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Análise semântico-argumentativa de uma crônica de José Simão:

a relevância do fator textual coerência e da estratégia da seleção lexical

CORRÊA, Julio César Portela - UEL (PG)

0. Introdução

Nosso trabalho tem por objetivo principal analisar, com base nas teorias da
lingüística textual e da semântica argumentativa, uma crônica humorística de autoria do jornalista José
Simão, publicada em outubro de 2006, no jornal Folha de S. Paulo.
O autor estudado possui um estilo próprio e bastante despojado de escrever seus
textos. Com sutis (e às vezes, nem tanto) toques de humor, comenta e critica atitudes e acontecimentos do
cotidiano no Brasil e no mundo, em diversas áreas. Seus textos abrangem assuntos desde a economia e a
política, até esportes e entretenimento. Embora utilize uma linguagem informal e objetiva, nem sempre
parece fácil compreender o seu texto completamente. Esta aparente dificuldade será o principal enfoque
do presente trabalho.
Ao longo do artigo, procuramos examinar os diversos mecanismos textuais
utilizados pelo autor, dentre eles a evidente e cuidadosa seleção lexical – e a importância dos fatores de
coerência para completa compreensão e interpretação de sua crônica.

1. Referencial teórico

A base teórica escolhida para este trabalho engloba aspectos da Semântica


Argumentativa ou Semântica da Enunciação, desenvolvida por Anscombre e Ducrot (1976) e da
Lingüística textual, cujos precursores foram Dressler (1974) e Beaugrande (1980).
A Semântica Argumentativa traz a máxima de que a argumentação está na própria
língua e que não é somente a estrutura do enunciado o bastante para demonstrar todos os seus sentidos. A
Argumentação tem origem remota, possuindo na Retórica, arte considerada suprema nos últimos cinco
séculos antes de Cristo, sua descendência. Nesse período, a Retórica já possuia divisões de uso, as quais
deram origem aos três gêneros de discurso: forense, político e epidítico ou cerimonial. A argumentação
compreende uma série de estratégias das quais lança mão o enunciador – incluí-se aí a estratégia da
escolha lexical, em que se estabelecem as oposições, os jogos de palavras, as metáforas etc. – com a
principal finalidade de persuadir seu interlocutor. Ao considerar a linguagem como um ato de persuasão,
é possível deduzir que não há discurso neutro e um papel muito importante nesse jogo comunicativo é
desempenhado pelo interlocutor, responsável pelas deduções (chamadas pela Lingüística Textual de
Inferências) e interpretações do discurso.
Nesse ponto há o encontro do que postula a Lingüística Textual ao afirmar que a
coerência, fator importantíssimo para a compreensão do texto/discurso, decorre de fatores dos mais
variados: lingüísticos, discursivos, cognitivos, culturais, interacionais etc.
Dentre esses fatores, os que observamos estar intimamente ligados com a leitura do
texto em questão são os elencados por Koch e Travaglia (1995): a) conhecimento lingüístico; b)
conhecimento de mundo; c) conhecimento partilhado; d) inferências; e) intertextualidade; f)
intencionalidade e aceitabilidade;
Ao decorrer da análise, é possível que haja alguns pontos de interseção entre as duas
teorias, visto que possuem algumas semelhanças, especialmente no que diz respeito às intenções do autor
no momento de produzir seu texto.

2. Análise

Logo no título “Buemba! O Lula pegou uma barbada!”, notamos as pistas que o
autor fornece do que será o seu texto. Apenas com esse fragmento já é possível verificar o uso do recurso
da Seleção Lexical. A expressão Buemba!, assim como outras tantas que veremos no decorrer do texto,
são comuns e recorrentes em suas crônicas. Assim notamos que, ao selecionar repetir este termo para
iniciar a crônica, o autor tem a intenção de chamar o leitor para a leitura. Desse modo, além de trazer algo
familiar, demonstra que o texto que segue é de sua autoria, como uma marca registrada já utilizada em
outros textos. Em seguida, o autor conta com o conhecimento de mundo do seu leitor, que acaba por ser
também conhecimento partilhado entre autor e leitor, sem o qual é e será, em inúmeras outras partes do
texto, impossível de se estabelecer a coerência, essencial para seu entendimento. O autor espera que o
leitor possua algumas informações prévias tais quais: O Lula citado, refere-se ao atual presidente da
república e então candidato à reeleição (como já foi dito na introdução, a crônica foi publicada em
outubro de 2006, época de eleições presidenciais), a expressão pegar uma barbada vem do Turfe e refere-
se ao cavalo de um páreo que é considerado favorito por sua comprovada superioridade em relação aos
demais e por extensão, na linguagem coloquial, é também considerada qualquer competição fácil de ser
vencida. Dessa forma, apenas com o título, o leitor já poderá inferir do que o texto irá tratar: política –
especialmente a corrida presidencial e o possível favoritismo do candidato Lula.
Como são característicos das crônicas deste autor, seus parágrafos possuem orações
curtas, com muitas informações e pontuação bastante exclamativa. Isso, por si só, já demonstra uma
necessidade de se escrever muito em pouco espaço (físico ou temporal) e, assim, sua escolhas, tanto
lexicais como de argumentos e até mesmo de pontuação, devem ser as mais precisas possíveis, porém
sem quase nenhuma oportunidade de auto-explicação.
O primeiro parágrafo inicia-se com uma espécie de auto-apresentação satírica:
Buemba! Buemba! Macaco Simão Urgente! O esculhambador-geral da República! Direto do País do
Pleito Caído!. Destacamos aí a escolha lexical, o jogo de palavras com o termo Pleito que, ao aproximar
com o termo caído, torna aparente a homofonia entre pleito e peito, tornando a comparação cômica. Isso
também ocorre com o pseudo-cargo criado pelo autor esculhambador-geral, que faz alusão a outros, de
fato, existentes como, por exemplo, Procurador-Geral. Em seguida temos: Debate no SBesTeira! Num
güento mais debate. Prefiro debater uma banana com Neston! E o Lulalelé só repete: 'o adversário só
sabe vender, não sabe comprar'. Só o Lula sabe comprar: deputado, dossiê e avião! Rarará. Neste
trecho, há vários jogos de palavras, deixando clara a escolha da linguagem coloquial e oral, percebida
pelo uso de termos como güento e rarará. Há inclusive a paródia da sigla SBT, transformada em
SbesTeira, explicitando a posição ideológica do autor em relação à emissora de TV. Além disso, o autor
conta com o conhecimento de mundo do leitor para que o trecho tenha o sentido de humor pretendido,
entre eles os fatos recentes da política no país, envolvendo compra de deputados e de um dossiê por
colegas de partido do candidato Lula, contra políticos de oposição ao seu partido e da aquisição de um
novo avião, por parte do governo federal, apelidado de “Aerolula”.
No segundo parágrafo temos:

E por que o Geraldo Picolé de Chuchu só repete: 'Você, que está em


casa! Você, que está em casa'. E quem tá no motel? Tem tara pra tudo! 'Meu
bem, vamos assistir o debate no motel?'. E o Lula fala tanto em futebol que
ele vai lançar um novo regime político: a TORCIDOCRACIA! Rarará!

Neste parágrafo, ficam evidentes duas críticas do autor: a primeira em relação à fala
repetitiva do candidato Geraldo Alckmin e a crítica às recorrentes metáforas futebolísticas utilizadas pelo
candidato Lula. No trecho, ainda é possível notar a despreocupação com a norma culta da língua
portuguesa. O autor utiliza assistir o debate, embora a regência gramatical do verbo assistir, com o
sentido de ver, observar, apreciar exige a preposição a, no caso, assistir ao debate. Ainda notamos que,
por meio da seleção lexical utilizada pelo autor na atribuição da alcunha Picolé de Chuchu ao candidato
Geraldo, é possível inferir seu conceito de pouca estima em relação ao candidato.
No terceiro parágrafo, notamos:

E já tem gente cantando a vitória do Lula, pegou uma barbada!


Barbudo pega uma barbada! E, se dependesse do público masculino, a Ana
Paula Padrão teria levado no primeiro turno. E eu tenho uma sugestão pro
Geraldo derrubar o Lula. Tem um cavalo que corre no Jockey Club de
Buenos Aires chamado El Seka Lula. Compra o cavalo, importa o cavalo.
Cavalo argentino derruba o Lula. Rarará!

Neste parágrafo, o autor retoma o título do texto, acrescentando-lhe mais um jogo


com as palavras barbada e barbudo, contando mais uma vez com o conhecimento prévio do leitor em
relação às características físicas de Lula. Além de fazer uma observação cômica e um pouco machista em
relação à mediadora do debate realizado entre os presidenciáveis, Ana Paula Padrão, o autor utiliza,
também com humor, a polissemia do verbo derrubar.
No quarto parágrafo, o texto deixa um pouco de lado a política para tratar de
assuntos ligados ao mundo do entretenimento, vejamos:

E a Madonna? A Madonna quer adotar um menino malauiano. Tá


mais fácil adotar um goiano! E eu queria ser filho da Madonna. Primeiro
pra chamar a Madonna de mamãe. E segundo que, se eu fosse filho da
Madonna, ia mamar até os 15. Rarará! E eu já disse que a grande sensação
do Salão do Automóvel é a minivan chinesa: a Chana! E aí um leitor me
perguntou: e se um Picasso der uma porrada na Chana é acidente de
trânsito ou estupro? Rarará. E diz que a Clodovéia, ops o Clodovil, assim
que entrar no Congresso vai gritar: 'Quero todos os membros em pé!'. E nem
precisa cantar o Hino Nacional! Rarará. E na Mostra vai ter mulher
pelada? Porque eu só vou em Mostra que mostra tudo. É mole? É mole, mas
sobe. Ou, como diz aquele outro: é mole, mas chacoalha pra ver o que
acontece!

Novamente o autor conta com o conhecimento partilhado entre autor e leitor para se
fazer compreender. Primeiro o leitor necessita saber que Madonna é uma famosa cantora norte-
americana, considerada por diversas vezes símbolo sexual e que, em visita à África, interessou-se, como
dito, em adotar uma criança que se encontrava em situações precárias. A partir desse mote, o autor
aproveita para fazer uma piada com conotações sexuais. Em seguida, ao comentar sobre um automóvel
denominado Chana, aproveita a homofonia do termo com outra palavra que na linguagem popular
denomina o órgão reprodutor feminino, considerada tabuísmo. Assim, utiliza mais uma vez a polissemia
do nome próprio para fazer piada com outro modelo de automóvel Picasso. O autor segue abusando da
seleção lexical, por meio da polissemia e do conhecimento de mundo por parte do leitor para fazer piada
com o estilista, homossexual assumido e deputado federal eleito, Clodovil Fernandes e com uma Mostra,
sobre a qual não dá detalhes. Ao final do parágrafo, encerra com uma expressão popular É mole? A qual é
utilizada como pretexto para satirizar, mais uma vez, com possíveis conotações sexuais.
No penúltimo parágrafo do texto, o autor conta com mais um fator de coerência, o
intertexto dos termos reloaded e a missão, que se relacionam a seqüências de obras cinematográficas e,
assim as utiliza para dar o mesmo sentido de continuação à sua campanha, vejamos:

Antitucanês Reloaded, a Missão. Continuo com a minha vulcânica e


mesopotâmica campanha 'Morte ao Tucanês'. Acabo de receber mais um
exemplo irado de antitucanês. É que em Recife tem uma rua chamada Beco
da Facada. Uau. Parece Dias Gomes. Viva o antitucanês. Viva o Brasil!

O tucanês aqui pode ser entendido como um discurso mais formal e rebuscado
utilizada por políticos filiados a um partido cujo símbolo é o tucano. Além disso, ocorre mais um
intertexto: ao considerar Beco da Facada, um exemplo de antitucanês, acrescenta a opinião de que
parece Dias Gomes. No caso, a comparação é em relação à linguagem direta e clara do dramaturgo. Sem
esses conhecimentos e informações extralinguísticas, o trecho tornar-se-ia bastante incoerente para o
leitor.
O lulês, ao contrário do tucanês, é considerado pelo leitor uma língua mais fácil,
assim tem o exemplo do último parágrafo:

E atenção. Cartilha do Lula. Mais um verbete pro óbvio lulante.


'Repetente': companheiro que vai votar de novo no PT. Rarará. O lulês é
mais fácil que o inglês. Nóis sofre, mas nóis goza. Hoje só amanhã. Que eu
vou pingar o meu colírio alucinógeno. Chega de pleito! Queremos blunda!

Mais uma vez o autor é bastante criativo ao fazer um jogo de palavras com o termo
repetente. E, novamente, o conhecimento partilhado com o leitor é imprescindível para produzir os
efeitos de sentido necessários. Ao final, utiliza, nessa crônica, expressões já bastante conhecidas por seus
leitores, devido ao fato de sempre repeti-las ao final de seus textos e encerra mais uma vez com um jogo
de palavras, com a palavra pleito (o mesmo que disputa) e neologismo, blunda. Tudo para manter o tom
cômico e bem-humorado, presente em todo o texto.

3. Conclusão
Diante dessa análise, é possível concluir que, de fato a seleção lexical exerceu um
relevante e decisivo papel na produção da crônica. O cuidado com a escolha dos termos fez com que
ocorressem os efeitos de humor, sátira e crítica pretendidos.
No entanto, a aparente facilidade de leitura, em virtude de ser um texto curto, em
linguagem direta, traz, na verdade, uma certa dificuldade e exige um leitor altamente qualificado. Ou seja,
para ser compreendido em todos os seus possíveis sentidos, o texto necessita de um leitor que possua
conhecimentos abrangentes de atualidades em diversas áreas e assuntos, sem os quais o texto não atingiria
sequer o objetivo de ser cômico.
Assim, a preocupação do autor em persuadir o leitor fica evidente, embora na
mesma proporção, se faz necessária um amplo conhecimento extralingüístico por parte do leitor para
fazer inferências e, no jogo discursivo, compreender, acatar ou discordar das posições ideológicas do
autor.

4. Referências

ANSCOMBRE, J. C. e DUCROT, Oswald. L’argumentation dans la langue. In Langages 42, Didier


Laurousse, Paris, 1976. P. 5-27

BEAUGRANDE, Robert de. Text, discourse and process. Londres: Longman, 1980.

DRESSLER, Wolfgang U. Introduzione alla linguistica del texto. Roma: Officina Edizioni, 1974.

KOCH, Ingedore G. V. e TRAVAGLIA, Luiz C. A coerência textual. São Paulo: Contexto. 6ª ed., 1995.

SIMÃO, José. Buemba! O Lula pegou uma barbada! In: Folha de S. Paulo, São Paulo, 21/10/2006.

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