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Diário de Viagem de

Francisco Freire Alemão


Fortaleza-Crato, 1859
/43

Viagem de Fortaleza a Aracati


16 a 24 de agosto de 1859
[l-28,8,2]

[f. I]
Viagem da Fortaleza a Aracati
Agosto
16: Terça-feira, 16 de agosto, saímos da casa onde tem
residido a comissão, pelas quase cinco horas da tarde, eu, o
Lagos e o Carvalho, com os nossos ordenanças. Obsequia-
ram-nos acompanhando até o rio Cocó o Exmo. presidente
da província, o Dr. Gabaglia e seus adjuntos: Soares, Bar-
bado, Borja Castro, Lassance e Assis, que o acompanhou,
faltando o Sr. Santos Souza, por estar em Arronches, o Oli-
veira, o Bezerra e seu genro.
Chegamos a Messejana às seis horas e meia, indo co-
nosco O Dr. Assis. Logo que chegamos nos apresentamos ao
suplente de subdelegado, que estava em camisa e ceroula, na
frente de sua taberna. Depois fomos a um sujeito chamado
João Crisóstomo, que é da cidade e aí está tomando ares, com
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sua fan1ília; este nos recebeu mui bem , nos ofereceu a sua
casa e quanto precisássemos, quis que fôssemos tomar ch á
com ele, mas como hesitássemos ofereceu-se para o mandar
à casa da Câmara onde íamos pousar. D epois de conversar
algum tempo fomos para a Câmara, onde armamos as redes;
tomamos o chá e mais uma frigideira que o Assis mandou
preparar em casa de outro sujeito que nos tinha ido encon-
trar (assim o pensamos) em casa oferecendo-se para tratar
dos nossos animais aquela noite, o que aceitamos; mante-
ve-se sempre zeloso em servir-nos, mas nos pareceu homem
interesseiro e ladino. De manhã, estando já encomendado
o almoço a esse sujeito, nos mandou convidar para almoçar
com ele o Sr. João Crisóstomo, o que não aceitamos, visto
ter já o almoço aprontando-se. Veio logo de manhã visitar-
nos o subdelegado, o Sr. João Crisóstomo e um padre que
serve ali de vigário.
O Sr. João Crisóstomo demorou-se e assistiu ao nosso
almoço, mandando a sua casa buscar leite, que nos faltava.
Era nossa tenção seguirmos de tarde para o Aq uiraz, mas
acontecendo falar-se na viagem ele e o tal ladino nos dis-
seram que o caminho pelo Aquiraz tinha para o comboio
inconvenientes, tendo de passar o rio Pacoti, que só ofere-
cia uma trilha vadeável, sendo para os lados fundo; e enfim
havia ainda a passagem [f. 2] do rio Catu, inevitável indo
por ali, e que só embarcando se fazia. Isto nos surpreendeu,
por nunca nos falarem nessas dificuldades, e tendo um lote
de 30 e tantos cavalos carregados com malas pesadas, deli-
45

bamos imediatamente os segu ir, • e mand


• ou-nos
nossos cavalos e, d epo1s de nos d . aprontar os
. , esped1rmos dO
do João Cnsosromo (o vigári subdelegado
o morava fora d0
artimos eram 11 horas e um q ( povoado),
P uano o Dr A . .
mais cedo para a cidade). Era O sol b · ssis tmha saído
astan te forte e
roda de areia, passamos O rio C ª estrada
. y· . ' . auaçu por duas pontes 0
no 1pu1u por uma ponte; neste lu a , '
.d g r e a terra arenosa e
denegn a, e produz muito boa m d·
an toca e a sua farinha foi
afamada em outros tempos como
. o atesta uma quadrinha
popular da cidade.

Água da Jacarecanga
Tainhas do Cocó
Cunhás de Parangaba (Arronches)
Farinha do Tipuiú.

E vimos nas vizinhanças do rio roça da mandioca.


E à uma hora chegamos ao vale do Pacori.
É uma larga vargem, mui plana de barro denegrido,
agro-seco e rachado, pelo meio da qual se espreguiça fazendo
gepos [sic] e dividindo em dois ramos o rio Pacori - destes
ramos só um, que passa perto do morro do Aquiraz, é que
tinha água; no lugar onde passamos reria de largura umas
cinco ou seis braças e água até dois palmos, e só na ribeira
ºP 0st ª o barro negro fazia atoleiros, que ofereciam alguma
dificuld ad e ao passar. A nossa tropa, ou com boio · con10 aqui
dizem ·, E 1 d rio coberto de
, Ja estava descarregada. ste va e O '
-
46

, ,. . coda a sua ex tensão, tem em fren te do Aqu·


ca rnau 6,1s en1 lraz
•, le'o-ua de largo e é limitado pelo lado da vila
ralvez meu o por
. d·- de oiteiros arenosos, além dos quais e em exc en-
un1 co r <l 0

são talvez de mais de légua está o mar; o rio porém, fazen do


volras encostado a esses oiteiros, as vai romper longe dai,
fo rmando barra a três léguas ao nordeste do Aquiraz. E no
rempo das chuvas fica todo coberto d' água, formando um
vasto lagamar.
[f. 3] Há feito um aterrado que o corta em linha reta
do Aquiraz à entrada do vale, e que havia ponte na passa-
gem do rio, mas o rio a levou e hoje se não passa por esse
aterrado, ficando a passagem tomada no tempo das cheia.s
ou passando-se com muitos riscos, ou em balsas. Aquiraz
está, como já disse, sobre a esplanada dum vasto combro de
areias, que se comunica com os medões que formam os ta-
buleiros daí até o mar com duas a três léguas de largo. Logo
que chegamos, fomos para a casa da municipalidade onde
estava já a nossa bagagem e nos informamos das autoridades
do lugar: o subdelegado não estava e fazia as suas vezes o
suplente, que fomos logo cumprimentá-lo achando-o n1ui-
to à fresca em uma mui pequena casa de comércio, a loja,
antes armarinho; daí fomos ao juiz municipal, o Sr. Alcino
de tal, o qual achamos no seu engenho e assentando um
alambique. Tem a família em um sobradinho do engenho
e tem uma sala particular onde recebe, limpa e ordenada:
por aí nos conduziu e nos demoramos pouco. Este engenho
é uma bºª 1r/6 · com moendas de ferro e é o segun do que
ª nca
17

. H>.S ,:1 qui a qu e se pock dar O nom<.: de.: _ . h


v111 tngcn o; l <.:~te.: t 0
1. Monguba.
(, .1
I)c tarde sJÍmos a vi sitar a povo· : ,
pc:q u<.: -
açao, Cjuc t
c dccadcn rc, pass~unos rx la Matriz , f. .
nn r , e omos exam1nar
. ~· ruínas dJ igreja do s jes uítas , que eles cham
,1J · am co J1.egw
.

e qttl' está dentro das ce rcas do engen ho do Sr. Alcin o. A


igreja era de boas proporções, com paredes de pedra e cal,
port::idos de crintaria t adornos cm relevo _ tem a era de
l 753 . O claustro não se chego u a fazer, havend o ao lado
direito (e prova11elmente ao esq uerdo, que não vi) pedras de
espera par;:i essa obra. A casa dos jes uítas, ao lado da igreja e
comunicando com ela, era de esteios de aroeira, de um resto
ainda à sapota; os mais, assim como os outros materiais,
foram tirados e os quatro esteios que atualmente sustentam
os dois sinos da Matriz foram provavelmente tirados dele.
A igreja está sem teto e [de] todo desornada; as imagens
foram depositadas na Matriz. O chão da igreja e do claus-
tro tem sido revolvido profundamente pelo povo, e talvez
pelas autoridades, cuidando acharem-se ali tesouros [f. 4]
escondidos pelos padres, quando foram extintos. Foi um
verdadeiro vandalismo o desmantelamento desse templo,
que se devia conservar. Diz-se que foi no tempo da pre-
sidência do senador Alencar que se começou essa obra de
destruição e as más línguas asseveram que algumas coisas
foram para a sua fazenda, o que não posso acreditar; depois
foi outro presidente cujo nome me não lembro que man-
dou tirar a telha e madeiras do teto, dando para isso SO ou
18

1
OO$ [ J 00 rnil-réisL e qu e tudo se es banjou. Isto é o guc
aIi co rn cn rararn.
A res peito da expul são dos jes uítas contou -nos urn ve-
lh o qu e 3 í cem um a venda, e que conta hoje 89 anos, qu e a
ord em chegou na véspera de Natal e que nessa mes ma noite
fora o col égio cercado e nel e estavan1 juntos todos os jes u-
ítas, donde se presume que eles sabiam dos negócios. O s
padres estavam. sempre espalhados, havendo dois em Arron-
ches, dois na Matriz, dois em Soure etc., e nessa noite todos
estavam reunidos. O convento cercado por tropa, os padres
disseram missa, ou antes diziam missa, porque estiveram as-
sim presos por 15 dias, tendo se1npre duas sentinelas à vista.
Embarcaram no porto do Iguape, que pouco depois se obs-
truiu. A sentença da expulsão dos jesuítas, escrita em latim e
em português, está transcrita no livro da Matriz, onde Lagos
a VlU.

18: Apresentados na casa da Câmara, aí dormimos; e


ao amanh ecer do dia 18 caiu alguma chuva (o céu se car-
regou e começaram a cair pancadas de chuva mui fortes;
as nossas malas ou bolsas estavam na rua a apanhar roda a
chuva que, continuando até além das dez horas , obrigou a
ficar ar'é à tarde).
Às sete horas e tneia partiu o cornboio, fazendo um ro-
deio para evitar a passagem por canoa do rio Catu, designan-
do-se-lhes o Cajueiro do Ministro para pouso, mas usando
o ca1ninho seguirain ae,e eascavel. N os
, fi camos em Aquiraz,
.
0
Reis fez O desenho da Matri z e do col égio, Lagos tomou
49

mwras notas de tradições do lu .


, • ) ..L gar. Os l1v d
(anre.s armano ua l\1unicipal' d d ros o Arquivo
I a e nos for fr
mas de pouco [f. ;J nos servir am anqueados,
. am, por não e . . .,
mais anngos. XIsurem Ja aí os
A casa da Câmara é um d ..
par 1e1ro de telha -
ladrilhado e o seu madeiramen , d va, apenas
, l , d . to e e carnaúbas (uma coisa
nocave e que aqui para Aracatí O m d .
. . ª eiramenro dos tetos
digo , os caibros de carnaúba não - J . '
sao pe a ma10r parte=-: em
bicas , onde se assentam os canos dos Jh d
. te a os, mas os canos
são assentados nos intervalos dos caib ros, que sao
, de car-
naúbas rachadas , .postas com o miolo para baixo
· ou mesmo
para cima destes telhados; tinha visto um na cidade, na sala
de jantar da casa em que aí mora o Sr. Franklin de Lima. E
uma razão ouvi para isso que me parece plausível, e é que,
se uma telha dos canos se quebra, é logo vista e substituída,
quando do outro modo não se vê e a água caindo na bica de
carnaúba a apodrece.
Na véspera às ave-marias tínhamos ido ver o cacimbáo,
que é um poço grande de boca quadrada, [palavra ilegível] de
pedras e com fundo d' água de talvez 40 palmos. Foi este poço
feiro pelo padre Serafim, missionário que persuadi~ o p~vo ,ª
do Pacoti dai a ues le-
ir buscar pedras para a o bra na barra
, ande represa ou acude.
guas; ao lado desse poço esta uma gr ' .
da tarde quando parnmos
Eram passadas quatro horas d
b uiar várias pessoas o 1u-
de Aquiraz, querendo-nos O seq

.. Na casa em que estamos é de bicas.


50

gar, que nos aco1npanhara1n até a passagcrn do Catu, onde


chegan10s pelas cinco horas, tendo andado por tabuleiros
onde há alguns engenhos de açúcar. A passagem do C~atu é
un1 grande lagamar tortuoso, que tem. também algumas lé-
guas e formado pela obstrução da barra do rio; o lugar onde
passa.mos em canoa é o 1nais estreito e muito fundo: cem de
largura 50 a 60 braças, os cavalos passan1 ao lado, a paisagem
é bela e Carvalho a desenhou. Passados nós voltaram os qua-
tro cavaleiros que nos aco1npanharam e nós seguimos para o
Cajueiro do Ministro, onde chegamos talvez às sete horas da
noite, tendo perto desse lugar passado uma capanga onde os
cavalos quase nadaram, e isto era já noite.
Capanga cha1nam a poços mais ou menos fundos e
seguidos uns dos outros. Não achamos aí a nossa bagagem,
que depois soubemos que seguiu para Cascavel por errarem
[f. 6] o caminho. O dono deste sítio é um sujeito de uns
50 anos de idade, baixo, barrigudo, conversador, de camisa
sobre as ceroulas e casado pela segunda vez com uma moce-
tona morena e de belos olhos; é n1ajor da Guarda Nacional.
Recebeu-nos com afabilidade, deu-nos ceia de carne
seca com farofa, água de café com grude, isto é, beiju de
tapioca e coco - é [na] verdade o que nós chamamos sola,
menos o coco - e umas broinhas de ovos bem feitos, queijo
duro etc. etc.; mandou-nos logo estender redes, mas nada
de água para banho e para os pés, é coisa quase desconhe-
cida pelas roças no Ceará. Dormimos, e ao amanhecer caiu
uma ligeira neblina, ou chuva fina. A casa do nosso hóspede
51

é pequena, térrea, ladrilhada e telha vã, está pegada com a


casa de farinha, que é u1n largo telheiro, apenas com paus-
a-pique em alguns lugares, roda de cevar com rodete como
é geral aqui, prensa de parafuso (como a do Azarias) e for-
no de tijolos. São os fornos de farinha no Ceará fehos de
grandes tijolos quadrados que assentam sobre crês, quatro
ou cinco arcos, como os dos fornos de louça, com uma beira
de pouco menos de um palmo, feita de tijolinhos postos
obliquamente. Alguns destes fornos os medi e tinham 14
palmos de boca. O mexedor de farinha tem um assento, or-
dinariamente oposto à boca da fornalha, que fica para fora,
e mexe a massa ou farinha com um rodo cujo cabo tem 16
a 18 palmos de largo. A farinha é sempre malfeita, grossei-
ra e cheia de caroços às vezes do tamanho dum caroço de
amêndoa, sendo as peneiras da massa mui grosseiras, deixam
passar crueiras. Tiram muita goma da massa.
Ao lado desta casa de farinha estava o engenho de açú-
car. As moendas são de ferro e puxadas por dois bois. Estava
moendo. O corpo do engenho é todo aberto e coberto de
folha de palmeira. A casa das caldeiras, pequena, é de tijolo
e coberta de telha; havia um barigue [sic] de três tachos, o
caldo caía num pequeno cocho, ou gaveta, e daí era lavado
para a primeira tacha em urna cuia de cabaça arnargosa [f. 7]
grande. As formas de barro grandes, de três, quatro e cinco
arrobas_ só faz açúcar mascavo, o ano passado vendeu 2.060
arrobas. Cada carrada de açúcar que vai para a cidade leva
120 arb. [arrobas] e lhe custa 50$000. Não tem escravos,
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"apenas dois escravinhos", disse ele, "e trabalho com livres


do país, pagando-lhes 320 por dia alimentando-os, ou 640 a
seco". Os canaviais são mui perto da fábrica, ficam por detrás
em uma baixada por onde corre um ribeiro d' água perene e
donde bebi; eu lá fui, é como o rio das Piabas no Mundaú,
e dum e do outro lado a terra é um barro denegrido, onde
ele planta a cana; mas é necessária esta venda - disse ele que
no ano passado comprou estrumas de animais no valor de
500$000. Vi a plantação de cana, é por quadrados e destes
vimos pouco pela ribeira; abaixo da ribeira para a casa e en-
genho a subida é mui suave e na distância de 300 passos. O
sítio está sobre um terreno raso a perder de vista. Há ao lado
da ribeira alguns pés de buriti, palmeiras que pela primeira
vez vi, e foi isso o que me levou lá, digo, aos canaviais. O
homem planta também mandioca, mas só para o gasto; e so-
mente vende o excedente, e isto nas areias secas, e nada mais.
Deu-nos [para] almoço fritada de carne seca, farofa, paçoca,
isto é, carne socada com farinha, café, digo, água suja de
café, e grude e beijus de massa. O almoço nos mandou pôr
dentro na casa do jantar, mas ninguém da família apareceu.
(Nós tínhamos visto várias senhoras e meninas andarem lá
dentro, deitadas na rede na saleta de fora; elas andavam pela
sala de dentro e passavam pelo corredor, olhando sempre
curiosas para fora .)
Também ele nunca se sentou à mesa, nem à ceia, nem
agora ao almoço; estava em pé em roda, servindo, mandan-
do e conversando.
53

Mas, logo que pront r


os nos romos despedir dele, se
apresentaram as senhoras , a saber·. a mu Ih er e outra, que ta l-
vez era sogra, e uma menina , e nos d espe d·imos d e as.
1
Este lugar é chamado O c aJueiro
· . d o M·1n1stro
. porque
nest e lugar havia um rancho antigo e [f. 8] em frente dele
um vasto cajueiro. Quando os ouvidores ou ministros da
justiça andavam em correição, o dono do sítio mandava pre-
parar o rancho e limpar o cajueiro por baixo, donde ficou
o nome de Cajueiro do Ministro; e talvez mesmo que os
viandantes e parecem o quanto os magistrados preferissem
pousar embaixo do cajueiro, antes que no rancho, e quem
sabe se mesmo aí não davam audiência? Isto são conjeturas,
mas o homem só nos disse que o sítio fora de seu avô e que
este tinha aquele cuidado em mandar limpar o Cajueiro do
Ministro. Depois das nossas despedidas e agradecimentos e
oferecimentos dele para ficarmos para jantar, saímos eram
mais ou menos nove horas.
Andamos primeiro por tabuleiros e ora por matos, até
chegarmos a Cascavel pelas 11 e meia queimados de sol.
Achamos a nossa bagagem pousada na casa da Câmara Mu-
nicipal, edifício, ou casebre, e tão bem se não pior que o do
Aquiraz. Logo que chegou, nos informamos das autoridades
do lugar. O subdelegado estava firme, fazia suas vezes um ~u-
plente e mesmo a cavalo dirigimo-nos a sua casa para o cum-
.
pnmentar e o ac h amos a' iresca
e no balcão duma pequena lo-
.. h a; vo l tamos a descansar e logo fomos visitados pelo juiz
Jln
. . l e po r outras pessoas · Depois do jantar, às cinco
mun1cipa
54

horas fornos à casa do juiz, estivemos à porta conversando,


aí estava tatnbém o Lagos e outro sujeito da terra, capitão da
Guarda Nacional; pedindo eu água, o doutor nos convidou
para dentro e nos apresenta uma mesa com goiabada, queijo
e água. A casa era da maior simplicidade: na sala havia uma
rede e algumas cadeiras; para dentro era tudo simples e tos-
co, salinhas mui pequenas de telha vá; bom quintal, onde ele
teve os nossos cavalos. Dali demos uma volta pela vila e nos
recolhemos. Ao anoitecer fui [me] lavar [f. 9] para o lado
do mar, e a noite foi quente. Ao amanhecer do dia seguinte
estava o céu carregado e ventava do mar, e pouco depois,
quando já se ajuntavam os animais de carga, entrou a chover
por pancadas mui fortes, o que durou até mais de 11 horas,
de modo que se resolveu ficar a viagem para de tarde; e as
nossas malas, que estavam na rua, apanharam toda a chuva.
Passada a chuva, foi o Carvalho tirar as vistas da Matriz e da
capelinha de N. S. do Ó e eu andei correndo a vila para tirar
dela um plano, como já havia feito no Aquiraz. De tarde,
antes de sairmos, fui também ver o interior da capelinha da
Senhora do Ó, ao lado direito da qual estão quatro catacum-
bas com letreiros e em uma delas se lê a data de 1713 e seus
letreiros foram copiados pelo Carvalho. A igreja é pequena e
a capelinha é toda pintada à antiga e pinturas fingindo pedra
que não deixam de ter sua elegância. Montamos a cavalo e
assim nos fomos despedir do suplente e saímos da vila para
pousar no Alto das Cajazeiras. O caminho a seguirmos logo
tirado a linha, bordado de matos dos dois lados e arenoso, é
55

bonito; antes das seis h oras chegam .


suave descida chegam os ao no Choró, por um a
os ao vale do r'10
onde entramos, apres que , pelo lado por
en tava uma cam .
de carnaúbas e de cact d ptna rara com rnoí tas
os e uma forma l d
fazer -nos parar par e egante, e sorte a
a contemplar o lind 0
nos oferecia· 0 rio . panorama que se
. d . carna embaixo murmurando sobre um
1
a1eito pe regoso,
b
ou formado d
uma greda dura, era largo de
gumas racas e de fundo d . al
· Ih d ' esigu , mas não excedendo os
JOe os os cavalos. [f· IO] A n.b anceua . do lado oposto era
a b rupta e. alta de duas br aças t alvez; logo a subimos, se apre-
sentou diante de nós uma gran d e Plan1c1e
, . de terra denegri-
da e grotada, coberta duma floresta de carnaúbas, o sol ia
entrando e uma infinidade de vira-bostas, de anuns pretos
e brancos e de bandos de uns pássaros pardos, de peitos-
vermelhos, goelas de fogo voavam de uns para outros e en-
chiam os ares com seus cantos. É este vale uma ilha de légua
de comprido que o rio faz dividindo-se em dois ramos: o
primeiro, que tínhamos passado, tem o nome de Passagem
do Beija-bode, e o segundo, que íamos passar, se chama Pas-
sagem da Casa-forte; quando a esta chegamos nos meteu
algum medo, tinha ribanceiras altas, água escura e largura de
cinco a seis braças, mandou-nos adiante um dos ordenanças
que, mal entrou, voltou logo porque o cavalo se ia afundan-
do. Grande aflição do Lagos porque via a impossibilidade de
passar nosso comboio que vinha já perto, mas o outro meu
O
· om água que não chegou às
ordenança atirou-se e passou, e
. · nda assim re1nia ele que as cargas se
a 6as d o se 11m; mas 31
56

molhassem e irritava-se quando eu lhe dizia que passaria sem


perigo; e voltou para trás mandar buscar outra passagem do
rio mais alta e fazendo parar o comboio que vinha chegan-
do. Fizemos pensar que o José do Ó fosse sondar o rio e de lá
nos gritasse que se passasse.
Acalmou-se o Lagos e passamos o rio sem novidade,
sendo já quase noite; a tropa seguiu-nos logo e passou bem.
Alguns passos adiante, um oitavo de légua talvez, está
o pouso chamado Alto das Cajazeiras; para aí nós [f. 1 I]
fomos a uma palhoça, que tem fora duas grandes cajazeiras,
e aí nos indicaram uma casa de farinha para pouso, com
efeito para lá fomos. Acabavam de fazer farinha e estavam
fazendo beijus e grudes (solas) várias mulheres e raparigas,
e ao mesmo tempo espremiam e lavavam massa para tirar
a goma; vários homens havia aí também, trabalhando. A
casa é um grande telheiro aberto, ou sem paredes, e só pelo
lado de fora estava fechado de grossos paus-a-pique, por
dentro havia um cercado para onde montamos os nossos
cavalos de sela e lhes demos para comer jerimuns (abóbo-
ras); os animais de carga ficaram no campo peados. Cea-
mos fatias de presunto assadas com beijus e solas que nos
vinham oferecer as farinheiras; foi de galhofa até às nove
horas ajuntando-se depois mais homens, curiosos e con-
tadores de histórias. Ficamos em nossas redes e a turba,
assim como alguns dos nossos, foi para a casa vizinha, e
ao som duma rabeca e de uma viola dançou o samba até
muito tarde.
57

De madrugada Ievant
ou-se urna ventania .
logo de chuva que e l ., que se seguiu
oava pe os telhad
alha e outra de t Ih . , os, que eram n1 etad e d e
P e a, nos com 0 st ,
. fi ' e avamos na parte telha-
da , nem assim camos isentos d o- • .
as o 0 teiras; rnutta da nossa
carga fi cou molhada. Ao rom d .
. per O dia cessou a eh uva e o
combo10 tratou logo de sair N,
. . , · os, a sa 6er, eu, Lagos e Car-
valho .e os dois ordinario s fi camos para almoçar; o almoço
nos veio da casa do don 0 d ara c,b nca
· e constou de café, antes
água de café, e de uma [f· 12] d,uz1a • d e ovos, que em vez de
quentes estavam cozidos e nos foram apresentados dentro de
um prato de rosto. Comemos os ovos com os b~ijus que nos
ficaram da véspera, eram quase crueiras, e bebemos em cima
a água suja de café. Já então estava de novo a casa de farinha
cheia da mesma gente da véspera, que continuava a sua la-
butação. Às nove horas montamos a cavalo e seguimos para
o Pirangi. Era todo o caminho bordado de matas virgens, ou
capoeiras, que se não diferencia deles, e que se parecem com
as nossas capoeiras. Às 11 horas mais ou menos chegamos ao
vale do Pirangi: é um vale largo semelhante ao do Pacoti, co-
berto de carnaúbas e pelo qual passa o rio desse nome, divi-
dido em crês ramos; rodos estavam secos, apenas em alguns
lugares havia poções duma água barrenta. Saindo desse vale
demos em uma grande vargem chamada vargem da Serra,
no meio da qual está a situação onde íamos pousar.
O dono da casa nos apareceu em camisa e ceroula, nos
• andou ou antes foi armar
agasalhou com boas maneiras, m
,. d e · h e mandou aprontar almoço; este
rres redes na casa e rann a
58

contava de dois pratos de fritada , de carne seca assada, de


farofa, de beijus, meia dúzia de ovos duros e uma água suja
de café, e 1norna intragável, mas para não descontentá-lo
- ele comeu conosco igualmente, mas nos havia dito que já
tinha alinoçado -, como dizia, para [f. 13] contentá-lo eu )

fazendo das tripas coração, emborquei duas xícaras. Depois


disso nos fomos deitar nas redes, e ele sentado num ban-
quinho não cessou de falar, fazendo-nos questões às vezes
impertinentes. Contava ele que nós (digo, a comissão) ví-
nhamos ao Ceará descobrir minas de metais preciosos, fartar
a província de águas e ensinar a trabalhar: "Porque, dizia ele,
nós estamos ainda muito brutos; na sua terra (parecia que
se referia à Europa) há tantos meios de abreviar o trabalho
que nós desconhecemos, vejo coisas vendidas por preço tal
que seria impossível fazê-los entre riós" (isto é, o Ceará); re-
feria-se sem dúvida aos artefatos europeus. "Eu aqui tenho
tanto trabalho para plantar, limpar e de fazer a mandioca em
farinha, desejava ver algum meio de fazer esse serviço mais
depressa"; e era nisto, como em outras coisas, que ele espe-
rava que a comissão desse ou ensinasse modos de facilitar
os trabalhos, e quando eu lhe expliquei qual era o objeto da
minha seção e da do Lagos, o homem caiu das nuvens e não
podia compreender-me; e enfim disse: "Já vejo que com os
senhores não ganho nada". Era curioso ver este homem falar,
era uma linguagem quase composta por ele: por exemplo,
para dizer "por esta redondeza" dizia "por este redontório",
para dizer "estamos carregados de trabalho" dizia "estamos
59

ca rregados de fabór zo
• ,, e a .
. 'd , ss1rn por d.
sua rusttcl ad e disco rna . b ern iante. Mas no meio • de
Tem creio que 12 filh os , seis . fiA
e mostrava muito bo m senso.
e emeas e s · h
nos, que roram os que ei s rnac os; os meni-
se mostraram (a
[f. 14] as víamos na p d s meninas e mulh eres
ona a cozinh
farinha onde estávam ª que dava para a casa de
os, e onde al
sem nos falarem me guma moradora (en tramas
, nos um a pecurru h ) l
bém apareceu de vez e ª e a mu her tam-
em quando)· os m . d .
maior terá 16 ano - . ' eninos, os quais o
s, sao mu1 ágeis. e d esem baracados· quando
c h egou a nossa bagagem for . , '
, l ' am ªJudar a descer as cargas e a
carrega- as,
, .mas tem O pai. gran d e desgosto, por serem mui
ru d es. Ha cinco ou seis
· meses que têm mestre e nem ainda
soletram bem um nome , e i·sro to d os eles.
Aconselhei-lhe que os nao
- atormentasse com panca-
das, como fazia o mestre, que tivesse paciência, não sendo
eles culpados da pouca inteligência; e que em vez de bolos
de palmatória lhes desse antes bolos de aveias ou de milho
em prêmio quando dessem boa lição; isto causou-lhe certa
surpresa e disse rindo - e para o mestre, que estava presente
-: "Vou mandar vir uma carga de rapaduras para dar os me-
ninos", o que causou riso geral na companhia - havia entre
muitas pessoas em roda. Eram rodos matutos , mas espertos e
curiosos, examinando e admirando as espingardas e pistolas
que levava o Lagos. Era de noite e nós não tínhamos jantado,
esperando que O
nosso homem nos desse de comer, mas ele
(que passa por sovina) , rendo-me perguntado se nós rrazía-
mos comida e eu lhe dissesse que sim, descansou; mandou-
60

nos pois assaz presunto e fazer farofa, com que ceamos, e ele
nos mandou um bule da água suja de café, temperado com
rapadura. No dia seguinte me pediu desculpa de não nos
ter dado jantar. De manhã cedo nos aprontamos para sair,
el e ofe receu-se para ir [f. 15] com o Lagos a sua roça [pala-
vra cortada] ver os estragos da lagarta nos mandiocais e dali
levá-lo a ver um serrote que tem muitas e variadas pedras.
E como nos não oferecesse almoço nem café, comemos um
pouco de presunto cru com farinha e queijo e montamos a
cavalo às sete horas, eu com o comboio e o Lagos com ele;
designado o s.ítio da Amarela para nos reunirmos. Andamos
por pedaços de estrada arenosa, reta e bordada de vistosas
matas, que faziam um belo efeito; e a manhã era fresca.
Chega1nos aos córregos da Amarela, onde há uma pa-
lhoça. Os córregos estavam secos, são dois leitos de torren-
tes, com largura de 30 a 40 braças, que se encontram neste
Iugar; tornando em uma vargem larga que vai ter a uma la-
goa chamada Amarela, ou das Amarelas, seja porque a água
é amarelada, ou porque é essa lagoa cheia de pedras de cor
atnarela, e de que vimos algumas nos leitos secos das torren-
tes; é essa vargem coberta de carnaúbas. No encontro dos
chamados córregos fica utn alto ou espécie de promontório
etn ci1na do qual está a palhoça de que falei. Esta palhoça
tem ao lado um pequeno curral, onde havia uma porção de
cabras presas, e ao pé do cercado uma outra palhoça toda
aberta onde era a casa de farinha. Chegamos aí seriam nove
horas, o sol já queitnava.
6J

Era rudo silêncio só a , b d


' - "s ca ras avam sinal de vida no
curral, fornos rod ea ndo a casa até O fi d . .
.
mos n1ov11nento d entro e um fal . b .
un °,
eu e o Reis sentt-
, ar atxo, nos aproximamos
à parre de eras e chamamos· [f IG] d'
,., . ' · acu iram duas mulheres,
mas nao queriam chegar-se a ,
. , nos e correram quando nos
aproximavamos a elas; então esta d . , , e. d
n o Ja nos no 1 un o da
casa apareceu uma mulher a quem d' Ih
pe imos agasa o e a1-
moço, sobre esta última parte ncez suas d'fi 1 cu ld ad es d'1zen d o
que nada tinha que nos conviesse . "O que comeu V mce.
[vosmecê]?", lhe perguntei eu • "Jerimum , retJao,
e .. ,.,
o que D eus
quer", respondeu ela. Então eu lhe disse: "Estão aqui cabras,
-- tem lette.
nao . 1" • "'T'1em" , d·1sse ela. "Não tem rapadura?". "Um
bocadinho", respondeu. "Não tem café?". "Muito pouco".
"Pois então faça café, ajunte leite e adoce com rapadura que
estamos satisfeitos". Sorriu-se e entrou para dentro.
Nós voltamos para a frente, onde uma das meninas
estava vendendo melancias a uns soldados de um destaca-
mento que chegou depois de nós. (Este destacamento de uns
poucos de soldados, alguns casados levavam suas mulheres,
iam para o Crato e conduziam dois presos, criminosos de
morte e iam ambos algemados, para responder aos júris do
Icó, um, e o outro no Crato.) O Reis comprou logo duas
boas melancias, que estavam excelentes, abriu-as logo e foi
as devorando, eu também com duas talhadas para minorar
a sede, havia também boa porção de jerimuns e logo com-
pramos uns poucos para os nossos cavalos, que não tinha
· · · --o do dono da
capim. Nessa correria chegou um suJetto trma
62

casa e navou logo conversa co nosco. C hega serão dez horas


o Lagos con1 o seu ordenança, vinha torrado , e sequioso ati-
rou-se às n1elancias, como gato a bofes, e dizendo-lhe que
esperasse pelo café: ~'N ão quero café, morro de sede". O ho-
1nern de que111 aciJna falei e a quem disse que pedira café à
senhora [f. 17] que era sua cunhada, e sabendo que não havia
e.m casa beijus, saiu e daí a pouco voltou com uma porção de
bcíjus de massa, grosseiros, mas que nos remediaram. Enfim
pôs na mesa, veio um bule cheio de ótimo café com leite de
cabra e um prato com uma dúzia de ovos cozidos, que nos
regalou. O Lagos mandou vir café simples, o Reis também to-
mou pouco café com leite, por terem comido muita melancia;
eu fartei-me no café tomando quatro xícaras famosas e com
isso ficamos até à noite. O velho estendeu logo uma rede para
mim e mandou buscar outras duas, para o Lagos e Reis, e nós,
estendidos e balançando-nos nas redes, conversávamos e nos
divertíamos com uns rapazes que chegaram depois e algumas
raparigas, que vieram para a sala, aí se contou muita história,
se tomaram muitas notas e se gracejou bastante. Eu apenas saí
a ver uns pés de cumaru na vargem, os quais estavam inteira-
mente sem folhas, e o Lagos foi com um dos rapazes a um lu-
gar de muitas pedras e trouxe de lá algumas amostras também
do serrote a que o tinha levado de manhã o dono do sítio do
Pirangi; levou pedaços que lhe pareciam ser de mármore.
Passamos um dia mais alegres do que cuidávamos e às
três horas e meia partimos, e ainda com sol quente, com o
desígnio de dormir nas Imburanas, onde deviam ter pousa-
63

do as nossas cargas. Chegamos a esse lugar às cinco horas;


é um a grande vargcm de barro denegrido, coberta de car-
nJúbas, onde no tempo das águas se forma um vasto laga-
mar; agora apenas tinha alguns poços. Em roda dessa grande
[f. 18] bacia seca havia algumas palhoças, a uma das quais
que nos parece a mais freqüentada nos dirigimos; mas nada
encontramos, nem notícia da nossa bagagem; depois uma
pessoa que encontramos certificou-nos que ela ia já muito
adiante, o que pôs o nosso Lagos enfurecido e por mais que
eu o quisesse acomodar dizendo que, se se tinha adiantado,
era para achar melhor comida para os animais de água e
milho, nada o abrandava e fomos seguindo para diante por
um caminho, já não tão bom, mas bastante sujo de mato
pelo meio do caminho, e marchávamos de noite com os ca-
valos cansados, indo muito de~agar, até que avistamos um
vale com algumas carnaúbas e uma grande lagoa; aí vendo
luz em uma palhoça lá se foi indagar e se soube que acé que
estava arranchado ali perto no sítio das Carnaubinhas; está-
vamos a alguns passos desse lugar. De lmburanas por diante
começamos a encontrar muitas maracanãs, as primeiras que
eu tinha visto no Ceará: sentavam pelas árvores à beira do
caminho e mui mansas. Apeamo-nos no pouso, onde a nos-
sa gente havia chegado pouco tempo antes. O Lagos ralhou
bastante com o Raimundo (condutor da tropa) e com o José
do Ó, nosso Jactótum. É uma casa grande, meia coberta de
telha e meia de palmas, meia roda aberta, onde havia fábrica
de farinha, e outra meia ainda meia barreada e meia fechada
64

. cotn cercados de porcos, de cabras, de vacas


d e paus-a-pique,
o é um rapaz casado e com família nos
etc. aos 1ad os. O don '
rece beu mui· contente , nos deu ceia de peixe e café ralo feito
com água barrenta, única que aqui há e que, [f'. 19] se eu a
quis beber, pedi-lhe que me mandasse fazer uma garapa com
rapadura, e assim a traguei.
23: De manhã nos levantamos e nos aprontamos para
sair, com tenção de ir almoçar no Aracati, que é daí a duas
léguas e meia; ele nos não ofereceu café, talvez por não tê-
lo, e nos convidou para comermos carne seca assada, o que
agradecemos. Eram sete horas quando montamos a cavalo
e por um caminho como o da véspera, isto é, maltratado,
caminhei até oito horas e meia, indo devagar e por uma cha-
pada quase igual; a essa hora avistava-se ao longe um baixa-
do, que eu presumi logo ser o leito ou vargem do Jaguaribe;
com efeito pouco depois, por entre as duas bordas de matas
do caminho, avistei eu os tetos de algumas casas atrás duma
igreja. Clamei mui contente: "Estamos em Aracati", que foi
sempre descortinando-se e mostrando-se até que o vimos
em toda a extensão sem vermos porém o rio. Chegamos à
vargem, como as outras de um barro denegrido rachado,
coberto de carnaúbas e limitado em nossa frente por uma
porção mais elevada e arenosa e com alguma vegetação de-
trás da qual está o rio. Esta vargem é bastante larga e estava
seca; começamos a ver algumas palhoças e depois entramos
por uma cancela, espécie de barreira, donde avistamos o rio,
e além dele a cidade · A mare' esta' vazia
· e o no
• so, 01erece
e a
65

largura de talvez 50 braças e fi


com undo raso por
cavalos apenas nadam umas quatr . quanto os
0
. , ou Ctnco braças no meio
do no; a passagem e em canoas.
As pessoas de pé vêm desc 1
. . ª ças e, arregaçadas as calças,
entram no no, pois na maré baixa a , . .
agua se espraia muno e a
canoa pela [pega] logo na areia [f 20] e 1•
· os cava eiras entram
no rio até a borda da canoa e nela se apei· · ·
am, ttram os arre10s
do cavalo, o cavaleiro dentro da canoa e O cavalo fora, pu-
xando por cabresto até a canoa encalhar do outro lado, en-
tão sela-se de novo o cavalo e o cavaleiro monta e sai do rio.
O canoeiro nem outra pessoa carrega aqui os passageiros;
tem a demora da passagem porque os cavalos passaram em
duas viagens, não podendo passar mais de três de cada vez;
estivemos esperando na praia e expostos ao sol ardente até
além das dez horas. Enfim entramos na cidade e seguimos
pela mui grande rua até a casa já ocupada por Manoel e Vila
Real, que haviam chegado uns quatro dias ante~. .
Tivemos um bom almoço de peixe e cafe com lette e
pão e boa água; foi um verdadeiro regalo. ,
.
Gastamos nesta viagem, que fazem ser de 30 leguas,
. d da cidade no dia 16 de agosto
oito dias incompletos, sain ° . d
1
d em Aracati no dia 23 pe as ez
às quatro da tarde e entran °
da manhã. d .
, 11 horas a noite.
Aracati, 24 de agosto as b e apontamentos
,., f; .ta às pressas e so r
Foi esta narraçao ei . so muito incom-
. gem· e por 1s
tomados a lápis durante ª via '
pleta, e muito mal escrita.

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