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FROM THE

J. HUNTINGTON WOLCOTT FUND

Established in 1891 by Roger Wolcott (H. U. 1870), in


memory of his father, for “the purchase of books of
permanent value, the preference to be given to
works of History, Political Economy, and
Sociology,” and increased in 1901 by
a bequest in his will.
UMA EPOCA ADMINISTRATIVA
DA -

MADEIRA E PORTO SANTO, º |

Contar do dia 7 de outubro de 1846.


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PUBLICABA

POR

*ERYULo DRUMMOND De MEvezes

SECRETARio GERAL Do Govenxo Civil. Do FUNCHAi.

FUNCHAL — NA Typ. NacioNAL,

1849.
UMA EPOCA ADMINISTRATIVA

DA |- •

MADEIRA E PORTO SANTO, º

Contar do dia 7 de outubro de 1846.

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.…………
POR

Seiyuu, Daviruoso pe Meyezes

SECRETARIo GERAL Do GovFRNo Civil. Do FUNCIIAi.

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FUNCHAL — NA TvP, NACIONAL,


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1849.
27 Arº
gº" *#
JAN 13 1919
É/BRARY
A OS LEITO RES.

Sobre a Administração do Exmº Conse


dor Civil
lheiro JosédoSilvestre
DistrictoRibeiro,
do Funchal, foram ja
como Governa •

publicados os seguintes opusculos:


1.° — Collecção de Documentos relativos
ao Asylo de Mendicidade.
2."—ldem a respeito da Ponte do Ribei
r0 Secco.
3.° — Idem a respeito da Crise da Fome,
porque passaram as Ilhas da Madeira, e Por
to Santo no anno de 1847.
Nestas Collecções encontrão-se os mais au
thenicos elementos para a historia adminis
trativa deste Districto, no periodo que decor
rê desde 7 de Outubro de 1846; como po
rém se refiram a factos e acontecimentos par
ciaes, haveria uma grande falta, para bem
se escrever ou avaliar aquella historia, senão
fossem publicados os muitos actos, essencial
mente administrativos, que no mesmo periodo
tiveram logar.
Esta lacuna começo eu a encher agora ,
oferecendo ao Pablico o 1º volume de uma
obra em que hão de ser transcriptas as peças
oficiaes relativas aos variados pontos adminis
trativos em toda a sua extenção e desenvol
vimento; acrescentando-lhe, para dar varie
dade á Collecção, alguns escriptos litterarios,
politicos, e economicos, que o mesmo Ma
gistrado publicou durante a sua administra
Ça0. • •

Fsta obra, bem como as Collecções ante


riores, sobre apresentarem o maior interesse
como estudo de administração pratica, hão de
um dia servir de grande auxilio para a his
toria da Madeira, fornecendo noticias, que
ordinariamente se buscão em vão, porque a
nossa natural indolencia deixa de registar o
de que convem guardar lembrança. •

No 2.° volume espero excitar ainda mais


a curiosidade dos Leitores, apresentando no
ticias oficiaes sobre assumptos importantes,
taes como o reparo e recunstrucção de Igre
jas, o impulso vigoroso dado ás grandiosas
obras do Rabaçal e Estrada para Camara de
Lobos, a animação dada á industria e á agri
cultura, residencia de Augustas persona
gens &c. &c.
Penetrado da convicção de que presto aos
presentes e aos vindouros um bom serviço, e
querendo deixar assignalada na escriptura, do
mesmo modo que o fica nos factos, a admi
nistração do Conselheiro José Silvestre Ri
beiro no Districto do Funchal, me animei a
publicar esta Collecção oficial, que procuro
concluir.

Funchal 2 de Dezembro de 1849.

Servulo Drummond de Menezes.


INDICE dos assumptos a que se referem as peças
oficiaes, e outras que contem este primeiro volume.

Agricultura . . . . 257 3 293

Artigos Litterarios . . . . 489 3 518

Associações Agricolas . . . 477 3l 488

Assumptos Policiaes. . . . 455 3 468

Assumptos Politicos . . . 541 3 601

Assumptos Relativos a Estabeleci


mentos de Beneficencia . 519 540

Cadeias, Sustentação de Prêsos 136 163

Emigração (dos Madeirenses pa


ra Demerara) . . . . . 92

Expostos . . . . . 417 422


Fazenda . • • 388 417

Funcções e Gerencia Municipaes 601 633

Illuminação das rúas 341 356

Instrucção Publica . . . 423 454


Junta Geral de Districto . 634 638
Obras Publicas . 164 256

O Clero e Templos, Estabeleci


mentos pios e religiosos . . 136
Posse . . . :
Protecção aos Povos. . 385 388

Provimentos dos Logares de Se


cretaria do Governo Civil . , Pag. 356 a 374
Questões Economicas e Commer
cio . . . . . . . . . « 294 a 340
Regulamentos d'Incendios . . . « 375 a 384
Saude Publica . . . . . . « 468 a 476
DECRETO DE NOMEAÇÃO.

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Attendendo ao merecimento e mais partes que


concorrem na pessoa do Conselheiro Joze Silvestre
Ribeiro: Hei por bem Nomeal-o para Governador
Civil do Districto do Funchal. O Presidente do Con
selho de Ministros, Ministro e Secretario d'Esta
do dos Negocios do Reino, assim o tenha enten
dido e faça executar. Paço de Belém em 5
de Setembro de 1846, — RAINHA. — Duque de
Palmella.
P O S S E.

•-->==><><>==----

Artigo do N.° 354 do Defensor de 10 de Outubro


de 1846.

Quarta feira passada, 7 do corrente, pelo meio


dia tomou posse do Governo Civil deste Districto
Administrativo, o Exm.º Snr. Joze Silvestre Ribei
ro, que ha pouco occupou igual cargo na Ilha Ter
ceira, e ultimamente em Beja, em cujos Distric
tos deixou grandes saudades pela maneira com que
em ambos se condusio. S. Exc." sahio, pouco an
tes da hora aprasada, do Palacio de S. Lourenço
para a Casa da Camara Municipal, acompanhado
do Exm.º Snr. Valcntim de Freitas Leal, Gover
nador Interino, e pelos Illm."* Snrs. Governador
Militar, Secretario Geral, Governador do Bispa
do , e por muitos outros cidadãos, e empregados
publicos, ecclesiasticos, civis e militares, fazendo
lhe as devidas honras uma guarda que se achava
postada no, largo da Praça da Constituição. Ten
do sido recebido nos Paços do Concelho pela Com
missão Municipal, e tendo todas as pessoas pre
sentes tomado os seus logares, o Snr. Dr, Barra
—3 —

das, como fiscal, dirigio a S. Excº uma breve


e eloquente allocução, á qual S. Exc." respondeo
de uma maneira que produsio uma profunda im
pressão em todos os circunstantes, terminando com
vivas a S. M. a Rainha, a El-Rey, á Real Fami
lia, á Carta Constitucional, e aos habitantes da
Madeira, os quaes foram correspondidos com gran
de enthusiasmo. Feito o competente auto, sahio
S. Exc.", dirigio-se á Sé a dar graças, e recolheo
se depois á sua residencia, com o mesmo acom
panhamento, do qual se despedio com a maior ur
banidade e cortezia.

--*<><><>--

Artigo do N.° 8 do Independente, de 8 d’Outubro


de 1846.

S. Exc." o Snr. Governador Civil Joze Sil

vestre Ribeiro apresentou-se quarta feira 7 do cor


rente pelo meio dia no Paço do Conceiho para
prestar o devido juramento, sendo acompanhado
por todas as authoridades ecclesiasticas, militares,
e civis, assim como por um luzido sequito de
pessoas d’estas classes. Na occasião da ceremo
nia o fiscal da Camara dirigio em nome d’ella a
— 4—

Sua Excellencia uma breve allocução, na qual


manifestou o regosijo de que estava cheio por ver
este Districto governado por um cavalheiro de tal
merito. Sua Excellencia respondeo que a honra
que acabava de receber com a nomeação de Sua
Magestade subira de ponto com a consideração de
que vinha viver entre um povo illustrado, paci
fico, e obediente ás leis; que para que elle po
desse prestar-lhe todos os serviços que estivessem
ao seu alcance precisava de ser auxiliado por to
dos, e mormente pelas authoridades; —- que esta.
coadjuvação importava o esquecimento e anniqui
lação de dissenções e intrigas particulares; e o
víverem todos como uma só familia, concorrendo
assim mais poderosamente para a salvação do paíz;
e rematou levantando as seguintes vivas: — a Sua
Magestade a Rainha e Sua Augusta Familia; — á
Carta com as reformas aconselhadas pelo estado e

actual do paiz; — e á união de todos os portugue


zes. Depois d'isto S. Exc." sahio acompanhado
pela Camara e pelas pessoas que até alli o tinham
seguido, dirigio-se á cathedral para fazer oração,
e logo ao Palacio do Governo. #
Nós os Madeirenses que entendemos bem o
que é liberdade folgamos com ver á testa do ge

—5 —

verno d'esta perola dos mares o Exm.º Snr. José


Silvestre Ribeiro, que já por muitas vezes tem
provado ser um verdadeiro liberal; por quanto
nós entendemos que cste nome deve ser dado áquel
les que imbuidos dos principios constitucionacº
exercem as funcções de quaesquer cargos com de
sinteresse, lealdade, intelligencia, e perseverança.
Ôra S. Exc." em posição identica á que ho
je occupa tem exuberantemente manifestado que
se interessa do coração pelo povo que rege , e
que tem sempre considerado como filho seu ; por
tanto, claro é que não havendo rasão alguma da
nossa parte que amorteça ou torça as disposições
benevolas de S. Exc.", repartirá elle de certo
comnosco esse amor paternal que tem feito a fe
licidade de muitos. Por consequencia , mereça
mo-lo nós provando que S. Exc." não se enganou
quando disse essas palavras memorandas que deve
rão de ficar indelevelmente impressas em nossos
peitos. A ingenuidade e candidez com que sabi
ram de sua boca provam de mais a lealdade de
suas intenções; e por isso, entreguemo-nos cheios
de confiança a quem até no rosto prazenteiro mos
tra a pureza da alma.
Nós sympatisamos com este digno homem.
— 6—

E nem se diga que a lisonja nos dicta estas


palavras, pois que taes como temos sido até aqui
seremos sempre os apregoadores da boa moral, e
da inflexibilidade na justiça.

--*<####===--

Circular aos Consules.

1.° Repartição — L.º 2.° — N.° 277 — Illm."


Snr. —Tenho a honra de participar a V. S." que
tomei hoje posse do cargo de Governador Civil des
te Districto, para o qual Houve S. M. a RAINHA
por bem nomear-me por Decreto de 5 de Setem
bro ultimo. Na occasião em que desempenho para
com V. S." o dever desta communicação, experi
mento a necessidade de lhe assegurar, que no exer
cicio do meu cargo procurarei manter com V. S."
a melhor intelligencia e harmonia, como o de
mandam as amigaveís relações, que existem entre
os dois paizes que representâmos. — Concebendo a
grata esperança de que V. S." por sua parte se
dignará retribuir-me com igual procedimento, a
proveito desde já esta opportunidade para oferecer
a V. S." o testimunho de minha profunda conside
ração. — Deos Guarde a V. S." – Palacio do Go
—7—

verno Civil no Funchal 7 d’Outubro de 1846 —


Illm.º Snr. Consul...... O Governador Civil, Joze
Silvestre Ribeiro.

—–==><x<>###<><===----

Circular ás Authoridades do Districto.

1.° Repartição — Lº 2º Nº 278 — Ilm° Sr. —


Tenho a honra de participar a V. S." que tomei posse
do cargo de Governador Civil deste Districto, para o
qual Houve S. M. a RAINHA por bem Nomear
me por Decreto de 5 de Setembro ultimo.
He ardua a tarefa de que me encarrego, e em
cedêra por certo ás dificuldades que apresenta, se
não me animasse a consoladôra idêa de que venho
lidar com um povo illustrado, pacifico, obediente
á Lei, e respeitador das authoridades.
Um tal povo he digno de ser feliz, e tem di
reito á mais completa dedicação da parte de quem
o governa.
Penetrado pois desta convicção, empregar-me
hei sempre gostoso em concorrer, na esfera de
minhas attribuições legães, para a prosperidade
deste paiz encantador; esperando affoutamente en
contrar has authoridades, e em todos os habitan
— 8—º

tes, a coadjuvação, quo a minha insuficiencia não


póde dispensar. — Deus Guarde a V. S." — Palacio
do Governo Civil no Funchal, 7 d'Outubro de 1846.
—Illm.º Snr...... O Governador Civil, Joze Sil
vestre Ribeiro.

E M I G R A Ç Ã O.

**…EE9@>

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — N.° 1182 — Illmº e


Exm.º Snr. — No Districto do Funchal reina
hoje perfeito socego.
A agitação que produsio os tumultuarios
acontecimentos do mez dº gosto ultimo, pa
rece ter-se desvanecido com o embarque do
Doutor Kalley............
Os primeiros dias da minha administra
ção não podem deixar de ser consagrados ao
estudo do paiz; e eu considero este primei
ro periodo como uma epocha de tyrocinio e
de aprendizagem.
—9—

Desde já porém observo duas circuns


tancias que muito me consternam, e que
no meu entender devem desafiar toda a so
licitude do Governo: — A 1.° dellas he a ex
traordinaria e assustadôra emigração dos ma
deirenses para Demerara, e outros pontos
da Guiana Ingleza. — A 2.° he a miseria a
que estádesta
pulação redusida
Ilha. a maxima parte da po •

Muito em breve espero poder habili.


tar-me a informar sobre estes assumptos o
Governo de Sua Magestade com a devida
exactidão, e desenvolvimento; limitando-me
agora a pedir com a mais viva instancia ao
Governo de Sua Magestade, que se digne
mandar estacionar, sem perda de tempo,
uma escuna de guerra no porto do Funchal,
cuja presença nestas agoas reputo eu, e co
migo todas as authoridades, indispensavel
para obstar á emigração clandestina, que
vae despovoando esta Ilha , e até para impe
dir o contrabando. — Deus Guarde a V.
Exc.° — Funchal 8 d’Outubro de 1847. —
Illm.º e Exmº Snr. Ministro e Secretario
d'Estado dos Negocios do Reino. — O Go
vernador Civil, Joze Silvestre itibeiro.
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|
— 19 —

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — º º 1183 — Ilmº e


Exmº Snr. — Um terrivel mal está afligin
do a Ilha da Madeira, e de tão grave na
turesa he elle, que a não ser atalhado de
prompto. produsirá consequencias, as mais
deploraveis.
Quero falar da espantosa e assustado
ra emigração de habitantes desta Ilha para
Hemerara, e outros pontos da Guiana Bri
tanica.
Os campos vão ficando abandonados, e
freguezias ha onde ja tem rareado sensivel
mente a população, com grave prejuiso de
todos os interesses e especialmente dos da
agricultura. Não tenho expressões com que
descreva a força com que está obrando nes
te povo a mania de abandonar a patria pa
ra procurar fortuna em paizes estrangeiros,
esperança illustria, que tem sacrificado mi
lhares e milhares de individuos, aproveitan
o apenas a inui poucos. •

Dificil será deparar exemplo de um


phenomeno moral tão extraordinario como
este, porque, se os povos insulares são em
— 11 —

geral mui apegados á terra onde nasceram,


nenhum entre esses demonstrava disposições
mais contrarias a emigrar que o povo da
Madeira.
Ouso pois invocar toda a attenção do
Governo de S. M. a Rainha para este tão
importante objecto, e julgo do meu dever
apresentar á sua consideração as providencias,
que, no meu entender, devem ser imme
diatamente adoptadas para diminuir a inten
sidade deste quasi flagello que ameaça de
aniliquilação o mais formoso paiz da terra.
Dando como provada a miseria que la -
vra nos campos da Madeira, — assumpto
importante de que me occuparei em outro
oficio — he de saber que os Infelises campo
nezes, desejando melhorar sua triste con
dicção, e imaginando que vão encontrar em
Demºrara, e em outras possessões britani
cas a abundancia e a riquesa, abandonam
quanto possuem, e sem mais reflexão, sem
garantias de nenhuma especie, lá vão en
tregar-se em mãos de especuladores avidos,
e sem consciencia, que se hão dado ao tra
fico deste novo genero de escravatura.
Como já disse a V. Exc." esta espe
-- 12 —

ranca tem enganado a quasi todos; e, em


vez da sonhada fortuna, só vão encontrar
maior miseria, curtir novas privações, so[
frer molestias, e mui frequentemente acabar
os dias nos pantanos, e sob os ceos inhos
pitos da Guiana, ou nas ardentes possessões
das West-indias.
Conviria pois (e quanto este expedi
ente não seria proveitoso!) que se tratasse
de desvanecer a ilusão popular, demons
trando por um modo bem sensivel o ne
nhum proveito que colhem, os grandes pe
rigos e infortunio a que se arriscam, aquel
les que tão irrellectidamente dão costas á
patria, e largam quanto nella possuem, fian
do o futuro todo da sua vida a homens que
especulam com a credulidade do povo.
Para attingir este fim nada se me af
figura tão eficaz como tomar o Governo de
S. M. a resolução de mandar a Demerara,
ainda que algum sacrificio custe, um ou
mais navios com ordem de receber os mui
tos colonos portuguezes que suspiram por vol
tar á Madeira, e que não podem realisar
esse desejo, falhos, como estão, de meios
para fazerem as dospezas da viagem.
A apparição d'esses colonos desgraça
dos, victimas da seducção e do engano, se
ria o argumento mais convincente para to
lher o progresso da emigração; pois que of
fereceria aos habitantes que estão dispostos
a expatriar-se, o vivissimo e muito eloquen
te quadro da miseria que os aguarda n'a
quellas remotas paragens, — quadro que fe ,
riria tanto mais fortemente a imaginação
impressionavel do povo, quanto he certo que
o efeito delle seria auxiliado pelas narra
ções insuspeitas, e patente desengano de
conterraneos
gamente o seuquedesatino.
já haviam pago bem amar

Se porem este expediente que eu te


nho a honra de propôr á sabia considera
ção do Governo de S. M., he assez pode
roso para produsir optimos rezultados, não
ha duvida tambem que se devem adoptar si
multaneamente outras algumas providencias
que cooperem ao mesmo fim. Outros meios
ha, directos e indirectos, que convem lem
brar como muito eficazes.

Um grande numero de individuos, pa


ra forrarem as despezas de passaportes, e
evitarem as diligencias e embaraços policiaes,
emigram clandestinamente, occultando-se em
d.ferentes pontos da costa. [ que geralmen
te facilita o embarque furtivo] ou nas ilhas
Dezertas, e d’ahi passam para bordo dos
navios que se empregam no ominoso trafico
da escravatura. Nestes fraudulentos mane
jos he bem de crer que tomem parte mui
activa os agentes que promovem a emigra
ção: primo — porque assim conseguem le
var grande numero de pessoas que não po
derião de outro modo sahir do paiz: secun
dó — porque são vantajosamente retribuidos
pelos colonos que conseguem embarcar a oc
cultas da authºridade: tortio — finalmen
te porque tem grande interesse em esqui
var-se ás disposições dos regulamentos de
policia, em vista dos quaes os capitães dos
navios não poderião transportar nem tão
crescido numero de passageiros, como ordi
nariamente levam, nem pelo modo com que
nisso procedem, sem aguada nem manti
mentos
do, e c. suficientes, sem cirurgião a bor

Para obstar pois a esta perniciosissima,


e muito extensa fraude, conviria que o Go
verno mandasse estacionar desde já, e per
— 15 —

manentemente uma escuna de guerra no"


porto do Funchal, para neste sentido ser em
pregada como fôr necessario. Este navio
poderia não só prestar-se a tão importante
serviço, mas ser tambem de grande auxilio
para obstar a contrabandos; devendo notar
se que a despesa da embarcação correria por
conta dos rendimentos da Madeira.
• • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • • •

Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal


14 de Outubro de 1846 — ilm.º e Exm.º
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino. — O Governador Civil,
Joze Silvestre Ribeiro.

-—==x_>-3-@xxx=-—

Ao Ministerio do Reino.

2° Repartição — N.° 1189 — Illmº e


Exmº Snr. — Em officio n.° 1 183, de 14
do corrente, tive a honra de chamar a at
tenção do Governo de S. M, sobre a emi
gração dos Madeirenses para Demerara, e
particularmente notei a emigração clandesti
na, como sendo a mais funesta.
— 16 —

Careceria por ventura de ser demons


trada a minha asserção, pois que eu não
mencionei documento algum que a abonasse:
oferece-me porém o acaso a occasião de
pôr fóra de toda a duvida o que disse no
meu citado oficio, e he o testemunho irre
cusavel do Consul Portuguez em Demerara,
o qual respondendo ao meu antecessor no Go
verno Civil deste Districto, sobre certos qui
sitos que este lhe havia proposto, se expri
me pelo modo que V. Exeº verá na copia
Junta.
Com quanto deva deixar falar por mim
o documento, que tenho a honra de encami
nhar ás mãos de V. Exc.", não posso todavia
deixar de transcrever aqui alguns trechos do
oficio do Consul, os quaes inteiramente con
firmam as minhas revelações:
« Cumpre-me pois levar ao conhecimen
« to de V. Excº, que quasi todos os
« navios, que sahem da Ilha da Madeira
({
para esta Colonia, trazem a seu bordo
não pequeno numero de pessoas refugia
. das sem passaportes, da costa da Ilha.»
« Igual procedimento praticaram estas
((
duas embarcações em especial, (a Barca
— 17 —

« Ingleza «Palmira» — e o Brigue Portu


« guez « Visconde de Bruges») pois que a
« primeira recebeo no porto do Funcha! 23
« emigrados. e aqui trouxe 410 delles; . — e
({ a outra 160. »
E por esta occasião, seja-me permit
tido ponderar que começam a desvanecer-se
as apprehensões que neste Governo Civil exis
tiam a respeito do Consul Portuguez em Be
merara; pois que, sendo ele subdito brita
nico, e podendo presumir-se que nos interes
ses da colonia do seu paiz fosse menos aliei
çoado aos de Portugal, eu vejo com muito
prazer que elle se exprime mui francamen
te, e manifesta muito zêlo em beneficio das
nossas cousas. O que todavia não dispensa
as observações que eu entendi dever fazer
no meu citado oficio, para se lhe recom
mendar pelo Ministerio dos Negocios Estran
geiros a leal observancia dos seus deveres
consulares.
Fallei tambem no meu oficio sobre a
deploravel sorte, que aguarda os Madeiren
ses em Demerara; e para demon-trar esta
circunstancia transcreverei aqui alguns extrac
tos de uma Altocução do Bispo Catholico (ir
- 18–

landez) de Demerara aos habitantes da co


lonia, na qual pinta vivamente a miseria e
abandono em que jazem os Madeirenses em
Demerara, e implora em beneficio delles a
publica compaixão.
Escolhi de proposito as duas seguintes
notas da reſerida allocucão, porque além des
tes, darão outros esclarecimentos importantes
W. Exc.”:

« Though I speak above of the perils of



the soul as being more important, and of
((
more immediate concern to my sacred office,

yet I feel deeply, and every humane heart

must join me in regreting, the extent of phy
sical suffering the poor Portuguese endure,
partly from their own over-eagerness to
«
work before they become acclimatized, and,
(K in some instances, from the want of a little
(K
consideration on the part of the manager or
((
overseer. I have myself passed into the Co
(ſ
lonial Hospital, during the present year over
((
770 Portuguese alone; and it is but justice
to Dr. Blair and the other medical officers
{{ of that establishment for me to state, that
((
of my numerous recommendations every
— 19 —

one has been properly attended to, and I


&
have not received a single complaint of in
attention or had treatment. )
« According to a recent return from
a the General Emigration Agent's office, the
« number of Portuguese immigrants there
o(
registered, were:

• On whom bounty had been paid 4,749


« Without bounty. . . . . . . . . . 5,548
10,297

« —— If to these we add the numbers


who have arrived without being registered,
and the excess of births over deaths, we
: may fairly reckon the present amount at
over 12,000 or a tenth of the whole po
pulation, now estimated at 120,000. But if
from the mixed population of 108,000 we
deduct women, aged people, and children,
and the multitudes who have ceased to work
on the plantations, we will not have more
than 20,000 efficient labourers while on
the other hand, at least two thirds (or
8,000) of the Portuguese are really efficient
— 20 –

« and serviceable to the general interests of


« the colony, and most of them to are young
« or in the prime of the life. These are
« considerations deserving the serious atten
« tion of all who take an active interest in
« public affairs.»
Fica pois demonstrado quanto asseve
rei no meu citado oficio, e cada vez mais
evidente se torna a indispensabilidade das pro
videncias, que propuz para atalhar a asso
ladôra emigração da Madeira; isto he: 1.°
de se fazer o sacrificio de se enviar a De
merara uma ou mais embarcações, com o
fim de receberem todos os infelizes Madei
renses, que lá suspiram por voltar á sua bel
la patria, já desenganados, já desiludidos:
2.° — de mandar estacionar no porto do Fun
chal uma escuna de guerra, que obste ao
furtivo embarque de colonos, e acabe com
esta causa de um sem-numero de desgraças:
3.° — que se dêem ao nosso Consul na Guia
na Ingleza, depois de se solicitar do Gover
no Britanico o seu «exequatur» que ainda
lhe falta, as mais terminantes ordens e ins
trucções no sentido que já ponderei.
Oxalá que eu tenha a fortuna de qne ao
— 21 —

Governo de S. M. pareçam admissiveis as


minhas idêas, que respeitosamente submet
to á sua sabia consideração.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 21
d'Outubro de 1846. — Illm.º e Exm.º Snr.
Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios
do Reino. — O Governador Civil, Joze Sil
vestre ítibeiro.

*-*><><>----

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — Nº 1193 — Illm.º e


Exmº Snr. — A emigração clandestina pa
ra Demerara continúa do mesmo modo ,
visto que no porto do Funchal não existe
embarcação alguma portugueza de guerra,
que fiscalize a sahida dos navios de trans
porte para aquela colonia, e ponha em
respeito os capitães dos mesmos, os quaes
muito a seu salvo podem receber quantos
passageiros se escondem em diferentes pon
tos da costa, onde já está tudo acautelado
para passarem em pequenos barcos para
bordo dos ditos navios.
Cada vez pois se torna mais urgente,
— 22 -

que neste porto venha estacionar-se uma


escuna de guerra, a qual, como já disse,
poderá tambem prestar muito bom serviço
em evitar o desembarque de contrabando;
tendo o Governo a vantagem de que a des
peza da escuna corre por conta dos co
fres desta Ilha.
Releve V. Exc." a minha importunação,
dignando-se de considerar a urgentissima pre
cisão que ha da providencia, que instante
mente devo reclamar, e que pelo Ministerio
competente deve ser satisfeita com a possi
vel brevidade.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 30
d'Outubro de 1846. — Illm.º e Exmº Snr.
Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios
do Reino. — O Governador Civil, Joze Sil
vestre Ribeiro.

—=> @ ©=

Circular aos Administradores de Concelho.

2.° Repartição — L.° 5.° — N.° 248 — Circu


lar –- Illm.º Snr. — Diz a Carta Constitucional no
artigo 145, §. 5.º «Qualquer póde conservar-se
« ou sahir do Reino, como lhe convenha, levan
– 23 —

« do comsigo os seus bens; guardados os regu


« lamentos policiaes, e salvo o prejuizo de ter
« ceiro.»

Eis aqui bem definida a amplissima faculda


de, que a todo o cidadão portuguez he concedi
da de sahir do reino, como, e quando lhe con
venha; eis aqui tambem justificadas as exigencias
policiacs, a que deve sujeitar-se o cidadão, que
manifesta desejos de passar a um paiz estran
geiro.
Nada mais claro, nada mais terminante. A
brigámo-nos á sombra da abençoada arvore da
Liberdade, e desde esse momento abriram-se as
portas da patria, a fim de que a cada um de nós
fosse permittido — ou ir viajar e adquirir conhe
cimentos — ou ir recrear a alma, e restabelecer
a saude — ou finalmente ir procurar meios de sub
sistencia e de riqueza, que nem sempre podemos
cnçontrar na terra do nosso nascimento.
Mas esta liberdade degeneraria sem licença,
e prejudicaria consideravelmente a associação po
litica, — se aos menores fosse livre abandonar o
paiz scm licença de seus paes ou tutores, — se o
criminoso podesse subtrahir-se á acção da Justi
ça. — se o mancebo sujeito aos encargos da miliº
— 24—

eia, podesse subtrahir-se a este onus, fazendo-o


pezar sobre outros, — se o devedor podesse exi
mir-se de solver as suas dividas, interpondo entre
si e o credor a barreira dos mares; ou delongas,
distancias & c.

Qual he pois a eonsequencia que póde tirar


se destes principios? He que, apenas um indi
viduo, ou uma familia, patenteiam a vontade de
sahir do Reino, não ha poder sobre a terra que
lhes embargue os passos, uma vez que perante as
authoridades demonstrem, que a sua sahida não
ofende os direitos da sociedade, nem envolve pre
juizo de terceiro. ••

Sujeitando ao rigor desta analyse a espantosa


emigração, de que hoje he o triste theatro a Ilha
da Madeira, considerá-la-hia eu como um aconte
cimento ordinario, e até muito trivial e corrente,
se nella visse a influencia da espontaneadade, e a
inspiração das resoluções livres, voluntarias, uni
camente dictadas pelo interesse proprio. E ainda
assim mesmo, olharia eu para essa emigração com
lastima, e não com o horror que hoje me infunde,
se não a visse enlaçada com algum dos crimes,
— 25 —

que acompanhavam as barbaras scenas da EscrA


vATURA, — graças aos manejos que a mais funesta
alliciação parece empregar, para poder apresen
tar um grande numero de colonos nas praias de
Demerara! •

Como poderá ver-se a sangue frio expostas ao


desamparo tres infelizes creanças, em um cami
nho do concelho de Santa Anna, abandonadas por
seus paes no acto de emigrarem para aquella colo
nia !

Quem poderia ouvir, sem que o coração se


lhe quebrasse de dór, um pae infeliz, o qual de
bulhado em lagrimas e desatinado, profere estas
palavras de fogo e de amargura: «Restituam-me o
meu filho — que m’o roubaram essas gentes que
por ahi andam á caça de gente para Deme
rara ! »

Oh! como vem aqui a pêllo a eloquentissima


invectiva de um membro do parlamento inglez
contra o ominóso trafico dos negros:
« Por uma benevola compensação da providen
» cia, tanto na ordem moral, como na ordem
» phisica, he ordinario que um bem surja ao lado
» do mal. — Os furacões purificam o ar; a per
» seguição inflamma o enthusiasmo pela verdade;
— 26 —

o orgulho, a vaidade, e a profusão contribuem


» muitas vezes indirectamente para a felicidade
2•
da especie humana. Nada ha tão odioso, que
» não tenha um palliativo. — O selvagem he hos
pitaleiro; o ladrão he intrépido; a violencia he
em geral isenta de perfidia; a arrogancia — de
baixeza. Mas aqui nada ha de semelhante.
» Este detestavel tráfico tem o privilegio de de
Y)
pravar igualmente o bem e o mal, e de man
» char até o proprio crime: he um estado de guer
» ra, não ennobrecido pela coragem; he um es
})tado de paz, que não preserva nem da devas
» tação, nem da mortandade: he o todo dos vicios
» das sociedades policiadas, afóra a delicadesa
» dos costumes, que os moderam; he a barbari
» dade primitiva do homem, desprovido de toda a
» innocencia; he uma perversidade pura, e com
» pletamente isolada de todo o sentimento honro
» so, e de todas as vantagens, que podem ser
))
contempladas sem indignação, ou ser confessa
» das sem opprobrio.»

*=+=.

O que deixo dito parece-me bastante, para


que V. S." conheça:
—27—

1.° — Que não póde pôr-se obstaculo á sahida


de qualquer cidadão, — o qual sujeitando-se aos
regulamentos policiaes, e salvo o prejuizo de ter
ceiro, pertenda passar a paizes estrangeiros.
2.° — Que he dever impreterivel das autho
ridades Administrativas impedir por todos os meios
ao seu alcance a emigração clandestina, não só
porque ella importa uma infracção formal da nossa
Lei Fundamental, mas tambem porque póde ser
occasião de muitos crimes, que a esperança da
impunidade he capaz de produzir.
3.° — Que as mesmas authoridades, procu
rando seguir os passos da fatal alliciação que
mysteriosamente se ensina por esses campos, e
tão deploraveis males acarreta sobre este paiz, de
vem proceder de maneira, que possam habilitar a
Justiça a descarregar sobre os culpados toda a se
veridade das Leis.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Governo
Civil no Funchal, 24 de Novembro de 1846. —
Illm.º Snr. Administrador do Concelho de ......
= O Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
*--**>9@as--"
Ao Administrador do Concelho do Funchal.

2º Repartição — N.° 299 — Lº 5.° — Illm.º


Snr. — A cabam de ser feitas a S. Exc." o Snr.
Conselheiro Governador Civil do Districto revela

ções, que a serem verdadeiras, demonstram que


os alliciadores da emigração estão praticando fac
tos horrorosos, dignos da mais alta punição.
Ordena por tanto S. Exc." que V. S." chame
immediatamente á sua presença Antonio Rodrigues
de Gouvêa, da freguesia da Ribeira da Janella;
que o interrogue attentamente sobre este importan
tissimo negocio, e que em vista do que depozer,
mande proceder desde logo aos competentes autos
de investigação contra todas as pessoas envolvidas
nos criminosos manejos, que teem por fim arrastar
á emigração os infelizes habitantes desta Ilha.
S. Excº recommenda mui especialmente a V.
S.° a execução do que lhe he ordenado, e quer
que V. S." lhe dê conta do que obrar a semelhan
te respeito ( a ). Deus Guarde a V. S.° — Secre

(a) Em consequencia deste oficio procedeu-se


a Auto de Investigação na Administração do Conce
lho, o qual foi remettido ao Poder Judicial.
— 29 —

taria do Governo Civil no Funchal aos 29 de Ja


neiro de 1847. — Illm.º Snr. Administrador do
Concelho do Funchal. — O Secretario Geral inte
rino, Augusto de Carvalhal Esmeraldo Lencrastro.
—=>@<=

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — Nº 2028 — Illmº e


Exmº Snr. — A emigração para Demerara
e Trindade não tem cessado até hoje; mas
o que he mais para lamentar, e que aliás
desafia toda a indignação, he que a maior
parte dos colonos sahem sem passaporte,
embarcando claudestinamente, a despeito de
todas as providencias que se teem tomado e
em contravenção formal da Carta Constitu
cional da Monarquia. -

He pois do meu dever chamar nova


mente a attenção do Governo de S. M. so
bre este grave assumpto, referindo-me em
tudo ao que tenho dito ácerca d’elle nos meus
oficios anteriores, renovando todavia designa
damente a supplica, que por tantas vezes
tenho feito ao Governo, de mandar es
tacionar neste porto do Funchal uma escu
- 30 —

na de guerra, para os fins que hei apon


tado.
Dirigi ultimamente aos Administrado
res de Concelho uma circular, na qual tra
tei de aclarar bem esta materia, e de pres
crever-lhes algumas instrucções, segundo as
quaes devem regular a sua marcha n’este
ponto. — Incluza tenho a honra de encami
nhar ás mãos de V. Exc." um exemplar
dessa Circular, desejando que V. Exc." ap
prove os termos em que he concebida.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal
10 de Fevereiro de 1847. – Illm.º e Exm.º
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino. — O Governador Civil,
Joze Silvestre Ribeiro.

-=>cGE<-Sè&ê><==--

Circular aos Administradores de Concelho.

2.° Repartição — Lº 5° — Nº. 474.


—Circular. — Ilm° Snr. — Vejo-me na pe
nosa obrigação de suscitar fortemente a exe
cução da minha circular, de 24 de No
vembro do anno passado, na qual me pro
puz demonstrar:
— 31 —

• 1.° — Que não póde pôr-se obstaculo


f em presença da Lei Fundamental da Mo
narchia ] á sahida de qualquer cidadão pa
ra fóra do paiz, uma vez que elle se su
jeite aos regulamentos policiaes, e salvo o
prejuizo de terceiro.
2.° — Que he dever impreterivel das
authoridades administrativas impedir, por
todos os meios ao seu alcance, a emigração
clandestina.
3.° — Que as mesmas authoridades,
procurando servir os passos da fatal allicia
ção, que mysteriosamente se insinua por
esses campos, e tão deploraveis males a
carreta sobre este paiz, devem proceder de
maneira, que possam habilitar a Justiça a
descarregar sobre os culpados toda a seve
ridade das Leis. -

Por mau fado deste paiz tem-se ag


gravado nos ultimos mezes o mal que já n'a
quella epocha eu tanto lamentava, e se por
ventura não tiverem um proximo termo os
escandalosos e infames abusos que neste
particular se estão praticando, eu agouro um
horrivel futuro a esta Ilha, que desgraça
damente nutre em seu seio filhos degenera
— 32 —

dos ... os quaes não teem pêjo, nem te


mor de Deos, nem o mais leve remorso de
traficarem com seus irmãos, do mesmo mo
do que outrora se traficava com os ne
gros!
Lancemos os olhos sobre as horrorosas
scenas que por esses campos, por toda es
sa costa da Ilha se estão passando.
Um grande numero de alliciadores per
correm as povoações e os campos, com o
damnado intento de induzirem gente a emi
grar, e a tal ponto parece ter chegado
as cousas, que já eles recorrem á violen
cia, arrancando de suas moradas innume
ras creaturas que nenhum desejo teem de
abandonar os seus lares. Por efeito, e
como necessaria consequencia destes mane
jos — aqui um páe abendona seus filhos e
familia — acolá, mulheres abandonam seus
maridos — os filhos desobedecem aos paes,
e pelo mais leve pretexto deixam o tecto
paterno — os creados fogem a seus amos
.... e dest’arte se vão desatando os santos
laços que mantem a harmonia das associa
ções humanas! •

Graças á boa idole do povo, não tem


ainda havido muitos exemplos dos deplora
veis acontecimentos, que he dado recear
da impunidade que os malfeitores encontram
nesta — para elles — valvula de salvação.
E com efeito, se continuar este fatal abu
so, o homem ruim poderá perpetrar negros
attentados, e lá está nas horas mortas da
noite, um barco, ás bordas do mar, para
o conduzir com os despojos do crime, ou
com o barbaro prazer de qualquer vingan
ça, a Demerara, a S. Vicente, á Trinda
de ...... ou não sei aonde !
Miseravel sêde do lucro que anima es
ses alliciadores a colherem com suas redes
um bando de infelizes cuja imaginação in
flammam, fazendo-lhes crêr que vão encon
trar minas de riquezas nesses paizes
longiquos onde os arrastam! Mil vezes
mais detestavel maquinação, se á força os
obrigam a deixar a terra do seu nascimen
to!
Um abysmo chama por outro abysmo.
Essa funesta emigração vae despovoando es
ta formosa Ilha; dentro em breve espaço a
agricultura carecerá de braços, — de bra
gos carecerá igualmente todo esse trafico
— 34 —

da vida social, — a Fazenda Publica sofre


rá consideravel diminuição em seus rendi
mentos, — os encargos publicos, taes como
o recrutamento, o serviço para as estradas,
&c. &c., ficarão por satisfazer, ou tornar
se-hão infinita e injustamente pesados ao res
tante da população que resistir ás seducções
dos alliciadores.
Esses homens de coração de bronze
não attendem
fazendo ? ! a todos estes males que estão •

Pois bem, Snr. Administrador do Con


celho, se elles são indiferentes á sorte des
te paiz, não o sejamos nós, e façamos quan
to de nós depender para attenuar as funes
tas consequencias dos seus nocivos e preju
dicialissimos manejos.
Comece V. S." por não consentir que
se demore em parte alguma desse Concelho
qualquer pessoa que de fóra vá ahi alliciar
gente para emigrar; e em caso de reluc
tancia, ou desobediencia, V. S." a autoará,
e entregará ao Ministerio Publico. Se en
tre os moradores do seu concelho houver al
gum que se occupe nesse mister, V. S." o
avisará logo de que a continuar em tal es
— 35 —

candalo, o autoará, e entregará ao Minis


terio Publico. •

Passará V. Sº immediatamente a fa
zer um recenseamento de todos os barcos,
que a opinião publica denunciar, como em
pregados em conduzir gente para bordo dos
navios, que levam colonos para Demerara
e outras possessões inglezas. Avisará aos
respectivos donos, ou arráes, que a continua
rem a prestar-se áquelle serviço, serão cas
tigados severamente, e fazer-se-lhes-ha sa
ber que a tal ponto tem chegado as cousas,
que as Authoridades se verão reduzidas á
forçosa obrigação de lhe inutilisar os seus
barcos.

Aos Regedores e Cabos de Policia re


commendará V. S." a mais activa e assidua
vigilancia sobre este negocio, por maneira
que os alliciadores, os barqueiros, e quaes
quer outras pessoas implicadas neste tráfico,
tenham como certo que a toda a hora são
observados seus passos. E se por ventura
entre os seus subalternos algum houver que
capitule com o seu dever por peita ou su
bôrno, não hesite V. S." em o fazer punir,
como indigno de toda a confiança.
*-36 -

Nestes casos o exemplo de V Sº pó


de ser muito proveitoso; e por esse motivo
recommendára eu a V. S." que, de vez
em quando, exercitasse pessoalmente a sua
inspecção, como meio de adquirir por seus
proprios olhos o conhecimento das cousas,
despertar o zelo dos seus subalternos, e in
cutir terror nos ruins traficantes deste novo
genero de escravatura.
Snr. Administrador do Concelho! At
tente V. S." bem seriamente neste negocio.
Tão escandalosamente teem embarcado colo
nos em diferentes pontos da costa desta
Ilha, que a alguem se tem afigurado exis
tir connivencia entre os traficantes e al
guns empregados dos concelhos. — As ap
parencias enganam, e neste particular eu
me comprazo de crêr que não tem funda
mento a desconfiança. — Mas, Snr. Admi
nistrador, não basta ser honrado, he mis
ter arredar até a sombra da suspeita. He
por isso que eu recommendo a todos os Snrs.
Administradores, que empreguem toda a
diligencia para afastar dos seus subalternos
qualquer imputação que possa fazer-se-lhes.
Entenda-se V. S." com os Reverendos
—37—

Parochos desse Concelho, e peça-lhes que


façam conhecer aos seus parochianos o pe
rigo que correm, os inconvenientes a que
se sujeitam, os males a que se expõem a
bandonando a sua patria. Peça lhes que
façam sentir ao povo o quanto lhe convem
viver na terra onde nasceu, e que a Provi
dencia hade castigar mais cedo, ou mais
tarde o cabeça de família que deixou ao
desamparo a esposa e filhinhos — o filho re
belde que fugio a seus páes — o irmão que
deixou sem arrimo os irmãos. — Peça-lhes
que lembrem aos menos abastados, que se
n'uma hora d'amargura amaldiçôam a sua
sorte, nem por isso devem perder a espe
rança de melhores dias; o amor do traba
lho, a beneficencia, e até mil eventuali
dades melhoram o seu destino, sem ser
necessario demandar a terra estranha.
Snr. Administrador. Muito me fica
por dizer; mas não devo por mais tempo
cançar a sua paciencia. — O que deixo ex
poste será bastante para a fervorar o seu zelo no
santo empenho de pôr um dique á torrente
de tantas calamidades.

Somos livres, e as portas da patria


estão abertas para quem quizer passar a
outros paizes. Mas sáia sómente quem
muito espontaneamente, e por seu proprio
interesse quizer sahir; mas sáia sómente
aquelle que tiver satisfeito aos regulamentos
protectores de bem entendida policia: —
mas sáia sómente o que não causar prejui
zo de terceiro.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do
Governo Civil no Funchal, aos 31 d'Agos
to de 1847. Illm.º Snr. Administrador do
Concelho de .... — O Governador Civil,
Joze Silvestre Ribeiro.
----…<><><>=-–

Ao Commandante do Brigue Douro.


2.° Repartição — L.° 3.° — N.° 916 — Illm."
Snr. — Folgo muito que V. S." esteja disposto a
fazer-se de vella, logo que sáiam as duas embar
cações mercantes que pertendem receber colonos
na costa d'esta Ilha.
Obrando assim , presta V. S." um relevante
serviço a esta Ilha, onde a emigração dos seus
moradores para Demerara e outras possessões in
glezas está causando os maiores males. Dentro
em pouco a agricultura carecerá de braços; será
— 39 —

impossivel realizar-se o recrutamento; a Fazenda


Publica sofrerá consideravel abatimento nas suas
rendas; e sobre tudo isto, renovar-se-hão as in
fames scenas do trafico da escravatura , pois que
a alliciação de infelizes colonos vai desatando os
laços da sociabilidade: os filhos abandonam os paes,
as espôsas os maridos...... e talvez que um dia
a esperança, a quasi certeza da impunidade gére
erimes sem conto.

Nestes termos já V. S." vê o grande serviço


que presta á Madeira, e em geral á Nação Por
tugueza , inutilizando os esforços de miseraveis
alliciadores, que a differentes pontos da costa ar
rojam bandos de infelizes de ambos os sexos e de
todas as edades, para os conduzirem para bordo
dos navios mercantes que andam neste trafico.
A perseguição dos barcos da costa que con
duzem furtivamente os colonos para bordo dos
navios, he certamente o meio mais eficaz de aca
bar com este perniciosissimo abuso.
Lembro a V. S." que por toda essa costa
até a Calheta e Porto do Moniz se está fazendo o

embarque com grande escandalo; — sem fallar das


Dezertas. — Por este motivo toda a vigilancia e
actividade de V. S." são indispensaveis, convindo
– 40 —

que appareça em diferentes pontos, e que aos al


liciadores e barqueiros faça recear a toda a hora
a sua apparição.
Deus Guarde a V. S.° — Palacio do Gover
no Civil no Funchal 31 d’Agosto de 1847. —
Illm.º Snr. Vicente J dos Santos Moreira Lima,
Commandante do Brigue Douro — O Governador
Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
--><><>--•

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — N.° 2101 — Illm.º e Exm.º


Snr. — A emigração dos Madeirenses para Deme
rara e outras possessões inglezas continúa de uma
maneira espantosa e assustadora. Os alliciadores
não cessam de empregar todos os meios de seduc
ção , para conduzirem gente a emigrar, e até já
alguns exemplos consta ter havido de recorrerem
a violencias para arrastarem infelizes colonos áquel-.
las paragens. •

Acabo de dirigir aos Administradores de


Concelho uma circular, despertando energicamen
te a sua attenção sobre este desagradavel assump
to , e prescrevendo-lhes instrucções segundo as
— 41 —

quaes devem regular-se no importantissimo serviçº


de obstar aos males, que comsigo acarreta este
novo genero de trafico de escravatura: — Oficiei
tambem ao Commandante do Brigue Douro, surto
neste porto, a fim de perseguir os barcos costei
ros que levam furtivamente colonos para bordo
dos navios.

Os termos em que oficiei áquelles e a este


constam das copias juntas N.° 192, sobre cujo
eontheudo ouso chamar a attenção de V. Exc.",
por isso que n'aquelles documentos desenvolve am
plamente todas as considerações relativas a este ob
jecto.
Ao dar conhecimento d'estas providencias a
V. Excº", he meu intento pedir ao Governo de
S. M. que se digne tomar na mais séria conside
ração este ponderoso negocio. — O Poder Judicial
não encontra Lei terminante que puna os allicia
dores, e estes á sombra da impunidade, e arras
tados pelo fortissimo incentivo de extraordinarios
lucros, que desgraçadamente lhes chegam pa
ra remunerar numerosos agentes, celhem em
suas rêdes centenares de infelizes, a quem ten
ta a esperança de irem encontrar riquezas em
o novo mundo. — Alguns barcos da costa teem si
— 42 —

do apprehendidos na occasião em que levam pa


ra bordo dos navios bandos de colonos, que
embarcam furtivamente e sem passaporte; mas o
Poder Judicial os relaxa depois, porque, ou não
adquire provas do crime, ou não encontra Lei
que puna taes factos. -- Mas este trafico, sobre
ameaçar de anniquilação a Ilha da Madeira, apre
senta já um grande numero de caracteres que
manchavam o commercio dos escravos negros; e
a humanidade, a par de outras considerações, re
clama altamente providencias eficazes, que po
nham um dique á torrente de calamidades que
ameaçam este bello paiz, digno de melhor sorte.
Deos Guarde a V. Exc "—Funchal 4 de se
tembro de 1847. — Illm.º e Exmº Snr. Ministro
e Secretario d'Estado dos Negocios do Reino. —
Gº Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

- *===$$$#x=----

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — N.° 2103 — Illm.º e


Exmº Snr. — No meu oficio N.° 2101 de
4 do corrente, que vae pelo mesmo navio
que hade levar este, tenho a honra de cha
— 43—

mar a attenção de V. Exc." sobre o desa


gradavel assumpto da emigração de colonos
madeirenses para Demerara e outros pontos
das possessões inglesas das West-Indias. Com
esse remetto a copia de uma circular que
em data de 31 d'Agosto ultimo dirigi aos
Administradores de Concelho; e se V. Exc."
achar mui forte a severa linguagem que alli
emprégo, digne-se de considerar que ainda
isso he pouco em comparação do que me
recem os alliciadores da emigração, e nada
em comparação dos males que está causan
do a esta Ilha aquelle fatal abuso.
Aproveitando a presença do Brigue de
Guerra « Douro» tenho requisitado ao res
pectivo Commandante que se faça de vella
apenas sahe do porto do Funchal qualquer ma
vio que leva colonos, e se destina a receber
outros na costa da Ilha. — Esta providencia
porém he ineficaz, por que em quanto o
Brigue navega para oeste, fica livre aos os
peculadores a costa de leste; d’onde tenho
concluido, que só poderá pôr-se um termo
á emigração, quando tivermos á nossa dis
posição duas escunas de guerra, as quaes
andem sempre sobre vella, vigiando — uma
— 44 —

a costa de leste desde a Ponta de S. Lou


renço até ao Grajáo, incluindo o mar das
Desertas; e outra, a costa do oeste desde
o Ilhéo do Funchal até Ponta Delgada. —
Deste modo a vigilancia dos vasos de guer
ra será contínua, e poderá attingir cabal
mente o fim a que nos propomos. — Ora,
as escunas pódem aproximar-se muito mais
á costa do que o Brigue, e he essa uma
vantagem muito de attender neste caso; em
quanto que não farão ambas tanta despesa
como o Brigue, ou pelo menos não a farão
maior, podendo o Governo dar ontro desti
no ao Brigue, que por este modo he dis
pensavel nestas aguas.
A emigração, que eu atégora tenho
earacterisado de « clandestina», começa já
em alguns pontos da Ilha a ser publica e
escandalosamente feita de dia, sahindo bar
«os carregados de gente para bordo de na
vios que conduzem colonos. — Os Administra
dores de Concelho acodem a um ou outro ponto,
"mas não pódem acudir a todos; formam au
tos de investigação, prendem de vez em quan
do alguns barqueiros, entregam-os ao Po
der Judicial, mas por fim de contas, ou seja
por falta de provas, ou por falta de Lei expres
sa, ei-los muito em breve em liberdade, e
o mal redobra depois com maior intensidade.
He chegada a quadra das vindimas nes
ta Ilha; — serviço este que occupa muitos
braços. Crê-se que durante o tempo desta
tarefa agricola a emigração afrouxará um
tanto, mas que, em acabando, a gente do
campo está pela maior parte disposta a emigrar.
Convem evitar este mal terrivel, e ne
nhum remedio mais eficaz se antolha do que
a perseguição dos barcos costeiros. Para se
conseguir este resultado he que se torna in
dispensavel a presença de duas escunas de
guerra, as quaes vigiando como acima dis
se as costas da Ilha, impeçam os barcos
de condnzir gente para bordo dos navios.
A par desta providencia conviria talvez
que o Governo de S. M. tomasse sobre si a
responsabilidade de decretar uma providencia
sevéra contra os alliciadores, a fim de que
o Poder Judicial podésse fazer descarregar
sobre elles um rigoroso castigo.
Conviria que o Governo de Sua Mages
tade se entendesse com o Governo Inglez pa
ra que as Authoridades de Demerara, S. Vi
—46 —

cente e Trindade, não recebessem colono


algum da Madeira que não fosse munido do
competente passaporte; e que os Comman
dantes de navios que alli chegarem com co
lonos semá passaporte
trazê-los Madeira. fossem obrigados a vir

Conviria que aos Consules Portuguezes


daquellas possessões fosse ordenado muito a
pertadamente que formassem autos, nos quaes
se exarasse a nota dos navios que levaram
gente sem passaporte, com todas as indivi
duações, por maneira que esses autos, sen
do remettidos a este Governo Civil, fossem
uma segura base de um processo contra os
capitães criminosos, e por consequencia da
muleta pecuniaria a que estão sujeitos.
Em uma palavra: o mal he gravissi
mo, e eu espero que o Governo de S. M.,
solícito como he pelo bem publico, se dig
nará de e remediar promptamente.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 9
de Setembro de 1848. — Illmº e Exmº Sr.
Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios
do Reino. — O Governador Civil, Joze Sil
vestre Ribeiro. •

--—=> @ ©a
— 47 —

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — N.° 2108 — Ilmº e


Exmº Snr. — Foi-me hontem denunciado que
o Bergantim Portuguez «Marianna», que ha
mais de quinze dias desaferrára do Porto do
Funchal, se achava fundeado defronte da fre
guezia da Ponta do Pargo desta Ilha, e alli
tractava de receber a seu bordo colonos.
Apenas recebi esta denuncia ordenei im
mediatamente ao Commandante do Brigue de
G." Portuguez «Douro», que mandasse sem
perda de tempo uma das suas Lanchas á dita
Ponta do Pargo, e fizesse apprehender o
Bergantim no caso de elle se estar occupande .
no criminoso trafico de que era suspeitado.
O Commandante do Brigue «Douro»
mandou logo uma das suas Lanchas ao indi
cado ponto, a qual encontrou efectivamente
o Bergantim «Marianna»
Deixarei falar o Commandante, trans
crevendo aqui as proprias palavras da com
municação que me dirigio em data de hoje:
« Em consequencia da participação que
« recebi de V. Exc." mandei immediata
» mente largar a lancha deste Brigue em di
— 48 —

reitura ao local que me foi indicado, e


hontem pelas 9 horas da manhã foi avistado
o dito Brigue ao mar da Ponta do Pargo
estando atravessado: a lancha foi direita
a elle, e logo que foi conhecida pelo Bri
gue, este navegou, e como havia calma,
}}
a lancha o alcançou, tendo feito alguns
tiros antes com balla, cahindo uma dellas
dentro do Brigue, que felizmente não of
: fendeu pessoa alguma, porém o Brigue
não atravessou, nem içou bandeira.
» Logo que a lancha atracou ao Bri
gue, o Aspirante do Batalhão Naval, Pe
))
dro Joze Corrêa, encarregado da expe
dição, conhecendo que o Brigue conduzia
gente sem passaporte, mandou mariar pa
ra este ancoradouro.
» O Capitão não fez resistencia, mas
devo diser a V. Exc." que o Aspirante me
))
participou que o Capitão lhe oferecêra du
zentas patacas e outras duzentas para a
guarnição da lancha, isto foi tão publico,
})
que toda a guarnição o confessa, as
}} sim como tambem se ofereceo di
nheiro a um pratico que eu mandei d'aqui
na lancha, tendo a satisfação de dizer a
—º —
V. Exc.", que não só o Aspirante repul
sou com a honradez de um Portuguez,
mas igual honradez teve toda a tripulação
da lancha; ainda depois d’isso foi ofere
cido um saco com moedas d’ouro para o
Oficial se servir do que quizesse, não ac--
ceitou, e vendo o Capitão e mais guar
nição do brigue , que a tripulação da lan
cha não se seduzia, tentou a tripulação
revoltar-se, o que constando ao Aspirante
encarregado da lancha, mandou ao Capitão
que a sua tripulação fosse para baixº,
colocando sentinellas em pontos seguros
e assim veio ao ancoradouro.» •

» A vista de tudo isto bem se deixa


vêr, que o Brigue conduzia gente sem pas
saporte, e que procurou todos os meios
de seduzir a guarnição da lancha, para
se evadir, prova evidente do seu contra
bando. »

» Peço a V. Exc.º que este negocio


seja examinado com todo o cuidado e que
se espere por decizão do Governo de Lis
boa a quem vou dár parte deste aconte
cimento. »

Logo que o Bergantim «Marianna» che


– 50 –

gou a este porto, e o Commandante do Bri


gue Douro me dêo conhecimento da appre
hensão, entreguei immediatamente todo o
negocio ao Poder Judicial, para o fim de
se haver o procedimento que fôr de Lei. —
Oxalá que pelo Poder Judicial se dê uma
lição sevéra, que sirva de escarmento aos
que tão escandalosamente se consagram ao
ominoso trafico desta nova especie de escra
vatura!
Deus Guarde a V. Fxc.° — Funchal
10 de Setembro de 1847. — Illm.º e Exm.º
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino. — O Governador Civil,
Joze Silvestre Ribeiro.
*--*E9@>-rº

Camara Municipal do Funchal — 2.°


Repartição — N.° 340 — Illm.º e Exmº Snr.
—Teve V. Exc." a bondade de dár conhe
cimento á Commissão Municipal, á que pre
sido interinamente, da sua circular aos Snrs.
Administradores de Concelho, datada de 31
d'Agosto ultimo, na qual estão fielmente
descriptos os crimes que despovoão esta Ilha,
e os males gravissimos que por efeito des
—51 —

ses crimes, todos os dias repetidos, esta


mos já sentindo, e progressivamente se tor
não mais intensos e damnosos.
Ahi, com referencia a outra circular
anterior, diz V. Exc.: «Por mau fado des
» te paiz tem-se aggravado nos ultimos me
» zes o mal que já naquella época eu tanto
» lamentava, e se por ventura não tiverem
» um proximo termo os escandalosos e in
» fames abusos que neste particular se estão
» praticando, eu agouro um horrivel futu
» turo a esta Ilha, que desgraçadamente
» nutre em seu seio filhos degenerados....
» os quaes não tem pejo, nem temor de
» Deus, nem o mais leve remorso de tra
» ficarem com seus irmãos do mesmo modo
» que outr’ora se traficava com os negros!
“ Um grande numero d’alliciadores per
“ correm as povoações e os campos com o
“ damnado intento de induzirem gente a e
“ migrar, e a tal ponto parece terem che
“ gado as cousas, que já elles recorrem á
“ violencia, arrancando de suas moradas
“ innumeras creaturas que nenhum desejo
“ teem d'abandonar seus lares.
“ Miseravel sêde de lucro que anima
- 52--

“ esses alliciadores a colherem com suas re


“ des um bando d'infelizes, cuja imagina
“ção inflammam, fazendo-lhes crêr que vão
“ encontrar minas de riquezas nesses paizes
“ longiquos onde os arrastam! Mil vezes
“ mais detestavel maquinação se á força os
“ obrigam a deixar a terra do seu nasci
“ mento !

Repetem-se estes trechos da providente


Circular de V. Excº porque nunca será de
mais repetil-os e publical-os, e porque el
les conteem as bases sobre que deve assen
tar o procedimento das Authoridades que
quizerem salvar este Districto do horrível
futuro para o qual caminha a passos largos,
e que V, Exc. mui bem prevê.
Elles resumem verdades que ninguem
entre nós desconhece. E tambem he verda
de que, em logar das delicias promettidas,
os miseros illudidos e forçados vão encontrar
um terreno encharcado, uma atmosphera ar
dente e matadôra, penosissimos trabalhos su
periores ás suas forças, tractamentos crueis,
flagellos de toda a especie, perda da saude,
e de membros, a morte para o maior nu
mero, e para os outros, com rarissimas ex
—53—

cepções, uma vida mil vezes peior do que a


morte, — uma vida de dores, d'angustias, e de
miseria. Não he menos certo que a ousadia
dos traficantes tem chegado até ao ponto de
escravisarem alguns oficiaes de policia em
pregados em os reprimir!.. E lá foram
vendel-os com outros infelizes colhidos em dif
ferentes siladas.

Pela illusão e pela violencia são escra


visados os negros: — pela illusão e pela vio
lencia são escravisados os brancos da nossa
Terra !..
Os homens empregados neste vilissimo
trafico atacão a segurança e liberdade do
cidadão, entregam a tormentos e á morte
muitos milhares de infelizes, da sua espe
cie, da sua côr, e da sua patria; arrancam
nos a seus paes, a seus filhos, a seus ma
ridos, a suas esposas, a suas familias; o
brigam-nos a sacrificar sua fazenda; despo
voam uma importantissima porção do terri
torio portuguez; matam a agricultura e a
industria decepando-lhes os braços; exercem
despejadamente a fraude; prejudicam consi
deravelmente o Estado; causam innu.era
veis males publicos e particulares; são uns
— 54 —

salteadores, uns assassinos, uns malfeitores


publicos, são réos de muitos e mui graves
crimes, reincidem diariamente nelles, são
flagello cruenssimo, peste destruidora deste
Povo.
E não haverá Lei que os puna?! —
Não a teremos nós?! — Será crivel que elles
ahi estejam com a mais revoltante ousadia,
praticando impunemente tantas maldades, tan
tas vilezas, tanta infamia, no meio de um
Povo civilisado, que tem Leis providentissi
mas, Authoridades para as executarem, e
força para as fazer respeitar, e para repri
mir os que tão audaciosamente atacam a or
dem social?!
Temos Leis, temos Authoridades, te
mos força. Tudo será convenientemente em
pregado. Assim o esperam todos os que res
peitam as conveniencias publicas.
Temos o alvará de 26 de Janeíro de
1818, e outras muitas medidas prohibitivas
do nefando trafico d'escravatura, tomadas
d'accordo com a inglaterra, e outras Nações.
Não será a côr dos escravos que ha de re
gular a execução dessas providencias, —
nem a filantropia que as dictou será modi
— 55 —

ficada por essa circunstancia, pelo dominio


do territorio onde os escravos vão traba
lhar, ou pelas apparencias illusorias com
que se pretende encobrir a escravidão, ge
ralmente condemnada. Tudo quanto se iden
tifica com a razão da Lei está comprehen
dido na sua disposição; e portanto a perda
d'embarcações, o degredo, as mulctas, são
penas applicaveis aos nossos inhumanos agen
tes descravatura branca, e aos que os servem.
Temos o alvará de 19 de Setembro
de 1761, que impõe aos que sujeitarem
homens livres ao captiveiro a pena commi
nada pela Ord. Lº 5.° Tit. 95.° contra os
que fazem carceres privados; e sem duvida
são carceres privados os logares onde são oc
cultamente guardadas, e as embarcações que
conduzem aos matadouros das mortiferas co
lonias inglezas milhares de victimas illudidas,
e barbaramente arrastadas a essas voragens,
—he sujeitar ao captiveiro forçar homens li
vres a penosissimos trabalhos por certo nu
mero de annos, que a morte geralmente en
curta, e poucas vezes deixa ultrapassar, mas
para ser substituida pela inhabilidade perpe
tua,
— 56 —

Temos a Ord. Lº 5° Tit. 65º que pune


com a ultima pena os ilhçadores; e certa
mente o são csses perversos que, conluiados
em prejuiso de terceiro, empregão continua
mente a mais apurada fraude em mui varia
das formas para attrahirem os incautos a uma
convenção depravada, a que sujeitam sua li
berdade, todos os seus commodos, a sua
saude, e a sua vida.
Temos, em hypothese muito menos gra
ve do que as mencionadas, o Alvará de 4
de Julho de 1758, o de 6 d'Agosto de
1660, e as Providencias authorisadas por
Portaria de 9 de Julho de 1810, que pu
nem com prisão, trabalhos, mulcta de 1603
reis, e perdimento de barco, o simples fac
to de sahir da Ilha sem passaparte, e o pu
nem tanto na pessoa do passageiro, como
nas dos que o conduzirem e receberem.
Temos as diversas Leis que rigorosamen
te castigam as deserções de soldados, e quem
as favorecer; — e não são poucos os solda
dos que d'aqui tem desertado, colhidos nas
mesmas redes dos traficantes descravatura,
— sendo publico que na embarcação afreta
da por elles, e ultimamente apresada pelo
— 57 —

Brigue Douro, estão dois soldados deserto


tores entre os escravos que ella conduzia.
Temos as Leis que punem os salteadores
d’estrada, applicaveis aos traficantes que as
saltam e roubam gente pelas estradas e pe
las casas indefesas que invadem, e vão ne
gociar e lucrar com a liberdade e vida des
ses seus similhantes.

Temos Leis que authorisam a qualquer


do Povo para luctar contra esses malfeitores
que ahi andam dispersos sempre em flagran
te delicto contra a segurança dos cidadãos;
e bem haja quem já fez uso deste direito em
um dos concelhos desta Ilha.
Temos finalmente a Lei da salvação do
Povo que faz calar todas, e manda tudo.
Na presença dos factos horrorosos que
V. Exc." refere, e que todo este Districto
conhece, a Commissão Municipal desta Ci
dade não podia deixar de levantar com V.
Exc." e com a parte sã desta provincia um
alto brado d'indignação vendo como esses fac
tos, sempre repetidos e aggravados, passam
altivos e impunes por cima das Leis que os
ameaçam.
E a Commissão espera que não serãº
— 58–

em vão os gritos fortes e anciosos que se ele


vam continuamente de todos os pontos desta
provincia por efeito d’uma calamidade maior
que todas quantes teem recentemente passa
do por ella, e com tudo mais facilmente re
mediavel do que as outras. — Necessidade
publica, — extraordinaria, — gravissima, —
Leis, Authoridades, força, vontade geral,
tudo ahi está; e que mais he preciso para
remediar esse mal, já, sem perda d'um mo
mento ?

Não he menos d'esperar a voliosa coo


peração do brioso corpo de Commercio des
ta Praça em tão louvavel empenho. A Com
missão tem como certo que nenhum dos dig
nos membros d'aquella respeitavel Corporação
negará a V. Exc." a salutar e honrºsa pro
messa de não dar protecção alguma, direc
ta, ou indirecta, a embarcação que se em
pregar no criminnso e vil trafico de que se
tracta.

Conta tambem que os Tabelliães não


carecerão d'intimação de seus superiores pa
ra deixarem d'authorisar por um Instrumen
to publico o facto ilicito da escravidão, que,
ardilosamente ornada com as vestes da le
– 59 —

galidade a titulo do pagamento de passa


gem, comedorias, e outras despesas alta
mente sobrecarregadas, serve como de direi
to aos traficantes para venderem os nossos
concidadãos a quem mais lhes der por el
les, separando a mulher do marido, os fi
lhos dos paes, em terras estranhas, interes
sadas nesse trafico, tão repugnante á natu
reza e aos bons costumes, como ás filantro
picas intenções do Governo da Nação a que
pertence.
Confia que por este, e por todos os
meios possiveis se conseguirá que os emi
grados com passaporte se hão de apresentar
plenamente livres nas colonias inglezas, e que
os Mestres dos navios se hão de obrigar a de
sembarcal-os ahi como taes, fazendo-se cons
tar, por via segura, aos respectivos consules
portuguezes que todos os emigrados , que
d'aqui sahirem teem ampla liberdade de irem
prestar seus serviços a quem mais lhes agra
dar ou convier. — O Estado deve-lhes pro
tecção contra a fraude, e para lhes assegurar
a liberdade no uso de suas faculdades contra
os que pretenderem impedir-lha.
Tem finalmente muita confiança em V.
- 60 –

Excº e em todas as Authoridades, das quaes


deve vir o remedio que por si, em nome do
Município, e com todo o Districto pede; e
com isto descança e conclue estas reflexões
que por deliberação sua tenho a honra d'offe
recer á sá: ia consideração de V. Exc." —
J), us Guarde a V. Exc.° — Funchal 17 de
Setembro de 1847. — Illm." e Fxmº Snr.
Conselheiro Governador Civil do Districto. —
O Fiscal servindo de Presidente, Servulo
Drummond de JIenezes.
*-*****><><=>----

2º Repartição — Lº 3.° — Nº 379 — Illm."


Snrs. —Tive a honra de receber o oficio de V.
S." N ° 340 datado de 17 do corrente, no qual,
em seu nome, e no dos moradores do Município,
exprimem com toda a energía a desagradavel im
pressão que lhes tem feito a mui prejudicial emi
gração de colonos para Demerara e outras possºs
sões inglezas. — V. S." desafogam nesse oficio a
mais justificada indignação contra as pessoas que
lidam no ruim trafico de correcteres, seduzindo
e arrastando um sem numero de familias a aban

donar a patria, empregando todo o genero de se


ducções para illudir tantos infelizes, a quem des
– 61 —

vairam até o ponto de os fazerem trocar o mais


formozo e saudavel dos paizes por outros, onde os
aguarda a doençá, e talvez uma prematura mor
te. — Nesse mesmo oficio lançam V. S." um olhar
attento sobre a Legislação do nosso paiz, cujas
providencias salutares sobre este negocio pódem
na sua applicação pôr um termo ao mal, median
te os zelozos esforços das authoridades, para as
quaes V. S." appellam.
No que depende de mim, e dentro da es
phera das minhas attribuiçães posso asseverar a V.
S." que continuarei a empregar todas as dili en
cias possíveis para obstar a esse damnoso tracto;
convencido profundamente, como estou, de que
presto um bom serviço á Madeira , empenhando
me em oppôr um dique á torrente devastadora,
que ameaça de a assolar e reduzir a um ermo.
Concebo igualmente a esperança de que as
authoridades todas, no circulo da sua competen
cia, farão quanto dellas depender para destruir es
te cancro roedor da substancia desta formoza pos
sessão portugueza, digna de melhor sorte.
Se porem, Illm." Snrs., devemos todos com
bater de frente a fatal emigração, he igualmente
nosso dever procurar por todos os meios imagi
— 62 —

maveis melhorar a situação das classes menos a


bastadas, por maneira que tenham interesse em
não abandonar o seu paiz natal.
Para se conseguir este optimo resultado he.
mister trabalhar muito, por muito tempo, e re
correr a meios mui variados, a profundas combi
nações.—Já por vezes eu tenho aventado a idea
de que he indispensavel considerar muito attenta
mente a actual organisação da propriedade nesta
Ilha, para se conhecer o que ha ahi a reformar
no interesse da associação geral.—Já por vezes
tenho lamentado que os proprietarios não residam
em suas herdades, vivificando com a sua presença
e cuidados assiduos a agricultura, espalhando por
esses campos a abundancia, e finalmente prestan
do todo o genero de coadjuvação aos que immedia
tamente se occupam ne trafico agricolo. — Não me
tem esquecido aconselhar a conveniencia de intro
duzir entre os Madeirenses esse espirito de asso
eiação que n'outros paizes tem sido o abençoado
instrumento de grandes melhoramentos, dando vi
goroso impulse ao desenvolvimento da publica pros
peridade. Associações agricolas, e de industria,
seriam summamente proficuas a este bello paiz, on
de tudo está entregue á deficiencia e isolamento
—68 —
do individualismo. — Igualmente tenho por vezes
chamado a attenção das authoridades e dos mora
dores sobre a necessidade de serem arborisadas as
serranías da Ilha, para que a humidade accuda a
este sóllo que em partes se tornou já bem arido.
— Esta Ilha não será feliz em quanto entre as suas
diferentes povoações se não estabelecèrem boas vi
as de communicação, que abreviem as distancias,
e dêem commodo transito a todos os meios de lo
comoção, evitando-se assim o terrivel inconvenien
te de se fazer quasi todo o peneso quanto impro
ductivo serviço de carreto e transporte ás costas
de homens; e promovendo-se esse giro commercial
interno, que na opinião dos bons economistas he
o mais proveitoso aos povos.
Uma vez pois que, conservando-se a paz, o so
cego e a união, se tratar muito sériamente de mar
char no rumo que deixo indicado, he bem de crer
que se consiga melhorar a sorte do povo, augmen
tar as suas commodidades, e tornar-lhe gostosa a
sua residencia neste torrão.
He força combater a todo o transe os perfidos
manejos desses illiçadores inhumanos, que pouco
e pouco vão despovoando a Madeira; não nos es
queçâmos porem de que todas as diligencias dase
– 64 –

ducção serão impotentes, desde o momento em que


os povos estivérem ligados á terra, que os vio nas
cer, pelos vinculos indestructiveis do amor e do
interesse Como sahirá da patria, como abandona
rá os seus lares, como hirá em demanda de lon
ges terras, como se deliberará a peregrinar — uma
familia que vive no seio da abundancia e tem mo
tivos para estar satisfeita com a sua sorte?
O que tudo tenho a honra de oferecer á consi
deração da Camara, em resposta ao seu citado offi
cio.
Deus Guarde a V. S." Palacio do Governo Ci
vil no Funchal aos 21 de Septembro de 1847. —
Illm.º Snr. Presidente e Membros da Commissão
Municipal do Funchal. — O Governador Civil, Jo
sé Silvestre Ribeiro.

*==>93=3º#Qg->caza=--

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — Nº 2113— Illm.º e


Exmº Snr. — Em additamento á materia
dos oficios sob N.° 1 183 e 1189 que tive a
honra de elevar por mãos de V. Exc." á Au
gusta Presença de Sua Magestade, venho cu
—65—

tra vez invocar a attenção de V. Exc." so


bre o mesmo assumpto; porque estou per
suadido de que não ha explicações que sobe
jem quando se tracta de remediar um mal
que tão profundamente ameaça a existencia
politica destabella possessão da Coroa Portu
gueza.
Ao apresentar-se na ordem moral um
phenomeno como este — a emigração de cen
tenares de familias, de um paiz abençoado
para outro, onde as aguarda com prompto
arrependimento um clima inhospito e homici
da, o pensamento que logo succede ao trans
porte de admiração occasionado pelo especta
culo do phenomeno, he cada um perguntar a
si mesmo pausada e conscienciosamente —
«Pois qual he a causa de tal phenomeno?»
O furor de emigrar he tamanho; tama
nha he a cegueira com que o povo desta
ilha se vai d'ella sequestrando; que se me
eu não receiasse de ser taxado de visiona
rio, diria a V. Exc." que a emigração aqui
he uma nova especie de monomania; he uma
enfermidade moral, que, assim como ata
ca de periodo em periodo certas especies
de irracionaes, talvez tambem propelle o ho
— 66 —

mem a abandonar a sua terra, a trêco de


vantagens delusorias que se promette nou
tra que não conhece.
Não he hoje doutrina corrente e bem as
sentada entre os homens da sciencia, ser o sui
cidio uma verdadeira alienação mental, cu
jo efeito pathologico he exclusivamente ce
gar o homem té o ponto de querer não ser
para ser melhor? Quem sabe se o furor
emigratorio não he tambem uma enfermida
de analoga? Quem sabe se não he um co
mo contagio moral, do qual se póde dizer
o que dice Virgilio da fama — « vires acqui
rit eundo » — obra com tanta maior violen
cia, quanto maior he o numero das victimas
que tem feito?
Seja o que for, esta he a explicação
que logo lembra, direi mesmo a que me
lhor quadra com a magnitude do facto a
que a refiro; por que, Exmº Snr., por
grandes que sejão as artes dos alliciadores
que promovem a emigração, por grandes
que sejão as privações que sofrem na patria
os emigrandos, não está na ordem natural
das cousas, que o homem falho de recur
sos, o homem de habitos ferrenhos, como
— 67 —

he o homem do povo, principalmente o in


sular, dê tão facil adeos á terra de seus
paes, á terra em que nascêra e se creára,
á terra onde deixa ao desamparo os mais
charos penhores do coração.
O que me parece melhor averiguado he
que — seja ou não seja a emigração uma
mania, — ela revela no instincto do povo
uma idea fixa, que poderosa por demais,
mesmo a não sabidas d’elle, o vai forçam
do a cortar por todas as difficuldades, a
romper todos os laços, para ir debaixo de
um ceu estranho preencher o seu destino.
— Qual he essa idea ?
Uma e muitas vezes tenho interroga
do miseraveis que, tomados do desejo de
emigrar, se me apresentavam a requerer
passaportes; e pelas respostas que lhes ex
torqui á fôrça de geito e paciencia, tenho
podido alcançar que o principio vital do
desejo que os dominava, era a prevenção
em que estavam de que aqui, na sua terra,
nunca lhe seria dado emergir da situação
percaria em que laboravam, e em que se
sentiam definhar de dia para dia; porque el
les crem que ha o quer que he; ha uma
– 68 —

fôrça estranha e fatal. um poder mau


immutavel que os tem constantemente en"
cadeados ao poste do sºfrimento.
O reparo que logo se antolha a quem
se dºr ao trabalho de traduzir esta preven
ção do povo, he que alma que chegou a
conceber tal pensamento, não he uma alma
morta de todo ; não he intidade sem valor,
derrancada pelo estado de desesperação em
que tem vivido sempre; — he, bem longe
disso, uma alma que tem o instincto do
seu direito, e a consciencia de sua fôrça ;
uma alma que sente em si um futuro, e
quer ascender e marchar para elle; uma
alma, em cujo seio se não apagaram ainda
os santos estimulos da humanidade, a ambição, e
o amor do progresso e aperfeiçoamento pessoal.
A posteriori confirmam os factos as illa
ções da rasão. Pesso assegurar a V. Exc."
que a maior parte da gente que d'aqui tem
abalado, não são do refugo da plebe; não são
destas existencias anonymas, que só obedecem
aos instinctos da naturesa animal, e se preci
pitam como fézes na massa da população. São,
pelo contrario, bons operarios, artifices de
prestimo, e pricipalmente lavradores diligen
tes, e mais ou menos bem afazendados; os
— 69 —

quaes, ou vendem, ou largam por mão quan


to aqui possuem, e, com o mais que pódem
liquidar, vão em demanda de terra que lhes
seja menos madrasta.
Aqui cabe chamar a attenção de V. Exc."
sobre a indole de certas providencias, as quaes,
tomadas com a melhor intenção, tendem to
davia a aggravar o mal da situação, ou a pro
vocar outra maior lástima. Fallo das exi
gencias policiaes, com que se tem procurado
obstar indirectamente á emigração. Estas
exigencias, taes quaes se acham estabelecidas,
requerem incommodos pessoaes, e custam
muito dinheiro. D'aqui vem que só os homens
que teem alguns recursos, pagam por ellas,
e tiram passaporte, no entretanto que os pro
letarios, ou continuam a enfestar a terra com
suas malfeitorias, ou se vendem como negros
aos traficantes para serem exportados como
mercancia de contrabando. Eu quizera que
o resultado de taes medidas fosse outro; quizera
que facilitassem a emigração dos miseraveis
e dos vadios, difficultassem a dos homens pres
taveis, e não creassem o abominavel trafico da
escravatura branca. Perdo-me V. Exc." es
ta digressão.
— 70 —

He costume do povo queixar-se sem


pre. O desta ilha, por muita razão que te
nha pa a fazel-o, não he, em meu enten
der, dos mais infelizes povos da terra. Com
quanto seja má, não he desesperada a sua
situação. A suavidade do clima que habita,
he um elemento de prosperidade inaprecia
vel e inauferivel, que sobremaneira lhe faci
lita a tareia da existencia. Quanto não he
mais para lamentar a sorte de outros povos,
que para poderem manter a vida no ponto do
globo que lhes coubera em sorte, precisam de
luctar arca por arca e a toda a hora com um
solo ingrato, com um céo de bronze, com um
clima desabrido e doentio, e com mil outras
difficuldades que fôra longo enumerar? Lo-o
não são estorvos desta ordem, não são males
physicos, os que mais propellem o povo da
Madeira a fugir a sua terra.
Digo — não são os que mais propellem
— porque ha com efeito alguns limites pos
tos por Deus ao desenvolvimento da prospe
ridade material della. Tractarei destes em
primeiro logar. •

A estructura geologica da ilha he tal,


que requer da parte do lavrador, que houver
—71 —

de cultivar terras della, avanços considera


veis, com que ou de ordinario ele não pó
de, ou se póde, todo o capital que a elles
consagrar, terá de ser um fundo morto, que
só redundará em proveito do senhorio do so
lo. Ladeiras como são a maxima parte
dessas terras, ha muito que, arrastadas pe
los enxurros do inverno, teriam deixado es
burgados os serrilhos das montanhas, se as
não contivessem grandes socalcos de pedra,
e que atravessados, paralelos uns aos outros,
nas lombas da terra, apresentam o aspecto
de uma grande escadaria. Nos espaços in
termedios he que está reprèsa a porção de
terra mais rica e mais appropriada para a
cultura das vinhas; mas os lanços de muro
que a encerram, e os degrass que formam
essa escada , são pela maior parte bemfeito
rias do lavrador , que o tornam copproprie
tario com o senhorio no mesmo solo. -

Quando os vinhos valiam muito, e a ter


ra com menos custo os produzia em maior
cópia, podiam os cazeiros com os proventos
d seu trabalho fazer face ás despezas deste
dependiosissi no amanho. Hoje porém que o
Solo está mui cansado, e o preço dos vinaos
— 72—

tem descabido a menos de metade do que fô


ra, não ha productos que paguem ao lavra
dor o seu trabalho, muito menos que o ha
bilitem a fazer tão crescidas despesas com
paredes só adstrictas á sustentação das terras
ladeiras D'aqui vem começarem a presen
tir os lavradores, que dando todo o seu tem
po e trabalho a terias de tão difficil ama
nho, fazem um mau negocio, um negocio
de pura perda para elles.
Outro obstaculo que sobre modo aggra
va este estado de cousas he a escassez de a
guas de regadio. Raras são as terras da ilha
que não carecem de regadas nos tempos de
maior sêcca. Antigamente não era tanto
para sentir esta falta — havia com efeito
mais arvoredos nos cumes da terra, mais
humidades no ceo, mais cabedal d'agua nas
fontes. Agora porém que as culturas se teem
mais alargado para o interior, e o macha
do dos damninhos tem devastado essas ser
ras, o clima tem-se tornado mais arido, a
necessidade de regas frequentes tem cresci
do, o volume das aguas tem minguado.
Acham-se nos altos da ilha grandes ban
cos de terra, inteiramente limpos de cultu
— 73 —

ra, e calvos de arvoredo. Perguutará V.


Exc." —Porque se não arroteam e aprovei
tam melhor esses terrenos ? — Afóra outra
rasão que logo apontarei, o que mais tem
obstado á cultura deles, he a falta d'aguas
de regadio. Ai do proprietario que para
culturas que ahi emprehendesse fosse derivar
as aguas que apenas bastam para as culturas
á beira mar!.... sem fazer com isso pros
perar as primeiras, dera cabo das segun
das; trocára um lucro certo por outro incer
to; arruinar-se-hia inteiramente.
Mas o que mais ata as mãos ao lavra
dor; e que mais o constrange a cruzar os
braços e morrer de fome, ou a emigrar pa
ra ir morrer de peste, he o modo porque se
acha constituida na Madeira a propriedade
territorial debaixo da maligna influencia de
duas instituições dos tempos feudaes — vin
culos e contracto de colonia.
Duas terças partes das terras araveis
da Ilha são terras vinculadas. Esta ominosa
condicção, vedando a essas terras todo o
augmento de valor que aliás lhes poderia dar
a liberdade das transacções, tende necessa
riamente a deixal-as num estado estaciona
— 74 —

rio ou decadente, que de dia em dia im


peiora. Quem tiver qualquer experiencia
de como as cousas aqui correm, atravessan
do os campos da ilha vai dizer a ponto —
quaes são as terras vin uladas — quaes as li
vres. Tanto influe a inalienabilidade do ter
reno no estado de cultura e aproveitamento
delle !
E dessa condicção não ha melhoral-o
os respectivos proprietarios. Delles só curam
de disfructar, como arrendatarios, o que lhes
produzem as fazendas, que talvez nunca vi
sitaram. Delles, por muito que o quizess
sem . não teem os meios necessarios para
coadjuvarem os colonos no fabrico daquellas
bemfeitorias que só a eles utilisam, porque
só servem para lhes terem mão nas terras.
E quasi todos, vivendo na cidade a maior
parte do anno, condemnam as suas herda
des a todos os inconvenientes do absentismo
irlandez; quando as não arrendam a espe
culadores, cuj s interesses estão em vexar e
despir os pobres dos colonos!
As terras nos cumes da Ilha, de que
acima falei, e cujo estado de devastação he
uma das mais poderosas causas da aridez
— 75 —

do clima, e da crescente diminuição dos ma


Danciaes das aguas, pertencem pela maior
parte a morgados. Tanto mais he para las
timar este abandono, quanto he certo que,
a serem executadas as leis, nunca teria elle
tido logar; nunca se achariam redusidas a
estado de charneca, terras que foram doadas
de sesmaria, e que ainda modernamente fo
ram submett das ás sábias disposições do Al
vará com força de lei de 18 de Setembro
de 1811; — Alvará . que manda aos senho
ríos as aproveitem dentro de certo praso,
sob pena de serem dadas de aforamento
perpetuo a quem houver de aproveital
as. Mas, como era de esperar que hou
vessem de ser executadas providencias, que
tão profundamente entendiam com os inte
resses dos então poderosos da terra ? Nem
por este providente Alvará , nem pela lei das
sesmarias , nunca se fez obra, que eu saiba,
em prol dos interesses da communidade. D'a
qui resultou, que ficando accumuladas nas
mãos de particulares tão crescidas porções de
terreno, logo que as precisões da colonia che
garam a despi-las do mato e arvoredos que
nellas se creavam espontaneos, assim ficaram
escalvados e em abandono, com notavel que
— 76 —

bra dos interesses do povo e do Estado.


A derradeira das causas dos males que
sofre o povo, e que em certa medida são par
te para o furor de emigração que entre ele
lavra, he o contracto de colonia. Assim se
denomina na Madeira o contracto em virtude
do qual he obrigado o colono que bemfeitori
za terra de outrem, a partir com este me
tade dos fructos della. Quando este contrac
to foi aqui introdusido, as terras eram de si
tão ricas, que metade dos fructos dellas pa
gova largo os trabalhos de quem as cultivava.
Hoje porém as cousas teem mudado muito de
face. Quanto mais exhaustas estão as terras,
tanto maior trabalho demandam do colono,
tanto menos pagam esse trabalho. Isto digo
eu em geral. Terras haverá que não entrem
nesta regra; terras haverá, cujo rendimento
pague com vantagem, tanto o trabalho de
quem as cultiva, como o juro do capital que
representam, pertencente ao senhorio do solo.
Mias isso mesmo demostra quanto he absurda
a instituição, que sob apparencias da mais
restricta igualdade, envolve uma grandissima
desegualdade, uma enorme quebra de justiça,
Figure-se V. Exc. duas fazendas do mes
— 77 —

mo tamanho, mas tão diferentes entre si pe


la estructura geologica do solo em que de
moram, que uma está sentada n'um declive,
e a outra n'um valle. Esta para produzir cer
ta importancia de fructos precisa de um tra
balho como dois; aquella, para dar a mesma
importancia, precisa de um trabalho como
quatro. Todavia metade dessa importancia
he tanto n’uma como noutra fazenda a paga
do trabalho de quem as cultivou! He isto
justo? De certo que não.
I

Inclino-me pois a crer que mais cedo ou


mais tarde a mesma força das cousas hade
trazer colonos e senhorios ao ponto a que de
vem vir, para se conciliarem mutuamente os
interesses de uns e de outros. Os colonos
já começam de abandonar em tamanha escala
as terras dos senhorios, que muitos destes já
sofrem por isso consideravel desfalque em
suas rendas. Quando o mal tiver chegado
ao seu auge, e os colonos tiverem melhor
conhecido os seus interesses, ao contrato de
colonia succederá o de arrendamento. Em
vez de partirem com o senhorio metade dos
fructos das terras onde põem o seu trabalho,
os colonos arrendar-lhas-hão por um preço
— 78 —

mais ou menos alto. segundo ellas forem


mais ou menos productivas, e de amanho
mais ou menos facil.

E que hão de fazer os senhorios? hão


de resignar-se. Hão de abandonar a v da
de bruguezes, para se volverem ás suas ter
ras, para as irem cultivar por sua conta.
Isto não he um mal. A necessidade os
reconciliará com os habitos singellos da vida
dos campos; a economia, a ordem, a abun
dancia tornarão a sentar-se á meza del
les; a saude e as virtudes de seus maiores
será o melhor patrimonio de suas familias.
Tanto he certo que não ha mal, que não tra
ga comsigo algum bem.
Resumindo pois o que levo dicto, apoia
do nas rasões expendidas parece-me poder
assegurar a V. Exc." que a emigração para
fóra deste paiz tem por base uma prevenção
que não he inteiramente falha de verdade. —
O povo sofre, e sofre deveras. As princi
paes causas deste sofrimento são quatro; —
duas physicas, e duas moraes. As causas
physicas são: 1.° — a difficuldade da cultura
do solo em rasão de sua peculiar estructura
geologica — 2.° — a escassez das aguas de
– 79 —

regadio, de que muito carece a maior par


te das terras da ilha. As causas moraes
são — 1.° — a inalienabilidade de uma gran
de porção de terras em rasão dos vinculos
que as oneram. 2.° — o contracto consuetu
dinario em virtude do qual he obrigado o
colono a partir com o directo senhorio me
tade dos fructos da terra que cultiva.
Combater, destruir completamente a
primeira causa he impossivel; he sim possivel
minoral-a. E se me não engano, consegue
se esse rezultado, uma vez que a lei pre
vidente distinga duas especies de bemfeito
rias rusticas, umas permanentes outras tem
porarias; e ponha as primeiras a cargo do
dono do solo, as segundas a cargo do co
lono. Todas as bemfeitorias que só tenham
de aproveitar ao solo, correrão por conta
do senhorio delle; se este não póde, ou não
quer fazel-as, fal-as-hão os cazeiros, que se
pagarão do valor dellas por uma parte das
novidades.

A segunda causa reclama da parte do


Governo de S. Magestade a mais seria at
tenção. Se as serras chegarem a revistir
se; se uma boa administração florestal ani
– 89 —

mar o gosto da plantação de mattas, e co


arctar a izenção do machado devastador por
esses restos de arvoredos que ainda duram,
a progressiva diminuição das aguas terá um
termo; e se forem bem aproveitadas as que
ainda ha, não será difficil resgatar a lavoi
ra das peas que ora a trazem tão mesquinha
e atrazada. Fez a Junta Geral do Distric
to em sessão extraordinaria do anno de
1839 alguns trabalhos a este respeito, que,
segundo me consta, merecem bem a pena
de uma revisão. Opportunamente terei a
honra de chamar a attenção de V. Exc."
sobre elles.

O cancro das terras vinculadas já ago


ra não he um mal desesperado. Parece-me
que felizmente para esta terra, em face do
providente Decreto de 13 de Setembro de
1831, e da interpretação que lhe tem da
do tanto a Relação de Lisboa, como o Su
premo Tribunal da Justiça, poucos serão
aqui os morgados que compondo-se de Va
rias instituições, hajam de subsistir; porque
poucos são os que rendem mais de seis mil
cruzados, ainda que cada uma das institui
ções renda mais de 2003000 rs.
No entretanto que os interesses dos fi
lhes segundos não conseguem vencer as re
sistencias dos primogenitos, levando a cabo
uma revolução solutar que em germen está
na lei, bom fôra que o Maternal Governo
de S. M. su citasse a observancia das dispo
sições do alvará de 18 de Septembro de
1811; bem fora que compellisse os senhores
de vinculos a abrirem mão das terras que
não aproveitam , para serem dadas de afora
mento a quem houvesse de cultival-as; bom
fôra que criasse neste Districto um Tribunal
Administrativo pela feição do que antiga
mente superintendia nas aguas e arvoredos
da ilha, debaixo do nome de Junta dos Me
lhoramentos da agricultura.
Quanto á quarta e ultima das causas
do sofrimento do povo atraz deixo indica
das as providencias a meu ver mais condu
centes a removel-a. He a lei fazer substi
tuir o contracto por escriptura ao contracto
consutuedinario, o arrend mento dos fructos
a dinheiro , á partilha delles em especie: he
a lei distinguir as bemfeitorias rusticas em
temporarias e permanentes, e impôr ao se
nhorio a obrigação de fazer estas e ao ca
–82–

zeiro a de fazer aquelas, he a lei finalmen


te compellir o senhorio a não abuzar da
sua fôrça em prejuízo do caseiro, nem es
te da sua astucia em prejuizo do senho
I'10.

A lucta entre estas duas ordens de in


teresses cessará inteiram n’e, uma vez que
cesse a anomalia de serem dois os senhores
da mesma herdade — o senhorio pelo solo
— e o caseiro por bemfeitorias, de que o
solo não pode prescindir, e estão por isso
no caso das encravações O modo de con
seguir-se isso lentamente mas radicalmente
he favorecer por todos os meios possiveis a
conversão do contracto de colonia no de ar
rendamento, ou melhor — de aforamento.
Eis-aqui. Exmº Snr., quaes são em
meu entender, as verdadeiras causas dos
males pue promovem a emigração; e quaes
os remedios que combatendo esses males,
terão por ventura o feliz rezultado de a fa
zerem cessar por uma vez. Entendo que
em logar de imaginarem-se expedientes que
tendam a reprimir os efeitos desastrosos de
um mau pensamento, he melhor esclarecer o
espirito que concebeu esse pensamento; he
— 83 –

melhor annular a intenção que forceja pôl-o


por obra. A este fito he que atiram as hu
mildes indicações, que por mãos de V.
Exc." tenho a honra de submetter á eleva
da sabedoria do Governo de S. Magestade.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 23
de Setembro de 1847. — Illin " e Exm.º Sr.
Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios
do Reino. — O Governador Civil, Joze Sul
vestre Ribeiro.
—–=&es==----*

Circular aos Administradores de Concelho.

2.° Repartição — L.º 5.° — Nº 595 — Illm.º


Snr. — Tristissima he a epocha em que vivemos
os homens de hoje!
Os odios dos partidos, a sanha das facções,
e prurido do interesse, levados ao maior gráo de
exacerbação, a que por ventura teem chegado no
discurso dos seculos, — hão sido assaz poderosos
para transtornar, ao que parece, todas as ideas
do justo e do injusto, — para envenenar todas as
intenções, ainda as m is ou as — para fazer in
terpetrar em ruim entido os fac s mais justifi
cados, — para levantar cau, uias, e adulterar a
verdade . . . .
--84

Esta melancholica reflexão me he suscitada,


muito naturalmente, por uma circunstancia que
devo communicar a V. S º acompanhando-a de al
gumas ponderações, que julgo indispensaveis pa
ra rectificar a opinião publica sobre um assump
to que muito de perto nos toca.
Ao vêr a diligencia e perseverança com que
seguimos attentos o importante negocio da emigra
ção de colonos para Demerara e outras possessões
Estrangeiras, mais de uma pessoa tem gritado que
he este o unico paiz onde se prohibe a emigração dos
povos, a qual he não só permittida mas até animada
em outros, onde se comprehende a conveniencia de
deixar sahir livremente o cidadão que quer ir bus
car a sua fortuna, ou melhorar a sua sorte.
Mas quem póde asseverar que na Madeira se
prohibe a sahida dos moradores, a emigração de
colonos para onde muito bem o querem? Nin
guem por certo. — O que altamente se prohibe, o
que decididamente se veda, he a emigração clan
destina e fraudulenta, a qual póde occasionar os
mais graves e serios inconvenientes. E com efei
to, quem não vê que, permittindo-se a sahida de
toda a gente, sem a observancia dos regulamen
tos policiaes, e sem as prevenções tendentes a acau
telar prejuizo de terceiro, se alimenta a impuni
dade do crime, se favorecem todos os transtornos
da ordem, da tranquillidade publica, dº segurança
das pessoas e da propriedade? Se a um navio na
cional ou estrangeiro, fôr livre tomar a seu bordo
todos quantos passageiros se lhe apresentarem; —
se a um barco de pescadores, ou do serviço dos
portos e da costa, fôr facultado o cenduzirem de
terra para bordo todos e quaesquer individuos, in
discriminadamente, e a qualquer hora, ainda da
noute...... hade forçosamente succeder que um
pae póde affoutamente abandonar a familia a quem
servia de arrimo ; a esposa o marido, a mãe os
filhinhos, que ou ficam chorando no berço, ou ca
recem ainda dos cuidados maternaes; o filho deso
bediente e devasso ao pae decrepito; o tutor aos
erfaos, a quem leva a substancia e os haveres; o
ereado ao amo e até o malfeitor buscará o refugio
da emigração para subtrahir-se ao merecido casti
go.... E não se diga que eu estou forjando hy
potheses imaginaveis, não se diga que eu estou
traçando um quadro de phantasia, ou empregan
do um meio oratorio para desvairar a opinião!
Oxalá que a experiencia de tantos annos não po
desse convencer a todos da verdade das minbas
—86 —

apprehensões! Oxalá que a bem amarga realidade


dos factos não comprovasse a tal ponto a minha
exposição , que, bem longe de exagerada , deva
ser tida por muito pallida e pouco energica!...
Quaes clamores não se levantariam contra es
te Governo Civil, se por ventura não forcejasse
por impedir o mal neste caso ! O dito do grande
Affonso de Albuquerque parece ter sido proferido
para os dias de hoje: º Mal com El-Rey por amor
« dos homens; mal com os homens por amor d'El
« Rey. »
Lamento eu bem profundamente que os meus
desejos nao possam de todo o ponto realisar-se, e
que a despeito de tão terminantes recommenda
ções, ainda aqui e acolá escapem á vigilancia das
authoridades administrativas alguns foragidos.
He por esse motivo que approveito esta onportuni
dade, para suscitar a execução, das repetidas or
dens que a este respeito tenho expedido, e rogar
encarecidamente a V. S." que não afrouxe no
empenho de impedir por todos os meios ao seu al
cance a emigração clandestina e fraudulenta dos
moradores do Concelho a seu cargo.
Ao passo por em que isto lhe recommendo, de
sejára que V. S." tivesse a voz de Stentor para
— 87 —

fazer saber a todos, — que respeitamos a Liber


dade e a Lei Fundamental da Monarchia, e já
mais nos arrojamos a embargar os passos a qual
quer cidadão ou familia, que quizer sahir deste
paiz, sujeitando-se aos regulamentos policiaes, e

salvo o prejuizo de terceiro.


Deus Guarde a V. S.° — Palacio do Gover
no Civil no Funchal aos 7 de Fevereiro de 1848.
— Illm." Snr. Administrador do Concelho de ....
O Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

Ao Ministerio da Marinha.

2° Repartição — N.° 139 — Illm.º e Exm.º


Snr - Foi sempre meu parecer, e ainda hoje he,
que no porto do Funchal deve estar estacionado
um navio de guerra, afim de impedír a fatal emi
gração clandestina de colonos para Demerara, e
Outros pontos das Indias Occidentaes, bem como
para evitar o contrabando.
Neste sentido pedi por vezes ao Governo de
Sua Magestade, a graça de ordenar que esta exi
Sencia do serviço publico fosse satisfeita; até que
– 88 -

finalmente as occorrencias politicas do anno pas


sado tornaram possivel, e efeituaram, a acqui
escencia aos meus votos, vindo estacionar-se nas
agoas da Madeira o Brigue de Guerra « Douro.»
Optimo serviço tem prestado este navio, e
por tal modo me tem agradado o zêlo e dedica
ção do seu Commandante, o Capitão de Fragata
Vicente Joze dos Santos Moreira Lima, que nesta
occasião me dou por obrigado a testemunhar-lhe os
louvores que merece, e nos quaes cabe uma parte
aos seus oficiaes.

Grande he pois a repugnancia com que hoje


venho apresentar á consideração de V. Exc.º al
gumas ponderações, tendentes a estabelecer a ne
cessidade de ser removido o dito Brigue, e subs
tituido por uma Escuna de Guerra.
o funesto - Pronunciamento» da Madeira foi

parte para que os Cofres Publicos deste Dist, icto fi


cassem exhaustos, e que na actualidade comece a
experimentar-se uma sensivel falta de recursos pe
cuniarios para satisfazer aos encargos do Estado.
Neste estado de cousas. aggrava consideravelmen
te a nossa situação a despeza extraordinaria, e
aliás muito avultada , que he necessario fazer com
o Brigue, a qual chega a bem perto de dous con
tos de reis por mez. — Desgraçadamente , quando
se restabeleceo aqui o Legitimo Governo, foi mis
ter fazer despezas immensamente crescidas com o
pagamento de mantimentos, comedorias, e soldos
do Brigue º Douro», Corveta «D. João 1º», Es
cuna «Duque da Terceira», Vapor «Infante D.
Luiz», incluindo a despesa de carvão para este
ultimo. Esta circunstancia augmentou muito o
nosso apuro, e obriga-me hoje, em concorrencia
com outras, a pedir a V. Exc." que se digne de
mandar remover daqui o Brigue “Douro ” fazen
do-o substituir por uma Escuna de Guerra, a qual
venha preencher a mesma commisão , aliviando-se
assim este Districto, pelo menos da metade das
despezas que com o Brigue está fazendo.
Dest’arte conciliam-se perfeitamente as neces
sidades do serviço publico e as imperiosas exigen
cias da nossa pouco vantajosa situação financeira.
O Governo porém de S. M. mandará o que fôr
servido.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal aos 1$
de Fevereiro de 1848. — Illm.º e Exm.º Snr. Mi

nistro e Secretario d'Estado dos Negocios da Ma


rinha
vestre e Ribeiro.
Ultramar. – O Governador Civil, Joze Sil

Ao Ministerio do Reino.

2 º Rep. — Lº 3.° — N.° 49 — Illm.º e Exmº


Sr. — Desde que o Brigue «Douro» se acha estacio
nado no porto desta Cidade, tenho feito sempre
avisar o seu Commandante da sahida de qualquer
navio suspeito de empregar-se na conducção clan
destina de emigrados para as colonias inglezas, e
isto mesmo pratiquei por occasião da sahida do
bergantim inglez «Rowley » para Demerara no dia
5 do corrente.
Nos dias 8 e 9 participou o Commandante
que na manhã de 7 uma lancha do Brigue «Dou
ro» aprezionára aquelle bergantim defronte da Ponta
do Pargo, porque já tinha a seu bordo sem passaporte
dezeseis passageiros, tomados na costa da Ilha,
álem de 18 que levára legalmente d’este porto,
achando-se entre elles nm desertor do Batalhão de

Caçadores N,º 6.
Destas participações dei logo conhecimento ao
Juiz de Direito da Comarca Occidental do Funchal,
remettendo-lhos por copia authentica, — e isto mes
mo communiquei ao Commandante do Brigue.
Como dellas não constasse a distancia em que
estava da terra o Bergantim «Rowley» quando fô
·-91 —

"ra aprisionado, exigi que o Commandante de


Brigue « Douro º declarasse esta circunstancia ;
— elle satisfez logo declarando que o «Rowley »
estava então distante da terra tres milhas, pouco
mais ou menos; — e logo enviei ao dito Juiz de
Direito este novo documento.
O Consul inglez, allegando que o «Rowley »
fôra aprisionado a nove ou dez milhas de distancia
da terra, requisitou-me a entrega d'essa embar
cação para que o Governo Portuguez não tomasse
responsabilidade pelas perdas e despesas resultan
tes da detenção.
Respondi referindo-me ás informaçães oficiaes
que tinha , e que estando o negocio affecto ao Pe
der declarar
ou Judicial ,boa
só adelle dependia libertar o navio,
presa. •

No dia 11 foi essa embarcação desembaraça


da por despacho do Juiz de Direito.
No mesmo dia o Consul inglez requisitou-me que
se fizesse cumprir aquelle despacho. Dei conhe
cimento delle ao Commandante do Douro, para não
impedir a sahida do Rowley; respondi ao Consul
que nenhum impedimento se poria á viagem d'a
quella embarcação, e ella efectivamente já sahie
deste porto. -
– 32 —

Dando a V. Exc.° conta destas occorrencias,


espero que seja approvado o procedimento deste
Governo Civil.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 14 de
Março de 1848. — Illm.º e Exmº Snr. Ministro e
Secretario d'Estado dos Negocios do Reino. – O
Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

O CLERO E TEMPLOS.

EsTABELECIMENTOS PIOS E RELIGIOSos.


-+=> @<=

Acta da Sessão do Conselho de Districto


em 12 d'Outubro de 1846.

Aos 12 de Outubro de 1846, nesta


Cidade do Funchal, e sala onde celebra as
suas Sessões o Conselho de Districto, se
reunio o mesmo Conselho sob a presidencia
– 93–

de S. Exc." o Snr. Conselheiro Joze Silves


tre Ribeiro, Governador Civil deste Distric
to, estando presentes os Snrs. Pitta, Bet
tencourt, Rego, Medina, Florença, e Vas
concellos.

Aberta a Sessão pelo meio dia leo o Se


cretario a acta da antecedente que foi appro
vada. E logo depois usando S. Exc." da
palavra, mostrou ao Conselho em uma breve
allocução a imperiosa necessidade de se reu
inirem todos os recursos e todos os esforços
e fadigas, tanto as que dependerem das au
thoridades do Districto, como aquelas que
estiverem ao alcance dos proprietarios, e
mais pessoas ligadas com a prosperidade des
te bello paiz, para promoverem o melho
ramento do estado dele, hoje a todos os
respeitos bem pouco lisongeiro. — Entre ou
tras medidas lembrou S Exc." como ob
jecto de primeira necessidade a arborisação
das serras; o aproveitamento das aguas de
irrigação, o melhoramento das estradas ac
tuaes, e abertura de outras. Ponderou tam
bem a precisão de se attender ao estado das
nossas Igrejas, precisam hoje mais que nun
ea, de toda a urgencia, e depois de uma
— 94–

larga conferencia com os membros do Con


selho, na qual foram produsidas muitas e
judiciosas considerações sobre todas estas me
didas, concluio pedindo authorisação para
applicar ao reparo das ditas egrejas parte
das sobras dos rendimentos das confrarias.
O Conselho sobre maneira satisfeito com
as intenções manifestadas por S Fxc",
nas quaes vê o maior interesse pela felici
dade dos povos desta Provincia, annuio á
proposta de S. Exc º authorisando-o a dis
pôr dos fundos de que trata para o fim in
dicado. (assignados) do e Silvestre Ribeiro
— A. L. Pitta — Rego — Bel encourt — Flo
rença — G. N. Medina — Va concellos.
----==><><>>-—

Ao Ministerio dos Negocios Ecclesiasticos


e de Justiça.

2.° Repartição — N.° 228 — Illmº e


Exmº Snr — A agitação que deu motivo
ao precipitado embarque do Dr. Roberto Rei d
Kalley, parece ter-se desvanecido inteiramen
te, que tão completa he a serenidade a que
volveram os animos, — tão perfeito o soce
—95 —

go que ora desfructa este Districto!


Convem porém observar a V. Exc."
que o propagandista medico trabalhou por
largos annos na sua missão de proselytismo,
e que não só colheo amplos resultados, mas
deixou espalhada basta semente, que um dia
será productôra de ruim mésse, se a tem
po e successivamente se não olhar com sé
ria attenção para este tão melindroso assump
t0.
Um dos primeiros passsos para obstar á
continuação da polemica em materias de reli
gião, e para prevenir acontecimentos que
compromettam a tranquillidade do paiz, a
contecimentos qne seguem quasi sempre a
lucta de principios que tanto interessam o
o geral dos homens, he pôr em acção to
dos os recursos para que não volva a pisar
o solo desta Ilha o tenaz agitador das cons
ciencias de um povo que vivêra como todas
as fracções da nação portuguesa = unanime
e conforue na crença de seus maiores.
Se isto he, por um lado, de summa
conveniencia, não o he menos, por outro,
que regresse a Madeira sem perda de tem
po o Rev." Prelado Diocesano.
— 96 —

Fm todos os tempos, e sobre tudo em


crises como a de que trato, a presença e
influencia da authorid de superior ecclesias
tica he sobre modo precisa para proteger os
interesses da religião, guiar os ministros da
que hoje he verdadeiramente, Igreja mili
tante, e amparar, e fortalecer as conscien
cias do povo que Deos commetteu a sua vi
gilancia
Permitta-me agora V. Exc." que lhe
transmitta algumas breves observações, que
teem intima connexão com o objecto que me
occupa.
Agita-se nesta possessão importante da
coroa portugueza uma questão religiosa, e
os primeiros a tomar parte activa nella são
inquestionavelmente os membros do clero.
Não me cumpre entrar na indagação
= se esse clero está de todo o ponto habi
litado a empenhar-se na lucta, ou se lhe
falecem as poderosas armas da sciencia da
Religião com que facil lhe fôra adjudicar a
victoria á causa que defendem; mas o que
sei, o que muito importa saber do Governo
de Sua Magestade A Rainha, he que a sua
situação social lhe he em tudo, e para tu
— 57 —

do mui desfavoravel. —Com efeito que pode


rá esperar-se de Parochos, e (falo destes com
especialidade, porque sendo os mais uteis
na jerarchia ecclesiastica, são contra toda a
razão, os mais mal recompensados) muitos
dos quaes se acham na forçosa necessidade
de cultivar a terra por suas proprias mãos
para grangearem a parca subsistencia, a que
não chegam suas tenues e limitadissimas con
gruas? E o restante delles, tendo apenas
e a muito custo o que lhes he absolutamen
te indispensavel para as primeiras necessi
dades de sua mesquinha existencia?
Se além do que fica dito, V. Exc." se
recordar que as diminutas congruas dos Pa
rochos da Madeira estão sujeitas aos pesados
encargos de Direitos de Mercê e sello, e
de duas decimas, terá V. Exc." os dados
precisos para formar uma idêa exacta do
estado de miseria, a que está redusada esta
elasse tão util e tão digna da consideração
do Governo.
Collocados nestas apertadissimas circuns
tancias, qual delles, embora lhe supponhâ
mos a mais fervorosa charidade, poderá es
tender a mão de auxilio aos infelizes, accu
–98 -

dir com o pão de misericordia ao parochia


no indigente, e aos enfermos desvaldos, e
sem amparo? — E, ainda mais, qual delles
terá meios de viver, e de apresentar-se em
publico com a devida decencia, e com esse
complexo de circunstancias favoraveis que
impressionam o povo, geram a influencia, con
quistam o respeito, e inspiram confiança,
visto que os homens são por toda a parte
assim, e não ha prescendir com elles de taes
considerações ?
Imaginemos um Parocho intelligente e
zeloso, d mos-lhe todas as qualidades que o
constituam digno de exercer como he
mister as augustas funcções de sua evange
lica missão, mesmo assim, esse homem de
virtudes, e de saber, esse exemplar de Paro
chos, pouco poderia conseguir. luctando con
tra a influencia de tantas circunstancias des
vantajosas, que todas , mais ou menos, con
vergem a despojal-o dessa força moral, des
sa legitima e benefica influencia que deve
ter no espirito e no coração dos seus paro
chianos.
No momento em que um missionario
estrangeiro, summamente astuto, habil facul
— 99 —

tativo, derramando, com calculada generosi


dade muitos beneficios entre a gente necessi
tada, conseguio por esses meios abalar forte
mente as crenças de uma grande porção de
povo, nada deve omittir-se em ordem a res
tabelecer as cousas no pé em que d'antes es
tavam e restaurar a unidade des principios re
ligiosos, elemento indispensavel de paz e união
geral.
Para conseguir resultados de tamanha
magnitude, dous arbitrios se me autolham
que subinetto desde ja á superior considera
ção de V. Exc ", e do Governo de Sua Mia
gestade a Rainha.
He o primeiro — melhorar quanto fôr
possivel a sorte dos membros do corpo eccle
siastico na Madeira, e com muita especiali
dade a dos Parochos. Reconheço com ver
dadeiro pezar que os escassos recursos do The
souro tolhem a possibilidade de grandes refor
mas nesta parte: mas he minha convicção tam
bem que se o Governo de S. Magestade po
dér conseguir aliviar esta classe dos pesadis
simos encargos de direitos de Mercê e sello
e das duas decimas, e augmentar-lha ainda
que pouco, suas mui limitadas congruas, se
– 100 —

rá isto já um beneficio, que terá efeitos mui


salutares para a causa da religião e para o
paiz.
O segundo, — não menos eficiente que
o primeiro, he attender ao estado em que se
acham as egrejas nesta Ilha. — Muitas del
las, principalmente as das povoações ruraes,
estão em tal estado de abandono e deca
dencia, que he de absoluta urgencia acudir
lhes com promptos reparos sob pena de vêr
prostradºs de todo valiosos edificios, cuja
reconstrucção completa fôra quasi impossivel
na época de apuros que atravessāmos. — Além
destas considerações de economia, ha outras,
a certos respeitos mais importantes, que in
timam como de urgencia a medida que te
nho a honra de inculcar a V. Exc." — Não
farei cargo de as compendiar aqui, porque
estando V. Exc." cabalmente instruido da
situação deste Districto em respeito a assump
tes religiosos, facil lhe será avaliar a im
portancia de providencias que tendam a ra
dicar nos povos a convicção de que o Go
verno de Sua Magestade a Rainha, toma na
devida conta a causa da Religião, e as ne
cessidades do culto catholico.
– 101 —

Resta-me ponderar a V. Exc.º que es


tas medidas serão de curto alcance se não fo
rem reforçadas por uma providencia conco
mitante, que demarque bem positivamente
os limites da liberdade religiosa no sent do
da Carta Constitucional, e que determine a
linha de comportamento que as authoridades
devem seguir, e até que ponto lhes cumpre
interferir em assumptos desta ordem, já pa
ra extinguir o germen da scissão religiosa que
existe no paiz, já para oppôr esforços mais
amplos e decididos quando esta questão ve
nha a reproduzir-se com a mesma força e
extensão que ha pou o teve.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 13
de Outubro de 1847. — Illmº e Exm.º Sr.
Ministro e Secretar o d'Estado dos Negocios
do Reino. — O Governador Civil, Joze Sul
vestre ítibeiro.

---->$<=

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — N.° 1186 — Illm.º e


Exmº Snr – Entre as povoações da Ilha da
Madeira onde as doutrinas do Dr. Roberto
— 102 —

Reed Kalley e seus sequazes fizeram maior


numero de preselytos, conta-se a de "a to An
tonio da Serra; e por uma consequencia fa
tal, mas necessaria, he essa tambem a po
voação, cujos habitantes teem emigrado em
mais crescido numero.
A nascente e bellissima freguesia, de
que fallo, concorrem na mor parte d anno
muitas pessoas do Funchal, e dºs sítios cir
cunvis nhos, não só pela sua natural bellesa
e amenidade, pois que está assentada na mais
graciosa e encantadôra planicie: se não tam
bem por que he orago da respectiva egreja
um santo de muita veneração entre os po
VUS,

Essa egreja porém que ahi existe, cons


truida em tempos remotos, e quando a po
pulação deste sito era cousa mui inferior ao
que he hoje. he apenas uma pequena capel
la. Pode todavia accrescentar-se, e esta
obra não importa grandes despesas.
Em ordem a beneficiar os povos, — a
mostrar-lhe que o Governo de Sua Mages
tade tem a peito promover o culto catholi
co — para contrastar a influencia das doutrinas
do Dr. Kalley, entre uma população, cuja
crença foi fortemente abalada pelos esforços,
— 103 —

do propagandista-resolvi entrar na empresa


de dar maior capacidade á dita egreja; e
tendo já proposto ao Conselho de Dis
tricto a necessidade de se applicarem para estas
despesas uma parte dos rendimentos das con
frarias, bem desejára poder quanto antes pôr
mãos á obra.
Devo aqui levar ao conhecimento de V.
Exc." que estou disposto a mandar reparar
mais alguns templos que o precisem absolu
tamente; e tenho para mim que este arbi
trio, aliás util e vantajoso a todos os res
peitos, terá , como pensamento governativo,
o resultado de ir restabelecendo as crenças
catholicas
Pelo complexo de tão importantes mo
tivos e considerações, ouso esperar que esta
minha resolução não desmereça a approva
ção de V. Exc.", e do Governo de S. M. a
Rainha
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 15
de Outubro de 1846 — Illm.º e Exm.º Snr.
Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios
do Reino — O Governador Civil, Joze Sul
vestre tubeiro.
*sas=SED@@*Essa
— 194–

Aº Abbadeça do Convento das Mercês.

2.° Repartição — L.º 3.° — N.° 784 — Illm.º


Snr.° — S. Exc." o Snr. Conselheiro Governador

Civil, encarrega-me de communicar a V. S." que


o Conselho de Districto, annuindo ao que V. S."
lhe representou, acaba de votar a somma de Rs
503000, como auxilio ás religiosas do convento
de Nossa Senhora das Mercês, de que V. S." he
digna Abbadeça.
Sirva-se pois V. S." mandar receber esta im
portancia, quando lhe parecer conveniente, dignan
do-se remetter o competente recibo della.
Deus Guarde a V. S." — Secretaria do Gover
no Civil no Funchal em 22 de Outubro de 1846.
— Illm.º Snr." Madre Abbadeça do Convento de
Nossa Senhora das Mercês. — O Secretario Ceral
interino, Augusto de Carvalhal Esmeraldo Lencastre,
*=#D$4}==---

Ao Director das Obras Publicas.

4 º Repartição — Secção d'Obras Publi


cas — L.° 1.° — N.° 973 — Illm.º Snr. —
Desejando muito accudir á reparação dos
templos desta Ilha, que mais precisados es
— 105 –

tiverem de concertos e melhoramentos; e


constando-me que a egreja de S. Jorge do
Cºncelho de Santa Anna se acha em lasti
moso estado de ruina, — bem como que a
de Santo Antonio da Serra he por tal modo
acanhada, que não póde cºnter o povo, que
alli concorre para assistir á celebração do
Santo Sacrificio da Missa, e demais func
ções do culto catholico: tenho por convení
ente que V. S." se sirva, sem a menor per
da de tempo. de ir visitar as ditas egre
jas, e proceder ao orçamentos das obras
mais urgentes e indispensaveis, que ali de
vam fazer-se. Convem porém que V. S."
tenha em vista, que será absolutamente ne
cessario limitar-mo-nos pºr em quanto ao
que fôr de mais apurada necessid de , em
attenção aos poucos meios de que por ora se
pode dispôr.
Espero do zêlo e intelligencia de V.
S", que se prestará a fazer esta diligencia
e serviço com a maior brevidade, e ao mes
mo tempo com a maior exactidão possivel.
Deus Guard a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal em 22 de Outubro
de 1846. — Illmº Snr. Director das Obras
— 106 —

Publicas. — O Governador Civil, Joze Sil


vestre Ribeiro.
—-tas=>.oG=>>>>>><=

A Commissão Administrativa da Santa Casa da


Mizericordia.

2º Repartição — L.º 3.° — N.° 785 — Illmº


Snrs. Presidente e Membros da Commissão Admi
nistrativa da Santa Casa da Mizericordia do Fun
shal.
Pela conferencia, que acabo de ter com V.
S.", vim no conhecimento do dezagradavel estado
dos negocios dessa Santa Caza, no que he relati
vo á cobrança das suas muito avultadas dividas ac
tivas.
Li com grande dissabor a interminavel lista
dos devedores , e a das crescidas verbas de seus
debitos; e tanto mais me impressionou esta circuns
tancia, quanto por efeito della a Commissão será
privada da satisfação d'admittir um grande numero
de doentes , e de estender a influencia benéfica da
sua acção caritativa.
Este estado de couzas he funestissimo para o
pio estabelecimento, que V. S.", segundo sou in
formado, com tamanho zelo administram.
— 107 –

Este estado de couzas deve terminar, e por


uma vez; por isso que, ante a necessidade extre
ma e impreterivel de acudir aos desgraçados enfer
mos, cessam todas as considerações de contempla
ção, que uma situação mais feliz da Santa Caza
podesse, se não justificar, ao menos permittir sem
maior inconveniente.
Cumpre-me pois chamar com a mais viva ins
tancia a attenção de V. S." sobre este assumpto,
esperando affoutamente, que sem a menor perda de
tempo se servirão de intimar a todos os devedores
dessa Santa Caza para que no prazo mais curto tra
tem de satisfazer todas as dividas; no que não só
cumprirão elles o seu mais rigoroso dever, se não
tambem prestarão á humanidade desvalida um as
signalado serviço no momento em que a mesma
Santa Caza está luctando contra uma tão apurada
crise em seus recursos.

E se alguns houver, que sejam surdos á voz


do seu dever, e ás instantes necessidades da Mise
ricordia, ou não se dispozerem a tractar sobre e
meio mais commodo de pagarem suas dividas, se
jam estas relaxadas ao contencioso.
Permittam-me V. S." qne aproveite este ense
jo, para tambem lhes inculcar a indispensabilida
– 108—

de de diligenciar activamente a tomada das contas


dos legados pios.
Deus Guarde a V. S."— Palacio do Governo
Civil no Funchal 23 d’Outubro de 1846. — Illmºº
Snrs. Presidente e Membros da Commissão Admi
nistrativa da Santa Casa da Misericordia do Fun
chal - O Governador Civil, Joze Sulvestre Ribeiro.

–**>>>$-G(CBem

Ao Administrador do Concelho de Sant'Anna.

4.° Repartição — L.° 3.° — N.° 1054 — Illm.º


Snr. — Constando-me que a egreja Parochial de S.
Jorge, desse Concelho, se acha reduzida ao mais
lastimozo estado de ruina, tanto mais para lamen
tar, quanto sou informado de que era um tem
plo magnifico, e dos melhores da Ilha; encarre
guei o Director das Obras Publicas de orçar a
despeza que o seu reparo poderá occasionar.
Tenho á vista o orçamento a que proccdeo o
dito Director bem como a indicação das obras que
he mister fazer com urgencia na referida egreja,
a fim de se evitar a sua total ruina, e conseguir
se que ella possa preencher o seu elevado destino.
Como porem seja possivel que V. S." á vista
– 109 —

da indicação das obras precizas de que lhe re


metto copia, bem como do conhecimento cabal
que tem dessa povoação, possa informar-me sobre
o auxilio que neste particular póde esperar-se dos
moradores: tenho por conveniente rogar a V. S."
a mercê de examinar attentamente este negocio,
consultar as pessoas mais abastadas, convidar o
Reverendo Parocho a entender-se com os seus pa
rochianos, — e tudo isto, para se habilitar a di
ZCT-IIIC :

1.° — Se os moradores mais abastados quere


rão concorrer com alguns donativos, em dinheiro,
em generos, ou em materiaes de construcção, para
o reparo , ou melhor diria, reconstrucção da sua
Egreja Parochial.
2.°—Se os moradores menos abastados quererãe
eoncorrer com algum serviço braçal, com o fim
de se poupar a mão d'obra que não demandar º
trabalho de artifices competentes.
3.° — Se a Freguezia toda quereria tomar á
sua conta a conducção dos materiaes para a visi
nhança da Egreja.
rar-se4.°algum
— Se auxilio,
das Freguezias
e qual. visinhas póde espe

5.° —- Qual conviria mais, se mandar fazer a


– 110 —

obra por arrematação, se por conta deste Gover


no Civil, pondo-se á testa della um cidadão hon
rado e zelozo, que debaixo da inspecção do Di
rector das Obras Publicas, presidisse aos trabalhos,
e os encaminhasse convenientemente.
Se V. S.", em quem eu já deposito minha
eonfiança, se dignar de tomar este negocio em
seria consideração , e reconhecendo a urgentissi
ma necessidade da obra de que se trata, fizer
uzo da sua influencia para mover os seus admi
nistrados a coadjuvar-me neste cazo, eu concebo
a esperança de que conseguiremos restituir ao seu
antigo esplendor um templo , que merece os ga
bos de todos os que o teem visto, e que seria
quasi um crime deixal-o cahir em ruina, com ta
manho descredito nosso, e desserviço da Religião.
Queira pois V. S.", desviando-se até dos
quizitos que eu lhe proponho, se assim lhe fôr
mais commodo, incumbir-se de tratar este nego
cio pelo modo que julgar mais conveniente, di
zendo-me tudo quanto lhe occorrer a semelhante
respeito, e habilitando-me a tomar uma resolu
ção acertada e eficaz.
Esquecia-me lembrar a V. S.° a necessi
dade de examinar, se as Confrarias erectas nesse
— 111 —

Concelho poderão concorrer com alguma quantia


para a obra de que se trata.
Deus Guarde a V. S.° — Palacio do Governo
Civil no Funchal, aos 17 de Novembro de 1846
— Illm.º Snr. Administrador do Concelho de San
t'Anna — O Governador Civil, Joze Silvestre Ri
beiro.

Ao R." Vigario de Santo Antonio da Serra,


4.º Repartição = Lº 3º = N.° 1281
= Illm.º Snr. = Tendo eu tido occasião de
roconhecer pessoalmente a indispensavel ne
cessidade de se acrescentar a egreja Parochial
d'essa freguesia de Santo Antonio da Serra,
pois que he ella insuficiente para accommo
dar o grande numero de moradores que já
conta uma povoação, que demais disso pro
mette hir-se augmentando de dia em dia:
E sendo a todos os respeitos conveni
ente que se attenda ás necessidades do cul
to catholico, tenho resolvido emprehender a
indicada obra do acrescentamento da dita
egreja, a qual será posta em arrematação.
Como porém me pareça acertado que
— 112—

todos os seus parechianos tenham prévio co


nhecimento desta resolução, em que eles tan
to interessain, julgo do meu dever partici
cipal-a a V. S.", fedindo-lhe o ºbsequio de
a fazer constar a todos e de indagar delles
se cabe nos suas pºssibilidades concorrer com
algum genero de auxilio para o costeamen
to das despezas que se fizerem.
Queira pois V. S." ter a bondade de
tomar este negocio na mais séria considera
ção, e de me communicar quanto antes o
que se lhe oferecer a respeito delle
Deus Guarde a V. S." — Palacio do
Governo Civil no Funchal aos 17 de Novem
bro de 1846 — Illm.º Snr. Rev." Vigar o
de Santo Antonio da Serra. — O Governa
dor Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

Circular ás Camaras.

2.° Repartição — L.º 3.° — N.° 352 — Circu


lar — Illm." Snrs. — O Conselho de Districto, am
nuindo benigno a uma proposta minha, dignou-se
de authorisar a applicação de algumas sobras das
Contrarias para costear as despezas dos concertos,
— 113—

que indispensavelmente demandam algumas egre


jas, e designadamente as de Santo Antonio da
Serra, e São Jorge. Antes porem que eu dê des
tino aos pouquissimos recursos que esta authorisa
ção subministra, he do meu dever , e assim o man
da a lei, que eu solicite o beneplacito de V. S."
e das Juntas de Parochia. N'estes termos, e es
tando eu altamente empenhado a dar começo áquelles
urgentissimos trabalhos, se bem que em limitada es
phera, rogo a V. S." queiram declarar-me, ouvin
do tambem as Juntas de Parochia , se approvam
aquella justificada applicação. O aperto das cir
cunstancias desta Ilha, exige a maior pressa n’es
te negocio , e eu peço a V. S." que no mais
curto prazo de tempo se dignem responder.
Deus Guarde a V. S." — Paiacio do Go
verno Civil no Funchal em 21 de Abril de 1847
— Illm.º Snr. Presidente e membros da Camara
Municipal de .... O Governador Civil, Joze Sil
vestre Ribeiro,
— 114 —

Ao Exm.º e Revdm.° Bispo.

2.° Repartição — N.° 922 — Lº 3.° — Exm.º


e Revdm." Snr. — A Egreja do Collegio dos ex
tinetos Jezuitas desta cidade, he um templo mag
nifico, tal como construíam todas as suas cousas
esses padres, denominados » da Companhia, » á
qual um talento celebre de nossos dias chamou
com energia e propriedade » Companhia-Rei. »
A solidez da sua construcção, condiz com o
o pensamento dos famozos fundadores, que pare
ce edificavam para a eternidade; e o estilo ar
chitectonico, supposto ser muito alheio ás belle
zas e poesia dos admiraveis specimens da Batalha
e de Belem, tem com tudo um certo cunho de gran
dióso, que eleva a alma, e captiva profundamen
te a attenção.
Essa egreja pois encontrei eu reduzida a um
estado que muito fazia recear a sua proxima rui
na, se de prompto não lhe acudisse com os repa
ros necessarios.

Movido por esta consideração, e convencido


de que á geração actual se não lhe he dado ele
var monumentos como os que nos deixáram os ante
passados, impende com tudo a rigorosa obrigação
— 115 —

de sustentar e conservar cuidadosamente os que


recebeo em legado das gerações que º precedê
ram: dei-me por obrigado a mandar proceder,
tanto quanto o permittia a escassez de recursos pe
cuniarios, ao reparo da mencionada egreja, senão
radical e completo, ao menos o mais urgente e in
dispensavel.
D“esse trabalho incumbi o Director das Obras
Publicas, Vicente de Paula Teixeira, o qual o
desempenhou muito a meu contento, desenvolvem
do assaz de zelo, e mostrando sempre o mais vi
vo interesse pelo melhoramento de um tao bello
templo,
cial.
do que eu proprio foi testemunha presen •

Os concertos que alli se fizeram, tanto no in


terior, como no exterior, constam do relatorio
que me aprezentou o dito Director, cujo docu
mento eu tenho a honra de encaminhar ás mãos de
V. Exc." Revdm * por copia, para seu conheci
mento, visto que a egreja, propriedade nacional,
está hoje a cargo do ordinario
No dito Relatorio verá V. Exc º Revdm º que
oito paineis, todos de um mesmo author, que or
navam a magnifica sachristia da egreja do Colle
gio, estão hoje na Sé Cathedral, para onde foram
— 116 —

removidos prudentemente, para os preservarem da


ruina a que o templo estava condemnado. V,
Exc.° Revdm." resolverá com a sua costumada sa
bedoria se convem fazel-os voltar ao seu logar.
Quando as circunstanias o permittirem, tencio
no mandar reformar o soalho (*) do pavimento da
egreja, que em verdade está muito arruinado; he
porém força reservar para mais tarde esse concer
to, em consequencia do apuro do momento.
Tendo a fortuna de entregar a V, Exc."
Revdm.", assim reparada, a egreja do Collegio,
he para mim bem consoladôra a certeza de que
V. Exc." Revdmº se dignará de providenciar para
que a mais assidua vigilancia mantenha alli o
aceio e esses cuidados que preservam da decaden
cia os bons edificios.
Deus Guarde a V. Exc.° Revdm.° — Palacio
do Governo Civil no Funchal, 6 de Setembro de
1847. — Exm.º e Revdm º Snr. D. Joze Xavier
Cerveira e Souza, Bispo do Funchal. — O Gover
nador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

(*) Ja começou este trabalho, concorrendo pa


ra elle alguns sobcriptores, e o cofre das confrarias
regulares.
— 117 —

Illm.º e Exm.º Snr. —Tenho a honra d'apre


sentar a V. Exc." o relatorio incluso dos reparos
que por ordem de V. Exc º e debaixo de sua dia
ria e zeloza inspecção superior, fiz executar na
egreja do Collegio dos extinctos Jezuitas desta Ci
dade; e quanto á despeza em detalhe, refiro-me ás
folhas semanaes existentes na Secretaria do Gover
verno Civil, e já vistas e approvadas por V. Exc."
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal, 23 d' A
gosto de 1847. — Illm.º e Exm.º Snr. Conselhei
ro Joze Silvestre Ribeiro, Governador Civil des
te Districto. — Vicente de Paula Teixeira , Direc
tor das Obras Publicas. |

Relatorio dos reparos feitos na Egreja do Collegio


dos extinctos Jezuitas do Funchal.

Este magestoso edificio começado em 1570 e


acabado em 1578, no reinado do Snr. D. Sebas
tião, e nas administrações dos dois primeiros Rei
tores, o Padre Manoel de Sequeira , e o Padre
Pedro Rodrigues, foi encorporado nos Proprios
Nacionaes em 1752 pela cxtincção dos Jesuitas.
— 118 —

— Consumiram-se ricas peças de prata, e muitas


preciosidades que decoravam o magnifico templo
desse Collegio, a falta de reparos deu logar a
ruinas, e se não fossem os que ha pouco se con
cluiram, dois "nnos mais de abandono e despre
zo fariam abater uma das mais bellas e mages
tosas egrejas desta cidade.
As chuvas apodroceram as madeiras do tecto,
apagaram-lhe bellas pinturas, que sem grande
despeza não poderão revivêr , e mancharam as pa
redes do corpo da egreja, e das capellas, de gran
de custo que eram , pintadas a fresco. — Bellezas
que es aparam á acção do tempo não se livraram
da mão do homem. — Grosseira brocha ensopada
em consumidôra cál escondeu admiraveis traços
de delicado pincel, matou primôres d’arte.
Suspender o progresso de tão lamentavel dis
truição, e reparar alguns dos damnos causados,
foi o que se procurou pelas obras que passo a re
latar.

No comprimento de 120 palmos e em seten


ta d'altura, foi externamente picada, e de novo
chispada e rebocada a parede de leste do tem
plo, para evitar que as chuvas entrassem por es
sa parede despida em diferentes logares, e fossem
– 119 –

arruinar obras magnificas que ainda se achavam


perfeitas nos altares lateraes.
Foram feitos de novo os canos que circulam
o terraço por cima das capellas; — este, e a va
randa de cantaria que o cérca , e faz parte do or
mamento do frontespicio , foram concertadas, pon
do-se na varanda algumas pilastras novas.
Foi bem retelhada a egreja e seguras em
cal as duas ordens de telhas que tem. — A arma
ção acha-se alquebrada. — Bom seria pois examinar
a causa disto, e o seu estado para evitar damno
maior, deixando-lhe então uma só ordem de te
lhas para a aliviar.
A torre foi em quasi toda a sua altura re
mendada, e depois caiada toda com tres mãos de
cal virgem, raspando-se prímeiro o antigo limo que
a vestia.

O mesmo se fez no frontespicio do templo,


e ahi tambem quatro sacadas novas de ferro, al
gumas portas novas em janellas, concertos,
vidros, ferragens n'outras, pinturas em todas, e
um castello novo nas Armas Reaes.

As seis capellas lateraes da nave foram repa


radas; nos arcos de todas ellas reformados os or
matos que tinham; as suas portas de madeira e can
— 120 —

taria foram oleadas, conservando-se-lhes as côres


que indicavam: — foram renovadas as pinturas que
a muito custo se poderám descubrir de baixo da
cá nas paredes da nave, e que representavam fi
guras, paisagem, e architectura; — informações e
imaginação suppriram o conhecimento d'outras to
talmente consumidas pela cál, ou pela agua da
chuva; para tudo foi preciso preparar as paredes
com reboco na maior parte.
As tribunas que ficam superiores a estas ca
pellas foram concertadas, e pintadas. — Às portas ,
janeilas, e solho do côro foram reformados, tanto
de madeira, como de ferragens, e pintura. — Fo
ram novas com ferragem, e pintura as portas dos
dois terraços, e retocadas as pinturas que ha nas
paredes sobre as pias.
Foram renovadas as pinturas dos dois arcos que
acompanham o da capella mór, sobre os quaes fe
cha o grande cimalhao de canteria rija, e no espa
ço entre a volta e o pé direito, pintaram-se qua
tro evangelistas imitando os que ahi havia.
A cimalha foi toda pintada de novo, e o es
paço entre ela e o tecto, na frente da capella nór,
mostrando a continuação da architectura do arco
da mesma capelia, e no centro um pequeno es
— 121 —

paço com o olho da Providencia, cercado de nu


V e IlS.

Os azulejos que forram as paredes da capella


mór , e das duas ao lado desta, e o marmore dos
degraus e outras peças do prisbiterio, foram repe
tidamente em muitos dias lavados com sabão para
os tirar do estado immundo em que se achavam.
O altár mór, e os das outras capellas foram
concertados com grande custo e incommodo. —
Foi remendado em grande parte o solho da egreja,
sobre algum travejamento novo; e as grades das
capellas, foram concertadas com as madeiras e fer
ragens precisas.
Na sachristia concertaram-se as portas e as
janellas, renovaram-se vidros, e fizeram-se duas
vidraças novas para darem claridade a essa casa.
— O vestuario, que se achava arruinado, e inte
riormente podre em grande parte, foi reparado e
limpo pondo-se-lhe tambem as mãos de latão e fe
chaduras de que precisava. — Os ornatos de mar
more que tem a sachristia foram a muito custe
limpos com sabão.
Os excellentes paineis que decoram a sachris
tia, e os das capellas, foram, depois de bem
limpos, invernisados.—Oito d'aquelles, todos do
– 122 —

mesmo author, acham-se na Cathedral.


Em outra sachristia, onde está o Snr. dos
Passos , fizeram-se differentes reparos, no forro do
tecto, nas janellas e vidraças, que foram oleadas,
e nas ferragens das portas.
Algumas das janellas da torre foram feitas de
novo, — as outras concertadas, e todas pintadas.
—- o telheiro que cobre a abobada da capella mór
foi concertado e retchado, assentadas todas as te
lhas em cál.
Em taes reparos despenderam-se 7113615 rs.,
entrando nesta despeza o custo d'algumas madei
ras de pinho para andaimes, parte das quaes exis
tem disponiveis.
Fez-se o indispensavel para salvar da ruina
um edificio mui respeitavel da nação — Bem haja
o providente Magistrado que com o maior gosto,
e ardente zelo proveo esta necessidade.
Funchal 24 de Abril de 1847. — Vicente de
Paula Tciareira, Director das Obras Publicas.
— 123 —

Illmº e Exm.º Snr. — Com a mais cordial


satisfação acabamos de lêr o oficio de V. Exc."
de 6 do corrente, no qual achamos uma prova
nada equivoca da piedade que anima o coração de
V. Exc.", bem como do zêlo com que se esmera
na conservação dos mais distinctos monumentos na
cionaes.

Consiste esta nos reparos das ruinas e des


manchos, que o tempo e incuria dos homens tinham
occasionado no edificio da egreja de S. João Evan
gelista do extincto Collegio dos Jezuitas, templo,
que , por sua construcção e solidez, exigia impeº
riosamente as vistas conservadôras d'um Governo
piedozo e illustrado, e V. Exc." dezempenhando
com tanto disvelo este muito louvavel encargo,
bem mereceo da egreja e do estado, e adquirio
indisputavel direito ás bençãos d’uma e outra re
publica. Nós, como chefe da primeira nesta pro
vincia , damos a V. Exc.", por parte della, os
mais puros agradecimentos.
Os quadros de que V. Exc." nos falla no ci
tado oficio, vão ser restituidos ao seu respectivo
logar, visto que alli agora se podem conservar li
vres das injurias do tempo; e a egreja, que até
aqui se achava, por menos decente, vedada ás
— 124—

funcções do Culto Divino, vai desde já ser oppor


tunamente applicada ás funcções do mesmo respei
tavel Culto, ficando V. Exc." na certeza que não
Nos pouparemos em manter o aceio e decencia com
que V. Exc." No-la-entrega.
Deus Guarde a V. Excº — Rezidencia Episcopal
do Funchal 7 de Setembro de 1847. — Illm.º e
Exm.º Snr. Conselheiro Governador Civil deste
Districto. — J., Bispo do Funchal.

*--*<><><>==---

Ao Ministerio do Reino.

2 "Repartição = N° 2122=Illmº e
Exmº Snr. = N'uma Ilha, como a Madei
ra, descoberta ha quatro seculos, não he
possivel encontrar monumentos erigidos pela
mão do homem , que pela sua ancianidade
desafiem o respeito e admiração das gera
ções que se vão succedendo. Se porém não
existem monumentos dessa naturesa, outros
mais modernos pódem por diferente titulo
despertar a attenção, e provocar desvélos e
cuidados sobre a sua conservação.
Em tal caso me pareceo estar a magni
fica egreja do extincto Collegio dos Jesuitas
— 125 —

do Funchal, construida quasi nos fins do se


culo 16 segundo o typo das caracteristicas
edificações dos Padres da Companhia = Esta
egreja, maiormente n'uma povoação que não
sobresahe pelos primores de architectura,
parece-me digna de ser conservada em toda
a sua perfeição, reparando-a dos estragos que
o tempo lhe tem feito, e emendando o des
cuido que tem havido desde a extincção dos
Jesuitas de lhe consagrar algum cuidado con
servador.
Por este motivo, e convencido de que
o Governo de S Magestade tem muito a pei
to a conservação dos edificios nacionaes, e
com particularidade aquelles que sob algum
aspecto pódem considerar-se como monumen
taes, mandei, muito antes do «Pronuncia
mento», proceder ao reparo da mencionada
egreja, e acudir aos estragos que demanda
vam mais urgente remedio.
Nos documentos inclusos de n.° 1 a 3
se encontram as explicações convenientes so
bre este negocio, para que a todo o tempo
conste quaes os concertos que se fizeram
naquella egreja, e o mais que se passou a
semelhante respeito.
— 128 —

Devo ponderar a V. Exe." que submet


to este negocio á sua consideração inteira
mente sob um ponto de vista artistico e ad
ministratrativo, pois que na parte relativa
ás despesas de taes reparos, he por outro Mi
nisterio que devem ser apresentadas as con
tas e documentos.
Deus Guar de a V. Fxc." — Palacio do
Governo Civil no Funchal aos 5 d'Outubro
de 1847. — Illmº e Exmº Snr. Minis
tro e Secretario d'Estado dos Negocios do
Reino. — O Governador Civil, Joe Silves
tre Ribeiro.

*--*><><>----

Circular aos Administradores de Concelho.

2.° Repartição = Lº 5.º = Circular =


N.° 572 = Illm." Snr. = Attendendo a que
ultimamente fôra perpetrado na egreja Paro
chial da Ponta Delgada o sacrilego furto de
varios objectos de prata, com gravissimo es
candalo da Religi㺠e da Moral, ofensa da
sociedade, e Prºjusº dos interesses da res
pectiva Fabrica:
E sendo de toda a razão, que afóra as
— 127 –

diligencias empregadas na actualidade para


descobrimento dos perpetradores do nefando
attentado (e que eu espero affoutamente te
nham o melhor exito), se acautele a repe
tição de crimes tão arrojados, e subversivos
de todos os fundamentos da associação poli
tica:

Julgo indispensavel suscitar a observan


cia das instrucções que o Governo de Sua
Magestade tem dado a semelhante respeito,
G V e Im O SGT :

Que nas egrejas e ermidas, quer es


tejam em sitios ermos, quer em logares po
voados, não fiquem de noute vasos sagrados,
ornamentos, alfaias, roupas e quaesquer uten
silios de valor; mas só se conservem nos
templos na occasião em que delles se care
ce para as ceremonias e funcções do culto,
e em estas acabando, sejam immediatamen
te condusidos para segura guarda ou deposi
to em casa do Reverendo Parocho, ou de
qualquer parochiano de sua inteira confian
Ça.

Esta providencia tem por fundamento


a conveniencia de subtrahir á cubiça de ho
mens degenerados e preversos a preza que os
— 128 —

tenta e desafia ao crime, tanto mais insti


gadôra de suas sacrilegas tendencias, quan
to lhes he mais facil roubarem as egrejas
do que as casas de particulares, sempre ou
pela maior parte, seguras e bem defendi
das.
Os Snrs. Administradores de Concelho
vigiarão sobre a execução desta providencia,
entendendo-se com as Juntas de Parochia,
e designadamente com os Reverendes Paro
chos, para que se sirvam de tomar as cau
t las prescriptas, havendo tºdº o cuidado
em que jamais haja desleixo ou interrupção
na sua observancia
Ordinariamente, e assim o tem mos
trado a experiencia, os attentados de arrom
bamento de egrejas, e furto de objectos sa
grados, são commettidos por mais de um in
dividuo. Associações infames de malvados
se formam aqui e acolá para o fim de da
rem esses assaltos, e repartirem entre si as
riquezas dos templos, que a piedade de
muitos seculos tem ido accumulando.
Convém pois que os Snrs. Administra
dores de Concelho estejam sempre álerta,
e procurem seguir os vestígios dessas ligas
– 129 —

desastrosas, que até parece quererem aba


lançar-se a combater contra o Céo, levando
a devastação e o roubo á morada do Deus Vivo.
Espero que os Snrs. Administradores
de Concelho tomarão este negocio na mais
séria consideração, desempenhando assim tam
bem uma dos suas mais salutares obrigações,
qual he a de promover a repressão dos rou
bos, e tornar segura a propriedade publica
e particular. — Deus Guarde a V. S." — Pa
lacio do Governo Civil no Funchal aos 10 de
Janeiro de 1848. — Illm.º Snr. Administra
dor do Concelho de...... O Governador
Civil, Joze Silvestre Ribeiro. #

==E_>Q@@@==

Ao Exm.º e Revmº Bispo.

2.° Repartição — Lº 4.° — N.° 72 — .


Exm.º e Revm." Snr. — Logo que por ofi
cio de V. Exc.° Revm." e por outro do Ad
munistrador do Concelho de S. Vicente re
cebi no dia 2 deste mez a mui desagrada
vel noticia do sacrilego furto praticado na
egreja parochial da Ponta Delgada, em 30
de Dezembro, dei quantas providencias es
— 130 —

tavam ao meu alcance para serem desco


bertos os criminosos, e os objectos furtados,
oficiando ao General Commandante desta Di
visão Militar, aos Juizes de Direito das duas
Comarcas deste Districto, aos respectivos
Agentes do Ministerio Publico, a todos os
Administradores de Concelho, ao Adminis
trador da Alfandega, ao Oficial do Registo
do Porto, e aos Administradores do Contrac
to do Tabaco, para que, em desaggravo da
Religião, e da Lei, se servissem exercer,
por si e por seus subordinados, todo o zêlo e
actividade, e todos os meios de que podes
sem dispôr para se conseguir a achada do
furto, e a punição dos delinquentes, assegu
rando bom premio a quem os fizesse conhe
cer. Estão tomadas medidas policiaes de pre
venção e fiscalisação; — teem-se dado rigoro
sas buscas a bordo dos navios que teem sahi
do com emigrados, evitando-se depois, a com
municação delles com a terra; vou transmit
tindo ás authoridades competentes qualquer
noticia que chega ao meu conhecimento, e
as possa dirigir nas suas indagações ácerca do
facto de que se tracta; — e espero que todos
os funccionarios publicos hão de proceder
como lhes cumpre, e se conseguirá bom re
— 131 —

sultado dos trabalhos começados, e mui re


commendados.
Dando assim conta do que hei obrado
em negocio de tanta importancia, peço li
cença para concluir com uma observação que
me parece tão exequivel como proveitosa, e
vem a ser: se as pratas e mais objectos pre
ciosºs destinados ao Culto fossem guardados
fóra do templo em casa segura e habita
da, e quando empregados na egreja por oc
casião de alguma festividade, fossem ahi vi
giados de dia e de noite por pessoas de con
fiança, sendo responsavel o Reverendo Pa
rocho pela perda que podesse ser attribuida
a ommissão sua na execução de taes provi
dencias, evitar-se-hia a repetição do desa
cato e prejuiso que lamentâmos, e preencher
se-hiam as instrucções que o Governo tem
dado por mais de uma vez, e que eu passo
a recommendar novamente. — Deus guar
de a V.Exc." Revm.° — Palacio do Governo
Civil noFunchal aos 11 de Janeiro de 1848.
— Exmº e Revmº Snr. D. Joze, Bispo do
Funchal — O Governador Civil, Jose Sil
vestre Ribeiro. •

*--*><><>a
— 132 —

Ao Exm.º e Revm.° Bispo.

2* Repartição — Lº 4.° — N.° 73 —


Exm.º e Revmº Snr. — Acabo de receber
oficialmente a notícia, que hontem correo
nesta cidade de haverem sido achadas as pe
ças de prata furtadas da egreja parochial da
Ponta Delgada, e conhecidos os perpetrado
res de tão grave crime. — Bem fundada era
a esperança que concebi de se chegar a este
resultado; — nem era d'esperar o contrario
das medidas de prevenção e fiscalisação que
se tomaram em todo o Districto, e de que
já tive a honra de dar conhecimento a V.
Exc." Revm." — Vendo assim coroadas as
providencias que promptamente se deram em
negocio tão importante, apresso-me em trans
mittir a V. Exc." Revm.º esta noticia offi
cial, tão satisfactoria para V. Exc." Revm."
como o foi para mim. — Deus Guarde a V.
Exc.° Revm.° — Palacio do Governo Civil no
Funchal 12 de Janeiro de 1848. — Exm.º
e Revmº Snr. D. Joze, Bispo do Funchal.
O Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
—==EDID @ ©=

2º Rep.-N.°76 — L.° 3.° —Exm.º e Revm."


— 133 —

Snr.—Cabe-me a satisfação de congratular-me com V.


Exc." pelo feliz acontecimento de terem sido encontra
dos já os objectos roubados á egreja parochial da
Ponta Delgada, com a pequena diferença de uma
libra de prata, bem como de estarem presos os per
petradores do sacrilego furto, faltando apenas
dous que poderam evadir-se, mas que se empre
garão todas as diligencias para os capturar.
Este desagradavel negocio está agora entregue
ao Poder Judicial, e bem para desejar he que a
Justiça descarregue a sua severidade sobre os cul
pados, para escarmento dos máos, desagravo da
religião ofendida, e segurança publica.
Deos Guarde a V. Exc.° Revdm.° — Palacio
do Governo Civil no Funchal aos 15 de Janeiro
de 1848. — Exm.º e Revdm º Snr. D. Joze, Bis
po do Funchal. — O Governador Civil, Joze Sil
vestre Ribeiro.

—=>egº <=

Ao Ministerio dos Negocios Ecclesiasticos


e de Justiça.

4.º Repartidão — N.° 241 — Illm.º e


Exmº Snr. — Pa saios são já uns poucos de
mezes depois que eu tive a honra de dizer
— 134 —

um dos antecessores de V. Exc." no Mii


nisterio dos Negocios Ecclesiasticos e de Jus
tiça o que se segue:
« As egrejas parochiaes do Districto a
((
meu cargo estão quasi todas redusidas ao
((
mais deploravel estado de ruina, como
((
não tendo sido reparadas ha longos annos.
(( Os Reverendos Parochos não cessam de
G
representar-me a toda a hora a indispen
(
sabilidade de se acudir com prompto re
((
medio áquelle mal, fazendo-me sentir,
((
por um lado — a indecencia dos templos,
((
e os ponderesos inconvenientes que d’alli
((
resultam, — por outro, a impossibilidade
(!
em que estão as Fal ricas e as Confrarias
({
de costearem tão crescidas despesas.
« Não necessito de encarecer perante
V Exc." a urgencia do serviço de que se
((
trata, no qual muito vae do interesse da
Religião e do Estado. como he obvio,
((
maiormente em uma possessão portugueza,
« onde he inistér que tudo quanto tem re
lação com o culto catholico se faça nos
(( devidos termos, em consequencia da lucta
((
que tem a sustentar contra os esforços do
prºselytismo. -

« Nestes termos ouso rogar a V. Exc."


-- 135 —

({
que, tomando em consideração o que dei
« xo exposto, se digne providenciar com
« petentemente para que este Governo Civil
« seja authorisado com um credito de tres
« contos de reis insulanos, a fim de se faze
« rem nas egrejas parochiaes os reparos mais
« urgentes.
Desde então para cá tem-se aggravado
o mal, e fôra por certo um crime da mi
nha parte o ser surdo ás supplicas do cle
ro, e aos clamores do povo, o qual vê com
profundo desagrado e irritação, o descuido
com que são olhadas estas impreteriveis ne
cessidades da Religião, e o interpreta em sen
tido bem desfavoravel ás authoridados locaes.
A Cathedral desta formosa e importante
Cidade do Funchal está em tal estado de de
saceio e de estrago, que faz vergonha a na
cionaes, que tantos estrangeiros distinctos,
como os que afluem todos os annos á Ma
deira, a visitem e a percorram. Por esses cam
pos he doloroso vêr como as egrejas e suas de
pendencias vão cahindo em ruina, estando
já hoje indecentes, e muito desmerecidas da
gravidade do seu venerando destino.
Não he o luxo que eu levo em mira;
muito mais modesta he a minha mira, que
— 136 —

só desejára ver aceio e um tanto de decen


cia nos templos. -

Rogo pois encarecidamente a V. Excº


haja de providenciar a este respeito como me
lhor fôr.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal aos
28 de Janeiro de 1848. — Illm.º e Exm.º
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios Ecclesiasticos e de Justiça — O Go
vernador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

*==>OG######>e<=º

C A D E A S.

SUSTENTAÇÃo Dos PREsos,

Ao Ministerio do Reino.

2º Repartição — N.° 1 185 — Illmº e


Exmº Snr. — Dar conta a V. Exc." do es
tado em que achei a cadêa publica da Cida
de do Fuucnal — fazer sentir, se tanto me
– 137 —

fôr possivel, a lastimosa sorte dos infelizes


que alli existem amontoados, curtindo os pa
decimentos mais horríveis—he este um de
ver que não posso deixar de cumprir imme
diatamente sem faltar ao que reclama a hu
manidade, e á mais importante das obriga
ções que me impõe a posição que ora occu
po neste paz.
A cadêa do Funchal he situada na par
te central da cidade, e no melhor, e mais
nobre bairro della. — Pequena, mal dividida,
sem ventilação, he este o encerro de oiten
ta e tantos miseraveis, que ha longos annos
ahi penam e definham em pequenos alojemen
tos, oferecendo
despedaça um quadro de lasttima, que
o coração. •

Visitei no dia 12 do corrente, (…) esta


(*) O «Defensor» e o « Echo da «Revolu
ção » publicaram a este respeito a seguinte cor
respondencia: • •

Snr. Redactor.
Queira V. — ter a bondade de dar logar no
seu estimavel periodico ao seguinte:
O Exmº Snr. Governador Civil, visitou nº
dia 12 do corrente a cadêa desta cidade, acompa
nhado pelos Illm." Snrs. Juiz de Direito, Secreta
— 138 —

medonha habitação, e mal posso descrever


as impressões dolorosas que experimentei. A
humanidade sofre penosamente considerando
tantos desgraçados condemnados a gemer an
nos e annos apinhados em estreitos carce
res, tendo por alimento de cada dia um
pão negro, que nem para animaes seria pro
prio, e respirando de continuo exhalações
mephiticas, que levam a doença e a morte
ás constituições mais sadias e robustas.
Não ha um só dos prezos que alli vi,
que não apresente a repugnante e triste appa
rencia de um aspectro, sendo quasi todos
camponezes, perfeitamente sãos, vigorosos e
possantes no momento em que deram entra
da nessa manção de horror.

rio Geral, Delegados, Commissão da mesma Cadêa,


e Escrivães &c. &c. S. Exc."vio com toda a at
tenção todas as prisões; á vista das quaes patenteou
quanto sua nobre e compassiva alma se achava hor
rorisada, mostrando que este horroroso logar lhe
fazia recordar os atormentadores carceres da inqui
sição; que tal logar era mais proprio para féras do
que para homens, que apesar de se julgarem de
linquentes, não deixam de ter direito á cxistencia,
— 139 —

E não são elles sós os que sofrem,


porque sendo este edificio um fóco activissimo
de infecção, os miasmas putridos que exha
la, espalham nos sitios que o avisinham
os germens da doença, e da insalubridade.
He de força por tanto acudir a este
horrivel mal, he de força fazer desappare
cer um espectaculo que consterna a humani
dade e depõe pela maneira mais posisitiva,
contra a civilisação dos portuguezes; —he de
força finalmente curar com providencias ac
tivas e eficazes esta chaga asquerosa, que
mancha e deprecia a terceira cidade do Rei
no de Portugal, — aquela que em tudo o
mais dá mostras de um espirito de civili
sação em progresso, e que só por isto he tal
e á contemplação da humanidade. Protestou bus
car todos os meios de aliviar a triste sorte dos in
felizes ; e no dia seguinte S. Exc." mandou distri
buir um pão alvo de 30 reis a cada preso, a cujo
exemplo já a Commissão ordenou dar-se diaria
riamente um pão alvo, em logar do de rolão que
se dava. Este nobre modo de proceder, he já uma
prova de que á Madeira coube tambem a sorte de
partilhar a ventura que teve a Ilha Terceira e Be
– 146 –

vez, objecto de lastima e desprezo aos olhos


dos innumeraveis estrangeiros que acolhe em
seu recinto.
Pedir essas providencias beneficas — he
neste caso um dever imprescriptivel, e um
acto de humanidade — he lidar pelo credito
e honra do Governo de Sua Magestade e do
systema representativo — heresalvar um op
probrio ao nome do povo, a que temos a
honra de pertencer.
Oxalá pois que, em vista destas consi
derações, o Governo acuda a tamanho mal,
ajudando a Camara Municipal do Funchal a
construir uma prizão, que não seja um hor
rivel cemiterio de vivos — uma prizão, qual
a demandam a policia e necessidade de tem
ja, de ser governada por tão sabio, justo, e com
passivo Varão. Os infelizes prezos intimamente
penhorados pela acção, e protestos de S. Exc.",
já d'antemão se dão os parabens do melho
ramento de sua sorte; e cheios de gratidão dese
jariam levar aos pés de S. Exc." os seus humildes
agradecimentos, porém como isto sería atrevimen
to sendo feito directamente, por isso elles rogam
a V. — Snr. Redactor, haja de imprimir este; por
— 141 —

po em que vivemos.
Oxalá que o Governo acuda a este mal,
augmentando o credito para o sustento dos
prezos pobres, que desses he a quasi tota
lidade dos que existem actualmente na ca
dêa,
Oxalá, por fim, que o Governo acuda
em breve a este mal, ordenando que um
navio do Estado venha recêber sem a menor
perda de tempo os prezos que estão condem
nados a degredo para as possessões de Afri
ca e Asia; para que V. Exc º saiba o nu
mero dos que estão nestas circunstancias, te
nho a honra de enviar-lhe as duas inclusas
relações que exigi dos Delegados do Procura
rador Regio nas duas Comarcas do Funchal.
que talvez S. Exc." se digne lançar seus respeita
veis olhos sobre o seu periodico, vindo assim no co
nhecimento dos desejos de gratidão que para com
S. Exc." nutrem os tristes presos. Esperam pois
que V. — lhes faça esta graça, pelo que ficarão a
V. — muito obrigados —

UM PREzo EM NoME DE roDos.


Cadêa 14 de Outubro de 1846.
Deus Guarde a V. Fxc.° — Funchal
aos 14 d’Outubro de 1847. — Illmº e Exm.º
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino. — O Governador Civil, Jose
Silvestre Ribeiro.

A Camara Municipal do Funchal.

2.° Repartição — L.° 3.° — N.° 290 — Illmº


Snrs. — Um objecto ha, que deve attrahir toda a
attenção de V. S.", e maiormente na occasião em
que tantos beneficios se esperam da dedicação da
actual Camara. Quero fallar da conclusão da nova
Cadêa; — quero falar da urgentissima, da impre
terivel necessidade de acabar com esse terrivel foco
de infecção, com esse cemiterio de infelizes crea
turas vivas, a que se dá o nome de prizão publi
ca. —Sei que demanda essa obra alguns sacrifi
cios, mas reconheço que he força lavar uma no
doa, que mancha a civilisação desta cidade, tão
brilhante aliás a muitos respeitos. — A este propo
sito já oficiei ao Governo de Sua Magestade, re
presentando-lhe a conveniencia de ajudar a Camara
— 143—

nesta boa empresa; agora empenho todo o zelo,


todo o patriotismo de V. S.", para que se dedi
quem com o maior fervor a levantar este padrão
á gloria da sua administração, toda benefica, toda
paternal, toda de humanidade.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Governo
Civil no Funchal aos 23 de Outubro de 1846. —
Illmº Snrs. Presidente e Membros da Camara Mu
nicipal do Funchal. — O Governador Civil, Joze
Silvestre Ribeiro.

*--*==={#$@cr>=--

Ao Administrador do Concelho do Funchal.

2.° Repartição — Lº 5.° — N.° 233 —


Illm.º Snr — Entre muitas incumbencias,
que a lei commette aos Snrs. Administrado
res de Concelho figura tambem a da sus
tentação dos prezos.
Corre hoje esse cuidado por conta de .
uma Commissão especial em cujo zelo e
boa vontade eu deposito muita confiança; —
no entretanto he tão importante e difficil o
seu encargo, que ella não pode prescindir
da coadjuvação das authoridades, maiormen
te na parte relativa á obtenção de soccorros.
– Í44 —

He mister que por uma vez definamos


exactamente a situação dos prezos, marcan
do caracteristicamente o direito que elles
teem á compaixão e beneficencia dos abas
tados da terra. A religião santa que pro
fessamos, ennobreceo os beneficios exercita
dos para com aquelles infelizes, colocando
entre as virtuosas e meritorias obras, que o
christão póde praticar, a de visitar os en
carcerados; o que importa muito mais do
que ir ver por curiosidade, sympathia, ou
esteril compaixão, essas malfadadas creatu
T81S,

Desde a hora fatal em que um homem


he arrojado ás prisões, a caridade christãa
de accordo com a philantropia do philosofo,
não vê n'elle senão um desgraçado, embora
a justiça tenha que o encarar como assas
sino, como salteador, como réo. Os cri
mes, se os ha, serão examinados no tribu
nal competente, para attrahirem sobre o
culpado a severidade da lei; mas a sensibilida
de humana, vê a miseria, ouve lamentos,
e oferece ao infortunio consolações e alli
VIOS,

Sendo assim, convem que todos os


— 145 —

que gosamos da liberdade, nos transporte


mos pelo pensamento ás lobregas moradas,
onde a sociedade encerra os individuos que
infringiram as suas leis ou são vehemente
suspeitos de as haverem violado. E so
bre tudo convem que os ricos e podero
sos da terra escutem os gemidos, que
sahem lá do fundo dessas mansões de dor,
para repartirem com as tristes victimas que
alli jazem um bocado de pão, do que so
beja de suas mezas abundantes.
Repassado destes sentimentos he mis
ter que V. S." cuide de auxiliar a illustre
Commissão, que tem a seu cargo a policia
sanitaria das cadêas, e a sustentação dos
prezos pobres, fazendo interessar os seus ad
ministrados nesta santa obra de caridade,
e empregando todos os meios que o seu
bom juizo lhe suggerir, para que á dita
Commissão se proporcionem meios de de
sempenhar cabalmente a sua nobre missão.
Por esta occasião devo ponderar a V.
S." que acabo de pedir ao Governo de Sua
Magestade a graça de mandar a esta ilha
uma embarcação que conduza aos seus
destinos os prezos que já estão definitiva
— 146 —

mente condemnados a degredo, pois que não


convem por principio algum, que taes des
venturados estejam por muito tempo numa
situação equivoca, a qual participa de todos
os inconvenientes da punição, sem ter uma
só das vantagens que podem tender as sen
tenças do poder judicial. — Deus Guarde a
V. S." — Palacio do Governo Civil no Fun
chal 6 de Novembro de 18%6 — Illmº
Snr. Administrador do Concelho do Funchal
— O Governador Civil, Joze Silvestre Ribei
?"O.

-----><><><>-----

Ministerio do Reino — 3.° Direcção —


1 º Repartição — Sua Magestade, a Rainha,
sendo-Lhe presente o oficio do Governador
Civil do Districto do Funchal, em data de
14 d’Outubro ultimo, representando a neces
sidº de que ha de prover ao máo estado da
cadêa da referida Cidade, á sustentação dos
presos pobres, e á prompta remessa dos de
gradados que ali se acham para os respecti
vos destinos: Manda, pela Secretaria d'Esta
do dos Negocios do Reino, participar-lhe:
1.° — Que quanto ao máo estado da
– 147 —

cadêa, tendo o Governo esse objecto muito


em vista, tornará sobre ele a resolução que
mais convier, logº que as circunstancias ac
teaes o permittam.
2.° — Sobre a sustentação dos presos
pobres, que não estando consignados subst
dios alguns no orçamento para os presos in
digentes das Ilhas, como o está para os do
Reino, cumpre occorrer a essa sustentação
pelos meios porque até-agora se tem occorri
do , em quanto em Côrtes se não adoptar a
medida geral que mais adquada se mostrar.
3 * — Quanto aos degradados, que pelo
Ministerio da Justiça, em virtude de recia
mação desta Secretaria d'Estado, e de Iden
tica participação do Governador Civil, se
oficiou ao Ministerio da darinha, para que
os ditos degradados vão sendo conduzidos ao
seu destino com a urgencia que demandam
a justiça e a humanidade. — Paço das Neces
sidades, em 26 de Novembro de 1846. ==
Visconde de Oliveira.

2 º Repartição — Lº 3.° — Nº 820 —


Illmº Snr. —Tenho a satisfação de partici
– 148 —

par a V. Sº que solicitei, perante o Con


selho de Districto, a prestação de um soc
corro pecuniario em beneficio dos prezos po
bres das cadêas desta Cidade; e que o Con
selho attendendo ao apuro em que se acham
aquelles infelizes, resolveo que das sobras
dos rendimentos das Confrarias, se applicas
se para nm tão pio destino a quantia de
200$000 reis, sendo metade delle para ves
tuario, e a outra para alimento.
O Conselho de Districto interpretou nes
te caso a favoravel disposição das Corpora
ções Legaes, a quem a Lei manda consul
tar sobre a applicação de taes rendimentos,
e deu-se pressa em annuir ás minhas ins
tancias, acudindo de prompto com o indi
cado auxilio á miseria a que estão redusi
dos os encarcerados.
Póde pois V. S." insinuar ao Snr. The
soureiro que venha receber a referida quan
tia dos 2003000 reis; e servir-se-ha de
fazer dar-lhe a applicação acima inculcada.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do
Goveruo Civil no Funchal, aºs 24 de Feve
reiro de 1847. — Illm.º Snr. Dr. Juvenal
Honorio de Ornellas, Presidente da Com
— 149 —

missão de Beneficencia da Cadêa desta Cidade.


— O Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

A Camara Municipal do Funchal.

2° Repartição — Lº 3 ° — N.° 345 — Illmºº


Snrs. —- Depois de madura reflexão, e de accordo
com o sentir de muitas pessoas de bom juizo, te
nho adquirido a convicção de que he indispensa
vel e da maior urgencia proceder-se quanto antes:
1.° — á remoção da cadèa para o edificio do ex
tincto Convento de S. Francisco. 2.° — ao esta
belecimento dos Tribunaes no mesmo edificio.
3.° — á colocação da casa da camara no edifi
cio da cadêa actual. 4 º — e ao recolhimento dos
mendigos na casa que agora serve para a celebra
ção das sessões da Camara.
Em quaes fundamentos assenta a minha con
vicção? — Eu os vou dizer.
A cadêa actual he um foco de infecção para
a mais bella parte desta cidade, he antes nma
sentina fetida, um cemiterio dos malfadados pre
sos, do que uma casa de detenção — be um in
sulto feito á civilisação e aos formosos sentimen
— 150 —

tos que a filosophia e a Religião inspiram ao ho


mem — he uma vergonha permanente aos olhos do
quantos estrangeiros visitam esta Ilha.
Que he pois mister fazer neste caso?
Remover desde já, e á custa dos maiores sacrifi
cios essa immunda cadêa para um edificio, que cabal
mente satisfaça ás conveniencias de uma tal applica
ção. •

Teremos por ventura, e para já, um edifi


cio que esteja n’estas circunstancias? Ahi está o
do extincto Convento de S. Francisco. — Fica
dentro da cidade, e na mais vantajosa situação
hygienica — he assaz vasto para nelle se estabelece
rem não só prisões seguras, e bem dispostas a to.
dos os respeitos, se não tambem Tribunaes, com
todas as suas dependencias, incluindo até os car
torios dos escrivaes. — Aproveitando-se este edi
ficio para um tal destino, a humanidade soltará
uma voz de alegria, porque os encarcerados vol
tarão á vida, começando a respirar um ar puro,
em vez de sorverem esses miasmas fétidos e deie
terios, que até agora os matavam lentamente.
Approveitando-se convenientemente esse im
menso edificio para o estabelecimento de Tribu
naes restituiremos ás funcções da Magistratura
Judicial toda a gravidade que lhes he propria por
que a justiça he o esteio das nações e o local
onde os seus ministros a representam e servem,
deve ser magestoso, e influir veneração e respeito.
Removida a cadêa para o edificio do extine
to convento de S. Francisco, fica á Camara uma
excellente caza para o estabelecimento dos Paços
do Concelho, situada no centro, e na parte mais
bella desta cidade, como o demanda a natureza das
funcções municipaes, como o recommendam os ve
ne andos estilos dos nossos maiores, como o exi
gem considerações mil. .
E finalmente, tomando a Camara assento n’es
ta caza , ahi fica devoluto esse commodo, e bem
situado apozento das Angustias edificado positiva
e exp essamente para um Asylo de Mendicidade.
E neste cazo não he muito natural, não he
de toda a rasão, de toda a conveniencia, que es
se apozcnto, tão vantajosamente situado, tão com
modamente disposto para um estabelecimento pio,
volte, ou antes seja consagrado ao seu primitivo des
tino, mudando-se para alli os mendigos que ha
pouco foram recolhidos — provisoriamente — em um
canto do extincto convento de S. Francisco ?
E não se diga que a caza das Angustias he
— 152 —

demasiadamente magnifica para ser a morada dos


mendigos! Foi construida para esse determinado
fim, e ainda quando nelia houvesse demazias de
grandeza, poderia isso provar — quando muito —
que devera ter havido mais parcimonia nos gastos mas
nunca demonstrará em boa argumentação, que por
tal motivo devesse ser desviada da sua applicação....
Senhores da Camara Municipal do Funchal !
Tenho dado a V. S." uma idea clara dos projec
tos em que lido, dos motivos que me guiam e
e das vantagens que procuro conseguir dos meus
intentos. —Tenho sido e serei sempre estranho a
todas as considerações, que não tendam — unica e
exclusivamente — a melhorar a condição dos povos,
e a procurar o maior bem ao maior numero; es
tou penetrado da convicção de que o plano que
deixo exposto deve ser levado a execução, e só
deste proposito me poderá demover a desapprova
ção de V S." — Queiram pois V. S." declarar
me francamente se approvam ou reprovam o indica
do plano, na intelligencia de que eu tomo sobre
mim o remover as difficuldades que por ventura
possam occorrer neste negocio , tanto mais quanto
estou rezolvido a não querer desde o principio se
não o indispensavel, deixando para mais tarde o

— 153—

aperfeiçoamento da obra.
Por agora só careço de saber de V. S." se
approvam ou desapprovam o que proponho; depois
disso entrarei nas miudezas do assumpto. — Deus
Guarde a V. S." — Palacio do Governo Civil no
Funchal em 31 de Março de 1847. — Illm." Snrs.
Presidente e Membros da Camara Municipal do Fun
chal. — O Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

-+=> @<=

A L V A R A”.

O Governador Civil do Districto de


Funchal &c.
Tendo sido apresionado nas aguas da
freguesia da Ponta do Pargo, o Bergantim
Portuguez «Mariana » a cujo bordo se en
controu um grande numero de pessoas que tinha
aquele navio recebido sem passaporte para as
transportar á cºlonia ingleza de Demerara:
E tendo-me representado o Dr. Juiz de
Direito da Comarca Occidental sobre a ne
cessidade que ha de occorrer com alguns
meios de subsistencia a 74 daquelles mise
raveis que se acham encerrados na cadêa
desta Cidade, inteiramente faltos de recur
— 154 —

sos em quanto o Poder Judicial não dispõe


ácerca deles o que determinam as leis.
E reconhecendo eu quanto he indis
pensavel não deixar perecer á pura mingua
homens, que com quanto criminosos, ainda
não perderam o direito aos soccorros da huma
nidade.
Tenho por conveniente em conformida
de com a authorisação do Conselho de Dis
tricto, determinar que da caixa das Confra
rias extinctas e sobras de rendimentos das
existentes, se pague por uma vez SóInente
ao Snr. Thesoureiro da Commissão Adminis
trativa da Cadêa a quantia de 2003000 rs.
que serão applicados pela referida Commis
são a subsistencia dos mais necessitados dos
prezos acima referidos. E deste pagamen
to passará recibo ao pé deste o referido Snr.
Thesoureiro
Cadêa. da Commissão Administrativa da

• Palacio do Governo Civil no Funchal aos


21 de Setembro de 1847 — Joze Silvestre
Ribeiro.
*--*><><><><===-----
— 155 —

- Ao Presidente da Commissão da Cadéa.

2.° Repartição — L.° 4.° — N.° 37 —


Illmº Snr. — Na conformidade do que V.
S." me representou ultimamente, cumpre
me participar-lhe que convenho na exonera
ção pedida tão justificadamente, pelo hon
rado Thesoureiro do Commissão da Cadêa,
o Snr Antonio Machado Cotta; e nesta data
nomeio para o mesmo cargo o muito acre
ditado negociante desta cidade o Snr. Joãº
Augusto da Silva Carvalho.
Egualmente me havia V. S." represen
tºdo o apuro em que se acha a referida
Commissão, não tendo já meios de propor
cionar aos presos pobres o escasso alimento
do costume senão até ao meado do mez de
Dezembro proximo futuro; e succedendo que
tivesse eu honiem occasião de falar com º
nobre Duque de Palmella ácerca deste, as
sumpto, e de outros de caridade, S. Exc.",
animado pelos sentimentos de generosidade e
philantropia que o distinguem, me entregou
a quantia de 723000 reis insulanos (15 so
|beranos), dignando-se de dizer-me que a ol
recia para a sustentação dos prezos pobres.
He pois essa quantia que eu tenho hoje
– 156 –

a satisfação de remetter com este oficio a


V. S.", para ter o indicado destino.
Não deixarei escapar esta occasião, sem
rogar á Commissão a que V. S." preside, a
mercê de desenvolver a maior solicitude pa
ra com os prezos pobres, visitando amiuda
das vezes a cadêa, e procurando suavisar,
tanto quanto he possivel, a triste sorte des
sas malfadadas creaturas que além de estarem
privadas da liberdade, vivem acurvadas sob
o pezo da indignação da sociedade, do rigor
das leis, talvez do remorso, e teem a des
fortuna de habitar uma casa que reconheci
damente he destituida das condições hygieni
cas e de conforto.
Por minha parte farei quanto em mim
couber para ajudar a Commissão no desem
penho da sua tarefa, desejando ardentemen
te que ella queira utilisar a minha boa von
tade.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do
Governo Civil no Funchal 29 de Novembro
de 1847. — Illm.º Snr. Dr. Juvenal Hono
rio d'Ornellas. — O Governador Civil, Joze
Silvestre Ribeiro.
*--*#E-62-67 E…--
-- 157 —

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — Lº 3.° — N.° 22 — Illm.º e


Exm.º Snr. – Em oficio Nº 1185 de 14 de Outu
bro do anno proximo passado de 1846, de que
ora envio a inclusa copia authentica, tive a honra
de representar a necessidade urgentissima de cons
truir uma boa cadêa nesta Cidade do Funchal –
de provêr á sustentação dos prezos pobres — e á
prompta remessa dos degradados para os respecti
vos destinos.
Pela Portaria de 26 de Novembro do mes

mo anno, expedida pela 3.° Direcção, 1.° Repar


tição, do Ministerio a cargo de V. Exc.", me foi
participado.
1.° — Que quanto ao máo estado da cadêa,
tendo o Governo esse objecto muito em vista, to
mará sobre elle a resolução que mais convier •
logo que as circunstancias actuaes o permittam.
2.° — Sobre a sustentação dos prezos pobres,
que não estando consignados subsidios alguns nº
Orçamento para os prezos indigentes das Ilhas,
como o está para os do Reino, cumpre occorrer
a essa sustentação pelos meios porque até agora se
tem occorrido, em quanto em Côrtes se não adopº
— 158 —

tar a medida geral que mais adequada se mos


trar.

3.° — Quanto aos degradados, que pelo Mi


nisterio da Justiça, em virtude de reclamação
desta Secretaria d'Estado, e de identica partici
pação do Governador Civil, se oficiou ao Minis
terio da Marinha, para que os ditos degradados
vão sendo conduzidos ao seu destimo com a urgen
via que demandam a justiça e a humanidade.
Desgraçadamente vão-se aggravando de dia
em dia os males que eu expuz no citado oficio,
e he força que renove as minhas instancias.
A Cadêa Publica desta Cidade he um cemite

rio de vivos, como geralmente a denominam, so


bre ser um foco de infecção, como estando situada
no logar baixo e menos arejado da Cidade, e no
ponto mais central da mesma. Assim situada, e
demasiadamente pequena para conter o grande nu
mero de prezos que diariamente encerra, só ser
ve para arruinar a saude das malfadadas victimas
que alli jazem, e para espalhar aos arredóres pe
rigosos e deleterios miasmas. — He por tanto da
maior urgencia que o Governo de S. M. entenda
quanto antes sobre os meios de ser construida uma
cadêa, que preencha todas as indicações que a
– 159 —

humanidade , e ao mesmo tempo a saude e a se


gurança publica reclamam. — Ha n'esta Cidade
um local excellente para n’elle se edificar uma
boa cadêa, — he o edificio do extincto Convento
de S. Francisco; — e se o Governo se deliberar
a tratar deste negocio, cuidarei de o desenvolver
completamente, apresentando desenhos, orçamen
tos, e todos quantos esclarecimentos me forem
exigidos.
Em quanto á sustentação dos prezos, he mis
ter que o Governo de S. Magestade se digne
sollicitar um credito annual de um conto de reis

insulanos, cuja quantia eu reputo suficiente para


aquelle destino. — Os prezos indigentes vivem hoje
redusidos á maior miseria que imaginar-se póde;
as subscripções da beneficencia publica pararama
já ha muito tempo, e nem isso me admira, por
que os moradores estão geralmente pobres, e ao
mesmo tempo cançados de subscrever para tantas
necessidades publicas. Por outro lado, a Santa
Casa da Misericordia tambem não póde prestar soc
corro algum aos prezos, antes eila carece de ser
Soccorrida. Mas os amargurados prezos não de
vem ser victimas da fome, e por isso eu peço
enearecidamente a V. Exc.º queira dignar-se de os
— 160 –

beneficiar pelo modo que inculco.


No que toca á conducção dos degradados pa
ra os seus destinos, he força que eu rogue a V.
Exc.": — 1.° — Que se sollicite do Minasterio da
Marinha a providencia de ordenar que por aqui
passem embarcações de guerra para os levarem
aos logares de degredo; — 2.° — Que se solicite
do Ministerio da Justiça a providencia que pela
Repartição competente sejam enviadas aos Juizes de
Direito das duas Comarcas deste Districto as guias,
sem as quaes os prezos não pódem sahir para os
seus destinos. — Se estas guias estiverem suecessi
vamente na Madeira ao tempo da passagem de
qualquer embarcação de Guerra possivel será ir
mandando degradados para os seus destinos — no
que tanto interessam a Justiça e a Humanidade.
Digne-se V. Exc." acolher benigno estas mi
nhas rogativas, inspiradas como são pelo desejo de
acudir a infelizes, e de encaminhar tão importan
tes cousas nos devidos termos.
Deus Guarde a V. Exc." —Funchal 10 de
Fevereiro de 1848. – Illm.º e Exmº Snr. Ministro e'
Secretario d'Estado dos Negocios do Reino. — O
Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
«…rsãE><><>--***
— 161 —

"Ao Presidente da Commissão da Cadêa.

2.° Repartição — Lº 4.° — N.° 65 —


Illmº Snr. —Caie-ine a satisfação de par
ticipar a V. S." que nesta data mando en
tregar, por mão do oficial desta Secretaria,
Jacinto de Freitas ilomelino, ao Thesourei
ro da Commissão de Beneficencia dos pre
zos, a que V. S." preside, a quantia de
quarenta e oito mil reis [ dez soberanos]
Para ser
ferida applicada tem
Conmissão ás adespezas que a re
seu carge. •

Queira V. S." fazer constar aos infeli


zes a quem he destinado este soccorro, que
parte elle das generosas mãos de Sua Mages
tade a Rainha Adelaide, á Qual os desvai
dos devem já tantos beneficios. |

Deus Guarde a V S * — Palacio do Go


verno Civil no Funchal aos 5 de Janeiro de
1848. — Illmº Snr. Dr. Juvenai Honorio de
Ornellas, Presidente da Commissão de Bene
ficencia da Cadêa desta Cidade. — O Gover
Bador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
•==----<><><>-->

2.° Repartição – L."4" — N.° 111 -


– 162 —

Illmº Snr. — Satisfazendo á muito attendivel


requisição que V. S." me fez hontem de viva
voz, e profundamente condoído da tristissi
ma situação a que estão redusidos os prezos
pobres, sem meios de sustento e sem ves
tuario; rogo a V. S." a mercê de insinuar
ao Snr. Thesoureiro da Commissão a que V.
Sº preside, que venha receber do Snr. Mau
ricio de Castelbranco Manoel, official desta
Secretaria, a quantia de Rs. 1003000, que
pelos rendimentos das Confrarias extinctas
ponho á disposição de V. S." para ser ap
plicada em beneficio dos mesmos prezos. —
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal aos 20 de Março de
1848. — Illm.º Snr. Presidente da Commis
são de Beneficencia dos Prezos. — O Gover
nador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

===>>QQQ G==

2.° Rep.—Lº 4º.—N.° 1 18— Illm.º Sr.


— Acolhendo as ponderações que V. S." me
fez sobre o tristissimo estado de miseria e
nudez a que vivem redusidos os malfadados
prezos da cadêa desta cidade, e não menos
ás instancias que elles mesmos fizeram peran
— 163 —

te mim por meio de uma exposição escripta,


tratei de empregar todas as diligencias para
acudir a tão desgraçadas creaturas, podendo
conseguir que da Caixa das Confrarias ex
tinctas se lhes preste o soceorro de Rs. 1683,
cuja quantia servira para se lhes mandar fazer
algum fato, e o restante para o sustento.
Para se conseguir esta quantia na pre
sente occasião foi preciso fazer um empres
timo áquella Caixa; nó entanto, se ainda
antes da minha sahida poder obter mais al
guns fundos, tratarei de completar a quan
tia de Rs. 2003000, attenta a urgencia do
6BSO.

Póde V. S." insinuar ao Snr. Thesou


reiro dessa Commissão que venha receber na
Secretaria do Governo Civil a referida quan
tia de 1683000. • •

Deus Guarde a V.S." — Palacio do Go


verno Civil no Funchal aos 10 de Junho de
1848. — Ilim.° Snr. Dr Juvenal Honorio de
Ornellas, Presidente da Commissão de Be
neficencia dos Prezos da da Cadêa. — O Gover
nador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
*--*>G3}<>…--

- 164 —

OBRAS PUBLICAS.

Não se repete a publicação de peças


ofilciaes sobre esta materia, já publicadas
na — «CoLLECÇÃO DE DocEMENTos RELATI
vos Á CRISE DA FoME PoRQUE PAssARAM As
ILHAS DA MADEIRA E PORTO SANTO, NO AN
No DE 1847 ) — Veja-se por tanto nessa
Collecção o que nesta se omitte.

A Camara Municipal do Funchal.

[Extracto]— 4.° Repartição — Lº 1.°


— N.° 447. — Illmº Snr........... —
Approveito a occasião para recommendar a
V. S." como obra de urgencia a valla que a
Camara passada pretendia mandar abrir no
– 165 —

sitio da Achada, para evitar a repetição


dos desastrosos acontecimentos que tiveram
logar na calçada de Santa Clara e outros
pontos da Cidade, por occasião da afluvião
de 1842, cuja despeza foi incluida em um
dos ultimos orçamentos e auctorisada pelo
Conselho de Districto.
Uma obra de reconhecida utilidade ha
a fazer neste concelho — a colocação de um -
signal bem distincto na baixa denominada
. «O Carneiro» para preservar os barcos cos
teiros dos perigos que alli podem sofrer, e
de que ha infelizmente alguns exemplos; e
por isso convido desde já a Camara, a que V.
S." preside, a mandar fazer essa obra logo
que seja possivel.
Deus Guarde a V. S.° = Palacio do
Governo Civil no Funchal 14 d’Outubro de
1846. = Illm.º Snr. Presidente da Camara
Municipal do Funchal. = O Governador Ci
vil, Joze Silvestre Bibeiro.
—=>t89 e…--

Ao Commandante da Nona Divisão Militar,

4.° Repartição — Lº 3.° — N.° 1296


— 166 —

O
— [ilm.º e Exm.º Snr. — Por Decreto de
20 de Dezembro de 1842 Houve S. M. por
bem Ordenar, que da cerca do extincto Col
legio dos Jesuitas desta cidade se separasse o
terreno necessario, para poder levar-se a ef
feito o alinhamento da tortuosa, e quasi in
transitavel Rua do Castanheiro, ficando a Ca
mara obrigada a fazer á sua custa as obras
que este alinhamento occasionasse.
Por copia tenho a honra de encaminhar
ás mãos de V. Exc." o mencionado Decreto,
para que V. Exc." se sirva de vêr os ter
mos em que ele he concebido, e que aliás
estão de accordo, na parte essencial deste
negocio,
de fazer.
com o breve extracto que acabo

Tendo eu proprio ido examinar a Rua


do Castanheiro, que atravessa a parte mais
nobre do Funchal, e convencendo-me de que
com justificada razão a qualificou o dito De
creto de tortuosa e quasi intransitavel; pas
sei a conferenciar com o Presidente da Ca
mara no sentido de se proceder immediata
mente ao aformoseamento desta Cidade no
indicado ponto, visto que um Decreto da
Soberana authorisa esta urgentsssima obra.
– 167 —

Como porem a referida cêrca esteja eon


tigua ao quartel militar da dependencia de
V. Exc.", não posso prescindir de solicitar
de V. Exc." a competente venia, para que
desde já se comece a trabalhar naquella
obra.
Fazendo justiça ao bom juiso de V. Exc",
e ao conhecimento que tem das cousas desta
cidade, não hesito em crer que V Exc." se
prestará benevolo a condescender com os de
sejos que tenho a henra de lhe exprimir,
tanto mais quanto não se trata senão de dar
execução a um Decreto de S. M. a Rainha,
e de promover o aformoseamento e as com
modidades de uma das mais importantes ci
dades Portuguezas.
Deus Guarde a V Exc." — Palacio de
Governo Civil no Funchal aos 21 de Dezem
bro de 1846. — Illm.º e Exmº Snr. Coro
nel Commandante interino da Nona Divisão
Militar. — O Governador Civil, Joze Sºlves
tre Ribeiro. -
– 168 —

Portaria do Ministerio da Guerra.

Ministerio da Guerra — 2.° Direcção—


2." Repartição — Manda a Rainha, pela Se
cretaria d'Estado dos Negocios da Guerra,
communicar ao Commandante interino da No
na Divisão Militar, em resposta ao seu offi
cio N° 183, de 26 de Dezembro ultimo,
que nenhuma duvida se lhe deve oferecer em
consentir no alinhamento da Rua do Casta
nheiro, uma vez que a Camara Municipal do
Funhal se obrigue á reconstrucção do muro
e telheiro que teem de ser demolidos, per
tencentes á cêrca do extincto Convento dos Je
suitas, na confirm dado do determinado no De
creto de 20 de Dezembro de 1842, e da in
formação do Commandante d'Engenheria na
quella Divisão. — Paçº das Necessidades 16
de Janeiro de 1847 — Antonio Maria de
Souza e Azevedo.

-*E3><><>----

Ao Tenente Coronel Guerra.

4.º Repartição — Lº 3.° — N.° 1292


– Illmº Snr. -- Nus termos da confe
— 169 —

rencia que tivemos esta manhã, cabe-me


a honra de rogar a V Sº a mercê de mandar
quanto antes procederá construcção da ponte de
madeira da Rua dos Ferreiros, com a maior
solidez e perfeição possiveis.
Consta-me que alguns moradores daquel
las visinhanças se promptificam a concorrer
com algum soccorro para a feitura da dita
ponte; e por isso me parece bem que V. S."
ordene ao seu escripturario, que se entenda
com os ditos moradores, e delles receba as
quantias com que quizerem contribuir, fazen
do uma relação, que depois será publicada.
- Conversando, depois da nossa entrevis
ta, com o Snr. Presidente da Camara, este
me disse que a Camara punha á disposição de
V. S." toda a madeira que ella tivesse propria
para a ponte; o que, na verdade, he muito
de agradecer, em ordem a poupar á Fazen
da Publica alguma despesa. -- Deus Guarde
a V. S." — Palacio do Governo Civil no Fun
chal aos 11 de Janeiro de 1847. — Illm."
Snr. Manoel Joze Julio Guerra, Tenente Co
ronel do Corpo de Engenheiros. — O Gover
nador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
- 170 —

Ao Ministerio do Reino.

4.º Repartição — N.° 2053 — Illmº


e Exmº Snr. —Vim encontrar o edificio da Se
cretaria do Governo Civil deste Districto mui
to carecido de reparos, tanto no seu interior,
como no exterior; circunstancia esta muito
desagradavel, se se attender a que o local
onde está estabelecida uma Repartição Pu
blica de tal cathegoria deve apresentar uma
certa decencia, e maiormente na Ilha da Ma
deira, onde quasi todos os dias estão che
gando estrangeiros de distincção, que em
desembarcando veem logo visitar o Governa
dor Civil na sua Secretaria.

Movido por estas considerações, come


cei a entender n'esses reparos, e já hoje pos
so apresentar a Secretaria a qualquer pessoa,
por mais qualificada que seja, sem ter o me
nor receio de que se note falta de decencia,
e de gravidade, proprias de uma tal estan
cia.
* Para costear esta despesa oscorre-me pe
dir a V. Exc." authorisação para lhe appli
car o producto dos sobejos dos emolumentos
da Secretaria, que ainda não tivérem entra
— 171 —

do no cofre central do Districto, ou dos que


de futuro estivérem neste caso.
Deve ponderar a V. Exc º que a despe
sa não excéde a seiscentos mil reis, moeda
insulana, como brevemente terei occasião de
o fazer ver authenticamente. -

Se esta despesa não fosse costeada por es


te modo commodo, devêra sê-lo pelos Co
fres Publicos, como sendo o edificio da Se
cretaria um predio nacional; pareceo-me po
rem preferivel lembrar este meio, que em
verdade oferece mais vantagens.
Ouso esperar que V. Exc." se dignará
de approvar o meu pensamento, e conceder
me a authorisação que solicito.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal aos
20 de Março de 1847. — Ilmº e Exmº
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Ribeiro.
Silvestre Reino — O Governador Civil, Joze •

A Camara Municipal do Funchal.

4.° Repartição – L.° 2.° — N.° 20 — Illm."


Snrs. —Tendo eu mandado fazer em diferentes
pontos do Districto, obras que foram consideradas
— 172—

como as mais precisas e começal-as com urgencia


para fornecer pelo trabalho ás classes pobres os
meios de que carecem para escaparem aos crueis
efeitos da fome que as tem flagellado, foi uma
d’essas o melhoramento do caminho littoral onde
se juntam a Rua Bella de San' Thiago e a de
Santa Maria Maior. — Mas serve de impedimento
a esta obra uma pequena casa terrea que occupa
mais de dous terços da largura do caminho no
angulo formado pelas directrizes d’aquellas duas
TU1aS,

E como sou informado de que a Camara do


Funchal fizera avaliar essa caza para a pagar e
demolir, rogo a V. S." que ajudando-me eomo
dezejam no empenho em que lido de distribuir
Soccorros pelos necessitados, tirando d'esses soc
corros a maior somma possivel d'utilidade publi
ca, se sirvam levar a efeito o seu bem entendi
do projecto de expropriação. — Não me he possi
vel distrahir para tal expropriação dinheiro algum
do pouco que tenho destinado para as referidas
obras já orçadas e detalhadas, nem convem que
páre nenhuma dellas.
Confio pois que V. S." ordenando a peque
na despeza com que já contavam, e que justa
— 173 —

mente está a cargo d'este municipio, farão habili


tar o Snr. Engenheiro encarregado de taes obras
para mandar demolir aquella casa no dia 26 de
corrente. — Deus Guarde a V. Sº" — Palacio do
Governo Civil no Funchal aos 23 d'Abril de 1847.
-- Illmº Snrs. Presidente e Membros da Camara
Municipal de Funchal. — O Governador Civil ,
Joze Silvestre Ribeiro.

--…@@@>--•

Ao Tenente Coronel Guerra.

4.° Repartição — L.° 3.° — N.° 1325. — Illm.º


Sur. — A Câmara Municipal de Machico represen
tou-me ultimamente que as muralhas construidas
na ribeira daquella Villa depois da aluvião de
1842 se acham incompletas; — que a ribeira está
muito obstruida, com prejuizo do melhor desem
barcadouro que alli havia; — que a ponte da mes
ma ribeira está a desabar.
Queira V. S." ter a bondade de mandar exa
minar este negocio, e dar-me conta das obras que
ali he indispensavel fazer, e da quantia que será
necessario applicar para tal despeza.
Por esta occasião rogo igualmente a V. S." a
• 174—

mercè de me dizer se em algum outro ponto des


fa Ilha ha alguma obra publica de reconhecida uti
lidade, que deva fazer-se com urgencia. — Deus
Guarde a V. S." — Palacio do Governo Civil no
Funchal aos 10 de Abril de 1847. — Ilm.º Snr.
Manoel José Julio Guerra, Tenente Coronel do
Corpo d'Engenheiros — o Governador Civil, José
Silvestre Ribeiro.

Ao Tenente Coronel Guerra.

4.° Repartição — N.° 1332 — Livro 3.° — Ilmº


Snr. — Reconhecendo a conveniencia de que se fa
çam algumas obras para melhoramento dos diffe
rentes portos, e desembarcadouros da Ilha; rogo a
V. S. a mercê de me dar uma nota das necessida

des que a este respeito considera mais urgentes",


servindo-se de indicar-me os pontos da Ilha onde he
mister proceder a trabalhos d’esta naturesa, quaes
devem ser esses em cada uma das localidades e a

despesa que occasionam — Deus guarde a V. S." –


Palacio do Governo Civil no Funchal, aos 26 de
Abril de 1847. — Illmº Sr. Manoel Joze Julie
Guerra, Tenente Coronel d'Engenheiros. — O Go
vernador Civil, José Silvestre Ribeiro.
– 175 -

Ao Capitão d'Engenheiros Blanc.


4.º Repartição — Lº 3.° — Nº 1335
— Illmº Snr. — Não podendo ser das mi
nhas intenções fazer trabalhar em obras pu
blicas sem ter a certeza de poder mandar pa
gar no fim de cada semana os salarios de
vidos; •

E tendo verificado pela abertura de


Cofre Central, que a ultima ordem de cou
sas não deixára em caixa senão uma dimi
nuta somma de numerario, que possa cor
TCT :

E sendo outro-sim certo, que ainda


quando comecem agora a afluir rendimentos
ao Cofre Central, são em extremo numero
sas e apertadas as despesas da actulidade,
maiormente as occasionadas pela situação que
a indicada ordem de cousas creou:
Tenho por conveniente mandar suspen
der quaesquer trabalhos que estejam em a
berto, até que em tempo opportuno, quan
do habilitado com suficientes recursos, e de
vidamente authorisado, eu possa e deva re
novar esses trabalhos.
Regulando-me porém pelo primeiro fun
damento desta resolução, julgo de toda a
– 176 –

justiça que se mande pagar a despesa que


se tiver feito nestes 3 ultimos dias, poste
riores ao do restabelecimento do Governo
Legitimo, processando-se a competente fo
lha, com tanto quê nella, além da despeza
do pessoal dos trabalhadores, se não inclua,
mais
rem applicado dos materiaes
do que a neste que se houve
mesmo periodo. •

Nesta conformidade, e para levar a ef


feito esta resolução em todas as suas partes,
dará V. S º como Oficial Engenheiro, en
carregado das obras civis, todas as as pro
videncias que o caso demanda. .
Aproveito esta occasião para rogar a V.
S." a mercê de tornar conta do arquivo da
- da Repartição das obras civis, e de man
dar inventariar c pôr em arrecadação todas
as ferramentas, utensilios, e demais objectos
pertencentes á mesma Repartição; servindo
se de dar-me depois conta de tudo o que
neste particular fizer.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal aos 29 de Julho de
1847 — Illm.º Snr. Tiberio Augusto Blanc,
Capitão do Corpo d'Engenheiros. — O Gover
nador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
Ao Capitão Tiberio Augusto Blanc.

4.º Repartição — Livro 3.° — Nº 1843 =


Illmº Snr. — Respondendo ao officio de V. S." de
14 do corrente, cabe-me a satisfação de louvar o
zelo com que V. Sº quer promover a conclusão da
obra emprehendida no Cáes da Pontinha.
Esta obra, que, como V. S." diz era lembra
da de ha muito tempo pela opinião publica, foi
me proposta pelo Tenente Coronel d'Engenheiros,
Manoel Joze Julio Guerra, a quem eu havia pe
dido no mez de Março findo, me desse uma nota
dos trabalhos publicos, a que no seu entender de
veria proceder-se com preferencia E tamanho in
teresse me inspirou aquella obra, que em oficio
de 20 de Abril ultimo disse eu ao mesmo Tenen

te Coronel, «desejarei muito que por esta occasião


« se faça no Cáes da Pontinha uma obra completa,
« embora seja necessario gastar o dobro da quan
« tia que V. S." tue insinuou.
Começou este trabalho ainda durante o meu
exercicio, e continuou no periodo da Junta Go
vernativa, tendo-se feito chegar a tal ponto, que
de necessidade deve levar-se por diante, para
que o mar não inutilise as despezas já feitas.
— 178 —

Sendo tudo isto assim, já V. S." vê o quante


cu devo empenhar-me em que se ultime esta
obra, ou pelo menos se eleve a tal altura a mura
lha, de que V. S." trata, que fique a salvo do
risco de ser destruida pelo choque das ondas.
Nesta conformidade, servir-se-ha V. S." de
dár todas as providencias para que até ao mez de
Outubro, proximo futuro, se trabalhe na dita
obra com a maior actividade possivel, sem prejui
zo da solidez e perfeição convenientes; podendo V.
S." ficar certo de que cu farei os possiveis esfor
ços para costear a despesa semanal até á quantia
a que V. S." marca de perto de 8003000 rs.
Deus Guardc a V. S." — Palacio do Governo

Civil no Funchal aos 20 de Agosto de 1847. –


Illm.º Snr. Tiberio Augusto Blanc, Capitão de En
genheiros. = O Governador Civil, Joze Silves
tre Ribeiro.

E=EX@Gä=

4.° Repartição — L.º 3.° — N.° 1346 — Illm."


Snr. — Tomando na devida consideração o que V.
S.º me propõe no seu oficio de 23 do corrente, au
thoriso a V. S." a ultimar o reparo que se come
çou a fazer no alicerce da muralha da margem direi
– 179 –

ta da Ribeira de S. João desta Cidade, podendo V. S."


gastar até a quantia de Rs.. 40,3900, que inculca
indispensavel proximamente para a conclusão da re
ferida obra. -

Por esta occasião agradeço a V. S." o zelo com


que se houve em inspeccionar as ribeiras e ribei
ros desta Cidade, no intuito de examinar se care
ciam de alguns reparos urgentes, que podessem ser
feitos no pequeno prazo que decorre até ao proxi
mo inverno. Graças a essa muito louvavel inspec
ção ! conheceo V. S." a indispensabilidade do tra
balho que me recommendou no citado oficio, e
que eu de muito bom grado authoriso agora. —
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Governo Civil

no Funchal aos 27 de Agosto de 1847. — Illm.°


Snr. Tiberio Augusto Blanc, Capitão d'Engenhei
ros — O Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

*--*=<><><>…—º

Ao Administrador do Concelho de Machico.

4.° Repartição — L.º 3.° — N.° 1 131 — Illm."


Snr. — Em additamento ao meu offieio n.° 473, 2.°
Repartição, de 25 do corrente, cumpre me recom
mendar a V. S." que se entenda com a Camara Mu
-- 189 —

nicipal d'esse Concelho, para que quanto antes ha


ja de mandar acautelar os estragos que o proximo
inverno pode fazer nos caminhos da Freguezia de
Santo Antonio da Serra, parecendo que entre as
providencias a tomar desde já , he uma a de fazer
cortar as regadeiras. – Deus Guarde a V. S." — Pa
lacio do Governo Civil no Funchal aos 27 de Agos
to de 1847. = Illm.º Snr. Administrador do Con
celho de Machico. = O Governador Civil, Joze
Silvestre Ribeiro.

*--*es#26339E===----

Ao Ministerio do Reino.

4.° Repartição — N.° 2102. — Illmº e


Exm.º Snr — Fui um destes dias visitar a
famosa obra do «Rabaçal», de que o Go
verno de Sua Magestade já tem conhecimen
to pelas informações que os meus antecesso
res lhe hão enviado; e venho hoje dar con
ta a V. Exc." das impressões que recebi
naquela digressão, e do estado em que en.
contrei esse gigantesco trabalho.
A oito legoas de distancia do Fun
chal, fica para o lado do Norte o famige
rado sitio do «Rabaçal», cuja descripção he
— 181 –

superior á energia da palavra, e até mes


mo ao vigor do pincel mais habil. O es
pectador fica absorto em presença do mais
sublime espectaculo, que a naturesa se ap
prouve de oferecer-lhe no meio de serra
ntas elevadissimas; e ainda ao despedir-se,
lança sobre esse quadro magnifico um volver
de olhos, como quem lamenta que seja a
quella a vez derradeira de uma tão arreba
tadôra contemplação!
A naturesa dispôz naquele sitio em um .
vasto semicirculo magestosas montanhas, co
bertas de verdes arbustos e relva quasi em
toda a sua concavidade , e até nos mais al
tos pincaros; e de todas essas montanhas
está cahindo agua, em forma de cascata,
que desde longos tempos dava origem a uma
Ribeira denominada « a Ribeira da Janella»;
e he essa agua que hoje pertende aprovei
tar-se, reunindo-a e encanando-a em uma
levada, para ir regar immensos terrenos,
que della carecem.
No sitio do «Rabaçal» está já feito
muito trabalho, pois que a dois terços da
altura do immenso redondo das montanhas
está já construída mui solidamente a caixa
— 182 —

da levada, que recolhe todas as aguas que


do alto estão manando, e já a levada
está construida umas poucas de braças áquem
das nascentes. E de passagem direi a V.
Fxcº, que a obra já feita demandou avul
tadas de pesas, e revela da parte de quem
a dirigio no seu principio, o Director das
obras publicas, Vicente de Paula Teixeira,
não menos que dos animosos operarios que
alli trabalharam, muita intelligencia, e não
vulgar coragem, pois que só podiam os ho
mens trabalhar alli pendurados de cordas se
guras nas arvores das montanhas, tendo por
baixo de seus pés um abysmo, e sendo-lhes
necessario brocar e dar fogo a rochas de ba
salto.
Com quanto não esteja ainda feita, se
não em pequena extensão, a caixa da le
vada, he com tudo certo que o assento della
tem já continuado por espaço de cinco quar
tos de legoa para o sul, até chegar ao mon
te « das Estribarias» seguindo as ondulações
das montanhas, e já nivelado com pequenas
diferenças para receber o aqueducto. Tam
bem neste assento da levada foi mister gas
tar muito dinheiro, e vencer muitas difficul
dades, quaes as de cortar durissimas rochas,
— 183—

que
cios.
estão ás bordas de medonhos precipi

Em chegando ao monte das «Estriba


rias» oferece-se ao espectador uma quasi
maravilha do arrojo humano, e maiormente ao
considerar-se que pizamos terreno de uma
Ilha pobre, e onde a arte não tem chega
do á perfeição, a que tem subido nos pai
zes mais cultos. Na supposição de que a
agua do Rabaçal tivesse chegado ao monte
das « Estribarias», nada se teria consegui
do de proveitoso, porque essa montanha gi
gante não a deixaria passar para o ponto
onde se tenciona conduzir. Foi pois mister
furar a montanha no ponto que fica ao ni
vel do assento da levada, e fural-a na sua
grande espessura de 1956 palmos ! Encon
tra pois ali o viajante um tunnel, uma a
trevida galeria subterranea, que em estando
ultimada terá o comprimento de 1956 pal
mos, tendo por cima de si uma aboboda
de 600 palmos de grossura, que tanto vai
do nível da levada ao cimo do monte!
O furo da montanha, que eu lamento
não ter continuado com a largura que lhe
deu o primeiro Birector da obra, Vicente de
Paula Teixeira, vai já muito adiantado, e
— 184–

creio que pouco mais faltará do que um quar


to de sua extensão; pois que tendo-se toma
do a bem entendida resolução de abrir ao
mesmo tempo o furo do lado do Norte,
e o do lado do Sul, só resta a per
furar a porção do centro, que de cer
to não excede a 500 palmos. Este tra
balho tem agora apresentado maiores diffi
culdades, em consequencia de se ter dado
com rocha basaltica. Para maior claresa da
minha breve narração devo ponderar que fi
gurei o espectador colocado para o lado do
do Norte olhando para o Rabaçal, e o
vim condusindo para o lado do Sul,
que deita para o mar. Qual he, per
guntar-se-hia, a utilidade de uma obra tão
despendiosa, quanto ousada? Levar aguas de
irrigação ás freguesias dos «Prazeres» «Fa
jäa da Ovelha», «Ponta do Pargo », e tal
vez ao Porto do Moniz, e ir dar vida e ani
mação á cultura de immensos terrenos, que
em sendo regados serão fertilissimos.
Na presença desta exposição he natural
que V Exc. deseje saber o quanto será mis
ter ainda de despesa para ultimar esta im
portantissima obra, levando a ao ponto em
que os moradores das freguesias supramencio
— 185 —

nadas possam derivar a agua para os seus


campos. Segundo o juiso que formei, e á vis
ta de informações que colhi, entendo que se
rão necessarios ainda vinte, a vinte e cinco
contos de reis insulanos.
He avultada essa quantia que ainda
falta para a cabal conclusão deste trabalho,
mas eu entendo, e não devo hesitar em ex
primir me francamente, que tendo-se des
pendido até hoje talvez quarenta contos de
reis, não convém por modo algum que se dei
xe incompleta uma obra que vai vivificar a
agricultura, que acredita o povo que a em .
prehendeu, e o Governo que a costeou. Con
tinúa a trabalhar-se no furo do monte das
« Estribarias »; o restante porém do serviço
está paralisado. Mas como naquela parte da
Ilha só pôde trabalhar-se no verão, por isso
que o frio alli he intensissimo, e as chuvas,
e o gelo não deixam trabalhar se não desde
meados de Mayo até aos principios de Outu
bro; — eu devo rogar a V. Exc." que se dig
ne tomar este negocio na mais séria conside
ração: providenciando como convier para que
no proximo futuro anno seja authorisado este
Governo Civil a despender com a obra do Ra
baçal até á quantia de vinte a vinte e cinco
— 186 —

contos de reis, com a impreterivel condição


de se ultimar no dito anno. Trabalhando-se
com a actividade conveniente he possivel que
os restantes trabalhos se concluam naquele
prazo, e já com efeito he tempo de que os
povos comecem a gosar os beneficios de uma
obra, principiado ha tantos annos.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal aos
4 de Setembro de 1847. — Illm.º e Exm.º
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino — O Governador Civil, Joze
Silvestre Ribeiro.

------<><><>-------

A” commissão Municipal do Funchal.

4.º Repartição = L.º 2.° — N.° 33 — Illm."


Snrs. — Cabe-me a honra de rogar a V. S." a mer
cê de mandarem examinar a estrada de São Gonº
salo, que me consta ter ficado em pessimo estado,
em consequencia de não se ter ultimado a obra que
ali começou a fazer-se; dizendo-se-me até que na
proxima estação invernosa poderá tornar-se impra
ticavel aquella tão frequentada via de communica
ção.
Póde ser que alli podessem empregar-se algu
— 187 —

mas ordenanças, visto não terem tido este anno oc


casião de prestar o serviço do costume.
Por esta occasião tomo a liberdade de lem
brar-lhes a conclusão da exceliente obra do alar
gamento da Rua do Castanheiro, na qual vai tão
interessado o aformoseamento da Cidade.
Muito a meu pezar sou forçado a chamar a
attenção de V. S." sobre estes dous objectos, sa
bendo, como sei, as difficuldades com que actu
almente luctam.
Deus Guarde a V. S" — Palacio do Go
Verno Civil no Funchal aos 4 de Setembro de 1847.
— Illm." Snrs. Presidente e Membros da Commissão
Municipal do Funchal. — O Governador Civil, Joze
Silvestre Ribeiro.

----*@@@…--

4.° Repartição — L.º 2º – N.° 34 — Illm."


Snrs. — Com referencia ao meu oficio N.° 33 de
4 do corrente, relativo ao reparo da estrada de
S. Gonsalo, cumpre-me dizer a V. S." que cada
vez me encarecem mais a indispensabilidade de pro
ver ao melhoramento daquelia interessante via de
communicação, assegurando-se-me que o proximº
inverno a tornará impraticavei em alguns pontos,
– 188 —

onde se arrancou a calçada, ou se desmanchou o


que estava feito, e não chegou a concluir-se.
Por este motivo sou obrigado a chamar nova
mente a attenção de V. S." sobre o indicado con
certo; e como eu tenha conhecimento do apuro pe
cuniarie em que está a Camara, maiormente quan
do sobrecarregada com a despesa de tantas obras
que tem entre mãos, julgo do meu dever offerecer
á Camara um auxilio de cem mil reis do Cofre da
Junta Geral de Districto, visto como se trata de
estradas, que tambem estão a cargo desta Corpora
ção. — Deus Guarde a V. S." — Palacio do Gover
verno Civil no Funchal aos 8 de Setembro de 1847.
— Ilm." Snrs. Presidente e Membros da Commissão
Municipal do Funchal. — O Governador Civil, Joze
Ásilvestre Ribeiro.

-*-* =>@<><><=>-----

Ao Ministerio do Reina.

4.º Repartição — N.° 2123 — Illmº e


Exm.º Snr. — Em oficio n.° 2053 de 20 de
Março disse eu a um dos Exmº anteces
sores de V. Exc." o seguinte:
«Vim encontrar o edificio da Secreta
— 189 —

« ria do Governo Civil deste Districto muito


« carecido de reparos, tanto no seu interior,
« como no exterior; circunstancia esta muito
« desagradavel, se se attender a que o lo
« cal onde está estabelecida uma Repartição
« Publica de tal cathegoria deve apresentar
« uma certa decencia, e maiormente na Ilha
« da Madeira, aonde quasi todos os dias
« estão chegando estrangeiros de distincção,
« que em chegando veem logo visitar o Go
« vernador Civil na sua Secretaria. »
Influenciado por esta ponderosa consi
deração comecei a entender nos reparos que
demandava o dito edificio, e propondo ao
Governo de S. M. os meios mais commodos
de efeituar tão urgentes trabalhos, tive a
fortuna de que pela Secretaria dos Nego
cios do Reino, e em Portaria de 30 de Mar
ço ultimo, Mandasse S. M. Communicar-me
a seguinte resolução:
« Que sendo com efeito de utilidade
« e conveniencia publica que o edificio da
« Secretaria do Governo Civil effereça com
« modidade e decencia, bem fez o mesmo
« Governador Civil em começar a entender
« nos arranjos e reparos de que se carecia;
« e que não permittindo as forças actuaes do
— 190 —

((
Thesouro que pelos Cofres do Estado se
« proveja a essas despezas, Permitte S. M.
« que o costeamento dellas se faça igual
« uente, mas com discreta economia, pe
« las sobras dos e colamentos referidos.”

Cabe agora dar conta do que se fez,


e he este dever que eu venho desempenhar
nesta occasião, tendo a honra de encaminhar
ás mãos de V Exc." um Relatorio circuns
tanciado de todas as obras que se efeitua
rata no dito edificio, e a conta documenta
da da despesa que elas occasionaram (…).
Em resultado das obras de que trato
está hoje o edificio da Secretaria do Governo
Civil, com todas as suas dependencias n'um
tal estado de aceio e decencia, que sem a
presentar um contraste com o apuro das nos
sas circunstancias, sustenta o lustre e gra
vidade proprios de uma tal estancia.
Deus Guarde a V Exc.° — Funchal aos

(*) Veja-se adiante o Relatorio do Sr. Director .


das Obras Publicas.
— 191 —

5 de Outubro. de 1847. — Illm.º e Exmº


Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino. — O Governador Civil, - Jo
ze Silvestre Ribeiro.

=#>Q@Q<===

A Camara Municipal do Funchal.

4.° Repartição — N.° 47 — Livro 3.° —


Illm." Snrs. — Em resposta ao oficio de V.
S." de hoje, cumpre-me dizer-lhes que de muito
bom grado mando nesta data pôr á disposição de
Thesoureiro dessa Camara, a quantia de 30,3000
rs. que V. S." solicitam para a conclusão do re
paro da estrada de São Gonçalo, em addiciona
mento á de cem mil rs. que tambem pelo cofre da
Junta Geral do Districto mandei entregar á Cas
mara para o indicado reparo da referida Estrada,
Permittir-me-hão V. S." que por esta occa
sião chame a sua attenção, sobre os seguintes
pontos:
A maxima parte das cazas desta bella Cida
de está hoje em grande aceio e limpeza; no en
tanto as ruas publicas, e as praças conservam-se
muito desaceadas e immundºs. Conviria que a
•- 132 -

Gamara désse a este respeito as providencias que


lhe parecerem eficazes.
Seria muito proveitoso que a Camara prestas
se toda a sua attenção ao cuidado de promover a
illuminação da Cidade, á qual vão já habituando
se os moradores, e reconhecendo as suas vanta
gens, circunstancia esta que facilita muito o de
senvolvimento e progresso de uma innocação tão
proficua.
Entendo que a Camara deve fazer todas as
diligencias imaginaveis para concluir o alarga
mento da rua do Castanheiro, no qual começou
já a entender. Se a rua ficar no cstado em que
era se acha, tornar-se-ha uma occasião de incon
venientes para o quartel militar do Collegio, e
uma nódoa no plano de aformoseamento da Cidá
de. Talvez que os moradores d'essa rua quizes
sem entrar em alguma combinação com a Camara
cedendo-lhes ella as porções de terreno que a ca
da testada competirem dentro dos limites da linha
recta que do lado do sul deve traçar-se para me
lhor alinhamento das cazas. Com o producto des
ses proventos talvez podesse adiantar-se a obra; e
se por ventura faz algum embaraço a reconstruc
ção do telheiro, que pertence á Repartição Miliº
— 133 —

tar, julgo que a Camara deverá entender-se com o


Exia" Marechal Padua, a cuja obsequiosidade pó
de dever um mais facil arranjo desse negocio.
Finalmente devo chamar a attenção da Cama
ra sobre a muito sensível falta de agua potavel
que n'alguns pontos experimentam os moradores
em consequencia de se conservarem secos os cha
farizes, que muito despendiosamente fizeram as Ca
maras para commodidade do povo. Deus Guarde
a V. S." — Palacio do Governo Civil no Funchal
aos 18 de Dezembro de 1847. — Illm.º Snr. Pre
sidente e Membros da Camara Municipal do Fun
chal. — o Governador Civil , Joze Silvestre Ribei
?"O.

—–s_><><>…-----

A” Camara Municipal do Funchal.


4.º Repartição — Lº 2.° — N.° 57 — Illm."
Snrs. — O reparo da estrada de S. Gonsalo, para
A8
o qual puz á disposição de V. S." do cofre da
Junta Geral do Districto, cento e trinta mil reis,
parou em um sitio muito fragoso, de sorte que o
transito se torna muito incommodo n'aquelle ponto.
Aquella estrada communica esta Cidade coin
duas importantes povoações da Ilha, Santa Cruz
— 194—
e Machico, e afóra essa ponderosa circunstancia,
he consideravelmente frequentada pelos estrangei
ros valetudinarios, que a esta Ilha afluem para
restabelecerem a sua saude.

Sendo assim, e já que se tem despendido


tanto no referido reparo, julgo de toda a razão
que ao mesmo se remova o embaraço do ponto
que indiquei, quando não possa continuar-se o
melhoramento em maior extensão.

Para se conseguir este fim, occorre-me pôr


á disposição da Camara mais cem mil reis do mes
mo cofre da Junta Geral, dos quaes disporá para
sem a menor perda de tempo se começar a enten
der no trabalho que recommendo.
Por esta occasião julgo do meu dever cha
mar a attenção da Camara sobre um trabalho,
que ha poucos dias me foi lembrado, qual he o
de melhorar o transito da « Azinhaga dos Homisia
dos.» Passando a examinar aquelle logar, reco
nheci ocularmente o quanto he incommodo e até
perigoso aquele caminho que aliás se torna de
grande necessidade para as freguezias de Santo
Antonio e S. Roque, e dá serventía para uma fon
te publica, sobre commnnicar as duas margens
da Ribeira de S. João. — Diz-me o Director das
— 195 —

0bras Publicas que he facil melhorar aquella azi


nhaga, entulhando-se com pedra a parte mais fun
da , e formando-se uma rampa, a começar da es
trada até á ribeira ; e que este trabalho será fei
to gostosamente pelas ordenanças de S. Roque e
Stº Antonio, em attenção ao reconhecido benefi
cio quo o povo colhe deste trabalho. Confio pois
do zelo da Camara que tomará este negocio na de
vida consideração, e o encaminhará pelo melhor
modo.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Gover
Civil no Funchal aos 25 de Janeiro de 1848. —
Illm." Snrs. Presidente e Membros da Camara
Municipal do Funchal. — O Governador Civil, Joze
Silvestre Ribeiro.

*-*<s>G#ef>--—

Do Administrador do Concelho de Santa Anna.

Illm.º e Exmº Snr. — A reforma, a que V.


Exc.° mandou proceder na estrada que conduz des
ta Fregueia a essa Cidade acha-se concluida, c
devo dizer a V. Exc.º que se fez o mais que era
possivel, attendendo ao pessimo tempo que tem ha
vido. Na quebrada, junto á Ribeira do Estalei
— 196—

ro, que interceptava o caminho, fez-se uma pare


de que me parece bem construida, e poz a passa
gem melhor do que estava antes. A ladeira do
Pau do Bastião, tambem oferece agora commodo
e seguro transito, e tem as agoas bem cortadas,
condicção essencial para a conservação de todos os
caminhos da nossa Terra.

Tambem se reparou a ladeira da Paçadinha,


que conduz d'aqui ao ealhau de S. Jorge; — es
te ponto demanda tempo e dinheiro para se con
cluirem as obras começadas, mas melhorou-se a
gora quanto era possivel. — Deus Guarde a V. Exc."
— Administração do Concelho de Sant'Anna 22 de
Janeiro de 1848. — Illm.º e Exmº Snr. Conselhei
ro Governador Civil — O Administrador do Con
celho, Luiz Augusto Acciaioly.
*#O@G##===

A Camara Municipal do Funchal.


4.° Repartição — N.° 58 — Lº 2.° —
Illm.º Snr. — Em oficio N.° 447 de 13 de
Outubro do anno de 1846, tive eu a honra
de dizer á Camara deste Concelho, entre
outras cousas o seguinte:
“ Uma outra obra de reconhecida uti
— 197 —

“ lidade ha a fazer neste Concelho, a col


“ locação de um signal bem distincto na bai
“ xa denominada “o Carneiro” para pre
“ servar os barcos costeiros dos perigos que
“ ali possam sofrer, e de que ha infeliz
“ mente alguns exemplos, e por isso con
“ vido desde já a Camara, a que V. S."
“ preside, a mandar fazer essa obra logo
“ que seja possivel.”
Bastante tempo tem decorrido desde a
quella data, sem que se haja entendido na
dita obra, o que attribuo a motivos que
em nada deslustram a Camara, taes como
a multiplicidade de negocios e trabalhos,
ou o apuro de circunstancias pecuniarias.
He porém certo que esta obra não per
deo ainda a importancia e Interesse, que no seu
principio a recommendavam, e d’aqui vem
que tenho por conveniente chamar de novo
a attenção da Camara sobre ella para que a
leve a efeito com a brevidade que couber no
possivel. — Deus Guarde a V. S." — Pala
cio do Governo Civil no Funchal em 1 de
Março de 1848 — Ilm° Snr. Presidente
da Camara Municipal do Funchal. — O Go
vernador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
-----<=#>@<> @ #aa…--
— 198 —

A Camara Municipal do Funchal.


4.º Repartição — Lº 2.° — N.° 77 —
Illm." Snr. — Sou encarregado de communi
car a V. S." em resposta ao seu oficio N.° 380
em data de hontem, que acompanhou o re
querimento de Diogo Bean e Henrique Tem
ple, — que S. Exc." o Snr. Conselheiro Go
vernador Civil do Districto desejando contri
buir para que se leve a efeito o melhoramen
to da estrada do Palheiro do Ferreiro, deli
berou que ficasse á disposição da Camara a
que V. S." preside, a importancia de cem
mil reis [ 1002000 | pagos pelo Cofre da Jun
ta Geral do Districto, se com efeito tiver
execução o projecto de pôr em melhor esta
do a referida estrada; podendo V. Sº fazer
constar esta resolução aos signatarios do re
querimento que lhe devolvo. — Deus Guarde
a V. S." — Secretaria Geral do Governo Ci
vil no Funchal 14 de Junho de 1848. —
Ilim." Snr. Presidente da Camara Municipal
do Funchal. — O Secretario Geral, Servulo
Drummond de Menezes.
———"…GRX-#3-47@ga…--

Do Capitão de Engenheiros, Blanc.


Illm.º e Exm.º Snr. — Havendo V. Exc." des
— 199 —
velado-se tanto pelos interesses materiaes d’esta
Provincia, que para nossa ventura o Governo
approuve commetter-lhe a sua administração, e sendo
os trabalhos publicos aquelles dos interesses mate
riaes que mais palpavel e immediatamente se reco
nhecem de uma maneira incontestavel; julguei do
meu dever confeccionar uma Synopsis das diversas
obras que V. Exc." se dignou mandar executar :
as quaes foram todas inspiradas pelo luminoso
pensamento administrativo que tanto caracterisa a
V. Exc.º: — salvar as classes operarias das garras da
fome — e proporcionar ao publico as vantages que as
obras apresentam.
Por desfortuna desta Provincia encontrou V.
Exc." os cofres da Camara exauridos, e onerá dos
com uma grande divida, — o da Junta Geral do
Districto gemendo debaixo da influencia de uma an
ticipação de 4 0003000 de reis, (que he quasi a
sua receita annual) — e consumido o credito das
obras publicas, que o Governo vota annualmen
te. — ! Qual seria pois o Funccionario Publico,
que não recuasse á vista d’estes obstaculos? — e
não desesperasse de alcançar os remedios a myi
tos males que era mister curar?! — O talento ad
ministrativo que V. Exc." possue em eminente gráo,
— 200 —

he que soube crear recursos, e com clles applanar


difficuldades, e vencer obstaculos julgados por
insuperaveis.
Se a fome que poucos mezes depois de V.
Exc." haver empunhado o timão do Governo desta
Provincia começou a causar serios receios de de
sagradaveis scenas, inquietando o espirito de V.
Exc."; por outro lado o estado assustador das Ri
beiras, que atravessam esta Cidade, não menos fa
ziam despertar a necessidade de prompto e eficaz
remedio, o qual era constantemente solicitado a
V Exc º pelos habitantes d’ella. Nesta conjunc
tura pois, para attenuar os terriveis efeitos destas
duas ponderosas causas destruidoras, era forçoso em
pregar meios pecuniarios, a fim de occupar os braços
daquelles que luctavam com a fome, fazendo com el
les as obras que deviam diminuir os desastres de
uma innundação.
Pela Synopse iuclusa se verá as obras que se
fizeram n’estas ribeiras, para attingir o fim acima
indicado.
Fortalecida a opinião de V. Exc." com o re
sultado do conselho que se reunio no Palacio do
Governo Civil no dia 14 d’Outubro de 1846, por
convite de V. Exc.", composto de todas as Autho
—201—

ridades individuaes e collectivas do Districto, não


exitou V. Exe." sob sua responsabilidade em orde
nar a construcção das obras acima referidas, e nas
quaes empregou muitas vezes mais de mil opera
rios, cujas ferias foram sempre pagas pontualmen
te no fim de cada semana.
Condoido V. Exc." do estado mizeravel da
classe jornaleira não consentio que se executas
sem as obras das estradas por meio dos braços
das ordenanças, segundo era costume, e ordenou
que se fizessem estas a dinheiro por conta dos
Cofres do Estado. •

Entre o numero das obras determinadas por


V. Exc.° avulta a do melhoramento do Cáes da Pon
tinha, obra esta que depois de concluida, ligan
do-se pela beira-mar com a Alfandega, - offerece
por certo á cidade um dos mais lindos passeios,
além da commodidade dos embarques e desem
barques, da qual ainda hoje não gosa esta cida
de.
Para perpetuar pois a memoria de V. Exc."
nesta Provincia, bastaria parte das obras que man
dou executar, porém ao genio emprehendedor de
V. Exc." sempre solícito em promover tudo quan
to possa oferecer maior somma de interesses aos
— 202 —

seus administrados, não lhe escapou a Estrada Mo


numental filha do grandioso pensamento que conce
beo o Snr. Mousinho, cuja memoria será sempre
cara a todos os que conheceram suas patrioticas
virtudes. — A magnitude desta obra he considera
da como um dos maiores vehiculos de prosperidade
e riqueza para esta cidade, e os grandes recursos
que he mistér empregar para vencer os obstaculos
que elia apresenta na sua execução, tecm sido a
causa de se frustrarem os melhores desejos que teem
havido em levar adiante essa importante empreza,
como aconteceo quando o Exmº Snr. Barão de Lor
dello governou esta Provincia.
Estava pois reservado para V. Exc." cortar o
nó gordio que embaraçava o passo a esta maravi
lhosa obra; e hoje felizmente já não se pensa nas
difficuldades da Ponte do Ribeiro Secco.
Para desfazer finalmente os obstaculos que se po
diam offerecer á construcção da Ponte da Ribeira dos
Soccorridos, e á ultimação da Estrada, acaba V. Exc."
de dar mui apropriadas providencias, que lhes agou
ram um feliz exito, e o que hontem, era consi
derado um sonho, hoje he uma realidade!
Queira V. Exc." desculpar a linguagem fran
ca, leal, e verdadeira da exposição que tenho a
—- 203 —

satisfação de submetter á illustrada intelligencia de


V. Exc.", a qual julguei de meu dever confeccio
113 I'.

Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 17 de Ju


nho de 1848. — Illm.º e Exm.º Snr. Joze Silvestre
Ribeiro, Conselheiro Governador Civil deste Dis
tricto. — Tiberio Augusto Blanc . Capitão d'Enge
nheiros.

—=<><><>

S Y N O P S I S

DA S

Obras Publicas feitas por ordem do Exmº Snr. Conse


lheiro Joze Silvestre Ribeiro, Governador Civil do Dis
tricto do Funchal, desde que S. Erc.º assumio o Go
verno do Districto até 17 de Junho de 1848.

•==-===

Ribeira de São João — Reforço feito


no extremo norte da muralha oriental do
encanamento; concerto de alguns rom
bos entre as pontes de pedra e de pau
de São Lazaro .. .. .. .. 2953975
Ribeira de Santa Luzia ou da Pra
— 204—

ça — Desentulhamento do canal desde a


foz até á ponte de pau da Rua dos Fer
reiros; levantamento da muralha de
fronte da Praça do Peixe ; corte do
serro levantado no alveo entre a ponte
do Torroño e ponte Nova; reparação
dos rombos da muralha neste sitio... 1:7243449
— Construcção da ponte de ma
deira defronte da Rua dos Ferreiros
em 1847 .. • • • • • • •
5733370
Ribeiro do Valle Formoso — Conti

Ruação do aplanamento do alveo 3803165


Ribeiro da Carne Azeda — Conti

nuação da muralha .. 763250


Ribeira de João Gomes — Desentu
lhamento do canal desde a foz até o
Campo da Barca; levantamento das
muralhas defronte da Eschola da In
fancia, e continuação de uma porção
de muralha da parte direita junto á
foz .. . . .. .. .. .. ... 2:8813609
Cáes da Pontinha — Melhoramen
to do cáes velho, colocando-se uns
varões de ferro e cabos de portaló
para facilitar o serviço de embarque
– 265 —

e desembarque; reparação de alguns


rombos de muralha do lado do oeste,
— Deu-se principio ao cáes novo,
construindo-se parte da muralha que
o deve abrigar dos temporaes, e fez
se uma escada provisoria de madeira.
Começou em 19 de Abril de 1847 . . . 4: 1733159
S. Gonsalo — Melhoramento da es
trada da Forca, — alargando-se e cal
çando-se de novo uma grande exten
são. . . . . . . • • • • •
8213070
Caniço — Melhoramento dos ra
maes da ladeira que ha nas voltas do
Porto Novo; reformaram-se algumas
paredes e fizeram-se pequenos repa
ros na calçada... .. .. .. .. 1863445
Santa Cruz — Reparação tanto no
pavimento da estrada do Ribeiro Fran
cez como nas paredes do revestimento 1003300
— Continuação dos melhoramen
tos da estrada da Terça que vae de
Santa Cruz a Santo Antonie da Serra,
fazendo-se alguns ramaes novos .. 593745
Agua de Pena — Começo da pon
te de alveneria no Ribeiro da Polé 104.3538
— 206 —

Faial — Aperfeiçoamento da es
trada da Ladeira das Covas, continu
ando-se com o melhoramento da aber
tura d’uma ponte .. .. • • • •
583900
Monte e Sant'Anna — Estrada ge
ral do Poizo até Sant'Anna; limpou
se toda a estrada das muitas quebradas
que a obstruiam; fizeram-se entulhamen
tes em muitos logares até o Ribeiro Frio
e levantaram-se algumas porções de
muralha em varios legares, mormente
no Pau do Bastião.. • • • • • •
703000
Sant'Anna — Ponte de alveneria
na ribeira do Estaleiro, feita de vol
ta abatida, em 1847 . . .. . . . . 1503000
Sant'Anna e São Jorge — Melho
rou-se o pessimo sitio da Passadinha e
da Lapa d'Arêa .. • • • • • •
63000
São Jorge e Arco— Repararam-se
varios rombos que existiam na guarda
de alveneria na Entrosa do Arco, fei
tos a maior parte pela pedra que cahiº
de cima da rocha, e limpou-se todo o
caminho até á Assumada • • •
43706
Ponta Delgada — Aperfeiçoamen
— 297 —

to da abertura da importantissima es
trada do Paço da Arêa, rebaixando-a
e aiargando-a em alguns logares 1273545
Ponta Delgada e S. Vicente — Lim
peza geral do caminho e reedificação
de algumas porções delle destruido pe
lo mar • • • • • • •
53709
Porto do Moniz — Gontinuação da
abertura da importante estrada do Ar
rudal, pela beira-mar, sendo cortada
na rocha .. • • • • • • • •
533900
São Martinho — Construcção de
uma ponte de alveneria no Ribeiro do
Furado, sendo as avenidas de pedra en
sossa; tem 12 palmos de vão e 35 de
altura. Foi construida para evitar uma
subida, dá menos desenvolvimento á
estrada • • • • • • • • 6573887
"Estreito de Cama de Lobos — Com ,

plemento da volta nova que se abrio no


sitio do Sallão para suavisar a grande
ladeira que tem a estrada neste logar 4183475
— Estrada Central da Serra des

de o Estreito até S. Vicente; limpeza


e reparação em muitos logares, refor
– 208 —

mando-se algumas pontes de madeira,


e alargando-se o caminho .. 673000
Campanario—Continuação da aber
tura da estrada nova do Estreito, na
Eira das Moças, para a Serra d'Agua
pelo Jardim da Serra; este caminho he
quasi todo aberto em terra , tendo-se
feito algumas paredes e cortado alguma
rocha.. • • • • • • • • • •
803000
Ribeira Brava — Abertura do al

veo e construcção de algumas arruma


ções de pedra tosca para encanamento
das agoas .. • • • • • a •
223710
— Reparação do caminho dos Moi
nhos, da Ribeira Brava, que foi des
truido pela ribeira, e melhoramento
n'outro logar • • • • • • • •
1053820
Magdalena — Abertura da estrada
do Paço pela beira-mar, cortando-se na
rocha para unir a villa da Calheta com
a freguesia da Magdalena, evitando-se
assim uma longa viagem que ha a fa
zer pelo caminho velho.. 1993359
Ponte do Ribeiro Secco — Esta obra .
começou no dia 6 de Março ultimo e
–209 —

está continuando. Foi arrematada por 5:7993800


Ponte velha do Ribeiro Secco —
Reconstruio se o pé direito d'esta pon
te, o qual cahio na alluvião de 1842,
pondo em risco a ponte, a qual se
conservou em pé pela cohesão e arga
massa contra a rocha que lhe serve de
apoio: fez-se o pé direito d'alveneria
na altura de 40 palmos — Os arrema
tantes da ponte d'alveneria do Ribeiro
Secco foram authorisados a fazer esta
despesa, que a final lhes será levada
em conta até a quantia de .. • •
1503000
Estrada em seguimento á extrema
oeste da Ponte do Ribeiro Secco — Co

meçou a 3 de Março ultimo e está


continuando. —Tem-se aberto 100 bra

ças de extensão de estrada, construin


do-se uma grande parte dos muros do
revestimento do caixilho e guardas,
tudo feito de pedra ensossa , fazendo
um volume de 70 braças cubicas pro
xiihamente. — Existe uma porção de
50 braças singelas de pedra quebrada
e prompta para obra .. • • • •
3273745
–210 –

Ponte de alveneria na Ribeira dos


Soccorridos — Principiou a 5 de Junho
corrente e está continuando. — Deu-se
principio á abertura do cavouco onde
se ha de formar um dos pegões do ar
co grande, sendo o outro alicerçado
na rocha que reveste a margem direi
ta do valle. Tem-se extrahido 32 bra
ças cubicas de cascalho e pedra rola
da, que he o material que compõe o
alveo.. • • • • • • • • •
53500
Caes na Villa da Ponta do Sol —

Construio-se já uma grande muralha


curvilinea assente sobre um banco de
rocha, onde o mar bate com grande
violencia, e esta serve para altear o
caminho que deve conduzir á Ponte;
tem-se rebaixado á força de polvora os
logares onde se hão de formar as im
postas, e já existe esta prompta e to
do o lageado de alveneria para a abo
beda da ponte. — Começou a 8 de Maio
ultimo e está coutinuando .. .. 92,5619
Santo Antonio da Serra — Limpe
za da estrada geral até os altos de Ma
— 211 –

chico . . . . . . .. . . . . 43759
•••••••••••------ …,

Total da despesa .. ... 19:7643659


----> '

Esta despesa foi paga:


Pelo Cofre Central 5:3583448
Pelo Cofre da Jun

ta Geral do Districto 6:6073211


Por subscripção pa
ra a Ponte do Ribei

ro Secco .. .. 3.7993000

Archivo de Engenheria Civil no Funchal 17


de Junho de 1848. — Tiberio Augusto Blanc, Ca»
pitão d'Engenheiros.
—--*><><>--•

RELATORIO
• DAS

Obras publicas que tenho dirigido por or


dem do Exm.º Snr. Conselheiro Joze Silves
tre Ribeiro, Governador Civil do Districto
Administrativo do Funchal.

NA EGREJA Do CoLLEGIO.

Vêde o Relatorio a pag. 117 desta


Colleeção.
— 212 —

No EDIFICIo DA SECRETARIA Do Go
- VERNO CIVIL.

Relatorio das Obras feitas no Edificio


da Secretaria do Governo Civil do Funchal,
nos fins do anno de 1846, e principios de
1847; comprehendendo os trabalhos que ti
ceram logar no interior, e no exterior do
mesmo Edifício.
OBRAS INTERNAs.

Gabinete de Sua Excellencia.

Removeram-se deste quarto os arma


rios que occupavam uma grande parte d'el
le; — estucou-se o tecto, que era forrado
de taboado; guarneceram-se as paredes de
alizares; pozeram-se vidraças novas na ja
nella; — pintaram-se a oleo as portas, ali
zares &c., e as paredes a fresco, com gu
arnições a oleo; — tapetou-se o estrado de
tapeçaria de lãa tecida ; e mobilou se de
cadeiras, e sofá de palhinha.
Gabinete contiguo ao de S. Exc."
Alargou-se este quarto com a remoção
— 213 —

dos armarios, que alli existiam; — tape


tou-se de baeta verde; — fez-se de novo a
vidraça da janella; e pintaram-se a oleo as
portas, tecto &c.
Varanda que communica os dois Ga
binetes com a sala da entrada.

Removeram-se para o archivo dois gran


des armarios, que existiam nesta passagem,
com papeis da extincta Junta da Fazenda,
— passou-se o lavatorio para o quarto das
latrinas; — repararam-se os assentos de pe
dra e cal; e pintou-se tudo a oleo, inclu
sivamente o pavimento de tijolo.
Repartição de Fazenda.

Pintou-se a oleo toda esta grande ca


za; fizeram-se de novo as vidraças de uma
das janellas para o lado da Allandega; —
e repararam-se as demais, assim como as
respectivas gelozias; — fizeram-se alguns me
lhoramentos nos mezões dos Empregados,
e nos armarios que servem de archivo.
<massamsaesses==
-214 —

Archiro.

Collocaram-se em um dos quartos des


ta Repartição os armarios removidos dos dif
ferentes pontos acima mencionados, assim
como os que existiam na sala da Secreta
ria Geral, os quaes foram pintados, e con
venientemente arranjados para guarda dos
papeis; pintaram-se as paredes a fresco.

Caza de despejo.
Este quarto foi caiado, e pintado a
oleo a porta e janella; removeram-se d'el
le alguns pedaços de madeiras velhas que
foram vendidas pelo Snr. Lourenço Soares,
Fiel do Thesouro, por julgar inuteis e de
nenhum prestimo estes objectos.
Secretaria Geral

Pintou-se a oleo todo este salão , á


excepção das paredes, que o foram a fres
co; fizeram-se - alguns melhoramentos nos
mezões dos Empregados, e estantes dos li
vros; removeram-se para o archivo dois
grandes armarios para assim se dár melhor
— 215 —

ordem e arranjo à caza; — limparam-se


quanto foi possivel os quadros que guarne
cem as paredes.
Pagadoria.

Pintaram-se a oleo as portas, janella.


tecto, balcão. e grades da entrada; e ca
iaram-se as paredes.
Sala da entrada.

Caiaram-se as paredes; — pintaram-se


a oleo as portas. as cimalhas onde prendem
os reposteiros; as janellas, tecto, e banca
da em roda da caza; — fez-se de novo par
te desta bancada; assim como uma peque
na parte do forramento das paredes proxi
mo ao tecto. Tambem se pintou a escada,
que vai para o archivo da extincta Junta de
Fazeda.
Latrinas.

Caiaram-se as paredes; — pintaram-se


a oleo as portas, alizares, e janella; e
pozeram-se nesta umas gelozias; = colocan
do-se convenientemente o lavatorio que exis
— 216 —

tia na varanda, contigua aos gabinetes.


OBRAS EXTERNAs.

Pintou-se a oleo o alpendre á entrada


do Edificio; — assim como as sacadas das
janellas do 2° andar, as grades de ferro,
e cantarias das janellas do 1.°; — repa
rou-se o peitoril da escada, que tambem
foi pintado a oleo.
Reparou-se o beirado, e paredes, on
de existiam algumas ruínas; — caiou-se to
do o Edificio, e retelhou-se em parte.
Cellocou-se dois candieiros, que accen
dem todas as noites. um na porta da en
trada para o largo da Álfandega, e o outro na
extremidade do Edificio para o lado do Oeste.
Metade da despeza com as obras ex
ternas, á excepção d’aquella que diz res
peito aos candieiros, foi paga pela Alfande
ga, por isso que esta Repartição se acha.
estabelecida no mesmo Edificio.
A despeza paga pelo Governo Civil,
tanto com as obras externas, como inter
nas, montou a seis centos seis mil quatro
centos trinta e sete reis.
Funchal aos 22 d'Abril de 1887.
— 217 —

No APROVEITAMENTo DA FONTE VER


MELHA.

Esta fonte que nasce no alto do Cor


ral das Freiras, perto da estrada central,
sendo da mais excellente agua, era inutil
á maior parte dos viandantes, por estar em
sitio difficil, e perigosamente accessivel.
Removeo-se a difficuldade, e o peri
go, preparando-se caminho seguro para a
fonte, por meio de algumas paredes com
fundos alicerces, que lhes dessem a fir
meza necessaria, para sustentarem o pavi
mento d'esse novo caminho na encosta por
onde elle desce: — e fez-se um deposito da
agua, para mais facilitar o uso d’ella, o
qual he ornado de canteria, com porta de
madeira, e uma pequena lapide de marmo
me, onde se escreveo a era da construcção
d’esta obra de grande utilidade aos muitos
viandantes, que por alli continuamente pas
sam. — Gastaram-se n’ella Rs. 1303950,
como dos documentns na Secretaria do Go
verno Civil, e menor seria a despeza se a
obra não fosse feita em tempo de inverno.
Funchal aos 17 d'Abril de 1847.
— 218 —

EM UMA CAZA DE ABRIGO NA SERRA.

Precisava-se muito d'esta obra de sal


vação no sitio da Fonte das Môças, que he
no centro da Serra, junto á estrada geral
para diferentes freguezias do Norte, por
que nesse logar desabrido tem secumbido
muita gente aos rigores do inverno. Tem-se
já despendido Rs 503000, na execução
d’este beneficio publico, e concluir-se-ha em
estação propria, proporcionando-se meios que .
hoje faltam.
Funchal aos 26 d'Abril de 1847.

----><><>==----

RELATORIO

DAS •

Obras feitas nos dois Azylos proviso.


rios que se prepararam, para recolher os
Mendigos.

Vêde o Relatorio publicado a pag. 68


da «Collecção de Documentos relativos ao
Asylo de Mendicidade »
— 219 - -

No PALA CIO E FoRTALEZA DE S. Lou


RE*ço.

Fez se o retelhamento, com a telha


que tinha, e outra nova que se não podia
despensar; bicas novas de folha, para desa
guamento dos telhados, e das janellas sac
cadas. — Reparos e caiamento em todas as
paredes, interior, e exteriormente. — Re
forma de vidros em quasi todas as janellas.
Reparos e caiamento no Cavalleiro da For
taleza, vulgarmente chamado praça do Cas
tanheiro. Renovação de pintura nas portas,
janellas, forramento, e outras obras de ma
deira, assim como nas sacadas, e grades de
ferro. ortinas nas janellas das salas, e
capas para os lustres. — Uma escada de can
teria com mainel de ferro, pintado, G UIT12
porta para servidão commoda e decente, do
Palacio para a rua das Fontes, e aplana
mento de um peqneno espaço á entrada des
sa porta. o qual foi embelezado com plan
tas de jardim, calçado no logar da passa
gem, e fechado com parede levantada ao la
do do Sul. Reparos nos jardins, inferior e
superior, servindo a referida escada tambem
para os communicar. Encanamento de aguas
-- 220 —

que estavam perdidas, e pertenciam ao Pa


lacio, para limpeza d’elle, e rega dos jar
dins. — Alguns outros reparos em diferen
tes logares do Palacio e Fortaleza. Em
tudo isto se despenderam Rs. 4623990,
como consta de documentos na Secretaria do
Governo Civil.

Funchal 2 d'Abril de 1848.

—*SEG#}<>--

NA RIBEIRA DE S. JoÃo.

Preparou-se ahi com parede de pedra


e cal uma rampa calçada, e com degraus de
alveneria no fim, para se communicarem os
moradores dos dois lados da Ribeira, e pa
ra poderem descer a esta os do lado do Oes
te, evitado o perigo de vida a que se expu
nham os que por necessidade ousassem pas
sar o despenhadeiro, que se converteu em
bom caminho com esta obra, e com a pe
quena despeza de Rs. 223580, provado por
documentos existentes na Secretaria do Uo
verno Civil.

Funchal 14 de Março de 1848.


— 221 –

A azinhaga dos Homiziados. na fregue


zia de Santo Antonio, sendo de muito tran
sito, e utilidade, estava intransitavel, e pe
rigosa. S. Exc." maudou fazer uma parede
de 55 braças, para sustentar o aterramento
d'essa via de communicação, alargando-a, e
fazendo desbastar por via de muitas brocas
a rocha que impedia o melhoramento que se
lhe fez. Despenderam-se nisto até hoje
Rs. 47,3490; e concluir-se-ha a obra em
uma semana de trabalho, que poderá custar
seis mil reis.

Cazas da Fazenda.

Concertaram-se 32 cazas, despenden


do-se em dinheiro Rs 1:1873280.
Funchal 17 de Junho de 1848. — Vi
cente de Paula Teixeira, Director das Obras
Publicas.
—==> @ +=---

Recapitulação da despeza feita nas obras a cargo do


Snr. Director das Obras Pvblicas,

Na egreja do Collegio— Relatorio


– 222 —

a pag. 117.. • • • • • •
7113615
No edificio da Secretaria — Rel.
a pag. 212 • • • • • • • •
6063437
Na Fonte Vermelha — Rel. a pag.
217 . . . . . . . • •
1303950
N'uma casa d'abrigo na serra —
Rel. a pag. 218 . . • •
503000
No Palacio de S. Lourenço — Rel.
a pag. 219 . . • • • • • • • •
4623990
Na Ribeira de S. João — Rel. a
pag. 220 • •
223280
Na Azinhaga dos Homisiados —
Rel, a pag. 221 .. 473490
Nas casas da Fazenda Nacional..
1:1873280
No Asylo de Mendicidade — Rel.
a pag. 68 a 72 da respectiva Collecção 2553580
*-*-*…--- •••

Total da despesa... .. 3:4843922


*--*E Q4=>=

PoNTE DO RIBEIRO SECCO.

Portaria do Ministerio do Reino.

Ministerio do Reino —2.° Direcção — 1.°


— 223 —

Repartição — Lº 6.° — n.° 6 —Tendo sido


presente a Sua Magestade A Rainha o oficio
do Governador Civil do Districto do Funchal,
datado de 12 de Junho ultimo, no qual, re
mettendo uma colecção impressa dos docu
mentos relativos á construcção da Ponte do
Ribeiro Secco, participa haver conseguido,
por meio de uma subscripção e por outros
recursos independentes do Thesouro Publico,
a quantia precisa para satisfazer a impor
tancia de 5:7993000 reis, em que foi ar
rematada a construcção da referida ponte,
cujos trabalhos diz acharem-se em grande
adiantamento; e Tomando a Mesma Augusta
Senhora na devida consideração o importante
serviço prestado por aquelle digno Magistra
do aos interesses dos habitantes daquelle Dis
tricto, e o meio por que se houve para con
seguir tão util quão louvavel empenho: Ha
por bem Determinar A Mesma Augusta Se
nhora que em seu Real Nome lhe seja sig
nificado o apreço e consideração que lhe Me
receram o zelo e intelligencia que empre
gou em promover a construcção de uma
obra de tão reconhecida necessidade, sem
encargo para a Fazenda Pnblica, que nas
actuaes circunstancias, de certo não poderia
— 224 —

occorrer com os meios precisos para a sua


execução; e que, por serem igualmente dig
nos de muito apreço os sentimentos de de
sinteresse que levaram varios habitantes da
quella Ilha, assim nacionaes como estran
geiros a concorrerem com importantes quan
tias para a acquisição de uma parte dos meios
que habilitaram o referido Governador Civil
a emprehender a indicada obra, Quer que
este manifeste áqueles benemeritos habitan
tes a conta e apreço em que tem o seu im
portante serviço. — Paço das Necessídades em
8 de Julho de 1848. — Duque de Saldanha.
N. B. — Todas as outras peças oficiaes
sobre a obra da Ponte do Ribeiro Secco se
acham já publicadas na «Cellecção de Docu
mentos relativos á construcção da Ponte do
Ribeiro Secco», de que fala a Portaria an
tecedente, e por isso agora aqui se ommittem.
—=> @ <=

EsTRADA NovA PARA CAMA DR Lobos.

Ao Tenente Coronel Guerra.

4.º Repartição — Secção d'Obras Publiças —


—225 —
Lº 1.° — Illmº Snr. — Desde que eu cheguei a esta
eidade tenho ouvido constantemente fallar do famo
so projecto, concebido e começado a executar por
um homem illustre, que governou a Madeira, no
anno de 1834. Quero falar da estrada monumen
tal que o Snr. Mousinho d'Albuquerque perten
deo abrir, com o fim de communicar esta cidade
com a povoação de Cama de Lobos pelo littoral da
ilha, congratulando-a á memoria do Saudoso Du
que de Braganca, e tornando-a propria para pro
porcionar o mais agradavel passeio aos estrangeiros.
que a esta ilha vem restabelecer a sua saude.
Tudo neste projecto he grandioso! Tudo nºs
te projecto captou a imaginação, e ao mesmo tem
po a alma! O sentimento da gratidão para com
um principe immortal — enlaçado com o proposi
to de promover os interesses desta bella possessão
portugueza — eis um pensamento formôso, que a
todo o custo deve ser levado á execução.
Para tornar uma realidade aquelle projecto
ha tambem um incentivo, que a meu ver deve
estimular-nos fortemente, e vem a ser a conside
ração de que he sempre nobre e honroso dár se
guimento aos que outros começaram, quando os
seus planos são recommendaveis por qualquer ti
— 226 —

tulo. Dest’arte manifesta-se o devido respeito


ás pessoas que antes de nós trabalharam para bem
do publico, podendo até com mais facilidade co
lher-se fructo das suas emprezas, não só por
que já estão vencidas as difficuldades dos primeiros
começos, senão tambem porque o tempo já tem remo
vido alguns extervos, ou ensinado os meios de os
combater. •

Por todos estes motivos, e reconhecendo eu


o quanto lucraria esta Ilha em que os nacionaes,
e maiormente os estrangeiros doentes, que aqui
vem cuidar da sua saude, e que tantos in
teresses nos procuram, tenham um passeio assaz
extenso, plano e bem andamoso ao longo do
mar, facilitando-se-lhes até o uso dos commodos
meios de locomoção que a aspereza das montanha-8
da ilha impede na sua maxima parte: estou resol
vido a renovar o antigo projecto de abrir a men
cionada estrada para a villa de Cama de Lobos.
No entanto, como seja muito melindrosa esta
empreza, tenho por conveniente rogar a V. S.", co
mo digno Chefe que he da Commissão dos Snrs.
Engenheiros, a mercê de tomar com elles o mais
acertado accordo em ordem a que a obra possa fa
zer-se a aprazimento geral , produza a maior som
— 227 —

-ma de vantagens, e preencha as condições a que


deve satisfazer uma estrada desta natureza.
E neste sentido permitta-me V. S." que eu lhe
- peça :
1.° Uma planta topografica do terreno por
onde devia passar a estrada segundo o 1.° projecto.
2.° Uma planta topographica do terreno por
onde possa convir que a estrada passe, se por ven
tura houver motivo de preferencia sobre o 1.° pro
jecto: devendo neste caso explicar-se o fundamen
to dessa mesma preferencia.
Outro sim entrego ao seu exame a questão de
saber, se as pontes que hão de atravessar os valles do
Ribeiro Secco, e Soccorridos, devem ser de pe
dra, ou pensis.
Parece que um ou dous dos pilares, construidos
no Ribeiro Sècco, mostram já algumas arregôas; as
sim como me consta que dos materiaes que já se
tinham reunido para a ponte-pensil do mesmo Ri
beiro Sêcco, só existem hoje os penduraes ou sus
pensões. Estas circunstancias, reunidas á conve
niencia de se fazer desde logo uma obra solida,
duradoura, e propria para evitar os dispendiósos
concertos que periodicamento demandam obras de
madeira — serão por ventura poderosas para que
– 328 –

se perfiram pontes de pedra?


Afigura-se-me que a respeito de uma tal estra
da deverá antes ter-se em vista a facilidade do
Transito, o bem andamoso do piso, e que por is
so não importará que venha a ter um grande de
senvolvimento, com tanto que ofereça aos vian
dantes um passeio longo, commodo, proprio para
todas as qualidades de transporte, e aprazivel —
visto como não he possivel proporcionar-lhes taes
vantagens n'outros pontos da ilha.
A” proporção que se fôr procedendo á aber
tura da estrada, observar-se-ha com toda a atten
ção se he possivel construir ao menos, um ou deus
chafarizes ao longo della. Quando haja probabili
dade de assim poder ser, quer seja derivando agua
de uma das levadas superiores, ou por se desce
brir alguma vertente, será indispensavel considerar
simultaneamente a questão dos encanamentos.
Convirá por ventura que além do espaço cen
tral para o transporte de toda e qualquer viatura,
se construam dous passeios ou banquetas lateraes?
Deverá a estrada ser macadamisada, ou calça
da ao modo deste paiz?
Eis o trabalho e questões sobre que julguei
dever rodear-me das luzes da sciencia, para poder
- 229 —

tomar uma resolução acertada. Espero pois que


V. S." se dignará de tomar este negocio na mais
séria consideração, proporcionando-me todos os es
clarecimentos necessarios a semelhante respeito, e
suggerindo-me um parecer e plano, que perfeita
mente possam preencher os meus designios.
Deus Guarde a V. S." —Palacio do Governo
Civil no Funchal, aos 14 de Dezembro de 1846.
— Illm.º Snr. Manoel Joze Julio Guerra , Tenente
Coronel d'Engenheiros. — O Governador Civil, Jo
ze Silvestre Ribeiro.

*--*><><>…-----

Ao Capitão Tiberio Augusto Blanc.


4.° Repartição — N.° 1375 — Lº 3.°
— Ilm° Snr. — Faz hoje exactamente um
anno que eu chamei a attenção publica so
bre a estrada que um homem illustre, cu
ja perda lamenta hoje a nação, o Snr.
Mousinho d'Albuquerque, projectou abrir
para communicar esta cidade com a villa
de Cama de Lobos ao longo do mar.
Por essa occasião (em oficio de 14 de
Dezembro do anno de 1846) ponderei que
anto lucrará esta ilha em que os nacionaes,
— 230 —

e maiormente os estrangeiros doentes, que


aqui vem cuidar da sua saude, e que tan
tos interesses nos procuram, tenham um pas
seio assaz extenso, plano, bem andamoso,
ao longo do mar, facilitando-se-lhes o uso
de commodos meios de locomoção, que a as
pereza das montanhas da ilha impede na
sua maxima parte.
Nesse mesmo oficio lembrei a neces
sidade de uma planta topographica do terre
no por onde devia passar a estrada segundo
o primitivo projecto, e das alterações que
por ventura se entendesse que deviam fazer
se: bem como sujeitava á consideração das
pessoas competentes uma serie de questões,
cuja resolução me pareceu conveniente para
bem do plano de que se tracta.
Eram essas questões as seguintes:
1.° — Se as pontes que hão de atra
vessar os valles do Ribeiro Sêcco, e Soc
corridos devem ser de pedra ou pensis.
2.° — Parece que um ou dous dos pil
lares construidos no Ribeiro Secco mostram
já algumas arregôas; assim como me cons
ta que dos materiaes que já se tinham reu:
nido para a ponte pensil só existem os pen
duraes ou suspensões. Estas circunstancias,
— 231 —

reunidas á conveniencia de se fazer desde


logo uma obra solida, duradôra, e propria
para evitar os despendiósos concertos que, pe
riodicamente demandam obras de madeira
— serão por ventura poderosas para que se
prefira uma ponte de pedra ?
3.° — A respeito de uma tal estrada
parece dever-se antes ter em vista a facili
dade do transito, e o bem andamoso do pi
so, e por isso n㺠importará que venha a
ter um grande desenvolvimento, com tanto
que ofereça aos viandantes um passeio pla
no , proprio para todas as qualidades de
transporte, visto como não he possivel pro
porcionar-lhes taes vantagens noutros pon
tos da ilha.
4.° — Á proporção que se fôr proce
dendo á abertura da estrada, observar-se-ha
com toda a attenção se he possivel construir,
ao menos um ou dous chafarizes ao longo
della. Quando haja probabilidade de assim
poder ser, quer derivando uma porção de
agua das levadas superiores, ou por se des
cubrir alguma vertente, será indispensavel
considerar simultaneamente a questão dos en
CatlâRhentOS.

5.° — Convirá por ventura que além do


-- 232 -

espaço central para o transporte de toda e


qualquer viatura se constrúam dois passeios,
ou banquetas lateraes. •

6.° — Deverá a estrada ser macamadi


sada, ou calçada ao modo deste paiz?
Asiago foi para esta Ilha o anno que
está a terminar; não só o flagello da fome
veio perseguir-nos e extenuar-nos, senão tam
bem o demonio das perturbações politicas nos
roubou o socego, o tempo e os cabedaes.
Parte foram estas circunstancias para que
não podesse cuidar-se seriamente da empre
za da estrada de Cama de Lobos, e mais
uma vez ficou esteril um pensamento civili
sador nesta boa terra.
Graças porém á Providencia, eis que
vem residir entre nós S. M. a Raynha Ade
laide da Grã-Bretenha, e Esta Excella Se
nhora, que por toda a parte assignala a sua
passagem com um rasto luminoso de benefi
cios e de liberalidades, propõem-se a tam
bem deixar nesta Ilha uma lembrança da
sua magnanimidade, e acrisolada munificen
cia. Soube S. M. que se concebêra o pro
jecto de abrir a estrada em questão; veio
no conhecimento practico de que falta aos
arredores desta bella cidade um passeio as
– 233 —

saz longo, commodo, aprazivel, e proprio


para distracção dos muitos valectudinarios
que afluem á Madeira; e o seu Real Ani
mo se inflamou em desejos de proporcionar
a este risonho paiz mais um encanto da ar
te, mais um meio de conforto, mais um
elemento de prosperidade.
Foi pois a Mesma Augnsta Senhora
Servida Mandar insinuar-me que desejaria
obter o conhecimento do plano da estrada,
e o orçamento da despeza que póde occasio
nar; e por este motivo me dou eu a maior
pressa em convidar a V. S.", para que dentro
do mais curto prazo possivel, me habilite a
fazer chegar aos pés de S. M. os esclareci
mentos que a Mesma Augusta Senhora tem
por convenientes.
Para mais facil desempenho da incum
bencia que commetto ao cuidado de V. S."
e que lhe recommendo com apertada ins
taneia, acabo de ordenar ao Director das
Obras Pnblicas, Vicente de Paula Teixei
ra, que trate de entender-se com V.
S." para o auxiliar em tudo quanto ti
ver relação com este objecto; por ma
neira que V. S." possa, sem demora, e
com a devida exactidão, desenvolvimento e
— 234 —

clareza , subministrar-me as noticias, planos,


orçamentos, e demais explicações que o ca
so requer.
Não devo ommittir uma circunstancia
mui ponderosa, qual ne a do empenho que
S. M. parece mostrar em que se estreie o
anno novo de 1848, começando com elle
os trabalhos da estrada. Torna-se por isso
da maior urgencia que V. S." apresente,
sem a menor perda de tempo, a indicação
do ponto onde já póde empregar-se gente
nos primeiros dias de Janeiro proximo futu
ro, e a qual genero de obras se póde dár
gomeço.

O que tudo bei por muito recommen


dado a V. S.".
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal aos 14 de Dezembro de
1847. — Illm." Snr. Tiberio Augusto Blanc,
Capitão do Corpo d'Engenheiros. — O Gover
nador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
*--*EXG29«
f>…—

Auto de cessaç㺠de terreno. •

Aos seis dias do mez de Março de mil oito


centos quarenta e oito, veio a esta Secretaria do
— 235 —

Governo Civil do Funchal Antonio Ferreira Noguei


ra, proprietario e negociante desta praça, e disse
que no tempo da Prefeitura fôra cedida a terra em
que assentam dous pilares levantados na margem
de oeste do Ribeiro Secco para a ponte que entãº
se projectára, e mais uma porção de terra do mes
mo lado para a estrada que devia seguir até Cama
ra de Lobos, na largura de trinta e dois palmos,
e que ratificando a cessão da terra para esses pila
res, por ser hoje senhor da propriedade onde elles
se acham , a amplía concedendo qualquer espaço que
seja necessario para os pés direitos dos dous arcos
da ponte, que por novo plano já em execução, se
vai edificar naquelle sitio; assim como cede para
a estrada, em continuação dessa ponte, o espaço
que a mesma estrada e as paredes aos lados della
tem de occupar na largura de quarenta e cinco
palmos, em toda a extensão da sua propriedade
rustica no dito sitio, em logar dos trinta e dois
palmos que em mil oitocentos trinta e cinco o
ante-possuidºr da dita propriedade déra um pou
co mais abaixo da demarcação da estrada que hoje se
vai abrir, — oferecendo tambem a pedra de qualquer
parede sua que seja necessario demolir dentro da
demarcação declarada; e tudo gratuitamente, com
– 236 —

as seguintes condicções: 1.° — Que as paredes dos


lados terão pelo menos seis palmos de altura a
cima do pavimento da estrada, em quanto esta
passar na dita terra cedida: 2.° — Que se abra e
conclua a estrada nesse espaço: Que no mesmo
espaço se não plantem arvores se não do lado do
már. — E para constar se fez o prezente termo
por ordem de Sua Excellencia o Senhor Conse
lheiro Governador Civil, e o cedente o assigna
com as testemunhas, Marício Joze de Castelbranco,
e Jacinto de Freitas Lomelino, Oficiaes desta Se
cretaria. Servulo Drummond de Menczes, Secre
tario Geral, o fez escrever e assigna. — Servulº
Drummond de Menezes.
Não foi só o augmento na largura da terra que
já estava cedida, foi tambem no comprimento em ra
zão da nova direcção da estrada.
Antonio Ferreira Nogueira.

Como testemunha, Mauricio Jose de Castel-bran


CO,

Dita , Jacinto de Freitas Lomelino.

* - ….… -->
– 237 -

Ao Capitão d'Engenheiros Blanc.


4.° Repartição — Livro 3.° — Nº t394
— Illmº Snr. —Tendo começado hoje os tra
balhos da construcção da pente do Ribeiro Sec
co, S. Exc." o Snr. Conselheiro Governador
Civil julga conveniente que sem demora co
mecem tambem os da estrada em prºjeto que
ha de communícar esta cidade com a fre
guezia de Cama de Lobos, pela beira-mar;
e como seja necessario indicar o logar deste
trabalho, deseja S. Exc." que V. S." princi
pie quanto antes a assignalar o alinhamento
dessa estrada.
Esta operação tem de principiar em
terra do Snr. Autonio Ferreira Nogueira,
que generosamente a oferece na largura, que
a estrada vai ter, de quarenta e cinco pal
mos, comprehendendo o espaço dos maineis,
em toda a extensão da sua propriedade no
sitio do Ribeiro Secco, cedendo tambem a
pedra de paredes suas que ficarem dentro do
dito alinhamento, pagas aos colonos as bem
feitorias que ahi tiverem; e por tanto só es
tas terá V. S." de fazer avaliar por perito ou
peritos da sua escolha e da dos colonos; —
sendo esta a avaliação que por ora se recom
— 238 —

menda em quanto o andamento da estrada


não faz precisas outras. — Deus Guarde a V.
S.° — Secretaria do Governo Civil no Fun
chal, aos 6 de Março de 1848 — Illm.º
Snr. Tiberio Augusto Blanc, Capitão d'En
genheiros. — O Secratario Geral, Servulo
Drummond de Menezes.

--…<><><>-->

Ao Administrador do Concelho do Funchal.

• 4.º Repartição — N.° 1189 — Lº 3.°


— Illm.º Snr. — S. Exc." o Snr. Conse
lheiro Governador Civil do Districto cncar
rega-me de participar a V. S." que deverá
detalhar, e pôr á ordem do Snr. Capitão
Tiberio Augusto Blanc, o maior numero de
ordenanças que lhe fôr possivel, até 50 por
dia, para serem empregadas na abertura da
estrada do Ribeiro Secco.
Os individuos, que forem chamados pa
ra trabalhar neste ponto, deverão ser esco
lhidos dentre os contribuintes que residirem
em maior proximidade delle; — e a execu
ção desta ordem deverá começar segunda fei
ra, 13 do corrente.
E como a Camara do Funchal se ache
– 239 —

auctorisada para empregar ordenanças em


obras que correm por sua conta, cumpre que
V. S." lhe forneça as que lhe requisitar,
diminuindo, se assim fôr necessario, o nu
mero das que se lhe mandam apromptar pa
ra a estrada do Ribeiro Secco, tudo de in
telligencia com o Snr. Engenheiro encarre
gado desta obra, e com o Snr. Presidente
da Camara. — Deus Guarde a V. S." — Se
cretaria do Governo Civil no Funchal aos 11
de Março de 1848 — Illm.º Snr. Adminis
trador do Concello do Funchal — O Secre
tario Geral, Servulo Brummond de Mene
26 S.

Oficio do Capitão Tiberio Augusto Blanc.


Archivo de Engenheria Civil — Lº2º—
Nº 92 — Illm.º e Exmº Snr.—Em cumpri
mento das ordens de V. Exc." exaradas em offi
cio expedido pela 4.° Repartição sob N.° 1394
L.° 3.° tenho a honra de eneaminhar ás mãos de
V. Exc." o rol da avaliação feita pelo agrimen
sor ajuramentado, Joze Fernandes Vellosa,
das bemfeitorias que possuem alguns cazei
ros do proprietario Antonio Ferreira Noguei
*
*-246 —

ra, no sitio do Ribeiro Secco, e que são inu


tilisadas pelo alinhamento da projectada es
trada monumental a que V. Exc." me man
dou proceder; tendo logar a dita avaliação
na minha presença e dos proprios cuzeiros,
os quaes se louvaram no mesmo agrimen
sor, declarando que estavam por tudo quan
to ele fizesse.
Cada um dos ditos cazeiros ouviram do
proprio agrimensor o valor de suas bemfei
torias, as quaes sommam Rs. 563860, cu
ja importancia foi paga aos ditos cazeiros
pelo mui generoso negociante e proprietario
Antonio Joaquim Marques Basto, como cons
ta dos recibos passados no verso do dito rol
da avaliação: — tanto este proprietario como
Antonio Ferreira Nogueira cederam mui vo
luntariamente todo o terreno necessario para
a estrada, bem como as paredes comprehen
didas no alinhamento della.
Deus Guarde a V. Exc. —Funchal aos
12 de Março de 1848. — Illm.º e Exm.º
Snr. Joze Silvestre Ribeiro, Conselheiro Go
vernador Civil do Districto. — Tiberio Au
gusto Blanc, Capitão d'Engenheiros. * .
— 241 —

Oficio do Capitão d'Engenheiros Blanc.


Archivo de Engenhºria Civil —L"2" —
Illm.º e Exmº Snr. — Tendº as ord, nº aças
que andam no trabalho da estrada ºuviu sental
ponderado nos primeires das que eram en
ganadas, por quanto recebiam avisos para virem
ao caminho, e ao mesmo tempo lhe disiam
que receberiam alguma coisa para comerem
ao jantar, e vendo eu qne realmente todas
vinham desprovidas de comer para passarem
o dia, sendo umas pelo motivo indicado, e
outras pelo seu estado de miseria, resolvi man
dar abonar algum pão na semana passada, re
sultando desta medida um proficuo efeito,
por quanto trabalhavam como se fossem jor
naleiros pagos, e a sua alegria era tal que
queriam mostrar seu reconhecimento na di
ligencia com que trabalhavam.
Como por motivos de serviço eu não po
desse prevenir a V. Exc." desta minha deli
beração, suspendi este abono, donde proveio
um grande afrouxamento no trabalho, ven
do-me eu mesmo obrigado a despedir as or
denanças mais cedo, pois que no fim da tar
de já nada faziam por falta do forças, tende
despedido algumas logo depois do jantar, por
— 242–

que absolutamente nada podiam trabalhar: he


por todas estas rasões que vou propor a V.
Exc." a conveniencia de se abonar ao menos
nm pão por dia ás ordenanças que compare
cerem a dár a sua roda.
Deus Guarde a V. Exc. — Funchal 1
de Abril de 1848. — Illm.º e Exmº Snr.
Joze Silvestre Ribeiro, Conselheiro Gover
nador Civil do Districto, — Tiberio Augus
to Blanc, Capitão d'Engenheiros.
-*><><>…—

Ao Capitão Tiberio Augusto Blanc.


4.° Repartição — N.° 1410 — Li
vro 3.° — Ilm "Snr.—Tendo V. S." represen
tado a S. Exc." o Snr. Conselheiro Gover
nador Civil a necessidade que encontrou de
soccorrer com um pão, á hora do jantar,
os trabalhadores que vierão pagar a contri
buição annual de 5 dias de trabalho na es
trada que se está abrindo do Ribeiro Sêc
co a Camara de Lobos, pela beira mar, e
o interessante efeito que produzio este soc
côrro, mediante o qual trabalharam todos
com muita alegria e com a melhor vonta
de, como se fossem jornaleiros pagos; e
— 243 —

vendo S. Exc." que por tal meio se conse


gue adiantar aquella obra, de reconhecida
utilidade publica, tanto quanto se atrasaria
com trabalhadores debilitados por falta de
alimento, e pagando com desgosto e repug
nancia um onus que, bem naturalmente, de
sejam tornar o menos incommodo que ser
possa; encarrega-me de diser a V. Sº que
approva o soccôrro de um pão diario, de
vinte reis, a cada um dos mencionados con
tribuintes, e o auctorisa para continuar a
prestar-lhes igual soecôrro, carregando em
folha, para ser paga pelo cofre da Junta
Geral do Districto, a despeza respectiva,
que tem de mais a virtude de facilitar a
contribuição das cinco rodas a que todos pro
curam evadir-se, e que nunca são dadas
sem muita difficuldade — Deus Guarde a
V. S." — Secretaria do Governo Civil no
Funchal ao 1.° d'Abril de 1848. — Illm."
Snr. Tiberio Augusto Blanc, Capitão d'Enge
nheiros. — O Secretario Geral, Servulo Drum
mond de Menezes,
–244 —

A Camara Municipal de Cama de Lobos.


4 º Repartição — Lº 2.° — Nº 74 —
Illm." Snrs. — Quando entrei na empre
za da construcção de Ponte do Ribeiro
Secco, foi com animo de cortar a primeira
e principal difficuldade que se apresentava
para abrir a estrada littoral, que deve
communicar esta cidade com essa villa.
Consegui felizmente vencer essa diffi
culdade, e agora cumpre-me continuar na
diligencia de vencer outras, a fim de que
seja levado por diante o interessantissimo
plano da abertura da referida estrada.
Nestes termos, occorre-me começar a
entender desde já na construcção das obras
indispensaveis para se atravessar a Ribeira
dos Soccorridos, no ponto por onde deve
continuar a estrada do Ribeiro Secco d'esta
cidade para essa villa. •

Uma vez que comecem desde já esses


trabalhos, e ligando-se por este modo os ex
tremos deste trabalho, pode conceber-se a
esperança de se ultimar em breve a obra
da estrada, que tamanho beneficio vae fa
zer a Cama de Lobos, pondo-a em mais fa
cil e prompta communicação com o Funchal,
— 245 —
•.

e attrahindo-lhe o movimento e a vida que


lhe faltam.
As ordenanças d'esse concelho pode
riam, com preferencia a outro algum ser
viço, occupar-se já este anno nos trabalhos
da Ribeira dos Soccorridos.
A Camara devería dar todo o auxilio
possivel a estes trabalhos, embora fizesse al
gum sacrificio, a qual bem recompensada vi
ria a ser pelas immensas vantagens que os
povos hão-de vir a perceber.
Medite a Camara attentamente sobre
este assumpto, e estou certo de que se pres
tará a coadjuvar-me com toda a eficacia.
Aguardo a sua resposta, para no caso
de ser favoravel, começar eu a providenciar
o que necessario fôr.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal aos 31 de Mayo de
1848. — Illm." Snrs. Presidente e Membros
da Camara Municipal de Cama de Lobos. —
O Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
==>@oa===

A” Camara Municipal de Cama de Lobºs.

4.° Repartição — N.° 76 — Lº 2.° — Illm."


— 246 —

Snrs. — Proporcionou-me a maior satisfação a mui


to atteº ciosa resposta de V. S." do 1.° do corrente,
e bem assim me causaram mui vivo contentamen

to as boas disposições de que me dão conta, de


quererem concorrer dos rendimentos municipaes
com a quantia de Rs. 2903000 para os trabalhos
a fazer na Ribeira dos Soccorridos, e abertura da
estrada que deve communicar essa villa com º
Funchal.

Mandei já dár começo aos trabalhos da dita


Ribeira dos Soccorridos, e acabo de nomear uma
Commissão nessa villa, composta de excellentes
cidadãos, destinada a promover nesse concelho
uma subscripção para costear as despezas dos di
tos trabalhos, sollicitar do Governo Civil todas as
providencias que julgar precisas, e entender-se
com elle sobre tudo.

Para maior illustraç㺠do assumpto, remetto


a V. S.," a incluza cópia do alvará da creação
da dita Commissão.

Folgarei muito de que a Camara continue a


nutrir os mesmos sentimentes de enthusiasmo pe
la obra de que se trata, e de que durante a mi
nha ausencia se preste a coadjuvar este Governo
Civil, de sorte que na minha volta a esta ilha eu
— 247 —

tenha como espero, muitos motivos de lhe ende


reçar louvores.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Gover
no Civil no Funchal em 13 de Junho de 1848. —
Illm.ºº Snrs. Presidente e Membros da Camara
Municipal de Cama de Lobos. — O Governador
Civil, Joze Silvestre Ribeiro. •

—=>$5<=

Ao Ministerio do Reino.

4.º Repartição — Lº 3.° — N.° 77


— Illm.º e Exmº Snr. — A obra da «Pon
te do Ribeiro Secco º , que felizmente está
no melhor adiantamento, he apenas o preli
minar do grande trabalho da abertura da es
trada para Cama de Lobos, de cujas vanta
gens tive já a honra de falar a V. Exc.".
Debalde pois conseguiria eu construir a
indicada ponte, se ao mesmo tempo não di
ligenciasse promover com eficacia a abertu
ra da estrada, como tão apertadamente o de
mandam os intere ses desta ilha.
He por isso que, ao mesmo tempo em
que se está trabalhando na ponte, se come
çou a abrir a estrada, e já está aberto um
–248 -

grande pedaço, continuando-se incessante


mente em uma tal lida com todo o empe
nho.
Sendo porém esta obra um trabalho de
grande alcance, e immensamente despendioso,
entendi que devia nomear uma Commissão,
composta de pessoas muito respeitaveis, intelli
gentes, e de influencia, para o fim de pro
mover uma subscripção em larga escala, en
estrangeiros, para os gastos
tre nacionaes e
da mencionada estrada,
Esta Commissão funccionará dentro do
Funchal; como porém a estrada deva chegar
até Cama de Lobos, e os moradores da
quelle concelho devam concorrer para ella
na parte que lhes tºca , nomeei outra Com
missão especial na dita villa, encarregada da
mesma incumbencia, a respeito do respectivo
concelho, que a da cidade em quanto ao
concelho do Funchal.
Consta tudo, mais desenvolvidamente,
des documentos que inclusos tenho a honra
de encaminhar as mãos de V. Exc." sob os
N.ºs 1, 2, 3. \

Cumpre-me só cente asseverar a V.


Excº que o pessºal das duas Commissões na
da deixa a desejar, por isso que fixe a mi
— 249 —

nha escolha em cavalheiros, tanto portugue


zes, como inglezes e americanos, que estãº
a todos os respeitos no caso de bem satisfa
zerem á importantissima incumbencia de que
os encarreguei, e que elles me fizeram a as
signalada mercê de aceitar.
Tendo adoptado este expediente, e ou
tras providencias, estou descançado, e cabal
mente convencido de que durante a minha
ausencia deste Districto não sofrerão inter
rupção os trabalhos publicos, que tomei tan
to a peito, e dos quaes os povos hão de um
dia vir a colher grandes proveitos.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal aos
15 de Junho de 1848. — Illm.º e Exm."
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino. — O Governador Civil, Joze
Silvestre Ribeiro.

—*ERR42-G#E=m…--

ALVARÁ.

O Governador Civil do Districto do Funchal. &e.

Estando prestes a ausentar-me deste Districto,


em virtude da licença que acaba de conceder-me
o Governo de S. Magestade, para ir ao centinente:
— 250 —

E desejando ardentemente que não sofra a


menor interrupção o andamento da empreza que
encetei [e vae hoje em tão feliz progresso ] de
construir a Ponte do Ribeiro Secco, e abrir a im
portantissima estrada, qne deve communicar a

eidade do Funchal com a villa do Cama de Lo


bos pela beira mar:
E convindo por este motivo que no intervallo
da minha ausencia encontre o Governo Civil a mais
eficaz coadjuvação para o seguimento dos traba
lhos de que se trata:
Occorre-me crear n’esta Cidade uma Commis

são, que tome sobre si o encargo de promover,


entre nacionaes e estrangeiros, uma subscripçãº
em larga escala, quer seja em dinheiro, quer em
generos, e materiaes de construcção, destinada a
obter os meios indispensaveis para satisfazer os gas
tos da abertura da dita estrada :

E devendo uma tal Commissão ser composta


de pessoas, nacionaes e estrangeiras, que se tornem
recommendaveis por sua respeitabilidade, amor do
bem publico, e intelligencia, fixei a minha esco
lha nos Cavalheiros que passo a designar:
Illm.º* Snrs.

George Stoddart.
— 251 —

John Howard March.

George Day Welsh.


Diogo d'Ornellas França Carvalhal Frazão.
Jo㺠Francisco de Florença.
Antonio Joaquim Marques Baste.
Nuno Alexandre de Carvalho.
Estes Senhores constituir-se-hão immediata
mente em Commissão, nomeando d'entre si, Pre
sidente, Thesoureiro, e Secretario, e começando
desde logo a abrir e promover com toda a efflca
cia a subscripcão, nos termos que acima se decla
ram, e continuando sem limite de tempo n’essa di
ligencia , em ordem a que possa approveitar a ge
nerosa disposição de tantos estrangeiros que a esta
Ilha afluem na estação invernosa.
Afora isto , considerar-se-ha a Commissão co
mo a promotora da execução do importantissimo
projecto da abertura da estrada para Cama de Lo
bos, — como a representante dos designios é ivilisa
dores que presidem a esta empreza, a fim de jámais
deixar amortecer o enthusiasmo, que até agora tema
existido; — tende por constante incumbencia dár o
mais rigeroso impulso á obra, solicitar as provi
dencias que julgar indispensaveis, dár pressa ao
andamento dos trabalhos, lembrar todo o genero de
--252 —

alvitres, remover obstaculos, e em uma palavra,


ser o centro, a alma, a vida de toda esta empre
za, em perfeita harmonia com o Governo Civil.
Convencido de que a Commissão se haverá na
sua tarefa com o zelo, intelligencia, e decidido
empenho, que são de esperar dos illustres Membros
que a compõem, concebo a lisongeira esperança de
que por este modo asseguro a feitura e concluzão
de uma obra, que emprehendi e tenho encaminha
do com tanto gosto, e na qual muito vae dos in
teresses desta Ilha.
Dado no Palacio do Governo Civil no Funchal
aos 12 de Junho de 1848. – Joxe Silvestre Ribeiro.

«…>C2<>…"

ALVARÁ

O Governador Civil do Districto do Funchal &c.

Havendo eu tomado sobre mim a empreza de


abrir a estrada, que ha muitos annos se projectou
para communicar a cidade do Funchal com a villa
de Cama de Lobos pela beira-már:
E tendo começado por vencer a maior diffi
culdade que logo no começo apparecia, qual a da
construcção da Ponte do Ribeiro Secco:
— 253 –

E sendo indispensavel continuar a dár as pro


videncias necessarias para que a obra não seja in
terrompida, mas sim possa progredir, independen
temente de quaesquer circunstancias.
Tenho por conveniente remover desde já a
difficuldade, que, depois da construcção da Pon
te do Ribeiro Secco, se antolha como mais emba
raçosa, qual he a dos trabalhos necessarios para se
atravessar a Ribeira dos Soccorridos no ponto por
ende deve passar a já indicada estrada :
N’este sentido, mandei já applicar o serviçº
das ordenanças das freguezias de Cama de L9
bos, e de Estreito; visto como encontrei na Ca
mara do respectivo concelho a melhor vontade de
me coadjuvar, e de pôr á minha disposição todos
os recursos ao seu alcance.

Sendo porem certo que debalde este Governº


Civil se affadigaria em promover esta obra, se os
moradores do concelho de Cama de Lobos não se
prestarem a concorrer cºm a sua dedicação para
ser levada ao cabo uma empreza, de que tantos
beneficios hão de vir a colher pelo andar dos
tempos: •

Resolvo nomear uma Commissão, como effec


tivamente nomeio, composta dos seguintes mora
— 254 —

dores do referido concelho de Cama de Lobos,


em quem tenho a satisfação de depositar a mais
ampla confiança:
Illm.°º Snrs.

Antonio Ferreira de Corrêa, Presidente.


João Antonio Osorio de Menezes.
Roque Teixeira d'Agrella, Thesoureiro,
Domingos João de Gouvêa.
O Revdº Vigario do Estreito, Caetano Alíper
to de Barros.
João 6ualberto Pinto.
Silvino A. de Gouvêa , Secretario.

A Commissão instaurar-se-ha immediatamente

e terá por encargo o seguinte:


1.° — Abrir e promover com a maior efica
cia, entre os moradores do concelho de Cama de
Lobos, uma subscripção em dinheiro, em gene
ros, ou em materiaes, destinada para costear gas
tos das obras a fazer na Ribeira dos Soccorridos,
e abertura da estrada nas visinhanças da dita vil
la de Cama de Lobos.

2.° — Solicitar do Governo Civil todas as


providencias que julgar deverem ser adoptadas pa
— 255 —

ra o bom andamento dos trabalhos, e entender-se


com ele ácerca dº tudo quanto tenha relação com
esta incumbencia.

Se a Commissão se convencer de que são os


povos quem deve promover a sua felicidade, não
se atendo unicamente ao Governo; e sendo com
posta de tao recommendaveis Cidadãos, que mui
to se interessam pelo bem da sua terra, e mere
eem as sympathias dos seus compatricios, e a es
tima geral, concebo a mais bem fundada esperan
ça de que corresponderá de todo ponto aos desi
gnios que me levaram a nomeá-la.
Dado no Palaeio do Governo Civil no Funchal
aos 12 de Junho de 1848. — Joze Silvestre Ribeiro,

----*EPG354#aa…—--

Portaria do Ministerio do Reino.

Ministerio do Reino— 2.° Direcção —1."


Repartição — Lº 6.° —n."6—Tendo sido pre
sente a Sua Magestade a Rainha, o oficie
nº 77 do L.° 3.° datado de 15 de Junho
ultimo, em que o Governador Civil do Dis
tricto do Funchal dava conta de haver no
meado duas Commissões compostas de pes
soas respeitaveis e intelligentes, para pro
— 256 –

moverem assim na «Cidade do Funchal »


como no «Concelho de Cºma de Lobos » uma
subscripção em larga escala para ºs obras da
abertura da estrada que deve communicar a
quela cidade com o referido concelhº, da
qual estrada já existia feito um consideravel
lanço, em virtude dos exforços empregados
por elle Govereador Civil, e pelos membros
d'aquellas commissões, e alguns outros indi
viduos: Ha por bem a Mesma Augusta Se
nhora Mandar significar ao sobredito 51agis
trado que muito agradavel Lhe foi receber
mais essa exuberante prova da intelligencia e
incansavel zelo com que elie incessantemente
se empenha em promover os melhoramentos
materiaes no Districto a seu cargo ; — e outro
sim Quer Sua Magestade, que em Seu Real
Nome, elle transmitta os devidos louvores
aos individuos que tanto interesse tem toma
do pela realisação e progresso de tão util,
quanto importante obra. — Paço das Neces
sidades em 14 de Julho de 1848. — Du
que de Saldanha.
— 287 —

AGRICULTURA,

Aº Camara Municipal do Funchal.

4.º Repartição — L.° 1.° — N.° 448 — Illm."


Snr. — Por occasiao de examinar-se em Conselho

de Districto o orçamento supplementar que acom


panhou o oficio que V. S º dirigo a este Gover
no Civil em 12 do corrente, no qual apparecia
uma verba de 2003006 reis, destinada á compra
de semente de pitheirº, occorreo a idea de lem
brar á Camara Mu icipal a que V S º preside,
mandar vir de Portugal uma porção de bolota de
carvalho, asinheiro, e de sôbro, para ser distri
buida aos lavradores d’esta provincia:
Tenho por tanto a honra de fazer esta parti
cipação a V. S." para que se sirva leval-a ao co
nhecimento da mesma Camara, em ordem a que
faça d’ella º uso que julgar conveniente.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Governo
Civil no Funchal aos 17 d'Outubro de 1846 —
Illm.º Snr. Presidente da Camara Municipal dº
#
— 258 —

Funchal. — O Governador Civil, Joze Silvestre Ri


beiro.

*--*###><><>----

A Camara Municipal de Sant'Anna,

4.º Repartição — Lº 1.° — N.° 458


= Illmº Snr. — São tão frequentes e acom
panhadas de observações tão ponderósas, as
queixas e reclamações que sobem ao Gover
no Civil contra os mui prejudiciaes abusos
que se estão practicando nos córtes de ma
deiras, que teem logar nesse Concelho, que
entendo não dever demorar-me em chamar
toda a attenção da Camara Municipal, a
que V. S." preside, para occorrencias que,
no sentir das pessoas, a quem não he indif
ferente a sorte deste paiz, devem conside
rar-se como uma das causas mais activas
da decadencia da sua prosperidade. •

E com efeito, he tão repetida nesta


cidade a entrada de madeiras vindas desse
concelho, que a continuar assim, desappa
recerão em breve os poucos arvoredos que
ainda se encontram nas serras delle, outr’o
ra tão ricas de soberba vegetação. — Por
estes ponderosissimos motivos, recommendo
— 289 —

a V. S." a mais escrupulosa atençãº, e a


maior parciusonia possivel na concessão de
licenças para cortes de madeiras; devendo a
Camara adoptar tudos os treios que julgar
convenientes. e prºpôr me as medidas que
dependerem de mim, para se provêr de re
medio a um mal que tanto afecta os inte
resses dos habitantes desse concelho
Deus Guai de a V. S." — "aia, º do
Governo Civil no Funchal, aos 30 de Yo
vembro de i846. — illinº Snr. Presidente
da Camara Municipal de Sant'Anna — O
Governador Civil, doze Silvestre Ribeiro.
--…a+=>$$êGã>

A Camara Municipal do Funchal,

4.° Repartição = Lº 1.° = N° 461.


= Illmº Snr. = Venho cumprir o dever de
pôr nas mãos de V. S.", para que se dig
ne de a communicar á Camara, a cópia
d'um oficio que me endereçou o Snr. Al
ministrador do Concelho de Sant'Anna, no
qual me representa a necessidade de se ado
ptarem promptas e eficazes providencias,
tendentes a evitar os estragos que se fazem
na interessante mata de Ribeiro-Frio.
- 260 –

Attendendo á importancia do assump


to de que trata o dito oficio, julguei de
vê]-o apresentar á consideração do Conselho
de Districto, o qual, depois de o examinar
com toda a attenção, resolvêo que fosse le
vado ao conhecimento da Camara, para o
fim de deliberar a semelhante respeito o que
mais acertado e proveitoso lhe pareça.
Segundo o que pensa o referido Snr.
Administrador, parece que os devastadores
recorrem agora ao artificioso, quanto male
fico arbitrio de falquejarem d'um e d'outro
lado as arvores, para que elas - vão pouco
a pouco secando, visto como só se permitte
aos lenheiros trazerem para a cidade lenha
sêca. Por este motivo opina ele que convi
ria talvez prohibir inteiramente a entrada na
cidade de lenha de toda e qualquer arvore
indigena, menos urze e uveira.
Tenho a honra de falar a uma corpo
ração illustrada, e por isso me julgo dispen
sado de desenvolvêr largamente a conveni
encia de conservar as matas d'esta ilha,
bem como de as augmentar fazendo-se no
vos plantios — no que tanto interesse vai da
agricultura e da prosperidade deste torrão
abençoado.
— 261 —

Limitar-me-hei pois a chamar a atten


ção da Camara sobre este objecto, bem es
perançado de que ele será discutido com
toda a reflexão e zelo, e se adoptarão as
providencias que mais eficazes se antolha
rem para beneficiar a ilha. .
ta-me esquecendo de ponderar a V.
S", que tambem sobre a conservação das
matas oficiei á Camara do Concelho de San
t'Anna, recommendando-lhe, segundo a de
liberação do Conselho de Districto, que fos
se cautelosa, e summamente reservada na
concessão de córte de arvores no seu Conce
lho.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do
Governo Civil no Funchal, aos 19 de De
zembro de 1846. — film.º Snr. Presidente
da Camara Municipal do Funchal. — O Go
vernador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
—--**><><>-----

Ao Exm.º e Revdm." Bispo. •

4.º Repartição — N.° 1316 — Lº 3.°


— Exm.º e Revdm.° Snr. — Permitta-me
V. Exc." Revdm." a honra de encaminhar ás
suas mãos os cincoenta exemplares inclusos
— 262 —

de uma alocação, que em data de 23 do


corrente endercaei ás Authoridades Adminis
trativas, Cor orações Legaes, e moradores
deste Districto, no sentido de convidar os
povos a variarem a cultura dos seus campos,
para consegui em … rir a falta da batata
com outros pioductos agricelas.
V. Exc." Revdin." me o se juiará muito,
se se dignar remetter a cada um dos R."
Parechos um exemplar da dita allocução, re
commendando-lhe que expliquem a doutrina,
que nella se contém, aos seus parochianos,
e os induzam a vencer a indelencia, que os
condemna á miseria.
f)eus Guarde a V. Exc." Revdm." —
Palacto do Gºverno Civil n. lºunchal aos 30
de Março de 1847. — Exmº e Revdmº Snr.
}} foze, Bispo do Funchal. — O Governa
do Civil, Joze Silvestre Rikero.
-----…assaº=E4PCB>msw=-------

A L L o c U C Á o.
• O Governador Civil deste Districto,

Ás Authoridades Administrativas, Corporações


legaes, e moradores do mesmo.

Não ha ainda quatro annos que um talentoso


— 263 —

escriptor francez, examinando a importante ques


tão da subsistencia dos povos, e por occasião de
enumerar as causas que teem concorrido para di
Inínuir a mortalidade da raça humana nos tempos
modernos , escrevia estas palavras:
« O que mais tem concorrido, sobre tudo,
he a batata [semilha ], tão justamente chamada o
((
pão dos pobres, um pão já fabricado. Sabe-se que
C clla foi introdusida na Europa desde o seculo 16.",
e por muito tempo despresada, não obstante os
(U
preseverantes esforços de Turgot e de nosso ve
((
neravel Parmentier. Constitue ella hoje uma gran
((
de cultura, tante mais preciosa, quanto, por uma
C
especie de compensação da Providencia prospéra
(( nos annos menos favoraveis aos cereaes. A ba
(( tata seria bastante, só de per si, para tornar im
possiveis essas grandes faltas, essas fomes horri
((
veis que por tantas vezes assolaram o mundo, e
dizimaram as populações, anteriores todas á epo
{
cha em que começou a ser cultivada em ponto
(( grande.» - •

Era com efeito assim, e todos a uma voz a


bençoavam a preciosa dadiva, que nos enviára o
Novo Mundo, considerando a bem vinda planta co
mo um preservativo contra os horrores da fome, de
— 264 —

que as gerações passadas foram victimas em diver


sos periedos.
àias ah! uma doença fatal e funestissima ac
commetteo a planta, e desde esse momento uma
grande porção da humanidade ficou exposta ás crueis
vicissitudes da pentaria, que n'outras eras se tor
naram tão sensíveis. Nessa desditosa fracção do ge
nero humano sobresahio, em quanto ás privações,
e aos tormentos da fome, a malfadada Irlanda, que
quasi exclusivamente se sustentava de batatas: faltou
lhe esse alimento, e desde então centenares de vic
timas teem perecido á mingua , e pereceria por cer
to a maxima parte da população, se um Governo
poderoso, immensamente habil, e paternal, não se
desse pressa em mandar buscar a diferentes pontos do
globo um sem numero de cargas de grão e farinha,
e se não tomasse outras providencias, que em sua
sabedoria ulgou proprias para attenuar o mal, e
nº inorar a desgraça daquelle povo.
Aqui apparecem já os inconvenientes de que
um povo qualquer esteja atido unicamente a um de
terminado sustento, pois que, se por uma deplora
vel fatalidade vem esse a faltar, he consequencia
inevitavel a escassez, a penuria, a fome! Aqui
Se oferece desde já a indispensabilidade de admit
— 265 –

tir a maior variedade nas culturas, para nos con


formarmos com a sentença que tão elegantemente
exprimio um Classico Portuguez: Luz que se póde
apagar com um assºpro, não está segura sem fia
dor.

Ha quem assevere que a batata tem sido elo


giada muito além do que he de razão, notando que
ella não reune as circunstancias, que tornam re
commendaveis o trigo, o milho, o feijão e outros
cercaes, e outros legumes. — A batata, diz-se, he
sempre insuficiente para o sustento do homem,
quando não he acompenhada de substancias ani
maes, e outras que possam communicar-lhe o prin
cipio alimenticio que essencialmente lhe falta; e por
consequencia, cordo poderá ser uma boa nutrição
para o pobre, se elle a come ordinariamente sem
gordura, e por vezes até sem sal? — De mais a
mais, a batata he sujeita a uma incerteza de co
lheita, que a torna muito desvantajosa, comparada
com a do trigo, milho, e outras sementes; não ad
mitte a facilidade das reservas para os máos annos,
e he por tal modo volumosa, e entulhadora, se
assim pode dizer-se, que não se presta ao trans
porto.
Não entrarei eu nesta questão; para o mou pro
— 266 —

posito basta considerar que a batata não tem fruc


tificado nestes ultimos tempos, e que em quanto a
sciencia , ou o acaso não revelarem os meios de
destruir a terrivel doença, ou a naturesa não se
tornar mais benigna para com uma tal planta, fi
carão expostos a sofrerem os horrores da fome a
quelles povos, que principalmente com ella se sus
tentarem. E convirá por ventura neste intervallo
que o homem se abandone á desesperação, ou ain
da á indolencia estúpida do selvagem? Não, he
força que elle se a balance a confiar á terra outras
sementes, de cujo fructo possa tirar o seu sustento.
Será possível que este solo da Madeira tão
fecundo, quanto variado não possa produzir em
muitos terrenos assaz de milho, cevada, centeio, e
feijão ? Porque não tentará cada lavrador a cul
tura destes e d'outros cereaes e legumes? Por
que se ateem todos á vinha, e a poucas mais
plantas que cultivam?
Sei muito bem que esta ilha he essencialmen
le vinicola : mas tambem he certo que os seus mo
radores estarão sempre sujeitos a erueis eventuali
dades, se não procurarem cultivar os generos que
constituem a principal base da alimentação huma
na. — Quando o povo da ilha Terceira se lamenta
— 267 —

va das privações que sofria, escutava-o eu com in


credulidade, e dizia-lhe: — Povo ! não sejas ingra
to para com a Providencia, tu não tens de que le
vantar um só queirume! — E com efeito, uma pe
quena ilha que exporta cinco mil moios de trigo,
por vezes dois mil de milho.... esta terra lhe fe
liz, esta terra he invejavel. E por que? — Por
que produz superabundantemente os dois mais im
portantes meios do sustento ordinario. —Não respon
deria eu assim ao povo da Madeira, pois que per
correndo os seus campos, pouco mais encontro de
que vinhas, e he facil de perceber que este povº
ha de ser sempre pobre, em quanto as suas pro
ducções se limitarem quasi a um só artigo, sujei
to no seu consummo e valor aos caprichos de um
mercado, em que até impera a inconstante moda.
Tratem pois os Madeirenses de emancipar-se;
acordem desse lethargo em que jazem ; queiram
fortemente ser felizes, e sei-o-hão, porque a Pro
videncia quiz que o fossem, liberaiisando-lhes um
dos mais formosos, ricos, e ferteis bocadinhos de
globo.
Nao faliarei eu agora da necessidade de po
voar de arvoredo essas serras, que ahi estão es
calvadas — de derivar fertilizadoras aguas e cons
– 268 —

truir levadas — de arrotear os terrenos incultos


de erguer algumas fabricas, taes como de assucar,
papel, de sola, e outras; de melhorar as estradas,
e pontes, ou de construir novas.
Não entrarei tão pouco agora em outras con
siderações que se ligam a pontos financeiros e po
liticos, com quanto aliás eu reconheça a influencia
que poderiam ter sobre a felicidade deste Districto.
O meu intento he muito mais limitado. Eu
pertendo unicamente pedir a todas as Authoridades,
a todas as Corporações legaes, a todos os Cidadãos
amigos da sua patria, que empreguem todos os esº
forços, toda a sua influencia, para indusirem, e
obrigarem, se tanto convier, a todos os lavradores
a augmentar em torno de si, a variar quanto fôr
possivel, as sementeiras, e a procurar colher dos
terrenos que cultivaiu a maxima somma de produc
tos alimenticios.
O meu intento he prégar uma Santa Cruza
da (se assim convém dizel-o) contra a apathia dos
que não tiram o partido possivel dos recursos que
Deus lhes ministra — contra a desanimação dos que
só sabem lastimar-se, quando lhes falta o a que es
tavam costumados, e não se deliberam a lançar
mão d'outros expedientes, — «ontra a inercia dos
— 269 –

que não consideram que a Providencia só abençºa o


homem laborioso, recompensando liberalmente as
suas fadigas e condemnando á penuria e á miseria
os preguiçosos, os lazzaroni.
O meu iutento he dizer ás creaturas meralmen
te paraliticas: levantae-ros e marchae!
Cultivem-se com todo o esmero as vinhas des
te precioso torrão — facilite-se pelos meios compe
tentes a exportação do vinho — procure-se augmen
tar-lhe a venda, e subir-lhe o preço em todos os
mercados do mundo; mas lembrem-se os Madeiren
ses que elles estarão sempre á mercê de estranhos,
e será sempre precária a sua sorte, em quanto a
Ilha não produzir os generos indispensaveis para a
vida. O povo que dentro em si tiver estes ele
mentos, poderá não ser rico, mas necessariamen
te está ao abrigo da crise medonha que temos atra
vessado.
Aproveitem-se pois todos os terrenos — segun
do a sua diversa natureza; trate cada cabeça de
familia, dado á cultura da terra, de confiar a esta
mãe dadivosa todas as sementes que produzem ali
mentos salutares, e por certo que a fome se arreda
rá para sempre destas paragens.
Podéra sobre este assumpto desenvolver largas
— 270 —

considerações; mas o que deixo esboçado he mais


do que bastante para excitar os lavradores da Ma
deira a sem carem e a plantarem em mais variada
escala as suas terras — se estas ideas chegarem até
ás humildes cabsuas do javrador pobre, transmitti
das e explicadas pelas Authoridades, e pelos homens
instruidos, e amantes do seu paiz.
Funcha, 23 de Março de 1847. — Joze Silves
tre Ribeiro. •

*………………………………*

Ao Ministerio do Reino.

4.º Repartição — N.° 2167 — Illm.º e


Exm.º Snr. — Em data de 13 de Fevereiro
ultimo, tive a honra de oficiar para o Mi
nisterio a cargo de V. Exc." pedindo em
prol da arborisação das serras desta ilha a
remessa de alguns moios de semente de pi
nheiro silvestre, da que existe em deposito
no arsenal do exercito.
Permitta-me V. Exc." que não tendo
eu tido resposta áquelle oficio, hoje torne
a repetir o mesmo petitorio; por que as Ca
maras instam e eu tenho a intima convicção
de com o replantio das serras fazer-se um
— 271 –

beneficio inapreciavel á lavoura, e economia


domestica dos moradores desta ilha; — á
economia demestica, porque na ilha da Ma
deira já elies começam a sentir falta de
conbustível para o laboratorio de suas fabri
cas e cozinhas; — á lavoura porque despi
das como estão as serras força he irem bus
car de mui longe as madeiras de que ca
recem para o amanho de seus vinhataes
com notavel prejuízo das terras ladeiras que
os enxurros do inverno vão levando de con
tinuo para o mar, e das mananciaes das
aguas de rega que a aridez do clima cada
vez mais impobrece.
Por estas rasões reitero a supplica que
fiz naquella data; e asseguro a V. Exc.",
que fazendo-se uma remessa de alguns moios
da referida semente para eu a distribuir pe
las Camaras, o Governo de Sua Magestade
fará com pouco custo a esta boa terra um
beneficio que levará apoz si as bençãos de
todos os moradores.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 9
de Setembro de 1847. — . Illm.º e Exm.º
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino. — O Governador Civil,
Jozes Silvestre Ribeiro.
— 272 —

Aos Administradores de Concelho.

4.º Repartição — Lº 3º – Nº 1132


— Circular — Em data de 23 de Março ul
tino chamei eu a attenção de todas as Ca
maras , Authºridades e moradores d’esta Ilha
sobre a indispensabilidade de promover a
cultura do milho, visto ter falhado a das
semilhas [batatas], que estava colistituindo
o principal alimento da maxima parte da popu
lação. • •

Consta-me que efectivamente começá


ra já este anno a fazer-se em diferentes
pontos o ensaio da indicada cultura do mi
lho; e tenho agora por conveniente saber:
1.° — Em que escala se fez esse ensaio.
2.° — Se foi bem encaminhado.
3.° — Quaes os seus rezultados.
4.° — Se os povos estão deliberados a
progredir uos annos futuros em tão provei
toso emprenho. 8
Cumpre pois que V. S." comece a in
dagar em todo o Concelho a seu cargo o
que neste particular se fez, e se habilite a
informar-me em tempo cºmpetente [ que ali
ás está proximo] sobre todos os quisitos que
deixo expostos.
— 273 —

O que eu tenho visto ultimamente, a


proposito da cultura do milho, habilita-me
desde já a notar que esta operação agrícola
não foi feita em algumas partes nos devidos
termos. — E com efeito; a sementeira teve
logar muito mais tarde do que convinha; —
semeou-se muito basto, e não houve com a
planta o cuidado que n'outros paizes se lhe
applica.
Se pois em algumas freguezias não cor
responder o ensaio á expectativa dos lavrado
res, nem por isso elles devem desanimar,
pois que, em tendo mais experiencia, hão
de successivamente ir colhendo maiores lu
cros d'aquella abençoada planta.
Aqui e acolá tenho eu observado que o
lavrador sacrificando tudo ao pensamento am
bicioso de ter no mesmo terreno muitos pro
ductos, lançou á terra, de envolta com o
milho, diversas sementes, e d'aqui veio que
a planta do milho não poderia fructificar,
porque as suas companheiras lhe roubavam to
dos os seus nutritivos, de que carecia indiss
pensavelmente.
Guiado talvez pelo mesmo pensamento,
semeou o lavrador o milho muito basto, e
então succedeo que nenhuma das caneiras pô
— 274 —

de adquirir vigor para fructificar convenien


temente.

Pouco tempo depois que o milho tem


germinado, e tem adquirido a altura de meio
palmo, he necessario proceder á operação
da sacha, que tem por fim remexer o ter
reno, chegar terra ao pé de cada planta, e
desembaraçal-a das parasitas que lhe comem
toda a substancia: esta operação da sachu
repete-se mais duas vezes com intervallos de
20 a 30 dias, até que a planta do milho
se tem assenhoreado completamente do ter
reno. — Não sei se isto se fez na Madeira.
Em quasi todo o littoral da Madeira
se gosa durante o inverno de uma primave
ra continua , e por isso me parece que os
lavradores devem, nos sitios mais abrigados,
semear o milho muito mais cedo do que se
costuma em Portugal, afim de que a plan
ta possa vir a dispensar em grande parte as
régas que lhe são precisas durante o tempo
mais quente.
Quando pelo tempo adiante se fôr aug
mentando a cultura do milho, será mistér
lembrar aos lavradores a pratica dos povos
Açorianos, qual he a de conservarem por
muito tempo penduradas em arvores as ma
—278 —

çarocas do milho, as quaes recolhem depois


e guardam naquelle estado, para as irem
debulhando á medida que tem precisão do
genero para consummo.
Tenho entrado em todos estes promeno
res, porque estou convencido de que he mis
tér animar acaloradamente a cultura do mi
lho neste Districto. •

He este o principal alimento das classes


pobres, e a falta da sua producção ha de
sempre colocar estes povos na dependencia
dos estrangeiros, e occasionar as tristes e a
margas scenas de fome porque passaram este
8ll{}O.

Em tempo competente procurarei habi


litar gratuitamente os lavradores pobres com
semente de milho, para que no anno pro
ximo futuro se comece a dar uma grande
extensão a esta preciosa cultura; limitando
me por agora a solicitar uma informação
exacta sobre os quisitos que acima deixo e
xarados. •

Deus Guarde a V. S.° — Palacio do


Governo Civil no Funchal aos 31 d'Agosto
de 1847, — Illm.º Snr. Administrador do
Concelho de ... O Governador Civil, Joze
Silvestre Ribeiro.
–276 —

Aos Administradores de Concelho.

Repartição de Fazenda — Livro 9.°


— N.° 395 — Circular — Illmº Snr. —
Succede quasi todos os dias que a este
Governo Civil venham lavradores pedir a en
trega de predios e bemfeitorias da Fazenda
que outros colonos trazem de arrendamento;
alegando em seu beneficio que os terrenos
não são bem cultivados, nem tão pouco se
sustenta o valor das bemfeitorias, porque os
actuaes arrendatarios são pobres, velhos, ou
descuidades, ao passo que os solicitantes of
ferecem maior segurança ao Estado.
Este negºcio, Snr. Administrador, que
parece ser muito trivial e de pouco momen
to, merece todavia ser sempre considerado
com a mais escrupulosa attenção, pois que,
sob a apparencia de grandes interesses para
a Fazenda, pódem em realidade seguir-se
prejuisos, e por outro lado injustiças, ou pe
lo Inenos despreso das leis da humanidade.
Uma das vantagens que o contracto de
aforamento tem sobre o do arrendamento he
a estabilidade. O foreiro presiste sempre na
cultura do mesmo predio, e por censequen
cia considera-o como propriedade sua, e co
— 277 —

mo tal a trata com amor, tendo tambem a


vantagem de adquirir um mui cabal conhe
cimento da natureza do terreno, e de o be
neficiar de anno em anno. O ar, endatario
porém vive sempre na incerteza, e a expi
ração do praso do seu contracto he uma cri
se que ele aguarda com susto, porque a esta
hora tem talvez que largar a terra que cul
tivou com esmero, para a entregar a um
competidor mais feliz, O arrendatario está
á mercê da avidez do proprietario, e dos ma
nejos interesseiros de mil concorrentes
Que convém pois fazer para melhorar a
condição do arrendatario ? Um proprietario
particular, deverá attender a que a instabili
dade he o vício dos vicios em todas as cou
sas, e que para colher até certo ponto do
arrendamento as mesmas vantagens que da
emphyteuse, he mistér conservar o mesmo
cultivador o maior espaço de tempo que lhe
fôr possivel cerrando o coração a esse des
graçado prurido da sêde de ouro, que con
duz a despedir uma familia desvalida, para
receber de um invejoso, ou de um atraves
vessador astuto mais uns poucos de ceitis, ou
de grãos de trigo.
A Fazenda deve regular-se pelo mes
– 278 —

mo principio e eu desejo que os Surs. Admi


nistradores de Concelho, quando houverem de
informar sobre estes negocios, procuram con
ciliar os interesses da Nação com os senti
mentos da humanidade, para que já mais suc
ceda que uma familia pobre seja expulsa de
uma propriedade, de cuja cultura tirava a
subsistencia, e em cuja casa se abrigava e
vivia.
Se um colono não cultiva devidamente
a terra, seja elle advertido, e admoestado
para desempenhar o seu dever; se elle, em
vez de sustentar o valor das bemfeitorias, as
prejudica e estraga, seja forçado a pôr tudo
no primitivo estado, e se por ventura se mos
trar incorrigivel, seja então expulso, e obri
gado a indemnisar a Fazenda.
Se os contractos primitivos forem sem
prefeitos nos devidos termos, jámais appare
cerá a necessidade de expulsar colonos, pois
que n'essa hypothese só se entregarão bem
feitorias a bons colonos, quero dizer, a co
lonos que tenham uma boa fiança, e gozem
do eonceito de bons cultivadores.
O que deixo dito he bastante para que
os Snrs. Administradores dêem a este nego
cio a attenção conveniente.
— 279 –

Deus Guarde a V. S."—Palacio do Gover


no Civil no Funchal 13 de Janeiro de 1848.
— Illm.º Sr. Administrador do Concelho de..
O Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
---=<><><>---

A L V A R Â.

O Governador Civil do Districto Admi


nistrativo do Funchal &c.
Convencido das vantagens que resulta
rão a este paiz da cultura do milho, e es
tando disposto a não afrouxar no empenho em
que tenho lidado de a promover eficazmente:
Resolvi dar conhecimento ao publico das
informações que obtive oficialmente sobre o
augmento que no anno proximo findo teve a
referida cultura, e circunstancias notaveis que
OCCOFFCT81 Ill.

Para este fim mando dar á estampa


no «Madeirense» () as respostas dos Srs. Ad
ministradores aos quisitos que lhes propuz em
Circular de 31 d'Agosto ultimo, a qual pa
ra maior intelligencia da materia será trans
(*) N.° 49 — de 29 de Janeiro de 1848.
– 286 –

cripta na sua substancia, e em seguimento


deila os extractos mais importantes das in
formações oficiaes.
Um exemplar do «Madeirense», onde
forem insertos estes esclarecimentos, será en
viado aos Reverer dos Fãrechos, Presidentes
das Can arºs, Administradores de Concelho e
Regedores de Parochia; pedindo cu a todos
queiram dignar-se de os lêr aos lavradores
de suas respectivas localidades, explicando-os
com toda a clareza, e recommendando zelo
samente uma tão vantajosa cultura.
Não escapará á penetração de S. S."
que a falta de aguas para regas difficultou
muito a sementeira do milho, ou tornou es
cassa a sua producção. Esta circunstancia
deverá induzil-os a recommendar aos povos
que não devastem as mattas das serras, que
attrahem as chuvas aos campos; — que tra
tem de plantar arvoredo; que procurem appro
veitar todas as aguas que ainda estão no ca
so de o ser, ou vão perder-se no mar. — Será
tambem esta a occasião de observar-lhes que
n'um paiz tão quente como este, convirá que
a sementeira do milho se faça muito mais ce
do do que nos paizes frios; e quem sabe se
virá tambem a proposito fazer-lhes sentir a
— 281 —

falta de actividade, a indolencia, a misera


vel incuria dos moradores do campo, que,
em tendo que comer para um dia, se aban
donam ao occio, e ao estupido goso do far
niente?
Para mais animar esta preciosa cultura,
pediria eu a todas as Camaras, que, em ob
servancia das insinuações da minha circular
de 27 d’Outubro de 1847, adiantassem aos
lavradores pobres algum milho; — e aos Snrs.
proprietarios rogára encarecidamente que be
neficiassem os seus colonos habilitando-os a
poderem lançar á terra uma porção dessa se
mente.

He mistér que os lavradores se vão a


costumando a esta cultura; que em elles ad
quirindo o habito, e reconhecendo pratica
mente as suas vantagens, obedecerão muito
naturalmente, e sem dependencia de instiga
ção ás inspirações de seus interesses.
Dado no Funchal aos 15 de Janeiro de
1848. — Joze Sllvestre Ribeiro.

—=> "gs<=

Ao Ministerio do Reinº.

4.º Repartição — Lº 3.° — N.° 11 —


- 282 —

Illm.º e Exmº Snr. — O milho he o princi


pal alimento da classe pobre dos moradares da
Madeira e Porto Santo: infelizmente porém
tem esse genero sido muito pouco cultivado
nestas ilhas, as quaes por esse motivo são for
çadas a importal o todos os annos em grande
quantidade. •

Conhecedor desta circunstancia, tem si


do o meu mais fervoroso empenho promover
a cultura do milho nestas possessões portu
gnezas, e lisongeio-me de poder asseverar a
V. Exc." que já no anno passado a cultura des
te genero deu mais alguns passos do que nos
annos anteriores.
Mas este progresso, que muito me com
prazo de assignalar, he nada em comparação
do muito que resta a emprehender; razão es
ta porque me dou hoje por obrigado a solici
tar de V. Exc." as duas seguintes providen
cias, tendentes a animar fortemente a men
cionada cultura:
1.° — Que V. Exc." se digne de obter
do Poder Legislativo a providencia de ser
isempto do tributo dos disimos todo o milho
que as ilhas da Madeira e Porto Santo pro
dusirem por espaço de 10 annos, a contar do
presente anno.
– 283 –

2.° — Que V. Exc." haja por bem or


denar aos Governadores Civis de Ponta Del
gada e Terceira que promovam nos seus Dis
trictos, entre os lavradores e proprietarios,
donativos de milho, devendo eles, Governa
dores Civis remetter-me quaesquer porções
desse genero que obtiverem, para eu as dis
tribuir aos cultivadores pobres do meu Dis
tricto na proxima futura sementeira do cor
Tente afin0.

Digne-se V. Exc." de acolher benigno as


minhas supplicas em beneficio desta importan
te parte da Monarquia Portuguesa.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 27
de Janeiro de 1848. — - Illm.º e Exm.º
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino. — O Governador Civil,
Joze Silvestre Ribeiro.

*--**@<><>----

AO PUBLICO.

(AGRICULTURA)

Nos derradeiros annos da sua vida, um gram


de Cidadão Romano, Catão o Censor, temendo a
rivalidade de Carthago, terminava sempre os seus
– 284 —

discursos dizendo: Delenda Carthago.


Se he licito que os humildes aproveitem os
exemplos dos grandes homens, direi eu que o
meu «Delenda Carthago » na Madeira será sempre:
«promovei a agricultura.»
Perseverando neste empenho, dou-me por
ebrigado a fazer chegar ao conhecimento do pu
blico um interessante oficio, que acabo de rece
ber do muito habil e zcioso Administrador do Con
celho de Sant'Annna, o Snr. Luiz Augusto Accia
ioly.
N’esse oficio estão consignadas as explicações
de dous lavradores da ilha de S. Miguel, ora resi
dentes entre nós, sobre o modo pratico da cultu
ra do milho. — Ha uma grande analogia entre o
clima des Açores e o da Madeira; e daqui vem que
essas instrucções podem ser applicaveis á Madeira.
Quereis saber se ho ou não do interesse da
Madeira promover eficazmente uma tal cultura?
Considerae que esta ilha despende todos os annos o
melhor de meio milhão de crusados com o milho
que importa para consummo dos seus habitantes.
•••••=e+u=>++++++>

Nesse mesmo oficio porém se toca um ponto


–285 -

de grande transcendencia , qual he a necessidade


de despertar fortemente os Snrs. morgados e gran
des proprietarios a elharem com seriedade para os
desvelos, trabalho e lidas, a que indispensavel
mente devem consagrar-se, se quizerem augmen
tar os seus rendimentos — evitar a emigração de
innumeras familias — e promover o desenvolvimen
to da riqueza deste bello paiz, abençoado pela na
tureza, quanto desajudado dos bens serviços dos
homens.

« Faça-lhes vêr, diz esse oficio, que he pre


{
ciso semear para recolher; — que as nossas ser
((
ras estão despovoadas, e he preciso arborisal-as;
« — que ha muitas aguas perdidas que se pódem
« aproveitar; que ha instrumentos de agricultura
((
que se podem introduzir entre nós; — que ne
« norte da ilha é preciso substituir os castanheiros
“ que se estão a secar, por outras arvores que sus
« tentem as vinhas, &c. »

Eu tinha lamentado a indolencia da generali


dade dos lavradores, e o Snr. Administrador de
Concelho responde-me, com louvavel franqueza,
que não nasce disso o mal, mas sim da ignorancia
e da falta de recursos daquella infeliz classe; e que
os grandes proprietarios e morgados, como maiº
–286 –

instruídos e mais poderósos, são quem pode ope


rar o melhoramento da agricultura, reunindo-se em
associações, cuidando dos interesses communs, não
se limitando a consummir os poucos rendimentos
que lhes chegam ás mãos, mas tratando de fazer
render muito mais as suas terras; c de tornar mais
felizes os seus caseiros ou colonos, com a sua re
sidencia entre elles, com os seus conselhos, ensino
e SOCCOrrO.

Ponderando o muito que os individuos podem


fazer, independentemente dº Geverno, pergunta:
« Precisou por ventura Luiz d'Ornellas e Vas
e concellos de auxilios ou providencias do Governo,
« para fazer das felpas mais ingratas da Madeira
« uma das mais formosas e rendosas propriedades
« que tão util está sendo a toda essa cidade.? »
Oxalá que esse interessantissimo oficio, no qual
são expostas proveitosas verdades, com o mais ar
dente amôr da patria ; oxalá digo, que elle seja
lido, º meditado, por todos os Srs. morgados e
proprietarios! Queira o ceo que essas verdades ca
lem nos seus animos, tanto mais quanto ellas não
são dictadas pela intenção de censurar, senão de
melhorar a sorte dos povos.
Palacio do Governo Civil do Funchal aos 23
— 287–

de Fevereiro de 1848. – O Governador Civil , Jo


sé Silvestre Ribeiro

••••••

Oficio a que se refere a Allocução supra:

1.° parte: Instrucçõos sobre a cultura do milho.


Illm.º e Exm.º Snr. — Lembrado da recom

mendação de V. Exc.", logo que aqui cheguei


consultei os dois lavradores dos Açôres sobre a
cultura do milho, e ºs interroguei sobre quantas
circunstancias me occorreram a tal respeito, para
poder assim, ampliar as noticias que já a este res
peito tive a honra de dár a V. Exc."; e colligi e
seguinte.
O adubo mais proprio para a cultura do mi
lho he sem contradição a rama de tremoço, e quan
to mais quente fôr o Paiz, e menos aguas de
regadio tiver, tanto mais convirá o tremoço, por
ser planta muito fresca e cheia de succo. Os es
trumes animaes que empregâmos, com qualquer
calôr se tornam tão seccos que augmentam a pre
cizão de regar as plantações. Convirá aqui entre
moçar as terras nos mezes d’Outubro, Novembro e
– 288 –

e este processo é mui facil principalmente onde se


póde trabalhar com arado, que deve ser mais li
geiro do que aquelles de que uzamos; basta um
só córte d’arado para o tremoço, e não deve ter
mais d'um palmo de profundidade quandº muito;
lança-se-lhe o tremoço depois, e fica a sementeira
prompta. Por meados de Abril deve estar em
flor o tremoçº, e então se mete de novo o a
rado á terra que se vae enregando na direcção
que melhºr favor dér a agoa de regadio. Muitas
vezes acontece, quando e tremoço está muito viº
çozo, ser precizo meter segunda vez o arado no
mesmo sulco para descubrir bem a terra. e n'esse
mesmo suico se vac lançando a semente do milho
do modo seguinte; atraz do arado vae um homem
com um pequeno cesto d'estrume muito bem cor
tido, e na distancia de dois palmos vae deitando
uma mão cheia d'estrume no sulco; atraz deste
Vae outro com a Semente e sobre cada mão cheia
d’estrume doita duas ou tres sementes; o arado.
volta ao lado d'aquelle rego e com a terra que vae
levantando cobre o rego que se acabou de plantar:
este segundo fica sem semente, mas no terceiro tor
na-se a praticar o mesmo que no primeiro, e as
sim successivamente. D’ste modo, em poucas ho
– 289 —

rs, se p'anta um grande campo de milho. Parte


do tr...logo fica de paixo da terra que o arado le
vantou e parte acamado sobre ella , e espesinhado
pelo gado. Assim fica a plantação, até que pas
sados pouco mais ou meuos seis semanas e quan
do o milho tem um palmo d'altura, he chaçado,
isto he, desembaraçadº com a enchada, da rama
e terra que lhe cahio no rego, a ponto de o dei
xar com as raizes quazi descubertas; e como este
processo vem a ser feito em Maio, tempo em que
não ha ainda grandes calores e sempre cahe algu
mas humidades, não he natural que o milho sin
ta, e antes fortifica melhor porque as raizes
profundam naturalmente para ir procurar a frescu
ra da terra e a parte dos treinoços que ficºu al
terrada. Nesta occasião da primeira sacha dei
xa-se um só pé em cada logar. Passados quinze
dias torna a chegar-se a terra para o milho, e
nesta occasião se deixa o espaço que fica entre re
go e rego Plantadº, mais baixo para a agua de
rega, de modo que a linha onde está o milho, he
a que fica mais levantada. Este he o systema que
seguem nos Açores, e se a experieneia nos mostrar
que elle convém para aqui, muito barata fica a
tal plantação, porque emprega pouco trabalho bra"
--230 —

çal e pouco estrume. A terra fica prompta para


trigo no anno seguinte. O milho amarello das ilhas
será talvez o melhor para semente, porque não al
tea muito, e devemos ter isso em vista nas terras
altas come quasi todas as nossas. Tambem o mi
lho de sequeiro de Portugal nos póde servír muito,
porque produz bem e o pé não sobe de dous a tres
palmos; eu lancei algum á terra no anno proximo
passado, e sem lhe chegar agua tive boas maça
rocas e bem cheias. Este carece de repetidas mon
das para n㺠ser abafado pela erva.
Nas terras onde não póde trabalhar o arado,
entrega-se á enchada a torra, e deita-se nos regos
o tremoço, mas sempre o punhado d'estrume en
dº vai a semente. Deste ultimo modo tambem já aqui
vi plantar com optimo resultado. Em regra geral, a
terra que não produz bem o tremoço não produz bem
o milho. Em quanto a maçaroca não estiver completa
mente cheia he mais seguro não cortar as folhas nem
a espiga. Quando aqui chegaram estes lavradores
I1O anuº passado, acharam ainda na terra algumas

plantações de milho, e admiraram a bellesa e força


dellas, quando foram informados dos pessimos estru
mes que se haviam empregado, e viram o mau
systema que se havia seguido; isto he mais uma
– 2° 1 --

pºs: de gº o nosso terreno tambem he mni prº


priº para o mailino, e esta plantação poderia ser
ainda salvadora para nós se todos os proprietarius
fizessem como Laureano da Camara.

2.° parte : Brado aos Snrs. morgados e proprietarios.


Permitta V. Exc." que eu aproveite esta occa
sião para, fundado no conhecimento que tenho das
cousas de lavoura da nossa terra, lhe dizer que
não acho bem exacto o juiso que V. Exc. faz dos
lavradores na sua Circular de 18 de Janeirº; os
lavradores, principalmentº do Norte da ilha são ac
tivos e trabalhadores a não poder ser mais, porém
são ignorantes e não tem meios para fazer ensaios
e arriscar capitaes. D'aqui nasce todo o nosso
mal e quem o podia remediar, que eram os pro
prietarios e morgados, não cuidam disse; he a es
ses que com muita justiça se póde applicar o – far
niente — , V. Exe." ajguem já a Madeira deve tanto
seria o nosso regenerador se podesse fazer acor
dar esses senhores do tºthargo em que jazem fa
zendo-lhes vêr que he preciso semear para recolher,
que as nossas serras estão das povºadas, que ho pre
ciso arborisal-as, que ha muitas aguas perdi as que
se pódem aproveitar, que ha instrumento. d'agri
-292

cultura que facilitam o trabalho do lavrador, que


se pódem introduzir entre nós, que no norte da ilha
he preciso substituir os castanheiros, que se estão
a seccar, por outras arvores que sustentem as vi
nhas, e finalmente uma infinidade d'outras cousas
que para se fazerem he preciso que º colono seja
ajudado pelo senhorio.
Se os proprietarios se reunissem em socieda
de e cuidassem nos seus interesses communs, ain
da este paiz podia ser muito feliz, pois para isso
só falta, que quem póde, queira. Para desculpar
mos a nossa indolencia, queixamo-nos do Governo
e dos colonos, do Governo, que nos tem feito,
quasi sem excepção, quanto lhe temºs pedido, e
dos colonos que morrem com a enchada na mão!
A culpa de todos os males da nossa agricultura de
ve recahir inteira sobre os proprietarios das terras
que se limitana a consumir o pouco que lhes chega
á mão e não curam em fazel-as render mais. Pre
cisou por ventura Luiz de Ornellas e Vasconcellos
d'auxilios do Governo, para fazer das felpas mais
ingratas da Madeira uma das mais formosas e ren
dosas propriedades, que tão util está sendo a toda
essa cidade? ainda ahi foi preciso certamente em
pregar avultados capitaes; mas nos bons terrenos
— 293 —

da Madeira, bastam bons conselhos aos lavradores,


e soccerros tão pequenos, que estão ao alcance de
quasi todos os proprietarios.
Finalmente Senhor, queira V. Exc." dizer a
esses Senhores que comparem os róes de seus ren
dimentos d'ha dez annos a esta parte, e vejam a
crescente decadencia em que vão, e reconheçam
a mina que lhes está eminente, que só delles de
pende melhorar de sorte. He triste, Exm.º Snr.
que n'um dos melhores paizes do mundo, como
este onde em todas as estações a terra produz al
guma cousa, morra gente de fome. .
Queira V. Exc." empregar os seus........
e esforços para fazer conhecer aos nossos grandes
proprietarios e morgados, quaes os seus verdadei
ros interesses: se V. Exc." nada conseguir, fica
lhe a paz da consciencia, e esses que hoje dormem
na indolencia algum dia dirão — Bem dizia Joze
Silvestre Ribeiro.
Deus Guarde a V. Exc "— Administração do
Concelho de Sant'Anna aos 15 de Fevereiro de
1843. — Illm.º e Exm.º Snr. Conselheiro Governa
dor Civil. — O Administrador do Concelho, Luiz
Augusto Acciaioly.
-----…<><><>----
— 294 —

QUESTÕES ECONOMICAS
E •

CONi M # R CIO.

*********************

Pa Camara Municipal do Funchal.

Illm.º e Exmº Snr. — A situação cri


tica em que se acha este Districto ameaça
do da fotae, visto a escassez de cereaes que
ha por toda a parte, não permitte que se
olhe com indiferença para a exportação da
mui diminuta quantidade d'elles que ainda
existe, e por isso convocando hoje para uma
sessão extraordinaria a Camara, a que pre
sido, deliberou ella o que consta da copia
junta, bem certa de que V. Exc.", que tan
to a peito tem o bem deste Districto, fa -
rá cessar a exportação dos mantimentos in
dispensaveis para a sustentação dos povos
d'elle.
Deus Guardo a V. Exc.° — Funchal 19
— 293 —

d'Outubro de 1846 — ilm.º e Exmº Snr.


Conselheiro Joze Silvestre Ribeiro Governa
dor Civil deste Districto — João Joze Bet
tenCORtrt,

(Copia)=Tendo o Snr. Presidente fºi


to vêr á Camara, que servindo como Admi
nistrador do Concelho, soubera pelos ofi
ciaes de diligencias d'aquella Repartição, e
por via d'outras pessoas, que havendo mui
to poucos cereaes no mercado, e havendo
projectos d'exportação, como já hje come
çou a realisar-se para Canarias, havia con
venticulos entre o povo com o fim d'impe
pedir á força a exportação, e sendo geraes
os clamores para evitar que se diminuam,
por via d’ella, os cereaes necessarios para o
consumo, e assim o mal eminente d'uma fo
me provavel, em consequencia da falta
da batata ou semilha, e que por infor
mações seubera que os cereaes que ha no
mercado não darão provavelmente para mais
de dois mezes de consumo, julgára do seu
dever convºcar extraordinariamente a Ca
mara para se tomarem as providencias que
o bem do Município imperiosamente exige
— 196 —

A Camara tomando em consideração a ex


posição do Snr. Presidente, attendendo a
que, segundo tem tambem chegado ao co
nhecimento de cada um dos vereadores,
são verdadeiros os factos por elle referidos,
e mui seria a crise em que nos achamos,
e que isso mesmo se prova pelo preço su
bido a que tem chegado os cereaes: e at
tendendo outro sim a que, em consequen
cia da doença que atacou as batatas ou se
milhas, ha escasseado cºnsideravelmente es
te producto, havendo apenas o necessario
para semente, attendendo a que, em cir
cunstancias extraordinarias, he necessario
recorrer a providencias tambem extraordi
narias, para as quaes está authorisado S.
Exc." o Governadºr Civil pelo art.° 234 do
Codigo Administrativo, deliberou que se lhe
oficie afim de que se sirva prohibir a ex
portação de todos os cereaes em grão ou
por qualquer modo manufacturados, das ba
tatas ou sem ilhas, e de todos os eutros ge
neros que possam servir de pão, excepto os
que forem absolutamente precisos para con
sumo dos navios, não se applicando esta ex
cepção és batatas, — Bettencourt, — #a: a
das, — Menezes — Gonçalves d Orneliaº. —
— 297 —

Monteiro Teixeira. — Gomes, — Cavalleirº.


—----—

A Camara #inicipal do Funchal.


4.º Repartição — Lº 1.° — N.° 451
— Illin.° Snr. —Tive a honra de receber
esta manhã o cficio que V. S." me dirigio
em data de hontem acompanhando copia da
deliberação tomada pela Camara Municipal
em sessão extraordinaria do mesmo dia,
mediante a qual se me faz sentir a neces
sidade de adoptar providencias, que obstem
á exportação de cereaes, attenta a falta
que desses generos experimenta actualmen
te o paiz.
Adherindo de convicção á importancia
das considerações que determinaram o expe
diente que a Camara adoptou, he meu dever
transmittir-lhe a expressão do firme proposi
to em que estou, de pôr em acção as attri
buições que a lei me confere, para preve
nir que a carencia de generos de primeira
necessidade venha aggravar a mui deplora
vel situação, a que vejo redusidas as clas
ses menos abastadas deste Districto, - º
que, neste sentido, considerarei sempre cº"
— 298 —

no rigorosa obrigação cooperar com a Mu


nicipalidade para evitar este acrescimo de
males que ella receia.
Olhando este negocio por todos os lados,
convem ponderar que sendo ele de summo
melindre, e não se dando até agora senão
um caso de exportação de trigo, essa mes
ma mui limitada, por que a alta dos pre
ços dos generos cereaes não convida os es
peculadores a leval-os a outros paizes, bom
he que, antes de tomarmos definitivamente al
guma resolução, collijamos todos os dados
estatísticos, que teňdam a demonstrar o es
tado actual do mercado, e a pôr em toda
a luz a importante questão economica que
ora nos occupa; porque, como facilmente
V. S." reconhecerá, as providencias recla
madas pela Camara são de natureza tal, e
affectam tantos interesses differentes, e to
dos tão attendiveis, que só uma extrema
necessidade as pode justificar.
Não obstante o que deixo exposto,
não hesito em declarar a V. S." que se o
exame e indagações, a que vou desde já pro
ceder, derem um rezultado que comprove a
falta dos cereaes suficientes para consumo
do paiz, tomarei logo, de accôrdo com a
— 299 –

Camara Municipal (com a qual terei mes


mo uma conferencia em tempo opportuno)
as medidas que se julgarem convenientes,
em quanto o mercado não estiver mais a
bastecido, e não appresentar uma apparen
cia, que faça cessar o receio de vermos fal
tar a subsistencia indispensavel aos povos do
Districto.
Deus Guarde a V. S." — Palacio de
Governo Civil no Funchal 20 d Outubro de
1846 — illunº "n". Presidente da Camara
Reuniepal do Funchal. — O Governador Ci
vil, Joze Silvestre Ribeiro.
-->{# <>…--

Ao Administrador Geral da Alfandega.


4.° Repartição — Lº 3º – N.° 1264
— Illm." Snr — A Camara Riunicipal d’esta
Cidade, movida de mui louvavel solicitude
pria subsistencia dos povos, acaba de repre
sentar a necessidade de se prohibir a ex
portação de todos os cereaes, em grão ou
por qualquer modo manufacturados, bem co
no de batatas ou sem ilhas, e de todos os
outros generos que possam servir de pão;
com a unica excepção do que fôr necessa
— 399 —

rio para o consumo dos navios, entendendo


se todavia que esta excepção não se applica
ás batatas ou semilhas.
Como porem este melindrozo assumpto
careça de ser examinado por todos os lados,
e convenha antes de tudo conhecer-se ca
balmente o estado do mercado; pois que a
prohibição da exportação só póde ter logar
em apertadissimas circunstancias, e de natu
reza tão grave que possam justificar uma
providencia, essencialmente attentatoria da
liberdade de commercio: occorre-me rogar
a V. S." qneira ter a bondade de fornecer
me noticia da porção de trigo, milho e fa
rinha que existe actualmente, despachada
para consumo e ainda em poder de negoci
antes — bem como da que existe em deposi
to, sob a fiscalisação da Alfandega — e a es
timativa da que poderá achar-se espalhada
á venda nas diversas freguesias da ilha.
Na occasião em que V. S." se dignar
remetter-me estes esclarecimentos, folgaria
muito que se servisse de ºs acompanhar de
quaesquer observações, que a este respeito
se lhe oferecessem.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do
Governo Civil no Funchal 21 d'Outubro de
— 301 --

1846. — Illm.º Snr. Administrador Geral da


Alfandega do Funchal. — O Governador Ci
vil, Joze Silvestre Ribeiro.
---==><><>=

Do Administrador Geral da Alfandega.


Illustrissimo e Excellentissimo Senhor
— Accuso a recepção do oficio de V. Exc."
de 21 do corrente, e, em solução ás requi
sições nelle feitas, transmitto a V. Exc." o
incluso mappa do trigo, milho e farinha de
trigo que julgo existir nesta ilha, no qual
se vê haver em deposito sob a fiscalisação e
guarda desta Alfandega — 303 moios e 17
alqueires de trigo.
Em quanto á existencia destes generos,
depois de despachados para consummo, não
tenho dados certos para affiançal-a como exac
ta, por isso que já não são fiscalisados por
esta Repartição; — porém segundo o calculo
aproximado que d'essa existencia tenho fei
to, ouvindo para isso algumas das pessoas
que della melhor conhecimento pódem ter,
e sabendo por declaração dos proprios donos
as quantidades que teem em ser nos seus ar
marens, — julgo haver — dos cereaes já des
" – 302 –

pachados para consummo — 470 moios de


trigo, — 754 moios de milho — e 682 bar
ris de farinha — e dos espalhados á venda
pelas diversas freguesias da ilha — 200 moios
de trigo, 500 moios de milho — e 500 bar
ris de farinha, como tudo mostra o referido
mappa, no qual não incluo a estimativa da
existencia dos cereaes de producção do paiz
no corrente anno, que se póde mui bem cal
cular ainda para mais de metade do seu pro
ducto, — nem a da cevada, centeio e avêa
geirapossa
que comohaver, tanto de producção estran
nacional. •

A vista pois destes dados não suppo


nhº o estado do paiz assustador por falta de
mantimentos, não só porque ha uma quan
tidade de cereaes suficiente para o consum
mo d'alguns mezes, mas porque sei que di
versas cargas de grão são aqui esperadas do
norte de Portugal, de São Miguel, dos Es
tados Unidos, de Saffi e portos do Micditer
raneo, que em bem pouco tempo abundarão
o mercado — circunstancia que se dá sempre
que o preço deste, convida o commercio a
novas transacções e especulações.
Não posse deixar de dizer a V. Exc."
que entendo fóra de todo o lugar, quº des
— 303 —

de já se prohiba a exportação das batatas


ou semilhas, até mesmo para o consummo
dos navios, por que, não obstante não ser
tal exportação extraordinaria, quando tenha
logar essa prohibição, na verdade attentato
ria á liberdade e aos direitos adquiridos do
commercio, será sem duvida substituida a
exportação d'esse genero pela de alguns ou
tros como ervilha, feijão, aboboras e outras
verduras e legumes, ou mesmo pela do ar
roz e varios outros mantimentos que se achem
em deposito e cuja reexportação não possa
ser vedada ou restricta em vista dos provi
dentes Decretos de 22 de Março e 10 de
Julho de 1834 que regularam o porto fran
co, extensivo á Ilha da Madeira pela Carta
de Lei de 20 de Fevereiro de 1835, vindo
por tanto a ser igual o resultado da providen
cia reclamada, pois que tanto nos abastece a
batata ou semilha, como os outros generos de
que, em consequencia da prohibição da ex
portação desta, ficariamos privados pelo meio
da reexportação e exportação delles.
A meu vêr da grande vantagem que tem
porariamenie se oferece ao commercio aug
mentando o preço dos generos de primeira
necessidade pela escassez delles, he que re
— 364 —

sulta a maior prohibição que póde haver na


sahida dos mesmos generos, por que se o ne
gociante especula em transacções destas para
o exterior, ou he por que no commercio não
ha falta desses generos, — ou por que elle
prevê que grande abundancia está a cahir no
mercado, cujo equilibrio está no preço regu
lador, que torna mais ou menos afluente na
praça o genero de que ha necessidade ou a
bundancia.
A vista do que deixo dito concluirei,
dizendo a V. Exc." que, com quanto seja mui
louvavel o cuidado que toma a Camara Mu
nicipal pela subsistencia dos povos, me não
parece de necessidade que se tome desde já
a providencia que pede — na 1.° parte, em ver
dade, attendivel em mais apuradas circuns
tancias.
Deus Guarde a V. Exc" = Alfandega
do Funchal, 23 de Outubro de 1846, =
Illmº e Exmº Snr. Conselheiro Governador
Civil deste Districto. = O Administrador Ge
ral da Alfandega do Funchal, Biogo Telles de
Menezes.
– 305 –

Da Associação Commercial.

Illm.º e Exmº Snr. — Em virtude do officio


de V. Exc." de 21 do corrente, expuz á conside
ração da Meza da Direcç㺠da Associação Com
mercial a materia sobre que V. Exc." se dignou
ouvil-a. Não confiando, porém, sómente de seu
humilde juizo, objecto de tamanha gravidade, con
sultou a Assemblea Geral; e depois de madura
discussão, fixou suas ideas, encarregando-me de
transmittir a V. Exc.° a sua opinião.
Supposto seja mui louvavel o fim que a Illus -
trissima Camara do Funchal teve em vista na me
dida suggerida a V. Exc.", nenhum efeito póde
ella produzir, nem prohibindo-se a exportação
dos cereaes, nem dos gomeros produzidos no paiz.
Empecer a sahida d’aquelles he attentar á liber
dade do commercio; he offender uma Lei bene
fica, sabia, e protectora, não só do commercian
te, mas tambem do paiz: vedar a exportação des
tes, he desanimar a nossa pequena agricultura,
he fazer pezar mais sobre o povo o mal que a
Illm." Camara pretende remediar. Quanto maior
valor tem os productos de qualquer paiz, mais
avulta a sua riqueza: então a agricultura prospé
— 336 — |
ra, a industria desenvolve-se, o commercio dila
ta-se, e o pove he feliz. Na Madeira temos um
exemplo pratico: a sua opulencia d'outrora foi decres
cendo á medida que o seu genero de mór producção
foi baixando de preço. He hºje pobre, porque o
preço do seu vinho nem ao menos dá para a des
peza de sua cultura.
Por muitas vezes o mercade da Madeira tem
tido menor quantidade de viveres: algumas ve
zes se tem dado todas as circunstancias da actua

lidade, porém nunca sofremos os horrores da fo


me. A escassez temporaria de qualquer genero
he sempre motivo forte para o augmento de seu
preço: he esta vantagem que attrahe a influencia
dos especuladores, e da amontoação dos generos
resulta a abundancia, e d’esta a commodidade dó
seu preço.
A Madeira, Exmº Snr., tem viveres para
alguns mezes; mas são caros, porque pagam pc
zados impostos; são caros pelas e ircustancias; são
Caros, porque cada vez maais se apuram os meios
pcºuniarios do consummidor. Não ha em que o po.
vo empregue seu braço occioso: as producções do
paiz são mal reputadas, não ha bastante indus
tria; por conseguinte faltam-lhe todos ºs recursos,
— 307 —

e tem fome. A Illmº Camara cumpre, porque


póde, sanar um destes males.
Supponha-se, em fim, a fome imminente:
como remediar este mal? Ha-de ser só o com
mercio que sacrifique á utilidade publica o seu
interesse e conveniencia? Contribua cada um
com o seu contingente. Seja o commcrcio com
pellido a vender, quer á Camara, quer ao Go
verno , o seu genero pelo preço que lhe dá o ex
portador, e pelo mesmo seja vendido ao publico.
A Camara, porém, que alivie o povo dos peza
dos impostos que paga pelos cereaes que consomme;
que faça totalmente livre o milho, que he o ali
mento da classe pobre, quer haja abundancia,
quer escassez; que diminúa o direito enorme so
bre o trigo, que sendº 33090 por moio, confor
me decretou a Lei respectiva, se converteo em
4,3000 rs., com o emolumento da sua arrecada
ção pela Alfandega. Não póde ser nunca barato
o genero que tamanho direito pagar. D'esta fór
ma está prevenido o mal. Não se exportarão ce
reaes; o seu preço será rasoavel, e a fome ficará
n’uma illusão.
Eis-aqui, Exmº Snr., como a Associação
Commercial entendeo que se pedia resolver as pro
-308 —

postas da Illm.º Camara, sem quebra de Lei, sem


ofensa da liberdade de commercio, e sem expôr
o povo á fome. Foi desta fórma que ella pôde
comprehender uma materia sujeita a difuzas dis
sertações. Mas a Associação Commercial, de que
sou orgaõ, reconhecendo a sabia e illustrada in
telligencia de V. Exc.", conformar-se-ha com qual
quer medida que V. Exc." adopte a este respei
to, porque tanto ella, como o povo desta provin
cia, depositam em V. Exc." a mais alta confiança.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 28 de
Outubro de 1846. — lllm.º e Exm.º Snr. Conselhei
<ro Joze Silvestre Ribeiro, Governador Civil do Dis
tricto. – Guilherme Grant, V. Presidente.

-=>$2<=

Ao Ministerio do Reino.

4.° Repartição — N.° 1194 — Hlm.º e Exmº


Snr. – Em 19 do corrente tomou a Camara Mu
nicipal desta cidade a deliberação de me represen
tar a necessidade de prohibir a exportação de ce .
reaes e batatas, attenta a escassez que d’estes ge
neros ha no mercado da Ilha , e o subido preço a
que elles teem chegado. Esta resolução da Cama
ra foi tomada na occasião, em que um navio e5
— 309 –

tava carregando neste porto algum trigo para as


Ilhas Canarias; e em verdade he digna de louvor
a Camara pela solicitude que lhe merecco a in
feliz situação do povo, o qual, estando reduzido
á maior pobreza, não póde comprar o trigo e o
milho, em consequencia da demasiada carestia a
que teem chegado estes generos. E tanto mais
attendivel lhe pareceu esta circunstancia, quanto
se receia que não acudam á Madeira cereaes em
abundancia, sendo certo que em differentes paizes
da Europa se experimenta grande falta.
Lºgo que recebi esta representação da Cama
ra, tratei de proceder ás averiguações convenien
tes, para com todo o conhecimento de causa po
der approvar, ou regeitar a providencia suggeri
da; pois que he este um assumpto sobre maneira
melindrozo, em que a Authoridade se vê coloca
da entre as exigencias da Liberdahe do Commer
cio, e as não menos apertadas da subsistencia dos
povos.
Comecei pois por consultar o Director da Al
fandega do Funchal, e este Funccionario me decla
rou officialmente, no dia 23 do corrente que existiam:
Em deposito sob a fiscalisação da Alfandega,
303 moios de trigo. -
– 310 —

Despachado para consummo, e ainda existen


te em poder de diversos negociantes, 470 moios
de trigo, 754 de milho, e 682 barris de farinha.
Espalhado em pádarias e á venda pelas diver
sas freguezias da Ilha, calculado em 200 moios
de trigo, 590 de milho, e 500 barris de farinha.
Producção do paiz, ainda existente — calcula
da para mais de metade da producção do anno de
1846.
Por estes elementos, dizia o Director da AI
fandega , que podia contar-se com a existencia de
cereaes suficientes para o consummo d'alguns mc
zes, álcm de se esperarem aqui algumas cargas
de grão do Norte de Portugal, dos Açôres, dos
Estados Unidos, de Safi e portes do Mediterraneo,
que em bem pouco tempº tornar㺠mais abundante
O mercado.

E com efeito, já depois da communicação do


Director da Alfandega, chegaram deus navios com
milho, trigo e batatas; sendo o primeiro uma Pe
laca Toscana, que veio de Saffi, com 132 moios de
trigo, e 22 de milho; e o segundo o Hiate — Flor
do Mar — que veio da Terceira com 25 moios de
trigo, 10 de milho e 70 arrobas de batata,
Consultei tambem a Associação Commercial
— 311 --

desta cidade, a qual respondeo nos termos, que


V. Exc." se servirá vêr da copia junta, oppondo
se, bem como o Director da Alfandega á idea da
Camara, em quanto a prohibir-se a exportação de
CCTed CS.

Na presença de todas estas informações, e


depois de maduro exame d’este negocio, tenho re
solvido manter em toda a sua extensão a ampla li
berdade de commercio, que as Leis affiançam, e
só recorrerei ao meio extremo da prohibição, quan
do o mais apertado apuro das circunstancias as
sim o demandar imperiosamente.
E com efeito : não ha abundancia de cereaes

neste mercado, eu bem o conheço — demais d’isso


a carestia excessiva do seu preço está muito fóra
da proporção da pobreza que aflige as classes indi
gentes; no entanto, não seria o arbitrio de impe
dir a exportação assaz poderozo, para melhorar o
estado das cousas, antes pelo contrario o aggrava
ria, por isso que uma tal prohibição importaria o
mesmo que destruir os efeitos do art.° 1.° do de
creto de 20 de Fevereiro de 1835, pelo qual são
admittidos a despacho para consummo, baldeação,
e reexportação, todos os generos, que por qualquer
destas fórmas tiverem despacho nas Alfandegas de
– 312 —

Portugal. Se se realizasse a prohibição, como a


cudiriam jámais ao porto da Madeira os cereaes,
que aqui afluem de diferentes pontos do globo,
remettidos muitas vezes para deposito, até que ao
commercio convenha, ou consumil-os aqui, ou re
exportai-os para outros pontos? Por certo que o
receio da repressão da liberdade do commercio
afugentaria destas praias os navios, que aliás sob
a garantia da Lei nos vem aqui trazer a abundan
cia.
Ainda isto não he tudo. A causa real do mal
que sofre esta ilha he a miseria dos seus habitan
tes , he a fatal circunstancia de que as classes in
digentes não teem onde ganhem um vintem, he a
terrivel estágnação e abatimento dos productos do
seu sólo, he a funesta influencia da doença das ba
tatas; he, em uma palavra, um complexo de ele
mentos, que tem por efeito tornar muito sensivel
aos pobres e em geral a todas as classes o subido
preço a que chegaram os generos da primeira Ile
cessidade. E por ventura será a prohibição da ex
portação a medida propria para destruir , ou ao
menos attenuar o sofrimento do povo? O remedio
heroico he abrir obras de reconhecida utilidade
publica, para proporcionar meios de subsistencia a
— 318 —

milhares de pessoas, que pedem trabalho em vão,


a milhares de pessoas não podem obter dinheiro
para comprar um bocadinho de pão, e que, obri
gados pela fome, e pela desesperação, abandonam
a sua belia patria, emigram, e vão demandar as
praias de Demerara. O remedio heroico seria tor
nar livre de direitos a importação de cereaes n'uma
terra que os nao produz, senão para tres mezes do
anno; pois que he sempre da maior importancia e
vantagem que sejam commodos em preço os gene
ros da primeira necessidade. Mas esta questãº
carece de ser estudada.

Tambem deve notar-se, que o subido preço a


que aqui teem chegado os cereaes, he fundamento
bastante, para se não rccear que venham especu
ladores buscal-os, pois que he natural que elles
só vão compral-os nos pontos, onde o seu baixo
preço favorece as transacções; e antes pelo con
trario, esta situação do mercado hade chamar
aqui uma grande abundancia, porque o negociam
te corre sempre ao logar onde espera encontrar
maiores lucros.

Eis as razões em que me fundo para não ac


ceder aos desejos da Camara Municipal d’esta ci
dade, com quanto aliás muito louve as suas boas
— 314 –

intenções e solicitude que manifesta pelo bem do


povo.

Por oceºsião porém de dár circunstanciada


conta deste negocio a V. Exc.", e de º submetter
á sua sabia consideração, cumpre-me rogar a V.
Exe-º º mercê de attentar bem sériamente sobre
a deploravel situação da maxima parte dos mora
dores da Madeira, como já tive a honra de
ponderar-lhe. Permitta-me pois V Exc." que no
Vamente insista sobre a indispensabilidade da au
thorisação que pedi, para abrir obras publicas,
e dá trabalho e meios de subsistencia á pobreza,
concedendº-me um credito de 30 contos de reis
dos cofres publicos d’esta Ilha.
E finalmente rogo a V. Exc.º a mercê de
resolver, para o caso de não virem acudindo na
vios com cereaes, e de se realisarem as apprehen
sões da Camara Municipal, qual deve ser o ex
pediente a que devo recorrer, na presença do que
deixo ponderado.
Pºus Guarde a V. Exc." —Funchal aos 31
d'Outubro de 1846. — Illm.º e Exm.º Snr. Mi
nistro e Secretario d'Estado dos Negocios do Rei
"º - O Governador Civil, Joze Silvestre Ribei
TO.
— 315 —

A Camara Municipal do Funchal.


4.º Rep=N.° 434=Lº 1"=Illmº Sr.
=Tendo finalmente colligido as informações
e dados estatisticos, que me eram indispen
saveis para decidir se cumpria adoptar imme
diatamente, ou addiar a providencia propos
ta pela Camara 5lunicipal a que V. S." pre
side, em oficio de 19 do mez passado, de
vo agora cumprir o empenho que contrahi pa
ra com essa digna corporação, dando-lhe con
ta das investigações, a que procedi, e dos
motivos, porque, attentos os resultados des
sas investigações, julguei poder sobrestar sem
risco para o paiz, na adopção do recurso
indicado para obstar á exportação de ce
I'88193. •

Estou certo de que a Camara convirá


comigo que não era possivel prescindir do ex
pediente que adoptei, tendente a esclarecer
uma questão importante: porque complican
do-se esta com os interesses geraes do com
mercio, e com altas questões economico
politicas, e sendo, de mais a mais a provi
dencia suscitada evidentemente contraria ás
Leis que amparam a liberdade commercial
deste paiz, forçoso era examinal-a attenta
– 316 -

mente sob todos os seus aspectos, e em todas


as suas varídas relações.
Isto posto, permitta-me V. S." que lhe
faça aqui um succinto relatorio dos meios,
de que julguei dever auxiliar-me para colher
uma cabal informação ácerca do ponto ver
dadeiramente importante, que nos occupa.
Comecei por consultar o Director da
Alfandega do Funchal, relativamente ao es
tado do mercado; e este funccionario me
declarou oficialmente que existiam no paiz
os cereaes seguintes:
Em deposito sob a fiscalisação da Al
fandega, 303 moios de trigo.
Despachado para consummo, e ainda
existente em poder de diversos negociantes
= 470 moios de trigo =754 de milho =
e 682 barris de farinhas.
Espalhado em padarias, e á venda pe
las diversas freguesias da ilha [por calculo
aproximado ] 200 meios de trigo — 500 de
milho — e 500 barris de farinhas.
Producção do paiz, ainda existente, cal
culado para mais de metade da producção
deste anno, mil e tantos moios de trigo.
Por estes elementos, dizia o Director
da Alfandega que podia contar-se com a exis
— 317 —

tencia de cereaes suficientes para o consum


mo de alguns mezes; e que, além disso se
esperavam diversas cargas de grão do norte
de Portugal, dos Açores, dos Estados Uni
dos da America, de Saffi, e portos do Me
diterraneo, que em bem pouco tempo tor
nariam mais abundante o mercado.
E com efeito, já depois da communi
cação do Director da Alfandega, chegaram
dois navios, que conduziam 157 moios de
trigo, 32 de milho, e 70 arrobas de ba
tataS.
Taes foram os dados mui positivos que
alcancei ácerca do estado do mercado em re
lação a generos cereaes. Estes dados, co
mo estou certo que a Camara reconhecerá,
mostram que não era de absoluta urgencia a
medida solicitada para obstar á exportação de
CCTG3 GS,

Consultei ao mesmo tempo a Associação


Commercial desta cidade, que fez vêr, com
mui bons fundamentos, quão prejudicial seria
a este paiz a medida em questão.
E com efeito: reconhecendo que não ha
abundancia de cereaes no mercado, e que o
preço delles está muito fóra da proporção dos
meios das classes pobres, seria por ventura
— 318 —

o arbitrio de impedir a exportação assaz


poderosa para melhorar este estado de
cousas? Estou persuadido que este recurso
longe de surtir os efeitos que se esperavam,
aggravaria o mal, por isso que iria destruir
os resultados beneficos do artigo 1.° do De
creto de 20 de Fevereiro de 1835, pelo qual
são admittidos a despacho para consummo,
baldeação, e reexportação todos os generos
que por qualquer destas fórmas, tiverem des
pacho nas Alfandegas de Portugal.
Se se realisasse a prohibição poderia
mos acaso esperar que continuassem a afiluir
á Madeira os cereaes que aqui acodem de
diversos pontos do globo, remettidos muitas
vezes para deposito, até que ao commercio
convenha consumi-os ou reexportal-os?
Por certo que um tal expediente afu
gentaria de nossas praias muitos c muitos
navios, que, favorecidos por uma legislação
providente, as visitavam, para fazerem com
nosco um com mercio vantajoso, e derramar
a abundancia no nosso mercado. —Tendo co
mo axioma , que tudo quanto tender a ams
pliar a liberdade commercial he um bem
para a Madeira... não possº deixar de pen
sar que a medida requerida, embora fosse
— 319 —

executada com caracter de provisoria, não


poderia deixar de ser considerada como um
ataque ou violação desse principio de liber
dade ampla para o commercio, que tanto
convém manter; e que os seus efeitos, co
mo sempre aconteceu em causas desta natu
resa, irião muito além do que poderiamos
suppôr, ou antever.
Além de todas estas considerações, devo
ponderar á Camara, que a alta dos preços
dos cereaes não convida á exportação, nem
por modo algum a favorece, como bem o de
monstrou o unico caso de exportação que te
ve logar; porquanto a embarcação que aqui
aportou, para levar uma carga completa
de grão, apenas tomou um insignificante
numero de moios de trigo, para não perder
inteiramente os interesses da viagem.
A vista de quanto deixo exposto, lison
geio-me que a digna Camara, a que V. S."
preside, agora mais bem informada com os
dados positivos que lhe ministro ácerca do
estado do mercado, reconhecerá comigo que,
— em bem para o paiz — não se dava ab
soluta precizão de recorrer á medida repres
siva, que tem feito o objecto da nossa cor
respondencia — medida que só um extremo
– 329 —

apuro do circunstancias poderia justificar, e


que, mesmo assim, ameaçaria de desfavo
raveis alterações o giro commercial tão dil
ficil, em cazos taes, de volver ao seu es
tado, e curso normal.
|
Deus Guarde a V. S." — Palacio do
Governo Civil no Funchal , aos 4 de No
vembro de 1846. — Illm." Snr. Presidente
da Camara Municipal do Funchal. — O Go
vernador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
----…<><><>>>----

Ao Ministerio do Reino.

4.º Rep. - Lº3º-Nº2114 - Illmº e Exmº


Snr. — He incontestavel que vivemos em uma
epocha em que se tem reconhecido a in
dispensabilidade de fixar a mais grave e sé
ria attenção sobre as questões economicas,
como sendo aquelas de cuja acertada solu
ção e applicação póde resultar o progressi
vo desenvolvimento da civilisação dos povos.
— Ai dos Portuguezes, se eles se entrega
rem de todo á parte politica dos negocios
e se entranharem nesse pélago immenso de
odios, de enredos, e de paixões que as luc
tas dos partidºs occasionam, em vez de se
—321 –

consagrarem ao estudo e profundo exame


das necess dades publicas, dos meios de as
remediar!
Movido por estas considerações, e in
fluenciado por taes pensamentos, dei-me por
obrigado a endereçar ás Camaras e Admi
nistradores de Concelho do Districto a meu
cargo uma Allocução, na qual empreguei
todos os esforços possíveis por attrahir a at
tenção daquellas corporações e authoridades
sobre as questões economicas relativas ás es
peciaes necessidades, circunstancias, e ac
tual situação deste Districto, particularisan
do diferentes pontos de exame, e entram
do emo considerações
sobre assumpto. as mais desenvolvidas •

Incluzo tenho a honra de encaminhar


ás mãos de V. Exc." um exemplar dº in
dicadada Allocução, desejando que a sua
doutrina esteja no caso de merecer a sua
sabia approvação. • -

Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 5


de Septembro de 1847. — Illm.º e Exmº
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino. — O Governador Civil,
Joze Silvestre Ribeiro.
O Governador Ciril do Districto do Fun
chal a todas as Camaras, e Administra
dores de Concelho do mesmo Districto.

Desde o dia 26 de Julho findo, em


que se restabeleceu entre nós o Legitimo
Governo de Sua Magestade a Rainha, tem
sido o meu incessante empenho prégar a
paz, a ordem, o esquecimento profundo do
passado.
Desde esse dia esforcei-me tambem por
demonstrar que o Districtº do Funchal só
poderá ser feliz, se os seus moradores pro
curarem, cautelósos e discretos, arredar pa
ra bem longe os horrores da guerra civil,
— aguardar pacificos o desenlace das luc
tas que por máo fado se pelejárem no Rei
no , e dár de mão aos envenenados odios
dos partidos que só servem para amargu
rar a nossa curta existencia, e arrastar os
povos á decadeccia, á miseria, e á anni
quilação.
Ahi estão bem publicos todos os meus
escriptos, a contar da Proclamação do men
cionado dia 26, até á circular aos Snrs.
Administrados de Concelho datada de 7 d'A
gosto, a qual, por obsequiosa intervençãº
– 323 -

do Exm.º e Revdm.° Prelado Diocesano ,


deve ter chegado ás mãos dos Revd." Pa
rochos para geral conhecimento dos povos.
— Faço votos para que jámais possa o meu
brado ser tido na conta de vox clamantis
in deserto; quando porém por fatalidade
do povo forem despresados os meus avisos,
perante Deus e a minha consciencia ficarei
eu tranquillo e sem remorsos, por isso que,
sufocando justificados ressentimentos, falei a
linzuagem desapaixonada da rasão e da veria
de, e dei deliberadamente salutares conselhos.
Suppondo porém que os moradores do
Districto do Funchal serão assaz cordatos pa
ra seguirem a linha de comportamento que
lhes indico, e que por consequencia, desas
sombrados de paixões politicas, lhes fica tem
po, socego, e serenidade de animo para cui
darem séria e profundamente dos seus inte
resses reaes: nesta supposição, digo, he
mister que desde já olhem em torno de si,
vejam qual he a situação da Madeira, qual
o seu futuro, e o que cumpre fazer para me
lhorar a sua sorte.
Comecemos por olhar em torno de nós, e ve
jamos em que situação se encontra a Madeira.
Acaba a maxima parte da sua popula
— 324 —

ção de soltar-se das garras da miseria e da


forne; e ainda hoje. por efeito das privações
e da nociva influencia de ruins alimentos d'a
quelle negro periodo, bastantes victimas vae
cegando a fouce da morte.
Debatia-se ainda a Madeira nos tran
ces da miseria e das privações, quando nos
fins de Abril deste anno um acontecimento
extraordinario de naturesa politica, veio ag
gravar mais e mais a sua situação.
A emigração de innumeras familias da
Madeira para as possessões inglezas das In
dias Occidentaes he a ferida, qne sempre
aberta, sangra sempre, e parece hir debili
tando este corpo já tão enfraquecido
Uma docnça fatal acommetteo as batatas,
e acabou com o pão dos pobres, com o prin
cipal alimento das classes menos abastadas.
He verdade que já este anno em alguns pon
tos, e com particularidade no litoral da Ilha,
parece ter cessado esse flagello; mas ainda
assim o producto d'aquella planta não foi bas
tante para alimentar a população existente.
A agricultura permanéce estacionaria
— a industria não dá um só passso — a ins
trucção publica não tem tido o desenvolvi
mento de que caréce — o commercio jaz
— 325 —

amortecido, e o dos vinhos, fonte principal


da riquesa Madeirense, ha longos annos de
cadente, definha de dia em dia, — e em
geral, uma apathica indiferença, uma in
dolencia sem igual, parece ser o caracteris
tico desta epocha desgraçada.
Eis a situação das cousas no Districto
do Funchal, desenhada sim com traços lar
gos, mas com singela verdade.
Qual futuro nos espera? Um futuro
de miseria, de anniquilação, se em vez de
cuidarmos sériamente de remediar os nossos
males, nos engollarmos na voragem das dis
senções politicas, nos abandonarmos ás fratri
cidas luctas dos partidos.
Que cumpre pois fazer para melhorar
a sorte deste Districto?
Cumpre que todas as Camaras, todas
as Authoridades Administrativas, e em ge
ral todos os cidadãos illustrados, comecem
a reconcentrar toda a sua attenção sobre as
grandes questões economicas, cuja solução se
torna indispensavel para fixar o plano gover
nativo a seguir, e determinar com exacti
dão as regras, segundo as quaes deve tra
trabalhar-se no desenvolvimento da publica
prosperidade.
E quaes questões economicas serão es
sas? Apresentarei algumas.
A organisação da propriedade rustica
deste Districto be por ventura perfeita, ou
carece de ser reformada para bem do pro
prietario e do colono? Por outras palavras:
O systema adoptado em quanto ao modo de
fruir a terra, de desfructar os seus produc
tos, e de distribuir os lucros está acaso em
justa proporção do direito dominical com os
direitos dos colonos?
He suficiente para acantelar todas as
hypotheses, e satisfazer a todos os interes
ses, a legislação e pratica vigente sobre a
guas?
Nada ha que desejar sobre º systema
de irrigação em uso?
Quaes previdencias devem adoptar-se
sobre o plantio do arvoredo? Será bastante
deixar esse cuidado aos particulares? De
verão as Camaras plantar arvoredo em larga
escala nos terrenos concelhíos, ou em outros
que comprem? Quaes serão as providencias
mais eficazes para obstar á devastação das
matas?
Convirá estabelecer uma eschola agro
nomica, theorica e pratica, da qual possam
– 327 -

sahir homens versados na pratica da arte a


gricola, que espalhem conhecimentos que ou
tros não houverem adquirido, luctem á for
ça de conselhos e do seu proprio exemplo,
e até de bons resultados, contra a ignoran
cia, contra os habitos rutineiros, contra as
prevenções e preconceitos dos cultivadores,
generalisando em torno de si os bons me
thodos,
ment feiçooado
e dand
os aper s? to ao uso dos instru
credi •

Convém ou não, sem prejuiso da pos


sivel cultura das batatas, indemnisar as clas
ses pobres da consideravel diminuição de ali
mentos, que ultimamente tem sofrido, em
consequencia da fatal doença que accommet
teo aquella abençoada planta? — Não mos
trou já a experiencia em diferentes pontos
da Madeira, e designadamente no Porto do
Moniz, que a beterraba frutifica entre nós
admiravelmente, e póde fornecer um bom a
limento, na falta das batatas? — Não con
virá, e muito, fazer todos os esforços pos
siveis para dar successivo desenvolvimento ao
ensaio já feito este anno da cultura do ini
lho ?
He ou não indispensavel que se formem
associações para construir novas levadas, e de
– 328 —

rivar fertilisadôras aguas dessas montanhas,


que venham dar vida a immensos campos
que ahi estão sem cultura ?
He ou não proveitoso que se procure
formar associações entre os moradores abas
tados para promoverem a industria ? — He
ou não proveitoso que se estabeleçam compa
nhias, que assegurem ao lavrador um lucro
certo para os productos que tão facilmente
pódem crear, como a cana do assucar, o
café, o oleo de mamona, os bixos da seda,
e da cochonilha, e outros productos? He
ou não proveitoso que ao lado de cada pro
ducção se alevante uma fabrica, a qual ap
proveite as materias primas, dê um destino
lucrativo aos productos e fixe uma certa es
perança, uma espectativa de interesses ao
cultivador ?
A Legislação Commercial da Madeira,
a organisação da sua Alfandega, os direitos
especiaes de importação e exportação: — tu
do isto carece ou não, de modificaçoes, pa
ra bem dos interesses desta Possessão Por
tugueza ?
Para fiscalisar a boa qualidade dos vi
nhos de exportação, classificai-os, contribuir
para que elles adquiram nos mercados estran
–329 •+ *

geiros o credito e reputação que parece ha


verem perdido, principalmente no mercado da
Russia, que na Cidade do Funchal seja es
tabelecida uma Commissão permanente ad
hoc ?
Convirá no mesmo sentido que aos la
vradores vinicolas sejam prescriptas algumas
regras, segundo as quaes devem fazer as vin
dimas, e fabricar os vinhos?
A emigração de colonos para Demera
ra e outras possessões he ou não fatal a esta
Ilha? Julga-se que a população superabun
da, e que se torna indispensavel este meio
de a diminuir? Os cabedaes que os Madei
renses adquirem naquelas possessões, e vem
depois gastar na sua patria — ou os soccorros
que mandam a suas familias — são por ven
tura de tal vulto que compensem os inconve
nientes da emigração ? •

Na supposição de que a emigração, na es


cala em que se realisa, seja uma calamida
de , quaes motivos a occasionou ou promovem ?
Que meios devem empregar-se para a repri
mir ou evitar de todo ?
Estas e muitas outras questões, que tenham
por objecto o melhoramento das vias de com
municação, dos portos, dos cáes, o augmento
– 336 —

da Instrucção Publica &c. &c. — são as que


devem desafiar as cogitações das Authorida
des, e dos homens ilhistrados e pensa dores
deste Districto, a quem não fôr indiff rente
a prosperidade e a gloria de um tão formoso
paiz; valendo talvez a pena que até as Ca
maras Municipaes se combinem entre si, pa
ra estabelecerem premios aos authores de Me
morias, que discorrendo profunda e larga
mente sobre as necessidades do paiz, propo
zessem as providencias indispensaveis para re
mediar os males que se sofrem, e melho
rar a sorte dos povos.
O meu Deus! eu vejo entre as Nações da
Europa um povo, a quem a Nuturesa condemnou
a uma contínua lucta contra um elemento im
placavel; mas esse povo, por muito illustrado,
laborioso, perseverante, e sobre isso pacifi
co, amigo da ordem, e cheio de amor da
patria e de virtudes, tem vencido todos os
obstaculos, tem operado maravilhas no me
lhoramento do seu destino, e ei-lo ahi se a
presenta respeitavel ante o mundo que o ad
mira ! — Sabeis de qual povo eu fallo? Dos
Hollandezes ....... O solo qne habitam
está pela maior parte vinte pés abaixo do ni
vel do mar, contra cujas irrupções necessitam
— 331 —

de construir solidissimos diques, ás vezes de


mais de cincoenta pés de altura, e de cen
to e vinte de largura ! Cousa pasmosa! Só
o estabelecimento desses diques, e o seu
costeio annual de conservação tem absorvido
sommas tão consideraveis, que se tem cal
culado teria sido menos custoso formal-os
com o cobre do dinheiro que se tem dos
pendido! Esse povo heroico está continua
mente pelejando com o mar, e com os
seus rios, mas á força de perseverança, de
trabalho, de engenhosos maquinismos, de
aturada porfia, vae fazendo conquistas de
terreno, que depois reduz a cultura!...
Pois aquelle povo, tão desvantajºsamen
te tratado pela naturesa, que até para cons
truir os seus admiraveis diques, preciza de
mandar vir materiaes da Noruega; — pois
esse povo, digo, para quem a Providencia
parece ter sido madrasta ..... obra prodi
gios de esforço para disputar á furia de um
elemento poderesissimo uns bocados de ter
reno, esgota todos os recursos imaginaveis
por sustentar a sua gloriosa conquista;.....
e a Madeira favorecida com o melhor clima
do mundo, possuidora de um terreno solido
e acuberto das invasoes e estragos do már,
— 332 —

admiravelmente fertil, e proprio para a cul


tura de todas as sementes e plantas das dif
ferentes regiões do globo..... a Madeira,
assim e tão vantajosamente enriquecida pela
providencia, ficará estacionaria, ou antes des
cahirá de dia em dia da sua primitiva gran
deza, desprezando ingrata e descuidada os
mimos com que foi dotada ?
Funchal, no 1.° de Setembro de 1847.
Joze Silvestre Ribeiro.

*--*><><>-----

Portaria do Ministerio do Reino.

3° Direcção — 2.° Repartição — Lº 5.°


— N.° 837 — Sendo presente a Sua Mages
tade A Rainha o oficio do Governader Civil
do Districto do Funchal, em data de 25 de
Setembro ultimo, remettendo copia da allo
cução que dirigira ás Camaras Municipaes,
e Administradores de Concelho d'aquelle Dis
tricto a seu cargo, sobre a conveniencia de
attrahir a attenção dos povos para a solução
das questões economicas, afastando-os assim das
dissensões politicas, que as lutas dos parti
— 333 --

dos occasionam: Manda A Mesma Augusta


Senhora, pela Secretaria d'Estado dos Ne
gocios do Reino de clarar ao referido Gover
nador Civil — que he digno de louvor o inte
resse que toma pelas cousas do seu Districto,
assim como os esforços que faz para melhorar
a sorte dos seus habitantes, correspondendo
por esse modo dignamente as intenções do Go
verno: — que todos os pontos, sobre que elle
chama a attenção dos habitantes merecem ser
muito seria e profundamente meditados: —
e que não cesse de promover o exame e dis
cussão das materias, a que se refere, a fim
de poder melhorar o estado dos seus admi
nistrados, quanto couber nas suas proprias
faculdades, e solicitar do Governo, com per
feito conhecimento de causa, as medidas que
carecerem de authorisação superior. Paço das
Necessidades em 11 de Outubro de 1847.
— Antonio de Azevedo Mello e Carvalho.
*=><><>

DUAS PALAVRAS SOBRE UM ACTO GOVERNATIVO


RECENTE Do GovERNNo HESPANHoL.

As questões economicas são hoje as que mais


importa examinar e discutir, em presença da tem
dencia actual da sociedade.
O Governo da Hespanha acaba de tomar uma
providencia, que por forma alguma deve passar
inobservada, quer seja por que possa dár-se ne
eessidade de tambem a adoptarmos, quer pela
vantagem que sempre se colhe de meditar sobre
o que fazem as outras nações.
Em harmonia com as ideas que por vezes
tenho emittido, julguei dever chamar a attenção
publica sobre um acto governativo, embora de es
tranhos, que no meu entender está marcado com
o sello da mais sabia providencia, e se encami
nha a afastar sérios inconvenientes em materia de
grave momento.
O Governo hespanhol tomando em conta a
inquietação geral dos animos em toda a Europa,
suscitada pelas recentes impressões da carestia e
escassez dos cereaes. que se experimentaram no
discurso do presente anno, lembrou-se de recor
rer a um expediente, que facilita o abastecimen
to publico do trigo em Madrid, e evita um pre
çº excessivo, sem com tude ir buscar a eficacia
d'esse meiº a combinações complicadas, a sacri
ficios inuteis, e a estorvos, que, ofendendo e
– 335 -

commercio , contrariam o desenvolvimento do ín


teresse individual.
Eis o expediente:
«Estabelecer-se-ha em Madrid pºr conta do
Governo um deposito permanente de setenta mil
fangas de trigo, que poderá augmentar progressi
vamente conforme o exigirem as necessidades pu
bicas º

Tal he na sua essencia o expediente a que


recorreo o governo hespanhol; vejamos agora os
seus fundamentos e vantagens, bem como outros
pormenores.
O governo hespanhol entendeo que lhe impen
dia a rigoroza obrigação de assegurar a subsisten
cia da Capital do Reino, consideravel pela sua
numerosa povoação e importancia social; e n'esse
sentido nao hesitou em consagrar o principio de
que esse depºsito fosse feito por conta do Estado,
e por elle pago e importe do mesmo deposito,
concorrendo sómente a Municipalidade com a
promptificação dos necessarios armazens.
Um t㺠grande deposito porém occasiona ope
rações mui variadas, melindrosas e transcenden
tes, que de necessidade devem ser rodeadas de
precauções e de regras bem combinadas e discrº"
. – 336 —

tas. E com efeito, carece-se de formar o depo


sito de uma maneira que inspire confiança e não
dê aso a prevaricações; ha a attender ás despezas
da arrecadação, commissão e outras; he mister
inspeccionar os preços dos grãos, indagar a op
portunidade de realisar as compras, marcar as epo
cas em que hão de verificar-se as vendas, fiscali
sar a regularidade na expedição, etc, etc.
A tudo isso occorreo sabiamente o governo
hespanhol.
Os fornecimentos serão contractados em hasta
publica, verificada por cartas fechadas, as quaes
serão depois abertas e lidas em publico perante
uma Junta, a qual consulta em seguida o Gover
n0.
Essa Junta, centre e alma de todo este esta
belecimento, convenientemente constituida no seu
pessoal, he encarregada de todas as funcções de
acção e fiscalisação, que o acto governativo do
deposito oscasiona. Assim, pºr exemplo, he ella
quem ha de inspeccionar os depositos e ºs campos,
entender nas vendas verificar as arrematações, de
pois da resolução do Governo, determinar o nu
mero de fangas que successivamente houver de se
comprar, o preço de cada fanga, as epochas das
– 337 -

compras e vendas, qualidades do trigo e duração


dos contractos.

E para melhor intelligencia das cautellas com


que a Junta ha de regular as arremataçõees, quaes
as vantagens que percebem os arrematantes, en
cargos a que se sujeita o Governo, e resultado fi
nal desta importanto providencia, aqui transcrevo
litteralmente as regras com que deve conformar
Se a Junta: -

Artigo 7.° — Para fivar as condições da arre


matação a Junta deverá attender ás seguintes re
gras:
1.° — Que o arrematante ficará obrigado a ve
rificar os fornecimentos e as vendas pelo preço e
durante o tempo determinado, adiantande para esse
fim as sommas necessarias, e tomando por sua con
ta a conservação e expedição do trigo.
2.° — Que o governo pagará ao arrematante
pelas sommas que houver adiantado um interesse
annual de 6 por cento, e demais um premio que
não excederá nunca de 4 por cento pela compra,
conservação e venda do trigo.
3.° — Que se acaso se suscitar questão sobre
a qualidade de trigo na tempo da venda, a resol
verão dous peritos, nomeados, um pela Junta e ou
— 338 —

tro pelo arrematante; e no caso de não combinarem


virá um terceiro nomeado pelas partes contendedoras.
4.° — Que os utensilios de condução serão por
conta do arrematante.

5.° — Que a Junta determinará o preço da


compra pelo que tiver o trigo em Madrid ; e se o
empresario poder adquiril-o mais barato, ficará a
diferença a beneficio seu, quando o trigo fôr da
qualidade designada, e se verificar o fornecimen
to no tempo determinado.
6.° — Que em quanto o trigo estiver em po
der do emprezario, antes ou depois de armazena
do, os damnos e prejuizos serão por sua conta e
risco, exceptuando os casos de força maior.
7.° — Que a municipalidade será obrigada a
proporcionar ao emprezario os armazens necessarios
para os depositos, entregando-lhes em estado de
poder ser bem guardado, e convenientemente con
servado o trigo.
8.° — Que todo o individuo que se apresentar
como arrematante deverá depositar no banco de S.
Fernando, quer em metal, quer em titulos de 3
por cento ao preço corrente, no dia do deposito,
a decima parte do valor do trigo que se comprar,
conforme o preçº por que fôr pagº.
– 339 ---

9.° — Que o arrematante, a quem o governo


adjudicar o fornecimento, não poderá alevantar a
semma depositada, em quanto não mostrar perante
a Junta ter ministrado uma quantidade de trigo de
igual valor ao deposito do banco.
Art.° 8.° — As cartas fechadas com as propos
tas dos cºncorrentes, melhorando os tantos por cen
to, segundo indica a regra segunda do artigo ante
rior, serão abertas e lidas em pulico perante a Jum
ta, a qual as remetterá ao Ministro do Reino, com
a sua informação motivada, manifestando quaes as
que se devem acceitar, para que sobre ellas se
tome resolução opportuna.
Art.° 9.° — A Junta procurará obter que o con
tractador observe exactamente as obrigacões do con
traeto, por cujº cumprimento responderão as º m
mas depositadas no banco, ou os trigos armasenrdos.
Art.° 10.° — Sendo o fim dº Governo que e
trigo depositado se venda sómente para accudir por
preços modicos ao consummo publico, a Junta de
terminará o methodo que se ha de seguir na venda,
de modo que esta seja mais barata do que a do
mercado publico, procurando satisfazer uma neces
sidade real, e não desiquilibrar, sem ella existir,
os preços correntes,
Tenho dado uma idêa clara, ao que me pare
ce, da providencia do Governo Hespanhol, que
pertendi oferecer á consideração dos Madeirenses;
e faço votos para que a examinem attentamente, e
procurem descubrir qual partido poderia no volver
dos tempos tirar-se della em beneficio dos povos,
ou quaes as modificações que as circunstaneias espe
ciaes deste Districto demandariam na sua applicação.
Esqueceo-me insistir bem determinadamente
sobre o caracter de permanencia que o Governo Hes
panhol deu ao seu expediente. Se elle fosse even
tual e transitorio, poderia tornar-se oneróso á ad
ministração , e arredaria a possibilidade da compen
sação, que naturalmente se deve desejar entre os
rendimentos de um anno abundante e as faltas de
OutrO eseass0.

Entenda-se bem e meu pensamento: não pro


ponho a adopção do acto governativo de que se tra
ta, submetto-o unicamente á ponderação do publi
co, como podendo ser uma occasião de reflectir
sobre assumptos economicos de grande monta.
Funchal 27 de Dezembro de 1847.
Joze Silvestre Ribeiro.

******>{#><a>=-a
– 341 --

ILLUMINAÇÃO DAS RUAS.

A Camara Municipal do Funchal.


2.° Repartição — N.° 290 — Lº 3.° —
Illin." Snrs — Quando uma povoação qual
quer chega a adquirir a importancia, o de
senvolvimento, e grão de civilisação, a que
tem subido a do Funchal, afigura-se-me in
dispensavel, que os cuidados do seu governo
municipal se encaminhem a proporcionar-lhe
todas as commodidades, e a dopta-a de
todos os estabelecimentos, de que estão go
zando as grandes cidades nestes nossos tempos.
Sendo assim, não levará a Camara a
mal que eu, muito succintamente, lhe apre
sente algumas ponderações sobre os melho
ramentos que conviria talvez introduzir no
Funchal, em ordem a que esta Cidade pes
sa emparelhar na sua policia e conforto com
as cidades da sua ordem.
– 342 —

A iluminação das ruas he por certo


uma necessidade da civilisação. que deve de
safiar toda a solicitude da Camara, como
sendo um assumpto de alta monta, enlaça
do essencialmente com as commodidades dos
moradores, e conveniencias de boa policia.
— Por minha parte, tenho já cuidado de a
judar a Camara neste empenho, mandando
colocar tres candieiros em differentes pontos
da Cidade, sendo um á entrada da Forta
leza de S. Lourenço, outro á entrada da Al
fandega, e o terceiro por cima das Fontes
de João Diniz. Lido na pertenção de collo
car mais outros em diferentes pontos, sen
do-me alguns destes inculcados pelos oficiaes
engenheiros, como indispensaveis, na parte
mais baixa da cidade, onde as innundações
costumam fazer estrago. Se pois a Camara
reconhecer a utilidade deste serviço, he de
crer que, colocando todos os annos, e pou
co, a pouco alguns candieiros, se conseguirá
em breve periodo illuminar todas as ruas com
grande proveito do publico.
Outro beneficio póde a Camara fazer aos
moradores da cidade e até ás pessoas estra
nhas a ella, convidando os proprietarios das
casas a construirem pouco e pouco nas tes
— 343 ---

tadas das suas moradas anditos ou passeios


lateraes, levantados acima do piso do cen
tro, com pedra de cantaria, convenientemen
te lavrada, afim de oferecer ás pessoas que
transitam a pé um caminho commodo. Es
tes passeios lateraes, que aliás só poderiam
ter cabimento nas ruas mais largas, dão uma
apparencia mais grandiosa á cidade e appro
veitam muito para evitar o desagradavel in
conveniente da passagem em concorrencia com
os animaes, e tornar mais suave o piso para
as pessoas. Cada proprietario gasta pouco
em fazer o passeio que lhe cabe — aformo
$ela à Sua easd — e concorre a0 mesm0 tem

po para o beneficio geral.


Finalmente, movido do interess e que me
inspira este bello paiz, tenho por conveniente
que a Camara, auxiliada pela Administração
do Concelho, faça pôr em vigor, ou estabe
leça de novo , e faça executar todas e quaes
quer posturas, tendentes a c nseguir a lim
peza e a salubridade, bem como a prohibir
todos os actos que poderem ofender a de
cencia, e apresentar-nos aos olhos dos estran
geiros, como um povo menos civilisado.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do
Governo Civil no Funchal, aos 23 d'Outubro
— 344 —

de 1846. — Illm." Senrs. Presidente e


Membros da Camara Municipal do Funchal.
— O Governador Civil, Joze Silvestre Ribei
{'Oe
—…<><><>=

A Camara Munical al do Funchal.

2.° Repartição — N.° 312 — Lº 3.° —


Illm." Snrs. — Ja tive a honra de chamar a
attenção da Camara sobre a necessidade da
illuminação das ruas desta bella cidade e por
essa occasião lhe participei que lidava no em
penho de a promover com toda a eficacia,
para cujo fim mandára já colocar alguns
candeiros, e projectava colocar outros em
diferentes pontos.
Eu cumpri fielmente o que disse á Ca
mara; e como o meu intento era o de in
citar os moradores por meio do exemplo a
imitarem o que neste particular viss m fazer,
experimento a maior satisfação ao ter que
declarar a V. S.", que muitos dos funcha
leuses tem já colocado candieiros, e que eu
tros mais se propoem a tomar parte nesta em
preza civilisadôra.
A imprensa periodica desta ilha tem
— 345 —

já tratado esta importante questão e eu li


com verdadeiro prazer as observações mui
sensatas que em uma carta: (inserta no In
dependente ) datada de 22 de Novembro fin
do , foram expostas por um Madeirense e são
as seguintes:
« Querem os particulares fazer toda a
despeza dos candeiros ? sim.
« Porém como se hade tratar da lim
peza dos candheiros, bem como da vigi
lancia que sobre elles he preciso ter? —
quem se hade incumbir de os mandar ac
cende ? quem se hade encarregar da co
brança da quota com que cada um concor
re para a illuminação? Os particulares?
— hão-de os particulares fazer sempre tu
do isso?....
« Não acreditamos que a illuminação
da cidade. quando chegue a efectuar-se,
seja muito der doura, estando por esse
: modo sujeita a mil vontades, mil caprichos,
mil esquecimentos, mil faltas....
« Em presença de todas estas observa
ções he nossa opinião que para se levar a
efeito desde já a illuminação da cidade,
: com a regularidade sem a qual não he pos
sivel existir, he preciso uma contribuição
– 346 —

directa lançada pela Camara do Funchal


sobre todos os cidadãos que se acharem no
caso de a pagar, e que a mesma Cama
ra recebendo o producto dessa contribuição
especial, contraiha por esse facto para com
o publico a obrigação de illuminar a cida
de. —Se todos querem concorrer para esta
illuminação, julgamos que ninguem duvida
(( rá fazel-o por este meio, que supposto não
seja o melhor de todos, he todavia prefe
(( rivel ao que se pretende adoptar, e sem
(( duvida alguma o unico de que he possivel
(( lançar mão nas circunstancias em que nos
achamos.
« E se acaso os particulares querem in
cumbir-se da compra e colocação dos can
dieiros — se isso he mais conveniente, se
facilita mais o negocio — sirva o meio que
apontamos para a alministração dos mes
mos candieiros: porque d'outra fórma, re
petimos, não he facil, he talvez impossi
vel conservar-se a cidade regularmente il
luminada; e se nos faltar a luz nas ruas
depois de a termos gosado por algum tem
po, será justamente quando nos hade ser
muito sensível a sua falta.»
Transcrevo estes trechos da carta cita
– 347 –

da por isso que he sempre bom aproveitar


os conselhos da imprensa periodica, quando
elles são salutares, e exprimidos em termos
decentes, e graves. He neste sentido que
a liberdade de escrever póde ser proveitosa
aos povos; não assim porém, quando O CS

criptor he influenciado pelas inspirações da


maledicencia, da calumnia, do frenesí do
espirito de partido, ou do sentimento da
vingança.
Felizmente o que diz neste particular
o author da carta citada he muito bem pen
sado, e sobre maneira judicioso; e a tal
ponto me convence a sua doutrina, que eu
não hesito em a sujeitar á consideração da
Camara, rogando-lhe muito encarecidamente
que a medite em sua sabedoria.
He incontestavel, obvia e quanto urgente,
e até indispensavel, a necessidade de illu
minar as ruas desta vasta e populosa cida
de; he igualmente certo e fóra de toda a
duvida, que os funchalenses receberam com
interesse e verdadeiro euthusiasmo os peque
nos ensaios deste inapreciavel melhoramento,
prestando-se alguns a colocarem á sua custa
os candeiros, e outros concorrendo para o
costeamento de illuminações parciaes; e fi
– 348 —

nalmente, he de toda a evidencia que estes


esforços particulares, cem quanto muito lou
vaveis, demonstram sim a boa disposição
dos moradores para um objecto de tamanha
monta, mas não ; ódem por modo algum sa
tisfazer com regularidade e perseverança ás
exigencias de um vasto e complicado servi
ço, que demanda uma certa ordem, um cer
to regulamento, vigilancia e trabalho de to
dos os dias, e uma não interrompida e me
thodica série de providencias.
Sendo isto assim, permitta-me a Ca
mara, que eu conceba já a grata esperança
de que ela tomará as providencias que lhe
parecerem mais adquadas, para regularisar
este serviço, imprimir-lhe um caracter de
uniformidade, centralisar a sua inspecção,
e finalmente dar-lhe vida e duração.
Não deixemos morrer á nascença este
germen civilisador, que promette desabrochar
viçoso entre um povo, que dá indicios de
querer marchar na carreira do progrésso.
Arrostemos cºm todas as difficuldades, para
fazer fructificar um pensamento de utilidade
publica, que já começou a ser redusido a
pratica sob tão esperançosos auspicios.
A Camara poderá talvez cnsaiar porto
-349 —

do o anno de 1847 um systema, por exem


plo, o proposto pelo author da carta su
pracitada, aproveitando agora a boa vonta
de dos funchalenses, até que o tempo lhe
ensinasse o que mais acertado e eficaz podes
SC Sel".

Um grande numero de candieiros estão


já colocados; — a Camara poderia augmen
tal-os até ao numero de cem ; mais tarde
ser-lhe-hia possivel exceder este numero,
pouco e pouco e segundo as circunstancias
o fossem permittindo.
Estou convencido de que muitos dos
briosos moradores da cid de auxiliariam a
Camara em quanto á despesa da construcção
dºs candieiros, e todos se promptificariam a
contribuir para a despesa do azeite e outras
proprias da illuminação.
Mas para que he demorar-me mais so
bre este assumpto? A illustração dos mem
bros do Camara dispensa mais amplos desen
volvimentos; e eu só tenho que appellar pa
ra o interesse que lhes inspira o bem desta
cidade, e esperar afoutamente que ella to
mará este negocio na mais séria considera
ção.
Deus Guarde a V. S." — Palacio dº
-386 –

Governo Civil no Funchal aos 23 de Dezem


bro de 1846. — Illinº Snr. Presidente da
Camara Municipal do Funchal. — O Gover
nador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
*=><><>=-=

Ao Ministerio do Reino.

2 º Repartição = Nº 2034 — Ilmº


e Exmº Snr. —Tenho a honra de partici
par a V. Exc.", que julgando pouco prºprio
de uma cidade, como o Funchal, a circuns
tancia de não ter ainda illuminação nas suas
ruas, procurei empregar todos os meios ao
meu alcance para conseguir este melhoramen
to, como imperiosamente o demandam um
sem numero de considerações, entre as quaes
avultam a commodidade dos moradores, e as
conveniencias poli iaes.
Por máo fado meu vim encontrar a Ca
mara Municipal redusida ao estado de quasi
fellencia, em razão do alcance em que ficou
o seu Thesoureiro; e por este motivo não
podendo a Camare tomar sobre si a despesa
da illuminação, foi-me forçoso recorrer a ou
tros expedientes, quaes e de empenhar dife
— 351 —

rentes moradores abastados a colocar candi


eiros nas suas respectivas ruas, tendo prece
dentemente mandado colocar alguns por con
ta deste Governo Civil, como para oferecer
um estimulo e incentivo.
O resultado das minhas diligencias he
por em quanto pouco importante, no entan

to, á força de perseverança, e apezar da mi


seria deste povo, não perco a esperança de
pouco e pouco ir introdusindo este elemento
civilisador.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 12
de Fevereiro de 1847. — . Illm.º e Exm.º
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios do Reino. — O Governador Civil,
Joze Silvestre Ribeiro.

—--escº-@@as…-----

A Commissão Municipal do Funchal.

2.° Repartição — Lº 3.° — N.° 363 —


Illmº Snrs. — Não tenho tido tempo de a
gradecer a V. S." a obsequiosa condescen
dencia, com que se prestaram a tomar sobre
si o cuidado da maxima parte da illumina
ção desta cidade, que tem estado a cargº do
— 352 —

Governo Civil; agora porém mais desemba


raçado da multiplicidade de negocios dos pri
meiros dias da recente mudança politica, ve
nho á presença de V. S." testemunhar-lhes
a minha satisfação e reconhecimento.
V. S." dignaram-se, a rogativas mi
nhas, de encarregar-se da inspecção, en
tretenimento, e despezas de doze dos
candieiros que o Governo Civil costeava, e
por esta fórma contribuiram poderosamente
para fazer entrar o importantissimo serviço
da illuminação da cidade no estado regular
a que deve ser levado. E como seja bem
de esperar do zêlo, que V. S." consagram
ao cumprimento de seus deveres, que muito
em breve tem em á sua conta os restantes can
dieiros que ainda estão a cargo do Governo
Civil, e igualmente se deem por obrigados
a estabelecer outros em alguns pontos, onde
são de absoluta necessidade, — não hesito em
crer que he chegada a occasião de vêr reali
sado o empenho, em que ha tanto tempo li
do, de acrescentar á formosa cidade do Fun _* ----
chal mais um titulo de civilisação, e de pro
gresso, dotando a de um melhoramento in >__
ternº, de que outras povoações, aliás menos
importantes, gozam já desde longos annos
— 383—

nºs diferentes paizes da Europa, e de outras


partes do globo.
Deus Guarde a V. S." = Palacio do
Governo Civil no Funchal, aos 16 de Agosto
de 1847. = ilim." Snrs. Presidente e Mem
bros da Commissão Municipal do Funchal. =
O Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.
—=> @

A Cainara Hunicipal do Funchal.

2.° Repartição — L.º 3.° — N.° 498 — Illm.º*


Snrs. — Debalde nos empenharemos em emprehender
qualquer cousa, embora no principio desenvolvâ
mos grande actividade, se pelo discurso do tempo
não formos perscverantes. •

A sombra desta verdade me abrigo eu con


tra a censura que possa fazer-se-me de importu
no , vindo ainda outra vez chamar a attenção de
V. S." sobre a necessidade de se cuidar séria
mente de estabelecer a completa illuminação des
ta bella eidade. •

Sei que a Camara está em uma situação apu


rada de meios; sei que he difficil a empreza de
dár mais largas á illuminação, como sendo moti
vo de augmento de despezas; mas muito acima
– 354 —

de tudo isto está a indispensabilidade de levar


por diante o que já começou a fazer-se neste par
ticular, com tão bons resultados, e com tão espe
rançosos auspicios.
Medite a Camara bem sobre o assumpto; ve
ja os variados beneficios que da illuminação re
sultam para uma tão populosa cidade como o Fun
chal, onde aliás afluem tantos estrangeiros, — e
considere se vale a pena ou não de procurar ven
cer todas as difficuldades, de excogitar todo o ge
nero de recursos, de fazer até os maiores sacrifi
cios, para felicitar os seus administrados.
A” custa de bastantes lidas tenho conseguido
colocar já alguns candieiros em diferentes pontos
da cidade; a Camara já tomou sobre si a despeza
de alguns d'esses, no que toca a fornece-los de
azeite, acendê-los e limpa-los; mas tudo isso, he
pouco em comparação do muito que resta a fazer.
E convirá por ventura perder esta opportuna oc
casião de fazer um tão relevante serviço aos mo
radores do Funchal? Convirá acaso que encete
II]O$ projectos uteis sem os levar á execução? se
rá bem que se recúe perante quaesquer obstacu
los? De que serviriam os governantes dos povos,
se só trabalhassem quando se dá uma completa fa
cilidade de fazer as couzas?

He mister lançar uma contribuição para se


conseguir a completa illuminação do Funchal?
Lance-se affoutamente com tanto que se escolha a
menos onerosa, a mais justa , a mais equitativa
.... Qual povo ha hi que não pague as commo
didades, cs beneficios, as vantagens, o bem de
que gosa? Em ultima analise são os povos quem
paga tudo, e por bem recompensados se dão elles
quando vêem bem aproveitados os seus sacrificios,
quando vêem economia, zelo e boa vontade nos
que administram.
A despeza de que se trata he eminentemente
productiva. E como? Gera commodidade a innu
meras pessoas que durante a noute teem precizão
de atravessar as ruas de uma vasta povoação; he
um auxiliar da boa policia, um esteio dos bons
costumes, tornando impossiveis os perigosos eu
deshonetos desvios que procuram a escuridão das
trevas; e finalmente dá um aspecto de civilisação
a uma cidade importante. E haverá al uua Ca
mara que hesite em tomar a responsabilidade de
gastos publicos, tão evidentemente proveitosos ?
Submetto todos estas ponderações á reflexão
da Camara, e empenho toda a sua dedicação pa
– 355 —

ra que tome este negocio na mais séria considera


ção, e o conduza a bom termo.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Gover
no Civil no Funchal aos 29 de Março de 1848.
— Illm.º Snrs Presidente e membros da Camara
Municipal do Funchal. — O Governador Civil, Jo
ze Silvestre Ribeiro.

PROVIMENTO DOS LOCARES DA SECRETARIA


DO GOVERNO CIVIL.

ALVARA”

O Governador Civil do Districto Admi


uistrativo do Funchal $c.
Desejando eu informar com todo o co
nhecimento de causa e escrupulosa imparcia
lidade o Governo de Sua Magestade sobre a
pertenção em que lidam diferentes requeren
tes de serem providos no logar vago de offi
— 357 —

cial da Secretaria do Governo Civil d’este


Districto:
E sendo certo: — 1." que no curto
praso da minha residencia nesta cidade não
he possivel que eu pudesse obter conheci
mento cabal das pessoas: º 2.° — que nin
guem mais proprio ha para me informar a
este respeito com a devida exactidão, do que
os empregados mais graduados da secretaria
d’este Governo Civil
Por estes motivos resolvo nomear uma
Junta composta dos Snrs. — Secretario Ge
ral interino Augusto de Carvalhal Esmeral
do Lencastre, e Oficiaes, Antonio Jacinto
de Freitas, e Mauricio Joze de Castelbrai
co; aos quaes incumbo de examinarem to
dos os papeis relativos a estas pertenções, e de
me darem por escripto o seu parecer com indi
e duação, franqueza e imparcialidade, sobre
se he indispensavel o provimento do logar de
que se trata, e qual dos requerentes deve
ser preferido no caso de fazer-se a nomea
ção pedidº.
Dado no Palacio do Governo Civil no
Funchal aos 28 d'Outubro de 1846. — jo
ze Silvestre R. beiro.
-—-es><><>…--
– 358 —

Parecer da Junta.

—=>$<=

Secretaria do Governo Civil do Fun


chal — Illmº e Exmº Snr. — Dando prompto
cumprimento ao Alvará de 28 do corrente,
pelo qual foi V. Exc." servidº ordenar que
declarassemos se julgamos de absoluta ne
cessidade que seja provido o logar de ofici
al desta Secretaria, vago por falecimento de
João Nepomuceno d'Oliveira, e, na hypo
these de pensarmos que tal emprego não de
va ser supprimido, lhe subministremos uma
informaç㺠circunstanciada, franca, e im
parcial em relação ao merecimento das pes
soas, que o hão requerido, já directamente
ao Governo de Sua Magestade, já a V.
Exc." — temos a honra de submetter á con
sideração de V. Fxo." o parecer que nos foi
exigido, e em que só attendemos á justiça
dos concorrentes, e ás conveniencias do ser
viço desta importante Repartição.
Respondendo separadamente aos dois
quisitos propostos no Alvºrá, a que alludi
mos, entregamos ao mui atilado exame de
V. Exc." as seguintes considerações:
— 359 -

1.° — Que he indispensavel provêr o


logar de oficial chefe da 2.° Repartição,
por ser esta uma das mais trabalhosas da
Secretaria , e dever existir necessariamente
um empregado que se occupe exclusivamen
te em dirigir o andamento dos muitos e
mui variados negocios que lhe são afectos,
2.° — Quanto aos pretendentes, cujos
requerimentos nos foram transmittidos com o
AlAará de V. Excº", julgámos poder classi
fical-os da maneira seguinte: — Primeiro —
pretendentes externos, ou que não perten
cem á Secretaria do Governo Civil: Se
gundo — pretendente, que, sendo desta Re
partição, não he com tudo empregado ad
ministrativo, ou do quadro do Ministerio do
Reino: — Terceiro — pretendentes que tem
servido e servem actualmente empregos da
competoncia, e quadro legal do referido
Ministerio,
Em respeito aos da primeira classe,
que são o Doutor Luiz da Costa Pereira;
João Francisco de Sequeira; e Francisco
Leandro Severim Junior, entendemos cons
cienciozamente que seria injustiça antepol-os
a empregados que ha longos annos servem
nesta Repartição, e que em remuneração
— 360 —

de seus trababalhos nada esperam mais que


melhorar um dia de situação na carreira
gºº.ºncetaram. Nomear outros, seria cor
tar-lhe inteiramente essa Carreira, reduzin
dº os a exercer indefinidamente os primei
ros logares, e os menos lucrativos; seria
não respeitar o contracto tacito que se dá
ºutrº os empregados e o Governo, em vis
tº do qual, aquelles tem direito a esperar
deste accrescentamento e melhoria no servi
co, quando não se deem factos que os tor
nº indignos desse apoio, e favoravel con
sideração. Mas álem de Pensarmos que um
tal procedimento ofenderia os principios ge
raes de justiça tambem Suppomos que seria
bastantemente desvantajoso, ao menos por
bastante tempo, para o bom e regular ser
viço desta Secretaria.
Entre os pretendentes da primeira clas
se ha com efeito alguns que oferecem maio
res habilitações litterarias, que o da segun
dº , e os da terceira; mas com quanto de
mos a devida importancia a essas hubilita
ºººº, qdº ºpºveitam elas por muito tem
Pº aos trabalhos da Repartição, sendo co
no comº são, principalmente as dos dois re
querentes, Doutor Costa, e Sequeira, pura
— 361 —

mente theoricas e não tendo estes candidatos


a mais leve noção pratica dos negocios pu
blicos, e dos trabalhos de uma Repartição
qualquer? Pedimos a V. Exc" que consi
dere que o logar, de cujo provimento se tra
ta, não he d'aquelles que se consideram co
mo de tirocínio para as pessoas que se de
dicam ao serviço do Estado; he um logar
de importancia — um logar que demanda
Vasta pratica , e conhecimento seguro e exac
to de varios ramos do serviço deste Gover
no Civil; e por tanto não he aqui admissi
vel um praticante, mas requer-se imperiosa
mente um empregado feito. A não ser as
sim algum iria fazer o trabalho que o regu
lamento da Sccretaria commette ao chefe da
repartição de que falamos, e ahi tem V.
Excº distrahidos das proprias occupações,
um ou mais empregados e compromettido
assim o regular expediente da Secretaria.
Quanto ao requerente que figura de per
si só, na segunda classe , Luiz Antonio d'Or
nellas, he de rigorosa justiça observarmos a
V. Excº que ele reune as qualidades que
são precisas para bem desempenhar o logar
que requer, e se não nos decidimos inteira
mente por elle, he unicamente pela força das
considerações que deixamos expostas quanto
á conveniencia de serem attendidos com pre
ferencia os requerentes que pertencem ao
gremio da Repartição, de que he parte inte
grente o logar que se tracta de provêr. O
empregado de que ora nos occupamos perten
ce ao pessoal do Governo Civil, mas he da
Repartição de Fazendo, e não do quadro do
Ministerio do Reino, como os tres ultimos
que colocámos na terceira e ultima classe.
São estes os de que nos resta falar:
Jacinthe Aluizio Jervis d'Athouguia, he
pessoa de exemplar conducta, desempenha os
trabalhos do logar que ora occupa, e he o
amanuense mais antigo da repartição; he ca
sado
Jacintho de Freitas Lomelino, reune as
mesmas qualidades moraes, he muito traba
lhador e sendo amanuense da mesma Re
partição de que pretende ser chefe, tem a seu
favor a pratica que tem adquirido dos traba
lhos della. O seu diploma he anterior em
data ao do pretendente de quem vamos fallar,
mas tendo sido demittido em 16 d’Ontubro
de 1837, e interrompido assim a carreira
do serviço, cºnta por isso menos algum tem
po de exerciciº efectivo que este; — he ca
— 363 —

zado e tem poucos meios para subsistir com


sua família.
Antonio Joaquim de Vasconcellos, he
como os seus collegas de muito boa conduc
cta; he activo no serviço da Secretaria, de
cujos trabalhos geraes tem adquirido bastan
te pratica e tem dado provas de aptidão no
desempenho das funcções do seu cargo. A'
cerca deste prentedente o primeiro signata
rio da presente infºrmaç㺠refere-se em tudo
ao attestado que lhe deu, datado de 23 de
Septembro do corrente anno, e que he o ul
timo documento que vem annexo ao respec
tivo requerimento. — Deus Guarde a V.
Exc.° — Secretaria Geral do Governo Civil
28 d'Outubro de 1846 — Illm.º e Exm.º
Snr. Joze Silvestre Ribeiro, do Conselho de
Sua Magestade Fidelissima, Governador Ci
vil do Districto do Funchal. —Augusto de
Carvalhal - smeraldo Lencastre — Antonio Ja
cinto de Freitas — Hauricio Joze de Castel
branco.
-=>G@@e>→

Ao Ministerio do Reino.

1.° Repartição — N.° 2600 — Illm.º e Exm.º


Snr. — Em Portaria expedida pela 2.° Repartição
— 364 —

da 3.° Direcção do Ministerio do Reino, em data


de 19 do corrente, foi V Exc." servido de remet
ter-me os requerimentos de alguns empregados da
Secretaria d’este Governo Civil, e de outro per
tendente, nos quaes pedem ser providos no logar
vago de oficial da mesma Secretaria; ordenando
V. Exc." que eu informe, 1.° — se he indispensa
vel o provimento do logar de que se trata; 2.° —
qual dos requerentes deve ser preferido, no caso
de fazer-se a nomeação pedida.
Devolvo agora os ditos requerimentos, e ad
diciono-lhes mais tres de outros tantos pertenden
tes, que me requereram directamente o serem
providos n'aquelle logar.
Tratando-se de um objecto muito melindroso,
e estando eu ha muito pouco tempo no Funchal,
e por consequencia não conhecedor do merecimen
to das pessoas, maiormente do seu merecimento
comparativo; entendi que me era indispensavel
crear no seio da Secretaria d’este Governo Civil
uma Junta de informação, composta do Secretario
Geral interino e dos dous mais qualificados oficiaes
da dita Secretaria e da Repºrtição de Fazenda,
cºm o fim de me fornecerem as informações, de que
careço.
— 365 —

O Alvará da nomeação d'esta Junta he aquel


de que no original tenho a honra de encaminhar ás
mãos de V. Exc."; e a resposta que a nomeada
Junta me deu acompanha tambem no original este
oficio.

Reporto-me inteiramente á resposta da Junta


de informação, na qual vão exarados todos os es
clarecimentos indispensaveis, para que a sabedo
ria do Governo possa fazer a escolha mais acertada.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 31 de
Outubro de 1846 — Illm.º e Exm.º Snr. Ministro
e Secretario d'Estado dos Negocios do Reino. —
O Governador Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

Ao Ministerio do Reino.

1.° Repartição — N.° 2031 — Illmº e


Exmº Snr. — Em Portaria expedida pela
3.° Direcção, 2.° Repartição do Ministerio
a cargo de V. Exc.", com data de 8 do
mez findo, e por mim recebida em 5 do
corrente, Manda Sua Magestade qne eu co
ordene e proponha á Regia Approvação,
pelo mesmo Ministerio, um projecto de Re
gulamento para a nomeação dos logares de
– 366 –

eficiaes e amanuenses da Secretrria do Go


verno Civil, que me está confiada.
Obedecendo ás Soberanas Ordens de
S. M. a Rainha, a despeito da minha in
suficiencia, tenho a honra de encaminhar
ás mãos de V. Exc." o incluso projecto de
Regulamento.
O pensamento geral que me guiou na
organisação deste Regulamento foi fechar
todas as avenidas ao arbitrio cm nomeações
tão ponderosas; — bem como o dár uma di
recção mais rasoavel às ambições, que ho
je mais que nunca se desenvolvem, rode
ando os legares da Secretaria de uma cer
ta gravidade e importancia, pelas habilita
ções que exijo, e provas a que subjeito os
COncorrentes.
Dest’arte, o principio geral do con
curso, e a severidade das habilitações e
provas, hão de povoar de homens habeis a
Secretaria, tornando innacessíveis esses lo
gares á incapacidade e á ignorancia.
Ao mesmo passo porém que foi sevé
ro em quanto ao provimento dos loga
res, pertendi estabelecer um quadro pro
priamente tal, da Secretaria do Governo Ci
vil, separando-a da Repartição de Fazendº,
— 367 -

e arredando do concurso as pessoas estra


nhas á Secretaria, excepto no caso de não
se encontrar no seio d’ella a capacidade e o
ImereCIfnent0.
Digne-se V. Exc." de relevar indul
gente a imperfeição de meu trabalho.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal
aos 11 de Fevereiro de 1847 — Illmº e
Exmº Snr. Ministro e Secretario d'Estado
dos Negocios do Reino. — O Governador Ci
vil, Joze Silvestre Ribeiro.
-*><><>

Projecto do Regulamento para a nomeação


de Oficiaes e Amanuenses da Secretaria
do Governo Civil do Funchal.

T I T U L O I.

DISPosições PRELIMINAREs.

Artigo 1.° — A Secretaria do Governo


Civil he inteiramente separada da Reparti
ção de Fazenda, no que toca á sua organi
sação pessoal, e provimento de Legares.
Art. 2.° — Na Secretaria do Governo
Civil são aspirantes aos logares vagos de
— 368 ---

amanuenses os praticantes, ou supra-nume


rarios, que tem feito serviço não interrom
pido na mesma Secretaria, desde o dia da
sua admissão.
No caso porém de não haver pratican
tes ou supra-numerarios, ou na hypothese
acautelada no § º Unico do Artigo 20." do
Titulo 4.° deste Regulamento, podem aspi
rar áquelles logares quaesquer pessoas, que
se sujeitarem ás provas, de que abaixo se
faz menção.
Art. 3.° — São aspirantes aos logares
de Officiaes da Secretaria do Governo Civil
os Amanuenses do numero da mesma Secre
taria — e só eles — excepto no caso previs
to no Art, ultimamente citado.
Art. 4.° — Nenhum logar de Amanu
ense e de Oficial será provido, senão por
meio de concurso.

****-**************

TITULO 2.°

HABILITAÇÕES E DOCUMENTOS.

Art. 5.° — Para ser amanuense requer


S6 :
— 369 –

1 * — Boa fórma de lettra, boa orthc


grafia, e facilidade de escrever.
2° — Conhecimento da Grammatica
Portugueza, e da Arithmetica.
3" — Algumas noções das linguas Fran
ceza e Ingleza.
Art. 6.° — Para ser nomeado Oficial,
requer-se que o candidato tenha noções mui
to desenvolvidas das seguintes doutrinas:
1.° — Grammatica Portugueza.
2.° — Grammatica Philosofica.
3° - Arithmetica.
4.° — Oratoria.
5.° — Principios de Direito Adminis
trativo.
6.° — Conhecimento das linguas Fran
cesa e Ingleza.
º Unico — Afóra isto deverá ter:
1.° — Boa fórma de lettra, boa orto
graphia, e facilidade de escrever.
2° — Disposição para minutar com a
certo um oficio; tendencia para dar uma
boa direcção aos negocics, e classificar me
thodicamente ºs papeis de uma dada Repar
tição da Secretaria.
Art. 7.° — Tanto os candidatos aos
logares de Amanuenses, como aos de Ofi
– 376 –

cºes, deverão instruir os seus requerimen


tos com os seguintes documentos:
1.° — Certidão de edade.
2."—Certidão de antiguidade de ser
Viço na Secretaria do Governo Civil.
3.° — Attestados da Camara Munici
Pºl, do Parocho, e do Administrador do
Cºncelho, que abonem o seu bom compor
tamento moral, civil, e politico.
4.° — Attestados de quaesquer Chefes,
com quem tenham servido, pelos quaes mos
trem a sua assiduidade no trabalho, e boa
vontade no desempenho das suas obrigações.

T I T U L O 3º

DOS CONCURSOS E EXAMES PARA O PROVI


MENTO DOS LOGARES DE AMANUENSES, E
DE OFFICIAES DA SECRETARIA DO GOVER
NO CIVIL.

Art.° 8.° — Logo que vagar um logar


de Amanuense, ou de Oficial, o Governador
Civil abrirá immediatamente um concurso,
fixando um praso de tempo, que nunca po
--

– 371 —

derá exceder a quinze dias, dentro do qual


se apresentem a exame os candidatos àquel
les lugares.
Art. 9º – O exame dos concorrentes
será presidido pelo Secretario Geral do bo
verno Civil, e serão examinadores os Pro
fessores de Latim, Geometria, Rhetorica ,
e de Frrncez e Inglez, do Lyceu do Funchal,
e o Primeiro Oficial do Governo Civil.
Art. 10.° — Cada um dos Professores
perguntará sobre as doutrinas, que mais im
mediatamente lhe competirem; o Secretario
Geral, e o primeiro oficial perguntarão so
"bre o que he relativo á theoria e á pratica
dos assumptos de Administração, e Secreta
ria.
Art 1 1.° — Tanto o Secretario Geral,
como os restantes Examinadores, terão dian
te de si exemplares de qualificações, e em
frente de cada um dos diseres lançarão o seu
juizo sobre o desenvolvimento dos concorren
tes, segundo as suas respostas e provas, li
mitando-se ás seguintes manifestações: Opti
mo, Bom, Mediocre, Nada. •

Cada um dos exemplares das qualifica


ções, tanto no caso de concurso para o lºgar
de amanuense, como para o de oficial, se
— 872 —

rá respectivamente datado e assignado, logo


que o concorrente se retirar.
Art. 12.° —Terminada a prova littera
ria, pelo modo que fica dito, passar-se-ha
á prova moral, a qual consiste no exame dos
documentos de que trata o Art. 7º do Ti
tulo 2.° deste Regulamento.
Art. 13.° — Em seguimento procederão
os Examinadores com o Secretario Geral, a
conferenciar entre si, em presença das qua
lificações e dos documentos, sobre a capaci
dade ou incapacidade do concorrente; e de
pois lavrarão um termo, no qual lançarão o
conceito que lhes merece.
Art. 14.º — Havendo muitos concorren
tes, e tendo-se praticado para com todos o
que dispõem os Art" antecedentes, procede
rão os Examinadores com o Secretario Geral
a conferenciar sobre o merecimento compara
tivo dos concorrentes, e logo lavrarão um
termo, no qual declarem qual lhes merece a
preferencia,
mo ou se reputam
gráo de merecimento . a todos no mes

Art. 15.° — Terminadas as operações dos


artigos antecedentes, reunirá o Secretario
Geral todas as qualificações, documentos,
termos, e demais papeis do exame; fechan
do-os e lacrando-os em presença dos Exami
nadores, os remetterá ao Governador Civil.

T I T U L O 4º

NOMEAÇÃO DEFINirva.

Art. 16.° — Logo que o Governador Ci


vil receber os papeis de que trata o Artº 15,
procederá a nomear o candidato, que aos
Examinadores tiver merecido um bom con
ceito, em quanto ás provas litteraria e mo
ral.
Art. 17° — Se houve um só concor
rente, e o parecer dos Examinadores lhes he
de todo ponto favoravel, o Governadcr Civil
o nomeará immediatamente. •

Artº 18.° — Tendo havido mais de um


concºrrente, nomeará o Governador Civil o
candidato a quem os Examinadores houve
rem dado a preferencia.
Artº 19.° — Se porém os Examinado
res reputarem os concerrentes em igualdade
de merecimeoto, o Governador Civil obser
vará as seguintes regras:
— 374 --

1.° — Fm igualdade de merecimento


litterario e moral, preferirá o mais antigo
na Secretaria.
2.° — Sendo igual a antiguidade, pre
ferirá o mais velho.
3.° — Sendo igual a edade, preferirá o
mais pobre ao mais rico.
Art. 20." — Se o parecer dos Examina
dores fôr de todo ponto desfavoravel ao can
didato, ou candidatos, o Governador Civil,
sobre estará no provimento do logar vago,
até que um novo concurso ofereça um rezul
tado favoravel.
§ º Unico — A este novo concurso pode
rão concorrer quaesquer pessoas que se jul
guem com as habilitações acima apontadas,
devendo neste caso dár-se preferencia nos Em
pregados da Repartição de Fazenda. — Se
cretaria do Governo Civil no Funchal 9 de
Fevereiro de 1847. — O Governador Civil,
Joze Silvestre Ribeiro.
— 375 —

REGULAMENTO D’INCENDIOS.

Ao Administrador do Concelho do Funchal.

2.° Repartição — Lº 5.° — N.° 227


— Illm.º Snr. — Sabe V. S." perfeitamente,
que se ha uma crise apurada para qualquer
povoação, he por certo aquella em que se
desenvolve um incendio com alguma violen
cia. — Então, as faculdades do homem são
violentamente abaladas pelo temeroso es
pectaculo das chammas, que mais e mais se
enfurecem , e ameaçam devorar vidas e pro
priedades. — Então, a razão perturba-se, e
como que só dominam os impulsos do cora
ção, mais proprios para produsirem bellos
rasgos de heroica dedicação. de que para ins
pirarem providencias eficazes, e salvadôras.
Consta-me porém que nesta bella cida
de não estão bem acautelados os meios de
atalhar os incendios, sem embargo da nota
– 376 –

vel e briosa disposição, que tem os funcha


lenses para accudirem áquelles desastres —
E como convenha que um tão importante
serviço esteja d'antemão regulado, por ma
neira que n'aquelas funestas occasiões de de
sordem e confusão se possam preencher as se
guintes condições: 1.° a promptidão dos soc
corros: 2.° a boa ordem na sua applicação:
3." abundancia de utensilios e materiaes,
proprios para apagar o fogo:
Tenho rasolvido encarregar a V. S." da
confecção d'um regulamento, no qual se fi
xe e determine com a maior clareza e de
senvolvimento, tudo quanto he relativo á par
te pessoal, material, e policial deste trans
cendente negocio — e ao mesmo tempo se
acautelle tudo, para que no momento do in
cendio, nada mais haja a fazer se não ap
plicar com methodo, boa ordem, e possivel
serenidade os soccorros, lá de antemão pre
venidos.
Para V. S º seguiar no trabalho que lhe
incumbo, ofereço á sua consideração um ex
cellente escripto do Barão d'Eschwego, com
o titulo de «Memoria sobre o melhoramen
to das providencias para atalhar os incendios,
e para o augmento de agua em Lisboa», o
– 377 –

qual vem transcripto no tomo 12°, parte 1.",


das Memorias da Academia Real das Sci
encias de Lisboa.
Outro sim consultará V. S." os Snrs.
Oficiaes Engenheiros, estacionados nesta ci
dade, cuja pericia e conhecimentos especiaes
muito pódem aproveitar-lhe; sendo aliás de
esperar que elles só prestem de bom grado
a coadjuval-o.
E finalmente cuidará V. S.° de enten
der-se com a Camara, e com a Authorida
de superior Militar, afim de que este as
sumpto possa ser tratado com a devida ex
tensão, e abranja todas as providencias, e
combinações, tendentes a tornar completo
este serviço; convindo até consultar o Corpo
do Commercio, para elle fornecer os escla
recimentos e auxilio a que podér compro
metter-se para o mesmo serviço, que, a te
dos interessa.
Com quanto seja ardua a tarefa de que
o encarrego, fio tudo do seu zêlo e decidi
da dedicação, esperando que muito em bre
ve me apresentará um trabalho completo a
semelhante respeito, e por tal sorte traça
do , que facil e proveitosamente possa ser
redusido á pratica, quando fôr necessario.
– 378 –

— Deus Guarde a V. S.° — Palacio do Go


verno Civil no Funchal aos 2 de Novembro
de 1846. — Illm." Snr Valentim Mendonça
Drummond, Administrador do Concelho do
Funchal. — O Governador Civil, Joze Silves
tre Ribeiro.

*--*=><><>--*-*

A” Camara Municipal do Funchal.

2.° Repartição — L º 3.° — N.° 412 — Illmºº


8nrs. — Em 2 de Novembro de 1846 encarreguei
eu o Administrador deste Concelho de confeccionar
um «Regulamento d'Ineendios» insinuando-lhes en
tão, quaes principios devia ter em vista na organi
sação de um tal trabalho, bem como, quaes auxi
lios lhe convinha solicitar, afim de bem preencher
uma tão importante tarefa.
Neste sentido lhe observei:
1."-Que por occasião de incendios, e nesses
ºpertados momentos de confusão e desordem, era
força procurar-se satisfazer a tres condições: — A
-promptidão dos soccorros; B –boa ordem na sua
applicação; C — abundancia de utensitios e materiaes
proprios para apagar o fogo.
--379 –

2.° — Que no pedido «Regulamento» se fixas


se, com a maior clareza e desenvolvimento tudo
quanto he relativº ao pessoal, material e policial
deste negocio, por maneira que no momento do
incendio nada mais houvesse a fazer do que ap
plicar methodicamente, e com a possivel serenida
de , os soccerros d'antemão prevenidos.
Outro sim, para que o referido Magistrado
podesse guiar-se mais seguramente na promptifica
ção deste trabalho, lhe indiquei a leitura da «Me
moria sobre o melhoramento das providencias pa
ra atalhar os incendios», que vem transcripta no
tomb 12, parte 1.", das Memorias da Academia
Real das Sciencias de Lisboa; e lhe recommendei
que consultasse os Snrs. Oficiaes Engenheiros. e
diversas Repartições, como meio de reunir em um
centre a maior somma de conhecimentos, e formar
depois um todo perfeito.
O Administrador do Concelho procurou satis
fazer á minha exigencia, e se bem que não fosse
possivel dar um andamento rapido ao negocio, con
seguio ha poucos dias organisar um projecto de Re
gulamente, que acaba de remetter-me, juntamen
te com alguns trabalhos que lhe serviram de base
e illustração.
— 380 —

He esse projecto de Regulamento (1 ) que eu


tenho a honra de encaminhar ás mãos de V. S." •

bem como, por copia, o oficio de remessa do Ad


ministrador do Concelho, e no original, todos os
papeis que o acompanhavam, e são as respostas
dos Snrs. Engenheiros, e Associação Cemmercial.
Fazendo esta remessa a V. Sº, he meu inten
to pedir-lhes que se dignem de examinar attenta
mente o projecto de Regulamento, e de procura
rem conseguir que elle seja posto em pratica, tal qual
está, eu com as alterações que julgar em convenien
teS.

O Administrador do Concelho pondera que


teve em vista organisar o Regulamento, de
que podesse ser levado a execução, em pre
sença do estado dos Cofres Municipaes, e em at
tenção a muitas circunstancias locaes. — Nesta par
te parece-me que muito avisadamente andou elle,
pois que, sendo a Camara quem hade fazer as des
pezas de um tal serviço, era indispensavel accom

(1) Foi publicado no N.° 52 do Madeiren


se de 22 de Abril de 1848; — não vae nesta Col
lecção porque a Camara Municipal ainda não tomou
resolução alguma ácerca delle,
— 381 –

modar o Regulamento ás possibilidades da mesma


Corporação.
Entre os papeis que acompanham o Regula
mento, pede a justiça que eu mencione como re
commendavel, a resposta que deu o Snr. Capitão
d'Engenheiros Azevedo, o qual tratou com todo o
desenvolvimento este assumpto, forneceo á Admi
nistração do Concelho muito aproveitaveis elementos.
A Camara examinará tudo com a devida at

tenção, tratando de formar um juiso seguro sobre


a materia, e habilitando-se assim a tomar uma re
solução acertada.
sabem v. S.", tão bem ou melhor do
que eu, quanto he admiravel a briosa disposi
ção des Funchalenses para accudirem aos incen
dios, e prestarem por essa occasião os maiores
serviços. He porém certo que tamanha c tão leu
vavel dedicação deve ser dirigida com todo o a
certo, ordem e regularidade para que possa ser
proveitosa.
A isto tendo essencialmente o prejecto de Re -
gulamento que ofereço a V. S.", felicitando-me
por me ser dado proporcionar a V. S." os meios
de adoptarem uma providencia proficua e intºres
santissima.
– 382 —

Por minha parte, estou prompto a fazer tudo


quante dependa do Governo Civil para a execução
do Regulamento, bem come a advogar perante o
Conselho de Districto quaesquer authorisações que
V. S." deverem solicitar para este fim.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Governo
Civil no Funchal aos 18 d'Abril de 1848 — Illm.º"
Snrs. Presidente e Membres da Camara Municipal
do Funchal. — O Governador Civil, Joze Silvestre
Ribeiro,

*=> @<=

Ao Ministerio do Reino.

2.° Repartição — N.° 61 — Illm.º e


Exmº Snr. — Logo nos primeiros mezes da
minha Administração neste Districto tive oc
casião de observar a natural tendencia, e fa
cilima, quanto briosa disposição que teem os
Funchalenses para accudirem aos Incendios,
prestarem nesses momentos criticos de cons
ternação os mais relevantes serviços, e de
senvolverem a mais nobre e corajosa dedi
CaÇâ0.
A par, porém, dessas louvaveis tenden
cias, e dos admiraveis rasgos de philantropi
- 388 –

ca devoção, de que era testemunha presen


cial, conheci desde logo que era indispensa
vel imprimir a esses esforços um caracter
de ordem, de methodo e regularidade, que
por certo lhes faltava.
N’este seutido encarreguei em 2 de
Novembro de 1846 o Administrador do
Concelho do Funchal de confeccionar um
a Regulamento d'Incendios » insinuando-lhe os
prnicipios porque devia guiar-se na organi
sação de um tal trabalho, bem como recem
mendando-lhe que tomasse conhecimento de
uma «Memoria sobre o melhoramento das
providencias para atalhar os incendios », que
vem transcripta no tome 12. parte 1.",
das Memorias da Academia Real das Scien
cias de Lisboa, — e consultasse os Oficiaes
Engenheiros e diversas Repartições, como
meio de reunir em um centro a maior
somma de conhecimentos, e poder formar
depois um todo perfeito.
No fatal anno de 1847 nada pôde o
Administrador do Concelho fazer, porque a
todos nós roubaram o socego e o tempo as
crueis crises da fome, e das agitações poli
ticas; no anno corrente perem, em que
mais alguma quietação havemos gosado, en
— 384 —

tendi dever apertar com aquelle Funcciona


rio para que desempenhasse a incuiabencia
de que o encarregára. até que aos 8 deste
mez me apresentou um projecto de «Re
gulamento.» •

No dia 18 deste mesmo mez remetti


á Camara o dito trabalho, com todos os es
clarecimentos que serviram de base ao Ad
ministrador do Concelho, e lhe recommen
dei que o examinasse attentamente, e tra
tasse de o pôr em pratica, tal qual estava,
ou com alterações que julgasse conveniente;
oferecendo-lhe toda a coºperação que de
penda deste Governo Civil, e do Conselho
de Districto... para o fim de ser adoptada e
posta em pratica uma providencia civilisa
dora que falta a esta terra.
Faço votos para que a Camara se a
presse a desempenhar nesta parte o seu de
ver; e em tempo competente darei conta a
V. Excº do que se fizer.
Deus Guarde a V. Exc." — Palacio do
Governo Civil no Fnnchal aos 28 d'Abril de
1848, — Illm.º e Exm.º Snr. Ministro e
Secretario d'Estado dos Negocios do Reino.
— O Governador Civil, Joze Silvestre Ri
beiro.
---- 3 S5 •••+

PROTECÇÃO AOS POVOS,

Aos Administradores de Concelho.

2.° Repartição — N.° 229 — Lº 5.° —


Circular — Illinº Snr — Se a acção dos Snrs.
Administradores de Concelho se limitasse a
transmittir aos seus subalternos, ou aos po
vos as ordens superiores, seria ella por cer
to de bem pouco proveito para o publico,
ainda quando a respeito de determinados ne
gocios desempenhassem as attribuições, que
a lei lhes commette. Uma idêa porém mais
elevada formo eu da missão administrativa de
um tal cargo, entendendo que ella abrange
e comprehende essencialmente a obrigação de
prestar aos administrados todo o genero de
protecção, quer seja para os escudar contra
arbitrariedades e injustiças, quer para advo
gar e promover os seus interesses, quer fi
nalmente para solicitar em beneficio delles
— 386 —

salutares providencias, ou soccorros, como


demandarem as circunstancias.
Sendo assim tenho hoje por convenien
te chamar a attenção de V. S." sobre um
objecto, que me parece muito ponderoso.
Tem-me a experiencia de outros Dis
trictos feito conhecer, que por vezes as Au
thoridades subalternas, tanto da ordem ad
ministrativa, como da judicial, e seus es
crivães, e outros agentes, opprimem os po
vos com vexames, que nenhum motivo plau
sivel justifica. He ordinariamente nas (re
guesias ruraes onde mais sensivel e repetido
se torna este inconveniente, porque não che
ga lá tão facilmente a vigilancia moralisa
dôra das Authoridades superiores e tambem
porque os habitantes daquellas freguesias não
levantam clamores contra a oppressão, talvez
porque não conhecem os seus direitos ou re
ceiam fazel-os valer.
He bem possivel que neste paiz, em
verdade muito civilisado, não se verifiquem
as minhas apprehensões; oxalá que assim suc
ceda ! No caso porém de que tambem nes
te Districto haja necessidade de acautelar os
abusos que deixo indicados, espero que V.
S." olhará sériamente para este negocio, in
— 387 —

dagando com toda a individuação, se por


ventura os povos teem de que queixar-se con
tra as Authoridades, seus escrivães ou agen
tes, e procurande protegel-os contra quaes
quer arbitrariedades, injustiças e vexames,
que por ventura sofram da parte de quem
teem direito de esperar toda a justiça e bons
oficios.
Este serviço porém deve ser feito com
a maior circunspecção, afim de que essas
Authoridades, escrivães, e demais agentes
nunca sejam embaraçados no seu exercício,
em quanto estão dentro dos limites da lei,
mas sómente se lhes promova em termos com -
petentes e com a mais escrupulosa legalida
de, o castigo que merecerem.
Saibam os povos que os Snrs. Admi
nistradores de Concelho vigiam sobre este ne
gocio — e desde esse momento as cousas en
trarão no seu verdadeiro caminho. Saibam
os agentes subalternos da acção governativa,
que sobre eles estão fictos os olhos das Au
thoridades superiores, e desde esse momento
desapparecerá a prepotencia, de que são vic
timas os desvalidos, com tamanho descredi
to do Governo e da libe: dade.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
- 388 —

verno Civil no Funchal 3 de Novembro de


1846. — Illm.º Snr. Administrador do Con
celho de........ O Governador Civil, Jo
ze Silvestre Ribeiro.

*--****><><>-----

F A Z E N D A.

Repartição de Fazenda — 1.° Secção —Lº


8.° — N.° 5877 — Circular -— Illm.º Sr. —
São tão apertadas as ordens do Governo de S.
Magestade ácerca dos importantissimos negoci
os da Fazenda, e designadamente sobre a re
messa regular e prompta das Tabellas da co
brança, que me vejo novamente obrigado a
chamar a attenção dos Snrs. Administradores
de Concelho sobre este assumpto.
Convém primeiramente que os Snrs Ad
ministradores façam sentir aos Recebedores
respectivos o escrupulo e rigorosa exactidão,
com que nos dias 10, 20, e ultimo de ca
da mez devem remetter ao Thesoureiro Pa
— 389 —

gador os recibos dos pagamentos, transferem


cias, ou passagens de fundos, que durante
cada um desses períodos tiverem efectuado;
e quando a este dever impreterivel se falte,
devem e são altamente obrigados os Snrs. Ad
ministradores a fazer tornar efectiva essa re
II]GSS{l. *

He bem sabido que os Recebedores dos


Concelhos não pódem, nem devem conservar
em seu poder quantias de dinheiro, exce
dentes á importancia, porque se houverem
afiançado para com a Fazenda Publica.
Neste caso, cumpre que os Snrs. Admi
nistradores de Concelho fiscalisem cuidado
samente a observancia deste preceito, fazen
do immediatamente, e sem a menor perda
de tempo, entrar no Cofre Central do Dis
tricto todo o dinheiro que estiver individa
mente nas mãos dos respectivos Recebedo
res, afim de que nunca se realise a previ
são do art. 36 das Instrucções de 8 de Fe
vereiro de 1843.
Sejam os Snrs. Administradores de Con
celho summamente sevéros em fazer cum
prir as disposições do art. 37 das referidas
Instrucções; e não consintam já mais, seb
sua restricta responsabilidade, que os Rece
– 390 —

bedores respectivos deixem de apresentar-se


lhes, até ao dia 3 de cada mez, a prestar
contas da sua gerencia, e responsabilidade,
em relação ao mez antecedente.
He por occasião desta tomada de con
tas no dia 3 de cada mez, que os Snrs. Ad
ministradores,por intervenção de seus Es
crivães, devem proceder ao exame e con
frontação dos documentos de cobrança efec
tuada, com a escripturação e titulos corres
pondentes que existirem na Administração de
Concelho, e igualmente á conferencia dos ta
lões, conhecimentos, e recibos, que os mes
mos Recebedores nessa epocha exhibirem,
com a relação que os deve acompanhar. —
E note-se que a mesma disposição he ap
plicavel á despesa efectuada pelos Recebe
dores. • .

Deve tambem haver a mais pontual e


xactidão em enviar á Repartição de Eazen
da do Governo Civil, pelo primeiro correio
immediato ao dia do exame, a conta ou de
claração do saldo existente em poder do Re
cebedor, para os fins marcados no S. unico
do art. 38 das ditas Instrucções.
Oferece-se agora, e he o logar pro
prio, de excitar todo o zelo dos Sºrº "º
— 391 —

ministradores sobre o mais importante nego


cio fiscal, que por Lei lhes he commettido;
quero falar da formalisação das Tabellas de
Cobrança dos rendimentos arrecadados em
dinheiro e em generos, segundo as disposi
ções do art 39 das citadas Instrucções. O per
feito e exacto acabamento destes documentos
he o serviço mais proveitoso, que se póde
prestar em materia de escripturação fiscal,
por isso que delle depende a escripturação
geral do Districto, que serve de base à ge
ral de todo o Reino.
Tanto as Tabellas de cobrança em di
nheiro, como as de cobrança em generos,
devem ser remettidas á Repartição de Fa
zenda do Governo Civil até o dia 8 de cada
mez; e nesta parte he indispensavel a maior
pontualidade, pois que embora tenham sido
exactos todos os Snrs. Administradores de
Concelho, menos um, na remessa das suas
respectivas Tabellas. o serviço fica paralisa
do na Repartição de Fazenda pela falta ou
ommissão desse unico Funccionario, que não
remetteo a tempo o que a Lei tão aperta
damente lhe recommenda.
Depois de remettidas as Tabellas teem
os Snrs. Administradores de Concelho que de
— 392 —

sempenhar fielmente o que lhes fie ordenado


nos arts. 40 e 41 das citadas Instrucções.
Tenho particularisado com toda a miu
deza os principaes pontos, que as Instruc
ções de 1843 prescrevem sobre a parte mais
importante da escripturação de Fazenda, a
cargo das Administrações e Recebedorias de
Concelho. Foi meu intento desafiar toda a
solicitude de taes Repartições, para que um
serviço de tamanha transcendencia se faça com
toda a exactidão e regularidade, evitando-se
as delongas, e as omissões, que muito em
baraçam o movimento da grande maquina fi
nanceira. Reporto-me no demais ao que dis
se na minha Circular de 21 de Fevereiro
de 1845, expedida para o Districto de Bé
ja, a qual por ordem do Governo foi nesse
anno mandada aos Snrs. Administradores do
Districto do Funchal por este Governo Ci
vil.
Espero pois ter, durante a minha Ad
ministração, muitos motivos de louvar a ac
tividade e zelo dos Snrs. Administradores de
Concelho sobre negocios de Fazenda, e até
occasiões de recommendar ao Governo de S.
Magestade o seu bom serviço neste particu
lar,
— 393 —

Deus Guarde a V. S." — Repartição de


Fazenda da Secretaria Geral do Governo Ci
vil no Funchal aos 4 de Novembro de 1846.
— Illm.º Snr. Administrador do Concelho
de........ O Governador Civil, Joze Sul
vestre Ribeiro.

-----…es><><>----

Circular aos Administradores de Concelho.

Repartição de Fazenda — L º 9.° —


N.° 87 — Circular — Illm.º Snr. — De
sejando só ter motivos e occasiões de ende
reçar louvores ás Authoridades com quem
tenho a satisfação de servir: e tendo mui
to a peito arredar a penosa necessidade de
exprimir-lhes o menor sentimento de desa
grado:
Dou-me por obrigado a declarar, que
tendo sempre á vista a minha Circular N.° 5877
de 4 de Novembro de 1846. e outra de 21
de Fevereiro de 1845, por mim dirigida ás
Authoridades Administrativas, quando Gover
nador Civil de Béja, e mandada observar pe
lo Governo de Sua Magestade: — não pode
rei dispensar-me de ser inexoravel para com
– 394 -

qualquer dos Snrs. Administradores que não


remetterem nos devidos prasos á Repartição
de Fazenda deste Governo Civil os documen
tos exigidos pelas Instrucções de 5 de Fe
vereiro de 1843, e fôr ommisso em obser
var e fazer observar litteral e restrictamen
te as disposições das referidas Instrucções,
a fim de que a escripturação, contabilida
de, e fiscalisação dos negocios da Fazenda si
gam uma marcha regular, methodica, e exac
ta, e a mesma Fazenda não sofra prejui
so algum. — Deus Guarde a V. S." — Pala
cio do Governo Civil no Funchal aos 2 de
Setembro de 1847. — O Governador Civil,
Joze Silvestre Ribeiro.

—=>$5<=

Ao Ministerio da Fazenda.

Repartição de Fazenda — Lº 1.° —


N.° 319 — Illmº e Exm.º Snr. — A Junta
Governativa deste Districto havia mandado
proceder á arrematação dos rendimentos dos
Disimos, Proprios Nacionaes, Real d'agua
de vinho e carne, e Subsidio Litterario de
todo o Districto.
Dissolvida a Junta, e restabelecido em
26 de Julho ultimo, o Governo Legitimo,
foi necessario que este Governo Civil olhasse
com séria attenção para o que neste impor
tante negocio se havia feito. Dizia-se geral
mente que alguns dos Termos de arrematação
nem sequer assignados estavam pelos arrema
tantes; — que á praça não haviam concorri
do muitos licitantes, que estavam escondi
dos, ou tinham duvida sobre a legalidade
de similhantes actos praticados perante autho
ridades que se reputavam ilegitimas; — que
era muito contestavel a idoneidade de cer
tos arrematantes e seus fiadores &c, &c.
* Na presença destes rumores era força
que eu procurasse indagar o que de positivo
havia nelles, e pºr esse motivo ordenti á
Repartição de Fazenda, em 28 de Julho,
que á vista dos documentos que encontrasse,
ou de informações de pessoas recommenda
veis me informasse sobre este particular, e
mittindo o seu parecer sobre se convinha re
considerar as arrematações feitas e abrir no
va praça, bem como propondo-me qualquer
providencia que de de já acautelasse os pos
siveis ou provaveis prejuisos da Fazenda. Cons
ta esta resolução da copia junta n.° 1.
— 396 —

No dia 29 respondeo-me a Repartição


de Fazenda nos termos que constam da copia
n.° 2, aconselhando a indispensabilidade de
abrir nova praça, e de no entretanto man
dar suspender a entrega dos generos arre
matados; — dando para tudo isto razões muito
attendiveis.
Conformando-me com o parecer da Re
partição de Fazenda, expedí nesse mesmo
dia, aos Administradores de Concelho a cir
cular constante da copia n.° 3, mandando
suspender, até nova ordem, a entrega dos
generos arrematados, e ordenando-lhes que
tomassem por conta o que estivesse arreca
dado dos disimos, e procedessem á fiscali
sação da Renda do real do vinho, e da car
ne, tres reis da carne e cinco por cento ad
dicionaes.
No dia immediato, 30 de Julho, con
voquei a Junta de Recursos, creada por De
creto de 8 de Abril de 1842, e submetten
do á sua consideração este negocio em pre
sença da informação da Repartição de Fa
zenda, decidio ela o que consta da copia
n.° 4.
Em virtude da decisão da Junta, logo
nesse mesmo dia, mandei afixar os Editaes
– 397 —

pelos quaes se annunciava que voltassem à


praça nos dias 9 — 10 — e 11 de Agosto
as Rendas dos ! Disimos, dos Proprios Na
cionaes, e dos impostos do Real d'agua de
vinho e da carne ec., tudo na fórma da
citada decisão da Junta de Recursos.

Efectivamente abrio-se nova praça nos


dias 9 — 10 — e 11 de Agosto findo, a
qual durou até o dia 17 do mesmo mez.
No primeiro dia da praça os Licitan
tes, maiormente os que tinham entrado com
dinheiro nos Cofres sob o Governo da Junta,
forcejaram muito para que se considerassem
válidas algumas das arrematações já feitas,
mas a Junta entendeu ser de rigorosa justi
ça sustentar a sua decisão do dia 30 de Ju
lho, dando como se não houvessem existido
as arrematações perante a Junta, e não se
fazendo cargo dos adiantamentos feitos á mes
ma Junta pelos arrematantes.
Em a nova praça conseguio a Fazenda
um interesse de Rs. 3:1643729. comparan
do os preços obtidos perante a Junta com os
que se obtiveram ultimamente, sendo Rs.
2.6863658 nos Disimos; — Rs 373444
nos Proprios Nacionaes; — Rs. 1533406 no
— 398 —

Real d'agua de vinho; — e ºs 2873221 do


Real d'agua de carne, tres reis em arratel,
e cinco por cento addicionaes.
Constam muito desenvolvidamente estes
optimos resultados dos Mappas N." ! A. —
Nº 2 B — N.° 3 C. — e N.° 4. D., que
juntos tenho a honra de encaminhar ás mãos
de V. Exc." — Nas casas de observações des
ses Mappas vão exarados todos os esclareci
mentos necessarios para bem avaliar este pon
deroso negocio, e entrar no conhecimento ca
bal das suas menores circunstancias. A es
ses esclarecimentos pois me re, orto, ousando
chamar sobre elles a attenção de V. Exc.".
Valeu pois a pena de que a Junta de
Recursos mandasse pôr novamente em praça
as arrematações das Rendas deste Districto,
pois que independentemente do vicio de nul
lidade que lhes encontrou, e que era forçoso
sanar, lucrou a Fazenda com esta operação a
quantia de tres contos cento e tantos mil reis,
e obteve mais seguras garantias dos contrac
tos; devendo notar se que estes resultados a
vultam tanto mais, quanto que já bem tarde
se verificaram as arrematações, o que he
sempre em desvantagem da Fazenda.
Entrei em todas estas miudezas, e a
-

"
Nº 1 – A.
MAPPA das arrematações das Rendas dos Dizimos a arrecadar-se em todas as Frequezias deste Districto
Administrativo do Funchal, no anno corrente de 1847, compºradas "º arrematações com as que tº bºrdi"
logar ante o governo que neste "º" Districto existira durante a administração da junta gºver" dette,
desde 29 de Abril a 25 de Julho ultimo, e com as do anno de 1846.

Preços e produ- Preços das arre- | Preçºs que obti- | Diferenças que
ctos das rendas matações no anno veram as mesmas | obtiveram para
arrematadas no I de 1847 durante | arrematações, le- mais em favor da

CONCELHOS FREGUEZ1AS anno de 1846 u. I a administração | vadas novamente | Fazenda naciº º


mas em globo e da junta gover- á praça, ante o em comparaçãº
outras a barril e nativa. Governo Ligitimo das arremataçoes
| |- - aiqueire. feitas perante a
|- - - junta governativa

Sé e S Pedro . . . . . . 164:490
Santa Maria Maior . . .. 92:355 |
São Gonsalo . . . . . . . ! 70: 132 |
Fusca… . . . . . . Santa Huzia e Monte .. |480:667 373:804 |
São Roque . . .. .. . . 624:394 -

| Santo Antonio - - -- -- 977:535 |

são Martinho .. .. .. 550; 522


Curral das Freiras . . 1 15:298 248:392 233.772 15:180

CAMA DE LOBOS. .
{ Cama de Lobos ..
Estreito ditto - .
..

4 244:722
665:628
- | Campanario. .
Fajã dos Padres e dos
.. ..
Asnos
.. 233:266
138: 625
/ () 4:800
4 43:728 156:860 4 1: 132

Postº do Sor... Todo º ººººººº: 790: 1 17 4 : 0 17:060 4,523:084 508:024


Arco da Calheta - - - - -- ) - -

Cajheta . . . . . .. 920:000 4,084864 1,3 10:147. 226:283


Estreito ditta . . . . . }
" - - - - - - ) | Prazeres e Jardim .. . |

Paul do Mar . . . . . 304:612 482:218 658:306 476:088


Fajã da Ovelha . . .. . | - |

Porto do Moniz e . . | } - • . C. / . ^{

PoRTO DO MONIZ ---- Ribeira


Seixa | da Janella •
.. } 1, 143:584 1, 159:347 1, 159:347
" . … • • • • • • • • • • 944; 3 1 1 932: 696 1,2 15:412 262.716
Ponta do Pargo . . * * * * 50: 170 365:332 506; 101 140:769
São Vicente . . . • • • • 4,322:684 4,426:920 1781: 120 334:200
São VicENTE ... } | Ponta Delgada e . .. .. ? •

- Boa Ventura. . . .. , 1,644:300 1,646:524 1,646:524


Santa Annº - - - - - - - 809: 600 | 8 19:720 1,434.452 3 14:732

A ANNA . . .
{ | * #0
Arcº de S㺠Jºrge . . . .
Jorge • • • • • • •
430; i {}{}
1,325:720
4. 3;767
4,367:212
435:767
1,858:032 490:820
|- º " …, , , : 1,363: 164 4,375:308 1.559:492 18 4: 184,
Porto da Cruz . . .. .. 1,842:852 1,856: 1 16 4,865: 145 |
- * * * - ---- Todo º Concelho . . . 738:832 S$6:34 2 886: 312
* . . …" . . . . Dito • • • • 342:006 467 344 469 · 368 2:02,4
º OfTO SANTO. . . - Dito . . .. .. .. 2,024:000 2,023:012 2,023:518 306

2 686:658

Declara-se que em virtude da resoluç㺠da Junta creada por Decreto de 8 de Abril de 1842, ante a qual tºº logar as
arrematações das Rendas Publicas deste Districto, como assim fôra determinado em Portaria emanada do Tribunal do The
souro Publico, por despacho de 22 de julho de 1842, com data de.... de Julho do mesmo antº: todas as Rendas que havião
sido arrematadas durante o governº da junta governativa do Districto foram levadas novamente a praçº. Pº º conhecer que
daquelas arrematações provinham á Fazenda prejuisos que convinha evitarsº: Do presente Mappa se vê quaes os productos de
taes Rendas no anno de 1846, quaes os preços porque foram arrem atadas ante o governo da juntº , Gºººº º "º obtiveraº
perante o Governo Legal - e ººººººº vantagens conseguidas a favor dº Fazenda. Andaram ºº pregão estas Rendas desde o dia
9 a 17 de Agosto corrente , e foram arrematadas em globo pelºs Prººººººº # a no indicados, as dos Concelhos de — Machico,
Stº Cruz, — Ponta do Sol , S. Vicente, Santa Anna, Calheta - Porto do Moniz — e Porto Santo e no de Catoa de Lobos sómen
te a do Curral das Freiras , e ºs duas da Fajã as dos Padres e dos Asnos, — todas as nais neste Concelho de Cama de Lobos,
apezar da do Campanario ter sido arremºtadº em globo ante o governo da junta governativa do Districto , e similhantemente
no Funchal a das Freguesias de Santa Luzia e Monte, não obtiveram arrematações situilhantes, mas sim a barril e aiqueire;
pelo que vendo-se exactamente quaes as vantagens resultantes Para a Fazenda , com para das as duas arrematações , não he pO *- -

sivel com tudo designar-se aº Gºº lhe possão Pº} dos Dizimos das Freguesias, cujas Rendas foram arte matadas a barril e
alqueire. Os dizimos do vinho da Freguezia de Cama de Lobos arrematados perante o governo da junta governativa do Dis
tricto a RS, 23 505 por barril obtiveram o mesmº preço ante o Governo Legal. — Os da Freguesia do Campanario, que haviam
sido arremata dos em globo ante a mesmº junta , Pº falta de lanço que assim conviesse á Fazenda em quatto andara in em
pregão, foram arrematados a barril por Rº. 15950 Os da Freguezia do Estreito, que ante a junta dita não tiveram arrema
tante, foram arrematados a barril ante o Governº Legal por Rs. 13800. — Os dizimos de cevada (sem se mencionar os de
Centeio ) de Cama de Lobos, Campanario e Estreitº, que ante º Junta dita haviam sido arrematados à Rs. 193.500 por meio
foram arrematados ante o Governo Legal, tanto estº comº ºs Ge centeio, milho, feijão e favas a preço de Rs, 385 po
arqueire. — Os dizimos do vinhº dº Freguesias do Concelho do Funchal - Sé, S. Pedro, — Santa Maria Maior, — S. Gon
safo, que ante a Junta dita não tiveram arrematantºs, obtiveram ante o Governo Legal os preços de fºs, 1,3760 ao barril Or
Sé e São Pedro; de Rs. 1 3 600 por Santa Maria Maior e S. Gonselo Os das Freguezias de Santa Luzia e Monte "…"
lados em Globo ante a Junta dita, por não tºrº" gººm assim os pertendesse , ante o Governo Legal obtiveram o” reco de
Rs. 13600 por barril. — Os das Freguezias de de Santo Antonio e S. Martinho foram arrematados . * } ,,, -• • • e

foram ante º Junta , sendo os de Santo Antonio a RS. 2,3475 por barril, e os de S. Martinho a """ "3"#" # ºs:
Roque sem a remat ção ante a Junta, foram arrºººtados a Rs 23 00 por barril. — Os º mº", tºdº cºmº do e
203 50 dito
Concelho foram arremºtados
do Funcha, arrematados ante
ante oa Governo Legal
Junta ditº, a peço
sendo os dedeCevada
Rs. 21,3000
a Rs. ao153100 ao moi
moio, co ". de} Cent
* a R }OlO G cºl0. 3 #S.

tação, e pelo
expostas, é namesmo preço
verdade , os vantajoso
muito dizimos deo acrescidº
milho , favas, e feijão.
de perto A fóra
de tres o bom
contos resultado
de leis, co,#"""
só nas *que*",
e das ponderaçoes 11Caim
Fazenda obteve pela operação de se abrir nova prº Perante o Governo Legitimo } 3TTê Thatações dos dizimos, que a
Repartição de Fazenda do Governo Civil do Distileto do Funchal 4 de Setembro de 1847 O Governador Civil, José
Silvestre Ribeiro, — Esta conforme, o secretario Gº", Marceliano Ribeiro de Mendonça. * *-*
Nº 2 – B.
M4 PP4 das arrematações dos rendimentos dos Bens Proprios Nacionaes rusticos a arrecadar-se em todos os Concelhos deste
Districto Administrativo do Funchal no anno de 1847, comparadas estas arrematações com as que tiveram logar ante o governo
que neste mesmo Districto existira, durante a administração da junta governativa, desde 29 de Abril a 25 de Julho deste anno,
bem como com as do anno de 1846.

Preços e produtos | Preços das arre- | Preços que ob- Diferenças que
|- dos rendimentos matações no anno | tiveram as mes- obtiveram para
- dos bens proprios de 1847 durante | mas arremataçõ= | mais em favor da
nacionaes rusticos | a administração | es levadas nova- fazenda nacional
CONCELHOS FREGUEZIAS arrematados em da junta gover- mente a praça an
1846 p." concelhos nativa. | te o Governo Les
uns em globo, ou- gal no mesmo an
tros a barril e al- no de 1847.
queire. -

FUNCHAI, .. - Todo o Concelho 355:718 374:440 374: 440


{'AMA DE LOBOS. . ditto $73: 778 797:456 | |

PONTA DO SOL . . ditto 40 l : ()(){} 457: 424 463:520 S 096


CALHETA . . . . ditto 21 1:895 335:718 335:748
PoRTO DO MONIZ. ditto 32: 624 50;701 62:744 12.043
SÃO VICENTE . . ditto 254.012 237:098 257:098
SANTA ANNA . . ditto | 40: 480 43:546 60821 17:303
MACHICO , . - ditto 68:316) 69.828 69.828 - -

SANTA CRUZ, . . ditto 109:802 1 14:320 14 1:320


37:444 |

O BS E R VA CO E S |- |

Declara-se que em virtude das mesmas causas expendidas nas observações consignadas no Mappa N.° 1 andaram estes
rendimentos em praça ao mesmo tempo com as rendas dos Dizimos Compara das as arrematações feitas ante o Governo Legal,
com as que tiveram logar perante o da administração da junta governativa, se evidencêa, na competente columna a melhoria
dos preços que obtiveram os rendimentos dos tres Concelhos — Ponta do Sol — Poito do Moniz — Santa Anna — dando todos
tres em favor da Fazenda o augmento de Rs 873444; e que não ha endo quem mais désse pelos rendimentos dos outros Con
celhos — Funchal Calheta — S. Vicente — Machico — Santa Cruz – foram arrematados pelos mes os preços quaes o tinhão sido
ante o governo da administração da mencionada junta; e supposto que os rendimentos ditos do Concelho de Cama de Lobos.
fossem tambem arrematados ante o mesmo governo, como se vê da respectiva columna, e não se conseguisse lanço similhante,
foram arrematados a barril, e aiqueire, sendo o vinho a Rs.23631 barril, o Trigo, a Rs. 42,3504 por n ojo, a Cevada, Cen
teio, Milho, Feijão, e Favas a RS 183216 moio; e as verduras foram contratadas com pagamento á vista em Rs 85,38 7.
Repartição de Fazenda dº Governo Civil do Districto do Funchal 4 de Setembro de 1847. – O Governador Civil, José
Silvestre Ribeiro, — Está conforme, O Secretario Geral, Marcelliano Ribeiro de Mendonça. -
N." 3 – C. - -

MAPPA das arrematações dos Rendas do Real d'agua de vinho a arrecadar-se nos Concelhos deste Districto Administra
tivo do Funchal, abaixo designados duranteo o anno economico de 1847 a 1848, comparadas estas arrematações com as que ti
veram logar ante o governo que neste mesm Districto existira no período da administração da junta governativa, desde 23 de
Abril a 23 de Julho deste anno de 1847 e com as do anno de 1846. -

- - •
Preços porque Preços das arre- | Preços que ob- | Diferenças que
ram arremanta- matações no anno | tiveram as mes= | obtiveram para
das no anno de de 1847 durante | mas arremataçõ= | mais em favor da
CONCELHOS -
FREGUEZIAS 1846Real
do Rendasl
as d'Agua ada adminis
junta tração
gover-| es levadas
mente nova-
á praça fazenda
an em naciona
compar açãol
|- de vinho, dos di nativa. te o Governo Le- I das arrematações
, versos Coneelhos gal. feitas perante a
junta governativa.

Sé e São Pedro . . . .
Santa Maria Maior . .
Santa Luzia e Monte . .
} 2,3 19:009 2,3 19:542 2,319:512

FUNCHAL . . .. Santo Antonie . . . .


São Roque .. .. .. } 194: 776 259: 104.
São Martinho . . . . . -

São Gonçalo... .. .. 73:392 73:904 76: 464 3.560


CAMA DE LOROS. . Todo o Concelho 284:24(} 348:300 393:460 44:960
PoNTA Do SoL . . ! ditto 844; 736 394 094 498:890 404:886
CALHETA . . . . ditto 243.896 244:152 242:82S
# PoRTo Do MoRIZ. ditto 83.760 94.000 | 89:486
SÃO VICENTE . . ditto 187:03() 139:744 446 688
SANTA ANNA . . ditto 462:640 462:663 314 : 600
MACHICO . . . . ditto 34 1:600 41(): 648 358: 125
SANTA CRUZ. . . ditto |- -
270:840 294: 320 | 288.933

- -
153: 406

O BS E R VA Q O ES.
Declara-se que em virtude das mesmas causas expendidas nas observações consignadas no Mappa N.° 1 —
andaram estas Rendas em praça ao mesmo tempo com as dos Dizimos. Comparadas as respectivas arrematações feitas ante
o Governo Legal, com as que se déram perante o da administração da junta governativa, que as contractára por todo o anno eco
nomico de 1847 a 1848; entenda-se que sómente foram arrematadas pelos doze mezes do mesmo anno as duas Rendas do Real
d'agua de vinho, a cobrar-se, uma nas freguezias. —Sé e S. Pedro — Santa Maria Maior — Santa Luzia e Monte. — e outra
na freguezia — S. Gonçalo. — A primeira destas duas Rendas, por não haver quem maior lanço oferecêsse foi arrematada pelo
mesmo preço porque antes se havia contractado; e a segunda obteve um maior lanço em que a Fazenda lucrou Rs. 3,5560,
ficando em administração a outra Renda semelhante das tres freguezias — S. Antonio — S. Roque. — S. Martinho — que ha
vendo tambem antes sido arrem atada, não houve ulteriormente quem a pretendesse; que sendo arrematadas por onze mezes as
Rendas semelhantes dos Concelhos de Cama de Lobos, e da Ponta do Sol [ bem como assim o fôram as dos demais Concelhos
restantes ] nestas duas arrematações lucrou a Fazenda, sobre os preços que antes foram contractados por um anno as duas ad
dições Rs.. 443960, e Rs. 1043886, descriptos na competente columna ; e mais lucraria se as podéra ter efectuado por doze
mezes com todas as dos subsequentes Concelhos, Calheta, Porto do Muniz, S. Vicente, Santa Anna, Machico, e S. Cruz; o
que não foi possivel, visto haverem os arrematantes ante o governo da administração da referida junta pago adiantadamente
a mezada correspondente a Julho, e por isso arrecadado o competente producto das mesmas Rendas. Entenda-se finalmente que
competindo ás Camaras Municipaes dos Concelhos ditos, a media parte dos preços contractados nas arrematações destas Rendas
sómente se demonstra neste Mappa a parte devida á Fazenda.
-
Repartição de Fazenda do Governo Civil do Districto do Funchal 4 de Setembro de 1847. — O Governador Civil, José
Silvestre Ribeiro, — Está conforme, O Secretario Geral, Marcelliano Ribeiro de Mandonça. -
Nº 4 — D. - • *
#APPA das arramatações das Rendas do Real d'agua de carne, dos trº reis em
arratº da mesma carne, e dos cincº º cento
addicionaes a cobrar-se nos Concelhos deste pistricto Administrativo do ºunchal, abaixo desig"008 dura" º "º economico de 1847 a
1848 comparadas estas arrematações com as que tiveram logar ante o gover"04" neste mesmo Districto existira noperíodo da administra
cão da junta governativa desde 29 de Abril a 25 de Julho dºtº "º de 1847, bem cº" com º do anno de 1846.

Producto de ca- | Preços Pºººº Preços que obti- Diferenças, que


da renda e seu | foram arremata" | Yºººººº mesmas | obtiveram para
- total por Conce- das anº ººººº" arrematações le= | mais as ditas ar
CONCELHOS DESIGNAÇÃO DAS hos em o an= | nº da junta go- Yºdas novamente. rematações em |

RENDAS
-
no de 1846:

ver 1847.
nativa em áGoverno
praça legal
ante noo favor da Fºzºº
da Nacional -

- - | mesmo anno de
- | - 1847, - }
-- - |
-
|-
–––– ---- -

Real d'agua de Carne.. ... 1424342 - -

Tres reis em arratel. - 2,620:575 |

5 por cento addicionaes. . . 129:335 - -

FUNCHAR, . . . . . . | 4,174:432
–––———- 4,244.780 | 4,311:197 66: 447 |
|

n㺠a nº do a mim, 202200 4533924 303.600 149.676 | "º


Real d'agua de Carne. - - - 70:978

- - Tres reis em arratel . . . . 448: 110 | |


#CAMA DE LOBOS. . 5 por cento addicionaes . . 7:376
T 15:56 139:656 142.680 | 3.024 |

Real d'agua de Carne. . . . - 32.256


- \ | Tres reis em arratel .. 73:822
#Portº Do Sor. . . 5 por centº addicionaes - - 3:598
100.676 |- 1 16:380 $: 704

- - Tres reis ém arratel. .. .. 77.585


CALHETA . . . . . . . . # Pºr cºntº addicionaes . . ____*_ - . |

|- 84 - 463 79.948 84.061 1:013

| Tres reis em arratel. . . . . 40.216


- * 5 por cento addicionaes . . 1: 976

Ponto no Moxiz. | 42:492


--> …>-- -------- 48.576 6:384

Real d'agua de Carne. . .. 32.266


- \ | Tres reis em arratel. . . . . 43:963
ºãº ViceNTE : 5 por cento addicionaes . . 2: 497

|- 78,426 |

- Tres reis em arratel . . - 70 e o


# [ 5 por cento addicionaes - - 3: 534
SANTA ANNA...
|- | -
__________
74.214

Real d'agua de carne. .. 17,75


|- Tres reis em arratel . . 19:421 -

MActrico ....... ) | 5 por cento addicionaes . . . 974


|- 38:035 44.998 3.963

|- Real d'agua de Carne. . . . ---- 20:55 |


SANTA CRUZ. . . . . #'; e S reis C}}} artºtel * * * * 32:283
|
' ' - 5 por cento addicionaes - - -
|-

--------
1:6 14 |

\ - |- 54: 732 {$0:720 5:988

| Real d'agua de Carne... .. 11 063


PoRTO SANTO. . . . . Tres reis em artetº . . . . 24:083
" | 3 por cento addicionaes . . 1.202

- { 36:348

| ---- 287:221

O E SERVAÇO ES
Declara-se que em virtude das mesmas causas expendidas nas observações consignadas no Mappa N.° 1 , andaram estas
Rendas em praça ao mesmº tººººººººº rendas dos Dizimos. Comparadas as arrematações feitas ante º Governo Legal, com
as que tiveram logar perante o da administração da junta governativa, entenda-se que aº Rendas comprehendidas nº Conce
hº do Funchal arrematadºs ante o governo da administração da referida junta, pelos doze mezes do anno economico correttº ,
não poderam ser assim contractadas perante o Governo Legal, porque aquelles arrematantes haviam pago adiantadamentº aº
mezadas correspondentes a Julho, e por isso efectuado a competente arrecadação do producto das Rendas; foram por tantº ºº
rematadas ante o Governo Legal por onze mézes: os preços destas duas arrematações mais subidos do que os efectuados por
dºze mezes, apresentam em favor da Fazenda as duas primeiras addicções designadas na competentº columna , que a renda
do Real d'agua de carne do Concelho de Cama de Lobos não tendo sido rema da perante o governo da juntº , foi contrac
tºda pelos doze nezes ante º Governo Legal, cujo preço comparado com o do anno precedente obteve a vantagem que sº evi
depºis na respectiva columna ; as rendas dos tres reis, e cinco por cento addicionaes, arrematadas por onze mezes pelas razões
supraditas deixaram para a Fazenda a vantagem descripta; que as Rendas dos Concelhos – Ponta do Sól, Machico, Santa
Cruz, Porto do Moniz, e Sant'Anna, pelas mesmas rasões expendidas, em relação á Renda do Real de agºº de Carne do
Concelho de Cama de Lobos, produziram para a Fazenda o augmento constante das addições designadas; e se declara que
nos Concelhos do Porto do Moniz º de Sant'Anna não ha Real d'agua de carne . — Que a Renda dos tres leis em arratel de
carne cºm ºs "º Pºr centº addicionaes do Concelho da Calheta onde não se cobra para a Fazendº o Real d'agua de carne ,
tºdº sidº arrematada ulteriormente Por onze mezes pelas razões já acima ponderadas, assim "ºs"º obtivera por este peri odo
"º "º do que anteriormente conseguira, por um anno, e por isso produzira para a Fazenda a quantia que evidenceia na
******** columna ; e finalmente; que não havendo quem pretendesse lançar nas Rendas dºs Concelhos — São Vicente e Porto
Sa º ficaram ambas em administração por conta da Fazenda em todo o anno economico correnº de 1847 a 1848.
- º de Fazenda do Gºvernº Civil do Districto do Funchal 4 de setembro de 1847. – O Governador Civil, José
* * Ribeiro, — Está conforme, o Secretario Geral, Marceliano Ribeiro de Mendonça.
— 399 —

presento a V. Exc." uma tão longa serie de


documentos, por isso que se tracta de um ob
jecto transcendente, e he sempre bom expôr
com a devida claresa e authenticidade os ne
gocios da Fazenda.
Deus Guarde a V Excº — Funchal aos
4 de Setembro de 1847 — Illm.º e Exm.º
Snr. Ministro e Secretario d'Estado dos Ne
gocios da Fazenda. — O Governador Civil,
Joze Silvesjre Ribeiro.

*--*E96=>-->

\_/ C o P I A N.° 1.

O Governador Civil do Districto do Funchal,


por Sua Magestade Fidelissima que Deus Guarde Yc.
Sende certo que o Governo de Sua Magestade
recommenda aos Governadores Civis, como um dos
cuidados que mais séria e fortemente devem occu
pal-os na presente conjunctura, a organisação dos
negocios da Fazenda:
E desejando eu ardentemente regularisar com
indispensavel presteza esse importante serviço, mar
chando todavia com a devida circunspecção, de
sorte que em tudo se guarde a justiça e se observº
religiosamente a Lei:
— 400 —

E seudo certo que o breve espaço da minha


administração anterior á ultima ordem de cousas,
me não proporeionou assaz de pratica sobre o que
póde haver de especial sobre negocios da Fazenda
deste Districto, maiormente em objectos de arrema
tações das rendas publicas; — circunstancia esta ,
que me impossibilita de avaliar até que ponto sejam
exactos os rumores que correm sobre a insustenta
bilidade das arrematações feitas durante o governo
da Junta.

Julgo indispensavel que a Repartição de Fa


zenda do Governo Civil averigúe, sem a menor
perda de tempo, e em presença dos documentos
que encontrar, ou de informações de pessoas re
commendaveis o que ha de verdade nesses rumores,
a fim de me propôr se convém aos interesses da
Fazenda reconsiderar as arrematações que se hou
verem indevidamente feito.
Como porém possa dar-se necessidade de to
mar desde já alguma providencia, que acautelan
do prejuisos possiveis ou provaveis, não seja de
naturesº definitiva; — a mesma Repartição de Fa
zenda me proporá sem demora o que neste parti
cular entender por conveniente. — Dado no Palacio
do Governo Civil no Funchal aos 28 de Julho de
— 401 --

1847. — Joze Silvestre Ribeiro. — Está conformc


— O Secretario Geral, Marcelliano Ribeiro de
Mendonça

C o P I A N.° 2

Illmº e Exmº Snr. — Os abaixo assignados,


em cumprimento do Alvará de V. Exc.° datado de
hontem, tendo examinado os Termos das arrema
tações, feitas durante a existencia da dissolvida
e illegal junta, alguns dos quaes nem assignados
estão pelos arrematadores, são de parecer que
taes contractos não pódem nem devem considerar
se válidos sem manifesto prejuiso da Fazenda: pri
mó porque em praça não concorreram todos os que
poderiam concorrer, — uns por estarem escondidos,
— outros por não considerarem válidos os contrac
tos feitos com um governo ilegal; e provindo da
concorrencia dos licitantes o augmento do preço
das arrematações, fica claro que quanto menor fôr
o numero delles, tanto menor será o preço obti
do : secundó porque arrematações ha feitas por pes
soas cuja idoneidade he muito duvidosa, e a Fa
zenda não deve fiar de taes mãos as suas rendas:

tercio finalmente porque rendas dos Disimos ha ar


— 402 —

rematadas com a condição de pagarem os arremata


dores as congruas constantes d'uma relação que lhes
fôra presente, quando para evitar duvidas se devêra
nos termos declarar o montante de taes congruas. —
Quando este parecer seja adoptado he de urgencia
oficiar-se desde logo aos Administradores de Con
celho; para que façam sustar a entrega dos ge
neros arrematados, tomem por conta o que existir
arrecadado de genero dos disimos, e procedam á fis
calisação e arrecadação das rendas do Real do Vinho,
e carne, tres reis de carne, e cinco por cento addi
cionaes.— Repartição de Fazenda do Governo Civil do
Districto do Funchal, 29 de Julho de 1847. —O De
legado do Thesouro, Roberto Ferreira Pestana. —
Antonio Jacinto de Freitas, Chefe da Repartição de
Fazenda. — Luiz Antonio de Ornellas. — Está con
forme. — O Secretario Geral, Marcelliano Ribeiro
de Mendonça

C o P I A N.° 3

Repartição de Fazenda — Lº 9° — N.° 2 —


Circular — Illm.º Snr. — Havendo me informado a
Repartição de Fazenda deste Governo Civil que as
arrematações feitas, durante a existencia da junta,
— 403 —

não pódem, nem devem considerar-se válidas, sem


manifesto prejuiso da Fazenda, pelas razões que am
plamente desenvolveu em uma Consulta que hoje me
dirigio; e sendo possivel que a Junta de Recursos,
a qual vou ouvir ámahãa, conformando-se com este
parecer, dê por nullos taes contractos; julgo indis
pensavel para bem dos interesses da Fazenda, or
denar que os Snrs. Administradores de Concelho fa
çam suspender desde já, e até nova ordem, a en
trega dos generos arrematados, tomem por conta o
que existir arrecadado dos generos dos Disimos, e
procedam á fiscalisação e arrecadação da renda do
real de vinho e carne, tres reis de carne , e cinco
por cento addicionaes. Deus Guarde a V. S." —
Palacio do Governo Civil no Funchal, 29 de Julho
de 1847. — O Governader Civil, Joze Silvestre Ri
beiro. — Está conforme. — O Secretario Geral, Mar
celliano Ribeiro de Mendonça

C o P I A N.° 4

Em os trinta dias do mez de Julho de mil oi


tocentos quarenta e sete, reunida a Junta , creada
por Decreto de oito de Abril de mil oitocentos qua
renta e dous na sala competente da Secretaria dº Go
— 404 —

verno Civil deste Districto Administrativo do Fun


chal, para efeito de consultar sobre a deliberacão
a tomar-se relativamente ás arrematações que, du
rante o periodo do governo intruso neste mesmo
Districto, acabaram de ter logar em diversas ren
das publicas de Disimos, e outras de real d'agua
de vinho e de carne, &c.; deliberou unanimemen
te que se conformava com o parecer da Repartição
de Fazenda deste Governo Civil pelas razões por ella
apontadas; todavia, quanto ao resultado, he de
parecer que tem de fazer-se as seguintes modifica
ções: Primeira: Quanto ás rendas dos Disimos, e
rendimentos dos Proprios, se deviam as arremata
ções, feitas perante a Junta, considerar como nul
las e de nenhum efeito: Segunda: que quanto aos
Tributos, apezar de haver a mesma nullidade, co
no haja decorrido um mez, cujo producto foi re
cebido pelos arrematantes devem de novo ir á pra
ça pelos onze mezes restantes: Terceira: E quanto
ao subsidio literario, cujo producto, na actuali
dade, póde estar já recebido, não havendo por
isso quem licite em praça, devia representar-se ao
Governo, para resolver o que julgar justo; suspen
sos no entanto os efeitos da arrematação. Portan
to mandam que julgadas nullas as arrematações
— 405 —

feitas, se proceda de novo a ellas, nos termos,


e pelo medo supramencionado, e quanto aos dinhei
ros entregues por conta, ou pagamento de rendi
mentos arrematados, a Junta protesta não appro
var estes actos consummados, sem que para isso
receba ordem do Governo de Sua Magestade, de
quem vae solicitar Regia Resolução; e outro sim
ordena que ás novas arrematações se proceda den
tro do improrogavel prazo de dez dias, contados
do da data da publicação da presente Consulta.
Antonio Jacinto de Freitas, Chefe da Repartição de
Fazenda, servindo de Secretario da Junta, a fez —
Ribeiro — C. e Sousa — Silveira — Torres — Veiga.
— Está conforme — O Secretario Geral, Marcelia
no Ribeiro de Mendonça.

*as…………***

Repartição de Fazenda — 1.° Secção — L,º 9.°


— N.° 415 — Circular — Illm.º Snr. — Muito aper
tadamente tem o Governo de Sua Magestade re
commendado em differentes occasiões ás Authorida
des Administrativas que olhem attentas para tude
quanto diz respeito ao imposto das sizas, em or
dem a que a Fazenda Publica não seja prejudica
- 406 –

da em seus rendimentos, nem fique fora da acção,


fiscal um só acto que involva legalmente o paga
mento do mesmo imposto.
Muito espalhadas andão porém as diversas
providencias, e resoluções que o Governo tem to
mado, e um tanto complicados são a Legislação e
regulamentos existentes sobre este negocio; de sor
te que eu julgo prestar bom serviço aos Srs. Ad
ministradores de Concelho, oferecendo á sua con
sideração um resumo substancial de tudo quanto
neste serviço póde aproveitar-lhes para o cabal de
sempenho dos seus deveres, e para o bem dos in
teresses publicos.
N’este sentido envio a V. S." a inclusa copia
impressa de uma circular que, no anno de 1845,
dirigi aos Srs. Administradores de Concelho do
Districto de Bêja (…) na qual dou uma idêa abre
viada da parte historica do imposto das Sizas: a
presento depois algumas ponderações sobre o bene
ficio que trouxe aos povos o Decreto de 19 d'Abril
de 1832 acabando com as desigualdades desse im
posto até então immensamente ante-economico; men

(*) Vede a « Colleção de alguns escriptos ad


ministrativos do Governador Cívil de Béja, o Snr.
Jose Silvestre Ribeirº.» — Lisboa, 1845,
– 407 –

ciono em seguimento a legislação novissima ; e ul


timamente traço o quadro resumido das provi
dencias tomadas pelo Governo desde o anno de
1835.

Tornando agora a examinar esse trabalho, reco


nheci a necessidade de lhe acrescentar algumas dis
posições de Portarias e Resoluções Regias, que me
havião escapado. E o que na presente circular pas
SO a tranSC rever :

Na Portaria do Thesouro Publico de 17 de Maio


de 1836 — Manda Sua Magestade que os Gover
nadores Civís convidem por Editaes todos os que
tiverem celebrado compras e vendas de bens de rais
desde a publicação do Decreto de 19 d'Abril de
1832, para que no prazo de oito dias paguem a
respectiva Siza, pena de serem depois executados
pelo dobro, e poderem ser denunciados, vencendo
o denunciante o premio que a Lei marca.
Portaria de 6 de Março de 1838. — Reino –
Ordena que ás Authoridades Administretivas sejam
remettidas, em quanto ao preterito, relação dos
credores a quem se tenhão adjudicado bens de
raiz, com a declaração das quantias dos bens adju
dicados, sua situação, confrontacões, e preços, ou
valores por que foram adjudicados em pagamento;
— 468 —

- e que de futuro se remettam relações semelhan


tes nos casos Occorrentes.

Esta Portaria demonstra que segundo a letra


e espirito da disposição do Art. 23 §. unico do
Decreto n.º 26, de 18 de Maio de 1832, a ad
judicação e separação dos bens de raiz nos inven
tarios para a solução das dividas passivas legalisa
das do casal dividendo produz o efectivo pagamen
to e extincção das mesmas dividas. O efeito juri
dico destas adjudicações he a transmissão do do
minio e propriedade para os credores adjudicata
rios, exceptuando os corpos de mão morta, em
razão da incapacidade de possuirem bens de raiz;
e por consequencia he essa separação e adjudica
ção de bens de natureza tal, que na censura de
direito se considera compra e venda, sendo o pre
ço d'esta aquelle por que se verificou a adjudicação,
do qual se deve siza conforme o disposto no S. 1.",
Cap. 39 dos Artigos das Sizas do Alvará de 5 de
Maio de 1814, e no Art.º 1.° de Decreto de 19
de Abril de 1832, que limitou e restringiu o paº
gamento das sizas sómente á compra e venda dos
bens de raiz.

Pela Portaria de 9 de Junho de 1838 se pro


hibe aos Recebedores de Concelho a abusiva prati
— 409 —

ca de exigirem e perceberem emolumentos pelos


Conhecimentos de Sizas, e pelas verbas de sello
que passam aos Contribuintes.
Em Portaria de 7 de Novembro de 1838 se

recommenda aos Juizes de Paz que se a Concilia


ção involver algum acto de que se deva siza, in
cumbe aos respectivos escrivães não expedir o ti
tulo de conciliaçao sem encorporar n’elle o conhe
cimento do pagamento da siza, na conformidade
da Urdenação do Livro 1.°, Titulo 78 §. 14.
A Portaria de 17 de Julho de 1841 do The

souro Publico manda que se fação as mais activas


diligencias para obter conhecimento dos individuos
que, ou por adjudicações feitas nos Juizos de Paz,
ou por Escriptura Publica, ou por contracto en
tre particulares, por meio de escriptos, ou ajustes
verbaes, estejam de posse de bens sem previo pa
gamentº da siza, formando-se summarios das dili
gencias a que se procede", os quaes serão remet
tidos ao Contencioso, para serem constrangidos es
ses individuos a satisfazer o que deverem deste im
posto, e as penas em que tenhão incorrido, bem
como todas as mais pessoas desobedientes ao precei
to da Lei. — Na mesma Portaria se recommenda
aos Administradores Geraes, Administradores dº
— 410 —

Concelho, Regedores de Parochia e até aos Cabos


de Policia que syndiquem c vigiem constantemente
se os possuidores dos predios, situados nas suas res
pectivas localidades, teem ou não titulos legaes,
exigindo, para o fim de se arrecadar a siza, a
aprczentação dos mesmos titulos.
A Resolução de 12 de Setembro de 1843, pu
blicada em Edictal de 15 do mesmo mez e anno

declara abusiva, illegal, e intoleravel a pratica


de se reputarem bens immoveis as Inscripções da
Junta do Credito Publico para o caso das trocas
de que falla o Decreto de 19 de Abril de 1832,
no qual, como no das vendas dellas proprias se
deviam considerar como valor ou preço do con
tract0.

Na Portaria do Ministerio da Fazenda de 20


de Agosto de 1845 dá-se a seguinte hypothese
D. Barbara Felicidade Ferreira pediu se de
clarasse não ter logar o pagamento de siza pela
subrogação de um foro vinculado de quatrocentos
e vinte mil reis, que havia contractado com D.
José Maria Carlos de Noronha Castilho por oito
contos e quatrocentos mil reis, em Inscripções da
Junta do Credito Publico.
A resolução do Governo he a seguinte: Que
— 411 —

no contracto a que se allude he illegal a exigen


cia da siza, por isso que devendo a subrogação
vincular ter um valor igual ao dos bens que li
berta, não ha excedente sobre que se deva calcus
lar siza. — Neste caso não se dá venda de bens

vinculados por Inscripções para com estas se eom


prarem bens de raiz, mas intervem para ficarem
substituindo os bens vinculados.
Addicionada assim a minha Circular do anno
de 1845, vem ella a oferecer aos Srs. Adminis
tradores uma especie de Collecção de tudo quan
to de mais importante ha sobre o Imposto de Si
zas, na parte relativa á missao administrativa e fis
cal; e eu espero que V. S." se penetrará da dou
trina d’estes dous escriptos, desempenhando com
zelo as obrigações que lhe são recommendadas.
Deus Guarde a V. S. — Palacio do Governo
Civil no Funchal aos 29 Janeiro de 1848. — Illm.º
Snr. Administrador do Concelho de......... O
Governador Civil, José Silvestre Ribeiro.

Repartição de Fazenda — l.° Sessão — Lº 9.°


Nº 462 — Illm.º Snr. — Se ha ahi objecto que de
mande exactidão, e regularidade, he por certo a
— 412 -

arrecadação dos dinheiros publicos, e a sua entre


ga nos Cofres da Nação. D'aqui vem que com to
do o cuidado e eficacia tenho ja chamado a atten
ção dos Srs. Administradores sobre este assumpto,
e que ainda uma vez venho recommendar lhes o
que neste particular tenho por conveniente, em
ordem a que jamais incorram na responsabilidade
que a lei lhes commina, e aos Srs. Recebedores.
O que quer a lei neste ponto? Quer que os
Recebedores dos Concelhos ou Freguezias não con
servem em seu poder quantias de dinheiro exceden
tes á importancia porque se houverem affiançado
para com a Fazenda Publica.
Quem pode naturalmente , e deve por lei fis
calisar cuidadosamente a observancia d’este precei
to? Os Administradores de Concelho — Porque?
Porque tal he a obrigação imposta ao seu cargo
para bem da Fazenda Publica, que precisa da ar
recadação dos seus rendimentos, e he altamente
prejudicada em que o respectivo producto fique
nas mãos dos cobradores, tanto mais quanto estes
podem tornar-se insoluveis.
Afóra porem a força do dever legal, ha tam
bem uma razão poderossima para que um Admi
nistrador de Concelho nao deixe parar dinheiros
nas mãos do Recebedor, e vem a ser, e seu pre
prio interesse — Leia-se a Portaria de 17 de Se
tembro de 1846, e ahi se encontrará esta grave
advertencia : — « Os Administradores de Concelho
« responderão elles mesmos, por seus bens por qual
« quer alcance dos Recebedores de Concelho,
« quando se prove que á sua indolencia e falta de
« cumprimento das obrigações, que a tal respeito
« lhes são impostas he devido o mesmo alcance » E
note-se que as Instrucções de 8 de Fevereiro de
1843 no art.° 36 in fine estão em perfeito accordo
com esta disposição.
Convencido estou de que não he mister fazer
valer esta ultima ponderação para que os Srs. Ad
ministradores e Res ebedores, com quem tenho a
honra de servir n’este Districto, desempenhem os
seus deveres no que respeita á gerencia financei
ra. As generosas e nobres inspirações da probida
de e do pondonor são suficientes para os incitar
a promover os interesses da Fazenda, e a arredar
severas responsabilidades; julguei todavia conve
niente insistir sobre este ponto, para que em tem
po algum se possam queixar de que não foram
avisados por quem tem obrigação de os bem dirigir.
Aproveitando esta occasião tocarei de passa
—414—

gem outros objectos relativos á Fazenda Publica,


que muito importantes considero:
Estou satisfeito com a promptidão e regulari
dade que nestes ultimos mezes tem havido na remes
sa á Repartição de Fazenda das Tabellas; e folga
rei muito de só ter de elogiar d'ora em diante o
bom serviço dos Srs. Administradores nesta parte,
como sendo um trabalho de impreterivel necessida
de, e da mais apertada urgencia.
Convencido de que tanto os Srs. Administrado
res, como os Srs. Recebedores de Concelho trata
rão de estudar as Instrucções de 8 de Fevereiro
de 1843, bem como todas as Leis vigentes e or
dens do Governo, pelas quaes se regula a arre
cadação dos rendimentos publicos, a entrada da
sua importancia nos Cofres do Estado, e o demais
que a semelhante respeito he relativo; — não can
çarei a V. S." com a enumeração das diferentes
incumbencias que nestes documentos são referidas.
Limitar-me hei porém a observar que o problema
a resolver neste caso he o seguinte: Que os rendi
mcntos publicos entrem a tempo com o minino des
faique e com a menor oppressão e vexame do con
tribuinte, nos Cofres do Estado.
As Authoridades Administrativas devem possuir
— 4 15—

se do seguinte principio : « He justo que assim co


« mo se exige dos Contra tadores de impostos e
« rendas nacionaes o cumprimento das obrigações
« a que se sujeitaram, assim tambem deve pro
« porcionar-se-lhes os meios de arrecadarem o que
« lhes fôr devido. »

He por isso que as Authoridades Administrati


vas devem adoptar todas as providencias que fôr
necessario pôr em pratica, para que os arrematan
tes possam promover com facilidade a arrecadação.
He o que se deduz da Portaria do Ministerio da
Fazenda de 29 de Setembro de 1846.

Logo que os Srs. Administradores de Concelho


houverem recebido quaesquer Certidões de dividas
fiscaes para cobrança administrativa, nos termos
do que dispõem os Decretos de 13 de Agosto de
1844, e 30 de Dezembro de 1845, devem proce
der sem a menor demora á instauração das deligen
cias necessarias para tal cobrança, em conformi
dade das respectivas Instrucções publicadas no
Diario do Governo N.° 8 de 9 de Janeiro de 1846;
cumprindo-lhes outro-sim dar immediatamente con
ta pela Repartição de Fazenda do Governo Civil,
do numero de certidões de semelhantes dividas,
que conservarem em seu poder, com declaração
— 416–

da respectiva importancia total, e distincção das


que se acharem em processo ou sein andamento, e
porque motivo Portaria do Tribunal do Thesouro
Publico do 1.° d'Outubro de 1847.
He summamente importante que os Srs. Admi
nistradores de Concelho procurem ter em perfeita
ordem a escripturação da Fazenda em todas as suas
partes, lembrando-se de que « acontecendo verifi
« car-se, em resultado das visitas a que o Gover
“ nador Civil mandar proceder, que os documen
«( tos da escripturação a cargo dos Administrado
(( res se acham em abandono, far-se ha effectiva
a disposição do art.º 8.° do Tit 4º do Decreto
« n.° 22 de 16 de Maio de 1832, que determina
« — que as despezas das visitas sejão pagas pelos
« Empregados, que forem achados em omissão ou
« culpa.» Portaria do Ministerio da Fazenda de
8 de Outubro de 1847.
Hum objecto ha em que eu devo fixar a at
tenção dos Srs. Administradores de Concelho, e
vem a ser, o cuidado relativo á conservação dos
predios nacionaes, rusticos e urbanos, que andam
de arrendamento. Deve ter-se todo o cuidado em
examinar se os arrendatarios e Inquilinos tratam
bem os predios, para se evitarem os prejuizos da
— 417 —

Fazenda, e poder haver o conveniente procedimen


to contra quem o merecer.
Deus Guarde a V. S.". Palacio do Governo
Civil no Funchal, aos 23 de Fevereiro de 1848.
— Illm,º Sr. Administrador do Concelho de .....
— O Governador Civil, José Silvestre Riboiro.

Expostos.

A Camara Municipal do Funchal.

2.° Repartição — L.º 3.° — N.° 292 — Illmº


Snr. — Folgára eu de só ter occasiões e motivos
de louvar as Corporações respeitaveis, a quem a
lei commette a importante gerencia dos negocios
municipaes; e ser-me-ha sempre penôso o desem
penho do dever impreterivel de despertar a sua at
tenção, ou desafiar a sua solicitude sobre quaes
quer objectos de sua competencia, em que por ven
tura haja alguma ommissão ou falta, e maiormente
com prejuizo dos interesses publicos.
N’este ultimo caso me vejo constituido hoje,
— 418 —

para com a Camara a que V. S." preside; se bem


que no assumpto de que vou tratar, não esteja ella
envolvida em responsabilidade, por ter entrado ha
tão pouco tempo em exercicio. Como porem os
corpos moraes não morrem mas sim se succedem
sem interrupção, he obvio que as Camaras presen
tes teem obrigação de remediar o que deixáram de
fazer as suas predecessoras, ou de melhorar o que
ellas fizeram indevidamente.

Entre as despezas obrigatorias das Camaras, se


alguma ha urgente, impreterivel, e que sobre
todas as outras deva ser satisfeita com preferencia,
he sem duvida a relativa á sustentação dos malfa
dados expostos. Muito se tem já dito sobre este
assumpto e ocioso fôra agóra estar a demonstrar
uma asserção, que o coração admitte e abona
Sendo assim, he bem para lamentar que a este
Governo Civil tenham subido tantas representações
de Camaras, pedindo que se lhes pague a divida
em que para com ellas está o cofre geral dos ex
postos; fazendo algumas saber, que ás amas se
devem os salarios de 18 mezes !
E como não será assim, se a Camara Munici
pal do Funchal deve ao dito cofre geral a quantia
de 4:4193840 reis, contando só até ao dia 31
— 419 —

de Dezembro de 1845 ?
Queira pois V. S." submetter á consideração
da Camara estas ponderações convidando-a a dar
a este respeito o possivel e mais prompto remedio,
como o demandam imperiosamente o apuro e mi
seravel situação das amas dos expostos, e a indis
pensabilidade de satisfazer ás mui justificadas exi
gencias das Camaras, a quem o cofre geral está
devendo.
Deus Guarde a V. S.". Palacio do Governo Civil
no Funchal 5 de Novembro de 1846. Ill"º Snr.
Presidente da Camara Municipal do Funchal —
O Governador Civil Joze Silvestre Ribeiro.

--… =*

2º Repartição — Lº 3.° — Nº 299 —


Circular — Illm.º Sr. — Entre as despezas, a
cuja satisfação são applicados os rendimentos
municipaes, poucas, raríssimas mesmo haverá
de tão reconhecida urgencia, como a da sus
tentação dos expostos — dessas infelizes, e
innocentes creaturas, que a Legislação de todos
os paizes civilisados colocou sob a protecção
e amparo da publica beneficencia.
No Codigo Administrativo he esta despeza
classificada como obrigatoria, e com isso deo
— 420 —

o Legislador uma prova iniquivoca da alta


consideração, em que a tinha, e transmittio
ás municipalidades o preceito de a attenderem,
como encargo por extremo importante. — He
verdade que a Lei não deo um caracter de
preferencia a esta obrigação de acudir á sus
tentação dos expostos; mas o que a Lei não
disse, recommenda-o altamente como um de
vér imperioso a voz da humanidade, a que
não devem ser surdos aquelles a quem incum
be vigiar pela sorte de tantos desditozos,
que , privados na primeira quadra da vida de
seus protectores naturaes, só podem contar
com os soccorros que a patria, mãi commum
dessa classe de desvalidos, providentemente
consagrou para auxilio e esteio do primeiro
periodo de sua existencia.
Mas quão longe estamos nós de olharmos,
como nos cumpre, por este ramo de serviço,
a que a lei, a humanidade, e mil conside
rações de interesse social dão tão subida im
portancia! quão longe estamos de termos at
tingido esse desiderandum de beneficencia,
e de philantropia!
Alem de outros factos que comprovam es
ta triste verdade, ha um, que as Camaras
Municipaes devem fazer cessar quanto antes.
— 421 —

Todos os dias se apresenta neste Governo Ci


vil crescido numero de amas de expostos,
queixando-se de que ha longos mezes não re
cebem nada por conta de seus salarios. E
como póde esperar-se que estas mulheres,
desprovidas de meios de subsistencia, te
nham com as creanças, de que se encarre
garam, os cuidados que reclama a sua tenra
idade, e que substituam para com elas o lo
gar de mães, que seu máo fado quiz que
não conhecessem, se nos infelizes expostos
não vêem senão um encargo, que aggrava
a sua mesquinha existencia ?
He pois de toda a força que as Camaras
Municipaes se penetrem da importancia dos
deveres que têem a desempenhar em objecto
de tamanha transcendencia; —he de força que
façam cessar os justissimos clamores que le
vantam as amas dos expostos, acudindo-lhes
com os recursos, a que têem indisputavel
direito, e de que tanto carecem; por que
a continuação do procedimento ate-agora se
guido, he não só grave injustiça para com
as ditas amas, mas influe da maneira mais
prejudicial na creação e trato das creanças,
que lhes foram confiadas.
Certo que a Camara, a que V. S." pre
— 422 —

side, terá na devida consideração quanto


deixo exposto, desde já espero que empe
nhará os mais activos esforços para pôr ter
mo aos males, que derivam da falta de cum
primento das providencias legislativas no que
respeita á sustentação dos expostos.
Devo por fim ponderar a V. S." que,
alem desta obrigação geral para todas as
Camaras, ha outra especial. e de grave mo
mento para algumas, qual he — a de satisfa
zerem com toda a brevidade a divida que con
trahiram para com o cofre geral da sustenta
ção dos expostos; porque he de toda a urgen
cia que esse cofre solva, por sua parte, os
debitos em que está para com certas Cama
ras, que não cessam de reclamar o pagamento
com uma força de justiça, a que não póde
oppor-se nenhuma objecção.
Deus Guarde a V. S." Palacio do Governo Ci
vil no Funchal, 21 de Novembro de 1846.
= Illmº Snr. Presidente da Camara Muni
cipal de...... = O Governador Civil, José
Silvestre Ribeiro.
— 423 —

INSTRUcçAõ PUBLICA.
***--*>@é=>-----

Aos Administradores de Concelho.

4 º Repartição — Lº 3.° — Nº 1050 —


Circular — Illmº Sr. — Nas visitas, que por
dever do meu cargo tenho feito a diversas es
cholas desta Cidade, tenho tido occasião de a
Preciar o merecimento de alguns Professores,
bem como o talento e progressos de muitos
dos seus alumnos, e se nem tudo o que hei
visto me tem completamente satisfeito, nem
por isso desespero de vêr melhorado pouco
e pouco este importantissimo ramo de serviço
publico, graças ás felizes disposições naturaes
que encontro nos Madeirenses.
Um dos Professores porem fez-me saber,
que alguns dos seus discipulos, por oc
casião de lhes estranhar o modo indecente e
tumultario com que sahiam da aula, lhe ob
servaram que elle Professor somente tinha
auctoridade sobre os alumnos dentro da eschola!
Fez-me uma desagradavel impressão esta
resposta impertinente, a qual revela uma in
— 424 —

docilidade, bem pouco propria dos primeiros


annos da vida, e accusa desgraçadamente que
sob o tecto paterno não receberam, talvez,
esses meninos a desvelada educação, com que
deveram entrar no santuario do magisterio.
E com efeito, qual tempo he este nosso,
em que umas poucas de crianças se arro
jam a contestar ao seu Mestre o indisputa
vel direito, que lhe assiste, de encaminhar
os seus discipulos pela carreira do bem, e
de lhes influir os proveitosos principios da
moral e da civilidade? Devo eu queixar-me
da extravagante petulancia dos filhos, ou da
descuidosa indiferença dos paes na materia
de educação ?
Seja o que fôr, entrego á consideração
de V. S." a resolução desta difficuldade,
cumprindo-me agora unicamente chamar a
sua attenção sobre este melindroso negocio,
e convidal-o a d'ora-avante procurar saber dos
Professores, na occasião em que desempe
nhar o dever que o seu Regimento lhe pres
creve de inspeccionar as escholas, se alguns
alumnos ha desobedientes a seus Mestres, ou
se para manterem a policia de suas Aulas
elles carecem de alguma coadjuvação, ou fi
nalmente se convem lembrar a alguns Paes
— 425 —

a necessidade de advertirem seus filhos, em


quanto ao comportamento destes.
Faço a devida justiça á discrição de V.
S", e supponho qne tomará parte no disgos
to que me causou a resposta, a que acima
alludí, e que nessa conformidade olhará com
serio cuidado para este negocio Aonde nos
levariam o desleixo e a indolencia com que
parece olhar-se para a educação litteraria,
moral. e religiosa da infancia e da mocida
de? Aonde nos levaria a desassisada crença
de que um Professor só deve ser obedecido
dentro das paredes da sua eschola , e que em
sahindo do lumiar da sua porta, ficam os alum
nos desembaraçados de toda a sujeição moral?
Praza aos Ceos que os Professores nunca
se deslembrem de que o Magisterio he tam
bem um genero de Sacerdocio, e que em
reunindo á sciencia o prestigio de uma vida
pura e exemplar, serão considerados como
novos paes de seus discipulos, tão acredores
ao respeito destes como o são os verdadei
ros progenitores. = Deus Guarde a V. S."
Palacto do Governo Civil no Funchal, 7 de
Novembro de 1846 = Illmº Snr. Adminis
trador do Concelho de...... = O Gover
nador Livil, José Silvestre Ribeiro.
— 426 —

A Camara de Camara de Lobos.

4.º Repartição — N.° 456 — Liv. 1.° — Illmº. Srs.


—Tendo hido hontem visitar o interessantissimo
e magnifico sitio do Curral das Freiras, tive oc
casião de saber que naquella povoação não existe
eschola de ensino primario, sendo muito para
notar que não haja entre os moradores, senão o
Parocho e o actual Regedor que saibam ler e es
CTCV e T.

Conversei largamente sobre este objecto com


muitos dos moradores, e todos lamentavam amar
gamente a falta, que eu muito deplóro. Lembrei
me porém de perguntar ao Parocho se elle quere
ria incumbir-se de ensinar as crianças da sua fre
guesia, e elle me respondeo que, com quanto lhe
fosse penoso esse trabalho, se prestaria com tudo
a toma-lo sobre si em attenção ao grande benefi
eio que nisso faria ao povo.
Estando as cousas nestes termos occorre-me
appellar para a illustração e patriotismo de V.
S", e rogar-lhes a mercê de tomarem em conside
raç㺠a urgentissima necessidade do estabelecimen
to da eschola de ensino primario na dita fregue
sia do Curral das Freiras. •
— 427 —

A boa disposição do referido Parocho he muito


de approveitar, por isso que reconheci na pessoa
delle assaz de aptidão e bons termos para exercer
o Magisterio, e demais disso, por que tenho para
mim que he sempre da maior vantagem enlaçar o
Santo Ministerio Parochial com o ensino litterario
da infancia. Com os primeiros rudimentos das le
tras he mister insinuar no espirito e no coração das
crianças os principios de moral , e da Religião;
e quem mais proprio para isto do que os Paro
chos? A fóra esta consideração, e outras muitas
que podéra adduzir, ha tambem a notar que os
Parochos estão nas circunstancias de poderem in
cumbir-se da regencia de taes cadeiras nas suas
Parochias por menor sallario, do que um homem
que exclusivamente se consagrasse ao ensino, pois
que, em se accrescentando ás suas congruas, que
elles já percebem, uma gratificação rasoavel, muito
facilmente podem elles prestar-se a um serviço,
que tanto em harmonia está com os seus mistéres
parochiaes.
Se pois V. S." adoptarem este meu modo de
ver as cousas, muito me favorecerão se se digna
rem de cuidar desde já em levar a efeito o plano
que suggiro, entendendo-se com o referido Parocho,
— 428 —

e providenciando no demais como julgarem conve


niente, a fim de proporcionarem áquella povoação,
a quem a naturesa fez tão notavel, o beneficio
immenso da instrucção primaria. — Deos Guarde
a V. S." — Palacio do Governo Civil no Funchal
aos 9 de Novembro de 1846. — Illmº Snr. Presi
dente e Membros da Camara Municipal de Camara
de Lobos. — O Governador Civil, José Silvestre
Ribeiro.

Aos Administradores de Concelho.

4 º Repartição — Nº 1091 — Lº 3º –
Circular, — Ilm° Sr. — As Leis que se re
commendam pelo seu caracter salutar, provi
dente, e civilisador, devem ser executadas
com toda a ponctualidade e sem a menor in
terrupção.
Deste numero he a Lei de 20 de Setem
bro de 1844, relativa á Instrucção Publica.
Impõe ella aos paes, tutores, e superiores
º ºbrigação de mandar ás escholas de Instruc
ção Primaria das povoações onde residem,
ou dentro de um quarto de legoa em circum
ferencia, a seus filhos, pupilos, ou outros
subordinados desde os sete annos até aos quin
— 429 —

ze de edade; e no caso de falta, exige que


o Administrador do Concelho successivamen
te os arise, intime, e reprehenda e ultima
mente os multe de 500 até 13000 reis,
observando-se esta disposição todos os annos
nos primeiros tres mezes do anno lectivo.
Não percâmos nunca de vista esta excel
lente determinação da Lei, para que não suc
cêda que se apague esse fogo sagrado da ins
trucção pela incuria e desleixo daquelles, que
o devêram alimentar com aturada perseveran
ça. — A natureza, e a sociedade ordenam aos
cabeças de familia que cuidem da educação
e do ensino dos seus subordinados; mas se
elles são indolentes e remissos no desempe
nho deste dever imperioso, acudam as Autho
ridades com as suas instancias a remediar uma
falta, que tão nociva se torna aos povos.
Não se esqueça V. S." jamais de desem
penhar a incumbencia que a Lei lhe com
mette de inspeccionar as escholas de ensino
primario. Na occasião de repetidas visitas
áquelles estabelecimentos convem despertar
o fervor dos Professores, pedindo-lhes para
bem da humanidade que se esmerem na edu
cação litteraria, moral e religiosa das crian
cinhas, confiadas ao seu magisterio. Nessas
— 430 —

occasiões he opportuno tomar conhecimento das


necessidades das escholas, que fôr facil reme
diar, bem como attender às representações,
e a quaesquer advertencias que se façam, no
sentido de promover directa ou indirectamen
te a instrucção publica.
Snr. Administrador, tome V. S." muito á sua
conta a tarefa de concorrer, no Concelho a
seu cargo, para que o ensino primario se de
senvolva e frutifique. Reflicta na magnitude
do beneficio que póde prestar a essas novas
gerações, que vem despontando no caminho
da vida, e que depois teem que representar
um papel na sociedade — bom e proveitoso,
se a intelligencia foi cultivada desde os ten
ros annos, se o coração ainda novél foi dou
trinado nos sentimentos honestos e virtuosos —
pessimo, detestavel, prejudicial, ou pelo me
nos esteril, se naquelle primeiro periodo da
existencia houve desleixo, e culpavel descui
do da parte dos paes, tutores, superiores
quaesquer, e authoridades.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal aos 2 de Março de
1847. — Illm." Sr. Administrador do Conce
lho de.......
Silvestre —O
Ribeiro. Governador Civil, José

— 431 —

4.º Repartição N.° 1 105 — Lº 3.° —


Illm.º Sr. — Lembrado estará V. S." de me
haver ponderado a necessidade que sentia de
se fornecer ás criancinhas pobres que frequen
tam as escholas d'ensino primario do seu
Concelho, alguns livros de que elas fizessem
uzo para os exercicios de leitura.
Esta insinuação de V. S." obrigou-me sua
vemente a coordenar alguns elementos statis
ticos sobre a Cidade de Beja, que eu colli
gira ali no anno de 1845, e a compor um
livrinho com o fim de o oferecer para as Es
cholas Primarias d’este Districto.
He por isso que hoje tenho a satisfação de
encaminhar ás mãos de V. S. cem exempla
res do indicado opusculo = Beja no anno de
1845, ou primeiros traços statisticos daquel
la Cidade.
Esses cem exemplares terá V. S." a bon
dade de repartir pelas escholas desse Conce
lho , recommendando aos respectivos Professo
res que os d stribuam aos meninos mais po
bres, ficando todavia propriedade das escho
las, a fim de hirem successivamente servin
do para os que não tiverem outros livros.
Não olhe V. S." eu lh'o pésso, para a
pequenhez e insuficiencia do donativo, mas
— 432 —

leve a sua benevolencia até ao ponto de só


attender ao motivo que lhe deu origem, e
lhe dá hoje o destino. = Deus Guarde a V.
S.º. Palacio do Governo Civil no Funchal, aos
21 de Abril de 1847 — Illm.º Snr. Admi
nistrador do Concelho da Ponta do Sol = O
Governador Civil, José Silvestre Ribeiro.

N. B. — Para o mesmo fim foram remettidos 80


exemplares d’este opusculo a cada Administrador
de Concelho, e 150 á Camara do Funchal.

Aos Administradores de Concelho.

4.° Repartição — Lº 3.° — Nº 1134 —


Illmº Snr. — A circunstancia de ter hoje
por Secretario Geral d’este Governo Civil
um Funccionario, que muito se ha distin
guido como Professor, tem-me proporciona
do a occasião de meditar mais profunda
mente sobre o importantissimo assumpto de
ensino publico, guiado pela experiencia que
o mesmo Professor adquirio no exercício do
Magisterio.
Daqui vem que a minha attenção se tem
agora fixado fortemente sobre objectos desta
—433 —

ordem, afervorando mais e mais o desejo que


já tinha de promover no Districto a meu car
go o desenvolvimento da instrucção publica,
que em verdade se acha em grande atraso.
, Darei começo a esta tarefa, tratando das
qualidades que deve ter um candidato ás ca
deiras de ensino primario.
Acha-se actualmente vaga a cadeira de
uma eschola de ensino primario. De um pa
ra outro momento poderão vagar outras, que
hão de ser providas na conformidade da lei.
Tenho me por obrigado a chamar a attenção de
V. S." sobre o complexo das qualidade e dis
posições que deve possuir o cidadão que ha
ja de concorrer ao provimento de taes ca
deiras; a fim de que V. S." dando a estas
ideas toda a publicidade possivel, incutindo
as nos animos de seus administrados, haja de
por esse modo facilitar a missão da Auctori
dade, a cujo cargo está o provimento.
Na carreira do ensino publico, Snr. Ad
ministrador, póde sempre um homem illus
trar-se, fazendo bem, e fazel-o he sem du
vida, a verdadeira gloria immortal. Mas pa
ra bem satisfazer ás exigencias de sua posi
ção, releva que a natureza o tenha chama
do para ella, releva que para ella se tenha
— 434 —

habilitado por um estudo assiduo e conscien


cioso.
As mais das vezes procura um homem
esta carreira sem ter previamente apreciado
a naturesa, os incommodos, e as dificulda
des d’ella; presume-a facil e lucrativa; n’el
la se lança, á mingua de meios para seguir
Outra.
Isto he uma imprudenia, uma temerida
de, quasi um crime; porque poucas carrei
ras ha que demandem maior somma de pre
dicados intellectuaes e moraes, — que impo.
nham tantos sacrificios, — que a troco degual
grau de dedicação não deparem mais avulta
das vantagens.
Antes de encetar esta carreira he mister
que o candidato SC interrogue a si mesmo,
uma e muitas vezes, conscienciosamente, So
bre todos os generos de capacidades, de que
vai pedir-lhe rigorosa conta, sob todo o pezo
de sua responsabilidade, a Auctoridade que
inspecciona as escholas. Essas qualidades pó
dem reduzir-se a tres classes: physicas intel
lectuaes e moraes. •

Quanto ás primeiras, he mister que o can


didato tenha uma saude robusta, constituição
sadía, boa vista, ouvido delicado, e um or
gão de voz sonoro e claro; porque uma voz
ingrata, um certo gráu de surdez, vista cur
ta, alguma muito saliente deformidade cor
porea, e uma saude fraca, ofereceriam sérios
estorvos ao desempenho de seus deveres: de
pouca monta no ensino superior, taes defei
tos tornam quasi impossivel o bom successo
na educação popular.
As qualidades intellectuaes todas se redu
zem a estas duas — conceber e exprimir com
clareza todas as noções da instrucção prima
ria; e estas são as de que reza o artigo 1.°
do Decreto de 20 de Septembro de 13" ".
Não requer a lei para mestres de eschola ho
mens de engenho superior; o que a lei quer,
são homens de uma intelligencia prompta, de
uma concepção clara, e de facil elocução.
Se esta fôra ao mesmo tempo pitoresca e ca
lorosa, tocaria o apice da perfeição.
No tocante ás qualidades moraes, incumbe
religiosamente á Auctoridade ser muito mais
escrupulosa. Quem quer instruir e educar os
outros, deve poder prégar com o exemplo;
deve ser homem de uma virtude sincera e
activa, de uma fidelidade profunda e esclare
cida, de uma dedicação inalteravel e capaz
de algum enthusiasmo. Qualidades de tão
— 436 —

subido preço apenas bastão para a boa direcção


de uma eschola popular. Para encaminhar bem
a mocidade e instrui-a e educal a , a primeira
de todas as condições, he ter-lhe amor. Este
sentimento, que aliás tanto se confunde com
o amor da humanidade, e com o amor de
Deus, deve, sobre todos os mais, predomi
nar no coração do professor densino primario;
mas deve predominar de modo, que lhe não
esteja de continuo nos labios. A vºlubilidade
natural dos primeiros annos, a indolencia de
uns, a petulancia de outros, mais requerem
certa sobriedade de palavras do que sôfrega
efusão de sensibilidade. Com a energia da
ternura convem trazer sempre casada a ener
gia da justiça; e da boca do mestre, elogio
e censura devem sahir com egual franqueza,
mas com a mesma sobriedade.
Dever mais importante e difficil de preen
cher he o que tem o mestre, de ser constan
temente senhor de si, de seus pemsamentos
e afectos, como de suas palavras. Quem tem
de governar os outros, bom he que possa go
vernar-se a si proprio. Ninguem quer, por
certo, que o educador da mocidade seja ho
mem sem defeitos. — Onde está esse ho
mem? O que a lei quer, e razão ha para
— 437 —

querel-o, he que os defeitos d'esse homem


não deem nos olhos, não transpareçam. O
mestre, mais o observam os discipulos, de
que são por elle observados; qualquer de
suas imperfeições fôra para estes — ou um
obj.cto de censura, — ou (o que ainda mais he)
occasião a imitações desastrosas. Quanto mai
or bulha fizer de roda d’elle o sangue fer
vente da mocidade, tanto maior deve ser a
sua prudencia e placidez d'alma. A sereni
dade de genio, a paz imperturbavel do espiri
to, talvez são de sobra para desarmar a pe
tulancia, pôr brio á turbulencia, e evitar a
familiaridade tão visinha da desattenção. E
só esses dotes inapreciaveis pódem pôr o
mestre a cuberto destes accessos de impa
ciencia, que, com quanto pareçam percal
çºs inseparaveis do ºficio, sobre-medo des
lustram e aviltam as suas nobres funcções.
Sim. Snr. Administrador, difficil e muito
dificil he a carreira que pede tantas virtu
des, tão aturada perseverança em esforços
cujo objecto he sempre o mesmo. Mas quão
nobre que ella he, que assim nos compelle
à pratica de tantas virtudes, e assim as fe
cunda todas!
Acredite-me, Snr. Administrador. As func
– 438 —

ções de um professor de ensino primario teem


em si a mais doce das recompensas, o mais
puro dos gosos do coração. Se alguem ha ahi
que não aprecie devidamente o valôr d’ellas,
he porque n㺠conhece a doçura d’este com
mercio tão intimo com a infancia durante as pri
metras manifestações dos sentimentos e da
razão della; he porque ignora o encanto d'es
ta influencia tão profunda, que a toda a ho
ra exerce o professor nos afectos e pensa
mentos da mocidade. Ora tão forte he o at
tractivo d'esta atmosphera intellectual e mo
ral em que vivem professor e discipulos, que
não ha no mundo cousa que dar possa idêa
de mais puras delicias. Não ha mestre, por
pouco enthusiasta que seja, que se não dei
xe tomar da magia de sua profissão; que se
não tenha, quando desempenha os seus de
veres, pelo mais feliz dos mortaes. Por mes
quinha que seja a retribuição que lhe dá o
Estado, como só espalha beneficios, tem uma
fé viva que o consola; — e he que se n’este
mundo não logra todas as bençãos a que lhe
da direito sua dedicação, um mundo ha, em
ue lhe serão levados em conta tantos sacrifícios.
Eis aqui. Snr. Administrador qual a dou
trina que eu bem quizera vêr depositada nos
— 439 —

animos de todos os seus administrados, que


de futuro hajam de concorrer como opposito
res ás cadeiras de ensino primario. Sem is
to . nunca poderei ter a lisongeira esperança
de vêr occupadas essas cadeiras pelo sólido
merecimento. E sem isto, nunca a instruc
ção primaria no Districto a meu cargo che
gará ao ponto de perfeição que pertende
dar-lhe a lei. Queira V. S." por sua parte
auxiliar-me n'este empenho, e creia que tu -
do quanto para isto fizer, eu o tomarei em
conta de grande mercê que me faz.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal aos 3 de Septembro
de 1847. — Illm.º Snr. Administrador do
Concelho de...... O Governador Civil, José
Silvestre Ribeiro.

Ao Administrador do Concelho de Sancta Cruz.

Repartição de Fazenda — 1.° Secção — L.º 9.°


— N.° 153 — Illm.º Snr. — Em resposta ao oficio
de V. S.º., N.° 153, de 20 do corrente, que aca
bo de receber, no qual V. S." informa o reque
rimento, que inclue, de varios moradores d'essa
Villa, que pedem sejam concedidos, gratuitamen
— 440 —

te , um ou dous quartos do extincto Convento d'essa


mesma Villa para estabelecimento d'uma eschola
particular d'ensino primario; sou a dizer a V. S."
o seguinte:
Tendo muito a peito facilitar por todos os mo
dos possiveis o desenvolvimento da instrucção pu
blica, attendendo a que V. S." assevera não haver
n'essa Villa caza propria para o estabelecimento
de que se trata, e de mais a mais contribuir para
a conservação do edificio o destino e applicação
que se requer: convenho em que V. S.° ponha á
disposição do professor escolhido pelos requerentes
um ou dous quartos do mencionado edificio, fazen
do-lhe assignar Termo pelo qual se responsabilise
a não deteriorar os ditos quartos , mas sim a tra
tal-os como bom inquilino.
Esta concessão porém deve entender-se sem pre
juiso de qualquer applicação que se tenha dado
ao edificio que seja incompativel com a de que
Se trata.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Governo
Civil no Funchal, aos 22 de Septembro de 1847.
— Illmº Snr. Administrador Substituto do Conce
lho de Santa Cruz. — O Governador Civil José
Silvestre Ribeiro.
— 441 —

Aos Administradores de Concelho.

4.º Repartição — Lº 3.° — N.° 1.165 — Circular


— Illºº Snr. — He obvia e bem conhecida a ne
cessidade de promover entre os povos a Instrucção
Primaria, desgraçadamente tão descuidada, e em
tamanho atraso entre nós. Demonstrar qualquer
destas duas asserções fôra dizer superfluidades, e
gastar tempo com pura perda.
Supposto isto, o que resta he promover com to
da a eficacia, o desenvolvimento desse immenso
beneficio, que o Governo deve proporcionar aos
Seus administrados.
As escholas de ensino primario não são entre
nós tão frequentadas, como o devêram ser D'onde pro
vem este prejudicialissimo inconveniente? Muitas
causas concorreráõ para elle, mas por certo que
ninguem hesitará em conceituar como a principal
o descuido, a indolencia, e por ventura o desa
mor da maxima parte dos Páes, dos Tutores, e
dos Chefes de quaesquer Estabelecimentos........
As creancinhas poderão gostar mais de folgar
nas ruas e nos campos, do que de hirem sujeitar-se
ao rigor da disciplina escholar, mas se desculpa
merecem esses innocentes cegos, he todavia incon
testavel que nem a Misericordia Divina tem nos
seus thesouros assaz de indulgencia, para relevar
o criminoso desprezo com que he tratada a obriga
ção de superiores natos, a quem a rasão já allumia
suficientemente para conhecer deveres imprescripti
veis, ou vantagens solidas, ou inconvenientes gra
vissimos. •

Levantemos pois um brado forte, despertemos de


inerte somno esses páes, esses tutores, esses Chefes
de Estabelecimentos, que sendo postos pela Provi
dencia, e pela Sociedade, como sentinéllas da boa
creação e instrucção de seus filhos, pupilos e subor
dinados, adormécem durante a vigilia que lhes fôra
recommendada, e condemnam pelo seu funesto des
leixo á cegueira de perpetua ignorancia as creatu
rinhas confiadas á sua guarda. Digámos-lhes sem
hesitação: «Sois réos de lesa consciencia, e a Jus
« tiça Divina ha de castigar-vos, porque não que
« reis dar o pao do ensino a quem de direito o
q deveis. »
Qual Lei mais providente e ao mesmo tempo
equitativa poderia dar-se, do que a actual da Ins
trucção Primaria ?
Se os pães, tutores, e quaesquer outros superio
res, mostrarem que os meninos sob sua guarda,
— 443 —

adquiriram já o necessario conhecimento dos objec


tos do primeiro gráo de instrucção primaria, estão
dispensados da multa em que incorrem os ommis
sós; — semelhantemente os que mostrarem que fóra
das escholas publicas subministram aos filhos, pu
pillos e subordinados igual ou maior instrucção. E
se por ventura mostrarem que não podem mandar
os meninos á eschola por sua extrema pobreza,
tambem a Lei os dispensa da multa; e se por ven
tura a alguns fôr penosa a falta do trabalho das cre
anças, permittido lhes he mandarem-nas á eschola
em uma só das lições diarias.
Qual pretexto haverá pois para deixar de desem
penhar este salutar dever? Tu és pobre, e necessi
tas que teu filho vá ao matto, ou vá levar ao pasto
as rèzes, ou fazer outro qualquer serviço indispen
savel? ... Pois bem , a Lei respeita os direitos
domesticos, e reconhece a conveniencia de acudi
res ás primeiras necessidades da vida; mas quer,
e com toda a razão, que em cessando essas urgen
cias, tu aproveites as horas da suspensão do traba
lho para durante ellas o teu filho hir receber a ins
trucção, que tão proveitosa lhe hade ser no discur
so da vida.
Que he isto? — Pois o Estado, e as Camaras hãº
— 444 —

de estar despendendo avultadíssimas sommas com a


manutenção de escholas, e esses estabelecimentos
hão de estar desertos e abandonados? — Que he isto ?
Pois he a instrucção primaria algum veneno que
se propina ao genero humano ? — Não, mil vezes
não. A instrucção primaria he o germen de incalcu
laveis beneficios para a vida do homem seja qual
fôr a sua condição na sociedade, e até o proprio
operario, podendo instruir-se, por meio da leitu
ra, dos methodos que tornam mais perfeitos e mais
facéis os seus trabalhos, adquire a vantagem de
sahir da rutina da tradição oral, segundo a judicio
sa ponderação do Visconde de Chateaubriand , de
augmentar assim os seus commodos, e de multipli
car as riquezas do Estado.
Sendo isto assim, Snr. Administrador, sou eu
obrigado a recommendar a V. S." o que já noutros
Districtos tenho recommendado ás Authoridades Ad
ministrativas, isto he, que empregue todas as dili
gencias imaginaveis, tendentes a operar no animo
dos povos uma revolução salutar, qual a de se de
cidirem determinadamente, e por uma vez, a cui
darem de aproveitar o beneficio da instrucção
para bem da infancia e da mocidade. — Para se
conseguir este fim, occorre-me lembrar a V. S."
— 445 —

que deve entender-se com os Reverendos Parochos,


pedindo lhes encarecidamente que persuadam aos seus
Parochianos a necessidade de mandarem seus filhos,
pupillos, e subordinados, ás escholas; — rogando
lhes outro sim a mercê de lêrem aos seus Parochia

nos a inclusa allocução, que no anno de 1845. en


derecei aos moradores de Beja, (…) e que aliás he appli
cavel em toda a sua extensão aos da Madeira e Por

to Santo; explicando-lhes com a devida clareza o


que alli houver de mais obscuro, em ordem a que
o povo perceba tudo quanto lhes digo para seu bem.
Afóra este poderoso auxilio, não se poupará V.
S." á diligencia de associar-se com os cidadãos mais
intelligentes e respeitaveis do seu Concelho, a fim
de espalharem as doutrinas desta circular e da re
ferida Allocução, e habilitarem por meio de dona
tivos os pobres a mandarem ás escholas os filhinhos,
que absolutamente carecerem de fato, e dos uten
silios escholares.

Até aqui — a parte benefica da Administração;


começa agora a parte severa da sua missão:
O Art.° 32 da Lei de 20 de Septembro de 1844
he concebida n’estes termos:

(*) Haja vista á nota a pag. 406.


— 446 —

« Os páes, tutores, e outros quaesquer indiví


« duos, residentes nas povoações em que estiver em
« collocadas as escholas d'instrucção primaria, ou
(( dentro de um quarto de legoa em circumferen
(( cia d’ellas, deverão mandar instruir, nas mes
(( mas escholas, os seus filhos, pupilos ou outros
(( subordinados desde os sete annos até os quinze
( de edade. »

« $.° unico. — Os que faltarem a este dever serão


« successivamente avisados, intimados e reprehendidos
« pelo Administrador do Concelho; e ultimamente
« multados, desde 500 até 13000 rs. »
« Esta disposição será observada todos os annos
(
nos primeiros tres mezes do anno lectivo: º
Para ser desempenhada esta disposição hemister —
que os Srs. Administradores se entendam com os
Reverendos Parochos, a fim de saberem quaes os
Cabeças de familia que estão nas circunstancias de
mandar meninos ás escholas — quaes os que cum
prem com este dever — quaes os que são ommissos,
— quaes os que proporcionam a seus filhos, pupi
los, ou subordinados a necessaria instrucção fóra
das escholas — quaes os que por sua extrema pobre
za estão impossibilitados de cumprir com tal obri
gação.
— 447 —

Em concorrencia com este meio de informação,


deverão os Srs. Administradores visitar assiduamcn
te, por si, por seus subalternos, ou por pessoas
de sua confiança, as escholas, inquirindo e exami
nando ocularmente tudo quanto a este negocio res
peita, e solicitando dos Professores todos os escla
recimentos que reputarem indispensaveis para com
segurança formarem o seu juizo e darem execução
á Lei.

Assim informados, só resta avisar os ommissos,


intimá-los, e reprehendê-los, segundo successiva
mente se dér occasião, e ultimamente multá-los na
quantia marcada, formando para isso um auto de
investigação, no qual se mencione a circunstancia
de que tal ou tal individuo fôra primeiramente avi
sado, depois intimado, e ultimamente reprehendi
do por elles Srs. Administradores, e que mostran
do-se indocil a todos estes meios, continuára na
reprehensivel e criminosa ommissão, como o decla
ra o respectivo Professor, que tambem deve assi
gnar esse auto. Ao multado deve dar-se conheci
mento da multa em que incorrêo para de prompto
a satisfazer, e em caso de repulsa, será obriga
do pelos competentes meios judiciaes a satisfazê-la.
A multa entrará com guia dos Snrs. Administra
— 448 —

dores nos Cofres Publicos.

O que tudo hei por mui recommendado a V. S."


esperando que todos os mezes me dará noticia do
resultado que forem tendo as diligencias acima in
culcadas,

Deus Guarde a V. S.". Palacio do Governo Civil


no Funchal aos 18 de Janeiro de 1848 Illmº Sr.
Administrador do Concelho de.... O Governador
Civil, Joze Silvestre Ribeiro.

Ministerio do Reino.

4."Repartição — Nº 28 — Illm.º e Exmº


Snr "- Não tive ainda occasião de transmit
tir ao Gºverno de S. M. a expressão dos lou
Vores que merecem a Mestra de uma Escho
la de Emsino Mutuo d'esta Cidade, bem co
mo as Protectoras de um tão interessante Es
tabelecimento.
Venho hoje desempenhar-me desse gosto
So dever.
º Gºverno de S. M. creou nesta Cidade
uma Eschola de Ensino Primario, destinada
a instruir creanças do sexo feminino, e di
rigida pelo systema do Ensino Mutuo. Na
— 449 —

epocha do seu estabelecimento uma familia


Ingleza, residente no Funchal, e immensa
mente respeitavel por suas virtudes. entendeu
que, em seguimento de diligencias, que ja de
ha muito fazia para promover a instrucção
publica, devia prestar a mais desvelada e ge
nerosa protecção á nova eschola, auxiliando
assim o Governo Portuguez em uma empre
za civilisadora — Esta familia recommenda
vel e verdadeiramente virtuosa he a família
« Phelps »
A Senhora Phelps formou uma pequena
Sociedade de Senhoras, de que ela se cons
tituio Presidente, com o fim de promover
subscripções em beneficio da eschola, e en
caminhá-la ao maior gráo de desenvolvimen
to de que fosse susceptivel.
A Sociedade propoz-se no principio a dar
á eschola uma boa mestra , o que efectiva
mente conseguio habilitando para aquele mis
tér a Maria Emilia Cunha, a quem por con
curso legal e precedendo exame foi dada a
cadeira. — Estabelecida esta tratou a Socie
dade de promover donativos, e desde esse
momento começou um tão engenhoso encadea
mento de beneficios, que em verdade impres
siona vivamente a quem se interessa pelo
— 430 —

|bem da humanidade.
A sociedade entendeu que a mestra devia
ser bem remunerada, para poder desempe
nhar cabalmente as suas obrigações, e por
isso, ao diminuto ordenado do Governo, e
subsidio da Camara, aerescentou a quantia
de sete mil reis mensaes, e tem até hoje
pago o aluguer da casa da eschola, que ao
mesmo tempo serve de residencia da mes
tra. — A sociedade, auxiliada com o produ
cto de donativos de pessoas generosas, pela
maior parte inglezas, compra chitas, pannos
de algodão, e depois de cortar estas e outras
fazendas em objectos de vestuario, as manda
para a eschela, a fim de dar entretenimem
to, e fornecer meios pratices de ensino ás meni
nas pobres, vendendo-se depois os artigos ma
nufacturados a quem os quer comprar, e com
o seu producto se vae alimentando a boa fon
te da beneficencia.
Ainda hontem tive o prazer de verificar o
que por tantas vezes já tenho admirado. Cen
to e tantas meninas estavam na eschola ; ás
quatro horas da tarde chegou a Duqueza de
Saxe-Weimar com as Princezas suas Filhas,
que a Senhora Phelps havia convidado, vin
do pouco depois o Duque de Palmella com sua
- 451 —

Filha, e todas estas Altas Personagens tiveram


occasião de ver a boa ordem com que a es
chola he dirigida, a proficiencia e desvelo da
mestra, o espirito religiöso que preside ao
ensino, e a carinhosa protecção com que a
virtuosa Senhora Phelps ampara o seu esta
belecimento querido. Deixando outras miu
desas, aliás interessantes, devo mencionar
que a mestra, por insinuação da Senhora
Phelps, mostrou á Duqueza varias obras de
costura das meninas, que S. Alteza elogiou
muito, pedindo que diferentes artigos fossem
mandados á Rainha Viúva — o que dá espe
ranças de que alguma compra avantajada ve
nha beneficiar a eschola.
Não devo cançar por mais tempo a atten
ção de V. Exc." — O que deixo dito será
bastante para V. Exc." conhecer o quanto he
formoso um tal estabelecimento!
O Governo de S. M. folgará por certo de
rodear com a sua eficaz protecção este im
portantissimo instituto, concedendo-lhe uma
caza da Fazenda, quando devoluta, afim de
que a Sociedade, desembaraçada da despeza
do aluguer que agora a onéra, possa dar maior
desenvolvimento aos seus beneficios. — Neste
sentido ouso rogar a V. Excº a mercê de
— 452 —

solicitar do Exmº Ministro da Fazenda a


authorisação necessaria, para que eu ponha
á disposição da mestra a caza da Fazenda,
que estando devoluta, fôr accommodada para
um tal destino. — Deus Guarde a V. Exc." —
Palacio do Governo Civil no Funchal ao 12 de
Fevereiro de 1848 —Illm.º e Exmº Sr. Minis
tro e Secretario de Estado dos Negocios do Rei
no. O Governador Civil, José Silvestre Ribeiro.

A Camara Municipal do Funchal.


4. Repertição — Lº2º — N.° 68 — Illmº
Sr. — Recebi o oficio de V S.", n.° 375,
de 18 do corrente, e com ele um exemplar
impresso do « Regulamento das Escholas Mu
nicipaes de Instrucção Primaria do Concelho
do Funchal» que a Camara acaba de organisar.
Li com toda a attenção o mencionado « Re
gulamento », e assevéro a V. S." que ha mui
to tempo não chegava ás minhas mãos um
escripto que tão completamente me satisfizesse.
Este documento interessantissimo, que no
seu generº, considero uma obra perfeita, sa
tisfaz cabalmente a todas as exigencias do
luminoso Decreto de 20 de Setembro de 1844
*• — 453 —

e encerra todas as instrucções que podem e


devem seguir se no regimea das escholas de
ensino primario, naturesa e extensão das ma
terias, methodo de ensino, frequencia, poli
cia, disciplina e economia das escholas....
tudo allihe tratado com a devida proficiencia.
Queira V. S." acceitar benigno a expres
são do meu sincero louvor, tanto mais senti
do e calorôso, quanto em diferentes logares
desse bellissimo trabalho encontrei a mais bem
deduzido exposição de principios de moral e
de virtude, não menos que de illustrados pen
samentos sobre a difficil arte de guiar a intel
ligencia e o coração de tenras crianças.
Outro-sim pedira a V. S." a mercê de
mandar publicar pela imprensa periodica es
te importante escripto, que tamanha honra
faz ao seu author, bem como á Camara que
o adoptou. •

No que toca ao auxilio que a Camara sol


licita deste Governo Civil, e que eu estou dis
posto, e mui gostosamente decidido a pres
tar-lhe, cumpre-me ponderar a V. S." que
já em data de 18 de Janeiro ultimo endere
cei uma Circular aos Administradores de
Concelho, recommendando-lhes que empregas
sem todas as diligencias imaginaveis para mo
— 454 —

verem os seus administrados a mandarem seus


filhos, pupilos e subordinados ás escholas;
que se entendessem com os Reverendos Paro
chos, a quem pediriam que prégassem esta
necessidade ao povo, e se dignassem de lêr
uma allocução que no anno de 1845 endere
cei aos moradores do Districto de Béja so
bre este mesmo assumpto. Na mesma Cir
cular desenvolvi larga e claramente o mode
de ser executado a disposição do Sºunico do
art.° 32 do citado Decreto de 20 de Setem
bro de 1844 — Se a Camara quizer tomar
conhecimento da dita Circular e allocução,
poderá vê-la no n.° 44 do « Madeirense» de
26 de Fevereiro ultimo. — Apezar porem
de me haver anticipado nas providencias que
a Camara reclama, não me dispensarei de
renovar as mais apertadas instancias para com
o Administrador deste Concelho, a quem im
mediatamente cabe exercitar uma coadjuvação
activa e zelosa no sentido do que a Camara
mui justificadamente pertende.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal aos 27 d'Abril de
1848 — Illm." Sr. Presidente da Camara
Municipal do Funchal — O Governador Civil,
José Silvestre Ribeiro.
— 455 —

AssUMPTos PoLICIAEs.

- *><>…----

Aos Administradores de Concelho.

2.° Repartição — Lº 5.° — N.° 236 — Circular


— Ilmº Snr. — Entre os assumptos de que trata
a publica administração, alguns ha por tal modo
delicados, que se encontra sempre um tal ou qual
embaraço em fallar d'elles, enlaçados como estão
com graves interesses, ou com principios de uma
moral austera.

Sabe V. S." que o seu Regimento lhe prescreve


a policia relativa ás mulheres prostitutas, e por
certo que não ha ahi uma tarefa de tamanho
melindre, como esta, pois se trata de uma classe
de pessoas, excepcional na sociedade.
A pezar porem da repugnancia, que naturalmen
te existe de tratar d’este objecto, não me he per
mittido hesitar em me occupar d'elle, tanto mais
quanto reconheço a necessidade de despertar a vi
gilancia das Authoridades Administrativas sobre as
exigencias de um serviço, em que vai interessada a
— 456 —

moral publica, e a saude dos povos.


A existencia desta lamentavel classe de pessoas
parece ser um protesto permanente contra a pure
sa dos costumes, uma infracção continua das leis
que protegem e esteiam a associação politica; e
com tudo nào podemos deixar de admittir este mal,
como um fato que não pode ser destruido, mas
que a todo o custo convem sujeitar á acção de
uma policia salutar, a fim de diminuir os efeitos
funestos que elle pode produzir.
Fazer respeitar as leis do pudor, estabelecer
uma certa barreira entre a honestidade e a devas
sidão , e preservar a saude dos estragos que lhe
podem causar fataes enfermidades: eis o alvo a
que devem tender as providencias e vigilancia das
Authoridades Administrativas.
Na conformidade destes principios convem :
1 * — Que a Authoridade Administrativa se dê
ao estudo topographico das povoações, e que de
pois de adquirir um perfeito conhecimento de causa,
haja de designar taes ou taes bairros, taes ou taes
ruas e becos, para a residencia das prostitutas,
guiando-se pelo pensamento de as afastar, quanto
for possivel, dºs visinhanças dos templos, passeios
publicos, praças, ruas principaes, estabelecimen
tos de instrucção publica, recolhimentos &."
2.° — Que a Authoridade empregue todos os
meios repressivos, tendentes a evitar que a pros
tituição appareça em toda a sua hediondez, e cy
nismo, vagueando pelas ruas e praças publicas,
com o vergonhoso cortejo de provocações escanda
lozas, as quaes, segundo ja alguem disse, expõem
nossos filhos e filhas a conhecer em um instante o
que nós lhe occultámos com tamanho cuidado.
3-º — Que a Authoridade, attendendo ao perigo
que corre a saude, exposta a nocivas influencias que
viciam a origem da vida , trace de acordo com os
Facultativos competentes um plano, dest nado a re
gular o exame e visitas sanitarias, bem como o cu
rativo de taes mulheres em quanto este negocio não
fôr subjeito a um Regulamento geral em todo o Reino.
O que tudo V. S." tomará na devida conta, para
com toda a circunspecção e prudente juizo ir exe
cutando, como, e quando mais acertado e opportu
no lhe parecer. — Deus Gnarde a V. S.". Palacio
do Governo Civil no Funchal 10 de Novembro de
1846 — Ilim.º Snr. Administrador do Concelho
de... — O Governador Civil, José Silvestre Ribeiro.

samma=.*** -> <=º


— 458 —

Ao Administrador do Concelho do Funchal.

2.° Rep. — Nº239 — Lº 5.° — Ill." Snr.


— Não he só por meio de longas dissertações,
que se consegue demonstrar importantes ver
dades, ou dar uma ideia exacta e luminosa
das couzas; antes muitas vezes, com uma só
fraze, com uma, ou poucas palavras, se al
cança perfeitamente o mesmo rezultado.
Quando no Parlamento Inglez um Ministro
celebre foi apertado pela oppozição a dar cla
ramente, e em uma só phrase, a razão por .
que continuava na guerra contra a França, o
habil Ministro, que éra nada menos do que
o grande Pitt, teve a felicidade de exprimir
se nos seguintes termos:
« Não sei se poderei responder em uma só
« phrase, mas por certo que o farei com uma
« só palavra: Seguridade!» E a resposta foi
cabal e triunfante.
He assim tambem que um famozo Magis
trado Francez compendiou em tres palavras
todas as obrigações de uma authoridade po
licial; e foi o cazo:
Tendo o Marquez d'Argenson sido nomea
do em 29 de Janeiro de 1697 Intendente
Geral da Policia em Paris, foi fazer, passa
— 459 —

dos alguns dias, a sua primeira visita oficial


a Mr. Harlay, Prezidente do Parlamento; e
acertou de ser em occazião que este Magis
trado, por muito entretido com negocios, não
podia distrahir-se com a recepção do novo
Intendente. Era porem forçôzo dizer alguma
couza, e Mr. de Harlay , abrindo um pouco
a porta do seu gabinete, e dirigindo-se ao
Marquez, proferio em voz alta, e bem accen
tuada, estas tres palavras: Claridade, Aceio,
e Segurança.
O Marquez de Argenson fez destas tres
palavras, o programa da sua administração,
e por tal modo dezempenhou os deveres do
seu cargo, que a historia dá testemunho de
que o aceio, a tranquilidade, e a segurança
de Pariz chegaram no seu tempo ao mais
subido ponto.
E com efeito, Snr. Administrador, se uma
povoação qualquer fôr illuminada, como o
requerem a commodidade e a segurança dos
moradores; se nella houver aceio, em que
tão interessada vai a salubridade publica, e
se finalmente as pessoas e a propriedade es
tiverem, a todos os respeitos, sob a mais
desvelada protecção da authoridade policial:
—he incontestavel que ahi se poderá conse
— 460 —

guir uma boa porção das vantagens, a que


naturalmente aspiram os homens, reunidos em
sociedade.
Dezenvolver todos estes pontos, desentra
nhar delles a doutrina que encerram deman
daria longa escriptura, e eu devo abster-me
de destruir com estirados pormenores a im
pressão que naturalmente produz o admiravel
laconismo que acabo de elogiar.
Limitar-me-hei pois nesta occazião a ofe
recer á sua ponderação aquelle conceituoso
enunciado, como para desafiar as suas cogi
tações sobre um dos mais inter ssantes ramos
das funcções administrativas, e para lhe rogar
que, adoptando-o como programma da sua
administração, haja de applicar á Cidade do
Funchal os cuidados policiaes, que ella de
manda, como sendo uma das mais importan
tes povoações do nosso paiz.
Deus Guarde a V. S.". Palacio do Governo
Civil no Funchal, aos 16 de Novembro de
1846. — lllm.º Snr. Administrador do Con
celho do Funchal. — O Governador Civil, José
Silvestre Ribeiro.
— 461 —

Ao Administrador do Concelho do Funchal.

2.° Repartição — Lº 5º — N.° 502 —


Illm.º Snr. —Tenho visto com verdadeira
satisfação que a Commissão Miunicipal lida
muito activamente em providenciar sobre o
aceio e aformoseamento da Cidade do Fun
chal, condescendendo assim com a recom
mendação que a semelhante respeito lhe fiz,
não menos que desempenhando o que lhe
prescréve em geral o seu legimento.
Por boa fortuna tambem um grande nu
mero de particulares teem ajudado este em
penho da referida Commissão, fazendo lim
par as suas moradas, e procedendo a ou
tros trabalhos tendentes a melhorar a appa
rencia desta já tão formosa Cidade. ·

Já pois que estamos marchando neste ca


minho de civilisação (e oxalá que nelle con
tinuemos a marchar), he bem que applique
mos tambem a attenção para outras neces
sidadºs, que muito convem serem attendi
das, para que os estrangeiros não tenham
que censurar descuidos, faltas e irregulari
dades que ainda se encontram no serviço po
licial.
Porque razão, na occasião em que che
gam paquetes inglezes, ou outros navios, e
saltam em terra passageiros, ha de succe
der que um sem numero de arrieiros se a
montoam no calháu. atropellando tudo com
os cavallos, e importunando de um modo
oppressor esses passageiros? Não seria mais
regular que os cavallos ficassem sempre nas
arrierias, embora os arrieiros fossem á práia
para indicarem aos passageiros os logares
onde encontraráõ cavalgaduras ?
Porque razão não se ha de applicar se
veramente a postura contra quem correr a
cavallo pelas ruas da cidade a trote largo,
ou a galope, com tão grave perigo de quem
vae caminhando a pé?
Porque razão não se hão de pôr em exe
cução permanente e indefectivel as posturas
que prohibem a quaesquer pessoas tomar
banhos no már desde as seis horas da ma
nhã até ao anoitecer, na cortina da cidade,
e nas ribeiras, sem estarem vestidos de cal
ças, ou em camisa até abaixo dos joelhos? Porque
razão se não hão de evitar tantas Indecencias que
a este respeito se estão practicando todos os
dias? Como não se tem já tambem escar
mentado os barqueiros, gente de mar, e
trabalhadores, que por occasião de carga
— 463 —

ou descarga de barcos, ou em outro qual.


quer serviço á borda do mar, se apresentam
de um modo tão indecente, sem tanga que
lhes chegue até ao joelho ?
Para que se ha de consentir que nojen
tas creaturas de ambos os sexos e de todas
as idades, divaguem por essas ruas, osten
tando com artificiosa hypocrisia defeitos phy
sicos, asquerosas chagas, immundos farra
pos, e entretendo-se em catar-se ao sól,
por maneira que nos atrahem a zombaria
e bem sensiveis motejos de quantos estran
geiros se lembram de escrever das nossas
cousas?
Porque se não hão de construir nas bor
das das ribeiras e do mar, e em sitios acom
modados algumas latrinas, para que de uma
vez acabe o terrivel inconveniente de vermos
immundicias e desaceio, em pontos onde só
devêra encontrar-se limpesa?
Não leve V. S.º., Snr Administrador, a
mal que eu desça a estas miudezas. Reflicta
V. S." na desagradavel impressão que fazem
certas scenas no animo de estrangeiros, que
estão acostumados a vêr reinar a ordem, o
aceio, e a boa polícia nos seus paizes, e que
por isso notam e estranham tanto mais viva
— 464 —

mente o desmazêlo que se lhes depára. — Lei


am-se essas innumeras descripções que estram
geiros tem feito de Portugal e de suas Pos
sessões, e alli se encontrarão, atravez de mui
tas exagerações e até de muitas falsidades, no
ticias que nos fazem córar de vergonha, e
que aos olhos das nações nos apresentam
como barbaros a certos respeitos.
Levado d'esta consideração, convencido de
que em verdade somos demasiadamente des
cuidados em objecto de policia e bom regi
mem, e desejoso de que esta encantadôra ilha
attraia cada vez mais, e captive por todos
os modos a tantos estrangeiros que a visitam,
ou nella residem temporaria ou permanente
mente: julgo de meu mais rigoroso dever
chamar a attenção de V. S." sobre estes assum
ptos, e pedir-lhe que se entenda com a Com
missão Municipal, que desperte o zêlo de to
dos os seus subalternos, e ponha em acção
todos os meios possíveis para se conseguirem
os resultados que tenho em vista. — Deus
Guarde V. S." — Palacio do Governo Civil
no Funchal aos 6 de Outubro de 1847. —
Illm." Sr Administrador do Concelho do
Funchal. — O Governador Civil, Jose Silves
tre Ribeiro.
— 465 —

Aos Administradores de Concelho.

2 º Repartição — Lº 5.° — N.° 575. —


Circular. — Illmº Snr. — As exigencias do
serviço publico em assumptos policiaes são
ordinariamente as mesmas em todos os Dis
trictos do Reino. He por isso que, havendo
eu no Districto de Béja () dirigido no anno
de 1845 uma Circular a todos os Snrs.
Administradores de Concelho na qual lhes
expliquei circunstanciadamente a parte poli
cial das attribuições administrativas, tenho
hoje por conveniente oferecer á consideração
dos Srs. Administradores do Districto do Fun
chal a mesma doutrina, tal qual a expuz ou
tr’ora, bem convencido de que da sua obser
vancia se hão de seguir bons resultados na Ma
deira e Porto Santo, a cuja administração
me cabe a ventura de presidir na actualidade.
Nessa Circular, que por copia envio a V.
S.", começo por chamar a attenção dos Srs.
Administradores sobre o respeito com que de
ve ser considerada a inviolabilidade da caza
do cidadão; — passo depois a fazer bem sen
sivel a circunspecção com que se ha de proceder
P

(*) Haja vista á nota a pag. 406.


— 466 —

à prisão de quaesquer cidadãos, afim de se evi


tarem arbitrariedades; — e explico em segui
da o que deve entender-se por flagrante delicto.
O respeito que as Authoridades Administra
tivas devem consagrar á independencia do Po
der Judicial he tambem um dos objectos que
muito apertadamente recommendo; ao mesmo
passo que determino muito característicamen
te a restricta obrigação de fornecer á Justiça
todos os esclarecimentos que possam guiar a
sua tutelar acção, — Como porem nesta parte
os indicios de qualquer crime representem
um importante papel, julguei ser de toda a
utilidade dár conhecimento dos luminósos prin
cipios consignados no novo Codigo Penal Aus
triaco, citados pelo nosso illustre Juriscon
sulto Corrêa Telles, os quaes guiam admira
velmente a Administração na tenebrosa lida
do descobrimento dos criminosos. Sobre este
ponto invoco toda a atenção de V. S.", pe
dindo-lhe que se penetre bem de tal doutrina.
Na parte policial he indispensavel que se
procure estabelecer a mais perfeita intelligen
cia entre os Funccionarios Administrativos e
o Poder Judicial, e por essa razão aconse
lhei aos Srs Administradores que em casos
graves de policia consultem as Authoridades
— 467 —

Judiciaes e o Ministerio Publico.


Pondero igualmente a necessidade de não
deixar cahir em relaxação os regulamentos
policiaes sobre o transito de nacionaes e estran
geiros. Neste Districto porem he mister at
tender designadamente ao embarque e desem
barque de nacionaes e estrangeiros, para que
os regulamentos privativos desta especialida
de, incluindo tambem os da parte sanitaria,
nunca sejam postos em desuso.
As hospedarias, estalagens e demais casas
onde se dá pousada devem ser objecto da
vigilancia da Administração Publica.
Por occasião de mencionar este dever trans
creví da nossa Legislação as obrigações a que
se sujeitam os donos desses estabelecimentos.
E finalmente fallo das tabernas e dos vadios.
Se V. S." tomar em conta a doutrina da
referida circular, e regular por ella a sua
acção policial, com o zelo que deve esperar
se de um funcionario publico, tenho por cer
to que prestará aos seus administrados um
bom serviço, concorrendo para que entre el
les haja ordem, socego, e segurança.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal 12 de Janeiro de
1848. — Illm.º Sr. Administrador do Con
— 468 —

celho de.... — O Governador Civil, José


Silvestre Ribeiro.
•••••••••a-à-*

.S A UD D E P U B L [ C. A.

Ao Administrador do Concelho do Funchal.

2.° Repartição — Lº 5.° — Nº 263 — Illmº Snr.


—Tendo-me representado o Guarda Mór da Saude
do Porto do Funchal a indispensabilidade de se des
tinar para Lazarêto uma casa da Fazenda Nacional,
sita junto da Ribeira de Gonsalo Ayres, ás bordas
do mar : •

E convindo que este negocio, por muito ponde


roso, seja tratado com a maior circunspecção, a fim
de que satisfazendo-se ás exigencias da policia sani
taria, se acautelem ao mesmo tempo os inconvenien
tes, a que pode dar logar o estabelecimento de que
se trata , uma vez que não se attenda préviamente
a todas as circunstancias do mesmo :

Entendo ser conveniente que V. Sº, convidan


do o Snr. Delegado do Conselho de Saude, o Snr.
Guarda Mór da Saude, algum dos Srs. Facultati
vos da Camara, e o Snr. Director das Obras Pu
— 469 —

blicas, haja de passar com elles ao referido local,


afim de ser examinada a casa, e se conhecer se
ella he propria para o destino indicado, ou se al
guns inconvenientes occasiona, com relação ao pc
rigo que pode correr a saude publica.
Do exame que se fizer mandará V. S." lavrar
um auto, no qual circunstanciadamente se mencio
nem os pareceres de todos os Srs. que para este
serviço são convidados, devendo ser por todos as
signado.
Na hypothese de que a dita caza seja acommo
dada para o estabelecimento do Lazarêto, com tanto
que se façam algumas obras, indispensaveis por
qualquer motivo — o Snr. Director das Obras Pu
blicas tratará de proceder ao orçamento d’ellas, se
gundo as indicações que apresentarem os Srs. Fa
cultativos. — Deus Guarde a V. S.". Palacio do Go
verno Civil no Funchal, aos 9 de Dezembro de
1846. — Illm.º Snr. Administrador do Concelho do
Funchal — O Governador Civil, José Silvestre Ribeiro.

Aos Administradores de Concelho,


2.° Repartição — L.° 5.° — N.° 612 — Circular
— Illm.º Snr. — Em data de 8 de Janeiro findo di
— 470 —

rigio o Conselho de Saude Publica do Reino uma


circular aos seus Delegados nos differentes concelhos
dos Districtos Administrativos do Continente e Ilhas,
exigindo-lhes:
1.° — Um Relatorio circunstanciado ( em refe
rencia ao semestre ultimo) sobre o estado sanitario
dos respectivos Districtos, indicando as molestias
que mais grassáram, as suas localidades, causas
mais geraes que as produziram, que classes do
povo mais accommetteram, e finalmente, com a pos
sivel exactidão, o numero dos accommettidos em
relação á população, e o dos mortos em relação
aos acommettidos: indicando tambem as causas que
atégora tem sido permanentes de insalubridade.
2.° — Igual Relatorio de dous em dous mezes,
a contar do de Janeiro findo.

3.° — Que hajam de recommendar aos faculta


tivos territoriaes, a applicação de todo o cuidado
e vigilancia, logo que appareça ou descubram
qualquer epizootia, ou molestia epidemica qualquer,
tenha ou não o caracter contagioso, afim de faze
rem immediatamente as devidas e circunstanciadas
participações.
*==

Ora, como para o inteiro cumprimento dos quisi


— 471 —

tes e diligencias supra, devam os Delegados do


Conselho de Saude corresponder se com os facul
tativos territoriaes, por intermedio dos Adminis
tradores de Concelho, como Sub-Delegados que
são do mesmo Conselho de Saude; he por isso que
sou obrigado a recommendar a V. S." com a mais
viva instancia , que se preste a satisfazer com a
maior promptidão a todas as requisições, que n'este
sentido lhe fizer o Snr. Delegado do Conselho de
Saude neste Districto.
E por esta occasião julgo a proposito chamar a
attenção de V. S." sobre o relevante serviço, que
para a manutenção da saude publica dos seus
concelhos, podem e devem prestar os Srs. Admi
nistradores de Concelho, como Sub Delegados na
tos que são do Conselho de Saude, e como com
petindo-lhes pelas leis vigentes as funcções fiscaes
administrativas a semelhante respeito.
Independentemente das exigencias ou instrucções
da Delegado do Conselho de Saude, he obvio que
o zelo de que se presumem animados os Adminis
tradores de Concelho os deve mover a entender
nos seguintes assumptos :
Cemiterios Publicos — Prescrever as medidas que,
— 472 –

segundo o parecer de Facultativos intelligentes,


forem proprias para conservar n’elles a salubri
dade, e evitar as exhalações putridas que infeccio
nem o ar com risco da saude dos povos, e espe
cialmente pelo máo methodo ou defeito no enterra
mento dos corpos. — Vejam-se sobre este objecto
o excellente preambulo do Decreto de 21 de Sep
tembro de 1835 — o proprio Decreto.—O Regu
lamento de 8 de Outubro de 1835 — Os artigos
20 e 22 do Regulamento de 3 de Janeiro de 1837
——A Portaria do Ministerio do Reino de 30 de
de Outubro de 1839.

Estabelecimentos de Caridade. —Hospitaes Civis,


Recolhimentos, Lazarètos, Casas de Asylo de Men
dicidade, e quaesquer outros Estabelecimentos em que
se recolham enfermos ou invalidos, orfãos ou expostos.
Todos estes estabelecimentos devem ser inspec
cionados, afim de se procurar conseguir que n'elles
se observem as regras que uma avisada policia sa
nitaria recommenda, em ordem a evitar tudo
quanto possa prejudicar a saude publica.
Cadeias — Inspeccionar as prizões no que toca
ao aceio e salubridade, providenciando, quanto
coubér nas faculdades administrativas, e de accor
do com as Commissões de Beneficencia e de Poli
cia Sanitaria, para que ellas sejam limpas, lava
das, arejadas, e defumadas, bem como para que
os prezos se sujeitem a todos os regulamentos de
aceio, e finalmente para que os alimentos que se
subministram aos indigentes sejam saudaveis.
Fabricas—O Regulamento de 3 de Janeiro de
1837 recommenda a inspecção das fabricas de cor
tumes, de vélas de espermaceti, e de quaesquer
outros artefactos, cujas materias primas ou manu
facturadas podérem influir na saude publica.
N’esta parte a Legislação Franceza, applicada
a uma nação muito adiantada na industria, he
convenientemente desenvolvida, e deve com pro
veito ser consultada á medida que a nossa indus
tria se fôr augmentando, e se dê a necessidade
de tomar providencias ácerca do local e outras cir
cunstancias do esta belecimento de fabricas e oficinas,

Debaixo do ponto de vista sanitario, as fabri


eas e oficinas são divididas em tres classes: — 1.°
– Comprehende aquellas que devem estar afastadas
das habitações particulares; — 2.° — aquellas cujo
afastamento não he rigorosamente necessario, mas
cujo estabelecimento não convem todavia permittir,
se não depois de se adquirir a certeza de que as
operações que alli se praticam não são executadas de
— 474 —

modo que incommodem os proprietarios das visinhan


ças, nem lhes causem prejuizo, — 3.° — Os estabe
lecimentos que sem inconveniente podem ficar per
to das habitações, mas que devem ficar sujeitos á
vigilancia da policia.
Veja-se o Decreto (Legislação Franceza) de 15
de Outubro de 1810, Ordenanças de 14 de Janei
ro de 1815, 5 de Novembro de 1826, 20 de Se
ptembro de 1828, e 31 de Maio de 1833.
Pantanos — No caso de existencia de pantanos,
charcos, agoas estagnadas, ou outros quaesquer fo
cos de infecção, cumpre-lhes entender sobre o mo
do de extinguir ou melhorar estes perigosos elemen
tos de transtorno de saude; ouvindo a opinião, e
seguindo o conselho de pessoas competentes, em
pregando ou reclamando as providencias que o caso
pedir. — Fazer executar inexoravelmente as posturas
das Camaras sobre os matadouros, e particularmen
te sobre a limpeza das ruas, praças, caminhos,
canos, cloacas & c. ouvindo os entendedores sobre
o methodo melhor e mais prompto e eficaz de se
conseguir este bom resultado, ou requerendo no
vas posturas, e em uma palavra, recorrendo a to
dos os expedientes que as circunstancias locaes, do
tempo, e outras occorrentes recommendarem.
— 475
** —

Facultativos. — Inhibir a continuação do exercí


cio dos Facultativos de Medicina ou Cirurgia, que
indevidamente se inculcarem habilitados para cu
rar, bem como dos Boticarios, Pharmaceuticos,
Dentistas, Parteiros e Parteiras etc., que exerce
rem taes misteres, sem estarem para elles habili
tados. Cumpre porém que em qualquer destes ca
sos não obrem injustamente, ofendendo direitos le
gitimos; e por isso em caso de suspeita deverão
consultar os Delegados do Conselho de Saude, quan
do previamente não tiverem sido prevenidos.
Remedios de composição secreta. — Inhibir a ven
da de remedios de composição secreta, quando não
estiverem previamente approvados pelo Conselho.
Comestiveis — Vigiar a venda publica de comes
tiveis, liquidos, drogas, remedios &c. nos ter
mos do Regulamento de 3 de Janeiro de 1837.
Penetrando-se V. S." profundamente da impor
tancia deste serviço, e do quanto he preciosa a sau
de publica, estou certo de que se consagrará com
a mais decidida dedicação a proporcionar aos seus
adiministrados as vantagens, que nesta parte elles
tem direito a esperar da tutelar authoridade que
eXerCC.

Examinar todas as posturas existentes ácerca da


limpeza, e salubridade — fazer executar sem con
templações as que de todo ponto forem proficuas —
solicitar o estabelecimento de outras, que a expe
riencia fôr aconselhando — consultar os facultati
vos e as pessoas entendidas sobre cousas de hygiéne
e salubridade — executar com promptidão as ins
trucções e exigencias do Delegado do Conselho de
Saude — instruir sobre estes especiaes deveres os
subalternos administrativos — e em uma palavra, vi
giar sobre a manutenção da saude publica, com o
mesmo amor e desvello com que um particular pro
cura conservar a existencia...... eis, Sr. Admi
nistrador, os cuidados que a sua missão lhe pres
ereve imperiosamente neste particular.
Terminarei este oficio, exprimindo com franque
za os votos que faço, para que nestes objectos de
Saude não succeda que os povos se lembrem com
saudade dos antigos Almotacés, se por ventura des
cubrirem frouxidão e desleixo nas Authoridades
policiaes de hoje a respeito de um serviço de ta
manha monta.
Deus Guarde a V. S.". Palacio do Governo Ci
vil no Funchal aos 24 de Fevereiro de 1848. —
Illmº Sr. Administrador do Concelho de.... O Go
vernador Civil, José Silvestre Ribeiro.
AssociAções AGRIColAs.

Aos Administradores de Concelho.

4.º Reparticão — Nº 1055 — Livro 3.°


— Circular — Illm.º Snr. — Compete aos Go
vernadores Civis promover o estabelecimento
de sociedades agricolas, como he expresso
no N.° 13.° do Art. 244 do Codigo Admi
nistrativo.
Além disso, o Decreto de 20 de Setem
bro de 1844 diz assim no Art. 89: « Em
(( cada uma das Capitaes de Districto ha
(( verá uma sociedade agricola, com o fim
V( de vulgarisar os conhecimentos, e meios
({
adequados para o melhoramento da agricul
(( tura.

Ǥ unico. Estas sociedades, compostas


{(
de pessoas intelligentes, e zelosas dos pro
((
gressos agronomicos. serão presididas pe
los Governadores Civis, e terão por seus
((
correspondentes os Membros da Juntas Ge
raes dos Districtos — os Administradores
— 478 —

« dos Concelhos — e os Medicos e Cirurgiões


« de partido das Camaras Municipaes. »
Na presença de tão terminantes disposi
ções não ha que hesitar, he mistér que se
procure estabelecer nesta Capital de Districto
uma sociedade agricola; e desta maneira,
cumprindo-se com os preceitos da lei, sa
tisfaz-se ao mesmo tempo ás necessidades
que esta importante possessão portugueza tem
de reanimar a sua cultura e riquesa.
Antes porém de entrar directamente nes
te empenho, convém primeiro despertar a
attenção publica sobre as vantagens, que pó
de proporcionar uma tal sociedade; e como
nella tem que figurar as Authoridades Admi
nistrativas, entendo que por sua intervenção
devo fazer chegar ao conhecimento dos po
vos a indispensabilidade de introduzir uma
tão proficua instituição.
Desde que cheguei ao Funchal, não se
tem passado um só dia, em que não tenha
ouvido lastimar a decadencia da agricultura,
e encarecer a necessidade de se lhe acudir
com promptos remedios. Serão exageradas
estas lamentações? Não por certo. Quem cul
tiva as terras? Colonos pouco sabedores da
dificil sciencia agronomica, que fazem uni
— 479 –

camente o que seus paes já fizeram, e que


nunca imaginaram que doutra sorte se po
desse fazer. Supponhamo-los porém infinita
mente adiantados em conhecimentos, progres
sistas, enthusiastas até pelos melhoramentos
da agricultura; que poderão fazer esses in
felizes, reduzidos, como estão, á penuria e
á miseria? A terra não dispensa o suór do
lavrador, antes o recebe agradecida, como
se fosse o orvalho do céo; mas isso não lhe
basta — he mais exigente — demanda tra
balhos custosos, que o pobre abandonado á
sua deficencia, não póde consagrar-lhe.
Como deixaria pois de estar abatida a a
gricultura, colocada entre a ignorancia e a
miseria ? Contra estes dous terriveis inimi
gos, nem sequer a poderiam escudar o me
lhor clima do mundo, e um sólo feracissi
mo, onde vejo crescer, igualmente viçosas,
as plantas dos tropicos e as dos paizes do
norte.

Mas onde poderemos nós encontrar a il


lustração, e a abundancia de recursos, com
que a agricultura se desenvolve e prospéra?
Pondo de parte a conveniencia de que os
proprietarios se liguem mais ás suas terras
e as beneficiem com essa vigilancia, com es
— 480 —

ses cuidados de todos os dias, de que ellas


tanto se pagam; pondo de parte essa pro
tecção paternal, que a caridade evangelica,
e os seus proprios interesses lhe recommen
dam para com os seus rendeiros, ou forei
ros, ou caseiros, pondo de parte isto, e o
mais que a similhante respeito poderia dizer-se,
responderei áquella pergunta, asseverando af
foutamente que a agricultura continuará a de
finhar, e morrerá de inanição, em quanto
o espirito de associação a não restaurar com
o seu sopro de vida.
E com efeito, Snr. Administrador, consi
dére V. S." comigo quaes vantagens a agri
cultura póde tirar dos serviços de uma so
ciedade agricola, bem estabelecida, perse
verante, e penetrada profundamente do amor
da patria. •

As sociedades agricolas, instituidas nos


paizes onde ha liberdade, e verdadeiro zê
lo pelos interesses nacionaes, propõem-se:
1.° — A discutir assumptos importantes da
sciencia agronomica, derramando luz sobre
os pontos difficeis da mais util e prestavel
das occupações do homem.
2.° — A esclarecer os lavradores sobre os
methodos e pratica, que devem seguir nos
– 481 —

trabalhos ordinarios.
3.° — A mandar vir de todas as partes
do globo as sementes, plantas, maquinas,
instrumentos e utensilios agricolas, e livros
cuja necessidade reconhece. •

4.° — A determinar as culturas, e expe


riencias que devem fazer-se, e a indicar o mo
do de encaminhar as novas empresas.
5." — A melhorar as raças dos animaes,
de cujo prestimo e serviço o homem tira
partido.
6." — A procurar estabelecer quintas ex
perimentaes, onde se ensaiem novos methodos
de cultura, e se façam ousadas tentativas de
introducção de certas plantas, sementes, ins
trumentos etc. — tentativas que um particu
lar não poderia fazer, sem arriscar os seus
limitados recursos.
7.° — A estabelecer escholas de instruc
ção agronomica.
8" — A pedir aos Governos, aos parla
mentos, ás authoridades, as providencias que
julgar indispensaveis em beneficio da agri
cultura.
Mas para que he enumerar mais vanta
gens, que póde produzir uma sociedade a
gricola ?
– 482 —

Uma tal sociedade he o faról da agricul


tura — he a sentinella que vigia cautelosa
em torno da morada do lavrador — he a
providencia
sante classe social applicada á mais interes
de cidadãos. •

Possua-se V. Sº desta convicção, e pro


cure faze-la calar no animo de seus admi
nistrados, por maneira que, preparando-se
assim o terreno, eu ache facilidade em plan
tar uma arvore, que por certo ha de dar
bons fructos.
Não se esquéça porém V. S." de fazer
ponderar, que de balde se toma com o mai
or fervor uma resolução — em vão se entra
nas cousas com grande enthusiamo nos pri
meiros dias, se depois, e pelo discurso do
tempo não ha perseverança, não ha essa te
nacidade, esse proposito inabalavel de não
afrouxar nos bons intentos.
Rematarei este oficio, que já vai longo,
pedindo a V. S." que me envie uma relação
nominal das pessoas desse Concelho, que
V. S." tiver na conta de mais intelligentes,
e zelosas pelos progressos da agricultura.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal, aos 20 de Novem
bro de 1846. — illmº Snr. Administrador
— 483 —

do Concelho de.... O Governador Civil,


José Silvestre Ribeiro.

Ao Ministerio do Reino.

4.º Repartição — N.° 2033 — Illmº e


Exmº Sr. — Desejo ardentemente estabele
cer n’este Districto uma Sociedade Agricola
em desempenho do que me he ordenado pe
la lei, e para o fim de promover o desen
volvimento da agricultura n’esta bella posses
são portugeuza.
N’este sentido, e querendo preparar a opi
nião publica sobre um assumpto tão ponde
roso, entendi que devêra endereçar aos Ad
ministradores de Concelho uma circular, na
qual expuzesse as vantagens de uma tal ins
tituição e os convidasse a fazel-as sentir aos
povos.
Incluzo tenho a honra de encaminhar ás mãos
de V. Exc." um exemplar da indicada circu
lar; asseverando por esta occasião a V. Exc."
que muito em breve tratarei de estabelecer
definitivamente a sociedade agricola , de cu
jos trabalhos e diligencias póde vir grande
beneficio para estes povos. — Deus Guarde a
– 484 —

V. Exc.". Funchal 10 de Fevereiro de 1847


— Ill." e Exc.º Snr. Ministro e Secretario
d'Estado dos Negocios do Reino — O Go
vernador Civil, Jose Silvestre Ribeiro.

Portaria do Ministerio do Reino.

Ministerio do Reino — 2 º Direccão — 2.°


Repartição. — Sua Magestade A Rainha, a
Quem foi presente com o oficio Nº 2033
do Governador Civil do Funchal um exemplar
do oficio circular dirigido aos Administrado
res de Concelho do Districto com o fim de
promover a creação, e organisação de socie
dades agricolas, como providencia essencial
para o desenvolvimento da agricultura, Man
da declarar ao mesmo Governador Civil que
os louvaveis desejos, e todos os esforços, que
já tem empregado, e continua a empregar
para o estabelecimento de tão util sociedade
merecerão cada vez mais a consideração, e
aprêço, em que Sua Magestade Tem os bons
serviços, e reconhecido zêlo do Governador
Civil. — Paço das Necessidades em 26 de
Fevereiro de 1847. — Visconde de Oliveira.
— 485 —

Convite para a organisação da Sociedade


Agricola

4.º Repartição — L.º 3.° — N.° 1317 —


Circular — Illº Snr. — Sendo já tempo de
dar começo á organisação da sociedade agri
cola, recommendada pelo Decreto de 20 de
Setembro de 1844; e havendo-me já os Srs.
Administradores de Conceiho enviado a rela
ção nominal das pessoas que nos seus respec
ctivos concelhos são tidas na conta de mais
intelligentes, e zelósas pelos progressos da
agriculura: •

Tenho resolvido celebrar uma reunião das


pessoas d’este concelho que naquelle sentido
me foram inculcadas pelo respectivo Sr. Ad
ministrador, com o fim de tratar com ellas
sobre o modo de se organisar definitivamente
a sociedade agricola do Districto do Funchal.
Para esta reunião tenciono igualmente ter
a honra de convidar o Conselho de Districto,
a Camara Municipal desta cidade, e a Associa
ção Commercial, por isso que em semelhan
te negocio convem aproveitar todas as lúzes,
e tambem porque nesta occasião se oferece
opportunidade de discutir a conveniencia de
estabelecer uma associação industrial, e de
— 486 –

considerar alguns pontos economicos de interes


se para esta importante possessão portugueza.
. He por este motivo que rogo a V. S." a
mercê de comparecer no Palacio de S. Lou
renço, ás onze horas da manhã do dia oito
d'Abril proximo, onde terá logar a referida
reunião; esperando que V. S.", em attencão
ao ponderôso objecto de que se trata, se di
gnará annuir ao meu convite.
Deus Guarde a V. S.". Palacio do Governo
Civil no Funchal aos 30 de Março de 1847.
Illmº Snr.... O Governador Civil Jose Sil
vestre Ribeiro.

Ao Ministerio do Reino.

4.º Reparticão — N.° 2062 — Ill." Ex." Snr.


— Tenho a satisfação de participar a V. Exc.º que
no dia de hontem reuní no Palacio do Governo a
Camara Municipal, o Conselho de Districto, a As
Sociação Commercial, muitos proprietarios e lavra
dores, com o fim de dar começo á organisação da
sociedade agricola, de que falei a V. Excº no
meu oficio N.° 2033, de 10 de Fevereiro ultimo.
Reunida a Assembleia, fiz ver as vantagens de
— 487 —

uma tal sociedade, empenhei a todos os membros


presentes para que me coadjuvassem n’este empe
nho, e em seguimento tratei logo de formar uma
Commissão, destinada a redigir os estatutos com
petentes.
Nomeada que foi a Commissão, passei logo com
ella a tratar da redacção dos ditos estatutos, e
tenho toda a esperança de que no dia 13 do cor
rente poderei celebrar outra reunião geral para a
discussão d'elles. (1)
Penetrado profundamente da convicção de que as
associações são um poderoso elemento para promo
ver a prosperidade dos povos, estou disposto a fa
zer quanto em minhas apoucadas forças cabe para
dar vigor a esta sociedade; infelizmente porem hei

(1) A Commissão, presidida pelo Exmº Sr. Conselhei


ro José Silvestre Ribeiro, e composta dos Srs. Luiz
de Ornellas e Vasconcellos, João Francisco de Flo
rença Pereira, Francisco Vieira da Silva Barradas,
Luiz Antonio de Ornellas, Manoel de Gouvêa Rego ,
Manoel de Sanct'Anna e Vasconcellos e de outros Ca
valheiros do Funchal, chegou a formar um projecto
de Estatutos, segundo o modello dos da « Sociedade
Promotora da Agricultura Michaelense.» Esses Esta
tutos hião a discutir-se, quando a infernal politica
veio transtornar todos os planos de melhoramento.
Preparava-se, e verificou-se depois o fatal « Pronun
— 488 —

de encontrar na miseria geral da Ilha um grande


embaraço, e só o Governo poderá prestar-me a coa
djuvação de que n'este caso preciso, para logo no
principio influir alento nos Madeirenses, mandan
do pôr á minha disposição a maior e mais variada por
ção de sementes, modelos de maquinas, desenhos de
instrumentos agrarios, livros &c. Permitta-me pois
V. Exc. º que eu approveite esta occasião para lhe
rogar a singular mercê de proteger esta minha em
preza, tanto quanto for compativel com as actuaes
circunstancias do nosso Paiz.
Deus Guarde a V. Exc º – Funchal aos 9 d'Abril
de 1847 — Illm.º e Exmº Snr. Ministro e Secre

tario d'Estado dos Negocios do Reino — O Gover


nador Civil, José Silvestre Ribeiro.

ciamento » que tantos males acarretou á Madeira,


que tantas sementes de odios e divisões lançou nesta
terra , e que poz um termo ao desenvolvimento pro
gressivo da prosperidade publica, em que tão fervo
rosamente estava empenhada a Authoridaue Adminis
trativa. Foi por esta razão que não coube á Madei
ra a gloria de ser o primeiro Distrieto, depois do de
S. Miguel, em que se estabelecêsse a Sociedade Agri
cola ; pede porem a justiça que se leve em conta o
nobre esforço do Governador Civil ao Funchal que
já no anno de 1847 tinha tão adiantado este ne
gocio.
– 489 —

ARTIGos LITTERARIos.
+

NAPoI.EÃo

« Transportemo-nos pelo pensamento ao


futuro, disse um dia Mr. de Fontanes, (1)
e vejámos este heroe, como a posteridade o
ha de entrever atravez das nuvens do tempo;
então sim, que a sua grandeza parecerá por
ventura fabulosa; mas milhares de monumen
tos virão attestar as maravilhas da sua vida,
e dissipar quaesquer duvidas. Se os vossos
derradeiros descendentes quiserem saber qual
foi o homem, que só, depois do imperio ro
mano, reunio em um corpo toda a Italia, a
historia lhes dirá: Foi Napoleão. Se per
guntarem quem dissipou quasi na mesma epo
cha as hordas arabes e musulmanas ao pé
das Pyramides, e nas margens do Jordão,
a historia lhes dirá: Foi Napoleão. Maiores
enleios porem os aguardam: um homem, de
alguma sorte designado lá de cima, parte
(1) No anno de 1809, por occasião do encer
ramento da sessão
M. de Fontanes eradoPresidente.
Corpo Legislativo, de que

— 490 —

do fundo do Egypto, no momento em que


todas as vozes da França o chamavam em seu
soccorro, e ei-lo que vôa a restabelecer as
leis, a religião, e a ordem social, ameaça
das d’uma ruina proxima; este homem foi
tambem o mesmo Napoleão ! Ao verem, no
espaço de dez annos, trinta estados mudan
do de forma, thronos fundados, thronos des
truidos, Vienna duas vezes conquistada, e os
successores do Grande Frederico perdendo a
metade da sua herança, os nossos vindouros
julgarão que tantas revoluções, e tantas vic
torias são obra de muitos conquistadores;
mas a historia, encostada ao testemunho una
nime dos contemporaneos, dissipará todos os
enganos, e mostrará ainda outra vez o mes
mo Napoleão, arremeçando-se da Austria
sobre a Prussia, levando sua marcha victo
riosa até aos confins da Polonia, voando de
repente lá do cabo da Sarmacia até aos Pi
renêos, e triumfando junto dessas regiões,
onde a antiguidade colocava os limites do
mundo! E no entanto, ainda não estão es
gotados todos os prodigios; ainda he necessa
rio traçar os beneficios d'um Codigo Immortal;
ainda he necessario pintar as artes todas,
chamando a Pariz a magnificencia da antiga
— 491 —

Roma, porque he justo que a cidade, onde


reside um tão Grande Homem, venha a ser
a Cidade Eterna. »
Eis o modo porque se explicou um ho
mem de admiravel talento para encarecer os
maravilhosos feitos de Napoleão Bonaparte.
Na verdade, a adulação não seria capaz de
elevar se a tamanha altura de eloquencia, e
força he confessar que o brilhante orador en
controu no fundo da sua consciencia as inspira
ções da verdade, sem as quaes a palavra he
fria e gelada.
Quando Napoleão jazia no desterro de
Sancta Helena, ouvio-se no Parlamento In
glez uma voz amiga, que assim se exprimio:
« Até as pessoas que detestaram este grande
homem, teem reconhecido que ha déz secu
los não tinha apparecido um caracter mais
extraordinario. A Europa iuteira tomou lucto
pelo heroe, e aquelles que contribuiram para
este grande crime estão condemnados ao des
prêzo das gerações presentes, bem como ao
da posteridade.» — Ainda disse pouco Lord
Holland; he necessario remontar mais acima
na antiguidade, para encontrar o unico homem,
que possa comparar-se com Napoleão Crê-se
que Cesar he o homem mais completo da his
— 492 —

toria, por isso que reúne o triplicado genio


de politico, de escriptor, e de guerreiro;
não seria porem difficil demonstrar que, não
só Napoleão he igual a Cesar, se não a cer
tos respeitos lhe leva vantagem.
O Heroe 1 omano só fez, como observa
M. Bignon, uma guerra a favor de Roma,
e a sua principal gloria provem das victorias
que alcançou nas guerras civis; e n'esta par
te, quanto não lhe he superior Napoleão, cu
jos louros forão sempre colhidos nos campos
dos estrangeiros? Cesar conta nos Commenta
rios as suas brilhantes campanhas das Galli
as, e das guerras civis; não lhe esquece uma
só circumstancia para exaltar a sua gloria,
e apezar d’isso, apresenta elle por ventura
esses rasgos de genio da memoravel campa
nha da Italia , e os quasi fabulósos da campa
nha do Egypto? Ha por ventura na vida de
Cesar um episodio tão notavel, como o de Na
poleão, a quem Kleber levanta aos ares, quando
termina a batalha de Aboukir, e lhe diz:
General / tu és grande como o mundo! —
arrebatado de enthusiasmo e de admiração
pelo genio do seu rival? Póde acaso alguma
das batalhas de Cesar comparar-se com as
de Marengo e de Austerlitz?
— 493 —

Alexandre nascêo nos degráos do throno;


Cesar veio ao mundo, envolvido nas faixas
da purpura dos senadores; Napoleão devêo
tudo á sua espada, devêo tudo ao seu genio.
— Cesar encontrou o mundo romano cança
do da tempestuosa liberdade, e carecido de
centralisar-se sob o regimen de um che
fe unico; o amor dos soldados lhe entregou
o poder, e se o punhal dos conspiradores
lhe deu a morte, he todavia certo que em
sua vida não existiam em torno delie, exce
ptuando Pompêo, senão rivalidades subalter
nas. Napoleão teve que lidar com um povo
embriagado do amor da liberdade; encontrou
uma nação civilisada, competidores sem nu
mero, que á força de talento lhe disputavão
o passo, mas o heroe triunfou de tudo, por
que o seu genio era vasto, e de tal modo fas
cinador que ainda as superioridades se lhe
dobravão.
Cezar aformoseou Roma, abrio um porto
na embocadura do Tibre, reformou as leis,
4ez adoptar um novo calendario, e creou um
grande numero de estabelecimentos uteis. Na
poleão leva nesta parte uma reconhecida van
tagem a Cesar. Dêo á França um Codigo
perfeito, e monumental, e no meio de con
– 494 —

tinuas guerras construio os magnificos molhes


de Anvers, e Flessingue; fez as obras hy
draulicas de Dunquerque, do Havre, e de
Nice; o gigantesco molhe de Cherburgo; as
obras maritimas de Veneza; as bellas estra
das de Anvers a Amsterdão, de Mayence a
Metz, de Bordêos a Bayona ; as passagens
atrevidas e muito superiores aos trabalhos dos
Romanos, as passagens, digo, do Simplon,
do Mont-Cenis, e da Corniche, que franquei
am os Alpes em quatro direcções; as estra
das dos Pirineos aos Alpes, de Parma a Spez
zia , de Savona no Piemonte; as pontes de Jena,
d'Austerlitz, das Artes, de Sévres, de Tours,
de Rouanne, de Lião, de Turim, da Isére,
da Durance, de Bordêos, de Ruão etc.; o
canal que une o Rheno ao Ródano pelo Doubs,
ligando os mares da Hollanda com o Medi
terraneo; o canal que une o Escalda á Som
me, ligando Amsterdão com Pariz; o canal
que une a Rance com a Vilaine; o canal
d'Arles, o de Pavia, o do Rheno. — Operou
o esgotamento dos pantanos de Bourgoing,
do Cotentin, de Rochefort. Restabelecêo a
maior parte das egrejas demolidas durante a
revolução; edificou outras de novo; construio
um grande numero de estabelecimeutos de
— 493 —

industria para a extincção da mendicidade,


São tambem obra sua os trabalhos do Lou
vre, os celeiros publicos, o banco, o canal
do Ouricq, a distribuição das suas agoas pela
cidade de Pariz, os numerosos canos de es
coamento, aformoseamentos e monumentos da
capital; os trabalhos para o aformoseamen
to de Roma, o restabelecimento das manu
facturas de Lião, a creação de centenares de
manufacturas de algodão, de fiação e tecido etc.
Se admiramos Cesar como politico, pode
remos acaso negar a nossa admiração a Na
poleão? Tinha por ventura Cesar necessida
de de um tão grande genio para dominar o
mundo romano na epocha em que existia,
como Napoleão para sujeitar a Europa civili
sada do seculo 19.° E demais d’isso, se Na
poleão tivesse tido um almirante e uma es
quadra; se não tivesse por fatalidade encon
trado traidores, seria por ventura facil neu
tralisar as suas profundas combinações poli
ticas ?
Cesar foi orador distincto, foi um escrip
tor insigne; mas ahi estão as Proclamações,
e as Memorias de Napoleão, e diga-se se o
heroe Romano chegou jamais a tamanha altu
ra. Não arranquemos a Cesar a palma de
— 496 —

primeiro Orador militar dos tempos antigos,


que seria este um acto de grande injustiça,
mas confessemos que não encontramos, nos
seus commentarios, nem em Plutarcho e Sue
tonio, seus biografos, os traços de sublime
eloquencia que se admiram em Napoleão B -
naparte. O celebre veni, ridi, vici, de Ce
sar; a exclamação que elle sólta ao pôr o
pé na terra Africana, quando, para arre
dar supersticiosos agouros, diz depois de ca
hir: Africa, és minha , não me escapas! ; o
que elle diz ao Piloto aterrado pela furia das
ondas, e da tempestade: Perge, generose,
perge, vade, nec “ertimesce quiquam, Caesa
rem vehis, ao Caesaris fortunam navigationis
comitem: — tudo isto tem sido admirado, e
o será em quanto os homens tiverem o ins
tincto do bello. Mas quantos pensamentos,
quantas expressões de verdadeiro genio não
proferio Napoleão, que os contemporaneos ou
virão, e a historia transmittirá ás futuras eda
des? — Do cimo destas Pyramides, quarenta
srculos vos contemplão! disse Napoleão aos
soldados do Egypto. Aos Plenipotenciarios de
Leoben: A Republica Francesa he como o sol.
Quem a não vê, he cego ! Ao exercito de
Marengo: Soldados! Lembrai-vos que he meu
– 497 —

costume dormir nos campos de batalha. Ao


General Moreau, por occasião de lhe ofere
cer um rico par de pistolas: Quiz fazer gra
var n’ellas o nome de todas as vossas victo
rias; mas não eram assaz espaçosas para os
conterem. A uma sentinella a quem encontrára
dormindo: Depois de tantas fadigas, he per
mittido a um bravo, como tu, adormecer.
A um General de Corte que lhe pedia o bas
tão de Marechal: Não sou eu quem faço ma
rechaes, he a victoria. A historia guardará
sempre como um precioso deposito, a Carta
que Napoleão escreveo ao Principe Regente
de Inglaterra, a bordo do Bellerophon; «Al
teza Real! Em lucta com as facções que di
laceram o meu paiz, e com a inimisade das
maiores potencias da Europa, terminei a mi
nha carreira politica, e venho hoje, como
Themistocles, assentar-me ao lar do povo bri
tannico, e abrigar-me á sombra da protecção
das suas leis, a qual reclamo de Vossa Alte
za Real, como sendo o mais poderoso, o mais
constante, e o mais generôso dos meus ini
migos !
E se quiséssemos memorar aqui os ditos
que proferio o grande homem no solitario
rochedo de Santa Helena, fôra um nunca
— 498 —

acabar. Ouçamos porem alguns trechos das


suas immortaes proclamações. Napoleão entra
em Milão, e para mais inflamar a coragem
de seus soldados, lhes diz: « Soldados! Pre
cipitasteis-vos como uma torrente do alto dos
Apenninos. O Piemonte está libertado; Milão
he já vossa , e em toda a Lombardia fluctúa
a bandeira dos Francezes. Transposésteis o
Pó, o Tesino, o Adda, esses preconisados
baluartes da Italia. Vossos paes, mães, es
pôsas, irmãs e amantes regosijão-se agora
com os vossos triunfos, e ensoberbecem-se de
vos pertencerem. Sim, soldados! Tendes feito
muito.... mas não nos resta acaso mais nada
que fazer? Hade a posteridade dizer que en
contrasteis Capua na Lombardia? Partâmos!
Temos ainda que emprehender marchas for
çadas, submetter inimigos, colher louros, e
vingar injúrias! »
« Restaurar o Capitolio, e as estatuas dos
seus heroes; despertar o povo romano, que
ha longos seculos jaz no lethargo da escravi
dão...... eis o que vos falta ainda por fazer.
«Terminado isto, voltareis aos vossos lares,
e os vossos concidadãos dirão, quando passar
des: Aquelle pertenceo ao exercito da Italia!»
Quando atravessava o Mediterraneo para o
– 499 —

Egypto, falou assim ao exercito expedicio


nario: « Soldados! Vós sois uma das alas
do exercito d Inglaterra! Já fisesteis a guerra
de montanhas, de planicies e de cercos; fal
ta-vos fazer a guerra maritima. As legiões
romanas, a quem vós tendes por vezes imi
tado, combattiam Carthago alternativamente
neste mar e nos plainos de Zama; nunca a
victoria as abandonou, por que constantemente
forão bravas, sofredoras, disciplinadas, fir
mes. Mas, Soldados! A Europa fita em vós
os olhos ! Tendes que preencher grandes des
tinos, tendes que pelejar batalhas, e vencer
fadigas »
Mas já a frota enxerga as praias de Ale
xandria, e Bonaparte diz ao exercito: « Fran
cezes! vós hides empreender uma conquista,
cujos efeitos sobre a civilisação e o commer
cio do mundo são incalculaveis. A primeira
cidade que vamos encontrar foi edificada por
Alexandre. »
A Proclamação que Bonaparte endereça
aos Egypcios he uma obra prima de elo
quencia, de discreta e avisada politica: «Ca
dis, Cheiks, Chorbadgis! dir-vos-hão que
eu venho destruir a vossa religião: não o
acrediteis. Respondei que venho para resta
— 509 —

belecer os vossos direitos e castigar os vos


sos usurpadores, e que respeito, mais do
que os Mamelucos, Deus, o seu propheta e o
Coran. »
« Dizei ao povo que todos os homens são
iguaes perante Deus, e que só a sabedoria,
os talentos e as virtudes estabelécem entre
elles as diferenças etc. etc. »
Mas para que he accumular mais provas?
Se não tivermos chegado a demonstrar
que o genio de Napoleão se avantaja ao de
Cesar, nem por isso he menos certo que o
heroe da Italia e do Egypto he um desses
faróes animados, como alguem já disse, que
a Providencia faz brilhar de longe em lon
ge no oceano das edades, para mostrar de
que prodigios he capaz o desenvolvimento o
mais completo da intelligencia humana, au
xiliado na sua acção por todo o favor da
fortuna.
Mas ah ! Napoleão jã não existe; do he
róe fenecido só subsiste a sua immensa glo
ria, e a recordação immortal do seu extra
ordinario genio. A Providencia apagou com
um sopro o espirito que o animava; o ho
mem cahio, e pereceo, como cahiram e pe
recêram Alexandre e Cesar. Alexandre, diz
– 591 –

o espirituoso author do Lirro dos Orado


res, morre na flor dos annos, saciado de
triunfos e de vºluptuosidades, na embria
guez d'uma festa; Cesar cahe ao pé da es
tatua de Pompêo, ferido pelo punhal repu
blicano, quando pelo Senado hia ser coroado
Imperador perpetuo de Roma, depois de ter
sujeitado ás suas leis a terra toda: e final
mente, Napoleão só pára na carreira da am
bição, quando o arrojão para um rochedo
solitario, no meio das vagas do Oceano.
Profunda lição da Providencia! O phe
nomeno da nossa edade, a maravilha dos
nossos dias, Napoleão, morre num peque
no ponto da terra, longe da França que
illustrou, longe da Europa que encheo de
assombro, longe da Filha dos Cesares que
escolhêra para espôsa, longe do Filho cuja
saudade o devorava; longe dos soldados a
quem levára tantas vezes á victoria, e que
o idolatravam como um semidêos! He por
que Napoleão era homem — e o homem não
he mais do que uma cinza orgulhosa que o
Soberano Senhor alevanta ou abate, como
lhe apraz Quid superbit terra et cins ?
Funchal, 23 de Novembro de 1846.
José Silvestre Ribeiro.
—502–

Fox e Pitt julgados por Benjamin Constant.


Entre as suaves recordações da minha vi
da ha uma em que muito se delicia o meu
coração, qual a de ter conhecido pessoalmen
te dous homens illustres dos nossos tempos,
que entre os caracteres mais puros dos defen
sores da Liberdade muito e muito fulgurão.
Ainda agora se reproduz na minha imagina
ção a impressionadora scena de que gozei no
anno de 1829 na saudosa terra de França.
Nesse paiz hospitaleiro estava eu naquella era
em que tambem me assentei como perigrino
á meza de caridosos estranhos, quando um
dia fui assistir a uma sessão da Camara dos
Deputados. Dois velhos venerandos estavão en
costados a uma columna da sala das sessões,
praticando entre si com a placidez propria dos
longos dias, e do remanso de uma conscien
cia pura.
Fizerão-me impressão aquelas magestosas
figuras de homens, e levado da curiosidade
perguntei a um francez que junto de mim
estava, quem eram aquelles dois anciões. Pois
não os conheceis!, acudio o meu visinho, são os
Srs. General Lafayette e Benjamin Constant.
— Não estou fazendo um artigo romantico;
— 503 —

refiro apenas com singeleza as sensações da


quella epocha: um repentino estremecimento
me coou pelas veias, que não pude eu ver
sem uma viva commoção dois homes cujos no
mes estavão ja gravados no meu coração pe
los serviços que prestado havião á Liberdade!
Fnxugei o pranto que involuntariamente me
rebentou dos olhos, c comecei a saborear com
profundo prazer o aspecto daquelles valentes
athletas da boa causa dos povos, os quaes na
postura em que os via, eram a imagem viva
da missão que a Providencia lhes commettera
de serem os sustentaculos dos sagrados fóros
da humanidade. •

Fôra-me grato falar aqui do venerando


amigo de Washington; não o sofre porem o
particular objecto deste artigo: nem ao me
nos posso espraiar-me como desejara ácer
ca de Benjamin Constant; que é força li
mitar-me a traçar um muito rapido esboço
do merecimento politico deste publicista fa
IT]OSO.

Ninguem manejou ainda até hoje com maior


habilidade do que Benjamin Constant a lin
guagem politica; assim como ninguem em
França prestou tamanhos serviços á causa da
Liberdade Constitucional. Durante os quinze
— 504 —

annos que decorrerão desde a quéda de Na


poleão até á revolução de 1830 esteve elle
sempre á brecha, como soldado esforçado e
infatigavel, fazendo a mais habil e perseve
rante opposição aos planos anti-liberaes dos
Ministros da Restauração. Quando não falla
va, escrevia — quando não escrevia, fallava;
de sorte que os seus artigos, cartas, brochuras e
discursos daquella epocha comporião mais
de doze volumes — diz um engenhoso escrip
tor Francez. •

Eloquencia a mais propria de assumptos


politicos — erudição vastissima e apurada —
sal epigrammatico de finissima graça — sin
cera e profunda paixão pela Liberdade —
amor entranhavel da especie humana, harmo
niosamente enlaçado com o patriotismo o mais
fervoroso — illimitada confiança no predominio
da razão e da justiça — tolerancia generosa
e illustrada — dedicação completa ao desem
penho dos deveres de representante do povo;
eis as brilhantes qualidades deste homem ce
lebre, eis o que os seus escriptos revelão
em cada pagina. •

Tratava-se um dia na Camara dos Deputa


dos de uma discussão ácerca das loterias; Ben
jamin Constant tomou a mão a falar; e o que
— 595 —

elle disse he a expressão mais eloquente da


nobre indignação d’uma alma, toda repassa
da do amor da humanidade, e ao mesmo tem
po do horror que naturalmente inspira aquel
le funestissimo jogo:
« Se existisse, Senhores, nas praças pu
blicas, ou lá nas profundezas d'um antro es
curo um jogo que infalivelmente houvesse de
arrastar á ruina os jogadores — se o director
desta illicita e traiçoeira empreza vos con
fessasse que o seu jogo vai de encontro ás leis
da probidade a mais trivial — que para asse
gurar o bom exito da sua desleal especulação,
arma laços á classe mais facil de ser embai
da — se vos dissésse que circunda de seduc
ções o pobre, impelle o innocente ao crime;
recorre, para deslumbrar a preza, á impos
tura e á mentira — se vos dissésse que as suas
mentiras e imposturas são apregoadas á luz
do dia por todas essas ruas; que as suas pro
messas absurdas e illusorias retinem á orelha
da credulidade e da ignorancia; que traçou
um plano de clandestinidade e de trevas a fim
de que as victimas se precipitassem no golfão,
sem que a razão podésse illustral-as, o re
ceio da censura detê-las, e os gritos dos pa
rentes preserval-as da tentação: se esse tal
— 506 —

director acrescentasse, que para corresponde


rem aos seus perfidos convites, incessantemen
te renovados, o criado rouba o amo, o ma
rido despoja a mulher, o pai os filhos; em
quanto elle, tranquillamente assentado na pri
vilegiada caverna, ao mesmo tempo instiga
dor, encubridor e cumplice, estende a mão
para recolher o producto do roubo e os mise
raveis ceitís que arranca á subsistencia das
familias:-E se finalmente se reconhecesse que
todos os annos as desordens por elles provo
cadas arrastão as victimas — da miseria ao
crime, do crime ás galés, ao suicidio ou
ao cadafalso.... que sentimentos esperimen
tariamos nós? Senhores, eis o que he a lo
teria com todas as suas combinações, arti
ficios, calculos e resultados. Tudo quanto vos
dizem em seu favor não altera em nada o
fundo e a essencia das cousas. A loteria ex
iste para operar a espoliação e o roubo, a
limenta se com embustes, e termina nos es
tragos, no suicidio, ou nos supplicios. »
O Ministerio Francez pertendia no anno
de 1822 encobrir arteiramente o projecto
liberticida que formára contra a Hespanha, e
neste sentido, em logar de dizer abertamen
te que carecia de fundos para costear as
despesas d'um exercito destinado a operar a
contra-revolução na Peninsula, pedia á Ca
mara um credito para o serviço sanitario. O
discurso que por esta occasião proferio Ben
jamin Constant he muito notavel; darei ape
nas noticia de alguns breves extractos: ....
« Com efeito, que podésteis vós deprehen
der do discurso do Snr. Ministro dos Nego
cios Estrangeiros! Fez votos pela felicidade
da Hespanha; mas isso não significa nada,
porque cada um entende a felicidade das
nações á sua guisa: os despotas, por ex
emplo, pensam que os povos são infinita
mente afortunados sob o seu jugo, (riso)
disse ele uma só palavra tendente a desva
necer o receio de que essas providencias sa
nitarias venham a ser o preambulo d'uma
Cruzada criminosa e inepta contra esse po
vo generoso? .......................
..... A resposta pois do Snr. Ministro con
firma o que eu disse ha dias nesta tribuna.
Querem que vamos atacar a Hespanha; e
os cordões sanitarios são a vanguarda da Co
allisão. A Santa Alliança nossa aliada n'es
ta agressão injusta, ha de exigir a passagem
de suas tropas pelo sólo da França — e quan
do sahirão ellas? &. &. »
— 508 —

Neste mesmo anno de 1822, quando o


Ministerio foi pedir á Camara um credito pa
ra despesas de policia secreta, orou Benja
mim Constant com tamanha eloquencia, que
fez uma profunda impressão nos animos dos
seus collegas. A policia que o Governo Fran
cez exercitava naquella epocha era summa
mente rigorosa, e impropria do systema cons
titucional, chegando até a abranger a vigi
lancia mais off nsiva para com as pessoas dos
Deputados Liberaes —.......... « He para
estabelecer uma semelhante eschola de per
versidade que o Sr. Prefeito da Policia exi
ge fundos? O que estou disendo, aconteceo
comigo, e de bom grado aproveito este ensejo
para dizer que se o Sr. Prefeito da Policia
tem suspeitas de mim, delibere-se a tomar
alguma responsabilidade, e mande apprehen
der com todo o apparato da força os meus
papeis. Nelles encontrará a expressão do pro
fundo desprezo que eu voto aos instrumentos
da tyrania, ao mesmo passo que a do assi
gnalado respeito que consagro ao governo
Constitucional. Se adquirir provas em contra
rio, se chegar unicamente a verosimilhan
ças, a patria lho agradecerá, e ainda assim
haverá alguma nobreza na sua dedicação;
– 599 –

mas semear na população laboriosa o germes


de toda a sorte de corrupção e de vicios, fa
zer de seus agentes uma especie de monitor
de ensino mutuo de aviltamento e de trai
ção.... isto he não só um delicto para com
nosco, he tambem um crime para com a socie
dade (braros no lado esquerdo). E agora,
Senhores, permitti-me que eu remonte a
considerações mais elevadas do que os inte
resses pessoaes, ou do que o alvo a que atira
o Sr. Prefeito da Policia. »
«Dizei-me, Senhores, eu vo-lo pergun
to, que poderemos nós esperar desse funes
to sistema de arredar da estrada honesta dé
trabalho a classe infima, que tem tantas ne
cessidades e tão poucos prazeres, e que por
isto mesmo tão facilmente se presta á seduc
ção ? Fazem-na desprezar todos os escrupulos,
habituão-na a todas as commodidades a que
nunca poderia aspirar, proporcionão-lhe meios
de conseguir essas commodidades á custa de
acções vis, que não são castigadas.... e que
ha de resultar daqui? Ha de succeder que
no momento em que esses infelizes, de quem
fizerão criminozos, já não forem precisos,
tornarão a voltar á miseria, mas já com as in
fames ideias que lhes influirão, mas já aborreci
— 510 –

dos do trabalho; mas já habituados á ociosidade,


á devassidão e aos delictos que lhes ensinarão.
Nessa occasião já não tem os vergonhosos sa
larios que recebião; lembrão-lhes as commo
didades que gosárão, querem consegui-las a
todo o custo, e não hesitarão em attentar con
tra a propriedade e contra a vida dos seus
concidadãos; aqui está o crime da authori
dade — julgou que estabelecia espias e só
creou assassinos (viva adhesão no lado esquer
do). A espada da Lei não tardará em des
carregar o golpe sobre elles; mas quem se
rá responsavel pelo sangue que se derramar?
Elles erão honrados; seguião pacificos o seu
obscuro destino, antolhavão um futuro sem
mancha, esperavão só gosar da mais parca
fortuna, desempenhavão bem os deveres que
lhes cabião.... e a Policia veio tentá-los,
corrompe los, vota-los ao crime, e depois ao
cadafalso (novos applausos). »
Como resistir á tentação de citar mais al
guns fragmentos dos bellissimos discursos des
te grande Orador?.... No entanto he força
deixar para outra occasião a sua biographia,
e uma noticia desenvolvida de todos os seus
escriptos; agora devo apresentar já o eloquen
te e sabio juizo que ele formou ácer.
— 511 —

ca do extraordinario, se bem que diverso,


merecimento dos dous maiores Estadistas e
Oradores de Inglaterra, que tão resplandecen
te rasto de luz deixárão no mundo:
« Paixões impetuosas — um grande amor
e uma grande necessidade de sensações fortes
— uma ambição ardente, mas generosa —
um patriotismo de tal sorte illustrado que
não excluia a filantropia — uma sensibilida
dade profunda e verdadeira — uma fidelidade
a toda a prova na amisade — uma constan
cia nas afeições, que prevalecia sobre os odi
os e sobre os interesses de partido — uma
encantadora mistura de infancia e de supe
rioridade — um espirito fino, penetrante, al
gumas vezes ironico, mas temperado por uma
bondade perfeita, e sómente empregado para
combater doutrinas funestas, ou para auxili
ar os movimentos de uma nobre indignação
— uma eloquencia arrastadora, mas por ve
zes Inquieta e precipitada, como se innume
ras ideias rodeassem o orador, e o arremes
sassem mais longe do que ele queria — um
instincto admiravel e rápido ácerca de tudo
o que dizia respeito á liberdade — o gosto de
quanto ha de elegante nas artes, e de bello
na naturesa — o dom de amar a especie hu
– 512 —

mana, e de só experimentar desconfiança de


pois dos factos a provocarem: taes erão as
qualidades que colocavão Fox nas fileiras dos
mores e mais estimaveis homens de que se
honra a Inglaterra.
« Mui diversas erão as qualidades de Pitt;
poderosa e vehemente dialectica — doutrina
pura, e de vez em quando elevada — ambi
ção immensa, mas pausada e fria. Na am
bição se reconcentravão todos os affectos, to
das as paixões deste homem singular; que
nem o distrahião jamais o gosto das artes,
nem a seducção dos prazeres, nem os attrac
tivos das mulheres. Querem dizer que de
tempos a tempos se entretinha em folguedos
obscuros e vulgares, e que na sua mocidade
( o que eu creio) não desgostava de se de
morar, como he uso de inglezes, horas largas
á meza no fim dos banquetes; he certo porem
que até a sua embriaguez era grave, e por
nenhum modo estabelecia entre elle e os seus
commensaes, a quem tractava por amigos, a
menor intimidade, porque na sua alma não
havia germen algum de sympathia que o en
laçasse com elle »
« Antes de occupar os altos empregos pro
professara Pitt os principios da liberdade, co
— 513 —

mo acontece a todos os candidatos ao minis


terio; mas se compararmos os discursos que
pronunciou neste sentido (em verdade pou
cos, porque aos vinte e tres annos era já
Ministro) com os que consagrou no restante
da sua carreira ao empenbo de reforçar o
poder, vê-se que a defeza do povo não era
o terreno proprio para o desenvolvimento das
suas faculdades — a authoridade era a sua
atmosfera, bem como a liberdade era a de
Fox. »
« O modo por que estes dous homens ce
lebres encaravam a Constituição ingleza era
em todo o ponto diferente: Fox via nella uma
nobre esperança de aperfeiçoamento para todas
as classes da especie humana — Pitu olhava-a
como a mola vigorosa dum poder regular,
e um elemento de estabilidade para a oli
archia. »
« Fallei da constancia de Fox nas suas
afeições.... os inglezes ainda hoje se sen
sibilisam quando se recordam das lagrimas
que ele derramou em pleno parlamento por
occasião do seu rompimento com Burke. Não
sei se Pitt chorou alguma vez; mas por
certo não foi pelo generoso motivo de in
terrupção ou quebra de velhas amizades:
— 514 —

For teve amigos, Pitt só teve associados,


ou antes subalternos. » •

« Estou em dizer que o ministerio de Pitt


foi em 1789 uma grande calamidade para a
Europa. Não sei quem disse que o coração
tinha mais penetração do que a propria in
telligencia Um ministro mais cosmopolita e
menos inglez do que Pitt teria visto na re
volução franceza uma epocha, que poderia
vir a ser feliz para a humanidade; mas Pitt
só vio nella uma crise que enfraquecia a na
ção rival da Inglaterra, e por isso tratou
de aggravar o mal em logar de concorrer
para o bem. Chegou elle, he verdade, a
sepultar a França n'um horrivel cahos —
mas o destino he justo — a França sahio
desta desordem, e a Inglaterra esteve quasi
a abismar-se nella. Eu não quero accusar
Pitt de haver fomentado todos os horrores
da demagogia sanguinaria de 1793; crises
ha, durante as quaes as facções não carecem
de incitamento para commetterem excessos:
as sem-razões de Pitt remontam a outra e
pocha. Em 1789 e 1790 combateo por to
dos os meios secretos que estavam ao seu
alcance os exforços que 41. Neckar fazia pa
ra pacificar a França; e eu ouvi dizer a es
te ultimo que encontrára muitas vezes a in
fluencia ingleza entre os embaraços que se
oppunhão ás providencias tendentes a restabe
lecer o socego, por exemplo, a respeito do
abastecimento de viveres no terrivel inverno
de 1789. »
« He bem de crer que Fox tivesse se
guido outro rumo. Teria favorecido a ten
dencia amigavel que então se desenvolvia en
tre as duas nações; teria oferecido aos fran
cezes, inquietos, e então martirisados pelo
flagello das estações, pelo demonio da anar
quia, e pelas intrigas estrangeiras, uma
alliança nobre e leal. Em logar de excitar
os Soberanos da Europa a levantarem o es
tandarte contra um povo que queria respei
tar a independencia dos seus visinhos, com
a unica condição de tambem lhe respeitarem
a sua, teria empregado a influencia do ga
binete de S. James para fazer sentir à pri
meira coallisão que não devia irritar 25
milhões de homens apaixonados pela liber
dade; e d’est’arte teria provavelmente con
seguido salvar Luiz XVI, e assim mesmo a
milhares de victimas, que antes e depois
deste infeliz monarcha foram sacrificadas. »
« E se navegando neste bordo não conse
– 516 —

guia a Inglaterra exercitar o monopolio do


commercio. nem ser a unica potencia ma
ritima da Europa, tambem por uma feliz
compensação não chegaria a ver em Stock
port. em Manchester, em Smithfield reuni
ões de setenta mil descontentes — não che
garia a vêr ameaçada a Constituição — nem
posta em problema a obediencia às leis —
nem um bando de insensatos demagogos en
caminharem se para a liberdade pela estra
da da anarchia, e para a justiça pela do
assassinio...... tristes resultados de um
triunfo insolente! »
« Pitt he o fundador da eschola politica
que actualmente domina na Inglaterra, e
que tem por moveis o egoismo, o desprezo
dos homens, e o amor do dinheiro. Deve
porem dizer-se, e a imparcialidade assim o
demanda, que Pitt era muito supperior a
quaesquer considerações de interesse particu
lar: a sua inteireza em objectos pecuniarios
era de todos reconhecida. Só os homens me
diocres são ávidos de ouro, e não admira
que o talento de Put , talento que aliás não
sobresahe em nenhum dos seus discipulos, o
preservasse dos sordidos calculos de vís in
teresses. Mas os houvens a quem a sede do
— 517 —

mando devora tem uma especie de arrogan


cia, que lhes torna agradavel o verem que
os instrumentos de que se servem são influ
enciados por paixões menos nobres: alem do
prazer de se sentirem supperiores a esses ins
trumentos, julgam-se mais seguros, porque
he natural considerar-mos como propriedade
nossa o que compramos. »
............ « Fox deixou uma im
pressão profunda no coração de todos os a
migos da liberdade em Inglaterra. Pitt le
gou ao seu paiz uma seita de adoradores que
celebravam o seu machiavelismo ainda no
momento em que a Inglaterra já sofria o
castigo daquelle systema. Sir Romilly, Sir
James Mackintosh, M. Bennet, M Tiernei
são da eschola de Fox; os discipulos de Pitt
são assaz conhecidos, não he preciso nomeá
los. »
« Duas circunstancias estabelecem entre
Fox e Pitt uma semelhança apparente: am
bos reclamáram a reforma parlamentar, mas
he curioso e interessante comparar os seus
discursos sobre este assumpto. Quanto de
enthusiasmo, de expansão, de sinceridade
naquelle! — Quanto de calma, de compas
Sada elegancia, de calculada reserva neste !
— 518 —

— Um penetra até ao amago, e outro não


passa da surpeficie. — Um quer que o povo
seja mais verdadeiramente livre, o outro que
a eligarchia se disfarce com maior destreza.
Ambos baqueáram nas suas tentativas, sin
ceras ou apparentes; mas he de crer que
Fox sentio dolorosamonte a derrota, e que
Piu folgou com ela. O futuro decidirá qual
apreciava com mais justeza a situação da
Inglaterra. »
« Morreram ambos na vida privada; mas
os ministros que substituiram Fox eram seus
adversarios, em quanto os successores de
Pitt (os quaes ou se formáram na sua eschola,
ou adoptaram as suas tradições, ou se pe
netraram de seu espirito) obraram segundo
as maximas do mestre, e por consequencia
recahe a responsabilidade de todos os seus
actos em Pitt. Pelo contrario Fox prestou
sempre como membro da Camara dos Com
muns o relevante serviço de uma opposição
constitucional, e a sua memoria não he res
ponsavel pelas faltas que se lhe seguiram. »
José Silvestre Ribeiro.

"*><><><--—
— 519 —

ASSUMPTOS RELATIVOS A ESTABE


LECIMENTOS DE BENEFICENCIA.

*-* =>6e==

Conselho de Direcção da Sociedade que mantem


a Sala d'Asylo. — Acta da Sessão de 30 de Novem
bro de 1846.

No dia 30 de Novembro do corrente anno reu


nio-se em sessão extraordinaria o Conselho de Di
recção da Sociedade que mantem a Sala d'Asylo
sob a presidencia do Ex." e Rmº Snr. Bispo do
Funchal.

Assistirão á sessão todas as Sr." que actualmen


te teem a seu cargo a direcção do Asylo.
O objecto desta reunião era principalmente pro
vêr de remedio ao estado de decadencia em que
se acha o estabelecimento; e neste sentido 8. Exc."
o Snr. Conselheiro José Silvestre Ribeiro, actual
Governador Civil do Districto, que já antes tinha
visitado a eschola, e que fôra convidado pelo Con
selho para assistir á reunião em que se devia tra
tar de objecto tão importante, leu a seguinte ex
posição, que comprehende diversas providencias
— 520 —

tendentes ao fim que fica indicado.

O estado de decadencia, a que se acha redusida


a Sala d'Azylo, por falta de meios para occorrer
ás suas despezas, exige absolutamente que se em
preguem todos os expedientes que possão dar em
resultado a acquisição de recursos pecuniarios, para
habilitar a Direcção a collocar de novo tão util
Estabelecimento no estado prospero, em que ja
esteve, e a dar todo o possivel desenvolvimento
aos beneficios que elle assegura ás classes indigen
tes — beneficios agora, mais que nunca, precisos
— agora. mais que nunca reclamados pelo estado
de miseria, em que vive essa grande fracção do
povo da Madeira.
Neste sentido, tenho a honra de propor á appro
vação do Conselho de Direcção as medidas que até
agora me tem occorrido, proprias, em meu enten
der, a produsir um resultado, em que todos temos
tão vivo interesse, e a que ligamos tamanha impor
tancia.

1."- Expedir-se-ha quanto antes uma circular,


convidando todas as pessoas, que o possão fazer, a
contribuirem para a manutenção da Salla d'Asylo.
— 521 —

2º – A quota mensal dos subscriptores não ex


cederá nunca a 200 reis; mas acceitar-se-ha qual
quer somma por muito inferior que seja ao maximum
que fica prefixado.
3.° — Os subscriptores existentes poderão conti
nuar a contribuir com o mesmo que até agora pa
gavam, se assim for de sua vontade.
4.° — Attendendo á diminuta quantia, a que mon
tará a generalidade das subscripções serão estas
pagas de tres em tres mezes. Fica todavia livre
pagar a subscripção annual de uma só vez, ou por
qualquer outro modo que o contribuinte declare
querer fazel-o. •

5.° — Alem das contribuições ordinarias, solli


citar-se-hão subsidios extraordinarios, e bem assim
donativos em generos, comestiveis, e fazendas &c,
— tanto a nacionaes, como a estrangeiros.
Para execução desta providencia, uma commis
são nomeada pelo Conselho sollicitará de todos os
negociantes, logistas, proprietarios de fancarias, &c.
o donativo de alguma porção de mantimentos, e res
tos de mercadorias que lhes sejão de pouco inte
resse, e que para o asylo serão de grande valia.
6.° — Haverá na Sala de Asylo um cofre para
receber quaesquer esmolas que os visitantes alli
— 522 —

queiram lançar.
Este cofre terá 3 chaves; e serão clavicularios e
Presidente, o Thesoureiro, e o Secretario.
O cofre será aberto no primeiro dia de Janeiro,
Abril, Julho, e Outubro ; e o dinheiro que con
tiver será entregue ao Thesoureiro, como receita
do Estabelecimento.
7.° — Haverá na Sala de Asylo um album, no
qual os visitantes serão convidados a inscrever os
seus nomes, com as observações que lhe suggerir
o estado do Estabelecimento, tanto no pessoal, co
co no material, na disciplina e methodo de ensino,
indicações dos melhoramentos de que fôr suscepti
vel em tudo isto &c.

8. — Requerer-se-ha á Authoridade Superior Ad


ministrativa , que na occasião de conceder licenças
a artistas, comicos e outros, para quaesquer espe
ctaculos, ou devertimcntos imponha sempre a con
dicção de contribuirem com o producto de uma
recita, sessão ou concerto a beneficio do nosso Es
tabelecimento.
9° - Verificar-se-ha todos os annos no mez de
Março um bazar, cujo producto entrará como re
ceita do Asylo.
Para este bazar concorrerão com prendas, arte
— 523 —

factos, livros, e quaesquer outros objectos de sua


industria ou applicação, os subscriptores de um e
outro sexo, e serão convidadas para offerecel-os as
religiosas dos differentes conventos desta cidade,
bem como quaesquer pessoas nacionaes ou estran
geiras.
Estes leilões serão feitos na Sala d'Asylo com to
do o apparato possivel.
10.° — Requerer-se-ha á Camara do Funchal que
vote alguma verba a beneficio do Asylo.
11. — Pedir-se-ha igualmente á Authoridade Su
perior Administrativa que solicite no Conselho de
Districto uma prestação annual com o mesmo fim,
paga pelas sobras dos rendimentos das Confrarias.
Funchal 30 de Novembro de 1846. — José Silves
tre Ribeiro, Governador Civil.

Finda a leitura, S. Exc. indicou, como addita


mento ao complexo das medidas, que acabava de
propor, quanto seria conveniente convidar a Or
chesta da Sociedade Philarmonica, e alguns muzi
cos estrangeiros, que se achão na ilha, para darem
um concerto a beneficio da eschola; oferecendo
— 524 —

se S. Exc. a fazer de sua bolsa a despeza da illu


minação da sala grande do palacio de sua residen
cia, onde, a poder realisar-se, deveria ter logar o
mesmo concerto. A Illm.º Senhora D. Justina Arau
jo offereceu igualmente o seu piano para servir no
COncerto.

O Conselho agradeceo estas generosas offertas —


approvou a indicação devida ao zelo philantropi
co de S. Exc. o Governador Civil, e do mesmo
modo todas as de mais providencias por elle pro
postas a beneficio do asylo.
Em consequencia desta resolução o conselho no
meou uma commissão composta das Illm." Senho
ras D. Maria Leopoldina Oliveira, D. Zozima Ca
rolina Larica, e D. Luiza Pestana, para levarem
a efeito o que dispõe o S.° 5.º da exposição que
acabava de ser lida.
Deliberou-se tambem que houvesse um livro,
onde se lançasse os Estatutos da Sociedade, e em
additamento
vernador o relatorio
Civil. •
apresentado pelo Sr. Go

Nesta sessão fui unanimamente eleita para tomar


a presidencia do Conselho das Srº. Directoras,
a exm.º Sr." D. Maria da Gloria Sampaio Ribeiro,
nomeação que S. Ex.:"ºººeitou com a melhor vontade.
Funchal 1 de Dezembro de 1846. — J. Bispo do
Funchal, Presidente — M. L. Oliveira — Luiza Pes
lana – J. E. Fernandes. — Zozima Larica — Justina

d'Araujo — Vicente de Brito Corrêa, Thesoureiro—


Augusta de Carvalhal E. Lencastre, Secretario.

Ill" e Exc." Snr. — A Commissão, que


V. Exc. se servio nomear para dirigir as
disposições, e arranjos que tornava necessarios
a realização do Concérto de musica a benefi
cio da Sala d'Asylo, vem dar conta do que
julgou dever fazer em execução das instrucções
que V. Exc. lhe indicou.
Abstendo-se de entrar em minuciosos de
talhes, a commissão tratará somente de dar
noticia do que lhe parecer absolutamente ne
cessario para que V. Exc. possa saber a ma
neira porque ella julgou dever dispor os pre
parativos da brilhante festa, que teve logar
em a noite de 3 do corrente.
Depois de ter provido convenientemente ao
arranjo das salas do palacio de São Lourenço,
destinadas por V. Exc. para o divertimento,
mandou a commissão imprimir o numero de
bilhetes correspondente ao de pessoas que lhe
pareceo poder accommodar o local; e, no
— 526 –

sentido das indicações de V. Exc. repartio-os


entre o Exc." e Rmº Bispo da Diocese,
e Snr." Inspectoras da Sala do Asylo, e en
tre as demais pessoas, que gostosamente se
oferecerão para distribuil-os, querendo as
sim tomar parte nesta obra de beneficencia.
A conta geral da receita e despeza do
Concérto, annexa ao presente relatorio, dá
os precisos esclarecimentos no que respeita á
distribuição, e producto dos bilhetes, e em
tudo o mais de que resultou receita a favor
do Asylo.
He grato para a commissão ter de memo
rar que quando ja se achavam vendidos todos
os bilhetes, se dirigiram a ella varias pessoas,
manifestando o desejo que tinham de concor
rer ao concerto, e pedindo que, á falta de
bilhetes, se lhes admittisse pagarem a res
pectiva importancia á entrada.
Esta circunstancia dá bem a vêr com quanta
sympathia o publico acolheu o mui louvavel
pensamento de beneficiar um estabelecimen
to, que tão proveitoso tem sido, e cuja exis
tencia hoje, mais que nunca, importa um
grande beneficio á classe pobre de nossos
concidadãos.
Meditou a cºmmissão o que conviria re
— 527 —

solver neste caso, e sem deixar de attender


a que se achavão distribuidos os bilhetes cor
respondentes ao numero de pessoas que era
conveniente admittir no salão destinado ao
beneficio; e que, por tanto, augmentar esse
numero teria o resultãoo de causar algum in
commodo aos concorrentes; — julgou todavia
que convinha ceder ás considerações produ
zidas a este respeito, que merecerão a ap
provação de V. Exc., facultando pela forma
indicada, isto he sem bilhete, a entrada a
algumas pessoas — arbitrio que produzio a
verba addicional de Rs. 11,5000, como se
vê da conta geral.
Recapitulando aqui os resultados, que apre
senta essa conta, vê-se que se venderão pelo
preço minimo de 600 reis 523 bilhe
tes... .. .. .. .. .. 313,5800
Por 13000 reis 24 Ditos — 243000
Por 23000 reis 1 Dito — 23000
Por 23500 reis 2 Dito — 53000
Sem bilhetes.
Uma entrada por ........ ... 43000
Uma dita por .......... 13000
Déz ditas por 600 rs. cada uma 63000
3553800
*>#*#########>++>
— 528 —

Desta avultada receita a commissão só dís


trahio o que foi strictamente preciso para pa
gamento da despeza com o arranjo do coreto,
conducção de cadeiras, gratificação a creados
&c. unicas despezas que teve a satisfazer, vis
to que V. Exc. se ofereceo a pagar de sua
bolsa 113400 reis, a que montou o gasto
com a illuminação do palacio.
Deduzindo pois da receita a modica impor
tancia de 153320 reis, ficou liquida a favor
do Asylo a somma de 3403480 reis, que
foi remettida ao Exc." e Rmº Bispo. Pre
sidente da Sociedade que mantem a Sala d'
Asylo, para que se dignasse dar-lhe o com
petente destino.
A commissão não deve finalisar este rela
torio sem fazer especial menção das ofertas,
que recebeo dos Snrs. A. L. da Cunha,
Wilkinson, Innes, G. Boldorini e Caetano
Domingos Drolha. O primeiro destes Snrs.
prestou-se a mandar imprimir sem remune
ração alguma, os bilhetes de entrada, e os
programmas do Concérto, fornecendo tambem
O papel para estes; — os Snrs. Wilkinson,
Innes, e Boldorini, oferecêrão o cartão para
o avultado numero de bilhetes que forão dis
tribuidos; - e o Snr. Drolha atinou gratui
— 529 —

tamente o piano que servio no concérto. —


Funchal aos 11 de Dezembro de 1846 —
Augusto de Carvalhal E. Lencastre — Mau
ricio José de Castel-Branco — Jacinto de Frei
tas Lomelino — Antonio Joaquim de Vas
concellos.

Exc." e Rm º Snr. — Cabe-me a honra


de vir á respeitavel presença de V. Exc."
Rm.", participar-lhe, que o concerto, pro
movido em beneficio do Asylo da Infancia
desvalida, produzio a quantia de Rs. 3403480,
liquido de todas as despezas.
Nas mãos de V. Exc." Rm.° terá a honra
de depositar aquela quantia o oficial desta
Secretaria, Mauricio José de Castelbranco
Manoel, a fim de que V. Exc.", como digno
Presidente que he da Direcção da Sala de
Asylo, se sirva dar-lhe o destino conveniente.
Por esta occasião, permittir-me-ha V. Exc.
Rmº que lhe off-reça, para bem do dito
estabelecimento, toda a minha dedicação, e
serviços , como particular, ou como Authori
dade; podendo asseverar a V. Exc." Rm."
que a isto me induzem o respeito e estima
que consagro a V. Exc.", digno Presidente
— 530 —

do mesmo estabelecimento, como os desejos


que nutro de concorrêr para que se consiga
o interessante fim , a que aquelle se destina.
1)eus Guarde a V. Exc.° Rm º Palacio do
Governo no Funchal 11 de Dezembro de
1846 — Exmº e Rmº Snr. D. José, Bispo
do Funchal. — O Governador Civil, Jose Sil
vestre 1, ibeiro.

Acta da Sessão de 2 de Janeiro de 1847.

No dia 2 Janeiro de 1847, reunio-se o Conse


lho em sessão ordinaria, e S. Exc." Rmº o Sr.
Presidente, apresentou por copia o oficio que se di
rigio ao Illm.º e Exm.º Sr. Conselheiro José Sil
vestre Ribeiro, Governador Civil, agradecendo
lhe os esforços que tèe posto em practica para me
lhorar o estado do asylo e com especialidade o
grande beneficio que realizou com o concerto que
teve logar a 3 de Dezembro ultimo. O oficio éra
concebido nos termos seguintes: —
« Illm.º e Exmº Sr. — O Conselho de Direcção
da Sºciedade, que mantem a sala de Asylo para
crea"Gººººsvalidas, teve conhecimento, em sessão
de 22 dº cºrºnte, do valiosissimo resultado que
— 531 —

deu o concerto emprehendido por V. Exc." a be


neficio do estabelecimento, que elle dirige.
« Na situação de extremo apuro, a que se acha
va redusida esta instituição de charidade — quando
attento o estado de abatimento, de que se ressentem
todas as cousas em nossa terra, viamos com profun
do pezar aproximar-se o momento, em que os filhos
do pobre terião que deplorar a falta do unico asy
lo que lhes deparava a beneficencia publica — des
se asylo agora, mais que nunca preciso, porque
nunca, tanto como agora, foi digna de lastima a sor
te de uma avultada fracção de nossos compatrio
tas — nesta crise, dizemos, o pensamento que V.
Exc." concebeu, e que realisou com tanta felicida
de, valeu a prolongação da existencia do estabe
lecimento a nosso cuidado — a continuação dos be
neficios que elle espalha entre a classe pobre. »
« Se a V. Exc.” não coube a gloria de levantar
entre nós este monumento de civilisação, e das
mais ricas virtudes que ennobreçe o coração do ho
mem, com o zeloso e eficaz apoio que lhe ha pres
tado — com o beneficio tão grandioso, com que as
sim a tempo lhe acudio — V. Exc." salvou-o da
ruina inevitavel que o ameaçava — adjudicou-se á
gratidão dos habitantes d’este paiz, e o louvor de
— 532 –

restaurºr a obra de um homem illustre.


« Por tudo isto, temos a honra de pôr presente
a V. Exc.", em nosso nome, no da Sociedade que
representamos, e no dos infelizes, que ella prote
ge, a expressão de nosso mais vivo, e cordial
agradecimento. — Deos Guarde a V. Exc.° — Fun
chal aos 23 de Dezembro de 1846. — Illm.º e Exm.º
Sr. José Silvestre Ribeiro, Conselheiro Governador
Civil do Districto. — (assignados) Os membros do
Conselho.

Ao Ministerio do Reino.

2.º Rapartição —Nº 2060—Ill" e Exmº


Snr. —Sua Magestade, A Rainha, Havendo
por bem approvar, por Portaria do Ministe
rio do Reino de 2 de Março ultimo, os tra
balhos de que tive a honra de dar conta a
V. Exc." pelo meu oficio, nº 2032, de 12
de Fevereiro d'este annno, empregados para
reanimar e manter o asylo d infancia desvai
da creado nesta cidade, Foi servida recom
mendar-me que não poupasse diligencias para
assegurar d'um modo permanente a existen
cia deste estabelecimento.
Cumprindo esta gostosa incumbencia, tive
— 533 —

a satisfação de vêr realisado o Bazar que na


quelle meu oficio annunciei.
Ao meio dia de 5 do corrente as sete
Directoras do asylo, ás quaes nada esqueceo
para tornarem tão agradavel como proveitoso
este incentivo da beneficencia, tinham prepa
radas em duas sallas do palacio da minha
residencia as mezas a que presidiam, abun
dantemente guarnecidas de lindos artefactos
expostos á venda, em que eram coadjuvadas
por zelosas amigas.
As salas, as mezas das Directoras, e a
entrada do edificio estavam, singella, mas
elegantemente decoradas. Duas bandas de mu
sica, executando diferentes peças de bom gos
to, solemnisáram o acto; — a do destaca
mento d'infantaria n.° 1 1 colocada no pateo do
palacio; — a da Sociedade Philarmonica em
uma das sallas do Bazar.
Foi grande, luzida, e geralmente gene
rosa a concorrencia de nacionaes e estran
geiros, d'ambos os sexos. Tanta dedicação
da parte das Directoras e dos concorrentes
merecia todo o elogio. Eu expressei este sen
timento dirigindo-lhes uma breve allocução.
As 3 horas da tarde estavam vendidos to
dos os objectos pertencentes ao Bazar; e es
—534—

te produzio 595,3800 reis, dos quaes, dedu


zida a pequena despesa de 73400 reis, fi
cão liquidos 5883400, que quasi triplicão o
fundo adquirido por meio d'um concerto vo
cal e instrumental, e mencionado no meu
sobredito oficio.
Deus guarde a V. Exc.° — Funchal 8 de
Abril de 1847 — Illmº e Exmº Snr. Ministro
e Secretario de Estado dos Negocios do Reino
— O Governador Civil, José Silvestre Ribeiro.
Nota do producto do Bazar que teve logar no dia
5 do corrente, em beneficio da Eschola da Infancia.
A Illm.º e Exm.º Snr.° D. Maria da
Gloria Sampaio Ribeiro, importancia que
produzio a meza da sua direcção .. .. 2373120
D. Maria Leopoldina de Oliveira, dº 853130
» » D. Zozima Carolina Larica, d.º.. 433720
» » D. Guilhermina Lecor Palhares, dº 873920
» » D. Luiza Julianna Pestana, dº ... 523210
» » D. Justina d'Araujo e D. Izabel
Emilia Fernandes, dº... .. .. .. .. 893700
-----

Rs... 595,3800
-

Funchal aos 8 d'Abril de 1847, — Vicente de


Brito Correta , Secretario.
— 535 —

Conselho de Direcção da Sociedade do Asylo da


Infancia Desvalida

Illm.º e Exm.º Snr. – O Conselho de Direcção da


Sociedade, a que tenho a honra de presidir, teve
hontem conhecimento do avultadissimo producto do
Bazar emprehendido a beneficio da Sala d' Asylo;
e reconhecendo que tão prospero resultado he, em
grande parte devido aos muitos esforços, e incansa
vel zelo de V. Exc.", encarregou-me de lhe ma
nisfestar, em seu nome, e no da Sociedade que
representa, que por este, e pelos demais auxilios
que V. Exc." lhe ha prestado, — por este, e pelos
demais actos de eficaz, e illustrada protecção, ca
be a V. Exc.° sem duvida o título , e justa gloria
de Restaurador do estabelecimento, que elle dirige.
O Conselho agradece igualmente a V. Exc." a
delicada, e apreciavel demonstração de interesse
que V. Exc." deu ao mesmo estabelecimento, com
pondo e offecendo-lhe o interessante opusculo — A
pontamentos sobre as Classes Desvalidas — tão util
pelas noticias que encerra, como grato por essas
doutrinas consoladoras, e verdadeiramente chris
tãas, que despertando sympathias para com os
desfavorecidos da fortuna, lhes garantem por esse
— 536 —

modo e auxilio e protecção dos ditosos do mundo.


— Deus Guarde a V Exc.° — Funchal 8 d'Abril
de 1847. — Illm.º e Exm.º Snr. Conselheiro José
Silvestre Ribeiro. — J. Bispo do Funchal, Presi
dente do Conselho Director.

Ao Ministerio do Reino.

4.º Repartição — N.° 59 — Illm.º e Exmº Snr.


— Cabe-me a satisfação de participar a V. Exc."
que no dia 27 do mez de Março findo teve logar,
nas sallas do palacio da minha residencia, o mais
brilhante e concorrido Bazar, em beneficio dos
dous Asylos da «Mendicidade, º e « Infancia Des
valida » desta Cidade do Funchal.
S. M. a Rainha Adelaide da Grã Bretanha Di
gnou-se enriquecer o Bazar com alguns primo
rosos trabalhos de suas proprias mãos e das de suas
Augustas Parentas, os quaes obtivéram um subido
preço. — Afora isto, Dignou-se tambem a Mesma
Augusta Senhora honrar com a sua presença
aquelle acto, e de comprar um grande e variado
numero de objectos, com o que muito favoreceu
— 537 —

os pios estabelecimentos, para quem era destinado


o producto do Bazar.
Nesta occasião tratei de prestar a S. M. todas
as attenções e respeitos que lhe são devidos, e de
que aliás se torna accredora pela sua affabilidade,
e bondoso coração.
O Bazar produzio a quantia de Rs. 6333730,
a qual, depois de deduzida uma diminuta des
peza, foi distribuida igualmente pelos dois men
cionados Asylos da « Mendicidade » e « Infancia
Desvalida. »
Congratulo-me com V. Exc." por se ter consegui
do um tão vantajoso resultado, empregando-se este
meio civilisador, que por um modo tão engenhoso
proporciona allivio e soccorro aos infelizes.
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 17 de Abril
de 1848 — Ill."º e Exc.º Snr. Ministro e Secretario
de Estado dos Negocios do Reino — O Governador
Civil, José Silvestre Ribeiro.

•=>=+º

Do N.° 48 do Madeirense de 28 de Março de 1848:

Verifica-se qne o resultado do Bazar foi ainda


muito mais vantajoso do que o do anno passado , e
— 538 —

he o seguinte:

A Exm.º Snr." D. Maria da Gloria


Sampaio Ribeiro, liquidou em sua
II1628 . . • •
3563910
D. Zosima Larica. . . . 923220
D. Luiza Pestana.. • • •
693270
D. Maria d' Araujo e Izabel Fer
nandes .. • • • • • •
613680
D. Guilhermina Lecór Palhares.. 533650
Rs.. 6333730

Do Miinisterio do Reino.

3.° Direcção — 2º Repartição N.° 151 —


L.° 6.° — Sua Magestade A Rainha, a Quem
foram presentes os oficios do Governador Civil
do Districto do Funchal, N.° 58, 59, 60,
61 e 62, de 16, 17, 18, e 28 de Abril,
e 3 de Maio, ultimos: Manda, pela Se
cretaria d'Estado dos Negocios do Reino, de
clarar em resposta ao mencionado Governador
Civil o seguinte:
Que he digna de louvor a intenção em que
– 539 —

está o Governador Civil de ir apresentando


em circulares aos Administradores de Conce
lho e Camaras Municipaes exposições desen
volvidas de doutrina administrativa, reunindo
todas as disposições de Leis, Portarias e ou
tros documentos, e chamando essas Authori
dades e Corporações ao mais facil e fiel de
sempenho dos seus deveres: e que por tanto
merece a plena approvação de Sua Magestade
a circular que ele expedio em 25 de Feve
reiro proximo passado e de que enviou um
exemplar impresso com o primeiro dos oficios
referidos.
Que lhe foi sobre modo grata a communi
cação do bom exito que tivera o bazar de 27
de Março ultimo, cujo producto liquido (seis
centos trinta e tres mil sete centos e trinta
reis) fôra igualmente distribuido pelo Asylo
de Mendicidade, e pelo da Infancia desvalida;
e que comprazende-Se com a noticia do pros
pero estado destes dous Estabelecimentos, Re
conhece que ele he devido em grande parte ao
zelo e eficacia do Governador Civil.
Que merece tambem louvor o empenho de
que a Cidade do Funchal veja quanto antes
illuminadas as suas ruas e praças; e que mui
to bom será que a Camara Municipal possa
— 546 —

levar a efeito esta medida civilisadôra e de


reconhecida utilidade, sem faltar ás suas des
pezas obrigatorias e mais urgentes e sem m
postos disproporcionados ás faculdades dos
contribuintes.
Que a regularidade no serviço para atalhar
os desas rosos efeitos dos incendios é digno
de toda a attenção por parte das Authoridades
Administrativas e Municipaes; e que para o
hir successivamente melhorando e aperfeiço
ando nenhuma diligencia deve ser ommitida.
E finalmente que a Collecção dos Documen
tos impressos, relativos ao Asylo de Men
dicidade, mostram o acerto com que teem si
do dirigidos os negocios deste Estabelecimen
to, e explicam a sua prosperidade.
Por todos estes trabalhos, a que alludem
os mencionados oficios “ Manda Sua Mages
tade A Rainha transmittir ao Governador
Civil os louvores de que se faz digno.
Paço das Necessidades em 15 de Junho
de 1848 — Duque de Saldanha.
— 541 —

AssUMPTos PoLITIcos

A liberdade em Portugal; agitação que tem


occasionado; beneficios que tem produsido.
A fé moral e religiosa, condição imperiosa
da Liberdade.

Pourtant, ó liberté, ton nom m'est doux et cher.


(L. Dussert.) —º

Disse um Escriptor de grande nome em


França, que nada he mais fecundo em ma
ravilhas do que a arte de ser livre, ao mes
mo tempo que nada ha tão arduo como o ty
rocinio da Liberdade.
Este conceituoso pensamento me acóde ao
espirito, sempre que medito sobre a historia
de todos os paizes, que teem querido ser
livres, e que ao cabo de penósos sacrificios,
de incalculaveis esforços, e atravez de mil
vicissitudes, tem conseguido arvorar o pen
dão da Liberdade. E se a historia de outros
povos não me fornecesse exemplos daquella
verdade profunda, eu os encontraria na nos
sa patria, recordando o que entre nós tem
— 542 —

succedido no discurso dos ultimos vinte e seis


àI]\]OS.

E com efeito, suppondo presentes á me


moria de todos a nossa historia politica da
quelle periodo, perguntarei eu — se não tem
sido penosissima a aprendisagem da Liberda
de entre nós? Oxalá que se podesse respon
der negativamente, pois que nesse caso, sem
falar da alegria maliciosa que devisamos no
semblante dos amigos da velha monarquia,
não houvera hoje tantos seguidores das novas
ideias, que paréce estarem já desgostosos de
tão repetidas, quanto tempestuosas mudanças,
ou antes ensaios — e ao mesmo tempo tão in
dispostos contra uma ordem de cousas, e theo
rias, que se lhes afiguram serem só podero
sas para produsirem essa agitação, que os
atturde — essa instabilidade, que os espanta —
essas divisões de bandos que os consternam
— e finalmente essa esterilidade de resulta
dos proficuos, que mais que tudo os desgos
ta, os desanima, e os irrita.
« Em tempos não mui remotos, dizem
«elles, nesses tempos felizes que nossos paes
«desfructaram, e que alguns de nós ainda
«alcançámos - reinava a paz, a ordem, e a
« união; — as Authoridades eram obedecidas
— 543 —

« e respeitadas; — a maquina governativa era


« simplissima, movia-se regularmente, e sem
«o menó abalo; — o que uma vez se esta
«belecia tinha que durar longo tempo; — quer
« em quanto ás pessoas, quer em quanto ás
« cousas, predominava um principio conser
«vador , que repellia todas as tendencias de
«sorganisadoras; os povos dormiam o doce
«somno de uma quietação profunda, &c. »
Seria um não acabar, se eu quisesse aqui
lançar tudo quanto se tem dito neste sentido.
Ha com efeito um fundo de verdade n'es
tas reminiscencias, direi até, n'estas sauda
des dos tempos que já lá vão.
Convem porem ohservar antes de tudo,
que a arvore da Liberdade nem sequer ain
da creou bastantes raízes entre nós, e por
força de maior razão, não póde ainda oferecer
nos os fructos deliciosos e salutiferos, que ou
tras nações mais adiantadas em civilisação já
tem colhido. Que se tem feito pois em Por
tugal ha vinte e seis annos? Preparar o ter
reno para o novo plantío, desembaraçando-o
de ruins hervas, e dispondo-o para receber
as benignas influencias da atmosphera. Esse
longo período tem sido consummido na lucta
encarniçada entre os principios da vélha mo
— 544 — -

narquía e os da Liberdade — lucta de mor


te, em que teem apparecido em campo os
interesses, que contavam muitos seculos de
existencia, pugnando e defendendo-se valen
tes contra a invasão das ideias modernas No
discurso d'esses vinte e seis annos, e maior
mente, quando alguns momentos de tregoas
o permittiram, tem-se cuidado de ensaiar
praticamente essas theorias liberaes, que tan
to satisfazem a razão, e que n'outros paizes
tem produzido tão proficuos resultados.
N’esses ensaios he possivel que nem sem
pre tenha havido a necessaria placidez, a In
dispensavel prudencia, o conveniente tacto
politico — consultando-se a experiencia, apro
veitando-se o bom dos tempos passados, at
tendendo-se aos imprescriptiveis dictames da
justiça, e finalmente tendo-se em vista o avi
sado conselho da sabedoria romana, quando
dizia; « In rebus novis constituendis evidens
« esse debet utilitas, ut recedatur ab eo jure
«quod diu oequum visum est (L. 2. f. de
« const. princ.)
Que admira pois que em tempos de com
bates incessantes, e de repetidas tentativas
no campo da politica, tenha reinado essa
agitação, essa instabilidade, que tanto se faz
valer para desacreditar o Governo Represen
tativo? Que admiraria até essa preconisada
esterilidade de resultados proficuos, com que
igualmente se pertende desabonar a santa
causa da Liberdade ?
Não recorrerei eu ao já tantas vezes em
pregado argumento do que se passou em In
glaterra e em França , onde a liberdade
custou tanto tempo, tanto sangue, e por
ventura tantos crimes, primeiro que se ar
reigasse e condusisse as duas nações ao a
pogêo de gloria e de poder, que o mundo
admira hoje.
Não posso porem prescindir de apresentar
um argumento, que a historia fornéce e he
elle tão ponderoso, que responde cabalmente
á impaciencia, e até ao desgosto que a mui
tas pessoas causa essa lucta entre a immo
bilidade e o progrésso.
Tinha ou não necessidade o mundo romano,
no tempo dos Cesares, de uma reforma re
ligiosa e moral? Brévemente demonstrarei,
que não póde haver a menór hesitação em
respºnder afirmativamente. Por agora bas
tará appellar para a consciencia dos leitores,
e espéro que será reconhecida a indispensa
bilidade de introduzir naquella epocha de
— 546 —

profunda corrupção os luminosos e sublimes


principios do christianismo. Pois bem; rom
pêo a violenta lucta entre as duas religiões,
e qual espectaculo ofereceria o mundo aes
homens d'essa epocha ? O da maior confusão,
o do cáhos. A terra, como diz o eloquente
Benjamin Constant, separada do Céo, pare
cia-lhes uma prisão, e elles batiam com a ca
beça contra as muralhas do carcere, onde ja
ziam encerrados. Mas ao menos, foi breve
essa lucta, passou rapido esse periodo turbu
lento ? Não, durou uns poucos de séculos.
Quatro centos annos antes de Jesus Christo
já as crenças pagans estavão destruidas na
Grecia. e a philosophia começava a anticipar,
até certo ponto, a doutrina que o Salvador
do Mundo veio prégar mais tarde; e com
tudo, se o christianismo fez nos primeiros
quatro seculos muitos proselitos entre os espi
ritos mais cultivados, he todavia certo que
decorrêo muito tempo antes d'elle chegar ás
massas populares, podendo dizer-se, que o
espirito humano gastou perso de mil annos em
Passar do dogma pagão para o dogma Christão.
Se pois uma Religião Santa, em cuja pro
pagação e estabelecimento influiram tantas
causas divinºs, gºstou tanto tempo a consoli
— 547 —

dar se, atravessou tão perigosas crises, e tão


longos periodos de perturbação; — como po
derá ser objecto de espanto que uma causa,
meramente humana, tenha tambem encontra
do estorvos, gerado um tanto de desordem
social, e haja sido um pouco lenta em pro
porcionar felizes resultados?
Vejamos porém com sinceridade, se os
vinte e seis annos da lucta da Liberdade
em Portugal, entrecortados aliás por um
periodo de tres annos, em que o absolutis
mo voltou á scena, e por outro de seis an
nos, em que a mais estupida e brutal tyra
nia nos avexou sob o governo da usurpação;
vejamos, digo, com sinceridade, se esse pe
riodo tem algum lado por onde possa ser
encarado favoravelmente.
Por uma fatalidade, inherente á fraquesa
do coração humano, são os homens natural
mente inclinados a dar maior attenção aos
pequenos males que flS ('O USi)S occasiºnam,
do que aos grandes beneficios que elas pro
duzem. Desde que a Aurora da Liberdade
começou a despontar em nosso horisonte,
raiou immediatamente com ella o mais es
perançoso desenvolvimento da intelligencia,
a qual até então estivéra como em lethargº.
— 548 —

Foi livre a cada um exprimir os seus pen


samentos, e desde esse momento nós mos
trámos ao mundo, já em escriptos periodi
cos, já em mais de um bom livro, que
tambem somos dignos de tomar parte na
missão civilisadora da presente geração
A industria, desembaraçada das algemas
que lhe poséra um systema menos bem con
cebido, começou a dar signaes de vida ; —
a agricultura, que visivelmente definhára,
augmentou-se de um modo admiravel, a pon
to de que já tem dado algum cuidado a
extraordinaria producção de cereaes, mai
ormente n'esse rico celleiro do Alemtejo; —
o commercio alargou os braços, ainda depois
que nos faltou o Brasil, a quem o Snr. Rei
D. João 4.° chamava a sua vaca de leite.
Apagaram-se as fogueiras do impio e bar
baro tribunal da Inquisição, e nem por is
so se extinguio esse amor entranhavel á re
ligião de nossos paes; acabou sim essa in
tolerancia fanatica e feroz, que ousava demi
nar as crenças, mas não ficou menos arden
te esse sentimento religioso que parte dos
Corações.
Havia uma instituição sublime e sobre
maneira hºnrºsº para a memoria dos nos
— 549 —

sos Reis, quero fallar das Santas Casas de


Misericordia e dos Hospitaes: que tem suc
cedido a esse respeito desde os primeiros
dias da nossa Liberdade? Esses estabeleci
mentos tem consideravelmente melhorado em
administração, em edificios, em tudo.
Tivémos e gosámos sempre a bellissima
instituição municipal; que tem succedido a
esse respeito desde os primeiros dias da nos
sa regeneração? A voz creadora da liberda
de, as cidades, as villas, as aldeias afor
moseáram-se consideravelmente — aqui vemos
novos caminhos, fontes, passeios, pontes; a
lém admiramos obras monumentaes, que hão de
apresentar esta nova epocha accredora da gra
tidão dos vindouros.
O sopro vivificante da Liberdade creou
innumeros estabelecimentos economicos e de
piedade, que honram a caridade, ou se qui
serem, a philantropia destes nossos tempos.
Cºsas pias, ou creadas de novo, ou melho
radas — caixas economicas onde o homem
poupado deposita os fructos do seu trabalho
e os poem a render — asylos de mendicida
de — asvlos da infancia desvalida — asylos
de invalidos, de lazaros — tudo isto abona
a minha asserção.
— 550 —

Nos tempos do absolutismo (que eu aliás


não pertendo desacreditar) o cidadão hones
to e illustrado reputava uma necessidade a
isolação, e dest’arte ficava a nação privada
dºs bons serviços que elle lhe poderia pres
tar. Como se atrevería elle a reunir-se, a
associar-se a outros, podendo um tal passo
ser interpretado sinistramente pela natural
desconfiança de um governo despotico, quan
do ao menos lhe fosse permittido este acto
innocentissimo ?
O sol da Liberdade porém allumiou o
nosso paiz, e a contar de então começáram
a apparecer associaçõos, em que a riqueza,
a habilidade, a sciencia, o interesse, o amor
da patria, reúnem, concentram, poem em
commum os seus contingentes, e desta for
ça collectiva de tão bons elementos resultam
beneficios mil, que o absolutismo não dei
xava germinar.
Será acaso necessario, que para traçar
um quadro completo dos beneficios da Li
berdade eu mencione e particularise a sabia
e bem combinada divisão dos poderes poli
ticos, º indepencencia do Poder Judicial, a
introducção dos jurados, a publicidade do
processo depois da pronuncia, o direito e
— 551 —

leitoral, a representação nacional, a indis


pensabilidade da votação annual dos tribu
tos; e finalmente as preciosissimas garantias
dos direitos civis e políticos do cidadão?
Tenho apresentado. sem lhes diminuir a
força, os queixumes dos descontentes, ou para
melhor dizer, dos desanimados; traceitam
bem, sem exageração, o quadro dos benefi
cios que a Liberdade nos tem já proporcio
nado: e se não pude desenvolver larga e
profundamente os dous pontos, expuz ao
menos com toda a claresa os termos de uma
questão importante, que merece ser tratada
pºr pessoa, a quem não faltem, como a
mim, cabedaes e tempo.
Seria porém de todo ponto incompleta a
minha tarefa, se depois de mostrar a mais
ardente fé na força creadora da Liberdade,
eu me dispensasse de oferecer á reflexão dos
leitores algumas ponderações de um author
grave, e verdadeiramente filosofo (1), e
SãO as seguintes :
« Donde provinha a organisação social que
ha tres seculos começou a ser minada, e que
alfim foi destruida pela revolução francesa ?

(1) Th, Jouffroy. Cours de droit naturel.


- 552 —

das soluções que o Christianismo dava ás gran


des questões da humanidade. Essas soluções,
senhores, não erão negativas, como o são as
que hoje nos apresentam os grandes homens
desta epocha; pois que dellas dimanavam con
sequencias positivas, em quanto á moral, em
quanto á arte, em quanto á religião, em quanto á
politica; — dellas dimanavam para a sociedade
certas instituições, certas leis; — nellas se con
tinha implicitamente, e estava um germen , um
todo de ordem social e politica...... Hoje
está por terra essa ordem, e para crear ou
tra nova he indispensavel um novo germen, is
to he, nova resolução das questões supremas,
a que o Christianismo havia respondido....
Como quereis vós que homens, que não sa
bem, nem como, nem para que fins existem
sobre a terra, possão saber o uso que devem
fazer da vida? E como quereis vós, que ig
norando elles isto, saibam todavia o modo
porque devem constituir, organisar, regular
a sociedade? Quando se ignora o destino do
homem, ignora-se o destino da sociedade; e
desconhecido este, impossível he organisa-la;
logo a solucção do problema politico está na
fé moral e religiosa: mas esta fé não existe,
e em quanto não nos fôr deparada, he eviden
te que todas as revoluções materiaes imagi
naveis serão impetentes para organisar a so
ciedade.
« Eis o que deve meditar mui seriamente
qualquer que pertender formar uma ideia
justa e exacta da situação em que estamos;
todo o segredo dessa situação está n'isto, e
não noutra cousa. Mas como o povo ignora
isto, facil tem sido desfructar a sua cegueira,
e tirar partido dos seus nobres instinctos. Vin
te empiricos se gabam todas as manhãs de que
possuem o segredo de encher esse vacuo, de
que o povo tem a consciencia, que o povo
folgára de ver preenchido, e que a ninguem
he dado consegui-lo! mas, aos olhos de quem
sabe o de que se trata, he pelo menos certo
que esses taes se enganam; como porém dão
um nome ao que nos falta, chamando-lhe
republica, sufragio universal, legitimidade,
essa palavra nos seduz — tomâmo-la por uma
cousa, apaixonamo-nos por esse topico des
conhecido, e só se desvanece o encantamento,
depois que a experiencia nos mostra que essa
palavra era vã, e nada continha. He assim
que, baptisando alternativamente com dif
ferentes nomes o objecto desconhecido dos
nossos votos, tambem alternativamente nos
— 554 —

inspiram paixão por um grande numero de


cousas, realmente ineficases, e que apenas
conquistadas nos deixam tão descontentes, co
co d'antes. Tal he a explicação dos desenga.
nos que ha quarenta annos teem experimen
tado entre nós os amigos das liberdades pu
blicas. Cada uma dessas liberdades nos foi
parecendo o bem porque suspirávamos, e a
sua ausencia a causa de todos os nossos ma
les; e com tudo, nós fomos conquistando es
sas liberdades... mas nem por isso adian
támos mais, pois que no dia immediato ao
de cada revolução, démo-nos logo pressa em
redigir o vago programma de outra revolução.
E assim devêra ser, porque nós laboramos
num engano; cada uma das liberdades, que
tanto desejámos, até a propria liberdade não
são, nem podem ser o fim a que uma socie
dade como a nossa aspira. Uma sociedade
livre tem a vantagem de que o soberano não
póde desvia-la do fim a que se destina, para
lhe pres rever o fim a que ele tende; uma
sociedade livre tem ainda outra vantagem, e
vem a ser que he muito mais propria e asáda
para buscar a sua felicidade e attingi-la, do
que as sociedades escravas: entre as chama
das liberdades publicas nem uma só deixa
— 555 -

de ser boa por este dupplicado titulo, mas


nenhuma dellas o póde ser por outro titulo.
Qualquer das liberdades he para um povo o
meio de chegar ao seu fim, e sobretudo uma
segurança de que não o estorvarão de chegar
a esse fim; nenhuma porém faz parte des
se fim, bem como tambem não faz parte del
le a ordem; como sendo esse fim — estranho
e superior a estes dous elementos. »
O nosso author exemplificando esta sua
ultima asserção com a eleição pupular, e
com a liberdade da imprensa, tira depois
esta consequencia: •

« Logo, se chegardes a apaixonar-vos exces


sivamente por tal ou tal formula, por tal ou
tal instituição, imaginando que nisso está o
remedio do mal que vos atormenta, estae
certos de que muito enganados vos achareis.
Essas instituições, essas formulas, não são
senão garantias contra os embaraços que po
derião dificultar a revolução moral (unica
que póde curar aquelle mal) ou talvez meios
para apressar essa revolução; e digo talvez,
porque apezar da muita estima que tributo
ao espirito de todo o mundo, penso que es
se espirito, isto he, o senso commum, he
menos proprio para descobrir a verdade, do
– 556 —

que para a reconhecer depois que lh'a mos


tram : e com efeito, de todas as verdades
que teem influido sobre os destinos da espe
cie humana, nenhuma d’ellas, que eu saiba,
sabio do instincto das massas, — todas fo
ram descobertas por homens privilegiados,
todas foram o fructo da meditação solitaria
dos pensadores, embora depois de publica
das, tenha sido a adopção das massas quem
as consagrou, e essa consagração a nenhuma
tem faltado »
«O que acabo de dizer-vos, senhores, so
bre a nossa situação presente, indica bem
claramente o cºmportamento que deve ter ,
no interesse da sua dignidade e na do seu
paiz, todo o homem serio e grave, na epo:
cha em que vivemos. »
« A primeira cousa a fazer, senhores, he
tratar cada um de se serenar a si proprio,
e de se subtrahir a esses sonhos quimeri
cos, de que se nutrem as massas, e por es
se meio dar de mão á embriaguez fogosa, e
tentativas insensatas que aquelles produsem..
. . . . Não vendo no que nos succede senão
as phases necessarias d’uma lei da humani
dade que se está cumprindo, menos dispos
tos estaremos a nos deixarmos impressionar
— 557 —

desses temores, dessas esperanças apaixona


das, desses enthusiasmos e odios furiosos,
que nos são inspirados pelos pequeninos par
tidos e pequeninos acontecimentos, que a to
da a hora surgem em torno de nós, e aos
quaes, quando não os olhamos d’esta altura,
damos uma importancia exagerada.
« Não basta porem assocegar a intelligen
cia, hº demais disso necessario obrar em con
formidade desses principios............
« A todo o homem he facil, procurando
seriamente conhecer o que he bom e o que
he máo, purificar a sua intelligencia e a sua
alma d'essa immensidade de ideias falsas,
immoraes, extravagantes, que uma licença
incrivel do espirito, ainda mais que do cora
ção, derrama hoje sobre a sociedade, pela
triplicada via dos jornaes, do theatro, e dos
livros. A todo o homem, que interrogar o
bom senso e o coração, he facil prescrever a
si proprio um plano de comportamento, con
forme com as maximas puras da moral, e por
efeito de uma vontade forte ser fiel a esse
plano, e executá-lo. -

« Em quanto á patria, senhores, á pa


— 558 —

stria que depois da nossa dignidade pessoal,


deve ser o primeiro objecto de nossos cuida
dos, ha tambem para todos um meio de lhe
ser util e vem a ser o de fazer sentir a to
dos os seus filhos a verdadeira situação , e
as razões d’ella, bem como de lhes explicar
o segredo do seu mal, a naturesa do bem a
que aspiram, e os meios falsos, e os meios
verdadeiros de os conseguirem. Esclareçamos
pois o povo, senhores; nunca as luzes lhe
foram tão necessarias, nunca elle teve preci
são de tamanho descernimento.

« He desnecessario acrescentar, que não sen


do as revoluções materiaes assaz poderosas
para fazerem conseguir o fim a que tende a
sociedade, e produsindo sempre muito de
desordem e muito de mal, longe de ser pro
prio d'um homem illustrado e d'um bom cida
dão o provacá-las, he pelo contrario do dever
d'um e d'outro prevenir, quanto fôr possivel,
este mal inutil »
Amigos da Liberdade ! pezáe bem as pa
lavras deste escriptor philosofo....
Funchal 1.º de Dezembro de 1846. — Jo
se Silvestre Hibeiro.
— 539 —

MADEIRENSES !

Está restabelecido entre vós o Legitimo Governº


de Sua Magestade a Rainha !
Congratulo me com vosco por tão fausto aconte
cimento; — tomo grande parte na vossa extraordi
naria alegria; — e sou sobremaneira sensivel ás li
songeiras demonstrações de estima e consideração
que acabaes de dar-me.
Madeirenses! A Nossa Augusta Soberana. Tende
a peito conciliar os animos de todos os Portuguezes,
e evitar a continuação das calamidades que hão
afligido o reino, Escutou Benigna o seu Maternal
Coração, lançando um véo sobre os ultimos acon
tecimentos politicos.
Imitemos, no que em particular nos toca, um
tão formoso, quanto respeitavel exemplo. Esque
çâmo-nos das sem razões que por ventura nos tenham
sido feitas; sejamos faceis em perdoar os desatinos
das paixões politicas, e tornemo-nos dignos de ser
mos livres, á força de moderação, e de bem enten
dida tolerancia.

Seja para nós sem significação a palavra « vin


gança » . Attentemos unicamente no bem da Patria,
e consideremos que as nações, para serem felizes,
— 560 –

carecem de que os seus filhos se olhem como irmã


os, como membros d’uma só familia, em cujo seio
devem reinar a ordem, a união e o amôr.
Profundas feridas teem rasgado o seio do malfa
dado Portugal, e seremos acaso tão desacordados
que queiramos, em vez de as curar , aggravá-las
mais e mais com os irritantes estimulos das dissen
sões e dos odios !

Madeirenses! Eu espero só ter motivos para ap


plaudir a vossa sensatez, moderação, e generosi
dade.

Viva Sua Magestade a Rainha!


Viva a Carta Constitucional !
Viva a União entre os Portuguezes!
Funchal aos 26 de Julho de 1847.
O Conselheiro Governador Civil,
José Silvestre Ribeiro.

Ao Ministerio do Reino.

Illmº e Exc." Snr. — Chegou finalmente a sus


pirada ºccasião de participar a V. Exc.", que o
Governo de S. Magestade a Rainha está restabele
cido na Ilha da Madeira.
O enthusiasmº, que hontem desenvolveram os
— 561 —

Funchalenses, he superior a toda a expressão, e


já mais me recordo de haver visto demonstrações de
tamanho regosijo de todo um povo !
Os Representantes das Potencias alliadas presen
ciaram aquellas prasenteiras scenas, e diante de
muitas mil pessoas me felicitaram por um tão lison
geiro testemunho de amor dos Madeirenses, carac
terisando-o de uma ovação perfeita, de um triumpho
verdadeiramente glorioso , e dizendo-me que dariam
conhecimento desta circunstancia aos seus Governos.

Seria pouco mais de duas horas da tarde , quan


do alguns oficiaes da marinha ingleza e france
za, foram buscar-me á quinta do Deão, onde eu
tinha residido ultimamente. A este tempo já esta
va comigo a porção mais luzida e numerosa de
cidadãos, e todas as ruas e praças que os ditos
oficiaes atravessaram estavam apinhadas de povo
de todas as classes. A penas chegaram os oficiaes,
pozemo-nos em marcha para o palacio de S. Lou
renço, onde me aguardavam os Capitães Codrington
e Dégenés, para me entregarem o Governo depois
que a junta se dissolveu. Pelas ruas do nosso tran
sito até ao palacio occupavam as janellas formosos
grupos de elegantes damas, as quaes nos lançavam
{lores, e agitavam lenços para nos saudarem, ofere
— 562 –

cendo este quadro a mais brilhante perspectiva, pôr


isso que as janeilas estavão graciosamente adorna
das de verdura, flores, e bandeiras, nas quaes se
lia — Viva Sua Magestade a Rainha — Viva a Car
ta — e tambem o meu humilde nome lá apparecia.
— O nosso immenso cortejo vinha atroando os ares
com mil vivas, e parecia que a loucura se havia
apoderado de tantas mil pessoas.... tal era o fre
nezi do seu enthusiasmo.

Depois de um longo quanto aprazivel trajecto,


cheguei finalmente ao palacio, onde, na principal
sala, os dous Representantes das Potencias estran
geiras me saudaram como Governador, lavrando
um termo da entrega do poder, que a junta aC3\

bára de resignar-lhes. Agradeci aos ditos Repre


sentantes os esforços que “haviam empregado para
se chegar a um tal resultado; e em seguimento en
derecei a palavra ao povo, que havia penetrado no
palacio, recommendando-lhe ordem, moderação,
esquecimento do passado, e pedindo-lhe encarecida
mente, que não manchasse a gloria daquelle dia
com um só excesso. No cabo desta breve allocução,
rompeu esse concurso immenso em vivas á Rainha
e á Carta; e estrondosamente foram victoriados os
Representantes das Potencias alliadas. No acto em
— 563 —

que se realisou a entrega do Governo, os Capitães


Codrington e Dégenés fizeram signal para bordo das
suas Fragatas, e sem detença deram uma salva de
21 tiros todas as embarcações de guerra que esta
vam no porto, entre as quaes o Brigue portuguez
Douro, e a Corveta D. João I As fortalezas do
Ilhéo e o Pico salvaram igualmente.
Terminado aquelle acto, pedi aos Capitães Co
drington e Dégenés que me acompanhassem á Ca
thedral, onde o illustre e respeitavel Bispo Dioce
sano ordenára, que se cantasse um solemne Te-De
um em acção de graças, pelo restabelecimento do
Governo Legitimo de Sua Magestadc a Rainha. Ac
cederam a este meu convite, e depois que termi
nou a pomposa solemnidade religiosa, me acompa
nharam outra vez ao palacio, e d’alli se retiraram
para bordo das suas Fragatas.
O povo , de volta da Cathedral, tornou novamen
te a entrar nas salas do palacio, e alli se reprodu
siram novos movimentos de enthusiasmo, tocando a
Sociedade Philarmonica um hymno, que os Madei
renses me dedicaram antes do pronunciamento.
O restante do dia foi consagrado pelo povo ex
clusivamente á alegria, e até uma grande parte da
noite se passou em demonstrações do maior enthu
– 564 —

siasmo. •

No meio de todas essas scenas, em que o povo


esteve abandonado a si mesmo, não houve a deplo
rar um só excesso, um só insulto, e este povo mos
trou-se digno da Liberdade, e completamente ci
vilisado.

Muito antes de sahir da quinta para o palacio,


eu tinha feito correr, impressa, uma rogativa aos
Funchalenses, concebida nos termos constantes do
exemplar incluso n.° 1. A minha rogativa foi at
tendida, de sorte que nem uma só mancha des
Juziu o fulgor deste dia, que ficará para sempre
gravado na memoria dos Funchalenses.
No fim da tarde dirigi aos Madeirenses uma
proclamação da qual tenho a honra de encaminhar
ás mãos de V. Exc." o exemplar incluso n.° 2,
desejando, que mereça a approvação de Sua Ma
gestade. — Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal,
27 de Julho de 1847. — film.º e Exmº Snr. Mi
nistro e Secretario d'Estado dos Negocios do Rei
no. — O Governador Civil, José Silvestre Ribeiro,


Documento N.° 1

Ao Publico. — O abaixo assignado pede com o


maior encarecimento a todos os seus amigos que
— 565 —

Procurem evitar qualquer acontecimento, que possa


perturbar a ordem, ou tenda a desluzir a gloria
deste dia. A manifestação do regosijo dos Madei
renses deve ser inoffensiva, pura e sem mancha.
Assim o espera deste bom povo, O Conselheiro,
José Silvestre Ribeiro.

Ministerio do Reino.

Sua Magestade a Rainha, a quem foi presente


a correspondencia do Governador Civil do Fun
chal, comprehendendo quatorze oficios sob diver
sas datas, desde 6 de Julho proximo passado até
27 do mesmo mez. todos relativos aos actos que
precederam e se seguiram ao restabelecimento do
legitimo governo naquelle Districto: Manda, pela
Secretaria d’estado dos Negocios do Reino, signi
ficar ao sobredito Magistrado, que Lhe foi sum
mamente agradavel Vêr que os Madeirenses, li
vres da força que os opprimia, poderam sem es
torvo manifestar a sua lealdade ao Throno, e a
Sua sincera adhesão á Carta Constitucional da Mo

narquia. — Não foi menos agradavel á Mesma Au


gusta Senhora, a certeza de que o restabelecimen
to da ordem legal se operou sem que um unico ex
– 566 —

cesso viesse manchar a gloria desse acto : — istº


demonstra a civilisação e instrucção dos Madeiren
ses, e quanto são dignos da liberdade e prosperi
dade, que o Governo não deixará de assegurar
lhes por todos os meios ao seu alcance. Sua Ma
gestade Confia que o Governador Civil, tendo ob
tido a afeição daquelle povo, pela imparcial e
recta justiça que lhe tem administrado, continua
rá no mesmo systema de moderação, benevolencia,
e protecção para com todos os individuos que vi
verem socegados ao abrigo das leis, quaesquer
que tenham sido as suas opinioes em politica, por
isso que o mais ardente desejo da Mesma Augusta
Senhora he vêr toda a familia portugueza reunida,
e feliz em volta do Throno Constitucional. Não
se publicam as portarias dirigidas ao Governador
Civil, e a que elle allude no oficio n.° 34, por
quanto essa publicação seria hoje extemporanea;
e igualmente por não ser presumivel, que depois
das ultimas occorrencias da Madeira, haja quem
possa pôr em duvida a veracidade daquella cor
respondencia. — Paço das Necessidades, em 11
de Agosto de 1847. — Francisco Tavares de Al
meida Proença.
*=
– 567 —

Ao Ministerio do Reino.
§s
Ill." e Exc."º Snr. —Tenho a honra de
encaminhar ás mãos de V. Exc." as incluzas
copias de uma circular, que logo em data
de hontem dirigí aos Administradores de
Concelho, bem como a de um oficio que es
pecialmente dirigí ao do Funchal.
N’esses documentos verá V. Exc." qual
tem sido o meu empenho em manter o soce
go, e em evitar o exercicio de vinganças
particulares. Felizmente tem-se conseguido
atégora esse feliz resultado, e espero que
continue a boa ordem, se da parte dos afectos
á dissolvida junta, ou dos seus proprios mem
bros, houver tanta prudencia como tem havido
da parte dos cidadãos fieis a S. M. a Rainha.
Incluza encontrará V. Exc." uma copia
do Alvará pelo qual nomeei hontem mesmo
uma Commissão Municipal, que vae entrar
immediatamente na gerencia dos negocios do
Concelho.
Em quanto aos outros Concelhos estabeleci
como regra geral, que a organisação admi
nistrativa volte ao estado em que se achava
antes do dia do Pronunciamento, reservando
me para mais tarde, e com o necessario co
— 568 —

nhecimento de causa, adoptar as providencias


que parecêrem convenientes. — Deus Guarde
a V. Ex.° — Funchal 27 de Julho de 1847.
— Illm.º e Exmº Snr. Ministro e Secreta
rio d'Estado dos Nogocios do Reino. — O
Covernador Civil, José Silvestre Ribeiro.

Aos Administradores de Concelho.

Copia — Illmº Snr. — Está restabelecidº


nesta ilha o Governo Legitimo de S. Ma
gestade a Rainha.
Na proclamação, de que envio a V. S."
alguns exemplares para lhes dar a maior
publicidade, encontrará V. S.", exposta com
toda a clareza, a linha do comportamento
que este Governo Civil se propõem seguir
na sua marcha. — Esquecimento completo do
que se passou desde o dia 29 de Abril ul
timo até hoje, eis em que se cifra esse pro
gramma, destinado, como he obvio, a pôr
termo a todos os motivos de desassocego, a
apagar os vestigios das desgraçadas dissen
ções que nos hão dividido e dilacerado, e
a reunir todos os cidadãos em volta do Thro
no e da Carta Constitucional, sagrados pe
– 569 —

nhores de liberdade e bem estar.


Sob a influencia destes principios deve
V. S." tomar como seu principal cuidado fa
zer manter a ordem publica, o respeito ás
leis, e á propriedade particular, evitando
por todos os meios possiveis o mais leve ex
ercicio de vinganças particulares, que o Go
verno de S. M. não póde, nem deve, nem
quer tolerar.
Snr. Administrador! Penetre-se V. S."
profundamente da indispensabilidade da união
entre os membros da familia portugueza, e
assim couvencido, emprégue assiduo, incan
savel, incessante, todos os meios ao seu al
cance para aconselhar aos cidadãos que deem
de mão aos tristes odios dos partidos, — para
lhes fazer ver que devem viver como irmãos,
e sacrificar no altar da patria quaesquer res
sentimentos que entre si nutram. — Faça
lhes V. S." sentir que he já tempo de ter
mos juízo, e de nos apresentarmos ante o
mundo civilisado com um caracter respeita
vel, em vez de oferecer o melancolico es -
petaculo de continuadas agitacões, de luctas
fratricidas de quasi todos os dias. de ranco
rosas paixões que nos arrastam a deplora
veis excéssos. — Diga-lhes que mesquinhas
— 570 —

vinganças só servem para perpetuar divi


sões, e que ao passo que a religião e a
moral as condemnam, tambem o interesse
da sociedade, e mil outras considerações as
proscrévem.
No que toca á organisação administrativa
desse Concelho, da sua competencia, tome
V. S." como regra geral que as cousas vol
tem inteiramente ao estado em que se acha
vam até ao dia 28 de Abril ultimo, fican
do-lhe o direito salvo de me representar pos
teriormente sobre as alterações ou mudan
ças que convenha fazer. No que diz respei
to ao pessoal deste negocio, convirá que V.
S", mas suas representações, tenha em vis
ta que por dever, e necessidade, deve procu
rar-se para os empregos homens de inteira
probidade, e que não tenham incorrido no
odio e antipatia dos povos.
No que em particular diz respeito aos ne
gocios da Fazenda, entender-se-ha V. S."
com o Snr. Recebedor do Concelho, e pela
sua repartição tomará todas as providencias
para que sejam remettidos a este Governo
Civil todos os papeis e documentos legaes do
estilo e lei. que por ventura tenham deixa
do de ser enviados — bem como quaesquer
— 571 —

esclarecimentos que possam derramar luz so


bre a gerencia financeira destes 3 ultimos
mezes — e finalmente promoverá a remessa
para o cofre central de quaesquer quantias
que estejam em arrecadação, e convidará os
devedores a entrar nesta occasião de apuro
financeiro com as sommas que devêrem.
Em uma palavra, Snr. Administrador, a
maquina administrativa deve voltar aos seus
eixos, para trabalhar com a regularidade e
presteza com que funccionava antes do pro
nunciamento, e eu espero que no Concelho
a cargo de V. S.", mediante os seus acti
vos, quanto purdentes exforços, se consiga
sem perda de tempo este resultado.
A estreiteza do tempo, e a urgencia das
circunstancias, me obrigam a recommendar
a V. S." que logo e logo se entenda com a
Camara desse Concelho, convidando-a a en
trar desde já em exercicio. Fallo da Cama
ra que existia até ao dia 28 de Abril ul
timo — Deus Guarde a V. S." — Funchal,
no Palacio do Governo Civil, aos 26 de Ju
lho de 1847. — Illm.º Snr. Administrador
do Concelho de... . . — O Governador Ci
vil, José Silrestre Ribeiro.
— 572 —

. . Ao. Administrador do Concelho do Funchal.

Copia — Illmº Snr. —Tanto pela procla


mação de que enviei a V. S." alguns exem
plares, como pela circular desta data, terá
V. S." avaliado o quanto tenho a peito man
ter a ordem nesta conjunctura, evitar exces
sos, e conseguir que a manifestação do re
gozijo publico seja inofensiva, pura, e sem
mancha alguma que deslustre a mudança po
litica, que felizmente acaba de operar-se.
Exercita porem V. S." a sua authorida
de em um grande centro de população, e
nessa razão cresce a conveniencia de desen
volver muito maior vigilancia e energia, pa
ra assegurar a manutenção do socego publi
co, do que se torna preciso nos demais con
celhos. — Por este motivo he força que pa
ra, com V. S." insista mais particularmente
nas ideias d’aquelles dous escriptos.
O Governo de Sua Magestade não quer,
não póde, nem deve consentir que se com
metta um só excesso, parta elle donde par
tir; nem por certo, poderia haver cousa mais
desagradayel aos olhos do mundo civilisado
que tão dº perto nos observa pelas pessoas
dos represººntes das duas grandes nações
da Europa, do que o criminoso exercicio
de baixas vinganças, de insultos, no mo
mento em que a nossa Augusta Soberana
chama em volta do seu Throno a todos os
portuguezes.
Fio do nobre, caracter dos Madeirenses
que elles darão agora um novo testemunho
da sua sensatez e generosidade, parecendo
me por isso que a tarefa de V S." será
muito mais facil, do que se tivera a lidar
com um povo, em quem não imperassem
os nobres sentimentos de magnanimidade,
que por boa fortuna caracterisam os mora
dores da risonha Flôr do Oceano.
Não cesse porém V. S." de lhes recom
mendar placidez e moderação; — não cesse
de lhes aconselhar o esquecimento do passa
do; — não cesse de lhes indicar a indispen
sabilidade da união.
Diga-lhes que a força militar he compos
ta de irmãos nossos a quem devemos consa
grar o mesmo afecto que aos demais cida
dãos — diga-lhes que quaesquer prevenções
a semelhante respeito devem ceder ante a
verdade, ante a razão, ante o bem publico.
Diga-lhes que estejam acautellados contra
esses rumores e invenções que nestas con
-— 574 —

juncturas se espalham, muitas vezes com in


tenções pouco leaes, convindo por isso que
escutem tudo com placidez, e não se deli
berem a obrar sem entrar no verdadeiro co
nhecimento das cousas, sem darem tempo á
reflexão, sem consultarem .cs prudentes.
Diga-lhes que relevem indulgentes quaes
quer imprudencias de dictos ou factos que por
ventura ouçam, ou presenciem , porque he
bom evitar conflictos, e dar de mão a moti
vos de desavencas, sempre funestas.
Aos seus Delegados, e agentes policiaes,
recommendará V. S. a mais circunspecta pru
dencia no desempenho de suas obrigações,
ordenando-lhes muito terminantemente que
não ofendam ninguem — que empreguem to
dos os termos da delicadeza e attenção para
com todos os cidadãos, — que estejam sem
pre promptos a acudir ao ponto onde fôr ne
cessario o seu auxilio — e em uma palavra,
mantenham a ordem, a segurança e o sece
go por todos os meios ao seu alcance.
Na actividade de V. S. confio eu de tal
modo que tenho como certo que nesta occa
sião terei o prazer de levar ao conhecimen
to de S. M. o seu bom serviço.
Deus Guarde a V. S. — Palacio do Go
— 573 —

verno Civil no Funchal aos 26 de Julho de


1847. — Illmº Snr. Administrador do Con
celho do Funchal — O Conselheiro Governa
dor Civil, José Silvestre Ribeiro.

Do N.° 1.4 do Madeirense de 27 de Julho


de 1847.

No dia 21 do corrente tinhão surgido nes


te porto dois navios pertencentes á esquadra
de Sua Magestade Britanica nas aguas do Te
jo; — a fragata a vapor. « Terrible, º – e
o brigue, «Recruit.» No dia seguinte entrára
tambem a fragata Franceza « Armide.» Logo
se divulgou que a concorrencia desta força ti
nha por fim apoiar a intimação que á junta
fizera para dissolver-se, o nobre comman
dante da Fragata Ingleza «Thetis», surta em
frente do Funchal desde o dia 23 de Junho
ultimo.
Os Commandantes destas forças, depois de
haverem conferenciado a bordo da «Thetis»
sobre o modo de levarem a efeito as instruc
ções que trazião, fizerão saber á junta pe
les respectivos agentes consulares que no dia
subsequente, ás 11 horas da manhã precisa

•••• 576 —
vam de ter uma conferencia com ella.
Verificou-se a conferencia. O resultado foi
prefixar-se o dia de hoje… para o restabeleci
mento da Legitima Auctoridade da Ramha
nesta ilha, e por conseguinte para a reinte
gração do Exmº Sur. Conselheiro José Si}
vestre Ribeiro no logar de Governador Civil
deste Districto. - •

Acontecimentos d'ha tanto almejados pe


la grande maioria dos Madeirenses parecião
tardar demasiado para a impaciencia publica.
No mesmo dia (24) sahirão dos respecti
vos asylos muitos dos refugiados, e começá
ram de afluir á Praça da Constituição nume
rosos grupos de cidadãos com o intento, aliás
louvavel, de vietoriarem com vivas o Augus
to Nome da Rainha. Mas o digno Comman
dante da «Thetis», de accôrdo com o Exm."
Sr. Conselheiro José Silvestre Ribeiro, jul
gando de seu dever evitar qualquer quebra
do estipulado, fez saber seus desejos; logo
o concurso dispersou. Era com efeito melin
droso precipitar uma crise, para a boa di
recção da qual ainda não estavam concerta
das as necessarias providencias.
Chegou porém o dia aprasado, foi então
que o Funchal apresentou um espectaculo co
mo, havia 13 annos, se não tinha visto ou
tro igual. O dia 5 de Junho de 1834 re
petio-se em 26 de Julho de 1847. N'um e
n'outro tractava-se de uma restauração; —
mas — no primeiro era objecto da restaura
ção uma ideia que estava no espirito de todos,
e nada mais — no segundo, a ideia que esta
va no espirito de muitos, tinha entre nós
uma pessoa que a representava , um illustre
martyr da lealdade e da honra do seculo dos
Martins de Freitas. Isto explicará a diferen
ça que houve entre um e o outro dia.
A uma hora da tarde tinha o Exmº Sr.
Conselheiro de vir tomar das mãos dos com
mandantes das forças navaes auxiliares, a au
thoridade que lhe haviam confirmado reiteradas
ordens do Governo de S. Magestade. Mas lo
go desde as 11 da manhã começáram de rei
nar o maior movimento e alacridade, princi
palmente nas ruas que tinha de attravessar
S. Exc., vindo da Quinta do Deão, onde lhe
prestára um asylo a generosidade britanica,
para o Palacio de S. Lourenço, onde tinha
de continuar a residir.
Reuniram em casa de S. Exc. para o a
companharem todas as authoridades civis e
militares, parte da oficialidade do brigue
— 578 –

Douro, todos os oficiaes desligados dos cor


pos da guarnição, empregados publicos de
todas as repartições, proprietarios, negoci
antes. e um immenso concurso de povo.
Pela volta das duas horas chegaram offici
aes inglezes e francezes encarregados de an
nunciarem a S. Exc. que a junta estava dis
solvida. Logo todo o concurso se poz em mar
cha para o palacio de S. Lourenço. •

As janellas adereçadas de festões, panos


de seda e bandeiras — o bello sexo accenan
do com lenços brancos, e attirando flores —
ruidosos vivas de mistura com o repique dos
sinos e com o estourar dos foguetes — tudo
annunciava a energica reacção de um senti
mento, que a força das baionetas tinha até
então como encarcerado no amago dos cora
ções madeirenses. |

Logo que S. Exc. entrou na sala do pala


cio, onde o esperavam os commandantes das
fragatas ingleza e franceza, leu e assignou o
competente auto da entrega do podêr, e di
rigiu em lingua franceza aos dignos repre
sentantes das potencias aliadas um tão breve
quão delicado cumprimento, que muito os
impressionou; e em seguida fez ao concurso
que o escutava, uma viva e energica allocução.
— 579 —

Parece que ainda nos estão resoando no


ouvido os magos accentos daquella voz que
para aconselhar a moderação, a tolerancia. e
a generosidade que muito folga quando esque
ce, quando perdoa, empenhava todo o preço
da amisade que lhe consagra este povo. —
Madeirenses! dizia S. Exc." sóis meus ami
gos? um só favor vos peço, e espero de vós
— procede de modo que vingança seja nesta
terra palavra sem sentido. — E esta depreca
ção solemne, nos labios de quem tinha sofri
do tanto, tinha alguma cousa de profunda
mente religiosa e christã, que exprimia dos
olhos de muitos lagrimas de compuneção.
Findo o acto da entrega da auctoridade sal
varam as fortalezas e as embarcações de guer
ra surtas neste porto: e S. Exc.", acompa
nhado de todo o concurso que ali se achava,
e muitos milhares de pessoas que o espera
vão fóra sahio para a Cathedral a dar graças
a Deus, assistindo ao Te Deum que tinha de
celebrar o Exmº Bispo da Diocese.
A porta da egreja repetia a banda de mu
sica da sociedade philarmonica os hymnos na
cionaes que havia tocado na Quinta do Deão
á sahida do luzido acompanhamento. O templo
continha tudo o que ha de mais elegante no
– 580 —

Funchal, tanto de um como do outro sexo,


O espectaculo de mais de tres mil pessoas,
dirigindo a Deus fervorosas graças pela feliz
restauração do Governo de Sua Magestade
a Rainha Constitucional dos Portuguezes, ti
nha alguma cousa de tão sublime, que quanto
mais se entranhava na alma suavemente, tan
to menos sofria descrever-se.
Acabado o Te Deum, voltou S. Exc." pa
ra o palacio de sua residencia, precedido da
banda de musica, e acompanhado dos com
mandantes das forças auxiliares, e de um con
curso immenso, no meio de reiterados vivas
e repiques de sinos, e das bençãos de todo
um povo que o idolatra, e cujo amor acriso
láram ainda mais os muitos padecimentos a
que se resignára S. Exc." em prol delle.
A Madeira tem sido aitamente calumniada:
tem se dicto que a maioria do povo madei
rense esposara ufanosa o movimento de 29
d'Abril. O dia de hoje deu solemne desmen
tida a essa imputação afrontosa. E quando a
ordem, e o zélo do serviço que faz milagres,
renascerem á voz do Homem que a Madeira
tem por seu amigo, o dia 26 de Julho terá
de viver na memoria deste povo a par da sem
pre doce recordação do dia 5 de Junho de 1834.
– 581 –

Da Camara Municipal do Funchal.

Senhora — O dia 26 de Julho ultimo deo a Vos


sa Magestade, á Nação, e ao mundo a mais bri
lhante e convincente prova de que o 29 d'Abril
deste anno não foi dia dos Madeirenses.
Nem podia ser delles o que elles, logo ao pri
meiro olhar, encararam com horror.
Não podia ser delles a obra das trevas, que elles,
no mais puro e expressivo prazer, viram abater-se,
correndo o octogesimo nono dia da sua, — curta,
mas perniciosa, — duração.
E bem leal foi o presentimento, — bem justa a
alegria que sentirão ao verem a realidade medonha
que elle annunciára, transpôr a raia do presente.
Os Madeirenses virão trocar a lealdade pela trai
ção, a verdade pela calumnia e pelo embuste, os
bons termos pelos insultos, as palavras de conforto
pelas ameaças, o favor pela ingratidão, a ordem
pelo desconcerto, a tranquillidade pelos terrores,
a paz pelo tumulto, a fé pela desconfiança, as ga
rantias constitucionaes pela intolerancia feroz, um
governo suave e benefico por um jugo pesado e
nocivo, a liberdade pela oppressão: — a illegali
dade enthronisada, poluto o Sanctuario da Lei, a
— 582 –

Soberana desacatada; — as principaes convenienci


as publicas desprezadas, impecidas ou viciadas;
— os costumes. e os differentes ramos d'industria
resentindo-se de tudo isto.
Virão uma mui extensa e insondavel calamidade,
e, contristados, fizerão ouvir por toda a parte as
vozes do seu profundo desgosto.
Virão renascer a Legalidade, e seus corações se
derramárão em copiosas effusões de sancto jubilo.
E essa calamidade, cujos efeitos maleficos ain
da por muito tempo se hão de sentir, trouxeram-na,
Senhora, os homens do chamado pronunciamento
quando elles mesmos ja annunciavão com seguran
ça o fim da lucta do Continente, e a victoria do
seu lado, — quando oferecião com isto uma razão
de mais para que a Madeira não excitasse odios
amortecidos, não accendesse inutilmente a discor
dia, não accrescentasse a longa cadêa de seus in
fortunios, sahindo da ordem, e da obediencia que
sempre lhe convirá conservar ao Governo da Capi
tal do Reino, — Não foi um acto de valôr e de ge
nerosa dedicação.
Sua mão Pezada e rude ahi ficou marcada por

dolorosos vestigios na face deste povo, que sabe


sofrer e perdoar.
— 583 —

Outra mão amºstrada pela sabedoria e pela expe


riencia, retomando a administração da Provincia,
e dirigindo-a suave e providentemente, vai pouco
a pouco, fazendo entrar na ordem os elementos que
constituem o bem geral, dispersos pela revolta e
pelo capricho; vai, pouco a pouco, reanimando
as forças que um sofrimento continuo e penoso dei
Xou mui atenuadas, — e mitigando as dores que ain
da recordão a presença funesta d'uma causa que
felizmente passou.
Esta mão protectôra he a do Conselheiro José
Silvestre Ribeiro, Governador Civil deste Districto,
cuja incansavel actividade cresce, cujo querer,
forte, justo, e eficiente, se reforça com a idêa
creadora e sublime dos seus deveres. He a mão do

Homem que, convindo a todos os povos que gover


nar, convem sempre á Madeira, e ainda mais na
presente conjunctura.
Dois grandes beneficios recebêrão os Madeirenses
no dia 26 de Julho: O restabelecimento do Legiti
mo Governo Constitucional, e a conservação do
Conselheiro José Silvestre Ribeiro á testa da Ad
ministração do Districto.
Os Madeirenses esquecem os males passados por
estes suspirados bens presentes; — abração-se, com
— 584 —

gratulão-se, exprimem vivamente o prazer que taes


beneficios lhes infundem , e incessantemente diri
gem a Vossa Magestade pura felicitação pelo pri
meiro, — sincero agradecimento pelo segundo como
acto de mui proveitosa justiça.
E bem expressados forão estes sentimentos no
Concelho do Funchal, cabeça do Districto.
Orgão legal de seus habitantes, a Commissão,
ha pouco encarregada da administração municipal
do mesmo Concelho, tem a gostosa honra de os fa
zer subir por este meio ao Throno de Vossa Mages
tade; Elles são tambem os sentimentos da Com
missão. •

Digne-se Vossa Magestade accolhel-os como ver


dadeiros e respeitosos.
Deus guarde a Preciosa Vida de Vossa Magesta
de como he mister.

Funchal 3 de Agosto de 1847.


(Assignados ) Nuno de Freitas Lomelino, Presi
dente. — Servulo Drummond de Menezes, Fiscal —
Pedro Agostinho Pereira de Menezes e Agrella —
Severiano Alberto de Freitas Ferraz — Diogo d'Or
nellaº França Carvalhal Frazão Figueiroa = Anto
nio Machado Cotta.
*-……………
– 585 –

Ao Ministerio do Reino.

1.° Repartição — Nº 2088 — Illm.º e Exm.º Sr.


— Os Capitães Codrington e Dégenés, Commandan
tes das Fragatas Ingleza e Franceza, «Thetis» e
« Armide º , houvéram-se de um modo tão brilhan
te e louvavel no desempenho da sua tarefa de pro
mover o restabelecimento do Legitimo Governo n'es
ta Ilha, que eu julguei de toda a delicadeza
exprimir-lhes, em meu nome e no dos Madeirenses,
o mais vivo reconhecimento.
Os termos em que redigí esta manifestação cons
tam da copia junta, a qual tenho a honra de sub
metter á consideração de V. Exc.", pedíndo lhe
no caso de a julgar devidamente redigida, se digne
fazê-la transcrever no Diario do Governo, em obse
quio daquelles dous Cavalheiros.
Deus guarde a V. Exc." -- Funchal 5 de Agosto
de 1847 — Illm.º e Exm.º Sr. Ministro e Secreta
rio de Estado dos Negocios do Reino — O Governa
dor Civil, José Silvestre Ribeiro.

Illmº Snr. — A multiplicidade de negocios que


nestes dias tenho tido entre mãos, como he natural
por occasião de mudanças politicas desta ordem,
— 586 —

me impedio de desempenhar o gostoso dever de tri


butar a V. S." a homenagem de meu agradecimen
to, pela eficacia com que V. S.", de accordo com
seu Illustre Collega, se consagrou ao restabeleci
mento do Legitimo Governo de S. Magestade a
Rainha, nesta Ilha.
Se bem que tarde, permitta-me V. S." que ago
ra lhe signifique os sentimentos de respeito, esti
ma e gratidão, que me preso de nutrir para com
V. Sº, inspirados pelo conhecimento que tenho da
nebre dedicação, prudencia, e completa lealdade,
que V. S." desenvolveu na sua melindrosa tarefa.
O cuidado escrupuloso que V. S.", de combina
gão com o seu Illustre Collega, pôz em arredar
tudo quanto podesse ofender, ainda levemente, a
nacionalidade portugueza; — o fino tacto com que
forão guardadas as convenientes attenções para com
a irritavel susceptibilidade dos partidos; — e final
mente a tendencia pacificadora que se imprimiu a
este negocio, dando em resultado a feliz situação
que hoje saborea esta Ilha; — tudo penhora os Ma
deirenses, não menos que a mim proprio, consti
tuindº-nos na imperiosa quanto suave obrigação de
nos confessarmos eternamente reconhecidos para com
v. s."
— 587 —

Faço votos para que V. S." se dê por satisfeitº


do comportamento conciliador que hei tido nestes
primeiros dias, e que estou disposto a seguir d'ora
em diante, bem convencido de que os Madeirenses
continuarão a conhecer que o seu interesse lhes
prescreve a moderação , o amor da ordem, o es
quecimento do passado, e a união fraternal de todos.
Aproveito esta occasião para testemunhar a V.
S." o profundo respeito e alta consideração com que
sou de V. S." muito attento venerador e humil

de creado — Illm.º Sr. H. S. Codrington, Com


mandante
beiro. da Fragata «Thetis.» — José Silvestre Ri

N. B. — Identica a M. Dégenés, Commandante


da Fragata Franceza « Armide.»
-",

Do Ministerio do Reino.

Ministerio do Reino — 3.° Direcção —


1.° Repartição — Sendo presente a Sua Ma
gestade A Rainha, o oficio do Governador
Civil do Funchal , datado de 5 do corrente
mez, em que se inclúe a copia do oficio col
lectivo que elle dirigira aos Capitães Co
— 588 —

drington e Dégenés, commandantes das Fra


gatas Ingleza e Franceza, «Thetis», e «Ar
mide º , — manifestando o respeito e estima
que consagrava a estes distinctos oficiaes,
pela louvavel maneira porque desempenha
ram a sua honrosa missão, de promoverem
o restabelecimento do Legitimo Governo n'a
quella Ilha: Manda A Mesma Augusta Senho
ra, pela Secretaria d'Estado dos Negocios
do Reino, Significar ao dito Governador Ci
vil, que muito Se Compraz de que elle inter
petrando os sentimentos do Governo désse á
quelles illustres Capitães, uma authentica de
monstração de agradecimento, pela delicadê
sa, urbanidade e prudencia com que se hou
veram em tão delicada tarefa, deixando pe
nhorado o reconhecimento dos Madeirenses,
que por muito tempo recordarão com sauda
de os nomes destes dous Commandantes. —
Paço das Necessidades, em 24 d’Agosto de
1847. — Antonio de Azevedo Mello e Car
valho. |

( Diario nº 200 — de 25 d'Agosto, )

Ministerio do Reino — 3 º Direcção — 2.°


Repartição — N.° 449 — Lº 5.° — Sendo
— 589 —

presente a Sua Magestade a Rainha a Repre


sentação da Commissão Municipal da Cidade
do Funchal, elevando á Real Presença os res
peitosos protestos de seus sentimentos de ale
gria e satisfação pelo restabelecimento do Le
gitimo Governo, que alli tivera logar no dia
26 de Julho ultimo; e outro sim agradecen
do a conservação do Conselheiro José Silves
tre Ribeiro á frente da administração daquel
le Districto: Manda A Mesma Augusta Se
nhora, pela Secretaria d'Estado dos Negocios
do Reino, que o Governador Civil do Distri
cto do Funchal louve em Seu Real Nome á
sobredita Commissão Municipal, assim como
todos os Madeirenses, em cujo nome ella fal
la, por seus constantes sentimentos de fideli
dade e devoção á Causa do Throno e da Car
ta Constitucional, de que tem dado tantas
provas, e mais lhes faça saber, que muito
Se compraz Sua Magestade, de que os Func
cionarios, em que tem posto a Sua Confian
ça, mereçam de tal modo o amor e benevo
lencia dos povos que lhes estão confiados. —
Paço das Necessidades em 25 de Agosto
de 1847. — Antonio de Azevedo Mello e
Carvalho.
— 590 —

Ao Ministerio do Reino,

Illm.º e Exmº Snr. —Tenho a honra de


encaminhar ás mãos de V. Ex º o incluzo
exemplar de uma circular que em 7 do cor
rente dirigí aos Administradores de Conce
lho deste Districto, tendente a demonstrar
com a maior evidencia, e de uma maneira
incontestavel, que á Madeira convem arre
dar do seu seio as agitações politicas, a
guardando em perfeita quietação o desenlace
de quaesquer luctas que se pelejem no Con
tinente.
Recorrí neste mesquinho escripto a todas
as razões que podem convencer os Madeiren
ses da indispensabilidade do socego e da paz,
e parece-me ter-lhes apresentado todas as
considerações que devem firmá-los no propo
sito de não tomarem parte nos enredos e
maquinações da turbulenta política.
A esta circular tenho dado a maior pu
blicidade, pedindo até ao Exmº Prelado
Diocesano que a transmittisse aos Parochos
para explicarem ao povo a sua doutrina.
Faço votos para que sejam do agrado de
V. Ex." a indicada doutrina, e os termos da
sua exposição.
— 531 —

Deus Guarde a V. Ex.° — Funchal aos 25


de Agosto de 1847. — Iilm.º e Exmº Snr.
Ministro e Secretario d'Estado dos Negocios
do ireino. — O Governador Civil, José Silves
tre Ribeiro.

Aos Administradores de Concelho.

Copia — 2 º Repartição — Lº 5." — N.°


463 — Circular — Ilm° Snr — Jamais en
derecei ás Authoridades, nem ao povo da
Mladeira uma só palavra sobre cousas politi
cas, antes do dia 29 de Abril ultimo, por
isso que, conservando-se o Districto a meu
cargo em perfeito socego até esse dia, fôra
uma superfluidade occupar-me de tão melin
droso assumpto. -

Hoje porem, e depois dos ultimos acon


tecimentos, entendo que em vez de guar
dar silencio, me cumpre erguer bem alto a
voz, para aconselhar o que tenho por mais
conveniente aos interésses desta ilha.
Que convém á Ilha da Madeira ? Conser
var-se tranquilla, arredar do seu seio os
horrores da guerra civil, e aguardar em
perfeita quietação o desenlace de quaesquer
— 592 —

luctas que se pelejem no Continente.


Eis o que eu passo a demonstrar, tencio
mando ser breve, quanto franco em minha
exposição.
A Ilha da Madeira deo a Providencia uma
fonte de riqueza, a qual lhe cumpre não des
perdiçar jamais. Fallo da inapreciavel cir
cumstancia de ser o seu clima muito proficuo
aos que padecem doenças pulmonares. Graças
a este beneficio da Natureza, um grande nu
mero de estrangeiros, e particularmente de
ricos inglezes, frequentam todos os annos es
te delicioso paiz, onde, como em paga de
recobrarem a saude, despendem avultadas som
mas, que vivificam a agricultura e o com
mercio da Madeira. — Mas os doentes folgam,
e necessitão indispensavelmente do remanso
da paz, e de uma inalteravel tranquillidade.
Esses estrangeiros, desejosos de buscar alivio
para os seus padecimentos, respirando um ar
balsamico e restaurador, não hesitam em atra
vessar o Oceano para demandar estas para
gens, onde os conduz a suave esperança de
que hão de restabelecer os debilitados orgãos;
mas, e repare-se bem, elles fugirão com hor
ror de uma terra, onde a desordem e a
guerra civil estiverem enthronisadas.... Não
— 593 —

será acaso fundado o receio de vêr descon


ceituada a Madeira na opinião de estrangei
ros, — a Madeira, que ainda ha um anno
era tida na conta da mais pacifica, da mais
tranquilla das vivendas? Os factos são tudo,
quando a reflexão avaiía as cousas. No mez
de Agosto de 1846 uma sublevação popu
lar; — na noute de 28 de Abril de 1847
uma revolta militar! — e note-se que não
me faço eu cargo de afferir estes dous acon
tecimentos pelo padrão sevéro da justiça e
da razão, pois que para o meu intento bas
ta sondar a desagradavel impressão que taes
scenas produzem, e o quanto desvirtúam um
povo qualquer. •

A Ilha da Madeira está tão vantajosa


mente situada, que, reproduzindo o que tan
tas vezes se tem dito, he a hospedaría que
no meio dos mares se depara aos viajantes
da melhor parte do globo. E quanto não
será grato a todos esses que abordam a suas
praias encontrar no regaço desta Natureza
magnifica e arrebatadôra o asylo da paz, a
boa ordem dos povos civilisados, a união
que torna suave a vida social ?
A Ilha da Madeira está em relação com
diferentes noções pelo seu commercio, e na
— 594 —

da ha hi que tanto estreite essas relações,


essencialmente pacificas, — nada ha hi que
tanto attraia especulações mercantís, e ali
mente o trafico do negocio, como a certeza
da estabilidade das cousas, como o conheci
mento de que n'um dado paiz reina a or
dem, o socego, o respeito á lei, a seguram
ça pessoal e de propriedade.
Se a Madeira chamar a guerra civil ao
seu recinto, se lhe oferecer para campo de
batalha o seu proprio solo, afrouxará o fer
vor pelos interesses reaes do paiz, por que
toda a energía dos habitantes, todas as fa
culdades intellectuaes, todos os impulsos do
coração, todo esse fogo do enthusiasmo que
cria as grandes cousas, se reconcentrarão nas
questões politicas, inutilisando completamen
te esses admiraveis elementos da publica pros
peridade, — E sendo assim, como poderá a
Madeira consagrar-se eficazmente ao cuida
do de melhorar a sua sorte, emprehenden
do a arborisação das suas serras, a abertu
ra de novas levadas, o augmento e a varia
ç㺠da sua cultura, o desenvolvimento da
instrucção publica — e em uma palavra, co
mo poderá ela curar do que sºbre tudo lhe
importa, do que sobre tudo lhe interessa?
Se a Madeira se envolver em luctas po
liticas, chamará fortemente para dentro de
si a impreterivel necessidade de consummir os
seus apoucados rendimentos em despesas im
productivas. As exigencias de um estado de
guerra são sempre insaciaveis, tudo absorvem,
tudo devoram, — e tudo em pura perda do
povo, que alfim vê despendidos avultados ca
pitaes, sem vêr augmentado o seu bem-estar.
Sob o imperio daquelas crises o apuro do
momento he tudo, e o fortissimo desejo que
naturalmente arrasta os partidos a promover
o seu triumpho, cerra-lhes os olhos sobre a
applicação da fortuna publica, por que antes
de tudo lhes he necessario organisar uma grande
força, e pôr em acção todas as providencias
que reputam salvadoras, embora seja indis
pensavel despender até o ultimo ceitil. — Sc
rena a tempestade, volta a ordem, e os po
vos, olhando como de uma elevada altura o
passado, só teem que lamentar o esteril em
prego de consideraveis sommas, que bem
pudéram ter dado alento ao commercio, á indus
tria, á agricultura — que bem pudéram ter
levantado obras de permanente utilidade, de
reconhecido interésse commum.
Se a Madeira arder na labarèda de intes
— 596 —

tinas discordias, será condemnada a ver ac


cender terriveis odios entre seus filhos, —
funestos odios que só diuturno espaço de tempo
póde adormecer: verá desatarem-se esses
laços de sociabilidade, que pela naturesa das
cousas manteem a harmonia entre os povos,
mas que num pequeno centro de população
se tornam ainda mais indispensaveis; — verá
uma sociedade em dissolução, mil vezes mais
intoleravel do que a vida errante dos selva
gens. — E se na maior generalidade convem
a um povo viver dias de branda paz, cimen
tada pelo perfeito accordo de seus membros,
quanto mais não quadra essa afortunada si
tuação á ilha da Madeira, onde a naturesa
lie bella, he formosa, he risonha, e parece
estar convidando o homem a não mover
guerra ao seu semelhante ?
Ainda | orém pondo de parte as conside
rações que deixo expostas, admitte por ven
tura duvida que a Bladeira, pobre e abati
da como está , não póde lançar na balança
peiitica de Iortugal assaz de peso para a fa
zer pender para um dos lados? Poderá elia
for ever grandes so… mas de dinhºu o a al
gun) dos contendentes? Poderá acaso enviar
tropas? Como poderá sugeita-se a larga san
gría um corpo enfraquecido? Para que he
debilitá-lo ainda mais, e cortar-lhe o der
radeiro alento vital ?

Snr. Administrador! Se as razões que


muito em substancia ficam deduzidas lhe pa
recerem demonstrar a asserção, que acima
estabeleci. sirva se V. S." de espalhar essa
doutrina entre os seus administrados, a fim
de que elles se penetrem das vantagens de
uma paz aturada, e inalteravel, — da im- '
periosa necessidade de despedaçar a cadeia
de desatinados odios, de funestas represalias, |

que acabam por anniquilar os povos — e fi


nalmente se convençam de que devem re
pellir corajºsos e afoutos qualquer tendencia
para a perturbação da ordem. — Deus Guar
de a V. S." — Palacio do Governo Civil no
Funchal aos 7 de Agosto de 1847. — Illm.º
Snr. Administrdor do Concelho de.... — O
Conselheiro Governador Civil, José Silvestre
Ribeiro.
------…………………

O Governador Civil a todas as Camaras e


Administradores de Concelho.

Em data de 27 de Setembro findo fiz expedir


as necessarias ordens para se começar a entender
— 598 –

na importantissíma tarefa eleitoral, a que manda


proceder e Decreto de 12 d'Agosto do corrente
anno, enviando-se por essa occasião — a quêm
convinha — o mencionado Decreto, o meu Álvará
que regula as epocas das opperações eleitoraes nes
te Districto, e a copia da circular do Exm.º Mi
nistro dos Negocios do Reino, de 3 do corrente,
que explica a todos os Governadores Civis o pen
samento do Governo, e lhes traça a linha de com
portamento a seguir nesta conjunctura.
Nos termos da referida circular, cuja luminosa
doutrina recommendo a todas as Camaras, Admi
nistradores de Concelho, e em geral a todos os
cidadãos, compete-me.
1.° — Diligenciar que todos os actos eleitoraes
se façam em conformidade das disposições da lei.
2.° — Assegurar a mais completa liberdade nas
eleições.
3.° —- Remover todo o genero de abusos, violen
cias, fraudes e intrigas, ou meios de subôrno.
4.° — Reprimir tumultos, prepotencias e falsifi
cação de votos; seja quem for que promôva ou
empregue tão odiosos recursos.
5.° — Recorrer ao unico meio da persuação pa
ra recommendar que a escolha dos eleitores re
— 599 —

caia sobre cidadãos capazes de desempenhar o dif


ficil encargo de Legislador; sem com tudo promo
vêr individualmente qualquer candidatura.
Eis a substancia das instrucções que o Governo
de S. Magestade dá aos seus Delegados, e que
aliás quadram perfeitamente ás minhas naturaes
tendencias.

Antevejo pois que não será muito ardua a minha


missão na proxima lucta eleitoral. Não me inspira
sentimento algum de interesse pessoal, e lido com
um povo civilisado, que respeita a lei, e está ha
bituado aos meios pacificos e de ordem.
Tenho a completa certeza de que todos os actos
eleitoraes se hão de fazer em conformidade da lei;
tal he a confiança que deposíto na rectidão das
Camaras e Authoridades, bem como no bom juizo
dos cidadãos do Districto a meu cargo.
Comprazo-me igualmente de acreditar que nem
uma só pessoa, nem uma só das parcialidades po
liticas, commetterá o desatino, ou antes o crime,
de recorrer a esses meios de violencia ou de frau

de , que roubam á votação o caracter de verdade,


sem o qual nada mais he do que uma prostitui
ção do mais precioso dos direitos, — Se porém,
contra toda a expectativa, se offerecer a triste ne
— 600 —

cessidade de reprimir excessos de qualquer natu


reza, não hesitarei um só momento em cumprir
com o meu devêr.

No que toca á recommendação que o Governo


faz aos seus Delegados, para que elles illustrem
a intelligencia dos eleitores, e a esclareçam por
meies suasorios, a fim de que a sua escolha não
venha a recair sobre individuos destituidos do ver
dadeiro merecimento de um Legislador — pouco
he necessario fazer; porque, sobre ser óbvio o
quanto convem de escrupulo na escolha de um
Deputado, a circular do Governo assaz se explica.
neste particular. Bastará pois ponderar o seguinte:
O cidadão, que fôr eleito Deputado, vae ao seio
da Representação Nacional advogar os interesses
da nação em geral, não menos que os especiaes
dos seus constituintes. Em que occasião porém to
ma elle sobre seus hombros esse pezado encargo?
No momento em que os portuguezes se desemba
raçáram apenas dos trances e horrores da guerra
civil — no momento em que sangram ainda as fe
ridas da malfadada patria — no momento em que
são precisos prodigios de prudencia, de dedica
ção, de sabedoria, para reconciliar a familia por
tugueza, desobstruir as fontes da riqueza publica,
— 601 —

e abrir aos povos os caminhos da sua prosperidade.


Quanto pois de profundo saber, de consummada
prudencia, de fervoroso patriotismo, de nobre de
sinteresse, não demandam estas circunstancias na
pessoa de um Deputado ás proximas Côrtes ?
Meditem attentamente os povos sobre isto, e co
nhecerão que mal lhes irá , se a eleição de De
putados não for guiada pelos dictames da severa
razão, e pelo pensamento sincero de melhorar os
destinos do nosso paiz.
Palacio do Governo Civil no Funchal, aos 5 de
Outubro de 1847. — José Silvestre Ribeiro.

_-\-\">

FUNCÇÕES E GERENCIA MUNICIPAES.

A Camara do Funchal.

Primeira Repartição — N.° 57 — Lº 4.°


— fllm." Snr. — Em uma das ultimas sessões
do Conselho de Districto apresentei eu o of
ficio dessa Camara de 2 de Novembro findo,
no qual a Camara pedia ser relevada da im
putação, que póde advir-lhe de não terem
— 602 —

sido apresentadas em tempo competente as


contas da mesma Camara, e exigia a desi
gnação d'um prazo rasoavel, dentro do qual
houvesse de prestá-las.
Dizia a Camara nesse oficio que a Com .
missão que precedeu a Camara actual não pres
tou contas em Julho ultimo, como devêra,
por que entrando no exercicio de suas func
ções não achou em dia a escripturação; e que
depois de ser posta em dia se descobrio o al
cance do ex-thezoureiro &c.
O Conselho de Districto, unanime em sen
timentos neste particular, lamentou profun
damente as irregularidades que esta declara
ção da Camara patenteia , não menos que as
consequencias deploraveis que dessas irregu
laridades seguem necessariamente.
Sem pertender exacerbar o desgosto que
a Camara actual ha de por certo ter experi
mentado com as dezagradaveis occorrencias
que deixa entrever no seu oficio, he de meu
dever communicar á Camara que o Conselho
de Districto achou de absoluta conveniencia ,
e até de necessidade, que a Camara lhe ti
vesse já apresentado um relaterio, assaz ex
plicito e circunstanciado, no qual fossem nar
rados com o devido desenvolvimento os factos
— 603 —

que apenas podem ser conjecturados, attentº


a conciza expozição da Camara.
E com efeito, reflexionou o Conselho que
nada ha tão incurial como o facto de não es
tar em dia a escripturação de uma Camara,
de tal importancia e avultada gerencia como
a do Funchal. O Conselho mostrou impacien
tes desejos de saber, 1º quaes providencias
empregou a Camara para compellir os em -
pregados a terem a escripturação em dia, e
o Thesoureiro a prestar as contas no devido
tempo; 2.° como era fiscalisada a contabili
dade municipal sem haver escripturação em
dia , achando-se onerado o município com uma
divida de mais de doze contos de reis, e pa
rando alias em poder do Thesoureiro fundos
tão avultados, 3.° quaes providencias tem a
Camara adoptado para vir no conhecimento
do verdadeiro alcance do Thezoureiro, para tor
nar efectiva a sua responsabilidade, haver a
importancia do alcance, bem como para pro
mover o castigo de quem quer que por omis
são ou commissão tenha contribuido para es
te desagradavel estado de cousas.
Sabe o Conselho que os membros da actual
Camara não estão implicados no escandaloso,
quanto nocivo extravio des dinheiros munici
— 694 —

paes, nem tão pouco nas irregularidades, des


leixo, e imperdoavel incurta com que foram
procedentemente administrados os rendimen
tos, e dirigidos os negocios municipaes; mas
he certo, que á Camara actual incumbe o
imperioso dever de deslindar este assumpo —
o imperioso dever de promover o conheci
mento mais claro, evidente e comprobativo
do mal que se fez, com a designação das
pessºas que o fizeram — o imperioso dever
de apresentar ao Conselho de Districto uma
exposição franca e circunstanciada de tudo o
que encontrou, do que tem feito, e do re
sultado das suas diligencias — e finalmente o
imperioso dever de encaminhar as cousas ao
melhoramento indespensavel, ou já empregan
do providencias ao seu alcance, ou solicitan
do-as d’este Governo Civil, ou de quem con
vier.
A Camara não ignora que se trata de um
objecto, que por todos os lados se apresenta
dezagradavel, e fertil em inconvenientes. Co
mo ha de a opinião publica olhar para o extra
vio de dinheiros municipaes? Como ha de en
carar-se sem profundo dissabor o facto de que
a escripturação de uma Camara como a do
Funchal não estivesse em dia ? Que se dirá
* – 605 —

quando se notar que as contas da sua gerem


cia não foram apresentadas em Julho findo,
porque era impossivel apresental-as em conse
quencia do cahos da administração municipal,
e do criminoso desleixo na escripturação?
Que se ha de dizer quando no cabo de algumas
indagações se descobre um grande alcance, e
nessa mesma occasião, e em seguimento, e ain
da muito depois, se apresentam as amas dºs
expostos a reclamar o seu salario, e a pedirem o
sustento de infelizes crianças, ja quasi mortas
de innanição? Que ha de responder o Gover
no Civil as Camaras Municipaes que vem to
dos os dias solicitar o pagamento das quotas
que lhes arbitrou a Junta Geral de Districto
para a sustentação dos respectivos expostos ?
Só tem uma resposta a dar-lhes, e he esta:
« A Camara do Funchal deve ao Cofre dos
expostos uma arultada somma , e como cila
não póde pagar a esse Cºfre, vêde se encon
traes na vossa philantropia alguns recursos pa
ra acudirdes ás amas das malfadadas crian
cunhas; e se não deixai-as morrer á ..... »
... Não me atrevo a terminar a resposta.
Tenho até aqui ºferecido á consideração
da Camara as ponderações que se fizeram em
uma das ultimas sessões do Conselho de Dis
— 606 —

tricto. A minha exposição he singelamente


traçada segundo a lembrança do que se dis
correo a semelhante respeito, e tem por fim,
Segundo a deliberação do mesmo Conse
lho, chamar a attenção da Camara sobre
este melindroso negocio, e solicitar os es
clarecimentos de que acima falei.
Se particularmente me fosse permittido
acrescentar alguma observação ao que fica
expendido, eu ousára ponderar á Camara,
no sentido, se posso assim dizer, o mais ami
gavel: que sendo a sua situação immensamente
ardua e melindrosa, deve na proporção d'es
sas difficuldades crescer o seu zelo e fervor
em dar o mais prompto e etficaz remedio ás
cousas; — e que finalmente he nas occasiões
apuradas — que o amor da patria, o brio
pessoal, e direi até o amor proprio dos indi
viduos, se empenham fortemente em adop
tar providencias salvadoras, em recorrer a ex
pedientes felizes.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Go
verno Civil no Funchal, aos 17 de Dezem
bro de 1846. — Illmº Snr. Presidente da
Camara Municipal do Funchal — O Gover
nador Civil, José Silvestre Ribeiro.
— 607 —

Circular ás Camaras.

1.° Repartição — Lº 4.° —N.° 180. — Circular.


— Illm." Snrs. — Uma providencia foi tomada ulti
mamente ( em 8 de Novembro do anno findo ) pelo
Governo de Sua Magestade, que deve ser acolhida
com o mais vivo interesse, como encerrando os
mais fecundos elementos para traçar a historia do
nosso paiz. He por este motivo, e convencido da
grande utilidade de uma tal providencia, dictada
por um pensamento eminentemente civilisador e

patriotico, que eu me dou por obrigado a recom


mendá la a todas as Camaras do Districto a meu
cargo, solicitando com apertada instancia a sua
adopção.
Entendêo o Governo de Sua Magestade que « em
cada uma das Camaras Municipaes dos Concelhos
do Reino e Ilhas Adjacentes deve haver um Livro
especial com a denominação de Annaes do Munici
pio —, no qual annualmente se consignem os acon
tecimentos e os factos mais importantes que occor
rem, e cuja memoria seja digna de conservar-se, e
bem assim os descobrimentos de riquezas, substan
cias e combustíveis mineraes; — o augmento ou
diminuição da producção agricola, e suas causas;
— 608 —

— a longevidade das pessoas de que houver noti


cia, com a declaração do modo de vida que ti
veram, e do seu alimento habitual: as acções
generosas, e os nomes dos seus authores, que
mereçam ser transmittidos ás gerações futuras; —
e finalmente tudo quanto possa interessar as tra
dicções locaes. » |

Para se conseguir este fim ordena o Governo de


Sua Magestade « que os Presidentes das Camaras
nomêem uma commissão composta de alguns ve
readores, ou vogaes do Concelho Municipal, que
forem julgados mais aptos, a qual em todos os
annos, no principio do mez de Março, e depois
das reuniões necessarias, redigirá uma memoria
que contenha as noticias e esclarecimentos acima
indicados, e que sendo lançada em letra bem legi
vel no referido livro, que se guardará cuidadosa
mente no archivo da Camara, será assignada por
todos os vogaes da commissão. » -

Não he necessario gastar muito tempo, nem fa


zer grandes exforços de argumentação para de
monstrar as vantagens desta providencia, que as
saz se inculca ella per si mesma. — Se as Camaras
desempenharem zelosamente, como lhes cumpre,
esta nova incumbencia, tenho por certo que as SC
— 608 –

rações futuras encontrarão nesses Annaes uma fon


te de conhecimentos, que até agora estava occul
ta — uma preciosa mina de noticias, que o histo
riador lavrará com proveito — documentos seguros
que darão authenticidade ao que se contar do passado.
Leiam-se os nossos historiadores, e conhecer-se
ha o quanto embaraçados se encontráram no meio
da deficiencia de noticias! Guiou-os por vezes a tra
dicção, mas quanto fallivel não he esse testemunho ?
Os nossos maiores pão se davam ao trabalho de con
fiar pela escriptura á lembrança, á admiração, e
ao exemplo dos vindouros os successos de que fôram
testemunhas, ou actores; e aqui vem a pêllo aju
diciosa censura do nosso insigne João de Barros:
— « E vendo eu que nesta diligencia de encommen
« dar as cousas á custodia das letras (conservado
(
ra de todalas obras), a Nação Portuguez he tão
<( descuidada de si, quão prompta, e diligente em
(( os feitos, que lhe competem per milicia, e que
mais se préza de fazer, que dizer ; quiz nesta
((
parte usar ante do oficio de estrangeiro, que da
« condição de natural. »
Afóra este ponderoso inconveniente, outro havia
de mui grave momento. O espirito philosophico não
ilustrava ainda a humanidade; de sorte que as chro
— 610 –

nicas antigas pouco mais continham do que a mar


ração, por vezes emphatica e exagerada, de proe
zas bellicas, de panegiricos de guerreiros, de con
tos supersticiosos. Cada pagina desses escriptos, ou
goteja sangue, e inspira horror, — ou bem pouco
contém que derrame luz sobre a marcha da civili

sação dos povos.


Qual dessas historias nos apresenta noticias cir
cunstanciadas sobre os Tratados de Commercio,
suas vantagens, inconvenientes º influencia que pro
duziram? Qual dellas nos dá uma idea cabal do es
tado em que se achavam entre nós a agricultura, a
industria, o commercio, as artes, as letras e sci
encias, e a navegação, num determinado seculo
ou periodo? Em qual dellas se assignala caracteris
ticamente a marcha progressiva, ou retrograda, ou
estacionaria do povo na moral, na religião, nos
bons costumes, na polidez, no amor do trabalho,
etc. etc ? Qual dellas nos subministra o conheci
mento desses bellos rasgos de generosa dedicação,
que tamanha honra fazem á humanidade, mas que
pela maior parte ficam ignorados, quando não são
praticados nos palacios dos Reis, ou dos grandes
da terra ?
Deixando porém estas observações geraes, e tra
— 611 —

tando unicamente da hypothese que me occupa,


não posso dispensar-me de ponderar o quanto de
vantagens ha de colhêr o Districto da Madeira e
Porto Santo, no que toca á sua historia, da confec
ção annual da Chronica, Registo, ou Annaes, que
o Governo tão providentemente manda organisar.
Já la vão quatro seculos desde que a Madeira e
Porto Santo foram descobertas; e perguntarei eu —
teremos acaso os elementos necessarios para cscre
ver com todo o desenvolvimento a historia destas

duas possessões portuguezas em cada um dos qua


tro seculos? Por certo que não, se attendermos a
que a historia, tal qual he comprehendida nos tem
pos modernos, deve satisfazer á curiosidade do es
pirito em todos os pontos que dizem respeito ao
bem e aperfeiçoamento da especie humana. E com
virá acaso que as gerações futuras tenham em le
gado, em vez de amplas noticias, a ignorancia em
que quasi de todo nos deixaram as passadas?
Tomemos para exemplo o anno que acaba de su
mir-se nas profundezas do tempo, o anno de 1847.
Quantos factos não occorreram nesta Ilha durante
elle, que seria lastima não consignarmos exten
sa e authenticamente em escriptura para conhe
cimento dos vindouros? Padecemos algum flagél
— 612 —

lo. commettemos erros, démos algum passo no ca


minho da civilisação, occorreo algum acontecimen
to notavel?.... Pois encommendemos tudo isso á
custodia das letras, quer para gloria ou escarmen
to dos que vivem, quer para instrucção dos que
hão de viver depois de nós.
Penétrem-se pois as Camaras das vantagens da
providencia do Governo, e empreguem na sua exe
cução o zelo que as deve inspirar em tudo quanto
he proveitozo aos seus administrados. — Nomeiem
desde já Commissões de 3 ou 5 membros, escolhi ,
dos d’entre os vereadores e vogaes do Conselho
Municipal, que mais proprios parecêrem pelas su
as habilitações litterarias, habito de escrever, pa
ciencia de recolher noticias , curiosidade e crite
rio de indagação. Comecem essas Commissões a col
ligir desde já apontamentos sobre todos os factos
notaveis que occorreram nos respectivos municipios
no discurso do anno findo de 1847, dignos de serem
perpetuados na memoria dos homens; sobre o pro
gresso ou decadencia da agricultura, e suas cau
Saº , - sobre os descobrimentos que se fizeram,
seja qual fôr o seu objecto, uma vez que possam
tender ao desenvolvimento da publica prosperida
de ; — sobre casos de longevidade, que apresen
— 613 —

tem circunstancias ponderosas, e subministrem ele


mentos hygienicos proveitosos á conservação da sau
de e da vida — e em uma palavra, como diz o
Governo de Sua Magestade, sobre tudo quanto pos
sa interessar as tradicções locaes,
Colligidos assim esses apontamentos, deverão as
Commissões reunir-se no primeiro dia do mez de
Março proximo futuro (e nos annos seguintes em
igual dia) para redigirem a Memoria, que o Gover
no de Sua Magestade recommenda, e se seguirem
os demais termos que elle insinúa.
Espero afoutamente que as Camaras prestarão a
esta incumbencia a mais séria attenção, devendo
eu preveni-las de que por minha parte estou disposto a
prestar-lhes todo o genero de coadjuvação, inclu
indo a concessão de quaesquer esclarecimentos of
ficiaes da Secretaria d’este Governo Civil. — Deus
Guarde a V. S." — Palacio do Governo Civil no
Funchal aos 3 de Janeiro de 1848. — Illm." Srs.
Presidente e demais Membros da Camara Munici
pal de...... O Governador Civil, José Silvestre
Ribeiro,
— 614 —

As Camaras Municipaes.
1.° Repartição — Lº 4.° — N.° 203 —
Circular — Illm.º Snr. — Tenho visto com
summo desprazer qne na generalidade (salvo
as honrosas excepções) não correm os nego
cios municipaes do Districto a meu cargo,
com a regularidade e bons termos, que se
tornam indispensaveis em serviço de tamanha
ImOnta.

Aqui não se reunem os vereadores no dia


da sessão; acolá he o Escrivão da Camara
quem parece ter o monopolio da direcção
dos negocios; em um dado Concelho estão por
pagar ha longos mezes as amas dos expostos
ou os empregados municipaes; em outro es
tá desordenadamente lançada a escripturação;
não he raro ver os caminhos publicos em
pessimo estado — thesoureiros alcançados —
os cofres municipaes exhaustos; e como con
sequencia fatal de tudo isto a desordem, o
desarranjo de cousas que tão de perto inte
TCSS8 In a OS povos.
Este mal deve ser remediado, e ceder
o passo ao bom andamento do serviço; aliás
he melhor acabar com a esteril ostentação
de um maquinismo complicado e dispendioso,
— 615 —

Tratemos de entrar seriamente no cami


nho qne a lei e o dever nos traçam.
Porque motivo não serão assiduos em com
parecerem nas sessões os eleitos do povo? A
não ser uma impossibilidade absoluta, provo
niente de molestia, ou de uma circunstancia
grave e independente da vontade, nenhuma
escusa, nenhum pretexto se quer, póde dar
se para que o homem de honra, a quem os
seus concidadãos distinguiram com a mais li
songeira confiança, em quem o povo deposi
tou as suas mais ardentes esperanças, se
subtráia ao trabalho de ir advogar os inte
resses da communidade. — Não sois remune
rados com dinheiro. ? He verdade; mas tem
des em recompensa um salario infinitamente
mais apreciavel, qual he o prazer de serdes
uteis aos vossos conterraneos, — de contri
buirdes para os melhoramentos da vossa ter
ra — de tomardes parte na governança pu
blica.
Os Escrivães das Camaras devem tomar o
seu logar, sem jamais arrogarem faculdades
ou preponderancia, que forem álém das at
tribuições que a lei lhes fixa. — Os Escri
vães da Camara teem preenchido os seus de
veres, se cuidarem escrupulosamente da guar
— 616 —

da do archivo, se procurarem manter a boa


ordem e regularidade dos trabalhos da Se
cretaria, se trouxerem em dia o serviço da
sua repartição, se estiverem habilitados para
fornecer, e de feito fornecerem, quando fôr
occasião, os esclarecimentos que a Camara
lhes peça. — Os Escrivães das Camaras estão
no circulo legal das suas attribuições, em
quanto assistem ponctuaes ás sessões, lavram
as actas, fazem todo o serviço do expediente
que lhes he ordenado, subscrevem os actos
legaes, e exercem as funcções de que forem
encarregados pelas posturas da Camara, ou
ordens do Presidente. — Desempenhando fiel
e zelosamente esses deveres, os escrivães con
servam-se no seu devido posto; mas se qui
zerem exercer outro genero de influencia,
entram nos dominios da uzurpação, e ex
põem-se a que uma Camara, conhecedora
das suas regalias, lhes embargue os passos,
ou provoque uma severa contemplação.
Como he possivel que marchem regular e
satisfactoriamente os negocios do municipio,
se as Camaras deixarem de satisfazer em
devido tempo os seus encargos? como pode
esperar-se que as infelizes amas dos expos
tos sustentem carinhosamente, e com pro
— 617 —

veito, as malfadadas creaturinhas, que lhes


foram dadas a crear, se decorrêrem longos
mezes sem que se lhes pague? Como hão de
prover á sua subsistencia, ou com qual ani
mação poderão trabalhar os funccionarios do
municipio, quando não perceberem por gran
de espaço de tempo o seu salario ? — « Mas
as Camaras teem difficuldades em obter meios
de pagamento.... » Sim, mas a questão he
vencer essas difficuldades, he trabalhar in
cessantemente, he empregar todo o genero de
exforços para obter rendimentos, e efeituar
eobranças. Dentro dos limites da justiça toda
a severidade e rigor para os devedores; to
da a economia compativel com as necessida
des municipaes; perseverança nos planos en
cetados; consagrar ao descobrimento dos meios
de felicitar o municipio longas sessões e não
uma reunião pro fórma, na qual só sobre
sahe a nimia pressa e insofrida impaciencia
dos vereadores; eis a fonte onde as Camaras
pódem encontrar recursos.
As Camaras administram os rendimentos
dos municipios — a sua gerencia tem por ob
jecto fundos alheios, de que hão de dar exac
tissimas contas. E como poderão desempe
nhar-se d’este melindroso encargo, se a es
— 618—

cripturação que lhes respeita, ou fôr desor


denada, ou deficiente? — He tão facil pôr
em ordem a escripturação municipal! — As
Camaras teem receita e despeza; aquella he
ordinaria ou extraordinaria; e o Codigo bem
circunstanciada e claramemte define a natu
reza de uma e outra nos artigos 135 e 136;
— esta he obrigatoria ou facultativa, e com
todo o desenvolvimento he caracterisada es
ta distincção nos artigos 133 e 134. Entre
as fontes da receita figuram as contribuições
municipaes directas e indirectas; como pódem
e devem ser lançadas umas e outras, com
toda
145. a clareza o explicam os artigos 137 a
• •

No que toca aos orçamentos e contabili


dade não poderia o Codigo ser mais explici
to do que o he nos artigos 147 a 155, e
156 a 163. •

A intervenção do Conselho Municipal está


fixada nos artigos 170 a 172.
Determinada pois esta classificação tão me
thodica, e definidas com tal clareza as func
ções financeiras da Camara, só resta enca
minhar as cousas no sentido de dar á escri
pturação o mesmo caracter de regularidade,
exactidão, e secera probidade, que conviria
— 619 —

a uma bem acreditada casa de commercio.—


Qual não deve ser a satisfação de uma Ca
mara, quando o Conselho de Districto, por
occasião de examinar as suas contas annuaes,
encontra bem lançada a receita, devidamen
te desenvolvida e documentada a despesa,
uma perfeita combinação entre a receita ge
ral e as diversas contas correntes, todas as
verbas da despesa justificadas e assentando
em disposição da lei e nos verdadeiros inte
resses municipaes; nem uma só das formulas
e prescripções legaes preteridas!
He do brio das Camaras tornarem sensi
vel e evidente a sua acção governativa, por
meio de melhoramentos do município, ou pe
lo menos, da cuidadosa conservação dos ca
minhos e estabelecimentos confiados ao seu
cuidado e inspecção. — Solicitar a applica
ção de ordenanças, promover a concorrencia
dos moradores para obras de sua utilidade,
acudir a tempo a certos reparos que mais
tarde seriam muito despendiosos, vestorisar
tudo e não se limitar a informações que nem
sempre são exactas.... eis o que neste par
ticular incumbe ás Camaras.
A escolha de bons thesoureiros he ob
jecto de grave ponderação. São eles os uni
— 620 —

cos encarregados de receber e arrecadar to


dos os rendimentos municipaes do concelho,
e de pagar todas as despesas devidamente
ordenadas; bastando este só enunciado, in
dependentemente da responsabilidade que a
lei impõem aos vereadores por qualquer ex
travio da fazenda municipal, para induzir
as Camaras a escrupulisarem muito sobre uma
tal nomeação, e sobre a idoneidade das fi
anças. •

Faço votos para que não sejam estereis


as ponderações que deixo expostas; e queren
do, quanto em mim cabe, aligeirar o pezo
da ardua tarefa que a lei commette ás Ca
maras, passo a oferecer á consideração das
mesmas uma seria de principios geraes, e de
resoluções oficiaes, que pódem servir-lhes de
grande auxilio no exercicio de suas funcções:
1.° — Nenhum acto de authoridade, por
mais graduada que seja, he ligitimo, e pó
de ter efeito, quando não he conforme com
a lei, por que ninguem ha que lhe seja
superior. •

2" — A acção das Camaras Municipaes


não he suprema e absoluta na sociedade;
está pelo contrario restricta aos objectos que
pelas leis são da sua competencia. — Só nos
+ — 621 —

pontos de sua legal competencia pódem en


tender, consultar, e representar ás authori
dades superiores; e todo o acto que exceder
estes limites he manifesto excesso de authori
dade, e uzurpação de poder alheio.
3.° — As Camaras não teem hoje nenhum
caracter politico, nem nenhuma interferencia
no Governo publico da sociedade geral.
4.° — He conveniente guardar sempre os
bons estilos de delicadeza e polidez, quando
elles sem ofensa da Lei pódem contribuir
para a manutenção da harmonia, regularida
de e bom andamento do serviço publico.
5.° — Nenhuma injuria irroga a qualquer
corpo ou authoridade inferior a deliberação
tomada pelos superiores, quando esta por
lei esteja na esphera das suas attribuições.
6.° — Ante o serviço publico devem em
mudecer todas e quaesquer indisposições par
ticulares.
7.° — Se o vereador que recusa servir
foi legalmente eleito, a sua eleição está vali
da, perfeita, e em vigor, e não póde veri
ficar-se em outro; e se fôr injusta a sua re
cusa do serviço, deve proceder-se contra elle
na conformidade da lei. — Portaria do Mi
nisterio do Reino de 3 de Fevereiro de 1844.
— 622 — •

8.° — Ao Conselho de Districto, e não á


Camara pertence conhecer da escusa pedida
por um cidadão nomeado Juiz de Paz pelo
Conselho de Districto, por se haverem veri
ficado as circunstancias previstas nos artigos
90 a 93 do Codigo. — Portaria do Ministe
rio do Reino de 12 de Agosto de 1843.
9º – A disposição do artigo 278 N.° 2 do
Codigo deve reger tanto na hypothese da elei
ção, como da nomeação para os cargos mu
nicipaes. (Idem).
10.° — As escusas de cidadãos eleitos para
cargos administrativos são só relativas ás rec
leições do mesmo cargo, e não pódem ter
logar quando o serviço anterior foi prestado
em emprego diferente, posto que da mesma
ordem administrativa; por que as escusas,
como privilegios, só pódem ser estatuidas por
disposição expressa da lei. — Portaria do
Ministerio do Reino de 2 de Março de 1839.
11.° — O art. 112 do Codigo, posto que
litteralmente só falle dos impedimentos, deve
com tudo, segundo os principios de Jurispru
dencia, applicar-se a todas as faltas, qualquer
que
— 3seja
de oFevereiro
motivo pordeque elas se verifiquem.
1844. • •

12.° — A nenhuma Camara póde ser licito


– 623 —

provocar a sua dissolução, para assim se es


quivar ao desempenho das obrigações que a
lei impõe; porque sómente ao Governo com
pete ajuizar das circunstancias em que este
acto deve ter logar.
13.° — Aos corpos administrativos foi com
mettido o juizo sobre a legitimidade ou ille
gitimidade das faltas de alguns membros nas
respectivas sessões, e por isso aos mesmos
corpos pertence authorisar a ausencia, e ap
provar as ditas faltas como procedentes de
causa legitima. Portaria do Ministerio do Reine
de 22 de Junho de 1839.
14.° — A disposição do art. 112 do Co
digo não exclue aquelles vereadores que per
tencêram ás Camaras dissolvidas, por que a
dissolução, não tendo efeito retroactitivo, nem
invalidando os actos anteriores, não priva esses
vereadores da qualidade que já tinham ad
quirido pela sua eleição e serviço, qualidade
a que a lei só attendeo para determinar as
substituições futuras; e assim como os mem
bros das Camaras dissolvidas não ficam inha
beis para nova eleição, assim por identidade
de razão, não devem reputar-se inhibidos da
substituição que lhes tocar, segundo a lei.
Portaria de 31 de Janeiro de 1844.
— 624 —

15.° — Os privilegiados do Tabaco e Sa


bão, cujos privilegios, estipulados em con
tractos onerósos, constituem uma parte d’elles,
não pódem ser obrigados ao serviço da subs
tituição dos vereadores, embora houvessem
antes renunciado ao uso do seu privelegio,
acceitando o cargo de vereadores em virtude
da eleição popular, por que tal renuncia,
nesse caso particular, não importa a perda
perpetua do do
de Janeiro seu 1844.
privilegio. Portaria de 31
• |

16º — Na regra geral do artigo 122 do


Codigo comprehende-se o caso de recurso das
Camaras para o Conselho de Districto sobre
objectos de nomeação de empregados mera
mente municipaes. Portaria do Ministerio do
Reino de 12 de Fevereiro de 1844.
17.° — Em regra geral os membros de
qualquer corporação electiva pertencentes á
Administração Publica ou Municipal, são sup
pridos em seus impedimentos legitimos pelos
que serviram no mesmo corpo nos annos an
tecedentes.
18.° — O parentesco dos escrivães das
Camaras com os vereadores d’ellas não inha
bilita a estes do exercicio da vereação, que
devidamente lhes competir na conformidade
— 625 —

da lei. Portaria do Ministerio do Reino de


31 de Maio de 1844,
19" — — Os vereadores, que ao mesmo
tempo forem os maiores contribuintes do Con
celho, são impedidos de formar parte do Con
selho Municipal, e devem ser substituidos em
numero igual pelos contribuintes immediatos.
Portaria do Ministerio do Reino de 14 d'Abril
de 1842.
20.º — Os vereadores das Camaras Mu
nicipaes pódem ser eleitos procuradores á Junta
Geral do Districto. Portaria do Ministerio
do Reino de 20 de Janeiro de 1845.
21.° — Os emolumentos são equiparados aos
tributos, e não póde por isso jámais ampliar
se a disposição da lei a respeito delles; e por
tanto só os marcados nas tabellas pódem ser
recebidos, e sómente por aquelle empregado,
a quem expressamente são concedidos.
22.° — O emolumento de 480 reis por cada
Alvará de Licença para venda, passado pelas
Camaras, não póde exigir-se integralmente
pelas licenças de tres, seis, ou nove mezes,
e só póde exigir-se na proporção do tempo a
que ellas se referirem , e em razão da quan
tia marcada na lei. Portaria do Ministerio do
Reino de 27 de Agosto de 1844.
— 626 —

23.° — Sendo os emolumentos a recompen


sa do trabalho prestado, pertencem por isso
áquelle empregado que está no efectivo ser
viço do emprego, posto que seja interina
mente e por impedimento qualquer do proprie
tario — exceptuam-se os Secretarios Geraes,
que não ficam privados dos seus emolumen
tos quando servem interinamente de Gover
nadores Civis. •

24.° — As Camaras pódem, sem ofensa


da lei, alterar, por meio dos seus orçamen
tos annuaes, os ordenados dos empregados do
municipio, salva a approvação dos respectivos
Conselhos de Districto, que como corpos de
liberantes e dentro dos limites da sua com
petencia, decidem em ultima instancia; sem
que obste, dando-se diminuição de ordenado,
e o pagamento dos direitos de mercê, como
não obsta á diminuição dos ordenados de todos
os funccionarios publicos, por que não ha a
attender aos direitos que suppunham adquiri
dos por aquelles empregados, e sim ás ne
cessidades e maior conveniencia do serviço, e
ás forças dos rendimentos municipaes: enten
dendo-se que se a diminuição se verificar an
tes de chegar o empregado a vencer um anno
por inteiro do ordenado de que solveu direi
— 62? —

tos, lhe cabe a restituição de parte delles em


referencia ao que foi diminuido ou cerceado:
mas logo que se venceu o ordenado de um
anno completo não tem logar restituição ou
diminuição alguma. Portaria do Ministerio do
Reino de 2 de Julho de 1845.
25.° — O anno economico de que falam o
art. 1.º da Carta de Lei de 27 de Outubro
de 1841, e os artigos 146 e 162 do Codi
go Administrativo para os orçamentos e con
tas municipaes, he sem duvida alguma o an
no financeiro de Julho a Junho seguinte, se
gundo o systema adoptado para o regimen do
Estado; devendo as Camaras, que acabam,
deixar escripta toda a sua receita e despeza
no ultimo semestre, e por essa escripturação,
as Camaras que lhes succederem, poderão
prestar as suas contas daquelle semestre, re
cahindo toda a responsabilidade, que d’ellas
resultar, nos vereadores que então serviam.
Portaria do Ministerio do Reino do 1.° de
Fevereiro de 1844.
26 º — Os vereadores fiscaes devem usar
do Regimento dos Antigos Procuradores dos
Concelhos, na parte que não encontrar a ac
tual Legislação. Portaria do Ministerio do
Reino de 6 d'Agosto de 1839.
— 628 – =|

27." — As despezas do local destinado ag


serviço dos Tribunaes de Justiça são classi
ficadas pelo artº 133 Nº. 9 entre as obriga
torias dos municipios; e posto que tal dispo
sição se refira a leis particulares que não exis
tem ainda, he todavia indubitavel que o Co
digo de modo nenhum deixou a sua execu
ção dependente da existencia de taes leis, se
gundo por argumentos legaes, e pela melhor
opinião dos Jurisconsultos foi sempre entendi
do. Portaria do Ministerio do Reino de 7 de
Março de 1844.
28.° — Um dos requisitos legaes para o
aforamento dos baldios he que os terrenos af
forados sejam desnecessarios para logradouro
commum dos povos. •

29.° — Em materia de impostos as dispo


sições das leis não sofrem interpretação ex
tensiva, mas carecem de disposição expressa
que os authorise: — os impostos devem entrar
nos Cofres com o minimo desfalque e com a
minima oppressão e vexame dos contribuintes;
— oão devem afectar o pleno desenvolvimen
to das faculdades productivas; — não devem
nunca ser contrarios á moral publica; convem
que sejam cobrados nas occasiões em que o
contribuinte está mais em estado de os poder
— 629 —

pagar: não convem lançar novos tributos, em


quanto não estiverem esgotados todos os re
cursos que se pódem tirar da economia e da
boa ordem.
30° — O § 2° do art. 142 do Codigo
he explicado pela Portaria de 16 de Feverei
ro de 1843. no sentido de que são isemptos
da contribuição municipal indirecta quaesquer
porções de um genero, com quanto elle se
achasse exposto a venda em retalho, logo que
se prove que essas porções foram exportadas.
31. — N'esta parte de contribuições mu
nicipaes directas e indirectas o regulamento
mais completo que as Camaras tem a obser
var he a Carta de lei de 10 de Junho de 1843,
na qual muito terminantemente são declara
dos os artigos 135, 137 e 139 do Codigo.
32." — He direito mui certo e antigo n’es
tes Reinos, que as Camaras Municipaes
não pódem com as suas posturas, regulamen
tes ou outros quaesquer actos, prejudicar a
Fazenda Publica do Estado; e d'aqui vem
que nes termos da Portaria de 20 Dezem
bro de 1843 os generos destinados ao forne
cimento da tropa não são sujeitos aos tribu
tos municipaes indirectos; porque isso impor
taria o lançar o imposto, não sobre o consu
— 630 — º

mo individual do Concelho, mas sim sobre


o consumo publico do Estado, no que seria
prejudicada a Fazenda Nacional, sobre a qual
viria a recahir o imposto. •

33.° — As Camaras Municipaes devem mi


nistrar promptamente aos Administradores de
Concelho as informações e esclarecimentos que
por estes lhes forem pedidos, ácerca do pre
ço dos generos, quando se verificar a hypo
these da Portaria do Ministerio do Reino de
17 de Janeiro de 1846, isto he, quando
qualquer Commandante ou Authoridade Mili
tar pedir documento do preço dos generos,
necessario para a melhor fiscalisação das suas
COI)tas.
34.° — Relativamente aos « Tombos» dos
bens dos Concelhos, as Camaras devem ter em
vista a doutrina da Portaria de 8 de Junho
de 1844, segundo a qual, pelos fundamen
tos alli expostos, as despezas com os mesmos
Tombos devem seguir os mesmos meios es
tabelecidos para os dos particulares sahindo
dos Cofres Municipaes. -

35. — A Portaria do Ministerio do Reino


de 26 de Março de 1841 ordena que as Ca
maras Municipaes façam recolher ao seu ar
chivo em boa e segura arrecadação o cartorio
— 631 —

que lhes respeita; e isto por constar que al


guns Secretarios das Camaras abusivamente
conservavam nas casas da sua residencia os
cartorios pertencentes ás mesmas Camaras,
o que podia occasionar extravio de documen
tos importantes, risco de serem roubados, e
inutilisados por algum incendio, ou qualquer
outro incidente por falta de segura arrecada
ção.
Deus Guarde a V. S." — Palacio do Governo
Civil no Funchal aos 25 de Fevereiro de 1848
— Illmº Sr. Presidente e Miembros da Cama
ra Municipal de...... — O Governador Ci
vil, José Silvestre Ribeiro.

Ao Ministerio do Reina.

1.° Repartição — N.° 58 — Illm.º e Exm.º Snr.


— Em um dos meus anteriores oficios dei conta

ao Ministerio a cargo de V. Ex." de que era mi


nha intenção hir apresentando em circulares, aos
Administradores e Camaras, uma exposição desen
volvida de doutrina administrativa, procurando alem
disso reunir todas as disposições de Lei, portarias e
outros documentos, que andam espalhadas, a fim
de que aquellas authoridades e corporações tenham
— 632 —

maior facilidade de desempenhar seus deveres.


Nesta conformidade tenho hido trabalhando, e
entre as circulares desta natureza julgo indispen
savel submetter á sabia consideração de V. Exc."
uma, que enderecei nos fins do mez de Fevereiro
ultimo ás Camaras, e he a que consta do exemplar
que acompanha este oficio.
Dous parágraphos da dita circular, que passo a
transcrever, dão ideia do pensamento de toda ella:
« Aqui não se reúnem os vereadores no dia da
(
sessão; acolá he o Escrivão da Camara quem pa
« rece ter o monopolio da direcção dos negocios;
((
em um dado Concelho estão por pagar ha longos
« mezes as amas dos expostos, ou os empregados
G
municipaes; em outro está desordenadamente lan
((
çada a escripturação; não he raro ver os cami
((
nhos publicos em pessimo estado — thesoureiros
((
alcançados — os cofres municipaes exhaustos; e
( como consequencia fatal de tudo isto a desordem,
((
o desarranjo de cousas que tão de perto interes
(
sam os povos. »
« Este mal deve ser remediado, e ceder o passo
«…ao bom andamento do serviço; aliás he melhor
« acabar com a esteril ostentação de um maquinis
« mo complicado e dispendióso.»
— 633 —

Oxalá que na circular, de que tenho a honra de


remetter um exemplar, eu haja, no conceito de V.
Exc.", preenchido cabalmente o fim a que me pro
puz, qual foi o de assignalar o mal, a conselhar
o bem, e propor os convenientes remedios, bem
como recopilar uma série de principios e de resolu
ções oficiaes, que, reunidos em um só corpo, tem
dem a auxiliar as Camaras no exercicio das suas
funcções.
Se a doutrina, e theor de exposição da dita cir
cular, merecêrem a approvação de V. Exc.", dar
me-hei por muito feliz, ao mesmo passo que essa ap
provação dará mais força ás minhas palavras. (…)
Deus Guarde a V. Exc.° — Funchal 16 de Abril
de 1848. — Ill." e Exc.ºº Snr. Ministro e Secre
tario d'Estado dos Negocios do Reino — O Gover
nador Civil, José Silvestre Ribeiro.

"…) Vede a portaria lançada a pagina 338.


— 634—

JUNTA GERAL DO DISTRICTO.

O Governador Civil do Districto Admi


nistrativo do Funchal Sc.
Sendo conveniente que os trabalhos que em
Junho proximo futuro hão-de sêr presentes á
Junta Geral do Districto, nos termos da Lei,
se vão preparando com a maior antecipação
possivel: •

Sendo outro-sim certo, que pelo motivo


da minha curta residencia neste Districto, se
me torna difficil comprehender desde já as
especialidades que a respeito da Junta Geral
do mesmo Districto se verificam, taes como
o serviço das estufas &c., tanto mais quanto
he indispensavel conhecêr os fundamentos das
primittivas resoluções a semelhante proposito,
saber o que se tem feito, qual a direcção que
se tem dado a este serviço, e a tendencia que
agora cumpre imprimir-se-lhe:
Resolvo nomear no seio da Secretaria do
Governo Civil uma commissão composta dos
Snrs. Antonio Jacinto de Freitas, Luiz de
Ornellas, e Luiz Vianna.
Esta commissão começará por examinar
*

>
— 635 —

immediatamente as actas e consultas da Jun


ta Geral do Districto desde o anno em que se
estabeleceo o serviço das rodas, e o imposto
sobre as estufas até ao presente.
Reduzirá a termos claros todas as disposi
ções que encontrar a semelhante respeito, for
mando dellas uma exposição methodica; e
em seguimento apresentará um quadro das
disposições que segundo a deliberação da Jun
ta regúlam para o corrente anno economico.
Formara uma conta de tudo quanto a Jun
ta Geral está devendo atégora, classificada por
annos, com as convenientes declarações que
mostrem evidentemente a naturesa das dividas,
e o seu fundamento — e apresentará outro sim
o seu juizo sobre a ordem em que essas di
vidas devem ser pagas, a fim de que a pre
ferencia nesta parte assente em justificadas
Tazões.
Apresentar-me-ha igualmente um relato
rio sobre o estado da cobrança dos rendimen
tos da Junta, acompanhado de uma exposi
ção das providencias que no seu entender de:
vem ser adoptadas para apressar essa cobran
ça, e conseguir-se que no cofre da Junta en
tre com a maior brevidade possivel a maior
somma dos seus rendimentos.
— 636 –

Appresentar-me-ha outro-sim uma memo


ria sobre o melhor modo de desempenhar as
ultimas deliberações da Junta Geral acêrca
das obras publicas da sua competencia; em
ordem a que eu possa saber o systema e me
lhor methodo que deve seguir-se na execução
das ditas deliberações, e se evitem algumas ir
regularidades que a practica tenha apresentado.
Outro sim me apresentara um quadro das
despezas que a Junta authorisou ou abolio
ultimamente.
Em uma palavra, a Commissão tratará de
estudar tudo quanto he relativo ás deliberações.
da Junta Geral — seus rendimentos — cobran
ça — dividas activas e passivas, e sua clas
sificação — quaes os meios de promovêr a co
brança daquellas, e motivos de preferencia
no pagamento das outras — providencias ne
cessarias para bem encaminhar as obras pu
blicas da competencia da Junta &c.
E se por ventura lhe fôr necessario con
sultar sobre este assumpto alguns membros
da Junta Geral, ou Camaras, ou Adminis
tradores de Concelho, a Commissão fica au
tholisada a faze-o. — Dado no Palacio do Go
verno Civil no Funchal, aos 19 de Dezembro
de 1846. — José Silvestre Ribeiro.
MAPPA resumido do estado da Caixa da Junta Geral do Districto do Funchal, durante a Administração de Sua Exc." o Snr.
Conselheiro Governador Civil, José Silvestre Ribeiro, desde o dia 3 d’Outubro de 1846 até 28 d'Abril de 1847 ; — e desde 26 de
Julho do mesmo anno te a presente data; dando-se tambem esclarecimento da Receita e Despesa feita na interrupção do Governo do
mesmo Exmº Snr., de 29 d'Abril até 25 de Julho de 1847.

{
Estado da Caixa desde 3 de Outubro juntº governativa Estado da Caixa desde 26 de Ju
de 1846, até 28 de Abril de 1847. Estado da Caixa desde 29 de lho de 1847 até 7 de Fevrº de 1848
Abril de 1847 até 25 de Julho d."

Entrada Sahida Em sêr Entrada Sahida Em sêr Entrada Sahida Em sêr

2, 178:389 | 1,431:945 | 746:444 1,077:312 | 830:638 | 246:674 1,549:997 | 332738 | 217.259

Existia em caixa no dia 3 #>


Existia em Caixa no dia 28 ? • 46,3 %. K.K
Existia em Caixa no dia 26 }
- @# * X
|
"*" | A"Aindis"
foi º "8" ; 20263278 , "| tia###### ( ***" |
. }
Entrou desde esse dia até
28 d'Abril de 1847.
Junta Governativa teve á
• \_A - •
de . . . . . . . .
•• • sua disposição esse saldo, e | Recebeu-se desde esse dia } 1:3033323

—- recebeu mais, durante o seu 3303868 | até 7 de Fevereiro de 1848


{ Total da Receita Rs. 2: 1783389 governo dos rendimentos da } Total da receita neste ulti-
} -
-

junta. . •

Desde 3 d’Outubro de …, | - mo período { 1:5493997


1846 até 28 d'Abril de | Total da Receita Rs. 1:0773312 | ——————— =====
1847, mandou S. Exc." , 1:0993660 ===== Neste período mandou S.
pagar de dividas dos annos |
Por Conta da divida dos an- | Exc." pagar de dividas de
1844 1845 1846: 700,3035
de 1844, 1845, 1846. nos de 1844, 1845, e 1846,
E nesse mesmo período | pagou a junta — 1143350 e de forragens
pagou-se para obras pe- 3323285 | e mais ao Engenhei- 2593700 | aºs Engenheiros 7543935
lo mesmo Sr. authorisa- ro Guerra de forra- Tiberto e Azeve
" */ das . . .. . . . . gens até 31 de Julho | do até 31 de De-
zembro de 1845-343900
}
— de 1846 . . . . 1453330 º
Total da Despeza 1:431%945 -
Para obras authorisadas pe- } 4463137
------ Aos Empregados da J. Geral 583381 | lo mesmo Sr. . . . . . .
Ficandº em Caixa nº dia 7469444 Para trabalhos publicos .. 5125607 Para % Empregados da 1313666
28 d'Abril de 1847 Junta Geral . . . . ..
===== Total da Despeza
P Rs. 8303638
z====== Total da Despeza Rs. - _>,
1:3323738
|-

Deixou em Caixa a junta —, → - -

Governativa.. } 2463674 Saldo em sêr na mão do


Snr. Thesoureiro -
}
} 2473259
••

# E C O P J LA CA O |

Da divida antiga da Junta Geral do Districto dos annos de 1844, 1845, e 1846.

Era a divida da Junta Geral em 8 d’Outubro de 1846, de trabalhos feitos nas Estradas des- 3:0943394
-

ta Província de . . . . . . . . . . . . .. . . . . . . . . . . . .
De forragens aos Engenheiros, Guerra, Tiberio, e Azevedo até 31 de Dezembro de 1845 1643700
E de ditas aos ditos, desde 1 de Janeiro de 1846 até 31 de Julho dito .. (1) 1263000

Total da Divida 3.385.3091


De Ordem dº S. Exc." o Snr. Governador 1847
Civil, pagou-se por conta até 28 d'Abril edeAzeve 10993660
De dita dita dita dito aos Engenheiros, Tiberio,
do , pelo que tinhão vencido de forragens até 31 de Dezembro de 1845 (2) 543900 |

Pago por Ordem da Junta governativa, ao Engenheiro Guerra, pelas forragens que tinha

vencido no anno de 1845, e até 31 de Julho de 1846 .. . . . . . . (3) 1433350


Pago de ordem da mesma Junta, á conta de folhas de despeza dos sobreditos annos 1143330
Pago por ordem de S. Exc." o Snr. Govrenador Civil, de 26 de Julho até 7 de Fevereiro
do corrente á conta de folhas de 1844 a 1846 . . . º º º º e º « • 7003033
|

Total do que se pagou por Conta 2.114.3295


Balanço hoje em Divida Rs. l:2943796 |

(1) Esta importancia sendo proveniente de forragens que vencerão os Engenheiros até 31 de Julho de 1846, não devia figurar por ter a Junta
Geral do Districto determinado em Sess㺠de | 8 dº Junho de 1846, que não se abonassem aos Engenheiros forragens neste anno; porem como a junta
governativa sem attender a esta deliberaçº, mandasse Pagar ao Engenheiro Guerra a quantia de Rs. 63,3000 que tinha vencido de 1 de Janeiro de
1846 até 31 de Julho, por isso não póde deixar de ser aqui descripta como tal.
(2) Requerendo os 2 Engenheiros "; º Azevedo, em Agosto de 1847, para que S. Excº o Snr. Governador Civil lhes mandasse pagar a
gratificação vencida de forragens, a exemplº, "º que tinha sido praticado com o Engenheiro Guerra, ordenou o mesmo Exmº Snr. que só se lhes abo
masse o vencido, até 31 de Dezembro de 1843, por não Poder passar alem do que estava determinado pela Junta Geral, o que assim se fez, pagan
do-se-lhes menos Rs. 63,3000 que pedi㺠de forragens vencidas até 31 de Julho de 1846. >

(3) Desta quantia só devia ter sido Pºººº de Rs. #*#350; se a junta Governador
governativa attendesse a deliberação da Junta Geral do Districto.
N. B. Todos os trabalhos authorisadº por S. Exe o Snr. Conselheiro Civil, desde 3 d’Outubro de 1846, até 28 dº Abril de 1847
e de 26 de Julho aré 7 de Fevereiro de 1848, º achão pagos, tanto do pessoal, como do material. — *** • -

Funchal 7 de Fevereiro de 1848. - 4* Vianna, Oficial da Repartição de Fazenda, encarregado da escripturação da Caixa.

FIM DO 1º VOLUME. \
LIN. ERROS Emendas

• had bad
ensina insinua
servir seguir
ter terem
idole indole
COIT] Cill

longiquos longinquos
192 1 e 2
pertence pertencem
tracto facto
pricipalmente principalmente
pricisam precisao
saber do fazer saber ao
foi fui
sobcriptores subscriptores
vehemente vehementemente
vantagens que vantagens a que
8) OS I]()S

innocação innovação
C da
congratulan
do-a consagrando-a
cessação cessão
PAG. LIN. ERRos Emendas

313 2 não podem que não podem


31 6 2 varidas variadas
329 3 Russia, Russia, convirá
347 18 obvia e quanto e obvia, quanto
380 14 de de modo

Ao leitor será facil corrigir outros pe


quenos erros que escaparam na impressão.
Iiiiiii
HN SEPF ()

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