeados embaixa­
dores (cargo em comissão) brasileiros no estrangeiro pessoas que não
pertençam à carreira diplomática. Quando os embaixadores são escolhidos

1337
dentre pessoas da carreira (liplomálica. eles são em princípio ministros de
1- classe. Contudo, devido ao déíicil de diplomatas em certa época no
Brasil também têm sido nomeados “ministros de 2- classe”, conforme
consagra a legislação mais recente. No Brasil “os chefes de Missão Diplo­
mática de caráter permanente” são nomeados pelo Presidente da Repú­
blica com a aprovação do Senado. O Brasil foi o primeiro país sul-americano
a ter embaixada no exterior: EUA (1903); Paris (1919); Londres (1920);
Lisboa (192J); Buenos Aires (1923); etc. O primeiro embaixador brasileiro
em Washington foi Joaquim Nabuco e em Paris foi Gastão da Cunha (G.
E. Nascimento e Silva).
Até o final do século XVIII o chefe de Estado designava um chefe de
Missão junto a um Estado estrangeiro sem qualquer aprovação deste. Quan­
do o chefe da Missão atingia o seu posto, era algumas vezes recusado pelo
Estado junto ao qual ia servir. Visando evitar este inconveniente, no século
X IX formou-se a prática do “agrément” (“agreement”), isto é, um chefe
de Missão não é nomeado sem que o Estado onde ele vai servir declare á
sua aceitação. A recusa de dar o “agrément” não precisa ser motivada, e
o Estado é inteiramente livre para concedê-lo ou não. Tem sido denomi­
nado de “agréation” a apresentação do pedido de “agrément”.
Sobre a nomeação e recepção dos agentes diplomáticos, tem surgido
uma prática bastanié com um atualmente, que éji de se designar um mesmo
agente perante mais de um~Estádo. fcsta pratica-se desenvolveu em virtude
de razoes puramente econômicas. Os Estados, em nome da poupança,
nomeiam junto a dois ou mais Estados estrangeiros, cujas relações com
eles não sejam tão importantes, o mesmo agente diplomático.10 Tal pro­
cedimento só é possível se os Estados acreditados não se opuserem expres­
samente. Entretanto, esta oposição não poderá existir se a nomeação do
agente diplomático for para servir junto a um Estado e junto a uma
organização internacional.
O mesmo indivíduo poderá ser acreditado por dois Estados “ chefe de
Missão perante outro Estado, a não ser que o acreditado a isso se oponha”
(art. 6e) .I!
Quanto aos adidos militares, navais ou aeronáuticos, o Estado acredi­
tado “poderá exigir que seus nomes lhe sejam submetidos de antemão
para aprovação” (art. 7a). Tal fato decorre de estes adidos cuidarem de
assuntos que afetam a segurança nacional do Estado acreditado. Eles têm
o mesmo estatuto do pessoa) diplomático. A nomeação de adidos militares
nas Missões Diplomáticas começou a surgir após 1816, sendo que na Prússia
foi uma solicitação dos militares.
O pessoal diplomático deve ter em princípio a nacionalidade do Estado
acreditante. Se isso não for observado, o Estado acreditado necessita dar
o seu consentimento.
O pessoal da Missão, ao ser nomeado, a sua chegada, bem como a sua
partida, deve ser notificada ao Ministério das Relações Exteriores do Estado
acreditado.

1338
O c h e fe da M issão in ic ia as suas fu n çõ e s ao a p re s e n ta r as suas c r e d e n ­
ciais "o u le n h a c o m u n ic a d o a sua chegad a e a p re s e n ta d o as cóp ias fig u ­
rad as de suas c re d e n c ia is ' 1' ao M inistério das R e la ç õ e s E x te rio re s ou ao
M in iste rio em q u e se te n h a c o n v e n c io n a d o 13 (art. 13 ).
As credenciais são o documento que demonstra estar o chefe da Missão
habilitado a desempenhar ás suas funções. Elas não têm forma lixa11 e são
assinadas pelo chefe de Estado acreditante e dirigidas ao chefe de Estado
acreditado.
506. A carreira dos agentes diplomáticos é determinada pela legislação
interna de cada Estado, que dá a cada posto a denominação que bem
entender. Assim sendo foi que a URSS, após a Revolução de 1917, denomi­
nava a todos de “representante diplomático”, o que ocasionou inúmeros
problemas e fez com que ele voltasse às ctenominações tradicionais em 1943.
No Brasill4Aa carreira se inicia no cargo de 3--secretário e sucessivamente
2--secretário, 1--secretário, ministro de 2- classe e_rninisi.ro de Ia classe (art.
33 da Lei n- 3.9F7, de ] 961). Entre o l s-secretário e o ministro de 2a classe
foi criado o cargo de conselheiro (Decreto na 71.323, de 7-11-72).,4B
No mundo internacional, entretanto, inúmeras questões surgiram no
tocante à precedência dos chefes de Missão.15 Apareceu assim a idéia de
uma regulamentação internacional para terminar com esta questão. A
primeira que houve foi um protocolo no Congresso de Viena em 1815,
que classificou os diplomatas em três classes: Ia — embaixadores, legados
ou núncios:16 2- — enviados, ministros ou outros acreditados junto aos
soberanos;1' 3a — encarregados de negócios acreditados junto aos ministros
das Relações Exteriores. Estabelecia ainda que as Missões extraordinárias
não teriam qualquer superioridade na precedência, ao contrário do que
ocorrera em preríodos anteriores, como no século XVII. A precedência
seria dentro de cada classe, levando-se em consideração a data da notifi­
cação oficial de sua chegada. Determina ainda que a respeito da prece­
dência não haverá “nenhuma inovação relativamente aos representantes
do Papa” .18
Esta classificação foi alterada no Congresso de Aquisgrana, com a
colocação entre a 2a e a 3a classes de mais uma categoria, que era a dos
ministros residentes.19
A Convenção de Viena (1961), no seu art. 14, classifica os chefes de
Missão em três-classes: a) “embaixadores ou núncios acreditados junto aos
chefes de Estado ou outros chefes de Missão, tendo uma categoria equi­
valentes” ;20J>)J!ermados, ministros ou internúncios acreditados junto aos
chefes de Estado”; c) “a dos encarregados de negócios acreditados junto
aos ministros das Relações Exteriores”. A precedência é estabelecida dentro-
de cada classe, nos termos do art. 13, já explicado.
507. Corpo Diplomático é expressão empregada para designar o con­
junto dos agentes diplomáticos. Corpo Diplomático nacional é o conjunto
dos agentes diplomáticos nacionais. Coipo Diplomático estrangeiro é o

1339
conjunto fie agentes diplomáticos estrangeiros acreditados junto ao chefe
de Estado 011 ministro das Relações Exteriores. Segundo Arbuei Vignali.
o Corpo Diplomático tena entre outras atribuições as de: representação,
defesa do status diplomático, proteção, etc.
As Missões Diplomáticas trabalham de um modo geral independente­
mente umas das outras; entretanto, em certos casos elas se reúnem e traçam
normas de conduta em comum. Assim ocorreu na Historia inúmeras vezes,
por exemplo, quando do bombardeio de Paris em 1870, sem aviso prévio,
houve um protesto do Corpo Diplomático.
O Corpo Diplomático estrangeiro tem à sua frente o decano, isto é,
um diplomata estrangeiro na mais elevada das três categorias que há mais
tempo servir junto àquele país. Os Estados católicos reconhecem o repre­
sentante do Papa como sendo o decano, independentemente do seu tempo
de Missão.21 O art. 16, alínea 5, declara, à semelhança do Congresso de
Viena, que, em matéria de precedência, ele “não afeta a prática que existè
ou venha a existir, no Estado acreditado, com respeito à precedência do
representante da Santa Sé".22 Cahier observa com razão que uni chefe de
Missão não deve recusar-se a aceitar um decano porque o seu Estado não
se encontra em boas relações com ele, porque isto seria um ofensa ao
Estado junto ao quaJ está acreditado, e que a posição do d e c a n o “é inde­
pendente de sua pessoa enquanto chefe de Missão de um Estado particu­
lar” .
A função do decano é a de ser o porta-voz do Corpo Diplomático
estrangeiro.
508. A Missão. Diplomática não é formada exclusivamente por agentes
diplomáticòs.^la tem também um pessoal técnico e administrativo^ Tem
assim secretáríàs. criptógrafos, etc.
A Convenção de Viena admite expressamente que o Estado acreditado
pode determinar o efetivo das Missões Diplomáticas estrangeiras (art. 11).
Este procedimento é muito utilizado nas relações diplomáticas do Ocidente
com os Estados do bloco socialista.23 A limitação do n ú m ero de membros
da Missão Diplomática é feita com base na reciprocidade.
509. As funções da Missão Diplomática estão enumeradas no art. 3S
da Çgnvenção de Viena como sendo as seguintes: “ g) representar o Estado
acreditante perante o Estado acreditado: b) proteger no Estado acreditad o
os interesses do Estado acreditante e os de seus nacionais, dentro dos
¡imites permitidos pelo Direito Internacional; ò negociar com o governo
"3o Esta.do acreditado; d) inteirar-se, por todos os meios Iícitõs7'das condi
ções e da evolução dos acontecimentos no Estado acreditado e informar
a esse respeito o governo do Estado acreditante; g) promover relações
amistosas e desenvolver ás relações .econômicas e científicas entreJoJEstadcT
acreditante.eT<í E.sra4o.ãcredjtado.” Esta enumeração é meramente exem-
plificativa e outras funções podem ser dadas às Missões Diplomáticas, como
funções consulares.24

1340
A Missão Diplomática entra em contato com o Estado acreditado atra­
vés do Ministério das Relações Exteriores. Entretanto, atualmente, na prá­
tica, esta regra lem sido amenizada e os adidos militares entram em contato
diretamente com os Ministerios militares. Cabe ao Estado acreditado fixar
o procedimento a"ser seguido.
Os agentes diplomáticos possuem deveres em relação ao Estado acre­
ditado, sendo que o principal deles é o de não se meter na política interna
do Estado acreditado, respeitar as leis do Estado acreditado, etc.
5 10. Os agentes diplomáticos, para o desempenho dajs suas funrñes
gozanide privilégios e imunidadeT^Ã razão de ser destas imunidades foi
multo discutida entre os doutrinacjores que procuram justificá-la. Atual­
mente, a posição adotada é quase que unánime. Vejamos, entretanto, as
inúmeras teorias sobre o assunto que surgiram através da Historia.

a) O a g e n te d ip lo m ático re p re se n ta n te d o so b era n o ou do
E stad o e stra n g eiro

Ela remonta ao período medieval. As relações internacionais eram


relações entre chefes de Estado. O Estado era propriedade do soberano.
Ofender ao agente diplomático, era ofender ao soberano estrangeiro. Foi
a teoria esposada por Burlamaqui e Montesquieu.
A Revolução Francesa, destruindo a concepção de que o Estado fosse
propriedade do soberano, fez com que o agente diplomático representasse
o próprio Estado. Entre os seus defensores está Fort-Dumanoir.
Esta teoria é insuficiente porque ela não explica as imunidades das
pessoas da família do agente diplomático que não têm qualquer aspecto
representativo.

b) T e o r ia d a ex tra te rrito ria lid a d e

Ela data do século XVII e foi exposta por Hugo Grotius. Os seus
defensores sustentam que por meio de uma ficção a embaixada faz parte
do território do Estado de que ela é nacional.
Esta teoria foi sendo rejeitada pela jurisprudência. O seu abandono
remonta ao século XIX, no tocante a crimes comuns ocorridos na embai­
xada. Se esta fosse território estrangeiro, o criminoso só poderia ser en­
tregue por meio de um processo de extradição, o que na prática não
ocorre. Por outro lado, alguns países (ex.: França) permitem que seja
movida uma ação contra o estrangeiro que não mora no país por obrigações
que tenham sido aí contraídas. Ora, neste caso, o agente diplomático
poderia então ser acionado, o que é contrário a suas imunidades. Outro
caso é que o asilado em Missão Diplomática é considerado com o estando
ainda no território do Estado.26

1341
I'.n lie os .n ito res m o d ern o s d a só foi defendida por G e n e t, e inuilo
ra ra m e n te n a ju risp ru d ên cia.

c) O u tras leo rias têm sido p ro p o stas, co m o a de qu e o d ire ilo de


leg ação , d e o n d e d ecorrem as im unidades, faria p arte d o d ireito
n atu ral (G e n lili). O d ire ilo n atu ral contém ap en as p rin cip io s
gerais e o d ire ilo de leg ação faz p arte do d ireito positivo.

O Duque d’Aiguillon sustentava que os privilégios e imunidades de­


corriam de um acordo tácito. Ora, se assim fosse, nada impediria a denúncia
deste acordo, ou, ainda, o Estado poderia não dar o seu consentimento
para este acordo,-o que não é possível.
Cecil Hurst sustenta na sua leoria que o agente diplomático possui
privilégios e imunidades em relação à lei local, “porque ele não pertence
aqueles para os quais a autoridade legislativa possa fazer leis”. Esta teoría
mereceu uma cerrada crítica, porque as imunidades se tornam inúteis,
porque o agente diplomático já não estaria sujeito às leis do Estado. Na
verdade, ele se encontra submetido a e)as, apenas gozando de imunidades.

d) T e o ria d o interesse da fu n ç ã o

O primeiro a esboçá-la foi Vattel. Foi adotada pelo Instituto de Dl e


no grupo da Harvard Law School. Ela foi consagrada no direito positivo
nos preâmbulos das convenções sobre relaçõ es diplom áticas d e Havana
(1928) e Viena (1961). Esta última declara:

/ “Reconhecendo que a finalidade de tais privilégios e imunida-


I des não é beneficiar indivíduos, mas, sim, de garantir o eficaz
j desempenho das funções das Missões Diplomáticas em seu ca-
\ Táter de representantes dos Estados.”

Este é o fundamento das imunidades da Missão Bielernáuca. que está


consagrado>na _jurispjmdência e aceito por quase todos os doutrinadores:
garantir o desempenho dasluncoes.
511.-.Às imunidades e privilégios diplomáticos existem desde a Anti­
güidade, quando os agentes diplomáticos se revestiam de um aspecto
sagrado. Em Roma, a violação de embaixadores romanos era dos motivos
que tornavam uma guerra justar
Estas imunidades têm uma origem consuetudinaria e foram se desen­
volvendo, através dos tempos, até serem codificadas, no âmbito interame-
ricano, na Convenção de Havana (1928), e, no âmbito “universal”, na
Convenção de Viena (1961), concluída sob os auspícios da ONU.
Estes privilégios e imunidades podèm ser classificados em: inviolabili­
dade, imunidade de jurisdição civil e criminal e isenção fisca].27 Eles se

1342
e ste n d e m n ã o ap e n as aos a gen tes d ip lo m á tic o s , mas ain d a aos fu n cio n á rio s
da M issão, q u e os possuem de m o d o m ais restrito.
O agente diplomático, ao penetrar no Estado acreditado, passa a se
beneficiar deles e, se nele já se encontrar, gozará das imnnidades quand<5
a sua nomeação for comunicada ao Estado acreditado. As imunidades
subsistem até que a pessoa saia do Estado acreditado, ou com a expiração
de um “prazo razoável” que lhe tenha sido dado para este fmi.2S
512. A inviolabilidadejá existia na mais remota Antiguidade, em virtude
do caráter sagrado do agente diplomático. Atualmente, ela é encarada
como decorrendo da necessidade de assegurar o desempenho das funções
diplomáticas da Missão estrangeira com liberdade.29
Ela abrange a Missão Diplomática e as residências particulares dos
agentes diplomáticos.30A inviolabilidade significa que nestes locais o Estado
acreditado não pode exercer nenhum ato de coação íex.: ser invadido
pela polícia), a não ser que haja o consentimento do chefe da Missão. Do
mesmo modo, não pode'ser efetuada uma citação dentro da Missão.31
O mobiliário, os arquivos, “assim como os meios de transporte da
Missão, não poderão ser objeto de busca, requisição, embargo ou medida
de execução” (art. 22, § 3“).
A Missão deverá not^car ap Ministério do Exterior os locais que se
beneficiam deste privilégio.
A inviolabilidade cessa* se os locais da Missão forem utilizados de modo
incompatível com as funções da Missão. Cgjsa am daem caso de urgencia
(ex.: incêndio). Neste sentido tem se manifestado a prática. Entretanto,
tudo parece indicar que a Convenção de Viena pretendeu consagrar uma
inviolabilidade absoluta. Um outro aspecto referente a esta questão consiste
na desapropriação, pelo Estado acreditado, do imóvel por necessidade
pública. A Comissão de Dl considerou que estando os imóveis da Missão
submetidos às leis locais, deverão ser entregues pelo Estado acreditante,
que deverá receber uma justa indenização; entretanto, na convenção não
há qualquer dispositivo sobre este assunto
E inviolável também a correspondência diplomática.32 A inviolabilidade
dos agentes diplomáticos significa que eles não_podem ser presos.
O Estado acreditado, como uma decorrência da inviolabilidade, deverá
proteger os imóveis da Missão, bem c o m o a própria pessoa dos agentes
diplomáticos.
513. Os atos da Missão, praticados como representante do Estado
acreditante (ex.: assinatura de um tratado), não podem ser apreciados
pelos tribunais do Estado acreditado.
Quanto àqueles praticados pela Missão em que ela age como simples
particular, a jurisprudência tem sido hesitante. Na Inglaterra, defende-se
a imunidade absoluta. Na Europa continental, 'segue-sejj prática de se
distinguir os atos “jure imperii” e os atos “jure gesüónis”~i.havendo imu-

1343
nidadc apenas paia os prim eiros. ’4 A .12oiiveiiçêo d e Vicn¿i-é om issa a es le
respeite^
"^Simiinidade de execução tem sido encarada em sentido mais absoluto
do que a de julgar, l'al lato decorre da inviolabilidade dos bens da Missão
Diplomática, não havendo, portanto, neste particular, qualquer distinção
entre atos “jure impirrii” e atos “jure gestionis^y
O agente diplomático goza de imunidade de jurisdição criminal. Ela
é absoluta, aplicando-se a qualquer delito. No século XVI ela já estava
consagrada, apesar das constantes violações de que foi objeto.
Ele.tem ainda a imunidade de jurisdição civil, que parece só ter sido
consagrada no século XVIII.1'1 A Convenção de Viena a consagra no art.
31, salientando que ele goza de imunidade de jurisdição civil e adminis­
trativa’' . Admite a Convenção algumas exceções a este princípio: a) uma
ação real sobre imóvel privado, situado no território do Estado acreditado,
salvo se o agentediplom aticõopossuir por conta do Estado acreditante
para os fins daJVjjssão;*6 b) uma ação sucessória na qual o agente diplo­
mático figure a título privado, tTnão em nome do Estado, como executor
testamentário, administrador, herdeiro ou legatário; c) uma ação, referente
a qualquer profissão liberal ou atividade comercial exercida pelo agente
diplomático no Estado acreditado, lora de suas funções oficiais.37
A imunidade de iurisdicão não se aplica às acões reconvencionais. í ?
O agente diplomático nao está obrigado a “prestar depoimento como
testemunha.”.
Um Aviso do Ministério das Relações Exteriores de 31-3-54 determina
aos juizes, “em cada ação referente a qualquer diplomata estrangeiro
acreditado no Brasil, dirigir-se, por intermédio do Ministério da Justiça,
ao Ministério das Relações Exteriores, o qual verificará se ocorre exceção
à regra de imunidade de jurisdição civil e penal”, acrescentando que
“sotaente em caso afirmativo, a ação poderá ter andamento”.
A imunidade de execução é, como já dissemos, mais absoluta do que
a de jurisdição. Nos próprios casos de exceção à imunidade de jurisdição
a execução só pode ser realizada se não afetar a pessoa ou a residência
do agente diplomático.
" \ A imunidade de jurisdição não significa que o agente diplomático
esteja acima da lei, mas significa apenas que ele deverá ser processado no
Estado, acreditante.
Entretanto, poderá haver renúncia à imunidade de jurisdição do agen­
te diplomático ou de qualquer pessoa que dela se beneficie. Esta deverá
ser feita expressamente pelo Estado acreditante.38 A renúncia à imunidade
de jurisdição não significa a renúncia à imunidade de execução. Para que
esta última ocorra, há necessidade de uma nova renúncia,
/-'•''filialmente, podemos salientar que a imunidade de jurisdição não
significa que o agente diplomático esteja acima das leis do Estado onde
serve. Tanto assim é que ele deve cumprir as leis deste Estado. Na realidade,

1344
clejíao-güga de uma imunidade jni-i^HicCip mus de unia imunidade do
exercício da jurisdição. £ interessante obsei^ar que nos EUA os diplomatas
estrangeiros devem pagar as multas de tráfego, uma vez que eles não
implicam ein um (“legal process") processo (Francis Deak).
Tem-se sustentado que a imunidade de jurisdição penal «d» diplomata
não se aplica quando houver flagrante em ça&D dc tráfico de entorpecentes
ou de infrações aduaneiras. De um modo mais amplo tem sido sustentado
que a imunidade penal cessa em caso de flagrante delito que não esteja
ligado ao exercício de suas funções.
514. A imunidade fiscal abrange o Estado acreditante e o chefe da
Missão, que “estao isentos de todos os impostos e taxas nacionais'regionais
ou municipais sobre os locais da Missão de que sejam proprietários ou
j n quilinos excetuados os que representam ojpagamento de serviços pres-
ta3os’’:w (ãrt. isenção, contudo, não se estende às pessoas que
contratam com ã Missão Diplomática, às quais incumba o pagamento de
tais impostos e taxas (ex.: o locador do prédio da Missão). O que a Missão
perceber por atos oficiais goza de isenção fiscal (art. 28).
Os agentes diplomáticos possuem “isenção de todos os impostos e
taxas, pessoais ou reais, nacionais, regionais ou municipais”. O art. 34
enumera, ainda, as exceções a esta imunidade fiscal: a) os impostos indi­
retos que esteiam normalmente incluídos no preco das mercadorias ou
dos serviços; b) os impostos e taxas sobre bens imóveis privados, situados
no território do Estado acreditado, a não ser que o agente diplomático os
possua em nome do Estado acreditante e para os fins da Missão; c) os
direitos de sucessão...;40 d) os impostos e taxas sobre rendimentos privados
que tenham a sua origem 110 Estado acreditado e os impostos sobre o
capital, referente a investimentos em empresas comerciais no Estado acre­
ditado; e) os impostos e taxas que incidam sobre a remuneração a serviços
específicos; j) os direitos de registro, de hipoteca, custasjudiciais e impostos
de selo, relativos a bens imóveis, salvo o disposto no art. 23, que foi acima
transcrito.
Os agentes diplomáticos gozam de isenção aduaneira tanto em relação
aos objetos destinados ao uso oficial da Missão quanto aos objetos de uso
pessoal,^ sendo que a sua bagagem não deve sofrer in sp e çã o 2
Pode-se acrescentar que a Ata Final de Helsinque (1 9 /5 ) assegurou o
livre acesso às missões diplomáticas por parte dos indivíduos.
515. Os ageines diplomáticos e _a Missão Diplomática possuem outros
privilégios e iiffúmdadgs: a) direito ao culto privado; 6) diréító' dè~ãfvõrar
o pavílKãõ nacional; c) isenção de legislação social;43 d) isenção de pres­
tações pessoais; e) “o Estado acreditado dará todas as facilidades para o
desempenho das funções da Missão”: f) liberdade de circulação e trânsito
a não ser em zonas que interessam à segurança nacional.44 Em Viena, foi
assinado um protocolo facultativo, que estipula que os membros da Missão45

1345
c as suas familias “lião adquirirão somente em virtude de dispositivo de
lei do Estado acreditado a nacionalidade do referido Estado”.
Algumas observações podem ser acrescentadas. Na Grã-Bretanha é
proibido aos agentes diplomáticos portarem arinas sem autorização. Du­
rante um certo período em 1973 a Nigéria suspendeu a inviolabilidade da
inala diplomática a fim de reprimir o contrabando de divisas. Procedimento
igual ao da Nigéria foi adotado anteriormente pela Grã-Bretanha (1944),
França (1945) e Camboja (1970), em casos de necessidade. A Holanda,
em 1972 apreendeu armas na bagagem de um diplomata argelino. Ale­
gou-se neste caso que a imunidade de diplomata em trânsito cessa em caso
de flagrante delito, bem como que se tratava de atos extra-oficiais.
Estas observações servem para mostrar que nem sempre as'imunidades
e privilégios são tão absolutos como parecem ser à primeira vista.
516. Os agentes diplomáticos que são nacionais do Estado acreditado
ou aí tenham a sua residência permanente46 gozam de privilégios e imu-
jrndades mais restritos, porque se assim não fosse eles ficariam acima da
lei._
A inviolabilidade e imunidade só existem para_os “atos oficiais prati­
cados no desèmpenlio dc suás funções^ra não ser que o Estado acreditado
lhes reconheça outros privilégios e imunidades. .
- >517'. A fãmfliã do agente diplomático goza dos mesmos nrivilépios e
imunidades que o próprio agente diplomático?
Entende-se por família as pessoas que vivem com o agente diplomático
sob sua dependência econômica, que façam parte do seu “ménage”.46A
518. O pessoal administrativo e técnico da Missão, na definição da
Convenção de Viena, “são os membros d_o_p^ssoaj da Mjssão empregados
nos sf-rviros _adrnjn isfra tiv o e lécniro da Missão” . Nesta categoria estão as
secretárias,ps_cxiptógrafos,_etc.
Este pessoal, com o os membros de sua família que vivem consigo,
gozam dos seguintes privilégios e imunidades, desde que não tenham a
nacionalidade do Estado acreditado ou aí não tenham a sua residência
permanente: a) inviolabilidade de residência e pessoal como os agentes
diplomáticos; b) completa imunidade de jurisdição penal; c) imunidade
de jurisdição civil e administrativa para os atos praticados no exercício de
suas funções; d) isenção de previdência social; é) isenção fiscal igual à do
agente diplomático; j) isenção de prestações pessoais; g) isenção alfande­
gária para os objetos importados, a fim de fazer a sua primeira instalação.'1'
Os que tiverem a nacionalidade do Estadò .acreditado ou aí tiverem
a sua residência permanente, as suas imunidades e privilégios só existirão
na medida em que forem reconhecidas pelo Estado acreditado, que
“deverá exercer a sua jurisdição sobre tais pessoas de maneira a não
interferir demasiadamente no desempenho das funções da Missão” (art.
38, alínea 2).

1346
519. A Convenção de Viena define o pessoal de serviço como “os
membros do pessoal da Missão empregados no seiA'igo doméstico da Mis-
_são”_(ex.: faxineiro).
Eles gozam dos seguintes privilegios e íinunidades, se não forem na­
cionais do Estado acreditado ou ar não tiverem residencia permanente: a)
inmnidade para os atos praticados no exercício de suas funções; b) isenção
de impostos e laxas sobre os salarios; c) isenção de previdencia social. Os
que sejam nacionais do Estado acreditado ou aí tenham a sua residencia
permanente têm o mesmo tratamento do pessoal técnico e administrativo
nesta situação.
520. O “criado particular” , nos termos de Convenção de Vi en a, “é a
pessoa do serviço doméstico de um membro cfa Missão que não seja em­
pregado do Estado acreditante”.
Os que não forem nacionais do Estado acreditado ou aí não tiverem
a sua residência permanente estão isentos de impostos e taxas sobre ós
seus salarios e da previdência social (para esta última isenção é necessário
ainda que ele esteja submetido ao sistema de previdência do Estado acre­
ditante ou de outro Estado).
Os que forem nacionais ou tiverem residencia permanente no Estado
acreditado terão o mesmo tratamento do pessoal técnico e administrativo
e do pessoal de serviço nesta situação.
521. A_M i^o_piplqmática permanente termina por diversas razões:
.
a) guerra
----rtr-i»»
|
entre o- —acreditante
» r-M—
iw i :—rrr-1—,M
e o acreditado: b)
,—-------inihumni-nmiM—r i------r------li
rupturarnririi
—m¡■TirlnrTrT~irrm
d
ti
deT relações diplo-
- —---p--------------------------------

o n-Ãp.xp.c6abj^mcnxo.iio^a>Bsma;,A.-neIo..p.edido. de. passar

errt caso de guerra, na embaixada pedir ao Ministério da Relações Exte­


riores do Estado que lhe sejam entregues os passaportes. Na verdade, é
um “laissez-passer” ou autorização que o embaixador pede para sair do
país.
Havendo ruptura de relações diplomáticas, o Estado acreditado deverá
respeitar a inviolabilidade dos locais da Missão, seus bens e arquivos. O
Estado acreditante poderá confiar a guarda dos locais da Missão, bem
como a proteção dos seus interesses, a um terceiro Estado que seja aceito
pelo Estado acreditado. A ruptura não põe fim aos tratados existentes
entre o acreditante e o acreditado.
Em caso de conflito armado, o Estado acreditante deverá facilitar a
saída das pessoas que compõem a Missão Diplomática.
Nenhum dos casos que ocasionam o término da Missão Diplomática
faz cessar os privilégios e imunidades diplomáticas.
O agente diplomático pode ter as suas funções terminadas: “a) pela
notificação do Estado acreditante ao Estado acreditado de que as funções
do agente diplomático terminaram; b) pela notificação do Estado acredi­
tado ao Estado acreditante de que... se recusa a reconhecer o agente
diplomático como membro da Missão.”48

1347
522. C) agente diplomático, e a sua família. ao atravessar um terceiro
Estado. que lhe lenha concedido vislo no passaporte, a fim (le assumir ou
reassumir o seu posto, ou ainda regressar ao seu Estado, gozará neste
terceiro Estado dos seus privilégios e imunidades diplomáticas. Os demais
membros da Missão Diplomática não deverão ler a sua passagem dificultada
pelo terceiro Estado. Deverão, ainda, os terceiros Estados, reconhecer a
inviolabilidade da correspondência e comunicação oficial e dos correios
diplomáticos. E interessante observar que no início do século XVI os
embaixadores em trânsito em terceiros Estados não gozavam de imunidade
de jurisdição. As esposas não acompanhavam os embaixadores e Veneza
proibia que o fizessem.
5 23. As Missões especiais são as enviadas pelo Estado-temporariamente,
isto é, elas visam desempenhar determinada função que, quando executa­
da. faz com que elas terminem (ex.: para a posse de chele de Estadok £
a chamada diplomacia “ad h oc”. tão com um nos dias de hoje. Esta ex­
pressão surgiu pela primeira vez na Comissão de Dl, em 1960. Elas estão
regulamentadas por uma convenção concluída em 1969 sob os auspícios
da ONU em Nova Iorque.
Segundo Barios só entra no conceito de diplomacia “ad hoc” as Missões
que tiverem as seguintes características: a) delegados designados por um
Estadojunto a outro para um fim específico; b) a Missão não é permanente,
cessando com a realização de sua tarefa; c) representar um Estadojunto
a outro Estado.
O desenvolvimento das Missões especiais enfraqueceu as Missões per-
manenips As Missões especiais podem ser de: a) negócios; b) cerimônias
(funerais etc?) ;~¿)~estudo; d) assistência téçriica; e) assistência militar. Elas
são lima decorrência da “ especialização” que tem surgido nas relações
internacionais (Maresca).
Elas podem ter uma estrutura simples (uma-única categoria de pessoas)
ou complexa (várias categorias de pessoas).
As Missões especiais são muito utilizadas em relação a Estados e go­
vernos não reconhecidos, vez que o estabelecimento da Missão permanente
acarretaria o reconhecimento.
A Missão especial só pode ser enviada com o consentimento do Estado
quej S . r„e.cei?Qãr7^roTlãPTlCMissão-especial deverá ser estabelecida por
Tõnsentimento mútuo entre o Estado que envia e o que recebe.
Pode exislir Missão especial quando não existem relações diplomáticas
e consulares entre o Estado que nomeia e o que recebe a Missão.
Os seus membros são indicados livremente pelo Estado que envia. O
Estado que recebe poderá, a qualquer momento., declarar que um membro
da Missão especial é “non grata” ou-“não aceitável”. Tal pessoa deverá
ser retirada da Missão pelo Estado que envia e, se este se recusar a isto, o
Estado que a receber pode não lhe reconhecer o caráter de membro da
Missão especial.

1348
A mesma Missão especial pode ser enviada a mais de um Estado, mas
os Estados que vão recebé-la precisarão concordai'.
O Estado que envía deve notificar o Estado que recebe: a) a composição
da Missão: b) a sua chegada e partida ou o término das funções de um
dos seus membros; c) a inclusão ou demissão ds pessoas da Missão que
residam no Estado que recebe; etc.
A precedencia dos chefes das Missões especiais é determinada pela
ordem alfabética dos nomes dos Estados de acordo com o protocolo vigente
no Estado que as recebe.
A Missão inicia suas funções ao entrar em contato oficial com os órgãos
competentes do Estado que recebe, não dependendo de apresentação de
credenciais ou plenos poderes.
A Missão especial termina as suas funções quando: a) cumprir a função
que lhe foi confiada ou terminou o prazo para que foi -constituida; b)
notificação pelo Estado que envia de ter chamado de volta a Missão; c)
notificação pelo Estado que recebe a Missão terminou; d) expiração do
prazó para que foi criada a Missão; e) acordo entre o Estado que envia e
/• o Estado que recebe.
A sede da Missão especial será acordada pelos Estados, caso contrario,
será tida como sendo na localidade em que o Ministério do Exterior do
Estado que a recebe tem sede.
\ Se a Missão especial funciona em mais de um local, ela pode ter mais
de urna sede.
Os membros da Missão especial deverão ter a nacionalidade do Estado
que envia.
A Missão especial tem o direito de usar o emblema e a bandeira do
Estado que envia.
Bartos observa, com fundamento na Comissão de DI, que, de um modo
geral, as Missões especiais pozam dos mesmos privilégios e imunidades das
Missões permanentes.
‘ Quanto aos_grivilégios e imunidades, podemos apontar os seguintes:
a) 1iTEstaào~querecebe d ev ê^ T õ ^ d èn B ãf^ ^ m o ^ çõ és adequadas; b) os
imóveis da Missão gozam de isenção fiscal; c) inviolabilidade dos imóveis
e arquivos; d) liberdade de movimento para realizar a sua função; é)
liberdade de comunicação; f) inviolabilidade pessoal e da "residência"
privada; g) imunidade de jurisdição criminal; h) imunidade de jurisdição
civil e administrativa a não ser nos seguintes casos: 1 — ação real sobre
imóvel particular que não é utilizado para a Missão; 2 — ação relativa a
uma sucessão; 3 — ação relativa a uma atividade profissional ou comercial;
4 — ação resultante de acidente causado por veículo utilizado em atividade
particular; z) isenção de previdência social; y) isenção de impostos e taxas,
com exceção das: 1 — taxas e impostos indiretos que se incorporam ao
preço das mercadorias; 2 — taxas e impostos sobre imóveis particulares;

1349
etc.; I) isenção de serviços pessoais; m) isenção de impostos alfandegários
e de inspeção de bagagem.
Um chefe de Estado^ou ministro das Relações Exteriores cliefiando
uma Missão especial se beneficia dos privilégios e imunidades de chefe de
Estado e ministro das Relações Exteriores.
Os membros do Stcrff administrativo e técnico da Missão gozam destes
mesmos direitos, com exceção da imunidade de jurisdição, que para eles
só cobre os atos praücados no exercício de suas funções. Por outro lado,
a isenção de impostos aduaneiros só existe quando da sua primeira entrada
no país.
Os “membros do serviço do staff’ (aqueles utilizados em trabalhos
“domésticos” da Missão) têm os seguintes privilégios e imunidades: a)
imunidade de jurisdição para os atos praticados no exercício de suas fun­
ções; b) isenção de impostos sobre os salários; c) isenção de previdência
social. ■-
Os membros do pessoal privado (utilizado no serviço particular dos
membros da Missão) têm isenção de impostos e taxas sobre os salários, e
as demais imunidades dependerão do Estado que os recebe.
Os membros da família do stajf diplomático que não são nacionais do
Estado que os recebe ou aí não têm a sua residência permanente gozam
dos privilégios e imunidades dos membros do staff diplomático. Os demais
membros da Missão nesta mesma situação só têm imunidades na medida
em que o Estado que os recebe lhes conceder.
As imunidades podem ser retiradas pelo Estado de envio e precisam
ser retiradas de modo expresso.
Os terceiros Estados devem conceder imunidades ao pessoal diplomá­
tico da Missão especial, bem com o à sua correspondência e comunicações
oficiais. O seu trânsito em terceiro Estado deve ser notificado previamente.
Em caso de morte, a família continua a gozar dos seus privilégios e
imunidades durante um período razoável para que possa deixar o país.
A Missão especial tem obrigação de respeitar as leis do Estado que a
recebe e não interferir nos negócios internos deste Estado. Ela não pode
exercer atividade profissional particular ou atividade comercial.
524. A diplomacia49 tem acompanhado a evolução da sociedade inter­
nacional e novas formas têm surgido.
A expressão “diplomacia parlamentar” foi cunhada por Dean Rusk,
em 1955, para denominar as negociações e discussões que ocorrem nos
órgãos da ONU de acordo com regras processuais. Ela é aplicada às ne­
gociações que ocorrem no seio das organizações internacionais. Rusk afir­
ma que ela envolve quatro fatores: a) uma organização permanente; b)
“ debate público regular”; e) “ regras processuais que governam o processo
do debate e que são elas mesnias matéria de manipulação tática...”; d)
“conclusões formais geralmente expressas em resolução”.
Esta diplomacia se desenvolveu com as organizações internacionais.

1350
52 í>. A diplomacia comercial. que smgiu no t'i11 i■11 <j>quancl do «-culo
XIX, lem se acentuado nos últimos decênios com a criação dos ( llamados
escritorios comerciais.
Esies escritórios comerciais térn o seu estatuto iixaclo em acordos éntre­
os Estados interessados. A URSS, entretanto, reivindicou para tais escritó­
rios imunidades e privilegios diplomáticos alegando que o comércio era
atividade do Estado. A grande maioria dos países não reconhece estes
privilégios e imunidades, só os dando em certos casos ao chefe do escritório
e ao sen adjunto."” Os locais do escritório são considerados invioláveis.
As representações comerciais soviéticas estão sob a direção das embai­
xadas, mas dependem do Ministério do Comércio Exterior. As suas funções
são:"representar os interesses da URSS 110 comércio exterior e contribuir
paia o desenvolvimento das relações comerciais. Elas só aceitam ajurisdição
dos tribunais de Estados estrangeiros para questões comerciais realizadas
no Estado estrangeiro. A seção da representação comercial soviética no
Rio de Janeiro tem imunidades consulares. A doutrina da URSS sustenta
que elas devem ter os privilégios e imunidades das representações diplo­
máticas.
A Corle de Segurança do Estado na França, em 1975, afirmou que os
representantes comerciais de Estado estrangeiro estão equiparados aos
funcionários administrativos e técnicos da convenção de relações diplomá­
ticas de 1961 e têm as imunidades destes.
Outras formas de diplomacia tem sido mencionadas, como a diploma­
cia das comissões mistas, sendo que estas ao contrário das organizações
internacionais não têm personalidade internacional e as suas reuniões são
permanentes. Guido Soares que faz esta exposição cita como exemplo o
Comitê Inter-Govemamental Coordenador da Bacia do Prata.
Guido Soares fala ainda em Diplomacia Presidencial, que é a condução
pessoal da política externa.
526. Em 1975 foi concluída, em Viena, sob os auspícios da ONU,
convenção sobre a representação dos Estados em suas relações com as
organizações internacionais de caráter universal. Podemos repetir as suas
principais normas: a) as imunidades são concedidas para garantir o bom
desempenho das funções da Missão; b) a organização notificará ao Estado
hóspede a criação de uma Missão junto a ela; c) a Missão permanente tem
as seguintes funções: 1 — assegurar a representação do Estado; 2 — fazer
a “ligação” enire o Estado e a organização; 3 — celebrar negociações com
a organização; 4 — assegurar a participação do Estado nas atividades da
organização; 5 — proteger os interesses do Estado jun io à organização;
etc.; d) o Estado pode acreditar a mesma pessoa com o chefe de Missão
junto- a duas ou mais organizações; e) as credenciais são expedidas pelo
chefe de Estado, de governo, ministro das Relações Exteriores e transmi­
tidas à organização; /) o chefe de Missão não necessita de plenos poderes
para “adotar” o texto de um tratado entre o Estado e a organização. Ele

1351
necessita de plenos poderes para a assinatura de uni Tratado em caráter
definitivo, a não sêr que se possa deduzir da prática da organização serem
os plenos poderes dispensáveis; g) a Missão compreende: pessoal diplomá­
tico, administrativo e técnico e pessoal de serviço. O número destas pessoas
deve ser “razoável e normal", levando-se em consideração as funções do
organismo. O Estado deve notificar à organização: nome, título, ordem
de precedência, saida e chegada; h) a precedência é por ordem alfabética
do nome dos Estados utilizado na organização.’1 Adota-se o mesmo em
relação aos observadores; i) a Missão deve se localizar onde a organização
tem a sua sede. Para a Missão se estabelecer em local diferente é necessária
a autorização do Estado hóspede; j ) o Estado hóspede deve conceder as
facilidades para o desempenho das funções, bem como auxiliar para que
obtenha locais razoáveis para a instalação da Missão; t) a organização
auxiliará a Missão junto ao Estado hóspede quando for necessário para
assegurar os privilégios e imunidades da Missão; m) os locais da Missão são
invioláveis. O Estado hóspede deve protegê-los. Os meios de transporte,
mobiliário, etc., não podem ser objeto de requisição, embargo, ou medida
de execução. Os locais da Missão são isentos de impostos, com exceção
das taxas por serviços prestados. Os arquivos e documentos são invioláveis.
E assegurada a lib e r d a d e d e circulação, limitada pela segurança nacional
do Estado hóspede. A correspondência, a mala e o correio da Missão são
invioláveis. A Missão goza de livre comunicação para todos os fins oficiais;
n) o pessoal diplomático é inviolável, assim como as suas residências. Têm
completa imunidade de jurisdição penal. A imunidade de jurisdição civil
tem as seguintes exceções: 1 — ação real sobre imóveis particulares que
não sejam para os fins da Missão; 2 — ação sucessória; 3 — ação relativa
a atividade profissional ou comercial. O Estado pode renunciar às imuni-
dades de seu pessoal diplomático. A renúncia deve ser expressa. O pessoal
diplomático tem isenção de previdência social e de impostos (com exceção
dos indiretos). Estão isentos da prestação de serviços pessoais. Gozam de
franquia aduaneira. Os membros de sua família beneficiam-se de inviola­
bilidade, imunidade de jurisdição, isençãQ de previdência e de impostos,
franquia aduaneira, etc.; ó) o pessoal administrativo e técnico tem as mes­
mas imunidades ciladas acima, com as seguintes restrições: 1 — só tem
franquia aduaneira para os objetos trazidos para a sua primeira instalação
no país; 2 — a imunidade de jurisdição civil é apenas para os atos praticados
no exercício de suas funções; p) o pessoal de serviço tem imunidade para
os atos oficiais e isenção de impostos sobre os salários. As demais imuni-
dades dependem do Estado hóspede da organização; q) os nacionais do
Estado hóspede ou que aí tenham residência permanente só têm imuni­
dade para os atos oficiais praticados no desempenho das funções; r) as
imunidades começam quando o indivíduo ingressa no Estado hóspede; 5)
o pessoal diplomático não pode exercer atividade profissional e comercial.
O membro de sua familia que exercer tais atividades não terá imunidades;

1352
/) as funções do chele da Missão termina com a notificação do Estado de
envió dirigida à organização e com a retirada temporária 011 definitiva da
Missão. A Missão, mesmo neste caso, deverá ser protegida pelo Estado
hóspede.
Os Estados não membros da organização podem estabelecer uina Mis­
são permanente com observador. As funções do observador consistem em
fazer a ligação entre o seu Estado e a organização, negociar com a orga­
nização, etc. As suas credenciais serão apresentadas ao órgão competente
da organização. Ao contrário da Missão permanente, o observador não
pode assinar tratados sem estar munido de plenos poderes. O Estado
notifica a organização da chegada e partida do observador e a organização
•comunica ao Estado territorial. Os observadores têm. em princípio, os
mesmos privilégios e imunidades das delegações.
As delegações junto às conferências das organizações internacionais
só podem representar um Estado. Não pode ser nomeado membro de
uma delegação um nacional do Estado territorial, a não ser que este dê a
sua autorização. A delegação deve ter um número razoável e normal de
pessoas. O delegado não pode assinar tratados sem estar munido de plenos
poderes, a não ser que haja intenção em dispensá-los. A precedência é
dada pela ordem alfabética adotada na organização. Tem imunidade de
jurisdição para os atos praticados 110 exercício de suas funções e imunidades
de jurisdição penal e pode ser acionado em virtude de danos causados em
acidentes por carro, navio ou aeronave sempre que o dano não for reparado
por seguro. O término das funções da delegação ocorrem por notificação
do seu Estado ou ao ser concluída a reunião do órgão ou conferência (art.
42 e segs.).
Os membros de uma Missão Diplomática permanente ou consular, ao
serem incluídos em uma delegação, conservam os seus privilégios, acres­
cidos dos da presente convenção.
Todas as pessoas deverão respeitar as leis do Estado hóspede. Os locais
da Missão não podem ser usados de modo incompatível com os seus fins.
O pessoal diplomático goza de privilégios e imunidades em terceiros Es­
tados. Se houver litígio sobre a aplicação da convenção., serão realizadas
consultas, e se estas não conduzirem a um acordo, será feita a conciliação.
Esta será por meio de uma comissão em que cada Estado indica um membro
e o terceiro será indicado por estes dois.
Uma observação que a nosso ver merece ser feita em separado é que
a Santa Sé está na A1EA, FAO, OIT, UNESCO, Conselho da Europa, etc.
O Estado-Cidade do Vaticano está na UPU, UIT, Conselho Internacional
do Trigo, etc. Se o Papa aborda a questão espiritualmente ou politicamente,
é a Santa Sé. Se é “territorialmente ou materialmente”, é o Vaticano.
Uma última consideração é que o Estado não pode .declarar “persona
non grata” alguém que integre Missão Diplomática junto a organização
internacional.

1353
526A. Tem sido assinai,ido que a diplomacia entre governos r epresenta
apenas um dos níveis das relações inlernacionais. Existe atnahncnte urna
diplomacia não oficial realizada por particulares, como organizações in­
ternacionais não-governamentais, Comitê Internacional da Cruz Vermelha,
etc. Os particulares, ao realizarem a “sita" diplomacia, têm muitas vezes a
aprovação dos governos.
Têm sido apontadas as seguintes vantagens em favor dos grupos pri­
vados: a) não sofrem constr angimento; b) podem Talar livremente, vez que
não representam uma política; c) não solrem a publicidade; d) podem ser
desautorizados pelos governos; etc. Podemos cilar que no Vietname orga­
nizações privadas norte-americanas conseguiram repatriar pilotos norte-
americanos que se encontravam presos.
Rosenau fala no papel relevante das organizações privadas nas nego­
ciações internacionais. A impor tância destas organizações é cada vez maior
e tem enfraquecido o dêsempenho do Estado (Richard K. Ashley).

1354
NOTAS
]. M. Franchini Nelio — Diplomacia — Instrumento da Ordein Inu-rnarioiul.
J964; Pbilippe Cahier — Le Droii Diplom atique Comemporain. 1962: M. Hartos
— Le Statm des Missions Spéciales de la Diplomaúe “ad h o c". in RdC, 1963. vol.
I. t. 108, págs. 431 e segs.; Philip C. Jessup — Parliamemary Diplornacv: An
examination o f the legal qualiiy of the rules o f procedure of organs o f the United
Nations, in RdC, J 956, voi. I, t. 89. págs. 185 e segs.: Mario Giuliano — Les Relations
et Immunités Diplomatiques, in RdC. 1960, vol. II, t. 100, págs. 75 e segs.; C. E.
do Nascimento e Silva — Convenção de Viena sobre Relações Diplomáticas, 1967;
Edmund A. Walsh — L ’EvoIution de la Diplom atie aux Etats Unís, in RdC, 1939.
vol. III, t. 69, págs. 153 e segs.: Hardv Cross Dillard — Som e Aspects o f Law and
Diplomacy, in RdC, 1957, vol. I, t. 91, págs. 445 e segs';J\ Pradier-Fodéré — Conrs
de Droit Diplom atique, 2 vols., 1898; Adolfo Maresca — La Missione Diplomática,
1959; Daniel Antokoletz — Tratado T eó rico y Consular, 2 vo!s. (vol. I). 1958; L.
Weckman — Les origines des missions diplomatiques perm anentes, in RGD1P.
Avril-Juin, 1952, ne 2, págs. 51 e segs.; R eport o f the International Law Commission
on the work o f its sixteenth session I I M ay-24July 1964; Jo sé Sebastián de Erice
y O 'Shea — D erecho Diplomático, 2 vols.,1954; Ernst Wolgast — Le diplómate et
ses fonctions (“ déduits de la nature de l’organisation internationale publique du
pouvoir extern e de l’É tat"), in RdC, 1937, vol. II, t. 60, págs. 251 e segs.; Graham
Stuart — Le droit et la pratique diplomatique et consulaire, in RdC, 1934, vol. II,
t. 48, págs. 463 e segs.; Raoul Genet — Traite de Diplomatie et de Droit Diplo­
matique, 3 vols., 1931-1932; Cecil Hurst — Les immunités diplomatiques, in RdC,
1926, vol. II, t. 12, págs. 119 e segs.; Satow’s C.uide to Diplomatie Practice, 4® ed.,
editado por Nevile Bland, 1958; Léo Strisow er— L ’exterritorialité el ses principales
applications, in RdC, 1923, t. I, págs. 233 e segs.; Francesco P. Contuzzi — Trattato
Teorico-Pratico di Diritto Consolare e Diplom ático, 2 vols. (vol. I I), 1910-1911:
Harold Nicolson — Diplomatie, 1948; idem — T h e Evolution o f Diplom atie Mel-
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Pinter — T eo ría y Práctica de la Diplomacia, 1958; Ernesto T . Rayneli — Derecho
Diplomático M oderno, 1914; De Maulde-La Claviére — La Diplomática au Temps
de Machiavek, 3 vols., 1892-1893; Claude-Albert Colliard — La Convention de
Vienne sur les Relations Diplomatiques, in AFD1, vol. VII, 1961, págs. 3 e segs.;
De Garden — T raité Complet de Diplom atie, 3 vols.,1833; Santi Nava — Sistema
della Diplomazia, 1950; Ginés Vidal y Saura — Tratado de D erecho Diplomático,
1925; Garret M attingly— Renaissance Diplomacy, 1955; Rubens Ferreira de Mello
— Tratado de Direito Diplomático, 2 vols., 1949; Corneliu S. Blaga — L ’Évolution
de la Diplom atie, t. I, 1958; V. Potiem kine — H istoire de la Diplom atie, 3 vols.,
1946-1947; Philippe Ardant — La pratique diplomatique chinoise récente, in
RGDIP, O ctobre-D écem bre 1968, n- 4, págs. 991 e segs.; G. E. do Nascimento e
Silva — Diplom acia e Protocolo, 1969;-G . E. do Nascimento e Silva — A Missão
Diplomática, 1971; H erber Arbuet Vigna'li — El Cuerpo Diplomático, 1969; Herber
Arbuet Vignali — D erecho Diplomático, 1971; M. Torrelli — Les relations exté-
rieures du Q uébec, in AFD1, 1970, págs. 275 e segs.; Abdullah El-Erian — Sixth
Report on Relations between States and International Organizatíons, International
Law Commission, 1971; Raphael Valentino Sobrinho — O “ Estado Com erciante”
nas Relações Internacionais, in SBDI, 1964, n°s 39 e 40, págs. 186 e segs.; Adolfo
Maresca — Le Missioni Spcciali. 1975: Luis García Arias — Las antiguas y nuevas
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nacionales v D erecho de Gentes, vol. I. págs. 2 6 ! e segs.: Guido S. Soares —
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707 e segs. (separata); G. E. do Nascimento e Silva — Imunidade de Jurisdição
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Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, l s semestre 1980, págs.
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nacional, vol. 5, 1979, págs. 145 e segs.: Eduardo V ilariño Pintos — En T o rn o al
Concepto de Diplomacia, in Anuario Hispano-Luso-Americano de Derecho Inter­
nacional, vol. 5, 1979, págs. 159 e segs.: Amado Luís Cervo — Os Primeiros Passos
da Diplomacia Brasileira, in Relações Internacionais, setembro-dezembro 1978, n 9
3, págs. 43 e segs.; J o e Nordman — La conceriation non institucionnalisée, in
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Keitb Hamilton e Richard Langhorne — The Practice o f Diplomacy, 1995; Je a n
Salmón — Manuel de D roit Diplomatique, 1994; T h e Diplomats 1939-1979, coor­
denado por Gordon A. Craig e Francis L. Loew enheim , 1994. L ’invention de la
diplomalie, sob a direção de Luden Bély, 1998. F. Javier Quel López — Los
Privilegios e Imunidades de los Agentes Diplomáticos en el Derecho Internacional
y en la Practica Española, 1993. Guido Fernando Silva Soares — Órgãos dos Estados
nas Relações In tern a cion ais: Formas da Diplomacia e as Imunidades, 2001; Ismael
M oreno Pino — La D iplom acia, 2001.
IA. No Brasil o dia do diplomata é 20 de abril (data do nascimento do Barão
do Rio Branco). O prim eiro diplomata brasileiro nom eado após a nossa inde­
pendência foi Antônio M anuel Corrêa da Câmara, com o cônsul e agente com ercial
em Buenos Aires (Amado Luís Cervo).
IB. E de se observar que alguns autores têm criticado a diplomacia de um
m odo geral como instituição. George Modelskí (Principies o f World Politics, 1972,
págs. 180 e segs.) observa que: o) é tecnológicam ente redundante, tendo em vista
a existência de telex, telefon e, etc.; b) não é econôm ica, ocasionando grandes
gastos; c) politicamente é nociva, a'fastando os líderes e criando intermediários;
d) as embaixadas criam problem as de segurança para os Estados que as recebem ;
e) acabam por se interessar apenas por questões militares. Pode-se repetir a ob­
servação de H. Kissinger que “ os diplomatas podem ainda se encontrar, mas não
um persuadir o outro” . Os diplomatas procuram átingir a opinião pública. Eles
“são menos um fórum para a negociação do que uma plataform a para propaganda”
(Nuclear Weapons and Foreign Policy, 1957, pág. 31 8 ). E>entro desta mesma linha

1356
de crítica: Otto H einrich von der Gablentz (In trodu cción a la Ciencia Política.
1974, pág. 403) observa que dificilmente a diplomacia se concilia con) a democracia,
vez que ela é matéria de uma elite e que ela acaba por fugir ao controle do governo
e da publicidade. M arcel M erle (Sociologie des Relations Imernationales, 1974,
pág. 562) observa que atualm ente as missões diplomáticas tém apenas uma função
protocolar. Assinala que passaram a ter novas funções económicas e culturáis.
Entretanto, são funções de execução de uma política que foi determinada pelo
contato direto entre os governantes. Uma crítica literária ao diplomata está em
H onoré de Balzac, quando escreve: "Acreditava-se m uito forte em diplomacia, a
ciencia daqueles que não possuem nenhuma outra, e que, por seu próprio vazio,
mais profundas parecem: ciência, aliás bastante côm oda, por isso que se demonstra
pelo exercício mesmo de seus altos empregos; porque precisando de homens
discretos, ela perm ite aos ignorantes nada dizerem, fecharem-se em acenos de
cabeça misteriosos; porque, enfim, o homem mais forte nesta ciência é aquele que
nada, conservando a cabeça acima da onda dos acontecim entos que simula con­
duzir, tudo reduzindo, assim, a uma questão de leveza específica. Aí, com o nas
artes, se encontram mil mediocridades para um hom em de gênio” (Ilusões Per­
didas, 1955, pág. 50). Para Cahier vários fatores levam a “diminuir a autonomia
e independência dos diplom atas” : a) a diplomacia deixa de ser secreta; b) a adoção
cada vez maior do parlamentarismo e, em conseqüência, a diplomacia saiu das
mãos do chefe de Estado; c) os meios de com unicação e de transporte mais rápidos;
d) o Estado passou a se interessar por outras áreas além da política, com o a
economia, a cultura e a técnica. Mudando a tônica da nossa exposição, pretende­
mos expor algumas noções de diplomacia. Para Guido Soares “diplomacia seria
sinônim o do conjunto das relações que uma com unidade relativamente hom ogê­
nea e diferenciada de outras mantém com outras com unidades de idênticas ca­
racterísticas. A palavra diplom acia vem desde o Im pério Rom ano, que elaborava
salvo-condutos ou passaportes em placas de metal que eram costuradas e dobradas
entre si de modo especial e que tinham o nom e de diplomas, que vem do grego
“ diploun” (dobrar). Esta é a opinião predominante na doutrina.
1C. Em Roma as missões eram para a conclusão de tratados, integrados por
várias pessoas, sendo presididas pelo mais velho. Levavam sinais exteriores de sua
dignidade, por exem plo, anel de ouro. _
2. Acredita-se que os relatórios eram, de um m odo geral, verbais apesar de
em Bizâncio eles serem escritos. Em Bizâncio, assinala Louis Brehier, “ a diplomacia
era o próprio fundam ento do Estado bizantino e con tribuiu mais que as próprias
armas para assegurar a sua sobrevivência”.
3. Foi Sforza quem nom eou o primeiro em baixador perm anente fora da Itália,
que foi enviado ju n to a Luís XI. Alfonso da Silva foi o primeiro embaixador
perm anente que não era italiano, nomeado pela Espanha ju n to à França em 1464.
A origem da primeira Missão perm anente tem sido discutida pelos autores. Um
grupo (Genet, Maresca, Satow ) considera que a origem da Missões permanentes
está em Veneza na prim eira m etade do século X V com os seus “oratores”. Outros
(Weckmann) consideram que Pontremoli foi o prim eiro diplomata perm anente.
Menciona-se ainda a missão diplomática de Sigismundo (rei da Hungria) ju n to a
Filippo Maria Visconti (M ilão) de 1325 a 1432. A m aioria dos autores tem dado
precedência a Veneza (C ah ier). Roland Mousnier (Les XVI et XVII siècles, 1993)
também dá precedência a Veneza e afirma ter ocorrido a primeira missão perm a­
nen te no século XV. K eith Hamilton e Richard L angh orne sustentam que as

1357
missões per-mancilles su rgiram na Itália do N o rte, p o rqu e foi aí q u e surgiu o
R enascim ento. bem c o m o era uma região que n ão eslava subm etida a n en h u m
Im pério.
4. F.m 1460, o Duque de Savóia nonieia Ensebio Margarida embaixador junto
ao Papa. E a primeira vez que a permanência da Missão figura explicitamente lias
credenciais ("orator et em baixador conlin nu s et procurator”) (Weckmann).
5. Diplomata e diplomacia são palavras que datam do século XVI11. Anterior­
mente, eram chamados de oradores, legados, etc. Segundo o Barão Szilassy. existem
duas teses sobre a origem da palavra diplomacia: a) do grego “diplos”. que significa
falso, com duplicidade: b) do grego “diploma", isto é, “ato dobrado” , é que as
credenciais eram dobradas ao meio. Daí “diplom ática” , isto é, a ciencia dos do­
cumentos. Esta última lem sido considerada a mais correta. Na França a palavra
diplomacia foi usada pela primeira vez por Linguet, em 1791; a palavra diplomata
foi usada pela primeira vez por Robespierre, em 1792.
6. Houve época em que o direilo de enviar em baixadores era exercido pelas
grandes potencias, enqu anto as menores enviavam ministros.
7. Os beligerantes e os governos depostos atuam na rida internacional por
meio de agentes políticos, que são agentes diplomáticos.
7A. Uma situação interessante é a de Quebec, cujos delegados na Grã-Bretanha
tém status de cônsul. Na França o delegado geral de Q uebec goza entre outros
privilégios e imunidades da inviolabilidade pessoal, dom icílio e arquivos (a partir
de 1964). Ainda podemos m encionar os escritorios instalados em 1973 em Pequim
(EUA) e Washington (C h in a), que tém privilégios e imunidades diplomáticas, mas
que são considerados Missões Diplomáticas para se evitar o reconhecim ento do
governo de Pequim. E ntretanto, na prática tais escritórios atuaram com o verda­
deiras Missões Diplomáticas. Posteriormente foram transformados em missões di­
plomáticas.
8. “Sendo o cham ado direilo de legação um direito perfeito em principio, é
ele imperfeito na prática, j á que nenhum Estado é forçado a manter Missões
Diplomáticas no exterior ou a receber em seu territorio representantes de outros
Estados” (G. E. do N ascim ento e Silva).
9. A Convenção de Viena, no seu art. 2S, fala apenas em “Estados” .
10. Se um Estado acredita um chefe de Missão perante dois ou mais Estados,
poderá estabelecer um a Missão Diplomática dirigida por um encarregado de ne­
gócios “ad interim” em cada um dos Estados onde o chefe da Missão não lenha
a sua sede perm anente” (art. 5B, alínea 2, da Convenção de Viena).
11. Os artigos citados sem qualquer referência são da Convenção de Viena
sobre relações diplomáticas (1961).
12. A entrega das cópias figuradas ocorre quando a agenda do chefe de Estado
está tomada ou ele se encontra viajando e há necessidade de o chefe da Missão
entrar logo em exercício de suas funções. Alguns países, como o Brasil, conside­
raram na Conferência de Viena que a simples notificação da chegada seria sufi­
ciente, o que não foi adotado.
13. Assim foi colocado em virtude dos Altos Comissários (são em relação a
países com que se tenha elo de amizade especial) que, por exemplo, na Inglaterra
não se entendem com o Foreign Office, mas com o Commonwealth Relations
Office.

1358
14. Geralmente, “ elas mencionam o nom e, os títulos, a qualidade especial do
agente, o objetivo geral da sua missão; pede-se que seja dada fé ao que o agente
poderá dizer em nom e de seu governo e que lhe seja dada uma boa acolhida’’
(Cahier). Quando o ch efe de Estado acreditante ou acreditado é substituído, há
necessidade de novas credenciais. Entretanto, no caso de substituição do ch efe de
Estado acreditado, o novo chefe de Estado recebe os chefes da Missão em con jun to
e não separadamente. T al prática se deve ao crescim ento do Corpo Diplomático.
14A. Geralm ente o candidato à carreira de diplomata cursa o Instituto Rio
Branco, criado pelo Decreto-lei 7.473 de 18-4-45, e que em 1946 pelo Decreto-lei
9.032, de 6-3-46, passou a ter a função de recrutar e form ar os que pretendem
ingressar na diplomacia. O curso do Instituto Rio B ranco deixa de ser realizado
quando o candidato ingressa pelo denominado “ concu rso direto” para a carreira,
que é aberto “às vezes” pelo„Itamarati.
14B. O D ecreto 7 9.556, de 20-4-77, regulam enta dois cursos de aperfeiçoa­
m ento para a diplomacia: a) Curso de Altos Estudos a ser feito pelos conselheiros
e b) Curso de A perfeiçoam ento de Diplomata a ser feito pelos 2as-secretários. Eles
são requisitos para prom oção na carreira.
15. A precedência nos séculos XVII e XV11I criou inúmeros conflitos. No
século XVII, as negociações entre a Áustria, Veneza, Turquia e Polônia em Carlowitz
se desenvolveram em um parilhão redondo que possuía tantas portas quanto os
negociadores.
16. Os núncios e legados são representantes do Papa. Os primeiros, encarre­
gados de Missões perm anentes, enquanto os segundos seriam de Missões extraor­
dinárias. Os primeiros não seriam cardeais, enqu anto os segundos seriam . Os
primeiros núncios foram designados em 1513 pelo Papa Leão X , ju n to às Cories
da Alemanha, da França e da Inglaterra. Desde 1970 que a Santa Sé não nom eia
internuncio, mas um pró-núncio apostólico. A delegação apostólica é um prelado
que representa o Papa, mas sem caráter diplomático.
17. A prática inclui nesta categoria os internuncios. Eles são enviados aos
Estados que não reco n h ecem a precedência dos núncios.
18. E que já lavra a prática nos Estados católicos de se considerar o repre­
sentante do Papa com o o decano, independentem ente do seu tempo de Missão.
19. Eram acreditados também ju n to ao ch efe d e Estado. “Historicamente, os
ministros residentes são os primeiros titulares de Missões Diplomáticas perm anen­
tes; os embaixadores ou ministros extraordinários eram enriados para Missões
extraordinárias ou a postos muito importantes, eles tinham direito a tfm cerim onial
mais solene...” (C ahier).
20. Visa atender os Altos Comissários da Commonwealth e os Altos Repre­
sentantes da França.
21. Pombal, em 1760, em uma circular, já afirmava a precedência do núncio
e do representante do Santo Império, independentem ente do seu tempo de Missão.
Pombal também sustentara nesta circular que a precedência seria pelo tem po de
Missão.
22. O tratado franco-m algaxe (1960) estabeleceu que o decano será sem pre
o embaixador francês. E ntretanto, este procedim ento parece-nos que deverá ter­
minar, vez que deve haver neste particular uma igualdade entre os Estados, com­
portando apenas a exceção da alínea 3 (Colliard).

1359
23. Estes países costum am lim itar a área em que os a g en tes diplom áticos
podem se loco m o ver. Tal fato tem sido en carad o por alguns (C a liier) co m o ilegal,
porqu e im p e d e qu e alguns d iplom atas d esem p enh em liv rem ente as suas funções.
E n tre ta n to , esta prática se e n co n ira consag rad a e os dem ais E stados tam bém a
adotam com base na reciprocid ade.
24. Fauchile salientava que as funções de um diplomata não poderiam ser
definidas juridicam ente.
25. Alguns autores procuram distinguir os privilégios das imunidades. A. Ham-
marskjold declara que os privilégios se referem ao “prestigio" e as imunidades à
“garantia"; Maresca afirma que os privilégios se referem a um “ tratam ento especial
e mais favorável aos agentes diplom áticos", enquanto as imunidades visam isentar
os agentes diplomáticos de obrigações a que os outros habitantes do país estão
obrigados. Perrenoud sustenta que há imunidade quando o agente diplomático
não está sujeito a urna norma interna do Estado e a sua sanção e haveria privilégio
quando a norm a interna comum é substituida por norm a especial. Na verdade,
esta distinção não tem qualquer valor prático e a doutrina e a prática têm usado
as duas palavras como sinônimas (C ahier). Para Sompong Sucharitkul " privilégio’’
é a concessão de vantagens substantivas, enquanto “im unidade” é abstenção do
exercício do poder. “Privilégio” é cortesia e sujeito a reciprocidade, e não é exigível
como direto a não ser quando consagrado em tratado. Para Gilda Maciel Correa
Meyer Russomano privilégio é o gênero (sentido amplo) e a imunidade a espécie
(sentido estrito) porque nem todo privilégio é imunidade.
26. T anto assim é que, pela Convenção de Caracas, sobre asilo diplomático
(1954), o Estado terrilorial pode exigir que o asilado saia do seu território, dando
as devidas garantias.
27. Existem outros privilégios que não se enquadram, com o veremos, nestas
três categorias.
28. Ao fortalecer um mem bro da Missão que goza de privilégios e imunidades,
as pessoas de sua família continuam a se beneficiar deles “até a expiração de um
prazo razoável que lhes permita deixar o território do Estado acreditado” (art.
39, alínea 3).
29. A Comissão de Direito Internacional da ONU considerou que a “inviola­
bilidade dos locais da Missão não é uma conseqüência da inviolabilidade do chefe
da Missão, mas um atributo do Estado acreditante em virtude do fato de os locais
serem usados com o sede da Missão” .
30. “ O Estado acreditado deverá facilitar a aquisição em seu território pelo
Estado acreditante, dos locais necessários à Missão ou ajudá-lo a consegui-los de
outra m aneira” bem como, se necessário, alojamento para os m em bros da Missão
(art. 2 1 ). Este dispositivo visa solucionar o problema da aquisição de imóveis pelas
Missões Diplomáticas nos países socialistas.
O m encionado artigo da Convenção estabelece ainda que o Estado deverá
ajudar a Missão, se for necessário, a arranjar alojamentos “convenientes”. Esta
disposição visa os EUA, vez que em virtude da discrim inação racial as Missões
Diplomáticas de Estados africanos não têm de um modo geral conseguido aloja­
mentos de acordo com o seu status.
Nos países em que a aquisição ou a locação é livré, este dispositivo não deverá
ser aplicado. No Brasil, a Lei de Introdução ao Código Civil, no seu art. 11, estipula
que os governos estrangeiros só poderão adquirir imóveis para as representações
diplomáticas e consulares. A Lei 4.333/64 deu a tais imóveis e aos adquiridos pata
residencia dos agen les diplomáticos e membros da Missão o seguinte tratamento:
“a aquisição de tais imóveis dependerá sempre da autorização do Ministerio das
Relações Exteriores, q u e ajuizará, em cada caso, da necessidade da compra, de-
vend». para lam o, consultar a Prefeilura do Distrito Federal e a Secretaria-geral
do Conselho de Segurança N acional’'.
Nos EUA, em 1988, com eçou a vigorar lei federal estabelecendo, em relação
às missões diplomáticas: a) um projeto imobiliário deve ser submetido à aprovação
do secretário de Estado se este solicitar; b) se isto não for feito, o secretário de
Estado pode constranger a missão diplomática a ceder o seu título de propriedade
ou o seu uso; r) em caso de ruptura de relações diplomáticas e não havendo
potência protetora, o^governo dos EUA pode tomar posse da propriedade; d) o
secretário de Defesa e o FBI podem se opor a qualquer aquisição imobiliária de
país comunista, õu de país que faz espionagem, ou que apóia o terrorismo.
31-. O comum é esta citação ser enviada ao Ministério do Exterior do Estado
acreditado, que fará uma com unicação à Missão.
32. A Missão poderá instalar uma estação de rádio com o consentim ento do
Estado acreditado.
33. Esta distinção teve início na jurisprudência italiana.
34. No Brasil, os tribunais se têm recusado a julgar ações trabalhistas contra
as Missões Diplomáticas.
35. Esta última parte foi colocada porque alguns Estados proíbem a aquisição,
por Estados estrangeiros, de propriedades imobiliárias, que são adquiridas então
no nom e do chefe da Missão.
36. Esta última parte foi colocada porque alguns Estados proíbem a aquisição
por Estados estrangeiros, de propriedades imobiliárias, que são então adquiridas
no n o m e do c h e f e da Missão.
37. Tal fato decorre da proibição de o agente diplomático exercer “atividade
profissional ou comercial em proveito próprio" (art. 42).
38. A imunidade é dada no interesse do Estado acreditante, a fim de que o
agente diplomático possa bem representá-lo; em conseqüência, a renúncia cabe
a ele e não ao agente diplomático.
39. A legislação brasileira perm ite isentar os móveis das Missões Diplomáticas
pertencentes aos grupos estrangeiros das taxas de água e esgoto, desde que haja
reciprocidade.
40. Estes direitos não serão cobrados sobre bens móveis, que estiverem no
Estado acreditado devido à posição do “de cujus'’ como m em bro da Missão, ou
pessoa de sua família. Cahier observa com razão que a isenção deveria abranger
também os imóveis.
41. Para a armazenagem, o transporte, etc.. o agente diplomático não tem
isenção.
42. A inspeção só será feita se houver fortes motivos para suspeitar da existência
de “ objetos cuja importação é proibida” pela legislação do Estado acreditado, os
sujeitos aos seus regulamentos de “quarentena” , bem com o de objetos que não
se destinam ao seu uso pessoal ou ao uso oficial da Missão.
43. E ntretanto, se o agente diplom ático empregar pessoas que não têm esta
isenção, ele deverá pagar previdência social imposta aos patrões.

1361
44. As relações diplomáticas com os países do bloco socialista quase sempre
nao consagram esta liberdade. E com um que os Estados delimiiein a zona de
locom oção dos agentes diplomáticos (v. nota 23).
45. “ Membros da Missão” são o chefe da Missão e os membros do pessoal da
Missão, e “ membros do pessoal da Missão” são os membros do pessoal diplomático,
do pessoal administrativo, técnico e do pessoal de serviço da Missão (art. 1° ).
46. Esta restrição não se ju stifica porque o agente diplomático pode ter a
residência habitual do Estado acreditado, mas ter a nacionalidade do acreditante.
46A. Em 1971, em virtude d e contrabando de maconha, um filho de diplomata
canadense viajando sozinho (em um terceiro país) foi preso na Holanda. Ch.
Rousseau observa que as imunidades não atuam “no caso de violação de leis penais
do-Estado de tránsito, sobretudo se sé traía de flagrante delito" (RGDIP, Octo-
bre-Dçcem bre 1972, ng 4, pág. 1.131).
47. Está sujeito a inspeção de bagagem.
48. O Estado acreditado pode declarar que uma pessoa da Missão é “persona
non grata” sem precisar apresentar justificação. Se esta pessoa não sair do territorio
do Estado acreditado em um prazo razoável, ele “poderá recusar-se a reconhecer
tal pessoa com o membro da Missão” (art. 99). Esta é a opinião de Cahier, já Satow
considera que se deve dizer por que é “ persona non grata” .
49. Segundo o “Oxford English Dictionary”, em conceítuação aceita por
N icholson, ela é “o modo de conduzir as relações internacionais por negociações,
o m étodo pelo qual essas relações são ajustadas e orientadas por embaixadores e
enviados; o oficio ou arte do diplomata” . Os Estados executam a sua política
exterior através da Diplomacia.
50. O Brasil, pelo Protocolo assinado em 1965, equiparou o escritorio comer-
.cial soviético a Missão Diplomática. O Acordo de Comércio e Pagamentos Brasil-
URSS de 1972 estabeleceu que o ch efe da Representação Com ercial, seus dois
suplentes e demais funcionários têm os mesmos privilégios e imunidades dos
diplomatas. As imunidades não se estendem a assuntos com erciais em que a
Representação Comercial seja parte.
51. E interessante observar, apesar de não se tratar de missão permanente,
que nas conferências para a codificação do Dl realizadas sob os auspícios da ONU
"a precedência é dada pela ordem alfabética do nome dos países em língua inglesa.
CAPÍTULO LV

CÔNSULES'

. . 527 — Definição; 5 2 8 — Evolução histórica; 5 2 9 ’—‘ Relações consu­


lares; 530 — Espécies de cônsules; 531 — Funções e deveres; 532 —
Estabelecimento de Consulado; 533 — Seleção, nomeação e recepção
dos cônsules; 534 — Classificação dos chefes de repartição consular.
Precedência. Repartições consulares brasileiras; 535 — Privilégios e
imunidades: das repartições consulares, dos funcionários consulares de
carreira e de outros membros da repartição consular; 536 — Privilégios
e imunidades dos Consulados e cônsules honorários; 5 3 7 — Fim das
funções consulares; 5 3 8 — Cônsules e agentes diplomáticos.

527. Os cônsules Rodem ser definidos como funcionários públicos do


Estado giie os envia para o estrangeiro a fim de aí exercerem determinadas
funções., como a proteção dc>s interesses e de nacionais do Estado que os
envia. Eles são Ôrgãos do Estado n ¿ exterior.
\ ’ 528. A existência dos cônsules é bastante antiga, antecedendo de muito
o aparecimento das Missões Diplomáticas permanentes.
A sua história remonta à antiga Grécia, com as figuras dos “proxenos”
e dos “prostates”.2 Os “proxenos” “eram escolhidos entre os que residiam
no estrangeiro e algumas vezes eram nacionais do Estado junto ao qual
serviam” (Luke Lee).3 Os “prostates” eram escolhidos pelos estrangeiros
residentes em uma cidade grega para servirem de intermediários nas re­
lações entre os estrangeiros e o governo da cidade (Luke Lee). Eles eram
escolhidos entre os nacionais da cidade onde se encontravam os estran­
geiros (Maresca). Os “proxenos” tinham um aspecto mais político do que
os “prostates”.4
Em Roma, visando as relações com os estrangeiros, havia o pretor
peregrino, os “recuperatores” e o “patronato”. Os “recuperatores” for­
mavam um colégio de árbitros, para decidir, com base na eqüidade, os

1363
litigios entre Roma e os estrangeiros. Posteriormente, apareceu o pretor
peregrino, encarregado cie julgar os litigios entre estrangeiros ou entre
romanos e estrangeiros. O “patrono” era eleito pelo povo conquistado
por Roma para defendê-lo junto a ela. Eles eram escolhidos entre os
romanos e nomeados pelo Senado romano, que aceitaria 011 nào os esco­
lhidos pela cidade.
Alguns autores (Maresca, Anzilotti) têm afirmado que a instituição
consular teria surgido no período medieval e que as instituições da Anti­
guidade acima mencionadas seriam criação do Estado territorial, que dava
assim uma proteção ao estrangeiro. Nesta fase da Historia ocorreria exa­
tamente o contrario do que acontece atualmente com a instituição dos
cónsules, que é o Estado proteger os seus nacionais e interesses no esiran-
geiro por meio deles. Entretanto, se esta argumentação é válida em relação
aos “prostates”, aos “recu pera tores”, ao “pretor peregrino” ou, ainda,
para o “ patronato”, ela não o é em relação aos “ proxenos”, que eram
instituidos por uma cidade junto a outra. O próprio Maresca sentiu este
aspecto e salienta que eles não podem ser considerados como os primeiros
cônsules porque eles possuíam funções diferentes5 das destes. Entretanto,
não nos parece que esta argumentação seja válida, uma vez que as funções,
através dos tempos, não poderiam permanecer as mesmas e eles tinham
a principal característica dos cónsules: eram designados por uma cidade
junto a outra para proteger os nacionais da cidade que os nomeava.6
Salienta ainda o intemacionalista italiano que eles não eram órgãos do
Estado no seu sentido moderno. Entretanto, é de se assinalar que os
proxenos, apesar de não manterem contato regular com a cidade que os
enviava, não deixavam de ser um órgão desta cidade, podendo ter missões
junto às autoridades da cidade em que serviam em nome da que os no­
meara.
Podemos concluir que os proxenos foram os primeiros cônsules que
a História registra. Esta instituição, entretanto, veio a se desenvolver apenas
na Idade Média.7
No período medieval as corporações de ofícios que existiam nessa
época tinham juizes para resolver os litígios entre os seus membros, ou
entre estes' e os estrangeiros; tais juizes tinham o nome de cônsules. Com
as Cruzadas, os comerciantes ocidentais estabeleceram as suas corporações
no Oriente, com os seus juizes.8 Deste modo, os comerciantes de Veneza,
Marselha, Gênova, etc., foram-se instalando no Egito, na Palestina, etc. Gs
cônsules aplicavam nos julgamentos o seu direito nacional.9 Eram assim
eles escolhidos pelos próprios comerciantes, sem a intervenção do Estado.
Esta era a regra geral; entretanto, encontramos no século XII cônsules
nomeados p or Veneza ou Constantinopla. No século XIII, o “Consulado
do Mar” fala em “ magistrados que acompanham òs navios em suas viagens
como cônsules” (Luke Lee).10 Originariamente, era um Tribunal Marítimo
que passou a ter jurisdição em assuntos comerciais. Ele surgiu para proteger
os interesses mercantes tíos comerciantes catalano-aragoiieses. Os juízcs
eram eleitos pelos 11pro-homens do mar". Tinha sessões regulares. Osjuízcs
(cônsules) tentavam primeiro, à margem do tribunal, unia solução pacífica,
e os poderes de polícia que tinham, asseguravam a execução das sentenças.
Esta instituição se espalha pela Europa do Mediterrâneo com a intensifi­
cação das relações comerciais e a partir do século XIII já se encontra na
Europa do norte. O poder central dos Estados ocidentais se fortalece e o
poder de julgar passa a ser do Estado, perdendo assim os cônsules a sua
função inicial de julgar (século XVII) — afirma-se a jurisdição territorial
dos Estados." Por outro lado, eles passam a ser designados pelo Estado e
a ser seus funcionários (século XVI). A partir da criação^das Missões
Diplomáticas permanentes eles perderam as suas funções diplomáticas. No
século XVII os Estados passam a regulamentar o serviço consular por meio
de Jegislações nacionais, sendo que a primeira'foi a de Colbert, cuja Or­
denança de Marinha (1681) é dedicada também aos consulados. A legis­
lação norte-americana é de 1792 e a da Grã-Bretanha de 1846.
Os Consulados, transformados em “sinecuras hereditárias”, começam
a ter à sua frente indivíduos apenas interessados em sua fortuna particular,
que começam a praticar urna série de abusos. Os cônsules passam a ser
malvistos. Nos séculos XVII e XVIII, a instituição consular entra em deca­
dência e inúmeros tratados — Ryswick (1697), Utrecht (1713) e Versalhes
(1739) — determinam que “no futuro nenhum cônsul será admitido por
uma ou outra parte”. Neste século, apenas a Holanda e a Inglaterra, com
um desenvolvido comércio marítimo, ainda mantêm os cônsules. Neste
período os interesses econômicos nas relações internacionais são talvez
menores que os políticos.
No século XIX , com o incremento das relações comerciais, a instituição
consular tem um verdadeiro florescimento. A partir de 1860, com a assi­
natura entre a França e a Inglaterra do Tratado Cobden,12 o Consulado
se desenvolve de maneira uniforme.
A instituição consular tem, assim, uma origem consuetudinaria. Em
1928, em Havana, é concluída uma convenção interamericana sobre agen­
tes consulares. Em 1963 é que este instituto recebe uma regulamentação
uniforme “parauniversal” com a convenção sobre “relações consulares”
concluída em Viena sob os auspícios da ONU. Atualmente ela está regulada
ainda por inúmeras convenções bilaterais e pela legislação interna dos
Estados. Em 1967 foi concluída, no âmbito do Conselho da Europa, uma
convenção sobre as funções consulares.
529. O art. 8-. da Convenção de Viena.13 detcnrim a ..g i^
consulares entre Estados.se fazem D.Qr^QB^eBiijiLeaiajQaikual^Asãin.fifin^,.
HõTõ~direito de consulado, como ocorre com o direito de legação, só pode
ser exercido pelo Estado-com a concordância do outro Estado. E le é um
direito de que e titular o Estado soberana! Entretanto, nada impede que

que o protetor ou o suserano IKe déé'ñi tal direito.

1365
As relações consulargs-apresentam urna independência das relações
diplomáticas. A ruptura de relações diplomáticas não acairéla a ruptura
de relações consulares. I'al j[aip..o.coae> por exemplo, nos casnsjam^rji y .as-
relames diplomáticas são rompidas para não haver o reconhecimento de
límñoro governo.0 Pode ocorrgr assim qu.<;._ps Estados rompam as relações
políticas (diplomáticas'), mas mantenham as comerciais (consulares). Enr
tretanto, ao ser dadpja consenümeiiip. p ^ a ,o .e^lahcIecinie.Dlo..(Ie^Eehiçõe3
diplomáticas, implicitamente é dado .Q Cii0 .s<;iL¿mcut0 .para o esta.beleçi.-
mentó ríe rélacóe_s_cpjasularfis__ _
530. Os cônsules podem ser de duas especies: os “electi" e os “missi”.
Os cônsules “electi” ou honorários—são aqueles escolhidos entregos
nacionais do Estado junto ao qual vão servir..'Eles remontam ao século
XIII (entretanto os seus antecessores podem ser-encontrados na Grécia)
e eram inicialmente eleitos pelos comerciantes estrangeiros originários de
uma mesma cidade para representá-los junto ao govemo do Estado onde
se encontravam. Eles eram naturais do Estado junto ao qual iam servir.
Eram chamados inicialmente de cônsules “hospites”, e a partir do século
XVIII foram denominados de cônsules “electi”. Atualmente, a denomina-
cão-mais comum é a de cônsules honorários
Os cônsules “missi” sâo aqueles designa«ÍQS_Belg_Estado entre os seus
nacionais15 para defender no estrangeiro os seus nacionais, bem corno os
seus interesses. A denominação de cônsules “ missi” surgiu no século XVIII,
apesar de eles datarem do século XVI. São denominados, hoje em dia,
cônsules de carreira.
Atualmente os cônsules “electi”, bem 'com o os “missi”, são sempre
nomeados pelo Estado cujos interesses eles. vão defender no estrangeiro.
A distinção entre os honorários e os de carreira reside no fato de que os
primeiros são escolhidos entre os nacionais do Estado em que vão servir16
(geralmente sào comerciantes), enquanto os segundos são nacionais do
Estado que os envia. Oi cônsules honorários têm imunidades mais restritas,
que os de carreira. De um modo geral, os honorários não recebena salários
como os de carreira, mas uma pr^tifirarão Os cônsules honorários têm-r
às vezes, funções mais restritas: o Decreto n2 23.776, de 1947, proibiu os
cônsules honorários brasileiros de registrar e certificar mortes, casamentos
e nascimentos, etc. Eles estão geralmente subordinados aos Consulados
de caiTeira ou às Missões Diplomáticas, podendo, entretanto, em alguns
casos, estar subordinados diretamente à Secretaria de Estado (parágrafo
único, do art. 31, da Lei ns 3 .9 1 7 /6 1 ).
A maioria dos Estados nomeia os dois tipos de cônsules; entretanto,
existem alguns países que não reconhecem os cônsules honorários (Hun­
gria, Tcheco-Eslováquia). Outros Estados aceitam a existência de cônsules
honorários no seu território, mas-não os nomeia para representá-los (EUA,
Nova Zelândia, Austrália). Eles ainda existem por medida de economia
para os Estados. „

1366
531. As funções dos cônsules estão enumeradas no art. 5“: a) “proteger
no Estado de residencia os interesses cío Estado de envio e de seus cida-
dãosT^) "favorecer o d esei ivolvi ni eñTo de relações comerciais, económi­
cas, culturais e científicas”;..c) “sg Iníoriiiar.-poiL-Laclos. os-iin-ins. líriins-
da vida comercial, económica, cultural e c i e n t íf i c a .: d) fprn.ece.c.p.a5S.a-
port.es aos cidadãos do Estado de envió; é) dar assistência aos cidadãos do
Estado de envió; j) agir como notario; g) “salvaguardar os interesses dos
cidadãos do Estado de envio nas sucessões no territorio do Estado de
residência: h) salvaguardar os interesses dos menores incapazes, cidadãos
do Estado de envió, no Estado de residência; i) representar ou lomar as
medidas necessárias para a representação, perante os tribunais ou autori­
dades do Estado de residência, os seus nacionais; j) transmitir os atos
judiciais; t) fazer a inspeção e o controle dos navios nacionais do Estado
que o designou; m) dar assistência aos navios e aeronaves, bem como a
sua equipagem; n) exercer as demais funções que lhe forem atribuídas. E
de se assinalar que a Córte Interamericana de Direitos .Humanos, em 1999,
em uma opinião consultiva, afirma que a assistência consular a seu nacional
é urna norma de direitos humanos. A convenção sobre relações consulares
de 1963 é considerada como sendo entre estados, mas com a exceção
assinalada.
f Estas funções podem ser resumidas nas seguintes: a) observação: b)
proteção; ç) execucãó_íootaD^I^i^.7íiscaI_(ar£££adaZ£niQliim^Til.Qa. pagas
I p e l a fiin r ã o .ríe , n o t a r i o ) 17
Os cônsules podem. na ausencia de Missão Diplomática, praticar atos
diplomáticos se o .Estado de residéncia concordar (art. Í2 3a Convenção
de Havana). Ele__deverá _permaiiec.er .corQ...q_s_& u ^ jto ¿t¿s de cónsul, isto é,
com os flrivijpfrins e imunidades consulares?^
Os cónsules podem, ainda, representar o Estado de envió em urna
organização internacional após notificação ao Estado de residência. Neste
caso, ele gozará das imunidades diplomáticas como representante do Es­
tadojunto à organização internacional e de imunidade de jurisdição de
cónsul pelos atos que praticar no exercício de funções consulares (art.
17).18A
Os cônsules têm o dever de respeitar as leis19 e o governo do Estado
de residencia.
532. Um Consulado só pode ser estabelecido com o consentimento
do Estado onde ele vai ser instalado.
A sua sede e sua circunscrição necessitam de ser aprovadas pelo Estado
de residencia. A mesma exigência ocorre quando o Consulado-geral ou
Consulado, pretende instalar um Vice-consulado, urna agencia consular
ou ainda um escritorio em local diferente do em que está instalado.20
O local de jurisdição do Consulado se denomina distrito consular, e
muitas vezes coincide com as divisões administrativas do Estado de resi­
dência sem, entretanto, haver obrigatoriedade neste sentido. Os cônsules
têm funções locais, üàú normalmente existirem em um Estado diversos

1367
Consulados e somente com o consentimento do Estado de residencia eles
podem exercer funções fora do distrito consular.
Os Consulados agem independentemente um do outro e se corres­
pondem"diretamente com o Ministério do Exterior do Estado nadõnaI~E~
~trrpié~~5c0rré com os Consulados brasileiros. Eles são independentes da
Missão Diplomática; entretanto, ela e que os protege, bem como serve de
intermediaria entre os Consulados e o governo central do E.sl>ido_rie .msL-
HênHa. Õ Decreto ne 71.534, de 12-12-72, estabelece que as repartições
consulares de carreira são diretamente subordinadas à Secretaria de Estado,
contudo em assuntos de interesse político, económico e cultural devem
dar conhecimento de suas atividades a Missão Diplomática.
-N a vida internacional tem sido invocado algumas vezes o principio da
equivalencia consular, istn é . ntn F_srarlo..tpj;L.jia„tprritñrin rir .nntra .n
mesmo número de Consulados que este tem no seu território. Em 1952,
o Irã se utilizou dele em relação à Inglaterra.
533. A seleção e nomeação dos cônsules é assunto regulamentado pela
lei interna dos Estados.
No Brasil, não tem o s carreira consular.21 A pessoa faz o Curso Rio
Branco; ao sair, é nomeada 32-secretário. Os individuos designados como
cônsules são tirados da carreira diplomática. Eles podem ser designados
para servir como agentes diplomáticos ou ter função consular. Assim sendo,
o Decreto nB 71.323, de 7 de novembro de 1972, estabelece no art. 3S que:
a) o cônsul-geral será escolhido entre os ministros de 2~ dasse; b) o côn­
sul-geral adjunto dentre os conselheiros; c) o cônsul dentre os conselheiros,
primeiros e segundos secretarios; d) o cónsul adjunto dentre os primeiros
e segundos secretários; é) o vice-cônsul dentre os terceiros secretários.
A nomeação do chefe da repartição consular é feita pelo Estado de
envió e “ admitido no exercício de suas funções pelo Estado de residência”
(art. 10). Quando um Estado vai designar um chefe de repartição consular
para servir em outro, deverá ser'transmitida a este urna carta de provisão
(carta patente, contendo o nome, a sede da repartição consular, etc.), por
via diplomática. Quando o chefe da repartição consular é aceito pelo
Estado-onde ele vai servir, a carta de provisão pode ser substituida por
um a notificação contendo os mesmos elementos da carta de provisão. Os
vice-cónsules e os agentes consulares recebem um “ documento similar” à
carta patente, usualmente denominado “brevet” (Von Glahn).
O chefe da repartição consular é admitido no exercício das suas fun­
ções por uma autorização do Estado de residencia, 'que é denominada
“exequátur” (art. 12). Somente após receber o “exequátur” é que ele
entra em função.22 A recusa do “exequátur”23 não precisa ser justificada.24
O “exequátur”25 pode ser definido como sendo “a outorga da admissão
definitiva” (Zourek). O e x e q u á tu r ” tem também a finalidade de tornar
público na ordem interna que o cónsul pode exercer as funções que são
da sua competência. A forma do “exequátur” é fixada pela legislação
interna.

1368
E n tretan to , an te s d e ser d ad o o " e x e q u á tu r ” , “ o ch e fe da re p a rtiç ã o
co n su la r pode ser a d m itid o p rov iso riam en te n o e x e r c íc io de suas fu n çõ e s "
(art. 1 3 ).“
O Estado de residência deve comunicar às autoridades do distrito
consular que o chefe do Consulado assumiu as suas funções.
Uma mesma pessoa pode serin c li c a d a pa ra fi in cio ná rio c o nsu Ia r de
dois EstadosTHêsdé- que o Estado de residência concorde.
.Os membros'(To pessoal.consular (“funcio nários consulares que não
sejam o chefe da repartição consular, empregados consulares e membros
do pessõãl~de_SCTVÍÇT3av7'sãõ nomeados livremente pelo Estado, efue deverá
entretanto ¿o!5l£ãra"5~Tistãdcrde residência a nomeação. O pessoal con­
sular pode ser limitado a determinado número, a pedido do Estado de
residência.
Os fnnrinná^ps ro nsulares_(“ toda pessoa, inclusive o chefe da repar­
tição consular que exerce funçães..co.nsuJares”) -devem ter, via dê regrà, a
nacionalidade do Estado cie envio, Se esta regra não Tõr respeitada, é
neçessáno que haja o consentimento doTTstado dê~rê~sidênciã!
O Estado3e~rê^cIehcia deve ser notificado das nomeações, chegadas
e partidas dos membros da repartição consular, bem como pessoas de suas
famílias.
O Estado de residência pode declarar um funcionário consular corno
“persona non grata" ou qualquer outro membro da repartição consular
como não aceitável, sem precisar apresentar os motivos disto. O Estado de
envio deverá retirar esta pessoa do Estado de residência em um prazo
razoável, e se isto não foi feito o Estado de residência pode tirar o “exe­
quátur” ou deixar de considerá-lo como tendo imunidades e privilégios.
534. A classificação dos chefes de repartição consular é realizada no
art. 9Qda Convenção de Viena em quatro classes: a) cônsules-gerais; b)
cônsules; c) vice-cônsules: d) agentes consulares.27 Esta classificação, entre­
tanto, não impede que os Estados designem os seus chefes de repartição
consular com outra denominação.
A precedência entre os chefes de repartição consular é feita dentro
de cada classe pela data da concessão do “exequátur”. Se o cônsul foi
admitido antes do “exequátur”, conta-se este período para a precedência.
Se o “ exequátur” ou “ admissão provisória” de dois cônsules têm a mesma
data, leva-se em consideração a data da apresentação da carta patente. Os
chefes interinos de repartição consular, na precedência, vêm depois de
todos os chefes “efetivos” de repartições consulares.
Os cônsules estrangeiros são denominados de Corpo Consular Estran­
geiro28 e os nacionais de Corpo Consular Nacional.
O Brasil tem as seguintes repartições consulares,29 nos termos "da Lei
na 3.917, de 1961:
“ 1 — Repartições consulares de carreira:
a) Consulados-gerais;
b) Consulados;

1369
2 — Consulados Privativos;111
3 — C on su lad os H o n o r á r io s .-'
O B rasil criou em 1 9 S 3 os C on su lad os-gerais d e l 3 Classe para o n d e
são n o m e a d o s m in istro s d e I a Classe.
535. Os privilegios e imunidades31 consulares têm o mesmojimdaxnen-
to dos gilê têm os agentes flíplbmáti eos, ou seia. eles são concedidos “nao
j a r a dar vantagens aos indivídúos. mas para, assegurar a_realiza.ção-efica2-
de suas funções pelas repartições consulares em nome dos seus Estados”
(preâmbulo da Convenção de Viêria de 1963).
As repartições consulares gozam de uma série de imunidades e privi­
legios. Elas devem receber todas as facilidades, inclusive para adquirir
imóveis para a sua instalação e alojamento dos seus membros, para desem­
penharem as suas funções. Têm o direito de arvorar o seu pavilhão bem
como o escudo de armas do Estado de envio. Os locais consulares são
invioláveis, só podendo as autoridades, do Estado deresictéñqa ai penetrar
com cóhsentimeñtó do chefe da repartição consular..Este consentimento
é presumido ter sido dado em ceños casos, como incendio, etc. Os locais
consulares, os móveis e os meios de locomoção não podem ser requisitados
pelo Estado de residência. As desapropriações devem ter uma “indenização
justa, adequada e efetiva”. Os locais consulares32 e a residência do chefe
da repartição consular gozam de isenção fiscal, a não ser que sejam taxas
cobradas por serviços prestados ou incumbam ao locador do imóvel (art.
32). Os arquivos são invioláveis. A repartição consular tem liberdade de
comunicação, podendo instalar uma estação de rádio com o consentimento
do Estado de residência. 1À malaf consular não pode ser aberta ou retida.
só podendo ser aberta se houver suspeita de co n ter outros õBTetos além
da correspondência é^nram<?H^s^^aai7. O x o rre io consular etnviolável.
Os funcionários consulares têm líEerdãde de comunicação com os cidadãos
do Estado que os enviou, mesmo que eles estejam presos, não podendo
entretanto intervir em seu favor se o interessado não o quiser. Do mesmo
modo, o Estado de residência deve assegurar liberdade de movimento aos
membros do posto consular, podendo, contudo, proibir o acesso a zonas
que interessam à segurança nacional. Às reparações consulares se comu­
nicam com as autoridades locais do distrito consular e só o fazem com as
autoridades centrais do Estado de residência se a legislação deste permitir.33
A repartição consular pode auferir taxas p e lo s serviços consulares presta­
dos, que gozam de isenção fiscal. O Estado de residência deve notificar à
repartição consular: naufrágio, acidente aéreo ou morte de um indivíduo
nacional do Estado de envio da repartição consular, etc.
Í O s funcionários consulares de carreira34 gozam de privilégios e inmu­
nidades mais restritos do que os dos agentes diplom áticos^iüevido ao seu
grande número dentro dos Estados e ainda porque não representam o
seu Estado de envio. Eles só têm jmunidades para_og_ aU3s_Rr^ügjjdQs_ji£>
exercício de suas fa rfç õ ê iíljli^ ^ .»ageittZdP
Eskdo.de envio”. Eles devemj:ec.e.b^nda^t a d í ¿ á ¿ J ^ SM k ^ 4 j£ a t^ áo
n e ce ssária para o d e s e m p e n h o das snas fu n çõ e s. El es si) podcin sur d etid o s
o ir"D iis» s dpi crim e a ra v r <■ d cp o it de u m a d e c isa o 'da autondaiTe jiuli~
ciária c o m p ete n te ” : f'ora «leste caso, cíes só p o d ern s e r detidos após ‘ iinia
d ecisão ju d iciária d efin itiv a ” . O fu n cio n ário c o n su la r deverá se ap re se n ta r
p e ra n te as autorid ad es c o m p e te n te s em caso d e p ro c e sso crim inal c o n tra
e le . O Estado de re s id e n c ia deverá n o tificar a o c h e fe d a rep artição c o n su la r
a prisão ou o p ro ce sso crim in a l con tra um fu n c io n á r io consu lar, ou n o ti­
fic a r a Missão D ip lo m á tica , se fo r o p ró p rio c h e fe d a rep artição o p e rse ­
gu id o ou delido. G ozam d e im u nid ad e de ju r is d iç ã o p elos atos p raticad o s
n o e x e rc íc io de suas fu n ç õ e s .’r> Os fu n cio n á rio s c o n su la re s pod em p re sta r
te ste m u n h o q u an d o co n v o cad o s para isto,'1' n ã o s e n d o , e n tre ta n to , o b ri­
g ad os a d ep o r so b re as suas fu n çõ es. O s fu n c io n á rio s con su lares e as pessoas
da sua fam ília q u e vivem sob sua d e p e n d ê n cia n ã o estão o b rig ad o s ao
reg istro de e stran g eiro s. O s fu n cio n ário s c o n su la re s e stã o isentos da lic e n ç a
d e tra b a lh o para e x e r c e r as suas fu n çõ es o fic ia is. E stão isentos da previ­
d ê n cia social, bem c o m o as pessoas da sua fa m ília .18 T ê m isen ção fiscal os
fu n cio n á rio s c o n su la re s, b e m com o as p esso as d e sua fam ília q u e vivam
co m e le, a suas e x p e n sa s, de todos os im p o sto s, c o m e x ce çã o d os: a)
im p o sto s in d iretos; b) im p o sto s e taxas so b re b e n s p a rticu la re s; c) d ireito s
d e su cessão; d) im p o sto s e taxas sobre re n d a s p a rtic u la re s; e) im p o sto s de
re g istro , selo, h ip o te c a , co m e x ce çã o do q u e e s ta b e le c e o art. 32 acim a
citad o . E stão isen to s d e im p osto s ad u an eiro s p ara os o b je to s d estin ad os
ao uso oficial ou p ara u so de pessoas da sua fa m ília q u e vivam co n sig o a
suas expensas. A in s p e ç ã o da bagagem d estas p esso as não é feita, a n ão
se r q u e h aja fo rtes su sp eitas de ela e n c o b rir a im p o rta ç ã o e e x p o rta ç ã o de
p ro d u to s em q u a n tid a d e s su p erio res a suas n e ce ssid a d es ou de o b je to s
p ro ib id o s p or re g u la m e n to s d e q u a re n te n a .38'' O E sta d o de re sid ê n cia n ão
c o b r a rá im postos p e lo s b e n s m óveis d eixad os p o r u m fu n cio n á rio ou p essoa
d e sua fam ília q u e se e n co n tra v a m n o seu te r r itó r io e m virtude das fu n ç õ e s
q u e ali e x e rcia o fu n c io n á r io con su lar. O E sta d o d ev erá p erm itir a e x p o r ­
ta ç ã o d os b ens m óveis d o d efu n to , com e x c e ç ã o d o s q u e foram ad q u irid o s
n o seu te rritó rio e q u e h a ja p ro ib ição d e e x p o r ta ç ã o . O s fu n cio n á rio s
co n su la re s e as p essoas d e sua fam ília estão ise n to s d e p restação de serviços
pessoais p o r re q u isiçã o d o E stad o de resid ên cia. O s fu n cio n á rio s co n su lares
d e ca rre ira não p o d e m e x e r c e r atividade p ro fiss io n a l ou co m e rcia i. As
p essoas de sua fa m ília q u e tiverem n o E stad o d e re s id ê n c ia um a o rn p a c áo

O sfu n c io n á rio s 'c o n s u la re s que forem n a c io n a is d o Estado de re s id ê n ­


cia ou a í têm a sua rêsi3êh d â'~ p erm an & n te S ó ffozam -tie-.inM o la b ili3 a d e
pessoal e de im u n id a d e d e ju ris d iç ã o para o s a to s p ra tica d o s no e x e rc íc io
d e suas fu n çõ e s e n ã o e stã o obrigad os a d e p o r s o b r e as s i ja s íu r i ç o e s . A
sua p risão, ou p e rs e g u iç ã o p e n a l, deve ser n o ú íic a d a p e Ío Estado d e resi­
d ê n cia . A fam ília d o fu n c io n á r io con su lar n a s itu a ç ã o aqui d escrita só goza
d o s privilégios e im u n id a d e s n a m edida em q u e o Estado d e re sid ê n c ia

1371
ad m itir. O E sta d o , ao e x e rc e r a su a ju ris d iç ã o , não deve e n tra v a r de 'm a ­
neira e xcessiv a" as fu n çõ es da re p a r tiç ã o consular.
Os membros da repartição consular (são os “funcionários consulares,
os empregados consulares™ e pessoal de serviço" )4" têm privilégios e imu-
tiidades bem mais restritos, como vemos, do que a Missão Diplomática.
Veremos agora os privilégios e imunidades dos. membros da repartição
consular, excluindo^e_os funcionários consulares de que já tratamos.
Os empregados consulares têm os seguintes privilégios e imunidades:
a) devem prestar testemunho quando solicitado, não sendo obligados a
depor sobre as suas funções; b) estão isentos da licença de trabalho; c) têm
isenção de previdência social: d) estão isentos da prestação de serviços; é)
em caso de morte de membro da repartição consular ou de sua família
aplicam-se as normas cabíveis aos funcionários consulares; J) tém imuni-
dade-de jurisdição pelos atos praticados 110 exercício das suas funções com
as mesmas restrições dos funcionários consulares; g) estão isentos do re­
gistro de estrangeiros;41 h) têm isenção fiscal, juntamente com a sua família,
igual à dos funcionários consulares; i) têm isenção de impostos aduaneiros
para os objetos importados para a sua primeira instalação.
O pessoal de serviço enunciado tem, em resumo, os seguintes privilé­
gios e imunidades: a) deve prestar testemunho quando solicitado, não
sendo obrigado a depor sobre as suas funções; b) está isento de licença de
trabalho; c) está isento da prestação de serviço; d) isenção de previdência
social; e) isenção fiscal de impostos sobre salários recebidos por suas fun­
ções.
O pessoal privado (não é membro da repartição consular) quase não
foi tratado na Convenção de Viena e as poucas normas existentes lhe dão
os seguintes privilégios e imunidades: a) esta isento da licença de trabalho;
b) isenção da previdência social, desde que não tenha a nacionalidade ou
a residência permanente no Estado de residência e que esteja submetido
ao sistema de previdência do Estado de envio ou de um terceiro Estado.
Os empregados consulares, o pessoal de serviço e o privado, bem como
as suas respectivas famílias, não terão os privilégios e imunidades mencio­
nados se tiverem ocupação lucrativa de aspecto privado no Estado de
residência.
Os membros da repartição consular que não sejam os funcionários
consulares, se forem nacionais do Estado de residência ou aí tiverem a sua
residência, só têm privilégios e imunidades na medida em que o Estado
de residência admitir. O mesmo ocorre com os membros de sua família e
com o pessoal privado. Entretanto, o Estado de residência, ao exercer a
sua jurisdição, não deve entravar de “ maneira excessiva o exercício das
funções da repartição consular”.
A renúncia aos privilégios e imunidades de um membro da repartição
consular deve ser feita pelo Estado de envio de forma expressa. A renúncia
à imunidade de jurisdição não significa renúncia à imunidade de execução.
O s m e m b ro s tia rep artição c o n su la r com eçam a gozai de privilégios i-
im u n id ad es ao e n trarem n o E stad o de resid ência c. se aí se e n co in ra n i-se
b e n e fic ia m d elas a partir da d ata em que assum irem as suas fu n çõ es.
Os privilégios e imunidades subsistem mesmo ein caso de conilito
armado. Eles subsistem até a saída do membro da repartição consular do
território do Estado de residência, ou ainda até a expiração do “prazo
razoável” dado pelo Estado de residência para que a pessoa saia do seu
território. A imunidade de jurisdição permanece “sem limite de duração”
para os atos praticados no exercício das suas funções. Em caso de morte
de um membro da repartição consular, a sua família continua a gozar dos
privilégios e imunidades que ele tinha até sair do território do Estado de
residência ou até ser vencido um “prazo razoável” que lhe tenha sido dado
para se retirar. Este prazo é dado à família quando morre membro da
repartição consular, ou quando é declarado “persona non grata” ou não
aceitável.
Os terceiros Estados devem respeitar as imunidades e privilégios para
os membros de uma repartição consular que atravessar o seu território
para assumir, ou quando deixarem o seu posto, ou aí se encontram por
força máior. O mesmo tratamento será dado à correspondência e ao correio
consular.
C As imunidades e privilégios aqui estudados não se aplicam aos membros
das familias dos empregados consulares, do pessoal de serviço e do pessoal
privado, a não ser que elas tenham sido dadas expressam ente?48')
i^~Frnalmente, podemos salientar que na grande maioria dos países não
existe um correio consular, vez que ele foi fundido no correio diplomático
(Francis DeakJ>i
536. Os Consulados honorários devem receber facilidades para o de­
sempenho dàs suas tunçoes.'*3 Têm o direito de arvorar opãvilhao ê üsãF
rr~escüdõ de armas. O Estado de residência deve facilitar a aquisição de
locais para a instalação do Consulado e alojamento para os seus membros.
Têm os mesmos direitos dos Consulados de carreira em relação à liberdade
de movimento e de se comunicar com os cidadãos do Estado de envio e
de ser informado sobre naufrágio, morte, etc., de pessoas ou coisas nacio­
nais do Estado de envio; liberdade de comunicação com as autoridades
do'Estado de residência e de cobrança de taxas e emolumentos consulares.
Os locais consulares devem ser protegidos. Os arquivos são invioláveis. Os
locais consulares gozam de isenção fiscal quando o Estado de envio é seu
proprietário ou locatário e não deverão ser utilizados de modo “incompa­
tível com o exercício das funções consulares”. Os terceiros Estados darão
à sua correspondência os mesmos privilégios e imunidades que são dados
à correspondência dos Consulados de carreira; entretanto, a “troca de
malas consulares” entre dois Consulados honorários em Estados diferentes
só é admitida se ambos os Estados concordarem. Gozam de isenção adua­
neira os objetos importados para a instalação do Consulado: móveis e

1373
m ate rial d e e scritó rio , im p ressos o fic ia is . livros, b a n d e ira s, escu d o s, etc. Os
locais c o n su la re s devem ser u tiliz a d o s d e m od o com p atív el com as fun ções
e, se n o m e sm o im óvel e x istire m o u tr o s “ e sc ritó rio s", o jo c a l d o C onsulado
d everá e sta r em " c o m p a rtim e n to s e p a ra d o d ele s".
Os cônsules honorários têm os seguintes privilégios e imunidades: a)
o processo penal iniciado contra eles deve ser feite cie modo a não preju­
dicar o exercício das suas funções, a não ser que eles estejam presos; b)
devem ser protegidos pelo Estado de residência; c) estão isentos de impos­
tos e taxas sobre emolumentos recebidos pelas suas funções; d) estão isentos
do registro de estrangeiro se não exercerem nenhuma atividade comercial
ou profissional em seu proveito; e) devem ser isentados da prestação de
serviços por requisição do Estado; f) o Estado lhes deve comunicar a prisão
ou a perseguição contra pessoa que faça parte do Consulado; g) têm
imunidade de jurisdição pelos atos praticados no exercício de suas funções
nos mesmos limites da que os funcionários consulares.têm; h) não estão
obrigados a depor sobre fatos relativos às suas funções consulares; i) a
renúncia às imunidades e privilégios rege-se pelas mesmas normas dos
funcionários consulares; j) o mesmo ocorre com as normas sobre começo
e fim dos privilégios e imunidades; l) têm o dever de respeitar as leis e
regulamentos do Estado de residência e não se imiscuir nos assuntos
internos do Estado.
[ Os privilégios e imunidades acima não se estendem à família do cônsul
honorário, nem ao empregado consular “que estão empregados em um
posto consular dirigido por um funcionário consu lar h o n o r á r io ’’ (art. 58^
§ 3a).
537. As funções consulares terminam por: q) retirada do “exequátur";
b) notificação feita pelo Estado de envio de que as funções consulares de
determinada pessoa terminaram; c) notificação do Estado de residência
ao Estado de envio de que ele nâo considera determinada pessoa como
fazendo parte do. pessoal consular; rf) pela_mo£t£._
538. Os cônsules e agentes diplomáticos têm várias Idifereríça^ entre
si. Elas pocTem ser sintetizadas nas seguintes: a) o cônsul não tem aspecto
representativo no sentido político, enquanto o agente diplomático tem;
b)_o cônsul tem funções junto às autoridades locais, enquanto o agente
diplomático as tem junto ao governo central; r) os agentes diplomáticos
têm maiores privilégios e, imunidades .do
— ------ A- M . ^ 1LU- ■■.
que
. .
os cônsules; «d) diversidade
inii i '..nu .u .i i a .l - i ----------
m i ii í l w w

de funções (pe. ex.: os cônsules não tratam de assuntos políticos como


fazem os agentes diplomáticos); e) o agente diplomático recebe credenciais
do Estado acreditante, enquanto o cônsul recebe carta patente do Estado
de envio; f) o agente diplomático entra em função após a entrega das
credenciais, enquanto o cônsul o faz após a concessão do “ exequátur”; g)
o cônsul só tem atuação no distrito consular, enquanto o agente diplomá­
tico a tem em todo o território do Estado, havendo uma missão diplomática
e várias repartições consulares.

1374
NOTAS
1. Luke T. I.cc — Vienna Convcniion ou Consular Relalions, 1966, ídem —
(Consular Law, 1961; G. E. (lo N ascim ento e Silva — Manual de D erecho Consular,
1952; Albert M. Candioli — Historia de la Institución Consular en la Antigüedad
y en la Edad Media, 1 .1, 1925; Ellery C. Stowell — Le Cónsul, 1909;Jaroslav Zourek
— Le Statut et les Fonclions des Cónsules, in RdC, 1962, vol. II, t. 106, págs. 537
e segs.; Francesco Ferrara — M anuale di Diritto Consolare, 1936; Adolfo Maresca
— Le Relazioni Consolari, 1966; Francesco P. Contuzzi — Trattato Teorico-Pratico
di Diriuo Consolare e Diplomático, 2 vols. (vol. I), 1910-1911; Graham Stuart —
Le Droit et la Pratique Diplomaliques el Consulaires, in RdC, 1934, vol. II, t. 48,
págs. 463 e segs.; Daniel Antokoletz — Tratado Teórico y Práctico de Derecho
Diplom ático y Consular, 2 vols. (vol... I I), 1948; G. E. do N ascim ento e Silva —
Organização Diplomática e Consular ■Brasileira, 1959; Francesco Contuzzi — La
lstituzione dei Consolati ed il Diritto Intertiazionale Europeo nella sua applicabilitá
in O riente, 1885; Alphonse Heyking — La Théorie et la pratique des services
consulaires, in RdC, 1930, vol. IV, t. 34, págs. 815 e segs.; J . Irizarry y Puente —
Traité sur les Fonclions Internationales des Consuls, 1937; Dem etrio de Toledo
— Cônsules e Diplomatas, 1930; S. Torres-Bernardes — La C on féren ce des Nations
Unies sur les relations consulaires (La Convention de V ienne sur Les relalions
consulaires), zreAFDI, vol. III, 1963, págs. 73 e segs.; Giuseppe Biscoltini — Manuale
di Dirilto Consolare, 1969; Adolfo Maresca — Les Relations Consulaires et les
Fonctions du Cónsul en Matiére de D roit Privé, in RdC, 1971, vol. III, t. 134, págs.
105 e segs.; Mohammed Ali Ahmad — L ’Institution Consulaire el le Droit Inter­
national, 1973; Robert Sidney Smith — Historia de los Consulados del Mar 1250-
1700, 1978. Guido Fernando Silva Soares — Órgãos dos Estados nas Relações
Internacionais: Formas da Diplomacia e as Imunidades, 2001.
2. Neste mesmo período da História, na India, havia prática semelhante. A
Fenicia e Cartago parece que conheceram os proxenos (Contuzzi).
3. Eles eram escolhidos pela própria cidade que os incum bia de receber os
seus nacionais no estrangeiro, isto é, de recebê-los na cidade ju n to às quais eles
funcionavam. V ictor Ehrenberg dá um a explicação um pouco diferente, salientan­
do que “ proxenia ou ‘hospitalidade pública’ era uma honra que uma cidade
conferia p o r decreto a um cidadão de uma outra cidade, e este que se tomava
proxeno, assumia perante a sua cidade os interesses da cidade que o honrara e
de seus súditos” (L ’État Grec, 1976, pág. 175).
4. No Egito, no século VI a.C., em Naucraiis, já havia “ prostates”.
-5. E n ire estas funções podem ser mencionadas: a de velar pelo crédilo das
cidades que os nomeava, dar hospitalidade aos seus nacionais, etc.
6. O próprio Maresca afirma que os proxenos tinham um tratam ento que
“parecia p rean u n ciar’o ‘stalus’ consu lar”, com o certa precedência, facilidades
fiscais e aduaneiras, etc,
7. O Código Visigodo (séculos VI e VII) já estabelecia que os mercadores
seriam ju lgad os conform e as suas leis pelos seus “ lelonarii” (G. E. do Nascimento
e Silva).
8. Eram denominados “cônsules do mar" ou, ainda, “cônsules dos marinheiros
e com erciantes” (“cônsules m arinariorum et m ercantorium ” ), “alderm an” , etc.
A palavra “cônsul” vem de “consu lere” , que significa: ju lg ar, estatuir, assistir, etc.
A palavra cônsul com eça a ser usada para os magistrados especiais dos comerciantes

1375
a partir do século X JI. em Veneza. Pisa, Genova c parir do Oriente (Ali Ahmad).
Uma exposição sobre a origem dos cónsules é a de Friedricli Heer (L ’Univers du
Moven Age. 1970). que escreve: no fim do século X I surgem os cónsules: em 1081.
em Lucca e Pisa; em 1094, em Milão: em J0 9 9 , em Genova. Eles eram. no inicio,
"confirmados pelo reí ou pelo imperador” . Erani os representantes das com unas
que linham atingido a sua "maioridade política” . O Cónsul é geralm ente um
nobre ou um rico burguês. A sua função era hitar contra as dissensdes internas.
9. Predominava neste período o princípio da personalidade das leis: v. capítulo
XXXII.
10. Fauchille denom ina esta fase da história consular como sendo o período
municipal: o rei não participa da indicação dos cónsules. Ernst Kantorowicz (L ’Em-
pereur Fréderic II, 1987) escreve que este nom eara um cónsul em Túnis. que foi
o sarraceno H enricus Abbas, substituido pelo cristão Petrus CapSanus d ’Amalfi.
Este fato teria o corrido na década de 30 do século X III e foi-“a primeira vez que
uma monarquia ocidental mantinha uma representação permanente além-mar” .
11. O poder de ju lg a r dos cônsules só vai perm anecer nos países do O riente
com o regime de capitulação. Nestes países os cônsules tinham também o poder
de polícia e de representação do seu Estado nacional.
12. Este tratado, consagrando o livre com ércio e a cláusula de nação mais
favorecida, faz com que as relações com erciais se intensifiquem.
13. Os artigos desta convenção serão citados sem menção a ela. O presente
capítulo está fundam entado na Convenção de V iena (1963), que é a prim eira
regulamentação convencional de âmbito parauniversal. Entretanto, nada im pede
que convenções bilaterais (ex.: a dos EUA e Rússia, 1964) fixem normas diferentes
(esta convenção, por exem plo, declara inviolável a residência do chefe da missão
consular, etc.).
14. Sobre os cônsules e o reconhecim ento de governo e Estados: v. capítulo
Reconhecim ento. Podem os acrescentar apenas com L. Lee que relações consulares
por longo tem po são incompatíveis com o não reconhecim ento. Zourek salienta
que a solicitação de “exequátur” a um governo ou Estado não reconhecid o não
implica reconhecim ento, porque a solicitação é dirigida para a autoridade de fato
e acompanhada de uma declaração de não reconhecim ento.
15. Inicialm ente eles podiam ser estrangeiros.
16. A França geralm ente escolhe os seus nacionais estabelecidos no estran­
geiro.
17. O D ecreto n s 1, de 1961, do Conselho de Ministros, no seu art. 62, enum era
as atribuições dos cônsules. A convenção relativa a notificação no exterior de atos
judiciários e extrajudiciários em matéria civil ou com ercial (Haia. 1965) admite
que os cônsules façam citações.
18. Do m esm o m odo, se um agente diplom ático praticar atos consulares não
perde o seu status de agente diplomático e pode se dirigir, como os cônsules, às
autoridades locais (art. 70).
Atualmente, por questão de economia, é com um os Estados darem às mesmas
pessoas funções consulares e diplomáticas (convenção entre EUA e Filipinas de
1947 e convenção entre EUA e Inglaterra de 1951). Entretanto, alguns Estados
não aceitam esta prática (Venezuela).
18A. No caso Arcaya v. Paez (EUA, 1956) um cônsul que era acionado foi,
no meio da dem anda, designado para a M issão Diplomática do seu país ju n to à

1376
ONU v o tribu nal ap en as suspendeu o fe iio e n q u a n lo ele servisse ju n io à ON U.
consid erand o q u e a d em an da com eçara am es da sua designação.
19. Assim a C o n v e n ç ã o de Viena determ ina expressamente que os membros
da repartição consular deverão respeitar "todas as obrigações impostas pelas leis
e regulamentos do F.stado de residência em matéria de seguro de responsabilidade
civil para a utilização de todo veículo, navio on aeronave" (art. 56).
20. O Consulado deve ter a sua sede no local onde ele vai funcionar. O Brasil,
em 1938. recusou aceitar um Consulado da U nião Snl-Africana que seria instalado
em Buenos Aires, mas com jurisdição no Brasil e no Uruguai. A Convenção de
Viena, entretanto, admite a instalação de uma repartição consular em outro local
diferente daquele em que ela vai funcionar, desde que os Estados interessados
concordem.
21. Alguns países têm duas-carreiras: a consular e a diplomática. Assim, já
exisiiti na Argentina, onde acabou por ser feita a unificação, porque era comum
se passar da carreira consular para a diplomática sem que ocorresse o contrário.
22. No Brasil é um ato assinado pelo Presidente e referendado pelo ministro
das Relações Exteriores.
23. Vem de “ exsequor” (deixe-o realizar) e era utilizado em outros sentidos
como autorização do soberano, etc. (O ppenheim -Lauterpacht). No século XVIII
o "exequátur’' para os cônsules já está consagrado na Europa, usando-se a fórmula
"aprovado e adm itido’' (De Louter).
24. A URSS tem o costume de pedir um “ agrém ent” para os cônsules. Este
sistema tem a vantagem de evitar a recusa do “ exequátur” e torna a admissão
provisória quase que "in ú til” (J. Zourek).
25. Nos países muçulmanos é chamado de “ Barat" ou “Berat” .
26. “Um ‘gerente interino’ pode agir a título provisório como chefe de uma
repartição consular.” Se este interino for um ágem e diplomático, ele pode conti­
nuar a gozar das imunidades diplomáticas se o Estado de residência concordar
(art. 15).
27. Em alguns Estados esta denominação é dada “aos funcionários honorários
trabalhando sob a responsabilidade de um cônsul de carreira” (Zourek).
A Convenção de V iena declara que o Estado de envio e o de residência são
livres para estabelecer e aceitar a criação de agências consulares dirigidas por
agentes consulares, mas que não sejam designados com o chefe de repartição
consular pelo Estado de envio. Tais agentes consulares terão os seus privilégios e
imunidades fixadas pelos Estados de residência e de envio. Nem todos os Estados
usam agentes consulares. Se o agente consular for nomeado por um cônsul, ele
depende deste. Nos EUA agentes consulares são designados pelo Secretário de
Estado, que recebe a apresentação do seu nOm.e feita pelo chefe da repartição
consular de cafreira. Os agentes consulares dos EUA não recebem salário fixo,
mas são reembolsados pelas despesas feitas. Os agentes consulares são muitas vezes
substituídos dos cônsules. Antigamente a expressão agente consular era genética,
sendo que atualm ente é que ela recebe este significado próprio.
28. O Corpò Consular no Estado de residência não tem personalidade ju ríd ica;
entretanto, possui um a existência de fato, sendo comum a sua reunião para decidir
um procedimento em comum em certo assunto.
29. Elas são criadas e extintas por decreto do Presidente da República.

1377
HO. São criadas cin cidades próximas à fronteira. Os cónsules privativos são
brasileiros e deven) estar “familiarizados com o meio onde exercerão os sous
cargos" (art. 30, da Lei 3.917). Dispõe ainda este diploma legal que (aisConsulados
estarão “subordinados a repartições consulares de carreira ou a Missões Diplom á­
ticas”. Os Consulados privativos foram criados por Afránio Meló Franco em 1931.
31. Alguns autores, com o em relação aos agem es diplomáticos, tentam distin­
guir os privilegios e as imunidades. Os primeiros seriam “os favores concedidos
por exceção à lei com um ” do Estado de residencia, enquanto as im unidades se
refeririam à “não aplicação da jurisdição em matéria civil, penal ou administrativa”
(Zourek).
32. Eles não devem ser utilizados de “ m aneira incompatível com o exercício
das funções consulares". Se existirem outros escritórios no mesmo imóvel, o local
do Consulado deverá estar em “com partim ento” separado deles.
33. C om ojá vimos neste caso, a com unicação é feita geralmente por interm édio
da Missão Diplomática.
34. Podem ser incluídos nesta categoria os nossos cônsules privativos, que são
cônsules “missi” (G. E. do Nascimento e Silva).
35. Os autores do século XVIII (W icquefort, Bynkershoek) observam que eles
não representam os Estados e que se encontram submetidos às leis locais. Esta
tendência de se restringir os privilégios dos cônsules data da Paz de Munster
(1648), quando eles passaram a ficar subordinados às Missões Diplomáticas. No
século XVI, eles tinham um “estatuto diplom ático” .
36. A im unidade não se aplica quando a ação civil é intentada por terceiro
que tenha sofrido prejuízo com um acidente ocorrido no Estado de residência,
que tenha sido provocado “por um veículo, um navio ou aeronave” . O mesmo
ocorre com a ação civil resultante de con trato em que o funcionário consular não
o tenha “concluído expressa ou im plicitam ente com o mandatário do Estado de
envio” (art. 43 ). D o mesmo modo, se um funcionário consular, ou um em pregado
consular, intentar um a ação e houver no decurso do processo uma reconvenção,
ele não pode alegar imunidade de ju risd ição.
37. Se eles se recusarem, nenhum a medida coercitiva pode ser tom ada contra
eles.
38. Se eles têm pessoas a seu serviço que não têm esta isenção, estão obrigados
a pagar previdência com o empregador.
38A. As convenções consulares concluídas pelos países socialistas assimilam
os cônsules aos agentes diplomáticos em m atéria de franquia aduaneira.
39. E toda pessoa empregada “ nos serviços administrativos ou técnicos de
uma repartição consular” .
40. Pessoa “ destinada ao serviço dom éstico de uma repartição consu lar".
41. Esta isenção só se aplica aos em pregados consulares que tiverem vínculo
permanente de em prego com o Estado de envio e que não tenham em prego
privado lucrativo no Estado de residência.
42. As pessoas da família de qualquer m em bro da repartição consular têm:
isenção da prestação de serviços e gozam dos privilégios e imunidades já assinalados
em caso de m orte de membro da repartição consular ou de sua família. As pessoas
da família dos empregados consulares têm , além dos privilégios e imunidades
acima enum erados, os seguintes: a) isenção fiscal; b) registro de estrangeiros se o
empregado consular livor vínculo tic em prego perm anente com o listarlo de envio
e não tiver atividade lucrativa de caráter particular.
Os membros da família do funcionário consular têm os seguintes privilégios
“e imunidades. ri) isenção aduaneira; b) isenção de inspeção da bagagem pessoal;
r) isenção de registro de estrangeiros; d) isenção de prestação de serviços; e)
isenção fiscal; J) em caso de morte de m em bro da repartição consular ou de sua
família gozam dos privilégios e imunidades já descritos; g) privilegios e imunidades
em lerceiro Estado.
As pessoas da família do pessoal de serviço só lêm os seguintes privilégios e
imunidades: a ) isenção da prestação de serviços; b) os já assinalados em caso de
morte de m em bro da repartição consular ou de sua família.
A família do pessoal privado não foi tratada na Convenção e as poucas normas
consuetudinarias parecem consagrar a não concessão de privilégios e intimidades,
uma vez que ® pessoal privado não integra a repartição consular.
A pessoa da família do membro da repartição consular que exercer atividade
privada de caráter lucrativo não terá qualquer privilégio e imunidade.
43. Nenhum Estado é obrigado a nom ear ou receber cônsules honorários.

1379
LIVRO VIII

MODOS DE SOLUÇÃO DOS LITÍGIOS .


INTERNACIONAIS. SANÇÕES

1381
WMMNiMMK
CAPÍTULO LVI

MODOS PACÍFICOS DE SOLUÇÃO DOS LITIGIOS


INTERNACIONAIS'

539 — Introdução: a) Modos diplomáticos; 5 4 0 — Negociações diplo­


máticas; 541 — Serviços amistosos; 542 — Bons oficios; 5 4 3 —
Mediação; b) Modos políticos; 544 — Na ONU; 545 — Na OEA; c)
Modos jurídicos; 546 — Comissões de investigação; 547 — Conciliação;
548 — Solução judiciária e arbitral.

f j539>Os litígios internacionais ciue aparecem entre os Estados devem


ser s5feciona¿oide modo pãcTfíco, uma vez que houve a renuncia à guerra.
Entre o s textos internacionais quê~consagram a solução pacífica estão as
'Cartas da ONÜ (art. 2S, alínea 3) e da QEÁ (art. 2Q, letra b). Êntre as
convenções estão a “para a solução pacífica dos conflitos internacionais”,
concluída na Ia Conferência de Haia em 1899 (art. P ) ; a “para a solução
pacífica dos conflitos internacionais”, concluída na 2a Conferência de Haia
em 1907 (art. I 9); a “sobre direitos e deveres dos Estados”, concluída na
Conferência Pan-americana de Montevidéu, em 1933 (art. 10); no tratado
de renúncia à guerra (Pacto Briand-Kellogg), concluído em Paris em 1928
(art. 2a); e no Tratado Americano de Soluções Pacíficas (Pacto de Bógotá,
1948, art. F ) . ?
Podemos mencionar ainda o Ato Geral para a Solução Pacífica dos
Litígios Internacionais, adotado pela SDN, em 1928, e revisto pela ONU
em 1949, e a Convenção Européia para a Solução Pacífica dos Litígios
Internacionais (1957). O princípio da solução pacífica dos litígios integra
a noção de coexistência pacífica.
Pode-se definir litígio com as palavras utilizadas pela CPJI, em 1924,
em sua decisão no caso Mavrommatis: “um desacordo sobre uma questão
de direito ou de fato, .uma contradição, uma oposição de teses jurídicas
ou de interesses entre dois Estados”. O “litígio internacional” é mais

1383
restrito do que a Carla ria ONU, no art. 34, clcnomina de "siluação'' que
possa “dar origem a unia controvérsia". A nosso ver a ‘siluação” é anterior
ao litígio e. muitas vezes, as leses ainda não estão claramente delimitadas.
Para Politis não é a justiça que trará a paz, mas esta é que trará aquela.
A solução dos litígios se caracteriza por ser pacífica e voluntária. A
jurisdição é obrigatória quando unia das partes pode invocá-la unilateral-
mente.
E denominada de cláusula compromissória a inserida em um tratado
em que o Estado se su5mete a um modo de solução pacífica. Ela é de.no-.
minada de especial (quando _é aplicada aos litígios surgidos do tratado)
ou geral (quando é aplicada a todos os litígios).
Os modos pacíficos de solução dos litígios internacionais podem ser
classificados3 em: diplomáticos, jurídicos e políticos. Os diplomáticos são:
1 — negociações diplomáticas (bilaterais e multilaterais): 2 — serviços
amistosos; 3 — mediacãç: 4 — bons ofícios.
Os políticos seriam as soluções dadas pelas organizações imernacio-
-aais»4
Os jurídicos são: 1 — comissões de inquérito; 2 — conciliação: 3 —
arbitragem: 4 — solução judiciária.
As controvérsias internacionais a serem decididas pelos meios acima
mencionados podem ser de natureza política ou de nãujnrêzãjüriHicã!
Segundo Lauterpatch foi Vattel quem introduziu a noção de litígio
não sujeito a julgamento. Assim tentou-se excluir da arbitragem os litígios
políticos que visariam uma mudança e revisão do direito, enquanto os
litígios jurídicos visariam a aplicação e interpretação do direito. Era um
meio de se atender a soberania dos Estados, vez que se alegava que os
litígios políticos atingiriam os in t^ s se s vitais dos Estados (Merignac). No
período entre as duas Guerras Mundiais os litígios jurídicos eram aqueles
resolvidos com base no direito. Na SDN havia solução judiciária para os
litígios jurídicos e os litígios políticos teriam a mediação do Conselho da
SDN, vez que poderiam ameaçar a paz. Depois considerou-se que os litígios
políticos seriam julgados por eqüidade.
Na verdade, como mostraremos em seguida, Morgenthau tem razão
ao afirmar que político e jurídico não são termos antitéticos. A tendência
atual é não se fazer mais a distinção entre litígio político e litígio jurídico.
Este parágrafo é calcado em Photini Pazartzis.
Os tratados Brvan concluídos pelos EUA foram os primeiros a não
fazer esta distinção. A conciliação é prevista para os litígios políticos que
são excluídos da solução arbitrai (Photini Pazartzis).
Pode-se acrescentar que é comum os Estados excluírem certos litígios
por meio de reservas. Até 1914 excluía-se os litígios que atingissem a honra
e a independência dos Estados. Atualmente, os tratados de arbitragem
excluem as matérias que pertencem à jurisdição doméstica dos Estados; já
a C1J é q u e m di" f a lo a p r e c ia se o a s s u n to é o u n ã o d a ju r i s d i ç ã o d o m é stic a
d o s E s ta d o s ( P h o t in i P a z a rtz is ). a
Kelsen c Visscher procuram distinguir as mencionadas controvérsias,
assinalando que jurídica é aquela cuja solução é dada pela aplicação de
norma jurídica, enquanto polítioa seria aquela cuja solução não fosse dada
pela aplicação de norma jurídica. Na verdade, esta distinção não apresenta
qualquer valor, vez que ela nem sempre é possível, porque as controversias
que visain interesses meramente políticos são geralmente apresentadas
com fundamento jurídico. A própria CIJ pod.e_vj_r a_,d_e.cidircontroy.érsias
políticas.'1 Assim sendo, tanto as políticas como as jurídicas são passíveis
de solução pelos modos pacíficos aqui assinalados. Na verdade, as galavras
“jjolúica” e “ jurídica” parecem referir-se mais aos métodos empregados
para a solução da controvérsia do que a própria natureza destas (Rosalvn
Higgins). . .
Vincent Cousirat-Coustière observa que o direito aplicado 11a solução
dos litígios é finalista e, em conseqüência, serão levados em consideração
os princípios de adaptação e de especificidade que determinarão o proce-
dimemei a ser adotado.
v^s neeociacóes diplomáticas podem ocorrer de duas formas: bi-
1 ■VjXQ- laterais (se a questão interessa apenas.a clois Estados) e multilaterais (se
/ V\10 interessa a mais de dois Estados)..,
’ Às negociações diplomáticas diretas entre dois Estados têm sido muito
utilizadas por ser uma “via discreta” (Hoijer). O Brasil a utilizou inúmeras
ve^es para as suas questões de fronteiras, tais como a da Bolívia (Tratado
de 1903), a do Uruguai (Tratado de 1909), etc.
As conferências ou congressos internacionais surgem quando as ques­
tões interessam a vários Estados (ex.: a Conferência de AJgeciras, em 1906,
sobre o Marrocos). As negociações em um Congresso às vezes facilitam a
obtenção de um acordo tendo em vista que os seus debates são públicos
e a opinião pública acaba por pressionar naquele sentido (Quoc Dinh).
Alguns autores (Luis García Arias) contudo têm observado que as confe­
rências entre chefes de Estado apresentam uma série de inconvenientes:
a) entra em jogo, muitas vezes, a animosidade pessoal; b) as reuniões nem
sempre têm um objeto preciso; c) os especialistas são afastados; etc.5A
Destas negociações diplomáticas, sejam bilaterais ou multilaterais,
pode-se chegar a diversos resultados: a) desistência quando um Estado
renuncia à sua reivindicação; b) a aquiescência, que é quando um Estado
reconhece a reivindicação do outro, ou seja, é de um modo geral o reverso
da desistência; c) a transação é quando os Estados fazem “concessões
recíprocas" (Accioly). Este modo de solução depende, entretanto, da in-
. tenção das partes litigantes, o que o torna pouco eficaz. Assinala ainda
Rousseau que 'este modo de solução somente funciona de modo pleno
quando os Estados em negociação possuem uma equivalência de força,
caso contrário os pequenos-Estados ficam nas mãos dos grandes.

1385
Finalmente, c de se assinalar que alguns autores (Lall) empregam a
expressão " negociação internacional”. em sentido amplo, abrangendo os
bons ofícios, a mediação, ele. Entretanto, nós a tomamos em sentido
restrito, abrangendo apenas aqueles entre os interessados na questão sem
a participação de terceiro, como ocon en osb on s ofícios, mediação^etc.
Pode-se fazer aqui uma referência às conferências cfe cijpüla~ Elas
tratam de assuntos gerais e podem ir além da pauta fixada. Elas visam criar
um clima de confiança. Geralmente o seu fato gerador é uma crise. Elas
reúnem “os detentores da autoridade suprema e do poder político 110
interior dos Estados". Elas estão previstas 11a OUA, na Commonwealth,
etc. Muitas vezes as despesas são divididas entre os Estados participantes,
como ocorreu na Conferência ‘cie Helsinque.
541. Os denominados servieos amistosos são aqueles prestados seip
aspecto oficial, sendo entretanto que algumas vezes o governo solicita ao
seu diplomata q,ue_a^pa;jj£.
542. Os bons ofícios podem ser definidos como “as ‘démarches’ e os
atos por meio dos quais uma terceira potência procura aplainar e abrir a
via às negociações das partes interessadas ou de reatar as negociações que
foram rompidas” (Hoijer).6
Os bons ofícios foram regulamentados no “tratado interamerícano
sobre bons ofícios e mediação” concluído na Conferência Pan-americana
de Buenos Aires (1936). Esta convenção previa a criação de uma lista de
cidadãos eminentes “pelas suas virtudes e competência jurídica”. Cada
Estado indicaria dois cidadãos. Havendo um con flito internacional, os
Estados litigantes escolheriam um cidadão' da lista formada, que estaria
depositada na União Pan-americana.
Outras convenções internacionais também previam os bons ofícios
como modo de solução dos litígios internacionais: a convenção para a
solução pacífica dos litigios internacionais de Haia, 1899 (título II); a
convenção para a solução pacífica dos conflitos internacionais, de Haia,
1907 (título II); tratado americano de solução pacífica de Bogotá, 1948
(arts. 99 e 10); etc.
O Brasil, através da História, jã se utilizou dos bons ofícios de potências
estrangeiras. Assim, em 1864, Portugal interpôs os seus bons ofícios entre
o Brasil e a Inglaterra:» fim de que os governos brasileiro e inglês reatassem
as relações diplomáticas. Por outro lado, o Brasil já interpôs os seus bons
ofícios entre potências estrangeiras. Assim, em 1930, conseguimos que o
Peru e o Uruguai reatassem as relações diplomáticas.
543. A mediação é definida por Hoijer como “o ato pelo qual um ou
vários. Estados., seja a pedido das partes em litígio, seja por sua própria
iniciativa, aceitam livremente, seja por conseqüência de estipulações ante­
riores, se fazerem intermediários oficiais de uma negociação com a fina­
lidade de resolver pacificamente um litígio, que surgiu entre dois ou mais
Eiiados”?

1386
A mediação se distingue (los bous oficios; no sentido tic que o papel
i do mediador é mais ativo. Ele não é “uní simples intermediário que se
f contenta de colocar em presença os~EsTã~dõs em litigio .para.os,_ieyai.a
\ entrarem negociações-.."; pelo contrário, “ele participa de maneira reinilar
\ e ativa nas negociações...” (Hoijer).
' Esta distinção, na prática, nem sempre é fácil de ser feita e os bous
ofícios e a mediação têm sido confundidos (Cavaré).
/ A (mediação se distingue da^arbitragen^ urna vez que a opinião do
j mediador não é obrigatória, enguantó a tlêcisão arbitral é obrigatória. Por
I outro aspecto, o rnediador não está sujeito a normas, como ocorrc^com q
l árbitro, t^ue se deve cingir aos termos do comproniisso arbitral.
A mediação também se distingue da intervenção, urna vez que a opinião
do mediador não tem o “aspecto ditatorial” que caracteriza a intervenção.
A mediação surgiu no período medieval, com a supremacia do Papado.
Gs seus representantes faziam a mediação entre Estados litigantes.9 A
política de equilíbrio do Renascimento (na Itália) e no resto da Europa
(séculos XVII e XVIII) difunde a mediação.
A mediação pode ser oferecida e solicitada. A oferecida é a mais
comum. O oferecimento, bem como a recusa da mediação, não são atos
inamistosos.10
A mediação pode ser, quanto ao número de Estados que a exercem:
individual e coletiva.
Ela se apresenta ainda como facultativa e obrigatória. A regra geral é
que ela seja facultativa; entretanto, algumas convenções internacionais,
como o Ato Geral de Berlim (art. 12). proibiam a guerra antes do recurso
à mediação e consagraram a obrigatoriedade da mediação.
O Pacto de Bogotá estabelece algumas normas em relação à media­
ção:11 á) o mediador ou mediadores “serão escolhidos mediante comum
acordo das partes interessadas” ; b) o mediador não fará relatórios e “o
processo será absolutamente confidencial”; c) se no prazo de dois meses
ou após o início do processo de mediação as partes não tiverem chegado
a um acordo sobre o mediador ou mediadores, elas deverão recorrer a
outro modo de solução pacífica; d) se no prazo de cinco meses não houver
uma solução do litígio após ter sido iniciada a mediação, as partes recor­
rerão a outro modo de solução.
As Convenções de Haia de 1899 (art. 8a) e 1907 (art. 8~) previram um
processo de mediação especial: nos casos de ameaça à Paz, “os Estados em
conflito escolhem respectivamente uma potência à qual confiam a missão
de entrar em entendimento direto com a potência escolhida pela outra
parte, para evitar a ruptura das relações pacíficas”. E dado às potências
mediadoras o prazo máximo de trinta dias. Durante este período, os liti­
gantes não devem tratar do conflito, que “é considerado como submetido
exclusivamente às potências mediadoras”.
A mediação está prevista no art. 33 da Carta da ONU. Ao serTeçusada
ou aceita sua proposta, faz com que o mediador cesse as suas funções.

1387
O Brasil já se utilizou da mediação, como de mediador foi o papel da
Inglaterra 110 reconhecim ento da nossa independencia por Portugal
(1825). O Brasil, ao lado de otaros Estados americanos, sem a de mediador
na questão do Chaco entre o Paraguai e a Bolívia (1935).
Até o século X X só os Estados poderosos atuavam como mediadores,
enquanto atualmente também atuam pequenos Estados, organizações in­
ternacionais e atores transnacionais (igrejas, personalidades, eLc.). Por
outro lado, os mediadores, muitas vezes, corno os EUA, no Oriente Médio,
têm meios para oferecer prêmios e castigos (Thomas Princen).
Na mediação feita pela ONU têm sido considerados importantes a
habilidade e o “status”'.moral do Secretário Geral, bem como a cooperação
existente entre os membros permanentes. A Mediação é uma extensão do
processo de negociação. Os mediadores são aceitos pelos litigantes, porque
eles protegem os interesses das partes. Atualmente a palavra mediação tem
sido utilizada em sentido amplo, abrangendo também os bons ofícios e a
conciliação (Jacob Bercovitch).
'\544j O Pacto da SDN (arts! 12 a 15) já tratava da solução pacífica dos
litígios internacionais. O órgão mediador era o Conselho. Ele fazia um
relatório, caso não conseguisse resolver a controvérsia, que se fosse apro­
vado por unanimidade (excluíam-se as partes litigantes) os membros da
SDN não poderiam “recorrer à guerra contra a parte que se conformar
com a conclusão do relatório”. Entretanto, se ele fosse aprovado por
maioria, ou rejeitado, não tinha o relatório qualquer obrigatoriedade e os
membros da SDN reservava-se “o direito de proceder como julgarem ne­
cessário para a manutenção do direito e da justiça”, o que significava
admitir o recurso à guerra.
Este sistema não produziu grandes resultados devido, acima de tudo,
à adoção da unanimidade, que é difícil de ser obtida.
Na ONU, a solução pacífica das controvérsias está regulamentada no
capítulo VI da Carta. O art. 33 determina que nas^controvérsias “de ameaça
à manutenção de paz e da segurança internacional” as partes litigantes
deverão chegar à solução pacífica por qualquer"um dõTmõclõs Existentes
do Dl: mediação, conciliação, arbitragem, solução judicial, negociação,
inquérito, através de organismos regionais, ou por qualquer outro meio.12
Se ela não for'resolvida, as partes deverão submetê-la ao Conselho de
Segurança. O Conselho de Segurança, nos casos de ameaça à paz, pocTe
fazer recomendações de “procedimentos ou métodos de solução apropria­
dos”, devendo fazer antes uma investigação sobre a controvérsia ou situa­
ção, bem’ como dar uma solução de fundo.
Ao ser rejeitada a solução de fundo e havendo “ameaça à paz, ruptura
da paz e atos de agressão”, o Conselho de Segurança pode, além de fazer
recomendações, também “decidir” sobre as medidas a serem tomadas
(capítulo VII). Significa isto que o Conselho pode, além de “recomendar”,
também “ ordenar”. Estas suas decisões, se não forem respeitadas, são
passíveis de.sanções, como o rompimento de relações diplomáticas, e tc ."
4

F. de sc assinalar que, 110 âmbito da ONU. a Assembléia Geral tc-rn


tratado da solução dos conflitos iiUcriiacionais. Ennetamo, cia só tem o
poder de lazer j;ecomendações. Por outro lado, a Assembléia Geral tem
criado comissões de bons ofícios e indicado mediadores. Podemos acres­
centar ainda que o Secretário-geral tem exercido em alguns casos a função
de mediador.
Finalmente, é de se observar que os órgãos políticos não estão sujeitos
à máxima “nem ojudex in sua causa”, que só é aplicada em órgãos judiciais.
$45.. No âmbito da OE A_teraos o r e g i111 e d e consulta como modo de
solução pacífica dos litígio^in ternacionais.14
A consulta é definidajpor H. Accioly “com o sendo a troca de opiniões
entre dois ou mais j*overnos, interessados_ direta ou indiretamente nuni
TTETgíõTnternacional, com vistas à solução pacífica deste".Ij
Este sistema se desenvolveu principalmente no continente americano,
sendo que no seio da OEA existe a sua institucionalização em um dos seus
órgãos, que é a Reunião de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores,
encarregada de “ examinar os problemas de caráter urgente e de interesse
comum para os Estados Americanos”.16 Também com funções de órgão
de conciliação e investigação era a Comissão Interamericana de Paz (v. n9
301), que foi substituída pela Comissão Interamericana de Solução Pacífica
dos Litígios.
A consulta é colocada por Photini Pazartzis entre os modos diplomá­
ticos e é considerada como uma discussão sobre os diferentes pontos de
«r vista, sendo uma 1- instância no processo de solução do litígio.
í _ ¿ T 5 4^ A (cg g i^ ^ ^ £ _ Íg j¿g ¿^araQ~) rorno modo de solução pacífica dos
'isX, ^ litígios internacionais,"surgiu em 1899, na P Conferência de Haia, por
proposta do delegado da Rússia, Martens.17
Este “processo corisiste, quando do aparecimento de um litígio, em
submetê-lo ^ ..
a. ......comissários
1
investigadores,
in11 !■!-■■■ 1* ‘ <n »n 1- ~i ■ 1
cuja única missão é estabelecerT fa
' ~ 1' iy ij ~i~t 11 i~n--------- rrt~i—1-----"" ‘ ict f~ 1 fri 1■ ~ *■iiliTi lí ~ * ■ 1 i
materialidade dos ratos, mas sem se pronunciarem sobre as responsabili-
~Hades” (Rousseau)'.
Ela foi prevista e regulamentada em diversas convenções internacio­
nais: na convenção para a solução pacífica dos litígios internacionais (Haia,
1899); na convenção para a solução pacífica dos litígios internacionais
(Haia, 1907); tratado para evitar ou prevenir conflitos entre os Estados
americanos (Tratado Gondra — Santiago do Chile. 1923); Carta da ONU,
Pacto de Bogotá (1948).
As três grandes regulamentações foram os textos de 1907, 1923 e 1948.
A Convenção de Haia previa:;2) as comissões internacionais de inquérito
seriam formadas por tratado concluído entre as partes litigantes; @ s e a
convenção não designar a sede da comissão, ela se instalará em Haia; (cj>
as partes podem designar agentes especiais para representá-las junto à
Comissão; ^ 0 inquérito é contraditório, podendo cada parte juntar os
documentos que desejar; 0 as sessões da comissão são secretas; o rela-

1r 1 ; 1389
lório fia comissão não c? obrigatório; u comissão decide por maioria. O
Tratado Gondra estabelecia: a) a existencia de duas comissões investiga-
11 cloras permanentes (uma com sede em Montevidéu e outra com sede em
Washington), “constituídas pelos irés agentes diplomáticos am ericanos de
mais antiguidade entre os acreditados nas ditas capitais”. Estas comissões
receberiam e encaminhariam à ou ira parie os pedidos de formação de
comissões de investigação; b) as comissões teriam cinco membros, sendo
que cada Estado indicava dois (só um podendo ser seu nacional) e o quinto
seria eleito pelos quatro indicados; c) os relatórios não são obrigatórios;
d) após ter sido transmitido o relatório, as partes, durante seis meses,
devem procurar uma solução pacífica. Após este prazo, elas terão “liber­
dade dç ação”.18
Diante do exposto, podemos afirmar que este sistema apresenta as
| seguintes características: a) visa apurar meramente fatos: b) o relatório não
\ é obrigatório..
\ Este sistema tem sido utilizado por organismos internacionais, a fim
de se esclarecerem sobre determinadas questões (v. Comissão Interameri-
cana de Paz, n® 301). A investigação pode partir de decisão de uma orga­
nização internacional, isto é, de uma “autoridade independente das partes
em litígio”.
Há uma tendência para a extensão da competência das comissões de
investigação que foi consagrada em tratados concluídos entre 1915 e 1939,
que copiavam os Tratados Bryan, isto é, incluíam a conciliação. A origem
deste movimento está na América Latina, com o tratado concluído, em
1915, entre Argentina, Brasil e Chile, para a solução pacífica dos litígios
internacionais. Salienta T. Bensalah que T5 último tratado centrado exclu-
r sivamente na.investigação foi o Tratado Gondra (1923).
r'i ViVÍ. (JÜ47J A(conciliação^ como modo de solução pacífica dos litígios inter-
' nacionais, apareceu na prática internacional após a 1- Guerra Mundial.
Este sistema pode ser considerado como uma herança dos Tratados "Bryan
de “que a mediação devia ser confiada não a um Estado, mas a um órgão
independente, a uma ‘comissão de conciliação’, completamente livre de
influências políticas”' (Delbez). As comissões de conciliação desempenham
papel semelhante ao do mediador (Cavaré). E. Jiménez de Aréchaga ob­
serva que a diferença entre mediação e conciliação está no órgão, qu_e a
exerce. A mediação é exercida por um Estado ou por um re presentante
j o Estado, e que se encontra submetido às instruções. A -conciliação é
exercida por um órgão integrado por pessoas que não dependem, nem
recebem instruções de qualquer Estado e quer continua o intemacionalista
uruguaio, atuam
------- ’■ ■ " com1 -----------------
independência ---------------------—¡w para
.......n chegar
. . . - , ........... — a uma fórmula
-»•
_.. de har-----
monização que venha a satisfazer as partes. A conciliação s.e fundamenta
em um tratado. O órgão é autônomo em relação às partes. Combacau e
Sur consideram um modo diplomático de solução dos litígios.

13%
Asna origem está nos Tratados Bryan, concluidos pelos EUA tm 1913
e 1914, que aperfeiçoaram a investigação c a orientaram para a conciliação.
As partes se comprometem a submeter o litigio a uma comissão permanente
que tein o prazo de um ano para apresentar um relatório. A Comissão
examina as questões de fato e de direito e apresenta um relatório. Durante
este período as parles não podem recorrer à guerra. Foi esta a origem da
moratoria da guerra adotada no Pacto da SDN. A Comissão examina as
questões de fato e de direito. A conciliação foi divulgada pelos Estados
escandinavos e pela Suíça, e a partir de 1922 pela SDN. A partir de 1924
os procedimentos de conciliação e judiciais tornam-se complementares. A
conciliação é usada antes do recurso arbitral ou judicial (Pholini Pazartzis).
A conciliação pode ser definida como o modo de solução pacífica dos
“litígios internacionais, consistindo no exam e do litigio, sob todos os as­
pectos, por um órgão gozan do da confiança comum das partes litigantes
v\ ~que dirige suas negociações e que, sem a sua participação direta, lhe propõe
4 uma sol uçà o, fu n dad a em concessões recíprocas, que as partes são íivres
efe aceitar óú de rejeitair” (C. Vulcan). A conciliação é assinu-ng fundo.
uma:mediação “institucionalizada” sujeita a rearas de pioceHimento (nor-
mas da (Jomissáo de Conciliação). Este sistema foi regulamentado em
convenções multílaterais (a Convenção Geral de Conciliação Geral intera­
mericana, 1929; Tratado Saavedra Lamas, 1 9 3 3 ),19 bem como em tratados
bilaterais; recentemente, a conciliação foi prevista na convenção para a
solução dos litigios relativos aos investimentos entre Estados e nacionais
de outros Estados (1965), e no anexo à convenção sobre direito dos tratados
(1969). As Comissões geralmente dnham cinco membros (D. Carreau). O
que caracteriza a conciliação é a formação de uma comissão e os concilia­
dores representam os interesses dos estados (Guido Soares).
Rousseau e Efremoff classificam os tratados sobre conciliação em vários
tipos: a) escandinavo (tratado somente de conciliação); b) polonés (tratado
de conciliação e arbitragem — recorre-se a esta quando aquela fracassar);
c) alemão (tratado de arbitragem e conciliação — a primeira para as
questões jurídicas e a segunda para as políticas); d) suíço (tratado de
conciliação, arbitragem e solução judiciária. Ex.: Tratado de Locarno: os
litígios são primeiramente submeudos à conciliação; se esta fracassar, as
questões políticas são resolvidas por arbitragem e as jurídicas judiciaria-
mente).
A conciliação não se confunde com a investigação. E preciso não
confundiros dois institutos, apesar de vários tratados darem as duas funções
a uma única comissão. Salienta N. Quoc Dinh que os resultados de uma
comissão de investigação são aceitos mais facilmente pelas partes do que
os de uma comissão de conciliação que propõe uma solução.
O Pacto de Bogotá (1948), no capítulo III, regulamentou em conjunto
o “processo de investigação e conciliação” e determina: a) a Comissão de
Investigação e Conciliação terá cinco membros, sendo que cada parte
indica dois (apenas um pode ser seu nacional), e o quinto será eleito pelos

1391
quatro indicados; b) liavcrâ na União Pan-americana um quadro de con­
ciliadores americanos, sendo que cada listado indica dois membros por
prazo de três anos; c) a Comissão de Conciliação e Investigação será con­
vocada pelo Conselho da OEA a pedido de uma das partes; d) as partes
podem designarjunto à Comissão Delegados Plenipotenciarios ou Agentes;
é) a comissão tem o prazo de seis meses, a não ser que as partes prorroguem
este prazo; f) o relatório não é obrigatório; g) os membros da comissão
receberão “vencimentos"’ ; h) se houver a conciliação entre as partes, o
relatório apenas reproduzirá “o texto do acordo conseguido”; z) as deci­
sões da comissão são tomadas por maioria.
* Diante do que foi exposto, podemos concluir que o sistema de’-conci-
liaçâo apresenta as seguintes características: a) a comissão deve pr'opor
uma solução para o litigio; b) o relatório não é obrigatório; c) exercem
processo semelhante ao das comissões de investigação.
O Ato Geral (1928-1949), a respeito da conciliação, traça as seguintes
normas: a) a pedido de uma das partes a Comissão Permanente de Con­
ciliação deverá ser constituída em seis meses; b) a comissão terá cinco
membros, sendo que cada Estado indica um nacional, enquanto os outros
três serão escolhidos entre nacionais de terceiras potências; c) os comissá­
rios serão nomeados por três anos e podem ser reeleitos; d) se surgir um
litígio e não houver uma comissão permanente, será constituída uma
comissão especial no prazo de três meses; é) se os Estados não chegarem
a um acordo sobre os membros da comissão, eles serão escolhidos por
uma terceira potência ou, se concordarem, pelo presidente da Assembléia
Geral da ONU; j) a Comissão se reúne na sede da ONU ou em outro local
designado pelo presidente: g) os trabalhos da Comissão serão secretos; h)
o processo será contraditório; i) as decisões Serão por maioria e as questões
de fundo só serão decididas com todos os membros presentes;/) as partes
serão representadas junto à comissão por agentes; I) a corrjissão, se não
for decidido em contrário pelas partes, dará a sua decisão no prazo de seis
meses; m) o “processo verbal” da comissão não dirá se a decisão foi por
unanimidade ou maioria; n) as partes facilitarão o trabalho da comissão;
o) a “decisão” não é obrigatória.
A conciliação também existe dentro do quadro das" organizações in­
ternacionais. Assim, na ONU, o Conselho de Segurança, ao fazer recomen­
dações em questões políticas, está atuando como órgão conciliador. Na
SDN era o Conselho.
Na OUA foi concluído, em 1964, um protocolo de mediação, conci­
liação e arbitragem, onde é criada uma Comissão de Mediação, Conciliação
e Arbitragem (21 membros eleitos pela Conferência de Chefes de Estado
e Governo), que é um dos órgãos permanentes desta organização.
Em 1990 a Assembléia Geral aprovou um projeto de normas para a
conciliação: prevê a existência de um, três, ou cinco conciliadores, sendo
que nos dois últimos casos formam uma comissão. Regulamenta a escolha
(lo c o n c ilia d o r : a) p e la s p a r te s : b) o u p o r um t e r c e i r o lvsiad o : i) o n . a ín d a ,
p e lo P r e s id e n te d a C1J. As p a r te s a p r e s e n ta r ã o as s u a s d e fe s a s ao c o n c ilia ­
d o r . O s tra b a lh o s d o c o n c i l ia d o r d e v e rã o s e r s e c r e t o s . A C o m iss ã o se r e ú n e
e m im ó v e is d a O N U . S e as p a r te s a c e ita m a s o lu ç ã o , d e v e se r f e ito um
d o c u m e n t o c o n s a g r a n d o tal fa lo .
Tem sido observado com toda razão que a distinção entre mediação,
bons ofícios e conciliação é meramente académica, porque na prática estes
pro£#dimentos~sç misturam.
Afsolução judicT¿na)e a varbitral¿ se disjiftguem no seu. aspt-.f-Jo
formal, isto e 'o m bu nal arbi Ira 1IT constituido pelas partes litigantes para
resolver o litigio e desaparece com ele, enquanto o tribunal judiciário é
anterior ao litigio e subsiste à sua solução, bem como os seus componentes
^Vrao sáõ escolhidos pelas partes litigantes. Devido à permanencia do
tribunal ]ucuciano e que ele desenvolve uma lunspnidencia. O orgao
judiciário rege se por normas que não podem ser alteradas pelas partes,
~ a¿ contrario do arbitral
,A solução arbitral e judiciária, segundo Serení, tem as seguintes carac­
terísticas: a) se fundamenta na vontade das partes: b) é aplicada apenas
aos litigios caracterizados como controvérsias internacionais; c) as partes
sejam sujeitos de DI; d) a decisão é conforme o DI; é) as parles se obrigam
a cumprir a decisão; f) a decisão emana de um órgão (individual ou
coletivo) que deve ser imparcial.
Sobre a solução arbitral: v. capítulo LV.
Sobre a solução judiciária v. na 306 (Tribunais Administrativos das
Organizações Internacionais); ns 297 (Corte de Benelux); n5 301 (Corte
de Justiça da ODECA); ng 277 (CIJ); ou, ainda, a nB301 g (Corte de Justiça
do Grupo Andino).
A solução judiciária tem sido usada pelos Estados para poucas matérias:
a) assuntos ligados a acontecimentos excepcionais (conseqüências de guer­
ras internas ou de descolonização, etc.); b) proteção de bens e pessoas; c)
questões de direito das organizações internacionais (tem sido objeto de
pareceres); d) atribuição ou exercício de jurisdição, por exemplo, nas
questões Marítimas (M. Virallv).
NOTAS

1. Amole) d e Saint S c i i t c — La C onciliatioi) Im e m a tio n a le , J 930; PhiJip M ars­


hall Brow n — l a C o n ciliaiio n In tern atio n ale, 1 9 2 5 ; J e a n Z am firesco — D e la
M ed ia tio n , 1911; O lo f H o ije r — La So lu lion P acifiqu e des Litiges In tern alion au x
avant el depuis la S o cie lé d es N ation s, J 925; Je a n E fr e m o f f — O rganisation de la
c o n cilia iio n com m e m oyen d e p revenir les g u erres, in R dC , 1937, vol. 1, l. 5 9 ,
págs. 103 e segs.; idem — L a C o n ciliaiio n ln le m a lio n a le , in RdC, 1927, vol. III,
t. 18, págs. 5 e segs.; A n d ré N. M andelslam — La c o n c ilia iio n d ’aprés le Pacte el
la ju ris p ru d e n c e du C onseil d e la S o c ie lé de N ations, in R d C , 1926, vol. IV, l. 14,
págs. 3 3 7 e segs.; C o nstan tin V u lcan — La C o n ciliation d an s le D roil In lern ation al
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1
1394
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co o rd en a d o res: A ram iíita d e A zevedo M ercadante e J o s é Carlos de M agalhães,
1999.
2. E ste tratado e n tro u em vigor, mas não foi ra tifica d o p o r lodos os Estados
am erican o s. Na m edida em qu e é feita a sua ra tifica çã o , os dem ais tratados an te­
rio re s en um erad os n o seu art. 5 8 d eixarão de vigorar. As re fe rê n cia s neste cap ítu lo
ao s dem ais tratados p ren d e-se ao aspecto histórico e à n ã o ratificação do P acto
d e B og otá por lod os os Estados am ericanos. Ela está e n i vigor entre apenas 1 1
E stados.
3. A classificação n ã o é p acífica en ire os d o u lrin ad o res. Assim Accioly estuda
a so lu çã o dos co n flitos na O N U n o capítulo d ed ica d o aos “ m eios ju ríd ic o s” .
R ousseau já a co lo ca n os “ m eio s políticos” . A ccioly co n sid e ra as “com issões d e
investigação e co n cilia ç ã o ” co m o m eio ju ríd ico , e n q u a n to Rousseau considera as
co m issões de investigação c o m o “ m eio diplom ático” , etc.
4 . O s m odos p o lítico s n ã o deixam de ser m od os d ip lo m áticos, com o o co rre
co m a consu lta. A c o n cilia ç ã o p o d e se r um m odo ju r íd ic o ou político. E n tretan to,
co lo ca m o s nesta classificação a so lu ção dos litígios in te rn a cio n a is no ám bito das
o rg an izaçõ es in tern a cio n ais q u e têm um p ro ced im en to p ró p rio e preferim os assim
estudá-la em separado.
5. V. n 9 2 77, J .
5A. Fazia-se a m ig a m en te a d istinção en tre co n g resso e co n feren cia. O s co n ­
gressos eram reu niões de c h e fe s de E stado ou p len ip o ten ciá rio s, em circunstâncias
esp eciais, co m o ap'ós urna g u erra. T in h am “fu n çõ es” p o lítica , norm ativa, etc. As
c o n fe rê n cia s possuíam ap en as um a “fu n ção ” norm ativa. A tu alm en te esta distinção
n ã o tem mais valor e só tem sido usada a palavra “ c o n fe rê n c ia ” .
6. O tratado a m e rica n o d e so lu ções pacíficas (B o g o tá 1948) adm ite qu e os
b o n s o fício s sejam ex ercid o s po r cidad ãos em in entes, ao co n trá rio das C onvenções
d e H aia. O T ratad o d e B o g o tá dá a seguinte d efin içã o d e bo ns ofícios: “ consiste
na g estão po r parte de um ou m ais governos am erican o s o u d e um ou mais cidadãos
e m in e n te s de qu alqu er E stad o am erican o alheios à co n tro v érsia ” .
7 . ' S e os Estados n ã o ch eg arem a um aco rd o q u a n to a este cidadão, cada
E stado’ escolh e um e estes d ois escolhidos esco lh erão o q u e fará os bons ofícios.
8. O P acto de B o g o tá , na m esm a o rien tação do T ra ta d o d e Buenos Aires,
a firm a .q u e a m ediação p o d e se r realizada por indivíduos. O seu art. 11 o define:
“ co n siste em su bm eter a co n trov érsia a um ou m ais g o v ern o s am ericanos, ou a
um o u m ais cidadãos e m in e n te s d e qualquer Estado a m e rica n o alheios à co n tro ­
vérsia”.

1J95
0. N cslc p e río d o fia História a m ed iação e os bons o fício s na prática se
co nfu n d iam . A d istinção en tre boi&s o fício s e m ediação co m eço u a ser feita pela
doutrina do sé c u lo X V II. X o p róprio p e río d o medieval a arb itrag em e a m ediação
se co n fu n d iam (S e re n i, Z am firesco), se n d o que a distinção e n tre estes dois insti­
tutos tam b ém só foi feita no sécwlo X V II.
10. P elo P a cto de Bogotá, ela n ão p o d e ser oferecid a q u an d o “ a controvérsia
estiver su jeita a o u tro s processos e sta b elecid o s no presente tra ta d o ” . D en tro desta
categoria estão os litígios previstos n o art. 36, alínea 2, do E statu to da C IJ, que,
pelo P acto , os E stados aceitam co m o o b rig a tó rio , isto é, aceitam a cláusula facul­
tativa do E statu to da Corte.
11. A j á citad a C onvenção de B u e n o s A ires (1936) criou para a m ediação o
m esm o p ro cesso qu e previa para os b o n s ofícios.^
12. N os casos d e existir não um a “ co n tro v érsia” mas u m a sim ples “situ ação” ,
não há a o b rig ato ried ad e de as p artes “ re c o rre re m a um m od o p a cífico de solução
e em caso de fracasso de subm etê-la. ao C o n se lh o ” . Se houver “ co n tro v érsia” , os
G randes, se fo re m partes no litígio, d everão se abster, e se fo r “situ a çã o ” , não há
esta o b rig a to ried a d e, podendo assim su rg ir o veto (D elbez). A d istin ção entre
“controv érsia" e “ situ ação” nos é dada p o r Jim é n e z de A réch ag a: “ a controvérsia
é um co n flito e n tr e Estados, no qual há rec íp ro ca s acusações e d efesas, bem com o
têm partes d e fin id a s". A “situação” é “ u m a disputa em ‘status n a s c e n d i’, isto é,
um co n flito qu e n ão se definiu e n o qual aind a n ão existem partes b em d eterm i­
nadas” . A q u a lificação em controvérsia ou situação é feita pelo p ró p rio C onselh o.
Nas co ntrov érsias o Estado parte n ão vota.
13. V. ca p ítu lo LVII.
14. A C arta da OEA, no cap ítu lo V, prevê a solução p acífica d os litígios por
qu alqu er m é to d o antes de serem levados a o C o n selh o de S e g u ran ça da O N U . No
nosso c o n tin e n te tem os ainda o P acto d e B o g o tá, a que j á fizem os referên cia .
15. O sistem a de consulta n ão é exclu sivo do co n tin en te a m e rica n o . Assim, o
T ratad o d e W ash in g to n (1 9 2 1 ), c o n clu íd o e n tr e os EUA, In g laterra, J a p ã o e Fran ça,
sobre os seus d o m ín io s no O. P a cífico , j á o previa. Do m esm o m o d o , o tratado
q u e instituiu a O T A N tam bém o prevê.
16. V ., so b re a R eunião de C o n su lta, n Ê 301.
17. A o rig em da “investigação” está n a explosão do e n co u ra ça d o norte-am e-
rican o “M a in e ” em Havana. A E sp a n h a n o m eo u um a com issão d e investigação,
que d eclarou ter a explosão resu ltad o d e causa in tern a do navio. A investigação
n o rte-am erican a co n clu iu que as au to rid ad es de C uba (sob d o m ín io da E spanha)
eram responsáveis. E ste acidente fez co m qu e fosse deflagrada a g u erra en tre os
EUA e a E sp a n h a. Ao ser proposto este m od o, esperava-se q u e u m a com issão
in tern acion al elim in aria as divergências das com issões nacionais, bem co m o que
uma ex p o siçã o im p arcial dos fatos co n d u zisse a um a solução p a cífica.
18. E le tem sido regu lam en tad o tam b ém em tratados bilaterais. N este caso
estão os T ra ta d o s Bryan (secretário d e E stad o no rte-am erican o, 1 9 1 3 -1 9 1 4 ) em
cerca de trinta tratados que previam o sistem a d e investigação: a) as com issões
seriam p e rm a n e n te s e teriam cin co m em b ro s, sen d o que três n ão seriam nacionais
dos E stados p artes na controvérsia; b) este sistem a era o b rig a tó rio se um a das
partes litig an tes o desejasse; c) o re la tó rio n ã o era obrigatório.
19. Este tratad o estabelece: a) q u e n ão havendo Com issão P e rm a n e n te de
C onciliação ou ó rg ã o com esta m issão ela terá cin c o m em bros (ca d a p arte indica
?

uní seu tmcioiKil e os outros tres são escolhid o s de comum aco rd o en tre nacionais
de terceiro s E stad os): !>) a com issão estab elece as suas lesbias de p rocesso, cine será
co n tra d itó rio ; r.) o relatório deverá ser apresentad o no prazo d e uní an o . a não
ser q u e haja esiip u lação em co n trário : d ) as parles tém uní prazo de seis meses
para ch eg a rem a um aco rd o com base no seu relatório, fm do o qual as parles tém
lib erd ad e d e ação : e) o relatório n ão é o b rig ató rio.
20. C onsid era-se que um tribu nal é in tern acion al qu and o ele foi instituido
por um tratad o intern acion al.

1397
CAPÍTULO LVII

ARBITRAGEM1

5 49 — Definição; 550 — Objeto; 551 — Evolução histórico; 552 —


Formas de arbitragem; 5 5 3 — A arbitragem como modo facultativo;
554 — Características; 5 55 — Comtrromisso arbitral; 556 — Consti­
tuição do Tribunal; 5 5 7 — Poderes do Tribunal; 5 5 8 — Processo
arbitral; 559 — A sentença; 560 — Interpretação da sentença; 561
— Anulação da sentença; 562 — Revisão da sentença; 563 — A
obrigação de decidir do Tribunal; 564 — Os tratados que consagram
a arbitragem; 565 — _A Corte Petmanente^ de Arbitragem; 5 6 6 — O
projeto da Corte de Justiça Arbitrai; 567 — A arbitragem no continente
ameiicano; 568 — A arbitragem nos dias de hoje.

549. A arbitragem pode ser,definida


de solução dos litígios internacionais por meio de juizes escolhidos pelas
s? partes litigantes. ' " * *
O nosso estudo se prende à arbitragem internacional .de Direito Pú­
blico. Ela se diferencia da arbitragem de direito privado, segundo Carabi-
ber, pelo seguinte: a) a de D. Público tem um processo mais formalista;
b) a de D.-Privado está sujeita ao controle judiciário; c) a sentença na de
D. Público é publicada, enquanto não o é na de D. Privado, o que é
considerado como sendo uma vantagem pelos grupos econômicos; d) na
de D. Privado a sentença é executável. Podemos mencionar c o m o as prin-
. cipais convenções de arbitragem comercial as seguintes: a) convenção
européia sobre arbitragem comercial internacional de 1961; b) convenção
sobre reconhecimento e “enforcement” (execução) de sentença arbitrai
estrangeira (1958); c) Convenção de Washington do Banco Mundial sobre
solução de litígios sobre investimentos entre Estados e nacionais de outros
Estados (1965); d) em 1976 a Comissão de Direito Comercial Internacional
adotou o seu projeto final de “Regras de Arbitragem”; etc.

1399
550. As Convenções de Haia de 1989 e 1907 estabelecem que a detisao
será “na base d o respeito do d ireito ” (art. 15 da convenção paia a solução
pacífica dos conflitos internacionais de 1899 e art. 37 da convenção para
a solução pacífica dos conflitos internacionais de 1907).
O Ato Geral de Genebra (1928) ,2 revisto pela Assembléia Geral da
ONU (1949). admite que qualquer litígio seja resolvido pela arbitragem,
com exceção daqueles que, em virtude da cláusula facultativa do Estatuto
da Corle Internacional de Justiça, forem a esta submetidos.
Como se pode observar, os textos internacionais não são uniformes: os
de Haia parecem dar a entender que apenas as questões jurídicas são
submetidas a arbitragem, enquanto o de Genebra parece admitir o contrario.
A orientação do Ato Geral parece-nos ser a mais acertada. Toda e
qualquer controvérsia pode ser-submetida a arbitragem. O Tribunal Arbi­
tral poderá decidir por eqüidade se as partes lhe deram competência para ' ’
isto. Esta tem sido a orientação mais consagrada através da História, em
inúmeros tratados de arbitragem (ex.: noruegués-sueco de 1925). Esta é
também a orientação do modelo de regras de arbitragem adotado pela
Assembléia Geral da ONU em 1958.3 Por outro lado, não vemos razão para
restringir o campo da arbitragem apenas às questões jurídicas (La Pradelle,
Wehberg).4 Finalmente, podemos observar com Chapa) que a distinção
entre litigios jurídicos e políticos só tem valor didático, uma vez que todo
litigio tem um aspecto jurídico e outro político e a qualificação vai depen­
der da vontade das partes.
551. A arbitragem é um dos institutos jurídicos da vida internacional
mais antigos. O direito arbitral tem origem consuetudinária. Ele já é en­
contrado, segundo alguns (Tod), no tratado entre Eanatum e os homens
de Umma em 3100 a.C. É, entretanto, na Grécia que ele tem o seu desen­
volvimento e que foi o seu verdadeiro “berço” (Taube). Na Grécia, a
arbitragem se desenvolveu graças à semelhança dos sistemas jurídicos das
cidades-Estado que a compunham.3 Ela conhecia tanto a arbitragem com-
promissória, bem como a obrigatória. Os compromissos designavam os
árbitros e o objeto do litígio. O laudo arbitral6 era gravado em placa de
metal ou de mármore e colocado nos principais templos das cidades, para
que o povo tomasse conhecimento. A maioria dos litígios versava sobre
“direitos e interesses de cidadãos estrangeiros” (isto é, o Dl Privado) e
sobre limites. O árbitro era escolhido pelas partes. A arbitragem continuou
a ser praticada mesmo sob o domínio de Roma.
Em Roma, a arbitragem, que pressupõe Estados soberanos e, em con­
seqüência, juridicamente iguais, quase desapareceu. Dominava a “Pax Ro­
mana”, que era uma paz imposta.
No período medieval, a arbitragem foi muito utilizada, devido, acima
de tudo, aos esforços da Igreja. Ela era utilizada não' apenas no plano
internacional, mas também no interior da Igreja, da sociedade feudal e
entre comunas. Um dos árbitros mais famosos deste período foi S. Luís,

1400
re i d e F ra n ça O á r b itr o , o u á rb itr o s , p e lo c o m p r o m is s o a r b itr a i, r e c e b ia m
p o d eres de á r b itr o ( “ a rb ite r , a r b itm to r " ) ou de m e d ia d o r (” a m ic a b ilis
c o m p o s it o r " ) .'
A ausência de monopólio do poder de julgar pelo poder público
manteve a arbitragem (Robert Kolb).
Os doutrinadores, bem como os autores de projetos de paz perpétua,
pregaram a arbitragem como modo de solução pacífica dos litígios inLer-
nacionais: Suárez, Grotio, Vattel, Crucé, Dubois, etc.
No período compreendido entre a Paz de Vestefália e o Tratado Jay
não houve arbitragem (Juan Carlos Puig).
A arbitragem entrou na sua fase moderna com o tr.atado anglo-anie-
ricano de 1794 (Tratado Jay), que estabelecia a constituição de comissões
mistas para: a) fixar a identidade do rio Santa Cruz: b) tratar do pagamento
a credores ingleses; c) tratar das presas marítimas. Elas se reuniram, res­
pectivamente, em 1798, 1802 e 1804. A I a Comissão era formada por um
inglês e dois norte-americanos; a 2a Comissão por dois norte-americanos
e três ingleses e a 3 a Comissão por três norte-americanos e dois ingleses.
E a partir deste tratado que a arbitragem passou a ter importância na vida
internacional moderna.
552. Charles Rousseau, traçando a evolução histórica da arbitragem,
observa que surgiram três tipos de arbitragem:
I a — a realizada p or chefes de Estado — muito com um n o período
medieval, em que o Imperador e o Papa tinham uma categoria mais elevada
que os demais e eram os árbitros naturais. Desapareceu com a Reforma.
Entretanto, este tipo de arbitragem continuou a ser utilizado e os árbitros
são os chefes de Estado, sem que haja um superior e, portanto, o árbitro
“natural”;
2a — a realizada por comissões mistas — teve início no final do século
XV1I1.8 Inicialmente, a comissão era formada de dois membros, sendo que
cada um indicado pelas partes litigantes. Posteriorpiente, esta “comissão
mista diplomática” é substituída por uma “comissão mista arbitral”. Esta
última, formada de comissionários em número ímpar, tem o superárbitro
para desempatar, geralmente escolhido entre os nacionais de terceiro
Estado. Com esta forma eslava aberta a porta para o Tribunal Arbitral. O
superárbitro na comissão mista tem um papel subsidiário, intervindo quan­
do há desacordo entre as partes para desempatar (Cavaré);
3a — a realizada por Tribunal — é consagrada no caso Alabama
(Inglaterra e EUA). “É a primeira vez que.á arbitragem era utilizada para
resolver um litígio entre duas grandes potências” (Rousseau). A maioria
dos juizes não é nacional das partes contratantes.
A arbitragem realizada por chefe de Estado apresenta vários inconve­
nientes: a) o árbitro não tem conhecimento-do assunto e o caso é estudado
por jurisconsultos que ficam no anonimato, sem responsabilidade no laudo;
b) outras vezes, as decisões não são motivadas, uma vez que há receio de
que os princípios ali expostos venham a ser alegados contra o seu próprio

1401
país. Entretanto, este tipo de arbitragem possui algumas vantagens, tais
como: <i) o processo é simples e b) "a autoridade do soberano é nina
garantia da execução da sentença" (Cavaré).
A arbitragem por comissão mista apresenta algumas vantagens: a) a
questão é resolvida pelos próprios interessados; b) competência dos comis­
sários; c) as decisões são legalmente motivadas. Ela, entretanto, na sua
forma diplomática, apresenta o inconveniente de já se saber de antemão
a sua decisão, sendo que em determinadas comissões o desempatador foi
escolhido entre os nacionais dos Estados litigantes.
A arbitragem por tribunal tem sido considerada a forma mais avançada.
Ela assegura maior imparcialidade à decisão. E a forma consagrada na
Convenção de Haia de 1907 e nó Ato de 1928: o Tribunal Arbitrai, formado
de cinco membros, tem apenas um árbitro nacional de cada parte.9
A arbitragem por tribunais é a mais utilizada e, como já dissemos, o
tipo mais evoluído. Contudo, nada impede que as partes litigantes resolvam
hoje em dia submeter a questão a um outro tipo de arbitragem. •.
553. A arbitragem, como a solução judiciária, não é obrigatória para
os Estados. O seu fundamento está na vontade das partes. A arbitragem
obrigatória g era lm en te é regional.
Segundo o “modelo” aprovado pela Assembléia Geral, se houver dú­
vida sobre a submissão de um litígio à arbitragem quem decide é a CIJ. E
de se salientar que o “modelo” da ONU não teve maior aceitação porque
“não corresponde à prática corrente dos Estados em matéria de arbitra­
gem” (Chapai).
O processo arbitrai é consagrado no compromisso arbitrai concluído
entre os litigantes. Da validade deste tratado vai depender a validade de
toda a arbitragem.
554. A arbitragem apresenta as seguintes características: q) as partes
fixam livremente o objeto do litígio; b) os arbitrossáo escolhidos, em regra
geral,""pelas "partes; c) a decisão* é obrigáMria.
A arbitragem se distingue dos bons ofícios, da m ed iaçào e da conci­
liação,_no_ sentido de que a decisão arbitrai é obrigatória para as partes,
'3 ¿ & a S £ a m l2 i^ ^
m.ter.aa.cj^ a is^ .c.u ta s. l d £.cis.õ j;^Ln a ii.a m 4ÍS-sãs. d o. q ue_si.mRl.es

555. O compromisso arbitral é o acordo de vontades entre as partes


litigantes, destinado a submeter o litígio à solução arbitrai.
JEljL.é um tratado internacional e está submetido a todas as condições
de validade d^gteT11A nulidade do compromisso arbitrai acarretaa nuiidãcTe
de toda a arbitragem.
O compromisso arbitrai deve conter no mínimo, segundo o modelo
de regras de arbitragem adotado pela Assembléia Geral, o seguinte: q) o
compromisso de submeter a questão à arbitragem;. ¿)..o.jobjeto do litígio;12
c) o método de formar o Tribunaí e o número de árbitros.13 O compromisso
pode ¡linda conter: n) as regras de direito a serem seguidas p e l o Tribuna)
e se ele pode julgar põjHjquuIadeT1r_b\ se o 1 ribnna)_ U:m podvivs pavvi
fazei' as suas próprias regras de processo; JJJumieTojle niembros neres-
sarios para formar quorum; d) a maioria necessária para a sentença; r) o
prazo em que a sentença (leve ser proferida;J )_a língua a ser utilizada 110
processo; etc. . -
A Convenção de Haia de 1907 (an. 53) determinava que se as parles
concordassem, a Corte Permanente de Arbitragem podia elaborar o com­
promisso.
O compromisso arbitrai é d lei na qual os juizes se fiindanicjutam para
julgar.
No silêncio do compromisso aplicam-se as regras do art. 38 do Estatuto
da C1J (Ato Geral de Genebra de 1328).
556. A constituição do Tribunal é determinada pelas partes litigantes.
A indicação dos árbitros pode constar do compromisso on ser feita poste­
riormente. O compromisso, como vimos, deve conter apenas o número
de árbitros e o método para a sua formação. Entretanto, nada impede que
a especificação de quais são os árbitros seja feita depois.
Podem ser árbitros chefes de Estado, jurisconsultores, etc., sendo que,
a respeito da arbitragem por chefe de Estado, é de se assinalar que não
se escolhe normalmente o indivíduo que ocupa o cargo, mas o chefe
daquele Estado, seja qual for o ocupante do cargo. Assim sendo, é que,
quando o Brasil concluiu o compromisso arbitrai com a Argentina, para
submeter à arbitragem a questão do território de Palmas, era Presidente
dos EUA Harríson, e quando foi dada a decisão ocupava o cargo Cleveland.
O Ato Geral de 1928, revisto em 1949, determina que o Tribunal
Arbitra) terá cinco membros. Cada parte indica um seu nacional. Os outros
três são escolhidos entre os nacionais de terceiras potências e deverão ter
nacionalidades diferentes. Se no prazo de três meses, a contar da data do
período de constituição do Tribunal por uma das partes, o Tribunal ainda
não estiver formado, a sua constituição será confiada a uma terceira po­
tência. Se as partes não chegarem a um acordo sobre esta terceira potência,
cada parte indicará uma potência. Se as duas potências indicadas não
chegarem a um acordo no prazo de três meses, a indicação dos árbitros
será feita pelo presidente da Corte Internacional de Justiça. Se este for
nacional de uma das partes litigantes, a escolha será realizada pelo vice-
presidente, e se este também estiver impedido, ela será feita pelo juiz mais
antigo que não seja nacional das parles litigantes.
O modelo de regras arbitrais da ONU traz algumas ipodificações no
procedimento acima e faz algumas simplificações: a) se no prazo de três
meses o Tribunal não está constituído, o presidente da CIJ, ou vice-presi­
dente, ou ainda o juiz mais antigo, conforme o caso, a pedido de uma das
partes, pode designar os árbitros; b) o Tribunal deverá ter um número
ímpar de juizes e de preferência possuir cinco árbitros; c) quando o pre­

1403
sidente, conforme o compromisso, lor escolhido pelos árbitros, isto deverá
sei feilo no prazo de dois meses, e se este lapso de lempo não for respeitado,
a sua escolha será feila pelo presídeme da CIJ, 011 vice presidente, ou aínda
pelo juiz mais anligo que não l'or nacional das partes litigantes; d) o
Tribunal é considerado constituído com a escolha do presidente; e) os
árbitros devem ser competentes em Direito Internacional.
Estabelece, ainda, o mencionado “modelo" que a composição do Tri­
bunal é inallerável. Os árbitros só podem ser substituídos após o inicio do
processo arbitral por consentimento mútuo das partes e em casos excep­
cionais. Uma parte litigante pode solicitar a desqualificação de um árbitro,
em virtude de fato posterior à constituição do Tribunal. Por fato anterior
à constituição do Tribunal, a desqualificação só pode ser pedida se a
indicação do árbitro foi obtida mediante fraude, ou se a parte ignorava o
fato da desqualificação. Em ambos os casos, a decisão ser tomada pelo
próprio Tribunal. Se o árbitro for um só, ou se se tratar do presidenle'do
Tribunal, a desqualificação será decidida pela CIJ.
Se houver vacância e o lugar for preenchido pelo novo árbitro, este
poderá requerer que as alegações orais recomecem do início.
557. Os poderes do Tribunal estão especificados no compromisso ar­
bitral. Inicialmente, podemos assinalar com inúmeros autores (La Pradelle,
Rousseau, Accioly) que o Tribunal tem poderes para interpretar o com­
promisso. O direito positivo consagra também esta orientação: Convenção
de Haia de 1899 (art. 48), Convenção de Haia de 1907 (art. 73) e o
“m odelo” da ONU de 1958 (art. 99).
O Tribunal decide sobre a sua própriajurisdição (Chapai).14AO árbitro
só pode julgar com base na eqüidade se o compromisso arbitral lhe der
tal poder expressamente. AJguns autores (Delbez) distinguem o árbitro
que decide com base na eqüidade do que atua c o m o “amicabiíis compo­
sitor” , vez que o primeiro decide questões jurídicas e atua dentro do
direito, enquanto o segundo decide questões políticas e pode ir contra o
direito. Esta distinção a nosso ver não tem grande valor, porque, como já
vimos, não há real diferenciação entre questões jurídicas e questões polí­
ticas. O Tribunal, na ausencia de normas no compromisso arbitral, aplicará
as convenções internacionais, o costume e os principios gerais de direito.
As decisões judiciais e a doutrina serão empregadas como “meios subsi­
diários para a determinação de regras de direito".
558. O compromisso arbitral deve conter as regias do processo. En­
tretanto, se isto não ocorrer, o processo será regulado pelos árbitros; tal
fato ocorre em litigio submetido à arbitragem de chefe de Estado (art. 56
da Convenção de 1907). Os árbitros, ao fazerem a regulamentação, se
utilizam dos textos internacionais da Convenção de Haia de 1907 (art. 26
do Ato Geral de 1928).
As partes designam agentes perante o Tribunal “para agirem como
intermediários entre elas e o Tribunal". Eles podem ter conselheiros e

1404
advogados p a ia d e fe n d e r e m o s s e u s in te r e s s e s . E le s p o d e m l e v a n t a r o b je -
çò es, sen d o (|\ie s o b r e e la s a d e c is ã o do tr ib u n a l é f in a l.
O p ro cesso co m p reen d e duas fa se s: a e s c r ita e os d e b a te s o r a is . A
e s c r ita é fo rm a d a p e la m e m ó r ia , r é p lic a , e tc . A o r a l é d ir ig id a p e lo p r e s i­
d e n t e e e l a s ó s e r á .p ú b lic a s e o T r i b u n a l a s s im d e c i d i r , c o m a c o n c o r d â n c ia
d a s p a r te s .

O s d o c u m e n to s d e v e m s e r ju n t o s a té o e n c e r r a m e n to d a fa se e s c r ita .
Se, e n tre ta n to , a lg u m d o c u m e n to u a z id o p o s te r io rm e n te fo r le v a d o em
c o n s id e r a ç ã o p e lo T r ib u n a l, a o u tra p a r te te m d ir e ito a to m a r c o n h e c i­
m e n to d e le .
O Tribunal pode convocar peritos e pedir a audiência de testemunhas.
Se o compromisso ou outro fratado não proibir, o Tribunal pode
decidir questão correlata que “ele considere ser inseparável do assunto
principal da disputa e necessário para a sua decisão final’7.
O Tribunal pode determinar medidas provisórias visando preservar os
direitos das partes.
A sentença será dada no prazo determinado pelo compromisso; en­
tretanto, o Tribuna] tem competência para estender este prazo.
Quando uma das partes não comparece perante o Tribunal, a outra
pode pedir que ele decida em seu favor. Pode o Tribunal conceder ao
“ revel” um prazo para que compareça perante ele. Se a parte ainda não
comparecer, a decisão só pode ser favorável à outra se ela estiver funda­
mentada “no fato e no direito”.
As deliberações do Tribunal são secretas.
Todos os árbitros devem participar das decisões, a não ser que o
compromisso estabeleça de modo diferente. Se algum árbitro estiver au­
sente sem permissão, ele será substituído por um indicado pelo presidente
da CIJ, ou vice-presidente, ou pelo juiz mais antigo que não seja nacional
das partes litigantes.
Estas são as normas referentes ao processo arbitral que constam do já
citado “modelo” aprovado pela Assembléia Geral da ONU em 1958 que,
no tocante a este assunto, reproduziu praticamente o estabelecido na
Convenção de Haia de 1907.
A mencionada Convenção de Haia criou, ao lado do processo arbitrai
já descrito, um outro, que é o processo sumário de arbitragem. Ele seria
utilizado nos litígios de pequena monta. Cada parte designaria um árbitro
e os dois indicados escolheriam um superárbitro. Se não chegarem a um
acordo sobre o superárbitro, cada um “apresenta dois candidatos tirados
da lista geral dos membros da Corte Permanente de Arbitragem, fora dos
membros indicados por cada uma das próprias partes e que não sejam
- nacionais de nenhuma delas” e entre os quanto nomes apresentados será
tirada a sorte.
O presidente do Tribunal é o superárbitro.

1405
O p ro i esso é p o r e s c r ito . s rm fa s e o r a l. E n t r e t a n t o , o T r i b u n a l p o d e r á
s o lic ita r e x p lic a ç õ e s o r a is a o s a g e n le s , h em c o m o às te ste m u n h a s .
O p r o c e s s o s u m á r io só fo i u tiliz a d o e m to d a a h is tó r ia d a C o rte P er­
m a n e n te d e A rb itr a g e m ap enas u m a vez, e m q u e stã o r e la tiv a a bens de
in g le s e s , fra n c e se s e e s p a n h ó is em P o r tu g a l, q u e d e p o is d a P r o c la m a ç ã o
da R e p ú b lic a fo ra m s e q ü e s tr a d o s p e lo g o v e rn o p o r tu g u ê s .
559. A se n te n ç a a r b itr a i é o b r ig a tó r ia p ara as p a r le s litig a n te s . E la s
d e c la r a m e x p re ss a m e n te a c e ila r a se n te n ç a 110 c o m p r o m is s o a rb itr a i, a p e ­
sar de is to s e r d e s n e c e s s á r io .
A s e n te n ç a p o ssu i d u a s p a r te s : a e x p o s iç ã o de m o tiv o s e a p a ite d is ­
p o s itiv a .
Ela é dada por maioria de votos e será por escrito. Ela deve ser proferida
em sessão pública, estando presentes os agentes das parles. Ela será comu­
nicada imediatamente às partes. Durante o período de um mês após ela
ter sido dada, o Tribunal, por iniciativa própria ou a pedido de uma das
parles, pode relificar erro tipográfico, aritmético ou qualquer erro óbvio.
Uma questão, cuja orientação não tem sido das mais uniformes, é a
de saber se os árbitros em minoria podem dar o seu voto em separado. A
Convenção de 1899 (art. 52) admitia que “os membros, que constituírem
a minoria, poderão, ao assinar, fazer constância do seu dissentimento”. A
Convenção de 1907 determina que a sentença será assinada pelo presidente
e pelo escrivão. Accioly considerou assim que, se o compromisso arbitrai
não estabelecer de outro modo, os árbitros minoritários não poderão dar
o voto em separado. O “modelo” aprovado pela Assembléia Geral da ONU
já determina que qualquer membro do Tribunal pode dar o seu voto em
separado, a não ser que o compromisso estabeleça o contrário. Esta ten­
dência nos parece ser a mais acertada, uma vez que a sentença arbitrai
tem sido cada vez mais semelhante à sentença judiciária, onde este direito
existe para os juizes que queiram dar o seu voto em reparado.
A sentença é obrigatória, como já vimos, para as partes litigantes. Ela
não produr efeito em relação a terceiros Estados.|J A obrigatoriedade da
sentença ocorre se ela estiver de acordo com o compromisso arbitral; caso
contrário, isto não acontecerá. Podemos dizer que, de certo modo, o seu
fundamento está na regra “pacta sunt servanda”.
A sentença arbitrai não é executória, ao contrário do que ocorre com
■<\s sentenças dos tribunais internos dos Estados. A sua execução cabe às
partes litigantes, que devem executá-la com boa fé. O mesmo já não ocorre
ccSm as sentenças da CIJ, que- são passíveis de execução forçada pelo
Conselho de Segurança da ONU (art. 94, § 2“, da Carta). Um dos poucos
casos em que se tenha consagrado a executoriedade de uma sentença
arbitrai foi o da Convenção Drago-Porter,16 que previa a intervenção quan­
do a parte não cumprisse a decisão arbitral. O Pacto da SDN (art. 13, §
4fi) previa que o Conselho proporia medidas no caso de sentenças não
executadas visando lhe “assegurar o efeito”. Existem várias sentenças ar-

1406
bilrais que não (oram executadas. Enlre elas podemos mencionar o lando
arbitral proferido pelo Presidente da Argentina, em 1909, sobre uma ques­
tão de limites, entre o Peru e a Bolívia, e esta última se recusou a execulaik
a sentença. A sanção que existe nesles casos é a opinião pública. Os Estados
empregam, algumas vezes, medidas coercitivas nestes casos (v. capítulo
LVIII). A sentença é definida no sentido de que ela põe fim à questão
litigiosa. A sentença pode, entretanto, ter recursos de interpretação, ou
de anulação, ou de revisão.
560. O recurso de interpretação pode ser interposto por qualquer uma
das parles, quando houver dúvida sobre o sentido ou alcance da sentença.17
A jurisprudência internacional registra alguns casos (questão entre a In­
glaterra e a França, decidida pelo Rei da Prússia [1843] sobre o territorio
de Portendick), mas a utilização deste recurso não tem sido comum.
O recurso de interpretação deve ser interposto no prazo de três meses
após ter sido proferida a serftença. Se for impossível submeter o recurso -
ao mesmo Tribunal, e se "as partes não chegam a um acordo, ele poderá
ser levado à CIJ. A execução sera suspensa até a decisão do recurso. Estas
são as normas estabelecidas no mencionado “modelo” da Assembléia Geral
da ONU.
561. A decisão arbitral é passível de anulação. Esta, entretanto, não
tem um tribunal internacional que a julgue de modo obrigatório. A anu­
lação é invocada livremente pelas partes. As Convenções de Haia não
tratam deste assunto sem que se possa concluir terem elas abolido a nuli­
dade, uma vez que, para ocorrer tal fato, isto teria de ser feito expressa­
mente (Verdross).
A nulidade pode ser invocada, segundo o citado “ modelo”, cujas regras
reproduzimos, nos seguintes casos: a) excesso de poderes; b) corrupção
de um membro do Tribunal; c) violação de um principio fundamental do
processo ou Ierro na motivação da sentença; d) o compromisso arbitral é
nulo.
Se, no prazo de três meses após ter sido contestada, as partes não
chegarem a um acordo sobre um novo tribunal, a questão deverá ser
decidida pela CIJ, que declarará a nulidade total ou parcial da sentença.
O prazo para a contestação da validade da sentença deverá ser nos
mencionados casos: a e c, no prazo de seis meses após a sentença ter sido
proferida; e nos casos b e d, no prazo de seis meses após ter sido descoberta
a corrupção ou o fato que acarreta a nulidade do compromisso. Nestes
dois últimos casos, o prazo máximo para requerer a nulidade é de dez
anos.
A Corte, a pedido de uma das partes, pode suspender a execução da
sentença, se houver necessidade.
Façamos a análise de causa mais comum de nulidade: o excesso de
poderes. Ele acarreta a nulidade da sentença arbitral .porque a sentença
só será obrigatória se quem a prolatou tinha poder para fazê-lo. São causas
cie excesso de poderes: a) decidir com ljnse nvi eqüidade quando não linha
poderes expressos paia tal; b) violação do compromisso arbitra); c) abuso
na interpretação do com prom isso; d) ;t não motivação da sentença.^
562. A revisão11' da sentença é possível se forem preenchidos os seguin­
tes requisitos: a) a descoberta de um fato novo que seja decisivo 11a questão;
b) o desconhecimento deste fato por parte do Tribunal e por parte de
quem pede a revisão; c) que esta ignorância não seja devida à negligência
de quem pede a revisão; d) a revisão seja pedida no prazo de seis meses,
a contar da data da descoberta do fato novo;20 e) que não tenham trans­
corrido dez anos da sentença.
No-caso de revisão, o Tribunal deve decidir previamente se ela é
cabível, para somente depois julgar o mérito.
A revisão, sempre que possível, deverá ser feita pelo tribunal que deu
a decisão, e se isto não for possível e as partes não decidirem de outro
modo, ela será submetida à C1J. Este, ou outro tribunal, a pedido de uma
das partes, poderá decidir a suspensão da execução da sentença, se houver
necessidade.
A admissão da revisão é tradicional no instituto da arbitragem, tendo
sido consagrada nas Convenções de Haia21 e no “modelo” da Assembléia
Geral da ONU, cujas normas reproduzimos.22
563. O Tribuna) Arbitrai deve decidir a questão, não podendo deixar
de fazê-lo com fundamento no “silêncio ou obscuridade do direito a ser
aplicado”.
A orientação acima é a consagrada 110 “modelo” da Assembléia Geral
da ONU. Entretanto, os doutrinadores (Politis) não têm sempre concor­
dado com ela. Salienta-se que um árbitro pode estar sujeito a não estatuir,
vez que as partes litigantes podem não lhe dar poderes para tal no com­
promisso arbitrai. Neste caso então se dariam maiores poderes ao árbitro
o.u se escolheria outro. E de se assinalar que alguns compromissos já
consagraram este direito de o árbitro se recusar a decidir.
564. A arbitragem tem sempre por base um tratado. Ela pode apre-
sentar-se sob duas formas: a facultativa e a obrigatória.
Afirma-se que a arbitragem é facultativa quando não existe um tratado
anterior ao litígio obrigando a sua submissão a uma solução arbitrai. Ela
é obrigatória quando existe um tratado anterior ao litígio obrigando o
Estado a submetê-lo a uma solução arbitrai.
Os tratados que obrigam a submissão do litígio à arbitragem podem
ser: tratado de arbitragem propriamente dito e tratado com cláusula com-
promissória (Accioly).
Os denominados tratados de arbitragem propriamente ditos são os
que apenas tratam de arbitragem. São chamados de permanentes quando
são concluídos para os litígios que venham a aparecer no futuro. Eles
podem se referir apenas a determinado tipo de litígio ou a todo e qualquer
litígio, bem como podem criar para a submissão do litígio à arbitragem

1408
condições 011 não. E o caso de arbitragem obrigatória. Este tipo de tratado
pode sei também 11111 caso de arbitragem facultativa: é quando ® tratado
só contém dispositivos sobre arbitragem, mas visando determinado litígio
que já tenha surgido, isto é, o tratado tem por fim submeter à arbitragem
um litígio já existente, para o qual não havia obrigatoriedade tle ser levado
à solução arbitrai.
Os tratados com cláusula compromissória são aqueles tratados que,
versando sobre os mais diferentes assuntos, possuem uma cláusula (deno­
minada cláusula compromissória) obrigando a submissão de litígio que
venha a surgir no futuro à solução arbitral. A cláusula compromissória
pode se referir apenas a determinados litígios ou a qualquer litígio, sendo
a primeira designada cláusula compromisoria geral e, a segunda clásula,
compromissória especial. A cláusula compromissória depende, no tocante
à sua validade, .dp tratado em que ela está inserida.
Pode-se acrescentar que a cláusula compromissória especial é de uso
corrente (v. cap. anterior).
A obrigação de negociar um compromisso arbitral cria um “pactum
de negotiando" que não significa uma obrigação de se chegar a um acordo.
Já o “pactum de contrahendo”, que é um tratado preliminar (v. cap.
tratados), cria uma obrigação de conclusão de um tratado, caso contrário
todas as cláusulas compromissórias não teriam valor. De qualquer modo,
como observa Photini Pazartzis, é difícil se distinguir os dois pactos. De
qualquer modo, é de se recordar a existência da “pacta sunt servanda”.
A mesma autora citada acima salienta que quando o tratado prevê o
recurso a arbitragem e tem normas de como deve ser estabelecido o
compromisso arbitrai, é denominado de “pactum de compromitendo”.
Os tratados de arbitragem concluídos tendo em vista determinado
litígio são o próprio compromisso arbitrai. Os tratados de arbitragem
permanente, bem como as cláusulas compromissórias, necessitam da con­
clusão do compromisso arbitrai quando houver litígio.
565-, A..Corte. P a m a n enULde Arbinagemlor.criada. na_ 1 - Conferência
de Haia. em 1899, e revista na 2a Conferência, em 1907.
No século XIX pensou-se em tornar a arbitragem obrigatória.
A finalidadejda Corte Permanente de Arbitragem era de impulsionar
a evolução da arbitragem para, o tipo judiciário, dando-lhe um tribunal
permanente, que não desaparecesse com a solução do litígio e que fosse
capaz de desenvolver uma jurisiyudéncia. A Corte, entretanto, não res­
tringiu a liberdade dos Estados, como veremos adiante. Ela .Y!$3Xa.4g£a?s
f a c ilita r a p r á t i r a .d a a rh itr a g a m .
Em 1989, na Conferência de Haia, surgiram três projetos (EUA, Rússia
e Grã-Bretanha) para a constituição de üm-tribunal arbitral que fosse
permanente. Ela foi criada no capítulo II, do título IV, da convenção para
a solução pacífica dos conílitos internacionais (1989) e revista no capítulo

1409
I I , c io t í l u l o V , d a c o n v e n ç ã o p a r a a s o lu ç ã o p a c ífic a d o s c o n f lit o s in te r n a ­
c io n a is (1 9 0 7 ).
Todos os douti inadores têm salientado cjne a sua denominação está
/ errada, urna vez que ela não é uma coFicTe íie^ñrFperinanente.T^ao é uma
corte, vez que os jufees que a compõem não são obrigatórios para as partes.
Não é permanente porque não se reúne.em momento algum, tendo apenas
I uma sede, que é em Haia. A sede tem uma Secretaria, que guarda os seus
\ arquivos, mas isto não significa que ela seja permanente.
^ Ã Corte é, na~verdade, uma simples lista de juizes, sendo que cada
Estado indica quatro nomes. Tais pessoas devem: a) ser competentes em
Dl; b) ter completa idoneidade moral; c) estar dispostas a aceitar as funções
que lhes forem dadas. O mandato é de seis anos. A finalidade deste quadro
é de colocar à disposição dos Estados uma lista de árbitros, para que eles
escolham os membros do Tribunal Arbitral que venham a constituir para
resolver o litígio entre eles. A Corte Permanente de Arbitragem, desde a
sua constituição até a Ia Guerra Mundial, julgou vinte casos e, posterior­
mente, somente seis, sendo que o último julgamento data de 1932. Após
a constituição das Nações Unidas, julgou apenas um caso, em 1954.
A Corte Permanente de Arbitragem: fracassou? devido a três fatores: a)
não ser permanente; b) a sua tendência para decisões diplomáticas; cY.
devido à variabilidade dos árbitros acabou por não desenvolver uma juris-
jtn td âatja oniforiQ^ Finalmente, a CPJI e, depois, a CIJ passaram a ter a
preferência dos Estados para a solução dos litígios internacionais.
A única função que os membros da Corte têm atualmente é a de
apresentarem à Assembléia Geral e ao Conselho de Segurança os nomes
para~TMÍzes da Cl], sendo que a eleição destes sera feita pelos mencionados
órgãos-dajQ NH-
A Corte possui: um Conselho Administrativo e o Secretariado. O pri­
meiro é formado pelos representantes, junto ao Governo da Holanda, das
partes contratantes. E p erm a n en te e a presidência é.do ministro das Re­
lações Exteriores da Holanda. O segundo tem à sua frente um secretário-
geral, que é designado pelo prazo de cinco anos pelo Conselho Adminis­
trativo. O secretário-geral serve de chefe do pessoal e escrivão da Corte.
E interessante observarque as despesas da Corte são pagas adiantada-
mente pela Holanda, que é depois reembolsada pelos membros; em outras
palavras, os Estados contribuem de maneira.exala, s'em que no orçamento
haja um superávit (François). Por outro lado, as despesas são pagas pelos
Estados na mesma proporção que é utilizada"para o Bureau do UPU. Em .
outras palavras, há várias categorias de contribuições para as despesas.
566. Na 2a Conferência de Haia (1907), pensou-se em criar uma Corte
de Justiça Arbitrai, que teria uma reunião anual e se aproximaria dos
tribunais judiciários. A sua função era a de julgar os casos que lhe fossem
submetidos “em virtude de uma estipulação geral de arbitragem ou de um
acordo especial”. Ela serviria ainda como um tribunal de 2a instância para
a revisão das sentenças arbitrais. Ela funcionaria ao lado da Corte Perma­
nente. A convenção que a criava não estabeleceu a sua composição, de­
terminando apenas que haveria juizes e juí/.es suplenLes com o mandato
de 12 anos. Entretanto, sobre a sua composição jainais se chegou a um
acordo: uns pretendiam que houvesse tantos juizes quanto os Estados-mem-
bros, e a Corte funcionaria em Câmaras, teria ao todo 44 juizes (Brasil);
outros sustentaram que haveria juizes permanentes para as grandes potên­
cias e juizes temporários para as menores potências, etc. Em conseqüência
deste desacordo, ela não entrou em funcionamento.
Assinala Manley Hudson que o seu projeto serviu de “ponto de partida”
para a comissão que elaborou o estatuto da CPJI.
567. A arbitragem no continente americano sempre teve um grande
desenvolvimento. Na Conferência Pan-americana de Washington foi con­
cluído um tratado de arbitramento (1890) cujo art. l s estipulava que o
arbitramento era adotado “como princípio do Direito Internacional Ame­
ricano” para a solução dos litígios internacionais. •• ’
Na Conferência Pan-americana do México foi aprovada resolução de
arbitragem obrigatória (1902), em que os Estados se comprometiam a
resolver, por arbitragem, os litígios internacionais que tivessem. A Confe­
rência Pan-americana do Rio dejaneiro (1906) recomendou que os Estados
americanos aprovassem a convenção de arbitragem na Conferência de
Haia que se retiniria no ano seguinte.
Na Conferência Pan-americana de Buenos Aires, na convenção sobre
reclamações pecuniárias aí concluída, Estados americanos se comprome­
tem a submeter à arbitragem os litígios sobre tais questões.
Na Conferência Pan-americana de Santiago do Chile foi aprovado um
voto para o progresso da arbitragem.
Na Conferência Pan-americana de Havana foi aprovada uma resolução
em que os Estados americanos adotavam a arbitragem como sendo obri­
gatória para a solução dos litígios internacionais. Em 1929, tendo por base
esta resolução, é concluído o tratado geral de arbitramento internacional
e o protocolo de arbitramento progressivo.
Na Conferência Pan-americana de Bogotá foi concluído o tratado
americano de soluções pacíficas, cujo capítulo V é dedicado à arbitragem.
Em 1967 um protocolo para a solução dos liugios no âmbito da ALALC
previu a criação de um tribunal arbitral (cada Estado indica um membro),
que decidira Os litígios quando as negociações fracassarem.
Como se pode verificar, a arbitragem sempre esteve presente no con­
tinente americano, sendo que alguns países a consagram como obrigatória
nas suas Constituições (Brasil — art. 7" da Constituição de 1969).
568. Atualmente, predomina a arbitragem por tribunal e por comissão
mista, sendo que esta última é usada geralmente para os litígios de m en or
importância, uma vez que ela se reúne no local onde há o litígio. A
arbitragem por chefe de Estado tem sido cada vez menos freqüente, e

1411
p o d e m o s c ita i , c m 19(> (> . l i m a d e c is ã o da R a in h a E liz a b e th da In g la te r r a
em lim a q u e s t ã o de fr o n te ir a s e n tr e A r g e n tin a e C h ile .
T rês d ir e ç õ e s pod em ser a p o n ta d a s com o sen d o as te n d ê n c ia s da
a r b itr a g e m nos d ia s de h o je : a) a a r b itr a g e m é o b r ig a tó r ia p ara c e rto s
litíg io s ; b) s u b m is s ã o à a r b itr a g e m d o s litíg io s p o lític o s ; c) a reserv a e sta ­
b e le c e n d o que a s q u e s t õ e s r e la tiv a s à h o n r a e à s o b e r a n ia d o E s ta d o não
são s u b m e tid a s à a r b itr a g e m e stá d esap a recen d o g r a d a tiv a m e n te (R o u s­
s e a u ).
E de se salientar que. após a Ia Guerra Mundial foram constituídos,
pelos tratados de paz. diversos tribunais arbitrais mistos para resolver as
questões surgidas com as medidas tomadas durante-# guerra (ex.: seqüestro
de bens). EsLes tribunais tinham como característica que o indivíduo tinha
acesso a eles. Eram formados por três juizes (um para cada parte e um
desempatado)). Na verdade, como diz Rousseau, havia um “juiz único”
(o desempatador) ,2í Depois de 1945, foram constituídos inúmeros tribunais
arbitrais (França e Alemanha; os Aliados e a Itália; etc.). E em 1977 um
tribuna] arbitrai proferiu decisão no caso do canal de Beagle entre Argen­
tina e Chile. O Tribunal foi designado pela Rainha da Inglaterra.
Sohn salienta que a arbitragem atualmente pode ser empregada em
assuntos de menor importância, cuja submissão à CIJ seria “exagerar” a
sua importância, bem como naqueles assuntos em que as partes desejarem
uma solução rápida.
Por outro lado, o Conselho Administrativo da Corte Permanente de
Arbitragem “decidiu”, em 1960, encorajar o uso das facilidades da Corte
para arbitragens entre Estados e sociedades comerciais, sendo que, em
1962, foram preparadas pelo Bureau Internacional desta Corte as regras
para tais arbitragens e ainda a conciliação nestes casos.24
Podemos lembrar que atualmente tem sido muito utilizada a denomi­
nada arbitragem comercial, que foi regulamentada, por exemplo, pela
Convenção de 1958, concluída sob os auspícios’da ONU, em Nova Iorque,
e no continente europeu pela “convenção européia sobre arbitragem co­
mercial internacional”, concluída em Genebra, em 1961.
A Comissão Jurídica Interamericana (1973) preparou um projeto de
convenção sobre arbitragem comercial. Os árbitros são nomeados pelas
partes, bem como elas fixam o pro.cesso. O laudo arbitrai tem força de
sentença definitiva. Só se pode alegar contra a execução do laudo: à)
nulidade ou extinção da cláusula conípromissória; b) fraude ou coação na
expedição do laudo; c) excesso de poderes dos árbitros; d) os termos do
laudo são contraditórios; etc. Estabelece ainda este projeto que é compe­
tente para conhecer a oposição à execusão do laudo a autoridade judicial
do local onde foi dado o laudo.

1412
NOTAS

1. Simón Rimdstcin — L'aibitrage inlernational en matiére privée. in RdC.


1928, vol. 1)1. I. 23. págs. 33] e segs.; ju lien Makowski — L'organi.sation actuclle
de L’arbitrage international. in RdC, 193). vol. II, i. 3G, págs. 267 c segs.; Paul
Guggenheim — I.es mesures conservatoires dans la procédurc arbítrale et judi-
ciaire ?;tRdC,1932, vol. II. t. 40. págs. 649 e segs.; Eugéne Borel — Les voies de
recours contre les sentences arbitrales, in RdC. 1933, vol. II, t. 52, págs. 5 e segs.:
Giorgio Baltadore Pallieri — L ’arbitrage privée daus les rapports iuternationaux,
in RdC. 1935, vol. II, t. 51, págs. 291 e segs.: E ugén e Borel — L'Acte General de
Genéve, in RdC, 1929, vol. II, i. 27, págs. 501 e segs.; Rudolf Blühdorn — Le
fonctionnement et la ju rispm dence des Tribunaux arbitraux mixtes crées par les
Traités de París, in RdC. 1932, vol. III, l. 41, págs. 141 e segs.; J . L. Simpson e
Hazel Fox — International Arbitration, 1959; O lo f H oijer — La Evolution Paci­
fique des Litiges Internationaux avant et depuis la Société des Na'lions, 1925;
Michel de Taube — Les Origines de 1 Arbitrage International -— A ntiquiié et
Moyen Age, in RdC, 1932, vol. IV, i. 42, págs. 5 e segs.; Kennet S. Carlston — The
Process of International Arbitration, 1946; N. Politis — La Justice Internationale,
1924; Louis B. Sohn — T h e Function o f International Arbitration Som m aire de
1'Arbitrage permanent, 1910; Michel Revon — L ’Arbitrage International, 1892; A.
Mérignhac — Traité Théorique et Pratique de l’Arbitrage International, 1895;
Charles Carabiber — L ’Arbitrage International de Droil Privé, 1960; Jacqu es
Dumas — LesSanctions de l’Arbitrage International, 1905; Francisco Jo sé Urrutia
— La Evolución del Principio de Arbitraje en América — La Sociedad de Naciones,
1920; E. Ronard de Card — Les Destinées de f A rbitrage International depuis la
sentence rendue par le tribunal de Genéve, 1892; A. André — De l’Arbitrage
Obrigatoire dans les Rapports Internationaux, 1903; Augusto Malauzat — La Cour
de Justice Arbítrale, 1914; H enri Hélie — La Notion des “Motifs’r dans l’évolution
de l’arbitrage international, 1912; Ferdinand Dreyfus — L ’Arbitrage International,
1982; Alessandro Corsi — Arbitrati Intem azionali, 1893; Jackson H. Ralston —
International Arbitration from Athens to Locarno, 1929; Jivoin Y. Markovitcb —
Du caractére définitif des senlences arbitrales en D roit International Public, 1937:
R. Raeder — L ’Arbitrage International chez Ies H ellénes, 1912; J . P. A. François
— La Coun Perm anente d ’Arbitrage. son origine, sa jurisprudence, son avenir,
in RdC, 1955, vol. I, t. 87, págs. 460 e segs.: Frede Castberg — L ’excés de pouvoir
dans la jusdee internationale, in RdC, 1931, vol. I. t. 35, págs. 357 e segs.: Ch.
Carabiber — L A rbilrage International entre Gouvernements et Particuliers, in
RdC, 1950, vol. 1, t. 76, págs. 221 e segs.: Phillipe Chapa] — L ’Arbitrabilité des
Difféi*ends Internationaux, 1967; José Izidro M artins Sonto — O Valor Ju ríd ico
do Arbitramento com o Processo de Resolução dos Litígios Internacionais, ¿«Revista
da Faculdade de Direito de Caruaru — Estado de Pernam buco, anos IV e V III, n°
5, págs. 147 e segs.; Carlos Bueno-Guzman — Colección de Tratados de A rbitraje
Institucional, 1970; Geraldo Bezerra de Moura — A com petência da OAC1 em
matéria de arbitragem internacional, 1967; Ivon Loussouarn eJean-D eenis Bredin
— Droit du Com merce International, 1969, págs. 84 e segs.; Helmut Coing —
Substantive Law and Procedural Law in International Arbitration, in Law and State,
vol. 7, 1973, págs. 16 e segs.; Émile Tyan — Le D roil de l’Arbitrage, 1972; A. M.
Stuyt — Survey o f International Arbitrations (1794-1970), 1972; P. Sandérs —

1413
Trcnils in iIm: I-icld oi Inu-nuiiioival Comercial Arbitr.ition, in RdC. l ‘.V75, vol. II.
I. 143, págs. 205 c si'gs.: Clivc M. Schinilthoff — Uiúversalism and Rrgionalism
in International Com inercial Arbitration. in International Econom ic aixl Trade
Law, coordenado p o r“Clive M. Schm itlhoff e Kenneth R. Simmonds, IÍ)7G, págs.
171 e segs.; Louis B. Sohn — Setilemcnt o f Disputes Relating to the lnicrprotadon
and Application o f Treaties, in RdC, 1976, vol. II, t. 150, págs. 195 e segs.: Riccardo
Luzzato — lnternâtiõna! Commercial Arbitration and The Municipal Law o f States.
in RdC, 1977, vol. IV, t. 157, págs. 9 e segs.; Guido F. S. Soares — Ó rgãos das
Soluções Extrajudiciárias de Litígios, 1985; Jo sé Carlos de Magalhães e Luiz Olavo
Baptista — A rbitragem Comercial, 1986; M aurice Flory e outros — La Kormation
des normes en D roit International du Developpem em , 1984, págs. 327 e segs.;
Pierre Lalive — O rdem Pública Transnacional e Arbitragem Internacional; con­
teúdo e realidade da ordem pública transnacional na prática arbitrai, in Revista
do Direito do C om ércio e das Relações Internacionais, 11° 1, 1984, págs. 25 e segs.;
Photini Pazartzis — Les Engagements Internationaux en Matière de Réglem ent
Pacifique des Différends entre Etats, 1992. Arbitragem Comercial Internacional,
coordenação da Adriana Noemi Pucci, 1998.
2. Este tratado previu três processos de solução: a) conciliação prévia para
todos os litígios; b) a solução judiciária para os litígiosjurídicos; c) a solução arbitra]
principalmente para os litígios políticos (não proibia que a arbitragem também
resolvesse questões ju ríd icas). Os Estados podiam aderir apenas ao processo ou
processos que desejassem.
3. O próprio art. 38 da citada Convenção de Haia de 1907 falava em “ eqüi­
dade”: “Nas questões de ordem jurídica, e em primdro lugar, nas questões de
interpretação ou de aplicação das convenções internacionais, a arbitragem é re­
conhecida pelas potências contratantes com o o meio mais eficaz e, ao mesmo
tempo, o mais equitativo para resolver os litígios que não forem dirimidos por ria
diplomática” .
4. Em senddo contrário: Fauchílle, H oijer.
5. Os gregos não praticavam a arbitragem com os estrangiros.
6. No início, eles eram resumidos para, posteriorm ente, passarem a ser mais
detalhados.
7. As sanções religiosas eram a excom unhão (que proibia a pessoa de tomar
os sacramentos durante a vida) e o interdito (proibia que determinada cidade ou
região tivesse os sacram entos e às vezes se suspendia temporariamente a missa em
todo o país).
8. Na história diplomática do Brasil, logo após a sua independência, encon­
tramos algumas com issões mistas com Portugal (Tratado de 1825), com a França
(Tratado de 1828).
9. Como assinala H oijer, nos tribunais, ao contrário das comissões mistas, a
maioria é alheia ao litígio e, por outro-lado. norm alm ente eles funcionam em um
terceiro Estado. E ntretanto, é de se assinalar que se tem denominado de tribunais
arbitrais mistos os criados após a P Guerra Mundial, enquanto que eles seriam
mais bem denom inados de comissões mistas. Accioly sustenta o contrário do que
escrevemos e que as denominadas comissões mistas, com terceiro árbitro não sendo
nacional de uma das partes, já são “verdadeiros tribunais arbitrais” .
10. V. a diferença entre arbitragem e solução judiciária: n9 548.
1 1. 1 rm -sr sust eu I ¡ulo. com razão. qu e se a ;u biti aiírm é prevista a n in iiM iiiru tr
('in um tratado já aprovado pelo Legislativo. o com prom isso arbiiral não p i n isará
sei' subm elido à aprovaçao deste po d rr. K iiiirl;iiiU ). o Senado n o rir-a in rrií an<>
icin considerado qu e a sua aprovação é aind a necessária neste caso.
12. Elo deve estar bem especificado.
13. A C o nven ção de Haia.de 1907 determ inava ainda que constaria a quantia
que os litigantes d epositariam com o "a d ia n ta m e n to para as despesas".
14. O Alo G eral de 1928 estabelece que se o com prom isso n ão liver as regras
a serem aplicadas pelos árbitros, serão aplicadas as "reg ras de fun do do art. 38
do Estatuto da C lj.
14A. É in teressa n te assinalar que a d o u trin a mais antiga (Fatich ille) co nsid e­
rava que o tribu nal não podia decidir so bre a sua própria co m p etên cia, vez que
•levava em co n sid era çã o o “aspecto co n sen su al" da arbitragem . E n tre ta n to , esta
posição levaria à paralisação da arbitragem .
15. O Brasil protestou em relação à decisão de um tribunal arbitrai presidido
por De Martens, em um litígio entre a Grã-Bretanha e a Venezuela, cuja sentença
estabelecia limites que entravam no nosso território.
16. V. ns 224.
17. O recurso de interpretação deverá estar previsto no compromisso arbitrai.
18. As Convenções de Haia estabeleceram que as sentenças deverão ser mo­
tivadas. A nossa orientação é a consagrada no “ modelo” da Assembléia Geral da
ONU. Entretanto, anteriorm ente a estes textos, houve sentenças não motivadas,
geralmente as proferidas por chefe de Estado.
19. A revisão se distingue da apelação porque esta é dirigida a um tribunal
mais elevado. A revisão, ao contrário, é muitas vezes dirigida ao mesmo tribunal
e só é possível quando há descoberta de um fato novo.
20. A Convenção de Haia de 1907 estabelecia que o prazo seria determinado
no compromisso arbitrai.
21. Na 2a C onferência de Haia, Rui Barbosa defendeu a revisão da sentença
arbitrai, sustentando que, se ela não fosse admitida, seria considerar os árbitros
como infalíveis.
22. A revisão deve estar prevista no compromisso arbitrai. Ela tem sido admitida
quando está implícita no compromisso, ou quando o Tribunal não desapareceu
depois de proferir a sentença, ou no caso de o Tribunal não desaparecer depois
de proferir a sentença, ou no caso de o Tribunal ainda ter questão para decidir,
ou, ainda, quando a questão versa sobre fatos difíceis de serem estabelecidos,
devido a ter transcorrido um longo tempo ou em virtude de uma guerra (Simpson
e Fox).
23. Anzilotti, em uma opinião isolada, assinalava que estes Tribunais não eram
internacionais, uma vez que eles decidiam questões em que o homem era parte.
Estes Tribunais eram internacionais, uma vez que foram criados por ato interna­
cional: tratado (ex.: Tratado de Versalhes).
24. Na Comissão de Dl, Garcia Amador propôs que se adotasse a arbitragem
para questões entre indivíduos e Estados, o que infelizmente foi recusado. Dentro
desta orientação podem os mencionar que em 1965 uma convenção concluída no
âmbito do BIRD para a solução dos litígios relativos aos investimentos entre Estados
e nacionais de outros Estados prevê, ao lado da conciliação, a arbitragem como
modo de solução dos conflitos.

1415
CAPÍTULO LVIII

AS SANÇÕES NO DI’

569 — Introdução; 57 0 — As medidas coercitivas e a guerra; 571 —


Rompimento das relações diplomáticas; 572 — Retorsão; 573 — Re­
presalias; 574 — Bloqueio pacifico; 575 — Embargo; 576 — Boico-
tagem; 577 — As sanções na ONU; 578 — sanções no sistema
jurídico ínteramericana.

569. A sanção não é da essência da norma jurídica, mas o “seu com­


plemento normal” (E. Giraud).*
A sanção surge em um grupo “social” quando há “uma comunidade
de idéias e de concepções", “ uma certa organização” e os “ seus membros
percebem a violação da regra e têm consciência que uma ação social...
deve ser realizada para apagar a perturbação causada por esta violação”
(Cavaré).
O Dl, como os demais ramos da ciência jurídica, procura organizar as
suas sanções, de modo que as violações às normas internacionais sejam
“reprimidas”. As sanções, de um modo geral, fazem com que as normas
jurídicas sejam mais respeitadas. As sanções fazem com j u e j a j io r m a s
TüHdícasatinjam melhor o seu fim . Sem sanções, o^direito torna-se inútil
na maioria das vezes. (V. Capítulo II, inciso, 13.)
Mareei Sibert define sanção como sendo “um procedimento social
destinado a assegurar a. aplicação_de uma regra_de_direito realizando a
‘repressão -dê suas violações”. Ela atua após ter ocorrido a violação da regra
jurídica; em conseqüência, se distingue das denominadas “garantias” (ex.:
de neutralidade), que visam impedir a violação de determinada norma.
As sanções, nas palavras de M. Reisman, são “ técnicas e estratégias
para a defesa da ordem pública”. Elas se integram no “contexto sócio-po-
lítico”.
A sanção, visa uma reparação (ex.: pagamento de indenização) ou
submeter o “culpado a uma pena” (ex.: punição de criminosos de guerra).3

1417
Existem duas concepções sobre ¿1 coação: a) a clássica — que considera
a coação como 11111 meio cíe tornar efetivo o direito. Este é 11111 complexo
de normas que se faz “valer" coalivamenie (lhering. Carnelutti):- b) a
moderna — a coação é um objeto das normas jurídicas. O direito é um
complexo de normas regulando o uso da força coativa (Kelsen e Ross).
Assim o Direito Internacional pode ser visto como uni conjuntQ dp normas
que regulam as relações entre os Estados (concepção tradicional) ou um
conjunto de normas que disciplina o caso da força nas relações interna­
cionais modernas (concepção moderna). Este parágrafo foi tirado de:
Norberto Bobbio — U Positivismo Giuridico. 1979.
O sistema de sanções no Dl é inteiramente diverso do sistema de
sanções no direito~mternõT~Fla ordem jurídica internacional ele não é
m onopolizado por uni poder central superior aos Estados ou indivíduos,
'mas, pelo contrário, elas são ainda de fato aplicadas pelos próprios inte-~
ressados. Por outro lado. elas são coletivas, ao contrário doT O nterno, em
que as sanções s~ão irtdividuais. ’ "
As sanções não constituem uma novidade na nossa matéria,já existindo
na Antiguidade, como na Grécia e em Roma, onde as represálias eram
comuns. Elas, entretanto, jamais foram organizadas, cabendo sempre aos
interessados aplicá-las. Com a SDN e, posteriormente, com a ONU, ten­
tou-se organizar um sistema coletivo de sanções a ser aplicado pela orga­
nização internacional como poder superior aos Estados. Esta organização,
com o veremos abaixo, é ainda incipiente.
Podemos mencionar as seguintes sanções: o rompimento de relações
diplomáticas, a retorsão, as represálias, o bloqueio pacífico, o embargo e
a Uoicotagem,^ etc , sendo de assinalar que o b lo q u e io pacífico, d ev id o à
sim 'importância e desenvolvimento, vamos estudá-lo em separado. Além
destas sanções, que implicam na prática de atos, muitas vezes, de força,
temos no Dl sanções morais, como a opinião pública mundial.4-'
As medidas coercitivas só podem ser aplicadas após uma tentativa de
reparação por negociação. Entretanto, esta não é uma opnião unânime,
vez que há autores que alegam poder o Estado adotar uma reação imediata.
Esta só pode existir, contudo, em casos especiais que sejam graves e exijam
uma resposta imediata.
Por outro lado, pode-se aplicar contramedida antes de se submeter o
litígio a uma solução judiciária ou a qualquer outro modo de solução, mas
não durante o procedimento de solução, como o raid realizado pelos EUA
no Irã, em 1980, quando a CIJ estava julgando o caso dos diplomatas
americanos presos no Irã.
Estas sanções são atualmente ainda empregadas pelos Estados indivi­
dualmente,a o que faz com que elãs se tomem profundamente injustas,
uma vez que apenas os “grandes” podem aplicá-las (ex.: bloqueio pacífi­
c o ).6 A grande tendência é que elas venham a se tornar um monopólio
da ONU, a fim de que sejam aplicadas imparcial e indiscriminadamente
a todos os Estados,7 e mais, c o m o salienta Brownüe, os litígios devem ter

1418
u m a s o lu çã o p acífica. A g ra n d e d esvantagem do ro m p im e n to de relações
d ip lo m á tica s, represalias, e tc ., é q u e o Estado q u e as a p lic a tanibem sofre
c o m elas, com o o co rre d e m o d o claro com o ro m p im e n to de relaçõ es
d ip lo m áticas.
EsLas medidas coercitivas são utilizadas geralmente pelos Estados para
obterem determinada solução nos conflitos internacionais.
As expressões utilizadas não estão cristalizadas, sendo que ' renasceu"
a de autoconservação. ou, ainda, a de '“represálias defensivas", q u e é
híbrida e foi usada pelos EUA para justificar o raid aéreo sobre a Libia
em 1986. A tendência atual é de se reservar a palavra sanção para as
medidas tomadas por organização internacional, enquanto para as aplica­
das pelos Estados usa-se a expressão contramedidas.
Nem toda sanção é urna contramedida (v. capítulo Responsabilidade
Internacional), porque há sanções que não violam o DI, como a relorsáo
e o rompimento de relações diplomáticas.
570. As medidas coercitivas não se confundem com a guerra e déla se
distinguem por varias razões:
a) a prática das sanções mencionadas não é considerada ato de guerra
e, em conseqüência, permanecem as relações diplomáticas;
b) tais medidas coercitivas não podem atingir terceiros Estados, en­
quanto a guerra cria, para os terceiros, direitos e deveres (ex.: de neutra­
lidade);
c) as medidas coercitivas devem ser paralisadas quando o Estado que
as sofre aceitar a solução que lhe tiver sido apresentada, enquanto a guerra
só cessa se as duas partes concordarem;
d) tem sido acrescentado que na guerra ’o Estado não encontra limite
ao uso da força, a não ser dentro do que estabelecem as leis de guerra e
de humanidade. As medidas coercitivas devem ser proporcionais ao ilícito
praticado;
e) a guerra é empregada para resolver conflitos em que os Estados
consideram não ser possível outra solução dentro do quadro da paz; os
meios coercitivos são, assim, um estágio anterior à guerra;
f) o emprego dos meios coercitivos, não quebrando o estado de paz,
faz com que os tratados continuem a ser cumpridos, ao contrário do que
ocorre com a guerra.
Pode-se dizer, com Brownlie, que .em torno de 1880 se reconheceu
que nem sempre o uso da força criava o estado de guerra. Assim, surgem,
através do costume, as represálias, bloqueio pacífico e vários tipos de
intervenção.
571. O rompimento de relações diplomáticas provoca a interrupção
de relações com o outro Estado. O que é feito j>ela retirada dos agentes
diplomáticos.
Esta sanção serve para demonstrar “que a_parte ofendida já naCLespera
jiada das negociações diplomáticas” e que poderá “adotar medidas de
caráter independente” (Accioly).8

1419
É ,i mais coiinini das sanções nas relações internacionais» O seu incon­
veniente é coruir fie ceno modo a possibilidade de negociações futuras.
A m pm ra de relações diplomáticas é em princípio um ato unilateral
e discricionário, podendo entretanto ser também obrigatório quando há
uma resolução de organização internacional nestê stntido. E interessante
observar que os países em vias de desenvolvimento 011 são mais suscetíveis
ou porque têm menos interesses políticos e por conseguinte utilizam-se
mais do rompimento de relações diplomáticas do que as grandes potências.
A ruptura não se confunde com a suspensão de relações diplomáticas.
Esta ocorre, por exemplo, quando um Estado relira o seu chefe de Missão
e entrega a sua Missão a um encarregado de negócios interino; ou ainda,
quando um novo governo sobe ao poder por um golpe de Estado, até que
haja ou não o seu reconhecimento.
■E de se assinalar que apesar do rompimento das 'relações diplomáticas
os governos geralmente continuam a manter relações por meio de “outros
canais”.
A ruptura de relações diplomáticas não faz com que desapareça a
inviolabilidade dos locais da Missão e dos seus arquivos, bem como os
agentes diplomáticos permanecem com suas imunidades.
Os interesses do Estado passam a ser representados por um terceiro
denominado de potência protetora.
O rompimento de relações diplomáticas não acarreta necessariamente
o rompimento de relações consulares e econômicas.
572. A retorsão, foi comum nas relações do O cidente com o bloco
comunista_(ex.: expíilsàõ de agentes diplomáticos), nada roais~é~do que a
íéi de talião. .Ela consiste na aplicação, pelo ofendido ao ofensor, das
mesmas medidas queeste aplicou em relação a ele.
A retorsão precisa ser um ato que não contrarie o Dl, isto é, ela
necessita ser um ato exèrcid o p~elo -Elstadõ-deritro da ordem jurídica inter-
ITãciomrf-Seii) violá-la.TV siiã origem pode ser um fato lícito (ato inamistoso)
ou ilícito.
Accioly menciona diversas causas que tornam legítima a retorsão: por
exemplo, proibição por um Estado que navios de outro entrem em seus
põTtõsTaumênto exagerado de direitos alfandegários de produtos prove­
nientes de outro Esíãdõ, etc. Como se pode observar, sã o todos eles atos
qüé"o Estado pratica sem violar qualquer norma internacional.
A retorsão, bem comp o rompimento de relações, diplomáticas, são
medidas coer citivas aplicadas unilateralmente pelos Estados sem-que haja
violação do DL9
573. As represálias são medidas empresarias por um Estado em relação
a outro que tenha violado seus direitos.9A Elas,_ao contrário da retorsão,
violam norma in te rn a cio n a l. Existem em tempo de paz e de guerra e visam
fazer com que o Estado autor da ofensa respeite o Dl. Elas se justificariam
por ser uma resposta a uma violação do Dl." Ela é uma foiTna.de autotutela.
Elas devem preencher os seguimos requisitos, segiindo <>s seus dei eji-
sores: a) a existência de um aio_ai)terioi ..contrário ao DI; b) a inexistência
de outros meios para qtie_o Estado obtenha reparaçãpj c) proporcionali­
dade em relação ao deJito; d) que o Estado lesado tenha tentado, antes
ae praticá-las, obter satislação sem sucesso.'lrTLTas~ñáó~clevem ter ã siTa
finalidade alterada, isto é, a razão inicial para o seu desencadeamento deve
ser mantido.
Assinala Jean Delivanis que a legítima defesa e as represálias lém o
mesmo fundamento, isto é, “a violação de uma norma internacional por
um Estado". Entretanto, as suas finalidades são diferentes, porque nas
represálias se procura obter uma reparação, enquanto na legítima defesa
se paralisa o ataque. As represálias se distinguem da legítima defesa no
sentido de que nesta o Estado impede que o ilícito seja realizado, enquanto
naquela o ilícito já foi consumado (Quadri). A legítima defesa só é utilizada
em caso de ataque armado, enquanto a represália é uma reação a qualquer
ilícito internacional. A represália deve ser precedida de uma tentativa de
solução pacífica que não existe na legítima defesa (Andrea de Gutirv).
As represálias podem ser invinieras medidas coercitivas, tais como o
bloqueio pacífico, o embargo e a boicotagem. São os “acts short of war”
dos doutrinadores ingleses e norte-americanos.
Classificam-se em positivas e negativas. As primeiras são as realizadas
quando o Estado deixa de praticar atos obrigatórios pelo Dl (ex.: deixa
de efetuar pagamento de uma dívida).
Elas não podem ser usadas" quando ocasionarem danos a terceiros.
Alguns autores (Kelsen) têm admitido a validade das represálias, salien­
tando que o Estado, ao praticá-las, age em nome da sociedade internacio­
nal, vez que elas são reação contra um delito no plano internacional.
Dentro desta orientação está também Accioly.
Outros (Calogeropoulos Stratis) consideram que as represálias não
devem ser admitidas como válidas, porque a Carta da ONU proíbe o uso
da força pelos Estados, a não ser em caso de legítima defesa.
Esta segunda corrente nos parece a mais acertada, não somente porque
o uso da força está proibido, mas também porque a represália só seria
justa se houvesse um poderio semelhante entre os Estados. Dentro da
sociedade internacional, ela se torna uma arma dos fortes contra os fracos,
só utilizada por aqueles. Por outro lado, ela deverá ser eliminada gradati-
vamente da ordem jurídica internacional, como for eliminada da ordem
jurídica interna.11 Se este é o ideal, não podemos deixar de reconhecer a
sua utilização ainda atualmente. A nossa crítica se prende sobretudo às
represálias que implicam o uso da" força; quanto às demais, “existem, de
certa forma, até mesmo no direito interno" (ex.: “exceptio inadimpleti
contractu”).
Uma exposição mais detalhada da situação da represália na Carta da
ONU é a exposta por Andrea de Guttry. A intemacionalista italiana observa

1421
que o art. 2", alínea 4. da Carta da ONU, é interpretada pelos Estados
ocidentais como só proibindo a força atinada, enquanto para o 3- Mundo
proíbe a toet ção económica e política. Na Conferência cie São Francisco
o Brasil apresentou proposla no sentido de que a “força" abrangesse a
coerção económica, mas ela foí rejeitada. A Assembléia GeraJ não pode
deliberar sobre ação coercitiva, que é da competencia do CS, mas ela lem
aprovado recomendações com aspectos de sanção econômica e política.
A Carta da ONU não proíbe represalia de aspecto não-coercitivo, que seria
lícita no DI. As represalias podem ser de cometido econôm ico ou não.
A distinção entre retorsão e represalia é que esta viola normas inter­
nacionais, ao contrario daquela:
Um aspecto interessante, cuja atenção é chamada por Andrea de Gut-
try, é que terceiros Estados podem aplicar represálias. Assim, quando da
ocupação das ilhas Malvinas pela Argentina, a Nova Zelandia cortou rela­
ções diplomáticas e cancelou vôos aéreos. Os atos praticados por terceiros
Estados não entram nas represalias típicas.
Observa Wengler que a maior parte das violações de Direilo Interna­
cional, atualmente, não é seguida de represalias e que estas dévem ser
evitadas, porque mesmo sem o uso da força, algumas vezes, elas não são
consideradas pacíficas.
As contra-represálias são ilícitas, porque elas são uma réplica a um fato
lícito (Sicilianos).
Finalmente, é de se recordar que Bowett chama a atenção para o fato
de que as represálias armadas estão proibidas, mas têm sido aceitas de fato.
Uma violação desta idéia ocorreu em junho de 1993, quando os EUA
lançaram um ataque de mísseis a um conjunto de prédios militares em
Bagdá alegando que era uma represália ao atentado sofrido pelo ex-Pre-
sidente Bush no Kuwait, em abril do mesmo ano Os EUA fundamentaram
a sua ação no art. 51 da Carta da ONU. E de se ressaltar que a represália
não pode ter natureza militar. O citado art. 51 fala em legítima defesa e
esta presupõe um ataque armado, o que não houve. Por outro lado, não
há legítima defesa que seja desencandeada dois meses após o fato em que
se procura fundamentá-la.
A doutrina tem dado a nosso ver uma extensão abusiva às represálias
ao falar em “represálias armadas defensivas” para lutar contra o terrorismo,
que não seriam proibidas pela Carta da ONU. O terrorismo é considerado
um ato de agressão. Logo tais represálias seriam um ato de legítima defesa
(O. Schachter) e o terrorismo precisa ser combatido em seus santuários.
A represália, em princípio, só é praticada contra o Estado fraco ou
pequeno, com o que se obtém resultados rápidos sem maiores riscos (Myres
S. McDougal e Florentino P. Feliciano).
5 7 4 / 0 bloqueio pacífico pode ser definido como sendo a forma de
i;epresália que “consiste em impedir, por meio da força armada, as comu­

1422
nicações com mu porto ou as costas de um país ao «¡uai se.- nao declarou
a guerra, mas que se pretende obrigar a .proceder jj.- certom od o'’ (Arcio-
iy)-'2 . ...
Historicamente, o bloqueio pacífico surgiu no cenário internacional
em 1827, com a luta pela independência da Grécia, cujas costas foram
bloqueadas pelas esquadras da França, Rússia e Inglaterra. Este bloqueio
acabou por provocar a batalha de Navarino, entre as mencionadas esqua­
dras com a esquadra da Turquia, sem que isto fosse considerado uma
guerra. O Brasil, em 1828, esteve ameaçado de um bloqueio por parte de
uma esquadra francesa comandada pelo Almirante Roussin, sendo que o
conflito com a França foi resolvido por um acordo.13 De dezembro de 1862
a janeiro de 1863, o Rio de Janeiro foi bloqueado por uma esquadra
inglesa.
O bloqueio pacífico não deve ser admitido atualmente, vez que é uma
sanção que .só pode ser utilizada pelas grandes potências marítimas, que
o consideram pouco dispendioso. Por outro lado, eltTe um * verdadeiro
estado de hostilidades circunscrito” (Fauchille). E a Carta da ONU proíbe
a utilização da força nas relações internacionais.
Os seus defensores (Liszt, Bluntschli) têm apresentado algumas con-
dições que, respeitadas, o tornariamválido: <z)_ele só pode ser empregado
após o fracasso das negociações; b) que seja efetivo;’'' c) que seja notificado
oficialmente; d) que ele só é obrigado para os navios do bloqueante e do
bloqueado, não o sendo-pa ra os dois terceiros Estaclos. As represálias não
atingem terceiros E sta d o s,a o contrário do bloqueio em tempo de guerra;
e) os navios que forem apreendidos devem ser devolvidos no final do
bloqueioTE de se recordar que oTiloqueío pela DeclaTá^ão lIã ONTTqiie
define agressão (1974) é um ato de agressão.
575. O embargo (palavra de origem espanhola: embargar) J* consiste
na imobilização dè navios de comércio estrangeiros, tendo em vista fazer
pressão no Estadollífque eles são, nacionais” (I. Le Clère). E o seqüestro
em tempo de~paz de navios e cargas estrangeiros que se encontram nos
portos ou em águas territoriais do fcstado.
As caracten'sjj£^...do-.erob.argo.__seriam: a) só pode ser exercido por
Estado soberano; b) é ato inamistoso; ~c) ele é exercido em relação a navios
jcle comércio;16 d) é acompanhado de certas medidas (ex.: guarda armada
no navio, desembarque da tripulação); e) ele não é confisco, vez que não
opera tránsferência de propriedade; J) não dá direito a indenização.
A sua condenação tem sido gTande. vez que atinge a i n o c e n t e j iu .
seja,~~ã~~5lmples~particulares. Entretanto, ele ainda não^desapareceu das
relações internación ais.
O embargo se distingue do direito de angaria.17 Este é um direito de
requisição que o Estado possui sobre meios de transporte estrangeiros que
estão no seu território. Enquanto que, no embargo, o Estado não se utiliza
dos bens apreendidos, o mesmo já não ocorre no direito de angária. Neste,

1423
o lisiado que faz a requisição paga uma indenização, ao contrário do
embargo. A angaria ¡lio é medida coercitiva como o embargo. A angaria,
para alguns autores, existe em tempo de paz e de guerra, como o embargo.
A angaria, por sua vez, se distinguiría da simples requisição, porque esta
visa imóveis e móveis que eslejam seinpre no territorio do Estado, enquanto
aquela visa bens “in transilu” (Le Clére). A angaria só pode ser exercida
por Estado soberano, em caso de necessidade absoluta, sem abranger a
equípagem, e comporta uma indenização ao proprietário do bem utilizado.
O Estado que exerce o direito da angaria passa a arvorar o sen pavilhão
no bem requisitado. Estas são as características do direito de angaria.
Finalmente, é de assinalar que a doutrina mais moderna (Accioly, Colom-
bos) tem considerado que o direito de angária só existe em tempo de
guerra. Neste mesmo sentido está Rousseau, que a define como a requisição
de navio de Estado neutro por um beligerante.
O embargo se distingue do “embargo de’ príncipe” ou “arresto de
príncipe”. Este não é medida coercitiva. Existe na guerra e na paz. E
quando se proíbe a saída de navio estrangeiro de águas territoriais por
motivos sanitarios, judiciais, etc. Este instituto já expstia em Rom a.18
576. A boicotagem (palavra de origem inglesa: “ boycott” ) “é a inter-
rupção de relações comerciais e finanreiras rom_outro Estado" (Stone).
Esta palavra surgiu lía TiTalida, em 1880, sendo o nome de um rico pro­
prietário, “a quem foi aplicada, pela primeira vez, tal medida, como re­
presália” (Oliveiros Litrento).
Ela pode ser realizada pelo governo ou por particulares, sendo que
esta última pode ser e s p o n t á n e a ou forçada pelo governo.. A boicotagem
tem sido considerada legal quando for, tima represália para a defesa do
Estado. Neste caso então ela não acarretaria a responsabilidade do Estado.19
Ela pode compreender sanções. econômicas (interrupção de relações
comerciais) bem como sanções financeiras (ex.: interrup^ão -de assistência
fipanceira).
A boicotagem deve ser condenada como o foram as demais formas de
represálias^. Ela pode até mesmo atjngir_,o ponto de ser considerada umaL
“agressão econômica”... Toda e qualquer sanção só é legítima se determi­
nada pela organização internacional “competente”.
E de se lembrar que a boicotagem também prejudica o Estado que a
aplica.
John Norton Moore faz uma classificação do boicote: 1 — recusa de
comércio com a outra nação, ou suas firmas, ou nacionais (é o “primary
bovcott”); 2 — recusa de permissão para serem reexportadas mercadorias
para a nação boicotada (é o “extended primary boycott” ); 3 — recusa de
tratar com terceiros Estados ou empresas que lidam com o boicotado (é
o “secóndar)' boycott”); 4 — recusa de tratar com quatros Estados, oú
empresas que tratam com terceiros Estados, ou empresas que lidam com
o boicotado (é o “extended of tertiary boycott”); 5 ”— recusa de dar
assistência m ilita r a te rc e iro s E stad os q u e au x iliam o b o ico ta d o (é o " n
assistance b o y c o ti” ); (5 — esfo rço s d ip lo m á tic o s para unía te r c e n a n;
se ju n ta r ao b o ic o te (é o “ diplom atic: e ffo r ls to extern ! a b o v e o tt").
Inicialmente, como vimos acima, a palavra embargo era usada apei—,
em relação ao fato de imobilizai' navio de comercio estrangeiro. Entretanto,
atualmente, também significa a proibição de exportação e importação para
um Estado. Assim, por exemplo, os EUA o tem aplicado abusivamente coin
um alcance extraterritorial, como foi o caso dos produtos destinados à
construção do gasoduto euro-siberiano em 1982. Os demais Estados con­
sideraram tal ato invasão de sua soberania.
Em jujjio de 1993 o documento final da 3a Conferencia de Cúpula
Ibero-americana, onde estavam reunidos 2] chefes de Estado e de Governo,
salienta a “necessidade de eliminar a aplicação unilateral, por qualquer
"Estado, com fins políticos, de medidas de caráter econômico e comercial
contra outro Estado”. E uma condenação ao embargo económico a Cuba.
A grande fraqueza das sanções econômicas é que não são respeitadas
por todos os Estados.
577. As sanções no ámbito internacional, a exemplo do que ocorreu
na ordem jurídica interna, deverão ser um monopolio das organizações
internacionais, isto é, de um poder superior ás partes litigantes.
Toda instituição tem o poder de sanção, como é o caso da exclusão
de um Estado-membro (ex.: a URSS, na SDN, após a invasão da Finlandia).
E de se mencionar aqui que Friedmann fala em um novo tipo de.
sanção, que pertence ao direito de cooperação internacional: a não par­
ticipação, por exemplo, não lhe ser dado auxílio contra o subdesenvolvi­
mento.
O Pacto da Liga da Nações já determinava sanções em caso de guerra,
com o rompimento de relações comerciais. Entretanto, o sistema da SDN
fracassou inteiramente e a ONU tem o mais evoluído sistema de sanções -
colocado à disposição de uma organização internacional até hoje. Não
queremos com isto afirmar que ele seja perfeito, mas foi o que melhor se
pôde fazer até agora. O grande ideal da sociedade internacional neste
assunto é o desaparecimento da autotutela.
Na ONU todos os seus órgãos podem determinar sanções.. Neste sen­
tido, o C o n selh o de Tutela podia censurar urna potencia administradora.
A Assembléia Geral censurou a China como agressora na guerra da Coréia.
Todo órgão tem o poder para afastar um tratado que não tenha sido
registrado na ONU. A CIJ, ao decidir a reparação em determinada questão,
está constatando “o desrespeito ao direito, o ato ilítico e o sanciona pela
indenização” (Cavaré).
O Conselho de Segurança, sendo o principal órgão da ONU, é que
determina as principais sanções. Entre as sanções determinadas-pelo Con­
selho de Segurança estão: a) as medidas provisorias (ex.: suspensão de

1425
armas, ordcm <lc cessar-fogo), estas medidas são simplesmente acautelató-
rias; b) “sanções verdadeiras” de que o Conselho se utiliza “para tornar
efetiva suas decisões" (art. 41 da Carta) e que podem ser: o uso da força
armada, rompimento de relações diplomáticas, “interrupção completa ou
parcial das relações econômicas, dos meios de comunicação ferroviários,
marítimos, aéreos, postais, telegráficos, radiofônicos, ou de outra qualquer
espécie...”, ou com o uso da força armada quando as anteriores, segundo
o art. 42 da Carta da ONU, forem “inadequadas” (“demonstrações, blo­
queios e outras operações”, por meio de “forças aéreas, navais ou terres­
tres”).20
Neste sentido pode-se lembrar as sanções econômicas contra a Rodésia
aprovadas pelo CS que foram um “verdadeiro bloqueio” (D. Ruzié).
O CS coloca em funcionamento os comitês de sanções para fiscalizar
as impostas pela ONU, que são criados quase sempre nas resoluções que
aprovam as sanções.
A Assembléia Geral tem poder para determinar poucas sanções: a)
exclusão de um membro (art. 6a); b) suspensão dos direitos e privilégios
de um membro (art. 6“); c) sanções morais (ex.: censura); d) tem feito
recomendações para a formação de tropas, ou ainda recomendado em­
bargo de material estratégico. Tais recomendações ocorrem, por exemplo,
na guerra da Coréia. E de se assinalar que estas sanções são simples reco­
mendações. Do mesmo modo ela faz recomendações “para a solução
pacífica de qualquer situação” (art. 14).
J. Combacau observa que as sanções da ONU não se aproximam das
sanções civis, vez que estas visam uma reparação, por exemplo, pagamento
de indenização, e as da ONU têm por finalidade fazer com que apenas o
Estado se “arrependa”.
E preciso lembrar que o próprio embargo total não se aplica a socorros
humanitários. As ONGs criticam os comitês de sanções por falta de trans­
parência e pela demora em tomarem decisões, o que prejudica os socorros
humanitários.
578. No sistema jurídico interamericano o Tratado de Assistência Re­
cíproca estabelece que cabe ao órgão de consulta (Reunião de Consulta
dos Ministros das Relações Exteriores), em caso de agressão, determinar
as medidas a serem tomadas em “auxílio do agredido”, que “compreen­
derão uma oü mais das seguintes: a retirada dos chefes de Missão; a ruptura
de relações diplomáticas; a ruptura de relaçõe's consulares; a interrupção
parcial ou total das relações econômicas ou das comunicações ferroviárias,
marítimas, aéreas, postais, telegráficas, telefônicas, radiotelefónicas ou ra-
diotelegráficas e o emprego de força armada”.

1426
NOTAS
1. Mário Pessoa dc Oliveira — O Problem a (las Sanções 110 Direito Interna­
cional Público, 1939; Julius Stone — l.egal C ontrols oT lniernalional Conflicl.
1959, págs. 285 e segs.; Ju lien Le Clère — Les Mesures Coercilives sur les navires
de com merce étrangers, 1949; Otto Bruck — Les Sancuons eu Droil Im ernaiional
Public, 1933; L. Cavaré — Les Sanctions dans le cadre de 1’ONU, in RdC, 1952,
vol. I, l. 80, págs. 191 e segs. L. Gabriel R o binet — Le Blocus à iravers 1’H isioirr,
1943; Yves de La B rière — Evolmion de la d octrine et de la pratique en maiière
de représailles, in RdC, 1928, vol. II t. 22, págs. 241 e segs.; Émile Giraud — Le
Droit International Public et la Politique, in RdC, 1963, vol. III, l. 110, págs. 419
e segs. (especialm ente págs. 662 e segs.), Je a n Delivanis — La Legitim e Defense
en Droit International Public Moderne, 1971; R oberto Papini e Gaetano Córtese
— La Rupture des Relations Diplomatiques et ses Conséquences, 197?; D. Ruzié
— Organisations Internationales et Sanctions Intem ationales, 1971; Laurenl Luc-
chini — Le Boycottage, in Colloque d ’O rléans — Aspects du Droit International
Eeonomique, 1972, págs. 67 e segs.; Pierre-M arie M artin — t e Conflit Israelo-Arabe,
1973, págs. 177 e segs.; Mareei Merle — Le D roit internalional et 1’opinion publi­
que, in RdC, 1973, vol. 1, l. 138, págs. 373 e segs.; Je a n Combacau — L e Pouvoir
de Sanction de 1’O N U, 1974; W. M ichael Reism an — Sanctions and Enforcem ent,
in The Future o f T h e International Legal O rd er, editado por Cyril E. Black and
Richard A. Falk, vol. III, 1971. págs. 273 e segs.; Ju an Beneyeto — La Opinión
Pública Internacional, 1963; Paul de La Pradelle — L ’Opinion Publique Interna­
tionale, in G. B erger e outros — L ’O pinion Publique, 1957, págs. 431 e segs.;
Riccardo M onaco — L e rôle de 1’opinion publique dans Ia construction europée-
ne, in Recueil d’Etudes de Droit International en Hommage à Paul Guggenheim,
1968, págs. 841 e segs., Jo h n Norton M oore — U nited States Policy and the Arab
Boycott, in Proceedings o f the 71sl. Annual M eeting, Americam Society o f Inter­
national Law, April 21-23, 1977, págs. 174 e segs.; Ian Brownlie — International
Law and the Use o f Force by States, 1981; Pierre-M arie Dupuy — Observations
sur la Pratique R écen te des Sanctions de rilic ile , in RDGIP, 1983, págs. 505 e
segs.; Tom J . Farer — Polítical and Econom ic C oercion in Contem porary Inter­
national Law, in A JIL, vol. 79, n5 2, April 1985, págs. 405 e segs.; Andrea de Gutuy
— La Represaglia non com portanti la coercizione militare nel Ditritto Inlernazio-
nale, 1985; Linos-Alexandre Sicilianos — Les Reactions Décentralisées à rilicile
des Contre-Mesures à la Légitime Défense, 1990; Pierre-Marie Dupuy — Conside-
rations sur 1’opinion publique internationale dans ses rapports avec le Droit, in
Les relalions internationales à 1’épreuve de la Science politique — M élanges Mareei
Merle, 1993, págs. 303 e segs.; Margaret P. Doxey — International Sanctions in
Contemporary Perspective, 1996; Lors Fisler D am rosch — Enforcing International
Law Through N on-Forcible Measures, “in” RdC, 1997, t. 269, págs. 19 e segs.
2. Em sentido contrário está Kelsen, que considera a sanção com o sendo da
essência do direito.
3. A responsabilidadè penal 11a ordem ju ríd ic a internacional é excepcional.
4. Entre outras tem-se acrescentado a intervenção (O ppenheim -Lauterpachl),
que para nós, quando realizada,individualmente, é ilegal. Ela só se legitim a se for
realizada sob a form a de ação pòlílica internacional, isto é, pela O N U, ou com a
sua autorização p o r organism o regional.

1427
4A. Marcel Merlo afirma que no D1P existe uma opnião pública organizada
(a dos representantes dos Estados que falam em nome de suas populações) e unía
opinião pública não organizada (opinião pública interna sobre problemas inter­
nacionais). Os seiores q u e mais interessam á opinião pública, segundo esle autor,
são os seguintes: 1") direitos do hom em : 29) direito de autodeterm inação dos
povos; 39) direito de guerra: 4 9) o T erceiro Mundo e o desenvolvimento; 59)
reconhecim ento de Estado: etc. A opinião pública exerce menos influência devido
à sua desorganização. O próprio DIP é utilizado como propaganda tendo em vista
os interesses dos Estados. Observa M erle que o direito orienta a opinião pública
dando-lhe uma finalidade. Ela acaba por ter uma função apenas m oral. A opinião
pública internacional é formada ainda por meio de lima série de fatores como o
cinem a, a imprensa (esta tem os seus correspondentes no estrangeiro, tiragens
internacionais), televisão, rádio, etc. E de se recordar a força da propaganda no
mundo internacional de hoje e que se tem condenado a intervenção por propa­
ganda (v. capítulo Intervenção).
A ordem jurídica internacional tem consagrado em certos casos apelos à
opinião pública, como os atrasos que prevêem “consultas populares” , ou, ainda,
as Convenções de Haia de 1899 e 1907, que fazem menção às leis de guerra, usos
entre as nações civilizadas e as “exigências da consciência p ú b lica ’ . A própria
moratória da guerra consagrada no Pacto da SDN visava que a opinião pública
acabasse por condenar a guerra. No Tribunal de Nurembergue falou-se também
na consciência do mundo (Paul de La Pradelle).
Pode-se m encionar ainda a grande influência da opinião pública na política
externa no período entre as duas guerras mundiais.
5. A autotutela é a “liberdade que o Dl deixa ao ofendido de agir contra o
ofensor” (Quadri).
6. Entretanto, algumas delas (ex.: rompimento de relações diplomáticas) são
aplicadas individualmente, sem que isto levante protestos dos doutrinadores.
7. M ário Pessoa, em obra publicada no tempo da SDN, observa com razão:
“A aplicação das sanções importa, de certa forma, num ju lg am en to. Encarado
assim o problem a, só existem, atualm ente, as sanções previstas pelo Pacto da SDN.”
A tualmente, entretanto, ao lado da ONU, as organizações regionais também votam
sanções em caso de agressão (ex.: rom pim ento de relações diplom áticas).
8. Julius Stone assinala que o rom pim ento das relações diplomáticas ocorre
principalm ente por quatro motivos: a) para desaprovar a conduta do Estado; b)
para dem onstrar que os agentes diplom áticos do Estado agiram de modo contrário
aos interesses do Estado que rom pe relações; c) “para influenciar o Estado ofensor
para rem ediar as conseqüências de algum ato ilegal ou inam istoso’ : d) com um
aviso ao Estado ofensor de que no futuro poderão ser adotadas medidas inamistosas.
9. Alguns autores (Stone) consideram que aretorsão pode “vagam ente” violar
o art. 29, alínea 3, da Carta da ONU, que estipula que as controvérsias internacionais
devem ser resolvidas pacificamente sem ameaçar “a paz, a segurança e a justiça
internacionais” , quando por exem plo a retirada de concessões de tarifas “atinge
seriam ente com ércio de outro Estado” e é injust'a em relação ao ato de que ela é
uma retorsão.
9A. As represálias remontam à lei de alião, como mostra a palavra inglesa
“retaliation” para dominá-las, sendo que no início elas eram privadas (Pierre-Marie

1428
Martin). Elas adquiriram uma fisionom ia própria cimio instituto ju ríd ico a partir
do scculo X lll (G. Slrozzi). O desenvolvimento do com ércio fez com que as canas
de represálias deixassem de ser dadas aos particulares e se tornassem públicas. Foi
resultado de uma evolução lenta a distinção da represália da guerra.
10. Os requisitos a, c e d foram consagrados 110 caso Naulilaa (1929) , decidido
por um tribunal arbitrai alemão-poriuguês. Um outro requisito pode ser acrescen­
tado com o faz Yves de La Brière: a intenção reta. isto é, a coação só ser empregada
se realm ente não "puder ser evitada” .
11. Em tempo de guerra, desde que preenchendo as suas condições de vali­
dade, as represálias ainda se justificam , vez que a organização internacional que
teria o poder de sanção teria perdido a sua força. As represálias só se justificavam
quando não havia um “poder" para aplicar a sanção (Y. de La B rière).
12. A expressão bloqueio pacífico parece ser devida a H autefeuilb (1848-1849);
anteriorm ente, a denominação era de bloqueio simples.
13. O Brasil decretara o bloqueio do rio da Prata em uma guerra que tratava
com a Argentina e apreendeu uns navios franceses. O acordo estabelecia que em
caso de bloqueio o navio não seria apreendido se não lhe tivesse sido comunicada
a existência do bloqueio.
14. A efetividade do bloqueio foi consagrada nas Ligas da Neutralidade Armada
e em 1780 e 1800. mas somente na Declaração de Paris de 1856 é que este requisito
foi incorporado ao Dl convencional.
15. Este requisito foi violado pela quarentena de Cuba pelos EUA (1962) e
imposto aos terceiros Estados. E de se assinalar que este país, através da História,
foi dos que mais lutaram contra a existência do bloqueio pacífico. A Inglaterra
sempre se recusou a reconhecer o bloqueio pacífico com o obrigatório para os
terceiros Estados. Os EUA tentaram diferenciar a quarentena do bloqueio, dizendo
que aquela era de “coerção restrita” , bem como visaria apenas impedir armas
estratégicas e ofensivas (Miguel A. D. Estefano Pisani). Os EUA qualificou o blo­
queio de Cuba, como legítima defesa regional, o que evitaria os problemas que
surgiriam por considerar tal ato com o bloqueio (Hermes M arcelo Huck).
16. “Em sentido amplo, também se admite o embargo sobre propriedades
públicas ou privadas, situadas no território do Estado que lança mão dessa medi­
da" (Acciolv). Von Glahn apresenta com o uma variedade do em bargo: o denomi­
nado embargo de mercadorias que é realizado principalmente em relação a ar­
mamentos militares.
17. Esta palavra tem a sua origem no persa e no grego “aggareia” (servidão).
Este instituto existiu na mais rem ota Antiguidade.
18. Segundo Le Clère, o em bargo, a angária ou arresto de príncipe podem
ser invocado's no direito aéreo.
19. Tam bém não há responsabilidade do Estado quando a boicotagem é
realizada espontaneamente por particulares, sem a participação do governo.
20. V. capítulo XXV.

1429
LIVRO IX

SEGURANÇA COLETIVA

Alguns autores (Síru pp, D elbez) se utilizam d a expressão Direito P reventivo


d a Guerra. Delbez in clu i neste título, a o la d o d a S eguran ça Coletiva, a
solução p a c ífic a dos litígios internacion ais.

1431
CAPÍTULO LIX

SEGURANÇA COLETIVA1

579 — Introdução; 5 8 0 — A interdição ao recurso à força; 581 —


Desarmamento; 582 — Os tratados de proscrição de armas nucleares;
583 — Conclusão.

579. A segurança coletiva no Dl tem sido definida como sendo o sistema


visando proteger os sujeitos de Dl da guerra ou da utilização da força. A
expressão segurança coletiva passou a ser de uso corrente nos anos 30
(Regis Debray).
Ela risa preservar a paz.
A segurança coletiva é realizada através da renúncia ao uso da força,
por tratados internacionais,2 pelas organizações internacionais, as sanções3
em caso de violação do Dl e pelo desarmamento. A idéia de segurança
coletiva surgiu durante a P Guerra Mundial e seria uma reação à idéia de
balança do poder que fracassara.
580. A sociedade internacional nem sempre aprovou todas as guerras,
admitindo que apenas algumas eram consideradas justas.
No século XX passa a existir um repúdio não só à guerra, mas à
utilização da força de um modo geral.3A
• O Pacto da Liga das Nações não proibiu propriamente o uso da força.
Ele apenas obrigara os Estados litigantes a, antes de iniciaren? uma guerra,
tentarem uma solução pacífica do conflito, sendo o caso submetido a uma
decisão arbitrai, ou judiciária, ou levada ao Conselho da SDN. A guerra,
ou qualquer outra medida coercitiva, só poderia ser iniciada após três
meses da decisão arbitrai ou judiciária, ou ainda, do relatório do Conselho.4
E a “moratória da guerra”.
A renúncia à guerra surgiu com o Pacto Briand-Kellogg, assinado em
1928, em Paris, por quinze Estados, sendo que às vésperas da 2- Guerra
Mundial ele contava com 63 Estados.’

1433
O rig in o u -se di- um a m en sa;g<--ni Bríand. m in istro das Re/ações Ex­
te rio re s da Franca, d irig id a ao s E U A para c o m e m o ra r o 10- aniversario da
e n tra d a destes na ] 3 G u e rra M u n d ia l, o n d e atirm ava q u e a gu erra deveria
s e r c o lo c a d a “ fora da le i" . O S e c r e tá r io de Estado n o rte -a m e ric a n o K ellogg
p ro p õ e algum as sugestões q u e são aceitas por B ria n d : será proibida qual­
q u e r g u e rra , e não ap e n as a d e agressão, e o tratarlo será m u ltilateral, e
n ã o b ila te ra l. A gu erra, p e lo P a c to de Paris, é a b a n d o n a d a “ co m o instru­
m e n to cíe po lítica n a c io n a l" . W e h b e rg . in te rp re ta n d o esta expressão, afir­
m a q u e ela significa ser p e rm itid a a gu erra de le g ítim a d efesa e “ a guerra
e m p re e n d id a pela c o m u n id a d e in te rn a c io n a l” .6 EJe ro m p e d efinitivam en­
te co m a d o u trin a da g u e rra ju s t a . As gu erras são p ro ib id a s, sem im p ortar
a sua ju s tiç a .
Este Pacto, apesar da sua grande importância na evolução do DI,
contém algumas falhas. Entre elas, podemos mencionar que ele não previu
sanções para aqueles que o violassem, bem como não interditou o uso da
força nos casos em que não houvesse guerra.
Em 1933, a Comissão Política da Conferencia para a Redução e a
Limitação dos Armamentos aprova uma resolução “interditando expressa­
mente o recurso à força”.
Em 1933, foi concluído o tratado antibélico de não agressão e de
conciliação (Pacto Saavedra Lamas) Neste, os Estados “condenam as guer­
ras de agressão".
A Declaração de Princípios Americanos (Lima, 1938) afirma que “não
é lícito o uso da força como instrumento de política nacional ou interna­
cional” .
Como se pode verificar, alguns textos, anteriores à Cana da ONU não
proíbem apenas o recurso à guerra, mas o recurso à força de modo gené­
rico. O Paclo Briand-Kellogg serviu de base nos julgamentos de Nurem-
bergue e Tóquio para acusar os criminosos de crimes contra a paz.
A Carta da ONU mantém-se dentro desta tradiçãr) e o seu art 2-, alínea
4, determina:

“Todos os membros deverão evitar, em suas relações interna­


cionais, a ameaça ou o uso da força contra a integridade terri­
torial ou a independência política de qjialquer Estado, ou qual­
quer outra ação incompatível com os propósitos das Nações
Unidas." ‘

Em conseqüência, qualquer uso da forç-a'é proibido, a não ser em dois


casos: legítima defesa individua] e coletiva ou, ainda, q u a n d o fo r autorizado
pela ONU. O art. 2a, alínea 4, segundo Wehberg, refere-se apenas à “força
física” e, em conseqüência, um boycott poderá ser considerado um caso de
“ameaça à paz” pelo Conselho de Segurança e condenado, mas ele não
violaria o art. 2~, alínea 4.

1434
O B atad o In te ra n u ric a n o d e A ssistência K rc íp m c a ( 1‘)47) "co n d en a
fo rm a lm e n te vi guerra e as p a n e s se obrigam a n ao r e c o rre r a am eaca ou
ao uso da l o r i a . ''
A mesma renúncia ao uso da loica c encomiada na Carla da OEA.
sendo que nela se proíbem ainda " medidas coercitivas <le caráter econó­
mico e político para foiçar á vonlade soberana de outro Estado e obler
deste vantagens de qualquer natureza". (Jomo se pode verificar, no ámbito
da OKA o boyro/t é nm ilícito.
E fie se assinalar que as violações flesies textos internacionais — como
a Alemanha, ao iniciara 2a Guerra Mundial, violón o Pacto Briand-kellogg:
ou a quarentena de Cuba, violando a Carta fia ONU — não tiram o sen
valor.hBrownlie observa que até 1939 não se linha estabelecido com firmeza
a proibição do uso da força nas relações internacionais e lembra que a
Inglaterra reconheceu em 1938 a soberania italiana na Etiópia.
58). A palavra desarmamento é utilizada geralmente em dois sentidos:
a) para designar a redução de armamentos: b) ou, ainda, a supressão' de
armam en tos.h'
Os autores tém distinguido o "desarmamento" do “ controle de armas"
(“arms control’’). Hedlev Buli observa que: a) '‘desarmamento é a redução
ou abolição de armamentos”, podendo ser: “unilateral ou multilateral;
geral ou local; completo ou parcial: controlado ou sem controle”; 6) o
controle de armas “é exercido internacionalmente em relação à política
de armamentos, a respeito do nível de armamentos, sua característica,
desdobramento, ou uso”. As duas noções se relacionam, mas não se con­
fundem, vez que pode existir desarmamento sem controle de armas e este
sèm que traga desarmamento, isto é, sem redução de armamentos ou
mesmo sem fixar um limite de armamento (ex.: quando se regulamenta
o seu uso). Plano e Olton observam que o controle de armas visa princi­
palmente estabilizar as armas, enquanto o desarmamento visa reduzir ou
eliminar as amias. O controle de armas tem por finalidade proibir certos
tipos de armas, eliminação de testes nucleares, etc. A expressão controle
de amias surgiu em Harvard e na Rand Corporation, sendo que foi usada
pela primeira vez por Kennedy (Ravmond Aron). P. Leliouche observa
que a política de controle de armas não conduziu a uma diminuição
quantitativa das armas nucleares, bem como acabou por estimular os mís­
seis de alcance intermediário em áreas não cobertas pelos acordos do
SALT. O corttrole de armas é uma técnica bilateral e a sua origem está
em uma declaração norte-americana de 1961, que preconizava uma apro­
ximação gradual para o desarmamento. Há uma tendência de se ampliar
o conceito de controle de armas prevendo um diálogo intenso e habitual
de cooperação abrangendo as normas que regem as relações militares
entre os estados. Devemos esclarecer que amias estratégicas são aquelas
que podem atingir o alvo adversário e são lançados do território do estado
ou do alto-mar (Peter Calvocoressi).

1435
Atualmente. o nnmdo internacional procura lom ar eletivas as duas
noções, 1'eni-se procurado distinguir desnuclearização de não proliferação
salieiilando-se que esta pode existir sem aquela. Assim sendo, quando um
Estado tem armas nucleares em outro sob o sen controle, existe uma não
proliferação, mas não uma desnuclearização (Delcoigne e Rubinslein).
Otili as distinções têm sido apresentadas: a) não proliferação visa impedir
novos produtos de armas nucleares; b) não disseminação visa evitar o
aumento do número de Estados possuidores (não produtores) de armas
nucleares. A não disseminação não exclui a colocação de armas nucleares
em um Estado sob o controle do Estado que as instalou; r) não nucleari-
zação é o Estado no qual jamais foi produzida ou depositada arma nuclear
e se pretende manter esta siluação; d) desnuclearização “ deveria” qualificar
a renúncia de um Estado ou região nuclearizada a qualquer atividade
nuclear (Ph. Bretton e J. P. Chaudet). Para Queuneudec esla palavra é
utilizada para espaços maiores que o tamanho de uni lerrilório nacional.
Proliferação vertical é quando uma potência que já tem armas melhora o
seu arsenal. Proliferação horizontal é aumentar os produtores de armas
nucleares. Estas distinções apresentadas pelos doutrinadores nem sempre
estão consagradas de modo claro na prática internacional, e como se pode
ver, nem sempre são uniformes.
Van Dvke alinha os diversos motivos que levam os Estados a propor o
desarmamento: a) poupança; b) eliminar o perigo de uma guerra, redu­
zindo a tensão internacional; c) reduzir o poder de destruição na guerra;
d) obier vantagem militar; é) obter propaganda favorável a ele, etc. Arnold
Wolfers observa que a partir de um certo momento o desejo de aumentar
a segurança por meio de armamentos acaba por diminuir, porque traz
inquietação aos demais Estados.
O desarmamento e o controle de armas têm, de uní modo geral, três
finalidades: a) a segurança internacional; b) defender a economia estatal;
c) preservar as instituições democráticas'que são geralmente corrompidas
pelo militarismo (Hedley Buli). Pode-se acrescentar ainda a de aumentar
a ajuda econômica aos países subdesenvolvidos.
H. Thierry acentua com razão que o controle de armas é uma ação
dos EUA e URSS com a finalidade de ser imposta aos demais a fim de
reforçarem a sua supremacia. Segundo este autor, uma corrida de armas
pode " desestabilizá-los”. De qualquer modo, o controle de armas é uma
conciliação entre o desejo de.aumentar e o de reduzir as armas (Henkin).
Pretende-se com o controle dê armas assegurar a paz, tendo em vista que
a guerra é a mais violenta forma de afrontamento entre os Estados. De
qualquer modo, não é o desarmamento que vai terminar com a insegu­
rança, mas é a segurança que acarretará o desarmamento (H erz).8t Juergen
Habermas (A crise de legitimação no capitalismo tardio, 1980) observa
que nas sociedades capitalistas “... o desarmamento real parece, com efeito,
improvável. Contudo, a regulan)entação da corrida armamentista não é,

1436
f i n si m e s m a , in c o m p a tív e l c o m a e stru tu ra d as s o c ie d a d e s ia p ila lis ia s
a v a n ç a d a s ..." .
A lula pelo desarmamento e controle de armas 110 ámbito inlei nacional
é quase sempre a história de fracassos on, quando muito, de meias viiórias.
Tal ponto ocorre desde os projetos de desarmamento de Luís Felipe (11)31)
e Napoleão 111 (1863) alé os dias tie hoje.M1 Para Charles Rousseau o
primeiro acordo de limitação de armamentos foi concedido em 1787 entre
a França e a Inglaterra com a mediação da Prússia para limitação de
armamentos navais. Em 1816 Alexandre I da Rússia propôs à Grã-Bretanha
uma redução simultânea de suas forças armadas (Régis Debray).
A Conferência de Haia de 1899, convocada por inspiração do Czar da
Rússia, tinha por finalidade o desannamento, vez que a Alemanha se eslava
armando, e a Rússia, devido à sua situação econômica, não podia acom-
panhá-la, e a própria paralisação no crescimento de armamentos deixaria
à Rússia ainda uma grande vantagem. Os demais países aceitaram a con­
ferência por pressão da opinião pública, influenciada por movimentos
pacifistas e o movimento socialista internacional. A conferência, no tocante
a armamentos, não chegou a qualquer resultado. Este exemplo serve para
demonstrar o “oportunismo" dos Eslados neste assunto, que, sob a capa
de uma proposta que visaria a salvaguarda da Humanidade, nada mais
fazem, na maioria das vezes, do que defender os próprios interesses.
O Pacto da Liga das Nações, no seu art. 89, alínea 1, declarava expres­
samente: “Os Membros da Liga reconhecem que a manutenção da paz
exige a redução dos armamentos nacionais ao mínimo compatível com a
segurança nacional e com a execução das obrigações internacionais im­
postas por uma ação comum.” Deste modo, a questão do desarmamento
passa a ser uma das questões de maior importância. Assim, teve início em
1932 (prolongou-se até 1933) uma conferência geral de desarmamento
em Genebra, na qual participaram 59 Estados, sem que fosse possível a
chegada a algum resultado, fracassando acima de tudo com a retirada da
Alemanha.
No período entre as duas guerras mundiais talvez o único resultado
concreto tenha sido o tratado da limitação dos armamentos navais, con­
cluído em Washington, em 1922, entre os EUA, o Império Britânico, a
França, a Itália e o Japão.
A Carla da ONU não se refere à questão do desarmamento, como
fazia o Pacto da SDN; entretanto, o Conselho de Segurança, no seu pri­
meiro mês de funcionamento, criou a Comissão das Nações Unidas de
Energia Atômica e a Assembléia Geral, em 1946 (I a sessão), recomendou
a criação de uma outra comissão, para tratar dos armamentos convencio­
nais.*®
Em 1952, a Assembléia Geral criou a Comissão de Desarmamento,
sendo eliminadas as anteriores. Foram selecionados quatro temas para
apreciação: “a) regulamentação, limitação e redução das forças armadas

1437
e ai m a iiu -n to s: b) eletivo c o n tro le in te rn a cio n a l chi e n e rg ia atô m ica : t )
e lim in a ç ã o de iod as as anu as d e desti u ição em massa; d) e sta b e le c im e n to
de uni a d e q u a d o siítfcma de salv agu ard as".
Em 1958. a Assembléia Geral decidiu que a Comissão de Desarmamen­
to compreenderia iodos os membros das Nações Unidas. Em 1959, loi
criado uni Comitê de Desarmamento de dez países, que continuaria o
estudo do desarmamento e que manteria a Assembléia Geral e a Comissão
de Desarmamento informadas sobre os uabalhos.
O Comitê se reuniu em Genebra em 1960. Posteriormente, o número
de membros do Comitê foi elevado para 18 (Eighteen Nations Commiliee
on Disarinament) e a sua sede foi fixada em Genebra. Atualmente são
vinte membros.5' Este Comitê foi criado pela Assembléia Geral e apresenta
relatórios ã ONU, mas não é um órgão da ONU (G. Fischer). Em 1974
ela tinha 3J membros. Em 1978 ela foi sucedida pela Comissão de Desar­
mamento, com 35'países.
Os resultados da luta em favor do desarmamento e controle de armas
tém sido parciais."’ Assim, em 1963 foi concluído o Tratado de Moscou,
entre EUA, Inglaterra e URSS, que proibiu explosões experimentais de
armas nucleares em local em que os dejetos radioativos possam cair fora
das fronteiras do Estado que fez a explosão.10' Salientam os autores que
este tratado foi concluído em virtude cie ser possível controlar a existência
de explosões nucleares sem que haja uma inspeção local.
A Antártida e o espaço exterior serão utilizados para fins pacíficos,
conforme tratados concluídos.11
A Assembléia Geral da ONU, em 1961, aprovou em uma resolução a
desnuclearização da África.
Em 1970 foi concluído o tratado que proíbe a colocação de armas
nucleares e outras armas de destruição em massa no fundo dos mares e
dos oceanos, assim como no seu subsolo. Este tratado é aplicável a uma
distância de 12 milhas da linha de base do mar territorial. Estabelece a
consulta entre os Estados e a notificação ao Conselho de Segurança ern
caso de violação. E permitido aos Estados observarem as atividades na
região de aplicação do tratado, sem prejudicá-las.llA
E de se mencionar ainda as negociações do SALT (Strategfc Arms
Limitations Talks). São consideradas armas estratégicas as armas nudeares,
porque os seus efeitos de destruição ultrapassam o campo de batalha
(Bretton e Chaudet). As negociações têm ocorrido em Helsinque e Viena.
As negociações em Helsinque entre EUA e URSS tiveram início em 1969.
As negociações do SALT têm na sua base a “doutrina” do Secretário de
Defesa dos EUA, Robert McNamara, de que o arsenal russo e o none-ame-
ricano ultrapassaram a capacidade de destruição que seria necessária para
desencorajar a qualquer agressor.
No Tratado de Moscou entre EUA e URSS (1972) sobre a limitação
dos mísseis antibalísticos (A.B.M. Treaty) os Estados se comprometem a

1438
limitar os sistemas de mísseis antibalíslicos ABM. Este tratado lixa. cm
cintas regiões. o número tic mísseis ABM, bem como <le laclar ABM. Os
Estados se comprometeram a não construir mísseis ABM. Estabelece urna
comissão consultiva para a aplicação do tratado. Aínda em 1972, entre
EUA e URSS, foi concluída uma convenção provisória concernente à li­
mitação de armas ofensivas estratégicas. As partes se comprometem a partir
de 1-7-72 a não construir novas rampas de lançamentos terrestres fixas de
mísseis balísticos intercontinentais (ISBM). No mesmo sentido limitam os
lançadores de mísseis balísticos instalados em submarinos (SLBM ).1"' O
SALT foi concluído por cin co anos. O SALT1 faz uni a limitação quantitativa
e não qualitativa, porque os engenhos existentes podiam ser modernizados.
Ai«<la não existe meio de detecção capaz de distinguir o míssil de “cabeça
única.” do de “cabeça múltipla”. O SALT não trata dos engenhos trans­
portados por avião, ou dos que estão localizados em bases fora do território
das duas potências (André Fontaine). Em 1979 foram concluídos acordos
que foram o SALT II, mas que não entraram em vigor.
Em 1973, EUA e URSS concluíram acordo sobre prevenção da guerra
nuclear. Eles se comprometem a não ameaçar ou usar a força contra a
outra parte e seus aliados em circunstâncias em que haja perigo para a
paz internacional. Deverá ser evitada qualquer situação que comporte um
risco de guerra nuclear.
Em 1974 novos acordos foram concluídos entre URSS e EUA para a
limitação de armamentos nucleares. E o SALT II que não foi ratificado.
Em 1975, reuniu-se, em Helsinque, a Conferência de Segurança e
•Cooperação Européia, onde compareceram 35 paíseS, renunciou-se ao uso
ou ameaça da força, considerou-se as fronteiras dos Estados invioláveis,
etc. Os princípios consagrados em Helsinque foram: 1) igualdade soberana;
2) não recurso e ameaça ou ao uso da força; 3) inviolabilidade das fron­
teiras; 4) integridade territorial dos Estados; 5) solução pacífica dos litígios;
6) não intervenção nos assuntos internos; 7) respeito aos direitos do ho­
mem; 8) igualdade dos povos e direito dos povos à autodeterminação; 9)
cooperação entre os Estados; 10) execusão de boa fé das obrigações assu­
midas conforme o DI. E de se observar que a ata final tem 335 páginas.
Alguns consideram que ela foi uma denota do Ocidente, que reconheceu
a hegemonia da URSS na Europa Oriental sem que fosse dada qualquer
concessão ao Ocidente. E um projeto soviético que data de 1955, com a
finalidade de que fossem reconhecidas as fronteiras nt> leste da Europa,
e naquele tempo visava introduzir a Alemanha Oriental na sociedade
internacional. A ata aprovada em Helsinque tem valor político e moral,
mas não tem valor jurídico, isto é, obrigatório.
- A 2~ Conferência para a Segurança e Cooperação Européia reuniu-se
em Belgrado em 1977. A 33 Conferência de Segurança Européia reuniu-se
em Madri em 1980. Outra reunião foi em Estocolmo (1984), e em Viena
(1986). Em 1992, ela se reuniu em Helsinque. Na verdade, a CSCE se

1439
encontra atualmente institucionalizada e ingressaram nela os países bálti­
cos e os lisiados da CEI. Em 1992 a CSCE linha 52 Estados. Em 1990 ela
aprovou a Caita de Paris, onde são estabelecidos os princípios da nova
ordem européia, que consiste no respeito aos direitos do bomem, na
democracia e 110 estado de direilo. Ela de quase permanente passou a ser
institucionalizada: a) reunião a cada dois anos dos chefes de Estado 011 de
governo; b) reunião anual dos Ministros das Relações Exteriores. Em 1991
foi criado um “mecanismo de consulta e de cooperação 110 que concerne
às situações de urgencia”. Em 1992 foi criado um AJto Comissário para as
Minorias e é adotado o princípio da criação de lima Corte de Conciliação
e Arbitragem para as cjuesiões de minorias. As origens da idéia da CSCE
parecem estar na proposta de Molotov, em 1954, de um " tratado geral
sobre a segurança coletiva na Europa". Ela se transformou em Organização
para a Segurança e a Cooperação 11a Europa (1995) e decide por unani­
midade, o que a tem paralisado. Neste mesmo ano ele se reuniu em
Budapeste.
Em 1976, EUA e URSS concluíram acordo regulamentando explosões
nucleares subterrâneas para fins pacíficos. Proíbe explosões com potência
superior a 150 quílotons e admite “que técnicos de um país presenciem
no outro qualquer detonação superior a 100 quílotons”.
Em 1977 foi concluída convenção proibindo o emprego de técnicas
de modificação do meio ambiente para fins militares ou outros usos hostis.
Em 1975 foi concluído, em Londres, o “gentlemen’s agreement” para
evitar a proliferação nuclear e foi concluido, por iniciativa dos EUA, eníre
os exportadores nucleares: EUA, Alemanha Ocidental, Grã-Bretanha,
URSS, Canadá, França e Japão. Outros países aderiram posteriormente.
Os princípios aí consagrados são: a) os fornecimentos não serão usados
para fabricar os explosivos nucleares e as instalações de materiais físseis
serão submetidas ao controle da AIEA; b) os países clientes devem proteger
as instalações e combustíveis contra riscos de sabotagem e terrorismo; c)
os países importadores submeterão ao controle da AIEA toda instalação
derivada ou copiada a partir de instalações compradas no estrangeiro; d)
o con trole da AIEA se estende ao material derivado ou copiado reexportado
pelos países importadores; e) o país importador se compromete a não
elevar acima de 20% a taxa de enriquecimento do urânio em instalação
fornecida pelo exportador ou com tecnologia fornecida por ele. Este “ acor­
do” de Londres não é üm tratado formal. Ele tem um documento com um ,-
espécie de “gentlemen's agreement” com o qual os sete países estão de. ■
acordo, mas cada um se engaja unilateralmente. Ele é de 1975, mas só se
concretizou em 1976, por meio de troca de notas entre os sete países. O
acordo de cooperação nuclear entre Brasil e Alemanha Ocidental é dé.
junho de 1975 e o “acordo” de Londres é de novembro de 1975 (sobre
esta matéria v. Simone Courteix).
Sobre as armas bacteriológicas, v. cap. LXVI.

1440
Km 1982 os EUA passaram a desejar a i ontiniiacão das negociações
SALT. sendo que Reagan passou a denomina-las de SI'ART (Sualegic Arms
Reduction Talks). Em 1991 os EUA e a URSS assinaram um tratado S TAR I
sobre redução de armas nucleares e que haverá um controle ?>i si/u. A
Rússia. Armenia, Ucrania, Bielo-Rússia e Casaquistáo deram a sna adesão.
Passou a ser desarmamento. Foi a primeira vez. em 1991, que os EUA
previram uma limitação e redução de armas nucleares. As negociações do
SALT passaram a denominar-se START em 1981. Finalmente, é de se
registrar que o tratado de 1991 teve um protocolo em 1992. Em 1993, íoi
concluído o Slart II que visa a eliminação dos mísseis intercontinentais. E
mais nos submarinos as ogivas foram reduzidas a 1.750 para cada lado.
Foram propostos alguns planos conhecidos pelos nomes dos seus au­
tores,12 bem como propostas dos Grandes, mas que não tiveram aceitação
na prática. Talvez a maior divergência entre os EUA e a URSS. além do
constante oportunismo dos projetos de desarmamento a que já nos refe­
rimos, seja a respeilo do seu controle. Os EUA pretendem um controle
integral., enquanto a URSS não o aceita.13 Esta questão atualmente perdeu
muito do seu valor, devido, por exemplo, aos satélites.
Existiam também as negociações entre a OTAN e o Pacto de Varsóvia,
denominadas de MBFR (Mutual and Balanced Force Reductions), que
visam reduzir as forças armadas na Europa Central. As reuniões começaram
em 1973. são secretas e se realizam em Viena. Os resultados eram embrio­
nários (Patrick Wajsman).
De 1973 a 1989 chamou-se MBFR e a partir desta data a denominação
passou a ser FACE ou CAFE (Forças Armadas Convencionais na Europa).
O primeiro tratado do Face foi concluído em 1990, que fixava para cada
aliança militar (OTAN e Pacto de Varsóvia) um limite de carros, peças de
artilharia e veículos blindados. Em 1992, durante reunião de cúpula da
CSCE foi concluído o FACE II, que fixa os potenciais das forças armadas
de cada Estado: EUA (250.000 homens); Rússia (1.450.000 homens); Ale­
manha (345.000 hom ens); Grã-Bretanha (260.000 homens) e França
(325.000 homens).
Pode-se assinalar que em torno da desnuclearização há uma disputa
entre os Grandes e os demais. Os primeiros, pretendendo manter o mo­
nopólio das armas nucleares, não querem que os demais possam fazer
pesquisas sobre matéria nuclear, enquanto os segundos lutam por conser­
var a liberdade de pesquisa para utilizá-la na paz e ainda não ficarem
inteiramente nas mãos dos Grandes. Atualmente, para um Estado ser
realmente uma potência nuclear ele necessita possuir não apenas as armas
nucleares, mas também os engenhos para transportá-las. Os Estados que
adotam a teoria da dissuasão nuclear consideram que a arma atômica tem
importância na manutenção da segurança internacional.
Em 1987 foi concluído tratado entre EUA e URSS para a eliminação
de foguetes de curto e médio alcance (euromísseis). Em 1991 foi realizado

1441
H a la d o f i l t r e H IJA c U R S S s o b r e r e d u ç ã o e lim ita ç ã o d e a r m a s e s t r a t é g ic a s
o fe n siv a s. E m J 9 9 3 , 11111 tra ta d o c u t r e E U A e R ú ssia p rev é u m m á x im o d e
3 .5 0 0 o g iv a s p a r a c a d a u m . O s E U A t a m b é m c o n c lu ír a m t r a t a d o s c o m a
B ie lo -R ú s s ia , U c r a n i a e C a s a q u is tã o q u e te m og ivas n u c l e a r e s e m seu s
te r r itó r io s .
E de se ressaltar que varias zonas de paz forain instituidas. Ern 1971 a
AG declarou o Oceano índico como zona de paz. O mesmo ocorreu em
1986 com a Zona de Paz e Cooperação no Atlántico Sul, que tem origem
em proposta do Brasil de 1985. Alguns Estados protestaram pela zona no
O. índico, alegando que ela violava a liberdade no alto-mar, porque a
passagem de navios de guerra seria controlada e haveria prejuízo para a
legítima defesa. Contudo, a liberdade ao alto-mar deve ter fins pacíficos.
A zona de paz atinge as águas arquipelágicas, a plataforma continental,*a
zona económica e a zona contigua. Se o Estado aceita a zona de paz ela
lambém se estende a seu mar territorial. Ñas águas sobrejacentes à plata­
forma continental os navios de guerra podem navegar, mas não podem
exercer atividades militares. As grandes potências sustentam que para exer­
cerem a legítima defesa necessitam ter presença além do seu território.
No entanto, esta posição é muito mais ampla do que estabelece o conceito
de legítima defesa (Surya P. Subedi).
Em janeiro de 1994 foi assinado acordo entre Rússia, EUA e Ucrânia
estabelecendo que a Ucrânia renuncia ao arsenal nuclear e serão desmon­
tados 176 mísseis com mais de 1.800 ogivas nucleares. O urânio enriquecido
será utilizado em usinas civis. Os EUA financiaram a operação com um
bilhão de dólares.
O tratado de Pelindaba de 1996 desnudearizou a África e o tratado
de Bang Kok de 1995 desnudearizou o sudeste asiático.
Finalmente, é de se lembrar que a Al EA (v. cap. XXVI) não cuida
propriamente do desarmamento, sendo que ela desenvolve uma “idéia de
garantia e inspeção” (Rainaud).
As garantias da AIEA só são obrigatórias se o Estado recebeu auxílio
dela. As garantias consistem em: a) examinar os planos das instalações; b)
inspeções; etc. Se o Estado viola as suas obrigações, a AIEA pode votar
sanções como a restituição dos produtos que ela lhe forneceu.
Pode-se ainda acrescentar que em 1974, na Ata de Ayacucho, oito
países latino-americanos (os libertados por Bolívar e San Martin) coinpro-
meteram-se a limitar as suas compras de armamentos.
Em 1978 reuniu-se uma Conferência de Desarmamento da ONU em
Nova Iorque (sessão especial da Assembléia Geral).
Em 1986, a Assembléia Geral da ONU aprovou resolução declarando
o Atlântico Sul zona de paz e sem armas nucleares.
Em 1987, foi concluído, em Washington, acordo entre a URSS e os
EUA para a destruição de mísseis de curto e médio alcances na Europa.
Em 1989, os EUA e a URSS, para evitar o risco de uma guerra, concluíram

1442
a c o r d o s o b r e a p r e v e n ç ã o d e a liv id a d e s m ilita r e s p erig o sa s. Km 1 9 9 0 , M
p a ís e s d a O T A N e d o P a c to d e V a rs ó v ia , n a C o n f e r ê n c ia d e S e g u r a n ç a
E u r o p é ia , r e g u la m e n ta r a m as “ F o r ç a s A r m a d a s C o n v e n c io n a is ” n a E u r o p a .
N o tr a ta d o d e R a r o t o n g a d e 1 9 8 5 , q u i n z e p a ís e s d o P a c íf ic o S u l d e ­
c la ra ra m a r e g iã o d e s n u c le a r iz a d a .
Em 1996 a AG da ONU aprovou tratado para a interdição completa
dos ensaios nucleares. Em 1997, foi concluido um tratado, em Paris, esta­
belecendo um “Partenariat” com a Rússia na OTAN. A Rússia passou a
ter um papel consultivo.
Pode-se mencionar ainda como controle de armas os tratados para a
limitação e proibição de armas químicas e bacteriológicas (v. cap. LXVI).
582. O tratado interditando as armas nucleares na América Latina
(Tratado de Tlatelolco), concluido no México, em 1967,14 determina o
seguinte: a) a utilização pelos Estados de material e instalações nucleares
é destinada a fins exclusivamente pacíficos; b) os Estados se obrigam a não
fabricar armas nucleares; c) define “arma nuclear”14' como “todo dispo­
sitivo suscetível de liberar energia nuclear de maneira não controlada, e
cujo conjunto de características o destinam a ser empregado em fins bé­
licos” ; d) o engenho para o Lransporte destas armas, se pode ser separado
delas, não é proibida a sua construção; e) criou o Organismo para a
interdição de Armas Nucleares na América Latina com sede no México;
J) as partes farão relatórios semestrais ao “organismo” a fim de mostrarem
que o tratado não é violado; g) admite inspeções feitas pelo “organismo”
e pela AJEA em virtude de acordos que os Estados concluirão com esta
organização para se beneficiarem do seu sistema de garantias; h) não
proíbe a utilização de energia nuclear pal a fins pacíficos, permitindo ainda
“explosões de dispositivos nucleares para fins pacíficos”, entretanto, os
Estados interessados nisto deverão comunicar a explosão ao “organismo”
e à AJEA (tipo e origem do dispositivo nuclear, local e o objetivo da
explosão, etc.); z) a violação do tratado ameaçando a paz internacional
deverá ser comunicada à ONU e à OEA; j) as questões referentes à apli­
cação e interpretação do tratado serãõ resolvidas pela CIJ; etc.
O Protocolo Adicional 1 estende a proscrição de armas nucleares tam­
bém aos territórios coloniais na América. O Protocolo Adicional II cria o
compromisso para as potências nucleares de não empregarem armas nu­
cleares em países da América Latina e nem ameaçarem estes países com
o seu emprego. E preciso assinalar qile a idéia de desnuclearizar a América
Latina é do Brasil desde 1962.
A grande vantagem deste" tratado para nós é que ele -não proíbe a
utilização e explosões nucleares para fins pacíficos. Por outro lado, os EUA,
URSS, França e Inglaterra se comprometeram a respeitar o tratado acima.
Na verdade, ao se evitar a disseminação de armas nucleares é necessário
que se dêem garantias aos nãb nucleares.
Outro tratado sobre esta matéria é o aprovado pela Assembléia Geral
da ONU em 1968: o tratado de não proliferação das sumas nucleares que

1443
r tic âmbito universal. Este tratado determina: a) \nn Estado que possui
armas nucleares ou outros dispositivos nucleares explosivos se compromete
a não transferi-los nem direta, nem indiretamente ao Estado que não os
possua; b) os Estados não nucleares se comprometem a não receber armas
nucleares ou dispositivos explosivos nucleares, iK-rw a fabricá-los ou adqtii-
ri-los; c) os Estados não nucleares se comprometem a aceitar as garantias
estipuladas em um acordo que deverá ser negociado e concluído com a
AIEA; d) os Estados nucleares não fornecerão a um Estado não nuclear
material físsil, equipamentos para tratamento de matéria físsil, ele; n) a
utilização pacífica da energia nuclear ser feita de acordo com os termos
do presente tratado, possuindo todos os Estados este direito; f) os Estados
não nucleares se beneficiarão da energia nuclear para fins pacíficos sem
discriminação, mediante acordos internacionais especiais através de um
organismo internacional apropriado; etc. Este tratado proíbe a proliferação
horizontal, mas não a proliferação vertical (C. L. 2orgbibe).
Qualquer emenda ao tratado tem que ser aprovada por todos os Es­
tados nucleares. Em 1975 realizou-se em Genebra uma conferência preli­
minar para a revisão deste tratado.
Este tratado foi muito criticado pelo Brasil e outros Estados não nu­
cleares, porque ele retira destes Estados, “de fato”, a possibilidade de
desenvolverem pesquisas nucleares, uma vez que ele cria uma série de
limitações. Assim se reivindicou que os Estados não nucleares pudessem
ter “dispositivos nucleares explosivos”, mas nada se conseguiu. Como se
pode verificar, este tratado é muito mais rígido para os não nucleares do
que o Tratado do México que vimos acima. Devido à importância dos
EUA, é de se m encionar a sua lei de não proliferação nuclear de março
de 1978 (texto in International LegaLMaierials, vol. XVII, ns 2, março
1978, págs. 397 e segs.).
O tratado de 1968, como escreve Mário Pessoa., cria uma nova forma
de colonialismo. Infelizmente, o Brasil aceitou o tratado de não prolifera­
ção em junho de 1997.
Em 1996, foi concluído, em Nova York, o tratado de completa inter­
dição de ensaios nucleares. Os estados se comprometem a não fazer ex­
plosão experimental de arma nuclear ou outra explosão nuclear de qual­
quer natureza. Ele cria uma organização internacional do tratado de com­
pleta interdição de ensaios nucleares com os seguintes órgãos: a) Confe­
rência; b) Conselho Executivo (5 membros). Tem várias sedes de acordo
com a região geográfica; c) Secretariado técnico. Em outubro de 1999 a
Senado dos EUA não aprovou este tratado.
583. O desarmamento, como bem demonstra Van Dyke, só poderá
ocorrer quando a organização internacional mundial se fortalecer e possuir
força suficiente para aplicar sanções eficazes aos violadores da ordem
jurídica internacional. Quando isto ocorrer, haverá um desarmamento
natural, vez que o Estado não necessitará mais de armas para a sua vida
externa.

141-1
D e s a p a r e c e r á 110 l li u ir o ta m b é m a n e u t r a lid a d e , q u e se rá su b s titu id a
p o r urna in te g ra l s o lid a r ie d a d e in t e r n a c io n a l. 1-' p o d e m o s c o n c lu ir , c o m
L in n e u <le A lb u q u e r q u e M e llo :

“ A c o n d iç ã o in d is p e n s á v e l A e x is t e n c ia d o s d e m a is e le m e n t o s
d e c o m b a te à g u e r r a é , sem d ú v id a, o a b a n d o n o d a n e u tr a lid a d e ,
p e lo m e n o s 110 s e n t id o d e p a ssiv id ad e e im p a r c ia lid a d e .”
NOTAS

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1447
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pgs 6/ 7 e segs.
2. D e n tro desta orientação estão os T ratad o s de L o c a m o ( 1 9 2 5 ) , em qu e a
A lem anha, a B élg ica e a França se co m p ro m etiam à não agressão, consagravam a
inviolabilidade das fronteiras (fran co -alem ã e belgo-alem ã), etc. E sta inviolabilida­
de era g a ra n tid a co n tra a agressão d e um E stad o a ou tro pela Itália e p e la In g laterra.

1448
3. A g a ra n tia . com o diz D elbez. co n siste não apenas m i respeitai i.» que r
g aran tid o, nías ein def'enrlc-lo cn i caso de algum a violar,fio. Assim. t> ari. 1U. do
P acto da SD N . determ inava que a "in te g rid a d e territorial e a in d ep en d en cia
política" d os seus m em bros seriam resp eitad as e m antidas Este dispositivo amevia
“ tima o b rig a çã o ju ríd ica de garantía e de assistência".
3A. N ão se pode esq uecer que a hita co n tra a guerra deve m uito ao m ovim ento
o p erario d esd e o século X IX e a In te rn a cio n a l. A L- In te rn a cio n a l era unánim e
na in te rd içã o à gu erra, bem co m o o co n g resso da 2 S In tern acio n al Socialista.
4. As partes só não poderiam re c o rr e r à guerra se o C o n selh o d ecidisse por
u n a n im id a d e, excluindo-se os votos dos litigantes. Ou, ainda. n ão se poderia
re c o rre r ñ g u e rra “contra nenhum M em b ro da Liga qu e com elas (sentenças
proferidas pela C P JI) se co n fo rm ar” .
5. E d e se assinalar que o P ro to c o lo para a solução pacífica das controvérsias
in te rn a cio n a is de 1924 (P ro toco lo de G e n e b ra ) já estabelecia q u e os signatários
.convêm q u e n ã o devem, em caso alg u m , re c o rre r à guerra.
6. K elsen , ao interpretá-lo, co nsid erava ser possível um a g u erra com “ju sta
causa”, p e ra n te o P acto de ren u n cia à g u erra. A firm a ele q u e um E stad o, ao fazer
a g u erra a o u tro q u e tenha violado o D I, n ã o está d efen d en d o in teresses nacionais,
mas in teresses in tern acion ais.
7. A lguns a u to res (Verdross) co n sid eraram qu e a in terv en ção para a defesa
do n a cio n a l n ã o violava este dispositivo, p o rq u e ela não atingia a "in teg rid ad e
te rrito ria l, o u a in d ep en d ên cia p o lítica ” . E n treta n to , A réch ag a d em o n stra pelo
ele m e n to h is tó rico deste dispositivo q u e ele tem por fin alid ade p ro ib ir qualquer
uso da fo rç a e assinala que o art. I 9, so b re os propósitos das N açõ es U nidas, na
sua a lín ea 1-, e sta b elece qu e co m p ete a ela tom ar “ m edidas coletivas eficazes para
m anter a paz” , e q u e isto “ significa q u e so m e n te são com patíveis co m os Propósitos
das N açõ es U n id as as medidas de fo rça q u e se exerçam co letiv am en te, vale dizer,
a fo rça arm a d a em pregada com o san ção d e caráter policial e com base em uma
d ecisão da O rg an ização, salvo a qu e se utiliza co m o legítim a d efesa c o n tra um
ataque a rm a d o ” .
7A. A lguns autores têm salientad o q u e os tratados de seg u ran ça coletiva têm
p ouca e fic iê n c ia m ilitar e que têm servido ap en as para o G ran d e “c r ia r ” seguidores
in co n d icio n ais.
8. E in te re ssa n te m en cion ar aqu i a ch am ad a “ D outrina R usk” , em q u e um
“pais a le g a n d o ‘ataque arm ad o’ fica livre para agir t m au to d efesa q u an d o ele
quiser” (F a lk ), q u e a nosso ver deve ser rejeita d a , vez que ela dá p o d eres muito
am plos aos E stados, que na prática acab ariam po r se co n sid erar sem p re vítimas
de ataq u e arm ad o .
8A. E ste é o seu sentido literal e q u e na verd ade é impossível d e ser realizado,
vez q u e “ os gov ern o s necessitam sem p re d e ter algum podei' arm ad o à sfla dispo­
sição” (V an D ik e). T em sido co n sid erad o po r alguns autores qu e a palavra desar­
m am en to sig n ifica tam bém o e sta b elec im en to d e um lim ite de a rm am e n to (o que
não significa reduzi-lo, uma vez qu e os E stad os q u e ainda n ão atin g iram tal lim ite
podem a u m e n tá -lo ).
8 B . U m se n tid o diverso do qu e d em o s é o de Clóvis B rigag ão , para quem
p ro lifera çã o h o riz o n tal “ traduz o n ú m e ro ex isten te de reato res d e pesquisas e
usinas n u cle a re s . In clui tam bém tod a a p a rte d e pesquisa e d esenv olvim en to que

1449
contribui fundamentalmente paru a disseminação do conhecim ento sobre o átomo
c a energia iniciar". F. proliferação vertical "traduz o que existe cm termos de
poder militar nuclear, ou seja. armas nucleares disponíveis com base na terra, no
mar e 110 ar distribuídas pelos mísseis, bombardeios, navios, submarinos e satélites".
8C . G altu ng d enuncia a "v io lê n cia estru tu ra!” que existe na d om in ação dos
p obres p elos ricos sem o uso da fo rça arm ada. Denuncia ainda a falsa segurança
e ju stifica a violência revolucionária para lutar contra os privilégios que têm os
poderosos.
8D . N ão significa isso que n ão ten h am existido tratados so b re lim itação de
arm am en tos an terio res a esta data. Assim , em 1817, o A cordo K ush-Bagot limitava
as forças navais dos EUA e da In g la terra nos Grandes L agos a irês navios de
ton elag em e arm am ento iguais para cad a um.
8E . O s tratados de paz de 1947 com a Itália, Bulgária, F in lân d ia, Hungria e
R o m ên ia p ro íb em estes países de p o ssu írem , experim entarem e fab ricarem armas
nu cleares. A m esm a proibição fig u ra 110 tratado de paz com a Austria de 1955.
9. D e fa to , são 19, porque a F ra n ça se recusa a participar das suas reuniões.
10. N ada im pede a realização d e exp lo sões subterrâneas.
10A. Os tratados de paz d e 1 9 4 7 co m Itália, Bulgária, R o m ên ia . Hungria e
F inlând ia, bem com o o tratado de paz com a Áustria e o p ro to co lo III com a
A lem an h a O cid en tal, de 1954, p ro íb e a estes países de fabricarem arm as nucleares,
mas n ã o p ro íb em que eles possuam tais arm as.
11. V. capítu los Regiões P olares e E sp aço Exterior.
II A . A ten d ên cia para se p ro ib ir o uso do fundo do m ar para fins que não
sejam p a cífico s surgiu em 1958, na C o n fe rê n cia de G enebra, p o r p ro p osta da índia
qu e p ro ibia co nstru ções m ilitares na plataform a co n tin en tal. Esta proposta não
foi aprovada. O uso do leito d o m ar para fins militares ap resen ta vantagens: d)
não está su je ito a observação p o r satélite; b) pode-se c o lo ca r su bm arino tipo
“P olaris” sem iperm anen te; c) bases d e m ísseis; etc. A U RSS, q u e tem gran de frota
de su b m arin o s, desejava que fosse in clu íd a n o tratado a p ro ib içã o d e colocação
de d e te cto re s d e subm arinos. O s EU A desejavam que nada im ped isse a colocação
de d ete cto re s. Esta lese no rte-am erican a fo i a consagrada.
I I B . A lgum as críticas nos E U A têm sido dirigidas ao aco rd o d o SA LT: a) a
lim itação d e mísseis antibalísticos faz co m q u e a população d e cada superpotência
fique co m o refém da outra; b) o aco rd o sobre armas estratég icas ofensivas dá
su p eriorid ad e à U RSS. O significado d e algum as siglas usadas n o S A L T é o seguinte:
ICBM (m íssil balístico in te rco n tin e n ta l); M IRV (mísseis d e ogivas m últiplas inde­
p e n d e n te s ); ABM (míssil an tib a lístico ); A LBM (míssil b alístico lan çad o do ar).
12. O P la n o Lilienthal estipulava q u e seria formada um a au to rid ad e interna­
cion al q u e teria o m onopólio da p ro p ried ad e de material utilizado na fabricação
de arm as n u cleares, bem co m o a p en a s ela poderia fabricá-los. O P lan o B anich
(1 9 4 6 ) se fu n d am en ta no an terio r e p ro p õ e que no âm bito da O N U seja criada
a A u torid ad e d o Desenvolvim ento A tô m ico (ficaria depositária de tod os os co n h e­
cim e n to s em m atéria atôm ica) e q u e n ão m ais se construíssem b o m b as atôm icas,
bem co m o se destruíssem as existen tes. P ro p õ e ainda qu e n o C o n selh o d e Segu­
ran ça d e ix e d e existir o veto em assuntos atôm icos e o e sta b e le c im e n to de uma
in sp eção. O P la n o Rapacki (1 9 5 7 ) p ro p ô s a d esnuclearização da P o lô n ia, T checo-
E slováquia e d a A lem anha. Pode-se d izer q u e estes acordos en tre os EU A e a U RSS

1450
são um resu ltad o da coexistência p acífica (v. n ” 68) ou d isiiu sã o (a palavra clis-
tcn são foi utilizada pela prim eira vez n o p lan o da política in tern acio n al, cm 1933.
110 C o n g resso M undial das Forças da Pa/, em M oscou, qu e falo u em distensão
p o lítica e m ilitar na F.uropa) ( E d m u n d o ja n Osmanczyk — E n ciclo p ed ia Mundial
de R e la cio n e s In tern acion ales y N acio n es U nidas. 1976). O P lan o K apacki não foi
ad ian te devido à tensão existen te, na ép o ca , en tre as duas A lem anhas.
P ode-se a cre scen ta r que a détent.e" co m o um co n ceito ju r íd ic o fo rm al” , surgiu
n o in íc io da d écad a de 1960 por p ro p o sta do G eneral D e G au lle n o sen tid o de
ser um novo p erío d o nas relaçõ es da E u ro p a, haveria um a E u ro p a do A tlântico
aos U rais. Esta co n cep ção d esap areceu (Edward M cW hinney).
13. Ela só aceita para o que fo r d estru íd o , mas não so b re o q u e perm an ecer
em estoque.
14. A p rim eira reu nião p relim in ar so b re a d esnu clearização da A m érica Latina
foi ce le b ra d a a convite do governo d o M éx ico em 1964. ”
14A. O s tratad os que versam so b re m atéria nu clear usam a exp ressão “artefato
n u cle a r” p ara “ a explosão an o d in a" e “ arm a nu clear" para “ q u alq u er artefato
q u e seja susceptível de liberar en erg ia n u c la r de form a não co n tro la d a e q u e tenha
um c o n ju n to d e características pró p rias para seu em prego co m fins b é lico s” (Guido
F ern a n d o Silva S o ares). Salienta este ju r is ta , iro n icam en te, qu e um a rtefato para
ser co n sid e ra d o um a bom b a é n e ce ssá rio qu e nele esteja escrito se r u m a bom ba.

1451
LIVRO X

DIREITO DE GUERRA E NEUTRALIDADE

Obs.: Nesta parte incluímos também a guerra civil, apesar de ela pertencer ao
Direito de Paz. Foi a í que tratamos da responsabilidade e intervenção na
guerra civil, bem como vimos os beligerantes e insurgentes. Entretanto, como
certas leis da guerra são aplicadas na guerra civil, bem como por razões
meramente didáticas, resolvemos incluir a guetra civil neste “livro”, quando
juridicamente ela fa z parte do Direito de Paz. Outra observação a ser feita
é que o direito de guerra está sendo denominado de D. dos Conflitos Armados,
tendo em vista que a guerra é atualmente um ilícito. Entretanto, podemos
repetir com Tom Farer que ao usar a palavra guerra é um meio de se proteger
do desuso “um símbolo verbal poderosamente emocional”.

1453
CAPÍTULO LX

A GUERRA: NOÇÕES GERAIS1

584 — Conceito; 585 — A guerra n a história do DI; 586 — A guerra


justa; 5 8 7 — O “ju s ad bellum”; 5 8 8 — O “ju s in bello”esu a sanção;
5 89 — Guerra Total; 590 — A guerra e o pensamento econômico; 591
— Classificação das guerras; 5 91A — Observação fin al.

584. A guerra2 não é fácil de ser conceituada perante o DI. Duas


correntes sobre tal matéria têm se manifestado: a) a subjetivista (Strupp)
afirma que a guerra só existe quando há o “animus belligerandi”, que
sozinho cria a guerra; b) a objetivista (Despagnel) considera que a prática
de atos de guerra cria o estado de guerra, independente da intenção. A
maioria dos autores (Rousseau, Accioly) tem salientado que ela só existe
quando os dois elementos são reunidos: o objetivo e o subjetivo.
O elemento objetivo é a luta armada entre Estados e o subjetivo é a
. intenção de fazer a guerra.- A reunião destes é que cria o denominado
estado de guerra, que é regulamentadp^QX.BQjm^^EáBJ[k5jA ssim sendo,
nenhuma guerra surge por acaso, mas sempfê~põr”vontade do Estado4
(Balladore Pallieri).
A guerra se distingue, assim, daqueles atos em que é utilizada a força
(“acts short of war”) mas que não criam o estado de guerra, vez que não
têm o elemento subjetivo da guerra. Tais atos, por exemplo, não criam
direitos e deveres de neutralidade para os terceiros Estados nem provocam
o rompimento de relações diplomáticas entre os Estados participantes de
tais atos (ex.: conflito sino-indiano de 1962). Tais atos, por outro lado,
compreendem o uso efetivo da força armada, mas de modo limkado e
restrito a determinada região.
Os doutrinadores (Jessup) têm salientado que atualmente vivemos em
um status intermediário que não é de paz nem de guerra: a guerra fria.’
Ela se caracteriza por uma paz com uma série de conflitos localizados com

1455
a u tiliz a ç ã o d e fo r ç a a u n a d a ( e x .: Y ie liv a in e ), se in q u e e s ta c rie um e s ta d o
d e g u e r r a . T e m sid o o b s e iv a d o ( S e r e n í) q u e o D l n ã o c o n h e c e o r e f e r id o
status e q u e tais c o n f lit o s n ã o a lte r a n ) a paz.
Na verdade, a última opinião enunciada é a que nos parece a mais
correta, porque a paz não é rompida. Entretanto, não podemos deixar de
reconhecer que existe um status intermediario no campo da política, mas
que ainda não atingiu o direito. E realmente uma ficção, sobretudo em
certos casos, dizer-se que nem toda utilização de força armada é guerra.
Entretanto, esta ficção, isto é, a distinção entre atos com a utilização de
força armada que fazem surgir a guerra e atos que não fazem, é da maior
conveniencia e vantagem parã-à atual sociedade internacional. A sua gran­
de vantagem é que permite evitar o aparecimento de uma guerra em que
o emprego da força é total e quase sem limitações, bem como se estendendo
a toda a humanidade.
Podemos definir a guerra como sendo: “ l i m a luta arm ada f n l , r e F.sta- .„
dos, desejada ao menos por um~deles e empreendida tendo em vista um
interesse nacional" (Uêlbez). Podemos concluir que o conceito de guerra
é um conceito legal e formal, visto que a existência de “luta” não é
suficiente para criar o estado de guerra, que produz efeitos jurídicos in­
ternacionais.6 Outra definição é a de Clausewitz: “a guerra é um conflito
de grandes interesses resolvido por sangue, e é somente nisto que ela se
distingue dos outros conflitos”. Ou, como diz Holsti: que um “approach”
clausewitziano considera a guerra em termos racionais como uma forma
de política visando atingir'certos fins. Moltke considerava que o início e
o fim da guerra eram assunto do político e só a estratégia se desenvolve:
de modo autônomo. Para Hegel, nas guerras todos os beligerantes t ê m \
direito ao que desejam, e esta contradição é resolvida por um novo direito,
que surge da guerra. Pode-se lembrar a afirmação de John Vasquezde que
“o preço do poder mundial é a morte”. E mais, o comportamento político
conduz não à paz, mas à guerra, vez que o Estado faz uma imagem que o,
mundo é inseguro. Gilpin afirma que o Estado hegemônico constrçi um
sistema para defender os seus interesses. Ou, como tem sido assinalado, a
guerra é o meio que uma “cultura” tem para “manejar determinaji^si­
tuação".
José Luís Fernandes — Flores v de Funes escreve; “a guerra é um
produto da irracionalidade do homem, uma conseqüênçia do instinto
humano escassamente controlado pela razão’; . E mais adiante o jurista
espanhol afirma: “o ser humano é fundamentalmente egoísta, relativamen­
te social e escassamente racional”.
O nosso estudo se prende apenas ao aspecto jurídico da guerra, isto
é, a sua regulamentação pelo DI.' A guerra é um status jurídico.
Na verdade, a caracterização de guerra não é fácil, sendo quejá houve
conflitos armados no século X X sem que houvesse guerra (uma longa fase
da guerra sino-j apon esa), e já houve guerras sem combates (Polônia e

1456
Lituânia). Em 1935, quando a liália invadiu a Abissínia. ambas as partes
diziam que não era guerra. Mas a Liga das Nações interpretou como sendo
guerra. Em 1933, 110 conflito sino-japonés, o Conselho da Liga interpretou
como nâo havendo estado de guerra. Em 1985, a Grécia colocou fim ao
estado de guerra contra a Albânia, que durava desde 28-10-40. Guerra, no
fundo, é aquilo que a sociedade considera como guerra.. É um conceito
político e jurídico. Devido ao grande número de guerras sem que fossem
consideradas como tais, bem como devido ao falo de a guerra ser consi­
derada um ilícito, é que se fala atualmente em “conflitos armados inter­
nacionais”, que têm sido versados pelo direito humanitario (Convenções
de Genebra de 1949 e protocolos de 1977).
Pode-se acrescentar que toda guerra é um conflito armado intercon­
tinental, mas nem todo conflito armado internacional é uma guerra.
Após os atentados de 1 1 /9 /2 0 0 1 nos’ EUA a palavra guerra passou a
ser usada em um sentido altamente impreciso como guerra ao terrorismo.
A palavra guerra tem uma conotação emocional e os governos a utilizam
indistintamente para situações graves.
A guerra é o estágio mais grave nas relações internacionais. Ela é um
ilícito ou mesmo um crime internacional. Os conflitos armados que não
sao guerras não obrigam os terceiros Estados ao estatuto de "neutralidade,
os tratados entie as~pãrtès~èm luta não são suspensos ou rompidos, nem
há necessariamente o ronrpãmejÍLÇL.dg.-reja£pês diplomáucas. A guerra é
um~sfãlus jiiridlco que foi definido em uma evolução durante séculos. O
conflito armado é uma noção humanitária que surge no século XX . Ele
não rompe o status de Paz.
Conflito armado internacional éje fin id o pelas Convenções de Gene­
bra de 1949 como atbrangendo a “guerra declarada ou “qualquer outro
conflito aripado”. O Protocolo I de 1977 acrescenta como pertencendo a
esta categoria “os conflitos armados em que os povos lutam contra a
dominaçàocolonial e a ocupação TiTrangeíra^c5ntrã~^Teginigs racistas.
no exercício do direito dos povos à autodeterminação...”.
O D. Humanitário é formado por normas quê~não podem ser trans­
gredidas mesmo que os estados não tenham ratificado os tratados.
585. A guerra sempre existiu entre os povos e em todas as épocas. Ela,
entretanto, de um modo geral esteve sempre sujeita a determinadas nor­
mas. O uso da força sempre leve uma certa regulamentação, assim no
Código de Manu encontramos normas sobre prisioneiros de guerra.8 Pode-
se dizer que a guerra é a agressão a nível de Estado. Os modernos estudos
de Etologia (Konrad Lorenz — Agressão, 1973) têm mostrado que ela
existe entre os animais, bem como estes têm um “instinto” de território.
Assim sendo, aparece igualmente entre os homens. Lorenz sustenta que
a agressão é um instinto como os demais e contribui para a conservação
da espécie. Ashley Montagu (A Natureza da Agressividade Humana, 1978)
sustenta que os comportamentos humanos nãó são determinados apenas
geneticamente, mas lambem pelas experiências que são acumuladas du­
rante a vida. Se o homem for dotado de agressão, nada poderá ser feito.
As causas das guerras são econômicas e políticas. Tein-se sustentado que
a guerra, sendo impessoal, não dá vazão à agressividade. Sustenta este
autor que só o homem e certas espécies de formiga fazem a guerra. Morton
. Fried, ao tratar da evolução da atividade guerreira, assinala que ela au­
mentou com o aparecimento do Estado (A Evolução da Sociedade Política,
1976). A visão de Freud sobre a guerra vai ser explicada com as palavras
de Sergio Paulo Rouanet (Mal-estar na Modernidade, ]993): a guerra
corresponde a realidades psíquicas profundas. Ela tem a função de grati­
ficar os impulsos agressivos dos homens, que a civilização tenta domesticar,
mas sem êxito durável, porque eles estão entre as forças motrizes mais
poderosas do comportamento humano. A guerra é, portanto, uma regres­
são, eticamente lamentável, mas psicologicamente fundada... As frustrações
geram violência. Existem psicotrópicos para controlar a agressão, mas não
se sabe como atuam. O homem é o único animal que tem conflitos intra-
espécies, isto é, a guerra. Na região do Sudão, entre 12500 a.C. e 10000
a.C-, no período, já há sinais de guerra (Gabriel Camps). A guerra faz
parte do conhecimento de uma cultura que o grupo herda (Margaret
Mead).
Seguindo a Georges Minois podemos salientar que no Antigo Testa­
mento é Deus quem toma a iniciativa para os combates. No Deuteronômio
as cidades fora do território de Canaã, se não aceitarem a paz, deverão
ser destruídas e os homens mortos, guardando-se com o butim as mulheres,
crianças e o gado. Se a cidade está no território de Canaã, adota-se o
costume do “hérem”, e tudo deverá ser exterminado, para se evitar a
contaminação dos falsos deuses através dos vencidos. Javé dirigia todas as
guerras e exércitos. Ele só aprovava as guerras justas, como as que puniam
os insultos.
Salienta Minois que as religiões fundamentaram a guerra no sagrado
e com isto reconheceram o aspecto irracional da guerra, que tem raízes
no inconsciente. Ela surge do inconsciente coletivo. O Novo Testamento
não cuida da guerra, vez que a sua preocupação é com a vida interior do
indivíduo.
Parece que o primeiro código relativo ao direito de guerra foi o do$
sarracenos, baseado no Alcorão e nas decisões de Maomé e seus seguidores
(Gerald Adler). Ele proibia “projéteis” incendiários, envenenamento de
poços e cursos de água, etc. Na Idade Média a regra era a morte e a
escravidão- No final do século XVII já se considera como bárbara a decla­
ração de que não seria dado quartel.
O próprio Dl surgiu como sendo eminentemente um direito de guerra.
Neste sentido, estão inúmeras das primeiras obras do Dl: Legnano —. “De
bello” (1360); Gorco — “De bello, justo” (1420); Martin de Lodi — “De
bello” (séc. XV); Wilhelmus Mathiae — “Libellus de bello justo et licito”
(1 514); Francisco Arias de Valderas— “Libellusde belli insliiia iimistnivivt”
(1533); A. Guerrero — “Traclalus de bello justo el injusto" (1543); Fran­
cisco de Vitoria — “De Jure belli” (1577); F. Martini — “l)e bello el
duello” (1589); Baltazar de Ayala — “De jure et officiis bellicis el disciplina
militan” (1581); Pietro Belli — “De re militan et bello” (1558); Alberico
Gentili — “De jure belli” (1958). O próprio Grotius colocava a guerra
antes da paz, “De jure belli ac pacis” (1625). A guerra sempre teve na vida
internacional um papel relevante, servindo para que os Estados por meio
dela resolvessem os seus litígios e defendessem os seus interesses. O DI,
segundo Castren, foi originariamente um direito de guerra, urna vez que
as relações entre os Estados eram, nos primeiros tempos, de “natureza
essencialmente militar”.8'' No século XVI só houve 25 anos sem grandes
operações militares na Europa, enquanto no século XVII só existiram sete
anos sem guerra importante entre os Estados (Perry Anderson).
Tal fato ocorreria em virtude de vários fatores: a) as relações econô­
micas não tinham eficácia; b) a guerra tinha grande atração para os homens
(Sereni). Por outro lado, a guerra não envolvia todos os habitantes dos
Estados, mas, pelo contrário, era assunto de uns poucos. E de se observar
que não existia uma perfeita distinção entre o estado de paz e o de guerra.
Tal fato era devido apenas à freqüência das guerras, mas também à con­
fusão entre guerra pública é privada, como veremos adiante.
A existência de contigüidade territorial parece determinar maior opor­
tunidade para o aparecimento da guerra. Para Bremer a questão territorial
até 1815 deu origem a mais de 70% das guerras; de 1815 a 1914 a por­
centagem foi de 58%; de 1918 a 1941 foi de 73% e de 1945 a 1989 foi de
47% . Segundo Luard, em certas épocas as guerras foram ocasionadas por:
aquisição de trono, proteção de religiões e aquisição de território, inde­
pendência ou, ainda, instalar governos aliados em territórios vizinhos. Os
Estados estão mais interessados nos recursos dos territórios do que nestes.
As guerras visando lucros comerciais foram poucas. As guerras por rivali­
dade são criadas por toda a sociedade que cria imagens hostis do adversário
influenciando as lideranças. E a política interna que define o “timing”
para o início da guerra (este parágrafo é fundamentado em John A.
Vasquez).
Com a evolução do DI e o início de uma institucionalização da socie­
dade internacional a nossa matéria passou a ser eminentemente um direito
de paz. A guerra deixou de ser uma sanção, ou um modo violento de
solução dos litígios internacionais, para ser um ilícito internacional. Um
dos fatores que contribuíram para a evolução neste sentido foi a intensi­
ficação das relações internacionais e, em conseqüência, multiplicando as
ocasiões para guerras. Diante deste fato os Estados passaram a procurar
resolver os litígios internacionais por modos pacíficos (Quincy Wright).
Outro fator que levou os Estados a esta posição foi o processo de demo­
cratização, que fez com que os povos passassem a participar na vida política,
no aspecto interno e externo, do Estado.

1459
Apesar de lodos os belos argumentos os conflilos armados continuam
a proliferar: o) de 1945 alé 1990 houve 140 conflilos armados, sendo que
a maior parte no 3" Mundo (M. Bedjaoni); b) “nos últimos 45 anos ocor­
reram no Terceiro Mundo 125 guerras que provocaram 40 milhões de
mortes” (Robert S. McNamara em 1992); c) o Jornal do Brasil de 29-11-92
afirma que naquele momento esta va rn ocorrendo 30 guerras internas (Hai­
ti, Nicarágua, El Salvador, Georgia, Marrocos, Libéria, Angola, Etiopia,
Somália, Sudão, Moçambique, Sri Lanka, ele.) e urna guerra internacional
entre a .Armênia e o Azerbaijão, pelo enclave de Najorno Karabakh, de
armenios localizados no Azerbaijão. Desde 1945 houve 250 conflitos ar­
mados internos e internacionais que causy am baixas de 170 milhões d.e,
pessoas. (Bassiouni — 1999). A maior parteados conflitos são internos €
não são tratados entre forças armadas organizadas, mas entre bandos rivais
indisciplinados sem estrutura de comando, mas os combates são de enver­
gadura (Philipe Bretton).
Entre 1740 e 1974 houve 366 grandes guerras e morreram 85 milhões
de pessoas. Em dois terços delas o agressor foi o vitorioso (Gastón Bouthoul
e René Carrère).
586. Desde a Antiguidade há uma preocupação em se classificar a
guerra de justa e injusta. Era assim uma classificação que de certo modo
procurava condenar uma determinada categoria de guerras.
Na Grécia a noção de guerra justa não existia. Em Roma já se consi­
deravam apenas determinadas guerras como sendo “ pia e justa” .9 Em Roma
a guerra sem quartel era feita contra escravos, soldados amotinados e
piratas, não se confundia com a guerra justa. Até 170 d.C. a Igreja Cristã
não considerava a guerra como sendo moral em nenhuma circunstância.
A análise da noção de guerra justa se desenvolveu com a filosofia cristã
na Idade Média. Entretanto, alguns destes filósofos (Tertuliano, Lactâncio)
condenavam toda e qualquer guerra. A condenação de toda guerra é
abandonada definitivamente a partir do século V. É Santo Ambrosio, no
“De Officiis”, que começa a achar a guerra como justificada em celtas
circunstâncias. Outros (Santo Ambrosio e Santo Agosdnho) admitiram a
existência de guerra justa, que ocorreria quando houvesse uma justa causa,
isto é, quando a gueFra visasse reparar um_ilícito.10 Santo Agostinho prega
a paz social. No período carolíngio o que interessa é a paz interior, e
pode-se fazer guerra a outros povos. A paz na Idade Média é apenas um
espaço de não-violência (Henri Dnbois). Santo Tomás observa que a guerra
para ser justa deve ter: a) causa justa: b) intenção reta nas hostilidades
(evitar fazer o mal e procurar fazer o bem): c) que seja declarada pela
autoridade competente. A guerra para ele deve ter por fim © bem comum.
Este estudo da guerra justa é retomado por Francisco de Vitória e Francisco
Suárez, que o aprofundaram. Assim, para Vitória a única das causas justas
é “a violação de um direito”; não é qualquer violação de um direito que
justifica a guerra, “porque a grandeza do delito deve ser a medida do
castigo” e, em conseqüência, os delitos leves não devem acarretar a guerra.
Em Suárez se observa explicitamente que um dos requisitos para a guerra
ju sta é q u e a " g r a v e v io la çã o (lo d ir e it o " n ã o possa s e r r e p a r a d a fie o n tro
m o d o .’" '
No final da Idade Media a guerra é o status normal. Os príncipes
sempre consideram os seus litígios como sendo justos. Guerra justa é a
empreendida pelo Estado. Não se aplica mais a Tregua de Deus. Comba-
te-se até mesmo quando necessário na sexta-feira e no domingo. A guerra
é selvagem e surge a necessidade de regulameniá-la, e as cortes dos prín­
cipes atuam comojuízes. Regulam en ta-se o sítio e o regime dos prisioneiros
de guerra. O rei podia declarar guerra mortal e hasteava então bandeiras
vermelhas. Este parágrafo é tirado de Colette Beaune.
No século XVI, com a Reforma e a diminuição do poderio do Papa,
a concepção de guerra justa sofreu profundas transformações. Maquiavel
considera que a guerra, sendo necessária, passa a serjusta.11 Já para Erasmo
a guerra era o “supremo mal".
Nos séculos seguintes se afirma a tese de que sendo o Estado soberano
cabe a ele apreciar se a guerra deveria ser realizada ou não. Moser (século
XVIII) considera a guerra justa da doutrina medieval como sendo “dou­
trina moral”. Para James Turner Johnson a tradição moral ocidental só
justifica o uso da força para proteger e preservar valores. A doutrina da
guerra justa veio ressurgir no século XX , com Strisower, Kelsen e Gugge-
nheim, que sustentam ser justa a guerra que for uma “reação contra
violação do Dl Positivo”. Ao contrário dos autores medievais, eles não
admitem a guerra contra uma violação do D. Natural como justa.
Atualmente a própria doutrina católica modificou a concepção de
guerra justa. Em 1944, o Papa Pio XII condenou a guerra de agressão.
João XXIII, na “Pacem in Terris” (1963), afirma que a guerra não “é um
meio apto para reparar um direito violado". Só se poderia falar de guerra
justa em caso de legítima defesa. Esta posição decorre dos meios de des­
truição à disposição dos Estados.11'
Hoje em dia podemos dizer que a noção de guerra justa é a mesma
de guerra legal. Esta é também a doutrina norte-americana de guerra justa
(Robert W. Tucker).
E preciso lembrar que o judaísmo e o Islã também se preocuparam
com a conduta da guerra, e no Antigo Testamento a guerra era determi­
nado, por Deus.
Uma observação final é a de que a noção de guerra justa pertence à
política internacional e à interna, sendo uma tentativa de colocar a política
dentro da moral (Jean Bethke Elshtain).
Para Michael Walzer guerra justa é uma guerra limitada regulamentada
por um conjunto de regras que protegem os não combatentes. Assinala
este autor que a agressão é o único crime que os estados c o m e c e m contra
outros estados.
587. O “tus ad bellum”, isto é. Q .d ix _ ei.t0 _ _________
compreendido com o estudQ jaglim inar sobre a distinção entre a guerra
~ra privada. O direito à guerra inicialmente não era privi-

1461
No período medieval encontram os guerras entre nacionais de um
mesmo reino ou entre EsiadosTAs primeiras eram denominadas de guerras
privadas. As guerras privadas tiveram a desaprovação da Igreja e enfraque-
ceram a Cristandade. Em conseqüência, foram proibidas no século XIV
na França e no século XV na Alemanha^
No século'XVl, GéñBlí fez a distinção ferttre guerra pública e guerra
privada ao escrever “Bellum est armorum publicorum justa contentio”
A (“De Jure Belli”, 1598).12 j^JM _SStajMsròpeão é importante, porque so-
• mente lhe interessa diretamente a guerra pública, enquanto a guerra
\ privada (guerra civil) só tem interesse quando ameaça a paz internacional,
\ oü, aindaTpor um aspecto humanitario (art. 3a"das (in venções decTénebra
' de 1949 sobre prisioneiros de guerra, etc.).
Assim sendo, o “jus ad bellum”, em certo período da história, per­
tencia não apenas ao Estado, mas também aos particulares.
. . . O “jus ad bellum”, no DI, com a afirmação da soberania do Estado e
o fortalecimento do poder central, passou apenas ao Estado.
Até o século X X o “jus ad bellum” pertenceu ao Estado. O DI regu­
lamentava a guerra entre Estados. Atualmente, com a renuncia à guerra^
(v. capítulo anterior), os Estados perderam, teoricamente, o “jus ad bel­
lum”. O usó da força armada está se tornando um monopolio da ONU e
o seu emprego por ela não cria propriamente uma guerra, porque é apenas
umá ação de polícia internacional.
O direito à guerra tem sido reconhecido atualmente aos movimentos
de libertação nacional a partir de 1960 (Heather A. Wilson).
Entretanto é de se lembrar que tem predominado na doutrina e na
jurisprudência o princípio da igualdade entre beligerantes, mesmo quando
uma guerra é declarada ilegalmente. O “jus in bello” é aplicado de modo
igual ao agressor e ao agredido. Este princípio tem o seu fundamento no
aspecto humanitário do direito de guerra (Meyrowitz). Por outro lado,
muitas vezes é difícil de se distinguir quem é realmente o agressor e o
agredido. Pode ser lembrado ainda que só recentemente foi possível se
definir a agressão. Em sentido contrário ao princípio da igualdade está
Seyersted, para quem “um criminoso não pode ter os mesmos direitos que
a polícia”.
588. O “jus in bello” é a regulamentação da guerra. $ão, por exemplo,
as normas qutTTeguIajn a conduta dos beligerantes. ¿le é form ¿lfljp.^as
normas internacionais que vigoram após o início da guerra (L.Kotzsch).~
"S ã o as iiõrmas aplicadas no « ta d o de guerra. A distinção entre “jus in
bello” e “jus ad bellum” parece que só se tomou clara no século XVIII,
com Vattel.
Ele se desenvolveu através do costume internacional, já se encontrando
normas que p ertencem * ele desde a Antiguidade. As normas costumeiras
começaram a se transformar em convencionais no decorrer do século XIX.
Durante a guerra de Secessão Lincoln encarregou Lieber de fazer um
c ó d ig o p a r a a c o n d u la d o s e x é r c i t o s d o N o rte q u e tin lia u m a sp e c to
h u m a n itá r io .
Deste modo, podemos afirmar que a ação dos beligerantes não é livre
e que sofre limitações, bem como eles estão submetidos aos princípios de
humanidade (v. as Convenções de Genebra sobre prisioneiros de guerra).
Como observa Cançado Trindade, a Declaração de São Petersburgo (1868)
já procurava conciliar a necessidade militar e a idéia de humanidade.
Carlos Calvo e FauchiJJe salientaram que o direito de guerra está sujeito
a dois princípios: o da necessidade e o de humanidade. O primeiro se
desenvolveu na Alemanha,ls afirma que na guerra, para se conseguir a
vitória, não há qualquer restrição nos meios a serem empregados. E a tese
de Hartman, que nega as leis da guerra. Não haveria assim leis da guerra.
Esta teoria que tem o seu fundamento na “razão de Estado” , é meramente
política e não encontrou acolhida no Dl. Assim a Convenção de Haia de
1907 sobre leis e costumes na guerra terrestre, no sen regulamento anexo.

dos meios de. prejudicar ft..ininiigQ ”-X L jM ^ iiã a .d ^ humanidade- visa-


tnO!(^...dajLerftssijjla4ieJ4 Na verdade, negar a exis-
tência Hõ prTmênx) princípio é desconhecer a realidade da guerra; e negar
o segundo é transformar a guerra em algo que está fora do direito. Os
dois princípios coexistem,13 apesar de no futuro só dever existir o princípio
de humanidade.
Segundo Sereni as principais convenções multilaterais que regulamen­
tam o direito de guerra são as seguintes:
1) Declaração de Paris sobre guerra marítima, de 1856;
•» 2) Convenção de Genebra para a melhoria da sorte dos ^militares
feridos nos exércitos em campanha, de 1864 (Convenção da Cruz
Verriíelhi);
3) Declaração de São Petersburgo para proscrever, em tempo de
guerra, o emprego de projéteis explosivos ou inflamáveis (1868);
4) Convenção de Haia às leis e usos da guerra terrestre com um
regulamento em anexo (1899);
» 5) Convenção para.a .adaptação à. guerra marítima dos princípios da
Convenção de Genebra (Haia, 1899);
6) Declaração de Haia de 1899 proibindo o lançamento de projéteis
e de explosivos dos balões (não está ¿rn vigor);
7) Declaração de Haia de 1899 proibindo o emprego de gases asfi­
xiantes ou deletérios;
8) Declaração de Haia de 1899 proibindo o emprego de projéteis
que explodem no corpo humano;
e 9) Convenção de Genebra de 1906 sobre o melhoramento da sorte
dos doentes e feridos;
10) A III Convenção de Haia de 1907 relativa ao rompimento das
hostilidades;

1463
11) IV Convenção de Haia de 1907 relativa às leis e usos da guerra
terrestre com regulamento em anexo;
12) V Convenção de Haia de 1907 sobre direitos e deveres dos neutros
em caso de guerra terrestre;
13) VI Convenção de Haia de ”1907 relativa ao regime dos navios
mercantes inimigos no início das hostilidades;
14) VII Convenção de Haia de 1907 relativa à transformação de navios
mercantes em navios de guerra;
15) VIII Convenção de Haia de 1907 relativa à colocação de minas
submarinas automáticas de contato;
16) IX Convenção de Haia de 1907 sobre o bombardeamento por
forças navais em tempo de guerra;
17) X Convenção de Haia de 1907 para a adaptação à guerra marítima
dos princípios da Convenção dè Genebra;
18) XI Convenção de Haia de 1907 relativa a certas restrições ao
exercício do direito de captura na guerra marítima;
19) XII Convenção de Haia de 1907 sobre direitos e deveres dos neutros
em caso de guerra marítima;
20) Declaração de Haia de 1907 relativa à proibição de lançar projéteis
e explosivos dos balões (não está em vigor);
21) Protocolo de Genebra de 1925 sobre a proibição da guerra química
e bacteriológica;
« 22) Convenção de Genebra de 1929 sobre o melhoramento da sorte
dos feridos e doentes;
„ 23) Convenção de Genebra de 1929 sobre o tratamento de prisioneiros
de guerra;
24) Protocolo de Londres de 1936 relativo ao uso da força por parte
de submarinos contra navios mercantes;
25) Convenção para melhoria da sorte dos feridos e enfermos dos
exércitos em campanha (Genebra, 1949);
26) Convenção para melhoria da sorte dos feridos, enfermos e náu­
fragos das Forças Armadas no Mar (Genebra, 1949);
27) Convenção relativa ao tratamento de prisioneiros de guerra (Ge­
nebra, 1949);
a 28) Convenção relativa à proteção dos civis em tempo de guerra (Ge­
nebra, 1949);
29) Convenção de Haia de 1954 sobre a proteção’ dos bens culturais
em caso de conflito armado;15A
» 30) P rotocolos I e II às Convenções de Genebra de 1949 (1977);
31) Convenção de T972 proibindo a fabricação e aperfeiçoamento de
armas bacteriológicas ou tóxicas, e estabelece ainda sobre a sua
destruição (assinada em Londres, Moscou e Washington);
32) Convenção de 1981 sobre a interdição ou a limitação do emprego
de algumas armas clássicas que podem ser consideradas como

1464
produzindo efeitos traumáticos excessivos ou como ferindo sem
discriminação (ONU — D. de Nova York);
33) Convenção sobre a Proibição de Utilizar Técnicas de Modificação
Ambiental com Fins Militares ou outros Fins Hostis (Genebra.
1977).
34) Convenção sobre interdição de aperfeiçoamento, de fabricação,
de estocagem e do emprego de armas químicas e sobre sua desti-
nação (Nova York, 1993);
35) Protocolo modificado sobre a interdição ou a limitação do emprego
de minas, armadilhas e outros dispositivos (Genebra, 1996).
Observa o intemacionalista italiano que algumas destas convenções,
concluídas antes da 2a puerra Mundial, não estão em vigor, mas que muitas
vezes elas codificam normas costumeiras que estão em vigor. Outras con­
venções foram substituídas por outras, mais modernas, entretanto há Es­
tados que apenas ratificaram as mais antigas.U,B Ao lado dos tratados, têm
sido apontados como fontes do direito de guerra os regulamentos militares
internos das grandes potências (Ch. Rousseau).
Nos conflilos armados atualmente são aplicados os textos internacio­
nais do D. de Haia (as Convenções de 1907), o D. de Genebra, denominado
Humanitário (convenções de 1949 e 1977), e o D. de Nova York (conven­
ções concluídas sob os auspícios da (1981).
O “jus in bello” possui sanções que procuram reprimir a sua violação.
Esta acarreta a responsabilidade internacional do Estado. Como sanções
temos a opinião pública nos Estados neutros, as represálias e a punição
do responsável pêla violação. As represálias são o que mais nos interessa;
Accioly apresenta três condições para a sua validade: 1) só podem ser
usadas “depois que o beligerante que as emprega esgotou inutilmente as
advertências contra os atos ilícitos do outro beligerante; 2) se elas podem
ser eficazes”; 3) “o seu rigor não deve exceder o da infração que se pretende
coibir ou a que se responde, com o intuito de evitar a sua reprodução”.
As represálias" têm sido condenadas porque atingem pessoas que nada
têm com a violação das leis da guerra, apesar delas visarem o Estado
ofensor.16 Elas só subsistem porque no mundo internacional ainda não há
uma sociedade institucionalizada com um poder efetivo acima dos Estados.
Assim se admite “responder uma injustiça por outra injustiça” (Accioly).
No Protocolo I (1977) são proibidas as represálias contra: feridos, doentes
e náufragos; população civil; bens indispensáveis à sobrevivência da popu­
lação; .bens culturais; meio ambienter e construções contendo forças peri­
gosas (êx.: usinas nucleares).
As demais sanções das leis da guerra não produzem tanto efeito quanto
as represálias: a) a opinião pública é uma sanção moral; b) a punição do
criminoso nem sempre é possível; c) o ressarcimento dos danos, quando
é concluída a paz, é uma sanção que só atua em favor do vencedor.
E de se assinalar que o fim do “jus ad bellum” não põe fim ao “jus
belli”, vez que as forças da ONU quando em ação ainda seguem várias de

1465
tem c on(^v/U^°
a de 1949). O q w
guerra voval
C^»venç®eSé“ c Co „cepção ■hra é-0£í
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posição (AriSl' ambos visam p r°leSe H u m ® tó n ° V e estes são

nizações m t e ^ ^ m d h a ln ie r n .dC1o n a ^ s Humanos, e ^ P ^ Qe

n o íoníiito; b) um estado pode aderir a um artigo facultativo e


reconhecer a competência da comissão em relação a outro estado.
Finalmente, é de ser ressaltado que o Pacto de Direito Civis e Políticos,
a convenção americana de Direito do Homem, bem como a Européia,
permitem a suspensão das garantias em caso de guerra. Entretanto, existem
dispositivos que não podem ser suspensos: direito à vida, proibição de
escravidão, etc. De qualquer modo, a suspensão deve ser estritamente o
necessário.
589. A designação de guerra total tem as suas raízes em Clausewitz,17
que consideiava introduzir na filosofia da guerra o princípio de mode-
lação seria um absurdo” porque a guerra era por natureza um ato de
grande violência. Esta concepção se desenvolveu, acima de tudo, no Esta­
do-maior alemão na 1! Guerra Mundial.18 A guerra total conduz ao desa­
parecimento da distinção entre beligerantes e não beligerantes e leva ao
desaparecimento das leis da guerra.
Rousseau apresenta as seguintes características: a) é universal; b) não
se limita ao território dos beligerantes (ex.: houve combates no Egito que
era neutro na 2a Guerra Mundial); c) ela se estende a todos sem distinguir
beligerantes e não beligerantes;19 d) ela se prolonga mesmo depois da
cessação das hostilidades: guerra-fría; e) a guerra total exige,uma capitu-
sc i»<>W>ngvK-u>.

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roodo ger;i' sa niaurnas esu¿c ¿s ^ ^ y.X kvJY h 'líu 1 estudo não faz

Desejamos mostrar apenas como as principais correntes do pensamen­


to econômico encaram a guerra. O liberalismo (Sav) considera a guerra
nociva economicamente, destruindo a riqueza nacional; a guerra, em ne­
nhuma hipótese, é vantajosa. O socialismo (Marx) também repudia a
guerra e identifica o socialismo com a paz. Na verdade, o socialismo tem
se mostrado também beligerante, como demonstra a invasão do Vietname
no Camboja. Os protecionistas (List) fazem uma distinção entre as nações
vencidas e as vitoriosas e salientam que para as últimas uma guerra.pode
ser vantajosa economicamente.
Na verdade, a guerra é de um modo geral sempre desvantajosa para
os Estados; mesmo-os vitoriosos levam muitos anos para se recuperar cias
perdas que tiveram. Tal falo decorre, acima de tudo, da guerra econômica
total, em que se procura levar a nação inimiga à miséria. Diante cias armas
nucleares nenhum Estado poderá considerar que o seu território está livre
da guerra. A própria vitória não será no futuro economicamente compen­
sadora.19''
Para Max Weber a guerra surge como um fator importante para a
quebra da tradição, a secularização do direito e. em conseqüência, a ra­
cionalização do direito e da dominação.
591. As guerras podem ser classificadas segundo diversos critérios.
XüMQroi&jiAyjÚuS-Ü-Ca-lejms^
.Secundo o campo de operações: guerra terrestre, guerra marítima e
guerra aérea. ~ —— —*
Podem ser aínda conforme o seu ámbito: im ernacionais e civis. A
distinção entre guerra civil e guerra internacional nem sempre é fácil de
ser feila, sendo que as duas noções algumas vezes se confundem no mesmo
conflilo (v. capítulo Guerra Civil). Pode-se acrescentar que Gasthon Bout-
houl e René Carrère constataram, no período de 1740 a 1974, “ 366 guerras
estrangeiras e revoluções”, sendo que nenhum ano correu sem que hou­
vesse uma guerra (A. Collet).
„A § .g u err^ je g u n d o ji sua natureza, podem ser: ofensivas e defensivas,
sendo que apenas estas últimas são legais perante o D I/1' *
Fala-se aínda em guerras limitadas, que de 1945 a 1993 foram mais de
100 conflitos, com cerca de 15 milhões de mortes. Elas se desenvolveram
em “limites geográficos bem definidos e implicitamente aceitos" (André
Collet). O conceito de guerra limitada varia de um autor para outro.
Segundo Kissinger é a que tem “objetivos políticos específicos”, visa “do­
brar a vontade do adversario e não a destruí-lo a fim de criar condições
para a paz", etc^Para Robert Ósgood “as beligerantes limitam o objeto de

tição do que fe
problemas que

1468
NOTAS

Q u m cy W right - A Studv o f W ar, 2 vols . í g ^ ' T V c i b M ™ ’' / 1'' ,!>19;


de G u e r r e , ra R G D I P . Jan v íer-M ars. 1953. n ' l . t f p . 16 e “ g T
m e t a p h y s iq u e d e g iie r r e , in R G D l P J u i l I e t - S e p t e n l r e , 1952 ® » 3 "
i em ^ La n o t io n s o c io l o g iq u e d e g u e r r e . m R G D I P , j a n v i e r - M a r s ¡<3r-,2

> A : p á y . l7 V e " T gr W a r a s I U d Í T 1T d C ^ " " V - ” K GD 1P> 1903.'


e T h o m a s C . C o c h ^ ! 19 4 1 * p “ K
d e r p o l , L o t u s R o ll a n d , F r é d é r i c D u v a l \ T a n a u e r r v __ I ' F o T t- ’ \a n -

p u b liq u e en A il e m a g n e aU M o y e n A g T m R d C ^ 9 2 9 . 't o l H I“ ' T s ' n . f

- - W a r T h ro u g h th e A g e s , Í 9 « f , J W » ■« *Co* ™ ~ ^ <?¿ M. Paix d ans


L o is et C outuines APPb c^ le % 25 e segs.; C elso D. d e A lbuquerque
I n t e r n a t io n a l e d e Ju n ste s .M a rs ’ G uerra no P en sa m e n to C atólico: A G uerra
M ello - In trod u ção a o ^ setem b ro d e 1 968, págs. 221 e se g s ,
Ju sta , m Revista V erbum , t- » r-n erre 1938' L u ig i Stu rzo — Les G uerres
Ivés de la B rié re - L e D ro it - L e P rincipe de l’é-
M o d e rn e s e t la Pensee C a t h o h q u e 19 , ^ í 9 7 o ; jó s é D alm o Fairbanks
g a lité des belligérants d evant le d - de G u erra*Ju sta, 1964: N. B o b b io , R.
B e lfo rt de Mattos - O C o n c e n o C ^ Dc ra hé C J . F rie d n c h . Cl. P olin, R.
B o sc, H . B u ch , S. Cotta !M ^ ^ ^ T b é o n e s , 1970;
' R o lin , C h. R ousseau, P. M . V ern es, t.. e c j a jmelMg págs. 5 9 0 e segs.; Claude
J . F re u n d — L ’ essence du p o h u q u e , ^ ’ ^ P ro id e J 9 7 1 ; Alesan d ro Migliazza -
D elm a s — A rm em ents N u cleaires e > )um ié r e d e la saw eg ard e des
L ’évo lu tio n de la 1 4 2 e seg, ; T on , J . F a i e r
d roits d e l’lio m m e, ’ f ]m e rn a tio nal L e g a l O rd er, editado por
S fh in itz — l a G u erre M o d e r a r , i» A rq u iv o s (to M i n i s t é r i o d a J u s t i ç a , d e z e m b r o
d e 1 9 7 2 . n “ 1 2 4 . p á g s. 5 1 o s e g s .; D a v id D u n n — W a r a n d S o c ia l C h a n g r . m The
U s e o f F o r c e i n I m e n i a l i o n a l R e l a t i o n s . e d i t a d o p o r K. S . N: o r i h c d g c . 1 9 7 4 . p á g s .
2 2 0 e s e g s .'. I g n a z S e i d l - H o h e n v e f d e r n — T h e I d c a o f E q u a l i t v in J u s in B e l l o , in
L a w a n d S t a t e , v o l. 1 2 , 1 9 7 5 , p á g s . 7 7 e s e g s .; R a y m o n d A r o n — P c i t s e r Ia g u e r r e ,
C l a u s e w i t z , 2 v o ls ., 1 9 7 6 ; E r i c k v o n L u d e n d o r f f — L a G u e rr a T o ta l, 1 9 6 4 ; A n d rc
F o n ta in e — H i s t o i r e d e l a G u e r r e F r o i d e , 2 v o ls ., 1 9 6 5 - 1 9 6 7 ; S t a u i s l a w E . N a h l i k
— Le P r o b lè m e des R e p r e s a d le s a la L u m iè r e des T ra v a u x de la C o n f é r e n c e
D ip lo m a t iq u e s u r le D r o it H u m a n it a ir e , in R G D I P , t. 8 2 , 1 9 7 8 , v o l. 1. p á g s . 1 3 0 e
s e g s .; A n d r é G lu c k s m a n n — L e D i s c o u r s d e la g u e r r e , 1 9 7 9 ; A r i s t i d i s S . C a l o g e r o -
p o u lo s -S tr a tis — D r o it H u m a n ita ir e e t D r o its d e l ’h o m m e . L a p r o te c tio n de la
p e r s o n n e e n p é r io d e d e c o n f lit a r m é , 1 9 8 0 ; J e a n - P í e r r e C o lín — G u e rr e s et L u tte s
A r m é e s o u L e D r o i t I n t r o u v a b l e , m J e a n - P a u l C h a r n a v e o u t r o s — D e la d é g r a d a t i o n
d u d r o i t d e s g e n s d a n s le m o n d e c o n t e m p o r a i n , 1 9 8 1 , p á g s . 1 7 5 e s e g s .: M a q u ia v e l
— A A rte d a G u e rra , 1980; The W a r S y s te m ; A n Im e rd is c ip lin a r y A p p ro a ch ,
c o o r d e n a d o p o r R i c h a r d A . F a lk e S a m u e l K im , 1 9 8 0 ; l a n B r o w n l i e — I n t e r n a t i o n a l
L a w a n d th e U se o f F o r c é b y S t a t e s , 1 9 6 3 ; C h a r le s R o u s s e a u — Le Dtoíi d e s C o n flits
A r m é s , 1 9 8 3 ; G e o ffre y B e s t — H u m a n ily in W a r f a r e , 1 9 8 3 ; I n g r id D e t t e r d e L u p is
— T h e L a w o f W a r, 2 0 0 0 ; T h e O r ig in a n d P r e v e n tio n o f M a jo r W a rs , c o o r d e n a d o
p o r R o b e r t I. R o l b e r g e T h e o d o r e K . R a b b , 1 9 8 9 ; M i c h a e l H o w a r d — La g u erre
d a n s l ’h i s t o i r e d e l ’ O c c i d e n t , 1 9 8 8 ; P h i l i p p e R a y n a u d — L a g u e r r e e t le d r o it : Ie s
lim ite s d e la r a tio n a lis a tio n . M a x W e b e r e t sa p o s te r ité , in A r c h iv e s d e P h ilo s o p h ie
d u D r o i t , t. 3 2 , 1 9 8 7 , p á g s . 1 0 1 e s e g s . ; M i r A . F e r d o w s k i — R e g i o n a l C o n f l i c t s in
t h e T h i r d W o r ld : D im e n s io n s , C a u s e s , P e r s p e c tiv e s , in L a w a n d S t a t e , v o l. 3 8 , 1 9 8 8 ,
p á g s . 2 7 e s e g s .; C h r i s t o p h e S w in a r s k i — D ir e it o I n t e r n a c i o n a l H u m a n i t a r i o c o m o
S is t e m a d e P r o te ç ã o I n t e r n a c io n a l d a P e s so a H u m a n a , 1 9 9 0 ; M a u r ic e T o r r e lli —
L e D r o il In te rn a tio n a l H u m a n ita ir e , 1 9 8 5 ; P e te r H a g g e n m a c h e r — G r o t iu s e t la
d o c t r i n e d e la G u e r r e J u s t e , 1 9 8 3 ; L e s D im e n s io n s I n t e r n a t i o n a l e s d u D r o i t H u -
m a n ila ir e , 1 9 8 6 ; E v an L u a r d — C o n f lic t a n d P e a c e in t h e M o d e r n I n t e r n a t io n a l
S y s te m . A S tu d y o f t h e P r in c ip ie s o f I n t e r n a t io n a l L a w , 1 9 8 3 ; D e re k B o w e tt —
R e p r i s a l s In v o lv in g R e c o u r s e l o A r m e d F o r c é , in S t u d íe s o n a J u s t W o r ld O r d e r ,
n 2 2 , In te rn a tio n a l L aw . A C o n te m p o r a r y P e r s p e c tiv e , c o o r d e n a d o p o r R ic h a r d
F a l k , F r i e d r ic h K r a t o c h w il e S a ú l H . M e n d lo v itz , 1 9 8 5 , p á g s . 3 9 4 e s e g s .; L a G u e r r e
A u jo u r d - h u i. D é fi H u m a n it a i r e . P r é f a c e d e P ie r r e G r a b e r . R a p p o r t a la C o m m is s io n
I n d é p e n d a n t e s u r le s Q u e s t i o n s H u m a n ita ir e s I n t e r n a t i o n a l e s , a p r e s e n ta d o por
M o h a m m e d B e d ja o u i, 1 9 8 6 ; A n t o n i o A u g u s to C a n ç a d o T r i n d a d e — A E v o lu ç ã o
d o D ir e it o I n te r n a c io n a l H u m a n it á r io e a s P o s iç õ e s d o B r a s il, in B S B D I , 1 9 8 7 / 1 9 8 9 ,
n as 6 9 / 7 1 , p á g s . 7 6 e s e g s . ; C o m m e n t a i r e d e s P r o t o c o l e s a d d i t i o n e l s d u 8 ju in
1 9 7 7 a u x C o n v e n lio n s d e G en év e du 1 2 a o u t 1 9 4 9 , C o m i t é I n t e r n a t i o n a l d e la
C r o i x R o u g e , 1 9 8 6 ; H e a t h e r A . W ils o n — I n te r n a tio n a l L a w a n d th e U se o f F o r c é
b y N a tio n a l L ib e r a tio n M o v e m e n ls , 1 9 8 8 ; C a th e r in e G u ic h e r d — L ’E g l i s e C a t h o -
l i q u e e t la P o l itiq u e d e D é f e n s e a u D é b u t d e s A n n é e s 1 9 8 0 , 1 9 8 8 ; A n d r é F o n t a i n e
— L ’ u n s a n s l ’a u t r e , 1 9 9 1 ; K a l e v i J . H o l s t i — P e a c e a n d W a r : a r m e d c o n f l i c t s a n d
in t e r n a t io n a l o r d e r 1 6 4 8 - 1 9 8 9 ,1 9 9 1 ;J u s t W a r T h e o r y , c o o r d e n a d o p o r je a n B e t h k e
E ls h ta in , 1 9 9 2 ; Y v on G a r la n — L a G u e r r e d a n s l ’A ji t i q u i t é , 1 9 9 0 ; P ie r r e C h a u n u
— L e s F o n d e m e n ts d e la P a ix , 1 9 9 3 ; J o h n A . V a s q u e z — T h e w a r p u z z le , 1 9 9 3 ;
H a n s D e lb r u c k — H i s t o r y o f t h e A r t o f W a r , 4 v o l s ., 1 9 9 0 ; P h i l i p p e C o n t a m i n e —
L a G u e r r e a u M o y e n , 1 9 8 0 e P ie r r e G ra ssr — L e s T e m p s d e la G u e r r e F r o i d e ,

1470
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de Funes — El Derecho de los Conflictos Armados, 2001; Luigi Bonanate — A
Guerra, 2001.
2. A -origem da palavra guerra parece estar no alto alem ão médio “W erra”
(“W ehr” atualmente significa “defesa” ) (Carlos Calvo). W erra quer dizer revolta
e discórdia. A ntenor Nascimento também coloca com o tendo origem em “W irro”,
que significa confusão (Celso Lafer).

1471
S. A f ie r r a possui ainda um terceiro elem ento. que é id eológico, isto é, a
sua finalidade, ou seja. a defesa tic mn interesse estatal.
4. A vontade de nm único Estado é necessária para fazer surgir a guerra.
5. A guerra fria começou a surgir antes mesmo da rendição do Jap ão na 23
Guerra Mundial. Ela é urna “hita entre ideologias”. Uma lma entre dois blocos
(norte-am ericano e soviético). A verdadeira consciência da guerra fria surgiu a
partir de um discurso de Churchill, em Fulton (Missouri. EUA), em 1946, quando
afirmou que “De Stetin, no Báltico, até Trieste. 110 Adriático, unia ‘cortina de
ferro' foi baixada através do Continente europeu” . Em 1946 H erberi Bavard Swope
colocou a expressão “guerra-fria” em um discurso de Baruch, mas este a retirou
e só foi usá-la em 1947, quando de um debate sobre o auxílio a ser dado à Grécia.
Posteriormente ela foi usada por Walter Lippmann 110 título de seu livro publicado
em 1947: “A Guerra Fria: estudo sobre a política exterior am ericana." Ele criticava
neste livro a tese de Kennan de con tenção do comunismo. Na verdade esta ex­
pressão vinha sendo usada desde 1939 para designar “um estado das relações
diplomáticas” ou “um estado de espírito” (Claude Delmas). Observa Delmas que
a guerra fria teria tido o seu início quando a revolução de 1917 triunfou na Rússia
com a “vontade do universalismo” . Para Daniel Yergin a guerra fria foi um ‘ mal­
entendido”, vez que os sucessores de Roosevelt consideravam que a URSS era um
“estado revolucionário mundial” e, em resposta, os EUA e^boram uma “ teoria e
estrutura de segurança nacional” . Os autores têm considerado atualm ente que a
guerra fria foi provocada pelos EUA por um erro de avaliação da política da URSS.
Stalin só era revolucionário para efeitos de propaganda interna, tendo ele “de­
sencorajado” que os partidos comunistas francês e italiano subissem ao poder,
bem como não desejava a ascensão de Mao Tsé-tung. A URSS não estava preparada
para a guerra tendo em vista inclusive a perda de homens que ela sofreu na 2l
Guerra Mundial. O próprio George F. Kennan, que sustentara um a política de
repressão em relação à URSS, fez em 1965 uma crítica à política norte-am ericana
ao tempo da guerra fria. Kennan, em suas “Memórias”, declara que no seu célebre
artigo apenas se referia à contenção política da URSS e que ele não tratara da
contenção militar, porque não havia am eaça militar (Isaac D eutscher — Mitos da
Guerra Fria, in David Horowitz, organizador — Revolução e Repressão, 1969, págs.
15 e segs.; Jo h n Lewis Gaddis — Was T h e Tram an Doctrine a Real Turning Point?,
in Foreign Aífairs, January, 1974, vol. 52, n- 2, págs. 386 e segs.). Franz Schurman
sustenta que a guerra fria surgiu porque os EUA pretendiam criar um império
dentro da visão de Roosevelt, o que era inaceitável para a URSS. Sobre a expressão
“cortina de ferro ”, divulgada a partir do discurso de Churchill citado acima, era
comum na Alem anha desde o princípio da década de 20 para designar a fronteira
da URSS (John Lukacs — A Última Guerra Européia, 1980). Goebbels também a
usou quando os soviéticos dominaram a Finlândia (joseph Goebbels — Diário,
Últimas A notações, 1945, 1978). Outros (Arthur Funk) declaram que ela já consta
de um telegrama de Churchill a Truman em 12-5-45. Apenas a título de curiosidade,
para André Fontaine (entrevista in L T listorie. n8 151, jan eiro 1992) foi criada por
Don Juan M anuel de Castelo e Leão, no século XIV, para descrever o conflito
entre cristãos e mulçumanos, por ser uma guerra que com eçara sem declaração
e terminaria sem tratado de paz. De qualquer modo, em 1984 os EUA já consideram
ultrapassada a doutrina de “conter” a URSS, vez que esta já se encontrava muito
poderosa. As relações URSS e EUA após 1945 tem sido dividida em: a) l - Guerra

1472
l;ria (de 194"> a 1963 ): b) D étem e tio 19(53 (c o m e ç a m as negociações r n i r e os doi-S
Grandes) até 1979: r) 2 ’ Guerra Fria (le 1979 (invasão pela U RSS d o Afeganistão)
alé J 9 8 9 (q u e d a d o M u ro de B erlim ).
G. O con ceito da Europa Continental considera que a guerra é unia “ relação
enlre Estados” c não entre indivíduos (Jean-Jacques Rousseau, Porta lis). O conceito
anglo-saxão considera que'elá estabelece relação enlre Estados e indivíduos (N'u-
rick. Kent. Pufendorf).
7. Outras “ noções" sobre a guerra existem, com o a noção sociológica (estuda
c o m o fato social as suas causas, conseqüências, etc.) ou a n o ç ã o metafísica (estuda
a sua “ natureza íntima e sua significação profunda") (Delbe/.).
8. Será feito o histórico de cada instituto ao se fazer o seu estudo.
8A. H erácüto de Efeso considerava a guerra como a “mãe do direito das
gentes". Nos últimos 3.400 anos de H istória^ó existiram 250 anos de paz geral
(Pictet). Para se sentir o poder de destruição da guerra atualmente, podemos
repetir a observação de André Fontaine de que no final da ] 3 Guerra Mundial
calculou-se que eram necessárias cerca de dez mil balas de fuzil para matar um
indivíduo, ou dez de obus. Atualmente fala-se em “mega-death” . Na 1? Guerra
Mundial, para cada civil morto morreram 20 soldados. Na 23 Guerra Mundial, o
número de civil mortos foi igual ao de militares. Na guerra do Vietnã, para cada
militar m orto, m orreram 20 civis. A previsão é que no futuro m orrerão 100 civis
para cada militar morto (Jayme Landm ann).
9. Alguns autores (Weiss, Joachin von Elb) sustentam que os feciais examina­
vam os motivos da guerra e que eles podiam desaconselhar a sua realização. Outros
(Laurent, D elbez) consideram que a análise era meramente formal e a guerra
seria pia e ju sta se declarada conform e o rito dos feciais.
10. O D ecreto de Gratiano (1150) assinalava que a guerra é ju sta quando “é
feita em virtude de um edito que tem por finalidade vingar as injúrias...” (Van-
derpol).
10A. E preciso assinalar que Eppstein observa já existir em Santo Agostinho
e Santo Tom ás o requisito de que para haver guerra justa a injúria não pudesse
ser reparada por m odo pacífico.
11. Verdross assinala, entretanto, que Grotius, Pufendorf, Wolff, etc., incor­
poraram a seus sistemas a doutrina da guerra ju sta. Sendo, contudo, de se assinalar
que para Grotius a guerra justa é do direito natural, enquanto que toda guerra
devidamente declarada na sua forma é legítima para o direito positivo (W ehberg).
1 IA. E interessante assinalar que certos autores católicos (P. Cordovani) negam
a justiça de qualquer guerra: “inclusive a guerra defensiva é ilícita” .
12. No século XV1I1 ainda existem situações em que as guerras públicas e
privadas se confundem , mas já sem aquela generalidade dos séculos anteriores.
13. Os autores alemães costumam distinguir as leis da guerra (“ Kriegsrecht")
da necessidade ou razão da guerra (“ Kriegsrãson”), e a primeira poderia ser
derrogada por qualquer beligerante em nom e da segunda (Fauchile).
14. Serení nega a existência de um princípio geral de humanidade, que só
existiria em casos específicos. Neste sentido estaria o Tribunal de Nurembergue,
que não con den ou pelo emprego de meios desumanos (ex.: a guerra submarina
alem ãf-
15. O princípio da necessidade deve ser entendido como sendo o “quejustifica
em certo sentido o emprego da força ou da astiicia nos limites em que são

1473
nrccssái'ias para alcançar o objetivo da guerra” (Calvo). O (Código I Jc b c r admitia
a ” necessidade militar" e assim não dar quartel, por exemplo, quando a Iropa não
pode ter prisioneiros.
Í5A. Podemos acrescentar a D eclaração Naval de Londres (1909) sobre guerra
marítima, que não entrou em vigor.
15B. E de se lembrar que a ausência de convenção não significa ausência de
um direito de guerra. A denominada Cláusula Martens, na convenção relativa às
leis e usos da guerra terrestre (Haia, 1907), já estabelecia que no caso não previsto
110 regulam ento anexo à convenção “as populações e os beligerantes ficam sob a
salvaguarda e sob o im p ério dos princípios do direito das gentes, com o resultam
dos usos estabelecidos entre nações civilizadas, das leis da Humanidade e das
exigências da consciência pública” .
16. As Convenções-cie Genebra de 1949 proíbem as represálias contra pessoas.
17. Têm sido citados’ como atos de guerra que não distinguiam beligerantes
e não beligerantes, entre outros, os seguintes: Sherman devastou a Geórgia e
Sheridan o Vale de Shenandoah na Guerra de Secessão (guerra civil) para obrigar
os confederados a se renderem.
18. A sua formulação doutrinária foi dada pelo Marechal Eric von Ludendorff
em seu livro “A Guerra Total” (“Die totafe Krieg”), em 1938, em que ele analisava
a I a Guerra Mundial.
19. A guerra total leva à adoção do conceito anglo-saxão de que a guerra é
relação entre Estados e indivíduos.
19A. É interessante assinalar que um a corrente do pensam ento econômico
considera a guerra, bem como a sua preparação (ex.: arm am entos), com o sendo
o grande fator de “estabilização e con trole das economias nacionais” . Os gastos
com a guerra influem de modo “positivo no crescimento do produto nacional
bruto e da produtividade individual” (A Paz Indesejável — O Relatório da Mon­
tanha de Ferro — Apresentação de Leonard _C- Lewin, 1969). Tem sido observado
que a crença na inevitabilidade da guerra pode ser uma de suas causas.
20. García Arias lembra que se poderia falar em guerra “ de facto” e guerra
“de iure” , sendo entretanto a reunião das duas que cria o fenôm eno jurídico
internacional que denominamos guerra.

1474
CAPÍTULO LXI

DECLARAÇÃO DE GUERRA.
EFEITOS DO ESTADO DE GUERRA1

5 92 — Inicio da guerra; 5 9 3 — Definição; 594 — Da necessidade


da declaração de guerra; 5 9 5 — Espécies; 596 — Poder competente;
5 9 7 — Efeitos do estado de guerra: a) quanto aos Estados; b) quanto
aos indivíduos c) quanto aos bens.

592. A guerra pode começai' de diversas maneiras: a) a prática de atos


hostis com intenção de criar o estado de guerra; b) o não atendimento de
um ultimátum que declarasse a criação do estado de guerra caso não fosse
cumprido; c) quando um Estado considera que um ato praticado por outro
cria o estado de guerra. Não importa aqui saber se quem pratica o ato
tinha ou não intenção de provocar a guerra; d) declaração de guerra.
593..A_declaração de guerra pode ser definida como sendo o ato em
que um Estado comunica a outro, ou outros ¿"existencia do estado "de
guerja,-. — ....................
E de se salientar qua a declaração de guerra não tem efeito retroativo.
594. Na Antiguidade, era comum a declaração de guerra. Deste modo,
na Grécia ela era declarada por arautos e em Roma pelo Colégio dos
Feciais.
No período medieval, inicialmente havia cartas de desafio que eram
entregues p or mensageiros especiais; posteriormente utilizaram-se os arau­
tos. Assim, na primeira metade do século XVII a declaração era necessária
para criar o estado de guerra. A doutrina também a defendeu: Pufendorf,
Grotius, Gentili, etc.
Nos séculos XVIII e XIX as guerras em que nao há declaração foram
em maior número do que as precedidas de declaração.
Havia assim, nestes dois últimos séculos, a predominancia da concep­
ção anglo-saxã, que não considera a declaração como um ato imprescin-

1475
dível e alega: 1) o b e lig e i;m li- não p od e p e rd e r a vantagem de um a ta q u e
d e surpresa; 2 ) a g u e rra com eçaria c o m o p rim e iro ato de h o stilid ad e e
se fosse levada em co n sid e ra çã o "a d ata d e um a d eclaração fie g u e rra
fo rm a l’’ as coisas se co m p licaram aind a m ais (R ou sseau ).
Em 1907. a C o n v e n ç ã o de H aia, relativ a ao ro m p im en to das h o stilid a ­
des, e sta b e le ce u n o seu art. I 9, na lin h a da c o n ce p ç ã o c o n tin e n ta l, o
seguinte:

“As Potências contratantes reconhecem que as hostilidades en­


tre si próprias não devem começar sem um aviso prévio e ine­
quívoco, que terá, seja a forma de uma declaração de guerra
motivada,2 seja a de um ultimato com declaração de guerra
condicional.”3

O alcance deste texto não é muito grande, porque ele não declara
qual o prazo entre o aviso “prévio” e o início das hostilidades. A declaração
pode ser feita quase ao mesmo tempo em que as hostilidades têm início.1
A “ preventividade” se transforma em “ contemporaneidade” (Balladore
Pallieri).5 Por outro lado, o “ultimato” tem sido deturpado, vez que não
se dá à parte que o recebe tempo de aceitá-lo (ex.: ultimátum da Alemanha
à Bélgica em 1940).6
Na verdade, o valor da Convenção de Haia é bastante relativo, porque
a convenção só é obrigatória para as partes contratantes, bem como a
prática de atos de hostilidade sem declaração cria o estado de guerra do
mesmo modo que se houvesse declaração. Parece-nos que a razão está com
Balladore Pallieri, de que “é impossível se inferir que se tenha formado
entre os Estados uma convicção geral da obrigatoriedade” da declaração
de guerra. As potências do Eixo na 2* Guerra Mundial não respeitaram
neste pár.ticular a Convenção de Haia.
A grande vantagem da declaração de guerra é que por meio dela se
dá uma certeza sobre a criação do estado de guerra e a data do seu início.
Ela não tem sido usada porque o seu autor seria facilmente qualificado
como agressor. Todos os conflitos após a 2- Guerra Mundial, em sua
maioria, iniciaram-se sem declaração de guerra.
Em 1936, Grafton Wilson considerava que ern 140 guerras ocorridas
entre 1700 e 1907 apenas uma dezena delas começou com uma declaração.
_Nos últimos 200 anos os EUA declararam guerra cinco vezes e usou suas
forças no exterior ao menos 200 vezes (Eugene V. Rostow).
As declarações de guerra são uma “relíquia” do passado e a última
que ocorreu foi a da URSS contra o Japão, em agosto de 1945 (H. Levie).
Ela não tem mais valor jurídico ou político (Michel Voelckel). Ela caiu
em dessuetude (Eric David).
595. A declaração de guerra na Convenção de Haia pode ser de duas
espécies:

1476
a) declaração de guerra produzindo efeito imediato e que deve ser
motivada; »
b) declaração de guerra condicional é o ultimátum, isio é, a guerra terá
início se o Estado que recebeu o ultimátum não satisfizer as suas
exigências em certo prazo. Sendo que esta questão de se daf um
prazo, corno vimos, não tem sido cumprida.

596. A declaração de guerra, para ser válida, deve em anando.poder


competente cio Estado. O Dl__deixa ao direito interno a_conipetêxiçia_xle
fixar qual é ele.
Na maioria dos países a declaração de guerra é da competência do
Executivo após autorização do Legislativo (EU A ).6A
No Brasil a. matéria,está regulamentada no art. 84 da Constituição:

“Co!HP.c‘ie privativamente ao. Presidente da República:

X IX — declarar guerra, no caso de agressão estrangeira,7 auto­


rizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando
ocorrida no intervalo das sessões legilativas, e, nas mesmas con­
dições, decretar, total ou parcialmente, a mobilização nacional."

597. Os efeitos do estado de guerra são múltiplos. E de se lembrar que


estes efeitos se manifestam com ou sem declaração de guerra, bastando
para eles aparecerem a existência do estado de guerra.
E interessante observar que a Constituição brasileira continua a não
dispor sobre o fornecimento de tropas para as organizações internacionais.
Não há neste caso a existência de uma guerra. E uma situação especial
que a nosso ver merecia um dispositivo constitucional para evitar o que
tem ocorrido. Assim o Decreto Legislativo n2 61, de 1956, que “autoriza
o Presidente da República a contribuir com um contingente militar para
a formação ou integração da Força Internacional de Emergência” (Suez)
é fundamentado no art. 66, item III, da Constituição Federal, combinado
com a Lei ns 2.953 de 17-11-56. Ora, o citado dispositivo constitucional
estabelecia:

“Art. 66 — E da competência exclusiva do Congresso Nacional:

III — autorizar o Presidente da República a permitir que forças


estrangeiras transitem pelo território nacional ou, por motivo
de guerra, nele permaneçam temporariamente.”

Como se verifica, o texto citado nada tem a ver diretamente com a


matéria.

¿477
O D e cre to n - 5 6 .3 0 8 d e 21-5-65, q u e se fu n d a m e n ta no D e c r e to L e­
gislativo n “ 38 d e 2 0 -5 -6 5 , “ cria o D e sta c a m e n to B rasileiro da F o rça A rm ad a
In te ra m e rica n a — FA 1R B R A S” (R e p ú b lica D o m in ic a n a ), está p o r sua vez
fu n d am e n tad o n o a rt. 8 7 , in ciso I, da C o n stitu içã o , que d ete rm in a:

“Art. 87. Compele privativamente ao Presidente da República-,


1 — sancionar, promulgar e fazer publicar as leis e expedir
decretos e regulamentos para a sua fiel execução.”

A ação da OTAN na lugoslavia foi considerada por todos os países,


com exceção da Inglaterra, como criando o estado de guerra. A França
„ não declarou guerra quando houve ação contra a Sérvia e o Montenegro.
Este episódio mostra a imprecisão do Dl na prática internacional
adotada pelos estados.

jí) Quanto aos Estados


A guerra rompe as relações diplomáticas e consulares entre os belige-
...cantes. Entretanto, no conflito entre o írâ e o Iraque, que começou em
setembro de 1980 por uma agressão do Iraque, as relações diplomáticas
foram mantidas. Os interesses dos beligerantes passam a ser defendidos
por um 3a Estado, que é um neutro.8 Em 1942, no continente americano,
uma Resolução da Reunião de Consulta dos Ministros da Relações Exte­
riores proibia um Estado americano de assumir a representação de um
Estado não americano em guerra com um Estado americano. Esta resolução
não é mais aplicada, tanto que os EUA passaram a rep resen tar a Grã-Bre-
tanha em Buenos Aires durante o conflito das Malvinas. Salienta Rousseau
que o Estado que defende os interesses de outro Estado não é um repre­
sentante e que ele apenas exerce os “bons ofícios não oficiais”. As partes
em luta passam a ter o status de beligerante e os terceiros o status de
neutros, sendo que tanto uns como outros passam a ter dirfeitos e deveres
próprios. Apesar da concepção de guerra total acreditamos qiie a guerra
deve ser ainda predominantemente entre Estados.
Os tratados também são atingidos pela guerra. Até o século X IX pre­
dominou a concessão de que a guerra punha fim a todos os tratados entre
os beligerantes.9 Esta tendência se manifestou ainda nos tratados de paz
após a l 3 Guerra Mundial.
Atualmente, uma posição diferente é que encontra acolhida na prática
internacional, isto é, a que defende que nem todos os tratados terminam
com o estado de guerra.10

/ f Dentro desta orientação pode-se afirmar que substituem: a) os tratados


concluídos para vigorarem em tempo de guerra; b) os tratados que esta-
/ belecem situações definitivas e já integralmente executados (“pacta tran-
| sitoria”); c) as cláusulas em tratado de navegação que visam ser aplicadas
l em tempo de guerra. ■

1478
Os tratados miiltilulerais envolvendo Ix-tigei .mus r neutros lém os
seus efeitos suspensos entre os beligerantes c continúan) a ser aplicados
com os neutros. Terminada a guerra, eles voltam a produzir eleitos.
Os tratados de natureza política, de comercio, etc., concluidos entre
os beligerantes, desaparecem com a guerra.
Os tratados de extradição concluídos entre os beligerantes são apenas
suspensos (v. capítulo Extradição).
Pode-se acrescentar que os Estados possuem os seus códigos para a
condula dos exércitos em campanha, que serão aplicados nos combates.
O dos EUA, “The Law of Land Warfare", foi promulgado em 1914 e ainda
está em rigor em ] 992.

b) Quanto aos indivíduos


—Em -relaçãn.ans nariemais Hn F.Kfarln é feita a m n h itÍ7arão e a popnlarãp
é dividida em combatente e não combatente. As relações comerciais com
estrangeiros nacionais do Estado beligerante são geralmente proibidas."
Publicam-se leis marciais para punir mais rigorosamente certos delitos.
Faz-se a convocação de nacionais no estrangeiro (“edicta avocatoria”). No
Brasil a guerra é um dos casos que justifica o estado de sítio (art. 137,
inciso II).
Os nacionais de Estados neutros deverão subordinar-se às medidas de
segurança do Estado beligerante em que se encontram. Entretanto, não
podem ser convocados para o serviço militar no Estado beligerante e não
podem “comerciar com os nacionais de outro Estado beligerante” (Accioly).
Os nacionais do outro Estado beligerante12 são sujeitos a uma série de
normas, devendo se submeter às leis de segurança do Estado. Muitas vezes
se dá um prazo para que eles se retirem do território estatal.13 Esta prática
existia no século XVII por iniciativa da França. Em 1793 e 1803 a França
utilizou-se do internamento e a Inglaterra passou a usá-lo na guerra dos
bôeres. Em outros casos, para não fornecer homens ao exército inimigo,
o Estado permite que o estrangeiros permaneçam nele, entretanto, pode­
rão ser internados ou colocados em campos em nome da segurança na­
cional.14 E o mais adotado atualmente. A convenção sobre a proteção das
pessoas civis (Genebra, 1949) estabelece entretanto a obrigação para o
Estado de criar um Tribunal ou órgão colegiado para apreciar os recursos
contra o internamento. O internamento é uma privação da liberdade
fundamentada em uma decisão administrativa emanada de autoridades
civis ou militares. Ele se distingue assim da detenção que é a privação da
liberdade após decisão judicial. Proibe-se o tratamento cruel, a prática de
reféns, atentados humilhantes, deportações, etc., e dá-se assim uma pro­
teção ao civil. O estrangeiro súdito do beligerante inimigo conserva o
direito de acesso aos tribunais (Convenção de Genebra citada acim a).1’
Eles não podem comerciar com os seus nacionais não apenas com os que

1479
se encontram em território inimigo, mas também cm território neutro."’
Os contratos entre nacionais e inimigos são ab-rogados (ex.: compra e
venda) ou suspensos (ex.: seguro de vida).
A correspondência de nacionais e estrangeiros com otitro beligerante
é geralmente proibida e, ao menos. censurada.

c) Q u an to aos bens

Os bens de particulares, até o final do século XVIII, eram confiscados,


entretanto, por influência da concepção de que a guerra é entre Estados,
este tratamento foi alterado. Desde o século XIX, e nas'.Convenções de
Haia se estabeleceu que a propriedade privada não pode ser objeto de
confisco. O mesmo tratamento tem sido dado a dívidas e créditos de
particulares.
Na prática, todavia, este respeito à propriedade privada não tem sido
cumprido. Na Ia Guerra Mundial usou-se do seqüestro (“guarda e admi­
nistração dos bens”) e não do confisco. Entretanto, na Paz de Versalhes
os Estados retiveram e liquidaram os bens alemães n o seu território.1' Na
2- Guerra Mundial, em diversos casos, houve o confisco. Entretanto, após
a Paz diversos Estados acabaram devolvendo os bens confiscados.
E de _se.. assinalar....c^ae.-.a-.i;espcitcuiupjripii r ria à a -, priva d.) é regra-da-
~gH£ÍI3i^WIfi§ÍE!5aPasttén considera que as normas de respeita.à,pro.prig7_
dade privada, apesar das violações, contiauam em vigor.-
Os bens do Estado estrangeiro que.diz.emxespeita iL'guerra.são-passíveis
<je confisco. Os dçjnais ben s, d o d o m ín io público, fio^erâoser^utilizados
pelo Estado inimi^o, rnas não confiscados (Accioly).
Aos navios mercantes inimigos em porto do beligerante é dado um
prazo para que se retirem.18 E o “indulto”, ou “prazo de favor” , que tem
a sua origem na guerra da Criméia, quando Napoleão III deu o prazo de
seis semanas aos navios russos. O “indulto” não é utilizado quando o navio
mercante pode ser transformado em navio de guerra. A Convenção de
H aia.(1907) sobre o regime dos navios mercantes inimigos no começo das
hostilidades determina que se o navio não pode sair por força maior no
prazo estipulado, ele pode ficar detido (capturado) ou ser requisitado para
devolução após a guerra.1" Os navios neutros estão sujeitos ao direito de
angária.

1480
NOTAS
I. Arnold Duncan MrNair-A. D. Watts — Legal Effects of War. I'JGG: Isidoro
Rui .Moreno — Guerra Terrestre y Aérea, 1926. págs. 43 e segs.. Arnold VciVair
— Les effets de la guerre sur les traites, in RdC, 1937, vol. I. t. 59. págs. 527 e
segs.; Lucien de Saint-Croix — La Déclaration de Guerre et ses effets immédiats
en droit français, 1892; Agostinho Curti Gialdino — Gli Effetti della Guerra sui
T rauati, 1959; Michele Scndiero — Aspecti dei Poteri Necessari per lo Stato di
Guerra. 1969; Alton Frye — A Responsible C ongress. 1975, págs. 177 e segs.:
Edward S. Corwin — Tota! War And the Constitmion, 1947; Bernard Schwartz —
Los Poderes del Gobierno, vol. II, 1966; Arthur M. Schlesinger Jr . — T he Imperial
Presidency, 1973; Louis Henkin — Foreign Affairs and T h e Constitution, 1972;
Frits Kalshoven — The Law o f W arfare. 1973. V. os estudos sobre a guerra do
Vietnam e e a Constituição de Gidon GottJieb, Lawrence Law Velve!, Francis.D.
W o rm u lh ,Jo h n Norton M oore e a “ note" de Harvard Law Review, todos ¿«T h e
Vietnam War and International Law, editado por Richard A. Falk. vol. 2, 1969,
págs. 597 e segs. V'. ainda estudos sobre o mesmo assunto de Eric F. Goldman,
Quincy Wright e W. Taylor Revelly. III, etc. todos in The Vietnam W ar and Inter­
nationa) Law, editado por Richard A. Falk, vol. 3, 1972, págs. 489 e segs.; Jean
Beauté — Le probléme de la lim itation des com pétences du Président des Etats
Unís en matiére d’operations militaires, in RGDIP. O ctobre-D écem bre 1976, págs.
1.037 e segs.; W. Taylor Revelly, III — T h e Power to Make AVar. in T h e Constitution
and T h e Conduct of Foreign Policv, editado por Francis O. Wilcox e Richard A.
Frank 1976, págs. 83 e segs.; Francis Hamon — La loi du 7 Novembre 1973 sur
les pouvoirs de Guerre du Président des Etats Unis et du Congrés, in Mélanges
offerts a George Burdeau. Le Pouvoir, 1977, págs. 539 e segs.; Thom as M. Franck
— A fter T h e Fall; The New Procedural Framework for Congressional Control over
T h e W ar power, ¿«AJIL, O ctober 1977, vol. 71, ns 4, págs. 605 e segs. V.'ainda os
estudos de; Philippa Strum, Charles A. Lofgren, Raoul Berger, Don Wallace, Jr.,
Scott J . W enner, Charles N. Brower, Eugene V. Rostov, in T h e Vietnam War and
International Law, editado por Richard A. Falk, vol. 4, 1976, págs. 479 e segs.;
Clinton Rossiter — The Suprem e Court and The Com m ander in Chief, 1976;
M ichael J . Glennon — The War Power Resolution ten Years Later; More Politics
than Law, in AJIL, July 1984, vol. 78, n - 3, págs. 571 e segs.; Charles Rousseau —
Le Droit des Conflits Armés, 1983; Eugene V. Rostow — President, Prime Minister
or Constitutional Monarch, ¿«A JIL, O cto ber 1989, vol. 83, ns 4, págs. 740 e segs.;
Thom as M. Franck — Rethinking W ar Powers: By Law or by “Thaumaturgic
Invocation”?, ín AJIL. October 1989, vol. S3, ns 4, págs. 766 e segs.; Lori Fisler
Damrosch — Covert Operations, ¿«A JIL . O ctober 1989, vol. 83, n e 4. págs. 795 e
segs.; L. Henkin — United States N uclear Defense Policy; T h e Constitutional
Framework, in Sri lantra Journal o f International Law, vol. 1. Ju n e 1989, págs. 63
e segs.; Edward S. Convin — Total War and the Constitution, 1947; Jo h n Hart Ely
— W ar and Responsibility. Constitutional Lessons o f Vietnam and Its Aftermenth,
1993.
2. Esta motivação pode ser muitas vezes falsa; a Alemanha em 1914 declarou
que aviões franceses a haviam bom bardeado, o que foi negado depois da guerra
pelos próprios alemães.

1481
3. O arl. 2” determina: “ O estado de guerra deverá ser notificado sem demora
às Potências neutras e não produzirá efeito, com relação a elas, senão depois de
recebida uma notificação, que poderá ser mesmo feita por via telegráfica. Contudo,
as potências neutras não poderão invocar a falta de notificação, se se estabelecer
de maneira indubitável que de fato conheciam o estado de guerra."
4. Na I a Guerra Mundial a Alem anha declarou guerra à França depois de ter
invadido o território francês, violando assim a Convenção de Haia.
5. Houve de certo m odo o atendim ento a uma das razões que fundamentam
a concepção anglo-saxã de que a declaração de guerra é desnecessária.
6. E interessante observar que se tem discutido em saber se a nota japonesa
de 20 de novembro de 1941 e a norte-americana de 26 de novembro de 1941
eram ou não ultimátum.
6A. Um grande problema atualm ente em discussão no D. Constitucional e
com grande repercussão no DIP é de se saber s£ o Presidente da República pode
utilizar as forças armadas no exterior sem- autorização do Congresso. A questão
tem sido debatida nos EUA em \irtude da guerra do Vietnam e. A Corte Suprema
se recu so u a considerá-la inconstitucional, mas os debates no campo doutrinário
perm anecem . A Corte Suprem a considerou que se tratava de uma questão política.
F.sta tem sido caracterizada com o aquela em que “não se pode adotar padrões
ju diciais para resolvê-la”, ou, ainda, quando existe “uma impossibilidade de decidir
sem haver inicialmente uma determ inação política de aspecto não judicial” . Ale­
ga-se que se o poder do Presidente para utilizar as forças amadas fosse restringido,
isto diminuiria o seu poder de defender o país. Sustenta-se ainda que a guerra do
V ietnam e não foi uma guerra no sentido técnico ju ríd ico ; bem como que os
acordos da defesa coletiva que são aprovados pelo Senado nos EUA já constituem
um a autorização para o Executivo quando agir em execução destes acordos. No
caso do Vietnam e houve ainda um elem ento a ser acrescentado, que é a Resolução
do G olfo de Tonquim, que o Executivo interpretou com o uma autorização à sua
ação; sendo que esta autorização é negada por outros. Finalm ente, é de se lembrar
que o Presidente é com andante-chefe das Forças Armadas. Em sentido contrário
vários argumentos podem ser alinhados: a) o Presidente só pode declarar guerra
autorizado pelo Congresso; b) estas intervenções militares são verdadeiras guerras
no sentido material e podem conduzir o pais a uma guerra em sentido técnico-
ju ríd ic o ; c) se não houver o con trole pelo Congresso o Executivo sozinho pode
engajar o país em uma guerra; d) cabe ao Congresso autorizar o Presidente a
declarar a guerra; etc. Na verdade, é extrem amente difícil se-chegar a uma con­
clusão nesta matéria, tendo em vista que o Direito e a Política se entrelaçam
intim am ente. A política externa do Executivo ficaria enfraquecida se ele não
pudesse utilizar prontam ente as forças armadas. Por outro lado, o Congresso
poderia, em certos mom entos, por motivo de política interna, aniquilar a política
externa do Executivo negando a utilização das'forças armadas. Entretanto, do
ponto de vista estritamente ju ríd ico , não podemos tirar a razão dos que negam a
constitucionalidade d o Presidente agir sem autorização do Legislativo.
D ’Amato salienta que a linguagem da Resolução do Golfo de Tonquim não
tem a especificidade de um a declaração de guerra. E mais, a linguagem é tão
ampla que-se fosse uma declaração de guerra seria uma delegação de poder do
Congresso ao Presidente, o que é inconstitucional.

1482
Nos EUA a participação militar sem autorização do Congresso tem sido cons­
tante na História norte-americana. As ações são empreendidas polo Presídeme cm
nom e da legítima defesa, etc., sem que elas sejam consideradas guerra. Tendo em
vista a guerra do Viemame, o Congresso aprovou, em 1973, o “The War Powers
Act” , que estabelece que na ausência de declaração de guerra as forças armadas
norte-am ericanas só podem ser utilizadas em hostilidades 011 em situações de um
ataque armado iminente aos EUA, ou às suas forças armadas, proteção de cidadãos
norte-am ericanos durante sua evacuação ou cumprindo específica autorização
legal. A utilização das forças armadas deverá ser comunicada ao Congresso e não
poderá ser feita por prazo superior a sessenta dias, prorrogáveis por mais trinta
dias sem que haja autorização por legislação específica. Determ ina ainda que o
C o n g resso p o d e p ô r fim ao uso da fo r ç a armada. Esta legislação se utiliza de
expressões ambíguas como “ataque armado iminente” e “ hostilidades". Pode-se
observar que em qualquer país seria extremamente perigoso deixar apenas nas
mãos do Executivo o poder de iniciar uma guerra. Tem sido considerado que a
“W ar Powers Resolution” não tem funcionado bem, com o mostram as ações no
Líbano, Granada, Nicarágua, Golfo Pérsico, etc., e o erro parece ser que o Presi­
dente pode usar em casos amplos demais as forças armadas, desde que seja em
um período de tempo fixo (Thom as M. Franck). O Congresso tem procurado
“lidar” com as atividades paramilitares subversivas, apesar de elas não estarem
incluídas na “War Powers Resolution” de 1973.
No caso da Guerra do Golfo, o Presidente Bush colocou o Congresso diante
de um fato consumado. Ele só solicitou autorização ao Congresso em jan eiro de
1991, quando as tropas já tinham sido enviadas ao Golfo Pérsico em agosto de
1990. Ela foi considerada com o autorizada pelo “War Powers Resolution”.
Nas últimas intervenções armadas, que são rápidas, o Congresso não tem
participação. Contudo, em 1992, o Legislativo autorizou os fuzileiros navais a
ficarem 18 meses no Líbano.
A Guerra da Coréia não foi aprovada pelo Congresso dos EUA com os seguintes
argum entos: a) era d efesa d a C o r é ia do Sul; b) a autorização do CS substituía a
do Congresso; c) era uma ação de polícia.
A grande questão é a dos Estados entrarem em “guerras” (no sentido material)
sem qualquer autorização parlamentar. O fato não é novo e perm anece até hoje.
O Presidente do Conselho de Ministros da França, Jules Ferry, para as suas expe­
dições coloniais, utilizava a seguinte técnica: a) pedia créditos insuficientes para
não alertar a opinião pública; b) enviava as tropas aos poucos; c) começava a
cam panha militar sem avisar à Câmara; d) comprometia a honra da bandeira até
que htjuvesse um não retorno; e) exigia mais créditos; /) em nom e do “prestígio
" da Fran ça” mandava mais tropas (Pierre Miquel — La Troisièm e République,
1989). O que se fazia no final do século X IX -é o mesmo que se faz no final do
. século X X , se seguirmos os com entários de Alain Jo x e (L ’Am érique Mercenaire,
• 1992): “mas não se declara mais guerras, entra-se nelas de fato por pequenas
portas e procedimentos administrativos” . Valéry Giscard d ’Estaing ordenou expe­
dições militares em guerras na África sem aprovação da Câmara.
No caso da Guerra do Golfo, o Presidente convocou um a sessão extraordinária
do Parlam ento, que votou a participação da França (Olivier Duhamel — Le Pouvoir
.Politique en France, 1993).

1483
7. É de se observar que em caso de agressão o Eslacla que c'xerce a legítima
defesa não precisa fazer declaração de guerra peíante o 1)1.
8. A potencia protetora passa a ter as seguimes funções: 1) proteger os na­
cionais do beligerante; 2) conduzir a negociação para a troca do pessoal diplomá­
tico e consular; 3) proteger a propriedade privada dos nacionais do beligerante;
4) prote.ger com a Cruz Vermelha os prisioneiros de guerra; 5) proteger "as
propriedades públicas (arquivos, imóveis oficiais)" do beligerante; 6) em alguns
Estados intervém com “fins de bons oficios” nos julgamentos de presa (Rousseau).
9. Assim, no século XVII, ao ser iniciada a guerra, fazia-se uma proclamação
em que se afirmava que os tratados cessavam de existir. Este costum e chamava-se
“diffidatio". Posteriorm ente passou-se a declarar que a guerra, “ipso fació’’ , ab-
rogava os tratados.
10. Esta tese, que é hoje definida, ®não constitui novidade, sendo q u e ja fora
consagrada em uma decisão de Corte Suprem a norte-americana em 1823. Em
1910, na A rbitragem das Pescarias do A tlántico Norte, o laudo arbitral afirma que
muitas “obrigações de tratados não são anulados pela guerra, ficando, quando
muito, suspensas por ela” (Accioly).
11. V. nota abaixo. Os contratos celebrados com um nacional do inimigo ai
residente são nulos, porque contrariam a ordem pública.
12. E interessante observar que há duas correntes para identificar os individuos
inimigos; a) o sistema francês da nacionalidade é o predominante; b) o anglo-saxão,
que é o critério do domicílio, não interessando saber se é nacional de Estado
inimigo ou neu tro (foi abandonado pela Grã-Bretanha). A mesma duplicidade
ocorre nas pessoas jurídicas; a) o critério tradicional da sede social; b) o critério
anglo-saxão do controle social (é o predom inante).
13. Na Antiguidade e na Idade M oderna, se os individuos nâo se retiravam,
o Estado podia expulsá-los em massa (xenelásia). A legitimidade deste procedi­
mento foi ainda adotada pelo Instituto do DI (1892). Entretanto, a partir do século
X IX ela deixou de ser praticada. Neste século começou-se também a amenizar o
tratam ento ao estrangeiro nacional do beligerante deixando-se, por exem plo, de
encerrar todos eles. Parece que este procedim ento foi empregado pela última vez
em 1803, ao se mandar prender todos os hom ens ingleses que eslava in na França
entre 18 e 60 anos.
14. No Brasil previu-se o internam ento da Lei 3.393, de 1917. Na 2- Guerra
Mundial o Brasil internou japoneses e italianos. Contudo o Brasil só declarou
guerra ao Ja p ã o em ju n h o de 1945. A crescenla Rousseau que o Brasil ignorou os
mais elem entares princípios de D ireito Internacional e que se apoderou de 10 a
30% dos depósitos bancários dos súditos inimigos.
15. A té recentem ente esta capacidade era negada. Na C onferência de Haia
de 1907, no regulam ento anexo à convenção sobre leis e costum es à guerra
terrestre, no seu art. 23, é proibido que se suspenda ou extinga “ diretos e ações
nacionais da parte adversa". Duas interpretações surgiram: a anglo-saxã, susten­
tando que a proibição era apenas para os comandantes militares na ocupação do
- território inim igo que não podiam proibir o acesso aos tribunais dos habitantes
do território ocupado; a da Europa Continental, que defendia que a proibição se
aplicava em relação aos nacionais inim igos do território do Estado. A primeira
concepção fo i a predominante nas duas guerras mundiais e adotada no Brasil na
Lei 3.393, (le J917. A jurisprudencia norteam ericana na 2’ Guerra .Mundial nrgou
a capacidade de ser parte em um tribunal: a) aos governos estrangeiros inimigos;
b) aos estrangeiros nacionais de países inimigos que residissem nestes países. Con­
tudo, reconheceu este direito aos nacionais dos Estados estrangeiros inimigos que
residissem no ELJA.
16. A proibição de comerciar já era pregada por Bynkershoek e pela doutrina
anglo-saxà. A proibição atinge os nacionais e estrangeiros. Tem-se aplicado o
critério da nacionalidade e do domicílio em relação às pessoas com as quais é
proibido com erciar.
17. “O seqüestro transformou-se (...) em verdadeiro confisco mas a Alemanha
foi obrigada a indenizar seus nacionais” (Accioly).
"18. Outrora eles eram confiscados.
19,-No caso de detenção (captura), ao ser devolvido o navio, não há indeni­
zação a ser paga. No caso de requisição, uma indenização deve ser paga.
CAPÍTULO LXII

A GUERRA TERRESTRE1

598 — As forças armadas; 5 9 9 — Meios de combate; 600 — A


espionagem; 601 — Sítio e bombardeio; 602 — Prisioneiros de guerra;
603 — Feridos e enfermos; 604 — Mortos; 605 — Reféns; 606 —
Parlamentários; 607 — A proteção dos civis; 608 — Invasão e ocu­
pação; 608A — Direito de perseguição; 608B — Mercenários; 608C
— Infrações graves.

598. A distinção entre beligerantes e não beligerantes, clara nos pe­


ríodos anteriores da História, tornou-se quase sem sentido com a concepção
de guerra total, que, de certo modo, atinge indiferentemente tanto a uns
como a outros. Atualmente tem-se feito a distinção entre beligerante e
combatentes. O primeiro é aquele que é parte em um conflito armado
(Estado), enquanto o segundo é o que participa pessoalmente em um
combate (indivíduo).
Tanto a população civil como as forças armadas dão a sua contribuição
para a guerra. Entretanto, procura-se respeitar õs nao EêKgêrames fazendo
com que eles nao sejam alvo de ataque,2 nem sejam feitos prisioneiros.
Devendo, entretanto, se sujeitar ã sanção penal se praticarem atos de
beligerância.
O regulamento anexo à convenção relativa a leis e usos da guerra
terrestre (Haia, 1907)3 afirma, no seu art. 39, que as forças armadas (be:
liberantes) se compõem de combatentes e não combatentes (ex.: fornece­
dores). São também não combatentes o pessoal dos serviços médicos mi-
litares, que são incluídos nas forças armadas. Os jornalistas, pelo Protocolo
1 (iy/V ) as Uonvençoes de Direiío'HTTmSHitário (1949), devem estar mu­
nidos de um cartão de identidade (o modelo é fixado no protocolo) e são
considerados civis.
As forças armadas de uma parte em luta se compõem: do exército
regular e de auxiliares (milícias e corpos de voluntários).4 Estes corpos

1487
auxiliares também estão sujeitos aos direitos e deveres da guerra desde
que preencham as seguintes condições: “ ]) estarem sob o comalido de
uma pessoa responsável ’ por seus subordinados; 2) terem um signo distin­
tivo, fixo e reconhecido a distância; 3) levarem armas ostensivamente; 4)
conformarem-se em suas operações às leis e usos da guerra” (re”gulamento
acima mencionado). São combatentes os que têm parte ativa na luta.
O Protocolo 1 às Convenções de 1949 de D. Humanitário,°A aprovado
em 1977. define forças armadas de uma parte em luta como: “toda forca
armada organizada, grupos e unidades que estão sob um comando res-
ponsável para a Parte pela conduta de seus subordinados, mesmo se esta
Parte é representada por um governo ou uma autoridade não reconhecida
por uma Parte adversa”. Estas forças devem ter um sistema interno de
disciplina e respeitar as normas de direito internacional. São todos eles
considerados corpbat.entes, com exceção do pessoal médico e religioso.
Um outro caso que nos interessa é o do levantamento em massa.6 O
regulamento citado determina que a população “de um território não
ocupado” que se arma para enfrentar o invasor “será considerada como
beligerante, se estiver ostensivamente armada7 e se respeitar as leis e os
usos da guerra” (art. 29). Ela só recebeu uma configuração jurídica na
Conferência de Bruxelas (1874), reunida por iniciativa do Czar Alexandre
II para formular uma declaração das leis e costumes da guerra.
Este texto convencional consagrou uma distinção que não tinha maior
fundamento, ou seja, o de apenas proteger o levantamento em massa de
território não ocupado. Entretanto, esta distinção não é mais aceita, tendo
em vista o que dispõe a Convenção de Genebra de 1949 relativa ao trata­
mento aos prisioneiros de guerra no seu art. 4®, alínea 2, em que estabelece
serem considerados prisioneiros de guerra: “os membros de outras milícias
e de outros corpos de voluntários, inclusive os que façam parte dos movi­
mentos de resistência organizados, pertencentes a uma parte em conflito
e agindo fora ou no interior do seu território, mesmo que esse território
esteja ocupado”, desde que preencha as condições enumeradas na Con­
venção de Haia de 1907.
E de se assinalar que os não combatentes em determinadas situações
têm o direito de serem tratados como prisioneiros de guerra: correspon­
dentes de jornal, mensageiros, autoridades chis, etc. Sendo que aqueles
que acompanham um exército sem dele fazerem parte (ex.: correspon­
dentes, fornecedores) necessitam possuir “um atestado de autoridade mi­
litar do exército que eles acompanhavam" (art. 13 do citado Regulamento).
Um caso que m erece destaque nos dias de hoje é o dos movimentos
de resistência, que foram comuns em toda a Europa durante a 2a Guerra
Mundial. A Alemanha (ordenança de 1938) fuzilava todo franco-atirador
que atacasse o exército alemão e não fizesse parte das forças armadas do
inimigo. A Resistência francesa, em 1944, recebeu por uma ordenança um
estatuto jurídico em que se reconhecia que ela integrava o exército francês
desde que tivesse à sua frente um chefe reconhecido pelo Comitê Francês

1488
de Li líe ila ç ã o N acio n al e a sua o rg an ização re c o n h e c id a pelo C FLN . Seiis
m e m b ro s passaram a usar em b lem as (b ra ç a d e ira s ); apesar disso a A lem a­
n h a co n tin u o u a fuzilá-Ios.
O Protocolo I protege como prisioneiro de guerra a guerrilha (exclui
os mercenários). Os guerrilheiros não precisam mais usar uniformes.só
permanecendo a obrigação de portar armas abertamente no momemo do
combate e respeitar as regras do direilo humanitário, o que exclui os
terroristas. E de se lembrar que pela Convenção de 1949 a guerrilha podia
não ter o tratamento do prisioneiro de guerra, bastando para isso que o
captor considerasse que ele não tinha respeito às leis de guerra. M. Arassen
observa que há uma discriminação entre as forças regulares, que são obri­
gadas a respeilar todas as regras de D. Humanitário, e a guerrilha., que
pode em certos casos não respeitar.
As crianças menores de 15 anos não podem ser recrutadas.
599. As armas a serem utilizadas na guerra sofrem certas restrições a
fim de se evitar “males supérfluos". Quando se fala em meios de combate
estamos no referindo as armas utilizadas, enquanto os métodos de combate
significam a maneira de se utilizar tais armas. Deste modo não são admitidos
o uso e emprego de: a) “projéteis de peso inferior a 400 gramas, explosivos
ou carregados de matérias fulminantes ou inflamáveis”; b) as balas “dun-
dum”;7B c) armas envenenadas; d) gases asfixiantes, deletérios ou tóxicos;
e) armas bacteriológicas.8 Os amores Mirimanoff-Chilikine têm salientado
que a classificação em armas convencionais e armas de destruição em massa
(ABC) está caduca, tendo em vista as bombas com bilhas, com flechas
(pequenas), etc., que atingem a todos indiscriminadamente, causando
males supérfluos. Estas armas e outras foram usadas pelos EUA na guerra
do Vietname. E de se recordar que os EL?A usaram da guerra meteorológica
na guerra do Vietname, provocando chuvas.
O regulamento anexo à Convenção de Haia relativa às leis e usos na
guerra terrestre estabeleceu, no seu art. 2 2 ,.que “os beligerantes não têm
direito ilimitado quanto à escolha dos meios de prejudicar o inimigo”, e
no art. 23 enumera várias proibições: 1) matar ou ferir à traição indivíduos
pertencentes à nação ou ao exército inimigo; 2) matar ou ferir um inimigo
que tendo deposto as armas, ou não tendo meios de defesa, se entregou
“à discrição”; 3) declarar que não se dalá quartel;SA4) usar indevidamente
o pavilhão nacional ou insígnias- militares e uniformes do inimigo, bem
como signos distintivos da Convenção de Genebra; 5) destruir ou apreen­
der propriedades inimigas, salvo os casos em que a destruição otra apreen­
são forem imperiosamente recomendadas pelas necessidades da guerra;
6 ) declarar extintos, suspensos ou não admissíveis em justiça os direitos e
ações dos nacionais da Parte contrária; 7) forçar os nacionais da Parte
contrária a participarem das operações de guerra dirigidas contra o seu
país, mesmo no caso em que tivessem estado a seu serviço antes do início
da guerra; 8) “atacar ou bombardear, por qualquer meio que seja, cidades,
aldeias, habitações ou edifícios que não estejam defendidos"; 9) “entregar

1489
ao saque uma cidade 011 localidade, mesmo tornada de assalto". Outras
proibições podem ser assinaladas: a) simular rendição para quando o
inimigo se aproximar poder melhor atingi-lo (Fauchille, Accioly); b) “Ne­
nhuma pessoa protegida poderá ser punida por infração que não tiver
cometido pessoalmente. As penas coletivas, da mesma maneira que qual­
quer medida de intimidação ou de terrorismo, são proibidas.” A pilhagem
é proibida. As medidas de represálias contra as pessoas protegidas9 e seus
bens são proibidas (Convenção de Genebra de 1949 relativa à proteção
dos civis em tempo de guerra).
Entretanto, nada proíbe a astúcia (ex.: camuflagem).
Em 1977 foi aprovada na ONU convenção proibindo o uso militar de
técnicas de modificação do meio ambiente com fins militares ou outros
fins hostis. Esta convenção tem a sua origem em um projeto russo-norte-
americano. Segundo Falk, até 1970 várias atividades militares não eram
vistas como atingindo o meio ambiente como: terra arrasada, destruição
de colheitas, etc.
O Protocolo I às Convenções de 1949 de D. Humanitário, aprovado
em 1977, estabelece expressamente que os Estados não têm um direito
ilimitado para as partes escolherem os meios e métodos de guerra. São
proibidas as armas que causem sofrimento supérfluo. Proíbe a perfídia,
como fingir que está doente, fingir que é civil, usar bandeira falsa, etc. O
citado protocolo distingue a astúcia da perfídia. Rousseau afirma que
astúcia é o ato para induzir o adversário em erro ou fazer com que ele
cometa uma imprudência, mas que não viola o Direito Internacional,
enquanto a perfídia tem por finalidade enganar, como faltar com a palavra
dada.
Em 1981 foi concluída convenção sobre a interdição ou a limitação
de algumas armas clássicas que podem ser consideradas como produzindo
efeitos traumáticos excessivos ou como atingindo sem discriminação. Ela
tem três protocolos anexos sobre três categorias diferentes de armas clás­
sicas: a) uma visa às armas de fragmentação da granada a bomba de avião
e são proibidas Os estilhaços não são localizáveis por raios X no corpo
humano;9-' b) as minas, armadilhas e outros dispositivos, que não podem
ser usados se atingem os civis. Só podem ser usados em objetivos militares.
E proibida a colocação de armadilhas em objetos inofensivos com o brin­
quedos de criança, bem como são proibidas armadilhas que causem sofri­
mentos supérfluos, as minas devem ter mecanismos de neutralização para
que elas fiquem desativadas; c) sobre armas incendiárias, que são proibidas
contra os civis e ainda contra objetivos militares que se localizem no interior
de uma concentração de civis em caso de ataque por aeronave.
Algumas observações ainda podem ser formuladas. Tem razão Ali Saab
ao afirmar que é proibida toda arma que não discrimina civil de comba­
tente. Bretton observa que não se sabe o que é mal supérfluo. A mesma
imprecisão continua com a expressão “efeitos traumáticos”. Traumático
vem do grego e significa ferimento. O uso de minas não é proibido, mas
tem sido considerado “perverso” devido aos danos que causam às pessoas.
Pode-se acrescentar que certos tratados protegem o meio ambiente de
modo indireto, ao proibir certas armas, por exemplo, incendiárias (A.
Bouvier).
Um grande problema atual é a colocação de minas, sendo que nas
últimas lutas civis internacionais a ONU calcula que foram colocadas 100
milhões, em 62„ países, que estão causando danos terríveis nas pessoas. A
ONU tem mantido especialistas para desarmá-las no Camboja, Moçambi­
que, Afeganistão, etc. Os EUA proibiram a venda de minas de 1992 a 1996
e o Parlamento Europeu de 1992 a 1997.
Calcula-se existir 9 milhões de minas em Angola, 4 a 7 milhões no
Camboja, 3 milhões no Vietnã, 10 milhões no Irã, 9 no Afeganistão, 7
milhões na ex-Iugoslávia e 5 a 10 milhões no Iraque. O preço de cada
mina é de 3 a 10 dólares. O custo de busca e neutralização é de 300 a
1000 dólares.
Em 1997 foi assinada em Ottawa a convenção para a proibição de
Minas Antipessoas. Ela proíbe a produção, o transporte e o armazenamento
desta arma. Os campos minados serão desativados em dez anos. EUA,
Rússia e China não assinaram esta convenção.
600. A espionagem é um meio lícito no âmbito internacional. A sua
utilização não é privilégio de guerra, mas é utilizada também na paz. Na
paz a espionagem não tem qualquer regulamentação internacional e a sua
repressão é feita pela legislação penal de cada Estado.
A espionagem em tempo de guerra foi tratada no regulamento anexo
à Convenção de Haia de 1907 relativa às leis e usos de guerra terrestre. O
espião é definido com o sendo “o indivíduo que, agindo clandestinamente
ou sob pretextos falsos, recolher ou procurar recolha informações na zona
de operações de um beligerante, com a intenção de comunicá-los à Parte
contrária”.10
O espião apanhado “em flagrante não poderá ser punido sem julga-
mentoprévio”. Ò citado Protocoló I determina que o espião não tem status
de prisioneiro de guerra.
O espião que conseguir se unir ao seu exército depois de atos de
espionagem, ao ser preso posteriormente será considerado “prisioneiro
Be güerra è nãõ incorre em responsabilidade alguma por seus atos ante-
TiõTes de êspionagem''. ~~~
601. Sítio “é o cerco posto a uma cidade ou a uma praça forte, para
impedir suas comunicações com o exterior e, por esse meio, levá-la a
render-se” (Accioly).
O bombardeio é um ato que pode existir em caso de sítio ou não. Ele
começou a ser utilizado a partir do século XVI.
O Dl admite a prática tanto do sítio com o do bombardeio, estabele­
cendo entretanto certas normaspara regulamentá-los. O regulamento ane­
xo à Convenção de Haia, de 1907, relativa às leis e usos de guerra terrestre,
trata da matéria nos arts. 25, 26 e 27, fixando as seguintes regras: a) “é
proibido atacar ou bombardear, por qualquer meio que seja, cidades,

1491
aldeias, habitações ou edifícios que não estejam defendidos” ;" b) antes
de ser iniciado o bombardeio, as autoridades do local a ser bombardeado
devem ser avisadas; este dispositivo entretanto não l'oi respeitado na 2a
Guerra Mundial;1' c) “devem ser poupados os edifícios consagrados aos
cultos, às artes, às ciências e à beneficência, os monumentos historíeos, os
hospitais e os locais de alojamento de enfermos e de feridos, salvo o caso
em que estejam sendo empregados ao mesmo tempo para fins militares”.
Os sitiados têm o dever de designar estes locais por meio de sinais visíveis
especiais que serão antecipadamente notificados ao sitiante.
O Protocolo 1 estabelece que não podem ser atacadas instalações que
tenham “forças” perigosas, como usinas nucleares. E dada uma proteção
aos bens culturais e igrejas. E proibido o ataque a localidades não defen­
didas, bem como as que tiverem sido desmilitarizadas por acordo.
Na Paz de Westfália só se falou na devolução de arquivos e documentos.
Foi em 1815 que surgiu a norma de restituição dos bens culturais, isto é,
após as campanhas de Napoleão.
A proteção aos bens móveis e imóveis que têm “grande importância
para o patrimônio cultural dos povos” está consagrada pela Convenção de
Haia de 1954 relativa à proteção dos bens culturais em caso de conflito
armado: eles não poderão ser objeto de saque, requisição, represálias,
etc.12AEles deverão ser identificados com um sinal especial. Esta convenção
cria ainda uma proteção especial para os bens culturais de maior impor­
tância desde que: a) eles estejam a uma “distância suficiente de um grande
centro industrial ou de todo objetivo militar importante”; b) eles não sejam
utilizados para fins militares. Os bens que gozam de proteção especial são
inscritos no “Registro internacional de bens culturais sob proteção espe­
cial” sob o controle da UNESCO. Prevêem-se ainda potências protetoras
para os bens culturais (com ou sem proteção especial) e um procedimento
de conciliação. A UNESCO dará o “concurso técnico”. A Convenção de
1954 tem um protocolo, concluído em 1999, que estabelece a responsabi­
lidade penal de quem causa danos aos bens culturais.
Dois aspectos relativos ao sítio devem ser ainda examinados e sobre
os quais não há normas explícitas do DL Um é saber se os agentes diplo­
máticos' no local sob sítio têm o direito de se retirar, sendo que a maioria
dos autores responde no sentido afirmativo. O outro aspecto diz respeito
ao poder do sitiante de obrigar as mulheres, crianças e velhos que se
retiram a voltar à praça sitiada. Tal fato pode ocorrer quando o chefe do
local sob o sítio ordena a saída de tais pessoas para facilitar ou prolongar
a defesa. Ainda aqui não há norma de Dl explícita e o comandante do
exército que realiza o sítio pode impedir a retirada destas pessoas se isto
prejudicar a operação militar que realiza.
É proibido o denominado “ bombardeio cego”, que surgiu no período
entre as duas guerras mundiais, atingindo a população civil; por exemplo,
bombardeios italianos na Etiópia (1933-1936); na guerra civil espanhola;
alguns bombardeios japoneses de grandes cidades chinesas (1937). Os

1492
E U A . n a g u e rra do V ie in a m e , cria ra m as “ zonas d e b o m b a rd e io liv re", ou
“ zo n as d e fo g o livre” , sen d o q u e e n o rm e s le g iõ e s e ram esvaziadas de sua
p o p u la ç ã o civil, o que p e rm ilia a g ir sem ad v ertên cia. O s b o m b ard e io s (le
“ s a tu ra ç ã o " p rov ocaram “ d ev a sta çõ e s e co lóg icas irre p a rá v e is” . O s b o m b ar­
d eio s d e p o p u la çã o civil, alé m d e p ro ib id o , é in e fica z , p o rq u e em lugar
d e e n fl a q u e c e r a fo rça m o ral d a p o p u la ç ã o cria u m a v o n tad e cíe resistência.
T a l fa lo fo i con statad o em p e sq u isa s n o rte -a m erica n a s apó.s a 2~ G u erra
M u n d ial (M . A rassen).
602. O tratamento dado aos prisioneiros na Antiguidade era dos mais
cruéis, sendo regra geral matá-los13 ou transformá-los em escravos. Excep­
cionalmente eram libertados. Havia ainda a prática do resgate. Este trata-
mentó continuou ainda <yn grande parte do período medieval para final­
mente o tratamento dado a eles começar a se humanizar por influencia
do Cristianismo. Assim o Concilio de Latrão (1179) condenou a escravidão
e a venda de prisioneiros feitos em guerras entre povos da Cristandade. A
prática da escravidão desapareceu quando esta foi eliminada na Europa.
Entretanto, durante largo tempo os prisioneiros foram objeto de vingança.
A prática do resgate perdurou por longo tempo, sendo que Grotius (século
XVII) ainda declara que a quantia para o resgate de um soldado é a
correspondente a um mês do seu salário.14 No século XVII os prisioneiros
passaram a ser considerados com o pertencendo ao Estado e não às forças
armadas que os tinham aprisionado, como era até então comum. A prática
do resgate (cuja quantia era fixada por cartel no inicio da guerra) perdurou
ainda no século XVIII, sendo que o último cartel neste sentido foi entre
a França e a Inglaterra, em 1780. Neste século firma-se também a prática
de cartéis para troca de prisioneiros. Os campos de concentração surgiram
em Cuba, em 1896, quando foram usados pelos espanhóis em relação aos
cubanos, com o nome de campos de “reconcentração”.
Parece que o primeiro tratado a humanizar o tratamento aos prisio­
neiros de guerra foi em 1875 no tratado de amizade entre EUA e Prússia,
onde se determinou que os prisioneiros de guerra não iriam para as prisões
comuns e ficariam em locais saudáveis onde pudessem fazer exercícios e
seriam tratados como soldados.
No século XIX se afirma o princípio de que os prisioneiros de guerra
deveriam ser tratados pelo captor como este tratava as suas próprias tropas.
A situação dos prisioneiros de guerra passou a ser regulamentada em
várias convenções internacionais: convenção relativa às leis e usos da guerra
terrestre (Haia, 1899), convenção relativa às leis e usos da guerra terrestre
(Haia, 1907), convenção relativa ao tratamento dos prisioneiros de guerra
(Genebra, 1929) e, finalmente, a convenção relativa ao tratamento dos
prisioneiros de guerra (Genebra, 1949).
Atualmente o instituto dos prisioneiros de guerra visa apenas evitar
que~êfes voltem a participar da guerra (Erik Castrén). J¿ ‘‘tima medida de.
precaução tomada em relação a um adversário desarmado” (Rousseau).
A Convenção de Genebra de T 949 ê aplicada rTão apênas êm caso de
guerra, mas em “qualquer outro conflito armado”. Por outro lado a sua

1493
regulamentação se estende não apenas às forças armadas, mas ainda às
milícias, movimentos de resistência, etc., desde que preencham certas
condições (“ter como chefe pessoa responsável pelos seus subordinados”,
“ ter um emblema distintivo fixo e reconhecível a distância”, “portar armas
abertamente” e “conforma-se, em suas operações, às leis e costumes de
guerra”). Ela é ainda aplicada à equipagem da aviação civil e da marinha
mercante, à população que pegue armas, etc.
Os direitos concedidos aos prisioneiros de guerra não são passíveis de
renúncia. A convenção é aplicada sob a fiscalização de potências protetoras.
Os prisioneiros de guerra somente são obrigados a declarar “o seu sobre­
nome,. preñóme e graduação. a data do nascimento e <r> número de ma­
trícula; ou, na falta disso, uma indicação equivalente” . Não podem sofrer
torturas. Podem conservar a sua bagagem pessoal, com exceção do equi-
pamento militar. Eles poderão ser internados “em estabelecimentos situa­
dos em terra firme e que apresentem todas as garantias de higiene e
salubridade.” Não pod em ser^ xp ostos ao fogoaê uma zon a de combate".
“As condições de alojamento dos prisioneiros de guerra serão tão favoráveis
quanto as reservadas às tropas da Potência detentora acantonadas na mes­
ma região”. “A ração quotidiana básica deverá ser suficiente para manter
os prisioneiros em boa saúde e impedir uma perda de peso...” Os campos
terão enfermaria e preferência de médicos de sua nacionalidade. Terão
assistência religiosa. Os oficiais prisioneiros dé guerra só poderão trabalhar
se quiserem. Os suboficiais serão empregados em “ trabalho de suaerm áflLj.
“A Potência detentora dará a todos os prisioneiros de guerra um paga-
mento adiantado do soldo mensal...” cuja, quantia é fixada na convenção.
Eles serão renumerados pelos trabalhos que Fizerem. Poderão receber
remessas de dinheiro. Eles têm direito a manter correspondência. Têm o
direito de apresentar reclamações à autoridade detentora. Os prisioneiros
estão sujeitos às regulamentações do campo e são passíveis de sanção. A
•convenção trata ainda do repatriamento. Os beligerantes deverão, no início
da luta, constituir um “Escritório oficial de informações sobre os prisio­
neiros de guerra que se achem em seu poder”. Em um país neutro será
formada a Agência Central de Informações, que poderá ser organizada
pela Cruz Vermelha. Serão repatriados “os prisioneiros de guerra doentes
e feridos em estado grave”. A hospitalização também pode ser em um
Estado neutro.1’ Estas são algumas das normas fixadas na citada Convenção
de Genebra. Rousseau observa que a potência detentora tem responsabi­
lidade internacional por maus-tratos infligidos aos prisioneiros.
Uma questão após o término da guerra da Coréia, quando grande
parje dos prisioneiros de guerra em mãos da Coréia do Sul e dos EUA se
recusou à repatriação. A Convenção de Genebra apenas determinava que
os prisioneiros “serão libertados e repatriados sem demora, após o fim das
hostilidades ativas”. Duas teses se defrontaram: a comunista, se baseando
em uma interpretação literal da Convenção de Genebra e. alegando que

1494
o soldado é uin funcionario militar e que tem a obrigação de voltar à sua
pátria: a outra tese sustentava que a repatriação não podia ser forçada
tendo em vista a proteção que se procura dar ao prisioneiro dc.^guerra. A
Assembléia Geral da ONU (1952) consagrou a tese de que a repatriação
será feita com o consentimento do prisioneiro de guerra. A questão da
repatriação foi ai fiscalizada por uma comissão de neutros, -
Os prisioneiros de guerra não têm uma situação jurídica inteiramente
pacífica no campo do DI. Assim, o Vietname do Norte, alegando reserva
formulada à Convenção de Genebra de ]949, se recusou a considerar os
aviadores norte-americanos como prisioneiros de guerra, porque eles te­
riam violado o direito de guerra. Na própria guerra da Coréia, a Coréia
do Norte, que adotara a Convenção de Genebra sobre prisioneiros, não
fornecia o nome de todos eles ao CICV.
No Vietname organizações privadas norte-americanas conseguiram re­
patriar pilotos norte-americanos presos. Salienta Falk que estas organiza­
ções são, em certas circustâncias, mais aceitáveis do que Estados neutros
ou mesmo que o CICV.
O citado Protocolo I declara que todo combatente será considerado
prisioneiro de guerra (v. definição acima). Presume-se ser prisioneiro de
guerra uma pessoa que tenha tomado parte ñas hostilidades. Mesmo que
ela não tenha direito a este status ela se encontra protegida de assassinato,
tortura, mutilação, castigo corporal, etc.
Pode-se acrescentar que segundo o Protocolo I todas as pessoas (sejam
prisioneiros de guerra ou não) devem ter um tratamento humano. Assim,
ele proíbe assassinato, mutilação, tortura, tomada de reféns, castigos cole­
tivos, etc., sejam tais atos praticados por civis e militares. Consagra o
“nullum crimen, nulla poena sine lege”. O direito de ser julgado publica­
mente, ninguém pode ser obrigado a se confessar culpado, etc. Consagra
ainda, o Protocolo, uma proteção especial às mulheres e crianças.
A violação das leis de guerra não faz com que o combatente perca o
estatuto de prisioneiro de guerra.
603. Na Antiguidade os médicos já acompanhavam os exércitos. En­
tretanto, foi a partir do século XVI que se começou a organizar os serviços
de saúde. E neste século que são concluídas várias capitulações, sendo que
a primeira foi entre a cidade de Courtrai e Alexandre Farne. Estes serviços
eram deficientes e via de regra só atendiam os feridos do seu exército.16
Foi somente no século XIX que a situação dos feridos em campo de batalha
começou a melhorar com a criação da Cruz Vermelha.17 Em 1864 foi
concluída a Convenção de Genebra, para melhoria de sorte dos militares
feridos nos exércitos em campanha, que deu o estatuto de neutro às
ambulâncias, serviço de saúde, etc Em 1906 nova convenção em Genebra
foi concluída sobre esta matéria. Em 1929, novamente em Genebra, foi
concluída a convenção para a melhoria-da sorte dos feridos e enfermos
nos exércitos em campanha. A matéria está regulamentada atualmente

1495
pula Convenção de Genebra para a melhoria da sorte dos feridos e enfer­
mos dos exércitos en) campanha (1949).
A convenção aplica-se em caso de guerra ou em outro conflito entre
duas partes contratantes. Os direitos ai consagrados não são passíveis de
renuncia. A aplicação da convenção é feita sob o controle de potências
protetoras. Os feridos e enfermos “deverão ser respeitados e protegidos
em todas as circunstâncias". A parte em cujo poder eles se encontrem
deverão tratá-los sem qualquer distinção. “Soinente razões de urgência
médica autorizarão prioridade na ordem dos cuidados a serem prestados.'1
A convenção protege as forças armadas, as milícias, os movimentos de
resistência organizados, tripulação da marinha mercante, tripulação da
aviação civil, etc. “ Os estabelecimentos fixos e as unidades sanitárias móveis
do serviço de saúde não poderão, em nenhuma circunstância, ser objeto
de ataques, mas deverão ser respeitados e protegidos pelas partes em luta.“
A proteção se estende ao pessoal sanitário. Este pessoal “não será retido
se cair em poder da parte adversária, senão na medida em que o estado
sanitário, as necessidades espirituais e o número de prisioneiros de guerra
o exigirem". Tanto o material sanitário, bem como os imóveis destinados
a estabelecimentos sanitários que caírem em poder do inimigo, continua­
rão com a mesma destinação. Os transportes de feridos e enfermos ou de
material sanitário deverão ser respeitados e protegidos. O pessoal empre­
gado em funções sanitárias usarão braçadeira com o emblema distintivo
(Cruz Vermelha ou Cruz de Genebra, etc.). São proibidas as represálias
contra os feridos e enfermos. Os Estados adotarão sanções penais para
reprimir as violações à presente convenção. O julgamento e a punição do
infrator é feita pelo Estado que o deteve, independentemente da sua
nacionalidade. As partes em luta poderão criar zonas sanitárias,18 onde
ficariam os enfermos e feridos, que gozariam de proteção.
O Protocolo I determina que ninguém pode ser punido p or prestar
assistência médica a quem quer que seja. Proíbe que sejam feitas represálias
contra o pessoal médico. Em caso de ocupação, o ocupante deve dar
assistência ao pessoal médico para que ele exerça as suas funções. São
protegidos os meios de transporte do pessoal médico, inclusive as aerona­
ves. O pessoal médico pode portar armas leves. E uma simples proteção
contra uma delinqüência comum. É proibido ao pessoal médico fazer
mutilações, experiências, etc., mesmo quando a pessoa der seu consenti­
mento.
No caso do pessoal médico que cai em mãos do inimigo, surge o
problema dele ter que colaborar com o inimigo. Na 2® Guerra Mundial o
pessoal sanitário foi tratado como prisioneiro de guerra. Na Conferência
de 1949 houve duas tendências: a) eliminar o privilégio de não ser feito
prisioneiro de guerra, para que ele dê assistência aos outros prisioneiros;
b) ser mantido em poder da Potência que o deteve, por necessidade ele
deverá dar assistência aos outros prisioneiros.

1496
Tem sido formuladas algumas obseivações que devem ser reproduzi-
das. O direito humanitario está mal adaptado aos conflitos em q u e o estado
desapareceu e onde se lem por objetivo eliminar urna parcela da popula­
ção. O “pessoal sanitario” é definido pelo direito humanitário “de maneira
muito restrita". Ele só trata do pessoal sanitário cips_exércitos e o seu
tratamento só foi estendido d outras unidades dos governos. Assim não
inclui o pessoal das ONGs e das organizações inter-governamentais. A
ausência do emblema da Cruz Vermelha nas ONGs dificulta a sua proteção.
604. A regulamentação internacional referente aos mortos remonta às
Convenções de Genebra de 1906 e 1929, já mencionadas. Atualmente a
matéria está regulamentada na Convenção de Genebra para melhoria da
sorte dos feridos e enfermos dos exércitos em campanha. As suas noynas
estabelecem: d) após um encontro entre as Partes em luta os mortos
deverão ser procurados, impedindo-se “que sejam despojados”; 6)'deverão
ser registrados, “no mais curto prazo possível, todos os-elementos úteis à
identificação..." dos “mortos da parte adversária caídos em seu poder”; c)
as informações deverão ser enviadas aos escritórios de informações previs­
tos na convenção sobre prisioneiros de guerra; d) antes da inumação ou
incineração, ser feito individualmente um exame dos corpos; é) a incine­
ração será feita “em razão de imperiosas medidas de higiene ou por
preceitos estabelecidos pela religião do falecido"; j) os corpos deverão ser
“sepultados decentemente”.
O Protocolo I determina que as partes deverão procurar as pessoas
consideradas desaparecidas pela parte adversa, bem c o m o transmitir as
informações relevantes.
605. A prática de reféns foi comum na Antiguidade, período medieval
e perdurou até o século XVTII, quando desapareceu, para ressurgir na
guerra franco-alemã de 1870. A Alemanha passou a deter pessoas preemi­
nentes que seriam mortas caso algum ato contrário ao exército de ocupação
fosse praticado. Foi utilizado pela Inglaterra na guerra dos bôeres.
Nas duas guerras mundiais a Alemanha muito se utilizou da prática
de reféns.
A Convenção de Genebra relativa à proteção dos civis em tempo de
guerra proibiu a prática de reféns.
606. Os parlamentários têm a sua situação regulamentada pelas Con­
venções de Haia de 1899 e 1907 relativas às leis e usos de guerra terrestre.
Esta última traça as seguintes normas: eles gozam de inviolabilidade “assim
como o corneta, clarim ou também o porta-bandeira e o intérprete que
o acompanharem”; a pessoa a quem ele é enviado não é obrigada a
recebê-lo; ele pode ser retido temporariamente em caso de abuso (ex.:
incitar à traição); “perde seus direitos de inviolabilidade se ficar provado
de maneira positiva e irrecusável que se aproveitou de sua situação privi­
legiada para provocar ou cometer um ato de traição”.
A Convenção de 1907 define o parJamentário como sendo “o indivíduo
autorizado por um dos beligerantes a entrar em conversações com o outro
e apresentando-se com a bandeira branca” .

1497
Os parlamentónos modernos se utilizam de motorista, operador de
nidio e intérprete.
607. A proteção aos civis já figura nas Convenções de Haia de 1899 e
1907 relativa às leis e usos da guerra Lerrestre. Em Genebra, em 1949. foi
concluída uma convenção relativa à proteção dos civis em tempo de guerra.
A convenção se aplica em caso de guerra ou de conflito armado entre as
partes contratantes. Ela protege “as pessoas que, a qualquer momento e
de qualquer maneira, se encontrem, em caso de luta ou de ocupação, em
poder de uma Parte em luta ou de um Estado ocupante de que elas não
sejam nacionais”. Os direitos aqui consagrados não são passíveis de renún­
cia. Ela será aplicada sob o controle de potências protetoras. A convenção
protege a vida dos civis, proíbe penas coletivas, deportações para o Estado
ocupante, etc. “As pessoas protegidas não podem s'ejr sujeitas ao trabalho
senão na mesma medida que os nacionais da Parte em luta no território
em que elas se achem.” O internamento, ou residência forçada, somente
ser imposto se for “absolutamente necessário” para a segurança do Estado.
O internamento, ou residência forçada, será passível de recurso perante
tribunal ou autoridade administrativa. Não podem ser obrigados a se alistar
nas forças armadas. A convenção trata ainda, entre outras coisas, das “regras
relativas ao tratamento dos internados” : locais de internamento, alimen­
tação, higiene, propriedade pessoal, religião, etc.'9
O Protocolo I estabelece deveres para a população civil, que deverá
respeitar os feridos, doentes e náufragos mesmo quando pertencerem ao
adversário. Determina ainda que os civis devem gozar de proteção dos
perigos oriundos das operações militares. Assim, são proibidos ataques
indiscriminados. Os bens dos civis não devem sofrer ataques ou represálias.
Não devem ser submetidos à fome.
Em 1993 o UN1CEF diz que na última década houve dois milhões de
crianças mortas, 12 milhões sem lar, mais de um milhão ficaram órfãs ou
afastadas de seus pais e cerca d e 10 m ilh õ es traumatizadas. As crianças
estão incluídas na proteção aos civis. Elas sIq mais vulneráveis do que os
adultos. Contudo, nenhum estado quer ser acusado de matar crianças. Há
na população mundial 30% de crianças. O Dl admite que seja soldado a
partir de 15 anos. Na Etiópia, EI Salvador, Moçambique e Peru houve
crianças com menos idade como soldados. Elas são muitas vezes coagidas.
As crianças são usadas para transmissão -de informações, sabotagem, etc.
L. Dasberg afirma que “infância”" é uma noção que varia com a época
histórica, a cultura local e condições socioeconómicas. A convenção para
a p r o te ç ã o das crianças afirma que elas precisam de imunidade e salva­
guardas especiais. O islamismo, a África Negra e a índia têm culturas que
respeitam as crianças na guerra. Existem normas costumeiras para proteger
as crianças com o não ser privada de vida e ter o direito a um tratamento
especial. O UNICEF atua muito na área da saúde, assim em El Salvador,
Líbano e Sudão nas tréguas tem sido feita vacinação. Para Graça Machel
têm sido treinadas para serem soldados durante apenas três semanas. Um

1498
verdadeiro soldado sabe o certo e errado e tem senso de honra. Daí tais
crianças não serem verdadeiramente soldados. Km 1994 foi aprovado um
projeto de Declaração dos Direitos das Crianças em Conllito Armado
(Amsterdã).
Na 2a Guerra Mundial muitas mulheres ilegalmente foram reduzidas
à escravidão sexual (200 a 400.000) e cerca de 70 a 90% delas morreram.
608. A ocupação do território inimigo ern tempo de guerra acarreta
a produção de uma série de efeitos jurídicos. Ela pode ser definida como
sendo aquele ato da guerra em que o exérciLo de um beligerante domina
parte ou todo o território do ouuo beligerante. Ela se caracteriza por dois
fatos: a) o governo não exerce mais a sua autoridade no território; b) o
exército inimigo é quem exerce a autoridade (Accioly).
Tem sido unânime a distinção da ocupação da invasão. A primeira é
a invasão mais a posse do território inimigo, com o fim de conservá-lo. Na
ocupação o exército inimigo procura estabelecer uma administração. Já
na invasão tal fenômeno não ocorre, não há “caráter de estabilidade”. Na
verdade, não existem dois institutos com regulamentações'diferentes: o da
ocupação e o da invasão. A própria Convenção de Haia de 1907 não
reconhece distinção entre invasão e ocupação. O que importa à regula­
mentação jurídica é a circunstância de saber se um Estado beligerante está
de “posse efetiva” de território inimigo. Se tal fato ocorre, surgem os
deveres e os direitos do ocupante. A palavra invasão com sentido próprio
diverso do da ocupação é a invasão-incursão (ex: comandos), em que não
há posse efetiva (neste sentido, Migliazza).
A ocupação também se distingue da conquista, modo de aquisição de
território. Nesta o território do Estado inimigo é incorporado em caráter
definitivo ao vencedor. Já a ocupação é um ato de guerra terrestre de
natureza temporária que pode resultar ou não na conquista. A conquista
é feita após a cessação das hostilidades.20 A ocupação é um ato de hostili­
dades. A conquista atualmente não é mais considerada um modo lícito de
aquisição de território. A “occupatio bellica” se transforma em “occupatio
imperii” após “a cessação prolongada das hostilidades e a não resistência
do imasor” (Accioly).
A ocupação também não se confunde com a “debellatio” . Esta é “uma
conseqüência da ocupação total do território adversário”. O Estado cessa
de existir vez que ele não possui mais território nem soberania (Balladore
Pallieri). Esta era a regra geral, entretanto, durante a 2a Guerra Mundial,
os Estados ocupados pelo Eixo tiveram considerados os seus governos
instalados em Londres como governos no exílio e mantida a sua persona­
lidade internacional. E de se assinalar que a “debellatio” pode ocorrer
antes mesmo da ocupação, uma vez que no fundo se caracteriza pelo “fato
que o território lodo não tem mais organização política” (Rousseau). Por
outro lado, pode existir a ocupação total e não haver a “debellatio”,
quando: a) “permanece o estado de guerra com os aliados do país ocu­
pado”; b) há um movimento de resistência interno, ou um governo no
exílio reconhecido internacionalmente; c) estrutura adminstrativa e judi­

a i'
ciária não funciona em nome fio ocupante e mantém em relação a este
independência (Migliazza) .2I Na " debellalio’’ há a extinção do Estado.
A "occupatio beliica” não se confunde com a ocupação de territórios
"res nullius”, nem com aquela que decorre de arrendamento de território.
Estas últimas ocorrem em tempo de paz, ao contrário da primeira. Por
outro lado, pode existir ocupação militar de territórios em tempo de paz
(p. ex.: para assegurar a execução de um tratado).
As normas referentes a ocupação em tempo de guerra têm sofrido
grande transformação nos últimos séculos. Assim, no século XVIII, o ocu­
pante tinha de um modo geral plenos direitos no território ocupado como
se fosse o soberano. Esta concepção predominou na prática até o início
do século XIX .22 A partir de então, com base-na doutrina do século XVIII,
foi consagrado o princípio que a “occupatio bellica” não transfere sobe­
rania. Salienta Rousseau que a jurisprudência francesa em 1813 já consi­
derava que a ocupação de guerra não transferia a soberania.
No período histórico em que a simples ocupação operava transferência
de soberania, o ocupante podia obrigar os habitantes daquele território a
servirem no seu exército.23 O ocupante podia ainda dispor do território
fazendo cessão dele a um terceiro Estado.
O primeiro autor a distinguir a ocupação militar de um modo de
aquisição de território com todas as suas conseqüências parece que foi
Heffter, em 1844, com a sua obra “Direito das Gentes da Europa” (Oppe-
nheim Lauterpacht). A ocupação foi regulamentada convencionalmente
na Conferência de Haia de 1899, na convenção relativa às leis e usos da
guerra terrestre cujo regulamento anexo estabelece uma série de normas
nos seus arts. 42 a 56. A matéria foi novamente regulamentada na Confe­
rência de Haia de 1907, na convenção relativa às leis e usos da guerra
terrestres, cujo regulamento anexo estabelece uma série de normas nos
seus arts. 42 a 56. Vejamos um resumo destas normas. Território ocupado
é definido como sendo aquele que “se encontrar de fato sob a autoridade
do exército inimigo”. A população não pode ser obrigada a dar informação
sobre o exército, nem ser obrigada “a jurar fidelidade à Potência inimiga”.
Proíbe-se a pilhagem. A propriedade privada, os direitos de família e a
vida dos indivíduos serão respeitados. O ocupante pode arrecadar impos­
tos, conforme as leis fiscais vigeijtes. e deverá “prover às despesas da
administração do território: ocupado até onde estivesse obrigado a fazê-lo
o governo legal”. Se, além dos impostos, forem cobradas “outras contri­
buições em dinheiro no território ocupado, somente poderão ser destina­
das às necessidades do exército ou da administração desse território” . E
vedada a aplicação de “pena coletiva, pecuniária ou de outra espécie” à
população. As contribuições somente sèrão percebidas “em virtude de
ordem escrita e sob a responsabilidade de um general-chefe”. Aos contri­
buintes será dado um recibo. As requisições em espécies e serviços serão
proporcionais aos recursos-do território ocupado “e de tal natureza que
não implique para as populações a obrigação de participarem das opera­

1500
ções de guerra contra sua pátria" . As prestações em especie serão pagas a
vísta ou “comprovadas por meio de recibos” . O exército ocupante “ p o d e rá
apossar-se do numerario, dos fundos e valores exigíveis que pertencerem
ao Estado, dos depósitos de armas, dos meios de transporte, armazéns e
víveres e, em geral, de toda a propriedade mobiliária do Estado de natureza
a servir às operações de guerra. Todos os meios destinados em térra, mar
e ar à transmissão de notícias, ao transporte de pessoas ou de coisas, além
dos casos regidos pelo direito marítimo, os depósitos de armas e, em geral,
todas as espécies de munições de guerra, podem ser apreendidos, mesmo
que pertençam a particulares, mas deverão ser restituidos e as indenizações
serão reguladas ao celebrar-se a paz”. Os cabos submarinos que ligam o
territorio ocupado a um Estado neutro “não serão objeto de posse ou de
destruição, senão em caso de absoluta necessidade”. O ocupante terá o
usufruto dos bens do Estado ocupado, com exceção dos “bens comunais
e municipais, os dos estabelecimentos consagrados aos. cultos, à caridade
e à instrução, às artes e às ciências, mesmo pertencentes ao Estado serão
tratados como propriedade particular”. Proíbe-se o confisco e a destruição
destes bens.
A Convenção de Genebra de 1949, relativa à proteção dos civis em
tempo de guerra, estabelece uma série de normas referentes à ocupação:
à) as pessoas protegidas24 têm direito “ao respeito à sua pessoa, à sua honra
e aos seus direitos de família, a suas convicções e práticas religiosas, a seus
hábitos e costumes”. Não serão objeto de violência ou intimidação. As
mulheres serão protegidas “contra qualquer atentado à sua honra”, as
pessoas protegidas poderão se dirigir aos Estados protetores24'' e à Cruz
Vermelha. E proibida a captura de reféns; b) é proibida a deportação
“ de pessoas protegidas do território ocupado para o território do Estado
ocupante”. O ocupante contudo poderá determinar por “razões militares
imperiosas” ou para a segurança da população a evacuação de determinada
região. O ocupante não poderá deportar para o território ocupado a sua
população civil; c) deverá ser assegurado “o bom funcionamento dos es­
tabelecimentos consagrados aos cuidados e à educação das crianças”; d) a
população não pode ser obrigada a se alistar no exército ocupante. Proí­
be-se a propaganda para alistamento voluntário; e) o trabalho só pode ser
exigido de maior de 18 anos. O trabalho não pode levar as pessoas a
tomarem parte nas operações militares. O trabalho será realizado “no
interior do território ocupado em que as referidas pessoas se encontram”;
f ) é proibida a destr uição de bens móveis ou imóveis pertencentes a pessoas
privadas; g) o ocupante não pode “modificar o estatuto dos funcionários
ou dos magistrados do território ocupado"; h) deverá ser garantido o
abastecimento à população; 0 devem ser mantidos os serviços médicos, ■
hospitalares, de saúde e de higiene pública; j) os hospitais civis só poderão
ser requisitados em caso de urgência; k) o Estado ocupante aceitará as
remessas de socorro para a população; l) a legislação penal será mantida
e somente será revogada se “constituir ameaças à segurança do ocupante”

1501
ou contrariar a presente convenção. As novas leis penais que forem pro­
mulgadas não lerão efeito retroativo. Poderão ser constituidos 110 território
ocupado tribunais militares regulares que poderão julgar os culpados por
violações da segurança do território ocupado, etc.; m) as pessoas protegidas
não poderão ser processadas ou detidas por atos praticados antes da ocu­
pação; n) a condenação deverá ser “precedida de processo regular"; o) o
acusado lem direito de defesa e a recurso; p) a condenação à morte somente
será executada após o prazo de seis meses, contado “a partir do momento
em que o Estado protetor tiver recebido a comunicação do julgamento
que confirme essa pena ou da decisão que recuse comutação’7; q) o Estado
ocupante “por motivos imperiosos de segurança” poderá impor às pessoas
protegidas “residência forçada ou interná-las”. Estas são algumas das nor­
mas fixadas na Convenção “de Genebra, que procurou completar as Con­
venções de Haia que se tinham mostrado insuficientes nos últimos conflitos.
I Podemos.resumir os efeitos da ocupação com base em H. Acciolv da
seguinte maneira: 1) as leis civis, penais e comerciais não devem ser alte­
radas. Via de regra se alteram, entretanto, as leis penais e se criam tribunais
militares que julgarão os crimes contra o exército ocupante. AJteram-se
também as leis administrativas sobre imprensa, imigração e liberdade de
reunião e alistamento militar; 2) o ocupante se apropria dos “bens móveis
do Estado inimigo, suscetíveis de servir às operações militares”; 3) devem
ser respeitadas as quantias pertencentes a particulares; 4) o “material
rodante” pode ser usado pelo ocupante, que õ devolverá com a paz; o
mesmo já não ocorre quando este material se destina exclusivamente a
fins militares; 5) os imóveis do domínio público “que se destinem direta­
mente a fins militares” (ex.: fortalezas) podem ser usados e destruídos
pelo ocupante, devendo-se respeitar os que não têm finalidade militar (ex.:
museus); os bens do domínio privado (ex.: edifícios), o ocupante ser ape­
nas o seu usufrutuário; 6) a propriedade privada será respeitada;25 7) o
ocupante pode determinar requisições (“é o ato pelo qual o exército de
ocupação obriga os habitantes do território ocupado à prestação de serviços
ou ao fornecimento de objetos ou animais necessários ao mesmo exérci­
to”). Não estão sujeitos à requisição os agentes diplomáticos e os cônsules.
Os súditos de um Estado neutro, mas em território ocupado, também estão
sujeitos à requisição; a requisição pela Cpnvenção de Haia deve preencher
os seguintes requisitos: a) deve ser apenas para atender as necessidades
do exército ocupante; b) deve ser proporcional aos recursos do território
ocupado; c) deve ser feita por autoridade competente; d) deve ser indeni­
zada; 8) a contribuição de guerra (é uma multa imposta ao autor do delito
contra o exército ocupante)' deve ser condenada, uma vez que ela normal­
mente atinge inocentes.
A ocupação em relação aos civis do território ocupado foi estudada
mais acima no item anterior, bem como neste ao descrevermos as conven­
ções sobre o assunto. Na verdade, as normas do instituto de ocupação têm
como a sua principal finalidade a proteção da população do território
ocupado.
O Protocolo 1, citado, protege a “defesa civil", islo é, a ( J i i e abrange
serviços de evacuação, salvamento, serviços médicos e religiosos, etc. O
pessoal e organizações de defesa civil devem ser “ respeitados e protegidos".
No caso de território ocupado, ela deve receber do ocupante as facilidades
necessárias para a realização de suas larefas. O ocupante, por razões de
segurança, pode desarmar O pessoal da defesa civil. A sua proteção só cessa
se fora de suas atividades ela realizar atos nocivos ao ocupante.26
Uma questão que tem sido debatida é a de se saber se o ocupante
pode explorar as jazidas de petróleo do território ocupado. Uns (Alian
Gerson) respondem afirmativamente, desde que a exploração não seja
predatoria. Outros (Charles Rousseau) consideram que a Convenção de
Haia de 1907 apenas dá ao ocupante o poder de administrar o territorio
-ocupado. Por outro lado, assinala o intemacionalista francés, o ocupante
não poderá vender o petróleo explorado, porque os bens públicos do
territorio ocupado só podem ser usados para a satisfação das necessidades
de guerra do ocupante e as necessidades da população local.
Theodor Meron considera que a aplicação de convenções multilalerais
a territorio ocupado quando ratificadas pelo ocupante deve ser analisada
em cada caso concreto e não decidido de modo a priori
O último aspecto a que devemos nos referir é o de saber se a ocupação
é relação entre Estados ou se as organizações internacionais também po­
dem se utilizar da ocupação militar. Serení afirma que a ocupação é entre
Estados porque as organizações internacionais não têm competências ter­
ritoriais. Seyested admite a ocupação por forças da ONU, que está sujeita
aos deveres humanitários, bem como teria direito a medidas econômicas
que os Estados não têm pelo direito de guerra, bem como alterar “estrutura
política do território ocupado do agressor”. Esta última posição parece-nos
ser a mais aceitável, tendo em vista que as NU agem em nome da sociedade
internacional. Por outro lado, com a ilicitude da guerra a ocupação passa
a existir nas ações de polícia internacional que são realizadas pela ONU.
A doutrina (Adam Roberts) tem apresentado como uma categoria
especial a ocupação prolongada, como a de Israel desde 1967 sobre terri­
tórios árabes. E de se recordar que a convenção de 1949 establece que a
ocupação deve terminar um ano após a cessação do conflito armado. Falk
propõe que após dez anos de ocupação deverá ser dado ao povo o direito
de autodeterminação.
608A. O direito de perseguir um exército inimigo que se refugia em
território neutro não existe na guerra terrestre. Não existe qualquer norma
costumeira neste sentido.
Na guerra da Coréia, por iniciativa dos EUA, foi feita consulta entre
os Estados no sentido de se saber se poderia ser exercido o direito de
perseguição. Os Estados recusaram a existência deste direito. Entretanto,
este direito foi exercido no território do Camboja. Os EUA, contudo, não

1503
lylaram cm direito de perseguição, mas em direito de legítima defesa
(RGDIP,“1971, n y 1).
608B. O mercenário 110 Protocolo 1 é definido como a pessoa que: a)
é especialmente recrutada para com bater em um conflito armado; b) toma
parte direta nas hostilidades; c) toma parte nas hostilidades em vista do
pagamento que receberá, que é superior ao dado aos combatentes de
categoria similar; d) não é nacional da Parte no conflito, nem residente
em território controlado pela Parte; e) não é membro das forças armadas
da Parte em conflito; f) não foi enviado por um terceiro Estado em missão
oficial. Para ser mercenário é necessário reunir todos estes requisitos.
Observa G. H. Aldrich que o indivíduo só é mercenário quando está em
combate.
Eles não têm o direito de ser combatentes e nem de ser prisioneiros
de guerra (v. capítulo Guerra Civil). Entretanto, o mercenário, em poten­
cial, apesar de tudo, está protegido pelo art. 45 do Protocolo 1. em virtude
do qual toda pessoa que toma parte nas hostilidades e que cai em poder
do inimigo é presumido ser prisioneiro de guerra. A sua qualidade deverá
ser estabelecida por um tribunal competente. Ou, ainda, está protegido
pelo art. 75 do mesmo, que dá um regime jurídico a quem cai em poder
do inimigo, que tem direito a um tratamento humanitário, proibindo-se
tortura, penas corporais, mutilações, etc. Pode-se acrescentar que o Pro­
tocolo II não proíbe o uso do mercenário. Acresce ainda que até a entrada
em vigor do Protocolo I o uso do mercenário só é condenado se for para
ameaçar a independência de um Estado, ou é um obstáculo à luta contra
o colonialismo e o racismo. Até a entrada em vigor do citado Protocolo
ele terá direito a tratamento de prisioneiro de guerra (]. Tercinet).
O mercenário é quase sempre branco. Na década de 90 estão sendo
usados em: Nagorno-Karabakh (pela Armênia e Azerbaijão), Libéria, Su­
dão, Zaire, Croácia e Bósnia-Herzegovina. A escalada no uso de mercená­
rios foi na década de 50 e início da de 60.
608C. O Protocolo I trata da repressão às denominadas infrações graves
e infrações. São consideradas infrações graves as violações das convenções
praticadas contra pessoas que se encontram em poder da parte adversa
como prisioneiros de guerra, pessoas que tomaram parte nas hostilidades,
refugiados e apátridas, pessoal sanitário e religioso, meios de transportes
sanitários, feridos, doentes e náufragos. São consideradas também infrações
graves quando praticados intencionalmente os seguintes atos causando a-
morte 011 danos à integridade física: submeter a população civil a um
ataque, ataque sem discriminação que atinja a população civil, ataque
contra instalações que contêm forças perigosas, ataque contra monumentos
históricos que constituem o patrimônio cultural dos povos, experiências
médicas, etc. Elas são consideradas crimes de guerra. Esta parte do Proto­
colo I é muito criticada não só porque as infrações graves estão enumeradas
de modo impreciso, bem como porque ela não distingue ,ts infrações
simples das infrações graves. Swinarski faz uma distinção que n o s parece
inteiramente válida. O intemacionalista suíço começa por obseivar que os
Estados tém que aplicar sanção a todas as violações ao direito humanitário.
No caso das infrações, os seus autores estão sujeitos a sanções administra­
tivas, disciplinares e judiciais e, no nivel internacional, a responsabilidade
internacional por ter violado norma convencional. Já no caso das infrações
graves, elas são consideradas crimes de guerra e estão enumeradas de
modo exaustivo no Protocolo I. São as mais graves violações ao direito
humanitário, como o homicidio intencional, etc. Cabe a cada Estado im­
plementar esta parte do D. Humanitario promulgando legislação interna
definindo o crime e a pena. Sobre este último aspecto houve várias pro­
postas na Conferencia de Genebra, como a dos EUA, de que haveria
infração grave quando a pessoa estivesse nas mãos do adversário, ou ainda
que fosse infração grave ou que constasse do estatuto de Londres que
criou o Tribunal de Nurembergue. Por outro lado, o protocolo não trata
das infrações por “omissão contrária a um dever de agir".
O cumprimento de ordens superiores não tira a responsabilidade se
o infrator tinha consciência de que praticou uma infração.
A competência para o julgamento é do juiz do Estado que prender os
autores do crime. No caso de extradição, será dada prioridade ao Estado
em cujo território foi praticado o crime. Entretanto, é preciso recordar
que sendo a infração grave um crime de guerra pode ser aplicado a ela o
princípio da competência universal, isto é, qualquer Estado poderá julgar
o criminoso.
E criada uma Comissão Internacional para o estabelecimento dos fatos.
Ela é permanente e os seus membros são eleitos por cinco anos. Ela só
inicia a investigação por solicitação de uma das partes e o consentimento
da outra.
Várias considerações têm levado à impunidade dos criminosos de guer­
ra, como salvaguardar segredos de Estado, muitas vezes os crimes são
realmente ordenados pelas mais altas patentes, não desejar expor a opinião
pública mundial de que praticou crime de guerra, etc.
Os exércitos pelo Protocolo I ficam obrigados a ter conselheiros jurí­
dicos para velarem pela aplicação do D. Humanitário.
Em -1994 foi concluída convenção sobre a segurança do pessoal das
Nações Unidas e do pessoal associado. Para haver uma infração contra
estas pessoas é necessário que haja: á) um elemento subjetivo (“fato in­
ternacional” ) e b) um elemento objetivo, ataque contra a pessoa ou a sua
liberdade. Pune-se também a ameaça. Os Estados devem prever na legis­
lação interna tais infrações e fixar penas conforme a sua gravidade. Devem
também estabelecer a sua competência: a) se a infração foi praticada no
seu território; b) se foi cometida por um seu nacional; c) se o autor está

1505
no território (lo Estado e este não quer extraditá-lo; d) se é apátrida mas
leni residência no Estado; c) se a vítima é nacional do Estado; etc.
O Estado em cujo território se encontra o criminoso de_ve pmressá-lo
ou extraditá-lo. A convenção não se aplica a operação determinada pelo
CS com fundamento no Capítulo Vil da Carta da ONU.
Em 1999 o Secretário Geral da ONU fez uma CirciIlaT determinando
que as Forças da ONU respeitassem o direito humanitário.

1506
NOTAS

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2. Esta norma, como veremos adiante, é constantemente violada no caso de
bombardios aéreos. Observa com razão Eduardo de No Louis: “o que aumentou
consideravelmente são os objetivos militares e a possibilidade de atacá-los; porém
subsiste uma população civil que déve ser respeitada em principio e que somente
pode ser atacada quando se encontra trabalhando, ou por outra causa qualquer,
dentro ou nas imediações de um objetivo militar”. Podemos concluir que juridi­
camente há ainda razão para a distinção entre combatentes e população civil,
devendo estes últimos gozar de certa proteção.
3. A primeira vez em que'se regulamentou de forma escrita a guerra terrestre
foi em 1863, quandor na Guerra de Secessáo norte-americana, Francis Lieber
preparou uma instrução para os exércitos por determinação do governo do Norte.
4. Estão aí incluídos os voluntários, entretanto, se'eles forem nacionais do
Estado contra o qual -ltitam e este os prende, eles podem ser julgados como
traidores. Este é o tratamento dado aos tránsfugas, desertores, etc.
5. A palavra “responsável” parece-que significa “responsável perante uma alta
autoridade” (Oppenheim-Lauterpacht).
5A. Alguns autores sustentam a autonomia do D. Humanitário dentro do DI
de Guerra.
Pode-se observar que a instituição-chave nas convenções de D. Humanitário
de 1949 para serem colocadas em funcionamento (continua nos Protocolos de

1509
1977) éa potência protetora, que é encarregada de salvaguardar os interesses das
partes no conflito. E nina prática costumeira que apareceu no século XV (Calo-
geropoulos Sirails). Outros autores (G. Draper) afirmam que surgiu na guerra
franco-prussiana de 1870-1871 devido à expulsão dos cônsules e das medidas severas
impostas aos súditos inimigos.
E uma extensão do instituto da representação ao D. Humanitário. Ela pode
ser: ü) organismo imparcial e eficaz; b) se a potência de origem dos prisioneiros
não designar a potência protetora ela pode ser designada pela potência que detém
os prisioneiros e os civis; c) a potência detentora pode solicitar a um organismo
como o C1CV para assumir as funções. São pessoas protegidas os feridos, doentes
e náufragos, prisioneiros de guerra e a população civil. Este instituto contudo não
tem funcionado, segundo os doutrinadores, pelas seguintes razões: a) pode ser
considerado um reconhecimento tácito, quando os beligerantes não se reconhe­
cem; b) muitas vezes as relações diplomáticas são mantidas e torna desnecessário
este instituto; c) a maioria dos conflitos são internos e aí não existe este instituto;
d) grande parte das guerras são guerras-relâmpago; e) não é fácil encontrar neutros
dispostos a cumprir tais funções.
Uma Circular do Secretário Geral da ONU (1999) afirma que se aplica o
Direito Humanitário quando as forças da ONU estão “ativamente em combate”.
A ONU se encontra sujeita as normas costumeiras do Direito Humanitário.
6. Esta expressão, “levantamento em massa”, designava a convocação (França,
1793). Na Prússia, em 1813, foi “um apelo dirigido a todos os súditos prussianos
para pegarem em armas e atacarem as tropas inimigas de uma maneira qualquer”
(Rousseau).
7. Esta condição de pegar em armas abertamente foi acrescentada nesta
convensão, vez que a de 1899 que regulamentou o assunto apenas exigia que
seguissem os usos e leis de guerra, conforme estava consagrado na Declaração de
Bruxelas de 1874.
7A. Os EUA assinaram o Protocolo I, mas não o ratificaram. Reagan se opôs
considerando que ele vai beneficiar o terrorismo. Esta posição tem sido criticada.
O Protocolo 1 é o mais importante tratado sobre direito de guerra desde as
Convenções de Haia de 1907. Em julho de 1990, já havia sido ratificado por 97
países. Os EUA consideram que a proteção da guerrilha protegerá a OLP. Eles
consideram que o guerrilheiro deve usar distintivo. Na verdade, os arts. 1®, § 4e,
e 44 combinados não dão qualquer proteção ao terrorismo. Alegam ainda, os
EUA, que o Protocolo I não tem mecanismos para a sua implementação, o que
não é verdade. Os EUA desejam aplicar o Protocolo I como direito costumeiro
àquilo que lhe interessa, eliminando o que não for do seu interesse. Esta nota é
fundamentada em George H. Aldrich. Pode-se acrescentar que o Protocolo I tem
aspecto revolucionário ao não ser aplicado apenas a conflitos entre estados, mas
também em caso de ocupação, ou ainda, de governo racista.
7B- Estas balas têm o nome da localidade da índia onde eram fabricadas. Os
ingleses alegavam que as balas comuns não eram suficientes para deter as hordas
de fanáticos selvagens. Elas foram proibidas pela Declaração de Haia de 1899.
8. A questão da legitimidade do uso de armas nucleares será estudada mais'
adiante.
8A. Não dar quartel significa que a luta será feita até a morte e não se farão
prisioneiros, o que toma a luta implacável e desumana, tomando mais difícil o
cumprimento do direito (M. Arassen). ,

1510
9. “São protegidas pela Convenção as pessoas que. a qualquer momrnio e <|(.
qualquer maneira, se encontrem, em caso de hila ou de ocupação, em poder de
unía parle em hita ou de um Estado ocupante de que elas não sejam nacionais"
(art. 4sf.
9A. São aquelas em que as munições revestidas de materiais cujos átomos não
são absorvidos pelos raios X (plástico, madeira, vidro. etc.).
ÍO. '(..) Os militares não disfarçados que peneirarem 11a 7.011a de operações
do exército inimigo para recolher informações não são considerados espiões. Da
mesma maneira, não são considerados espiões: os militares e os não militares,
cumprindo ostensivamente sua missão, encarregados de transmitir despachos des­
tinados, tamo ao seu próprio exército, como ao exército inimigo” (art. 29 do
citado Regulamento).
11. Tem-se considerado que não devem ser bombardeadas as denominadas
“cidades abertas”. SePeni fixa os três requisitos para uma cidade ser considerada
“cidade aberta”:.a) deve estar próxima a ser ocupada pelo inimigo; b) ela "não
deve opor resistência à ocupação inimiga"; c) a declaração de “cidade aberta”
deve sér aceita pdo inimigo.
12. E de se assinalar que também não foi respeitada a proibição de bombardear,
por exemplo, habitações nao definidas. As habitações privadas foram atingidas por
bombardeios nas duas guerras mundiais. Na verdade, a distinção entre o que pode
e o que não pode ser bombardeado é difícil de ser aplicada na prática devido a
diversos fatores: a imprecição dos bombardeios e a alta potência de destruição
desles, o que faz os seus efeitos se estenderem além dos objetivos militares. Por
outro lado, a destruição do moral da população civil é um dos objetivos de guerra
total.
12A. É interessante notar que no século XVII Justino Gentilis, ao condenar
as destruições feitas pelos exércitos de Luis XIV no Platinado, declara que o Dl
proíbe “A destruição e a apreensão de coisas que não têm importância para a
conduta da guerra”. Entre tais coisas coloca vários bens culturais, como os quadros.
A mesma proteção é encontrada em Vattel no século XVIII (Stanislaw E. Nahlik).
13. Eram às vezes oferecidas em sacrifício aos deuses.
14. Houve tempo que se concedeu ao prisioneiro o direito de se resgatar, por
si mesmo, por meio de contrato especial (Accioly). O resgate surge no século XVI,
e os espanhóis introduzem a prática de liberar os prisioneiros sob palavra de não
lutarem contra os vencedores (Roland Mousnier — Les XVI et XVII siècles, 1993).
15. “Poderão ser hospitalizados em país neutro: 1) os feridos e doentes cuja
cura pode ser esperada no ano que se segue à data do ferimento ou no início da
enfermidade se um tratamento em país neutro deixar prever uma cura mais curta
e mais rápida”; 2) se o cativeiro piorar a situação do doente. A repatriação de
prisioneiro hospitalizado em país neutro terá suas condições fixadas “por acordo
entre os Estados interessados”.
16. Pictet procura explicar a insuficiência destes serviços da seguinte maneira:
“Sem dúvida deve-se ver a razão no fato que nesta época a sorte da guerra dependia"
muitas vezes de uma única batalha e que, realizada esta, a sorte dos soldados que
tinham sido o instrumento não importava mais.”
17. V. sobre a Cruz Vermelha, cap. XXIII.
18. A idéia de criação de zonas sanitárias remonta a 1933, em Madri, em
Congresso internacional de medicina e farmácia militares. Em 1934, um Congresso

1511
de médicos militares e juristas, reunido em Monaco, aprovou normas sobre a
matéria (Accioly).
19. A proteção dos civis será estudada ainda no item seguinte.
20. V. capítulo Modos derivados de aquisição de territorio.
21. Sobre a ocupação total e a "debellatio" há um caso recente que tem sido
objeto de grandes discussões entre os autores: a Alemanha após a 2a Guerra
Mundial. Alguns autores (Kelsen) sustentam que os Estado alemão desapareceu.
Teria ocorrido a “debellatio”. Kelsen sustentava que Aliados tinham um condo­
mínio na Alemanha. André Gros fala em tutela temporária e Virallv caracterizou
como um “regime de administração ínternacionaí”. Entretanto, a prática interna­
cional é no sentido de que o Estado alemão continuou a existir. A prova em favor
desta posição é que não houve uma sucessão de Estados (ex.: sucessão nas dívidas
públicas), apesar de ter havido uma ocupação total e rendição incondicional. Os
Aliados, peía declaração de 5 de junho de 1945, apenas “assumiram as competên­
cias supremas para governar a Alemanha", mas não são um “governo alemão
propriamente dito”. “A organização geral dos serviços públicos permanece alemã.
A ocupação era feita em nome das Nações Unidas. Tsoutsos, fundamentado em
vários autores, afirma que a Convenção de Haia sobre a matéria não era aplicada.
E de se assinalar que apesar da inexistência de um tratado de paz o estado de
guerra desapareceu juridicamente por “consentimento tácito” e de fato. A partir
de 1948 a Alemanha passou a ser administrada separadamente pelos ocupantes
(Este e Oeste). Em 1949, a Alemanha Ocidental promulgou a sua Lei Fundamental
(Constituição); neste mesmo ano a Alemanha Oriental também promulgou a sua
Constituição. Em 1951 vários dos aliados liderados pelos EUA, Inglaterra e França
puseram fim ao estado de guerra com a Alemanha por via “ legislativa ou regula­
mentar”. Sobre o regime da Alemanha após a 2- Guerra Mundial, é interessante
acrescentar que pela Declaração de 5 de junho de 1945 foi afirmado que as
fronteiras seriam fixadas por eles por meio de um ato unilateral. Tal fato faz
Rousseau observar com razão que “só o soberano territorial tem o poder de dispor
do território. Em conclusão, podemos assinalar que o regime da Alemanha foi
realmente “sui generis”. Por outro lado, não era um condomínio porque não
havia “indivisão territorial”. Uma tese de que o Estado alemão desapareceu em
1945 é a defendida por Aldo Bernardini. Este autor salienta que com a capitulação
da Alemanha em 7-8 de maio de 1945 e a sua ocupação total desapareceu a
“occupatio bellica”. Em Berlim, teria havido uma ocupação ou administração
conjunta. Para ele a ocupação da Alemanha teria sido com base em direitos
originários, vez que o Estado alemão desapareceu (v. sobre esta matéria o capítulo
Classificação de Estados).
22. Balladore Pallieri cita antecedente no final do século XVI1 da concepção
de que a ocupação não transferia a soberania. Na verdade, diversas normas sobre
a ocupação já são encontradas no século XVI (o ocupante tinha os seus poderes
limitados, por exemplo, deveria respeitar a propriedade privada em regra'geral,
os direitos familiares) (Migliazza).
23. Em períodos mais remotos o ocupante podia matar os habitantes-do
território ocupado. Até o século XVI11 a propriedade privada era objeto de pilha- -
gem.
24. V. item anterior.
24A. A idéia de potencias protetoras nas guerras é antiga <■ sr transformou
em norma costumeira na I3 ('.nerra Mundial. Salienta D Forsvthe que a supervisão
*iios conflitos armados é em grande parte não oficial, porque é realizada pelo
CICY.
25. Na 2* Guerra Mundial a Alemanha em inúmeros casos confiscou sem
indenização a propriedade privada, bem como chegou a este fim por meios indi-
retos (ex.: laxa de cambio arbitraria).
26. O Protocolo 1 prevé a criação de uma Comissão de Investigação formada
por quinze membros para investigar as violações graves às convenções de direito
humanitário, bem como “através de seus bons ofícios'’ facilitar que seja restaurado
o respeito às convenções. A Comissão será eleita pelos contratantes quando, pelo
menos, vinte Estados a aceitarem ao ciarem a stia ratificação ao Protocolo 1.
CAPÍTULO LXIII

G U E R R A M A R ÍTIM A 1

609 — Definição; 610 — Leis da guerrà marítima; 611 — Forças


armadas; 612 — O corso; 613 — Pessoal considerado beligerante; 614
— Meios de combate; 615 — Prisioneiros de guerra; 616 — Feridos,
enfermos e náufragos; 617 — Pessoal religioso e sanitário; 618 —
Mortos; 619 — Espioes; 620 — Parlamentários; 621 — Tripulação
de navio mercante; 622 — Ocupação; 623 — Guias, pilotos e reféns;
624 — A propriedade pública do inimigo; 625 — A proptiedade
privada. O direito de presa; 626 — Cabos submarinos.

609. A guerra marítima tem sido caracterizada de diversos modos: a)


leva-se em consideração o local em que a guerra se desenvolve; em con­
seqüência, guerra marítima é aquela feita no m ar (Rivier); b) leva-se em
consideração a natureza das forças armadas; em conseqüência, guerra
marítima é aquela em que as operações bélicas são realizadas por navios,
não importando se tais operações ocorrem nos rios ou no mar (Kaufman);2
c) leva-se em consideração as normas a serem aplicadas; em conseqüência,
guerra marítima é aquela regulamentada pelas leis da guerra marítima,
não importando saber quais as forças armadas e o local das operações
bélicas (Dupuis). Neste capítulo critério o que caracteriza a guerra marí­
tima seria o direito de captura da propriedade privada inimiga. Gidel,
seguidor deste critério, acrescenta ainda que há uma segunda caracterís­
tica: “a verificação jurisdicional na regularidade do exercício do direito
de captura”.
O primeiro critério não pode ser aceito, vez que ele exclui da guerra
marítima a realizada nos rios, quando na verdade a guerra fluvial tem
seguido as normas da guerra marítima: assim na América inúmeras presas
foram realizadas no río da T?rata (século X IX ), bem como bloqueio nesta
região. O mesmo ocorreu no rio Danúbio a respeito de presas.

1515
O terceiro critério parece-nos que inverte os termos da questão e não
caracteriza o que é guerra marítima, porque antes de se elaborar as leis
da guerra marítima é preciso saber a que tipo de operações elas se destinam.
Caso contrário, seria fazer normas sem que o seu objeto estivesse clara­
mente delimitado.
O segundo criterio é o que tem encontrado maior número de segui­
dores (Rousseau, Serení, Isidoro Ruiz Moreno) e é o que nos parece mais
acertado.
Assim sendo, guerra marítima é aquela travada entre forças navais. Em
conseqüência, não há distinção entre guerra travada no mar ou em rios,
o que importa é saber se a força combatente é naval ou não.
A distinção entre guerra marítima e guerra terrestre não é uma questão
meramente doutrinária, mas, pelo contrário, apresenta um grande inte­
resse, vez que na guerra terrestre a propriedade privada inimiga deve ser
respeitada, ao contrário do que ocorre na guerra marítima, onde ela está
sujeita a captura. A guerra terrestre se limita ao território dos beligerantes,
enquanto a guerra marítima se estende ao alto-mar, que não pertence a
eles. Outras diferenças podem ser apresentadas, por exemplo, pode-se usar
do pavilhão neutro para fugir à perseguição, sendo que este ardil é proibido
na guerra terrestre (Isidoro Ruiz Moreno).
610. Na guerra marítima as suas leis surgiram consuetudinariamente,
sendo de se observar que o costume nem sempre foi uniforme .3 Nas leis
da guerra matítima duas concepções se defrontam, a anglo-saxã e a con­
tinental, como verem os em in ú m eros institutos .1
No século X IX as leis da guerra marítima começaram a ser codificadas
a partir da Declaração de Paris de 1856 e inúmeros tratados se sucederam
sobre a matéria, sendo que os principais textos, além da já citada Declaração
de Paris, são os seguintes: a) Tratado de Washington de 1871, entre In­
glaterra e EUA sobre o caso Alabama e que trata dos deveres dos neutros;
b) as sete Convenções de Haia de 1907 sobre guerra marítima; c) a decla­
ração naval de Londres (1909), que nunca entrou em vigor mas que serve
de elemento informativo, vez que de um modo geral codificou as normas
da guerra marítima vigentes naquela época; d) tratado en tre França, In­
glaterra, EUA, Itália e Japão sobre o emprego de submarinos e gases
asfixiantes em tempo de guerra (Washington, 1922); na mesma conferência
que deu origem a este tratado foi feita uma declaração s o b r e as “leis da
guerra naval que tivessem sido constantemente violadas pelos comandantes
de submarinos alemães” (Colombos). O Tratado de Washington não en­
trou em vigor; e) tratado naval de Londres de 1930 e o protocolo de 1936
sobre guerra submarina; j) convenção para a melhoria da sorte dos feridos,
enfermos e náufragos das Forças Armadas no Mar (1949).
Salienta H. Accioly5 com razão que as normas da guerra marítima são
mais imprecisas do que as da guerra terrestre e por conseguinte mais
passíveis de violação.
As sanções às leis da guerra marítima são. via de regra, as mesmas
sanções das leis da guerra em geral. Entretanto alguns tratados, como o
já citado de Washington de 1922 (não entrou em vigor), estabeleciam que
a violação de suas normas faria com que o autor da violação fosse julgado
como pirata, estivesse ou não o infrator agindo sob ordens superiores.
611. As forças armadas dos beligerantes compõem-se de navios desti­
nados a operações de natureza militar. O que caracteriza estes navios são
os seguintes elementos: a) comandante da marinha de guerra; b) arvorar
pavilhão da marinha de guerra; c) tripulação desta marinha; d) pertençam
ao Estado. Estes navios compõem as denominadas forças regulares.
E de se assinalar que os submarinos integram as forças armadas regu­
lares dos beligerantes e que eles estão sujeitos às mesmas normas do Dl a
que estão submetidos os navios de superfície. Este princípio foi consagrado
, no tratado naval de Londres de 1930 e no protocolo de Londres de 1936.
Os aviões de um porta-aviões fazem parte do navio (Sandiford).
Ao lado deles existem as denominadas forças auxiliares, que são os
navios mercantes de que os beligerantes se utilizam em tempo de guerra .6
A marinha auxiliar resulta da transformação em navios de guerra dos navios
privados (neste sentido, Genet) .7
Uma das questões mais discutidas na guerra marítima é a da transfor­
mação de navios mercantes em navios de guerra. Esta matéria foi regula­
mentada na 2a Conferência da Paz de Haia (1907) na “convenção relativa
à transformação dos navios mercantes em navios de guerra”. As normas
aí estabelecidas são as seguintes: a) o navio mercante transformado em
navio de guerra só terá os direitos e deveres deste se a transformação seguir
as normas da convenção e deverá estar sob a “autoridade direta” e “res­
ponsabilidade da Potência cujo pavilhão ostentar”; b) o navio mercante
transformado em navio de guerra deverá usar o pavilhão da sua marinha
de guerra; c) o comandante deve figurar na lista de oficiais da marinha
de guerra e a equipagem “deve estar submetida às regras da disciplina
militar” ; d) o navio deverá observar as leis e usos da guerra; é) o navio
mercante transformado em navio de guerra deve ser “o mais breve possível”
incluído na lista da Armada.
Sobre a transformação de navios mercantes em navios de guerra, várias
questões permanecem ainda em suspenso, como o local em que pode
ocorrer a transformação e a questão da retransformação.
Quaiito ao local da transformação, tem-se admitido'que esta pode
ocorrer nas águas territoriais ou em um porto de um beligerante, bem
como no de uni aliado, ou ainda em território ocupado por ele. E vedada
a transformação em águas territoriais ou porto de Estado neutro. A grande
questão ainda em aberto é a da possibilidade de transformação em alto-mar.
Um grupo de autores afirma a existência deste direito (Balladore Pallieri)
enquanto outro (Erik Castrén) considera que é questão ainda não resol­
vida. Na 2- Conferência de Haia (1907) a Inglaterra, endossada pelo Brasil,

1517
negou tal possibilidade alegando, entre outras coisas, que “ a transforma­
ção, se operada em alto-mar, ofereceria sérios perigos para os neutros, que
lém lodo interesse em saber de antemão quais os navios que podem exercer
os direitos de beligerante” (Accio!)').*
A retransformação de um antigo navio mercante transformado em
navio militar novamente em um navio mercante não foi regulamentada
na Convenção de Haia. No continente americano a re transformação é
admitida pela convenção sobre neutralidade marítima (Havana, 1928),
que estabelece cinco condições para que o navio “retransformado” seja
considerado mercante: a) o navio “não tenha violado a neutralidade do
país onde ele aporta”; b) que a nova transformação tenha sido realizada
“em portos ou águas territoriais dó-país a que pertence o navio” ou em
portos de seus aliados; c) a transformação seja efetiva, isto é, a sua equi-
pagem e instalações por sua natureza não lhe permitam servir na “frota
armada de seu país na qualidade de auxiliar como ele fazia anteriormente”;
d) que o governo a que ele pertence comunique aos demais países o nome
dos navios auxiliares que readquiriram a qualidade de navios mercantes;
e) que tais navios não sejam mais destinados “a serviço da frota armada
na qualidade de auxiliares” .9
Outra questão que deve ser analisada a respeito das forças armadas
na guerra marítima é a respeito dos navios privados armados. O armamento
destes navios deverá ter finalidade meramente de defesa. O uso de os
navios mercantes se armarem remonta ao século XVI (legislação inglesa)
e continuou nos séculos XVIII e XIX , sendo consagrado na legislação de
presas da Grã-Bretanha, França e’ EUA.
A grande importância a respeito d a possibilidade de os navios mer­
cantes se armarem é que se ela for respondida de modo afirmativo estes
navios terão o tratamento de navios privados e não de navios de guerra,
acarretando com isto conseqüências; eles podem freqüentar os portos
neutros, ou, ainda, não podem sofrer ataques ou destruições sem aviso
prévio (quando oferecem resistéñeia podem ser atacados), e havendo a
destruição os passageiros e tripulantes deverão ser colocados em segurança.
A doutrina tem-se mostrado dividida sobre a equiparação ou não destes
navios aos de guerra. Um grupo (Triepel, Strupp) defende a equiparação.
Outro (Higgins, Dupuis) sustenta que eles não se equiparam aos navios
de guerra .10
A prática internacional também não é uniforme. Na 2“ Guerra Mundial
a França e a Inglaterra sustentaram a legitimidade de os navios mercantes
se armarem e continuarem navios privados; enquanto a Alemanha conti­
nuou a equipará-los a navios de guerra.
Na América o tratamento tem Variado. A já citada convenção intera­
mericana sobre neutralidade marítima, no seu art. 1 2 , determinou que os
navios mercantes armados se equiparavam aos navios militares a respeito
de permanência, abastecimento e fornecimento quando se e_ncontrassem

1518
em portos ou águas territoriais de Estados neutros. A Reunião de Consulta
dos Ministros das Relações Exteriores (Panamá, 1939) na Declaração Geral
de Neutralidade estabeleceu:

“Não serão equiparados aos navios de guerra os navios mercan­


tes armados, de bandeira beligerante, quando não transportem
mais de quatro canhões, de seis polegadas, colocadas na popa,
e não tenham reforçadas as cobertas laterais, ou quando, ajuízo
das autoridades locais, não existem outros elementos que reve­
lem que o navio m ercante pode ser empregado com finalidades
ofensivas. Poderá exigir-se que, para a entrada nos portos, os
ditos navios depositem os explosivos e as munições nos lugares
indicados pela autoridade local. ” 11

Como se pode verificar, a tendência mais recente no continente ame­


ricano é a de se conciliar as duas posições consagradas na prática européia.
612. O direito de presa nem sempre, através da História, pertenceu
exclusivamente aos navios de guerra.
No período medieval estão as raízes do corso . 12 Nesta fase histórica a
pirataria ameaçava constantemente o tráfego comercial marítimo; em con­
seqüência os particulares começaram a armar “expedições privadas com
a finalidade inicialmente de defender-se contra a pirataria”, devido à
deficiência da proteção dada pelo Estado no mar. Posteriormente tais
expedições passaram “a realizar ações guerreiras de represália privada
contra povos vizinhos e finalmente terminaram por cooperar com as forças
regulares do Estado na guerra marítima”. Os regulamentos de Pisa (1298),
Gênova (1313 e 1316), são as regras mais antigas sobre o corsário.
O corso passou a ser regulamentado pelo Estado, que concedia “au­
torizações especiais”, inicialmente dadas apenas aos nacionais do Estado,
estabeleciam-se cauções a serem dadas pelos corsários e “se disciplinou a
repartição das presas” . 13
Nos séculos XVI, XVII e XVIII o corso se desenvolveu com o fim de
destruir o comércio inimigo, o que se acentuou nestes dois últimos séculos.
Passou-se a conceder a carta de corso 14 a navios não nacionais, o que se
afirma nos séculos XVII e XVIII.
O corso passa a existir com grandes abusos e sem respeitar o comércio
neutro. A principal razão destes motivos é que o corsário se pagava com
os despojos.
Os Estados passam a concluir tratados declarando que cm caso de
guerra não se utilizariam do corso (EUA e Prússia, 1785).
Finalmente, em 1815, na Declaração de Paris, foi estabelecido: “O
corso é e fica abolido.” Um dos poucos países a não aceitar esta abolição
foi os EUA (outros foram: Espanha, México e Venezuela) , 13 sendo que b
corso foi utilizado na Guerra de Secessão pelos confederados (Sul). O

019
procedimento dos EUA na época da Declaração de Paris foi justificado
pela alegação que, se o corso fosse suprimido, eles seriam obrigados a
manter uma grande esquadra de guerra permanente ;16 alegou este Estado
que aceitaria a abolição do corso se fosse assegurada a inviolabilidade
absoluta da propriedade privada mesmo sendo inimiga.
Finalmente, é de se assinalar que o corsário tinha a qualidade de
beligerante (Rousseau) e não se confundia com o pirata.
613. Não há nenhum texto positivo do Dl que defina quais são as
pessoas que devem ser consideradas como beligerantes na guerra marítima.
Pode-se considerar pessoal beligerante: a equipagem dos navios de
guerra e navios auxiliares; a equipagem de um navio mercante transfor­
mado em navio de guerra também deve receber o tratamento de belige­
rante.
Quanto à equipagem de um navio mercante armado, o seu tratamento
vai variar com o país se ele aceita ou não que os navios mercantes se armem
ou se os considera navios de guerra.
Quanto ao caso de levantamento em massa, o Instituto do Dl consi­
derou que se deve aplicar o mesmo princípio que é utilizado na guerra
terrestre, quando uma população “arma espontaneamente navios” para
combater o inimigo. As mesmas restrições que existem na guerra terrestre
também seriam aqui aplicadas (ex.: respeito às leis de guerra). Na verdade,
a guerra marítima não registra exemplos desta natureza, sendo que o único
caso que a História registra é o da Prússia na guerra de 1870, que teve o
seu projeto de uma marinha voluntária (levantamento em massa) fracas­
sado. A Convenção de Genebra (1949) “para a melhoria da sorte dos
feridos, enfermos e náufragos das Forças Armadas no Mar” estabelece que
esta convenção se aplicará: “à população de um território não ocupado
que, à aproximação do-inimigo, pegar em armas espontaneamente para
combater as tropas invasoi'as, sem ter tido tempo de se constituir em forças
armadas regulares, se portar armas abertamente e se respeitar as leis e
costumes de guerra”.
614. A guerra marítima como a guerra terrestre consagra nos combates
a condenação da utilização de vários meios. O Manual de Oxford do
Instituto de Dl consagra estas proibições: a) matar ou ferir inimigo à
traição; b) afundar um navio que se rendeu sem antes.recolher a sua
tripulação; c) fazer declaração de que não' será dado quartel; d) usar
pavilhão parlamentar de modo indevido, ou se utilizar ainda indevidamen­
te dos sinais da Cruz Vermelha ou sinais do inimigo; e) usar armas enve­
nenadas e projéteis que causem males desnecessários (ex.: projéteis explo­
sivos); f) praticar atos de pilhagem; g) usar torpedo que não se tom e
inofensivo após ter errado o alvo; h) fazer bombardeio de cidades que não
são definidas; z) bombardear sem aviso prévio, salvo caso de necessidade
militar, etc. . -
Uma das questões que merece sei estudada em maiores detalhes é a
colocação de minas. O assunto foi regulamentado na Convenção de Haia
relativa à colocação de minas submarinas automáticas de contato (1907)
que estabeleceu diversas normas: a) é proibido “ colocar minas automáticas
de contato não amarradas, a menos que estejam construídas de tal maneira
que possam tornar-se inofensivas uma hora ou mais depois que aquele que
as colocou houver perdido o controle sobre elas”; b) é ainda proibido:
“colocar minas automáticas de contato amarradas, que não se tornarem
inofensivas, desde que houverem rompido as amarras” e “empregar tor­
pedos, que não sejam inofensivos quando tenham falhado o alvo"; c) “íica
proibido colocar minas automáticas de contato diante das costas e portos
do adversário com o único objetivo de interceptar a navegação comercial”;
d) deve-se tomar “todas as precauções possíveis" para “a segurança da
navegação pacífica, quando as minas.de çontato amarradas forem empre­
gadas”. Assim estas minas deverão se tornar inofensivas “depois de um
lapso de tempo limitado” e assinalar as regiões perigosas por um aviso à
navegação “logo que as exigências militares o permitirem”; e) o neutro
que se utilizar nas suas costas de minas automáticas de contato deverá
respeitar estas mesmas regras; J) cada parte no fina] da guerra devera
retirar as minas colocadas; etc.
Na 2- Guerra Mundial a Alemanha usou de modo abusivo de minas
magnéticas, provocando represálias da França e Inglaterra.
Na guerra do Vietname os EUA se utilizaram de minas. Afirmou Rous­
seau que o tratado de 1970, que proíbe a colocação de armas nucleares e
de destruição em massa no leito do mar, abrange também as minas. V. a
convenção de 1981 sobre a interdição de algumas armas clássicas que
podem ser consideradas como produzindo efeitos traumáticos excessivos
ou como atingindo sem discriminação (v. capítulo Guerra Terrestre).
O bombardeio naval foi regulamentado na Conferência de Haia (1907)
na convenção relativa ao bombardeamento por forças navais em tempo
de guerra. Tendo sido estabelecidas as seguintes normas: a) é proibido o
bombardeio de cidades, edifício, etc., “que não estiverem defendidos"; b)
não se pode bombardear uma localidade pelo simples fato de diante do
seu porto terem sido colocadas minas submarinas automáticas de contato;
c) as obras e estabelecimentos militares, os depósitos de armas, etc., podem
ser destruídos após uma intimação feita pelo comandante para que eles
sejam destruídos em um prazo razoável; não havendo sido feita a destrui­
ção, pode ser feito o bombardeio e o comandante não será responsável
pelos prejuízos involuntários que causar; d) pode-se bombardear cidades,
edifícios, etc; após uma notificação expressa “se as autoridades locais,
comunicadas por intimação formal, recusarem a aceder a requisições de
víveres ou de fornecimento indispensáveis às necessidades prementes da
força naval que se encontrar diante da localidade”; e) as requisições serão
proporcionais aos recursos da localidade e serão comprovadas por recibo;

1521
f) proíbe-se o bombardeio pelo não pagamento de contribuições em di­
nheiro de cidades, edifícios, etc.; não defendidos; g) devem ser poupados
os edifícios consagrados ao culto, artes, monumentos históricos, hospitais
etc.; os habitantes deverão designar estes edifícios e monumentos por
“sinais visíveis”; h) quando as exigências militares permitirem, deve-se
ávisar as autoridades antes do bombardeio; i) é proibido o saque.
O emprego de submarinos1'tem levantado discussões no campo dou­
trinário. Três grandes correntes podem ser mencionadas: a) a alemã de­
fende a guerra submarina integral, isto é, “a guerra ilimitada aos navios
de comércio inimigos e neutros servindo ao abastecimento do adversário
ou assim se presumindo”. A destruição por submarino é “ cômoda e segura”
e ele é “arma dos fracos financeira e militarmente”. Esta tese foi defendida
entre outros p o r Martini; b) a inglesa proíbe a utilização de submarinos
contra o comércio inimigo. Esta tese (Higgins) alega em seu favor que o
submarino é arma pérfida e que ele não aplica o direito de presa e de
visita ou, ainda, o de salvamento de equipagem; c) a francesa propõe uma
tese conciliatória entre a inglesa e a alemã e defende uma utilização
regulamentada do submarino, isto é, o submarino pode ser empregado,
mas deve se subordinar a leis e usos da guerra marítima quanto à captura
e ao direito de visita.
Pode-se observar que na P Guerra Mundial, em 1916, a Alemanha
utilizou submarinos mercantes, “Deutschland” e “Bremen”, que viajavam
entre a Alemanha e os EUA transportando níquel e borracha. Os governos
inglês e francês sustentaram que eles eram navios de guerra e os intem a­
cionalistas afirmavam que pela sua natureza o submarino é navio de guerra.
Em sentido contrário se manifestou Raoül Genet, que defendeu serem
eles navios mercantes.
No período entre as duas guerras mundiais o Tratado de Washington
(1922)18 proibiu a utilização do submarino para deseuição do comércio e
o submeteu às normas do D. Marítimo: a) obrigação da visita; b) só admite
a destruição de navio mercante em caso de resistir à visita após colocar
em segurança a equipagem e passageiros, etc. A violação destas normas
fazia com que o submarino fôsse considerado pirata, o que era um erro
porque o submarino não tinha intuito de lucro e agia conforme ordens
superiores. Este tratado não obteve nenhuma ratificação.
Em 1930, a matéria foi novamente regulamentada no tratado naval de
Londres, que estabelecia no seu art. 22 as seguintes normas: a) os subma­
rinos devem se submeter às regras do DI a que se encontram submetidos
os navios de guerra de superfície; b) um navio de comércio só pode ser
afundado após recusa de parar ou resistência à visita ou, ainda, após a
colocação em segurança da tripulação e da equipagem e dos papéis de
bordo, etc. Enfim, o submarino é equiparado ao navio de guerra de su­
perfície. O protocolo de Londres de 1936 reproduz estas normas e abre
o seu texto à adesão dos demais Estados. Ele chegou a estar cm vigor entre
36 Estados.
Na 23 Guerra Mundial estas normas foram sistematicamente violadas
pelos beligerantes.19
Sobre os meios de combate é ainda de se assinalar que a astúcia é
considerada meio lícito, não se admitindo, entretanto, a perfídia (ex.: uso
indevido de pavilhão parlamentar). Entretanto, os autores têm divergido
sobre o uso de pavilhão alheio em situação que não seja propriamente de
combate. Assim Colombos admite este uso “por um navio de guerra...
quando tal navio procura escapar, ou quando persegue um navio inimigo”.
Entretanto, assinala o intemacionalista inglês que um navio de guerra tem
que arvorar o seu pavilhão antes de abrir fogo. Accioly por sua vez admite
o Uso de pavilhão falso para escapar de uma perseguição, mas não o admite
para fazer a perseguição. Entretanto, a posição defendida por Colombos
parece ser a que está consagrada na prática.
O uso de bandeira falsa por navios mercantes tem levantado ainda
maiores discussões. O uso contudo parece consagrar o emprego de pavilhão
falso. Colombos acrescenta em favor desta prática que “o caráter neutro
ou inimigo d erum navio se determina somente ‘prima facie’ pelo pavilhão
que arvora, e todo navio de guerra desfrutou sempre do direito de visitar
um navio mercante para averiguar se tem direito ao pavilhão que exibe”.
615. Os prisioneiros de guerra na guerra marítima têm o mesmo
tratamento dos prisioneiros na guerra terrestre. A Convenção de Genebra
de 1949 sobre prisioneiros de guerra aplica-se também a eles, bem como
o Protocolo I de 1977 a esta convenção.
Os que integram as forças armadas navais têm o tratamento de prisio­
neiros de guerra. Entretanto, não deverão ser considerados prisioneiros
de guerra os indivíduos que estejam a bordo e não se encontrem a serviço
do inimigo (Instituto de Dl).
A prática internacional não tem sido uniforme no tocante a indivíduos
que se encontrem a bordo de navios inimigos, que vão integrar a força
armada deste, mas que ainda não fazem parte dela. A França considerava
tais indivíduos como podendo ser feitos prisioneiros de guerra. A Itália
(1938) adotou norma contrária, só admitindo o aprisionamento: a) se faz
parte da tripulação do navio que resiste à visita e à captura; b) se integra
tripulação de navio que faz assistência hostil; c) se tais indivíduos fiJeram,
a bo'rdo, atos que beneficiaram o inimigo.
Uma questão não resolvida é como os submarinos devem agir com os
prisioneiros.
616. A preocupação em se proteger os feridos, enfermos e náufragos das
forças armadas no mar não é recente. Assim, em 1868 foi feita uma convenção
sobre a matéria, mas que não entrou em vigor. Nas Conferências de Haia
(1899 e 1907) foram concluídas convenções para “a adaptação à guerra
marítima dos princípios da Convenção de Genebra”. A mais recente conven­
ção sobre a matéria é a de Genebra (1949), “para a melhoria da sorte dos

1523
feridos, enfermos e náufragos das Forças Armadas 110 M ar", que traça uma
série de normas sobre o assunto: a) os feridos, enfermos, pessoal sanitário e
religioso não podem renunciar aos direitos assegurados pela convenção; b)
a convenção “será aplicada com o concurso e sob o controle das Potências
protetoras encarregadas de salvaguardar os interesses das partes em lula”; c)
os membros das forças armadas e outras pessoas (membros de corpos de
voluntários), pessoas que acompanham as forças armadas sem dela fazerem
parte (ex.: correspondentes de guerra), membros de equipagem e população
em caso de levantamento em massa “que se encontrem no mar, feridos,
enfermos ou náufragos, 20 deverão ser respeitados e protegidos"; d) o navio
de guerra pode exigir a entrega dos feridos, enfermos ou náufragos,"'que
estejam em navios-hospitais, “qualquer que seja sua nacionalidade”, desde
que a condição dos feridos e enfermos permita a sua transferência, bem como
“o navio de guerra disponha de instalações que lhes assegure tratamento
adequado”; e)se náufragos, enfermos ou feridos fo r e m recolhidos por navio
de guerra neutro ou aeronave militar neutra, “ deverá ser assegurado, quando
o DI o requerer, que eles não participarão novamente das operações de
guerra”; J) “as partes em luta deverão registrar, no menor prazo possível,
todos os elementos próprios para identificar os náufragos, feridos, enfermos
e mortos da parte adversária, caídos em seu poder” e deverão ser enviados
ao Escritório de informações previstos na convenção relativa ao tratamento
dos prisioneiros de guerra; g) os navios-hospitais não podem ser atacados,
nem capturados; h) o navio-hospital “que se encontrar em um porto que caia
em poder do inimigo, será autorizado a deixá-lo”; i) os navios-hospitais
deverão prestar “socorro e assistência aos feridos, enfermos e náufragos sem
distinção de nacionalidade” ;j) “ navios mercantes que tenham sido transfor­
mados em navios-hospitais não podem ser utilizados para nenhum outro fim
durante todo o período de hostilidades”; l) a equipagem dos navios-hospitais
pode estar armada “para manter a ordem, para a sua própria defesa ou para
a proteção dos feridos e enfermos”. A convenção trata ainda dos transportes
sanitários, do emblema distintivo, da repressão dos abusos e das infrações,
etc .21
O citado Protocolo I protege igualmente os navios médicos e sua
tripulação. Nenhum navio de guerra pode obrigar tais navios, a parar ou
a desviar a sua rota. A sua proteção só cessa se ele praticar ato’ nocivo ao
inimigo.
6T17. O pessoal religioso e sanitário na citada Convenção de Genebra
receberá uma proteção “talvez mais ampla ou mais libefal do que a atri­
buída ao pessoal sanitário, na guerra terrestre” (Accioly) .22
As normas da convenção relativas a este pessoal são as seguintes: a)
“o pessoal religioso, médico e hospitalar dos navios-hospitais e sua equi­
pagem serão respeitados e protegidos, não podendo ser capturados en­
quanto estiverem a serviço desses navios, haja ou não feridos e doentes a
bordo”; b) se o pessoal mencionado cair “em mãos do inimigo será res-
peitado e protegido”; c) “se, 110 entanto, for necessário reter parte desse
pessoa] em razão das necessidades sanitárias ou espirituais dos prisioneiros
de guerra, todas as medidas serão tomadas paia desembarcá-lo o rnais
depressa possível”; d) ao ser desembarcado, o pessoal retido ficará subme­
tido às disposições da convenção... para a melhoria da sorte dos feridos e
enfermos nas forças armadas em campanha; e) os transportes sanitários,
isto é, os navios destinados ao transporte de material destinado ao trata­
mento de enfermos, feridos 011 para a prevenção de enfermidades não
poderão ser capturados, nem confiscado o material transportado; entre­
tanto, o adversário poderá abordá-los.
618. A Convenção de Haia (1907) para a adaptação à guerra marítima
dos princípios da Convenção de Genebra já tratara dos mortos, estabele­
cendo que eles deveriam ser protegidos do saque, bem como obrigava os
beligerantes a se manterem “reciprocamente ao corrente” dos óbitos, etc.
A convenção já mencionada de Genebra de 1949 torna regulamentar
o tratamento dado aos mortos: a) os mortos deverão ser registrados “no
menor prazo possível” com os elementos que os identifiquem; b} o lança­
mento ao mar será feito individualmente após um “exame cuidadoso”
para se confirmar a morte; c) não poderão ser “ despojados".
619. Aplicam-se à guerra marítima em relação aos espiões as mesmas
n orm as existentes na guerra terrestre.
620. Os parlamentários na guerra marítima são regulados pelas mesmas
normas “mutatis mutandis” da guerra terrestre. Sendo de se assinalar que
a equipagem de um navio de cartel (é o que arvora bandeira de parla­
mentários) é inviolável, se não violar os deveres do parlamentário (ex.:
não praticar ato de traição).
621. A questão da tripulação de navio mercante foi regulamentada na
Conferência de Haia de 1907 na convenção relativa a certas restrições ao
exercício do direito de captura na guerra marítima e traça as seguintes
regras: a) na captura de navio mercante inimigo “os homens de sua equi­
pagem, nacionais de um Estado neutro, não são feitos prisioneiros de
guerra”; b) o mesmo tratamento terão os oficiais e o comandante, nacionais
de Estado neutro, “se prometerem formalmente e por escrito não servir
num navio inimigo durante a guerra”; c) “o capitão, oficiais e os membros
da equipagem nacionais do Estado inimigo, não são feitos prisioneiros de
guerra, desde que se comprometam, sob fé de promessa formal escrita, a
não aceitar, durante as hostilidades, serviço algum que tenha relação com
as operações de guerra; d) não se beneficiam destes dispositivos os navios
que “tomarem parte nas hostilidades"; etc.
A Convenção de Genebra (1949) sobre prisioneiros de guerra afirma
que “os membros das equipagens, inclusive os comandantes, pilotos e
aprendizes, da marinha m ercante e as equipagens da aviação civil” somente
terão tratamento de prisioneiros de guerra se não forem “beneficiados
por tratamento mais favorável em virtude de outras disposições de direito

1525
internacional”. Ora, com o vimos, a Convenção de Iiaia dá exatamente
este tratamento mais favorável.
622. A ocupação na guerra marítima ¿6 existe quando há ocupação
do dominio terrestre. Assim sendo, aplicam-se as mesmas normas relativas
à guerra terrestre.
625. O beligerante não pode obrigar qualquer indivíduo a lutar contra
o seu próprio Estado, ñera mesmo exigir que ele forneça informações.
E proibida a requisição obrigatória de guias e pilotos nacionais da
parte beligerante inimiga.
Como na guerra terrestre, é proibida na guerra marítima a prática de
deter individuos como reféns.
624. A propriedade pública do beligerante está sujpita à captura e à
destruição na guerra marítima (ex.: navio de guerra).
A doutrina tem-se dividido em relação ao tratamento a ser dado aos
navios públicos civis. Entretanto, tem pre'dóminado a concepção de que
eles não devem ser equiparados aos navios de guerra (Instituto de DI,
Accioly) vez que eles não praticam atos de natureza militar. Em conse­
qüência, tais navios devem estar submetidos ao direito de presa e podem
ser confiscados por assistência hostil (Accioly). Em sentido contrário: An-
zilotti. Sico, em recente trabalho existente sobre a matéria, observa que a
apropriação de navios públicos não está sujeita ao direito de presa. A
propriedade se adquire “ipso iure” pela apropriação (Alemanha) ou por
um ato administrativo de confisco (Itália).
Eles entram na teoria do botim de guerra e a transferência da pro­
priedade ocorre sem qualquer procedimento jurisdicional. Pode-se acres­
centar que apesar das nossas observações este procedimento tem sido
utilizado em relação aos navios públicos em geral (Rousseau).
As mercadorias pertencentes ao Estado inimigo e que estiverem a
bordo de navios públicos civis e navios privados devem ser submetidas ao
direito de presa.23 Esta tendência visa dar maior predomínio ao direito na'
guerra marítima. Reconhecemos, entretanto, que não há norma obrigató­
ria neste domínio.
625. A propriedade privada na guerra marítima nunca foi respeitada,
ocorrendo assim o oposto do que acontece na guerra terrestre.24 Surge,
em conseqüência, o direito de presa.23
A palavra presa é considerada como possuindo dois sentidos, assim o
“ Dictionnaire de Ia Terminologie du Droit International’’ lhe dá os se­
guintes significados: a) é “a operação de guerra naval pela qual um beli­
gerante coloça sob o seu poder um navio de comércio inimigo ou neutro,
ou mercadorias", com a finalidade de fazer o seu Tribunal de Presas se
pronunciar sobre o seu confisco”; b) é o “navio ou mercadoria que foi
objeto da medida "de guerra naval designada anteriormente”.
O direito de presa abrange dois momentos: a captura e o confisco. A
captura é “ato puramente militar” da apreensão, enquanto-o confisco é a

1526-
atribuição da propriedade do objeto da captura (navios, mercadorias) ao
captor (Sandiford). Entretanto, a atribuição de propriedade ocorrerá por
sentença dos tribunais nacionais de presa.
A finalidade do direito de presa é meramente “mercantil”, isto é, visa
“arruinar o comercio inimigo”, sendo que o com ercio dos neutros é um
“objetivo suplementar" (Paul Parfond). Atualmente, resguarda-se o co­
mércio dos neutros, que só pode ser legitimamente atingido se ocorrer a
violação dos deveres de neutralidade (ex.: contrabando de guerra), isto é,
o objetivo é atingir o inimigo a que se esteja prestando auxilio.26 Sobre a
importancia do direito de presa para enfraquecer o inimigo, não tem
havido uniformidade entre os autores: uns (Wehberg) consideram que ele
não tem grande efeito -sobre o inimigo, enquanto outros (Dumas) defen­
dem tese oposta.
O direito de presa está consagrado na prática desde a Idade Média,
sendo que o Consulado do Mar,2' escrito em catalão e publicado no século
XIV em Barcelona, coletânea dos usos e costumes do comércio marítimo
no Mediterrâneo, já regulamentava o direito de presa. Sobre a matéria
determinava que a propriedade privada inimiga pode ser apresada, encon­
trándose ela em navio neutro ou inimigo. Respeita-se a propriedade neu­
tra. O Consulado do Mar adota o sistema de nacionalidade da mercadoria,
que foi seguido durante séculos na Europa. Pode-se ainda observar que
em 1373 foi criada uma jurisdição de presa na Europa.
Nos séculos XVI e XVII passa a ser adotado o sistema da “infecção
hostil" consagrando que “a mercadoria neutra é confiscável em navio
inimigo, da mesma fôrma que o é a mercadoria inimiga em navio neutro,
bem como o próprio navio que a transporta” (Accioly). Este sistema ado­
tado na prática contrariava a doutrina dos autores da época (Gentil e
Grotius) que faziam a defesa do respeito às mercadorias neutras em navios
inimigos. O sistema de infecção hostil foi adotado na Ordenança de Fran­
cisco I, de 1543, e na Ordenança de Colbert no século XVII. Este sistema,
segundo Kleen, parece ser o mais antigo de todos e teria mesmo antecedido
“os códigos marítimos da Idade Média”.
O sistema de nacionalidade do navio predominou do final do século
XVII até a primeira metade do século XIX. A mercadoria inimiga em navio
neutro é livre c 3 mercadoria neutra em navio inimigo é confiscável. O
Tratado de Utrecht (1713) consagrou estas normas.
Durante a Guerra dos Sete Anos a Inglaterra proibiu que os neutros
fizessem a comércio que não lhes fosse permitido em tempo de paz
(1 7 5 6 ).28 Esta medida resultou do fato de a França ter dado à Holanda o
direito de fazer o comércio entre ela e as suas colônias para fugir ao
controle da armada inglesa.
Nos séculos XVIII e X IX acentuou-se a luta pela liberdade de comércio
dos neutros com as Ligas de Neutralidade Armada 29 e a independência

1527
dos EUA.3" Alguns amores (Parfond) salientam que 110 século XIV já se
tentara conseguir “imunidade da propriedade privada no m a r'.
A salvaguarda do comércio dos neutros veio a ser consagrada na De­
claração de París (1856), que aboliu o corso ,31 estabelecendo:

“ O pavilhão neutro cobre a mercadoria inimiga, com exceção


do contrabando de guerra; a mercadoria neutra, com exceção
do contrabando de guerra, não pode ser apreendida sob pavi­
lhão inimigo.” 32

Como se pode verificar, há nesta matéria uma questão da maior im­


portancia, isto é, qual o critério a ser adotado para se verificar a naciona­
lidade do navio ou da mercadoria. .
Três critérios existem sobre a nacionalidade do navio: a) o anglo-saxão
considera o pavilhão uma mera presunção de nacionalidade e que pode
ser abandonado quando: 1 — os proprietários ou co-proprietários forem
inimigos; 2 — o navio fizer em tempo de guerra navegação que em tempo
de paz é exclusiva dos navios nacionais do beligerante; 3 ■— a nacionalidade
neutra não foi concedida conforme o direito do Estado neuiro; b) a fran­
cesa leva em consideração o pavilhão do navio e seu proprietário; c) a
Declaração de Londres (1909) levou en consideração apenas a nacionali­
dade do navio, sendo que este critério foi abandonado em 1915.
O critério que parece ser o predominante nos dias de hoje é o que
figura em uma decisão da Corte de Reclamações norte-americana no caso
da Transatlantic Co. (1949), que afirma:

“A regra do Dl parece ser que, se um navio arvora pavilhão


inimigo, não é permitido demonstrar perante uma corte de
presas que o seu verdadeiro proprietário é neutro; mas o fato
de que ele arvora pavilhão neutro não impede que o captor
prove que o seu verdadeiro proprietário é inimigo.”

A respeito das mercadorias também existem dois critérios para a veri­


ficação do seu caráter neutro ou inimigo. O francês defende o critério da
nacionalidade do proprietário da mercadoria, sendo que o inglês adota o
do domicílio do proprietário. Não há norma internacional consagrando
um ou outro critério, e a própria Declaração de Londres não diz se o
critério á ser aplicado seria o da nacionalidade ou o do domicílio. Se a
carga é de propriedade de uma pessoa jurídica, ainda dois critérios existem
para determinar a nacionalidade do seu proprietário: o do controle social
(inglês) e o da sede social (francês).
A mercadoria que for encontrada em navio inimigo e cuja nacionali­
dade não puder ser determinada é considerada boa presa (Genet).
A transferencia da propriedade de mercadoria que se encom ie no
mai. de um inimigo para um neutro, não é oponível ao captor.
Sobre a transferencia de navios podemos citar a Declaração do Lon­
dres.1' que estabeleceu: a) a transferencia é válida se não for “ comprovado"
que “se realizou com o propósito de fugir às conseqüências que acarreta
o caráter de navio inimigo”; b) presume-se a nulidade, admitindo-se prova
em contrario, “se o navio perdeu a nacionalidade beligerante menos de
sessenta dias antes do inicio das hostilidades”; a mesma presunção existe
“se o ato cie transferência não se encontrar a bordo”; c) há presunção
absoluta de validade se a transferência foi efetuada mais de trinta dias
antes do inicio dás\hostilidades, “se ela for absoluta, completa, conforme
a. legislação dos países interessados e se verificar para tal efeito que o
controle do navio e os benefícios do seu emprego não permaneceram nas
mesmas mãos em que se encontravam antes da transferência. Entretanto,
se o navio perder a nacionalidade beligerante menos de sessenta dias antes
do início das hostilidades, ou se o ato de transferência não se encontrar
a bordo, o apresamento do navio não poderá dar margem a perdas e
danos"; d) a transferência “depois do início das hostilidades é nula, a
m en os que se comprove que essa transferência não se realizou com o
propósito de fugir às conseqüências que acarreta o caráter do navio ini­
migo”. Havendo neste caso presunção absoluta de nulidade: “ 1- — se a
transferência se reaiizou enquanto o navio estava em viagem ou num porto
bloqueado; 29 — se houver cláusula de reserva de domínio ou de resti­
tuição; 3® — se as condições, às quais estiver submetido o direito de pavilhão
de acordo com a legislação do pavilhão arvorado, não houverem sido
observadas” . Na 2a Guerra Mundial foi abandonado o sistema da Declara­
ção de Londres, seguido na P Guerra Mundial, e foi admitida a transfe­
rência de navios que se refugiaram em portos neutros quando foram
iniciadas as hostilidades. Este foi o procedimento adotado na América,
cujos países compravam navios alemães.
Charles Rousseau assinala que o direito de presa deve se subordinar
a condições “ratione temporis” e “ratione loci”.
As condições “ratione temporis” são as seguintes: a) somente após a
declaração ‘da guerra pode ser exercido o direito de presa;34 b) o direito
de presa pode ser exercido até o fim da guerra e não é suspenso durante
os armistícios, a não ser que se convencione expressamente.
As condições “ratione loci” podem ser reduzidas nas seguintes: a) o
direito de presa pode ser exercido nas águas territoriais dos beligerantes
e no alto-mar; b) não pode ser exercido nas águas territoriais dos neutros;
c) pode ser exercido em terra pelas “ autoridades marítimas” (ex.: em um
porto), tem-se acrescentado que “o aspecto de propriedade marítima das
mercadorias desembarcadas persiste ainda durante um certo tempo em
terra” (Rousseau).

1529
O direilo de presa é aplicado em relação aos navios privados e pare­
ce-nos ser de jusliça a sua aplicação, corno já dissemos, aos navios públicos
civis. Quaiuo aos navios pertencentes ao Estado, mas destinados a atividade
comercial, são considerados navios privados. Os navios públicos de guerra
não estão sujeitos ao regime de presas, porque a sua propriedade passa
ao captor pelo simples fato da captura.
Há navios que não são objeto do direito de presa: navios de pesca,
navios postais, navios encarregados de missões científicas, religiosas e fi­
lantrópicas, navios-hospitais, navios que façam “serviços de pequena nave­
gação” e “navios munidos de salvo-conduto”.33
A imunidade dos navios de pesca remonta ao século XVI. A Convenção
de Haia relativa a certas restrições ao exercício do direito de captura (1907)
só dá esta imunidade aos navios de “pesca costeira”, desde que eles não
participem das hostilidades. Esta restrição se prende à falta de uniformi­
dade da jurisprudencia.
Os navios postais tiveram a sua imunidade reconhecida em tratados
bilaterais do século XIX. A Convenção de Haia relativa a certas restrições
ao exercício do direito de captura na guerra marítima (1907) os equiparou
aos navios mercantes quanto às leis e costumes da guerra marítima, vez
que eles fazem normalmente, ao lado do transporte de correspondência,
o transporte de mercadorias.
Os navios de pesquisa científica gozam de imunidade desde o século
XVIII e foram incluidos na citada Convenção de Haia ao lado dos navios
encarregados de missões religiosas ou filantrópicas, por iniciativa da Italia,
com a finalidade de proteger os navios oceanográficos de Monaco.
Os navios-hospitais tiveram a sua imunidade reconhecida em varias
convenções, assim na de Haia (1907) para a adaptação à guerra marítima
dos princípios da Convenção de Genebra e na de Genebra (1949) para a
melhoria da sorte dos feridos, enfermos e náufragos das forças armadas
no mar.
Os navios de pequena navegação local estão isentos da captura pela
Convenção de Haia (1907) relativa a certas restrições ao exercício do
direito de captura na guerra marítima. Diz Rousseau que eles só podem
ser determinados em cada caso.
Os navios munidos de salvo-conduto também estão isentos do direito
de captura. O salvo-conduto é dado aos navios que transportam agentes
diplomáticos e outras vezes é dado aos navios que evacuam a população
civil.
Não estão sujeitos ao direito de presa os pertences pessoais de equi­
pagem, desde que não constituam contrabando de guerra.
A correspondência postal também goza de inviolabilidade, seja ela
oficial ou privada, se encontrada a bordo de navio neutro ou inimigo.36
Se o navio for capturado, ela deverá ser expedida pelo coator. Estas normas
estão fixadas na acima citada Convenção de Haia, que determina ainda

1530
que a imunidade não é reconhecida em relação à correspondência que
“ern caso de violação de bloqueio... se destina ao governo do porto blo­
queado”. Charles Rousseau assinala que na prática houve uma interpreta­
ção restritiva da Convenção de Haia: n) a inviolabilidade não se aplica aos
“colis postaux”; b) não há inviolabilidade quando o apresarnento se realizar
nos portos e águas territoriais dos beligerantes: c) a inviolabilidade não se
aplica aos sacos postais, uma vez que neles eram enviados, muitas vezes
nas suas dobras, propagandas, instruções secretas, valores destinados aos
inimigos
A captura1' é o alo da guerra marítima pelo qual o comandante de
um navio de guerra coloca sob sua autoridade o navio, as mercadorias e
a equipagem de um navio mercante neutro ou beligerante. Os nayios
mercantes armados não têm o direito de captura.
Hildebrando Accioly explica o procedimento que um captor deve ter
em relação ao navio apresado: “ 1) apoderar-se dos papéis de bordo, in­
ventariá-los e pô-los em invólucro selado; 2) lavrar uma ata de captura,
bem como um inventário sumário do navio; 3) mandar fechar e selar as
escotilhas, os cofres e os paióis de mercadorias; 4) fazer um inventário
especial dos objetos pertencentes às pessoas encontradas a bordo; 5) co­
locar guarnição a bordo do navio apresado, a fim de o conduzir ao porto
mais próximo do captor”.
A captura é o primeiro momento do direito de presa.38 Uma questão
que tem levantado grandes problemas é a de saber se o captor pode destruir
as mercadorias ou o navio apresado. A conseqüência da captura é a do
navio ou mercadorias serem conduzidas ao Estado captor para que seja
julgada por jurisdição de presa. Entretanto esta norma não tem sido sempre
respeitada na prática internacional, por diversas razões: a) a destruição
traz vantagens para o captor, que não tem despesas; b) permite ao captor
continuar as suas operações; c) tira a possibilidade dela ser reapresada ou
libertada; d) o inimigo tem o seu prejuízo; e) ele não precisa dividir a sua
tripulação com o navio apresado (Dupuis).
A Convenção de Haia referente aos direitos e deveres das potências
neutras (1907), apesar das discussões que ali foram travadas, não tratou
da matéria. Apenas estabeleceu: a) “uma potência neutra pode permitir
o acesso de seus portos e baías às presas escoltadas ou não, quando para
àí forem levadas para serem deixadas sob seqüestro, esperando a decisão
do Tribunal de Presas”; b) que somente em virtude do mau estado do mar
a presa poderia ser levada para um porto neutro, e que-ela deveria partir
logo que cessasse a causa que justificara a sua entrada, constituindo causas
justificativas d falta de combustíveis e provisões. Se um navio de guerra
não partisse com a sua presa, o Estado neutro a libertaria.
A questão da destruição de presas só foi regulamentada na Conferência
Naval de Londres de 1909, que proibiu a destruição de presas neutras,39
a não ser que a condução das mesmas possa “comprometer a segurança

1531
do navio (te guerra 011 o éxito das operações em que este estiver empe­
nhado". Em caso de destruição, as pessoas e papéis de bordo serão colo­
cados em segurança. Se a presa destruida for “declarada nula o captor
deve indenizai os interessados em substituição da restituição a que teriam
direito". A indenização será extensiva aos proprietários das mercadorias
destruidas.
Sobre a destruição de presa inimiga tem-se assentado que os navios
“não podem ser atacados e afundados 011 destruidos sem aviso previo e
que as pessoas que estão a bordo devem ser em segurança colocadas” e
“os papéis de bordo devem ser resguardados” (Accioly).
O captor pode se utilizar do navio apresado, entretanto, deverá avaliar
a presa para efeito de indenização caso ela venha a ser anulada. O mesmo
deve ocorrer com as mercadorias, que devem ser avaliadas para posterior
indenização quando o captor precise se utilizar délas (ex.: alimentos). E
o que tem sido denominado de direito de preempção à carga.
A t r a n s m i s s ã o da propriedade40 da presa só ocorre com a sentença do
Tribunal de Presas. Antes da sentença o Estado captor tem apenas um
“direito eventual” . A presa que passa “da posse de fato à de direito é boa”
(Kleen). Desde o século XIV (Ordenança inglesa de 1373) que está fixada
a regra de “toda presa deve ser julgada”.
A jurisdição de presas é nacional. Cada Estado constituí o seu tribunal.
A origem d estes tribunais teve um aspecto quase que mercenário.41
A organização dos Tribunais de Presas varia de país a país: em uns são
judiciários (EUA, Inglaterra), em outros administrativos (Espanha, Fran­
ça), ou ainda mistos (Alemanha, Itália). O processo nestes tribunais é
fixado pelos Estados.
As decisões são obrigatórias para as partes.42 Se as sentenças não vali­
darem a captura, o captor deverá pagar uma indenização aos proprietários
da presa. A indenização deverá ser paga ainda no caso de a presa não ser
submetida a julgamento. A sentença acaba com os direitos reais de garantia
porventura existentes em relação ao navio. A sentença de confisco em
alguns países (Turquia, Alemanha) é que caracteriza o momento da aqui­
sição da propriedade. Em outros países (Itália, Noruega, Romênia) a sen­
tença apenas declara a propriedade do Estado, porque se considera que
o momento da aquisição é o da captura. Esta última é a que tem predo­
minado. Segundo Sico, a sentença do relaxamento da presa é constitutiva,
porque “anula ex nunc” a captura e “retransfere a propriedade à pessoa
contra a qual o Estado exercera o direito de presa”.
Podemos recordar que a presa não é invalidada pela alegação de boa
fé dos proprietários, destinatários ou armadores.
O direito de presa é um direito jurisprudencial (Guttinger). O juiz
inglês aplica no julgamento o Dl, enquanto o juiz francês aplica o direito
interno, isto é, o Dl só é aplicado na medida em que o direito interno se
referir a ele.
O caso mais recente de Tribunais de Presas forani os instituidos pela
India na guerra de Bangladesh.
A idéia de se internacionalizar a jurisdição de presas é encontrada no
século passado nos trabalhos do Instituto de Direito Internacional, mas
foi a Conferencia de Haia de 1907 que elaborou uma convenção ern que
se criava uma Corte Internacional de Presas. Esta Corte seria um órgão de
25 instancia ao qual caberia apreciar os recursos interpostos das decisões
proferidas pelas jurisdições nacionais, que passariam a ser Ia instancia. Os
recursos, com algumas ressalvas, poderiam ser interpostos: a) pelo Estado
neutro; b) por particular neutro; c) por particular nacional de um Estado
inimigo. Esta Corte nunca entrou em funcionamento devido às.divergen­
cias a respeito de sua composição. Ela seria formada de 15 juízes, sendo
oito permanentes (Alemanha, EUA, Austria-Hungria, França, Grã-Breta­
nha, Itália, Japão e Rússia) e sete temporários, os quais fariam rodízio
conforme um quadro anexo. O Brasil foi colocado em posição de inferio­
ridade no rodízio, o que levantou o protesto de Rui Barbosa.
Finalmente, é de se mencionar que a questão de presa é geralmente
regulamentada na celebração da paz que pode confirmar ou obrigar a
revisão dos julgamentos de presa,43 ou ainda a sua restituição.
626. A única regulamentação internacional a respeito dos cabos sub­
marinos em tempo de guerra é a que figura na Convenção de Haia (1907)
relativa às leis e usos na guerra terrestre, que estabelece no seu regulamento
anexo: “Os cabos submarinos, ligando um território neutro, não serão
objeto de posse ou de destruição, senão em caso de absoluta-necessidade.
Deverão ser igualmente restituidos e as indenizações serão reguladas ao
celebrar-se a paz.”
Esta forma, como se vê, refere-se apenas à guerra terrestre e êm ter­
ritório ocupado.
Na guerra marítima e prádea internacional tem sido no sentido de se
cortar os cabos submarinos, vez que a interrupção das comunicações tem
sido considerada de grande importância militar. Seria considerada um ato
legítimo de guerra. Se os cabos submarinos pertencem aos neutros, deve
ser paga uma indenização (Schwarzenberger).
NOTAS
1 Linneu de Albuquerque Mello — Gênese e Evolução da Neutralidade. 1943;
Roberto Santiford — Diritto Marítimo di guerra, 1938; Gilbert Gidel — Les Lois
de la Guerre Maritime, 1946-1947; C. Jo h n Coloinbos — Derecho Internacional
Marítimo, 1961; Richard Kleen — Loís et L'sages de la Neutralicé, d'aprés le Droit
International Convenuonnei et Coutumier des Etats Civiüsés. 2 voJs., J 898-] 990;
José Maria de Aveilar Brotero — Questões sobre Presas Marítimas, 1863; M arcel
Pognon — Du Principe du Droit de Prise dans la Guerre Maritime et des Restric-
tions qu’il com porte, 1912; Charles Dupuis — Le Droit de la Guerre Maritime
d’aprés les C onférences de la Haye et de Londres, 1911; Paul Reuter — Étude de
la régle “toute prise doit étreju g ée”, 1933; Celso de Albuquerque Mello — Presa,
in Repertorio Enciclopédico do Direito Brasileiro, vol. 39, págs. 68 e segs.; A.
Pearce Higgins — Droit de visite et de capture dans la guerre maritime, in RdC,
1926, vol. t. 11, págs. 69 e segs.; Isidoro Ruiz M oreno — Guerra Marítima, 1925;
José Luiz de Azcárraga y Bustamante — El Corso Marítimo, 1950; Jacques Bruneau
— La Ruse dans la G uerre sur Mer, 1938; Ch. Peyreigne — Les Conflits Maritimes
entre les États, 1912; Roberto Sandiford — Diritto Marítimo, 1960, págs. 543 e
segs.; Raoul G enet — Droit Maritime pour le Tem ps de Guerre, 2 vols. e um
suplemento, s.d.; Charles de Boeck — De la Propriété Privée ennem ie sous le
pavillon ennem i, 1882; Enrico Calallani — La Dichiarazione di Londra relativa al
Diritto della Guerra Marittima, 1912; Ferdínandi Gillet — Le Caractére Hostile
de propriété privée dans la guerre maritime, 1911; C. Jo h n Colombos — A Treatise
on the Law o f Prize, 1949; José Luis de Azcárraga y Bustamante — Evolución del
Derecho de la Guerra Submarina, in La Guerra Moderna, vol. V, 1958, págs. 347
e segs.; Roberto Sandiford — Evolution du d roit de la guerre maritime et aérienne,
in RdC, 1939, vol. II, t. 68, págs. 561 e segs.; H erbert Arthur Smith — L e déve-
loppement m oderne des lois de la guerre m aritime, in RdC, 1938, vol. I, 63, págs.
607 e segs.; Luigi Sico — “Toute prise doit é tre ju g é e ” . II giudizio delle prede nel
diritto internazionale, 1971; José Luis de Azcárraga — Derecho Internacional
Marítimo, 1970, págs. 174 e segs.; Philippe Guttinger — Reflexions sur la juris-
prudence des prises maritimes de la seconde guerre mondiale, in RGDIP, Janvier-
Mars 1975, págs. 25 e segs. Manual de San Rem o sobre el Derecho Internacional
aplicable a les conflictos armados en el mar, elaborado por juristas intem acion a­
listas y expertos navales, reunidos bajo los auspicios del Instituto Internacional de
Derecho Hum anitario, aprovado em ju n h o de 1994, 1995.
2. O Instituto de D l, na sessão de O xford, em 1913, excluiu da guerra marítima
a guerra nos rios.
3. E de se assinalar que inúmeros códigos ou ¡eis marítimas trataram da guerra,
tais como o Consulado do Mar (séculos X III ou X IV ), a Ordenança francesa de
1681, etc. O m esmo ocorreu com atos internacionais como a Declaração da Liga
de Neutralidade Armada de 1780, etc.
4. A grande divergencia entre as duas concepções pode ser resumida na
seguinte: a Inglaterra, grande potencia marítim a, reivindicava “m aior liberdade
de ação para os beligerantes na guerra m arítim a” , enquanto a França e outros
Estados com m enos força m arítim a procuravam impor “grandes lim itações aos
poderes d o s beligerantes” (Serení).

1534
5. Este mesmo am or acrescenta: “Em princípio, as leis ila guerra terrestre são
aplicáveis à guerra m arítim a.”
6. Muitas vezes, esses navios já são construidos (em tempo de paz) segundo
planos aprovados pela administração de marinha de guerra e que permitem sua
rápida transformação em navios próprios para a gu erra (Accioly). Assim a Inglaterra
desde 1887 passou a concluir acordos com as com panhias de navegação para se
utilizar dos seus navios em caso de ■guerra. Os EUA seguem este procedim ento
desde 1892,
7. A Marinha Auxiliar na guerra veio a se desenvolver após a abolição do
corso.
8. A Inglaterra sustentou esta tese (com batida pela França), porque ela possuía
inúmeras bases navais espalhadas pelo mundo inteiro.
9. Esta convenção teve pon cas ratificações, significando isto que os principios
ai consagrados não tiveram grande aceitação. •
10. Argumenta-se de um modo geral em favor desta posição com o direito de
legítima defesa.
11. O Brasil (1939) pouco antes desta declaração nas suas regras de neutra­
lidade estabeleceu que se o armamento não fosse apenas defensivo tais navios
seriam equiparadas aos navios de guerra e acrescentou: “Entre outras provas,
sujeitas à verificação das autoridades navais brasileiras, de que o arm am ento não
terá fins ofensivos, devem con correr as seguintes: o navio não terá tubo lança-tor-
pedos; o calibre dos canhõ es não será superior a seis polegadas; as armas e munições
de guerra serão em pequena quantidade, a tripulação normal e a carga consistirá
em artigos im próprios para a guerra” (art. 25).
12. O corso pode ser definido com o “a em presa naval de um particular contra
os inimigos de seu Estado, realizada com a permissão e sob a autoridade da potência
beligerante, com o exclusivo objetivo de causar perdas ao com ércio inim igo e
entorpecer ao neu tro q u e se relacione com os ditos inimigos” (José Luis de
Azcárraga y Bustam ante).
13. Assim em Pisa (1 2 9 8 ), Gênova (1313) e na Liga Hanseática (1262, 1263
e 1264) se obrigava os arm adores do corso a darem “um a caução para responder
pelos danos ao tráfego nacional ou estrangeiro não inimigo” (sobre o histórico
do corso, Sandiford).
14. Carta de corso ou carta de marca eram as autorizações dadas pelo Estado
ao corsário, autorizando-o a apresar navios inimigos.
15. O Brasil aderiu em 1857.
16. E interessante observar que M onroe em 1823 propusera -a abolição do
corso.
17. V. Rousseau.
18. Ele foi inspirado por Root, dai as suas norm as serem denominadas “ reso­
luções Rool” .
19. Os alm irantes alem ães Raeder e Doeniz não foram condenados em Nu­
rembergue pela violação das normas a respeito do uso de submarinos, vez que os
Aliados também tinham se utilizado de uma guerra submarina sem limites (ex.:
EUA no P acífico).
20. A palavra náufrago abrange “a amerissagem forçada ou queda n o m ar”.
21. As partes contratantes fixarão sanções penais a serem aplicadas “às pessoas
que cometam ou dêem ordem para com eter qualquer das infrações graves contra

1535
a presente Convenção'’ . São consideradas infrações graves: “ homicídio internacio­
nal, tortura ou tratamento desumano, inclusive as experiências biológicas, o fato
de causar intencionalm ente grandes sofrimentos ou atentados graves à integridade
física ou à saúde, a destruição ou apropriação dos bens, não justificadas peias
necessidades militares e executadas em grande escala, de maneira ilícita e arbitrá­
ria” .
22. O “pessoal religioso, m édico e hospitalar j á recebera proteção nas Con­
venções de Haia em 1899 e 1907” para a adaptação à guerra náutica dos princípios
da Convenção de Genebra.
23. As regras italianas de 1917 dispensavam o ju lgam ento quando se tralava
de “ qualquer navio ou mercadorias pertencentes ao Estado inimigo”.
24. No século XIV houve tentativas de se conseguir a “imunidade da proprie­
dade privada no mar" (P arfond ). Assim, na guerra entre a França e a Inglaterra,
Eduardo II proibiu em 1324 que os seus súditos apresem navios inimigos que não
praticassem hostilidades. Entretanto, Carlos o Belo não aderiu a este princípio e
a propriedade privada do inimigo não foi respeitada. Em 1329, no fim da guerrá,
os beligerantes devolveram as presas que ainda tinham em seu poder. A proprie­
dade privada inimiga tam bém não foi capturada na guerra enlre a França e a
Espanha, em 1823. Neste m esmo ano Monroe propôs à França, Inglaterra e Rússia
a não captura de navios privados inimigos. Todavia esta proposta “ não teve segui­
m en to” (Sandiford).
25. O direito de presa abrange tanto o direito de guerra quanto o direito da
neutralidade. Procuraremos estudá-lo tanto quanto possivel nos seus dois aspectos
neste capítulo.
26. Na verdade, ao se estudar o histórico do direito de presa constata-se que
ele é o histórico da luta dos neutros pela liberdade de com ércio durante a guerra.
27. Uns (Nys) consideram que o Consulado do M ar "reproduziu a jurispru­
dência dos magistrados que tinham assento- na Corte M arítima de Barcelona” .
O utros (Azuni) o consideram “uma produção dos habitantes de Pisa” (v. Linneu
de Albuquerque M ello).
28. Esta regra, abandonada pela Inglaterra no século X IX , desapareceu defi­
nitivamente no início do século XX.
29. A Liga da N eutralidade Armada de 1780 estabelecia que “os navios neutros
podem viajar livremente de um porto a outro e ao longo das costas dos Estados
beligerantes, sem estar sujeitos a detenção”, bem com o “as mercadorias inimigas
são livres sob pavilhão neu tro, excetuando o contrabando de guerra’’ . A Liga da
Neutralidade Armada (1800) repete os mesmos princípios acrescentando: a) “um
navio neutro só é culpado de violação de bloqueio quando, depois de advertido,
procura rompê-lo m ediante estratagema ou à viva força”; b) “os navios mercantes
neutros que viajarem sob a escolta de um navio de guerra também neutro não
devem ser submetidos a visita. Ter-se-á como suficiente, em tal caso, a declaração
do oficial, comandante do com boio, de que não há a bordo contrabando de
guerra” (Linneu de Albuquerque Mello).
30. Os EUA passaram a defender as regras de U trecht e “a liberdade do
com ércio dos neutros e n lre portos de um Estado beligerante, desde que se não
transportasse contrabando de guerra” (Linneu de A lbuquerque Mello).
3 1 . 0 corsário era o responsável por grande núm ero de presas. Alguns chefes
d& Estado, ao lhes darem carta de corso, deixavam-lhes com o pagamentos as presas

1536
que íizessem, o que aumentava a cobiça. Com a abolição do torso desaparecen a
prática do resgate de presa.
32. A Declaração de Paris não especifica se o navio é público ou privado e
pode-se concluir que em qualquer uni defes a mercadoria neutra é protegida.
33. Outros sistemas sãç>: a) francés — é nula toda transferência após o início
das hostilidades e válida a anterior; b) anglo-saxã admite a validade da transferência
de boa fé mesmo depois do inicio das hostilidades.
34. É comum os Estados darem aos navios dos inimigos um prazo (prazo de
indulto) para que saiam dos seus portos. Esta prática já se encontra consagrada
no Tratado de Utrecht de 1713 e se desenvolveu no século X IX após a Declaração
de Paris e foi consagrada na Convenção relativa ao regim e dos navios mercantes
inimigos no com eço das hostilidades, que estabelecia: a) “quando um navio mer­
cante pertencente a urna das potencias beligerantes se encontrar, do com eço das
hostilidades, nura porto inimigo, “ é ‘desejável’ que lhe seja permitida saída livre.
imediatam ente ou após um prazo de favor suficiente, e ganhar diretamente, depois
de ter sido munido de um salvo-conduto, o seu porto de destino ou outro que
Ihe for designado”; b) “o m esmo se dará com um navio que houver saído de seu
últim o porto de partida am es do inicio da guerra e entra mim porto inimigo sem
saber das hostilidades". Na 2 a Guerra Mundial a França, Inglaterra e Alemanha
não deram prazo de indulto aos navios inimigos.
35. Kleen acrescenta ainda os “navios em desgraça” , reconhecendo contudo
que esta imunidade não foi admitida por todos os Estados.
36. A imunidade de correspondencia postal já se encontra consagrada em
diversos tratados do século X IX , com o na convenção franco-inglesa de 1833.
37. No caso de recaptura os efeitos são fixados pelas legislações nacionais
tendo direilo sobre a presa o últim o captor (Accioly).
38. Antes da captura há o direito de visita (v. capítulo Neutralidade Marítima).
Atualm ente, devido ao perigo de uma visita no mar (ex.: submarinos) é comum
se desviar o navio de sua rota e levá-lo a um porto. E a denominada por alguns
autores de “prática de Kirkwall” que era um dos portos ingleses de controle nas
Orcades. Esta prática está consagrada desde a I- Guerra Mundial e os Tribunais
de Presas não dão indenização ao navio neutro por desvio de rota e ter ficado
imobilizado mesmo que seja injusto. As indenizações só têm sido fixadas se o navio
é imobilizado por um lapso de tempo abusivo (Rousseau). O primeiro caso de
desvio de rota para visita ocorreu em 1912 na guerra "ítalo-turca em que unv
cruzador italiano desviou o navio francês “Carthage” e o levou a Cagliari para
efetuar a visita.
39. A Inglaterra sem pre se opôs à destruição de presa neutra porque a sua
propriedade só se transmite quando for considerada boa presa. Defendia, por
outro lado. a destruição de presa inimiga porque esta propriedade se transmite
com a captura.
40. Outros sistemas já existiam na prática: a) o anglo-saxão, em que a pro­
priedade do navio beligerante se transmitia com a captura; b) o do Consulado do
Mar, em que a propriedade da presa era adquirida ao ser ela “conduzida a lugar
seguro” .
41. “Era necessário fiscalizar as presas marítimas a fim de que cada um pudesse
ter a sua parte no botim sem estar obrigado a reconquistá-la uma segunda vez

1537
contra os seus próprios irmãos de armas: o almirante tinha direito à décima parle
das capturas efetuadas, e foi este motivo egoísta que o levou a se imiscuir etn todos
os casos de presas para defender seus direitos. Esta prática estava de tal modo
enraizada no espirito que quando no século XV1J1 o almirante renunciou ao seu
décim o muitos armadores acreditaram que em decorrência deste único falo as
presas cessariam de ser ju lgadas” (Paul Reuter).
42. E um caso excepcional de violação ao principio de que ninguém é juiz
em causa própria.
43: Os tratados de paz de 1947 com a Jiália, Rom ênia e Finlandia, bem como
o tratado com o Japão, estipularam uma revisão dos julgam entos de presa “não
conform es ao Direito Internacional”.

1538 -
CAPÍTULO LXIV

A GUERRA AÉREA'

627 — Introdução¿ 628 — Forças beligerantes; 629 — Meios de


combate; 630 — Prisioneiros. Feridos e espiões; 631 — Presa.

627. A utilização da aviação na guerra é recente e, em conseqüência,


não foram concluídas convenções sobre a matéria. Aplica-se por analogia
a Convenção de Haia de 1907 sobre leis e usos da guerra terrestre, bem
como normas da guerra marítima. Não há nem mesmo regulamentação
consuetudinaria. Há uma codificação de valor doutrinário: o Código de
Haia (1923). A tendência que se verifica nas regras de Haia é de se dar à
guerra aérea uma regulamentação autónoma distinta das da guerra marí­
tima e terrestre. Assim as regras de Haia não falam em cidade aberta ou
defendida, mas em objetivo militar. Na 2- Guerra Mundial, como veremos
adiante, a guerra aérea quase não conheceu nenhuma regulamentação
jurídica nos bombardeios.
A primeira guerra em que se utilizou a aviação foi a ítalo-turca (1911-
1912),2 mas o seu emprego só se desenvolveu com a I a Guerra Mundial.
Em 1907, na Conferência de Haia, foi feita uma Declaração, que renovava
a Declaração de São Petersburgo (1868) e de Haia (1899), que proibia o
“lançamento de projéteis e de explosivos, dos balões, ou por outros modos
análogos novos”.
A primeira decolagem de um a vi âo de um navio foi em novembro de
1910 e a primeira operação aeronaval foi em 1914, quando navios britânicos
colocaram aviões diante de Auxhaven, e em 1942 a batalha do mar de
Coral colocou em luta aviões embarcados (Ch. Rousseau).
Em 1911, o Instituto de Dl reconheceu a legitimidade de guerra aérea
desde que ela não apresentasse “para as pessoas ou a propriedade da
população pacífica, maiores perigos do que a guerra terrestre ou maríti­
m a”.

1539
A g n e u .i vié re a c aquela cu jas “ o p e ra ç õ e s bélicas são realizad as rio ai
( S e r e n í) .
628. Foi mam as forças beligerantes as aeronaves militares. ' As aerona­
ves públicas civis devem receber c m r e g i a geral o tralamen lo de aeronaves
privadas.4 Someme as aeronaves militares têm o direito de beligerantes.
Urna aeronave pública civil 011 privada pode ser transformada em
aeronave militar desde que a transformação ocorra em território submetido
a jurisdição do beligerante e não em alto-mar. As aeronaves devem ter
marca externa de sua nacionalidade e da sua natureza militar. Estas são
algumas das. regras que figuram no Código de Haia de 1923, elaborado
por uma comissão de juristas da França, EUA, Itália, Inglaterra e Japão,
conforme fora resolvido na Conferencia de Washington (1922) para a
limitação de armamentos. Entretanto este projeto não se transformou em
convenção. Quanto às aeronaves privadas armadas para a sua defesa, o
Código de Haia nada prevê e a doutrina (Ruiz Moreno) lhe tem sido
contraria. A própria prática não a consagra.
629. Na guerra aérea, a exemplo do que tem ocorrido nas guerras
marítima e terrestre, tém sido condenados a perfídia e os atos que provo­
cam sofrimentos inúteis. Assim tem-se proibido os bombardeios que não
tenham objetivo militar.
O já citado Código de Haia traça várias normas sobre a matéria: a) é
proibido o uso de marcas externas falsas; b) é proibido o uso de aeronaves
com fins de propaganda; c) é proibido o bombardeio aéreo com finalidade
de “ atemorizar a população civil ou de destruir ou danificar a propriedade
privada sem caráter militar ou de ferir aos não combatentes”; d) é proibido
o bombardeio para obrigar o pagamento de contribuições em dinheiro,
etc.; e) o bombardeio só é lícito quando-for dirigido a um objetivo militar;
f j deve-se resguardar dos bombardeios os edifícios destinados aos cultos,
às artes, monumentos históricos;3 g) não devem ser atacados os ocupantes
de umà- aeronave destruída que caem de pára-quedas; etc.
E de se salientar que na guerra aérea não é exigido o aviso prévio do
bombardeio, como ocorre nos casos de bombardeio na guerra marítima.
Na verdade, durante a 2a Guerra Mundial as denominadas regras de
Haia não foram observadas, houve assim bombardeios para aterrorizar a
população civil, bombardeies em cidades não definidas e bombardeios
para obrigar a capitulação. Diz Charles Rousseau com grande razão que
“a regressão não podia ser mais complexa”. Tem-se observado "(Kalshoven)
que a indústria de guerra’ pode ser bombardeada e se tem considerado
algumas vezes que os operários empregados nestas indústrias são “quase
combatentes”. As cidades não defendidas são declaradas cidades abertas
e não podem ser bombardeadas. Contudo, elas não fo ra m respeitadas na
Guerra da Etiópia, na Guerra Civil Espanhola, na Guerra Sino-Japonesa,
na Guerra Mundial e no Vietnã (1965-1972).
O Protocolo 1 de 1977 às convenções de direito humanitário de 1949
proíbe o bombardeio de diques, obras de irrigação, usinas nucleares, etc.,
porque isto pode causar danos à população civil.

1540
630. No locante aos prisioneiros na guerra aérea, dá-se a eles o mesmo
tratamento dos prisioneiros na guerra marítima e terrestre. Aplica-se <fssini
a Convenção de Genebra de 1949 relativa ao tratamento dos prisioneiros
de guerra.
Quanto aos feridos e enfermos, apíicam-se igualmente as normas da
guerra terrestre e marítima. A Convenção de Genebra de 1949 para a
melhoria da sorte dos feridos e enfermos dos exércitos em campanha
determina normas para a guerra aérea: a) “as aeronaves exclusivamente
utilizadas para a evacuação de félidos e enfermos, assim c o m o para o
transpone do pessoal e do material sanitário, não serão objeto de ataque,
devendo ser respeitadas pelos beligerantes durante os vôos que efetuarem
em altitudes, horarios e rota especificamente ajustados entre todos os
beligerantes”; b) “salvo acordo em contrario, será proibido o sobrevpo de
territorio inimigo ou-ocüpado pelo inimigo. As aeronaves sanitarias deve­
rão obedecer a qualquer intimação para aterrar” ; c) as aeronaves sanitarias
poderão sobrevoar território dos Estados neutros obedecendo às restrições
impostas por estes Estados; d) os feridos ou en ferm os que forem desem­
barcados em Estado neutro ficarão ai retidos; etc. Os mesmos dispositivos
se encontram na Convenção de Genebra de 1949 para a melhoria da sorte
dos feridos, enfermos e náufragos das Forças Armadas no mar.
O citado Protocolo I traça uma serie de normas relativas à aeronave
médica, salientando que ela deve ser respeitada e protegida. A aviação
sanitária foi introduzida na Convenção de Genebra de 1929. Os aviões
pintados de branco e reservados de modo permanente e exclusivo ao
transporte de feridos e doentes militares.
Para esta proteção não é necessário nenhum acordo especial quando
tal aeronave se encontra em área controlada por tropas aliadas ou sobre
área do mar não controlada pelo inimigo. Se a aeronave se encontra em
área de contato entre as tropas inimigas a sua proteção depende de um
acordo prévio entre as autoridades militares. A proteção sobre área con­
trolada por inimigo depende de autorização do inimigo. As aeronaves
médicas não podem ser utilizadas, para a obtenção de informações mili­
tares. As aeronaves médicas sobrevoando área de contato das tropas ou
território dominado por inimigo podem receber ordens de aterrar para
inspeção. A aeronave médica não pode sobrevoar território de Estado
neutro a não ser que haja autorização prévia. Desde a 2S Guerra Mundial
este tipo de aviação tem sido um fracasso.
Quanto à situação dos espiões na guerra-aérea, aplicam-se por analogia
as leis e usos da guerra terrestre. Esta é a orientação das regras de Haia,
que estabelecem ainda: “não poderá ser considerado espião o indivíduo
que se encontrar a bordo de uma aeronave beligerante ou neutra a não
ser quando, trabalhando clandestinamente ou sob falsos pretextos, recolhe
ou procura recolher durante o vôo informações em jurisdição beligerante

1541
ou na zona de operações militares de um beligerante, com intenção de
comunicá-las à parte contraria”.
A proteção que é dada aos ocupantes de unía aeronave é limitada aos
que a abandonam devido a uma “avaria" da própria aeronave. Os pára-
quedistas podem ser atacados, enquanto descem, porque eles não se en­
contram fora de combate. O Protocolo 1 é expresso no sentido de que
uma pessoa que está descendo de para-quedas, porque a sua aeronave está
perdida, não pode ser atacada. E ao chegar em térra deve ter a oportuni-
P A i * , j y y i d er antes de ser atacada. Entretanto, é estabelecido que as
Pnvadas, “Se a c h a ' ^ - ^ ^ ^ “/^ g ^ ro te g id a s por este dispositivo.
í ’roíbe-se a rfL”1 SUje,taSao confié” ^ ram«ítín&iÇ-aí tiveram origem

- - *

a visita.'
NOTAS

I. Spaight — Air Power and war righis. 1947; Rafael Día/ Llanos — Guerra
Aérea, 1942; Isidoro Rniz Moreno — Guerra Terrestre y Aérea. l ‘.)2G. págs. 5-15 e
segs.; Joseph Kroell — Traiié de Droil Iniernational Public Aérien. ] í)Hf>. i. II;
Marcel Le G off — Manuel de Droit Aérien. 1954, págs. 453 e segs.; Ming-Miu
Peng — Le Siauit Juridique de l’A éronef Militaire. págs. 8 ] <■ segs.; Marcel Le
G off — Traité Théorique ei Praijque de Droil Aérien. 1934. págs. -166 e segs.;
supplémenu 1939, págs. 119 e'segs.; Am onio Llop Lamarca —•La Aviación en la
guerra, in La Guerra Moderna, vol. IV, 1957. págs. 29 e segs.; Roberto Sandiford
— Évolution du droit de la guerre inarilim e ei aérienne, in RdC, 1939, vol. II, t.
68, págs. 561 e segs.; Hamilton De Saussure — Receñí Developmems in T h e Law
of Air W arfare, in Annals o f Air and Space Law, vol. I, 1 9 7 6 , págs. 33 e segs.; E.
Evrard — Le Nouveau Staiut Protecteurdes Transports Sanitaires par voie aérienne
7 . Ê e v i d e n t " " ' ”'é--.¿íi_RGDIP, i . 8 2 , vol., 1, págs. 2 1 1 e segs.

9 ue p r e t e n d e 3 'l s,ta s° p o rW ; .. V ou , mais precisamente, .


a te r í. ^ e* ^ c e r o d i " ™ ™ * ™ ser feita effl
de «««a ími >e rra ou no0 m ar
m ar.
P ,eJegraf0 c a r i „ aeronave
' P an) qu e a ,outra

1543
c a p ít u l o lx v
DELAÇÕES ENTRF r»c «
b e lig e ra n te s 1
, Pasaporte, e liJ n ç á - « V ' ' Parlan‘enlános- ¿34 ' - -
podem ser 635 _ SaH,am a r d a . ’¿ 34 ^ ^ o - c o n d u t a ,
nais concluidos entre sujeitos beligerantes-no — Ganéis; _
ao fim das operações de guerra” (Monaco).
Estas convenções se distinguem dos tratados internacionais comuns
em vários pontos: não são concluídas geralmente pelos órgãos normais do
Estado para as relações internacionais, mas pelo comandante-chefe das
forças militares.- A competência do comandante-chefe deriva de uma nor­
ma internacional como uma regra geral mas que tem exceções, sendo em
alguns casos (ex.: quando na convenção se “modifica substancialmente a
situação recíproca dos beligerantes", isto é, com caráter político) necessá­
rio o “consentimento do chefe de Estado”. As convenções entre belige­
rantes, via de regra, devido à necessidade de elas entrarem rapidamente
em vigor, não são submetidas ao Poder Legislativo do Estado para apro­
vação, constituindo assim acordos do Executivo. As convenções militares
podem ter forma escrita ou oral.
Elas se distinguem dos tratados quanto à sua execução, não havendo
assim necessidade, por exemplo, de uma promulgação das normas inter­
nacionais no âmbito interno. Elas geram obrigações diretamente para o

1545
Estado e são e x e c u ta d a s pelos ó rg ãos m ilitares. l\las en tram c m vigor
im e d ia ta m en te ap ó s a sua c o n d i)sã o .
As relações entre os beligerantes são também denominadas de “co­
mercia belli".
Estudaremos no presente capímlo não apenas as convenções, mas
também outros tipos de rtlações entre os beligerantes.1
633. O parlamentario é definido na Convenção de Haia (1907) relativa
às leis e usos da guerra terrestre como sendo “o indivíduo autorizado por
um dos beligerantes a entrar em conversações com o outro e apresentan-
do-se com a bandeira branca”.
A citada Convenção de Haia estabelece ainda outras normas sobre os
parlamentarios: a) “têm o direito à inviolabilidade, assim como o corneta,
clarim ou tambor, o porta-bandeira e o intérprete que o acompanharem";4
b) “o chefe ao qual um parlamentario for enviado não é obrigado a
recebê-lo em todas as circunstâncias” f c) o chefe “pode tomar todas as
medidas necessárias a fim de impedir o parlamentario de se aproveitar de
sua missão para se informar” e “tem o direito, em caso de abuso, de reter
temporariamente o parlamentario”; d) “o parlamentario perde seus direi­
tos de inviolabilidade, se ficar provado de maneira positiva e irrecusável
que se aproveitou de sua situação privilegiada para provocar ou cometer
um ato de traição”.
634. Salvo-condutos6 são as “permissões especiais, escritas, aos nacio­
nais inimigos, para que estes possam atravessar, sob determinadas condi­
ções, certas regiões”. São também dados “a cidadãos neutros, para circu­
larem livremente na zona de operações de guerra dentro de certos limites”
(Accioly).
Geralmente a concessão de salvo-conduto é recíproca.
Ele se caracteriza por ser: a) intransferível; b) revogável; c) tem prazo
de validade; d) só é válido “no território ocupado pelo exército que o
concedeu”.
O salvo-conduto não depende de acordo prévio.
Sobre o salvo-conduto, é de se mencionar o art. P da convenção
relativa ao regime dos navios mercantes inimigos no começo das hostili-,
dades (Haia, 1907): “Quando um navio mercante pertencente a uma das
Potências beligerantes se encontrar, no começo das hostilidades, num
porto inimigo, é desejável que lhe seja permitida saída livre, imediatamente
ou após um prazo de favor suficiente, e ganhar diretamente, depois de ter
sido munido de um salvo-conduto, o seu porto de destino ou outro que
Lhe for designado. O mesmo se dará com um navio que houver saído do
seu último porto de partida antes do início da guerra e entrar num porto
inimigo sem saber das hostilidades.”
Passaporte aqui é “o documento permitindo um súdito inimigo viajar
(...) sem restrição em locais sob o controle do beligerante e incidentemente
gozar de proteção especial...”. Ele se distingue do salvo-conduto porque
este leí» “finalidade mais esliita” (Cheney fiyde).
Os salvo-condutos, passaportes, salvaguardas e licenças são concedidos
por acordos bilaterais entre os beligerantes ou por um convite dirigido
por um dos beligerantes a determinado individuo.
635. A salvaguarda “é a proteção que um chefe militar concede a
certos edifícios ou estabelecimentos para que fiquem ao abrigo tios aci­
dentes de guerra” (Acciolv).
Ela pode ser de dois tipos', mona e viva. A primeira ocorre quando é
dado somente um “documento escrito que consigna as imunidades con­
cedidas”. A segunda é quando se dá uma proteção ao estabelecimento ou
edifício-por meio de um efetivo militar.
636. Sao denominados de cartéis os acordos entre os beligerantes para
a troca de prisioneiros.' Tem sido assinalado que os cartéis podem ter
outra finalidade, por exemplo, comunicações telegráficas.
637. Suspensão de armas é “o acordo em virtude do qual o emprego
dos meios de combate fica interrompido durante breve período, para se
atender a exigencias que não interessam à direção geral da guerra” (Mo­
naco).
A suspensão de armas tem efeito limitado, vez que ela só produz efeitos
entre os corpos dos exércitos em que foi concluída.
A suspensão de armas é ajustada muitas vezes tendo por objetivo “o
enterro de mortos, a remoção de feridos”; etc. (Accioly).
Quando uma suspensão de armas entra em vigor, as tropas em combate
não pódem modificar as suas posições.
As suspensões de armas podem ser negociadas não somente pelos
comandantes-chefes, mas também pelos comandantes de unidade. O acor­
do permanece válido mesmo se quem o concluiu não tinha competência
para isto (Monaco),
Elas se distinguem do armistício local no seguinte: a supensão de armas
“tem ffhs locais, temporários e estritamente militares”, enquanto o armis­
tício local “ tem um a im portân cia política no quadro da guerra considerada
no seu conjunto, e ele somente pode ser estipulado quando uma parle
considerável das forças armadas suspende as hostilidades”; ele, por outro
lád.o, não é sempre tempoFário. A suspensão de armas não tem maior
importância, ao contrário do armistício local. A suspensão -de armas é
concluída sob a forma escrita, verbal ou, ainda, tácitamente, quando o
armistício o é geralmente por escrito.8
S. Bailey estabelece que no Conselho de Segurança existe trégua quan­
do há a intervenção de um intermediário (geralmente um órgão subsidiário
do Conselho de Segurança). O armistício haveria quando ele resulta de
uma negociação entre as partes. O “cessar-fogo” ou “cessar hostilidades”
é quando há um apelo de emergência do CS que é geralmente acompa­

1547
n h a d o d e p ed id o d irig id o a um ó rg ã o subsid iário p ara o rg an izar um a co rd o
m ais d urável. *
638. O arm istício é a m ais im p ó rta m e das c o n v e n ç õ e s assinadas p elos
b e lig e ra n te s. T e m sid o o b se rv a d o q u e ele n ão evolu iu d esd e 1907.
O armistício ,re o acordo que tem por efeito a suspensão total ou
parcial cias hostilidades por um tempo determinado ou indeterminado,
sobre todo o teatro da guerra ou sobre uma parte deste último" (Lei
italiana de guerra — R. Monaco). O acordo é sempre concluído entre as
duas partes beligerantes mesmo que ele seja assistido por um terceiro. E
interessante observar que o Conselho de Segurança jamais impôs um
armistício aos beligerantes.
Existem duas espécies de armistícios: o geral e o local.
O geral suspende as hostilidades em toda a guerra. O local suspende
as hostilidades apenas em determinada zona do teatro de guerra.
Tem-se salientado que o armistício pode ser: de direito e de fato. O
primeiro é o comum. O de fato ocorreria quando os beligerantes sem
qualquer acordo suspendem de fato as hostilidades, sendo que isto é raro.
O armistício pode surgir de uma iniciativa dos beligerantes ou de
terceiro (Estado neutro, organismo internacional).
Os armistícios são celebrados por negociadores (chefe de exército ou
agentes diplomáticos) munidos de plenos poderes e necessitam de ratifi­
cação, a não ser que esta seja dispensada nos plenos poderes concedidos
(Accioly). Atualmente não são ratificados e são imediatamente executáveis.
As convenções de armistício devem tratar da situação das forças arma­
das e se cria para exercer o controle a “comissão executiva do armistício”.
Algumas vezes o vencedor impõe: o desarmamento, entrega de instalações
industriais. Estas cláusulas foram inseridas nos armistícios “que suspende­
ram as hostilidades no fim da 2a Guerra Mundial”.9 Assinala Monaco que
os armistícios mais recentes contêm cláusulas econômicas. O armistício só
pode ser violado pelos sujeitos do DI que o concluíram. Assim atos de
particulares sem ordens não acarretam a violação do armistício, devendo
entretanto o Estado a que pertencem reprimir os seus atos. Aplicam-se
assim os mesmos princípios da responsabilidade do Estado em tempo de
paz.
Os armistícios palestinos, coreano e indochineses apresentaram em
comum: a) cessação das hostilidades; b) os adversários se comprometem
a não recorrer à força armada; c) o restabelecimento da paz não é imediato,
mas eles contêm medidas complementares para assegurar a estabilidade
do armistício até atingir a paz (A. Gervais). Pode-se acrescentar que na
ONU geralmente são criadas comissões para supervisionar o armistício.
Alguns autores (H. S. Levie) têm considerado que os armistícios atualmente
são assimilados às preliminares de paz ou até a tratados de paz definitivos.
Imannuel Geiss observa que todos os conflitos armados internacionais
desde ! 945 têm terminado com armistício, com exceção do tratado de paz
entre Egito e Israel em 1979.
A Convenção de Haia (1907) relativa às leis e usos da guerra terrestre
estabeleceu varias normas para o armistício: a) se o armistício não tiver
duração determinada, “as Partes beligerantes podem retomar, a qualquer
momento, as operações, mas com a condição de que o inimigo seja avisado
no tempo convindo, de conformidade com as condições do armisticio”:
b) “o armisticio pode ser geral ou local”; c) “o armisticio deve ser notificado
oficialmente e em lempo útil às autoridades competentes e às tropas. As
hostilidades são imediatamente suspensas após a notificação ou no prazo
fix-ádo"; d) as partes fixarão as suas relações no teatro de guerra; e) a
violação grave por uma das partes dá à outra o direito de denunciar o
armisticio e reiniciar as hostilidades; f) “a violação das cláusulas do armis­
ticio, por particulares que procedam por iniciativa própria, dá direito
somente a reclamar a punição dos culpados e, se for o caso, uma indeni­
zação pelas perdas sofridas”.
Algumas questões têm sido levantadas em relação ao armistício. Assim
pergunta-se no silêncio do armistício se uma praça sitiada pode ser abas­
tecida. A melhor opinião parece ser que o abastecimento deve ser feito
para atender o seu consumo normal. Se este procedimento não for ado­
tado, a praça durante o armistício acaba por esgotar os seus recursos. A
respeito do repatriamento dos prisioneiros tem-se observado que quando
ele for um ato preliminar da paz (o que é comum) devem os beligerantes
acordar sobre o repatriamento dos prisioneiros.
O armistício não acarreta: a) suspensão de bloqueio; b) supressão do
direito de visita; c) o direito de captura permanece para os navios com
contrabando de guerra ou que façam assistência hostil (Instituto de Dl);
d) permanecem os direitos e deveres da neutralidade, vez que o estado de
guerra não terminou.
O fim do armistício ocorre nestes casos: a) expiração do prazo; b)
denúncia quando não há prazo ou há violação; c) celebração da paz.
639. A capitulação é das convenções entre beligerantes que tem grande
importância no desenvolver da guerra. A capitulação e o armisticio às vezes
se confundem, como .ocorre nos casos de armistício-capitulação. Entretan­
to, podemos dizer que a característica essencial da capitulação é a rendição
de tropas que inexiste no armistício. A capitulação versa sobre a rendição
de tropas, que podé, em conseqüência, versar apenas sobre determinada
região do teatro de guerra.
Ela contém geralmente normas: a) sobre o momento em que as hos­
tilidades cessarão; b) sobre a sorte das tropas que capitulam; c) a segurança
das tropas de ocupação; d) “o tratamento da propriedade privada dos
prisioneiros”; etc. H. Accioly define as capitulações como sendo as “con­
venções militares para a rendição com ou sem condições, de uma cidade,
uma fortaleza, um corpo de tropas ou forças navais” .

1549
A capitulação pode set concluida pelos comándenles de tropa, sob a
forma escrita 011 verbal, sendo aquela a mais usada. Depois de assinada a
capitulação, não pode o cjue capitula destruir o material bélico.10 ^
A capitulação pode ser incondicional, isio é, aquela em que o belige­
rante que capitula deverá se subordinar às condições impostas pelo beli­
gerante a que ele capitula (Sereni). Ela pode ser condicional, isto é? erque
se rende estabelece certas condições.
A única norma internacional sobre capitulações está fixada na Con­
venção de Haia (1907) relativa às leis e usos da guerra terrestre, que
estabelece: “as capitulações ajustadas entre as Partes contratantes devem
ter em consideração as regras de honra militar. Urna vez fixadas, devem
ser escrupulosamente observadas por ambas as partes”.

1550
NOTAS

1. R icardo M onaco — L es C onventions en tre B ellig én m ts. in RdC. 1949, vol


II, l. 7 5 , págs. 277 e segs.; idem — L ’Armistizio nt'l sistem a degli actord i in tein a-
zio n ali, 1943; Paul R o b e rl — D es E ffets de l'A rm istice G én éra l. l'J0 6 ; Isidoro Ruiz
M o re n o — G uerra T e rre stre y A érea, 1926, págs. 175 e segs., A. Gervais — Les
arm istices palestiniens, c o re e n et in d och inois et leu rs en seignem ents, in AI DI,
1 9 5 6 , págs. 97 e segs.; Sydney D. Bailey — Cease-fires. T ru ce s and Arm istices in
T h e P ractice o f the UN Secu rity C o u n cil, in AJ1L, Ju ly 1 977, vol. 71, n " 3, págs.
461 e segs.; R. R. B ax ter — A rm istices and O th er Form s o f Suspensión of I losiilities,
in R dC , 1976, vol. I, t. 149, págs. 3 5 3 e segs.
2 . O s com an d an tes in ferio res tam bém podem c o n c lu ir estas convenções desde
q u e p reen ch am certas co n d içõ e s: a) “sejam comandante'?; de unidades” , tend o,
p o rta n to , autonom ía; b) sejam n o m ead o s pelo co m an d an te-ch efe.
3. S o b re este ilem , v. M o n aco .
4. Na guerra m arítim a o navio q u e conduz o p arlam en tario também é invio­
lável.
5 . Se um c h e fe m ilitar d eclara q u e por ce rto lap so d e tem po não receb erá
p a rla m en ta rio e lh e é enviad o um , a doutrina (F a u ch ille) tem consid erad o qu e
este n ã o goza de inviolabilidad e.
6. S o b re passaportes, salvo-cond m o, salvaguarda, c a rié is e parlam entarios, v.
O p p e n h eim -L a u terp ach l, C h en ey Hyde e Fauchille.
7. D enom ina-se navio d e c a rte l o qu e é em p reg ad o n a troca de prisioneiros
e o q u e transporta p arlam en tário . O navio e seu pessoal são invioláveis (A ccioly).
8. V. M o n aco e A ccioly.
9. N o arm isticio estip u lad o e n tre a F rança e A lem an h a, em 1940, a prim eira
“ se incu m b iria de p ro ib ir seus cid ad ãos de lutarem c o n tra a A lem anha nas forças
m ilitares d e ou tros países” . Estas pessoas receb eriam o tratam en to de franco-ati­
rad ores. A A lem an ha visava D e G au lle (William L. S h ire r — A Q ueda da Fran ça,
vol. III, 1969, pág. 2 3 5 ).
10. A lguns países su b m etem os seus co m an d an tes q u e capitulam a um “co n ­
s e lh o d e investigação” .

1551
r,
CAPÍTULO LX-yi

A G U ER R A N U C LEA R . A G U ER R A Q U ÍM IC A 1

640 — As armas n veteares; 641 — As armas químicas e bacteriológicas.

640. A utilização da bomba atómica na guerra foi feita pela primeira


vez contra a cidade de Hiroxima,- pelos EUA, em 6 de agosto de 1945, e,
posteriormente, contra a cidade de Nagasáqui em 9 de agosto de 1945.
A utilização de armas nucleares Lem constituido urna grande ameaça
à humanidade, daí a preocupação atual com o desarmamento e vários
planos se têm sucedido neste sentido. Sendo de se salientar que as bombas
nucleares mais modernas são muitas vezes mais poderosas do que as lan­
çadas sobre o Japão.
Não existe nenhum tratado que proíba a utilização de armas nucleares
na guerra, entretanto, como veremos, o seu emprego viola inúmeras leis
da guerra.
Assim podemos mencionar que na-guerra os beligerantes não têm
completa discrição nas armas de destruição a serem empregadas, bastando
lembrar que as leis e usos da guerra proíbem o emprego de armas que
causem danos- desnecessários, ou mesmo ferimentos cruéis. Deste modo,
são proibidas, por exemplo, as balas explosivas. Deve-se observar que há
uma grande tendência para a humanT-zação da guerra.
Por outro lado, é de se salientar que as armas nucleares não atingem
apenas o seu alvo, mas também-pessoas fora dele em viriude^da radiação"
nuclear que atinge a terceiros provocando grandes danos à saúde humana.
A radiação nuclear “consiste em raios gama. nêutrons, partículas beta e
uma pequena proporção de partículas alfa", sendo que os nêutions e os
raios gama “são diretamente'.nocivos aos seres humanos" (Nagendra
Singh).
As armas nucleares quanto aos seus efeitos de destruição não se limitam
aos objetivos militares como determinam as leis da guerra. Não permitindo

1553
assim, como determinam estas mesmas leis, que sejam poupados os hos­
pitais, museus etc.
A outra grande violação da lei da guerra é que, como já vimos, o uso
de amias nucleares não distingue entre beligerantes e não beligerantes,
violando assim a Convenção de 1949 para a proteção de civis.
Poderíamos analisar se é legal o emprego de armas nucleares como
represália. Parece-nos que isto não deve ser admitido, vez que o seu em­
prego violaria as Convenções de Genebra de 1949 que procuram humanizar
as leis da guerra. Tem-se condenado as represálias no Dl porque elas,
apesar de visarem o Estado ofensor, acabam sempre por atingir a terceiros
inocentes. Neste caso, esta crítica às represálias é da mais clara procedência.
Finalmente, é de se observar que o emprego de armas nucleares pode
atingir os direitos dos neutros, vez que os efeitos da destruição, bem como
da radiação, não são perfeitamente delimitados, dependendo, por exem­
plo, a radiação, na área que vai produzir efeitos, dos ventos. Acresce ainda
que a opinião pública mundial não dá legitimidade ao liso da arma nuclear.
E de se observar que os manuais militares (EUA) não proíbem o uso
de armas nucleares e assinalam que não existe norma internacional proi­
bindo a sua utilização.
Em 1996, pelo voto de seu Presidente, a CIJ em um parecer afirma
não poder concluir se a arma nuclear é legal ou ilegal em legítima defesa
em situação extrema. Tem se argumentado que a decisão da CIJ não foi
clara, porque ela não quis legislar, porque haveria uma lacuna na DL
641. E preciso lembrar que as leis da guerra condenam as “armas
bárbaras”, que provocam sofrimentos inúteis. Entre tais armas proíbem-se
inúmeras armas químicas e bacteriológicas.
Dentro desta orientação o Tratado de Washington de 1922 proibiu a
utilização de “agentes asfixiantes, tóxicos ou similares”. Na verdade a
interdição do uso destes gases remonta à Conferência de Haia de 1899,
que em uma declaração proibiu o seu emprego. Entretanto, na l 3 Guerra
Mundial eles haviam sido utilizados pela AJemanha. A Convenção de Haia
sobre leis e usos na guerra terrestre (1907) proíbe o emprego de veneno
e armas envenenadas, etc. Em 1919 o Tratado de Versalhes também reco­
nhecera a proibição do seu uso. Em 1925 o Protocolo de Genebra proibiu
os “meios químicos ou bacteriológicos”.3 Esta proibição foi reafirmada em
uma resolução de 1932 da Conferência Geral de Desarmamento e em
resoluções do Conselho e Assembléia da SDN. Em 1982 uma resolução da
ONU mantém ainda em vigor o Protocolo de Genebra de 1925 e se
encontra, em 1993, bastante adiantada a elaboração de um tratado sobre
a matéria.
Em 1972 foi concluída uma convenção na ONU que proíbe o aper­
feiçoamento e fabricação de armas bacteriológicas (biológicas) ou tóxicas
e estabelece ainda sobre a sua destruição. Os Estados se comprometem a
não aperfeiçoar, fabricar, estocar ou adquirir agentes microbiológicos, ou
agentes biológicos, ou ainda tóxicos, a não ser que seja para fins pacíficos.
A mesma proibição se estende às armas e equipamentos necessários par.i
o emprego de tais agentes ou toxinas para fins hostis. F. dado o pra/.o de
nove meses parados Estados destruírem os estoques que possuem. Os Es­
tados não podem transferir para outros Estados os estoques que eles pos­
suem. Diante de uma violação o Estado pode apresentar queixa perante
o Conselho de-Segurança. Os Estados deverão trocar informações sobre
toxinas, agentes bacteriológicos para fins pacíficos. O Estado pode denun­
ciar a convenção com um prazo de pré-aviso de três meses em circunstâncias
excepcionais.
Na 2- Guerra Mundial esta proibição foi respeitada pelas partes em
luta (Rousseau).4 Entretanto, mais recentemente o “napalm” (gelatina de
gasolina inflamável) foi utilizado em guerras do Oriente, como na Coréia
e no Vietnã.
Na prática os Estados'consideram que podem se utilizar de gases não
tóxicos (ex: gás lacrimogêneo).
No Vietnã do Sul os EUA utilizaram agentes químicos desfolhantes,
apesar de proibidos pelo Protocolo de Genebra de 1921, vez que eles
causam danos à saúde da população civil e ao equilíbrio ecológico. Houve
autorização do governo do Vietnã do Sul para o seu uso. Entretanto, esta
autorização foi dada para regiões que de fato não eram controladas pelo
Vietnã do Sul. Alguns destes agentes foram proibidos depois devido aos
seus danos, bem como ao aumento do número de nascimentos de crianças
deformadas nas regiões em que foram utilizados (R. Pinto). Gabriel Kolko
(Anatomy of a War. Vietnã, the United States, and the Modern Histórica!
Experience, 1985), em um livro magistral, afirma que a Administração
Nixon suspendeu a guerra química não por razões humanitárias, mas
porque não havia herbicida suficiente para os usuários norte-americanos,
bem como Thieu considerou que o uso de herbicidas provocava um “im­
pacto político” negativo nos agricultores, e na opinião pública mundial.
A Consultoria do Departamento de Defesa dos EUA sustentou a tese
de que não é proibido usar desfolhantes ou destruir colheitas porque ela
não causa danos diretamente ao homem. A mesma posição é sustentada
nos EUA em relação aos “Chemical riot control agents” porque não causam
danos desnecessários aos combatentes, sendo o seu uso mais humano do
que outros meios. Em 1982 os EUA, no governo Reagan, retomaram a
fabricação de armas químicas.
Em janeiro de 1989 reuniu-se em Paris, na sede da UNESCO, uma
conferência com 149 países para proibir o uso de armas químicas, apro­
vando uma declaração neste sentido. Em 1988, a França já renunciara ao
seu estoque de armas químicas. As armas químicas contudo têm sido
utilizadas: a) a guerra do Irã contra o Iraque, este as usou (década de 80);
b) pelo Egito no Yemen (anos 6 0 ); c) pelos EUA no Vietnã; d) pelo Vietnã
no Camboja e Laos; e) pela URSS no Afeganistão; J) pela África do Sul

1555
comía a SWAPO em 1978: g) por Cuija contra a L'nita. em Angola, i-ni
1985: h) pela Libia 110 Clrade. eni 1987; i) pelo Iia fju e coima os curdos,
em 88 e 89; etc. (Pierre Lellouche). Armas químicas e biológicas foram
usadas na Guerra do Golfo.
Um grande problema que podemos mencionar é o de saber se a
obrigação da não utilização da guerra química e bacteriológica só existe
para os Estados signatarios dos mencionados “acordos" internacionais.
Parece-nos que não, vez que a condenação destas armas é feita pela “opi­
nião universal do mundo civilizado" e contraria as leis de humanização
da guerra.
Na verdade, o DI tern condenado sempre a guerra ABC (atómica,
bacteriológica e química — “chemical”) . ’
Pode-se repetir, com Falk, que o uso de armas químicas pode ser
considerado um ecocídio. . _ .
Kalshoven observa que a arma de nêutrons pode ser considerada como
guerra química e provoca males supérfluos e deve ser proibida. No mesmo
sentido Lutfalla afirma que quanto maior for a distancia de onde cair a
arma de nêutrons mais lenta será a colocação das pessoas fora de combate
e, em conseqüência, eía pode ser considerada urna arma que causa males
supérfluos.
Finalmente, é de se recordar que em 1977 foi aprovada na Assembléia
Geral da ONU convenção proibindo o uso militar de técnicas de modifi­
cações do meio ambiente.
O Iraque utilizou armas químicas na guerra contra o Irã, em 1984,
1986 e 1987, bem como contra vilarejos curdos em 1988 (Chapour Hig-
highat — Historie de la Crise du G olfe,'I992).
Finalmente, é de se salientar que a idéia de proibir a produção e a
estocagem de armas químicas surgiu em 1968, no Comité dos 18 Estados
para o Desarmamento, apresentada pela Suécia. Em 1990 foi concluido
acordo entre EUA e URSS sobre a destruição dos arsenais químicos. A
convenção sobre a interdição do aperfeiçoamento da fabricação da esto-
cagemas e do emprego das armas químicas e sobre sua destruição é de
1993. São consideradas armas químicas: a) produtos químicos tóxicos. E
considerado tóxico àquele que provoca no homem e nos animais morte
ou danos permanentes, ou incapacidade temporária; b) as munições que
provocam a morte por ação tóxica; c) todo material a ser usado especifi­
camente para o emprego das munições. E uma convenção sobre desarma­
mento, estabelecendo a destruição das armas químicas mas também as
instalações para a sua fabricação. É proibida a produção, bem como a
aquisição de armas químicas.
As armas químicas produzidas entre 1925 e 1946 não apresentam mais
perigo, mas os Estados têm de apresentar relatório ao Secretariado Técnico
da Organização para a Proscrição das Armas Químicas. As produzidas após

1556
1 9 4 6 a in d a iip r f s e n t a .n i p e r ig o . O E s t a d o , n c -s u - r a s o , f a r á u n i r e l a t ó r io a o
S e c r e t a r ia d o .
Os herbicidas não estão proibidos pela convenção, mas os Estarlos
reconhecem que eles não devem ser usados corno meio de guerra, tendo
em \lstã o que estabelece a convenção sobre a interdição da utilização das
técnicas de modificação do meio ambiente para fins militares on fins hostis.
Os herbicidas são proibidos se causarem danos duráveis ou graves ao meio
ambiente.
Os agentes anti-revolta são aqueles que causam uma irritação sensorial
ou incapacidade física temporária que desaparece rapidamente. Eles são
proibidos como meios^de guerra e permitidos para manter a ordem pública.
A citada organização tem sede em Haia e conta com a seguinte estru­
tura: á) Conferência das Partes Contratantes; b) Conselho Executivo; c)
Secretariado. Prevê a criação de um Conselho Científico Consultivo e a
nomeação de um Diretor-geral para o Secretariado. O Conselho tem 41
membros eleitos pela Assembléia, que levará em consideração a repartição
geográfica, importância da indústria química e os interesses políticos e de
segurança. A Conferência pode criar órgãos subsidiários, como o Conselho
Científico. Ela não é uma organização especializada das NU, mas está
prevista a conclusão de um tratado entre ela e a ONU.
As sanções são: a) restrição ou suspensão dos direitos e privilégios; b)
medidas coletivas; c) medidas aprovadas pela AG e CS.
Os Estados têm que implementar a convenção no direito interno,
porque ela visa pessoas físicas e jurídicas. E necessário se estabelecer sanção
de natureza formal.
Os parágrafos acima são fundamentados em Natalino Ronzkti.

1557
NOTAS

1. N agendra Sin g h — N u clear W eapons and Im ern aiio n al Law, 1959, G eorg
Schw arzen berger — T h e Legality o f N uclear W eap o n s, 1958; W. J . M. van Eysinga
— La G uerre C h im iq u e e t le m ouvement p o u r sa répression, m R dC, 1927, vol.
I, l. 16, págs. 32 9 <; segs.; M iguel M artin N aran jo — O rien tacio nes so b re P osibles
Consecuen cias del E m p le o de Armas A tóm icas en el Cam po T áctico , in L a G u erra
M oderna, vol. 11, 1 9 5 6 , págs. 25 3 e segs.; Ju a n E ch an d i Uriz — A puntes so b re
G uerra A tóm ica, in La G u erra M oderna, vol. III, 1 9 5 6 , págs. 139 e segs.; B e rtran d
Russel — C o m in on S e n se an d N uclear W arfare, 1 959; M ichael K repon — W eap o n s
Polentially ln h u m a n e : T h e Case o f Cluster B o m b s, in Foreign Affairs, A pril 1974,
vol. 5 2 , n s 3, págs. 5 9 5 e segs.; Jo h n N orton M o o re — Ratificatión o f T h e G eneva
P rotocol on gas and B acterial W arfare: A L egal and P olitical Analysis, in T h e
V ietnam W ar and In te rn a tio n a l Law, vol. 4 , 1 9 7 6 , ed itad o por R ich ard A. Falk,
págs. 176 e segs.; R ich ard A. Falk — E n viro n m en tal W arfare and E co cid e , in T h e
V ietnam W ar an d In te rn a tio n a l Law, vol. 4 , 1 976, ed itad o por R ich ard A. Falk,
págs. 287 e segs.; N atalin o R onzitti — La co n v en tio n sur l’in lerd ictio n d e la m ise
au point, de la fa b rica tio n , du stockage et d e l ’em p loi des arm es ch im iq u es e t sur
le u r d estruction , in R G D IP , t. 9 9, n “ 4, 1 9 9 5 m , págs. 881 e segs.
2. Calcula-se q u e m o rreram 2 82.000 pessoas. O s autores têm co n sid erad o q u e
foram lançadas b o m b as atôm icas n o ja p ã o a fim d e apressar a sua ren d içã o , ten d o
em vista a en trad a da U R S S na guerra d o P a cífico e a sua posição s e r m ais favorável
a um a invasão d o J a p ã o d o qu e a dos EUA . A U R S S d eclarou guerra ao Ja p ã o no
dia da explosão atôm ica em Nagasáqui, em 9-8-45. E n treta n to , em Potsdam (ju lh o ),
a U RSS j á havía ace rta d o e n trar em g u erra co n tra o Ja p ã o 90 dias d ep o is da
‘ren d ição da A lem an h a, o q u e os russos cu m p riram . O com prom isso d a U R S S
e n tra r na g u erra co n tra o Ja p ã o , segundo F o n ta in e , fo i assumido em Ialta. M olotov
pediu aos EU A u n p re te x to para declarar- g u erra ao Jap ão . Em co n seq ü ên cia ,
T ru m an em carta a S talin p ed e em n orn e d o arl. 103 da Carla da O N U , q u e n ão
estava ratificad a, q u e e le c o o p e re para a m a n u ten çã o da paz in tern a cio n a l. Para
T ru m an as b o m b as atô m icas foram lançad as p o r três razões: a) salvar vidas n o rte­
a m e rica n a s ; 6) e ra ju stificáv el d iante d a traição d e P earl H arb o r e os ja p o n e s e s
haviam violado as leis d e g u erra (ex.: m aus-tratos a prisioneiros de g u e rra ); c) a
in ten çã o e ra atin g ir ob jetivos m ilitares, q u e eram m uitos nas duas cid ad es. Para
C hurchill o uso d a b o m b a atôm ica teve duas van tagen s: a) perm itiu q u e o J a p ã o
se rendesse, salvando a h o n ra ; b) im pediu os soviéticos de en trarem em g uerra
com o Ja p ã o .
3. Os E stados fizeram reserva de q u e só n ã o se utilizariam desses m eios em
relação aqu eles q u e n ã o o s em pregassem . T em -se discutido se os h e rb icid a s en ­
trariam n a p ro ib içã o estab elecid a-n este p ro to co lo , vez qu e não eram co n h ecid o s
qu and o ele foi co n clu íd o .
4. E o caso d e se assinalar que na 2- G u erra M undial foi utilizad o o lança-
çham as, q u e é a rm a q u ím ica. O Iraq u e usou g uerra quím ica c o n tra os cu rdos
(“napalm ” , g ás).
5. M. K rep o n p ro p õ e , a respeito d e arm as p o ten cialm en te d esu m anas, qu e
os órgãos g o v ern am en tais dêem in fo rm açõ es a fim de qu e haja in flu ê n cia p o lítica
d esde o in íc io d e sua fab ricação , que se avalie a possibilidade de d an o s co laterais,
q u e se verifiqu e se elas são o u não o p era cio n a is, etc.

1558
CAPÍTULO LXVII

G U ER R A IN T E R N A 1

642 — Introdução; 642A — Considerações sobre a guerra interna;


643 — Legalidade; 644 — Tipos; 645 — Definição; 646 —■ A
assistência estrangeira e a caracterização do conflito como guerra civil;
647 — Situação dos revoltosas; 648 — O direilo de guerra; 649 —
Os terceiros Estados; 650 — A ONU, a OEA, a OUA e as guerras
civis; 650A — Fim da guerra civil; 651 — Conclusão.

642. A guerra civil sempre despertou o interesse dos intemacionalistas.


Assim, no século XVIII, Emeric Vattel traça normas para a sua regulamen­
tação. No final do século XIX, e nas primeiras décadas do século XX ,
surgiram inúmeros trabalhos sobre a matéria, sendo que na última década
ela volta a despertar o interesse dos intemacionalistas.
O grande renascimento no estudo desta matéria decorre, a nosso ver,
do grande número de Estados que alcançaram a independência após a 2-
Guerra Mundial. Ora, em grande número de vezes esta independência foi
alcançada após luta armada com a Metrópole. Por outro lado, tais Estados,
de um modo geral, integram o denominado 3S Mundo, isto é, são subde­
senvolvidos. Ora, os sociólogos já demonstraram que o subdesenvolvimen­
to, com o seu processo de modernização,, traz consigo uma instabilidade
das instituições políticas, tornando comuns desde os “pronunciamentos”
até as guerras civis.
As guerras civis têm sido também denominadas de guerras internas,
para melhor contrapô-las às guerras internacionais.
642A. As causas das guerras internas1' podem ser divididas em causas
internas e externas, isto é, as que são próprias do Estado e as que teriam
origem no plano internacional. Entretanto, é de se salientar que esta
distinção é meramente didática, porque os cientistas políticos têm, com
razão, observado que não é possível se distinguir a política interna da

1559
p o lít ic a in t e r n a c io n a l, la l o e n tr e la ç a m e n to e x is t e n te e n t r e a m b a s a tu a l­
m e n te .
No plano internacional, pode-se assinalar a existência de dois su per-
grandes, EUA e URSS, que têm interesses universais. Eles se encontram
comprometidos com grupos ou partidos políticos que agem 110 interior
dos Estados. EUA e URSS são os grandes exportadores das ideologias que
se digladiam nos países subdesenvolvidos.
O conflito interno é importante porque: a) ele se espalha; b) causa
grande sofrimento; c) desperta o interesse de organizações internacionais;
d) atinge a estabilidade regional; e) afeta os estados vizinhos cujos terri­
tórios são usados para fornecimento de armas aos insurgentes; f) os estados
vizinhos, muitas vezes estimulam as guerras internas e, atualmente, menos
de vinte estados são homogêneos étnicamente (Michael E. Blown).
No plano interno, é de se constatar que as guerras internas têm ocor­
rido em sua grande maioria nos países subdesenvolvidos. Huntington as­
sinala que os países adiantados e atrasados apresentam estabilidade política.
A instabilidade viria do processo de modernização. Segundo este cientista
político, as causas que conduzem a uma revolução são as seguintes: à) as
“instituições políticas são incapazes de proporcionar canais para a partici­
pação de novas forças sociais na política e de novas elites no governo” e
a vontade destas forças de participarem da política; b) os grupos mais
revolucionários nas cidades são: o “lumpenproletariado”,18 os operários e
os “intelectuais da classe média”; c) as revoluções são precedidas de um
aumento do índice de alfabetização. Outros, como Joh n Dunn, assinalam
que as revoluções ocorrem quando há caos, derrota militar e invasão, ou,
ainda, quando um grupo de revolucionarios “trabalha” “massas de ho­
mens” descontentes. Black fala que a modernização acarreta dois efeitos:
a) o aumento das unidades administrativas em nome do progresso tecno­
lógico; b) grandes investimentos são realizados e acabam por produzir uma
exploração “da maioria pela minoria privilegiada”. Virginio Santa Rosa
declara que as revoluções “surgem inesperadamente na vida social”. Toc-
queville escreve que as revoluções não ocorrem em países pobres, mas nos
países em que existem “esforços para uma reforma administrativa”. Outros
(Groth) falam que elas ocorrem quando não há laços de ligação entre as
elites e os revolucionários, quando existem estes laços há golpe de Estado,
mas não revolução. Mosca observava que há rebelião quando os governan­
tes estão distanciados dos governados. Gottschalk afirma que a revolução
só ocorre quando há uma fraqueza das forças conservadoras. Chorley
salienta que nos países com um exército bem treinado uma revolução só
é possível se for quebrado o controle do corpo de oficiais. Duff e McCamant
afirmam que as revoluções ocorrem após um período de desenvolvimento
que pára. Sotelo assinala que a instabilidade não é uma característica do
3a Mundo, mas que os países ricos também estão acumulando uma “carga
e x p lo s iv a " . O u tr o s ( W c lc h e T a i n t o r ) l'alam r a í «K -sa p o n u m u -in o c m n
s e n t im e n t o d e p riv a ç ã o , b e m c o m o u m a “ v a c ila ç ã o . iiiL o m p e ié iK ia e in ­
c o e r ê n c ia (la lid e r a n ç a p o lí t i c a " . B r in t o n estren e q u e as re v o lu ç õ e s e x iste m
q u a n d o h á d ific u ld a d e s f in a n c e ir a s g raves, b e m c o m o q u a n d o c e n o s g ru ­
p o s c o n s id e r a m q u e a s su a s a tiv id a d e s e c o n ô m i c a s sã o c e r c e a d a s p e lo
r e g i m e e x is te n te .
Para Gur a principal causa de lima revolução é o descontentamento
e a sua politização. Para Pare to a revolução é possível quando as elites não
estão constituídas por in divídu os decididos a usar a foiça. Observa que as
massas são dirigidas por uns poucos homens, mantendo a sua teoria das
elites.
Seguindo a A. Cohan podemos fazer uma exposição sistemática das
diferentes teorias da revolução. Este autor parte da existência de quatro
grupos.de teorias: a) marxista; b) funcionalistas; c) partidários da teoria
da escola da sociedade de massa: d) enfoques psicológicos.
a) Para Marx as revoluções são normais porque elas “resolvem as
contradições básicas em que assentam as organizações sociais”. A classe
explorada se aliena e acaba por ter uma consciência de classe, surgindo
então a revolução. Há uma revolução sociaJ quando há uma mudança no
modo de produção. Kelsen observa que para Marx e Engels no Manifesto
Comunista a palavra revolução não tinha sentido preciso: a) o manifesto
declara que a burguesia teve um papel revolucionário; b) declara também
que o proletariado é a única “classe verdadeiramente revolucionária”; c)
declara ainda que a Alemanha está às vésperas de uma revolução burguesa,
quando a burguesia era a classe dominante. Ao contrário do que previa
Marx, as revoluções não estão ocorrendo nos países industrializados, mas
naqueles com uma burguesia e operariado incipientes.10 Lênin considerava
que uma revolução era viável nos Estados em que o capitalismo esteja em
desenvolvimento. Sustentava que os operários devem participar de todas
as etapas de revolução e que não é necessário aguardar que o capitalismo
atinja o seu mais alto estágio. Para ele os fatores básicos são: a) decompo­
sição da máquina administrativa repressiva; b) desenvolvimento de órgãos
do poder operário para criar uma dualidade de poderes; c) crise de legi­
timidade das instituições estatais. Para Trotski a revolução não depende
do desenvolvimento das forças produtivas; mas das condições de luta de
classes; da situação internacional, capacidade de luta, etc. Para ele-a revo­
lução permanente é a sociedade estar em movimento até atingir a sua
transformação socialista-. Para Rosa Luxemburgo o fator decisivo era a
massa. Para ela a revolução para vencer precisa um alto grau de instrução
política e luta ampla com participação das massas, um determinado grau
de maturidade das condições políticas e econômicas, consciência de classe,
greve geral das massas e uma organização que deve se desenvolver na luta
revolucionária. Para Lênin a revolução é um problema de organização e

1561
pailido, já para Rosa Luxemburgo é uma questão do desenvolvimento
capitalista com suas contradições. que se manifesta n a -greve de massas.
Se a luta de classe significa apenas a conquista do poder por lima
minoria sein relação com as organizações revolucionárias, haveria o bían-
quismo.
Para Mao a revolução depende da massa, seja na sociedade industrial
ou pré-imlustrial, e usa o camponês. Para Marcuse a classe operária não
é detentora do potencia] revolucionario e a possibilidade de mudança
social se encontra “no substrato dos vagabundos e dos desamparados, dos
explorados e dos perseguidos de outras raças e outras cores, dos desem­
pregados e dos inaproveitáveis”. Fanón atribuí à classe camponesa o po­
tencial revolucionário. Debray defendeu que a guerrilha precede o desen­
volvimento do movimento revolucionário.
b) Para os funcionalistas não existem contradições na sociedade e as
revoluções são evitáveís. Chalmers Johnson sustenta como fator X do pro­
cesso revolucionario o fracasso da eiite em manter o apoio dos meios de
coerção (exército).
c) Para os partidarios da teoria da escola da sociedade de massa a
possibilidade de revolução surge quando são abolidas “as relações estru­
turais tradicionais”. Para Hanna Arendt foi “a atomização social e uma
extrema individualização que precedeu o movimento de massa”. Para
Kornhauser são os indivíduos e intelectuais desenraizados que apóiam o
movimento.
d) Para as teorías psicológicas as revoluções surgem quando a popu­
lação considera a sua situação insustentável, ou quando considera que
deveria receber mais do que recebeu. Para Sorokin ela surge quando a
população tem o sentimento de que está sendo reprimida. ParaTocqueville
ela ocorre quando a população considera que está recebendo m enos do
que esperava. Para Brinlon ela surge quando há a “convicção, por parte
dos principais grupos empresariais, de que. as suas oportunidades de pros­
perar... são indevidamente limitadas por arranjos políticos”. Para Tanter
e Midlarsky a possibilidade de revolução aumenta “quando é maior a
distancia entre a satisfação das necessidades que ocorrem e aquela que é
esperada pela população”. ParaTed Gurrhá revolução quando há privação
da população, porque isto acarreta um-comportamento agressivo.
A melhor concepção é a maf-xista, que explica as causas da revolução.
A funcionalista não explica a “ dessincronização” que ocorre na sociedade.
Por outro lado, foi o movimento de massa que precedeu a sociedade de
massa. E imposs/ve) se medir a" satisfação das necessidades- Hobsbawm
observa com razão que “a grande fraqueza dos revolucionários formados
em quaisquer das versões derivadas do marxismo” é considerarem que se
pode determinar previamente às condições em que as revoluções vão
ocorrer. Lembra este autor que as pessoas são levadas à revolução quando
não podem alcançar o que desejam da vida “sem uma mudança funda-

1562
mental na sociedade". Pode-se ati escrutar que admitir o “ voluntar'ismo
revolucionário ’ , isto é, a revolução ocorrer sem (jue haja condições obje­
tivas, é denominado de blanquisino. Esta posição é rejeitada dentro da
corren te marxista.
De qualquer modo, podemos repetir que de 1930 a H)6.r> houve, na
América Latina, 101 golpes militares de Estado com éxito, tendo sido
excluidos da pesquisa o Uruguai e o México (Floresta» Fernandes). Em
Honduras houve 115 mudanças no Executivo em 125 anos. Alguns outros
dados podem ser acrescentados. De 1945 a 1964 houve 54 quedas de
governo na América Latina. Nos trés anos seguintes à crise de 1929, isto
é, em 1930, 1931 e 1932, dezessete governos foram derrubados pela força
em 12 países latino-americanos. Entre 1930 e 2957 o cargo de presidente
na América Latina foi ocupado por 56 militares por pelo menos um ano
(Edwin Lieuwen). A Bolívia, em 155 anos de independencia, teve cerca
de 189 golpes de Estado. José Nun sustenta que “os golpes de Estado
ocorrem independentemente do nível de desenvolvimento econômico me­
dido por indicadores convencionais”, assim, entre 1920 e 1974, Argentina
e El Salvador tiveram seis golpes de Estado. Pode-se observar que Howard
Wiarda considera que em raras exceções a América Latina é “irrevolucio-
nária” e que “a esperada revolução social de proporções hemisféricas não
ocorreu e provavelmente não sobrevirá”.
De 1960 a 1975 houve mais de 200 golpes de Estado, sendo que destes
cerca de 40 ocorreram na Asia. Na Africa, em julho de 1963, havia dois
países governados por militares; em julho de 1968 havia 10; em julho de
1973 havia 18 e em julho de 1978 havia 22. No século XVII a noção de
golpe de Estado já surge com um sentido preciso. Ele é visto co m o urna
“ medida extraordinária”. A 1- edição do Dicionário da Academia Francesa
(1964) afirma: “golpe de Estado é o que é útil ao bem do Estado” (Denis
R ichet— Cours d’Etat, in Dictionnaíre Critique de la Révolution Française,
de François Furet e Mona Ozouf, 1988, págs. 41 e segs.).
Precisamos fazer agora a distinção entre revolução e golpe de Estado.
Esta distinção não existe no plano do direito, onde toda quebra da Cons­
tituição é considerada uma revolução (Kelsen). Entretanto, é uma distinção
bem estabelecida na ciência política. A palavra revolução no início era
utilizada apenas na astronomia. No século XVII é que penetrou na ciencia
política, sendo que inicialmente o seu conceito foi reacionário e significava
apenas uma substituição de governo: “uma simples volta da roda da for­
tuna”. De qualquer modo, a raiz do sentido político da revolução se
encontra na Italia, no século XIV, quando se usava a palavra “rivoluzione”
e “rivoltura” para designar distúrbios violentos. A palavra revolução tinha
um aspecto de acontecimento fatal. Revolução no sentido que hoje usamos
surgiu em 1688, na Inglaterra, com a “Glorious Révolution”, que foi a
primeira revolução assim denominada (Kurt Lenk). No século XVIII Mon-

1563
tesquieu escreve que o despotismo i ra o regime natural das revoluções
populares. E no século XVIII que surge a idéia de progresso revolucionário
(Paul Wilkinson). Neste século o fundamento da revolução está na idéia
do progresso11’ e no direito natura] que sustenta a existência de direitos
do indivíduo anteriores ao Estado. Os autores da Revolução Francesa não
pensavam na rebelião das massas, o que eles temiam. Entretanto, é a partir
da Revolução Francesa que se passa a admitir a revolução como uma
estratégia elaborada pelo homem e não como algo independente da von­
tade humana.
Para Humington revolução “é um j mudança rápida, fundamental e
violenta nos valores e mitos dominantes de uma sociedade, em suas insti­
tuições políticas, sua estrutura social, sua liderança e na atividade e normas
de governo". Para WeJch e Tain io r ela significa: a) mudança dos processos
de seleção dos líderes políticos e a criação de novas elites políticas por
meios não previstos na Constituição; b) “novos e mais amplos canais de
acesso a posições de poder político”; c) “expansão da participação política,
possivelmente temporária” ; d) criação de uma nova ordem política com
uma legitimidade diferente. Outros, como Groth, consideram que a vio­
lência não é necessária para uma revolução e que a criação de novos
regimes por “assembléias constituintes é geralmente revolucionário”. R.
Dahrendorf conceitua revolução como “uma mudança política e social
que transcorre sob violência e de um modo extremamente rápido e mostra
conseqüências profundas”. Caio Prado Júnior a caracteriza como “o pro­
cesso histórico assinalado por reformas e modificações econômicas, sociais
e políticas sucessivas que, concentradas em período histórico relativamente
curto, vão dar em transformações estruturais da sociedade, e em especial
das relações econômicas, e de equilíbrio recíproco das diferentes classes
e categorias sociais”. Hélio Ja^uaribe apresenta as seguintes noções de
revolução e de golpe de Estado: -“.revolução é um processo de m u d ar ou
tentar mudar o sistema político, expulsando as autoridades em exercício
ou modificando suas normas, em violação destas, pelo uso ou a ameaça
de emprego de capacidade de coerção resultante da mobilização de pessoas
suficientes, em uma sociedade, suficientes para impedir que as autoridades
em exercício imponham à sociedade ou partes relevantes dela, obediência
a suas decisões. Como o golpe de Estado é um processo de introduzir
mudança política pela violência e em violação do regime político. De modo
diferente do golpe de ¡Estado, porém, os elementos coercitivos usados nas
revoluções para violar as normas anteriores e para suprimir a capacidade
de vigência das autoridades, não .são o uso do p r ó p r io subsistema de
coerção anterior, mas'a mobilização de pessoas suficientes, na sociedade,
para neutralizar ou realmente derrotar aquele subsistema de coerção. O
aspecto-chave de uma. revolução, como processo, é a form ação de outro
subsistema de coerção, independente e oposto ao anterior, capaz de man­
tê-lo ou colocá-lo fora-de ação”.

1564
Octavio htiini cscrevc: “cni suma, a ruptura que propicia o progresso
pode ser de dois lipos. Ela é ‘revolucionária’, ou tolal, (¡uando altera os
fundamentos estruturais da sociedade. Sempre implica na ascensão de unía
nova classe ao poder, realizando e simbolizando o rompimento drástico
tíos vínculos externos e com a sociedade tradicional. A ruptura reformista’ ,
por outro lado, ocorre quando se alteram somente outros quadros insti­
tucionais, sem qualquer modificação estrutural básica. Implica na ascensão
de outras facções da classe dominante ao poder, verificando-se a recom­
posição das forças políticas e econômicas. O ‘golpe de Estado’, na grande
maioria dos casos, é uma reação contra as soluções revolucionárias ou
reformistas, em andamento ou projetadas. Por isso envolve a restauração
e o endurecimento de estruturas arcaicas. Isto é, o golpe de Estado sempre
inaugura um estilo de poder autoritário e implica na cristalização da
estrutura de apropriação”.
Florestan Fernandes escreve que os golpes-militares conduzem a uma
ditadura de classe com uma concentração de poder social elevada. Eles
proclamam ser uma “revolução” para daí tirar a sua legitimidade.
Tanter e Midlarsky fazem a seguinte distinção: a) revolução de massa
— alta participação popular, longa duração, muita violência, mudanças
fundamentais na estrutura da autoridade política e no sistema social; b)
golpe revolucionário — pequena participação popular, duração curta e
moderada, pouca ou moderada violência, mudanças fundamentais na es­
trutura política e possivelmente alguma mudança no sistema social; c)
golpe — reforma muito pequena, participação popular; duração curta a
moderada, pouca violência: moderada mudança na estrutura da autoridade
política; d) revolução de palácio — nenhuma participação popular, du­
ração muito curta, virtualmente nenhuma violência; virtualmente nenhu­
ma modificação.
E. Luttwak apresenta ainda as seguintes distinções: “ Pronunciamiento"
seria uma versão espanhola e sul-americana de golpe de Estado, mas que
estaria aparecendo na África. Na versão espanhola do século X IX ele
apresentava as seguintes fases: 1a) “ trabajos”, em que era sondada a opinião
dos militares; 2a) “ compromisos”, em que eram estabelecidos os compro­
missos e as recompensas; 3-) a ação.
Ele era liberal e procurava encarnar a vontade nacional. Posteriormen­
te, na Espanha, passou a ser reacionário, e procura estabelecer a vontade
real, que nem sempre é a da maioria, afirmando-se a existência de uma
“essência nacional”. Ele é organizado e conduzido por um líder em nome
de todos os oficiais, enquanto o “putsch” é conduzido por uma facção. O
golpe de Estado pode ser conduzido por civis usando unidades das forças
armadas. O “pronunciamiento” é as forças armadas como um todo. O
“putsch” surge em tempo de guerra e de pós-guerra, sendo levado a cabo.
por um corpo dentro das forças armadas. O golpe de Estado é dado por
um pequeno grupo de militares sem uma orientação política determinada.

1565
Este autor apresenta como pi é-condições de golpe de Estado as seguintes:
a ) as condições econômicas e sociais devem ser tais que a participação
política estejif confinada a lima pequena fiação da população; h) o Esiado
não deve sofrer influência política do Estado estrangeiro, caso contrário
é necessário que este dê o seu apoio; r) o Estado deve ter um centro
político e se eles forem vários devem sei identificados para se obter o seu
consentimento ou a sua neutralidade.
De qualquer modo, todo golpe de Estado se autodenomina de revo­
lução, porque esta palavra tem um conteúdo emocional. Ela encerra um
mito.11 Para Florestan Fernandes os movimentos golpistas tomam o nome
de revolução porque são eles que ditam as suas próprias leis.
Pode-se observar qutj a própria palavra revolução é imprecisa. Para
uns (Huntington) ela é caracterizada pela alteração de valores na socie­
dade. Para outros (Marx, Lênin) é a alteração da estrutura social o que
importa. Outros (W. Moore, Lyford Edwards) falam em mudança institu­
cional. Ainda outros (Lasswel) dizem que ela existe quando há “uma
mudança na composição de classe de elites”. Edwards considera que a
revolução não precisa ser violenta. Enquanto outros (Huntington, Calvert,
Mao) consideram que a revolução é violenta.
Brinton observa que no início o governo revolucionário é dominado
pelos moderados e a propaganda o é pelos extremistas. Estes, entretanto,
acabam por dominar o governo. As razões para esta substituição decorre­
riam principalmente de três razões; a) os moderados acabam por se des­
gastar; b) as revoluções pregam a liberdade, isto é, eles não podem reprimir
os extremistas; c) os extremistas são em pequeno número, e as minorias
são mais ativas. Este período dominado' pelos extremistas apresenta as
segu in tes características: são raros os crimes comuns violentos, bem como
o governo passa a mudar os nomes de ruas, praças, etc. Posteriormente,
vem a fase denominada “Termidor”, que se caracteriza por s e r um a ép oca
mais tranqüila. A volta a um período mais calmo é explicada por Brinton
da seguinte maneira: " parece também que a maioria dos homens não'pode
agüentar por muito tempo a tensão decorrente do esforço de viver de
acordo com idéias muito elevadas. Nt> período de crise, o n ão militante é
levado ao limite de sua resistência pela interferencia com algumas de suas
rotinas mais caras e íntimas; o militante é levado a um grau de esforço e
excitação espiritual além de sua capacidade de resistir” . Acrescenta ainda
este autor que “o fenônreno de reação e restauração parece quase inevi­
tavelmente uma parte do processo revolucionário”.
Manoel Gonçalves Ferreira Filho, em uma visão pessimista, afirma que
a 3a etapa de Brinton, citada acima, oferece três alternativas: a) “recon­
quista do poder” por aqueles que foram derrubados; b) prosseguimento
do terror; c) “cair o poder completa e duravelmente nas mãos das forças
armadas, particularmente do exército” .

Í5 6 6
Para Rudi Supek as revoluções têm duas fases: a da tolalização, em
que a vontade e a consciencia individuais concordam com a ação coletiva,
e a da destotalização, em que os indivíduos não mais se associam aos seus
líderes.
Huntington diferencia o “modelo oriental”. O ocidental apresentaria
as seguintes etapas: 1) derrubada das instituições políticas; 2) “mobilização
de novos grupos”; 3) criação de novas instituições. O oriental teria uma
ordem diferente: I) “mobilização cie novos grupos"; 2) “criação de novas
instituições políticas”; 3) derrubada “violenta das instituições da antiga
ordem”. As fases seriam mais demarcadas nas revoluções ocidentais, en­
quanto nas orientais as três fases ocorreriam de forma “mais ou menos
simultânea” . No Ocidente “os revolucionários chegam ao poder primeiro
na capital e logo estendem o seu domínio, pouco a pouco, para o campo.
No Oriente se retiram das zonas centrais urbanas... e estabelecem uma
zona básica de domínio em uma região remota, lutam para obter o apoio
dos camponeses por meio do terror e da propaganda, estendem com
lentidão o âmbito de alcance de sua autoridade e aumentam de modo
gradual o nível de suas operações militares, que passam de ataques terro­
ristas individuais à guerra de guerrilhas, logo à guerra móvel e por fim à
guerra regular” e a capital é ocupada na fase fina] da revolução. O terror
nas orientais é a primeira fase, ao contrário das ocidentais, em que ele é
uma fase posterior.
Cole Blazier, analisando o processo revolucionário na América Latina
(Cuba, México, Bolívia e Guatemala), constata a existência de três fases:
lâ — O movimento rebelde derruba a ditadura militar; 2~ — os rebeldes
no poder adotam uma política reformista e não revolucionária; 3a — eles
são derrubados e tem início um governo revolucionário, que ganha o
co n trole ao iniciar a política revolucionária.
Podemos reproduzir a distinção de Roland Corbisier (Filosofia e Crítica
Radical, 1976), com fundamento em Sartre, entre revolucionário e revol­
tado. O primeiro age em função de sua classe, a sua atitude não é gratuita
ou arbitrária. O revoltado não possui consciência de classe e é um reacio­
nário, porque ele deseja manter o status quo que serve de justificação para
a sua revolta.
Desejamos mencionar ainda a opinião dos autores sobre dois “grupos
sociais” que têm atuação nas guerras internas: os intelectuais e os militares.
Os intelectuais, muitas vezes, têm sido um-foco de oposição aos gover­
nos. Huntington observa: “a cidade é o centro da oposição no país; a classe
média é o fo c o da oposição na cidade; a intelectualidade, o grupo mais
ativo da classe média, e os estudantes são os revolucionários mais coerentes
e efetivos, dentro da intelectua!idade”.1F Brinton afirma que há “maior
proporção de intelectuais empenhados em criticar as instituições existen­
tes”. Aron observa que a “intelligentsia", ao agir na política, o faz como
se fossem “não intelectuais” e com os mesmos preconceitos que estes.

1567
E sfrcv e ainda que nem sempre des são contra os governos. como o io irn i
com os letrados em certa lase <la História da China. Gramsci obsena que
o intelectual é “o empregado do grupo dom inante', ou o “funcionário
• da superestrutura”. Entretanto, ele obsena que se pode ser “intelectual
orgânico” do proletariado por “assimilação” ou “conquista ideológica',
quando ele dá a sua adesão ao programa do proletariado. Ele obsena que
o intelectual de um modo geral está ligado a ura modo de produção.
Sustenta que o novo intelectual deve participar da vida prática. O Partido
Comunista faz dos seus membros um “intelectual” na medida em que ele
acarreta um engajamento político. Para Gramsci todos os homens são
intelectuais, mas nem todos os homens têm função de intelectuais. Pode­
mos acrescentar ainda algumas observações deste grande pensador político
do.século X X que foi Gramsci. Os intelectuais são os “organizadores da
função da classe a que eJes estão ligados organicamente”, bem como
organizam a coerção exercida pela classe dominante “ sobre as outras classes
por intermédio do Estado”. “O intelectual não é o reflexo da classe social:
ele desempenha um papel positivo para tornar mais homogénea a con
cepção naturalmente heterogênea desta classe. Ele classifica os intelectuais
em orgânico (está ligado às classes progressistas) e tradicional (está ligado
às classes que desapareceram ou estão em vias de desaparecer). Estas
últimas observações são tiradas de Jean-Marc Piotte — La Pensée Politique
de Gramsci, 1977. O intelectual tradicional não faz apelos classistas, ao
contrário dos orgânicos.
Michael Lowy observa que os intelectuais não são uma classe, mas uma
categoria social, isto é, eles são definidos “não por um lugar no processo
de produção, mas por sua relação a instâncias extra-econômicas da estru­
tura social” . Eles têm um papel ideológico. Eles se comportam como
membros de sua categoria social. A maior parte deles é recrutada na
pequena burguesia. As próprias profissões intelectuais pertencem à pe­
quena burguesia. Está ocorrendo, segundo Lowy, uma proletarização do.s-
“trabalhadores intelectuais”. Para A. Weber e Mannhein a intelectualida­
de é um “estrato relativamente sem classe”. Para Kanapa, a intelectualidade
é sempre um arauto da burguesia e de seus interesses, enquanto um Anhur
Koestler a interpreta como órgão introspectivo do coipo social... O próprio
Koestler associa intimamente “intelligentsia” e neurose (A. L. Machado
Neto). A palavra “intelligentsia” foi criada pelo romancista russo Bobory-
kin, em torno" de 1860. Para Edgar Morin “a intelligentsia" é uma classe
relativamente desenraizada “e que o intelectual moderno é ao mesmo
tempo destruidor e produtor de mitos”.
Schumpeter, no início a década de 40, já falava em “.superprodução
de intelectuais” , e que, em conseqüência, viria o desemprego. -
Ernest Mandei sustenta que atualmente não são pequenos burgueses,
mas “trabalhadores intelectuais proletarizados”. Em conseqüência, o tra­
balho intelectual se especializa e atomiza. Acrescenta o pensador belga:
“um trabalho intelectual desse tipo, parcelado, fragmentado, tendo per-

1568
(lid o to d a a v isã o d e c o n ju n t o d as a tiv id a d e s s o c ia is c m q u e so in s e r e . n ã o
p o d e d e ix a r d e s e r o tr a b a lh o a lie n a d o . A p r o k l a i i/.ação d o t r a b a lh o
in te le c tu a l n a s c o n d iç õ e s d o sa la ría lo c o n d u z in e v ita v e lm e n te a su a a lie ­
n a ç ã o ” . O b s e rv a q u e a a ç ã o p o lític a d o e s iu d a n te n ã o le n i d is c ip lin a e
p a c ie n c ia , p o r q u e e le s n ã o e stã o s u b m e t id o s a o p ro c e s s o d e p r o d u ç ã o
in d u stria l.
Habermas salienta que o trabalho intelectual é a base da nossa eco­
nomia, sendo que a ciência e a técnica são "a força produtiva principal”.
Assim sendo, “o progresso científico e a técnica se tornam uma fonte
independente de mais valia”. E preciso rever Marx, porque ele só levava
em consideração a “força de trabalho do produtor imediato que tem a
sua importância cada vez mais reduzida”.
Hobsbawm lembra que “o revolucionário típico de hoje é estudante
ou intelectual, geralmente jovem...”. Entretanto, seguindo o historiador
inglês, não significa isto que eles farão a revolução.
Mannheim (ao contrário de Lênin) considerava que a “ intelligentsia '
podia permanecer sem classe e atingir um alto grau de imparcialidade e
objetividade.
Michael Lowy (Ideologias e Ciência Social. Elementos para uma análise
marxista. 1988) afirma que os intelectuais “são categorias definidas por
critérios extra-econômicos” e existem intelectuais pertencendo “às dife­
rentes classes sociais”.
Para concluir este conjunto de opiniões podemos lembrar a definição
de intelectuais de T. Bottomore: “são aqueles que contribuem diretamente
à criação, à transmissão e à crítica das idéias, isto é, os homens de letras,
os artistas, os sábios, os filósofos, os pensadores religiosos, os técnicos
sociais, os escritores políticos”.
Os militares têm adquirido cada vez maior relevo no processo político
dos países em desenvolvimento. Grande número destes países tem governos
militares. Este fato decorre de uma série de considerações que podem ser
elaboradas. Eles possuem as armas dentro do Estado, o que facilita a sua
ascensão ao poder pela força, bem como a sua permanência nele. Elaboram
de um modo geral um Direito que lhes permite fazer uso da força de
modo mais ou menos indiscriminado, o que lhes permite evitar as reivin­
dicações salariais e de um modo geral as sociais, por exemplo, através da
greve. Enfim, tornam-se o regime ideal para as grandes empresas, ou para
- o poder econômico, que é quem realmente detém o Poder, mesmo em
regimes militares. Por outro lado, eles possuem uma formação uniforme,
o que torna as suas desuniões bastante superficiais, sem que existam maio­
res dissensões. A sua missão os fortalece e faz com que a luta pelo Poder,
bem como a sua permanência nele, seja facilitada. Pode-se acrescentar
ainda que muitas vezes estão sujeitos à influência de grandes potências,
através das missões militares destas, sendo de se recordar que são elas as
fornecedoras dos armamentos para as forças armadas. Enfim, um exército

1569
b e m e q u ip a d o p o s s u i m a io r p re s tíg io . E e s t a b e le c id a assim u m a r e la ç ã o
d e d e p e n d ê n c ia .
Os militares nos países em desenvolvimento não apresentam mais na
maioria das vezes um valor real para a defesa externa do país, tendo em
vista a distância cada vez maior em armamentos entre países ricos e pobres.
Não é por outra razão que as grandes potências1vendem com facilidade
determinados armamentos aos subdesenvolvidos, permitindo que elas fa­
çam excelentes negócios e aumentem a dependência do subdesenvolvido,
bem como não lhes traz qualquer ameaça efetiva. As forças armadas de
uni país em desenvolvimento em matéria de defesa externa quase que só
existe em relação a outro país em desenvolvimento que seja limítrofe. Na
América Latina a defesa externa extracontinental está praticamente entre­
gue aos EUA. Em 1907 o jornal “La Battaglia”, da corrente anarquista de
São Paulo, já afirmava que “o militarismo não é destinado a defender uma
pátria, mas sim a atacar a pátria do vizinho, e, sobFetudo, a defender os
privilégios e a supremacia das classes ricas” (Silvia Lang Magnani — O
Movimento Anarquista em São Paulo, 1982).
Pode-se acrescentar que a grande função desempenhada pelos milita­
res na maioria dos países em desenvolvimento tem sido o de manter a
unidade do Estado quando este é multinacional e apresenta ameaças de
movimentos de secessão. Enquanto este movimento não eclode, as ativi­
dades militares acabam, algumas vezes, na prática, por se confundir com
as atividades policiais, por exemplo, na denominada “ espionagem interna”,
ou “segurança interna”, encontrada nos mais diferentes países, inclusive
nos desenvolvidos. Jean Bondei apresenta as seguintes características para
a “profissão militar”; a ) constituem um “.ram o da burocracia em sentido
amplo e adquirem uma formação especializada e um “esprit de corps”.
Porém esta função especializada tem a peculiaridade “de estar diretamente
relacionada com a existência e sobrevivência do Estado como organização”,
vez que é sua função defender este; b) desenvolve uma profissão improvável
de ser exercida devido ao progresso dos armamentos, e daí o horror à
guerra. Alain Rouquié observa que “a estatolatria é... um dos elementos
constitutivos da ideologia militar desde o início do século”.
Este mesmo autor analisa as “condições que favorecem a intervenção
militar na política” : a ) “o isolamento dos militares do resto da nação”, o
que acarreta o aumento de sua profissionalização, e esta, por sua vez,
também o isola da nação; b) quando diminui “a legitimidade do sistema
político”, sendo que a insegurança deste ameaça a segurança externa do
Estado; c) “a probabilidade da intervenção militar diminuí à medida que
o sistema político, social e-econômico aumenta sua complexidade”; d) há
um aumento de probabilidade de intervenção quando “as ideologias que
prevalecem na sociedade diferem mais dos propósitos característicos dos
militares... as probabilidades de uma intervenção militar aumentam acen­
tuadamente com o aumento do liberalismo e da democratização”. Estas
duas lendências isolam os militares, que necessitam “de confiar na disci­
plina e na organização hierárquica para conservar seu nivel de preparo”.
Pode-se recordar que Veblen colocou os militares na classe ociosa, isto é,
que não produz no sentido económico, e Tolstoi (Guerra e Paz, 1982, vol.
I) já escrevera: “ora, toda uma classe social, a dos militares, goza precisa­
mente desse estado de ociosidade imposta e não censurável. Essa inação
forçada, legal, sempre foi e sempre será o principal atrativo do serviço das
armas”.
Pode-se observar que a intervenção dos militares na política possui
uma série de nuanças, desde a simples ameaça até a substituição do governo
civil por eles. Huntington considera a intervenção dos militares como
“parte inseparável da modernização'política”, sendo que nos países atra­
sados eles assumem uma atitude modemizadora, enquanto nos países com
maior desenvolvimento, como Brasil e Argentina, eles são “conservadores
e reacionários”. Para José Nun há, na América Latina, uma ligação entre
as intervenções militares e as classes médias. As Forças Armadas “protege­
riam” as classes médias. E um meio que estas têm de fazer prevalecer as
suas reivindicações perante as oligarquias. Segundo N. Lechner o que
caracteriza os golpes militares da última década é que eles tomam o poder
como instituição, procurando criar um novo Estado sem se apoiar nas
forças civis.
No Império Brasileiro a Guarda Nacional (não era militar) tinha uma
grande força, sendo se de recordar que Caxias quando agia como pacifi­
cador era designado Presidente da Província a fim de poder utilizar a
Guarda Nacional. E a partir da guerra do Paraguai que os militares passa­
ram a adquirir uma “consciência de classe”. A proclamação da República
foi obra do Exército. O início da República foi abertamente dominado
pelos militares. Um dos mais célebres movimentos militares no Brasil foi
o denominado tenentismo,lc que conduziu à Revolução de 1930. Talvez
se possa encerrar estas observações com uma frase atribuída a um oficial
do exército dominicano, em 1974: “La Constitución es una cosa; los mili­
tares somos otra.”
A título de ilustração podemos repetir as palavras de Alfred de Vignv
sobre o exército: “O exército é uma nação dentro da outra. Envergonha-se
de si mesmo e não sabe o que quer. Investiga-se sem cessar para descobrir
se é escravo ou senhor do Estado e seu corpo busca sua alma por toda
parte sem encontrá-la.”
Gostaríamos de ciõar a seguinte passagem: “ (...) pois sempre notei que
os homens que mais facilmente perdem a cabeça e se mostram em geral
mais fracos durante as revoluções são os militares; habituados a encontrar
à sua frente uma força organizada e em suas mãos uma força passiva,
desconcertam-se prontamente diante dos gritos desordenados da multidão
composta de cidadãos, inofensivos e desarmados e diante da hesitação e

1571
às vezes da conivência de seus próprios soldados" (Alexis de Tocqueville
— Lembranças de 1848. As Jornadas Revolucionárias em Paris, 1991).
Finalmente, é de se repelir as observações de P. Legendre, de que a
revolução se loniou consumível e vendáyelcomo o amor, tendo se tornado
“um bordel”.
A nossa intenção ao fazer este inciso foi de fornecer ao estudante
apenas algumas observações para que ele possa fazer uma relação entre o
Direito e a realidade política.
643. A questão da legalidade das guerras civis perante a ordem jurídica
internacional não é matéria que faça parte do Dl Positivo. O DIP não traça
normas detalhadas sobre a guerra civil, mas apenas normas genéricas.
O que importa fixar é que o Dl não proíbe a guerra civil. Alguns
autores (Padelford) chegam a afirmar que.o Dl favorece a guerra civil, vez
que pelo instituto do reconhecimento os revoltosos podem ter um trata­
mento semelhante ao que é dado ao governo legal. Salienta Falk que “o
Dl trata uma guerra interna com o ‘status’ de beligerancia como essen­
cialmente idêntica a uma g u erra en tre Estados soberanos”.
E de se assinalar que o direito interno, ao contrário do Dl, não reco­
nhece a legalidade da guerra civil. Na verdade o direito interno proíbe
toda e qualquer luta interna. O direito à insurreição só foi reconhecido
na Constituição da Revolução Francesa de 1793. A legislação penal pune
os crimes políticos. Como se observa, pode parecer existir aqui um conflito
entre as ordens jurídicas interna e internacional. Entretanto, este conflito
é meramente aparente porque o Dl apenas outorga efeitosjurídicos a uma
luta civil quando ela existe, isto é, quando ela é uma realidade e, em
conseqüência, a ordem jurídica internajá foi violada. Na verdade, ao Dl
não interessa estimular guerras civis, mas não pode ele ignorar a sua
realidade. Por outro lado, o Dl, englobando os mais diferentes regimes
políticos e econômicos, não tem interesse em defender um determinado
status quo existente no interior do Estado.2 O contrário ocorre no Direito
Interno, em que o governo de um Estado procura manter sempre no seu
interior o status quo existente, seja o próprio governo, ou o sistema eco-
nômico-social, ou até mesmo as reformas preconizadas por ele.
Entretanto, havia um tipo de guerra civil cuja legalidade tem sido
admitida expressamente, ou seja, as lutas de independência. Assim as
declarações da Assembléia Geral da ONU de 1966 e 1968 sobre descolo­
nização: “reafirma seu reconhecimento da legitimidade da luta que sus­
tentam os povos sob dominação colonial para exercer seu direito à auto­
determinação e à independência”. Para Abi-Saab tradicionalmente a guer­
ra de libertação nacional era guerra interna. Entretanto, isto não era tão
antigo, vez que na independência dos EUA a França teve um papel rele­
vante, bem como a Inglaterra, França e Rússia tiveram um papel importante
nã independência da Grécia. Tudo indica que a posição de considerar tais
guerras como guerra in tern a fo i p o r influência do positivismo e do hege-
lianismo. Atualmente as guerras de libertação nacional são consideradas
conflitos armados internacionais. A expressão guerra de libertação nacional
era utilizada para designar o povo que lutava contra o invasor. Abi-Saab
apresenta as seguintes condições para o reconhecimento dos movimentos
de libertação nacional: a) reconhecimento por uma organização regional;
b) controle de território; c) que ele seja realmente representativo do povo;
d) tenha um mínimo de efetividade como beligerante. Fazemos aqui men­
ção à guerra de libertação nacional, vez que já foi considerada guerra
interna, bem como para fazer uma menção em separado, entretanto,
repetimos, elas são conflitos armados internacionais.
644. Há dois tipos de-lutas civis. O primeiro e que apresenta maiores
repercussões na ordem internacional é o das guerras de independência.
. O segundo consiste nas lutas internas para a derrubada do governo.
Nos termos do texto de 1949, as lutas coloniais eram lutas rivis En­
tretanto, o Protocolo I de 1977 coloca “os conflitos armados nos quais os
povos lutam contra a dominação colonial e a ocupação estrangeira e contra
os regimes racistas no exercício do direito de autodeterminação dos povos”
como conflito armado internacional.3 Esta posição acarretou que na Con-
j ferência de Genebra o 3S Mundo perdesse o interesse pelo Protocolo II,
I que trata dos conflitos armados não internacionais, e até mesmo se opusesse
\ ^ a ele em nome da soberania nacional.
Atualmente as guerras de libertação nacional são consideradas confli­
tos armados internacionais. Por outro lado, as guerras civis são atualmente
designadas nos textos internacionais como “conflito armado não apresen­
tando caráter internacional”. Esta expressão, que tecnicamente é a mais
correta, surgiu na XVIII Conferência Internacional da Cruz Vermelha,
reunida em Estocolmo, em 1948 (S. P. Marks). Este tipo de conflito tem
aumentado nas últimas décadas, sendo de se recordar que 80 a 90% das
vítimas em conflitoí-^rmados após a 2S Guerra Mundial ocorreram nestes
conflitos (D. Schindler).
Pode-se observar que se fizermos uma classificação dos conflitos arma­
dos seguindo as Convenções de Genebra de 1949 e os Protocolos de 1977,
existem quatro tipos de conflitos: a) os conflitos armados internacionais;
b) as guerras de'libertação nacional (têm o mesmo tratamento das ante­
riores); c )'o previsto no art. 3a das Convenções de Genebra de 1949:
“conflito armado sem caráter internacional e que surge no território” de
um dos contratantes; d) o art. 1 s, do Protocolo II. Este visa desenvolver
o texto anterior. Ele é aplicado nos conflitos armados no interior de um
contratante “entre suas forças armadas e as forças armadas dissidentes ou
grupos armados organizados que, sob a conduta de um comando respon­
sável, exercem sobre uma parte do seu território um controle que lhe
permita conduzir operações militares, contínuas e coordenadas...”. Este
conceito tem sido criticado porque ele é restrito e não abrange vários
casos, como das guerras civis em que a ONU age, bem como não se aplica

1573
a todos os conflilos entre grupos armados. Ele só será usado en) poucos
casos e nos conflilos que tiverem uma certa intensidade. De qualquer
modo, é o primeiro passo para se aplicar o direito humanitário aos conflitos
internos.
Finalmente, é de se observar que o Protocolo II não é aplicado “às
situações de tensões internas, de agitações internas, como as revoltas, os
atos isolados e esporádicos de violência e outros atos análogos, que não
são considerados como conflitos armados”. Em 1970, o CICV tentou ca­
racterizar o que eram agitações interiores como: a) atos de violência de
uma certa gravidade: b) uma certa duração; c) luta entre dois ou mais
grupos possuindo alguma organização; d) a existência de vítimas. Ele foi
abandonado, tendo em vista que a caracterização foi considerada insufi­
ciente.
645. A definição de guerra civil não é fácil de ser formulada, vez que
a distinção entre ela e a guerra internacional .nem sempre é clara. Como
bem salienta Linda Miller, as guerras civis são encaradas como fazendo
parte de um contexto mais amplo de Juta anticolonialista ou da guerra-fria
e constituem um potencial de ameaça à paz internacional. Na verdade,
nos dias de hoje as guerras civis sofrem sempre interferência de terceiros
Estados.
Erik Castren apresenta como características da guerra civil as seguintes:
a) conflito armado “entre órgãos do Estado ou grupos de população que
se opõem dentro de um Estado”; 6) na guerra internacional as duas partes
em luta têm “completa capacidade legal”; já tal fato não ocorre na guerra
civil; c) as finalidades da guerra civil (“reforma social e política”) são
diferentes da guerra internacional (ex.: apropriação de território).
Podemos definir a guerra civil como sendo o conflito armado que se
desenvolve no interior de uma ou entre várias coletividades estatais, mas
em que apenas uma das partes tem personalidade internacional plena.
Esta definição precisa de uma explicação da expressão “entre várias
coletividades estatais, mas em que apenas uma tem personalidade inter­
nacional plena”: o que pretendemos com isto é afirmar que constituem
guerra civil as guerras de independência,SAvez que na ordem internacional
as colônias, etc., não têm personalidade internacional plena, mas não
deixam de ser coletividades estatais com personalidade internacional limi­
tada.
Assim são guerras civis as dentro de uma união real e de uma federação.
As guerras entre Estados de uma união pessoal são internacionais, vez que
os seus componentes têm personalidade internacional plena. As guerras
dentro de uma confederação é que podem levantar maiores problemas,
vez que cada Estado tem personalidade internacional e o mesmo pode
ocorrer com o órgão central da confederação. Neste caso, como os Estados
têm o direito de secessão e uma personalidade internacional quase qüe
plena podemos salientar que a guerra aí tem contornos de guerra inter­

1574
nacional. Quanto às guerras entre protetor e protegido, no caso de pro-
tttorado internacional, serão guerras internacionais se o protegido tiver
uma capacidade ampla no campo internacional, caso contrário, será guerra
civil. Os amores soviéticos sustentam com razão que as declarações de
descolonização deram aos povos coloniais uma personalidade internacio­
nal ao dar a eles um direito (de independência). As guerras de inde­
pendência são denominadas de guerra de libertação nacional. São as guer­
ras “progressistas”. Entretanto, esta caracterização não é tão pacífica como
pode parecer à primeira vista. Zorgbibe assinala que na guerra do Oriente
Médio há uma “realidade psicológica e sociológica de conflito interno”,
porque os palestinos procuram criar o seu Estado e destruir o Estado de
Israel. Entretanto, pode-se sustentar que um conflito armado internacional
existe meSno quando os beligerantes não se reconhecem (Israel x árabes).
646. Um grande problema na caracterização da guerra civil consiste
em saber se a assistência de países estrangeiros lhe dá um aspecto de guerra
internacional. Tem-se considerado que a referida assistência não transfor­
ma a guerra civil em guerra internacional. Este foi o procedimento adotado
na guerra civil espanhola e, posteriormente, na guerra do Vietname. Tal
fato ocorre quando a assistência estrangeira não alterar a característica
principal da guerra civil: ser travada no interior de um Estado, ou melhor,
de uma pessoa internacional com capacidade plena. Pode-se considerar
que isto é uma ficção, vez que a palavra “internacional”, significando
“entre Estados”, tal guerra deveria ser considerada internacional, vez que
muitas vezes os Estados estrangeiros tomam parte importante na luta. Na
verdade, muitas vezes o aspecto de guerra civil e internacional existe no
mesmo conflito. Assim, na guerra do Vietname, o papel dos EUA foi maior
do que o do governo do Vietname do Sul. Entretanto, esta ficção tem
como razões práticas as mais importantes: a) não estender os efeitos da
guerra; b) n ão violar a Carta da ONU, que proíbe a guerra internacional;
c) evitar para os terceiros Estados status de neutralidade (este só surge na
guerra civil se os terceiros Estados quiserem, isto é, se reconhecerem‘os
revoltosos); a) evitar uma guerra mundial.
A caracterização de um conflito como guerra civil nem sempre é fácil
de ser feita, bastando lembrar o caso da guerra do Vietname, que levantava
de início o problema de saber se o Vietname era um único Estado, ou se
eram dois.4 D. Schindler propõe que uma guerra civil, que for internacio­
nalizada, deve ser tratada parcialmente como conflito internacional (entre
os Estados inimigos que dão assistência aos beligerantes) e parcialmente
c o m o co n flito interno.
— O Protocolo II de 1977 às convenções de direito humanitário de 1949
estabelece que nada nele estabelecido pode ser invocado para justificar
uma intervenção direta ou indireta em um conflito armado.
647. Os revoltosos em uma guerra civil podem se encontrar em três
situações diferentes:

1575
a) revoltosos que não obtiveram reconhecimento dos demais Estados;
b) revoltosos que foram reconhecidos como insurgentes (v. capítulo
XXIII);
c) revoltosos que foram reconhecidos como beligerantes (v. capítulo
XX III).4A
Estas três situações deveriam depender da intensidade da guerra civil,
entretanto, devido ao aspecto político do reconhecimento que ainda pre­
domina no campo jurídico internacional, tal fato não ocorre.0
^ (§48>As noimas sobre guerra civil são normas costumeiras, resultantes
das diferentes práticas estatais. A codificação nesta materia é quase que
inexistente. No plano parauniversal temos apenas um dispositivo nas Con­
venções de 1949 (art. 35). No ámbito do DI Americano temos a Convenção
de Havana de 1928 sobre deveres e direitos dos Estados em caso de lutas
civis e um protocolo de 1957 adicional a esta convenção, que abrangem
todos os casos de lutas civis, tenha havido ou não reconhecimento, e o
Protocolo II nas convenções de 1949 de 1977.
O DI procura fazer com que as leis da guerra sejam aplicadas na guerra
civil a fim de que esta seja humanizada. Dentro desta orientação as Con­
venções de Genebra de 1949 consagram todas, no seu art. 3 Q, normas a
serem aplicadas em “caso de conflito armado sem caráter internacional”.
Não importa saber se houve ou não reconhecimento. Estas normas podem
ser resumidas nas seguintes: a) assegura-se “ às pessoas que não participem
diretamente das hostilidades, inclusive aos membros de força armada que
tiverem deposto as armas e às pessoas que foram colocadas fora de combate
por doença, ferimento, detenção ou por qualquer outra causa, um trata­
mento com ‘humanidade’ sem discriminação de cor, raça, sexo, religião,
fortuna”, etc.; b) as pessoas mencionadas anteriormente gozam da seguinte
proteção: 1) não se pode atentar contra a sua vida, fazer nelas mutilações,
torturas, etc.; 2) proíbe-se “a detenção de reféns”; 3) interditam-se aten­
tados à dignidade e tratamentos humilhantes; 4) proíbem-se condenações
e execuções sem julgamento prévio e decididos por tribunal que não esteja
regularmente constituído e que não ofereça garantias judiciárias; c) “os
feridos e enfermos serão recolhidos e tratados”; d) “um organismo huma­
nitário imparcial, tal como o Comitê Internacional da Cruz Vermelha,
poderá oferecer os seus serviços às Partes em luta”; etc. Tem-se considerado
que o CICV pode “intervir de ofício, no exercício do direito geral de
iniciativa que lhe pertence” (R. Pinto). O CICV interveio em várias guerras
civis com o próprio reconhecimento dos governos (Guatemala, 1954; Ar­
gélia, 1955; Congo, 1960; etc.). As duas partes em luta estão obrigadas
pelo texto da convenção que obriga ao Estado inteiro. Surge agora a
questão de saber se havendo movimentos internossem aspecto de conílito
armado as partes devem se sujeitar a alguma norma internacional.-A.dou­
trina tem sido unânime no sentido de considerar que ainda aí se devem
aplicar princípios de humanidade. Tendo alguns governos aí admitido a
intervenção do CICV (ex.: as duas Alemanhas em 1958). Uma crítica que
lem sido dirigida ao Protocolo II é que ele não prevé a responsabilidade
penal internacional para os autores de suas violações.
Outros aspectos em relação às normas do ai t. 3- são os seguintes: a)
elas são obrigatórias em levar em consideração a reciprocidade; b) o próprio
dispositivo determina: “a aplicação das disposições precedentes não terá
efeito sobre o estatuto jurídico das Partes em luta”, isto é, a aplicação não
transforma os revoltosos em insurgentes ou beligerantes.
O citado Protocolo II proíbe a: a) tomada de reféns; b) escravidão; c)
pilhagem; a) atos de terrorismo; etc. Prevé igualmente un) “tratamento
humano” e que todas as pessoas que foram privadas de liberdade devem
gozar da proteção nele estabelecida, mesmo terminado o conflito: a) tódo
. processo deve ter garantias; b) o acusado deve ser considerado inocente
até ser provada a culpa; c) ninguém pode ser obrigado a se considerar
culpado; a) a responsabilidade penal é individual; e) os doentes devem ser
tratados; etc."' Determina ainda a proteção da população civil, que não
pode ser submetida à fome e nem removidos os bens indispensáveis à sua
sobrevivência. Proíbe-se o bombardeio de diques, usinas nucleares, etc.
Entretanto, a Cruz Vermelha só pode propor os seus serviços nestes
conflitos ao Estado contra o qual os revoltados entraram em luta e só pode
oferecer aos beligerantes os seus serviços se o Estado contra o qual eles
lutam der o seu consentimento. Este, na verdade, nunca será dado. Este
dispositivo fic o u sem força por pressão do 3S Mundo (índia, Paquistão,
Filipinas).
Diversas normas do direito de guerra têm sido propostas para serem
aplicadas nas guerras civis e algum as delas o têm sido por meio de acordos
tácitos entre as partes em luta. Esta extensão, além do que estabelece o
citado art. 3a, é que ele tem sido considerado “um simples minimum” (R.
Pinto). Assim tem-se proposto: «) o internamento e detenção dos suspeitos
sob a salvaguarda de organismos humanitários; b) a criação de ‘“-zonas e
de localidades sanitárias e de segurança ao abrigo dos efeitos da guerra
civil”; deve ser protegida a população civil;5® c) os revoltosos que simples­
mente carregam armas não devem por esse simples fato ser condenados;
d) os revoltosos que não tenham cometido crime terrorista antes de inte­
grarem o exército dos revoltosos devem ser internados em campos milita­
res, como fazendo parte de um exército inimigo (prática da França na
Argélia); é) em 1957 a Conferência Internacional da Cruz Vermelha propôs
que se estendesse a inviolabilidade do pessoal médico e sanitário à guerra
civil.6
O CICV tenta aprovar uma Declaração para proteger aqueles casos
não previstos no Protocolo II: “distúrbios internos e tensões interiores”,
proibindo execuções sumárias, prática de reféns, aterrorizar a população
civil, uso excessivo de força, proibição de deportações e de detenções
prolongadas, proteção do pessoal médico e religioso, etc. Os Estados te-

1577
niein tuna interferência cm área de sua soberania. Entretanto, o CICV tem
atuado em situações não abrangidas pelo direito humanitário “com base
na tradição, nas resoluções das conferências do CICV e nos seus estatutos".
Assim o CICV luta contra a tortura, pela melhoria das condições de de­
tenção, etc.
E interessante assinalar que a Declaração da Assembléia Geral em
1968, para Implementação da Declaração de Descolonização: “declara que
a prática de usar mercenários contra movimentos de libertação nacional
e independência é punível como um ato criminoso e que os próprios
mercenários são ‘fora da lei’ (outlaws) e solicita aos governos de todos os
países para promulgarem legislação declarando que o recrutamento, fi­
nanciamento e treinamento de mercenários em seu território é uma ofensa
punível e proibindo seus nacionais de servirem como mercenários”. São
considerados mercenários os individuos de nacionalidade estrangeira que
se engajaram ou por um determinado período ou para executar determi­
nados serviços a um governo ou a um grupo político. O mercenário não
tem estatu to d e prision eiro de guerra e pode serjulgado por ter participado
ilegalmente da guerra (ver a caracterização de mercenário nos termos do
Protocolo I de 1977 no capítulo Guerra Terrestre).
Alguns autores (Schwarzenberger) têm procurado distinguir os guer­
rilheiros e os terroristas: d) os terroristas usam a força indiscriminadamente,
enquanto os guerrilheiros agem em termos militares; b) os guerrilheiros
agem em grupos, enquanto os terroristas podem agir isoladamente; c) os
terroristas não criam uma guerra civil, enquanto a existência de guerri­
lheiros em grande número cria uma guerra interna. Esta distinção na
prática não é fácil de ser feita, porque muitãs vezes o status de guerrilheiro
e terrorista se confunde nas mesmas pessoas. No DIP guerrilheiros e ter­
roristas são palavras que não têm sentido técnico (Schwarzenberger). O
guerrilheiro só terá tratamento de beligerante se pertencer ao exército
regular ou a grupos assimilados a ele (v. capítulo Guerra Terrestre). Na
prática, ao se afirmar isto é se negar toda e qualquer proteção a ele. Era
o caso do vieteongue, a quem o Vietname do Sul considerava criminoso
comum, porque não usava “braçadeira”. Ora, o uso da braçadeira era
quase que exigir do guerrilheiro o seu suicídio.
O guerrilheiro tem um “caráter intensamente político”, sendo que
“partisan” (guerrilheiro) vem de “pártei” (partido), assinala Carl Schmitt.
Este mesmo autor apresenta as seguintes características para o guerrilheiro:
d) não pertence ao exército regular; b) tem intensa mobilidade: c) grande
comprometimento político; d) aspecto telúrico (ligação com a terra). To­
davia, é preciso lembrar que há uma confusão entre guerrilha e terrorismo,
sendo de se lembrar que os diferentes “modelos” de guerrilha são estu­
dados em obras sobre terrorismo. Os mais conhecidos “ modelos” na Amé­
rica Latina são os de Guevara-Debray e o de Marighela, sendo que o
primeiro dá predominância ao campo e o segundo ã cidade. Entretanto,
podemos recordai que Guevara era contrário ao terrorismo (v. capítulo
Extradição). Salienta R. Aron que os franco-atiradores se transformam em
“partisan", isto é, ficam a serviço de uma* causa, quando se transformam
em militantes. Guerrilha é uma palavra espanhola (“guerrilla” ) que signi­
ficava guerra pequena. Surgiu na Espatelia em 1808, já tendo sido usado
este tipo de luta pelos chouans na Bretanha e Vendéia de 1793 e 1802. A
guerrilha só é eficaz quando o seu apelo é atendido por “uma alta per­
centagem da população rural numa grande proporção territorial do país"
(Hobsbawm).
Os movimentos de resistência na Convenção de Haia (1907) eram
obrigados a: a) portar armas abertamente; b) usar sina) distintivo; c) res­
peitar as leis de guerra; d) comando por pessoa respdhsável. Em 1972 o
CICV adotou uma fórmula alternativa para as duas primeiras condições.
Observa Chaumont que dentro do princípjo da reciprocidade os guerri­
lheiros só precisam cumprir as leis de guerra se as outras partes também
respeitarem.
Os terroristas e os guerrilheiros pretendem, “indiretamente”, se be­
neficiar do direito humanitário aplicável nos conflitos armados. A tendên­
cia da ONU é neste sentido (Schwarzenberger).fiA
E de se repetir neste capítulo que o Protocolo I de 1977 estende a
noção de pessoa que se beneficia do tratamento de prisioneiro de guerra,
sendo nela incluídos todos os combatentes, inclusive a guerrilha. Esta não
precisa mais usar uniforme e tem apenas a obrigação de portar armas
abertamente no momento do combate e respeitar as regras de direito
humanitário (o que exclui os terroristas).
Alguns problemas do direito de guerra podem ser mencionados em
relação à guerra do Vietname. O Vietname do Norte, signatário da Con­
venção de Genebra (o Vietname do Sul e os EUA são igualmente signatá­
rios), não cumpriu vários de seus dispositivos, deixando de fornecer o
nome dos prisioneiros e proibindo a sua correspondência. O Vietname do
Norte alegava que não havia obrigatoriedade em dar aos prisioneiros o
tratamento de prisioneiro de guerra, porque nenhuma das partes em luta
formulara declaração de guerra. Por outro lado, a Frente de Libertação
Nacional não se considerava sujeita ao art. 3a da Convenção de Genebra.
O Vietname do Sul era acusado de maltratar e torturar os prisioneiros de
guerra. O Vietname do Norte considerava os pilotos norte-americanos
como criminosos de guerra e, durante um largo período, ameaçoujulgá-los
como criminosos. O Vietname do Norte alegava que fez reserva do art. 58
da Convenção de Genebra, que declara que os prisioneiros acusados de
crimes continuam com o status de prisioneiros de guerra.
Inúmeros outxós problemas podem ser mencionados em relação aos
prisioneiros de guerra: a) os guerrilheiros do Vietcongue não usavam um

1579
sinat de identificação e, por isso. não recebiam o tratamento de prisioneiros
de guerra e se beneficiavam apenas do art. 3" da Convenção de Genebra.
Tal fato, de certo modo, é injusto, porque o Vietcongue só podia lutar
clandestinamente devido à superioridade esmagadora dos EUA; b) 110
“front” era irrelevante a distinção entre civil e militar; c) a FNL, para não
ver seus membros executados como terroristas, adotava a prática de matar
reféns como represália; d) as condições de alimentação não eram boas nos
campos de prisioneiros; ê) prática de torturas para obter informações; J)
a FNL alegava que os prisioneiros norte-americanos, devido ao seu hábito
alimentar, custavam mais por indivíduo do que os seus próprios homens
em luta.
Meyrowitz observa que as forças norte-americanas utilizaram no terri­
tório do Vietname do Sul agentes químicos contra homens e vegetação,
violando o Protocolo de Genebra de 1925 que proíbe a guerra química e
bacteriológica. Pode-se citar ainda outras violações, como o bombardeio
dos EUA visar objetivos não militares (diques, etc.).
Outras violações têm sido assinaladas, como a lista que encontramos
na Crônica dos Fatos Internacionais escrita por Charles Rousseau (RGDIP,
1973, nQ3, págs. 825 e segs.): a) bombardeio de hospitais vietnamitas pela
aviação norte-americana; b) bombardeio de diques no Vietname do Norte;
c) bombardeios aéreos “não controlados” no Vietname do Norte (1971-
1972). O General Lavelle (“autor” dos bombardeios) desobedecia ordens
e quando ia ser submetido à Corte Marcial se aposentou; d) minas na
entrada dos portos e águas territoriais do Vietname do Norte, violando a
Convenção de Haia de 1907 que proíbe quando a sua finalidade é apenas
interceptar a navegação de comércio; é) bombardeios aéreos no Camboja
e no Laos (1969-1972); J) danos a pessoas e bens dos Estados neutros
quando a aviação norte-americana fazia bombardeios
A guerra do Vietname acabou por se alastrar, sendo de se recordar
que os EUA acabaram por participar da guerra no Camboja (que se de­
clarara neutro por uma lei de 1957), principalmente através de bombar­
deios que tiveram início em 1969-1970, alegando que isto era necessário
para a defesa do Vietname. O Laos, em 1971, foi também invadido, com
a finalidade de se destruir os denominados santuários do Vietcongue, isto
é, locais de abastecimento, bem como locais para os soldados se restabe­
lecerem.
Apenas a título de curiosidade podemos repetir alguns dados forneci­
dos por Alva Myrdal: a) de 1965 ao meio de 1972 os EUA lançaram sete
milhões de toneladas de bombas na Indochina, isto é, duas vezes a quan­
tidade de bombas lançadas pelos aliados na 2- Guerra Mundial em todos
os “fronts”; b) o Pentágono admite que os EUA usaram na Indochina,
entre 1965 e 1973, quinze milhões e meio de toneladas de munições de
todas as espécies. Assinala Westing que “pode ter sido mais que o total de
munições, usadas pelo homem em todas as guerras passadas” .

1580
Algumas outras observações podem ser acrescentadas ao reproduzir­
mos algumas das opiniões de P^delford ao estudar a guerra civil espanho­
la:61* a) os Estados podem criar patrulhas navais internacionais a fim de
defenderem os seus navios em aho rnar das partes em luta, sem que isto
signifique reconhecim enio'com o beligerantes; b) minas em guerra civil
foram usadas pela primeira vez na Guerra de Secessão no rio Mississipi e
posteriormente foram usadas na guerra civil espanhola no porto de Bilbao
em 1873; c) na guerra civil grega em 1935 utilizaram-se também submari­
nos, mas só na guerra civil espanhola é que foram usados contra o comércio
estrangeiro no alto-mar, ocasionando o afundamento de navio alemães,
russos e ingleses; d) nas águas territoriais, mesmo sem o reconhecimento,
as partes em luta podem controlar a navegação estrangeira; e) nestas
mesmas águas podem ser colocadas minas automáticas de contato, mas os
navios estrangeiros devem ser-informados, bem como lhes serem dados
meios de atravessar os campos minados, etc.
649. Se não houve o reconhecimento como beligerantes, as partes em
luta não podem exercer atos de guerra fora do território estatal.
Na América temos a Convenção de Havana (1928) sobre deveres e
direitos dos Estados nos casos de lutas civis, que traça várias normas para
os terceiros Estados que podem ser resumidas nas seguintes: a) os Estados
devem evitar que os habitantes do seu território tomem parte em uma luta
civil em outro Estado; b) “desarmar e internar toda força rebelde que
transponha as suas fronteiras, sendo os gastos de internamento por conta
do Estado onde a ordem tiver sido alterada” 7 As armas só serão devolvidas
ao outro Estado depois que aí terminar a luta civil; c) “proibir o tráfico
de armas e material de guerra” para os revoltosos e para qualquer uma
das partes em luta se houver reconhecimento como beligerantes. Neste
último caso, aplicam-se as regras de neutralidade; d) “evitar que na sua
jurisdição se equipe, arme ou adapte ao uso bélico qualquer embarcação
destinada a operar em favor da rebelião”; e) a qualificação de pirata por
um Estado em relação a “ navios armados em guerra” não obriga os demais
Estados; f ) “o navio insurreto, de guerra ou mercante, equipado pela
rebelião, que chegue a um país estrangeiro ou procure refúgio nele, será
entregue pelo governo deste ao governo, constituído do país em luta civil
e os tripulantes serão considerados como refugiados políticos”;8 g) se um
Estado for vítima de depredação praticada por navios insurretos: 1) se for
navio de guerra, ele pode capturá-lo e entregá-lo “ao governo do Estado
a que pertença, o qual o julgará”; 2) se for navio mercante, o Estado pode
captuçá-lo e aplicar a sua lei penal; h) a captura pode ser realizada por
um Estado cuja bandeira seja utilizada por navio de guerra ou mercante
para “encobrir os seus atos”. Em 1957 foi concluído um protocolo adicional
a esta convenção que estabeleceu: a) os Estados devem manter sob fisca­
lização o tráfico de armas e material de guerra; b) suspender a exportação
de armamentos quando tiver suspeita de que ele está sendo utilizado para

1581
promover ou sustentar nina guerra civil; r) proibir a exportação ou impor­
tação de armamentos que visein uina guerra civil; d) em caso de reconhe­
cimento como beligerante, aplicain-se as regras de neutralidade; é) apli-
cam-se as normas relativas a navios da Convenção de 1928 também às
aeronaves; /) os Estados devem evitar que pessoas que se encontram no
seu territorio vão fomentar guerra civil em outro Estado; etc.
Na guerra do Vietname a participação dos terceiros Estados (assistência
econômica) não provocou a aplicação do direito de guerra. Entretanto,
os terceiros Estados, mesmo não participando militarmente no conflito,
negam a condição jurídica de neutros. A guerra interna não cria automa­
ticamente o status de neutralidade.
650. A ONU, com o já d echáramos, se preocupa com a paz e a segurança
internacionais. Entretanto, as güerrasjcivis podem se constituir em uma
ameaça à paz internacional. Estã ameaça se acentua cada vez mais nos dias
de hoje, em que as guerras civis nada mais são do que um dos componentes
da guerra-fria. A guerra civil é um dos campos em que os dois grandes
blocos da sociedade interriãciõnãTse digladiam. Em conseqüência, há quase
sempre o risco de ela se transformar em uma guerra internacionaLRã~
verdade, em inúmeros casos a guerra civil e o conflito internacional se
misturam. Diante disto, há a ação da ONU em inúmeros casos. Como bem
salienta Linda Miller, as Nações Unidas procuram uma limitação de “toda
violência”. Por outro lado, a ONU tem entre os seus fins promover a
autodeterminação dos povos e grande parte das guerras civis são guerras
de independência.
Assim o art. 34 da Carta da ONU estabelece: “ O Conselho de Segurança
poderá investigar sobre qualquer controvérsia ou situação suscetível de
provocar atritos entre as Nações ou dar origem a uma controvérsia, a fim
de determinar se a continuação de tal controvérsia ou situação pode cons­
tituir ameaça à manutenção da paz e da segurança internacionais.” Ora,
este dispositivo -Confirm a o que foi dito acima, de que a ONU pode agir
se a guerra civil traz ameaça à paz internacional.
”A~Assembléia Gend7derTtro desta mesma orientação, tem feito resolu­
ções sobre guerra civil (1949, 1950 e 1965) em que condena a intervenção
de um Estado em guerra civil de outro Estado e considera esta intervenção
como crime contra paz.
A ONU tem “ participado” de várias^ guerras civis pelas mais diversas
maneiras: Indonésia. Argélia. Congo. Chipre, etc. Segundo Tom Farer as
funções da ONU em. guerras limitadas são: .a) centralizar o processo de
dedsão_em jrelação à situação: b) observar e_elaborar relatórios; c) admi-
nistrar-a ierritóiio;.A -facilitara mediação.
A OEA se preocupa apenas com a paz internacional e não tem poderes
para intervenção em guerra civil. Entretanto, em 1965, ela interveio na
guerra civil que existia na República Dominicana e chegou a criar a de­
nominada Força Interamericana da Paz na 10a Reunião de Consulta dos
Ministros das Relações Exteriores naquele mesmo ano. A FIP tinha por
finalidade “manter a segurança dos habitantes c a inviolabilidade dos
direitos humanos e estabelecer uma atmosfera de paz e conciliação que
permita o funcionamento de instituições democráticas”. Na realidade a
OEA não tem poderes para a criação de “forças” desta natureza, bem
como o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca do Rio de Janeiro
(1947) somente traia de conflitos internacionais.
Podemos mencionar a respeito do papel da OEA em guerra civil a
chamada Doutrina Johnson, formulada por este presidente na Universida­
de de Baylor (1965). A doutrina sustenta que a distinção entre guerra civil
e guerra internacional perdeu a sua validade e que a OEA deveria intervir
sempre que houvesse ameaça de comunismo na América. Os EUA, antes
da OEA, haviam feito uma intervenção na República Dominicana com o
fundamento de ali defender e evacuar os estrangeiros, evitar o comunismo
e o derramamento de sangue. A Doutrinajohnson apenas procurajustificar
este ato. Na verdade, a OEA só chegoü à República Dominicana para
ratificar o ato dos EUA. A intervenção dòs EUA na República Dominicana
visava no fundo evitar uma defecção na sua zona de influência. Por outro
lado, a não distinção entre guerra civil e guerra internacional é perigosa
porque pode internacionalizar certos conflitos. E de se assinalar que a
Doutrinajohnson não teve maior aceitação nas Américas.
A OUA não permite que os seus membros dêem assistência às partes
em luta em uma guerra intema. Ela só age para pacificar. Em 1967,
condenou os movimentos de secessão (Francis W odie).9 Zorgbibe assinala
que ela, ao proibir a subversão, transforma-se em uma Santa Aliança, vez
que os Estados que a integram adotam o sistema de partido único. Entre­
tanto, esta prática não é tão rígida como pode parecer esta afirmação. E.
Jouve assinala que a OUA apóia movimentos de libertação que ela reco­
nhece.
650A George Modelski, em uma relação de cem guerras internas desde
1900, observa que em 78 delas uma das partes foi vencedora (metade para
cada lado), que em 11 houve separação dos revoltosos (secessão), em seis
houve um acordo e cinco àquela época estavam sem solução. Salienta este
autor que para haver um acordo entre as partes é necessária a reunião das
seguintes condições: 1) “identidade das partes em luta”; 2) certa duração
da luta e 3) um “grau de comunicação” entre os contendores. Para Stephen
John Stedman entre 1900 e 1980 só 15% das guerras civis acabaram por
negociação, sendo que 85% terminou pela vitória de um lado.
A guerra civil, ao terminar, nem sempre faz com que os problemas do
Estado desapareçam, porque a situação ainda permanece tensa durante
algum tempo. Assim é comum os sabotadores, guerrilheiros, etc., perma­
necerem deslocados e procurarem apoiar as suas reivindicações na força.
O Estado fica durante algum tempo enfraquecido na sua posição interna­
cional. Por outro lado, a guerra interna muitas vezes permite que o Estado
forje a nação.

1583
651. A conclusão que podemos apresentar é que as guerras internas
perdurarão na sociedade internacional, enquanto esta estiver dividida em
dois blocos. Há interesses dos líderes destes blocos em fomentarem guerras
civis, seja diretamente ou mesmo indiretamente, quando impedem em
certos países determinadas mudanças pacíficas que possam abalar a sua
liderança. Esta afirmação não significa que toda guerra civil suija em
virtude de participação estrangeira, apenas quer dizer que grande parte
delas assim se origina. Enfim, a guerra-fria foi um estímulo à guerra civil
e esta por sua vez torna aquela ainda mais próxima de uma guerra “quen­
te”. Tal fato ocorre'pela participação das potencias estrangeiras em prati­
carem uma intervenção ou a resultante destar a comra-intervenção.
O ideal seria que o controle de qualquer guerra fosse sempre pela
ONU, entretanto, isto é ainda um simples ideal, uma vez que difícilmente
as grandes potencias “transferirão autoridade e poder” para as organiza­
ções internacionais (Richard A. Falk).
A guerra civil, em conseqüência da interdependência cada vez maior
entre os Estados, apresenta a tendência a se internacionalizar, tornando-se
cada vez mais matéria de Direito Internacional Público.
Não acreditamos que o desaparecimento do bloco comunista faça com
que desapareçam as guerras internas, tendo em vista a diferença brutal
entre ricos e pobres. Acreditamos, entretanto, que elas ocorrerão em me­
nor número e intensidade.
NOTAS

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— Guerra Civil Contemporánea. A ONU e o Caso Salvadorenho, 2001.
IB . Para este autor é a segunda geração de favelados que será revolucionaria.
Já Perelm an observa que no Brasil, em 1964, os favelados juntaram -se à classe
média. Para esta autora eles são conform istas no sentido de que têm consciência
de sua im potência.
IC . Até o X X Congresso do Partido Comunista da URSS se considerava que
o S° M undo estava fora da zona onde ocorreria a revolução. E neste congresso
que com a noção de “burguesia nacion al” uma aliança tem poraria com o prole­
tariado e os camponeses vai consagrar que a revolução deve ser estimulada. Admite
que a burguesia nacional não pode criar governos socialistas, mas pode instalar
g o v ern o s progressistas.
ID . Varios autores (Collingwood, A rendt) negaram existir a idéia de progresso
na Antiguidade, entretanto outros (Boas, Nisbet) afirmam que ela existiu, porque
os gregos e romanos devem ter tido consciencia do seu passado e medido o seu
progresso. Na Idade Média a idéia de progresfõ não existiu, bem com o no Renas­
cim ento, que era uma volta à Antiguidade greco-romana (Robert Nisbet — History
o f the Idea o f Progress, 1980).
IE . A mentalidade mítica faz parte da cultura política global. O mito visa
conservar urna cultura contra a desintegração e destruição. Ele pode se originar em
conceitos ou teorias racionalmente construidas, como o de revolução, marxismo,
etc. A atitude mítica (não diferencia o todo das partes) se distingue da atitude crítica
(supõe a distinção entre o sujeito pensante e o objeto pensado). A atitude mítica
tende a vera realidade histórica com o uma luta entre poderes.conflitivos. CarlSchmitt
falava da relação política com o sendo a relação entre o amigo e o inimigo. No
marxismo existe uma atitude mítica em varios autores. Assim, em 1918. Trotsky
escreveu: “o mais belo, o mais nobre que contêm as amigas religiões e a doutrina de
Cristo está encarnado na doutrina do socialismo... (vajnos) criar um paraíso real”
(v. M anuel Gracía-Pelayo — Los mitos políticos, 1981’). LassweII e Kaplan observam
que o m ito político serve para explicar e justificar práticas políticas.
IF . Para Alistair Hennessy os estudantes, sendo um “ g ru p o ’ de transição” ,
apresentam uma " ambivalência para com as questões sociais e políticas” . Entretanto
este autor salienta a politização de universidades latino-americanas em determina­
das fases.
IG . Alguns autores (B oris Fausto) negam “a existência de um a estreita vin-
culação entre o movimento e as chamadas classes médias” .
2. T am o assim é que o DI Universal não proíbe que individuos por iniciativa
própria (privada), nacionais de um Estado, participem de guerra em om ro Estado.
3. Em 1973 a Assembléia Geral já consagrara em sua Declaração que os
conflitos armados contra a dominação colonia! e governo racista era conflito
armado internacional.
3A. Tal fato não significa que a n o ss o ver a caracterização de guerra civil para
uma lula de independencia não possa ser apreciada pelo ONU com o pretenderam
algumas potencias sociais. Esta m atéria, devido à sua relevância, pertence hoje ao
campo internacional, e a luta contra o colonialismo é uma das grandes caracte­
rísticas do Dl Público dos dias de hoje. Na verdade, podemos considerar aqui
válido o uso da força em nome dos direitos que os territórios coloniais têm a serem
independentes e, por extensão, poderíamos invocar ainda o direito à legítima
defesa.
4. O Acordo de Genebra (1954) determ ina que “uma linha de demarcação
militar será fixada e de cada um dos lados da linha as forças das duas partes serão
reagrupadas" (art. I a), e a Declaração Final desta conferência salienta na $ua-
alínea 63 que: “a linha de dem arcação militar é provisória e que não deve em
hipótese alguma ser considerada um a fronteira política ou territorial” . Entretanto,
em sentido contrário tem-se argum entado: a) de fato eram dois Estados inde­
pendentes; b) em 1957 a URSS propôs que os dois Vietnames ingressassem sepa­
radamente l ia ONU; c) o Vietname do Sul era reconhecido por mais de 50 Estados
e é mem bro de inúmeras organizações internacionais especializadas na ONU; d)
o Vietname do Norte era reconhecido por mais de 20 Estados e é mem bro de
várias organizações internacionais. Na verdade, não me parece que tais argumentos
sejam suficientes para porem fim ao que foi convencionado em Genebra: ]) a
existência de fato da independência dos dois Vietnames não era suficiente para
criar um direito. É o aforismo "e x in iu riaju s non oritur” ; 2) a proposta da URSS
tentando consagrar a divisão apenas demonstra o que poderíam os cham ar uma
tendência política; 3) o reconhecim ento é ainda um ato em inentem ente político
(“Reconhecim ento é um ato político do governo",J. E. S. Faw cett); 4) o argumento
mais sério èr a o do ingresso em organizações internacionais. E ntretanto, nenhum
dos dois Vietnam es entrou para a O N U , isto é, para um a organização que ao
admitir um m em bro o está qualificando de soberano. As demais organizações mais
preocupadas com a cooperação internacional nem sempre exigem que os seus
membros sejam todos Estados, com o faz a ONU para os m em bros admitidos (ex.:
UNESCO, etc). E de se lembrar a opinião de J . H. W. Verzíjl: “A única conclusão
possível parece ser que o termo Estado, quando usado em tratados, não tem
qualquer sentido definido claram ente e que precisa ser verificado em cada caso
(...)” Contudo Verhoeven considera que os dois Vietnames eram pelo menos
Estados de fato. -
4A. Alguns autores modernos (R. Higgins) têm afirmado que o g o v ern o lega)
não pode reivindicar direitos de beligerantes a não ser que os revoltosos tenham
sido reconhecidos como beligerantes. A ineficácia do reconhecim ento com o be­
ligerantes, bem como o ultrapassamento das normas que o regulam, é assinalado
por Siotis, que observa não se respeitar nos dias de hoje o dever de neutralidade,
que é o principal dever do reconhecim ento como beligerantes.
5. Sob re responsabilidade na guerra civil, v. capítulo X X II.
5A. E interessante recordar que Su Tzu já pregava que os prisioneiros em
uma guerra civil podem ser bem tratados. Mao Tsé-tung, na guerra civil chinesa,
seguiu esta orientação.

1589
5B. Bishop prefere utilizar a expressão “n ã o com batente” em lugar da de
“população civil” . Alega este autor: muitos terroristas são civis.
6. Não se tem admitido com o tfãlído o fecham ento de portos em poder de
revoltosos (Padelford, Wiesse). Assim o fechamento de portos, em poder dos
revoltosos, pelo governo brasileiro, em 1930, não era legal. O mesmo procedimento
adotou o governo fecyando os pbrfos de São Paulo, em 1932, que estava em poder
dos revoltosos, mas neste caso ele estabeleceu um bloqueio de fato (com navios
e aviões, mas sem notificá-la), mas que foi amenizado ao ser perm itido em certos
locais o em barque e desembarque de passageiros, bem com o de malas postais (v.
Accioly).
6A. Sobre terrorismo, v. capitulo Extradição. Para citarm os um caso brasileiro
podemos lem brar que na guerrilha do Araguaia (início da década de 1970) não
houve, pelo menos por parte das forças govemaipentais, respeito às Convenções
de G enebra, havendo a pratica de torturas dos prisioneiros. O governo os deno­
minava de terroristas, mas na realidade eram guerrilheiros (v. Palm ério Dória e
outros — A Guerrilha do Araguaia," 1978). Pode-se acrescentar que a tendência
n o Brasil a cham ar os “rebeldes” de torristas e a luta de “guerra subversiva”
prende-se a uma série de razões: a) afastar a população civil dos rebeldes; b) utilizar
as forças armadas em função policial; c) evitar o reconhecim ento por parte de
terceiros Estados; d) tentar legitim ar o uso da tortura porque se trataria de uma
guerra; e) mobilizar a população para o lado governamental; etc.
6B. Nesta guerra ocorreu uma prática interessante a respeito dos agentes
diplom áticos, que acreditados ju n to a Madri foram no in ício da guerra para a
França (“Hendaye” e “St. Je a n de Luz”), mas continuando acreditados ju n to ao
governo de Madri, apesar de se encontrarem em território francês. A França,
m esmo sem a conclusão de qualquer tratado, outorgou a eles o privilégios e
imunidades diplomáticas.
7. É o asilo. Salienta R ougier q ue se o Estado pode con ced er asilo a criminoso
político individualmente, também o pode coletivamente. E de se recordar o grande
nú m ero de insubmissos e desertores norte-americanos durante a guerra do Viet-
nam e. Eles foram anistiados pelo Presidente dos EUA em 1974, desde que se
apresentassem até 31-1-75 e prestassem, durante durante dois anos, “serviço na­
cional em um corpo civil” . I
8. Este dispositivo convencional (art. 89) foi aplicado pelo Uruguai em relação
às aeronaves que lá se refugiaram após uma revolta fracassada contra Perón.
9. Sobre o pacto de Varsóvia, v. capítulo Intervenção.

1590
CAPÍTULO LXVIII

NEUTRALIDADE1

652 — Aspecto histórico; 653 — A neutralidade no continente ameri­


cano; 654 — O Brasil e a neutralidade; 655 — Definição e caracte­
rísticas; 656 — Direitos e deveres; 657 — Espécies; 658 — Não
beligerância; 659 — Declaração; 660 — Sanções.

652. A neutralidade, isto é, a abstenção de um Estado em guerra que


se realiza entre outros, já existia na Antiguidade como um simples fato.
Ela entretanto só nos interessa “a partir do momento em que a simples
circunstância de permanecer neutro um grupo social, diante da guerra
desencadeada entre outros, passou a ser um ato capaz de produzir, na
ordem jurídica, direitos e obrigações”.2 Ch. Rousseau afirma que a neu­
tralidade pode ser vista tanto como uma situação jurídica ou cómo um
comportamento político. Falk observava que era difícil a neutralidade em
um mundo bipolar, em que os Estados tendem a se filiar a um bloco.
Na Grécia a neutralidade “ começou pela neutralização de certos lu­
gares -^.santuários e templos” — e, também, de determinadas “pessoas”
(ex.: “sacerdotes que, acompanhando as tropas, conduziam o fogo sagra­
do” ). A neutralidade surgiu também pelo simples fato de abstenção em
uma guerra. O primeiro reconhecimento do status de neutralidade foi na
Paz de Nicias, em 422 a.C., na Guerra do Peloponeso (David J. Bederman).
Em Roma a neutralidade praticamente desapareceu, devido “ao alheamen­
to das guerras ser incompatível com a sua política imperialista”.
O comércio marítimo com as suas necessidades e por influência do
'Consulado do Mar é que começa a formação do instituto da neutralidade
juridicamente.
Outros institutos, como o “fridland” (terra da paz), fazem com que a
neutralidade não seja apenas marítima, mas também terrestre. O “fridland”
foi instituído pela Noruega e consistia nos beligerantes considerarem um
determinado território como local de asilo, “e que servia de refúgio, no
meio das hostilidades, para os estrangeiros e para os débeis” .3

1591
No século XVII afirma-se a soberania cios Estados e a doutrina da
guerra justa é abandonada. 0 “Eslado é soberano para fazer a guerra sem
analisar a sua justiça. Em conseqüência, “reconheceu-se também que os
terceiros não tinham que se pronunciar acerca de justiça da guerra” (Po-
Iitis). Os terceiros podiam decidir discricionariameme a sua participação
ou não em uma guerra.
Nos séculos XIV ao XVIII surge a neutralidade convencional. Nos
tratados de aliança passa a existir uma cláusula “em que cada um dos
contratantes se obriga a não ajudar, em caso de guerra, o inimigo do outro
e impedir que esse inimigo receba auxílio”.
Na Guerra dos Trinta Anos a neutralidade foi usada “e desempenhou
decisivo papel diplomático e militar”. Surgem aí as primeiras declarações
unilaterais de neutralidade.
Hugo Grotius, no “De júre belli ac pacis” (1625), é quem escreve “o
primeiro ensaio sistemático da doutrina da neutralidade”. Sustenta Grotius
que “o dever do neutro não é igual em relação a ambos os beligerantes,
se um deles ampara uma causa evidentemente injusta. Neste caso, o dever
decorrente da neutralidade consiste em nada fazer para o aumento da
força daquele cuja causa é má...”. Depois de Grotius, entre os clássicos,
quem tratou da neutralidade foi Bynkershoek, em “Quaestionum Juris
Publici” (1737). Esse autor defende a imparcialidade dos neutros perante
as partes em luta e o dever de não fornecer assistência a elas.
As palavras “neutralidade” e “neutro” foram usadas pela primeira vez,
entre os clássicos do Dl, por Wolff, em 1749, na sua obra “Jus Gentium
methodo scientifica petractatum”. Anteriormente as expressões utilizadas
eram várias: “non hostes” (Bynkershoek),," paca ti” (Grotio), etc. Entre­
tanto, o adjetivo “ neutralis” significando “ estranho” já existe em um de­
creto francês de 1408 (A. Miele). Para Hermes Marcelo Huck a palavra
parece ter origem em Neumayr de Ramsala, em 1620.
No século XVIII vão sendo elaboradas normas referentes à neutrali­
dade marítima. Os EUA fazem a sua independência e passam a defender
a neutralidade. Assim, em 1794é promulgado o Neutrality Act, que “inau­
gura..., por via legal, o sistema de declaração unilateral de neutralidade”.
Formaram-se as Ligas de Neutralidade Armada em 1780 e 1800. Como se
pode observar, a neutralidade é um instituto desenvolvido pelas potências
marítimas (Meyrowitz).
No século X IX novas normas vão sendo elaboradas, como na Confe­
rência de Paris (1856). No final da Guerra de Secessão norte-americana
surgiu na arbitragem internacional o caso Alabama. O tratado entre EUA
e Inglaterra para submeter este caso a arbitragem estabeleceu três regras
para'guiar os árbitros, que passaram a ser conhecidas como “regras de
Washington”: a) “o governo neutro é obrigado a usar de toda a vigilância
para impedir, nas águas sob sua jurisdição, o equipamento e o armamento
de qualquer navio que possa ser suspeitado de se destinar a operar contra
uma potência com a qual o dito governo esteja em paz..."; b) “o governo
neutro é obrigado a não permitir aos beligerantes que se entreguem a atos
de hostilidade dentro de suas águas jurisdicionais, ou delas se sirvam para
o fim de renovar ou aumentar seus suprimentos militares ou de armas, ou
de recrutar hom ens"; c) um governo neutro é obrigado a exercer a vigi­
lância necessária em seus portos e águas e sobre todas as pessoas dentro
da sua jurisdição para impedir a violação das obrigações indicadas.
A neutralidade se desenvolveu (Oppenheim-Lauterpacht) pelo seguin­
te: a) “a atitude dos EUA”; b) a neutralidade permanente da Suíça e da
Bélgica; c) a regra de 1856: "navio iivre, mercadorias livres”; d) o respeito
aos neutros por parte dos beligerantes com medo de transformá-los em
inimigos/ -
Em 1899 a convenção sobre (eis e costumes da guerra terrestre tem
dispositivo sobre pessoas internadas em Estado neutro.
Em 1907, na Conferência de Haia, é concluída uma convenção “rela­
tiva aos direitos e deveres dos Estados e das pessoas neutras em caso de
guerra terrestre”. Foi ainda concluída uma convenção para a criação de
um Tribunal Internacional de Presas, bem como uma relativa a certas
restrições ao exercício do direito de captura na guerra marítima.
Em 1909, na Conferência Naval de Londres, trata-se da assistência
hostil, etc. Enfim, de aspectos da neutralidade marítima.
Na l à e 2- Guerras Mundiais consagram-se inúmeros princípios da
neutralidade.
A partir da SDN começou-se a elaborar a idéia de uma “neutralidade
benevolente”, em favor do Estado que havia sofrido uma agressão. A SDN
consagrou no seu Pacto que uma guerra em violação aos preceitos ali
estabelecidos (a não submissão da controvérsia a solução judiciária ou
arbitrai ou a sua não submissão ao Conselho) era uma guerra contra todos
os membros. Estabelecia-se assim uma solidariedade no campo internacio­
nal.'Eptre tanto, o Pacto da Liga não foi respeitado.
O Pacto Briand-Kellogg (1928), ao estabelecer a condenação do re­
curso à guerra, levantou a questão da existência ainda da neutralidade,
vez que a guerra passava a ser um ilícito. Entretanto, predominou a tese
da existência ainda da neutralidade.4
Na Carta da ONU se estabeleceu uma solidariedade entre os Estados,
mas a neutralidade ainda subsiste (v. capítulo ONU).
O que podemos concluir é que a guerra, sendo um ilícito, a tendência
é de desaparecer a neutralidade, uma vez que não se pode permanecer
passivo perante um ilícito. O dever de imparcialidade não seria mais in­
dispensável para caracterizar a neutralidade. Haveria o que Cohn deno­
minou de neoneutralidade.
653. No período entre as duas guerras mundiais no continente ame­
ricano se desenvolveu “a tendência para uma neutralidade continental”
(Linneu de Albuquerque Mello).

1593
Na Conferencia de Havana (1928) foi concluída lima convenção sobre
neutralidade marítima “que procurou completar e regular aspectos da
questão” não resolvidos na Conferência de Haia de 1907.
No tratado antibélico do Rio de Janeiro de 1933 foi admitida a neu­
tralidade. Admitiu-se também aqui a neutralidade “benevolente a favor do
agredido e contra o agressor” (Accioly).
Aidéia.de uma neutralidade continental foi consagrada na I a Reunião
de Consulta dos Ministros das Relações Exteriores (1939), quando se apro­
vou a Declaração Geral de Neutralidade e a zona de segurança continental.
Foi ainda criada a Comissão Interamericana de Neutralidade, que se reuniu
pela primeira vez em 1940.
654. No Brasil a primeira declaração formal de neutralidade foi em
1854 na guerra entre França e Inglaterra de um lado e a Rússia, do outro.
Em 2 9 /4 /1 8 9 8 o Brasil promulgou normas detalhadas de neutralidade,
quando da guerra Hispanoamericana, em urna circular do Ministério das
Relações Exteriores aos Presidentes e Governadores dos Estados e Minis­
térios.
Na Ia Guerra Mundial traçamos as nossas regras de neutralidade nos
Decretos n9s 11.037, 11.093, 11.141 e 1L209-A, todos de 1914.
Na 2- Guerra Mundial diversos diplomas legais foram promulgados,
tais como os Decretos-leis n9s 1.561, de 1939; 2.360, de 1940; 2.947, 2.985
e 2.986, de 1941.
655. A neutralidade pode ser definida como sendo a “situação jurídica
e política de um Estado que, em presença de urna guerra entre dois ou
vários outros Estados, permanece fora desta guerra, se abstendo de assistir
a um ou a outro dos beligerantes” (Dictionnaire de la Terminologie du
Droit International).0
A neutralidade tem como características o seguinte: a) é um ato dis­
cricionário do Estado; b) cria direitos e deveres na ordem internacional.
E preciso salientar que o direito de neutralidade é hoje “incerto” e
mesmo “caótico” (Kunz, Schindler). Entre os fatos que para isto contri­
buíram, podemos mencionar o fenómeno da “guerra não declarada”, isto
é, a existencia de guerras de fato que não são consideradas como “guerras”
no D1P (ex.: Vietname). Sobre estes conflitos podemos apresentar algumas
das conclusões de Schindler a) um Estado beligerante que nega a exis­
tencia de guerra não pode exigir a neutralidade de terceiros Estados; b)
o terceiro não está obrigado à neutralidade mas pode se declarai' neutro
e os beligerantes deverão respeitar isto. Entretanto, a declaração de neu­
tralidade só pode ser feita tendo em vista a C¡irta da ONU, etc. A neutra­
lidade só funciona de modo plano quando há uina guerra internacional.
Para Schindler, entre a guerra e a neutralidade, há, atualmente, situações
intermediárias, como no caso da aplicação de medidas económicas. A
neutralidade, conforme o DIP, tem urna grande conotação política.
fi56. D c u m m o d o geral p o d e m o s a ssin a la r que a n e u tra lid a d e o rig in a
dois deve res: o d e a b ste n çã o e o d e im p arcialid ad e (v. R o u sse au ).
O Eslado neutro deve se abster de auxiliar qualquer uma das partes
em luta. seja de forma direta ou indireta (ex.: ‘ por particulares com sua
tolerância").6 Este dever se originou no século XVIII. Sendo defendida
por Bvnkershoek e Vattel, e foi definitivamente consagrado no século
XIX.
O Estado neutro deve ser imparcial, isto é, deve dar aos beligerantes
um tratamento igual. A simples simpatia por uma das partes em luta não
é violação da neutralidade. E a neutralidade benevolente. Os direitos do
neutro podem ser resumidos nos seguintes: 1) o seu território é inviolável;
2) ele tem liberdade de relações comerciais seja com outros nentros, seja
cóm os beligerantes.
Podemos concluir que a neutralidade tem o seu fundamento na sobe­
rania do Estado. Entretanto, com as restrições que são impostas cada vez
em maior número à soberania estatal, a neutralidade deverá desaparecer
no futuro em nome da solidariedade internacional, co m o já existem indí­
cios (ex.: Carla da ONU).
657. A neutralidade pode se apresentar sob diferentes formas:'

a) Ela pode ser voluntária (decorre de ato discricionário do Estado)


e convencional (quando é determinada em tratado).
b) Apresenta-se simples (quando o Estado não faz a mobilização de
suas forças armadas) e armada (quando faz a mencionada mobili­
zação para defender a sua neutralidade).
c) Existiria ainda a neutralidade qualificada, seria aquela em que o
neutro estaria obrigado a uma imparcialidade igual em relação aos
beligerantes, mas, pelo contrário, deveria distinguir o agressor da
vítima. Ela teria sido introduzida no Pacto da SDN, n o P acto Briand-
Kçllogg e no tratado antibélico do Rio de Janeiro.
d) Ela pode ser permanente (é aquela em que o Èstado se compromete
a ^er sempre neutro)8 e temporária ou acidental (é aquela em que
o Estado pode a qualquer momento abandoná-la).
e) Apresenta-se ainda-como geral (“abrange todo o território de um
Estado”) e parcial (abrange apenas uma parte do território).0
f) Seria ainda: neutralidade perfeita (aquela'-em que são observadas -
as normas da neutralidade) e imperfeita (quando o neutro dá as­
sistência direta ou indireta a uma das partes em luta “em virtude
de compromissos assumidos anteriormente à guerra e sem que esta
tenha sido diretamente visada”). A neutralidade imperfeita foi co­
mum no século XVII] e ainda se manifestou no início do X X .
g) A neutralidade de fato (são Estados que fazem declarações de guerra,
mas não participam das hostilidades) e neutralidade de direito (não
é feita a declaração de guerra nem participam das hostilidades).

1595
Na verdade, a neutralidade imperfeita é unia incongruência com o
estatuto da neutralidade, vez que viola uma de suas normas mais impor­
tantes, que é o dever de imparcialidade. Entretanto, a partir do Pacto da
SDN e Carta da ONU ela ressurge de certo modo e passa a ser confundida
com a neutralidade qualificada.10 . -
658. Deve ser feita a distinção entre neutralidade e não beligerância.
Assim a Itália, logo no início da 2a Guerra Mundial, afirmou que adotaria
a posição de “não beligerancia”. Este conceito se confunde com a neutra­
lidade imperfeita (Accioly). Ela é a neutralidade benevolente em relação
a uma das partes em luta.
Os autores (Castrén) têm considerado que a expressão “não belige­
rante” é meramente política.11
Na verdade a “não beligerância” ou neutralidade imperfeita significa
que a “neutralidade é boje .discriminatória”, tendo em vista que o neutr.o
só pode dar assistência “à vítima de agressão” (Mevrowitz). A expressão
“potências não beligerantes” só foi usada na 3- Convenção de Genebra
de 1949, para designar “todas as situações de fato, todas as conjunturas
diplomáticas que podem ser criadas no curso de um conflito armado
internacional, sem levar em consideração a qualificação jurídica que um
Estado julga conveniente dar ou não dar a sua participação ou a sua não
participação”. Entretanto, isto “não significa que o Direito Internacional
acolheu a instituição de “não beligerância” (Meyrowitz).
Pode-se observar que entre 1939 e 1945 Os Estados adotam uma série
de atitudes intermediárias entre a participação efetiva na guerra e a neu­
tralidade. Os Estados têm considerado a neutralidade como facultativa, o
que é contrário ao Dl.
659. Normalmente os Estados, ao adotarem o estatuto da neutralidade
perante um conflito, o fazem por meio de uma declaração. Nesta decla­
ração são fixadas as regras de neutralidade adotadas pelo Estado.
E de se assinalar que para a existência da neutralidade não há neces­
sidade da declaração, porque aquela existe desde que o Estado não parti­
cipe das hostilidades ou, ainda, não faça declaração de guerra.
660. As normas internacionais de neutralidade, quando violadas, fazem
surgir a responsabilidade internacional do autor da violação e o seu dever
de reparação.
Na prática internacional os Estados beligerantes autores das violações
têm se recusado a submeter estes casos de responsabilidade à apreciação
de tribunais internacionais. O que faz Rousseau assinalar que a responsa­
bilidade só existe “na medida em que eles previamente aceitaram” (p. ex.:
em um tratado). Quanto às sanções do Dl Comum, são de difícil aplicação
por parte do neutro, por causa do risco de constituírem uma violação do
seu dever de imparcialidade. A sanção é praticamente moral: opinião
pública. Já quando a violação das normas internacionais é feita por parte
dos neutros, os beligerantes adotam medidas de represália (ex. ^consideram

1596
o le m ió ri o neutro como território beligerante) ou, ainda, aplicam certos
direitos que possuem, por exemplo, na guerra marítima, como o apresa-
memo de contrabando de guerra.
No locante â reparação dos danos de guerra realizados pelos belige­
rantes aos neutros, só há quando um tratado a consagra, e a forma mais
benéfica, não reconhecida por todos, é a de assimilar os cidadãos neutros
aos nacionais.
Na verdade, os neutros não conseguem nunca fugir completamente
aos efeitos da guerra. Assim, além de danos que lhe são provocados dire­
tamente, eles sofrem as repercussões econômicas da guerra direta (geral­
mente os beligerantes restringem as exportações para os.neutros com medo
de que venham a cair em mãos do inimigo) e indiretamente.
Os não participantes podem aplicar represálias ou retaliações a quem
os ofender.

1597
NOTAS

1. Linneu de Albuquerque Mello — Gênese c Evolução da Neutralidade, 1943;


Georgh Cohn — Neo-Neutrality, 1939; Richard KJeen — Lois et Usages de la
Neutralité, 2 vols., 1898-1900; Isidro Fabela — Neutralidad, 1940; idem — Neu-
tralité, 1949; Sidney Shopfer — Le principe juridique de la Neutralité et son
évolution dans l’histoire du droit de la guerre, 1894; Charles-Marie Chaum om —
La conception américaine de la neutralité, 1936; F. Bottié — Essai sur le Genése
et rÉvoluiion de la Notion de Neutralité, 1937; NevUralily, its History, Econom ics
and Law, 1935-1936, vol. 1 — The Origines — Phillip Jessup and Francis Deak;
vol. II — The Napoleonic period — W. Alison Phillip e Arthur H. Peede: vol. 111
— T he world war period — Edgar Turlington; vol. IV — Today and tomorrow —
Phillip Jessup; Nicolás Politis — La neutralité et la paix: 1935; W. P. J . A. Van
Royen — Analyse du problém e de la Neutralité au cours de l’évolution du droit
des gens, 1938; Robert A. Divine — The Illusion o f Nemrality, 1962; Titus Romar-
nicki — The Place o f Neuirality in the Modern System o f International Law, in
RdC, 1952, vol. I, t. 80, págs. 395 e segs.: D. Schindler — Aspects contem potains
de la neutralité, in RdC, 1967, vol. II, t. 121, págs. 221 e segs.; Henri Meyrowitz
— Le Principe de l’Égalité des Beligérants devant le Droil de la Guerre, 1970,
págs. 3 1 1 e segs.; Alberto Miele — L’Estraneitá ai Confliti Armati secondo il Diritto
Internazionale, 2 vols., 1970; J . Freund — L ’Essense du Politique, 1965, págs. 580
e segs.; Ulrich Sch eu ner — Neutrality in Public International Law Today, in Law
and State, vol. 7, 1973, págs. 53 e segs.
2. Todo este inciso é tirado da obra de Linneu de Albuquerque Mello. O
histórico será com plem entado ao estudarmos cada instituto ou norma de neutra­
lidade. Pretendemos aquí dar uma visão geral.
3. Schopfer considera que a neutralidade teria surgido “das guerras intestinas
do Santo Império Rom ano e das guerras civis crônicas da cristandade” . A “ pequena
nobreza e a burguesia nascente” adotaram uma neutralidade para evitar o seu
empobrecimento. O mesmo aconteceu com os pequenos Estados, que passaram
a ser “imparciais" em relação aos conflitos dos grandes.
4. O “Lend Lease B ill” (1941) dos EUA só pode ser explicado dentro do
quadro da neutralidade se levarmos em consideração que a Alemanha havia em­
preendido uma guerra de agressão. Fora desta consideração ele violaria as leis da
neutralidade.
5. A origem da palavra neutralidade não é das mais antigas. Na Grécia se
usavam expressões com o “Ficar quieto”, “ não ser de nenhuma das partes", “a
parte que ocupa posição intermediária”, que significavam a “abstenção nas hosti­
lidades” . Os rom anos usavam, entre outras, a de “ medii” . “A palavra ‘neutralitas’
surge, apenas, na Idade Média. Foi Froissarl (1337-1410) quem primeiro a utilizou
no sentido m oderno” (Linneu de Albuquerque M ello).
6. Tem-se considerado a neutralidade com o sendo uma relação de Estado a
Estado. Os neutros não têm sempre desejado reprim ir as violações da neutralidade
por seus particulares. Tem-se considerado que eles empreendem uma “aventura”
(“noção de aventura” ) sob sua própria responsabilidade. Em conseqüência, o
Estado neutro a que estes indivíduos pertencem deve tirar-lhes a sua proteção.
Caberá ao Estado lesado agir contra eles (Rousseau).
7. V. Accioly e Oppenheim-Lauterpacht.

1598
8 . v. c a p ít u l o X X .
9. A neutralidade tende a ser seinpre geral e quando ela se refere apenas a
determinado territorio (parcial) o melhor seria falarmos em neutralização (v.
capítulo X X ). *-
10. Oppenlieim -Lauterpacln falam em neutralidade qualificada ou imperfeita
e não adotam a distinção feita por Accioiy, que seguimos. Esta distinção parece-nos
ter valor meramente histórico.
11. Guggenheim considera que a “ não beligerância” permite ao neutro ajudar
a uma das partes em lula, o que para nós já seria o abandono da neutralidade,
assinala entretanto com razão o intem acionalista suíco que ela é uma “etapa
preliminar para o estado de gnerra” .

1599
CAPÍTULO LXIX

NEUTRALIDADE TERRESTRE1

661 — Introdução; 662 — Deveres dos Estados e pessoas neutras; 663


— Deveres dos beligerantes; 664 — O internamento de beligerantes e
feridos em território neutro.

661. A neutralidade, tendo um status jurídico ao lado do político, gera


uma série de deveres que os Estados devem respeitar nos diferentes teatros
de guerra terrestre, marítimo e aéreo. Assim, a neutralidade terrestre
significa o conjunto de deveres e conseqüentes direitos que o status de
neutro cria na guerra terrestre.
662. Os deveres dos neutros decorrem daqueles dois deveres que vimos
no capítulo anterior: o de abstenção e o de imparcialidade.
O dever de abstenção pode ser resumido no seguinte: deve abster-se
de participar de modo direto ou indireto na guerra. O neutro tem o dever
de não permitir: a) a passagem de comboio de munições e víveres no seu
territorio; b) a formação de corpos de combatentes ou a instalação de
eseritórios de alistamento em seu territorio; c) a instalação de estação
radiotelegráfica ou qualquer outro aparelho “de com unicaçãoxom forças
beligerantes”; d) a utilização da estação mencionada anteriormente pelos
beligerantes “com um fim exclusivamente militar e que não tenha sido
aberta ao serviço da correspondencia pública”.
O Estado neutro só é obrigado a punir os atos contrarios à neutralidade
que “ tenham sido cometidos em seu próprio território”.
Não constitui violação do dever de abstenção do Estado neutro o
seguinte: a) repelir “pela força as violações da sua neutralidade'’ ; b) “a
exportação ou o trânsito por conta de um ou de outro beligerante, de
armas, munições e, em geral, de tudo quanto possa ser útil a um exército
ou uma esquadra”; c) pode permitir, por parte dos beligerantes, a utilização
“dos cabos telegráficos ou telefônicos, assim como dos aparelhos de tele-

1601
graiia sem fio, que) fie siia propriedade, quer da propriedade de empresas
ou particulares” ; d) como já vimos as potências neutras têm o devei de
imparcialidade; em conseqüência, se nos itens b e celas tomarem medidas
restritivas, estas “deverão ser uniformemente aplicadas por ela(s) aos be­
ligerantes” . Também não constitui violação da neutralidade o desempenho
da função de “potência protetora” , conforme está previsto na Convenção
de Genebra de 1949. Pode-se ainda afirmar que a troca de prisioneiros
em território neutro não significa violação da neutralidade, sendo de se
recordar que quando isto ocorre é porque os beligerantes concordaram.
As pessoas neutras não estarão cometendo atos em favor dos belige­
rantes segundo a Convenção de Haia (1907) relativa aos direitos e deveres
das potências'e. das pessoas neutras em caso de guerra terrestre nos casos
de: a) “os fornecimentos feitos ou os empréstimos concedidos a um dos
beligerantes, contanto que o fornecedor ou o prestamista não habitem o
território da outra Parte nem o território ocupado por ela, e que os
fornecimentos não provenham desses territórios”; b) “os serviços prestados
em matéria de polícia ou de administração civil".
As pessoas neutras (“nacionais de um Estado que não participa da
guerra”) não podem: a) “cometer atos hostis contra um beligerante”; b)
“cometer atos em favor de um beligerante, especialmente... voluntaria­
mente prestar serviços nas fileiras da força armada de uma das Partes”.2
As pessoas que cometerem tais atos não podem “prevalecer-se de sua
neutralidade”. O tratamento dado às pessoas neutras neste caso pelo Estado
beligerante contra o qual ele praticou tais atos não poderá ser mais rigoroso
do que o dado, “pelo mesmo fato, a) um nacional do outro Estrado
beligerante”.
663. Os deveres dos beligerantes estão enumerados na citada Conven­
ção de Haia: a) “o território da potência neutra é inviolável”; b) “é proibido
aos beligerantes fazer passar através do território de uma potência neutra
tropas oir comboios, quer de munições, que de víveres”; c) “instalar n o
território de uma potência neutra uma estação radiotelegrãfica ou qualquer
aparelho destinado a servir como meio de comunicação com forças beli­
gerantes”; d) “utilizar qualquer instalação desse governo estabelecido por
eles antes da guerra no território de potência neutra com um fim exclu­
sivamente militar e que não tenha sido aberto ao serviço da correspon­
dência pública”; e) n ão pode formar em território neutro corpõ de com­
batentes nem criar escritório de alistamento; j) o beligerante não pode
requisitar e utilizar material de estrada de ferro proveniente de Estado
neutro a não ser que haja “necessidade imperiosa”; logo que for possível
será devolvido à potência neutra e deverá ser paga uma indenização.3
664. A já mencionada Convenção de Haia regulamentou nos artigos
11 a 15 os beligerantes internados e os feridos cuidados em território dos
neutros.
As tropas beligerantes que penetrarem em território dos neutros serão
internadas. Os oficiais delas poderão ficar em liberdade, mas deverão
assumir “o compromisso sob palavra de não abandonarem o território
neutro sem autorização". Os gastos com o internamento serão pagos pelo
beligerante a que a tropa pertencia. Podendo, entretanto, os neutros for­
necer víveres, vestuários, etc., e serem reembolsados apenas após n paz.4
Os prisioneiros de guerra que penetrarem em território neutro fugidos
de uma das partes beligerantes serão deixados em liberdade. Se tais pri­
sioneiros ficarem em território neutro, este “poderá fixar-lhes uma resi­
dência". Acrescenta a convenção: “a mesma disposição é aplicável aos
prisioneiros de guerra conduzidos por tropas que se refugiarem no terri­
tório da potência neutra” ,5 O neutro pode autorizar a passagem no seu
território de feridos e enfeiTnos dos beligerantes, mas os trens que os
conduzem não poderão levar pessoal ou material de guerra. “ Os feridos
ou enfermos conduzidos nessas condições ao território neutro por um dos
beligerantes, e que pertencerem à parte contrária, deverão ser guardados
pela potência neutra de maneira a não poderem de novo participar das
operações bélicas. Esta potência terá os mesmos deveres quanto aos feridos
ou enfermos do outro exército que lhes forem confiados”.6 Estabelece,
finalmente, a Convenção de Haia, que se aplica a Convenção de Genebra
“aos doentes e feridos internados no território neutro”. O mesmo princípio
está consagrado no art. 4° da Convenção de Genebra (1949) para a me­
lhoria da sorte dos feridos e enfermos dos exércitos em campanha, acres­
centando “assim como aos mesmos do pessoal sanitário e religioso, per­
tencentes às forças armadas das Partes em luta, que forem recebidas ou
internadas em seu território” (neutro).

1603
NOTAS

1. (V. bibliografia do capítulo LXVIII); W. G aracham ine— Droits et Devoirs


des Neutres dans ¡a Guerre sur Terre. 1910; Isidoro Ruiz Moreno — Guerra
Terrestre y aérea, 1926, págs. 279 e segs.; Giuseppe Ottolenghi — II Rapporto di
NeuiraJilà, 1907.
2. O Estado neutro não será responsabilizado, estabelece ainda a mesma
convenção, “pelo fato de indivíduos passarem isoladamente a fronteira para se
colocarem a serviço de um dos beligerantes".
3. O mesmo direito com idêntica obrigação têm os neutros em relação ao
material de estrada de ferro proveniente do território de Estado beligerante.
' 4. Trata-se aqui do asilo dado a tropas beligerantes. Tem sido indagado se ele
deve ser dado aos desertores e a resposta tem sido no sentido afirmativo, vez que
a deserção é crim e m ilitar e não passível de extradição. Castrén assinala que sendo
eles admitidos, não deverão ser internados.
5. Os neutros, de um modo geral, não impedem que os prisioneiros libertados
por se encontrarem em território neutro partam de seu território.
6. A convenção não se justifica inteiram ente neste dispositivo vez que os
prisioneiros ficam livres para sair do seu território sem restrição, e os feridos e
enfermos não gozam desta mesma liberdade sem qualquer justificação.

1604
CAPÍTULO LXX

NEUTRALIDADE MARÍTIMA1

665 — Deveres e direitos dos neutros; 666 — Direito de angaria; 667


— Direito de presa; 668 — Zona de Segurança Continental e zona de
exclusão; 669 — Medidas económicas; 670 — Bloqueio; 671 — Con­
trabando degueira; 672 — Assistência hostil; 673 — Direito de visita.

665. Os direitos e deveres dos neutros na guerra marítima estão con­


substanciados em convenção concluída em Haia concernente aos direitos
e deveres das potências neutras em caso de guerra marítima em 19072 e
na Convenção Pan-americana de Havana sobre neutralidade marítima
(1928).
Os deveres e direitos se entrelaçam e, com o já dissemos, um representa
o reverso do outro. Daí não ser sempre muito fácil a distinção entre uns
e outros. Entre os deveres dos neutros podemos mencionar: a) “impedir
em sua jurisdição o equipamento ou o armamento de quaisquer navios,
que ele tenha motivos razoáveis para acreditar que sejam destinados a
realizar ou a concorrer a operações hostis contra uma potência com a qual
estiver em paz”; b) o mesmo dever existe quando o navio for “adaptado
no todo ou em parte, aos usos de guerra” em território neutro; c) deve
aplicar aos beligerantes as normas que tiver baixado a respeito de “admissão
em seus portos, enseadas ou águas territoriais, dos navios de guerra beli­
gerantes ou de suas presas";3 d) o neutro deve libertar a presa que for
conduzida ao sei) território fora das condições estabelecidas (v. mais adian­
te); e) dever de “exercer a vigilância” para impedir em suas águas territo­
riais violações do que é estipulado na convenção; f) não pode entregar
“ direta ou indiretamente” navios, munições ou material de guerra aos
beligerantes.4 ' -
Quanto aos direitos, a Convenção de Haia estabelece, ao lado dos
deveres citados acima, os seguintes: a ) os neutros têm o direito de não

1605
lerem as suas águas territoriais violadas pelos beligerantes; b) nas suas águas
não pode liaver direilo de captura nem exercício do direito de visita; r)
as águas neutras não podem servir de base para operações militares dos
beligerantes; d) pode permitir “a exportação ou o tránsito, por coma de
um ou de outro dos beligerantes, de armas, munições em geral, de tudo
quanto puder ser útiJ a um exército ou a uma esquadra”"’ e) impedir o
acesso às suas águas territoriais do navio beligerante que não se conformar
a os regulamentos baixados pelos neutros; f) a “simples passagem” por
águas territoriais neutras “de navios de guerra e das presas dos beligeran­
tes” não compromete a neutralidade do Estado; g) os navios de guerra
dos beligerantes não podem permanecer em águas neutras por mais de
24 horas,6 podendo haver prorrogação em caso de áVjiria ou devido ao
estado do mar;6' h) o número máximo de navios de guerra dos beligerantes
em um dos portos neulros não deve exceder de três, a não ser que o
neutro estipule algo diferente; i) quando os navios das duas partes belige­
rantes estiverem em porto ou baía neutra, o prazo de 24 lloras deve
transcorrer entre a partida de um e de outro navio; a ordem da partida é
dada pela ordem de chegada; j ) os navios beligerantes não podem com­
pletar ou aumentar armamento e equipagem em águas neutras; só podem
se abastecer “para completar o seu abastecimento normal do tempo de
paz”; assim só podem “receber combustível para chegar ao porto mais
próximo do seu país”; k) os navios beligerantes que tomarem “combustível
no porto de uma potencia neutra, não podem renovar o seu abastecimento
senão três meses depois num porto da mesma potência”; l) se o navio
beligerante não deixar o porto neutro, onde não tènha o direito de ficar,
após notificação do Estado neutro, pode ser retido juntamente com os
seus oficiais e tripulação; m) “uma potência neutra pode permitir que
navios de guerra dos beligerantes se sirvam de seus práticos munidos de
patente”.
A Convenção de Haia (1907) relativa à colocação de minas submarinas
automáticas de contato afirma que os Estados neutros podem “colocar
minas automáticas de contato diante de suas costas” devendo “tomar as
mesmas precauções que as impostas aos beligerantes” (v. capítulo Guerra
Marítima). Deverão eles dar aviso à navegação do local onde colocaram
tais minas.
O neutro pode adotar medidas restritivas também em relação aos
navios mercantes dos beligerantes para evitar a violação da sua neutrali­
dade. Evitar, por exemplo, que eles recebam provisões superiores às suas
necessidades para irem depois abastecer’navio de guerra, transmitir pelo
telégrafo informações aos navios de guerra, etc.
O neutro tem o direito de manter relações diplomáticas e consulares
com os beligerantes, bem como de nestes proteger os seus nacionais.''
A Convenção para a melhoria da sorte dos feridos, enfermos e náu­
fragos das Forças Armadas no Mar (Genebra, 1949) regula, nos arts. 15 e
17, o in t e r n a m e n t o e m E stad o n e u t r o d e fe r id o s e e n fe r m o s n a g u e r r a
m a rítim a , m a s só a t in g e os nav ios d e g u e r r a , v ez q u e e la n ã o r e g u la m e n to u
o s navios m e r c a n te s .
666. O d ire ito d e an g aria p od e ser d e fin id o co m o sen d o urna e sp e c ie
de requisição fe ita p o r um dos b e lig e ra n te s em relação a b ens p e r te n c e n te s
aos neutros, q u e se e n co n tra m n o te rritó rio d e q u em e x e rc e este d ire ito
ou em te rritó rio o cu p a d o .8 A tu alm en te te m sido en ca ra d o c o m o sen d o
um d ireito ta m b é m d os n eu tro s.9
O objeto deste direito são os navios e aeronaves neutras, bem como
os seus carregamentos. Ele não abrange “ os s e r v i ç o s pessoais das tripulações
se são estrangeiras" (Colombos).
Ele se distingue do embargo porque neste há a apreensão de bens
sem a sua utilização, enquanto na angária eles são utilizados por quem os
requisitou.
Da requisição propriamente dita, segundo Fauchille, ele se distingue,
porque na angária tem-se por objeto bens que se encontram'de passagem
no território do Estado, enquanto a requisição propriamente dita tem por
objeto bens que se encontram em estreito contato com o território.
O fundamento deste direito tem sido considerado a soberania territo­
rial do Estado10 e a sua necessidade urgente de utilização do bem.
O histórico deste direito é longo, vez que ele remonta à Antiguidade.
A própria palavra tem a sua origem no persa e no grego “aggareia”
(servidão).11 Parece que a sua origem remonta aos persas e teria existido
na Grécia e em Roma. Foi consagrado na Idade Média, quando os belige­
rantes com esquadras insuficientes obrigavam as embarcações dos comer­
ciantes neutros que estavam em seus portos juntamente com as suas tri­
pulações a transportar tropas, munições, etc., mediante pagamento adian­
tado. Desenvolveu-se esta prática com Luís XIV. No século XVII os Estados
começaram a concluir tratados em que renunciavam ao direito de angária
em relação aos navios do outro contratante. Diante disto ele desaparece
no século XVIII. Entretanto, no final deste século e no XIX vários tratados
foram concluídos prevendo o direito de angária e uma indenização no
caso de ele ser exercido.
A maioria dos autores (Le Cière) tem assinalado que o direito de
angária é ainda consagrado na rida internacional.
As condições para o exercício do direito de angária podem ser resu­
midas nas seguintes: a) deve haver uma necessidade urgente dos navios e
mercadorias por parte do Estado que exerce este direito; b) o pagamento
de uma indenização; c) a localização dos bens objeto deste direito (v.
acima).
667. O direito de presa, como já salientamos (v. capítulo Guerra Ma­
rítima), é matéria que interessa tanto à guerra como à neutralidade ma­
rítima. Veiemos agora apenas alguns aspectos que não foram ainda men­
cionados.

1607
A Convenção de Haia (1907) referente aos direitos e deveres das
potências neutras em caso de guerra marítima estabeleceu diversas normas
ein relação à questão de presas: a) se um navio for capturado em aguas
neutras e se a presa estiver ainda em território sob a jurisdição do Estado
neutro, este deverá “usar dos meios de que dispuser para que a presa seja
rebocada coin seus oficiais e sua equipagem, e para que a equipagem
colocada a bordo pelo captor seja internada”; b) se a presa não estiver
mais na jurisdição do Estado neutro, a pedido deste o captor “deve relaxar
a presa com seus oficiais e su a equipagem”; c) não pode ser formado
tribunal de presas de beligerante em territorio neutro; d) “urna presa
somente pode ser levada a um porto neutro per causa de navegabilidade,
do mau estado do mar, de falta de combustível on de provisões”. Cessada
a causa da entrada, “ela deve partir imediatamente”; se não o fizer, o
neutro poderá notificá-la para que o faça; e se não for cumprida a ordem,
o neutro deverá “libertá-la com seus oficiais e sua equipagem e internar
a equipagem posta a bordo pelo captor”; e) dever ser igualmente libertada
a presa que entrar era territorio neutro fora das condições previstas na
letra d; J) o neutro pode admitir em suas águas e portos a entrada de
presas “quando para aí forem levadas para serem deixadas sob seqüestro,
esperando a decisão do tribunal de presas”.12 O neutro pode conduzi-la
“para outro dos seus portos”. “Se a presa for escoltada por um navio de
guerra, os oficiais e os homens postos a bordo pelo captor são autorizados
a passar para o navio de escolta. Se a presa viajar sozinha, o pessoal colocado
a bordo pelo captor é deixado em liberdade.”
As regras brasileiras de neutralidade de 1939 faziam alguns acréscimos
ao que foi dito acima: d) as presas trazidas às águas brasileiras “deverão
partir dentro em 24 horas, ou logo que haja cessado o motivo da sua
entrada”; b) não será permitida a venda de presas “no território brasi­
leiro” .13
H. Accioly dá os seguintes casos que “justificam o apresamento”:

l e) o comandante do navio não poder justificar a sua qualidade de


neutro, ou porque não possui a bordo os papéis regulamentares,
ou porque estes se acham incompletos, ou não apresentam a devida
regularidade;
2S) o navio desviar-se da sua rota sem que o seu comandante possa
apresentar razões plausíveis desse desvio, e a carga compreender
artigos de contrabando' de guerra;
3e) o navio tentar romper um bloqueio regularmente notificado;
4S) o navio destinar-se a porto inimigo, ainda que não bloqueado;
52) o navio, intimado a parar, tentar fugir;
6-) o navio resistir à visita, ou, embora aceite esta, fazer oposição à
busca. A resistência à visita legítima dá ao beligerante o direito de
destruir o navio.
() upresamenio pode ocorrer tanto em relação ao navio inimigo como
em relação a navio neutro. Quando é de navio inimigo a jurisdição de-
presas apenas se preocupa em verificar se é realmente inimigo e se o
apresamemo foi feito conforme as normas internacionais. Se isto ocorre,
há o confisco em nome do direito dos beligerantes de se apoderarem da
propriedade inimiga. Quando é de navio neutro o confisco só ocorre se
houver violação de um dos deveres da neutralidade. O confisco só pode
ocorrer por decisão do Tribunal de Presas.
668. A zona de segurança continental é mencionada pelos intemacio­
nalistas como um caso em que os neutros se manifestaram além do direito
que possuíam. Ela não foi respeitada pelos beligerantes e não tinha qual­
quer fundamento no Dl. Ela alcançava, em certos locais, a largura de 300
milhas (EUA, Brasil), em outros tinha 100 milhas (Argentina) e em outros
50 milhas (Chile), etc.
Sobre esta zona, v. capítulo Zona Contígua, Alto-mar.
O Dl ainda não reconheceu expressamente as zonas de exclusão, em
que os navios neutros ficam advertidos do risco de captura ou destruição.
Em 1904, a Rússia minou Port Arthur. Durante a guerra Irã e Iraque o
CS, em 1984, aprovou resolução estabelecendo tom ar medidas efetivas,
caso as hostilidades não cessassem, para garantir a navegação marítima.
Em 1986, o CS aprovou resolução lamentando os ataques a navios neutros.
A doutrina tem considerado que as potências marítimas não aceitarão
restrições no mar em tempo de guerra. Na guerra russo-japonesa (1904-
1905) o Japão adotou a zona de guerra ou zona de exclusão (foi a primeira
vez) de dez milhas de largura para controle do comércio dos países neutros.
Nestas zonas se “recusa a navegação estrangeira o respeito de seus direitos
e a sua proteção”, que existiria normalmente. Em 1915 a Alemanha de­
clarou zona de guerra a todas as extensões marítimas ao redor das ilhas
britânicas, e todo navio de comércio inimigo seria afundado por subma­
rino. Em 4 de abril de 1982 a Grã-Bretanha estabeleceu uma zona marítima
de exclusão de 200 milhas de largura ao redor das lllias Malvinas, dizendo
que atacaria todos os navios de guerra argentinos. Em 28 de abril de 1982,
em uma nova declaração dirigida à Argentina, falou em “zona marítima
totalmente interdita” e se aplicava a todo navio e aeronave que apoiasse
a ocupação argentina. No fim das hostilidades a zona foi reduzida para
150 milhas e parece visar apenas a Argentina. Só a URSS protestou contra
o ato da Inglaterra. A doutrina está dividida sobre a legalidade destas zonas
de guerra. Em sua defesa se usa o instituto das represálias, a legítima defesa
(usada pela Grã-Bretanha) e também se fala que elas estão consagradas
pelo costume (T. Halkiopoulos). O Tribunal de Nurembergue considerou
a “zona de guerra” como contrária ao Dl. Outros casos de zona de exclusão
podem, ser mencionados: a) em 1939 foi criada uma zona em tomo da
Grã-Bretanha; b) os EUA, na 2- Guerra Mundial, fizeram o mesmo no
Oceano Pacífico e fizeram uma guerra submarina irrestrita contra ojapão;

" 1609
c) a mesma zona dc exclusão foi decretada na guerra entre Irã e Iraque
(1980-1988) por a m b o s os países.
Michel Voecktrl observa que a denominação desla zona tem variado
como zona de defesa, zona de operação ou zona de exclusão, mas que
todas elas significam a mesma coisa. A sua fixação é unilateral, por nina
das partes em* conflito, que passa a exercer o seu controle e fica proibido
o acesso a ela por navio não autorizado, e se este acesso ocorre os navios
são considerados hostis e podem ser atacados. A justificação política destas
zon as é separar as forças inimigas e diminuir a intensidade do conflito.
669. As medidas económicas de que vamos tratar começaram a surgir
na 1- Guerra Mundial. Assim neste período os aliados publicaram as listas
negras onde eram incluidas “¿is pessoas suspeitas de comerciarem co m o
inimigo”. Foram limitadas as importações dos neutros levando-se em con­
sideração, em regra geral, as suas necessidades em 1913. Nos EUA foi feito
o embargo geral dê todas as mercadorias, que só podiam sair do território
norte-americano com uma licença especial.
Na 23 Guerra Mundial foram utilizados vários tipos de*Tfnedidas:

a) compromissos de não reexportação, “que eram garantidos pelo


próprio Estado neutro ou por organismos semipúblicos sob o seu
controle”;
b) listas negras — este sistema voltou a ser aplicado, tanto em listas
oficiais, bem com o oficiosas. “A ameaça de ver seu nome inscrito
na lista negra constituía uma arma eficaz a respeito de importadores
neutros” (Rousseau);14
c) sistema de contingentes — fixaram-se as necessidades dos neutros
levando-se em consideração os anos anteriores à guerra;
d) controle das exportações dos neutros — os neutros a pedido dos
aliados cessaram (a Turquia com o crom o) ou diminuíram (a Es­
panha com o volframio) as suas exportações para a Alemanha;
e) controle das exportações alemãs; passaram a ser apreendidas as
mercadorias fabricadas na Alemanha. A França considerava como
tendo origem alemã quando “a parte alemã em matéria-prima ou
em mão-de-obra representava mais de um quarto do valor total” .

670. O bloqueio pode ser definido como “a interceptação por mar do


acesso às costas ou portos de um adversário, com a finalidade de lhe cortar
todas as comunicações com o ultramar” (Colombos).
O bloqueio se distingue do contrabando vez que neste só as mercado­
rias que figuram em determinadas listas podem ser capturadas, enquanto
que no bloqueio “ todo navio mercante e todo carregamento, de qualquer
nacionalidade e espécie, que intentem entrar ou sair da área bloqueada
estão sujeitos ao confisco” (Colombos).

1610
E le lam bem se d is tin g u e d o fe ch am e n to cios p o rlo s. O b lo q u e io é
ap lica d o a p o rlo s olí costas em pod ei' do in im ig o . C) fe c h a m e n to dos p o rlo s
é d e c re ta d o pelo E stad o em re la çã o aos p o rto s q u e estão em sen p od er.
A v iolação do fe c h a m e n to d o s p o rlo s a ca rre ta a p e n a s , gei alíñ en te, o pa­
g a m e n to de m ulla.
O bloqueio é obrigatório para lodos os navios, entretanto lem-se re­
nunciado por cortesia internacional em relação aos navios de guerra neu­
tros, ou, ainda, em relação a navios mercantes neutros que eslejam em
dificuldade, bem como se eles se dedicam a missões filantrópicas. Ele deve
ser aplicado imparcialmente a todos os pavilhões.
O histórico do bloqueio remonta à Antiguidade, quando já teria sido
tusado. Foi entretanto no século XVI que ele começou a se desenvolver,
por influência dos holandeses. Assim, em 1584 os Países Baixos bloquearam
os portos de Flandres, que se encontravam em poder dos espanhóis, contra
os quais eles lutavam pela sua independencia.14'' Em 1630 os holandeses,
em uma proclamação, passaram a aplicar os principios do sitio na guerra
terrestre ao bloqueio na guerra marítima. No final do século XVII,l:> a
respeito do bloqueio, já havia duas posições claramente delineadas: uma
que defendía os interesses dos neutros (entre os seus defensores, a Holan­
da), e a inglesa, que defendia os interesses dos beligerantes. Na P Liga
de Neutralidade Armada (1780), formada pela Rússia, Dinamarca e Sué­
cia,16 foi defendida, em nome dos neutros, a necessidade do bloqueio ser
efetivo. Ao contrario da Inglaterra, que defendia a validade do bloqueio
fictício. A efetividade do bloqueio foi novamente defendida em 1800 na
2a Liga da Neutralidade Armada (Rússia, Suécia, Dinamarca e Prússia).1'
Finalmente, na Declaração de París de 1856, foi consagrada a efetividade
do bloqueio para a sua validade.
O bloqueio, com o desenvolvimento da aviação, pérdeu muito a sua
importancia. Nas duas guerras mundiais foi muito utilizado o bloqueio a
longa distancia (“long distance blockade”), que ao contrário do bloqueio
tradicional é feito a longa distancia das costas bloqueadas, mas de tal modo
que possa ser impedido o acesso a elas.
Os bloqueios podem ser classificados em: a) estratégicos, “quando
fazem parte de operações militares contra a costa bloqueada ou visam a
privar de abastecimento as forças terrestres do adversario na área bloquea­
da”; b) comerciais, “quando não se estão realizando operações militares,
porém a finalidade do bloqueio é isolar de todo comércio a zona bloquea­
da”; no fundo a sua finalidade é também estratégica, visando enfraquecer
o inimigo; c) bloqueio fictício (“paper blockades”, bloqueio de gabinete),
é aquele feito por uma proclamação sem força militar suficiente para
assegurar a sua realização (Colombos). Outras categorias podem ser acres­
centadas, como a de bloqueio de fato, isto é, aquele que é feito sem a
devida declaração e notificação. Este tipo de bloqueio tem sido condenado

1611
p or n ã o p r e e n c h e r as c o n d iç õ e s p ara a sua validade. A m e sm a a ú n a é
d irig id a ao b lo q u e io fictício .
A justificação do bloqueio tem sido objeto de controvérsia entre os
autores.-T«m-se criticado que o bloqueio prejudica o comércio dos neutros.
Uns (Blumschli) dizem que ele se justifica em nome da necessidade da
guerra. Outros (Ortolan) falam em ocupação das águas. Na verdade, estas
teorias não são satisfatórias, vez que consagrar as “necessidades militares"
seria abrir a porta para uma série de abusos por parte dos beligerantes. A
da ocupação também não pode ser aceita, porque, como já vimos, o
alto-mar, “res comniunes”, não pode ser ocupado pelos Estados. A teoria
que tem encontrado maior número de seguidores (Fauchille, Accioly) é
a que sustenta ser O bloqueio “uma conseqüência natural do estado de
neutralidade-, residindo o seu fundamento na obrigação que incumbe aos
neutros, de se abster de qualquer ingerência nas operações de guerra”.
Os bloqueios para serem válidos devem preencher as seguintes condi­
ções: a ) estado de guerra; b) ser utilizado em locais em que é permitida
a sua aplicação; c) declaração e notificação; d) efetividade.
A existência de um estado de guerra é indispensável para a caracteri­
zação do bloqueio, vez que este é uma medida aplicada por beligerantes.
Ora, beligerante e neutro só existem em uma guerra. Caso contrário,
teremos o bloqueio pacífico.18 O armistício e a suspensão de armas só
suspendem o bloqueio se isto for expressamente determinado.
O bloqueio, c o m o já dissemos, tem por objeto costas e portos que se
encontrem em poder do inimigo. Não se pode bloquear portos neutros a
não ser que estes estejam em poder de beligerante.
A declaração e notificação estão consubstanciadas como requisitos do
bloqueio na Declaração de Londres de 1909. A declaração de bloqueio19
deve ser feita pela autoridade competente do Estado, o que é fixado pelo
direito interno de cada um. Ela deve conter, segundo a Declaração de
Londres, o seguinte: a) a data em que o bloqueio começa; b) determinar
a região bloqueada; c) qual o prazo dado aos neutros para saírem da região
bloqueada.20
A declaração deVera ser notificada: a) a os Estados n eu tro s pelo Estado
bloqueante; b) às autoridades da região bloqueada pelo comandante da
esquadra bloqueante; as citadas autoridades por sua vez deverão notificar
aos cônsules estrangeiros que estejam sediados na região bloqueada. A
respeito da notificação,21 em relação a navios neutros, pode-se observar
que o navio neutro só pode ser capturado por violação do bloqueio se ele
tomou “conhecimento real ou presumido do bloqueio”; há a presunção
de conhecimento do bloqueio, salvo se o navio sair de porto neutro antes
da notificação do bloqueio. Se um navio neutro se destinar a porto blo­
queado sem ter conhecimento do bloqueio, deve ser feita a ele uma noti­
ficação, q u e deverá ser escrita no diário de bordo.22 Se o comandante não

1612
tiver n o tific a d o as au torid ad es lo ca is d o b lo q u eio ou n ã o tivei sido dado
uni prazo p a ra os navios n eu tro s sa íre m estes deverão passar liv rem en te.
A efetividade do bloqueio foi consagrada convencionalmente na De­
claração de Paris (1856), que estabeleceu: “os bloqueios, para serem ol>
rigatórios, devem ser efetivos, isto é, mantidos por uma força suficiente
para vedar realmente o acesso ao litoral do inimigo”. A Declaração de
Londres estabeleceu que a efetividade é uma questão de fato e que o
bloqueio não é levantado quando as forças bloqueantes se afastam por
momentos, em virtude de mau tempo. Atualmente, faz-se o “bloqueio por
cruzeiro”, que “ consiste em fazer vigiar certa extensão de costas por navios
que cruzem defronte de tais costas” (Accioly). Este procedimento evita
que a força bloqueante fique estacionada. Atualmente são também utili­
zados os aviões. Admite-se ainda a colocação de minas automáticas de
contato que fiquem inofensivas quando forem rompidas as suas amarras.
Os navios que violam o bloqueio estão sujeitos ao confisco e devem
ser “conduzidos ao porto disponível mais próximo do país que apresou,
para que sejam devidamente submetidos ao procedimento de presa” (Co-
lombos). A carga também pode ser confiscada, a não ser que quem a
embarcou prove que não tinha “ a intenção de violação do bloqueio” ,23
A Declaração de Londres determina, no art. 19, que “a violação do
bloqueio é insuficientemente caracterizada para autorizar a apreensão do
navio quando este estiver realmente dirigido para um porto não bloqueado,
qualquer que seja o destino ulterior do navio ou do seu carregamento”.
Estabelece em outros dispositivos que: “a apreensão dos navios neutros
por violação do bloqueio só pode ser efetuada dentro do raio de ação dos
navios de guerra encarregados de assegurar a efetividade do bloqueio”.
Para a captura em caso de violação é necessário que haja uma perseguição
sendo que se esta for abandonada não pode mais haver captura.24
O bloqueio pode terminar por diversas causas: a) fim do estado de
guerra; b) a região bloqueada cai em poder dos bloqueantes; c) os blo­
queantes renunciam ao bloqueio; d) quando o bloqueado expulsa a es­
quadra bloqueante; é) quando o armistício ou a suspensão de armas esta­
belecem o levantamento do bloqueio
Uma grande discussão doutrinária é a que se tem travado em torno
do art. 49, alínea 3, do Protocolo I, de 1977, que define ataque como “os
atos de violência contra o adversário, sejam ofensivos ou defensivos”, e
afirma qiíe os dispositivos da seção “proteção geral contra os efeitos das
hostilidades” “se aplicarão a qualquer operação de guerra terrestre, naval
ou aérea que possa afetar em terra população civil, as pessoas civis e aos
bens de caráter civil”. A discussão se prende ao fato de se saber se as
citadas normas são aplicadas ao bloqueio e ao contrabando de guerra.
Para Rauch a resposta é afirmativa, e este autor-defende que a guerra
econômica, que não distingue civil e militar, é incompatível com o Proto­
colo 1. Para ele o tratamento de víveres como contrabando absoluto e o

1613
bloqueio pura reduzi]' a população à foine estão proibidos pelo Protocolo
I até como represália. Para Mevrowitz há uma diferença entre a guerra
terrestre e a guerra man tima, sendo que as regras de uma não %io aplicadas
11a outra. Na guerra marítima existem medidas que não são atos de vio­
lência, como privar o inimigo dos navios mercantes que lhe pertencem.
O direito de guerra marítima está sempre junto com o dheito de neutra­
lidade. O bloqueio não distingue bens de caráter civil e bens destinados
a fins militares. A principal finalidade da guerra marítima é o comércio
inimigo. A razão da distinção entre o contrabando absoluto (armas) e o
condicional (víveres) não é a proteção da população civil, mas o interesse
do comércio dos neutros. O Protocolo I não atinge as regras para a des­
truição de navios mercantes. A proibição da fome como arma de guerra
não se aplica à guerra marítima. No Tribunal de Nurembergue, Doenitz"
não foi condenado pela guerra submarina total e ataque a navios- de
comércio britânicos sem advertência. Os juizes admitiram que: a) estes
navios estavam armados; b) navegavam em comboio; c) deviam transmitir
relatório se avistassem submarinos. O Tribunal constatou que Doenitz
violara o Dl nos seguintes casos: a) ataque sem advertência a navios de
comércio neutros que navegavam em “zonas de operação”; b) não colocar
previamente as pessoas de bordo em segurança. Na verdade, a Grã-Breta­
nha cometera as mesmas violações.
A minha posição é a de Rauch, sem deixar de reconhecer a validade
da tese de Meyrowitz. Entretanto, em um mundo que possui armas alta­
mente destrutivas, parece-nos que devemos adotar uma posição humanista,
isto é, de proteção ao homem e, em conseqüência, estender ao máximo
o direito humanitário.
671. A expressão contrabando de guerra designa as mercadorias que
um neutro não pode enviar ou transportar para um beligerante, vez que
tais mercadorias se destinam a ser utilizadas na guerra.
Como se pode observar, é o contrabando de guerra uma restrição ao
comércio dos neutros em tempo de guerra. A prática do contrabando de
guerra por um neutro não é considerada violação da neutralidade. O
contrabando só pode ser capturado no alto-mar e em águas territoriais
dos beligerantes.
Assinalam os autores que para uma mercadoria ser considerada con­
trabando de guerra é necessário a reunião de dois elementos: a) ser passível
de uso “beligerante” e b) estar sendo encaminhada para o inimigo.
A origem do contrabando de guerra não é nova. Na Antiguidade já -
se considerava crime o envio de armas para o inimigo. Na Idade Média os
papas proibiam que se vendessem armas aos sarracenos, sob pena de
excomunhão. Em 1445 aparece na Itália a palavra “ contrabandum” a
respeito do comércio de sal, “ao descrever assim a contravenção” (Colom-
bos).2;> Em relação à guerra, esta palavra-é utilizada peia primeira vez no
Tratado de Southampton (1625), concluído entre a Inglaterra £ a Holanda.

1614
Entretanto, antes mesino da consagração desta palavra no direito de guerra,
já se proibia o comercio de armas, munições, etc. Assim esta prática foi
sendo adotada nos sé-culos XVI e XVII.
Em 1661 o Tratado de Whitehall, concluido pela Inglaterra e Suécía,
proibia o comércio de armas, cavalos, arreios, navios, etc. Adotava-se assim
um critério bem mais amplo do que aquele seguido pela França e Espanha,
que só consideravam como contrabando de guerra as anuas, munições e
salitre.26 No século XVII, por influencia de Grotius e da prática inglesa,
surge o contrabando ocasiona) ou condicional.2' Assim as mercadorias que
fossem contrabando absoluto seriam capturadas e confiscadas, enquanto
que aquelas que constituíssem contrabando condicional poderiam ser con­
fiscadas ou o Estado captor teria preferência na venda.
No século XVIII surge a teoria da viagem continua: “consiste em
considerar a viagem efetuada por um navio, de um porto neutro a outro
porto neutro e deste último a um porto inimigo, como um só todo, de
maneira que, suprimida, pelo pensamento, a primeira etapa, só se tem em
vista o destino definitivo da carga. Assim, esta poderá ser apreendida desde
a primeira parte da viagen, e, da mesma forma, o navio” (Accioly). Esta
teoria visa evitar uma possível simulação por parte dos neutros que desejem
comerciar com o beligerante. O que importa é o destino final da merca-
doria. A origem desta regra de 1756 é a seguinte: os neutros, na Guerra
dos Sete Anos, a fim de fugir à regra que proibia a eles comércios novos,
isto é, comércio em tempo de guerra que eles não possuíam em tempo
de paz, passaram a fazer escala em um porto neutro na viagem entre a
metrópole e a colônia. A jurisprudência, inglesa passou a considerar que
“a viagem em duas partes não era oponível aos beligerantes, a segunda
viagem era a continuação da primeira e o conjunto constituía uma ope­
ração única de caráter hostil” (Rousseau). Esta teoria foi aplicada pela
primeira vez ao contrabando de guerra na Guerra de Secessão pela juris­
prudência americana.
Em 1856 o Congresso de Paris consagra o contrabando de guerra sem
entretanto defini-lo ao estabelecer os seguintes princípios: “o pavilhão
neutro cobre a mercadoria inimiga com exceção do contrabando de guer­
ra” e “a mercadoria neutra”, com exceção do contrabando de guerra, não
pode ser apreendida sob pavilhão inimigo.
Finalmente, em 1909 foi feita uma regi llamen tação do contrabando
de guerra na Declaração Naval de Londres, que como já vimos não entrou
em vigor.28
Vimos no início quais são ós- elementos que caracterizam o contraban­
do de guerra, entretanto, eles não nos fornecem uma regra precisa, vez
que cada Estado elabora uma lista diferente do que ele considera como
sendo contrabando de guerra,‘aí colocando mercadorias diferentes.
A Declaração de Londres conservou a distinção de origem inglesa de
contrabando absoluto e contrabando condicional. A lista de contrabando

1615
absoluto é dada no art. 22: armas, munições, navios de guerra, ele. No art.
23 ela estabelece que “os objetos e materiais, que sof^eni exclusivamente
empregados na guerra, podem ser acrescentados à lista de contrabando
absoluto por meio de declaração notificada” ; sendo que a notificação será
dirigida às demais potencias, se a notificação for feita após as hostilidades
terem inicio ela “só será dirigida às Potencias neutras"-
A lista do contrabando condicional (“os objetos e materias suscetíveis
de servir aos usos da guerra como aos usos pacíficos")2'1 está prevista no
art. 24: víveres, ouro, prata, veículos, combustíveis, etc. Da mesma maneira
que o contrabando absoluto, pode ser feita uma declaração acrescentando
outras matérias que também serão notificadas aos demais Estados nos
mesmos moldes do contrabando absoluto. Em conclusão, cada beligerante
declara livremente o que é contrabando.30 As listas de contrabando de
guerra têm sido tão detalhadas que acabam por excluir apenas os bens de
luxo e os bens de interesse artístico (Sico).
A Declaração de Londres enumerou algumas mercadorias que não
podem ser consideradas contrabando de guerra, tais como: a) “os objetos
e materiais que servirem exclusivamente para o tratamento de doentes e
feridos” que se destinarem ao inimigo, mas podem ser requisitados me­
diante indenização “em caso de necessidade militar importante”; b) os
objetos destinados ao uso do navio, equipagem e passageiros; c) mobiliários;
d) algodão; etc.
A caracterização do contrabando de guerra absoluto é feita levando-se
em consideração a natureza da mercadoria e a sua destinação ao território
inimigo.
A caracterização do contrabando condicional já é feita de modo dife­
rente, não é suficiente aqui a destinação ao território inimigo, mas é
necessário ainda “ estabelecer que se destinam ao uso das forças armadas
ou da administração do Estado inimigo” . Há presunção do destino citado
“se a remessa for endereçada às autoridades inimigas ou a um comerciante
estabelecido em país inimigo, e quando for notório que esse comerciante
fornece ao inimigo objetos e materiais dessa natureza”, etc.
H. Accioly observa em relação à Declaração de Londres que a teoria
da viagem contínua é adotada no contrabando absoluto e “afastada, em
princípio”, no contrabando condiciona].11
A citada declaração estabelece que a sanção para o contrabando é o
confisco. O navio será também confiscado se o contrabando for mais da
metade da carga “ou por seu valor, ou por seu peso, ou por seu volume,
ou por seu frete”.32 “As mercadorias que pertencerem ao proprietário do
contrabando e que se encontrem a bordo do mesmo navio ficam sujeitas
ao confisco.”33 O navio “por motivo da proporção do contrabando pode
ser autorizado, conforme as circunstâncias,, a continuar sua viagem, se o
capitão estiver pronto a entregar o contrabando ao navio beligerante... O
captor tem a faculdade de destruir o contrabando que assim lhe for en-

1616
tregüe”. "Sc um mivio for encontrado no mar navegando ira ignorância
das hostilidades on da declaração de contrabando aplicável ao sen carre­
gamento, os artigos de contrabando somente podem ser confiscados me­
diante indenização...’’ Considera-se que um navio não tomou conhecimen­
to “se ele saiu de um porto depois do início das hostilidades ou da decla­
ração de contrabando ter sido dirigida ao Estado de cujo porto ele saiu”.
O navio só pode ser apreendido por contrabando de guerra “in delicio”,
isto é, no momento que está fazendo o transporte do contrabando.
Finalmente, é de se salientar com Sandiford que “toda captura deve
ser conhecida” pelo Tribunal de Presas.
Com a finalidade de diminuir’jos entraves à navegação dos neutros
surgiu na P Guerra Mundial, com a prática britânica, o sistema dos “na-
vicerts”, em 1916. O “navicert” é um certificado fornecido aos navios
neutros pelo beligerante após ter obtido prova por parte do neutro de
que a carga não se destina ao inimigo. O exame da carga é feito no porto
de partida do navio pelas autoridades consulares do beligerante. E, em
resumo, um “laissez-passer” fornecido ao navio. A validade do “navicert”
era geralmente de dois meses. Esta prática foi utilizada pelos aliados na
2- Guerra Mundial”,34 entretanto, a jurisprudência alemã de presas consi­
derava que um navio neutro que recebesse “navicert” aliado era culpado
de assistência hostil.3’
Ao lado do “navicert" surgiram o “mailcert”36 (para os “colis pos-
taux”), o “aircert” (para os “colis postaux” que fossem enviados via aérea),
o “landcert”, etc. (Rousseau).
672. Assistência hostil é expressão utilizada “para designar o fato pelo
qual um navio neutro presta a um beligerante serviços incompatíveis com
as regras de neutralidade, tais como certos transportes de pessoas ou
transmissão de informações no interesse deste beligerante, participação
direta nas hostilidades, etc., e o mencionado fato acarretando, conforme
a sua gravidade, a aplicação a este navio do tratamento aplicável ou um
navio neutro transportando contrabando de guerra, ou a um navio de
comércio inimigo” (Dictionnaire de la Terminologie du Droit Internatio­
nal).
A expressão “assistência hostil” foi utilizada, como tradução da expres­
são inglesa “unneutral Service”, pela primeira vez na Conferência de Haia
de 1907 nos debates sobre contrabando de guerra que se realizaram na
4a Comissão. Em 1908, em uma circular do governo britânico, surge no­
vamente esta expressão, que foi definitivamente consagrada na Conferên­
cia Naval de Londres (1909).
A assistência hostil se distingue’do contrabando de guerra no seguinte:
a) o contrabando de ■guerra é encarado com o uma “aventura comercial”
e é “um ato de cumplicidade muito indireta e algumas vezes muito duvidosa
nas operações de guerra” (Ch. Dupuis); enquanto a assistência hostil
abrange atos “mais graves, que não são atos de comércio, mas atos de

1617
guerra” (Jemtel); b) o contrabando de guerra é apreendido quando a
caminho de inimigo; enquanto na assistência hostil não se leva em consi­
deração o destino do navio, mas a natureza do serviço prestado por ele;
c) no contrabando de guerra o confisco pode ser apenas da carga; enquanto
na assistência hostil atinge sempre o navio.3'
A assistência hostil foi regulamentada na Declaração Naval de Londres
(1909). Dois tipos de assistência hostil com sanções d iferen tes fo ra m a i
previstas. O primeiro tipo está caracterizado no art. 45: “um navio neutro
é confiscado e, de uma maneira geral, passível de tratamento que teria
um navio neutro sujeito ao confisco por contrabando de guerra”: a) o
navio viajar especialmente para transportar “passageiros individuais incor­
porados na força armada do inimigo” ou para transmitir notícias ao ini­
migo; b) transportar com conhecimento do proprietário ou comandante
destacamento militar do inimigo38 ou pessoas “que, durante a viagem,
prestarem assistência direta às operações do inimigo”. Nestes casõs também
são confiscadas as mercadorias que pertencerem ao proprietário do navio.
O estabelecido acima não se aplica quando o navio ignorar o estado de
guerra.
O segundo tipo está previsto no art. 46: “ um navio neutro é confiscado
e, de uma maneira geral, passível do tratamento que teria se fosse um
navio mercante inimigo”: d) “quando tomar parte direta nas hostilidades”;
b) quando estiver sob controle ou ordens “de um agente colocado a bordo
pelo governo inimigo”; c) quando fretado integralmente pelo inimigo; d)
“quando estiver atual e exclusivamente afeto, ou ao transporte de tropas
inimigas, ou à transmissão de notícias n o interesse do inimigo”. As m er­
cadorias que pertencerem ao proprietário .do navio são também confisca­
das.
A Declaração de Londres estabelece ainda que: “qualquer indivíduo
incorporado à força armada do inimigo e que for encontrado a bordo de
um navio mercante inimigo poderá ser feito prisioneiro de guerra, mesmo
não havendo ensejo de capturar esse navio”. Tal fato ocorre quando o
navio não é considerado culpado de assistência hostil e, portanto, não está
sujeito a captura. A Declaração de Londres não pretendia incluir neste
tratamento os reservistas, daí a expressão “indivíduos incorporados à força
armada do inimigo” . Entretanto, desde a I a Guerra Mundial que a França
e a Inglaterra estenderam este tratamento também aos reservistas (Accioly).
Não é considerado ato de assistência hostil pela prática internacional
o transporte de agentes diplomáticos inimigos em navios neutros; esta
orientação foi adotada desde a Guerra de Secessão norte-americana.
Duas observações devem ser feitas: a) a enumeração feita na Declaração
de Londres é exaustiva e não exemplificativa; 6) não subsiste mais atual­
mente a distinção de dois tipos de assistência hostil, ou seja, indireta (art.
45) e direta (art. 4 6 ), vez que a sanção é sempre a mesma: a captura do
navio (Rousseau).

1618
O fu n d a m e n to d o in stitu to da a ssistê n cia hostil e suas s a n çõ e s é a
v iolação p o r p a rte d o n e u tr o de seus d ev eres d e a b s te n çã o e im p a rcia lid a d e .
Finalmente, é de salientar que o navio capturado por assistência hostil
deverá ser julgado pelo Tribunal de Presas do captor.
673. Tem sido reconhecido aos beligerantes o direilo de visita nos
navios privados em alto-mar. Ele é uma decorrência do direito de captura.
O direito de visita já existia implícito no Consulado do Mar, ao esta­
belecer a captura de mercadorias inimigas em navios neutros. Ele veio a
se desenvolver no século XVII. O fundamento deste direilo decorre do
fato de que os neutros não se responsabilizam pelo comércio realizado
por seus súdítos. Assim sendo, cabe aos próprios beligerantes fiscalizar este
comércio, em norae de sua autodefesa.
O direito de visita pode ser exercido no alto-mar e nas águas territoriais
dos beligerantes.3.9 Ele pode ser exercido apenas por navios de guerra.
Podem ser objeto deste direito apenas os navios privados dos neutros. Os
navios públicos militares e civis de neutros não estão sujeitos a este direito.
A navegação em comboio é bastante antiga, sendo que ela surgiu com
a finalidade de se dar proteção à navegação contra a pirataria. Foi ela
consagrada ñas Ieis de Wisby e no código da Liga Henseática. Inicialmente
os navios mercantes “não iam acompanhados de navios de guerra, mas os
próprios navios estavam armados”. “A carta do Almirantado40 era o do­
cumento que continha as cláusulas desta associação especial.” Já há exem­
plo de navegação em comboio no século XIV (Colombos).
No século XVI os neutros passaram a dar escolta com navios de guerra
a seus navios mercantes a fim de protegê-los dos beligerantes. No século
XVII, a Suécia reivindicou que o direito de visita não fosse exercido pelos
beligerantes em relação a navios neutros, quando estes se encontrassem
escoltados por navio de guerra e o comandante declarasse que não havia
contrabando de guerra nos navios privados escoltados. Ñas Ligas de Neu­
tralidade Armada (1780 e 1880), foi reafirmado o direito de comboio, e
elas mandavam que seus navios resistissem à visita.
A navegação em comboio foi regulamentada na Declaração de Londres
(1909), que estabeleceu: a) isenção do direito de visita se o neutro estiver
“sob comboio de seu próprio pavilhão”.41 O comandante do comboio dará
ao beligerante as informações solicitadas; b) se o navio de guerra belige­
rante tiver suspeita que o comandante do comboio foi enganado, comu­
nicará isto a ele. Entretanto, quem decide se deve haver ou não investigação
é o comandante do comboio. A Grã-Bretanha não aceita o comboio desde
o século XIX. Contudo, na guerra entre Irã e Iraque, os EUA e a Italia '
aceitaram o comboio.
O fundamento da isenção do direito de visita dos comboios neutros
é “a garantía oferecida aos beligerantes p o r um agente responsável de
governo neutro, a respeito de fatos cuja natureza só poderia ser dada a
qualquer daqueles pela visita e busca” (Accioly).

1619
A Franca lisa a palavra “acompanhamento” c- a sua diferença do com­
boio é que o primeiro não é uma noção jurídica. Continua Voeckel que
o acompanhamento é apenas uma presença atenta e amiga, bem c o m o o
Estado não tem responsabilidade se houver algum prejuízo.
Sobre a resistência à visita, determina a Declaração de Londres: “A
resistência oposta pela força ao exercício legítimo do direito de detenção,
visita e captura, acarreta, em qualquer caso, o confisco do navio. A carga
é passível do mesmo tratamento que sofreria a carga de um navio inimigo;
as mercadorias pertencentes ao capitão ou ao proprietário do navio são
consideradas como mercadorias inimigas.” E de se observar que a merca­
doria neutra, não sendo contrabando de guerra, não pode ser confiscada,
em virtude do que estabelece a Declaração de 1856.
A tentativa de fuga não deve ser equiparada a resistência à visita, que
deve ser entendida como a utilização da força. Se um neutro fugir e for
posteriormente apanhado42 em momento que não v iole a sua neutralidade,
não sofrerá sanção (Accioly).
NOTAS

I Linneu de Albuquerque Mello — C.cnese e Evolução da Neutralidade, 1943;


Ilenry Vercken — De l’Assistance Hosiile dans la Guerre M aritime, 1911; Daniel
* Cham ice)' Bewer — Righls and Dm ies o f Neutrals, 1916; G ilben Oído! — Les Lois
de la Guerre Maritime, 1946-3 947: L. Gabriel-Robinet — Le Blocus à Travers
l’H istoire, 1943; Yves L e je m le l — L'Assistance Hosiile dans les Guerres Maritimes
M odernes, 1937; Xavier Martín — Étude sur le Blocus M aritime, 1909; Charles
Dupuis — Le Droit de la Guerre Maritime d’aprés les con férences de la Haye et
de Londres, 1911; Roberto Sandiford — Diritto Mariltimo di Guerra, 1938; Louis
Guichard — Histoire du Blocus Naval (1914-1918), 1929; Isidoro Ruiz Moreno —
Guerra Marítima, 1925; André Pepy — Les Problémes soulevés par l’asile maritime
en temps de guerre el la notion de contrabande de guerre depuis le XVII1' siécle
ju sq u ’á nos jou rs, 1907; Joseph Lévy-Boullier — De l’Asile accordé aux vaisseaux
de guerre des belligérants dans les ports neutres, 1912; A. Pearce Higgins — Le
Droit de Visite et de Capture dans la Guerre Maritime, in RdC, ] 926, vol. I, t. 11,
págs. 69 e segs.; C. Jo h n Colombos — Derecho Internacional Marítimo, 1961; E.
Duboc — Le Droit de Visite et la Guerre de Course, 1902; Raoul Genel ■ — Droit
Maritim e pour le temps de guerre, 2 vols. e um suplem ento, s.d.; Richard Kleen
— Lois et Usages de la Neutralilé, 2 vols., 1898-1900; L. B. Hautefeuille — Des
Droit et des Devoirs des Nations Neutres en Temps de G uerre Maritime, 3 vols.,
1858; L. Gessner — Le Droit des Neutres sur Mer, 1865; Jo s é Carlos Rodrigues —
Notas sobre o Contrabando de Guerra, 1921; Herbert A rthur Smith — Le Déve-
loppem ent moderne des lois de la guerre maritime, in RdC, 1938, vol. I, t. 63,
págs. 607 e segs.; Alberto Miele — L ’Estraneitá ai Conflilti Armali secondo il Diritto
Internazionale, 2 vols., 1970; Luigi Sico — “Toute prise doit é tre ju g é e ” . II giudizio
delle pred e nel diritto internazionale, 1971; Jo sé Luís de A zcárraga — Derecho
Internacional Marítimo, 1970, págs. 245 e segs.; Alessandro Migliazza — L ’évolution
de la réglem entation de la guerre à la lumiére de la sauvegarde des droits de
rh o m m e, in RdC, 1972, vol. III, t. 137, págs. 143 e segs.;. T. Halkiopoulos —
Interférences des régles du Nouveau Droit de la Mer el de celles du Droit de la
guerre, in René-Jean Dupuy e Daniel Vignes — Traité du Nouveau Droit de la
Mer, 1985, págs. 1.095 e segs.; Elm er Rauch — Le droit contem porain de la guerre
m aritim e, in RGDIP, 1985, n9 4, págs. 958 e segs.; Henri Meyrowitz — Le Protocole
Additionnel I aux conventions de Genéve de 1949 et le Droit de la Guerre Maritime,
in RG DIP, 1985, ns 2, págs. 243 e segs.
2. Esta convenção “som ente se aplica às potências contratantes e se os belú
gerantes forem todos participantes da Convenção”.
3. O asilo marítimo é faculdade do neutro que pode concedê-lo ou não. Os
navios em desgraça têm sido admitidos em portos fechados aos beligerantes (Oppe-
nheim -Lauterpacht).
4. A doutrina (Accioly) tem acrescentado os seguintes deveres: a) proibir a
passagem de navios de guerra dos beligerantes nos rios, mesmo que se trate de
rio aberto à navegação internacional; b) não proibir a passagem em estreitos abertos
à navegação internacional. O Estado não pode perm itir a passagem de prisioneiros
em seu território; esta prática rem onta ao século X IX (v. capítulo anterior).
5. A Convenção de Havana é ainda mais taxativa, ao acrescentar: “deverão
perm itir o trânsito, quando, achando-se em guerra duas nações americanas um

1621
(los b e lig era n tes é país m ed iterrán eo , que não lenh a ou tros m eios de se abastecer
e se m p re qu e isso não atin ja os interesses vitais do país através do qual se peça o
trá n sito ” .
6. E sla lim itação não se aplica aos “ navios de guerra exclu sivam en te destinados
a um a m issão religiosa, cien tífica ou fila n tró p ica ". A regra das 24 horas é de origem
inglesa, en q u a n to a prática fran cesa não limitava tem po, a n ã o ser qu e o navio
tivesse presa.
6A. Migliazza observa que devido ao movimento dos direitos do homem
algumas regras de neutralidade foram modificadas e que o Eslado neutro pode
negar aos navios do Estado agressor o direito de se refugiar em seus portos para
os reparos necessários. O refugio hoje só é dado por razões humanitárias, como
o abastecimento, desembarque de feridos, etc., modificando o art. 17 da Convenção
de Haia (1907) referente aos direitos e deveres das potencias neutras, que permite
- a navio beligerante reparar avaria indispensável à navegação em porto neutro.
7. Os cidadãos neutros em território beligerante estão sujeitos aos “encargos
extraordinários estabelecidos nesse país para os seus próprios nacionais, em con­
seqüência da guerra”, entretanto, eles não podem ser alistados à força (Accioly).
8. Oppenheim-Lauterpacht admite que ele seja exercido no alto-mar, o que
não nos parece acertado, vez que se deve resguardar a “ liberdade” dos neutros.
No sentido da afirmação de Oppenheim-Lauterpacht, pode-se assinalar o que foi
estabelecido no art. 29 da Declaração de Londres ao determ inar que as mercadorias
destinadas aos feridos e enferm os “ podem ser requisitadas em caso de necessidade
m ilitar urgente e sujeita ao pagam ento de compensação, se têm destino inimigo”
(Colom bos). Entretanto, a D eclaração de Londres não entrou em v ig ore apenas
foi aplicada no início da l 3 Guerra Mundial.
9. Este direito também existe em tempo de paz.
10. Este fundamento não atende ao direito de angária quando exercido em
território sob ocupação militar.
11. Segundo Oppenheim -Lauterpacht se õriginaria de palavra grega signifi­
cando “ mensageiro”.
12. Esta norma, apesar de admitir por parle do neutro a assistência ao beli­
gerante, foi aí incluída com a finalidade de evitar a destruição de presas.
13. No Dl nada impede ao Estado neutro de permitir a venda em seu território
de presa feita pelo beligerante após o pronunciamento do Tribuna] de Presas e
considerando boa presa.
14. De quem foi tirado este inciso e as citações que ele contém.
14A. Segundo A. Miele “ o prim eiro caso documentado de bloqueio naval foi
no século XVII, a respeito da cidade de Riga, declarada bloqueada” pelos suecos.
Os suecos conseguiram o reconhecim ento desta prática no tratado de 1613 com
a Dinamarca e no de 1614 com a Holanda.
15. Foi nesle século que a palavra “blocus” foi utilizada “no sentido de
operação econômica dirigida contra um país para obter m elhor resultado em
operações militares”. A palavra “ blocus” se origina do alem ão “ block-haus” , sendo
que block significa bloco e haus significa casa. Blocus era a palavra utilizada para
designar pequenas fortificações que serviam “de ponto de apoio aos que fizessem
o cerco ” de uma cidade (L. Gabriel-Robinet).
16. Outros Estados se ju n taram posteriormente a estes.
17. Esta acrescentou mais um princípio a respeito do bloqueio: que um navio
neutro só pode ser considerado culpado de violação de bloqueio se for advertido
e depois disto ainda tentar rom pei o bloqueio por meio de ardil ou ;'i lorça (Linneu
de Albuquerque Mello).
18. V. capítulo Sanções.
19. E “o ato no qual a autoridade com petente (governo ou chefe de esquadra)
consigna que um bloqueio se acha ou vai ser estabelecido, em condições que serão
precisadas" (Louis Renault).
20. Este prazo geralm ente é de poucos dias (três tbu quatro), não havendo
entretanto qualquer norma internacional que fixe a sua extensão.
21. A ausência de notificação pode acarretar a responsabilidade internacional
do Estado e o pagamento de uma indenização.
22. Sobre esta matéria, até a consagração das normas aqui reproduzidas, pela
Declaração de Londres: havia duas orientações, a francesa e a inglesa. A inglesa
sustentava que os navios neutros que se dirigissem para o porto bloqueado não
precisavam de nenhuma notificação especial e que bastava a notificaçãg feita ao
Estado neutro. Só haveria notificação especial para: a) navios que viessem de portos
longínquos; b) navios que viessem de portos onde não se soubesse da existência
do bloqueio; c) quando não houvesse notificação, isto é , n.o caso de bloqueio de
fatò.-A francesa afirmava que deveria ser sempre feita uma notificação especial ao
navio e este estaria sujeito a captura se depois desta noLificação tentasse violar o
bloqueio.
23. Para caracterizar a violação do bloqueio há duas doutrinas: a anglo-ame­
ricana e a da Europa Continental. A anglo-americana (doutrina do direito de
prevenção) defende que “ é passível de captura o navio que, ciente do bloqueio,
vai de um porto neutro com destino a um porto bloqueado, bem como o que,
sabendo, em caminho, da existência do bloqueio do porto para onde se dirige,
continua na mesma direção” . A doutrina continental para considerar a existência
de violação do bloqueio leva em consideração apenas o fato consumado ou a
tentativa real de violar o bloqueio (Accioly).
24. A doutrina anglo-am ericano sustenta “que o navio infrator pode ser cap­
turado enquanto não chegar ao seu porto de destino final, tenha sido ou não
perseguido” . E a aplicação da teoria da viagem contínua, condenada no art. 19,
acima citado, pela Declaração de Londres (Accioly).
25. A palavra “contrabando” vem do italiano “con trabband o’ que significa
literalm ente “contra a proclam ação, contra a ord enança” , isto é, “contra os de­
cretos ou proclamações com inatórias, pelos quais se proibia o tráfico de certos
artigos” (Accioly). Neste sentido, Rousseau. Segundo G en et vem do espanhol
(“contrabando” ). Para esclarecer: “ ban”, no antigo direito, é “a ordem notificada
e proclamada publicam ente” (G en et).
26. No sentido de apenas as armas e munições constituírem contrabando
manifestou-se a I a Liga de Neutralidade Armada.
27. Formam o contrabando condicional aquelas mercadorias que são capazes
de um duplo uso: pacífico e beligerante.
28. Na Conferência de Haia (1907) a Inglaterra propôs a abolição do. con tra­
bando de guerra, mas o seu projeto foi rejeitado.
29. Grotius falava em “res ancipitis usus” .
30. A distinção entre contrabando absoluto e contrabando condicional desa­
pareceu “de fato” na última guerra mundial, com a “generalização da presunção
de em prego pelo inimigo” . Na 2r Guerra Mundial os Estados não fizeram mais
“listas detalhadas” do que consideravam contrabando, usaram “fórmulas gerais” ,
e cabia ao Tribunal de Presas “estabelecer a presunção de emprego pelo Estado

1623
inimigo que tornará confiscáveis as mercadorias cm si mesmas inofensivas” (Rous­
seau) .
31. Na 2- Guerra Mundial esta teoria recebeu na jurisprudência inglesa uma
grande amplitude e não se exigiu mais "a proximidade imediata do porto de
destino aparente e do território inim igo", bastando que um referido porto seja
“utilizado para reexpedição ao inimigo” (Rousseau).
32. A jurisprudência inglesa no século X IX , por influência do Lord Stowell,
para o confisco do navio levava em consideração se o armador sabia do contrabando
de guerra.
33. E a cham ada teoria da infecção, que já estava consagrada no Tratado de
Utrecht de 1713. Os Tribunais de Presas, durante as guerras mundiais, da Europa
Continental não aplicaram mais este princípio, afirmando que a Declaração de
Londres não era obrigatória. Já o Tribunal de Presas inglês, em nom e de “ antigos
procedentes” , continuou a aplicá-lo.
34. Na 2® Guerra Mundial a Inglaterra introduziu a prática do “ ship's warrant” ,
que era um passe “entregue a barcos (não britânicos) cujos proprietários ou
afretadores concluíssem acordos satisfatórios com o Ministério de Transportes de
Guerra em Londres, visando a que todos os barcos sob seu controle se absteriam
de efetuar tráfico de contrabando, ou tráfico capaz de produzir algum benefício
ao inim igo". Em 1942, a Inglaterra passou a só conceder “navicert” a navio que
possuísse “ship’s warrant" inglês (Colom bos).
35. Em 1939 uma lei alemã restaurou um sistema que já havia sido parcialmente
praticado na l s Guerra Mundial e que consistia “por intermédio de seus repre­
sentantes em países neutros europeus entregar certos documentos ( ‘Geleitschei-
ne’), que autorizavam a expedição de mercadorias cujo trânsito o dito governo
julgava poder perm itir sem inconveniência para seus interesses” . Eles visavam os
transportes terrestres (Accioly).
36. Surgiu em 1941.
37. Não há razão assim para ser utilizada ejm relação à assistência hostil, como
já ocorreu, a expressão “contrabando por analogia”. Entretanto, esta expressão é
ainda a preferida de alguns doutrinadores, com o A. Miele, que segundo ele indica
“co m clareza que a ação individual considerada deve ser reconduzida à categoria
de contrabando de guerra e a disciplina própria deste instituto, mudando apenas
a natureza do bem ou serviço prestado pelo terceiro”.
38. O transporte de militares é proibido aos neutros desde os meados do
século XV II em vários tratados.
39. E perm itido ao beligerante conduzir o navio privado neutro a um porto
neutro para ali exercer o direito de visita. Entretanto isto só deve ser feito “quando
houver motivo real para se suspeitar da presença do contrabando” (Accioly).
40. O c o m b o i o escolhia um chefe, q u e era chamado “am iral”, daí carta de
“am irauté” (Colombos).
41. E interessante assinalar que na 2 3 Guerra Mundial os navios neutros
(exceção dos espanhóis) viajaram em com boio sob a proteção de navios de guerra
aliados. Era “violado” assim o que estabelecia a Declaração de Londres, que exigia
que o navio de guerra fosse da mesma nacionalidade do mercante. Por outro lado,
a jurisprudência internacional tem assimilado os navios neutros sob proteção dos
beligerantes a navio inimigo (Rousseau). - .
42. S e o n a v io n eu tro f o r destruído n a perseguição, a responsabilidade é sua.
CAPÍTULO LXXI

NEUTRALIDADE AÉREA1

674 — Deiieres e direitos dos neutros; 675 — Bloqueio aéreo; 676 —


Presa; 677 — Conclusão.

674. Os Estados neutros não devem permitir a passagem de aeronave


militar beligerante em seu territorio. Caso isto ocorra, ela deverá ser “se­
qüestrada, com o respectivo material, e a tripulação deverá ser internada’’
(Accioly). Entretanto, deverá ser verificado se a violação foi feita intencio­
nalmente ou não, o que pode ser testado por meio de uma intimação, isto
é, se ela atender à intimação e se retirar não deverá ser obrigada a descer
para ser seqüestrada.
Se a aeronave militar beligerante aterrar em territorio neutro por motivo
de tempestade, etc., não deverá ser seqüestrada (Balladore Pallieri).2
Um outro aspecto que deverá ser analisado é o de uma aeronave militar
beligerante naufragada ou desamparada ser encontrada em zona de alto-
mar por aeronave neutra. Se quem a encontrou for uma aeronave militar
neutra, a aeronave beligerante será seqüestrada e a tripulação internada.
Se quem a encontrou for aeronave privada neutra, a aeronave beligerante
será seqüestrada e a tripulação ficará em liberdade.
O Código de Haia1 determina que um Estado neutro não é obrigado
a “impedir a exportação ou o trânsito, por conta de um beligerante, de
aeronave, de peças soltas, ou de material, implementos ou -munições para
aeronaves”. Entretanto, determina o mesmo código que o neutro deve: a)
“impedir a saída d.e sua jurisdição de uma aeronave pronta para realizar
um ataque contra uma potência beligeran te ou que for portadora ou estiver
aparelhada de aparatos ou de material cuja montagem ou utilização lhe
permitisse perpetrar úm-ataque, se existirem razões para crer que essa
aeronave se acha destinada a ser utilizada contra uma potência beligeran­
te”; b) “impedir a saída de uma aeronave cuja tripulação compreenda um

1625
m e m b ro qualquer das forças combatentes de uma potência beligerante’’;
c) “impedir ¿1 realização em uma aeronave de obras destinadas a preparar
sua saída em contraposição com os propósitos cio presente artigo”. O
governo neutro não pode direta ou indiretamente fornecer a um belige­
rante aeronaves, peças soltas, munições, etc. Entre os direitos dos neutros,
podemos mencionar o de “proibir ou regulamentar em tempo de guerra
o acesso, os movimentos 011 a estadía das aeronaves em sua jurisdição”
(Código de H aia).4 Tem-se reconhecido também o direito de angária em
relação às aeronaves. Estes direitos não são apenas dos neutros, mas tam­
bém dos beligerantes.
675. O bloqueio aéreo segue as mesmas condições de validade do
bloqueio marítimo: a) efetividade, isto é, “força aérea suficiente para
impedir o acesso aéreo do território bloqueado” (Accioly); b) declaração
e notificação.
A sanção da violação do bloqueio é a mesma do bloqueio marítimo:
confisco da aeronave e, às vezes, também da carga. O Código de Haia
declara que ela é passível de captura se tenta forçar um “bloqueio devi­
damente estabelecido e mantido efetivamente”. Uma aeronave que tenha
violado um bloqueio só pode ser capturada “até haver alcançado o seu
ponto de destino” (Accioly).
Na verdade, devemos reconhecer que é difíci) que haja um bloqueio
realizado apenas com forças armadas aéreas.
676. O Código de Haia estabelece que uma aeronave privada neutra
se encontra sujeita a captura: “<z) se resiste ao legítim o e x e r c íc io d o s direitos
dos beligerantes; b) se viola uma proibição de que tivesse conhecimento
por uma publicação de um comandante beligerante, em virtude das dis­
posições do art. 30;5 c) se é culpada de assistência hostil; a) se está armada,
em tempo de guerra, fora da jurisdição de seu próprio país; é) se não tem
marcas externas, ou se usa marcas falsas; j) se não tem papéis de bordo
ou se os papéis são insuficientes t?u irregulares; g) se está, manifestamente,
fora da sua rota, entre o ponto de partida e o ponto de destino indicados
em seus papéis, e se, após o inquérito que o beligerante possa julgar
necessário, nenhuma justificação é fornecida a respeito de tal desvio. A
aeronave, assim como os membros da tripulação e os passageiros podem
ser retidos durante o inquérito; h) se transporta contrabando de guerra
ou ela é em si mesma'contrabando; 2) se tenta forçar um bloqueio devi­
damente estabelecido e.mantido efetivamente;/) se passou da nacionali­
dade beligerante para -a nacionalidade neutra em data e circunstâncias
que indiquem a intenção de escapar aos riscos a que uma aeronave inimiga
se acha, com o tal, exposta”.
Salienta H. Accioly -com razão que com exceção da alínea j a aeronave
só pode ser capturada por infração cometida no decurso da viagem.
Estabelece ainda o citado Código de Haia: a) a aeronave privada
inimiga está sujeita, “ em qualquer circunstância”, à captura; b) as aeronaves

1626
públicas civis neutras “só esuio submetidas ao reconbccimenlo fie seus
papéis".
A captura de uma aeronave 011 mercadorias a bordo de aeronave deverá
ser apreciada por um Tribuna! de Presas, que segue as mesmas normas
do direilo marítimo.
A destruição de presas aéreas6 neutras só é admitida excepcionalmente,
em caso de “existir uma necessidade militar de extrema urgencia que não
permita ao comandante liberá-la ou fazê-la conduzir peíanle o Tribunal
de Presas para ser julgada”. Entretanto, anles de ser destruída deverão ser
postas a salvo as pessoas que estejam a bordo, bem como os papéis de
bordo. Estas normas constam do Código de Haia.
677. Podemos finalmente assinalar que a neutralidade aérea, com
algumas exceções, segue as normas da neutralidade marítima.'
A Convenção de 1949 para a melhoria da sorte dos feridos e enfermos
dos exércitos em campanha admite as aeronaves sanitários e aterrisarem
em Estados neutros em caso de necessidade-, fazer escala e desembarcar
feridos com o consentimento do Estado. O Protocolo 1 de 1977 declara
que o sobrevôo do territorio de Estado neutro por aviões solitarios está
subordinado a acordo prévio entre as partes e a transmissão do plano de
vôo.

1627
NOTAS

]. V. Bibliografia do capítulo LXIY.


2. Os aviões a bordo de um navio seguem a condição do navio e o régim e
deste.
3. Elaborado em 1923 e de valor puramente doutrinário.
4. D urante a 23 Guerra Mundial inúmeras vezes o território aéreo dos neutros
foi violado.
5. Este artigo declara que um com andante para assegurar o êxito de suas
operações militares pode impedir o sobrevôo de aeronave neutra na área em que
está operando.
6. V. capítulo G uerra Aérea.
7. Assim “ as aeronaves privadas se ãcham sujeitas à risita e à captura por parte
das aeronaves militares beligerantes” (Regras de H aia).

1628
CAPÍTULO LXXII

FIM DA GUERRA1

678 — Modos de terminação da guerra; 679 — Tratado de paz; 680


— Capitulação incondicional; 681 — Efeitos; 682 — Poslímfnio; 683
— O julgamento dos criminosos de guerra; 684 — O Brasil e as
reparações.

678. A guerra entre os Estados pode terminar de várias maneiras, sendo


entretanto que a mais comum é a da conclusão de um tratado de paz.
Na 2S Guerra Mundial adotou-se a capitulação incondicional.
Um outro modo é a “debellatio”, isto é, quando um dos beligerantes
é aniquilado completamente. O beligerante não tem mais meios de resis­
tência. E a ocupação total do território do vencido, sem que haja mais luta
qüe possa ser considerada guerra (Balladore Pallieri).2
A História até o século XIX registrou ainda uma outra forma pela qual
a guerra terminava: as hostilidades eram simplesmente cessadas. Sereni
denominou este modo de “ desistência”. Ele foi sendo abandonado devido
às questões que deixava em aberto.3 Um outro modo não clássico de
término dá guerra é o ato unilateral. Assim, em 1919 o Parlamento chinês
votou uma lei colocando fim ao estado de guerra com a Alemanha, e em
1920 o Congresso americano terminou o estado de guerra por meio de
uma declaração.
679. A conclusão de um tratado de paz é o modo normal de terminação
da guerra. Ele é geralmente antecedido de um armistício que algumas
vezes “é seguido de um ajuste de ‘preliminares de paz’ ou é fixado ao
mesmo tempo que ele” (Accioly).
Após a 2- Guerra Mundial, em vários casos, o tratado de paz não foi
concluído. Em 1945, o acordo de Potsdam estabeleceu que deveria ser
elaborado um tratado de paz com a Alemanha, que até hoje não_ foi
concluído. Em 1956, o Japão e a URSS fizeram uma declaração em comum
pondo fim ao estado de guerra.

1629
O tratado de paz segué as normas gerais do processo de conclusão
dos tratados. Entretanto, é de se assinalar que pda sua própria natureza o
tratado de paz é válido apesar da coação que normalmente existe sobre o
vencido. A doutrina tem, contudo, condenado os denominados tratados
leoninos.
Ele normalmente contém, além da regulamentação da situação entre
o vencedor e vencido, tima cláusula que trata das reparações. Militas vezes
é criada uma comissão de reparações. Esta cláusula, que obriga o vencido
a pagar uma indenização de guerra, ven) sendo incluida nos tratados de
paz desde o século XVIII. ^ No século X IX era comum os tratados estipu­
larem o pagamento de uma indenização pelo vencido. O vencedor arbi­
trariamente calculava a indenização levando em consideração o custo da
guerra para si e incluía as perdas em propriedades e vidas civis. Atualmente,
não se fala mais em reparações, que deve abranger os danos materiais
provocados pelo agressor (ou seja, o vencido...). Esta prática surgiu no
Tratado de Versalhes por influencia dos EUA e da Austrália.'1'' Na 2- Guerra
Mundial as reparações passaram a ter um fundamento diverso que não é
apenas para cobrir “as perdas sofridas, mas também pelo fardo suportado
e a parte assumida na realização da vitória comum” (Rousseau). Assim as
reparações deveriam ser dadas primeiramente às potencias que maiores
perdas sofreram e mais contribuíram para a vitória. Ao contrário da l 3
Guerra Mundial, em que a reparação era em dinheiro, aqui se admitiu
que fosse em mercadorias, fábricas, etc. Por outro lado, tem-se acrescen­
tado, além da indenização pelos danos, “a idéia de compensação fundada
na responsabilidade do Estado vencido em razão da agressão cometida
por ele” (Meyrowitz). E uma sensação, tendo em vista que o agressor violou
o DI. No século X X as reparações deixam de ser arbitrarias e com exceção
de 1918 e 1945 elas não são mais fixadas unilateralmente pelos vencedores
(Tran Van Minh). É interessante observar que no tratado de paz com o
Japão não se levou em consideração a questão de quem foi o agressor. O.
Tratado de São Francisco (1951) reconhecia que o Japão devia pagar
reparações pelos danos causados, mas se reconheceu que os recursos do
Japão não eram suficientes para isto e “m anter uma economia viável”. A
idéia de pagamento de reparação pela Alemanha vai figurar em vários
atos, desde a Conferência de Moscou em 1943 e inclusive a Declaração de
Potsdam em 1945. C o m o regra gei'al, só têm d ireito a rep a ração as cole>-
tividades que já eram Estados no inicio da guerra. Assim a Polonia não
recebeu reparações em 1919. Entretanto, Israel, em nome dos judeus,
conseguiu uma reparação da Alemanha Ocidental. Nos tratados de paz do
Japão com a Birmania (1954) e a Indonésia (1958), as reparações foram
feitas por meio de verdadeiros investimentos do Japão nestes países.
As tendencias atuais em matéria de reparação, segundo Tran Van
Minh, são as seguintes: a) “o montante das reparações é em função do
grau de responsabilidade”. Assim, após a l 3 Guerra Mundial a . Bélgica

1630
recebe» reparação integral, porque a violação da Alemanha em relação a
ela foi a mais grave; b) as desposas com a guerra não são indenizadas, só
o sendo as peí das em virtude de operações militares; c) há uma limiuição
das reparações à capacidade de pagamento do Estado responsável.
Os EUA, após a guerra do Vietname, sustentaram que não pagariam
reparações. Entretanto o Acordo de Paris (1973) prevê o pagamento de
uma “contribuição” pelos EUA, que é uma verdadeira reparação.
Os tratados de paz constuniam prever a garantía de sua execução, que
é normalmente a ocupação militar do território do vencido. Esta ocupação
pacífica apresenta as seguintes características: a) o ocupante tem o direito
de requisição e de tratar da segurança do exército, podendo declarar o
estado de sítio; b) é temporária, sendo o prazo determinado no tratado de
paz; c) ela não é modo de aquisição de territorio; d) a legislação aplicada
é a do ocupado, sendo que a do ocupante só é aplicada no que diz respeito
à segurança do exército; e) a competência administrativa e judiciária é do
ocupado, com exceção no que se refere ao exército de ocupação.
680. A expressão “capitulação sem condição” foi utilizada por Roose-
velt em 1943 na Conferência de Casablanca pela primeira vez.4B Ela signi­
ficava que os Aliados “no fim das hostilidades não estariam ligados por
qualquer obrigação de origem jurídica em relação à Alemanha” (Rous­
seau).
A idéia de capitulação incondicional vem da Guerra de Secessão, quan­
do foi imposta ao Sul para que fosse aceita a autoridade federal.
No caso de capitulação incondicional, são concluídos tratados, mas o
vencido não conclui propriamente um tratado, pelo contrário, ele, por
meio de um ato unilatera, dá uma adesão às condições determinadas pelo
vencedor. Este procedimento foi utilizado em relação ã Alemanha após a
2® Guerra Mundial.0
Pode-se repetir, com Georges Soutou, que a Guerra Mundial já criara
um novo tipo de paz, em que pela primeira vez o vencido não participa
da negociação de paz.
681. Os efeitos do fim da guerra podem ser resumidos, segundo Accioly,
nos seguintes: d) “cessação absoluta das hostilidades e, por conseguinte,
dos direitos e deveres de beligerância e de neutralidade”;6 b) restabeleci­
mento de relações diplomáticas; c) a solução do “casus belli”; d) “ a anistia
para os atos políticos ou militares cometidos, durante a guerra, pelos
nacionais de um dos beligerantes contra os nacionais do outro”. OTribunal
de Nurembergue julgou crimes de “ categoria especial” e não propriamente
crimes políticos e militares; é) se o tratado de paz não determinar o
contrário, aplica-se o princípio do “uti possidetis”, isto é, a manutenção
do estado de coisas em que se celebra a paz”; J) o restabelecimento de
tratados deverá ser estipulado expressamente no tratado de paz, caso con­
trário ele não ocorrerá.

1631
O fim da guerra não estabelece assim automáticamente o "status quo
belluni” , por exemplo, não há obrigação de entrega do território ocupado,
etc., que deverá ser convencionado no tratado de paz.
682. O “jus postliminii” 110 direito romano era " o direito de retomai'
retroativamente todos seus direitos, reconhecido na época clássica, em
proveito do cativo que retom ou efetivamente sobre o território romano,
com a intenção de nunca mais retornar ao inimigo" (R. Monier — Petil
Vocabulaire de Droit Romain, 1942). Este instituto foi mlizado por alguns
intemacionalistas (Oppenheim-Lauterpacht) para explicar que os bens,
indivíduos e território que estiverem em mãos do inimigo ao retornarem
ao seu Estado voltam a ter a mesma situação que possuíam antes de cair",
em .mãos do inimigo. Ele é defendido apenas em relação à ocupação
durante a guerra de território por inimigo e não atingiria os atos legítimos
praticados pelo ocupante. E de se lembrar que a doutrina (Wengler) tem
considerado que cada Estado é livre para manter ou não a validade dos
atos praticados pelo ocupante, mesmo aqueles que não violaram o direito
de guerra.
Na verdade, não há razão para se adotar esta teoria, vez que em relação
aos particulares a guerra não deve atingi-los, porque a guerra é entre os
Estados. Em conseqüência, os seus direitos 110 máximo ficarão apenas
suspensos enquanto houver guerra. Por outro lado, “no tocante às relações
entre Estados beligerantes... (ele) não pode ter por efeito restabelecer,
retroativamente, direitos de soberania, que não foram anulados” (Accioly,
Fauchille). Na verdade, a ocupação do território durante a guerra não
ocasiona a transferência de soberania. A soberania do Estado a que ele
pertence fica apenas suspensa.
683. Sobre o julgamento dos criminosos de guerra, v. capítulo X X X .
684. Durante a I a Guerra Mundial, decreto de 13-5-1917, o governo
brasileiro apreendeu os navios de nacionalidade alemã que estavam em
portos brasileiros.' O Brasil os “apreendeu” e não “confiscou’7. Mesmo
após a declaração de guerra mantivemos o regime destes navios como
“apreendidos”. Após a guerra, Epitácio Pessoa defendeu que estes navios
serviriam para indenizar as reparações que a Alemanha deveria nos pagar.
Contudo, as grandes potências defenderam que os navios que nãahaviam
sido confiscados e nem submetidos a Tribunais de Presas tinham que ser
divididos entre os Estados que tiveram perdas marítimas. O Brasil adjudicou
os navios “mediante indenização razoável”, bem como por um acerto de
contas, tendo em \ista que a Alemanha reivindicava uma indenização por
termos usado os navios.
O Decreto-lei n- 4.611, de 24-8-42, incorporou os navios alemães ‘e
italianos ao Lloyd Brasileiro, isto é, ao patrimônio nacional. Foram incor­
porados três alemães, onze italianos, cinco dinamarqueses e um finlandês.
Estes navios não podiam sair dos portos brasileiros devido ao patrulha-
mento da Inglaterra. Em 1942, criou-se a Comissão de Reparações de
Guerra, que funcionou alé 1960 e era presidida pelo ministro do Kxierior.
Ainda em 1942 foi criado o Fundo de Indenização, no ámbito do Banco
do Brasil, com a finalidade de administrar e posteriormente liquidar os
bens confiscados aos países inimigos.
Após a 2a Guerra Mundial o Brasil devolveu sete navios italianos e
guardou os alemães.
Os latino americanos, conforme resolvera a Conferencia de Polsdam,
da qual eles não participaram, deveriam obter as “reparações" dos da nos
que sofreram com os bens do Eixo que se encontravam em sen território.
Assim sendo, o Brasil não participou da Conferência de Reparações, rea­
lizada ern Paris, em 1945.

1633
NOTAS

]. Isidoro Ruiz .Moreno — Guerra Terrestre y A érea, 1926, págs. 314 e segs.;
Pieter N. Drost — Contraéis and Peace Treaties, 1948; Larnaude, H. Barlhlémy,
Joseph Barlhlémy, A. Weiss, Louis Rolland, Jacques H erm ant — La Réparation
des Dommages de Guerre, 1917; H enri Meyrowkz-— Le Principe de l’Egalité des
Belligérants devani le droit de la guerre, 1970, págs. 17 e segs.; Tran Van Minh
— Les reparations de guerre au Vietnam et le droit international, in RGDIP, t.
8.1, 1977, págs. 1.407 e segs.; Alfons Klafkowski — Les Form es de Cessation de
l’É iat de Guerre en Droit International, m RdC, 1976, vol. I, t. 149, págs. 217 e
segs.; Nisuke Ando — Surrender, Occupation and Prívate Property in International
Law. An Evaluation o f Som e U nited States Practices during o f Surrendered japan,
m K obe University Law Review, n9 20, 1986, págs. 1 e segs.
2. Na “debellatio" não significa sempre que o vencedor vai se apoderar do
territorio do vencido.
. 3. A doutrina considera que neste caso deverá predom inar o “status quo post
bellum ” ou “uti possidetis” (Accioly).
4. Neste século ela é o “resgate da derrota” (Rousseau).
4A. Os tratados das duas guerras mundiais não parecem incluir a obrigação
do Estado agressor reparar todos os danos causados por ele mesmo e os causados
por seus adversarios (Meyrowitz).
4B . V.: Máxime Mourin — Rendition sans Conditions, 1973.
5. Sobre a Alemanha, v. capítulo LXII.
6. Os Tribunais de Presas têm efetuado julgam entos, após o fim da guerra,
de presas feitas durante a guerra.
7. Este inciso é inteiram ente calcado na original con ferên cia de Pedro Calmon
Filho sobre a participação da M arinha do Brasil na 23 Guerra Mundial — O
arrestam ento dos navios m ercantes italianos e_ajemães e a sua liquidação depois
da 2“ Guerra Mundial. Esta conferência foi pronunciada em setem bro de 1974.
APÊNDICE

D. I. Econômico
i
CAPÍTULO LXXIII

DIREITO INTERNACIONAL ECONÓMICO1

685 — Introdução; 686 — Definição; 687 — Aspectos Gerais; 687A


— Solução dos litígios econômicos; 688 — DI da moeda; 688A — DI
do desenvolvimento; 689 — Conclusão.

685. O estudo do DI Econômico lem alcançado cada vez maior im­


portancia nas relações internacionais. E em torno dele que tem ocorrido
o maior número de disputas. E onde tem ocorrido o maior número de
choques entre países ricos e pobres. As organizações econômicas são, ao
lado das militares, as que predominam nas relações internacionais.2
No período do liberalismo os Estados não interferiam nas relações
econômicas. Havia uma “despolitização da esfera econômica”. A.interven­
ção estatal comeca a partir da década de 1930 quando há uma “ publicização
das relações econômicas internacionais”. Para Vellas cerca de 80% das
regras de Direito .Internacional que entraram em vigor após 1945 são de
natureza econômica.
686. Schwarzenberger define Dl Econômico como “sendo o ramo do
DIP que trata da: a) propriedade e exploração dos recursos naturais; b)
produção e.distribuição de bens; c) (...) transações internacionais de as­
pecto econômico ou financeiro; d) mo'eda e finanças; e) matérias relacio­
nadas; _/) o ‘status’ e a organização dos que se encontram empenhados em
tais atividades” z1
Rttuter o define como o ramo do DIP que visa regulamentar juridica­
mente os problemas relativos à produção, ao consumo e à circulação das
riquezas.
Para D. Carreau ele é o ramo do Dl “ que regulamenta, de um lado a
instalação sobre o território dos Estados de diversos fatores de produção
(pessoas e capitais) que provenham do estrangeiro e, de outro lado, as
transações internacionais aos bens, serviços e capitais”. Ele teria como

1637
ramos: a) direito dos investimentos; b) direito das relações econômicas; r)
direito das instituições econômicas; d) direito das integrações econômicas
regionais; e) direito da situação do estrangeiro (D. Carreau). Podemos
dizer que em sentido amplo é o “direito das transações econômicas inter­
nacionais”. Ele visa proteger os Estados mais fracos. Entretanto, ainda tem
sido predominantemente um “direito do poder econômico” (G. Faijat).
O DIP tem um conteúdo econômico em praticamente toda a sua
extensão, e estudar o Dl Econômico é no fundo estudar quase todo o DIP.
Vamos nos limitar à exposição de apenas alguns princípios.
687. O Dl Econômico é talvez o setor do DIP em que se encontra mais
aberta a luta entre o nacionalismo e o internacionalismo. Vimos que os
Estados têm direito de dispor livremente dos seus recursos econômicos,
mas por outro lado existe uma necessidade para todos os Estados do
desenvolvimento do comércio internacional e o grande debate é em torno
de se estabelecer os termos em que este deve ser processado.
O Dl Econômico só tem alcançado maior desenvolvimento nos últimos
anos, o que explica a sua sistematização. Esta contudo decorre principal­
mente do choque de interesses entre países ricos e pobres, que acaba por
impedir a fixação de normas sobre a matéria.
Starke apresenta os seguintes princípios para o Dl Econômico: a) o
Estado não pode introduzir restrições comerciais discriminatórias; b) o
Estado não pode impedir o pagamento de lucros de investimentos estran­
geiros realizados no seu território. Este princípio pode sofrer restrições;
c) os Estados devem cooperar na estabilização dos preços das mercadorias;
d) os Estados devem evitar o “dumping” e a criação de estoques que
interfiram no desenvolvimento de países subdesenvolvidos; e) há uma ten­
dência para se restringir as barreiras comerciais; f ) há uma tendência para
se eliminar as restrições quantitativas de importações e exportações; g) os
Estados subdesenvolvidos têm direito a uma assistência econômica.
O Dl Geral não limita a competência do Estado em matéria de direitos
aduaneiros, proibições de importação ou exportação, etc. As restrições ou
regulamentações existentes são sempre decorrentes de tratados, sem que
se possa dizer que elas são obrigatórias para todos os Estados, mas apenas
para os contratantes. Entretanto, esta cooperação comercial estabelecida
por meio de tratado não é nova e acordos bilaterais são encontrados nos
séculos XII e XIII.
Os Estados consideram que esta matéria pertence à sua jurisdição
doméstica e que eles podem regulamentá-la livremente, a não ser quando
limitarem a soberania por seu consentimento expresso, manifestado em
um tratado. Desde o século XIII que os reis consideram com o seu atributo
fixar as taxas de câmbio.
No século XIX, tendo em vista as conseqüências da revolução, indus­
trial, os Estados começam a estabelecer restrições às importações.
A d ificu ld ad e para se e s ta b e le c e r unía re g u la m e n ta ç ã o in tern acio n al
n o s e to r e c o n ó m ic o é e x p licad a, c ita n d o a ju ris p ru d ê n c ia n o rte-am erican a,
p o r um d os nossos raros (talvez ú n ic o ) esp ecialistas nestt- ram o d o DIP.
q u e é C elso L afer, no sen tid o d e q u e as possibilid ad es são tão g la n d e s que
se to m a im possível fazer u m a re g u la m e n ta ç ã o g eral.
W eil a p re se n ta u m a sérié de ca ra cte rística s p ró p ria s ao D l E co n ô m ico :
a) “a obsessão pelo fato”, ocasionando uma série de consultas entre os
Estados; b) o princípio da igualdade é “ reinterpretado” tendo em vista o
tratamento especial reivindicado pelos subdesenvolvidos; c) as suas normas
são imprecisas e maleáveis, trata-se de "uma regra de direito fugidia",
decorrência do fato que as “flutuações inerentes à vida econômica são
muito rápidas e muito amplas” ; d) a sanção é a não participaçao;'.e) a
solução dos litígios não é feita por procedimento arbitrai ou judiciário,
mas por negociações ou através de órgãos internacionais.
Malinverni apresenta as seguintes características: a ) a norma do Dl
Econômico é móvel e funciona] e está constantemente se adaptando; b)
ele tem espontaneidade e realismo e é aleatório;1' c) é escorregadio e
indeterminado. E particular e casuista; d) as obrigações são vagas e impre­
cisas.
Algumas características podem ser reproduzidas de D. Carreau: á) no
DIP o fundamento é a soberania, enquanto no DIE é a interdependência;
b) tem sujeitos de direito não tradicionais, como empresas multinacionais
e associações de exportadores; c) não é formalista; d) não se adota a
igualdade dos Estados, sendo que os votos do Estados nas organizações
econômicas são ponderados dependendo do seu desenvolvimento (ainda
que excepcionalmente existam organizações consagrando um Estado, um
voto); e) as normas são mais efetivas porque os seus autores têm meios de
fazer com que elas sejam respeitadas; f) a norma não é rígida. Muitas das
normas são redigidas no condicional; g) as obrigações são de comporta­
mento; h) as normas não são “detalhistas”, mas impressionantes; i) o DIE
não tem uma visão legalista e contenciosa de ordem internacional; j) a
solução dos litígios é interna das organizações.
R. Bermejo apresenta para este raino de Direito as seguintes caracte­
rísticas: a) é um" direito de finalidade'. Ele não tem por objetivo apenas a
coexistência entre os Estados, mas é um quadro necessário paca as políticas
econômicas de desenvolvimento. A sua norma traça diretrizes que devem
ser observadas. Os seus princípios não são detalhados. A sua grande fina­
lidade é econômica e ele se encontra a serviço da e.conomia; b) é um
direito móvel no sentido de que é dinâmico que se adapta às flutuações
econômicas e, em conseqüência, as suas normas duram pouco tempo. Ele
é marcado pela “flexibilidade e mobilidade”; c) é um direito realista, sendo
que as suas normas não são abstratas e têm “objetivos bem determinados”;
d ) é um direito programático no sentido de que “visa a atingir um resultado
positivo”.

1639
Alain Pellet salienta que a relatividade da norma tem um tempo favo­
rável lio Dl Econômico e que as resoluções têm um papel preponderante.
Seguindo a Pierre Vellas podemos redigir o presente parágrafo. Ele
observa que para Prosper Weil o DIE está comprometido pela sua flexibi­
lidade e as cláusulas de salvaguarda que destroem as cláusulas principais.,
ou ainda não ter normas, mas programa. Vellas, em resposta a tais obser­
vações, salienta que o Dl Geral também é flexível, porque a sociedade
internacional não é hierarquizada. Por sua vez as cláusulas de salvaguarda
são necessárias devido à rápida evolução que existe nesta matéria. O D.
Intemo também se utiliza de leis-programa. O DIE é mais prospectivo e
visa mais uma mudança de atitude. A “flexibilidade” do DIE não o com ­
promete, porque as suas normas têm um controle eficaz devido ao grande
poder econômico-financeiro das organizações internacionais. O DIE apre­
senta as seguintes características: a) empírico e muito pouco formalista;
b) pragmático (deseja um resultado efetivo); c) é fluido e tem mobilidade;
d) possui vocação supra-estatal; e) não conhece a distinção entre direito
público e direito privado. No tocante às fontes, as normas costumeiras não
têm um papel relevante, porque elas são de formação lenta.
Alguns autores (D. Carreau) têm salientado que o Dl Econômico tem
especificidade e seria formado por normas do Dl Público, Dl Privado e
técnicas financeiras; apesar disto, ele nega a sua autonomia. Entretanto,
estamos de acordo com Prosper Weil para quem ele não é autônomo e é
apenas o Dl aplicado na economia.
A doutrina (Virally, Guy Lacharrière) tem negado uma autonomia e
especificidade ao Direito Internacional Econômico, apesar dele ter algumas
particularidades, como os princípios de não discriminação e reciprocidade
serem adaptados nas relações econ ôm icas en tre países ricos e países pobres.
Para Virally é um direito que não está completamente formado e o jurista
se encontra em uma zona cinzenta. Ojurista, segundo ele, encontra normas
selvagens que não se sabe o que são e cabe ao jurista domesticá-las e
introduzi-las no Direito sem causar dano a este. Para R. Bermejo o Direito
Internacional Econômico tem uma relativa autonomia. Pode-se acrescentar
ainda que a denominada “lex mercatoria” não é uma ordem jurídica
própria, vez que é formada por normas do Direito Interno ou do Direito
Internacional (Julio A. Barberis).
Outra observação que se pode fazer ao Dl Econômico é que ele não
tem uma uniformidade nas suas normas, vez que ele leva em consideração
a desigualdade econômica. Assim existiriam normas para: a) as relações
entre países desenvolvidos; b) as relações éntre estes e os subdesenvolvidos;
c) as relações entre subdesenvolvidos.4 Estas últimas não constituem um
“ regime organizado” e seria um “ direito em formação”. Raul Prebisch
propunha, em 1964, que os países subdesenvolvidos dessem preferência
em seus mercados às importações de países subdesenvolvidos, bem como
que os desenvolvidos dessem preferência às importações dos subdesenvol­
vidos.1'
Os órgãos técnicos da ONU preferem utilizai nos tratados que aprovam
a aceitação e a aprovação em lugar da ratificação para dar maior flexibi­
lidade. As convenções adotadas em conferências plenárias são assinadas
pelo presidente e, outras vezes, o acordo é apenas rubricado, o que no Dl
Clássico significa que o plenipotenciario tem alguma reserva, enquanto
no DIE a intenção é dar tempo aos Estados para estudarem o acordo e,
após algumas semanas, ele é então assinado. Os acordos utilizam-se da
assinatura diferida (P. Vellas). Ainda seguindo a este intemacionalista
francês pode-se acrescentar o uso dos “gentlemeiVs agreements-', que são
respeitados pelos Estados. Na OCDE, apesar do que estipula o "tratado,
prescinde-se da ratificação. Os acordos em forma simplificada são freqüen­
tes no DIE, mas menos usados do que no Dl Geral, porque este precisa
de segredo e aquele de publicidade. A assinatura, muitas vezes, faz com
que o acordo entre em vigor provisoriamente até a ratificação. Os acordos
do DIE se utilizam muito da cláusula de adesão. A retirada de um Estado
de um tratado ocorre para assegurar o interesse do Estado, ou quando ela
é uma sanção usada de modo restritivo e precedida de consulta entre as
partes. No DIE a interpretação e aplicação nas organizações internacionais
econômico-financeiras é realizada pelos conselhos ou comitês executivos
e o regime de consulta é muito utilizado para que o órgão possa dar uma
decisão obrigatória. O pragmatismo decorre do fato da norma não ter
força executória (este parágrafo é fundado em Pierre Vellas).
Nas organizações internacionais econômico-financeiras as recomenda­
ções são precedidas de consulta e tomam-se obrigatórias, vez que são
impostas pelas organizações. São realizados “ciclos de estudos”, isto é,
conferências com debates dirigidos no sentido de que as recomendações
devem ser adotadas.
Antes de entrarmos na Nova Ordem Econôm ica Internacional devemos
reproduzir algumas considerações da maravilhosa obra de Bermejo. Este
intemacionalista espanhol, que tem a mais completa obra sobre os funda­
mentos jurfdicos da NOEI, defirre ordem econômica internacional como
“o conjunto de princípios, de regras e de práticas privadas ou públicas
que regem e organizam as relações econômicas entre o s atores que hoje
determinam a sociedade internacional: Estado, organizações internacio-
-nais e grupos transnacionais”. Observa que inúmeras mudanças ocorreram
após 1945: a erosão do predomínio dos EUA co’m o fortalecimento da
Europa Ocidental e do Japão: o peso econômico crescente dos países
socialistas, a descolonização. Observa Bermejo que a ordem de 1945 era
uma “ordem dos ricos” e ela foi inspirada pelos "EUA e organizada con­
forme um modelo para o 1B Mundo.
Bermejo apresenta uma série de disparidades:, o) os países industriali­
zados (i4cluindo a URSS) no período de 1970-1974 representavam 30,5%

1641
da população mundial e consumiram 87% da energia e asseguraram 82%
da produção e 98% da pesquisa; b) em 1974 o produto nacional bruto por
habitante foi de 7.870 dólares na Suíça e 70 dólares no Laos: c) 32,9% da
população do 3UMundo (560 milhões) vivem na pobreza absoluta; d) em
relação aos direitos especiais de saque no FM1 os países ricos têm 180,4
bilhões de dólares, os exportadores de petróleo 46,2 e os demais 52,8
bilhões de dólares; e) entre 197] e 1979, as dividas do 3a Mundo quadru­
plicaram e o serviço da dívida aumentou em sete vezes, etc. Leopold
Senghor observa que “a troca desigual é a nova forma” de “pilhagem do
3“ Mundo”. André Fontaine ressalta que, em 1989, os países em desenvol­
vimento pagaram 77 bilhões de dólares em juros e reembolsaram 85 bilhões
de dólares aos credores, significando isto que os povos pagaram aos países
ricos 50 bilhões de dólares a mais do que eles receberam sob a forma de
auxílio. Somente três países do mundo desenvolvido (Noruega, França e
Países Baixos) fornecem um auxílio ao desenvolvimento igual ou superior
ao 0,7% de sua renda nacional que a AG da ONU tinha lhes prometido
destinar em 1970.
Tem sido apresentada como um dos primeiros elementos da NOEI a
Convenção de Lomé (1975) entre a CEE e 46 países africanos, Caribe e
Pacífico. Ela estabelece que os países industrializados devem pagar vanta­
josamente pelas materias-primas, deve ser permitida uma certa produção
industrial no 3S Mundo. E em troca é mantida a divisão internacional do
trabalho. Esta Convenção vigorou até 1980. A CEE, por esta Convenção,
estendeu o sistema de preferência aos países africanos, do Caribe e do
Pacífico. Estes davam à CEE o tratamento de nação mais favorecida e se
comprometiam a não fazer discriminação e entre os membros da CEE.
Anteriormente, o acordo de Yaoundé (1963 e 1969) entre a CEE e 18
países da Africa estabeleceu um sistema de preferências e segundo J.
Galtung contribuiu para prejudicar o comércio da África com o resto do
39 Mundo.
Pode-se recordar que estas convenções são varias: a) Yaundé I (1964-
1969); b) Yaundé II (1969-1975); c) Lomé I (1975-1980); d) Lomé II
(1980-1985); e) Lom é III (1985-1990). O sistema geral de preferências
tem a sua origem em uma declaração de R. Prebisch, na UNCTAD, em
1964, que propôs uma política de preferência tarifaria para auxiliar as
novas indústrias dos países em desenvolvimento a encontrarem mercados
no exterior.
A vantagem dos acordos de Yaundé I a Lomé III é que tom a a nego­
ciação permanente, e o conteúdo do acordo deve ser renovado a cada
cinco anos. O sistema geral de preferências se reduziu sob o efeito de
medidas dos países industrializados, bem como o GATT tem reafirmado
princípios liberais de reciprocidade e não-discriminação e sustentado que
os países em desenvolvimento devem voltar progressivamente a eles.

1642
O sistema geral de preferencia náo faz discriminação, não é fundado
na reciprocidade, não é obrigatório e é temporário. Por outro lado, os
Estados que concedem “preferência” lêin um poder discricionário (Feuer
e Cassan). Este sistema tem a sua origem na 1- Conferencia da UNCTAD
em Genebra, em 1964, por influencia de R. Prebisch, que propõe um
tratamento preferencial visando .estimular a exportação de produtos ma­
nufaturados originarios de países em desenvolvimento. Ele foi adotado na
UNCTAD em 1968 e “legalizado” na GATT em 1971, e adotado na CEE
em 1973. Este sistema não é obrigatório e os Estados doadores determinam
as preferencias que eles pretendem conceder. Os países industrializados
consideram o SGP temporario, mas ele tem sido prorrogado. Os Estados
doadores se beneficiam da denominada “cláusula escapatória”, que é urna
cláusula de salvaguarda a posteriori,
isto é, aqueles países podem suspender totalmente a preferencia con­
cedida se ela ameaçar “causar um prejuízo grave aos produtores nacionais”.
A Nova Ordem Económica Internacional atua nos mais diferentes
campos: económico, cultural, político, etc., daí alguns autores (Touscoz)
falarem apenas de um modo mais ampio em Nova Ordem Internacional.
Por outro lado, tem sido assinalado que as relações econômicas se politi­
zaram. A grande finalidade da NOE1 é a luta contra o subdesenvolvimento,
que é um fato político (Maurice Flory)- A conceituação de subdesenvolvi­
mento tem variado. Na ONU, inicialmente, se utilizou da renda nacional
por habitante, sendo que primeiro se falou em 500 dólares anuais, depois
600, 700, etc. Foram propostos outros critérios, com o analfabetismo, taxa
de poupança, etc. Atualmente surgiu uma nova categoria, a dos países
atrasados, que está abaixo dos em desenvolvimento. Na ONU, o grupo de
trabalho do Comitê de Planificação do Desenvolvimento fixou os seguintes
critérios para identificar os países atrasados: a) produto bruto por habitante
inferior a 100 dólares; b) contribuição da indústria no produto interno
igual ou inferior a 10% ; c) taxa de alfabetizados (de 15 ou mais anos)
igual ou inferior a 20% . A UNCTAD fala também em, além de beneficiar
os países atrasados e os em desenvolvimento, beneficiar também os sem
litoral eos insulares. Posteriormente acrescentou os países mais gravemente
atingidos por crises econômicas e catástrofes naturais. O PNUD Estabelece
quatro categorias de países em desenvolvimento: a) países menos avança­
dos; b) países com pequena renda por habitante (100 dólares); c) países
com rendimento médio p or habitante; d) países com rendimento elevado
por habitante. Há dúvida sobre a que fixar para as. categorias c e d: 350,
500 ou 700 dólares. Na OCDE se fala em auto-eleição para ser desenvolvido
ou em desenvolvimento, e que ela necessita de ser reconhecida. Estas
observaçõessão tiradas de Bermejo. Surge hoje, em conseqüência, o direito
ao desenvolvimento (v. capítulo X X IX ).
A grande preocupação atualmente é com a criação da Nova Ordem
Econômica Internacional, visando uma proteção dos subdesenvolvidos nas

1643
relações econômicas internacionais. Esle lema surgiu por pressão dos sub­
desenvolvidos, en) 1974, na Assembléia Geral
Os documentos que consagram esta Nova Ordem não são meramente
econômicos, mas também políticos. O status d e país em desenvolvimento
o tom a credor de um determinado tratamento. Alguns autores vêem nela
unia contradição ao se assinalar a responsabilidade da comunidade inter­
nacional como um todo na luta contra o subdesenvolvimento e, ao mesmo
tempo, se defender a soberania dos produtores de matérias-primas.
Em maio de 1974 a Assembléia Geral da ONU aprovou uma "decla­
ração relativa à instauração de uma nova ordem econôm ica1' e o “programa
de ação relativo à instauração de uma nova ordem econômica internacio­
nal” . Jacques Mourgeon declara que elas têm na descolonização econômica
a mesma importância que a Declaração de Bandoeng para a descolonização
política.
A Carta de Direitos e Deveres Econômicos dos Estados415 aprovada pela
Assembléia Geral da ONU em dezembro de 1974 estabelece como “prin­
cípios das relações econômicas internacionais”: a ) soberania e igualdade
dos Estados; b) não agressão; c) não intervenção; d) benefício mútuo e
equitativo; e) coexistência pacífica; f) não estabelecimento de zonas de
influência e hegemonia; g) respeito aos direitos do homem e liberdades
fundamentais; h) cooperação internacional para o desenvolvimento; i)
cumprimento das obrigações internacionais com boa fé; j) solução pacífica
dos litígios; etc. Entre os direitos e deveres econômicos dos Estados pode­
mos mencionar: a) o Estado tem o direito soberano de escolher o seu
sistema econômico; b) o Estado tem completa soberania sobre os seus
recursos e atividades econômicas;4C c) regular e supervisionar as atividades
das empresas transnacionais dentro de sua jurisdição. Estas empresas não
podem intervir nos assuntos do Estado; d} regulamentar o investimento
estrangeiro; è) nacionalizar e expropriar a propriedade pertencente a es­
trangeiro. Esta matéria deverá ser resolvida por seus tribunais internos, a
não ser que o Estado livremente acorde diferentemente; f ) não haverá
discriminação no comércio internacional em virtude de sistema político,
econômico e social do Estado; g) o direito de se associar em organizações
de produtos de base para desenvolver a economia nacional; h) dever de
contribuir para o desenvolvimento do comércio internacional de merca-
•dorias através de acordos multilaterais que levam em consideração os
interesses dos produtores e consumidores; í) o Estado é livre para escolher
os meios de realizar a sua principal responsabilidade, que é promover o
desenvolvimento;^) dever de cooperar em matéria econômica, social, cul­
tural, científica e tecnológica para promover o progresso econômico e
social; l) os Estados têm o direito de participar em pé de igualdade na
tomada de decisões sobre matéria econômica, financeira e monetária; m)
devem ser estimuladas medidas e a eficiência das organizações para pro­
mover o desenvolvimento; n) direito de se agruparem em organizações
regionais para o seu desenvolvimento econômico; o) direito de se beneficiar
dos avanços na tecnologia^e ciência visando o seu desenvolvimento; p)
dever de cooperar para expansão e liberalização do comércio mundial; q)
promover o desarmamento e eliminar o colonialismo, “"apartheid”, neo-
colonialismo; r) a cooperação internacional para o desenvolvimento é o
objetivo de todos os Estados; s) os países desenvolvidos devem desenvolver
sistema de tarifas que beneficiem os subdesenvolvidos; í) os países em
desenvolvimento devem expandir o seu comércio mútuo; u) não se deve
prejudicar os interesses dos países em desenvolvimento; v) devem os Esta­
dos cooperar para o ajustamento de preço das exportações dos países
subdesenvolvidos em relação com os preços de suas importações, etc.
Estabelece ainda que deve haver a proteção do meio ambiente que é uma
responsabilidade de todos os Estados, bem como os recursos das grandes
profundidades marinhas são "“herança comum da humanidade”. Nenhum
Estado pode usar meios econômicos e políticos para coagir outro Estado,
etc.
A Carta é ambígua, mas tem sido considerada, acima de tudo, como
um “instrumento de luta” , ou “instrumento de incitação” . Bensalah a
considera obrigatória e não apenas uma recomendação, porque cabe à
Assembléia Geral fazer a codificação e o desenvolvimento progressivo do
Dl. Kramer considera que ela pode ser tida como um acordo em forma
simplificada. E interessante observar que a Carta tem dispositivos que criam
direitos e deveres; outros, um dever de cooperação, mas sem estabelecer
os meios, bem como tem dispositivos que são recomendações (Jorge Cas­
tañeda). M. Bettati afirma que defender a obrigatoriedade dos instrumen­
tos da NOEI é “suscitar, solicitar, pedir” o assentimento e observar que
“ a ficção tem virtudes” .
Em 1975 a Assembléia Geral aprovou resolução sobre desenvolvimento
e cooperação econômica internacional onde se estabelece: a) ação comum
para diversificar as exportações dos subdesenvolvidos; b) que a assistência
externa aos subdesenvolvidos não deve ser vinculada (“tied aid”); c) co­
operação para a criação de uma infra-estrutura tecnológica nos países
subdesenvolvidos; d) os desenvolvidos devem dar aos subdesenvolvidos livre -
acesso à tecnologia cuja transferência não esteja sujeita à transferência
privada, etc.
De qualquer modo, a noção de nova ordem econôm ica internacional
é dinâmica. As resoluções das organizações internacionais são extrema­
mente importantes para a sua elaboração. Bedjaoui observa que a expressão
“nova ordem econômica internacional” é errada, porque antes dela não
havia uma ordem anterior, mas uma desordem. B. Stern observa que a
NOEI “é um conceito ideológico” sobre o que deveria ser e não sobre o
que existe.
Na NOEI está o princípio da eqüidade, sendo que a igualdade formal
é amenizada pela idéia de compensação. Em conseqüência, surge o prin­
cípio de não reciprocidade e um sistema geral de preferências nas relações

1645
econômicas com países industrializarlos, como eliminar os entraves aos
produtos exportados pelos países subdesenvolvidos. Um o u ir o princípio
fundamental da NOEI é o da soberania permanente do Estado sobre os
recursos naturais (Bermejo), v. capítulo Direitos Fundamentais dos Estados.
M. Bettati observa que a soberania na NOEI é libertada do respeito aos
direitos adquiridos dos estrangeiros em matéria de investimento. E de se
observar que “permanente” significa que o Estado não perde a sua sobe­
rania nem quando há concessões ou tratados que podem ser revogados
(Jorge Castañeda). Para Carrillo Salcedo aJtfOEI tem duas linhas mestras:
a afirmação radical da dimensão econômica da soberania e, como assinala
Remiro Brotons, a cooperação para desenvolver os subdesenvolvidos .
Para o Prof. Kimminidi a criação da NOErabandonou o individualismo
do Estado, que foi substituído pelo “princípio da solidariedade interna­
cional”.
François Borella apresenta três contradições na NOEI: a) entre o
princípio da igualdade soberana e se levar em consideração as desigual­
dades econômicas não podem ser desigualdades entre Estados, porque
estes são iguais. O que não impede que se aplique normas diferentes a
situações diferentes. Não existe uma categoria jurídica de Estado m en os
desenvolvido. Os Estados é que se auto-elegem como subdesenvolvidos. Os
países capitalistas sustentam que as suas maiores responsabilidades justifi­
cam o seu poder de voto nas organizações financeiras, mas se recusam a
reconhecer as desigualdades econômicas como fundamento de uma obri­
gação jurídica para eles compensarem as desigualdades. Todo Estado in­
voca em seu proveito a desigualdade de fato, conforme seu interesse; b)
o princípio de não-intervenção e a tomada em consideração de situações
concretas do povo. O respeito à autodeterminação impede a ordem inter­
nacional de controlar os índices de subdesenvolvimento e as desigualdades;
c) os próprios mecanismos jurídicos da NOEI não prevêem um centro
político de decisão "capaz de impor regras.
Finalmente, é de se observar que estão sendo elaborados no âmbito
da ONU dois códigos de conduta: o código internacional de conduta para
a transferência de tecnologia e o código de conduta das sociedades trans-
nacionais. A expressão “código de conduta” é utilizada para regulamentar
certas atividades" transnacionais de natureza econômica e geralmente co­
mercial. Michel Virally observa que o termo “conduta” tem uma conotação
moral. Observa este intemacionalista que este conceito escapou às catego­
rias jurídicas clássicas, e pergunta se elé é uma categoria jurídica. Tais
códigos se caracterizam por conterem “uma disciplina livremente consen­
tida” (Virally). A expressão código de conduta começou a ser usada no
final dos anos 50, no meio de negócios, após nacionalizações sem indeni­
zações, e fói retomada em 1960, pelo FMI e GATT, no campo monetário
internacional (Eugene Berg). Pode-se recordar que a expressão Código é
pouco usada no Dl e, como exemplo, pode ser citado o do Código de Dl

1646
Privado, no âmbito interamericano, concluído em Havana, cm 1928, co­
nhecido como Código Buslamanle. A sua foiça obligatoria vai depender
de sua forma jurídica, por exemplo, tratado ou dcciaração. Virally observa
que os códigos de conduta são solicitados não pelas empresas, mas pelos
governos. Apesar disto talvez eles acabem por beneficiar as empresas trans-
nacionais, ao fazerem o seu reconhecimento no plano internacional. As­
sinala René-Jean Dupuy que se havia proposto que se fizesse os códigos
de conduta algo híbrido, contendo normas de conduta obrigatórias e
normas recomendatárias. A discussão sobre estes Códigos é, como estamos
vendo, imensa, sendo que H. W. Beade considera que eles podem criar
obrigações. Virally se interroga se eles são uma “categoria jurídica”. O
intemacionalista francês afirma que os Estados devem incorporar os códi­
gos ao direito interno, vez que eles se dirigem a sociedades de direito
privado e, em conseqüência, teriam “um estatuto internacional infrajurí-
dico ou pré-jurídico”. Parece que o-grupo dos 77 está considerando que
é melhor que os códigos sejam .recomendatários, vez que não se pode
obrigar a um Estado, por exemplo, os países ricos, a aceitar um tratado.
O Código de Transferência de Tecnologia está pronto e deverá ser apro­
vado por uma resolução da Assembléia Geral, mas até agora (1993) não
foi aprovado. Apesar de várias resoluções da AG e a NOEI a consagrar ela
é ainda apenas um ideal. Pode-se recordar, que a convenção sobre D. de
Mar (Área), as convenções de 1992 sobre mudança de clima e biodiversi­
dade falam em transferência de tecnologia. Pode-se concluir este item
observando que os organismos internacionais mais importantes continuam
trabalhando em favor dos países ricos. Assim têm sido concluídos acordos
dos EUA com ojapão, N1S (novos Estados industrializados: Taiwan, Coréia
e Cingapura e CEE), limitando as exportações e assim violando princípios
fundamentais do GATT, que entretanto não os considera ilegais, poque
eles visam proteger a economia dos EUA. O próprio GATT, na Rodada
do Uruguai, tentou liberalizar na ordem internacional os serviços: direitos
autorais, transportes, transferências de dividendos, etc., a fim de beneficiar
os EUA. A Rodada começou em 1986 e só terminou em 1993 devido à
oposição de grande número de países.
Ainda sobre os códigos de conduta podemos acrescentar que esta
expressão era utilizada nos “meios de negócios” dos EUA com um outro
sentido. Os Códigos de conduta têm regras “de comportamento livremente
consentido e de regulamentação imposta”. Ele é um conjunto de normas
elaboradas pelos Estados sobre a regulamentação das empresas e com um
mecanismo de supervisão (P. Merciai). E o caso do Código de Conduta
da OCDE sobre investimento internacional e empjresas multinacionais
(1976). As normas dos Códigos não são obrigatórias. 0 ' 3 9 Mundo deseja
que eles sejam aprovados por resolução da AG da ONU. P. Merciai afirma
que eles são um “acordo informal” , ou “acordo de facto”, òu ainda “Gen-
tlemen agreement”. Eles podem ser aprovados p or uma resolução da

1647
organização internacional oti uma declaração “sui generis" da organização.
Eles lém n o rm a s ílcxívcis e são fonte material fio direito. São dotados de
lima “sanção indireta" que são as pressões. Há ainda a influência do
mecanismo de supervisão. A parte Jesada em resposta pode praticar atos
inamistosos.
687A. Devemos fazer agora em separado o estudo da solução dos
litígios econômicos, vez que ela apresenta características particulares. Este
inciso será todo ele calcado em Malinverni (v. Bibliografia), que escreveu
excelente obra sobre a matéria.
Nas organizações regionais de integração econômica tem-se recorrido
à solução judiciária quando fracassa um outro modo de solução do litígio.
Nas organizações internacionais estritamente econômicas os litígios
não são submetidos a órgãos que tenham como função principal solucionar
litígios. A solução é política e não judiciária. A solução judiciária não se
adapta às relações econômicas pelas seguintes razões: a) as nonnasjurídicas
nem sempre existem e quando existem elas são imprecisas. As partes não
fundamentam as suas pretensões no Direito; b) as questões econômicas
têm, muitas vezes, por objeto, um prejuízo em potencial; ç) as organizações
internacionais econômicas não têm um órgão especializado para a solução
do litígio, que faz parte do dia-a-dia da organização. O procedimento de
solução do litigio é “interiorizado e multilateralizado”. A solução do litígio
é uma das funções da organização; d) a rapidez e as flutuações das relações
econômicas não dão longa duração às normas; é) as obrigações são vagas
e imprecisas e dão aos Estados escapatórias para o caso de elas acarretarem
graves prejuízos econômicos. Diz Malinverni que não se pode falar em
ilegalidade apesar da atitude do Estado provocar, às vezes, um dano; f)
não se identifica um ilícito porque não existem normas ou elas são impre­
cisas; g) a CIJ exige um precisão na formulação jurídica; h) o procedimento
judicial é 'formalista e preocupado com o primado do Direito e não deixa
campo para o compromisso; i) o procedimento judiciário é lento.
O dano no Dl Econômico é mais importante do que o ilícito. Assim
a violação de uma norma não acarreta a responsabilidade se não houver
um dano, e este deve ter uma certa gravidade. Os procedimentos de solução
de litígios e c o n ô m ic o s são, muitas vezes, desencadeados quando o prejuízo
ainda é potencial porque este pode se tornar irreversível. Os Estados podem
apresentar uma reclamação quando são lesados em seu interesse, ou quan­
do os fins da organização são atingidos pela atitude do outro Estado.
Nas organizações internacionais econômicas procura-se o compromis­
so justo, sendo ele mais importante do que a aplicação rígida do Direito.
Daí as negociações terem uma grande importância para a solução dos
litígios. Elas ainda têm a vantagem de afastar a opinião pública. Quando
elas se prolongam, o dano econômico pode ser agravado. Adota-se também
a conciliação, que consiste em dirigir às partes litigantes uma recomenda­
ção. Se a infração não é grave e o Estado não violou o tratado, ela é

1648
“ llex ív cl" S c o E stad o violou o tra ta d o . a re c o m e n d a ç ã o é ‘ taxativa" De
um m od o g e r a l as re c o m e n d a çõ e s são observad as, p o rq u e elas já são
elabo rad as le v a n d o em co n sid era çã o a p o ssibilid ad e d o E stad o cum p ri-la.
No GATT a violação cria direito ã retorsão, e relatórios de painéis que
são formados por técnicos independentes, cujas decisões não são obriga­
tórias, são muito respeitadas. O GATT só aplicou sanções uma vez (J.
Touscoz).
A comissão de investigação visando estabelecer a materialidade dos
falos é importante nas relações económicas. O seu processo é contraditório.
O relatório, antes de ser transmitido à organização, é enviado às partes.
Várias organizações têm preferência por comissões “ad hoc” para o
estudo do litígio. Elas são formadas por personalidades independentes.
Elas preparam o exame do litígio para um órgão político. As comissões
têm tido uma grande importância e teriam atualmente um aspecto “quase
judicial”. Há uma grande dificuldade em se "jurisdicionalizar” a solução
deste tipo de litígio: a) os órgãos da organização são formados por repre­
sentantes dos Estados; b) estas organizações adotam o voto ponderado, o
que acarreta maior influência para os Estados m ais ricos; c) n in g u ém pode
ser juiz em causa própria. Quando a solução é dada nas organizações
econômicas por um órgão restrito, há possibilidade de um recurso ao
órgão plenário da organização.
Malinverni observa que em matéria econômica, muitas vezes, a infração
é tolerada porque ela permite ao Estado se soerguer economicamente. As
infrações nem sempre são seguidas de sanções. Estas são raras. Por outro
lado, elas não atingem os países ricos.
As sanções nas organizações internacionais são quase sempre no sen­
tido de privarem o autor da infração das vantagens que efe tem como
membro da organização. As funções das sanções são duas: a) obrigar o
Estado a pôr fim à infração; b) restabelecer o equilíbrio dos interesses
econômicos.
Algumas observações podem ser apresentadas com fundamento em
Bermejo, de que os juizes não têm conhecimento da vida econômica. A
Bélgica e a Holanda chegaram a propor uma Câmara econômica na CfJ.
Nas organizações econômicas tem se considerado que o litígio faz parte
da administração corrente da organização.
Uma síntese fundamentada em Laurence Boisson de Chazournes sobre
as contramedidas deve ser apresentada. A expressão contramedidas é uma
noção norte-americana que foi consagrada no laudo arbitrai entre EUA e
França sobre a interpretação de acordo relativo ao transporte aéreo inter­
nacional, em 9 /1 2 /7 8 . A mesma expressão surge na Clj, no caso dos reféns
norte-americanos n o Irã (sentença de 1980) e no caso das atividades mi­
litares e para-militares na Nicarágua (sentença de 1986). Riphagem tentou
distinguir dois tipos de contramedidas: as de reciprocidade e as de repre­
sálias. As medidas de reciprocidade visam “ restabelecer o equilíbrio entre

1649
as posições respectivas do Estado autor e do Estado lesado”. As de repre­
salias seriam aquelas visando que ele realize as suas novas obrigações.
Ambos os tipos de contraniedidas visam restabelecer a “relação primária",
sendo que as represalias seriam mais severas.
A aplicação de contraniedidas não exige que se esgote os recursos de
solução pacífica dos litigios.
Não há uma distinção pacífica entre represalias e contramedidas, es­
tando estas últimas previstas no GATT e no acordo internacional sobre
café de 1968.
As contramedidas resultam de um falo imputável a um Estado, seja
ele lícito ou ilícito, e que atinja a um outro Estado. Já as medidas da
Salvaguarda surgem em “circunstancias económicas particulares”,'çm que
há um acordo entre os Estados, sendo que elas não surgem de um com­
portamento, mas de uma situação.
As contramedidas só são usadas na última fase de solução do litigio
para restabelecer o equilibrio entre as partes, bem como visam pressionar
um estado a negociar. As contramedidas podem resultar da violação de
um co m p ro m isso internacional, s e n d o q u e, outras vezes, é suficiente a
ameaça de uma lesão de interesses. Elas devem levar em consideração os
compromissos dos direitos do homem. Devem ser proporcionais ao fato
gerador da sua aplicação. Elas visam preservar os interesses do Estado
lesado. Finalmente, “um motivo de natureza política pode justificar um
exercício de contramedidas de teor económico”.
Um dos grandes problemas do DI Económico e nova ordem económica
internacional é a transferência, de tecnologia que os países ricos só trans­
ferem aos pobres quando ela se encontraultrapassada. A ONU está ela­
borando um Código Internacional de Conduta para a transferencia de
tecnologia. Estão em vigor 3,5 milhões de patentes, sendo 80% dos países
ricos, 13% dos socialistas e 6% dos subdesenvolvidos. Nestes últimos, 84%
são detidas por estrangeiros, principalmente por empresas m u ltinacionais.
Na realidade os países em desenvolvimento só têm 1% do estoque mundial
de patentes. O citado Código visa definir práticas comerciais em matéria
de transferencia de tecnologia entre particulares ou empresas. O 3® Mundo
considera que o direito da propriedade industrial beneficia apenas os
países ricos. O 3S Mundo vem lutando por um Código -sobre este tema
desde 1961.
A transferência de tecnologia realizada na sociedade internacional não
atende aos países pobres e sofre uma série de críticas: a) quando ela é
realizada, não beneficia a toda a sociedade do Estado, mas é feita apenas
em proveito de urna filial ou subsidiária de urna filial cuja matriz está no
exterior. A transferência ficou restrita a verdadeiras ilhas no Estado pobre;
b) a transferência é quase sempre de técnicas consideradas obsoletas; c)
existe uma diferença entre “técnica” e “tecnologia”. P. Guenaud observa
que, nas palavras de Dahar, “a tecnologia constitui-uma reflexão sobre a
técnica, compreendendo a descrição e a historia das técnicas, a circulação
das atividades". A tecnologia na “plática industrial” abrange “igualmente
o esludo das técnicas aplicadas às máquinas — ferramenta para colocar
em aplicação a técnica”. E claro que os países ricos preferem transferir a
técnica e não a tecnologia; d) critica-se ainda que a tecnologia transferida
nem sempre é a que atende as necessidades do desenvolvimento; e) o
preço da transferencia é muito elevado para os países pobres; /) o processo
de transferência aumenta a dependencia dos países pobre.
Existem vários tipos de contratos de transferência de tecnologia se­
gundo Feuer e Cassan: a) em que se faz uma cessão da propriedade
industrial ou se concede uma licença para a sua exploração. Os países
pobres nem sempre têm meios para explorar as patentes; b) contrato de
transmissão de “know how” quando uma parte comunica à outra deter­
minados conhecimentos para “auxiliar na fabricação de um produto”; c)
contrato de assistência técnica, ele pode ser a cessão de propriedade,
transmisão de “know how” ou, aínda, inclui a venda de equipamentos
industriais. A sua variedade é grande. E o utilizado pelas organizações
internacionais, e, neste caso, é regido pelo DI, e se for urna empresa
privada, será regulado pelo D. Interno; d) contrato “produit en mains”,
que obriga a uma transferência efetiva de tecnologia e “know how”. A
empresa estrangeira cabe bens, transfere tecnologia e tem que garantir
uma determinada produção, bem como assegurar a formação de um pes­
soal técnico, etc.
Cari Dahlman assinala que com a globalização da economia a tecno­
logia se tom ou um elemento-chave da competitividade, o que significa
maior proteção da propriedade intelectual e a sua não transferência.
688. O Direito Internacional Público da Moeda é o conjunto de normas
internacionais que regulamenta determinadas atividades do Estado acerca
da moeda. E talvez o ramo do DIP que tenha recebido tratamento dou­
trinário sistemático mais tarde. O D. Monetário Internacional surgiu “na
zona de contato entre várias ciências jurídicas (DI Público, DI Privado, D.
Civil, D. Financeiro, D. Público, etc.) bem como de ciências econômicas
e sociais” (Arkadi Altshuler). Não se pode dizer que ele seja novo, poden-
do-se lembrar que normas a respeito da moeda são bastante antigas. Entre
as cidades-Estado da Grécia, em torno do ano 400 a.C., já existiam tratados
padronizando as moedas, por exemplo, o seu tamanho. Para citarmos
doutrinadores mais'antigos, podemos lembrar que Jean Bodin já defendia
que o Príncipe não podia desvalorizar a sua moeda para prejudicar tercei­
ros. Em 1469, 1499 e 1523 foram concluidos acordos monetários entre a
Inglaterra e os Países Baixos.
As fontes deste ramo do DIP são as mesmas do DIP em geral: tratados,
costume, princípios gerais do direito (interdição do abuso de Direito, etc).
A moeda permaneceu matéria dentro da soberania do Estado, que a
regulamenta livremente, a não ser quando concluía acordo com outro

1651
E stad o. O s a co rd o s e ra m b ilaterais, ap esar d e u n ia c o n fe rê n c ia re u n id a
em L o n d res, em JÍW 3. te r re c o m e n d a d o a c o n c lu s ã o de acord os gerais.
O FMI foi criado em 1944, na conferência de Bretton Woods. com
base nos Planos White (EUA) e Kevnes (Grã-Bretanha), sendo que a sua
estrutura legal é a que constava no Plano White. A moeda é internaciona­
lizada a partir do FMI. Ele surge como uma espécie de reação às desvalo­
rizações competitivas que teriam existido no período entre as duas guerras
mundiais. ’
O FMI estabelece uni Código de Boa Conduta, para ser aplicado em
períodos “normais”, que tem dois princípios: a) proibição das desvalori­
zações competitivas; b) respeito a taxas de câmbio estáveis e únicas.
O primeiro princípio visa evitar o que foi mencionado’ e que era
denominado de política de “ beggar-mv-neighbour policy”. Os países que
integram o FMI declaram inicialmente uma paridade de sua moeda com
o ouro. E admitida pelo acordo do FMI uma taxa de variação de 1%.
Entretanto, em 1971, o Grupo dos Dez alterou esta taxa para 2,25% sem
que fosse feita qualquer modificação ao acordo.6A A obrigação de se ter
uma única taxa de câmbio advém do fato de que alguns Estados adotavam
taxas de câmbio variáveis de acordo com o tipo de operação (comércio,
turismo, etc.). Entretanto, os Estados combinando alguns dos seus dispo­
sitivos (seção I, a, 3 e 4. b, do art. IV), ainda conservam alguma flexibilidade
e acabam por possuir mais de uma taxa de câmbio.
O FMI prevê um controle para as suas medidas: a) publicidade; b)
regime de consultas; c) recomendações; d) suspensão de ajuda; etc. Ele
não tem grande preocupação com as sanções, mas sim em fazer com que
as violações terminem o mais rápido possível.
A moeda tem levantado problemas em relação à responsabilidade
internacional. Algumas considerações podem ser formuladas sobre esta
matéria. Alguns autores (Fawcett, Mann e Wortley) sustentam que “restri­
ções de câmbio podem, em certas circunstâncias, constituir a tomada de
uma propriedade”. Entretanto, nada impede ainda aos Estados de estabe­
lecerem determinadas restrições cambiais. Outros autores (Borchard, Wor­
tley) consideram que o pagamento ao credor de um empréstimo (“bond-
holder”), em moeda desvalorizada, constituiria um. ilícito internacional.
Em sentido contrário estão as opiniões de Físcher Williams e O'Connell.
A razão parece estar com estes últimos, sendo que os próprios EUA têm
evitado conceder proteção diplomática nestes casos. E de se observar que
a desvalorização deve ser considerada como um ilícito quando ela for
discriminatória em relação ao estrangeiro, e de modo abusivo. Nos demais
casos, ela não é um ilícito, tendo em vista que o-Estado o faz por necessidade
econômica. As mesmas considerações podem ser dirigidas às restrições
cambiais.
A cooperação financeira entre os Estados não se limita ao FMI, que
dá auxílio financeiro aos Estados com a finalidade de dar ao Estado uma
estabilidade financeira. A mencionada cooperação se estende também aos
Bancos Centrais, sendo que no século X IX os da França e da Inglaterra
já se auxiliavam em momentos excepcionais, sob a forma de envio de ouro.
Atualmente esta é feita, por exemplo, por meio de acordos de troca
(“swap"), que é a venda de moeda nacional, com o compromisso de
recomprá-la a termo (o prazo é em geral de três meses) a um câmbio
fixado previamente. Em 1930, dentro do Plano Yoting, foi criado o Banco
Internacional de Pagamentos (Banco Internacional de Compensação).
Foram seus fundadores: Alemanha, Bélgica, França, Grã-Bretanha, Itália,
Japão e Suíça. Este é uma sociedade anônima submetida ao direilo suíço
com várias categorias de acionistas: a) bancos centrais; b) bancos norte-
americanos que participaram da sua criação; c) estabelecimentos financei­
ros de terceiros países; d) particulares que adquiriram ações vendidas pelos
anteriores ao público. Estes últimos são muito poucos. A sua finalidade é
efetuar pagamentos financeiros que lhe foram confiados por acordos es­
pecíficos. A sua sede é em Bâle.
Em 1962 foi criada a União Monetária do Oeste Africano, que tem a
convertibilidade do franco assegurada pela França. Em 1965 os Estados da
ALALC concluíram um tratado multilateral de “clearing” (compensação).
Os Bancos Centrais, por este tratado, podem conceder linhas de crédito
recíproco sob a garantia mútua de convertibilidade e transferibilidade.
Pretendemos apenas exemplificar a cooperação monetária entre os Estados
e não reproduzir todos os organismos internacionais que se interessam
por esta matéria, como o CEE, OCDE, etc.
O 3S Mundo tem recorrido cada vez mais ao setor privado, vez que a
assistência externa pública não é suficiente. São apontadas como causas
do endividamento as grandes somas recebidas pelos bancos que vieram
dos países exportadores de petróleo, e os países do 32 Mundo aproveitaram
as facilidades dadas pelos bancos. Os acordos de reescalonamento das
dívidas com os bancos privados criam duas obrigações para os devedores:
a) dar toda as informações que sejam úteis para o pagamento das dívidas;
b) concluir acordo de confirmação com o FMI e aplicar o programa de
estabilização feito por ele (Feuer e Cassan). Remiro Brotons considera que
os acordos da dívida são usurários e o DIP não os protege.
Os denominados euromercados surgiram nos anos 50, quando a URSS
e outros países socialistas começaram a aplicar dólares nos bancos europeus
com receio de que os EUA os bloqueasse em caso de conflito. Estas euro-
divisas eram aplicadas a curto prazo e deram orgem aos eurodólares, e os
bancos europeus os emprestavam. Na década de 80 surgiram as euro-ob-
rigações, em que os bancos trocam os empréstimos, e tais operações não
figuram no orçamento. Existe ainda no m ercado financeiro os denomina­
dos “ eurotítulos”, em que um banco ou uma empresa apresenta uma
assinatura permitindo a quem tomou emprestado emitir um empréstimo

1653
a curto prazo; os “eurotítulos” e os bancos garantem 011 compram os
empréstimos (J. Touscoz).
O Clube de Paris reúne os^ Estados credores e o Clube de Londres
reúne os credores privados. Em 1988, o G-7 solicitou ao Clube de París
que beneficisse os países em desenvolvimento.
688A. Um dos aspectos mais importantes do DI Económico é o DI do
Desenvolvimento, do qual seriam titulares os países em desenvolvimento.
Antes dele o que havia era o direito de assistência, em que medidas
fragmentarias visavam dar aos subdesenvolvidos meios para chegarem ao
desenvolvimento (Feuer e Cassan). A expressão DI do Desenvolvimento
foi criada por André Philip, representante da França na 1* UNCTAD
(março a junho de 1964). Ele a utilizará em um artigo que foi publicado
em setembro de 1964, em “Développemenf et Civilisation”, e ainda em
um coloquio realizado, em 1965, em Nice (v. D. ao Desenvolvimento no
capítulo Direitos do Homem).- .
O seu sentido pode ser sintetizado nas palavras de Michel Virally:
“Enfim, o Direito Internacional do Desenvolvimento não merecería o seu
nome, se ele não favorecesse a multiplicação de fórmulas de cooperação
técnica e os investimentos nos estrangeiros, até as associações de produção
mais avançadas.” Maurice Flory, após observar que, hoje, o DI “está a
serviço de um projeto: o nascimento de urna nova ordem económica
internacional”, caracteriza o DI do Desenvolvimento como “um direito a
serviço de uma finalidade., a Juta contra o subdesenvolvimento e a procura
de uma verdadeira independência para os países subdesenvolvidos”. Ob­
serva ainda este autor que o positivismo em nome do formalismo e da
neutralidade do Direito não aceita que este seja finalista e considera que
o desenvolvimento faz parte da política. Flory considera o Direito Inter­
nacional do Desenvolvimento como urna “releitura do DI”, enquanto
Touscoz o qualifica com o “o fermento na massa do DI”. Este direito
“aparece como um direito em devenir a serviço de uma ideologia não
estabilizada” (A. Pellet). Têm havido também críticas, como Bedjaoui, que
o considera “direito de gueto”, ou M. Benchick, que diz ser “Direito
Internacional do subdesenvolvimento. Uma nova ordem na dependência”.
Entretanto, os juizes internacionais, conforme tem sido observado, consi­
deram que os argumentos do 3“ Mundo não têm fundamento jurídico.
Quanto à colocação do DI do Desenvolvimento como um ramo do DI
Econômico, não é algo pacífico e podemos lembrar que Gross Espiell o
considera urna disciplina nova visando criar -instrumentos normativos na
luta contra o subdesenvolvimento. Segundo este jurista, ele não pertenceria
a<3 DI Económico, porque há urna parte dele que não se insere nele, como
o desenvolvimento político, social e cultural. Entretanto, o colocamos
dentro jdo DI Económ ico (neste sentido, A. Pellet) por ser o aspecto
e c o n ó m ic o -o mais importante e o que tem recebido maior atenção no Dl
do Desenvolvimento.
Para alguns a u to re s e le é um a nova visão tío D IE t- para A. P elh i c li­
se fu n d am en ta n o s 3 D : d ireito à a u to d e te rm in a ç ã o , ao d esen v o lv in ien lo
e à d esco lo n ização .
De 1983 a 1992 foram transferidos 147 bilhões de dólares dos países
em desenvolvimento para os países ricos.
Em 1960 a AG, em resolução, propunha que 1% da renda nacional
dos países avançados seria destinado à ajuda internacional. Em 1968 a
UNCTAD fixava em 1% do P1B. Em 1969 a OCDE afirmava que os países
ricos aceitavam isto. Em 1970 ela falou em 0,7% do PIB.
Em 1993 somente quatro países tinham ultrapassado o patamar fixado:
Noruega, Dinamarca, Suécia e Países Baixos.
A Françã. estava em 0,63%, o Japão em 0,30% e os EUA em 0,20% .
O Dl Econômico e o Dl do Desenvolvimento têm em parte o mesmo
campo de atuação, na medida em que o subdesenvolvimento é um pro­
blema econômico. Entretanto, este último tem um campo mais amplo,
porque ele é também político, social e cultural, etc. (Jean Touscoz).
Na verdade a definição do DID vai depender do conteúdo que dermos
à palavra desenvolvimento (Messaoud Mentri).
Feuer e Cassan observam que o DID não é formado por um conjunto
homogêneo ou sistematizado de normas e que estas formam um “mosaico”.
O DID se refere, segundo estes autores, a três noções: a) soberania; b)
igualdade; c) solidariedade.
As reivindicações dos subdesenvolvidos a respeito do comércio inter­
nacional surgem pela primeira vez na Conferência de Bandoeng (1955).
As suas raízes, segundo Guy Feuer, se encontram nos arts. I9, 2~ e capítulo
IX da Carta da ONU, que fala em cooperação econômica e social. Uma
das vitórias dos subdesenvolvidos é a Carta de Direitos e Deveres Econô­
micos dos Estados, citada acima. E na UNCTAD que os subdesenvolvidos
têm apresentado as suas reivindicações. A partir de 1960 a Assembléia
Geral proclama em suas resoluções que o direito à independência e o
direito-aQ desenvolvimento são a mesma coisa, ou formam uma unidade.
Em 1964 a UNCTAD preconiza a adoção de regras derrogatórias do Dl
Comum (J. Bouveresse). A NOEI, segundo Samir Amin, surge de negocia­
ções entre as elites capitalistas do Norte e a “burguesia neocompradora
do Sul”.
'Bensalah afirma que o direito ao desenvolvimento pode ser resumido
no seguinte: a) os Estados subdesenvolvidos devem ser recolocados na
situação de poderem se desenvolver. Assim sendo, devem ser restituidas a
estes Estados as potencialidades necessárias para o seu desenvolvimento;
b) a função deste direito é fazer uma redistribuição justa na economia
internacional. Ele seria uma espécie de direito social internacional.7 E de
se recordar que os Estados subdesenvolvidos têm reivindicado a principal
responsabilidade de assegurar o seu desenvolvimento.
A. Pellet observa que o Dl do Desenvolvimento apresenta as seguintes
características: a) ele concretiza porque leva em consideração a realidade;

1655
b) democratiza no sentido de que propõe nm Estado igual a um voto.
Propõe a supressão dos óigaos restritos com poucos Estados; c) a idéia de
integração econômica está presente. Salienta ainda este autor que os países
subdesenvolvidos terftarn transformar as recomendações em costumes, e
ocorre uma inversão ao praticado no Dl Clássico, porque o elemento
psicológico passa a preceder o elemento material. Ele ainda não é um
direito no sentido técnico da palavra.
Para Petersmann o Dl do Desenvolvimento reconheceria uma prefe­
rência em favor dos subdesenvolvidos e que ele consagra o princípio do
“social welfare”.
Seguindo a J. Bouveresse, o DID é um direito de prospectiva, isto é,
finalista, dinâmico e messiânico, "que não pretende cristalizar as situações.
Segundo ainda o jurista'francês, é um direito de coordenação e aleatório,
sem coação e juiz. Este ramo do Dl tem a vantagem de corrigir o próprio
DI, vez que este, segundo Colliard, é um direito indiferente que não se
preocupa com o desenvolvimento e a solidariedade, que ele considera
como pertencendo à moral e à política.
Pode-se dizer que ele tem na sua base o princípio da solidariedade
que, segundo alguns autores, seria fundamental na sociedade internacional
contemporânea.
E de se recordar que várias reivindicações têm sido formuladas pelos
países subdesenvolvidos: a) cada Estado desenvolvido reservar uma parte
do seu mercado para produtos dos subdesenvolvidos; b) os países desen­
volvidos não estimularem a produção de produtos sintéticos que substituam
òs produtos naturais dos subdesenvolvidos; c) o direito de determinarem
a sua política demográfica; etc.
Entretanto, não se pode afirmar que o Dl do Desenvolvimento tenha
encontrado uma grande elaboração. Maurice Flory observa que atualmente
apenas existe uma série de acordos bilaterais e multilaterais. Não há ainda
uma “regulamentação comum que se imporia aos Estados”. O que também
é uma série de resoluções de organismos internacionais, que Colliard
afirma “se aproximar (em) mais de um direito transitório, uma espécie de
pré-direito que põe fim ao direito antigo e precede o novo direito”. Alain
Pellet afirma que o DID não está consagrado en nenhum texto jurídico
obrigatório de caráter universal. Entretanto, Friedman salienta que as
resoluções têm um papel importante na evolução do Dl, enquanto Tunkin
as considera uma fonte subsidiária.
Maurice Flory, em trabalho mais recente, observa que o DID só obriga
a aqueles que o aceitam e fala em um Dl da Caridade, que seria facultativo
para o auxílio contra o subdesenvolvimento, e acaba por propor um D.
Social Internacional.
A tendência é não se aplicar sanções no DID, mas se procurar soluções
de compromisso.
A liberalização do comércio com a OMG e o dcsapancinu-nio da
solidariedade entre os estados levou ao desaparecimento do DID.
Apenas a título de exemplo, em 1996. o PNUD aliunou que ‘20% <la
população mundial não têm 1 dólar por dia para viver.
Podemos tratar aqui dos voluntários. O CES define o voluntário como
a "pessoa que dá os seus seiviços sem visar a ganhos financeiros e com a
finalidade cie contribuir para o desenvolvimento do país beneficiário".
Eles são escolhidos peías organizações internacionais e não representam
o seu governo. E o representante do PNUD que é responsável pelo volun­
tário junto ao governo do Estado onde ele atua.
"O estatuto do voluntário é fixado por um acordo internacional. O país
que retrebe o voluntário asegura as prestações “in natura”, alojamentos,
transportes, etc. A cooperação internacional criou o Secretariado Interna­
cional de Serviço Voluntário, com sede em Genebra. E)e tem um Conselho
e uma Assembléia.8
689. O Dl Econômico eslá ainda em elaboração e não oferece normas
explícitas. O Dl da Moeda, que poderia ser considerado uma subdivisão
do anterior, já fornece uma série de normas consagradas em tratados, o
que tem permitido o aparecimento de estudos sistematizados sobre a ma­
téria.
Sobre a matéria tratada neste capítulo deve ser feita remissão ao ca­
pítulo Tratados (cláusula de nação mais favorecida, cláusula de salvaguarda,
etc.).

1657
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2. O fato econ ôm ico é a nosso ver o mais im portante na vida internacional,
sendo que j á se fala em “segurança econ ôm ica coletiva” . Esta fase foi defendida
pelo Brasil na ONU na 85 Sessão da A ssenbléia Geral, bem com o em 1973 ela
implicaria um processo quase permanente de negociações, o direito de cada nação
dispor livremente de seus recursos, etc. A sua finalidade última é a paz.
3. O “direito econôm ico internacional” se desenvolveu por influência do
jurista alemão G. E rler e do intem acionalista inglês G. Schwarzenberger em tra­
balhos publicados respectivamente em 1956 e 1966. Colaboraram ainda para o
desenvolvimento deste ramo: F. A. Mann e E. Langen, que estudaram alguns
setores. F. A. M ann prefere falar em DIP C om ercial (A lexjacquem in e Guy Shrens).
Preferimos en tretan to utilizar a expressão D ireito Internacional E conôm ico, con­
sagrada por Prosper Weil. Tal expressão tem a vantagem de salientar que a de D.
Econôm ico Internacion al deveria ser reservada a ô ia m o D. Econôm ico interno do
Estado que tivesse alcance internacional.
3A. A. H auriou foi quem usou a palavra aleatória para caracterizar um ramo
do Direito que foi o “ D. Administrativo do A leatório” , que seria o D. Administrativo
dos atos coletivos, do auxílio mútuo entre a administração e seus “partenaires” .
Aleatório vem da linguagem matemática e seria o caso de fenômenos parcialm ente
dependentes e parcialm ente independentes. O D. Administrativo do Aleatório
seria o relativo ao Plano e procedimentos para a sua execução. Ele se caracterizaria
pela confiança (André Hauriou — Le D ro it Administratif de 1’Aléatoice, in Mé­
langes Louis T rotabas, 1970, págs. 1 0 7 'e segs.).
4. Guy Feu er, ao estudar o Dl do Desenvolvim ento, fala em dois tipos: relações
entre países subdesenvolvidos e relações en tre estes e países desenvolvidos. E na
UNCTAD onde os subdesenvolvidos têm apresentado as suas reivindicações.
4A. A igualdade entre países com desenvolvim ento desigual é uma “im postura”
(Maurice Feury). Colliard a considera um a “fórm ula hipócrita” .
4B. A origem desta Carta está em discurso do Presidente Echeverría do M éxico,
na 3- UNCTAD (1 9 7 2 ), em Santiago do Chile. A UNCTAD aprovou uma resolução

1661
estabelecendo que se deveriam fixar "norm as geralmente aceitas que regerão as
relações econôm icas entre os Estados” . Uni dos antecedentes da cilada Carta é a
proposta do Brasil na UNCTAD, em 1966. de uma Carta de Desenvolvimento.
4C. A. Pellei observa que o adjetivo perm anente colocado geralm ente ao lado
de soberania nas declarações da ONU “significa que a soberania é uma conquista
contínua e que o Estado não pode abandonar o sen exercício por um período
mais ou menos con tín u o".
5. Segundo R olfe e Burile as desvalorizações competitivas no períod o entre
as duas guerras teria sido um mito. “O mito de que uma nação desvalorizava para
obter um ‘superávit’, que era compensado por represálias imediatas de outros
países que também desvalorizaram suas moedas, não parece confirm ado pelas
fontes."
6. Os Estados membros do FMI têm, en lre outras obrigações: á) adotar as
medidas convenientes para que não se realizem no seu território operações mo­
netárias que não respeitem as normas e lim itações do FMI; b) não fazer discrimi­
nação monetária; c) assegurar a converlibilidade dos saldos na sua m oeda que se
encontram em poder dos demais membros do FMI.
6A. Atualmente há uma tendência de se adotar taxa de câmbio flexível, com e
sendo o meio de o Estado se defender das multinacionais.
7. E interessante observar que a caracterização de um país subdesenvolvido é
realizada por ele mesmo e é preciso que não haja contestação dos Estados “doa­
dores” da assistência. A lista destes países varia de uma organização internacional
para outra. Em 1960 a participação dos subdesenvolvidos no com ércio mundial
era de 22% e em 1970 baixou para 18%. E interessante observar que, conform e
classificação da O N U, além do 3a Mundo existe um 4 S Mundo, e para caracterizá-lo
foram usados os seguintes critérios: a) produto interno bruto por habitante igual
ou inferior a 100 dólares; b) as indústrias manufatureiras participam n o produto
interno bruto na proporção igual ou inferior a 10% ; c) taxa de alfabetização na
população de mais de 15 anos igual ou inferior a 20% . São os seguintes países:
Botsuana, Burundi, Dahomey, Etiópia, Guiné, Alto Volta, Lesoto, Malawi, Mali,
Niger, Uganda, Tanzânia, Ruanda, Somália, Sudão, Chade (16 países africanos) e
oito países da Ásia e da Oceania: Afeganistão, Butão, Laos, Maldívias, N epal, Samoa
Ocidental, Sikkim e Iêm en, e um país da América Latina: Haiti (M. B en n o u n a).
Foi no GATT que surgiu pela primeira vez a idéia de se fazer lima distinção entre
os subdesenvolvidos (1955). No tratado da ALALC (1960) surge mais um a cate­
goria: a de “ país com mercado nacional exíguo” . Em 1964, a UNCTAD cria a
noção de “país m enos avançado” (4B M undo) e “países em desenvolvimento sem
litoral”, surge ainda nela a categoria de “ países em desenvolvimento insulares” .
O Banco Mundial divide os países em desenvolvimento em três categorias: a) países
de fraca renda (de 80 a 400 dólares); b) países de renda intermediária, que são
divididos em dois tipos: 1 — de 420 a 1.630 dólares; e 2 — de 1.700 a 5.6 7 0 dólares;
c) países exportadores de petróleo com renda elevada de 8.450 dólares a 24.660
dólares. O que m ostra a não-coincidência en tre país rico e pais desenvolvido (Feuer
e Cassan). Existem inúmeras outras classificações, e citamos apenas estas a título
exemplificativo. Finalm ente, é de se assinalar, no tocante aos produtos de base,
que 60% são exportados pelo Ocidente desenvolvido e menos de 30% pelo T erceiro
Mundo.
8. O Peace Corps dos EUA é uma agência governamental ind ependente. Ela
é da “com petência” do Secretário de Estado. Ela não está incorporada ao Depar­
tamento de Estado.

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1689
—O Capítulo X XX Proteção da Pessoa H u m an a.................................................. 907 *
318 — Introdução; 319 — Tráfico de escravos, escra­
vidão e trabalho forçado; 320 — T ráfico de mulheres;
321 — T ráfico de armas, de bebidas alcoólicas, de
publicações obscenas e repressão à falsificação de moe­
das; 322 — Com ércio de estupefacientes; 323 — Sal­
vaguarda da vida humana no mar; 324 — A Proteção
Internacional do Trabalho; 325 — Minorias; 326 — :
Saúde; 327 — Genocídio; 328 — Crimes contra a hu­
manidade; 329 — A questão da Corte Internacional
Criminal. \ i
Capítulo X X X I N a cio n alid ad e.............................................................................. 953 / í
330 — Sentidos e definição de nacionalidade; 331 — |
Natureza ju ríd ica; 332 — A nacionalidade e o DIP;
333 — Princípios gerais; 334 — H istórico; 335 — í
Nacionalidade originária; 336 — Nacionalidade adqui- i
rida; a) aquisição por benefício da lei; b) casamento; j
c) mutações territoriais; d) “ju s laboris”; e) naturali- |
zação; 337 — Conflito negativo de nacionalidade: apa-
trídia; 338 — Conflito positivo de nacionalidade, po-
lipairídia; 339 — Perda da nacionalidade; 340 — Rea­
quisição de nacionalidade.
Capítulo X X X II Princípios e Normas acerca da repressão dos delitos
nas Relações Internacion ais.................................................... 971 c |
341 — Direito Internacional Penal e Direito Penal |
Internacional; 342 — Introdução aos diferentes siste- j
mas; 343 — Sistema da territorialidade; 344 — As |
normas sobre imunidade dejurisdição (o denominado j
sistema da extraterritorialidade); 345 — Sistema juris- |
dicional; 346 — Princípios da com petência pessoal; ?
347 — Princípio da competência real; 348 — Princípio í
da com petência universal; 349 — Princípio da reprç- f
sentação; 3 5 0 — A solidariedade internacional contra ' ¡;
o crim e. ¡5
_> Capítulo X X X III E x tra d iç ã o ..................................................................................... 981 ,!
3 5 1 — D efinição; 352 — Histórico; 353 — Razões em - |
favor da extradição; 3 5 4 — A extradição com o instituto *
■I
1691 í:
d o O l í ’ : 3:V > — F o r m a s ( l e e x t r a d i ç ã o : 3 5 6 — P r i n c i p i o s
que regem a e xtrad ição ; 357 — A n a cio n a lid a d e d o
in d iv id u o p assível d e extrad ição ; 358 — D elito s q u e
n ã o e stã o s u je ito s a e x t r a d i ç ã o : a) d elitos m ilita re s : b )
d e lito s político s, c) o u tr o s d elitos; 358A — T e r r o r is m o ;
359 — C o n d iç õ e s p a ra a extrad ição; 3 6 0 — A q u e stã o
da retro aliv id ad e d o s tra ta d o s d e extrad ição ; 3 6 ! —
P re fe re n c ia e n tre os p e d id o s d e extrad ição; 3 6 2 — O
P rocesso de E xtrad ição.
C ap ítu lo X X X I V - ....................................................................... 1007
F .xp u lsão d e E s t r a n g e ir o s
363 — Definição; 364 — Fundamento; 365 — Natureza
Jurídica; 366 — Efeitos; 367 — Princípios internacio­
nais; 368 — A legislação brasileira.
C ap ítu lo X X X V - Condição Jurídica ‘dos E stran g eiro s................................. 1017
369 — Introdução; 370 — Histórico; 371 — Direitos
e deveres dos estrangeiros; 372 — Nacionalização de
empresas; 372A — P roteção dos investimentos estran­
geiros; 373 — Contratos entre Estados e empresas
estrangeiras.
Capítulo X X X V I ■ Deslocamento da Pessoa H um ana...................................... 1043
374 — A imigração no D l; 375 — O sistema de quotas;
376 ■— A legislação brasileira; 377 — Regime de pas­
saportes.
—1> Capítulo X X X V II Direito de A silo ......................................................................... 1051
378 — Introdução: a) Asilo territorial; 379 — Conceito
e evolução histórica; 380 — Da obrigatoriedade do
asilo; 381 — Refugiados: conceito e qualificação; 382
— Fundamento do direito de asilo; 383 — A Proteção
Internacional dos Refugiados; 384 — Estatuto dos Re­
fugiados; 385 — Fim do Asilo; b) Asilo diplomático;
386 — Definição; 387 — Evolução histórica e âm bito
de aplicação; 388 — Da obrigatoriedade do asilo; 389
— Fundamento do asilo diplomático; 390 — Locais
de asilo; 3 9 J ,— Pessoas que gozam do asilo e a sua
qualificação; 392 — Direitos e deveres do Estado asi­
lante; 393 — Direitos e deveres do Estado territorial;
394 — Fim do asilo; 395 — A CIJ e o asilo diplomático.

LIVRO VI
O Território e o Direito f ntem aacm al Púlilico

Capítulo X X X V III - O Domínio Terrestre do E sta d o ............................: . . . . 1071


396 — Introdução; 397 — O papefdo território através
da História; 398 — T eoria jurídica do território: a)
lerritório-objeio; b) território-sujeito; c) território-li-
mite; d) território-com petência; e) soberania territo­
rial; 399 — Fronteiras e limites: noções gerais; 4 0 0 —
A delimitação; 401 — Princípio do "uti possidetisli
401A — Transportes ferroviários e rodoviários; 401B
— Enclaves; 401C — Riquezas do subsolo.
Capítulo X X X IX Formação Histórica do T erritório Brasileiro.......... . . 1091
402 — As bulas papais <* o Tratado de Toidesilhas;
403 — Tratados do período colonial: a) Tratados de
Utrecln; b) Tratado de Madri, c) Tratado de EI Pardo;
d) Tratado de Sam o Ildefonso; e) Paz de Badajoz; 404
— A Independência, os limites e o seu reconhecim en­
to; 405 — As grandes questões territoriais: a) T erritório
de Palmas; b) Q uestão do Amapá; c) Os limites c o m
a Guiana Inglesa; d) A questão do Território do Acre;
406 — Outros limites brasileiros.
«="-$)C apítu lo X L Modos de Aquisição de Território. Modos O riginá­
rios................................................................................................... 1109
407 — Classificação dos modos de aquisição de terri­
tório; 408 — O cupação: a) Conceito e elem entos; b)
Fundamento; c) H istórico; d) Teorias sobre o alcance
da ocupação; e) Conseqüências da ocupação; f) O
denominado direito internacional; g) Conclusão; 409
— Acessão: a) D e fin içã o 'e classificação; b) Acessão
natural; c) Acessão artificial.
'— A) Capítulo XLI Modos Derivados de Aquisição de T e r r itó r io ............... 1119
410 —; Introdução; 411-— Cessão; 412 — Adjudicação;
413 — Prescrição aquisitiva; 414 — Conquista.
Capítulo XLII Regiões P o la re s .......................................................................... 1127
415 —: Noção; 416 — As regiões polares e o DI; 417
— Aspectos econôm icos, estratégicos e políticos; 418
— O Artico: a teoria dos setores; 419 — A Antártica.
t__ -p (^Capítulo X L III Águas Interiores. Mar Territorial. Zona E co n ô m ica . . 1137
420 — Introdução; 420A — Águas interiores; 421 —
Mar territorial: con ceito, terminologia; 422 — Evolu­
ção histórica; 423 — Direitos do Estado costeiro no
mar territorial; 424 — Direito de passagem inocen te
L{V e passagem de trânsito; 425 — A linha de base e al­
gumas normas de delim itação no mar territorial. Águas
arquipélagas; 426 — O limite exterior. O lim ite do
rilar territorial entre dois Estados; 427 — Largura do
mar territorial; 428 — Natureza jurídica do m ar ter­
ritorial; 428A — Zona econômica.
Plataforma Continental. As Grandes Profundidades . 1177
429 — Dados geográficos; 430 — Recursos; 431 —
Definição; 432 — Term inologia; 433 — Evolução his­
tórica: 434 — Direitos e deveres do Estado na plata­
forma; 435 — Limites; 4 3 6 — Fundamentos dos direi­
tos do Estado na plataforma; 437 — As grandes pro­
fundidades marinhas.
—Jp ¡.-Capítulo XLV ' — Zona Contígua. Alto-mar. Pesquisa Científica Mari­
nha ..............................................................................-. . t .......... 1199
438 — Zona contígua; 439 — Alto-mar: noção; 440 —
Natureza ju ríd ica do alto-mar; 441 — H istórico da
liberdade dos mares; 442 — A liberdade dos m ares'na
Convenção de G enebra; 443 — Liberdade de navega- ’
ção; 444 — Liberdade de pesca; 445 — L iberd ad e de
colocar cabos subm arinos e oleodutos; 446 — Liber-

1693
dade de sobrevôo; 446A — Liberdade de colocar ilhas
artificiais; 447 — Lim itações à liberdade dos mares de
origem consuetudinaria: a) Introdução; b) Direito de
revista e de aproxim ação; c) Direito de perseguição;
d) Repressão à pirataria; 448 — Limitações de origem
unilateral ã liberdade dos mares; 449 — Lim itações e
origem convencional à liberdade dos mares; 449A —
Pesquisa científica m arinha; 449B — O bjetos históri­
cos e arqueológicos.
Capítulo XLV] — Pescarias. Conservação dos Recursos Vivos do Alto-
m a r ................................................................................................. 1221
450 — A pesca e a sua importância; 4 5 1 — A liberdade
7^ de pesca; 452 — A justificação para as restrições à
o liberdade de pesca; 453 — A regulamentação da pesca
; em alto-mar; 454 — A regulamentação convencional
¡ ' e a unilateral; 455 — Pescarias sedentárias; 4íj>6 — A
. . conservação dos recursos vivos do alto-mar nas con fe­
rências internacionais.
Capítulo XLVII — Navios............................................................................................ 2 233
457 — Definição; 458 — Classificação; 459 — Navios
de guerra; 460 — Navios públicos civis; 461 — Navios
privados; 462 — N acionalidade: 463 — Navios em
águas interiores estrangeiras: a) Navios privados; b)
Navios públicos; 464 — Navios em mar territorial es­
trangeiros: a) Navios privados; b) Navios públicos; 465
— Navios em zona contígua “estrangeira”; 465A —
—-^Navios em zona econôm ica; 466 — Navios em alto-mar.
Capítulo XL.VIII — Rios..................................................................................... 1253
y / 167 — Introdução; 468 — Evolução histórica do Dl
Fluvial; 469 — Rios nacionais; 470 — Rios internacio­
nais; 471 — Política brasileira; 472 — Regime de alguns
rios internacionais .
Espaço A é re o ............................................................................... 1265
473 — Introdução; 474 — Natureza jurídica; 4 7 5 —
A regulamentação convencional; 476 — Aeronaves;
477 — As aeronaves internacionais; 478 — Os “ limites
hirozontais” da soberania estatal no espaço aéreo; 479
— Apoderamento ilítico de aeronave e outros crimes.
Espaço E x te rio r...................................... r ................................. 1281
480 — Introdução; 481 — Noção de espaço exterior;
482 — Dados geográficos; 483 — Corpos celestes; 484
— Regulamentação ju ríd ica internacional; 485 — A
cooperação internacional na exploração espacial.
Capítulo LI — T elecom unicações..................................................................... 1.291
486 — Introdução; 4 8 7 — A internacionalização da
matéria; 488 — Princípios; 489 — Telecom unicações
por satélites; 490 — Rádios piratas.
Capítulo LII — Meio A m b ie n te .......................................................................... 1-299
491 — Introdução; 492 — Poluição do mar; 492A —
Poluição dos rios; 492B — Poluição do ar; 492C — As
organizações internacionais e a poluição; 492D — Le-

1694

¡¡■■l
gislação brasileira; 493 — Declaração (le Estocolm o e
Conferência das NU de 1992; 494 — M eteorologia;
494A — População.

LIVRO V I1
Órgãos do Estado nas Relações internacionais

“t? Capítulo L1I1 \—


Chefe de Estado. M inistro das Relações Exteriores . . 1327
495 — Os chefes de Estado na ordem internacional;
496 — A subida ao poder do chefe de Estado; 497 —
~ títulos; 498 — Correspondência; 499 — Imunidades;
---- 500 — O Ministro das Relações Exteriores; 501 —
Organização do M inistério das Relações Exteriores.
Capítulo L rv -J- Agentes D iplom áticos............................................................. 1335
502 — Definição; 503 — Histórico; 504 — D ireito de
; legação; 505 — Seleção, nomeação e recepção dos
/ agentes diplomáticos; 506 — Classificação dos agentes
/ V / diplomáticos; 507 — Corpo Diplomático; 508 — Pes­
soal da Missão; 509 — Funções e deveres dos agentes
diplomáticos; 510 — Fundamento dos privilégios e
imunidades diplomáticas; 511 — Privilégios e imuni­
dade; introdução; 512 — Inviolabilidade; 513 — Imu­
nidade de jurisdição civil e criminal; 514 — Isenção ^-
fiscal; 515 — Outros privilégios e imunidades; 516 —
Privilégios e imunidades dos agentes diplomáticos na- ~
cionais do Estado acreditado; 517 — Privilégios e imu­
nidades da família dos agentes diplomáticos; 518 —
Privilégios e imunidades do pessoal técnico e adminis­
trativo; 519 — Privilégios e imunidades do pessoal de
serviço; 520 — Privilégios e imunidades dos em prega­
dos domésticos; 521 — Fim da Missão Diplomática e
das funções dos agentes diplomáticos; 522 — O s mem­
bros da Missão Diplom ática e os terceiros Estados; 523
— Missões especiais; 524 — Diplomacia parlamentar;
525 — Diplomacia com ercial; 526 — As Missões per-
manentes ju n to às organizações internacionais; 526A
— Diplomacia não oficial.
_Capítulo LV — Cônsules............................................................................................... 1363
527 — Definição; 528 — Evolução histórica; 5 2 9 —
Relações consulares; 530 — Espécies de cônsules; 531
— Funções e deveres; 532 — Estabelecimento d e Con-
\ ¡ sulados; 533 — Seleção, nomeação e recepção dos
/ _ cônsules; 534 — Classificação dos chefes de repartição
consular. Precedência. Repartições consulares brasilei­
ras; 535 — Privilégios e imunidades: das repartições
consulares, dos funcionários consulares de carreira e
de outros m em bros da repartição consular; 5 3 6 —
Privilégios e imunidades dos Consulados e cônsules
honorários; 537 — Fim das funções consulares; 538
— Cônsules e agentes diplomáticos.

1695
LIYRO VIH
Modos de Solução dos Litígios Internacionais. Sanções »

/-Capítulo LVI — Modos Pacíficos de Solução dos Litígios Internacio­


nais ................................................................................... 1383
539 — Introdução: a) Modos diplomáticos: 540 —
Negociações diplomáticas; 541 — Serviços amistosos;
542 — Bons oficios: 543 — M ediação; b) Modos po­
líticos; 544 — Na ONU: 545 — Na OEA; c) Modos
jurídicos; 546 — Comissões de investigação; 547 —
Conciliação: 548 — Solução judiciária e arbitrai.
Capítulo LVII — A rbitragem ................................................................................... 1399
549 — Definição; 550 — O bjeto: 551 — Evolução
histórica; 552 — Formas de arbitragem ; 553 — A ar­
bitragem com o modo facultativo; 554 — Característi-
. _ cas; 555 — Compromisso arbitrai; 556 — Constituição
do Tribunal; 557 — Poderes do Tribunal; 558 — Pro­
cesso arbitrai; 559 — A sentença; 560 — Interpretação
da sentença; 561 — Anulação da sentença; 562 —
Revisão da sentença; 563 — A obrigação de decidir
do Tribunal; 564 — Os tratados que consagram a
arbitragem ; 565 — A Corte Perm anente de Arbitra­
gem; 566 — O projeto da Corte de Ju stiça Arbitrai;
567 — A arbitragem no continente am ericano; 568 —
A arbitragem nos dias de hoje.
Capítulo LVIII — As Sanções no D l .................................................................... 1417
569 — Introdução; 570 — As medidas coercitivas e a
guerra; 571 — Rompimento de relações diplomáticas;
572 — Retorsão; 573 — Represálias; 574 — Bloqueio
pacífico; 575 — Embargo; 576 — Boicotagem ; 577 —
As sanções na ONU; 578 — As sanções no sistema
ju ríd ico interam ericano.

LIVRO IX
Segurança Coletiva

Capítulo L IX — Segurança C o le tiv a .................................................................. 1433


579 — Introdução; 580 — A interdição ao recurso à
força; 581 — Desarmamento; 582 — Os tratados de
proscrição de armas nucleares; 583 — Conclusão.

LIVRO X
Direito de Guena e Neutralidade

Capítulo L X — A Guerra: Noções G e'rais....................................................... 1455


584 — Conceito; 585 — A guerra na história do Dl;
586 — A guerra ju sta; 587 — O “ju s ad bellum”; 588
— O “ju s in bello” e sua sanção; 589 — Guerra total;
590 — A guerra e o pensamento econôm ico; 591 —
Classificação das guerras; 59 IA — Observação final.
Capítulo L X I — D eclaração de Guerra. Efeitos do estado de guerra. . 1475

1696
592 — Inicio da guerra; 593 — Definição: 594 — Da
necessidade da declaração de guerra: 595 — Especies:
596 — Poder com petente: 597 — Efeilos do estado
de guerra: a) <|iianto aos Estados; b) quanto aos indi­
viduos: c) quanto aos bens.
Capítulo LX1I A Guerra T e r r e s tr e .................................................................. 1487
598 — As forças armadas; 599 — Meios de com bate;
600 — A espionagem; 601 — Sítio e bom bardeio; 602
— Prisioneiros de guerra; 603 — Feridos e enferm os:
604 — Morios: 605 — Reféns; 606 — Parlamentarios;
607 — A proteção dos civis; 608 — Invasão e ocupação:
608A — Direito de perseguição; 608B — Mercenarios.
Capítulo LX1II Guerra M a rítim a ......................................, .............................. 1515
609 — Definição; 610 — Leis da guerra marítima; 611
— Forças armadas; 612 — O corso; 613 — Pessoal
considerado beligerante; 614 — Meios de combate;
615 — Prisioneiros de guerra; 616 — Feridos. enfer­
mos e náufragos; 617 — Pessoal religioso e sanitário;
618 — Mortos; 619 — Espiões; 620 — Parlanientários;
621 — Tripulação de navio mercante; 622 — Ocupa­
ção; 623 — Guias, pilotos e reféns; 624 — A proprie­
dade pública do inimigo; 625 — A propriedade priva­
da. O direito de presa; 626 — Cabos submarinos.
Capítulo LXIV A Guerra A é r e a .......................... .............................................. 1539
627 — Introdução; 628 — Forças beligerantes; 629 —
Meios de com bate; 630 — Prisioneiros. Feridos e es­
piões; 631 — Presa.
Capítulo LXY Relações entre os B e lig e ra n te s ........................................... 1545
632 — Introdução; 633 — Parlamentarios; 634 — Sal-
vo-conduto, passaporte e licença; 635 — Salvaguarda;
636 — Cartéis; 637 — Suspensão de armas; 638 —
Armisticio; 639 — Capitulação.
Capítulo LXVI A Guerra Nuclear. A Guerra Q u ím ic a ............................. 1553
640 — .As armas nucleares; 641'-*—As armas químicas
e bacteriológicas.
Capítulo LXVIJ Guerra In tern a............................................................................ 1559
642 — Introdução; 642A — Considerações sobre a
guerra interna; 643 — Legalidade; 644 — Tipos; 645
— Definição; 646 — A assistência estrangeira e a ca­
racterização do conflito como guerra civil; 647 — Si­
tuação dos revoltosos; 648 — O direito de guerra: 649
— Os terceiros Estados;. 650 — A ONU, a OEA e a-
OUA e as guerras civis; 650A — Fim da guerra civil:
651 — Conclusão.
Capítulo L X VI11 N eu tralid ad e........................................ ; ................................... 1591
652 — Aspecto histórico; 653 — A neutralidade no
continente am ericano; 654 — O Brasil e a neutralida­
de; 655 — D efinição e características; 656 — Direitos
e deveres; 657 — Espécies; 658 — Não beligerantes;
659 — D eclaração; 660 — Sanções.
Capítulo L X IX Neutralidade Terrestre--........................................................... 1601

1697
661 — Introdução; 662 — Deveres dos Estados e pes­
soas neutras; 663 — Deveres dos beligerantes; 664 —
O internam ento de beligerantes e os feridos em ter­
ritório nevilro. »
Capítulo L X X — Neutralidade M a rítim a ........................................................... 1605
665 — Deveres e direitos dos neutros; 666 — Direito
de angária; 667 — D ireito de presa; 668 — Zona de
Segurança Continental e zona de exclusão; 669 —
Medidas econôm icas; 670 — Bloqueio; 671 — Contra­
bando de guerra; 672 — Assistência hostil; 673 —
Direito de visita.
Capítulo L X X I — Neutralidade A é re a .................................................................. 1625
674 — Deveres e direitos dos neutros; 675 — Bloqueio
aéreo; 676 — Presa; 677 — Conclusão.
Capítulo LXX1I — Fim da G u erra........................................ .*................................. 1629
678 — Modos de term inação da guerra; 679 — Tratado
de paz; 680 — Capitulação incondicional; 681 — Efei­
tos; 682 — Poslim ínio; 683 — O julgam ento dos cri­
minosos de guerra; 684 — O Brasil e as reparações.

Apêndice
DI Econôm ico

Capítulo LX X II1 — Direito Internacional E co n ô m ic o ...................................... 1637


685 — Introdução; 686 — Definição; 687 — Aspectos
gerais; 687A — Solução dos litígios econôm icos; 688
— DI da Moeda; 688A — DI do Desenvolvimento; 689
— Conclusão.

Bibliografia. 1663

1698

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