Beruflich Dokumente
Kultur Dokumente
[f. I]
Viagem da Fortaleza a Aracati
Agosto
16: Terça-feira, 16 de agosto, saímos da casa onde tem
residido a comissão, pelas quase cinco horas da tarde, eu, o
Lagos e o Carvalho, com os nossos ordenanças. Obsequia-
ram-nos acompanhando até o rio Cocó o Exmo. presidente
da província, o Dr. Gabaglia e seus adjuntos: Soares, Bar-
bado, Borja Castro, Lassance e Assis, que o acompanhou,
faltando o Sr. Santos Souza, por estar em Arronches, o Oli-
veira, o Bezerra e seu genro.
Chegamos a Messejana às seis horas e meia, indo co-
nosco O Dr. Assis. Logo que chegamos nos apresentamos ao
suplente de subdelegado, que estava em camisa e ceroula, na
frente de sua taberna. Depois fomos a um sujeito chamado
João Crisóstomo, que é da cidade e aí está tomando ares, com
44
sua fan1ília; este nos recebeu mui bem , nos ofereceu a sua
casa e quanto precisássemos, quis que fôssemos tomar ch á
com ele, mas como hesitássemos ofereceu-se para o mandar
à casa da Câmara onde íamos pousar. D epois de conversar
algum tempo fomos para a Câmara, onde armamos as redes;
tomamos o chá e mais uma frigideira que o Assis mandou
preparar em casa de outro sujeito que nos tinha ido encon-
trar (assim o pensamos) em casa oferecendo-se para tratar
dos nossos animais aquela noite, o que aceitamos; mante-
ve-se sempre zeloso em servir-nos, mas nos pareceu homem
interesseiro e ladino. De manhã, estando já encomendado
o almoço a esse sujeito, nos mandou convidar para almoçar
com ele o Sr. João Crisóstomo, o que não aceitamos, visto
ter já o almoço aprontando-se. Veio logo de manhã visitar-
nos o subdelegado, o Sr. João Crisóstomo e um padre que
serve ali de vigário.
O Sr. João Crisóstomo demorou-se e assistiu ao nosso
almoço, mandando a sua casa buscar leite, que nos faltava.
Era nossa tenção seguirmos de tarde para o Aq uiraz, mas
acontecendo falar-se na viagem ele e o tal ladino nos dis-
seram que o caminho pelo Aquiraz tinha para o comboio
inconvenientes, tendo de passar o rio Pacoti, que só ofere-
cia uma trilha vadeável, sendo para os lados fundo; e enfim
havia ainda a passagem [f. 2] do rio Catu, inevitável indo
por ali, e que só embarcando se fazia. Isto nos surpreendeu,
por nunca nos falarem nessas dificuldades, e tendo um lote
de 30 e tantos cavalos carregados com malas pesadas, deli-
45
Água da Jacarecanga
Tainhas do Cocó
Cunhás de Parangaba (Arronches)
Farinha do Tipuiú.
1
OO$ [ J 00 rnil-réisL e qu e tudo se es banjou. Isto é o guc
aIi co rn cn rararn.
A res peito da expul são dos jes uítas contou -nos urn ve-
lh o qu e 3 í cem um a venda, e que conta hoje 89 anos, qu e a
ord em chegou na véspera de Natal e que nessa mes ma noite
fora o col égio cercado e nel e estavan1 juntos todos os jes u-
ítas, donde se presume que eles sabiam dos negócios. O s
padres estavam. sempre espalhados, havendo dois em Arron-
ches, dois na Matriz, dois em Soure etc., e nessa noite todos
estavam reunidos. O convento cercado por tropa, os padres
disseram missa, ou antes diziam missa, porque estiveram as-
sim presos por 15 dias, tendo se1npre duas sentinelas à vista.
Embarcaram no porto do Iguape, que pouco depois se obs-
truiu. A sentença da expulsão dos jesuítas, escrita em latim e
em português, está transcrita no livro da Matriz, onde Lagos
a VlU.
De madrugada Ievant
ou-se urna ventania .
logo de chuva que e l ., que se seguiu
oava pe os telhad
alha e outra de t Ih . , os, que eram n1 etad e d e
P e a, nos com 0 st ,
. fi ' e avamos na parte telha-
da , nem assim camos isentos d o- • .
as o 0 teiras; rnutta da nossa
carga fi cou molhada. Ao rom d .
. per O dia cessou a eh uva e o
combo10 tratou logo de sair N,
. . , · os, a sa 6er, eu, Lagos e Car-
valho .e os dois ordinario s fi camos para almoçar; o almoço
nos veio da casa do don 0 d ara c,b nca
· e constou de café, antes
água de café, e de uma [f· 12] d,uz1a • d e ovos, que em vez de
quentes estavam cozidos e nos foram apresentados dentro de
um prato de rosto. Comemos os ovos com os b~ijus que nos
ficaram da véspera, eram quase crueiras, e bebemos em cima
a água suja de café. Já então estava de novo a casa de farinha
cheia da mesma gente da véspera, que continuava a sua la-
butação. Às nove horas montamos a cavalo e seguimos para
o Pirangi. Era todo o caminho bordado de matas virgens, ou
capoeiras, que se não diferencia deles, e que se parecem com
as nossas capoeiras. Às 11 horas mais ou menos chegamos ao
vale do Pirangi: é um vale largo semelhante ao do Pacoti, co-
berto de carnaúbas e pelo qual passa o rio desse nome, divi-
dido em crês ramos; rodos estavam secos, apenas em alguns
lugares havia poções duma água barrenta. Saindo desse vale
demos em uma grande vargem chamada vargem da Serra,
no meio da qual está a situação onde íamos pousar.
O dono da casa nos apareceu em camisa e ceroula, nos
• andou ou antes foi armar
agasalhou com boas maneiras, m
,. d e · h e mandou aprontar almoço; este
rres redes na casa e rann a
58
ca rregados de fabór zo
• ,, e a .
. 'd , ss1rn por d.
sua rusttcl ad e disco rna . b ern iante. Mas no meio • de
Tem creio que 12 filh os , seis . fiA
e mostrava muito bo m senso.
e emeas e s · h
nos, que roram os que ei s rnac os; os meni-
se mostraram (a
[f. 14] as víamos na p d s meninas e mulh eres
ona a cozinh
farinha onde estávam ª que dava para a casa de
os, e onde al
sem nos falarem me guma moradora (en tramas
, nos um a pecurru h ) l
bém apareceu de vez e ª e a mu her tam-
em quando)· os m . d .
maior terá 16 ano - . ' eninos, os quais o
s, sao mu1 ágeis. e d esem baracados· quando
c h egou a nossa bagagem for . , '
, l ' am ªJudar a descer as cargas e a
carrega- as,
, .mas tem O pai. gran d e desgosto, por serem mui
ru d es. Ha cinco ou seis
· meses que têm mestre e nem ainda
soletram bem um nome , e i·sro to d os eles.
Aconselhei-lhe que os nao
- atormentasse com panca-
das, como fazia o mestre, que tivesse paciência, não sendo
eles culpados da pouca inteligência; e que em vez de bolos
de palmatória lhes desse antes bolos de aveias ou de milho
em prêmio quando dessem boa lição; isto causou-lhe certa
surpresa e disse rindo - e para o mestre, que estava presente
-: "Vou mandar vir uma carga de rapaduras para dar os me-
ninos", o que causou riso geral na companhia - havia entre
muitas pessoas em roda. Eram rodos matutos , mas espertos e
curiosos, examinando e admirando as espingardas e pistolas
que levava o Lagos. Era de noite e nós não tínhamos jantado,
esperando que O
nosso homem nos desse de comer, mas ele
(que passa por sovina) , rendo-me perguntado se nós rrazía-
mos comida e eu lhe dissesse que sim, descansou; mandou-
60
nos pois assaz presunto e fazer farofa, com que ceamos, e ele
nos mandou um bule da água suja de café, temperado com
rapadura. No dia seguinte me pediu desculpa de não nos
ter dado jantar. De manhã cedo nos aprontamos para sair,
el e ofe receu-se para ir [f. 15] com o Lagos a sua roça [pala-
vra cortada] ver os estragos da lagarta nos mandiocais e dali
levá-lo a ver um serrote que tem muitas e variadas pedras.
E como nos não oferecesse almoço nem café, comemos um
pouco de presunto cru com farinha e queijo e montamos a
cavalo às sete horas, eu com o comboio e o Lagos com ele;
designado o s.ítio da Amarela para nos reunirmos. Andamos
por pedaços de estrada arenosa, reta e bordada de vistosas
matas, que faziam um belo efeito; e a manhã era fresca.
Chega1nos aos córregos da Amarela, onde há uma pa-
lhoça. Os córregos estavam secos, são dois leitos de torren-
tes, com largura de 30 a 40 braças, que se encontram neste
Iugar; tornando em uma vargem larga que vai ter a uma la-
goa chamada Amarela, ou das Amarelas, seja porque a água
é amarelada, ou porque é essa lagoa cheia de pedras de cor
atnarela, e de que vimos algumas nos leitos secos das torren-
tes; é essa vargem coberta de carnaúbas. No encontro dos
chamados córregos fica utn alto ou espécie de promontório
etn ci1na do qual está a palhoça de que falei. Esta palhoça
tem ao lado um pequeno curral, onde havia uma porção de
cabras presas, e ao pé do cercado uma outra palhoça toda
aberta onde era a casa de farinha. Chegamos aí seriam nove
horas, o sol já queitnava.
6J