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ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

SECRETARIA DA SEGURANÇA PÚBLICA


BRIGADA MILITAR – DEPARTAMENTO DE ENSINO

CURSO BÁSICO DE FORMAÇÃO POLICIAL-MILITAR - CBFPM 2018

19 - DIREITOS HUMANOS (30 h/a)

Apresentação
A Declaração Universal de Direitos Humanos, de 1948, introduziu uma concepção
contemporânea de direitos humanos, desenvolvendo-se o Direito Internacional dos Direitos Humanos.
Assim, os Direitos Humanos nasceram como direitos naturais universais e desenvolveram-se como
direitos positivos particulares posteriormente incorporados pelas constituições.
A Constituição Federal Brasileira de 1988 buscou sedimentar o Estado Democrático de Direito
no Brasil e, desde então, assuntos e temas relacionados com os Direitos Humanos vêm sendo incluídos
nos planos de ensino de cursos de formação e especialização das polícias de segurança pública, numa
visão sistêmica global e regional.
A Brigada Militar enquanto o órgão integrante da Segurança Pública que mais interage com a
comunidade é comprometida com as políticas públicas voltadas para a prevenção, e tem o dever de
manter os seus policiais sempre preparados para atuar com respeito aos Direitos Humanos.

Capítulo 1 – Evolução Histórica dos Direitos Humanos

1.1 Evolução histórica dos Direitos Humanos


A civilização humana, desde os seus primórdios, até o período atual, passou diferentes fases,
cada uma com suas peculiaridades, com seus pontos negativos e positivos, de modo que as evoluções
científicas, tecnológicas, políticas, econômicas, sociais e jurídicas são muitas vezes lentas e graduais.
A evolução histórica dos direitos inerentes à pessoa também é lenta e gradual. Não são
reconhecidos ou construídos todos de uma vez, mas sim conforme a própria experiência da vida
humana em sociedade, por isto é de extrema importância, para entender seu significado atual
compreender como eles foram observados em eras passadas para eliminar os erros e aperfeiçoar os
acertos.
Discute-se na doutrina a respeito da terminologia correta para designar os direitos essenciais a
pessoa humana. Fala-se, como exemplo em, “direitos humanos”, “direitos morais”, “direitos naturais”,
“direitos públicos subjetivos”, “direitos dos povos”, “liberdades públicas” e “direitos fundamentais”,
analisar-se-á o conteúdo de cada um a destas expressões explicado as razões pelas quais se escolhe
uma ou outra terminologia para identificar esses direitos.
Tenta-se encontrar já na Idade Antiga, na Idade Média e no início da Idade Moderna, alguns
resquícios de tais direitos. Analisa-se também a influência das Revoluções Inglesa, Francesa e
Americana no reconhecimento e na positivação dos direitos essenciais à pessoa humana, para então
discutir a respeito das dimensões ou, como grande parte da doutrina entende, das gerações dos direitos
fundamentais.
A doutrina constitucional reconhece três dimensões de direitos fundamentais, entretanto, alguns
constitucionalistas propõem uma quarta dimensão não existindo, entretanto, um reconhecimento
constitucional positivo de sua existência nem uma concordância quanto ao seu real conteúdo.
A ciência jurídica, condicionada à existência de vida humana, também passou por inúmeras
modificações, enormes avanços e infelizes retrocessos que muitas vezes acabaram com vários séculos
de lutas e esperanças por um mundo mais justo, sendo necessária uma análise histórica para a melhor
compreensão destes fenômenos.
Os direitos humanos e os direitos fundamentais foram construídos, ao longo dos anos, não
apenas a partir de pesquisa acadêmica, de bases teóricas, mas principalmente resultam das lutas contra
o poder. Nesse sentido Norberto Bobbio (1992, p. 5) afirma que: “Os direitos do homem, por mais
fundamentais que sejam, são direitos históricos, ou seja, nascidos em certas circunstâncias,
caracterizados por lutas em defesa de novas liberdades contra velhos poderes e nascidos de modo
gradual, não todos de uma vez e nem de uma vez por todas.”
Assim, os direitos essenciais à pessoa humana nasceram das lutas contra o poder, das lutas
contra a opressão e contra o desmando, gradualmente, ou seja, não nasceram todos de uma vez, mas
sim quando as condições lhes foram propícias, quando se passou a reconhecer a sua necessidade para
assegurar a cada indivíduo e à sociedade um existência digna.

1.2 Conceitos
1.2.1 Direitos humanos são direitos positivados em tratados internacionais, ou seja, são direitos
compreendidos no âmbito do direito internacional público. A proteção a esses direitos é feita mediante
convenções globais, por exemplo, pacto internacional sobre direitos civis e políticos ou regionais, por
exemplo, ou a convenção americana de direitos humanos.

1.2.2 Direitos do homem são direitos de cunho jus-naturalistas, não positivados ou não escritos
(seja na Constituição, seja na legislação infraconstitucional); são direitos inatos que, de acordo com
a Sociologia do Direito, existem porque são intrínsecos à natureza humana, bastando a condição de
ser humano para possuí-los, assim como o é o direito à vida.
1.2.3 Direitos fundamentais são aqueles constituídos em certo momento histórico, em determinado
Estado; são direitos constitucionalmente protegidos, ou seja, estão positivados uma em uma ordem
jurídica. Ocorrem quando os direitos naturais são positivados ou escritos no texto constitucional,
galgando conotação de direitos positivos constitucionais.

É importante ter cuidado para não confundir os direitos fundamentais com garantias
fundamentais. Direitos fundamentais são os bens protegidos pela Constituição, como a vida, a
liberdade, a propriedade; garantias fundamentais visam proteger esses bens, ou seja, instrumentos
constitucionais. Um exemplo de garantia fundamental é o habeas corpus que é instrumento de
manutenção do bem jurídico da liberdade de locomoção.
O termo “direitos naturais” está identificado com o jus-naturalismo, como se fossem fruto de
uma revelação, não levando em conta a sua construção histórica. Essa expressão está situada em
momentos históricos anteriores às primeiras Declarações do Século XVIII, que a utilizavam para
identificar os direitos essenciais à pessoa humana. Esta terminologia é, portanto, antiquada e está
praticamente em desuso, sendo utilizada apenas quando do estudo deste período (MARTÍNEZ, 1999,
p. 25).
A expressão “direitos públicos subjetivos” surge com a intenção de delimitar os direitos
considerados essenciais à pessoa humana dentro de um marco positivista (PÉREZ LUÑO, 1999, p. 33)
estando presa ao conceito de Estado Liberal atuando como um limite ao poder político, mas não nas
relações entre particulares (MARTÍNEZ, 1999, p. 28) não abrangendo, portanto, grande parte das
situações em que é necessário reivindicar tais direitos.
Segundo a doutrina francesa, “liberdades públicas” compreendem não apenas aquelas ligadas
ao Estado, mas também as relacionadas aos particulares, sendo públicas porque estão protegidas pelo
Direito (ISRAEL, 2005, p. 14), entretanto, esta expressão não consegue abranger os direitos sociais e
econômicos, por isso entende-se não ser adequado o seu uso, assim como “liberdades fundamentais”,
outro termo utilizado pelos franceses não consegue abranger tais direitos.
O Direito anglo-saxão utiliza-se da nomenclatura “direitos morais” com uma conotação jus-
naturalista, estando presa à ideia de Estado Liberal, dificultando os direitos de participação política,
assim como os direitos sociais, culturais e econômicos (MARTÍNEZ, 1999, p. 35).
Utiliza-se a expressão “direitos dos povos” para designar aqueles direitos que os povos têm de
determinar seu destino no campo político, social, cultural, econômico, o direito de se relacionar com
outros Estados, direito à paz, não abrangendo, entretanto os direitos da pessoas como individuais,
concretas, insubstituíveis (MIRANDA, 2000, p. 68).

1.3 A relação entre os Direitos Humanos e os Direitos Fundamentais


Embora alguns autores entendam que direitos humanos e direitos fundamentais sejam
sinônimos, parte da doutrina entende que existem algumas diferenças entre eles, sendo necessário
conceituá-los para determinar suas diferenças.
A expressão “direitos humanos” também tem sido objeto de muita polêmica. Devido à
amplitude do termo, pode-se chegar a inúmeras conclusões que muitas vezes podem prejudicar o seu
real significado e dificultar o reconhecimento e a proteção de tais direitos.
Alguns doutrinadores de forte tendência jus-naturalistas entendem que os direitos humanos são
aqueles frutos da própria qualidade de pessoa humana pelo fato de pertencer a essa espécie. Não lhes é
tirada a razão, no entretanto esta concepção pode restringir o seu significado, pois embora se entenda
como verdadeira esta afirmação, ela exclui aqueles direitos decorrentes da evolução histórica, social,
político e econômica que da civilização humana. Corre-se o risco, ao conceituá-los apenas segundo
este conteúdo, de não considerar os direitos oriundos das transformações pelas quais a humanidade
passa evitando assim o seu reconhecimento e a sua proteção.
O conceito de direitos humanos deve reconhecer sua dimensão histórica, o fato de não terem
sido revelados para a humanidade, em um momento de luz, mas foram construídos ao longo da história
humana, em virtude das evoluções, das modificações na realidade social, na realidade política, na
realidade industrial, na realidade econômica, enfim em todos os campos da atuação humana.
Segundo Perez Luño (1999, p. 48):

Los derechos humanos aparecen como un conjunto de facultades e instituciones que, en cada
momento histórico, concretan las exigencias de la dignidad, la libertad y la igualdad humana,
las cuales deben ser reconocidas positivamente por los ordenamientos jurídicos a nivel
nacional e internacional.

Portanto, embora os direitos humanos sejam inerentes à condição humana, seu reconhecimento
e sua proteção são frutos de todo um processo histórico de luta contra o poder e de busca de um
sentido para a humanidade.
Quanto aos direitos fundamentais, estes nascem a partir do processo de positivação dos direitos
humanos, a partir do reconhecimento, pelas legislações positivas de direitos considerados inerentes à
pessoa humana. Neste sentido, José Joaquim Gomes Canotilho (1998, p. 259):

As expressões “direitos do homem” e “direitos fundamentais” são frequentemente utilizadas


como sinônimas. Segundo a sua origem e significado poderíamos distingui-las da seguinte
maneira: direitos do homem são direitos válidos para todos os povos e em todos os tempos;
direitos fundamentais são os direitos do homem, jurídico-institucionalmente garantidos e
limitados espacio-temporalmente. Os direitos do homem arrancariam da própria natureza
humana e daí o seu caráter inviolável, intertemporal e universal; os direitos fundamentais
seriam os direitos objetivamente vigentes numa ordem jurídica concreta.

A expressão direitos humanos tem sido utilizada pela doutrina para identificar os direitos
inerentes à pessoa humana na ordem internacional, enquanto a expressão direitos fundamentais refere-
se a ordenamentos jurídicos específicos, ao reconhecimento de tais direitos frente a um poder político,
geralmente reconhecidos por uma constituição.
Pode-se considerar, portanto, direitos humanos como aqueles direitos que buscam a proteção da
pessoa humana tanto em seu aspecto individual como em seu convívio social, em caráter universal
(ANTUNES, 2005, p. 340), sem o reconhecimento de fronteiras políticas, todas decorrentes de
conquistas históricas e independentes de positivação em uma ordem específica.
O termo "direitos fundamentais" surge para a humanidade quando esses direitos são positivados
por um ordenamento jurídico específico, geralmente garantidos por normas constitucionais frente a um
Estado.
Segundo Ingo Wolfgang Sarlet (2005, p. 35 e 36):

[...] o termo direitos fundamentais se aplica para aqueles direitos do ser humano reconhecidos e
positivados na esfera do direito constitucional positivo de determinado Estado, ao passo que a
expressão direitos humanos guardaria relação com os documentos de direito internacional, por
referir-se àquelas posições jurídicas que se reconhecem ao ser humano como tal,
independentemente de sua vinculação com determinada ordem constitucional, e que, portanto
aspiram à validade universal, para todos os povos e tempos, de tal sorte que revelam um
inequívoca caráter supranacional.

Utilizar-se a expressão “direitos humanos” para designar o momento em que estes surgiram ou
foram reconhecidos pela comunidade humana e a expressão “direitos fundamentais” para marcar a
positivação destes direitos.
Os direitos fundamentais não surgiram simultaneamente, mas aos poucos, em consonância com
a demanda de cada época, motivo pelo qual os estudiosos costumam dividi-los em gerações ou
dimensões, conforme sua ingerência nas constituições. Paulo Bonavides foi um dos principais
constitucionalistas que leu os direitos fundamentais a partir de um perfil histórico, agrupando os
mesmos em gerações de direitos.

1.4 Divisão dos direitos


Afirma-se que esta divisão está amparada no surgimento histórico dos direitos fundamentais,
sendo que parte doutrina tem evitado o termo “geração”, trocando-o por “dimensão”. Isso porque a
ideia de “geração” está diretamente ligada à de sucessão, substituição, pois os direitos fundamentais
não se sobrepõem, não são suplantados uns pelos outros. A distinção entre gerações serve apenas para
situar os diferentes momentos em que esses grupos de direitos surgem como reivindicações acolhidas
pela ordem jurídica.
A divisão das dimensões pode ser facilmente realizada, com base no lema da Revolução
Francesa: liberdade (1ª dimensão), igualdade (2ª dimensão) e fraternidade (3ª dimensão).
Hoje, podemos afirmar que existem os direitos de primeira, segunda e terceira gerações, sendo
que ainda existem doutrinadores que defendem a existência dos direitos de quarta e quinta gerações.
Desde já, vale a pena ressaltar que a divisão de tais direitos em gerações ou dimensões é meramente
acadêmica, uma vez que os seres humanos não podem ter seus direitos divididos em gerações ou
dimensões estanques, sendo que referida divisão diz respeito somente ao reconhecimento dos mesmos
em momentos históricos específicos.

1.4.1 Os direitos de primeira geração ou dimensão


Referem-se às liberdades negativas clássicas, que enfatizam o princípio da liberdade
configurando os direitos civis e políticos. Surgiram nos finais do século XVIII e representavam uma
resposta do Estado liberal ao Absolutista, dominando o século XIX, e corresponderam à fase inaugural
do constitucionalismo no Ocidente. Foram frutos das revoluções liberais francesas e norte-americanas,
nas quais a burguesia reivindicava o respeito às liberdades individuais, com a consequente limitação
dos poderes absolutos do Estado. Oponíveis, sobretudo, ao Estado, são direitos de resistência que
destacam a nítida separação entre o Estado e a sociedade. Exigem do ente estatal uma abstenção e não
uma prestação, possuindo assim um caráter negativo, tendo como titular o indivíduo.
Podem exemplificar os direitos de primeira dimensão o direito à vida, à liberdade, à
propriedade, à liberdade de expressão, à liberdade de religião, à participação política, etc.
Vale à pena transcrever as palavras de Daniel Sarmento: “dentro deste paradigma, os direitos
fundamentais acabaram concebidos como limites para a atuação dos governantes, em prol da liberdade
dos governados”. Eles demarcavam um campo no qual era vedada a interferência estatal,
estabelecendo, dessa forma, uma rígida fronteira entre o espaço da sociedade civil e do Estado, entre a
esfera privada e a pública, entre o „jardim e a praça‟. Nesta dicotomia público/privado, a supremacia
recaía sobre o segundo elemento do par, o que decorria da afirmação da superioridade do indivíduo
sobre o grupo e sobre o Estado.
Preciosa são as palavras de Paulo Bonavides ao fazer referência aos direitos de primeira
dimensão, afirmando que

os direitos fundamentais de primeira dimensão representam exatamente os direitos civis e


políticos, que correspondem à fase inicial do constitucionalismo ocidental, mas que continuam
a integrar os catálogos das Constituições atuais (apesar de contar com alguma variação de
conteúdo), o que demonstra a cumulatividade das dimensões.

1.4.2 Os direitos de segunda geração ou dimensão


Relacionam-se com as liberdades positivas, reais ou concretas, assegurando o princípio da
igualdade material entre o ser humano. A Revolução Industrial foi o grande marco dos direitos de
segunda geração, a partir do século XIX, implicando na luta do proletariado, na defesa dos direitos
sociais essenciais básicos: alimentação, saúde, educação etc. O início do século XX foi marcado pela
Primeira Grande Guerra e pela fixação de direitos sociais. Isso fica evidenciado, dentre outros
documentos, pela Constituição de Weimar, de 1919 (Alemanha), e pelo Tratado de Versalhes, 1919
(OIT).
Conforme muito bem ressaltado por Daniel Sarmento:

As Constituições do México (1917) e de Weimar (1919) trazem em seu bojo novos direitos que
demandam uma contundente ação estatal para sua implementação concreta, a rigor destinados a
trazer consideráveis melhorias nas condições materiais de vida da população em geral,
notadamente da classe trabalhadora. Fala-se em direito à saúde, à moradia, à alimentação, à
educação, à previdência etc. Surge um novíssimo ramo do Direito, voltado a compensar, no
plano jurídico, o natural desequilíbrio travado, no plano fático, entre o capital e o trabalho. O
Direito do Trabalho, assim, emerge como um valioso instrumental vocacionado a agregar
valores éticos ao capitalismo, humanizando, dessa forma, as até então tormentosas relações jus
laborais. No cenário jurídico em geral, granjeia destaque a gestação de normas de ordem
pública destinadas a limitar a autonomia de vontade das partes em prol dos interesses da
coletividade.

O direito de segunda geração, ao invés de negar ao Estado uma atuação, exige dele ste políticas
públicas, tratando-se, portanto de direitos positivos, impondo uma obrigação de fazer, correspondendo
aos direitos à saúde, educação, trabalho, habitação, previdência social, assistência social, entre outros.
Bonavides, ao fazer referência aos direitos de segunda geração, afirmou que

(...) são os direitos sociais, culturais e econômicos bem como os direitos coletivos ou de
coletividades, introduzidos no constitucionalismo das distintas formas de Estado social, depois
que germinaram por obra da ideologia e da reflexão antiliberal deste século. Nasceram
abraçados ao princípio da igualdade, do qual não se podem separar, pois fazê-lo equivaleria a
desmembrá-los da razão de ser que os ampara e estimula.

Seguindo os mesmos caminhos, Ingo Wolfgang Sarlet ressalta que:

(...) os direitos de segunda dimensão podem ser considerados uma densificação do princípio da
justiça social, além de corresponderem a reivindicações das classes menos favorecidas, de
modo especial da classe operária, a título de compensação, em virtude da extrema desigualdade
que caracterizava (e, de certa forma, ainda caracteriza) as relações com a classe empregadora,
notadamente detentora de um maior ou menor grau de poder econômico.

Traçando um paralelo entre os direitos de primeira e segunda gerações, George Marmelstein


afirma que

os direitos de primeira geração tinham como finalidade, sobretudo, possibilitar a limitação do


poder estatal e permitir a participação do povo nos negócios públicos. Já os direitos de segunda
geração possuem um objetivo diferente. Eles impõem diretrizes, deveres e tarefas a serem
realizadas pelo Estado, no intuito de possibilitar aos seres humanos melhores qualidade de vida
e um nível de dignidade como pressuposto do próprio exercício da liberdade. Nessa acepção,
os direitos fundamentais de segunda geração funcionam como uma alavanca ou uma catapulta
capaz de proporcionar o desenvolvimento do ser humano, fornecendo-lhe as condições básicas
para gozar, de forma efetiva, a tão necessária liberdade.

1.4.3 Os direitos de terceira geração ou dimensão


Consagram os princípios da solidariedade ou fraternidade, sendo atribuídos genericamente a
todas as formações sociais, protegendo interesses de titularidade coletiva ou difusa, não se destinando
especificamente à proteção dos interesses individuais, de um grupo ou de um determinado Estado,
mostrando uma grande preocupação com as gerações humanas, presentes e futuras. Possui origem na
revolução tecnocientífica (terceira revolução industrial), revolução dos meios de comunicação e de
transportes.
Podemos citar como direitos de terceira geração: direito ao desenvolvimento ou progresso, ao
meio ambiente, à autodeterminação dos povos, direito de comunicação, de propriedade sobre o
patrimônio comum da humanidade e direito à paz, cuidando-se de direitos transindividuais, sendo
alguns deles coletivos e outros difusos, o que é uma peculiaridade, uma vez que não são concebidos
para a proteção do homem isoladamente, mas de coletividades.
Paulo Bonavides, ao se posicionar sobre os direitos de terceira geração, afirma:

Com efeito, um novo polo jurídico de alforria do homem se acrescenta historicamente aos da
liberdade e da igualdade. Dotados de altíssimo teor de humanismo e universalidade, os direitos
da terceira geração tendem a cristalizar-se no fim do século XX enquanto direitos que não se
destinam especificamente à proteção dos interesses de um indivíduo, de um grupo ou de um
determinado Estado. Tem primeiro por destinatário o gênero humano mesmo, num momento
expressivo de sua afirmação como valor supremo em termos de existencialidade concreta.

Em nosso ordenamento jurídico brasileiro temos a distinção entre direitos coletivos em sentido
estrito, direitos individuais homogêneos e direitos difusos, sendo que a definição destes direitos está
contida no art. 81, parágrafo único do Código de Defesa do Consumidor:

I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para efeitos deste código, os


transindividuais, de natureza indivisível, de que sejam titulares pessoas indeterminadas e
ligadas por circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos deste código, os
transindividuais, de natureza indivisível de que seja titular grupo, categoria ou classe e pessoas
ligadas entre si ou com a parte contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos os decorrentes de origem
comum.

Ao fazer referência aos direitos de terceira geração ou dimensão, Ingo Sarlet ressalta que

cuida-se, na verdade, do resultado de novas reivindicações fundamentais do ser humano,


geradas, dentre outros fatores, pelo impacto tecnológico, pelo estado crônico de beligerância,
bem como pelo processo de descolonização do segundo pós-guerra e suas contundentes
consequências, acarretando profundos reflexos na esfera dos direitos fundamentais.

Fernanda Luiza aponta que:

os direitos de terceira dimensão são denominados de direito de fraternidade ou de solidariedade


porque têm natureza de implicação universal, sendo que os mesmos alcançam, no mínimo, uma
característica de transindividualismo e, em decorrência dessa especificidade, exigem esforços e
responsabilidades em escala mundial, para que sejam verdadeiramente efetivados.

Portanto, os direitos de terceira geração ou dimensão possuem como seus sujeitos ativos uma
titularidade difusa ou coletiva, uma vez que não visualizam o homem como um ser singular, mas toda
a coletividade ou o grupo.

1.4.4 Os direitos de quarta geração ou dimensão


Na atualidade, existem doutrinadores que defendem a existência dos direitos de quarta
geração ou dimensão, embora não exista consenso na doutrina sobre o conteúdo dessa espécie de
direito. Para Noberto Bobbio, “tratam-se dos direitos relacionados à engenharia genética”.
Apesar de ter uma visão um pouco diferente de Noberto Bobbio, Paulo Bonavides também
defende a existência dos direitos de quarta geração, com aspecto introduzido pela globalização
política, relacionados à democracia, à informação e ao pluralismo, conforme abaixo transcrito:

A globalização política neoliberal caminha silenciosa, sem nenhuma referência de valores. (...)
Há, contudo, outra globalização política, que ora se desenvolve, sobre a qual não tem jurisdição
a ideologia neoliberal. Radica-se na teoria dos direitos fundamentais. A única verdadeiramente
que interessa aos povos da periferia. Globalizar direitos fundamentais equivale a universalizá-
los no campo institucional. (...) A globalização política na esfera da normatividade jurídica
introduz os direitos de quarta geração, que, aliás, correspondem à derradeira fase de
institucionalização do Estado social. É direito de quarta geração o direito à democracia, o
direito à informação e o direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade
aberta do futuro, em sua dimensão de máxima universalidade, para a qual parece o mundo
inclinar-se no plano de todas as relações de convivência. (...) os direitos da primeira geração,
direitos individuais, os da segunda, direitos sociais, e os da terceira, direitos ao
desenvolvimento, ao meio ambiente, à paz e à fraternidade, permanecem eficazes, são infra-
estruturais, formam a pirâmide cujo ápice é o direito à democracia.

Além de Paulo Bonavides, outros constitucionalistas vêm promovendo o reconhecimento dos


direitos de quarta geração ou dimensão, conforme podemos perceber nas palavras de Marcelo
Novelino (2008, p. 229), quando ressalta que

tais direitos foram introduzidos no âmbito jurídico pela globalização política, compreendem o
direito à democracia, informação e pluralismo. Os direitos fundamentais de quarta dimensão
compendiam o futuro da cidadania e correspondem à derradeira fase da institucionalização do
Estado social sendo imprescindíveis para a realização e legitimidade da globalização política.

1.4.5 Os direitos de quinta geração ou dimensão


Alguns autores defendem a existência dos direitos de quinta geração ou dimensão, dentre os
quais citamos Paulo Bonavides, que vem afirmando que a paz seria um direito de quinta geração. Vale
à pena frisar as palavras de Raquel Honesko, quando ressalta que:

(...) em recentes debates científicos (IX Congresso Íbero-Americano e VII Simpósio Nacional
de Direito Constitucional, realizados em Curitiba/PR, em novembro de 2006, bem como II
Congresso Latino-Americano de Estudos Constitucionais, realizado em Fortaleza/CE, em abril
de 2008), BONAVIDES fez expressa menção à possibilidade concreta de se falar, atualmente,
em uma quinta geração de direitos fundamentais, onde, em face dos últimos acontecimentos
(como, por exemplo, o atentado terrorista de “11 de Setembro”, em solo norte-americano),
exsurgiria legítimo falar de um direito à paz. Embora em sua doutrina esse direito tenha sido
alojado na esfera dos direitos de terceira dimensão, o ilustre jurista, frente ao insistente rumor
de guerra que assola a humanidade, decidiu dar lugar de destaque à paz no âmbito da proteção
dos direitos fundamentais.

José Adércio Sampaio Leite referencia os direitos de quinta geração ou dimensão:

como o sistema de direitos anda a incorporar os anseios e necessidades humanas que se


apresentam com o tempo, há quem fale já de uma quinta geração dos direitos humanos com
múltiplas interpretações. Tehrarian (1997 a e b) diz sobre “direitos ainda a serem
desenvolvidos e articulados”, mas que tratam do cuidado, compaixão e amor por todas as
formas de vida, reconhecendo-se que a segurança humana não pode ser plenamente realizada
se não começarmos a ver o indivíduo como parte do cosmos e carente de sentimentos de amor
e cuidado, todas definidas como prévias condições de “segurança ontológica” para usar a
expressão de Laing (1969). Para Marzouki (2003), tais direitos seriam direitos oriundos de
respostas à dominação biofísica que impõe uma visão única do predicado “animal” do homem,
conduzindo os “clássicos” direitos econômicos, culturais e sociais a todas as formas físicas e
plásticas, de modo a impedir a tirania do estereótipo de beleza e medidas que acaba por
conduzir a formas de preconceitos com raças ou padrões reputados inferiores ou fisicamente
imperfeitos. Essa visão de complementaridade é encontrada também em Lebech (2000),
todavia em relação ao direito à vida sob os desafios das novas tecnologias, derivando então um
direito à identidade individual, ao patrimônio genético e à proteção contra o abuso de técnicas
de clonagem.

A divisão acima detalhada das gerações ou dimensões dos direitos fundamentais trata-se de um
método meramente acadêmico, uma vez que os direitos dos seres humanos não devem ser divididos
em gerações ou dimensões estanques, retratando apenas a valorização de determinados direitos, em
momentos históricos distintos.

1.3 Principais características dos Direitos Humanos


a. Historicidade: os direitos são criados em um contexto histórico e, quando colocados na
Constituição, se tornam Direitos Fundamentais.
b. Imprescritibilidade: os direitos humanos fundamentais não se perdem pelo decurso de prazo,
eles são permanentes.
c. Inalienabilidade: os direitos fundamentais não se transferem de uma para outra pessoa, seja
gratuitamente, seja mediante pagamento.
d. Irrenunciabilidade: os direitos humanos fundamentais não são renunciáveis. Não se pode exigir
de ninguém que renuncie à vida (não se pode pedir a um doente terminal que aceite a eutanásia,
por exemplo) ou à liberdade (não se pode pedir a alguém que vá para a prisão no lugar de outro)
em favor de outra pessoa.
e. Inviolabilidade: nenhuma lei infraconstitucional nem nenhuma autoridade pode desrespeitar os
direitos fundamentais de outrem, sob pena de responsabilização civil, administrativa e criminal.
f. Universalidade: aplicam-se a todos os indivíduos, independentemente de sua nacionalidade, sexo,
raça, credo ou convicção político-filosófica.
g. Concorrência: podem ser exercidos vários Direitos Fundamentais ao mesmo tempo.
h. Efetividade: o Poder Público deve atuar de modo a garantir a efetivação dos direitos e garantias
fundamentais, usando inclusive mecanismos coercitivos, quando necessário, porque esses direitos
não se satisfazem com o simples reconhecimento abstrato.
i. Interdependência: estão vinculados uns aos outros, não podendo ser vistos como elementos
isolados, mas sim como um todo, um bloco que apresenta interpenetrações; as várias previsões
constitucionais, apesar de autônomas, possuem diversas intersecções para atingirem suas
principais finalidades.
j. Complementaridade: os direitos humanos fundamentais não devem ser interpretados
isoladamente, mas sim de forma conjunta, com a finalidade da sua plena realização.
k. Indivisibilidade: sob este prima podemos afirmar que tais direitos compõem um único conjunto
de direitos, uma vez que não podem ser analisados de maneira isolada, separada. Afirma-se que o
desrespeito a um deles constitui a violação de todos ao mesmo tempo, ou seja, caso seja
descumprido será com relação a todos.
l. Relatividade ou limitabilidade: os direitos fundamentais não podem ser considerados absolutos
por encontrarem limites em outros direitos e interesses coletivos também consagrados na
Constituição. Assemelha-se ao princípio da relatividade ou da convivência das liberdades
públicas. Vale ressaltar que o Noberto Bobbio apontava dois direitos que seriam exceção: direito a
não ser escravizado e o direito a não ser torturado.
m. Essencialidade: são inerentes ao ser humano, tendo por base os valores supremos do homem e
sua dignidade (aspecto material), assumindo posição normativa de destaque (aspecto formal).
n. Interrelacionaridade: com a evolução da proteção nacional e internacional dos direitos
fundamentais, após as grandes guerras e revoluções, afirma-se que hodiernamente os mecanismos
para assegurar a inviolabilidade dos direitos e garantias fundamentais passaram a ter abrangência
regional e mundial. Por meio de tal característica, a pessoa poderá optar por qual âmbito de
proteção deseja para assegurar a inviolabilidade do seu direito fundamental, o global ou regional.
o. Vedação ao retrocesso: jamais podem ser diminuídos ou reduzidos no seu aspecto de proteção
(O Estado não pode proteger menos do que já vem protegendo).
p. Aplicabilidade imediata: o artigo 5º, §1º da Constituição Federal determina que as normas
definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata, cabendo aos poderes
públicos (Judiciário, Legislativo e Executivo) promover o desenvolvimento desses direitos.
q. Inexauribilidade: são inesgotáveis no sentido de que podem ser expandidos, ampliados e a
qualquer tempo podem surgir novos direitos (vide art. 5º, § 2º, CF).
r. Constitucionalização: por meio dela faz-se a divisão entre direitos fundamentais e direitos
humanos. Quando nos referimos ao ordenamento jurídico interno, principalmente no que tange aos
direitos fundamentais, dizemos que são aqueles previstos na Constituição de um país, ou seja, os
mesmos possuem esta característica da constitucionalização.

Capítulo 2 – Princípios e normas que regem os Direitos Humanos

2.1 Tratados e normas internacionais de Direitos Humanos


 Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Assembleia Geral das
Nações Unidas (Resolução 217 A III), em 10 de dezembro de 1948.1
 Código de Conduta para Funcionários Responsáveis pela Aplicação da Lei.

2.2 Princípios humanitários aplicáveis à função policial


 Princípios orientadores para a aplicação efetiva do Código de Conduta para os Funcionários
Responsáveis pela Aplicação da Lei, adotados pelo Conselho Econômico e Social das Nações
Unidas pela sua resolução 1989/61, de 24 de maio de 19892.
 Princípios Básicos Sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Policiais, adotado pela
ONU, em 07 de julho de 19903.
 Princípios Básicos Sobre o Uso da Força e Armas de Fogo pelos Funcionários Responsáveis pela
Aplicação da Lei, adotados por consenso em 7 de setembro de 1990, por ocasião do Oitavo
Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e o Tratamento dos Delinquentes.

2.3 Outras normas internacionais importantes:


 Convenção Americana sobre Direitos Humanos;
 Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos;
 Convenção Sobre Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes;
 Constituição Federal do Brasil - artigos 1º, 3º 5º, 6º, entre outros.

1
Declaração Universal dos Direitos Humanos Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/pt/resources_10133.html.
Acesso em 06 Fev 2019.
2
Princípios orientadores para a aplicação efetiva do Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela
Aplicação da Lei – 1989. Disponível em: http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Sistema-Global.-
Declara%C3%A7%C3%B5es-e-Tratados-Internacionais-de-Prote%C3%A7%C3%A3o/principios-orientadores-para-a-
aplicacao-efetiva-do-codigo-de-conduta-para-os-funcionarios-responsaveis-pela-aplicacao-da-lei.html. Acesso em 06 Fev
2019.
3
Princípios Básicos Sobre a Utilização da Força e de Armas de Fogo pelos Policiais, adotado pela ONU em 07 de
julho de 1990. Disponível em: http://pfdc.pgr.mpf.mp.br/atuacao-e-conteudos-de-
apoio/legislacao/segurancapublica/principios_basicos_arma_fogo_funcionarios_1990.pdf. Acesso em 06 Fev 2019.
Capítulo 3 – Aplicação dos Direitos Humanos na atuação policial-militar

3.1 Atuação policial-militar


O texto constitucional outorga ao policial o direito de agir em nome do coletivo, absolutamente
dentro do que a lei permite, mesmo quando lhe é autorizada a utilização da violência. O policial não
pode se exacerbar na utilização deste direito e deve empregar a força e os recursos necessários para
conter uma ação não autorizada por lei, suficiente para contê-la, caso contrário a sua ação será
considerada ilegítima e não amparada por lei. O excesso de violência desequilibra o policial que passa
a utilizá-la indiscriminadamente. Assim, o policial deve respeitar para ser respeitado, agindo como um
educador, um pedagogo da cidadania.
Para que possamos construir um pensamento inicial, há que se posicionar a atuação policial nos
termos da CF em seu “TÍTULO V – Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas”, mais
especificamente no “CAPÍTULO III”, onde o art. 144 cita os órgãos responsáveis pela segurança
pública “para a preservação de ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio público”:
polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis e polícias militares e
corpos de bombeiros.
Assim, vê-se que estas instituições defenderão o Estado Democrático de Direito, preservando e
garantindo os direitos individuais declarados no art. 5º CF, por meio de suas missões específicas. Neste
contexto se inserem os Direitos Humanos.
Esta visão de que as polícias, como instituições democráticas, têm como missão precípua a
proteção dos direitos individuais não se coaduna com as missões das polícias nos estados anteriores
como o estado feudal, em que as polícias visavam à manutenção e à proteção do estado e dos poderes
constituídos. Ao contrário, na atualidade a garantia dos Direitos do Homem constitui a razão de ser da
força pública (CAPPI, 2003, p. 107).
Nesta linha, a Declaração dos Direitos Humanos de 1948 declara em seu art. 12 “a garantia dos
direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública: esta força é, pois, constituída em
proveito de todos, e não para a utilidade particular daqueles a quem for confiada”. Assim, a Declaração
dos Direitos Humanos confere legitimidade para que as polícias atuem efetivamente “para a promoção
e garantia dos Direitos Humanos” (CAPPI, 2003, p. 108).

3.3 Polícia e os Direitos Humanos


Numa análise simplista parece que a atividade policial não se coaduna com uma política
voltada para os Direitos Humanos, ao contrário, no atual ordenamento jurídico, as missões policiais
estão afetas à democracia vigente, onde a truculência e o autoritarismo não se enquadram.
Mas esta análise clara, hodiernamente, não tinha a mesma transparência, pois “no Brasil, em
momento posterior da história, a partir da rearticulação democrática, agregou-se a seus ativistas a
pecha de „defensores de bandidos‟ e da impunidade”. (BALESTRERI, 2003, p. 21)
Obviamente esta visão é míope e carregada de preconceito, onde pensa-se que o “bandido” se
desfaz de sua condição humana, justificando ações estatais que atentem contra os direitos e garantias
individuais. A exacerbação deste pretenso “direito”, certamente conduzirá o policial numa atividade
criminosa contra a pessoa humana, em que o maior exemplo era o Estado Feudal, onde estes direitos
sequer existiam e necessitou que surgisse o Estado de Direito em substituição àquele, para que pudesse
surgir do povo o cidadão como portador de direitos.

3.4 O policial como cidadão


Esta é a visão inicial em oposição àquela visão míope sobre os Direitos Humanos como
defensores de bandidos. O policial é um cidadão, assim como o bandido, pois “o policial é, antes de
tudo um cidadão e na cidadania deve nutrir sua razão de ser. Irmana-se, assim, a todos os membros da
comunidade, em direitos e deveres.” (BALESTRERI, 2003, p. 22)
Ora, se o policial é, antes de tudo, um cidadão, esta é a sua condição primeira, como portador
de direitos e, obviamente, tutelado pelo ordenamento jurídico brasileiro. Desdobra-se daí que não
existe uma sociedade civil e uma militar ou policial, e também que o policial e o bandido não se
desnudam de sua condição de cidadão.

3.5 O pedagogo da cidadania


Esta visão do policial como educador, um “pedagogo da cidadania”, conforme afirmou
Balestreri (2003), é aquela em que mostra o policial como um profissional que, antes de tudo, respeita
o ser humano, mesmo que seja um bandido da pior espécie (homicida, traficante, sequestrador,
estuprador, etc.). Esses bandidos não se desincumbem de sua condição humana, mesmo que o crime
praticado possa nos proporcionar sentimentos de repulsa.
Mesmo nas condições mais críticas, o policial deverá respeitar os Direitos Humanos, até
daqueles que não respeitaram, pois não se pode exigir respeito desrespeitando e esta é a dimensão do
policial como educador, missão nobre da atividade policial, pois “é por esses comportamentos e
atitudes, mais do que por suas palavras que o policial educa” (BALESTRERI, 2003, p. 24)
Segue o autor afirmando que “só respeita o outro aquele que se dá respeito” e

Quem se dá respeito, não é capaz de macular a si mesmo com práticas atentatórias à própria
dignidade de sua condição humana. Um policial, pois, que queira bem a si mesmo e à
profissão/missão que exerce, jamais se deixará rebaixar a procedimentos criminosos.
(BALESTRERI, 2003, p. 25)

3.6 A violência do Estado


Na conceituação de Weber, o Estado se caracteriza pelo uso da violência legítima e a violência
é o seu instrumento específico, mas o autor utilizou-se desta conceituação de Estado ao final do séc.
XIX. Será que esta conceituação se aplicaria ao Estado atual? Parece-nos que sim, com diferenciações,
pois o Estado de ontem não é o mesmo de hoje uma vez que vivemos num Estado Democrático de
Direito. Gize-se que o Estado pode violar direitos e não somente a violência física, porém há que se
observar critérios.
Dentro desta nova interpretação, o Estado pode utilizar da violência, até mesmo a letal, porém
observando-se fielmente os princípios da proporcionalidade e da legalidade, pois não pode exacerbar
deste “direito à violência” e o funcionário que o fizer em nome do Estado e da sociedade, certamente
será responsabilizado por estes.
O uso legítimo da força não se confunde, contudo, com truculência. A fronteira entre a força e a
truculência é delimitada, no campo formal, pela lei; no campo racional, pela necessidade técnica; e no
campo moral, pelo antagonismo que deve reger o modus operandi de policiais e criminosos.
(BALESTRERI, 2004, p. 26,27)
Não se deve confundir violência legal com truculência, uma vez esta funciona como
provocação de desordem e, quando utilizada por agente estatal, “semeia na sociedade elementos de
fragilização moral, detonando, de forma rapidamente incontrolável, pulsões agressivas no inconsciente
coletivo” (BALESTRERI, 2003, p. 27). Ora, esta violência desnecessária utilizada pelo agente estatal
só pode ser causadora de mais truculência da qual, muitas vezes, o próprio policial é vítima. Portanto,
ao policial “não cabe ser cruel com os cruéis, vingativo contra os antissociais, hediondo com os que
praticam atos hediondos. Apenas estaria com isso, licenciando a sociedade para fazer o mesmo, a partir
de seu inevitável patamar de visibilidade moral”. (BALESTRERI, 2004, p. 28)

Capítulo 4 – Sujeitos de Direitos Humanos (ferramentas e ações)

4.1 Grupos vulneráveis


A vulnerabilidade à violência é distribuída de forma desigual entre as pessoas, já que a
violência pressupõe, em grande parte, alguma desvantagem da vítima em relação ao agressor. Neste
sentido, é importante estudar os grupos que estão mais vulneráveis à violência.
Grupo vulnerável “é o conjunto de pessoas pertencentes a uma minoria que por motivação
diversa, têm acesso, participação e/ou oportunidade igualitária dificultada ou vetada, a bens e serviços
universais disponíveis para a população”. (Bastos, 2002).
A vitimização não está distribuída aleatoriamente entre a população. Nem todas as pessoas são
atingidas, física ou psicologicamente, da mesma maneira ou com a mesma intensidade. Uma criança,
ao presenciar seu pai agredindo sua mãe, sofrerá um impacto muito maior do que um adulto.
Há muito tempo reconhecida pelo senso comum e pelos especialistas do assunto, apenas
recentemente esta realidade alcançou uma visibilidade social capaz de provocar denso debate público e
ações incisivas, resultando em mudanças nas legislações.
Em uma abordagem inicial, identificam-se as vulnerabilidades ligadas às diferenciações de
gênero e de idade.
Homens e mulheres têm chances diferentes de sofrerem violência. Mesmo considerando que a
proporção de vítimas de atos violentos, especialmente de homicídios, é maior entre os homens do que
entre as mulheres, estas últimas têm uma ínfima participação entre os agressores. As mulheres sofrem
principalmente com a violência perpetrada por adultos masculinos que lhe são próximos. Também
sofrem diversas agressões, tanto físicas quanto psicológicas, os homossexuais. Neste caso, a
vulnerabilidade é maior, pois, além das agressões, sofrem estigmatização negativa por parte de vários
órgãos estatais que lhes deveriam proteger.
As crianças e adolescentes também são vítimas em estado acentuado de vulnerabilidade. Nos
últimos mapas da violência no Brasil, foi identificado o grupo de pessoas entre 15 e 24 anos como a
faixa etária mais atingida pelos delitos de homicídio (WAISELFISZ, 2004). Considerando os
adolescentes como pessoas em plena fase de desenvolvimento da personalidade adulta, pode-se pensar
nos resultados prejudiciais de sofrer violência neste período de afirmação de identidade. Quanto às
crianças, estas sofrem já com a violência dos homens contra as mulheres, porém, o mais difícil é
perceber que várias crianças são abusadas física ou sexualmente por pessoas que deveriam lhes
proteger e ajudar, causando traumas de difícil superação. Algumas pesquisas acusam a contribuição
das relações violentas entre pais e filhos para o desenvolvimento de personalidades agressivas.
Outra população que sofre com a vulnerabilidade conferida pelo próprio estado físico e
emocional em que se encontra são os idosos.
As vulnerabilidades relativas a gênero e idade podem ser constatadas pela análise estatística de
registros policiais de ocorrências no Rio Grande do Sul. O número de ocorrências em que crianças,
adolescentes ou mulheres figuram como vítimas é superior àquele em que aparecem como autoras dos
fatos delituosos.
A violência sofrida por mulheres, crianças, adolescentes e idosos é praticada, muitas vezes, no
âmbito doméstico. Além disso, a análise dos homicídios revela que a maior parte das mulheres vítimas
são assassinadas na própria residência, enquanto que os homens são mortos preferencialmente em via
pública.
A definição de violência doméstica é imprecisa. Conforme Sousa (2001), ela

[...] se refere às formas de violência exercidas no âmbito da casa, geralmente entre familiares
ou pessoas com quem se tem laços de afetividade, mas podendo ser exercida por pessoas
estranhas, além de se estender, às vezes, para fora de casa. (SOUSA, 2001, p.15).
Este tipo de violência situa-se no terreno das relações interpessoais, em contextos de pouca
visibilidade para os órgãos públicos, contribuindo com a dificuldade de ser tratada, prevenida e
reprimida. Conforme a pesquisa de vitimização do IBGE, o percentual das pessoas que sofreram
agressão de parente e registraram queixa na polícia e bem menor do que nos casos em que o autor da
agressão é pessoa desconhecida.
Além das questões de gênero e idade, a vulnerabilidade ligada à raça ou etnia deve ser
mencionada. Recentemente, o Brasil voltou a contar sua história de opressão e violência contra os
índios, os negros e outras etnias ou raças. Esta diferença de tratamento em tempos passados traz
consequências nefastas até hoje. A formação de cinturões de miséria oriundos de um desenvolvimento
desordenado mantém a maior parte da população de negros e indígenas em condições extremamente
desfavoráveis em relação às dos brancos. Segundo pesquisas do IBGE, os negros, quando empregados,
possuem salários menores do que os brancos no mesmo tipo de emprego. A polícia também acaba
sofrendo influências desses fatores de segregação, sentindo-se muitas vezes mais à vontade para
reprimir esses segmentos da população.
A violência contra grupos vulneráveis alcançou grande evidência na contemporaneidade. No
decorrer dos últimos anos, com a crescente organização da sociedade civil no Brasil, têm-se afirmado
os direitos individuais e sociais dos cidadãos e uma série de violações anteriormente pouco
reconhecidas e tratadas passou a ser visibilizada e menos tolerada, emergindo como tema de
preocupação social. Essa maior visibilidade relaciona-se aos avanços na percepção dos direitos:

Existe uma maior sensibilidade coletiva de percepção da violência nas várias esferas da
sociedade, perpassando o público e o privado, em relação a atos que passam a ser identificados
como violentos e inaceitáveis devido ao maior reconhecimento de direitos sociais e de
cidadania. (WAISELFISZ, 1998, p. 146).

Uma das principais iniciativas tomadas pelo poder público, nos últimos anos, para atacar esse
problema foi a criação de órgãos policiais de atendimento à mulher, de proteção ao idoso e para a
criança e o adolescente, com o objetivo de oferecer às vítimas um atendimento direcionado, tentando
estimular suas denúncias. Assim, as polícias cumprem um importante papel no primeiro atendimento
às vítimas de violência, na repressão do crime e na própria conscientização das pessoas envolvidas
quanto aos seus direitos e deveres. Uma vez que os problemas dessa ordem provêm de causas variadas,
o rompimento do ciclo de violência exige a atuação integrada do poder público com as entidades da
sociedade civil.
Em termos jurídicos também houve mudanças importantes, com a criação de legislação
específica a cada grupo. Dentre elas, pode-se citar o Estatuto da Criança e do Adolescente, o Estatuto
do Idoso, a lei que define os crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor e a promulgação da
recente Lei Maria da Penha, que representa um instrumento mais eficaz de defesa das mulheres.
Além do que já foi referido, há outras formas mais difusas de vulnerabilidade, ligadas à
pobreza ou a condições especiais de trabalho.
As populações de periferia das grandes cidades, como as residentes nas favelas do Rio de
Janeiro, sofrem tremendo estigma sem terem necessariamente contribuído para a violência e a
criminalidade. Há uma crença geral de que a criminalidade está concentrada naqueles locais,
desprezando-se totalmente o fato de que a maioria das pessoas lá residentes é constituída de
trabalhadores que, por sua vez, vivem em situação de exclusão social. Neste sentido, Cano e Santos
(2001) discutem a “hipótese da vitimização diferencial”, segundo a qual os indivíduos de renda mais
baixa têm maior probabilidade de serem mortos do que os de maior renda. Conforme a perspectiva
teórica centrada na vítima, a renda age como fator de proteção contra a violência.
De certa forma, poderíamos incluir também os policiais entre os grupos vulneráveis à violência,
por trabalharem diretamente expostos à criminalidade em condições desfavoráveis (escassez de
equipamentos de proteção individual, assistência psicológica deficiente) e outros fatores que causam
sofrimento no trabalho (MORAES JR., 2005).
Outros grupos vulneráveis também estão presentes na sociedade. O importante é que sejam
vistos como tais, necessitando de maior atenção do poder público, bem como tratamento diferenciado
pelas polícias e demais órgãos de segurança pública.
Enquanto fenômenos sociais, o crime e a violência modificam-se na mesma medida em que se
transforma a sociedade. Os avanços tecnológicos e aqueles relativos ao reconhecimento de direitos
apresentam constantes desafios aos que trabalham com a segurança pública. Cabe a esses profissionais
compreender a sua própria importância diante dessas tendências, e buscar conhecê-las.

4.2 Policial como protagonista e sujeito de Direitos Humanos


Desde sua criação, a Brigada Militar tem como objetivo principal a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, dentro das mais variadas atividades que
realiza. A essência primordial é o contato com a comunidade, qualificando para isso seus integrantes,
para que, com diálogo e empatia, consigam realizar o trabalho de prevenção da melhor forma possível.
Em sentido amplo, o conceito de prevenção policial compreende tanto o emprego do
policiamento ostensivo fardado como o exercício de ações educativas voltadas ao cidadão. Nessas
ações de prevenção, enquadram-se aquelas que visam a prevenir quaisquer tipos de ato atentatório à
dignidade humana.
Sabedores que somos que o Brasil é signatário de diversos tratados internacionais de Direitos
Humanos e que o histórico da inserção da força policial no Brasil atribui posição antagônica entre a
efetividade dos Direitos Humanos e a atuação das forças de segurança pública, há necessidade de que
esses dois institutos atuem juntos em defesa da sociedade.
É importante aproximar a polícia da comunidade por meio de ações afirmativas, de programas
institucionais consistentes que resgatem a dignidade do profissional de segurança pública e a confiança
do cidadão, há muito tempo perdida, na atividade policial.
Atualmente, as ações afirmativas podem ser definidas como um conjunto de políticas públicas e
privadas de caráter compulsório, facultativo ou voluntário, concebidas com vista ao combate à
discriminação racial, de gênero e de origem nacional, bem como para corrigir os efeitos presentes da
discriminação praticada no passado, tendo por objetivo a concretização do ideal de efetiva igualdade
de acesso a bens fundamentais como a educação e o emprego.
Pessoas com deficiência sempre formaram um grupo discriminado, excluído do ambiente
econômico e social, e merecem o mesmo olhar. Alijados do mercado de trabalho e impedidos de se
desenvolverem como pessoas, os deficientes subsistiram, até que uma forma diferente de pensamento
emergiu com o fim da II Guerra Mundial. Nesse período, vários soldados, ao voltarem da guerra com
seus corpos mutilados, despertaram a atenção do poder público.
A partir daí, um novo tratamento começou a ser pleiteado pelos parentes desses indivíduos, que
argumentavam serem eles merecedores de mais respeito e dignidade humana. Tal demanda, apenas,
poderia ser concretizada pelo acesso ao meio social que o emprego é capaz de proporcionar.
O princípio da busca do pleno emprego surgiu na ordem econômica brasileira pela Emenda
Constitucional nº 01/69, com o nome “expansão das oportunidades de emprego produtivo” (art. 160,
inc. VI, Constituição Federal (CF/67-9). Todavia, somente com a promulgação da CF/88 é que o
conceito de emprego foi ampliado e lapidado para comportar, por exemplo, a ideia de sistema de cotas
para acesso de deficientes a cargos e empregos, públicos ou privados. Esse sistema de ação afirmativa,
atualmente, vigora como desdobramento da vedação constitucional de toda e qualquer discriminação,
tanto no tocante a salário como a critérios de admissão do trabalhador com deficiência, instituída desde
o inc. XXXI do art. 7º desta Carta Política brasileira.
Segundo o Decreto n° 3.298/99, que regulamenta a Lei nº 7.853, de 24 de outubro de 1989, que
dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa com Deficiência, as pessoas com
deficiência de grau leve não são considerados deficientes. Ao excluir a proteção dessas pessoas com
deficiência, o ato normativo colide frontalmente com o pleno emprego, valor constitucionalmente
assegurado, bem como com o Decreto n° 6.949/09, por meio do qual o Brasil ratificou a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo Facultativo, assinados em
Nova York, em 30 de março de 2007.
Fazem parte desta política:
 grupos étnicos raciais;
 políticas de combate à discriminação com recorte de gênero;
 população LGBTT;
 pessoas em situação de rua;
 refugiados.

A EXCLUSÃO DOS POLICIAIS NOS DISCURSOS SOBRE DIREITOS HUMANOS

Nos relatórios sobre direitos humanos, seja em nível internacional como os da Human Rights
Watch ou Anistia Internacional, seja em nível nacional, como pesquisas acadêmicas das universidades,
os profissionais de segurança pública são constantemente citados como violentadores de direitos, mas
muito pouco como violentados.
Principalmente no que diz respeito aos direitos trabalhistas, ou nas defesas contra assédio
moral, ou mesmo nas defesas do que a mídia publica sobre estes profissionais, nenhuma voz se
levanta.
No Relatório Final da Comissão Especial de Segurança Pública, da Assembleia Legislativa do
Estado do Rio Grande do Sul, em 2003, observa-se o seguinte comentário, feito pelos parlamentares
gaúchos:

É compreensível que mortes de civis pela Polícia tenham grande repercussão. Nasceu o mito da
prepotência policial. Mas os números não o confirmam. Parece ocorrer, em muitas situações,
conflito entre a "Era da Informação Instantânea" e a "Era da Informação Desejada". Uma
noticia o fato no momento em que acontece, a outra noticia também o fato mas já revestido da
ótica desejada. E, assim, passa a ser verdade uma interpretação subjetiva. A Polícia violenta é
um desses casos.[...] Os números acima demonstram que a repercussão de incidentes
lamentáveis cria imagem que não corresponde aos dados estatísticos.

Isto evidencia que os policiais são tratados como profissionais que tem por obrigação enfrentar
a violência, mesmo que não lhes sejam oferecidas as condições mínimas para tal enfrentamento.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Aqui se traz o que já foi escrito em outras ocasiões sobre o mesmo tema4
As instituições policiais encontram-se, de certa maneira maltratadas, tanto como sendo a única
instituição estatal que atinge todas as camadas da população, quanto na consideração de culpa pelo
crescimento da violência.

4
Ver outros artigos sobre violência contra policiais escritos por Martim Cabeleira de Moraes Jr.
Pois em ambos os casos, considerando o sistema de segurança pública, tal como descrito por
SILVA (1999, p. 85), envolvendo o ministério público, o judiciário, o sistema prisional e outros
órgãos, que atuam desde a prevenção ao crime até a ressocialização do delinquente, passando pelo
julgamento e prisão, somente a polícia está acessível às camadas menos privilegiadas da população,
uma vez que vai até o local onde ocorrem fatos que exijam intervenção desta instituição.
Os direitos humanos são sempre pensados como se não envolvesse os policiais do ponto de
vista das vítimas, mas sempre como algozes.
Nesta esteira o programa de saúde mental para os trabalhadores da segurança púbica (2002)
colocou a seguinte conclusão:

Se, por um lado, muito tem-se dito a respeito do trabalho policial, sistema prisional,
arbitrariedade, corrupção e impunidade policiais, por outro lado, muito pouca ou quase
nenhuma atenção tem-se dedicado aos modos de funcionamento das organizações da segurança
pública. Temos assistido a uma inflação de debates nunca antes promovida, frequentes
reportagens policiais com forte apelo sensacionalista, explorando a inoperância do aparelho
policial ou, então, a violência por ele exercido, não raras vezes, tratadas como se fossem
mercadorias. Esta forma simplificada de encaminhamento da discussão sobre a temática causa
efeitos que se refletem na formulação de um senso comum cristalizado prejudicial para o
avanço das discussões, produzindo sofrimento, ou seja, efeito nos policiais.

É preciso que, cada vez mais os acadêmicos e juristas, bem como os próprios policiais
compreendam a necessidade de que a violação de direitos humanos dos policiais sejam tornados
visíveis e façam parte da contextualização das discussões sobre segurança pública, criminalidade e
violência.
Conforme já mencionado, seguindo as ideias de SILVA (1999), os problemas de segurança
pública devem ser vistos considerando todo sistema social de proteção aos cidadãos, desde a
prevenção até a recuperação de delinquentes, passando, necessariamente, por questões como o
tratamento adequado da violência a que estão expostos os policiais.
Nada pode acontecer, sem que antes exista um diagnóstico confiável do quadro geral
apresentado, eis porque as pesquisas devem ser estimuladas, mas não como motivo de orgulho dos
pesquisadores, e sim como ferramentas alavancadoras de políticas públicas que visem resolver os
problemas sociais de segurança pública.
Por derradeiro se conclui que, como afirmou o ex-secretário nacional de segurança pública Luiz
Eduardo Soares, é necessário que se faça uma discussão honesta e apartidária sobre a violência urbana,
para então se chegar a um consenso sobre quais as medidas efetivas a serem tomadas, independente de
motivações individuais ou corporativas.
Assim se espera que discussões sobre a violência contra policiais, sejam cada vez mais
freqüentes e profundas, permitindo assim uma progressão dialética, onde cada tese poderá originar
novas antíteses e sínteses, as quais servirão como novas teses, seguindo um ciclo evolutivo de
pensamentos e práticas em prol do bem estar social.
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WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da violência IV: os jovens do Brasil. Brasília: UNESCO,
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