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Kultur Dokumente
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H arry G . W e st e professor de
Harry G. West • :% $■*& . ■■
Antropologia Social na Escola de
Estudos Orientais e Africanos
"l1.' ' * (SOAS) da Universidade de Londres.
Além do presente'livro, é autor de ■::
' Ethnographic Sorcery (University of
Chicago Press, 2007), co-organizador
£ de Enduring Socialism: Explorations
o f Revolution and Transformation,
Restoration and Continuation (Berghahn
y ./ Books, 2008), Borders and Healers:
BrokeringTherapeutic Resources in
Southeast Africa (Indiana University
gs-
Press, 2006) e Transparency and .
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it . .O Poder e o Invisível , Conspiracy: Ethnographies o f Suspicion
in the New World Order (D uke
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Harry G. West
O Poder e o Invisível
em Múeda, Moçambique
Baseado numa investigação
realizada em colaboração com
Marcos Agostinho Mandumbwe
e com a assistência de
EusébioTissa Kairo
e Felista Elias Mkaima
Imprensa
de Ciências
Sociais
Im prensa de Ciências Sociais
■SlOt/.r,
yTvcÈS"
Instituto de C iências Sociais
da U niversidade de Lisboa
www.ics.ul.pt/imprensa
E-mail: imprensa@ics.ul.pt
Parte 1 .................................................................................................... 59
Capítulo 1
O povoamento do planalto de Mueda e a criação
dos m acondes.................................................................................. 63
Capítulo 2
Provocação e autoridade, dissidência e solidariedade.................... 71
Capítulo 3
Carne, poder e satisfação dos apetites.............................................. 79
Capítulo 4
O reino invisível.................................................................................. 85
Capítulo 5
Visões que curam ................................................................................ 97
Capítulo 6
Vítimas ou agressores?......................................................................... 109
Capítulo 7
Carreiras complicadas......................................................................... 115
Capítulo 8
Feitiçaria de construção..................................................................... 129
Parte I I ..................................................................................................... 139
Capítulo 9
Conquistadores im aginados................ ............................................. 147
Capítulo 10
Consumir o trabalho e os seus p ro d u to s..........................................161
Capítulo 11
O cristianismo e a tradição m aco n d e................................................175
Capítulo 12
Conversa e conversão......................................................................... 189
Capítulo 13
Cristãos, pagãos e feitiçaria................................................................. 199
Capítulo 14
Gente da n o ite .....................................................................................207
Capítulo 15
Jogos mortíferos de esconde-esconde............................................... 221
Capítulo 16
Revolução, ciência e feitiçaria............................................................. 231
Capítulo 17
Reescrevendo a paisagem...................................................................249
Capítulo 18
A comunalização da feitiçaria.............................................................261
Capítulo 19
Autodefesa e enriquecimento pessoal............................................... 269
Parte III......................................................................................................283
Capítulo 20
O «ressurgimento da tradição»........................................................... 287
•
Capítulo 21
A reforma neoliberal e a tradição moçambicana............................. 295
Capítulo 22
Um reconhecimento lim itad o ...................... 303
Capítulo 23
Transcendendo as tradições..................... 323
Capítulo 24
Saberes incerto s................................................................................... 337
Capítulo 25
A sociedade incivil do pós-guerra..................................................... 347
Capítulo 26
Democratização e/do uso da fo rç a ................................................... 355
Capítulo 27
Governando na pen u m b ra.......................... 365
Capítulo 28
Reforma constitucional e suspeita perpétua..................................... 373
Bibliografia........................................................................................... 393
índice remissivo...................................................................................419
Agradecimentos
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A gradecim entos
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Prólogo
Provas imateriais
»
«Rebuscámos a casa do homem toda», afirmou Simão, «mas não con
seguimos encontrar os materiais que ele usou para os fazer». Esboçou
um sorriso forçado. «O tipo era esperto, sabe?»
«Mas ele Je-los mesmo?», perguntou Marcos.
«Toda a gente sabia que ele os tinha feito», respondeu Simão. «Os van-
tumi va ku mwitu [leões do mato] não se comportam como aqueles leões
se comportaram. Aqueles eram vantumivakuvapika [leões fabricados]!»
Marcos e eu partilhávamos uma refeição da tarde, composta por feijão
manteiga e ugwali (papas), com Simão Benjamim, o presidente da locali
dade de Miula. Como Marcos observou depois, Simão era muito jovem
para ocupar já um tal cargo de autoridade. De facto, quando Simão e eu
nos conhecemos, Marcos informara-me que este frequentara uma das
escolas de ensino primário mantidas pelos guerrilheiros, nas zonas liber
tadas, por que Marcos fora responsável durante a guerra da independên
cia de Moçambique (1964-1974). Contudo, o jovem Simão era um
homem bastante seguro de si. A T-shirt com os dizeres «I Love Vegemite»
que envergava era de uma brancura reluzente. Tinha um sorriso rasgado
e uma atitude descontraída. Embora Simão nos tratasse respeitosamente,
enquanto seus convidados, também procurava ser por nós tratado como
um igual, um intelectual. Tinha continuado a estudar depois da guerra e
deu aulas no ensino básico durante algum tempo, mas acabou por rece
ber formação para seguir uma carreira na administração do Estado.
«É uma boa carreira», asseverou-nos, «mas custa viver aqui no mato
permanentemente».
Fitou-nos nos olhos, um após outro, e depois alongou o olhar por'
sobre a praça da aldeia, para além do pátio de sua casa. Mulheres, ves
tidas com capulanas1desbotadas, faziam fila junto ao chafariz com bal
1Uma capukma é um pano estampado que as mulheres usam enrolado à volta do corpo.
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des de lata de vinte litros. Homens com T-sbirts esfarrapadas e calças puí
das aglomeravam-se em redor de uma mesa de madeira, à espera que o
representante de uma das lojas da cidade de Mueda lhes pagasse as sacas
de 50 kg de milho que tinham trazido para vender.
«Há muita ignorância nestas aldeias», disse Simão. «Ninguém está
interessado em aprender. Raramente tenho a oportunidade de ter uma
conversa inteligente com pessoas como vocês.»
Não obstante o seu tom algo condescendente, Simão, como viemos
a descobrir, era estimado pelos aldeões sob a sua jurisdição. Governava
com diplomacia e bom humor, além de ser um hábil conversador, o
que o tomava querido tanto dos aldeões como dos visitantes.
Enqúanto a esposa colocava dois pratos no chão, à nossa frente, per
guntei-lhe como é que ele tinha ido parar a Miula. A sua vinda, expli
cou-nos, estava associada a estranhos acontecimentos ocorridos numa
das aldeias sob a sua responsabilidade.
«Só aqui fui colocado este ano [1999], quase no fim da estação das
chuvas, em Abril.» Inclinou-se para a frente no assento e empurrou os
pratos para mais perto dos pés dos convidados. «O meu antecessor não
conseguiu resolver uma situação delicada na aldeia de Kilimani.
Disseram-me para fazer disso a minha principal prioridade.»
«Conte-nos o que se passou», pediu Marcos, enquanto enterrava os
dedos no prato comum de ugwali e moldava uma bola de papa na mão,
mergulhando-a seguidamente no prato de feijão.
Simão seguiu-lhe o exemplo, metendo uma bola de ugwali com
molho na boca, antes de responder. «Tivemos conhecimento do pro
blema quando a população de Kilimani escreveu uma carta ao admi
nistrador distrital a comunicar o aparecimento de vários leões na
aldeia.»
«Que tipo de leões?», perguntou Marcos, sabendo que a história
dependia da resposta a esta pergunta.
«A questão é essa», respondeu Simão. «Os aldeões acusavam um dos
habitantes da aldeia de fazer os leões e de os usar para ameaçar os vizinhos.»
«Que fez o administrador distrital?», perguntei a Simão, ao mesmo
tempo que molhava uma bola de ugwali no prato de feijão.
«Mandou o meu antecessor dizer à aldeia que os aldeões teriam de
resolver a situação entre eles.»
«E resolveram?», perguntei.
«Não», retorquiu Simão, como se esse resultado fosse improvável.
«A situação só piorou. Os leões continuaram a aparecer e os aldeões
ficaram cada vez mais agitados.»
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Prólogo
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Prólogo
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to como aquele com que deparou nos seus primeiros dias de trabalho
em Miula. O poder destes anciãos provinha das posições que ocupavam
no topo de instituições políticas organizadas segundo os princípios de
parentesco. Desde que foi criada, a Frelimo encarou sempre essas figu
ras de autoridade com grande desconfiança. Segundo as suas declara
ções, a política colonial portuguesa de usar os «chefes» locais como
intermediários administrativos corrompera e retirara legitimidade a
essas instituições. Aò longo de toda a guerra da independência, a
Frelimo excluiu os detentores desses títulos - pelo menos enquanto tais
- de quaisquer posições formais de autoridade na estrutura de coman
do da guerrilha. Aquando da independência, o governo da Frelimo
baniu todas as chefias tradicionais, criando órgãos de governo local des
tinados a substituir a autoridade dos chefes em assuntos como a distri
buição de terras e a resolução de conflitos intra e interfamiliares.
A Frelimo também proibiu os rituais de iniciação e de súplica aos ante
passados, bem como de controlo da feitiçaria/bruxaria, práticas rituais
que tinham consolidado a autoridade desses chefes.
Quando iniciei o trabalho de investigação no planalto de Mueda, os
seus habitantes hesitavam em falar abertamente sobre temas relaciona
dos com a feitiçaria, em grande medida porque os responsáveis locais os
proibiam, há mais de 25 anos, de o fazerem. Imediatamente antes de
partir para Mueda, foi-me dito por Isabel Casimiro, uma investigadora
moçambicana do Centro de Estudos Africanos (CEA) da Universidade
Eduardo Mondlane (UEM), que um recente projecto de investigação
do CEA tentara estudar a importância dos «leões fantasma» em Mueda,
mas que as suas tentativas para levar as pessoas a falarem sobre o fenó
meno tinham sido infrutíferas. Tudo isto viria a mudar, porém, pois os
acontecimentos históricos que mudaram a face de Moçambique duran
te a minha permanência no terreno permitiram que os habitantes do
planalto voltassem a falar francamente, entre si e com outras pessoas,
sobre a feitiçaria.
Após 16 anos de uma guerra civil devastadora (1977-1992) que se
seguiu à independência, o governo da Frelimo e a liderança da
Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) chegaram a acordo em
Outubro de 1992. Quando comecei o trabalho de campo no planalto,
no início de 1994, os moçambicanos preparavam-se para as primeiras
eleições multipartidárias da história do país. A Renamo tinha poucos
apoiantes em Mueda - região por vezes apodada de «berço da revolu
ção da Frelimo», porque esta última ali manteve a sua base central duran
te a luta pela independência e porque muitos dos seus naturais comba-
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Prólogo
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***
Alguns dias depois de Simão nos ter narrado, a Marco e a mim, os
acontecimentos de Kilimani, tivemos a oportunidade de falar com o
superior de Simão, o administrador do distrito de Mueda, Ambrósio
Vicente Bulasi. Ambrósio, como toda gente de Mueda lhe chamava, era
poucos anos mais velho do que Simão, mas apresentava-se de forma
muito mais cosmopolita.3 A pequena e sonolenta cidade de Mueda
movia-se a grande velocidade na sua proximidade. Quando o contactá
mos no edifício da Administração, sugeriu-nos que nos encontrássemos
ao final da tarde em sua casa, onde teríamos mais tranquilidade.
Quando chegámos, estava a ligar o gerador no seu quintal - um dos
dois únicos geradores existentes na cidade de Mueda. Convidou-nos a
sentar no alpendre enquanto atendia vários indivíduos que, hão tendo
conseguido uma audiência no seu gabinete, o aguardavam agora,
emboscados em sua casa.
Depois de dar instruções a uma jovem que estava dentro de casa para
nos trazer cerveja, juntou-se finalmente a nós. Gritávamos uns para os
outros, alumiados por luzes fracas, enquanto o gerador rugia. Ambrósio
pediu desculpa por a cerveja estar quente, ao fim de um dia inteiro no
frigorífico desligado.
3 O próprio Ambrósio não usava o termo «cosmopolita», mas ainda assim adoptava
o estilo de vida cosmopolita definido por Ferguson (1999).
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Prólogo
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Prólogo
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Prólogo
supus eu, que segundo nos disseram era o juiz que presidia ao tribunal
da aldeia. Sentámo-nos em frente da casa de Silvestre e juntaram-se
alguns aldeões à nossa volta. Simão disse que tinha de se ausentar para
«tratar de outros assuntos», mas como a aldeia só tinha oito ou dez casas
e a maioria dos residentes estava a trabalhar no campo, havia pouco
para ele fazer e nenhum sítio onde pudesse desaparecer facilmente.
Deixou-se ficar debaixo de uma árvore, à vista, mas suficientemente
longe para não poder ouvir o que dizíamos.
Marcos e eu conversámos um bocado com Silvestre sobre a história
da aldeia que, segundo descobrimos, apenas tinha sido fundada no iní
cio dos anos 80. Kilimani estava situada na orla descendente a sudoes
te do planalto, perto de uma estação de bombagem de água das nas
centes situadas nas terras baixas para abastecer as aldeias da planície.
Quando essa estação foi ameaçada pela Renamo durante a guerra civil,
o governo permitiu que quem tivesse terras nas redondezas deixasse a
sua aldeia comunitária (denominada Lunango), a duas horas de marcha,
e formasse uma pequena aldeia própria. Os aldeões seriam protegidos
pelas milícias governamentais que guardavam a estação de bombagem
e contribuiriam para a alimentação destas.
A certa altura, mudei o tema da conversa. «Ouvimos dizer que tive
ram problemas com leões recentemente.»
«É verdade», confirmou Silvestre. «Começaram a aparecer no início
do ano passado. Vieram das terras baixas à volta de Nambali», disse,
apontando por cima do ombro.
«Nessa zona há muitos animais?», perguntei.
«Há macacos, mas pouco mais. Algumas gazelas.»
«E também não há lá leões e leopardos, normalmente?», perguntei,
lembrando-me do que tinha aprendido sobre a região em anteriores
conversas com caçadores do planalto.
«Às vezes, ficam leopardos presos nas armadilhas que fazemos para
os porcos do máto.»
«Então há lá porcos do mato?»
«Muitos. Dão-nos cabo dos campos, por isso fazemos armadilhas
para os apanhar.»
Pensei no que os caçadores me diziam: «Onde há carne, há carnívo
ros.»
«Então», disse eu, «os leões foram vistos pela primeira vez no ano pas
sado...»
«Leões e hienas. Vieram dos lados de Lunango. Esses animais ameaça
ram-nos. Vieram direitos à nossa aldeia, às nossas casas, até às nossas por-
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tas. Foi uma luta para os afugentarmos. Uma luta renhida, garanto-vos.
O presidente da aldeia andou por aí de noite, a dizer às pessoas: «Não
quero essas feras por aqui! Se matarem alguém, eu mato essa pessoa!»
O relato feito por Silvestre da proclamação do presidente era uma
descrição inequívoca de uwavi wa kudenga (feitiçaria de construção).
Com a minha pergunta seguinte, dei a entender a Silvestre que o
tinha compreendido: «O presidente da aldeia sabia quem era o feiticei
ro?»
«É possível», respondeu Silvestre. «Não sei. Não sei quem andava a
fabricá-los. Talvez o presidente da aldeia dessa altura o saiba, mas ele
reformou-se e já não está cá.»
Fiquei surpreendido. «Não houve aqui um julgamento?», inquiri.
Silvestre fitou-me de frente. «Como ninguém foi identificado, não
podia haver julgamento.»
Recostei-me na cadeira, sem saber como continuar. Viéramos falar
sobre o julgamento, mas o juiz da aldeia dizia-nos agora que não hou
vera julgamento nenhum. Marcos devolveu o meu olhar de espanto
com uma expressão de confusão e frustração e, depois, reformulou a
pergunta, mas Silvestre voltou a invocar ignorância.
Esquecera-me completamente de Simão, que surgiu de repente no
meio de nós. Interroguei-me, por instantes, se a sua presença não seria
a causa das reticências do ancião, mas com Simão no nosso círculo,
Silvestre recomeçou a falar com confiança.
«A minha casa foi cercada por quatro leões», afirmou ele. «Vários
anciãos da aldeia concluíram que aquilo era obra de um certo homem
suspeito, que vivia entre nós. Esse homem foi confrontado e, pouco
depois, deixou a aldeia.»
Marcos acenou com a cabeça, em sinal de assentimento, a Simão,
que já estava sentado ao pé de nós. Isto fez-me entender como o caso
continuava a ser complexo e delicado para os habitantes de Kilimani,
mesmo nesta era democrática. Perguntava-me agora se Silvestre falara
porque tinha medo de Simão ou, talvez, dos superiores.de Simão. Em
caso afirmativo, será que os temia por serem funcionários do governo
ou por serem feiticeiros? Ou seria sequer possível fazer essa distinção?
Por outro lado, pensei, talvez ele tivesse receio de Marcos ou de mim.
Talvez ele tivesse medo por Simão. Talvez suspeitasse que o nosso inter
rogatório podia levar à revogação da decisão em que ambos tinham
estado envolvidos.
Enquanto estes pensamentos me passavam rapidamente pela mente,
apercebi-me de outra figura que se aproximava. Ergui os olhos e vi um
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Prólogo
4 Uma cabana é uma barraca provisória que serve de abrigo junto dos campos, no
auge das épocas agrícolas.
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Prólogo
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Prólogo
vocação - é muito ténue. Quem sabe o que disse o homem? Mas dis
sesse o que dissesse, se lá ficasse no meio de tanta hostilidade, eles iam
preocupar-se com a sua coragem - preocupar-se com o que ele sabia.»
A expressão «saber alguma coisa» equivale, na língua shimakonde, a
um eufemismo para designar a feitiçaria. Os feiticeiros, segundo os habi
tantes do planalto costumam dizer, receiam poucas coisas porque
«sabem algo» que os protege.
«Então e os leões?», perguntou Marcos.
«Sabes tão bem como eu que há leões por lá. Os caçadores estão sem
pre a dizer-nos que existem leões - leões do mato, quero eu dizer -
naquelas planícies. Aquilo passou-se durante a estação das chuvas,
quando os léões gostam de sair das terras baixas e subir para o planalto.
Os Malavoni aproveitaram os leões para se verem livres do tipo.»
Marcos ficou calado por instantes. Depois disse: «Tens razão. Estas
coisas têm de ser estudadas cientijicamente.»
Fiquei calado, satisfeito por Marcos ter percebido a lógica da minha
interpretação do caso.
«Sabes o que se diz», acrescentou Marcos. «Onde há raios, os feiti
ceiros usam-nos. Onde há guerra, os feiticeiros usam-na. Onde há doen
ça, os feiticeiros usam-na. Estes Malavoni usaram leões.»
Vendo que estávamos a acabar as nossas cervejas, a empregada levan
tou-se do banco e tirou outras duas do frigorifico. Limpou com a capu-
lana as gotas de condensação que molhavam as garrafas, abriu-as e pô-
-las na mesa baixa entre nós.
Lembrei-me que não sabia exactamente o que Marcos queria dizer
quando sugeria - coisa que fazia com frequência - que era necessário
estudar a feitiçaria «cientificamente».
«Talvez fossem apenas leões do mato», sugeri, sentindo o meu triun
fo interpretativo a desvanecer-se.
«Mano», disse Marcos, com alguma exasperação. «Eles tiraram roupas
do estendal. Deixaram os chispes dos porcos. Alguém fez aqueles leões!»
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I
Introdução
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1 Ver também Ellis e ter Haar (1998,201); Palmié (2002,20). Compare-se esta posi
ção com o apelo feito pelo escritor camaronense Daniel Etounga-Manguele para que se
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Introdução
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Introdução
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8 Em conjunto com Todd Sanders, abordei este tema na introdução a um livro publi
cado que apresenta etnografias contemporâneas de discursos do oculto, que vão desde
a feitiçaria e o xamanismo até aos mitos urbanos e à teoria da conspiração (West e
Sanders 2003).
9 Wyatt MacGaffey (1980) argumentou que conceitos com o uw avi vãa são, em últi
ma análise, passíveis de tradução. Ver também Tumer (1964); Fadiman (1993, 14-15);
Abrahams (1994, 10); Saler (1967, 72). Geschiere, pelo contrário, alega que os próprios
africanos traduziram esses conceitos para as línguas europeias que conhecem e que os
estudiosos podem, e devem, seguir-lhes o exemplo (1997, 14).
10 Ao aderir ao envolvimento dialógico com outras línguas, inspiro-me em Rosaido
(1980, 20) e Limón (1994). Ver também Pels (1998, 201).
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Introdução
tf* * *
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Introdução
num reino para além do mundo visível. Deste ponto de observação pri
vilegiado, visionam o mundo diferentemente das pessoas normais e tor
nam as suas visões realidade, geralmente ao serviço dos seus próprios
interesses egoístas e em detrimento de vizinhos e parentes. Embora o
poder produza, de facto, disparidades visíveis em termos de riqueza e
de bem-estar, segundo este esquema, os mecanismos e a dinâmica explí
citos do poder permanecem ocultos das pessoas comuns, que são, por
definição, relativamente destituídas de poder.
Este esquema cultural não postula, todavia, que todo o poder é des
trutivo. Na verdade, ele é essencial para a produção e a manutenção do
bem-estar spcial. O poder manifesta-se de forma benéfica nos actos de
figuras de autoridade responsáveis, que - tal como os feiticeiros malé
volos - possuem a capacidade de entrar no reino invisível para formu
lar e realizar visões transformadoras do mundo. O exercício benéfico do
poder implica, de facto, que se transcenda o mundo produzido pelos
feiticeiros maléficos e que se desfaçam os seus actos de poder destruti
vos. O poder é, assim, uma série infindável de manobras transcenden
tes e transformadoras, cada uma das quais ultrapassai contraria, inverte,
derruba e/ou reverte a precedente. Na verdade, é sinónimo de tais
manobras: o desfazer e refazer decisivos (ainda que temporariamente)
do exercício do poder de outrem, aquilo que no discurso da uwavi se
denomina kupilikula.
Mesmo estando expostos a outras linguagens de poder, que em
alguns casos passaram a dominar, os habitantes de Mueda têm com
preendido e interagido com um mundo em mudança inspirados pelo
esquema cultural da uwavi. De facto, eles consideram geralmente que
aqueles que falam linguagens de poder não familiares sãofeiticeiros que
proclamam visões transcendentes de um mundo transformado. Assim
aconteceu, como veremos, com os administradores coloniais, os mis
sionários católicos, os guerrilheiros nacionalistas e os planificadores
socialistas.
Por ironia, ao conceberem essas figuras de poder como feiticeiros, os
habitantes do planalto vão articulando as suas próprias visões do
mundo - visões que fixam essas figuras de poder no seu olhar. Têm par
ticipado, de forma tentativa, cautelosa, nos diálogos travados no seu
seio, contrariando, invertendo, derrubando e/ou revertendo muitas das
afirmações feitas por interlocutores com mais voz e mais poder. Têm
efectuado eles próprios, discretamente, as suas próprias contramanobras
(kupilikula), apesar de dizerem - tal como os feiticeiros e contrafeiticei-
ros - que não possuem poder para isso.
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Introdução
13 Veja-se Stoller, que oferece um relato bastante matizado de uma viagem de inves
tigação repleta de interrupções e desvios, que abandonou sem ter completado, dizendo
aos seus leitores: «ter persistido naquele caminho desconhecido impedir-me-ia de vos
contar a minha história» (Stoller e Olkes 1987,229). (Cf. Van Binsbeigen, que informa
os seus leitores de que, depois de «se tomar um sangoma», o discurso antropológico pas
sou a ser irrelevante para ele; 1991, 333).
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14 Isto não chegou a acontecer, pois Mpalume saiu do Arpac antes de Felista ter ter
minado a colaboração comigo.
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«Tens a certeza de que o nosso carrinho nos leva até lá?», perguntava-me às vezes
Tissa, antes de partirmos em viagem de uma aldeia para outra. «Ahh, de certeza
que leva», respondia Felista, normalmente antes de mim. «É um carro, não é?»
17 Mas examinei com eles partes substanciais do seu texto, quando estive em Cabo
Delgado no ano de 2004, a fazer aquilo que Steven Feld (1987) denominou «edição dia-
lógica».
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r
Capítulo 1
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Até para irem trabalhar nos campos, as mulheres necessitavam de uma es
colta armada. Os jovens iam na frente, a gritar o tempo todo: «Estamos a vê-
66
0 povoam ento do plan alto de M ueda e a criação dos macondes
-los!», m esm o que não vissem ninguém. Faziam-no para afugentar os atacan
tes. Em seguida, as mulheres trabalhavam todas nos campos da mesma zona,
enquanto os hom ens as guardavam. Era pior quando as mulheres iam às fon
tes de água, na base do planalto. Era um dos locais preferidos pelos bandos
de assaltantes para fazerem cativos.
4 Beidelman (1993,12) também caracteriza o povo da África Oriental que veio a cha
mar-se kaguru, com o sendo simultaneamente vítima e praticante do tráfico de escravos.
5 Aqui, Marcos refere-se, na verdade, a uma antepassada feminina, talvez a mãe da
sua mãe ou a avó materna desta.
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t
i
Capítulo 2
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Embora os vahumu nunca tenham sido usados pelos portugueses com o inter
mediários nativos - não estando, por isso, incluídos na proibição das chefias tra
dicionais imposta pela F relim o após a independência - a instituição caiu em
desgraça nos anos a seguir à independência. Q uando conhecem os o humu Man-
dia, em 1994, havia já m uitos anos que ele não fazia a dança ritual do humu.
C om o não tinha ninguém que tocasse tambor para o acompanhar, Marcos ofe
receu-se para o fazer, tentando reproduzir o m elhor que podia a batida frenética
e aguda que recordava das danças que presenciara em criança. O velho Mandia
cansou-se rapidamente, mas estava tão feliz por ter dançado, que as lágrimas lhe
subiram aos olhos e correram pela cara abaixo.
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Provocação e autoridade, dissidência e solidariedade
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iji
I
Capítulo 3
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2 N o seu tempo, Dias e Dias (1970,363) constataram que curandeiros macondes uti
lizavam meios similares para matar leões suspeitos de terem sido criados por feitiço. Tur
ner (1968: 115) descreve os ritos praticados pelos ndembus para lidar com leões «fami
liares».
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C am e, p o d er e satisfação dos apetites
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3 Fabian (1990) descreve com grande detalhe como o verbo «comer» estava conotado
com «podep> entre os lubas com quem trabalhou no Zaire (actual República Democrática
do Congo). Bayart (1993) argumenta convincentemente que «comep> constitui um eufe
mismo essencial para o poder na política africana contemporânea, em geral. Schatzberg
(1993) afirma igualmente que o tema central do discurso político africano é o consumo.
Ver também MacCormick (1983, 56); Ferguson (1995); Shaw (1996); Chabal e Daloz
(1999,36); Ellis (1999a, 223); Masquelier (2000); Mbembe (2001:102-141). Bayart declara
que os idiomas políticos do consumo têm sido radicalmente transformados na era pós-
-independência para legitimar a crescente diferenciação social (26) (ver também Ellis 1999a,
223) Fabian apresenta provas em apoio desta afirmação, observando que, onde os lubas
antes exprimiam valores de partilha em provérbios sobre «comep>, hoje dizem (exclusiva
mente em francês, a língua oficial actual): «o poder come-se inteiro» (1990,28-31).
4 Tumer (1996[1957], 31) descreve igualmente a partilha/distribuição de came como
uma forma de reproduzir as relações sociais. A literatura comparativa sobre este tema é
tão vasta que Wliyte lhe chama, sarcasticamente, «escola etnográfica da perna dianteira
da vaca» (1997, 96).
82
C am e, p o d er e satisfação dos apetites
Marcos não se encontrava com igo quando conheci Kalamatatu, nem nunca
tinha estado com o ancião. Q uando os apresentei um ao outro na m inha se
gunda visita a casa do ancião, em Matambalale, Kalamatatu ficou espantado por
eu m e recordar d o seu nom e. D eu uma pequena cotovelada a Marcos e pergun
tou: «Ouviste isto?! Ele disse o m eu nome!» D epois, pegou-m e na m ão e disse-
-me: «A partir de agora, tu também és ‘Kalamatatu’!» A esposa, sentada ali perto,
pôs as m ãos na barriga e riu. «Diz-lhes o que isso significa», instou o marido.
O ancião informou-nos, «Tatu significa três, claro. Kalam atatu significa uma via
gem de três dias sem vir a casa. Q uando eu era jovem gostava m uito de viajar.»
A esposa exclamou: «Gostavas era de visitar mulheres!» Kalamatatu sorriu tra
vessamente: «Sim, eu tive muitas mulheres, nessa época. Por isso, a m inha esposa
dizia-me: Três dias chegam para fâzeres negócio; do quarto dia vais ter de m e
prestar contas!’ Q uando eu partia, ela gritava atrás de mim: ‘K alam atatu. Acabou
por se tom ar um nome.»
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Capítulo 4
O reino invisível
•
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0 reino in visível
«Não sei porque é que as pessoas m e invejam», respondeu Kom esa Baina,
quando lhe perguntei por que razão os feiticeiros o atacavam. «Não provoco
ninguém. Fico em casa e não in com odo ninguém. Sou apenas um velho.» N a
realidade, Komesa era um hom em de poder e riqueza relativamente grandes, na
aldeia de Namande. Ocupara cargos de autoridade n o governo local, a sua casa
estava coberta com um telhado de zinco e vestia bem. «Deve fazer parte de um
plano maior para m e destruir», disse ele. O lhou directamente para cada um de
nós e acrescentou: «O facto de vocês m e terem visitado hoje quer dizer com
certeza que vou ser atacado esta noite.»
dez ou quinze metros adiante da sua casa. A fieira de casas onde ficava
a dele estava virada para o centro da aldeia, onde havia algumas crianças
sentadas sob uma mangueira, que nos observavam atentamente. Komesa
dirigiu o nosso olhar novamente para a sua casa. Junto da esquina frontal
direita estava um cajueiro, com não mais de cinco metros de altura, para
o qual apontou.
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0 reino in visível
5 Ver também Mbembe (2001,143-146). Cf. Horton (1993,326), que fez equivaler as
ideias do «oculto» às «teorias secundárias» invocadas quando as primeiras teorias explica
tivas falham.
6 Whyte (1982,2060; 1997,28,180) também menciona a utilização do ácido das pi-
Ihas/baterias com o uma substância medicinal n o Uganda.
7 Dias e Dias (1970,367) sugerem que as substâncias mágicas obtidas a partir das ár
vores serviam com o intermediárias entre os vivos e os seus antepassados, cujas sepulturas
eram assinaladas com árvores, que absorviam a sua essência corporal.
89
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0 reino in visível
348); Atldnson (1989, 91); Lambek (1993, 243); Plotkin (1993, 235); Bongmba (1998,
173); Gufler (1999,183); Nyamnjoh (2001,43). Cf. Ferme (2001,4), que documenta as
crenças mende de que o poder provém da capacidade «de ver para além dos fenómenos
visíveis e de interpretar significados mais profundos», apesar de sugerir que o povo mende
não considera o exercício desta capacidade com o estando limitado ao reino do oculto.
11Ver também Willis e Chisanga (1999,3,173). Segundo Nyamnjoh, o reino invisível
tem um nome entre os habitantes das savanas dos Camarões; ele descreve o msa como
«um mundo misterioso de abundância e possibilidades infinitas», que existe em paralelo
com o mundo visível (2001,44). Eliade (1964,259-260) fez a célebre sugestão de que «a
principal técnica xamânica é a passagem de uma região cósmica para outra»; é precisa
mente isto que fazem os feiticeiros de Mueda - e, com o veremos, os contrafeiticeiros.
12 Entre os fores das montanhas da Nova Guiné, segundo Lindenbaum (1979,56), a
palavra para feitiçaria, kio’ena, significa expressamente «está escondido». Embora isto não
se aplique ao planalto de Mueda, feitiçaria e invisibilidade implicavam-se mutuamente
no discurso local sobre a feitiçaria. Ver também Beidelman (1963: 65).
13 Ver também Lattas (1993); Devisch (2001,111); Ferme (2001,209-212).
14A associação da bruxaria e/ou feitiçaria à dança é alegadamente comum no sudoeste
africano; e diz-se que essas danças são normalmente efectuadas sem roupa. Lambek, por
exemplo, fala de feiticeiros que dançavam nus, em grupo, em Mayotte (1993,251). O s.
informadores de van Dijk sugeriam que os bruxos tomavam as suas práticas atraentes
para potenciais bruxos combinando-as com duas actividades irresistíveis: a dança e a
nudez/relação sexual (van Dijk 1992).
15Middleton (1963,271; 1967,65) afirma também que os bruxos «invertem» as normas
sociais. Van Binsbergen declara: «Bruxaria... é tudo o que sai fora da ordem familiar, não
é regulada por essa ordem, [ou] desafia, rejeita, [ou] destrói essa ordem.» (2001: 241)
91
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Mair (1969, 42) diz que os bruxos formam uma «anti-sociedade». Boddy usa a mesma
expressão - «anti-sociedade» - para descrever o zar, o mundo dos espíritos para os ho-
friyatis do Norte do Sudão. A autora escreve que «os traços de comportamento dos zayran
ultrapassam e invertem os dos humanos: nuns aspectos, os zayran são a antítese dos ho-
friyatis; noutros, são a sua caricatura.» Sugere ainda que a língua usada no zar íunciona
com o uma «antilíngua» (Boddy 1989,156-157,273-274). Ver também Beidelman (1963);
Forth (1993); Devisch (2001,113-114).
16 Ver também Devisch (2001,111).
17 Gf. Humphrey e O non (1996,352).
18 A feitiçaria em Mueda, tal como nos foi descrita, assemelha-se muito ao «conheci
mento profundo» que os yombas descreveram a Apter (2002, 234-238), na medida em
que constitui uma capacidade de «correcção e inversão». Ver também Kapferer (1997), o
qual refere que os budistas Cingaleses entendem a feitiçaria com o o poder de fazer o
mundo através do acto constitutivo de o ver.
19 Beattie (1963,29) sugere que não se deve ver a utilização das poções com o sendo
«mágica», pois os seus efeitos podem ser explicados química e fisiologicamente. Ver tam
bém Fields (1997). Em Mueda, de qualquer m odo, considerava-se o uso de shongo como
um acto de feitiçaria, por definição.
20 Lambek (1993,242) descreve a utilização de dispositivos semelhantes pelos feiticei
ros em Mayotte.
92
0 reino in visível
21 C f Lienhardt (1951,305), o qual sugere que, quando os dinkas diziam que os bruxos
«comem» as suas vítimas, queriam dizer que os bruxos consumiam o bem-estar dos outros
e não que comiam realmente a carne das vítimas.
22 Dias e Dias (1970:394) usam o termo mchatwani para designar os mortos-escravos
entre os macondes no final dos anos 50. O fenómeno dos trabalhadores escravos mor
tos-vivos aparece nos registos etnográficos de toda a Áftica. Ver, por exemplo, Beidelman
(1963,66; 1993,155); Ardener (1970,147); Geschiere (1992,170-174; 1997,147-149; 1998,
822-824); Mesaki (1994,49); Reynolds (1996, 90); Stadler (1996, 92); Jean Comaroff e
John Comaroff (1999); Sanders (1999,123; 2001,170); Ashforth (2000, 182); Niehaus,
Mohlala e Shokane (2001,69-71). Willis e Chisanga (1999,144-146) mencionam especi
ficamente o uso, pelos feiticeiros lungus, de bananeiras para substituir os corpos das suas
vítimas. Curiosamente, Beattie (1963,46) informa os leitores de que, na era pré-colonial
em Bunyoro, os feiticeiros condenados eram amarrados dentro de folhas secas de bana
neira e queimados na fogueira; ver também em Fadiman (1993, 250) testemunhos da
execução de bruxos por este mesmo m étodo entre os merus do Quénia colonial. White-
head (2002,82), em contrapartida, relata que os cadáveres dos patamunas eram enrolados
em folhas de bananeira para afastar os hanaimà (magos negros).
93
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94
0 reino in visível
95
K u piliku la
Deve matar alguém da sua própria família e, se não o fizer, aqueles com
quem está em dívida podem acabar por matá-lo.»28
A filha de Libata, Mbegweka, disse-nos, certa vez, que era o círculo vi
cioso das dívidas de carne que fazia a feitiçaria perdurar, atraindo novos
recrutas para o círculo de feiticeiros e ampliando a sua força destrutiva
na sociedade de Mueda, hoje tal como no passado.29
28Van Dijk (1992) relata a existência de bruxos, no Malawi, que exigiam o pagamento
em espécie das dívidas de carne de acordo com as partes do corpo - literalmente, olho
por olho, útero por útero, pénis por pénis, etc.
29 Masquelier (1997) descreve como os mawris do Níger são considerados capazes de
negociar com os espíritos doguwa, cuja fome insaciável por carne devem alimentar indi
cando vítimas entre os vizinhos, amigos, e até estranhos.
96
Capítulo 5
97
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«Então pensei: ‘Vou tratar deste tipo’. Fui à beira da estrada e encontrei
uma árvore com folhas verdes. Nem sei de que espécie eram. Arranquei
algumas, cortei-as aos pedaços, esmaguei-as e misturei-as com água para
fazer uma pasta.» Enquanto falava, simulava os actos que ia descrevendo.
«Pus essa pasta no peito do tipo e comecei a invocar os meus antepas
sados.» A voz do contador de histórias dava agora lugar à do homem
que invocava reverentemente os espíritos dos seus antepassados.
«‘Shondedisse eu.» Um sorriso pôs rapidamente fim à reverência de Mar
cos, quando acrescentou: «E tudo o resto.»
Prosseguiu, sorrindo, mas ainda sério: «Invoquei os nomes de todos
os antepassados que conhecia. Especialmente Ndikutwala. Ndikutwala.
Ndikutwala.»
«A mãe da tua mãe», disse eu.
«Essa mesmo.»
«E então, o que aconteceu?», perguntei, depois de Marcos permanecer
em silêncio por algum tempo.
«Quando o tipo ouviu aquilo pensou ‘este homem é um curandeiro’,
e acalmou-se. Levei-o de volta para a coluna e conseguimos chegar a Mo-
címboa.»
«E ele ficou bem?», perguntei eu.
«Ficou óptimo», respondeu Marcos, com um largo sorriso. «Eu curei-o».1
***
98
Visões que curam
99
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5 Cf. Marwidc (1967,104), que apresenta a expressão «mortes de Deus» como sendo
muito antiga entre os chewas. Maxwell (1999, 85) descreve a dicotomia entre «doenças
de Deus» e «doenças do homem» como um fenómeno pré-colonial entre os hwesas. Jan-
zen (1978, 67-74) afirma que as categorias «doença de Deus» e «doença do homem» são
usadas pelos bakongos do Zaire, mas não nos diz se esta dicotomia é anterior ao período
colonial. Whyte (1982, 2057) relata que os nyoles suspeitavam de que as doenças incu
ráveis eram «de Deus».
6 Pelo contrário,.Rasmussen (2001b, 30) regista que os tuaregues consideravam ser
«doenças de Deus» aquelas que podiam ser curadas pelos curandeiros corânicos.
7 Pelo contrário, os oráculos azandes, de acordo com as descrições de Evans-Pritchard
(1976 [1937]), informavam aqueles que os consultavam da identidade dos seus agresso
res.
8 Cf. Ciekawy (2001,181).
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Visões que curam
9 A política e a prática administrativa coloniais (a analisar na parte ii) podem ter de
sempenhado algum papel na supressão das acusações e dos ordálios de feitiçaria.
10Há uma literatura substancial sobre «caça aos bruxos» ou «rituais de limpeza de bru
xos» na região, que remonta ao período colonial; ver, por exemplo, Richards (1970
[1935]); Marwick (1950); Tail (1963); Willis (1968; 1970); M. Green (1994; 1997); Fields
1997; Maxwell (1999); Probst (1999).
101
K u piliku la
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Visões que curam
11 Maia Green (1994:25) relata o uso do termo birisi para designar objectos semelhantes
usados pelos pogoros da Tanzânia. Davis-Roberts (1992,388) relata igualmente a utilização
de tais amuletos entre os tbwas do Zaire (actual República Democrática do Congo) para tor
nar as potenciais vítimas invisíveis para os seus atacantes. Ver também Whyte (1997,133).
103
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12 Curiosamente, Ginzburg (1992 [1966], 24) escreve que os benandanti do Sul da Eu
ropa, nos séculos XVI e XVII, costumavam armar-se com pés de funcho para combater bru
xos armados com hastes de sorgo. Maia Green (1994:38) diz-nos que os curandeiros po-
goros aplicavam farinha de milho miúdo na cabeça e no corpo dos doentes com o forma
de obter as bênçãos dos antepassados.
104
V im s que curam
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K u piliku la
15 Nem todos os vamitela eram curandeiros (alguns só faziam adivinhação e/ou toma
vam medidas preventivas), e um número muito reduzido de vakulaula não usava quais
quer mitela nas suas práticas curativas.
18 O termo Impilihtla encontra correspondência em conceitos de contrafeitiçaria curativa
em todo o continente afticano e para além deste. Devisch informa que os curandeiros yalcas
do Zaire (actual República Democrática do Congo) combatiam uma doença «virando-a
contra si própria, para que se autodestruísse» (1990,220-221). Joralemon e Sharon descre
vem os curanderos peruanos enviando, similarmente, «[o feitiço] de volta à sua origem»
(1993,253). John Bowen diz que os curandeiros gayos de Sumatra obtêm «retribuição» ao
«devolverem» os espíritos malignos a quem os enviou primeiro (1993, 179). Ver também
Luomala (1989:291); Rodman (1993); Whyte (1982,2057; 1988,219; 1997,3). Em Mueda
usam-se também os verbos htpindula e kupindikula com significados semelhantes.
17 Lienhardt (1951, 304) também usa o termo «contrabruxo» para descrever os dinka
que combatem a bruxaria.
18À semelhança dos curandeiros yakas descritos por Devisch, os curandeiros de Mueda
trabalhavam «para além dos habituais mapas cognitivos dos limites do espaço-tempo»
(Devisch 2001,106).
106
Visões que curam
107
•|!
i
Capítulo 6
Vítimas ou agressores?
«Porque é que os feiticeiros haviam de vir ter consigo?!», perguntei a
Shindambwanda, muito surpreendido.
O curandeiro estava ocupado com a tarefa que tinha entre mãos - res
ponder de forma mais ampla, com uma demonstração, à minha pergunta
sobre como sabia se os pacientes que o procuravam eram vítimas dos
ataques de feiticeiros. Marcos - que fazia de seu doente - estava pacien
temente sentado no chão, sobre uma esteira de junco, com as pernas es
tendidas para a frente. Shindambwanda sentava-se por detrás dele num
igoli. 1
«Muitos dos que me vêm consultar não são vítimas de feitiços», dissera
Shindambwanda, puxando levemente a camisa de Marcos para que este
a tirasse.
Eu ficara à espera que o curandeiro me dissesse que as outras pessoas
que ele tratava sofriam de «doenças de Deus». Em vez disso, declarou:
«Muitos deles são feiticeiros.»
Shindambwanda segurava na mão um frasco de perfume reaprovei-
tado, cheio de um líquido azul-escuro e tapado com uma rolha de cortiça.
Mandou Marcos endireitar as costas e inclinar-se ligeiramente para a
frente.
Em resposta à minha expressão de surpresa, acrescentou: «Os feiticei
ros causam sarilhos a si próprios.»
«Sarilhos como?», perguntei.
Shindambwanda poliu as faces do frasco com um pedaço de pano.
«As coisas que os feiticeiros atacam estão, muitas vezes, protegidas contra
109
K u piliku la
110
V ítim as ou agressores?
5 Maia Green (1994: 35) descreve os rituais antibruxaria dos pogoros, nos quais, pelo
contrário, não se fazia qualquer distinção entre as pessoas acusadas de bruxaria e os seus
acusadores.
6 Ver também Geschiere (1997,55). O cenário está porém longe de ser universal; por
exemplo, os informantes navajos de Kluckhohn (1944, 49) ligaram a confissão de um
bruxo às melhoras da sua vítima e não à recuperação do bruxo.
111
K u piliku la
comum é a dor nas costas. Mas eles também me costumam dizer que
são vakulityaa.»
Shindambwanda estava menos confiante de que os seus doentes con
fessassem, quando eram feiticeiros feridos, e por isso praticava a adivi
nhação (como demonstrara com Marcos), a fim de determinar se eram
vítimas de feiticeiros ou feiticeiros que se tinham magoado. «Não posso
curá-los se não confessarem», disse-nos. «Mando-os embora. Digo-lhes
que procurem outro curandeiro.»
Vantila Shingini, de Namande, abordava o problema de forma dife
rente: «Quando o tratamento não resulta num doente, começo a des
confiar que ele se feriu a si próprio».7
Limitedi Untonji, o curandeiro cego de Nandimba, tinha a mesma
abordagem: «Quando um feiticeiro ferido não confessa, os tratamentos
normais não resultam. Por isso, se um doente meu não responde ao tra
112
V ítim as ou agressores?
8Tais confrontos são suscitados pelas acusações dos curandeiros e não pelas confissões
dos pacientes; ver também Wyllie (1970,132).
9 Ver também Mayer (1970, 65-66); Ruel (1970b, 333); Devisch (2001,120).
113
Capítulo 7
Carreiras complicadas
«Ora, aqui está um proclamou Marcos, pousando a mão no
joelho de Shindambwanda, quando mudou do shimaconde para o portu
guês. Fitei Marcos directamente nos olhos. Embora estivéssemos sentados
à sombra, o seu rosto estava brilhante de suor. O tom era jocoso mas, to
davia, sincero. Senti relutância em falar. Embora nunca tivesse ouvido
Shindambwanda falar português, tinha a certeza de que ele entendia o su
ficiente para saber que Marcos o estava a acusar de ser feiticeiro.
A conversa com o nkulmla principiara, nesse dia, com uma pergunta de
Marcos. «Nangklo [ancião]», dissera ele. «Pode contar-nos alguma coisa
sobre os feiticeiros que fazem leões?»
«Uwavi wa hipika», respondera Shindambwanda, designando esta cate
goria de uwavi como «feitiço de fazer», ou «feitiço de fabricação».
O ancião prosseguiu: «Há uma coisa chamada imika, que é essencial para
o feitiço de fabricação. As dimika(pl.) são pedaços de madeira tratados com
mitela.»
Ergueu a mão, mostrando-nos uma fiada de pedacinhos de madeira que
usava como pulseira em redor do pulso. «Estas são dimika», disse ele. Fez
uma pausa, como se conjurasse uma visão. «Há outros tipos de diniika que
são usados para fazer animais.»
Aproximou-se de um banquinho de madeira que estava no chão, à sua
frente. «Um feiticeiro põe um pedaço de imika no chão», afirmou, dando
pancadinhas no tampo do banquinho como se este fosse o chão. «Depois
diz: ‘Amanhã, quero encontrar aqui uma cobra5. De manhã, quando re
gressa, experimenta a imika levando-a até uma árvore e dizendo-lhe: ‘Agora
quero que mordas5. Quando ele diz isto, ela morde a árvore e, assim, ele'
sabe que está pronta. Pode mandá-la morder a pessoa que indicar.»1
115
K u piliku la
116
Carreiras com plicadas
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Carreiras com plicadas
Libata Nandenga foi buscar o seu nom e ao termo com que se designam os patos
no planalto de Mueda (a palavra portuguesa transliterada para shimaconde). En
quanto o seu n om e suscitava o riso, o seu ar carrancudo provocava m edo e res
peito.
119
K u piliku la
seu pai, que a ajudaram a determinar o que afligia os doentes que a vi
nham consultar.
Muitos dos curandeiros do planalto com quem trabalhámos passaram
por uma situação de doença durante o processo de se tomarem curan
deiros. 6 Shapatintwa Shikumula Shitwanga, uma curandeira que vivia
na aldeia de Miula, aprendeu a tratar dores de cabeça com o nkulaula que
a curou das dores de cabeça que a afligiam. Na mesma aldeia, Nantulima
Lipatu contou-nos que se virou para a profissão de curandeiro depois de
ter sido curado de tuberculose, dores nos ossos e «fraqueza», por um
homem chamado Lingala. Verónica Romão, em Matambalale, disse-nos
que ficou cega em 1988, ao fim de um ano em que teve problemas cada
vez mais graves nos olhos. Depois de o curandeiro Tomás Nido, de Nam-
panha, a ter curado, começou a tratar outras pessoas. Komesa Baina, de
Namande, começou a tratar as pessoas com as mesmas mitela que Ar
mando Mwikumba usara para o curar de dores de estômago. O curador
de Renata Damião, possuído por um espírito chamado Fatuma, disse-
-lhe que ela só se restabeleceria da doença que a flagelava havia seis anos
se aprendesse a curar outras pessoas. Ela assim fez, curando-se, deste
modo, a si própria.
Na região do planalto de Mueda, era tão comum os curandeiros apren
derem a curar ao serem eles próprios curados, que Marcos me sugeriu
certa vez: «Não podemos tratar uma coisa se não tivermos sofrido e sido
tratados dela. O que quero dizer é que, por exemplo, não podemos tratar
uma mordedura de serpente se não tivermos sido mordidos.» Contudo,
e apesar das palavras de Marcos, nem todos os curandeiros do planalto
iniciaram as suas carreiras no momento em que venceram uma doença.
E certamente que muitos deles tratavam doenças de que nunca tinham
sofrido.
Muitos curandeiros contemporâneos com os quais trabalhámos tam
bém recebiam inspiração de espíritos semelhantes aos que possuíram
Mbegweka. Renata Damião, tal como ela, tinha um avô que fora curan
deiro enquanto era vivo. Morrera antes de Renata nascer. Quando traba-
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Carreiras com plicadas
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K u p ilih d a
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Carreiras complicadas
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Carreiras com plicadas
Quando conheci Verónica Romão, com entei com Tissa que ela era muito jovem.
«E possível que uma mulher tão nova saiba tanto sobre as m itela com o alguns
destes hom ens e mulheres mais velhos com quem trabalhámos?», perguntei. Ele
soltou uma curta gargalhada, perante a m inha ingenuidade. «Podes ter a certeza
de que ela sabe alguma coisa!», garantiu ele. «Uma m ulher tão nova a trabalhar
com o nkulaulal\... Podes ter a certeza de que sabe muito!»
125
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126
Carreiras complicadas
1,1 A ideia de que os curandeiros são feiticeiros (ou bruxos) parece ser comum em
África. Ver, por exemplo, Evans-Pritchard (1976 [1937], 79); Gray (1963,144); La Fontaine
(1963, 195); LeVme (1963, 236); Mair (1969, 77); Mombeshora (1994, 83). Geschiere
(1997, 51) informa que os makas dos Camarões dizem que o nkong (curandeiro) é «um
bruxo que bateu todos os recordes». Ver também Shaw (1997, 867-868, 872 n. 17).
15 Whitehead (2002: 224) tem a mesma opinião sobre os xamãs dos patamuna da
América do Sul.
16 A crença de que os curandeiros são feiticeiros curados ou reformados parece estar
muito difundida. Taussig (1987), por exemplo, analisa os xamãs das montanhas da Amé
rica do Sul sob esta luz. Stephen (1996) sugere que, em algumas sociedades da Melanésia,
se considera que os próprios feiticeiros são os maiores peritos da comunidade em matéria
de rituais e, ao serem capazes de mediar o poder sagrado, actuam sob muitos aspectos
com o xamãs. Ver também Nadei (1970, 287); Nitibaskara (1993, 126); Ashfort (2001b,
214); Rasmussen (2001a, 150).
127
Capítulo 8
Feitiçaria de construção
*
«Estou a ver-te! Sei quem tu és! Estás a matar-nos, à gente desta po
voação! Estás a matar-nos com a tua uwavü»
O ancião Vicente Anawena estava sentado no chão, com os joelhos do
brados junto ao queixo. A sua voz era tão serena, a sua postura de tal modo
contida, que achei difícil imaginá-lo de pé, à noite, junto da shitala (a barraca
onde os homens se reuniam, no centro da povoação) a repreender os fei
ticeiros, tal como nos estava a contar que fazia antes da guerra da indepen
dência, quando os habitantes de Mueda viviam em povoações dispersas.
Contudo, Anawena fora chefe de povoação (m ng'ok mwenehtjd) e com
petia-lhe, tal como, segundo nos disse, a todos os chefes, policiar tanto o
reino visível como o reino invisível que constituíam a sua povoação.
«Não queremos aqui a tua uwavi!», continuou o ancião. «Se não pa
rares, expulsamos-te desta povoação! Se alguém morrer por causa da tua
uwavi, eu mato-te! Estou a ver-te! Sei quem tu és!»
Anawena baixou a cabeça e contextualizou a sua reconstituição ora
tória, dizendo: «Quando a uwavi atingia limites intoleráveis, era isto que
nós fazíamos.»
Nas povoações a que Anawena se referia, o encontro entre os habi
tantes e os especialistas a quem recorriam quando sofriam de algum pa
decimento, estava, como vimos, saturado de ambivalência e suspeitas
mútuas. A contínua ocorrência de doenças e desgraças, bem como a pre
sença constante da adivinhação e do curandeirismo, estavam ligadas à
infindável propagação de boatos e insinuações, acusações e desmentidos.
Neste ambiente, as pessoas às vezes procuravam distanciar-se daqueles
com quem tinham más relações. Gmpos de variadas dimensões abando
navam, por vezes, a povoação, passando a residir a alguma distância, fora
do alcance dos feitiços.1Essas cisões, porém, tinham consequências po-
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Feitiçaria de construção
2 Práticas semelhantes são descritas porM . Wilson (1970 [1951], 278); La Fontaine (1963:
198); LeVine (1963,239); Mair (1969, 58); Goody (1970,211-212). Evans-Pritchard (1976
[1937], 3940) descreve como as famílias das vítimas azandes faziam, elas próprias, orações
públicas em que expressavam a sua convicção de terem sido atacadas por bruxos.
3 Ao contrário das figuras de autoridade dos benges descritas por Gottlieb (1989), que
consolidavam a legitimidade popular mostrando-se dispostas a sacrificar os do seu próprio
sangue pelos interesses do grupo social no seu todo, as pessoas de Mueda não esperavam
que os chefes de povoação praticassem essas formas «destrutivas» de feitiçaria. Nesta pers
pectiva, as figuras de autoridade de Mueda assemelhavam-se aos bm andanti - praticantes
de paganismo no Sul da Europa julgados pela Inquisição. Segundo nos diz Ginzburg, pen
sava-se, de um m odo geral, que estes benandanli eram capazes de praticar formas destrutivas
de bruxaria (1992-[1966], 78) mas, como bmandanti, esperava-se que combatessem os bruxos
e não que fizessem feitiços. Cf. Tumer (1996 [1957], 112), que caracteriza os suspeitos de
feitiçaria ndembu como não sendo idóneos para ocupar cargos de autoridade.
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sua povoação, Anawena (que fora ele próprio chefe) respondeu (na ter
ceira pessoa): «Ele era um tnwavi. Tinha de o ser, para saber quem eram
os outros - para os... controlar. Todos os vanangolo vem kaja eram vavi.
Deste modo, garantia que a uwavi praticada na povoação era uwavi wa
ishima [feitiço de respeito], em que se respeitavam os limites.»
O termo que Anawena utilizou nesse dia para classificar a intervenção
do chefe de povoação no reino da feitiçaria foi revelador. Chamou a esse
acto uwavi wa kudenga - literalmente, «feitiço de construção» (também
traduzível como «feitiço de edificação»).4
O termo «feitiço de construção» era muito usado entre as pessoas com
quem trabalhámos, mas também se utilizavam outros termos para des
crever formas de feitiçaria socialmente benéficas. O curandeiro Libata
chamava à prática de feitiçaria para proteger os interesses da povoação
uwavi ndenga kaja, «feitiço de construção da povoação». Outros usavam
as palavras shimaconde para «vigilância», «controlo», «aviso», «recomen
dação», «chamar a atenção», «criticar» e «garantir o respeito» como ad-
jectivos para descrever a feitiçaria praticada por figuras de autoridade res
ponsáveis. Independentemente do termo utilizado, a ideia era a mesma:
através da sua própria prática de feitiçaria, o chefe de povoação bem su
cedido delimitava e definia o reino do poder invisível, suprimindo nesse
reino os actos de outras pessoas que pudessem ser classificados como
«feios», «sujos» ou «maus» {uwavi wa kunyata), como «perigosos» {uwavi
wa kujoa) ou como «ruinosos» {uwavi wa Iwanongo).
Os leitores familiarizados com a literatura sobre a bruxaria e a feitiçaria
africanas poderão admirar-se com o grande número de adjectivos utili
zados em Mueda para caracterizar a uwavi, mas talvez reconheçam nesta
prática um tema familiar. Do mesmo modo que consideravam que as
mitela eram fontes de poder neutras, os habitantes do planalto também
consideravam moralmente neutro o poder originado por essas substân
cias. 5 Segundo as pessoas com quem trabalhámos, os feiticeiros - à se-
4 Geschiere (1997,13) regista o uso do termo «construtivo» para descrever alguns actos
de feitiçaria nos Camarões. Noutros lugares, Fisiy e Geschiere (1990, Í42) falam de «fei
tiçaria de autoridade» praticada por anciãos no contexto dos conselhos de aldeia.
5 A ambivalência dos habitantes do planalto de Mueda face à feitiçaria é semelhante
à ambivalência dos safwas, descrita por Harwood, em relação a uma capacidade oculta
chamada itonga. Segundo o relato de Harwood, os safwas consideravam a itonga simples
mente como «o poder de compreender e de fazer ‘coisas às escondidas’», com o «fazer
coisas aos outros sem ser visto», ou com o «o poder de agir, sem que os outros percebam»
(1970, 57). Tal poder podia ser usado para fins morais ou imorais. U m informador des
creveu as pessoas com itonga dizendo: «Elas são como chaves, que tanto podem abrir
como fechar portas» (59). Com base na sua percepção da itonga dos safwas, Harwood
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7 Stephen (1996, 92) informa que o poder dos feiticeiros mekeos (Melanésia) era por
vezes atribuído ao facto de terem ingerido a carne de uma serpente venenosa.
8 D e Heusch (1985,32-33) diz que os chefes de linhagem tetela (Zaire, actual República
Democrática do Congo) - que se vestiam com o leopardos nas danças rituais - se absti
nham de comer carne de leopardo porque «leopardo não come leopardo». As figuras de
autoridade de toda a Áírica têm sido identificadas com os leões e os leopardos. Por exem
plo, Tumer (1996 [1957], 11) conta que os chefes ndembus se sentavam sobre peles de
leopardo e de leão. De Heusch (1985, 104) relata que os reis swazis faziam o papel de
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11 Cf. Harwood (1970), que escreve sobre a distinção que os safwas estabelecem entre
boa itonga e má itonga.
12 Geschiere (1997,57-58) defende esta posição eloquentemente.
13N o relato de Evans-Pritchard, os azandes tinham as suas próprias tábuas de esfregar
e consultavam-nas sozinhos; os oráculos de térmitas também eram consultados sozinhos;
os oráculos fonge eram consultados na presença de outra pessoa, mas esta não transmitia
o veredicto do oráculo.
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Parte II
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2 Shaw (2002) alega que, na Serra Leoa, as crenças e práticas associadas à bruxaria ti
veram origem nas perturbações sociais produzidas pelo tráfico de escravos. Rosenthal
(1998) liga a feitiçaria, historicamente, ao tráfico de escravos. Hartwig (1971) associa o
aumento da feitiçaria entre os kerebes da Áfiica Oriental às desigualdades fomentadas
pelo comércio caravaneiro. D e forma semelhante, Gow (1996) coloca a hipótese de que
o xamanismo ligado à ayahuasca só tenha surgido na Amazónia ocidental depois do «con
tacto», afirmando-se nos interstícios «racializados» que se formaram entre as comunidades
indígenas, os colonizadores europeus e as populações mestiças.
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casa com riquezas nunca antes vistas, de usarem a feitiçaria para se ali
mentarem a si próprios, com exclusão dos outros e à custa deles, ao passo
que os retomados suspeitavam que os seus conterrâneos recorriam à fei
tiçaria para os consumir ou destruir, bem como aos seus bens adquiridos
com tanto trabalho. Os cristãos atraíam as invejas e suspeitas dos não
cristãos e os dois lados acusavam-se mutuamente de feitiçaria. Mais tarde,
os habitantes de Mueda interpretaram as manobras evasivas da luta de
guerrilha na linguagem familiar da uwavi, atribuindo a culpa dos ataques
mortíferos a formas portuguesas de feitiçaria e/ou à colaboração com os
portugueses de feiticeiros malévolos que viviam entre eles. Quando a Fre-
limo os instalou em aldeias comunais, depois da guerra, os habitantes
do planalto entenderam essa iniciativa como uma tentativa de consolidar
o poder de Estado graças à criação de condições para uma vigilância mais
apertada tanto do reino visível como do invisível.
Em última análise, as pessoas ouviram algo familiar nas visões sobre o
funcionamento do mundo expostas por agentes históricos como os mis
sionários católicos e os revolucionários da Frelimo, cada um dos quais
proclamava que as suas verdades invalidavam as crenças e práticas da
uwavi. Estas reivindicações da verdade eram interpretadas como afirma
ções da capacidade de transcender o mundo que as pessoas comuns co
nheciam e, até, o mundo conhecido pelos feiticeiros locais - por outras
palavras, como formas de feitiçaria ainda mais poderosas, isto é, como
manobras transcendentes, transformadoras {kupilikula). Nos lugares onde
os habitantes beneficiavam do poder destas novas figuras de autoridade,
consideravam-nas geralmente como feiticeiros de construção, na tradição
dos anciãos responsáveis. Foi o que aconteceu, crescentemente, com os
missionários católicos, cujas muitas iniciativas enriqueciam e/ou confe
riam poder aos convertidos, e cuja abordagem cada vez mais liberal da
tradição maconde permitiu que as pessoas aderissem ao cristianismo sem
deixarem de ser macondes. Os líderes da Frelimo também incentivavam,
por vezes, os habitantes do planalto a vê-los como poderosos feiticeiros,
ao falarem - ou mesmo consultarem - os especialistas de substâncias má
gicas locais, durante a guerra da independência. Enquanto as pessoas sen
tiram que o poder da Frelimo era um meio para se libertarem do domí
nio português, consideraram que os seus líderes eram feiticeiros de
construção. No entanto, quando a campanha de modernização socialista
lançada pela Frelimo foi travada pela guerra civil moçambicana que se
seguiu à independência, a maioria entendeu que as autoridades da Fre
limo exerciam cada vez mais o poder em seu único e exclusivo proveito,
«comendo tudo» e, como muitos desconfiavam, «todos». Assim, en-
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1
*
Capítulo 9
Conquistadores imaginados
«É ele», afirmou Marcos, com segurança.
«Como é que sabes?», perguntei, surpreendido. «Disseste-me que não
o conhecias pessoalmente.»
Marcos ignorou a minha pergunta. De olhos fitos na nossa frente, li
mitou-se a repetir: «É ele.»
Ao aproximarmo-nos, brotou do peito de Marcos uma risadinha di
vertida. Olhei-o, procurando discernir a causa do seu divertimento, mas
percebi logo que o seu riso não pretendia incluir-me ou partilhar qual
quer piada comigo. Marcos parecia estar suspenso noutro tempo ou
lugar, absorto no objecto do seu riso - o objecto do seu olhar extático.
Quando me dera a conhecer Mueda e os seus habitantes, nos primei
ros meses do meu primeiro trabalho de investigação no planalto, em
1994, Marcos sugerira que centrássemos a nossa atenção em questões
históricas sobre as quais pudéssemos conversar sem ferir as susceptibili
dades da política contemporânea. Depressa descobri que os anciãos gos
tavam muito de falar connosco sobre acontecimentos como a conquista
do planalto pelos portugueses. Vários deles brindaram-nos com animados
relatos da resistência heróica que os seus antepassados tinham oferecido.
Dos vanang’olo (anciãos) que combateram os portugueses, destacava-se
o lendário Malapende, e muitas dás pessoas com quem falámos infor
maram-nos que, se quiséssemos realmente conhecer a sua história, de
víamos ir à aldeia de Litembo e falar com Lyulagwe, um sobrinho do
grande chefe militar. Marcos nunca encontrara Lyulagwe nem ouvira falar
dele. Além disso, embora tivesse parentes no aglomerado de aldeias si
tuado a leste de Litembo, e também no aglomerado situado a oeste, Mar
cos não conhecia ninguém que vivesse ou fosse natural de Litembo. De
morámos, por isso, a localizar o sobrinho de Malapende, até percebermos
claramente que este seu herdeiro era considerado por muitos como o
portador da sua história.
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6 Dois anos antes, o capitão António Pires afirmava ter dividido «a meio toda a região
rebelde dos Malcondes no Nyassa» (Pires 1924, 18), mas o itinerário da sua campanha
para ligar o rio Rovuma a Porto Amélia contornara a margem sudoeste do planalto e evi
tara as zonas onde a população estava concentrada (ver mapa 2). Em relatos ulteriores
(Costa 1932) é dito que os macondes se envolveram em escaramuças com as tropas por
tuguesas, poucos meses após a passagem de Pires.
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Mapa 2
Viagens de Henry O ’N eill e rotas da conquista portuguesa.
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fogo e, até, a produzir peças sobressalentes para elas, tomando esta tec
nologia, antes surpreendente, em algo cada vez mais terreno.
Nos actuais relatos orais da conquista, os habitantes do planalto de
Mueda reconheciam que as armas de fogo dos portugueses eram perigo
sas, mas não as descreviam como instrumentos decisivos no recontro
entre combatentes portugueses e macondes. De facto, descreviam os ma-
condes a utilizar armas de fogo tão bem ou melhor que os portugueses
e os seus mercenários - até as reservas de pólvora terem acabado.
Segundo Maunda Ng’upula, após os portugueses terem sido atraídos
para a emboscada montada por Malapende e Namashakole, Mbavala
disse aos portugueses: «Eu avisei-vos que eles eram ruins!» A história,
contada por Maunda reza que «os portugueses responderam: ‘Aquilo
devem ter sido os alemães!’ Os portugueses regressaram a Macímboa da
Praia e voltaram três semanas depois. Aconteceu a mesma coisa: sofreram
uma emboscada e retiraram. Desta vez, porém, acreditaram em Mbavala,
quando este lhes disse que quem os atacara fora Malapende e Namasha
kole, e não os alemães.»
Maunda prosseguiu a sua história: «Oito meses depois, os portugueses
voltaram e caíram numa emboscada. Desta feita, morreram macondes e
portugueses. Os portugueses regressaram a Mocímboa da Praia. Os ma
condes tinham ficado sem pólvora e foram buscar mais.»
Quando os portugueses regressaram, os macondes voltaram a ficar sem
pólvora, segundo Maunda Ng’upula. Pouco tempo depois, deitaram fogo
à povoação de Maunda e retiraram para a de Malapende, deixando que
os portugueses estabelecessem a sua «administração» nas minas da po
voação de Maunda.7
Porém, os momentos mais reveladores, tanto na narrativa de Lyulagwe
como na de Maunda Ng’upula, surgem no intervalo entre o esgotamento
das reservas de pólvora dos macondes e a sua «rendição» final. Neste in
terregno, o «poder de fogo superion> dos portugueses é completamente
neutralizado pelos astuciosos estratagemas dos vam ng’olo macondes. No
relato de Lyulagwe, como ouvimos, Malapende atrai os portugueses e os
seus afiados para corredores estreitos onde morrem trespassados por lan
ças. Na narrativa de Maunda Ng’upula, a táctica ainda é mais incrível:
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Conquistadores im aginados
8 Claro que este é um tema comum nas histórias de guerra africanas. O exemplo mais
famoso refere-se à sublevação dos Maji Maji na África Oriental alemã, em 1905 (Adas
1979). Ver também (Fry 1976,107); K. Wilson (1992); Rosenthal (1998,113); Wild (1998);
Rasmussen (2001a, 140). Bastian (2001) informa que os membros de algumas fraternida
des universitárias nigerianas se afirmam imunes às balas. Ver também Worsley (1968,141)
sobre fenómenos semelhantes na Melanésia.
9 Os habitantes de Mueda descreveram a Dias e Dias (1970,371) estratégias semelhan
tes para escapar ao perigo - incluindo transformarem-se em nuvens.
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i° y er relato semelhante de um chefe mbugwe, que muitos admitiam ter chamado tro
pas (alemãs, nada menos) por meio de bruxaria, para punir os seus inimigos, em Gray
(1963,147).
11 Dias e Dias contam que um dos seus informantes lhes disse: «Os brancos sabem
fazer máquinas e andar pelo ar, mas o régulo Mbavala era capaz de fazer coisas superiores
aos brancos» (1970, 364).
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Capítulo 10
Consumir o trabalho
e os seus produtos
«O regulado1nasceu com o imposto», disse-nos o idoso que entrevis
távamos. «Antes da chegada dos portugueses não havia impostos, e antes
dos impostos não havia régulos12- só chefes de povoação.»
«O chefe de povoação não ficava também com uma parte da riqueza
do seu povo?», perguntei.
«Isso era diferente», respondeu. «O chefe de povoação redistribuía os
bens entre o seu povo. Cuidava do seu bem-estar. O régulo comia as pes
soas. E os portugueses comiam o régulo.»
O mais extraordinário nestas palavras do ancião era o facto de ^ p r ó
prio ter sido régulo no fim do período colonial.
«Eu fui o quarto régulo Ndyankali», dissera-nos ele. «O primeiro foi o
filho de Makapela.»
«Como é que ele foi escolhido?», perguntara eu.
«Depois da derrota dos macondes em Nanenda, os portugueses vieram
a cada uma das zonas do planalto e perguntaram: ‘Quem é o chefe?’
Nesta zona, Ndyankali descendia do fundador inicial. Era um m ng’oh
mwene shilambo. A terra pertencia aos seus antepassados, por isso foi iden
tificado e deram-lhe uma bandeira para hastear no seu recinto. Outros
vanang’olo vene kaja da zona - que até então prestavam obediência ao
nang’olo mwene shilambo e aos seus antepassados - passaram a receber or
dens dele. Era obrigado a cobrar impostos e a dar o dinheiro aos portu
gueses.»
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16 Uma das formas de litígio mais comuns na região do planalto era a seguinte. Pouco
depois da conquista, um chefe de povoação nomeava um subordinado para interagir
com o regime colonial. O chefe de povoação aproveitava a oportunidade para consolidar
a união do seu povo através da nomeação de um dos descendentes de uma mãe escrava,
com fraca lealdade à matrilinhagem (que não era verdadeiramente sua). Contudo, quando
o posto na hierarquia colonial se revelava lucrativo, o chefe de povoação (ou o seu her
deiro) procurava expulsar o nomeado (ou o seu herdeiro) questionando a linhagem de
que ele descendia. Ver também Dias e Dias (1970,307).
17 Os antropólogos africanistas constataram, há muito, que a utilização das «autorida
des nativas» pelas administrações coloniais colocava estas figuras em posições incómodas
- «intercalares» - (Gluckman, Mitchell e Bames 1949). Fadiman (1993) apresenta um re
lato fascinante deste dilema, tal com o foi sentido pelos meras do Quénia.
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20 Ver também Harries (1993), que sugere que a migração laborai há muito constitui,
no Sul de Moçambique, uma espécie de ritual de passagem para o estatuto de chefe de
família economicamente independente.
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22 Lindenbaum (1979,74) sugere que os fores, das terras altas da Nova Guiné, passaram
por uma proliferação semelhante das formas de feitiçaria após o contacto colonial.
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Capítulo 11
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3 Peei (2000, 249) argumentou, convincentemente, que é com grande incerteza que
discernimos a convicção religiosa nas manifestações práticas da crença; a «conversão»,
segundo sugere, só pode ser definida como a adopção de uma identidade social. Por con
seguinte, coloca os termos «conversão» e «convertido(s)» entre aspas.
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Lucas N g’avanga foi uma das primeiras pessoas que conheci em Mueda. Encon
trei-me com ele na sua casa, em Pemba, para onde se mudara para estar próximo
da família, incluindo a filha, Angela, uma freira da Igreja Católica. N g’avanga
era um respeitado ancião da com unidade m aconde de Pemba. Marcos exortou-
-me a visitá-lo com frequência, m esm o que não tivesse nada específico para tratar.
Inicialmente, senti relutância em passar demasiado tem po com uma única pes
soa, pois considerava necessário obter o maior núm ero possível de perspectivas
sobre as muitas questões que m e interessavam na m inha investigação. Por fim,
acabei por entender que as visitas regulares a anciãos com o N g’avanga eram uma
maneira fundamental de demonstrar respeito. À medida que a m inha relação
com N g’avanga amadurecia, descobri uma grande satisfação em passar tem po
com ele, deixando que as nossas conversas divagassem sem rumo definido.
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6 Pels (1999,7) alega que a «iniciação» constitui uma metáfora melhor para a evange
lização cristã em África do que a «conversão». Os padres de Montfort holandeses toma
ram esta metáfora de forma literal.
7 Pels (1999,136) documenta o m odo como os missionários entre os lugurus tentaram
substituir os ritmos africanos por outros que consideravam mais adequados às sensibili
dades cristãs. Os padres de Montfort em Nang’ololo ensinaram, igualmente, hinos euro
peus à sua congregação, mas também parecem ter demonstrado maior tolerância em re
lação aos ritmos afiicanos do que os missionários sobre quem Pels escreve. Neste aspecto,
o seu comportamento assemelha-se mais ao dos missionários que trabalharam entre os
huwesas e descritos por Maxwell (1999,92).
8 O mesmo termo é alegadamente usado para denominar o espírito ancestral entre os
pogoros (M. Green 1994,32; 1997,331) e os benas (Mombeshora 1994,75) da Tanzânia.
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R egulados e m issões de M on tfort n a ép oca colon ial
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10 Com o Landau (1995, 132) sugeriu, os historiadores têm prestado insuficiente aten
ção ao papel crucial desempenhado pelos próprios africanos na evangelização cristã.
11 A Legião de Maria é uma associação católica laica fundada em 1921, em Dublin,
na Irlanda, por Frank Duflf. Esta associação põe a tónica numa «espiritualidade mariana
em grande medida inspirada pelos escritos de Louis Grignion de Montfort», fundador
da ordem missionária de Montfort (McBrien e Attridge 1995, 763).
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Capítulo 12
Conversa e conversão
Emiliano Simão Ncimi foi um dos primeiros da sua matrilinhagem a
converter-se ao cristianismo. Marcos, Felista e eu estávamos sentados
com ele, ao fim da tarde, no exterior da sua casa, na aldeia de Napanya,
enquanto ele partilhava connosco as recordações das suas primeiras con
versas com os padres de Montfort. Contou-nos: «Nós, macondes, costu
mávamos pintar uma cruz com óleo de rícino no solo, sobre o local onde
tínhamos enterrado um membro da família. Quando os padres vieram,
explicaram que essa cruz era aquela onde Jesus estava crucificado.1Pare
cia que os padres sabiam mais sobre aquilo que nós sabíamos do que
nós mesmos!»
Como vimos no capítulo 11, quando chegaram ao planalto de Mueda,
os padres de Montfort afirmavam ser portadores de verdades transcen
dentes. A seu tempo, muitos habitantes aceitaram estas afirmações e con-
verteram-se ao cristianismo, como testemunha Emiliano Simão Ncimi.
Até as pessoas que não se «converteram» foram profundamente afectadas
pelo embate cultural mais geral que a sociedade do planalto sofreu a par
tir de meados da década de 1920.
Jean Comaroff e John Comaroff afirmaram que, à medida que os tswa-
nas do Sul «conversavam» com os missionários cristãos que viviam entre
eles no século XIX - comparando os poderes relativos dos fazedores de
chuva e das orações ao Deus cristão, por exemplo - mesmo aqueles que
resistiram à «conversão» ao cristianismo foram arrastados «involuntária e,
muitas vezes, relutantemente para asformas do discurso europeu»; foram
«seduzidos para os métodos de debate racional, conhecimento positivista
e razão empírica que estão no centro da cultura burguesa» e, por isso, «não
1 Voeks cita provas de que o sinal da cruz já era, igualmente, «um símbolo sagrado
tradicional para os escravos [brasileiros] provenientes do Daomé» (1997, 158).
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podiam evitar interiorizar os termos através dos quais estavam a ser desa
fiados» (Comaroff e ComarofF 1991,213). Afigura-se que, até certo ponto,
esta afirmação é igualmente aplicável aos macondes que «conversavam»
com os padres de Montfort nas décadas de meados do século XX.
Porém, como também foi referido no capítulo 11, os missionários de
Montfort que trabalhavam junto dos macondes aprenderam a falar como
os habitantes do planalto na mesma medida em que estes aprenderam a
falar como eles - referindo-se ao Deus cristão como Nungu, aos santos
cristãos como antepassados e à alma cristã como mahoka.. Batucavam e
dançavam aos ritmos locais,2vestiam-se como mapiko e actuavam como
mestres dos rituais de iniciação. Ao relacionar-se com o mundo através
da língua shimakonde, os missionários interiorizaram de forma não des
prezável os esquemas culturais autóctones e ratificaram «inadvertida
mente» a lógica local que pretendiam contestar.3
Considere-se a «conversa» entre os habitantes do planalto e os padres
de Montfort a respeito da feitiçaria. Por vezes - talvez com maior fre
quência nos primeiros anos da história da missão - os missionários rejei
tavam a uwavi como mera superstição. Quando falei com Simoni Ma-
tola, um dos primeiros cristãos de Nang’ololo, ele recordava-se
perfeitamente do dia em que acompanhou um dos missionários numa
visita a casa do ancião Shakoma, um curandeiro de grande reputação.
«O padre disse a Shakoma que os objectos-espíritos existentes na sua casa
não eram deuses.4Eram apenas objectos. Disse ao ancião para os deitar
fora, pois eles eram inúteis, não tinham qualquer poder.»5
Noutras alturas, no entanto, os missionários de Montfort falavam aber
tamente, e com segurança, sobre a existência e a natureza da uwavi, que
«traduziam» umas vezes como «pecado original» do homem, e outras
como «obra de Satanás» e «das suas legiões de demónios».6 Mais ainda,
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Conversa e conversão
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K u piliku la
13 Pels (1999, 239, 259) sugere que os lugurus também concebiam os missionários
com o waganga (curandeiros). Landau (1995, 113) sugere que esta ideia era comum nos
encontros dos africanos com os missionários. Ver também Rekdal (1999,472).
14 White (2000,184) conta que os Padres Brancos da Rodésia do Norte, tal com o os
missionários africanos noutras zonas, eram geralmente considerados como feiticeiros po
derosos. Pels (1999, 262) sugere que os lugurus consideravam que os missionários que
viviam entre eles só eram capazes de praticar formas de magia benéficas.
15 M. Green (1994,41,43) sugere, igualmente, que as proibições católicas das crenças
e práticas de bruxaria entre os pogoros da Tanzânia eram interpretadas com o expressões
da oposição da Igreja aos «bruxos verdadeiros».
192
Conversa e conversão
193
K u piliku la
16Até 1929, a política portuguesa limitava o ensino das crianças «nativas» à formação
tradicional que melhorasse as suas capacidades de trabalho (Hedges 1985,7). Nesse ano,
novas disposições regulamentares permitiram que as crianças africanas estudassem jun
tamente com as brancas, mas apenas se as suas famílias tivessem adquirido o estatuto de
«assimilados» através de um processo oficial no qual demonstravam ter usos e costumes
«civilizados» de comer, falar, vestir, etc. (Penvenne 1991). As crianças «indígenas» (não
assimiladas) estavam limitadas a uma educação «rudimentar», que incluía a primeira e a
segunda classes do ensino primário e uma terceira classe rudimentar (uma versão simpli
ficada da terceira classe).
17 Estes acordos exigiam que o programa escolar fosse aprovado pela administração
colonial e que fomentasse um sentimento de nacionalismo português entre os alunos,
instruindo-os em português e ensinando-lhes a história e a geografia de Portugal (Sheldon
1998). As crianças indígenas continuavam a estar limitadas a uma escolaridade que ter
minava na quarta classe, a seguir à qual apenas lhes era permitido estudar em escolas pro
fissionais.
194
Conversa e conversão
18 A terceira classe elementar completava a terceira classe para os estudantes que ti
nham feito, anteriormente, a terceira classe rudimentar.
19 Pels (1999,258) descreve com o os rosários e as medalhas de baptismo eram igual
mente adoptadas pelos lugurus com o substitutos dos amuletos de protecção outrora for
necidos pelos waganga (curandeiros). Maxwell (1999, 90) descreve o mesmo fenómeno
entre os hwesas.
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20 Ver também Pels (1999, 137). Em anos posteriores, os estudantes das missões que
fizessem a iniciação ou escarificação tradicionais corriam o risco de serem expulsos da
escola da missão.
21 Métraux (1972 [1959], 324-326) apresenta este argumento em relação ao vodu hai
tiano, o qual contradiz depois dizendo que os praticantes de vodu estavam «convencidos
da eficácia da liturgia católica e, por isso, desejavam que a sua própria religião beneficiasse
dela» (328). Murphy (1988, 32) debate este argumento em relação à santeria cubana.
Voeks (1997,60) apresenta um argumento semelhante a respeito do candomblé brasileiro,
mas acrescenta ser improvável que os eclesiásticos católicos fossem ludibriados por essas
manobras, sobretudo atendendo à política da Igreja de substituir gradualmente as «di
vindades pagãs» por imagens de santos católicos.
22 Ver também Deren (1953, 56). Murphy (1988, 122) descreve esses altares entre os
praticantes de santeria; Brandon (1993,121) ilustra um deles. Ver também Fry (1977) re
lativamente ao m odo com o os praticantes de umbanda descendem de escravos que
«[mantinham] as tradições de África vivas ocultando os Deuses de África... por detrás
dos Santos Católicos». Danfhlani relata que os membros eggons do culto ijov da Nigéria
«utilizam a Biblia» mas «acusam os seus autores... de substituir os espíritos pelo nome
de Cristo» (1999,191).
23 Esses «conversos», pelo menos, adoptaram identidades cristãs (Peei 2000,249).
196
Conversa e conversão
24 Bond (2001,147) também sugere que os yombes «aumentaram» o seu «campo ri- -
tual» através da apropriação do cristianismo. Ver também Gilbert (1989,61).
25 Murphy (1988,40, 114,122) sugere que os santeros consideram que os santos ca
tólicos são «personae», ou «atitudes» dos orixás e que o catolicismo é uma «forma dos
orixás» no N ovo Mundo. Ver também Bastide (1978,123) e Apter (2002,238) a respeito
do vodu, e Fry (1977) e D . Brown (1994 [1986]) sobre a umbanda brasileira.
26 Ver também Horton (1993, 317).
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K u piltku la
27Ver também Behrend (1999,116). Métraux referiu uma dinâmica semelhante no Haiti
como sendo a «verdadeira apropriação do catolicismo pelo vodu» (1972 [1959], 331).
28 Ver também Barker (1990); Meyer (1992,122).
29 Ver também Landau (1995, xxi), bem como Masquelier (2001), que descreve igual
mente as complexas relações prevalecentes entre os boris e o islamismo, no Níger.
30 Cf. Jean Comaroff e John ComarofF (1991,229).
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Capítulo 13
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Cristãos, pagãos efeitiçaria
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4 Maxwell (1999,109) sugere que muitos jovens hwesas se tomaram cristãos precisa
mente para fugir aos constrangimentos da «comensalidade tradicional».
s Fadiman (1993) relata, similannente, com o os merus cristãos suscitaram as suspeitas
dos merus não cristãos, no Quénia colonial.
6 Ver também White (2000,189).
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Cristãos, pagãos efeitiçaria
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Capítulo 14
Gente da noite
«
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1As danças mapiko há muito que constituíam um fórum de crítica subtilmente velada
dos portugueses, através do uso de máscaras que caricaturavam administradores, donos
de plantações ou funcionários da junta do algodão. As danças eram, assim, ambientes
plenos de subversão (Alpers 1983,149). Neste aspecto, as mapiko assemelhavam-se aos
cultos hauka entre os songhay do Níger, descritos por Stoller (1989, 147-163).
2 Os dirigentes políticos moçambicanos seguiram o exemplo dos mobilizadores da
TANU, que também recrutavam apoiantes entre os trabalhadores migrantes (Iliffe 1969),
sobretudo membros de clubes de dança e outras organizações sociais destes trabalhadores
(Ranger 1969).
208
Gente da noite
Durante a investigação que realizei em 1999, levei com igo um exemplar da dis
sertação que concluíra para mostrar às pessoas com quem tinha trabalhado.
«Nang’olo» (ancião), disse eu a Jacinto Omar, «as histórias que o senhor e os
seus amigos m e contaram estão neste livro». «Então lê-mas», respondeu ele. D u
rante horas, li passagens do texto, traduzindo de im proviso para o m eu público
de duas pessoas, Marcos (que aqui se vê com Omar) e o próprio protagonista.
D e vez em quando, o ancião corrigia-me ou dizia «nikweli» (é verdade). Quando
terminámos, perguntou-me se o trabalho ia ficar guardado np Arquivo Histórico
de Moçambique. Q uando lhe garanti que assim seria, agarrou-me na mão e disse
«wambone» (muito bem!).
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K u piliku la
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Gente da noite
No meu primeiro dia na cidade de Mueda, onde viera fazer uma visita explora
tória, tinha uma delegação à minha espera quando acordei. Na companhia de
vários funcionários da Direcção Distrital da Cultura estava um homem lendário
a nível local: Faustino Vanomba, um dos líderes protonacionalistas cuja detenção
desencadeara os protestos que terminaram no Massacre de Mueda. Embora me
sentisse tentado a aproveitar aquela oportunidade para conversar com Vanomba
sobre o seu papel nesses acontecimentos históricos, expliquei-lhe que voltaria
algumas semanas depois para começar a trabalhar no planalto, onde ficaria ano
e meio, período durante o qual falaria detalhadamente com muitas pessoas.
Virei-me para Vanomba e fiz-lhe algumas perguntas de cortesia a seu respeito.
Ele olhou para mim, aborrecido, e disse: «Isto não é a sério. Se o senhor quer
saber coisas a meu respeito, deve ter o equipamento adequado. Quando regres
sar, traga um gravador e uma máquina fotográfica. Não vou falar sobre estas coi
sas para o senhor depois as esquecer. Esta história é importante e deve ficar do
cumentada.» Depois de se certificar de que eu entendera a sua ordem,
acrescentou, com um sorriso: «Traga também uma câmara de vídeo. Quero ser
filmado em vídeo... e não se esqueça de trazer cigarros!» Acabei por me entre
vistar Vanomba longamente e ele contou-me a história da sua vida. Ficou muito
contente quando lhe pedi para posar para uma fotografia diante do edifício da
administração onde estivera detido.
tigos dirigentes dos três partidos que se fundiram para formar a Frelimo
depressa foram marginalizados na hierarquia do partido por novos líde
res, muitos dos quais tinham estado recentemente a estudar na Europa.
Algumas das disputas travavam-se literalmente em tomo da comida, pois
os marginalizados queixavam-se amargamente de que os novos dirigentes
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Gente d a noite
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10 Kriger (1992,104) apresenta relatos semelhantes dos ataques do ZANLA aos chefes,
na Rodésia.
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Gente da noite
11 D os dezoito régulos da metade sul do planalto, oito acabaram por se pôr do lado
da Frelimo e um foi preso pelos portugueses. A Frelimo matou três. Dois refugiaram-se
junto dos portugueses. Três fugiram para a Tanzânia (não consegui obter quaisquer dados
sobre o régulo remanescente) (West 1997b, 164-168,312).
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Gente da noite
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Gente da noite
M ais im p ortan te ainda, c o m o v erem o s n o s cap ítu los seguin tes, a es
trutura d e c o m a n d o m o d ifica d a fa cilitou o s esfo rço s d o s líderes da Fre-
lim o para m an terem ta n to o s guerrilheiros c o m o o s civis so b vigilância
e ob terem , assim , u m a p erspectiva fu n d am en ta l sobre o fu n cio n a m en to
d o p o d e r n o s seu s d o m ín io s florestais.
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Capítulo 15
221
K u piliku la
Quando cheguei a Pemba, a primeira pessoa que contactei para a investigação in
formou-me de que eu deveria encontrar-me com Rafael Mwakala. «O Rafael tem
experiência com pessoas com o você», disse-me ela. N a verdade, Mwakala servira de
intérprete à equipa de antropólogos chefiada por Jorge Dias, que trabalhou n o pla
nalto de Mueda em finais da década de 1950. Quando viajava com a equipa de
Dias, Mwakala esgueirava-se, depois de escurecer, para recrutar homens jovens para
a causa da Frelimo - sem que Dias e os seus colegas dessem por isso (West 2004a,
n. 311). Aqui, está a posar com um exemplar da etnografia publicada pela equipa
de Dias, aberto numa página em que se pode ver uma fotografia da sua esposa.
eles não nos conseguiam ver. Podíamos organizar os nossos ataques, fazer
emboscadas aos soldados em [patrulha] e voltar a desaparecer na flo
resta.» Enquanto falava, Rafael mimava os actos que descrevia, crivando
o seu inimigo imaginário com as descargas de uma arma automática.
«Nós éramos invisíveis; eles não podiam fazer nada. Por isso, tinham
de nos sobrevoar, abrir caminho através da floresta e queimar o coberto
florestal, para chegar até nós. A guerra era isso.»
Seguimos os olhos de Rafael, que se elevaram para o céu.
«Tínhamos de nos manter um passo à frente, sempre fora de vista, à
escuta dos aviões, prontos para nos abrigarmos ou mudarmos de poiso
de um momento para o outro.»
***
222
Jogos mortíferos de esconde-esconde
conde que durou toda uma década. Ser visível para o inimigo era estar
vulnerável. Ser invisível era estar seguro. Poder ver o inimigo era ser letal.
A dinâmica da guerra foi mudando ao longo da sua duração, juntamente
com as relações ópticas mantidas entre os combatentes.
Nos primeiros anos da guerra, os guerrilheiros da Frelimo operavam em
pelotões de seis a doze homens - reunindo-se em destacamentos para os
ataques de maior dimensão - e assediavam as instalações e rotas de abas
tecimento militares dos portugueses (Opello 1974, 29). Armados pela
China, a União Soviética e a Europa Oriental, muitos guerrilheiros da Fre
limo possuíam armas mais sofisticadas do que as das tropas portuguesas
contra quem lutavam (Henriksen 1978,32). Em todo o caso, as minas ter
restres eram responsáveis por dois terços das baixas portuguesas, gerando
psicose das minas e uma postura defensiva e estática nas tropas coloniais
(Henriksen 1983:44; Monlcs 1990,73). Normalmente, as patrulhas portu
guesas não se afastavam muito das suas bases - situadas ao longo do rio
Rovuma, na cidade de Mueda e na missão de Nang’ololo - e regressavam
pouco antes do anoitecer. Quando se aventuravam mais longe, os portu
gueses eram sujeitos àquilo a que Frelimo chamava «flagelação» - embos
cadas rápidas e súbitas, que produziam um número reduzido mas cons
tante de baixas (Monlcs 1990, 71). Depois de atacarem, as unidades da
Frelimo desapareciam imediatamente no mato circundante. As contrame
didas, severas mas esporádicas, dos portugueses, que se abatiam sobre as
concentrações de civis suspeitas de acolherem ou apoiarem os combatentes
da Frelimo, só serviam para gerar um grande número de refugiados, que
fugiam para a Tanzânia e eram, muitas vezes, recrutados pela Frelimo.
Em 17 de Maio de 1970, o General Kaúlza de Arriaga - um perito em
guerra de guerrilha, que estudara com especialistas de contra-insurreição
americanos para aprender as tácticas utilizadas na Guerra do Vietname -
chegou a Moçambique, jurando que a sua «Operação Nó Górdio» aca
baria com a Frelimo até ao final do ano. Kaúlza de Arriaga utilizou trac
tores de terraplenagem e pulverizadores de desfolhantes para abrir uma
rede de corredores de vigilância na densa mata do planalto. Lançou bom
bas de napalm sobre alvos de guerrilha e civis, e recorreu a um forte apoio
aéreo para proteger os mais de 35 000 soldados portugueses envolvidos
em missões de limpeza de «busca e destruição». Ao fim de alguns meses,
porém, os custos operacionais, a fadiga do exército e a habilidade com
que a Frelimo escapava a estes ataques levaram os portugueses a empreen
der missões de limpeza menos dispendiosas (e menos eficazes) a pé,
apoiados por bulldozers e rebenta-minas que não conseguiam avançar mais
de cinco a dez quilómetros por dia (Monks 1990, 97).
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1A pedra angular destes projectos eram os aldeamentos - aldeias planificadas que, su
postamente, deveriam assegurar cuidados de saúde, água potável e educação aos seus ha-
bitántes, mas que, de facto, constituíam pequenos povoados estratégicos. Construíram-
-se muitos aldeamentos na parte sul de Cabo Delgado, mas na parte norte do distrito
colonial só foi construído um pequeno número (em redor da cidade de Mueda e ao
longo da fronteira tanzaniana), apesar dos ambiciosos planos de fazer aldeamentos ao
longo de todo o rio Rovuma (ver Opello 1974,33; Calvert 1973, 83).
2 Lan (1985,7) menciona a utilização desta técnica pelas forças rodesianas na guerra
da independência do Zimbabué.
3 Muitos entrevistados insistiam que as palavras de Lázaro Nkavandame eram cuida
dosamente formuladas para transmitir uma mensagem oposta à que os portugueses pre
tendiam. Quer fosse verdadeira quer não, esta percepção indicava não só a recusa po
pular em acreditar na campanha de aviltamento da Frelimo contra Nkavandame, mas
também o persistente empenhamento da população na ideia da luta armada pela inde
pendência.
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Jogos mortíferos de esconde-esconde
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12 Noutro local (West 2003a), escrevi mais demoradamente sobre o aparelho de segu
rança da Frelimo e a violência contra os moçambicanos durante a guerra da indepen
dência.
13 Kriger (1992, 156) apresenta relatos semelhantes da execução de pessoas suspeitas
de traição pelos guerrilheiros zimbabueanos.
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Capítulo 16
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Revolução, ciência efeitiçaria
2 Ver descrições dos serviços sociais que a Frelimo prestava aos civis nas suas zonas li
bertadas em Melo etal. (1974); Gabriel e Stuart (1978); Negrão (1984); Johnston (1989).
3 Em 1981, o presidente Samora Machel declarou: «A vitória do Socialismo é uma vitória
da ciência, ele é elaborado e organizado cientificamente.» (citado em Pitcher 2002,76)
4June Nash (1993 [1979], 159) menciona a utilização de uma linguagem semelhante
pelos organizadores dos sindicatos nas minas de estanho bolivianas, para criticar as cren
ças dos mineiros num Deus protector.
5 O relativo êxito da Frelimo nessas iniciativas distingue a sua rebelião armada de m o
vimentos com o as H oly Spirit Mobile Forces [Forças M óveis do Espírito Santo] no
Uganda, descritas por Behrend (1999), cujos líderes não só muniam os seus combatentes
de armaduras rituais, mas também os proibiam expressamente de se protegerem quando
atacados (57), atribuindo as baixas no campo de batalha ao incumprimento dessas regras
e à feita de fé que este revelava.
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K u piliku la
6 Pelo contrário, Niehaus (1998; 2001) descreve casos em que os «camaradas» do Con
gresso Nacional Africano (ANC) na África do Sul do tempo do apartheid agiam, efecti-
vamente, com o caçadores de bruxos, no seu esforço para consolidar o apoio popular,
não obstante os dirigentes do A N C terem proibido tais actividades. N os processos ins
taurados por esses camaradas, os acusados de bruxaria eram <mecklaced» (isto é, espanca
vam-nos e enfiavam-lhes um pneu pela cabeça, que depois regavam com gasolina e in
cendiavam).
7 Dinum ba são cabaças usadas para misturar e transportar substâncias mágicas.
8 Yangele, «adivinhação».
9 Mueggler(2001,164) descreve tentativas semelhantes dos dirigentes comunistas chi
neses para abolirem os festivais associados ao sistema de chefia ts’ici.
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Revolução, à ên á a efeitiçaria
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12 Em 1963, muitos dos membros cujos nomes figuravam nós dois registos que caíram
nas mãos da PIDE foram presos e torturados (West 2003a).
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Revolução, ciênria e feitiçaria
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gunagwela (para garantir que ele seria bem recebido pelas pessoas à sua
volta) e que realizara um ritual para defender a sua «casa» e os alimentos
que comia contra os feitiços. Outro nkulaula, de nome Dodo Nindo,
também já falecido, teria fornecido a Samora lukalongo hia ntumi (gar
ganta de leão, para garantir que ele seria escutado e temido), lyungu lya
ntumi (saliva de leão, para lhe garantir força e longa vida), e lulimi Iwa
ntumi (língua de leão, para garantir que as suas ordens seriam escutadas
e obedecidas) - substâncias que outrora estavam, todas elas, exclusiva
mente associadas a anciãos macondes poderosos, como os vahumu, que
eram reconhecidos como feiticeiros competentes por direito próprio.23
Os habitantes do planalto que interpretavam as acções dos dirigentes
da Frelimo à luz do esquema de pensamento da uwavi não viam qualquer
contradição no comportamento destes dirigentes. Na verdade, aquilo
que viam e ouviam reforçava, de um modo geral, as suas convicções de
que a guerra se travava, simultaneamente, nos reinos visível e invisível.
Ao condenarem, simultaneamente, a feitiçaria e o tráfico de substâncias
mágicas, as autoridades da Frelimo agiam de forma muito semelhante à
que as figuras de autoridade do planalto sempre tinham adoptado. Da
mesma forma que, outrora, os chefes de povoação ficavam, à noite, junto
da shitala no centro da povoação a desafiar os feiticeiros e a ordenar-lhes
que parassem de fazer feitiços, sob pena de enfrentarem a ira dos anciãos,
erguiam-se agora os oficiais da Frelimo perante as assembleias (muitas
vezes realizadas à noite), bradando que a feitiçaria era «um problema» -
que ela (ou pelo menos as conversas sobre ela) punham os moçambica
nos uns contras os outros, quando deveriam, em vez disso, concentrar-
-se num inimigo comum.
Claro que os dirigentes da Frelimo não se limitaram a dizer que a
uwavi era «um problema». Rejeitaram-na como superstição e condena
vam os que dela falavam como promotores do «obscurantismo». No en
tanto, mesmo estas afirmações tinham um precedente. Não desprezara
Malapende a uwavi dos seus inimigos, juntamente com as tropas portu
guesas que cercavam a sua povoação, como meros «produtos da imagi
nação»? À semelhança de Malapende e dos que o seguiram na batalha
contra os mortíferos produtos de imaginação de Mbavala, muitos dos
residentes do planalto em guerra contra os portugueses, décadas depois,
243
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24 Kohnert (1996, 1351) nana uma reacção popular similar à retórica antiobscurantista
do Estado no Benin. C£ Humphrey (2003): os budistas Buryati interpretaram a campanha
de Estaline contra o Budismo como a concretização de uma saga budista, nomeadamente
a reincarnação do Elefante Azul, cuja destruição do Budismo por três vezes fora profetizada.
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Revolução, ciência efeitiçaria
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26 Kriger (1992,116-169) sugere que o medo que os zimbabueanos rurais sentiam dos
soldados do ZANLA impossibilitava a existência de um verdadeiro apoio popular à luta
de guerrilha.
246
Revolução, ciência efeitiçaria
247
K u p ilih d a
fazer essas visitas pela fé no poder dos curandeiros de Mueda, mas também
os pode ter visitado para os apaziguar, bem como aos seus apoiantes, ou,
cinicamente, para manipular as convicções locais e consolidar o respeito
(ou o medo) popular em relação a si próprio. Não podemos ter a certeza
de que Machel foi sequer tratado dentro das cabanas dos curandeiros que
se sabe ter visitado. Sabemos seguramente, no entanto, que ele entrou nes
sas cabanas e que até passou a noite na casa de Alabi Makanga, logo após
o fim da guerra. Também podemos estar certos de que Machel compreen
dia que, ao visitar esses curandeiros e, em especial, ao «entrar lá dentro»
com eles - eufemismo local para «procurar tratamento» - facilitou muito
as suposições populares de que estava «bem protegido».
Em todo o caso, tal como os padres de Montfort se apresentaram aos
habitantes do planalto como portadores de uma visão transcendente do
mundo, o mesmo fizeram os dirigentes da Frelimo, quando pregavam con
tra a feitiçaria nas zonas libertadas. À semelhança do que antes tinham
feito os padres de Montfort, que condenavam as pessoas pela sua ignorân
cia e superstição, os dirigentes da Frelimo ergueram-se no meio delas e pro
clamaram, essencialmente: «Nós estamos a ver-vos! Sabemos quem sois
(camponeses sem consciência de classe revolucionária)! Sabemos o que
julgais ver no mundo (feitiçaria)! Mas nós vemos o vosso mundo mais cla
ramente do que vós (através das lentes do socialismo científico)!»
Tal como sucedera com os padres, muitos habitantes de Mueda acre
ditaram nas afirmações dos líderes da Frelimo de que possuíam uma visão
transcendente, entendendo-as, simultaneamente, no contexto do género
discursivo da uwavi. Ao concluírem que esses líderes eram feiticeiros po
derosos, os habitantes locais reafirmaram, ironicamente, o seu próprio
ponto de observação transcendente, invertendo (kupilíkula:) o discurso
do socialismo científico com as suas (contra)interpretações, mesmo
quando negavam (como todos os feiticeiros) a força das suas próprias vi
sões para construírem o mundo.
248
Capítulo 17
Reescrevendo a paisagem
•
249
K u piliku la
250
Reescrevendo a paisagem
251
K u p ilik iã a
L. Nnngade
• Aldeias
Nangadc — Estradas
......Curvas de nível em metros
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Mapa 4
Aldeias comunais pós-independência
252
Reescrevendo a paisagem
mais estas figuras, como oportunistas corruptos que, na era colonial, ti
nham beneficiado pessoalmente das suas funções como cobradores de
impostos, recrutadores de mão-de-obra e agentes policiais locais (Macheí
1985, 5). Aquando da independência, a Frelimo procurou excluí-las de
todos e quaisquer cargos de autoridade. Na primeira sessão do Conselho
de Ministros, em 1975, as chefias tradicionais foram sumariamente abo
lidas (People’s Republic o f Mozambique 1990 [1975], 4; Monteiro 1989,
14; Sachs e Honwana Welch 1990, 58-60; Meneses etal. 2003,352).2
Os dirigentes da Frelimo reconheciam que a transformação da lógica
e do funcionamento do poder a nível local exigia que se transformassem
as condições da sua prática. A concentração em aldeias foi, por isso, con
cebida como uma forma de permitir que o partido/Estado da Frelimo
reescrevesse a paisagem do poder no Moçambique rural, através da criação
de novas instituições políticas e económicas baseadas nas aldeias, as quais
substituiriam as estruturas de autoridade assentes nos laços de sangue
que a Frelimo considerava serem hierarquias «feudais» (Munslow 1983,
140; Machel 1985, 41, 55, 57; Meneses et al. 2003, 351). As aldeias co
munais deviam constituir a base sobre a qual os «homens novos» de Mo
çambique se governariam através do exercício do poder popular, numa
nova sociedade sem classes (Munslow 1983; Machel.1985,2,43; Egerõ
1987; Hanlon 1990,135-146; Casal 1991). Os aldeões elegeriam os seus
pares para as assembleias populares e estes representariam os interesses
dos aldeões na nação recém-chegada à independência. Também elege
riam juízes para os tribunais populares, que resolveriam os conflitos que
surgissem entre eles. Os assuntos económicos, incluindo a produção agrí
cola e o comércio de bens de consumo produzidos nos centros urbanos,
seriam mediados por cooperativas, cujos dirigentes também seriam eleitos
de entre a população. Tudo isto iria garantir que o poder popular fun
cionasse de forma transparente e racional, no interesse de todos os mem
bros da comunidade - que todos «comeriam bem», como se dizia entre
os habitantes do planalto.
No entanto, os aldeões não exerceriam o poder popular sozinhos.
A cultura de comando da guerra de guerrilha persistiu no interior da Fre
limo depois de a guerra terminar, e foi reforçada pela sua transformação
num partido de vanguarda, em 1977.3 Os dirigentes da Frelimo assumi-
2 Ver também a Lei n.° 1/77, artigo 14.° (publicada no Bóleúm da República).
3 C om o Pitcher (2002,78) faz notar, esta cultura de comando manifesta-se na lingua
gem através da qual a Frelimo governava: lançava «campanhas» de alfabetização e «ofen
sivas» contra a pobreza e a doença, por exemplo.
253
K upilikula.
4 Dinerman (2001) sugeriu que, nas zonas da província de Nampula onde fez inves
tigação, as antigas autoridades gentílicas mantinham, muitas vezes, o controlo dos orga
nismos estatais locais (orquestrando, com frequência, a nomeação de familiares para esses
cargos). Em Mueda, porém, onde a Frelimo se estabelecera no contexto da guerra de
guerrilha, o partido foi mais rigoroso na exclusão das antigas autoridades gentílicas dessas
posições de influência.
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Reescrevendo a paisagem
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Reescrevendo a paisagem
M apa 5
Aldeia de Matambalale e antigas povoações circundantes (cerca de 1994).
As cinquenta e oito povoações cujos habitantes vivem agora em Matambalale
são discemíveis, na paisagem do planalto, pelos aglomerados de árvores que ou-
trora davam sombra às suas casas.
1. N tum bati 12. N tam ba 24. Woyo 36. M pelo 48. Nanda
2. Shimbola 13. Namakate 25. N andang’a 37. Likabaleni 49. Koio
3. Malipudya 14. M ashaninga 26. Nauli 38. Tendinyama 50. Shiponda
4. N dum usha 15. Shilende 27. Pinda 39. Audulole 51. Nacngo
5. M bum ila 16. Mang’anyuka 28. Sandia 40. Mweva 52. N andondo
6. Mpalakele 17. Liguguma 29. Ng’om a 41. M inga 53. Nyushi
7. Atibu 18. M pupa 30. Kakoli 42. Mwalabu 54. Shoongo
8. Niwanje 19. Makutí 31. Nam osha 43. Tekuno 55. Kwalata
9. M apiko 20. M undum u 32. N ungam a 44. Sheka 56. M buba
10. M papalola 21. Lijega 33. Shileumbutuka 45. N andem bu 57. N am osha
11. Akalimui 22. K undapanango 34. M am ba 46. Ndaigwashana 58. Ng’om a
23. N aunam a 35. Lilandoma 47. N ding’uni
6 Isto aconteceu, claro está, trinta a trinta e cinco anos após terem abandonado as suas
povoações, e vinte a vinte e cinco anos após as chefias tradicionais terem sido oficialmente
abolidas em Moçambique.
7 Ver em West (2001) um tratamento mais alargado das aldeias comunais de Mueda e
da persistência, nestas, das instituições baseadas nos laços de sangue.
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Reescrevendo a paisagem
um meio para realizar a «modernização socialista» nas zonas rurais mas, si
multaneamente, como uma componente da segurança nacional.101
No início de 1977, Moçambique voltou a estar em guerra. Os militares
rodesianos responderam ao refugio concedido aos guerrilheiros do Exér
cito de Libertação Nacional Africana do Zimbabué (ZANLA) enviando
agentes de contra-insurreição através da fronteira para atacar as bases do
ZANLA. Os moçambicanos descontentes com a Frelimo, incluindo mui
tos que tinham combatido contra ela no exército português, foram re
crutados pelas forças armadas rodesianas para se juntarem às forças anti-
-insurreição. Quando o regime de colonos brancos chefiado por Ian
Smith entregou o poder aos nacionalistas zimbabueanos, em 1980, as
Forças de Defesa da África do Sul adoptaram esses agentes e, depois de
lhes darem um treino adicional, reintroduziram-nos em Moçambique
para desestabilizar o regime da Frelimo, que granjeara a inimizade da
África do Sul ao acolher a sede do Congresso Nacional Africano (ANC)
em Maputo. Estes agentes da contra-insurreição transformados em in-
surrectos, que viriam a denominar-se Resistência Nacional Moçambicana,
ou Renamo, visavam agora as infra-estruturas do Estado moçambicano
e aterrorizavam os moçambicanos das zonas rurais (Hall 1990; Morgan
1990; T. Young 1990; Vines 1991; África Watch 1992; Roesch 1992; Min-
ter 1994).
A Renamo estendeu as suas operações a todo o território moçambi
cano, recrutando, por vezes à força, novos soldados nas zonas onde che
gava. No início da década de 1980, já estava na província de Cabo Del
gado. Os responsáveis da Frelimo na região procuraram utilizar as aldeias
comunais como uma barreira ao contacto da Renamo com as populações
locais, muito à semelhança do que os portugueses tinham feito com as
aldeamentos estratégicos que construíram em Cabo Delgado, durante a
guerra da independência. Por isso, quando os habitantes do planalto de
Mueda abandonaram as suas aldeias para regressar às antigas povoações,
os funcionários da Frelimo responderam energicamente.
Embora a Renamo nunca tenha estabelecido uma presença duradoura
na região do planalto, na década de 1980 os habitantes voltaram a sen
tir-se novamente em guerra.11 As autoridades advertiam-nos constante-
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Capítulo 18
A comunalização da feitiçaria
«
«Há muito tempo», contou-nos Limitedi Untonji, «a uwavi wa kuli-
shmgila [feitiçaria de autodefesa] era a mais comum.»
O filho e o neto de Limitedi estavam sentados a seu lado. O neto era
demasiado jovem para entender as palavras do ancião, mas o filho escu-
tava-o com muita atenção. Anteriormente, dissera-nos que ele e a mulher
tinham começado a estudar com o ancião para aprenderem as suas mi-
tela.
«Se as pessoas queriam dançar uwavi na povoação, o chefe da povoa
ção saía e dizia: ‘Aqui não!’ Agora, na aldeia, é diferente.»
O ancião enfatizava as suas palavras apenas com uma inflexão da voz,
pois os seus olhos eram de um branco brilhante e vazio.
«O povo unido do Rovuma ao Maputo!», disse ele. A palavra de
ordem, que fazia referência aos dois rios que constituem as fronteiras
norte e sul do país, era frequentemente pronunciada pelo presidente da
Frelimo Samora Machel, nos primeiros tempos da independência mo
çambicana. «Nas aldeias, os vavi também estão unidos», prosseguiu o al
deão. «De noite, tocam o sino e reúnem-se. Não pertencem à likola de
ninguém.1Esta é a uwavi wa shílikali [feitiçaria do governo]!»
Marcos debruçou-se para a frente no lugar, tocando com respeito o
joelho do ancião cego para lhe chamar a atenção, antes de se lhe dirigir.
«Os vavi usam o sino da aldeia normal?»
O ancião respondeu, sem hesitar: «Só se o presidente da aldeia tam
bém for presidente da noite!»
«Ummm», proferiu Marcos, indicando que entendera o eufemismo.
Depois perguntou-lhe, directamente: «Qual é a diferença entre uma al
deia onde o presidente é feiticeiro e uma aldeia onde não é?»
261
Kupilihda
Quando conversávamos com Limitedi Untonji, aqui retratado com o seu filho-
-discípulo e o neto, lembrei-me do meu próprio avô, cuja visão debilitada sus
citara uma maior sensibilidade e acuidade dos restantes sentidos. Um número
desproporcionalmente elevado dos vakulaula do planalto de Mueda que encon
trámos sofria de cegueira, mas eles «viam» aquilo que as pessoas normais não
podiam ver - o reino invisível.
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A com unalização dafeitiçaria
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Kupitikula
5 Honwana (2002,171) nana com o a proibição pela Frelimo das cerimónias da chuva,
dos rituais de fertilidade e da súplica aos antepassados fora vivida na região Sul do país,
onde ela trabalhava. Conta que, nalguns casos, havia curandeiros entre as pessoas detidas
e transferidas para o Norte do país a título da «operação produção», um programa exe
cutado pela Frelimo em 1983 e que alegadamente visava expulsar os migrantes desem
pregados das zonas urbanas (172).
6 Feierman menciona a posição tomada pelo governo socialista da Tanzânia de que
«o socialismo e a superstição [eram] incompatíveis» (1986,210). Humphrey informa que
os xamãs da Sibéria, da Mongólia e da Manchúria eram «presos e mortos pelos governos
comunistas», que rejeitavam o xamanismo como uma «superstição primitiva» (Humphrey
e Onon 1996,1). Segundo Brandon (1993,101-102), apesar de o Estado socialista cubano
ter demonstrado uma maior tolerância oficial face às «crenças e práticas populares», por
vezes autorizava medidas antagónicas. Karen Brown (1991,378) refere «campanhas anti-
-superstição» recorrentes no Haiti.
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A com unalização dafeitiçaria
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MGeschiere (1997) argumenta que, anteriormente, a feitiçaria era limitada pelas fron
teiras da consanguinidade, mas isso deixou de acontecer em muitos lugares de África.
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Capítulo 19
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A utodefesa e m riqueám ento pessoal
saúde do planalto, tal como os do resto do país, ficaram sem pessoal. A al
ternância entre o excesso e a falta de medicamentos essenciais deu origem
a um mercado negro de medicamentos e levou a população a suspeitar da
existência de grande corrupção entre os técnicos de saúde e os fimcionários
governamentais em geral (Kappel 1994,488; Lubkemann 2001,95).2
Idênticas tendências se observaram na educação (Johnston 1990a;
1990b; Marshall 1993). À medida que o orçamento da educação dimi
nuía, os professores receberam instruções para cobrarem propinas cada
vez mais altas e os alunos passaram a ter de pagar dinheiro pelos manuais
escolares. Depressa surgiram escândalos no sistema escolar de Mueda, à
semelhança do que se passava noutros sítios, por culpa dos alegados des
vios de fundos perpetrados por professores e fimcionários escolares mal
pagos. As escolas, que tiveram um êxito notável no aumento das taxas
de alfabetização entre crianças e adultos, durante a guerra da indepen
dência (Johnston 1984; 1989), tinham mergulhado no caos.
O sofisticado sistema de abastecimento de água construído no planalto
após a independência (U N IC EF1981,1993; Técnica Engenheiros Con
sultores Lda. 1994), e que constituíra um gesto simbólico de gratidão na
cional pelo papel que os habitantes da região desempenharam na luta
pela independência, também deixou de funcionar no final da década de
1980 (Cooperação Suíça 1992; West 1997b, 206-208). No planalto, cor
reram boatos de que os engenheiros do sistema e os funcionários gover
namentais estavam a vender no mercado negro as peças sobresselentes e
o gasóleo necessários para manter o sistema a funcionar. A maior parte
das vezes, porém, esses recursos essenciais não se encontravam, pura e
simplesmente, disponíveis.
Entre os serviços sociais que deixaram de funcionar no período da
guerra civil figuravam também as lojas do povo e as cooperativas de pro
dução e consumo (Oficina de História 1984; Egerõ 1987; Littlejohn
1988). As graves carências privaram a maioria dos habitantes do planalto
de meios de produção agrícola essenciais, como enxadas e sementes, e
de bens de consumo básicos, como o açúcar, o sal, o óleo alimentar e o
vestuário. As cooperativas eram dominadas pelo nepotismo e pela cor
rupção, pois os membros da hierarquia utilizavam-nas para controlar o
acesso a bens escassos, que muitas vezes vendiam no mercado negro
(Egerõ 1987; Littlejohn 1988).
2 Van der Geest (1988) sugere que o mercado negro de substâncias mágicas é tão
omnipresente na África contemporânea que constitui uma componente fundamental da
categoria da «medicina tradicional».
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N o caso dessas coisas, não se pode enterrar uma lipande [mina antífeitiço]
lá dentro, com o se fàz num a casa. Assim, com um autom óvel, por exemplo,
é necessário tirar algumas peças e pô-las num saco junto com mitela e enterrá-
-las n o chão num sítio longe. Q uando alguém vier com a intenção de estragar
aquele carro, as m itela chamam a atenção desse feiticeiro para o sítio onde
essa peça está enterrada. Ficam confusos e não conseguem ver o automóvel.
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17 Chabal e Daloz advertem que as elites «que não redistribuem ou que, na opinião
popular, pouco redistribuem, correm o risco de enfrentar hostilidade e suspeição» (1999,
107). N o planalto de Mueda, estas suspeitas encontraram expressão no género discursivo
da tm avi.
18 Para uma análise semelhante, ver Geshiere (1997,6).
19 Goheen (1996,161) descreve a ocorrência de discussões semelhantes entre os nso’
nos Camarões.
20 Geschiere (1997,9,43) menciona a utilização do mesmo termo - «blindados» - para
descrever os feiticeiros nos Camarões.
21 Ardener (1970, 147-148) refere a suspeita alimentada pelos bakweris do Oeste dos
Camarões, no fim do período colonial, de que aqueles que eram relativamente mais prós
peros tinham construído as suas casas de telhado de zinco com o trabalho de escravos
zombies. Simmons (1980), porém, mostra os aldeões comuns, entre os badyarankes do
Senegal, igualmente relutantes em acusar pessoas mais poderosas do que eles.
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Parte III
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Parte III
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Capítulo 20
O «ressurgimento da tradição»
Quando Márcos e eu entrámos na aldeia de Nandimba, numa fria
manhã de Agosto de 1999, as palavras dele ainda estavam frescas na
minha memória: «Sim, mano, esse é um bom tema para a nossa investi
gação. Estas coisas devem ser estudadas cientificamente!»
Fiquei surpreendido, não com a aquiescência de Marcos - pois ele co
nhecia-me suficientemente bem para confiar que eu não levaria a minha
agenda de investigação mais longe do que as condições o permitissem -
mas sim com o seu entusiasmo. Em anos anteriores, eu sentira a neces
sidade de evitar o tema da feitiçaria quando trabalhava com Marcos, um
activo quadro da Frelimo. Em vez disso, explorara prudentemente os
meus interesses pela feitiçaria sozinho ou na companhia de Tissa, um
homem mais jovem e algo menos constrangido pelos princípios da Fre
limo. Em 1999, havia já vários anos que as pessoas falavam em Maputo
sobre o «ressurgimento da tradição»1em Moçambique, e eu estava deci
dido a dar mais realce ao estudo da feitiçaria na minha investigação. No
entanto, apesar de já se terem passado cinco anos de democracia multi-
partidária, eu sabia que o planalto de Mueda continuava a ser «o berço
da revolução».
A excitada resposta de Marcos também indicava uma mudança no
ambiente reinante no planalto. Nas semanas seguintes, eu viria a reco
nhecer as complexidades subtis dessa mudança. Algumas pessoas com
quem trabalhámos afirmavam que «os tempos estavam a mudar» mas,
por entre os tempos de mudança, muita coisa permanecia familiar.
Antes de chegarmos a Nandimba para trabalhar, Marcos e eu tínhamos
cumprido o protocolo, informando o presidente da aldeia da nossa in-
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Kupilikula
com uma lâmina de barbear, uma faca ou uma catana, com a inserção
de substâncias mágicas nos golpes. Ningore prometia que esta técnica
garantiria aos seus clientes uma longa vida e imunidade contra o feitiço.3
Pelos seus serviços, Ningore recebia, alegadamente, pagamentos em
dinheiro, gado e equipamentos electrónicos (Membe 1995). À medida
que acumulava riquezas, os fimcionários provinciais começaram a olhar
as suas práticas com reprovação, mas enquanto o inganga gozou de
grande popularidade, permitiram-lhe que continuasse a trabalhar. O
apoio a Ningore entrou em declínio quando um barco cheio de clientes
seus se virou na baía de Pemba, afogando dezenas de pessoas. Os clientes
de Ningore e o público em geral concluíram, mais ou menos consen
sualmente, que o curandeiro tinha usado o seu poder para fins destruti
vos, causando ele próprio o acidente. Só então o governador da provín
cia, António Simbine, prendeu Ningore, que morreu na prisão pouco
tempo depois.
Porém, o «fenómeno Ningore» - como o jornalista moçambicano Re-
mígio Membe (1995) o apelidou - ressuscitou em 1995, quando um
homem que afirmava ser da aldeia de Namapa, província de Nampula,
apareceu em Cabo Delgado «para terminar o trabalho de Ningore» de
eliminar o feitiço. Os seus seguidores chamavam-lhe «Pergunta Bem»,
mas ele autodenominava-se «Perseguido sem Motivo». Asseverando ter
aprendido os seus métodos com os famosos guerrilheiros Naparamas, que
actuavam na província da Zambézia e dificultavam a vida tanto às forças
governamentais como às da Renamo, no final da guerra civil moçambi
cana (K. Wilson 1992), Pergunta Bem prometia limpar as aldeias e os
bairros urbanos do feitiço, casa a casa. Acompanhado dos seus numero
sos seguidores, a tocarem tambor, Pergunta Bem descia às comunidades
e dançava para identificar os feiticeiros existentes no seio delas. Os seus
seguidores espancavam qualquer pessoa que lhe opusesse resistência ou
contestasse as suas sentenças. Muitos dos que ele acusava de feitiço eram
obrigados pelos vizinhos a fugirem de suas casas e a irem residir para
outro local.
Segundo Membe, que acompanhou o exorcista ambulante, Pergunta
Bem, tal como Ningore antes dele, aceitava pagamentos em dinheiro,
animais e equipamentos electrónicos. Os responsáveis da Frelimo na ci
dade de Pemba tinham o cuidado de não ofender os seus muitos apoian-
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g sw w w -1
Capítulo 21
A reforma neoliberal
e a tradição moçambicana
«Nós queremos que a autoridade tradicional exista.»
As palavras do presidente Chissano chegaram-me à Virgínia, onde eu
estava a escrever a minha dissertação, através do Listserv da Internet.
Quando falou aos meios de comunicação social, depois de se reunir com
um grupo de antigos régulos na província de Niassa, em Junho de 1995,
o líder do partido que duas décadas antes tinha abolido as chefias tradi
cionais declarava agora: «Nós queremos que a autoridade tradicional
exista.» (Mohomed 1995b; ver também Mohomed 1995a)
A declaração de Chissano reflectia e contribuiu para uma transforma
ção drástica do discurso público moçambicano sobre temas que muitos
agora comentavam, como a «autoridade tradicional» ou a «medicina tra
dicional». Forças históricas complexas inspiravam as palavras do presi
dente moçambicano. Desde a subida de Chissano ao poder, o Muro de
Berlim tinha caído, a União Soviética desmoronara-se e a Guerra Fria
chegara ao fim. Tendo deixado de receber auxílio dos aliados do Bloco
de Leste, a Frelimo abandonou a sua identidade socialista, adoptou me
didas de austeridade e, por último, aceitou as condições do FMI para ga
rantir o afluxo de ajuda ocidental. Quando o apartheid deu o último sus
piro e a assistência militar sul-africana à Renamo diminuiu, a Frelimo
também consentiu em liberalizar a política moçambicana, possibilitando
a cessação da luta armada e a transformação da Renamo num partido
político que faria oposição à Frelimo nas umas e não no mato.
No período que antecedeu as primeiras eleições multipartidárias do •
país, a Renamo levantou as questões da «autoridade tradicional» e do
«curandeirismo tradicional». Na verdade, à medida que a Renamo se ex
pandira pelo país, na década e meia anterior, a rebelião não só tinha des
truído todos os vestígios do programa de modernização socialista da
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Kupiltkula
1 M ambo é um termo para «chefe» nas línguas shona faladas nas regiões centrais de
Moçambique, onde a Renamo tinha mais força durante a guerra e de onde muitos dos
seus principais líderes eram originários. Em algumas regiões de Moçambique, a Renamo
utilizava outros termos locais em vez de mambo, mas este termo era aplicado muito para
além das fronteiras da zona em que tinha significado histórico.
2 Englund (2002), por exemplo, apresenta uma descrição subtil dos diversos cenários
presenciados na região de fronteira entre Moçambique e o Malawi, na província de Tete.
3 Manning, de facto, concluiu que «as autoridades tradicionais foram igualmente de
cisivas no forte resultado eleitoral da Renamo» em 1994 (2001,159).
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A reforma neoliberal e a tradição moçam bicana
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7 Para descrições detalhadas do projecto, ver VeneKlasen e West (1996); Fry (1997).
Para uma crítica mais substancial do projecto, ver West e Kloeck-Jenson (1999).
8 Os objectivos destas brochuras são apresentados na primeira da série: Cuehela (1996:
7). Ver também Al fane (1996); Fernando (1996); Mucussete (1996); Nhancale (1996).
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A reforma n eoliberd e a tradição m oçam bicana
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Kupilikula
baseadas nesses laços eram fundamentais para uma sociedade civil mo
çambicana revigorada e uma democracia moçambicana florescente (Lub-
kemann 2001, 90-91).
Entre estes reformadores, figuravam os investigadores do projecto do
NDA, chefiados pela antropóloga sueca de origem brasileira Iraê Bap-
tista Lundin. Nas obras que publicaram, estes investigadores exaltavam
as instituições da autoridade tradicional como uma «afirmação socio-
cultural de Afncanidade» (Lundin 1995,10). As publicações do projecto
apresentavam-nas como tradições duradouras - «costumes e crenças
desde há muito praticados» (Afiica-America Institute 1997,14) - e lou
vavam-nas como tendo uma natureza essencialmente democrática. Lun
din escreveu que as instituições da autoridade tradicional estavam sujei
tas às restrições populares dos conselhos de anciãos, os quais agiam
como «colégios eleitorais», controlando as acções dos chefes - umas
vezes verificando a sua autoridade, outras refreando-a e outras ainda
contestando a sua legitimidade (Lundin 1995, 27; ver também Lundin
1996; Nhancale 1996). Tão nitidamente legítimas e tão nitidamente de
mocráticas eram as autoridades tradicionais, no dizer de Lundin, que
não necessitavam que a sua autoridade fosse confirmada através de con
tendas eleitorais multipartidárias, como alguns propunham, pois obe
deciam aos seus próprios princípios de democracia interna.10 Em vez
disso, Lundin sugeria que o governo se limitasse a identificar essas figuras
e a «reconhecê-las» mediante a distribuição de uniformes, como se fizera
com os régulos no período colonial.
Os reformadores também classificaram os curandeiros tradicionais
como elementos essenciais para uma sociedade civil moçambicana revi
talizada. Muitos salientavam que eles eram detentores de formas carac
terísticas de «saber local» (ou de «saber indígena») susceptíveis de com
plementar outros recursos no contexto do desenvolvimento neoliberal.
Quando visitei o Ministério da Saúde em Maputo, em 1999, um mem
bro do pessoal do GEMT disse-me: «Os curandeiros tradicionais são os
guardiães de uma cornucópia médica moçambicana.» Em Pemba, no
mesmo ano, um responsável da Direcção Provincial de Saúde assegurou-
mente baseadas, têm, pelo menos, potencialidades para assegurar uma articulação positiva
entre o Estado e a sociedade, a exclusão dessas instituições da definição de sociedade
civil não parece particularmente útil.» (1999,110-111) Ver também Durham (1999,196).
10 A maioria dos antigos régulos concordou, evidentemente, com Lundin quando ela
se reuniu com eles, argumentando que a sua legitimidade provinha da sucessão e que
seria posta em causa se os seus subordinados os pudessem destituir por meio do voto
(Mohomed 1996).
300
A reforma neoliberal e a tradição m oçam bicana
11Janzen (1978,62) sugere que tais pontos de vista são comuns entre as elites africanas.
N o entanto, essas perspectivas fazem eco das dos antropólogos médicos e dos etnobotâ-
nicos que trabalham em diversas localidades. O antropólogo médico Sjaakvan derGeest
(1997) alega que essas esperanças justificam as atitudes de abertura biomédicas à medicina
tradicional. Ver também Plotkin (1993,13,236).
12 Semali (1986, 88) e Feierman (1986, 214) descrevem iniciativas semelhantes em
preendidas na Tanzânia socialista, em meados da década de 1970, pela Unidade de In
vestigação de Medicina Tradicional da Universidade de Dar-es-Salam.
13Joralemon e Sharon (1993:163) sugerem que uma investigação semelhante serviu
para legitimar os curanderos do Peru.
14 Edward Green (1994:44-45) alegou também que ainda só era possível obter bene
fícios mínimos da bioprospecção de substâncias medicinais devido ao elevado custo das
análises laboratoriais e dos ensaios farmacêuticos. Sobre esta questão, ver também Cha-
vunduka e Last (1986:255); Pearce (1986:255); Green (s. d.).
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Capítulo 22
Um reconhecimento limitado
«
1 White (1994, 363; 2000, 99) relata que as injecções há muito que suscitam medo e
fascínio em África. Vaughan (1991, 59) sugere que este fascínio levou os africanos a assi
milarem as práticas médicas dos missionários ocidentais nos repertórios dos seus curan
deiros. Pelo contrário, Whyte, van der Geest e Hardon (2002,104-116) não só documen
tam a existência de «injeccionistas» (técnicos não oficiais que utilizam agulhas
hipodérmicas para injectar nos clientes uma grande variedade de substâncias medicinais)
em toda a África contemporânea, com o sugerem que este procedimento está ligado a prá
ticas terapêuticas indígenas muito antigas: «Fazer um corte, ou várias pequenas incisões,
com uma fàca ou lâmina de barbear, e esfregá-los com medicamentos, ainda é comum
em muitos contextos africanos.» (112) Ver também Whyte (1988,220). Em qualquer caso,
a «vacinação» é uma componente comum do repertório de muitos curandeiros africanos
contemporâneos. Ver, por exemplo, Marwick (1950,104); Beattie (1963,42); LeVine (1963,
235); Redmayne (1970:113); Janzen (1989,241); M. Green (1994,37); Yamba (1997,214-
-215); Willis e Chisanga (1999, 138); Ashforth (2001b, 213; 2000, 48,116). Ver também
Wafer (1991, 91) a respeito de práticas semelhantes no candomblé brasileiro.
303
K u piliku la
Depois virou-se para trás para pegar num pequeno frasco cheio de uma
substância negra e pastosa. Usando a lâmina como uma espátula, espa
lhou a substância nas incisões que fizera.2
«O que é isso?», perguntei, referindo-me à substância.
«Mitela», respondeu ele.
«Sim, eu sei», disse eu. «Mas que tipos de mitelah
Quando acabou o par de incisões em que estava a trabalhar, fez uma
pausa para dar uma resposta ligeiramente mais reveladora. «É feita com
várias folhas queimadas e reduzidas a pó.» Esticou o braço para agarrar
um almofariz e um pilão pousados na borda da esteira e mimou com
eles o método que usara para tratar essas substâncias não especificadas.
«Oh, e mais isto», acrescentou, pegando numa pilha AA desmontada.
Talvez prevendo que eu iria perguntar outra vez «De que tipo?», infor
mou voluntariamente: «E do tipo que se usa num rádio».3
Quando Vantila Shingini acabou de tratar a mulher, foi visitado por
outras duas pessoas, que combinaram voltar mais tarde nesse dia. Havia
pessoas que vinham tratar-se de dores nas costas, disse-nos ele, outras
para se defenderem de feitiços. A composição das mitela que usava para
vacinar os doentes dependia da natureza dos males que os afligiam.
Tal como a sua doente, também eu fiquei sentado, imóvel, reflectindo
se o vírus da SIDA ou os da hepatite conseguiriam sobreviver à exposição
ao ácido de bateria.
st**
304
Um reconhecimento lim itado
Vantila Shingini, aqui retratado a vacinar uma doente, tratava quer aquilo a que
chamava «doenças vulgares» (dores de cabeça, de barriga, de costas e de pernas),
quer as doenças relacionadas com a feitiçaria. Tratava as vítimas de feitiçaria e
também as pessoas que se tinham ferido a praticá-la. Muitos dos seus doentes
eram crianças, segundo nos contou. «Às vezes, os feiticeiros dão pedacinhos de
carne humana a comer às crianças, para que também se tomem feiticeiras. Essas
crianças são-me trazidas com dores de barriga, mas eu consigo ver qual é o pro
blema delas pela maneira como me olham, com os olhos muito abertos, inter
rogadores. As crianças podem ser curadas induzindo o vómito ou a diarreia,
mas depois de adultas é tarde demais. Nessa altura, só podemos tentar controlar
o problema.»
305
K u piliku la
4 Agrawal (1995, 430; 2002, 290) faz notar que o «saber indígena» só existe como tal
no momento em que é «validado» por meios científicos e absorvido no conjunto supos
tamente universal do «conhecimento científico». A validação do saber indígena, sugere
ainda Agrawal, é um processo eivado de poder - em que os detentores do saber indígena
estão peipetuamente subordinados aos guardiães da ciência, obrigados a agir como «olhos
e ouvidos» de um cérebro científico (Howes e Chambers 1980, 327). Purcell e Onjoro
lembram-nos que a «tendência ocidental para utilizar o conhecimento científico como o
padrão apriori de todo o conhecimento ‘verdadeiro5é tão antigo como a própria ciência»
(2002,173). Sobre a utilização do conhecimento biomédico como bitola de medição do
conhecimento médico tradicional, ver também Last e Chavunduka (1986, 3); Mac-
-Cormick (1986, 155); Oyebola (1986,230); Greene (1998,640,642); Langford (2002,8).
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Um reconhecimento lim itado
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Um reconheámento lim itado
16 Ver também Fiy (2000,140). Pearce (1986,239) menciona que os técnicos de saúde
da Nigéria demonstravam uma relutância semelhante em encaminhar os seus doentes
para os curandeiros tradicionais.
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Um reconhecimento lim itado
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não estão armados nem lhes é pennxtido espancar pessoas como faziam
na era colonial? Como serão respeitados se não são temidos - se o go
verno que os apoia não é temido, como eram os portugueses? Mas nós
já não queremos governar através do medo.»23 Como o administrador
distrital de Mueda, Ambrósio Vicente Bulasi, teria dito, as antigas auto
ridades gentílicas não estavam preparadas para «governar cientifica
mente».
Alguns dirigentes da Frelimo em Maputo fizeram-se eco destas preo
cupações. O comportamento violento das autoridades tradicionais res
surgidas - muitas vezes motivado e/ou validado por adivinhos, caçadores
de bruxos e/ou curandeiros - desmentiu as afirmações dos reformadores
de que estas instituições podiam ser racionalizadas e incorporadas no
quadro da governação estatal.24 Consequentemente, muitos duvidaram
que a reconstituição da autoridade tradicional fosse compatível com a
«boa governação» e a protecção dos direitos humanos fundamentais25
na nova era democrática, da mesma maneira que os responsáveis da
saúde encaravam com reservas a ideia de colaborarem com os curandei
ros tradicionais. Apesar de uma crescente retórica oficial de tolerância
para com a «tradição» rural, o Estado continuava a manter as autoridades
«tradicionais» a uma certa distância.
É claro que a política partidária também desempenhou algum papel
nesta questão. Como aqueles que reclamavam a autoridade tradicional,
na maior parte dos sítios, tinham sofrido sob o domínio da Frelimo e
muitos tinham sido «reintegrados» pela Renamo, esta última estava agora
318
Um reconhecimento lim itado
319
K u piliku la
28 Ver n.° 2 do artigo 8.° da lei. Alfredo Gamito, ministro da Administração Estatal,
chegou até a afirmar em 1995 que, «de facto, o fenómeno municipal e o das autoridades
tradicionais têm a mesma Lei, pois, quer um quer outro são expressão da vontade comu
nitária da auto-govemação e auto-organização» {Diário de Moçambique 1995). Ver também
Notícias ( m b x , 1995b).
29 N o decreto, prevê-se que os óigãos do governo local «deverão articular com as au
toridades comunitárias, ascultando opiniões sobre a melhor maneira de mobilizar e or
ganizar a participação das comunidades locais, na concepção e implementação de pro
gramas e planos económ icos, sociais e culturais, em prol do desenvolvimento local»
(Hanlon 2000).
320
Um reconhecimento lim itado
30 Meneses etal. (2003, 370,380) relatam vários casos em que o reconhecimento das
autoridades tradicionais pela Frelimo levou a Renamo a condenar essas figuras com o •
«traidoras».
31 Em algumas aldeias, realizaram-se referendos para confirmar a autoridade dos pre
sidentes de aldeia antes de os tomar dirigentes comunais e, por vezes, os aldeões esco
lheram outros candidatos. Esses mecanismos democráticos, na verdade, puseram a nu o
facto de estas figuras não serem autoridades tradicionais na acepção exaltada por Lundin
e outros apologistas.
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Kupilikula
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Capítulo 23
Transcendendo as tradições
«
1 Maia Green escreve sobre os curandeiros pogoros da Tanzânia, que trabalham fre
quentemente com o auxílio de espíritos que habitam em «charcos de profundas águas
paradas numa parte intacta da floresta» (1994,37).
323
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2 Janzen (1992) comenta o papel dos espíritos m ajini nas práticas de curandeirismo na
costa da África Oriental. Boddy (1989,143) menciona os espíritos zayran que se apoderam
das mulheres hofriyati como uma categoria de majini. Willis e Chisanga (1999,147, n. 4)
descrevem a apropriação do termo kiswahili m ajini pelo povo lungu da Zâmbia para de
signar apenas os «espíritos malignos». Gray (1969, 174) conta que, entre os segejus do
norte da costa tanzaniana, não são os m ajini que possuem as pessoas, mas sim uma cate
goria de espíritos denominados shetani. Estes mesmos shetani inspiraram um estilo espe
cífico de escultura entre os macondes que emigraram para a Tanzânia (Kingdon 2002;
West e Sharpes 2002).
324
Transcendendo as tradições
3 Boddy (1989,284-288) informa que os hofriyati também classificam alguns dos zay-
ran que os possuem como «espíritos árabes». O aparecimento de espíritos «estrangeiros»
em ritos de possessão é comum. Ver, por exemplo, Stoller (1995).
4Janzen (1989,239-240) sugere que na África Central e Austral se tem atribuído cres
centes poderes aos espíritos de origens distantes.
5 Boddy (1989,165) informa que os espíritos zayran dos hofriyati também são, geral
mente, «originários de localidades exóticas para a aldeia». Gray (1969,179) anota o facto
de os mganga cantarem «numa língua esotérica, não compreendida pelas pessoas co
muns», durante os seus rituais de cura. Engelke (2004) descreve a utilização de um shona
«profundo» (arcaico) pelos curandeiros do Zimbabué. Ver também Eliade (1964, 347)
sobre a utilização de linguagem esotérica no curandeirismo.
325
K u piliku la
Mbegweka contou-nos mais tarde que começara por ser possuída pelos
espíritos dos seus próprios antepassados, mas que posteriormente passara
a ser possuída por espíritos que os seus doentes - e até ela própria - con
sideravam exóticos.6Acontece que, pouco depois de ter começado a tra
tar os seus próprios doentes, Mbegweka se convertera ao islamismo -
uma religião estranha à maioria dos habitantes do planalto, que apenas
a conhecem das suas viagens à costa de Cabo Delgado (cujas populações
mwani e macua são maioritariamente muçulmanas) ou à Tanzânia (cuja
população maconde é maioritariamente muçulmana). Mbegweka adop-
tou o nome muçulmano de Atija e começou a estudar numa escola islâ
mica para aprender a ler.7
Enquanto os paladinos da medicina tradicional começavam a elogiar
o «saber indígena» no despontar da era neoliberal, Mbegweka e outros
curandeiros de Mueda desafiavam os conceitos de tradição, localismo e
autoctonia de inúmeras formas. As práticas de cura de muitos vahãaula
com quem trabalhámos dependiam da reformulação da «tradição» ma
conde e da transgressão das fronteiras geográficas e cosmológicas pelas
quais a «tradição» podia ser definida.8
Asala Kipande vangloriava-se de ter uma «prática internacional».9Con
fiou-nos orgulhosamente, quando estivemos com ele, que fora à Tanzânia
no ano anterior e que, durante a sua estadia, ingressara numa associação
de curandeiros tanzaniana.10Além disso, Kipande estava a aprender a ler
e a escrever para poder «interpretar» o Corão com os seus doentes. Entre
os macondes de Moçambique, predominantemente cristãos, o islamismo
é algo ao mesmo tempo exótico e que está na moda. «Na sua maioria, os
vakulaula não são muçulmanos», disse-nos Kipande, «mas hoje em dia há
uma tendência crescente para se tomarem muçulmanos.»
6 Quando falava dos espíritos dos seus próprios antepassados, Mbegweka usava o
termo shimaconde mangonde\ quando falava dos outros espíritos que, por vezes, a pos
suíam, utilizava o termo majini.
7 Anteriormente, apenas frequentara uma das escolas do mato da Frelimo nas zonas
libertadas, durante um ano, no tempo da guerra da independência.
8 Ver também Geschiere (1998,821).
9 Os curandeiros azandes já o faziam no tempo de Evans-Pritchard (1967 [1929], 18).
Last (1992, 398) conte que entre os hausas da Nigéria, os remédios «estrangeiros» têm
mais valor devido à sua «estranheza».
10 Para provar o que dizia, Kipande mostrou-nos, para que o examinássemos, um re
cibo n o valor de 500 xelins relativo ao pagamento de cotas a uma organização denomi
nada Tamofa (Associação de Amizade Tanzânia-Moçambique). (Que eu saiba, a Tamofa
não desempenha nenhuma íimção explícita em relação ao curandeirismo tradicional.)
326
Transcendendo as tradições
Mbegweka esperava que passássemos pelo menos uma parte do dia com ela,
quando estávamos na cidade de Mueda, e que a avisássemos de que tínhamos
regressado sãos e salvos após uma viagem. A sua grande autoconfiança permi
tia-lhe competir graciosamente com os curandeiros seus rivais pelas nossas aten
ções. No fim do nosso trabalho de investigação, em 1999, para lhe mostrar a
nossa gratidão pelo acolhimento caloroso que sempre nos dispensou, comprá
mos uma cabra para ser abatida e consumida numa festa organizada no seu re
cinto. Mbegweka convidou outros membros da Ametramo, bem como os seus
doentes. O facto de ser anfitriã desse evento consolidou o seu prestígio, que já
era considerável, no mundo dos curandeiros de Mueda.
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11 Atkinson sugere que entre os xamãs wanas também «se dá grande vaJor à busca de
novas e poderosas formas de conhecimento» (1989, 65).
328
Transcendendo as tradições
Júlia Nkataje informou-nos que, todas as noites, lhe diziam em sonhos onde
deveria ir buscar a água onde fervia os seus escritos curativos.
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disse-nos Júlia, não sabia ler o Corão. A própria Júlia era analfabeta e,
ainda por cima, não era muçulmana. Mesmo assim, as suas anotações -
escritas da esquerda para a direita e de cima para baixo - faziam lembrar
vagamente a escrita árabe. Questionei-a a este respeito.
«Não é o Corão que eu escrevo», disse ela.
«O que é então?», perguntei. «Tem algum significado?»
«Sim», respondeu ela com convicção. Depois sorriu e acrescentou:
«Mas eu não sei o que significa.»
Quando chamou os doentes reunidos no recinto para que se aproxi
massem, informou-nos de que, na verdade, era cristã: «A Virgem Maria
apareceu-me quatro vezes», afiançou, a título de confirmação.
Os doentes faziam agora fila junto ao alpendre. Como havia quatro
copos, eram tratados em grupos de quatro. Ajoelhavam em frente dos
copos e pegavam-lhes. Ao beberem, em conjunto, faziam o sinal da cruz
sobre o coração.
Parecia-me absurdo classificarJúlia como uma «curandeira tradicional»
no contexto de Mueda, visto não usar quaisquer mitela. Interroguei-me,
até, por que critérios os habitantes do planalto determinariam que ela
era uma nkulaula legítima e não uma charlatã, pois as suas práticas eram
muito diferentes das de todos os outros vakulaula que eu conhecera.14
Perguntei a Júlia se o seu trabalho já tinha sido criticado por alguém, no
meadamente pelo governo. Respondeu-me que, muito antes de o go
verno local ter começado a registar os curandeiros, ela pedira documentos
para legalizar a sua prática. «O administrador distrital respondeu man
dando dizer às autoridades da aldeia para me protegerem», garantiu-nos.
Por ironia, Júlia era talvez a curandeira mais concorrida do planalto.
O seu recinto era um local muito mais animado do que o mercado no
centro da aldeia. No interior da cerca de bambu que delimitava a sua
propriedade, mais de dez pessoas descansavam em sombras dispersas,
enquanto quase o dobro se atarefava em redor de uma grande casa em
construção. Todas essas pessoas eram suas pacientes, segundo nos infor
maram. Algumas estavam «internadas», residindo durante dias, semanas
ou mesmo meses a fio no dormitório com dezoito camas contíguo à sua
casa. Outras vinham consultá-la de dia e voltavam para casa à noite. As
que estavam em condições de o fazer trabalhavam para ela em troca dos
14 Langford (2002, 188-230) apresenta uma descrição fascinante das suas tentativas
para discernir como as pessoas com quem trabalhava distinguiam os curandeiros aiurvé-
dicos «genuínos» dos «charlatães». Esta investigadora observa que, quando aplicado, todo
e qualquer critério por si testado se revelou problemático.
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18 São comuns os curandeiros da região que afirmam conhecer curas para a SIDA.
Ver, por exemplo, Probst (1999).
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Transcendendo as tradições
25 Ver também Greene (1998,653), o qual sugere que, enquanto os técnicos biomédi-
cos tentavam «cientizar» os xamãs aguarunas, estes xamãs «xamanizaram», na verdade, a
ciência biomédica.
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Capítulo 24
Saberes incertos
»
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Saberes incertos
estivesse a ser tratado por eles, mas Eusébio fugia sempre dos recintos
dos seus curandeiros, para regressar bêbado ou pedrado.
Era esse o estado de Eusébio quando me fez a sua pergunta, na opor
tunidade momentânea que lhe fora facultada pela saída de Felista de
junto da reconfortante fogueira que ardia no recinto do curandeiro. Pou
sou-me a mão no ombro e soltou a primeira palavra.
«Russo», disse ele.
Balançou ligeiramente a cabeça, fazendo uma pausa, para me permitir
apreciar a gravidade do que me ia perguntar. Continuou então, medindo
lentamente as palavras.
«É uma .ciência?», perguntou, deixando a sua voz em suspenso por
instantes. «Ou é uma droga?»
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7 Horton (1993, 320-327) defende que paradigmas com o a feitiçaria são utilizados
com o «teorias secundárias» para «explicar, prever e controlar» o mundo, quando as «teo
rias primárias» não conseguiram fazê-lo.
8 Ver também Pigg (1996,161); Langford (2002,200).
9 Van Dijk (2001,106) informa-nos que, alegadamente, os bruxos do Malawi fazem
aviões com esqueletos humanos e usam sangue humano como combustível. Pelo con
trário, Gottlieb (1992,127,132) diz-nos que os benges da Costa do Marfim consideram
que as máquinas fotográficas, as máquinas de escrever, os automóveis e os aviões são in
venções dos bruxos ocidentais: «Quem, se não um bruxo, poderia inventar [tais coisas]?»
10 Com esta afirmação, Makwava alterou o sentido das palavras escritas por Charles
Taylor: «Aconteça o que acontecer / N ós temos / A arma Gatling / E eles não têm.» (ci
tado em Pels 1998,203)
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Saberes incertos
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15Whyte (1997,24) indica que, por razões com o estas, os nyoles manifestam «subjun-
tividade» nas suas afirmações sobre a doença, o azar e as forças ocultas.
16 Werbner (2001, 193) e Ashforth (2001b, 217) fazem afirmações semelhantes.
Humphrey e Onon (1996:5) salientam que o conhecimento xamânico é sempre «pardal»
- shinu sboeshoe, «uma coisinha», em shimaconde.
17Ver também Last (1992); Ashforth (1998a, 57); Bastian (2003); Sanders (2003).
18 Cf. Whyte (1997,68,81-82).
19Ver também Kendall (2003); West (2003b); salvo o devido respeito a Kohnert (1996,
1352).
20 Ver também Sanders e West (2003,16).
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Capítulo 25
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A sociedade in á v il do pós-guerra
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A sociedade in á v íl do pós-guerra
Sanders 2001). Bailey (1994) apresenta o exemplo de um empresário bem sucedido, numa
aldeia indiana, que acaba por ser destruído por acusações de feitiçaria (5); descreve a sua
história com o «o pesadelo de todos os planeadores e promotores do desenvolvimento
liberais e defensores da livre iniciativa, que os Estados Unidos semearam pelo Terceiro
Mundo da década de 1950 em diante» (206). Ver também La Fontaine (1963,217); Mac-
-Cormick (1983,58); Geschiere (1997,143,147).
3 Gable (1997) sugere igualmente que, embora o receio do castigo sobrenatural suscite
tentativas de «dissimular o que se tem de seu» entre os manjacos da Guiné-Bissau, as pes
soas também escondem a vergonha de não possuírem nada que possa verdadeiramente
causar inveja.
4 Geschiere (1988,49) cita responsáveis camaroneses que afirmam que «os aldeões estra
gam tudo com os seus feitiços» (ver também Fisiy e Geschiere 1990,143). Em Mueda, con
tudo, eram os próprios aldeões que o sugeriam, presumindo a existência de malevolência
por parte dos vizinhos e parentes (como também é referido em Ashforth 2001a, 17).
353
K u piliku la
5 A água (ou a falta deste recurso essencial) proporciona um terreno fértil para expres
sões ocultas de vulnerabilidade e suspeita. Serra (2003) narra a história de habitantes da
província moçambicana de Nampula, que atribuíam à colocação de comprimidos de
cloro nos poços locais pelos responsáveis da saúde e o pessoal das organizações de ajuda
o surto de cólera que estes diziam pretender controlar. Serra conclui que tais manifesta
ções não se devem tanto a uma resistência à modernidade com o à frustração causada
pelas suas promessas vãs (91). Em todo o caso, no exemplo descrito por Serra, bem como
no planalto de Mueda, é possível afirmar que essas manifestações fomentam um clima
desfavorável «ao trabalho de desenvolvimento».
354
Capítulo 26
355
Kupilikula
va-me agora até que ponto seria genuína a aceitação de Mpachoka. Per
guntei a mim mesmo se as palavras dele seriam as de um «verdadeiro
crente» ou as de um político arguto, no ambiente neoliberal emergente,
caracterizado pela «tolerância» face à «tradição» moçambicana?
A conversa orientou-se para um caso ocorrido em Mwambula no ano
anterior e de que eu só tomara conhecimento poucos dias antes, por ou
tras pessoas com quem falámos. Mpachoka apresentava-me agora a sua
versão.
«O tipo era um antigo combatente», disse Mpachoka, que também
combatera na guerra da independência: «Vivia aqui em Mwambula, mas
ia a pé para Chitashi, onde tencionava apanhar uma boleia para Pemba,
para ir receber a sua pensão de antigo combatente. Ao que parece,
quando ia a passar pelas terras baixas,, foi atacado por um leão. As pessoas
descobriram o seu corpo dilacerado e seguiram um rasto de sangue até
encontrarem o leão. O homem era grande e forte. Tinha ferido o leão
com a sua faca antes de a fera o matar.»
Mpachoka olhou para mim como se estivesse a decidir se devia ou
não interromper ali a sua narrativa. Devolvi-lhe o olhar, interrogativa
mente, dando-lhe a entender que sabia que a história não ficava por ali.
Ele prosseguiu.
«Quando o leão foi morto, viu-se que, afinal, era um ancião da família
do homem.»
Em conversas anteriores sobre aquele caso, já me tinham contado que
a carcaça do leão assumira a aparência de um dos anciãos da família da
vítima e que os parentes chamados para ir buscar o cadáver desta viram
e reconheceram esse membro da família.
«Porque é que o ancião atacou o homem?», perguntei.
«Por inveja», respondeu Mpachoka. «O tipo ia buscar os cheques da
pensão de antigo combatente. Tinha coberto a sua casa com um telhado
de zinco.1Tinha a vida muito bem organizada.»
Ficámos calados, por momentos, reflectindo sobre a tragédia, até Mpa
choka quebrar o silêncio. «Este tipo de coisa é comum. Ainda há uns
dias, aqui em Mwambula, um homem saiu a correr de casa, em plena
luz do dia, a gritar que outro tipo tinha abatido o seu helicóptero.»
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D em ocratização e/d o uso d a força
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D em ocratização e/do uso da força
vel. Leão nunca tomou o homem como sua principal presa. Que leão é
este que ataca pessoas de forma repetida? Quando leão está faminto,
ataca, por azar, apenas uma pessoa para se alimentar, e daí abandona a
zona residencial, contrariamente ao que aconteceu desta vez. Por isso é
um facto inexplicável.»
Dizia-se que algumas das feridas das vítimas pareciam ter sido feitas
por facas. Os caçadores que perseguiram os leões afirmaram que as pe
gadas de patas se transformavam em pegadas humanas, ou em marcas
de sandálias. Correram boatos de que tinham sido encontradas cartas
onde se proclamava: «Não nos matarão. Somos demasiados.»
Pedro Agostinho, também de Namakandi, disse à Limbombo: «Reu
níamos muitas vezes. ‘E também, eu dizia aos velhos mais velhos per
guntando esta situação, como que é?’ ‘Se houver uma pessoa que sabe
na verdade que esse leão é leão magico, é bom nos dizer e sempre deve
chegar a nos informar que o tal está a fazer isso. Então o governo vai
tomar medida antes de fazer’. Mas nada. Não dizia nada. Também os ve
lhos só ficaram admirados.»
Ainda mais chocante para a maioria dos habitantes - mais «inexplicá
vel» (embora desse origem a várias explicações) - era a «inacção» do go
verno, que nada fazia por sua própria iniciativa. À medida que o medo
se intensificava, os aldeões abandonaram os campos, o que provocou
fome na região. As mulheres só podiam ir buscar água em grandes gru
pos, acompanhadas de homens armados com arcos e flechas. As escolas
reduziram o horário lectivo para as crianças poderem estar em casa a
meio da tarde. Os habitantes fechavam-se dentro de casa antes do pôr-
-do-sol, urinando e defecando em cabaças ou panelas velhas, em vez de
irem à latrina, depois de anoitecer (Limbombo 2003). Mesmo assim, a
matança continuou.
Segundo Pedro Seguro, administrador do distrito de Muidumbe, a ad
ministração distrital não dispunha de armas para caçar os leões e as re
quisições que ele fez não obtiveram resposta. Os aldeões ficaram ainda
mais irritados com o silêncio público de Seguro no decurso de aconteci
mentos tão sinistros. «Uma das grandes falhas do administrador de dis
trito», assegurou-me Limbombo, «foi nunca ter vindo a público condenar
o que estava a acontecer.» Como Seguro não conseguiu resolver a crise
- ou sequer falar dela publicamente - os aldeões decidiram tomar nas'
próprias mãos a resolução da ameaça que sobre eles pendia, linchando
os vizinhos e parentes suspeitos de fabricarem ou de se transformarem
em leões (Limbombo 2003). O jovem Tadeu Jonas, de Mwambula, con
tou a Limbombo que o seu tio foi intimado a comparecer no centro da
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D em ocratização e/do uso da força
social, uma inveja com a qual os próprios «vigilantes» poderiam ter sen
tido emparia, do mesmo modo que a podiam sentir em relação às «am
bições» de «autopromoção» das elites emergentes. Segundo a reportagem
de Limbombo, as pessoas com relativamente mais recursos económicos
eram frequentemente acusadas de feitiçaria quando familiares seus eram
mortos por leões. Quando o seu irmão morreu dilacerado por um leão,
Emiliano Lucas, proprietário de uma banca no mercado de Mwambula,
foi suspeito de o ter morto para fazer dele um lindandosba (escravo zom-
bie). «Uma pessoa ter alguma coisa assim a vender... Isso, muita gente
diz que você tem [magia]», declarou Lucas a Limbomba. Todavia, Lucas
conseguiu espapar ao linchamento, tal como muitos outros suspeitos re
lativamente mais ricos. Em todo o caso, num ambiente em que a uwavi
operava sem peias, fortes e fracos, ricos e pobres, sofriam do mesmo
modo. Qualquer um podia ser atacado, tanto por feiticeiros como por
aldeões «vigilantes» que o acusassem de feitiçaria. Qualquer um podia
ser arruinado, qualquer um podia ser destruído (kupilikula:).
A uwavi, como diziam os habitantes do planalto, «não fazia sentido».
Era esta, pelo menos, a opinião que eles exprimiam assertivamente sobre
a uwavi, enquanto (re)produziam o mundo de acordo com a visão re
cheada de uwavi que dele tinham.
No entanto, para autoridades da Frelimo como Ambrósio Vicente
Bulasi, Rafael Mpachoka e Pedro Seguro, a maior ironia era a seguinte:
apesar do recém-assumido «respeito» da Frelimo pela «tradição», os al
deões de Mueda olhavam-nos com um olhar crítico. A liberalidade dis
tante demonstrada por responsáveis como Seguro em relação às acusa
ções e suspeitas de feitiçaria era interpretada como uma renúncia da
responsabilidade pelo policiamento da uwavi. Na verdade, devido à sua
tolerância do discurso da uwavi, muita gente suspeitava da cumplicidade
deles com feiticeiros maléficos. Muitos supunham que homens como
eles, que certamente sabiam alguma coisa («De outro modo, como teriam
chegado a posições de tanto poder?»), se não agiam como feiticeiros de
construção é porque deviam ser feiticeiros de perigo.9 De facto, antes
de as matanças terem abrandado em Muidumbe, o administrador dis
trital tomara-se o principal suspeito aos olhos da maioria. Os habitantes
de Muidumbe não só pediram ao comandante provincial da polícia e
5 Reconhecendo este mesmo dilema, Ashforth (1998b, 531) alega que o Estado sul-
-afncano pós-apartheid teve, em última análise, de escolher entre reprimir activamente os
bruxos ou ser considerado defensor destes.
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10Muita gente suspeitava que Seguro «vendera» a «três brancos» direitos para atacarem
os habitantes do distrito com feitiços pelo preço de «três sacos de dinheiro». Entre os
«brancos» suspeitos, estava um técnico de ortodontia que trabalhava na missão de
Nang’ololo. Tal com o os técnicos de saúde mencionados por Serra (2003), este técnico
era suspeito de fazer mal às pessoas que a clínica devia tratar, suspeita essa eventualmente
provocada pelo facto de os dentistas removerem elementos dos corpos dos seus doentes.
Por sua vez, Seguro adquirira recentemente o antigo edifício da escola da cidade e estava
a transformá-lo numa pensão, a única do distrito. Quando o visitámos, o edifício estava
cheio de sacas de cereais colhidos nos seus campos. Possuía também um florescente res
taurante no mercado da cidade. Apesar das suas prósperas empresas - ou melhor, pôr
causa delas - muitos desejavam conhecer a verdadeira origem da sua avultada riqueza re
lativa.
364
Capítulo TI
Governando na penumbra
•
Numa fresca manhã de Agosto de 1999, Tissa e eu estávamos sentados
a conversar com Mariano Makwava, presidente da aldeia de Matamba-
lale. Enquanto conversávamos, um dos netos de Makwava - talvez com
sete ou oito anos de idade - dava voltas ao pátio numa trotineta rudi
mentar, feita com pedaços de sucata. Vestindo uma smat-sbirt imunda
com mais buracos do que tecido, o rapaz balançava para cima e para
baixo ao avançar sobre rodas de madeira desigualmente desgastadas.
Makwava, que era presidente de Matambalale desde que eu começara
a trabalhar na região de Mueda, confessou-nos que, nos últimos anos,
vinha achando a sua função cada vez mais difícil. Ao mesmo tempo que
o Estado lhe transferia cada vez menos recursos para satisfazer as expec
tativas dos seus constituintes, dependia cada vez mais dele para consoli
dar a ordem na aldeia. Quando os aldeões apelavam ao Estado para que
os ajudasse a resolver os seus problemas, e quando - em nome da des
centralização democrática - os responsáveis distritais empurravam os pro
blemas de volta para o nível das aldeias, exigindo que aí fossem resolvi
dos, o paradoxo de um Estado que estava simultaneamente ausente e
presente era personificado por presidentes de aldeia como Makwava.
Neste como noutros aspectos, Makwava, à semelhança de outros pre
sidentes de aldeia, ocupava um espaço intersticial nos assuntos locais.
Enquanto os administradores distritais, como Ambrósio Vicente Bulasi
e Pedro Seguro, e os primeiros secretários do partido, como Rafael Mpa-
choka, ganhavam salários que lhes permitiam manter residências na ca
pital provincial, onde podiam investir em actividades económicas, os se
cretários das aldeias não recebiam qualquer pagamento pelos seus
serviços e obtinham os seus meios de subsistência no âmbito da econo
mia da aldeia. Makwava e a sua família cultivavam campos agrícolas,
como os aldeões comuns. Duas vezes por mês, porém, este presidente ia
a Pemba comprar grandes quantidades de bens de consumo essenciais -
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3 Geschiere (in Fisiy e Geschiere 2001, 229) conta uma história similar de um admi
nistrador do governo dos Camarões que admoesta publicamente os aldeões por pratica
rem feitiçaria.
4 U m dos informadores sul-africanos de Ashforth (1998b, 523) também levantou esta
questão. Bailey (1994,3,73,204-205) descreve uma história semelhante numa aldeia in
diana, sugerindo que o acusado, Tuta, era tratado coino um «arruaceiro» em parte por
ter obtido mais sucesso financeiro do que os aldeões estavam dispostos a aceitar num
homem da sua casta - porque ele se tinha «soltado dos grilhões do passado».
5 Tal com o os chefes de povoação do período anterior à independência, Makwava
protegia-se das suspeitas populares de ele próprio ser feiticeiro atribuindo o seu conheci
mento do reino invisível a feiticeiros-consultores.
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Mariano Makwava (à esquerda, a conversar com Eusébio Tissa Kairo) não com
bateu pela Frelimo durante a guerra da independência de M oçam bique, tendo
passado os anos da guerra na Tanzânia. Por este m otivo, nunca teria sido n o
m eado presidente de aldeia n o período socialista da Frelimo. Mais de um a dé
cada depois, porém, a Frelimo escolheu-o para esse cargo devido à sua conduta
equilibrada e hábil diplomacia.
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dacioso, nem na voz do povo que servia. Nem «tradicional» nem «cien
tífico», parecia que Malcwava governava no espaço crepuscular entre o
Estado e os habitantes da aldeia - na penumbra entre o reino visível e o
reino invisível - com toda a destreza que isso exigia.6
6 Quando regressei a Matambalale para fazer uma curta visita, em 2004, descobri que,
de fàcto, Makwava tinha sido substituído no cargo de presidente da aldeia em eleições,
realizadas antes de esse cargo ter dado lugar ao de «dirigente comunal». O vencedor dessas
eleições, Romão Geraldo Nankuta, era um dos catorze candidatos que concorreram con
tra Malcwava. Embora algumas pessoas considerassem este processo como democrático,
havia habitantes de Matambalale que receavam que um dirigente comunal eleito apenas
representasse as pessoas que tinham votado nele, enquanto anteriormente o presidente
da aldeia, tendo sido nomeado pelas autoridades distritais, os governava a todos.
371
Capítulo 28
Reforma constitucional
e suspeita perpétua
«Olha para isto, mano», disse Marcos, com excitação. «Estão a investir
o Papá Chissano como humu\»
Era o primeiro dia em que os candidatos das eleições de 1994 estavam
autorizados a fazer campanha e o presidente da República, Joaquim Al
berto Chissano, deslocara-se a Mueda. Marcos e eu estávamos os dois na
pista alcatroada do aeródromo, com milhares de pessoas vindas de todo
o planalto. Vários grupos corais de mulheres trajando vestidos de cores
alegres, novos e todos iguais, feitos a partir de capulanas, competiam
entre si na demonstração de um apoio entusiástico ao líder da Frelimo,
cantando canções em louvor do «Papá Chissano».
A decisão de Chissano de iniciar a sua campanha em Mueda foi si
multaneamente simbólica e estratégica. Queria lembrar à nação as ori
gens heróicas da Frelimo na luta armada pela independência moçambi
cana e recordar aos habitantes do planalto a filiação histórica que há
muitos anos os ligava à Frelimo. Neste dia, iria falar não em português,
a língua do Estado, mas sim em kiswahili, a língua franca da luta armada
no mato.
Um pequeno grupo de antigos combatentes da Frelimo, reunido na
pista, tinha os seus próprios objectivos simbólicos. Tinha «mobilizado»
a população local nas semanas anteriores, preparado a cidade, construído
o palco para os oradores, ensaiado os grupos corais e exercitado o corpo
protocolar de atiradores. Tinha «entregue Mueda ao Papá Chissano», e
agora queria falar com ele. Depois de descer do avião e de saudar as au
toridades locais e os representantes da imprensa, o presidente viu-se,
inadvertidamente, perante os antigos combatentes. Estes mandaram-lhe
tirar a camisa e depois impuseram-lhe as insígnias de humu (que incluíam
uma túnica, uma fita em tomo da cabeça e uma lança), colocaram-no
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3 Ver Alden (2001, 86-89) para um relato circunstanciado do investimento directo es
trangeiro em Moçambique, no período posterior ao ajustamento estrutural.
4 Hanlon (1991) e Saul (1993) oferecem estimulantes comentários sobre o desafio que
essas tendências colocavam à soberania moçambicana.
5 Hibou refere-se genericamente a este processo chamando-lhe a «privatização do de
senvolvimento», e argumenta que ele anda de mãos dadas com a «erosão da capacidade
administrativa e institucional oficial» e com «um reforço do poder das elites, sobretudo
a nível local» (1999,99-100). Chabal e Daloz descrevem este fenómeno com o a «descen
tralização da corrupção» (1999,105).
6 Ver M. Bowen (1992, 270); Harrison (1999, 543); Alden (2001, 92); Pitcher (2002,
140-178).
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12 Ou seja, os habitantes do planalto de Mueda estavam mais ansiosos por obter pro
tectores políticos do que por mudar o carácter da ordem política (cf. Chabal e Daloz
1999,14,44).
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13 Na mesma linha, Manning assevera que as «eleições podem ... servir para demonstrar
a todos os partidos que, mesmo no auge da intensidade, a competição política obedece
a regras imparciais, mutuamente acordadas, tanto na letra com o no espírito» (2001:166)
- isto apesar de ela própria reconhecer que a transição para a democracia em Moçambique
sofria de feita de transparência (156).
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Reform a constitucional e suspeita perpãu a
23 Englund e Leach (2000), que contestam a ideia de que discursos como o da uw avi
são exteriores a uma modernidade única e a criticam, lembram-nos que os sociólogos da
viragem do século xx estabeleceram uma ligação bem explícita entre modernidade e am
bivalência.
24 Worsley (1968,44) sugere que a ambivalência dos melanésios em relação aos bene
fícios da modernidade europeia se exprimia de fsrma semelhante através dos cultos da
carga. June Nash (1993 [1979], 164) argumenta que os mineiros das minas de estanho
bolivianas exprimiam, ao mesmo tempo, frustração e desejo pelas coisas modernas através
do culto de Supay.
25 Tal como os patamunas descritos por Whitehead (2002,176), os aldeões de Mueda
têm experimentado a modernidade como algo «muito episódico e fugaz, uma série de
espectáculos únicos, com temporadas curtas e produções que depressa terminavam».
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Iff
Epílogo
Linhas de sucessão
«É ali que fencontrarás o novo humu Mandia», informou Marcos, apon
tando para uma casa anichada no entroncamento das estradas de Mui-
dumbe e de Mocímboa da Praia para Mueda, em Lilondo.
«Mandia mudou-se de Nimu?», perguntei.
«Não, não», respondeu Marcos, brincando com a minha confusão.
«Este é o novo humu Mandia!»
«Não entendo», confessei.
Marcos riu-se de mim.
Tinham passado cinco anos desde que, em 1994, visitara pela última
vez o ancião em Nimu, localidade onde ele vivia. Nas muitas vezes que
conversámos nesse ano, Mandia contara-me que a instituição do humu
tinha sido trazida para a região do planalto por cativos macuas, que fora
remodelada para satisfazer as necessidades das matrilinhagens macondes
e que, em dada altura, tinham chegado a existir trinta e seis vahumu na
região do planalto. Descrevera-me o demorado processo de empossa-
mento dos vahumu pelos seus pares, as substâncias mágicas que lhes
davam poder para protegerem o seu povo e resolverem os litígios, e o
papel que desempenhavam na preservação da unidade da lihola. Lamen
tara-se por haver apenas três vahumu vivos na região do planalto, naquele
tempo. Como os outros ainda eram mais idosos do que ele, Mandia re
ceava vir a ser o último a morrer e que já não restasse nenhum humu que
tratasse do seu corpo para o enterramento, facto que colocaria os mem
bros da matrilinhagem em grave perigo de serem atacados pelos preda
dores mortais que o corpo não tratado poderia produzir, quando as subs
tâncias mágicas que ingerira ao tomar-se humu saíssem dele.
«Porque é que agora só há três vahumu, quando dantes existiam tan
tos?», perguntara-lhe eu.
«Quando os vahumu morrem, não são substituídos», respondera-me,
simplesmente.
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Q uando conheci o jovem humu Mandia, este informou-me que o ancião Man
dia, que passava o dia a trabalhar nos seus campos situados nas terras baixas e
dormia à noite num a cabana, se desequilibrara recentemente e caíra na fogueira
em que cozinhava, tendo-se queimado com gravidade. C om o Marcos e eu tí
nham os de partir em breve do planalto de M ueda e a única forma de chegar
junto do ancião era caminhando a pé, não pudem os visitá-lo. Mandia perguntou
se eu conhecia algum tratamento bom para as queimaduras. Fui buscar o m eu
estojo de primeiros socorros e dei-lhe materiais para tratar as feridas do ancião
- partilhando, para variar, um p ouco dos meus conhecim entos médicos.
balagens de preservativos que, nessa altura, eram distribuídas nas zonas ru
rais de Moçambique por uma ONG de saúde pública denominada PSI
(Agha, Karlyn e Meekers 2001; Karlyn 2001). O diabrete e os preservativos
eram denominados «JeitO». Também enquanto escultores, Mandia e os
seus aprendizes tinham insuflado uma nova vida na «tradição» maconde
- o tipo de vida que muitos turistas e clientes das lojas dos aeroportos acha
vam cativante, mas que os críticos de arte ocidentais desaprovavam por
lhe faltar «autenticidade» e dignidade (West e Sharpes 2002).
390
E pílogo
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z
V Zambeze (rio), 69,101,225 n.7.
Vacinação tradicional, 303-304, 305, Zambézia (província), 292.
309,313, 333-334. ZANLA (Zimbabwe African National
Vanomba, Faustino, 211,239. Liberation Army), 259.
Veículos, 275, 342; Zar (cultos), 324.
e elites, 275, 342-343; Zimbabué (v. ZANLA).
e riqueza, 342-343. Zombies (v. escravos zombies).
Vieira e Baptista, 168. Zonas libertadas, 17,52,118,215-219,
Vigilância: 229,238, 386;
dos aldeões sobre os seus Outros: educação nas, 231-233.
436
)
Outros títulos de interesse: ■
■ No planalto de Muèdà, nq Norte de, Moçambique, diz-se que os
A Sociedade Ghope feiticeiros se alimentam das suas vítimas; por vezes «criando»
Indivíduo e aliança leões ou transformando-se em leões para devorarem,
no Sul de Moçambique literalmente, a carne delas. Na sua época socialista, a Frelimo
David J. W ebster
condenou as crenças na feitiçaria e as práticas de contrafèitiçaria
Ao Encontro dos Mambos como «falsa consciência»; Desde que se empenhou na reforma
Autoridades tradicionais vaNdau neoliberal, contudo, o partido, que continua nò poder após três
e Estado em Moçambique ciclos eleitorais, tem «tolerado a tradição», permitindo que a
■Fernando Florêncid
população rural interprete e interaja corrí, os acontecimentos na
Outros Muçulmanos linguagem da feitiçaria. Agora, quando os leões deambulam pelas
Islão e narrativas coloniais aldeias do planalto em busca de presa, os suspeitos de feitiçaria
Lorenzo Macagnó ,
são por vezes linchados.
Vidas em Jogo Nesta etnografia histórica da feitiçaria, Harry G. W est baseia-se
Cestas de adivinhação numa década de trabalho de campo e conjuga as perspectivas da
e refugiados angolanos antropologia e da ciência política para revelar como os habitantes '
na Zâmbia
Sónia Silva
do planalto de Mueda esperam que as autoridades responsáveis
vigiem o reino invisível da feitiçaria e revertam («kupilikula») os
A Persistência da História ataques destrutivos dos feiticeiros, praticando, elas próprias, uma
Passado e contemporaneidade forma construtiva de contrafèitiçaria. -
em África
Clara Carvalho
Kupilikula argumenta que, quando as políticas neoliberais
João, de Pina Cabral fomentam a divisão social em vez de garantirem a segurança e a
(organizadores) prosperidade, as populações do planalto usam o discurso da
feitiçaria para avaliar as reformas e por vezes para as reverter,
contrapondo visões alternativas de um mundo transformado.
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