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Revista Brasileira de Nutrição Clínica Volume 27 • Número 4 • Outubro-Dezembro/2012

Volume 27 • Número 4 • Out–Dez/2012


ISSN 0103-7196
Revista Brasileira de

Nutrição Clínica
Volume 27 – número 4
Outubro/Dezembro de 2012

Publicação Oficial Odery Ramos Júnior


Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (SBNPE)   Universidade Federal do Paraná – Faculdade Evangélica
Federación Latinoamericana de Nutrición Parenteral y   de Medicina do Paraná – Curitiba/PR
Enteral (FELANPE) Paulo Roberto Leitão de Vasconcelos
  Universidade Federal do Ceará – Fortaleza/CE
Indexada na base de dados LILACS – Literatura Latino- Rosa Gaudioso Celano
Americana e do Caribe em Ciências da Saúde   Universidade de Taubaté – São Paulo/SP
Ricardo Guilherme Viebig
Editor Chefe:   Inst. de Gastroenterologia de SP (IGESP) – São Paulo/SP
Joel Faintuch Ricardo S. Rosenfeld
  Hospital da Lagoa – Rio de Janeiro/RJ
Editores Associados: Roberto Carlos Burini
Josefina Bressan   UNESP – Botucatu/SP
Mário Cícero Falcão Roberto José Negrão Nogueira
  Universidade de Campinas – Campinas/SP
Robson Freitas de Moura
Corpo Editorial
  Escola Bahiana de Medicina – Salvador/BA
Nacional
Silvio José de Lucena Dantas
Antônio Carlos L. Campos   Universidade Federal do Rio Grande do Norte – Natal/RN
  Universidade Federal do Paraná – Curitiba/PR
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Cristina Martins Atalah E – Chile
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  Fundação Pró-renal – Curitiba/PR Baptista G – Venezuela
Dan L. Waitzberg Camilo ME – Portugal
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Eduardo Eiras da Rocha Crivelli A – Argentina
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Helvio Chagas Ferro Freund H – Israel
  Santa Casa de Misericórdia de Maceió – AL García de Lourenzo A – Espanha
Izaura Merola Faria Klaasen J – Chile
  Instituto da Criança – Curitiba/PR Kliger G – Argentina
Jonas Moreira Cortez Perman M – Argentina
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  Instituto de Medicina Integral Prof. Fernando Figueira -
  IMIP – Recife/PE Secretária:
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  Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da
  USP – São Paulo/SP Revisora Científica:
Maria Cristina Gonzalez Rosangela Monteiro
  Universidade Católica de Pelotas – RS Projeto Gráfico, Diagramação e Revisão:
Maria de Lourdes Teixeira da Silva Sollo Comunicação e Design
  Hospital da Beneficência Portuguesa – São Paulo/SP
Maria Isabel T. Davisson Correia Impressão:
  Fundação Mário Pena – HC – Belo Horizonte/MG Prol
Faintuch J & Ramos O

Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral


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Presidente:  Comitê de Farmácia: 


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Membros do Comitê Educacional:  
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Izaura Merola Faria
Segundo Tesoureiro: Rita Medeiros
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Comitê de Defesa Profissional: Suely Itsuko Ciosak
José Eduardo Aguilar Nascimento Letícia Faria Serpa

Comitê de Nutrição: Mario Jorge Sobreira


Maria Carolina Gonçalves Dias Marcelo Gastaldi

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II
Sumário
Editorial/ Editorial
O mercado de trabalho para nutricionistas: qual é o futuro?...........................................................................................211
Job market for dietitians: what is the future?
Joel Faintuch, Odery Ramos
Artigos Originais/Original Articles
Cálcio, goma guar parcialmente hidrolisada e triacilglicerídeos de cadeia média interferentes na disponibilidade do ferro
não-heme em soluções nutrientes......................................................................................................................................... 213
Calcium, partially hydrolyzed guar gum and triacylglycerols of medium chain of interfering availability of non-heme iron in nutrient solutions
Luciana Bueno, Julio Sérgio Marchini, José Eduardo Dutra de Oliveira
Análise comparativa de fórmulas de estimativa de peso e altura para pacientes hospitalizados. ............................................ 218
Comparative analysis of equations for estimating weight and height for hospitalized patients
Elizabete Alexandre dos Santos, Roberta Nemer Camargo, Andrea Zumbini Paulo
Efeito da adição de fibras dietéticas a dietas hospitalares oferecidas a mulheres no pós-operatório de cirurgias obstétricas e
ginecológicas . ....................................................................................................................................................................226
Effect of dietary fiber addiction in hospital diets offered to women after surgery of obstetric and gynecological surgeries
Sandra Soares Melo, Camila Saueressig, Jaqueline Fuchter Filipi, Daiani Reis, Patrícia Formento
Perfil antropométrico de crianças internadas em uma unidade de pediatria segundo as curvas de crescimento NCHS e OMS . 235
Anthropometric profile of children admitted to a pediatric unit according to the NCHS and OMS growth charts
Vivian Cardoso Assis, Thais Araújo Cavendish, Maria Hélida Guedes Logrado, Eliane Oliveira Ustra

Artigos de Revisão/Review Articles


Avaliação nutricional subjetiva proposta pelo paciente versus outros métodos de avaliação do estado nutricional em pacientes
243
oncológicos .........................................................................................................................................................................
Patient-generated subjective nutritional assessment versus other methods of evaluation of nutritional status in oncological patients
Ana Lilian Bispo dos Santos, Rebeca de Castro Marinho, Priscila Nunes Martins de Lima, Renata Costa Fortes
Desnutrição em oncologia: revisão de literatura . ................................................................................................................. 250
Malnutrition in oncology: literature review
Cristiane Amine Smiderle, Carin Weirich
Métodos de avaliação da gordura abdominal........................................................................................................................ 257
Methods for evaluation of abdominal fat
Marina de Moraes Vasconcelos Petribú, Cláudia Porto Sabino Pinho, Poliana Coelho Cabral, Ilma Kruze Grande de Arruda,
Ana Maria de Carvalho Albuquerque Melo
A importância dos probióticos na microbiota intestinal humana................................................................................... 264
Importance of probiotics on the human intestinal microbiota
Elisandra Salete Stürmer, Samuel Casasola, Maristela Comoretto Gall, Magda Comoretto Gall
Contagem de carboidratos aplicado ao planejamento nutricional de pacientes com diabetes melittus.................................. 273
Carbohydrate counting applied in the nutritional plan of diabetes mellitus’s patient
Bianca da Silva Oliveira, Simone Côrtes Coelho
Estado nutricional e diabetes mellitus gestacional .............................................................................................................. 280
Nutritional status and gestational diabetes mellitus
Vanessa Meurer Campos, Jean Carl Silva, Silmara Salete de Barros Silva Mastroeni

Instruções aos Autores / Instructions for Authors..................................................................................................285


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III
Faintuch J & Ramos O

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IV
E Editorial

O mercado de trabalho para nutricionistas: qual o


futuro?
Job market for dietitians: what is the future?

Joel Faintuch1,Odery Ramos2

Mercado de trabalho é uma preocupação altamente individual, como também eminentemente coletiva. É relevante saber
que a taxa de desemprego numa determinada ocupação é de apenas 2%, ainda que se o leitor fizer parte desses 2% a notícia
nada conterá de auspiciosa. Na mesma medida, se a faixa de salários da profissão se elevou, tal informação é economicamente
significativa, com a óbvia exceção daqueles que continuam recebendo a mesma remuneração.

Essas considerações seriam um tanto filosóficas e acacianas se o mundo não vivenciasse transformações tão drásticas e aceleradas.
Gerações de “brazucas” e “dekasseguis” investiram anos de luta, respectivamente, nos Estados Unidos da América e no Japão, com
retornos compensadores e até espetaculares. Muitos compatriotas se radicaram no exterior e mantêm seu padrão de vida. Ainda assim,
quase da noite para o dia o fluxo se inverteu, e hoje o número dos que retornam excede em muito o daqueles que ainda se aventuram lá fora.

O paralelo não é apropriado e os contextos são distintos. Ainda assim, o programa Ciência sem Fronteiras, que já começou a
despejar milhares de discentes de graduação e pós-graduação em instituições estrangeiras de ensino superior, desperta em igual
medida paixões e insônias. Ganhará o país? Lucrarão os bolsistas? O desempenho científico e tecnológico do profissional e das
instituições nacionais será alavancado? Ou estaremos diante de mera bolha de esperança e otimismo? As dúvidas são tão grandes
quanto o porte da iniciativa, e somente o futuro trará em seu bojo as respostas esperadas.

Numa abordagem mais pragmática, como se encontra o mercado de trabalho dos profissionais da nutrição clínica? Neste
editorial, serão tecidas algumas considerações específicas para nutricionistas, alicerçadas em recente texto da revista da Associação
Dietética Americana, que recentemente mudou de designação1. Como as informações relativas ao meio brasileiro são extremamente
escassas, as conjecturas aqui apresentadas tanto poderão fazer muito sentido quanto se encontrarem equivocadas. Desde já, ficam
colegas nutricionistas e outros interessados convidados a enviar Cartas ao Editor da RBNC, se possível com números e referências,
para maior objetividade, aprovando, rejeitando ou comentando a mensagem que se segue.

Números gerais
O Escritório de Estatísticas de Trabalho Americano (U.S. Bureau of Labor Statistics)2 assinalou, em 2010, que as nutricionistas
americanas recebiam, em média, 53.250 dólares anuais, ou pouco mais que 4.000 dólares por mês. Torna-se difícil comparar
com as remunerações brasileiras, por conta de significativas diferenças de custo de vida, impostos, benefícios adicionais, como
férias, 13º salário e FGTS (nenhum desses existente nos Estados Unidos) e investimento prévio (as universidades americanas são
geralmente dispendiosas).

Um diferencial é a introdução de internato e residência para nutricionistas em muitas instituições, algo já oficializado e
reconhecido pelo “Accreditation Council for Nutrition and Dietetics” da “Academy of Nutrition and Dietetics”, nova designação da
antiga “American Dietetic Association”. Retornando ao prisma da empregabilidade, o Escritório prevê um crescimento de 20% nos
postos de trabalho até 2020, acima da média americana. Deve-se interpretar com cautela essa previsão, tendo-se em vista a recessão
norte-americana e mundial, que em 2010 já se delienava, contudo não se afigurava tão profunda e longeva quanto agora.

Oferta de mão-de-obra
No âmbito norte-americano, a crise não gerou redundância de nutricionistas. Ao contrário, relata-se que a demanda mantém-
se um pouco maior que a oferta, algo que não parece ser verdade em nosso meio. Com a explosão de escolas superiores brasileiras
nas últimas décadas, não há notícia de carência em nenhum setor das profissões da saúde. O que se tornou raridade são postos de
trabalho sérios, bem estruturados e com oportunidades de progressão na carreira, porém essa é uma realidade válida para todos
recém-formados, não importa a área.

1. Editor da Revista Brasileira de Nutrição Clínica.


2. Presidente da Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral.

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Faintuch J & Ramos O

Demografia
Em um país etnicamente diverso como os Estados Unidos da América, onde os hispânicos e os negros são minorias significativas
e, em geral, economicamente menos favorecidas, a estratificação dos profissionais acentua tal disparidade. Assinala-se, também,
o envelhecimento dos nutricionistas em atividade, algo certamente decorrente da escassez de mão-de-obra.

No Brasil, como sabido, os que defendem as cotas raciais nos exames vestibulares utilizam como argumento precisamente
essa subrepresentação da população mestiça, negra e indígena.

Empregos na gestão e na indústria


O estudo dá ciência que a proporção de nutricionistas atuando como consultores ou assessores em comércio, indústria e
serviços tende ao declínio. Torna-se difícil depreender se tal se deve à retração global desses setores numa economia em recessão,
ou se outros elementos ocupam vagas antes reservadas para nutricionistas.

No Brasil, escuta-se muito sobre nutricionistas se estabelecendo, individualmente ou junto a grupos organizados, na montagem
de restaurantes, lanchonetes, pizzarias e estabelecimentos do gênero, porém estatísticas são quase inexistentes.

Nutrição clínica
No grande país do norte, essa área se encontra em florescimento, notadamente no que tange a subespecialidades com nutrição
em moléstias renais, emagrecimento ou pediatria. Enfatiza-se que esse é o terreno onde a titulação e a qualificação profissional
são mais requeridas, algo pelo que a SBNPE sempre se bateu.

Ao que consta, o comércio, a indústria e os prestadores de serviços levam mais em conta a experiência empresarial que o
diploma de especialista, o que se encaixa na ótica mercantil de tais estabelecimentos.

Educação, ensino e pesquisa


A investigação não aborda em profundidade essas atividades, porém na medida em que muitas tarefas rotineiras são
padronizadas, sendo subsequentemente delegadas para técnicos e, em grande escala, informatizadas, tende a avultar a busca
por indivíduos de alto nível profissional combinado com uma mente analítica. Seriam os professores e planejadores os que
desenham os fluxogramas, interpretam as planilhas de operação e instruem sobre sua utilização. São esperados desdobramentos
e repercussões para formação e atuação de nutricionistas em todos os ambientes, desde a faculdade até à beira do leito.

Não há muito como escapar dessa implacável realidade. No futuro, todas as profissões da saúde perderão parte do seu
humanismo e calor humano. Espera-se que somente uma pequena parcela, jamais a totalidade, na medida em que sofrem
progressiva tecnicização e robotização.

Ocorrerá uma numerificação do trabalho, com uso e abuso de “tablets”, planilhas e computadores. Para evitar que tal
“comoditização” da assistência nutricional gere distorções, riscos e monstruosidades, ao invés de benefícios assistenciais e
terapêuticos, crescerá a procura por indivíduos a um tempo versados em atenção primária e gestão à distância.

Trata-se de conciliar o monstro da frieza e insensibilidade mecânica com carinho, valorização humana e orientação personalizada
que todos desejam e merecem3. Algum gênio efetivamente conseguirá conciliar tais extremos? Não há alternativas cômodas e todos
caminhos são pedregosos, o que não significa um chamado para a conformidade e a alienação. De todo modo, resta pagar para ver.

REFERÊNCIAS
1. Rogers D. Dietetics trends as reflected in various primary research projects, 1995-2011. J Acad Nutr
Diet. 2012;112(3 Suppl):S64-74.
2. U.S. Bureau of Labor Statistics. Dietitians and Nutritionists. Disponível em: www.bls.gov/ooh/Heal-
thcare/Dietitians-and-nutritionists.htm
3. Bogg J. Dr. Jekyll and Ms. Hide. Nature. 2007;447(7140):114.

CITE OS ARTIGOS DA REVISTA BRASILEIRA DE NUTRIÇÃO CLÍNICA NAS SUAS PUBLICAÇÕES.


AS CITAÇÕES ROBUSTECERÃO NOSSAS CHANCES DE INDEXAÇÃO.

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ACálcio, goma guar parcialmente hidrolisada e triacilglicerídeos de cadeia média interferentes na disponibilidade do ferro não-heme em soluções nutrientes
Artigo Original

Cálcio, goma guar parcialmente hidrolisada e triacilglicerídeos


de cadeia média interferentes na disponibilidade do ferro
não-heme em soluções nutrientes
Calcium, partially hydrolyzed guar gum and triacylglycerols of medium chain of interfering availa-
bility of non-heme iron in nutrient solutions

Luciana Bueno1 RESUMO


Julio Sérgio Marchini1 O ferro é um dos nutrientes que a absorção intestinal envolve em vários processos orgânicos,
José Eduardo Dutra de Oliveira1
entre os quais a interação com as outras substâncias presentes nos alimentos. Em trabalhos
realizados pelo grupo de pesquisa, foi observado que o método in vitro pode demonstrar
os efeitos antagônicos e sinérgicos que interferem na dialisibilidade de ferro nas soluções
Unitermos: de múltiplos nutrientes que, por meio de um estudo de sobrecarga de ferro, isola o mineral
Ferro. Cálcio. Fibras na dieta. para que pudesse ser realizado o presente estudo. Pelos resultados foi possível verificar que a
presença de cálcio e fibras interagiu com o ferro nas formulações nutricionais e nos nutrientes
Key words: avaliados, reduzindo a sua disponibilidade. Esses fatos demonstraram que o método in vitro
Iron. Calcium. Dietary fiber. de avaliação da biodisponibilidade de ferro pode ser uma ferramenta útil para estimar a
disponibilidade de ferro em alimentos e formulações complexas de nutrientes.
Endereço para correspondência:
Luciana Bueno ABSTRACT
Av. Bandeirantes, 3900 - Monte Alegre - Ribeirão The iron is one of the nutrients that the intestinal absorption involves in several organic
Preto, SP, Brasil - CEP: 14048-900. processes, such as interaction with the other present substances in foods. We have been
E-mail: lubuenno@yahoo.com.br
verified for the method of the diizability in vitro antagonistic and synergic factors influence
Submissão in the solutions of iron through an overload of the mineral and the balances confirm the
8 de maio de 2011 presence of substances like calcium and fibers what they interact with the iron in foods,
reducing availability of iron. Those facts show that this method in vitro of appraisal of the
Aceito para publicação bioavailability of the iron is useful and it can be used to estimate of the iron in foods and
21 de outubro de 2011 complexes formulations of nutrients.

1. Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil.

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Bueno L et al.

IntroduçÃO Método
Estudos de interações entre nutrientes vêm sendo Material
considerados importantes, principalmente em fórmulas Foram elaboradas duas formulações A e B, descritos
de suplementos nutricionais contendo diversos nutrientes, por Bueno1 que reproduzissem a composição em nutrientes
por serem capazes de formar compostos complexos entre dos produtos utilizados para suplemento nutricional oral
si devido às suas constituições moleculares, aliadas aos ou nutrição enteral (Tabela 1). Para o preparo dessa
seus potenciais de ligação química. Uma das formas de formulação foi utilizado isolado protéico de soja, malto-
se estudar as interações entre os nutrientes presentes em dextrina, óleos de canola, milho, lecitina de soja, goma
uma formulação foi demonstrada por Bueno1, que aplicou guar parcialmente hidrolisada, misturas de minerais e
a metodologia de superfície de resposta associada ao vitamínicas.
método in vitro de determinação da dialisabilidade de Foi preparada uma solução aquosa contendo 25 mg
minerais para estudar as interações do ferro dialisável de ferro elementar e, posteriormente, foram adicionados
com o cálcio, a fibra e os triacilglicerídeos de cadeia diversos nutrientes, como: 1) goma guar parcialmente hidro-
média (TCMs) presentes na formulação nutricional. Esses lisada; 2) mistura salina; 3) mistura vitamínica; 4) cálcio
estudos foram conduzidos porque em literatura tem sido e 5) vitamina C (Tabela 2). Independente da composição
demonstrado que a absorção do ferro da alimentação nutricional das formulações, a concentração de ferro foi
sofre influência de vários nutrientes que podem propi- mantida constante em todas as formulações testadas (25
ciar efeitos inibitórios e promotores, afetando direta- mg). As quantidades dos nutrientes foram alteradas para
mente a sua biodisponibilidade, tendo esses efeitos demarcar os possíveis efeitos do cálcio, fibra e TCM na
potencializados pela oferta de formulações nutricionais disponibilidade do ferro.
múltiplas 1-3. Assim, o tipo de fórmula dietética pode
influenciar o estado nutricional de uma pessoa e/ou
provocar o aparecimento de doenças. Recentemente,
têm sido elaboradas formulações nutricionais contendo Tabela 1 – Composição centesimal das formulações A e B.
múltiplos nutrientes, com o objetivo de suprir as necessi- Componentes Formulação A Formulação B Bueno1
dades nutricionais pela via oral ou enteral de indivíduos Proteína Total (g)
enfermos 4. Dentre essas características, passam a ser Isolado Protéico de 3,10 3,10 13,34
importantes os questionamentos quanto às quantidades Soja
e à qualidade dos nutrientes a serem acrescidos nas Carboidrato Total (g)
formulações nutritivas5-7. Maltodextrina 63,10 64,10 59,12

Os nutrientes que são capazes de inibir a absorção de Gordura (g)


ferro são fibras, fitatos, oxalatos, fosfatos, cálcio e zinco, TCM 4,50
presentes em diversos alimentos, como cereais, grãos e Óleo de Milho 1,00 7,31
verduras. Outros nutrientes que são capazes de facilitar Óleo de Canola 3,50 7,74
o aproveitamento do mineral são as proteínas de origem Lecitina de soja 3,00 3,00 1,30
animal, como cisteína, alimentos fermentados, ácido Minerais (g)
ascórbico e cítrico6-8. Para medir os nutrientes em formu- Mistura salina 4,00 3,00 2,15
lações nutricionais e conhecer esses efeitos, os métodos in Fe (mg) 25,00 25,00 2,50
vitro de avaliação da disponibilidade de ferro, que cons- Ca (mg) 1000,00 800,00 80,00
tituem uma simulação da digestão gástrica e duodenal, Vitaminas (g)
podem ser empregados. A proporção do elemento difun- Mistura vitamínica 1,00 1,00 4,30
dida através da membrana semipermeável, durante o Fibra (g)
processo, representa a dialisibilidade do elemento, após Goma guar parcial- 25,00 25,00 4,30
um período de equilíbrio, sendo utilizado como estimativa mente hidrolisada
da biodisponibilidade do nutriente9,10. Total (g) 100,00 100,00 100,00
Assim, o objetivo do presente estudo foi avaliar o cálcio, Mistura de minerais (4/3g): Mg (15 mg), P (75 mg), K (90 mg), Zn (0,50 mg), I (0,09
mg), Mn (0,11 mg), Cu (0,08 mg), Na (60 mg)
goma guar parcialmente hidrolisada e triacilglicerídeos de Mistura vitamínica (1g): Vitamina A (500 µgRE), Vitamina D (4µg), Vitamina E (8 mg
cadeia média na disponibilidade do ferro não-heme em TE), Vitamina K (40 µg), Vitamina B1 (1 mg), Vitamina B2 (1 mg), Niacina (10 mg),
Ácido Pantotênico (5 mg), Vitamina B6 (1,5 mg), Ácido Fólico (150 µg), Vitamina
soluções de nutrientes. B12 (0,5 µg), Biotina (120 µg), Vitamina C (50 mg)

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Cálcio, goma guar parcialmente hidrolisada e triacilglicerídeos de cadeia média interferentes na disponibilidade do ferro não-heme em soluções nutrientes

Tabela 2 – Composição das diferentes formulações utilizadas no presente protocolo de pesquisa.


Formulações Goma guar parcialmente hidrolisada (g) Mistura salina (g) Mistura vitamínica (g) Cálcio (mg) Vitamina C (mg) TCM
Solução aquosa de ferro - - - - -
Solução aquosa de ferro 25 - - - -
+ fibra
Solução aquosa de ferro 3 -
+ mistura salina
Solução aquosa de ferro 1 -
+ mistura vitamínica
Solução aquosa de ferro 1000/800
+ cálcio (A/B)
Solução aquosa de ferro 135
+ vitamina C
Formulação A 25 3 1 1000 50 4,5
Formulação B 25 3 1 800 50

Digestão e diálise das amostras A porcentagem de ferro dialisado foi muito baixa nas
As determinações da porcentagem de ferro dialisado nas formulações A e B, indicando que as quantidades dos
amostras foram realizadas de acordo com a técnica descrita nutrientes presentes nas formulações são importantes na
por Miller et al.9 e modificado por Luten et al.10. bioacessibilidade do ferro em nutrientes.

Determinação do ferro total e dialisado DISCUSSÃO E CONCLUSÃO


Para a determinação do ferro total nas soluções aquosas e Estudos dessas formulações analisadas pelo método
nas diversas formulações testadas, foram obtidas amostras de 2 in vitro, cujo alcance da metodologia está em demons-
g, que foram digeridas com ácido nítrico (HNO3) e peróxido de traram a solubilidade de ligação química das moléculas
hidrogênio (H2O2) em proporção de 5:1, a 100 ºC, em bloco de acordo com a sua afinidade por elétrons, resultaram
digestor (Pyrotec®). As amostras (total e dialisada) e das curvas em 0,70 ± 0,02 e 0,80 ± 0,01% de dialisibilidade de
padrões foram feitas Espectofotômetro de Absorção Atômica, ferro, respectivamente, para as formulações A e B. Uma
marca Shimadzu® modelo AA 6200 (Shimadzu Corporation, solução aquosa de 25 mg de ferro mostrou dialisibilidade
Tokio – Japão). As soluções da curva padrão do ferro foram de 70 ± 6%. Na mesma solução de ferro em que foi
preparadas com o Cloreto Férrico Titrisol Merck 9972, nas adicionado o ácido ascórbico houve aumento para 90
concentrações de 0,5, 2,0 e 4,0 µgFe/mL. ± 3% de ferro dialisável, confirmando a sua influência
Todas as dosagens foram feitas em triplicatas e os dados positiva na absorção do ferro, pela capacidade de alte-
são apresentados como médias e desvios padrão. ração da solubilidade do ferro em simulação da condição
digestiva humana. Com a adição de fibras à solução de
ferro, o valor do ferro dialisado foi de 1,00 ± 0,01%.
Resultados
Isso demonstrou que a fibra tem capacidade de ligação
Na Tabela 3, pode-se observar que a porcentagem do com átomos de hidrogênio, devido a sua baixa energia
ferro dialisado foi muito baixa quando se adicionou fibra e de ativação e, por consequência, não são capazes de
cálcio na solução aquosa de ferro, enquanto que a adição formar compostos organometálicos. Com diferentes
da vitamina C aumentou a porcentagem do ferro dialisado. quantidades de cálcio, 800 e 1000 mg/L, os valores de
ferro dialisados diminuíram para 0,80 ± 0,01% e 1,30
± 0,02%, demonstrando forte interação do cálcio na
Tabela 3 – Média e desvio padrão da porcentagem de ferro dialisado
na solução aquosa pura ou acrescida por diversos componentes
dialisibilidade do ferro.
e nas formulações A e B. Van Dyck et al.11 estudaram a influência dos compo-
Formulações Ferro dialisado (%) nentes nutricionais de formulações múltiplas na dialisibili-
Solução aquosa de ferro 70,00 ± 6,00
Solução aquosa de ferro + fibra 1,00 ± 0,01 dade de ferro e concluíram que interferem negativamente
Solução aquosa de ferro + mistura salina 2,00 ± 0,06 as fibras, fitatos e cálcio. Azevedo 12 mostrou que as
Solução aquosa de ferro + mistura vitamínica 25,00 ± 0,12
Solução aquosa de ferro + cálcio (A) 0,80 ± 0,02
proporções de cálcio e ferro, variando de 50:1 a 60:1, e os
Solução aquosa de ferro + cálcio (B) 0,70 ± 0,02 componentes de fibras interferem fortemente na dialisibili-
Solução aquosa de ferro + vitamina C 90,00 ± 3,00 dade de ferro em formulações múltiplas. As porcentagens
Formulação A 0,70 ± 0,02
Formulação B 0,80 ± 0,01 de ferro dialisado nessas formulações foram de 2,34 a
Formulação descrita em Bueno1 7,00 ± 0,40 9,67%. Essas formulações enterais para a porcentagem
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215
Bueno L et al.

de ferro foram classificadas de três maneiras, sendo baixa não-heme nas soluções de múltiplos nutrientes avaliados
disponibilidade para o ferro, < 5% de ferro dialisado; no estudo e ainda, comparados aos trabalhos anteriores
média disponibilidade, de 5 a 8%, e boa disponibilidade, de Bueno1, demonstrou que esses nutrientes são inter-
> 8%. Bueno1 mostrou que a solução enteral deveria ferentes na disponibilidade de ferro. O efeito de altas
conter na formulação 10 g/L de fibra, 0 (zero) de TCM, concentrações desse nutriente pode acarretar prejuízo
320 mg/L de cálcio e 10 mg/L de ferro, para apresentar à saúde de indivíduos, em comparação a formulações
dialisabilidade de 7% de ferro. Ou seja, nessa mistura previamente estudadas e, em seguida, confirmados
complexa de nutrientes, a biodisponibilidade de ferro com os nutrientes isolados em soluções aquosas, poten-
estimada por modelagem matemática seria de 7% do cializando esse efeito interferente pelas quantidades
ingerido, correspondente a 0,7 mg/L. de nutrientes e, diretamente, podendo-se questionar
As interrelações entre os nutrientes acontecem pela o impacto disso no aproveitamento desses nutrientes
composição química e molecular dos compostos, que quando ingeridos pelas pessoas em formulações múlti-
acabam sofrendo alterações em sua solubilidade, além plas 17-20. As soluções de múltiplos nutrientes podem ter
disso, pelo seu potencial de afinidade de elétrons e capa- baixa biodisponibilidade para o ferro, que pode ser
cidade de ligação química são capazes de formarem entre afetado, entre outros, pela oferta de fibras e do cálcio
si complexos insolúveis. A adição das fibras nas fórmulas nas formulações avaliadas, que comprometem o ferro por
múltiplas em nutrientes traz benefícios devido às suas meio das interações nutriente-nutrientes 1,2. O método in
características funcionais para a saúde dos pacientes que vitro, que simula a condição digestiva humana por meio
são submetidos a terapia nutricional13,14. Por outro lado, da digestão gástrica e duodenal, se mostrou capaz de
estudos relacionados à ação da fibra em minerais devem medir as influências do ferro nessas formulações e em
ser relevantes, uma vez que a absorção desses pode ser soluções aquosas com nutrientes isolados.
afetada5,15,16. Gupta et al.17, ao avaliarem a biodisponibili-
dade de cálcio e ferro em vegetais folhosos, pelo método in REFERÊNCIAS
vitro de diálise, concluíram que os componentes presentes
1. Bueno L. Efeito antagônico do ferro e do zinco em uma formu-
na estrutura química desses alimentos, como fibras, lação de alimentação enteral. Quím Nova. 2008;31:585-90.
oxalatos, taninos e ácido fítico, são os principais interfe- 2. Bueno L. Efeito do triacilglicerídeo de cadeia média, da fibra e
rentes da biodisponibilidade de ferro. A biodisponibilidade do cálcio na disponibilidade de magnésio e zinco pelo método
in vitro e metodologia de superfície de resposta. Quím Nova.
de diversos minerais medidos pelo consumo habitual de 2008;31:306-11.
alimentos, como trigo, arroz, milho e soja, na população 3. Hoppe M, Sjöberg A, Hallberg L, Hulthén L. Iron status in
chinesa, demonstrou que as quantidades de fitatos nesses Swedish teenage girls: impact of low dietary iron bioavailability.
Nutrition. 2008;24:638-45.
alimentos propicia a formação de compostos insolúveis
4. Sicchieri JJF, Unamuno MRDL, Marchini JS, Cunha SFC.
e diminui a biodisponibilidade do ferro 9. Em cereais Evolução antropométrica e sintomas gastrointestinais em
matinais fortificados ou não, a interação da absorção do pacientes que receberam suplementos nutricionais ou nutrição
ferro foi diminuída na presença de fibras e de outros tipos enteral. Rev Assoc Med Bras. 2008;5:149-52.
5. Yoon S, Chu D, Juneja LR. Chemical and physical properties,
de alimentos, como o café e o leite, provavelmente pela safety and application of partially hydrolized guar gum as dietary
presença de cafeína e cálcio18. Kapsokefalou et al.19, ao fiber. J Clin Biochem Nutr. 2008;42:1-7.
compararem a solubilidade e a dialisibilidade de diversas 6. Lynch MF, Griffin IJ, Hawthorne KM, Chen Z, Hamzo MG,
Abrams SA. Iron absorption is more closely related to iron status
fontes de ferro (pirofosfato, 2-glicinato, glutamato, lactado than to daily iron intake in 12-to 48-Mo-Old children. J Nutr.
e sulfato ferroso) em amostras de leite com adição prévia 2007;137:88-92.
de ácido ascórbico, observaram que os produtos para 7. Reddy MB, Hurrel RF, Cook JD. Meat consumption in a varied
lactentes com menores quantidades de proteína total e diet marginally influences non-heme iron absorption in normal
individuals. J Nutr. 2006;136:576-81.
cálcio na composição apresentaram disponibilidade em 8. Ma G, Jin Y, Plao J, Kok F, Guusje B, Jacobsen E. Phytate,
torno de 62% maior para o ferro que dos leites indicados calcium, iron, and zinc contents and their molar rations in
para crianças maiores. Velasco-Reynold et al.20 obser- foods commonly consumed in China. J Agric Food Chem.
2005;53:10285-90.
varam in vitro que, em refeições hospitalares, os minerais 9. Miller DD, Schricker BR, Rasmussen RR, Van Campen D. An in
magnésio e cálcio sofrem interações nos alimentos devido vitro method for estimation of iron availability from meals. Am
a sua similaridade química, e que esses nutrientes devem J Clin Nutr. 1981;34:2248-56.
10. Luten J, Crews H, Flynn A, Van Dael P, Kastenmayer P, Hurrel
ser avaliados quanto ao seu aproveitamento dietético e R, et al. Interlaboratory trial on the determination of the in vitro
seus níveis séricos nas pessoas que recebem essas refei- iron dialysability from food. J Sci Food Agric. 1996;72:415-24.
ções compostas. 11. Van Dyck K, Tas S, Robberecht H, Deelstra H. The influence of
different food components on the in vitro availability of iron,
A presença de cálcio, goma guar parcialmente hidro- zinc and calcium from composed meal. Int J Food Sci Nutr.
lisada e triacilglicerídeos de cadeia média para o ferro 1996;47:499-506.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 213-7


216
Cálcio, goma guar parcialmente hidrolisada e triacilglicerídeos de cadeia média interferentes na disponibilidade do ferro não-heme em soluções nutrientes

12 . Azevedo CH. Avaliação in vitro da disponibilidade de ferro em 17. Gupta S, Lakshmi A, Prakash K. In vitro bioavailability of
dietas enterais submetidas a duas condições digestives [Disser- calcium and iron from selected green leafy vegetables. J Sci
tação de Mestrado]. São Paulo: Faculdade de Ciências Farma- Food Agric. 2006;86:2147-52.
cêuticas, Faculdade de Economia e Administração, Faculdade 18. Wortley G, Steven L, Good C, Gugger E, Glahn R. Iron avai-
de Economia e Administração, Faculdade de Saúde Pública
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13 . Slavin JL, Greenberg NA. Partially hydrolyzed guar gum: clinical of fourteen iron forms using an in vitro digestion/human
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14. Spacen H, Van Malderen DC, Suys OE, Huyghens L. Soluble fiber 2005;93:65-71.
reduces the incidence of diarrhea in septic patients receiving total 19. Kapsokefalou M, Alexandropoulou I, Komaitis M, Politis
enteral nutrition: a prospective, double-blind, randomized, and I. In vitro evaluation of iron solubility and dialyzability of
controlled trial. Clin Nutr. 2001:20:301-5. various iron fortificants and of iron-fortified milk products
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16. Méndez RO, Bueno K, Campos N, López D, Wyatt CJ, Ortega 20. Velasco-Reynold C, Alarcon MN, Serrana HLG, Valero VP, Agil
MI. Contenido total y disponibilidad in vitro de hierro y zinc A, Martinez MCL. Dialysability of magnesium and calcium from
en alimentos de mayor consumo em Sonora y Oaxaca, México. hospital duplicate meals: influence exerted by other elements.
Arch Latinoam Nutr. 2005;55:35-46. Boil Trace Elem Res. 2010;133:313-24.

Local de realização do trabalho: Laboratório de Espectrometria de Massas, Departamento de Clínica Médica, Faculdade de
Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil.

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217
A Artigo Original
Santos EA et al.

Análise comparativa de fórmulas de estimativa de peso


e altura para pacientes hospitalizados
Comparative analysis of equations for estimating weight and height for hospitalized patients

Elizabete Alexandre dos Santos1 RESUMO


Roberta Nemer Camargo2 Introdução: Pacientes acamados necessitam de métodos de avaliação nutricional alternativos
Andrea Zumbini Paulo3
pela impossibilidade de aferição do peso e da altura. Nesse caso, são utilizadas fórmulas de
estimativa, como as propostas por Chumlea et al.11, que são as mais utilizadas atualmente.
Porém, em 2008, Rabito et al.12 validaram e recomendaram duas novas fórmulas para estima-
tiva de peso e altura, respectivamente, baseadas em indivíduos adultos e brasileiros. Objetivo:
Analisar e comparar as fórmulas propostas para estimativa de peso e altura, com o peso e altura
real aferido de pacientes hospitalizados. Método: A amostra constitui-se de 30 pacientes, com
idades entre 19 e 58 anos. Para a análise das fórmulas de estimativa, foram aferidas as seguintes
medidas antropométricas: peso, altura, circunferência do braço, circunferência do abdome,
circunferência da panturrilha, altura do joelho e semi-envergadura. Resultados: Dos pacientes
analisados, 83,3% apresentavam HIV/AIDS e 16,7%, outras patologias. Verificou-se, no presente
estudo, uma forte relação entre as medidas antropométricas e o peso e altura estimados pelas
fórmulas. Nos pacientes analisados, os resultados obtidos pela fórmula de Rabito et al.12 chegaram
mais próximos do peso real dos pacientes. Em relação à altura, as fórmulas de Chumlea et al.11
chegaram mais próximas do valor real. Conclusão: Mais estudos devem ser realizados com uma
amostra maior de pacientes, de preferência brasileiros e adultos. Na prática, deve ser utilizada a
fórmula que melhor se adeque à rotina hospitalar, tendo como principal objetivo a recuperação
e a manutenção do estado nutricional do paciente.

ABSTRACT
Unitermos: Introduction: Bedridden patients require alternative methods of nutritional assessment by the
Antropometria. Peso corporal. Altura. impossibility of measuring weight and height. In this case, equations are used to estimate as those
proposed by Chumlea et al.11, that are most currently used. However, in 2008, Rabito et al.12
Key words: validated and recommended two equations to estimate weight and height, respectively, based
Antropometry. Body weight. Body height. on Brazilian and adults persons. Objective: Analyze and compare the proposed equations for
estimating weight and height, with the real weight and height measured from hospitalized patients.
Endereço para correspondência: Methods: The sample consisted of 30 patients, aged from 19 and 58 years. In order to analyze
Elizabete Alexandre dos Santos the equations, weight, height, arm circumference, abdominal circumference, calf circumference,
Av. Barro Branco, 113 - Jabaquara – São Paulo, SP, knee height and half-arm span were measured. Results: Of the studied patients, 83.3% had HIV/
Brasil - CEP: 04324-090 AIDS and 16.7% another diseases. It was found in this study a strong relationship between anthro-
E-mail: elizabetea@yahoo.com
pometric measures and weight and height estimated by the formulas. In the analyzed patients,
Submissão the results obtained by the Rabito et al.12 formula came closest to the real weight of the patients.
28 de março de 2011 In relation to height, Chumlea et al.11 formulas came closest to the real value. Conclusion: More
studies should be conducted with a larger sample of patients, preferably Brazilian and adults. In
Aceito para publicação practice should be used the equation that best suits the hospital routine, with the main objective
7 de outubro de 2011 the recovery and maintenance of nutritional status of the patient.

1. Nutricionista, Graduada pelo Centro Universitário São Camilo, Aprimoranda em Nutrição Hospitalar pelo Instituto de Infectologia Emílio Ribas,
São Paulo, SP, Brasil.
2. Nutricionista, Especialista em Nutrição Clínica pelo Centro Universitário São Camilo, Suplente da Coordenadora do Programa de Aprimoramento
em Nutrição Hospitalar do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, São Paulo, SP, Brasil.
3. Nutricionista, Mestre em Ciências da Saúde pela UNIFESP-EPM, Diretora Técnica do Serviço de Nutrição e Coordenadora do Programa de
Aprimoramento em Nutrição Hospitalar do Instituto de Infectologia Emílio Ribas, São Paulo, SP, Brasil.

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218
Análise comparativa de fórmulas de estimativa de peso e altura para pacientes hospitalizados

Introdução para a escolha de medidas terapêuticas a serem utilizadas


No ambiente hospitalar, é muito comum que os pacientes e para a monitorização do estado de saúde de indivíduos,
sofram com a deterioração do seu estado nutricional. O principalmente daqueles hospitalizados6,8.
paciente hospitalizado é nutricionalmente vulnerável devido Porém, algumas situações podem necessitar de métodos
a uma série de fatores, decorrentes de mudanças na ingestão de avaliação nutricional alternativos, pela impossibilidade
alimentar após a internação, ou pela presença de um estado de mensuração do peso ou da altura10: pacientes acamados
catabólico relacionado à doença em curso¹. que não deambulam (devido a procedimentos cirúrgicos de
O estado nutricional de pacientes hospitalizados influi grande extensão, ou devido a algumas patologias), indiví-
diretamente em sua evolução clínica2. A desnutrição é duos amputados e politraumatismo9. Dessa forma, algumas
frequentemente encontrada em hospitais e estudos demons- fórmulas de estimativa são propostas pela literatura para que
tram que 40% dos pacientes encontram-se desnutridos no se possa obter o peso e a altura desses pacientes.
momento da admissão e cerca de 75% perdem peso durante Atualmente, as fórmulas mais utilizadas para estimar
o período de internação. Dessa forma, a detecção precoce o peso e altura de indivíduos acamados são as propostas
do risco nutricional e da desnutrição pode ser decisiva para por Chumlea et al.11, porém essas fórmulas foram criadas
a sobrevida do paciente3,4.De acordo com Kondrup5, a causa tendo como referência indivíduos americanos e, portanto,
primária da desnutrição em hospitais é a demanda aumen- de acordo com Rabito et al.12, não se aplicariam a indiví-
tada ou modificada das necessidades nutricionais decorrentes duos brasileiros, diante da diversidade étnica presente em
da doença e, ao mesmo tempo, da redução do apetite. nosso país. Assim, esses mesmos autores desenvolveram,
Assim, para a oferta de um suporte nutricional adequado, no ano de 2006, cinco fórmulas para estimativa de peso
a avaliação do estado nutricional é imprescindível, sendo e altura, baseadas em indivíduos adultos, brasileiros. Em
importante que o profissional tenha acesso a técnicas rápidas 2008, Rabito et al.13 realizaram um novo estudo com obje-
e de baixo custo e a métodos precisos que forneçam um tivo de validar as equações desenvolvidas e compará-las às
diagnóstico confiável6. equações já descritas por Chumlea et al.14,15. As equações
desenvolvidas anteriormente foram validadas e duas delas
A avaliação do estado nutricional tem como objetivo
foram recomendadas para estimativa de peso e altura, visto
identificar os distúrbios nutricionais, possibilitando uma
que essas equações poderiam ser facilmente utilizadas e sua
intervenção adequada, de forma a auxiliar na recuperação
significância estatística foi alta para a amostra de indivíduos
e/ou manutenção do estado de saúde do indivíduo e deve
brasileiros estudados13.
preferencialmente ser realizada nas primeiras 24 horas
de internação hospitalar7. Diversos métodos podem ser Portanto, tendo em vista que o peso e a altura de pacientes
utilizados para avaliar o estado nutricional, como: antro- hospitalizados são utilizados não somente para o diagnóstico
pometria, parâmetros bioquímicos, consumo alimentar, nutricional e para o cálculo das necessidades nutricionais
exame físico e avaliação subjetiva global8. Dentre esses do paciente, mas também para a prescrição de medica-
métodos, a antropometria é um dos mais utilizados para mentos nas doses adequadas, torna-se necessário que as
verificar as alterações nutricionais que ocorrem frequen- fórmulas propostas por ambos os autores sejam analisadas
temente em pacientes hospitalizados. Trata-se de um dos e comparadas.
indicadores diretos do estado nutricional e apresenta as O objetivo do presente estudo é analisar e comparar as
vantagens de não ser invasiva, de fácil execução, baixo fórmulas propostas pela literatura para estimativa de peso
custo e alta confiabilidade. Porém, sofre interferência em e altura, com o peso e altura real aferidos de pacientes
sua acurácia em situações limítrofes do estado nutricional, hospitalizados.
como na presença de ascite ou edema e exige a padro-
nização de procedimentos e a manutenção periódica dos
Método
equipamentos9.
O peso é a medida antropométrica mais simples e Trata-se de um estudo epidemiológico, de caráter trans-
habitualmente aferida. É a soma de todos os componentes versal, realizado no Instituto de Infectologia Emílio Ribas
corpóreos e reflete o equilíbrio protéico-energético do indi- (IIER-SP), no período de maio a outubro de 2010.
víduo. A altura é bastante utilizada para o cálculo do Índice A amostra constituiu-se de 30 pacientes adultos, inter-
de Massa Corporal (IMC), das necessidades energéticas e de nados nas unidades de internação do Instituto, de acordo
alguns métodos de determinação da composição corporal9. com os critérios de inclusão e exclusão. Foram considerados
Assim, por meio do peso e da altura é possível obter o IMC, critérios de inclusão: pacientes deambulantes, idade acima
que é o indicador mais simples do estado nutricional, sendo de 19 anos e abaixo de 59 anos (adultos); não ser gestante
essencial para o diagnóstico nutricional inicial do paciente, ou puérpera; não possuir edema, ou anasarca; não possuir
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219
Santos EA et al.

membros amputados; não possuir doenças hepáticas, não na maior porção da região da panturrilha, sem comprimí-
possuir linfomas ou tumores sólidos e não estar com hidra- la e com a fita em posição perpendicular em relação à
tação intravenosa. panturrilha16.
Inicialmente foi realizado um levantamento no prontuário A altura do joelho (AJ) foi medida na perna esquerda,
médico dos pacientes e na ficha de triagem nutricional, a fim com o paciente sentado, em posição supina, de maneira a
de se obter o diagnóstico, a idade, e verificar a presença de formar um ângulo de 90º entre o joelho e a coxa e entre
fatores que pudessem excluí-los do estudo. Em seguida, os o pé e a perna. Em seguida, posicionou-se a fita métrica e
pacientes que se enquadraram nos critérios de inclusão foram mediu-se a distância entre a cabeça da patela (rótula) e a
abordados em seus leitos e questionados se realmente pode- base do calcanhar6,16.
riam deambular e permanecer em pé para a mensuração
A medida da semi-envergadura (SE) foi realizada com o
do peso e para a realização das medidas antropométricas.
paciente em pé, com o braço esquerdo formando um ângulo de
Assim, os pacientes selecionados foram esclarecidos sobre
90º com o corpo. Dessa forma, localizou-se a ponta da clavícula
o estudo e sobre os procedimentos da coleta e assinaram
direita, na incisura esternal. O paciente deveria estender o braço
o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Em
esquerdo em posição horizontal alinhado com os ombros, com
seguida, foram coletadas as seguintes medidas antropomé-
o pulso reto. Com a fita métrica, passando paralelamente à
tricas: peso, altura, circunferência do braço, circunferência
clavícula, mediu-se a distância entre a linha mediana na incisura
do abdome, circunferência da panturrilha, altura do joelho
esternal até a ponta do dedo médio6,17.
e semi-envergadura.
O peso foi aferido em uma balança analógica, com Após a obtenção das medidas antropométricas foram
capacidade máxima de 130 kg e divisão de 100 g, com os calculados os pesos e as alturas estimadas dos pacientes com
indivíduos descalços, usando roupas leves (camiseta e calça as fórmulas de Chumlea et al.11 e Rabito et al.12 (Tabelas 1
fornecidas aos pacientes pelo próprio hospital). e 2). Em seguida, foi calculado o Índice de Massa Corporal
(IMC), com o peso e a altura reais, quanto com as medidas
A altura foi aferida com auxílio de um estadiômetro fixo
estimadas, por meio da fórmula: IMC=Peso (kg)/Altura (m²) e
ao chão, com extensão de 2,05 m, dividido em centímetros
a classificação do estado nutricional foi feita de acordo com
e subdividido em milímetro, com esquadro acoplado a uma
os pontos de corte preconizados pela Organização Mundial
das extremidades. O paciente deveria ficar em pé, descalço,
de Saúde (WHO)18, para ambos os gêneros.
com os calcanhares juntos, costas retas e os braços esten-
didos ao longo do corpo8. Todos os dados coletados e valores obtidos por meio das
fórmulas foram transcritos para uma tabela elaborada no
Para obtenção das circunferências, da altura do joelho e
da medida da semi-envergadura, foi utilizada uma fita métrica software Excel® 2007 e assim foram verificadas as medidas
inelástica graduada em centímetros, com extensão de 150 cm. antropométricas encontradas, bem como os valores obtidos
após a aplicação das fórmulas de estimativa. Dessa forma,
A circunferência do braço (CB) foi realizada com o
foram feitas as médias das variáveis e, posteriormente, as
paciente em pé e medida no braço não dominante. O braço
análises percentuais dos dados encontrados. O estudo foi
do paciente foi flexionado em direção ao tórax, formando
iniciado após a aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa
um ângulo de 90º. Foi localizado o ponto médio entre o
(CEP), sob o protocolo de número 24/10.
acrômio e o olécrano e solicitou-se ao paciente que ficasse
com o braço estendido ao longo do corpo com a palma da
mão voltada para a coxa. Em seguida, contornou-se o braço
Tabela 1 – Descrição das equações para estimativa de peso
com a fita métrica no ponto marcado de forma ajustada, comparadas neste estudo, São Paulo, 2010.
evitando-se a compressão da pele ou folga8. Equações para estimativa de peso (kg)
A circunferência do abdome (CA) foi mensurada com o Chumlea et al.11
paciente em pé, de forma ereta, olhando para frente e com Gênero Feminino:
19-59 anos (Negra) = (AJ X 1,24) + (CB x 2,97) – 82,48
os braços estendidos paralelamente ao corpo, com as palmas
19-59 anos (Branca) = (AJ X 1,01) + (CB X 2,81) – 66,04
da mão voltadas para ele. Foi localizado o ponto médio entre Gênero Masculino:
a última costela e a crista ilíaca do lado direito e do lado 19-59 anos (Negro) = (AJ X 1,09)+ (CB X 3,14) – 83,72
esquerdo do corpo. Em seguida, a fita métrica foi circun- 19-59 anos (Branco) = (AJ X 1,19) + (CB X 3,21) – 86,82
dada ao redor do corpo, mantendo-a justa, sem comprimir Rabito et al.12
0,5759 (CB) + 0,5263 (CA) + 1,2452 (CP) – 4,8689 (G) – 32,9241
os tecidos e a leitura foi feita no momento da expiração8,16.
Sendo:
A circunferência da panturrilha (CP) foi aferida com o G= Gênero
paciente sentado, com a perna esquerda formando um Gênero masculino = 1
ângulo de 90º com o joelho. A mensuração foi realizada Gênero feminino= 2

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220
Análise comparativa de fórmulas de estimativa de peso e altura para pacientes hospitalizados

Tabela 2 – Descrição das equações para estimativa de altura se refere à altura, as fórmulas de Chumlea et al.11 chegaram
comparadas neste estudo, São Paulo, 2010. mais próximas do valor real. Isso pode ser verificado quando
Equações para estimativa de altura (m) as médias de peso e altura reais e estimadas são observadas
Chumlea et al.11 (Figuras 3 e 4).
Gênero Feminino:
Por fim, realizou-se a classificação do estado nutricional
19-59 anos (Negra) = 68,10 + (1,86 X AJ) – (0,06 X id*)
19-59 anos (Branca) = 70,25 + (1,87 X AJ) – (0,06 X id*)
por meio dos valores de IMC real e estimado. Verificou-
Gênero Masculino: se que os valores de IMC baseados no peso e na altura
19-59 anos (Negro) = 73,42 + (1,79 X AJ) estimada, pela equação proposta por Chumlea et al.11,
19-59 anos (Branco) = 71,85 + (1,88 X AJ) superestimaram o número de pacientes desnutridos. Os
Rabito et al.12 valores de IMC baseados na equação proposta por Rabito
63,525 – 3, 237(G) – 0, 06904 (id*) + 1, 293 (SE) et al.12 superestimaram o número de pacientes eutróficos.
Sendo: Ambas as equações subestimaram o número de pacientes
Gênero masculino = 1
com sobrepeso (Tabela 8).
Gênero feminino= 2
*id= idade

Resultados
Foram analisados 30 pacientes, sendo 10 (33,3%) do
gênero feminino e 20 (66,7%) do gênero masculino (Figura
1). A média de idade foi de 38 anos. A caracterização dos Figura 1 - Percentual de pacientes analisados de acordo com o gênero,
pacientes de acordo com a idade e parâmetros antropomé- São Paulo, 2010.
tricos é apresentada na Tabela 3.
No que se refere às doenças dos pacientes anali-
sados, 83,3% apresentavam HIV/AIDS e 16,7%, outras Tabela 3 – Caracterização dos pacientes de acordo com a idade e
parâmetros antropométricos, São Paulo, 2010.
doenças, dentre elas meningite e dengue, por exemplo
Variáveis Média Mínimo-Máximo
(Figura 2).
Idade (anos) 38 19,00-58,00
Em relação às medidas antropométricas necessá- Peso aferido (kg) 61,18 38,00-89,80
rias à aplicação das fórmulas, verificou-se no presente Altura aferida (cm) 1, 69 1,48- 1,86
estudo forte relação entre a circunferência do braço e IMC real (kg/m²) 21,36 13,18- 28,99
o peso estimado na fórmula de Chumlea et al. 11. Ou CB (cm) 25,20 17,50- 33,50
seja, quanto maior a CB, maior foi o peso estimado e CA (cm) 78,82 56,00- 101,50
vice-versa. Isso pode ser observado quando analisamos CP (cm) 33,25 25,00- 41,00
o maior e o menor valor de CB encontrados e os respec- AJ (cm) 51,17 43,00- 56,00
tivos pesos obtidos com a fórmula (Tabela 4). O mesmo SE (cm) 82,68 70,00- 92,00
ocorreu com a fórmula de Rabito et al. 12 em relação à Peso estimado (Chumlea et al.11) 55,04 27,37- 88,01
CP: quanto maior a CP, maior o peso estimado (Tabela Peso estimado (Rabito et al.12) 57,98 32,89- 85,40
5). A AJ e a semi-envergadura relacionaram-se com a Altura estimada (Chumlea et al.11) 1,66 1,47- 1,77
altura estimada obtida pelas fórmulas de Chumlea et Altura estimada (Rabito et al.12) 1,63 1,44- 1,76
al. 11 e Rabito et al. 12, respectivamente (Tabelas 6 e 7). IMC estimado (Chumlea et al.11) 19,91 9,98- 30,26
A CA foi a única medida antropométrica que não se IMC estimado (Rabito et al.12) 21,61 12,08- 28,83
relacionou com o peso e com a altura dos pacientes
analisados.
A diferença média de peso para mais ou para menos foi
de 6,14 kg com a fórmula de Chumlea et al.11 e de 3,20 kg,
com a fórmula de Rabito et al.12. A diferença média de altura
para mais ou para menos foi de 0,03 cm com a fórmula de
Chumlea et al.11 e de 0,05 cm com a fórmula de Rabito
et al.12. Assim, observou-se que nos pacientes analisados os
resultados obtidos pelas fórmulas de Rabito et al.12 chegaram Figura 2 - Percentual de pacientes analisados de acordo com o diagnóstico,
mais próximos do peso real dos pacientes. Por outro lado, no São Paulo, 2010.

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Santos EA et al.

Tabela 4 – Relação entre CB e peso estimado pela fórmula de Tabela 8 – Estado nutricional de acordo com o IMC real e estimado,
Chumlea et al 11, São Paulo, 2010. São Paulo, 2010.
Paciente CB Peso estimado IMC Real IMC Estimado IMC Estimado
Chumlea et al.11 Rabito et al.12
Maior valor 35 cm 88,01 kg Desnutridos IMC < 18 7 (23,3%) 10 (33,3%) 7 (23,3%)
Menor valor 17,5 cm 27,37 kg Eutróficos IMC 15 (50%) 14 (46,7%) 16 (53,3%)
entre 18,5- 24,99
Sobrepeso 8 (26,7%) 6 (20%) 7 (23,3%)
IMC entre 25- 29,99
Tabela 5 – Relação entre CP e peso estimado pela fórmula de Rabito et
al. 12, São Paulo, 2010.
Paciente CP Peso estimado Discussão
Maior valor 41 cm 85,40 kg Deve-se destacar que, no presente estudo, mais de
Menor valor 25 cm 32,89 kg 80% dos pacientes avaliados possuem HIV/AIDS. Nesses
indivíduos, um bom estado nutricional é fundamental, pois
auxilia na manutenção do sistema imunológico, protegendo
o organismo contra possíveis infecções19. A avaliação do
Tabela 6 – Relação entre AJ e altura estimada pela fórmula de estado nutricional nesses pacientes tem como objetivo a
Chumlea et al.11, São Paulo, 2010.
identificação de possíveis distúrbios nutricionais, utilizando-
Paciente AJ Altura estimada se principalmente de métodos objetivos, como a avaliação
Maior valor 58 cm 1,77 m antropométrica20.
Menor valor 43 cm 1,47 m Embora ainda não tenha sido criado e padronizado
um protocolo específico para a avaliação nutricional de
pacientes com HIV/AIDS, o monitoramento da evolução
de parâmetros antropométricos, como peso, IMC, circun-
Tabela 7 – Relação entre SE e altura estimada pela fórmula de ferência do abdome e pregas cutâneas, pode trazer
Rabito et al.12, São Paulo, 2010.
informações úteis para o diagnóstico precoce de altera-
Paciente SE Altura estimada ções morfológicas secundárias à terapia antirretroviral,
Maior valor 92 cm 1,76 m tendo em vista que essas alterações corporais têm sido
Menor valor 70 cm 1,44 m frequentemente relatadas, especialmente no que se refere
à redistribuição da gordura corporal21, 22.
De qualquer forma, independente da presença do HIV/
AIDS, todo paciente hospitalizado deve ter seu diagnós-
tico nutricional realizado adequadamente. Os resultados
deste estudo demonstraram que a fórmula que chegou
mais próxima do peso real dos pacientes foi a proposta
por Rabito et al. 12. Sabe-se que o peso é de grande
importância na prática clínica devido à sua utilização na
avaliação do gasto energético e à sua associação com
morbimortalidade6. A fórmula de Chumlea et al.11 foi a que
chegou mais próximo da altura real dos pacientes, sendo
Figura 3 - Comparação entre as médias de peso real e estimado nos pacientes
analisados, São Paulo, 2010.
essa medida de suma importância, visto que é essencial
na determinação do estado nutricional.
No presente estudo, a avaliação do estado nutri-
cional por meio do IMC real e estimado apresentou dife-
renças significativas. As fórmulas de ambos os autores
subestimaram o número de pacientes com sobrepeso.
Porém, a fórmula de Chumlea et al. 11 superestimou o
número de pacientes desnutridos e a de Rabito et al. 12,
de eutróficos. Os dois extremos do IMC estão associados
Figura 4 - Comparação entre as médias de altura real e estimada nos pacientes
com maior risco de morbimortalidade: o IMC abaixo da
analisados, São Paulo, 2010. normalidade está associado com morte por tuberculose,
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222
Análise comparativa de fórmulas de estimativa de peso e altura para pacientes hospitalizados

câncer pulmonar e doença pulmonar obstrutiva crônica, peso dos pacientes. A medida da CB têm sido um indicativo
sendo IMC igual a 12 kg/m 2 considerado limite mínimo do estado nutricional em indivíduos de diferentes faixas
para sobrevivência humana. O IMC alto relaciona-se etárias. Essa medida é bastante útil na presença de ascite
com morte por doenças cardiovasculares, diabetes e e edema, representando a soma das áreas constituídas
câncer 23. pelos tecidos ósseos, muscular e gorduroso do braço27.
Rezende et al.6 realizaram um estudo com 98 homens Contudo, em função de sua inespecificidade, a utilização
saudáveis, com idades entre 20 e 58 anos, com objetivo de tal medida como fator único de avaliação do estado
de avaliar a validade de fórmulas preditivas de peso e de nutricional pode não apontar de maneira objetiva a quan-
altura e a composição corporal. Foram utilizadas as fórmulas tidade de gordura ou de massa magra desse segmento
propostas por Chumlea et al.11,24 para indivíduos idosos e corporal28.
adultos e verificou-se que o peso estimado diferiu significan- A CP, de acordo com a WHO 18 , é aquela que
temente do peso aferido. Apenas a equação de estimativa fornece a medida mais sensível da massa muscular nos
de altura validada para homens brancos adultos mostrou-se idosos. É particularmente recomendada na avaliação
adequada. Tanto a medida de envergadura quanto a de nutricional de pacientes acamados e deverá ser consi-
semi-envergadura resultaram em superestimação da altura derada adequada quando a circunferência for igual ou
aferida. Além disso, realizou-se a classificação do estado superior a 31 cm para homens e mulheres 29. Também
nutricional pelos valores de IMC real e estimado, e verificou- pode ser utilizada em adultos, porém estudos devem ser
se que os valores de IMC baseados na altura estimada, realizados para avaliar a aplicabilidade dessa medida,
tanto pela medida de envergadura e de semi-envergadura nessa faixa etária.
quanto pela equação proposta para idosos por Chumlea Por outro lado, a AJ e a semi-envergadura relacionaram-
et al.24, superestimaram o número de indivíduos com baixo se com a altura dos pacientes analisados. A AJ é considerada
peso e eutróficos e subestimaram o número de indivíduos uma, medida confiável, pois é fácil de mensurar, esteja o
com sobrepeso. indivíduo sentado ou em uma posição reclinada, indepen-
Em estudo realizado por Sampaio et al.25, na Divisão dente da sua mobilidade30.
de Saúde da Universidade Federal de Viçosa (MG), com A envergadura corresponde à maior distância entre as
objetivo de comparar diferentes fórmulas de estimativa pontas dos dedos médios de cada mão, medida com os
de peso e de altura com as medidas reais em pacientes braços esticados na horizontal, e tem sido bastante utili-
adultos e idosos em um hospital, foram utilizadas a zada na avaliação nutricional de adultos com idades entre
fórmulas propostas por Chumlea et al.14,24. Observou-se 18 e 50 anos e em idosos hospitalizados31. A medida da
que não houve diferença significativa nas medidas reais e semi-envergadura tem sido utilizada como uma alterna-
estimadas de peso entre os pacientes adultos. Já quanto tiva de altura em alguns estudos epidemiológicos, prin-
à altura, verificou-se uma diferença bastante significativa, cipalmente entre idosos. Essa medida tem sido incluída
segundo ambas as fórmulas, evidenciando que as mesmas em instrumentos de avaliação nutricional para identificar
não se equivalem. Tal diferença repercutiu no IMC, que pacientes em risco de desnutrição quando a mensuração
também apontou diferença estatística. da altura não é possível. Entretanto, ainda não está claro
Dock-Nascimento et al.26 realizaram um estudo com se a semi-envergadura deve ser utilizada na ausência da
os seguintes objetivos: calcular as medidas estimadas pela altura real dos pacientes31.
fórmula de Chumlea et al.15, avaliar a correlação dessas Cape et al.17 realizaram estudo com objetivo de avaliar se
medidas com as reais e identificar o estado nutricional a AJ seria uma medida mais adequada do que a envergadura
utilizando tanto as medidas estimadas quanto as reais em na determinação da altura e do IMC em um grupo de pessoas
150 pacientes internados em tratamento de câncer. Os idosas sul-africanas (idade maior ou igual a 60 anos). Os
resultados deste estudo demonstraram que tanto a altura autores observaram que as medidas da AJ relacionaram-se
quanto o peso estimado foram semelhantes à medida real. mais com a altura do que a envergadura, sendo que o IMC
O uso do peso e da altura estimada, para determinar o calculado a partir da altura obtida com a envergadura tendeu
diagnóstico nutricional dos pacientes estudados, levou a um a classificar os idosos como “baixo peso”. Portanto, conclu-
aumento no percentual de pacientes desnutridos. Tanto para íram que a medição da altura do joelho seria um método
o cálculo do IMC quanto para a relação envolvendo o peso mais preciso e adequado para determinar a altura de pessoas
habitual, o número de pacientes desnutridos foi maior do idosas. Em contrapartida, Hirani e Mindell31 realizaram um
que quando o peso e a altura real foram utilizados. estudo com objetivo de avaliar as diferenças entre a altura
No que se refere às medidas antropométricas, como real/mensurada e a medida de semi-envergadura em uma
citado anteriormente, a CB e a CP relacionaram-se como população de idosos (idade igual ou acima de 65 anos) e
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 218-25
223
Santos EA et al.

investigar o impacto do uso dessa medida quando utilizada seria a mais indicada. Atualmente as fórmulas propostas por
no cálculo do IMC. Os resultados obtidos mostraram que Chumlea et al.11 são as mais utilizadas, porém outros estudos
a altura real foi menor do que a medida da envergadura devem ser realizados com uma amostra maior de pacientes,
na faixa etária de 70 a 74 anos em homens e em todas as de preferência brasileiros e adultos. Na prática hospitalar,
idades no grupo de mulheres. O IMC obtido por meio da o ideal é que sejam utilizadas as fórmulas que melhor se
altura real não diferiu significantemente do IMC encontrado adequem à rotina diária, de acordo com a equipe e materiais
por meio da envergadura. Porém, a prevalência de baixo peso disponíveis, tendo sempre como objetivo a evolução favorável
foi menor quando o IMC foi calculado utilizando a altura real do estado nutricional do paciente.
das mulheres com idade maior ou igual a 65 anos.
É muito importante que se leve em consideração as Referências
dificuldades encontradas tanto nas fórmulas propostas por
1. Fuchs V, Mostkoff D, Gutiérrez Salmeán G, Amancio O. Estado
Chumlea et. al.11, quanto nas propostas por Rabito et al.12 nutricio en pacientes internados en un hospital público de la
As fórmulas de Chumlea et al.11 são baseadas em indiví- Ciudad de México. Nutr Hosp. 2008;23(3):294-303.
duos americanos e a mensuração da altura do joelho pode 2. Fontoura CSM, Cruz DO, Londero LG, Vieira RM. Avaliação
nutricional de paciente crítico. Rev Bras Ter Intens.
estar comprometida, pelo fato de pacientes acamados com 2006;18(3):298-306.
membros inferiores imobilizados não poderem flexionar a 3. Kondrup J, Rasmussen HH, Hamberg O, Stanga Z; Ad Hoc
perna. Portanto, nesse caso, a medida poderá ser feita da ESPEN Working Group. Nutritional risk screening (NRS 2002):
a new method based on an analysis of controlled clinical trials.
maneira incorreta. Além disso, a presença de edema em Clin Nutr. 2003;22(3):321-36.
membros superiores pode ser um entrave no uso da fórmula, 4. Oliveira LML, Rocha APC, Silva JMA. Avaliação nutricional em
já que o valor de CB não será o real. pacientes hospitalizados: uma responsabilidade interdisciplinar.
Saber Cient. 2008;1(1):240-52.
As fórmulas propostas por Rabito et al.12 são válidas por 5. Kondrup J. Proper hospital nutrition as a human right. Clin Nutr.
serem baseadas em indivíduos brasileiros, porém também 2004;23(2):135-7.
apresenta suas limitações. A mensuração da circunferência 6. Rezende FAC, Rosado LEFPL, Francheschinni SCC, Rosado
GP, Ribeiro RCL. Avaliação da aplicabilidade de fórmulas
do abdômen e da semi-envergadura podem ser difíceis de preditivas de peso e estatura em homens adultos. Rev Nutr.
serem realizadas, pois o paciente acamado muitas vezes não 2009;22(4):443-51.
consegue se movimentar. Além disso, seria necessário mais de 7. Vannuchi H, Unamuno MRDL, Marchini JS. Avaliação do estado
um profissional para auxiliar no momento da mensuração, o nutricional. Medicina. (Ribeirão Preto) 1996;29:5-18.
8. Kamimura MA, Baxman A, Sampaio LR, Cuppari L. Avaliação
que muitas vezes não é viável. A presença de ascite, edema nutricional. In: Cuppari L, ed. Nutrição clínica no adulto. São
ou imobilidade em membros inferiores também podem difi- Paulo:Manole;2005. p.89-115.
cultar o uso da fórmula. 9. Sarni, ROS. Avaliação antropométrica e de composição corporal.
In: Silva SMCS, Mura JDP, eds. Tratado de alimentação, nutrição
Portanto, sendo a avaliação do estado nutricional de & dietoterapia. São Paulo:Roca;2007. p.131-40.
extrema importância para a determinação das condutas 10. Hernández CG, Calderón, GR, Hernández RAH. Estimación de
la estatura a partir de la longitud de pierna medida con cinta
clínico-nutricionais, deve-se ter muita cautela ao utilizar esti-
métrica. Nutr Hosp. 2005;20(5):358-63.
mativas. Valores incorretos nas estimativas podem contribuir 11. Chumlea WC, Guo SS, Steinbaugh ML. Prediction of stature
para erro no diagnóstico e na conduta terapêutica. Nesse from knee height for black and white adults and children with
caso, há maior risco de adoção de uma conduta equivocada, application to mobility-impaired or handicapped persons. J Am
Diet Assoc. 1994;94(12):1385-8.
interferindo diretamente na saúde do indivíduo, principal- 12. Rabito EI, Vannuchi GB, Suen VMM, Castilho Neto LL, Marchini
mente, daqueles hospitalizados6,32. JS. Weight and height prediction of immobilized patients. Rev
Nutr. 2006;19(6):655-61.
13. Rabito EI, Mialich MS, Martínez EZ, García RW, Jordao AA Jr,
Conclusão Marchini JS. Validation of predictive equations for weight and
height using a metric tape. Nutri Hosp. 2008;23(6):614-8.
Sendo a avaliação nutricional fundamental no atendi- 14. Chumlea WC, Roche AF, Steinbaungh ML. Estimating stature
mento às necessidades de pacientes hospitalizados, torna- from knee height for persons 60 to 90 years of age. J Am Geriatr
se imprescindível que as fórmulas de estimativa de peso e Soc. 1985;33(2):116-20.
15. Chumlea WC, Guo S, Roche AF, Steinbaugh ML. Prediction of
altura sejam avaliadas. A superestimação de pacientes com body weight for the nonambulatory elderly from anthropometry.
desnutrição e a subestimação de pacientes com sobrepeso, J Am Diet Assoc. 1988;88(5):564-8.
são fatores que podem acarretar prejuízos na recuperação 16. Marucci MFN, Alves RP, Gomes MMBC. Nutrição na geriatria.
In: Silva SMCS, Mura JDP, eds. Tratado de alimentação, nutrição
do paciente, seja pelo excesso ou pela falta de um suporte & dietoterapia. São Paulo:Roca;2007. p.391-416.
nutricional adequado. 17. Cape W, Marais D, Marais ML, Labaradios D. Use of knee height
Tendo em vista que as fórmulas de ambos os autores as a surrogate measure of height in older South Africans. South
Afr J Clin Nutr. 2007;20(1):39-44.
apresentaram resultados positivos na estimativa de peso e 18. World Health Organization. Physical status: the use and interpre-
altura respectivamente, não é possível afirmar qual fórmula tation of anthropometry. In: World Health Organization. Report

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224
Análise comparativa de fórmulas de estimativa de peso e altura para pacientes hospitalizados

of the WHO Expert Committee. Geneva:WHO;1995. (WHO 26. Dock-Nascimento DB, Aguilar-Nascimento JE, Costa HCBAL,
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Local de realização do trabalho: Instituto de Infectologia Emílio Ribas, São Paulo, SP, Brasil.

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225
A Artigo Original
Melo SS et al.

Efeito da adição de fibras dietéticas a dietas hospitalares


oferecidas a mulheres no pós-operatório de cirurgias
obstétricas e ginecológicas
Effect of dietary fiber addiction in hospital diets offered to women after surgery of obstetric and gyne-
cological surgeries

Sandra Soares Melo1 RESUMO


Camila Saueressig2 Introdução: As fibras dietéticas destacam-se por seu papel na prevenção da síndrome de constipação
Jaqueline Fuchter Filipi2
Daiani Reis3
intestinal. Em adição ao baixo consumo de fibras, as cirurgias obstétricas e ginecológicas podem
Patrícia Formento3 influenciar a ocorrência do sintoma de constipação no período pós-operatório. Objetivo: Avaliar a
eficácia de dietas acrescidas de fibras dietéticas em mulheres no período pós-operatório de cirurgias
obstétricas e ginecológicas. Método: A pesquisa contou com 116 participantes e foi realizada em
um Hospital Maternidade privado do Estado de Santa Catarina. Os protocolos dietéticos incluídos no
estudo consistiram em: dieta padrão/branda (Grupo Controle), dieta padrão acrescida de módulo
de fibras (Grupo Fibra Suplemento) e dieta padrão rica em fibras provenientes dos alimentos (Grupo
Fibra Alimento) ofertadas durante três dias de internação. As variáveis analisadas foram: hábitos
alimentares, ingestão hídrica, hábito intestinal, uso de medicação e exercício físico. Resultados: Os
tratamentos dietoterápicos não exerceram influência estatisticamente significativa na melhora do
hábito intestinal pós-operatório, porém reduziram os sintomas de distensão e propiciaram liberação
de flatos. Observou-se que a ingestão hídrica durante a internação apresentou tendência estatística
na regularização do hábito intestinal. Conclusão: Identificaram-se dados relevantes à evolução
dos protocolos hospitalares para melhor hábito intestinal pós-cirúrgico, tais como: ingestão hídrica
adequada e dieta rica em fibras provenientes dos alimentos. Por amenizar sintomas de distensão
abdominal, esta prática resultou em um maior conforto durante o período de permanência hospi-
talar. Estudos adicionais devem ser realizados, a fim de verificar a melhora do habito intestinal em
populações com maior permanência em âmbito hospitalar.

ABSTRACT
Unitermos:
Background: Dietary fiber noted for its in preventing constipation syndrome. In addition to low
Fibras na dieta. Constipação intestinal. Obstetrícia.
intake of fiber, obstetric and gynecological surgery may influence the occurrence of symptoms of
Key words: constipation in the postoperative period. Objective: To evaluate the efficacy of increased dietary
Dietary fiber. Constipation. Obstetrics. fiber diets in women in the post-surgical obstetric and gynecological surgeries. Methods: The
study involved 116 participants and was accomplish in a private Maternity Hospital in the State
Endereço para correspondência: of Santa Catarina. The dietary protocols included in the study were: standard diet/soft (Control
Sandra Soares Melo Group), standard diet plus fiber module (Fiber Supplement Group) and standard diet rich in fiber
Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI. Laboratório from food (Food Fiber Group) offered during the three days of hospitalization. The variables
de Nutrição Experimental - LANEX Bloco 27, Térreo, analyzed were dietary habits, water intake, bowel habits, medication and exercise. Results: The
Rua Uruguai, 458, Centro - Itajaí, SC, Brasil - CEP: dietary treatment did not influence statistically significant improvement in bowel habits after
88302-000. surgery, but reduced the symptoms of bloating and facilitated release of flatus. It was observed
E-mail: ssmelo@gmail.com
that water intake during hospitalization, presented statistical trend in regulating bowel habits after
Submissão surgery. Conclusion: It was identified relevant data for the development of hospital protocols to
11 de setembro de 2011 better post-operative bowel habits, such as adequate fluid intake and diet rich in fiber from food.
For ease symptoms of bloating, this practice resulted in greater comfort during hospitalization.
Aceito para publicação Additional studies should be performed to verify the improvement in bowel habits in populations
28 de novembro de 2011 with a longer stay in hospital.

1. Docente do Curso de Graduação em Nutrição da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, Doutora em Ciência dos Alimentos pela Universi-
dade de São Paulo – USP, Itajaí, SC, Brasil.
2. Acadêmica do Curso de Graduação em Nutrição da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, Itajaí, SC, Brasil.
3. Nutricionista graduada pela Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, Itajaí, SC, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 226-34


226
Efeito da adição de fibras dietéticas a dietas hospitalares oferecidas a mulheres no pós-operatório de cirurgias obstétricas e ginecológicas

INTRODUÇÃO MÉTODO
A constipação intestinal funcional (CIF) é uma síndrome A presente pesquisa se caracterizou como sendo de
decorrente dos distúrbios da motilidade enterocolônica. intervenção controlada.
Apresenta elevada prevalência na população mundial, com A população de estudo foi constituída por mulheres na
um percentual que varia, de acordo com os locais e tipos condição pós-operatória atendidas em um Hospital Mater-
de inquéritos utilizados para diagnóstico, entre 2% a 27% nidade privado do Estado de Santa Catarina, no período de
da população1-3. março a julho de 2011.
Para melhor entendimento, foram estabelecidos critérios Para o cálculo de estimativa da amostra, considerou-se
que facilitam seu diagnóstico, que incluem: ritmo intestinal o total de mulheres decorrentes de cirurgias obstétricas e
com menos de três evacuações por semana, sensação de ginecológicas, dentre elas parto cesáreo e histerectomia,
dificuldade para evacuar, fezes pequenas e endurecidas e respectivamente, atendidas no período de 1 de fevereiro a
sensação de evacuação incompleta4,5. 31 de agosto de 2010. Com auxílio do programa Epi Info
Embora usualmente não represente risco à vida, a CIF 6.04, calculou-se intervalo de confiança de 95%, com erro
pode provocar grande desconforto nos portadores e reper- de 5% e prevalência de desfecho de 50%, totalizando 108
cutir negativamente na sua qualidade de vida e no seu desem- mulheres, com acréscimo de 10% para possíveis perdas.
penho pessoal6,7. Dentre as complicações decorrentes dessa Contabilizou-se um total de 116 mulheres no período da
síndrome, cita-se distensão abdominal, vômitos, agitação, coleta de dados. Os critérios de exclusão foram mulheres
obstrução e perfuração intestinal, além de outras pouco com idade inferior a 18 anos ou que estivessem fazendo uso
elucidadas até o momento8. de laxantes, sob prescrição médica, em âmbito hospitalar.
O quadro normalmente está associado à menor ingestão A demanda menor de outras cirurgias obstétricas e gine-
alimentar, à falta de resíduos dentro do cólon, à perda da cológicas realizadas no Hospital e Maternidade, bem como
mobilidade, à fraqueza das musculaturas abdominais e a rápida alta hospitalar das pacientes em procedimentos
pélvica e ao uso de medicações9. cirúrgicos, como, por exemplo, a curetagem, foi critério
Dieta pobre em fibras pode não ser tomada como causa, importante para a escolha das cirurgias estudadas. Portanto,
mas como fator contribuinte da constipação intestinal10. Por a pesquisa incluiu duas cirurgias, cesárea e histerectomia,
outro lado, a dieta quando acrescida de fibras aumenta a sendo estas as mais recorrentes na instituição participante
frequência de defecação e resulta em eliminação de fezes do estudo.
mais macias11. Estudos demonstram que suplementos fibrosos O projeto foi submetido à aprovação pelo Comitê de
são eficazes e parecem não ter efeitos adversos11. Ética em Pesquisa (CEP) do Hospital e Maternidade privado
No ambiente hospitalar, a dieta exerce grande impor- do Estado de Santa Catarina envolvido no estudo e pelo CEP
tância, por garantir o aporte de nutrientes ao paciente da Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, sob o parecer
internado e, assim, preservar seu estado nutricional, por seu consubstanciado 443/10.
papel coterapêutico em doenças crônicas e agudas e também Somente após a aprovação deste, foi solicitada a assina-
por ser uma prática que desempenha um papel relevante na tura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)
experiência de internação12,13. pelas participantes do estudo, realizado de acordo com as
O acompanhamento dietoterápico desses pacientes é de normas da resolução estabelecida pelo Conselho Nacional
fundamental importância, uma vez que o estado nutricional de Saúde (CNS 196/1996), que normatiza as pesquisas
está diretamente associado à resposta orgânica ao trauma, realizadas com seres humanos na área da saúde.
ao íleo pós-operatório e à recuperação14. É necessário As pesquisadoras realizaram abordagem às mulheres
conhecer o estado nutricional pré-operatório do paciente para realizar a coleta de dados com a posterior apresentação
para delinear a melhor conduta pós-operatória15. do projeto, destacando seu objetivo, importância e o quanto
Recomendações atuais suportam o uso de fibras alimen- a pesquisa poderia auxiliar na implementação de protocolos
tares em nutrição clínica, quando não houver contraindica- dietéticos hospitalares que possam beneficiar pacientes em
ções, mas existem poucas informações sobre quais os tipos cirurgias obstétricas e ginecológicas.
e combinações de fibras que possam fornecer benefício Após assentimento por parte das mulheres, estas assi-
relevante em certas populações de pacientes16. naram o consentimento de participação do sujeito. Após
Diante do exposto, a presente pesquisa teve como objetivo essa etapa, fez-se a aplicação do questionário.
avaliar a eficácia de dietas hospitalares acrescidas de fibras Os procedimentos realizados com as pacientes nesse
dietéticas sobre o hábito intestinal hospitalar de mulheres período, dentre outras variáveis, consistiram em avaliar a
no pós-operatório de cirurgias obstétricas e ginecológicas. função intestinal. Utilizaram-se três instrumentos com validade
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 226-34
227
Melo SS et al.

e confiabilidade previamente testadas pela literatura, base- branco pelo pão integral, rico em fibras. O módulo foi adicio-
ados na utilidade clínica e de pesquisa, como base para nado em um suco de frutas e acrescido à dieta duas vezes
elaboração de um questionário clínico. Separadamente foi ao dia, servido no almoço e no lanche da tarde, separado
elaborado um questionário de frequência alimentar. em duas porções individuais de 7,5 g cada, totalizando 15
Esses instrumentos são o The Bristol Stool Scale17, que g ao dia.
avalia características das fezes por meio de classificação Os cálculos dos nutrientes das dietas foram realizados
visual em setes tipos distintos, Constipation Assessment com a ajuda do Software Diet Win e comparados com os
Scale18, que provê graduação de sintoma e Constipation Risk valores de recomendação estimada de energia20, a fim de
Assessment Scale19, que avalia fatores de risco, tais como obter conhecimento acerca da quantidade de fibras presentes,
mobilidade e ingestão de líquidos. e se essas estavam adequadas à recomendação vigente. De
No questionário, solicitou-se a informação de dados acordo com os cálculos realizados acerca do conteúdo de
pessoais e clínicos da paciente, bem como dados de iden- fibras, a dieta padrão/branda ofereceu diariamente 8,28g, a
tificação, condição fisiológica (idade fértil, pré-menopausa, dieta padrão acrescida de módulo de fibras ofertou 19,68g
menopausa, pós-menopausa), existência de doença prévia de fibras, sendo que 8,28g consistiam na dieta padrão e
e/ou atual, ingestão hídrica diária pregressa e atual, prática 11,4g referia-se ao módulo, e a dieta padrão rica em fibras
de atividade física pregressa, hábito intestinal pregresso provenientes dos alimentos ofereceu 20,81g.
e a caracterização da consistência das fezes (amolecida, Conforme a recomendação estimada de energia20, a
normal, cíbalos), frequência pregressa de consumo de ingestão de fibras dietéticas deve ser no valor de 25g diárias.
alimentos fontes de fibras (consumo diário/semanal/não A dieta rica em fibras provenientes dos alimentos atingiu
consome), propensão à constipação intestinal, uso de 83,24% da recomendação vigente, seguida pela dieta
laxantes anteriormente e no período da internação, satis- padrão acrescida de módulo de fibras (78,72%), e a dieta
fação com a dieta oferecida, rejeição a algum alimento padrão/branda, com 33,12%.
constituinte da dieta, presença de sintomas como vômitos, Após o término da pesquisa, os resultados foram dispo-
náuseas, flatulência, distensão abdominal, dor abdominal, nibilizados ao Hospital e Maternidade por meio da apresen-
azia, refluxo, se havia conseguido evacuar no período pós- tação dos resultados ao grupo médico e pela elaboração e
operatório, em caso afirmativo, solicitava-se a descrição exposição de um folder informativo sobre o papel das fibras
das características das fezes. dietéticas na dieta hospitalar.
Para avaliar o efeito das fibras dietéticas nas pacientes, Os dados coletados na pesquisa foram tabulados com
foram oferecidos três tipos de dietas para diferentes auxílio do programa Microsoft Excel 7.0. A análise estatís-
mulheres, ocorrendo alteração na prescrição da dieta  no tica foi realizada utilizando-se o teste Qui-quadrado para
sistema Tasy, programa de gerenciamento hospitalar onde variáveis qualitativas, considerando-se significativas as
são feitas as prescrições eletrônicas,  conforme atingido associações com p< 0,05. Para a realização desse teste foi
o total de pacientes de cada grupo. A dieta referente a utilizado o programa GraphPad versão 3.0.
cada grupo foi ofertada no período em que as pacientes
Para viabilizar a análise estatística, as frequências de
permaneceram no ambiente hospitalar, correspondendo
consumo semanal ou não consumo do questionário de
há três dias, sendo que a coleta dos dados foi realizada
frequência alimentar foram unidas em uma só categoria.
no terceiro dia da internação.
Os protocolos dietéticos incluídos no estudo consistiram
em: dieta padrão/branda (Grupo Controle), dieta padrão RESULTADOS
acrescida de módulo de fibras (Grupo Fibra Suplemento) Foram estudadas 116 mulheres submetidas a procedi-
e dieta padrão rica em fibras provenientes dos alimentos mentos cirúrgicos (obstétricos e ginecológicos), com tempo
(Grupo Fibra Alimento). médio de permanência em âmbito hospitalar de três dias,
O módulo de fibras alimentares utilizado é formado por sendo distribuídas nos três grupos: Grupo Controle (n=41,
um mix de fibras (6 tipos), constituído principalmente por 35,34%), Grupo Fibra Suplemento (n=39, 33,62%) e Grupo
fibras solúveis (60%) – frutooligossacarídeos (FOS), inulina Fibra Alimento (n=36, 31,03%).
e goma arábica e fibras insolúveis (40%) - polissacarídeo de Os Grupos foram compostos por uma amostra acima
soja, celulose e amido resistente. do número estimado, devido à inclusão de margem de
Para a dieta padrão, rica em fibras provenientes dos segurança para possíveis perdas amostrais no decorrer da
alimentos, houve modificação no modo de preparo dos pesquisa. Entretanto, no presente estudo, não ocorreram
legumes, substituindo o emprego da cocção pela oferta de perdas dos dados, sendo contabilizadas todas as partici-
alimentos crus. Em adição, ocorreu a substituição do pão pantes da pesquisa.
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 226-34
228
Efeito da adição de fibras dietéticas a dietas hospitalares oferecidas a mulheres no pós-operatório de cirurgias obstétricas e ginecológicas

A Tabela 1 apresenta os dados de identificação e A Tabela 3 apresenta os dados de associação entre


clínicos da totalidade das mulheres participantes do ingestão hídrica diária atual e hábito intestinal pós-operatório
estudo. Os dados clínicos encontrados são semelhantes das mulheres participantes do estudo.
entre os três grupos estudados. Observou-se que a idade Embora sem diferença estatisticamente significativa
média foi próxima entre os três grupos, tendo prevalência (p=0,0707), verificou-se que mulheres que atingiram ou
de mulheres adultas jovens. A maior parte das mulheres ultrapassaram a recomendação de ingestão hídrica diária
encontrava-se em idade fértil e submeteu-se a procedi- maior ou igual a 2 litros tiveram maior tendência de evacu-
mentos cirúrgicos obstétricos (cesárea). Baixo percentual ação no período pós-operatório.
de indivíduos referiu a presença de doenças pregressas Quando consideradas somente as mulheres com ingestão
(n=12, 10,34%) e/ou atual (n=21, 18,10%). Dentre as hídrica adequada, não se observou associação estatística
mais citadas, destaca-se: hipotensão (n=2, 16,66%) como (p=0,3285) entre o tratamento dietético e o hábito intestinal
doença pregressa, e doença atual, a diabetes gestacional atual, sugerindo que a ingestão de água é um importante
(n=5, 23,81%). fator a ser considerado no pós-operatório.
Observou-se associação estatisticamente significativa A Tabela 4 apresenta os dados de associação entre
(p=0,0425) entre tratamento dietético e propensão à cons- tratamento dietético recebido com a presença ou ausência
tipação intestinal pregressa. de distensão abdominal e flatulência de mulheres no período
Embora sem associação estatisticamente significativa, pós-operatório de cirurgias obstétricas e ginecológicas
observou-se na caracterização dos grupos de estudo que avaliadas no estudo.
o Grupo Fibra Alimento apresentou maior percentual Observou-se tendência estatística (p=0,0626) entre o
(52,78%) de mulheres ingerindo menos de dois litros de tratamento dietético e a presença de distensão abdominal,
água por dia, contrariamente ao Grupo Fibra Suplemento, sendo que o Grupo Fibra Alimento apresentou menor número
que referiu ingerir mais de dois litros de água por dia de indivíduos com distensão, seguido pelo Grupo Fibra
(58,97%). Suplemento, em relação ao Grupo Controle. Ressalta-se que
Ressalta-se que, das 116 mulheres estudadas, 47 a maior parte da amostra referiu distensão abdominal após
(40,52%) relataram a prática de algum tipo de atividade o procedimento cirúrgico.
física. Dentre as 47 mulheres, 31 (65,96%) afirmaram Em relação ao tratamento dietético e presença ou
não serem propensas à constipação intestinal. Resultado ausência de flatulência os dados foram associados estatis-
semelhante foi encontrado no grupo que não praticava ticamente. O Grupo Fibra Alimento exibiu maiores percen-
atividade física, 69 (59,48%), sendo que 49 (71,01%) tuais de sintomas de flatulência, seguido pelo Grupo Fibra
mulheres referiram não ter propensão à constipação Suplemento, em relação ao Grupo Controle.
intestinal. A Tabela 5 apresenta os dados de associação entre os
Dentre as atividades mais citadas destacam-se cami- diferentes tipos de dietas administradas no hospital e o hábito
nhada (n=14, 29,79%), musculação (n=5, 10,64%) e intestinal no período pós-operatório de cirurgias obstétricas
hidroginástica (n=4, 8,51%). Entretanto, não se observou e ginecológicas das participantes do estudo.
associação estatisticamente significativa (p=0,6305) entre Não se observou associação estatisticamente significativa
a prática de atividade física e o hábito intestinal durante entre os três tratamentos dietéticos administrados e o hábito
a internação. intestinal atual. Ressalta-se que, das 116 mulheres estudadas,
Observou-se, nos prontuários, que a totalidade das 22 (18,96%) relataram ter alguma dificuldade/receio de
mulheres estava fazendo uso de medicamentos no âmbito evacuar em âmbito hospitalar.
hospitalar. Dentre os mais utilizados, destaca-se: Cetopro- Das 116 mulheres estudadas, 109 (93,96%) disseram
feno (n=116, 100%), Metoclopramida (n=114, 98,27%), estar satisfeitas com a dieta recebida e 80 (68,96%), não
Dimeticona (n=112, 96,55%) e Dipirona Sódica (n=112, apresentar aversão a nenhum alimento constituinte da dieta,
96,55%). e dentre as que mencionaram aversão (n=36; 31,03%), o
A Tabela 2 caracteriza os hábitos alimentares pregressos alimento mais citado foi sopa (n=5; 13,88%), seguido por
da população participante do estudo. Ressalta-se que o abóbora (n=4; 11,11%) e chuchu (n=4; 11,11%).
consumo alimentar habitual pregresso não influenciou A Tabela 6 apresenta os dados de associação entre o
estatisticamente o hábito intestinal pregresso (p=0,9992), hábito intestinal pregresso e hospitalar no período pós-
a ingestão hídrica habitual pregressa (p=0,2171) e o uso cirúrgico das participantes do estudo. Observou-se que não
pregresso de laxantes (p=0,4226). houve associação estatisticamente entre os grupos.
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Melo SS et al.

Tabela 1 – Dados de identificação e clínicos de mulheres no período pós-operatório de cirurgias obstétricas e ginecológicas de um
Hospital Maternidade privado de Santa Catarina, março/julho de 2011.
Grupo Controle n=41 Grupo Fibra Suplemento n=39 Grupo Fibra Alimento n=36 Total n=116 (100%) Valor de p
Idade (média/dp) 33,49 (6,96) 30,18 (5,93) 30,18 (5,93) 30,80 (6,19)
Condição fisiológica n (%) p=0,2256
Idade fértil 36 (87,80) 37 (94,87) 36 (100,00) 109 (93,96)
Pré-menopausa 4 (9,75) 2 (5,13) – 6 (5,17)
Menopausa 1 (2,44) – – 1 (0,86)
Doença pregressa n (%) p=0,9810
Presença 4 (9,75) 4 (10,25) 4 (11,11) 12 (10,34)
Ausência 37 (90,24) 35 (89,74) 32 (88,89) 104 (89,65)
Doença atual n (%) p=0,1984
Presença 4 (9,75) 8 (20,51) 9 (25,00) 21 (18,10)
Ausência 37 (90,24) 31 (79,49) 27 (75,00) 95 (81,90)
Procedimentos cirúrgicos n (%) p=0,1557
Cesárea 37 (90,24) 37 (94,87) 36 (100,00) 110 (94,83)
Histerectomia 4 (9,75) 2 (5,13) – 6 (5,17)
Propensão à constipação p=0,0425
intestinal pregressa n (%)
Sim 10 (24,39) 18 (46,15) 8 (22,22) 36 (31,03)*
Não 31 (75,61) 21 (53,85) 28 (77,78)
Ingestão hídrica pregressa n (%) p=0,5338
< 2L 21 (51,22) 16 (41,02) 19 (52,78) 56 (48,27)
≥ 2L 20 (48,78) 23 (58,97) 17 (47,22) 60 (51,72)
Legenda: DP = desvio padrão
Os dados estão apresentados em colunas, perfazendo 100% da população avaliada em cada grupo e no total da população.
Houve associação estatisticamente significativa entre os grupos em relação à propensão à constipação intestinal pregressa.

Tabela 2 – Caracterização de consumo alimentar pregresso de mulheres no período pós-operatório de cirurgias obstétricas e
ginecológicas de um Hospital Maternidade privados de Santa Catarina, março/julho de 2011.
Grupo Controle n=41 Grupo Fibra Suplemento n=39 Grupo Fibra Alimento n=36 Total n=122 (100%)
Frutas
Diário 31 (75,61) 28 (71,79) 26 (72,22) 85 (73,28)
Semanal 10 (24,39) 8 (20,51) 10 (27,78) 28 (24,14)
Não consome – 3 (7,69) – 3 (2,59)
Vegetais
Diário 33 (80,49) 23 (58,97) 27 (75,00) 83 (71,55)
Semanal 8 (19,51) 15 (38,46) 6 (16,67) 29 (25,00)
Não consome – 1 (2,56) 3 (8.33) 4 (3,45)
Pão integral
Diário 11 (26,83) 9 (23,08) 11 (30,56) 31 (26,72)
Semanal 12 (29,27) 13 (33,33) 13 (36,11) 38 (32,76)
Não consome 18 (43,90) 17 (43,59) 12 (33,33) 47 (40,52)
Aveia/trigo/linhaça
Diário 5 (12,19) 4 (10,26) 4 (11,11) 13 (11,21)
Semanal 17 (41,46) 11 (28,21) 12 (33,33) 40 (34,48)
Não consome 19 (46,34) 24 (61,54) 20 (55,56) 63 (54,31)
Leguminosas
Diário 15 (36,58) 18 (46,15) 10 (27,78) 43 (37,07)
Semanal 25 (60,98) 20 (51,28) 25 (69,44) 70 (60,34)
Não consome 1 (2,44) 1 (2,56) 1 (2,78) 3 (2,59)
Os dados estão apresentados em colunas, perfazendo 100% da população avaliada em cada grupo e no total da população.
Não houve associação estatisticamente significativa entre os grupos.

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Efeito da adição de fibras dietéticas a dietas hospitalares oferecidas a mulheres no pós-operatório de cirurgias obstétricas e ginecológicas

Tabela 3 – Associação entre ingestão hídrica diária atual e hábito intestinal hospitalar em mulheres no período pós-operatório
de cirurgias obstétricas e ginecológicas de um Hospital Maternidade privado de Santa Catarina, março/julho de 2011.
Evacuou n (%) Não evacuou n (%) Total n (%)
< 2 litros 8 (30,77) 46 (53,49) 54 (48,21)
≥ 2 litros 18 (69,23) 40 (46,51) 58 (51,79)
Total 26 (100,00) 86 (100,00) 112 (100,00)
Análise estatística: Teste Qui Quadrado, valor de p = 0,0707.
Os dados estão apresentados em colunas, perfazendo 100% da população avaliada em cada grupo e no total da população.

Tabela 4 – Associação entre tratamento dietético recebido e presença ou ausência de distensão abdominal e flatulência em mulheres no período pós-operató-
rio de cirurgias obstétricas e ginecológicas de um Hospital Maternidade privado de Santa Catarina, março/julho de 2011.
Grupo Controle n=41 Grupo Fibra Suplemento n=39 Grupo Fibra Alimento n=36 Total
Com distensão n(%) 33 (80,49) 26 (66,67) 20 (55,55) 79 (68,10)
Sem distensão n(%) 8 (19,51) 13 (33,33) 16 (44,44) 37 (31,90)
Com flatulência n(%) 15 (36,58) 26 (66,67) 25 (69,44)* 66 (58,90)
Sem flatulência n(%) 26 (63,41) 13 (33,33) 11 (30,55) 50 (43,10)
Análise estatística: Teste Qui Quadrado, valor de p = 0,0626 para distensão abdominal
Análise estatística: Teste Qui Quadrado, valor de p = 0,0047 para flatulência

Tabela 5 – Associação entre tratamento dietético recebido e o hábito intestinal hospitalar em mulheres no período pós-operatório de
cirurgias obstétricas e ginecológicas de um Hospital Maternidade privado de Santa Catarina, março/julho de 2011.
Controle n=41 Fibra Alimento n=39 Fibra Suplemento n=36
Evacuou n (%) 10 (24,39) 9 (23,08) 7 (19,44)
Não evacuou n (%) 31 (75,61) 30 (76,92) 29 (80,56)
Total n (%) 41 (100,00) 39 (100,00) 36 (100,00)
Análise estatística: Teste Qui Quadrado, valor de p = 0,8674
Os dados estão apresentados em colunas, perfazendo 100% da população avaliada em cada grupo e no total da população.

Tabela 6 – Associação entre o hábito intestinal pregresso e o hábito intestinal pós-cirúrgico em mulheres no período pós-operatório de
cirurgias obstétricas e ginecológicas de um Hospital Maternidade privado de Santa Catarina, março/julho de 2011.
Hábito intestinal pregresso Evacuou n (%) Não evacuou n (%) Total n (%)
1 a 6 dias 9 (34,62) 29 (32,22) 38 (32,76)
Diário 17 (65,38) 61 (67,78) 78 (67,24)
Total 26 (100,00) 90 (100,00) 116 (100,00)
Análise estatística: Teste Qui Quadrado, valor de p = 0,8189
Os dados estão apresentados em colunas, perfazendo 100% da população avaliada em cada grupo e no total da população.

DISCUSSÃO intestinal normal em 87% dos entrevistados e prevalência


As fibras alimentares estão envolvidas na redução de risco de padrão intestinal constipado em 12%, sobretudo em
e no tratamento de diversas alterações do trato digestório21. mulheres.
Dentre os principais distúrbios, destaca-se a constipação No presente estudo, quando questionadas sobre
intestinal, que é uma queixa comum em atendimento médico propensão à constipação intestinal, 31,03% das mulheres
primário ou especializado22,23. responderam afirmativamente a esse item.
Nota-se maior prevalência de constipação entre mulheres2,3. As causas da constipação na gravidez são provavelmente
Embora a explicação exata para essa diferença permaneça de origem multifatorial, sendo que fatores dietéticos e o estilo
incerta, entre os fatores envolvidos citam-se os danos causados de vida desempenham um papel, porém, fatores hormonais
à musculatura pélvica e à sua inervação decorrentes de partos e e alterações mecânicas também são importantes26. Dentre
cirurgias ginecológicas24, além de idade superior a 40 anos3,24. essas alterações, citam-se a diminuição da pressão da cárdia,
Em estudo populacional conduzido em Roraima por a presença de estase biliar e a diminuição da velocidade do
Domansky25, com 2162 indivíduos, observou-se padrão trânsito do intestino delgado4,27-29.
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 226-34
231
Melo SS et al.

Alguns autores30,31 relacionam o surgimento de consti- constipação40. Ressalta-se que a totalidade da população
pação à concentração plasmática de motilina, por influência utilizou medicamentos, sendo que a frequência de utilização
da progesterona na gravidez, um polipeptídio intestinal que dos medicamentos foi similar entre os grupos.
estimula a contração das fibras lisas do intestino. Parece No presente estudo, o consumo alimentar habitual de
haver também influência da somatostatina na regulação da alimentos fontes de fibras não influenciou estatisticamente o
motilidade na gestação30,31. hábito intestinal pregresso. Jaime et al.41 não encontraram
Após a cesárea, o próprio procedimento cirúrgico pode associação significativa entre prevalência de constipação
favorecer ou agravar os sintomas ou, então, a dor na cicatriz e consumo de alimentos fontes de fibras, visto que, dos
operatória intensifica as queixas32-34. indivíduos constipados e não constipados de sua amostra,
Estudo realizado por Vieira et al.35 revelou o diagnóstico 37,97% e 43,8%, respectivamente, referiram frequência de
de constipação presente em 45% das puérperas, relacionado ingestão desses alimentos de 1 a 2 vezes por dia, enquanto
principalmente à ingestão insuficiente de fibras e líquidos. 16,46% e 17,72% da amostra, respectivamente, relataram
frequência de 1 a 2 vezes por semana.
Dados semelhantes são encontrados na histerectomia, sendo
que a prevalência de constipação após esse procedimento é de As mulheres participantes da presente pesquisa que atin-
37%, não importando a técnica cirúrgica utilizada36. giram ou ultrapassaram a recomendação de ingestão hídrica
diária atual de pelo menos 2 litros tiveram maior tendência
Gant et al.37 afirmam que, para evitar a constipação puer-
de evacuação no período pós-operatório.
peral, é fundamental a deambulação precoce e o consumo
de dieta regular, ocorrendo a restauração da normalidade No estudo de Jaime et al.41, ao estabelecerem associação
intestinal, tanto de pós parto normal quanto cesariano. entre a ingestão de líquidos e surgimento de constipação intes-
tinal funcional, não foi encontrada diferença estatisticamente
Desse modo, no estudo em questão, sugere-se que o
significativa e, observaram que, dos indivíduos constipados e
percentual de mulheres com constipação intestinal foi similar
não constipados, 84,81% e 80,17%, respectivamente, possuíam
ao da literatura consultada e que procedimentos cirúrgicos
ingestão inferior a sete copos de água por dia. Complementando,
ginecológicos e obstétricos, tais como cesárea e histerec-
estes autores descrevem que é recomendada uma ingestão de
tomia, podem influenciar, agravando esse sintoma.
pelo menos oito copos por dia de líquidos, como água e sucos,
No presente estudo, a prática de atividade física pregressa por exemplo, pois exercem papel no peso e maciez das fezes,
não exerceu influência na melhora do hábito intestinal no além de contribuírem para o aumento do número de reflexos
período pós-operatório. gastrocólicos e proporcionar lubrificação intestinal.
Rodriguez et al.38 comentam que não existem evidências Contrariamente, Müller-Lissner et al.42 referem que
científicas do papel da atividade física para a melhora do aumentar a ingestão de líquidos não exerce efeito importante
quadro de constipação. Mas, conforme descrito por Cota e sobre a função do cólon e não é recomendada para tratar a
Miranda25, o exercício físico promove motilidade intestinal, constipação, a menos que haja evidência de desidratação.
mudanças hormonais, melhora do tônus muscular da muscu- Porém, de acordo com os resultados encontrados no
latura pélvica e abdominal, auxiliando a eliminação das fezes presente estudo, sugere-se o consumo de pelo menos 2
após a atividade realizada. litros de água por dia43, visto que a ingestão influenciou
Desse modo, sugere-se que a realização de atividade física positivamente o hábito intestinal hospitalar, possivelmente
não exerceu influência significativa sobre o hábito intestinal de pela característica de auxiliar na formação do bolo fecal,
mulheres no período pós-operatório, possivelmente pelo fato facilitando o movimento peristáltico.
das mulheres que realizavam atividade física terem interrompido Ao ser analisada a eficácia do tratamento dietético recebido
sua prática, devido à gestação e/ou internação, motivo pelo durante os três dias de internação sobre o hábito intestinal
qual os efeitos da atividade física não puderam ser observados hospitalar, verificou-se que os grupos não apresentaram dife-
sobre o hábito intestinal das pacientes do presente estudo, visto renças estatisticamente significativas entre si. Belo et al.44, ao
que, para trazer benefícios, a atividade física deve ser contínua, avaliarem 64 adultos, de ambos os sexos, hospitalizados no
de intensidade moderada e frequência adequada. setor de traumatologia do hospital por 15 dias, que ao 7º dia
No entanto, outros fatores como uso de medicamentos de internação começaram a apresentar sintomas de constipação
que diminuam a motilidade intestinal e uma dieta inadequada intestinal, observaram redução de 78% sobre a constipação
são susceptíveis a desempenhar papel na constipação39. quando oferecida dieta laxativa acrescida de goma-guar, em
Dentre os medicamentos mais utilizados em âmbito hospi- comparação à dieta laxativa padrão. Ressalta-se que a gravidez
talar, destaca-se o Cetoprofeno, analgésico antiinflamatório foi considerada critério de exclusão do estudo.
não esteróide, utilizado pela totalidade da população estu- Tramonte et al.45, ao avaliarem pacientes que possuíam
dada, podendo gerar, dentre outros sintomas, flatulência e trânsito intestinal lento ou disfunção do assoalho pélvico,
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 226-34
232
Efeito da adição de fibras dietéticas a dietas hospitalares oferecidas a mulheres no pós-operatório de cirurgias obstétricas e ginecológicas

verificaram resposta negativa à suplementação de 30g de semelhantes foram encontrados em estudo realizado por
fibras diariamente, enquanto que pacientes sem distúrbios de Carvajal et al.50, ao avaliarem 96 pacientes, sendo que destes,
motilidade tiveram melhoras nos sintomas de constipação, 56 estavam na clínica de ginecologia e obstetrícia e 90% dessa
sugerindo que as fibras alimentares podem agir de maneiras população classificaram como boa a alimentação servida.
diferentes, dependendo do grupo populacional tratado. O elevado grau de satisfação da dieta oferecida no âmbito
Para tal achado no presente estudo, sugere-se a dificuldade hospitalar pode ser justificado pelo fato de não haver grandes
e receio de evacuação no hospital como possível fator de inter- restrições e modificações na alimentação e no modo de preparo
ferência na melhora do hábito intestinal, como também fatores dos alimentos em cirurgias de pequeno porte e gestação.
psicológicos associados, receio pela sutura realizada na cirurgia
e por estarem em um local diferente ao que estão habituadas, e CONCLUSÃO
atuação dos hormônios da gestação, refletindo na diminuição
dos movimentos peristálticos. Outro fator contribuinte pode ser As dietas acrescidas de fibras no período pós-opera-
pelo fato de as dietas ofertadas não terem alcançado a ingestão tório das cirurgias obstétricas e ginecológicas estudadas
diária recomendada de fibras, bem como o curto período de não apresentaram associação estatisticamente significa-
permanência hospitalar das pacientes. tiva com a melhora do hábito intestinal pós-operatório.
Porém, identificaram-se dados relevantes e positivos para
Da totalidade da população, 56,90% e 68,10% apresen-
a evolução dos protocolos e condutas hospitalares para
taram flatulência e distensão abdominal, respectivamente.
tratar o sintoma da constipação intestinal nas cirurgias em
Tais dados são similares aos encontrados por Braz e Justi46,
pesquisa, tais como: ingestão hídrica adequada, dieta rica
ao avaliarem 53 puérperas, 30 delas com parto cesariano,
em fibras provenientes dos alimentos, a fim de amenizar
os quais verificaram por meio de entrevistas realizadas com
sintomas de distensão abdominal e propiciar liberação
as pacientes, 7,69% de diarreia; 30,76% de constipação
de flatos, conduzindo a maior conforto durante o período
intestinal e 61,53% de flatulência.
de permanência hospitalar. Ressalta-se que a adição do
Observou-se que o tratamento dietético com alimentos
módulo de fibras resultou em maior distensão abdominal no
fontes de fibras (Grupo Fibra Alimento), seguido pelo
período pós-operatório para as pacientes. Estudos adicio-
Grupo Fibra Suplemento, resultou em menores percentuais
nais com indivíduos que permaneçam por um período mais
de distensão abdominal e, consequentemente, maiores
longo em âmbito hospitalar devem ser realizados, a fim de
percentuais de flatulência. Resultados semelhantes foram
possibilitar melhor avaliação da melhora e normalização
encontrados por Takahashi et al.47, ao observarem aumento
do habito intestinal pós-operatório.
significativo da flatulência quando utilizada fibra goma-guar
parcialmente hidrolisada em mulheres constipadas.
AGRADECIMENTOS
Alguns autores sugerem que o aparecimento e a intensidade
de sinais e sintomas abdominais aumentam proporcionalmente Agradecemos ao apoio do Hospital e Maternidade, pelo
com o incremento na quantidade de fibras consumidas47,48. fornecimento do módulo de fibras utilizado e ao artigo 171,
Sugere-se, na população que recebeu Dieta Fibra Alimento, pelo financiamento do projeto.
maior ocorrência de flatulência e menor queixa de distensão,
pelo fato da fisiologia do trato gastrointestinal não favorecer o REFERÊNCIAS
sintoma de distensão quando há liberação dos flatos, reduzindo 1. Talley NJ. Management of chronic constipation. Rev Gastroen-
assim o desconforto pós-operatório. Já a maior ocorrência de terol Disord. 2004;4(1):18-24.
distensão na população que recebeu Dieta Fibra Suplemento 2. Garrigues V, Gálvez C, Ortiz V, Ponce M, Nos P, Ponce J. Preva-
lence of constipation: agreement among several criteria and
em relação à Dieta Fibra Alimento pode ser explicada pelo
evaluation of the diagnostic accuracy of qualifying symptoms and
fato de que a ingestão hídrica não atingiu a recomendação de self-reported definition in a population-based survey in Spain. Am
pelo menos 2 litros para grande parte da amostra estudada, J Epidemiol. 2004;159(5):520-6.
podendo assim ter provocado efeito adverso, visto que a 3. Pare P, Ferrazzi S, Thompson WG, Irvine EJ, Rance L. An
epidemiological survey of constipation in Canada: definitions,
adição de fibras, sem o consumo adequado de líquidos, pode rates, demographics, and predictors of health care seeking. Am J
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Local de realização do trabalho: Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, Itajaí, SC, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 226-34


234
A Artigo Original
Perfil antropométrico de crianças internadas em uma unidade de pediatria segundo as curvas de crescimento NCHS e OMS

Perfil antropométrico de crianças internadas em uma


unidade de pediatria segundo as curvas de crescimento
NCHS e OMS
Anthropometric profile of children admitted to a pediatric unit according to the NCHS and OMS
growth charts

Vivian Cardoso Assis1 RESUMO


Thais Araújo Cavendish1 Introdução: A desnutrição infantil é um grande problema de saúde pública no mundo.
Maria Hélida Guedes Logrado2
Eliane Oliveira Ustra2
Método: Este estudo transversal exploratório descreveu o perfil socioeconômico, clínico,
dietético e antropométrico das crianças internadas em uma unidade de pediatria e analisou
comparativamente as prevalências dos déficits nutricionais conforme as curvas do National
Center for Health Statistics (NCHS, 1977), utilizando os pontos de corte propostos pela Orga-
nização Mundial de Saúde (OMS, 2000) e as novas curvas da OMS (2006/7), segundo pontos
de corte do Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN, 2009). Resultados: Dois
terços da amostra composta por 42 crianças apresentaram condições socioeconômicas satis-
fatórias, porém para mesma proporção foram verificadas condições alimentares inadequadas.
A diferença entre as prevalências de acordo com os métodos citados foi estatisticamente
significativa para os índices peso/idade (P/I) e estatura/idade (E/I) (p < 0,05). Conclusão: A
Unitermos: redução dos pontos de corte sugerida pelo SISVAN identifica um menor percentual de crianças
Desnutrição. Pediatria. Antropometria. Gráficos de desnutridas, por excluir a desnutrição leve.
crescimento.
ABSTRACT
Key words: Introduction: Child malnutrition is a major public health problem worldwide. Methods: This
Malnutrition. Children. Anthropometry. Growth charts. cross-sectional exploratory study described the socioeconomic, clinical, dietary and anthro-
pometric indices of hospitalized children in a pediatric unit and comparatively examined the
Endereço para correspondência:
Maria Hélida Guedes Logrado prevalence of nutritional deficits as suggested by the National Center for Health Statistics
SQN-116 BL-A APT- 604 - Brasílis, DF, Brasil. (NCHS, 1977) using cutoff points proposed by World Health Organization (WHO, 2000) and
E-mail: guedeslogrado@gmail.com the new growth charts of WHO (2006 / 7), according to cutoff points suggested by Sistema de
Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN, 2009). Results: Two thirds of the sample (composed
Submissão by 42 children) had satisfactory socioeconomic conditions, but for the same proportion inade-
15 de outubro de 2011 quate feeding conditions were observed. The difference between the prevalence according
to the methods cited were statistically significant for weight/age (W/A) and height/age (H/A)
Aceito para publicação (p <0.05). Conclusion: Reducing the cutoff points suggested by SISVAN identifies a lower
26 de janeiro de 2012 percentage of malnourished children by excluding mild malnutrition.

1. Nutricionista residente do Programa de Residência em Nutrição Clínica do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), Secretaria de Estado de
Saúde do Distrito Federal (SES/DF), Brasília, DF, Brasil.
2. Nutricionista preceptora do Programa de Residência em Nutrição Clínica do Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), Secretaria de Estado de
Saúde do Distrito Federal (SES/DF), Brasília, DF, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 235-42


235
Assis VC et al.

INTRODUÇÃO crianças internadas na Unidade de Pediatria (UPE) do Hospital


A desnutrição pode ter início durante a vida intrauterina e Regional da Asa Norte (HRAN) da Secretaria de Estado de
comumente cedo na infância, em decorrência da interrupção Saúde do Distrito Federal (SES/DF) e analisar comparativa-
precoce do aleitamento materno exclusivo e da alimentação mente os resultados conforme os dois métodos citados.
complementar inadequada nos primeiros dois anos de vida, sendo
associada, muitas vezes, à privação alimentar e à ocorrência de MÉTODO
repetidos episódios de doenças infecciosas. Outros fatores de
Estudo observacional transversal e de caráter exploratório.
risco para o desenvolvimento da desnutrição são: problemas
A amostra foi composta de crianças de 1 a 10 anos, internadas
familiares relacionados com a situação socioeconômica, precário
na UPE do HRAN da Secretaria de Estado de Saúde do Distrito
conhecimento das mães sobre os cuidados com a criança, baixa
Federal (SES/DF), no período de 1/1/2010 a 10/7/2010. Os
idade materna e o fraco vínculo entre mãe e filho1-3.
responsáveis pelos sujeitos da pesquisa assinaram o Termo
A desnutrição afeta todos os órgãos e sistemas da criança.
de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). O projeto de
No tubo digestório, leva a atrofia das vilosidades intestinais,
pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da
com consequente redução das enzimas digestivas, má digestão
Secretaria de Saúde do Distrito Federal (CEP - SES/DF).
e absorção. No fígado, podem ocorrer lesões de hepatócitos,
alterações de suas funções e redução da síntese de proteínas e Foram excluídas da pesquisa as crianças com paralisia cere-
gliconeogênese. O rim também reduz sua filtração e excreção bral, edema não nutricional ou com qualquer impossibilidade
de eletrólitos. A disfunção imunológica está presente em de mensuração correta do peso. Crianças cujo peso estava
consequência da atrofia generalizada do tecido linfoide4,5. mascarado por edema de origem nutricional foram dispensadas
da pesagem e classificadas diretamente como desnutridas.
Dados da Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS)
revelam que mais de 200 mil crianças morrem antes dos cinco Os dados socioeconômicos, clínicos, dietéticos e antropo-
anos nas Américas, a cada ano, em consequência da desnu- métricos foram levantados por meio de entrevista com os pais
trição e doenças evitáveis. No Brasil, a taxa de mortalidade e/ou responsáveis, com auxílio de formulário específico, no
hospitalar das crianças desnutridas graves é de cerca de 20%2. momento da admissão ou até 48 horas de internação na UPE.
A avaliação do estado nutricional é de grande importância A classe social dos indivíduos da amostra foi definida
para o estudo da saúde da criança e mede as condições nutricio- com base no questionário validado da Associação Brasileira
nais do organismo do indivíduo. Vários métodos para avaliação de Institutos de Pesquisa de Mercado (ABIPEME). Conforme
nutricional podem ser utilizados, contudo, deve-se eleger aquele esse instrumento, o nível socioeconômico da população é
que melhor detecte o problema nutricional da população de estratificado em cinco classes, denominadas A, B, C, D e
estudo6. Para avaliação do crescimento infantil, as medidas mais E de acordo com a pontuação correspondente. As classes
utilizadas são o peso e a estatura, porém uma observação isolada sociais dos sujeitos desta pesquisa foram reagrupadas
de peso e estatura tem valor relativo, sendo indispensável valorizar em: classe social 1 (classes A e B, de acordo com critério
a curva ponderal ou o canal de crescimento7. da ABIPEME); classe social 2 (classe C); e classe social 3
No Brasil, há muito tempo, se utilizam as curvas do National (classes D e E)11. A avaliação socioeconômica da criança
Center of Health Statistics (NCHS) para monitoramento do também incluiu o nível de escolaridade materna e as
crescimento de crianças, contudo, esse padrão de referência condições gerais de moradia (existência de água encanada,
apresenta limitações, tais como: possuir amostra composta luz elétrica e esgoto) que foram consideradas adequadas
apenas por crianças brancas, em uso de aleitamento artificial quando a mãe completou o ensino médio e quando havia
e pertencente à classe média, em sua maioria8,9. na casa água encanada, luz elétrica e esgoto.
Para atenuar essas limitações, a Organização Mundial Os dados clínicos coletados foram: diagnóstico clínico
de Saúde (OMS) lançou a partir de 2006 as novas curvas principal, idade gestacional (termo e pré-termo), peso ao
construídas com base em um estudo multicêntrico envolvendo nascer (≤ 2,5 kg ou > 2,5 kg).
seis países (Brasil, Gana, Estados Unidos da América, Índia, Os dados dietéticos foram coletados com o acompa-
Noruega e Omã) em que a amostra de crianças deveria ter nhante mais inteirado sobre a alimentação da criança com
aleitamento materno exclusivo ou predominante pelo menos base nos seguintes itens: tempo de amamentação exclu-
até os quatro meses de idade e situação socioeconômica que siva, características da alimentação complementar (início
não prejudicasse o crescimento da criança, entre outros10. da alimentação complementar e consistência e tipos de
Mediante tais diferenças metodológicas entre as curvas e alimentos) e inquérito dietético (dia alimentar habitual) para
o fato das curvas do NCHS ainda serem muito utilizadas em avaliação do padrão alimentar prévio à doença. O tempo de
serviços e pesquisas, os objetivos desse estudo foram descrever amamentação foi considerado adequado quando a criança
o perfil socioeconômico, clínico, dietético e antropométrico das recebeu aleitamento materno exclusivo por seis meses. Já
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 235-42
236
Perfil antropométrico de crianças internadas em uma unidade de pediatria segundo as curvas de crescimento NCHS e OMS

a alimentação complementar foi considerada adequada A classe social predominante foi a C (52,38%, n=22),
conforme a introdução de alimentos e evolução de consis- seguida da A e B (26, 19%, n=11), enquanto a prevalência da
tência preconizada pelo Guia Alimentar para Menores de D e E foi de 21,4% (n=9). Quanto às condições de moradia,
Dois Anos12. O padrão alimentar pregresso foi contabilizado 64,29% (n=27) estavam adequadas e, em relação à escolari-
em porções e comparado às pirâmides alimentares relativas dade, foi verificado que 61,90% (n=26) das mães das crianças
às faixas etárias13, sendo adequado quando essas porções estudadas não concluíram o ensino médio. Portanto, pelo menos
atingiram pelo menos o mínimo de porções recomendado dois terços da amostra (classes A, B e C) foram caracterizados
pela pirâmide e inadequada quando qualquer dos grupos como não comprometidos sob o ponto de vista socioeconômico,
alimentares estivesse em desacordo com a recomendação. exceto em relação à escolaridade materna (Tabela 1).
As medidas antropométricas foram realizadas utilizando-se As doenças respiratórias representaram a condição
procedimentos padronizados segundo Lohman et al.14. O peso clínica mais frequente (40,48%, n=17), enquanto apenas
das crianças de idade entre 1 e 2 anos foi aferido em balança duas crianças, isto é, 4,76%, tiveram como diagnóstico
pediátrica da marca Filizola®, com precisão de 5g e capacidade principal a diarreia. Um considerável número de crianças
máxima de 15 kg. O peso das crianças maiores de 2 anos foi nasceu a termo (83,33%, n=35) e com peso acima de 2,5
aferido com balança digital da marca Plenna®, com precisão kg (78,57%, n=33). Em relação às duas últimas variáveis
de 100g e capacidade máxima de 150 kg. Todas as crianças clínicas, verificou-se que mais de dois terços da amostra
foram pesadas sem roupa (menores de 2 anos) ou utilizando apresentaram condições satisfatórias (Tabela 1).
as vestimentas fornecidas pelo hospital (maiores de 2 anos).
A análise das variáveis dietéticas demonstrou que a maior
O comprimento das crianças de idade entre 1 e 2 anos foi proporção de adequação, aproximadamente dois terços da
aferido por infantômetro horizontal, com precisão de 1 cm e amostra (61,9%, n=26), foi em relação à consistência dos
medida máxima de 105 cm. Para crianças maiores de 2 anos, alimentos introduzidos, seguido pelo aleitamento materno
a estatura foi aferida com estadiômetro vertical da marca exclusivo (AME) até seis meses, alcançando aproximadamente
Sanny®, com precisão de 1 cm e medida máxima de 205 cm. metade das crianças (52,38%, n=22) e, posteriormente,
A classificação antropométrica da amostra foi obtida por menos de um terço da amostra (26,19%, n=11) com o
meio dos índices antropométricos: peso/estatura (P/E), estatura/ consumo de alimentos adequados nessa fase. Por último, em
idade (E/I), peso/idade (P/I) e índice de massa corporal/idade relação a análise do dia alimentar habitual prévio à doença,
(IMC/I), expressos em valor de escore Z, tendo como padrões apenas 4,76% (n=2) apresentavam adequação (Tabela 1).
de referências as curvas do NCHS (1977) e da OMS10,15. A O diagnóstico antropométrico baseado nas curvas do
classificação antropométrica, segundo o NCHS, considerou NCHS identificou 12 (28,57%), 7 (16,67%) e 9 (23,07%)
os critérios da OMS (2000)16: desnutrição grave/moderada crianças com algum grau de déficit nutricional para os índices
menor que -2 DP, leve entre -1 e -2 DP e sem risco nutricional P/I, E/I e P/E, respectivamente (Tabela 2), enquanto que o
maior que – 1 DP. Já na classificação segundo curvas da OMS, baseado nas curvas da OMS identificou 2 (4,76%), 1 (2,38%),
adotou-se como ponto de corte os valores de escore Z propostos
2 (8,7%) para os mesmos índices, além do índice IMC/I, que
pelo Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN)17.
apresentou a maior prevalência (n=4, 9,52%) (Tabela 3).
Para melhor apresentação e comparação dos dados, estes
últimos foram reagrupados em: desnutridos (< - 2DP), eutróficos A simples comparação entre os resultados das duas
(mesmos pontos de corte definidos pelo SISVAN) e sobrepeso/ curvas possibilitou observar que as prevalências encontradas
obesidade (indivíduos com escore Z acima da eutrofia). conforme as curvas da OMS foram todas inferiores às do
NCHS para todos os índices comuns. A diferença entre
O banco de dados foi construído em planilha do programa
os déficits nutricionais diagnosticados pelos dois métodos
Microsoft Excell® versão 2000 e transportado para o programa
segundo os índices P/I e E/I foi estatisticamente significativa
Stata® versão 8.0. Inicialmente, a amostra foi caracterizada
(p < 0,05), o que não ocorreu com o índice P/E (Tabela 4)
conforme as variáveis socioeconômicas, clínicas e dietéticas. As
e isso pode ter sido influenciado pelo fato da curva da OMS,
diferenças entre as prevalências de desnutrição, identificadas
para esse índice, ter tido uma amostra diferenciada por não
pelas curvas (NCHS e OMS), foram avaliadas pelo teste t-Student.
contemplar todas as faixas etárias.
Considerou-se significante p<0,05 para todas as análises.
Contudo, foram observadas prevalências iguais para
os índices P/I e E/I e valores próximos para P/E quando
RESULTADOS foram comparados apenas os valores das prevalências das
A amostra foi composta por 42 crianças, sendo 57,14% crianças classificadas como desnutridas moderadas/graves,
(n=24) do sexo masculino e 42,86% (n=18) do sexo feminino. conforme as curvas do NCHS/OMS (P/I=4,76%, E/I=2,38%,
Deste universo, 59,5% (n=24) se enquadravam na faixa etária P/E=7,69%) e das classificadas como desnutridas da OMS/
de um a cinco anos e 42,9% (n=18), na de seis a dez anos. SISVAN (P/I=4,76%, E/I=2,38%, P/E=8,7%).
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 235-42
237
Assis VC et al.

Os pontos de corte propostos pela OMS, em 2000, para Tabela 2 – Classificação do perfil antropométrico das crianças internadas
as curvas do NCHS se referem apenas à classificação de na Unidade de Pediatria do Hospital Regional da Asa Norte, segundo as
desnutrição, enquanto os pontos de corte propostos pelo curvas de crescimento do NCHS, com pontos de corte da OMS (2000) –
Brasília, 2010, n=42.
SISVAN, em 2009, para as curvas da OMS trazem estratifi-
Classificação antropométrica P/I n (%) E/I n (%) P/E n (%)
cações não apenas para déficits nutricionais, mas, também, Desnutrição moderada/ grave 2 (4,76%) 1 (2,38%) 3 (7,69%)
para o sobrepeso e a obesidade. Portanto, neste estudo, Desnutrição leve 10 (23,81%) 6 (14,29%) 6 (15,38%)
segundo as curvas da OMS, alguns pacientes foram classi- Sem risco nutricional (*) 30 (71,43%) 35 (83,33%) 30 (76,92%)
Total 42 (100%) 42 (100%) 39 (92,8%)**
ficados acima da faixa de eutrofia (sobrepeso e obesidade), (*) Os pontos de corte da OMS - 2000 permitem classificar apenas a desnutrição.
sendo que as prevalências para essa condição segundo os (**) O menor número da amostra para esse índice deve-se ao fato de a OMS (2006/7)
não recomendar o seu uso para maiores de 5 anos de idade.
índices P/I e IMC/I foram iguais (9,52%), enquanto que, para
o índice P/E, que teve uma amostra diferenciada devido ao
fato de sua curva não contemplar todas as faixas etárias da
Tabela 3 – Classificação do perfil antropométrico das crianças internadas
amostra, apresentou prevalência de 4,35% (Tabela 3).
na Unidade de Pediatria do Hospital Regional da Asa Norte, segundo as
curvas de crescimento da OMS, com pontos de corte do SISVAN (2009) –
Brasília, 2010, n=42.
Tabela 1 – Características socioeconômicas, clínicas e dietéticas das Classificação P/I n E/I n P/E P/E
crianças internadas na Unidade de Pediatria do Hospital Regional da Asa antropométrica (%) (%) n (%) n (%)
Norte - Brasília, 2010, n=42. Desnutrição 2 (4,76) 1 (2,38) 2 (8,70) 4 (9,52)
Variável n (%) Eutrofia 36 (85,71) 41 (97,62) 20 (86,96) 34 (80,95)
Classe social Sobrepeso/obesidade 4 (9,52) - 1 (4,35) 4 (9,52)
AeB 11 (26,19) Total 42 (100%) 42 (100%) 23 (54,7%)** 42 (100%)
C 22 (52,38) (**) O menor número da amostra para esse índice deve-se ao fato de a OMS (2006/7)
DeE 9 (21,43) não recomendar o seu uso para maiores de 5 anos de idade.
Condições de Moradia
Inadequada 15 (35,71)
Adequada 27 (64,29)
Escolaridade Materna Tabela 4 – Prevalência de desnutrição segundo os índices antropométricos
Não conclui o ensino médio 26 (61,90) de peso-idade, peso-estatura e estatura-idade de acordo com as curvas da
Concluiu o ensino médio OMS e do NCHS, Brasília, 2010, n=42.
Não souberam informar 4 (9,52) OMS NCHS p – valor
Índices antropométricos
Diagnóstico N % N %
Doenças respiratórias 17 (40,48) P/I 2 4,76 12 28,57 0,0216
Diarreias 2 (4,76) E/I 1 2,38 7 16,67 0,0234
Demais doenças 19 (45,24) P/E 2 8,70 9 23,07 0,6861
Sem diagnóstico definido 4 (9,52)
Idade Gestacional
Pré-termo 6 (14,29)
À termo 35 (83,33) DISCUSSÃO
Não souberam informar 1 (2,38)
Peso ao nascer
Os fatores socioeconômicos exercem influência direta na
≤ 2.500 kg 4 (9,52) saúde infantil, por serem indicadores de recursos e conheci-
>2.500 kg 33 (78,57) mentos acerca de cuidados com a saúde18. No presente estudo,
Não souberam informar 5 (11,90) 78,57% (n=33) das crianças faziam parte das classes sociais
AME
A, B e C. No estudo de Grillo et al.19, que analisou escolares
≤ 5 meses 13 (30,95)
6 meses 22 (52,38) de uma escola pública de Santa Catarina, essa prevalência foi
> 7 meses 6 (14,29) similar (78%), porém o estudo não identificou nenhuma criança
Não souberam informar 1 (2,38) na classe social A. Valor inferior foi encontrado por Ribeiro et
Consistência da AC*
al.20, avaliando o nível socioeconômico de escolares do Paraná,
Liquidificados/coados 14 (33,33)
Amassados 26 (61,90) cujo estudo constatou que 37,4% das crianças faziam parte dos
Não souberam informar 2 (4,76) níveis sociais médio alto e médio. Diversos estudos investigam
Alimentos oferecidos na AC* a relação entre classe social e estado nutricional de crianças,
Inadequado 29 (69,05)
porém as variáveis utilizadas para aferições socioeconômicas
Adequados 11 (26,19)
Não souberam informar 2 (4,76) não são padronizadas, sendo frequentemente empregados,
Dia alimentar habitual dentre outros: renda familiar, renda per capita, ocupação dos
Inadequado 37 (88,10) pais e/ou condições de moradia.
Adequado 2 (4,76)
Sem informações 3 (7,14) Condições ambientais adversas, como a falta de água
* AC = alimentação complementar e esgoto, dentre outras, correlacionam-se aos níveis de
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238
Perfil antropométrico de crianças internadas em uma unidade de pediatria segundo as curvas de crescimento NCHS e OMS

desnutrição encontrados nos países em desenvolvimento, por A ocorrência de baixo peso ao nascer observada no
representar um fator de insalubridade. Estudo de Engstrom et presente estudo foi de 9,52% (n=4), similar à prevalência
al.21, utilizando dados da Pesquisa Nacional sobre Saúde e nacional (9,2%) descrita na Pesquisa Nacional sobre Demo-
Nutrição (PNSN), realizada em 1989, verificou que crianças grafia e Saúde (PNDS)31. No entanto, Rocha et al.22, analisando
que possuíam condições precárias de moradia apresentavam crianças menores de cinco anos internadas em hospital de
7,8 vezes mais chances de desenvolver desnutrição em Santa Catarina, encontraram maior prevalência em seu estudo
relação às crianças que apresentavam boas condições. Em (14,6%). O baixo peso ao nascer é um forte preditor do cresci-
nosso estudo, foi constatado que 35,71% (n=15) das crianças mento pós-natal, já que estas crianças estão mais vulneráveis
estavam expostas à falta de rede de esgoto e/ou luz elétrica e/ à desnutrição e a déficits de crescimento e desenvolvimento4,32.
ou água encanada, o que revela a necessidade de a avaliação Vários estudos sugerem forte associação entre desnutrição
nutricional completa englobar esse quesito ambiental e consi- infantil e práticas inadequadas de amamentação. Sabe-se que
derar a vulnerabilidade da criança exposta a essas condições. o tempo de aleitamento materno adequado contribui para a
No quesito escolaridade, predominaram as mães que redução da morbimortalidade, uma vez que a composição
não concluíram o ensino médio (61,90%, n=26). Dados do leite humano, tanto de nutrientes quanto de fatores imuno-
semelhantes (59,1%) foram encontrados por Rocha et al.22, moduladores, é essencial para o bom desenvolvimento da
ao avaliar crianças e adolescentes de 0 a 14 anos em criança33-35. Em nosso estudo, metade da amostra (52,38%)
hospitais de Porto Alegre. A escolaridade dos pais atua como recebeu aleitamento materno exclusivo até o sexto mês de
determinante dos déficits de crescimento em função da sua idade, valor muito superior aos encontrados por Sarni et al.29
influência nos cuidados preventivos e curativos23. e Rocha et al.22 (12,5% e 10,7%). O achado do presente
estudo representa um fato curioso, já que mais de 50% das
Falbo et al.24 destacaram as infecções respiratórias como a
mães das crianças estudadas não concluíram o ensino médio
segunda maior causa de internação (26,3%) de crianças de um
e, paradoxalmente, quase 80% da amostra pertence às classes
a sessenta meses em hospital de Recife. Rocha et al.25 verificaram
sociais mais abastadas. Assumindo que os conhecimentos
que a pneumonia foi o diagnóstico que mais levou à internação
relacionados à amamentação são considerados específicos
de crianças menores de cinco anos em um hospital de Fortaleza.
e têm caráter de cuidado, supõe-se que a melhor condição
No presente estudo, as doenças respiratórias foram a primeira
social da amostra viabilizou o acesso aos serviços básicos de
maior causa de internação (40,48%, n=17), sendo superior
saúde e, de certa forma, pode ter suprido a falta de informação
aos valores encontrados nos estudos citados. Elevadas taxas das mães decorrente da baixa escolaridade.
de infecções respiratórias agudas são identificadas em crianças
A consistência dos alimentos fornecidos na introdução da
menores de cinco anos, sendo semelhante em países desenvol-
alimentação complementar foi adequada para 61,90% (n=26)
vidos e em desenvolvimento. Nestes últimos, a mortalidade por
das crianças no presente estudo. Kitoko et al.36 referiram preva-
essas infecções está aumentada em até trinta vezes26-28.
lência, entre crianças menores de um ano, de 32,2% em Floria-
Dentre as crianças deste estudo diagnosticadas com outras nópolis e 24,8% em João Pessoa de adequação de consistência
doenças, chama a atenção o fato de somente uma criança ter desses alimentos. O Ministério da Saúde recomenda que a
tido como diagnóstico clínico a desnutrição. Tal dado revela alimentação complementar deve ser espessa desde o começo,
o desconhecimento ou negligência frente à correta avaliação iniciando com consistência pastosa e evoluindo gradativamente
nutricional da criança em sua admissão e/ou durante inter- até chegar na alimentação da família12. A prevalência de
nação, o que contribui para ocorrência de complicações e adequação de mais de 60% para esse item no presente estudo
hospitalizações prolongadas. Mostra, também, a importância pode ser explicada da mesma forma que para o aleitamento
do papel do nutricionista, como membro da equipe de saúde, materno, isto é, esse item foi favorecido pela melhor condição
realizando a triagem e a avaliação nutricional das crianças social que pode ter viabilizado o acesso aos serviços básicos de
admitidas para a complementação do tratamento das mesmas. saúde e seguimento das orientações prestadas nesses serviços.
Sarni et al.29 identificaram que 33,3% de crianças entre zero A forma de introdução da alimentação complementar leva
e cinco anos internadas em hospital de São Paulo nasceram a repercussões ao longo da vida do indivíduo. A adequação
com idade gestacional menor que 37 semanas. Já no estudo nutricional dos alimentos oferecidos nessa fase é importante na
de Rocha et al.22, 22,5% das crianças estudadas nasceram prevenção de morbimortalidade na infância, incluindo a desnu-
prematuras. Uma menor prevalência de crianças nascidas trição16. Em nosso estudo, foi observado que 69,05% (n=29)
pré-termo foi observada no presente estudo (14,29%, n=6). das crianças consumiram pelo menos um alimento considerado
Sabe-se que crianças prematuras apresentam dificuldade de “inadequado” para o período, isto é, apenas 26,19% (n=11)
manter um padrão de crescimento e desenvolvimento normal, tiveram nessa fase uma adequada introdução dos alimentos.
uma vez que estão sob alto risco nutricional devido aos esto- Corrêa et al.37, investigando crianças menores de dois anos
ques precários de nutrientes e imaturidade fisiológica30. em campanha de vacinação de Florianópolis, revelaram dados
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Assis VC et al.

semelhantes ao identificar que 62% ingeriram leite integral aos 6,2 durante a avaliação de crianças menores de sessenta meses
meses, que, aos sete meses, já haviam recebido iogurte e bola- internadas em hospital de Pelotas (15,1%, 16,4% e 4,1%) e
chas e, aos oito meses, consumiam bolacha recheada, doces em o de Santos et al.42, estudando pré-escolares de uma creche
geral, sucos industrializados e refrigerantes. A introdução inade- de Duque de Caxias, (15,2%, 9,1%, 28%).
quada de alimentos observado no presente estudo pode ser uma Ao avaliar o perfil antropométrico de crianças estudadas,
reflexão do fenômeno da transição nutricional, especialmente segundo curvas da OMS, observou-se prevalências de
quando se considera que mais de 50% das mães das crianças déficits nutricionais de 4,76% (n=2), 2,38% (n=1), 8,70%
não concluíram o ensino médio, o que pode permitir maior (n=2), e 9,52% (n=4) para os índices P/I, E/I, P/E e IMC/I.
vulnerabilidade das mesmas em relação ao que é divulgado na Prevalências maiores foram encontradas por Torres et al.43
mídia sobre os alimentos ou devido a certas características desse no Hospital Universitário de Brasília, em crianças menores
tipo de alimento, como maior facilidade de acondicionamento, de sessenta meses (5,9%, 6,9% e 9,6%). Já no estudo de
ser prontos para uso, durar mais tempo, etc.
Stahelin et al.44, que avaliou crianças menores de cinco anos
A Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) de 2002- de uma creche em Florianópolis, os valores de prevalência
2003 evidencia o aumento do consumo de alimentos com de déficits flutuaram em relação aos valores do presente
alto teor de açúcares e gorduras, além de produtos industria- estudo (1,5%, 19% e 0%). Esses estudos citados utilizaram
lizados e refinados em detrimento de alimentos dos grupos os pontos de cortes da OMS16, enquanto o presente estudo
dos cereais, leguminosas e frutas, caracterizando a transição utilizou os pontos de cortes do SISVAN17.
nutricional38. Esse padrão alimentar foi observado em nosso
Para o índice IMC/I, este estudo encontrou 9,52% (n=4)
estudo, com prevalência de 88,10% (n=37) de inadequação
de desnutrição, 80,95% (n=34) de eutrofia e 9,52% (n=4) de
da alimentação habitual. Grillo et al.19 verificaram que, para
sobrepeso/obesidade. Já Lazzarotto45, ao analisar crianças
todos os grupos alimentares analisados, mais de 50% da
maiores de 2 anos em uma creche de Florianópolis, de acordo
amostra apresentavam consumo inadequado (insuficiente ou
com o índice IMC/I, classificou 1,52% da amostra como desnu-
excessivo). O panorama de inadequação identificado pelos
trida, 68,17% como eutrófica e 30,31% como sobrepeso/
autores citados e pelo presente estudo reforça a existência
obesidade, portanto, esse autor encontrou menos desnutridos e
do fenômeno da transição nutricional.
uma maior prevalência de crianças acima da faixa de eutrofia,
Estudos transversais utilizando as curvas do NCHS com os
o que pode ser em parte devido a não existência de doença
pontos de corte da OMS foram publicados nos últimos anos,
aguda, por se tratar de crianças de uma creche.
descrevendo as prevalências de desnutrição moderada e
grave de acordo com os índices antropométricos. Dentre esses Estudo realizado em cinco municípios de São Paulo, em
estudos, Teixeira et al.39, estudando crianças de um a cinco anos crianças entre zero a cinco anos de idade, identificou um
moradoras de área de invasão de Juiz de Fora, detectaram que percentual de excesso de peso de 6,6%46, valor similar ao
10,62%, 11,23% e 6,07% das crianças apresentavam déficit encontrado por Tuma et al.40 em escolares de Brasília (6,1%).
nutricional conforme os índices P/I, E/I e P/E, respectivamente, Já no presente estudo, a prevalência de obesidade (9,52%)
enquanto, Tuma et al.40, avaliando pré-escolares de três creches foi superior. O que já pode ser reflexo da inadequação da
de Brasília, encontraram, para os mesmos índices, prevalências introdução dos alimentos, assim como do padrão alimentar
de 2,2%, 4,8% e 0,4% e Rocha et al.25, 18,7%, 18,2% e 6,9%, constatado e já discutido anteriormente. O aumento da inci-
ao investigar crianças menores de cinco anos internadas em dência de obesidade é um fato preocupante, uma vez que
hospital de Fortaleza. Já, no presente estudo, a prevalência está associada a comorbidades crônicas que sobrecarregam
de desnutrição moderada e grave foi de 4,76% (n=2), 2,38% o sistema de saúde e a estrutura socioeconômica do país.
(n=1) e 7,69% (n=3) para os índices citados, respectivamente, Como já citado, neste estudo, foram observadas diferenças
observou-se que apenas para o índice P/E a prevalência foi entre as prevalências dos dois métodos, sendo as mesmas
maior em relação aos estudos descritos anteriormente, o que estatisticamente significativas para os índices P/I e E/I e não
pode ter ocorrido por se tratar de crianças internadas, cuja exis- significativa para o índice P/E. Além disso, as maiores preva-
tência da doença normalmente interfere no estado nutricional. lências de desnutrição, diagnosticada pelos três índices, foram
O valor menor para o índice E/I pode ser justificado, em parte, identificadas pelas curvas do NCHS. O mesmo não ocorreu no
por se tratar de uma amostra com pelo menos dois terços dos estudo de Abreu et al.41, cujas prevalências de déficits nutricio-
sujeitos favorecidos do ponto de vista socioeconômico, já que nais encontradas de acordo com as curvas do NCHS foram P/
esse índice avalia o estado nutricional pregresso. I=32,9%, E/I=38,3% e P/E=9,76% e de acordo com as curvas
O mesmo não ocorreu em relação à desnutrição leve da OMS P/I=28,75%, E/I=45,2% e P/E=9,76%. Da mesma
(P/I=23,81%, n=10; E/I=14,29%, n=6; P/E=15,38%, forma, Silveira et al.47, que estudaram crianças maiores de um
n=6) segundo as curvas do NCHS em comparação a outros ano moradoras do Alto do Vale do Jequitinhonha, encontraram
estudos que utilizaram o mesmo método, como Abreu et al.41, prevalências, de acordo com as curvas do NCHS, de P/I=7,4%,
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240
Perfil antropométrico de crianças internadas em uma unidade de pediatria segundo as curvas de crescimento NCHS e OMS

E/I=11,1% e P/E=0,9% e, de acordo com as curvas da OMS, As diferenças de diagnóstico evidenciadas entre os padrões
P/I=2,8%, E/I=14,8% e P/E=2,8%. NCHS e OMS e seus respectivos pontos de corte revelam que a
Foi constatado que os estudos citados que comparam redução dos pontos sugeridos pelo SISVAN identifica um menor
as curvas do NCHS com as curvas da OMS utilizam os percentual de crianças desnutridas, uma vez que considera
mesmos pontos de corte para classificação antropométrica. crianças anteriormente classificadas como desnutridas leves em
No presente estudo, utilizaram-se as curvas citadas, porém eutróficas. Sugere-se, portanto, que as instituições de saúde e
com pontos de cortes diferentes, já que a proposta da OMS os órgãos governamentais relacionados analisem essa proposta
em 2000 foi elaborada especificamente para as curvas do de pontos de corte para avaliação de sua adequação para a
NCHS. A recomendação mais atual no Brasil, preconizada população infanto-juvenil brasileira, por meio de estudos de
pelo Ministério da Saúde, é a de utilizar os pontos de corte validação, relacionando as classificações conforme os respec-
do SISVAN para as novas curvas da OMS. Por esse motivo, tivos pontos de cortes com a ocorrência de morbimortalidade.
os déficits nutricionais diagnosticados por essas curvas foram
diferentes entre si e na comparação deste com os demais REFERÊNCIAS
estudos citados.
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p.119-23. 2009;27(2):133-8.

Local de realização do trabalho: Hospital Regional da Asa Norte (HRAN), Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal
(SES/DF), Brasília, DF, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 235-42


242
A Avaliação nutricional subjetiva proposta pelo paciente versus outros métodos de avaliação do estado nutricional em pacientes oncológicos
Artigo de Revisão

Avaliação nutricional subjetiva proposta pelo paciente


versus outros métodos de avaliação do estado
nutricional em pacientes oncológicos
Patient-generated subjective nutritional assessment versus other methods of evaluation of nutritio-
nal status in oncological patients

Ana Lilian Bispo dos Santos1 RESUMO


Rebeca de Castro Marinho1 O câncer é caracterizado pelo crescimento anormal das células. Os fatores relacionados à carci-
Priscila Nunes Martins de Lima1
Renata Costa Fortes2 nogênese incluem: dieta, tabagismo, etilismo, obesidade e sedentarismo. Estudos científicos
apontam que mais da metade dos pacientes apresentam desnutrição em virtude dessa doença.
Dentre os principais fatores que interferem no estado nutricional desses pacientes, destacam-
se: redução na ingestão alimentar, alterações metabólicas, imunológicas e gastrintestinais. O
comprometimento nutricional resulta em caquexia que, por sua vez, pode culminar com intensa
depleção de reservas adiposas e musculares. Tendo em vista a complexidade das alterações
nutricionais ocasionadas pelas neoplasias malignas, evidencia-se a necessidade de uma triagem
nutricional para identificação dos pacientes oncológicos em risco. O objetivo principal deste
estudo foi avaliar, mediante uma revisão crítica de artigos publicados nas bases de dados Medline,
PubMed, Bireme, Capes, SciELO, Google Scholar e Cochrane, a utilização de uma avaliação
Unitermos:
nutricional subjetiva específica para pacientes oncológicos e sua correlação com outros métodos
Avaliação nutricional. Anorexia. Caquexia. Câncer.
de avaliação do estado nutricional.
Key words:
Nutrition assessment. Anorexia. Cachexia. Cancer. ABSTRACT
The cancer is characterized by abnormal growth of cells. The factors related to carcinogenesis
Endereço para correspondência: include: diet, smoking, alcoholism, obesity and physical inactivity. Scientific studies show that more
Ana Lilian Bispo dos Santos
than half of the patients present desnutrition as a result of this disease. Among the main factors that
Av. Parque Águas Claras. Qd. 301. Conj. 08. Lote
05/07. Residencial Itacaré. Ap. 1004 – Águas Cla- affect the nutritional status of these patients include: reduction in food intake, metabolic, immu-
ras–Norte – Taguatinga, DF, Brasil – CEP: 71902-180. nological and gastrointestinal alterations. The compromising nutritional results in cachexia, which,
E-mail: analilian_nutricao@yahoo.com.br in turn, can lead to intense depletion of adipose and muscle reserves. In view of the complexity of
nutritional changes caused by malignant neoplasms, becomes necessary a nutritional screening
Submissão to identify the oncological patients at risk. The principal aim of this study was to evaluate, through
11 de abril de 2011
a critical review of articles published in Medline, PubMed, Bireme, Capes, SciELO, Google scholar
Aceito para publicação and Cochrane databases, the use of subjective nutrition assessment specific to oncological patients
8 de setembro de 2011 and their correlation with other methods for evaluation of nutritional status.

1. Residente em Nutrição Clínica, Hospital Regional da Asa Norte, Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, Brasília, DF, Brasil.
2. Preceptora do Programa de Residência em Nutrição Clínica, Hospital Regional da Asa Norte, Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, Brasília,
DF, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 243-9


243
Santos ALB et al.

INTRODUÇÃO MÉTODO
O câncer, doença caracterizada pelo crescimento Este artigo consiste em uma revisão crítica, sobre o tema, de
anormal das células1, é considerado um importante problema artigos publicados principalmente em revistas indexadas nas bases
de saúde pública, sendo responsável, a cada ano, por mais de dados Medline, PubMed, Bireme, Capes, SciELO, Google
de 6 milhões de óbitos no mundo, o que corresponde a cerca Scholar e Cochrane, com ênfase nos últimos dez anos, nos
de 12% de todas as causas de morte2. idiomas inglês, espanhol e português, utilizando-se os descritores:
avaliação nutricional subjetiva proposta pelo paciente, avaliação
No Brasil, estimativas apontavam para 2008 e 2009,
nutricional subjetiva global, síndrome da anorexia-caquexia,
231.860 e 234.870 novos casos de câncer para o sexo
alterações metabólicas e imunológicas, indicadores do estado
masculino e feminino, respectivamente, sendo o câncer de
nutricional e câncer. Foram selecionados estudos transversais,
pele não-melanoma (115 mil casos) considerado o mais
observacionais, epidemiológicos, entre outros, seguidos de
incidente, seguido pelos tumores de próstata (49 mil), mama
tratamento estatístico com significância de p≤0,05.
feminina (49 mil), pulmão (27 mil), colorretal (27 mil), estô-
mago (22 mil) e colo uterino (19 mil)3.
O câncer possui origem multicausal1, sendo a interação ALTERAÇÕES METABÓLICAS E IMUNOLÓGICAS
NO CÂNCER
entre fatores genéticos e ambientais uma das formas mais
comuns no seu desenvolvimento. Os principais fatores Células cancerosas apresentam maior preferência pela
relacionados ao processo de carcinogênese incluem: dieta, glicose como substrato energético. Esse fato resulta em alte-
tabagismo, etilismo, obesidade, inatividade física, contato rações no metabolismo de carboidratos e de proteínas pelo
frequente com carcinógenos, radiação, idade, etnia e sexo4. aumento da gliconeogênese hepática proveniente de aminoá-
Evidências científicas mostram que 40% a 80% dos cidos musculares (principalmente glutamina e alanina) e lactato9.
pacientes oncológicos apresentam algum grau de desnutrição No fígado, esses aminoácidos são convertidos em glicose,
durante o curso da doença. Essa prevalência atinge cerca com consequente aumento no Ciclo de Cori, balanço nitroge-
de 15% a 20% dos pacientes no momento do diagnóstico e nado negativo e maior consumo de energia pelo organismo,
80% a 90% dos pacientes no estádio avançado, influenciando o que induz ao acentuado catabolismo muscular e perda de
significativamente no aumento da morbimortalidade e na peso observada nos pacientes oncológicos9.
diminuição da qualidade de vida5. Outra alteração metabólica encontrada nesses pacientes
Os cânceres, principalmente aqueles cujo crescimento é é a intolerância à glicose e a resistência à insulina em
lento e que levam maior tempo para serem diagnosticados, consequência da redução na sensibilidade das células
promovem alterações catabólicas extenuantes ao indivíduo, β-pancreáticas e dos tecidos periféricos, respectivamente,
podendo culminar com hiperglicemia9.
resultando em caquexia4.
Além da degradação da massa magra, que promove a
A caquexia, desnutrição grave acompanhada de astenia e
redução da capacidade funcional, a caquexia do câncer é
anorexia, é uma síndrome caracterizada por perda progressiva
caracterizada por alterações no metabolismo lipídico, com
e involuntária de peso, intenso catabolismo de tecidos muscular
intensa perda de gordura corporal9. Essa perda está associada
e adiposo, astenia, alterações metabólicas e disfunção imuno-
à redução da lipogênese e aumento da lipólise por inibição
lógica6. Essas alterações promovem um impacto negativo na
da lipase lipoprotéica em resposta ao aumento do fator de
qualidade de vida do paciente, levando ao estresse psicológico
necrose tumoral-alfa (TNF-α), levando a hiperlipidemia6,9-11.
e maior tempo de permanência hospitalar7.
Citocinas humorais como interleucinas 1 (IL-1) e 6 (IL-6),
Aliadas a esses fatores, as modalidades de tratamento TNF-α e interferon gama (INF-γ) também estão envolvidas no
oncológico, que incluem cirurgia, quimioterapia, radioterapia processo de carcinogênese. Essas citocinas, além de induzirem a
ou ambas, podem causar efeitos colaterais, interferindo inapetência, estimulam as proteínas da fase aguda, destacando-
negativamente no estado nutricional dos pacientes8. se a proteína C-reativa (PCR) e, reduzem as proteínas negativas,
Tendo em vista a complexidade das alterações ocasio- particularmente, albumina, pré-albumina e transferrina12.
nadas pelo câncer, que levam principalmente ao compro- A IL-6 tem sido considerada importante fator indutor de
metimento do estado nutricional, evidencia-se a necessidade atrofia muscular e perda de peso. Seus níveis se apresentam
de uma triagem nutricional para identificação dos pacientes elevados nos pacientes com neoplasia, porém, esta não atua
oncológicos em risco8. isoladamente no processo10.
O objetivo principal deste estudo foi avaliar a utilização A IL-1 e INF-γ possuem ação semelhante ao fator de
de uma avaliação nutricional subjetiva (ou triagem) específica necrose tumoral; ou seja, redução da lipase lipoprotéica e
para pacientes oncológicos e sua correlação com outros aumento da lipólise, sendo o efeito anorexígeno da IL-1 tão
métodos de avaliação do estado nutricional. potente quanto o do TNF-α10,11.
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Avaliação nutricional subjetiva proposta pelo paciente versus outros métodos de avaliação do estado nutricional em pacientes oncológicos

Outros fatores que promovem acentuado catabolismo Com o objetivo de determinar a prevalência da desnutrição
tecidual e que estão envolvidos no estabelecimento da anorexia em pacientes internados em um hospital particular, constatou-
e perda de peso incluem: fator de mobilização de lipídios e se por meio da ASG que, dos 136 pacientes avaliados, 24,3%
fator de mobilização de proteínas. O fator de mobilização encontravam-se desnutridos, sendo que o maior índice de
de lipídios age sobre as reservas adiposas, liberando ácidos desnutrição foi dos pacientes oncológicos, de 53%16.
graxos livres e glicerol. O fator de mobilização de proteínas Dewys et al.17 avaliaram a perda ponderal em pacientes
atua sobre as proteínas musculares, resultando em importante com câncer de cólon, gástrico e pancreático nos seis meses
depleção protéica, com redução de sua síntese9-11,13. antecedentes ao tratamento antineoplásico. Os autores
Em associação às alterações metabólicas mediadas pelo concluíram que cerca de 40% a 80% dos pacientes apresen-
tumor, o estado nutricional dos pacientes com câncer pode tavam uma perda de peso moderada ou grave, sendo que
ser comprometido por inúmeros processos, destacando-se a a perda ponderal nos pacientes com neoplasia gástrica ou
redução na ingestão alimentar e o aumento da taxa metabó- pancreática foi maior.
lica basal que, por sua vez, eleva o gasto energético total9. Outro estudo foi realizado com o objetivo de avaliar
A taxa metabólica basal de um indivíduo sadio representa a prevalência da desnutrição em pacientes oncológicos
cerca de 60% a 70% do gasto energético diário, sendo este de acordo com o estádio da doença. Os pacientes com
composto ainda pelo fator atividade, efeito térmico dos tumores de esôfago, estômago e reto foram agrupados em
alimentos e termogênese facultativa9. duas classes: estádios I e II (doença local) e estádios III e IV
Em pacientes oncológicos, o gasto energético de repouso (doença avançada com ou sem metástase). Observou-se que
pode variar entre 60% e 150% a mais que os níveis de norma- 10% dos pacientes do estádio I tinham perdido mais de 10%
lidade; ou seja, o metabolismo energético alterado no câncer do seu peso habitual, enquanto que 85% dos doentes com
pode ser caracterizado por hipermetabolismo ou catabolismo estádios III e IV apresentavam perdas ponderais superiores
persistente9. Sendo assim, alterações na ingestão, no gasto a 10%. Averiguou-se, também, que a maior perda de peso
energético e no metabolismo intensificam o comprometi- ocorreu nos pacientes com tumores de esôfago e estômago18.
mento nutricional de pacientes com neoplasias malignas14. Segura et al.19 avaliaram 781 pacientes com câncer
Observa-se, ainda, que pacientes com câncer sofrem a inter- avançado em regime ambulatorial e hospitalar e constataram
ferência de hormônios como leptina, neuropeptídeo Y, grelina, que a prevalência de desnutrição foi de 52%, sendo que
insulina, dentre outros que, quando desregulados, implicam no 40% desses pacientes foram considerados com desnutrição
estabelecimento da síndrome da anorexia-caquexia, resultando moderada e 12% com desnutrição grave.
em progressão da doença, aumento nas taxas de morbimortali- Um estudo conduzido em 207 pacientes oncológicos no
dade e redução da qualidade de vida desses pacientes9. pré e pós-tratamento radioterápico revelou que 31% dos
pacientes apresentavam algum grau de desnutrição prévia
SÍNDROME DA ANOREXIA-CAQUEXIA EM à radioterapia, sendo que esse valor aumentou para 43%
PACIENTES ONCOLÓGICOS após essa modalidade de tratamento20.
A desnutrição e a perda de peso são achados comuns nos Dock-Nascimento et al.21 realizaram um estudo em 150
pacientes oncológicos, sendo que a localização e a extensão pacientes com neoplasias malignas submetidos a tratamento
do tumor estão entre os principais fatores implicados no grau clínico ou cirúrgico e identificaram desnutrição moderada ou
de comprometimento do estado nutricional5,7. grave em 46% dos casos.
Os pacientes com câncer de mama, leucemia, sarcomas Oitenta pacientes com neoplasias digestivas em fase pré-
e linfoma não-Hodgkin de histologia favorável são os que operatória foram avaliados por meio de um estudo que iden-
apresentam o menor grau de desnutrição, atingindo cerca tificou algum grau de desnutrição em 50% dos casos, sendo
de 30% a 40% dos pacientes. O câncer de pulmão, cólon, que 21% dos pacientes apresentavam desnutrição grave22.
próstata e linfomas não-Hodgkin de histologia não favorável A produção de compostos tumorais, as alterações meta-
oscilam entre 45% a 60%, já os tumores de pâncreas, esôfago bólicas e o processo inflamatório observados nos pacientes
e estômago levam a um pior prognóstico nutricional, atin- oncológicos levam ao aumento do gasto energético, cata-
gindo prevalência de desnutrição de 80% a 85%1. bolismo protéico e anorexia, repercutindo negativamente no
O Inquérito Brasileiro de Avaliação Nutricional (IBRA- estado nutricional8.
NUTRI)15, realizado com 4 mil pacientes internados na rede A desnutrição grave acompanhada de astenia e anorexia
pública de 12 estados e do Distrito Federal, revelou que, de é denominada caquexia. A palavra caquexia é derivada do
20,1% dos pacientes oncológicos, 66,4% apresentavam-se com grego “kakos”, que significa “mau”, e “hexis”, que significa
desnutrição, sendo 45,1% de grau moderado e 21,3%, grave. “estado”. Portanto, etimologicamente significa “mau estado”9.
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245
Santos ALB et al.

Embora a caquexia inclua a anorexia, ela difere da desnu- A Avaliação Nutricional Subjetiva (ANS) ou Avaliação
trição simples pelo fato de que há alterações metabólicas Nutricional Subjetiva Global (ANSG) é um método essencial-
e inflamatórias presentes. Na desnutrição, ocorre o catabo- mente clínico e integrado de avaliação do estado nutricional.
lismo do tecido adiposo, poupando o músculo esquelético, Esse método se baseia em um questionário composto por
e na caquexia, há igual mobilização do tecido muscular e parâmetros da história clínica (perda involuntária recente
adiposo. Além disso, a desnutrição pode ser revertida com a de peso, mudanças na dieta usual, presença de sintomas
terapia nutricional, enquanto que na caquexia a adequação gastrintestinais e capacidade funcional do indivíduo) e do
do estado nutricional exige um controle sistêmico do câncer exame físico (perda de gordura subcutânea, definhamento
associado ao suporte nutricional11. muscular e presença de edema ou ascite) do paciente26,
Dentre os fatores que contribuem para a caquexia, classificando, posteriormente, o avaliado em três categorias:
destaca-se a reduzida ingestão alimentar e/ou saciedade A (nutrido), B (moderadamente desnutrido ou com suspeita
precoce, definida como anorexia. A anorexia no câncer de desnutrição) e C (gravemente desnutrido)27,28.
ocorre devido aos efeitos locais do tumor ou ao tratamento O diferencial entre a ANS e os demais métodos de
antineoplásico que tem como efeitos colaterais mais comuns avaliação do estado nutricional utilizados na prática clínica
náuseas, vômitos, alterações no paladar, xerostomia, muco- como, por exemplo, peso atual, peso usual, altura, circun-
site e disfagia. As alterações psicológicas como ansiedade e ferência de braço, dobra cutânea triciptal, circunferência
depressão também contribuem para a anorexia5,9. muscular de braço, percentual de perda ponderal e índice
Clinicamente, a caquexia manifesta-se por anorexia, de massa corporal está no fato dela não incluir apenas as
astenia, perda de peso, atrofia muscular, edema em membros alterações da composição corporal, mas também as altera-
inferiores, palidez, letargia e infecções frequentes. As alte- ções funcionais do paciente, possibilitando a identificação
rações laboratoriais observadas são hipoalbuminemia, precoce dos pacientes em risco nutricional29.
hiperglicemia, lactacidemia, hiperlipidemia, contagem total Cabe ressaltar que a ANS foi validada, em 1984, por
de linfócitos e hemoglobina diminuídas22. Detsky et al.30 como uma ferramenta de triagem de pacientes
Como consequência, o paciente caquético apresenta cirúrgicos e, posteriormente, adaptada para o uso em várias
menor tolerância ao tratamento oncológico e maior risco populações, em diversos ambientes e estados de doença,
de complicações pós-operatórias em virtude da reduzida tais como: pacientes clínicos, ambulatoriais, domiciliares,
capacidade de cicatrização e maior suscetibilidade a hepatopatas, nefropatas, geriátricos, HIV positivos e, princi-
processos infecciosos. Essas complicações implicam no palmente, oncológicos.
aumento do tempo de internação e dos custos hospitalares, Esse método de avaliação nutricional desempenha um
além de conduzir o paciente oncológico a um prognóstico papel muito importante na determinação dos pacientes
desfavorável, com grande impacto sobre o seu estado físico, cirúrgicos em risco nutricional, pois ele consegue identificar
psicológico e social23. a desnutrição antes do aparecimento de alterações na
composição corporal associada à carência de nutrientes26.
AVALIAÇÃO NUTRICIONAL SUBJETIVA GLOBAL A ANS tem demonstrado pouca variabilidade entre os obser-
VERSUS AVALIAÇÃO NUTRICIONAL SUBJETIVA vadores, resultados de fácil reprodutividade e uma sensibilidade
PROPOSTA PELO PACIENTE maior do que a antropometria30. Apesar disso, apresenta algumas
O simples fato de o paciente apresentar neoplasia limitações, tais como sua utilização para monitorar a evolução
maligna classifica-o como um paciente em risco nutricional, dos pacientes, devido aos seus critérios qualitativos, e sua precisão
devido às alterações metabólicas resultantes dessa doença diagnóstica dependente da experiência do observador28. Porém,
e dos tipos de tratamentos utilizados. Sendo assim, torna-se essas limitações não invalidam o seu uso como instrumento
necessária a identificação precoce dos pacientes em risco prognóstico e diagnóstico, tendo sido validada por vários autores
nutricional24. em estudos comparativos, mostrando boa concordância com
métodos de avaliação nutricional objetivos26,27,30-32.
Indicadores de risco nutricional como a antropometria, a
avaliação laboratorial e vários cálculos de índices nutricionais Modificações foram realizadas na ANS inicial para sua utili-
têm sido utilizados nos últimos anos. Entretanto, na prática zação em pacientes oncológicos, dando origem a ANS proposta
oncológica, o método de avaliação nutricional precisa ter pelo paciente (ANS-PPP), que inclui informações adicionais
as seguintes características: fácil execução, custo adequado, sobre alguns sintomas comumente presentes nesses pacientes.
reprodutível em diversas situações clínicas, capaz de predizer Esta avaliação consiste de um questionário dividido
pacientes com necessidade de intervenção nutricional e que em duas partes, sendo a primeira auto-aplicada e inclui
se beneficiarão dessa intervenção, e que tenha pequena perguntas sobre alguns sintomas relacionados ao câncer,
variabilidade entre os observadores25. alteração da ingestão alimentar, perda de peso e alterações
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246
Avaliação nutricional subjetiva proposta pelo paciente versus outros métodos de avaliação do estado nutricional em pacientes oncológicos

na capacidade funcional. A segunda parte do questionário é Bauer et al.34 avaliaram o uso da ANS-PPP como uma ferra-
preenchida pelo profissional de saúde (médico, nutricionista menta de avaliação nutricional em 71 pacientes hospitalizados
ou enfermeiro) por meio do exame físico semelhante à ANS com diversos tipos de câncer (49% linfomas, 13% câncer de
inicial e da avaliação de fatores relacionados ao diagnóstico mama e 4% cânceres de próstata, esôfago, pulmão, sarcoma
que aumentem a demanda metabólica, como, por exemplo, e mieloma), sendo 56% homens e 44% mulheres, com idade
estádio do tumor, febre, estresse, depressão e fadiga29,33. entre 18 e 92 anos e identificaram que 24% possuíam estado
A ANS-PPP tem a vantagem de fazer com que o paciente se nutricional adequado, 59% desnutrição moderada e 17%,
sinta mais participativo, além de diminuir o tempo gasto pelo desnutrição grave. Os autores concluíram que a ANS-PPP é
profissional para finalizar a avaliação. Ela se mostrou adequada uma ferramenta fácil de ser usada e de rápida identificação da
na identificação de pacientes oncológicos que se beneficiaram desnutrição em pacientes oncológicos hospitalizados (Tabela 1).
de intervenção nutricional preventiva durante a terapia oncoló- Cinquenta e dois pacientes oncológicos (62% mulheres e
gica, e tem apresentado boa concordância entre os resultados 38% homens), ambulatoriais (52%) e hospitalizados (48%),
das avaliações realizadas por médicos e nutricionistas29. com idade entre 24 e 75 anos, em tratamento paliativo,
Segundo alguns estudos em pacientes com câncer34,35, a participaram de um estudo com intuito de caracterizar as suas
ANS-PPP apresenta especificidade de 82%-83%, sensibilidade necessidades nutricionais por meio da ASG-PPP. Neste estudo,
de 96%-98% e correlação inversa (r=-0,55) entre a variação as neoplasias mais comuns foram: câncer colorretal (12%),
em ANS-PPP e a qualidade de vida nesses pacientes. câncer de mama (14%) e câncer de pulmão (12%). De acordo
com a ASG-PPP, os seguintes resultados foram observados:
E S T U D O S C O N D U Z I D O S E M PA C I E N T E S 25% dos pacientes estavam em bom estado nutricional, 52%
HOSPITALIZADOS COM USO DAANSG E DAANS-PPP moderadamente desnutridos ou com suspeita de desnutrição
moderada, e 23% gravemente desnutridos. Os autores não
Um estudo conduzido em 250 pacientes hospitalizados, encontraram diferença estatística entre pacientes internados
com idades entre 16 e 76 anos, pertencentes aos sexos
e ambulatoriais nessas categorias39 (Tabela 1).
feminino (48,8%) e masculino (51,2%), e com diagnóstico
de ingresso médico (50,4%) e cirúrgico (49,6%), permitiu um Um estudo realizado com o objetivo de verificar o perfil
diagnóstico precoce de desnutrição em 49% dos casos por nutricional de pacientes oncológicos com idade entre 27 e 74
meio da utilização da Avaliação Nutricional Subjetiva Global36. anos, sendo 55,55% do sexo masculino e 44,44% do sexo femi-
nino, identificou que, quanto ao tipo de atendimento, 44,44%
Outro estudo identificou que 70% dos 120 pacientes
estavam internados com diagnóstico de câncer e 55,55% em
adultos, idade média de 49,1±15,6 anos, 58,3% homens
e 41,7% mulheres, sendo a maioria hepatopatas (24,2%) e tratamento ambulatorial para quimioterapia. Foram apresen-
cardiopatas (22,5%), apresentavam algum grau de compro- tadas 11 localizações de tumores, 38,89% no esôfago/faringe/
metimento nutricional ao utilizar a ANS como ferramenta de fígado/intestino/cólon/reto, 27,78% no pulmão, 22,22% na
avaliação nutricional37. mama/ovário e 11,11% no rim/bexiga. Os pacientes foram
avaliados por meio da ANS-PPP, do índice de massa corporal
Segundo Arias et al.38, foi possível detectar, por meio
(IMC), da prega cutânea tricipital (PCT), da circunferência do
da Avaliação Nutricional Subjetiva Global, que 62% dos
pacientes internados tem problemas nutricionais, os quais se braço (CB) e da circunferência muscular do braço (CMB).
beneficiaram com a intervenção nutricional precoce. Identificou-se 50% de desnutrição segundo a ANS-PPP, 5,56%
segundo o IMC, 66,67% segundo a PCT, 38,89% segundo a
Trinta pacientes oncológicos, 73% homens e 27% mulheres,
CB e 16,67% segundo a CMB. A diferença entre os indicadores
entre 18 e 80 anos, com diversos tipos de neoplasias malignas
utilizados revelou a necessidade de uma investigação completa
(44% de cólon, 30% pulmonar, 17% gástrica, 3% esofágica,
do estado nutricional do paciente oncológico40 (Tabela 1).
3% pancreática e 3% enfermidade de Hodgkin) e submetidos
a tratamento quimioterápico (93%) e quimioterápico/radio- Conde et al.28 realizaram uma avaliação nutricional
terápico (7%) participaram de um estudo onde a desnutrição pré-operatória em 80 pacientes (41 homens e 39 mulheres)
foi diagnosticada, por meio da ANS-PPP em 63% dos casos com neoplasia digestiva (estômago, n = 23, pâncreas, n
e por meio da antropometria em 26% dos casos35 (Tabela 1). = 6, cólon, n = 27, e reto, n = 24), com idade entre 27 e
Em um estudo realizado com 100 pacientes hospitalizados 92 anos, e observaram perda ponderal superior a 5% em
com intuito de comparar a ANS com avaliação nutricional 3 meses em 53% e albumina plasmática inferior a 3,5 mg/
objetiva, Coppini et al.31 observaram associações estatistica- dL em 49% dos casos. A ANS-PPP mostrou prevalência de
mente significativas (p<0,05) entre albumina (<3,5mg/dL), desnutrição em 50% dos pacientes. A desnutrição se correla-
hemoglobina (<13,9g/mL), prega cutânea triciptal (<10mm) cionou significativamente com a idade (mais frequente com o
e circunferência muscular do braço (<23,3) com a presença aumento desta) e com o tipo de neoplasia (maior prevalência
de desnutrição moderada e grave estabelecidas pela ANS. no câncer gástrico) (Tabela 1).
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 243-9
247
Santos ALB et al.

Tabela 1 – Ensaios conduzidos em pacientes oncológicos por meio da ANSG e ANS-PPP.


Referência Base de dados Tipo de estudo Objetivo do es- População-alvo Resultados
tudo
Gómez-Candela Medline Coorte - c o m p a r a r a - amostra: 30 pacientes oncológicos - desnutrição (ANS-PPP): 63%;
et al.35 ANS-PPP com - tipos de câncer: de cólon, pulmonar, - desnutrição (antropometria): 26%;
outros marcado- gástrico, esofágico, pancreático e en- - concluiu-se que a ANS-PPP é uma fer-
res padronizados fermidade de Hodgkin ramenta útil para triagem de pacientes
- sexo: masculino (73%) e feminino oncológicos;
(27%) - a especificidade da ANS-PPP se
- idade: 18 - 80 anos aproxima do padrão, quando realizada
por avaliadores treinados.
Bauer et al.34 PubMed Observacional - avaliar o uso da - amostra: 71 pacientes oncológicos - estado nutricional adequado: 24%;
ANS-PPP como - tipos de câncer: linfoma, mamário, - desnutrição moderada: 59%;
ferramenta de prostático, esofágico, pulmonar, sar- - desnutrição grave: 17%;
avaliação nutri- coma e mieloma - concluiu-se que a ANS-PPP é uma
cional em pacien- - sexo: masculino (56%) e feminino ferramenta de fácil utilização, que
tes oncológicos (44%) permite rápida identificação de pa-
hospitalizados - idade: 18 - 92 anos cientes oncológicos hospitalizados
com desnutrição
Bortolon et al.39 Bireme Coorte - caracterizar as - amostra: 52 pacientes oncológicos - bom estado nutricional: 25%;
necessidades nu- - tipos de câncer: colorretal (12%), de - moderadamente desnutrido ou com
tricionais por meio mama (14%) e pulmonar (12%) suspeita de desnutrição; moderada:
da ANS-PPP - sexo: masculino (38%) e feminino 52%;
(62%) - gravemente desnutrido: 23%
- idade: 24 - 75 anos
Ulsenheimer Capes Transversal - verificar o per- - amostra: 18 pacientes oncológicos - desnutrição (ANS-PPP): 50%;
et al.40 fil nutricional por - tipos de câncer: esôfágico/ faringe- - desnutrição (IMC): 5,56%;
meio de diferen- ano/ hepático/ intestinal/ colorretal - desnutrição (PCT): 66,67%;
tes métodos (38,89%), pulmonar (27,78%), mamá- - desnutrição (CB): 38,89%;
rio/ ovariano (22,22%) e de bexiga/ - desnutrição (CMB): 16,67%.
renal (11,11%)
- sexo: masculino (55,55%) e feminino
(44,44%)
- idade: 27 - 74 anos
Conde et al.28 SciELO Transversal, - analisar a preva- - amostra: 80 pacientes oncológicos - perda ponderal superior a 5% em 3
observacional lência de desnu- - tipo de câncer: gástrico (28,75%), meses: 53%;
e descritivo trição em pacien- pancreático (7,50%), de cólon (33,75%) - albumina plasmática inferior a 3,5mg/
tes oncológicos e reto (30,00%) dL: 49%;
s u b m e t i d o s à - sexo: masculino (51,25%) e feminino - desnutrição (ANS-PPP): 50%
intervenção ci- (48,75%)
rúrgica - idade: 27 - 92 anos

CONCLUSÃO REFERÊNCIAS
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Local de realização do trabalho: Hospital Regional da Asa Norte, Secretaria de Estado de Saúde do Distrito Federal, Brasília, DF, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 243-9


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A Artigo de Revisão
Smiderle CA & Gallon CW

Desnutrição em oncologia: revisão de literatura


Malnutrition in oncology: literature review

Cristiane Amine Smiderle1 RESUMO


Carin Weirich Gallon2 Sabe-se que as taxas de cura para o câncer ainda são baixas e, dessa forma, faz-se necessário
dispor ao paciente medidas de controle de sintomas para melhora da qualidade de vida. O
câncer é capaz de alterar os hábitos fisiológicos e normais de vida em um paciente, fazendo com
que haja comprometimento nutricional, principalmente no que diz respeito à ingesta de macro
e micronutrientes. A desnutrição e a caquexia estão presentes em cerca de 80% dos pacientes
oncológicos antes mesmo do diagnóstico e, dessa forma, compromete a resposta do paciente
ao tratamento. Objetivou-se, através desta revisão de literatura, reunir diferentes estudos e
comparar seus resultados com a finalidade de relacionar a desnutrição com os diferentes tipos
de câncer. Nas bases de dados pesquisadas LILACS, PubMed e MEDLINE foram encontradas
201.904 publicações. Após aplicação de filtros, foram incluídos 15 artigos publicados entre os
anos de 2007 e 2011. Dentre os principais achados podemos observar que no câncer de cabeça
e pescoço há elevados índices de desnutrição, pelo fato de normalmente haver disfagia e dificultar
a deglutição de alimentos. No câncer do trato gastrointestinal, também observamos desnutrição
principalmente no pós-operatório, onde se torna necessária terapia nutricional enteral em muitos
casos. Em relação ao câncer de pulmão, este também se encontra na lista dos tumores que mais
desnutrem. Nos estudos podemos observar desnutrição, bem como aumento dos sintomas em
Unitermos:
Avaliação nutricional. Desnutrição. Estado nutricional. função da baixa ingesta alimentar.
Perda de peso.
ABSTRACT
Key words: It is known that the cure rates for cancer are still low, thus it is necessary to dispose to the patient
Nutritional assessment. Malnutrition. Nutritional symptom control measures to improve the quality of life. Cancer is able to change physiological
status. Weight loss. habits in a patient, causing compromised nutritional status, especially regarding the intake of
macro and micronutrients. Malnutrition and cachexia are present in about 80% of cancer patients
Endereço para correspondência: before diagnosis, which compromise the patient’s response to treatment. The objective of this
Cristiane Amine Smiderle literature review is to compare different studies results in order to find a relation between malnu-
Rua José Jaconi, 734, apto 901 - Centro - Caxias do trition and different types of cancer. In the searched databases LILACS, MEDLINE and PubMed,
Sul, RS, Brasil - CEP: 95020-250. 201.904 publications were found. After applying filters, 15 articles published between the years
E-mail: cris.smiderle@terra.com.br
2007 and 2011 were included. Among the main findings we noticed that the head and neck
Submissão cancer has high rates of malnutrition due to dysphagia or difficulty swallowing food. In cancer of
7 de novembro de 2011 the gastrointestinal tract we can observe malnutrition mainly in the postoperative period, where
it becomes necessary enteral nutritional therapy in many cases. In relation to lung cancer, this is
Aceito para publicação also on the list of tumors that cause great malnutrition. In the studies we find malnutrition as well
22 de fevereiro de 2012 as increased symptoms due to low food intake.

1. Acadêmica do curso de Nutrição da Universidade de Caxias do Sul. Centro de Ciências da Saúde. Departamento de Nutrição, Caxias do Sul, RS, Brasil.
2. Mestre em Ciências Médicas pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), docente dos Cursos de Nutrição e Medicina da Uni-
versidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul, RS, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 250-6


250
Desnutrição em oncologia: revisão de literatura

INTRODUÇÃO Frente às alterações nutricionais que o câncer pode trazer


O câncer é definido como uma enfermidade multicausal aos pacientes, este estudo teve como objetivo reunir diversas
crônica, caracterizada pelo crescimento descontrolado das bibliografias e comparar os resultados dos estudos, a fim de
células e a disseminação de células anormais, que continuam avaliar o estado nutricional nos tipos de câncer em que a
a se reproduzir até que formem uma massa de tecido conhecida desnutrição é mais prevalente.
como tumor. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde
(OMS) de 2007, o câncer atinge pelo menos nove milhões de MÉTODO
pessoas e mata cerca de cinco milhões a cada ano, sendo hoje
O método adotado foi a revisão de literatura, consistindo na
a segunda causa de morte por doença nos países desenvolvidos,
busca retrospectiva de artigos científicos tratando de desnutrição
perdendo apenas para as doenças cardiovasculares1.
em diferentes tipos de câncer, nesse caso especificamente em
Mesmo com os gran­des avanços da Medicina referente câncer de cabeça e pescoço, gastrointestinal superior e pulmão.
ao tratamento onco­lógico, as taxas de cura ainda são baixas. Para esta pesquisa, foram utilizadas as bases de dados MedLine,
Deste modo, os pacientes considerados fora de possibilidades LILACS e PubMed. Como estratégia de busca, inicialmente
terapêuticas curativas necessitam de controle da dor e dos realizou-se uma ampla revisão sobre os termos utilizados para
sintomas decorrentes da doença, além dos relacionados com indexação relacionados à desnutrição no câncer. Utilizou-se para
os as­pectos psicológicos, sociais e espirituais, com o objetivo esta pesquisa os Descritores em Ciências da Saúde – DeCs. Os
de investir na melhora da qualidade de vida (QV)2. termos para indexação encontrados e utilizados posteriormente
A presença do câncer altera, indubitavelmente, todos os foram: “Avaliação Nutricional”, “Desnutrição”, “Estado Nutri-
aspectos da vida do indivíduo e pode acarretar profundas cional”, “Perda de Peso” e “Subnutrição”. (“Nutrition Assess-
alterações no modo de viver habitual, conforme o compro- ment”, “Evaluación Nutricional”, “Malnutrition”, “Desnutrición”,
metimento da capacidade e habilidade para execução de “Nutritional Status”, “Estado Nutricional”, “Weight Loss”, “Pérdida
atividades de rotina3. de Peso”). A busca bibliográfica foi realizada entre os meses de
Cerca de 80% dos pacientes com câncer apresentam setembro e outubro de 2011. Obteve-se como resultado 201.904
desnutrição já no momento do diagnóstico. Essa desnutrição artigos publicados até o momento. Desses artigos, 145.142 foram
é do tipo calórico-proteica e ocorre devido a um desequi- encontrados na base de dados PubMed, 6.553 na base de dados
líbrio entre a ingesta e as necessidades nutricionais desses LILACS e 50.209 na base de dados MedLine. Após a consulta
pacientes, comprometendo seu estado nutricional, o que está geral nas bases de dados foram considerados apenas artigos
associado ao aumento da morbimortalidade no câncer e ao publicados em português, inglês e espanhol, disponíveis para a
favorecimento da caquexia, uma complicação frequente no pesquisa entre os anos de 2007 a 2011. Destes artigos, foram
paciente portador de neoplasia maligna4-6. escolhidos 15, por apresentarem dados relevantes sobre desnu-
trição no câncer e possuírem metodologia bem descrita, sendo
Desnutrição e caquexia em pacientes com câncer são
que o restante dos artigos foi utilizado para introdução e conceitos.
problemas significativos devido a uma variedade de meca-
Os artigos foram avaliados quanto ao desenho do estudo, tema
nismos que envolvem o tumor, a resposta do hospedeiro ao
abordado, principais desfechos, principais achados e relação da
tumor e terapias anticâncer. Desnutrição tem sido associada
desnutrição com o câncer. Com a análise dos artigos foi possível
com uma série de consequências clínicas, incluindo a quali-
realizar a avaliação quantitativa e qualitativa dos dados.
dade de vida que se deteriora, diminuição da resposta ao
tratamento, aumento do risco de toxicidade induzida por
quimioterapia e redução na sobrevivência ao câncer7-9. Desnutrição no câncer de cabeça e pescoço
Segundo Andrade et al. , a desnutrição é frequentemente
10
O câncer de cabeça e pescoço ocupa a quinta posição na lista
associada a carcinomas de cabeça e pescoço e trato diges- das neoplasias mais frequentes, com incidência mundial estimada
tivo superior. Entretanto, os efeitos terapêuticos e tóxicos dos de 780.000 novos casos por ano. Os sítios anatômicos que estão
agentes antineoplásicos dependem do tempo de exposição e incluídos nesse grupo de neoplasias constituem a cavidade oral,
da concentração plasmática da droga. A toxicidade é variável que compreende mucosa bucal, gengivas, palato duro, língua,
para os diversos tecidos e depende da droga utilizada9,10. soalho de língua; faringe, que inclui: orofaringe, nasofaringe,
Em todo o mundo, o câncer de pulmão é a forma mais hipofaringe; cavidade nasal e seios paranasais; laringe glótica e
comum de câncer, com incidência de 1,35 milhões de novos supraglótica e glândulas. A ocorrência aproximada é de 40% na
casos por ano e 1,18 milhões de mortes, com as taxas mais cavidade oral, 15% na faringe e 25% na laringe, sendo o restante
elevadas na Europa e América do Norte. Câncer de pulmão nos demais sítios remanescentes14.
de não-pequenas células (NSCLC) é responsável por cerca de Em relação à nutrição, estudos epidemiológicos relatam
80% de todos os cânceres de pulmão11. Estudos demonstram que o consumo de frutas e vegetais ricos em vitaminas A e
a frequência de perda de peso e desnutrição em câncer de C e em betacaroteno estão inversamente relacionados ao
pulmão entre 31% a 87%, variando de acordo com a loca- risco de câncer oral, enquanto a carne e a pimenta vermelha
lização e estádio do tumor12,13. são consideradas fatores de risco15.
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 250-6
251
Smiderle CA & Gallon CW

O diagnóstico tardio das lesões primárias orais e metástases do tratamento, melhorar o resultado, a qualidade de vida e o
cervicais são comuns, o que faz do tratamento dessas doenças estado nutricional19. Dessa forma, o paciente que se encontra
uma situação particularmente grave. A constatação da doença em em melhor estado nutricional antes do tratamento obtém maior
fase avançada e a agressividade dos tratamentos antineoplásicos resposta ao tratamento, além de apresentar melhor prognóstico,
associam-se à acentuada redução da ingesta alimentar e cons- menor tempo de internação e melhora da qualidade de vida19.
tituem as principais causas da desnutrição energético-proteica Tal fato foi corroborado pelo estudo de Jager-Wittenaar et
(DEP) nos indivíduos acometidos por esse tipo de câncer16. al.20, que teve como objetivo testar se o estado nutricional de
Um estudo transversal conduzido por DeCicco et al.17 foi pacientes com câncer de cabeça e pescoço sofreu alterações
realizado com o objetivo de avaliar as práticas de avaliação durante e após o tratamento   (radioterapia, sendo sozinho
de desnutrição por radioterapeutas em pacientes portadores ou combinado com quimioterapia ou cirurgia). O estado
de câncer de cabeça e pescoço. Foram enviadas 14 perguntas nutricional (incluindo o peso corporal, massa magra e massa
a 333 radioterapeutas auto-identificados como “interessados gorda) e consumo alimentar foram avaliados em 29 pacientes.
no tratamento de câncer de cabeça e pescoço”. Esse estudo Os pacientes foram avaliados uma semana antes e 1 mês e 4
demonstrou que 87% dos radioterapeutas utilizam peso como meses após o tratamento. Durante o tratamento, o peso corporal
único determinante para desnutrição na consulta inicial. Uma e a massa magra diminuíram significativamente. Pacientes
diferença significativa foi encontrada entre radioterapeutas com com ingesta suficiente (35 kcal e 1,5 gramas de proteína /
educação nutricional formal versus aqueles sem, ao responder kg) perderam menos peso corporal e massa magra do que
se as intervenções de nutrição desempenham um papel signifi- pacientes com ingesta insuficiente (diferença média, -4,0 ±
cativo no prognóstico de pacientes com câncer. Além disso, uma 1,9 kg e -2,1 ± 1,0 kg, respectivamente). Após o tratamento,
diferença significativa foi observada em métodos usados ​​para apenas os pacientes com ingesta suficiente ganharam peso
determinar a ingesta calórica adequada quando os oncologistas
corporal (2,3 ± 2,3 kg) e massa magra (1,2 ± 1,3 kg). Pacientes
foram estratificados por suas crenças sobre nutrição, sendo
com câncer de cabeça e pescoço não conseguem manter ou
uma variável importante que afeta o prognóstico. A avaliação
melhorar o estado nutricional durante o tratamento, apesar da
ou triagem para desnutrição no câncer de cabeça e pescoço
ingesta suficiente20. Isso já era esperado, pois sabemos que a
deve ser parte da rotina da consulta inicial. Radioterapeutas e
ingesta adequada de nutrientes em pacientes em tratamento
sua equipe médica, incluindo nutricionistas, devem usar uma
oncológico é fundamental para a recuperação e melhor resposta
triagem nutricional adequada e uma ferramenta de avaliação,
ao tratamento. Dessa forma, o peso corporal e a massa magra
além do peso do corpo como um indicador de desnutrição. A
são preservados em pacientes que possuem ingesta suficiente e
educação nutricional deve ser melhorada nos radioterapeutas,
depletadas em pacientes com ingesta insuficiente. Além disso, a
para melhor comunicar os efeitos positivos das intervenções de
perda de massa magra é sugestiva de perda de proteína visceral,
nutrição no prognóstico17. Esse achado justifica a necessidade
o que pode levar o paciente a um quadro de caquexia20.
de um profissional de nutrição frente aos pacientes oncológicos,
para que seja possível obter mais dados no que diz respeito ao Van den Berg et al.21 realizaram estudo entre 2005 e 2007
estado nutricional e não apenas avaliá-lo pelo peso corporal, para avaliar o valor do aconselhamento dietético individual
já que esse é um parâmetro isolado. (ADI) (energia ótima e exigência de proteína) por um nutricio-
Em estudo transversal retrospectivo de Garcia-Peris et al.18 nista em relação ao padrão de cuidados nutricionais (PCN)
realizado com 87 pacientes com câncer de cabeça e pescoço, realizado por um enfermeiro de oncologia. Os desfechos
de janeiro de 2000 a maio de 2005, foi possível observar encontrados foram perda de peso, IMC e desnutrição (perda
que a disfagia orofaríngea estava presente em 50,6% dos de peso de 5% / mês) antes, durante e após o tratamento.
pacientes, principalmente para alimentos sólidos (72,4%). Foram incluídos e distribuídos uniformemente 38 pacientes ao
Foi necessário suporte nutricional em 57,1% dos pacientes. A longo de dois grupos. A diminuição significativa na perda de
desnutrição mostrou-se presente em 20,3% dos pacientes e foi peso foi encontrada dois meses após o tratamento (P = 0,03)
observado principalmente do tipo marasmo (81%). Em relação para ADI comparado ao PCN. Desnutrição em pacientes com
à qualidade de vida, 51% dos pacientes relataram diminuição ADI diminuiu ao longo do tempo, enquanto a desnutrição
devido à disfagia. Mostrou também que existe alta prevalência aumentou em pacientes com PCN (P = 0,02). Portanto,
de disfagia em pacientes tratados com cirurgia e tratamentos precoce e intensivo aconselhamento dietético individualizado
coadjuvantes. Dessa forma, constata que a vigilância nutri- por um nutricionista produz efeitos clinicamente relevantes
cional é importante para detectar e evitar a desnutrição18. em termos de diminuir a perda de peso e desnutrição em
Capuano et al.19, em um estudo para avaliar a prevalência e comparação com cuidados nutricionais padrão em pacientes
influência de desnutrição na qualidade de vida de pacientes com com câncer de cabeça e pescoço submetidos à radioterapia21.
câncer de cabeça e pescoço antes do tratamento de rádio ou Sabemos que a avaliação feita por um nutricionista é de
quimioterapia concomitante, verificaram que, dos 61 pacientes extrema importância, visto que esse profissional tem subsídios
estudados, 36 estavam em desnutrição antes do tratamento. Os e recursos específicos para avaliar e classificar o estado nutri-
dados sugerem que um suporte nutricional precoce e intensivo cional e, dessa forma, contribuir para melhor recuperação
pode reduzir a perda de peso antes, durante e após a conclusão do paciente, melhorando sua qualidade de vida.
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 250-6
252
Desnutrição em oncologia: revisão de literatura

Desnutrição no câncer do trato gastrointestinal superior cirúrgicos com câncer gastrointestinal.  O estado nutricional,
A desnutrição é muito prevalente no paciente oncológico juntamente com inadequadas práticas de pós-operatório de
e associa-se à diminuição da resposta ao tratamento especí- nutrição, está associado com piores resultados clínicos37. Isso
fico e à qualidade de vida, com maiores riscos de infecção já é evidenciado pela literatura e na prática assistencial, pois
pós-operatória e aumento na morbimortalidade. O grau e sabemos que pacientes com estado nutricional depletado têm
a prevalência da desnutrição dependem também do tipo e piora do quadro clínico, piora no prognóstico, baixa resposta
do estágio do tumor, dos órgãos envolvidos, dos tipos de ao tratamento e permanecem muito mais tempo internados do
terapia anticâncer utilizadas, da resposta do paciente e da que aqueles que se encontram em estado nutricional adequado.
localização do tumor, que quando atinge o trato gastroin- Tal fato foi corroborado em Madrid, Espanha, quando Conde
testinal (TGI) causa desnutrição bastante evidenciada22-32. et al.38, em um estudo com 80 pacientes entre 27 e 92 anos
O carcinoma esofágico é uma das neoplasias mais comuns (41 homens e 39 mulheres), demonstraram que 51 pacientes
em todo o mundo, ocupando o oitavo lugar na incidência e tinham câncer do trato gastrointestinal inferior (cólon e retal),
o sexto lugar na mortalidade entre os tumores e seus sítios33. 23, câncer gástrico e 6, neoplasia de pâncreas. Observou-se
A desnutrição proteico-energética é comum em pacientes que 53% dos pacientes estudados tinham perdido mais de 5%
com carcinoma esofágico, sendo uma causa importante do de seu peso usual nos últimos 3 meses. Em 49% dos casos, os
aumento da morbidade e da mortalidade. É importante não níveis plasmáticos de albumina estavam abaixo de 3,5 mg/dl.
esquecer que a ingesta diminuída pode surgir também por difi- A aplicação da Avaliação Subjetiva Global mostrou prevalência
culdades de deglutição, obstrução mecânica do trato gastroin- de desnutrição em 50% (29% moderadamente desnutridos ou
testinal, dor e, mais raramente, por distúrbios psicológicos34. em risco de desnutrição e 21% desnutrição grave). Observou-se
ainda que a desnutrição estava associada com a idade, sendo
Os adenocarcinomas gastrointestinais superiores estão entre
mais frequente em pacientes com câncer gástrico. Concluíram
as causas mais prevalentes de mortes relacionadas ao câncer no
que são necessários mais estudos sobre prevalência de desnu-
mundo. Essa categoria inclui os adenocarcinomas de estômago,
junção gastroesofágica (JGE) e terço inferior do esôfago35.  trição em pacientes com câncer38. Sabemos que tumores do
trato gastrointestinal são os tumores que mais levam a quadros
Javier et al.36 investigaram 14 pacientes com gastrectomia de desnutrição, visto que a ingesta de nutrientes se torna mais
total ou parcial com evolução mínima de 5 meses, a fim de
difícil. Dessa forma, se faz necessária a intervenção nutricional
avaliar o estado nutricional. O índice de massa corporal foi de
precoce, para evitar que esses pacientes sejam classificados na
22,03 kg/m². Dos pacientes estudados, 50% apresentaram peso
faixa de desnutrição, ou quando este quadro já foi instalado,
normal, enquanto 4 estavam com sobrepeso (28,6%) e apenas
pelo menos evitar sua progressão.
3 com desnutrição leve (21,4%). Os percentuais de dobra
cutânea tricipital e circunferência muscular do braço foram de O estudo de Marin et al.39 foi realizado para verificar a
77,1±37% e 89,6±9,5%, respectivamente. Com base nos associação entre a gravidade da doença com estado nutri-
resultados, os autores afirmam que desnutrição não foi uma cional pré-cirúrgico, as principais complicações pós-cirúr-
consequência inevitável de gastrectomia e pode ser prevenida36. gicas e a mortalidade em pacientes com câncer esofágico.
Foram analisados 100 pacientes divididos em G1 (grupo 1:
Em contrapartida, o estudo de Garth et al.37 teve como
n=25), submetidos a esofagectomia e G2 (grupo 2: n=75)
objetivo determinar se as práticas nutricionais especificas pré-
submetidos à gastro ou jejunostomia. Foram incluídos dados
operatórias e protocolos estão associados com os resultados de
clínicos, endoscópicos, histológicos (TNM-UICC), dietéticos,
melhora nesse grupo. Pacientes admitidos para cirurgia eletiva
químicos do sangue, antropométricos, e mortalidade e
de câncer do trato gastrintestinal superior (n = 95) durante um
complicações pós-cirúrgicas (> 30 dias). A amostra estudada
período de 19 meses passou por uma auditoria para avaliar
foi predominantemente masculina, cor branca, fumantes e
o histórico médico de alterações de peso, ingesta alimentar,
bioquímica, complicações pós-operatórias e tempo de perma- alcoólatras, disfágicos e na maior parte apresentaram perda
nência. Um subgrupo de pacientes (n = 25) foi submetido à de peso antes do diagnóstico de câncer. Obstruções esofá-
avaliação nutricional pela Avaliação Subjetiva Global (ASG) gicas foram associadas ao menor índice de massa corporal.
antes da cirurgia, além de avaliação no pós-operatório de Complicações pós-operatórias foram mais comuns no G1.
resultados médicos, ingesta nutricional e tempo de duração Níveis plasmáticos de albumina foram menores no G2 do
de intervenção dietética. Tempo de internação foi significativa- que em G1, e foram associadas com complicações pós-
mente maior em pacientes que tiveram grande perda de peso operatórias e mortalidade, enquanto que menor contagem
no período pré-operatório em comparação àqueles que não de linfócitos foi associado com a mortalidade no G139.
[P <0,05]. Perda de peso, albumina baixa e o pós-operatório No estudo de Ryu e Kim40, foram estudados 80 pacientes
também foram preditivos de aumento do tempo de estadia. Dos sem evidência de doença recorrente e sem perda de acompa-
pacientes submetidos à avaliação nutricional, 32% foram nhamento após a cirurgia curativa para o câncer gástrico. Nesse
classificadas como leves a moderadamente desnutridas e 16% grupo, 9 pacientes foram submetidos a gastrectomia total e 71
gravemente desnutridas. Pacientes desnutridos foram hospitali- pacientes a gastrectomia subtotal. Na admissão, 6 e 12 meses
zados duas vezes. A desnutrição é prevalente entre os pacientes após a cirurgia, os pacientes foram avaliados através da Avaliação
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Subjetiva Global (ASG), triagem de risco nutricional (NRS-2002), parâmetros foram associados a desnutrição, perda de peso e
índice de risco nutricional (IRN), medidas antropométricas e dados hipoalbuminemia. A toxicidade induzida pela quimioterapia
de laboratório. Os dados antropométricos foram menores nos em pacientes com câncer de pulmão de não-pequenas células
grupos desnutridos definidos pela avaliação de SGA e NRS-2002, tratados com paclitaxel e cisplatina foi associada a desnutrição
mas não diferiram entre os grupos usando a avaliação IRN. Peso e hipoalbuminemia. Afirmaram que a avaliação nutricional
corporal (PC), índice de massa corporal (IMC), circunferência precoce e de apoio poderia conferir efeitos benéficos44.
do braço e da prega cutânea tricipital foram significativamente Isso se confirma no estudo em que Xara et al.45 avaliaram
reduzidos, mas a contagem total de linfócitos, albumina, proteína, a associação entre qualidade de vida e desnutrição em
colesterol e níveis de ferro sérico não diminuíram durante o pacientes com NSCLC.  O estado nutricional foi avaliado
período pós-operatório. Seis meses após a cirurgia, houve boa com a Avaliação Subjetiva Global (ASG) e Qualidade de
correlação entre os instrumentos de avaliação nutricional (ASG Vida (QV), usando a Organização Européia para Pesquisa
e NRS-2002) e os outros instrumentos de medição nutricional e Tratamento do Câncer de Qualidade de Vida - C30 e
(PC, IMC e medidas antropométricas). No entanto, 12 meses também com o módulo específico para pacientes com câncer
após a cirurgia, a maioria dos pacientes que foram avaliados de pulmão. Uma amostra consecutiva de 56 pacientes foi
como desnutridos pela ASG e NRS-2002 havia retornado ao seu avaliada.  A proporção de pacientes desnutridos é 35,7%.
estado pré-operatório, embora as medidas de PC, IMC e medidas Pacientes desnutridos têm pior estado de saúde global,
antropométricas indicassem desnutrição. A combinação entre as funcionamento físico, emocional e social.  Pacientes com
avaliações objetivas e subjetivas são necessárias para a detecção NSCLC têm alta frequência de desnutrição em estágios
precoce do estado nutricional no caso de pacientes com câncer avançados da doença.  Pacientes desnutridos têm mais
gástrico após gastrectomia40. Podemos observar que, quanto mais sintomas, pior estado de saúde globais/qualidade de vida,
avaliações subjetivas e objetivas realizarmos nos pacientes onco- funcionamento emocional e social do que pacientes sem
lógicos, maior a facilidade em detectar a condição nutricional, desnutrição. A desnutrição está associada a pior qualidade
possibilitando conduta precoce, melhora na terapêutica e mais de vida, especificamente nos parâmetros: perda de apetite,
rapidamente a resposta ao tratamento. náuseas e vômitos, constipação e fadiga45. Dessa forma, é de
extrema importância que o estado nutricional do paciente seja
Desnutrição no câncer de pulmão avaliado e acompanhado para diminuir as consequências e
Câncer de pulmão é o segundo câncer mais comum sintomas que o NSCLC pode acarretar.
entre homens e mulheres, sendo a principal causa de morta- Confirmando os resultados anteriores, o estudo de Wie et al.46
lidade relacionada ao câncer41. A mortalidade por câncer foi realizado para investigar a prevalência e fatores de risco de
de pulmão é alta, já que muitas vezes é detectado após o desnutrição em pacientes com câncer internados em função do
desenvolvimento da doença em estágio final41. estágio e localização do tumor. De 14.972 pacientes com câncer
admitidos no Centro Nacional do Câncer, 12.112 realizaram
O câncer de pulmão é o mais comum de todos os tumores
exames de rastreio e o estado nutricional foi avaliado em 8.895
malignos, apresentando aumento de 2% por ano na sua inci-
pacientes. O estado nutricional de cada indivíduo foi avaliado
dência mundial. No Brasil, foi responsável por 20.485 mortes
pelo índice de massa corporal (IMC), albumina sérica, contagem
em 2008, sendo o tipo que mais fez vítimas. Foram estimados
total de linfócitos e dieta e classificados em três grupos: de alto
para o ano de 2010 cerca de 27.630 novos casos42.
risco, risco moderado e baixo risco de desnutrição. Cerca de 61%
No momento do diagnóstico, 80% dos pacientes com dos pacientes internados estavam desnutridos e a prevalência
câncer gastrointestinal e 60% dos portadores de câncer de de desnutrição foi maior nos pacientes do sexo masculino com
pulmão apresentam perda de peso significativa43. maior tempo de internação (60,2%) e pacientes readmitidos
Segundo Arrieta et al.44, em sua população de estudo (66,6%). Pacientes com câncer de fígado e de pulmão (86,6% e
(n=100) com câncer de pulmão de não-pequenas células 60,5%, respectivamente) e os pacientes com estágio de câncer
(NSCLC), tratados com paclitaxel (175 mg/m²) e cisplatina (80 avançado (60,5%, III ou IV) apresentaram maior prevalência
mg/m²), com idade média de 58 ± 10 anos, foi observado de desnutrição do que outros pacientes (P <0,0001). A análise
que 51% dos pacientes estavam desnutridos e 50% tinham mostrou que os pacientes com estágio de câncer avançado e
albumina ≤ 3,0 mg/mL. A relação linfócitos-plaquetas ≥ maior permanência hospitalar e os pacientes readmitidos estavam
150 foi significativamente relacionada com um índice de em maior risco de prevalência de desnutrição. A prevalência
massa corporal basal ≤ 20 (p = 0,02) e hipoalbuminemia de desnutrição em pacientes com câncer internados foi alta e
(p = 0,02). Pacientes desnutridos e com hipoalbuminemia variou entre localização do tumor e do estágio. A identificação
desenvolveram mais toxicidade induzida por quimioterapia precoce do estado nutricional é necessária para a intervenção
geral quando comparados àqueles sem desnutrição (p = nutricional adequada durante a internação46. Fica evidente que
0,02) e valores normais de albumina (p = 0,002), respectiva- o câncer de pulmão é considerado um câncer que desnutre e
mente. A relação linfócitos-plaquetas ≥ 150 estava associada faz-se necessário acompanhar o paciente quanto ao seu estado
ao desenvolvimento de toxicidades grau III/IV (p = 0,008) e nutricional, bem como realizar intervenções para evitar quadros
anemia (p = 0,004). Os autores relataram, também, que os de caquexia, comuns nessa população.
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No estudo de Gioulbasanis et al.47, foi comparada a Mini reduzindo a ingesta alimentar e, consequentemente, redu-
Avaliação Nutricional (MNA) com a perda de peso de 5%, zindo a absorção de nutrientes. Em pacientes com câncer de
um critério comum utilizado na avaliação oncológica. O pulmão, pudemos observar elevados níveis de toxicidade aos
estado nutricional de 171 pacientes virgens de quimioterapia componentes de quimioterapia em função do estado nutri-
com câncer de pulmão metastático foi avaliado pelos dois cional depletado antes e durante o tratamento. Observou-se
métodos. Os resultados foram comparados e correlacionados também que pacientes com câncer de pulmão, porém bem
com os valores clínicos e laboratoriais e com a evolução nutridos, respondem melhor ao tratamento, melhoram a
clínica. A incidência de desnutridos ou pacientes em risco foi qualidade de vida, além de reduzir o tempo de internação.
maior de acordo com o MNA (P <0,001). A Mini Avaliação Novas pesquisas vêm sendo realizadas no decorrer
Nutricional supera a perda de peso como método de triagem dos anos para curar o câncer, ou pelo menos amenizar os
nutricional inicial em pacientes com câncer de pulmão metas- sintomas decorrentes dessa doença. Sabe-se que a cada dia
tático e pode refinar ainda mais o prognóstico47. a Medicina está empenhada na busca de terapias novas, a
Werynska et al.48 realizaram estudo que mediu os níveis fim de reduzir o tempo de internação do paciente, bem como
séricos de leptina em caquéticos, pacientes com câncer de melhorar a qualidade de vida e proporcionar ao paciente
pulmão não-caquéticos, controles saudáveis ​​e correlacionaram menos consequências decorrentes do tratamento oncológico.
a concentração de leptina com marcadores de estado nutricional. Com esta revisão da literatura foi possível perceber
Quarenta pacientes com câncer de pulmão foram incluídos no que a desnutrição anda lado a lado com os pacientes em
estudo: 20 com caquexia, 20 sem caquexia e 10 controles saudá- tratamento oncológico. Com isso, há aumento do tempo
veis. Concentração sérica de leptina, massa corporal, índice de de internação hospitalar, maiores custos em saúde pública
massa corporal (IMC), circunferência do braço e espessura da e aumento de estatísticas de morte por câncer.
prega tricipital foram medidos em cada nível. O nível de leptina Dessa forma, se faz necessária a inclusão de um profissional
sérico em pacientes com câncer caquéticos foi significativamente nutricionista junto aos pacientes oncológicos. Esses profissionais
menor do que nos controles não-caquético e saudável. Concen- são habilitados e capacitados a realizar de forma específica
trações de leptina foram correlacionadas com a massa corporal, a avaliação nutricional e determinar qual a melhor conduta
circunferência do braço e tríceps. Pacientes com câncer de dietoterápica para obter melhor resposta ao tratamento, bem
pulmão caquético têm significativamente menores concentrações como otimização e/ou manutenção do estado nutricional.
séricas de leptina do que os pacientes não-caquéticos e controles
saudáveis, o ​​que pode sugerir que a leptina não desempenha
um papel importante no desenvolvimento da caquexia no câncer. REFERÊNCIAS
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Local de realização do trabalho: Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul, RS, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 250-6


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A Artigo de Revisão
Métodos de avaliação da gordura abdominal

Métodos de avaliação da gordura abdominal


Methods for evaluation of abdominal fat

Marina de Moraes Vasconcelos Petribú1 RESUMO


Cláudia Porto Sabino Pinho2 A obesidade é uma doença crônica não transmissível, resultante do desequilíbrio crônico entre
Poliana Coelho Cabral3
Ilma Kruze Grande de Arruda4
consumo alimentar e gasto energético, sendo considerada um grave problema de saúde pública
Ana Maria de Carvalho Albuquerque Melo3 da atualidade, com prevalência crescente nas últimas décadas e forte correlação com alta taxa
de morbi-mortalidade. O acúmulo de tecido adiposo na região abdominal é considerado um
fator de risco para diversas morbidades e, diante da relevância da gordura visceral no estudo da
síndrome metabólica, diversos métodos vêm sendo propostos para avaliação da distribuição da
gordura corporal e quantificação da adiposidade intra-abdominal. Uma variedade de técnicas
para a avaliação da composição corporal tem sido descrita na literatura, tais como medidas
antropométricas (circunferência da cintura, razão cintura/quadril, razão cintura-estatura, índice
de conicidade e diâmetro sagital) e medidas de imagem (medida de absorção dos raios X de
dupla energia (DXA), tomografia computadorizada, ressonância magnética e ultrassonografia).
A capacidade do avaliador de reproduzir as medidas, a padronização das técnicas, a utilização
de instrumentos calibrados e precisos e a viabilidade de realização são fatores importantes para
determinar a escolha do método a ser utilizado nas pesquisas ou intervenções clínicas. Esta revisão
tem o objetivo de descrever os principais métodos de avaliação da gordura abdominal e/ou
visceral, ressaltando as vantagens e limitações de cada método, proporcionando aos profissionais
de saúde a escolha do método mais apropriado a sua prática clínica.

ABSTRACT
Unitermos:
Obesity is a not transmissible chronic disease resulting from the chronic imbalance between
Obesidade abdominal. Obesidade. Avaliação nutri-
cional. food intake and energy expenditure and is considered a serious public health problem now a
days, with increasing prevalence in recent decades and a strong correlation with a high rate of
Key words: morbidity and mortality. Fat accumulation in the abdominal region is considered a risk factor for
Obesity, abdominal. Obesity. Nutrition assessment. many diseases and because of the relevance of visceral fat in the study of metabolic syndrome,
various methods have been proposed for evaluating the body fat distribution and quantification
Endereço para correspondência: of intra-abdominal adiposity. A variety of techniques for the assessment of body composition has
Marina de Moraes Vasconcelos Petribú been described in the literature, such as anthropometric measurements (waist circumference, waist
Rua Professor José Brandão, 269 – apt 201 – Boa hip ratio, waist height ratio, conicity index and sagittal diameter) and image measurements (dual
Viagem – Recife, PE, Brasil – CEP 51020-180 energy x-ray absortionmetry (DXA), computed tomography, magnetic resonance and ultrasound).
E-mail: mpetribu@hotmail.com The evaluator’s ability to reproduce the measures, the techniques´ standardization, the use of
calibrated and accurate instruments and feasibility of implementation are important factors in
Submissão
18 de janeiro de 2012 choosing the method to be used in research or clinical interventions. This review aims to describe
the main methods for assessment of abdominal and/or visceral fat, highlighting the advantages
Aceito para publicação and limitations of each method, providing health care professionals to choose the most appropriate
11 de abril de 2012 method to their clinical practice.

1. Mestre em Nutrição pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)/ Especialista em Nutrição pela UFPE, Recife, PE, Brasil.
2. Mestranda em Nutrição pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)/ Nutricionista da Universidade de Pernambuco (UPE), Recife, PE, Brasil.
3. Doutora em Nutrição pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)/ Profª Adjunto do Departamento de Nutrição/ UFPE, Recife, PE, Brasil.
4. Doutora em Nutrição pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE)/ Profª Associada do Departamento de Nutrição/ UFPE, Recife, PE, Brasil.

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Petribú MMV et al.

Introdução Circunferência da Cintura


A obesidade é uma doença crônica não-transmis- A circunferência da cintura (CC) é o método mais
sível, resultante do desequilíbrio crônico entre consumo comumente usado na literatura para avaliar a adiposi-
alimentar e gasto energético e definida como o acúmulo dade visceral2, por sua simplicidade1,12,13,18, facilidade de
excessivo de gordura corporal em extensão tal, que acar- execução12,18,19, baixo custo1,19 e reprodutibilidade18. Entre-
reta prejuízos à saúde dos indivíduos1. É considerada um tanto tem sido demonstrada sua fragilidade como variável
grave problema de saúde pública da atualidade, apre- preditora da quantidade de gordura corporal, em razão de
sentando prevalência crescente nas últimas décadas em suas dimensões incluírem outros tecidos e órgãos além do
diversas populações, estando relacionada com alta taxa tecido adiposo12 e, principalmente, por não separar gordura
de morbi-mortalidade2. intra-abdominal da subcutânea13.
Nos Estados Unidos, a prevalência de obesidade (IMC > A comparação das medidas antropométricas com exames
30kg/m2) em mulheres adultas é de 33,4% e, em homens, de diagnóstico por imagens, como a ressonância magnética
27,5%. No Brasil, segundo dados do inquérito nacional de e a tomografia computadorizada, demonstra que a CC foi a
1997, a prevalência está em torno de 12,4% para mulheres variável antropométrica que apresentou melhor correlação
e 7,0% para homens3. Dados divulgados pela Sociedade com o tecido adiposo visceral1,5.
Brasileira de Cardiologia apontam que aproximadamente A Organização Mundial de Saúde (OMS) recomenda
32% e 8% da população brasileira apresentam sobrepeso e que a CC seja aferida com uma fita métrica não-flexível
obesidade, respectivamente4. diretamente sobre a pele, na região mais estreita entre o
A obesidade abdominal ou a obesidade androide, isto tórax e o quadril ou, em caso de não haver ponto mais
é, o aumento de tecido adiposo na região abdominal, é estreito, no ponto médio entre a última costela e a crista
considerada um fator de risco para diversas morbidades, ilíaca, sendo a leitura feita no momento da expiração20. O
representando risco diferenciado quando comparada a outras ponto de corte determinado pela OMS é de 94 cm e 80 cm,
formas de distribuição de gordura corporal5, predispondo os como medida de risco metabólico aumentado (nível 1) para
indivíduos a diabetes, hipertensão, alterações desfavoráveis homens e mulheres, respectivamente, e 102 cm e 88 cm,
no perfil das lipoproteínas plasmáticas, resistência insulínica, como indicação de risco metabólico muito elevado (nível 2)
síndrome metabólica e problemas cardiovasculares2,6. A para morbidades associadas à obesidade21.
obesidade abdominal é composta de gordura subcutânea Questiona-se, no entanto, o uso universal desses pontos
e gordura visceral7, apresentando esta última características de corte, visto que a sensibilidade desses na identificação dos
metabólicas e funcionais que a distingue daquela localizada fatores de risco associados à obesidade pode variar entre os
em outras regiões anatômicas6, representando maior valor grupos etários e as diversas populações1 e etnias2.
preditivo para doença cardiovascular8.
Diante da relevância da gordura visceral no estudo
Relação Cintura-Quadril
da síndrome metabólica, diversos métodos vêm sendo
propostos para avaliação da distribuição da gordura A relação cintura-quadril (RCQ) é um indicador ampla-
corporal e quantificação da adiposidade intra-abdominal2. mente utilizado na aferição da distribuição centralizada do
Há uma variedade de técnicas para a avaliação da tecido adiposo em avaliações individuais e coletivas12,19. É
composição corporal, como medidas antropométricas uma medida antropométrica que apresenta baixo custo,
(circunferência da cintura, razão cintura/quadril9, razão praticidade10,22, e sensibilidade para distribuição da gordura
cintura-estatura10, índice de conicidade11,12, e diâmetro corporal23, apesar de não fornecer uma avaliação tão
sagital7,13) e medidas de imagem (tomografia computa- acurada e detalhada, já que é utilizado, na maioria das vezes,
dorizada, ressonância magnética e ultrassonografia13-17). sem prévia validação na população que se pretende avaliar22.
A capacidade do avaliador de reproduzir as medidas, a Esse indicador é determinado pela divisão dos períme-
padronização das técnicas, a utilização de instrumentos tros da cintura (cm) e do quadril (cm) e deve ser obtido pela
calibrados e precisos e a viabilidade de realização9 são aferição da região do quadril na área de maior protube-
fatores importantes para determinar a escolha do método rância e da cintura na área mais estreita entre o tórax e o
a ser utilizado nas pesquisas ou intervenções clínicas. quadril20, fazendo parte dos critérios diagnósticos para a
Esta revisão tem o objetivo de descrever os principais síndrome metabólica propostos pela Organização Mundial
métodos de avaliação da gordura abdominal e/ou visceral, de Saúde (WHO, 1998); entretanto, vem perdendo espaço
ressaltando as vantagens e limitações de cada método, para a CC, que, por se tratar de uma única medida, estaria
proporcionando aos profissionais de saúde a escolha do menos sujeita à variabilidade na mensuração e características
método mais apropriado a sua prática clínica. raciais2. Segundo Björntorp24, esses dois indicadores contêm
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Métodos de avaliação da gordura abdominal

informações diferentes sobre os distúrbios metabólicos asso- 55.563 adultos de ambos os sexos em Taiwan, com objetivo
ciados à obesidade centralizada. A CC seria melhor indicador de identificar os pontos de corte da RCE para discriminar
da massa adiposa visceral, estando fortemente relacionada pelo menos um fator de risco cardiovascular (diabetes,
com as doenças cardiovasculares ateroscleróticas. Por outro hipertensão ou dislipidemia), Lin et al.29 encontraram valores
lado, a RCQ, que contém a medida da região glútea com de 0,48 e 0,45 para homens e mulheres, respectivamente,
numerosos tecidos musculares, principais reguladores da evidenciando ainda forte associação da RCE com hipertensão
sensibilidade à insulina sistêmica, seria mais fortemente arterial, intolerância à glicose, diabetes e dislipidemias29.
associada à resistência à insulina24. Pitanga e Lessa28, estudando 968 adultos de 30-74 anos
Estudos demonstram que a RCQ é capaz de predizer de idade de Salvador-Brasil, encontraram valores de 0,53 e
a incidência de diabetes na mesma magnitude que outros 0,52 para homens e mulheres, respectivamente. Os achados
índices, como Índice de Massa Corporal (IMC) e CC22, apre- desse estudo sugerem a realização de novos que possam
sentando associação inversa com baixos níveis de HDL25. A comparar a RCE com outros indicadores de obesidade mais
RCQ também tem apresentado maior capacidade preditiva comumente utilizados para discriminar o risco coronariano
para hipertensão arterial que a CC em homens e mulheres elevado, recomendando também que sejam realizados estudos
acima de 20 anos26. com crianças, adolescentes e adultos de diferentes grupos
Os pontos de cortes estabelecidos pela OMS, 199820, etários, para que se possa observar o poder discriminatório da
para discriminar valores adequados da RCQ são inferiores RCE para o risco cardiovascular nesses subgrupos específicos.
a 0,85 e 1,0 para os sexos feminino e masculino, respecti-
vamente. Outros pontos de corte têm sido sugeridos como Índice de Conicidade
preditores do risco cardiovascular20. Pereira et al.26, em
No início da década de 90, o índice de conicidade (índice
estudo de base populacional realizado no município do Rio
C) foi proposto como mais uma opção antropométrica para
de Janeiro, mostraram que a utilização dos pontos de corte
avaliação da obesidade e distribuição da gordura corporal.
de 0,95 para homens e 0,80 para mulheres associava-se
Esse índice baseia-se no pressuposto de que o perfil morfo-
melhor à predição da hipertensão arterial26. Ferreira et al.19,
lógico do corpo humano, ao apresentar maior concentração
estudando adultos do sexo masculino, apontaram um ponto
de gordura na região central, apresenta um formato parecido
de corte de 0,90 como melhor indicador para hipertriglice-
com um duplo cone com uma base comum, enquanto que
ridemia e relação colesterol/HDL elevada19.
aquelas com menor quantidade de gordura na região central
teriam a aparência de um cilindro11,12.
Razão Cintura-Estatura A boa correlação do Índice C com a obesidade central e
Outro indicador antropométrico da distribuição de gordura com os fatores de risco predisponentes às doenças cardiovas-
corpórea sugerido recentemente para identificação do risco culares e metabólicas11,12 determina esse indicador como um
cardiovascular é a relação cintura/estatura (RCE)10,26,27. A utili- bom preditor de risco à saúde30. As maiores limitações para seu
zação dessa medida tem a vantagem da simplicidade de deter- uso são a inexistência de pontos de corte que possam discri-
minação e de basear-se em medidas de fácil obtenção10,26. minar alto risco e a dificuldade de se calcular o denominador
A RCE, determinada pela divisão da circunferência da da equação proposta para sua determinação, limitando sua
cintura (cm) pela estatura (cm) 10,26-28, apresenta-se como um utilização em estudos populacionais11,12. Por outro lado, não
bom marcador para monitorar excesso de peso em jovens, ser necessária a medida da circunferência do quadril para
por considerar o crescimento tanto da cintura quanto da sua determinação é uma vantagem do índice C11. Para o seu
cálculo são envolvidas as medidas do perímetro da cintura
estatura. Nessa faixa etária, indicadores antropométricos
e da estatura, expressas em metros, e do peso corporal (kg),
que utilizem a medida da circunferência do quadril podem
através da seguinte equação matemática11,12,31:
ser inapropriados, pois a largura pélvica modifica-se rapi-
damente durante o estirão do crescimento, e esses índices Índice de Conicidade = Perímetro da cintura (m)
poderiam estar refletindo mais essa variação do que, propria- 0,109√ Peso Corporal (kg)
mente, o acúmulo de gordura10. Estatura (m)
Estudos têm demonstrado a forte associação dessa medida Valdez et al.32 sugeriram adotar valores de ponto de corte
com o risco cardiovascular, sendo essa relação maior que em próximos de 1,00 (perfil morfológico similar a de um cilindro
outros indicadores antropométricos, como IMC e RCQ11,27. perfeito) como indicativo de baixo risco e valores próximos de
Os pontos de corte sugeridos para discriminação da 1,73 (perfil morfológico similar a de um duplo cone perfeito)
obesidade abdominal e risco cardiovascular são ≥ 0,5 para como indicativo de elevado risco para o aparecimento e o
homens e mulheres27. Em estudo realizado com amostra de desenvolvimento de disfunções cardiovasculares e metabólicas.
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Petribú MMV et al.

Pitanga e Lessa11, com o objetivo de selecionar por meio cm e 19,3 cm em homens e mulheres, respectivamente,
de sensibilidade e especificidade os melhores pontos de corte segundo a curva ROC, correspondente a 130 cm² pela TC,
para o índice C como discriminador de risco coronariano que é relacionado a profundas deteriorações metabólicas7.
elevado, encontraram valores de 1,25 para homens (sensi-
bilidade de 73,91% e especificidade de 74,92%) e 1,18 Tomografia Computadorizada
para mulheres (sensibilidade de 73,39% e especificidade
A Tomografia Computadorizada (TC) tem sido conside-
de 61,15%)11. Esse estudo foi o primeiro a publicar pontos
rada a técnica mais acurada e reprodutível para medição
de corte para a utilização do índice C como discriminador
da gordura corporal, particularmente do tecido adiposo
de risco coronariano elevado e foi posteriormente utilizado
abdominal17, permitindo a diferenciação da adiposidade
por outros estudos30.
subcutânea e visceral nessa região, sendo, portanto,
Estudo realizado com o objetivo de avaliar qual indi- considerada desde 1990 o método “padrão-ouro” para
cador antropométrico melhor se correlaciona com o risco determinação da gordura visceral 2,9,15,17. Pode ser usada
cardiovascular identificou o índice C como um dos melhores como referência na comparação com técnicas antropo-
indicadores. No mesmo estudo, a CC e o IMC foram descritos métricas9 e outras técnicas que determinam a gordura
com intermediário e baixo poder discriminatório do risco, corporal. No entanto, a TC não pode ser usada como um
respectivamente31. teste de rotina por ser dispendioso, submeter o indivíduo
a radioatividade 9,13,15-17, além da pouca disponibilidade
Diâmetro Sagital dos aparelhos 9. Em alguns estudos anteriores, a área
de gordura subcutânea e intra-abdominal foi obtida em
Estudos recentes têm apontado o diâmetro sagital
um único corte da tomografia no nível L4-L5, expressa
abdominal como uma medida antropométrica preditora
em centímetros quadrados 16,17 . Pontos de corte têm
da gordura visceral33,34, que apresenta estreita correlação
sido propostos para predizer a morbidade16. Estima-se
com as variáveis de risco cardiovascular, como resistência
que uma área adiposa visceral de 130 cm2, tanto em
à insulina34, elevação dos níveis de lipídeos e ácido úrico,
homens como em mulheres de várias faixas etárias, seja
pressão arterial e síndrome metabólica7,33.
fortemente relacionada a distúrbios metabólicos 9. No
Trata-se de uma medida simples, não-invasiva, que apre- entanto, outros pontos de corte foram propostos por
senta boa reprodutibilidade e precisão7,33,34, baseada no fato outros autores. De acordo com Willians et al. 35, o limite
de que para os indivíduos em posição de decúbito dorsal mínimo de gordura visceral acima do qual as alterações
(supina) o acúmulo de gordura visceral mantém a altura do metabólicas são nitidamente observadas é 110 cm 2 para
abdome, no sentido sagital, ao mesmo tempo que a gordura mulheres, enquanto que para Després e Lamarche36, o
subcutânea é reduzida, porque se espalha para os lados, valor de 100 cm2 para ambos os sexos já está associado
devido à força de gravidade7,34. a significantes alterações de risco para doença cardio-
Uma limitação da utilização do diâmetro sagital na vascular. Nicklas et al.37, estudando mulheres na peri
prática clínica é a inexistência de consenso para os pontos e pós-menopausa, apontaram que uma área de tecido
de corte adotados e a ausência de definição dos protocolos adiposo visceral ≥106 cm2 está associada a risco elevado
de medição que melhor discriminam o risco de doenças de baixa concentração de HDL colesterol, hipertriglice-
cardiovasculares34. ridemia, alta relação LDL/HDL colesterol, tolerância à
glicose prejudicada e hiperinsulinemia comparado com
Estudos sugerem que a medição seja realizada com o
uma área de tecido adiposo visceral ≤105 cm2. Uma área
indivíduo em posição supina, aferindo com um antropô-
≥163 cm 2 é um preditivo ainda maior para os fatores de
metro a distância entre o dorso em contato com a superfície
risco metabólicos da doença cardiovascular 37.
e o ponto mais elevado do abdome, entre a última costela
e a crista ilíaca7,13. Outros métodos de aferição têm sido
descritos na literatura. Öhrvall et al.33 recomendaram que a Ressonância Nuclear Magnética
medida seja tomada no nível da cicatriz umbilical e Iribarren A Ressonância Nuclear Magnética (RNM) é uma técnica
et al.34 adotaram como procedimento a tomada da medida de imagens não-invasiva que possibilita estimar a gordura
com o indivíduo em pé. visceral com boa acurácia2, promovendo resultados simi-
Sampaio et al.7, em estudo inédito no Brasil e em um lares à TC, com a vantagem de não expor os indivíduos
país em desenvolvimento, com a finalidade de identificar os à radiação2,9,38. No entanto, seu custo é ainda mais proi-
pontos de corte que melhor representem associação com bitivo que a tomografia para uso na rotina clínica e em
as doenças cardiovasculares em comparação à tomografia pesquisas2,17, sendo muito mais cara do que os outros
computadorizada (TC), encontraram valores limites de 20,5 métodos14.
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260
Métodos de avaliação da gordura abdominal

Foi demonstrada boa reprodutibilidade para avaliar o abdominal, na linha xifo-umbilical, em 231 mulheres e
volume de tecido adiposo total e visceral, sendo levemente 191 homens entre 20 e 60 anos e estabeleceram como
mais baixa do que relatos prévios usando a TC38. pontos de corte os valores de 7 cm como limite superior
Em um estudo realizado por Leenen et al.39, imagem da normalidade e melhor preditor de risco cardiovascular
transversa de ressonância magnética foi obtida entre a moderado em ambos os sexos e 8 cm e 9 cm para alto
margem da costela mais baixa e a crista ilíaca, enquanto os risco nas mulheres e homens, respectivamente13. Esses
sujeitos estavam na posição supina. Nessa população obesa, mesmos autores encontraram boa associação entre as
a reprodutibilidade da determinação da área de gordura, medidas da USG e os fatores de risco cardiovascular,
expressa como o coeficiente de variação, foi 1,8%, 5,0% e sendo esta mais evidente nos grupos classificados como
2,2% para estimação das áreas de gordura total, visceral e de alto risco13.
subcutânea, respectivamente39. Usando análise multivariada, Hirooka et al. 14, ao
Tecido adiposo subcutâneo e área de gordura visceral estudarem 87 pacientes com idade média de 54,9 ± 16,7
no nível L4-L5 determinada em 27 homens saudáveis pela anos e IMC médio de 25,3 ± 2,92 kg/m 2, propuseram
RNM foram 252,8 ± 132,9 e 117,9 ± 62,1 cm2, respec- uma equação para avaliar o volume de gordura visceral
tivamente, e as diferenças entre duas medidas variaram com forte correlação com o volume descrito pela TC,
de 1,4 a 4,2%40. que leva em consideração a distância entre a superfície
interna do músculo reto e da veia esplênica, a distância
Ultrassonografia entre a superfície interna do músculo reto e a parede
posterior da aorta no umbigo e a espessura da camada
A Ultrassonografia (USG), inicialmente proposta por
de gordura da parede renal posterior direita 14, conforme
Armellini et al., é um método não-invasivo, com boa repro-
descrito a seguir:
dutibilidade16,17, rápido17, de fácil manuseio, baixo custo
e que não envolve exposição à irradiação13, aparentando [volume de gordura visceral] = -9,008 + 1,191 x [a
ser um exame útil e de boa aplicabilidade para mensurar distância entre a superfície interna do músculo reto e da veia
a espessura visceral13, no entanto, equipamento específico esplênica (mm)] + 0,987 x [a distância entre a superfície
e um examinador bem treinado são requeridos17. É um interna do músculo reto e a parede posterior da aorta no
método bastante específico, pois permite a visualização umbigo (mm)] + 3,644 x [a espessura da camada de gordura
individual da gordura subcutânea e intra-abdominal da parede renal posterior direita com uma correlação signi-
(visceral)17. ficativa (mm)]
Diversos estudos encontraram boa correlação entre a Ribeiro-Filho et al.16 definiram a gordura intra-abdominal
quantidade de tecido adiposo intra-abdominal medido como a distância entre a face interna do músculo reto-
pela USG e pela TC 14-17, demonstrando concordância abdominal e a parede anterior da aorta e encontraram uma
de 74% com a mesma 17, tendo maior especificidade concordância entre os critérios de obesidade visceral pela
e acurácia do que a CC e o diâmetro sagital, prova- USG e TC de 65%, com um coeficiente de variação inter e
velmente por ser mais preciso do que essas medidas intra-observador inferior a 2%.
antropométricas em quantificar espessura visceral 13. No Mais estudos são necessários para estabelecer a utilidade
entanto, não há consenso na literatura de um ponto da determinação da gordura visceral pela USG para predizer
de corte para o diagnóstico da obesidade visceral que morbidade e mortalidade cardiovascular16.
poderia indicar maior risco cardiovascular 16,17 e nem do
protocolo a ser utilizado.
Conclusão
Em um estudo realizado por Ribeiro-Filho et al.17, que
avaliaram 120 mulheres obesas com idade entre 20 e A obesidade abdominal visceral é o mais grave fator
65 anos, a gordura visceral foi definida como a distância de risco cardiovascular25, refletindo a necessidade de inter-
entre a face interna do músculo reto-abdominal e a parede venção para reduzir o alto risco atribuído a esses pacientes17.
anterior da aorta, sendo encontrado um valor de 6,90 A diversidade de métodos de mensuração da composição
cm como um ponto de corte diagnóstico para obesidade corporal contribui para que a escolha de um deles seja
visceral baseado na área de gordura visceral de 130 cm2 baseada não somente na precisão da medida, mas na sua
pela TC17. viabilidade, levando em consideração inúmeros fatores
Leite et al.13 mediram a espessura da gordura intra- envolvidos nessa escolha, como, por exemplo, a população
abdominal pela USG considerando a distância entre a estudada, a idade e, principalmente, as diferentes condições
parede posterior do músculo reto abdominal e a parede e modelos experimentais em que se baseiam as pesquisas
posterior da aorta na região da bifurcação da aorta ou intervenções clínicas9.
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Petribú MMV et al.

Apesar dos numerosos métodos de avaliação da 13. Leite CC, Matsuda D, Wajchenberg BL, Cerri GG, Halpern A.
composição corporal, são poucos os estudos que avaliam Correlação da medida de espessura intra-abdominal medida pela
ultra-sonografia com os fatores de risco cardiovascular. Arq Bras
a sua reprodutibilidade e acurácia na população. Além
Endocrinol Metab. 2000;44(1):49-56.
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custo e de facilidade técnica que possam ser utilizados,
metabolic syndrome better than do measurements of waist
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de indivíduos em centros de saúde, clínicas e em estudos 16. Ribeiro Filho FF, Faria AN, Kohlmann O, Ajzen S, Ribeiro AB,
populacionais, a fim de garantir adequado direcionamento Zanella MT, et al. Ultrasonography for the evaluation of visceral
das medidas de intervenção e das políticas de saúde22. fat and cardiovascular risk. Hypertension. 2001;38(2):713-7.
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Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 257-63


262
Métodos de avaliação da gordura abdominal

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Local de realização do trabalho: Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), Recife, PE, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 257-63


263
A Artigo de Revisão
Stürmer ES et al.

A importância dos probióticos na microbiota intestinal


humana
Importance of probiotics on the human intestinal microbiota

Elisandra Salete Stürmer1 RESUMO


Samuel Casasola2 Introdução: Probióticos são microrganismos vivos que conferem benefícios à saúde do hospe-
Maristela Comoretto Gall3
Magda Comoretto Gall4 deiro e os gêneros mais utilizados são Lactobacillus e Bifidobacterium. A microbiota intestinal
humana (MIH) tem grande contribuição para a manutenção e promoção da saúde e uma dieta
contendo probióticos e outros coadjuvantes como os prebióticos e simbióticos podem garantir o
equilíbrio dessa microbiota. Objetivos: Realizar uma revisão bibliográfica sobre a importância
dos probióticos sobre a MIH, possíveis mecanismos de ação e seus benefícios à saúde. Método:
Foi realizada uma revisão bibliográfica nas bases de dados Lilacs, Medline, SciELO, PubMed e
EBSCO. Conclusão: Uma MIH saudável e equilibrada resulta na homeostasia fisiológica garan-
tindo também qualidade de vida. O uso de probióticos em associação com prebióticos acelera
os efeitos dos microrganismos probióticos dando origem aos alimentos funcionais, inclusive com
Unitermos: efeito imunomodulador. Por isso, a atenção do consumidor se volta cada vez mais à procura e
Probióticos; Microbiota intestinal humana; Benefícios. ao consumo de alimentos com probióticos.

Key words: ABSTRACT


Probiotics; human intestinal microbiota; Benefits.
Introduction: Probiotics are live microorganisms that confer health benefits to the host and the
Endereço para correspondência: genres most commonly used are Lactobacillus and Bifidobacterium. The human intestinal microbiota
Magda Comoretto Gall (HIM) has a great contribution to the maintenance and promotion of health and a diet containing
Rua Farroupilha, 8001; Bairro São José, Canoas - probiotics and other adjuvants such as prebiotics and synbiotics can ensure the balance of this
RS, Brasil. CEP 92425-900. Tel.: +55 51 34774000. microbiota. Objectives: conduct a literature review on the importance of probiotics on the HIM,
E-mail: mcgall888@gmail.com possible mechanisms of action and their health benefits. Methods: Was performed a literature
review in the databases LILACS, MedLine, SciELO, PubMed and EBSCO. Conclusion: A healthy and
Submissão
17 de novembro de 2011 balanced MIH results in physiological homeostasis while also ensuring quality of life. The use of
probiotics with prebiotics in combination accelerates the effect of probiotic microorganisms giving
Aceito para publicação rise to functional foods, including immunomodulatory effect. Therefore, the consumer’s attention
27 de fevereiro de 2012 turns increasingly to demand and consumption of foods with probiotics.

1. Acadêmica do curso de Biomedicina da Universidade Luterana do Brasil, Canoas, RS, Brasil.


2. Residente em Saúde do Adulto e Idoso da Universidade Luterana do Brasil, Canoas, RS, Brasil.
3. Nutricionista especialista em Medicina Ortomolecular, Canoas, RS, Brasil.
4. Professora da Universidade Luterana do Brasil, Canoas, RS, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 264-72


264
A importância dos probióticos na microbiota intestinal humana

INTRODUÇÃO Metchnikoff11 observou o papel positivo desempenhado por


A prevenção de doenças, o aumento dos gastos médicos, algumas bactérias, o que garantiu ao russo o Prêmio Nobel por
a conscientização dos consumidores sobre a relação entre a seu trabalho no Instituto Pasteur. Segundo ele, com a depen-
saúde e a nutrição, a expectativa de vida maior, o anseio de dência dos microrganismos intestinais, ficava possível tomar
medidas que alterassem a microbiota intestinal, substituindo os
batalhar contra os males causados pela poluição, por micror-
micróbios patógenos por micróbios benéficos11,12.
ganismos e agentes químicos no ar, água e nos alimentos e,
por último, grande destaque das evidências científicas sobre a O francês e pediatra Tissier Henry, por volta de 1906,
sua eficácia, são algumas das causas para a elevada procura notou que as fezes de crianças com diarreia apresentavam
por alimentos funcionais1. menor número de bactérias com uma morfologia distinta.
Assim, ele recomendou a ingestão dessas bactérias em
A Assembleia Mundial da Saúde, em 2004, promoveu a
pacientes com diarreia para promover a restauração da
Estratégia Global para Alimentação, Atividade Física e Saúde,
microbiota intestinal saudável13.
a fim de formalizar essa preocupação na área da nutrição
quanto da atividade física2. A maioria dos probióticos é constituída de bactérias ácido-
láticas, Gram-positivas, geralmente catalase-negativas, que
Em 2003, no Relatório Mundial da Saúde, foi observado
crescem em microaerofilia. Os probióticos incluem espécies
que a baixa ingestão de frutas, legumes e verduras (FLV) está
ácido-láticas dos gêneros Lactobacillus, Bifidobacterium, Ente-
entre os dez principais fatores de risco que contribuem para
rococcus, Lactococcus, Leuconostoc, Pediococcus, SporoLacto-
a mortalidade no mundo3.
bacillus e Streptococcus; espécies não ácido-láticas, tais como,
Há elevado crescimento na produção de alimentos que, Bacillus cereus, Escherichia coli e Propionibacterium freudenrei-
além de apresentarem características nutricionais e tecno- chii; e as leveduras Saccharomyces cerevisiae e Saccharomyces
lógicas adequadas, tenham componentes que cumpram boulardii14.
funções biológicas, com o objetivo de evitar doenças e gerar
saúde, os chamados alimentos funcionais, dentre os quais se
destacam a soja, os probióticos e os prebióticos4. Prebióticos

Um grupo de especialistas em probióticos, convocados Outras substâncias fermentáveis, constituídas basicamente


pela Food and Agriculture Organization of the United Nations por carboidratos desde mono e dissacarídeos até grandes
and World Health Organization (FAO/WHO), estabeleceu polissacarídeos, exercem o papel de suplementos alimentares
critérios e metodologias que são recomendados para não hidrolisáveis nem absorvidos no intestino delgado. Denomi-
avaliação dos mesmos, a fim de elaborar instruções para nadas como prebióticos, essas substâncias auxiliam as bactérias
estabelecer critérios para garantir maior segurança alimentar endógenas, beneficiando-as em seu crescimento e metabolismo
frente ao uso dessas espécies5. probiótico, permitindo modificações específicas na composição
O objetivo deste estudo foi realizar uma revisão biblio- e/ou na atividade da microbiota gastrintestinal, resultando
gráfica sobre a importância dos probióticos na microbiota também em benefícios ao bem-estar e à saúde do hospedeiro15.
intestinal humana, apresentar possíveis mecanismos de ação, Como representante dos prebióticos podemos citar a
os benefícios à saúde pelo consumo regular, identificar os inulina, glico-oligossacarídeos, galacto-oligossacarídeos,
principais probióticos descritos na literatura e seus efeitos fruto-oligossacarídeos, xylo-oligossacarídeos, isomalto-
benéficos e classificar os principais probióticos utilizados no oligossacarídeos, entre outros15,16. Segundo Chen e Walker16, a
reequilíbrio da microbiota intestinal humana. lactose, a lactulose e o lactitol, não digeridos e não absorvidos
no intestino delgado, podem surtir efeito prebiótico no cólon.
Probióticos Os fruto-oligossacarídeos (FOS) ou oligofrutoses são
carboidratos complexos de configuração molecular que os
O termo probiótico provém do grego, que quer dizer tornam resistentes à ação hidrolítica da enzima salivar e intes-
“para a vida”. Foi primeiramente utilizado por Lilly e Stillwell6. tinal, chegando intactos ao cólon. São formados a partir da
Os probióticos são definidos como suplementos alimentares hidrólise da inulina, que tem diversas funções no organismo,
à base de microrganismos vivos que afetam beneficamente como alteração do trânsito intestinal, redução do colesterol
o hospedeiro, promovendo o balanço de sua microbiota plasmático e da hipertrigliceridemia, melhoram a biodis-
intestinal. Dentre eles, os gêneros mais utilizados são Lacto- ponibilidade de minerais e contribuem para o aumento da
bacillus e Bifidobacterium7,8. concentração das Bifidobacterium no cólon17. São moléculas
A definição internacionalmente aceita é que eles são presentes na cebola, raízes de almeirão, beterraba, chicória,
microrganismos vivos e, quando administrados em quan- alho, lecitinas, alcachofra, cereais, aspargos, banana, trigo
tidades apropriadas, produzem benefícios à saúde do e tomate. Também podem ser encontrados no mel e açúcar
hospedeiro9,10. mascavo e em alguns tubérculos e bulbos18.
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 264-72
265
Stürmer ES et al.

Atribui-se ao consumo de FOS a redução do potencial de Os Lactobacillus são compostos pelas espécies L. casei,
várias doenças normalmente associadas ao elevado número L. paracasei e L. rhamnosus, que possuem maior valor
de bactérias intestinais patógenas, como diarreia associada comercial para a indústria alimentícia e integram uma fração
a antibióticos, doenças autoimunes, intoxicação alimentar, substancial da microbiota constituída por L. spp. na mucosa
câncer, acne, cirrose hepática, constipação, distúrbios diges- intestinal humana28.
tivos, alergias e intolerâncias a alimentos e flatulência19. Dentre os microrganismos mais estudados e tidos como
Estudos em animais comprovam a ação estimuladora dos probióticos, destaca-se a linhagem dos L. casei Shirota, que é
prebióticos sobre a diferenciação das células T auxiliares (Th) o ingrediente ativo do Yakult®. O consumo regular de Yakult®
em células T auxiliares do tipo 1 (Th1 - célula T “helper” 1, proporciona evidências diretas ou indiretas relacionadas à
subtipo de linfócitos T auxiliar ), na redução dos níveis de diminuição do risco de neoplasia de bexiga e supressão de
imunoglobulinas E (IgE) total, na modulação da resposta neoplasia cólon-retal29.
imunológica e na prevenção das doenças alérgicas. Em Os Lactobacillus acidophilus estão presentes no intestino,
humanos, há evidências de que o acréscimo de prebióticos na parede da vagina, no cérvix e na uretra, oferecendo
às fórmulas infantis leva à produção de imunoglobulinas proteção contra o acesso e a proliferação de microrganismos
responsáveis pela modulação da tolerância oral em crianças patogênicos30.
e reduz o risco do advento de manifestações alérgicas20.
Rettger Cheplin, em 1935, evidenciou que desordens do
sistema digestório podiam ser tratadas com a ingestão de leites
Probióticos mais utilizados fermentados, contendo um número elevado de L. acidophilus
de origem humana. Assim, já se relacionavam distúrbios intes-
Para ser empregada como probiótico, a bactéria precisa
tinais com o desbalanceamento da microbiota e L. acidophilus
ter identificação internacionalmente reconhecida, sobreviver
foi o primeiro microrganismo indicado para sua restauração31.
à acidez gástrica e à ação dos sais biliares, ter efeito bené-
fico ao hospedeiro comprovado in vivo e in vitro por meio L. acidophilus produzem a enzima lactase, que cliva as
de uma dose conhecida, ser capaz de se aderir ao muco ou moléculas de lactose presentes no leite em carboidratos mais
epitélio intestinal, oferecer segurança comprovada e possuir simples para serem facilmente digeridos. Pessoas com intole-
a garantia da manutenção da viabilidade até o momento do rância à lactose não produzem essa enzima, podendo assim
consumo independente do veículo utilizado21,22. beneficiar-se do uso de probióticos com L. acidophilus32.

As bactérias pertencentes ao gênero Lactobacillus, como O gênero Bifidobacterium faz parte da microbiota intes-
L. Rhamnosus GG, Bifidobacterium e, em menor escala, tinal humana, principalmente das crianças, cerca de 85%
Enterococcus faecium e Streptococcus thermophilus, bem a 99%. Com o aumento da idade, essas concentrações
como os fermentadores Saccharomyces boulardii, são mais diminuem, ocupando o terceiro ou quarto gênero em termos
empregados como suplementos probióticos, por terem sido de quantidade33.
isoladas de todas as porções do trato gastrintestinal humano Das 29 espécies do gênero, as mais usadas são B.
hígido23. De acordo com Shah24, 56 espécies pertencentes ao bifidum, B. longum, B. lactis, B. infantis, B.animalis, B. adoles-
gênero Lactobacillus e 29 espécies do gênero Bifidobacterium centis, B. breve e B. Thermophilum34,35.
são consideradas como probióticos, entretanto, poucas são O Kefir é um leite fermentado, ligeiramente efervescente
as linhagens com efeito probiótico bem demonstrado. e espumoso, originário das montanhas do Cáucaso, do Tibet
As Bifidobacterium são populares por estimularem o e da Mongólia. Resultante da ação da microbiota natural
sistema imunológico, produzirem vitamina B, inibirem a presente nos grãos de Kefir - leveduras fermentadoras e não
multiplicação de patógenos, diminuírem a concentração fermentadoras de lactose, Lactobacillus casei, Bifidobacterium
de amônia e a colesterolemia e ajudarem a restabelecer sp e Streptococcus salivarius subsp thermophilus36.
a microbiota normal após tratamento com antimicro- Devido à sua composição microbiológica e química, o
bianos. Esses microrganismos comumente utilizados em Kefir pode ser considerado um produto probiótico complexo
intervenções dietéticas visam o progresso da saúde dos por possuir microrganismos vivos capazes de melhorar o
indivíduos25,26. equilíbrio da microbiota intestinal, produzindo benefícios à
O gênero Lactobacillus é capaz de fermentar carboidratos saúde de quem o consumir37.
produzindo ácido lático, caracterizando-se como homo ou Baseados em estudos taxonômicos e fisiológicos de
hetero-fermentadores. Compreendem 56 espécies, sendo as bactérias láticas probióticas, os autores deduziram que a
mais utilizadas como suplemento dietético L. acidophilus, L. maioria dessas culturas não possuía a designação apropriada
casei, L. helveticus, L. paracasei, L. fermentum, L. plantarum, de espécie. A diferenciação adequada entre as espécies é
L. bulgaricus, L. Salivarius27. essencial por razões de biossegurança em termos de saúde38.
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 264-72
266
A importância dos probióticos na microbiota intestinal humana

Anatomia e microbiota do sistema O conteúdo protéico apropriado, a presença de lacto-


digestório ferrina, a maior quantidade de α-lactoalbumina, o baixo
O sistema gastrintestinal mede de 250 m2 a 400 m2 conteúdo de fosfatos, a presença de lactose, os nucleotídeos
da boca até o ânus, formando um tubo de nove metros de e os oligossacarídeos presentes no leite humano estimulam o
comprimento, sendo uma importante linha de proteção do efeito bifidogênico49. Contudo, recém-nascidos que receberam
organismo contra o meio externo39. fórmulas infantis ou leite de vaca integral, sem a composição
característica para causar este efeito, desenvolveram, conse-
O intestino é formado principalmente por três componentes
quentemente, microbiota intestinal diferente das amamentadas
que estão em contato permanente e se relacionam entre si,
no seio, prevalecendo nelas Bacteroides e Enterobacteriaceae50.
que são as células intestinais, os nutrientes e a microbiota40.
A microbiota do indivíduo se torna devidamente instalada
A microbiota intestinal é um conjunto de microrganismos
dos 18 aos 24 meses de idade e tende a ser estável durante
comensais que evoluíram harmonicamente com seu hospedeiro,
toda a vida51, contendo de 400 a 1.000 espécies de bactérias,
melhorando a saúde deste último41. Esses microrganismos envol-
das quais 30 a 40 são as predominantes. Cerca de 3% das
vidos no desenvolvimento do sistema imunológico e regulação
espécies são anaeróbias facultativas e 97% são anaeróbias.
da resposta a patógenos são essenciais para o estabelecimento
Julga-se saudável a microbiota intestinal onde haja grande
e manutenção da tolerância imunológica da mucosa42.
participação dos Lactobacillus e das Bifidobacterium14-16.
A composição da microbiota intestinal está envolvida em
As Bifidobacterium e os Lactobacillus são considerados
vários processos fisiológicos, além de funções metabólicas
não-patogênicos ou benéficos, pois realizam atividades
do organismo, tais como a produção de vitaminas e outros
biológicas positivas na saúde humana, por isso tornaram-se
substratos43. O ácido butírico e o butirato, presentes no lúmen
alvos comuns das intervenções dietéticas51.
do cólon após a digestão, regulam a diferenciação de células
da mucosa do intestino e induzem a apoptose para controlar Alterações podem ser observadas no equilíbrio da micro-
a inflamação e prevenir desenvolvimento de câncer44. biota gastrintestinal em condições patológicas, como pelo
uso de antimicrobianos e tratamento imunossupressor ou por
Mais de 500 espécies de bactérias estão abrigadas no
sistema digestório e sua distribuição não é homogênea ao ocasião de infecções intestinais52.
longo de sua extensão. O estômago e o intestino delgado Já existem estudos que demonstram que a seleção bacte-
possuem poucas espécies tanto aderidas ao seu epitélio, riana inicial dentro do trato gastrintestinal seja em parte deter-
como livres no seu lúmen. O cólon contém um complexo e minada geneticamente. Em pesquisa realizada com gêmeos
eficaz ecossistema microbiótico abrigando grande concen- adultos monozigóticos, morando separados, encontrou-se
tração de bactérias, chegando a atingir mais de 1011 a 1012 semelhança maior na composição da microbiota do que
unidades formadoras de colônia por mililitro45. entre indivíduos não relacionados53. Segundo uma hipótese,
Em seguida ao nascimento, começa a colonização do o genótipo determina o padrão de colonização, através dos
lactente, sendo diversos os fatores que interferem nesse sítios de adesão na mucosa intestinal. Há uma especificidade
processo: tipo de parto, microbiota intestinal materna, na ligação da bactéria com o receptor de mucosa, o que
condições de higiene e o tipo de nutrição oferecida. Recém- seleciona a colonização do hospedeiro. O padrão desses
nascidos que receberam aleitamento materno aumentaram locais de adesão é geneticamente determinado53.
rapidamente o número de Bifidobacterium em seu trato Além da pré-determinação dos sítios de adesão, o
gastrintestinal, juntamente com os Lactobacillus, chegando hospedeiro ainda pode regular a população bacteriana por
a representar mais de 90% da microbiota intestinal já nos meio do sistema imune53. Existem evidências experimentais
primeiros dias de vida46. Nos lactentes que recebem aleita- de que a Imunoglobulina A (IgA) secretória operaria como
mento artificial, essas bactérias correspondem de 40 a 60% mediador dessa seleção bacteriana. Houve propagação inco-
da microbiota, onde se encontram também bactérias dos erente e demasiada de bactérias anaeróbias na colonização
gêneros Clostridium, Staphylococcus e Bacteróides14-16. intestinal de uma linhagem de ratos deficientes de IgA e a
O acréscimo de galacto-oligossacarídeos (GOS) e fruto-oligos- recomposição da microbiota habitual após a normalização
sacarídeos (FOS) em fórmulas infantis promove o crescimento de da produção de IgA secretória54.
Bifidobacterium, tornando a microbiota intestinal mais semelhante As bactérias muitas vezes são lembradas por sua capaci-
à de crianças amamentadas ao seio47. A estimulação microbiana dade de provocar infecção, em detrimento aos seus efeitos
é necessária para prevenir atopias, segundo a hipótese da higiene. benéficos. Estudos clínicos e experimentais têm evidenciado
Marschan et al.48 agregaram o aumento da proteína C-reativa em que a interação micróbio-hospedeiro pode influenciar favo-
lactentes aos seis meses de idade com a diminuição de eczema ravelmente a saúde humana, de diversas maneiras: funções
atópico aos dois anos de vida, sugerindo que a inflamação influen- antibacterianas (competição por nutrientes; competição por
ciaria no processo alérgico a longo prazo. sítios de adesão; produção de bacteriocinas - proteínas
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267
Stürmer ES et al.

metabolicamente ativas, que auxiliam na destruição de peristálticos e impedindo que bactérias patogênicas, como
microrganismos indesejáveis; estímulo para o sitema imune; Salmonella typhimurium e Yersinia enterocolitica, e linhagens
produção de um ambiente fisiologicamente restritivo), imuno- patogênicas de Escherichia coli desempenhem seus efeitos
moduladoras (salvamento energético; nutrição do colonócito; enteropatogênicos. Por exemplo, o Lactobacillus plantarum
desenvolvimento de tolerância imunológica; conversão do sintetiza adesinas para receptores intestinais que contêm
colesterol em coprastanol), metabólico-nutricional (inativação manose. Competem, assim, com os sorotipos de Escherichia
da tripsina; síntese de vitamina K, conversão de bilirrubina em coli, que necessitam ligar-se às células intestinais por meio
urobilina), restauração da permeabilidade intestinal (produção desses receptores para exercer sua atividade patogênica60.
de muco conferindo eficácia do papel de barreira da mucosa Os efeitos imunológicos dos probióticos incluem aumento
intestinal) e digestão de proteínas no trato gastrintestinal51,55. da secreção de interferon gama em pacientes com alergia a
leite de vaca e dermatite atópica, provavelmente em decor-
Mecanismo e modo de atuação das rência do desvio da resposta imunológica para um perfil
bactérias probióticas Th1. Assim, a presença desses agentes no trato gastrintes-
tinal poderia auxiliar no desenvolvimento de uma resposta
Metchnikoff11 observou os benefícios dos probióticos
tolerogênica61.
ao relacionar o consumo de leite fermentado com a maior
longevidade de campesinos búlgaros. Diversas evidências sugerem também, entre outras coisas
já citadas, a redução do número de bactérias envolvidas na
Em 1930, no Japão, Shirota isolou uma espécie de Lactoba-
pró-carcinogênese e mutagênese. A redução das enzimas
cillus que vem sendo usada na produção de um leite fermentado
β-glicuronidase e nitroredutase, produzidas por bactérias
que é comercializado há anos, inclusive no Brasil. Tanto os
patogênicas, leva à hidrólise de compostos carcinogênicos,
Lactobacillus como as Bifidobacterium foram identificados primei-
reduzindo as substâncias nocivas e, assim, diminuindo o
ramente nas fezes de crianças alimentados com leite humano.
risco de neoplasia62.
As bactérias probióticas só apresentam efeitos biológicos
A administração de Lactobacillus rhamnosus linhagem
no ambiente intestinal se atingirem um número mínimo. Por
GG às gestantes, no período pré-natal, mostrou-se eficaz na
exemplo, o número de L. rhamnosus para reduzir significati-
prevenção das atopias em crianças consideradas de alto risco63.
vamente a ocorrência da chamada diarreia dos viajantes é de
109 UFC/g56. Assim, considerando um consumo de produtos
lácteos de 100 g, estes devem conter pelo menos 107 UFC/g Indicações do uso de probióticos
de bactérias probióticas viáveis no momento da compra do A indicação do uso de probióticos tem sido investigada
produto. Esse é o número recomendável por diversos autores57. no tratamento ou na prevenção de infecções intestinais,
Os probióticos têm sido estudados no tratamento da principalmente as provocadas por vírus, Clostridium diffi-
diarreia aguda infecciosa na infância, na prevenção e cile, outras espécies de bactérias causadoras de enterites
tratamento da diarreia associada ao uso de antibióticos e (alguns sorotipos de Escherichia coli, Salmonela, entre
na prevenção da recorrência da doença de Crohn58. Em outras), e de enterites inespecíficas, como a diarreia dos
pacientes internados em UTI, os probióticos mostraram-se viajantes64. Estudos clínicos demonstraram que bactérias
capazes de substituir a microbiota patogênica por bactérias ácido-lácticas, tais como L. rhamnosus GG, apresentam
comensais e interagir com o sistema imunológico59. efeitos positivos no tratamento de gastrenterites por
Os Lactobacillus e as Bifidobacterium produzem rotavírus em crianças65. Ensaios in vitro verificaram que
compostos orgânicos decorrentes da atividade fermentativa, algumas espécies de probióticos, principalmente Lacto-
que aumentam a acidez do intestino, impedindo a multipli- bacillus e Bifidobacterium, induziram os macrófagos a
cação de bactérias patogênicas no intestino. Elas também produzirem citocinas inibidoras da replicação viral66, expli-
têm a propriedade de produzirem as bacteriocinas15. cando, assim, a atividade dessas bactérias no tratamento
A disponibilidade de nutrientes é um dos fatores limitantes das gastrenterites virais.
para o crescimento bacteriano na luz intestinal. A competição Há estudos que demonstram que algumas linhagens
é maior no colón distal, onde existe menor quantidade de selecionadas de Lactobacillus (L. rhamnosus GR-1 e L. reuteri
resíduos alimentares. O aumento do número de Lactobacillus B-54 e RC-14) podem reduzir a recorrência de infecções do
e Bifidobacterium não deixaria a proliferação de bactérias trato urinário e o risco de vaginites67.
consideradas patogênicas ocorrer no hospedeiro15,16. No primeiro ensaio duplo-cego realizado com porta-
Uma das ações atribuídas aos probióticos é a capaci- dores de câncer polipectomizados68, constatou-se que a
dade de aderência a certos tipos de receptores presentes na administração de probióticos Bifidobacterium lactis Bb12
mucosa intestinal, não sendo eliminados pelos movimentos e Lactobacillus delbreuckii rhamnosus GG em associação
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 264-72
268
A importância dos probióticos na microbiota intestinal humana

com prebióticos produziu alterações positivas em vários patógenos no intestino e em outros tecidos, além da exclusão
biomarcadores de câncer colo-retal. Pode-se constatar que competitiva e da produção de compostos antimicrobianos73.
nas populações que têm o hábito de consumir grandes
quantidades de produtos lácteos contendo Lactobacillus ou P rin c ip a i s produto s c ont e ndo
Bifidobacterium, os casos de câncer de cólon são menores. probióticos
O consumo regular de leite fermentado contendo o probió-
tico L. casei foi considerado responsável pela diminuição da A escolha de bactérias probióticas baseia-se nos seguintes
recorrência de câncer superficial de bexiga69. critérios: o gênero ao qual pertence a bactéria ser de origem
humana, estável frente ao ácido e à bile, capaz de aderir à
mucosa intestinal e colonizar, ao menos temporariamente,
Benefícios dos probióticos o trato gastrintestinal humano, capaz de produzir compostos
Três trabalhos com prebióticos utilizaram a mistura antimicrobianos e ser metabolicamente ativo no nível do intes-
GOS:FOS (9:1) em fórmulas infantis em lactentes nos tino, não apresentar patogenicidade e nem devem estar asso-
primeiros meses de vida70,71. Os efeitos foram a alteração da ciadas a outras doenças tais como endocardite, não possuir
microbiota intestinal, promoção do efeito bifidogênico e a genes determinantes de resistência aos antimicrobiana73,74.
redução na incidência de doenças alérgicas (eczema atópico, Os principais produtos contendo culturas probióticas são os
broncoespasmo de repetição e urticária) nos primeiros dois derivados do leite, que podem ser adicionados separados ou em
anos de vida em crianças com risco para atopias. conjunto com outras bactérias lácticas, durante ou após a fermen-
Em relação aos probióticos, há alguns trabalhos publi- tação, ou ao produto fresco antes de sua comercialização27.
cados que utilizaram linhagens na forma de cápsulas, pó ou A Food and Agriculture Organization (FAO) da Organi-
acrescentadas a fórmulas infantis, com doses variáveis ao dia. zação Mundial da Saúde iniciou a compilação de estudos
Eles incluíram gestantes, crianças e adultos na prevenção e no disponíveis, necessários para o estabelecimento de alega-
tratamento de doenças alérgicas (dermatite atópica, alergia ao ções de propriedades funcionais dos alimentos contendo
leite de vaca, rinite e asma). Os microrganismos utilizados foram probióticos para subsidiar o Codex quanto a informações
L. rhamnosus (GG), B. lactis, L. casei, L. paracasei, L. reuteri, L. que deveriam fazer parte da rotulagem desses alimentos21.
acidophilus, B. longum, B. breve e P. freudenreichii sp72. Alguns fabricantes desenvolveram e licenciaram suas
Os benefícios da ingestão de probióticos são, entre outras próprias bactérias probióticas como Lactobacillus johnsonii
coisas, o controle das infecções intestinais, o estímulo da (Nestlé), Lactobacillus GG (Valio), LA7 (Bauer), Causido (MD
motilidade intestinal, a melhor absorção de determinados Foods) e Lacticel (Danone). O leite fermentado de origem
nutrientes, a melhor utilização de lactose e o alívio dos japonesa contendo L. casei Shirota (Yakult) expande-se tanto
sintomas de intolerância a esse carboidrato, a diminuição na Europa quanto no Reino Unido75,76.
dos níveis de colesterolemia, o efeito anticarcinogênico e Na Tabela 1, são citados os grupos de alimentos, marcas
o estímulo do sistema imunológico, devido ao estímulo da registradas dos mesmos e quais são os microrganismos
produção de anticorpos e da atividade fagocítica contra probióticos contidos em cada produto.

Tabela 1 – Grupo de alimentos que contêm probióticos.


ANSG
Grupo Produto Produtor Probióticos
Leite fermentado Yakult Yakult L. casei linhagem Shirota
Chamyto Nestlé L. johnsonii
Leite fermentado L. helveticus
Parmalat Parmalat L. casei
Vigor Club- Vigor B. lactis
Poke-mons Batavo L. acidophilus
Leite fermentado aromatizado Batavito Nestlé L. casei
LC1 Active (sabor laranja) Batavo L. acidophilus
L. casei
L.bulgaricus
L.acidophilus NCC 208
S. thermophilus
Iogurte Iogurte Biofibras Parmalat B. lactis
L. acidophilus
Dietalact
B. lactis
Danone L. acidophilus
Activia DanRegularis® é a Bífidobacterium animalis DN173010
Fonte: Adaptado76.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 264-72


269
Stürmer ES et al.

Culturas probióticas nos produtos Os efeitos dos microrganismos probióticos e dos ingre-
lácteos dientes prebióticos podem ser acelerados por meio de sua
Segundo Parvez et al.77, a ação dos probióticos nas associação, dando origem aos alimentos funcionais. As
fermentações durante a fabricação de produtos lácteos pode informações geradas ao longo dos últimos anos indicam que
implicar na conservação do leite, pela produção de ácido vários probióticos têm, além de sua atividade como agentes
lático e de outros compostos antimicrobianos e a produção de crescimento e reguladores da microbiota das mucosas,
de compostos aromáticos e outros metabólitos os quais irão efeito imunomodulador.
preencher o produto com qualidades sensoriais desejadas A qualidade dos produtos alimentícios e a sua influência
pelo consumidor, melhorar o valor nutricional do produto sobre a nutrição humana vêm garantindo lugar de destaque
alimentício por intermédio da liberação de aminoácidos livres nos meios científicos. Dentre estes se destacam os leites
ou da síntese de vitaminas e, por fim, fornecer propriedades fermentados, que são resultantes da fermentação microbio-
terapêuticas ou profiláticas. lógica do leite.
Os laticínios colaboram para a sobrevivência dos O papel direto dos microrganismos presentes no leite
probióticos ao suco gástrico, por ter efeito tamponante e fermentado, no sentido de propiciar, preventivamente,
protetor78. A indústria de laticínios encontrou nas culturas uma microbiota intestinal saudável e equilibrada a
probióticas uma fórmula para o desenvolvimento de novos quem o consome, se dá com o consumo regular desses
produtos79. Por isso, diversos laticínios probióticos são dispo- alimentos.
níveis comercialmente e a multiplicidade desses produtos
continua em ampliação80.
Considerações finais
Para aumentar a multiplicação de um probiótico, a adição
de outra espécie probiótica em cocultura é uma alternativa. Estudos nesse sentido devem ser cada vez mais estimu-
Entretanto, deve-se verificar a compatibilidade entre as lados para melhor compreensão sobre a interação entre a
culturas a serem usadas. Gomes e Malcata32 comprovaram microbiota intestinal e o hospedeiro, abrindo novas possibili-
que Bifidobacterium lactis se multiplica mais em cocultura dades de produzir novos produtos alimentícios que promovam
com Lactobacillus acidophilus. a saúde do consumidor, através de ações microbianas
benéficas no intestino.
Todos os aspectos relacionados à obtenção das linhagens
probióticas, para posterior adição aos produtos alimentícios,
devem ser muito bem determinados, já que as tecnologias REFERÊNCIAS
de fermentação, de secagem e de microencapsulação das 1. Sanders ME. Overview of functional foods: emphasis on probiotic
culturas influenciam a funcionalidade dos probióticos79. bacteria. Int Dairy J. 1998;8:341-7.
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CONCLUSÃO
Health Organization; 2004.
Por meio desta revisão da literatura foi possível comprovar os 3. World Health Organization. The World Health Report. Shaping
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benefícios que o uso regular de alimentos contendo probióticos 4. Roberfroid MB. Concept in functional foods: the case of inulin
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Local de realização do trabalho: Universidade Luterana do Brasil, Canoas, RS, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 264-72


272
A Artigo de Revisão
Contagem de carboidratos aplicado ao planejamento nutricional de pacientes com diabetes melittus

Contagem de carboidratos aplicado ao planejamento


nutricional de pacientes com diabetes melittus
Carbohydrate counting applied in the nutritional plan of diabetes mellitus’s patient

Bianca da Silva Oliveira¹ RESUMO


Simone Côrtes Coelho² O Diabetes Mellitus (DM) é uma doença caracterizada pela ausência da secreção de insulina
ou pela insulino-resistência associada ou não a queda da sua produção. Uma alimentação
equilibrada e completa em nutrientes é base fundamental para retardar ou até evitar as
complicações associadas à doença. O objetivo deste estudo foi demonstrar a técnica da
contagem de carboidratos no planejamento nutricional de pacientes portadores de DM,
bem como os desafios para sua implantação nos serviços de saúde e o papel da equipe
Unitermos: multidisciplinar na atenção a esse paciente. O trabalho consiste em uma pesquisa de revisão
Carboidratos na dieta. Planejamento alimentar. de literatura sendo utilizados dados dos últimos 15 anos. Com a realização deste estudo foi
Diabetes mellitus. Insulina. possível observar os benefícios que a Contagem de Carboidratos proporciona aos pacientes,
destacando-se dentre eles o melhor controle glicêmico com redução da HbA1C. Foi obser-
Key words: vado, também, que a atuação da equipe multidisciplinar é fundamental para sucesso do
Dietary carbohydrates. Food planning. Diabetes tratamento do paciente diabético, bem como a educação em diabetes, sendo que o pouco
mellitus. Insulin enfoque dado ao tema nas graduações de Saúde ainda é um desafio a ser superado.
Endereço para correspondência:
Simone Côrtes Coelho ABSTRACT
Rua Prof. José de Souza Herdy, 1.160 – Vinte e Cin- The Diabetes Mellitus (DM) is a disease attribute to the no insulin secretion or to the insulin
co de Agosto – Duque de Caxias, RJ, Brasil – CEP: resistance together or not the low insulin production. A well-balanced diet and complete in
25071-202 nutrient is elemental base to delay or until avoid the complications associate the disease. The
E mail: prof.sccoelho@uol.com.br objective of this study was to show the carbohydrate counting technic in the meal-planning
of patients with DM, like that the challenges to the your implantation in the heath services
Submissão
and the multiprofessional care in the attention for this patient. With the this study realization
7 de dezembro de 2011
was possible to observe the advantages that the carbohydrate counting give to your patients,
Aceito para publicação detached among that the A1C diminution, was too observed that the multiprofessional care
3 de março de 2012 is elemental to the success of the diabetic patient treatment like that the diabetic education.

1. Nutricionista graduada pela Universidade do Grande Rio – Unigranrio, Duque de Caxias, RJ, Brasil.
2. Docente da Universidade do Grande Rio – Unigranrio, Duque de Caxias, RJ, Brasil.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 273-9


273
Oliveira BS & Coelho SC

INTRODUÇÃO Uma alimentação equilibrada em calorias e nutrientes é o


O Diabetes Mellitus (DM) é uma doença caracterizada princípio fundamental para um bom controle metabólico do
pela ausência da secreção de insulina ou pela insulino- paciente diabético, tanto do tipo 1 como do tipo 2. Segundo
resistência associada ou não à queda da sua produção; os a Sociedade Brasileira de Diabetes6, a recomendação da
tipos mais comuns são o DM tipo 1 e o DM tipo 21. ingestão diária de carboidratos é de 50% a 60%, de proteínas
entre 15% e 20%, e de lipídios até 30%.
O DM tipo 1 é caracterizado pela ausência da produção
de insulina, decorrente da destruição autoimune das células Em 1935, a Contagem de Carboidratos foi iniciada na
beta pancreáticas, esse tipo é mediado por marcadores Europa, sendo uma das estratégias nutricionais utilizadas
imunológicos anti-ilhotas e anti-insulina. Quando não pelo Diabetes Control and Complications Trial (DCCT), que,
detectados esses autoanticorpos, temos então o Diabetes do em 1993, anunciaram que essa técnica se mostrou eficaz
tipo idiopático, onde a causa da destruição das células beta no controle glicêmico dos participantes do estudo, isso foi
pancreáticas é desconhecida. O tratamento de única escolha devido ao adequado tratamento das hipoglicemias, ajuste
para o DM tipo 1 é a utilização de insulina via subcutânea2,3. da insulina de acordo com a refeição, rápido tratamento das
hiperglicemias e, principalmente, a maior adesão ao plano
O DM tipo 2 pode ser decorrente da resistência dos
alimentar. Em 1994, a American Diabetes Association (ADA)
tecidos à ação da insulina ou a diminuição da sua produção,
adotou a nova estratégia nutricional; o tema começou a ser
inicialmente ocorre uma elevação na produção de insulina
abordado no Brasil em 1997, em simpósios, congressos e
para compensar a resistência, nessa fase, o quadro ainda
fóruns sobre diabetes7.
pode ser reversível, mas com o tempo as células beta
pancreáticas sofrem exaustão, o que leva à diminuição de A Contagem de Carboidratos é uma técnica atual que
sua produção, se instalando permanentemente o quadro vem facilitando e individualizando o plano alimentar do
de DM tipo 24. paciente diabético, o que é fundamental para adesão do
tratamento e, assim, melhorar seu controle metabólico. Ela
O número crescente de casos de DM tipo 2 em crianças e
baseia-se no fato de que quase 100% dos carboidratos inge-
adolescentes foi inicialmente observado há duas décadas em
ridos são convertidos em glicose, no caso das proteínas, a
canadenses e índios americanos suscetíveis à doença. Esse
conversão é em torno de 50%, e os lipídios em apenas 10%5,8.
fato se explica em parte pelo grande aumento da obesidade,
aproximadamente de 70% a 90% das crianças com DM tipo Por volta de 1980, as Associações Britânica e Americana
2 são obesas, dentre elas 38% são mórbidas5. de Diabetes mudaram a estratégia de uma dieta restrita em
carboidratos para indivíduos diabéticos e passaram a visar
Cerca de 90% a 95% dos casos de diabetes são do tipo
uma dieta controlada em gorduras, rica em carboidratos
2, e de 10% a 15% do tipo 1. O desenvolvimento do tipo 1
complexos e fibras alimentares. A contagem de carboidratos
pode ser rápido e progressivo, especialmente em crianças e
deve ser inserida no contexto de uma alimentação saudável,
adolescentes, dentre os quais 25% apresentam como quadro
respeitando a individualização do plano alimentar. Os
inicial da doença a cetoacidose diabética5.
carboidratos são os maiores responsáveis pela glicemia pós-
São diversas as consequências que o DM traz, dentre prandial, uma vez que são praticamente todos convertidos em
elas estão: complicações vasculares, nefropatias, retinopa- glicose, assim, a contagem de carboidratos leva em conta a
tias, neuropatias, hipertensão e dispilidemias. O impacto quantidade total de carboidratos consumidos por refeição,
econômico causado é de grande importância nos serviços sendo que essa quantidade deverá obedecer às necessidades
de saúde devido aos custos com o tratamento das compli- diárias do paciente6.
cações causadas, sendo assim, é imperativo que se evitem
os agravos que o DM traz e que se criem ferramentas para
evitar ou mesmo retardar as complicações da doença2. PLANEJAMENTO ALIMENTAR PELA CONTAGEM
DE CARBOIDRATOS
A adesão do paciente diabético ao tratamento dietético
é ainda um grande desafio; até 1921, antes da descoberta O controle glicêmico está diretamente ligado à quanti-
da insulina, os pacientes chegavam a falecer de inanição dade de carboidratos consumidos nas refeições, sabendo-se
devido à “dieta da fome” que era aplicada ao tratamento que praticamente 100% deles serão convertidos em glicose.
do DM. Após esse período, houve constante evolução da O uso do índice glicêmico pode oferecer algum benefício
dieta recomendada, a dieta evoluiu junto às novas pesquisas, quando associado à contagem dos carboidratos, uma vez
sendo o ponto principal o bom controle metabólico, seguido que isoladamente não representa grande benefício a longo
da melhor qualidade de vida para o paciente; apesar das prazo9,10.
mudanças tornarem o plano alimentar mais flexível, elas não O planejamento alimentar deve incluir a otimização das
consideravam as preferências individuais do paciente, o que escolhas dos alimentos de forma que atenda às necessi-
dificultava a adesão ao tratamento. dades nutricionais individualizadas, bem como as diferenças
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Contagem de carboidratos aplicado ao planejamento nutricional de pacientes com diabetes melittus

regionais, culturais e sociais de cada indivíduo. Dietas restritas implantação da Contagem de Carboidratos, é importante
são difíceis de serem mantidas a longo prazo, quando se que o paciente saiba ler e escrever ou tenha boas noções de
flexibiliza o plano alimentar respeitando as preferências e medidas caseiras, estar motivado para receber todas as novas
hábitos, a possibilidade do paciente aderir ao tratamento é orientações, bem como disciplinado para aderir ao novo
sempre muito maior, uma vez que não lhe implicará grandes tratamento, e realizar a monitorização glicêmica domiciliar,
sacrifícios9,11. será com base nela que se dará todo seu tratamento, tanto
Estudos demonstram que, à medida que a duração do medicamentoso como a dieta elaborada7.
DM vai aumentando, consequentemente os pacientes vão
abandonando a dieta e a atividade física. A Organização MÉTODO POR EQUIVALENTES
Mundial de Saúde considera que a dieta do diabético é um
Com esse método separamos os alimentos por grupos,
dos fatores responsáveis por manter a glicemia dentro dos
onde cada alimento corresponde a uma substituição de 15
limites desejáveis; a escolha do tipo de tratamento poderá
gramas (g) de carboidrato. Dessa forma, o paciente poderá
influenciar a decisão do paciente por um controle mais rígido,
realizar trocas entre alimentos, serão estimuladas trocas
para qual o profissional de saúde deve estar habilitado para
entre alimentos do mesmo grupo, porém poderá haver situ-
orientá-lo e capacitá-lo12.
ações em que o paciente fará substituições entre os grupos,
Agregar ao paciente diabético a possibilidade de uma trocando, por exemplo, um alimento do grupo do leite por
alimentação o mais próximo possível a de seus familiares e um alimento do grupo das frutas6.
amigos, permitindo a ele alimentar-se em lugares frequen-
No plano alimentar com base em equivalentes, a quan-
tados pelas suas companhias, certamente o trará maior satis-
tidade de carboidratos pode ser arredondada para mais ou
fação e melhor qualidade de vida. O objetivo da contagem
para menos, de modo a aproximar todos os alimentos para
de carboidratos é exatamente dar ao paciente essa melhor
15g de carboidrato, como no caso do leite, onde 1 copo de
qualidade de vida, esperando dele maior adesão a seu
200 ml contém, em média, 12g de carboidrato, ou no caso
tratamento e, juntamente com isso, melhorar seu controle
de um caqui pequeno, que tem em média 17g de carboi-
glicêmico, evitando ou retardando complicações futuras que
dratos, ambos serão considerados como 15g; a variação de
o DM traz consigo10,13.
9 a 25,9 gramas será considerada como 1 equivalente10.
A elaboração do plano alimentar se iniciará pelo cálculo
As fibras não são transformadas em glicose, por isso não
das necessidades calóricas diárias do paciente de acordo com
serão contabilizadas, se um alimento a ser consumido tiver
a anamnese. Após determinar o VET, calcula-se a quantidade
mais de 5 gramas de fibra, o total da mesma deverá ser
total de carboidratos a ser consumida por dia, fraciona-se
subtraído da porção, para se obter o valor real de carboi-
o total em refeições, levando-se em conta a rotina, horá-
dratos a serem convertidos em glicose10.
rios e medicação do paciente, teremos então a quantidade
de carboidratos determinada por refeição. Dessa forma, Apesar da proteína não ser o foco da Contagem de
poderemos realizar a contagem de carboidratos de duas Carboidratos, ela deverá ser contabilizada se consumida
formas: pelo método por equivalentes, também chamado acima de uma porção, por exemplo, 1 bife médio de 90g
de método básico ou de substituição, e pelo método por tem 25 gramas de proteína, sabendo que 60% da proteína
gramas, também chamado de método avançado6,10. são convertidos em glicose, teremos: 60% de 25 igual a 15g
de carboidrato6.
Um estudo realizado com 56 pacientes diabéticos do tipo
1, maiores de 70 anos, com surgimento da doença antes dos
30 anos, onde 37 realizavam a Contagem de Carboidratos MÉTODO POR GRAMAS
e 29 estavam no grupo controle, demonstrou que, ao final No método por gramas, a quantidade total de carboi-
de 30 dias, a Hemoglobina Glicada (HbA1C) foi menor nos dratos por refeição será obtida pela soma dos carboi-
pacientes realizando a Contagem de Carboidratos que nos dratos de cada alimento a ser consumido, através do uso
pacientes do grupo controle14. de tabelas e rótulos dos alimentos. Esse método é mais
Outro estudo realizado em 2008, com 58 pacientes preciso, uma vez que se sabe exatamente o quanto de
diabéticos insulino-dependentes com idade entre 18 e 60 carboidratos será consumido, porém é mais trabalhoso e
anos, demonstrou redução da HbA1C nos pacientes reali- exige maior habilidade do paciente, será de grande impor-
zando a Contagem de Carboidratos, quando comparado a tância que ele se habitue à leitura da tabela nutricional
HbA1C inicial15. nos rótulos dos alimentos6.
Segundo a Associação Americana de Diabetes6, o moni- O uso da sacarose poderá ser considerado na
toramento dos carboidratos continua sendo uma estratégia Contagem de Carboidratos, a sacarose será contabilizada
fundamental para alcançar o controle glicêmico. Para como qualquer outro carboidrato, sendo que a mesma
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Oliveira BS & Coelho SC

deverá ser incluída como uma substituição de outros apenas a escolha do tipo de carboidrato. Após calculada e
carboidratos e não simplesmente adicionada. Lembrando fracionada a quantidade de carboidratos, a mesma poderá
que a sacarose fornece muitas calorias e grande quanti- ser passada para o paciente pela forma de substituições ou
dade de carboidratos, deve-se manter a preferência pelos de gramas, dependendo da habilidade do paciente, pode-se
adoçantes artificiais, pois em sua maioria não fornecem passar as duas formas6.
carboidratos, podendo então utilizar a quantidade a ser A terapia com múltiplas doses de insulina consiste na
consumida nas refeições com alimentos que trarão bene- aplicação de quatro ou mais doses de insulina por dia, que
fícios nutricionais e satisfação ao paciente7. em geral são aplicadas 30 minutos antes ou imediatamente
Um estudo realizado com 10 adolescentes diabéticos após as refeições. Os limitantes dessa terapia são os maiores
com idade entre 12 e 18 anos, durante 8 meses, onde riscos de hipoglicemia e ganho ponderal de peso; a principal
nos 4 últimos meses foram introduzidos, no lanche vesper- vantagem para o paciente inserido nessa terapia é a possi-
tino, alimentos com sacarose na forma de doces, mostrou bilidade de flexibilizar, além do tipo de carboidrato, também
que não houve diferença estatisticamente significante no a quantidade a ser ingerida8,19.
colesterol total e triglicerídeos comparando os valores A razão insulina x carboidrato é determinada pela
dosados no início e no final do estudo, e que houve divisão da constante 500 pela dose diária de insulina do
diminuição da HbA1C, revelando que a introdução de paciente. Ela mostra o quanto de carboidrato 1 unidade
alimentos com sacarose, utilizando a técnica da Contagem (U) de insulina cobre; se um paciente faz uso de 40 U de
de carboidratos, não comprometeu o controle metabólico insulina por dia, sua razão insulina x carboidrato será: 500
dos adolescentes16.
÷ 40 = 12,5 gramas. Caso esse paciente deseje consumir,
O álcool não fornece nutrientes, porém afeta a por exemplo, 15g de carboidrato além da quantidade
glicemia, seu uso poderá causar hipoglicemia. No estabelecida, ele poderá cobrir essa quantidade com 1 U
momento em que o fígado está metabolizando o álcool, ele a mais de insulina6.
interrompe a gliconeogênese. Para evitar a hipoglicemia,
As insulinas de ação ultra rápida (início de ação em 15
recomenda-se seu uso juntamente com algum alimento,
minutos) são de grande vantagem para crianças, devido à
a Associação Americana de Diabetes, em 200917, reco-
possibilidade de aplicá-la imediatamente após a refeição,
mendou como ingestão máxima de álcool, por dia, um
caso a criança não coma toda a refeição oferecida, pode-se
drink para mulheres e dois para homens.
subtrair a quantidade de carboidratos rejeitada e aplicar
a dose ajustada para quantidade real consumida, as insu-
APLICAÇÃO DA CONTAGEM DE CARBOIDRATOS linas de ação rápida (início de ação em 30 minutos), não
NO DM TIPO 1 permitem essa flexibilidade, devido seu início de ação ser
O maior benefício da Contagem de Carboidratos no DM mais demorado, ela precisa ser aplicada antes da refeição
Tipo 1 se dá para os pacientes em uso de insulina, que na e, caso a criança rejeite o alimento, certamente fará
grande maioria das vezes são crianças e adolescentes. Um hipoglicemia7,20.
estudo realizado com crianças e adolescentes diabéticos, A terapia com SIC é a forma mais fisiológica de apli-
com idade entre 2 e 12 anos, e tempo de diabetes superior cação de insulina, ela utiliza apenas insulina de ação ultra
a 1 ano, em uso de múltiplas doses de insulina ou Sistema rápida, que é injetada em pequenas quantidades lenta e
de Infusão Contínua de Insulina (SIC), passando a realizar continuamente, imitando assim a função do metabolismo
a Contagem de Carboidratos, mostrou que houve redução basal do pâncreas. Após as refeições, o paciente ajusta
da HbA1C em 0,8%18. no aparelho a dosagem necessária para cobrir o total de
a Contagem de Carboidratos para o diabético do Tipo carboidratos consumido na refeição. As vantagens desse
1 deriva de acordo com seu esquema de insulinização, que método são os menores riscos de hipoglicemias, diminuição
poderá ser de três formas: a terapia convencional, múltiplas da HbA1C, substituição das múltiplas injeções por dia,
doses de insulina ou por SIC com bomba de infusão. A terapia maior flexibilidade com horários e alimentação e melhor
convencional consiste na aplicação de insulina de duas a três qualidade de vida, o maior limitante da terapia com bomba
vezes ao dia, essa forma é comumente utilizada em pacientes de infusão é o alto custo21,22.
em estágio inicial do diabetes ou em diabéticos do Tipo 2 A principal vantagem do SIC na Contagem de
quando os hipoglicemiantes orais não surtem mais efeito8. Carboidratos é a possibilidade de ajustar precisamente a
Na terapia convencional, a Contagem de Carboidratos dosagem bolus necessária para cobrir os carboidratos da
será realizada de acordo com os horários e dosagem de refeição; utilizando o exemplo acima, o mesmo paciente
insulina, nesse caso, não será possível flexibilizar a quan- que tem a razão insulina x carboidrato de 12,5, quando
tidade de carboidratos a ser consumida, a vantagem será em uso de injeção, precisaria fazer 1 U de insulina para
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Contagem de carboidratos aplicado ao planejamento nutricional de pacientes com diabetes melittus

cobrir 12 gramas de carboidrato, já com o uso da bomba ser iniciado logo após superação do impacto emocional
ele faria a quantidade exata para as 12 gramas: 12,5 ÷ e psicológico que sucede o diagnóstico. Infelizmente, o
15 = 0,83 U de insulina6. tempo disponibilizado para as consultas são muito curtos, se
comparados ao tempo necessário, ainda existem limitações
APLICAÇÃO DA CONTAGEM DE CARBOIDRATOS para consultas multidisciplinares, poucos são os centros de
NO DM TIPO 2 saúde que trabalham dessa forma20.
A educação em diabetes é a ferramenta mais útil, com
No DM Tipo 2, a flexibilidade da Contagem de Carboi-
resultados permanentes e de longo prazo, que conseguem
dratos se dá apenas na escolha do tipo de carboidrato, como
adiar ou até evitar as complicações do DM, ensinar ao
a maioria dos diabéticos do tipo 2 não faz uso de insulina,
não há possibilidade de ajuste da medicação para cobrir paciente e sua família a importância de aderir ao tratamento
qualquer quantidade de carboidrato acima do seu limite dietético, farmacológico e mudança de estilo de vida. É
estabelecido7. um processo contínuo e que exigirá ação multidisciplinar.
Esse processo depende de tempo, recursos educacionais
Iniciaremos a Contagem de Carboidratos calculando os
adequados para sua aplicação e uma equipe capacitada
gramas de carboidratos a serem consumidos diariamente,
na atenção ao paciente diabético26,27.
levando em conta as necessidades individuais, atividade
física realizada, hábitos, horários e medicação, fracio- Equipes como as Ligas de Atenção à Criança e ao Adoles-
naremos o total em refeições e passaremos ao paciente cente Diabéticos, que têm como proposta a priorização das
seus gramas ou equivalentes por refeição. É importante necessidades sociais e afetivas do paciente e de sua família
estimular o paciente a não ultrapassar suas cotas e fazer a fim de promoverem informação quanto à doença e seu
escolhas saudáveis6. controle e integração do paciente diabético com a socie-
dade, são muito úteis na aceitação do paciente a doença,
A educação nutricional é indispensável para o paciente,
consequente adesão ao tratamento e aprendizado do auto
a SBD recomenda o modelo do Dietary Approaches do Stop
cuidado. Infelizmente, a realidade atual dessas equipes é a
Hypertension (DASH), que associado a um estilo de vida
falta de recursos financeiros e patrocínios, o que dificulta o
saudável pode promover melhora da sensibilidade à insulina.
alcance aos pacientes de baixa renda28.
Esse modelo enfatiza o consumo de alimentos naturais, com
redução dos industrializados, sódio e lipídios transaturados
e saturados23. O PAPEL DA EQUIPE MULTIDISCIPLINAR
Educar o paciente diabético para o autocuidado é
DESAFIOS PARA IMPLANTAÇÃO NOS SERVIÇOS um investimento benéfico, tanto para ele quanto para o
DE SAÚDE profissional de saúde e hospital que o atende, uma vez
A aplicação da Contagem de Carboidratos para o que se poupa mais tempo do que se consome. Ao montar
paciente diabético depende diretamente da automonitori- um plano de educação, deve-se ter conhecimento das
zação glicêmica domiciliar, é por meio dela que será avaliado características da população atendida, conhecer seu nível
e calculado o planejamento alimentar. O custo despendido de educação e instrução, costumes, hábitos e alimen-
com materiais para aferição glicêmica ainda é elevado, tação, isso será fundamental para o sucesso da equipe19.
principalmente para os que necessitam de maior número Uma equipe multidisciplinar bem estruturada deve ser
de aferições20,24. formada por médicos especialistas em DM, educador físico,
A Sociedade Brasileira de Diabetes, em 2006, em nutricionista, enfermeiro e psicólogo, cada qual desempe-
virtude dos benefícios que a automonitorização glicêmica nhando um papel de extrema importância no cuidado e
traz, manifestou seu pleno apoio à disponibilização gratuita ensino ao paciente e sua família28.
de monitores de glicemia e tiras reagentes por entidades Nas consultas multidisciplinares, o paciente é aten-
privadas, planos de saúde ou governamentais de saúde. Esse dido pelo médico endocrinologista, que avalia o grau
ainda é um desafio a ser superado para que as estratégias de controle metabólico alcançado e pesquisa possíveis
de estímulo ao controle glicêmico sejam bem sucedidas, em complicações do DM no paciente. A enfermagem ensina
vista que a grande maioria das instituições públicas e privadas o paciente a aplicação terapêutica e medicamentosa. O
de assistência ao paciente com Diabetes não disponibiliza psicólogo avalia os aspectos emocionais do paciente e
esses insumos9,25. de sua família, ensinado-o a lidar com as dificuldades
O tempo investido na orientação e educação ao paciente emocionais. Por fim, o nutricionista avalia as necessidades
diabético, ou de sua família, no caso das crianças, pode dietéticas e adesão ao plano alimentar, orienta as escolhas
chegar a 15 horas ao todo. O processo educativo deve e seguimento da dieta29,30.
Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 273-9
277
Oliveira BS & Coelho SC

São escassos os estudos demonstrando a importância da Considerando os benefícios da Contagem de Carboidratos


atuação da equipe multidisciplinar em doenças específicas aliados à atenção multidisciplinar, o controle do DM alcan-
como o DM. Um estudo realizado com graduandos de çará maior sucesso.
enfermagem e nutrição, onde foi proposta uma disciplina em
comum, denominada de Equipe Multidisciplinar na Educação
REFERÊNCIAS
em Diabetes, mostrou por meio de um questionário, que ao
final da disciplina os alunos saíram com maior conhecimento 1. Guyton AC, Hall JH. Tratado de fisiologia médica. 10ª ed. Rio
de Janeiro:Guanabara Koogan, 2002.
teórico e com visão ampla sobre a atuação multidisciplinar 2. Ministério da Saúde. Cadernos de Atenção Básica – n.º 16 Série
no DM. Foi visto que uma atuação conjunta de diferentes A. Normas e Manuais Técnicos. Diabetes Mellitus. Brasília:
profissionais traz benefícios ao paciente e conhecimento Ministério da Saúde;2006.
3. Sperling MA. Type 1 diabetes: etiology and treatment. New
integrado à equipe atuante31.
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As colônias de férias para diabéticos são uma ótima 4. Harrison. Medicina interna. 16ª ed. Rio de Janeiro:Mc Graw
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5. Sociedade Brasileira de Diabetes. Tratamento e acompanhamento
Day Weekend, onde é realizado um acampamento de fim do Diabetes Mellitus: Diretrizes da Sociedade Brasileira de
de semana com crianças e adolescentes diabéticos do tipo Diabetes. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Diabetes;2007.
1, havendo 1 profissional de saúde para cada 4 partici- 6. Sociedade Brasileira de Diabetes. Manual Oficial de Contagem
de Carboidratos para profissionais da Saúde. Rio de
pantes, mostrou que as atividades educacionais realizadas
Janeiro:Sociedade Brasileira de Diabetes;2009.
no acampamento levaram a melhor aceitação da doença, 7. Gouveia GR, Bruno LPC, Pascali PM. Contagem de carboidratos
redução das complicações agudas e crônicas e menor neces- e monitorização: 101 respostas. São Paulo:Preventa;2003.
sidade de uso diário de insulina das crianças e adolescentes 8. Wada LY. Contagem de carboidratos: mais fácil que contar ate
3. Rio de Janeiro:Atheneu;2003.
participantes26. 9. ADA-American diabetes Association. Recomendações da ADA
Outro projeto de acampamento de férias para crianças para prática clínica no diabetes, Diabetes Care. 2010 [Acesso
e adolescentes diabéticos, realizado pela Associação de 2010 ago 15]; 33(1). Disponível em: http://www.anad.org.br/
Profissionais/Noticias/Indexinterna.asp?Textos_ID=2836.
Diabetes Juvenil, demonstrou, por meio de coleta de dados 10. Souto DL, Rosado EJ. Contagem de carboidratos no diabetes
realizada durante o acampamento, pela equipe de psico- melito: abordagem teórica e prática. Rio de Janeiro:Rubio;2010.
logia, que as crianças tinham menor dificuldade de acei- 11. Hissa ASR, Albuquerque LL, Hissa MN. Avaliação do grau de
satisfação da contagem de carboidratos em diabetes mellitus tipo
tação da doença e seu tratamento do que os jovens. Isso foi 1. Arq Bras Endocrin Metabol. 2004;48(3):394-7.
atribuído ao fato de que os jovens começam a se responsa- 12. Brito KM, Buzo RAC, Salado GA. Estilo de vida e hábitos alimen-
bilizar pelo seu próprio cuidado. Os dados mostraram que tares de pacientes diabéticos. Rev Saúde Pesq. 2009;2(3):357-62.
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centes com diabetes mellitus tipo 1: relato de experiência, 2010.
esclarecer muitas dúvidas dos participantes, além de melhorar [Acesso em 2010 ago 26] Disponível em: http://www.diabetes.
a aceitação da doença32. org.br/colunistas-da-sbd/nutricao-e-ciencia/1221-educacao-
nutricional-para-adolescentes-com-diabetes-mellitus-tipo-1-
relato-de-experiencia
CONSIDERAÇÕES FINAIS 14. Trento M, Borgo E, Kucich C, Passera P, Trinetta A, Charrier
L, et al. Quality of life, coping ability, and metabolic control in
A prescrição dietética é fundamental para o controle glicê- patients with type 1 diabetes managed by group care and a carbo-
mico no DM, o contingente de pacientes que não aderem ao hydrate counting program. Diabetes Care. 2009;32(11):134.
15. Azzolini CR. Nutritional therapy effectiveness of carbohydrate
tratamento ainda é muito elevado, isso se dá pelas mudanças
counting through glycated hemoglobin in insulin-dependent
radicais ainda impostas pela terapia dietética tradicional. diabetic patients. Rev Bras Nutr Clin. 2010;25(2).
Respeitar a individualidade e hábitos do paciente mostra-se 16. Costa PCA, Franco LJ. Introdução da sacarose no plano
uma peça fundamental para adesão ao tratamento e melhor alimentar de portadores de diabetes mellitus tipo 1 – sua
influência no controle glicêmico. Arq Bras Endocrinol Metab.
controle glicêmico. 2005;49(3):403-9.
Ainda existe uma carência muito grande do ensino da 17. ADA – American Diabetes Association. Standards of medical
Contagem de carboidratos nas graduações de Nutrição, o care in diabetes-2009, Diabetes Care. 2009;32(1):13-61.
18. Mehta SN, Quinn N, Volkening LK, Laffel LMB. Impact of
que não permite conhecimento da técnica para sua devida carbohydrate counting on glycemic control in children with type
aplicação. A Contagem de carboidratos é uma ferramenta 1 diabetes, Diabetes Care. 2009;32(6):1014-6.
muito útil e atual que requer a devida capacitação profissional 19. Oliveira JEP, Milech A. Diabetes mellitus: clínica, diagnóstico,
tratamento multidisciplinar, São Paulo:Atheneu;2004.
para aplicá-la. 20. Malerbi D, Damiani D, Rassi N, Chacra AR, Niclewicz EA,
A atuação da equipe multidisciplinar é fundamental para Filho RLS et al. Posição de Consenso da Sociedade Brasileira de
sucesso do tratamento do paciente diabético, bem como a Diabetes – insulinoterapia intensiva e terapêutica com bombas
de insulina. Arq Bras Endocrinol Metab. 2006;50(1):125-35.
educação em diabetes. O pouco enfoque dado ao tema nas 21. Araújo J. Aprenda a cuidar da criança e adolescente com
graduações de Saúde ainda é um desafio a ser superado. diabetes. SBD. 2008;2(2).

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 273-9


278
Contagem de carboidratos aplicado ao planejamento nutricional de pacientes com diabetes melittus

22. Tombini M. Guia completo sobre diabetes da American Diabetes 28. Setian N, Damiani D, Dichtchekenian V. Diabetes mellitus
Association. Rio de Janeiro:Anima;2002. na criança e no adolescente: encarando o desafio. São
23. Gouveia GR. Manual de Nutrição – Profissional de Saúde. Rio Paulo:Sarvier;1995.
de Janeiro:SBD;2009. 29. Leite SAO, Costa PAB, Guse C, Dorociaki JG, Silveira MC,
24. Brasil. Portaria nº 2.583 de 10 de outubro de 2007. Define elenco Teodorovicz R, et al. Enfoque multidisciplinar ao paciente diabé-
de medicamentos e insumos disponibilizados pelo Sistema tico: avaliação do impacto do “staged diabetes management”
Único de Saúde, nos termos da Lei nº 11.347/2006, aos usuá- em um sistema de saúde privado. Arq Bras Endocrinol Metab.
rios portadores de Diabetes Mellitus. [Acesso em 2011 nov 24] 2001;45(5):481-6.
Disponível em: http://portal.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/ 30. Ferraz AEP, Zanetti ML, Brandão ECM, Romeu LC, Foss MC,
Portaria_N_2583.pdf Paccola GMGF, et al, Atendimento multiprofissional ao paciente
25. Sociedade Brasileira de Diabetes. Automonitorização glicêmica e com diabetes mellitus no Ambulatório de Diabetes do HCFMRP-
monitorização contínua da glicose: indicações e recomendações para USP. Medicina (Ribeirão Preto) 2000;33(1):170-5.
a disponibilização pelos serviços de atenção ao portador de diabetes. 31. Torres HC, Salomon IMM, Jansen AK, Albernaz PM.
Revista Brasileira de Medicina, São Paulo, suplemento 1, 2006. Interdisciplinaridade na educação em diabetes: percepção
26. Maia FFR, Araújo JR, Projeto “Diabetes Weekend” – Proposta dos graduandos de Enfermagem e Nutrição. Rev Enferm.
de Educação em Diabetes Mellitus Tipo 1, Arq Bras Endocrinol 2008;16(3):351-6.
Metab. 2002;46(5):556-73. 32. Heleno MGV, Vizzotto MM, Mazzotti T, Gomes RC, Modesto
27. Sociedade Brasileira de Diabetes. Tratamento e acompanhamento SEF. Acampamento de férias para jovens com diabetes mellitus
do diabetes mellitus: Diretrizes da Sociedade Brasileira de tipo 1: Achados da abordagem psicológica. Bol Psicol.
Diabetes. Rio de Janeiro: Sociedade Brasileira de Diabetes;2006. 2009;60(130):77-90.

Local de realização do trabalho: Universidade do Grande Rio – Unigranrio, Duque de Caxias, RJ, Brasil.

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279
A Artigo de Revisão
Campos VM et al.

Estado nutricional e diabetes mellitus gestacional


Nutritional status and gestational diabetes mellitus

Vanessa Meurer Campos1 RESUMO


Jean Carl Silva2 Crescentes evidências científicas indicam que o peso pré-gestacional e quantidade de peso
Silmara Salete de Barros Silva Mastroeni3
ganho durante a gravidez podem afetar a saúde da mãe e do bebê. As mães classificadas
com sobrepeso ou obesidade, avaliadas pelo Índice de Massa Corporal, apresentam risco de
complicações médicas e obstétricas, resultando em um aumento da mortalidade materna e de
resultados fetais adversos. Iniciar uma gravidez com sobrepeso ou obesidade, bem como ter
um ganho de peso gestacional excessivo, pode aumentar situações de alto risco gestacional,
como o diabetes mellitus gestacional. Definido como qualquer grau de intolerância à glicose
com início ou primeiro reconhecimento durante a gravidez, o diabetes gestacional está asso-
ciado com risco aumentado de complicações perinatais e, a longo prazo, risco aumentado para
desenvolver diabetes mellitus tipo 2, tanto para as mães como para seus filhos. Contudo, em
virtude das evidências sobre as consequências danosas para a mãe e para o feto que o diabetes
gestacional pode acarretar, principalmente associadas ao excesso de peso, a presente pesquisa
objetivou revisar trabalhos atuais sobre o tema, para que os mesmos possam servir de subsídio
para novos estudos sobre prevenção ou tratamento dessa condição clínica relacionados ao
Unitermos:
Diabetes gestacional. Estado nutricional. Ganho de estado nutricional materno.
peso.
ABSTRACT
Key words: Increasing scientific evidence indicates that the pre-pregnancy weight and amount of weight
Gestational diabetes. Nutritional status. Weight gain. gained during pregnancy can affect the health of mother and baby. Mothers classified as
overweight or obese, as assessed by body mass index, are at risk of medical and obstetric
Endereço para correspondência: complications, resulting in an increase in maternal death and fetal adverse outcomes. Beginning
Vanessa Meurer Campos a pregnancy overweight or obese as well as having an excessive gestational weight gain can
Rua Machado de Assis 219 – apto 202 – América – increase high-risk situations such as pregnancy gestational diabetes mellitus. Defined as any
Joinville, SC, Brasil – CEP: 89204-390 degree of glucose intolerance with onset or first detection during pregnancy, gestational diabetes
E-mail: vanutri@gmail.com.
is associated with an increased risk of perinatal complications and increase long-term risk for
Submissão developing type 2 diabetes mellitus, both mothers and for their children. However, because
11 de janeiro de 2011 of evidence about the harmful consequences for mother and the fetus can lead to gestational
diabetes, mainly associated with excess weight, this study’s objective is to review current work
Aceito para publicação on the subject so that it can serve as a support for new studies on prevention or treatment of
2 de outubro de 2011 this clinical condition related to maternal nutritional status.

1. Nutricionista, Mestranda em Saúde e Meio Ambiente da Universidade da Região de Joinville – UNIVILLE, Joinville, SC, Brasil.
2. Doutor em Ciências Médicas - Professor do Curso de Medicina e do Mestrado em Saúde e Meio Ambiente da Universidade da Região de Joinville -
UNIVILLE, Joinville, SC, Brasil.
3. Doutora em Saúde Pública- Professora do Curso de Nutrição da Associação Educacional Luterana, Bom Jesus/ IELUSC, Joinville, SC, Brasil.

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280
Estado nutricional e diabetes mellitus gestacional

Introdução trabalhos atuais sobre o tema para que os mesmos possam


Crescentes evidências científicas indicam que o peso servir de subsídio para novos estudos sobre prevenção ou
tratamento do DMG relacionados ao estado nutricional
pré-gestacional e a quantidade de peso ganho durante a
materno.
gravidez podem afetar a saúde da mãe e do bebê. Nesse
sentido, as orientações sobre peso, dieta e exercícios devem
ocorrer com as mulheres que planejam engravidar para que Obesidade e gestação
no início da gravidez o Índice de Massa Corporal (IMC) esteja A obesidade é uma doença grave, de origem multifatorial,
mais próximo do ideal. Além disso, profissionais de saúde e que apresenta na sua etiologia fatores genéticos, metabólicos,
gestantes devem trabalhar em conjunto para definir metas de ambientais, sociais e psicológicos, que podem atuar em
ganho de peso na gravidez com base em diretrizes e outros conjunto ou isoladamente20. A influência dos fatores ambien-
fatores relevantes para as necessidades individuais de cada tais decorre do desequilíbrio energético entre sedentarismo e
paciente1-3. A relação entre peso e estatura materna com excesso de consumo de alimentos hipercalóricos, resultando
complicações da gravidez foi bastante explorada e o IMC em um balanço energético positivo21. Considerada uma
foi amplamente aceito como um bom indicador de estado epidemia mundial, a obesidade atinge indivíduos em todos
nutricional4. os níveis socioeconômicos, levando a aumento nas taxas de
As mães classificadas com sobrepeso ou obesidade, mortalidade22. No Brasil, segundo pesquisa realizada pelo
avaliadas pelo IMC, apresentam risco de complicações Ministério da Saúde (2009), 13% dos adultos são obesos,
médicas e obstétricas, resultando em aumento da mortalidade sendo o índice maior entre as mulheres (13,6%) do que entre
materna e de resultados fetais adversos5,6. As complicações os homens (12,4%)23. Devido ao aumento da incidência de
pré-natais incluem abortos recorrentes, malformações mulheres obesas na atualidade, a obesidade na gestação
congênitas, hipertensão induzida pela gravidez (HIG), pré- passou a ser considerada um problema cada vez mais preo-
eclâmpsia, diabetes mellitus gestacional (DMG), tromboem- cupante e motivo de diversos estudos24. A gestação pode
bolismo venoso e maior propensão a cesariana. Os bebês atuar como desencadeante da obesidade ou agravante
de mães com sobrepeso e obesidade são frequentemente desta, quando for pré-existente. A associação da obesidade
macrossômicos e exigem internações prolongadas7-9. Além e gravidez condiciona a mãe e o filho a um alto risco, sendo
disso, crianças que são grandes para a idade gestacional concordante que o excesso de peso pré-gestacional aumenta a
(GIG) ao nascimento e, portanto, possivelmente expostas a morbidade materna e fetal25,26. A gestante que inicia a gravidez
um ambiente intrauterino de diabetes ou obesidade materna, obesa apresenta risco maior de resultados adversos à gravidez,
têm maior risco de desenvolver a síndrome metabólica, como aborto espontâneo, tromboembolismo, hipertensão
perpetuando o ciclo da obesidade e resistência à insulina arterial, diabetes gestacional, parto prematuro, cesariana
nas gerações seguintes10. e complicações a longo prazo, como retenção de peso e
Diante do exposto, iniciar uma gravidez com sobrepeso Diabetes tipo 227-30. A obesidade materna está associada
ou obesidade, bem como ter ganho de peso gestacional também às complicações fetais, sendo as mais comuns: morte
intrauterina, anomalias congênitas e macrossomia31. Em longo
excessivo, pode aumentar situações de alto risco gesta-
prazo, os recém-nascidos grandes para a idade gestacional
cional como o DMG 11,12, doença que representa uma
(GIG) de mães obesas e/ou diabéticas estão propensos ao
complicação adicional para a mãe e a criança13. Definida
desenvolvimento da obesidade infantil e síndrome metabólica
como qualquer grau de intolerância à glicose com início
na vida adulta31.
ou primeiro reconhecimento durante a gravidez, o DMG
está associado com um risco aumentado de complicações
perinatais e, a longo prazo, risco aumentado para desen- Estado nutricional pré-gestacional e DMG
volver diabetes mellitus tipo 2 (DM2), tanto para as mães A associação entre o estado nutricional materno pré-
como para seus filhos10,14-18. gestacional e altas taxas de ganho de peso gestacional,
Poucos fatores de risco modificáveis para o DMG são especialmente no início da gravidez, podem aumentar
conhecidos. Estes parecem espelhar os preditores estabe- o risco de DMG32,33. Em um estudo de coorte sobre a
lecidos de DM2, sendo a obesidade o principal fator de associação entre o estado antropométrico materno pré-
risco modificável identificado associado ao DMG até hoje19. gestacional e o risco de intercorrências gestacionais,
Contudo, em virtude das evidências sobre as consequências realizado em clínicas pré-natais do Sistema Único de
danosas para a mãe e para o feto que o DMG pode acar- Saúde (SUS) de seis capitais no Brasil, entre 1991 e 1995,
retar, principalmente associada ao excesso de peso, que tem foi observado que, das 5.564 gestantes avaliadas, 25%
sido abordado como fator de risco para o desenvolvimento estavam com excesso de peso ou obesidade. Medidas de
dessa condição clínica, a presente pesquisa objetivou revisar peso pré-gravídico, idade, escolaridade e paridade foram
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Campos VM et al.

obtidas mediante entrevistas utilizando-se questionário D e t e r mi n a n t e s d o g a n h o d e p e s o


padronizado. A altura foi medida em duplicata. O estado gestacional
nutricional foi estabelecido a partir do índice de massa O organismo da mulher sofre intensas modificações estrutu-
corporal (IMC), utilizando-se os critérios da Organização rais e funcionais durante a gestação, para garantir um ambiente
Mundial da Saúde. Mulheres obesas apresentaram risco propício à formação fetal. Dentre estas está o ganho de peso
maior para diabetes gestacional, macrossomia e distúrbios fisiológico, que compreende: crescimento fetal, líquido aminiótico,
hipertensivos, e menor risco para microssomia34. placenta, útero, tecido mamário, volume sanguíneo aumentado,
Além do excesso de peso pré-gestacional, o ganho de acúmulo variável de tecido adiposo e líquido tecidual. Conse-
peso pouco tempo antes da gravidez e a idade materna quentemente, ocorre aumento da demanda energética para
foram associados em alguns estudos como risco aumen- atender às necessidades requeridas por essas modificações
tado de DMG, sugerindo que esses fatores também devem fisiológicas40. Assim, as recomendações nutricionais durante o
ser considerados quando a triagem seletiva para diabetes pré-natal devem ser direcionadas para adequada ingestão ener-
gestacional é praticada35-37. gética, resultando num ganho ponderal gestacional adequado2.
O ganho de peso recente pode resultar em aumento Estudos recentes estão evidenciando que a maior parte das
na resistência à insulina, que pode levar a esgotamento gestantes está ganhando peso acima das recomendações41. O
na capacidade de células-β para secretar insulina sufi- ganho de peso acima do recomendado é relacionado com altos
ciente e, portanto, levar ao desenvolvimento do DMG. níveis de retenção de peso pós-parto, aumentando duas a três
Em acordo com essa suposta alteração fisiológica, um vezes o risco de ter sobrepeso após a gestação42. Além de contri-
estudo relacionando IMC e ganho de peso antes da buir para a obesidade, o ganho de peso excessivo está também
gestação com o DMG demonstrou que mulheres que não associado a alguns desfechos obstétricos e maternos indesejáveis4.
estavam acima do peso, mas que tiveram um ganho de
peso até a uma taxa de 1,1 a 2,2 kg por ano, nos cinco
Recomendações de ganho de peso na
anos antes da gravidez, aumentaram o risco de DMG,
gestação
sugerindo que a prevenção do ganho de peso entre as
mulheres que planejam engravidar poderia reduzir o Há quase duas décadas, o Institute of Medicine (IOM)
risco de diabetes gestacional32. Em acréscimo, o risco não divulgava recomendações sobre o ganho de peso ideal
para DMG pode aumentar em mais de 3 vezes entre as durante a gestação. O novo protocolo divulgado em 2009
mulheres que ganharam 10 kg ou mais na idade adulta, incluiu recomendações específicas para todas as mulheres,
em comparação às mulheres com uma variação de peso inclusive aquelas que estão com excesso de peso antes da
de 2,5 kg ou menos. Isto comparado ao peso que tinham gravidez1. Baseado no IMC, o novo protocolo difere do
aos 18 anos, segundo estudo publicado em 2007 sobre anterior ao classificar o estado nutricional5 de acordo com
características de peso e altura em relação ao Risco de as categorias de IMC proposta pela Organização Mundial de
Diabetes Mellitus Gestacional. Nesse estudo, os entrevis- Saúde e não mais nas tabelas do Metropolitan Life Insurance.
tadores pediram para as gestantes relatarem sua altura O novo protocolo inclui taxas específicas e relativamente
sem sapatos, seu peso com a idade de 18 anos, e seu estreitas de ganho de peso durante a gravidez2 para mulheres
peso imediatamente antes da gravidez. O índice de massa com excesso de peso pré-concepção1. No entanto, há falta de
corporal pré-gestacional foi usado para estimar a adipo- evidências sobre a influência do ganho de peso gestacional
sidade. Após o ajuste para fatores das características no desenvolvimento de DMG 33 (Quadro 1).
maternas (idade, raça / etnia e anos de estudo), o risco
de diabetes gestacional foi elevado entre as mulheres que
eram obesas aos 18 anos em comparação às mulheres Quadro 1 – Recomendações do ganho de peso gestacional de acordo
de peso normal (risco relativo (RR) = 4,53, 95 por cento com o estado nutricional.
intervalo de confiança (CI): 1,25, 16,43) 38. IMC (kg/m²) Estado Ganho de peso Ganho de peso
pré-gestacional nutricional (kg) total (kg/sem) no 2º e 3°
Baseado nas evidências científicas sobre a relação entre trimestre
estado nutricional pré-gestacional e DMG, os esforços para ≤ 18,5 kg/m² Baixo peso 12,5 – 18,0 0,51 (0,44-0,58)
reduzir as taxas dessa doença devem continuar se concen-
18,5 – 24,9 kg/m² Normal 11,5 – 16,0 0,42 (0,35-0,50)
trando na redução da prevalência da obesidade entre as
25,0 – 29,9 kg/m² Sobrepeso 7,0 -11,5 0,28 (0,23-0,33)
mulheres em idade fértil. Nesse sentido, a perda de peso
≥ de 30 kg/m² Obesidade 5,0 – 9,0 0,22 (0,17-0,27)
antes da gravidez, quando necessária, é uma estratégia
Fonte: IOM, 20091.
importante que as mulheres podem implementar para evitar 1 De acordo com a IOM (2009), aceita-se um ganho de peso de 0,5 a 2,0 kg
uma gestação de alto risco25,36,38,39. durante o primeiro trimestre da gravidez.

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282
Estado nutricional e diabetes mellitus gestacional

Ganho de peso no DMG e, dessa forma, pode estar relacionado também às complicações
perinatais. Sendo assim, orientações adequadas às pacientes com
Recomendações nutricionais para mulheres com diabetes
sobrepeso, dieta e exercícios com a participação de uma equipe
gestacional, incluindo ganho de peso gestacional, ingestão
multidisciplinar são fundamentais para reduzir esses riscos. No
calórica e composição de macronutrientes e de distribuição,
entanto, o ideal seria que as orientações não ocorressem somente
são baseados em evidência científica limitada43.
durante a gravidez, mas também quando as mulheres planejam
Ganho de peso excessivo especialmente no início da gestação engravidar, dado que muitas devem perder peso antes da gravidez
pode representar um fator de risco modificável para o DMG e para atingir um IMC mais próximo da normalidade.  
precisa de mais atenção dos profissionais de saúde. Em um estudo
com a participação de 341 mulheres que haviam desenvolvido
diabetes gestacional e com 793 outras que não tinham desen- Referências
volvido a doença, foi observado que as mulheres que ganharam 1. Rasmussen KM, Catalano PM, Yaktine AL. New guidelines for
weight gain during pregnancy: what obstetrician/gynecologists
peso mais lentamente (menos de 0,3 kg por semana) tiveram
should know. Curr Opin Obstetr Gynecol. 2009;21(6):521-6.
menor risco de desenvolver diabetes gestacional. Contudo, o risco 2. Saunders C, Bessa TCAA. Assistência nutricional pré-natal. In:
cresceu com o aumento da taxa de ganho de peso. No caso das Accioly E, Saunders C, Lacerda EA, eds. Nutrição em obstetrícia e
mulheres que aumentaram entre 0,3 e 0,4 kg, o risco de desen- pediatria. Rio de Janeiro: Cultura Médica;2005. p.119-44.
3. World Health Organization. Promoting optimal fetal development:
volver diabetes foi 43% maior. Nas mulheres que aumentaram report of a technical consultation. Geneva: WHO; 2006.
mais de 0,4 kg, o risco passou para cerca de 74% 33. 4. Cedergren M. Effects of gestational weight gain and body mass
index on obstetric outcome in Sweden. Int J Gynecol Obstetr.
De acordo com o IOM (2009), as mulheres com peso 2006;93(3):269-74.
considerado normal deverão ganhar no total do tempo de 5. Jensen DM, Ovesen P, Beck-Nielsen H, Molsted-Pedersen L,
gestação entre 11,5 a 16 kg. No estudo supramencionado, Sorensen B, Vinter C, et al. Gestational weight gain and pregnancy
outcomes in 481 obese glucose-tolerant women. Diabetes Care.
os investigadores constataram ainda que as mulheres que 2005; 28(9):2118-22.
excederam essas recomendações tiveram risco 50% maior 6. Dennedy MC, Dunne F. The maternal and fetal impacts of obesity
de desenvolver diabetes gestacional33. and gestational diabetes on pregnancy outcome. Best practice &
research. Clin Endocrinol Metab. 2010; 24(4):573-89.
Ao relacionar o ganho de peso da gravidez e a tolerância à 7. Doherty DA, Magann EF, Francis J, Morrison JC, Newnham JP. Pre-
glicose entre mulheres negras e brancas, na Carolina do Norte/ pregnancy body mass index and pregnancy outcomes. Int J Gynaecol
Obstetr. 2006;95(3):242-7.
EUA, foi verificado que peso pré-gravídico esteve fortemente 8. Callaway LK, Prins JB, Chang AM, McIntyre HD. The prevalence
associado a diabetes mellitus gestacional, enquanto o ganho and impact of overweight and obesity in an Australian obstetric
de peso durante a gestação foi associado a tolerância à glicose population. Med J Australia. 2006;184(2):56-9.
9. Jolly MC, Sebire NJ, Harris JP, Regan L, Robinson S. Risk factors for
diminuída somente entre as mulheres acima do peso44. macrosomia and its clinical consequences: a study of 350,311 preg-
Em outro estudo sobre o ganho de peso durante a gravidez e nancies. Eur J Obstetr Gynecol Reproductive Biol. 2003;111(1):9-14.
10. Boney CM, Verma A, Tucker R, Vohr BR. Metabolic syndrome in
o risco de hiperglicemia materna, realizado com 1960 mulheres, childhood: association with birth weight, maternal obesity, and
as participantes que mais ganharam peso apresentaram proba- gestational diabetes mellitus. Pediatrics. 2005; 115(3):e290-6.
bilidade maior de tolerância diminuída à glicose na gestação, 11. Morisset A-S, St-Yves A, Veillette J, Weisnagel SJ, Tchernof A, Robi-
taille J. Prevention of gestational diabetes mellitus: a review of studies
mas não ao diabetes mellitus gestacional45.
on weight management. Diabetes Metab Res Rev. 2010;26(1):17-25.
Uma pesquisa publicada recentemente apontou que o IMC 12. Chu SY, Callaghan WM, Kim SY, Schmid CH, Lau J, England LJ,
pré-gestacional e o ganho de peso no primeiro trimestre foram et al. Maternal obesity and risk of gestational diabetes mellitus.
Diabetes Care. 2007; 30(8):2070-6.
identificados como fator de risco independente e significativo 13. Fernández Yagüe C. Diabetes and gestation. Rev Enferm. (Barcelona,
para o DMG e, por isso, merecem mais atenção clínica46. Spain). 2004; 27(12):12-6.
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A recomendação de energia proposta para gestantes com Disponível em: http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/12017686
DMG é ainda contraditória, porém é consenso que a energia 15. Metzger BE, Buchanan TA, Coustan DR, Leiva A, Dunger DB,
recomendada deve prover o ganho de peso adequado e que Hadden DR, et al. Summary and recommendations of the Fifth Inter-
national Workshop-Conference on Gestational Diabetes Mellitus.
dietas com restrições importantes de energia não são acon- Diabetes Care. 2007;30(Suppl 2):S251-60.
selhadas, pois podem determinar a cetonúria. Por outro lado, 16. Plagemann A, Harder T, Dudenhausen JW. The diabetic pregnancy,
alguns autores relatam que restrição moderada (até 30% das macrosomia, and perinatal nutritional programming. Nestlé Nutri-
tion workshop series. Paediatric Programme. 2008; 61:91-102.
necessidades estimadas) de energia, em média 25 kcal/kg, em 17. Ben-Haroush A, Yogev Y, Hod M. Epidemiology of gestational
gestantes obesas (IMC>30 kg/m2), mantém a normoglicemia, diabetes mellitus and its association with Type 2 diabetes. Diabetic
sem elevação plasmática de ácidos graxos livres ou cetonúria47, 48. Med. 2004; 21(2):103-13.
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Local de realização do trabalho: Universidade da Região de Joinville (UNIVILLE), Joinville, SC, Brasil.

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Terapia nutricional em paciente com tuberculose e gastrectomia: relato de caso

Instruções aos Autores

REVISTA BRASILEIRA DE NUTRIÇÃO CLÍNICA


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Reproduzimos abaixo alguns exemplos mais comuns de referências empregadas nos
Estrutura do Artigo
artigos. Outros modelos podem ser acessados no site: http://www.nlm.nih.gov/bsd/
A RBNC adota os Requisitos de Vancouver - Uniform Requirements for Manuscripts Sub-
uniform_requirements.html
mitted to Biomedical Journals, organizadas pelo International Committee of Medical Journal
Editors - “Vancouver Group”, disponíveis em www.icmje.org. A obediência às instruções é
Modelos de referências
condição obrigatória para que o trabalho seja considerado para análise.
a) Página de Rosto
– Artigo padrão
b) Resumo e Palavras-chaves (unitermos, keywords) em Português e Inglês
c) Manuscrito Burjonrappa SC, Miller M. Role of trace elements in parenteral nutrition support of the
d) Referências surgical neonate. J Pediatr Surg. 2012;47(4):760-71.
e) Tabelas e Figuras
f) Lista para conferência (Check-List) – Artigo com mais de 6 autores
Moriya T, Fukatsu K, Maeshima Y, Ikezawa F, Hashiguchi Y, Saitoh D, et al. The effect of
1. Página de Rosto adding fish oil to parenteral nutrition on hepatic mononuclear cell function and survival
Deve assinalar o título do artigo, que não deve ultrapassar 150 caracteres. after intraportal bacterial challenge in mice. Surgery. 2012;151(5):745-55.
Devem ser informados nome completo dos autores com respectivas titulações, e-mail e
serviço ao qual estão vinculados, nome e endereço completo do autor correspondente – Artigo cujo autor é uma organização
(não esquecer telefone, celular e fax). Deve ser informada a instituição em que o trabalho Diabetes Prevention Program Research Group. Hypertension, insulin, and proinsulin in
foi desenvolvido. participants with impaired glucose tolerance. Hypertension. 2002;40(5):679-86.
Caso o trabalho tenha sido apresentado em congresso, devem ser mencionados: nome
do evento, local e data da apresentação. Acrescentar contagem de palavras do Resumo, – Livro padrão
e do Manuscrito, bem como número de Tabelas, Figuras e Anexos. Braunwald E, Zipes DP, Libby P, Bonow R. A textbook of cardiovascular medicine. 8th ed.
Philadelphia: Saunders Elsevier; 2008.
2. Resumo e Palavras-chaves
Os resumos devem ser estruturados (Introdução, Método, Resultados, Conclusões) e – Capítulo de livro
não devem exceder a 250 palavras. Meltzer PS, Kallioniemi A, Trent JM. Chromosome alterations in human solid tumors. In:
Nesta mesma página, devem ser incluídos 3 a 10 unitermos (palavras-chaves) que de- Vogelstein B, Kinzler KW, eds. The genetic basis of human cancer. New York: McGraw-
finam o assunto do trabalho, assim com a respectiva tradução para o inglês (keywords). Hill; 2002. p.93-113.
Esses unitermos podem ser consultados nos endereços eletrônicos: http://decs.bvs.br/
que contém termos em português, espanhol ou inglês, ou www.nlm.nih.gov/mesh, para – Website
termos somente em inglês. Brasil. Ministério da Saúde. DATASUS. Mortalidade para causas selecionadas – 2006
[Internet]. Brasília; 2007 [citado 2010 jul. 16]. Disponível em: http://www2.datasus.gov.
3. Manuscrito br/DATASUS/index.php
Os manuscritos poder ser submetidos nos idiomas português, inglês e espanhol, obe-
decendo à ortografia vigente, empregando linguagem fácil e precisa e evitando-se a 5. Tabelas e Figuras
informalidade da linguagem coloquial. Todas as figuras e tabelas devem ser numeradas sequencialmente, em algarismos arábicos,
Os manuscritos devem ser divididos em Introdução, Método, Resultados e Discussão. seguindo sua ordem de citação.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 285-6


285
Francisqueti FV & Pereira PCM

As tabelas devem ser apresentadas apenas quando necessárias para a efetiva compreensão que os autores se responsabilizam pela veracidade das informações. Caso um ou mais
do trabalho, não contendo informações redundantes já citadas no texto. autores possua conflito de interesse seu nome, da empresa e a natureza do vínculo ou
O corpo do texto deve trazer a indicação de onde as tabelas e figuras deverão ser inseridas. benefício deverão ser informados. Na hipótese contrária, deverá ser esclarecido que
As figuras e tabelas devem vir acompanhadas de suas respectivas legendas. Os símbolos e nenhum dos autores possui conflito de interesse. É proibida a inserção de qualquer texto,
abreviações empregados devem ser explicados na primeira vez em que utilizados, tanto figura ou esquema obtidos da internet, salvo aqueles acompanhados de permissão escrita,
no texto quanto nas tabelas. ou mediante comprovação de que se trata de portal de livre acesso. Fica ressalvada a
citação de artigos ou portais eletrônicos científicos, devidamente referenciados na seção
6. Lista para Conferência (Check List) Referências.
É Indispensável a submissão da Lista de Conferência (Check List juntamente com o ma- Todos os manuscritos publicados tornam-se propriedade permanente da Revista Brasileira
nuscrito, contendo todos os itens aplicáveis devidamente assinalados. A mesma precisará de Nutrição Clínica e não podem ser publicados sem o consentimento por escrito de
ser escaneada após o preenchimento. Os itens do Check List são listados abaixo: seu editor.
a) Contagem de palavras: Resumo; Os trabalhos submetidos à RBNC não devem estar sendo simultaneamente submetidos
b) Contagem de palavras: Manuscrito; a outro periódico e nem devem ter sido publicados anteriormente, com conteúdo
c) Número de Tabelas e Figuras; semelhante ao apresentado à RBNC. Caso os autores desejem inserir tabela, gráfico ou
d) Número de Anexos; outro material publicado anteriormente, deverá ser anexada autorização assinada por
e) Nome, titulação, serviço e e-mail atualizado dos autores; representante legal da editora da Revista ou Livro em questão, permitindo a utilização
f) Nome e endereço completo do autor correspondente; pela RBNC. Em se tratando de protocolo ou rotina de Hospital ou Instituição Acadêmica,
g) Declaração de Conflito de Interesse;
documento equivalente autorizando a transcrição deverá ser providenciado.
h) Termo de Cessão de Direitos Autorais assinado por todos os autores;
i) Aprovação ética informada no texto;
Pesquisa com Seres Humanos e Animais
j) Cópia da aprovação do estudo pela Comissão de Ética;
Os estudos envolvendo humanos e animais devem informar, no item Método, o nome
k) Permissão para publicação de fotos e tabelas e outros materiais, quando apli-
cável; da Comissão Ética Institucional que aprovou o protocolo (enviar declaração assinada que
l) Título, resumo estruturado e unitermos em português e inglês; aprova a pesquisa), consoante à Declaração de Helsinki revisada em 2000 [World Me-
m) Manuscrito estruturado com páginas numeradas; dical Association (www.wma.net/e/policy/b3.htm)] e da Resolução 196/96 do Conselho
n) Referências até 20 formatadas corretamente, e excluindo resumos e comuni- Nacional de Saúde (http://conselho.saude.gov.br/resolucoes/reso_96.htm).
cações não convencionais; Na experimentação com animais, os autores devem seguir o CIOMS (Council for Inter-
o) Legendas das figuras inseridas após a seção Referências, com prévia indicação national Organization of Medical Sciences) Ethical Code for Animal Experimentation (WHO
do local de inserção no texto; Chronicle 1985; 39(2):51-6) e os preceitos do Colégio Brasileiro de Experimentação
p) Tabelas inseridas ao final, sempre numeradas e com título, com prévia indicação Animal - COBEA (www.cobea.org.br). O Corpo Editorial da Revista poderá recusar
do local de inserção no texto; artigos que não cumpram rigorosamente os preceitos éticos da pesquisa, seja em hu-
q) Figuras numeradas e submetidas uma a uma. manos seja em animais. Os autores devem identificar precisamente todas as drogas e
substâncias químicas usadas, incluindo os nomes do princípio ativo, dosagens e formas de
POLÍTICA EDITORIAL administração. Devem, também, evitar nomes comerciais ou de empresas.
Fotos de pacientes só poderão ser incluídas mediante nome, documento e assinatura do
Avaliação pelos pares (peer review) envolvido autorizando publicação, mesmo que os olhos estejam vendados ou o rosto
Previamente à publicação, todos os artigos enviados à RBNC passam por processo de desfocado.
revisão e arbitragem, como forma de garantir seu padrão de qualidade e a isenção na
seleção dos trabalhos a serem publicados. Inicialmente, o artigo é avaliado pela secretaria, Política para Registro de Ensaios Clínicos
para verificar se está de acordo com as normas de publicação e completo. Após verifica- A Revista Brasileira de Nutrição Clínica, em apoio às políticas para registro de ensaios
ção estrutural inicial, será acusado o recebimento por e-mail com a devida numeração, clínicos da Organização Mundial de Saúde (OMS) e do International Committee of Medical
iniciando-se o processamento editorial. Todos os trabalhos são submetidos à avaliação Journal Editors (ICMJE), reconhecendo a importância dessas iniciativas para o registro e
pelos pares (peer review) por pelo menos três revisores selecionados dentre os membros divulgação internacional de informação sobre estudos clínicos, em acesso aberto, somente
do Conselho Editorial. A aceitação é baseada na originalidade, significância e contribuição aceitará para publicação artigos de pesquisas clínicas que tenham recebido um número
científica. Os revisores preenchem um formulário, no qual fazem uma apreciação rigorosa de identificação em um dos Registros de Ensaios Clínicos validados pelos critérios esta-
de todos os itens que compõem o trabalho. Ao final, farão comentários gerais sobre o belecidos pela OMS e ICMJE, disponível no endereço: http://clinicaltrials.gov ou no site
trabalho e opinarão se o mesmo deve ser publicado, corrigido segundo as recomenda- do PubMed, no item. O número de identificação deve ser registrado ao final do resumo.
ções. De posse desses dados, o editor toma a decisão final. Em caso de discrepâncias
entre os avaliadores, pode ser solicitada uma nova opinião para melhor julgamento. Critérios de Autoria
Quando são sugeridas modificações pelos revisores, as mesmas são encaminhadas Sugerimos que sejam adotados os critérios de autoria dos artigos segundo as recomen-
ao autor principal e, a nova versão encaminhada aos revisores para verificação se as dações do International Committee of Medical Journal Editors. Assim, apenas aquelas
sugestões/exigências foram atendidas. Em casos excepcionais, quando o assunto do pessoas que contribuíram diretamente para o conteúdo intelectual do trabalho devem
manuscrito assim o exigir, o Editor poderá solicitar a colaboração de um profissional que ser listadas como autores.
não conste da relação do Conselho Editorial para fazer a avaliação. Todo esse processo
Os autores devem satisfazer a todos os seguintes critérios, de forma a poderem ter
é realizado por e-mail.
responsabilidade pública pelo conteúdo do trabalho:
O sistema de avaliação é o duplo cego, garantindo o anonimato em todo processo de
• ter concebido e planejado as atividades que levaram ao trabalho ou interpretado
avaliação. A decisão sobre a aceitação do artigo para publicação ocorrerá, sempre que
possível, no prazo de três meses a partir da data de seu recebimento. As datas do re- os resultados a que ele chegou, ou ambos;
cebimento e da aprovação do artigo para publicação são informadas no artigo publicado • ter escrito o trabalho ou revisado as versões sucessivas e tomado parte no
com o intuito de respeitar os interesses de prioridade dos autores. Assim que uma processo de revisão;
decisão de Aceitação, Revisão ou Rejeição for alcançada, o autor correspondente será • ter aprovado a versão final.
informado eletronicamente. Pessoas que não preencham os requisitos acima e que tiveram participação puramente
Os editores se reservam o direito de editar e revisar os textos dos trabalhos aceitos, a fim técnica ou de apoio geral podem ser citadas na seção Agradecimentos.
de adaptá-los ao formato da Revista, remover redundâncias e deixar os textos mais claros
e compreensíveis, sem alterar o significado e o conteúdo dos trabalhos. Os manuscritos Publicações Urgentes
com edição substancial serão enviados ao autor correspondente para aprovação por via A Revista desencoraja submissões com prazo restrito, porém, em circunstâncias excepcio-
eletrônica, sendo que a falta de manifestação imediata será entendida como aprovação. nais, a exemplo de algumas publicações nacionais, tal será permitido mediante pagamento
da taxa de urgência de R$ 600,00 (seiscentos reais) ou USD 400,00 (quatrocentos dólares
Direitos Autorais e Responsabilidade pelo Conteúdo do Artigo americanos), em nome da SBNPE. Note-se que o pagamento da taxa enseja apenas
O texto dos trabalhos é de inteira responsabilidade dos autores que o assinam. Assim, ao prioridade no processamento, não garantindo aceitação do estudo.
enviar uma submissão, esta deverá vir acompanhada de uma autorização para a publicação As publicações urgentes que forem analisadas pelo Conselho Editorial e devidamente
do trabalho e cessão de direitos autorais para a RBNC, constando local, data e assinatura aprovadas serão impressas no primeiro número hábil que se seguir. Note-se que inde-
original de todos os autores. No texto deve constar que todo conteúdo, incluindo gráficos pendentemente de qualquer taxa, a Revista buscará a agilização de todas as publicações,
e figuras, é próprio ou devidamente autorizado conforme documentação anexa, sendo não existindo motivação para retardar ou prejudicar o andamento de qualquer submissão.

Rev Bras Nutr Clin 2012; 27 (4): 285-6


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