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A PEÇA CANTARIM DE CANTARÁ DE SYLVIA ORTHOF: UMA PROPOSTA


DE LEITURA PARA O ÂMBITO ESCOLAR

ALINE BARBOSA DE ALMEIDA

Graduação em Letras – Língua Portuguesa pela Universidade Estadual de Alagoas – UNEAL (2013);
Especialista em Língua Portuguesa e Literatura Brasileira pela Universidade Candido Mendes – UCAM
(2013); Mestre em Linguagem e Ensino pela Universidade Federal de Campina Grande – UFCG (2015);
Doutoranda em Letras pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho – UNESP; Professora
de Língua Portuguesa e Literatura Brasileira no Colégio Paulo de Tarso.

RESUMO

O teatro na escola é uma ferramenta importante para despertar o gosto pelo texto
dramático nas aulas de literatura, bem como formar a sensibilidade do indivíduo por
meio da encenação. Entendemos que esses são pontos significativos, uma vez que,
desperta o imaginário do leitor e o coloca como indivíduo ativo, já que seu corpo
também se tornará presente nessa atividade de encenação. Para tanto, partimos de uma
reflexão sobre a arte teatral no âmbito escolar, em seguida nos detemos à análise da
peça Cantarim de Cantará, de Sylvia Orthof. Procurando finalizar, propomos uma
abordagem de leitura em sala de aula da peça em questão, bem como uma encenação
para levar o leitor a uma produção teatral e estimular sua criatividade. Nosso arcabouço
teórico se pauta nos estudiosos Magaldi (1985), Bornheim (1983), Dezotti (2006) e os
Parâmetros Curriculares Nacionais: arte (1997), entre outros que abordam a temática do
estudo.

Palavras-chave: Teatro; Literatura; Ensino; Imaginação.


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O TEATRO NA ESCOLA

A arte tem sido um grande instrumento da educação, pois ela ganhou espaço
nas escolas como uma atividade que integra os saberes e os sentidos, desenvolvendo a
percepção, seja ela corporal ou não do indivíduo aluno. Entre as artes, a que mais ganha
destaque é o teatro, mas não como uma disciplina específica, ele está integrado ao
ensino de literatura, o qual se apropria da encenação, em que possibilita o leitor a
conhecer e apreciar o texto dramático. Esse é um diálogo interdisciplinar que tem como
fim ampliar os horizontes de expectativa do leitor e sua bagagem de leitura do texto
dramático. Por teatro podemos entender que:

A etimologia grega de teatro dá ao vocábulo o sentido de miradouro, lugar de


onde se vê. O edifício autônomo, de fins idênticos àquele que se chama hoje
teatro, se denominava odeion, auditório. Na terminologia dos logradouros
cênicos da Grécia, teatron correspondia à plataforma, anteposta à orquestra e
envolvendo-a como três lados de um trapézio ou um semicírculo. Não se
dissocia da palavra teatro a ideia de visão. Ler teatro, ou melhor, literatura
dramática, não abarca todo o fenômeno compreendido por essa arte. É nele
indispensável que o público veja algo, no caso o ator, que define a
especificidade do teatro. (MAGALDI, 1985, p. 7-8, grifos do autor.).

O termo teatro acaba sendo um conjunto de especificidades físicas como, por


exemplo, o palco. Mas há categorias indispensáveis como o ator, o texto e o público,
sem esses elementos a atividade de encenar não se sustenta, porque a dramatização
envolve uma dinamicidade marcante no que concerne às construções de seu espetáculo.
É por isso que o conceito de teatro vai mais além, uma vez que não há um limite para os
parâmetros de recepção de quem vê uma peça ou a lê. Pallottini (2002) nos explica que
prevalece uma diferença no que diz respeito ao ver e ler a peça, o ato de ver se remete
aos termos de teatro, já a ação de ler pensa-se em uma dramaturgia, no entanto, não
podemos negar que esses dois caminhos oferecem uma experiência rica com a arte e
também manifestam a presença de um conteúdo, que será expressado e veiculado na
encenação ou na leitura do texto dramático.
Podemos notar a importância do conteúdo, pois ele está associado a cada
indivíduo e que parte de uma criação por meio dos sentidos e dos sentimentos, estes por
sua vez são adquiridos com a vivência e a experimentação do mundo. O conteúdo
movido às sensações pode propiciar mudanças por meio do jogo de palavras utilizadas
na peça, bem como da representação mímica do autor.
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Essas mesmas materialidades do teatro são pensadas na escola, porém de uma


forma mais espontânea, já que nesse âmbito não permeia todas as técnicas que o teatro
profissional requer. Cada ser humano está ligado ao ato de dramatizar, pois isso faz
parte do nosso comportamento natural e da nossa capacidade de desempenhar diferentes
papéis no meio. Essa relação com o dramático está voltada não só para a fase adulta,
mas infantil, por isso entendemos que:

[...] o ato de dramatizar está potencialmente contido em cada um, como uma
necessidade de compreender e representar uma realidade. Ao observar uma
criança em suas primeiras manifestações dramatizadas, o jogo simbólico,
percebe-se a procura na organização de seu conhecimento do mundo de
forma integradora. A dramatização acompanha o desenvolvimento da criança
como uma manifestação espontânea, assumindo feições e funções diversas,
sem perder jamais o caráter de interação e de promoção de equilíbrio entre
ela e o meio ambiente. Essa atividade evolui do jogo espontâneo para o jogo
de regras, do individual para o coletivo. (BRASIL, 1997. p. 52)

Em sala de aula tudo que potencializa a fantasia é relevante para as descobertas


de uma criança, por isso que o teatro é uma ferramenta de trabalho que facilita a relação
ensino-aprendizagem, uma vez que ele amplia a criatividade da criança, estimulando
sua imaginação e seu compreender de mundo. A funcionalidade da arte de encenar na
escola volta-se, também, para o desenvolvimento da criança no que diz respeito a sua
relação com os demais sujeitos, levando ela do individual ao coletivo. Esse
desenvolvimento com o meio é fundamental para que a criança se sinta inserida e que
faça parte do todo, então, trabalhar com o teatro atrelado à leitura de textos dramáticos
torna-se relevante já que essa relação coloca em evidência o potencial criativo do leitor.
De acordo com Dezotti (2006) ao aproximar o ensino do teatro estamos dando
um impulso natural do homem com a dramatização, pois ao fazer uso da linguagem
teatral subentende-se que o professor se afasta do modelo tradicional das aulas e o
aproxima de sua capacidade natural para a mimese, além de lhe dar acesso a elementos
de diversas linguagens que compõem a linguagem teatral. A arte torna-se fundamental
no âmbito escolar, porque em:

[...] nossos dias, o homem pede menos arte, ou melhor as suas necessidades
estéticas satisfazem-se por outros caminhos que não os especificamente
artísticos. Evidentemente, no caso do teatro as coisas se complicam de modo
peculiar, já que nos deparamos com uma arte que é integradora por definição,
que exige tanto a integração das artes entre si com a da arte com o público –
aspectos estes que, em princípio, sempre deveriam permanecer indissociados
em qualquer tipo de expressão artística. (BORNHEIM, 1983, p. 81).
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Levando em consideração os aspectos da modernidade entendemos que o


caminho que se faz entre o homem e a arte torna-se mais distante, uma vez que a
efemeridade dos momentos lhe atravessa sem deixar experiências significantes em sua
formação. Portanto, a escola torna-se um espaço privilegiado para desenvolver esse
contato do leitor com o texto dramático e com a encenação é relevante nas séries iniciais
e no ensino fundamental, já que esse é o momento em que o indivíduo se encontra com
uma percepção mais apurada para o novo, o qual resignifica.
Vale ressaltar, que não estamos propondo, aqui, a criação de artistas na escola,
refletimos apenas sobre a leitura do texto dramático na sala de aula atrelado à arte de
encenar, já que essas relações, quando realizadas de forma efetiva, podem despertar o
prazer do leitor pelos textos dramáticos, dando a ele várias possibilidades de leitura e
não se detendo, somente, a prosa e a poesia como é de costume.

A PEÇA CANTARIM DE CANTARÁ DE SYLVIA ORTHOF: UM OLHAR


ESTÉTICO

Toda peça teatral passa por uma construção em que se leva em conta os signos
do espetáculo, dentro desse contexto, a teórica Pascolati (2005) fundamentada em
Kowzan propõe treze sistemas de signos – a palavra, o tom, a expressão facial, o gesto,
a marcação, a maquilagem, o penteado, a indumentária, o acessório, o cenário, a
iluminação, a música e o som, em que a maioria está ligada a composição da
personagem e diretamente ao ator. Assim, ela nos explica que a leitura do texto
dramático não deve estar limitado à apreensão do significado da obra, uma vez que esse
procedimento é comum nas produções dirigidos ao público infantil, pois nesses textos
prevalecem uma riqueza de organização desses signos, já que eles apelam intensamente
para uma dimensão visual, bem como procuram construir uma ação que tem o ritmo
dinâmico.
Pensando nessa abordagem, notamos que a peça Cantarim de Cantará, escrita
em 1977, mas publicada pela primeira vez em 1997, de Sylvia Orthof traz essas
composições, pois é uma obra destinada ao público mirim em que os recursos visuais
tornam-se atrativos e simbólicos, pelo próprio título notamos que a obra se refere a um
musical infantil, que é composto por personagens pássaros e que tem como
protagonista a Pomba-Rolinha.
Tal personagem passa por várias situações de perdas e ganhos, primeiro ela
perde sua casa para a ventania, em seguida a personagem Urubu lhe engana colocando-a
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em uma gaiola, deixando-a pressa e sem poder voar. Depois ela consegue uma porta
como casa, mas o Pássaro-fogo a destrói, recomeçando mais uma vez, a Pomba-Rolinha
consegue uma janela e ali ela se restabelece e tem uma passagem da vida para a morte
de forma amena.
Pensando em uma perspectiva mais estrutural, podemos mencionar que a peça
não possui uma divisão em atos ou cenas, mas a ação dramática é marcada pelos
dilemas da personagem principal Pomba–Rolinha. A peça já inicia com uma didáscália
que remete a ideia do cenário.

CENÁRIO: Fiapos de neblina e gaze. Início da alvorada. Surgem os atores,


em procissão, vestidos de pássaros irreais. Sobre túnicas brancas, máscaras,
cocares de plumas coloridas, fitas, insinuações de asas. Tudo é muito irreal e
festivo. Os pássaros trazem o amanhecer. (ORTHOF, 1997, p. 67).

Temos aqui uma descrição física da peça e ao mesmo tempo ideológica. Há a


indicação das personagens, suas posições e vestimentas, ao passo que esses elementos
se configuram na perspectiva do irreal, característica que irá prevalecer na construção
da obra. Assim a menção de “fiapos de neblina”, “túnicas brancas” e “plumas
coloridas”, nos remete a uma construção imagética do amanhecer. Por isso Pascolati
(2005, p. 04) nos diz que o cenário da peça Cantarim de Cantará nos “convida ao
sonho e à fantasia e instaura no texto/palco, na imaginação do leitor e na visão do
espectador, o símbolo estruturador do sentido do texto: o amanhecer, ligado
semanticamente à ideia de renovação da vida”. Para termos uma noção visual da peça e
de como esses elementos se mostram, segue a baixo duas imagens da peça apresentada
no teatro Valdemar Oliveira em Recife:

Figura 1- Peça Cantarim de Cantará Figura 2 - Peça Cantarim de Cantará

Fonte – (LEÃO, 2012)


Fonte – (LEÃO, 2012)
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Observamos como a peça encenada é rica em cores, trabalhadas na gradação de


cores frias e quentes no figurino dos atores. O cenário, em sua parte dianteira, tem uma
floresta ressaltando o ambiente natural dos pássaros. Na figura dois, temos um dado
importante, a iluminação, que na primeira se mostra mais clara e na segunda é como
uma penumbra, como se fosse o amanhecer. Esses elementos chamam à atenção do
público e desperta na criança um encantamento que lhe prende ao jogo imagético da
peça encenada.
Nesse sentido, no que diz respeito à ação, podemos entender que ela é a
motivadora do enredo. Hegel (1997) cita que a vontade humana é a principal fonte
geradora da ação, por isso que os conflitos são essenciais para que essa vontade seja
intensificada. Observemos como isso é presente na peça:

Um: É a Pomba-Rolinha!
Dois: O que será que aconteceu?
Sol: Dona Pomba – Rolinha, o que foi que aconteceu? Diga de uma vez!
Pomba – Rolinha: O que é mais bonito, num pássaro?
Sol: Eu acho que são as asas... Asas! Asas de voar!
Pomba – Rolinha: Asas de voar... é lindo poder voar, não é mesmo? (chora)
Mas a ventania voou forte demais... e derrubou a minha casa... (ORTHOF,
1997, p. 73, grifos do autor).

Urubu: Eu vou dar de presente, para a Pomba – Rolinha, uma porta para a
nova casa!
Pomba-Rolinha: É verdade, Urubu?
Urubu: Aqui está!
[...]
Pomba – Rolinha: Já tenho uma porta... (Urubu dá a chave) e uma chave de
abrir gaiolas... que festa para uma Pomba- Rolinha! (ORTHOF, 1997, p. 82-
83, grifos do autor.).

Borboleta: Mas que tristeza é essa? O que foi que aconteceu?


Pomba-Rolinha: Minha vida é rolar por aí... uma vez é ventania, outra vez é
gaiola, outra vez é Pássaro de Fogo... Estou muito sem esperança, Dona
Borboleta Azul!
Borboleta: Calma, Pomba – Rolinha!
Pomba – Rolinha: Eo que devo fazer?
Borboleta: Eu não sei... Você é quem sabe! Cada pessoa, borboleta ou
passarinho, tem que encontrar, dentro de si, o seu caminho!
Pomba – Rolinha: Dentro de mim a solução? (Pensa.) Mas o que posso
fazer? Só se for fazer e... refazer! É isso! A gente tem que saber rolar e
reconstruir... É pra isso que sou livre de gaiola... e quem é livre tem que lutar
por cada dia e momento... É isso. (Pausa.) Será isso? Será que a liberdade
custa a ser construída em nossa vida? Ai, estou começando a me sentir muito
livre, com vontade de reconstruir. (ORTHOF, 1997, p. 85-86, grifos do autor.)

A personagem Pomba-Rolinha é o principal elemento da ação na obra, já que


todos os conflitos se voltam para ela, por isso que o desejo e o desespero da personagem
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em adquirir uma casa são fundamentais para que a ação se propague de forma linear.
Vejamos a tristeza dela em perder a casa pela ventania, em seguida ficar pressa em uma
gaiola pela ganância da personagem Urubu, mas que em seguida se redime e lhe entrega
uma porta com chave, para lhe dar a liberdade de ir e vir. Mas o Pássaro de Fogo coloca
fogo em sua porta e ela, mais uma vez, volta à peregrinação da busca de um lar seguro.
Dessolada ela encontra uma nova vontade, ao conversar com a Borboleta acreditamos
que esse seja um ponto auge da ação que se desenrola no enredo, pois a partir dessa
conversa fica evidente a ideia do recomeçar e é por meio dela que a personagem dá
continuidade a sua busca. Em função desses dilemas, a Pomba – Rolinha configura-se
como personagem central da peça, à medida que as demais personagens como Pássaro-
Sol, Urubu, Sabiá, Bem-te-vi, Borboleta, Pássaro de Fogo, Milharal, Dindinha-Lua
Saravá e Estrelas, que são os secundários, lhe auxiliam na busca e/ou na desconstrução
da casa da Pomba – Rolinha.
Em função dessas relações entre as personagens o que se sobressai, ao olhar do
leitor, é a temática da coletividade, a qual acreditamos que seja a principal, uma vez que
essa vertente é a essência de uma sociedade. Todos precisamos um dos outros para nos
constituir como indivíduo no meio e é essa ideia que transmite a peça Cantarim de
Cantará, em que Pomba – Rolinha precisa o tempo todo do apoio dos amigos, para
continuar sua caminhada. Isso também leva o leitor, pensando no público infantil, a
refletir sobre sua condição no mundo: de que deve estar presente para o outro e ser
solidário. Assim a obra também ganha um caráter moralizador, no entanto, não deixa de
levar o público à imaginação e estimula-o a criatividade.
Por intermédio da linguagem poética podemos vivenciar momentos em que as
palavras adquirem uma força incomum, um lado escondido poucas vezes visitado pelo
nosso pensamento. Paixão (1983) destaca que “a sensação provocada pelo contato com
a natureza, uma situação cotidiana, ou o convívio de alguém, tem um sabor diferente
para cada um de nós e, se fossemos escrever sobre isso, nunca dois indivíduos usariam
as mesmas palavras.” Desta maneira, mesmo sendo complexa, cada um é dono de sua
linguagem poética, interpretando-a e expressando-a de acordo com sua individualidade.
Segundo Paixão (1983) apesar de a poesia estar representando a percepção de uma
realidade subjetiva, o poeta não se torna passivo diante de tudo que o rodeia.
Observado em diversas partes da peça Cantarim de Cantará, o caráter poético
pode ser identificado facilmente por meio das rimas, do ritmo, das metáforas e da
musicalidade. Assim a linguagem não se detém somente ao verso e a prosa, pois
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podemos acrescentar poeticidade aos movimentos e as ações. Nesse texto dramático é


possível identificar essa relação entre a linguagem e as ações das personagens,
tornando-se evidente enxergar na evolução dos mesmos a demonstração dos
sentimentos. Desse modo, os momentos de tristeza, dor, alegria, magia tornam-se
sentimentos profundos e inquietantes. Podemos observar essas características em um
dos trechos da peça:

Sol (comendo o milho, alegre):

Quando o sol tá muito quente


Faz o milho pipocar.
Ventania trouxe milho
Na ciranda de ventar!
[...]
Cirando do Sol
Ó cirandê, ó cirandeiro-ó
A pedra do teu anel
Brilha mais
Do que o sol! (ciranda nordestina)

(de repente, muda o ritmo. Ouve-se um gemido triste de cuíca.). (ORTHOF,


1997, p.71, grifos do autor.)

Vale ressaltar que essas manifestações de sentimentos se dão pelo processo de


enunciação, pois as didascálias servem para orientar, o ator e o leitor de textos
dramáticos, a essas mudanças repentinas de personalidade. A linguagem poética que
marca canções e falas das personagens se faz presente também no discurso do
enunciador, com metáforas como “fiapos de neblina” que exemplificam claramente
essa presença poética. Podemos observar em diferentes momentos do texto teatral
palavras que se repetem trazendo outro significado, adquirindo, portanto, outra
conotação “Eu sabia que alguma coisa terrível ia acontecer. Um
sabiá...sabe!”(ORTHOF, 1997, p.76). Assim também são as palavras criadas
(neologismos) para sugerirem ações e sentimentos que se remetem à característica dos
pássaros “Eu sabia, eu sabiava que algo terrível havia acontecido...” (ORTHOF, 1997,
p.77).
Destacamos outros aspectos relevantes na peça estudada: a música e o som,
trazendo ao texto dramático a dinamicidade e o ritmo, características importantes
quando nos referimos ao teatro infantil. Pascolati (2005) observa a rubrica que vem logo
após a descrição do cenário da peça, destaca que nesse momento a rubrica “recomenda
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ritmo de capoeira acompanhado de berimbau e indica a chegada dos instrumentos e sons


remetendo-se ao amanhecer.”
As músicas e as performances dos autores sugerem a peça um clima festivo e
alegre, convidando o espectador a participar desses momentos, algumas canções trazem
traços de outras canções populares já conhecidas pelo público o que os aproxima mais
do texto teatral. Há uma canção cantada por Pomba-Rolinha que anuncia sua entrada, é
uma paródia de uma marchinha carnavalesca muito popular:

Oi, abram alas


que eu quero chorar...
Oi, abram asas
que eu quero chorar...
A Pomba-Rola é triste
e passará!
Pomba-Rolinha
só sabe chorar, chorar!
Oi, abram alas
pra quem quer passar!
A Pomba-Rola,
triste, passará! (Orthof, 1997, p.72).

As cantigas presentes na peça resgatam muitas tradições culturais brasileiras


como as cirandas, o folclore, os rituais de candomblé, inspirando deste modo a
composição de algumas cirandas da peça a exemplo da “Ciranda das Estrelas”.
Outro aspecto relevante refere-se ao diálogo que a peça Cantarim de Cantará
tem com outras obras, nesse contexto atentamos para a relação com a obra “Morte e
vida Severina” de João Cabral de Mello Neto, ambos os textos se aproximam em alguns
aspectos formais, quando se observa a presença da linguagem poética em diversas
partes do texto, como nas cantigas, como também na aproximação entre os conteúdos,
destacando a presença constante da morte mesmo quando as personagens alimentam
esperança de vida, podemos perceber no canto do Pássaro de Fogo (p. 84). A
personagem Pomba-rolinha experimenta sensação semelhante à de Severino: esta
prestes a perder a esperança de uma vida melhor, é possível observar essa circunstância
no canto de Pomba-rolinha, em tom de lamentação e tristeza. O nascimento de uma
nova pomba-rolinha é a esperança que traz a ideia de renascimento, de que vale a pena
viver.
O encontro de Pomba-rolinha com a Borboleta Azul é comparado ao de Severino
com o Seu José Mestre Carpina, pois por intermédio desses encontros e da sabedoria
que é transmitida por esses personagens (Borboleta Azul e Mestre Carpina) ambos os
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protagonistas recuperam a crença de uma vida triunfante. Tal situação pode ser
observada no diálogo entre a Pomba-Rolinha e a borboleta Azul.

PROPONDO UMA EXPERIÊNCIA DE LEITURA

“Na leitura e na escritura do texto literário encontramos o senso de nós mesmos


e da comunidade a que pertencemos. A literatura nos diz o que somos e nos incentiva a
desejar e expressar o mundo por nós mesmos”. É desse modo que Cosson (2012) nos
diz a importância da leitura literária, já que ela nos proporciona uma experiência do
saber da vida por meio da vivência do outro, nesse caso, o texto dramático.
A leitura de obras dramáticas traz diversas inquietações quando se pensa em
metodologia para a realização da leitura em sala de aula. Esses textos, por possuírem
uma estrutura diferenciada da prosa e da poesia, são pouco abordados no contexto
escolar. Acreditamos que esses fatores possam estar ligados à formação do professor,
uma vez que esse na maioria das vezes possui uma experiência de leitura escassa em
função do tempo e de suas atividades pedagógicas excedidas.
A nossa proposta de leitura parte do objetivo de proporcionar ao leitor uma
experiência de leitura integral de uma peça de teatro e em que ele poça reconher alguns
elementos da estética do texto dramático como: a identificação das didascálias, a ação, a
estrutura, etc. A atividade é direcionada para uma turma do 6º ano do ensino
fundamental numa extensão de cinco encontros, cada um com sessenta minutos de
duração.
Nesse sentido, em um primeiro momento o professor pode levantar
informações a cerca do horizonte de expectativas dos leitores sobre a vivência dos
passarinhos, criando uma relação de diálogo a partir dos seguintes questionamentos:
Vocês já criaram algum tipo de passarinho? Como que vocês acham que é a vida de um
passarinho? Como que eles vivem? Onde eles dormem? Quais os perigos que eles
vivem? Como eles vivem nas cidades? Quem mata os passarinhos? Os passarinhos
costumam fazer mudanças? Quais são as alegrias dos passarinhos? Assim, deve-se
levantar uma breve discussão sobre a vivência dos pássaros e a interferência do homem
em sua moradia. Como motivação para a entrada do texto Cantarim de Cantará de
Sylvia Orthof, pode-se ouvir a música “Passaredo” de Chico Buarque.
No segundo encontro a leitura da peça deve ser realizada em semicírculo e em
voz alta, intercalando os momentos entre os leitores. Após a leitura evidencia-se a perda
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da casa de Pomba Rolinha pela ventania (p. 67-74). Pode ser Sugerido uma encenação
por meio do jogo dramático em sala, a partir da leitura em que Pomba Rolinha cai na
propaganda da personagem Urubu. Nesse momento, estimular os leitores a pensarem
em uma personagem Pomba Rolinha esperta e astuta, diferente da personagem
desenhada por Silvya Orthof. (p. 74-83).
No terceiro encontro, a tensão e a angústia que Pomba Rolinha sofre para ter
sua porta e sua janela (p. 83-90), podem ser ponto de partida para a continuação da
leitura da obra. A leitura em voz alta, expressiva e intercalada entre os leitores deve ser
prestigiada novamente. Provocar uma discussão a cerca do entendimento que os leitores
possuem sobre a ideia de migração e sobre o percurso migratório que os pássaros fazem
durante o ano. Estimulá-los a pensar sobre as perdas e ganhos durante esse processo, o
que eles deixam para trás e a vida que se renova em uma nova moradia. Após a leitura
fazer uma ponte com a itinerância nordestina, por meio da leitura em quadrinho da obra
“Morte e vida Severina”, de João Cabral de Melo Neto. Leitura da peça visando a morte
da personagem Pomba Rolinha e ovo como símbolo de esperança e de vida. (p. 90-95)
Seguindo, no quarto e no quinto encontro o professor propõe e estimula a
criação de um roteiro sobre a peça Cantarim de Cantará para ser encenado em sala de
aula. (organizar as roupas e o cenário de forma coletiva. Pode-se utilizar o tecido TNT
na cor azul para representar o céu, alguns galhos e/ou pedaços de madeira para se
pensar na criação da gaiola, da porta e da janela. O TNT amarelo, preto, vermelho,
laranja podem ser utilizados para confeccionar as roupas das personagens, que podem
ser costuradas ou grampeadas, pois facilita a preparação em grupo. Recortar bicos de
pássaros em cartolinas coloridas e colocar elástico. A trilha sonora também deve está
voltada para essa temática, pode ter ao fundo uma música instrumental com som de
pássaro piando, vento, etc. As cantigas presentes na peça também podem ser
prestigiadas.)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A peça Cantarim de Cantará possibilita muitas enunciações cênicas, o que


fortalece a necessidade de uma leitura do texto dramático que procure evidenciar, a
partir da matéria textual, os signos do espetáculo presentes na peça, atentando para
possibilidade de construção e ampliação dos sentidos da leitura dramática.
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Dentro dessa perspectiva, o professor adquire um papel fundamental para


construção dos significados, assumindo a mediação das leituras, por meio da escolha ou
indicação das mesmas, bem como proporcionar aos jovens leitores o acesso aos textos
dramáticos. Um professor, bem formado, será capaz de orientar seus alunos quanto aos
caminhos possíveis para a realização das leituras de diferentes gêneros textuais e as
técnicas necessárias para a construção dos sentidos dos textos, especificamente o
dramático, pois poderá enfatizar a dimensão estética da criação literária voltada para
crianças, assim como reforçar a experiência de leitura no âmbito escolar.

REFERÊNCIAS

BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: arte / Secretaria de Educação


Fundamental. – Brasília : MEC/SEF, 1997.

BORNHEIM, Gerd A. Teatro e Literatura. In: Teatro: cena dividida. Porto Alegre:
L&PM, 1983, p. 73-90.

COSSON, Rildo. Letramento literário: teoria e prática. 2 ed. São Paulo: Contexto,
2012.

DEZOTTI, Clara Beatriz da Silva. O Teatro como meio de comunicação: Um estudo


sobre a utilização do tableau na Proposta Pedagógica de Arte do Ensino Fundamental e
Médio da Rede Estadual de Ensino do Estado de São Paulo. Universidade de Marília,
Faculdade de Comunicação, Educação e Turismo, 2006.

HEGEL, G. W. F. Curso de estética: o sistema das artes. Trad. Álvaro Ribeiro. São
Paulo: Martins Fontes, 1997.

MAGALDI, Sábato. Conceito de teatro. In: Iniciação ao teatro. 2. ed. São Paulo:
Ática, 1985, p. 07-14.

ORTHOF, Sylvia. Cantarim de Cantará. In: As crianças vão ao teatro. 3. ed. Rio de
Janeiro: Agir, 1997, p. 65-67.

PAIXÃO, Fernando. O que é Poesia. São Paulo: Brasiliense, 1982.

PALLOTTINI, Renata. Afinal, o que é dramaturgia? In: ______. O que é dramaturgia.


São Paulo: Brasiliense, 2002.

PASCOLATI, Sonia Aparecida Vido. O texto dramático na sala de aula. In: Anais 15º
Congresso de Leitura do Brasil (COLE). Campinas – SP: UNICAMP, 2005.
Disponível em: <http://alb.com.br/arquivo-
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de julho de 2018.
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