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A explicitação do implícito

É preciso atenção para não ser enganado quando recriam aquilo que é evidente por si

José Luiz Fiorin

Numa tirinha de Mauricio de Sousa, publicada em O Estado de


S. Paulo (22/11/2007, D8), a professora diz à classe:
"Este ano só o Chico vai ficar em recuperação".
Ele pergunta:

"I os otro? Foro reprovado direto?"


O personagem Chico Bento, de Mauricio de Sousa:
história exemplificada como mensagens implícitas são
apreendidas pelo interlocutor por um processo de Esse exemplo ensina-nos que, quando falamos ou escrevemos,
inferência dizemos algumas coisas explicitamente e deixamos outras
implícitas, que, por um processo de inferência, são apreendidas
pelo interlocutor. Implícito é o que se diz sem dizer, é aquilo que se apresenta como evidente por si mesmo. A
inferência se dá por meio de duas operações: uma lógica, em que estabelecemos uma implicação: se... então (se
somente Chico ficou em recuperação, então os outros...); uma pragmática, em que levamos em conta o contexto
verbal e não verbal e os princípios que regem a comunicação.

A graça do exemplo acima reside no fato de que Chico Bento, ao fazer a inferência sobre o implícito na fala da
professora, realizou a operação lógica adequadamente, mas não a operação pragmática, pois violou o que Grice
chama a máxima da quantidade (o falante sempre deve dar a informação mais forte de que dispõe). A
informação mais forte seria a de que todos os outros foram reprovados. Se a professora não disse isso, a
conclusão correta seria: se apenas eu fiquei em recuperação, todos os outros foram aprovados direto.

Para compreender o que se diz, é preciso não só entender o que se afirmou explicitamente, mas também o que
se deixou implícito. Um senador italiano fez um protesto, em frente à embaixada brasileira em Roma, contra a
concessão pelo nosso país de asilo político a Cesare Battisti, condenado pela Justiça italiana por assassinatos
com motivação política. O senador segurava um cartaz que dizia "Bin Laden, peça asilo ao Brasil" ( O Estado de S.
Paulo, 23/1/2009, A8). Para compreender o tom de protesto, é necessário perceber o implícito: se o Brasil
concede asilo político a uma pessoa considerada terrorista pela Justiça italiana, então está disposto a conceder
refúgio a qualquer pessoa tida como terrorista.

Terrorismo
Deixar informações explícitas não significa necessariamente manipular ou enganar. Há coisas que se
compreendem sem que seja necessário dizê-las. São as informações que já se conhecem ou que se podem
facilmente inferir. Operamos sempre com implícitos. Mesmo certas perguntas mais banais da vida cotidiana,
estão construídas sobre eles: Que bicho te mordeu? Você viu passarinho verde? Qual é a sua?

Entretanto, uma tática de discussão é implicitar pontos de vista para ocultar algum elemento fraco ou duvidoso
da argumentação ou para apresentar como evidente aquilo que, de fato, não é indiscutível. Quando se diz, por
exemplo, "A oposição está impedindo a aprovação de projetos fundamentais para o Brasil", deixa-se implícito
que o governo está absolutamente correto em tudo o que faz e qualquer oposição a ele é, na verdade, uma
traição ao país. Ademais, esconde-se que o governo tem maioria no Congresso Nacional e que o problema para
a aprovação de seus projetos está em sua base. Deixar implícito um elemento argumentativo é, muitas vezes,
buscar desviar a atenção de uma opinião frágil, controvertida ou embaraçosa.

Maximizar
Outra tática utilizada nos debates é maximizar o que está implícito na fala do outro. Reconstrói-se o implícito,
indo além do que se pode atribuir efetivamente ao oponente. Exagera-se o que ele deixou implícito, para
facilitar o ataque a sua argumentação. Se alguém afirma "A vida dos mais pobres no Brasil melhorou no governo

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Lula, por causa das políticas sociais implantadas por ele" e o outro responde "Dinheiro não traz a felicidade", o
que este fez foi explicitar um implícito maximizando-o. Atribui ao primeiro o seguinte raciocínio: se os mais
pobres têm mais dinheiro, por causa das políticas redistributivas do governo, então são mais felizes. No entanto,
não se pode responsabilizar o oponente de ter dito isso. A reconstrução correta do implícito seria: se os mais
pobres têm mais dinheiro, a vida deles está mais fácil e, por conseguinte, melhor. Há uma interpretação
imaterial para uma vida melhor, a felicidade, que é mais ampla do que se pode inferir da afirmação da melhora
de vida. A adoção arbitrária dessa interpretação imaterial atribui ao outro a ideia de que o dinheiro traz
felicidade.

Azia
O presidente Lula, em declaração dada à revista Piauí, de janeiro de 2009, disse que não lê blogs, sites, jornais ou
revistas e explicou o motivo: "Porque eu tenho problema de azia".

Muitas pessoas viram aí, a partir de uma reconstrução do implícito, uma afirmação de que o presidente não
gosta de ler. Pode até ser verdade que o presidente não aprecie a leitura. No entanto, isso não pode ser inferido
da informação acima. O que o presidente disse foi: "Se o que leio me faz mal, não leio".

As pessoas que, nessa afirmação, viram um desapreço pela leitura estão maximizando o implícito. O presidente
fala do efeito e não sobre os benefícios ou os males da leitura.

José Luiz Fiorin é professor de Linguística da USP e autor do livro Em Busca do Sentido: Estudos Discursivos
(Contexto)

http://revistalingua.uol.com.br/textos.asp?codigo=11736

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