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1. Introdução.
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Doutoranda em Direito pela Universidade de Lisboa, Mestre pela Universidade Católica do
Salvador, Bacharela em Direito e Licenciada em Letras Vernáculas pela mesma Instituição. Professora de
Direito Civil e Linguagem Jurídica, Coordenadora do Curso de Direito e da Pós-Graduação da Faculdade
2 de Julho, Coordenadora do Comitê Estadual de Educação em Direitos Humanos - Eixo Ensino Superior
e Assessora Jurídica do Tribunal de Justiça da Bahia.
A violência focalizada na mulher representa também um obstáculo escondido ao
desenvolvimento econômico. Ocorre a dispersão da energia das mulheres, minando sua
confiança e privando a sociedade de uma maior participação feminina. O Fundo Unido
das Nações para as Mulheres (UNIFEM) observou, recentemente, que as “mulheres não
podem se dedicar inteiramente ao trabalho ou a idéias criativas se tiverem que lidar com
as cicatrizes físicas e psicológicas do abuso” (Carrillo, 1992, p. 34).
Este artigo tem por propósito demonstrar a inter-relação entre as políticas institucionais
brasileiras no combate à violência doméstica contra a mulher, trazendo o espectro
comparativo com a situação vivida, semelhantemente, em alguns outros países da
América Latina. Assim, a pesquisa desenvolveu-se sob a perspectiva teórica, com o
levantamento de dados atualizados sobre a violência contra a mulher e a análise de
textos jurídicos legais e doutrinários sobre o tema.
O olhar apontado neste trabalho não pretende ser conclusivo, entretanto pretende
demonstrar que o problema da violência da mulher é crônico e merece tratamento
emergencial por parte das políticas institucionais de todos os países, para que haja a
erradicação da violência contra a mulher e o reconhecimento real de sua igualdade
perante o homem.
Mesmo em países cujo problema da exclusão social não é tão intenso, percebe-se que a
adoção de um conjunto de medidas interventivas na comunidade – intermediadas pelo
Estado ou por ONGs - podem conservar vidas, reduzir lesões, e diminuir o impacto a
longo prazo da vitimização em mulheres e em suas crianças. Toda a resposta à violência
deve encontrar-se com as necessidades imediatas das vítimas ao trabalhar para combater
as atitudes, a opinião e as estruturas sociais que incentivam o abuso com base no sexo.
A título sugestivo, as medidas seriam: a) reforma de leis discriminatórias contra as
mulheres; b) expansão dos serviços de apoio jurídico, médico e psicológico para
vítimas; c) a criação ou expansão de disponibilidade dos abrigos para mulheres e seus
filhos; d) educação visando desestigmatizar as relações entre os gêneros, no seio
inclusive escolar e, finalmente, e) acesso a mulheres de baixa renda ao crédito, ao
cuidado das crianças, e ao divórcio.
b) do total de vítimas, apenas 40% tomou a iniciativa de registrar uma denúncia nas
delegacias comuns ou delegacias da mulher;
c) do total de 15% das entrevistadas que já foram vítimas da violência doméstica, 35%
afirmaram que a prática da violência começou até os 19 anos;
f) Os motivos principais da violência são o uso do álcool (45%) e o ciúme dos maridos
(23%);
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DATA SENADO. Relatório Analítico. Pesquisa sobre Violência Doméstica contra Mulher.
2005.
tópico que segue se presta a trazer à tona o progresso no amparo, mas também a
longevidade do cenário ideal.
Visando garantir a igualdade factual entre homens e mulheres, fora sancionada a lei
Maria da Penha (Lei Federal n. 11.340/2006), objetivando a criação de mecanismos
para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, fundamentando-se no §8º
do artigo 226 da Constituição Federal, na Convenção sobre a Eliminação de Todas as
Formas de Discriminação contra as Mulheres e na Convenção Interamericana para
Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher. Além disto, a mesma lei
também dispôs sobre a criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a
Mulher, além de ter alterado o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de
Execução Penal, adaptando os referidos diplomas à nova realidade.
A "Maria da Penha" que batizou a lei fora uma homenagem à mulher, vítima de
violência doméstica, Maria da Penha Fernandes, que havia sofrido duas tentativas de
homicídio por parte de seu ex-marido. Os fatos que marcaram esses tristes
acontecimentos merecem sempre ser rememorados, pois se relaciona à realidade de
muitas mulheres no Brasil. Desta forma, Maria da Penha fora agredida, inicialmente,
com um tiro enquanto dormia, tendo ficado, em razão disto, paraplégica. Após duas
semanas de sua alta hospitalar, seu marido tentou eletrocutá-la enquanto ela tomava
banho.
A referida Convenção toma por base a Carta das Nações Unidas e a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, principalmente no que tange à liberdade e igualdade
entre os homens, sem distinção de qualquer natureza, inclusive de sexo.
[...]
Por seu turno, a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência
contra a Mulher, adotada pela Assembléia Geral da Organização dos Estados
Americanos em 6 de junho de 1994 e ratificada pelo Brasil em 27 de novembro em
1995, estabelece, no artigo 7º que:
[..]
Como medidas específicas, o Juiz poderá, quando necessário (a): encaminhar a ofendida
e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;
(b): determinar a recondução da ofendida e seus dependentes a programa oficial ou
comunitário de proteção ou atendimento; (c): determinar o afastamento da ofendida do
lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos; (d):
determinar a separação de corpos.
Como dito acima, o acesso à Justiça não pode ser interpretado apenas enquanto acesso à
estrutura do Judiciário; é preciso muito mais para que o sentimento democrático seja
estabelecido. No caso da Lei Maria da Penha, o que se objetivou fora um sentimento de
efetividade, num espírito semelhante ao buscado na criação dos Juizados Especiais, com
providências específicas para o caso tratado, qual seja, relações de imposição da força
física masculina sobre a feminina e imposição do poder econômico e afetivo dentro de
uma relação familiar.
4. Considerações finais.
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O Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, por meio de auxílio do Ministério da Justiça,
implantará em Salvador o Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, cuja sede será
instalada no bairro dos Barris. De acordo com a previsão orçamentária, o referido Juizado cumprirá com
integralidade a Lei Maria da Penha, contando com equipe de atendimento multidisciplinar, composta por
profissionais especializados nas áreas jurídica, psicossocial e de saúde, além de contar com instalações
apropriadas, como sala para atendimento de mulheres em perigo. Vale registrar que os municípios de
Feira de Santana e Vitória da Conquista, e na própria comarca de Salvador, serão criadas Varas
Especializadas em Defesa da Mulher, pela aprovação da recente Lei de Organização Judiciária (Diário do
Poder Judiciário do Estado da Bahia, 2008, p.1)
O caráter crônico do problema trouxe, para o Brasil, a preocupação em fazer cumprir as
declarações de Direitos Humanos específicas em favor da proteção contra a
discriminação – e violência – contra a mulher, mediante medidas específicas constantes
na Constituição Brasileira e com a promulgação de diversas leis, em especial a Lei
Maria da Penha.
Muito resta ainda para ser feito, mas nota-se que a comunidade internacional (incluindo
os países da América Latina) e brasileira têm se mobilizado para erradicar o problema, o
que demonstra a afirmação de que o quadro tornou-se público e, por isto, medidas estão
sendo tomadas. Em breve, espera-se, que o próprio processo educacional, somado ao
jurídico, proporcione um estudo com respostas mais felizes, afirmando a insignificância
que terá assumido a violência contra a mulher, pela diminuição radical de seus casos.
7. Referências.
ALVES, Fabrício da Mota. Lei Maria da Penha: das discussões à aprovação de uma
proposta concreta de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. Jus
Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1133, 8 ago. 2006. Disponível em: . Acesso em: 27 ago.
2006.
BEAUVOIR, Simone. O segundo sexo. São Paulo: Ed. Nova Fronteira, 1995.
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HEISE, L.; PITANGUY, A. & GERMAINE, A., 1994. Violence Against Women: The
Hidden Health Burden. Washington D.C.: The World Bank.
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